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 LUCIANA EASTWOOD ROMAGNOLLI JORNALISMO CULTURAL EM CURITIBA: ANÁLISE DO CADERNO G DA GAZETA DO POVO Monogr af ia aprese nta da à Disciplina Tr abalho de Concluo de Curso como requisito parcial à conclusão do Curso de Comunicação Social – Jornalismo, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes, Universidade Federal do Paraná. Orientadora: Myrian Del Vecchio  CURITIBA

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LUCIANA EASTWOOD ROMAGNOLLI

JORNALISMO CULTURAL EM CURITIBA:

ANÁLISE DO CADERNO G DA GAZETA DO POVO 

Monografia apresentada à DisciplinaTrabalho de Conclusão de Curso comorequisito parcial à conclusão do Curso deComunicação Social – Jornalismo, Setor deCiências Humanas, Letras e Artes,Universidade Federal do Paraná.

Orientadora: Myrian Del Vecchio

 

CURITIBA

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SUMÁRIO

1 APRESENTAÇÃO....................................................................................................3

2 JUSTIFICATIVAS.....................................................................................................4

3 OBJETIVOS..............................................................................................................6

4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.................................................................7

5 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.............................................................................11

5.1 JORNALISMO CULTURAL..................................................................................11

5.2 A INDÚSTRIA CULTURAL...................................................................................13

5.2.1 A Teoria Crítica..................................................................................................13

5.2.2 As Culturas........................................................................................................19

5.2.3 Reflexões Sobre o Jornalismo na Indústria Cultural..................... ...................23

5.2.3.1 A indústria cultural e o jornalismo no Brasil

...................................................27

5.3 HISTÓRIA DO JORNALISMO CULTURAL..........................................................30

5.3.1 A Trajetória do Jornalismo Cultural no Brasil....................................................34

5.3.2 O Jornalismo Cultural no Paraná......................................................................43

5.4 PANORAMA DO JORNALISMO CULTURAL CONTEMPORÂNEO....................50

5.5 GÊNEROS DO JORNALISMO CULTURAL.........................................................60

5.6 A PRÁTICA JORNALÍSTICA................................................................................64

6 O CADERNO G.......................................................................................................71

6.1 ANÁLISE DE CONTEÚDO...................................................................................89

6.1.1 Análise Quantitativa...........................................................................................89

6.1.1.1 Análise das capas do Caderno G de segunda-feira a domingo...................93

6.1.1.2 Análise das edições do Caderno G de segunda-feira a sábado...................97

6.1.1.3 Análise das edições dominicais do Caderno G..........................................102

6.1.1.4 Análise quantitativa geral das 35 edições do Caderno G...........................105

6.1.2 Análise Qualitativa...........................................................................................110

6.1.2.1 Conclusões da análise qualitativa................................................................131

7 CONCLUSÃO FINAL............................................................................................137

REFERÊNCIAS........................................................................................................140

APÊNDICES.............................................................................................................143

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1 APRESENTAÇÃO

O presente trabalho traz um estudo histórico do jornalismo cultural impresso,

seu desenvolvimento no Brasil, as relações com a indústria cultural e com as rotinas

de produção de uma redação. Com base em tais pressupostos e no panorama atual

do jornalismo cultural, o objeto de estudo passará a ser o Caderno G, caderno de

cultura do jornal paranaense Gazeta do Povo, na busca de características que o

identifiquem e revelem como é o jornalismo cultural impresso realizado atualmente

em Curitiba pelo único veículo do estado que mantém uma equipe de jornalistas decultura.

A segunda etapa do trabalho consistirá no exame de 35 edições seqüenciais

(cinco semanas) do Caderno G, em que serão analisados quantitativa e

qualitativamente os textos publicados para traçar o perfil da publicação e situá-lo,

criticamente, no universo mais amplo do jornalismo cultural praticado nos jornais

brasileiros. A análise contemplará o conteúdo da publicação, concentrando-se na

 produção das mensagens veiculadas – sem entrar nos méritos dos estudos de

recepção. Desta forma, a proposta do trabalho é compreender, a partir da

 participação dos produtores, o jornalismo realizado na principal editoria de cultura

impressa paranaense, no caso, o Caderno G.

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2 JUSTIFICATIVA

O jornalismo cultural nasceu com a urbanização do país, na virada do século

XIX para o século XX, e acompanhou o desenvolvimento e a consolidação da

indústria cultural no Brasil, alterando-se conforme as modificações sofridas pelo

campo sócio-cultural. O cenário atual é conseqüência direta da fase pós-

industrialização da economia, em que há abundância de bens culturais (músicas,

filmes, livros, quadrinhos, coleções de moda, exposições de arte, etc.) produzidos e

consumidos como mercadoria, ou seja, sob a lógica industrial. O jornalismo culturalinsere-se duplamente nessa lógica: ao preencher suas páginas com os produtos

artístico-culturais e por ser, ele próprio, um produto da indústria de bens de

consumo. A passagem para um jornalismo cada vez mais pautado pelos produtos

culturais coincide com o aumento das críticas negativas em relação à qualidade do

 jornalismo cultural produzido no país, apontado por diversos intelectuais e jornalistas

como cada vez mais fraco – menos argumentativo e opinativo, mais orientado ao

consumo dos bens culturais.

A cultura, quando se tornou temática jornalística, apareceu, primeiro,

distribuída em matérias no corpo dos jornais. Depois, já mais valorizada, ganhou

espaço próprio em suplementos culturais (literários, em sua maioria) semanais ou

quinzenais. Só em meados do século XX apareceram os cadernos culturais, que

hoje estão presentes nos grandes e médios jornais do país. É o caso, por exemplo,

do Caderno 2 , de O Estado de S. Paulo, da Ilustrada, da Folha de São Paulo, do

Segundo Caderno de O Globo e do Caderno B do Jornal do Brasil . 

Em Curitiba, o Caderno G é o espaço diário destinado à cultura no jornal de

maior circulação do Paraná, a Gazeta do Povo. O caderno perdeu tamanho nos

últimos anos (é veiculado com apenas quatro páginas durante a semana, uma delas

ocupada por “serviços” como a programação de cinemas, teatros, museus e horários

televisivos), mas ainda é a referência em jornalismo cultural diário no estado. E

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como tal, é o principal veículo impresso local para divulgação da cultura, referência

para artistas e público, espaço de legitimação de produtos e manifestações culturais.

A análise do Caderno G no contexto do panorama contemporâneo do

 jornalismo cultural justifica-se, portanto, pela importância local da publicação. Afinal,

como é o caderno de cultura a que tem acesso o público local? Para determinar o

perfil do jornalismo cultural produzido na cidade e suas relações com o contexto

geral do jornalismo de cultura contemporâneo, este trabalho foi realizado.

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3 OBJETIVOS

 

O objetivo geral deste trabalho é traçar o perfil do caderno diário de cultura

da Gazeta do Povo, de modo a refletir sobre o jornalismo cultural praticado pelo

principal caderno dedicado à editoria no Paraná.

Os objetivos específicos, por sua vez, são:

1) Apontar as diretrizes, características e vícios presentes na publicação –

os temas mais pautados, enfoques recorrentes, etc.,

2) Identificar semelhanças com o jornalismo cultural contemporâneo emgeral e especificidades locais,

3) Comprovar ou desmerecer a hipótese de perda de qualidade do caderno.

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4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa pode ser considerada, de acordo com MINAYO (1993, p.23)

“uma atividade de aproximação sucessiva da realidade que nunca se esgota,

fazendo uma combinação particular entre teoria e dados”. Neste trabalho, tal ajuste

entre material teórico e outros dados obtidos passaram por diferentes abordagens

metodológicas de forma a aprofundar o tratamento do assunto, aumentar as

possibilidades de apreensão dos significados envolvidos e evitar que as conclusões

sejam limitadas pelos métodos de coleta e análise utilizados.O primeiro passo para a aproximação do tema estudado nesta monografia

foi a revisão bibliográfica. Foram recuperados os principais conceitos e críticas

relacionados à idéia de “indústria cultural”, a fim de delinear o contexto das

mudanças sofridas pelo jornalismo e pelas relações culturais. Tendo em vista igual

finalidade, assim como o desenvolvimento histórico do jornalismo de cultura, fez-se

necessária uma breve reconstituição da história do jornalismo cultural em geral, no

país e no estado do Paraná.

Contextualizados os antecedentes do tema, emergiu o ponto de

aproximação com os objetivos gerais e específicos deste trabalho: registrar o

panorama atual do jornalismo, com base nas críticas e apontamentos de

profissionais estudiosos da área. As reflexões sobre o jornalismo cultural atualmente

praticado no Brasil reforçam o escopo teórico para que a análise do caderno de

cultura do jornal Gazeta do Povo não se dissocie do contexto maior da atividade no

país – ao contrário, para que o Caderno G possa ser situado como integrante dessa

conjuntura. Nesta etapa, mais do que nas outras, grande parte das fontes estava

disponível na internet – a bibliografia impressa do tema é restrita. O procedimento

para seleção de fontes confiáveis foi a análise das referências. Portanto, foram

consultados para esta monografia artigos de jornalistas publicados em sites de

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cultura respeitados (quando não o próprio autor já um profissional respeitado na

área) e trabalhos acadêmicos desenvolvidos em universidades.

Como os objetivos desta monografia configuram-se no terreno da produção

das mensagens jornalísticas, quaisquer questionamentos pertencentes ao campo da

recepção da mensagem estão à margem do proposto e não são de interesse do

estudo. Tal delimitação justifica a inserção de teorias a respeito da prática

profissional do jornalista no referencial teórico, visto que são as variáveis de

produção que influem diretamente no objeto de análise. Para avaliação do material

 jornalístico produzido pela equipe do Caderno G, tornou-se necessária a análise deconteúdo, método que consiste na descrição objetiva, quantitativa e sistemática do

objeto com a finalidade de inferir – a partir dos indicadores de freqüência –

resultados que caracterizem ou revelem causas e efeitos da mensagem

comunicativa analisada. Ou seja, o trabalho não se limita à retirada de dados brutos

categorizados, abrange as conclusões que as relações entre os dados permitem.

Três fases integram a análise de conteúdo. A primeira, organizacional, é a

pré-análise, ou seja, a seleção dos documentos, a formulação de hipóteses e das

categorias necessárias para que sejam fornecidos dados que, quando interpretados,

possam elucidar as questões propostas pelo trabalho. A segunda consistiu em

explorar o material obtido. Por fim, foram feitas as inferências e interpretações dos

resultados. O processo compreendeu a analise quantitativa, a princípio, e a posterior 

análise qualitativa que proporcionou significados às respostas obtidas.

A pesquisa quantitativa serviu para a mensuração de categorias básicas de

análise – o início do delineamento do material publicado no Caderno G. Foi realizada

a tabulação dos dados obtidos nas categorias então estabelecidas e a posterior 

interpretação, com o cálculo percentual dos indicadores que se revelaram

concludentes. Para identificar o perfil do caderno – ou seja, determinar hábitos,

limitações e caracterizar a publicação – foram analisadas neste trabalho 35 edições,

publicadas no período entre 4 de setembro de 2005 (domingo) e 2 de outubro do

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mesmo ano (sábado). A amostragem é representativa por corresponder a cerca de

10% das edições do caderno publicadas em um ano, com igual número de edições

por dia da semana. O intervalo de análise é seqüencial e foi escolhido

aleatoriamente.

A pesquisa qualitativa completa o processo produzindo significados não-

quantificáveis. Segundo MENEZES e SILVA (2001, p.20), a abordagem qualitativa

“considera que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito, isto é, um

vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito que não

pode ser traduzido em números”. O método é descritivo. A pesquisa qualitativadivide-se em dois momentos neste trabalho. No primeiro, realizaram-se entrevistas

com os produtores do Caderno G, a fim de identificar as condições de trabalho e os

pontos de vista dos produtores em relação ao jornalismo cultural em si e ao caderno

da Gazeta do Povo especificamente.

Foi desenvolvido um questionário (vide APÊNDICE 1) aberto como modelo

inicial para as entrevistas, que levanta questões relacionadas desde à formação dos

  jornalistas, ao interesse pela área, à rotina de trabalho, até a auto-crítica e a

avaliação do caderno que produzem. O questionário desenvolvido é flexível (não-

estruturado), ou seja, o entrevistador pode alterar ou acrescentar questões de

acordo com o transcorrer da entrevista. A amostragem inclui seis dos sete repórteres

do Caderno G, o editor e a mais recente ex-membro da equipe – uma repórter 

despedida no primeiro dia do período analisado nesta pesquisa (04 set. 2005).

Decidiu-se por sua inclusão pela proximidade temporal com o objeto de estudo e

pelo fato de, desligada de vínculos empregatícios, estar livre para fazer suas

considerações. Acrescenta-se o fato de a repórter ter sido despedida por – uma das

causas, segundo a própria e colegas da equipe – opor-se à condução editorial do

caderno. Não se pretende, com isso, tomar por verdade absoluta as opiniões da

repórter, mas contrapor diferentes pontos de vista sobre a editoria de cultura na

Gazeta do Povo.

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Em um segundo momento, a análise qualitativa foi aplicada às edições do

Caderno G em estudo, com a seleção dos conteúdos relevantes e representativos

para serem examinados qualitativamente, em complementação aos resultados

verificados durante a etapa quantitativa. Ao objeto de análise foram aplicados os

métodos indutivo (fundamentado na experiência e na formulação de generalizações

a partir de casos reais e concretos) e dialético (considera as contradições e não

dissocia o objeto de estudo do contexto social, político e econômico).

Além da pesquisa quantitativa e qualitativa, este trabalho consta – sem

destaque para o método – da observação individual participante, uma vez que opesquisador estagiou no Caderno G entre os meses de fevereiro e março de 2005,

período em que acompanhou a rotina e organização do caderno e a elaboração das

reportagens. A experiência trouxe à tona as questões investigadas por esta

monografia, serviu como base para o planejamento da pesquisa e pode ser útil para

pontuações no desenvolvimento do estudo.

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5 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

5.1 JORNALISMO CULTURAL

A delimitação do campo do jornalismo cultural começa com uma questão

essencial: O que é cultura? A pergunta, aparentemente simples, é a entrada para a

complexidade em que estão inseridas as atividades do jornalismo cultural. A cultura

possui variedade de significados dependendo da abrangência que lhe for dada. A

definição mais ampla considera que toda a intervenção do homem sobre a natureza

é cultura – desde o cultivo agrícola. “Quando pensamos em cultura, pensamosportanto, em todas essas questões: a relação do homem sobre a natureza, o

domínio, ou melhor, a consciência humana do tempo e a interação simbólica

produzida por essa relação na dimensão passada, presente e futura.” (TEIXEIRA,

2005)

Quando apenas o aspecto simbólico é considerado, surge outra concepção

de cultura, que concentra todo o sistema de significações e símbolos de um grupo

social, as intervenções humanas em um ambiente natural. É ainda uma abordagem

ampla, na qual se encaixa a sociologia, a antropologia, a lingüística, a arte e até

mesmo o jornalismo. “O que se pode dizer desde logo, e isto deve dar a exata

dimensão do fenômeno, é que a expressão ‘jornalismo cultural’ revela-se

consideravelmente tautológica - porque jornalismo é, em ampla medida, apenas um

outro nome para cultura, o modo atual da cultura”. (COELHO 1, citado por ROSA,

2005).

Na prática do jornalismo cultural, no entanto, é preciso restringi-la, de forma

que cultura, dentro dos cadernos jornalísticos específicos, passa a significar o

campo das manifestações artísticas e intelectuais. A cultura, nesse contexto, fica

entendida como expressão de “idéias, valores, atitudes e criatividade artística e que

1  COELHO, Teixeira. Modos culturais pós-modernos. Revista da USP. São Paulo, nº 29, fev, 1996, p.101.

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oferecem entretenimento, informação ou análise” (COELHO2, citado por ROSA,

2005).

Os campos de atuação mais evidentes, portanto, das editorias de cultura,

são a arte tradicional (artes plásticas, teatro, dança, música, literatura e arquitetura)

e as novas manifestações artísticas, como o cinema e a fotografia. “Para muitos, um

conceito contemporâneo de jornalismo cultural deve abranger um universo amplo de

práticas que não se restringe às artes consagradas e artes de massa”.  (BUITONI,

2000, p.58) Assim, o jornalismo cultural trata ainda de idéias, entretenimento,

artesanato, patrimônio histórico, moda, publicidade, culinária, história emquadrinhos, design e outras produções humanas ligadas à arte ou ao intelecto. E

trata de comportamento, ou seja, os “fenômenos sócio-culturais no sentido amplo,

isto é, que não se vinculam claramente a um certo tipo de arte. Seu território por 

excelência são as tendências da vida noturna e os modismos sazonais”. (DAPIEVE,

2003, p.100). Se todos esses temas serão contemplados nas páginas dedicadas à

cultura em um veículo impresso ou não, dependerá de variáveis como a política

editorial da publicação e as áreas de interesse e de conhecimento dos profissionais

envolvidos (pauteiros, repórteres, editores).

Atualmente, o jornalismo cultural tem recebido a crítica de pautar-se pelos

temas da indústria cultural, agendado pelos produtos e lançamentos do mercado.

“No jornalismo cultural, a liberdade de pauta e o trabalho de reportagem estão sufocadospela ordem do mercado. O jornalista passa a fazer o papel de correia de transmissão deuma indústria determinante do que deve ou não ser publicado. Poucas são as vezes em queos veículos conseguem apresentar alternativas para o consumo cultural, ou mesmo,alternativa de um produto jornalístico empenhado em apresentar algo novo, mesmo queseja de produtos massificados.” (ROSA, 2005)

O panorama do jornalismo cultural praticado hoje será discutido

posteriormente. Para tanto, o próximo item trata do debate travado em torno da

indústria cultural, desde a criação do termo por Theodor Adorno.

2 COELHO, Teixeira. Dicionário Crítico de políticas culturais. São Paulo: Iluminuras, FAPESP, 1997.

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5.2 A INDÚSTRIA CULTURAL

Não se pretende aqui esgotar a discussão sobre a indústria cultural, que

mobiliza intelectuais discordantes e defensores dessa teoria, com opiniões

extremadas ou mediadoras, devido à amplitude do tema e de seus desdobramentos.

O que este item traz é a conceituação de indústria cultural, as questões referentes à

valorização da arte e aos tipos de cultura, sob o ponto de vista da teoria crítica

elaborada pelos teóricos frankfurtianos, e algumas reflexões quanto à culturadesenvolvidas a partir daí, com ênfase às críticas feitas à formulação original

frankfurtiana que analisa o papel da indústria cultural, evitando o raciocínio

maniqueísta. O desenvolvimento do tema deve esclarecer o poder de intervenção

(ou influência) da indústria sobre a cultura, ainda que não seja possível mensurá-lo

precisamente, de forma a pintar o cenário em que se desenrola o jornalismo cultural

hoje, e assim, em um segundo momento, propiciar a análise do panorama atual da

atividade.

5.2.1 A Teoria Crítica

Segundo Edgar MORIN, no século XX o poder industrial estende-se pelos

continentes e ocorre uma segunda industrialização: a industrialização do espírito.

“Não há dúvidas de que já o livro, o jornal, eram mercadorias, mas a cultura e a vida

privada nunca haviam entrado a tal ponto no circuito comercial e industrial (...)”.

(1975, p. 9)

A indústria cultural , denominação proposta por Theodor Adorno em 1947, é

o momento do capitalismo em que a lógica industrial impõe-se à cultura, a produção

artística é racionalizada, a criação torna-se bem de consumo e o público transforma-

se em consumidor. A industrialização da cultura desenvolve-se a partir da segunda

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metade do século XIX, propiciada pelo somatório de fatores pós-Revolução

Industrial: urbanização da população, existência de uma economia de mercado e

formação de uma sociedade de consumo (burgueses e assalariados). A discussão

sobre a indústria cultural foi objeto de interesse de um grupo de pensadores do

Instituto de Pesquisas Sociais de Frankfurt, Alemanha, fundado em 1923, formado

por Theodor Adorno, Walter Benjamin, Jürgen Habermas, Max Horkheimer e Hebert

Marcuse, entre outros.

As teorizações de Adorno, Horkheimer e Marcuse seguiam a distinção alemã

entre “cultura” e “civilização” . A cultura seria o mundo das idéias, dos sentimentoselevados, do lazer, da interioridade, da liberdade e da arte; já a civilização

corresponderia à reprodução material da vida, ao trabalho e ao sofrimento humano.

Tal separação seria o mecanismo que permite a exploração e a alienação do

trabalho, oferecendo em contrapartida a promessa de felicidade por meio dos bens

culturais. Entretanto, logo o modelo não era mais capaz de sustentar o sistema de

reprodução material  e de manter o trabalhador obediente (ou submisso). Outro

mecanismo fazia-se necessário.

Ocorre, então, a absorção da cultura pelo sistema de produção de bens

materiais, renovando as formas de interação e consumo cultural. Os bens culturais,

antes produtos de luxo destinados à elite burguesa, tornam-se bens de consumo de

massa. Essa transformação foi viabilizada pelas tecnologias que permitiram a

reprodução em série de obras de arte (a criação de cópias para consumo pela

massa), transformando-a em mercadoria submetida à lógica de mercado capitalista.

É a indústria cultural, fenômeno da produção de cultura para consumo massivo.

A indústria cultural subjugou a produção e a distribuição culturais às leis de

mercado – antes, apenas a circulação estava sob as regras do lucro. As

características internas da obra de arte – espontaneidade da criação artística,

complexidade e relação entre artista e público – perdem espaço para a técnica, para

a motivação externa que fará do produto um bem com status artístico. A baixa

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qualidade das produções é justificada pelo “gosto do público”, que a própria indústria

tratou de esterilizar política, ideológica e culturalmente. Os meios eletrônicos de

comunicação seriam também determinantes no processo de produção e reprodução

dos bens culturais – cada vez mais padronizados e homogeneizados. Adorno não vê

a tecnologia como má em si, o mal é dado pelo contexto econômico, político e social

dos interesses burgueses em que está inserida.

A obra de arte passa a depender do valor de troca e de uso, ou seja, “deixa

de ter o caráter único, singular, deixa de ser a expressão da genialidade, do

sofrimento, da angústia de um produtor (artista, poeta, escritor) para ser um bem deconsumo coletivo, destinado, desde o início, à venda, sendo avaliado segundo sua

lucratividade ou aceitação de mercado e não pelo seu valor estético, filosófico,

literário intrínseco”. (FREITAG, 1986, p.72). Segundo Adorno, a obra de arte (no

caso a música) já trazia o circuito da mercadoria previsto em sua produção. As

poucas que fugiam dessa realidade seriam as menos acessíveis e compreensíveis,

como certas composições eruditas. É uma visão elitista de cultura que será criticada

adiante.

A indústria de bens culturais atende aos mesmos princípios de outras

produções industriais: “O uso crescente da máquina e a submissão do ritmo humano

de trabalho ao ritmo da máquina; a exploração do trabalhador; a divisão do

trabalho.”  (COELHO, 1980, p.10) Produzida pelas normas da indústria, a cultura

perde seu caráter crítico e de conhecimento para tornar-se um produto consumível,

padronizado. Os produtos da indústria cultural repetem as normas sociais sem

questioná-las, ou seja, sem propiciar ao indivíduo a reflexão sobre si e sobre o meio

em que vive – ao contrário, os padrões sociais são reforçados e promove-se o

conformismo social.

Os produtos culturais são simplificados de forma a requerer apenas uma

atitude passiva do receptor e promovem “a deturpação e a degradação do gosto

popular”. (COELHO, 1980, p.26). Segundo os frankfurtianos, a indústria cultural faz,

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por meio do consumo, com que as massas não percebam a realidade alienada em

que vivem, anulando a reflexão e a crítica. Esta noção de massa alienada e

inteiramente submissa foi questionada por alguns autores, sobre os quais este

trabalho tratará. Mesmo dentro da Escola de Frankfurt, houve quem discordasse da

idéia que Horkheirmer e Adorno tinham da arte. Habermas criticou-os pelas visões

tradicionais, limitadas e idealistas, pelas análises a partir do conceito de arte

burguês e por insistirem que o desenvolvimento do sistema capitalista destruiria a

arte – Habermas via outro futuro para a arte: a mudança de caráter e função.

Já o foco de atenção de Benjamin era a questão da reprodutibilidadetécnica. Para o autor, a arte conquista nos séculos XVIII e XIX uma independência

que até então desconhecia, antes submetida à religião e ao valor ornamental. Ele

propôs duas categorias de análise das obras, para o entendimento da relação entre

produção e consumo: “valor de culto” e “valor de exposição” (inverso à dificuldade de

acesso à obra). “Na medida em que o mundo se dessacraliza, a obra de arte vai

sendo liberada para o olhar do espectador. Mas o valor de culto não desaparece”

(FREITAG, 1986, p.75).

Benjamin pensa a obra de arte como possuidora de uma “aura”,

caracterizada pela distância do espectador (ainda que dele esteja perto) e pela

raridade ou “unicidade” (FREITAG, 1986, p.75). A industrialização da cultura tira da

obra de arte sua aura ao transformá-la em mercadoria, não mais única e singular.

Perdido o valor de culto, o valor de exposição aumenta ao ampliar-se o acesso da

população à obra, e um novo valor emerge: o de consumo. MORIN contradiz o

argumento de que a reprodutibilidade rouba a aura das produções culturais,

afirmando que a atualidade e o original mantêm seu valor. “O disco não suprime a

cerimônia que é o concerto. A reprodução do quadro não reduz em nada o valor 

mitificado do original.” (1975, p. 44)

Benjamin não vê a reprodução como um desvirtuamento da obra de arte,

mas como um processo que modificaria a percepção do consumidor.

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“A moderna obra de arte, como a fotografia e o cinema (hoje acrescentaríamos a televisão,

o vídeo e o lazer), ao provocarem mudanças na percepção e nas atitudes dos

consumidores, estariam modificando esses mesmos consumidores. Por isso mesmo a obrade arte pode servir como instrumento de politização (Benjamin estava, na época, fortementeinfluenciado por Bertholt Brecht), mas também de instrumento de redução de tensões ...”.(FREITAG, 1980, p.76)

O papel politizador visto por Benjamin indica um ponto de concordância

entre ele, Adorno, Horkheimer e Marcuse: a crença na dupla função da cultura na

sociedade. De um lado, representar e consolidar a ordem vigente, por outro, ser o

instrumento capaz de criticar tal ordem.A capacidade crítica da arte foi expressa por Adorno na elaboração da

Teoria Estética. Para ele, a arte seria a antítese à sociedade massificante, o único

espaço de crítica, verdade e auto-reflexão que sobrava no capitalismo. “A teoria

estética procura desvendar na obra de arte sua essência, seu verdadeiro caráter de

negadora (e contestadora) do real estabelecido, sem submetê-la a sistemas

conceituais coerentes ou ao processo de produção e reprodução da mercadoria.“

(FREITAG, pág. 84) A teoria estética era um reduto capaz de evitar que a arte –

vista como a representação do real e de suas contradições – perdesse sua

complexidade e se dissolvesse no cotidiano.

A visão negativa da escola de Frankfurt em relação à industria cultural

estendeu-se ao jornalismo, que por submeter-se às regras industriais da sociedade

capitalista foi considerado outro instrumento de controle e reprodução da ideologia

burguesa, alienador e manipulador, sem espaço para a crítica do status quo. As

principais idéias sobre o tema foram analisadas por Adelmo Genro Filho, que se

propôs a superar o reducionismo frankfurtiano sem descartar a visão crítica da

Escola.

Genro Filho acusa Adorno e Horkheimer de sustentarem uma “recusa

abstrata”, ou seja, a crítica negativa por si só, atitude pessimista que não propõe

opções de saída positivas para a arte e a cultura na sociedade capitalista. Adorno

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não perceberia “as potencialidades democráticas e a realidade contraditória,

geradas pelos meios de comunicação de massa do capitalismo moderno” (GENRO,

1987, p.95). Daí viria sua noção do jornalismo como um fenômeno mercantil

alienado e alienante.

Habermas formulou teorias sobre o jornalismo, dividindo-o em três fases. A

primeira era informativa, mantida por pequenas empresas artesanais com objetivos

comerciais. Na segunda, a opinião ganhou espaço (o “jornalismo literário”) e os

 jornais passaram a instrumentos de legitimação burguesa. Na terceira e atual, os

 jornais são empresas capitalistas que, com o estado burguês já estabelecido e ocrescimento da publicidade, voltam-se novamente aos interesses comerciais. Esta

fase é, para Habermas, um retrocesso em relação à anterior – a opinião dos

proprietários privados substitui a possibilidade de expressão da “opinião pública”,

composta por cidadãos, e perde-se a capacidade crítica do jornalismo. Além disso,

com a comercialização, a imprensa torna-se manipulável.

Habermas considerou apenas o fator capital no desenvolvimento do

 jornalismo. Tal limitação é criticada por Genro Filho, para quem o capitalismo não

criou falsas necessidades – as novas necessidades de informação existem, o que o

capitalismo faz é distorcê-las e aproveitar-se delas para lucrar. A crítica estende-se à

obra de Ciro Marcondes Filho, O Capital da Noticia, que nega o valor de uso da

notícia no jornalismo atual – o “valor de troca” teria subjugado o “valor de uso” real,

restando apenas, na notícia-mercadoria, o “valor de uso aparente”. Para Genro

Filho, a notícia comercializada não perdeu o valor de uso, sem o qual o valor de

troca não se realiza. “O espaço ocupado pelas notícias e reportagens, mesmo que

secundários conforme a ótica puramente econômica, deve corresponder a uma

necessidade do público consumidor para que o espaço publicitário seja valorizado.”

(GENRO, 1987, p. 109-110). Habermas teria cometido equívoco semelhante. Sua

divisão do jornalismo desconsidera o próprio objeto de análise, ou seja, a notícia

como valor de uso.

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A terceira fase do jornalismo, para Genro Filho, é uma síntese das duas

primeiras e as informações jornalísticas fazem parte das novas necessidades da

sociedade capitalista. Segundo RIBEIRO: “Os capitalistas não inventaram a

necessidade de informação; eles transformaram em lucro o que captaram do público

  – a notícia tem real valor de uso na democratização da informação e das

oportunidades de inserção na sociedade.” (1994, p. 107).  Existem outras

divergências entre Marcondes e Genro Filho. O primeiro, influenciado pela ideologia

marxista, acredita que a imprensa deve funcionar como instrumento de classe; o

segundo crê que só quando a imprensa ultrapassa a função política assume ocaráter jornalístico: suprir necessidades reais de informação.

5.2.2 As Culturas

A conceituação de indústria cultural recebeu diversas críticas relacionadas à

visão maniqueísta que Adorno e Horkheimer teriam do sistema capitalista e da

sociedade burguesa. Os dois desconsideravam a possibilidade de novas relações

políticas e artísticas que a reprodutibilidade técnica criava e acreditavam que o

controle e a manipulação exercidos pela indústria cultural sobre as massas era

quase onipotente. O pensamento frankfurtiano é estruturado sobre dois pólos

culturais: a cultura tradicional burguesa, única “superior”, e a cultura de massa,

produzida de forma industrializada, necessariamente “inferior”. Nesta oposição está

o grande motivo de crítica às teorias da Escola de Frankfurt sobre a indústria

cultural.

COELHO (1980, p.18) discorda da separação total das culturas. Segundo o

autor, “deve-se lembrar que freqüentemente, ao longo da história, a passagem de

um produto cultural de uma categoria inferior para outra superior é questão de

tempo. É o caso do jazz...”. Para Alan Swingewood, a concepção de cultura de

Adorno, Horkheimer e Marcuse é elitista e evidencia um desprezo pelas massas.

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Swingewood vai além em sua crítica, afirmando que a cultura é uma manifestação

humana que não pode ser reduzida a um instrumento de dominação.

O equilíbrio entre os pensamentos de Swingewood e de Adorno é

estabelecido por Adelmo Genro Filho, que crê haver limites para o controle do

capital sobre a cultura, devido às contradições internas, com potencial crítico e

transformador, nascidas da própria cultura de massa. Mas a dominação não pode

ser ignorada: “O predomínio do critério mercantil desde a concepção até a produção

das obras, o forte traço manipulatório da ideologia dominante nessa cultura, sua

tendência à padronização e ao rebaixamento do nível estético da maioria de seusprodutos são algumas das características indiscutivelmente reais da cultura

burguesa atual.” (GENRO FILHO, 1987, p.103-104)

Medina classifica a visão adorniana de cultura de massa de “apocalíptica”,

por não reconhecer nem “o prazer como sublimação do cotidiano” como um aspecto

positivo da cultura de massa. Também critica Adorno e os autores que o seguem

por olharem a cultura do ponto de vista da elite, menosprezando a massa. “Os

críticos – diz [Jean] Lohisse [Paris, 1969] – não são capazes de ver que os

conteúdos, aparentemente insignificantes, são capazes de assegurar a difusão de

informações, de suscitar curiosidades, alargar horizontes”. (MEDINA, 1988, p. 37) 

Edgar Morin diagnostica a existência, dentro da classe intelectual ou

“cultivada”, de resistência à cultura de massa:

“Desdenha-se com altivez a cultura de massa nos lugares onde reinam os esnobismosestéticos, as receitas literárias, os talentos afetados, as vulgaridades convencionais. (...)Tudo parece opor a cultura dos cultos à cultura de massa: qualidade à quantidade, criação àprodução, espiritualidade ao materialismo, estética à mercadoria, elegância à grosseria,saber à ignorância. Mas antes de nós perguntarmos se a cultura de massa é na realidadecomo a vê o culto, é preciso nos perguntarmos se os valores da “alta cultura” não sãodogmáticos, formais, mitificados, se o “culto da arte” não esconde muitas vezes um

comércio superficial com as obras.” (MORIN, 1975, p.14)

E contesta o aprisionamento que a divisão das culturas faz ao delegar à

burguesia a cultura superior e à massa a inferior.

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“No começo do século XX, as barreiras de classes sociais, das idades, do nível deeducação, delimitavam as zonas respectivas da cultura. A imprensa de opinião sediferenciava grandemente da imprensa de informação, a imprensa burguesa da imprensa

popular, a imprensa séria da imprensa fácil. (...) Na verdade as estratificações sãoreconstituídas no interior da nova cultura. Os cinemas de arte e os cinemas de circuitopopular diferenciam o público cinematográfico. Mas essa diferenciação não é exatamente amesma das classes sociais. Os programas e sucessos do cinema de arte nem semprecoincidem com os dos circuitos comuns, mas muitas vezes são os mesmos.” (MORIN, 1975,p. 30, 33)

A discriminação da cultura acessível ao povo, por parte da elite, surgiu antes

da indústria cultural. “No século passado [XIX], vista como ‘cultura dos incultos’, a

cultura popular já é sentida como diferente da erudita. O burguês crê viver ‘racionalmente’ o progresso; já o homem do povo viveria miticamente as tradições.”

(BOSI, 1986, p.66). MORIN contesta a superioridade da cultura da elite e, ao

contrário de Adorno, não vê a formação da indústria cultural como a decadência da

arte. “A velha ‘alta cultura’ tinha horror ao que revolucionava as idéias e as formas.

Os criadores se esgotavam sem impor sua obra. Não houve idade de ouro na cultura

antes da cultura industrial.” (1975, p.43)

Para o autor, a cultura massiva, destinada a “uma massa social, isto é, um

aglomerado gigantesco de indivíduos compreendidos aquém e além das estruturas

internas da sociedade (classe, família, etc.)” (MORIN, 1975, p.10), não é a única na

qual está inserida a população capitalista. “Ela [cultura de massa] se acrescenta à

cultura nacional, à cultura humanista, à cultura religiosa, e entra em concorrência

com essas culturas. As sociedades modernas são policulturais”. (1975, p.11).

A cultura à qual a população tem acesso pode ainda ser dividida conforme

sua procedência. A massiva seria imposta pelos detentores dos meios de produção

aos consumidores, ou seja, de cima para baixo; enquanto a popular surge no interior 

da sociedade. Esta segunda seria criada  pelo povo – e não  para o povo, como a

cultura de massa. De tal diferenciação, surge outra concepção maniqueísta: a

cultura feita pelo povo (aí incluídas, principalmente, as manifestações folclóricas)

seria essencialmente boa, enquanto a de massa seria necessariamente nociva.

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Armand Mattelart, teórico da comunicação com influência frankfurtiana, critica a

dominação ideológica da cultura de massa, contrapondo-a à cultura popular – que

ele iguala às culturas nacionais, como se a dominação ocorresse apenas de um país

pelo outro, não dentro de um país, de uma classe pela outra. A conseqüência de sua

visão simplista é que manifestações culturais vindas de impérios capitalistas, como

os Estados Unidos, seriam necessariamente ruins, enquanto as produções da

cultura popular seriam invariavelmente boas e deveriam ser preservadas. A cultura

assume, assim, a mesma problemática da dependência econômica dos países

subdesenvolvidos. Teixeira COELHO é contrário a essa linha de pensamento quedefende incondicionalmente a cultura popular. “Os mesmos excessos de valorização

da cultura superior, diante da de massa, também são encontrados na defesa da

popular diante da pop [massa]”. (1980, p. 30)

A divisão de categorias culturais de Ecléa Bosi é ainda mais precisa. Para a

autora, o binômio cultura erudita x cultura popular subdividiu-se a partir da revolução

industrial, formando quatro categorias: cultura erudita e kitsch x cultura popular e de

massa. “À medida que a indústria cultural substitui o folclore, ela procura dar a seus

produtos uma aura populista ou popularesca [massa]. Junto a outro mercado, à

medida que a indústria adapta a arte cultural ao consumidor, ela dá a seus produtos

o caráter de “midcult” [cultura média] e de Kitsch.” (BOSI, 1986, p.68) A perda do

caráter dual da cultura acompanha a divisão da sociedade em várias classes – não

mais a relação senhor x servo da sociedade feudal.

Bosi destaca a pluralidade de grupos sociais (do operariado à burguesia,

passando por classe média inferior, meia e alta) como fator de desnivelamentos e

interpenetrações entre a alta cultura e a cultura de massa.

“Um setor considerável da população, extraído das classes médias, mas não

exclusivamente, é capaz de consumir e de fruir objetos culturais menos primários que osoferecidos pela ‘mass cult’ [cultura de massa]. Para satisfazer as exigências desse público,intermediário entre o refinado e o massificado, existe uma cultura média. A ‘midcult’ tem-sepor séria e digna. (...) No entanto, qualquer pessoa realmente culta e medianamente dotada

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de espírito crítico sabe que as revistas ‘midcult’ simplificam até aguar de todo as grandes

correntes de pensamento e de arte de nosso tempo...” (BOSI, 1968, p. 77-78).

Além de buscar produções culturais mais elaboradas, existe entre apopulação o desejo de individualizar-se. “O público médio quer diferir da massa. Ser 

diferente é seu supremo desejo. Há uma indústria do ‘diferente’ (...) Se a vanguarda

artística produz alguma forma de original, ela é de pronto solicitada a comunicar ao

público médio suas descobertas.” (BOSI, 1986, p. 80) A tentativa de diferenciar-se é

absorvida para o interior da indústria cultural por meio do Kistch, que aparentemente

dissemina os estilos da cultura superior, mas distancia-os de seu contexto, retira-

lhes a ideologia e o potencial crítico. É o caso, por exemplo, de uma reprodução em

cartaz da pintura Guernica (Pablo Picasso, 1937) transformar-se em decoração de

parede.

Ao considerar os conteúdos das mensagens produzidas no contexto da

indústria cultural determinantes para o julgamento de se o produto é bom ou mau,

revelador ou alienante, parte-se de um critério baseado na subjetividade, no ponto

de vista ideológico de quem julga. Aí sobrevive o preconceito totalizador da camada

intelectual contra a massa. “O que não parece ter mudado muito foram as atitudes

críticas dos intelectuais mais exigentes que (...) acusam essa cultura de massa de

não ser cultura, mas indústria; de não ser orgânica e co-natural aos leitores que

atinge, mas exterior a eles e manipuladora da sua inteligência e da sua

sensibilidade.” (BOSI, 1986, p.75)

5.2.3 Reflexões Sobre o Jornalismo na Indústria Cultural

Identificar exageros e falhas nas críticas frankfurtianas sobre a indústria

cultural não impediu diversos autores de formular suas próprias críticas ao sistema

de produção. Ao submeter o objeto de estudo aos conceitos da semiótica, Teixeira

Coelho conclui que o problema não está no que dizem as mensagens dessa

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indústria, mas no modo como são ditas. A indústria cultural, tanto nos meios de

comunicação quanto em escolas e universidades, seria o campo do signo como

índice, da consciência indicial. 

“Isto é: tudo, signos e consciências e objetos, é efêmero, rápido, transitório; não há tempopara a intuição e o sentimento das coisas, nem para o exame lógico delas: a tônica consisteapenas em mostrar, indicar, constatar. Como o que ocorre com o índice, o que é dado ao

receptor é alguma coisa já conhecida, às vezes já conhecida pelo próprio receptor. Não hárevelação, apenas constatação superficial – o que funciona como mola para alienação. Oque interessa não é sentir, intuir ou argumentar, propriedades da consciência icônica esimbólica; apenas, operar.” (COELHO, pág. 70)

Assim, se o receptor tem a impressão de conhecer o objeto tratado, por meio

da revelação de alguma de suas propriedades, quase sempre não passa de uma

propriedade superficial. Precedentes e conseqüências não são considerados,

impedindo que o leitor construa um universo significativo mais rico, que lhe permita a

compreensão além da superfície dos temas.

MORIN defende a democratização do acesso aos bens culturais trazida pela

industrialização, mas reconhece que vem acompanhada da vulgarização das obras,

como as fracas adaptações de bons livros para o cinema. “Os processos

elementares de vulgarização são: simplificação, modernização, maniqueização,

atualização”. (MORIN, 1975, p. 45) O resultado são híbridos culturais.

Na tentativa de conquistar o grande público, a indústria cultural busca

homogeneizar suas produções. Para tanto, tende à unificação entre a informação e

o “romanesco”. “Tudo que na vida real se assemelha ao romanesco ou ao sonho é

privilegiado” – vira notícia, seja o clássico exemplo do homem que morde o cachorro

(ao invés do contrário), seja a vida amorosa das celebridades. “Inversamente, no

setor imaginário, o realismo domina, isto é, as ações e intrigas romanescas que têm

aparência de realidade.” (MORIN, 1975, p. 29) A cultura de massa chega à imprensa

usando a dramatização como artifício para provocar a projeção e a identificação do

público. No jornal impresso, veículo de divulgação de um grande número de dados

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e de leitura individual, o leitor tem a oportunidade de elaborar de um ponto de vista

privado, ao mesmo tempo, é afastado do universo a que se refere o texto. Se o

intermédio das palavras dificulta o envolvimento do leitor com o assunto abordado, a

solução é apresentar as notícias de forma “dramatizada”, como forma de “esquentá-

las”.

Outra característica da sociedade na indústria cultural é que o lazer passou

a ser, em grande parte, consumo dos produtos.

“O indivíduo privado que quer consumir sua própria vida tente a valorizar o presente. Fica,

além disso, cada vez mais privado de passado; este não lhe fornece mais sabedoria enormas de vida; os antigos valores, as grandes transcendências são esmagadas por umdevir acelerado. (..) Paralelamente, a perpétua incitação a consumir e a mudar (publicidade,modas, vogas e ondas), o perpétuo fluxo dos ‘flashes’e do sensacional conjugam-se numritmo acelerado em que tudo se usa muito depressa (...) Um filme, uma canção, duram otempo de uma estação, as revistas esgotam-se numa semana, o jornal da mesma hora”(MORIN, 1975, p. 157, 159).

O autor aponta um “princípio fundamental” na relação entre a indústria

cultural e o consumidor: “a criação cultural não pode ser totalmente integrada num

sistema de produção industrial”. (1975, p. 21) É preciso que haja novidade e

individualidade nas criações para que o público se sinta atraído constantemente. As

contradições a serem superadas pela indústria cultural, portanto, estão nas

diferenças entre o caráter de suas estruturas de produção e as características que

seus produtos devem possuir para conquistar o consumidor: os binômios burocracia-

invenção e padrão-individualidade. São contradições dinâmicas, de adaptação

mútua entre público e indústria, que devem equilibrar-se na produção de bensculturais. Além disso, a cultura contemporânea não se restringe aos moldes da

cultural industrial. Existe uma contracorrente na indústria cultural (contrária às

manifestações da principal) e ainda uma terceira corrente, “em que fermentam as

perguntas e as contestações fundamentais, que permanece fora da indústria

cultural...” (MORIN, 1975, p. 43) Ambas são possibilidades de afastamento do

indivíduo da cultura massificada.

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No jornalismo, pensado como meio de comunicação de massa, a divisão do

trabalho serve à racionalização da produção e provoca a padronização, inclusive

espacial – como o pré-estabelecimento do tamanho de uma notícia, por meio da

quantidade de caracteres que deve ter. Um resultado da divisão do trabalho nas

redações é que “o autor não pode mais se identificar com sua obra”. (MORIN, 1975,

p. 26), considerando-se o repórter como o autor  no jornalismo. Não é ele quem

define suas pautas, decide a abordagem, o aprofundamento ou o tamanho de seu

trabalho, que ainda sofre alterações – às vezes, re-significantes, se os pontos de

vista são divergentes – do editor.“A imprensa de massa é mais burocratizada do que o cinema, porque a

originalidade e a individualidade já lhe são pré-fabricadas pelo acontecimento,

porque o ritmo de publicação é diário ou semanal, e porque a leitura de um jornal

está ligada a fortes hábitos.”  (MORIN, 1975, p. 22). É possível que esta seja, em

parte, a causa da perda de público dos jornais. A concorrência de meios de

informação aumentou e, se a atração do leitor pelo produto-jornal não é suficiente, o

hábito não se renova.

“Um jornal, uma estação de rádio e de televisão são burocraticamente organizados. Aorganização burocrática filtra a idéia criadora, submete-a a exames antes que ela chegue àsmãos daquele que decide – o produtor, o redator-chefe. Este decide em função deconsiderações anônimas: a rentabilidade eventual do assunto proposto (iniciativa privada),

sua oportunidade política (Estado)...” (MORIN, 1975, p. 19).

É necessário dizer que o fator político não interfere apenas em empresasestatais – nos jornais privados, depende de onde vêm os maiores investimentos em

espaços publicitários (por vezes, do governo) e dos interesses políticos dos donos

do jornal.

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5.2.3.1 A indústria cultural e o jornalismo no Brasil

A sociedade urbano-industrial só iniciaria no Brasil na década de 1940. “A

imprensa já havia consagrado desde o início do século formas como os jornais

diários, as revistas ilustradas, as histórias em quadrinhos. Mas não é a realidade

concreta dos modos comunicativos que institui uma cultura de mercado, é

necessário que toda a sociedade de reestruture para que eles adquiram um novo

significado e uma amplitude social” (ORTIZ, 1988, p. 38), o que só foi acontecer nos

anos 40 do século XX, com o início da sociedade de massa brasileira e odesenvolvimento do quadro cultural no país. Foi ainda nessa década e na seguinte

que o cinema tornou-se bem de consumo, com forte presença dos filmes norte-

americanos e a tentativa de produzir cinema nacional. As publicações de jornais,

revistas e livros crescem.

Para COELHO, o Brasil nunca teve uma produção ou consumo de “cultura

superior” significativos devido ao atraso econômico e social, o que fez com que a

cultura de massa no país se desenvolvesse-se a partir da cultura popular.

... a etapa da cultura letrada, superior, foi queimada. Não havendo aquele conflito, a cultura

de massa desenvolve-se num terreno ganho sobretudo à cultura popular, sem que esta seja

eliminada. E o resultado é uma forma cultural que, sem mais ser a popular, dela ainda

depende em larga medida. (...) Surge assim uma cultura de massa heterogênea e firmada

em ampla medida na estetização de formas e conteúdos da cultura popular. (COELHO, pág.94).

ORTIZ reforça a idéia ao afirmar que, nos Brasil da década de 1940, a

cultura popular de massa possuía “uma aura que em princípio deveria pertencer à

esfera erudita da cultura”. (1988, p. 65). Ainda não se formara o antagonismo entre a

cultura artística e a de mercado – foi pela imprensa, por exemplo, que a literatura foi

legitimada e difundida no país. O que havia era um desejo de modernizar-se, não

ainda uma modernização.

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O período de efervescência cultural começou por volta de 1945 (e durou até

o golpe militar, em 1964). É nessa época que se pode identificar a formação de um

 público no país, interessado em manifestações artísticas como música, espetáculos,

cinema e a novidade dos anos 50, a televisão. Com a demanda crescente,

multiplicavam-se as empresas culturais.

“Seria difícil aplicar à sociedade brasileira deste período o conceito de indústria culturalintroduzido por Adorno e Horkheimer. Evidentemente as empresas culturais existentesbuscavam expandir suas bases materiais, mas os obstáculos que se interpunham aodesenvolvimento do capitalismo brasileiro colocavam limites concretos para o crescimento

de uma cultura popular de massa. Faltavam a elas um traço característico das indústrias decultura, o caráter integrador.” (ORTIZ, 1988, p. 48)

A padronização como efeito da indústria cultural só se tornaria possível

quando a lógica capitalista se estendesse por toda a sociedade. A integração social,

então, não acontecia pela indústria cultural, mas por meio da política de Estado.

Além disso, o Brasil não possui um passado clássico como nações européias.

A temática da sociedade de massas demora a chegar às revistas. Somente

em 1966 Ferreira Gullar escreve um primeiro artigo sobre a estética da sociedade de

massa. Em 1968, a revista de Civilização Brasileira publica a tradução de um artigo

escrito por Adorno e outro por Benjamin. No mesmo ano, a Tempo Brasileiro lança

um número especial sobre comunicação e cultura de massa.

A consolidação do mercado cultural brasileiro ocorre nas décadas de 1960 e

1970. Antes, as produções eram restritas e chegavam a um número reduzido de

pessoas, e era forte a presença cultural estrangeira. Consolidado o mercado,

entretanto, a cultura brasileira conquista progressivamente mais autonomia, a

produção e a distribuição dos bens culturais expandem-se e diversificam-se,

atingindo a massa de consumidores. A razão industrial chega aos jornais, nos quais

novas normas de redação são implementadas, para tornarem-se empresas mais

produtivas e eficientes.

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“... o indivíduo, consciente de sua posição isolada e ao mesmo tempo integrada num todo

como a massa, liberta sua atomização e sua inquietude solitária num impulso de ser comoos outros. (...) Daí a tendência marcante da comunicação de massa em desenvolver asmensagens, não no universo particular que cada um tem, mas no que cada um tema ver 

com os outros homens.” (MEDINA, 1988, 36-37)

Essa busca pelo “universo de símbolos comuns” leva à homogeneização da

linguagem (clichês), da abordagem e da temática, em suma, do tratamento dado à

informação.

Outro aspecto da indústria cultural brasileira é estar “bastante voltada para

temas, assuntos e culturas estrangeiras, particularmente as norte-americanas.”

(COELHO, 1980, p. 81) Tal tendência diminui a valorização da cultura local, por 

outro lado, porém, permite aos brasileiros mais contatos culturais e informações

sobre as culturas estrangeiras. Uma dialética que não precisa ser evitada, segundo

COELHO, desde que não implique o predomínio do estrangeiro sobre o nacional. O

autor explica que ”mesmo uma indústria cultural ‘colonizada’, como se diz, acaba por 

vincular-se à realidade cultural do país E isto não por idealismo, mas porque ela

‘precisa vender seus produtos’ e, para tanto, precisa usar como chamariz algo que

chegue mais perto das pessoas.”  (COELHO, 1980, p. 97) Nas últimas décadas, a

cultura brasileira ganhou espaço e notabilidade no país, com o ressurgimento do

cinema nacional e a valorização dos artistas locais, por exemplo, mas a forte

presença norte-americana (no cinema e na música, principalmente) não pode ser 

ignorada.

É necessário considerar, ainda, a dependência econômica dos jornaisbrasileiros. As empresas jornalísticas tiram da venda de espaços para anúncios

publicitários a maior porcentagem de seu sustento (algo em torno de 80%), o que as

coloca em relação de dependência das agências e anunciantes, interessados na

tiragem e no público leitor do jornal. “Como norma, todas as preocupações culturais

se guiam pela preocupação maior, que é ‘vender alguma coisa’. Para vender, é

necessário criar e manter o hábito de consumir. E para que este sobreviva, é

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necessário embotar a capacidade crítica, em todos os seus domínios.”  (COELHO,

pág. 86) A frase final, extremista, é provavelmente um exagero. Recordem-se as

idéias de Edgar Morin, que identifica na indústria cultural a existência de um corrente

(terceira) que é o espaço de contestação e, portanto, crítica da indústria cultural.

Segundo Ortiz, mesmo com a industrialização, a cultura não se torna

inteiramente mercadoria – e, assim como o jornalismo, mantém seu valor de uso.

“Utilizando uma expressão de Foucault, eu diria que a indústria cultural age como

uma instituição disciplinadora enrijecendo a cultura [na qual enquadra-se o

  jornalismo].” (ORTIZ, 1988, p. 148) Para o autor, o que acontece na sociedadeindustrial não é a ausência total de manifestações criativas, mas menos espaço e,

portanto, uma maior dificuldade, para que ocorram.

A produção do jornalista passa a ser medida em termos de desempenho,

produtividade e rentabilidade. Entretanto, ainda que seguindo regras industriais, o

 jornalismo não se limita a produto em série. Segundo Carlos Eduardo Lins da Silva,

“O jornalismo não é uma atividade com o mesmo fim de uma indústria de sabonetes.

São muito parecidas, têm o objetivo máximo que é a lucratividade, mas o efeito do

 jornal tem uma carga simbólica muito mais importante do que a carga material dele

mesmo. A importância simbólica de um jornal é talvez maior do que a importância

material.” (SILVA, em depoimento a RIBEIRO, 1994, p. 55)

5.3 HISTÓRIA DO JORNALISMO CULTURAL

O jornalismo cultural surgiu na Europa, após o Renascimento, no princípio

da industrialização, com a formação das cidades – quando o homem deixou o

campo para ocupar o espaço urbano. Uma influência marcante em sua concepção

foi o ensaísmo humanista – como Os Ensaios de Montaigne, que mesclavam o

erudito e o mundano.

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Até o século XVII, não existia o conceito de público, e o consumo de livros,

músicas e espetáculos era restrito a pequenos círculos da elite. No século XVIII,

aumentou a quantidade de casas de espetáculos e museus na Europa, difundindo a

apreciação da arte para o público leigo. A crítica cultural chegou às revistas,

propagando conversas e idéias que surgiam nos salões. Música e literatura eram os

temas artísticos que mais apareciam no jornalismo cultural, então fundamentalmente

opinativo.

Um dos primeiros marcos do jornalismo cultural é a revista diária The

Spectator , criada na Inglaterra, em 1711, por Richard Steele e Joseph Addison,citados por PIZA, para “tirar a filosofia dos gabinetes e bibliotecas, escolas e

faculdades, e levar para clubes e assembléias, casas de chá e cafés.” (2003, p.11)

Seu público era o homem  urbano, interessado nas novas tendências e em obter 

conhecimento de forma prazerosa. “A revista falava de tudo – livros, óperas,

costumes, festivais de música e teatro, política – num tom de conversação

espirituosa, culta sem ser formal, reflexiva sem ser inacessível, apostando num

fraseado charmoso e irônico...” (PIZA, 2003, p. 12). Durante quatro anos, The

Spectator  alcançou o objetivo proposto: seu conteúdo foi discutido fora dos

ambientes puramente intelectuais e os autores ganharam fama.

Era o início de uma era de ouro do jornalismo europeu. Na Alemanha, G.E.

Lessing ficou famoso escrevendo sobre pintura, teatro e literatura. Na Inglaterra,

surgiram outros jornalistas culturais influentes. Samuel Johnson, que trabalhou para

The Rambler , foi o primeiro grande crítico de cultura – escreveu resenhas literárias,

ensaios, estudos sobre a língua inglesa e reflexões sobre assuntos diversos. Foi o

mais lido escritor de seu tempo e suas opiniões eram aguardadas pela platéia

importante na época. No final do século XVIII, o inglês William Hazlitt, jornalista de

The Examiner , foi outro que orientou os gostos de sua geração, reavaliou clássicos e

foi ainda polemista político.

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Com o avanço industrial, em meados do século seguinte, o jornalismo

cultural ensaísta e crítico conquistou mais poder de influência. Na Inglaterra,

destacou-se o crítico de arte John Ruskin, que tratava as opções estéticas como

manifestações morais ou filosóficas. Na França, o grande nome foi Sainte-Beuve,

cujas críticas escritas nos jornais Le Globe e Le Constitutionnel  serviriam como

padrão para o jornalismo cultural. A partir daí, o jornalismo cultural passou a ser uma

profissão com status próprio – o jornalista não mais precisava ser também escritor 

ficcional (como foi o poeta e crítico francês Charles Baudelaire) ou acadêmico para

construir uma carreira com boa reputação.Foi ainda no século XIX que o jornalismo cultural chegou ao continente

americano. Nos Estados Unidos, o escritor Edgar Allan Poe tirava seu sustento da

atividade de crítico cultural em revistas e jornais. Na segunda metade do século,

com o crescimento (inclusive cultural) do país, aumentou o número de críticos

americanos. O destaque nesse período foi Henry James, que produziu resenhas de

literatura e narrativas de viagem para veículos de Nova York.

No final do século XIX, as questões sociais e ideológicas ganharam o

interesse do jornalismo cultural. Crítico de arte e literatura, o francês Émile Zola foi

preso por defender um tenente judeu acusado de traição – o caso foi revisto e

provou-se a inocência do tenente. Em Londres, Bernard Shaw colocava em prática a

preocupação social, exigindo do jornalismo comprometimento com a realidade

humana. Shaw foi crítico de arte, música, literatura e teatro, polemista político e

observador social. Em Viena, Karl Kraus combinava comentário estético à sátira

política.

O jornalismo, antes do século XX, era dominado pelos debates artísticos e

articulismos políticos. A modernização social aumentou a demanda por informação

“objetiva” e factual, as notícias, a reportagem e a entrevista ganharam espaço.

  “O crítico que surge na efervescência do século XX, na profusão de revistas e jornais, émais incisivo e informativo, menos moralista e meditativo.(...) Como Shaw, ele luta pela

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relevância da cultura no cotidiano das pessoas, mas, ao contrário de Shaw, não quer 

encaixá-la num sistema de valores, numa mistura de ideologia e estética – embora muitasvezes a ideologia ainda dite muitas opções estéticas feitas pelos críticos culturais até hoje.”(PIZA, 2003, p. 20)

E é a partir do século XX que a indústria cultural passa a submeter a

produção jornalística às leis de mercado.

Nos Estados Unidos, a tradição ensaística inglesa foi resgatada, em um

  jornalismo com aprofundamento reflexivo. Piza aponta os escritores norte-

americanos Ezra Pound e T. S. Eliot como os dois maiores críticos do século, com

grandes contribuições à cultura. Outros dois importantes críticos, de tradição

exclusivamente jornalística, foram H. L. Mencken e Edmund Wilson. O primeiro

“sabia escrever para um público amplo sem fazer concessões populistas de

nenhuma espécie, por meio de um lança-chamas verbal.”  Wilson destacou-se por 

formular “critérios rigorosos de análise sensível” e como repórter da revista The New 

Yorker , criada em 1925. (PIZA, 2003, p. 22)

A New Yorker  logo se tornou uma referência em jornalismo cultural,

revelando críticos mordazes (como Dorothy Parker e Pauline Kael), humoristas e

articulistas (destaque para E. B. White e A. J. Liebling). Na revista, cresceu o

 jornalismo literário, mescla de histórias verídicas à narrativa ficcional, com recursos

da literatura, como descrições e diálogos, com as publicações de Hiroshima, escrita

por John Hersey em 1946 e eleita a “reportagem do século”;  A Sangue Frio, de

Truman Capote; e outras reportagens interpretativas, “com teor subjetivo, pique

narrativo e recursos da ficção como a atenção a detalhes e vozes.” (PIZA, 2003,

p.24)

Na Inglaterra, George Orwell destacou-se como ensaísta político, crítico e

com as reportagens literárias. Suas argumentações eram claras e incisivas, as

descrições levavam fina subjetividade e a política era determinante em suas

análises. Nos anos 1930 e 40, a política esteve muito presente em todo o jornalismo

cultural.

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A maior concorrente da revista New Yorker  era a Esquire, com

colaboradores importantes, entre eles, Aldous Huxley, George Nathan e Scott

Fitzgerald. O jornalismo literário, ou “New Journalism”, era produzido por Norman

Mailer e Gay Talese. Tom Wolfe fazia o mesmo, com mais recursos onomatopéicos

e metafóricos, no suplemento do jornal Herald Tribune. Levando ao exagero o New

Jornalism, Hunter Thompson criou o Gonzo Journalism, escrevendo para a revista

Rolling Stones reportagens em tom confessional e participativo, que estreitavam os

limites entre o jornalismo e a ficção, geralmente sob efeito do consumo de drogas.

Na inglesa The Spectator o jornalismo literário também ganhou espaço, masos críticos e colunistas permaneceram os maiores atrativos para o público. “A crítica,

claro, continua a ser a espinha dorsal do jornalismo cultural, não só das revistas.”

(PIZA, 2003, p. 28). Na França, destacam-se pelo teor crítico as publicações Le

Monde de La Musique, Magazine Littéraire e Cahiers du Cinema; no México¸ a

revista Vuelta foi editada por Octávio Paz, o grande ensaísta latino-americano do

século passado.

Além das publicações específicas, a crítica conquistou espaço na “grande

imprensa” na segunda metade do século XX. Nas décadas de 1970 e 80, artigos

publicados no New York Times definiam a reputação – e, muitas vezes, o sucesso

ou fracasso – de uma obra. Na revista Time, Robert Hughes alcançou a união cada

vez mais difícil para um crítico: estilo sofisticado, critérios exigentes e um grande

público leitor. Na Europa, a análise mantém seu status dentro do jornalismo cultural,

no qual há grande atuação de intelectuais e colunistas renomados, como Umberto

Eco e Mario Vargas Llosa.

5.3.1 A Trajetória do Jornalismo Cultural no Brasil

“Em 1838, o Jornal do Commercio foi um dos primeiros a tematizar questões

culturais através do suplemento Folhetim.” (GADINI, 2003, p. 5) Política, economia e

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cultura tornavam-se a tríade temática dos jornais brasileiros, a exemplo da Europa,

porém era um jornalismo “frágil”, segundo Nelson Werneck Sodré (1999, p.283),

sem grande espaço para informação e debates e com pouca especialização.

Segundo Sérgio Luiz GADINI (2004), devido ao alto analfabetismo e outras

defasagens sócio-econômicas e culturais, não se pode falar em consumo e crítica

cultural no Brasil antes das últimas décadas do século XIX. Até meados daquele

século, a taxa de alfabetização brasileira estimada era de 3% – um ambiente

inóspito para a produção e o consumo de bens culturais. No final do século, o

  jornalismo cultural se torna mais freqüente, embora ainda pouco especializado,surgem folhas de notícias e pequenas revistas culturais, que ampliam o mercado de

veículos impressos e estimulam o hábito da leitura na população. “É, então, ao que

tudo indica, um passo importante para a configuração ao modo como hoje funciona

ou se ‘edita’ o setor cultural – aqui compreendidas as variedades, tematização das

atividades artísticas e de entretenimento – em termos de organização e de rotina

produtiva...” (GADINI, 2003, p. 21) 

“Mas é no início do século XX que a cultura adquire status de notícia nos

quotidianos brasileiros. (...) E ainda na primeira metade daquele século, as seções

de teatro, música e cinema passaram a ser publicadas diariamente.” (GADINI, 2003,

p. 5) Os comentários artístico-culturais ainda eram elitizados, condizentes com a

classe que tinha acesso à leitura de periódicos. Com a inserção de fotografias e

aumento do uso de ilustrações nos jornais da década de 1920, a cultura impressa

começou a atrair também as classes com menos instrução. “No final da década de

20, o estilo europeu – ainda preponderante na imprensa brasileira – começou a

ceder lugar a um modelo norte-americano, mais noticioso e seco. No entanto, a

tradição literária persistia. O jornalismo ainda não encontrara sua linguagem

específica (...) o beletrismo continuou como uma carga sobre o texto jornalístico.“

(RIBEIRO, 1994, p. 31) Machado de Assis inicia sua carreira como crítico (de

literatura e teatro), caminho seguido por muitos outros escritores brasileiros até hoje

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(de Lima Barreto e Mário de Andrade à Rubem Alves e Carlos Heitor Cony). O

grande crítico do período foi José Veríssimo, escrevendo sobre literatura.

O Correio da Manhã, desde o surgimento em 1901, trouxe seções dedicadas

à temas culturais, como literatura e teatro, e, a partir da segunda década daquele

século, passou a publicar diariamente as seções de cultura. As revistas têm

participação ativa nas manifestações intelectuais e artísticas do século XX –

principalmente no surgimento e expansão dos movimentos modernistas, como o

futurismo e o surrealismo. No Brasil, por exemplo, a revista Klaxxon reunia os

articuladores da Semana de Arte Moderna de 1922. Foi nesse século, ainda, quenovos temas começaram a ser incorporados à apreciação jornalística, como o

cinema.

A partir dos anos 1930, o jornalismo brasileiro, até então fortemente político,

abre espaço para a cultura – em especial, a produção literária. O interesse

acompanha o desenvolvimento da indústria cultural no Brasil. As variedades

passam a compor a tríade jornalística, junto à política e economia. A demanda por 

informação, cultura e entretenimento surge quando diversão e lazer tornam-se bens

de consumo. A boemia que dominava a imprensa brasileira, então formada por 

escritores, poetas, políticos e funcionários públicos, dá espaço à profissionalização

do jornalista. O espaço literário deixa de se fazer presente ao longo de todo o jornal

e passa a ter áreas específicas; depois, ocorre a criação dos cadernos e

suplementos.

O crítico do início do século XX torna-se profissional e  “não só analisa as

obras importantes a cada lançamento, mas também reflete sobre a cena literária e

cultural”. (BUITONI, 2000, p. 32). A atuação de Mário de Andrade como crítico e

ensaísta cultural foi notável. Mário foi colaborador da revista O Cruzeiro, que marcou

época com reportagens investigativas e a publicação de contos e artigos dos

maiores artistas da época, entre eles, Millôr Fernandes, Anita Malfatti e Vinícius de

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Moraes. “O Cruzeiro configurou o visual brasileiro até ser substituída pela televisão.”

(BUITONI, 2000, p.60)

A criação de um público cultural acompanhava o processo de urbanização,

principalmente em São Paulo e na capital do país, Rio de janeiro. Chegam ao país

agências internacionais de publicidade. Com o sucesso do rádio, o público quer 

saber mais sobre os artistas que ouve, aumenta o interesse pelo campo cultural e o

hábito de consumir  cultura (de modo bem aquém do que aconteceria quando a

indústria cultural se consolidasse de fato – processo que se acentua depois de

1940). A imprensa assume o papel de legitimadora e crítica das artes – incluindo ocinema.

“As editorias ou páginas de variedades dos jornais tentavam, assim, responder a umademanda de novo leitores, bem como nascia um pouco atrelada à idéia decorrente danoção de futilidades – ou seja, de que a cultura estava ou poderia estar associada a certaslevezas ou curiosidades da vida privada com virtual interesse público: colunas com notassobre a presença ou deslocamentos de pessoas consideradas importantes, autoridades eacompanhantes, horóscopo, diversão e amenidades afins, considerando o interesse do

público feminino. Essa mesma noção editorial, por muito tempo orientou (e, em algunscasos, ainda orienta) profissionais e leitores do setor.” (GADINI, 2003, p. 55)

 

O país apresentou algumas peculiaridades no jornalismo de cultura. A

reportagem literária teve pouca aceitação no jornalismo brasileiro, porque, segundo

PIZA, “revistas com textos longos sempre foram vistas como comercialmente

inviáveis e o jornalismo cultural brasileiro amadureceu tardiamente”. (2003, p.33) Em

contrapartida, a crônica sempre teve destaque na imprensa nacional, como o gênero

de aproximação entre o jornalismo e a literatura.

Na década de 1940 começam os investimentos em cinema nacional, com a

fundação da Atlântida (1941) e da Vera Cruz (1949). São criados espaços culturais

importantes, como o Museu de Arte de São Paulo (1947), Museu de Arte Moderna

(1948, São Paulo), o Teatro Brasileiro de Comédia (1949) e a TV Tupi (1950). Após

a Segunda Guerra Mundial, o aumento das importações impulsiona o consumo no

país, do blue jeans ao whisky , à diversão nas boates e à vinda de ritmos musicais,

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com grande destaque para o rock’n’roll a partir dos anos 1950. É nessa época que

suplementos de literatura ganham espaço. O Diário de São Paulo, em seu

suplemento, publicou pela primeira vez no Brasil traduções de Willian Faulkner,

James Joyce, Marcel Proust, Virgínia Woolf, Federico García Lorca e outros

escritores. Os suplementos contavam ainda com a colaboração dos principais

escritores brasileiros da época.

Até a metade do século XX, a atividade jornalística é “marcada por maior 

liberdade de produção, em especial do texto, seja ensaio, crítica, comentário ou

ainda da reportagem marcada pelos estilos individuais dos próprios autores.”(GADINI, 2003, p.30) Começa então a busca pela objetividade jornalística, por meio

de artifícios como o lide e com a separação do espaço para opinião. Surgem os

primeiros “manuais de redação”. Com a publicidade ocupando 80% da renda dos

impressos, cresceu a preocupação em aumentar as tiragens. Ao mesmo tempo,

acontecia a modernização tecnológica das empresas jornalísticas.

Em 1959, alguns anos depois da reforma do Jornal do Brasil , é criado o

Caderno B, caderno cultural com circulação diária a partir de 1962, enquanto o

Suplemento Dominical saía aos sábados. O Caderno B trazia fotografia, manchetes

e chamadas na primeira página. “É o Caderno B, portanto, que passa a forjar a

tradição de agrupar as matérias de arte, cultura e variedades em um caderno

separado do primeiro.” (GADINI, 2003, p.60).

O Estado de S. Paulo não publicava um caderno diário específico de cultura

até a década de 1960, as notícias sobre o tema eram veiculadas em quatro páginas

no corpo do jornal. Em 1956, é criado o Suplemento Literário, com seções fixas de

literatura (poemas, crônicas, contos, artigos) e espaço para artes plásticas, música,

cinema e teatro. Vinte anos depois, é substituído pelo Suplemento Cultural , com 16

páginas publicadas aos domingos. Só em 1986 é criado o Caderno 2 e as matérias

de cultura passam a compor um caderno único diário.

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A Folha de S. Paulo lançou em 1958 a Ilustrada, de circulação diária, e em

1970 o suplemento Folhetim, veiculado aos sábados. 

“Alguns anos mais tarde (16/06/1964), a Folha Ilustrada, o 4º caderno do jornal, trazmatérias de artes plásticas, ciências, livros e autores, horóscopos, exposições, rádio e TV,cinema, música, discos, roteiros de teatro e de cinema, em meio aos anúncios da área,

estréias etc. Vale lembrar que a Ilustrada veicula também muitas notas ou matérias deagências internacionais (seja de astros do cinema hollywoodiano, musicais, descobertascientíficas, etc.).” (GADINI, cadernos, p. 75)

 

Os anos de 1940 a 60 foram os melhores para a crítica jornalística no Brasil.

No Correio da Manhã destacaram-se as críticas “impressionistas” de Álvaro Lins(impressões sobre a obra em primeira pessoa, com argumentação), as reflexões

sobre o destino do Brasil e da cultura e os ensaios de Otto Maria Carpeaux. No

suplemento dominical criado nos anos 1950, o Quarto Caderno, trabalharam os

importantes críticos de cinema Moniz Viana e José Lino Grunewald, o polemista

Paulo Francis e o dramaturgo Nelson Rodrigues. Esse grupo e mais outros que

escreviam para o Correio da Manhã fizeram-no um jornal fortemente opinativo.

Já o Caderno B do Jornal do Brasil dava espaço maior à reportagem e ao

visual, antecipando tendências do jornalismo cultural atual. Clarice Lispector, a

crítica de teatro Bárbara Heliodora e os irmãos Augusto e Haroldo Campos

colaboravam com o jornal. No Suplemento Literário de O Estado de São Paulo, o

diretor Décio de Almeida Prado estabeleceu um modelo de caderno de livros que

conciliava informação jornalística a um bom nível cultural: “Não exigiremos que

ninguém desça até se pôr à altura do chamado leitor comum, eufemismo que

esconde geralmente a pessoa sem interesse real pela arte e pelo pensamento.”

(PRADO3, citado por PIZA, 2003)

O destaque individual deste período foi Paulo Francis, com novas propostas

para o teatro brasileiro e um grande poder como polemista e comentarista cultural.

Francis trabalhou nas revistas Senhor e Diners, no tablóide O Pasquim – semanário

3 PRADO, Décio de Almeida.

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irreverente e irônico, que fazia resistência à ditadura e modernizou a linguagem

 jornalística – , no semanário Opinião, nos jornais Folha de São Paulo (Ilustrada), O

Estado de São Paulo (Caderno 2 )  e O Globo. A Ilustrada era conhecida pelas

polêmicas e por dar atenção à cultura jovem internacional – cinema americano e

música pop, principalmente. O Caderno 2 dedicava mais espaço à literatura, artes

plásticas e teatro.

As décadas de 1960 e 1970 consolidaram o mercado de bens culturais no

Brasil, com maior volume de produção e facilidade de acesso. “A produção de

cinema dá um bom indicador desse modelo também preocupado com uma culturanacional-popular , mesmo que sob o controle da censura e aval militar a toda e

qualquer perspectiva crítica ou preocupada com a realidade social.” (GADINI, 2003,

p.37-38) Houve ainda a ampliação dos mercados literário, fonográfico e televisivo.

Na opinião de GADINI (2003, p.39), tal crescimento, apesar de provocar a

profissionalização, “não garante o desenvolvimento de maior sensibilidade estética,

espírito crítico e nem mesmo opções de consumo no mercado cultural” – o que seria

a realidade brasileira.

Sob a censura do governo, a resistência democrática “começou a militar (...)

em defesa dos direitos humanos e no campo cultural, pautando/sugerindo

filmes/livros/discos de caráter crítico ao regime militar, buscando conquistar a

adesão e formar quadros intelectuais de setores das classes médias urbanas,

especialmente nas grandes e médias cidades brasileiras”. (GADINI, 2003, p.85) O

cinema novo e os festivais de música marcaram esse período.

Como no Brasil a industrialização tardou em impor-se em todos os cantos,

os efeitos da indústria cultural começaram com a chegada de produtos culturais

importados, especialmente dos Estados Unidos. Só aos poucos surge uma indústria

cultural nacional de fato, com produções locais massificadas, como cinema, novela e

programas de auditório. Ainda nos anos 1960 era grande a diferença entre a

influência da cultura de massa nos EUA e no Brasil.

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“Vemos nessa fase (década de 60) a expansão da indústria cultural e uma de suascontradições típicas de países em desenvolvimento – a defasagem entre os propósitos-massa de grandes centros urbanos e a audiência restrita, empresas jornalísticas de infra-

estrutura industrial tirando uma revista nacional para apenas 40.000 consumidores, outiragens de livros de ficção de 2 a 5.000 exemplares, ou tiragem de grandes jornais para100, 120.000 assinantes e compradores.” (MEDINA, 1988, p. 49)

Aí se encontrava uma contradição do jornalismo massivo no Brasil, o

tratamento massivo a produtos destinados a um público restrito. De certa

forma, tal contradição persiste – o jornalismo está inserido na lógica da indústria

cultural, as tiragens aumentaram consideravelmente, mas a leitura do jornal

impresso continua, na maioria dos casos, a ser quase privilégio das classes mais

instruídas e capitalizadas.

Antes da regulamentação da profissão de jornalista, em 1969, não se fazia a

distinção entre o bom escritor de literatura e o bom jornalista, o que deu a grande

parte dos escritores brasileiros da época um espaço nos periódicos nacionais.

A segmentação do trabalho jornalístico em editorias (como cultura, cidade, e

política), em áreas dentro das editorias (teatro, cinema, literatura, música, etc.) e em

papéis (repórter, editor e subeditor, sem o antigo pauteiro) é conseqüência da

industrialização da atividade. “Com a industrialização e a padronização da imprensa,

a maior parte do jornalismo cultural dos jornais diários e das revistas semanais

passou por um processo de simplificação, muito contaminado por lógicas de

promoção comercial, principalmente depois da década de 1970”  (BUITONI, 2000,

p.64).O fim do regime militar e o desenvolvimento da indústria cultural dão espaço

à configuração de um novo campo cultural no país, ainda com espaço para crítica,

mas já adaptado à demanda industrial. Os anos 1980, de volta à liberdade política,

foram marcados pelo progresso tecnológico dos veículos e pela concorrência entre

os meios. A saída para a imprensa diária foi o aprofundamento das notícias, para

diferenciar-se, e a busca por mais apelo visual, para aproximar-se dos meios visuais.

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Da metade da década em diante, o jornalismo de “serviço” ganha lugar, pautado por 

orientações para consumo. “A cobertura jornalística da cultura vai adquirindo outras

roupagens, como a prioridade da lógica de serviços e das atividades e produtos

mais voltados ao lazer e ao entretenimento, agendado em grande medida pelo meio

televisivo.” (GADINI, 2003, p.90)

“ Os jornais brasileiros começam a empregar os mesmos ingredientes que os internacionais.(...) E nessa fermentação, a mensagem jornalística se multiplica em formas oumanifestações. O relato noticioso, a reportagem, a entrevista, o editorial e outroscomentários opinativos, a pesquisa de reconstituição histórica (biográfica) dos focos do dia,a crônica,a crítica de espetáculos e arte. A mistura de tudo isso é um resultado colorido –

não mais páginas uniformemente compostas, mas um festival de títulos, seções, editoriais,recursos gráficos. Informação/ distração/ opinião se inter-relacionam de forma que montar um esquema de classificação não é fácil.” (Medina, 1988, p. 66)

“No Brasil, a baixa escolaridade conferiu liderança imediata aos meios

audiovisuais e cristalizou tiragens baixas no caso dos jornais – e ínfimas, no caso

dos livros.”  (RIBEIRO, 50) A sociedade não acompanha a modernização da

imprensa, a produção cultural criativa e crítica são fracas frente à cultura de massa.

O jornalista Paulo Francis já então reclamava da ausência de opiniões fortes, com

tradição humanista e generalista.

O panorama atual do jornalismo cultural impresso e as críticas que tem

recebido são os temas do próximo item. Antes, é oportuno lembrar que o jornalismo

de cultura contemporâneo tem dois outros grandes veículos de propagação além do

 jornal e da revista: o livro e a Internet. Cada vez mais jornalistas dedicam-se a

publicações de biografias, perfis e livros-reportagem. O crescimento do jornalismoon-line é também facilmente perceptível, com uma quantidade incontável de sites

dedicados à produção de notícias e críticas culturais, nos quais a idéia de interação

começa a desenvolver-se, com a criação de enquetes e fóruns – e onde o autor do

texto desfruta de maior liberdade criativa, com a possibilidade de criar seu canal

direto de comunicação com o leitor, como sites pessoais e blogs.

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5.3.2 O Jornalismo Cultural no Paraná

Assim como no restante do mundo, a história do jornalismo cultural no

Paraná inicia-se com publicações voltadas para a literatura. No fim do século XIX,

revistas relacionadas ao movimento simbolista marcaram época no estado. A

importância do movimento explica-se na obra Dicionário Histórico-Biográfico do

Paraná, por ter constituído “um momento peculiar da vida intelectual paranaense,

que revelado através das revistas manifesta-se fértil em quantidade, qualidade e

mesmo em contradições, fruto do ecletismo que caracterizou a riqueza de interessee informações.” (DICIONÁRIO, 1991, p. 467). Foram mais de uma dezena de

publicações ligadas ao simbolismo – entre elas, Club Curitibano (marco inicial, em

1890), O Cenáculo (1895),  A Arte (1895), Galáxia (1897),  A Pena (1897), Pallium

(1898), O Sapo (1898),  Azul  (1900), Breviário (1900), Turris Ebúrnea (1900) e

Stellario (1905) – concentradas, em geral, na reprodução de textos dos principais

escritores da época, além de artigos sobre literatura, com tiragens baixas e leitores

restritos.

“Se a Primeira Grande Guerra demarcou o fim da inocência das revistas

simbolistas, o término da Segunda Guerra representou um recomeço de jornada. A

maior expressão do período foi a revista Joaquim, surgida em 1946 e encerrada em

1948, com 21 números no total.” (FERNANDES, 2000, p.6) A revista, criada por 

Dalton Trevisan e com Poty Lazarotto, Guido Viario, José Paulo Paes e Wilson

Martins na equipe, seguiu uma linha iconoclasta, atacando desde Alfredo Andersen

e Emiliano Perneta a Otto Maria Carpeaux e Monteiro Lobato. Em 1987 foi lançada

outra publicação importante no estado, Nicolau , patrocinada pelo Governo do Estado

do Paraná e sob a coordenação de Wilson Bueno. No artigo O Primeiro Ano de

Nicolau: "Nós do Paraná" , Eduard Marquardt fala das características principais de

Nicolau :

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“Com uma tiragem bastante elevada, que ultrapassa os 150 mil exemplares, Nicolau passa a

circular mensal e gratuitamente, quer seja como anexo aos jornais paranaenses, quer seja viacorreio para as outras localidades. Com invariáveis 28 páginas, a distribuição de espaços éfixa, correspondendo mais ou menos aos seguintes percentuais: 16% para a reportagem,

14% para a ficção (contos e crônicas), 13% para a produção poética, 13% para depoimentos,13% para resenhas, ficando os 31% restantes para entrevistas, HQs, ensaios fotográficos,cartas do leitor e informes locais. Assim sendo, o leitor do jornal estaria em contato, em doseshomeopáticas, com toda a cultura produzida no Estado.” (2005)

Enquanto fervilhavam revistas culturais ligadas à literatura, o jornalismo

diário paranaense publicava notícias de cultura espalhadas entre as outras do jornal,

sem espaço delimitado. No Diário do Paraná (periódico integrante dos Diários

Associados), Reinaldo Jardim cria na década de 1970 a página  Anexo, que saía aos

domingos, provavelmente o primeiro suplemento sobre cultura em um jornal

paranaense. No final da década, surge no  Anexo o encarte Raposa, que, na década

de 1980, torna-se um caderno e passa a ser editado pela Fundação Cultural de

Curitiba.

Nos anos 1980, Rosirene Gmael editava no jornal Correio de Notícias os

cadernos Programe-se (diário, com oito páginas), e Bom Domingo (entre oito edezesseis páginas que só circulavam nos finais de semana). De acordo com GMAEL

(2005), o primeiro publicava releases com a agenda da cidade e uma ou duas

matérias elaboradas:

“Entrevistas longas, onde era possível abordar um tema com profundidade ou matérias depágina, com análise e opinião. Além disso, e isso era um verdadeiro luxo, o caderno

alternava textos – ora críticos ora literários - de Paulo Leminski e Wilson Bueno. Havia

liberdade tanto para criar polêmica, quanto para abusar do humor e liberdade de texto e dediagramação. Uma página podia ter uma foto enorme e apenas uma frase... no dia em queo Leminski morreu a página do caderno saiu em branco”.

Nos finais de semana, o caderno era ocupado por artigos de opinião. Celina

Alvetti escrevia sobre teatro; Lélio Sotto Maior, sobre cinema; Francisco Alves dos

Santos, sobre cinema nacional; Carlos Gaertner sobre música, Cláudio Setto sobre

artes plásticas, Cecília Zokner, sobre literatura latino-americana. Outro tema

freqüente era a ausência de políticas culturais. “O Programe-se discutia muito a

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cultura e cada área especificamente, incluindo desde a literatura infantil até as artes

gráficas e a cultura popular” (GMAEL, 2005).

No Bom Domingo, cada edição concentrava-se em torno de um tema que

mobilizasse as pessoas – como o beijo ou a “língua do P”. As edições criticavam

desde os critérios de seleção de artistas para o Salão Paranaense à linguagem da

televisão. “Como tínhamos espaço e podíamos ir a fundo – e contávamos com

colaboradores qualificados – sempre tínhamos assuntos polêmicos que “mexiam”

com os vários setores da cidade” (GMAEL, 2005). Helena Kolody, Alice Ruiz,

Domingos Pellegrini, Paulo Leminski, Valêncio Xavier, Solda, Ernani Buchman e KeyMaguire eram alguns dos colaboradores.

Tanto no Correio de Notícias quanto no Almanaque do O Estado do Paraná,

o jornalismo cultural era feito de modo diletante, por vezes fora do expediente, pelo

esforço do editor e colaboradores em trabalhar com a cultura. O  Almanaque

começou com uma coluna de roteiro às sextas-feiras, virou página diária e depois

tornou-se um caderno em formato tablóide aos domingos. Adélia LOPES, então

editora, conta sobre a influência do caderno na cidade:

“Percebi que os artistas do Paraná e entidades como o Instituto Goethe entenderam queestava começando a existir um espaço para divulgar o trabalho deles e aquilo cresceu comouma bola de neve. (...) Nos anos 80 e 90, Curitiba deu saltos culturais. Novos espaços

foram revitalizados e transformados em pontos de cultura. Tudo começou nos anos 70 como fechamento da Rua das Flores e a transformação do paiol de pólvora em teatro; criaçãode parques; festivais; a feirinha de artesanato que virou ponto de encontro. Surgiramassociações privadas, como a Associação Cultural A.Vieira, que criou um teatro no Palácio

Avenida, as escolas de idioma, principalmente o Instituto Goethe, patrocinavam a cultura esurgiram as leis de incentivos culturais. E a imprensa teve que acompanhar isso” (2005).

A profissionalização começa a aparecer com a publicação no caderno

 Almanaque sob edição de Aramis Millarch. Millarch era empregado da casa, tinha

horário e estrutura para trabalhar. O caderno trazia resenhas, entrevistas e notícias,

com ênfase em cinema de arte e música popular brasileira – preferências do editor.

O  Almanaque foi publicado por duas décadas, período em que alternou momentos

de maior e menor importância e influência local. Nos anos 1990 o Correio de

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Notícias entra em crise e é fechado, já há algum tempo com um caderno de cultura

sem expressividade.

Até esse momento, o jornal Gazeta do Povo, criado em 1919, não possuía

um caderno de cultura. As notícias sobre o tema eram publicadas sem editoria

específica e havia uma página chamada  A Gazeta nas Artes, escrita por Adalice

Araújo. Nos primeiros anos da década de 1990, Ana Amélia Filizola (filha de

Francisco Cunha Pereira, o proprietário do jornal), percebendo a lacuna existente

determinou-se a criar um caderno de cultura na Gazeta. FERNANDES conta que

Ana Amélia enfrentou resistência por parte da chefia do jornal para concretizar seuprojeto. O argumento era de que não havia, na cidade, notícias suficientes sobre

cultura para encher um caderno. A Gazeta do Povo apresentava-se como um jornal

conservador, comportado, enquanto a cultura mantinha uma aura “marginal”. Além

disso, a divisão em cadernos ainda não fora adotada pelo jornal – se não havia um

caderno de economia ou de política, por que ter um de cultura?

Ana Amélia FILIZOLA (2005) contradiz a informação: “Não houve problema.

Apresentei a idéia e a direção aceitou prontamente. Sabíamos, através de pesquisa

e até mesmo pelo retorno dos leitores e amigos, que havia necessidade que um

 jornal do porte da Gazeta do Povo tivesse o seu caderno de cultura”.

Marian GUIMARÃES relembra o método usado para convencer a diretoria

do jornal:

“Durante um mês (ou mais), diariamente nós duas recortávamos tudo que saía sobre culturanas várias páginas do jornal e íamos montando. Um dia, pegamos todas aquelas páginas(colávamos os recortes em páginas para ver quantas davam) e fomos falar com o Dr.Francisco, sobre a possibilidade de ter quatro páginas de cultura, no corpo do jornal.Mostramos aquele monte de jornais para ele, para provar que havia possibilidade. Ele olhoucom atenção e mandou que falássemos com o Dr. D'Aquino, que era o diretor de redação,porque era ele quem mandava. Fomos falar com o Dr. D'Aquino e ele disse que não poderia

resolver sem falar com o Sr. Rogério Florenzano, que era diretor comercial. Depois dissotudo, nos deram o pode (2005).

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Em 29 de março de 1992, Ana Amélia criou o Cultura G, com duas páginas

durante a semana e quatro aos domingos. A inauguração coincidiu com o primeiro

Festival de Teatro de Curitiba. “Ela marotamente aproveitou a circunstância”,

comenta FERNANDES (2005). Uma cidade que recebia montagens de Gerald

Thomas, Gabriel Villela, Antônio Nóbrega e Cacá Rosset teria material suficiente

para um caderno cultural diário. Além de Ana Amélia, Glenda Mezarobba e Marian

Guimarães formavam a equipe.

O Caderno G surgiu em 17 de junho de 1994, como um caderno de fim-de-

semana. A princípio, saía às sextas-feiras, com roteiro cultural e dividido emsessões. Ana Amélia era a editora, Marian Guimarães escrevia sobre gastronomia;

Abonico Smith cobria música e quadrinhos; José Carlos Fernandes escrevia sobre

televisão; Márcia Freitas era crítica de teatro; e Mariângela Guimarães cobria artes

plásticas e dança. Era um caderno mais profissionalizado do que fora o  Almanaque,

com uma equipe e uma sala. De acordo com FREITAS (2005):

“A intenção do Caderno G era ter uma parte de serviço – roteiros de cinema, exposições,teatro, televisão, uma parte de notas (de leitura rápida) – e que as pautas fossem o maisamplas possível. Falávamos de quadrinhos, de cinema, teatro, dança, literatura, tínhamos

colunistas regionais e nacionais (como Miguel Sanches, Nélida Piñon, Wilson Martins, etc).Embora nossos leitores sejam das classes A e B, o objetivo do caderno nunca foi ser elitista, mas sim um ‘apresentador’ de opiniões e assuntos diversos ligados à cultura”.

Nos outros dias da semana, o Cultura G ainda era publicado. Aos poucos,

ocorreu a transição para caderno, o que se completou em fevereiro de 1995, com as

edições de sábado. O Caderno G dava destaque à literatura às segundas-feiras,

artes plásticas às terças, música às quartas, cinema e vídeo às quintas,

programação do fim-de-semana às sextas, notícias sobre a cidade (como feiras e

bazares) aos sábados e, aos domingos, matérias especiais e notícias que

adiantavam os acontecimentos da semana. As escolhas temáticas eram ditadas pela

agenda da cultura local. “Essa política foi mudando depois porque a gente notava

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que, como dava o forte da semana no domingo, as pessoas não tinham motivo para

comprar o caderno durante a semana”, conta FERNANDES (2005).

O Caderno G tratava a cultura de forma noticiosa, diferente das revistas dos

grupos ligados à literatura. Trazia serviços, notícias e críticas.

“A cultura tratada como notícia é uma coisa muito tensa, porque ela fere a natureza do jornalismo cultural. O barato do jornalismo cultural é não ser notícia, mas para se afirmar nomeio teve que dar um tratamento noticioso. Mostrar que a cultura estava tão na ordem dodia quanto a educação e a política. Além das críticas, trabalhar com porcentagens, com

tendências, entender o que estava acontecendo, pensar em público. A linha editorial ia por aí.” (FERNANDES, 2005)

FERNANDES comenta a nova fase do jornalismo cultural que ali se iniciava:

“Quando começa, tem um efeito na cidade que ninguém esperava. A própria classeartística ficou muito surpresa com o efeito e começou a se aproximar de um jornal que elarejeitava antes. Curitiba sempre teve um movimento cultural, mas o Caderno G ajudou ainventar um pouco isso, ele revelou para a cidade pessoas e grupos que estavam muito noseu circuito fechado. O Estado do Paraná e a outras iniciativas faziam isso, mas de repentevocê tinha um jornal com uma tiragem muito grande para os padrões da época” (2005).

Ana Amélia saiu do Caderno G em 1997 e Mariângela Guimarães tornou-se

editora, cargo que ocupou até julho de 1999. Paulo Camargo assumiu e editou o

caderno até julho de 2000, quando foi fazer especialização em Cinema nos Estados

Unidos. José Carlos Fernandes assumiu a edição até junho de 2002 e, em julho,

Paulo Camargo voltou a editar o Caderno G. “Cada editor vai imprimir seu estilo no

caderno, é fatal, tanto seu olhar quanto seu estilo. A equipe conta muito, vai puxar 

de alguma maneira, mas existe uma afinação que é dada pelo editor”, afirma

FERNANDES (2005). Ele comenta o perfil editorial do caderno no período em que

foi editor:

“[Pensava] em que sentido a tentativa de se afirmar no jornalismo diário não estava tirando oque era mais legal da cultura, de ser gratuita, de um dia você querer fazer uma matéria sobreo Meu Pé de Laranja Lima, independente se o livro está sendo relançado. Nos dois anos que

eu fiquei na edição a idéia era trabalhar o noticioso, mas sempre tentar extrapolar, criar umavariação para o tema. Aumentou a quantidade de opinião, matérias especiais e interação.

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Criamos fóruns, a participação da classe artística dentro da discussão das pautas (fazíamos

encontros aqui, que eram ocasionais). [A idéia era] Fugir do artista falando do disco, do pintor falando da exposição, era criar uma pauta em cima do assunto. Criamos a sessão Trabalho

em Progresso. Ela pegava os artistas no período em que eles estavam produzindo, que eles

estavam pensando, não estavam fazendo nada. Eu tive uma certa vantagem porque nos doisanos em que eu fiquei [como editor] o caderno G teve 50 páginas por semana, uma equipelegal em número de pessoas, um correspondente nos Estados Unidos, um correspondenteem São Paulo, e todos os serviços de agência estavam funcionando.” (FERNANDES, 2005)

A “vantagem” acabou em setembro de 2002, quando o jornal entrou em uma

forte crise financeira e as páginas do Caderno G foram reduzidas pela metade. A

equipe, os colaboradores e as agências de notícias também diminuíram.

Atualmente, o caderno é editado por Paulo Camargo e conta com mais sete

  jornalistas: Rudney Flores, Juliana Girardi, Nikola Matevski, Irineo Netto, Omar 

Godoy, Rogério Galindo e Jennifer Koppe – contratada para substituir Adriane Perin.

A transcrição de um trecho da entrevista com FERNANDES esclarece as

dificuldades por ele percebidas ao longo da carreira como jornalista e editor de

cultura:

“Existe uma incompreensão dentro do próprio jornalismo do que é um caderno de cultura,isso é histórico. São pessoas muito ligadas à idéia de cultura como um violino em umrestaurante. É a idéia comum de que cultura é boa intenção, então há uma dificuldade delidar com a crítica. (...) A cultura não acontece em função de lançamento só. Também. Masa agenda vai engolindo, vai empobrecendo o jornalismo cultural. (...) A tendência, às vezes,é o grau de reflexão ficar um pouco abaixo, se [o jornal] acha que agradando vai atrair [oleitor]. A relação de amor e ódio é muito mais longeva no jornalismo do que a relação de

assédio. (...) Como eu vou responder ao público leitor novo? Os cadernos de cultura, aospouquinhos, parecem que estão envelhecendo. Em última análise você já não está maisconseguindo conversar com o seu público, então alguma coisa está errada. Mas esse é um

problema do jornalismo em geral, ele começa a escrever para si mesmo. Ele satisfazexpectativas internas. Esse distanciamento do leitor comum é um fenômeno geral. Comoser popular sem ser clichê, sem ser barato? Vai oscilar entre ser produto e ser idéia, entreser produto e ser reflexão.” (FERNANDES, 2005)

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5.4 PANORAMA DO JORNALISMO CULTURAL CONTEMPORÂNEO

A busca pela “objetividade”, o interesse crescente pelo factual, cortes de

orçamento, a preocupação com as vendas e outros fatores tornaram o jornalismo em

si, e a editoria de cultura particularmente, cada vez mais contido e superficial. José

Geraldo COUTO (1995), colunista de cultura da Folha de São Paulo, faz coro com

outros profissionais da área ao afirmar que o jornalismo cultural “passa hoje por uma

profunda crise”. E explica. “Ela está ligada, essencialmente, a dois fatores: a

acelerada transformação do mercado de produtos culturais e a não menos rápidamodernização dos grandes jornais brasileiros. No novo contexto criado a partir 

desse conjunto de mudanças, o jornalismo cultural ainda não encontrou o seu

espaço e a sua voz.” (COUTO, 1995)

Segundo SCHMITZ (2001), “há uma quase unanimidade em afirmar que a

cobertura está pasteurizada, as matérias são cada vez mais curtas e a crítica sumiu

das páginas...”. Em vez da análise, “predomina a divulgação do fato, sem uma

repercussão sobre seus efeitos. Ou, quando isso ocorre, sobressaem os gostos

pessoais dos jornalistas, que foram preparados desde a faculdade para serem

especialistas em generalidades.” Para completar o quadro de falhas cometidas nas

editorias de cultura atualmente, o autor afirma que a produção cultural regional é

“relegada à condição de manifestação folclórica pela padronização de gostos e

comportamentos ditados pelas grandes redes de televisão.”

O jornalismo cultural já não apresenta grandes nomes da crítica ou da

reportagem e não influencia o desempenho de uma obra como antes, quando

críticos podiam definir seu sucesso ou fracasso. Adriano Schwartz, também

 jornalista da Folha de São Paulo, exemplifica a perda de influência: 

“Quando saiu o último livro do Sidney Sheldon ( Quem Tem Medo do Escuro? , 2004) eu fizquestão de ler e fazer uma crítica para a Folha. Achei o livro horrível e fiz uma resenhabastante crítica. Ela foi publicada no dia do lançamento do livro e ainda ficou uns 3 dias na

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página principal da UOL [site] e mesmo assim o livro foi logo para os mais vendidos. Ou

seja, nada que se faça vai mudar a vendagem” (SCHWARTZ4, citado por HERRERO, 2005).

A concorrência massiva de outros meios de informação – rádio, cinema,televisão e, mais recentemente, a Internet – também tem influenciado o conteúdo

 jornalístico e a sua forma de apresentação nos veículos impressos. Para tentar 

alcançar a concorrência, que leva vantagens na disseminação das mensagens e na

atração do público, jornais adotam características das novas mídias, como a

agilidade – textos mais curtos e rasos – e o apelo visual – maior espaço para

fotografias, cores e itens de destaque do texto: olhos, gravatas, etc.

A idéia de que os jornais são empresas e devem ser geridos como tais (a

receita superior às despesas, acima de tudo) e de que os leitores em geral estão

satisfeitos com as informações ligeiras e as notícias sobre programação e

lançamentos de produtos culturais legitimam o jornalismo cultural produzido em

muitos veículos atualmente. No entanto, os jornais vêm perdendo leitores em todo o

mundo, tanto entre jovens (muitos, avessos à leitura), quanto entre o público das

classes A e B – a “elite cultural” do país. O primeiro fator geralmente apontado para

a diminuição do público leitor é a concorrência com a televisão e a Internet, e as

tentativas de dar ao jornal características semelhantes a esses meios não parecem

suficientes.

O problema, segundo Di Franco, está em enxergar o jornal como um meio

de comunicação de massa.

“Esqueceram que os diários de sucesso são aqueles que sabem que o seu público,independente da faixa etária, é constituído por uma elite numerosa, mas cada vez mais órfãde produtos de qualidade. (...) O leitor que precisamos conquistar não quer o que pode

conseguir na tevê ou na Internet. Ele quer qualidade informativa: o texto elegante, a matériaaprofundada, a análise que o ajude, efetivamente, a tomar decisões.” (DI FRANCO, 2005)

De acordo com essa posição, não é raro ouvir de profissionais e professores

que a tendência, após o crescimento do jornalismo on-line, é que veículos impressos

4 SCHWARTZ, Adriano. Seminário sobre Jornalismo Cultural. 01 dez 2004.

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tornem-se mais interpretativos e aprofundados, para conquistar o público

interessado em informações além das disponibilizadas quase imediatamente depois

da ocorrência de um fato – rapidez que um jornal impresso, por restrições técnicas,

não poderia ter. Uma possibilidade ainda longe de ser realizada.

Segundo SCHMITZ: “O jornalismo cultural vive hoje o paradoxo de

submeter-se sem pejo aos ditames do mercado e, ao mesmo tempo, prescindir dos

leitores mais exigentes, que formam opinião, têm bom poder aquisitivo e seriam

capazes, se lhes dessem chances, de ajudar a estabilizar as combalidas finanças

dos jornais brasileiros.“ (2001) Apesar das modificações sofridas, os cadernos decultura ainda são o espaço para experimentações gráficas e de linguagem no

  jornalismo brasileiro. É um oásis jornalístico, onde a objetividade deixa de ser a

norma número um. “... Está-se a lidar com arte e cultura, coisas que, por definição,

não se esgotam em informações objetivas – mas se desdobram em aproximações

subjetivas.” (DAPIEVE, 2003, p. 104)

Além de criatividade e da preocupação com a qualidade do texto, a editoria

de cultura exige cuidados com a apresentação gráfica. “Não pode um caderno falar 

de artes e cultura sem apresentar-se ao público com um formato interessante e um

desenho instigante. A ilustração, a fotografia, as soluções gráficas são fundamentais

para que se estabeleça com o leitor uma cumplicidade estética.” (Willer, 2000).

A subjetividade, no entanto, por vezes leva o jornalista a um vício de

linguagem indesejável: o abuso da adjetivação. O adjetivo é uma palavra carregada

de juízo de valor, puramente opinativa, que não permite ao leitor ter a noção do

campo referencial do repórter ou crítico, de que ponto de vista foi analisada a obra.

À adjetivação é preferível o uso do substantivo, “capaz de informar ao mesmo tempo

que, pela exemplificação, qualifica (...) com mais conhecimento de causa do que um

simples elogio ou reparo.” (DAPIEVE, 2003, p. 104) Outro elemento indesejável no

texto jornalístico de cultura é o “nariz de cera”, ou seja, a abertura de texto

dispensável, que ao invés de informativa traz uma longa e rebuscada introdução

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antes de entrar no tema. A abertura de uma matéria de cultura não deve abolir o

lide; o que pode acontecer é o adiamento, para dar lugar a um início mais atrativo –

uma narração ou citação, por exemplo – desde que acrescente informações úteis ao

leitor.

Mais que a linguagem e a elaboração do texto, o conteúdo é a maior 

deficiência do jornalismo cultural hoje. O problema começa pela seleção do que a

editoria de cultura irá cobrir. Dapieve coloca a questão da elaboração das pautas

como fator determinante do produto final (a reportagem). “O melhor caderno tende a

ser aquele que busca assuntos e tratamentos diferenciados, isso é um consensoentre os profissionais do ramo. Entretanto, cada vez mais o leitor tem a percepção

de que os diferentes jornais estão parecidos demais, repetitivos, acomodados.”

(DAPIEVE, 2003, p. 100) Há, segundo o autor, duas causas principais: a pressão

exercida pelas assessorias de imprensa, que enviam como sugestões de pauta

textos pré-prontos, já redigidos conforme a linha editorial do veículo, e a pressão da

concorrência, o medo do furo, que iguala os assuntos a serem abordados.

“No antigo jornalismo cultural, não havia pauta, exceto para uma ou duas matérias: para oresto, formava-se um grande corpo de colaboradores especializados, cada qual capaz deacompanhar as novidades no seu próprio setor, e respeitava-se o material queenviassem. No estilo atual, os editores de suplementos (em geral eles próprios gente de

formação apenas jornalística e sem nenhum mérito especial em literatura ou ciências, por exemplo) se tornaram tiranetes e a pauta se tornou uma régua destinada a tudo nivelar pelaaltura da cabeça deles. Para piorar, adotou-se nas páginas culturais a medida padrão dasmatérias do noticiário geral, sempre curtinhas porque se destinam a um público que

supostamente odeia ler. (CARVALHO, 2005)

A combinação entre o domínio da indústria cultural e a elaboração das

pautas por editores, representantes do jornal preocupados em manter o sustento

econômico, resulta em uma infinidade de matérias sobre os produtos culturais de

massa. Os cadernos de cultura, assim, seguem a agenda da indústria cultural, os

“lançamentos e eventos promovidos pelos conglomerados multinacionais de

comunicação, tais como estréias mundiais de filmes, premiações de Oscar,

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Grammy, temporadas de shows e demais promoções planetárias.” (BUITONI, 200,

p. 64) Pautado pelo show business, o jornalista muitas vezes limita-se a cumprir a

linha de montagem da indústria cultural, chamando a atenção do público para os

produtos e legitimando-os.

“... a imprensa deste setor trabalha envolvida no processo da indústria cultural, pois amaioria dos veículos de comunicação trata o jornalismo cultural baseado em serviços, naagenda de eventos, elaborando menu de programação artística voltado para o que éproduzido em tal indústria. Essa tendência tem enfatizado o aparecimento de críticos que

apenas sugestionam o consumo de uma ou outra atração e, também, de textos muitoparecidos que mostram os eventos e lançamentos da semana baseados no critério do que

vende mais.” (ROSA, 2005)

Sérgio Augusto, articulista da Bravo! , em artigo para a revista, recorda um

dia em que o início dos ensaios do musical Cambaio, com Chico Buarque e Edu

Lobo, foi a matéria de primeira página nos principais cadernos de cultura.

“E pensei comigo: puxa, o  jornalismo de agenda está se aperfeiçoando; já nem espera maispelo produto acabado. (...) O que me incomodou não foi o assunto em si, mas, como de

hábito, sua evidente manipulação por gente estranha ao ofício. Uma coisa é um repórter tomar conhecimento de que Chico e Edu começarão a gravar um disco no dia seguinte earticular uma cobertura daquele encontro musical; outra é essa pauta chegar empacotadaàs redações por agentes e promoters. A diferença entre as duas é a mesma que existeentre jornalismo e marketing, canais há muito indistintos nestas paragens.” (AUGUSTO,2002)

Augusto comenta que no começo da década de 1960 os jornais não eram

“fac-símile” um do outro e que estréias, por si só, não serviam de motivação para a

cobertura jornalística – era necessário interesse pela obra, ou seja, que tivesse

qualidade. “Conferir à cultura o mesmo status jornalístico da política e da economia

foi, sem dúvida, um avanço, mas algumas deformações ocorreram, ao longo do

processo, nenhuma tão lamentável quanto o desatinado culto ao furo, à primeira

mão, à exclusividade, que na maioria dos segundos cadernos vicejou.” (AUGUSTO,

2002) Tal necessidade de publicar o mais rápido possível uma notícia ou crítica

transforma-se em queda do padrão de qualidade, menos tempo para

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aprofundamento e cuidado na elaboração da matéria. Para não privilegiar uma

publicação, o que poderia causar a retaliação do produto pelas concorrentes, as

assessorias de imprensa dos produtos culturais determinam (com o dia do

lançamento, o evento de abertura ou uma entrevista coletiva) quando seu produto

estará nas páginas do jornal. O resultado é a previsibilidade das pautas e a

sensação de “matéria comprada”.

“A verdade é que a corrupção ocorre de modo muito mais sutil, às vezes quaseimperceptível. Gravadoras de discos ou empresas promotoras de eventos compram de fatoespaço na mídia quando oferecem, por exemplo, passagem para um jornalista ir a NovaIorque entrevistar determinado popstar. O jornal, que nunca desembolsaria um tostão paraconseguir tal entrevista, sente-se na obrigação de abrir-lhe um espaço de destaque em suaspáginas.” (COUTO, 1995)

Outra ferramenta das assessorias de imprensa para barganhar seu espaço

nos jornais é o release, a princípio, um material de apoio disponível para o jornalista

como sugestão de pauta e ponto de partida para informar-se sobre um assunto.

Entretanto, na correria do fechamento diário, com o enxugamento do número de

repórteres por editoria e dead-lines cada vez mais curtos, dissemina-se a “prática

(...) de tornar o release não o subsídio mas o substituto da matéria” (BAHIANA,

2004)

O jornalismo cultural não é (ou poderia não ser) apenas agenda dos

acontecimentos da indústria cultural. Segundo ROSA, “é importante encontrar 

saídas e tentar fazer o que o jornalismo sempre se propôs que é recortar a realidade

e refletir mais sobre a cultura brasileira...” (2005). TEIXEIRA chama a atenção para o

fato de a cobertura nas editorias de cultura fixar-se no produto final, sem buscar os

processos implicados na produção. “Percebe-se uma ausência de pautas sobre a

economia e a política da cultura, que poderiam minimizar o quadro.” (2005)

“O jornalismo cultural anda se sentindo pequeno demais diante do

gigantismo dos empreendimentos e dos ‘fenômenos’ de audiência”, diagnostica

PIZA. “ As publicações se concentram mais e mais em repercutir o provável sucesso

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de massa de um lançamento e deixaram para o canto as tentativas de resistência –

ou então as converteram em ‘atrações’ com ibope menor mas seguro.” (2003, p. 31)

As características próprias da cultura que deveriam pautar o jornalismo da área,

como a qualidade criativa, o aprofundamento reflexivo ou a inovação formal,

perderam para os critérios do jornalismo geral o poder de definir a cobertura de uma

obra.

“Assim, por exemplo, entre um livro excelente sobre assunto alheio ao noticiário geral e umlivro ruim sobre assunto de interesse jornalístico, este último é que é valorizado. Com isto,o jornalismo cultural torna-se apenas ‘jornalismo geral de assunto cultural’, [sem grifono original] perdendo o que é específico do jornalismo cultural. (...) Uma página de turfe, por exemplo, não privilegiará um jóquei por ser um tipo bonitão (...), mas por ter sedesempenhado bem segundo critérios estritamente turfísticos. Isto é tão óbvio que nem

deveria precisar ser explicado, mas o nosso jornalismo está tão doente que tem dificuldadeem entender essas coisas.” (CARVALHO, 2005)

A opinião já foi a parte mais valorizada das editorias de cultura, espaço para

análises e argumentações sobre as obras. “Todo grande momento cultural moderno

foi também um momento de proliferação de ensaios e resenhas”, afirma PIZA(2003). No jornalismo atual, entretanto, a crítica perdeu relevância e profundidade,

“se reduziu a um comentário binário, do eu gosto/eu não gosto, impressionista demais, ouentão uma voz tribal, de gueto, como se vê tanto na música pop - mas se vê também naresenha de livro nos suplementos de fim de semana, em que o objeto é resumido e depoisrecebe nota qualificadora, sem passagem pela fundamentação, pelo convencimento, pelaperspectiva. O jornalismo cultural virou uma espécie de júri de escola de samba.” (TORRES,2005)

E a opinião, como o restante do conteúdo da editoria de cultura, submeteu-

se à lógica da indústria cultural:

“Todos os filmes que entram em cartaz e virtualmente todos os discos e livros consideradosimportantes são objeto de comentário crítico nos jornais. O resultado mais imediato dessaopção pela extensão, em detrimento da profundidade, é a substituição da críticapropriamente dita pela resenha. Com poucas linhas à disposição para abordar uma

determinada obra – seja filme, disco, livro ou peça de teatro –, o resenhista limita-se, nomais das vezes, a uma sinopse, seguida da emissão de uma opinião. Sacrifica-se, desse

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modo, a análise abalizada da obra, de como ela utiliza a linguagem que lhe é própria para

atingir determinados fins estéticos, éticos ou sociais.” (COUTO, 1995)

O jornalismo é um meio de disseminação do acesso aos bens culturais, por isso deveria tratar o mercado sem preconceitos ou parcialidades ideológicas. Ao

mesmo tempo, por influir sobre as opiniões do leitor, o jornalismo cultural tem “o

dever do senso crítico, da avaliação de cada obra cultural e das tendências que o

mercado valoriza por seus interesses, e o dever de olhar para as induções

simbólicas e morais que o cidadão recebe.” (PIZA, pág. 45)

Dapieve vê na crítica um gênero fundamental do jornalismo de cultura e

destaca o desprezo relegado à crítica de televisão no país. “’Crítica’ traz embutida

uma idéia de peso e de aprofundamento que cada vez mais raramente jornais e

revistas conseguem materializar, por propósitos editoriais e por falta de espaço físico

mesmo.“ (DAPIEVE, 2003, p. 107) Para o autor, o foco das publicações mudou:

passou do criador da obra para a massa de consumidores dos produtos culturais

(incluídos os jornais). Com a função de orientar esses leitores, a crítica esvaziou-se

e adquiriu a forma de ‘resenha crítica’, mais apropriada à publicação nos jornais. Em

vista a “queixa comum de que ‘a crítica piorou’”, o autor indica um roteiro a ser 

seguido para que, mesmo em espaço reduzido, possa ser produzida uma resenha

crítica que vá além de “achismos” :

“1º. fornecer um mínimo de informação objetiva, que funcione como um serviço ao leitor,nomes, datas, títulos, circuito, editora, gravadora, etc.; 2º. contextualizar o presente trabalho

dentro do conjunto da obra do seu autor; 3º. contextualizar o autor dentro do cenárioartístico e histórico de onde ele surgiu, inserindo-o, por exemplo, numa escola ou estilo; 4º.avaliar forma e conteúdo, isto é, informar o enredo ou o conceito, e julgá-lo de acordo comseus meios expressivos; e 5º. opinar (sobre o trabalho em pauta) e refletir (a partir dele, por vezes em direção à própria vida e seus múltiplos sentidos)”. (DAPIEVE, 2003, p. 109)

Buitoni também aponta um caminho para a crítica cultural de qualidade:

“Conhecer os códigos e a história da arte ou do produto cultural a ser criticado, usar dametalinguagem própria daquele tema, inclusive explicando-a para o leitor, parece ser um

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rumo adequado para que a crítica jornalística traga informação e não seja apenas uma

paráfrase, recontando o filme ou a peça, ou descrevendo o quadro ou, então, impressãogostei ou não gostei.” ( 2000, p. 65)

Por sua vez, Piza defende o retorno do jornalismo cultural às origens

ensaísticas como forma de retomar a qualidade e a relevância da editoria.

“... há um afastamento amazônico em relação ao que o ensaio teve de mais transformador:o espírito que é ao mesmo tempo aberto e seletivo, com boa vontade e senso críticotrabalhando simultaneamente. O ensaio nasce precisamente do ceticismo, da dúvida diantedo que é apresentado como novo, justamente com a função de detectar aquela novidadeque tem poder de permanência, ao menos de pertinência geracional. Você lê hoje umaresenha dessas e não sabe se aquilo que está sendo elogiado tem o fôlego de uma semanaou um século.” (PIZA, 2002)

A recuperação dos ensaios não poderia, entretanto, manter o tom erudito

dos ensaístas de antigamente. Seria necessário encontrar uma linguagem atraente e

clara que permitisse a densidade do texto, a “capacidade de descrever conexões

mais sutis e irônicas entre as coisas, de perturbar o senso comum, de dizer muito

com pouco sem ser obscuro”. (PIZA, 2002) Piza cita Luis Fernando Veríssimo,

Arnaldo Jabor, Carlos Heitor Cony e Marcelo Coelho entre os escritores que

procuram dar tais características a seus escritos.

DAPIEVE levanta um questionamento pertinente: “...o que habilita alguém a

assinar reportagens e comentários sobre algo tão subjetivo quanto arte nas páginas

de um grande jornal ou de uma revista de circulação nacional?” (2003, p. 96) E

responde: “Essa pessoa haverá de ter, e não será a faculdade que vai dar em meros

três ou quatro anos, um enorme interesse e um conhecimento profundo sobre a

forma de arte da qual se propõe a escrever.”  (DAPIEVE, 2003, p. 96) A

especialização por assunto (literatura, teatro, cinema, etc.) é uma saída para a área,

 já que entender com profundidade de todos os assuntos que compõem o universo

da cultura é tarefa próxima do impossível.

Apesar do cenário apresentado, existem pontos de fuga para quem busca

qualidade no jornalismo cultural. Buitoni cita as revistas Bravo! , Cult e Palavra como

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espaços em que se encontra uma crítica de cultura mais elaborada. Para Piza, “o

Caderno 2 do Estado continua a ser o mais generoso em termos de páginas, e o

Mais!  da Folha é um suplemento que às vezes até exagera no intelectualismo."

(2003, p. 115)

‘Assim como os segundos cadernos sofrem o efeito da falta de publicações semanais sobreartes e espetáculos, os suplementos vêem-se obrigados a tentar suprir a escandalosaausência de uma revista literária no País. Os intelectuais, estudiosos, acadêmicos eescritores (...) escrevem sem nenhuma preocupação com a inteligibilidade de seu texto e

de suas idéias. (...) Em síntese, temos, de um lado, uma cobertura jornalística cotidiana areforçar de modo acrítico e redundante a produção da cultura de massa. De outro, uma

reflexão erudita acessível a poucos, normalmente já convencidos – ou convertidos.’(COUTO, 1995)

A dicotomia entre as publicações de cultura de massa (ou pop) e as de

cultura para a elite intelectual (eruditas) acontece, portanto, na diferenciação entre

os cadernos de cultura diários e os suplementos semanais, como a Ilustrada e o

Mais! , ambos da Folha de São Paulo. Os primeiros são acusados de superficialidade

e de submeter-se ao mercado; já os segundos, eruditos em demasia, por vezesacadêmicos, restringindo (e muito) o público leitor.

Piza redimensiona a problemática da queda de qualidade nas editorias de

cultura, expondo o contraste com a atenção que mereceriam das empresas

 jornalísticas:

“O triste é que esses segundo cadernos são mais importantes para os jornais e revistas do

que eles costumam imaginar. Não só as pesquisas de leitura em cada publicação apontam,na maioria das vezes, a seção como a primeira ou segunda mais lida depois da primeirapágina (ajudada, como se sabe, por coisas como quadrinhos, coluna social e horóscopo),mas também é dali que o leitor, muitas vezes, extrai suas referências afetivas, suas pontescativas com a publicação.” (PIZA, 2003, p. 63)

Para Fernando TORRES, “não é correto dizer que o jornalismo cultural hoje

é pior do que no passado - é diferente.” A diferença maior seria a de influência. A

visão do jornalista, ao contrário de muitos que examinam o jornalismo cultural do

ponto de vista do passado, está amarrada ao contexto atual. “As modificações da

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arte em si explicam, em parte, a nova representação do jornalismo cultural. Uma

cultura de massa merece uma análise de massa [sem grifo no original] -

conclusão óbvia.” (TORRES, 2005)

Entretanto, quando se considera a cultura além da massificada, há mais

distância entre o jornalismo cultural praticado e o desejável. “Ele é, ou deveria ser,

na sua essência, a tradução da sociedade que está refletida nas artes e na produção

cultural. (...) A informação cultural não deve se limitar à descrição do universo das

artes. É preciso promover o debate, refletir sobre as questões contemporâneas e

intervir na discussão.” (ZAPPA, 2005)COUTO (1995) propõe um caminho para o desenvolvimento do jornalismo

cultural: “Facilitar o complexo e complicar o fácil [sem grifo no original].” O

 jornalista explica: “... diante das expressões mais complexas do espírito humano (...)

cabe ao jornalismo cultural tentar torná-las mais acessíveis ao homem comum ou,

pelo menos ao indivíduo medianamente informado que lê jornal. E, diante das

expressões mais banais da cultura de massa, inseri-las criticamente no contexto

histórico-cultural que as fundamenta e que dá sentido.” (COUTO, 1995) Não é uma

proposta fácil de ser seguida, segundo o próprio autor, porém, mostra-se uma saída

pertinente e interessante, por combinar a densidade de conteúdo à democratização

do acesso a informações sobre cultura, sem preconceitos contra os produtos da

indústria cultural.

5.5 GÊNEROS DO JORNALISMO CULTURAL

A distinção básica de categorias jornalísticas é dual: jornalismo informativo x

  jornalismo opinativo. Ainda que nenhuma das formas exista “puramente”, a

separação é clara. Outras categorias de classificação já foram propostas, como o

 jornalismo interpretativo e o jornalismo de entretenimento ou diversional. As opiniões

de jornalistas e estudiosos sobre a validade da separação dessas categorias

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divergem. O jornalismo interpretativo seria aquele em que há um esforço em recriar 

as conexões e os contextos do fato, fazer comparações e análises para

compreender seus sentidos, sem a valoração do fato. Já o diversional trata de forma

romanceada fatos e personagens, como os depoimentos e as histórias de interesse

humano. É nessa categoria, também, que José Marques de MELLO inclui o New 

Journalism, que resgata a linguagem literária, implica envolvimento pessoal do

repórter com personagens e cenários, produzindo uma narrativa mais sensível aos

acontecimentos – Gay Talese, Tom Wolf e Truman Capote são os grandes

representantes do Novo Jornalismo norte-americano.O jornalismo pode ainda ser dividido em gêneros, definidos segundo

diferenças de estilo e uso da linguagem. A classificação dos gêneros jornalísticos

varia conforme o autor. Mello propõe uma adequada aos jornais brasileiros, partindo

das duas categorias básicas e subdividindo-a em gêneros. Assim, nota, notícia,

reportagem e entrevista compõem o jornalismo de informação; editorial, comentário,

artigo, resenha, coluna, crônica, caricatura e carta fazem parte do jornalismo de

opinião.

“A nota corresponde ao relato de acontecimentos que estão em processo de configuraçãoe por isso é mais freqüente no rádio e na televisão. A notícia é o relato integral de um fatoque já eclodiu no organismo cultural. A reportagem é o relato ampliado de umacontecimento que já repercutiu no organismo social e produziu alterações que são

percebidas pela instituição jornalística. Por sua vez, a entrevista é um relato que privilegiaum ou mais protagonistas do acontecer, possibilitando-lhes um contato direto com acoletividade.” (Mello, p. 67)

Pelas suas temáticas, outros gêneros jornalísticos, além da reportagem, são

necessários na editoria de cultura. Os gêneros opinativos complementam o trabalho

do jornalista cultural, permitindo novos enfoques, a elaboração de análises e uma

cobertura jornalística mais sensível e reflexiva – o que condiz com as características

intrínsecas das manifestações culturais.

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Entre os gêneros opinativos, o comentário analisa fatos importantes mas de

menor abrangência que o editorial (manifestação da opinião do jornal, veiculado em

espaço fixo do primeiro caderno), e é assinado, ou seja, manifesta a opinião do

autor, não necessariamente a linha editorial do jornal. O comentarista deve ser um

observador privilegiado dos fatos. Já o artigo é a argumentação de um autor,

 jornalista ou não, que explicita sua opinião. É mais curto que o ensaio e apresenta

pontos de vista mais transitórios, visto que os fatos ainda estão desenrolando-se. O

ensaio traz pontos de vista mais definitivos, embasados em fontes que confirmam a

opinião do autor. E as colunas são seções fixas, especializadas, com unidadescurtas de texto informativo e opinativo, em estilo mais livre e pessoal.

A crônica presente nos jornais brasileiros é um gênero próprio da imprensa

nacional. Uma composição leve, com linguagem trabalhada, estilo pessoal, humor 

ou ironia, relacionada a notícias e acontecimentos atuais. Trata de assuntos

cotidianos de interesse coletivo. É composta por jogos de palavras e conceitos,

associações e contraposições de idéias, em que o ficcional aparece para realçar o

real.

A resenha crítica, gênero característico da editoria de cultura, é

conseqüência de modificações sofridas pelo jornalismo que esvaziaram a crítica de

embasamento estético. Com a profissionalização e a popularização da imprensa, “os

grandes intelectuais não quiseram fazer concessões à simplificação e à

generalização pretendidos pela indústria cultural” (MELO, 1994, p.126) e os editores

viram a necessidade de tirar a crítica do âmbito exclusivamente intelectual para

apresentá-la às massas e torná-la mais utilitária. A apreciação dos produtos culturais

para orientação do público consumidor passou a ser feita, então, pela resenha.

“Desaparece (ou se torna residual) a crítica estética dedicada a apreender o sentido

profundo das obras-de-arte e situá-las no contexto histórico, surgindo, em seu lugar, aresenha, uma atividade mais simplificada, culturalmente despojada, adquirindo um nítidocontorno conjuntural (...) Trata-se de uma atividade eminentemente utilitária; havendo

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muitas opções no mercado cultural, o consumidor quer dispor de informações e juízos de

valor que o ajudem a tomar a decisão de compra.” (MELO, 1994, p. 127-128)

O crítico precisa argumentar em defesa de suas escolhas, ir além do simples“gostei” ou “não gostei” e fundamentar sua avaliação. Deve evitar o banal, o exagero

e o deslumbre, não confundir o autor com o narrador ou o ator com o personagem. A

boa crítica não admite ataques pessoais. Consiste no julgamento de valor de uma

obra (pessoal), com o qual o leitor poderá ou não concordar. O primeiro papel do

crítico é compreender a obra, para informar ao leitor qual será sua impressão geral

(seus temas e estilo) e o que ela pode oferecer-lhe de valioso. A análise deve levar 

em consideração as intenções do autor e o contexto no qual está inserido (histórico,

social e, principalmente, artístico).

A resenha é o resumo crítico de um produto cultural, mais rápida e menos

aprofundada que a crítica. Traz a apreciação da obra, com a finalidade de orientar 

apreciadores e consumidores. Deve trazer dados sobre a biografia e importância do

artista responsável pela obra, breve análise dos precedentes e contextos, resumo da

obra e comentário crítico em relação a ela, com linguagem acessível, sem ser banal.

Outro gênero encontrado nas editorias de cultura (não citado por MELO) é o

 perfil , reportagem interpretativa que busca retratar uma pessoa por meio de dados

biográficos e declarações de entrevistados (o próprio perfilado, familiares, colegas

de trabalho, amigos, desafetos). O perfil traz opiniões da pessoa em pauta sobre

assuntos importantes e o que os outros dizem dela, sua participação na sociedade

(cultural ou política), fatos relevantes de sua vida, carreira, cotidiano e comentários

sobre ela. Deve ser intimista sem ser evasivo e evitar glamurizar ou detratar a

personalidade.

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5.6   A PRÁTICA JORNALÍSTICA

A análise de um produto jornalístico não pode ser realizada sem pressupor-

se a natureza da atividade, algumas características que a definem e sua finalidade

social, que, em linhas gerais, é informar o cidadão e propiciar a formação de

opiniões sobre os assuntos discutidos na sociedade. O jornalismo há décadas

deixou de ser considerado o espelho direto da realidade, objetivo e imparcial. A

própria noção de realidade tem sido questionada, como algo que não existe em

estado bruto, único, pronto para ser relatado – mas constrói-se conforme a visão dequem a relata, o viés apresentado, a seleção dos fatos e fontes considerados

importantes. Hoje, entende-se que o jornalista faz a mediação entre a(s) realidade(s)

e o indivíduo – e ainda que busque ser um mediador objetivo e pluralista, o resultado

de seu trabalho não escapa por completo da subjetividade inerente a qualquer 

indivíduo. Jorge Cláudio RIBEIRO define os diferentes pontos que a mediação

 jornalística tenta aproximar:

“A ação mediadora do jornal situa-se entre vários pólos: de um lado, o mundo imediato doleitor e de outro uma realidade mais ampla (outros lugares e épocas); as vivênciasfragmentadas do indivíduo e o universo social; a relativa impotência do cidadão comum e adefesa do interesse público; um cotidiano desprovido de brilho e a proximidade de pessoasproeminentes e inacessíveis; o difícil acesso aos mecanismos ocultos que interferem navida de cada pessoa e seu desvendamento.” (RIBEIRO, 1994, p. 13)

O primeiro passo para a construção de uma notícia é a seleção de quais

acontecimentos devem estampar os jornais do dia seguinte. “Ao divulgar umanotícia, a imprensa seleciona uma ocorrência que afeta diretamente um grupo

restrito e a transforma num fato capaz de mobilizar e emocionar toda a sociedade,

canalizando suas energias para ações conjuntas.” (RIBEIRO, 1994, p. 11) A seleção

de quais aspectos da realidade são fatos jornalísticos não ocorre aleatoriamente.

“Os autores estabelecem certos critérios coincidentes como o de atualidade,

interesse por parte do público, veracidade e  facilidade de assimilação ou clareza

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(legibilidade para os norte-americanos). E os critérios vão assumindo um status de

verdades tácitas, sem aprofundamento crítico.” (MEDINA, 1988, p. 20)

É evidente a presença de juízo de valor em critérios como “interesse”. Como

definir o que é de interesse público, sem cair apenas nas regras da subjetividade?

Medina apresenta os critérios que o editor deve adotar: importância das pessoas

envolvidas no acontecimento, raridade, curiosidade, conflito, entretenimento e

utilidade prática. A subjetividade permanece dentro desses critérios – ela está

presente, sem alternativas, em todo trabalho de um jornal. Ainda assim, esses são

alguns dos principais padrões que o jornalismo costuma seguir – poderiam ser incluídos, entre eles, a atualidade, a proximidade e a abrangência. Medina apresenta

outras formas de classificação das notícias, tendo por critérios: a ocorrência

(previstas, imprevistas, mistas), a procedência (local, estadual, nacional,

internacional) e o tratamento (pesquisa, comparação, interpretação, seleção).

A editoria de cultura é composta por jornalistas que ocupam as seguintes

funções:

“... editor, subeditores, repórteres e críticos, embora boa parte das redações hoje seconstitua de repórteres-críticos... (...) O editor deve ser alguém que, sem abrir mão de suasconvicções pessoais, pois ‘editar’ tem a ver fundamentalmente com ‘escolher’, seja capazde olhar sem paixão para o material (inclusive humano) que tem à mão de modo a, levandoem conta os interesses do leitor, priorizar este ou aquele assunto. No entanto, também deveestar preocupado em surpreendê-lo, apresentando-o a manifestações artísticas que eleignorava de todo ou em parte.” (DAPIEVE, 2003, p. 97)

Há ainda os colaboradores externos, geralmente críticos de áreas de

conhecimento ainda mais específicas. A construção da mensagem jornalística é um

processo dividido em etapas, aos moldes da divisão industrial do trabalho. O

trabalho do jornalista começa com a elaboração da pauta, que define o assunto a

ser tratado e traz orientações sobre sua angulação. A angulação a ser dada à

matéria é percebida pelo repórter não apenas pela pauta, mas pelos valores e

comportamentos típicos da empresa para que o jornalista está trabalhando. A busca

por adequar-se ao “gosto médio” também se impõe no trabalho jornalístico diário nos

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veículos de massa. A elaboração e distribuição da pauta, hoje, é responsabilidade

do editor, profissional que:

“...está em perfeita sintonia com a angulação da empresa, com a angulação-massa – ouseja, age como elemento regulador da oferta e da demanda. (...) o editor define aformulação da mensagem. Seu lugar de valorização, a morfologia com a matéria aparece napágina, os títulos, a diagramação, o emprego da fotografia, tudo isso, a rigor, deverá estar intimamente ligado com a angulação inicial que gerou a matéria.” (MEDINA, 1988, p. 80)

Sempre sob o peso do ritmo industrial, há ainda a necessidade de respeitar 

o dead-line e atrair o consumidor.

A etapa seguinte da produção da reportagem é a coleta de dados. Hoje,grandes agências internacionais e nacionais disponibilizam, por contrato, seus

conteúdos noticiosos para os veículos impressos, que não raro compram a

reportagem e publicam-na sem alterações. Quando a coleta de dados é feita pelos

repórteres, o contato com a fonte pode ser pessoal, por telefone ou mesmo por e-

mail. Os dois últimos são formas mais ágeis, que se encaixam bem na rapidez

necessária à produção da informação diária, mas podem ocasionar a perda de

nuances e oportunidades que surgem na entrevista ao vivo. Ao repórter, cabe “a

observação do fato, a descrição minuciosa dos dados julgados essenciais, a busca

de informações complementares de todas as pessoas representativas de uma

vivência do acontecimento, a busca de opiniões especializadas de observadores

científicos da realidade.” (MEDINA, 1988, p. 86).

O horário de fechamento determina a distribuição do jornal, que, se chegar à

banca depois do concorrente, perde em vendas. A informatização das redações vem

para acelerar o fechamento da edição. “A direção dos jornais não aceita como

desculpa as condições de trabalho que ela mesma oferece aos jornalistas; é comum

estes interiorizarem a precariedade (cultural inclusive) do processo produtivo como

se fosse sua exclusiva responsabilidade.” (RIBEIRO, 1994, p. 122) Elas exigem com

rigor, ao mesmo tempo em que impõem condições de trabalho precárias. Para

manter a adesão do trabalhador intelectual, as empresas envolvem diretores e

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  jornalistas no “jogo do poder [que] procura articular tensões aparentemente

contraditórias: aliciamento e pressão; reforço positivo e reforço negativo.” (RIBEIRO,

1994, p. 149). Contratações, demissões, promoções, cortes nos textos, localização

nas matérias nas páginas, elogios e críticas são alguns dos mecanismos de

estimular e pressionar o jornalista.

O deadline deve ser cumprido, ainda que isso signifique falhas na

informação, como a supressão de resultados de partidas de futebol, ou o uso de

fórmulas e lugares-comuns que agilizam a produção textual (reflexões,

questionamentos e criatividade “atrasam” o cumprimento da tarefa). Antes tãovalorizados, o furo e a reportagem em profundidade desaparecem, pela falta de

investimento nas origens e correlações dos fatos – o que tomaria o tempo do

repórter e o dinheiro da empresa. Até a diversidade de fontes se restringe quando o

tempo é curto. Daí a tensão do editor, que responde pelo cumprimento do horário e

pela qualidade da edição – e repassa a tensão ao repórter, para que entregue o

texto sem atrasos. Mas chegar na banca a tempo não é o bastante, é preciso

conquistar e manter o interesse do leitor. “Apesar do esquema profissional de

distribuição, de promoção, marketing e vendas, os jornais sabem que precisam tocar 

a alma do leitor, atender a alguma necessidade importante, criar um elo duradouro.“

(RIBEIRO, 1994, p. 90)

A formulação da mensagem noticiosa, ou seja, a estruturação das

informações dentro da notícia, faz-se, freqüentemente, por meio de “fórmulas de

consumo fácil: a cronologia do acontecimento e sua reprodução é o caso mais típico,

o que se chama ‘ilusão cronológica’ ou tentativa de recomposição do real

referenciado.” (MEDINA, 1988, p. 102) Outras fórmulas são a “pirâmide invertida”,

em que as informações são dadas em ordem decrescente de importância; a

organização de informações em bloco, separados por intertítulos; e a apresentação

de personagens, que humaniza o relato.

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Quanto à linguagem jornalística, os manuais estabelecem o uso do

vocabulário simples e acessível – o mais comum em todas as produções da

indústria cultural (das letras de música aos anúncios publicitários e programas de

televisão), por possibilitar que a grande massa não-intelectualizada seja atingida.

Outra tendência da linguagem – e aqui o jornalismo cultural é uma das áreas mais

atingidas – é a “emotivação”, para criar o clima da matéria, que pode manifestar-se

como  “adjetivação” do texto. O recurso costuma invadir o jornalismo opinativo

quando a capacidade argumentativa diminui.

São dois os mercados para os quais as empresas jornalísticas estãovoltadas: o publicitário e o consumidor – este não é o individuo concreto, mas uma

estatística mercadológica. E, é o primeiro a principal fonte de renda dos veículos. A

partir do espelho da página, já com o desenho dos espaços vendidos para a

publicidade, o editor tem o restante para planejar a organização das matérias. Nessa

ordem, “é muito freqüente o editor precisar encurtar ou até suprimir notícias

importantes e que demandaram trabalho, porque o espaço que sobrou dos anúncios

para as notícias era pequeno.“ (RIBEIRO, 1994, p. 94)

No primeiro volume do livro Teoria do Jornalismo, Nelson Traquina trata de

teorias intimamente ligadas à prática da atividade jornalística, que serão úteis para a

segunda parte deste trabalho. Foram selecionadas as que se encaixam de forma

mais adequada aos temas e objetivos desta monografia. A primeira é a teoria da

ação pessoal ou do “gatekeeper” . A teoria do gatekeeper surgiu nos anos 1950, com

David White, e diz respeito às escolhas pelas quais o fluxo de informações deve

passar para a seleção do que é ou não notícia. Após estudo com jornalistas

americanos, White verificou que a seleção de notícias partia de um julgamento

arbitrário e subjetivo, e dependia das “experiências, atitudes e expectativas do

gatekeeper ” (TRAQUINA, 2004, p. 150), ou seja, era uma “ação pessoal”. Os

critérios mais citados pelos gatekeepers foram a “importância” e a freqüência do

fato. Essa teoria é restrita ao nível da avaliação individual do jornalista que, para

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outros teóricos do jornalismo, como Gieber, raramente pesam no processo de

seleção.

A teoria organizacional amplia a anterior, inserindo a atividade do jornalista

na organização em que trabalha. Para Warren Breed, a política editorial da

organização predomina sobre as crenças pessoais do profissional, por meio de sutis

recompensas e punições (como reprimendas e alterações no seu texto) que, ao

longo do tempo, ensinam ao jornalista as regras da empresa, ainda que nunca

sejam explicitadas. Tais regras presumidas não tolhem totalmente o trabalho do

  jornalista, que ainda encontra opções de seleção ao “decidir quem entrevistar equem ignorar, que perguntas fazer, que citações anotar e, ao escrever o artigo, que

itens realçar, quais enterrar e, de um modo geral, que tom dar aos vários elementos

possíveis da notícia.” (TRAQUINA, 2004, p. 156) Breed conclui que o jornalista

geralmente adequa-se à linha editorial da empresa, entre outros motivos, porque é

dela que recebe recompensas (principalmente em relação a sua carreira

profissional), não do leitor.

Outro ponto lembrado pela teoria organizacional é o papel da publicidade

nos jornais. O espaço comprado para anúncios determina o espaço que restará para

as notícias, afinal, é a publicidade que sustenta a empresa jornalística. O lucro

também pode interferir na cobertura jornalística de outra forma: a falta de recursos

para cobrir certos acontecimentos (como, no caso da editoria de cultura, festivais em

outras localidades ou que impliquem o pagamento de horas-extras), para a

contratação de mais profissionais ou para elaboração de reportagens mais

aprofundadas. O resultado pode ser a “homogeneização dos conteúdos mediáticos e

a limitação ao pluralismo de opiniões nos media.”  (TRAQUINA, 2004, p. 160).

Traquina enumera as variáveis que podem determinar o trabalho do jornalista na

empresa: a atuação do diretor, o tamanho da empresa – que influencia, por sua vez,

o grau de especialização dos profissionais, a comunicação interna, o grau de

autonomia dos jornalistas e a flexibilidade das estruturas de controle.

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A teoria interacionista considera o tempo um fator determinante da produção

  jornalística. O desafio cotidiano da profissão é entregar o produto final no prazo

estipulado, ou seja, até a hora do fechamento. Em um caderno diário (como o G da

Gazeta do Povo, que produz sete edições em cinco dias) o tempo disponível para

elaboração de cada reportagem não raro interfere no produto final. A teoria identifica

outros fatores que interferem na produção jornalística: a ordem no espaço – como os

  jornais não têm possibilidade de cobrir todo o espaço territorial, as notícias

“acontecem” onde há recursos para se noticiar os fatos, e formam-se “buracos” na

rede noticiosa, tanto geográficos quanto temáticos – e a ordem no tempo – os“buracos” podem ser ainda temporais, já que as empresas jornalísticas nem sempre

têm recursos para cobrir acontecimentos fora do expediente. Para aumentar a

eficácia do profissional e ordenar o tempo e o espaço, são instituídas rotinas a

serem seguidas pelos jornalistas, que podem criar a dependência de fontes

rotineiras e oficiais.

Além disso, a teoria interacionista “defende que os jornalistas não são

simples observadores passivos mas participantes ativos na construção da

realidade.” (TRAQUINA, 2004, p. 204) Essa margem de liberdade que torna o

  jornalista um participante ativo no processo de elaboração das notícias, a

interferência da empresa jornalística e a rotina em uma redação serão alguns dos

fatores considerados na análise da produção do caderno de cultura do jornal Gazeta

do Povo.

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6 O CADERNO G

Neste capítulo, o caderno será apresentado de forma descritiva, com a

distinção entre o material produzido pelos jornalistas da equipe e o elaborado por 

colaboradores. Este será caracterizado para complementar a apresentação do

 jornal, enquanto a caracterização e análise daquele, por ser o objetivo central do

trabalho, ocupa a segunda parte deste capítulo – sob o ponto de vista dos

produtores – e ítens posteriores. As diferentes visões dos produtores (aqui

entendidos como os repórteres e o editor do caderno) foram captadas a partir deentrevistas5. O confronto de idéias se justifica por propiciar o entendimento das

propostas dos produtores e a aproximação da realidade da rotina de trabalho6.

Segundo o editor Paulo CAMARGO (2005), “o jornalismo cultural é muito o reflexo

das cabeças das pessoas que o fazem, não ser assim seria contraditório”.

O perfil do Caderno G é mais amplo que o perfil da Gazeta como um todo,

com faixa etária mais abrangente e equilíbrio entre leitores masculinos e femininos –

o leitor da Gazeta está na faixa dos 30, 40 anos e o jornal é mais consumido nas

classes A e B. “O G tem uma penetração um pouco maior junto a formadores de

opinião. Existe um número substancial de pessoas que compra a Gazeta do Povo

por causa do caderno de cultura – até porque o jornal nacional não contempla a

agenda cultural do que está acontecendo na cidade” (CAMARGO, 2005).

O caderno de cultura da Gazeta do Povo é veiculado diariamente, com uma

página inteira ocupada por guias de programação e duas notas sobre cinema. De

segunda à quinta-feira e aos sábados, o caderno possui quatro páginas. Das três

não ocupadas pelo guia da programação, cerca de duas metades de página são

dedicadas a colunas de profissionais de fora da equipe. A coluna da segunda página

é assinada por Wilson Martins e discorre sobre crítica literária com linguagem e

5 O método utilizado no desenvolvimento e aplicação das entrevistas está especificado no item 4 deste

trabalho. O questionário modelo aplicado aos repórteres está em anexo (ANEXO 1).6 A relevância da rotina na prática jornalística é comprovada por variadas teorias, apresentadas noitem 5.6 desta monografia.

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temática elitista e acadêmica7. Na contracapa do caderno, Miguel Sanches Neto 8 

escrevia até o fim de mês de setembro textos menos pedantes na linguagem e que

tratavam de temas diversos, da crônica à crítica. Em outubro o espaço foi ocupado

por matérias.

Às sextas-feiras, véspera do fim de semana e, portanto, dia propício à

programação de cinema e outros eventos culturais, o caderno sai com seis páginas.

Uma página inteira denominada “Bom Gourmet9”, é produzida pela jornalista Marian

Guimarães, e abriga uma coluna sobre vinhos assinada por Luiz Groff 10,

desvinculados da equipe da editoria de cultura. Desde o início do mês de outubro, acoluna de Miguel Sanches Neto é publicada na edição de sexta-feira.

Aos domingos o caderno é maior. Possuía oito páginas até o dia 11 de

setembro e a partir da edição seguinte passou a apresentar dez páginas. O aumento

incluiu a entrada da coluna social de página inteira da jornalista Nadyesda Almeida 11 

- adjetivação em detrimento da informação – e da seção de quadrinhos, horóscopo e

palavras cruzadas nos domínios espaciais da editoria de cultura. Outra coluna fixa é

a de Nina Chavs, em que a jornalista comenta o meio cultural europeu. Nina fala de

estréias de shows, crise em galerias de arte, moda e outros assuntos, sem

profundidade e dando ênfase ao glamour 12.

7 Por exemplo: “Claro, Autor, Crítico e Leitor são entidades nominalistas, não pessoas reais: trata-sede personae complementares, nas quais a literatura simultaneamente se hipostasia” (MARTINS, Wilson.Sobre acrítica.Gazeta do Povo, Curitiba, 05 set. 2005).

8 Por exemplo: “A descrição que Hilda faz dos pés do criador é de uma beleza sensual e mostra oquanto ela se encontra facinada por seu interlocutor, nestes poemas que Alcir Pécora define como apóstrofes aDeus” (SANCHES NETO, Miguel. Travessia acompanhada. Gazeta do Povo, Curitiba, 05 set. 2005). Ou “Achoque todo mundo já quis pertencer a outra espécie animal. Meu desejo mais secreto é me transformar emtartaruga”. (IDEM. O Clão dos Quelônios. Gazeta do Povo, 12 set. 2005).

9 Cobertura da área de gastronomia, com matérias sobre restaurantes e chefes de cozinha.10 A coluna, denominada In Vino Veritas, varia entre o caráter informativo e a crônica.11 Coluna sobre a “alta sociedade”, com datas de aniversários, fotos em eventos, perfis, etc. Por 

exemplo: “Beleza de corpo e alma. Assim é Marilis Bocarth. (...) No clique, foi flagrada na loja Animale conferindoas novidades da coleção Primavera/Verão” (ALMEIDA, Nadyesda. La Blonde. Gazeta do Povo, 25 set. 2005)

12 Entre as “pérolas” da coluna, está o trecho: “Começa o OUTONO[sic], na Europa, eis um desafio:

633 romances novos, que serão lançados no mercado francês nos próximos dois meses. E a maioria temtiragem mínima de cem mil exemplares. Cultura demais para os reles mortais: é por isso que há tantadepressão por aqui [sem grifo no original]” (CHAVS, Nina. Gazeta do Povo, Curitiba, 04 set. 2005).

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Roberto Gomes13 e Domingos Pellegrini14 (mais irônico ou provocativo)

escrevem colunas em edições alternadas do caderno dominical. Ambos ocupam o

espaço com artigos de opinião reflexivos, crônicas e pequenos contos.

Excluídas as notícias de agências e as colunas citadas, o espaço editorial é

ocupado pela produção dos oito jornalistas da editoria de cultura – sete repórteres e

o editor. No primeiro dia do período de análise, a equipe era formada por Adriane

Perin, Irinêo Neto, Juliana Girardi, Nikola Matevski, Omar Godoy, Rogério Galindo e

Rudney Flores, sob a chancela de Paulo Camargo. No dia 4 de setembro, Jennifer 

Koppe ocupou a vaga de Adriane. O horário de trabalho da equipe é de segunda asexta-feira, das 8h30 às 15h, sem escalas de fins de semana – conseqüentemente,

são produzidas sete edições em cinco dias.

Cada dia da semana tem uma temática predominante, segundo os

  jornalistas do caderno: os domingos são os dias das pautas frias e especiais,

matérias mais trabalhadas e reportagens, um caderno distinto dos outros dias da

semana por ter mais páginas e ser lido por um número maior (e perfil mais

abrangente) de leitores, com mais tempo ocioso por não ser um dia útil.   Cada

repórter tem mais ou menos uma página para fechar. “A gente busca no caderno de

domingo fazer um aspecto diferencial, mais de análise de uma situação” (FLORES,

2005).

Segunda-feira é dedicada à literatura; terça-feira, às artes plásticas; quarta-

feira, à música; e quinta-feira, ao audiovisual. Na sexta-feira, o jornal volta-se à

13 Por exemplo: “E, como se fosse a coisa mais natural, muda o rumo da conversa:- Você é pai?- Sou pai, sim.- De quem?- Do meu filho, ora!” (GOMES, Roberto. Conversações com Isadora. Gazeta do Povo, Curitiba, 18 set.

2005).Ou: “Infelizmente, o mundo está coberto de insanidades. As últimas décadas serviram para nos impor 

o que há de pior na espécie humana” (IDEM. A insanidade racista. Gazeta do Povo, Curitiba, 02 out. 2005).10 Por exemplo: “Diante de descalabros e absurdos, as pessoas se espantavam e perguntavam’onde é

que isso vai parar?’. Agora, pararam de se espantar” (PELLEGRINI, Domingos. Domingos Pellegrini. Gazeta doPovo, Curitiba, 11 set. 2005).14

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programação do fim de semana. O sábado seria uma edição mais livre, voltada à

cidade. Paulo CAMARGO justifica a organização:

“A gente chegou à conclusão de que é importante que o leitor saiba o que vai encontrar. Oleitor que se interessa por cinema e quer saber o que está saindo em vídeo vai procurar o jornal de quinta-feira porque sabe que ali saem os principais lançamentos, os comentários e

matérias referentes à área. Isso torna a relação do veículo com o leitor – que em últimainstância é um consumidor – mais prática. Não pode ser estanque, um dia em que sepubliquem mais matérias sobre música não quer dizer que a capa necessariamente serásobre música. Se houver um acontecimento cultural de relevância de outra área naqueledia, obviamente vai ter prioridade. Mas a escolha de temas facilita inclusive a organizaçãodo trabalho”.

A setorização também distingue os repórteres, com o objetivo de que se

tornem especialistas no tema de que tratam. Adriane Perin era setorista de música

independente e escrevia também sobre cultura pop, comportamento e artes visuais.

“A música independente foi meu jornalismo de guerrilha, digamos assim” (PERIN,

2005). Na equipe em atuação desde sua saída, Jennifer Koppe entrou para cobrir 

artes visuais; Rogério Galindo, para cobrir teatro (e música erudita, menosfreqüente); Irinêo Netto é setorista de literatura; Rudney Flores, de cinema

(principalmente o nacional, também escreve sobre quadrinhos e MPB); e Juliana

Girardi, de música popular. Omar Godoy não se considera setorista por escrever 

sobre música, cinema, comportamento e televisão com freqüências variadas. “Se

tivesse que dizer que eu sou setorista de alguma coisa, seria televisão ou MPB”

(GODOY, 2005). Nikola Matevski diz ter “uma função meio híbrida”: “Tentaram criar 

uma função nova que eu devo desempenhar, um repórter que sai mais para a rua e

faz mais matérias de domingo, de maior fôlego. Fiz matéria de comportamento,

essas coisas. São temas independentes de questões setoriais” (MATEVSKI, 2005).

Rudney Flores e Omar Godoy são os mais antigos repórteres do caderno,

formados em 1999 e com pós-graduação não concluída na universidade Tuiuti, na

área de cinema. Omar afastou-se do Caderno G por dois anos – período em que

editou o extinto caderno FUN, voltado para o público adolescente – e retornou em

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fevereiro de 2005. Além de repórteres, exercem a função informal de subeditores,

auxiliando o editor no planejamento e fechamento das edições nos dias mais

tumultuados: quinta-feira, quando são fechadas as edições de sexta-feira e domingo;

e sexta-feira, dia em que fecham as edições de sábado e segunda-feira. Pela

formação acadêmica e pessoal, ambos declaram sentir-se preparados para escrever 

sobre os temas pelos quais são responsáveis.

No outro extremo, as contratações mais recentes do caderno são Rogério

Galindo e Jennifer Koppe. Nenhum dos dois tinha experiência nas áreas das quais

se tornaram setoristas. A defasagem tem sido combatida com leituras e cursosbreves. Koppe e Nikola Matevski (contratado em 2004) entraram para o Caderno G

recém-formados. Sobre casos em que falta ao repórter experiência e bagagem

cultural, o editor do Caderno G comenta:

“A nossa alternativa é identificar as áreas de atividade e tentar estimular que essa pessoa

se especialize. É o que está acontecendo agora com a Jennifer e outras pessoas docaderno. Como Curitiba é uma cidade onde os cadernos culturais – à exceção do Caderno

G – são basicamente feitos com matérias de agência e releases – nós temos a única equipeda cidade em jornalismo cultural – é uma área deficitária, não temos muita gente comexperiência” (CAMARGO, 2005).

Outra dificuldade para a contratação de repórteres experientes é, segundo

CAMARGO (2005), a questão salarial: “Acontece com menos freqüência por uma

questão simples: profissionais com mais experiência ou já estão colocados ou não

se submetem a trabalhar pelo piso salarial, um pouco maior que o do sindicato”.Para o repórter do caderno interessado em se especializar, o rendimento mensal

também é prejudicial. Segundo PERIN (2005): “As faculdades formam mal, você

não tem condições de se aprimorar, com o salário você não consegue fazer uma pós

ou um mestrado”.

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A crise financeira por que passam empresas jornalísticas como a Gazeta do

Povo determina condições de trabalho indesejáveis e, segundo Paulo CAMARGO,

influi na qualidade da publicação:

“O investimento é proporcional ao que aconteceu no jornalismo como um todo. As redaçõessão menores porque o jornalismo cultural impresso passa por uma crise – eu diria –irreversível. A tendência mundial é que ele se acomode em dimensões bem menores do

que já teve um dia. (...) A questão salarial poderia ser e deveria ser muito melhor, porquecada vez se exige mais em termos de formação e de disponibilidade dos profissionais,então seria interessante se houvesse uma contrapartida financeira em relação a isso. Apartir do momento que você nem sempre pode ter um profissional mais experiente, maispreparado, mais gabaritado, por conta da remuneração, é claro que interfere” (2005).

Como o jornal não paga horas extras – que são habituais na profissão –

instalou-se um banco de horas que compensa o tempo trabalhado a mais com dias

de folga. A situação cria a contradição de jornalistas precisarem de tempo para

produzir material de qualidade, mas não poderem exceder as horas de trabalho. “O

 jornal tem que sair no outro dia, não adianta, se você está apurando, não pode parar 

e ir embora”, defende FLORES (2005).Freqüentemente a equipe está desfalcada pela folga de um dos repórteres –

o que sobrecarrega os outros e instaura um ciclo. Não há plano de cargos, então

repórteres com meia década de trabalho no jornal recebem pouco mais que os

recém-contratados. Além disso, impôs-se a exclusividade como política da empresa,

saudável para diminuir o comprometimento dos repórteres com interesses extra-

  jornalísticos, mas sem aumento de salário ou outro adicional que compense

financeiramente a perda de uma fonte de renda (o duplo emprego). “É uma empresa

capitalista que tem que ter lucro e tem um monte de dívidas para pagar”, justifica

Rogério GALINDO (2005).  “Está longe do ideal, mas melhorou muito. Não tinha

cartão ponto, então você ficava 12 horas lá dentro, eu cheguei a trabalhar quatro

semanas sem um fim de semana no meio. Era um horror a parte trabalhista”

(GALINDO, 2005).

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O resultado foi que a direção do caderno passou a pressionar os jornalistas

para que não excedessem o horário. Adriane PERIN comenta:

“A empresa trabalha no vermelho, eles mesmo abriram isso no último ano e meio que eutrabalhei lá. Eles estavam pegando muito no pé, a ponto de chegarem e perguntarem: ‘Oque você está fazendo aqui ainda?’, depois das três e meia. As empresas jornalísticas como

um todo – não só a Gazeta e não só em Curitiba – estão vivendo uma fase complicada dereadequação. Mas eu acho que prejudica o jornalismo. O ideal seria que as empresastivessem uma equipe maior, escalas, turnos de jornalistas. Mas só enxuga, e isso é geral.Acho que os jornais estão trabalhando contra eles”.

Sair da redação para uma reportagem torna-se pouco usual. A cobertura de

eventos também é limitada. Em geral, a organização dos festivais e feiras convidam

o jornalista e pagam passagem, hospedagem e alimentação. O Festival Literário de

Parati, por exemplo, foi coberto à distância. Segundo NETTO, mesmo com a

organização do evento oferecendo hospedagem, por problemas orçamentários, a

Gazeta do Povo não enviou o repórter.

“Este é um ano atípico. O nosso orçamento anual está nas últimas. Mas invariavelmente a

gente consegue [apoio] com as organizações dos festivais – e quando não consegue agente acaba não indo. Eu afirmo para você que é um ano atípico pela experiência dosoutros, porque eu não estou aqui há muito tempo. Se eu não soubesse que esse é um anoatípico eu ficaria assustado, porque realmente foi um ano bem justo” (NETTO, 2005).

Longe das condições ideais, os jornalistas estão cientes de que a situação é

predominante no jornalismo brasileiro – e tem-se que fazer o melhor trabalho

possível apesar das limitações.

“Você ainda pode viajar de vez em quando, você tem acesso a computador, carro, telefone.Há jornais com só um terminal de internet para todo mundo! Apesar dos pesares, a Gazeta

ainda dá condições de trabalho, paga em dia – coisa que outros jornais não fazem. O pisodo Paraná de jornalismo é bem melhor que o piso de outros estados. Não é a condiçãoperfeita, mas se a gente olhar em volta, é melhor do que muita coisa por aí” (GODOY, 2005)

A mais perceptível das dificuldades geradas pelos cortes no orçamento é a

diminuição do espaço editorial. Segundo FLORES (2005), “o caderno era maior, e

fazia-se muito mais coisas durante a semana. Eram seis páginas de segunda a

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quinta e sábado, oito páginas na sexta e de dez a doze no domingo”. O editor 

aponta a racionalização como a maneira de lidar com a restrição espacial: “É

necessário que sejam feitas apostas, com a subjetividade de quem faz o caderno.

Essas escolhas podem ser certas ou erradas, mas são baseadas nas referências

individuais” (CAMARGO, 2005).

A afirmação levanta a questão das pautas no jornalismo cultural. A

subjetividade na seleção dos temas (o que é relevante ou não) soma-se a diferentes

pontos de vista em relação à cultura e ao jornalismo – ao papel de ambos. Entre os

repórteres do Caderno G é clara a diversidade de pontos de vista. As principaisdicotomias são: cobertura da agenda cultural X reflexão acerca do panorama cultural

e escrever sobre o que o público “quer” X formar o gosto do público.

Para o editor do caderno, Paulo CAMARGO (2005), “o jornalismo cultural

não pode ser jornalismo de divulgação, ele tem que ser um jornalismo de informação

formativa”:

“A gente não tem que dar para as pessoas o que elas querem, as pessoas no Brasil muitas vezes não

sabe o que elas querem. É pretensioso? Sim, mas tem que ser pretensioso. Você tem que se

enxergar como uma espécie de sonda que está no mundo captando os movimentos culturais, as

tendências. Tem que constatar e apontar caminhos. Eu gostaria muito de ver um jornalismo cultural

que ensinasse as pessoas a pensar, mas que não dissessem o que as pessoas devem fazer. O

 jornalista tem que dar condições para que as pessoas construam em termos reflexivos. (...) Em todos

os países com imprensa livre e civilizada há escolha sim, há subjetividade sim, e isso faz parte do

diálogo democrático. Você tem que conhecer quem é quem no meio cultural, quem tem um trabalho

autoral, consistente, que merece espaço. Todo mundo ter espaço na mídia invariavelmente significaria

encontrar um denominador comum medíocre.” (CAMARGO, 2005).

Nikola MATEVSKI defende que a seleção como é feita torna o jornal elitista

e alienado, longe da realidade do leitor: “O cara vai abrir o jornal e ler sobre coisas

que não pertencem à vida dele, não são do interesse dele. Está além da vida

cotidiana, é algo alheio a ele” (2005).

“Por exemplo, eu gostaria muito de escrever uma matéria sobre música gospel, a redação

recebe discos gospel, e claro que isso nem sequer sai. Esse é um valor que existesubentendido, quase acima de todos nós, de que aquilo não deve sair. Eu faria de uma

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forma ou de outra. Como jornalista, acho que posso escrever matérias tanto sobre música

gospel quanto sobre o novo disco da Marisa Monte ou da filha da Elis Regina, mas sóalgumas coisas passam em detrimento de outras” (MATEVSKI, 2005).

A análise da qualidade do disco ficaria por conta do desenvolvimento do

texto, e deveria estar fundamentada em argumentos.

Omar GODOY menciona outra função do jornalista, a garimpagem:

“O ideal é que o jornalista de cultura aponte também para o mercado cultural, para aindústria do disco ou do cinema, coisas que ele ache importantes e que não estão lá ainda.Descobrir um artista novo, alguém que está no underground fazendo alguma coisa. Não ésó ficar sentado esperando o CD vir. Fazer o caminho inverso. A garimpagem de talentos

também é um trabalho do jornalismo cultural que não é muito feito atualmente. Mas deveriaser. (...) Eu não sou exclusivista, não acho que tem que ser só o alternativo, só ounderground. Tem que ter as duas coisas porque eu também gosto do pop, do mainstream.Mas com quatro páginas o jornal tem que pensar no público médio e não sobra espaço para

o artista novo, alguém que está começando.” (GODOY, 2005).

Para Adriane PERIN, “o G precisava olhar mais para a cidade. O que você

vê? Regina Vogue, Festival de Teatro, Festival de Cinema, você só vê os grandes e

sem crítica. Você só vê os medalhões, o que já está estabelecido” (2005).Um dos entraves é a falta de espaço no jornal, já que a prioridade é dada

para a agenda cultural. “Existe uma pressão da direção do jornal em cima do Paulo.

O jornalismo de serviço: cada vez menos texto. Essa última reforma15, de novo

enxugou muito” (PERIN, 2005). Omar GODOY explica: “Quando só tem quatro

páginas, que é o nosso momento atual, você acaba ficando refém da agenda porque

o público também quer o serviço” (2005). Rogério GALINDO opina:

“Na maioria das vezes, por falta de espaço principalmente, você acaba reduzido a dar oserviço, mas você não pensa sobre aquilo, ou o que você pensa sobre aquilo você não temespaço para desenvolver. Acho que muito mais importante do que a estréia é você dar o

panorama geral, dizer para o leitor o que está acontecendo. A estréia deveria ser umamatéria menorzinha, só que a matéria normalzinha já toma 20% do espaço que a gente temem uma página” (2005). 

15 A reforma gráfica foi realizada em meados de 2005. Segundo Paulo CAMARGO (2005): “Acho que oobjetivo é tornar o jornal como um todo mais limpo, mais objetivo, mais atraente visualmente, com mais janelas

de leitura – boxes, infográficos, formas de atrair o olhar do leitor e facilitar a aproximação dele daquele texto.Houve uma evolução, todas as reformas gráficas feitas agregaram qualidade e objetividade ao jornal. Prioriza-semais a imagem do que antes”.

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Nikola MATEVSKI reforça a importância das matérias de agenda:

 “Matéria de agenda a gente tem que dar porque é o que se espera do jornal. Grande partedos leitores busca o jornal exatamente para se informar quando, onde e como vão

acontecer tais eventos culturais. Não acho que as pessoas busquem matérias reflexivas,mas isso é um chute meu, tão senso comum quanto a outra opinião. (...) Essa história deinsistir em matérias frias em um caderno com poucas páginas como o G, tende aescamotear eventos factuais que às vezes são muito importantes para falar de assuntosgerais [“frios”] que podem ser divertidos ou não para uns, mas no fundo não têm importânciapara a vida cultural da cidade” (2005).

O Caderno G não tem um profissional dedicado apenas à elaboração das

pautas. A função fica a cargo dos coordenadores na maior parte das editorias da

Gazeta do Povo. Sem um coordenador ativo no período analisado – Rogério Pereira

dividia a tarefa com a coordenação de esportes e o fechamento geral do jornal – o

trabalho “ficou muito centrado na figura do editor durante o ano inteiro, não tinha

esse coordenador para dialogar. Então, muitas vezes as pautas vinham de cima

para baixo, sem saber se a nossa linha editorial compreendia aquilo, se fazia parte

do nosso dia-a-dia”, conta Omar GODOY (2005).Segundo GALINDO, “a pauta é feita basicamente pelo editor, mas ele

consulta os repórteres uma vez por semana para corrigir rumo e definir a pauta da

semana, essa reunião acontece na sexta-feira. Normalmente, você tem uma pauta

por dia e mais uma que é a de domingo, que você precisa entregar até quinta-feira

de manhã” (2005). Repórteres mais antigos, como Omar Godoy e Rudney Flores,

afirmam pautar a si mesmos com freqüência. Os novos têm mais dificuldades. Nikola

MATEVSKI afirma que suas sugestões não se encaixam no “gosto” do Caderno G e

não sabe diferenciar o que interessa ou não para o jornal. “Honestamente eu não

tenho esse feeling, algumas coisas que eu sugiro não passam, ficam menores ou

são reaproveitadas de outra maneira” (2005). Jeniffer KOPPE conta que o repórter é

incentivado a sugerir pautas e que há bastante assunto durante a semana.

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“Como a maioria dos artistas sabe que a gente faz a divulgação do trabalho pelo menos no

roteiro, a gente recebe tudo que vai acontecer, os principais eventos. Mas não é a únicafonte para pauta. Geralmente você vai atrás através de sites na internet, revistas e o boca aboca mesmo. (...) Eu estou com um pouco de dificuldade para sugerir pautas de artes

plásticas para domingo, por exemplo, porque nem sempre tem coisas muito interessantespara colocar em um caderno que exige coisas mais abrangentes, um pouco maisaprofundadas” (KOPPE, 2005).

As sugestões de pauta são conversadas durante a semana e decididas e

organizadas na reunião. Constituídas, geralmente, de poucas linhas, as pautas

ganham enfoque definido por meio da conversa. “O Paulo, lógico, tem a visão do

editor, ele diz o tamanho da matéria, às vezes pergunta se merece um espaço maior 

ou menor, se vale capa ou não vale” (GODOY, 2005). As conversas sobre o enfoque

são, segundo GODOY e MATEVSKI (2005), a principal forma de influência do editor 

no trabalho do repórter. Para KOPPE, é importante para quem está começando: “Ele

dá um direcionamento na pauta se você estiver meio perdida, várias dicas em

relação a texto, principalmente, já que o texto do G é um pouco diferente do texto de

outros cadernos diários” (2005).

O processo acontece com mais liberdade do que em outras editorias, de

acordo com GALINDO: “Tem um acompanhamento principalmente quando você

pede; o Paulo pergunta se está pronto ou não e praticamente não mexe depois no

que você escreveu. Venho de um lugar em que você mexe muito no texto dos outros

porque é mais polêmico”. Uma característica da linha editorial que será tratada mais

à frente possibilita a maior liberdade: a ausência de polêmicas. “Você está só

anunciando o que vai acontecer”, justifica GALINDO (2005). Ocasionais pautas que

abordem temas “mais delicados” (críticas a políticos, por exemplo) tendem a receber 

mais atenção.

O trabalho do editor, além de chefiar a reunião de pauta, inclui planejar e

diagramar o caderno, decidir as fotografias ou infográficos, revisar os textos e fechar 

o caderno, que costuma ser fotolitado às 16h.

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“Como os repórteres sabem o tamanho do texto, do título, gravata, se tem olho ou não,

infográfico ou não, o texto já vem mais ou menos pronto. Mas é claro que cabe ao editor ocuidado com a parte de texto, correção gramatical, ortográfica e de conteúdo. A gente nãotem como rotina reescrever textos a não ser que seja extremamente necessário. No

 jornalismo cultural até se estimula uma certa autoria no que diz respeito a estilo de texto”(CAMARGO, 2005).

A elaboração das matérias obedece critérios diferentes do que é prioridade

para os jornalistas do caderno. GODOY busca refletir sobre a agenda: “Tento

conversar sobre os assuntos, contextualizar, explicar o que representa para o

cenário” (2005).

“Eu gosto de pôr um pouco de humor, um pouco de deboche, cinismo. Mas eu tenho plenaconsciência de que só isso não basta. Então, para dar o estofo à minha matéria, antes daopinião eu ponho muita informação. Eu não sou colunista, eu sou repórter, então tento ser um repórter opinativo. A opinião é um verniz que vem em cima para tornar o texto atraente,porque eu acho interessante ser pago para ser quem eu sou. Eu faço uma pesquisa muitogrande, tento saber tudo o que é possível, conversar com as pessoas, pesquisar na internet.

Isso é uma coisa que falta não só no jornalismo da Gazeta” (GODOY, 2005).

GALINDO segue duas etapas, avaliação da relevância cultural do tema e dese existe público para ele – mas preocupa-se principalmente com o conteúdo do

texto:

“Às vezes você tem uma coisa muito boa, mas tem que diminuir o espaço daquilo porque émuito fechada para um grupo específico de pessoas. Você tem que tentar dar algum

enfoque para aquilo que deixe a coisa interessante, não pode dar só o factual senão todasas matérias vão ficar iguais. Então você tem que descobrir o que naquilo é mais relevanteou original. Isso é o que dá mais trabalho. Terceiro cuidado, que é o último na verdade – as

pessoas às vezes consideram que é o primeiro, mas eu acho que é o último – é texto. Dar um tratamento de texto bacana. Mas o importante é ter o conteúdo.” (GALINDO, 2005)

A ordem de prioridades altera-se na visão de NETTO – setorista de literatura

e, talvez por conseqüência, autor dos textos com estilo mais literário:

“A principal preocupação que eu tenho na hora que sento para escrever uma matéria équanto à apresentação da informação. Eu sou muito de estilo. Claro que o conteúdo éimportante. Eu não gosto de dar a informação pela informação, eu acredito que a maneira

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de você dar a informação em um caderno de cultura é importante. Se você organiza o seu

texto de uma maneira sedutora e apresenta o que você tem para falar de uma maneirainesperada ou interessante ou diferente isso pode incitar mais a curiosidade do leitor”,(NETTO).

MATEVSKI contrapõe:

“Você pode fazer um texto lúcido, informativo, sem ele ser burocrático; por outro lado, vocêpode fazer um texto denso que realmente pense a cultura no espaço do assunto que vocêestá tratando. Eu, pessoalmente, acho mais eficiente você ir muito diretamente ao ponto ese houver introduções que elas durem três ou quatro linhas, não mais que isso. Um textolúcido é o texto que vai direto ao ponto pelo lide ou sem ser pelo lide, não tenta ludibriar”(2005).

CAMARGO fala sobre o que espera do repórter e as alternativas para buscar 

qualidade no reduzido espaço do caderno de cultura – que cada vez mais concorre

(desigualmente) com os meios eletrônicos de informação, mais ágeis:

“O grande desafio é que a informação venha acompanhada de alguma reflexão e sejaelaborada por alguém que tem conhecimento de causa. Quando o jornalista vai falar de umshow na cidade, se ele conhecer mais profundamente o histórico desse artista, ascondições em que essa produção cultural se deu, as determinantes culturais, históricas e

econômicas e souber produzir um texto embasado, essa notícia pode vir acompanhada dereflexão. (...) A gente tenta estimular que os repórteres encontrem a sua voz, que faça comque os leitores saibam que aquele texto é daquele repórter. Historicamente no jornalismobrasileiro e internacional, os consumidores de jornalismo cultural muitas vezes não apenas

vão atrás da notícia, mas vão atrás do autor, porque têm uma identificação” (CAMARGO,2005).

Com o desaparecimento da figura do crítico nos jornais – profissional que as

empresas jornalísticas não têm mais condições financeiras para bancar – o espaço

para opinião diminuiu e foi ocupado por jornalistas especializados que cobrem uma

área e produzem textos opinativos sobre ela. No Caderno G, um dos jornalistas que

escreve críticas – ou, pela classificação atual16, resenhas críticas – é o próprio editor 

do caderno.

“Eu produzo mais textos opinativos até por conta da minha formação, quer dizer, trabalho mais com

resenhas, artigos, textos opinativos, mas também produzo reportagens e faço entrevistas em caráter 

16 Vide item 5.5.

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mais episódico, porque nem sempre é possível. Existem algumas áreas que eu domino melhor, que

seria prioritariamente cinema e áudio visual e televisão, mas também um pouco de música e literatura

que são áreas que me interessam e que, se eu não domino, tenho conhecimento considerável que me

permite produzir esses textos sem ter a consciência pesada” (CAMARGO, 2005).

A formação acadêmica e pessoal em determinada área cultural é

determinante de quem produzirá textos opinativos ou não. Para MATEVSKI, a

resenha exige, principalmente, de argumentação que a fundamente. A crítica que faz

diz respeito ao domínio da adjetivação em textos de opinião.

“É a forma que você trata os assuntos, a forma com que você justifica as suas posições. Se eu quero

avaliar a interpretação de alguém, eu tento ser específico e mostrar como um certo diretor usa o ator,como ele funciona dentro da estrutura do filme e realmente conseguir dar um parâmetro palpável, que

possa ser verificado durante a fruição do filme por outra pessoa, para ela poder contestar a minha

opinião ou não. Essas coisas de crítica ou resenha que são muito freqüentes – ‘um grande ator’, ‘Uma

bela interpretação’ – são várias expressões que se transformaram em um clichê. Jornalistas nas

resenha opinam, mas na verdade não argumentam nada” (MATEVSKI, 2005).

Na área cultural, o trabalho de reportagem do repórter e dos editores sofre

menos interferência17 de instâncias hierarquicamente superiores em comparação a

outras editorias, mas não está imune.

“O jornal é conservador, os donos são católicos ligados à elite curitibana conservadora, issonão é uma crítica, é um fato. Há certos assuntos que são menos bem vistos lá do que emum jornal de esquerda ou um jornal de minorias. Já ouvi falar de matérias sobre produtos

GLS que não foram bem recebidas, mas no G a interferência é muito menor do que emoutros cadernos. Cultura não é normalmente levada tão a sério assim” (GALINDO, 2005). 

Outros repórteres também apontaram o tradicionalismo e conservadorismo

como características da linha editorial do caderno, refletida na desaprovação de

temas relacionados à homossexualidade, críticas à Igreja ou outros temas que

“afrontem a moral cristã”. O que não impede, necessariamente, de que os assuntos

sejam tratados, segundo FLORES: “Você tem que saber desviar. A gente não põe

17 “O G é uma ilha. Todas as outras editorias em que eu trabalhei são interligadas fortemente. Existe areunião de abertura do jornal, reunião de fechamento do jornal e a reunião de passagem do pessoal

da manhã para o pessoal da tarde. O G não participa de nenhuma. Isso é bom porque você tem muitomais autonomia em relação ao chefe, mas por outro lado acaba criando meio que um gueto”(GALINDO, 2005).

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na capa, põe lá atrás, eles não vão se ligar, eles não lêem a gente, não sabem o que

a gente está fazendo”.

NETTO comenta as interferências da direção do caderno, como a pauta

“recomendada”:“Aquele que diz que tem liberdade total está mentindo. Mesmo na Folha de São Paulo – eutinha aquela imagem de isenção total do jornal até o dia que desceu uma ordem do próprioOtávio Frias Filho para fazer um texto sobre a apresentação de um amigo dele em um

show. Aqui também a gente recebe indicações do que não pode deixar de ser abordadopelo jornal, acho que isso é normal, todo jornal tem. (...) Se for uma matéria delicada, quepode mexer com outras pessoas, você vê até o dono do jornal envolvido na pauta. Quandoa gente faz alguma denúncia, vai expor algum problema, alguma mazela do governofederal, estadual, esse tipo de coisa, é sempre mais delicado e tende a pedir a atenção de

outros editores. Mas isso é muito raro”, (2005)

PERIN narra duas situações em que houve intervenção:

“Vou contar um exemplo: eu tinha feito uma matéria que sairia no outro dia transformada emnota, sobre uma determinada artista que não era grande coisa, só que tem grana para ir para a França e é amiga da dona do jornal. No outro dia, lá pelas dez e pouco da manhã, amulher do Dr. Francisco [dono da Gazeta do Povo] liga para mim e fala:’ “Eu não gostei da

matéria que você fez sobre a minha amiga’ – que, com a orientação do meu editor, nós doischegamos à conclusão de que não merecia um espaço maior do que aquilo, editorialmentee artisticamente falando. Ela: ‘Não me interessam os outros assuntos que você tem.Quando eu ligo para você e digo para você fazer a matéria com a minha amiga, vocêesquece todo o resto e faz a matéria que eu mandei’. Eu comecei a rir, afastei o telefone efalei para o Paulo: “Paulo, eu respondo? Tenho autonomia para responder”. O Paulo passoupara o Zé [José Carlos Fernandes], que na época era o coordenador. O Zé conversou,conversou, foi lá e fez uma página inteira com a mulher. (...) Num outro episódio, já nogoverno Requião, foi feita uma matéria muito legal sobre os desmandos dele dentro da TVEducativa, logo que ele assumiu e parou tudo. Tentaram falar com o pessoal da TV e nada,

o repórter escreveu exatamente o que aconteceu, publicou as perguntas que ele tinha

mandado e não haviam sido respondidas. Uma matéria exemplar. O que a Gazeta do Povofez? No outro dia publicou um release do Requião na capa do caderno G.

No dia a dia, entretanto, a interferência é menor e pautada basicamente pelo

conservadorismo – “ligado à tradição de família, tradição religiosa”, especifica

NETTO (2005): “Talvez ele reflita um pouco o público leitor, que é

predominantemente mais velho e mais conservador, mais dessa Curitiba antiga,

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mais Boca Maldita18 ”. Além dessas características19 ligadas à tradição, a linha

editorial do caderno mostrou-se pouco conhecida pelos repórteres, que inclusive

questionaram a existência de uma. FLORES acredita que o período entre a

coordenação de José Carlos Fernandes e Marlet Silva configurou um hiato em que

não havia linha editorial definida no caderno, pela pouca aproximação do então

coordenador. PERIN apontou o cinema como prioridade do caderno – “mas não sei

se isso é linha editorial. Eu acho que não tem. Criam-se pautas...” (2005).

Sobre a linha editorial do caderno, MATEVSKI declara:

“Essa é a primeira pergunta que eu fiz para o Paulo quando entrei no Caderno G. Ele sintetizou em

uma frase: ‘ser acessível sem abaixar o nível’. Eu acabei verificando que isso significa misturar três

coisas: ser informativo; divertido, leve e com o texto conversado; e opinião. Isso me frustra bastante

porque eu acho que o jornalismo cultural acaba não sendo nenhuma das três coisas. E não baixar o

nível é não ser vulgar. Eu acho essa frase aplicável, mas, para mim, nível é uma questão de

abordagem e ser acessível é uma questão de tema. Ser acessível é falar freqüentemente de música

sertaneja, da maior pluralidade possível do que esteja acontecendo na vida cultural da cidade, e nível

é a maneira com que você vai tratar aquilo” (2005)

CAMARGO afirma que o jornalismo cultural é mais híbrido, ou seja, costumaser noticioso e reflexivo no mesmo texto. “A objetividade excessiva no jornalismo

cultural pressupõe superficialidade” (2005), acredita. Questionado sobre a linha

editorial do caderno, o editor responde:

“Hoje o que a gente busca é: não ser um jornalismo de divulgação, – e isso é uma coisa que eu falo

com bastante veemência – não ser um jornalismo de utilidade pública, não ser um jornalismo de

benemerência, nem de paternalismo. Principalmente, não ser um jornalismo politicamente correto –

uma praga no jornalismo nacional. Você instrumentalizar a cultura é bárbaro. A instrumentalização nãopode ser confundida com produção cultural – e a gente está mais interessada em produção cultural.

Tenta ter o discernimento crítico de quando a cultura está sendo utilizada como instrumento de

politização ou de conscientização ou condução e quando a discussão é efetivamente cultural”

(CAMARGO, 2005).

MATEVSKI não vê uma linha editorial precisa no caderno:

18 Boca Maldita é o nome dado à tradicional e conservadora tribuna livre do calçadão da Rua XV deNovembro em trecho próximo à praça Osório. É ponto de encontro, debate e agitação, e tem como lema: “nadavejo, nada ouço, nada falo”.

19

“A Gazeta é um jornal muito comportado, muito linear, não tem mudanças radicais. É uma coberturaque tenta se voltar para o nacional e ao mesmo tempo para o local, que tenta não provocar muita polêmica”.(GALINDO, 2005).

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"O que vejo é um sistema de publicação, há certos dias e certos padrões, qual assunto é tratado em

qual dia – o que para mim não chega a ser uma proposta editorial completa, apenas uma forma de

organizar o trabalho. Na questão da abordagem dos temas, da escolha dos temas e da própriaredação não há nada consistente. O que eu sinto ali é mais um senso comum de jornalismo cultural

que está disseminado pela Folha, pelo Estadão e pela maior parte dos jornais desse porte pelo país”

(MATEVSKI, 2005).

A crítica de GALINDO, por sua vez, pressupõe a existência de linha editorial:

“Eu particularmente acho que é um caderno com perfil elitista, isso é uma crítica que

eu faço. Por exemplo, a gente dá muita atenção para coisas que as pessoas não

estão nem aí e pouca atenção para coisas que são relevantes para o público. Para

resumir, a gente dá muita música erudita e pouca televisão” (2005).

Outros repórteres avaliaram o G e manifestaram as seguintes críticas, a

começar por Omar Godoy:

“Acho que falta, de uma forma geral, um pouco mais de personalidade. São repórteres muito jovens.

Acho que os textos são muito fracos, não no sentido formal, mas muitas vezes eles não passam

opinião, não contextualizam. O que aquele artista representa? Se eu vou fazer uma resenha sobre o

Eminem, eu tenho que dizer quem é ele, pesquisar a vida dele, mostrar quem é ele na Era Bush,quem é ele para o jovem americano, por que o jovem brasileiro se interessa. Por que um show do

Pearl Jam vai lotar a Pedreira Paulo Leminski? Ninguém está dizendo isso, o que o Pearl Jam

representa hoje para o rock para tanta garotada hoje ir lá? É só porque é velho? O que tem nas letras

que atrai as pessoas? Acho que falta reflexão” (GODOY, 2005).

KOPPE (2005) crê que os jornalistas poderiam ousar mais e, se fosse

possível, fazer um caderno mais crítico. De acordo com NETTO, “pelo fato de o

espaço ser reduzido, o caderno acaba tendo que abordar determinados temas demaneira mais superficial. Mas de maneira geral, com a estrutura que o caderno tem,

com o espaço que ele tem, o pessoal que faz o caderno, eu acho que ele é muito

bom, tanto que é referência no estado (2005).

MATEVSKI completa: “Os textos pecam em clareza, muitas vezes eles se

tornam afetados e chatos ao mesmo tempo. A parte da avaliação crítica e de pensar 

a cultura acaba sendo uma reflexão muito rasa. Essa é uma coisa que permeia o

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 jornalismo cultural não só no caderno G, mas em qualquer grande jornal” (2005).

Mas reconhece um outro lado do jornal:

“Por mais imperfeitas que as coisas sejam, acho que sem o caderno G a vida cultural da cidade

perderia muito. E várias vezes a interferência do caderno G ajudou as coisas a acontecerem, fez a

roda se mexer, principalmente no campo da música erudita, que era uma coisa que estava parada e a

gente começou a dar muitas matérias, foi um campo que deu uma levantada” (MATEVSKI, 2005)

 

As especificidades de se produzir jornalismo cultural em Curitiba também

foram citadas. Para GODOY, “talvez seja o fato de ter muita atividade cultural, mas o

público médio não acompanhar essa produção. Você está inserido em uma cena

que não tem diálogo com o grande público, os produtos não têm apelo, as pessoas

não correm atrás. Não é só o público que é medíocre ou a imprensa que é medíocre.

Fica essa bolha, essa coisa meio fechada” (GODOY, 2005).

NETTO aponta outro problema: “Em determinados eventos ou assuntos

Curitiba está um pouco à margem das cidades onde as coisas acontecem. Muito se

fala do eixo Rio – São Paulo, mas às vezes acontece de esse eixo pegar Belo

Horizonte e Porto Alegre – e pula Curitiba. Eu sinto que a cidade é um pouco isolada

do resto do Brasil nesses eventos” (2005).

As questões levantadas neste capítulo não foram ainda fechadas como

discurso porque servem de terreno para a análise a ser desenvolvida, considerando-

se contradições, incertezas e sugestões, de forma que o conhecimento obtido não

seja construído sobre um ponto de vista rígido, inadequado ou alheio. Cabem ainda

três considerações da equipe do G. A primeira, feita por PERIN, afirma que a equipe

do Caderno G é sub-usada. A segunda vem de CAMARGO e refere-se às falhas do

  jornalista e à pressão que enfrenta: “Por estar sempre tendo que fazer um novo

  jornal, você acerta, você erra, tem sempre a sensação de que poderia ter feito

diferente porque as suas escolhas foram feitas em um espaço de tempo reduzido e

nem sempre o seu foco é o correto” (2005).

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Por fim, ciente das limitações dispostas neste item, GODOY posiciona-se

contra o conformismo: “Esta é uma autocrítica que eu acho que todo mundo dentro

do jornalismo deve fazer: até que ponto você está amarrado, acomodado àquela

estrutura. Você está só reclamando dela e de repente você pode se desamarrar e

fazer mais coisas por conta própria. Tentar fazer mais por si coisas interessantes”

(2005). 

6.1 ANÁLISE DE CONTEÚDO

6.1.1 Análise Quantitativa

O conteúdo de 35 edições do Caderno G no período entre 4 de setembro e 2

de outubro de 2005 será analisado a partir de duas divisões principais. A primeira

refere-se ao critério tempo e consiste em duas subcategorias: a análise das edições

de segunda-feira a sábado e, em separadado, das edições de domingo. O intervalo

de estudo abrange cinco edições de cada dia da semana. Domingo é o dia em que o

caderno é lido por um público maior e mais abrangente. Para atender à gama de

leitores, a edição dominical possui mais páginas, traz assuntos variados e concentra

a maior quantidade de matérias frias, segundo afirmaram os repórteres e o editor 

nas entrevistas realizadas. A diferença editorial justifica a análise à parte das

edições do restante da semana em um primeiro momento.

A segunda divisão é justificada pelo maior destaque dado às matérias: as

capas (1ª página) dos cadernos serão analisadas em separado do interior da

edição (e contracapa), visto que a capa é a parte mais nobre da publicação – mais

visível e atrativa para o leitor – e o trabalho do editor pressupõe a seleção dos

assuntos mais importantes ou relevantes para ocupar tal espaço, que funciona como

“vitrine do caderno”.

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É necessário acrescentar que, por entender-se que colunistas não integram

a equipe da editoria no dia-a-dia da redação e nem sempre são profissionais

formados em jornalismo, terão tratamento diferenciado nesta análise. O número de

colunas por edição será quantificado, porém as especificidades referentes ao

conteúdo publicado só serão consideradas na análise qualitativa, quando será

possível relacioná-las ao conteúdo jornalístico produzido pela equipe de repórteres e

editor. As notas não farão parte do que se vier a referir como “material jornalístico

produzido”, por entender-se que são menos representativas do conteúdo do caderno

 – não exigem variedade de fontes, apuração aprofundada e não têm espaço paratexto elaborado, por exemplo.

A primeira categoria para verificação corresponde à área cultural do tema

da matéria, ou seja, como a temática da pauta se encaixa dentro dos diversos

assuntos que compõem a cultura. Foram criadas as subcategorias:

1) Política Cultural: Ações do poder público no campo administrativo e

orçamentário que influem na produção e desenvolvimento de atividades culturais.

2) Música popular: Aqui, não se pretende diferenciar a música dita “pop”, ou

seja, comercial, produto da indústria cultural, da música associada a movimentos

populares, mais artesanal. Ambas se encaixam na classificação de música popular,

em contraposição à idéia de música erudita. Compreende diferentes estilos, como

rock, jazz, MPB, sertaneja, samba, reggae, blues, rap, hip hop, etc.

3) Música erudita: Também conhecida por “música clássica” ou de concerto.

Geralmente aprendida em conservatório e baseada em estudo acadêmico, modelo

mais fechado e com técnicas estabelecidas que a música popular. Exige estudo, é

toda escrita em partitura e as composições são complexas. A categoria inclui

óperas, por assim serem classificadas na “cartola” da matéria.

6) Teatro: Representação dramática ou cômica de uma história por atores.

Dramaturgia apresentada para uma platéia ao vivo.

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7) Dança: Forma de expressão realizada por movimentos corporais,

geralmente acompanhado de música. Compreende diferentes estilos, como o balé, a

dança moderna, a dança de rua, o flamenco, o tango, etc.

8) Artes Visuais: Pintura, desenho, gravura, fotografia, grafite e demais

expressões artísticas apreciadas por meio da visão principalmente.

9) Cinema e telefilme: Produtos áudios-visuais de curta, média ou longa

metragem exibidos em salas de projeção (cinema) ou produzidos para a televisão

(telefilmes).

10) Televisão: Programação dos canais abertos e pagos das redes detelevisão, como seriados, novelas, talk-shows. Exclui os telefilmes.

11) Vídeo e DVD: Filmes em formato VHS ou DVD encontrados em

locadoras.

12) Literatura: Textos com valor estético e produção de sentidos. Apresenta-

se em formas diversas, como poesia, contos, romances, etc – ficcionais ou não.

13) Quadrinhos: Narrativa em seqüência que une texto à imagem.

Compreende HQs, mangás, cartoons, tiras, etc.

14) Comportamento: Hábitos, tendências, atitudes de um grupo de

indivíduos em um meio social.

15) Outros: demais temas tratados que não se encaixem nas subcategorias

anteriores, como design, moda, culinária, espaços culturais, bares e casas noturnas,

arquitetura, etc.

A segunda categoria adotada diz respeito ao espaço geográfico em que

o produto cultural foi produzido, o lugar de origem . No caso de o foco ser um

evento, como festivais, classificar-se-á pelo local onde acontece o festival. A

classificação mensura a atenção dada à produção cultural regional, nacional e

internacional. Subdivide-se em:

1) Local: Produtos ou eventos originários da cidade de Curitiba.

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2) Estadual: Produtos produzidos em outras cidades do Paraná ou eventos

que acontecem em outras localidades do estado.

3) Nacional: Produtos ou eventos originários de outros estados brasileiros.

4) Internacional: Produtos produzidos no exterior e eventos que acontecem

fora do país.

A terceira categoria são os gêneros20  do texto jornalístico, no caso: 1)

crítica, 2) resenha, 3) reportagem (aqui, entendida como matéria aprofundada e com

maior variedade de fontes – no mínimo três), 4) matéria (notícia com poucas fontes e

abordagem mais superficial), 5) entrevista (modelo pergunta e resposta), 6) perfil.A  quarta categoria diz respeito à verificação da origem da pauta: calcula

quantos dos textos publicados foram agendados pela indústria cultural – o que se

denomina, neste trabalho, de “texto de agenda”21. Incluem-se lançamentos de livros,

CDs, filmes, além de abertura de exposições, estréias de espetáculos, etc.

Quanto ao conteúdo da matéria, mais duas categorias entram na

quantificação. A quinta categoris são os títulos e a sexta são as aberturas das

matérias (ou “abre”, no jargão jornalístico). Ambas estão subdivididas em:

1) Factual: São os títulos e “abres” que respondem (algumas das) perguntas:

“quem fez o quê, onde, quando e como?”. No caso da abertura da matéria,

corresponde ao “lide”. Traz os “fatos”, com o mínimo de interferência opinativa do

repórter.

2) Opinativo: Quando o repórter expressa explicitamente um julgamento

sobre o assunto no título ou na abertura da matéria.

3) Literário ou “de revista”: Texto e título com tratamento literário, ou seja, de

estilo (paradoxos, aliterações e outros jogos de palavras, narrativas, personificação,

referências a ditados, frases feitas, trechos de música, títulos de filmes, etc.),

semelhantes aos do jornalismo de revista, com narizes de cera, contextualizações,

citações e outros jogos de idéias, antes da apresentação do assunto específico.

20 Especificados no item 5.5.21 Vide item 5.4.

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A sétima categoria classifica as matérias segundo a autoria:

1) Assinada: Texto assinado por um repórter da equipe ou pelo editor do

Caderno G.

2) “Da Redação”: texto em que não é especificado qual profissional da

editoria foi o autor.

3) Agência: Matéria produzida por agência de notícias.

4) “Especial para o G”: Quando assim for especificado ao fim da matéria.

5) Repórter de Fora: Quando assinada nominalmente por repórter que não

integra a equipe do Caderno G.

6.1.1.1 Análise das capas do Caderno G de segunda-feira a domingo22

GRÁFICO 1 – PORCENTAGEM DAS ÁREAS CULTURAIS DAS MATÉRIAS DE

CAPA DO CADERNO G DURANTE AS 35 EDIÇÕES ANALISADAS

Conforme a TABELA 1 (APÊNDICE 2), a música popular é o tema que mais

ocupou as capas do Caderno G no período analisado, com 24% do total das capas,

distribuídas de forma equilibrada ao longo da semana. O notável destaque

possivelmente foi favorecido pela efervescência de shows que marcou o período em

22 Os guias de programação não estão incluídos na análise por não constituírem matériaspropriamente.

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ASSUNTOS DA CAPA

24%

17%

14%11%

11%

23% Música Popular 

Literatura

Cinema e telefilme

Artes Visuais

Comportamento

Outros

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Curitiba: as atrações internacionais e nacionais do festival Curitiba Rock Festival e a

apresentação da pop star canadense Avril Lavigne, por exemplo.

Literatura aparece em segundo lugar, ocupando as capas de todas as

segundas-feiras e ainda uma capa de terça, o que totaliza 17% das edições.

Verifica-se que a segunda-feira é o dia da semana em que a setorização é mais

rígida. Segundo NETTO:

“Pela lógica de organização do caderno, segunda-feira é o dia de literatura, eventualmente agente consegue emplacar uma matéria que não seja tão específica de literatura – um poucomais aberta ao público não tão familiarizado com a literatura – como aconteceu no domingoquando a capa do G foi sobre a Lya Luft, uma escritora mais popular, que as pessoasconhecem mais. Esse tipo de situação é possível. Agora escrever sobre o livro queescreverei segunda-feira, “Depois de Babel”, do crítico Jorge Steiner, é o tipo de coisa que

não poderia ser publicado fora da segunda-feira, é um livro bastante específico de tradução,uma coisa mais direcionada” (2005).

O trecho somado ao resultado da quantificação aponta para uma visão da

literatura como uma área cultural menos acessível. Nenhum outro repórter afirmou

ter limitação de dia da semana para escrever sobre qualquer tema. O caderno desegunda-feira é visivelmente dedicado à literatura, com fixidez que indica o alcance

de um público restrito. A falta de acontecimentos culturais no primeiro dia da semana

útil e a antecedência com que o caderno é preparado (fechado na sexta-feira)

podem ser explicações para a predominância do tema. As divisões dos dias em

setores não se aplicam à capa a partir de terça-feira. Ao longo da semana, a

distribuição de temas é equilibrada e unanimidades como uma área ocupar todas as

capas de um dia da semana não se repetem.

A TABELA 2 (APÊNDICE 2) refere-se ao espaço geográfico de origem dos

acontecimentos e produtos culturais. Revela que as ações culturais originadas na

cidade de Curitiba têm predomínio nas capas do Caderno G, com 40% do total. Já a

produção nacional (23%) perde para a internacional (31%). A área de literatura é a

que mais aborda temas estrangeiros, com matérias sobre lançamentos de livros

norte-americanos, por exemplo. A literatura nacional e local tem pouco destaque.

95

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Já a produção cinematográfica da cidade ganhou espaço na primeira página

na mesma medida que os filmes estrangeiros. A cobertura local é a que engloba a

maior pluralidade de temas.

GRÁFICO 2 – PORDENTAGEM DOS ESPAÇOS GEOGRÁFICOS DE ORIGEM

DAS MATÉRIAS DE CAPA DO CADERNO G DURANTE AS 35

EDIÇÕES ANALISADAS

O que acontece fora de Curitiba mas ainda no território estadual recebe

menos atenção, com apenas 6% do total.

Quanto ao gênero jornalístico do texto de capa, seguindo a TABELA 3

(APÊNDICE 2), a matéria sem grande variedade de fontes ou investigação é maioria

absoluta (74%), seja simplesmente como um texto de serviço estendido ou com

alguma contextualização e comentários soltos do jornalista que não caracterizem

texto de opinião, nem chegam a configurar uma reportagem. Alguns temas, como a

música erudita e as artes visuais apresentaram – nas capas – apenas este modelo

de construção.

 

GRÁFICO 3 – PORCENTAGEM DE GÊNEROS JORNALÍSTICOS DAS MATÉRIAS

DE CAPA DO CADERNO G DURANTE AS 35 EDIÇÕES

ANALISADAS

96

ESPAÇO GEOGRÁFICO

40%

6%23%

31%Local

Estadual

Nacional

Internacional

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A reportagem de fôlego aparece em segundo lugar em freqüência (17%) e aresenha em terceiro (6%), bastante distantes do percentual da matéria. Outros

gêneros jornalísticos não configuraram freqüência representativa.

Todas as matérias de capa são produzidas por jornalistas da equipe do

caderno G, conforme especificado na TABELA 4 (APÊNDICE 2).

GRÁFICO 4 – PORCENTAGEM DE MATÉRIAS DE CAPA AGENDADAS PELA

INDÚSTRIA CULTURAL NAS 35 EDIÇÕES ANALISADAS DO CADERNO G

97

GÊNEROS

0%

6%

74%

0%17%

3%

Crítica

Resenha

Matéria

Perfil

Reportagem

Entrevista

MATÉRIAS DE AGENDA

66%

34%

Sim

Não

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A TABELA 5 constata a prevalência das pautas agendadas pela indústria

cultural – ou matérias de agenda –, com 66%, em relação de aproximadamente 2:1

com o conjunto das matérias frias ou especiais (34%).

O estilo literário ou de revista representa 97% dos títulos das matérias de

capa, com uso de diferentes recursos estilísticos. Na abertura dos textos –

parágrafos que indicam o tratamento mais ou menos objetivo que será dado ao

escrito, o balanço entre o factual (37%) e o literário (60%) teve resultado

contrastante, embora menos do que na categoria anterior.

GRÁFICO 5 – PORCENTAGEM DE ESTILOS DE ABERTURA DE TEXTO DAS

MATÉRIAS DE CAPA DO CADERNO G DURANTE AS 35 EDIÇÕES

ANALISADAS

A opinião (3%) não aparece explicitamente nos títulos de capa e é pouco

freqüente na abertura do texto.

6.1.1.2 Análise das edições do Caderno G de segunda-feira a sábado23

Quando considerado o interior e a capa das edições não dominicais,

literatura cai para a terceira colocação (11%) – concentrada, como está, nas

23 Incluídas as capas.

98

ABERTURA DO TEXTO

60%

37%

3%

Literário

Lide

Opinativo

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primeiras páginas de segunda-feira, o tema pouco aparece ao longo da semana,

conforme especificado na TABELA 9 (APÊNDICE 2). A música popular permanece

em primeiro (30%), com grande freqüência de pautas a partir da metade da semana

 – principalmente quarta-feira (dia dedicado ao setor musical), sexta-feira e sábado

(pela programação de shows da cidade). Cinema alcança a segunda posição (21%),

concentrado na sexta-feira, dia das estréias nas salas de exibição da cidade.

Somados ao percentual considerável de matérias sobre os lançamentos em DVD

(8%)(destaques das quintas-feiras), o percentual de audiovisual chega a ocupar 29%

das edições. Como música responde por 30%, resta pouco mais de um terço dosespaços no caderno para os demais assuntos.

GRÁFICO 6 – PORCENTAGEM DAS ÁREAS CULTURAIS DAS MATÉRIAS DO

CADERNO G DE SEGUNDA-FEIRA A SÁBADO

Outro tema que desponta durante a semana no interior do caderno (sem

destaque nas capas) é o teatro (8%), ocupando edições de sexta-feira com as

estréias nos palcos. Diferentemente das capas, a análise dos cadernos com um todo

revela a setorização por dia. Fato é que as matérias literárias pouco têm espaço fora

da edição de segunda-feira. Com artes visuais destacadas na terça-feira, música

popular dominante nas quartas, e assim sucessivamente um tema prevalecendo a

cada dia, percebe-se que no interior do caderno a setorização se faz mais presente

99

ÁREAS CULTURAIS

30%

21%11%8%

8%

22% Música Popular Cinema e telefilme

Literatura

Teatro

Vídeo/DVD

Outros

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do que na capa, ou seja, há discrepância entre os temas que imperam em uma

determinada edição e a temática alçada à “vitrine” – a primeira página.

Divergências surgem também entre os percentuais de procedência de uma

matéria publicada na capa do caderno e no seu interior – a soma total mostra que

matérias sobre a produção cultural nacional são mais constantes (38%), embora

ocupem o terceiro lugar nas capas. Simultaneamente, percebe-se a valorização do

local na hierarquia da edição: terceiro espaço de origem das matérias em geral

(26%), aparecia em primeiro no universo restrito das capas.

GRÁFICO 7 – PORCENTAGEM DOS ESPAÇOS GEORGRÁFICOS DE ORIGEM

DAS MATÉRIAS DO CADERNO G DE SEGUNDA-FEIRA A

DOMINGO

São as matérias sobre música popular que elevam a quantidade de

produção nacional coberta pelo caderno, conforme a TABELA 10 (APÊNDICE 2).

Apenas a música popular nacional ocupa 21% do caderno. Outro destaque é a

cobertura de cinema estrangeiro, que ocupa mais de um décimo (11,4%) das

matérias. Localmente, há equilíbrio entre os temas tratados.

Percebe-se a elevada proporção do aparecimento de música popular 

nacional (70%) em comparação à local (15%). Já nas artes visuais, o universo de

cobertura praticamente limita-se ao da cidade (77%). Os números referentes ao

100

ESPAÇO GEOGRÁFICO

26%

3%

38%

33%Local

Estadual

Nacional

Internacional

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cinema revelam que a cobertura de filmes nacionais (29%) é bastante representativa

apesar do gigantismo do mercado no exterior (55%). A ocupação local do espaço

destinado à literatura permanece restrita (14%); enquanto a porcentagem dedicada

ao mercado literário nacional cresce (28,5%).

GRÁFICO 8 – PORDENTAGEM DE GÊNEROS JORNALÍSTICOS DAS MATÉRIAS

DO CADERNO G DE SEGUNDA-FEIRA A DOMINGO

 

No corpo

do caderno, as resenhas ganham espaço e passam ao segundo lugar (25%),

enquanto diminuem as reportagens (6%), que exigem mais tempo – em falta nas

redações. Entrevistas aparecem discretamente (5%) e surge um perfil (1%). A crítica

permanece ausente (0%). Nota-se a fixidez dos modelos de cobertura, adequando o

caderno ao perfil conservador do jornal e facilitando a organização do trabalho frente

à falta de tempo. Não há espaço para soluções criativas no dia-a-dia.

Quando se verifica quais temas são submetidos à opinião em forma de

resenha, mais uma vez aparecem as áreas audiovisual (quase 55%) e música

popular (33%) em destaque. Teatro aparece em seguida, como 12% das resenhas.

Nenhum outro assunto recebeu cobertura opinativa no período. Nas reportagens, os

temas de destaque são política cultural (37,5%) e comportamento (25%) – ou seja,

distantes das pautas agendadas por lançamentos e estréias.

101

GÊNEROS

0%

25%

63%

1%6%5%

Crítica

Resenha

Matéria

Perfil

Reportagem

Entrevista

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A cada dez matérias, ao menos uma não é produzida pela equipe do

caderno (repórteres de fora ou agência de notícias). As matérias de agências de

notícias (5%) concentram-se na segunda-feira – dia em que o caderno é menor, mas

a edição é fechada junto à de sábado – e na área de literatura.

GRÁFICO 9 – PORCENTAGEM DE AUTORIA DAS MATÉRIAS DO CADERNO G

DE SEGUNDA-FEIRA A DOMINGO

A proporção

de matérias vinculadas à agenda cultural é alta durante a semana (83%):

GRÁFICO 10 – PORCENTAGEM DE MATÉRIAS AGENDADAS PELA INDÚSTRIA

CULTURAL DE SEGUNDA-FEIRA A DOMINGO NO CADERNO G

Quanto ao

estilo do texto,

mantém-se a predominância de títulos de revista ou literários (83%) – com pouco

102

AUTORIA

84%

5%

5%1% 5%

Assinada

"Da Redação"

Agência

Repórter de fora

"Especial para o G"

MATÉRIAS DE AGENDA

83%

17%

Sim

Não

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clareza, mas mais atrativos – enquanto no “abre” da matéria aparecem relativamente

mais construções em forma de lide (13,7%).

GRÁFICO 11 – PORCENTAGEM DE ESTILOS DE ABERTURA DE TEXTO NAS

MATÉRIAS DO CADERNO G DE SEGUNDA-FEIRA A SÁBADO

A abertura literária (48%) divide espaço com o factual (47%) e a opinião

permanece pequena (5%). A divisão exemplifica a dicotomia de opiniões dos

repórteres em relação ao estilo do texto.

6.1.1.3 Análise das edições dominicais do Caderno G

A primeira grande diferença observada entre as edições de domingo e as

dos outros dias da semana pode ser verificada no gráfico referente às áreas

culturais pautadas. A música popular, soberana no conjunto dos outros dias, cai para

a segunda colocação (21%) e a televisão, que nem figurava entre os temas mais

recorrentes de segunda-feira a sábado, aparece como tema dominante, ocupando

uma quarto das edições dominicais (28%). Uma ressalva faz-se necessária: no

primeiro dia da semana, a Gazeta do Povo publica também o caderno “Revista da

Tevê”, com matérias sobre a programação de novelas, seriados e etc. Ainda assim,

103

'"ABRE" DO T EXTO

48%

47%

5%

Literário

Lide

Opinativo

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a edição de domingo do G privilegia assuntos relacionados ao meio de

comunicação, o que indica a intenção de popularizar o caderno aos domingos.

A literatura desaparece da lista de temas que se destacam e o cinema

também apresenta queda vertiginosa em relação às edições de segunda-feira a

sábado.

GRÁFICO 12 – PORCENTAGEM DAS ÁREAS CULTURAIS DAS MATÉRIAS DO

CADERNO G AOS DOMINGOS

As artes visuais (12%) e teatro (9%) ganham espaço e – em menor escala,

crescem as pautas sobre comportamento (6%). A TABELA 17 (APÊNDICE 3) expõe

ainda as relações entre temas e origens geográficas. A cobertura da programação

nacional de televisão (77,7% do total das pautas de televisão) leva à frente a

porcentagem de pautas nacionais, as estaduais sequer aparecem e a cobertura

internacional declina (32,3%).

As matérias continuam predominando como gênero jornalístico no caderno

de domingo (66%), mas aumenta o número de reportagens (20%) e entrevistas

(14%) capazes de proporcionar aprofundamento e reflexão ao material jornalístico.

Por outro lado, as resenhas desaparecem.

104

ÁREAS CULTURAIS

28%

21%12%

9%

6%

6%

6% 6% 6%

Televisão

Música Popular 

Artes Visuais

Teatro

Política Cultural

Literatura

Cinema e ltelefilme

Comportamento

Outros

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GRÁFICO 13 – PORCENTAGEM DOS GÊNEROS JORNALÍSTICOS DAS

MATÉRIAS DO CADERNO G AOS DOMINGOS 

Outra

diferença significativa em relação às demais edições é a inversão da relação entre

matérias de agenda e pautas frias ou especiais. No caderno de domingo,

prevalecem as segundas, com mais de 60%. A agenda, grande determinadora dos

assuntos tratados durante a semana, aparece reduzida em mais de 40 pontos

percentuais.

GRÁFICO 14 – PORCENTAGEM DAS MATÉRIAS AGENDADAS PELA INDÚSTRIA

CULTURAL NO CADERNO G AOS DOMINGOS

105

GÊNEROS

0%

0%

66%0%

20%

14%Crítica

Resenha

Matéria

Perfil

Reportagem

Entrevista

MATÉRIAS DE AGENDA

63%

37%Não

Sim

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Diminuem também as matérias feitas por outros jornalistas que não da

equipe do jornal, conforme a TABELA 20 (APÊNDICE 4). Os títulos literários são

quase unanimidade (97%), como mostra a TABELA 22 (APÊNDICE 4). As

proporções entre textos abertos por lide (29%) ou trabalhados com linguagem de

revista (68%) afastam-se novamente, com predomínio do estilo literário:

GRÁFICO 15 – PORCENTAGEM DE ESTILO DE ABERTURA DE TEXTO NAS

MATÉRIAS DO CADERNO G AOS DOMINGOS

6.1.1.4 Análise quantitativa geral das 35 edições do Caderno G

Para finalizar a pesquisa quantitativa e passar à fase seguinte, da análise

qualitativa, convém quantificar e relacionar os resultados obtidos com a aplicação

das categorias nas 35 edições em estudo. A começar pela quantidade de matérias

produzidas por dia da semana.

A edição de domingo possui mais páginas (de oito a dez), mas a presença

de mais colunistas a iguala tecnicamente (22%) em número de matérias ao caderno

de sexta-feira (21%), que publica seis páginas. O cálculo é relativo, já que no

domingo há matérias mais longas – geralmente de página inteira.

106

"ABRE" DA MATÉRIA

68%

29%

3%

Literário

Lide

Opinativo

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GRÁFICO 16 – PORCENTAGEM TOTAL DE PRODUÇÃO DE MATÉRIAS POR DIA

DA SEMANA NO CADERNO G

A segunda-feira é o dia em que o caderno é menos encorpado (11%), com

menos produção jornalística dos repórteres. Basicamente, traz a matéria de capa e

os resumos dos lançamentos de livros, mais uma matéria de agência.

GRÁFICO 17 – PORCENTAGEM DE ÁREAS CULTURAIS DAS MATÉRIAS DO

CADERNO G ANALISADAS

Quanto às áreas culturais pautadas, o resultado total é semelhante ao das

edições de segunda-feira a sábado – já que são maioria – mas com dois outros

temas na lista dos principais, ainda que não a encabecem: televisão (6%) e artes

107

PRODUÇÃO POR DIA DA SEMANA

22%

7%

11%

14%14%

21%

11%Domingo

2ª Feira

3ª Feira

4ª Feira

5ª Feira

6ª Feira

Sábado

ÁREAS CULTURAIS

29%

17%

16%10%

8%

8%

6%6%

Música Popular 

Cinema

Outros

Literatura

Teatro

Artes Visuais

Televisão

Vídeo/DVD

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visuais (8%). Conforme pode ser verificado na TABELA 24 (APÊNDICE 5), política

cultural (5%), música erudita (5%) e quadrinhos (3%) têm seu espaço no caderno,

ainda que pequeno.

A média final das localidades de origem dos bens e serviços culturais indica

predominância daqueles de origem nacional (40%) e mais atenção ao internacional

(31%) do que ao local (27%) – ainda que a diferença não seja contrastante – e

descomprometimento com (ou desconhecimento de) o cenário cultural paranaense

em si (2%), além dos limites de Curitiba. Destacam-se, segundo a TABELA 26

(APÊNDICE 5), a música popular nacional (18% do total das matérias), o audiovisualestrangeiro (16%), as artes visuais locais (6%), a literatura estrangeira com 4,2%

(lançamentos) e nacional com 3,6% (entrevistas).

GRÁFICO 18 – PORCENTAGEM DE ESPAÇO GEOGRÁFICO DE ORIGEM DAS

MATÉRIAS DO CADERNO G ANALISADAS

Quanto

aos gêneros

de texto

 jornalístico, sente-se a ausência da crítica (O%), substituída pela resenha (20%) –

formato correspondente a um quinto do material publicado. As matérias (como

anteriormente definidas) ocupam 63% do espaço.

GRÁFICO 19 – PORCENTAGEM DE GÊNEROS JORNALÍSTICOS DAS MATÉRIAS

DO CADERNO G ANALISADAS

108

ESPAÇO GEOGRÁFICO

27%

2%

40%

31%

Local

Estadual

Nacional

Internacional

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Os

gêneros

predominantes estão intimamente relacionados ao fator tempo e à falta deaprofundamento nos assuntos. A reportagem de maior fôlego representa pouco

menos de uma a cada dez matérias. As entrevistas assumem espaço relevante

(7%). A diversidade não é um valor considerado nos modelos de texto.

No balanço entre as matérias frias do domingo e as agendadas pela

indústria cultural que imperam nos demais dias, tem-se que a agenda determina

quase 80% das pautas no total.

GRÁFICO 20 – PORCENTAGEM DE MATÉRIAS AGENDADAS PELA INDÚSTRIA

CULTURAL NAS EDIÇÕES DO CADERNO G ANALISADAS

A autoria dos textos publicados é de predomínio da equipe de repórteres

(87%) – assinados de acordo com o princípio de que o repórter de cultura deve dar 

109

GÊNEROS

0%

20%

63%

1%9%

7%

Crítica

ResenhaMatéria

Perfil

Reportagem

Entrevista

MATÉRIAS DE AGENDA

79%

21%

Sim

Não

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sua marca ao texto, conforme acredita o editor do caderno, Paulo CAMARGO

(2005). As notícias de agência tem percentual baixo (4%), mas relativamente

considerável por agruparem-se nas segundas-feiras.

GRÁFICO 21 – PORCENTAGEM DE AUTORIA DAS MATÉRIAS DO CADERNO G

ANALISADAS

Os títulos

de estilo literário predominam com maioria absoluta, presentes em mais de 85% das

matérias.

GRÁFICO 22 – PORCENTAGEM DE ESTILOS NO TÍTULO E NA ABERTURA DE

TEXTO DAS MATÉRIAS DO CADERNO G ANALISADAS

Na abertura

do texto, o estilo também conhecido como de revista prevalece (53%), mas o texto

110

AUTORIA

87%

4%4%4%

1%

Assinada

"Da Redação"

Repórter de foraAgência

"Especial para o G"

0%

20%

40%

60%

80%

100%

Títulos Abertura do Texto

TEXTO

Opinativo

Factual

Literário

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factual mantém-se em mais de 42% das matérias. A co-existência dos estilos, assim

como outras relações e interpretações que podem ser produzidas a partir dos dados

aqui descritos serão retomados posteriormente neste trabalho. O item seguinte abre

outra frente de análise: a qualitativa.

6.1.2 Análise Qualitativa

O aprofundamento da análise do Caderno G pode ser obtido por meio da

análise de conteúdo qualitativa, que pressupõe maior aproximação do pesquisador com o texto. Decidiu-se pela amostragem de sete exemplares do caderno, cada um

veiculado em um diferente dia da semana, como forma de averiguar especificidades

dos dias e o conjunto final formado pela soma das sete edições. Entendeu-se ser 

preferível não limitar o período de análise a sete dias seqüenciais, como forma de

evitar quaisquer fatores que possam ter influenciado o período ou transformá-lo em

uma semana atípica. A seleção aleatória das edições por dia semana constituiria

uma amostragem menos restrita por marcações temporais. Entretanto, durante a

triagem, alguns exemplares foram selecionados por verificar-se que traziam modelos

de matérias recorrentes no caderno – percebidos durante a pesquisa quantitativa. É

o caso da matéria acompanhada de um box  crítico ou opinativo, como será

explicitado adiante. Foram selecionadas as edições dos dias: 5 de setembro

(segunda-feira), 20 de setembro (terça-feira), 5 de outubro (quarta-feira), 15 de

setembro (quinta-feira), 30 de setembro (sexta-feira), 24 de setembro (sábado) e 11

de setembro (domingo) 24.

A edição de 5 de setembro de 2005 é aberta pela matéria “Sedução

Vampiresca”, que parte de um gancho da agenda cultural – o lançamento no Brasil

do best-seller  “O Historiador”, de Elizabeth Kostova (obra em inglês, sem

nacionalidade informada na matéria) –, informa sobre a criação do selo Suma de

24 Ou, em ordem temporal: 5/09, 11/09, 15/09, 20/09, 24/09, 30/09 e 5/10.

111

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Letras e comenta o mercado editorial de “literatura de entretenimento” – na ordem

inversa da disposta neste parágrafo, em matéria de página inteira mas em cujo

espaço apenas duas colunas são ocupadas por texto. O título faz analogia entre a

obra de Kostova, a lendária sedução dos vampiros que sugam suas vítimas e o

mercado de livros de entretenimento, em tom crítico pouco reverberado no texto. A

fotografia com filtro vermelho de um vampiro atacando uma garota ocupa quatro

colunas. É clara a opção editorial por imagem em detrimento ao texto. O primeiro

parágrafo da matéria comenta a literatura de entretenimento, define-a sem

acrescentar idéias além do senso comum, serve como contextualização do assuntoe como tentativa de conquistar o leitor por meio do comentário bem-humorado: “O

que explica o outro nome pelo qual é conhecida: literatura de aeroporto – um dos

lugares do mundo onde a passagem do tempo pode ser uma angústia terrível o

suficiente para levar alguém que nunca leu um livro na vida a considerar essa

possibilidade” 25. Seguem-se referências a “fenômenos literários” como Dan Brown,

em dois parágrafos é anunciada a criação de um selo do gênero pela

Objetiva/Santilla e então fala-se do livro lançado – a tiragem e a sinopse da obra em

menos de dez linhas. No parágrafo seguinte é levantada a questão dos best-sellers

transformarem-se em filmes e, para fechar o texto, são contrastadas duas opiniões

(desprovidas de argumentação): “Para alguns – como o editor Ivan Pinheiro

Machado, da gaúcha L&PM –, os grandes grupos editoriais entraram no Brasil como

predadores em busca de sangue (das editoras pequenas). Para Soto, isso ‘é uma

grande bobagem’. Sem meias palavras, ele diz que a Planeta quer mesmo

popularizar o livro, seguindo as regras de mercado. E elas mandam seduzir o leitor 

que não é consumidor assíduo de literatura.” 26 A escolha feita ao conduzir a matéria

fez com que abrangesse um tema amplo e indicasse possíveis desenvolvimentos,

em tom de comentário, mas sem aprofundar-se ou realmente desenvolver nenhuma

das possibilidades. É o que se pode definir como um texto raso – opta por apenas

25 (NETTO, Irinêo. Sedução Vampiresca. Gazeta do Povo. Curitiba, 05 set. 2005)26 Idem anterior.

112

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levantar os assuntos no espaço restrito disponível. O box que acompanha a matéria

vem preenchido por curiosidades, como o fato de sete séries de televisão sobre

vampiros já terem sido produzidas ou o significado do termo “drac” em romeno –

uma forma de a matéria, em si, aproximar-se do entretenimento.

Na página 2, o colunista Wilson Martins aproveita espaço semelhante para

versar sobre a crítica. A coluna, ao contrário da capa, pressupõe um leitor culto e

interessado em temas densos como a história da crítica literária: Martins fala sobre

alguns dos principais críticos da história literária do país e desenvolve reflexões

consistentes, como: “Lembremos, ainda, que a opinião crítica não é imposta por nenhum crítico individualmente considerado, mas pelo contraste das diversas

reações que a obra provoca: o autor é a fonte da idéia criadora; o leitor é o mundo

coletivo em que o texto vai atuar” 27. O aprofundamento do conteúdo, contudo, é

cercado por construções textuais elitistas (e passíveis da acusação de pedantismo):

“O ‘triálogo’ se resolve, afinal, num colóquio, num ágape, mas socrático, isto é,

crítico e irônico do que platoniano, isto é, doutrinário e docente”28. A coluna, pela

temática e tratamento dado ao assunto, acaba por aproximar-se do academicismo e

destoa do tom de conversa e textos leves predominante no restante do caderno.

Na mesma página, uma matéria da agência FOLHAPRESS trata do

lançamento de um livro sobre o escritor Mark Twain. O conteúdo não será analisado

por não ter sido produzido na redação do Caderno G, basta a informação de que a

matéria traça um breve perfil do autor, com linguagem que busca aproximar-se da

literária.

A terceira página é percorrida pelo guia de programação cultural da cidade.

A contracapa, por fim, abriga a seção “Lançamentos”, em que fotos de capas de

livros aparecem ao lado de uma sinopse que inclui uma breve contextualização da

obra ou autor.

27 MARTINS, Wilson. Sobre a crítica. Gazeta do Povo, 05 set. 2005.28 Idem anterior. 

113

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Na metade superior da página, o colunista Miguel Sanches Neto aparece em

espaço e diagramação idênticos a Martins, o que dá às colunas a feição do caderno

e potencializa a identificação; por outro lado, iguala os profissionais e “enquadra-os”

no rígido e conservador formato do jornal. Em “Travessia acompanhada”, o colunista

faz a crítica – ou elogio argumentativo, no caso – à obra da poetisa Hilda Hilst. “Esta

antítese marca os últimos poemas, em que Deus deixa de ser presença forte para

ser vacância que preenche. Ela vê o Criador como sede, como carência de algo que

existe justamente por ser um doído esvaziamento” 29. O texto do colunista fornece

impressões sobre a poetisa, trata com profundidade do estilo da escritora einterpreta-a com linguagem cuidada, em flerte com o poético, sem cair no elitismo

restritivo.

As duas colunas de crítica literária, os lançamentos e programação, a

matéria de capa e a de agência completaram o espaço de quatro páginas previsto

para as edições de segunda-feira. Além das sinopses dos livros – que não

configuram uma matéria – apenas um texto jornalístico elaborado por um repórter da

equipe foi veiculado no dia – fato do qual emergem possibilidades não-exclusivas: a

equipe do caderno estar “sub-aproveitada” 30, e certo desprezo editorial pela edição

pós-fim de semana.

Na terça-feira, 20 de setembro, o tema da capa do caderno era, novamente,

a literatura – desta vez a praticada em livros-reportagens por jornalistas conhecidos

nacionalmente. O gancho veio de duas sessões de autógrafo que aconteciam no

mesmo dia – pauta de agenda, portanto –, uma com o repórter do Fantástico,

Maurício Kubrusly, autor de “Me Leva Brasil: A Fantástica Gente de Todos os

Cantos do País”, e outra com o jornalista (e colunista da Gazeta do Povo) Alberto

Dines, autor da biografia “Morte no Paraíso”, sobre Stefan Zweig. O espaço do texto

soma aproximadamente duas colunas inteiras – possível padrão da diagramação,

um terço do espaço na página. A matéria abre com um comentário “engraçado”

29 SANCHES NETO, Miguel. Travessia acompanhada. Gazeta do Povo, Curitiba, 5 set. 2005.30 Opinião mantida pela jornalista Adriane PERIN (2005)

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(imaturo ou curioso, dependendo do humor do leitor) para introduzir o assunto

menos diretamente, em tom de conversa: “Diz a física que dois corpos não podem

ocupar o mesmo espaço simultaneamente, Mas e se for um corpo em dois espaços?

Impossível, mas viria a calhar” 31. Espécie de apelo completamente desvinculado do

conteúdo da matéria, o trecho reflete o desejo de não apresentar apenas a notícia,

mas construir uma relação com o leitor. A referência à lei física é uma brincadeira

com a coincidência de os dois jornalistas escritores estarem em sessões de

autógrafo que começam com uma hora de diferença. O tratamento pitoresco da

proximidade já sugere como a pauta não será conduzida ao longo do texto: o foconão são as obras. A matéria centra-se em dois pilares: a referência aos livros, que

não informa mais do que a proposta do autor, e a carreira jornalística, que sobrepuja

o ponto anterior. Para comprová-lo, considere-se o fato de as declarações colhidas

dos entrevistados referirem-se tão somente à profissão. Kubrusly responde sobre o

privilégio de ser jornalista em meio à crise política, o jornalismo de cultura e

entretenimento ter-se confundido com a vida das celebridades e em que outra

carreira teria interesse. Nenhum dos temas é levado adiante. Dines, por sua vez,

opina sobre o que caracteriza o bom jornalista. Os assuntos, relevantes ou

desinteressantes, limitam-se à superfície do comentário pinçado, sem serem

relacionados entre si. A condução da matéria não tem direção definida e, por isso,

não leva o leitor a lugar algum, nem desenvolve qualquer raciocínio. Resume-se a

apresentar os célebres profissionais da imprensa. Jornalismo de amenidades.

Na página seguinte, a reportagem “Ser ou não ser financiado” faz a

cobertura do Londrix – festival literário de Londrina – com base na primeira mesa de

debates do evento, sobre o papel das políticas públicas na área da literatura. A

reportagem centra-se nos diversos pontos de vista acerca do tema, ou seja, no

debate de idéias. Em pouco mais de meia página (em torno de 3/2 colunas de texto),

são apresentados os argumentos de cinco profissionais ligados à produção literária,

31 NETTO, Irinêo. Jornalistas literatos. Gazeta do Povo, Curitiba, 20 set.2005. 

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com opiniões diversas sobre o papel do governo no financiamento da cultura, e um

box traz a avaliação do evento segundo o organizador e o repórter – que viajou à

convite do Festival. Sem ocupar linhas com comentários ou apelos alheios ao

conteúdo do assunto, a reportagem consegue apresentar argumentações suficientes

para que o leitor possa desenvolver uma reflexão sobre o tema. A abertura da

matéria não fica prejudicada pela objetividade, ao contrário, é uma citação incisiva:

“’Ninguém encosta uma arma na cabeça de outra pessoa e a obriga a viver de

escrever. Por isso, não dá para a gente encostar a arma na cabeça dos outros e

dizer ‘Compra meu livro’’”32

. Questionáveis são o espaço e o destaque dados àsduas pautas acima. A seriedade e o conteúdo reflexivo da segunda não merecem a

capa do caderno, enquanto a primeira o faz sem dizer nada. É a opção pelo

destaque aos personagens celebrizados em detrimento à possibilidade de pensar a

cultura.

Ainda na segunda página, a matéria “Emmy consagra a estreante série Lost ”

apresenta a cobertura da entrega de prêmios da televisão americana. O texto

enumera as categorias e seus vencedores – com pouco informação a mais do que

se pode obter no box ao lado, onde a lista de ganhadores por categoria encontra-se

simplificada. Por exemplo, o trecho: ”Entre as comédias, o seriado criado por Ray

Romano se despediu das telinhas – foi encerrado este ano nos EUA, depois de nove

temporadas; no Brasil, o canal Sony ainda vai apresentar as (sic) dois últimos anos

do seriado – recebendo o prêmio de melhor de sua categoria e consagrando

também Brad Garrett e Doris Roberts como melhores atores coadjuvantes” 33, 

corresponde às seguintes informações contidas no box dos vencedores: “COMÉDIA/

Série – Everybody Loves Raymond/  (…)/ Ator coadjuvante – Bary Garrett

(Everybody Loves Raymond )/ Atriz codjuvante - Doris Roberts (Everybody Loves

Raymond )”34. Ou seja, a matéria traz, basicamente, a leitura do box. Espaço

32 Daniel Pelizzari, citado por GALINDO, Rogério. Ser ou não ser financiado. Gazeta do Povo,

Curitiba, 20 set. 2005.33 FLORES, Rudney. Emmy consagra a estreante série Lost. Gazeta do Povo, Curitiba, 20 set. 2005.34 Idem anterior.

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desperdiçado que seria mais bem aproveitado se, por exemplo, ampliasse a

cobertura da reportagem anterior.

A terceira página é ocupada pelo guia de programação. Na contracapa,

“Belas imagens da revolta” é o título da matéria situada na metade superior.

Agendada pela abertura da “Mostra de Fotos de Krajcberg”, a matéria concentra-se

na forte figura do artista polonês, refugiado no Brasil depois do Holocausto, crítico ao

descaso pelo meio-ambiente e com trabalho artístico reconhecido no exterior. A

abertura do texto é fraca: “Além de artista e ambientalista, Frans Krajcberg é um

amante do Brasil. Aos 84 anos, ainda tem vontade de gritar pelas ruas, mas nãopara ser preso ou rotulado de louco – o artista polonês naturalizado brasileiro

encontrou outras formas de expressar sua revolta” 35. Descontextualizado, o

parágrafo inicia o assunto de forma solta e é seguido pelo serviço da exposição, o

que aumenta a desconexão do texto. A opção pelo foco nas idéias do artista,

entretanto, funciona. As motivações de conscientização da obra são colocadas e

contextualizam a produção. Uma matéria de serviço acrescentada de raciocínio –

não do repórter, do personagem em si.

A página é completada por uma matéria “Da redação”, em que a pauta

agendada pela abertura da exposição “Devaneios” (do artista plástico Omar Carboni)

desenvolve-se no curto espaço dando ênfase às técnicas de criação, e por uma nota

sobre uma mostra coletiva de artistas plásticos. No geral, percebe-se maior 

liberdade de temas em relação à segunda-feira, ainda que a ênfase do dia seja para

as artes visuais. Emerge a questão da prioridade e destaque dados aos assuntos,

que revela preferência por temas menos sérios e mais populares. Estabelece-se,

ainda, a diferença entre tentativas de conquistar o leitor com um primeiro parágrafo

pretensamente sedutor – aqui não se pretende um julgamento de valor, diz-se

“pretensamente” por ser esta a pretensão do texto, realizada satisfatoriamente ou

35 KOPPE, Jennifer. Belas imagens da revolta. Gazeta do Povo, Curitiba, 20 set. 2005.

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não – mas desvinculado do cerne do assunto e, do outro lado, a abertura que vai

direto ao ponto de interesse.

A edição de quarta-feira, 5 de outubro, não traz na capa anúncios

publicitários, o que proporciona maior espaço para a matéria e reflete-se, no caso,

em qualidade de cobertura informativa. A pauta, de agenda, é o lançamento do CD

“Hoje”, da banda Paralamas do Sucesso. Três gêneros jornalistas são usados para

tornar mais completa a cobertura: a matéria principal, acompanhada por box de

resenha crítica e uma entrevista correlata 36. Na primeira, relata-se o momento atual

da banda e o processo de composição e produção do mais recente álbum. Oparágrafo de abertura contextualiza e comenta sobre a fase da banda: “Hoje é a

confirmação de que tudo voltou à normalidade na carreira do Paralamas do

Sucesso. O novo disco da consagrada banda brasileira, que está sendo lançado

este mês pela EMI, é o segundo de inéditas após o grave acidente sofrido em 2001

por Herbert Vianna. (...) Hoje apresenta todos os elementos tradicionais dos

Paralamas: o bom rock aliado a muitas pitadas do reggae e suas vertentes 37”. Nota-

se a combinação entre informações e comentários ao longo do texto – sinal da

subjetividade permitida no jornalismo cultural. As informações são passadas por 

citações de Barone, guitarrista da banda, que descreve e comenta o fazer do disco.

O espaço de aproximadamente uma coluna é suficiente para situar o leitor no

contexto de produção. O box com opinião é sucinto e pouco argumentativo – nem há

espaço físico para que desenvolva-se opiniões aprofundadas sobre o CD:

“Não há grandes novidades musicais em Hoje em relação a tudo o que Hebert, Bi e Barone já fizeram na carreira. Estão lá as músicas mais vibrantes, recheadas de teclado (a cargo deJoão Fera, o ‘quarto’ Paralama) e metais, como ‘2A', ‘Na Pista’, ‘Soledad Cidadão’ e ‘AoAcaso’, que dominam a primeira metade do registro de 13 faixas; e o rock vigoroso decanções como ‘Pétalas’, ‘Passo Lento’, ‘Fora do Lugar’, ‘220 Desencapado’ (ótima) e ‘Pontode Vista’. É um trabalho enxuto e conciso (o disco tem pouco mais de 40 minutos), que nãoimpressiona muito à primeira audição, mas vai se tornando cada vez mais redondo aos

36 Optou-se por classificar o conjunto matéria mais box crítico como “resenha”, por possuir 

informações e abordagem equivalentes: a introdução sobre o assunto, informações e comentários e avaliaçãonão-aprofundada.37 FLORES, Rudney. No Tempo de Hoje. Gazeta do Povo, Curitiba, 05 out. 2005.

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ouvidos. Marca da tradicional competência dos três principais nomes do rock nacional. (RF)

GGG” 38. 

O parágrafo acima constitui o conteúdo total do box. No espaço restrito,tentou-se abarcar todo o disco, distinguindo tipos de música e comentando entre

parênteses com elogios sobre determinada música que em nenhum momento são

  justificados. Aliás, a opinião é prioritariamente baseada em adjetivação: “vigoroso”,

“vibrante”, “ótima”, entre outros.

Ao pé da página, uma entrevista com o líder do grupo, Herbert Vianna

relaciona o momento da carreira (o novo álbum) com a recuperação pós-acidente do

vocalista. Somado à matéria principal, constitui um relato mais encorpado em termos

de informação. O ponto fraco da página acaba mesmo por conta da carga opinativa,

reduzida e sem desenvolvimento. Nota-se, mais uma vez, a opção por uma

fotografia grande, ao invés da liberação de espaço para a realização conjunta de

informação e opinião. Ao fim, apenas a primeira opção foi alcançada.

A página dois traz como principal texto “O grande negócio do rock-and-roll”,

resenha do novo disco dos Rolling Stones. Aqui, o espaço quadruplica-se em

relação ao box da primeira página, mas o conteúdo opinativo-argumentativo em

relação ao álbum pouco cresce. Metade das linhas serve para contextualização

(atual) da banda, como a idade avançada dos integrantes e o posicionamento

político recente. É difícil precisar a distinção entre comentário e opinião, já que o

texto permanece entre os dois, por vezes. O penúltimo dos seis parágrafos versa

sobre o CD em si: “espontaneidade do registro”, desempenho dos quatro músicos

destacado dos outros instrumentistas e diversidade de estilos – tudo em frases

breves. É a preferência editorial pelo “mito” de uma grande banda ao invés do seu

trabalho, como deixa clara a abertura do texto: “Nada de novo no front, mas quem se

preocupa com isso? Com um disco de inéditas na praça, e o mesmo som de

sempre, os Rolling Stones voltam aos holofotes prontos para recolher mais alguns

38 Classificação de um a cinco Gs, referentes à Fraco, Regular, Bom, Muito Bom e Excelente. 

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milhares de dólares de seus fãs devotados”39. A decisão de deixar o foco sobre a

banda justifica-se pela mitificação histórica dos Rolling Stones – o que não implica

necessariamente que a abordagem sobre a banda não possa trazer opiniões e

críticas consistentes. Não traz. Prefere-se o comentário irônico que não se posiciona

a favor ou contra com clareza.

Ao lado, o editor do caderno assina a resenha sobre o novo trabalho da

cantora Aimee Mann. Como nos textos opinativos anteriores, não ficam claros os

motivos ou fundamentos para a avaliação dada – ao fim de cada resenha a

quantidade de Gs (de um a cinco) classifica o trabalho – , no caso “GGG1/2”. Aresenha elogia o trabalho de Mann, mas não explicita o que faltou para o álbum

alcançar uma classificação maior, por exemplo. A contextualização impera sobre a

crítica, o que pode ser justificável por tratar-se de uma artista “à margem do

mainstream” 40, ou seja, menos conhecida do público do jornal.

Feitas as referências, pouco espaço sobrou para a crítica. Resume-se ao

trecho: “O disco reúne a maior parte das características dos trabalhos anteriores de

Aimee: canções classudas, letras elaboradas e vocais sempre bem colocados. A

diferença básica em relação ao seu registro anterior, o festejado Lost in Space

(2002), é que o antes tímido flerte com sonoridades mais roqueiras está mais

consolidado e marcante. Vale a pena conferir. GGG ½” 41. Há, clara, a tentativa de

avaliá-lo. Mas, o que são “canções classudas”? O que determina que as letras sejam

“elaboradas”? E “vocais bem colocados” significa o quê? Nikola Matevski é contra a

adjetivação imprecisa como forma de justificar opiniões em uma resenha:

“No meu texto de cinema você nunca vai ler que o Tom Hanks é um grande ator porque umgrande ator para mim é um ator obeso. Um grande ator não quer dizer nada na verdade. Seeu quero avaliar a interpretação de alguém, eu tento ser específico e mostrar como certodiretor usa o ator, como ele funciona dentro da estrutura do filme e realmente conseguir dar um parâmetro palpável, que possa ser verificado durante a fruição do filme por outra

39 GODOY, Omar. O grande negócio do rock-and-roll. Gazeta do Povo, Curitiba, 05 out 2005.40

CAMARGO, Paulo. Aimee Mann canta a saga de um pugilista. Gazeta do Povo. Curitiba, 05 out.2005.41 Idem anterior.

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pessoa, para ela poder contestar a minha opinião ou não. (...) “Um grande ator”, “Uma bela

interpretação”, aquela coisa de caixinha de locadora, “Um filme brilhante”, ou você dizer queum filme é mediano, razoável ou que se comunica bem com o público... Tem váriasexpressões que se transformaram em um clichê e os jornalistas nas resenhas opinam mas

na verdade não argumentam nada” (MATEVSKI, 2005).

A opinião aplica-se à grande parte das resenhas do Caderno G, em que a

adjetivação constitui críticas vazias. Impressão evidenciada frente ao trecho de

opinião sobre o álbum às linhas escritas na coluna Lançamentos, publicada na

mesma página: “... Have a Nice Day , nono disco do outrora cabeludo quarteto de

Nova-Jersey [Bom Jovi], é mais do mesmo: ‘I Want to Be Loved’ e a faixa-título são

perfeitas faixas levanta-povão, escritas sob medida para realimentar o culto em torno

do grupo. Bom para quem gosta” 42. Comparativamente, não há muito mais conteúdo

crítico na resenha, apesar de esta ser ao menos cinco vezes menor. Uma nota de

agenda fecha o espaço da página. A terceira está ocupada pelo guia de

programação.

A contracapa, além de notas e publicidade, traz uma matéria sobre o

fechamento do Espaço Cultural 92 graus, o qual apresenta como “... referência na

cena independente local, promovendo shows de bandas curitibanas, nacionais e

estrangeiras (...) muitas das quais tiveram uma parcela importante na construção do

cenário underground brasileiro e que representavam o mesmo movimento em outros

países” 43. Os nomes das bandas vêm enfileirados em um box, sem que nenhuma

história seja contada para aproximar o leitor do universo underground de que trata a

matéria. A contextualização é falha: “É comum ouvir histórias de bandas que fizeramsua primeira apresentação no Ninety Two Degrees – hoje chamado de Espaço

Cultural 92 Graus – ou de gente que, ao assistir a um dos shows realizados no

porão suado de JR, teve a iniciativa de montar ser próprio grupo” 44. A matéria não

consulta nenhuma dessas fontes. O único ouvido é o dono do local, que fala das

dificuldades enfrentadas que levaram ao fechamento da casa. A repercussão e as

42 CAMARGO, Paulo. Have a Nice Day. Gazeta do Povo, Curitiba, 5 out. 2005.43 GIRARDI, Juliana. Era uma vez um porão. Gazeta do Povo, Curitiba, 5 out. 2005.  

44 Idem anterior.

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conseqüências do fato na cena musical curitibana – o que justificaria o tema ser 

pautado – são ignoradas pelo texto. A matéria, assim, soa publicitária, mais ainda ao

terminar o texto com um apelo do proprietário para que a casa seja freqüentada nos

últimos dias de funcionamento. Desabafo acompanhado de superficialidade ao

explicar a relevância cultural do espaço – e mais nada – comprometem a pauta e a

compreensão do leitor sobre os significados envolvidos no fato. A cena

independente ganha caracteres no Caderno G, mas é tratada sem reflexão.

A edição inteira dedicada à música coincide, além do tema, na abordagem

rasa e não-explicativa da qualidade dos produtos culturais e das implicâncias dosacontecimentos. Os textos não parecem ter sido escritos para o leitor, pois ou não o

situam devidamente ou não permitem que ele compreenda parte dos significados

construídos na mensagem.

A edição do dia 15 de setembro, quinta-feira, traz na reportagem de capa a

decisão da Fundação Cultural de Curitiba de cobrar legalmente as prestações de

contas atrasadas dos projetos culturais incentivados pela lei municipal. A visão do

presidente da FCC é contraposta às explicações de três produtores beneficiados

pelo incentivo. A reportagem não discute a fundo os motivos que levam 95 projetos a

estarem irregulares, mas ouve três fontes entre os inadimplentes.

A explicação fica incompleta. Fala-se que o problema é o curto prazo para

realização do projeto, (“Pela lei o responsável pela idéia tem dois anos para arranjar 

o dinheiro a partir do momento em que sua proposta foi aprovada pela comissão

municipal. Depois disso, precisa realizar o projeto e, em 30 dias, levar à FCC os

documentos que comprovam o bom uso do dinheiro” 45), mas não fica claro o tempo

total: se dois anos e trinta dias, dois anos redondos ou dois anos e trinta dias mais o

tempo de realização, por exemplo.

Os entraves para produção no período são levantados, mas inconclusivos:

dificuldade de captação – sem explicações sobre quais, como ou por quê – e

45 GALINDO, Rogério. Projetos na mira da justiça. Gazeta do Povo, Curitiba, 15 set. 2005.

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contratempos como demora a conseguir reunir o elenco – sem esclarecimentos a

respeito de que, por vezes, a demora na aprovação do projeto faz que ele perca a

atualidade orçamentária e outras situações ocorram de modo a, em alguns casos,

não ser possível cumprir o planejado por falta de elenco, local, etc. Em resumo, a

reportagem permanece em território raso e não desenvolve as relações das

questões que apresenta. O box explica, de forma concisa, o processo de

financiamento cultural, mas não resolve as dúvidas e silêncios do texto da

reportagem.

As resenhas dos lançamentos em DVD de Lavoura Arcaica e Clube dos

Cinco ocupam juntas quase uma página inteira, onde duas notas e a coluna de

lançamentos de DVDs são os outros elementos presentes. É um espaço mais que

considerável para produtos que já estiveram em cartaz no cinema e, se relevantes (o

que se espera deles, já que pautados para a edição analisada), receberam cobertura

 jornalística na época. Jornalismo pautado pela indústria de produtos culturais para

consumo.

“Ao lado direito do pai” concentra-se sobre o filme Lavoura Arcaica 46 , situa-o

entre as adaptações literárias convertidas em película e discorre sobre a trama e as

qualidades do filme em si. Elogios imprecisos enfileiram-se: “patriarca vivido

brilhantemente por Raul Cortez”, “o ótimo Leonardo Medeiros”, “Simone Spoladore,

em marcante atuação”. Opiniões colocadas com mais clareza de conceitos também

surgem: “A belíssima fotografia de Water Carvalho, que consegue imprimir ao filme

tons de claro e escuro, torturantes e introspectivos” ou o confuso trecho “Outro ponto

alto é a trilha sonora de Marco Antônio Guimarães, que jamais [sic] confere à trama,

que facilmente poderia descambar, devido à temática, para o melodrama excessivo,

uma dramaticidade contida, latente”. Sem o termo “jamais” 47, a frase faria sentido

46

CAMARGO, Paulo. Ao lado direito do pai. Gazeta do Povo, Curitiba, 15 set. 2005.47 Não é raro encontrar nas matérias resíduos da edição, ou seja, palavras, artigos ou termos deligação que, depois da mudança de uma frase, são esquecidos e constituem erro.

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como uma avaliação explicativa dos motivos, do mesmo modo que a anterior, já que

as duas explicitam as sensações que levaram o jornalista à adjetivação.

No último parágrafo, “... tudo isso faz de Lavoura Arcaica uma obra-prima do

cinema brasileiro recente, única nos mais diversos aspectos.... “ é a mostra da falta

de amarras do texto. Em quais diversos aspectos? E o que a faz única entre outros?

Editorialmente, parece que não há preocupação em o leitor ter tais respostas.

“Cinco maneiras de adolescer” é uma pauta mais questionável: trata-se do

lançamento em DVD de um filme de 1985, Clube dos Cinco, repetido à exaustão nas

sessões da tarde da rede Globo. O resgate é determinado pela nova “embalagem”que o produto cultural recebe, aspecto comercial acima de outros (já que em VHS o

filme existe há décadas). Novidades o novo produto não trouxe, ou se o fez não

pareceu interessante para a repórter. O texto relembra o enredo e o diz atemporal.

A contracapa é aberta por matéria sobre suspeita de corrupção na secretaria

de cultura de Cascavel. O texto é assinado por Miguel Portela, que não integra a

equipe de jornalistas do Caderno G, portanto, foge do objeto de análise. A matéria

assinada da página é sobre música erudita. O texto curto concentra-se nas obras

que fariam parte do programa do espetáculo – uma alternativa para tratar músicos

pouco conhecidos e um assunto considerado elitista. Se falta espaço para

desenvolver raciocínios ou situar melhor o leitor nesse universo musical, informar 

sobre as obras tocadas – geralmente de nomes mais conhecidos, como Bach – foi

uma saída satisfatória para o entendimento do leitor.

As seis páginas de sexta-feira, 30 de setembro de 2005 trazem apenas

quatro matérias assinadas por repórteres do Caderno G. Muito do espaço é ocupado

por propaganda, a coluna Bom Gourmet e notas. A capa do caderno é dedicada à

estréia de cinema mais visada da semana, o filme “A Feiticeira”, protagonizado por 

Nicole Kidman. O filme é criticado na resenha por ser uma refilmagem que não está

à altura do original, porém, mesmo “insosso” 48, ganha o espaço mais nobre do

48 FLORES, Rudney. Sem a Magia do Original. Gazeta do Povo, Curitiba, 30 set 2005.

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caderno. Sexta-feira é o dia das estréias de cinema na cidade e, sem um título

comercial de mais qualidade, optou-se pelo que trazia uma estrela hollywoodiana no

elenco e resgatava uma série de tevê clássica. O vínculo do jornalismo cultural com

os produtos da indústria prevalece sobre a (falta de) relevância deles, aceita-se o

que é estabelecido pelos produtores como “notícia” e reproduz-se.

Ao menos, a resenha busca alguma reflexão sobre o filme em seu contexto

de produção cultural: “Mas a eterna crise de criatividade de Hollywood faz os

produtores apelarem constantemente ao resgate dessas obras passadas. Se o

reaproveitamento de idéias é inevitável, esse tipo de projeto teria sempre que ficar nas mãos de alguém com um mínimo de personalidade no trabalho, que tentará de

todas as formas fazer algo original...” 49. Com o espaço de página inteira, contexto e

crítica podem desenvolver-se mais do que nas outras resenhas analisadas – apesar 

de ainda muito longe do que se chama “crítica” como gênero jornalístico.

A segunda página traz, de propaganda, apenas a coluna (institucional) do

Clube do Assinante, entretanto, nem um dos textos que ocupam as linhas é

assinado pela redação do caderno G. O primeiro é uma reportagem de agência

sobre a morte da violeira brasileira Helena Meirelles. O editor justifica o uso de

agência de notícias em casos semelhantes:

“Matéria de agência é pela relevância. Os grandes jornais nacionais recebem tudo antes.Muitas vezes a gente prefere dar material de agência para dar com maior rapidez. Otrabalho que é feito por eles é mais ágil e melhor do que o que a gente faria à distância, até

porque seria derivativo. Da mesma forma que o nosso é melhor à respeito de coisas queestão acontecendo aqui” (CAMARGO, 2005).

A outra matéria da página foi assinada como “Da redação”. Trata-se de uma

matéria de agenda curta sobre o show da banda Nenhum de Nós. A terceira página

traz o guia da programação.

A coluna Bom Gourmet ocupa página inteira colorida. A coluna do enólogo

Luiz Groff comenta safras e tipos de vinho: “O Pedrosa Gran Reserva 99, também49 Idem nota 25.

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com 10% de Cabernet, 24 meses na barrica, é um vinho potente, opulento, com

taninos maravilhosos com muito desenvolvimento pela frente” 50. Tema elitista e

linguagem para iniciados no assunto. De resto, a página traz notas e matérias

assinadas pela jornalista Marian Guimarães, uma das fundadoras do Caderno G. Os

textos apresentam restaurantes, chefes de cozinha e outros assuntos semelhantes.

O espaço parece release de restaurantes. Em “Tacada de Mestre” 51, por exemplo,

passa-se o texto a elogiar a chefe de cozinha do restaurante Le Bourbon: “A

chegada da chefe coloca o restaurante Le Bourbon no centro das atenções. Não é

para menos. A clientela já começa a se deliciar com o estilo elegante e, ao mesmotempo, ousado de suas elaborações. E o bom preço é outro atrativo”. O cardápio do

local aparece discriminado a seguir. As matérias elogiosas de fonte única publicadas

na coluna pouco têm de jornalísticas.

A quinta página é dedicada ao teatro. A primeira matéria é a estréia de “Café

Andaluz”. O parágrafo inicial descreve um trecho da peça, bem escolhido pelo

repórter por, em contraposição de dois discursos, criar curiosidade no leitor: “Um

classificado é lido no rádio. Um jovem quer trocar uma aliança de ouro com a

inscrição ‘Luz da minha vida’ por uma arma de fogo de qualquer calibre. (...) Uma

moça troca um vestido de baile, usado em uma única noite, por um disco da cantora

Ella Fitzgerald. Diz o motivo: se ela gosta de sofrer, o problema é dela” 52. O repórter 

provoca o leitor a interessar-se pelo texto e pela peça, mas não se limita à

descrição. Segue com a contextualização do autor, levanta as características dele

como dramaturgo, ouve do diretor do espetáculo quais dificuldades havia na

montagem do texto – ou seja, não faltam as informações essenciais ao leitor.

Abaixo, a resenha da montagem “Rita Formiga”, em cartaz com Guta

Stresser no papel principal. O texto opinativo comenta o desenvolvimento da trama,

analisa o conteúdo do texto e avalia o desempenho da atriz, o que permite uma

50

GROFF, Luiz. Bodegas Perez Pascuas. Gazeta do Povo, Curitiba, 30 set. 2005.51 GUIMARÃES, Marian. Tacada de Mestre. Gazeta do Povo, Curitiba, 30 set. 2005.52 GALINDO, Rogério. De partida do lugar-comum. Gazeta do Povo, Curitiba, 30 set. 2005. 

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impressão geral do leitor sobre a peça. A resenha não se desdobra sobre aspectos

como direção, iluminação ou figurino, que compõem uma montagem. Nem mesmo é

citado o ator que divide a cena com Stresser, Cláudio Tizo. A crítica, mais uma vez,

não se aprofunda, parece olhar o espetáculo com olhos leigos. E recorre à

adjetivação: “O melhor da peça é certamente a própria Guta Stresser, carismática

como sempre e esbanjando talento”. Neste caso, entretanto, ao menos os três Gs da

avaliação entre um e cinco foram justificados com indicações de qualidades (a

interpretação da atriz) e falhas (perda de impacto do texto dos anos 1960) na obra.

A contracapa dá conta do lançamento dos CDs produzidos no projetoGrande Garagem que Grava, uma alternativa para bandas locais selecionadas

gravarem seu registro artístico. O projeto é explicado e contextualizado, sob o ponto

de vista único dos organizadores. A apuração é falha, já que nenhum dos artistas

que compõem os 16 CDs lançados foi entrevistado. O motivo talvez seja

compreendido ao ler-se o seguinte trecho da matéria: “Mas o impulso na divulgação

de artistas independentes não é, necessariamente, a principal marca deixada pelo

projeto. (...) Afinal, muitos dos nomes contemplados talvez nunca cheguem a gravar 

um CD nos moldes tradicionais. Outros sequer estarão na ativa em 2006” 53.

Percebe-se uma opinião pré-formada, por parte do repórter, a respeito dos artistas

independentes em geral, que por julgar efêmero o trabalho dos músicos, não lhes dá

voz.

O Curitiba Rock Festival ocupou a primeira página de sábado no dia 24 de

setembro de 2005. O evento com atrações internacionais foi apresentado com

referências às principais bandas que se apresentaram nos anos anteriores,

contextualizou-se com a mudança de local que precedeu o show. A abordagem

priorizou as conseqüências para o público, enquanto a investigação do porquê foi

preterida – preferência por condução centrada nas bandas a se apresentarem, como

matéria de agenda do show, as possibilidades investigativas sobre o que causou a

53 GODOY, Omar. Trincheira independente. Gazeta do Povo, Curitiba, 30 set. 2005.

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baixa venda de ingressos (em comparação ao ano anterior) e a diminuição do

festival.

O Weezer é mostrado como a banda mais aguardada do festival: cita-se o

nome do último álbum, o adjetivo “nerd” é relacionado ao vocalista e segue uma

declaração deste sobre o que prepara para o show. Informações insuficientes para

quem desconhece a banda – famosa entre os “alternativos”, mas menos conhecida

do público médio –, não faz referência a nenhuma música específica, por exemplo,

ou ao estilo da banda em si, apenas classifica-os no generalizante “indie” rock.

Entre as nacionais, as sete bandas enfileiraram-se em definições que acaracterizavam rapidamente: “... a pernambucana Rádio de Outono, com seu pop

sessentista de vocais melosos e elementos eletrônicos” ou “o quarteto paulista da

Biônica esbanja atitude roqueira, figurinos modernosos e letras engraçadinhas

exalando referências de MC5 e Stooges. 54” O espaço de página inteira ocupado pela

metade por fotos e a opção por mostrar todas as bandas faz com que nada ganhe

destaque e aprofundamento. Escolhe-se a cobertura genérica e ligeira.

Na segunda página é a inauguração de um espaço cultural que agenda a

pauta. Trata-se de uma matéria simples e pontual, que descreve a programação do

lugar e dá voz à proprietária para explicar suas pretensões. A matéria, entretanto,

recebeu espaço e destaque como a principal da página. Não há, no texto,

referências ao trabalho da proprietária ou à relevância especial da programação que

 justifiquem tantas linhas sobre o lugar. Falta de programação na cidade não seria

 justificativa, visto que, além do Curitiba Rock Festival, havia outro evento de rock – o

Tinidos, não pautado –, peças de teatro em cartaz e a presença na cidade dos

escritores Nélida Piñon, Lygia Fagundes Telles, Moacyr Scliar e Carlos Heitor Cony

 – que mereceu apenas uma nota.

Na mesma página, a outra matéria assinada não foi produzida pela equipe

do Caderno G. É a cobertura do show da dupla Zezé de Camargo e Luciano no

54 GIRARDI, Juliana. Pancadas de chuva e rock. Gazeta do Povo, Curitiba, 24 set. 2005. 

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Guaíra. A pauta contraria as declarações de Rudney Flores: “A gente faz um

caderno de cultura, não que seja elitista, mas essas coisas populares já têm espaço

demais. A gente acabou dando até Daniel, Zezé de Camargo e Luciano, mas até por 

conta do filme, você dá o show, mas pega o gancho do filme” (FLORES, 2005). No

caso, a matéria não faz referência qualquer ao filme ou outro contexto, muito menos

é a crítica do show. O que o texto faz é descrever a apresentação, com enfoque

equivalente ao das revistas de celebridades:

“As meninas dançavam, fotografavam tudo e gritavam muito: ‘lindo’, ‘gostoso’ e ‘tesão’

foram alguns dos adjetivos utilizados por elas. O momento de delírio foi quando a duplachamou uma fã no palco para que os dois cantassem, ao pé do ouvido, a clássica ‘Como vaivocê?”. (...) Em vários momentos, inclusive, a dupla brincava com a platéia e conversavacomo velhos amigos. Ou, como eles mesmos disseram, todos que estavam ali passavam afazer parte do grande álbum de família dos Camargo” 55.

O título “O Guairão aos pés da dupla Zezé e Luciano” completa o tom da

cobertura, cujo tema, enfoque e abordagem são gritantemente diversos do proposto

por um caderno de cultura sério como se pretende o G. Para ilustrar melhor o

afirmado, cita-se o olho da matéria: “Até Wanessa Camargo compareceu ao show

do pai e do tio”. Uma resenha crítica do show seria justificável. Uma reportagem

sobre reações de fãs em shows da dupla sertaneja poderia trazer informações e

reflexões. Optou-se pelo texto de revistas sobre artistas – não arte ou cultura.

A quarta página é aberta pela matéria sobre a preparação do Festival de

Cinema, Vídeo e DCine de Curitiba, com base nas propostas dos novos

organizadores do evento para divulgação e conquista de público. A matéria cumpre

o papel de dizer o que se prepara para atrair novos públicos, mas ao não retomar os

problemas do evento do ano anterior, a necessidade de mudanças fica menos clara.

Completam a página notas e uma matéria assinada por “Carlos Augusto Brandão,

Especial para o Caderno G”, que faz a cobertura do Festival de Cinema de Nova

Iorque.

55 FREITAS, Cristiano Luiz. Guairão aos pés da dupla Zezé e Luciano. Gazeta do Povo, Curitiba, 24set. 2005. 

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A última edição analisada é a de domingo, 11 de setembro, com oito

páginas. O tema de capa é a polêmica em torno das mudanças nas regras do Salão

Paranaense. Um anúncio publicitário de mais de meia página restringe o espaço da

matéria – ocupado pela metade por uma foto e mais uma quarto para o título. Resta

um cantinho de texto onde o tema é apenas apresentado, com a orientação, abaixo,

de que mais sobre o assunto pode ser lido no interior do caderno.

A segunda página traz a coluna de Domingos Pellegrini56, uma crônica da

atualidade que compara um outro tempo passado, para ressaltar as diferenças. Um

texto leve: “Antes, as sandálias eram franciscanas, agora são havaianas”57

.Mais de duas semanas antes da edição de sábado analisada acima, esta

edição de domingo trazia na segunda página a escalação de bandas nacionais que

participariam do Curitiba Rock Festival. A matéria em si ocupa menos de meia

coluna – introduz o assunto, relaciona as bandas locais e cita a organizadora do

evento explicando o critério de seleção dos grupos. As outras quatro colunas

formam um box maior que a matéria, em que destaques escolhidos pela repórter 

aparecem com fotografia, informações sobre o perfil, referências e indicação de

onde ouvir as bandas participantes na web. O resultado é uma matéria

esquematizada que contempla alguns dos participantes do evento.

A página três é a continuação da matéria de capa sobre o Salão

Paranaense. A reportagem contrapõe quatro opiniões diversas sobre as mudanças

nas regras para realização do evento, provenientes de diferentes profissionais

ligados ao tema: artista, professor universitário, crítica de arte e diretor do Museu de

Arte Contemporânea. Uma matéria correta tanto na apuração quanto na tentativa de

tratamento imparcial do tema, como se nota na abertura: “O assunto é polêmico.

Mas ninguém quer fazer um julgamento definitivo. Afinal de contas, o 61° Salão

56 Divide o espaço com Roberto Gomes, cada um escreve a cada duas semanas. Ver 7. 57 PELLEGRINI, Domingos. Gazeta do Povo, Curitiba, 11 set. 2005.

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Paranaense está para acontecer e as principais mudanças não foram colocadas em

prática” 58. Fora da agenda, uma matéria que pode levar o leitor à reflexão.

“O folhetim levado a sério” é a matéria que ocupa a quarta página da edição.

O tema abordado é, em si, reflexivo: um livro sobre as relações entre novelas e a

sociedade brasileira. A matéria levanta alguns dos pontos de discussão do livro,

deixando o desenvolvimento de tais para a posterior leitura da obra. Declarações da

autora, Esther Hamburguer, complementam o texto. Seria interessante a

apresentação de alguma das conclusões a que a autora chega com o livro, de forma

a aproximar o leitor da obra em si, mas prefere-se adotar referências a pontos deabordagem do trabalho. As exemplificações com novelas aparecem, breves. Se o

livro faz alguma crítica à televisão ou defende-a, não se sabe pela matéria.

Uma entrevista de página inteira aparece na folha seguinte. O interpelado é

Millôr Fernandes, humorista mais respeitado do país. A entrevista é criativa, põe de

lado questões objetivas sobre carreira e vida para apostar em perguntas subjetivas e

metafóricas. Millôr responde provocativo, entre ironias e escrachos. O resultado, por 

conseqüência, é também subjetivo. Poucas informações estão aparentemente à

disposição do leitor, mas a personalidade do entrevistado constrói-se no conjunto de

resposta. Saem, inclusive, o que se poderia chamar “pérolas”, como a resposta para

a pergunta “O senhor tem medo da morte?” 59: “Morte? Qué qué isso? Enquanto

vivemos a vida é eterna”. O espaço dominical para entrevistas com artistas,

  jornalistas e estudiosos do comportamento (entre outros possíveis entrevistados) é

uma novidade editorial do Caderno G, que trouxe ao caderno temas e conteúdos

interessantes e com potencial reflexivo crescente.

A página seis não traz matérias assinadas pela equipe do Caderno G.

Publicidade, notas e uma coluna produzida por agência noticiosa preenchem o

espaço. A coluna, de Bia Abramo, faz crítica à novela A Lua Me Disse pelo

58

KOPPE, Jennifer. Em tom de controvérsia. Gazeta do Povo, Curitiba, 11 set. 2005.59 NETTO, Irinêo. Nada como o presente. Gazeta do Povo, Curitiba, 11 set. 2005. Com a colaboraçãode Alberto Benett. 

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tratamento dado a uma personagem indígena. O guia de programação ocupa a

página seguinte.

Na contracapa, uma reportagem sobre teatro comprova a abertura maior do

domingo para temas frios ou “especiais”. “Na escola da sementinha” aborda, em tom

de curiosidade e de inusitado, os rituais e preparativos realizados por atores e

diretores curitibanos antes do início de uma apresentação. O texto é leve e mais

coloquial, vide a abertura: “Entender o que uma outra pessoa pensa é difícil, certo?

Imagine tentar compreender o que se passa dentro de uma semente de árvore. Pois

esse é um dos exercícios clássicos para quem está começando a fazer aulas deteatro. O sujeito chega para o curso e recebe a seguinte instrução: ’Seja uma

sementinha, brote lentamente, pense que você vai desenvolver seu tronco, depois

os galhos, etc’.” 60. A reportagem entrevista quatro artistas com hábitos pré-palco

diferentes. O resultado é divertido – valor que se sobressai no caderno de domingo.

6.1.2.1 Conclusões da análise qualitativa

O jornalismo praticado no Caderno G não foge à regra de submissão ao

interesse financeiro e às limitações impostas pelas empresas em busca do corte de

custos e aumento de vendas de inserções publicitárias e exemplares do jornal. O

primeiro e mais claro sinal disso é a redução de número de páginas e espaço de

texto em cada uma delas. A última reforma gráfica, segundo CAMARGO (2005),

diminuiu em 15% os textos do Caderno G. Embora o editor afirme ter sido uma

melhoria e que “tamanho nem sempre é documento” no jornalismo, a restrição do

espaço de construção do texto reflete-se no conteúdo publicado e mostrou-se

empecilho ao desenvolvimento da reflexão e do aprofundamento da matéria nos

exemplos analisados no item anterior deste capítulo. A matéria em poucas colunas,

dividindo espaço com a imagem ampliada e anúncios publicitários, pouco tem

60 GALINDO, Rogério. Na escola da sementinha. Gazeta do Povo, Curitiba, 11 set. 2005.

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condições de desenvolver-se. Somado a isso, quando a abordagem editorial busca,

em um mesmo texto, seduzir, contextualizar, informar e opinar, o resultado é um

passeio por enfoques que não se aprofundam, não comportam reflexão e não

chegam a lugar algum. Introduções dispersivas contribuem negativamente para o

processo, “enfeitando” o texto, mas roubando-lhe espaço argumentativo, reflexivo,

informativo ou útil. Por vezes, a necessidade de conquistar o leitor confunde-se com

eliminar a seriedade e a reflexão – conceito tão em falta quanto repetido neste

trabalho – e produzir matérias “leves”.

As restrições impostas pela empresa afetam a qualidade do produto jornalístico em mais duas frentes principais: o tempo e a formação. O banco de

horas realmente dificulta o trabalho do repórter, pressionado a não extrapolar o

tempo de trabalho em uma profissão – apesar de aproximada da linha de produção

industrial nas últimas décadas – em que imprevistos acontecem e em que não se

pode garantir uma boa reportagem caso os entrevistados não atendam o jornalista a

tempo, por exemplo, ou se pouco tempo restar para a elaboração do texto, quiçá

para a reflexão sobre o material apurado. Além disso, sair à rua para entrevistas

pessoalmente ou reportagens investigativas ou especiais torna-se raro – o tempo

não está disponível – e as coberturas ficam cada vez mais burocráticas, ao estilo

“repartição pública”.

Embora não quantificada nas análises anteriores, as leituras e a análise

qualitativa tornaram evidente outra característica não levantada anteriormente: a

limitação das fontes consultadas. Verificaram-se no decorrer da análise matérias

cujo único entrevistado era o produtor cultural, ainda que mais artistas e público

fossem necessários para uma cobertura menos simplista do assunto. São

abundantes as matérias que recorrem apenas ao produtor do serviço, seja ele o

diretor de uma peça de teatro, o artista plástico que realiza uma exposição ou o

cantor que fará o show. Tal abordagem aproxima o jornalismo cultural da divulgação

institucional dos acontecimentos culturais.

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Não sair da redação implica ainda menos tempo para olhar a cidade e

“enxergar” as pautas, o que causa as distorções, as pautas passam a ser limitadas

às sugestões da assessoria de imprensa e às percepções do grupo de jornalistas

que produz o jornal, mas não convive com, ou observa, diversos grupos sociais

distantes do seu. A questão financeira, por fim, influi na continuidade da formação do

repórter que, com baixos salários, têm dificuldade para fazer cursos e

especializações. E, como o próprio editor do caderno afirmou, são os salários a

  justificativa para a contratação de recém-formados, visto que profissionais

experientes não costumam aceitar as condições do contrato.Entre argumentos que transferem para a política da empresa a

responsabilidade pela assumida queda de qualidade do jornalismo, no entanto, cabe

notar o desperdício de espaço com pautas que podem ser consideradas fracas, ou

seja, sem relevância cultural ou vínculo essencial com as manifestações culturais

que emergem na cidade, e edições com pouca participação dos repórteres, além de

linhas gastas em ponderações sem opinião nem informação – que sugerem a

ocorrência de um sub-aproveitamento da equipe, como afirmado por Adriane Perin,

e de equívocos na distribuição e aproveitamento do espaço editorial.

Listados os principais entraves que a empresa impõe ao jornalismo de

cultura no Caderno G, volta-se agora ao conteúdo publicado. A crítica desapareceu

por completo das páginas do caderno. Junto a ela, reflexão e aprofundamento

tornaram-se qualidades pouco freqüentes nos textos. A maioria dos textos

publicados são matérias baseadas em poucas fontes, geralmente o diretor da peça,

o artista plástica que fez as obras ou o músico principal do espetáculo, o que reforça

o foco no produto dissociado de relações culturais externas. Reportagens de maior 

fôlego ou tratam da política cultural – com a contraposição de opiniões – ou ocupam

as páginas do fim de semana, mais abundantes. Em geral, contrapõem opiniões e

consultam mais fontes. Reportagens polêmicas ou investigativas não são comuns no

caderno.

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A agenda cultural pauta matérias que apenas dão conta dos produtos, não

tratados como manifestações culturais inter-relacionadas, temas de discussões

culturais ou sintomas de uma realidade. O amplo espaço dedicado às resenhas de

DVDs é um sinal: o tema de relevância cultural, ou seja, o filme produzido, em geral

  já recebeu cobertura quando lançado no cinema. A versão para locadora refere-se

apenas a uma nova embalagem para o produto, no máximo acrescida de alguns

extras – mas é pautada semanalmente pelo caderno. A orientação é para o

consumo.

As resenhas críticas são rasas e abusam da adjetivação como forma decaracterizar um produto. A falta de argumentos tenta ser compensada editorialmente

pelos comentários leves, às vezes com toques de ironia. A “voz do repórter”,

pretendida pelo editor, esbarra no posicionamento moderado a respeito dos

assuntos, na falta de aprofundamento e poder argumentativo. São publicadas

resenhas de cinema, música e, com menor freqüência, teatro.

A diversidade de pontos de vista dos repórteres proporciona alguma

variedade no conteúdo do caderno. Há diferentes medidas de objetividade e

subjetividade nos textos – como a opção pelo lide ou pelo comentário irônico –, além

de diferenças quanto ao desenvolvimento da matéria – se diretamente direcionado

ao ponto central (o que é mais importante) da matéria ou se encaminhado por meio

da abordagem de temas periféricos, resultando em superficialidade do texto. A

questão indicial apresentada na revisão téorica61 comprova-se presente: a

efemeridade das matérias de agenda, concentradas no produto cultural, sem

constatações elaboradas a partir dele, sem revelações jornalisticamente

consistentes. O que se apresenta é uma impressão sobre o produto tratado, que não

fornece ao leitor condições de compreensão e reinterpretação. Faltam questões e

reflexões sobre cultura e suas manifestações, sobram produtos para consumo e

matérias de serviço que facilitem sua venda. A tentativa de não ser um jornalismo de

61 Vide página 24.

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divulgação, afirmada pelo editor, nem sempre se realiza. Ao contrário, é a

divulgação dos produtos culturais o mais bem sucedido papel do jornalismo cultural

no Caderno G. Selecionar ou não os temas de que trata o caderno, a relevância dos

produtos culturais, como o Caderno G afirma fazer, não é suficiente para

descaracterizar a divulgação dos mesmos. Divulgar, acima de tudo, está relacionado

ao tratamento dado aos produtos nas matérias, ou seja, à falta de reflexão e crítica,

à ausência de inter-relações com o ambiente cultural e social, e mesmo à deficiência

na defesa da suposta relevância dos assuntos escolhidos.

O caderno equilibra-se entre as matérias nacionais, internacionais e locais –nesta ordem. O que acontece, por vezes, é o desmerecimento do produzido na

cidade, haja visto a matéria sobre o lançamento de CDs da Grande Garagem que

Grava. O ideal de garimpagem de artistas de talento, afirmado por GODOY (2005),

não se mostrou presente. O estabelecido é o que ocupa mais espaço.

A análise do jornal permite verificar que ele se enquadra cabalmente no

quadro que descreve o panorama do jornalismo cultural contemporâneo 62: A

diminuição das matérias e a superficialidade das abordagens; a ausência de crítica e

de grandes nomes da crítica ou da reportagem que provoquem polêmica ou

influenciem o gosto do público; o excesso de adjetivação como forma de compensar 

a falta de argumentação; as linhas desperdiçadas com “narizes de cera” nada úteis à

compreensão do texto, tampouco informativos, reflexivos ou argumentativos; a

preferência pelo apelo visual (janelas de leitura) em detrimento do conteúdo das

matérias; a repercussão de acontecimentos ou produtos culturais já legitimados por 

grandes empresas (gravadoras, por exemplo), rádios ou redes de televisão, com

alcance público alto, ainda que baixa pertinência e qualidade; em suma, a

divulgação rasa predominando sobre tentativas de refletir e pensar o ambiente

cultural.

62 Item 5.4

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7 CONCLUSÃO

As transformações por que passou o jornalismo nas últimas décadas,

atreladas à crise financeira dos jornais e ao fortalecimento da indústria cultural,

refletem-se no jornalismo cultura em geral e, como comprovado nas análises deste

trabalho, no jornalismo praticado no Caderno G. Traçar o perfil do caderno é levar 

em conta tais influências, a linha editorial do jornal aplicada à editoria de cultura e a

especificidade decorrente do perfil da equipe que o produz.

O Caderno G é, como em geral são as editorias de cultura, menosconservador do que a Gazeta do Povo em si, mas conservador o suficiente para

manter-se longe de polêmicas, seja uma campanha pelo não-fechamento do Cine

Ritz63, seja a crítica que difere do senso comum. O caderno raramente se posiciona.

É um caderno elitista no que se refere à condição social – público que pode adquirir 

um jornal diário. Intelectualmente, não se encaixa na elite cultural, por não pensar a

cultura. Ao mesmo tempo, não é acessível à média cada vez menos instruída

culturalmente e menos disposta a leituras. Em suma, é um caderno feito para a elite

financeira mas não intelectual da cidade.

As pautas tentam abranger os âmbitos local, nacional e internacional (na

maioria, atrações estrangeiras que podem ser vistas em Curitiba, além da cobertura

de festivais internacionais de cinema), com destaque para a produção audiovisual e

a música – manifestações mais massificadas (em comparação ao teatro e às artes

plásticas, por exemplo) e com mais profissionais da editoria interessados em

escrever sobre. Não há crítica em si e a resenha crítica pode aparecer em um

parágrafo do box, o que caracteriza o desejo de parecer opinativo e a

despreocupação em sê-lo realmente. Reportagens mais aprofundadas são

praticamente exclusividades da edição de domingo, que busca leveza, diversidade e

entretenimento para atingir um público maior. A divisão por dia da semana funciona

63 Tradicional cinema de rua curitibano, com preços acessíveis e programação diferenciada dasgrandes redes de cinema, fechado em 2005. O Caderno G não se posicionou.

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apenas na edição dominical – mais aberta – e na edição de segunda-feira – a mais

fechada, impreterivelmente dedicada à literatura. Nos outros dias, apesar de

prevalecerem temas, a diversidade de pautas no interior do caderno e de assuntos

elevados à capa não permite ao leitor comum a fácil percepção da divisão em

setores.

A abordagem dos temas é superficial e diretamente ligada ao produto

cultural pautado. Oscila-se entre a divulgação das propostas do artista e a

divulgação comentada das propostas do artista. A “voz do repórter” limita-se ao

comentário irônico, de entretenimento ou senso comum, de forma a não constituir uma personalidade forte com a qual o público identifique-se ou pela qual se sinta

provocado. Tais relações não se estabelecem. Menos ainda a intenção de ser um

  jornalismo “formativo”, já que sem argumentação forte e aprofundamento das

informações e reflexões, faltam ao leitor estímulos e caminhos que constituam uma

“formação” cultural.

A empresa jornalística é grande responsável pelo panorama atual, mas não

a única. Enquadrados, os repórteres perdem oportunidades de usar o espaço que

têm para expressar mais do que “alfinetadas”, elogios adjetivescos ou aspas de uma

única fonte.

A ausência de linha editorial concisa permite ao caderno variações de

qualidade e abordagem, inconstância. Cabe no caderno tanto a prosa elitista e

pedante64 de Wilson Martins quanto os comentários superficiais de Nina Chavs, o lide

e a abertura que chega ao meio do texto sem apresentar o assunto que motivou a

matéria. Crítica, aprofundamento e reflexão não cabem. Dos repórteres, percebe-se

o esforço em pensar o jornalismo e a cultura, nem sempre refletido no trabalho final.

Para o jornalismo cultural, tal panorama é negativo. Cultura tratada como

produto não desenvolve as relações sociais nem traz benefícios à sociedade além

da difusão do entretenimento. A reflexão não é estimulada, ao contrário, acostuma-

64 No contexto de um jornal diário, ao contrário de uma publicação acadêmica ou especializada.

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se a olhar para os acontecimentos culturais isolados em si, sem a consciência dos

seus antecedentes e conseqüentes, das ideologias (a capitalista, sobretudo) que

determinam as produções culturais, dos fatores envolvidos no sucesso ou fracasso

de um produto cultural. A cultura deixa de ser tratada como manifestação humana

propriamente, potencialmente presente em qualquer grupo social, para ser 

embalada pela indústria de bens culturais – e, só sob tal embalagem, legitimada.

O processo de construção de significações e reinterpretações culturais e

sociais é eliminado. Tratado como serviço, o universo cultural perde a capacidade de

interpretar os significados sociais, suprimida pelo caráter mercadológico – quetransforma as manifestações culturais legitimadas em mercadorias e o público em

consumidor. Além disso, a superficialidade de tratamento da informação e da opinião

dão a falsa impressão de conhecimento do objeto tratado. A relação estabelecida

proporciona ao público acesso a grande número de informações, mas não aos

mecanismos e caminhos para decodificá-las, compreendê-las, relacioná-las e

construir novas interpretações dentro do ambiente sócio-cultural.

Tornam-se opacos os potenciais questionadores e reflexivos que algumas

obras contêm. O conteúdo contestador ou revelador, se existia, quando muito

aparece diluído nas aspas do produtor cultural. O jornalista de cultura, por sua vez,

não produz reflexão ou raciocínio, não interfere no ambiente cultural além da

questão de mercado, além da seleção do que será divulgado ou não, além do senso

comum.

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REFERÊNCIAS

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APÊNDICE 1 – QUESTIONÁRIO-MODELO APLICADO AOS REPÓRTERES DO

CADERNO G

Qual seu nome completo e idade?

Onde nasceu?

Qual a sua formação?

Comente sua experiência profissional.

Quando entrou na Gazeta do Povo e em quais editorias do jornal trabalhou?

Desde quando é repórter do Caderno G?Sobre quais temas você escreve mais freqüentemente no G? Pode ordená-los?

Você tem algum tipo de especialização nessa(s) área(s), formal ou informal (como

leituras, cursos ou outra forma de busca de conhecimento)?

Sente-se despreparado para escrever sobre alguns dos temas?

Qual a rotina do caderno G?

Nas reuniões de pauta, você tem liberdade para sugerir pautas? Costuma fazê-lo

com que freqüência? Com que freqüência as sugestões são aproveitadas pelo

editor?

Considera satisfatórias as informações contidas nas pautas que recebe?

Qual a relação das matérias produzidas no Caderno G com a agenda cultural

(consumo)? Em que medida ela é determinante das pautas?

Qual o procedimento de trabalho com os releases recebidos?

Quais as suas principais preocupações na elaboração de uma reportagem?

Qual o prazo normal para a realização de uma matéria? Esse tempo interfere de

modo positivo ou negativo na apuração das informações e na redação do texto?

Explique o porquê.

Em caso de matérias especiais, quais as condições de trabalho: tempo, pesquisa,

investimentos da empresa?

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Qual a influência do editor no desenvolvimento de todo o trabalho

(acompanhamento, orientação, direcionamento, avaliação)?

As condições de trabalho (remuneração, exclusividade, horários) na editoria e na

empresa em geral são satisfatórias? Em que medida elas influenciam o material

 jornalístico que você produz?

A coordenação dos cadernos e outras instâncias hierarquicamente acima do editor 

interferem direta ou indiretamente no seu trabalho? Como?

Como o perfil editorial da Gazeta do Povo interfere no perfil do G?

Qual a linha editorial do G?Você costuma ler sua matéria publicada no jornal no dia seguinte? Quais as

principais alterações que o editor faz nos seus textos?

Quais as dificuldades para trabalhar com jornalismo cultural no universo de Curitiba?

Que auto-avaliação você faz do seu trabalho no Caderno G? Por quê?

Qual avaliação você faz do Caderno G em geral? Quais são os principais pontos

negativos e positivos? E quais as suas causas?

Está satisfeito em trabalhar com jornalismo cultural?

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