sumårio - bruno-latour.fr · direito, na religi o1.e m cada caso, uma forma precisa de conta- mina...

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a SUMÂRIO DOSSIÊ POLiTICA,cIÊNcxA E TEcNoLoGIA Coordenaçâo: Tamara Benakouche Arîigo Se foléssemos um poucode polifico? BrunoLotou, ,.,...,,..,.,,.,,.., l l Arligo Dilemos do simelrio enfre confexlo sociol e conhecimenlo: o redefiniçôo dos modolidodes de obordogem soclolégico do problemo do conhecimenlo MoræsAntônioMottdi ,.,., ,,.,...,,.,...,,...41 Artigo Do unidodenolurql è insfobilidode dos hibddos: lmplicoçôes conceituqis do crise ombienfol sobre o seporoç6o moderno enfre ciêncioe polifico Césor Pessoo P imentel . Roso Mor io Leif e Ribeiro Pedro .......... ,.. 8I Artigo Comunidodes ou coletividodes? O fozer clentiflco no ero do lnformoç6o MoiroBoumgor-tat ..,,,.,,,97 Artigo Memérlo elelrônlco e desteniforiolizoçôo JoralosFeneiro . Aé+loArnoral ..,,,,,,, ]37 Artigo Mistlco, moglo e lécnlco FraruJoæf Br(M<e ...,.,,167 a

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Page 1: SUMåRIO - bruno-latour.fr · Direito, na religi o1.E m cada caso, uma forma precisa de conta- mina o, de concatena o, de conex o,d e media o, de veiculo - pouco importa o termo -

m Sociologia Politica

los.

utiliz.ada ou;a da editora

r a divulgaçâo de trabalhos

I e internacional na ârea da

ue isto sigrtifica um processo

como é o caso da sociedade

o da sua capacidade reflexiva.

:âo & Arte Visual

Jr.

I na fonte

litica / UniversidadeP6s-Graduaçâo em

Florian6polis :

ersidade Federal den Sociologia Politica.

D U : 3 1 6 . 3 3 4 . 3

)-14/071

URArla 303-Ai)233 5282a - Brasila.com.br

com.br

a

SUMÂRIO

DOSSIÊ POLiTICA, cIÊNcxA E TEcNoLoGIACoordenaçâo: Tamara Benakouche

Arî igoSe foléssemos um pouco de polifico?

BrunoLotou, , . , . . . , , . . , . , , . , , . . , l l

Ar l igoDilemos do simelrio enfre confexlo sociol e conhecimenlo:o redefiniçôo dos modolidodes de obordogem soclolégico doproblemo do conhecimenlo

MoræsAntônioMottdi ,.,., ,,.,...,,.,...,,...41

Ar t igoDo unidode nolurql è insfobilidode dos hibddos:lmplicoçôes conceituqis do crise ombienfol sobre o seporoç6omoderno enfre ciêncio e polifico

Césor Pessoo P imentel . Roso M or io Leif e Ribeiro Pedro ..........,.. 8 I

ArtigoComunidodes ou coletividodes?O fozer clentiflco no ero do lnformoç6o

MoiroBoumgor-tat ..,,,.,,,97

ArtigoMemérlo elelrônlco e desteniforiolizoçôo

JoralosFeneiro . Aé+loArnoral ..,,,,,,, ]37

Art igoMistlco, moglo e lécnlco

FraruJoæf Br(M<e ...,.,,167

a

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I

1

ResenàosExclusoo digitol: borreiro à universolizoçôo do democrocio?

Rodfl 'goRosslHo'ochor,ski.,.,,,....,.,, ...,21g

Convile o um bonquefe dionisiocoCinfioSon MorlinFernondes ,,......,.,,.. 22s

Umo viogem oo mundo (des)conhecido do InfemetAdqltoHerculqnoGuesser,,,.., ..,........ 231

RESUMOS/SUMMRIES

PublicoçôesNormos de publicoçôo poro os coloborodores ....,,.,..243

\[este seu quarto num!

I \ cujo tema tem ainda ppolftica das relaçôes entrese jâ no século XVtl Francirelaçôes, ao defender a exsaber e poder, hâ quem aconhecimento cientifico epaz de isolâ-la dos interessrprometidos, prdprios ao caestâ perdendo força, como

A b r e o d o s s i ê o a r t ica?", de Bruno Latouç autrproduçâo no campo da ncNeste artigo, porém, Latoumas discute os significadosdade resolveu publicâ-lo juaqui é demonstrar as inter,tecnologia, considerou-se otermo desta associaçâo. par

la forma de expressâo é sisto acontece porque emenunciaçâo politica do doneleitos e eleitores - e a pr6de uma argumentaçâo derdesse tipo de enunciaçâo, Iniçôes utilizadas pela Lingi

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Se foléssemosum pouco de polilico?.

'' Bruno Letour**

f leplora-se em todos os lugares a existência de um desinteres-

lJ se pela polftica. E se a famosa "crise de representaçào" vies-se simplesmente de uma incompreensâo sobre a natureza exatadeste t ipo de representaçâo? Como se t ivéssemos passado, hâalguns anos, a exigir dela uma forma de f idel idade, de exat idâo,

de verdade, que ela nâo poderia em caso algum oferecer. Comose o falar politico tivesse se tornado uma lingua estrangeira, pri-

vando-nos pouco a pouco de toda a possibi l idade de nos expri-mir. Seria possfvel , portanto, esquecer a pol i t ica? Longe de seruma competência universal do animal do mesmo nome, tratar-se- ia ela de uma forma de vida tâo frâgi l que poderfamos docu-mentar seu aparecimento e seu desaparecimento? Esta é a hi-potese que eu gostar ia de explorar neste art igo.

A hipdtese pode ser formulada de modo simples: tentandoexplicar a politica por outra coisa que ela mesma, perdemos suaespecificidade e, deste fato, esquecemos de manter seu movimentoproprio, abandonando seu estudo. Para reencontrar a preciosaeficâcia da palavra politica, é preciso partir da idéia de que, se-gundo a vigorosa expressâo de Mme. Thatcher, "a sociedade nâoexiste". . . Se ela nào existe, é preciso fazê-la. E se é preciso fazê-la,

Art igo publicado originalmente na revista Poli t ix, n. 58, 2002, Hermes SciencePublications, Paris, França. A presente traduçâo foi feita por Marcos AntônioMaftedi (FURB/SC) e Tàmara Benakouche (UFSC). Na versâo original, o autoragradece D. Boull ier pelos comentérios feitos ao texto.

" Professor e pesquisador do Centre de Sociologie de I'lnnovation, École NationaleSupérieure des Mines de Paris, França.

O)+

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Polltlca& Sociedade

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N

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z

é preciso estabelecer os meios para isto. A politica é um destesmeios. Ora, quando a Sociologia Pol i t ica se dâ por objeto expl i -car a politica pela sociedade, ela torna a politica superficial esubstituivel. Quando, ao contrârio, uma outra Sociologia Politi-ca se dâ por objeto explicar a pr6pria existência dos agregadossociais pelo trabalho da fala, da palavra polftica, esta se tornaimediatamente insubst i tuivel . Na pr imeira soluçâo, perdendo-se a politica, nâo se perde grande coisa; na segunda, perderia-mos toda a possibi l idade de nos agruparmos.

A ressurreiçâo recente de Gabriel Tarde permite contrastarmais vivamente duas sociologias absolutamente opostas: aque-las que supôem resolvido o problema da constituiçâo da socieda-de e aquelas que se dâo como objeto a frâgil e provisdria constru-

çâo dos agregados sociais. A primeira categoria, descendente deÉmile Durkheim, serve-se de explicaçôes sociais para dar contados comportamentos, incluindo os politicos; a segunda catego-ria, descendente de Târde, abstém-se de toda explicaçâo socialpara fazer emergir as formas de coordenaçâo a partir das media-

çôes prâticas. Eu chamo os primeiros de "sociologias do social" eos segundos de "sociologias da associaçâo" ou da "traduçâo".

Mas estas ûltimas nâo possuem somente vantagens. Comefeito, as sociologias da traduçào têm um problema com o qualas sociologias do social nâo estâo confrontadas, porque estas ûl-timas partem sempre da existência prévia dos agregados: comoas mediaçôes heterogêneas, tornadas manifestas pela pesquisa,

se reagrupam para formar coerências provis6rias? A questâo queGabriel Tàrde propunha a Durkheim torna-se mais complexa, por-que os sociôlogos da mediaçâo privaram-se voluntariamente detoda estrutura social preexistente para coordenar as interaçôes(Târde, 1999). A soluçâo mais fecunda, segundo meu ponto devista, consiste em procurar nos modos de desenvolvimento e dedesdobramento das mediaçôes a fonte dos tipos de coordenaçâo,posta pelas sociologias do social nas estruturas subjacentes oupreexistentes. É isto o que eu chamo de "regimes de enunciaçâo".Como mostrou Antoine Hennion, seguindo Howie Becker, existe,por exemplo, um regime estético de desenvolvimento das me-diaçôes muito especif ico aos mundos da arte (Becker, 1993).

p , l l - 4 0

Esforcei-me para seguir aJDireito, na religiâol. Em rminaçâo, de concatenaçâc- pouco importa o termo

çâo que a expressâo "laçc

De acordo com est(dos regimes de enunciaçâsobre o que é que circulialguém, de maneira pol i t rregime de enunciaçâo? Qrpolitica de se ligar? Por 1que dizem respeito a assrcomo eleiçôes legislativas,necessârias votar. Nâo prrque sai da boca de homerexistisse uma esfera ou undo econômico, do social, cnar por este termo o conjltituiçâo da politica ou do predores das escolas de Cinais, Direito Constituciona

A pol i t ica, como a ciem-se, é certo, em inst i turmultaneamente ao conjulgostaria justamente de surniçôes de inst i tuiçôes, decos, que nos deixar iam nconteûdo, para me fixar erparticular de continente. Pre nâo falarmos de maneiraencontrar em familia, nunpol i t icamente de uma qurdas palavras pronunciadagum modo ao domfnio p<

' Sobre a ciência, ver Latour, 19-cLatour (2002a); sobre o Direitc

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Se folÉssemos um pouco de politlco?

Eruno Lotour

tra isto. A politica é um destesPolitica se dâ por objeto expli-r torna a pol(tica superficial eo, uma outra Sociologia Pol i t i -ipr ia existência dos agregadospalavra politica, esta se tornar pr imeira soluçâo, perdendo-e coisa; na segunda, perderia-agruparmos.

abriel Tarde permite contrastarabsolutamente opostas: aque-:ma da constituiçâo da socieda-:to a frâgil e provis6ria constru-eira categoria, descendente deLicaçôes sociais para dar contars politicos; a segunda catego-n-se de toda expl icaçâo socialrordenaçâo a partir das media-ros de "sociologias do social" e;sociaçâo" ou da "traduçâo".

uem somente vantagens. Comtêm um problema com o qualconfrontadas, porque estas ûl-a prévia dos agregados: comordas manifestas pela pesquisa,ias provis6r ias? A questâo quen torna-se mais complexa, por-rivaram-se voluntariamente depara coordenar as interaçôes

unda, segundo meu ponto derdos de desenvolvimento e de)nte dos t ipos de coordenaçâo,nas estruturas subjacentes ouro de "regimes de enunciaçâo".;eguindo Howie Becker, existe,de desenvolvimento das me-ndos da arte (Becker, 1993).

Esforcei-me para seguir alguns outros, na ciência, na técnica, no

Direito, na religiâo1. Em cada caso, uma forma precisa de conta-

minaçâo, de concatenaçâo, de conexâo, de mediaçâo, de veiculo- pouco importa o termo - permite dar conta do tipo de associa-

çâo que a expressâo "laço social" deixa na confusâo.

De acordo com este programa de comparaçâo sistemâtica

dos regimes de enunciaçâo, gostaria de recolocar aqui a questâo

sobre o que é que circula quando falamos de qualquer coisa a

alguém, de maneira politica. Qual é a tonalidade pr6pria desteregime de enunciaçâo? Qual é o veiculo que transporta a formapolitica de se ligar? Por politica, nâo entendo as conversaçôesque dizem respeito a assuntos direta e explicitamente polfticos,

como eleiçôes legislativas, corrupçâo dos eleitos, leis que seriamnecessârias votar. Nào pretendo também restringir o termo ao

que sai da boca de homens e mulheres ditos politicos, como se

existisse uma esfera ou um dominio prdprio que se diferenciasse

do econômico, do social, do legal, etc. Também nâo quero desig-nar por este termo o conjunto de ingredientes que formam a ins-

tituiçâo da polftica ou do politico, como podemos definir nos cor-

redores das escolas de Ciências Politicas - relaçôes internacio-

nais, Direito Constitucional, relaçôes de força, etc.

A politica, como a ciência, o Direito ou a religiâo constitu-

em-se, é certo, em instituiçôes heterogêneas que pertencem si-multaneamente ao conjunto dos regimes de enunciaçâo, masgostaria justamente de suspender, por um tempo, todas as defi-

niçôes de inst i tuiçôes, de sujei to, de gênero, de agentes pol i t i -

cos, que nos deixar iam na dependência de um certo t ipo de

conteudo, para me fixar em um regime de palavra, em um tipoparticular de continente. Podemos ser deputados na assembléiae nâo falarmos de maneira politica. Inversamente, podemos nos

encontrar em famflia, num escritdrio, em uma empresa, e falarpoliticamente de uma questâo qualquer, mesmo que nenhuma

das palavras pronunciadas indique que elas pertencem de al-gum modo ao dominio politico.

I Sobre a ciência, ver Latour, 1995; sobre a técnica, Latour (1992); sobre a religiâo,Latour (2002a); sobre o Direito, Latour (2002b).

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c!

Ia

I

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I

Se pudéssemos definir com alguma precisâo este regime deenunciaçâo tâo particular, poderiamos assinalar os momentos, oslugares, os temas, as pessoas que de fato matraqueiam a politica,

sem sermos incomodados pela necessidade de saber se eles per-

tencem ou nâo àquilo que as Ciências Politicas designam por estenome. Se existe, como pretendem tantos comentaristas, uma "cri-

se do politico" ou uma "fratura social", isto talvez se dê pela faltade se chegar a diferenciar este regime de enunciaçâo do dominiomuito mais restrito do qual falam os eleitos e seus eleitores.

Forços e froquezos do polovro politico

A expressâo politica é sempre enganosa, e é por ai que seprecisa começar. Em termos de transferência de informaçâo exatae sem deformaçâo sobre o mundo social e natural, pode-se dizerque ela parece sempre apresentar um terrivel déficit. As banalida-des, os clichês, os apertos de mâo, as semiverdades, as semimen-tiras, as "belas frases", as repetiçôes, sobretudo as repetiçôes ddnouseam. É o carâ ter bana l , "c i rcu la r " , co t id iano, " f rouxo" ,

tautoldgico desta forma de fala que choca os brilhantes, os retos,os râpidos, os organizados, os vivos, os informados, os grandes,

os decididos. Quando dizemos que alguém ou alguma coisa é"politica", assinalamos de inicio esta desilusâo fundamental, comose nào pudéssemos avançar de maneira retil inea, razoâvel, râpi-da, eficaz, mas como se fôssemos obrigados a "levar em conta""todo um conjunto" de "fatores extra-racionais", dos quais nâocompreendemos claramente nem as bases nem os f ins, mas queconst i tuem uma massa obscura, mole, pesada, redonda, que colanos pés dos mais bem-intencionados e que aparenta, segundodizem, retê- los. A expressào " isto é pol i t ico" signi f ica inic ial-mente " isto nâo avança direi to", " isto nâo avança râpido"; elasubentende sempre que "se nâo t ivéssemos este fardo, alcança-riamos nosso fim mais diretamente".

Por que o torto, o pesado e o lento fazem tanto parte

desta forma de fala? Porque ela é sempre avaliada por outrasformas que nâo a compreendem. É impossivel usar o termo "po-l i t ica" sem que se seja imediatamente obrigado a just i f icé- lo,

p . l l - 4 0

como se fosse necessârirautor izar sua manifestaçi

Qual é este tr ibunsem cessar a expressâo pmeira aproximaçâo, pelascia, de exat idào, de ret iddo pensamento ret i l ineo,ausência de qualquer memar de comunicaçâo doubputador. É em relaçâo amito, que a expressâo polé torta, retorcida, espefta,ra, mutâvel. Quando um tremos que ele se comparee inteira. Se o falar polftic,que o torto é julgado pelr

Mesmo quando estecomparaçâo com outro pavezes é indispensâvel cecconduzir de maneira "pol is ir ivo às expressôes que sip romisso , o senso da tâ t icapacidade de compor, demos o Principe de Maqui:pela boa causa. Mas, mesrde algo melhor, por falta drparte das vezes, daremosvios em relaçâo à l inha rerf ie l , e acusaremos a profementira, de corrupçâo ou (de art i f ic io. Nos dois casosco aceita ser julgado por rcritérios de validade destesteoria da l inguagem de co,

Ora, enquanto avaliaveicular a politica pelo padrobrigados, de um jeito ou c

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alguma precisâo este regime demos assinalar os momentos, osde fato matraqueiam a politica,

cessidade de saber se eles per-

cias Politicas designam por estetantos comentaristas. uma "cri-

cial", isto talvez se dê pela falta

;ime de enunciaçâo do dominioos eleitos e seus eleitores.

vro politico

)re enganosa, e é por ai que sernsferência de informaçâo exata, social e natural , pode-se dizerum terrivel déficit. As banalida-

, as semiverdades, as semimen-ies, sobretudo as repetiçôes cdrcu la r " , co t id iano, " f rouxo" ,

e choca os brilhantes, os retos,'os, os informados, os grandes,

ue alguém ou alguma coisa éta desilusâo fundamental, comoaneira retil inea, razoâvel, râpi-

; obrigados a "levar em conta":xtra-racionais", dos quais nâoas bases nem os f ins, mas que

role, pesada, redonda, que colardos e que aparenta, segundo:o é pol i t ico" signi f ica inic ial-" isto nâo avança râpido"; ela

:ivéssemos este fardo, alcança-le" .

e o lento fazem tanto parte

é sempre avaliada por outrasÉ impossivel usar o termo "po-

mente obrigado a just i f icâ- lo,

Se foléssemos um pouco de politlco?

Bruno Lotour

como se fosse necessârio passâ-lo diante de um tr ibunal para

autor izar sua manifestaçâo.

Qual é este tr ibunal, esta pol ic ia desconf iada que vigia

sem cessar a expressâo pol i t ica? Podemos designâ-la, numa pr i-

meira aproximaçâo, pelas noçôes de informaçâo, de transparên-cia, de exatidâo, de retidâo e de representaçâo fréis. É o sonhodo pensamento ret i l ineo, da nâo-deformaçâo, da imediatez, da

ausência de qualquer mediador, daqui lo que eu gosto de cha-mar de comunicaçâo double cl ick - por alusâo ao mouse de com-putador. É em relaçâo a esta exigência, a este sonho, a estemito, que a expressâo pol i t ica deverâ sempre confessar que ela

é torta, retorcida, esperta, comprometedora, inf iel , manipulado-ra, mutâvel. Quando um termo pol i t ico sai da nossa boca, que-

remos que ele se compare a uma l inha reta de informaçâo plena

e inteira. Se o falar pol i t ico parece ser sempre enviesado, é por-que o torto é julgado pelo reto.

Mesmo quando este julgamento é favorâvel, é sempre em

comparaçâo com outro padrâo. Admit imos sem remorso que àsvezes é indispensâvel ceder às perturbaçôes necessârias e seconduzir de maneira "pol i t ica"; neste caso, damos um valor po-

sir ivo às expressôes que sinal izam a habi l idade, a arte do com-promisso, o senso da tât ica, a adaptaçâo às circunstâncias, a

capacidade de compor, de contornar. Se necessârio, invocare-mos o Principe de Maquiavel, pr incipe dos termos distorcidospela boa causa. Mas, mesmo neste caso, serâ sempre por fal tade algo melhor, por fal ta de se poder i r direto ao ponto. A maiorparte das vezes, daremos um valor negativo a todos esses des-vios em relaçâo à linha reta da informaçâo e da representaçâof iel , e acusaremos a profer içâo pol i t ica de dissimulaçâo e dementira, de corrupçâo ou de versat i l idade, de inautent ic idade ede art i f ic io. Nos dois casos, posi t ivo ou negat ivo, o falar pol f t i -

co aceita ser julgado por um juiz mais exigente, que def ine oscr i tér ios de val idade destes atos de fala, o que chamariamos emteoria da linguagem de condiçôes de felicidade.

Ora, enquanto avaliarmos os enunciados encarregados deveicular a politica pelo padrâo da palavra que comunica, seremosobrigados, de um jeito ou de outro, a falar de politica como uma

p . l l - 4 0 15

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Polftlca&Sociôdade

\No

I

z

mentira, necessâria, talvez, mas uma mentira de qualquer modo.Como retirar este fardo que temos sobre a lingua e que nos impe-de de avaliar nossa palavra politica segundo seus proprios crité-rios? Como falar desta enunciaçâo como uma forma, certamenteparticular, de veracidade, de dizer o verdadeiro?2

A soluçâo consiste num primeiro momento em nâo julgâ-la

em relaçâo a uma outra palavra. Cada regime de enunciaçâo ela-bora seus pr6prios critérios de verdade e de mentira, seus pr6-prios critérios de felicidade e de infelicidade. Dizer da palavrapol(tica que ela é "distorcida" nâo possui a mesma significaçâo setomarmos como modelo ideal de proferiçâo aquele da linha retaou aquele da linha torta. Para desenhar um quadrado, as linhasretas sâo bem riteis; mas elas nâo sâo cômodas para dar conta deuma elipse. No primeiro caso, o falar politico é julgado por umtipo de exigência que nâo lhe diz respeito em nada; no segundocaso, ele se faz, ele pr6prio, o juiz do que busca desenhar: seuproblema nâo é mais o de se afastar ou nâo da retilinea direita,mas de verificar se ele traça ou nâo uma boa curva. Nas caixas deferramentas dos programas grâflcos de nossos computadores,damos a nosso cursor a escolha de traçar linhas bem retas oucurvas bem envolventes. Jamais nos virâ ao espir i to julgar asqualidades de uma pelas das outras. Do mesmo modo, deveria-mos ser capazes de emancipar o falar politico da dominaçâo - daditadura - da palavra reta. Poderiamos encontrar as condiçôes defelicidade que lhe sâo prdprias? Tal é o fim deste exercicio.

Por que nos queixamos que os homens politicos "nâo dizema verdade"? Por que exigimos que eles sejam "mais transparen-tes"? Por que desejamos "que de agora em diante haja menos dis-tância entre os representantes e os representados"? Coisa aindamais incongruente: por que desejar que "os politicos nâo mudemsempre de opiniâo", "nâo 'virem a casaca' por um sim ou por umnâo"? Estas injunçôes, repetidas na imprensa como uma espéciede lamento, de murmtirio, de grito, de rendiçâo, possuem apenas

2 Desse ponto de vista, a situa$o da fata politica é semelhante à da fala religiosa,esta ûltima sendo também acusada de falsa, em contraste com o padrâo oferecidopela comunicaçâo double click Ver Latour (2002a).

o. l ' l - 40

a aparência de bom sensodade de um regime de paprop6sitos politicos jamastsa chave, de sua tonalidarcisamente os jornais ingle

Coloquemos f im, ard a d e - a u m a i m p o s t u r a :nenhum caso se apoiar nrpara defender seus direitcvra fiel. Se for preciso deque deveriamos dizer dori l t imos que eles digam ;sem instrumento, sem eqlsem redaçâo de artigo, serfr io, rapidamente, diantesentido. Se a exigência dena a compreensâo da cunque o estabelecimento datornaria ainda mais imprimediato nâo convêm nendelicadas montagens da pcientemente Gaston Bachtreto e transparente a lei :todos os cient istas nâo patodos os politicos de corrrepresentaçào" nâo tem niqual idade dos pol i t icos oumos impor o jugo da tranvisam a outros f ins. À qumesmo que se queixar da 1ele nâo é capaz de filtrar t

Se colocarmos de larente para nos interessarn

3 Ver também Latour (2001). É prnâo retira evidentemente naccontrério, esta objetividade. V

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Se lqlôssemos um pouco de politico?

Bruno Latour

ma mentira de qualquer modo.

; sobre a lingua e que nos impe-

:a segundo seus pr6prios crité-

) como uma forma, certamenter o verdadeiro?2

neiro momento em nâo julgâ-la

lada regime de enunciaçâo ela-

erdade e de mentira, seus pr6-

: infelicidade. Dizer da palavra

possui a mesma significaçâo seproferiçâo aquele da linha reta

senhar um quadrado, as linhas

sâo cômodas para dar conta defalar politico é julgado por um

respeito em nada; no segundoriz do que busca desenhar: seu

star ou nâo da retilinea direita,io uma boa curva. Nas caixas de

icos de nossos computadores,de traçar linhas bem retas ou

nos virâ ao espir i to julgar asras. Do mesmo modo. deveria-

àlar politico da dominaçâo - darmos encontrar as condiçôes de

àl é o fim deste exercicio.

os homens politicos "nâo dizemLe eles sejam "mais transparen-

rgora em diante haja menos dis-

os representados"? Coisa aindalr que "os politicos nâo mudemr casaca'por um sim ou por umra imprensa como uma espécie

c, de rendi$o, possuem apenas

polftica é semelhante à da fala religiosa,lsa, em contraste com o padrâo oferecidorr (2002a).

a aparência de bom senso: todas elas julgam as condiçôes de felici-dade de um regime de palavra por um outro. O ato de denegrir ospropdsitos politicos jamais seria possivel sem esta ignorância desua chave, de sua tonalidade pr6pria, de seu spin, como dizem pre-cisamente os jornais ingleses (mesmo se for para zombar dela).

Coloquemos fim, antes de qualquer coisa, a uma ambigûi-dade - a uma impostura: a informaçâo double click nâo pode emnenhum caso se apoiar nos jalecos brancos do método cientificopara defender seus direitos em representar a via retilfnea da pala-vra fiel. Se for preciso detestar os politicos por suas mentiras, oque deveriamos dizer dos cientistas? Com efeito, exigir destesriltimos que eles digam a verdade diretamente, sem laboratdrio,sem instrumento, sem equipamento, sem manipulaçâo de dados,sem redaçâo de artigo, sem congresso e sem disputa, sem mais, afrio, rapidamente, diante de todos, sem titubear, nus, nâo teriasentido. Se a exigência de uma verdade transparente e direta tor-na a compreensâo da curva politica impossivel, nâo esqueçamosque o estabelecimento das cadeias referenciais pelos cientistas atornaria ainda mais imprat icâvel. O direto, o transparente e oimediato nâo convêm nem às complexas misturas sâbias, nem àsdelicadas montagens da palavra politica, como demonstrou sufi-cientemente Gaston Bachelard3. Se quisermos fazer do caminhoreto e transparente a lei suprema de todo deslocamento, entâotodos os cientistas nâo passarâo de mentirosos e manipuladores,todos os politicos de corrompidos e de indecentes. A "crise derepresentaçào" nâo tem nada a ver com uma repentina perda daqualidade dos politicos ou dos sâbios: ela emerge quando quere-mos impor o jugo da transferência de informaçâo a prâticas quevisam a outros f ins. À questâo absurda, resposta absurda. É omesmo que se queixar da pobre qual idade de seu modem porqueele nâo é capaz de filtrar o café encomendado pela internet...

Se colocarmos de lado a exigência de informaçâo transpa-rente para nos interessarmos um pouco mais diretamente pelas

3 Ver também Latour (2001). É preciso lembrar que a multiplicidade das mediaçôesnâo retira evidentemente nada da objetividade das ciências, mas permite, aocontrârio, esta objetividade. Veç por exemplo, Galison (2002).

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Politlca&Sociedade

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I

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condiçôes de fel ic idade prdprias ao falar pol i t ico, descobrire-mos toda uma outra exigência de val idaçào. O falar pol i t ico s6aparece como uma mentira em contraste com outras formas deverdade; nele mesmo e por ele mesmo, ele discr imina o verda-deiro do falso com uma precisâo estupefaciente. Ele nâo é indi-ferente à verdade, como o acusam injustamente, mas di fere detodos os outros regimes no julgamento que faz sobre a val ida-

çâo. Qual é, portanto, a sua pedra de toque, sua prova? Ele visaa fazer existir aquilo que, sem ele, nâo existiria: o priblico comototal idade provisor iamente def inida4. Ou bem este pr ibl ico étraçado por um tempo, e a palavra disse a verdade; ou ele nâo oé, e a palavra foi pronunciada falsamente.

Verdadeiro e falso, em pol i t ica, nâo podem, portanto, sercomparados ao t ipo usual de val idaçâo que corresponde, de fato,a uma versâo desf igurada da referência douta. O grande bomsenso das f i loso f ias da l inguagem dese ja que, se uma f rasecorresponder a um estado de coisas, ela serâ verdadeira, e que

ela se tornarâ falsa se nâo exist i r nenhum estado de coisas quelhe corresponda. É assim que julgamos, nos manuais, a verdadeou a fals idade da frase "o rei da Franca é calvo": existe ou nâoexiste um rei na França, ele tem cabelos sobre o crânio ou elenâo os tem. Mas aquele que diz "eu os compreendi", "nds so-

mos uma grande fami l ia " , "nos queremos" , ou a inda, "nossa

empresa deve conquistar partes do mercado", aqueles que re-pe tem " todos jun tos , todos jun tos , todos ! " , nâo poder iam re-sist i r a um julgamento verdadeiro/falso do mesmo t ipo. No en-tanto, eles saberiam bem o que faz a di ferença entre os enun-ciados falsos e os verdadeiros, mas eles detectarâo esta verdadeou esta fals idade nâo na presença ou na ausência de uma refe-rência, mas, antes - e vamos compreendê-lo logo - em um fe-nômeno inteiramente novo: a retomada ou a suspensâo do traba-

"Pûblico" tem aqui o sentido dado por Dewey (1 927). Nào se trata daquilo que seopôe ao privado, mas daquilo que resulta das conseqûências inesperadas e invi-siveis das açôes. O pûblico nâo é, portanto, a vontade geral, nem o Estado, nemo "bem pûblico", mas apenas o que nos esopa, o que perseguimos cegamente epara cuja persegui@o autorizamos especialistas tâo cegos quanto nôs.

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lho cont inuo de del ineamt

esta palavra procura con

prolonga; é mentira tudo

Esta questâo da cr ia

do social , evidentemente,

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do, pelo laço, pelo envol

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pensâvel, visivel, viâvel e

Mas quando começ.que o torna tal , nâo vemc

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cas, jur idicas, rel ig iosas e

) Dai toda a importância, Paraanalisados por Boureau (.1990

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Sobre estes ûlt imos, ver, Por

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s ao falar pol i t ico, descobrire-e val idaçâo. O falar pol f t ico s6ontraste com outras formas denesmo, ele discr imina o verda-estupefaciente. Ele nâo é indi-m injustamente, mas difere deamento que faz sobre a val ida-a de toque, sua prova? Ele visa:, nâo exist i r ia: o pr ibl ico comonida4. Ou bem este pr ibl ico é'a disse a verdade; ou ele nâo olsamente.

l ica, nâo podem, portanto, serlaçâo que corresponde, de fato,[erência douta. O grande bomem dese ja que, se uma f raseisas, ela serâ verdadeira, e que'nenhum es tado de co isas que

lamos, nos manuais, a verdadeFrança é calvo": existe ou nâocabelos sobre o crânio ou ele"eu os compreendi", "nds so-queremos" , ou a inda, "nossado mercado", aqueles que re-os , todos ! " , nâo poder iam re-o/falso do mesmo t ipo. No en-faz a di ferença entre os enun-rs eles detectarâo esta verdadea ou na ausência de uma refe-npreendê-lo logo - em um fe--:moda ou a suspensôo do traba-

ervey ( I 927). Nâo se trata daquilo que sea das conseqi.iências inesperadas e invi-rto, a vontade geral, nem o Estado, nem:scapa, o que perseguimos cegamente ecial istas tâo cegos quanto nôs.

Se fqléssemos um pouco de potltico?

Bruno Lqtour

lho cont inuo de del ineamento e de mater ial izaçâo do grupo que

esta palavra procura const i tuir . É ver idico tudo aqui lo que o

prolonga; é mentira tudo aqui lo que o interrompe.

Esta questâo da criaçâo continua do priblico, as sociologias

do social , evidentemente, nâo a colocam nunca, porque todas

elas começam por admitir a existência prévia e indiscutivel dos

agregados sociais - qualquer que seja sua dimensâo: do indivi

duo à naçâo, passando pela cul tura, a sociedade, o Estado, o gru-

po de referência, etc. Para se interessar pelo modo prdprio da falapol i t ica, faz-se necessârio, como nos ensinou Harold Garf inkel(depois de Gabriel Tarde), renunciar a toda existência confirmada

dos grupos. Estes estâo sempre a se fazer e refazeç e um dos

meios de fazê-los existir, de fazê-los "acertar o ponto", como se

diz de um molho, é cercando-os, apreendendo-os, assenhoran-

do-se deles, reproduzindo-os, pelo exercicio sempre recomeça-

do, pelo laço, pelo envolvimento, pela curva do falar pol i t ico.

Sem esta enunciaçâo, simplesmente nâo existiria agregado socialpensâvel, visivel, viâvel e unificâvel).

Mas quando começamos a descolar o grupo do ato de fala

que o torna tal, nâo vemos mais para que serve o falar politico,

que parece supérfluo, redundante, parasitârio, em relaçâo à "rea-

l idade" das "relaçôes sociais" e dos "grupos", que aparecem en-

tâo como "roubados", " traidos" ou "dissimulados" pela "ret6r i-

ca" "artificial" da "pura polftica". Se existissem outros modos de

manter um grupo, entâo, com efeito, a politica nâo serviria para

nada, e poderiamos nos juntar sem medo ao coro unânime da-queles que desprezam esta forma escandalosa de retôr ica, este

spin. Mas aqueles que sabem que nâo existem outras mediaçôes

para engendrar provisor iamente o social devem respeitar com

um cuidado infinito as frâgeis formas das falas criadas pela artepolitica - como jâ o fizeram para as mediaçôes cientificas, técni-

cas, jur idicas, rel ig iosas e econômicasb.

Dai toda a importância, para mim, dos magnificos exemplos cuidadosamente

analisados por Boureau (1990, 1992, e mais recentemente,200l, part icularmen-

te os capitulos sobre a invençâo da fala politica).

Sobre estes ûlt imos, ver, por exemplo, Callon (1998).

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N0)b

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Dai compreenderemos melhor, talvez, por que a palavrapolitica nâo pode se superpor a uma esfera nem a um dominioparticular: aqueles da vida ou dos sujeitos politicos, aqueles doshomens e das mulheres politicas; para todo agregado, qualquerque seja ele, precisa-se de um trabalho de (re)apreensâo que exi-ge uma palavra curva, capaz de traçar, ou retraçar provisoriamen-te, seu invôlucro. Nào hâ agrupamento sem (re)agrupamento, nâohâ reagrupamento sem uma palavra mobi l izadora. Uma fami-l ia , um ind iv fduo mesmo, uma empresa, um labora t6r io , umate l iê , um p laneta , um organ ismo, uma ins t i tu içâo nâo têmmenos necessidade deste regime que um Estado ou uma naçâo,que um Rotary Club, uma orquestra de jazz ou um bando demarginais. Para que cada agregado se del ineie, se redel ineie, épreciso uma dose part icular de pol i t ica que lhe seja adaptada.Por conseqi iência, l imitar a fala pol i t ica à ûnica forma of ic ial devida pûbl ica signi f ica dizer que nâo existe nenhum outro agre-gado, nenhum outro agrupamento que aquele da naçâo ou doEstado, que os outros nâo precisam exist i r , ou mesmo, que elesdevem se manter vivos por outros meios, sui generis, desconhe-cidos por n6s, que nâo requerem mais a retomada tâo part icu-lar da enunciaçâo const i tuinte. Limitar iamos esta enunciaçàoapenas à esfera pol i t ica, sem oferecer meios aos demais grupospara eles também se manterem existentes.

Porticuloridodes do polovro polltico

Empregando a expressâo "fazer existir" o agregado por umapalavra de reagrupamento, aproximo-me perigosamente de umaexpressâo que gostar ia, entretanto, de evi tar: o performativo.Muito r i t i l , mas ut i l izada demais, esta expressâo dissimula a par-ticularidade deste performativo especifico. Consideremos o mo-vimento proprio deste " laço", deste envolvimento, desenhandoum esquema tedrico deste regime de enunciaçâo. Certos traçosvào nos parecer familiares, porque a Filosofia Politica os elabo-rou hâ muito tempo, outros vâo nos parecer ex6ticos ou incon-gruentes, outros, enfim, deverâo aparentar um certo frescor.

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Do ponto de vista di

çâo, da exatidâo e da fidelcirculo polftico parece incoescandaloso. De que se tr ;em um por um pr ime i ropol issêmico que logo def ium segundo trabalho, deque chamamos freqûentenchamarei. mais brutalmenlque nos esforçamos, por rjuntas as duas partes, quasticas: como obter uma reprtta-se da mesma questâo cotos diferentes do mesmo n

De inicio, conhecemcda e celebrada por toda anossos dias. É na contemplcontramos a expressâo da lipre buscada, sempre colocarido por inteiro, nâo existerei ta, no esquema - que r

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lhor, talvez, por que a palavra

uma esfera nem a um dominio; sujeitos politicos, aqueles dos;; para todo agregado, qualquer

balho de (re)apreensâo que exi-açar, ou retraçar provisoriamen-rento sem (re)agrupamento, nâoavra mobi l izadora. Uma fami-empresa, um labora tdr io , ummo, uma ins t i tu içâo nâo têmque um Estado ou uma naçào,

:stra de jazz ou um bando deJo se del ineie, se redel ineie, érolitica que lhe seja adaptada.,olitica à ûnica forma oficial derào existe nenhum outro agre-:o que aquele da naçâo ou dolm exist iç ou mesmo, que eles's meios, sui generis, desconhe-r mais a retomada tào part icu-Limitar iamos esta enunciaçâo'ecer meios aos demais gruposlx is ten tes .

rpo l i t i co

zer exist i r" o agregado por umamo-me perigosamente de umato, de evi tar: o performativo.ssta expressâo dissimula a par-;pecff ico. Consideremos o mo-;te envolvimento, desenhando: de enunciaçâo. Certos traçose a Filosofia Politica os elabo-ros parecer ex6ticos ou incon-tparentar um certo frescor.

Se fqléssemos um pouco de politlco?

Bruno Lotour

Figura 1

Do ponto de vista da retidâo, da transferência de informa-

çâo, da exatidâo e da fidelidade, o objetivo do que chamarei de

cfrculo politico parece incongruente, contraditdrio e até mesmo

escandaloso. De que se trata, de fato? De transformar o muitos

em um por um pr ime i ro t raba lho de representaçâo - te rmopol issêmico que logo def inirei mais precisamente; depois, por

um segundo trabalho, de retransformar o um em muitos, aquilo

que chamamos freqi.ientemente de exercicio do poder, mas que

chamarei, mais brutalmente, de obediência. Notemos desde jâ

que nos esforçamos, por meio deste esquema, para considerarjuntas as duas partes, quase sempre disjuntas, das Ciências Poli

ticas: como obter uma representaçào e como exercer o poder. Tra-

ta-se da mesma questâo colocada duas vezes, mas em dois pon-

tos diferentes do mesmo movimento circular - retornarei a ela.

De inicio, conhecemos bem a figura desse circulo, desenha-

da e celebrada por toda a Filosofia Pol(tica, dos gregos até os

nossos dias. É na contemplaçâo desta forma, com efeito, que en-

contramos a expressâo da liberdade, desta famosa autonomia sem-pre buscada, sempre colocada em drivida: se o circulo for percor-

rido por inteiro, nâo existe ordem recebida - semicirculo da di-

reita, no esquema - que nâo seja ao mesmo tempo produzida

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por aqueles que a recebem - semicirculo da esquerda. Estou livrequando ocupo, de um jei to ou de outro, ao mesmo tempo - e jâ

veremos como - o alto e o lado de baixo da figura. A politica étautol6gica, e nào mais como hâ pouco porque ela designariauma torrente de banal idades, mas porque ela diz sempre duasvezes a mesma coisa - e porque ela recomeça, sem medo de secansar. . . Segundo a concepçâo clâssica, eu sou auto-nomo (por

oposiçâo a hetero-nomo) quando a lei (nomos) é ao mesmo tempoaqui lo que eu produzo, por expressâo da minha vontade, e aqui-lo ao qual eu me conformo, por manifestaçâo da minha doci l i -dade. Quando esta coincidência é rompida, eu saio do estado del iberdade para entrar naquele de dissidência, de revolta, de insa-tisfaçâo ou de dominaçâo. A emancipaçâo mais entusiasmante ea dependência mais abjeta nâo se opôem. Elas qualificam o mo-vimento, a repetiçâo, o percurso ao longo desta figura, quer ocirculo se feche, quer nâo (inûtil precisar que esta forma circularnâo depende de modo algum da presença ou da ausência do apa-relho bem particular da eleiçâo: podemos encontrar milhares decasos de eleiçâo sem fala pol i t ica e, inversamente, mi lhares decasos nos quais traçamos com precisâo este circulo sem jamais

proceder a um voto) (Abelès, 1990).

Mesmo se a figura do circulo nos é familiar, ela deveria, noentanto, nos horrorizar, na medida em que este movimento con-trafeito - "forçado", dir-se-ia em mecânica - é totalmente impra-ticâvel. O movimento de autonomia é impossivel por construçâo,porque a multidâo nele se torna um - é a representaçâo - antesque a unidade se torne mult idâo - é a obediência. Esta transmu-taçâo é ainda bem mais improvâvel que aquela do dogma datransubstanciaçâo da hôst ia. Na ida como na volta, a unidadetorna-se o mriltiplo e inversamente. A heteronomia faz, portanto,parte do cfrculo, o que expressei no esquema pela superposiçâode vdrios circulos confundidos no topo. Mais exatamente, a figurada autonomia - obedecer à sua prôpria lei - dissimula o trabalhode metamorfose, de traduçâo, da representaçâo, bem como o daobediência: aquele que fala em nome de todos deye necessaria-mente froir aqueles que representa, sem o que nâo obteria a trans-formaçào da multidâo em unidade; em troca, aqueles que obede-

o . l l - 4 0

cem devem necessariamenque eles apenas repet ir i :Di to de outra forma, ouefetivamente se fecha, oude informaçào, e jamais rpolitica veridica - no sen

como o movimento perpt

Assim, por um para

autonomia seria impossivepre produz nas pessoas rade, esta virtude suprema, Iparece mais que um defeibre a politica.nâo tem ou1mia e da l iberdade dissimda traiçâo, da transmutaçâresultado esconde a horrir

Para ampl iar um pr

observar o que acontecerita, exigissemos beatamend â o , a i m e d i a t e z e o n a t umos reto; se, em lugar detas que representassem fi

Suponhamos que evez, nâo se trata de pesso

nome, mas da funçâo poquer grupo) que eles "fala

te" aqui lo que dizem seurpular". O que aconteceriaa mult idào permaneceria

repet ir ( f ie lmente para a ia politica) a mesma coisaporém, o que reclamamcquando exigimos dos popovo", que eles "pareçam

car a eles", que nâo "haj;

eles "ponham um fim nadade", que provem que

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ricirculo da esquerda. Estou livrer outro, ao mesmo tempo - e jâ

de baixo da figura. A politica éâ pouco porque ela designariaas porque ela diz sempre duasela recomeça, sem medo de serlâssica, eu sou aafo-nomo (pora lei (nomos) é ao mesmo tempo:ssâo da minha vontade, e aqui-' manifestaçâo da minha docili-I rompida, eu saio do estado dedissidência, de revolta, de insa-rncipaçào mais entusiasmante ee opôem. Elas qual i f icam o mo-r ao longo desta figura, quer oprecisar que esta forma circular)resença ou da ausência do apa-rodemos encontrar mi lhares dea e, inversamente, mi lhares derecisào este circulo sem iamaisr0) .

Lo nos é famil iar, ela deveria, noLa em que este movimento con-mecânica - é totalmente impra-r ia é impossivel por construçâo,lm - é a representaçâo - antes- é a obediência. Esta transmu-âve l que aque la do dogma daida como na vo l ta , a un idadee. A heteronomia faz, portanto,no esquema pela superposiçâotopo. Mais exatamente, a figura'opr ia lei - dissimula o trabalhorepresentaçâo, bem como o daome de todos deye necessaria-r, sem o que nâo obteria a trans-); em troca, aqueles que obede-

Se foléssemos um pouco de politlco?

Bruno Latoul

cem devem necessariamente transformar a ordem recebida, sem oque eles apenas repet ir iam a injunçâo, sem colocâ-la em obra.

Dito de outra forma, ou existe uma dupla traiçâo, e o circulo

efetivamente se fecha, ou existe a fidelidade, transferência exata

de informaçâo, e jamais o circulo serâ completado. Uma palavra

politica veridica - no sentido da informaçâo - é tâo impensâvel

como o movimento perpétuo ou a quadratura do circulo...

Assim, por um paradoxo inaudito, sem esta dupla traiçâo a

autonomia seria impossivel, o que explica muito o horror que sem-pre produz nas pessoas razoâveis a irrupçâo da politica: a liberda-

de, esta virtude suprema, depende de um trabalho prévio, que nosparece mais que um defeito, uma odiosa impostura. A dûvida so-

bre a politica.nâo tem outra origem: as dignas figuras da autono-

mia e da liberdade dissimulam o terrivel trabalho da composiçâo,

da traiçâo, da transmutaçâo e da metamorfose. A autonomia como

resultado esconde a horrivel cozinha da heteronomia.

Para ampliar um pouco mais este paradoxo, é suficiente

observar o que aconteceria com o circulo se, na ida como na vol-

ta, exigissemos beatamente a fidelidade, a transparência, a reti-

dâo, a imediatez e o natural; se, no lugar do falar curvo, falâsse-

mos reto; se, em lugar de fechar o inv6lucro, desenhâssemos re-

tas que representassem fielmente, em vez de "trair" e "mentir".

Suponhamos que exigissemos dos pol i t icos (e, mais umavez, nâo se trata de pessoas que têm esse oficio e que levam este

nome, mas da funçâo pol i t ica associada à composiçâo de qual-

quer grupo) que eles "falassem verdadeiro" "repetindo exatamen-te" aqui lo que dizem seus mandantes "sem os trair e nem mani-pular". O que aconteceria? O "muitos" permaneceria o "muitos",

a mult idâo permaneceria a mult idâo; nào far iamos mais do que

repetir (fielmente para a informaçâo e, portanto, falsamente para

a pol i t ica) a mesma coisa duas vezes. Exigência absurda? É isto,porém, o que reclamamos todos os dias, em alto e bom tom,quando exigimos dos polf t icos que eles f iquem "pr6ximos dopovo", que eles "pareçam conosco", que possamos "nos identifi-

car a eles", que nâo "haja mais distância entre eles e n6s", que

eles "ponham um fim na fratura social", graças à sua "autentici-

dade", que provem que eles "sâo iguais a nds". Demandando

23p , l l - 4 0

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Polftlca& Sociedade

aoÈ

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transparência, retidâo e fidelidade pedimos que o circulo nâo sejamais um circulo, mas uma l inha reta, graças à qual o mesmopermaneceria exatamente o mesmo, na mais perfeita (e mortal)similitude. Na prâtica, isto significa pedir o fim da politica, e, porconseqûência, o fim da autonomia tâo louvada, porque - a mul-t idâo jamais sabendo como tornar-se uma - nào haveria maisganho de representaçâo. Uma representaçâo fiel (no sentido pro-metido da informaçâo double click), se ela fosse possivel, trairia opr6prio objeto da fidelidade pol(tica. É preciso escolher entre aautenticidade, perseguida em suas conseqtiências mais extremas,e o dificil trabalho da liberdade, que exige uma forma particularde "mentira", ou em todo caso, de curvatura.

O paradoxo torna-se ainda mais intenso se imaginarmosagora, em troca, as politicas que teriam a pretensâo atordoante dese verem "fielmente obedecidas". Desta vez, é a passagem do umao muitos que seria impraticâvel: exigiriamos da ordem dada queela fosse exatamente, diretamente, fielmente transpor[ada sem trai-

çâo, deformaçâo, viés, ou traduçâo! Pediriamos que a ordem fosseexecutada sem acréscimo, nem subtraçâo. Sabemos que isto é im-p o s s i v e l , p o r q u e o s h u m a n o s , c o m o n o s e n s i n o u L u d w i gWittgenstein, nâo seguem jamais as regras, mas "bordam" sobre odesenho que elas fornecem. Nada poderâ fechar aquilo que DonNorman chama "o abismo da execuÇâo" (Norman, 1988).

Figura 2

p . l l - 4 0

Aliâs, mesmo se isso fseguissem as regras, aindaporque é a multiddo que dâ opor este outro abismo, paratanciaçâo, nâo podemos cormelhança de forma entre o eda multidâo: nâo somente tmas, sobretudo, porque o "u"mentira" sâo tâo necessâria

Demandar que uma orpediç ai também, o circulobusca da autonomia. Essa irém, os pol i t icos de se qurcompreendidos", de teremnào "terem demonstrado sut ido tempo de apl icar seu 1tam sem cessar da "fratura"

terpretamos mal aqui lo quesem o que, como os comPrexige dos cidadâos que elessent ido que cidadâos exiginsentem f ielmente: a dupla i r :co meio de fechar o circulo -

ra 2. Donde o pavor que carcesso politico. Para evitar seMedusa, faremos tudo para isa cur iosa: mais o tempo painformaçâo double c/ick, maisdiçôes especificas de felicidiao ponto em que falar destasivel quanto repet ir propôsit

buscar outras causas para a'

Percorrer o coniunto do

Se este movimento cir<aos nossos olhos modernos s

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redimos que o circulo nâo sejareta, graças à qual o mesmoo, na mais perfeita (e mortal)pedir o fim da politica, e, por

tâo louvada, porque - a mul-r-se uma - nâo haveria mais:sentaçâo fiel (no sentido pro-

se ela fosse possivel, trairia o

ca. É preciso escolher entre aconseqiiências mais extremas,.re exige uma forma particular

curvatura.

mais intenso se imaginarmosiam a pretensâo atordoante deesta vez, é a passagem do umxigirfamos da ordem dada que

ielmente transportada sem trai-Pediriamos que a ordem fosse:raçâo. Sabemos que isto é im-como nos ens inou Ludwigregras, mas "bordam" sobre o

poderâ fechar aquilo que Don

çâo" (Norman, 1988).

Se foléssemos um pouco de polifico?

Bruno Lqtour

Aliâs, mesmo se isso fosse possivel, mesmo se os humanosseguissem as regras, ainda nâo chegariamos a fechar o circulo,porque é a multiddo que dâ o impulso, e ndo a unidade. Para trans-por este outro abismo, para saltar por cima desta outra transubs-tanciaçâo, nâo podemos confiaç por definiçâo, em nenhuma se-melhança de forma entre o enunciado de um e a passagem à açâoda multidâo: nâo somente porque as palavras se tornam açôes,mas, sobretudo, porque o "um" torna-se o "muitos". A traiçâo e a"mentira" sâo tâo necessârias na volta como na ida.

Demandar que uma ordem seja f ie lmente obedecida é im-pedir, ai também, o circulo de se fechar e tornar impossivel abusca da autonomia. Essa inverossimi lhança nào impede, po-rém, os pol i t icos de se queixarem sem cessar "de serem malcompreendidos", de terem "expl icado mal sua mensagem", denâo "terem demonstrado suf ic iente pedagogia", de "nâo teremtido tempo de apl icar seu programa". Eles também se lamen-tam sem cessar da "fratura" e da "crise" de representaçâo: "in-terpretamos mal aqui lo que eles dizem"! Ora essa, fel izmente,sem o que, como os compreenderiamos?! Um mandatâr io queexige dos cidadâos que eles obedeçam f ielmente nâo tem maissent ido que cidadâos exigindo dos pol i t icos que eles os repre-sentem f ielmente: a dupla inf idel idade, a dupla traiçâo é o ûni-co meio de fechar o circulo - mantida em superposiçâo na Figu-ra 2. Donde o pavor que causa sempre a simples visâo do pro-cesso politico. Para evitar sermos petrificados por esta face daMedusa, faremos tudo para ignorar o monstruoso impacto. Coi-sa cur iosa: mais o tempo passa, mais se estende o império dainformaçâo double c/ick, mais aumenta a incongruência das con-diçôes especificas de felicidade da polftica. Chegaremos ralvezao ponto em que falar desta maneira parecerâ tâo incompreen-sivel quanto repet ir prop6sitos rel igiosos. Serâ mesmo precisobuscar outras causas para a "cr ise de representaçâo"?

Percorrer o conjunto do circulo de representoçôo

Se este movimento circular é tâo impossivel, se ele pareceaos nossos olhos modernos saturados de inform açâo double click

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como uma impostura, como se fecha, entâo, o trabalho na verda-de bem real da autonomia? Por quais proezas inumerâveis pes-soas conseguem, todos os dias, resolver na prâtica esta quadraturado circulo, insolûvel na teoria? A razâo estâ no novo significadoque é preciso dar ao termo re-presentaçâo. Este, em politica, nâodesigna qualquer semelhança entre o representado e o represen-tante, o que nâo teria nenhum sentido, mas designa o recomeçodo pr6prio movimento da quadratura. O ûnico meio de colocarum fim à impostura constitutiva da fala politica consiste em reto-mor o bastâo de peregrino e traçar novamente o circulo impossivel, testando de outra maneira a dupla traiçâo.

A pol i t ica é uma impostura, é certo; que a vir tude da au-tonomia s6 pode ser conquistada ao preço do mal fundamentalda traiçâo, na ida como no retorno, também é uma coisa admi-t ida; sem nenhuma driv ida, a mentira - em oposiçào à verdadepretensamente fâci l da transferência f ie l de informaçâo - fazparte integrante do trabalho de composiçâo; sabemos bem queexigir de um porta-voz que ele "diga a verdade", que ele seja"autênt ico" termina por matar o p16prio trabalho de transubstan-ciaçâo. Mas isto nâo quer dizer que seja suf ic iente mentir ou seruma moeda falsa para se tornar um bom pol i t ico! Isto ser ia muitofâci l . . . O pr incipe dos termos distorcidos ter ia simplesmente subs-t i tuido o cavaleiro branco da transparência. A dissimulaçâo, oopor tun ismo, o popu l ismo, a cor rupçâo, o b izant ismo, a a r tedos compromissos e das combinazione nâo sâo suf ic ientes, por

si mesmas, para assegurar a cont inuaçào do circulo. Podemoscaminhar enviesados, pensar em curva, i r de lado, ser manho-sos, sem no entanto desenhar o circulo pol i t icoT. Nào é porquediferem igualmente da l inha reta que os movimentos de envolvi-mento se assemelham. Os "espir i tos curvos" se dist inguem muitobem uns dos outros, mesmo se todos sâo, indi ferentemente,objeto de escârnio dos "espir i tos retos".

Contudo, poderiamos levantar a hipôtese de que a surpreendente confiança doseleitores em seus eleitos se deve a um teste sobre o "grau de curvafura" de suafala: com os corrompidos sabe-se, pelo menos, que eles nâo vào, como os inte-gros, encher os ouvidos do pûblico com um discurso pedagdgico "reto"; que elesnâo levarâo o ptiblico de volta aos bancos da escola primâria.

A especif ic idade dque ele traça um cfrcul ,no fato de que ele resoles ta impra t icab i l idade,subversiva, esgotante dr

çâo deve-se a esta di fesuspensdo do movimentovoz ver idico nâo é aquelé mais obedecido que oos ou t ros , mas aque le q tpercorre com novos custda mul t idâo à un idade,vezes, na ida como na vtre a mult idâo e sua unmandatâr ios , o ma is corb io dos e le i tos , o ma is inâr io dos delegados cono percurso e se pôe a resperando ser obedec id rfato e de uma vez por to(

Mentira e verdade ;palavras pronunciadas, rrgar a impossivel tarefa dque permite ao circulo srnâo pode fazê-lo, porqu!representada e que jamai

uma mul t idâo , que fa râ ,daqui lo que lhe foi order

Para descrever este Ipermite realizar praticamt

te impossivel, contraditorproximo de autonomia, mbrilhante: o de autophuos,dramento (é o mesmo ver"fisica"). Encontramos eslsagem-chave do Gorgias

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ha, entâo, o trabalho na verda-

uais proezas inumerâveis pes-

rlver na prâtica esta quadratura

razâo estâ no novo significado

entaçâo. Este, em politica, nâo

3 o representado e o rePresen-

rtido, mas designa o recomeço

ilra. O ûnico meio de colocar

r fala politica consiste em reto'

r novamente o circulo imPossi-

rpla traiçâo.

, é certo; que a virtude da au-

ao preço do mal fundamental

ro, também é uma coisa admi-

r t i ra - em oposiçâo à verdade

ncia f ie l de informaçâo - faz

omposiçâo; sabemos bem que

diga a verdade", que ele seja'ôpr io trabalho de transubstan-

re seja suficiente mentir ou ser

r bom polf t ico! lsto ser ia muito'c idos ter ia simplesmente subs-

nsparênc ia . A d iss imu laçâo, o

rrupçâo, o bizant ismo, a arte

zione nâo sâo suficientes, por

t inuaçâo do circulo. Podemos

curva, i r de lado, ser manho-

: frculo pol i t icoT. Nâo é porque

lue os movimentos de envolvi-

)s curvos" se dist inguem muitotodos sâo, indi ferentemente,retos".

e de que a surpreendente confiança dos

este sobre o "grau de curvatura" de sua

menos, que eles nâo vâo, como os (nte-

rm discurso pedag6gico "reto"; que eles

s da escola primâria.

A especificidade do circulo politico nâo estâ no fato de

que ele traça um circulo - impossivel por construçâo -, mas

no fato de que ele resolve prat icamente esta impossibi l idade,

es ta impra t icab i l idade, pe la repet içdo obs t inada, incessante ,

subversiva, esgotante do trabalho de representaçâo. A dist in-

çâo deve-se a esta di ferença, percebida mais acima, entre a

suspensdo do movimento de repetiçâo e seu recomeço. O porta-

voz ver idico nâo é aquele que tem razâo contra os outros, que

é mais obedecido que os outros, que enxerga mais longe que

os outros, mas aquele que se pôe a dizer o verdadeiro porque

percorre com novos custos o conjunto do movimento que vai

da mul t idâo à un idade, depo is des ta àque la , ver i f i cando duas

vezes, na ida como na volta, que nâo existe relaçâo direta en-

t re a mul t idâo e sua un idade. Inversamente , o ma is f ie l dos

mandatâr ios, o mais conf iâvel dos representantes, o mais sâ-

b io dos e le i tos , o ma is insp i rado dos d i r igen tes , o ma is v is io -

nârio dos delegados começa a mentir sempre que interrompe

o percurso e se pôe a exp lo rar um t ipo de cap i ta l po l i t i co ,

esperando ser obedecido, conf iando no fato de que ele é de

fato e de uma vez por todos o porta-voz da multidâo.

Mentira e verdade nâo tratam, portanto, do conterido daspalavras pronunciadas, mas da capacidade de parar ou prolon-

gar a impossivel tarefa de fusâo, de traduçâo, de metamorfose

que permite ao circulo se fechar - enquanto, por def iniçâo, ele

nâo pode fazê-lo, porque a mult idâo serâ sempre inf ielmente

representada e que jamais, jamais! a ordem serâ obedecida por

uma mult idâo, que farâ, forçosamente, outra coisa di ferente

daqui lo que lhe foi ordenado.. .

Para descrever este movimento de repetiçào incessante, que

permite realizar praticamente aquilo que permanece teoricamen-

te impossivel, contraditorio, os gregos dispunham de um termopr6ximo de autonomia, mas que nâo teve a mesma descendência

brilhante: o de autophuos, que podemos traduzir por auto-engen-

dramento (é o mesmo verbo phuo que ressoa também na palavra

"fisica"). Encontramos esta expressâo estupefaciente numa pas-

sagem-chave do G6rgias que recentemente comentei em deta-

Se foléssemos um pouco de poliiicq?

Bruno Latour

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lhe8. S6crates nâo compreende o sentido do que ele ridiculariza,fingindo tomar esta repetiçâo por um simples eco, pelo qual osofista, aqui seu inimigo crimplice Calicles, nâo faz mais que se-gui-lo servilmente, que minar as hesitaçôes da multidâo, da ple-

be. Para S6crates, o autophuos nâo é mais que uma tautologiavazia. Ora, apesar de seus sarcasmos, autophuos e autonomia sâotermos ligados de tal sorte que somente o primeiro permite rea-lizar o segundo. A servilidade nâo é mais que um dos valores quepode assumir esta dupla metamorfose simbolizada pelo cfrculo -

que chamariamos hoje de demagogia ou popul ismo. Mas exis-tem outras, todas precisamente as que permitem realizar a duplatransformaçâo dos muitos em um e do um em muitos.

O fato de que esta operaçâo seja impossivel aos olhos deS6crates, o primeiro a tentar substituir a palavra curva pela viaretilinea da Epistemologia, nâo impede que seja absolutamentenecessârio chegar a realizâ-la para falar o politico, mesmo ao preço

de uma ruptura radical com os ditames da razâo pensante. Todacapacidade de uma palavra para (re)agrupar depende da manuten-

çâo desta pequena diferença entre a tautologia e o autophuos, entreo que diziamos hâ um instante e aquilo que dizemos agora, entreos percursos do circulo e a repetiçâo obstinada deste percurso.

Podemos atribuir duas fontes ao horror que pode suscitar oautophuos: a primeira, normal e positiva, vem do barulho continuoda âgora, do tumulto da multidâo, da dificuldade para escutar tan-tas vozes, de se fazer entender e de obedecê-las, de ser obrigado adecidir em tempo real, na grandeza de tamanho verdadeiro, emescala um, sem conhecimento seguro das causas e conseqûências- constrangimentos particulares à fala politica, sempre sublinha-

8 EmPondora'sHope (1999),capitulosTe8:"seacreditaquealguémvailhetrans-mitir um tipo de conhecimento especializado que lhe permitirâ adquirir poder aqui,mesmo se você nâo estâ de acordo com nosso sistema de governo (quer você sejamelhor ou pior do que ele), penso que você se engana, Célides. Se pretendeestabelecer alguma forma de relacionamento simpâtico e construtivo com osatenienses... EntÂo,nâo basta imitd-los:você deve ser igual a eles por natureza [...1.Em outras palawas, deveria ser capaz de eliminar toda diferença entre eles e você

[...]; isto o tomaria um retdrico e o tipo de politico que você aspira se4 porque todomundo gosta de ouvir suas prôprias opiniôes em um discurso e se irrita com aquiloque nâo conhece - a menos que você nâo esteja de acordo, meu amigo." (513a-c).

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dos pelos sofistas (Cassin,nhecido pela maior partedele publicamente por cau:ciso esperar que eles se repara que captemos parcela

A segunda fonte, inteçào artificial que imaginamserena da conversaçâo polirda pela escuta dos interessecomo as condiçôes ideais deEsta segunda fonte, e somerzo que endereçamos àquelespolitica. Desde Socrates, copoderiam fazer outra coisa rrem, como se existisse emtranscendência: a razâo perao tumulto da égora. Por e:"elevar o debate", a "tornalrac iona l " , nâo se pre tendtranscendência particulaç ar

S im, a enunc iaçâo ppr ia t ranscendênc ia , minûrpermi te jamais reencont raformaçâo, no mesmo estama maneira fazer ferver orpor t ra içôes sucess ivas , d rou t ra fo rma, do um ao nadmi râve is t ranscendênc ian i t ranscendência da pol i t i rme i ra nâo é mais que umasat is faz amplamente na i l r

7 Esta é grande liçào de Lippann (1les que defenderam a politica cuSpinoza, Lippann - foram aorsad,apenas se esforçavam para descccondiçôes prâticas que poderiatNoortje Marres por me ter apres

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ntido do que ele ridiculariza,um simples eco, pelo qual o.alicles, nâo faz mais que se-sitaçôes da multidâo, da ple-é mais que uma tautologia

s, autophuos e autonomia sâoente o primeiro permite rea-mais que um dos valores quese simbolizada pelo circulo -

gia ou popul ismo. Mas exis-ue permitem realizar a duplado um em muitos.

seja impossivel aos olhos detuir a palavra curva pela via,ede que seja absolutamentear o politico, mesmo ao preçones da razào pensante. Todagrupar depende da manuten-autologia e o autophuos, entrer i lo que dizemos agora, entreobst inada deste percurso.

ro horror que pode susci tar oiva, vem do barulho continuor dificuldade para escutar tan-rbedecê-las, de ser obrigado ade tamanho verdadeiro, em

r das causas e conseqûênciasr la polf t ica, sempre subl inha-

5e acredita que alguém vai lhe trans-que lhe permitirâ adquirir poder aqui,

;o slstema de governo (quervocê sejarcê se engana, Glides. Se pretendento simpâtico e construtivo com osdeve ser igual a eles por natureza 1...1.ninar toda diferença entre eles e vocêlftico que você aspira ser, porque todo; em um discurso e se irrita com aquiloteja de acordo, meu amigo." (513a-c).

Se fqléssemos um pouco de politico?

Bruno Latour

dos pelos sofistas (Cassin, 1995). Este horror, constitutivo, é co-nhecido pela maior parte dos polf t icos, mas eles jamais falarâodele publicamente por causa do desprezo que lhe dirigimos. É pre-ciso esperar que eles se recolham ao sossego de seus escritdrios,para que captemos parcelas deste admirâvel saber.

A segunda fonte, inteiramente diferente, provém da compara-

çâo artificial que imaginamos entre a confilsâo da âgora e a calmaserena da conversaçâo policiada, que conduz a uma decisâo pensa-da pela escuta dos interesses divergentes fielmente representados -

como as condiçôes ideais de comunica$o inventadas por Habermas.Esta segunda fonte, e somente ela, é que é responsâvel pelo despre-zo que endereçamos àqueles que se dedicam à algazarra da proferiçâopolitica. Desde S6crates, com efeito, fingimos crer que os politicospoderiam fazer outra coisa que falar atravessado e trair o que quise-rem, como se existisse em alguma parte uma fonte miraculosa detranscendência: a razâo permitindo levar um pouco de bom sensoao tumulto da âgora. Por esta operaSo, que visaria oficialmente a"elevar o debate", a "tornar razoâvel", a "permanecer entre genterac iona l " , nâo se pre tende mais , na verdade, que e l im inar atranscendência particulan aut6ctone, arriscada do autophuos.

Sim, a enunciaçâo pol i t ica possui, ela também, sua pr6-pr ia transcendência, minûscula, essencial , decisiva, nat iva, quepermite jamais reencontrar duas vezes o colet ivo, o grupo emformaçâo, no mesmo estado. Aqui lo que lhe permite de algu-ma maneira fazer ferver ou fermentar, de vol tar assim a passarpor t ra içôes sucess ivas , do mûl t ip lo ao um, e depo is , de umaout ra fo rma, do um ao mûl t ip lo . Cer tamente , comparada àsadmirâveis transcendências prometidas pela razâo reta, a mi-ni transcendência da pol i t ica é bastante tênue, mas como a pr i-meira nâo é mais que uma i lusâo, a luz que projeta a segundasat isfaz amplamente na i luminaçâo do caminho9. A minr iscula

9 Est" é grande liçâo de Lippann (1 922). Ali6s, é chocante constatar que todos aque-les que defenderam a politica curva - os sofistas inicialmente e depois Maquiavel,Spinoza, Lippann - foram acusados de ser profundamente antidemoqatas, quandoapenas se esforçavam para descobriç nas difiorldades sombrias da fala politica, ascondiçôes prâticas que poderiam permitir o exercfcio da democracia. AgradeçoNoortje Marres por me ter apresentado seu trabalho sobre Lippann.

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d i ferença entre tautologia e autophuos basta para assegurar alen ta des t i laçâo da au tonomia .

Por mais estranho que possa parecer, é preciso admit i rque nada fez mais mal à fala pol i t ica que a marcante pretensâo

de lhe pôr um f im recorrendo-se à razâo pensante. A forma par-

t icular de repet içâo e de agitaçâo da pol i t ica jâ é bastante arr is-cada para se querer acrescentar- lhe o sonho aberrante de poder

subst i tuir pela palavra ret i l inea a palavra distorcida. Poderfa-mos nos arranjar com a pr imeira fonte de confusâo, porque elafaz parte da prdpria enunciaçâo, mas com a segunda, totalmen-te arbi trâr ia e parasi ta, nâo podemos fazer nada, f icamos para-

l isados. Sem a segurança da razâo pensante a pol i t ica f ica di f i -c i l , mas prat icâvel; depois que prometemos a segurança de umarazâo superior a todas suas pobres mentiras, ela nâo presta para

nada; ela ousa apenas resmungar jurando, mas em surdina: "E

apesar de tudo, ela gira". . .

Por que é tâo importante liberar a palavra politica do peso

supérfluo da razâo pensante? Porque, seguindo os maus conse-lhos da razâo - transparência, serenidade, retidâo, fidelidade, au-tenticidade, representaçào por repetiçào, etc. -, transformamoso grupo a ser const i tuido num agregado de elementos fxos e,

deste fato, tornamos impossivel a constituiçâo variâvel dos gru-

pos e impraticâvel o exercicio da autonomia ou da liberdade. Comas melhores intençôes do mundo, aqueles que quiseram raciona-

l izar a pol i t ica (e Deus sabe que a hist6r ia nâo foi avara comrelaçâo a eles!) so chegaram a susci tar monstruosidades inf ini ta-mente mais graves que aquelas a que pretendiam pôr f im. Emmatéria de politica, todas as injeçôes de razào ao longo do tem-po foram bem piores que o mal. Tâlvez tenhamos expulsado ossof istas, mas colocamos em seu lugaç para i r direto ao assunto,

diversos t ipos de comissârios. Os especial istas inconstantes e àsvezes perversos do autophuos foram substitufdos pelos mestresque, como Sdcrates no Gdrgias, pretendem reinar sobre os huma-nos a partir do reino dos mortos, de Hades - e os mortos tam-

bém nào deixaram de comDarecer.

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A duplo imposturo d<

Tèntemos qualificarlavra politica sem esmagécomo supérflua, com outrmente . Is to nos permi t i renunciaçâo politica tem alra, a inst i tuiçâo ou o donmais no mistério particulaentre aqui lo que é di to e ;compreender por que jarr

O circulo sd é possivel sete, as duas posiçôes contrifazer é aquilo que eu teriexpressâo da obediência; '

eu ter ia di to se eu mesmotaçâo; "Faço somente o qL

Serâ que jâ se obseraquele que fala e aquele cenunciaçào, tal qual é definidos lingriistas e dos semiôti

çào um enunciador escondsua voz (Greimas e CourtesDo mesmo modo que toda 1acompanhada de uma sonbanal que seja, projeta um;

Quando ouço a fraseaparece assim que ela é pr,trata de Agnes, na peça fArnolfo. Este enunciador erdo enunciado: ele estâ sutmesma coisa, aliâs, se tivéssexisto": rapidamente um odo, apareceria por trâs do "

o termo enunciaçâo, ex-nulexemplo, "nûncio apostôliclavra nâo pertence jamais è

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tophuos basta para assegurar a

ossa parecer, é preciso admit i rl i t ica que a marcante pretensâo

: à razâo pensante. A forma par-

o da polf t ica jâ é bastante arr is-lhe o sonho aberrante de poder

r a palavra distorcida. Poderia-a fonte de confusâo, porque ela

, mas com a segunda, totalmen-lemos fazer nada, f icamos para-

:âo pensante a politica fica difi-rometemos a segurança de uma'es mentiras, ela nâo presta para

ar jurando, mas em surdina: "E

iberar a palavra politica do peso

)rque, seguindo os maus conse-renidade, ret idâo, f idel idade, au-epet içâo, etc. - , t ransformamosagregado de elementos lfrxos e,a const i tuiçâo var iâvel dos gru-

autonomia ou da l iberdade. Com>, aqueles que quiseram raciona-re a histôr ia nâo foi avara comlsci tar monstruosidades inf i ni ta-a que pretendiam pôr f im. Em

çôes de razâo ao longo do tem-. Tâlvez tenhamos expulsado oslugar, para i r direto ao assunto,s especial istas inconstantes e àsrram subst i tufdos pelos mestres)retendem reinar sobre os huma-s, de Hades - e os mortos tam-lr.

Se fqlossemos um pouco de politico?

Bruno Latoul

A duplo imposturo do enuncioçôo pollfico

Têntemos qualificar novamente a minitranscendência da pa-lavra politica sem esmagâ-la por uma comparaçâo, tâo perigosacomo supérflua, com outras formas que nào lhe convêm minima-mente. lsto nos permit i râ compreender por que o regime deenunciaçâo politica tem apenas uma relaçâo distante com a esfe-ra, a instituiçâo ou o dominio da politica como tal. Avancemosmais no mistério pafticular do autophuos qualificando a distânciaentre aquilo que é dito e aquilo que é redito, o que nos permitirâcompreender por que jamais existe exatamente uma tautologia.O circulo sd é possivel se as mesmas vozes ocuparem, justamen-

te, as duas posiçôes contraditôr ias: 'Aqui lo que você me diz parafazer é aquilo que eu teria desejado fazer eu mesmo" - tal é aexpressâo da obediência; 'Al iâs, aqui lo que você diz é aqui lo queeu teria dito se eu mesmo tivesse falado" - assim fala a represen-taçâo; "Faço somente o que quero e sou livre" - é a autonomia.

Serâ que jâ se observou o suficiente que esta relaçâo entreaquele que fala e aquele que é falado corresponde exatamente àenunciaçâo, tal qual é definida na teoria da linguagem? Aprendemosdos lingûistas e dos semidticos que cada ato de fala suscita em rea-

çâo um enunciador escondido, dissimulado, envolvido que delegasua voz (Creimas e Courtes, 1979; Ducrot,

'1989; Fontanille, 1998).

Do mesmo modo que toda forma material, mesmo à luz do dia, vemacompanhada de uma sombra, todo ato de l inguagem, por maisbanal que seja, projeta uma estrutura implfcita da enunciaçâo.

Quando ouço a frase "o gatinho estâ morto", um enunciadoraparece assim que ela é pronunciada, mesmo se eu ignoro que setrata de Agnes, na peça LÉcole des Femmes e que ela se dirige aArnolfo. Este enunciador estâ ao mesmo tempo inscrito e ausentedo enunciado: ele estâ subentendido ou implicito. Aconteceria amesma coisa, aliâs, se tivéssemos começado pela frase "penso, logoexisto": rapidamente um outro enunciador implicito, subentendi-do, apareceria por trâs do "eu" para lhe "enviar" a palavra - dondeo termo enunciaçâo, ex-nuncius (o termo ainda existe, como, porexemplo, "nuncio apost6lico"). Se seguimos estas definiçôes, a pa-lavra nâo pertence jamais àquele que a diz, mas sempre ao enun-

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ciador n-1 que a deu a quem fala. A maior parte do tempo, nosrelatos, nas trocas, na interlocuçâo em geral, estas estruturas nâocolocam problemas, seja porque, como na literatura, o enunciador"real" - o autor "em carne e osso" - nâo tem nenhuma importân-cia, e s6 conta, entâo, o enunciador n inscrito no relato; seja, aoinverso, porque nas trocas face a face a presença do locutor tornafacilmente decodificâveis os deslocamentos sutis entre os diversosplanos da enunciaçâo - o que nâo quer dizer evidentemente que,por isso, o locutor vivo fale "por ele mesmo".

Ora, a enunciaçâo tem de singular o fato de que dâ corpo erealidade à questâo da delegaçâo que nos faz falar: "quando eufalo, alguém me faz falar - eu obedeço -, e este alguém nâo diznada a nâo ser o que eu o faço dizer - ele me representa". Como naenunciaçâo clâssica, naturalmente, nâo se trata de uma similitude,de uma semelhança, de uma superposiçâo entre aquele que fala eaquele que faz falar, como acredita ingenuamente S6crates acusan-do Calicles de "imitador": ao contrârio, o abismo é infinito entre oenunciador inscrito no discurso e o enunciador que ocupa um lu-gar escondido daquele que "faz falar". Mas, contrariamente a to-das as outras formas de enunciaçâo que cartografei até agora, estelugar nâo é por isso implicito, inacessivel ou simplesmente pressu-posto: ele é ocupado por uma proliferaçâo de atividades; posso veraquele que me faz obedecer; posso me fazer ver por demonstra-

çôes daqueles que pretendem falar em meu nome.

A palavra profer ida nâo pertence jamais àquele que a diz, écerto, mas sua origem, contudo, é identificâvel, e é esta identifi-caçâo que define a forma politica de falar: "em nome de quem, deque outros agentes falamos?". A presença continua de todos estesoutros, de todos estes a/iens, seja sob a forma de sua irredutivelmultiplicidade, seja sob a forma de sua indispensâvel unificaçâo,explica muito o peso, a lentidâo e a curvatura da forma politicade fala que haviamos assinalado no começo. Isto explica tambémpor que a questâo do autor, da autor idade, da autor izaçâo éconsubstancial à maneira politica de falar. Todas as outras formasde palavra podem se emancipar de seu enunciador, omiti-lo ouignorâ- lo - é por isso que elas voam, elas planam, elas condu-zem, elas vâo direto e râpido -, mas nâo a enunciaçâo politica.

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A prdpria forma do rposiçôes que sào em princcomo vemos na figura abapalavra àquele que fala pornum outro espaço, num ooriginal nisto: é o que faz ttodo enunciador como enOra, eis o que subverte oa palawa vem também oculque o faz falar... "Você nârfaço você dizer; é disto qunomia e, portanto, de nomesmo tempo o delegadoele também a dâ a mim. Nautoctone que o delegadcmas razôes, é preciso que"mandado dizer" alguma cralmente, estes enunciadounidade, mas uma mult idpor que a palavra politicapolfticas de fala sâo julgar

qual, é bom lembrar, tamlverificaçâo das ciências: elrles que se acreditam mest

<l-

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r. A maior parte do tempo, noso em geral, estas estruturas nâo:omo na literatura, o enunciador" - nâo tem nenhuma importân-lor n inscrito no relato; seja, aoFace a presença do locutor tornacamentos sutis entre os diversos) quer dizer evidentemente que,:le mesmo".

ngular o fato de que dâ corpo e) que nos faz falar: "quando euedeço -, e este alguém nâo diz:r - ele me representa". Como na, nâo se trata de uma similitude,rposiçâo entre aquele que fala er ingenuamente S6crates acusan-'ârio, o abismo é infinito entre oo enunciador que ocupa um lu-llar". Mas, contrariamente a to-o que cartografei até agora, este:essivel ou simplesmente pressu-iferaçâo de atividades; posso verso me fazer ver por demonstra-r em meu nome.

:ence jamais àquele que a diz, éé identificâvel, e é esta identifi-de falar: "em nome de quem, de

lsença continua de todos estessob a forma de sua irredutivel

le sua indispensâvel unificaçâo,e a curvatura da forma politicao começo. Isto explica tambémautor idade, da autor izaçâo é

de falar. Todas as outras formasde seu enunciador, omit i - lo ouoam, elas planam, elas condu-nas nâo a enunciaçâo politica.

Se foléssemos um pouco de politico?

Bruno Lolour

A prdpria forma do circulo obriga o enunciador a ocupar duasposiçôes que sâo em principio impossiveis na teoria da enunciaçâo:

como vemos na figura abaixo, aquele que fala delega o exercicio dapalavra àquele que fala por ele -, o termo técnico é o de "desengate"

num outro espaço, num outro tempo, num outro actante. Nada de

original nisto: é o que faz todo narrador de conto, todo declamador,

todo enunciador como em "o gatinho estâ mofto" ou "ego cogito".

Ora, eis o que subverte o quadro usual: aquele a quem delegamosa palawa vem também ocupar a posiçâo n-1 , fazendo falar o locutorque o faz falar... "Você nâo me faz dizer nada além daquilo que eufaço você dizer é disto que sacamos a possibilidade de nossa auto-nomia e, portanto, de nossa l iberdade". O "meu-eu" é entào ao

mesmo tempo o delegador e o delegado: damo-lhe a palavra, masele também a dâ a mim. Nada menos autêntico, primitivo, natural,

aut6ctone que o delegador: como o "eu, eu penso", e pelas mes-mas razôes, é preciso que um enunciador de primeiro nivel tenha"mandado dizer" alguma coisa para que ele comece a falar. E, natu-ralmente, estes enunciados de nivel n-1 nâo sâo eles mesmos umaunidade, mas uma multidâo... Compreendemos entâo facilmentepor que a palavra politica suscita mal-estar sempre que as formaspoliticas de fala sâo julgadas pela medida da razâo pensante - aqual, é bom lembrar, também nâo pode dar conta do artificio deverificaçâo das ciências: ela parece sempre monstruosa para aque-Ies que se acreditam mestres daquilo que dizem.

o

r È

Quadro de referência do enunciadorinscrito no discurso

Quadro de referência do enunciador

Quadro de referência n-1 do enunciador

Figura 3

p . l l - 4 0 33

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N

I

I

z

Existem pelo menos quatro razôes para este peso, esta len-tidâo, esta total falta de autenticidade, de naturalidade, tâo tipi-ca da enunciaçâo pol i t ica: a) aquele que "faz falar" permanecevisivel e sensivel em lugar de fical como nas outras enunciaçôes,apenas subentendido; b) ele ocupa duas posiçôes contraditdr ias,porque estâ ao mesmo tempo diante de n6s - é a ele a quemdirigimos a palavra - e atrâs de n6s - é ele quem nos delega enos enuncia a palavra; c) nestas duas posiçôes contraditorias, eledi fere essencialmente, radicalmente, daquele que fala, se bemque nenhuma semelhança pode ser possivel , nenhuma transpa-rência, nenhuma imediatez, nenhuma mimesis, nenhuma superpo-siçâo; d) enfim, ele é sempre o resultado de uma multiplicidade:quando eu falo, é uma multidâo de outros que falam ao mesmotempo - seu nome, como para os demônios, é um legiâo. Nâosurpreende que nâo economizernos nenhum esforço para evitarfalar pol i t icamente de alguma coisa.. .

Sobreludo nôo explicor o pol(tico por outro coiso

Gostaria, para terminar, de extrair uma conclusâo que vainos permitir voltar à diferença entre as sociologias do social e associologias da traduçâo. De forma geral , como jâ disse, as pr i-meiras assumem, de inicio, grupos cuja coesâo é, para as segun-das, aquilo que é preciso explicar. As sociologias do social podemse permit i r desprezar a enunciaçào pol i t ica (e elas, al iâs, nâo seprivam disso), vendo na ret6rica politica uma "mentira que ocul-ta os verdadeiros mecanismos e relaçôes de dominaçâo". Mas,para as sociologias da traduçâo, nâo existe outro meio para pro-duzir os grupos que os (re)agrupamentos permitidos pela repeti-

çâo incessante da representaçâo pol i t ica - sempre no sent idoamplo. Por conseqùência, todo o esforço para racionalizar a falapolitica - impor-lhe o leito de Procusta da transferência de infor-maçâo sem deformaçâo - termina por tornar impossivel o ûnicoprocedimento, o circulo, cujo objetivo é dar existência provis6riaaos grupos. Se suspendêssemos a repetiçâo continua do circulo,simplesmente ndo existiriam (re)agrupamentos poss(veis. Encontrar-nos-iamos com agentes de limites fixos, que seriam proprietârios

o . l l - 4 0

exclusivos de suas falas: eldades, opiniôes. Eles nemciéveis; seus membros nàcnem comandar, nem obede

Ora, se devemos realum grupo a part i r de umaimpossivel , de fazer obedeordem comum, é necessâriropiniôes def inidas, com intrident idades def ini t ivas e <derrota certa, porque tod<apenas como um intolerâ' ,metimento, que quebrar ia,opiniôes, os interesses e assemos a "reconhecer" todota" todos os interesses, a "

tar" todas as vontades, nâo- nem na ida nem na voltaam, obst inadamente ampalÉnico meio de mover o ci{re)agrupamentos consiste rtades, de ident idades e depolitica é capaz de instaurÉ

Para que a vida politire preciso que os agentes air

.1am suscetiveis de mudâ-las;os pertencimentos se modiestejam seguros dos interes:de vacile ou, ao contrârio, see se modifiquem as relaçôefazem falar - semicirculo dasemicirculo da representaç;dessa alquimia frâgi l , contrnomeavam autophuos e que .pese a ironia de Sdcratesr aqde um outro, o qual nâo é rfranco, de menos autêntico (

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'azôes para este peso, esta len-lade, de natural idade, tâo t ip i-:le que "Îaz falar" permanececomo nas outras enunciaçôes,r duas posiçôes contradit6rias,r n t e d e n 6 s - é a e l e a q u e m6s - é ele quem nos delega eas posiçôes contraditdrias, elerte, daquele que fala, se bem:r possivel, nenhuma transpa-na mirnesis, nenhuma superpo-ul tado de uma mult ipl ic idade:e outros que falam ao mesmor demônios, é um legiâo. Nâors nenhum esforço para evitar4 . . .

rlifico por outro coiso

:xtrair uma conclusào que vai'e as sociologias do social e asr gera l , como jâ d isse , as p r i -cuja coesào é, para as segun-

rs sociologias do social podemr polf t ica (e elas, al iâs, nâo serl f t ica uma "mentira que ocul-e laçôes de dominaçâo" . Mas,o existe outro meio para pro-rentos permit idos pela repet i-rol i t ica - sempre no sent idosforço para racionalizar a falausta da transferência de infor-por tornar impossivel o ûnicoivo é dar existência provis6ria'epetiçâo continua do circulo,oamentos poss{veis. Encontrar-ixos, que seriam proprietârios

Se foléssemos um pouco de Politlco?

Bruno Lotour

exclusivos de suas falas: eles teriam interesses, vontades, identi-

dades, opiniôes. Eles nem seriam mais enunciâveis, nem denun-

ciâveis; seus membros nâo poderiam mais se fazer representar,

nem comandar, nem obedecer, nem mesmo pertencer.

Ora, se devemos realizar a impossivel proeza de (re)compor

um grupo a part i r de uma mult ipl ic idade ou, coisa igualmente

impossivel , de fazer obedecer uma plural idade a part i r de uma

ordem comum, é necessârio sobretudo nâo começar com seres com

opiniôes definidas, com interesses firmemente estabelecidos, com

ident idades def ini t ivas e com vontades f i rmes. Isto ser ia uma

derrota certa, porque todo trabalho de composiçâo apareceria

apenas como um intolerâvel compromisso, talvez um compro-

metimento, que quebrar ia, t r i turar ia, aniqui lar ia as vontades, as

opiniôes, os interesses e as ident idades' Ao contrâr io, se passâs-

semos a "reconhecer" todos os pertencimentos, a "levar em con-

ta" todos os interesses, a "escutar" todas as opiniôes, a "respei-

tar" todas as vontades, nâo chegariamos nunca a fechar o circulo- nem na ida nem na volta - porque as multiplicidades triunfari-

am, obst inadamente amparadas na sua irredut ivel di ferença. O

ùnico meio de mover o circulo, de fazer pol i t ica, de produzir

ire)agrupamentos consiste em nunca partir de opiniôes, de von-

rades, de identidades e de interesses estabelecidos. Apenas a fala

politica é capaz de instaurâ-los, restabelecê-los, modificâ-los.

Para que a vida politica seja pensâvel, enunciâvel, "falâvel",

é preciso que os agentes ainda nâo tenham opiniôes, mas que se-

jam suscetiveis de mudâ-las; que nâo tenham identidade, mas que

os pertencimentos se modifiquem no curso de debate; que nâo

estejam seguros dos interesses que representam, e que sua vonta-

de vacile ou, ao contrârio, se desenvolva à medida que se agrupem

e se modifiquem as relaçôes de todos os outros agentes que os

fazem falar - semicirculo da obediência - e que eles fazem falar -

semicirculo da representaçâo. Compreendemos agora o sentido

dessa alquimia frâgil, contradit6ria, meticulosa, que os sofistas

nomeavam autophuos e que nâo tem nada de tautol6gico, em que

pese a ironia de Sdcrates: aquele que fala nâo fala dele mesmo, mas

de um outro, o qual nâo é um, mas uma legiâo. Nada de menos

franco, de menos autêntico que a expressâo politica.

35p , l l - 4 0

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s

Nc)ù

z

E neste l igeiro deslocamento da fala que reside a mini-transcendência da politica, o que a permite mexer, fazer fermen-tar, às vezes confundir ou mesmo perturbar a vida priblica, mastambém "agitâ-Ia", se ouso dizeç antes de clarificâ-la, ou em todocaso, de aumentar sua temperatura. contrariamente aos receiosde Platâo, jamais o colet ivo é simplesmente semelhante a elemesmo; a vida pûbl ica é sempre agitada. A idéia de que a estaforma de vida faltariam transcendência, exterioridade, excesso,espiritualidade e que seria preciso adicionar-lhe um soberano queviria fechâ-la do exterior, como o graveto que Jûpiter terminou en-viando às râs que pediram um rei, nâo tem mais sentido desde queo gaguejar constitutivo da enunciaçâo politica é reconhecido: aqueleque fala nâo possui a palavra, ele fala em nome dos outros.

Se passamos, como Sdcrates, a reclamar dos cidadâos quese pertencem e se possuem, que raciocinam, que falam por elesmesmos e para eles mesmos, que formam opiniôes cientificamenteseguras, que sâo ligados a interesses tâo indiscutiveis que estâoprontos a morrer por eles, que reivindicam ident idades maisamplas que aquelas do corpo de cidadâos, ao ponto de fazê-laspertencer ao reino dos mortos, entâo a politica nâo é mais possi-vel. Estranhamente, a imagem de um corpo de cidadâos respon-sâveis e razoâveis, proprietârios seguros de suas falas, correspondeà forma mais mortifera do corpo politico... - e por corpo politico,mais uma vez, nâo quero dizer a cidade, o Estado ou a naçâo,mas todo o agrupamento que deve se fazer existir como tal, pormeio de uma vida pol i t ica apropriada à sua escala.

Se as opiniôes nâo sâo de quem as enuncia, mas as de seuenunciador; se as vontades nâo sâo as do cidadâo, mas as daque-le ou daqueles que o faz ou o fazem agir; se os pertencimentosnâo sâo os de hoje, mas os de amanhâ; se os interesses nâo sâofixos, mas dependem do nûmero de elementos que "interferem"

neles, compreendemos o efeito catastrôfico que pode produzirsobre a frâgil ecologia da fala politica a sribita necessidade, di-fundida por toda parte ao som de trombetas, de "dizer a verda-de", "de ser transparente", "fie|", "natural", "autêntico", "direto","sem artificio", "sem manipulaçâo", "razoâvel". Todos os locuto-res tornam-se subitamente paralisados por duas injunçôes con-

p , l l - 4 0

traditdrias: o antigo trabalà agitaçâo e à multiplicaçâexigência que reclama, aopara si mesmo". Se a segurna vida prlblica, a palavraente e até mesmo chocanlque somente ela pode provbém. Existem cada vez mernam-se te imos ias ; os in teenquistam-se; as vontades

lmpossivel contar cotdemos, mesmo por um dia,interesses, as ident idades,mam cada qual o seu camirrevoada de pardais. Se deste porque nâo hâ nenhumade uma vez por todas seucapazes de (re)agrupar novte artificial, artificioso, labrcaçâo, de remobilizaçâo cer

É este carâter evanes(têm coragem de percorrer otâvel acomodar-se ao lamenpercorrendo o cfrculo, inst iuma legi t imidade que nâo ;seria cômodo invocar a lei rsempre seguindo o circulo, la"pelos de cima". Mas nadanem a legi t imidade, nen a l ra menos que passemos de n,Contar com a inércia para atos em um e do um em muitàs claras, sem suscitar a indilocupados a clamar a nossanos com seus artificios, privde que lhes é propria. É estea incensamos porque ela tev

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:nto da fala que reside a mini-: a permite mexer, fazer fermen-o perturbar a vida pûblica, masantes de clarificâ-la, ou em todorra. Contrariamente aos receiosimplesmente semelhante a eleagitada. A idéia de que a esta

rdência, exter ior idade, excesso,o adicionar-lhe um soberano quegraveto que Jripiter terminou en-nào tem mais sentido desde que

;ào politica é reconhecido: aquelefala em nome dos outros.

:s, a reclamar dos cidadâos queraciocinam, que falam por eles'ormam

opiniôes cientifi camentesses tào indiscutiveis que estâore iv ind icam ident idades maiscidadàos, ao ponto de fazê-lasrtâo a politica nâo é mais possi-um corpo de cidadâos respon-

guros de suas falas, corresponderol f t ico.. . - e por corpo pol i t ico,

cidade, o Estado ou a naçào,'e se fazer existir como tal, poriada à sua escala.

uem as enuncia, mas as de seuo as do cidadâo, mas as daque-:em agir ; se os pertencimentosranhà; se os interesses nâo sâode elementos que " interferem"atastrofico que pode produzirl f t ica a sr ibi ta necessidade, di-' trombetas, de "dizer a verda-'natural", "autêntico", "direto",", "razoâvel". Todos os locuto-;ados por duas injunçôes con-

tradit6rias: o antigo trabalho de enunciaçâo politica, que instiga

à agitaçâo e à multiplicaçâo dos planos de enunciaçâo, e a nova

exigência que reclama, ao contrârio, que se fale "por si mesmo epara si mesmo". Se a segunda triunfa, o que geralmente acontecena vida pûblica, a palavra politica se rarefaz, torna-se incongru-ente e até mesmo chocante, e, por conseqûência, os agregadosque somente ela pode provisoriamente compor se rarefazem tam-bém. Existem cada vez menos (re)agrupamentos. As opiniôes tor-nam-se te imos ias ; os in te resses , ob tusos ; os per tenc imentos

enquistam-se; as vontades (boas ou mâs) fazem-se mais raras.

lmpossivel contar com a inércia do politico, pois se suspen-demos, mesmo por um dia, o movimento "forçado" do circulo, osinteresses, as identidades, os pertencimentos e as vontades reto-mam cada qual o seu caminho pr6prio e se dispersam como umarevoada de pardais. Se desprezamos tanto a politica é justamen-

te porque nâo hâ nenhuma força de inércia capaz de garantir-lhe

de uma vez por todas seu capital: um grupo que nâo fiôssemoscapazes de (re)agrupar novamente pelo trabalho necessariamen-te artificial, artificioso, laborioso de recomposiçâo, de reconvo-

caçâo, de remobilizaçâo cessaria rapidamente de existir.

É este carâter evanescente que logo esgota aqueles que nâotêm coragem de percorrer o circulo por inteiro. É bem mais confor-tâvel acomodar-se ao lanrento inarticulado, à raiva das elites, ou,percorrendo o circulo, instalar-se num escritôrio atapetado comuma legitimidade que nâo arriscariamos mais pôr à prova. Comoseria cômodo invocar a lei e a ordem para se fazer obedecer, ou,sempre seguindo o circulo, lamentar-se do absurdo das ordens dadas"pelos de cima". Mas nada adianta: nem o lamento, nem o 6dio,nem a legitimidade, ne:n a lei, nem a ordem possuem um sentido,a menos que passemos de novo a resolver a quadratura do circulo.Contar com a inércia para assegurar a transubstanciaçâo dos mui-tos em um e do um em muitos, eis um crime que se comete, hélas,

às claras, sem suscitar a indignaçâo de ninguém, enquanto estamosocupados a clamar a nossa raiva contra os politicos. Indignando-nos com seus artificios, privamo-nos justamente da rinica qualida-

de que lhes é propria. É este o paradoxo da sociologia dita critica:a incensamos porque ela teve a coragem de provocar "um impacto

Se fol6ssemos um pouco de politlco?

Bruno Latoul

p . l l - 4 0 37

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I Politlca& Sociedade

\q)ù

z

politico", quando, ao contrârio, em se expandindo, ela sufoca pou-

co a pouco toda forma politica de expressâo, substituindo-a pelo

desdobramento repetitivo das "relaçôes de dominaçâo simb6lica",dissimulado por trâs das mentiras dos representantes.

O que pode dissimular aos olhos dos observadores a perdaprogressiva desta forma de enunciaçâo é a confusâo freqiiente-mente feita entre as palavras com conteûdo politico e aquelas docontinente politico. Pode-se muito bem falar de eleiçâo, de rela-

çôes de força, de relaçôes internacionais, de luta de inf luência,etc., sem por isso proferir politicamente tais palavras: para fazê-las perder seu sentido, sua chave, sua tonalidade, seu spin pr6-pr io, é suf ic iente que atr ibuamos às coisas assim mobi l izadas umatransferência sem deformaçdo. Falando de "relaçôes de domina-

çào", acreditamos estar falando de politica, mas como essas rela-

çôes de força se deslocam em linha reta,à maneira da informaçâo,e nâo em linha curva, por traduçâo, nâo é por isso que estamosfalando pol i t icamente. Aqueles que se indignam ou que falampedagogicamente pensam fazer politica porque falam a linguada indignaçâo ou da organizaçâo, da legitimidade ou da luta con-tra a tirania, mas, se nâo quiserem percorrer a totalidade do cir-culo, é em vâo que se deblaterâo. Eles desejam, no fundo, que

seus objet ivos aconteçam de modo preciso e direto. Mesmo se

estes objetivos tenham um verniz de consideraçôes polfticas pro-

fundas e radicais, eles de fato perderam o br i lho que lhes permi-

t i r ia soar de modo pol i t ico: a audâcia de percorrer de novo o

circulo, representando a totalidade de um outro modo.

Se minha hip6tese é exata, podemos perfei tamente imagi-nar uma época em que a fala pol i t ica desapareceria ou, ao me-nos, tornar-se- ia de tal modo estranha que, quando pronunciada,

seria sempre marcada pela proibiçâo. Nâo penso aqui no simples

exercicio de uma censura de opiniôes, de uma fal ta de l iberdadede palavra que afetaria os conteûdos; nâo, trata-se de uma doen-

ça infinitamente mais grave que afetaria o prôprio continente da

fala politica. De tanto desvalorizar esta forma de fala, de julgâ-la

continuamente com base na transferência fiel e transparente da

informaçâo ou das relaçôes de força, poderemos muito bem nosprivarmos, pouco a pouco, de todos os seus recursos, como jâ

p , l 1 - 4 0

fizemos para a ciência e par

tros trabalhos. Como umapor tornar impossiveis todapenas relaçôes locais. Nâtranqûi l izadores, como se aco e que pudéssemos contafosse conservada intacta eslPreciosa, ela é também fr :meticulosos de uma culturat i tuindo a representaçâo do b e d i ê n c i a i m p o s s i v e l p

reagrupamentos pela tran:dominaçâo", poderemos mlem todo caso, esfriâ-la até rpecimento, sem mesmo seimprevidente perdido num

Referêncios

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38

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e expandindo, ela sufoca pou-

expressâo, substituindo-o pelo

ôes de dominaçâo simb6lica",)s representantes.

ros dos observadores a perda

rçào é a confusâo freqùente-onteûdo politico e aquelas doem falar de eleiçâo, de rela-ionais, de luta de inf luência,enfe tais palavras: para fazê-sua tonal idade, seu spin p16-coisas assim mobi l izadas umado de " re laçôes de domina-lol f t ica, mas como essas rela-gfo, à maneira da informaçâo,nào é por isso que estamos

: se ind ignam ou que fa lamli t ica porque falam a l inguar legi t imidade ou da luta con-lercorrer a total idade do cir-Eles desejam, no fundo, queprec iso e d i re to . Mesmo se

: consideraçôes pol i t icas pro-rar l o br i lho que lhes permi-ic ia de percorrer de novo ode unr outro modo.

;demos perfei tamente imagi-ca desapareceria ou, ao me-ha que, quando pronunc iada,r . \ào penso aqu i no s imp les:s. de uma fal ta de l iberdades; nào. trata-se de uma doen-.ar ia o proprio cont inente da'sta forma de fala, de julgâ- la

rência f ie l e transparente dar, poderemos muito bem nos)S oS SeuS reCurSOS, COmO jâ

Se foléssemos um pouco de Poliflco?

Bruno Lalour

fizemos para a ciência e para a religiâo, como jâ mostrei em ou-

tros trabalhos. Como uma rede viâr ia abandonada, que acaba

por tornar impossiveis todos os deslocamentos e que permite

apenas relaçôes locais. Nâo existem nestas matér ias dest inos

tranqûilizadores, como se a fala fosse inerente ao animal polfti-

co e que pudéssemos contar com a natureza das coisas para que

fosse conservada intacta esta forma tâo preciosa de enunciaçâo.

Preciosa, ela é também frâgi l , e s6 sobrevive pelos cuidados

meticulosos de uma cultura tâo del icada quanto art i f ic ial . Subs-

t i tuindo a representaçâo distorcida pela representaçào f iel , a

o b e d i ê n c i a i m p o s s i v e l p e l a p e d a g o g i a , a c o m p o s i ç à o d e

reagrupamentos pela transferência ret i l inea das "relaçôes de

dominaçào", poderemos muito bem matar a pol i t ica de vez, ou

em todo caso, esfr iâ- la até o ponto em que ela morra por entor-

pecimento, sem mesmo se aperceber disso, como um pedestre

imprevidente perdido numa nevasca.

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p . l l - 4 0 39

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Pol[tlca& Sociedade

\1

N

0)I)

a

I

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Dilemos do simre conheci

modolidodes dedo prol

O problemo do conh

I abordagem sociologic^{ \ damenta-se, metodolcde relaçôes que se estabelcontexto social. Estas relaçôsas formas como, por exetvalência com outras institrc ias do contexto social ncmesmo, por meio da prôprto e conhecimento. Esta pca uma ref lexâo mais geraldos prdprios ftrndamentosrefere à idéia de que formprocessos sociais. Com basde podermos estabelecer oto de estudo, necessitamoque possibi l i tam a formulaprimeiro nivel a invest igaçr:ào do que é o conhec imen

Este texto consti tui um substrCentre de Sociologie de Llnnc2003, com o apoio da Capes.Professor do Curso de Ciênciasciais da Universidade Regional c

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