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Sumários de Direito Penal FDL 1 DIREITO PENAL I SUMÁRIOS DO PROGRAMA ANO 2002/2003 Bibliografia: - Sebenta de DP do Mestre Augusto Silva Dias - Fascículos de DP do Prof. Doutor Jorge Figueiredo Dias PARTE I FUNDAMENTO E LIMITES DO DIREITO PENAL I. Noções básicas 1. O conceito de Direito Penal 1.1. Direito Penal em sentido estrito e Direito Penal em sentido amplo. Em sentido estrito: DP é o ramo de direito que versa sobre os crimes e respectivas penas. Em sentido amplo: DP são o conjunto de normas jurídicas que ligam certos comportamentos humanos, os crimes a determinadas consequências jurídicas, a pena, que só pode ser aplicada a quem tenha actuado com culpa, ao lado da pena, o DP prevê outro tipo de consequência jurídica, as medidas de segurança, as quais já não supõem a culpa do agente, mas a sua perigosidade. 1.2. Parte geral e parte especial do Direito Penal. Parte Geral: São as regras de imputação ou de atribuição de responsabilidade criminal (punição), que são comuns a um determinado tipo de incriminações. Parte especial: São as incriminações específicas, os crimes. 1.3. Direito Penal nuclear e Direito Penal complementar: critérios formais e materiais de distinção. Formal DP nuclear: Conjunto de incriminações que figuram no CP : DP complementar ou secundário: São aquele conjunto de incriminações de legislação penal avulsa ou extravagante Materia DP nuclear: È constituído pelo conjunto de incriminações contra os valores fundamentais da comunidade l: DP complementar: São o conjunto de incriminações que por necessidade político criminal, no momento são consideradas crime 2. A localização do Direito Penal no ordenamento jurídico

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DIREITO PENAL I SUMÁRIOS DO PROGRAMA ANO 2002/2003 Bibliografia:

- Sebenta de DP do Mestre Augusto Silva Dias - Fascículos de DP do Prof. Doutor Jorge Figueiredo Dias

PARTE I FUNDAMENTO E LIMITES DO DIREITO PENAL I. Noções básicas 1. O conceito de Direito Penal 1.1. Direito Penal em sentido estrito e Direito Penal em sentido amplo. Em sentido estrito: DP é o ramo de direito que versa sobre os crimes e respectivas penas. Em sentido amplo: DP são o conjunto de normas jurídicas que ligam certos comportamentos humanos, os crimes a determinadas consequências jurídicas, a pena, que só pode ser aplicada a quem tenha actuado com culpa, ao lado da pena, o DP prevê outro tipo de consequência jurídica, as medidas de segurança, as quais já não supõem a culpa do agente, mas a sua perigosidade. 1.2. Parte geral e parte especial do Direito Penal. Parte Geral: São as regras de imputação ou de atribuição de responsabilidade criminal (punição), que são comuns a um determinado tipo de incriminações. Parte especial: São as incriminações específicas, os crimes. 1.3. Direito Penal nuclear e Direito Penal complementar: critérios formais e materiais de distinção. FormalDP nuclear: Conjunto de incriminações que figuram no CP

:

DP complementar ou secundário: São aquele conjunto de incriminações de legislação penal avulsa ou extravagante MateriaDP nuclear: È constituído pelo conjunto de incriminações contra os valores fundamentais da comunidade

l:

DP complementar: São o conjunto de incriminações que por necessidade político criminal, no momento são consideradas crime 2. A localização do Direito Penal no ordenamento jurídico

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2.1. O Direito Penal como ramo do Direito Público. O DP é um ramo do direito público, porque a sua base é constituída pela relação Estado cidadão, aparecendo aqui o Estado dotado do seu pode de “Ius imperii”, podendo assim infligir pesadas consequências para a liberdade e o património dos cidadãos. 2.2. Autonomia e dependência do Direito Penal relativamente a outros ramos do Direito: critica à tese de BINDING da natureza puramente sancionatória do Direito Penal e defesa de um sentido moderno da ideia de subsidiariedade. Binding, autor penal dos princípios do séc. 20, diz que o DP não é autónomo mas sim sancionatório de normas de D. Público, esta concepção está hoje rejeitada, pois a doutrina qualifica que o DP é actualmente autónomo, pois não dispõe de sanções para quaisquer normas de D. Público, mas tão só para impedir ou evitar a violação gravíssima de valores ou bens jurídicos fundamentais, ou seja para repressão de comportamentos que violem gravemente os valores fundamentais da ordem jurídica sem que seja posta em causa o princípio da unidade de toda a ordem jurídica, ideia de não contradição valorativa (como sejam poder haver conceitos diferentes entre o DP e outros ramos de direito). È ainda o DP um direito autónomo pois é criador de uma específica ilicitude penal. II. Fundamento e funções da intervenção penal do Estado 1. O conceito de crime 1.1. O conceito formal de crime: seu significado e alcance. O crime é todo o facto qualificado e punível na lei como tal 1.2. O conceito material de crime e as funções do Direito Penal.

a) O crime como comportamento lesivo de valores ético-sociais da acção e a função do Direito Penal como tutela de tais valores (HANS WELZEL). b) O crime como comportamento disfuncional ao sistema social e a função do Direito Penal como exercício de reconhecimento da validade das normas (GUNTHER JAKOBS). c) O crime como comportamento lesivo de bens jurídicos fundamentais da comunidade e a função do Direito Penal como protecção subsidiária de bens jurídicos.

É este o conceito maioritariamente aceite, devendo no entanto ver se a pena é um meio necessário, adequado e eficaz, para proteger valores constitucionais, através da intervenção nos DLG É isto que quer significar o Art.º 40.º da CP, quando diz que “a aplicação de penas e de medidas de segurança, visa a protecção de bens jurídicos”.

Artigo 18º Constituição da República Força jurídica

1- Os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias são directamente aplicáveis e vinculam as entidades públicas e privadas.

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2- A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos.

3- As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucionais.

1.3. A teoria do bem jurídico

a) Origem e evolução histórica do conceito de bem jurídico. Esta evolução tem acompanhado a evolução dos valores sociais que a cada momento a comunidade considera como susceptíveis de protecção, bens que anteriormente se encontravam protegidos, e que após a reforma do actual código em 1995 deixaram de ter protecção, p.ex. a homossexualidade e o incesto entre outras condutas análogas, pois não deve ser punível qualquer conduta sexual, que tenha lugar em privado e entre adultos que nela consentem, o bem jurídico da liberdade e autodeterminação da pessoa na esfera sexual. Já S. Tomás de Aquino dizia que o legislador não deve deixar-se seduzir pela tentação de tutelar com os meios do DP, todas as infracções à “moral objectiva”. Pelo que se deve ter sempre presente a regra do Estado de direito democrático, segundo a qual o Estado só deve intervir nos direitos e liberdades fundamentais, na medida em que isso se torne imprescindível ao asseguramento dos direitos e liberdades fundamentais dos outros. b) O conceito de bem jurídico entre «mundo-da-vida» e experiência constitucional. Bem jurídico, é a realidade que se mostra indispensável para a formação da pessoa ou para que esta se integre na sociedade, ou seja de preservação das condições indispensáveis da mais livre realização possível da personalidade de cada homem na comunidade. A ordem constitucional é uma ordem de bens jurídicos fundamentais, valores sociais que foram regulados através da CRP, pelo que o DP visa a preservação de tais valores, de agressões insuportáveis e graves. Pelo que todo o bem jurídico penalmente relevante, tem de encontrar uma referência, expressa ou implícita, na ordem constitucional dos direitos e deveres fundamentais. Mas justamente em nome do critério da necessidade e da consequente subsidiariedade da tutela jurídico penal dos bens jurídicos, a inversa não é verdadeira, pois não existem imposições jurídico constitucionais implícitas de criminalização. O Estado e o seu aparelho formalizado de controlo do crime, devem intervir o menos possível, devendo só intervir na precisa medida necessária a assegurar as condições essenciais ao funcionamento da sociedade.

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c) Estrutura pessoal-relacional do bem jurídico e o conceito de dano jurídico-penal: a distinção entre objecto de protecção e objecto da acção. d) Classificação dos bens jurídicos: bens jurídicos individuais e bens jurídicos supra-individuais; teorias monistas e teorias dualistas. A diferença radica na existência de duas zonas relativamente autónomas, pois enquanto os primeiros se relacionam directa ou indirectamente, com a ordenação jurídico constitucional relativa aos DLG das pessoas e são regulados pelo DP primário, já os segundos regulados pelo DP secundário ou extravagante, de que se encontram exemplos no DP económico e se relacionam com a ordenação jurídico constitucional dos direitos sociais e à organização económica. Diferença que radica, por sua vez, na existência de duas zonas relativamente autónomas na actividade tutelar do Estado, uma visa proteger a esfera de actuação especificamente pessoal do homem, “como este homem”; a outra visa proteger a sua esfera de actuação social, “como membro da comunidade”. e) Funções do bem jurídico: funções imanentes e função crítica do sistema penal. f) O dano produzido num bem jurídico como critério fundamental do «merecimento de pena» de uma conduta.

1.4. «Merecimento de pena» e «necessidade da pena» e a natureza subsidiária da intervenção penal. Os movimentos de criminalização e de descriminalização: o exemplo do Direito de mera Ordenação Social (DL n°433/82 de 27 de Outubro). Uma vez que o direito penal utiliza, com o arsenal das suas sanções específicas, os meios mais onerosos para os direitos e liberdades das pessoas, ele só pode intervir nos casos em que todos os outros meios da política social, em particular da política jurídica se revelem insuficientes e inadequados. Quando assim não aconteça aquela intervenção pode e deve ser acusada de contrária ao princípio da proporcionalidade, sob a forma de violação do princípio da violação da proibição do excesso. Tal sucederá, p. ex. quando se determine a intervenção penal para protecção de bens jurídicos que podem ser suficientemente tutelados por intervenção de meios civis, pelas sanções do direito administrativo (contra ordenações) ou do direito disciplinar. O mesmo sucederá sempre que se demonstre a inadequação das sanções penais para prevenção de determinados ilícitos, nomeadamente sempre que a criminalização de certos comportamentos, seja factor da prática de muitas mais violações, do que aquelas que se pretendem evitar, o que sucede nos denominados crimes sem vitima, como p. ex. o consumo de drogas, prostituição, pornografia, etc. Contra ordenação: Contra ordem, violação da ordem, que foi criada para despenalização de comportamentos denominados contravenções, são violações de um dever, sendo um ilícito de uma actividade sócio económica, cujas sanções são as

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coimas, que é uma advertência social, sanção pecuniária, são aplicadas pela autoridade administrativa e não são convertíveis. 2. O conceito de pena. 2.1. Os fins das penas: fins de retribuição e de prevenção; uma resenha histórica. Fins das penas e funções do Direito Penal. Em relação aos fins das penas pode-se dizer sem exagero, que ela constitui no fundo, a questão do destino do direito penal. Teorias Absolutas

: Doutrina da Retribuição ou da expiação

Intimidação (negativa) Prevenção Geral Teorias Relativas Socialização (positiva)

: Integração (positiva)

Prevenção Especial Inocuização (negativa) Teoria Absoluta – Doutrina da Retribuição: Para esta doutrina, a pena tem como sua essência, a retribuição, expiação, reparação ou compensação do mal do crime, cuja justificação da pena se encontra no passado, no próprio facto do crime. Historicamente, esta teoria tem como modelo inspirador o muito conhecido principio de Talião, do “olho por olho, dente por dente”, mais tarde os defensores desta teoria vão inspirar-se na filosofia de Kant, que qualificava a pena como um “imperativo categórico”, o qual defendia que se o Estado e a sociedade viessem a desaparecer, “tinha o último assassino que se encontrasse na prisão de ser previamente enforcado, para que assim cada um sinta aquilo de que são dignos os seus actos e o sangue derramado não caia sobre o povo que se não decidiu pela punição”. Ultrapassado este período, acabou por reconhecer-se, que a pretendida igualação, não podia ser fáctica, mas que tinha que ser normativa. Restava no entanto saber-se se desejada reparação, deveria assumir o carácter de uma reparação do dano real, do dano ideal ou de qualquer outra grandeza, e se ela ocorria em função do desvalor do facto ou antes da culpa do agente. Hoje tem-se como assente, que a retribuição só pode ser em função da culpa do agente. Porque se o que está em causa é tratar o homem segundo a sua liberdade e a sua dignidade pessoal, então isso conduz-nos ao principio da culpa como máxima de todo o DP humano, democrático e civilizado, que nos leva ao principio segundo o qual, não há pena sem culpa e a medida da pena não pode em caso algum ultrapassar a medida da culpa.

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A concepção retributiva teve o mérito de ter erigido o princípio da culpa em princípio absoluto de toda a aplicação da pena e ter, deste modo, levado a que na aplicação de uma pena criminal, não se possa violar a eminente dignidade da pessoa humana. Mas o Estado democrático, pluralista e laico dos nossos dias não pode arvorar-se em entidade sancionadora do pecado e do vício, mas tem de limitar-se a proteger bens jurídicos, e para tanto não pode servir-se de uma pena conscientemente dissociada de fins. E justamente por isso a retribuição não aparece, muito exactamente, contabilizada entre os fins da aplicação da pena exarados no art.º40.1, mas apenas como limite inultrapassável da sua aplicação no art.º 40.2. Mas se toda a pena supõe a culpa, nem toda a culpa supõe a pena, mas só aquela culpa que simultaneamente acarrete a necessidade ou carência de pena, o que aliás se pode comprovar através do instituto da dispensa de pena, consagrado no art.º74 relativo a casos de crimes onde, estando ainda presente a culpa, todavia não se verifica a carência de pena, precisamente porque neles não se fazem sentir quaisquer exigências preventivas, podendo-se assim afirmar, que a culpa é requisito ou limite, mas não fundamento da pena. Uma pena retributiva esgota o seu sentido no mal que se faz sofrer ao delinquente como compensação ou expiação do mal do crime, nesta medida é uma doutrina puramente social –negativa, inimiga de qualquer tentativa de socialização do delinquente e de restauração da paz jurídica da comunidade afectada pelo crime. Teorias Relativas – Teorias Preventivas, de Fins: Também estas teorias reconhecem que a pena se traduz num mal para quem a sofre, mas que se deve usar desse mal para alcançar a finalidade principal de toda a política criminal, a Prevenção ou a profilaxia criminal, que é a que está consagrada no CP, cfr. art.º 40. Há todavia que distinguir entre as doutrinas de Prevenção Geral e as de Prevenção Especial ou Individual. Prevenção Geral

: Tem esta teoria como concepção, a susceptibilidade de poder vir a actuar psiquicamente sobre a generalidade dos membros da sociedade, afastando-os da prática de crimes. Parte-se da ideia de que muitas pessoas só são capazes de dominar as suas tendências criminosas, face ao reconhecimento de que quem se decide pela via do crime acaba por sofrer mais danos pessoais do que vantagens, a velha ideia popular de que o crime não compensa, tendo assim a pena como função a legitimação da ordem jurídica vigente e a manutenção da paz social.

Esta teoria de Prevenção Geral, distingue-se ainda em:

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Prevenção Geral Negativa ou de Intimidação

: Se a pena for concebida por uma parte como forma de intimidação, defesa da sociedade através do contra estímulo que é a ameaça da pena pode ter sobre as outras pessoas, pelo mal que com ela se faz sofrer o delinquente, pretendendo-se assim induzi-las a não cometerem factos criminais, dissuadindo assim também potenciais criminosos..

Critica: Não está provado que os delinquentes conheçam a pena quando cometem o facto ilícito, e qual será a quantidade de pena necessária para que ela funcione como forma de contrariar o crime, sabendo-se que a eficácia da pena como factor intimidatório, será tanto maior, quanto menor for a gravidade dos factos ilícitos praticados. Pelo que se poderá dizer que a eficácia da intimidação, não se mede pela quantidade dos crimes cometidos, mas pelos que deixaram assim de ser praticados. Embora seja um critério a ponderar, mas desde que não ameace a dignidade do ser humano. Prevenção Geral Positiva ou de Integração:

Quando a pena é concebida, com outra parte destinada a manter e a reforçar a confiança dos cidadãos na força de vigência das suas normas de defesa de bens jurídicos. Integrando-se assim nas pessoas a convicção que tais práticas criminosas são punidas, que o sistema jurídico penal funciona, pese embora todas as violações que até aí tenham tido lugar. Ou como dizia Montesquieu, que a causa de todos os desleixos (relâchements) está “na impunidade dos crimes e não na moderação das penas". Pretende-se assim criar uma coesão colectiva à volta de tais princípios.

Critica: Tal situação pode vir a criar atropelos ao princípios fundamentais do Estado de direito, pois ninguém deve ser considerado instrumento negociável para fins que lhe são estranhos, afectando assim a princípio da dignidade humana. Prevenção Especial ou Individual

: Pune-se para que o delinquente não pratique mais crimes, para o corrigir, sendo a pena um instrumento de actuação preventiva, como forma de prevenção da reincidência.

Estas teorias de Prevenção Especial, podem também ter uma vertente Positiva e outra Negativa, assim temos: Prevenção Especial Positiva ou de socialização, inserção social: Pretende-se a integração social do indivíduo, devendo a privação de liberdade o menos dessocializadora possível, pois a reclusão produz a exclusão da sociedade, devendo pôr-se à disposição do recluso as ferramentas que lhe possam ser úteis para quando termine o tempo de reclusão. No entanto esta ideia não pode assumir-se como única finalidade da pena, pois caso contrária corria-se o risco de manter alguém em que a

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sua socialização não fosse alcançada, na prisão indefinidamente, o que causaria profundos sentimentos anti-sociais, ao invés não se pode corrigir, tratar e melhorara as pessoas, separando-as da sociedade. Mas no caso de não se conseguir a sua integração social, consegue-se a sua intimidação pela privação de liberdade a que foi sujeito Mas o que realmente se deve criticar é o sistema de execução de penas que não permitem a inserção do delinquente na sociedade. Prevenção Especial Negativa ou de Inocuização

: Aqui a prevenção especial, pretende alcançar um efeito de pura defesa social, através da separação ou segregação do delinquente, só assim se conseguindo atingir a sua neutralização, que a sua perigosidade social impõe

ConcluindoA teoria Retributiva responde ao Porquê, as Preventivas respondem ao Para Quê.

: Fins das penas, deverá perguntar-se: Porquê? e Para Quê?

A pena afecta o cidadão em 3 momentos : - Na sua criação pelo legislador – Ameaça, teoria de prevenção geral

integrativa - Na sua aplicação concreta pelo Juiz – Prevenção especial de socialização - Na execução da pena – Retribuição e Prevenção especial

Porquê?: Porque é que o legislador ameaça na lei com uma pena?, para protecção de bens jurídicos, ou seja porque o legislador valora o facto como violador de bens jurídicos fundamentais, o legislador fixa a pena para proteger o bem jurídico fundamental, atribuindo-lhe um valor, para que se saiba quanto ele vale para a vida em comunidade, pelo que a teoria da Prevenção Geral Positiva/Integrativa dá a resposta, pois não é um efeito Intimidatório. Porque através de um comportamento humano foi praticado um facto ilícito (violação de um bem jurídico fundamental), culposo, com o empenho pessoal do agente, cuja pena não deve ultrapassar o envolvimento pessoal que o agente pôs na pratica de tal facto lesivo, mas por outro lado se não houvesse condenação o juiz estaria a desdizer aquilo que o legislador disse, mas ao contrário se a pena se aplicasse independente de culpa, a relação tinha um efeito perverso, de insegurança e não preventivo, tendo assim um efeito contrário sobre a comunidade. Para Quê? – Aplicação concreta: No momento da sua aplicação concreta, o juiz deverá ter em conta o efeito social da pena para o agente, pois ele mais tarde ou mais cedo voltará para o seio da comunidade, pelo que a pena terá de pesar os seus efeitos sobre a vida futura do delinquente, evitando que vá agravar o sentimento associal do agente.

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Execução da Pena: Prevenção especial, a pena deve ser cumprida tendo em conta a possibilidade do regresso do indivíduo à sociedade, devendo ponderar-se regimes de semi detenção (fins de semana), liberdade condicional, fiscalizado por um juiz de execução de penas, o qual tem os poderes para assim decidir. Assim temos que a pena, quer na sua ameaça, quer na sua aplicação concreta, quer ainda na sua execução efectiva, só pode prosseguir a realização de finalidades de prevenção quer geral quer especial, prevenindo assim a prática de futuros crimes. Pelo que a finalidade primária da pena deverá ser a Prevenção geral positiva ou de Integração, através do restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime, princípio da necessidade da pena, que será fornecida a moldura da prevenção, dentro de cujos limites devem actuar as consideração de prevenção especial (e não a culpa, a qual só é limite inultrapassável) a qual posteriormente vai então determinar a medida da pena, seja pela função positiva de socialização, seja pela função negativa de segurança. No entanto esta função de socialização só deve entrar em consideração, se o agente se revelar carente de socialização, o que a não ser necessária, permitirá que a pena desça até perto do limite mínimo da moldura de prevenção. Mas se ao contrário não houver esperança de êxito na socialização do agente, caso de incorrigibilidade, fica só em aberto a necessária segurança individual Medidas de Segurança de privação de liberdade: Tem um significado diferente, pois aplicam-se inimputáveis, internamentos psiquiátricos e desde que o grau de perigosidade assim o determine, que resultam da prática de um facto, perigosidade criminal concreta, e sua projecção para o futuro, pelo que a medida de segurança tem como pressupostos a prática de um facto, ilícito criminal e a perigosidade do agente, cuja finalidade do internamento é de Prevenção geral positiva/integrativa, para provar à sociedade que o valor violado é também protegido, mesmo que a agressão parta de um inimputável, é também uma Prevenção especial, pois o indivíduo é internado num hospital psiquiátrico, para ser tratado compulsivamente no intuito de debelar ou minorar a anomalia psíquica, através de um programa devidamente elaborado. Pelo que a finalidade de Prevenção especial ou individual, ganha assim uma dupla função por um lado de segurança, por outro lado uma função de socialização. No entanto como já se disse a função socializadora deve sempre que possível, prevalecer sobre a função de segurança, como é imposto pelos princípios da socialidade e da humanidade que dominam a nossa constituição, pelo que a segurança só pode constituir finalidade autónoma da medida se segurança, se e onde a socialização não se mostre possível.

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Art.º 91 CP, refere que a medida de segurança sendo aplicada tendo por base a perigosidade do indivíduo, é renovada de 2 em 2 anos e cessa logo que cessar a perigosidade e manter-se-á até ao limite máximo de pena fixado na lei (25 anos), mas o art.º 30 CRP não cobre tal situação, mas há sempre recurso com suporte legal na Lei Geral de Saúde (processo de tratamento psiquiátrico). Acrescenta o N.º 2 do art.º 91 CP que quando “o facto cometido pelo inimputável corresponder a crime contra a s pessoas ou a crime de perigo comum puníveis com pena de prisão superior a 5 anos, o internamento tem a duração mínima de 3 anos, salvo se a libertação se revelar compatível com a defesa da ordem jurídica e da paz social”. Um tal regime é sinal de que não se trata aqui de uma mera presunção de duração de perigosidade, mas que tendo-se cometido um crime grave há razões de tranquilidade social e tutela da confiança comunitária nas normas violadas a que a política criminal tem de responder mesmo estando-se perante inimputáveis, através da aplicação de medidas de segurança. Mas tendo sempre em conta o princípio da ponderação de bens conflituantes, segundo o qual liberdade da pessoa (de qualquer pessoa, mesmo inimputável), só pode ser suprimida ou limitada, como justamente nota Roxin “ quando o seu uso conduza, com alta probabilidade, a prejuízo de outras pessoas que, na sua globalidade pesa mais do que a limitações que o causador do perigo deve sofrer com a medida de segurança”. A culpa como limite inultrapassável da pena: A função da culpa tal como está inserida no Estado de Direito Democrático, é a de estabelecer o máximo de pena ainda compatível com as exigência de preservação da dignidade da pessoa humana, e da garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade, cfr. Art.º 40 CP Resumo: Defesa das Teorias de Prevenção1

1 – Toda a pene serve finalidade exclusivas de prevenção geral e especial

2 – A pena concreta é limitada no seu máximo inultrapassável pela medida da culpa 3 – Dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico. 4 – Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função das exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa de intimidação ou segurança individual. Defesa da Teoria da Retribuição2

1 Teoria penal defendida pelos Prof. Doutores Jorge Figueiredo Dias e Anabela Rodrigues

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2 Teoria defendida pelo Juiz Conselheiro José de Sousa e Brito

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Para este autor, a teoria da reparação do dano, visa reparar os danos cometidos pelo crime, pois o crime provoca 3 danos:

Vitima Comunidade – Afecta a paz social Criminoso – Consciência do dano da culpa

Vitima: Sofre um dano irreparável Comunidade: Afecta a paz social, diminui a confiança das pessoas, face à violação de bens jurídicos fundamentais. Criminoso: Dado que o dano culpa, diminui o valor da dignidade enquanto pessoa, diminui a sua qualidade de ser humano, que assim ao sujeitar-se à pena ele expia a sua dívida para com a sociedade, para voltar a recuperar a sua dignidade de ser humano. “Se é a prevenção especial que dá conteúdo material à reparação da culpa, de acordo com o seu fundamento racional, dai deriva que, por própria exigência da retribuição, há que preencher a pena devida pela culpa com todo o conteúdo possível de prevenção especial. Assim, se a culpa não determina mais do que uma certa escala ou medida de pena, e não uma pena pontual, há que determinar o ponto da pena dentro da escala correspondente à culpa de acordo com a prevenção especial. A pena retributiva será a que melhor serve as exigências de prevenção especial”3

2.2. O problema no Direito Penal português vigente. a) Posicionamento do Direito Penal português perante a distinção entre sistemas penais monistas e dualistas. Como vimos até aqui em regra as penas aplicam-se aos imputáveis delinquentes e as medidas de segurança aos inimputáveis, o que a ser assim teríamos um sistema Monista, o qual para ser Dualista teriam de se aplicar ao imputável uma pena e uma medida de segurança, pois como já sabemos ao inimputável só se aplicam Medidas de Segurança. Assim o art.º 194 e ss. diz que no caso de imputáveis portadores de anomalia psíquica, mas que no momento da prática do facto ilícito era imputável sendo a anomalia psíquica superveniente, e sendo condenado a uma pena, o juiz pode substituir a execução da pena pela forma de execução de medida de segurança, mas se a anomalia psíquica vier a ser debelada antes do cumprimento da pena, o juiz pode determinar que ele volte para a prisão, o juiz aqui escolhe tão só o regime de execução mais adequada, continuando assim o regime a ser Monista. Já a figura da pena relativamente indeterminada, culpa na formação da personalidade, o juízo de culpa tem por base não a atitude revelada na prática do facto ilícito, mas pela deformação da sua personalidade, não se

3 José de Sousa e Brito: “Os fins da penas no código penal”, Problemas Fundamentais de Direito Penal, Homenagem a Claus Roxin, Lisboa, Universidade Lusíada Editora 2002

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conformando com os valores protegidos pelo direito, e como essa deformação da sua personalidade é progressiva, sendo-lhe por isso atribuída a responsabilidade (inconstitucional), traduzindo-se a condenação, num tempo de pena que o viesse a converter, estabelecendo-se um prazo máximo e mínimo de pena. P. ex. alcoólicos, toxicodependentes e equiparados, os delinquentes por tendência, sendo o mínimo de 2/3 da pena de prisão que caberia ao crime cometido, sendo este valor aumentado gradualmente, podendo ir até a um máximo de 25 anos, art.º 83 e 86 CP. Desde que a sua tendência esteja na génese do crime, considera-se o tempo para além da pena uma medida de segurança, ora sendo um misto de pena e medida de segurança é um sistema Dualista, embora sejam ambas cumpridas na prisão. Conclui-se assim que através da pena de medida indeterminada, o sistema penal é Dualista, embora a regra seja o sistema Monista. b) As sanções penais: sanções penais principais, acessórias e substitutivas; traços gerais do respectivo regime jurídico. 2 Espécies de sanções penais: Penas e Medidas de Segurança de privação da liberdade

- Pena: Castigo, sofrimento, que são aplicáveis a quem for susceptível de culpa, juízo de reprovação de censura individual, é a sanção jurídico penal por excelência, aplicável a quem for susceptível de culpa (juízo de reprovação), de censura individual, que se traduz por um castigo ou sofrimento infligido ao agente que pratica um crime. As Penas podem ser: Principais e acessórias

o Principais: Prisão e Multa (Princípio da subsidiariedade das sanções) Multa: Só está prevista na pequena criminalidade, cfr. Art.º 70

CP. sendo a pena de prisão subsidiária da multa, mas caso a multa não seja paga, é esta substituída em dias de prisão correspondentes aos dias de multa, reduzidos em 1/3.

Prisão: Privação da liberdade, pena subsidiaria da multa

o Acessórias: Art.º 65 e ss. CP, são só de aplicação com a pena principal, reforço de proibição.

o Penas substitutivas: Trabalho em favor da comunidade, multa se não estiver prevista (art.º 44 CP) e admoestação art.º 60 CP.

Medida de Segurança: Aplicável a quem pratica o c<rime, mas não tem capacidade de culpa, inimputável, pena de internamento

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Diferença entre pena e medida de segurança: Nas penas, a finalidade de prevenção geral de integração assume o primeiro e indisputável lugar, já nas medidas de segurança as finalidade de prevenção especial de socialização e de segurança assumem lugar absolutamente predominante. Também nas penas tem de ser requisito irrenunciável da sua aplicação a estrita observância do princípio da culpa, principio este que já não tem qualquer espécie de relevo no âmbito das medidas de segurança.

2.3. Distinção entre as sanções penais e outras espécies sancionatórias: as coimas, as sanções disciplinares e as «penas privadas». Outra espécie sancionatória (não penal), decorre da prática das Contra - ordenações (que vieram substituir as contravenções), contra ordem, violação da ordem ou de um dever, um ilícito de uma actividade sócio económica, cujas sanções são as coimas. A Coima: É uma advertência social, uma sanção pecuniária, não é convertível como a sanção penal (pena, juízo de reprovação social por violação de um bem jurídico), a coima é aplicada por uma entidade administrativa, enquanto as penas só podem ser aplicadas pelos tribunais, embora possa haver recurso da coima para o tribunal. No entanto os princípios aplicáveis no DP são os mesmos das contraordenações, embora com mais flexibilidade. III. Limites à intervenção penal do Estado: os princípios de garantia com incidência penal. Uma conduta não é merecedora de pena, não sendo legitima a intervenção penal que não seja feita de acordo com os princípios constitucionais. 1. O princípio da subsidiariedade e a natureza do Direito Penal como ultima «ratio» de defesa da sociedade. O P. da Subsidiariedade (PS), estabelece, impõe uma ordenação de baixo para cima, ou seja da norma menos grave para a mais grave, o Estado deve adoptar medidas de controle necessários para minorar determinados comportamentos, e só depois é legítimo o recurso ao DP. Este PS, tem um fundo católico, encíclicas papais que exigiam a adopção de determinadas medidas para erradicar comportamentos, e só se tais comportamentos persistissem, é que se recorria ao DP, como forma de os resolver. 2. O princípio da culpa. Decorre este P. da Culpa (PC), do princípio da dignidade da pessoa humana, ou seja, quando se pune alguém sem se ter em conta a sua culpa, está-se a instrumentalizar a pessoa para finalidades que lhe são estranhas, pois não pode haver pena sem culpa e a pena não deve ultrapassar a medida da culpa, o que violaria assim este princípio.

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A pena deve ser adequada à culpa, segundo o demérito pessoal do agente revelado na prática do facto ilícito. 3. O princípio da proporcionalidade. Pretende-se com o princípio da Proporcionalidade (PP), que os meios têm de ser proporcionais aos bens que se pretendem proteger, proporcionalidade em sentido restrito, não podendo o DP proteger bagatelas (art.º 18 CRP). Está inserido no espirito deste princípio o P. da Ofensividade (PO), onde não haja bem jurídico ameaçado pela conduta que não tenha qualquer perigosidade, não há relação lesiva entre a conduta e o bem, significa que não tem dignidade penal, não sendo merecedora de pena (crime em sentido abstracto). 4. O princípio do «facto». O P. do Facto (PF), que se contrapõe ao DP do agente, sendo a resposta dada pelo modelo político de Estado, ou seja se o Estado é totalitário temos o DP do agente, o DP do inimigo interno, em que o ilícito é construído sob forma de desobediência ou traição, leis contra os parasitas do povo, tipos normativos do agente por detrás dos tipos legais, p. ex. homicídio, furto... por detrás do homicida está o homem que a comunidade modela como homicida, o que interessa saber é quem é quem é que praticou o furto, quem está por trás, ou seja se esse tipo não corresponde à imagem do tipo, não é condenado, selecção do criminoso capacitário, o que se pune é o agente sendo o facto o pretexto (tal como a figura da culpa na formação da personalidade, o que se está a pretender punir não é o facto, o que se censura é o modo como o agente se conduz na vida), aqui parte-se do agente e não do facto para se punir, porque o que está em jogo é o empenhamento pessoal do agente naquilo que ele fez, que é o corolário deste PF 5. Os princípios da tolerância e da humanidade. O princípio da tolerância e da humanidade das penas (PTHP), tem em vista as condições da execução de penas, não devendo estas ter efeitos dessocializantes. 6. O princípio da legalidade. O princípio da Legalidade (PL), “Nullem crimem, nulla poena sine lege”, é um produto político, que está inserido no Estado de Direito formal, é a ideia da segurança jurídica, pelo que é necessário que os factos ilícitos esteja, previstos na lei, evitando-se que os cidadãos possam ser surpreendidos com a criminalização de um comportamento, ou seja para haver intervenção penal, só se encontra legitimada a instância que represente o Povo como titular último do “Ius Puniendi”, donde a exigência de lei e neste caso lei formal emanada do Parlamento ou por ele devidamente autorizada (art.º 165.1 al. c) CRP) de acordo com art.º 18.2.3 e 27 da CRP.

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Visa-se impor limites à intervenção do Estado no âmbito do DP, limites esses que se dirigem não só ao Estado enquanto legislador, mas como também enquanto Juiz. Mas não pode estar previsto qualquer facto como crime, só devendo estar previstos aqueles comportamentos graves e lesivos dos bens jurídicos fundamentais, para os quais a comunidade não tem outro meio que não seja o DP, principio da subsidiariedade, ideia de garantia do E. Direito material, sendo o DP que corporiza o P. da Necessidade. PARTE II TEORIA DA LEI PENAL I. Breve história da legislação penal portuguesa 1. O período do Direito Penal intimidatório (até ao último quartel do séc. XVIII)

1.1. Os forais. 1.2. A lei das «Sete Partidas». 1.3. Das Ordenações de D. Duarte às Ordenações Filipinas.

2. O período do Direito Penal iluminista (do último quartel do Sec. XVIII até meados do Sec. XIX).

2.1. Princípios do Direito Penal iluminista. 2.2. O projecto de código criminal de MELLO FREIRE e a influência de BECCARIA. 2.3. O movimento codificador.

3. O período da codificação e as preocupações de reforma: o percurso desde o Código Penal de 1852 ao Código Penal de 1982. II. As fontes do Direito Penal português 1. A lei: o princípio constitucional da reserva de lei («nullum crimen, nulla poena sine lege scripta»). 2. O papel do costume, da jurisprudência e da doutrina. Para haver Costume terá de existir uma prática reiterada dos actos e quem os pratica terá de agir com a convicção que está a actuar de acordo com aquilo que a norma prescreve. Ora como já vimos o costume não pode criar leis penais Art.º 29 CRP, pela que a única fonte é a Lei, com uma única excepção Art.º 29.2 CRP, que são os princípios de direito Internacional, embora já todos eles constem do CP (é só uma questão de precaução). No entanto o costume e o uso podem ter uma função importante na concretização de conceitos indeterminados, quer os locais quer os nacionais. No entanto poderá haver casos em que o costume “contra legem”, pode ser importante como referência legislativa, na despenalização de certos

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comportamentos, p. ex. se ainda existisse uma lei (proibição do uso de saias curtas) que já estivesse ultrapassada pelo costume, poderia este servir como fonte de despenalização, ou de atenuante, tendo portanto só força derrogatória e nunca incriminatória, pois a tal se opõe o P. da Legalidade Certas práticas costumeiras também podem funcionar como causas para afastar ou de exclusão da responsabilidade criminal, p. ex. pancada dada com os alhos porros nas noites de S. João, bem assim como as chamadas Acções socialmente adequadas, que não ofendem bens jurídicos, p. ex. palmadas nos filhos, os murros dados no boxe, etc., não são vistas por determinadas comunidades, como acções ofensivas. Já o Costume como corrente jurisprudencial, tem valor como fonte interpretativa da lei, já que condiciona a forma de aplicação da lei, criando a convicção da obrigatoriedade para os tribunais inferiores das decisões emanadas dos Tribunais superiores. III. A interpretação da lei penal 1. A interpretação da lei penal no contexto da teoria geral da interpretação. Temos no CP normas Positivas e normas Negativas: Positivas: São aquelas que definem pela positiva os pressupostos da responsabilidade criminal, estabelecendo pressupostos positivos, p. ex. as normas da parte especial do código.

o Permite-se a interpretação extensiva (ex. açúcar = veneno para diabético, embora o açúcar não seja um veneno)

o Proíbe-se a analogia Negativas: Prevêem causas de exclusão da responsabilidade criminal, situações em que ou não há crime ou que o mesmo é atenuado, p. ex. Estado de necessidade, legitima defesa, acção directa, ...

o Permite-se a analogia o Proíbe-se a interpretação e a integração de lacunas

Em qualquer dos casos há autores que defendem que se pode fazer uma interpretação Declarativa lata, ou seja interpretar no sentido mais amplo que as palavras têm, o P. da Legalidade proíbe é a interpretação que ao subsumir-se ao facto ele não existe. È também permitida a interpretação de casos técnicos, mas só de forma a que tal não surpreenda os destinatários.

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2. Os limites da interpretação e o problema da analogia («nullum crimen, nulla poena sine lege stricta»): sentido e alcance da proibição da analogia (art°1 n°3 do CP). Dirige-se ao juiz afim de evitar a analogia, mas tal como no caso do Costume estamos a referir o analogia incriminatória, pois caso seja para atenuar a incriminação, já é possível. Quer interpretação quer a analogia são processos de obtenção do Direito, e no DP, o que não está dentro está fora, também se dirige a legislador para que na criação da lei, o faça de forma a não deixar lacunas, pois quando o faz é propositadamente, pelo que a proibição de integração analógica de lacunas se dirige ao juiz. 3. Os limites da interpretação e as exigências de certeza e de precisão da lei penal («nullum crimen, nulla poena sine lege certa»): o problema das leis penais em branco, das cláusulas gerais e dos conceitos indeterminados. Limites dirigidos ao legislador, princípio da tipicidade da lei penal, construção técnica legislativa dos tipos legais de crime, tipificação do comportamento punível é a concretização ideal do P. da Legalidade, a lei certa visa eliminar a indeterminação, não devendo utilizar-se recurso a técnicas que façam dissipar ou diluir a vinculação do juiz à lei, ou seja a possibilidade do juiz substituir os valores legais pela sua própria concepção, o que aconteceria sempre que o legislador utilizasse técnicas arriscadas, tais como:

Clausulas Gerais Leis penais em branco Conceitos indeterminados

O legislador por vezes não pode cumprir tais exigências de certeza ou determinação, pois tal não é possível, dado poder haver muitas normas que estão relacionadas com a tipificação do crime, e então por razões de economia legislativa, o legislador não pode deixar de recorrer quer às Clausula Gerais que por razões de equidade não são evitáveis, p. ex. No homicídio qualificado a atitude censurável ou perversa (clausula geral). Não deve é por em causa o P. da Legalidade, que é o limite à técnica legislativa, e que por essa razão é utilizado o recurso a

Também a variação da moldura penal não deve ser muito alargada

exemplos tipo

Acresce no entanto referir, que também quanto maior for a permissividade concedida pelo legislador na lei, maior terá de ser a fundamentação exigida ao juiz.

para reduzir a margem de indeterminação, fornecendo assim uma orientação ao juiz, ex. art.º 132.2 CP.

Lei penal em branco, é a lei que prevê uma pena cujo preenchimento (espaço em branco) dos pressupostos típicos, são remetidos para outra lei por razões de economia legislativa, ex. Lei 28/94 art.º 32.º . IV. Âmbito de aplicação temporal da lei penal

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1. O princípio da não retroactividade da lei penal («nullum crimen, nulla poena sine lege previa») e a aplicação retroactiva da lei penal mais favorável. É uma injunção dirigida ao Juiz, mas que também atinge o legislador, de se abster de criar leis com alcance retroactivo, cujo fundamento é a segurança jurídica consagrada na constituição art.º 29.1 e 4, sendo que também uma das consequências do PL é o da proibição da retroactividade em tudo quanto funcione contra o delinquente, o qual só pode ser punido por lei (em vigor) anterior ao momento da prática do facto. A consequência mais importante deste princípio, é que a proibição de retroactividade, só vale contra o agente, já não se aplicando a favor dele, o qual se consubstancia assim no princípio da aplicação da lei ou do regime mais favorável (lex mellior). Art.º 29 CRP e art.º 2 CP Por outro lado é obrigatória a retroactividade de aplicação de normas penais mais favoráveis ao delinquente. A própria lei se nada disser entra em vigor decorrido o período de “vacatio legis”, que é de 5 dias. O momento da prática do facto de acordo com o art.º 3 CP, é regra geral o momento da acção ou da omissão, ou seja o momento da violação da norma, pelo que desde este momento até ao trânsito em julgado ou até ao efectivo cumprimento da pena (conforme seja o caso), aplicam-se as leis que estavam em vigor ou que neste espaço de tempo iniciaram a sua vigência. A acção é dominável pelo agente mas o resultado é aleatório, não sendo por ele controlável, pelo que as proibições dirigem-se ás acções. Os crimes podem ser:

- Instantâneo: As acções esgotam-se rapidamente - Duradouros: A acção protela-se no tempo, indeterminadamente, p. ex.

Sequestro, que começa com a privação da liberdade da vitima e termina com a sua libertação

- Continuado: Art.º 30.2 CP, O delinquente vai cometendo crimes em série, vários tipos de crime que protegem o mesmo bem jurídico, que é uma excepção ao concurso de crimes, ex. furto, pois não podem ser bens jurídicos pessoalíssimos, acção homogénea propiciada por situações externas, que como que facilitam a prática do crime (a ocasião faz o ladrão), atenuando assim a culpa do agente, resumindo-se tudo a um crime (ficção jurídica). O crime continuado é um só crime, embora sejam vários delitos, o dolo/vontade/intenção tem se surgir de cada vez.

A diferença entre o crime Duradouro e o crime Continuado, é que no primeiro o agente é punido pela soma das parcelas, p. ex. se foi planeado uma série de furtos, soma-se o valor destes, o que pode alterar a qualificação criminal, no segundo o agente é penalizado só pela parcela mais grave ou de maior valor.

Leis penais em sentido impróprio – Art.º 2.2 CP: São as situações em que o facto deixou de ser considerado crime, p. ex. cheques sem provisão, drogas,... a execução

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da pena cessa no dia de entrada em vigor da nova lei, o que significa que o detido por tal crime, é devolvido imediatamente à liberdade. O que se passa na sucessão de leis penais em sentido impróprio, é a alteração dos elementos constitutivos do tipo incriminado, no entanto temos de verificar se há continuidade da lei nova em relação à antiga, ou se pelo contrário existe uma rotura entre a lei antiga e a lei nova, para se verificar tal situação, existem 2 teorias: Prof. Taipa de Carvalho: Faz-se por comparação abstracta. Prof. Figueiredo Dias: Faz-se pelo critério do facto, se o mesmo facto se puder enquadrar nos dois tipos de crime, há continuidade, havendo assim sucessão de leis penais em sentido próprio, se o facto já não se enquadra nos dois tipos de crime, há rotura típica, havendo assim uma sucessão de leis penais em sentido impróprio. No caso de a lei nova transformar o facto em contra – ordenação, mudando assim a natureza jurídica do facto, despenalizando tal situação através da nova lei descriminalizadora, cuja consequência é a extinção do processo crime, não se aplicando o regime das contra ordenações, dado que este também não se aplica retroactivamente (art.º 3.2), ora como também não existe sucessão de contra ordenações, e a sucessão de leis no tempo não é geral, de qualquer lei, mas sim de leis penais, estamos aqui em presença de uma rotura completa. Sucessão de leis penais em sentido próprio – Art.º 2.4 CP

Neste caso a doutrina divide-se pois há quem considera tal situação inconstitucional, pois o art.º 29.4 da CRP não estabelece limites de retroactividade, pelo que o art.º 2.4 do CP também não o deveria fazer, como p. ex. José de Sousa e Brito, que preconiza que em tal situação se deveria estabelecer o limite da pena, ou seja que não se deveria cumprir pena superior ao limite legal entretanto aprovado pela lei nova, dando como exemplo de tal injustiça, o crime praticado em co-autoria cujos autores são julgados em momentos diferentes, cumprindo por esta razão penas diferentes para o mesmo crime, o que viola quer o princípio da Igualdade, quer o princípio da Necessidade da Pena, que diz só ser legitima a actuação penal, na medida em que se demonstre que tal seja necessário para a protecção do bem jurídico, de acordo com o princípio da Subsidiariedade.

: Lei em sentido próprio, porque continuam a ser leis penais, quer formal quer materialmente, o que acontece é que apesar do facto continuar a ser crime, mantendo-se o tipo mas este ter sido restrito, ou então que as causas de exclusão se tenham alargado, ou ainda ter sido a moldura penal alterada pela lei nova, correspondendo-lhe um tratamento mais favorável, entrando a lei nova em vigor enquanto o delinquente cumpre a pena, aqui o caso julgado é limite inultrapassável de acordo com o art.º 2.4 CP, tendo o detido de cumprir a totalidade da pena.

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O Prof. Augusto da Silva Dias, defende a reabertura do processo sempre que se esteja em presença de uma sucessão de leis penais em sentido próprio, mesmo que o processo já tenha transitado em julgado, o qual deverá ser reapreciado à luz da nova lei, permanecendo no entanto os factos tidos anteriormente como provados. Para quem defende a constitucionalidade, p. ex. Figueiredo Dias, baseia-se no princípio da Segurança Jurídica, e que a reabertura de tais processos instalaria o caos no sistema judicial, o que seria razão suficiente para que nenhum legislador se atrevesse a levar a cabo uma reforma do CP, além de não competir à lei constitucional regular as condições de aplicação dos seus comandos, devendo limitar-se tão só a regular os limites desse âmbito. A determinação de qual é a lei mais favorável, tem de ser feita uma ponderação de todo o regime, globalmente, tendo sempre por referência o facto, verificando qual das leis é que tem um regime punitivo mais favorável para aquele facto, que se deve aplicar ao caso concreto, podendo dar-se o caso de numa situação de co-autoria, poder-se aplicar um regime a um autor e outro regime ao co-autor, desde que no caso concreto, sejam esses os regimes mais favoráveis respectivamente. O Prof. Taipa de Carvalho, diz que devem ser aplicados os aspectos mais favoráveis de cada uma das leis (regime transitório inter legal), sendo este regime aquele que deveria ser aplicado, dando-se assim ao juiz a possibilidade de criar um regime. 2. A questão das leis penais temporárias e de emergência (art°2 n°3 do CP). Uma excepção ao princípio da aplicação da lei mais favorável, são aquelas leis em que é o legislador a definir a sua data de validade, sendo editadas para um tempo determinado, quer em termos de calendário, quer em função da cessação de um certo evento, são assim formalmente temporárias, neste caso o facto é punível, mesmo que o autor só venha a ser descoberto depois da lei deixar de vigorar, sendo a razão que justifica o afastamento da aplicação da lei mais favorável, residir no facto em que a modificação legal se operou devido a uma alteração de circunstâncias fácticas

No entanto se a lei em vez de ser temporária em sentido formal o for em sentido material, estamos em presença de uma sucessão de leis, tendo o legislador de intervir para que a faça cessar, pois não deixa de vigorar automaticamente.

, não existindo por isso aqui expectativas que mereçam ser tuteladas.

Diferente também, são os Acórdãos de fixação de jurisprudência, que alteram a aplicação temporal da interpretação das leis. 3. A determinação do momento da prática do facto (art°3 do CP). Quer no crime Duradouro, quer no Continuado, o momento da prática do facto, é o momento da omissão ou da acção, é o do início do crime, 1.ª acção tendente à

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violação da norma (comando de proibição), inicio da execução que leva à ofensa do bem jurídico. V. Âmbito de aplicação espacial da lei penal 1. Direito Penal Internacional e Direito Internacional Penal. O Direito Penal Internacional, ramo de direito público, que delimita até onde vai o poder punitivo de cada Estado (elemento de conexão), soberania do Estado em matéria penal, nas relações com os outros Estados, que é o conjunto de normas nacionais que visam regular os termos e condições da aplicação da lei penal no espaço, princípio da territorialidade, mas que também leva à punição de factos cometidos no estrangeiro, princípio da Universalidade O Direito Internacional Penal, é o conjunto de normas fundadas no direito internacional público. Mas o espaço comunitário tem em vista o direito Comunitário Penal, cuja implementação não tem sido fácil (3.º pilar), devendo para tal ser aprovado por convenção e ratificado pelos Estados. O art.º 29 do TUE, apresenta diversos princípios em matéria penal. Há uma decisão quadro (de aplicação obrigatória), que altera a extradição, através do processo de entrega, esta decisão vem as sequência da Política de cooperação em matéria judicial e policial. 2. Aplicação da lei penal portuguesa a factos cometidos no território nacional (art°4 do CP).

2.1. O princípio da territorialidade. O princípio da Territorialidade (PT), é o princípio base do nosso sistema de aplicação da lei penal no espaço, cujas razões são: Razões jurídico – internacionais e de política estadual, dado ser a via que virá a facilitar em maior medida a harmonização internacional

, o respeito pela não ingerência em assuntos de um outro Estado, não se dando assim a possibilidade de se gerarem conflitos internacionais, dada a aplicação da lei penal respeitar as fronteiras de cada Estado.

Razões jurídico penais e de política criminal, pois deve ser na sede do delito que mais se faz sentir as necessidades de punição e de cumprimento das suas finalidades, nomeadamente as de prevenção geral positiva, pois é a comunidade onde o facto teve lugar, que viu a sua paz jurídica perturbada e

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como tal exige por isso que a sua confiança no ordenamento e as suas expectativas na vigência da norma sejam regularizadas através da punição. O PT encontra-se previsto no Art.º 4 do CP, segundo o qual, “... a lei penal portuguesa é aplicável a factos praticados em território português, seja qual for a nacionalidade do agente”. Para determinar o que é o território português, a resposta é dada pelo Art.º 5 da CRP, para determinar a sede do delito é o Art.º 7 do CP que refere “ o facto considera-se praticado tanto no lugar em que, total ou parcialmente, e sob qualquer forma de comparticipação, o agente típico se tiver produzido”. O legislador ao cumular aqui quer o critério actuou, ou, no caso de omissão, devia ter actuado, como naquele em que o resultado da conduta quer o do resultado, optou uma solução mista ou plurilateral, não deixando assim espaço a eventuais lacunas de punibilidade, caso se viesse a admitir só um dos critérios.

2.2. Extensão da competência territorial: o critério do pavilhão ou da bandeira. O Art.º 4.º CP, Princípio do pavilhão ou bandeira, cria uma extensão do território, pelo que todo o barco que navegue com bandeira portuguesa pode ser considerado território português, caso navegue em águas internacionais, pois acaso navegue em águas territoriais, está sob a jurisdição do país a que pertencem essas águas ou espaço aéreo.

3. Aplicação da lei penal portuguesa a factos praticados fora do território nacional (art°5 do CP).

3.1. O princípio da nacionalidade activa e passiva. Art.º 5.1 al. c) e d), nacionalidade é activa quando o agente é português e passiva quando a vitima é portuguesa. O princípio da nacionalidade activa tem por base o princípio da não extradição, consagrado no art.º 33.1 da CRP Al. c) - Requisitos de aplicação:

o Que o autor ouo Que o autor seja encontrado em Portugal

a vitima do facto seja portuguesa

o Que os factos sejam também puníveis pela legislação onde o facto foi praticado

o Não haver poder punitivo no local onde o facto foi praticado (ex. Antárctida).

o Necessário que esses factos admitam extradição, mas ela não poder ser concedida, por não ter sido requerida, quer ainda, por efeito de normas substantivas quer adjectivas (ex. pena de morte ou prisão ou medida de segurança perpétua, prevista para esse crime em concreto, art.º 33.1 e 3 CRP).

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Al. d) - Requisitos: o Tanto o autor como a vitima serem portugueses o Que o autor viva habitualmente em Portugal o Que o facto não seja considerado crime no local onde foi praticado,

para prevenir situações de fraude à lei penal (ex. ajuda de suicídio; Eutanásia, ...) a bigamia fica de fora pois não é contra portugueses.

Al. e): Princípio da administração subsidiária da justiça penal, pretende-se assim evitar que Portugal seja um paraíso de delinquentes. 3.2. O princípio da protecção dos interesses nacionais. Al. a): Também se pode aplicar a lei penal portuguesa a factos praticados no estrangeiro, mediante certos pontos de conexão ou princípios, como o Princípio da protecção dos interesses nacionais, p. ex. crimes de traição à pátria, crimes contra o Estado, incitamento à desobediência, etc. ... 3.3. O princípio da universalidade. Art.º 5.1 al. b) e n.º 2: Aplica-se a factos praticados fora do território, por razões de interesses da comunidade internacional de “luta contra a delinquência internacional perigosa”, pelo que se aplica a lei penal portuguesa a crimes contra bens jurídicos carecidos de protecção internacional, p. ex. crimes contra a paz e a humanidade; tráfico de pessoas para fins sexuais, etc. ... N.º 2: Pode ser também aplicada a lei portuguesa a factos cometidos fora do território nacional, por força do direito internacional convencional, a que Portugal esteja obrigado, como ex. pirataria aérea, tráfico de droga, etc.

4. A determinação do lugar da prática do facto (art°7 do CP). O N.º 1, determina o “locus delitis”, ou seja o lugar da prática do crime, este artigo consagra o princípio da Ubiquidade, que assim impede quaisquer casos de impunidade, dado abranger qualquer acto que contribui para a prática do crime, pelo que o facto considera-se praticado em território português, quando aqui acontece:

- O acto relacionado com o facto que contribui para a prática do crime - Resultado típico do crime - RNCT (Resultado não compreendido no tipo legal de crime) - Comparticipação

O momento da prática do facto, é o momento da acção, ex. crimes de mera actividade, previstos para protecção penal, para o momento da acção, não exige qualquer facto externo, mas a mera conduta (p. ex. violação de domicílio)

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Já os crimes de resultado, para além da acção exigem um acontecimento exterior separado da acção, ex. homicídio O RNCT, estes crimes não têm resultado típico, são para protecção antecipada, evitando assim determinados resultados nocivos, o resultado não faz parte destes tipos de crime, são situações decorrentes p. ex. dos crimes de mera actividade, mas caso se venha a verificar um resultado com um enquadramento típico de outro crime, será aplicada a pena a que corresponda a moldura penal mais elevada. P. ex. o crime de participação em rixa (art.º 151), se tiver como resultado uma morte ou ofensa corporal grave (não tendo havido dolo, o qual é no entanto necessário para o resultado típico do crime) houve aqui um RNCT. O critério da Ubiquidade, está na possibilidade do RNCT vier a acontecer em Portugal (morte), e o tipo de crime (participação em rixa) ser praticado no estrangeiro, o agente ser julgado em Portugal. O N.º 2, refere a tentativa, também está abrangida, é uma ficção, pois o resultado não se produz, ausência de resultado, pelo que seria o hipotético lugar em que o resultado se produziria. 5. Aplicação da lei penal estrangeira mais favorável pelo juiz nacional (artº6 do CP). N.º 1: A lei penal portuguesa é subsidiária da lei penal do país da prática do facto, ou da lei do país em que o agente é condenado, mas condiciona-se tal aplicação quando o agente aí não tiver sido julgado ou se houver subtraído ao cumprimento total ou parcial da pena, e desde que o elemento de conexão seja reconhecido pela lei penal portuguesa. Este princípio da Ubiquidade, de aplicação extraterritorial é supletivo do princípio prioritário da territorialidade, afim de prevenir a impunidade que poderia resultar de conflitos negativos de jurisdição. N.º 2: Para se saber se a lei penal portuguesa é aplicável. Tem de se saber se globalmente a lei penal do local da prática do facto é mais favorável ou não, pelo que o juiz deverá para tal fazer uma conversão de penas do sistema penal. A lei estrangeira tem assim efeitos sobre a lei penal portuguesa (que aqui tem aplicação subsidiária) quer por impedir a sua aplicação, quer por ser a aplicável se for a mais favorável. N.º3: Aqui a lei penal portuguesa já não cede perante a lei estrangeira, na defesa do princípio da defesa dos interesses nacionais. 6. Relevância interna das sentenças penais proferidas por tribunais estrangeiros: efeitos negativos e efeitos positivos de caso julgado.

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A sentença proferida pelo tribunal estrangeiro tem em Portugal dois efeitos:

- Art.º 75.3 CP: Efeito positivo de caso julgado, pois para os casos de reincidência conta-se esta condenação

- Art.º 83.4 CP: Efeito negativo de caso julgado, na medida em que impede uma nova condenação

, princípio do “Ne bis in idem”

VI. Âmbito de aplicação pessoal da lei penal Regimes substantivos excepcionais, de acordo com o art.º 157.1 CRP, os deputados têm imunidade (causa de excepção de pena) em relação aos votos e opiniões emitidas no exercício da sua função. De acordo com o art.º 157.2.3.4, 130.4 e 196 da CRP, regime processual de excepção no que diz respeito ao estatuto político de deputados, PR e membros do governo. VII. Âmbito de aplicação material da lei penal 1. Distinção entre o concurso aparente ou de normas e o concurso genuíno ou de crimes. Quando um comportamento realiza vários tipos incriminatórios, mas a violação de uma norma já engloba todo o ilícito do comportamento, estamos perante um concurso aparente e assim não se pode punir por vários crimes, pois violava-se o princípio “ne bis in idem”, ou seja se um dos comportamentos realiza o tipo e se a punição fosse por concurso efectivo, estava-se assim a punir várias vezes o mesmo tipo de crime. Assim um dos crimes absorve todos os outros, pelo que só temos um crime, mas quando é que podemos concluir que isso acontece? Para fazermos essa distinção, temos 3 constelações doutrinárias, que seguidamente analisaremos: Especialidade, subsidiariedade e consunção. 2. As relações inter-normativas de especialidade, interferência e heterogeneidade e os critérios de solução do concurso aparente: especialidade, subsidiariedade (implícita e explícita) e consunção (própria e imprópria). 1 – Especialidade: Lei Especial Lei Geral A relação de especialidade, contém todos os elementos da geral e mais alguns que o especializa, a lei especial derroga a lei geral, p. ex. A Ofensa corporal grave (especial), abrange a simples (geral) a partir da qual é construída. 2 – Subsidiariedade: T

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Tipos de crime diferentes Elementos comuns Ex. Coacção, art.º 154 CP, é elemento constitutivo de vários tipos de crime (extorsão, roubo, violação etc.), pois quando são utilizados meios coercivos (medo), realiza vários tipos de crime consoante o caso, o tipo de coacção é subsidiário quer da violação, quer da extorsão ou do roubo, só sendo aplicado se estes não o forem, pelo que punir em sentido efectivo seria uma vez mais violar o princípio “ne bis in idem”, pode-se dar também como exemplo a violência usada como elemento constitutivo de outros tipos de crime, mas a qual é instrumental para a prática do crime. A relação de subsidiariedade (violência), pode até gerar uma subsidiariedade de crimes, entre um roubo com sequestro (o ladrão fecha a vitima dentro de casa), que no caso de se esquecer de libertar a vitima, teríamos um concurso efectivo que em princípio era subsidiariamente aparente (se depois do roubo libertasse a vitima), mas porque se tornou um meio excessivo para o roubo, deixou de ser instrumental, ultrapassando em larga medida o meio típico, tendo em conta o fim típico. Assim, tudo o que seja excesso de lesão, deverá ser considerado concurso efectivo, punido-se pelo mais grave dos crimes. 3 – Consunção: Consunção Própria: O fim consome o meio Consunção Imprópria: O meio consome o fim A relação de consunção, surge como um acto preparatório ou de execução de outro, p. ex. violação de domicilio para destruir um quadro (dano), são dois crimes que nada têm em comum, sendo autónomos, mas a violação de domicilio é o meio para a prática do dano, sendo assim instrumental, pelo que o crime final consome o meio ou crime instrumental (consunção pura), mas se o crime instrumental for punido com pena mais grave, é este que consome o crime final (consunção impura), pois é nele que se concentra todo o desvalor daquele comportamento. PARTE III TEORIA GERAL DO CRIME I. Introdução 1. A dogmática jurídico-penal no contexto de uma «ciência global do Direito Penal». DogmaSistema de conceitos e regras de imputação ou atribuição de responsabilidade, com a particularidade de cada incriminação ser concebida como um sistema aberto.

(grego: opinião, doutrina), conceitos e regras de opinião.

Funções: Hermenêutica de obtenção e aplicação do direito aos casos concretos. Segurança: Utilizando a dogmática, introduziu-se uma maior harmonização na resolução dos casos, como função estabilizadora na aplicação do direito penal.

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Descarga:

Não impede no entanto uma função critica, sempre que seja necessário recorrer a argumentos de validade, de determinadas soluções ou leis, pois como se disse é um sistema aberto.

Dispensa o aplicador (juiz), do recurso permanente a valorações, não se interrogando se é válido o modo como aplica o direito.

Ordenada teleologicamente, a dogmática do crime é composta por elementos que do ponto de vista normativo deva ser considerado crime, servindo para determinar responsabilidade criminal, baseada em valorações do ordenamento jurídico, e assim atribuir responsabilidade criminal, a quem praticar factos correspondentes a essas definições. São elementos que definem e integram o conceito de crime: Facto, Típico, Ilícito, Culposo e Punível. Tal ordenação corresponde a uma lógica, elementos que correspondem a valorações. Facto

: Acção Humana

Típico: Formulação do tipo punível, de incriminação, descrição típica, modelar de tipos puníveis (parte especial), o tipo reflecte o ilícito, realização do ilícito, indicando assim a existência de um facto ilícito. Ilícito

Pode-se aplicar o Estado de Necessidade (art.º 34 CP), como causa de exclusão da ilicitude, mas falta um requisito [al. b)], que é a sensível superioridade do bem a salvaguardar relativamente ao bem sacrificado, pondera-se este conflito de interesses, recorrendo-se a valorações jurídicas, pelo que, só assim se pode concluir que o facto é ilícito.

: É ilícito, se não houver nenhuma causa de justificação do mesmo (análise negativa), na ordem jurídica no seu conjunto, de causas de justificação ou exclusão do facto ilícito, as causas de justificação não estão tipificadas, embora se utilize o tipo justificador.

Culpa

- Capaz de culpa: Imputável : São necessários 3 requisitos:

- Consciência da ilicitude - Não seja exigível um comportamento conforme à ordem jurídica, havendo

causas de exclusão da culpa, p. ex. art.º 35, Estado de necessidade desculpante, quando se sacrifica um bem alheio, para salvaguardar um bem jurídico pessoal e que não se tenha outra (alternativa) forma de o fazer, pois o direito não impõe que alguém sacrifique a sua vida, para salvar a vida de outrem (ex. tábua de Carneades).

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A diferença entre exclusão de culpa e de ilicitude, repercute-se só em relação a terceiros.

II. O ilícito penal: características gerais 1. O ilícito penal como ilícito típico. III. O crime doloso, consumado, praticado por um só autor 1. O facto típico.

1.1. O conceito de acção típica. Acção, é um comportamento humano socialmente relevante, requisito mínimo, indispensável e prévio à tipicidade, e que se destina a provar se aquela prestação se pode ou não considerar acção humana, pois a acção humana é uma exigência da norma, historicamente, a noção de comportamento humano teve 4 conceitos de acção, a saber: 1 – Causal ou Naturalístico

Foi criticada, porque levava a incluir nela, realidades que não eram comportamentos humanos (p. ex. actos reflexos), e deixava de fora comportamentos que deviam ser incluídos.

: Conceito adoptado pela escola clássica, com base nesta teoria, acção era todo o movimento corpóreo causador de uma alteração no mundo exterior.

2 – Conceito Social de acção

: Para este conceito, o comportamento humano, acção, é toda a resposta do agente a uma situação de emergência, que se lhe depara, mediante a realização de uma possibilidade de acção, de que o agente dispõe, devido à sua liberdade, ou seja, é a opção por uma possibilidade de agir entre várias possíveis.

3 – Conceito Final ou Ontológico de acção

Todo o agir humano antecipa mentalmente um fim

: Escola finalista de Welzel, que procura demostrar, que todas as acções, são acções para um fim, então só há acção, quando o movimento corpóreo tem uma finalidade, daqui resulta que:

A escolha dos meios aptos à produção de tal fim, de acordo com o seu conhecimento. Põe em marcha o seu comportamento, fase da execução

4 – Conceito Pessoal de acção (Roxim):

è toda a exteriorização da personalidade do agente, como unidade de corpo e espírito, para ele (Roxim), só há comportamento humano, quando o acto seja susceptível de ser controlado pelos mecanismos físicos e psicológicos do agente

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1.1.1. O conceito de acção na história da dogmática jurídico - penal: a disputa entre um conceito ontológico e um conceito normativo de acção. Crítica e tomada de posição: a defesa de um conceito significativo de acção.

A acção significativa (teoria da linguagem), é aquela em que partimos do princípio que as acções são atribuições, para que assim determinados actos do homem possam ser classificados de acções humanas, conforme as regras do sentido que utilizamos para descrever os comportamentos. 1.1.2. As funções dogmáticas de um conceito significativo de acção. A sua função, conceito (não jurídico) na análise do crime, na dogmática do crime, para se ver se o comportamento é crime ou não, é essencialmente negativa/selectiva, ou seja, o conceito serve para excluir da análise da tipicidade, aqueles comportamentos, que não são acções, pelo que, sempre que qualificarmos o acto do homem como sendo uma acção humana, estamos a seleccionar e a eliminar comportamentos que não são acção, os quais são: 1 – Estados de inconsciência, quando o agente actua como uma massa mecânica, ex. desmaios, convulsões, sonambulismo 2 – Força irresistível (vis absoluta), a pessoa é utilizada como instrumento, objecto, sendo utilizada por outra pessoa (coacção física), pelo vento, porque escorrega, ou vis relativa através de actos praticados sob coacção. 3 – Movimentos reflexos: Reacção instintiva, provocada quer por uma força exterior ou por actos anterior, há uma resposta do agente ao estimulo de que resulta a prática do acto ex. fecho dos olhos no espirro, por uma abelha ou aranha dentro de um carro, choque eléctrico, .. A doutrina afasta situações de fronteira, mas onde se podem ver acção humana, é o caso dos automatismos, movimentos automáticos, reiterados, que são acções humanas, como os actos em curto circuito, e os actos de afecto profundo Actos em curto circuito: Actos de defesa, coordenada par um determinado sentido, ex. A aperta os testículos de B, que ao voltar-se (acto de defesa), bate em C, que cai e morre, trata-se de acção humana, embora o acto seja instintivo, primitivo, pode-se ver uma manifestação de personalidade.

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Actos de afecto profundo (Taras): Actos que traduzem perturbações profundas, servem para satisfazer instintos ou para descarregar agressividade, determinadas pela personalidade, conscientes, pelo que são acções humanas. Note-se que tais actos apesar de serem situações qualificadas copmo acção, não são só por isso puníveis, há que verificar se encerram os atributos de tipicidade. Ilicitude e culpa, podendo assim o impulso defensivo ser resolvido pela legitima defesa e os estados de afecto profundo em sede de capacidade de culpa. A conduta activa (acção), vale “mutatis mutandis” para a omissão, pois a conduta tanto pode ser activa como omissiva, embora os comportamentos omissivos, só se tornam relevantes verificados os requisitos legais do art.º 10 CP. Pelo que todos os casos de eliminação de comportamentos activos, servem também para eliminar comportamentos omissivos. 1.1.3. Acção e omissão como objecto possível das normas penais. Só há omissão, quando se espera de alguém um comportamento activo, ou quem tem obrigação de agir. Um elemento de inexistência de omissão, é a incapacidade humana geral. Ex. a distância a que está o auxilio daquele que devia agir, diferente do pai que não se atira à água para salvar o filho, por não saber nadar, já não há incapacidade geral, mas pessoal, havendo assim um comportamento omissivo (excluído em sede de culpa). 1.1.4. O sujeito da acção: as pessoas colectivas (art°11 do CP) e o problema da actuação em nome de outrem (art°12 do CP). Só as pessoas singulares praticam acções, que se podem classificar em: Pessoa moral: A autora da acção humana Pessoa normativa: Centro de atribuição de direitos e deveres. As pessoas colectivas (PC), não são pessoas, só em casos excepcionais (infracções fiscais), responsabilidade criminal derivada da acção de pessoas singulares, as PC podem ser abrangidas pelo D. Penal. A finalidade criminal das PC, é eliminar uma lacuna, onde não é possível imputar responsabilidade às pessoas singulares, por não se saber quem foi o autor da acção (ex. grandes empresas).

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Assim as PC, podem ser objecto de responsabilidade criminal derivada de um dos seus elementos dos órgãos sociais ou representante, o autor da acção humana, cuja acção se repercute sobre a empresa. Art.º 12 CP: Responsabilidade criminal em nome de outrem (não é de PC), individual, tem a ver com a responsabilidade do representante por facto próprio, extensão da responsabilidade individual

1.2. O tipo legal de crime. A tipicidade, passa pela demonstração de que o comportamento humano se subsume à previsão do preceito legal. A técnica é decompor a previsão do tipo nos diferentes elementos em que essa previsão é susceptível de ser decomposta, verificando-se assim se o comportamento se subsume ou não à norma ex. art.º 131 CP, “Quem matar outra pessoa” (previsão), decomposição: - Quem - Matar/Morte - Outra pessoa. 1.2.1. Os elementos do tipo legal - taxonomia correntes: elementos descritivos e elementos normativos - crítica da distinção; elementos objectivos e elementos subjectivos. Toda a acção é uma acção final, tendo como consequência que o dolo (ideia finalista), é um elemento do tipo, passa da culpa para o tipo. Todo o comportamento típico há-se ser um comportamento doloso, a orientação finalista, vai no sentido em que mesmo sem aceitarem o ponto de partida de Welzel, de que toda a acção humana é uma acção finalista, acabam por considerarem que o dolo e a negligência são elementos do tipo. Elementos Subjectivos do tipo de delito têm 2 funções:

o Descritivos: Fundamento da linguagem, atribuindo à acção uma determinada tendência subjectiva, são imediatamente apreensíveis pelos sentidos.

o Normativos: Teoria das normas, a função das proibições e comandos é orientar o comportamento no âmbito normativo, no sentido do comportamento que a norma pretende dar, e só por dolo ou negligência, é que se pode desrespeitar a orientação normativa, e se os tipos legais de crime descrevem acções normativas, todas elas têm de ter um elemento subjectivo, o Dolo ou a Negligência. Pelo que todos os conceitos e expressões que figuram no tipo legal pertencem a um contexto normativo (suportam juízos de desvalor),

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pois não há elemento que dispensem o recurso à valoração, pelo que assim temos só elementos normativos

- Autor/Identificação

Elementos Objectivos do tipo por acção:

- Acção - Comportamento proibido - Objecto do facto - A vitima - Resultado Típico

- Nexo de causalidade entre o comportamento e o resultado, que é feito através da imputação objectiva (teoria da adequação, corrigida pela teoria do risco).

Elementos objectivos do tipo por Omissão: - Os 4 anteriores: Autor; Acção; Resultado e Nexo de imputação - Posição de garante

É assim em função destes elementos objectivos comuns, que surge a classificação dos tipos legais de crime, que são:

1.2.3. Classificação dos tipos legais segundo os elementos objectivos

a) Segundo o agente: crimes gerais ou comuns; crimes específicos (próprios e impróprios); crimes de mão própria;

comuns:

Tipo comum ou geral: Quando o tipo começa por “Quem”, é

cometido por qualquer pessoa Tipo específico: É aquele que só pode ser realizado por agente

específico, com determinada qualidade (ex. funcionário público) • Próprios: Qualidade do funcionário, só quando praticado

por aquele funcionário, ex. art.º 370 • Impróprio: A qualidade do funcionário agrava a situação

(ex. peculato, ou o do art.º 378) Crime de mão própria: Tem de haver uma prestação corpórea do

autor (só pode praticar um crime de cada vez, ex. cópula, coito no abuso sexual de menores).

b) Segundo a existência ou não de um evento espaço temporalmente separado da acção: crimes de mera actividade e crimes de resultado; Crimes de Mera actividade: Contempla uma só

Crimes de resultado: Além da mera acção, contempla também o resultado, ex. homicídio, é um crime material

acção, ex. violação de domicilio, é um crime formal

Só nos crimes de resultado, é que se coloca o problema de imputação objectiva, pois o tipo legal só está consumado, quando

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o resultado verificado é atribuído àquela acção, nexo entre a acção e o resultado (sem resultado, só haverá tentativa)

c) Segundo a estrutura do comportamento: crimes de acção e crimes de omissão. Casos - limite de destrinça entre acção e omissão: a interrupção de acções de salvamento. A distinção entre omissão própria e comissão por omissão; Se o resultado for produzido por uma conduta activa, estamos perante uma acção, caso contrário estamos perante uma omissão, critério de causalidade. Critério Normativo de valoração da conduta, ex. médico que desliga a máquina a um doente em coma, aqui estamos perante uma omissão de prolongar a vida, se fossemos pelo critério da causalidade estávamos perante um homicídio doloso., e o médico não tem o dever jurídico de prolongar a vida de um doente naquelas condições, mas se fossem os herdeiros do a desligar a máquina, já se encontrava realizado o tipo de homicídio doloso. Diferentes, são também situações em que ainda não foram postas à disposição da vitima os meios de salvamento, quando havia um dever geral de o fazer art.º 200 CP = Omissão por acção, outras, são as situações em que já foi criada uma expectativa de salvamento, comportamento activo.

o Omissão própria: O tipo descreve o comportamento numa forma omissiva, quando há um dever geral

o Omissão Imprópria ou Comissão por Omissão: Quando sobre o omitente recai um

de agir, ex. permanência na casa depois da violação do domicilio, ex. art.º 200

dever especial

de actuação (posição de garante), que ele actue de forma a evitar aquele resultado (dever de garante, da não verificação do resultado), art.º 10.2

d) Segundo o dano causado ao bem jurídico protegido: crimes de perigo (abstracto, abstracto - concreto e concreto) e crimes de lesão; Modalidades de Crimes de perigo (antecipação da tutela penal, risco: Abstracto: O perigo não é elemento do tipo, ex. condução sob o

efeito do álcool Concreto: Possibilidade de lesão objectiva, resultando em

perigo, tipo de perigo, ex. art.º 138.1, 150.2 Abstracto - Concreto: Intermédio, em que o perigo faz parte do

tipo, mas separado da acção, mas que decorre da própria acção,

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a acção tem de revelar aptidão para lesar o bem jurídico, ex. art.º 153 CP ameaça susceptível de causar medo àquela vitima

o Crime de Lesão: Relação entre o facto e o bem jurídico, de que resulta

a sua destruição, ex. homicídio. e) Segundo a duração da consumação: crimes instantâneos e crimes permanentes. A distinção entre consumação e termo do facto típico;

o Instantâneos: Um só acto, ex. art.º 142 o Duradouro: Quando a sua consumação se protela no tempo, ex.

sequestro, violação de domicilio, art.º 160 f) Segundo o modo de formação: crimes «sui generis», crimes qualificados e crimes privilegiados. g) Crimes de forma livre e forma vinculada. Livre: A acção e descrita genericamente, ex. aquele que mata outrem Vinculada: A acção está descrita em todos os seus detalhes (encadeamento de acontecimentos), ex. art.º 217, Burla

1.2.4. A posição de garante como elemento dos tipos comissivos por omissão (art°10 n°2 do CP): fontes da posição de garante; fontes formais e fontes materiais. Posição de garante e dever especial de agir.

As posições de garante, como elemento não escrito dos tipos de omissão imprópria, dado o Art.º 10.2 CP, exigir como pressuposto de punibilidade que sobre o omitente recaia um dever jurídico que pessoalmente o obrigue a evitar o resultado (crimes de resultado), sendo deveres específicos, que incidem apenas sobre determinadas pessoas, que são as garantes da não produção desse resultado. Segundo as fontes formais, vínculos jurídico formais que decorrem de contrato ou da lei, era muito difícil fundamentar a punibilidade do autor, em virtude p. ex. da nulidade da fonte de posição de garante, mas de acordo com a teoria da fonte material, já não existem obstáculos a essa fundamentação, pois ela decorre da relação material subjacente. Assim, quando um crime é de resultado, pode-se realizar o tipo de crime por omissão, quando se tem a posição de garante

Teoria das posições de garante, 2 grupos:

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1 - Posição de garante baseadas na protecção de determinado bem jurídico, quando existe uma relação quer formal quer material subjacente, através de lei, acto jurídico ou relação familiar. 1.1– No âmbito de estreitas relações de vida: Trata-se de casos em que se verifica uma dependência de umas pessoas em relação a outras, das quais se espera destas últimas o cumprimento de certas obrigações de protecção e assistência. É o caso das relações entre, pais e filhos, cônjuges e outras que assentam quase sempre em vínculos respeitantes ao direito da Família. 1.2 – Resultantes da assunção voluntária de funções de protecção: Situações em que determinada pessoa aceita desempenhar funções de protecção, p. ex. a baby-sitter, o médico em relação ao paciente, o guia de montanha 1.3 – Decorrentes de uma actuação ilícita, situações de ingerência: Ingerência nos bens jurídicos de outra pessoa, através de um comportamento ilícito, p. ex. o condutor que circula a 120/Kms hora dentro de uma vila e atropela uma pessoa, investe o condutor na posição de garante da não verificação do resultado, tendo assim o dever de a socorrer a vitima, pois tal acção, criada por conduta ilícita, constitui uma ingerência nos bens da vitima, pelo que se enquadra dentro do art.º 10 e não nos critérios do art.º 200.2, aplicável a condutas licitas do garante.

2 - Posição de garante decorrente do controle de uma fonte de perigo, quer por parte de quem as criou, quer ainda por quem tem a sua fiscalização.

2.1 – Resultante do domínio sobre uma fonte de perigo: Dever que recai

sobre todos aqueles, em cuja esfera de domínio se encontram instalações, máquinas ou animais, que podem criar perigo para os bens jurídicos de terceiros, e exerçam um controlo dessas fontes de perigo. P. ex. quem tem a seu cargo a fiscalização das condições de segurança de uma fábrica de explosivos, e nada faz quando vê crianças dentro das instalações a brincar com fósforos. Ou o guarda de uma jaula de leões que se esquece de fechar a porta, e o leão soltando-se fere um transeunte.

2.2 – Derivadas da responsabilidade pela actuação de outras pessoas:

Quem exerce determinadas funções de vigilância, criam nos outros a expectativa de protecção em relação a quem está sujeito à

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vigilância, p. ex. quem está encarregue da vigilância de doentes mentais perigos, ou os guardas prisionais que têm a vigilância de delinquentes perigosos.

1.2.5. Causalidade e imputação objectiva como elementos não escritos dos crimes de resultado. O art.º 10.2 CP, estabelece que se verifique um “nexo de adequação”, que é um elemento não escrito dos tipos de crime de resultado. Á relação de causa efeito é importante, pois foi aquela causa que provocou tal resultado, conexão entre a acção e o resultado, mas não chega, é preciso que essa causa seja adequada à produção do efeito ou resultado, isto é, o risco por ele criado é que fundamenta a imputação objectiva, só sendo imputável objectivamente ao autor o processo causal que esteja na sua esfera de domínio, pelo que só este significado do nexo de adequação exigido pelo art.º 10.1CP, se encontra em conformidade com a teoria do ilícito pessoal.

a) Teorias da causalidade: a teoria da equivalência das condições ou da «conditio sine qua non»; e a teoria da “causalidade adequada”, críticas.

Teoria da Equivalência

Esta teoria foi afastada e não é defendida por ninguém pois é impossível pensar num resultado, que não esteja inscrito numa cadeia causal infinita.

: Esta teoria utiliza como procedimento para se averiguar quando se está perante a causa de um resultado, a seguinte: causa de um resultado é toda a condição que, suprimida mentalmente, faz desaparecer esse resultado, ou seja é toda a condição sem a qual o resultado não teria tido lugar.

Teoria da causalidade adequada: Esta teoria surge para restringir os excessos a que levaria a teoria da “conditio”, trata-se de um juízo de prognose póstuma, mas reportado ao momento da acção, juízo este feito pelo juiz e que consistiria em saber se uma pessoa média colocada na posição do autor, representaria o resultado como consequência normal e previsível da sua acção, ou seja, se a acção de acordo com as regras normais de experiência e os conhecimentos específicos do agente, é idónea a produzir aquele resultado, em caso de ser previsível a produção do resultado a acção seria assim imputada ao seu autor, mas ainda que, sendo previsível era o resultado improvável ou de verificação muito rara, a acção já não seria imputada ao seu autor, devendo também ser levado em conta os especiais conhecimentos do

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agente, apesar de a generalidade das pessoas deles não ter conhecimento. Esta teoria não restringe os tipos de ilícito, como nos casos de condutas perigosas permitidas, como as condutas socialmente adequadas., além de levantar alguns problemas pela intervenção de terceiros e da interrupção do nexo causal, caso esta intervenção não fosse previsível e provável. b) Nexo causal e nexo de imputação objectiva: critérios normativos de

imputação e sua natureza tópica. O método tópico de imputação objectiva, critérios parcelares de pontos de vista valorativos, locais, que têm por objecto a sistematização desses mesmos critérios, assim temos: O resultado é objectivamente imputável quando: 1 – O seu comportamento criou, aumentou ou não diminuiu, um risco juridicamente desaprovado, ou seja um risco proibido, 2 – O risco derivado desse comportamento, cai no âmbito da

responsabilidade do seu autor. 3 – O resultado decorre concretamente do risco que assim se

materializa no resultado, nexo de causalidade. Assim podemos afirmar que a acção é adequado e imputável objectivamente ao seu autor, quando: “.Se cria, ou aumenta, ou não diminui um risco proibido, e esse risco que foi criado, aumentado ou não diminuído se concretiza, ou seja o resultado acontece”. Dentro destes critérios normativos, de natureza tópica podemos dentro desta mesma sistematização, afastar a imputação no seguintes casos: 1 – Quando o comportamento do agente se queda pelos nos limites do risco permitido ou nos casos em que há uma diminuição do risco

2 – Quando há um

, p. ex. B empurra A, para este não levar um tiro, apesar de A poder sofrer ima lesão com a queda, B diminui assim o risco de A ser morto (o que para a teoria da adequação, B seria o responsável pelas lesões que A viesse a sofrer).

comportamento licito alternativo, situações em que alguém no decurso do processo causal, tem um comportamento negligente, mas vem-se a provar que o comportamento diligente (licito alternativo), não teria evitado ou antecipado esse resultado, neste caso não havia imputação.

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Mas também pode acontecer que devido a essa intervenção no processo causal de um terceiro ou da própria vitima

O nexo de causalidade ou o nexo de imputação objectiva, só se coloca nos crimes de resultado, pois são elementos objectivos do tipo, pelo que sempre que entre a acção e o resultado, intervêm um terceiro, a própria vitima ou um facto natural, interrompe-se o nexo de causalidade iniciado pelo autor, seja por acção seja por omissão imprópria, (neste caso de quem tem a posição de garante, ou da própria vitima)

, a imputação possa ser transferida para a sua esfera de responsabilidade, a qual se torna assim competente pelo risco.

Causalidade antecipada

: São casos de interrupção do nexo causal, os quais se inserem dentro das mesmas situações já analisadas, ou seja quando um terceiro antecipa o momento da verificação de um resultado, embora o mesmo resultado se viesse mais tarde a verificar por acção do autor, este comete apenas uma forma de crime tentado, enquanto aquele pratica o crime na forma consumada.

Dupla causalidade

: Casos em que ambos os comportamentos tenham co-realizado o resultado segundo regras de experiência, cada um dos autores realiza o tipo de crime doloso consumado, sendo ambos competentes pelo risco criado (co-autoria)

Causalidade cumulativa

: Quando o resultado é obtido pela soma de duas acções em conjunto, se feitas isoladamente, cada um só pode ser punido por tentativa, se os dois soubessem da conduta um do outro ambos seriam punidos como co-autores de um crime consumado

3 – Quando o resultado pode ter-se verificado em razão de um outro factor qualquer, que pode ser em razão de um comportamento licito alternativo, ou ser um resultado não coberto pelo fim de protecção da norma,

3.1 - Caso se demonstre que na conduta licita alternativa (a que não chegou a realizar-se) o resultado teria sido o mesmo, sensivelmente no mesmo tempo, do mesmo modo e nas mesmas condições, a

que se verifica quando o resultado não é nenhum daqueles que a norma quis evitar quando proibiu o comportamento realizado, assim não há conexão pelo risco, pelo que o resultado não pode ser objectivamente imputado ao agente, pelo que é necessário que o resultado, seja um daqueles que cabe no âmbito de protecção da norma, para que assim se possa imputar o resultado à conduta

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imputação objectiva deve ser negada, pois não é possível comprovar uma verdadeira potenciação do risco, verificando-se que tanto a conduta indevida como a licita “alternativa”, produziriam o resultado típico.

c) A relevância jurídico-penal da causa virtual: factos hipotéticos e factos reais. O processo causal virtual, consiste num facto real impedido de actuar, porque a causa operante (autor substitutivo), o removei do caminho para o resultado. Têm a mesma relevância, quer os factos hipotéticos quer os factos reais se actuarem nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar e com o mesmo grau de intensidade. Em todos os outros casos lesar um bem jurídico, significa sempre antecipar futuras lesões, quer elas tenham lugar dentro de 1 ou 2 segundos depois, pois a normas jurídico penais, não podem recuar na função de protecção de bens jurídicos, ou seja, estes só seriam protegidos quando outras lesões não estivessem em execução ou eminentes, o que serias incompreensível. d) Especificidades da imputação objectiva nos crimes de comissão por omissão. Embora haja alguma divergência doutrinal, também se aplica aos crimes de comissão por omissão, a teoria da imputação objectiva do Risco, pois existe nexo de causalidade entre a não acção e o resultado, ou seja, tem de se saber se a não acção pode conduzir ao resultado

1.2.6. O tipo subjectivo. a) A construção do tipo subjectivo: a teoria dos elementos subjectivos da ilicitude e a tese finalista da inclusão do dolo no tipo. O dolo é o elemento subjectivo geral dos tipos de crime, e por força do art.º 13 CP, os comportamentos dos tipos descritos na parte especial, só serão punidos se forem cometidos com dolo, do ponto de vista de uma teoria do ilícito pessoal a única distinção legítima, é entre comportamento doloso e negligente b) O dolo.

I) Noção e os 2 elementos do dolo. O dolo é o conhecimento e a vontade

a) – O elemento cognitivo o “conhecer”, que implica: conhecer a factualidade tipicamente relevante, incluindo o processo causal, que represente correctamente e que o meio é idóneo para o efeito; conhecimento actual (sem reflexão) e co-

ou o querer de realizar os elementos objectivo de ilícito.

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consciência; diferenciação entre conhecimento intelectual e consciência da ilicitude (valoração social); conhecimento dos elementos típicos sem a valoração jurídica, a chamada valoração paralela na esfera do leigo (o juiz põe-se na posição do leigo)

b) – O elemento volitivo a “vontade” (art.º14 CP), é o que verdadeiramente serve para indiciar uma posição ou atitude do agente contrária à norma de comportamento, ou seja, uma culpa dolosa.

II) Modalidades do dolo: o problema da distinção entre dolo eventual e negligência consciente; teorias da probabilidade e teorias da aceitação - a solução à luz dos arts.14 n°3 e 15 al. a) do CP.

As várias modalidades do dolo distinguem-se pela forma como os dois elementos estruturais se combinam entre si: Art.º 14.1 CP

– O dolo directo do 1.º grau: É a intenção/vontade que está finalisticamente dirigida para a obtenção daquele resultado danoso. O agente pode até não estar seguro de vir a alcançar o objectivo pretendido, mas tem a intenção de o alcançar.

Art.º 14.2 CP

– O dolo directo do 2.º grau ou dolo necessário: É quando o agente aceita como consequência necessária efeitos colaterais da acção destinada a produzir os efeitos daquilo que visa atingir, p. ex. A quer matar B, e para isso coloca no seu automóvel uma bomba, mesmo sabendo que B nesse dia vai viajar com a família.

Art.º 14.3 CP – O dolo eventual: Compreende-se o dolo eventual através da sua distinção com a negligência consciente (art.º 15 al. a), em ambas as figuras o autor tem de representar o resultado como possível, mas enquanto no dolo eventual se conforma com essa possibilidade, na negligência consciente não, o que significa que conformar-se com a possibilidade do resultado acontecer, o risco da verificação de tal resultado. Segundo a teoria da aceitação, o elemento que realmente distingue o dolo da negligência é o elemento volitivo, na vontade e não o elemento cognitivo, a representação, sendo a conformação um vestígio da vontade, pois pode-se afirmar que quem se conforma, num certo sentido quer, mas se pelo

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contrário repudiou a verificação do resultado, esperando que ele se não verificasse, é negligente, isto segundo a teoria hoje dominante que é a da conformação, em que o agente toma a sério o risco da possível lesão do bem jurídico, mas não obstante decide-se pela realização do facto, está assim disposto a arcar com o seu desvalor. Segundo a formula positiva de Frank, haveria dolo eventual se naquele momento da decisão, o autor pudesse dizer para si mesmo: “haja o que houver, actuo”, aceitando assim correr o risco, já na negligência consciente o autor embora represente o resultado, ele não o toma como sério, pois confia que não vai produzir-se. Segundo uma tese de motivação (F. Palma), trata-se de saber qual foi a motivação do agente, porque é que actuou, assim em situações de dúvida, podemos dizer que :

- Quanto maior for a motivação que o levou a actuar, actua com dolo eventual.. - Quanto mais fútil for a situação que o levou a actuar, actua com negligência.

O dolo nos factos omissivos: Não há muita diferença, tendo o dolo nos crimes omissivos impróprios de abarcar:

• A posição de garante, que são elementos objectivos do tipo omissivo impróprio carecidos de valoração, pelo que também aqui se deve proceder a uma valoração paralela na esfera do leigo.

• O risco de realização do resultado típico • A possibilidade de uma intervenção que diminua o risco de

verificação do resultado c) O erro sobre os elementos objectivos do tipo (art°16 n°1 do CP).

A primeira parte do art.º 16.1, o erro sobre os elementos de facto ou de direito de um tipo de crime, são espécie de erro que excluem o dolo, mas também, espécies de erro que não excluindo o dolo excluem a culpa (art.º 17), “onde há dolo não há erro e vice –versa”, as espécies de erro que estudaremos, consiste no desconhecimento (ignorância), ou no falso conhecimento (falsa representação), tratando-se de uma espécie que afasta o dolo (embora possa haver negligência, art.º 16.3, se prevista), os quais são designados erros do conhecimento, pois afectam o elemento cognitivo do dolo, assim o erro sobre os elementos objectivos do tipo podem revestir as seguintes formas:

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I) O erro sobre o objecto da acção e o erro sobre a identidade da vítima. Há erro sobre o objecto, quando o agente dirige a sua acção a um determinado objecto que representa, o qual pretende lesar, mas por erro na representação, sobre a identidade do objecto, é outro o objecto que efectivamente vem a ser lesado. Consequências desse erro: Se os objectos forem tipicamente idênticos (erro sobre a identidade), é irrelevante, não se excluindo desta forma o dolo da acção, realizando desta forma o crime doloso consumado Se os objectos não são idênticos, exclui-se o dolo em relação ao objecto que não se pretendia lesar, sendo o agente punido por concurso efectivo, de Tentativa em relação ao objecto para o qual dirigiu a sua acção (falhada) e por Negligência (se previsto) em relação ao objecto efectivamente lesado. II) O erro na execução, ou “aberratio ictus” Este erro consiste num defeito na acção de execução, o autor identifica bem o objecto a ser lesado, mas o resultado da sua acção, vem a produzir-se não nesse objecto que ele representou, mas por erro de execução em outro objecto quer este seja idêntico ou não, exclui-se assim o dolo em relação ao objecto que foi lesado por erro, sendo punido por Negligência se previsto, e por tentativa em relação ao objecto falhado. A própria expressão latina esclarece bem este erro: “Aberratio ictus”

: acto que, dirigido a alguém, atinge indirectamente um terceiro, desvio do golpe.

III) O erro sobre o processo causal. Há erro sobre o processo causal, quando exista um desvio entre o processo causal representado pelo autor da acção e o processo causal realizado, assim, para que se possa afastar o dolo em relação ao resultado, é necessário que haja um desvio essencial, ou seja, que o processo causal realizado, caia fora do risco que normal e tipicamente decorre da acção, se o desvio é essencial, exclui-se o dolo generalis, e o agente só pode ser punido por tentativa

, caso o desvio do processo causal não seja essencial à produção do resultado, há imputação desse mesmo resultado à conduta , entendendo-se assim o dolo ao resultado verificado, considerando-se assim o crime consumado.

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São também casos de erro sobre o processo causal, os casos de “Dolus generalis”, (dolo geral, termo também utilizado para casos p. ex. de alguém que atira uma granada para dentro de um recinto fechado), aqui utilizado diferentemente dos casos de erro sobre o processo causal (em que só é realizada uma acção), pois aqui o agente realiza duas acções, como p. ie. A dá um tiro em B com a intenção de o matar, pensando estar A morto enterra-o para ocultar o cadáver, a autópsia revela no entanto que A ainda estava vivo antes de ser enterrado, sendo a causa da morte a asfixia. Neste casos também se verifica uma divergência entre o processo causal representado e o processo causal que dá lugar ao resultado, se aqui há dolo na 1.ª acção, já não há dolo no que diz respeito à acção que vem a provocar o resultado, pois o autor já não tem dolo de matar quando enterra a vitima, são duas acções distintas, assim sendo, o agente deve ser punido por tentativa em relação à primeira acção e por negligência em relação à segunda, pois é o comportamento que vem a produzir o resultado, que o autor não representou como previsível. No entanto não existem dúvidas, quando o autor planeia desde o inicio, a segunda acção que acaba por produzir o resultado representado (matar a vitima), estando essa segunda acção “ab initio” coberta pelo dolo do autor, realizando-se assim, um homicídio doloso consumado, dado o autor representar todos os comportamentos e querer que o resultado verificado se produza. Problemas podem surgir no entanto, quando, o autor não quis à partida o resultado, ou seja a vontade de praticar a segunda acção surge após a prática da 1.ª, neste casos, deve-se saber se a segunda acção é praticada num contexto de risco normal (quando uma pessoa normal e diligente colocada na prática do crime, fosse previsível prever que o autor praticasse uma segunda acção), nestes caso, em que a 2.ª acção é uma decorrência normal do risco criado pela 1.ª acção, o desvio do processo causal não é essencial entendendo-se assim o dolo da 1.ª acção à 2.ª, o que no exemplo dado, o autor realizava um homicídio doloso consumado. Se a resposta for negativa, então o desvio é essencial, aplicando-se assim nestes casos, as regras do concurso de crimes, tentativa e em concurso (eventual) com um crime negligente consumado. IV) O erro de subsunção e sua irrelevância.

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Fala-se em erro de subsunção, quando alguém invoca o desconhecimento jurídico dos elementos típicos a que a sua acção se subsume, o qual é irrelevante para a exclusão do Dolo, pois para se agir com Dolo, não é necessário o conhecimento do conceito jurídico mas sim que conheça o seu significado social, no sentido de uma valoração paralela na esfera do leigo. Assim se A, tenta corromper um funcionário público, não se pretende que ele conheça o significado jurídico de funcionário, mas tão só que esse funcionário desempenhava uma função dentro de uma repartição pública. Pode no entanto o erro de subsunção estar na base de um erro sobre a ilicitude, não como um erro de conhecimento, mas um erro de valoração, relevante nos termos do art.º 17 CP, por p. ex. A, não saber que B era funcionário público. V) O erro sobre a posição de garante nos crimes de comissão por omissão (art.º 16.1 CP). Neste erro, o agente desconhece a existência da relação em que se funda a sua posição de garante, ora sendo esta posição um elemento objectivo do tipo, o seu desconhecimento afasta o dolo da sua omissão, podendo no entanto vir a realizar um tipo de crime negligente.

d) Os elementos subjectivos específicos do tipo.

São elemento subjectivos que não se confundem com o Dolo, mas só se encontram nos tipos dolosos, estando no entanto para além do Dolo (e do art.º 13 CP), pelo que têm de estar sempre expressamente referidos (descritos pelo legislador), p. ex. art.º 203 a “intenção

de apropriação” (intenções específicas)

1.2.7. Os crimes agravados pelo resultado e a chamada preterintencionalidade (art°18 do CP). São situações, em que se verifica uma conduta base doloso (ofensa corporal), mas um resultado mais grave (morte), que o autor não quer nem a título de dolo eventual, sob pena de realizar o tipo de homicídio doloso, mas, de acordo com o art.º 18 CP, a conduta base do autor e o resultado agravado, tem de ter um nexo de imputação objectiva, tendo de ter uma relação, pelo menos de negligência (negligência simples), para se poderem fundir os dois crimes num

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só, o que se traduz por uma excepção às regras do concurso efectivo, pois há a fusão de dois crimes num só, sendo assim um misto de dolo - negligência. A expressão pelo menos

, consiste em identificar a negligência com a negligência simples e admitir que o resultado agravado possa ser imputado também a titulo de negligência grosseira (negligência grave).

1.2.8. A exclusão da tipicidade: os casos especiais das acções insignificantes e das acções socialmente adequadas.

São comportamentos juridicamente tolerados, e dado que do tipo de ilícito só fazem parte comportamentos socialmente inadequados, a qualidade socialmente adequada retira à conduta carácter lesivo, isto é, a sua aptidão para lesar bens jurídicos. Estas casos podem dividir-se em dois grupos:

- As situações de risco permitido ou de risco juridicamente irrelevante: Que são os casos de trânsito rodoviário, instalações industriais perigosas, certas competições desportivas, intervenções médico cirúrgicas, etc. - Acções de pequena gravidade e de tradição cultural: Como abates clandestinos ligados a festividades; poder de correcção dos pais, certas afirmações injuriosas entre habitantes das aldeias, tais acções mais não são do que uma questão de interpretação dos tipos.

2. O facto ilícito: as causas de justificação do facto

2.1. Tipicidade e exclusão da ilicitude (ou justificação do facto). Estando preenchida a tipicidade (ou seja verificando-se os elementos objectivos e subjectivos) esta indicia a ilicitude

. Há então que verificar se há ou não causas de exclusão ou justificação da ilicitude, para podermos concluir se o facto além de típico, é também ilícito.

2.2. A exclusão da ilicitude e os princípios da legalidade e da unidade da ordem jurídica. À ilicitude pertencem as causas de justificação, que possuem um significado negativo para a punibilidade. A punibilidade é apreciada do ponto de vista de existir uma conduta concreta e saber se ela realiza um tipo de delito e se preenche o conteúdo de ilícito e de culpa (estrutura tripartida), e assim haver a possibilidade de dirigir ao autor um juízo de censura pessoal, caso não ocorra nenhuma causa de justificação dessa ilicitude, pois caso contrário o facto é licito, havendo assim a compensação do desvalor de determinada acção, com a valoração de um resultado produzido por outra acção, que serviu para a protecção de um conflito de interesses.

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As causas de justificação representam permissões, autorizações de agir, impedindo assim um juízo negativo sobre o facto típico, como não estão sujeitas ao principio da legalidade não tem de haver uma inumeração taxativa. 2.3. Princípios gerais da exclusão da ilicitude. O juízo de licitude ou de ilicitude de um comportamento, resulta de uma ponderação de bens ou interesses, já que ele contém a decisão acerca de um conflito de interesses, sendo que as causas de justificação respondem ao problema de saber se a ordem jurídica deve recusar a protecção de um bem jurídico para salvaguardar outro . Assim o Principio da ponderação de bens, tanto pode integrar o núcleo da causas de justificação (p. ex. direito de necessidade, art.º 34 al. b)), como funcionar como um seu limite, como acontece no consentimento (art.º 38). Com efeito o principio subjacente ao consentimento é o principio da autonomia, sendo a renúncia pelo próprio à protecção do seu interesse, a não ser que a ordem jurídica considere tal interesse indisponível (p. ex. a vida e a integridade física), pelo que pode concluir-se que todas as causas de justificação, se baseiam em termos e intensidades diferentes no principio da ponderação de valores ou interesses. Num segundo plano de sistematização, temos os seguintes princípios de causas de justificação: Legitima defesa: Princípio da protecção, defesa do direito perante o ilícito Direito de necessidade: Principio da protecção e principio da tolerância Consentimento

: Principio da autonomia

2.4. Causas de justificação gerais e causas de justificação especiais (próprias ou impróprias). Análise das primeiras:

São causas de justificação gerais:

- Legitima Defesa - Art.º 32 - Direito de Necessidade - Art.º 34 - Conflito de Deveres - Art.º 36 - Consentimento do ofendido - Art.º 38 - Consentimento presumido - Art.º 39

Especiais: - Art.º 142 Interrupção da gravidez Código Civil: - Acção Directa

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- Direito de Retenção

Para as causas de justificação serem consideradas, têm de se verificar na realidade, ou seja se o agente está em erro em relação a uma causa de justificação da ilicitude, não há causa de justificação mas sim erro , que é aqui tratado separadamente.

a) A legítima defesa (art°32 do CP); Sempre que alguém se defende de uma agressão (que não seja provocada pelo próprio agente), está a tomar a defesa da ordem jurídica, como uma necessidade de manutenção de exigências de prevenção geral. Requisitos da legitima defesa - LD- Existência de uma agressão, sendo a agressão um comportamento humano, que ameaça um bem juridicamente protegido, não podendo todavia ser negada a LD, quando exercida contra animais que estejam a ser usados por alguém como instrumento de agressão, em que o animal aqui é a arma da agressão humana.

:

Na agressão considera-se tanto o comportamento activo como omissivo quer impróprio (ex. a mãe que se recusa a alimentar o seu filho recém nascido), quer ainda omissivo próprio (F. Dias) (ex. o caso do automobilista que se recusa a transportar um ferido ao hospital), quer seja em relação a defender bens supra individuais (ex. impedir pela força um individuo completamente embriagado de se fazer à estrada com o seu automóvel). - Não ser possível em tempo útil, recorrer à autoridade pública - A agressão tem de ser actual, tendo a sua execução já se ter iniciado, nos termos do art.º 22 CP, sendo aqui decisivo a situação objectiva e não aquilo que o agredido representa, pois caso a agressão deixe de ser actual pode estar justificada a Acção Directa (art.º 336 CC), caso estejam preenchidos os requisitos desta. - A agressão tem de ser ilícita, pelo que não há legitima defesa contra agressões licitas. A ilicitude é em relação à totalidade da ordem jurídica, não tendo de ser específica do DP (ex. A pode pela força, por termo às emissões de ruído de um bar, que ou funciona para além do horário permitido ou porque não cumpre com as normas legais de insonorização, e que o impedem de descansar durante a noite), a agressão tem de dirigir-se contra quaisquer interesses legitimamente

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protegidos, do agente ou de terceiros, só se excluindo os bens colectivos cuja tutela pertença ao Estado (Estado soberano, dotado de “Ius Imperii”, mas já se admitindo desde que seja como sujeito privado, p. ex. carro pertencente a ministério), estão no entanto também fora do âmbito da LD situações de agressões ou ameaças tipicamente relevantes, levadas a cabo pelo credor sobre o devedor, ou pelo marido para impedir que a mulher abandone o lar. - A defesa tem de ser um meio necessário, tem de ser adequado, proporcional à agressão, pelo que o meio não deve ser excessivo, no entanto conforme as circunstância do caso, pode-se considerar uma defesa irreflectida, a qual está justificada. Na ponderação dos meios não deve entrar-se em linha de conta com a possibilidade de fuga, pois apesar de assim se poder evitar a agressão, não se pode impor ao agredido o uso de meios desonrosos e também porque dessa forma se precludiria a prevenção geral, a que a LD está adstrita O excesso de legitima defesa, em determinadas circunstâncias, não é causa de exclusão da ilicitude mas de exclusão de culpa, porque lhe falta o meio adequado. - Só podem ser atingidos pela acção de defesa os bens jurídicos do agressor e não bens de terceiros A destruição do instrumento da agressão (p. ex. um animal), se adequada abarca o direito de defesa. A LD pressupõe a ilicitude da agressão, mas não a culpa do agressor, podendo assim ser repelida em LD agressões em que o agente actue sem culpa, quer devido a inimputabilidade, quer devido a uma causa de exclusão da culpa, quer ainda a um erro sobre a ilicitude não censurável - Conhecimento (ou Animus defendendi), elemento subjectivo, o agente conhece a acção do agressor (e/ou tem vontade de a repelir).

- Se por erro da agressão, não seja actual ou ilícita, Art.º 16.2, que por remissão do art.º 16.1 exclui o dolo, e remete para o 16.3, podendo o agente ser punido por negligência

Consequências da falta de requisitos:

- Sobre o meio necessário, caso este seja excedido, aplica-se o art.º 33, excesso de LD, mas se o excesso for provocado por o agente se encontrar erro sobre a ilicitude da sua acção, sem consciência de que o direito não lhe permitia reagir de forma tão excessiva, tal erro é abrangido pelo art.º 17, erro sobre a ilicitude, que exclui a culpa. - Caso falte (animus defendendi), o conhecimento da agressão o facto é ilícito, há um desvalor quer na acção quer do resultado, sendo assim o agente punido com a pena aplicável à tentativa, de acordo com a art.º

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38.4, por analogia (que é possível, dado ser favorável ao arguido), mas tal situação só é válida para os crimes dolosos, pois os crimes Negligentes não têm o elemento subjectivo e assim a tentativa fica impune. (ver em § 2.5)

b) O direito de necessidade (art°34 do CP); É um facto típico, praticado, como um meio adequado para: - Afastar um perigo actual - Salvaguarda de um interesse ou bem jurídico do agente (desde que a situação não tenha sido provocada intencionalmente pelo próprio, caso em que é afastada a justificação), ou de terceiro, de valor sensivelmente superior ao sacrificado - Que o titular do interesse lesado com a acção de necessidade suporte a agressão. Assim sendo o facto está justificado por direito de necessidade, pois caso contrário o facto seria ilícito. A ponderação de interesses é o pressuposto mais importante, e só em caso da situação não se subsumir ao art.º 34 é que se vai para o art.º 35.º CP, pelo que só conhecendo a natureza e o valor do interesse ameaçado e do interesse que se pretende sacrificar, é que se torna possível saber se a acção de necessidade é ou não um meio adequado. A al. a), ressalva bens jurídicos de terceiros inocentes, provenientes do perigo voluntário criado pelo próprio agente, que provoca a causa de perigo ou não a evita podendo. A al. b), que consagra o principio da ponderação de bens ou interesses, devendo a sensível superioridade ser não só o valor objectivo dos bens, como também a intensidade da respectiva lesão. P. ex. não se deve extrair pela força um rim a uma pessoa, só porque há outra que necessita de uma transplantação imediata para sobreviver, apesar de o interesse a salvaguardar (vida) ser superior, mas o que está em jogo, é a dignidade da pessoa humana, que não é um somatório de órgãos. A al. c)

, impõe um dever de solidariedade ou tolerância ao titular do bem sacrificado, pois só existe um tal dever quando a sua imposição é razoável, devendo fazer-se uma valoração sempre que se trate de bens pessoais e desde que não implique a violação da autonomia ética do terceiro, que é um limite ao direito de necessidade, p. ex. o médico não actua dentro do direito de necessidade impondo um transfusão de sangue a uma testemunha de Jeová, pois não pode impor-lhe um tratamento contra a sua própria vontade.

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Estado de necessidade defensivo: Figura intermédia entre a exclusão da ilicitude e a exclusão da culpa, sendo que, entre nós esta causa de justificação reconduz-se à figura da Acção Directa do art.º 336 do C. Civil,

Embora o art.º 336 CC, não preveja a acção directa em beneficio de terceiro mas tão só em beneficio próprio, é de concordar com Oliveira Ascensão, quando inclui tal benefício por via de analogia.

a qual se traduz na defesa do próprio direito contra agressões não ilícitas, dentro dos limites do necessário, ou seja, que o meio seja adequado para evitar o dano, e desde que não sejam sacrificados interesses superiores aos que o agente visa proteger.

c) O conflito de deveres (art° 36 n°1 do CP); Quando uma situação de perigo ameaça pelo menos dois bens jurídicos e apesar do agente ter o dever jurídico de salvar ambos, só pode, por força das circunstâncias salvar um deles, pelo que pode tal situação, representar um caso de estado de necessidade em sentido amplo

, para que tal comportamento seja justificado, basta que o agente tenha cumprido um dever de valor igual ao daquele que sacrifica, p. ex. o pai que vê dois filhos a afogarem-se e só pode salvar um, ora a ordem jurídica não pode aqui fazer mais nada, do que contentar-se com a realização de qualquer um dos deveres, segundo a livre discricionariedade do agente, mas se uma das pessoas que se estão a afogar uma é filho do agente e a outra não, aqui o conflito é entre um dever geral de auxílio e um dever baseado numa posição de garante, sendo esta inequivocamente superior e só o seu cumprimento justificará a conduta.

d) A obediência hierárquica (art°36 n°2 do CP e 271/2.3,CRP); O dever de obediência exclui a ilicitude da facto praticado, mesmo que essas ordens sejam ilegais, no entanto sempre que o subordinado tenha a suspeita fundada de que o cumprimento da ordem leva à pratica de um crime, deve recusar a obediência. Neste sentido a obediência hierárquica tem uma estrutura semelhante ao conflito de deveres, sendo a colisão entre o dever de obediência e o dever de não praticar um ilícito penal, pelo que uma vez mais se deve dar prevalência ao dever de não praticar crimes. e) O consentimento do ofendido (art°38 do CP);

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Neste capitulo, 2 teses se confrontam: A que propõe um tratamento global e unitário, e a que defende uma diferenciação entre consentimento e acordo, conhecida por tese dualista. Aqui iremos tratar do consentimento como causa de justificação, e só os bens jurídicos considerados disponíveis pela ordem jurídica, são susceptíveis de consentimento, tal disponibilidade decorre de dois requisitos: - Só bens jurídicos individuais são disponíveis - O consentimento só releva, se o facto consentido, não atentar contra os bons costumes. Sendo que o bons costumes são um conceito altamente indeterminado, o legislador no art.º 149 n.º 2 CP, forneceu alguns critérios (tópicos), a título exemplificativo, devendo os bons costumes ser aplicados aos factos consentidos e não ao consentimento, cfr. art.º 38.1 e 149.1 CP, devendo atender-se aos fins e motivos do agente e do ofendido, constituindo assim uma ofensa aos bons costumes, uma operação de cosmética contrária às “legis artis” e destinada a desfigurar um criminoso, para iludir a perseguição penal, pois o facto consentido, atenta contra o interesse da realização da justiça, sendo uma questão de moralidade, a referência aos bons costumes referidos no art.º 38.1 CP. O art.º 38.2 exige que o consentimento seja expresso de forma livre e esclarecida, podendo ser revogado até à execução do facto, caso o consentimento seja após a consumação do facto, só releva como perdão. O art.º 38.3, enuncia dois requisitos de eficácia: Que quem consente tenha mais de 14 anos e que possua o discernimento necessário para avaliar o sentido e alcance de tal facto. f) O consentimento presumido (art°39 do CP); Os elementos constitutivos do consentimento presumido são: 1 – A necessidade de tomar uma decisão de protecção de um bem jurídico (estado de necessidade em sentido amplo) 2 - Não haver em tempo oportuno um consentimento expresso, em virtude do titular do bem não estar em condições de prestar o consentimento, e caso se esperasse pela decisão, comprometia-se o sucesso da acção. 3 - Ser razoável supor que o titular do bem teria eficazmente consentido no facto, ou seja, que seria essa a sua vontade se a pudesse expressar nesse momento

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P. ex. Intervenções médico cirúrgicas urgentes. A vontade presumida tem de ser eficaz e na determinação dessa eficácia vale por força do art.º 39.1, os requisitos de eficácia do consentimento (art.º 38/1 e 3) O quadro justificante não se altera se o titular do bem manifesta posteriormente uma vontade contrária à que foi presumida, pois o suporte da justificação, não se encontra na vontade do titular do bem jurídico enquanto tal, mas no estado de necessidade em que se toma a decisão, para tal, o Juiz faz uma valoração, colocando-se na posição de um leigo face à situação em concreto.

2.5. Os elementos subjectivos das causas de justificação: alcance do art°38 n°4 do CP.

O elemento subjectivo está presente em todos os tipos justificadores, pois todos eles requerem um elemento subjectivo, que é o conhecimento por parte do agente da situação justificante, só com este conhecimento se consuma a exclusão da ilicitude, pelo que, se o agente actua desconhecendo a situação justificante, é punível com a pena aplicável à tentativa. A ocorrência dos elementos objectivos da justificação só eliminam ou compensam o desvalor do resultado, pelo que se o agente desconhece a situação objectiva justificante, actua com dolo pelo que tal comportamento não pode ser aprovado pelo direito, funcionando o elemento subjectivo que é o conhecimentoAssim o agente, só é punido com a pena aplicável à tentativa, pelo desvalor da acção, pois o desvalor do resultado é compensado pela salvaguarda de outro bem jurídico, não havendo assim qualquer desvalor do resultado (é como se não houvesse resultado, só tentativa), pois só subsiste o desvalor da acção.

, como contrapartida do dolo.

2.6. O erro sobre os pressupostos objectivos de uma causa de justificação (art°16 n°2 do CP) e sua distinção do erro sobre a existência ou os limites de uma causa de justificação. O art.º 16 n.º 2, por remissão do n.º 1, exclui a atribuição do Dolo, em virtude do agente se encontrar em erro sobre ao factos

O agente pensa que se verifica uma determinada situação que não existe por erro, erro sobre os elementos objectivos de uma causa de justificação da ilicitude, ou seja o agente representa os pressupostos de facto de uma causa de justificação da ilicitude, que por erro não de verificam, os quais por uma equiparação formal, leva à exclusão do dolo, o agente está convencido que actua conforme o direito, pensa p. ex. que vai ser agredido mas não vai, pelo

de uma causa de justificação, que a existirem, tornariam licita a sua conduta, pelo que tal representação defeituosa exclui o Dolo, ou seja, quem actua segundo circunstâncias que se existissem justificariam o facto, age com uma finalidade que a ordem jurídica aprova.

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que actua com consciência da ilicitude e que o seu comportamento é contrário ao direito, só que está justificado, pelos factos que ele pensa verificarem-se (por erro). O n.º 3 ressalva os casos em que a conduta ou não é censurável, ou é então específica da negligência, quando o agente actuou, sem observar o cuidado devido, pelo que a punibilidade por negligência fica assim ressalvada.

3. O facto culposo.

3. 1 Noção e significados da culpa jurídico-penal. A concepção psicológica de culpa, esgota-se no dolo ou na negligência, pelo que actualmente deixou de ter relevância, já na concepção normativa, o juízo de culpa deixa de ser visto como uma mera declaração de uma situação psíquica, para se transformar na atribuição à pessoa do agente, de um desvalor ou de um demérito, pelo que assim a culpa deixa de estar exclusivamente na cabeça do agente, para também estar na cabeça do juiz, que vai reconstruir a medida do envolvimento do agente, a sua atitude desvaliosa na prática dos factos, aos quais se torna possível endereçar assim, uma censura ao agente. Visa a culpa estabelecer também um limite à intervenção penal do Estado e ás correspondente necessidades de prevenção, não devendo o juiz punir para além da culpa. No juízo que se censura, de culpa, só se pode ter em conta aquilo que vai implicado no facto e não no carácter do agente. Pelo que, mais adequada parece a ideia de que o que se censura na culpa, é a atitude do autor perante o Direito, uma exigibilidade de acordo com o direito, expressa na relação de facto com os bens jurídicos lesados, em condições de liberdade. 3.2. Pressupostos da culpa jurídico-penal.

3.2.1. A capacidade de culpa ou imputabilidade. Capacidade em razão da idade: Art.º 19, fixa a idade de 16 anos para aquisição da capacidade de culpa, no entanto antes dos 16 anos se o menor se revelar perigoso, pode ser-lhe aplicada uma medida de segurança. Capacidade para avaliação da ilicitude do facto ou de autodeterminação de acordo com essa avaliação: Art.º 20.1, estabelece que é inimputável, quem por força de anomalia psíquica carece desta capacidade, dependendo assim a inimputabilidade de dois requisitos: - Biológico: a anomalia psíquica

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- Psicológico: A incapacidade para avaliar a ilicitude do facto ou de se determinar de acordo com essa avaliação, existindo assim o fundado receio da prática futura de crimes daquela natureza., podendo assim por tais razões ser aplicada uma medida de segurança.

Pelo que a anomalia tem de ser grave e duradoura, produzindo efeitos que o agente não domina. Ponto decisivo da apreciação da incapacidade é o momento da prática do facto, em virtude dado o facto de haver “loucos com intervalos lúcidos”. Art.º 20.2, Equipara o semi-imputável ou imputabilidade diminuída à inimputabilidade, equiparação esta no plano dos efeitos, podendo neste caso o semi-imputável ser declarado inimputável, pois só pode ser destinatário de um juízo de culpa e de uma pena, quem no momento da prática do facto está no pleno gozo das suas faculdades mentais, tendo capacidade para entender o significado desvalioso do facto que pratica. No entanto quem sofre de uma anomalia psíquica acidental ou duradoura, mas cujos efeitos domina, continua a poder ser objecto de uma censura de culpa e de uma pena de culpa, embora eventualmente atenuada. Art.º 20.3, dispõe que a comprovada incapacidade do agente para ser influenciado pelas penas, desde que associada a uma anomalia psíquica, poderá conduzir à situação prevista no n.º 2, podendo no entanto ditar o seu internamento em estabelecimento destinado a inimputáveis cfr. art.º 104 e 105 Art.º 20.4, consagra a figura da “Actio libera in causa” acção livre na causa do crime, que ocorre quando o efeito psicológico do n.º 1, provém de uma anomalia psíquica criada pelo agente com intenção de cometer o facto. O autor coloca-se voluntariamente nessa situação com o intuito imediato de praticar o facto (exige-se dolo directo), a conduta não é livre no instante da sua realização, mas é livre na causa., pelo que o autor permanece imputável . Se o autor se coloca numa situação de completa inimputabilidade quer de forma voluntária, actuando com dolo necessário ou eventual, ou ainda de forma negligente, e desde que não se tenha colocado nesse estado de completa inimputabilidade por causa do facto praticado e

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para o cometer, é punido por facto autónomo, de acordo com o art.º 295, crime de perigo abstracto. 3.2.2. A consciência da ilicitude, ou erro sobre a ilicitude, art.º 17 CP. O autor pode dispor de capacidade para avaliar a ilicitude do facto, mas no entanto efectuar erradamente essa avaliação, para haver culpa, é necessário que o autor esteja consciente do desvalor que a ordem jurídica atribui ao comportamento praticado, pelo que, a falta dessa consciência, quando não censurável, exclui a culpa

O agente representa os factos sem erro, e pensa que vai actuar ao abrigo de uma causa de justificação da ilicitude, não tem é consciência da ilicitude dos mesmos no momento em que actua, pois está em

, de acordo com o art.º 17.1, se for censurável pode atenuar a pena (art.º 17.2).

erro em relação à forma como o direito valora aquela realidade, sendo assim um erro de valoração jurídica.

A censurabilidade, comportamento eticamente reprovável, desvalorativo, corresponde a um juízo de valoração paralela, na esfera do leigo, feito pelo juiz ao juízo de ilicitude. Existem dois critérios de distinção da censurabilidade: - Critério da evitabilidade ou da invencibilidade: Erro que seja inevitável ou invencível, quando o agente tudo tenha feito para evitar ou vencer essa situação e não o tenha conseguido.. - Critério da rectitude da consciência idónea: É necessário que a consciência ética do agente seja recta. O que significa que a sua decisão pela ilicitude do comportamento foi tomada porque sobrevalorizou valores positivos que com aquela conduta visou realizar. O código distingue entre um erro sobre a ilicitude (art.º 17), e um erro sobre proibições cujo conhecimento é razoavelmente indispensável para que o agente possa tomar consciência da ilicitude do facto (art.º 16.1 in fine). O primeiro representa uma falta de consciência da ilicitude e exclui a culpa, quando não for censurável; o segundo integra o tipo de erro que exclui o dolo, sendo que o primeiro (art.º 17) é um erro de valoração, já que incide sobre o significado jurídico valioso ou desvalioso do facto praticado, o qual não se confunde com o segundo (art.º 16.1), com a representação da ilicitude formal, pois é a norma que desvalora o comportamento, é um erro de conhecimento da norma, p. ex. “in side trading”; “conduzir pela direita”, cujo conhecimento é indispensável para que o agente possa tomar consciência da sua ilicitude, ora se o agente não conhece tal proibição jurídica formal,

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nem sequer pode ter consciência da ilicitude do acto, pelo que exclui o dolo. Já no caso do erro do art.º 17.1 o agente actua conhecendo que o seu acto é desvalioso, pensa é que p. ex., actua dentro dos limites de uma causa de exclusão da ilicitude, o agente representa um limite jurídico maior da causa de exclusão da ilicitude, havendo por esta razão um erro sobre a ilicitude do facto, o que exclui a culpa

Já no erro do art.º 16.1 não existe um conhecimento da proibição (que não se confunde com o conhecimento da lei), pelo que assim o agente não sabe que o facto é ilícito, sendo um erro do conhecimento, exclui o dolo, pois quem desconhece a proibição não se decide por um comportamento contrário ao direito, no entanto o art.º 16.3, prevê que se o agente tinha o dever de se informar e não o fez conscientemente ou revelou uma atitude imprudente, é possível endereçar-lhe uma censura própria do facto

, se de acordo com o n.º 2 o erro não for censurável.

negligenteJá a falta de consciência da ilicitude (art.º 17.1), só exclui a culpa se não for censurável, a verificação de tal consciência pauta-se por pontos de vista pessoais objectivo (como todos os problemas de culpa), devendo ter-se em conta a personalidade do agente, o seu nível cultural, o seu tipo social, fazendo o juiz a valoração paralela na esfera do leigo e então se o erro sobre a ilicitude não lhe é censurável, a sua culpa está excluída.

.

Em ambos os casos, o agente conhece toda a realidade dos factos, o que não conhece são as normas que tipificam esses crimes. 3.2.3. A exigibilidade de um outro comportamento, conforme ao direito. Só são censuráveis as violações de proibições e comandos jurídicos, cujo cumprimento é exigível e só é exigível, o cumprimento quando o agente se move num quadro de motivação normal, isto é, quando actua segundo padrões médios de comportamento, pois o agente pode ter a capacidade para avaliar a ilicitude da sua conduta e ter consciência do seu significado ilícito, mas por força de um certo tipo de perturbações psíquicas, quando o seu poder de se motivar de acordo com a valoração que a ordem jurídica faz acerca do facto está total ou parcialmente afectado, não lhe é exigível um comportamento diferente, se o comportamento cai fora da capacidade do agente não lhe é exigível um comportamento conforme ao direito, afastando assim a culpa, são situações de inexigibilidade. 3.3 As causas de exclusão da culpa.

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3 Situações segundo o CP: - Excesso de legitima defesa desculpante - Estado de necessidade desculpante - Obediência desculpante 3.3.1. Exclusão da culpa e inexigibilidade: crítica da distinção entre causas de exclusão da culpa e causas de desculpa. Nas causa de exclusão da culpa, a ausência de culpa deve-se à falta de um dos seus elementos constitutivos: a capacidade de culpa ou imputabilidade e consciência da ilicitude. Nas causas de desculpa, haveria culpa, pois qualquer daqueles elementos está presente, mas o conteúdo dessa culpa seria tão diminuto, que a ordem jurídica renuncia em concreto a uma censura.

a) O erro sobre a ilicitude e o chamado «criminoso por convicção». A punibilidade do criminoso por convicção, é determinada fora do quadro do art.º 17, a não ser que a convicção esteja a associada a uma valoração errada do significado normativo do comportamento. Ex. se um médico praticar um homicídio assistido por estar convencido que tal prática é justa, conhece a ordem jurídica mas sobrepõe a essa a sua própria valoração, havendo assim consciência da ilicitude, mas no entanto de a sua convicção subjacente à prática do facto puder qualificar-se como “honrosa” ou respeitável, o autor poderá beneficiar da

atenuação especial do art.º 72.2 al. b).

b) O excesso de legítima defesa (art°33 do CP). Têm de se verificar todos os requisitos da legitima defesa, com excepção de um: O meio empregue não foi o adequado, foi excessivo, não foi razoável. Esta aqui presente uma situação de inexigibilidade conforme o direito, uma situação de medo ou susto, que exclui a culpa

Mas estados de raiva ou ódio, são estados censuráveis que não são desculpáveis, pelo eu não excluem a culpa, se a defesa se prolonga para além do necessário a agressão já não é actual, pelo

, dado o conflito de interesses em ponderação o agente excede-se nos meios, porque a agressão lhe provocou uma situação de medo ou susto, estados emotivos asténicos.

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que não é já um caso de legitima defesa, mas de excesso de defesa, neste caso excesso de meios e não de tempo, sendo o facto ilícito, podendo no entanto a pena ser especialmente atenuada (art.º 33.2) c) O estado de necessidade desculpante (art°35 do CP). Pressupostos:

- O bem jurídico a salvaguardar, não seja superior ao bem jurídico sacrificado - Situação de necessidade, perigo - Não existir outro modo de remover o perigo

- Conflito de interesses

Exigibilidade reforçada ocorre quando existe uma relação especial entre <o agente e certos interesses sociais ou individuais, em geral as posições de garante. Art.º 35.2 poderá existir um conteúdo de culpa maior dos que os casos do n.º 1, daí que a consequência possa ser uma atenuação especial da pena ou o agente ser dela isento. d) A obediência indevida desculpante (art.º 37 do CP).

A obediência é o dever de não praticar crimes, é um facto ilícito, o agente cumpre a ordem hierárquica sacrificando o dever de não praticar crimes (conflito de deveres), mas o agente não sabe que está a praticar um crime. Meio caminho entre a inexigibilidade e o erro, que se assemelha ao erro sobre proibições (art.º 16.1) ou erro sobre a ilicitude (art.º 17.1), mas os critérios de relevância são neste caso diferentes. Critério de saber se na obediência indevida, o agente sabia ou não que estava a praticar um crime, se sabia ou devia saber, a obediência indevida não exclui a culpa, mas caso contrário, se o agente não soubesse nem devesse saber que tal facto era crime, exclui-se a culpa.

Conclusão: Distinção entre ilicitude e culpa:

O que está em causa sobre a distinção entre exclusão da ilicitude e exclusão da culpa, são quatro consequências importantes:

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1 - A pena funda-se na culpa, enquanto a medida de segurança se reporta à ilicitude e a perigosidade, sistema dualista que assim exige a distinção 2 - A comparticipação num comportamento justificado permanece impune, ao contrário do que sucede à comparticipação num facto não culposo, é o que resulta do art.º 29 à contrário. 3 - Contra o facto justificado não é possível agir em legitima defesa, deferentemente do que sucede em relação ao facto desculpado. 4 - O erro sobre a existência ou limites de uma causa de justificação assume relevância jurídica, como o erro sobre a ilicitude (art.º 17), ao passo que idêntico erro sobre uma causa de exclusão da culpa nenhuma influência tem na punibilidade.

4. O facto punível (em sentido estrito).

4.1. As condições de punibilidade. 4.1.1. Distinção entre condição de punibilidade e resultado típico. O facto, típico, ilícito e culposo tem de ser punível, a punibilidade só entra quando se colocam questões que são de merecimento ou necessidade de pena, do comportamento típico, ilícito e culposo. A punibilidade é constituída por dois tipos de elementos: - Elementos positivos:

- Elementos Negativos: que são 2, Causas de exclusão da pena e causas de isenção da pena

Condições objectivas de punibilidade ditam a necessidade da pena, p. ex. a morte no crime de agressão em rixa. Estas condições estão relacionadas com o comportamento e distinguem-se do resultado porque a sua falta não implica a mudança de comportamento, apenas são o “se” da punibilidade, pois caso contrário não é punível

4.2. A exclusão da punibilidade

4.2.1. Causas de exclusão da pena. P. ex. A referente às injúrias que o deputado profere no exercício das suas funções, e que estão previstas no CPP, assim quando pratica o facto ele já tem de ser deputado. Estão ligadas a uma qualidade do agente, a qual tem já de existir no momento da prática do facto. 4.2.2. Causas de isenção da pena.

Produzem-se posteriormente à prática do facto, como p. ex. a desistência da queixa e da acusação, que se verifica depois da prática

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do facto típico, ilícito e culposo, o que se traduz em que tal comportamento não seja punido.

IV. As formas imperfeitas do crime 1. O crime tentado

1.1. Fundamento da punibilidade do facto tentado. Há tentativa quando o agente praticar actos de execução de um crime que decidiu cometer, sem que este chegue a consumar-se. A tentativa é uma extensão da tipicidade

, devendo aqui ser analisada.

Art.º 23.1 - A tentativa só é punível quando ao crime consumado respectivo, corresponder pena superior a 3 anos de prisão. 1.2. O «iter criminis»: o percurso ou a resolução criminosa, os actos preparatórios, os actos de execução e a consumação. A distinção entre actos preparatórios e actos de execução como pressuposto da fixação do limiar geral da punibilidade (o art°22 do CP). O “iter criminis”: Fases da acção: 1.ª Decisão = Dolo; 2.ª Preparação: 3.ª Inicio da execução e 4.ªConsumação. Ora na fase de decisão de formação do dolo, na preparação da realização do facto o direito penal não intervém, pois ainda não há ofensa aos bens jurídicos, assim a intervenção do direito penal, só se justifica no inicio dos actos de execução. Como então se pode distinguir actos preparatórios de actos de execução, pois em regra os actos de preparatórios não são puníveis (embora haja excepções), passemos então à análise das várias teses: 1.3. Os elementos do facto tentado: tentativa inacabada e tentativa acabada. Tentativa e dolo eventual - apreciação crítica da tese de FARIA COSTA. Tentativa e crimes de perigo. Subjectivista

: Os actos distinguem-se segundo a intensidade destes, nos actos preparatórios a decisão ainda não é firme, pois há a possibilidade de abandono do projecto criminoso, já em relação aos actos de execução a vontade do agente e tão firme que é improvável que recue na sua decisão. Esta tese não deve ser aceite, pois é um critério inseguro em virtude de ser subjectivo, dado ficar ao livre arbítrio do julgador, violando também o DP do facto, por não se partir do facto mas da decisão do agente (elemento subjectivo)

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Formal/Objectiva

: O actos de execução são os que já realizam elementos constitutivos do tipo legal de crime, sendo actos de execução do facto típico, são formais, pois têm a ver com a forma como está redigido o tipo de crime, art.º 22 al. a). Assim esta tese só se pode aplicar aos crimes complexos e crimes de forma vinculada, em que o legislador faz uma descrição do tipo de crime, p. ex. violação e burla, crimes em que a acção está descrita em todos os seus elementos. Mas já não se aplica nos crimes de forma livre, pois não contêm a descrição, como p. ex. o homicídio.

Adequação - Material e Objectiva

: Será um acto de execução o que for idóneo ou adequado para produzir o resultado, juízo de perigosidade para o bem jurídico, art.º 22 al. b), tem no entanto esta tese algumas insuficiências, pois há alguns actos que não são idóneos para produzir o resultado, mas que são perigosos para o bem jurídico.

Imediatidade:

Art.º 22 al. c), (FranK), São actos de execução, aqueles que se encontram numa antecedência imediata com os actos idóneos para produzir o resultado, estão no degrau anterior ao acto que produz o resultado, ao acto de execução segue-se imediatamente o plano do agente.

São elementos do tipo tentado a decisão ou dolo eventual e a prática de pelo menos um acto de execução e a não verificação do resultado por razões independentes da vontade do agente, assim a tentativa, tem a moldura penal do facto consumado reduzida de 1/3 do limite máximo. Diferente é quando há uma conduta activa do agente em não produzir o resultado, uma conduta reparadora, é a tentativa inacabada, art.º 24 CP. 1.4. A tentativa nos crime de comissão por omissão (art.º 10): início e termo da execução. Sendo crimes de resultado, há uma equiparação da omissão à acção, então os actos de execução distinguem-se pelo Critério dos lugares paralelos, pois o agente não actua no momento em que devia actuar, assim de acordo com Wessels: a execução tem inicio quando perante a proximidade do perigo o agente desperdiça ou não aproveita a primeira oportunidade de intervir, o que de acordo com o art.º 23.1, a tentativa só é punível neste caso, quando ao crime corresponda uma moldura penal, cujo limite máximo seja superior a 3 anos de prisão (regra geral, que tem excepções). 1.5. Tentativa impossível e crime putativo. Conceito e fundamento da punibilidade da tentativa impossível (art°23 n°3 do CP). Quando o meio usado é manifestamente inidóneo ou o objecto essencial à consumação não existe, assim a tentativa não é punível mesmo quando já haja

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actos de execução mas que não representem nenhum perigo para o bem jurídico, que não conduzam ao resultado querido pelo agente. 2 Situações típicas da tentativa impossível: - Utilização de meio manifestamente inidóneo - Inexistência do objecto essencial à consumação Embora em ambos os casos o agente actue com dolo, no primeiro caso p. ex. A envenena B com sais de fruta, em vez de veneno, no segundo caso A dispara sobre um manequim pensando ser uma pessoa. Assim a tentativa impossível só será punível, quando o meio não for manifestamente idóneo ou o objecto não seja inexistente, mas qual será o critério para aferir a manifesta (conceito indeterminado) inaptidão do meio: Tem-se por manifesta a inaptidão do meio, quando não aparente um perigo perante a comunidade, que não coloque em perigo o bem jurídico, assim quando o representante da comunidade, colocado na posição de observador, não lhe cause a impressão de perigosidade para o bem jurídico, não sendo assim punível pois não há ilícito típico tentado, em caso contrário será punível, Não há legitima defesa contra a tentativa manifestamente impossível, pois é um crime putativo (crime que só existe na cabeça do agente). 1.6. A desistência e seu regime jurídico.

1.6.1. Requisitos e efeitos da desistência: a desistência como causa de isenção da pena. Não há desistência de actos preparatórios, mas só de actos de execução, pois só a partir da desistência destes é que se está perante um ilícito que tem como fundamento a desnecessidade da pena, pois a conduta reparadora do agente, compensa o ilícito criminoso anteriormente praticado, havendo assim uma reposição da legalidade. 1.6.2. Delimitação das situações de desistência do art°24 e do artº25 do CP. O art.º 24, consagra 3 hipóteses: 1 - Desistência 2 - Impedimento da consumação do crime

3 - Impedimento da verificação do resultado não compreendido no tipo legal de crime

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2 - Impedimento efectivo da consumação ou resultado, através de novo acto que retrocede o processo causal (antídoto) tentativa acabada 3 - Casos em que existe a consumação de um crime de perigo, que não obstante a sua consumação, o agente evita um resultado de dano mais grave (ex. Mãe que abandona o filho recém nascido, mas passadas algumas horas volta para trás conseguindo assim evitar a morte do filho)

1 - Abandono voluntário e definitivo do projecto criminoso ( tentativa inacabada), art.º 24.1 - Formula de Frank: Voluntariedade da desistência, se o agente diz: “eu não quero atingir o fim ainda que possa”, mas caso contrário se disser: eu não posso atingir o fim ainda que queira, já não há voluntariedade, não há desistência de uma tentativa de crime, mas o que significa o “posso”

, se for uma possibilidade material (pode-se quase sempre), a formula não é aplicável, pois é uma tentativa de crime fracassado. Mas possa, como poder no sentido daquilo que uma pessoa média pode fazer (normativamente), critério objectivo, ou seja, quando as desvantagens de continuação são superiores às vantagens de abandono e o agente desiste a tentativa não é punível, embora os actos que entrem na sua execução possam ser punidos, se forem qualificados pela lei como crime

2 - Impedimento da Consumação: Art.º 24.1 in fine, Impedimento efectivo da consumação ou resultado, através de novo acto que retrocede o processo causal (antídoto) tentativa acabada, omissão de continuação dos actos de execução, quando a execução está completa o impedimento só pode ter lugar através de um acto activo. Art.º 24.2, impedimento do resultado, través do comportamento de um terceiro. 3 - Casos em que existe a consumação de um crime de perigo, que não obstante a sua consumação, o agente evita um resultado de dano mais grave (ex. Mãe que abandona o filho recém nascido, mas passadas algumas horas volta para trás, conseguindo assim evitar a morte do filho) 1.6.3. Casos especiais de desistência: a desistência de actos preparatórios; a desistência da tentativa impossível; a desistência nos crimes permanentes; a desistência nos crimes omissivos.

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Pode haver desistência da tentativa impossível. (Mas não há tentativa de crimes Negligentes)

2. A comparticipação criminosa (Clausula de extensão da tipicidade)

2.1. Autoria e participação: critérios objectivos e subjectivos de distinção; o critério do domínio do facto e respectivas modalidades. 2.2. Formas de autoria: autoria singular; co-autoria; autoria mediata (art°26 do CP). Fala-se em comparticipação, quando o crime é praticado por mais do que um agente, é a realização do facto típico por mais que um agente. Assim temos: 1 - Art.º 26: Autores do facto típico 1.1 - Autoria Imediata: Autor material 1.2 - Autoria Mediata: Autor por intermédio de outrem

1.3 - Co-autoria: Quem toma directamente parte na execução, por acordo, adesão ou juntamente com outro ou outros.

2 - Art.º 27: Participantes do facto típico 2.1 - Instigador: Determina o autor à prática do facto criminoso 2.2 - Cumplicidade: Quem ajuda ou auxilia 2.2.1 - Cúmplice: Ajuda materialmente

2.2.2 - Cúmplice Moral: Quem ajuda reforçando a vontade já existente do autor

Autor

: É aquele que contribui causalmente para a prática do facto, o CP, consagra um conceito restritivo, o autor é “quem” dos tipos da parte especial, sendo que a punibilidade do participante é feita por extensão dos tipos incriminadores.

Participante

: Não é autor, é punido por extensão dos tipos da parte especial em articulação com as normas da parte geral, que permitem englobar situações que não são de autoria.

Distinção entre Autor e Participante: Critério normativistaA: É aquele que realiza total ou parcialmente a conduta tipificada na lei

:

P: É aquele cuja conduta, não corresponde a nenhum comportamento típico Critério SubjectivistaA: É aquele que se sente como autor

:

P: É aquele que perante o facto exprime um animus acessório

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Teoria do domínio do facto (Welzel)

A: Só é autor quem tem o domínio do objecto

: Esta teoria aplica-se à generalidade das situações, contendo no entanto excepções:

P: Quem não tem o domínio do facto 2 elementos:

Positivo: Ter domínio do “se”, “como” e “quando” Negativo: Possibilidade de fazer gorar o facto, impedindo a sua realização.

Excepção- Pode ser autor de um crime de omissão imprópria, quem está vinculado ao dever de agir (posição de garante)

: Violação do vinculo do dever (quer de agir quer de não agir)

- É quem está sujeito ao vinculo do dever, de não cometer certos factos.

Autor Singular - Art.º 26.1

: Quem executa o facto por si mesmo, que tem o domínio da execução.

Co-autoria - Art.º 22

Na co-autoria o excesso na execução só é imputado ao co-autor executante, mas o acto de execução é imputado a todos os co-autores o que tem importância, para efeitos de se saber quando começa a tentativa de co-autor.

: Os agentes que têm o domínio do facto funcional, tendo cada um o domínio de uma parcela de execução do facto típico, seja por acordo ou juntamente com outro ou outros, quando (ambos) sabem (pode ser no próprio momento da realização e o conhecimento pode ser tácito), ou distribuem a execução do facto, tomando parte directa na execução, tendo domínio do “se”, “como” e “quando”.

Autoria Mediata - Art.º 26: É aquele que executa por intermédio de outrem, tem o domínio da execução, sendo o “autor atrás do autor”, pelo que o AM domina a vontade do autor imediato

1 - Casos em que o AI não pratica qualquer acção, casos de coacção física, vis absoluta, o executante é um instrumento da acção do AM.

, que tem o domínio da acção, sendo no entanto possíveis 3 grupos de situações possíveis:

2 - O AM, induz o AI em erro sobre o facto típico /art.º 16 e 17) 3 - Situações em que o AI, actua sem culpa, por ser inimputável ou por estado de necessidade desculpante (ex. do alpinista), em que o AM de aproveita de um estado de necessidade do AI, para este praticar o crime.

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4 - (Roxin) Quando o AI é um elemento fungível ao serviço do uma estrutura (aparelho) organizada de poder, sendo o AM o chefe, ex. da Máfia e SS É duvidosa no entanto esta teoria, pois apesar do AI não ter o domínio da vontade naquele momento, podia ter evitado tal situação de facto, pois quem pertence à organização aderiu voluntariamente, como é o caso da Máfia, e já devia saber as suas regras.

Tentativa do AM, 2 formas: - O AM pratica um acto de execução - Quando o AI pratica o primeiro acto de execução

2.3. A participação.

2.3.1. Fundamento da punibilidade do participante: teorias da acessoriedade, limitada e extrema (art. 28 e 29 do CP). O fundamento para a punibilidade do participante assenta em duas teorias de acessoriedade, a Limitada e a Extrema: Teoria Extrema

: O contributo acessório da vontade do participante vai até à corrupção da vontade do A. Esta teoria não pode ser aceite, pois de acordo com o art.º 29, ninguém participa na culpa de outro comparticipante.

Teoria Limitada

ex. B, que está a ser agredido, pede um pau a A, para repelir a agressão, mas neste caso o facto é licito por Legitima Defesa.

: O participante apenas contribui para a realização do facto típico ilícito e não da vontade de outro comparticipante, pois é o facto típico ilícito que é comunicável entre todos (de acordo com uma interpretação à contrário do art.º 29), assim, para que o participante seja punido só é necessário e suficiente que o facto seja típico e ilícito

Mas se A dá um pau a B que é inimputável, para que este agrida alguém, o facto não é culposo para B nem para A, pois o facto comunica-se mas a culpa não é comunicável. A punibilidade do participante está dependente da punibilidade do autor material, pois o participante não tem o domínio da execução, sendo a sua conduta acessória ou preparatória da prática do facto. 2.3.2. As formas de participação. a) A instigação (art°26 in fine do CP): forma de participação punida como autoria. b) A cumplicidade (art°27 do CP).

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Instigador - art.º 26:

Mas se o A, já está decidido a praticar o facto, e o instigador tiver só dolo em relação ao resultado, pode vir a ser punido como cúmplice moral, por ter reforçado a vontade do A, aconselhando e assim auxiliando este a praticar o facto, mas se tiver só dolo de motivação e não de resultado é agente provocador, o qual não é punível.

È equiparado para efeitos de punição ao autor, mas não é A, pois não tem o domínio do facto, art.º 26 in fine., assim o instigador, é aquele que determina outrem à prática do facto, cria no A, a vontade da prática do facto ilícito, através de um impulso específico (explicito) que o leva à prática do crime, cuja característica é ter duplo dolo, ou dolo do instigador, dado que: Quer criar no A, a vontade de praticar o facto e quer o facto.

Cúmplice - art.º 27

: É aquele que ajuda ou auxilia materialmente ou reforçando a vontade (neste caso cúmplice moral). O cúmplice tal como o instigador também tem duplo dolo, o do querer auxiliar o A, e o do querer o facto.

2.3.3. Participação tentada e participação na tentativa. 2.3.4. Participação por omissão e participação na omissão.

O garante que não é capaz ou não pode realizar o dever a que está obrigado, não pode ser responsabilizado, pois o domínio do facto, só está pensado para os crimes de acção. Quem não realiza o dever a que está vinculado, realiza o crime por omissão, autoria na omissão, pois poderia evitar o resultado por força do dever, pois se assim o quisesse tinha o domínio do facto. Co-autor por

Co-autor

omissão, é quando há uma acção e quem tem o dever de garante não actua.

na

omissão, neste caso não há acção, mas um perigo

Há autoria mediata na omissão, mas já não há por omissão, pois o AM, por erro pode dominar a vontade de quem tem a posição de garante, mas como o AM não é garante, só pode ser punido como cúmplice moral, pois aconselha o A, a não agir, o qual tem uma posição de garante.

2.4. O problema da comunicabilidade das qualidades ou relações especiais do agente que fundamentam ou agravam a ilicitude (art.º 28 do CP). O problema da comunicabilidade surge quer nos crimes específicos, que só podem ser cometidos por aquelas pessoas (descritas) ou nos crimes omissivos impróprios em que há uma posição de garante, mas como já vimos só o facto é

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que se comunica e não há comunicabilidade para a culpa, assim p. ex. se um juiz convence um irmão gémeo a vestir a sua toga e depois proferir determinado processo contrário ao direito que prejudica determinada pessoa, não haveria punibilidade se não fosse o art.º 28. ex. o agente que convence um pai a não agir para salvar o filho de morrer afogado, dizendo que é um golfinho que está a brincar, também não haveria punibilidade se não fosse a ficção jurídica do art.º 28, pois o pai estava em erro e o AM não tem posição de garante. O art.º 28.1 contém assim uma extensão da regra de acessoriedade, dizendo que quando a punibilidade depende da qualidade ou de relação especial, são comunicáveis entre os autores que tenham dela conhecimento, transmitindo-se assim a qualidade do participante para o A e co-autor e destes para o participante, assim no primeiro exemplo: Caso do juiz gémeo A, (extrameus), passa a ter a qualidade do juiz instigador (Intrameus) Caso do pai que tem a posição de garante passa esta para o participante , sendo este punido por autoria mediata. O art.º 28.2, aplica-se a crimes específicos e omissão imprópria, mas em que o juiz pode não aplicar a regra do art.º 28.1 ao Extrameus, como p. ex. Na violação do segredo de justiça, se for funcionário o ilícito é agravado em virtude da qualidade do agente, se o extrameus é instigador ou cúmplice, o juiz pode apenas considera-lo instigador ou cúmplice, podendo assim o participante ser punido pelo crime geral não agravado. 2.5. O erro sobre o papel do comparticipante: proposta de solução. Critério de resolução sobre o principio da culpa. Quem pensa que auxilia, que é cúmplice, mas na realidade está a praticar actos de execução, tendo assim o domínio do facto é objectivamente autor, nesta situação será punido como cúmplice segundo o seu dolo, pois a sua representação não é a de um acto de execução. Mas se pensa que está a executar, quando está apenas a auxiliar, sendo cúmplice, aqui também será punido por cumplicidade, pois só pode ser punido na medida da sua culpa que é um limite à punição. 2.6. O concurso entre várias formas de comparticipação no mesmo facto. Se o concurso for entre autor e cúmplice, temos uma situação de consunção, concurso aparente, sendo o agente punido pelo crime mais grave, mas só quando o facto típico é o mesmo

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Sumários de Direito Penal

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PARTE IV (parte do programa que não foi dada) TEORIA DAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO CRIME I. As penas 1. As penas principais

1.1. A pena de privação da liberdade 1.2. A pena de multa

2. As penas substitutivas 3. As penas acessórias II. A medida da pena 1. As fases de determinação da pena

1.1. Escolha da espécie de pena (art°70 do CP). 1.2. Determinação da medida abstracta da pena: estrutura essencial e estrutura acidental do crime; as circunstâncias modificativas. 1.3. Determinação da medida concreta da pena (o art° 71 do CP).

2. As regras específicas da reincidência (artº 75 e s. do CP) e da punição dos delinquentes por tendência (art°83 e ss. do CP) e alcoólicos e equiparados (art°86 e ss. do CP). III. As medidas de segurança (art°91 e ss. do CP).