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S TANISLAVSKI NA C ENA A MERICANA

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OS ESTADOS UNIDOS, teatro sempre foi negócio sério, com o qual o Esta-do nunca teve qualquer compromisso, salvo pelo curto período (1935 a1939) do Governo Roosevelt, quando uma pequena verba foi destinada

a socorrer artistas desempregados, no âmbito da política do new deal.Para se ter idéia do significado da palavra negócio, neste caso, basta dizer

que, até 1914, a maior empresa dedicada à sua exploração, a dos irmãos Shubert,controlava 350 salas de espetáculo em todo o país, e que nos anos de 1920 (quandose consolidou a Broadway como o maior centro de produção de mediocridades)havia centenas de pequenas empresas produtoras sob o guarda-chuva da ShubertTeatrical Corporation. Um desdobramento necessário desta idéia: quando o ci-nema surgiu como produto mais lucrativo que o espetáculo teatral sob qualquerponto de vista, esses produtores não hesitaram em transformar seus teatros emsalas de exibição de filmes ou de espetáculos por sessões, na melhor das hipótesesalternando espetáculos de variedades (que podiam incluir até números de strip-tease) e projeções de filmes.

Num ambiente deste tipo, surge quase que naturalmente o star system, emque num primeiro momento grandes estrelas (homens ou mulheres) caem nogosto do público e se tornam chamarizes de bilheteria. Por causa delas os elencosse hierarquizam, atores se especializam e as próprias peças são escritas, desdelogo oferecendo ao público o conhecido “mais do mesmo”. As estrelas são trata-das com a máxima distinção, inclusive monetária – já que “valem mais” que osmeros figurantes –, e em torno delas se desenvolve toda uma rede de interesses egrandes negócios liderada pela imprensa (jornais e publicações especializadas,que incluem livros e revistas).

As condições de trabalho, quando não chegam às raias da escravidão, en-volvem de péssimos salários para quem não é estrela ao aterrorizante lema “oespetáculo tem que continuar”, que despreza condições físicas ou psicológicasdos empregados (atores, técnicos, funcionários), ignora condições mínimas depalco (permitindo que artistas corram riscos de vida) e mesmo de sala – quepodem ser inacreditáveis pulgueiros, para não dizer coisa mais pesada, pois põemem risco a saúde pública e assim por diante. Arte é uma palavra que passa muitolonge do negócio, em larga medida herdada por Hollywood, que o desenvolveuamplamente e assumiu a liderança no setor (o teatro passou a funcionar de modosubordinado, sem nunca perder a condição de “laboratório artístico”), situaçãoque persiste até hoje, pois por enquanto estamos falando de business.

Stanislavski na cena americanaINÁ CAMARGO COSTA

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Não trataremos aqui dastentativas dos trabalhadores – dra-maturgos e atores, principalmen-te – de enfrentar os patrões, poisisto nos levaria longe demais.Mas fique o registro da criaçãode inúmeras organizações sindi-cais que trataram de moderar oapetite dos investidores lutandopor direitos autorais, no casodos dramaturgos, e por mínimascondições de trabalho, no casodos atores e técnicos.

Nosso assunto aqui tem aver com a insatisfação de dra-maturgos, atores e diretoresquanto aos resultados de seutrabalho e com as condições deprodução. Os dramaturgos, co-mo é o caso de um O’Neill noinício dos anos de 1920, porquenão admitiam a hipótese de ver seus textos interpretados por companhias comoas então existentes, e os atores e/ou diretores, porque tinham conhecimento daspossibilidades de atuar de modo diferente, e que já se desenvolviam na Europa,principalmente na Rússia. Desde 1905, quando o Teatro de Arte de Moscou(doravante referido como TAM) fez sua primeira excursão por Paris e Berlim, cir-culavam nos Estados Unidos notícias sobre “uma nova maneira de interpretar”.

Para além de notícias regulares em jornais americanos e ingleses, em 1911a publicação do livro de Gordon Craig (Da arte do teatro), com entusiásticoselogios a Stanislavski, estabelece um padrão de curiosidade sobre o trabalho doator que só tende a se intensificar nos anos seguintes. Por sua vez, a Revoluçãode Outubro de 1917 amplia o raio da curiosidade para o teatro russo (e agorasoviético) como um todo: em 1919 uma revista muito popular (Drama Maga-zine) publica um artigo que, sob o título O teatro dramático russo, já estabeleceaté mesmo as diferenças entre os métodos de Stanislavski e Meierhold.

Finalmente, em 1922 o New York Times traz a notícia que todos os interes-sados em teatro esperavam: nova excursão do TAM, que agora inclui os EstadosUnidos no roteiro. Falando de negócios, esta notícia marca o início de umacampanha publicitária que, por seu alcance e duração, só pode ser comparada àscampanhas de lançamento de filmes de Hollywood. Por exemplo: o correspon-dente do Times em Berlim relata o sucesso da apresentação do Tzar Fiodor e

Stella e L. Adler em Success Story’s, de J. H. Lawson.

Cortesia da Autora

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adianta que não é preciso saber russo para entender tudo o que acontece em cena. Asoutras providências práticas incluíam ampla divulgação por meio de anúncios emtodo tipo de veículo e sobretudo: venda antecipada de ingressos.

Mas, como estamos falando de uma companhia teatral da União Soviéti-ca, os empresários americanos acabaram contando com uma inesperada colabo-ração da direita para o sucesso da empreitada. Em Washington, a seção da AmericanDefense Society promove uma manifestação de protesto, levantando a suspeita

de que o TAM poderia serum bando de espiões so-viéticos e que estavam an-gariando fundos para acausa do comunismo in-ternacional. Com o NewYork Times e o New Repu-blic à frente, a grande im-prensa (cujos interessesem comum com o negó-cio do teatro já foram apon-tados) partiu para a defe-sa da iniciativa, inclusiveem editoriais, em nome daliberdade artística. Umdos grandes jornais publi-cou a declaração de Stanis-lavski em Paris: “Não te-mos ligação com o gover-no soviético. Só estamosinteressados em arte. Nóstrouxemos a nossa arte,não política” – o que, defato, era verdade.

O resultado da campanha ultrapassou as previsões mais otimistas. O TAMestreou em Nova York, em janeiro de 1923, com a casa lotada, e uma temporadaprevista para dois meses foi esticada para três, com direito a novo contrato paranovembro daquele mesmo ano e, desta vez, com o seguinte roteiro: nove sema-nas em Nova York, três em Chicago, uma nas cidades de Boston, Filadélfia, Wa-shington, Pittsburgh, Brooklin, Detroit e Cleveland; três dias em Hartford etambém em New Haven. Esta temporada se encerrou em maio de 1924.

A imprensa deu conta de registrar as mais importantes unanimidades ame-ricanas a respeito dos espetáculos do TAM: a barreira lingüística não prejudicoua fruição dos espetáculos porque se tratava de entender e sentir o que acontecia

Eva Le Galliene (abaixada) em peça de S. Glaspell de 1930

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em cena; no palco assistia-se a uma fatia de vida e não a uma peça de teatro; osatores vivem seus papéis, não os interpretam; e, independentemente de haverhierarquização dos personagens, todos os atores têm igual importância na reali-zação do espetáculo, o que resulta do trabalho conjunto (ensemble), coisa jamaisvista nos Estados Unidos.

Como não podia deixar de ser, os maiores interessados em ver os espetáculosdo TAM eram os próprios atores das inúmeras companhias. Por meio da ActorsEquity (uma organização sindical) obtiveram para a classe a realização de sessõesespeciais que sempre tiveram lotação esgotada. John Barrymore (da dinastia dosDrew), um dos maiores atores do star system, declarou que aqueles espetáculosforam a melhor coisa que se viu na vida em matéria de teatro.

Uma das atrizes do elenco, Maria Uspenskaia, resolveu permanecer nosEstados Unidos e, junto com Richard Boleslavski, veterano do TAM que se en-contrava no país, acabaram sendo contratados para dar aulas de interpretaçãonum empreendimento (igualmente business) que se chamou “American Labora-tory Theatre” iniciado já no ano de 1924. Na verdade, Boleslavski cuidava dateoria que expunha em palestras e Uspenskaia cuidava da prática em suas aulas.

Assim como esses dois, alguns outros veteranos do TAM vieram para osEstados Unidos ao longo dos anos de 1920 e início dos anos de 1930, onde seestabeleceram e assumiram a missão de transmitir o legado de Stanislavski, dosquais vale mencionar Maria e Ivan Lazariev, Leo e Barbara Bulgakov e, finalmen-te, Mikhail Tchékhov, sobrinho do dramaturgo, que passou primeiro pela Ingla-terra, onde fundou um estúdio, e só chegou em Nova York no final dos anos de1930. Ele foi professor do nosso conhecido Yul Brynner.

Por aquilo que já ficou dito, obviamente o “sistema” de Stanislavski nãopodia funcionar no star system americano e a questão do repertório (Ibsen, Gorki,Tchékhov) talvez nem seja a mais determinante. Mais que difícil, impossível paraum empresário teatral seria aceitar que seus elencos se organizassem como ensemblespara ensaiar e apresentar as peças, quaisquer que fossem. Primeiro, pelo temponecessário aos ensaios (enquanto pelo padrão Broadway uma peça podia no má-ximo consumir quatro semanas em ensaios, pelo padrão Stanislavski podia re-querer mais de quatro meses) e, em segundo lugar, pela democratização do tra-balho conjunto que implicava necessariamente a supressão das estrelas (as “gali-nhas dos ovos de ouro” do sistema).

Essa é a razão, por assim dizer, endógena (ao ambiente teatral) por que,desde o início, Stanislavski foi um assunto e um interesse da esquerda americana,ainda que sua introdução no país tenha sido uma operação estritamente de mer-cado. A outra razão do interesse por este mestre do teatro está ligada a seu víncu-lo natural com os problemas sociais e políticos do país, que também se traduzemem textos teatrais e se traduziram em experimentos e iniciativas que se contrapu-nham ao star system.

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O próprio American Laboratory Theatre é um exemplo disso e na mesmaconjuntura apareceram duas iniciativas complementares ou mesmo vinculadas aele. A primeira foi a criação do Civic Repertory Theatre em 1926 por Eva LeGallienne, proveniente de família com tradição no show business, que incorporoua seu elenco a atriz do TAM, Alla Nazimova, e se dedicou a encenar Ibsen eTchékhov segundo o padrão stanislavskiano. A segunda foi o Group Theatre,criado por profissionais do Guild Theatre (a mais avançada, moderna e respeita-da companhia do star system) que foram alunos de Boleslavski e Uspenskaia noAmerican Laboratory Theatre: Harold Clurman, Cheryl Crawford e Lee Strasberg.Foi também no American Laboratory Theatre que Harold Clurman conheceuStella Adler, com quem mais tarde se casaria (na verdade reencontrou a atriz quena infância vira no teatro ídiche de Nova York).

O Group Theatre também merece uma história à parte (já existe razoávelbibliografia a respeito), mas, para o que nos interessa agora, é preciso registrarque com ele pelo menos duas coisas ficaram demonstradas na cena americana. A

Cortesia da Autora

Marlon Brando e Jessica Tandy em Um bonde chamado desejo, de Tennessee Williams, em 1947.

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primeira é obviamente a viabilidade, o interesse e a superioridade do trabalhoteatral realizado por um ensemble. E a segunda foi a consolidação da dramaturgiaséria americana, fenômeno que só aconteceu no século XX e teve como pioneirosna primeira década do século Elmer Rice e Eugene O’Neill.

O capítulo seguinte desta história tem como protagonista Lee Strasberg, oprimeiro diretor do Group Theatre e que passou a ser conhecido como o respon-sável pelos desenvolvimentos propriamente americanos da teoria stanislavskiana,sobretudo nos anos de 1940, quando se tornou o maior mestre de atores noActors’ Studio e “senhor” do “Método”. Sua fama já vinha de algumas das expe-riências no Group e, descontando ao menos em parte a mitologia criada emtorno de sua figura, vale a pena reconstituir em linhas gerais o tema básico da“questão do método” que nos anos de 1950 envolveu a quase totalidade daclasse teatral – e, a esta altura, a cinematográfica também.

Por certo houve disputas diversas para se definir quem seria o legítimo“herdeiro” de Stanislavski nos Estados Unidos já no século XXI; não pode maisser esse o móvel da curiosidade de quem vive num país como o nosso, que sóacompanhou tudo isso muito à distância e sobretudo em seus aspectos inteira-mente transformados em folclore (pelas “publicações especializadas” do própriostar system).

De qualquer modo, o que poderíamos chamar de disputa entre Lee Strasberge Stella Adler tem alguma coisa produtiva que ainda hoje pode ser de interessepara nós. Tendo entrado para o Group em 1930 (ele fora fundado em 1929), elaestreou com seu irmão Luther numa peça de John Howard Lawson, dirigida porLee Strasberg, Success story. O resultado foi tão notável que a peça e sua atuaçãomemorável, especialmente na cena final, se tornaram cult (para usar o nosso jar-gão recente). Sobretudo atores se empenhavam em vê-la e consta que John Barry-more ia ao teatro para estudar seu trabalho. Noel Coward teria visto a peça porsete vezes!

O problema apareceu em seguida, quando a atriz se sentiu tolhida pelométodo de trabalho de Strasberg que, àquela altura, era centrado na exploraçãoda memória afetiva do ator. A atriz afastou-se do grupo, viajou à Europa e emParis conheceu ninguém menos que o próprio Stanislavski. Em uma longa con-versa com ele, concluiu que o seu problema não era com o sistema do mestrerusso, mas sim com a maneira como Strasberg o desenvolvera. Voltando ao Group,começou a dar aulas também, tratando de dar ênfase a aspectos com que Strasbergnão trabalhava, sobretudo o papel da imaginação do ator em seu trabalho. E,liberta das amarras da “memória afetiva”, voltou a encontrar prazer em atuar,criando em 1935 uma Bessie (personagem de Awake and sing, de Clifford Odets,dirigida por Harold Clurman) que também ficou na história.

O Actors’ Studio foi fundado em 1947 por Cheryl Crawford, Elia Kazan eRobert Lewis. Estes dois começaram como estudantes do Group Theatre, mas

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Bobby Lewis já fizera parte do elenco do Civic Repertory Theatre (como, aliás,inúmeros outros membros da primeira turma do Group). Com a saída deste em1948, Lee Strasberg foi convidado a participar do empreendimento e ali encon-trou finalmente o lugar onde levaria suas idéias sobre formação do ator às últimasconseqüências. A partir de 1951 tornou-se o diretor artístico do Studio. Quantoa Stella Adler, com o encerramento em 1939 das atividades do Group, passou alecionar na Erwin Piscator’s Dramatic Workshop da New School for SocialResearch. Mais tarde, em 1949, cria o Stella Adler Acting Studio e, desde então,nunca mais parou de dar aulas. (Para quem gosta de histórias fechadas, Strasbergmorreu em 1982 e Stella Adler em 1992.)

Com essas informações, estão identificados os principais representantesamericanos da Escola de Stanislavski nos Estados Unidos. O detalhe importanteé que ambos são provenientes da vida cultural judaica em Nova York.

Nos anos de 1930, a cultura relevante nos Estados Unidos era de esquerdae isso aparecia de modo mais claro no teatro. Foi esta situação que permitiu aosadeptos de Stanislavski implantarem no país uma cultura teatral infinitamentemais exigente em termos artísticos do que o establishment jamais fora capaz deproduzir. As condições materiais foram criadas pelo crack da Bolsa em 1929, quefez o dinheiro das produções da Broadway virar pó e levou os “grandes produto-res” a baterem em retirada. Mas com os ganhos da Segunda Guerra, eles se rea-linharam e rapidamente retomaram os seus lugares e, sobretudo, o controle ideoló-gico do debate sobre o teatro.

Assim, ao mesmo tempo em que grandes acontecimentos teatrais, amplossucessos de público e bilheteria, eram promovidos pela esquerda, como a revela-ção de Tennessee Williams em 1947 com Um bonde chamado desejo e a de MarlonBrando como um dos maiores atores de sua geração, ou a de Arthur Miller em1949 com A morte de um caixeiro viajante, eles iam sendo neutralizados peloestablishment com o crescente processo de discussão e, finalmente, a desqualificaçãodo “método”. Esta é uma história que ainda não foi devidamente examinadanem pelos próprios estudiosos do teatro americano moderno, mas existem váriosregistros das tentativas, por parte de seus adeptos, de ao menos colocar a discus-são nos seus devidos termos. Os livros de Lee Strasberg (Um sonho de paixão) eRobert Lewis (Método ou loucura), ambos publicados no Brasil, são importantescapítulos dessa verdadeira guerra travada na cena americana, sobretudo a partirdos anos de 1950. Mais recentemente, editoras brasileiras parecem ter descober-to também a contribuição de Stella Adler, mas estamos muito longe de dispor deum quadro mínimo do que se precisa saber em língua portuguesa.

Basicamente, Lewis e Strasberg nos ajudam a entender a preocupação cen-tral de Stanislavski com a formação exigente do ator. Stella Adler, além disso, tema preocupação, que também era de Stanislavski, com o estudo dos principaisdramaturgos do final do século XIX que, em suas palavras, ainda são tão mal

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lidos, mal compreendidos e mal encenados no teatro americano. Se ela estivercerta, a contra-revolução promovida pelo establishment foi vitoriosa em todas asfrentes. E a principal indicação de que sim é o sucesso que faz em um teatropaulista a produção “nacional” de A bela e a fera: teatro infantil para adultos!

Não vemos, entretanto, paradoxo nenhum no fato de que ainda hoje, ape-sar da contra-revolução, os mais relevantes atores do cinema americano, a cujotrabalho temos acesso, tenham sido todos aprendizes dos discípulos americanosde Stanislavski. Para ficar em poucos exemplos: Anne Bancroft, Al Pacino, Geral-dine Page, Harvey Keitel, Dustin Hoffman...

Referências bibliográficas

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TCHEKHOV, Michael. Para o ator. São Paulo: Martins Fontes, 1986.

Iná Camargo Costa é professora associada do Departamento de Teoria Literária e Lite-ratura Comparada da FFLCH-USP e autora de Panorama do Rio Vermelho – Ensaiossobre o teatro americano moderno (São Paulo: Nankin, 2001).