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TEORIA GERAL DO DIREITO PROCESSUAL Aula 2: Ministério Público e Defensoria Pública* Sumário: INTRODUÇÃO; 1 MINISTÉRIO PÚBLICO: 1.1 Divisão; 1.2 Garantias e Vedações Constitucionais; 1.3 Funções Institucionais; 1.4 Princípio do Promotor Natural; 1.5 Deveres e Responsabilidade; 1.6 Atuação Como parte; 1.7 Atuação como fiscal do ordenamento jurídico; 1.8 Prerrogativas Processuais; 1.9 Impedimento e Suspeição. 2 DEFENSORIA PÚBLICA: 2.1 Atuação Institucional; 2.2 Funções Institucionais; 2.3 Prerrogativas e direitos; 2.4 Deveres e Responsabilidade INTRODUÇÃO São funções essenciais à Justiça as exercidas pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública e pelos advogados públicos e privados. Em geral, o Ministério Público atua no processo quando há interesse público; a defensoria pública quando há necessidade de proteção à pessoa hipossuficiente; os advogados privados, profissionais liberais ou associados, quando são contratados para defenderem os interesses de seus constituintes em Juízo e/ou fora dele, o mesmo ocorrendo com os advogados públicos, concursados ou contratados pelo Poder Público para defesa da Fazenda Pública em Juízo e fora dela. O Ministério Público, a Defensoria Púbica e os advogados possuem capacidade postulatória e, salvo exceções, as partes devem ser representadas em Juízo por advogados e procuradores. A Defensoria e o Ministério Público agem em juízo em nome próprio defendendo direito alheio. Os advogados agem em juízo em nome e em defesa de direito alheio.

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TEORIA GERAL DO DIREITO PROCESSUAL

Aula 2: Ministério Público e Defensoria Pública*

Sumário: INTRODUÇÃO; 1 – MINISTÉRIO PÚBLICO: 1.1 –

Divisão; 1.2 – Garantias e Vedações Constitucionais; 1.3 – Funções

Institucionais; 1.4 – Princípio do Promotor Natural; 1.5 – Deveres e

Responsabilidade; 1.6 – Atuação Como parte; 1.7 – Atuação como

fiscal do ordenamento jurídico; 1.8 – Prerrogativas Processuais; 1.9 –

Impedimento e Suspeição. 2 – DEFENSORIA PÚBLICA: 2.1 –

Atuação Institucional; 2.2 – Funções Institucionais; 2.3 –

Prerrogativas e direitos; 2.4 – Deveres e Responsabilidade

INTRODUÇÃO

São funções essenciais à Justiça as exercidas pelo Ministério

Público, pela Defensoria Pública e pelos advogados públicos e

privados.

Em geral, o Ministério Público atua no processo quando há

interesse público; a defensoria pública quando há necessidade de

proteção à pessoa hipossuficiente; os advogados privados,

profissionais liberais ou associados, quando são contratados para

defenderem os interesses de seus constituintes em Juízo e/ou fora

dele, o mesmo ocorrendo com os advogados públicos, concursados

ou contratados pelo Poder Público para defesa da Fazenda Pública em

Juízo e fora dela.

O Ministério Público, a Defensoria Púbica e os advogados

possuem capacidade postulatória e, salvo exceções, as partes devem

ser representadas em Juízo por advogados e procuradores. A

Defensoria e o Ministério Público agem em juízo em nome próprio

defendendo direito alheio. Os advogados agem em juízo em nome e

em defesa de direito alheio.

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No cível ou no criminal o Ministério Público pode assumir a

posição de autor ou de fiscal do ordenamento jurídico (custos legis).

A Defensoria Pública pode ser parte ou exercer a curadoria especial;

o advogado como representante da parte em juízo pode ser um

profissional liberal, integrar associação de advogados particulares ou

ser advogado público na defesa de pessoas jurídicas de direito público

federal, estadual e municipal e outros entes públicos.

Cada um desses agentes possuem atribuições, deveres, direitos

e peculiaridades em sua atuação profissional e processual. Os

membros do Ministério Público possuem as mesmas garantias e

prerrogativas da Magistratura previstas na Constituição, ao passo que

os membros da Defensoria pública, esta instituição em consolidação

legislativa, tem atuação cada vez mais presente e intensa na Defesa

das pessoas necessitadas, judicial e extrajudicialmente.

1 – MINISTÉRIO PÚBLICO

O Ministério Público é um órgão historicamente conhecido na

história do Direito Processual. Para muitos, seus membros eram os

Procuradores do Rei na Antiguidade; na França eram chamados os

magistrados de pé; alguns países ainda mantém a divisão entre

magistrados do Ministério Público e magistrados do Judiciário, como

ocorre na Itália. No Brasil, o Ministério Público, apesar de possuir as

mesmas garantias, não se confunde com a magistratura; embora

ambos os órgãos recebam similares deveres, direitos e prerrogativas

funcionais.

Enquanto o magistrado dirige o processo e julga, o Ministério

Público exerce duas funções essenciais no processo brasileiro:

promove ações civis, penais, trabalhistas, eleitorais etc., ou seja, é

autor, demandante ao passo que o juiz é o julgador.

O Ministério Público – MP, segundo a Constituição, tem como

características próprias a unidade, a indivisibilidade de sua atuação e

a independência funcional (art. 127, § 1º da CF). Unidade e

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indivisibilidade significam que dentro da instituição, respeitada

divisão federativa o Ministério Público tem uma só voz, um só

comando e não se divide ou fragmenta e, respeitada a

inamovibilidade de seus membros, pode haver atuação de mais de

um membro em conjunto, como atualmente ocorre em forças-tarefas

do MP no combate ao crime organizado. Independência significa que

nenhum membro do órgão se sujeita à obediência de opinião de

outrem ou de Chefia, cabendo-lhe fazer o seu próprio convencimento

e atuar com autonomia, liberdade e imparcialidade no âmbito de suas

atribuições. Mesmo no processo penal, segundo o art. 28 do CPP,

quando o membro do Ministério Público pede o arquivamento de um

inquérito, o juiz não pode determinar a ação prossiga e sim remeter

os autos ao Procurador-Geral (Chefe da Instituição) e o órgão próprio

superior daquela unidade federativa ou da União poderá insistir no

arquivamento do inquérito ao qual o juiz está obrigado a atender, ou

oferecer a denúncia ou designar outro membro do Ministério Público

para realizar tal tarefa, mantendo-se a independência pessoal do

membro do Ministério Público que pediu o arquivamento do inquérito

policial.

De acordo com a Constituição Federal, o MP “é instituição

permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-

lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos

interesses sociais e individuais indisponíveis” (art. 127, caput, da CF).

O Ministério Público é órgão que atua judicial (e até

extrajudicialmente por meio de notificações a órgãos e pessoas)

visando à proteção dos direitos da sociedade, em especial direitos

coletivos e difusos, e indisponíveis, além de outras atribuições. Além

de poder ser parte, sua atuação em juízo se dá na qualidade de órgão

fiscalizador do devido processo, em nome da sociedade ou do

interesse público.

1.1 – Divisão

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Conquanto a Constituição faça alusão à unidade funcional, essa

característica do órgão não é absoluta, uma vez que a própria

Constituição no seu art. 128 faz a divisão entre Ministério Público da

União e Ministério Público dos Estados, atendendo ao princípio

federativo.

O Ministério Público da União é formado pelos seguintes órgãos:

Ministério Público Federal, Ministério Público do Trabalho, Ministério

Público Militar e Ministério Público do Distrito Federal e Territórios

(art. 128 da CF).

A Constituição define que o Ministério Público da União tem por

chefe máximo o procurador-geral da República, e o Ministério Público

dos estados possui como chefe o respectivo procurador-geral de

justiça.

O Ministério Público Federal rege-se basicamente pela LC n.

75/93, que dispõe sobre a organização, as atribuições e o Estatuto do

Ministério Público da União.

O Ministério Público Estadual, composto por Promotores e

Procuradores de Justiça, tem como normatização de regência a Lei n.

8.625/93 – Lei Nacional do Ministério Público, que dispõe também

sobre as normas gerais do Ministério Público das unidades da

federação.

1.2 – Garantias e Vedações Constitucionais

Aos membros do Ministério Público são asseguradas as

garantias constitucionais da magistratura, entre as quais as

seguintes: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de

subsídios.

A vitaliciedade significa que após dois anos de exercício no

cargo não pode o agente ministerial perdê-lo, a não ser que seja por

sentença judicial transitada em julgado após o devido processo legal.

Esta sanção decorre do processo penal (CPP) ou até na ação de

improbidade, nos termos da Lei nº 8.429/92.

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Por inamovibilidade entende-se que o membro do Ministério

Público não pode ser transferido ou removido ex officio e contra a sua

vontade de uma Promotoria para outra. Excepcionalmente o ocupante

do cargo ministerial pode ser removido por motivo de interesse

público, por decisão do órgão colegiado competente do Ministério

Público, pelo voto da maioria absoluta de seus membros, assegurada

ampla defesa.

A irredutibilidade de subsídio é a impossibilidade de que

medidas administrativas decretem a perda do poder aquisitivo

nominal dos valores percebidos pelos membros da carreira, exceto as

ressalvas e deduções previstas na Constituição.

Quanto às vedações, os membros do MP não podem: receber, a

qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou

custas processuais; exercer a advocacia; participar de sociedade

comercial, na forma da lei; exercer, ainda que em disponibilidade,

qualquer outra função pública, salvo uma de magistério; exercer

atividade político-partidária; receber, a qualquer título ou pretexto,

auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou

privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei.

1.3 – Funções Institucionais

São funções institucionais do Ministério Público, conforme o art.

127 da nossa Carta Fundamental: promover, privativamente, a ação

penal pública, na forma da lei; zelar pelo efetivo respeito dos Poderes

Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados

na Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;

promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do

patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses

difusos e coletivos; promover a ação de inconstitucionalidade ou de

representação para fins de intervenção da União e dos estados, os

casos previstos nesta Constituição; defender judicialmente os direitos

e os interesses das populações indígenas; expedir notificações nos

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procedimentos administrativos de sua competência, requisitando

informações e documentos para instruí-los, na forma da lei

complementar respectiva; exercer outras funções que lhe forem

conferidas, desde que compatíveis com sua finalidade, ficando

proibida a representação judicial e a consultoria jurídica de entidades

públicas.

Especificamente no processo, incumbe ao Ministério Público

requisitar a instauração de inquérito policial (art. 5º, II, do CPP),

inclusive diligências criminais para a descoberta da verdade sobre

fatos em investigação, promover a denúncia em caso de ação penal

pública, ou, requerer o arquivamento do inquérito ou de quaisquer

peças de informação. Havendo pedido ministerial de arquivamento,

como aduz o art. 28 do CPP, “o juiz, no caso de considerar

improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou

peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a

denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la,

ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz

obrigado a atender”.

1.4 – Princípio do Promotor Natural

“As funções do Ministério Público só podem ser exercidas por

integrantes da carreira, que deverão residir na comarca da respectiva

lotação, salvo autorização do chefe da instituição” (art. 129, § 2º da

CF).

Não pode nenhuma autoridade – judiciária ou da chefia do

governo ou da cúpula do Ministério Público – nomear alguém

estranho à carreira do Ministério Público para exercer as funções

ministeriais, porque tal ato se torna inválido a partir da nomeação.

Desse modo, em homenagem ao princípio do promotor natural,

vedou-se uma possibilidade antiga, antes da Constituição de 1988, de

uma pessoa estranha, autoridade ou particular, ser nomeada para

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exercer as funções de promotor de justiça (ad hoc), inclusive para

promover a ação penal pública, como ocorria no passado.

1.5 – Deveres e Responsabilidade

Os membros do Ministério Público possuem prerrogativas,

direitos e deveres funcionais.

É dever do agente público ministerial o de residir na Comarca,

salvo se houver autorização do chefe da instituição (CF, art. 129, §

2º).

Assim como ocorre no Poder Judiciário, “a distribuição de

processos no Ministério Público será imediata” (art. 129, § 5º da CF),

devendo o órgão velar para a razoável tramitação do processo

administrativo perante o órgão.

Por responsabilidade compreende-se a possibilidade de haver

sanções ao agente pela sua atuação pessoal ou por cometimentos de

atos contrários à lei, salvo as consequências previstas

normativamente.

O membro do Ministério Público pode ser responsabilizado civil

e pessoalmente, conforme a previsão genérica do art. 37, § 6º, da

Constituição, segundo a qual “as pessoas jurídicas de direito público e

as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão

pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a

terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos

casos de dolo ou culpa”.

Todavia, o agente ministerial não responde por culpa, como um

servidor público comum, apenas pela sua atuação por dolo ou má-fé.

“O membro do Ministério Público será civil e regressivamente

responsável quando agir com dolo ou fraude no exercício de suas

funções” (art. 181 do CPC).

A responsabilidade Administrativo-Disciplinar pode ocorrer no

âmbito da fiscalização e controle pelas Corregedorias internas de

cada órgão ministerial.

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Também o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP),

criado pela Emenda Constitucional nº 45/2004, faz o controle da

atuação administrativa e financeira do Ministério Público da União e

dos estados (e DF) e faz o controle do cumprimento dos deveres

funcionais dos seus membros. O CNMP é composto por 14 membros e

presidido pelo procurador-geral da República.

A responsabilidade Penal implica na possibilidade de o membro

do Ministério Público, na sua atuação funcional, cometer infrações

penais, se denunciado pelo próprio órgão ministerial a quem couber

tais atribuições perante processo no juízo competente. Essa

responsabilidade decorre da prática de infrações no exercício da

função, sem prejuízo do procedimento criminal por prática de delitos

comuns, por meio do devido processo legal no âmbito da respectiva

competência dos tribunais.

1.6 – Atuação Como parte

Especificamente no processo, civil, penal ou trabalhista, o

Ministério Público pode atuar como parte ou como fiscal do

ordenamento jurídico.

Como Parte cabe-lhe promover a ação de acordo com suas

atribuições: petição inicial no plano civil e promover a denúncia

criminal dando início assim ao processo.

Na qualidade de parte o Ministério Público exerce o direito de

ação em diversas situações e juízos, conforme suas atribuições

constitucionais (CPC, art. 177). Por exemplo: Ação civil pública, para

a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de

outros interesses difusos e coletivos (art. 129, III da CF).

Como parte também pode em seu nome proteger direito alheio,

daí falar-se em legitimação extraordinária ou, para alguns,

legitimação autônoma do órgão ministerial, como, por exemplo,

quando promover ação civil de reparação de dano em favor da família

pobre de vítima de crime contra o autor do crime (art. 68 do CPP),

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conquanto essa atribuição tenha passado a ser institucionalmente de

atribuição da Defensoria Púbica ou quando o MP promover ação civil

pública (art. 5º, I, da Lei n. 7.347/85) para proteger o meio ambiente

ou o consumidor, ou ainda, quando promover ação requerendo a

abertura de inventário, quando houver herdeiros incapazes (art. 616,

VII, do CPC). Porém, segundo a Súmula nº 470 do Superior Tribunal

de Justiça (STJ): “O Ministério Público não tem legitimidade para

pleitear, em ação civil pública, a indenização decorrente do DPVAT

em benefício do segurado”.

O Ministério Público, excepcionalmente, pode figurar com réu,

como no caso de ação rescisória contra sentença proferida em ação

que promoveu.

Como parte criminal (autor) o Ministério Público promove a

ação penal pública incondicionada ou condicionada à representação

(art. 129, I, da CF; e CPP, art. 257, I, do CPP).

1.7 – Atuação como fiscal do ordenamento jurídico

Além de agir como parte, o Ministério Público intervém no

processo na qualidade de fiscal da Lei ou, na nova linguagem do CPC

de 2015, fiscal da ordem jurídica ou do ordenamento jurídico. Nessa

condição, o membro do MP tem atuação obrigatória no processo (em

que pela lei ou pela natureza da causa deva intervir) mediante

promoções ou pareceres que deve exarar, à vista do interesse público

ou social. A não intimação do Ministério Público nos casos em que

deva participar como custos legis (fiscal da lei) gera nulidade

processual.

Como fiscal do ordenamento jurídico no plano civil, o Ministério

Público pode atuar conforme as previsões constitucionais e legais, em

especial havendo: interesse público ou social; interesse de incapaz;

litígios coletivos pela posse de terra rural ou urbana (CPC, art. 178).

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No processo de litígio coletivo possessório imobiliário o MP deve

ser necessariamente intimado para comparecer à audiência de

mediação (art. 565 e parágrafos do CPC).

Também lhe cabe promover a ação de restauração de autos

(desaparecidos do Juízo), conforme art. 712 do CPC.

Nas ações de família, tais como processos contenciosos de

divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável,

guarda, visitação e filiação, o Ministério Público intervirá apenas se

houver interesse de incapaz, devendo ser ouvido prévia e

necessariamente em caso de homologação de acordo (art. 693 c/c

art. 698 do CPC), caso contrário corre-se o risco de haver nulidade

processual. A intimação do Ministério Público como fiscal da ordem

jurídica é obrigatória, sob pena de nulidade (arts. 84 e 246 do CPC).

O Ministério Público participa como fiscal do ordenamento

jurídico no incidente de resolução de demandas repetitivas e poderá

ter legitimidade sucessória para continuidade do incidente em caso de

abandono ou desistência do requerente (§ 2º do art. 976 do CPC).

Também intervém como fiscal da lei, não obrigatoriamente, no

processo de mandado de segurança (art. 12 da Lei nº 12.016/09) em

que haja interesse protegido pelo órgão, e em outros casos, ainda

que não expressos em lei, considerados de interesse público.

Segundo o art. 178 do CPC, após ser intimado, o Ministério

Público tem o prazo de trinta dias para intervir como fiscal da ordem

jurídica.

O Novo CPC é bastante peremptório ao definir que o interesse

público não significa necessariamente interesse governamental.

“A participação da Fazenda Pública não configura, por si só,

hipótese de intervenção do Ministério Público” (art. 178, parágrafo

único, do CPC).

“Nos casos de intervenção como fiscal da ordem jurídica, o

Ministério Público: terá vista dos autos depois das partes, sendo

intimado de todos os atos do processo; poderá produzir provas,

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requerer as medidas processuais pertinentes e recorrer” (art. 179, I e

II, do CPC).

No âmbito criminal, o Ministério Público fiscaliza a aplicação da

lei, quando não for autor (CPP, art. 257), o que ocorre geralmente

em processo de iniciativa privada. Nesta hipótese intervém

manifestando-se depois das partes na ação penal privada.

No processo penal, quando não for parte autora, o Ministério

Público participa como fiscal da lei, como ocorre nas ações penais de

iniciativa privada.

Conforme aduz o art. 257 do CPP, o Ministério Público fiscaliza a

aplicação da lei, quando não for autor. Nessa intervenção manifesta-

se depois das partes privadas.

1.8 – Prerrogativas Processuais

O Ministério Público não é um litigante comum, pelo fato de

representar a sociedade e o interesse público, razão pela qual o

legislador lhe concede algumas benesses processuais. Conforme o

art. 180 do CPC possui prazo em dobro para se manifestar nos autos,

que terá início a partir de sua intimação pessoal, por carga, remessa

ou meio eletrônico.

Sua intimação pessoal se dá nos autos, conforme consta da Lei

Complementar nº 75/93, no seu art. 18, h; e no art. 41, IV, da Lei nº

8.625/93.

Sendo fiscal da lei o Ministério Público tem vista dos autos

depois das partes e poderá produzir provas e requerer medidas (art.

179 do CPC).

O membro do Ministério Público possui ainda o direito de

“sentar-se no mesmo plano e imediatamente à direita dos juízes

singulares ou presidentes dos órgãos judiciários perante os quais

oficiem” e “usar vestes talares” (LC 75/93, art. 18, a, b).

Sem prejuízo dos mesmos direitos das partes e da Defensoria

Pública, fiscal da lei ou parte o Ministério Público pode fazer “a

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representação ao juiz competente contra o auxiliar judicial que sem

justificativa exceder os prazos processuais legais” (art. 233, § 2º do

CPC).

Conforme o art. 279, § 1º e 2º, do CPC: “É nulo o processo

quando o membro do Ministério Público não for intimado a

acompanhar o feito em que deva intervir. Se o processo tiver

tramitado sem conhecimento do membro do Ministério Público, o juiz

invalidará os atos praticados a partir do momento em que ele deveria

ter sido intimado. A nulidade só pode ser decretada após a intimação

do Ministério Público, que se manifestará sobre a existência ou a

inexistência de prejuízo”

1.9 – Impedimento e Suspeição

O Ministério Público é órgão do Estado atuante principalmente

no processo. Mesmo quando ingressa com ação (autor) deve ser

isento e livre na sua atividade de busca da verdade, porque não

participou do conflito material como regra. Ao agir, deve obedecer

aos princípios norteadores da participação de um agente público, por

isso se diz que o membro do Ministério Público, em qualquer

modalidade de intervenção, não pode agir se estiver pessoalmente

sob a condição que o impeça de atuar, ou seja, impedido ou suspeito.

Aos membros do Ministério Público aplicam-se os mesmos

motivos de impedimento e suspeição direcionados ao juiz (CPC, art.

148, I), mutatis mutandi.

Conforme o art. 144 e 145 c/c art. 148, I, do CPC há

impedimento do membro do Ministério Público, sendo-lhe vedado

exercer suas funções no processo: em que interveio como mandatário

da parte, oficiou como perito, funcionou como juiz ou prestou

depoimento como testemunha (I); de que conheceu em outro grau

de jurisdição, tendo proferido manifestação (II); quando nele estiver

postulando, como defensor público, advogado ou juiz, seu cônjuge ou

companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em linha

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reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive (III); quando for parte

no processo ele próprio, pessoalmente, seu cônjuge ou companheiro,

ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o

terceiro grau, inclusive (IV); quando for sócio ou membro de direção

ou de administração de pessoa jurídica parte no processo (V);

quando for herdeiro presuntivo, donatário ou empregador de

qualquer das partes (VI); em que figure como parte instituição de

ensino com a qual tenha relação de emprego ou decorrente de

contrato de prestação de serviços (VII); em que figure como parte

cliente do escritório de advocacia de seu cônjuge, companheiro ou

parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o

terceiro grau, inclusive, mesmo que patrocinado por advogado de

outro escritório (VIII); quando promover ação contra a parte ou seu

advogado (IX).

Se estiver atuando antes no processo e se surgir seu cônjuge

ou companheiro, ou qualquer parente, consanguíneo ou afim, em

linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive como defensor

público, advogado ou juiz, o impedimento do agente do Ministério

Público só se verifica quando o defensor público, o advogado ou o juiz

já integrava o processo antes do início da atividade ministerial (§ 1º

do art. 144 do CPC).

O impedimento do Membro do Ministério Público, em caso

previsto no inciso III também se verifica no caso de mandato

conferido a membro de escritório de advocacia que tenha em seus

quadros advogado que individualmente ostente a condição nele

prevista, mesmo que não intervenha diretamente no processo (§ 3º

do art. 144 do CPC).

O membro do Ministério Público é considerado suspeito, como

parte ou como fiscal do ordenamento jurídico: quando for amigo

íntimo ou inimigo do juiz, de uma parte ou de advogado que atue no

processo; que receber presentes de pessoas que tiverem interesse na

causa antes ou depois de iniciado o processo, que aconselhar algum

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interessado acerca do objeto da causa ou que subministrar meios

para atender às despesas do litígio; quando uma das partes for sua

credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes

destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive; quando for

pessoalmente interessado no julgamento do processo (art. 145 e

seus incisos do CPC). Poderá, enfim, o membro do Ministério Público

declarar-se suspeito por motivo de foro íntimo, sem necessidade de

demonstrar as suas razões, passando os autos para que outro

membro do Ministério Público possa atuar, substituindo-o.

O juiz da causa decidirá o incidente de impedimento ou

suspeição aos membros do Ministério Público.

No campo penal, “os órgãos do Ministério Público não

funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for

seu cônjuge, ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou

colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que

lhes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos

impedimentos dos juízes” (CPP, art. 258).

2 – DEFENSORIA PÚBLICA

2.1 – Atuação Institucional

A Defensoria Pública é uma instituição essencial à

administração da Justiça, sobretudo no sistema judiciário pátrio em

face da realidade brasileira na qual parcela significativa da sociedade

não tem condições ou dificuldades de pagar as despesas processuais

e os honorários de advogado.

O art. 5º, LXXIV da Constituição estabelece que “o Estado

prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem

insuficiência de recursos”. O art. 134 da Constituição da República

complementa: “a defensoria pública é instituição essencial à função

jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a

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defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º,

LXXIV”. Diante desses termos infere-se que a atividade dos

defensores públicos é primordialmente a orientação prévia ou

paralela e a postulação judicial em benefício das pessoas

necessitadas.

A Defensoria Pública é o órgão do Estado que tem a missão

institucional de aumentar e dar o acesso à Justiça ao maior número

de pessoas e de representar os hipossuficientes, as vítimas e os réus

pobres. Para haver acesso à Justiça, em muitas situações, é essencial

que haja acesso em primeiro lugar à Defensoria Pública, que recebe

as demandas dos cidadãos, orienta-os juridicamente e passa a atuar

em Juízo em prol dos hipossuficientes.

De acordo com o art. 1º da LC n. 80/94, com a redação dada

pela LC n. 132/09, incumbe à Defensoria Pública, “como expressão e

instrumento do regime democrático, fundamentalmente, a orientação

jurídica, a promoção dos direitos humanos e a defesa, em todos os

graus, judicial e extrajudicial, dos direitos individuais e coletivos, de

forma integral e gratuita, aos necessitados, assim considerados na

forma do inciso LXXIV, do art. 5º, da Constituição Federal”.

Nesse sentido, o papel institucional da Defensoria Pública

complementa a trilogia processual (juiz, Ministério Público e Defesa)

em relação às pessoas sem condições econômicas de contratar

advogado e consolida os fins estatais de justiça, para a realização e

proteção a direitos humanos e ainda ao acesso à justiça ampla e

irrestrita.

2.2 – Funções Institucionais

Os defensores públicos, da União (que atuam perante a Justiça

Federal, do Trabalho, Eleitoral ou Militar) ou dos Estados e do Distrito

Federal, possuem atribuições processuais próprias em face da

situação pessoal do beneficiário ou às vezes da natureza da lide.

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Previamente à atuação processual o defensor exerce uma

atividade extrajudicial de prestar orientação jurídica aos

necessitados. São esses mesmos necessitados os contemplados pela

defesa em juízo por um Defensor, em todos os graus de jurisdição,

ou seja, no primeiro grau, nos Tribunais de Justiça, nos Tribunais

Regionais da União e nos Tribunais Superiores.

Anterior ou paralelamente ao processo cabe ao Defensor

Público promover, prioritariamente, a solução extrajudicial dos

litígios, visando à composição entre as pessoas em conflito de

interesses, por meio de mediação, conciliação, arbitragem e demais

técnicas de composição e administração da lide (art. 4º, LC n.

80/94).

O referendo da Defensoria Pública da transação, da mediação

ou da conciliação, constitui título executivo extrajudicial (LC 80, art.

4º, § 4º) e pode ser executado nos termos da legislação processual

civil.

Além de poder agir institucionalmente fora do processo,

inclusive na autocomposição prévia, o defensor público pode exercer

também a defesa do necessitado em processo administrativo

disciplinar, fiscal etc.

Ao defensor público também é atribuída a função de promover

ação civil pública e todas as espécies de ações capazes de propiciar a

adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou individuais

homogêneos quando o resultado da demanda puder beneficiar grupo

de pessoas hipossuficientes, nos termos da mesma Lei Complementar

a que se faz referência acima.

Nesse ponto, o Código de Processo Civil inovou ao possibilitar

que o Defensor Público possa promover a ação coletiva após ter sido

informado/intimado pelo juiz civil de que existem naquela instância

ou juízo diversas demandas repetitivas (art. 139, X).

Nos termos do art. 4º da Lei Complementar n. 80/94, cabe ao

defensor público também exercer a defesa dos interesses individuais

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e coletivos da criança e do adolescente, do idoso, da pessoa

portadora de necessidades especiais, da mulher vítima de violência

doméstica e familiar e de outros grupos sociais vulneráveis que

mereçam proteção especial do Estado.

Essa função, que era atribuída no passado ao Ministério Público

e também a algum parente da parte ou outras pessoas naturais,

agora é exercida pela Defensoria Pública. Trata-se da curadoria

especial nos casos previstos em lei (art. 4º, LC n. 80/94 c/c art. 72 e

p. único do CPC). Por exemplo, em caso de réu revel citado por edital

ou por hora certa ou réu preso que não tenha advogado o juiz

nomeará um Defensor Público para ser o curador do demandado a

fim de que a situação peculiar em que se encontra o réu, preso por

qualquer motivo, num processo civil que lhe é movido.

No âmbito penal também a Defensoria exerce o papel jurídico,

em especial no que diz com a regra segundo a qual todo acusado

tenha direito a um Defensor, independente de ser ou não

hipossuficiente. Sendo revel ou não, inexistente advogado para

defendê-lo, desde a fase do inquérito a Defensoria Pública atuará em

sua defesa, o que não obsta a atuação de um defensor dativo quando

a Defensoria não estiver instalada naquela sede ou a contratação pelo

acusado de um advogado a qualquer tempo, quando então cessa a

atribuição da Defensoria.

Ao defensor cabe acompanhar o inquérito policial, inclusive com

a comunicação imediata da prisão em flagrante pela autoridade

policial, quando o preso não constituir advogado. Na hipótese de ação

penal privada e a queixa subsidiária da ação penal pública (em caso

de inércia do Ministério Público) cabe à Defensoria Pública patrociná-

la também.

Tendo com um dos objetivos a garantia dos princípios do

contraditório e da ampla defesa, o defensor público pode atuar no

processo penal quando, por exemplo, ainda que foragido o acusado

citado regularmente não constituir advogado.

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Enfim, no processo civil a Defensoria age especialmente em

prol dos hipossuficientes e sem perder essa sua nobre missão

preenche o princípio do contraditório e, como é missão de todo

advogado, é múnus publico também do defensor público exercer a

defesa do réu, hipossuficiente ou não, pois nenhum acusado pode ser

processado sem defensor, exigência do devido processo legal.

2.3 – Prerrogativas e direitos

Conquanto não tenha previsão constitucional expressa a

funcionalidade e as prerrogativas e princípios institucionais do órgão,

a Defensoria Pública é contemplada em sua Lei Orgânica com

inúmeras atribuições, que também estabelece deveres, direitos e

prerrogativas de seus membros (Lei Complementar n. 80/94

atualizada pela Lei Complementar n. 132/06).

Tendo como escopo a proteção aos necessitados, o defensor

público tem capacidade postulatória igual a dos advogados.

O direito de postular em Juízo do Defensor, que antes gerava

discussão quanto à exigência de que o membro da Defensoria fosse

inscrito na OAB (órgão de classe dos Advogados) com a Lei Orgânica

da Defensoria esse questionamento fica a priori suplantado, uma vez

que a capacidade postulatória do integrante da Defensoria decorre

exclusivamente de sua nomeação e posse no cargo público (LC

80/94, art. 4º, § 6º), não necessitando da inscrição do defensor

público no Conselho de Classe (Seccional da OAB).

No art. 287, parágrafo único, II, do CPC, igualmente, dispensa-

se a procuração quando a petição inicial for assinada pela Defensoria

Pública que represente a parte em juízo.

Outra prerrogativa pontual se refere ao exercício das funções

forenses orais e presenciais do Membro da Defensoria Pública, sendo

direito desse agente estatal sentar-se no mesmo plano do Ministério

Público em salas de audiências e em sessões de tribunais.

Nas audiências de autocomposição, o defensor público tem o

direito de acompanhar e de fazer-se presente com a parte

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representada, podendo participar do ato de conciliação e de mediação

(art. 250, IV e art. 334, § 9º do CPC).

Também a mesma Lei Complementar n. 80/94 contempla o

princípio do Defensor Público natural, pela circunstância de que o

exercício desse cargo público é indelegável e privativo de membro da

Carreira. Isso não significa que as funções defensivas dos

necessitados nos lugares em que a Defensoria Pública é inexistente

ou funciona com deficiência não possa ser exercida por advogados

dativos (escolhidos pelo juiz da causa), inclusive por Núcleos de

Práticas Jurídicas ligadas às Faculdades de Direito de Universidades

Públicas e Privadas.

Salvo se a lei estabelecer de forma expressa um prazo próprio e

específico para a Defensoria Pública, em relação ao prazo processual

em geral, ao defensor público é deferido o prazo em dobro para suas

manifestações processuais (art. 185 e art. 186, § 4º, do CPC) e o

direito de ser intimado pessoalmente no processo. O prazo em dobro

para prática de atos processuais em geral se estende aos “escritórios

de prática jurídica das faculdades de Direito reconhecidas na forma

da lei e às entidades que prestam assistência jurídica gratuita em

razão de convênios firmados com a Defensoria Pública” (art. 186, §

2º, do CPC).

No âmbito processual civil, é prerrogativa do Defensor Público

de postular pela produção de uma prova, como pericial, ad

exemplum, sem que a Defensoria faça o pagamento prévio dos

valores, porquanto o art. 91 do CPC inclui (ao lado da Fazenda

Pública e do Ministério Público) a Defensoria Pública como beneficiária

do direito de não pagar antecipadamente (por ocasião da prática do

ato) as despesas processuais civis, podendo pagar ao final, se for

vencida na causa.

No entanto, nos termos do parágrafo único do § 1º do art. 91

supramencionado, “as perícias requeridas pela Fazenda Pública, pelo

Ministério Público ou pela Defensoria Pública poderão ser realizadas

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por entidade pública ou, havendo previsão orçamentária, ter os

valores adiantados por aquele que requerer a prova”. Ou seja, é o

Estado ou a União, entidades públicas das quais fazem parte a

Defensoria Pública (estadual ou distrital ou da União) que devem

arcar com as despesas das perícias.

2.4 – Deveres e Responsabilidade

Conquanto tenha prerrogativas processuais, o defensor público

se sujeita a deveres e a responsabilidade, no que lhes forem

aplicáveis, conforme as normas jurídicas, administrativas e

processuais.

Aos defensores públicos se aplicam os deveres previstos no art.

77 do CPC, por serem considerados, em tal contexto, procuradores

das partes, entre as quais: a exposição dos fatos conforme a

verdade; a abstenção de formular demanda quando estiverem

informados e conscientes de que não tem qualquer fundamento; a

vedação de produção de provas e atos úteis e necessários à

declaração de direito etc.

Ressalte-se que o dever de “cumprir com exatidão as decisões

jurisdicionais, de natureza provisória ou final, e de não criar

embaraços à sua efetivação” e o de “não praticar inovação ilegal no

estado de fato de bem ou direito litigioso” (art. 77, incisos IV e VI),

embora a violação a tais regras seja feita pessoalmente pelo defensor

público, em tal hipótese a multa não lhe poderá ser imposta e sim à

parte.

No entanto, se caracterizar que o Defensor Público incorreu na

ofensa à dignidade da Justiça, descumprindo os deveres previstos em

todas as hipóteses do art. 77 do CPC, o juiz pode adverti-lo (art. 77,

§ 1º do mesmo artigo) e ainda enviar as informações com as provas

da infração para que o órgão de fiscalização ou corregedoria da

Defensoria possa apurar a eventual responsabilidade disciplinar do

Defensor.

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Ademais, se o defensor público der causa a adiamento

injustificado de ato processual arcará com as despesas processuais,

conforme art. 93 do CPC, pois (assim como os juízes, Ministério

Público e auxiliares judiciais) também a Defensoria Pública, se sem

justo motivo houver gerado o adiamento ou a repetição do ato arcará

com as despesas do retardamento, se houver.

Por outro lado, nos termos do art. 94, § 3º e 5º, do CPC, não

pode o juiz ao condenar o beneficiário da justiça gratuita na perícia

realizada a pedido da Defensoria Pública, para fazer face à despesa

honorária pericial utilizar os “recursos do fundo de custeio da

Defensoria Pública”.

Os impedimentos aos juízes se relacionam com os integrantes

da Defensoria que exercem a defesa em juízo dos hipossuficientes,

por isso, entre outras hipóteses, o defensor público precisa afastar-se

do processo se ingressar numa causa civil em favor de um

necessitado quando antes estava atuando um membro do Ministério

público ou juiz que seja seu cônjuge ou companheiro, ou qualquer

parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o

terceiro grau, inclusive (art. 144 e § 1º do CPC).

Quanto à responsabilidade processual, “o membro da

Defensoria Pública será civil e regressivamente responsável quando

agir com dolo ou fraude no exercício de suas funções” (art. 187 do

CPC), de modo que o defensor público se equipara ao juiz e ao

membro do Ministério Público que não podem, em tal circunstância,

sofrer responsabilização por culpa (negligência, imperícia ou

imprudência) decorrente de atuação processual.

O defensor público também tem o dever de restituir os autos no

prazo assinalado, conforme o art. 234 e seus parágrafos do CPC. Se

for intimado e não restituí-los à Secretaria judicial no prazo de três

dias, perderá o direito à vista fora de cartório e incorrerá em multa

correspondente à metade do salário-mínimo. Tal multa, sendo o caso,

será aplicada ao agente público responsável pelo ato, não se

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aplicando aqui a multa à parte assistida pela Defensoria nem à

entidade pública a qual pertence o defensor. Não se pode falar,

tampouco, em ação regressiva, mas penalidade por previsão especial

de ato atentatório à dignidade da justiça. Pode o juiz ainda,

constatada a incúria, recalcitrância ou desídia do defensor, comunicar

o ocorrido à Defensoria Pública, que se encarregará pelas suas

instâncias próprias à instauração de procedimento disciplinar contra o

defensor que atuou no feito e sofreu a sanção processual.

Os deveres e responsabilidades relacionadas com a atuação da

Defensoria Pública possuem sua razão de ser pelo fato de que, acima

de tudo, o defensor público representa a parte e às vezes é substituto

processual dela. E porque se trata de instituição que deve zelar pela

ética processual, cobrar dos juízes, membros do Ministério Público e

advogados a mesma conduta, sem contar o rol de prerrogativas e

direitos processuais que possui, a fim de que possa defender no

mesmo plano de igualdade e com amplitude o direito dos

hipossuficientes.

* Vallisney de Souza Oliveira