teologia sistematica iniciais sturz

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Trecho da Teologia Sistemática de Richard Julius Sturz

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Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Sturz, Richard J. Teologia sistemtica / traduo Lucy Yamakami. So Paulo: Vida Nova, 2012.BibliograaISBN 978-85-275-0500-01. Bblia - Teologia 2. Teologia dogmtica I. Ttulo.12-07173CDD-230.046ndice para catlogo sistemtico:1. Teologia sistemtica : Cristianismo 230.046Copyright 2012 Edies Vida Nova1.a edio: 2012Publicado no Brasil com a devida autorizao e com todos os direitos reservados por SOCIEDADE RELIGIOSA EDIES VIDA NOVA,Caixa Postal 21266, So Paulo, SP, 04602-970www.vidanova.com.br | email: [email protected] a reproduo por quaisquer meios (mecnicos,eletrnicos, xerogrcos, fotogrcos, gravao, estocagemem banco de dados, etc.), a no ser em citaes breves,com indicao de fonte.ISBN 978-85-275-0500-0Impresso no Brasil / Printed in Brazil SUPERVISO EDITORIALMarisa K. A. de Siqueira LopesCOORDENAO EDITORIALJonas MadureiraREVISOElise YamakamiMari Madureira Lopes Norio YamakamiCOORDENAO DE PRODUOSrgio Siqueira MouraREVISO DE PROVASMauro NogueiraUbevaldo G. SampaioDIAGRAMAOLuciana Di IorioCAPASouto Crescimento de MarcaTodas as citaes bblicas, salvo indicao contrria, foram extradas da verso Almeida Sculo 21, publicada no Brasil com todos os direitos reservados por Sociedade Religiosa Edies Vida Nova.Apresentao ......................................................................................................... 9Prefcio ................................................................................................................ 11IntroduoPor que outra teologia sistemtica? ....................................................................... 13Parte I Prolegmenos1. Por onde comeamos? .................................................................................. 212. Uma noo da tarefa .................................................................................... 293. Inspirao da Bblia ...................................................................................... 384. As Escrituras e o telogo ............................................................................. 495. Interpretao da f ....................................................................................... 576. Tradio e teologia ....................................................................................... 667. Experincia e teologia .................................................................................. 768. O Deus da Bblia, no dos lsofos ............................................................. 869. Realismo crtico ........................................................................................... 99 10. Teologia e dialtica ..................................................................................... 112 11. Como pensar criticamente ......................................................................... 120 12. Jesus Cristo, a norma da teologia ............................................................... 131Parte II Teologia prpria13. Encontro com Deus ..............................................................................................14314. O Deus que fala e age ...........................................................................................15115. Quem Deus? Cristologia ..............................................................................16216. Quem Deus? Trindade I ...............................................................................172SumrioTeologia sistemtica617. Quem Deus? Trindade II .............................................................................18318. Como Deus? Atributos.................................................................................19219. Deus como Criador ..............................................................................................20420. O Deus que age na histria ..................................................................................21221. Anjos e demnios I ...............................................................................................22322. Anjos e demnios II ..............................................................................................23323. O problema do mal natural .................................................................................24224. Deus e o inferno ....................................................................................................251Parte III Antropologia 25. Introduo antropologia bblica ............................................................... 261 26. Quem Jesus de Nazar? ........................................................................... 266 27. O homem perfeito ..................................................................................... 275 28. A origem da humanidade ........................................................................... 284 29. A imagem de Deus: criada e perdida .......................................................... 294 30. A natureza humana .................................................................................... 304 31. O homem na comunidade .......................................................................... 315 32. O conhecimento de Deus........................................................................... 327 33. O problema do mal moral .......................................................................... 338 34. Origem e natureza do pecado .................................................................... 349 35. As consequncias do pecado ...................................................................... 358 36. Possesso demonaca .................................................................................. 368 37. O homem e o universo ............................................................................... 378Parte IV Soteriologia 38. Introduo histria da salvao ............................................................... 389 39. Jesus Cristo, Salvador ................................................................................. 397 40. Deus busca o homem ................................................................................. 408 41. Salvao no tempo ..................................................................................... 418 42.Jesus Cristo morreu por ns ..................................................................... 427 43. Reconciliao e regenerao ....................................................................... 438 44. A comunidade dos transformados .............................................................. 448 45. O lugar do homem na redeno ................................................................. 456 46. O lugar de Maria na redeno .................................................................... 465 47. Discpulos incontestes ................................................................................ 475 48. Fome de Deus ............................................................................................ 485 49. Como conhecer a vontade de Deus ............................................................ 497 50. Felicidade no Senhor ................................................................................. 508Parte V Eclesiologia 51. Relao entre a Igreja e Israel ..................................................................... 521Sumrio 7 52. O que Igreja? ........................................................................................... 531 53. A Igreja Cristo ........................................................................................ 541 54. O Esprito Santo cria a Igreja .................................................................... 551 55. A igreja como denominao ....................................................................... 562 56. Igreja e Estado ........................................................................................... 572 57. Que a Igreja seja Igreja ............................................................................... 582 58. A igreja como comunidade local ................................................................ 593 59. Organizao da igreja local ........................................................................ 603 60. A liderana da igreja local .......................................................................... 613 61. tica pastoral ............................................................................................. 622 62. Batismo e ceia do Senhor ........................................................................... 634 63. Teologia das ofertas .................................................................................... 644 64. Unidade da Igreja ....................................................................................... 653Parte VI Escatologia 65. Introduo escatologia ............................................................................. 665 66.O Senhor da histria .................................................................................. 674 67. Tempo e histria ........................................................................................ 685 68. A morte o destino de todos os homens ................................................... 696 69. Vida aps a morte ...................................................................................... 707 70. A ressurreio ............................................................................................. 715 71. O estado intermedirio .............................................................................. 723 72. O julgamento ............................................................................................. 733 73. Os estados nais dos mortos ...................................................................... 744 74. A interpretao da profecia escatolgica .................................................... 755 75. Cronologia do m ...................................................................................... 767 76. Venha o teu reino .................................................................................... 779 77. A redeno de toda a criao ...................................................................... 790 78. O incio da eternidade ................................................................................ 800Posfcio Loureno Stelio Rega .................................................................... 809A obraTeologiaSistemtica,doprof.RichardJuliusSturz,semprefoiesperada por seus ex-alunos e discpulos que, diante das magistrais aulas desse mestre, lamentavam no possuir por escrito todas aquelas discusses e provocaes. Edies Vida Nova agora coloca em nossas mos a riqueza de sua obra que muito vai contribuir para os estudos no campo da teologia.Embora o texto tenha sido nalizado no perodo da aposentadoria do prof. Sturz, quando vivia na cidade norte-americana de Aurora, Estado de Colorado, a produo essencial do texto ocorreu praticamente quando ele ministrava suas aulas de teologia sistemtica na Faculdade Teolgica Batista de So Paulo. Na poca em que fui aluno do prof. Sturz, lembro-me de que saamos estonteados de cada aula depois de concluir que tudo o que sabamos sobre o tema ministrado era pouca coisa e que devamos prosseguir mais nas pesquisas. Ele caminhava de um lado para outro na sala de aula, bem ao estilo da Escola Peripattica, iniciando as aulas com uma pergunta sobre o tema e, a partir da, prosseguia com outras perguntas, induzindo-nos a buscar as respostas necessrias. Previamente a cada aula tnhamos de discutir por escrito o tema respon-dendo a um questionrio que ele mesmo preparava ou tirava do livro Decide for Yourself: A Theological Workbook, de Gordon R. Lewis (Decide tu mismo, em espanhol). Cada trabalho prvio semanal (cheguei a cursar 3 disciplinas semanais com ele ao mesmo tempo) acabava tomando cerca de 6 a 8 pginas que deveriam ser entregues no incio de cada aula. Antes de eu me formar, recebi dele o convite para ser seu monitor, para ajud-lo na correo dos trabalhos, lanamento e clculo das notas.Depois que me formei em 1977 na graduao em teologia, recebi o convite para retornar faculdade e ser o seu assistente na disciplina. Foi um grande privilgio, mas tambm um grande desao. De imediato, ele me passou todas as suas anotaes de aulas, que guardo at hoje com muito carinho e saudades. Alis, esse costume dele em Apresentao Teologia sistemtica10passar os esboos de aulas para quem lhe pedisse era marcante. Ele no negava para ningum. Era algum que entendia que o conhecimento, uma vez desnudado, deve ser de todos. Um tipo de democratizao dos resultados de seus esforos e pesquisa.Outropontoimportanteemseutrabalhoquenosestimulavamuitoera leras entrelinhas de cada autor. No importava apenas o que estava escrito nos livros ou o que os autores falavam, mas por que falavam, por que concluram o que concluram. Ele desmontava o pensamento de cada autor e ia mostrando o que estava por trs, quaisseuspressupostosecondicionamentos.Issofoitopreciosoparamim,que, quando fui dar aulas de tcnicas de exegese acabei incluindo cerca de dois meses de aulas sobre pressupostos e condicionamentos do exegeta, como preliminares ao curso.Essa prtica que ele nos ensinava exigia que cada um ampliasse o campo de co-nhecimento, pois no bastava ler a Bblia, era necessrio buscar todo o ferramental de conhecimento auxiliar mais amplo envolvendo losoa, sociologia, antropologia, etc.Por esses e outros motivos, penso que esta obra bem diferente das outras sobre o tema, pois foi produto de uma carreira de produo no cho daqueles que desejam aprender com seriedade a Teologia, e no somente isso, mas aprender a pensar, a reetir e a buscar suas prprias concluses nesse to complexo campo de estudo.No tenho dvidas de que este texto vai enriquecer muito a sua vida e lhe trazer horas e horas de reexo e construo slida de sua f.Parque da gua Branca, Perdizes, So Paulo, dezembro de 2011.Dr. Loureno Stelio RegaDiretor da Faculdade Teolgica Batista de So PauloDepoisdeaguardaransiosamenteaobra-primadoprof.RichardSturzque, durantemuitosanoslecionounaFaculdade TeolgicaBatistadeSoPaulo, chega s nossas mos a bela e completa edio produzida por Edies Vida Nova. Naturalmente, para os alunos que frequentaram suas aulas, a publicao desta nova teologia sistemtica ser motivo de muita alegria. Anal, torna-se possvel relembrar e compreender muitas de suas ideias que, para muitos cristos ainda imaturos, pareciam complexas e obscuras. Mas no mais! Comclarezaeobjetividade,oprof.Sturztornouostemascentraisdafcrist relativamente fceis. Aps sua aposentadoria da Faculdade, gastou incontveis horas aperfeioandosuavisodaortodoxiaefazendoumaanlisedaculturabrasileira. Temos agora no Brasil um nmero razovel de teologias sistemticas, mas nesta obra os leitores notaro uma considervel diferena, que a distingue de todas as que tm surgido at o momento.Ns que, h muitos anos, incentivamos o famoso professor a escrever sua teolo-gia, temos o orgulho de ver esta obra sair do prelo. Enm, temos mais uma teologia sistemtica abrangente e esclarecedora, escrita para o contexto brasileiro. A grande demora teve uma razo:ele a reescrevia com o objetivo de tornar a linguagem mais simples e os conceitos mais fceis de serem compreendidos. Chegou a ensinar durante anos esta teologia em suas aulas de escola bblica dominical. Por isso, acredito que, na grande maioria dos 450 seminrios e escolas teolgicas do Brasil, esta teologia se tornar o livro-texto favorito para uso nas aulas de teologia.Uma teologia deve: instruir os leitores a respeito das verdades essenciais da f; sis-tematizar as posies bblicas de tal maneira que todos aqueles que desejam conhecer a verdade libertadora do evangelho quem persuadidos a pensar corretamente sobre o certo e o errado; criar um desejo de viver com mais santidade e piedade (Tt 2.12). Prefcio Teologia sistemtica12Alm disso, uma teologia pode esclarecer a importante distino entre o essencial e o cultural, e abrir a mente para compreender com mais clareza a inuncia do catoli-cismo romano, a teologia da libertao, o espiritismo e outras ideologias que formam a cultura religiosa do pas.Neste ano em que Edies Vida nova completa 50 anos de ministrio no Brasil, quero expressar a minha gratido a Deus e a essa editora por seu empenho em pre-parar esta nobre contribuio ao pensamento cristo brasileiro. Penso que esta obra do prof. Sturz acrescenta uma riqueza extraordinria ao crescente acervo brasileiro de literatura evanglica.A Deus seja toda a glria! Russell P. Shedd, Ph. D.I. Consideraes geraisDevido diversidade losca e teolgica do pblico-alvo, no serei nem excessiva-mente sucinto (Tillich), nem particularmente pesado (Brunner) e nem tediosamente longo (Barth). Sem tentar dar respostas a todas as posies que so defendidas em cada assunto, minha proposta , sobretudo, produzir uma teologia legvel, que se desenvolva com lgica.Precisamos de uma teologia que seja ao mesmo tempo reformada e batista. bem verdade que temos Berkhof (no batista, mas reformado) e Mullins e Dagg (batistas, masnoreformadosdefato). Tambmtemostelogos,comoLangston(batista)e Teixeira (presbiteriano) e at uma edio crtica das Institutas de Calvino. Cada um deles possui pontos fortes e alguns fracos em suas argumentaes. Ainda que eu no seja um defensor dos cinco pontos do calvinismo, minha posio tende mais para a interpretao reformada. Almdanecessidadedeumateologiareformadaebatista,precisamosqueesta seja mais contextualizada: escrita no contexto brasileiro e para o contexto brasileiro. Nem mesmo Langston (batista do sul que escreveu no Brasil) e Teixeira (presbiteriano brasileiro) atendem a esses critrios, pois no esto preocupados em interagir com a realidade brasileira. Meu desejo, portanto, ir alm da identidade cultural. Espero criar uma ponte entre a teologia tradicional e a cultura brasileira, de modo que seja possvel escaparmos do aprisionamento cultural.Ao mesmo tempo em que h a necessidade de um envolvimento pessoal com o texto bblico, sob a direo do Esprito Santo, h tambm a necessidade de estar sempre ciente das armadilhas do subjetivismo. Da a importncia de encontrar o que o texto realmente disse e diz, permitindo que as Escrituras falem para nossa situao presente. Nesse ponto, tenho a tendncia de manter uma postura mais objetiva do que subjetiva. Introduo Por que outra teologia sistemtica?Teologia sistemtica14A experincia pessoal do telogo deve existir, mas de forma contida, a m de que sua teologia seja mais do que apenas um reexo das pressuposies culturais da poca.De certa forma, como contraponto nfase subjetiva no papel do Esprito Santo, a cristologia o centro de minha abordagem. Embora eu j tivesse me deparado com essa abordagem na Dogmtica eclesistica, de Karl Barth, o que de fato fez com que ela determinasse meu pensamento foi a teologia paulina, que inteiramente desenvolvida em torno do conceito de estar em Cristo. O Evangelho de Joo, em comparao com o restante do Novo Testamento, o que mais se aproxima dessa abordagem. Tambm evidente que a chave hermenutica de Lutero para a interpretao das Escrituras a cristologia. luz desse tema central que pretendo tratar os vrios temas, tais como: Trindade, conhecimento de Deus e cristologia do Esprito. Por m, a sistematizao proposta neste livro considera com seriedade a questo das pressuposies. Isso implica tanto a elucidao dessas pressuposies como uma reavaliaoconstantedecadaumadelasnoquedizrespeitosuainuncianas conclusesprovenientesdareexoteolgica.Osquatrofundamentosqueservem de base a essa sistematizao teolgica (e aos quais me limito) so: Escrituras, tradi-o eclesistica, experincia pessoal e pressuposies loscas. Todos os quatro nos ajudam a encontrar Cristo, mas o prprio Cristo quem os coloca sob julgamento.Sei que parece entediante comear com uma longa seo de prolegmenos.Todavia, sem um esclarecimento bem detalhado de cada um desses quatro pilares, o restante do texto no ser compreensvel. Muitos telogos pulam essa etapa, deixando de esclarecer aos seus leitores, e at a si mesmos, os fundamentos sobre os quais esto construindo. Quandoessepassoomitidonoprocesso,aprpriaideologiadotelogo(sejaela uma adeso consciente ou no) ofusca o testemunho das Escrituras, a tradio e at mesmo a sua prpria experincia espiritual.II. Os pressupostos desta teologia1. CristologiaA teologia deve ser edicada sobre quatro pilares: as Escrituras, a tradio eclesistica, a experincia pessoal e as pressuposies loscas. Os quatro interagem entre si; e cada um deles, em parte, determina a contribuio que dada ao outro. A chave que controla o peso argumentativo dos quatro pilares a cristologia, o estudo de Cristo e seu lugar na redeno e revelao.Se a cristologia no determinar a interpretao dos quatro pilares, a teologia ser determinada por um deles, em detrimento da verdade revelada. Os dois mais propensos a assumir o controle so a experincia religiosa e pessoal do telogo, e sua ideologia. Semdvidaalguma,issoquevaiacontecer,mesmoqueotelogoarmequeas Escrituras e a tradio da igreja so a base de seu pensamento.Introduo15Alis, a cristologia precisa ser a chave para toda a teologia crist. Ela essencial para a compreenso das principais reas da teologia: Quem Deus? Qual a condio humana? Como algum salvo? O que a Igreja? Como a histria termina? Creia ou no, todas essas perguntas tm sido estudadas e ensinadas por vias que marginalizam a cristologia.Quem sacrica esse ponto essencial corre o risco de colocar o homem no centro de seu pensamento e desenvolver, assim, uma teologia humanista. O homem deve estudar teologiatendocomofocoavontadedeDeusreveladaemCristo.Dessaforma,os grandes tpicos da teologia (como a Queda, a paixo de Cristo, a formao do corpo de Cristo) assumem seu devido lugar em relao ao Filho de Deus.2. Solidariedade socialSe a cristologia nem sempre ocupa o devido lugar como chave da teologia, o conceito bblico de solidariedade social com frequncia desconsiderado devido importncia dada ao indivduo e sua necessidade de um relacionamento pessoal com Deus. Isso se torna ainda mais evidente quando a postura ideolgica a do ps-modernismo. Aigrejacomocomunidadesetornasecundriaemrelaoaoindivduoessuas necessidades. Alis, para o ps-moderno, sua comunidade torna-se um mero apoio para conrmar sua verdade individual.Masasolidariedadesocialachaveparaacompreensodaverdadebblicaa respeitodacomunidade,sejaelaaigrejalocal,sejaelaasociedadeforadaigreja.1 Quando Deus criou Ado e Eva, o primeiro mandamento foi que desenvolvessem uma cultura que permitisse raa humana sobreviver e cumprir seus outros manda-mentos (Gn 1.28-30). Aps a Queda, todas as culturas foram (e so) corrompidas pela natureza pecaminosa da humanidade.Assim, o homem torna-se homem apenas nos relacionamentos sociais, uma vez que seu desenvolvimento inuenciado pela cultura em que criado. Esse conceito de solidariedade social nos permite ver como a igreja poderia estar contextualizada em seu meio e, ainda assim, no car atrelada sociedade na qual est inserida. Ao lidar com os homens, o propsito de Deus torn-los livres, isto , sujeitos da prpria vida. Em outras palavras, o propsito torn-los capazes de resistir determinao cultural.Obviamente, isso s possvel no contexto de uma comunidade crist, mas, como veremos, isso muitas vezes no passa de uma mera possibilidade. Embora Cristo ordene que nos livremos de ideologias humanas (Rm 12.2), esse alvo raramente atingido.3. Natureza e identidadeApesardearevelaodeGnesisaApocalipsesernica,reconhece-seofatode que esta se desenvolveu, culminando no prprio Senhor Jesus (Hb 1.1-2). Alm do 1Russell P. Shedd. A solidariedade da raa. So Paulo: Vida Nova, 1995, p. 194.Teologia sistemtica16problemadodesenvolvimento,acrescenta-seadiculdadedetersidodadadentro de uma cultura especca. evidente que a cultura hebraica bem diferente daquela em que vivemos no terceiro milnio. Assim, quem estuda as Escrituras deve cumprir duas tarefas ao mesmo tempo: separar o cultural do eterno, e depois descobrir como o eterno se aplica especicamente na atual situao cultural. a essa diferena entre o eterno e o cultural que dou o nome de natureza e identidade. Nesse contexto, natureza se refere s verdades essenciais da f, enquanto identidade se refere s formas que a f assume em vrias culturas. A diculdade est na frequente confuso que se faz em relao s duas. Um exemplo disso quando algumas verda-des so consideradas fatores meramente culturais, e/ou algumas formas culturais so consideradas essenciais.A distino entre natureza e identidade tambm crucial para compreender por que a igreja e o cristo ao mesmo tempo so e no so o que foram chamados para ser. Aqui se abre espao para a discusso de essncia versus existncia, e tambm para o fato deDeus ser ao mesmo tempo presente e ausente. Alm disso, a questo da natureza versus identidade envolve a inuncia abrangente das ideologias e do contexto cultural, bem como a necessidade de a igreja contextualizar-se e, ao mesmo tempo, alienar-se ao seu contexto.24. A verdade bblica dialticaDurantetodaaIdadeMdia,apalavradialticafoiempregadanosentidode pensamento racional. Com Hegel, o termo assumiu novo sentido, o de resoluo de opostos. Muitos pensam nesse processo como o de unir alguns elementos de ambos os lados e excluir o resto. Para Hegel, porm, o pensamento dialtico era unir a tese com sua anttese, de maneira que ambas permaneam totalmente inteiras na sntese. Como exemplo, ele encontrou a sntese de ser e no ser em tornar-se.Apesar de a dialtica de Hegel no ser um parmetro para ns, ela pode nos ajudar avencerumadasdiculdadeshistricasdateologia:asaparentescontradiesnas Escrituras. fato que, ao longo dos sculos, a maioria das heresias na Igreja surgiu da tentativa de aplicar a lei da no contradio de Aristteles revelao bblica.Essas heresias brotaram da tentativa de resolver o fato de a Bblia proclamar que JesusplenamenteDeus,emboraplenamentehumano,oudeDeusser,dealgum modo, trs, embora seja somente um. Outro problema que tem gerado todo tipo de distoro do texto bblico a tentativa de resolver como o homem pode ao mesmo tempo ser predestinado, mas ainda assim ser responsvel por seu atos. E h outras: tais como a salvao eterna, enquanto alguns textos armam que possvel perd-la; Deus revela sua vontade, sendo, porm, quase impossvel conhec-la; etc.2Stanley Hauerwas; William Willimon. Resident Alliens. Nashville: Abingdon Press, 1989, 175 p.Introduo17ComoaabordagemdeHegelnosajudaria?Primeiro,precisoadmitirquea revelao das Escrituras foi dada numa cultura diferente, cultura que no analisava a verdade como ns, nos termos do princpio aristotlico da no contradio.3 Pelo contrrio, os autores humanos da Bblia escreveram o que Deus revelou em termos que consideramos contraditrios.De fato, pode-se dizer que todas as verdades especicamente crists so dialticas. Assim, h um s Deus, Yahweh. Mas o Novo Testamento no s revela que o Pai, o Filho e o Esprito Santo so Deus, como tambm que h distines entre eles. Assim, a verdade crist dialtica no sentido hegeliano de tanto isso como aquilo em lugar de ou isso ou aquilo, de Aristteles.III. Abordagens da teologiaO ponto de partida cristolgico permite teologia compreender os papis desempenha-dos pelas Escrituras, pela losoa, pela experincia pessoal do telogo e pelas tradies da igreja. Isso tambm pe cada um em seu devido lugar em relao aos outros. En-tretanto, uma vez que a prpria cristologia de algum pode ser condicionada pelos quatro pilares, preciso determinar, como critrio mximo, a verdade com respeito a Cristo conforme revelada nas Escrituras. S dessa maneira a cristologia pode se tornar a chave que destranca os elementos fundamentais da teologia crist.Por outro lado, todo o campo da verdade teolgica deve ser visto luz da experin-cia brasileira de Cristo e da igreja. Procuramos fazer isso examinando em especial os papisdesempenhadospelocatolicismoromano,pelateologiadalibertao,pelo espiritismo, pelo transcendentalismo, entre outros. medida que cada conceito teolgico estudado em suas vrias interpretaes, eles so desenvolvidos historicamente, o que os torna limitados s alternativas concretas que tm recebido crdito nas igrejas. Isso tambm signica que a teologia apresentada luz de uma tradio teolgica especca (batista). No se trata, portanto, de uma tentativa de produzir algo estril em relao histria eclesistica posterior ao Novo Testamento. Ao ser apresentada de maneira cronolgica [em vez de um tratamento lgico ou em ordem ascendente ou descendente], essa abordagem tambm evita que a concluso correta se evidencie de imediato. Foram tantos anos para desenvolver esse assunto que vale pena torn-lo um mate-rial permanente para aqueles que no tiveram a oportunidade de estudar comigo. Ele contm valor sufciente em si e por si para merecer publicao. Naturalmente, outros tero de estabelecer um juzo de valor nesse quesito.3Umacoisaconsideradasobomesmoaspectonopodeserenoseraomesmotempo (Metafsica, IV, 3).PROLEGMENOSPARTE lPonto de partida: Para fazer uma teologia sistemtica, preciso embarcar numa viagem interminvel pelos paradoxos da f, comeando pela autorrevelao de Deus e buscando descobrir tanto o que se deve crer, como o que se deve ser e fazer.I. O que so os prolegmenos?Para fazer teologia ou pensar em conceitos teolgicos, preciso partir de algum ponto. E os prolegmenos so exatamente isso. So as primeiras palavras. Na realidade, so palavras, conceitos e parmetros que precisam ser compreendidos antes de iniciar-mos qualquer discusso. Comear diretamente pela teologia o mesmo que entrar em terra de ningum, onde no h como recorrer a qualquer recurso para remediar erros cometidos. As concluses alcanadas estariam fundamentadas em premissas obscuras cujas amplas inuncias no poderiam ser nem compreendidas nem avaliadas.Por outro lado, todos pensam teologicamente. Quem pergunta Por que isso acon-teceu comigo? faz uma pergunta teolgica. No menos teolgica a discusso sobre os porqus e para qus do trabalho de algum. Alis, todas as perguntas importantes da vida so perguntas teolgicas; e, para isso, a pessoa pode ou no usar termos teo-lgicos ou falar de Deus. por isso que as questes loscas mais profundas so as mesmas com que os telogos se atracam.O estudo dos itens includos nos prolegmenos , portanto, um pensamento pr- teolgico,quelimpaoterrenocomanalidadedeevitar,namedidadopossvel, premissas e concluses falsas e isso inclui uma anlise de pressuposies culturais eideolgicas.Procura-setambm,nesseestudo,estabelecerdeniesquetornem possvelcomunicarcomclarezaasideiassubjacentessarmaesteolgicas.As Por onde comeamos?captulo1