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  • 1. 1 UNIVERSIDADE DE SO PAULO FACULDADE DE ECONOMIA, ADMINISTRAO E CONTABILIDADE EAD0601 - Trabalho de Concluso de Curso II COMRCIO ELETRNICO NA INDSTRIA BRASILEIRA DE ELETRODOMSTICOS: Um estudo dos efeitos da Internet sobre os preos do mercado RAFAEL SAMPAIO DE S1 Orientador: Dr. Antnio Carlos Aidar Sauaia2 So Paulo, 2006 1 Aluno do 8 semestre do curso de graduao em Administrao - FEA USP 2 Professor do departamento de Poltica dos Negcios e Economia de Empresas da FEA USP

2. 2 RESUMO Durante a ltima dcada, a Internet revolucionou o mundo dos negcios. Provendo um rpido e eficiente fluxo de informaes, a rede mundial de computadores estabeleceu novas bases de competio em inmeras indstrias, como os setores bancrio, de transporte areo, editorial e fonogrfico. Afetou tambm as estruturas produtivas, permitindo maior eficincia nos processos e menores custos de transao ao longo do sistema de valor. Embora seja uma fonte de valor econmico, no h direitos de propriedade bem definidos sobre a Internet. Dia aps dia, mais e mais consumidores ganham acesso informao livre e em tempo real, transmitida por milhares de sites espalhados pelo mundo. No entanto, ainda difcil determinar exatamente at que ponto os consumidores podem utilizar essa informao como forma de capturar uma maior fatia do excedente econmico trocado nas transaes comerciais. Neste trabalho, analisa-se como as ferramentas de busca e comparao de preos como Buscap e Bondfaro podem influenciar as decises de preos nas indstrias, reduzindo os lucros obtidos pela assimetria de informao. Para isso, examinam-se dados de preos de eletrodomsticos de linha branca coletados no Brasil durante o primeiro semestre de 2006. Os resultados indicam que, comparada do varejo tradicional, a variao de preos tende a ser menor na Internet, confirmando assim que a informao acessvel pode realmente levar os preos de mercado a um ponto mais prximo de um preo justo. Finalmente, discutem-se os possveis impactos desse fenmeno sobre o comportamento do consumidor e as demais foras que determinam a atratividade da indstria de linha branca. Palavras-chave: Eletrodomsticos, linha branca, Internet, comrcio eletrnico, preos, valor da informao. 3. 3 ABSTRACT During the past decade, the Internet has revolutionized the way firms do business across the world. By providing rapid and efficient exchange of information, the World Wide Web has already set new basis for competition in many industries, such as banking, airline transportation, books, press and music. It also affected the productive structures, allowing more efficient processes and less transaction costs within the value system of most industries. Despite being a source of economic value, the Internet is not a private propriety. Day after day, more and more consumers gain access to free real-time information provided through millions of websites. However, it is hard to determine exactly to which extent consumers may use information in order to capture a bigger share of the economic value traded with organizations. In this paper, I analyze how the product search and price comparison tools such as Froogle may influence price decisions within industries by reducing the profits obtained from asymmetric information. To do so, I examine home appliances prices collected in Brazilian market during the first semester of 2006. The results indicate that, compared to the traditional retail channels (e.g.: supermarkets, department stores and specialty stores), price ranges tend to be smaller on the Internet, therefore confirming that accessible information might actually drive market prices to an equilibrium point closer to the fair price. Finally, I discuss the possible impacts of this phenomenon on consumer behavior and the other forces that determine the attractiveness of the home appliances business. Key words: Home appliances, white line, Internet, e-commerce, prices, information value. 4. 4 SUMRIO 1. O valor econmico da informao ..............................................................................7 2. A indstria de eletrodomsticos brasileira: impresses iniciais..................................12 3. Compreendendo o mercado de eletrodomsticos no Brasil........................................16 3.1. Definio da indstria .......................................................................................19 3.2. A tipologia de Porter.........................................................................................25 3.2.1 Posicionamento dentro das indstrias ........................................................27 3.2.2 Anlise estrutural das indstrias ................................................................30 3.3. Anlise estrutural da indstria de linha branca...................................................37 3.3.1 Rivalidade interna .....................................................................................41 3.3.2 Novos entrantes.........................................................................................44 3.3.3 Ameaa de substitutos...............................................................................45 3.3.4 Poder dos fornecedores (fornecedores de ao) ...........................................46 3.3.5 Poder dos clientes (canais de distribuio).................................................49 4. Comrcio eletrnico no Brasil...................................................................................55 5. Comportamento do consumidor................................................................................63 5.1. Etapas do processo de tomada de deciso do consumidor sob condies de alto envolvimento (Exemplo: compra de um refrigerador)...................................................67 6. Informao assimtrica e as ferramentas de busca e comparao de preos...............77 7. Variao de preos na indstria de eletrodomsticos anlise quantitativa ...............91 7.1. Metodologia......................................................................................................91 7.1.1 Teste 1 Diferena de variabilidade dos preos ........................................94 7.1.2 Teste 2 Diferena entre preos mdios....................................................97 7.2. Resultados ........................................................................................................99 8. Consideraes finais............................................................................................... 108 8.1. Limitaes do estudo ...................................................................................... 111 8.2. Sugestes de novos estudos............................................................................. 111 9. Referncias............................................................................................................. 113 5. 5 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Estratgias genricas ........................................................................................29 Figura 2 - Cinco foras de Porter......................................................................................31 Figura 3 Representao grfica do modelo de negcios - Casas Bahia ...........................52 Figura 4 - Modelo genrico de tomada de deciso do consumidor ....................................65 Figura 5 - Conjuntos de marcas e produtos resultantes do processo de busca interna.........68 Figura 6 - Representao grfica de um modelo compensatrio de escolha.......................71 Figura 7 - Representao da regra conjuntiva de escolha ..................................................72 Figura 8 - Representao grfica da regra disjuntiva de escolha........................................73 Figura 9 - Representao grfica das regras conjuntiva e disjuntiva de escolha.................73 Figura 10 - Representao grfica da heurstica de eliminao por aspectos......................73 Figura 11 - Representao grfica do modelo de escolha lexicogrfico.............................74 Figura 12 - Representao grfica da heurstica de frequncia ..........................................74 Figura 13 - Estratgia de escolha gradual..........................................................................75 Figura 14 - Filtros por atributos no Buscap .....................................................................85 Figura 15 - Filtros por atributos no Bondfaro....................................................................86 Figura 16 - Filtros por atributos no Preomania ................................................................86 Figura 17 - Filtros por atributos no Froogle ......................................................................87 Figura 18 - Comparao pareada de ofertas no Buscap ...................................................88 Figura 19 - Comparao pareada de ofertas no Bondfaro..................................................89 Figura 20 - Comparao pareada de ofertas no Preomania ..............................................89 Figura 21 - Principais pontos do estudo .......................................................................... 110 6. 6 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Lucratividade no setor de eletrodomsticos de linha branca..............................13 Tabela 2 - Segmentao da Indstria de Eletrodomsticos ................................................20 Tabela 3 - Associados ELETROS.....................................................................................20 Tabela 4 - Volume de vendas industriais...........................................................................22 Tabela 5 - Matriz de correlao ........................................................................................22 Tabela 6 - Penetrao de mercado dos produtos de linha branca .......................................39 Tabela 7 - Ranking dos pases por nmero de internautas .................................................59 Tabela 8 - Preparao e organizao dos dados bsicos ....................................................93 Tabela 9 Formato da base de dados................................................................................94 Tabela 10 - Nmero de produtos por categoria na amostra analisada ................................99 Tabela 11 - Estatsticas................................................................................................... 100 Tabela 12 - Correlaes.................................................................................................. 100 Tabela 13 - Teste t.......................................................................................................... 100 LISTA DE GRFICOS Grfico 1 - Crescimento da produtividade industrial.........................................................17 Grfico 2 - Vendas industriais do complexo eletroeletrnico ............................................18 Grfico 3 - Vendas industriais de produtos por categoria ..................................................38 Grfico 4 Taxas mdias de juros cobradas ao consumidor (% a. a.)................................40 Grfico 5 Rendimento mensal nominal (mdia anual R$) ...........................................40 Grfico 6 Evoluo dos preos e da renda......................................................................40 Grfico 7 - IPA - OG - ferro, ao e derivados (mdia 1997 = 100)....................................47 Grfico 8 - Crescimento do nmero de internautas ...........................................................59 Grfico 9 - Internautas por classe social............................................................................60 Grfico 10 - Distribuio dos internautas por sexo............................................................61 Grfico 11 - Crescimento do e-commerce no Brasil..........................................................61 Grfico 12 Variao de preos por rede varejista, para produtos comparveis em diferentes estados ........................................................................................................... 104 7. 7 1. O VALOR ECONMICO DA INFORMAO Imagine um consumidor fazendo compras num supermercado. Provavelmente ele possui uma grande lista de compras e gostaria de obter a cesta completa de produtos pelo menor custo possvel. Esse objetivo est alinhado com a teoria economia clssica, em que os agentes buscam maximizar o valor econmico. Idealmente, a melhor forma de atingir esse objetivo seria comprar cada um dos itens pelo menor preo oferecido no mercado. Todavia, na prtica, o consumidor ir a um nico supermercado e far a compra completa, pagando mais por alguns itens que poderiam ser encontrados em outros locais a um custo menor. Estaria esse consumidor agindo irracionalmente? A resposta que no necessariamente. Para fazer a melhor compra possvel, o consumidor teria que pesquisar os preos de cada um dos itens em todos os estabelecimentos que o comercializam. Para isso, arcaria com uma srie de custos, que incluem o custo de transporte e o custo de oportunidade. Este ltimo poderia ser, por exemplo, o tempo despendido nesse processo. Grosso modo, esse consumidor poderia aproveitar o tempo dedicado pesquisa de preos para se dedicar a alguma atividade que lhe gerasse renda. Logo, essa renda poderia ser considerada um custo do processo de busca de informao. impossvel mensurar exatamente o montante, mas no h duvidas de que a informao possui um custo e tambm um benefcio econmico para o consumidor. Todavia, num processo de pesquisa de preos, os custos so certos, enquanto os benefcios so incertos. Afinal, antes de pesquisar os preos, o consumidor no pode mensurar a economia que ser obtida. H sempre a possibilidade de que o primeiro supermercado pesquisado possua efetivamente os preos mais baixos. Em funo dessas dificuldades enfrentadas pelo consumidor, muitas redes varejistas obtm ganhos adicionais atravs de estratgias de preos segmentadas por regio ou pblico alvo. O resultado disso que um mesmo produto pode ser encontrado por diversos preos de acordo com a localizao da loja. Esse , por exemplo, o conceito utilizado pelas lojas de bairro de grandes redes como o Carrefour e o Po de Acar. Poder-se-ia argumentar que as lojas de bairro possuem custos mais altos e por isso tm que cobrar preos mais altos. Ademais, oferecem o beneficio da comodidade e permitem que o 8. 8 consumidor se beneficie por no ter que se deslocar at regies mais distantes. De fato, esse benefcio existe e uma das razes do sucesso obtido por esse modelo de loja. No entanto, difcil acreditar que a diferena de preos suficiente apenas para cobrir os custos adicionais. O mais provvel que a empresa obtenha lucros adicionais pela capacidade limitada do consumidor de maximizar o valor. Essa racionalidade limitada devido carncia de informao completa constitui, portanto, uma fonte de valor adicional para as empresas. Para reforar esse ponto, imaginemos agora uma outra situao. Voc um turista ingls em sua primeira viagem a So Paulo. Ao chegar ao aeroporto, se d conta de que no trouxe consigo sua mquina fotogrfica digital. No caminho para o hotel, pergunta ao taxista qual o melhor local para comprar uma mquina semelhante na cidade. Ele indica a rua Santa Efignia, conhecida por concentrar um grande nmero de varejistas que comercializam produtos eletrnicos. Ao chegar l, voc entra em uma das dezenas de galerias existentes em busca da mquina. Ento, se d conta de que a mquina lhe custar R$2.000. Voc a compra e segue seu caminho. Duas quadras a diante, voc encontra a mesma mquina venda numa vitrine por R$1.000 e se questiona como isso pode acontecer. H muitas possibilidades. possvel que o primeiro vendedor possua custos adicionais como um aluguel mais alto. Assim como possvel que o segundo vendedor sonegue impostos. Todavia, o que ocorre em grande parte do comrcio informal uma prtica conhecida como discriminao de preos. Em poucas palavras, isso significa que o vendedor determinar um preo diferente para cada comprador, de acordo com seu preo reserva, ou seja, sua mxima disposio a pagar pela oferta. luz do nosso exemplo, a concluso poderia ser a seguinte: O primeiro vendedor, ao perceber seu sotaque ingls, presumiu que voc estaria disposto a pagar o dobro pela mquina. Simplesmente por possuir um nvel de renda superior, voc pagou um valor superior ao preo justo da mercadoria. Esse o efeito da discriminao de preos. Embora aparente ser uma postura oportunista, agentes que praticam algum tipo de discriminao de preo esto de fato atuando como agentes econmicos racionais, maximizadores, ao menos no curto prazo. Apenas no curto prazo porque, caso os clientes se 9. 9 dem conta desse tipo de comportamento, provavelmente se sentiro lesados e deixaro de comprar no estabelecimento, tornando a atividade insustentvel no longo prazo. Mas se de fato os vendedores esto apenas atuando como agentes racionais, por que razo os consumidores se sentiriam lesados? Simplesmente pelo fato de eles prprios no deterem a capacidade de atuar como agentes maximizadores. Sua racionalidade limitada por no possurem plena informao sobre os preos praticados no mercado. Consideremos ento uma situao diametralmente oposta. Digamos que somente o cliente possusse pleno acesso s informaes dos preos oferecidos por seus fornecedores. Nesse caso, ele sempre compraria um dado produto pelo menor preo possvel. Enquanto um determinado fornecedor no oferecesse uma oferta equivalente ao piso do mercado em termos de custo e beneficio, no conseguiria vender nem mesmo uma unidade. O preo de mercado passaria ento a ser determinado pelo custo marginal da empresa mais eficiente. o que ocorre, por exemplo, em mercados que se aproximam a uma estrutura monopsnica3 . Essa situao em que apenas o cliente possui plena informao ocorre com alguma freqncia em transaes B2B (entre empresas). Em transaes B2C, por haver uma grande massa de consumidores, mais provvel que os vendedores possuam informao equivalente ou superior do consumidor, constituindo o que se chama de assimetria de informao. Isso significa que, em comparao com os consumidores, os vendedores possuem maior conhecimento sobre as prticas de seus concorrentes, em parte porque possuem incentivos maiores para a busca dessa informao. As empresas possuem incentivos maiores para entender o comportamento dos preos de seus concorrentes, porque podem perder lucros tanto quando praticam preos muito acima do mercado, quanto nas ocasies em que seus preos esto posicionados muito abaixo do mercado. Ainda que os consumidores no possuam plena informao sobre a forma mais econmica de adquirir um dado produto, ao considerarmos uma grande massa de consumidores razovel pensar que a empresa que oferece o menor preo para uma oferta de benefcios equivalente obter o maior volume de vendas. Logo, uma vez que a informao ser aplicada a um grande nmero de transaes, seu custo por transao menor para as empresas que para o consumidor individual. em funo desse ganho de 3 Monopsnio a estrutura de mercado em que h apenas um comprador e muitos fornecedores. 10. 10 escala na busca de informao que as empresas possuem uma vantagem sobre o consumidor. Com o advento da Internet, entretanto, essa situao tende a se modificar. O surgimento de ferramentas de busca e comparao de preos como o Buscap (www.buscape.com.br), Bondfaro (www.Bondfaro.com.br), Jacotei (www.jacotei.com.br), Precomania (www.precomania.com.br) e Froogle (www.froogle.com) reduzem o custo da informao a nveis desprezveis. Com a crescente abrangncia desses mecanismos, a figura do consumidor desinformado que adquire produtos acima de seu preo justo d lugar a um consumidor muito bem informado e potencialmente mais racional. Essa racionalidade no se limita apenas varivel preo. Com essas novas ferramentas, o consumidor capaz de comparar de maneira imparcial produtos concorrentes, levando em considerao seus atributos funcionais tangveis, assim como as opinies expressas por outros usurios. Assim, alm de minorar os lucros obtidos pelas empresas em funo da assimetria de informao, esse novo consumidor estaria menos disposto a pagar um prmio de preo no lastreado por um beneficio tangvel. O primeiro ponto, que afirma que a Internet reduz a capacidade das empresas de praticar a discriminao de preos e obterem ganhos adicionais graas assimetria de informao at certo ponto intuitivo. J o segundo ponto mais controverso, pois afirma que as marcas por si s perderiam seu valor intrnseco, deixando de justificar prmios de preo. Para evitar que este estudo adquira um carter futurolgico injustificvel, a anlise focalizar o primeiro ponto. O objetivo principal saber se a presena de um consumidor mais bem informado induz efetivamente a uma menor variabilidade de preos entre ofertas concorrentes. Essa menor variabilidade entre preos concorrentes para uma mesma oferta pode ser interpretada como uma aproximao do mercado a uma estrutura de concorrncia perfeita, o que estaria alinhado teoria econmica clssica, em que informao plena um dos pr-requisitos para esse tipo de competio. Como objeto do estudo, foi escolhida a indstria de eletrodomsticos de linha branca brasileira. Diversas foram as razes que justificaram essa escolha, dentre elas meu envolvimento pessoal com a indstria aps trabalhar durante um ano em uma das maiores organizaes do setor. Pesou tambm o fato de ser uma indstria presente tanto nos canais de distribuio tradicionais quanto no comrcio eletrnico, assim como a disponibilidade de 11. 11 informao a respeito dos preos praticados em ambos os canais, para produtos e perodos comparveis. Finalmente, porm no menos importante, optou-se pela indstria de linha branca por se tratar de um setor em que o elo fabricante enfrenta dificuldades estratgicas importantes, dentre as quais a rpida concentrao do varejo se destaca como limitante da rentabilidade. Dessa forma, ao propormos a hiptese de que a Internet tende a aproximar os mercados a estruturas de competio perfeita estaramos de fato questionando as iniciativas de algumas empresas do setor relacionadas ao comrcio eletrnico. Publicaes a respeito de empresas que se inserem no comrcio eletrnico apontam problemas de lucratividade das operaes, ao mesmo tempo em que profissionais de marketing j reconhecem no consumidor virtual um agente significativamente mais sensvel a preo. Por outro lado, empresrios e executivos continuam firmes ao afirmar o carter estratgico de sua presena na Internet. Com este estudo, meu propsito levantar discusso sobre uma implicao do comrcio eletrnico aparentemente ignorada: o potencial aumento da competitividade na indstria. A partir dessa conscientizao, possvel abstrair e pensar sobre qual a posio que as ferramentas de busca e comparaes de preos ocupariam no sistema de valor, o poder que esse elo poderia concentrar e os efeitos que teriam sobre as foras determinantes da atratividade da indstria em estudo. 12. 12 2. A INDSTRIA DE ELETRODOMSTICOS BRASILEIRA: IMPRESSES INICIAIS O volume de vendas da indstria de eletrodomsticos do Brasil caiu 7,5% entre 1998 e 2003. Dentre os principais fatores que contriburam para esse declnio esto as altas taxas de juros, o alto desemprego e a reduo do poder de compra dos consumidores. Em 2003, pequenas e mdias empresas nacionais investiram em estratgias de preo agressivas para atrair consumidores de baixo poder aquisitivo, devido continuidade das dificuldades conjunturais. Essas pequenas empresas aumentaram sua participao no mercado de eletrodomsticos, em detrimento de grandes empresas j estabelecidas como Whirlpool, Electrolux e BSH Continental. Paralelamente intensificao da rivalidade entre os concorrentes, houve um intenso processo de concentrao no varejo. Empresas como Magazine Luiza, Ponto Frio, Insinuante e, principalmente, Casas Bahia; solidificaram suas posies competitivas frente ao pequeno varejo. Com alto poder de barganha junto aos fornecedores e ampla oferta de crdito ao consumidor, essas empresas cresceram a uma velocidade incomparvel nos ltimos 5 anos. Na outra ponta, o setor siderrgico, responsvel pelo suprimento do ao, matria-prima essencial para a maioria dos eletrodomsticos, foi beneficiado por circunstncias conjunturais favorveis. A principal foi o acelerado crescimento da economia mundial liderado por economias emergentes como a chinesa e a indiana, o que causou um abrupto incremento na demanda global pela commodity. Conseqentemente, os preos do metal subiram cerca de 60% no ano de 2004, pressionando ainda mais as j reduzidas margens de lucratividade do setor de eletrodomsticos. No h dvidas de que a atuao dessas foras ambientais uma das causas da degradao da atratividade da indstria de eletrodomsticos. Esse fenmeno se reflete na lucratividade das empresas atuantes no setor, conforme demonstra o quadro seguinte: 13. 13 Tabela 1 - Lucratividade no setor de eletrodomsticos de linha branca4 Margem bruta Resultado operacional 2002 2003 2004 2002 2003 2004 Firma 1 27,8 20,0 18,2 7,1 4,3 5,1 Firma 2 19,0 19,0 19,6 (2,8) (0,1) 3,9 Firma 3 27,0 22,0 21,1 7,0 2,9 4,5 Firma 4 19,4 17,7 20,2 (3,5) (4,1) 0,2 Firma 5 20,0 11,7 16,5 7,6 (10,7) (3,0) Lucro antes do IR Lucro lquido 2002 2003 2004 2002 2003 2004 Firma 1 6,2 2,0 2,0 8,0 2,6 0,5 Firma 2 (6,1) (2,6) (0,0) (6,2) (4,0) (2,0) Firma 3 0,4 1,5 2,2 0,2 0,3 1,1 Firma 4 (3,7) (9,9) (5,3) (5,3) (10,0) (5,4) Firma 5 9,5 (6,7) 2,2 6,2 (6,7) 1,6 Valores em % da receit a lquida Valores em % da receit a lquida Fonte: Serasa Tendo em vista essas tendncias que impem barreiras ao crescimento e rentabilidade das empresas fabricantes de eletrodomsticos, organizaes do setor reagem atravs de estratgias que visam a aproxim-las cada vez mais de seus consumidores finais. Em busca da fidelidade desses consumidores, empresas como a Whirlpool S/A, lder no mercado brasileiro de produtos de linha branca, passam a adotar estratgias de venda direta pessoa fsica, ampliando o contato entre fabricante e consumidor. Um dos canais utilizados para cumprir esse objetivo a Internet que, alm de permitir a realizao da venda, possibilita a coleta de informaes a respeito do comportamento do consumidor. A indstria de linha branca no , porm, a nica a explorar os benefcios gerados pela Internet e pelo comrcio eletrnico. Assim como a Whirlpool, empresas como a General Motors (indstria automobilstica), Dell (informtica), Claro (telefonia mvel), Avon (cosmticos), Abril (editora), Semp Toshiba (udio & vdeo), entre outras; utilizam a Internet como canal de venda direta ao consumidor. O mesmo vem ocorrendo com o varejo, onde empresas como Ponto Frio, Magazine Luiza e Americanas.com j fazem uso do comrcio eletrnico. 4 As identidades das empresas no foram reveladas por se tratar de uma fonte de informaes confidenciais. 14. 14 Alm de atenderem a um grupo crescente de consumidores que buscam a comodidade da compra via Internet, as empresas fabricantes encontram no comrcio eletrnico uma oportunidade de obterem margens de lucro mais altas, ao mesmo tempo em que capturam informaes valiosas a respeito das preferncias de seus clientes, fidelizando-os atravs de um relacionamento diferenciado. Como qualquer estratgia, porm, o avano das empresas fabricantes em direo ao comrcio eletrnico envolve riscos. Um dos mais comumente citados o risco de conflito com o varejo tradicional, uma vez que o fabricante, ao vender diretamente para o consumidor final, concorreria com seus clientes varejistas. No entanto, h alguns anos vem ocorrendo um movimento bastante peculiar na Internet, que pode vir a representar uma ameaa ainda maior para as empresas no longo prazo. Trata-se do surgimento e popularizao das ferramentas de busca e comparao de preos, que cada vez mais ampliam seus portflios de anunciantes e produtos anunciados. Esse movimento liderado no Brasil por sites como Buscap (www.buscape.com.br), Bondfaro (www.Bondfaro.com.br) e Jacotei (www.jacotei.com.br); mas j existem representantes internacionais, a exemplo de Precomania (www.precomania.com) e, mais recentemente, Froogle (http://www.froogle.com), uma iniciativa da Google, instituio renomada por sua atuao inovadora em diversos campos relacionados Internet. Mas qual seria o impacto representado por essas ferramentas para a indstria de eletrodomsticos de linha branca? Analisar-se- neste trabalho a hiptese de que a popularizao dessas ferramentas poderia causar o aumento da competitividade na indstria, visto que elas reduzem o custo da informao para o consumidor e permitem que este atue de forma mais racional no processo de deciso de compra. Ademais, sero discutidos os possveis impactos referentes deteriorao das vantagens competitivas baseadas em atributos intangveis, como a imagem da marca, medida que os consumidores se tornam mais bem informados e o processo de compra, mais racional. Na prxima seo, ambienta-se o estudo a partir de uma anlise estrutural da indstria de linha branca baseada na tipologia das Cinco Foras de Porter, justificando-se assim a escolha dessa indstria como objeto de anlise. Na quarta seo, ainda num esforo de 15. 15 contextualizao, apresentado um panorama geral do comrcio eletrnico no Brasil. Em seguida, na quinta seo, revisa-se a literatura em busca do conhecimento acumulado a respeito do comportamento do consumidor. Na sexta seo, apresenta-se uma anlise comparativa entre as ferramentas de busca e comparao de preos e os modelos tericos de deciso de compra, justificando a hiptese de que o crescimento do comrcio eletrnico e a popularizao dessas ferramentas levariam a um aumento da competitividade na indstria luz da teoria econmica clssica. Apresentam-se, ento, na stima seo, os resultados do teste dessa hiptese, realizado atravs de uma comparao entre preos de produtos de linha branca anunciados na Internet e no varejo tradicional. Finalmente, a oitava e ltima seo resume as principais concluses e faz recomendaes sobre futuros estudos. 16. 16 3. COMPREENDENDO O MERCADO DE ELETRODOMSTICOS NO BRASIL A economia brasileira viveu, na ltima dcada, um duplo desafio: num plano mais abrangente, a exemplo de todos os outros pases, viveu a transio rumo a uma economia globalizada; num plano mais localizado, a transio da instabilidade para a estabilidade. Ainda que seja questionvel fazer qualquer afirmao em termos conclusivos, no se pode negar que a estabilidade foi uma conquista memorvel. (ELETROS, 2000) Com a economia estabilizada, maior abertura comercial, e com reformas estruturais que visavam a tornar o Estado menor e mais eficiente, a economia brasileira retomou a perspectiva do crescimento sustentvel. Todavia, graas moeda forte nos primeiros anos do Plano Real, os produtos importados conquistaram o mercado nacional, sinalizando que, numa economia progressivamente aberta e competitiva, o aumento da produtividade seria imprescindvel. Na indstria de eletroeletrnicos de consumo no foi diferente. As empresas tiveram que se adaptar s novas exigncias impostas pela crescente competitividade da economia globalizada. O consumidor tornou-se mais informado e consciente de uma srie de direitos praticamente desconhecidos durante o perodo de vigncia de uma economia fechada. J no era mais possvel para os fabricantes nacionais repassarem ao consumidor a conta da ineficincia, antes mascarada pelos efeitos da inflao crnica e compensadas, pelo menos em parte, com os lucros no operacionais obtidos atravs da ciranda financeira. (ELETROS, 2000) O aumento de produtividade era uma necessidade imperiosa, razo pela qual muitas empresas implementaram programas de qualidade que as habilitaram a produzir artigos com padres semelhantes aos estrangeiros, com os quais seriam obrigadas a competir. Essa rpida resposta das empresas surpreendeu aos que imaginavam que a abertura causaria inevitavelmente o desaparecimento de diversos segmentos do parque industrial brasileiro. Os ndices de produtividade efetivamente apresentaram melhora significativa ao longo da dcada de 90. Esse aumento de produtividade aliado melhoria da qualidade dos produtos 17. 17 elevou a competitividade que, sob condies cambiais favorveis, passaram inclusive a exportar uma parcela considervel da produo. Grfico 1 - Crescimento da produtividade industrial ndice de produtividade da indstria de transformao (mdia 1990 = 100) 100 118 122 132 142 143 151 163 165 167 172 172 173 100 110 120 130 140 150 160 170 180 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 Fonte: IPEA/DATA Obviamente, os ganhos de produtividade no foram uniformes e, ainda hoje os padres alcanados, embora revelem melhoras significativas nos ltimos anos, ainda se encontram abaixo dos padres observados nas indstrias de ponta dos pases desenvolvidos. Ademais, indiscutvel que uma parte considervel dos ganhos de produtividade no se originou de um esforo exclusivamente interno, mas antes foram resultados de processos de parcerias, fuses e aquisies que ocorreram no setor, com forte presena de organizaes multinacionais. Em termos de qualidade, no entanto, o complexo eletroeletrnico de consumo alcanou uma situao amplamente favorvel, tendo hoje condies de oferecer ao mercado produtos de qualidade semelhante aos dos demais produtores, a preos que s no so mais competitivos graas ao confuso sistema tributrio que prejudica tanto a produo quanto a capacidade de exportao. 18. 18 A melhora da qualidade de produtos brasileiros, de um lado, e a reincorporao ao mercado consumidor de milhes de brasileiros, de outro, fizeram com que houvesse um considervel aumento da demanda dos artigos eletroeletrnicos, como pode ser observado nas estatsticas de vendas industriais de 1995 e 1996 (ELETROS, 2000). Esse aquecimento, decorrente da estabilidade conseguida com o Plano Real, porm, esgotou-se no final de 1996. Nos trs anos seguintes, as indstrias registraram sucessivas quedas nas vendas, como pode ser observado no grfico 1. Grfico 2 - Vendas industriais do complexo eletroeletrnico 27.4 35.0 41.4 37.4 31.9 29.4 32.5 30.6 30.2 29.5 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Fonte: Adaptado de ELETROS Dez anos aps o processo de abertura econmica, empresas tradicionais do complexo eletroeletrnico nacional enfrentam novos desafios que colocam em risco a atratividade do setor. Lento crescimento da demanda, baixo poder aquisitivo da populao brasileira, dependncia em relao disponibilidade de crdito, concentrao do varejo, novos entrantes asiticos, concorrncia de fabricantes nacionais de mdio e pequeno porte, estratgias agressivas de preo e intensa competio entre as grandes marcas; esses e outros fatores criam um ambiente de grande rivalidade que reduz a lucratividade. E em resposta a essas foras que empresas como a Whirlpool tm adotado estratgias que as aproximam do consumidor final, como a adoo do comrcio eletrnico, foco do presente estudo. Logo, importante mapear essas foras, uma vez que so elas que justificam as estratgias adotadas pelas empresas dessa indstria. 19. 19 Aplicar-se- a tipologia das Cinco Foras de Porter no desenvolvimento dessa anlise inicial, cujo principal objetivo fornecer ao leitor uma viso sucinta das motivaes que levam as empresas do setor a reverem suas estratgias de relacionamento com o canal ou mesmo suplant-las, atendendo diretamente ao consumidor final. Antes, porm, duas subsees foram acrescentadas. Na primeira (3.1) descreve-se a indstria de eletrodomsticos, justificando-se a escolha do segmento de linha branca como foco do estudo. A segunda (3.2) traz uma reviso terica da tipologia de Porter, exclusivamente para os leitores ainda no familiarizados com o tema. Os demais leitores podem prosseguir diretamente para a subseo 3.3. 3.1. Definio da indstria Internacionalmente, a indstria de eletrodomsticos (domestic electrical appliances) pode ser divida em: 1) eletrodomsticos de pequeno porte (small electrical appliances) e 2) eletrodomsticos de grande porte (large kitchen appliances). O primeiro grupo engloba utenslios domsticos, em geral, de menor valor nominal, como: utenslios para cozinha (batedeiras, liquidificadores, cafeteiras, processadores de alimentos, centrfugas, torradeiras, grelhas eltricas, fornos eltricos, etc); utenslios para higiene pessoal (barbeadores eltricos, escovas-de-dentes eltricas, secadores de cabelo, chuveiros, etc); equipamentos de limpeza (aspiradores de p e aparelhos de limpeza a vapor) e equipamentos para tratamento de gua (filtros e purificadores). J o segundo grupo formado por um conjunto de categorias normalmente conhecido como eletrodomsticos de linha branca, a saber: aparelhos de refrigerao/conservao de alimentos (refrigeradores e congeladores); aparelhos de coco/preparao de alimentos (foges e depuradores); aparelhos de lavanderia (lavadoras de roupa automticas, lavadoras de roupa semi- automticas, secadoras de roupa e lava-louas); aparelhos de microondas e, finalmente, aparelhos para controle de temperatura/umidade do ar (condicionadores de ar, aquecedores, umidificadores, etc). 20. 20 Tabela 2 - Segmentao da Indstria de Eletrodomsticos Segmentao da Indstria de Eletrodomsticos Pequeno porte Grande porte Utenslios para cozinha Aparelhos de refrigerao Utenslios para higiene pes soal Aparelhos de coco Equipamento s de limpeza Aparelhos de lavanderia Equipamentos para tratamento de gua Aparelhos de microondas Aparelhos para controle de temperatura Fonte: Euromonitor Uma classificao semelhante reconhecida pela ELETROS, Associao Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrnicos, que representa as principais empresas do complexo eletroeletrnico nacional, a saber: Tabela 3 - Associados ELETROS ELETROS - Lista de Associados em ordem alfabtica ARNO ESMALTEC MUELLER SONY BLACK & DECKER EVADIN PANASONIC SPRINGER CARRIER BSH / CONTINENTAL JVC PHILIPS SVA CINERAL LATINA PIONEER TEC TOY ELECTROLUX LGELECTRONICS SAMSUNG THOMSON ELGIN MABE SEMP TOSHIBA VIDEOLAR ELSYS MALLORY SINGER WHIRLPOOL Fonte: ELETROS Segundo a ELETROS, o complexo eletroeletrnico nacional pode ser dividido em trs grandes indstrias. A primeira, popularmente conhecida como indstria de linha branca, abrange produtos classificados como bens durveis, a exemplo de refrigeradores, freezers verticais, freezers horizontais, lavadoras automticas, lavalouas automticas, foges, condicionadores de ar e fornos de microondas. Em geral, so produtos de alto valor nominal e, portanto, dependentes do crdito como impulsionador do consumo. 21. 21 A segunda, popularmente conhecida como indstria de linha marrom, rene produtos classificados como bens durveis ou semidurveis, a exemplo de rdio-gravadores, sistemas de som, CD players, televisores, video-cassetes, DVD e camcorders. Em geral, so produtos de alto valor nominal, embora, em mdia, inferior ao dos produtos de linha branca. Ainda assim, a disponibilidade de crdito desempenha um papel importante com viabilizador do consumo. Finalmente, a terceira indstria engloba os produtos portteis, em geral classificados como bens semidurveis. Compem esse conjunto produtos como: aspiradores de p, batedeiras, cafeteiras, espremedores de laranja, ferros de passar roupa, liquidificadores, processadores de alimentos, secadores de cabelo, tostadores e ventiladores; a maioria dos quais possui valor nominal relativamente baixo, reduzindo, portanto, a dependncia do consumo em relao disponibilidade de crdito. Quadro 1 - Segmentao do complexo eletroeletrnico brasileiro LINHA BRANCA IMAGEM ESOM PORTTEIS Refrigeradores Aspiradores de p Freezers verticais Rdios -gravadores Batedeiras de bolo Freezers horizontais Sistemas de s om Cafeteiras - Filtro Lavadoras automticas Compact disc players Espremedores de frutas Lavalouas Automtica Televisores em cores Ferros de passar roupa Secadoras de Roupas Vdeo-cassetes Liqidificadores Foges DVD Digital Video Disco Processadores de alim. Condicionadores de ar Camcorders Secadores/ modeladores Fornos de microondas Tostadores Ventiladores COMPLEXO ELETROELETRNICO BRASILEIRO Fonte: ELETROS Essas indstrias possuem como caracterstica em comum as baixas taxas de crescimento anual, o que justifica sua classificao como indstrias maduras. 22. 22 Tabela 4 - Volume de vendas industriais Volume em milhes de unidades Linha Branca 7,0 10,2 11,1 10,1 8,5 8,2 8,6 8,9 8,7 7,7 1,0% Imagem e Som 10,0 12,7 16,0 13,9 10,4 7,7 9,9 9,9 9,9 10,9 1,0% Portteis 10,4 12,1 14,4 13,5 13,0 13,4 13,9 11,8 11,5 10,9 0,5% Total 27,4 35,0 41,4 37,4 31,9 29,4 32,5 30,6 30,2 29,5 0,8% 2001200019951994 CAGR 94 - 03 1999199819971996 20032002 Fonte: ELETROS Observa-se tambm que no h uma diferena significativa entre o tamanho dos mercados em termos de volume, o que nos leva a crer que, em funo do valor unitrio, as indstrias de linha branca e linha marrom so as mais significativas do complexo eletroeletrnico nacional. Ademais, conforme j salientado, o consumo dos produtos portteis se distingue dos demais eletroeletrnicos por se tratar bens de menor valor nominal e com ciclos de recompra mais curtos (semidurveis). Isso faz com que haja um menor envolvimento do consumidor no processo de compra, tornando-o menos estruturado quando comparado compra de produtos de linha branca ou linha marrom. Com intuito de provar que os determinantes do desempenho da indstria de portteis so distintos dos condicionantes que influenciam as indstrias de linha branca e linha marrom, foi construda a matriz de correlao entra as vendas anuais das trs indstrias. Os resultados indicaram uma estreita relao entre o setor de linha branca e o setor de imagem e som (82%), mas uma baixa correlao desses com a indstria de portteis (respectivamente 65% e 37%). Dessa forma, preferiu-se no adotar a indstria de portteis como foco para o estudo. Tabela 5 - Matriz de correlao Correlao Linha Branca Imagem e Som Portteis Linha Branca 1,00 0,82 0,65 Imagem e Som 0,82 1,00 0,37 Portteis 0,65 0,37 1,00 Fonte: Elaborado pelo autor 23. 23 Justificada a excluso da indstria de portteis do escopo da anlise, resta agora justificar a escolha da indstria de linha branca em detrimento da indstria de linha marrom. Afinal, embora as empresas participantes de cada um desses setores sejam, na maioria, bastante distintas, h claras semelhanas entre os dois mercados. Alm de compartilharem os mesmos canais de distribuio, tanto a indstria de linha branca quanto a de linha marrom se deparam com processos de compra semelhantes, em que o envolvimento e a racionalidade dos consumidores se fazem mais presente. Ambos dependem da disponibilidade de crdito como motor do consumo, sendo que muitas vezes concorrem entre si pelo poder de compra dos clientes. E, finalmente, ambos sofrem com a crescente concorrncia de novos entrantes, sejam pequenas empresas nacionais, sejam novos entrantes asiticos. No entanto, apesar de todas essas semelhanas, a sustentabilidade da indstria de imagem e som protegida pela perspectiva de ciclos de renovao tecnolgica mais rpidos quando comparada indstria de linha branca como um todo. Isso porque a revoluo digital iniciada na dcada de oitenta atingiu diretamente os setores relacionados aos meios de comunicao, como telefonia, rdio e televiso, impulsionando a adoo de tecnologias que motivaram e motivam o consumo, como o DVD, o MP3 e a televiso digital. Segundo Coutinho e Ferraz (apud ELETROS 2000): Assim como em outros setores (informtica, por exemplo) a inovao [no setor eletroeletrnico de consumo] se d de duas formas: atravs de mudanas radicais com a introduo de novas tecnologias ou, incrementalmente, via um processo evolutivo gradual de tecnologias j existentes. A expanso dos mercados tem se dado, desde a dcada de 50, por um misto das duas formas de inovatividade. Periodicamente introduzida uma inovao radical seguida de evolues graduais at o surgimento de uma nova alterao radical. Os sistemas multimdia e a televiso de alta definio podem se constituir na prxima inovao radical desta indstria. Em qualquer dos dois casos, a digitalizao da informao ter um papel central, provocando uma convergncia tecnolgica ainda maior entre setores do complexo eletroeletrnico. Ainda que as novas tecnologias possam representar uma ameaa para os fabricantes menos capacitados, indiscutvel que as quebras de paradigma desempenham o papel fundamental 24. 24 de revigorar a indstria, criando novos ciclos de consumo que permitem a ampliao das receitas e das margens de lucro. Por sua vez, indstrias que passam longos perodos sem vivenciarem grandes revolues tecnolgicas tendem a ter sua atratividade ameaada. Aparentemente, esse o caso da indstria de linha branca brasileira, que ser, portanto, analisada ao longo deste estudo. Poder-se-ia argumentar que a indstria de linha branca composta por uma ampla gama de categorias de produtos que, embora guardem algumas similaridades entre si, constituem mercados bastante distintos. Isso se torna uma preocupao se considerarmos que a indstria a unidade de anlise bsica para se compreender a competio (PORTER, 1990, p. 43). PORTER (1990, p.43) define indstria como um grupo de competidores que produzem mercadorias ou servios que competem diretamente entre si. Uma indstria estrategicamente distinta abrange produtos cujas fontes de vantagem competitiva so semelhantes. Embora, segundo o autor, estabelecer fronteiras entre as indstrias seja uma questo de grau, ele critica os estudos de competio que empregam definies muita amplas, citando inclusive o exemplo do setor de maquinaria, que no uma indstria apenas, mas dezenas de indstrias estrategicamente distintas, como mquinas de tecelagem, equipamento de processamento de borracha e mquinas de impresso, cada qual com suas exigncias peculiares para o xito competitivo (PORTER, 1990, p. 44). No entanto, apesar das diferenas existentes entre as categorias, optou-se por considerar a indstria de linha branca de uma maneira ampla. Quatro so as justificativas para essa deciso: 1. Os principais fabricantes nacionais de linha branca atuam em pelo menos trs das categorias. o caso, por exemplo, da Whirlpool e da Electrolux, que atuam nas nove categorias; e da BSH/Continental, Mabe e Esmaltec, que atuam em trs ou mais categorias; 25. 25 2. Todas as categorias compartilham os mesmos canais de distribuio (Supermercados, lojas de departamentos e lojas de especialidades); 3. Todas as categorias podem ser classificadas como bens de consumo durveis, o que significa que o processo de compra tende a ser racional; 4. Em geral, os fabricantes adotam uma marca nica para os produtos, independentemente da categoria. Algumas excees ocorrem no caso das empresas que administram mais de uma marca, como Whirlpool (Brastemp e Consul), BSH/Continental (Bosch e Continental) e Mabe (GE e Dako). Justificada a escolha da indstria de eletrodomsticos de linha branca como objeto de estudo, a subseo seguinte introduz a tipologia de Porter, que ser utilizada subseqentemente numa anlise estrutural dessa indstria. Os leitores j familiarizados com teoria podem prosseguir diretamente para a subseo 3.3. 3.2. A tipologia de Porter Para Michael Porter (1990), estratgia competitiva , em essncia, o desenvolvimento de uma frmula ampla para o modo como a empresa ir competir, quais deveriam ser suas metas e quais as polticas necessrias para obt-las. Ou seja, a estratgia seria a combinao dos fins (objetivos e metas) e dos meios para alcan-los. Conforme j explicitado anteriormente, Porter (1990, p.44) considera a indstria como a unidade bsica de anlise estratgica; a arena na qual a vantagem competitiva ganha ou perdida. Seria ento atravs da estratgia competitiva que as empresas buscariam definir e estabelecer uma abordagem para a competio que fosse, ao mesmo tempo, lucrativa e sustentvel. Ainda segundo o autor, ao escolher sua estratgia competitiva as empresas devem ter em mente duas preocupaes centrais: a estrutura da indstria e o posicionamento dentro da indstria. Nenhuma dessas duas preocupaes , por si mesma, suficiente para guiar a escolha de estratgia. Uma firma numa indstria muito atraente, por exemplo, pode ainda 26. 26 assim no obter lucros satisfatrios se tiver escolhido uma m posio competitiva. Logo, estrutura e posicionamento so os principais determinantes da lucratividade das empresas no longo prazo. Partindo dessa premissa, o autor sugere o modelo das cinco foras competitivas para a anlise estrutural da indstria e, para a definio do posicionamento, indica a existncia de trs estratgias genricas. Antes de descrever esses modelos tericos, porm, importante ressaltar dois pontos especficos de sua argumentao. O primeiro deles que, tanto a estrutura da indstria quanto a posio competitiva so dinmicas. As indstrias podem tornar-se mais (ou menos) atraentes com o tempo, na medida em que obstculos entrada ou outros elementos da estrutura se modificam. Por sua vez, a posio competitiva reflete uma batalha interminvel entre competidores. O segundo ponto que, a estrutura (ou atratividade) da indstria e a posio competitiva podem ser, ambas, condicionadas por empresas bem-sucedidas que no s reagem ao seu ambiente, como tambm procuram influenci-lo a seu favor. Porter (1990, p.45) vai alm, e afirma que: Na verdade, so as modificaes na estrutura da indstria ou o aparecimento de novas bases de vantagem competitiva que sublinham as oscilaes substanciais na posio competitiva. As empresas japonesas tornaram-se lderes internacionais em aparelhos de televiso, por exemplo, devido a uma mudana para aparelhos compactados, portteis e a substituio de vlvulas a vcuo pela tecnologia dos semicondutores. A partir desses dois argumentos infere-se que os participantes de uma indstria podem, ativamente, aumentar ou restringir sua potencial lucratividade. Algumas posies so mais lucrativas do que outras, a despeito de qual possa ser a lucratividade mdia da indstria. Conseqentemente, as firmas individuais desenvolvem estratgias que visem obteno de um posicionamento favorvel. No obstante, o conjunto das estratgias competitivas adotadas pelas empresas pode acarretar transformaes estruturais na indstria, modificando o equilbrio entre as cinco foras. Essa dinmica entre as estratgias escolhidas pelos participantes individuais e o efeito dessas decises sobre a atratividade do setor constitui o principal foco deste estudo. 27. 27 3.2.1 Posicionamento dentro das indstrias O posicionamento abrange a abordagem geral da firma para competir, e no apenas seu produto ou o grupo consumidor visado. [...] No centro do posicionamento est a vantagem competitiva. [...] No longo prazo, as empresas obtm xito em relao aos seus competidores se dispuserem de vantagem competitiva sustentvel. (PORTER, 1990, p.48) Ao longo de sua obra, Porter defende a existncia de apenas dois tipos de vantagem competitiva: menor custo e diferenciao. Elas so definidas pelo autor da seguinte forma: O menor custo a capacidade de uma empresa de projetar, produzir e comercializar um produto comparvel com mais eficincia do que seus competidores. A preos iguais ou prximos aos dos competidores, os custos menores traduzem-se em rendimentos superiores. A diferenciao a capacidade de proporcionar ao comprador um valor excepcional e superior em termos de qualidade do produto, caractersticas especiais, servios de assistncia. A diferenciao permite a uma firma obter um preo melhor, que leva a uma lucratividade superior, desde que os custos sejam comparveis aos concorrentes. (PORTER, 1990, p.48) Porter entende que pode haver somente um lder de custo em uma indstria, pois, caso contrrio, a disputa por participao de mercado entre as empresas aspirantes liderana levaria s guerras de preo, gerando um impacto desastroso para a estrutura da indstria no longo prazo. Em relao ao segundo tipo de vantagem competitiva, Besanko et al (2000, p.243) aponta que h tipos distintos de diferenciao: vertical e horizontal. Segundo o autor, a diferenciao vertical ocorre quando um produto inequivocamente melhor ou pior que os concorrentes. Constitui diferenciao vertical, por exemplo, o caso em que um fabricante de detergentes aumenta o poder de limpeza de seu produto. Isso torna o produto superior para todos os consumidores, embora possa haver divergncia no valor que cada um est disposto a pagar por esse desempenho superior. 28. 28 J a diferenciao horizontal ocorre quando alguns consumidores preferem um produto especfico, mesmo quando os preos so mantidos iguais. Por exemplo, quando um fabricante de detergentes lana um produto com perfume de limo, alguns consumidores daro preferncia a ele, enquanto outros preferiro uma verso com perfume de rosas. Na prtica, porm, so raros os casos em que os produtos concorrentes em uma indstria possam ser classificados exclusivamente como diferenciados horizontal ou verticalmente. Todavia, uma vez que ambas as formas de diferenciao possuem o mesmo efeito, ou seja, permitem a cobrana de um prmio de preo de um grupo de consumidores dispostos a pagar pela caracterstica diferenciadora; sero tratadas como um nico tipo de vantagem competitiva. Ademais, Porter acredita que vrias empresas podem perseguir a vantagem de diferenciao numa indstria, desde que se especializem em atributos distintos e que haja demanda suficiente disposta a pagar por tais caractersticas. Outra observao importante que as vantagens competitivas de custo e diferenciao tm resultados potencialmente equivalentes, visto que ambas se traduzem em produtividade superior dos concorrentes. A empresa de baixos custos produz determinada mercadoria usando menos insumos do que os competidores. A firma diferenciada obtm rendimentos superiores, por unidade, aos concorrentes. A vantagem competitiva est diretamente ligada ao sustentculo da renda Nacional (PORTER, 1990, p.48). Alm de definir qual das duas vantagens competitivas ir perseguir, a empresa deve tambm escolher o mbito em que ir competir, devido a natural segmentao existente nas indstrias. Natural, pois advm das necessidades diversas dos consumidores, que acabam por se converter em preferncias distintas por variedades de produtos, canais de distribuio ou mesmo localizaes geogrficas especficas. Essa segmentao importante inclusive na competio global, em que algumas empresas sucedem ao atender aos segmentos de mercado que possuem representantes em vrias naes. Empresas da mesma indstria podem escolher diferentes mbitos competitivos, sendo a escolha bsica aquela que se faz entre um mbito amplo e a focalizao num segmento especfico (PORTER, 1990, p.49). 29. 29 Associando essas duas variveis bsicas tipo de vantagem competitiva e mbito competitivo Porter (1991) aponta a existncia de trs estratgias genricas internamente consistentes e potencialmente bem-sucedidas que podem criar uma posio defensvel no longo prazo e superar os concorrentes: liderana em custo, diferenciao e enfoque. Essas estratgias encontram-se representadas na figura seguinte: Figura 1 - Estratgias genricas Liderana em custo Diferenciao Enfoque em custo Enfoque em diferenciao Vantagem competitiva mbitocompetitivo Menor Custo Diferenciao AmploRestrito Liderana em custo Diferenciao Enfoque em custo Enfoque em diferenciao Vantagem competitiva mbitocompetitivo Menor Custo Diferenciao AmploRestrito Fonte: Adaptado de PORTER 1990, p.50 Segundo Porter (1990), difcil, embora no impossvel que ao mesmo tempo uma empresa possua a liderana em custo e seja diferenciada em relao aos competidores. Conseguir as duas coisas difcil porque um desempenho, qualidade ou servio excelente so mais onerosos, na maioria dos casos, do que pretender apenas ser comparvel aos concorrentes, em tais atributos. Conseqentemente, embora as empresas possam melhorar a tecnologia ou os mtodos com procedimentos que reduzem simultaneamente o custo e ampliam a diferenciao, no longo prazo, os concorrentes foraro a uma opo pelo tipo de vantagem a conservar, em vista dos trade offs existentes entre a diferenciao e a manuteno do menor patamar de custos. O meio-termo no se trata de uma estratgia genrica, mas sim de uma posio desconfortvel. Segundo Porter (1991), ela ocorre quando a empresa fracassa ao desenvolver sua estratgia em uma das trs direes apresentadas liderana no custo total, 30. 30 diferenciao ou enfoque. A empresa que est no meio-termo na grande maioria das vezes apresenta uma baixa rentabilidade dentro de sua indstria, pois no consegue oferecer a diferenciao ou o enfoque de alguns concorrentes e assim poder cobrar preos mais altos, nem a posio de baixo custo que possa permitir a venda de grandes volumes. (POZZA, 2004). Por esse motivo, qualquer estratgia bem-sucedida deve atentar muito para ambos os tipos de vantagem, mantendo ao mesmo tempo um compromisso claro com a superioridade num deles. Um produtor a baixo custo tem de oferecer qualidade e servio aceitveis para evitar a perda de sua vantagem de custos pela necessidade de baixar os preos, enquanto que a posio de custos de um diferenciador no deve estar to distante da posio dos concorrentes que neutralize o seu preo maior de venda. (PORTER, 1990, p.49). A obteno de uma vantagem competitiva sustentvel permite s empresas a manuteno de margens de retorno superiores s obtidas por seus concorrentes diretos. Quanto maior essa margem, mais protegida a empresa estar contra a intensificao das foras que atuam sobre a indstria. A seo seguinte descreve justamente essas foras, assim como o modo pelo qual interagem e determinam a atratividade de um setor. 3.2.2 Anlise estrutural das indstrias A estratgia competitiva deve nascer de um conhecimento detalhado da estrutura da indstria e da maneira pela qual se modifica. Em qualquer indstria, seja interna ou internacional, a natureza da competio est materializada em cinco foras competitivas: (1) a ameaa de novas empresas, (2) a ameaa de novos produtos ou servios, (3) o poder de barganha dos fornecedores, (4) o poder de barganha dos compradores e (5) a rivalidade entre competidores existentes. (PORTER, 1990, p.45) 31. 31 Figura 2 - Cinco foras de Porter Rivalidade interna Ameaa de novos entrantes Poder de negociao dos fornecedores Ameaa de substitutos Poder de negociao dos clientes Rivalidade interna Ameaa de novos entrantes Poder de negociao dos fornecedores Ameaa de substitutos Poder de negociao dos clientes Fonte: Adaptado de PORTER 1990, p.45 As cinco foras competitivas, popularmente conhecidas como cinco foras de Porter, constituem talvez o modelo mais amplamente aceito de anlise do ambiente competitivo que circunda a empresa e de onde parte todo o processo de planejamento estratgico5 . Isso porque, no longo prazo, a atratividade de uma indstria determinada pela intensidade dessas cinco foras, de forma que, quanto mais intensas, menor tende a ser o potencial de lucratividade das empresas atuantes. As cinco foras competitivas determinam a lucratividade da indstria porque fixam os preos que as empresas podem cobrar, os custos que tm de suportar e o investimento necessrio para competir. A ameaa de novas empresas limita o potencial de lucro geral na indstria porque essas novas empresas trazem nova capacidade e buscam uma parcela do mercado, reduzindo as margens. Compradores ou fornecedores poderosos arrancam para si os lucros. Intensa rivalidade competitiva corri os lucros, exigindo maiores custos de competio (em publicidade, promoo de vendas ou pesquisas e desenvolvimento) ou a transferncia do lucro para os consumidores, na forma de menores preos. A presena de substitutos prximos limita o preo que os competidores podem cobrar sem provocar a substituio e corroer o volume da indstria. (PORTER, 1990, p.46) 5 Planejamento estratgico uma tcnica administrativa que, atravs da anlise do ambiente de uma organizao, cria a conscincia das suas oportunidades e ameaas, dos seus pontos fortes e fracos para o cumprimento da sua misso e, atravs desta conscincia, estabelece o propsito de direo que a organizao dever seguir para aproveitar as oportunidades e evitar os riscos. (FISCHMANN, 1995) 32. 32 Besanko et al (2000, p.360) relembra que o modelo das cinco foras apenas uma ferramenta, um instrumento que auxilia o pesquisador em sua anlise. Portanto, imprescindvel atentar para os princpios econmicos subjacentes a cada uma das foras. com base nesse olhar crtico sugerido pelo autor que se descreve a tipologia de Porter. 3.2.2.1 Rivalidade interna A rivalidade interna se refere disputa por participao de mercado entre as empresas concorrentes. Logo, um primeiro passo crucial para a anlise da rivalidade a definio da indstria, tanto no mbito do produto quanto em mbito geogrfico. Alm disso, identificar claramente os participantes da indstria, ou seja, as empresas cujas decises estratgicas so interdependentes. O segundo passo seria analisar qual a forma predominante de competio. As empresas podem competir em diversas dimenses, relacionadas ou no ao preo. Ambas as abordagens competitivas degradam as margens, embora a disputa por preo tenda a ter impactos mais significativos. Isso porque os investimentos em diferenciao que aumentam os custos so convertidos, geralmente, em preos mais altos. Nesse sentido, Besanko et al (2000, p.361-362) lista algumas das condies que corroboram para a competio baseada em preo: Existncia de um grande nmero de empresas no mercado; Estagnao ou declnio do mercado; Empresas que possuem custos diferentes; Excesso de capacidade produtiva; Produtos pouco diferenciados e compradores com baixos custos de troca de fornecedor; Preos e condies de vendas sigilosas, o que impede que os preos sejam ajustados rapidamente; Empresas que no utilizam prticas facilitadoras (ex.: liderana de preo) e no possuem um histrico de cooperao; 33. 33 Barreiras de sada, que prolongam as guerras de preo medida que as empresas lutam para sobreviver, ao invs de abandonar o mercado. 3.2.2.2 Ameaa de novos entrantes Novos entrantes prejudicam as empresas atuantes numa indstria de duas maneiras. Em primeiro lugar, os novos entrantes conquistam uma parcela da demanda, passando a dividir o mercado com as empresas anteriormente estabelecidas. Em segundo lugar, eles reduzem a concentrao de mercado, intensificando a rivalidade interna e reduzindo as margens obtidas. A ameaa de novos entrantes est diretamente relacionada s barreiras de entrada existentes, que podem ser estruturais (resultantes da tecnologia requerida para competir) ou estratgicas (dependentes das escolhas estratgicas das empresas estabelecidas). Novamente, Besanko et al (2000, p.362-363) lista as condies que afetam a ameaa de entrada: Produo requer economias de escala significativas; Consumidores valorizam a reputao e so fiis s marcas estabelecidas; Acesso dos entrantes a recursos estratgicos como tecnologia, know-how, matria- prima, distribuio, locaes ou patentes; Curva de experincia; Externalidades de rede, que favorecem empresas estabelecidas e com uma grande base instalada; Proteo do governo; Expectativas em relao competio ps-entrada. 3.2.2.3 Ameaa de substitutos A ameaa de substitutos apresenta um efeito semelhante ao da entrada de novos concorrentes. Produtos substitutos reduzem a demanda e intensificam a rivalidade interna, 34. 34 degradando as margens de lucro. Os determinantes a serem analisados ao avaliar a ameaa de substitutos so: Disponibilidade de substitutos prximos e tecnologias em desenvolvimento; Equao de valor dos substitutos; Elasticidade-preo da demanda. Similarmente ameaa representada pelos produtos substitutos, Besanko et al (2000, p.363) sugere que seja avaliada tambm a oportunidade oferecida por bens complementares. Grosso modo, os efeitos da oportunidade representada pelos complementares pode ser visto como simetricamente opostos aos gerados pela ameaa de substitutos. 3.2.2.4 Poder de negociao dos fornecedores Os fornecedores podem reduzir as margens obtidas por uma empresa quando atuam em um mercado concentrado e quando a empresa est comprometida com ativos especficos transao. Por exemplo, um fornecedor com poder de monoplio, seja ele conferido pela concentrao de mercado ou pela presena de ativos especficos, pode capturar parte do lucro de uma indstria aumentando os preos quando as empresas vo bem, e reduzindo-os, quando elas vo mal. Isso permite que o fornecedor monopolista realize lucros extraordinrios, sem que ocorra falncia das empresas clientes. (BESANKO et al 2000, p.363-364). Os fatores que influenciam o poder de negociao dos fornecedores so: Concentrao relativa entre a indstria em que atua o fornecedor, e a indstria da empresa; Volume de compras; Disponibilidade de substitutos para os insumos; Investimentos especficos ao relacionamento fornecedor-empresa; Ameaa de integrao vertical frente, por parte dos fornecedores; Habilidade dos fornecedores de realizar discriminao de preos, cobrando mais das empresas mais lucrativas; 35. 35 3.2.2.5 Poder de negociao dos clientes Analogamente, os clientes podem reduzir as margens obtidas por uma empresa atravs da negociao de melhores condies de preo. O poder de barganha dos clientes aumenta quando atuam em um mercado concentrado e quando a empresa est comprometida com ativos especficos transao (BESANKO et al 2000, p.363-364). Similarmente ao que ocorre com os fornecedores, os fatores que influenciam o poder de negociao dos clientes so: Concentrao relativa entre a indstria em que atua o cliente, e a indstria da empresa; Volume de compras; Disponibilidade de substitutos do produto oferecido pela empresa; Investimentos especficos ao relacionamento empresa-cliente; Ameaa de integrao vertical para trs, por parte dos clientes; Habilidade da empresa de realizar discriminao de preos, cobrando mais dos clientes mais lucrativos. A estrutura da indstria relativamente estvel, mas pode mudar com o tempo, na medida em que ela evolui. As modificaes estruturais criam oportunidades e ameaas para os competidores. Novas tecnologias, necessidades emergentes, mudanas de hbitos dos consumidores, surgimento de novos segmentos de indstria, custos ou disponibilidade oscilante de insumos e mudanas nos regulamentos governamentais resultam em vantagem competitiva para as empresas que as antecipam e agem agressivamente para explor-los. De acordo com Porter (1990, p.59), isso ocorre, porque: Os que agem rpido conseguem vantagens, como ser os primeiros a colher as economias de escala, reduzir os custos pelo aprendizado cumulativo, firmar as marcas e as relaes com os clientes sem competio direta, escolher os melhores canais de distribuio e obter as melhores localizaes para instalaes ou as melhores fontes de matrias-primas e outros insumos. As primeiras empresas a agirem podem traduzir inovao em vantagens de outros tipos, que bem podem ser 36. 36 mais sustentveis. A inovao em si pode ser copiada, mas as outras vantagens competitivas perduram, com freqncia. As mudanas estruturais no resultam somente de modificaes ambientais sobre as quais as empresas no tm poder de ao. Atravs de suas estratgias, as firmas individuais podem tambm influenciar as cinco foras, para pior ou melhor (PORTER, 1990, p.47). De certa forma, pode-se dizer que essa a linha de raciocnio defendida por HAMEL & PRAHALAD (1995), para os quais as empresas bem sucedidas so aquelas capazes de, mais que prever e antecipar o futuro, arquitetar e moldar as regras do jogo dos mercados de amanh. Grande parte da argumentao desses autores ressalta a necessidade de desenvolver hoje as competncias necessrias para obteno de vantagens competitivas no futuro. H, portanto, uma grande preocupao em torno da inovao tecnolgica e da correta percepo das transformaes ambientais, especialmente as modificaes das necessidades dos consumidores. Mais que isso, os autores sublinham a capacidade das organizaes de desenvolverem novas tecnologias, gerarem necessidades e moldarem o futuro, argumentando ser esse o papel dos lderes intelectuais que visam a se tornar lderes de mercado. Besanko et al (2000, p.365) confirma essa capacidade que as empresas possuem de modificar a estrutura da indstria. Todavia, no se limita s dimenses de tecnologia e demanda, apresentando ao longo de sua obra uma srie de instrumentos capazes de modificar cada uma das cinco foras, todos eles fundamentados em princpios econmicos normalmente aceitos. Cita, por exemplo, as estratgias de dissuaso de entrada, que amenizam a ameaa de novos entrantes; a cooperao entre competidores para alterao da legislao; esforos conjuntos em prol do desenvolvimento de novos padres de tecnologia; entre outros. Conclui-se, a partir disso, que as empresas devem balancear suas decises estratgicas entre dois objetivos distintos, embora interdependentes. Um desses objetivos o posicionamento, ou seja, a conquista uma vantagem competitiva sustentvel relativamente ao demais competidores, que permite firma obter lucratividade superior mdia da indstria na qual compete. O outro objetivo deve ser estrutural, baseado na atuao sobre 37. 37 as cinco foras, assim como outras foras ambientais relevantes (tecnologia, demanda, legislao e cultura), com o intuito de preservar ou mesmo aumentar a atratividade da indstria, ou seja, a lucratividade mdia do setor. No h dvidas de que as estratgias de posicionamento so os meios pelos quais as empresas conquistam a liderana em suas respectivas indstrias e, portanto, tm uma grande importncia. No entanto, quando muitas empresas buscam agressivamente ocupar uma mesma posio, o resultado tende a ser a intensificao das foras que restringem a lucratividade mdia da indstria. O caso mais tradicional ocorre quando mais de uma empresa objetiva conquistar a posio de liderana em custo atravs de economias de escala. A disputa por participao de mercado se intensifica, aumentando a freqncia de guerras de preo e/ou o poder de barganha dos clientes. Assumido o pressuposto de maximizao da riqueza dos acionistas, natural que os executivos levem em considerao os efeitos de suas decises estratgicas sobre as foras ambientais. Isso no implica que todas as decises tero efeito positivo sobre as foras competitivas. Os agentes possuem racionalidade limitada e nem sempre as aes se traduzem nos resultados esperados. De qualquer forma, h que se pressupor que exista uma inteno de melhora em cada movimento estratgico que, conseqentemente, pode ser interpretado como uma resposta s foras ambientais que momentaneamente restringem a capacidade da organizao de gerar valor para seus acionistas. Posto isso, a subseo seguinte analisa a indstria de linha branca brasileira luz da estrutura bsica proposta por Porter, em que a estratgia das empresas resulta da combinao das cinco foras ambientais com o posicionamento pretendido. 3.3. Anlise estrutural da indstria de linha branca Para discutir a racionalidade de uma estratgia, imprescindvel conhecer as motivaes que levam os agentes a adot-la. Vimos que a tipologia de Porter nos fornece os subsdios necessrios para o desenvolvimento de uma abordagem holstica das foras que atuam sobre as empresas numa determinada indstria. Por esse motivo, a anlise estrutural da 38. 38 indstria permite-nos justificar, ou ao menos identificar indcios das justificativas percebidas pelos agentes para a escolha de uma estratgia. Conforme discutido anteriormente, a indstria de linha branca engloba produtos classificados como bens de consumo durveis, que podem ser divididos em nove categorias: Refrigeradores; Freezers verticais; Freezers horizontais; Lavadoras automticas; Lavalouas automticas; Foges; Condicionadores de ar; Fornos de microondas. Dentre essas categorias, as mais significativas em termos de volume vendido no Brasil so os refrigeradores, os foges e as lavadoras de roupa que, juntas, respondem por aproximadamente 90 a 95% do total de vendas industriais. Grfico 3 - Vendas industriais de produtos por categoria 37,6% 41,2% 40,1% 41,7% 40,0% 11,5% 11,5% 13,9% 8,5% 5,6% 6,0% 42,4% 2000 2001 2002 Demais Categorias Lavadoras Foges Refrigeradores Fonte: Adaptado de ELETROS 39. 39 Outra constatao importante a maturidade do mercado nacional. Ainda que haja alguma controvrsia a respeito da forma ideal de mensurao dessa dimenso, um indicador normalmente aceito o percentual de penetrao do produto nos domiclios do pas. Como haveria de se esperar, esse ndice aponta que justamente os dois mercados mais significativos refrigeradores e foges so aqueles que possuem o maior percentual de penetrao nos domiclios brasileiros. Estima-se que, em 2005, 96,1% dos lares possua um refrigerador e 99,3%, pelo menos um fogo; o que reduz de forma significativa o potencial de crescimento da indstria. Tabela 6 - Penetrao de mercado dos produtos de linha branca Penetrao de mercado (%) 1998 2001 2005 Refrigeradores 90.6 94.0 96.1 Lavadoras 35.9 36.2 35.7 Foges 94.5 99.4 99.3 Microondas 17.4 22.7 23.9 Freezers 21.3 21.5 16.7 Secadoras 6.8 7.2 4.9 Lava-louas 3.9 3.5 3.0 Fonte: Departamento de Pesquisa de Mercado da Whirlpool S/A. No entanto, mesmo as categorias com baixa penetrao apresentaram taxas modestas de crescimento nos ltimos anos (2002 a 2005), reflexo talvez do binmio formado por baixo crescimento da renda e alto custo do crdito para o consumo. 40. 40 Grfico 4 Taxas mdias de juros cobradas ao consumidor (% a.a.) 189 212 203 152 147 154 159 144 142 - 50 100 150 200 250 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Fonte: Anefac Grfico 5 Rendimento mensal nominal (mdia anual R$) 854 855 853 862 868 874 968 1.044 1.117 0 200 400 600 800 1000 1200 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 Fonte: IPEA Grfico 6 Evoluo dos preos e da renda 0 50 100 150 200 250 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 IPCA IGP-M Renda nominal Fonte: FGV, IBGE e IPEA 41. 41 Embora a renda nominal tenha crescido no perodo, os preos aumentaram num ritmo muito superior, gerando reduo/estagnao do poder real de compra. Ademais, apesar da tendncia de declnio das taxas de juros na economia, o custo do crdito para o consumidor permaneceu acima de 100% a.a. Isso no significa que a disponibilidade de crdito diminui, mas sim que uma grande parte do poder de consumo destinou-se ao pagamento dos juros. Conseqentemente, no houve aumentos significativos da venda de produtos de linha branca no perodo. 3.3.1 Rivalidade interna Esse cenrio de baixo crescimento da demanda se contrape grande capacidade produtiva instalada no Brasil. Estima-se que a indstria de eletrodomsticos opere com uma ociosidade de aproximadamente 40%6 , extremamente alta para os padres competitivos atuais. A situao se torna ainda mais grave se considerarmos que a estimativa relativa a 2004, ano em que as condies cambiais possibilitaram um incremento significativo das exportaes no setor. A racionalidade econmica nos leva a inferir que o caminho natural para a indstria diante de to evidente lacuna entre oferta e demanda seria a concentrao, seja atravs de fuses e aquisies, seja por movimentos de sada. Embora alguns dos agentes como BSH/Continental apontem para esse caminho, o que se percebe no mercado um acirramento da competio. Esse fenmeno decorre tanto da postura das grandes empresas transnacionais atuantes no Brasil, quanto dos competidores nacionais, de menor porte. Os trs principais competidores na indstria brasileira de linha branca so Whirlpool, Electrolux e Mabe (GE). Essas empresas administram as principais marcas comercializadas no mercado interno, respectivamente: Brastemp/Consul, Electrolux e GE/Dako. Em quarto lugar aparece a BSH, que administra as marcas Bosch e Continental. A Whirlpool a empresa lder no mercado nacional, atuando em todas as categorias de produtos de linha branca. Sua marca Brastemp referncia de qualidade no Brasil, sendo a preferida entre os consumidores brasileiros, muito embora essa preferncia no se confirme 42. 42 em liderana de participao, devido aos preos praticados que a posicionam como produto premium. graas marca Consul, direcionada ao pblico de menor renda, que a Whirlpool sustenta seu alto volume de vendas e produo, garantindo tanto a liderana do mercado quanto os naturais ganhos de escala. J a Electrolux, que entrou no mercado brasileiro aps a aquisio da Prosdcimo, possui uma marca nica que carrega a mesma razo social da empresa. Assim como a Whirlpool, atua em todas as categorias de linha branca. Todavia, posiciona-se de forma intermediria entre as marcas Brastemp e Consul, oferecendo aos clientes uma alternativa mais barata em relao aos produtos Brastemp, com qualidade prxima. A Mabe, empresa de origem mexicana que controla as marcas GE e Dako, aparece tambm entre os trs players mais relevantes da indstria. Ainda que possua a limitao de atuar em apenas quatro categorias refrigeradores, freezers verticais, lavadoras e foges , destaca- se no mercado de foges para consumidores de menor poder aquisitivo, em que oferece produtos com a marca Dako. Por sua vez, a marca GE se posiciona de forma similar Electrolux, configurando uma estratgia multimarcas semelhante utilizada pela Whirlpool, porm em patamares inferiores de preo. Descrio similar pode ser aplicada BSH, que tambm baseia sua estratgia em duas marcas. A primeira, Bosch, possui um posicionamento direcionado s classes A e B, enquanto a Continental visa a atender as classes mais baixas. Atualmente, a BSH restringe suas operaes ao mercado de foges, tendo liquidado recentemente suas plantas de freezers (vendida para a Metalfrio) e lavadoras automticas. A presena dessas quatro empresas no mercado brasileiro denota que o que ocorre em termos de competitividade no Brasil nada mais que um reflexo da competio global. Whirlpool, Electrolux, General Electric e Bosch so reconhecidamente os principais players na corrida pela liderana mundial, embora ao menos trs representantes asiticos se apresentem de forma proeminente para pleitear essa posio: LG (Coria do Sul), Samsung (Coria do Sul) e Haier (China). Talvez por essa razo, Whirlpool, Electrolux e Mabe7 6 Estimativa de ociosidade da indstria de linha branca (referente a 2004) calculada com base em dados do Ministrio do Desenvolvimento da Indstria e do Comrcio Exterior (MDIC), ELETROS, sites institucionais das empresas e publicaes na mdia impressa. 7 A GE possui participao de 50% no capital Mabe, empresa lder do mercado mexicano que produz e comercializa as marcas GE e Dako no Brasil. 43. 43 (GE) se mostram relutantes em relao liquidao de operaes pouco rentveis no Brasil, o que cederia um terreno precioso para os concorrentes diretos. Em outras palavras, possvel que os sacrifcios econmicos representados pelas estratgias agressivas de conquista de participao de mercado no Brasil nada mais sejam que pilares de estratgias corporativas globais. No entanto, o cenrio competitivo no se limita presena dos representantes dessas grandes corporaes. H pelo menos duas empresas nacionais cuja atuao tem contribudo para tornar ainda mais intensa a competio no setor: Atlas e Esmaltec. A Atlas, que iniciou suas operaes com a produo de foges a lenha, possui hoje uma importante participao no mercado de foges a gs. Seu crescimento se deve em grande parte ao foco no mercado nas classes C, D e E, com a oferta de produtos simplificados a preos bem abaixo dos concorrentes. Graas parceria com as Casas Bahia, a empresa conquistou mercado rapidamente e, com a aquisio da Enxuta em 2003, ampliou sua atuao para o segmento de lavadoras automticas. Caminho semelhante foi adotado pela Esmaltec, empresa do grupo Edson Queiroz. Iniciou suas operaes com a produo de foges e hoje comercializa refrigeradores, freezers, depuradores, microondas e bebedouros. Parte de uma estratgia slida de diversificao do grupo controlador, a Esmaltec tem conquistado participao expressiva tambm graas parceria com grandes canais de distribuio e foco nas classes C, D e E. Embora no haja um nmero muito grande de competidores relevantes na indstria, h um claro movimento por parte dos canais varejista que favorece as empresas mais aptas a atenderem os segmentos de baixa renda. Assim, empresas como Esmaltec e Atlas, cujos produtos foram projetados para um posicionamento de baixo preo, possuem vantagens em relao s empresas multinacionais, que em sua maioria focam seus esforos de desenvolvimento em produtos para as classes A e B. Conseqentemente, para barrar a perda de participao de mercado, as empresas lderes tm necessariamente que reduzir os preos, diminuindo sua rentabilidade. 44. 44 3.3.2 Novos entrantes Diante do baixo crescimento da indstria e alta competitividade entre as empresas, poderia se pressupor menos expressiva a ameaa de novos entrantes. No entanto, esse pressuposto no se confirma quando observamos os fatos recentes. LG e Samsung, lderes no mercado coreano, iniciaram em 2005 uma estratgia de entrada no mercado brasileiro. Com produtos altamente diferenciados direcionados a um pblico de altssima renda, LG e Samsung tm com sucesso revertido a tradicional imagem menos- por-menos das marcas asiticas, conquistando uma imagem cada vez mais aspiracional. Esse movimento representa uma grande ameaa para marcas como Brastemp, Electrolux e GE, que buscam um posicionamento semelhante na mente dos consumidores. A preocupao para os fabricantes nacionais torna-se ainda maior se observarmos o que ocorreu na indstria mexicana. De forma semelhante, os coreanos entraram no Mxico com um posicionamento premium, praticando preos que limitavam o acesso aos produtos ao topo da pirmide social. At que, aps transformarem suas marcas em sonhos de consumo da classe mdia, introduziram linhas de produtos menos especificados, com preos competitivos e fabricao nacional, conquistando aproximadamente um quinto daquele mercado. Alm da entrada dos concorrentes asiticos, empresas j atuantes no mercado tm ampliado seu portflio de produtos, constituindo novos movimentos de entrada. A Mabe, por exemplo, introduziu em 2005 sua linha de refrigeradores e lavadoras GE Imagination, complementando seu portflio que j contava com os foges Dako. No mesmo ano, a Electrolux completou seu portflio, introduzindo a linha Revolux de foges, categoria em a empresa no atuava at ento. Finalmente, a Esmaltec, que originalmente fabricava apenas foges passou a produzir tambm refrigeradores, freezers, depuradores e microondas. Deduz-se a partir disso que, alm de baixa, a atratividade do setor demonstra uma tendncia negativa, que aponta para uma intensificao da competio e, portanto, para o fortalecimento do poder de barganha dos varejistas. 45. 45 3.3.3 Ameaa de substitutos Substituio, por sua vez, no um fenmeno facilmente perceptvel na indstria de linha branca. Todavia, se analisarmos bem, o surgimento de produtos substitutos tambm constitui um problema para algumas categorias do setor. O caso mais clssico explica a baixa penetrao das lava-louas no mercado brasileiro. Se por um lado a renda limita o acesso das classes C, D e E a esse produto, nas classes A e B a baixa penetrao atribuda ao grande nmero de empregadas domsticas que atendem de maneira satisfatria mesma necessidade. J a oferta de lavadoras de roupa semi-automticas, ainda que possuam funcionalidade semelhante das lavadoras automticas, no caracteriza substituio propriamente dita. Isso porque as lavadoras semi-automticas so antes uma adaptao dos modelos automticos, apresentando uma tecnologia claramente inferior, que se sustenta em mercados emergentes unicamente pelo baixo custo. Alm desses dois casos, pouco se pode argumentar em defesa de ameaas de substituio tecnolgica. At mesmo porque, no Brasil, persistem resistncias culturais aos movimentos de substituio. Um dos casos mais notveis ocorreu justamente no mercado de lavadoras- automticas, com a importao de produtos front load nos anos posteriores implantao do Real. Estes produtos chegavam ao Brasil com preos abaixo dos produtos top load8 e, apesar das vantagens funcionais, os consumidores demonstraram uma clara preferncia pela verso tradicional. Outras inovaes que no conquistaram o consumidor brasileiro foram os foges eltricos e os refrigeradores frost free, embora nesses casos no se possa atribuir causa preferncia do consumidor, uma vez que o poder de compra aparece como importante fator limitante. O mesmo se aplica aos fornos de microondas e aos condicionadores de ar, que permanecem como bens de luxo. Alm do alto valor nominal comparativamente renda mdia da populao, a longa vida til dos produtos explica o lento processo de adoo dessas novas tecnologias. Lenta adoo e baixo crescimento do mercado se traduzem em baixos incentivos para inovao, criando uma espcie de ciclo vicioso que mantm as empresas numa espcie de inrcia 46. 46 tecnolgica. Produtos como os foges a gs, por exemplo, mesmo possuindo uma tecnologia de menor complexidade, sofreram poucos avanos significativos ao longo de sua histria, facilitando inclusive a entrada de competidores nacionais. Em outras palavras, a inexistncia de barreiras tecnolgicas significativas permite que fabricantes nacionais disputem em condies de igualdade com os grandes fabricantes multinacionais, reduzindo a rentabilidade geral da indstria. Assim, mais que a ameaa de substitutos, a incapacidade das empresas lderes de deslocar o mercado como um todo para nveis mais altos de sofisticao um fator que induz ao acirramento da competio e queda da atratividade da indstria. 3.3.4 Poder dos fornecedores (fornecedores de ao) Desde meados de 2004 a indstria de eletrodomsticos de linha branca vem enfrentando um problema adicional em termos de rentabilidade. Graas em boa parte expanso da economia mundial, a cadeia produtiva do ao tem sido capaz de sustentar preos cada vez mais altos desse que o principal insumo no s da indstria de eletrodomsticos, como tambm de outras importantes indstrias como a automobilstica e a de mquinas e equipamentos. Desde ento, o governo brasileiro demonstra preocupao em relao s conseqncias dessa escalada dos preos do ao. A principal preocupao se d em funo dos efeitos que esses aumentos tm sobre os ndices de inflao. Em segundo plano, porm no menos importante, h uma preocupao com o consumidor. Admite-se aqui que a indstria automobilstica e os fabricantes de eletrodomsticos seriam capazes de repassar todo ou boa parte do reajuste ao consumidor. De fato, porm, no foi exatamente isso que ocorreu. Pelo menos no na indstria de eletrodomsticos. Como j discutido, embora o setor de eletrodomsticos possa ser considerado um oligoplio, sua capacidade de repassar os reajustes de preo ao consumidor limitada por pelos menos dois fatores essenciais: a concentrao no canal de distribuio e a capacidade ociosa presente na indstria. So duas questes complementares, visto que a ociosidade 8 Lavadoras top load so aquelas em que a abertura do compartimento de lavagem se localiza na parte superior da mquina. J os modelos front load, a abertura frontal. 47. 47 produtiva uma das fontes do poder de barganha do canal varejista, que no permite um repasse to significativo de preos ao consumidor. Grfico 7 - IPA - OG - ferro, ao e derivados (mdia 1997 = 100) 100 101 115 137 150 181 246 329 389 0 50 100 150 200 250 300 350 400 450 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 CAGR (1997 2002): 12,7% CAGR (2002 2005): 28,9% Fonte: FGV apud IPEA/Data A razo para a imposio dessa barreira ao reajuste de preos no necessariamente ruim para a indstria, pois o consumo de eletrodomsticos bastante sensvel renda e, por conseguinte, ao nvel de preos. Assim, ao pressionar a indstria pela manuteno dos preos, o canal varejista protege o consumidor, ao mesmo tempo em que garante indstria um volume de demanda mnima. Todavia, fosse o canal varejista menos concentrado, a absoro do custo adicional provocado pelo aumento do ao seria mais bem distribuda entre os elos do sistema de valor. Em vista desse cenrio, os setores usurios de ao pressionam o ministrio do desenvolvimento por uma interveno, alegando que o aumento da matria-prima ocorre porque siderrgicas do prioridade s exportaes, promovendo escassez no pas. Reaes mais contundentes de algumas indstrias j podem ser observadas no mercado. A Abimaq (Associao Brasileira da Indstria de Mquinas e Equipamentos) criou uma espcie de bolsa do ao: uma tabela na pgina da Internet da entidade com mais de mil cotaes para orientar seus associados. Em entrevista para o jornal Estado de So Paulo 48. 48 (24.11.2004), Newton de Mello, presidente da associao, afirmou que a iniciativa uma forma de organizar o setor e de ganhar poder de barganha. "Somos grandes compradores de ao, com grande variedade de indstrias, mas sem programao firme. Acabamos comprando de distribuidores e no das usinas, ficando sujeitos variao abrupta de preos". Por sua vez, Marco Polo de Mello Lopes, vice-presidente-executivo do Instituto Brasileiro de Siderurgia, considera que as siderrgicas vivem "um momento especial, com os preos internacionais extremamente elevados". Segundo ele, a cotao do ao est alta por causa do cenrio internacional e porque as matrias-primas para a sua produo tambm esto em alta. De fato, boa parte dos aumentos da cotao do ao se deve aos reajustes do minrio de ferro realizados pela CVRD (Companhia Vale do Rio Doce). Apenas como exemplo, em 2005, a companhia decidiu reajustar o valor do minrio em 90% (Estado de So Paulo, 28.11.2004). Segundo a CVRD, porm, a responsabilidade no cabe somente aos reajustes do minrio de ferro. A cadeia do ao aproveitou a forte demanda internacional e as vantagens competitivas do setor para elevar as margens de operao de 2001 at dezembro de 2004. Nesse perodo, as margens lquidas cresceram, de acordo com informaes da mineradora, US$ 161 por tonelada, deixando um patamar de US$ 107 para US$ 268 a tonelada. No mesmo perodo, o minrio de ferro e pelotas tiveram uma majorao de US$ 11 a tonelada, partindo de US$ 29 para US$ 40 a tonelada. (Estado de So Paulo, 11.04.2005). No cabe aqui apontar culpados do aumento do ao. Do ponto de vista estratgico, no h dvidas de que a atual conjuntura da economia global favorece as mineradoras e as siderrgicas. De forma semelhante, porm, sabe-se que h uma componente cclica no processo de crescimento da economia. Logo, a presso dos fornecedores tende esmorecer medida que a oferta e demanda mundiais alcanarem um novo patamar de equilbrio, balanceando o poder de barganha entre fabricantes e usuri