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MODELOS DE CONTRATOS PARA EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL: UMA ANÁLISE CRÍTICA DA EXPERIÊNCIA BRASILEIRA E DE ALGUNS PAÍSES SELECIONADOS Superintendência de Comercialização e Movimentação de Petróleo, seus Derivados e Gás Natural Dezembro 2007

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MODELOS DE CONTRATOS PARA EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL: UMA

ANÁLISE CRÍTICA DA EXPERIÊNCIA BRASILEIRA E DE ALGUNS PAÍSES SELECIONADOS

Superintendência de Comercialização e Movimentação de Petróleo, seus Derivados e Gás Natural

Dezembro 2007

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Superintendente de Comercialização e Movimentação de Petróleo, seus Derivados e Gás Natural José Cesário Cecchi Superintendente Adjunta Ana Beatriz Stepple da Silva Barros Assessores Julia Rotstein Smith da Silva Costa Marcelo Meirinho Caetano Equipe Técnica da Superintendência Alessandro dos Santos de Almeida (estagiário) Almir Beserra dos Santos André Regra Ary Silva Junior Guilherme de Biasi Cordeiro Helio da Cunha Bisaggio Heloíse Helena Lopes Maia da Costa Jader Conde Rocha Julia Rotstein Smith da Silva Costa Luciana R. de Moura Estevão Luciano de Gusmão Veloso Marcus Vinicius Nepomuceno de Carvalho Mario Jorge Figueira Confort Patrícia Mannarino Silva Tathiany Rodrigues Moreira Responsáveis pela Elaboração da Nota Técnica André Regra Guilherme de Biasi Cordeiro Julia Rotstein Smith da Silva Costa Luciano de Gusmão Veloso Tathiany Rodrigues Moreira

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Nota Técnica nº 021/2007-SCM

Rio de Janeiro, 17 de dezembro de 2007

ASSUNTO: MODELOS DE CONTRATOS PARA EXPLORAÇÃO E PRODUÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NATURAL: UMA ANÁLISE CRÍTICA DA EXPERIÊNCIA BRASILEIRA E DE ALGUNS PAÍSES SELECIONADOS

I – Introdução

Exercido desde 1953, o monopólio legal da PETROBRAS sobre as atividades de pesquisa e lavra, refinação e transporte de petróleo e gás natural, bem como comércio internacional de derivados foi quebrado com a edição da Emenda Constitucional nº 9/95.

A eliminação das barreiras institucionais à entrada possibilitou a abertura do mercado à concorrência, com a participação de empresas privadas nacionais e estrangeiras em diferentes atividades do setor petrolífero nacional, particularmente nos segmentos de Exploração e Produção (E&P) e comercialização, considerados potencialmente competitivos. As atividades de transporte e distribuição, contudo, mantiveram elevadas barreiras à entrada e saída, por constituírem-se monopólio natural.

Neste âmbito, promulgou-se em 1997 a Lei nº 9.478 (Lei do Petróleo), que estabeleceu os princípios e objetivos da política energética nacional, a criação do Conselho Nacional de Política Energética – CNPE e a criação da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP.

A partir desses regulamentos, ficou estabelecido que os direitos de prospecção e produção de gás natural no território brasileiro continuariam pertencendo à União, cabendo à ANP a sua administração, mediante concessões a empresas públicas ou privadas.

À ANP foi conferida, então, a responsabilidade de conduzir as Rodadas de Licitações para Exploração, Desenvolvimento e Produção de Petróleo e Gás Natural, as quais constituem-se, desde a promulgação da Lei do Petróleo, como o único meio legal no Brasil para a concessão do direito de exercício dessas atividades econômicas.

No período entre 1999 e 2005, realizaram-se 7 (sete) rodadas, onde foram concedidos mais de 500 blocos de exploração, totalizando um montante de R$ 3,26 bilhões correntes.

A rodada seguinte, realizada em novembro de 2006, foi suspensa por decisão judicial antes que tivessem sido leiloados todos os blocos previstos. E, recentemente, a 08 de novembro de 2007, foi editada a Resolução CNPE nº 6, a qual determinou ao Ministério de Minas e Energia – MME e à ANP a adoção das providências necessárias para a conclusão desta Oitava Rodada de Licitações, considerando o seu foco em gás natural e óleo leve.

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No dia 27 de novembro de 2007, a ANP realizou a Nona Rodada, onde foram ofertados blocos de exploração em águas profundas, águas rasas e terra, em áreas classificadas como de elevado potencial, novas fronteiras e bacias maduras. A área em oferta abrangeu 9 (nove) bacias sedimentares, a saber: Campos, Espírito Santo, Pará-Maranhão, Parnaíba, Pernambuco-Paraíba, Potiguar, Recôncavo, Rio do Peixe e Santos. Este último leilão superou o recorde de arrecadação até então obtido e arrecadou, com os Bônus de Assinatura da venda de 117 blocos (de 271 oferecidos) um total de R$ 2,1 bilhões.

Em que pese o sucesso alcançado por esta Nona Rodada em particular, a retirada do edital, às vésperas do leilão, de 41 blocos exploratórios situados na chamada camada "pré-sal", com grande potencial de reservas, decidida no início de novembro pelo CNPE, gerou contestações e incertezas acerca da estabilidade das regras e de qual modelo exploratório deverá de fato predominar no Brasil a partir deste episódio.

Isso porque, em 08 de novembro de 2007, foi anunciada pela PETROBRAS uma nova descoberta na Bacia de Santos, na área de Tupi, de petróleo tipo leve (28º API), estimado em cerca de 5 a 8 bilhões de barris de petróleo e gás natural, podendo, segundo especialistas, significar um incremento de 50% nas atuais reservas brasileiras.

A esse anúncio seguiu-se a decisão de retirada dos referidos blocos do leilão, em razão dos mesmos estarem localizados em áreas próximas à da descoberta e que, por isso, teriam grande probabilidade de também apresentarem petróleo de alta qualidade.

Tal fato comprometeu a participação das grandes empresas mundiais do setor que, mesmo estando habilitadas, não participaram da disputa, entre elas, Exxon Mobil, Chevron, Shell, BP, BG, Eni e Repsol.

É nítido que a mudança das regras afeta a confiança dos investidores no modelo regulatório vigente, podendo inibir os altos investimentos necessários e de longo prazo de maturação. Além disso, a alteração no edital original levantou dúvidas sobre se o real objetivo do governo com a retirada dos blocos seria a preservação das reservas de alto potencial para serem apropriadas futuramente pela PETROBRAS.

Apesar da forte participação de empresas nacionais e outras estrangeiras na disputa por áreas poder, de certa maneira, indicar um fortalecimento do modelo existente, o que se observa, na realidade, é a volta ao debate em torno do qual questiona-se este modelo, baseado em concessões públicas e ofertadas por meio de leilão.

Como se pode inferir do recente episódio, foi posta em xeque a permanência do modelo atual como parte do arcabouço regulatório brasileiro. As novas regras podem vir a significar exclusividade ou preferência à estatal petrolífera, mediante a adoção de um novo modelo exploratório baseado, por exemplo, em contratos de partilha de produção entre o governo e a empresa operadora, ou ainda, de outro modo, pode significar a criação de um modelo no qual as empresas privadas seriam apenas prestadoras de serviço.

Visando oferecer subsídios para aprofundar o entendimento acerca do real significado da adoção de um modelo alternativo, a presente Nota Técnica objetiva analisar as características dos diferentes modelos vigentes em alguns países selecionados, bem como apontar as implicações que sua adoção pode acarretar para o desenvolvimento da indústria brasileira de petróleo e gás natural.

Para tanto, este trabalho está dividido em 6 (seis) seções, incluindo esta introdutória. A segunda seção descreve e analisa os principais modelos de Contratos celebrados entre governo e empresas, sejam estatais ou privadas.

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Em seguida, faz-se uma descrição das características do modelo brasileiro de concessões para E&P de petróleo e gás natural, identificando-se os principais aspectos presentes nos Contratos, assim como as estruturas de government take.

Já a quarta seção apresenta a experiência de alguns países selecionados, cujos níveis de reservas e custos de E&P são bastante diferenciados entre si e pautaram a escolha do tipo de Contrato estabelecido em cada país.

Após, são tecidas as considerações finais, com a sugestão indicativa desta Superintendência quanto ao modelo mais apropriado que deve vigorar no Brasil, capaz de maximizar a arrecadação das rendas petrolíferas pelo Governo Federal.

Por fim, são citadas as referências bibliográficas utilizadas no presente estudo.

II – Principais Modelos de Contrato de Exploração e Produção de Petróleo e Gás Natural

Historicamente, os Contratos vigentes no segmento de upstream seguiam o modelo clássico de concessões e caracterizavam-se, principalmente, por: (i) longa duração, vigorando usualmente entre 60 e 75 anos; (ii) áreas de concessão com grande extensão (os contratos cobriam todo o território, ou a maior parte dele); (iii) soberania limitada para o Estado Nacional outorgante da concessão às companhias de petróleo internacionais (os Estados recebiam um limite de pagamento baseado na produção); e (iv) controle extensivo das companhias de petróleo internacionais sobre a programação e o modo sobre o qual as reservas de petróleo seriam desenvolvidas e produzidas (AL-ATTAR e ALOMAIR, 2005).

Esse modelo clássico de concessões permaneceu até a década de 50 e foi marcado pelo domínio de sete companhias internacionais na indústria de petróleo mundial, conhecidas como ‘Sete Irmãs’, um grupo de firmas multinacionais integradas verticalmente.

Já as décadas de 60 e 70 testemunharam a nacionalização, completa ou parcial, da indústria do petróleo e o surgimento de novos tipos de Contratos, com o aperfeiçoamento de algumas cláusulas e a obrigação de participação nos lucros ou parcerias com as firmas nacionais.

A partir de então, muitos países optaram por reabrir seus segmentos upstream e/ou downstream aos investimentos de firmas privadas ou estrangeiras através de variados tipos de Contratos, o que tem alterado substancialmente tais segmentos. A adoção desses novos modelos contratuais buscou reduzir a exposição do governo, mediante a repartição dos riscos com o investidor e, ademais, serviu à transferência de tecnologia, know-how e capital das firmas estrangeiras (AL-ATTAR e ALOMAIR, 2005).

De acordo com a literatura especializada, os principais fatores que afetam a escolha do modelo contratual são: volume de reservas, custos de E&P e fator de recuperação das reservas. Nesse sentido, em países com baixas reservas e altos custos de produção em águas ultraprofundas, tais como EUA, Reino Unido e Noruega, o modelo que predomina é o de Royalty/Tax (R/T), também conhecido como concessões, todavia, com características diferentes do modelo de concessões que vigorou até a década de 50. Já aqueles países que apresentam maiores reservas e em que os custos são médios, como Indonésia, China e Nigéria, a opção mais usual é a de Contratos de Partilha de Produção (CPP). Por seu turno, dados empíricos mostram que enormes reservas e baixos custos de produção, como os verificados no Kuwait, Irã e Venezuela, levam à escolha de Contratos de Risco (CR).

No que tange ao fator de recuperação das reservas, ou seja, a possibilidade de transformar reservas em recursos comercializáveis, ressalta-se sua importante

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influência sobre a alteração dos custos totais de produção. Assim, em áreas com baixo fator de recuperação, por exemplo, é necessário o emprego de técnicas de recuperação aperfeiçoadas, as quais resultam em incremento nos custos.

Importa notar que alguns países podem estabelecer mais de um tipo de Contrato. Isso se deve ao fato de que, muitas vezes, um mesmo território nacional apresenta reservas diversificadas, com custos totais de E&P distintos.

Os principais aspectos dos novos contratos que têm sido estabelecidos para o segmento de upstream, portanto, são: (i) redução nos custos marginais de E&P para o desenvolvimento de campos maduros; (ii) repartição de riscos de investimento e geológicos entre o governo e a firma de petróleo estrangeira; (iii) aumento na capacidade de produção de petróleo através da utilização de tecnologias otimizadas; e (iv) aumento na produção para cobrir demandas de petróleo futuras.

A despeito da diversidade de modalidades contratuais adotadas mundialmente no segmento de E&P, é característica comum de todas elas a formação de Joint Ventures entre as companhias petrolíferas que pretendem celebrar contratos com o Estado no upstream, no sentido de mitigar riscos e dividir custos.

Criada a Joint Venture, que também pode contar com a participação do ente estatal, esta assina um contrato com o Estado, seja ele de risco, ou de partilha de produção, o qual garante a este uma significativa parcela do óleo produzido. Deduzida esta parcela do valor associado ao volume de óleo remanescente, subtraem-se os valores referentes aos tributos, bem como aos custos1, sendo o saldo restante dividido, pró-rata, entre as partes da Joint Venture, isto é, o contratante e o Estado.

Tais acordos de associação, firmados entre uma empresa petrolífera e o Estado, têm o intuito de criar os mesmos incentivos econômicos de um Contrato de Concessão (ver subseção II.1, a seguir) por oferecer à empresa petrolífera participação nos ativos do projeto, providenciando, no entanto, um controle pelo Estado através da manutenção das empresas petrolíferas como contratantes, ao invés de Concessionárias.

A seguir, faz-se uma descrição dos principais modelos de contrato de E&P supracitados.

II.1 Contratos de Concessão

No segmento de upstream, os Contratos de Concessão possuem como partes signatárias as companhias petrolíferas, na qualidade de concessionárias, e a Administração Pública, na condição de Poder Concedente.

Tais instrumentos jurídicos possuem como escopo a execução das atividades de exploração, avaliação, desenvolvimento e produção dos blocos integrantes das áreas concedidas, visando à obtenção de petróleo e gás natural em condições comerciais.

Em geral, seus prazos de vigência variam de 20 a 30 anos e podem ser divididos em fases. No caso brasileiro, por exemplo, são previstas duas fases, a saber, Exploração e Produção, cujas respectivas durações são estabelecidas no corpo do próprio documento.

1 Existe um grande espectro de distribuição de custos entre Estado e contratante, no qual os contratos protagonizados pela Joint Venture podem ser assinados, sendo seus extremos, as seguintes situações: a) Joint Venture pura: quando os custos e riscos são compartilhados na base 50%-50%; e b) Joint Venture do tipo russo: o governo é financiado por toda a fase de E&P, até que as operações comecem a gerar fluxo de caixa positivo, os custos e riscos são 100% bancados pelo contratante, até que o empreendimento seja rentável.

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No âmbito destes Contratos2, as concessionárias possuem a exclusividade no exercício das atividades acima mencionadas, obrigando-se, contudo, por sua conta e risco, a realizarem todos os investimentos necessários para tal.3

Os eventuais prejuízos incorridos nas operações em questão são suportados por estes agentes, os quais não dispõem de quaisquer direitos a pagamentos, reembolsos ou indenizações, caso inexista descoberta comercial em suas respectivas áreas de concessão.

Importante registrar, também, que, em virtude da ocupação ou retenção das áreas da concessão, as concessionárias sujeitam-se aos encargos relativos aos tributos e às compensações financeiras atinentes às atividades por elas desenvolvidas, consoante a legislação aplicável.

Em contrapartida, cabe-lhes a propriedade do petróleo e do gás natural efetivamente produzidos, ainda que seus depósitos mantenham-se usualmente pertencentes ao Estado. No entanto, diante do caráter estratégico desses produtos e suas implicações em termos de soberania nacional, muitos países instituem cláusulas de prioridade ao abastecimento do mercado interno.

Tal mecanismo de repartição da renda oriunda da atividade petrolífera, em que todos os investimentos e o risco são suportados pelas concessionárias, as quais devem atender metas contratualmente previstas e se submetem a tributos determinados em regulamentação prévia, configura-se como um dos principais atrativos para a adoção deste sistema, uma vez que tornam menos complexas as ações fiscalizatórias empreendidas pelo Poder Concedente em comparação com os demais modelos.

Um outro aspecto a ser suscitado diz respeito à previsão, constante de grande parte dos Contratos de Concessão, de assinatura de Acordos para a Individualização da Produção, caso as jazidas de petróleo de uma dada área concedida se estendam para áreas adjacentes não abrangidas por tais documentos, ou seja, a unitização.

Por fim, é mister destacar que ao Poder Concedente, na qualidade de signatário dos Contratos de Concessão, incumbe acompanhar e fiscalizar permanentemente as operações desenvolvidas pelas concessionárias, com o propósito de assegurar-se o cumprimento integral das obrigações por elas assumidas nos termos destes instrumentos legais.

II.2 Contratos de Partilha de Produção4

Sob um Contrato de Partilha de Produção, a propriedade do recurso permanece sob o poder do Estado e a empresa operadora é contratada para explorar e produzir petróleo e gás natural, tendo como retorno uma parcela da produção. O governo detém o direito às reservas petrolíferas ainda no subsolo e destina ao investidor apenas o papel de contratante, auxiliando o país a desenvolver suas reservas.

Desse modo, ao invés de o governo pagar ao contratante uma taxa pelos seus serviços, enquanto sustenta os riscos, custos e despesas incorridos, as partes acordam que caberá ao contratante arcar sozinho com os custos de exploração e desenvolvimento, tendo como contrapartida uma parcela da produção que vier a

2 Grande parte destes Contratos de Concessão abarcam Programas Exploratórios Mínimos a serem seguidos pelos concessionários, que, por conseguinte, comprometem-se com metas de investimentos. 3 Em alguns casos o modelo de Contratos de Concessão pode prever alguma participação da empresa estatal no negócio após realizada uma descoberta. 4 Esta seção se baseia integralmente em SUNLEY, BAUNSGAARD e SIMARD (2003).

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ocorrer. Em caso de não ocorrência de descobertas e desenvolvimento, o contratante não tem direito a qualquer ressarcimento.

Em princípio, o governo retém e dispõe de sua parte no óleo e gás natural extraído, no entanto, acordos de comercialização conjunta (joint-marketing) podem ser celebrados com o contratante.

O funcionamento de um CPP é teoricamente simples. Este modelo geralmente especifica a proporção da produção total que pode ser retida pelo contratante para a recuperação de seus custos (“cost oil”). O petróleo remanescente (incluindo qualquer excedente do cost oil acima do necessário para a recuperação dos custos) é chamado de “profit oil” e é dividido entre o governo e o contratante, de acordo com uma fórmula estabelecida no CPP.

Royalties podem ser introduzidos no sistema de partilha de produção. Em alguns CPPs existe um pagamento explícito de royalties ao governo antes da produção ser dividida entre cost oil e profit oil. Como alternativa ao royalty, pode ser fixado um limite ao cost oil, o que garante o surgimento do profit oil assim que a produção se inicia. A fixação deste limite possui o mesmo impacto que a cobrança de royalties: o governo se apropria de uma renda (sua parcela no profit oil) tão logo a produção comercial comece.

A proporção entre cost oil e profit oil pode ser fixa ao longo de todo o CPP ou variar de acordo com o nível da produção, o preço do petróleo cru ou a taxa de retorno interna (TIR) obtida pelo projeto. Não é incomum, nesta modalidade contratual, a cobrança de imposto de renda devido pelos contratantes, referente à sua parcela na produção. Tal imposto pode ser pago através da parcela da produção que cabe ao governo, elevando-se, dessa forma, a participação governamental na produção e mantendo-se tudo o mais constante. Vale mencionar que esta opção possui a clara vantagem de permitir que cada projeto individual tenha suas especificidades respeitadas, sem a necessidade de se alterar o arcabouço fiscal vigente.

Os modelos contratuais do tipo CPPs permitem que as condições que regem a exploração e o desenvolvimento de petróleo e gás natural estejam consolidadas em um documento. Esta característica pode ser particularmente interessante para novos entrantes pouco familiarizados com o ambiente em que devem operar.

Apesar das vantagens acima mencionadas, na prática tais contratos podem ser tão complexos de se desenhar e administrar quanto aqueles celebrados dentro dos demais regimes exploratórios, em especial no que se refere à definição dos custos que devem ser permitidos recuperar e à possibilidade de que os entendimentos prévios entre as partes se tornem inapropriados, na medida em que a real rentabilidade do projeto seja conhecida.

Em termos fiscais não existe, também, qualquer razão a priori para se preferir o regime composto apenas pela cobrança de impostos e royalties a um regime de CPP, tendo em vista que este último pode replicar o regime de impostos e royalties, e vice-versa. Como mencionado, um CPP pode conter tanto cláusulas com uma cobrança explícita de royalty ou pode estabelecer um limite para os custos, funcionando como uma cobrança implícita. Além disso, em um regime de CPP as companhias petrolíferas estão sujeitas à mesma cobrança de imposto de renda das demais empresas.

II.3 Contratos de Risco

Nesta modalidade contratual, o contratante provê todo o capital necessário à exploração e ao desenvolvimento do campo, recebendo, em contrapartida, caso a

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exploração seja bem sucedida, os custos incorridos na empreitada através da venda dos produtos explorados. Após a recuperação dos custos, o contratante fará jus a uma remuneração proporcional à reserva remanescente, paga pelo Estado, que detém a propriedade de todo o óleo desenvolvido no campo. Estas taxas, em geral, são sujeitas à tributação.

A diferença em relação ao contrato de partilha da produção é mínima: à natureza do pagamento; enquanto no contrato de partilha o contratante recebe uma parte da própria produção como pagamento, no contrato de risco, este pagamento é feito através da supra-referida remuneração.

Note-se, por fim, a tendência da adoção, nestes contratos, do método de termos flexíveis para o cálculo do government take, segundo o qual este varia progressivamente em relação à lucratividade obtida pela contratante. A forma mais comumente utilizada para a operacionalização deste procedimento é a utilização de uma banda de variação (sliding scale): adota-se um parâmetro e definem-se patamares de variação para o mesmo. A simples mudança de patamar dispara o “gatilho” para a elevação do government take. Idealmente, o parâmetro adotado deve ser a taxa esperada de retorno do empreendimento, ou, na impossibilidade do uso desta, adota-se a melhor proxy possível para mesma.

A Tabela 1 a seguir apresenta um quadro-resumo dos principais aspectos que distinguem os regimes contratuais adotados no upstream.

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Tabela 1 – Principais Características dos Regimes Contratuais Adotados Mundialmente no Segmento de Upstream

Contratos de Concessão

• O Estado ou a autoridade competente concede direitos exclusivos de E&P de uma área contratada à uma companhia petrolífera.

• A companhia petrolífera providencia o financiamento, paga impostos e royalties, mas detém toda a produção.

• O Estado pode estabelecer requisitos mínimos de abastecimento interno.

• O Estado não contribui com qualquer capital no projeto.

• O fluxo de caixa do estado advém do pagamento de impostos e royalties.

• Flexibilidade em determinar os níveis de incidência dos impostos e dos royalties (fixo, proporcional à produção, etc.).

• O Estado geralmente não recebe toda a produção que excede aquela adquirida para atender às necessidades de abastecimento interno.

Contratos de Partilha de Produção

• O Estado ou a autoridade competente celebra com uma companhia petrolífera um Contrato de Partilha de Produção, onde a companhia, atuando como contratante, financia por sua conta e risco a exploração e o desenvolvimento da área contratada.

• Se bem sucedido a companhia petrolífera recuperará seus custos e obterá seu lucro através do recebimento de uma parcela da produção.

• Os custos são recuperados a partir do “cost oil”, que em geral representa uma parcela fixa da produção.

• A parcela da produção líquida do cost oil é chamada “profit oil”.

• O profit oil é dividido entre o estado e a companhia petrolífera ou em proporção fixa ou em proporção variável baseada no volume, no preço do petróleo cru ou na TIR do projeto.

Contratos de Serviço

• A companhia petrolífera paga todos os custos de exploração e desenvolvimento.

• A companhia petrolífera recebe por estas despesas através de um desconto na compra do petróleo cru, pagamento em dinheiro ou uma parcela da produção.

• O Estado se apropria de toda a produção, embora deva ser garantida à empresa operadora uma remuneração em função da prestação do serviço.

Fonte: AL-ATTAR e ALOMAIR (2005).

Considerando que um dos aspectos mais influentes sobre a escolha adequada do modelo de Contrato de upstream por um governo é o fator custo, a Tabela 2 apresenta, com base na experiência internacional, os modelos contratuais adotados por países com custos distintos de produção.

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Tabela 2 – Custos de E&P em Países Selecionados e os Tipos de Contratos de Upstream

País Custo de

Exploração Custo de Produção

Custo Total Tipo de

Contrato

Baixo Custo

Arábia Saudita $1.50 $1.50 $3.00 x

Kuwait $1.75 $1.80 $3.55 RSA

Iraque $2.25 $1.50 $3.75 x

Irã $1.75 $2.50 $4.25 RSA

Venezuela, extra-pesado $2.00 $2.50 $4.50 RSA

Venezuela, convencional $1.20 $3.42 $4.62 RSA

Algeria $2.15 $2.50 $4.65 RSA e PSA

Médio Custo

Emirados Árabes Unidos $3.00 $1.80 $4.80 R/T

Casaquistão $3.50 $1.30 $4.80 PSA e R/T

Nigéria $3.00 $2.25 $5.25 PSA e R/T

Omã $3.75 $2.50 $6.35 PSA e R/T

Brasil $3.80 $3.20 $7.00 R/T

China $3.50 $4.00 $7.50 PSA

Rússia $4.25 $3.50 $7.75 PSA e R/T

Angola $5.00 $3.00 $8.00 PSA e R/T

Indonésia $2.50 $6.00 $8.50 PSA

Alto Custo

US Lower-48 onshore $4.95 $3.57 $8.52 R/T

Canadá, oeste $6.75 $3.00 $9.75 R/T

Mar do Norte $7.50 $3.00 $10.50 R/T

Canadá, leste $8.00 $3.80 $11.80 R/T

US Golfo do México, Self $11.00 $3.50 $14.50 R/T Fonte: AL-ATTAR e ALOMAIR (2005).

Evidencia-se que, em países com baixo custo de E&P, o governo busca um maior controle sobre a operação e a produção, refletindo-se tal fato no tipo de Contrato que será negociado. Neste caso, o Contrato de Risco é o que mais se aproxima do referido objetivo, indicando, pelo menos em tese, um maior controle do país sobre a produção, a operação e o gerenciamento da atividade.

Em se tratando de custos de E&P médios, cabe dizer que a maioria dos países que apresentam custos totais entre $4,80 e $8,50 tem firmado o Contrato de Partilha da Produção. Contudo, pode-se verificar, alternativamente, a adoção, em muitos desses países de custos médios, de Contratos de Concessão.

Já em países com alto custo de E&P, onde os custos de exploração são maiores que os custos de produção, tem prevalecido o Contrato de Concessão (Royalties/Tax), através do qual todos os custos e riscos de E&P são assumidos pelas firmas de petróleo estrangeiras.

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III – Experiência Brasileira

No Brasil, os modelos de contratos que vigoram desde a promulgação da Lei do Petróleo são os Contratos de Concessão. Após efetuada a oferta de blocos por meio do mecanismo de leilões, são assinados os contratos de concessão entre a Agência Reguladora, em nome da União, e as empresas ou consórcios vencedores. Entre seus principais aspectos, os Contratos estabelecem: (i) o pagamento pela ocupação ou retenção das áreas; (ii) o pagamento dos royalties; (iii) o pagamento das participações especiais sobre campos de grande volume de produção ou de alta rentabilidade; (iv) as condições de devolução das áreas; (v) a vigência, duração do contrato e os prazos e programas de trabalho para as atividades de E&P; (vi) o compromisso com a aquisição de bens e serviços de fornecedores nacionais; (vii) o compromisso com a realização do Programa Exploratório Mínimo proposto na oferta vencedora; e (viii) as responsabilidades das concessionárias, inclusive quanto a danos ao meio ambiente.

No que diz respeito ao Programa Exploratório Mínimo proposto pela concessionária, vale lembrar que o mesmo possui um período variável de três a oito anos. Nessa fase, as empresas devem adquirir dados, realizar novos estudos geológicos e geofísicos, perfurar poços exploratórios e avaliar se as eventuais descobertas são comercialmente viáveis. Em caso afirmativo, a concessionária deve, antes de iniciar a fase de produção, submeter à aprovação do ente regulador um plano de desenvolvimento, proposta de trabalho e previsão de investimentos.

O Contrato de Concessão prevê ainda que, em caso de risco de desabastecimento de combustíveis no país, as concessionárias atendam prioritariamente às necessidades do mercado interno.

No âmbito das atribuições da autoridade reguladora, a serem realizadas diretamente ou mediante convênios com órgãos dos Estados ou do Distrito Federal, está o acompanhamento e fiscalização permanente das operações efetuadas nos blocos concedidos. O objetivo deste acompanhamento é assegurar que o concessionário adote as melhores práticas da indústria internacional do petróleo e obedeça às normas e procedimentos técnicos e científicos pertinentes, com vistas, inclusive, à segurança das pessoas e equipamentos, à conservação dos reservatórios e de outros recursos naturais e à proteção ao meio ambiente. Para tanto, o Contrato assegura ao regulador livre acesso às áreas da concessão e às operações em curso, aos equipamentos e instalações utilizadas, assim como a todos os registros, estudos e dados técnicos disponíveis, inspeção de instalações e de equipamentos.

Cumpre mencionar que, de acordo com o Art. 20, inciso IX da Constituição Federal, e com o Art. 3º da Lei do Petróleo, pertencem à União os depósitos de Petróleo e Gás Natural existentes em território nacional.

Quanto aos custos e riscos associados à execução das operações, o Contrato estabelece que os mesmos serão assumidos pelo concessionário, cabendo-lhe, como única e exclusiva contrapartida, a propriedade do petróleo e gás natural que venham a ser efetivamente produzidos e por ele recebidos no ponto de medição da produção, com sujeição aos encargos relativos aos tributos e às compensações financeiras e à legislação brasileira aplicável.

No que tange aos níveis de government take, cabe destacar que a Agência Reguladora brasileira teve a atribuição de estruturar um novo regime de tributação, incidente sobre os contratos de concessão e previstos no edital de licitação. Além do bônus de assinatura no ato dos leilões, foram instituídos os seguintes tributos: (i) royalties: de 5 % até 10% da produção de petróleo e de gás; (ii) participação especial; e (iii) pagamento pela ocupação ou retenção de área.

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Vale lembrar que os royalties são uma compensação financeira, paga pelas empresas concessionárias produtoras de petróleo e gás natural, ao governo por este abrir mão de receita futura ao permitir a produção hoje. No Brasil, os royalties são distribuídos aos Estados, Municípios, ao Comando da Marinha, ao Ministério da Ciência e Tecnologia e ao Fundo Especial administrado pelo Ministério da Fazenda, que repassa aos estados e municípios de acordo com os critérios definidos em legislação específica (Lei nº 9.478/97).

Os royalties são calculados mensalmente para cada campo produtor, aplicando-se a alíquota sobre o valor da produção. Este valor, por sua vez, é obtido multiplicando-se os volumes de petróleo e gás natural produzidos durante o mês pelos respectivos preços de referência relativos a esse mês.

A mudança, introduzida pelo novo marco legal, permitiu um expressivo aumento da arrecadação total de royalties, expressa em reais correntes (Gráfico 1). Não obstante a apreciação do real no período 2003-2006, ao longo do mesmo período observou-se forte aumento da arrecadação, influenciada pelo aumento da cotação do petróleo e pelo incremento da produção nacional deste energético. O total arrecadado saltou de um patamar de R$ 200 milhões de reais antes das mudanças nos critérios de arrecadação, em 1998, para mais de R$ 6 bilhões em 2005.

Gráfico 1 -Arrecadação de Royalties (R$ milhões)

0

1000

2000

3000

4000

5000

6000

7000

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

Fonte: ANP.

Além dos royalties, as concessionárias estão sujeitas ao pagamento de Participação Especial, compensação financeira extraordinária estabelecida pela Lei do Petróleo para campos de grande volume de produção ou de grande rentabilidade, e ao pagamento pela ocupação ou retenção de área.

Entre o início de sua arrecadação, em 2000, e a sétima rodada, em 2005, foram arrecadados cerca de R$ 22,5 bilhões em participação especial.

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Tabela 3 - Participações Governamentais (milhões R$)

1995 123 - - -1996 154 - - -1997 190 - - -1998 284 - - 291999 984 - 322 732000 1.868 1.039 468 912001 2.303 1.722 595 1252002 3.184 2.510 92 1472003 4.396 4.997 27 1262004 5.043 5.272 665 1242005 6.206 6.967 1.089 130

Participação Especial

Royalties Bônus de Assinatura

Pagamento por Ocupação ou Retenção de Área

Fonte: ANP. IV – Experiência Internacional

Tendo sido apresentada a experiência atual do Brasil com a celebração de contratos de exploração, esta seção dedica-se ao estudo da aplicação das diversas modalidades contratuais no mundo. Para ilustrar as diversas aplicações práticas dos modelos contratuais acima analisados, foram selecionados quatro países (Arábia Saudita, Estados Unidos, Rússia e Venezuela), por representarem o mais amplo espectro da adoção de distintos regimes exploratórios, adaptados às características das instituições e da organização industrial de cada um destes países.

IV.1 Arábia Saudita

A Arábia Saudita detém a maior reserva provada de petróleo do mundo, com 264,3 bilhões de barris de óleo equivalente5. Deste total, aproximadamente metade encontra-se em apenas oito campos (entre os maiores do mundo), que produzem óleo de alta qualidade a custos muito baixos6. Nestas condições, uma significativa capacidade ociosa é mantida.

A situação da indústria petrolífera árabe, portanto, é extremamente favorável, o que confere a ela algumas prerrogativas, dentre as quais a de influenciar significativamente o preço do energético no mercado internacional. Baseado nesta prerrogativa, o Estado Árabe definiu os seguintes objetivos em relação a sua política de preços do petróleo: (i) manter os preços internacionais num patamar que permita a manutenção deste como principal fonte de energia no longo prazo; (ii) manter capacidade ociosa suficiente para que o país seja capaz de estabilizar os mercados de óleo no curto prazo; e (iii) obter a receita mínima necessária para manter estável o sistema político local7.

É fácil verificar, a partir dos objetivos acima expostos, que a política árabe de preços do petróleo não se coaduna com a presença de capital privado, tampouco de empresas estrangeiras para consecução destes objetivos. Uma vez que o Estado não pode permitir ingerência na produção petrolífera, mantém fechado o segmento 5 Fonte: BP Statistical Report. 6 Segundo Energy Information Administratio, obtido em: http://www.eia.doe.gov/emeu/cabs/Saudi_Arabia/Oil.html 7 Como expresso no sítio do Ministério do Petróleo e Recursos Minerais saudita: http://www.mopm.gov.sa/mopmr/detail.do?content=sp_policy

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upstream à participação estrangeira e ao capital privado8, atribuindo a exclusividade de pesquisa, desenvolvimento e exploração dos campos em seu território à empresa estatal Aramco, cujo controle, desde 1980, é exercido pelo governo.

Nota-se, ademais, que os contratos celebrados entre petroleiras e Estado, no segmento upstream, de países cuja geologia não é tão favorável quanto a saudita, são um meio através do qual os Estados buscam atrair os vultosos investimentos de risco para a atividade desenvolvida neste segmento, bem como manter algum nível de ingerência nesta indústria considerada estratégica.

A peculiarmente favorável geologia saudita reduz significativamente os riscos envolvidos na atividade exploratória, de forma que este país prescinde dos recursos oferecidos pelos modernos contratos que ocorrem entre petroleiras e Estado no upstream.Tal situação, ademais, permite à Arábia exercer papel de liderança entre os países membros da OPEP.

Dessa forma, este segmento organiza-se como um monopólio estatal clássico, estruturado da seguinte forma: a política energética é ditada pelo Supreme Council of Petroleum and Mineral Resources (SCPMR), presidido pelo rei Abdullah. Este conselho controla também, desde 2005, a monopolista estatal Aramco, apesar de buscar não interferir nas atividades diárias da empresa, apreciando apenas questões de grande magnitude. O SCPMR, composto por 12 membros, tem entre seus participantes o presidente da Aramco Jum'ah, que se encarrega de aplicar a política determinada pelo referido conselho.

No que diz respeito government take, cabe dizer que este instrumento não se aplica à Arábia Saudita, uma vez que toda a riqueza produzida já nasce sob a tutela do Estado.

Este instrumento analítico foi desenvolvido para aplicação em situações em que coexistam, numa mesma indústria/segmento, agentes públicos e privados o que, evidentemente, não é o caso do upstream saudita; logo, não se aplica ao mesmo. Toda a riqueza que produz, pois é produzida pelo mesmo.

A Arábia Saudita, portanto, é um caso extremo no grande espectro de possíveis combinações público-privado na atividade upstream, já que o Estado desempenha, integralmente, as atividades do segmento. Isto decorre da peculiarmente confortável situação deste país em relação às suas reservas, a qual permite, por seu turno, uma atuação geopolítica estratégica relativa à manipulação dos preços do petróleo no mercado internacional.

IV.2 EUA

No segmento de E&P norte-americano, as atividades de exploração, desenvolvimento e produção de petróleo e gás natural são regidas por Contratos de Arrendamento (Lease Contracts), os quais possuem como partes signatárias as companhias petrolíferas (arrendantes) e os agentes proprietários dos territórios (arrendatários) onde tais atividades são realizadas.9

Bastante semelhantes aos Contratos de Concessão descritos previamente, tais instrumentos legais outorgam às companhias petrolíferas o direito de exercer, de maneira exclusiva, as atividades acima mencionadas (mineral rights). Em contrapartida, obrigam-se as mesmas, por sua conta e risco, a suportar todos os investimentos e custos correlatos, não possuindo qualquer direito a reembolso.

8 Disposto em: http://www.sagia.gov.sa/english/index.php?page=negative-list 9 Os territórios nos quais serão executadas as atividades em questão tanto podem pertencer a agentes privados como aos Governos Federais e Estaduais.

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Isto posto, destaca-se que os prazos contratuais podem ser divididos em fases: a primeira delas correspondente às atividades de exploração e desenvolvimento, cujo período de duração é fixado no próprio Contrato (primary term), e a segunda, referente à produção propriamente dita, a qual perdura até que as reservas de petróleo e gás natural sejam depletadas.

Ademais, é previsto, no bojo dos Contratos de Arrendamento, o pagamento de bônus de assinatura, royalties sobre a produção de petróleo e gás natural, além dos tributos federais e estaduais pertinentes, que compõem o government take norte-americano.

Quanto a este tema, merece registrar que, no ano fiscal de 2006, as empresas atuantes nos Estados Unidos faturaram US$ 77 bilhões com a venda de petróleo e gás natural produzidos em mares e terras federais. Em decorrência, o governo daquele país arrecadou, segundo dados do Department of the Interior’s Minerals Management Service (MMS)10, cerca de US$ 10 bilhões em royalties.

Em que pese a magnitude destas cifras, em relatório datado de 01 de maio de 2007, o United States Government Accountability Office (GAO) divulgou, com base em uma série de estudos, que o governo federal norte-americano apresenta um dos mais baixos government take do mundo, sendo superado, inclusive, por estados americanos tais quais Colorado, Wyoming, Texas, Oklahoma, Califórnia e Lousiana, conforme demonstra a Tabela 4 a seguir.

Neste contexto, os percentuais de royalties cobrados sobre a produção de petróleo e gás natural em águas profundas na região do Golfo do México foram aumentados, no primeiro semestre de 2007, de 12,5% para 16,67%, o que, na avaliação do MMS, incrementará as receitas governamentais correspondentes em US$ 4,5 bilhões ao longo dos próximos vinte anos. Em contrapartida, estima-se uma perda de US$ 820 milhões nesse mesmo período, em virtude da redução das taxas cobradas pelo arrendamento das áreas exploradas, bem como da queda de 5% da produção, ambas ocasionadas por tal aumento dos royalties.

10 O MMS é a agência federal responsável pelo recolhimento dos royalties pagos.

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Tabela 4 – Percentuais de Government Take nos EUA e outros Países Selecionados

Government Take (%)

BP Conoco Phillips1

CRA International

Daniel Johnston & Company

Van Meurs Corporation

América do Norte

Canadá 39-54

(Alberta) 58

(Ártico) 51

(Total) 50

(Areia Betuminosa)

EUA – Águas Profundas

42

(Golfo do México)

37-41 (Outer

Continental Shelf)

EUA – Águas Rasas

50

(Golfo do México)

48-51 (Outer

Continental Shelf)

EUA - Golfo do México – Total 45 43 40

EUA – Alaska – (Atual/Proposto)

56/61 63/68 53/63 53/56

EUA – Demais Estados2 51-57

Outros Países

Angola 73 66-71 64

Argentina 45-48

Austrália 61 57-59

Azerbaijão 75 68-72 54

Bolívia 55-58

Colômbia 68-70

Equador 56-61

Guatemala 63-68

Nigéria 77 52

Noruega 76 74 73-76 77

Peru 63-65

Reino Unido 52 52 30-32 50

Rússia – Sakhalin 69-72 70

Venezuela 89-91 Fonte: GAO (2007) Nota: (1) Informações extraídas do estudo “Global Oil and Gas Risk and Reward Study”, desenvolvido, no ano de 2004, pela consultoria Wood Mackenzie; (2) Colorado – 51%, Wyoming – 52%, Texas, Califórnia e Oklahoma – 53% e Louisiana – 57%.

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IV.3 Rússia

O setor de energia é um dos principais pilares da economia da Rússia e representa cerca de 30,0% do produto industrial, 54,0% das exportações, 45,0% do ingresso estrangeiro de capitais e, aproximadamente 32,0% das receitas de todas as esferas de governo, alcançando 54,0% da receita orçamentária federal. Além disso, a indústria petrolífera russa é capaz de abastecer plenamente o mercado doméstico de derivados líquidos (KRIVOSHCHEKOVA e OKUNEVA, 2006).

Grande parte do processo de crescimento recente da Rússia (6,7% a.a. entre 1999 e 2006)11 deve-se ao desempenho das exportações de produtos energéticos, fruto do aumento da produção de petróleo e de seus preços elevados no mercado mundial. Atualmente, a Rússia possui a maior reserva de gás natural do mundo, a segunda maior reserva mundial de carvão mineral e a oitava maior reserva de petróleo. Além disso, segundo dados do Departamento de Energia norte-americano (DOE), o país é o maior exportador de gás natural, o segundo maior exportador de petróleo e o terceiro maior consumidor mundial de energia (EIA/DOE, 2007).

Por ser altamente dependente das exportações de petróleo e gás natural, a economia russa está consideravelmente exposta a flutuações nas cotações internacionais de petróleo. Desta forma, de maneira a administrar variações abruptas das receitas petrolíferas, o governo criou, em 2004, um fundo de estabilização, com uma expectativa de arrecadação, em 2006, de aproximadamente US$ 80 bilhões, o que representa 8,1% do PIB nominal da Rússia em 2006 (EIA/DOE, 2007).

Após o processo de abertura econômica e do grande movimento de fusões e aquisições ocorrido no início dos anos 90, a indústria russa tornou-se consideravelmente oligopolizada, concentrada em torno de um pequeno grupo de grandes empresas e grupos financeiros. Em 2006, quatro grandes companhias de petróleo, a saber: Lukoil, TNK-BP (joint venture com participação de 50% da russa TNK e 50% da britânica BP), Surgutneftegaz, e Rosneft (após a obtenção de grande parte dos ativos da recém falida Yukos), foram responsáveis por cerca de 64,5% da produção de óleo, ao passo que no setor de gás natural 85,0% da produção total está a cargo da estatal russa Gazprom (ABN-AMRO, 2007). A maior parte das participações em novas companhias pertence a bancos russos, com exceção das companhias sob controle estatal Rosneft e Gazprom (GRIGORYEV, 2007).

Na Rússia, a atividade de exploração dos recursos naturais é regida por um arcabouço legal composto por dois modelos distintos. O primeiro é o modelo de licenças, regulamentado pela lei “Sobre Recursos Subterrâneos”, promulgada em 1992, e baseada no direito público-administrativo; e o segundo modelo, mais recentemente adotado, é o de partilha de produção, regulamentado pela lei “Sobre Acordos de Partilha de Produção”, promulgada em 1995, e baseada no direito civil (KRIVOSHCHEKOVA e OKUNEVA, 2006).

De acordo com a lei “Sobre Acordos de Partilha de Produção”, a divisão da produção deve ser feita obrigatoriamente de três maneiras: (i) uma parcela de cost oil é designada ao investidor de forma a compensá-lo pelas despesas realizadas ao longo do contrato deste com o Estado; (ii) a parcela de profit oil é então repartida entre o investidor e o Estado; e (iii) parte do profit oil do investidor constitui seu pagamento pelo uso dos recursos do subsolo, funcionando como o pagamento de royalties ao Estado (KRIVOSHCHEKOVA e OKUNEVA, 2006).

Desde a adoção da lei, o parlamento russo aprovou que vinte e nove campos de petróleo e gás natural fossem desenvolvidos sob os termos de acordos de partilha de produção. Até o presente momento, três destes acordos estão em vigor: Sakhalin-1, Sakhalin-2 e Kharyaga. No entanto, nenhuma companhia russa ou estrangeira se 11 Divisão de Estatística das Nações Unidas (http://unstats.un.org/unsd/default.htm).

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engajou em qualquer projeto sob os termos de um contrato de partilha de produção nos últimos nove anos, seja por motivos concernentes à legislação em si, ao ambiente institucional e político, ou por fatores externos (KRIVOSHCHEKOVA e OKUNEVA, 2006).

A Tabela 5 a seguir apresenta um sumário comparativo entre o CPP do projeto Sakhalin-2 e as características dos contratos freqüentemente celebrados na indústria petrolífera. Como pode ser visto, as cláusulas presentes no CPP do referido projeto tiveram o objetivo de torna-lo substancialmente mais atraente para os investidores, em detrimento dos ganhos do Estado.

Tabela 5 – Sumário Comparativo entre o CPP do Sakhalin-2 e os contratos CPP Padrões

CPP “Padrão” CPP Sakhalin-2

Risco exploratório arcado pela companhia. Descoberta de hidrocarbonetos já realizada, sem riscos para a contratante.

Custos de exploração e desenvolvimento recuperados durante a fase de apropriação do cost oil. Apenas após a recuperação dos custos, o proft oil é repartido entre a companhia e o Estado.

Custo e lucro (17,5% de TIR) vão para a companhia antes do Estado receber qualquer parcela da produção.

Limite anual para o cost oil durante os primeiros anos do projeto, ou seja, algum lucro para o Estado desde o início.

Sem limite anual para a recuperação dos custos.

Clara definição acerca de quais despesas podem ou não ser incluídas no cálculo do cost oil e da tributação sobre o lucro.

Sem limite claro acerca das despesas recuperáveis.

Royalty típico de 10-20%. Royalty de 6%.

Fonte: RUTLEDGE (2004)

IV.4 Venezuela

Durante a alta dos preços do petróleo na década de 1970, a Venezuela foi um dos pioneiros do processo de nacionalização das reservas deste energético, colocado em prática pela maioria dos grandes produtores de petróleo mundiais. Tal mudança no funcionamento do mercado petrolífero venezuelano foi iniciada com a promulgação da Lei de Nacionalização (1975), que determinou o fim do regime de concessões e delegou ao Estado a exclusividade nas atividades desta indústria. Para este fim, em 1976, foi criada a Petróleos da Venezuela S.A. – PDVSA (ANP, 1999).

No entanto, como resultado do contra-choque do petróleo da década de 8012 e suas conseqüências sobre a economia venezuelana, extremamente dependente das rendas

12 O contra-choque do petróleo ocorrido em 1986 foi uma retaliação da Arábia Saudita ao constante descumprimento, pelos países membros da OPEP, das cotas de produção fixadas. Este país, como líder da OPEP, decidiu abandonar suas cotas e inundou o mercado com sua produção petrolífera, o que ocasionou uma queda vertiginosa dos preços, de cerca de US$20,00 em apenas dois meses.

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advindas da indústria petrolífera, o país se viu obrigado a revisar seu modelo para o setor. Desta forma, iniciou-se no fim da década o processo denominado “Apertura Petrolera”, cujo principal objetivo foi incrementar os investimentos na cadeia do petróleo do país, através do capital privado estrangeiro. Com esses investimentos, seria possível recuperar os poços existentes, desenvolver as imensas reservas de óleo super pesado do país, e explorar áreas em busca de novos campos de óleo mais leve, possibilitando, assim, um aumento da capacidade produtiva da indústria petrolífera venezuelana (EIA/DOE, 1999)

Um dos mecanismos utilizados para a atração dos supracitados investimentos foi a mudança do modelo contratual até então vigente nas atividades de exploração e produção do país. Para tanto, utilizou-se a prerrogativa dada pelo Artigo 5o da Lei de Nacionalização, que permitia a utilização de acordos de cooperação quando necessário, desde que mantido o monopólio do Estado na propriedade do petróleo (ANP, 1999; MOMMER, 1998). A partir de então, introduziram-se os contratos de operação, nos quais a PDVSA detinha a propriedade da produção, enquanto as empresas operadoras recebiam um pagamento por barril de óleo produzido, caracterizando, desta forma, um modelo muito similar ao contrato de risco (operating service agreement).

No caso venezuelano, a operadora configurava-se como uma prestadora de serviços, cabendo-lhe o risco exploratório e de produção, e, em contrapartida, recebia um pagamento que remunerava cada barril produzido, com reajuste atrelado ao preço do petróleo. Já a empresa estatal ficava responsável pela comercialização do óleo produzido, cabendo-lhe, assim, o risco de mercado. Em última análise, a PDVSA (ou uma de suas subsidiárias) era a “empresa petrolífera”, sendo ela a responsável pelo pagamento de royalties e também por uma tributação diferenciada sobre a renda.13

O processo licitatório se iniciava com a definição das áreas a serem ofertadas e a avaliação das empresas interessadas. Uma vez definidas as empresas aptas a participarem dos projetos, as áreas eram destinadas de acordo com os programas de trabalho oferecidos (que nas rodadas posteriores passaram a ser definidos pelo governo) e pela taxa por barril produzido exigido pela empresa como remuneração pelo serviço prestado.

Utilizando-se deste modelo, o Estado venezuelano promoveu três rodadas de licitação entre os anos 1992 e 1997, implementando pequenas mudanças nas regras de cada uma delas. Como resultado, foram assinados 32 contratos de serviço, envolvendo diversos agentes estrangeiros, dentre eles Shell, Total e BP (ANP, 1999).

Paralelamente, foi implementado um modelo contratual específico para os projetos da Bacia do Orinoco, destinados à exploração de óleo extra-pesado e gás não-associado. Nesta modalidade os contratos, com prazo de vigência de 35 anos, eram firmados entre a PDVSA e a companhia petrolífera internacional, com o controle do projeto cabendo à primeira e com produção repartida entre as duas na proporção da participação de cada uma delas no contrato associativo. Por deter a propriedade de parte da produção, a companhia era tributada como empresa petrolífera, sendo responsável, também, pelo pagamento de royalties14. Ademais, o contrato previa a transferência de tecnologia para a estatal venezuelana e a comercialização conjunta do cru.

Posteriormente, outras alterações foram introduzidas na legislação petrolífera boliviana, modificando os contratos de E&P existentes no país. Na última delas, ocorrida em 2006, o modelo contratual implementado foi o de joint ventures entre a

13 A legislação previa o pagamento de imposto de renda diferenciado para empresas petrolíferas e para as não petrolíferas, com incidência de alíquotas de 34% e 67,7%, respectivamente. 14 Os royalties variavam de 1% a 16,6%, dependendo das condições de custo de cada campo.

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PDVSA e a companhia petrolífera internacional, com controle mínimo de 60% das ações do empreendimento por parte da primeira, royalties de 30% e imposto de renda de 50%. Cabe destacar que a migração dos contratos de serviço para o sistema de joint ventures foi compulsória, e sofreu resistência por parte de algumas empresas atuantes no país. V – Considerações Finais

Tendo em vista o debate suscitado acerca de uma eventual alteração no modelo exploratório brasileiro, vigente desde a abertura do mercado em 1997, é importante tecer alguns comentários que devem ser levados em consideração quando se depara com o problema de escolha ou redefinição do modelo contratual mais apropriado ao Brasil.

A análise dos principais tipos de contratos adotados no segmento de upstream da indústria mundial de petróleo e gás natural permite verificar a ligação intrínseca existente entre a escolha do modelo contratual e as especificidades de cada país quanto a custos de E&P, volume de reservas, acesso a tecnologias de exploração e aspectos institucionais.

As características do território brasileiro, baseado em custos médios e altos (considerando as descobertas recentes da região de Tupi) de E&P, uma vez que as principais reservas encontram-se em águas profundas; volume de reservas provadas em torno de 12,2 bilhões de barris de óleo equivalente, possibilita, em comparação com os dados observados de países selecionados, apontar para uma tendência de adoção do modelo baseado em Concessões.

Contudo, alguns outros aspectos de suma relevância devem pautar, ou mesmo determinar, a escolha do tipo contratual que irá viger. Mas, deve-se ter claro o que se deseja fazer com os recursos naturais que o país possui, tendo em vista a maximização do bem-estar da sociedade.

Em primeiro lugar, fatores como o tamanho da população, o nível de renda per-capita e o grau de conflito social interno, por exemplo, poderão sugerir um caminho de preferências quanto à opção de se privilegiar ganhos de curto prazo e, assim, o rápido atendimento às necessidades sociais, maximizando os esforços de exploração e produção. De outra forma, seriam priorizados ganhos de longo prazo, adotando-se um ritmo mais lento de extração do recurso natural, o qual pode indicar a preservação da empresa estatal como única operadora, se não de todos, pelo menos dos principais campos.

Como um país em desenvolvimento, com bacias sedimentares ainda pouco exploradas (menos de 5%) quando comparadas as dos EUA, por exemplo, interessa ao Brasil incentivar o maior nível de descobertas, atraindo, para tanto, o capital privado nacional e estrangeiro para as atividades de E&P, em complementação à atuação da empresa petrolífera estatal.

Assim, a cobrança de royalties, participações especiais e outras taxações serviriam como compensação ao governo por abrir mão de receita futura em prol da obtenção de ganhos no presente e, portanto, cabe dizer, deveriam ser empregados na diversificação econômica e na melhoria da infra-estrutura, ao invés de financiar gastos correntes.

Em segundo lugar, critérios políticos, além de econômicos, adicionam um forte viés partidário à tomada de decisões, à medida que estas passam a ser pautadas por políticas de governo, voltadas para a obtenção de ganhos de curto prazo, e não de Estado, as quais visam ao crescimento sustentado de longo prazo.

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Por fim, acrescenta-se como importante fator de análise prévia à possível re-definição do modelo contratual brasileiro, o fato de que o modelo atualmente vigente, baseado em Concessões, apresentou até agora bons resultados no que diz respeito à: (i) atração de investimentos privados, nacionais e estrangeiros, ainda que na maior parte das vezes tenham sido efetivados em parceria com a estatal petrolífera brasileira; (ii) desenvolvimento e produção dos campos; e (iii) obtenção de altos níveis de government take, com uma arrecadação em Bônus de Assinatura no valor de 3.258 milhões de reais até 2005 e, em arrecadação de outras taxas, como participação especial e pagamento por ocupação ou retenção de área, no montante de 22.507 e 845 milhões de reais, respectivamente.

Observando-se, portanto, o considerável sucesso de sua implementação, desde a abertura do upstream brasileiro, entende-se que não é recomendável uma alteração significativa do mesmo.

Eventuais benefícios advindos da adoção de Contratos de Partilha ou de outros modelos a ele assemelhados não superaria os riscos regulatórios associados à esta transição.

Assim, a fim de se aproveitar melhor os ganhos econômicos que podem ser obtidos com o desenvolvimento e a produção de campos de alta potencialidade, como os recém-descobertos em território brasileiro, sugere-se, alternativamente à mudança do modelo via alteração da Lei nº 9.478/97, o aumento da participação governamental nos blocos com as referidas características.

Este aumento dar-se-ia mediante a inclusão de uma alíquota específica sobre a produção de campos de alto potencial, a ser estabelecida por ato do Poder Executivo.

Entende-se que este procedimento é o mais indicado à maximização das rendas petrolíferas a serem apropriadas pelo governo e ao desenvolvimento da indústria brasileira de petróleo e gás natural, uma vez que não incorre em mudanças substanciais das regras, que afugentam os investidores, e, ao mesmo tempo, contribui para reforçar o compromisso do país com o bem-estar social.

VII – Referências Bibliográficas

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