sudoeste do paranÁ 1964: “grupo dos onze” no … · integrantes foram enquadrados pela...

16
SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO CONTEXTO DA INSTAURAÇÃO DO REGIME MILITAR NO BRASIL. Ismael Antônio Vannini 1 Ronaldo Zatta 2 INTRODUÇÃO Uma região de fronteira, distante dos grandes centros, de ocupação recente e com limitado acesso aos veículos de informação’, em definição geral, assim se caracterizava o sudoeste do Paraná no início da década de 1960. Apesar disso, os ideais do movimento da legalidade encontraram importante eco político na sociedade sudoestina. Propagado pela cadeia radiofônica, centrada na emissora Mayrink Veiga do Rio de Janeiro e comandada por Leonel Brizola, o movimento estimulou a organização dos “Grupos de Onze” por todo território nacional. Campanha que acabou por ser encampada também no longínquo espaço fronteiriço do país. Deflagraram-se as forças em nível nacional, no intuito de levar João Goulart assumir a presidência após a renúncia de Jânio Quadros. No entanto, a instauração do regime militar de 1964 fez dos “Grupos de Onze” uma forte organização de resistência popular. Seguindo orientações do comando central, formaram-se células de organização no sudoeste paranaense, atuando de forma estreita com a liderança de Brizola. Fazendo alusão a um time de futebol as formações eram comandadas por dez integrantes com uma liderança, e assim disseminavam- se conforme adesão de novos integrantes. Como se sabe, o governo militar recrudesceu com enérgica ação de repressão aos grupos oposicionistas ao regime. A presença do destacamento militar em Francisco Beltrão atuou de forma efetiva ao combate aos grupos na região. Vistos como subversivos, os integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de 1964, com sentença expedida em junho de 1969. Com base neste documento elementar, partimos para análise da presença e atividade dos “Grupos de 1 Doutor em História. Professor e Coordenador do Curso de História da UNICENTRO- Universidade Estadual do Centro Oeste do Paraná- Campus de Coronel Vivida. Vinculado ao Grupo de Pesquisa CNPQ intitulado - Cultura, Etnias, Identificações. E-mail: [email protected] 2 Doutorando em História pela UFPR. Bolsista CAPES. Vinculado ao Grupo de Pesquisa CNPQ intitulado - Cultura, Etnias, Identificações. E-mail: [email protected]

Upload: others

Post on 02-Jun-2020

1 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

SUDOESTE DO PARANÁ – 1964:

“GRUPO DOS ONZE” NO CONTEXTO DA INSTAURAÇÃO DO REGIME

MILITAR NO BRASIL.

Ismael Antônio Vannini1

Ronaldo Zatta2

INTRODUÇÃO

‘Uma região de fronteira, distante dos grandes centros, de ocupação recente e com

limitado acesso aos veículos de informação’, em definição geral, assim se caracterizava o

sudoeste do Paraná no início da década de 1960. Apesar disso, os ideais do movimento da

legalidade encontraram importante eco político na sociedade sudoestina. Propagado pela

cadeia radiofônica, centrada na emissora Mayrink Veiga do Rio de Janeiro e comandada por

Leonel Brizola, o movimento estimulou a organização dos “Grupos de Onze” por todo

território nacional. Campanha que acabou por ser encampada também no longínquo espaço

fronteiriço do país.

Deflagraram-se as forças em nível nacional, no intuito de levar João Goulart assumir a

presidência após a renúncia de Jânio Quadros. No entanto, a instauração do regime militar de

1964 fez dos “Grupos de Onze” uma forte organização de resistência popular. Seguindo

orientações do comando central, formaram-se células de organização no sudoeste paranaense,

atuando de forma estreita com a liderança de Brizola. Fazendo alusão a um time de futebol as

formações eram comandadas por dez integrantes com uma liderança, e assim disseminavam-

se conforme adesão de novos integrantes.

Como se sabe, o governo militar recrudesceu com enérgica ação de repressão aos

grupos oposicionistas ao regime. A presença do destacamento militar em Francisco Beltrão

atuou de forma efetiva ao combate aos grupos na região. Vistos como subversivos, os

integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado

inquérito militar em novembro de 1964, com sentença expedida em junho de 1969. Com base

neste documento elementar, partimos para análise da presença e atividade dos “Grupos de

1 Doutor em História. Professor e Coordenador do Curso de História da UNICENTRO- Universidade Estadual do Centro

Oeste do Paraná- Campus de Coronel Vivida. Vinculado ao Grupo de Pesquisa CNPQ intitulado - Cultura, Etnias,

Identificações. E-mail: [email protected] 2 Doutorando em História pela UFPR. Bolsista CAPES. Vinculado ao Grupo de Pesquisa CNPQ intitulado - Cultura, Etnias,

Identificações. E-mail: [email protected]

Page 2: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

Onze” na região sudoeste, sua composição, estratégias e articulações. Analisando comumente,

os métodos militares nas ações de combate e julgamento aos insurgentes – residentes nos

municípios de Francisco Beltrão, Capanema, Santo Antônio do Sudoeste e Barracão; além de

Dionísio Cerqueira no oeste catarinense – é possível analisar organização dos grupos na

região, vinculada diretamente a pessoa figura de Leonel de Moura Brizola.

A CONJUNTURA POLÍTICA NACIONAL NA DÉCADA DE 1960 E A

CRIAÇÃO DOS “GRUPOS DE ONZE” POR LEONEL BRIZOLA

Após a renúncia de Jânio Quadros da presidência do país, abria-se a arena dos

contrastas de poder. Diante do esvaziamento do grupo político, com apenas sete meses

ocupando o cargo, Jânio abdica em agosto de 1961. Curto período onde praticou política

econômica e externa que desagradou o grupo de sustentação, bem como das forças armadas e

outras frações sociais. João Goulart do PTB, seu vice-presidente, eleito pelas regras eleitorais

que estabeleciam chapas independentes para a candidatura, representava outra adversidade

nas articulações. Na última eleição direta antes do regime militar, sufrágio que iria se repetir

29 anos depois, Jânio chegou à presidência com apoio da UDN, que no seu ideário,

encontrava consideráveis diferenças com o partido de Goulart.

Pelas leis constitucionais o então vice-presidente deveria assumir o cargo, cabendo a

presidência a João Goulart. Vetado diante das ações dos grupos políticos mais conservadores

e dos ministros militares, o cargo foi assumido por Ranieri Mazzini, então Presidente da

Câmara dos Deputados. Entendendo e caracterizando a situação como um golpe militar,

Leonel Brizola, governador do Estado do Rio Grande do Sul, promove o movimento da

legalidade. O Palácio do Piratini em Porto Alegre se torna o epicentro das tensões políticas do

país. Diante da grande aglomeração, Brizola em seu discurso inflamado se pronuncia

denunciando o que entendia ser um golpe. Fazendo uso do rádio, tenta insuflar e mobilizar a

população para um embate. O Ministério da Guerra ordena a interrupção das transmissões de

todas as emissoras de rádio e ameaça bombardear o Palácio do Governo gaúcho.

O Movimento da Legalidade encontrou apoio do III Exército, sediado no Rio Grande

do Sul, bem como de importantes frações da sociedade. Intelectuais alinharam-se nas fileiras,

contando com recrutamento de estudantes e adesão de partidos políticos e grupos sindicais.

Page 3: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

Exigindo o cumprimento da legislação, as forças se mobilizavam no caráter de direto cívico,

na defesa da ordem jurídica e de apoio ao regime democrático. A campanha que durou apenas

dez dias aglutinou importantes segmentos organizados do país, bem como, de considerável

apoio popular. Goulart encontrava-se em visita a China comunista, ausente na renúncia Jânio,

mas sabedor da situação, foi recepcionado por uma multidão ao chegar em Porto Alegre no

dia 1º de Setembro. No entanto, sua posse é adiada e o Congresso Nacional vota as pressas

uma emenda constitucional, instituindo o sistema parlamentarista de governo, reduzindo os

poderes do presidente.

Goulart assume a presidência com Tancredo Neves como primeiro ministro, e o

governo parlamentarista se estendeu no período de 1º de setembro de 1961 a janeiro de 1963,

quando o referendo popular determinou o retorno ao presidencialismo. Como forma de

controlar os plenos poderes presidenciais, o plebiscito da readoção ao presidencialismo,

ocorreu a nove meses do fim do mandato de Goulart. Os atores políticos na verdade não

operavam politicamente com o sistema provisório de governo, a referência dos partidos se

delineava no arcabouço presidencialista. Inúmeros foram os momentos que o parlamento

ignorou as propostas sugeridas pelos conselhos de ministros. O hibridismo do sistema abria

espaço tanto para práticas predominantemente parlamentaristas, quanto para procedimentos

fortemente presidencialistas. As prerrogativas do Presidente da República seriam mais uma

questão subordinada às práticas e à experiência, do que aos aspectos teóricos do novo sistema.

(REIS, 2005).

Na instabilidade da conjuntura nacional do início da década de 1960, as bases das

legendas ideológicas e tensões políticas prenunciavam embates entre os grupos de poder. Fora

neste contexto que a liderança de Leonel Brizola se avulta. Posicionando-se como o principal

líder e tutor da idealização social das reformas de base, propõe uma organização de células

agrupadas em número de onze indivíduos. Os Grupos de Onze, ou, Grupo dos Onze. Também

identificados como Comandos Nacionalistas. Na época deputado federal pelo estado da

Guanabara, Brizola propaga a ideia reformista que tomava corpo durante o Governo de João

Goulart. Em outubro de 1963 dá inicio a organização dos grupos, que toma força, sobretudo,

entre os estratos mais simples da sociedade.

O mote dos grupos se direcionava na luta para a manutenção das conquistas

democráticas e pela concretização das reformas. Pressionando o Presidente perante tais

Page 4: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

medidas, o movimento se posicionava como representante popular diante de um congresso

contrário as reformas e denunciava os interesses dos latifundiários e da elite do país. Outro

elemento importante a ser destacado, se deve as denúncias que Brizola antecipava com o

eminente golpe militar que estaria sendo arquitetado no Brasil. Neste sentido, os “Grupos de

Onze” estariam sendo organizados para combater o regime ditatorial, prenuncio do então líder

do movimento.

Para compreendermos as ações dos indivíduos que compuseram o chamado G11

precisamos considerar que as três décadas que antecedem o golpe de 1964 são caracterizadas

pelo pensamento trabalhista que conquista grande parte dos trabalhadores urbanos, bem como

a aquisição de diversos direitos vinculados ao trabalho. De maneira ampla, o trabalhismo

pode ser considerado uma categoria para “conceituar a trajetória dos trabalhadores em busca

de seus direitos econômicos, políticos e sociais.” (GOMES, 1989, p. 81).

Em nosso país o trabalhismo3 foi construído através de uma relação que vinculava o

governo e os trabalhadores, construído desde 1930, paralelo à figura de Getúlio Vargas, os

movimentos sindicais brasileiros e a criação do Ministério do Trabalho. (PACHECO, 2011, p.

229).

Com o fim do Estado Novo e a iniciativa de criação de um partido próprio, PTB –

Partido Trabalhista Brasileiro, o discurso trabalhista é oficializado, e consequentemente com

o surgimento de novas lideranças na década de 1960 se torna mais radical reivindicando

mudanças nas bases sociais brasileiras. Neste meio surge Leonel Brizola que ocupando o

cargo de Governado do Estado do Rio Grande do Sul expropriou terras e estatizou empresas

norte-americanas, chamando atenção dos trabalhistas brasileiros. No ano de 1963, Leonel

Brizola difunde o G11, tido como um movimento que serviria como tática de aglutinação

entre trabalhadores que confirmavam as ditas reformas de base. (PACHECO, 2011, p. 231-

232).

3Deixamos à parte nesta comunicação a noção de populismo, mesmo estando cientes que exista um intenso debate entre

pesquisadores que se utilizam do trabalhismo e do populismo como categorias de análise. Para determinados historiadores

que analisam as relações entre governo e trabalhadores da década de 1950 a 1960, a definição de trabalhismo evita a

radicalização de que as massas sejam inconscientes perante um líder carismático, sendo participantes do processo político.

(FERREIRA, 2001). Para outros estudiosos não se deve reconhecer o trabalhismo a tal ponto de descartar o conceito de

populismo (DUARTE; FONTES, 2004, p. 116). Estamos cientes da impossibilidade de compreender o pensamento que

norteou as ações das classes trabalhadoras apenas com a utilização do trabalhismo como categoria de análise, pois este

mesmo se confunde com o getulismo e o brisolismo.

Page 5: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

Neste contexto é que percebemos que a formação do G11 está ligada diretamente às

experiências vividas pelas classes sociais trabalhadoras que se constituíram a partir da década

de 1930, e que a simetria de ações e das ideias destes homens foram erigidas em concordância

ao desenvolvimento do trabalhismo.

Em caráter nacional, a formação dos grupos se estruturou a partir da programação

emitida pela Rádio Mayrink Veiga todas as sextas-feiras, às 21 horas, onde eram divulgados

discursos de Leonel Brizola. O programa do PTB se tornou um sucesso ocorrendo à filiação

de diversas emissoras à rádio formando a “Cadeia do Esclarecimento”. (LEITE FILHO, 2008,

p. 251).

Foi através da “Cadeia do Esclarecimento” que Brizola chamou a população para se

organizar. O G11 consistia na aglutinação de onze indivíduos, tal como um time de futebol,

onde deveria ter um “capitão”, responsável por comandar e repassar as ordens oriundas da

liderança de Brizola.

A associação ao time de futebol, esporte mais popular no país, tinha o intuito de

assimilação rápida pelas classes populares. Este efetivo deveria ser facilmente mobilizado e

em condições, de que se fosse necessário pegar às armas em defesa das reformas de base e da

manutenção democrática.

Brizola também utilizou outro meio de comunicação direta com as massas a partir de

1964: o semanário “O Panfleto – o jornal do homem de rua”. Trata-se do meio de

comunicação impressa dos grupos, que em sete edições atingiu uma tiragem de 200 mil

exemplares. Com o semanário os grupos passaram a ter regimento próprio documentado, com

o interesse de defender um golpe ao governo constituído, e ao mesmo tempo pressionar o

mesmo governo a agilizar a aprovação das reformas de base. (KUCINSKI, 2003, p. 9).

Além dos objetivos claros, “O Panfleto” emitiu a Ata quais deveriam ser preenchidos e

enviados à Rádio Mayrink Veiga. Percebe-se neste documento que evidenciava uma ligação

entre a carta testamento de Vargas e as ações brisolistas diretamente atreladas, tendendo

orientar a causa.

O mesmo jornal anunciou a formação de 100 mil grupos espalhados pelo Brasil, o que

provocou uma reação imediata das classes conservadoras, sendo os G11 a motivação de

discursos de que a ameaça comunista estaria tomando o país rendendo referências de

Page 6: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

“comunista” e “agitador” ao seu líder Brizola divulgados nos mais diversos meios de

comunicação.

Alguns historiadores afirmam que a radicalização das esquerdas incitadas pelo G11

levou a radicalização da direita, matéria base para o golpe de 1964. (FERREIRA, 2004;

GASPARI, 2002). Estas análises não são unanimidades, sendo desconsideradas por outros

autores. (FICO, 2004).

Os ânimos estavam exaltados para um golpe, a pressão para profundas reformas

políticas e sociais ao mesmo tempo aumentava o crescimento do sentimento anticomunista.Os

militares depuseram o governo se prepararam para combater o exército nacionalista liderado

por Brizola, pois através dos discursos e pronunciamentos emitidos via rádio e publicados no

semanário achavam que ele não estaria sozinho. (BALDISSERA, 2005). Entretanto, o

enfrentamento jamais ocorreu!

Estudos recentes apontam a principal falha na formação dos grupos nacionalistas.

Grande parte da população da época era composta por analfabetos ou semianalfabetos, sendo

que os integrantes dos G11 inocentes e crentes que assinavam as listas de adesão sem

nenhuma intenção de compor grupos guerrilheiros. Assim,

As pessoas formavam os grupos de modo espontâneo. Depois de ouvirem as

conclamações de Brizola pelo rádio, agricultores deslocavam-se de casa em casa por

quilômetros, a pé ou a cavalo, buscando as assinaturas para a “lista dos onze”.

Outros, para atender rapidamente aos apelos, botavam nomes de pessoas de sua

família, incluindo idosos e crianças de poucos meses de idade. Muitos assinavam

movidos por amizade ou atendendo ao pedido de alguém da família. Eram homens

religiosos, que acreditavam estar contribuindo para a realização das Reformas de

Base e defendendo a bandeira brasileira – corria também o boato de que ganhariam

terras, tratores e insumos agrícolas em troca da adesão. Além do mais, seus nomes

eram lidos na rádio pelo Brizola em pessoa, o que já lhes dava grande satisfação.

Crentes que estavam aderindo a uma ação democrática que resultaria somente no

bem do Brasil... (BALDISSERA, 2009).

Os setores conservadores e os militares possuíam a informação de que os grupos

ostentados por Brizola constituíam braços armados da guerra revolucionária que estaria preste

a eclodir no país. Sobre a repercussão dos G11, o professor Jorge Ferreira nos relata que

A maior consequência dos “comandos” foi gerar o medo-pânico entre os

conservadores e a direita civil-militar. Mesmo que a iniciativa de Brizola não tivesse

tido tempo de prosperar, a imprensa supervalorizou o movimento, publicando

notícias assustadoras sobre supostas ações – na maioria das vezes imaginadas pelos

Page 7: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

donos dos jornais – dos “comandos nacionalistas”. Comunismo e guerra

revolucionária eram as imagens mais disseminadas. (FERREIRA, 2007, p. 559-560).

Os militares após o golpe civil militar de 1964 atuaram de forma rápida contra os

integrantes dos G11 foram enquadrados na Lei de Segurança Nacional, sendo as listas

confiscadas sem nenhum registro de confronto armado.

A PRESENÇA MILITAR NO SUDOESTE DO PARANÁ E O COMBATE AO

“GRUPO DE ONZE”

De ocupação recente, a região Sudoeste do Paraná apresentou características distintas

daquelas tendencialmente perpetradas no sul do País. Inúmeros fatores de ordem política,

judicial, militar e social, deram uma conotação, sobretudo conflituosa, no processo de

colonização. Litígios entre o Estado do Paraná e a União desencadearam contendas pelas

glebas de terras, que, posteriormente as rezingas foram protagonizadas também por interesses

particulares, empresas colonizadoras e pelos colonos posseiros. (GOMES, 2005).

Enquanto a questão tramitava sub judice, o governo varguista, na ação da marcha para

o oeste, intervém na região e cria uma colônia para incentivar a colonização a CANGO

(Colônia Agrícola Nacional Osório) por um decreto de 1943. Tal projeto estimulou rápida e

desenfreada migração de colonos, assentados ilegalmente nos lotes das glebas de terras do

sudoeste. Devido ao embargo litigioso em que a região se encontrava os colonos não

obtiveram os registros dos lotes, esta condição transformou os ocupantes em posseiros.

(LAZIER, 1998).

Uma companhia de capital norte americano adquiriu, também ilegalmente, a posse das

mesmas glebas, já questionadas pelos governos e pelas famílias dos colonos posseiros. Tal

contenda confrontou o interesse dos posseiros, que lutavam pelos lotes de terras, e os

jagunços, que em nome das companhias pretendiam expulsar os ocupantes. Como pano de

fundo, se deflagrava uma luta política entre os diferentes grupos de poder, que atingia

diretamente a instância estadual e federal. Por conta disso, as autoridades instituídas na região

representavam os interesses políticos conflitantes, e, no caso, posicionavam-se no sentido

contrário aos posseiros. (COLNAGHI, 1994).

Page 8: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

Quando o embate armado atingiu proporções alarmantes, a imprensa nacional e

internacional noticiavam o episódio do embate das guerrilhas agrárias, foi instalado um

destacamento efetivo do Exercito Brasileiro em Francisco Beltrão. A cidade também era a

sede da companhia colonizadora e abrigava os escritórios das empresas imobiliárias. A

princípio, tal destacamento se mantinha acantonado, como efetivo de forças a intervir no

momento que fosse convocado.

Quando o clima de instabilidade tomou conta da região, as autoridades políticas e

militares observaram a necessidade de medidas e forças de controle. Tornara-se imperativo o

deslocamento de efetivos militares, como forma de inibir o recrudescimento do conflito, no

sentido de atuarem como mediadores entre os grupos envolvidos. No ano de 1954, um efetivo

das tropas do Batalhão de Caçadores, provenientes de Joinvile –SC e outro efetivo de

Infantaria de Ponta Grossa- PR, se instalaram nas dependências da CANGO, em Francisco

Beltrão. 4 Nos anos posteriores o efetivo militar foi ampliado, em 1957 fora destinado a

Francisco Beltrão outro pelotão de Infantaria, constituído por quatro sargentos, cinco cabos e

vinte e quatro soldados, comandados pelo tenente João da Cruz Filho.5

Em outubro de 1957, o embate entre os grupos chegou ao ápice, convulsionando

articulações políticas da região, do Estado e da União. Os registros e as evidências do levante

armado, quando seis mil colonos tomaram de assalto o controle do Sudoeste do Paraná,

revelam que as forças militares foram decisivas para o controle do conflito. Vindo,

posteriormente em 1962, por determinação da Casa Militar, que por sua vez estava

subordinada diretamente à Presidência da República, operar, através do Grupo Executivo de

Terras para o Sudoeste do Paraná – GETSOP, a medição e titulação dos lotes urbanos e rurais,

trabalho que se prolongou até década de 1980, garantindo assim os direitos a propriedade da

terra na região de fronteira. (WACHOWICZ, 1987).

Importante entendermos o processo de colonização do Sudoeste do Paraná com a

presença efetiva e decisiva das forças armadas. Forças apaziguadoras e mediadores de um

sangrento conflito agrário, que, deve-se ressaltar, finalizado com uma inédita vitória dos

pequenos colonos posseiros. No final, as terras foram desapropriadas e as famílias tiveram

suas terras tituladas, permanecendo em suas propriedades. Nesta conjuntura, o Exercito se

4Boletim interno Nº 122 de 30 de Jun 2000, da 3ª Companhia do 33º Batalhão de Infantaria Motorizada. 5Boletim interno Nº 5 de 7 de Janeiro de 1957 do 13º Regimento de Infantaria da cidade de Ponta Grossa- PR.

Page 9: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

define como instituição atuante e de prestigio na região. Gozando de status de referência para

a ordem e paz entre a população. Destarte, a participação da Instituição lhes rendeu no

imaginário social local o título de “guardião” das terras em litígio.

Foi nesta conjuntura que em 1964 a presença militar empreende nova ação, desta vez

no combate às ações, consideradas, “comunistas subversivas” na região Sudoeste. Neste

momento, para enquadrar e inquirir a organização do “Grupo de Onze” que se organizara

como movimento político contestador do regime militar recém instalado. Foi então

instaurado um Inquérito Policial Militar – IPM, no destacamento de Francisco Beltrão em 13

de novembro de 1964, para apurar atividade política de formação do G11 no Sudoeste do

Paraná, cuja sentença foi expedida Processo nº 226 emitida pela Justiça Militar de Curitiba em

Junho de 1969 punindo os indiciados pelo IPM.

As extensas páginas do relatório revelam atenção meticulosa em identificar quem

realmente são os componentes do grupo, principalmente no sentido de analisar o grau de

periculosidade ante as ações que a cartilha do movimento instruía. Visto, que este, o intento

real seria a organização de comandos armados, que em fim último, formar-se-iam as

guerrilhas de efetivo combate. Nas preliminares investigações, as autoridades militares

identificam que:

Não houve a principio grande penetração comunista visível e os moveis da

participação dos implicados estavam relacionados aos interesses de melhoria de sua

situação na compra e venda de mercadorias. Verifica-se, porém que houve uma

formação de ‘grupos” um tanto extensa. Os representantes não são bem informados

sobre esses “grupos”. A participação realmente perigosa seria a do senhor S. P. mas

torna-se impossível colher mais dados, pois encontra-se foragido, ao que consta, no

Paraguai. (Relatório do IPM nº 226. 16º Esquadrão de Cavalaria Mecanizado de

Francisco Beltrão Paraná. 13 de novembro 1964. P. 276).

A recente Revolta dos Posseiros ocorrida em 1957, oito anos apenas da formação do

Grupo de Onze”, fez o efetivo militar redobrar a atenção. A organização guerrilheira no

conflito armado, seria eminente estimulo para uma nova investida de caráter revolucionário

com os grupos estimulados por Brizola: “Houve a ideia de ressuscitar a organização que os

colonos tiveram em 1957 em defesa de suas terras”. (Relatório do IPM nº 226. Justiça Militar

de Curitiba. Junho de 1969. P. 276)

As ações de investigação buscavam enquadrar de imediato as lideranças, como forma

de coibir o movimento prendendo seus articuladores. E os registros do relatório, revelam a

Page 10: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

eminente preocupação dos militares com a propaganda comunista, disseminada na formação

dos grupos contrários ao regime militar:

Sem dúvida, pesa sobre a pessoa de R. A. e isso é coisa comum a todos os

depoimentos, a responsabilidade da formação dos ditos grupos. Fato que se

reconhece nele um obstinado formador de tais grupos, por sua maior capacidade

intelectual. Os demais participantes foram colonos bem explorados pela propaganda

comunista. (Relatório do IPM nº 226. 16º Esquadrão de Cavalaria Mecanizado de

Francisco Beltrão Paraná. 13 de novembro 1964. P. 276).

Um fator de ordem geográfica precisa ser considerado. O limite de fronteira com a

Argentina e proximidade com o Paraguai, fez do sudoeste uma região favorável para os

integrantes do grupo buscarem refúgio. Ambos os países fronteiriços foram citados pelo IPM

como destino de fuga de vários dos arrolados nos processos. No momento da prisão dos

primeiros integrantes dos “grupos”, os demais envolvidos logo tratavam de bater em fuga:

“Quanto a atuação de T. C. de F. A. e O. H. não foi possível colher os depoimentos, estando

os mesmos foragidos no país vizinho da Argentina”. (Relatório do IPM nº 226. 16º Esquadrão

de Cavalaria Mecanizado de Francisco Beltrão Paraná. 13 de novembro 1964. P. 276)

Logo na segunda página de relatoria de sentença, que coube aos Capitães Juízes

Ercildo Bessa de Carvalho, Major Presidente, Celio de Jesus Lobão, Juiz Auditor, Alceu

Almeida Ferreira, Capitão Juiz, e Ary Freitas Pires, Capitão Juiz, explicita-se o temor da

organização dos “grupos” e seu caráter político, ideológico e revolucionário. Além disso, a

figura de Leonel Brizola logo é citada como da eminente força que exercia na liderança contra

o regime militar:

O então deputado federal LEONEL DE MOURA BRIZOLA apretexto de criar

grupos de pressão para apoio das apregoadas reformas de base, na realidade

objetivou criar organismos paramilitares com finalidades políticas, grupos esses

denominados de “Comandos Nacionalistas” ou “Grupos de Onze” que deveriam ter

um chefe, líder ou comandante, ao qual os demais membros deveriam subordinação

hierárquica, com finalidade combativa. Tais grupos foram constituídos atreves do

país, assim como na região sudoeste do Paraná, onde foi realizado o IPM que deu

origem ao presente processo.(Sentença do IPM nº 226. Justiça Militar de Curitiba.

Junho de 1969. P. 02).

Chama atenção a comprovação da estreita ligação que Leonel Brizola manteve com os

“grupos” formados. O então deputado federal se manteve próximo e principal articulador, a

Page 11: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

ponto de as lideranças se deslocaram até a cidade do Rio de Janeiro e Porto Alegre para

receberem suas instruções. Mais um elemento que o inquérito nos traz. “No sudoeste do

Paraná, uma das lideranças da organização coube a R. A. que formou vários grupos de

revolucionários, viajou ao Rio de Janeiro e teve contato com Brizola também em Porto

Alegre” (Sentença do IPM nº 226. Justiça Militar de Curitiba. Junho de 1969. P. 02).

As lideranças dos grupos do sudoeste se mantinham diretamente ligadas com o

comando brizolista. Em depoimento, uma testemunha de acusação revela:

Em juízo, a testemunha de L.N. confirma que A. P. recebeu correspondência de

Brizola. Em juízo, a mesma testemunha confirma em depoimento que C. F. recebeu

carta de Brizola, tendo angariado assinaturas e convidado elementos para fazerem

parte desses grupos. Em seguida, passou telegrama a Brizola e procurou manter

contato com o mesmo indo para a Guanabara, Uruguaiana, e Santo Ângelo.

(Sentença do IPM nº 226. Justiça Militar de Curitiba. Junho de 1969. P. 05)

Os registros do inquérito comprovam a metódica organização dos “Grupos de Onze”

na região. Mantinham contato efetivo, se não era diretamente com Brizola, o faziam com o

comando geral do movimento. Seguindo na normativa, as atas elaboradas pelos grupos eram

encaminhadas para a organização central, como também recebiam modelos destas atas. A

rádio Mayrink Veiga, que centralizava a rede de rádios nacionais na “cadeia da legalidade”,

organizada pelo próprio Brizola, era o destino das referidas atas:

Em Francisco Beltrão, P. F. escreveu a Mayrink Veiga, pedindo o livro ‘Coluna por

um’, recebendo-o e também telegrama de Brizola, acusando a remessa de instruções

para formação de grupos de onze, instruções essas que chegaram posteriormente.

Em seguida providenciou cópias de atas entregando-as a A. A.(Sentença do IPM nº

226. Justiça Militar de Curitiba. Junho de 1969. P. 04) Em reunião passaram a conversar sobre a finalidade dos grupos de onze e

resolveram organizar dois grupos, sendo escolhido R. W, para chefe de um, e N. P.

A. J. para chefe de outro. Tendo A. J. completado seu grupo, logo enviando a lista

para Brizola, por intermédio da Rádio Mayrink Veiga. (Sentença do IPM nº 226.

Justiça Militar de Curitiba. Junho de 1969. P. 05)

Acusados, delatores e testemunhas, relatam detalhes do contexto político que o país

vivia. As tendências ideológicas que se dividiam, refletiam-se, salvas as proporções, na região

sudoeste paranaense. Adeptos da continuidade do regime militar travavam embate político

com idealizadores de uma ruptura com o sistema vigente. A rádio parece ter sido realmente o

maior veículo informativo das disputas políticas. A cadeia conduzida pela Mayrink Veiga

Page 12: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

atingia os lugares mais longínquos e disseminava a ideia de que a derrubada dos militares do

poder, levaria a inúmeras vantagens, uma socialização com distribuição dos bens.

No depoimento de R. F. como testemunha refere-se a C. B. F. que não foi

localizado, por estar foragido. A testemunha afirma que F. ouvia frequentemente a

rádio de Cuba. Convidando frequentemente indivíduos para fazerem parte desses

‘grupos’ assim como criticava as instituições democráticas do país, dizendo que a

ordem político-social seria mudada, com distribuição de terras e gêneros

alimentícios. (Sentença do IPM nº 226. Justiça Militar de Curitiba. Junho de 1969.

P. 05)

Os inflamados discursos de Brizola deixavam a entender que estava incutida a

propaganda comunista. Pelo simples fato, como vimos, em depoimento acima, verificar-se a

crença de que a queda do regime traria uma nova ação política, com a distribuição de terras e

alimentos. O “perigo comunista” era eminente na interpretação da maioria da população.

Muitos dos delatores do grupo dos onze o fizeram na alegação que estavam diante de

indivíduos que pregavam tal ideologia. Bem como as autoridades militares que ao relatarem o

inquérito, faziam menção a esta condição dos arrolados e a definiam como critério. Ou seja,

combate aos elementos que disseminavam as ideias “comunistas”.

Com raras exceções, a maioria dos integrantes eram agricultores com baixo grau de

instrução, no entanto, tinha o conhecimento que o movimento por eles organizados teria uma

finalidade de atuação como guerrilha armada. Entendiam que deveria eclodir antes nos

centros maiores para, depois, disseminar-se pelo país. Um das testemunhas de acusação revela

como os integrantes definiam a ação: “T. A. por sua vez, afirma que D. G. falou sobre os

armamentos que seriam distribuídos nas grandes cidades. No inquérito, B. B. declara que D.

G. disse-lhe que havia entrado armas no Brasil”. (Sentença do IPM nº 226. Justiça Militar de

Curitiba. Junho de 1969. P. 06 e 07).

Ao arrolar o inquérito, o procurador Militar, antes mesmo do julgamento, propõe uma

pena para os acusados na formação dos “Grupos de Onze”, explicitando eminente

preocupação das autoridades diante da formação e ação da organização. Atribuindo a Brizola

o grande perigo como organizador e mentor do movimento.

Em alegações finais, o Dr. Procurador Militar, refere-se a denúncia, indicando os

nomes dos acusados que tiveram atuação marcante na formação dos grupos de onze,

em Francisco Beltrão, Santo Antônio, Capanema e Dionísio Cerqueira. Reporta-se a

declarações de testemunhas, dizendo que os acusados não conseguiram elidir as

Page 13: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

imputações feitas na inicial e que, sem sombra de dúvida exerceram atividade no

sentido de organizar tais grupos, obedecendo à pregação feita pelo deputado Leonel

Brizola. Termina pedindo a condenação de todos a pena de um ano de detenção,

como incursos nas sanções do art. 36, Dec-Lei 314/67. (Sentença do IPM nº 226.

Justiça Militar de Curitiba. Junho de 1969. P. 03)

O conselho de Justiça da Auditoria da 5ª Região Militar, apurando o conjunto

ordenado das peças do processo judicial, julgou e entendeu que parte dos envolvidos haviam

assinado as atas sem entenderem a fundo o propósito dos grupos. No entanto, com base nos

autos, os aliciadores e organizadores seriam indivíduos perigosos, capazes de por em risco a

ordem vigente. Eram inimigos do sistema e opositores do regime de governo, intimamente

ligados com o alto comando dos grupos revolucionários e por isso foram condenados.

Portanto, os integrantes foram investigados no caráter de nível de “periculosidade”,

entendendo que parte deles, considerados “ignorantes” e de “nível cultural baixo” deveriam

ser policiados com rigor, mas ficariam em liberdade, ao passo que os agitadores, insufladores

e organizadores deveriam ser punidos.

Diante do exposto, verifica-se que R. A - M. R. P - N. P. A. J. – T. A. e P. S. G,

exerceram atividade efetiva, no sentido de organizar os denominados “grupos de

onze”, conhecendo a finalidade combativa desse grupos e influindo pessoas de nível

cultural mais baixo, no sentido de preencherem as relações a fim de criarem esses

organismos prontos para oferecerem cobertura a seu idealizador, o ex-deputado

Leonel Brizola, pelo poder. (Sentença do IPM nº 226. Justiça Militar de Curitiba.

Junho de 1969. P. 07)

Fica evidenciada a ação combativa contra a organização dos comandos, bem como o

temor que Brizola causava no conjunto da ação opositora ao governo militar. Os lideres que

mantiveram contato com o idealizador, seriam realmente uma ameaça na disseminação das

células revolucionárias. Neste sentido que a Justiça militar estabelece a sentença para os

acusados.

Por essa razão, a cobertura desses acusados tipifica-se o delito definido no Art. 24 da

Lei 1802/53, atualmente Art. 36, do Dec-Lei 510/69 e, assim sendo, RESOLVE o

Conselho Permanente de Justiça, por maioria de votos, CONDENAR, como

condenado tem, os acusados - R. A - M. R. P - N. P. A. J. – T. A. e P. S, já

qualificados anteriormente, à pena de seis meses de reclusão, como incursos nas

sanções do Art.24, lei 1802/53, em definitivo. A pena dos acusados foi fixada nos

termos do Art. 229. § 2º, do C. J. M. (Sentença do IPM nº 226. Justiça Militar de

Curitiba. Junho de 1969. P. 08)

Page 14: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

O inquérito foi instaurado em 13 de Novembro de 1964 e os acusados sentenciados em

Junho de 1969. Tramitou na conjuntura de consolidação do governo militar e na instauração

do A-I 5, Ato Institucional nº 5, que definiu o momento mais duro do regime, dando poder de

exceção ao governo para punir arbitrariamente os que fossem considerados inimigos do

sistema vigente. O governo entendia que precisava ser mais enérgico no combate as “ideias

subversivas”, diagnosticando que haveria um processo adiantado de “guerra revolucionária”

liderada pelos comunistas. Foi nesta conjuntura política que as lideranças dos “grupos de

onze” do sudoeste do Paraná foram enquadrados e condenados.

CONCLUSÃO

A formação dos “grupos de onze” no sudoeste do Paraná, se configura nos moldes das

células que se propagaram pelo restante do país. Caracterizado na representação de um time

de futebol, seguiram a idealização de caráter político contestador de um sistema de poder

vigente. Movimento iniciado com intuito de levar João Goulart ao poder no movimento da

legalidade, se propagou com o ideal de destituir o governo militar instaurado em 1964.

Os autos do inquérito analisado evidenciam a estreita ligação com a figura

centralizadora e idealizadora de Leonel Brizola. A cadeia da legalidade, disseminada pelas

comunicações radiofônicas, chegou ao sudoeste paranaense. Obteve o efeito esperado, ou

seja, instigou a formação combativa de caráter oposicionista, empunhando ideias políticos e

interpretando o real sentido que o movimento ensejava. Os envolvidos aderiram ao

chamamento, organizando comandos e mantendo estreito contato com Brizola. Apesar de

nossos estudos ainda incipientes, somos levados a considerar o verdadeiro efeito que a cadeia

da legalidade atingiu, atestado pelo engajamento, sobretudo de suas lideranças, que

acreditavam no ideal político que se delineava.

Outro elemento que se destaca, é a presença efetiva e atuante do destacamento do

Exército na região. Enquadrou os envolvidos em uma ação policialesca, seguindo os moldes

de orientação nacional, inquirindo os revoltosos no rigor da cartilha de contenção das

organizações guerrilheiras. Atento a todos os movimentos, o destacamento militar de

Francisco Beltrão, atuante desde o conflito agrário de ocupação, preocupou-se em inquirir a

organização dos Grupos de Onze, atentando para o perigo das ideias subversivas. O caráter

Page 15: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

temerário se evidenciou pelo fato dos insurgentes manterem tratativas diretas com Leonel

Brizola, citado, como vimos, inúmeras vezes no inquérito e na sentença da justiça militar.

Vale lembrar que a região de fronteira com os estados platinos, preocupou as autoridades

militares e favoreceu o refúgio de vários dos enquadrados pelas autoridades.

Importante destacar a conjuntura política regional, que parece ter seguido as

tendências do caráter nacional. Pelos depoimentos, observamos que parte da comunidade

interpretava a presença dos grupos com o temor comunista subversivo, efeito da propaganda

do governo militar da época. Assim, muitos cumpriram o papel de delatores das organizações

que se propagavam, entendendo que o melhor seria extirpar a presença de ideias que poderiam

revolucionar a sociedade. Ouvir a programação da rádio Mayriki Veiga, era um parâmetro

para identificar prováveis insurgentes. Era a vertente que disseminava, além das ideias, todo o

processo de organização, estruturação e ação das unidades subversivas.

Por fim, mas não no sentido de esgotarmos as interpretações, observamos o rigor da

jurisprudência militar, tramitando inquérito por cinco anos e concluindo-o com sentença

condenatória para as lideranças dos grupos. Vale retomar aqui a ideia da conjuntura política

que o país atravessava neste exato período. Deflagravam-se movimentos contestatórios ao

regime militar, ao passo que o governo recrudescia a ação combativa aos revoltosos. Neste

contexto político-social de efervescência que as ações dos grupos de onze no sudoeste do

Paraná, tramitam em julgamento pelo tribunal militar. Pela ação propriamente observada e

desencadeada no interior da organização e pelo embate de forças no caráter nacional, temos a

condenação de parte dos réus no desenrolar dos acontecimentos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BALDISSERA, Marli de Almeida. Onde estão os grupos de onze? Os comandos

nacionalistas na região Alto Uruguai-RS. Passo Fundo: UPF, 2005.

BALDISSERA, Marli de Almeida. Onde estão os grupos de onze? Revista de História.

Disponível em: http://www.revistadehistoria.com.br/secao/artigos/onde-estao-os-grupos-de-

onze . Acesso em: 19 Ago. 2013.

COLNAGHI, Maria Cristina. Colonos e Poder: A luta pela terra no sudoeste do Paraná.

1984, 234 f. Dissertação (Mestrado em História)UFPR – Universidade Federal do Paraná,

Curitiba. 1984.

Page 16: SUDOESTE DO PARANÁ 1964: “GRUPO DOS ONZE” NO … · integrantes foram enquadrados pela jurisprudência militar, originando longo e detalhado inquérito militar em novembro de

DUARTE, Adriano Luiz; FONTES, Paulo R. O populismo visto da periferia: adhmarismo e

janismo nos bairros da Mooca e São Miguel Paulista, 1947-1953. Cadernos Arquivo Edgard

Leuenroth, Ed. Da Unicamp, v. 11, p. 87-122, 2004.

FERREIRA, Jorge (Org.). Populismo e sua história: debate e crítica. Rio de Janeiro:

Civilização Brasileira, 2001.

FERREIRA, Jorge. A estratégia do confronto: a frente de mobilização popular. Revista

Brasileira de História, v. 24, n. 47, 2004.

FERREIRA, Jorge. Leonel Brizola, os nacional-revolucionários e a Frente de Mobilização

Popular. FERREIRA Jorge; REIS, Daniel Aarão (Orgs.). Nacionalismo e reformismo

radical – 1945-1964. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. pp. 543-584.

FICO, Carlos. Além do Golpe: versões e controvérsias sobre 1964 e a Ditadura Militar. Rio

de Janeiro/São Paulo: Editora Record, 2004.

GASPARI, Elio. A ditadura envergonhada. São Paulo: Cia. das Letras, 2002.

GOMES, Ângela Maria de Castro; D’ARAUJO, Maria Celina. Getulismo e trabalhismo.

São Paulo: Ática, 1989.

GOMES Iria Zanoni. 1957, a Revolta dos Posseiros. 3ª. Ed. Curitiba: Criar Edições,

2005.

KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários: nos tempos da imprensa alternativa. 2.

ed. rev. e ampliada. São Paulo: Ed. da Universidade de São Paulo, 2003.

LAZIER, Hermógenes; Analise Histórica da posse de terras no sudoeste paranaense.

Francisco Beltrão: Grafite, 1998.

LEITE FILHO, Francisco das Chagas. El Caudillo: Leonel Brizola: um perfil biográfico. São

Paulo: Aquariana, 2008.

PACHECO, Diego. Os times do povo: o grupo dos Onze a memória trabalhista em Santa

Catarina. Visão Global, Joaçaba, v. 14, n. 2, p. 229-250, jul./dez. 2011.

REIS, Daniel Aarão. Ditadura Militar: esquerdas e sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar

Ed. 2005.

WACHOWICZ, Ruy Christovam. Paraná, Sudoeste: ocupação e colonização. Curitiba: Ed.

Vicentina. 1987.