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Fatores que influenciam os desvios de prazo e orçamento das grandes obras do Brasil LAUDO BRANCATO MBA Internacional em Gerenciamento de Projetos FGV – Fundação Getúlio Vargas

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Fatores que influenciam os

desvios de prazo e orçamento

das grandes obras do Brasil

LAUDO BRANCATO MBA Internacional em Gerenciamento de Projetos

FGV – Fundação Getúlio Vargas

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LAUDO BRANCATO

Fatores que influenciam os desvios de prazo e orçamento das

grandes obras do Brasil

Trabalho de Conclusão de Curso

apresentado ao curso MBA Executivo:

Internacional em Gerenciamento de

Projetos, de Pós-Graduação lato senso,

Nível de Especialização, do Programa FGV

Online como pré-requisito para a obtenção

do título de Especialista.

André Baptista Barcaui

Coordenador Acadêmico

Denise Basgal

Orientadora do TCC

Turma UCI-SP20-T1

São Paulo – SP

2016

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2

O Trabalho de Conclusão de Curso

Fatores que influenciam os desvios de prazo e orçamento das

grandes obras do Brasil

elaborado por Laudo Brancato e aprovado pela

Coordenação Acadêmica foi aceito como pré-

requisito para a obtenção do MBA Executivo:

Internacional em Gerenciamento de

Projetos, Curso de Pós-Graduação lato senso,

Nível de Especialização, do Programa FGV

Online.

Data de Aprovação: ___ de ___________ de 2016

____________________

Coordenador Acadêmico

___________________________

Professora Orientadora do TCC

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo principal identificar quais são os principais

fatores que influenciaram e ainda influenciam os desvios em prazo e custos nas

grandes obras de infraestrutura do Brasil, partindo da hipótese de que a questão

da falta de planejamento adequado exerce uma forte influência nestes desvios.

Para a verificação desta hipótese, foram pesquisados fatores históricos

relacionados aos contextos nos períodos antes e após a república, bem como

as características dos colonizadores, dos escravos e outros povos os quais de

certa forma influenciaram o Brasil dos tempos atuais, na forma de agir, de pensar

e de se integrar, e consequentemente na estrutura política e social de nosso

país. A intenção desta pesquisa foi de buscar fatores por trás da possível

carência de planejamento, fatores estes diretamente relacionados a aspectos

intrínsecos à personalidade do povo brasileiro, se é que é possível defini-la de

forma genérica, dada a mistura de povos com características distintas que

fizeram parte de nossa história, bem como a extensão geográfica e cultural do

nosso país.

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DEDICATÓRIAS

Dedico este trabalho aos meus pais,

Maria Helena Leme Villaça e Laudo V. Brancato,

que sempre prezaram, acima de tudo junto a boa

educação e ao caráter, pela boa formação acadêmica.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO

1.1. Tema

1.2. Objetivos

1.3. Hipótese

1.4. Justificativa

1.5. Metodologia

2. FATORES HISTÓRICOS

3. ASPECTOS HUMANOS, CULTURAIS E COMPORTAMENTAIS

4. A INFLUÊNCIA DOS FATORES POLÍTICOS

4.1. Aspectos relevantes da política no Brasil

4.2. A Corrupção no Brasil

4.3. Consequência dos Fatores Políticos

5. A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO

6. ESTATÍTICAS DOS DESVIOS E FATORES RELACIONADOS

7. EVOLUÇÃO NOS ÚLTIMOS ANOS

8. MODELOS NOS PAÍSES DESENVOLVIDOS

9. CONCLUSÃO

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1. INTRODUÇÃO

1.1. Tema

Um dos fatores mais recorrentes que estamos acostumados a ouvir e ler

nos jornais e nos diversos meios de comunicação em nosso país são os atrasos

e os estouros de orçamento das grandes obras de infraestrutura. Não estaremos

equivocados se afirmarmos que praticamente todas as grandes obras nas áreas

de transportes, saneamento, energia, portuária, entre outras, apresentaram

acréscimos significativos em seus cronogramas e grandes acréscimos no

orçamento inicialmente previsto.

Segundo Hélio Amorim, diretor da ABCE (Associação Brasileira de

Consultores de Engenharia), as obras públicas no Brasil têm, de uma forma

geral, seus projetos iniciados com atraso. Um dos argumentos é que os governos

sofrem pressão para darem início às obras, mesmo sem o projeto final definido,

fazendo com que estes projetos sejam feitos “na pressa”. Estes fatores são

observados nas esferas municipais, estaduais e federais. Os atrasos

ocasionados pelo “atropelo” nos processos, fazem com que projetos sejam

elaborados concomitantemente às obras, o que ocasiona estouros de orçamento

durante todo o ciclo de vida destes empreendimentos, os quais muitas vezes são

até mesmo inviabilizados no decorrer ou até mesmo ao final das obras.

No entanto, existem diversos fatores por trás da questão da falta de

planejamento, que devem influenciar os resultados das grandes obras do país,

como os fatores históricos que influenciaram na nossa cultura, nas

características do nosso povo, e consequentemente em nossa estrutura política,

econômica e social.

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1.2. Objetivo

O objetivo deste trabalho é realizar uma análise sobre quais fatores

estão intrinsicamente relacionados a estes desvios, buscando informações

históricas desde o período pré-republicano do Brasil, e tentando relacionar estes

fatores a aspectos humanos, culturais e comportamentais que influenciam nas

características do povo brasileiro e da classe dominante, formada por grandes

empresários e políticos com forte influência nas decisões e condução dos

grandes projetos do Brasil.

1.3. Hipótese

Segundo especialistas de diversas áreas da engenharia e de gestão de

grandes empreendimentos, uma palavra pode resumir as várias origens dos

problemas de atraso e estouro de orçamento nas obras no Brasil: Planejamento.

Para sermos mais claros, a falta dele.

Esta é a hipótese que deverá ser confirmada ou não na conclusão deste

trabalho, considerando os fatores por trás da possível falta de planejamento

como mencionado anteriormente, que são os fatores históricos, humanos,

culturais e comportamentais e suas influências em nossa estrutura política e

social.

1.4. Justificativa

A escolha do tema deste trabalho se deu pela relevância dos impactos

da má gestão dos grandes projetos do Brasil. Serão demonstrados mais adiante

estes impactos em números, além de como estes recursos poderiam ser

alocados em benefício da população, se fossem geridos de forma honesta e

competente.

Além disso, o tema escolhido salienta a importância de uma área crucial

no contexto de gerenciamento de projetos, que é o planejamento Todas as

metodologias consagradas consideram o planejamento como o “cérebro” do

gerenciamento de projetos. Sem ele, simplesmente não existe gestão.

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1.5. Metodologia

O trabalho inicia com uma abordagem histórica buscando definir o

contexto da formação de nossa estrutura política e social, para em seguida,

buscar relações entre este contexto e os aspectos humanos, culturais e

comportamentais da população brasileira, tentando identificar traços comuns nas

suas diversas características. Após esta abordagem, o trabalho busca nos

tempos atuais as consequências e influências destes aspectos em nossa política

e seus interlocutores, que por sua vez são reflexo de nosso eleitorado no regime

democrático do Brasil de hoje.

Por fim, fazemos a abordagem da importância do planejamento e

buscamos, em casos reais, os resultados de projetos de grande magnitude e

extrema relevância do Brasil.

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2. FATORES HISTÓRICOS

No contexto histórico do período colonial, uma questão importante a ser

levantada é sobre qual a influência da colonização portuguesa na cultura dos

brasileiros, principalmente quando o foco é voltado para as características deste

povo que se diferencia dos colonizadores de outras nações europeias de peso

na era colonial, como a Inglaterra. Existem sim diferenças culturais significativas

entre nações colonizadas pelos britânicos, de um lado, e Espanha e Portugal, de

outro. A questão básica é: podemos facilmente identificar diferenças não só nos

aspectos culturais visíveis como a arquitetura, ciências e na arte em geral, mas

também na forma de pensamento e comportamento entre estas nações? Por

que as nações colonizadas pelos espanhóis e portugueses têm ou tiveram em

seus históricos, em sua grande maioria, regimes ditatoriais?

HOLANDA (2015, p.37), enfatiza algumas características específicas

dos povos ibéricos, entre elas, ao valor do homem diretamente proporcional a

sua independência em relação aos demais. Para eles, cada indivíduo é filho de

si mesmo, de seu esforço próprio e de suas virtudes. Para HOLANDA, estas

características são tão imperativas, que podem marcar o porte pessoal e até

mesmo a fisionomia dos homens. Podemos verificar este aspecto no homem

latino americano? A resposta para esta questão deve ser positiva quase que por

unanimidade. É interessante notar a relação direta deste fator do individualismo

com a tendência a regimes ditatoriais nas nações colonizadas e influenciadas

por estes povos.

Sobre a característica dos ibéricos do improviso com pouco ou nenhum

senso planejador, HOLANDA (2015, p.131) salienta: “A rotina e não a razão

abstrata foi o princípio que norteou os portugueses, nesta como em tantas outras

expressões de sua atividade colonizadora. Preferiam agir por experiências

sucessivas, nem sempre coordenadas umas as outras, a traçar de antemão um

plano para segui-lo até o fim.” No trecho supra, o autor enfatiza uma

característica marcante dos portugueses, que certamente influenciou desde o

Brasil colônia até os tempos atuais. Trata-se do perfil improvisador dos

portugueses, que preferem agir instintivamente, com base em suas experiências

anteriores, a planejar antes de realizar suas ações.

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O Brasil foi formado por uma mistura abrangente de povos, distribuídos

de forma heterogênea nas diversas regiões. Mesmo no período do Brasil colônia,

em que a influência europeia era predominantemente proveniente de Portugal,

tivemos além da grande influência dos escravos, a permanência de britânicos,

aliados de Portugal nas guerras napoleônicas, bem como dos holandeses,

principalmente em Pernambuco, e outros povos da Europa que buscavam

oportunidades no novo mundo. No entanto, ainda dentro deste contexto de

miscigenação de raças, podemos observar algumas destas características do

individualismo dos povos ibéricos em maior grau em determinadas regiões.

A influência de Portugal sobre o Brasil se intensificou a partir da chegada

do príncipe regente Dom João VI, em 1807 em Salvador, para em seguida se

estabelecer no Rio de Janeiro, no início de 1808, onde permaneceria por cerca

de 13 anos. O Brasil colônia neste período era predominantemente rural com

mão de obra escrava, com poucos centros urbanos, entre eles o principal que

era justamente o Rio de Janeiro, centro que apresentava condições precárias,

sem saneamento, com cerca de 60.000 habitantes, formados em boa parte por

escravos e cativos, pequenos comerciantes, poucos profissionais liberais, e os

comerciantes de escravos (GOMES, 2007).

Nesta ocasião, já era notado a característica de improviso e

individualismo dos portugueses, mesmo sabendo que a vinda da corte ao Brasil

tratava-se de uma fuga diante do ataque iminente das tropas napoleônicas, e da

intenção dos britânicos, aliados de Portugal contra Napoleão, de tomar a colônia

(Brasil), caso o príncipe regente optasse por permanecer em Portugal. A família

real deixou Portugal em condições de extrema fragilidade, desembarcando no

Rio de Janeiro com nada menos do que 11500 pessoas ligadas a corte. Um

aspecto do individualismo e improviso dos portugueses mencionado no início

deste capítulo, se verificou quando estes integrantes da corte se estabeleceram

na cidade do Rio de Janeiro, de forma autoritária ocupando casas de moradores

locais, simplesmente inserindo um aviso PR (Príncipe Regente) nas entradas

destas moradias. Em alguns casos havia um acordo de pagamento de aluguel,

os quais muitos não foram cumpridos.

Outros fatos relacionados a má gestão e falta de planejamento por parte

da monarquia portuguesa, refere-se aos impostos e taxas criados pela corte que

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serviram, em grande parte, para suprir a carência de recursos deste alto

contingente dos membros e coligados da corte, que mantinham os seus

costumes de uma monarquia europeia já em decadência, gastando sem controle

e sem nenhum planejamento financeiro, em total descompasso com a situação

da colônia na ocasião. A má gestão dos recursos financeiros acarretou nas

dificuldades e quase falência do Banco do Brasil, que tinha os seus acionistas

indicados pelo Príncipe Regente em troca de apoio financeiro para suprir os seus

gastos junto ao seu contingente real, que crescia a medida que surgiam

oportunidades de trocas de financiamento por honrarias da corte. Mais tarde, na

ocasião do retorno da corte a Portugal em 1821, o rei Dom João VI havia raspado

os cofres nacionais.

Confirmando mais uma vez a característica do improviso na

personalidade dos portugueses, citamos um marco em nossa história: a

proclamação da independência. Segundo o próprio historiador Sérgio Buarque

de Holanda, a Independência do Brasil foi produto de “uma guerra civil entre

portugueses”, desencadeada na Revolução Liberal do Porto em 1820, e cuja

motivação teriam sido os ressentimentos acumulados na antiga metrópole pelas

decisões favoráveis ao Brasil adotadas por D. João VI. Este fato contraria a linha

de pensamento que defende a independência como um evento minuciosamente

planejado pela corte portuguesa.

Outro fator marcante em nossa história foi o longo e cruel período de

escravidão, que certamente traz consequências até os tempos atuais. Este

período se deu desde a metade do século XVI, com a produção de açúcar, até

a Lei Áurea, de 1888, após as pressões inglesas no sentido de acabar com o

tráfego de escravos provenientes da África. Na época da migração do Brasil

colônia para império (1822), de cada 3 brasileiros, 2 eram escravos, negros

forros, mulatos, índios ou mestiços (GOMES,2010). Os analfabetos somavam

quase que a totalidade da população (99%). Os ricos eram poucos, em sua

maioria ignorantes, formados por fazendeiros, mercadores de escravos e

comerciantes, em geral de origem europeia (portugueses, ingleses, espanhóis,

holandeses, entre outros). Este período de escravidão também influenciou a

forma de agir e pensar do povo brasileiro, tanto do lado dos que sofreram com o

trabalho escravo, como daqueles que injustamente se beneficiaram deste

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regime. Exploradores de escravos não possuíam, e nem poderiam ter,

conhecimentos eficientes de gestão, característica esta que perdurou desde os

períodos de esplendor rural até o desenvolvimento urbano com os reflexos da

revolução industrial. No período anterior e posterior a abolição, estes

exploradores já sentiram na pele esta carência com a chegada dos imigrantes,

que ocuparam o espaço da antiga mão de obra escrava.

A exploração do trabalho escravo maximizava de forma injusta e cruel

os lucros dos exploradores em sua maioria detentores de propriedades rurais, já

que a maior parte do custo da mão de obra se limitava a compra dos escravos.

Este fator propiciava uma forma de gestão mais solta, visto que os lucros eram

quase certos pelo baixo custo da mão de obra. Com a abolição da escravidão no

Brasil, houve a necessidade de um cuidado muito maior na gestão, e os

imigrantes possuíam um conhecimento e vivência muito maior, livre dos vícios

dos exploradores de escravos, fato este que possibilitou até aos trabalhadores

rurais imigrantes recém chegados sem praticamente nenhum recurso,

crescerem e prosperarem rapidamente como agricultores, que através do

acúmulo de capital tornavam-se proprietários de pequenas terras, e em alguns

casos posteriormente grandes fazendeiros e industriais. COSTA (1997), salienta

que para os exploradores de escravos, o trabalho manual era visto única e

exclusivamente como obrigação do negro, escravo. Era incompreensível para

estes exploradores, no período pós abolição se deparar com imigrantes

manuseando a terra ou operando máquinas. Mais incompreensível ainda era ver

que muitos destes imigrantes, ou a maioria deles, detinham conhecimentos

relevantes em diversas áreas, muitas vezes superando aos figurões da elite

brasileira, entre eles os grandes proprietários de terras. Alguns destes imigrantes

fizeram fortunas e hoje figuram entre os principais empresários do país.

Segundo GOMES (2010), “As dúvidas a respeito da viabilidade do Brasil

como nação coesa e soberana, capaz de somar os esforços e o talento de todos

os seus habitantes, aproveitar suas riquezas naturais e pavimentar seu futuro

persistiram ainda muito tempo depois da Independência.” Este aspecto reflete

um pensamento comum no período da independência, em que todos os fatores

aqui salientados, do período da escravidão, da chegada e saída da corte

portuguesa em fuga das tropas napoleônicas e por pressão dos ingleses, e sua

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influência antes e depois deste período, da proclamação da independência como

resultado de conflitos na metrópole, entre outros, tiveram forte influência na

forma de pensar do povo brasileiro, e consequentemente na sua história social,

política e econômica.

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3. ASPECTOS HUMANOS, CULTURAIS E COMPORTAMENTAIS

O individualismo salientado no capítulo anterior, como característica

marcante dos colonizadores refletindo no perfil do brasileiro, interfere em

diversos aspectos de sua vida, entre eles, a relação familiar, sua forma de pensar

e agir, sua escolha profissional, sua relação no trabalho, e, principalmente, os

seus resultados e conquistas profissionais. Neste último ponto, podemos afirmar

que o individualismo vem de encontro ao trabalho em equipe, fator reconhecido

como crucial para o desenvolvimento profissional.

Outro aspecto fundamental no contexto do individualismo está

relacionado aos altos índices de corrupção verificados no Brasil. O

individualismo, como aspecto comportamental, pode conduzir o indivíduo a

ações e condutas antiéticas. Um capítulo específico será dedicado ao tema da

corrupção no Brasil. “O homem nasce puro em sua essência, porém a sociedade

o corrompe.” Esta frase é de autoria do filósofo iluminista francês Jean Jacques

Rousseau, que sintetiza a questão do individualismo como fator quase inevitável

na vida do ser humano, e diretamente relacionado aos desvios de caráter e ética.

Este individualismo explica alguns aspectos comportamentais verificados nos

brasileiros, desde a época do Brasil colônia.

Alguns comportamentos padrão são verificados nas grandes capitais do

país, em grandes empresas entre seus executivos, clientes e empresas

subcontratadas. Um exemplo está na característica do brasileiro de atrasar em

compromissos e reuniões. Quantas vezes vivenciamos situações em que

reuniões são agendadas, e alguns integrantes atrasam, as vezes mais do que

trinta minutos? Em alguns países, principalmente Europa e EUA, isto é

considerado um insulto. Nestes países, as vítimas dos atrasos simplesmente se

retiram da sala e seguem os seus outros compromissos do dia. Para alguns

brasileiros, esta retirada após o atraso é motivo de indignação, por mais incrível

que pareça. É claro que existem exceções para estes casos, mas o fato é que

todos nós frequentemente vivenciamos situações como esta. Este

comportamento é potencializado de forma diretamente proporcional ao grau de

poder do indivíduo responsável pelo atraso. Quanto maior o poder, mais ele tem

em mente que os outros são subordinados a ele, e devem aguardá-lo. Este

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comportamento demonstra claramente a característica do individualismo, com

doses de egoísmo, no perfil do brasileiro. Além disso, este fato dos atrasos em

reuniões, pequeno em relação ao tema deste trabalho, demonstra no perfil dos

brasileiros, um certo descompromisso com prazos, que pode influenciar as

grandes causas.

3.1. A Educação no Brasil

De acordo com dados extraídos pelo jornal O Estado de São Paulo em

maio de 2015, o Brasil ocupa a 60ª posição no ranking mundial de educação,

divulgado pela OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento

Econômico. Foram avaliados 76 países através de testes em alunos de 15 anos

nas disciplinas de ciências e matemática. No ranking, o Brasil demonstra

desempenho inferior a países recentemente em guerra como o Irã (51º), e outros

vizinhos com economias mais fracas como Uruguai (55º) e Chile (48%). Abaixo

do Brasil ficaram Argentina (62º), Colômbia (67º) e Peru (71º).

Segundo CARVALHO (2007), a educação no Brasil carrega uma

curiosidade. Nos níveis básico e fundamental, temos um dos melhores ensinos.

Este fato, infelizmente na atualidade, se limita a uma pequena parcela da

população com acesso às escolas particulares de qualidade reconhecida

internacionalmente, as quais em alguns casos, são escolas estrangeiras. No

passado, até os anos 60, era válido também para as escolas públicas. Ao

considerarmos o ensino universitário, temos no Brasil os alunos mais

despreparados, quando comparados a países como China e India, além dos

países de primeiro mundo. Nos EUA, a qualidade do ensino cresce de forma

gradual no sentido do ensino básico para o ensino superior e de pós graduação.

As 20 melhores universidades americanas, recebem os seus calouros com

menos conhecimento do que os calouros das melhores universidades

brasileiras. Porém, em geral e com algumas exceções, estas universidades

americanas formam profissionais com mais conhecimento e preparo.

Especialistas na área educacional apontam que o sistema de educação

no Brasil não é capaz de preparar os jovens para a interpretação de textos

simples, elaboração de cálculos aritiméticos básicos, além dos conhecimentos

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elementares de física e química, entre outras disciplinas previstas para o ensino

fundamental.

Recentemente, no final de 2015, uma proposta do MEC com apoio do

Ministério da Educação, na ocasião liderado pelo ministro Aloyzio Mercadante,

previa a retirada na disciplina de história, os estudos referentes às civilizações

europeias e do Oriente Médio, base da história ocidental, limitando-se

exclusivamente a história dos “mundos ameríndios, africanos e afro-brasileiros”,

no 1º ano, dos “mundos americanos”, do 2º ano, e somente os “mundos

europeus e asiáticos”, no 3º ano. Não faz sentido nenhum estudar a história do

Brasil e das Américas sem antes deter o conhecimento das civilizações

colonizadoras destas nações, que por sua vez tiveram suas bases no período

dos grandes impérios. Atrás da abolição da “história ocidental”, há a supressão

do sentido temporal que caracteriza a disciplina. Este é um exemplo de uma

estratégia extremamente nociva arquitetada por visões populistas com segundas

intenções político partidárias, que podem influenciar profunda e negativamente

gerações. Segundo MAGNOLI (2015), a história, assim como outras disciplinas,

tem o papel de acender a chama da curiosidade intelectual, com o ensinamento

do pensamento científico, e a habilitação dos jovens para a investigação,

interpretação e reflexão, salientando que “Nossos doutrinadores de plantão,

sábios `especialistas` que não declinam seus nomes, jamais concordarão com

isto.”

No capítulo seguinte será demonstrado o índice de eleitores do Brasil

sem acesso a educação básica. Este índice, que já é elevado, é ainda menor

quando comparamos aos índices reais considerando toda a população, incluindo

as camadas abaixo dos 16 anos e acima dos 60.

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17

4. A INFLUÊNCIA DOS FATORES POLÍTICOS

4.1 . Aspectos relevantes da política no Brasil

Ao lembrarmos dos políticos no Brasil, podemos identificar mais um

padrão comportamental diretamente relacionado ao individualismo. Quantas

vezes já ouvimos a frase “o poder corrompe!”? Quando assistimos as

propagandas eleitorais, notamos em comum um comportamento dos políticos

diante da população completamente distinto daquele verificado após as eleições,

quando os candidatos são eleitos. É impressionante a mudança de postura, do

tom da fala, das atitudes, da fisionomia, notadas antes e depois das campanhas

eleitorais. A postura pós eleição dos candidatos vencedores em todas as esferas

do governo, carrega uma dose de sensação de poder claramente notada por

todos. Isto é ainda mais evidente no Nordeste, que ainda carrega nos políticos a

ideia do coronelismo e a herança do patrimonialismo, em que o poder é

soberano, e os fins justificam os meios. A população nestes locais, em geral de

baixa renda e sem acesso a educação, confere legitimidade a estas figuras

políticas, o que fortalece ainda mais o poder destes figurões.

Analisando pelo lado do eleitor, outra característica marcante está

relacionada a aceitação da falta de ética em troca de outros benefícios. A maioria

de nós já devemos ter ouvido a frase: “Fulano rouba mas faz!”. Esta afirmação

demonstra uma tendência de quem acha normal algumas condutas e

comportamentos antiéticos. A pergunta que deve ser feita em contraposição a

esta questão é: você contrataria este sujeito que rouba mas faz como seu braço

direito com o cargo mais alto de sua empresa, conferindo a ele as principais

responsabilidades e toda a confiança para conduzir a sua empresa? Outra

questão: Se você concorda que roubar dinheiro público em benefício próprio é

justificável, isto quer dizer que você roubaria para atingir um benefício “maior”,

ou seja, você acha que os fins justificam os meios?

Ainda sob o ponto de vista do eleitor, no Brasil sofremos com a falta de

consciência no voto. Este aspecto tem relação direta com a questão da

educação. Segundo dados coletados pelo jornal O Estado de São Paulo, dos

mais de 110 milhões de eleitores brasileiros, mais da metade (54%), nem sequer

terminou o primeiro grau. São mais de 70 milhões de indivíduos com ínfima ou

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18

nenhuma capacidade de formação de opinião ou juízo sobre as questões mais

relevantes da política nacional. A prova deste fato é a força que figuras como

Tiririca tem sobre um nicho do eleitorado, em geral formado por esta parcela da

sociedade sem acesso à educação básica, deixando de lado os aspectos da boa

ou má intenção deste candidato, e se atendo somente a sua formação

acadêmica e experiência política. Nenhum eleitor deste nicho se preocupa com

estes aspectos, e elege o candidato apenas por representar alguém do povo.

Quanto menos acesso à educação tem o eleitorado, mais força tem candidatos

como Tirirca.

Ao depararmos com o voto obrigatório, o que na teoria seria favorável se

tivéssemos cem por cento da população com níveis educacionais no mínimo até

o segundo grau completo, torna-se um problema para a política nacional, pois

esta parcela da população sem acesso à educação terá uma forte ou total

influência na eleição dos políticos que estarão envolvidos nas grandes decisões

e na direção do Brasil.

Em suma, se pudermos traçar um quadro da política brasileira, podemos

afirmar que a mesma é reflexo do eleitorado com uma maioria sem pouca ou

nenhuma condição de escolher adequadamente os seus governantes, levando

em consideração os seus projetos, sua experiência e competência para

governar. E o que é mais triste, este fato é reflexo de governos que deram pouca

importância à educação. Cria-se neste contexto um círculo vicioso, campo fértil

para políticas populistas que de forma maquiavélica incentivam um eleitorado

ignorante.

4.2 A Corrupção no Brasil

Uma pesquisa da revista exame divulgada em janeiro deste ano,

considera os índices de percepção da corrupção no setor público em 168 países.

Os valores de referência variam de zero a 100, sendo zero o mais corrupto. Ao

todo, dois terços dos 168 países indicam notas inferiores a 50, demonstrando

índices significativos de corrupção na maioria dos países do mundo. O Brasil

caiu de 69º na edição anterior, para 76º na edição atual (influenciado

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19

principalmente pelos escândalos da Petrobrás), estando em pior colocação

quando comparado a nações africanas como Namíbia e Botsuana.

Segundo AZEVEDO (2012), o sistema partidário no Brasil está caduco.

As legendas se unem para obter espaços na mídia e constroem ou desfazem

alianças em função da fatia do estado a que lhes é atribuído o poder. AZEVEDO

questiona e responde: “Por que o Brasil está entre as nações mais corruptas do

Planeta? Será o nosso sangue latino? O calor dos trópicos? A miscigenação? A

herança patrimonialista ibérica? Que determinismo sociológico, histórico ou

climático ou, ainda, que teoria estupidamente racista explicariam tanta

lambança? Bobagem, meus caros! O nome do desastre que aí está é um só:

tamanho do estado, com seu consequente aparelhamento pela pistolagem

política. Os Cachoeiras da vida estão sempre em busca de quem lhes possa

franquear as portas da administração e garantir acesso aos cofres.” Esta visão

demonstra que a dimensão do controle dos governos sobre uma sociedade está

diretamente relacionada aos índices de corrupção nela observados.

O estado, quando troca o papel de controlador por intervencionista, abre

portas para desvios éticos e morais de seus filiados, os quais, se aproveitam do

poder a eles atribuído para benefícios próprios e de seus aliados (altos cargos

em grandes empresas estatais, partidos políticos, organizações, sindicatos, etc).

Este fator é potencializado quando somamos a característica do individualismo

do brasileiro, apontado no capítulo 2.

Segundo dados coletados em meados de 2012, o governo federal

dispunha de mais de 24.000 cargos de confiança. Ao final do governo FHC, em

2002, este número era de cerca de 18.000. Para efeito comparativo, a Alemanha

apresentava apenas 170 cargos federais de confiança, a Inglaterra, 300 e os

EUA, 9 mil.

O jornalista e professor William Waack, em entrevista realizada através

das redes sociais em março de 2016, ao tratar do tema relacionado aos governos

populistas, menciona que o populismo fiscal leva à catástrofe. Ele indica ainda

que o excesso da intervenção estatal não produz os resultados que os seus

defensores vendem através de campanhas de marketing.

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Nos últimos 30 anos, nações da América Latina, após uma série de

golpes militares deflagrados nos anos 60 e 70, tentam se livrar de regimes

autoritários que prevaleceram na região neste período, com exceção de Cuba,

que mantém o regime autoritário até os dias de hoje. Forças contrárias aos

regimes democráticos ainda estão presentes na América Latina, representadas

pelo populismo. A Argentina com o kirchnerismo, a Venezuela com o chavismo

ainda fortemente presente no governo posterior (Maduro), Evo Morales na

Bolívia e o lulopetismo no Brasil são exemplos das forças populistas contrárias

ao regime democrático, apesar da característica comum destes governantes de

enfatizar a defesa da democracia nas suas estratégias políticas, o que

caracteriza uma antítese com a realidade. A boa notícia é que o Brasil não figura

entre os piores herdeiros das ditaduras e dos regimes populistas da América

Latina. VILLA (2014) diferencia a ditadura do Brasil com a de outros países do

cone sul, como Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai. No período entre 1964 e

1985, oficialmente caracterizado pelo regime militar, não houve uma linearidade

no autoritarismo típico destes governos nos países supracitados. Enquanto na

Argentina ocorreu a desindustrialização e o fechamento de cursos universitários,

no Brasil ocorreu justamente o contrário. Os governos militares, sem esquecer

os períodos de excessos, perseguição, censura, tortura e morte entre 1979 e

1985, tomaram ações de incentivo a industrialização e modernização da

infraestrutura. Estes governos autoritários e populistas têm em comum

frequentes indícios de corrupção, na intenção de beneficiar os seus partidários

e de permanecer no poder, desviando recursos públicos para financiar

campanhas, entre outros indícios.

Em relação a política fiscal, o economista Eduardo Gianetti da Fonseca,

em entrevista realizada na Rádio Jovem Pan em fevereiro de 2016, salientou

que a melhor forma de controlar os desvios nas arrecadações e os atos de

corrupção é fazendo com que os gastos sejam realizados o mais próximo

possível do local geográfico onde os mesmos são arrecadados. Isto quer dizer

que os tributos municipais devem ser destinados às prefeituras locais. O mesmo

ocorre com os tributos estaduais, deixando o mínimo possível para a

arrecadação e gastos no âmbito federal. Isto não ocorre no Brasil atualmente.

Gianetti também menciona a influência da questão da transição do poder

Page 22: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

21

centralizador e descentralizador, de forma curiosamente pendular, desde o

período colonial, passando pela regência, império, república até os tempos

atuais, sobre os índices de corrupção verificados no país. Governos

centralizados abrem arestas para desvios de recursos públicos e corrupção.

Outro fator de extrema relevância ao tratarmos da corrupção está

relacionado ao tratamento diferenciado dos processos que envolvem crimes

políticos. Políticos no Brasil, ao cometerem crimes, estarão sujeitos ao foro

privilegiado. O foro privilegiado, também conhecido na esfera jurídica como foro

por prerrogativa de função, é caracterizado pelo privilégio concedido às

autoridades políticas de ser julgado por um tribunal diferente daquele em que os

cidadãos comuns que cometem crimes são submetidos, os tribunais de primeira

instância. O artigo 102 da constituição, inciso I, letra “b”, atribui ao Supremo

Tribunal Federal o julgamento do presidente da república, vice-presidente,

membros do Congresso Nacional, ministros do estado, e o Procurador-Geral da

República quando há alguma infração penal comum a ser apurada. Esta é mais

uma condição que de certa forma estimula agentes políticos mal intencionados

às práticas de corrupção.

Curiosamente, na ocasião em que este capítulo estava em processo de

elaboração, em 04/03/2016, pela primeira vez na história deste país, um ex-

presidente (Lula), foi levado de forma coercitiva, isto é, sem opção de recusa, a

prestar esclarecimentos à Polícia Federal em relação a Operação Lava Jato, com

base em provas e delações extremamente graves. Logo após os depoimentos,

ao ser liberado, o ex-presidente fez um discurso extremamente populista, de

forma estratégica, demonstrando a sua indignação, apontando a investigação

como sendo algo provocado pela oposição, e salientando que poderá voltar a

disputar as próximas eleições convocando os seus defensores a uma reação.

Neste contexto, havia uma intenção de confronto às instituições ao tentar

desmoralizar a ação da PF. Poucos dias depois, em 16/03/2016, o ex-presidente

Lula foi flagrado em conversas telefônicas, publicadas em 16/03/2016, através

de gravações feitas a pedido do juiz Sergio Moro, quando tentava influenciar as

instituições (Supremo Tribunal Federal e de Justiça), para se livrar das

acusações com base em provas contundentes da operação Lava Jato, bem

como a tentativa de utilizar manobras junto a presidente Dilma Roussef para a

Page 23: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

22

obtenção do foro privilegiado, ao aceitar a proposta da presidente Dilma Roussef

para assumir o Ministério da Casa Civil. A intenção da presidente Dilma de

nomear o ex-presidente ministro da Casa Civil era livrar Lula do processo que

corria na polícia federal. Tal fato foi comprovado em uma gravação em que a

presidente Dilma informa Lula da urgência da assinatura do Termo de Posse, o

que automaticamente o levaria a condição de foro privilegiado.

Fazendo uma relação entre populismo e corrupção, LAMOUNIER

(2010), chama a atenção alegando que tensões nos regimes democráticos

tendem ao surgimento do populismo, do clientelismo, da corrupção e, “não raro,

movimentos ou partidos ideologicamente ambíguos a respeito das regras

democráticas de representação política”. Na análise de Lamounier, ao fim dos

regimes militares e com o restabelecimento da democracia, os políticos por

“vocação” saíram de cena, tendo o seu espaço ocupado pelos que vivem “da” e

não “para” a política. Realmente o que ouvimos nos dias atuais é que não temos

em nosso quadro político atual a presença de um estadista. O que observamos

nos dias de hoje, é que uma boa parcela destes políticos, principalmente aqueles

que representam partidos populistas e estão na base do governo, estão

envolvidos em escândalos de corrupção.

Page 24: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

23

4.3 . Consequência dos fatores políticos

É fácil imaginar que as diversas questões apresentadas nos capítulos

anteriores influenciam diretamente na gestão pública. O perfil dos políticos

responsáveis pelas principais questões do país, que envolvem desde concepção

e modificação de leis, criação, extinção ou aprovação de impostos, taxas e

tributos, gestão orçamentária em todas as esferas (municipal, estadual e

federal), até a concepção, aprovação e gestão da implantação de grandes obras

de infraestrutura, é reflexo das características e das ideias da classe detentora

do poder, que por sua vez foi eleita através do voto obrigatório de um eleitorado

em sua maioria com pouca ou nenhuma instrução e consequentemente com um

baixo ou nenhum nível de conhecimento em relação as questões mais relevantes

do país.

Nos últimos anos, a partir do 1º mandato do presidente Luiz Inácio Lula

da Silva, estamos observando claramente as consequências do populismo na

política e na economia. Não existe por parte do governo e sua base aliada, uma

intenção e muito menos um pequeno esforço no sentido de reduzir a dimensão

do estado e do intervencionismo. Além disso, cada vez mais o que se observa é

que, neste contexto de um estado de dimensões paquidérmicas e o excesso de

intervenção deste na economia, a total incapacidade e muitas vezes a má

intenção dos agentes do estado envolvidos na gestão de empresas ligadas ao

governo. Os maiores exemplos são os objetos das investigações da Operação

Lava Jato, que vem deflagrando inúmeros casos de corrupção na Petrobrás

envolvendo líderes do governo, detentores de cargos por estes indicados,

grandes empreiteiras e empresas contratadas, entre outros agentes que tem por

objetivo, através de práticas criminosas, favorecer campanhas eleitorais em

troca de contratos, bem como enriquecer de forma ilícita determinados membros

da organização criminosa.

Todos estes fatores prejudicam o desenvolvimento do país em diversos

setores, incluindo educação, saúde, saneamento básico e infraestrutura. Para se

ter uma ideia, dados de estudos realizados pelo Departamento de

Competitividade e Tecnologia (Decomtec) da Fiesp (Federação das Indústrias

de São Paulo) em 2008, indicam os prejuízos econômicos e sociais ocasionados

pela corrupção, chegando a um valor de R$ 69 bilhões por ano. Sem esta cifra,

Page 25: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

24

a renda per capita do país ser 16 % maior. Após a deflagração da Operação

Lava Jato, sozinha, já se pode imaginar um aumento significativo desta cifra.

Para a educação, sem este número da corrupção, o número de

matriculados no ensino fundamental da rede pública saltaria dos 34,4 milhões

para 51 milhões de alunos, representando um aumento de 47 %. Já podemos

perceber que teríamos uma melhora no nível educacional do eleitorado brasileiro

a médio e longo prazo. Aqui cabe uma questão: qual é o real interesse dos

governantes populistas em ter um eleitorado com nível educacional no mínimo

básico? Infelizmente, governos como o atual não incentivam de forma adequada

a educação no país. E quando o fazem, trazem propostas como aquela do

Mercadante anteriormente mencionada. Se pensarmos na saúde, a quantidade

de leitos para internação na rede pública (SUS), poderia crescer 89%, com cerca

de 320 mil leitos adicionais. Na habitação, o aumento de moradias populares

chegaria a 74%. No saneamento, a quantidade de domicílios atendidos, que

segundo a estimativa do PAC no período de 2008 era de 22.500, o serviço

poderia crescer cerca de 104 %, diminuindo riscos de saúde e a mortalidade

infantil. Por último, na infraestrutura, seriam acrescidos 13.230Km de ferrovias,

representando um aumento de 525 % para o escoamento da produção nacional.

Nos portos, dos 12 existentes, poderiam saltar para 184, representando um

aumento de 1537 %. Nos aeroportos, poderiam ser implantados mais 277 novos,

representando um acréscimo de 1383 %. Estima-se que, se considerarmos a

corrupção, a ineficiência do Estado, as falhas de logística e infraestrutura, ao

excesso de burocracia, ao descaso e a falta de planejamento, de cada R$ 100

produzidos no país, R$ 25 são desperdiçados por conta destes fatores. Isto

representa algo em torno de um trilhão de reais.

Segundo a APEOP (Associação Paulista dos Empresários de Obras

Públicas), uma prática comum dos governos é determinar um valor para uma

certa obra e escolher através das licitações uma construtora que cubra o menor

preço, como se fosse um leilão. A consequência disso é a falta de verba durante

as obras. O correto seria o governo conduzir os processos de concorrência

obtendo os valores reais para a implantação do empreendimento, com base em

dados concretos, isto é, projetos em fase adequada para a orçamentação e

Page 26: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

25

planejamento de forma a obter cronogramas e orçamentos mais próximos do

real.

Segundo Hiroshi IETSUGU, presidente da AESabesp, na cultura do

Brasil em governos ditos democráticos, “a vaidade impera sobre às prioridades

sociais, bem como o imediatismo inconsequente sobrepõe ao estudo meticuloso

e cuidadoso nos projetos de grande interesse nacional, articulados e definidos

por técnicos de reconhecido gabarito que deveriam estar à frente destes

projetos.” Esta afirmação comprova o fato de termos no Brasil boa capacidade

técnica, porém os interesses políticos, individuais e partidários ofuscam esta

competência.

Até aqui traçamos o perfil do eleitorado brasileiro, que elege políticos

influenciados, além da característica do eleitorado, por uma cultura histórica que

por sua vez carrega características intrínsecas do individualismo, e que traçam

um perfil da classe governante do país.

Page 27: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

26

5. A IMPORTÂNCIA DO PLANEJAMENTO

Segundo MATTOS (2010), o planejamento é um dos principais aspectos

do gerenciamento, caracterizado por um amplo espectro que engloba custos,

cronograma, gestão de recursos, qualidade, comunicações, entre outros. Ao

planejar, os líderes dos projetos são capazes de priorizar as ações, acompanhar

o desenvolvimento das atividades, comparar o andamento do projeto face aos

parâmetros pré-definidos, como por exemplo as linhas de base de custos e

prazo, bem como tomar as providências necessárias para minimizar os desvios

observados em relação a estes parâmetros. A deficiência do planejamento pode

trazer consequências desastrosas para os projetos, independente do porte. É

claro que as consequências em projetos maiores levam a impactos maiores, que

afetam desde pequenas comunidades até um estado.

Um exemplo de falta de planejamento que levou a um impacto

catastrófico foi a recente ruptura da barragem de Mariana, em Minas Gerais,

ocorrido em novembro de 2015. O acidente destruiu o distrito mineiro de Bento

Rodrigues, e foi caracterizado como o maior desastre do gênero da história

mundial nos últimos 100 anos. As causas ainda estão sendo investigadas, mas

certamente houve falha na identificação dos riscos inerentes aos projetos e

implantação das obras, falhas estas que abrangem falhas técnicas e de gestão.

O impacto do acidente não se limitou ao distrito de Bento Rodrigues, visto que

os rejeitos migraram através do rio por cerca de 600 quilômetros. A construção

de barragens são obras que devem ser concebidas com fatores de segurança

considerando períodos superiores a 1000 anos. Acidentes em barragens são

catastróficos e abrangem áreas imensas. Segundo a coordenadora da Bowker

Associates, Lindsey Newland Bowker, que estuda o caso, “todas as catástrofes

na mineração são ocasionadas por erro humano e falhas ao não se seguir as

melhores práticas estabelecidas, o melhor conhecimento, a melhor ciência.”

MATTOS (2010) salienta que as deficiências no planejamento e no

controle estão entre as principais causas da baixa produtividade no setor da

construção civil, de suas elevadas perdas e da baixa qualidade de seus produtos.

Ao planejar um projeto, o líder é capaz de agregar uma visão e um

conhecimento tal que o permite ser mais eficiente e eficaz na condução dos

Page 28: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

27

trabalhos. Abaixo são listados alguns dos vários benefícios proporcionados pelo

planejamento:

� Visão geral e detalhada do empreendimento

� Visualização das situações desfavoráveis e favoráveis (riscos)

� Conhecimento do orçamento e do cronograma e de sua viabilidade

� Otimização da alocação dos recursos existentes e futuros

� Definição de parâmetros para monitoramento e controle

� Padronização

� Definição e acompanhamento de metas

� Rastreabilidade de documentação

� Criação de um histórico ou um importante ativo de processo

organizacional

� Agilidade nas decisões

Na grande maioria dos casos os projetos são concebidos com recursos

e prazos limitados. Através do planejamento é que a viabilidade e a factibilidade

do projeto será confirmada. É função do líder do projeto indicar quando um

cronograma e/ou orçamento do projeto não poderá ser cumprido com as

restrições impostas, após verificação de todas as alternativas possíveis de

execução com os recursos disponíveis. Eventuais ajustes poderão ser feitos na

fase inicial para adequar o projeto a estas restrições. Um planejamento

inadequado faz com que este fato seja percebido tarde demais, podendo até

inviabilizar o projeto.

Não existe metodologia de gestão de projetos que ignore o

planejamento. Estas metodologias consideram o planejamento como aspecto

fundamental para o sucesso de um projeto.

A mais consagrada metodologia de gerenciamento de projetos, segundo

a entidade denominada PMI – Project Management Institute, elaborou o guia do

PMBOK® Guide- Project Management Body of Knowledge. O guia considera a

fase de planejamento como uma das 5 fases de um projeto, são elas: iniciação,

planejamento, execução, monitoramento e controle e encerramento. Segundo as

melhores práticas de gerenciamento de projetos, o grupo de processos de

planejamento não ocorre somente em uma determinada fase e sim em todo o

Page 29: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

28

ciclo de vida do projeto, visto que as atualizações nos dados do planejamento

deverão ser constantemente realizadas.

KEZNER (2002) salienta os 16 itens para a maturidade do

gerenciamento de projetos. Um dos primeiros itens trata do planejamento, ao

mencionar o comprometimento com o desenvolvimento de planos eficazes no

início de cada projeto. Algumas palavras chave enfatizam a importância do

planejamento nesta abordagem. A palavra comprometimento indica o esforço

que deve ser feito pela equipe de projeto e partes interessadas envolvidas,

inclusive o patrocinador, no planejamento. A palavra eficaz indica que um bom

planejamento não pode ser algo que futuramente será “engavetado”, e sim terá

eficácia em todo o ciclo de vida do projeto. A palavra início obviamente salienta

a importância do planejamento antes das fases de implantação do projeto, porém

o planejamento é algo que deve ser controlado e ajustado em todo o ciclo de

vida do projeto.

Segundo MULKAHY (2008), um planejamento bem elaborado e bem

controlado é o fator determinante do sucesso de um projeto. Ela enfatiza que o

desenvolvimento do plano principal e seus planos subordinados são realizados

de forma gradativa na medida em que vai se ampliando o conhecimento do

projeto nas diversas áreas de conhecimento. Ainda segundo a autora, a

quantidade de tempo gasto na fase de planejamento antes da execução do

projeto, é inversamente proporcional a quantidade de tempo gasto na resolução

de problemas ocasionados por desvios e conflitos a partir da fase de execução.

Em suma, o planejamento pode ser visto como a forma de pensar

antecipadamente sobre como iremos conduzir um projeto com base em aspectos

relacionados aos seus objetivos, suas restrições e limitações de recursos,

necessidades, entre outros. A fase do planejamento prevê o desenvolvimento do

plano do projeto e seus planos subordinados de forma documental, que deve ser

bem compreendida e apoiada pelos patrocinadores, equipes de projeto e outras

partes interessadas a critério da liderança do projeto.

Page 30: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

29

6. ESTATÍSTICAS DOS DESVIOS E FATORES RELACIONADOS

Dados do Ministério do Planejamento levantados em 2012, indicavam

que ao menos 8 das 15 obras mais caras do Programa de Aceleração do

Crescimento (PAC) criado nos governos de Luis Inácio Lula da Silva e Dilma

Roussef, tiveram seus prazos estendidos e quatro tiveram seus custos revistos

para mais, resultando em um montante de R$ 50,7 bilhões em acréscimo de

orçamento. Outras quatro obras estavam em revisão e tiveram seus custos

ampliados ainda naquele ano de 2012, ano em que o programa completava 5

anos.

Segundo levantamento da Confederação Nacional da Indústria (CNI) no

início de 2014, o custo do atraso de 6 obras do PAC, iniciadas pelo menos quatro

anos antes do levantamento, somavam R$ 28 bilhões. O cálculo considerava as

obras de saneamento em Fortaleza (esgotamento sanitário da bacia do Cocó),

o aeroporto de Vitória, o projeto de transposição do rio São Francisco, a ferrovia

de integração Oeste-Leste, na Bahia, o trecho da BR-101 no sul de Santa

Catarina e as linhas de transmissão ligando as hidrelétricas do rio Madeira ao

sistema integrado nacional.

Dentre os problemas que provocaram os atrasos e outros impactos

listados pela CNI, destacam-se a “má qualidade dos projetos básicos, utilizados

para a realização do orçamento e posterior licitação das obras, a demora na

obtenção de licenças ambientais e na realização de desapropriações; a má

gestão dos projetos durante as obras, com superestimativa de benefícios e

subestimativa de prazos e custos; a falta de qualificação técnica e experiência

das equipes que preparam, geram e acompanham os projetos; o viés da decisão

política em detrimento dos critérios técnicos que levam a má fixação de

prioridades e prazos entre outros.”

Segundo reportagem da revista CONSTRUMANAGER, nunca um país

teve tanto tempo e tantos atrasos para realizar um evento como a Copa do

Mundo de 2014, que se tornou mais cara que a soma das últimas 2 copas

(Alemanha e África do Sul). Segundo Cássio Germano, diretor da Portfolio

Gestão e Capacitação e professor do curso de pós-graduação em Gestão de

Projetos da Universidade Estadual do Ceará, ficou evidente no projeto da Copa

Page 31: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

30

de 2014 que “o Brasil não planeja e nem gerencia adequadamente os seus

projetos”.

Germano cita os erros de estimativa como uma das causas dos

problemas. No caso do Maracanã, a estimativa inicial de custos apontavam um

montante de R$ 600 milhões, e ao final do projeto, atingiu R$ 1 bilhão e meio. É

comum desvios de estimativas proporcionais ao nível de detalhamento dos

projetos na fase dos estudos. Estes desvios, em geral não ultrapassam 1,25

(valor real dividido pelo valor estimado), considerando que a base das

estimativas é no mínimo um projeto conceitual. No exemplo em questão, o valor

real é quase o triplo do valor estimado. Outra falha apontada por Germano foi a

concepção dos projetos, que na prática não funcionou pela falta de integração

entre as partes envolvidas – governos municipal, estadual e federal – para os

procedimentos definidos no projeto como as desapropriações, liberação de

recursos, infraestrutura com interfaces nos órgãos de energia, saneamento e

ambientais.

Por fim, Germano completa: “De forma geral, o Brasil não está bem

quando o assunto é gerenciamento de projetos, principalmente quando envolve

a gestão pública. Outros países não tiveram tantas dificuldades em fazer um

evento desse porte. Mas na iniciativa privada o cenário também não é muito

diferente. A maioria das empresas têm problemas em seus projetos.”

Uma pesquisa anual realizada pelo PMI (Project Management Institute),

com cerca de mil empresas brasileiras, indica que 25% das empresas costumam

ter problemas de prazo em seus projetos e 71% apontam problemas de custos.

Outro dado relevante da pesquisa aponta que 14% das organizações

pesquisadas possuem problemas de prazos em todos os projetos e 40% na

maioria das vezes. Ao considerar os custos, 8% delas têm problemas sempre e

39% na maioria das vezes.

Estes dados comprovam que no setor privado, muito menos sujeito aos

vícios e cultura do setor público, também são verificados desvios significativos

nos prazos e custos dos projetos, o que nos leva a crer que falhas ou a falta de

planejamento são fatores que caracterizam um denominador comum entre o

setor público e privado, mesmo que em menor escala no último caso.

Page 32: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

31

7. EVOLUÇÃO NOS ÚLTIMOS ANOS

Infelizmente, nos últimos treze anos de governo do PT, não houve um

esforço para uma redução da dimensão do estado no sentido de torná-lo mais

regulador e menos intervencionista. Mesmo assim, alguns governos, sentindo o

problema da falta de recursos e da pouca eficiência do estado na condução de

grandes projetos de infraestrutura, ao se deparar ao longo de décadas com

projetos superfaturados, inacabados ou concluídos com atrasos que

ultrapassam o dobro do prazo previsto, vêm buscando alternativas para diminuir

os seus gastos e melhorar a eficiência na condução de seus projetos chave.

Um exemplo são as PPP´s – Parcerias Público Privadas. O marco legal

da criação deste modelo ocorreu em dezembro de 2004, através da Lei nº

11.079, que “institui normas gerais para licitação e contratação de parceria

público- privada no âmbito da administração pública.”, seguindo a experiência

deste modelo em países europeus, como Portugal, Espanha e principalmente a

Inglaterra que se tornaram especialistas no modelo análogo, as PFI´s – Project

Finance Iniciatives. Segundo o Ministério do Planejamento, as PPP´s são

caracterizadas por contratos entre o setor público e o privado com o objetivo de

entregar um projeto ou um serviço tradicionalmente atribuído ao poder público,

em benefício da população.

Segundo estudo realizado pelo Fórum de Contratação e Gestão Pública,

tomando como exemplo o projeto de Modernização do Complexo do Mineirão

para a Copa do Mundo de 2014, através de estudo de VFM – Value for Money,

comparando o investimento do Poder Concedente (Estado) no modelo da PPP

com a modalidade de contrato público tradicional, constatou-se que a

contratação através da PPP é a alternativa mais vantajosa para o Estado, por

apresentar um menor VPL (valor presente líquido), caracterizando uma

economia significativa para o governo do estado de Minas Gerais. Ainda não

foram levantados dados de redução de cronograma comparados aos parâmetros

das obras públicas tradicionais, mas mesmo com os atrasos verificados em todas

as obras da Copa de 2014, ainda assim notou-se uma eficiência maior da

iniciativa privada na execução das obras e consequentemente na redução de

prazos se comparados com as obras públicas tradicionais.

Page 33: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

32

Outro exemplo de utilização do modelo de PPP como alternativa de

redução de gastos por parte do Estado, é a Linha 4 – Amarela do Metrô de São

Paulo. O estado de São Paulo agiu de forma pioneira ao utilizar esta modalidade

em um setor de tamanha importância que é o de transporte público. No caso da

Linha 4, o Governo do Estado de São Paulo previa desembolsos da ordem de

73 % do investimento total da linha, composto pelas obras civis, e o restante, de

27 %, foi atribuído ao Consórcio (iniciativa privada), responsável pelas obras de

sistemas.

Esta forma de contratação híbrida utilizada na Linha 4, onde parte do

empreendimento segue o modelo tradicional e parte o modelo de PPP, acarretou

em diversos problemas de interface entre as áreas de civil (modelo de obra

pública) e sistemas (modelo da PPP), dada a complexidade e a quantidade de

interfaces entre estas áreas. Estas lições aprendidas nortearam o modelo

utilizado para a Linha 6 – Laranja, conhecida como linha universitária, onde o

governo do Estado, tendo em vista as dificuldades encontradas no modelo da

linha 4, optou por um modelo de contratação “integrada”, onde os pacotes de

civil, sistemas e material rodante foram incorporados pelo consórcio privado.

Neste modelo da Linha 6, o Poder Concedente (Estado), se torna um mero

fiscalizador, onde sua atribuição é garantir que o projeto siga as normas e

padrões de implantação e operação da linha, sem arcar com os gastos inerentes

a um projeto desta magnitude. A Concessionária (grupo de empresas privadas),

por sua vez, terá a obrigação de implantar e operar a linha, por um período pré-

estabelecido em contrato, sendo remunerado pela cobrança dos bilhetes dos

usuários.

Os exemplos do Metrô são importantes, pois demonstram a intenção do

governo do Estado de São Paulo no setor de transportes metroviários, pioneiro

na contratação através de PPP, no sentido de otimizar os seus projetos, os quais

são gerenciados por um corpo técnico reconhecido como um dos mais

competentes dentro do setor público no Brasil. Se no Metrô vislumbra-se uma

alternativa de contratação diferente da tradicional (obras públicas), podemos

imaginar a diferença deste modelo para a modalidade de PPP em outros setores,

carentes de um corpo técnico como o do Metrô de São Paulo. O governo do

Estado de São Paulo, já pensando em futuras PPP´s, criou um órgão exclusivo

Page 34: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

33

para a fiscalização das PPP´s, a CMCP – Comissão de Monitoramento das

Concessões e Permissões, órgão diretamente ligado à STM – Secretaria de

Transportes Metropolitanos. É importante salientar ainda, que no caso do Metrô,

como será observado em uma das entrevistas com um ex-presidente do órgão,

existem sim equipes técnicas empenhadas no planejamento de projetos até a

sua contratação, de forma muitas vezes exaustiva. É comum neste órgão

estudos de novas linhas que levam anos e até décadas até a viabilização para a

contratação. O que se observa é a presença de fatores políticos que envolvem

as mudanças de governo que alteram os focos dos projetos, comum na história

dos grandes projetos de infraestrutura do Brasil.

Espera-se, em empreendimentos seguindo os modelos de contratação

através das PPP´s, uma maior eficiência e consequentemente menores desvios

em prazos e custos, dada a maior competência do setor privado em relação ao

setor público, historicamente conhecido pela burocracia e morosidade nos

processos decisórios, além das questões políticas anteriormente mencionadas

(desvios de verbas, corrupção, nomeação de cargos políticos, mudança de

governos com diferentes interesses e objetivos, entre outros).

No sentido contrário às vantagens observadas no modelo das PPP´s

encontra-se o risco de eventuais inadimplências. Segundo MONTEIRO (2014, p.

12), “um fator bastante relevante para que as desestatizações não tenham

atingido um nível de excelência que delas se espera consiste na fragilidade das

agências reguladoras ao impor penalidades às concessionárias em casos de

inadimplemento contratual, seja por atraso na realização de investimentos

previstos, seja por deficiências no serviço prestado. Essas vulnerabilidades

derivam de inúmeros fatores, desde a falta de pessoal para supervisionar a

prestação do serviço, o desenho imperfeito de indicadores de desempenho de

difícil aferição até o excesso de burocracia que caracteriza o mecanismo de

imposição de multas, marcado pela pluralidade de instâncias recursais

administrativas.”

Um dos fatores críticos relacionados ao exposto acima está na escolha

do consórcio vencedor, quando o principal parâmetro de análise é o preço. A

escolha do menor preço não necessariamente significa obter o menor custo real

ao final do empreendimento-ONT (Orçamento no Término). É preciso verificar

Page 35: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

34

não só através das equalizações dos preços entre os consórcios, envolvendo

equipes técnicas das diversas áreas (engenharias, econômica, jurídica, etc),

como também a factibilidade do preço e do prazo apresentado pelo vencedor.

Ao final do processo de escolha do vencedor, antes da assinatura do contrato, é

preciso ter a resposta para a seguinte pergunta: A empresa ou consórcio

vencedor tem condição técnica, jurídica e econômica para cumprir o contrato no

preço por ela indicado, sem pleitos ou custos adicionais e no prazo estipulado

em contrato? Se existir dúvidas a respeito desta questão, a empresa

imediatamente abaixo deve ser consultada e assim sucessivamente, até a

comprovação de que o custo e o prazo estimado para o projeto é real e factível.

No Brasil, é comum os governos se aterem exclusivamente aos preços nas

licitações, o que acarreta em desvios enormes de prazo e custo ao final do

empreendimento. Estes fatores contribuíram negativamente para uma cultura

enraizada nas grandes empreiteiras do país que contam com pleitos antes

mesmo de iniciar o projeto, na fase de concorrência. Não vamos aqui abordar as

questões éticas que envolvem a formação de cartéis, que além de maximizar de

forma ilícita as margens de lucro, ainda contam com os aditivos e pleitos de

reequilíbrio para obter ainda mais lucros de forma ilegal.

Em suma, os governos de uma forma geral já identificaram a

necessidade de reduzir os seus gastos e contar com a iniciativa privada na

condução dos seus projetos chave. As PPP`s, mesmo tendo muito o que evoluir

no Brasil, tornaram-se uma alternativa que deverá ser cada vez mais utilizada

nestes governos.

Page 36: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

35

8. MODELOS NOS PAÍSES DESENVOLVIDOS

A agência Office of the State Controller, órgão de auditoria independente

do estado de Nova York, publicou em 2013 um relatório denominado “Private

Financing of Public Infrastructure: Risks and Options for New York State”, com o

objetivo de apresentar recomendações ao Estado americano sobre a utilização

dos modelos de PPP´s (parcerias público-privadas).

O relatório aponta que este modelo vem sendo cada vez mais utilizado

no Estado de Nova York e no restante do país. No entanto, o relatório questiona

a eficiência do emprego de recursos públicos através de contratos de longo

prazo. Dentre os pontos salientados no relatório, algumas desvantagens foram

apontadas, a saber:

� O comprometimento das finanças públicas pelo financiamento privado; � Os pagamentos por disponibilidade podem ser ineficientes a longo prazo � Os contratos de longo prazo podem não representar a melhor alternativa

Uma outra pesquisa denominada “The future of the finance iniciative and

public private partnership”, realizada por pesquisadores das universidades de

Ulster e de Aberdeen, aborda os níveis de maturidade dos potenciais mercados

de atuação das PPP´s em países como Austrália, Canadá, Índia, Estados Unidos

e Reino Unido. O relatório aponta haver mais espaços para a utilização das

PPP´s, facilitando assim o suprimento das necessidades de investimento na área

de infraestrutura nestes países. Este mesmo relatório aponta o Brasil em um

momento, classificando em nível médio de atividade e baixo de sofisticação.

Um ponto importante a ser novamente salientado é que a inciativa

privada, como fonte de recursos para a realização de grandes projetos de

infraestrutura, reduzem a dimensão do Estado que por sua vez poderá

concentrar esforços na fiscalização e condução de outros projetos de interesse

público, sem o ônus demandado pelos grandes projetos de infraestrutura. É

importante também considerar a maior eficiência da iniciativa privada face ao

setor público, mesmo nos países de primeiro mundo, que enxergam entre as

vantagens das PPP´s, a maior transparência. Além disso, as empresas privadas

modernas estão sujeitas a normas e diretrizes (compliance), que as obrigam a

ser transparentes, condição esta necessária para estar atuante no mercado.

Page 37: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

36

9. CONCLUSÃO

Os grandes projetos do Brasil principalmente na área de infraestrutura,

em geral apresentam atrasos e acréscimos de custos em seus orçamentos, não

só no Brasil como em países de primeiro mundo como EUA e Alemanha. É fato

que no Brasil estes desvios são maiores e ultrapassam os limites considerados

aceitáveis de acordo com as melhores práticas e os mais sofisticados

conhecimentos em gerenciamento projetos. Para se ter uma ideia, segundo o

guia de gerenciamento de projetos do PMI (PMBOK®), estimativas de projetos

nas fases iniciais variam de -25% a +75%. No início da fase de planejamento,

quando temos, por exemplo, um projeto de concepção definido, estes desvios

podem variar de -10% a + 25%. Ao final da fase de planejamento, tendo por

exemplo como base um projeto básico de um grande empreendimento de

infraestrutura, deveríamos verificar ao final do empreendimento desvios de -5%

a + 10%. Esta última estimativa, denominada definitiva deve ser adotada como

meta.

O que se nota no Brasil são desvios que ultrapassam a casa de 200%,

isto quando o projeto é concluído, pois é comum termos projetos inacabados e

paralisados por fatores como: falta de recursos, mudança de governo que adota

outras metas sem se preocupar com os recursos já gastos em projetos

anteriores, corrupção, entre outros.

Desvios desta magnitude certamente estão associados a falta de

planejamento. No entanto, este trabalho comprova a existência de outros fatores

associados. Interesses políticos, que envolvem casos de corrupção, aliados a

aspectos de impunidade, impulsionados por fatores culturais e humanos

influenciados diretamente pelo contexto dos períodos antes e após a república

com os personagens que fizeram a história do país e suas características

(colonizadores, escravos e seus exploradores, comerciantes, entre outros),

criaram uma esfera que definiu a estrutura política e social do país. A

característica do individualismo dos povos ibéricos determinam um fator comum

na estrutura política e social de suas antigas colônias. Todas foram, em algum

momento, sujeitas a regimes ditatoriais e populistas, que encontram campos

vastos e férteis para desvios de recursos públicos com interesses individuais e

partidários. Outra característica comum destes regimes é a tendência

Page 38: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

37

intervencionista do Estado, e não regulador como forma muito mais salutar de

governo. Para estes governos populistas, a dimensão do Estado é vista de forma

distorcida como diretamente proporcional ao êxito dos seus governos, que

buscam sempre meios, na maioria das vezes ilegais, de se perpetuar no poder.

Ter um eleitorado com pouca ou nenhuma educação convém para estes

governos, que buscam formas de convencer através de discursos populistas.

Os projetos essenciais para o país, dentro do contexto mencionado,

tornam-se oportunidades para interesses políticos obtusos e, por consequência,

são verificados os péssimos resultados indicando desvios fora da realidade do

contexto de projetos.

Seria uma injustiça atribuir única e exclusivamente aos técnicos e

engenheiros do Brasil, que conta com diversos profissionais de qualidade

comparados aos profissionais de países desenvolvidos, a culpa da falta de

planejamento em nossos projetos. Ela existe sim, mais é consequência de nossa

estrutura política e social, diretamente influenciada pela nossa história desde o

período colonial, que proporciona um terreno fértil para os desvios ocasionados

por interesses de pequenos grupos com características marcantes de um

individualismo nocivo para a nossa nação.

Page 39: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

38

REFERÊNCIAS

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Page 41: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

40

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41

ANEXO B – TERMO DE COMPROMISSO

O aluno Laudo Brancato, abaixo-assinado, do Curso MBA Executivo: Internacional em Gerenciamento de Projetos, Nível de Especialização, oferecido pelo programa FGV Online, da Fundação Getúlio Vargas, no período de 18/07/2014 a 06/08/2016, declara que o conteúdo de seu Trabalho de Conclusão de Curso intitulado: Fatores que influenciam nos desvios de prazo e orçamento das grandes obras do Brasil, é autêntico e original.

São Paulo, 06 de agosto de 2016

_________________

Laudo Brancato

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42

APÊNDICE A – ENTREVISTAS

Para subsidiar este trabalho, foram realizadas algumas entrevistas com os

seguintes pré-requisitos:

I. Critérios de escolha dos entrevistados

A seguir serão descritos os critérios de escolha dos entrevistados:

a) Profissionais com no mínimo 20 anos de experiência

b) Atuação na área de grandes empreendimentos de infraestrutura

(investimentos acima de R$ 1 bilhão)

c) Vivência em todo o ciclo de vida de no mínimo 3 grandes

empreendimentos conforme critério do item supra

II. Questões

A seguir são descritas as questões que devem ser apresentadas aos

entrevistados.

a. Em sua experiência em grandes empreendimentos na área de

infraestrutura, quantos ou qual porcentagem aproximada

apresentaram atrasos e/ou acréscimos significativos de

orçamento?

b. A qual ou quais fatores você acha que estes desvios podem ser

atribuídos?

c. Em sua opinião, quais ações podem ser tomadas para minimizar

ou anular estes desvios?

III. Critérios para redação e validação das entrevistas

Após a realização da entrevista, um texto com base nas anotações feitas

durante a entrevista, é elaborado para a validação do entrevistado, tendo este

como terceira pessoa, que deverá autorizar informalmente a indicação do seu

nome no trabalho, como entrevistado.

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1º Entrevistado – Data da entrevista: 12/02/2016

Entrevistado: Caetano Jannini Neto

Cargo / Função: Membro da CMCP – COMISSÃO DE MONITORAMENTO

DAS CONCESSÕES E PERMISSÕES - SECRETARIA DE ESTADO DOS

TRANSPORTES METROPOLITANOS – STM.

GOVERNO DO ESTADO DE SÃO PAULO

Breve histórico: Físico formado pela USP – Universidade de São Paulo,

atua há mais de 40 anos no METRÔ de São Paulo, chegando a diretoria na

área de Planejamento, e presidência no período entre 1995 e 2001.

Resp.: Os grandes empreendimentos na área de infraestrutura realizados no

Brasil têm, por natureza, orçamentos muito elevados e longos prazos de

viabilização e implantação. Podemos afirmar que todos, na área de transporte

metropolitano, apresentaram atrasos e acréscimos em seus orçamentos

originais.

Um fato relevante neste contexto está relacionado às questões políticas,

principalmente a questão da natureza transitória destes empreendimentos

entre mandatos de governos distintos. Em um segundo plano, podemos

considerar o fator da instabilidade econômica, historicamente conhecida no

Brasil.

Os prazos de estudos, viabilização e implantação de projetos metroviários

ultrapassam 10 anos. Um mesmo governo, mesmo contando com a sua

reeleição, dificilmente terá participação em todo o ciclo de vida de um mesmo

empreendimento. Esta transição de governos, na maioria das vezes traz

conflitos de interesses, mudando prioridades e as vezes até paralisando

empreendimentos inacabados, o que segundo estudos de órgãos

especializados, é um dos fatores que mais onera um empreendimento.

Em direção contrária ao que muitos pensam, a falta de planejamento não é o

fator responsável pelos desvios. Nos empreendimentos do METRÔ, em geral,

prazos longos são gastos nas fases de pré-implantação, envolvendo equipes

técnicas competentes em estudos de viabilidade e planejamento de novas

linhas.

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Devido ao alto grau de complexidade destes empreendimentos e seus prazos

longos sujeitos as diversas dificuldades político-econômicas, riscos não

identificáveis nas fases iniciais de planejamento são fatores que também

influenciam os desvios de prazo e orçamento. Protestos de comunidades

influenciadas pelos empreendimentos, reivindicações de diversos setores da

sociedade que pressionam os governos, além dos fatores políticos e

econômicos supracitados são exemplos de riscos, muitas vezes não

identificáveis ou não quantificáveis, que também influenciam os desvios.

Uma das ações dos governos em alguns estados na tentativa de minimizar

estes desvios, é a migração do formato contratual de empreendimento público

para a Parceria Público Privada (PPP). Esta modalidade contratual sofre

menos influência das questões políticas mencionadas, porém estas influências

jamais serão nulas.

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2º Entrevistado – Data da entrevista: 18/02/2016

Entrevistado: José Geraldo de Almeida Monteiro

Função: Resp. pela área de planejamento – Consórcio Expresso Linha 6 do

Metrô de São Paulo

Breve histórico: Engenheiro Civil formado pela Universidade de São

Paulo – USP – 1977, atua há mais de 39 anos na área de infraestrutura de

transportes (rodoviários e metroviários).

Resp.: As grandes obras de infraestrutura do Brasil apresentaram e ainda

apresentam significativos atrasos e acréscimos no orçamento, podendo afirmar

que isto ocorre na grande maioria destes empreendimentos. Estes desvios são

maiores quando comparados aos desvios observados na Europa e EUA.

Um fator comum destes desvios está relacionado ao baixo investimento na

área de projetos. No Brasil, segundo dados de grandes empresas do setor de

construção civil, trabalha-se em uma faixa aproximada de 5 % do valor total do

investimento em projetos. Esta faixa aumenta nos países da Europa e nos

Estados Unidos, dobrando para 10%.

Esta carência na área de projetos é geralmente verificada desde a fase pré-

contratual, isto é, na fase de elaboração dos editais que deverão ser base para

as licitações e/ou contratações. Na fase pós-contratual, as empresas se

deparam com prazos reduzidos para a elaboração dos projetos básicos e

executivos.

Além do baixo investimento em projetos, os prazos para a elaboração são

reduzidos. É comum verificarmos, nas grandes obras públicas do Brasil, o

início das obras em paralelo ao desenvolvimento de projetos, o que

seguramente compromete o empreendimento em termos de prazo, orçamento,

qualidade, riscos, entre outros aspectos.

Na tentativa de melhoraria deste quadro, o entrevistado concorda que as

parcerias público privadas são uma forma de reduzir estes desvios. Nestes

modelos contratuais, os empreendimentos estarão livres dos modelo de

licitação pública baseada na Lei 8666, que prioriza o baixo custo com menor

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46

atenção a qualidade dos serviços prestados pelas empresas subcontratadas,

entre elas, as empresas de projetos.

3º Entrevistado – Data da entrevista: 19/02/2016

Entrevistado: Flavio Jose Linhares

Função: Engenheiro Civil - Coordenador de Contrato – Consórcio

Concremat Setec - Linha 6 do Metrô de São Paulo – (empresa certificadora)

Breve histórico: Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal do

Paraná – UFPR, atua há mais de 22 anos na área de infraestrutura de

transportes (rodoviários e metroviários).

O entrevistado afirma que todos os empreendimentos que vivenciou

apresentou atrasos no cronograma e acréscimos significativos no orçamento.

Ele atribui os desvios principalmente a interesses políticos que norteiam os

parâmetros de prazo e custos dos empreendimentos, de acordo com os

mandatos de governo e com as estratégias políticas que envolvem campanhas

eleitorais, interesses partidários, alianças políticas, rivalidades políticas, entre

outros.

Segundo o entrevistado, o planejamento em obras públicas é totalmente

ofuscado pelos interesses políticos, ficando em segundo plano e muitas vezes

inexistente.

Ele cita empreendimentos ferroviários que vivenciou, os quais as obras

iniciaram com sondagens locadas a cada 5 Km, o que comprova a falta de

planejamento e principalmente dos dados iniciais para a elaboração dos

projetos, os quais, como indicado pelo entrevistado anterior, são elaborados de

forma inadequada e concomitante as obras de implantação, o que somado os

fatores políticos aqui indicados, aumentam ainda mais o risco de desvios.

Como exceção à regra, ele cita o exemplo do IPPUC (Instituto de Pesquisa e

Planejamento Urbano de Curitiba), criada por Jaime Lerner em 1965, como um

órgão politicamente independente, responsável pelo plano diretor da cidade de

Curitiba que até hoje é tido como modelo para alguns urbanistas. Neste caso,

foi possível adotar o planejamento como base para os projetos de Curitiba, em

sentido contrário a maior parte das obras públicas do país.

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47

4º Entrevistado – Data da entrevista: 17/03/2016

Entrevistado: César Augusto Broetto

Função: Engenheiro Civil - Implantação – Concessionária Move São Paula

- Linha 6 do Metrô de São Paulo

Breve histórico: Engenheiro Civil formado pela Universidade de São

Paulo – USP em 1975, atua há mais de 40 anos na área de infraestrutura.

O entrevistado menciona que grande parte dos empreendimentos de

infraestrutura que vivenciou no Brasil apresentaram atrasos e acréscimos de

orçamento. Ele comparou a sua experiência no exterior, quando atuou como

engenheiro na área de infraestrutura na Austrália, mencionando que lá

observou casos em que o cronograma foi cumprido, bem como o orçamento.

O entrevistado apontou o conceito do Front End Loading (FEL), que é uma

ferramenta de gerenciamento de projetos que estrutura as fases de

desenvolvimento de um projeto, estabelecendo critérios para a verificação da

maturidade de cada etapa, com o objetivo de otimizar os parâmetros de custo,

qualidade e prazo dos projetos, verificando a viabilidade e maturidade em cada

fase. Ele menciona de maneira geral as fases, a saber:

� FEL 1 - Visualização - Fase de estudo de viabilidade através de dados

coletados de forma macro, sem projeto conceitual, somente utilizando

análises com base em outros projetos (estimativa análoga).

� GATE 1 – É viável? Aprovação para a fase seguinte.

� FEL 2 – Conceituação - Em caso afirmativo na resposta do GATE 1,

inicia-se o desenvolvimento do anteprojeto, quando é feito um novo

estudo de viabilidade com um nível de detalhamento maior, e em

seguida é feito um novo estudo de viabilidade.

� GATE 2 – O projeto ainda é viável? Aprovação para a fase seguinte.

� FEL 3 – Definição - Em caso afirmativo da questão do GATE 2, inicia-se

a elaboração do projeto básico, com uma nova confirmação da

viabilidade do empreendimento. A partir desta fase, já é possível iniciar

os processos de aquisições.

� GATE 3 – Verificação da viabilidade e aprovação para a fase seguinte.

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� FEL 4 – Implantação - Não havendo mudanças de escopo com a

confirmação da viabilidade (GATE 3), inicia-se o projeto executivo e a

implantação.

Segundo o entrevistado, o que é comum nos grandes empreendimentos de

infraestrutura do Brasil, principalmente falando de obras públicas, é que muitas

vezes o que se nota é o início dos processos de aquisição no FEL 2, as vezes

até no FEL 1, sem dados suficientes para uma precificação e definição de

prazos que deveriam nortear os processos de aquisições. Este fator é

influenciado por interesses políticos que comprometem o planejamento do

empreendimento. Por exemplo, a imposição de prazos com base nas gestões

de determinados governantes, sem se ater ao fato do prazo não ser factível

naquele determinado período.

Outra questão apontada pelo entrevistado é a descontinuidade de

disponibilização de recursos por parte dos governos, o que compromete

significativamente as linhas de base dos empreendimentos.

Ele aponta ainda a questão das grandes margens de lucro praticadas pelas

grandes empreiteiras durante um longo período de tempo, até o início dos anos

90, que de certa forma afrouxava a gestão devido a permanência em uma zona

de conforto de lucro. Isto mudou nos tempos atuais, com o acirramento da

concorrência e com o princípio do final do oligopólio das empresas executoras.

Sem estes fatores, o entrevistado admite que no Brasil existem profissionais

extremamente competentes e empenhados na área de planejamento, e que em

condições adequadas de recursos e parâmetros de prazo e custos, é possível

minimizar sensivelmente os desvios podendo executar os empreendimentos

dentro dos parâmetros pré-estabelecidos.

Como alternativa de melhoria, o entrevistado aponta a migração dos contratos

de obra públicas com base na Lei 8666, para as concessões patrocinadas ou

Parcerias Público Privadas (PPP). Esta é uma forma de trazer racionalidade

econômica aos empreendimentos, com menor influência de fatores e

interesses políticos. Porém, ele salienta a importância dos benefícios sociais

resultantes destes empreendimentos, que devem ser considerados em

conjunto aos interesses intrínsecos da iniciativa privada, que é a obtenção do

Page 50: TCC_Laudo Brancato_UCI SP 20 T1

49

lucro. Estes benefícios devem ser apoiados tanto pelo Estado quanto pelas

empresas envolvidas nestes grandes projetos.