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O mensalão da Globo A história da milionária sonegação da Rede Globo & outras crônicas de mídia

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O mensalão da Globo

A história da milionária sonegação da Rede Globo & outras crônicas

de mídia

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Prefácio

Estou devendo este livro desde o final de 2013, então começo pedindo desculpas por este atraso inconcebível.

Também não deu para fazer um livro impresso, porque me tornei um escritor tão profundamente digital que perdi completamente a manha (que aliás nunca tive) para fazer isso.

Também não quis incomodar nenhuma editora com um tema mais explosivo que uma experiência radioativa.

Denúncias contra a Globo faz levantar, do túmulo da nossa história, muitos fantasmas. As empresas têm medo de mexer com uma corporação tão poderosa, e não lhes tiro a razão.

Felizmente, temos as redes sociais, essa reação do sistema às corporações.

As redes sociais, assim como a internet, nasceram e cresceram à sombra da ditadura branca das mídias comerciais.

Um dia, elas se organizarão melhor e tomarão o poder, e a mídia corporativa será posta em seu lugar de direito: a lixeira da história.

A informação precisa ser livre, e isso não é exatamente um conceito revolucionário, mas um imperativo histórico que ultrapassa e engole o próprio capitalismo, porque o capitalismo também precisa da informação livre para se desenvolver.

Os textos desse livro digital contam a história de uma reportagem coletiva, um marco importante na história da blogosfera e das redes sociais.

A descoberta do esquema bilionário de sonegação da Rede Globo foi como ver um príncipe da persia antiga, que se dizia imortal, sangrar.

E serviu - talvez este tenha sido seu maior trunfo - para mostrar ao Brasil que os blogs também produzem denúncias, e por isso precisam ser respeitados.

Se a imprensa tradicional se pretende uma instituição essencial à democracia, e não quero negar este conceito, ela terá de aceitar também a blogosfera e as redes sociais como igualmente partes do sistema democrático.

Se tiver sabedoria, a imprensa tradicional se beneficiará da presença da blogosfera, que aponta seus vícios, que denuncia suas tramoias, e que publica coisas que ela, a imprensa, jamais publicará, por conflito de interesses.

Não se espera que a Globo denuncie a própria Globo, mas o que assusta um pouco no Brasil é constatar que outras mídias comerciais também não denunciam a Globo, o que revela um esquema autoritário e cartorial de informação, onde as empresas se autoprotegem.

Isso não é imprensa, é máfia.

É contra isso que nos insurgimos, e por isso achamos tão importante levar ao Brasil a denúncia da sonegação da Globo.

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Ao final de cada texto, há o endereço do link do post original no blog. Achei importante fazer isso porque o post contém links, frequentemente fácsímiles de documentos, além da discussão com os internautas, onde também se colhe bastante informação.

Perdoem-me também pelo visual “rústico” do livro: é o melhor que posso fazer no momento.

Boa leitura!

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Bomba! O mensalão da Globo!postado em 27 de junho de 2013

O Cafezinho acaba de ter acesso a uma investigação da Receita Federal sobre uma sonegação milionária da Rede Globo. Trata-se de um processo concluído em 2006, que resultou num auto de infração assinado pela Delegacia da Receita Federal referente à sonegação de R$ 183,14 milhões, em valores não atualizados. Somando juros e multa, já definidos pelo fisco, o valor que a Globo devia ao contribuinte brasileiro em 2006 sobe a R$ 615 milhões. Alguém calcule o quanto isso dá hoje.

A fraude da Globo se deu durante o governo Fernando Henrique Cardoso, numa operação tipicamente tucana, com uso de paraíso fiscal. A emissora disfarçou a compra dos direitos de transmissão dos jogos da Copa do Mundo de 2002 como investimentos em participação societária no exterior. O réu do processo é o cidadão José Roberto Marinho, CPF número 374.224.487-68, proprietário da empresa acusada de sonegação.

Esconder dólares na cueca é coisa de petista aloprado. Se não há provas para o mensalão petista, ou antes, se há provas que o dinheiro da Visanet foi licitamente usado em publicidade, o mensalão da Globo é generoso em documentos que provam sua existência. Mais especificamente, 12 documentos, todos mostrados ao fim do post. Uso o termo mensalão porque a Globo também cultiva seu lobby no congresso. Também usa dinheiro e influência para aprovar ou bloquear leis. O processo correu até o momento em segredo de justiça, já que, no Brasil, apenas documentos relativos a petistas são alvo de vazamento. Tudo que se relaciona à Globo, à Dantas, ao PSDB, permanece quase sempre sob sete chaves. Mesmo quando vem à tôna, a operação para abafar as investigações sempre é bem sucedida. Vide a inércia da Procuradoria em investigar a privataria tucana, e do STF em levar adiante o julgamento do mensalão “mineiro”.

Pedimos encarecidamente ao Ministério Publico, mais que nunca empoderado pelas manifestações de rua, que investigue a sonegação da Globo, exija o ressarcimento dos cofres públicos e peça a condenação dos responsáveis.

O sindicato nacional dos auditores fiscais estima que a sonegação no Brasil totaliza mais de R$ 400 bilhões. Deste total, as organizações Globo respondem por um percentual significativo.

A informação reforça a ideia de que o plebiscito que governo e congresso enviarão ao povo deve incluir a democratização da mídia. O Brasil não pode continuar refém de um monopólio que não contente em lesar o povo sonegando e manipulando informações, também o rouba na forma de crimes contra o fisco.

http://www.ocafezinho.com/2013/06/27/bomba-o-mensalao-da-globo/

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Globo recebeu mensalão dos EUApostado em 29 de junho de 2013

Uma reportagem publicada esta semana no site Carta Maior, fundamentada em livros de jornalistas e historiadores americanos, descreve como os Estados Unidos financiaram empresas brasileiras de mídia, sobretudo as Organizações Globo, para defender seus interesses econômicos, em detrimento do Brasil.

Um trecho:

Em 1962, o grupo Time-Life encontra seu parceiro ideal para entrar de vez no principal ramo das comunicações, a Televisão. A recém-fundada TV Globo, de Roberto Marinho. Era uma estranha sociedade. O capital da Rede Globo era de pouco mais de 200 mil dólares, ao câmbio da época. O aporte dado “por empréstimo” pela Time-Life era de seis milhões de dólares e a empresa tinha um capital dez mil vezes maior.

Observe a data: 1962. A Globo recebeu mensalão dos EUA não para aprovar “reforma da previdência”, conforme a ridícula teoria de Joaquim Barbosa sobre o mensalão do PT. Recebeu mensalão para incitar um golpe de Estado e defender interesses nocivos ao livre desenvolvimento das forças nacionais.

Não por outra razão, um dos refrões de protesto mais populares entre os manifestantes de ruas tem sido: “a verdade é dura, a globo apoiou a ditadura!”

Se somarmos o mensalão dos EUA a todas as regalias que a Globo passou a receber do governo a partir do golpe militar, podemos ter uma vaga ideia de como os Marinho se tornaram a família mais rica do mundo no setor de mídia. Com um detalhe triste, os governos Lula e Dilma continuaram a encher a barriga do monstro. Nos últimos 10 anos, a Globo recebeu cerca de R$ 6 bilhões em publicidade federal.

A Globo acaba de admitir, em comunicado, que sonegou impostos federais através de uma operação em paraíso fiscal, confirmando o furo deste blog.

A emissora afirma que pagou a multa. A informação que eu tinha era de que não havia pago. A ver. O que importa aqui é detectar o modus operandis da Globo há muitos anos. Apoiando golpes de Estado, inventando manobras para sonegar tributos, manipulando informações, editando debates políticos para favorecer um candidato. Com a internet e as redes sociais, este poderio tem sido contestado, mas a própria Globo também usa a internet para se tornar mais poderosa.

Enfim, reitero o que disse nos posts anteriores que tratam da fraude tributária da Globo. Quem dera o problema dos platinados fosse apenas um caso de sonegação de impostos! O maior dano que a Globo faz à democracia é ser a cabeça de um cartel que monopoliza a informação no país. O gigante popular, quando acordar de vez, terá que enfrentar esse outro gigante, que nunca esteve dormindo.

http://www.ocafezinho.com/2013/06/29/globo-recebeu-mensalao-dos-eua/

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Mensalão da Globo: se pagou, mostra o DARF!postado em 29 de junho de 2013

Minha fonte me liga para contestar a informação divulgada pela Globo, via UOL, de que ela quitou a dívida de R$ 615 milhões com a Receita Federal.

A dívida é a soma do impostos mais juros e multa, resultantes de um auto de infração no qual a Receita detectou a intenção da Globo de fraudar o fisco. Em valores atualizados, chegaria perto de R$ 1 bilhão.

“Se ela pagou, então mostra o Darf, o povo quer saber”, diz o garganta profunda deste humilde blogueiro. Darf, como todo bom pagador de impostos sabe, é o documento da receita onde o contribuinte registra o pagamento de uma dívida tributária.

“Se tivesse pago, o processo não estaria constando como ‘em trânsito’, conforme se pode verificar com uma Consulta Processual no site da Receita Federal”.

Eu, um simples blogueiro leigo em assuntos tributários, que não trabalho na Receita, posso apenas repetir os garotos que protestam na rua e dizer à Globo: desculpe o transtorno, mostre o DARF.

Eu consultei o site da Receita e, de fato, consta lá “em trânsito” no processo que investiga a fraude da Globo.

Outra coisa, na matéria do UOL, o número do processo está errado. O número é de uma etapa anterior. O processo mais atualizado, com o assunto ” representação fiscal para fins penais”, é o que reproduzimos acima.

De qualquer forma, nos consideramos parcialmente satisfeitos por saber que a Globo admitiu a sua estrepolia. A Receita concluiu que houve uma gravíssima e comprovada fraude tributária e aplicou multa à empresa. O que está em aberto é se a Globo pagou ou não. A Globo diz que sim, mas minha fonte diz que não. Se pagou, diz ela, porque o processo consta ainda “em trânsito”?

Um detalhe: quem responde pela Globo, na matéria do UOL, é uma “assessoria particular”. Não é a assessoria oficial da empresa, nem nenhum funcionário autorizado. “Isso está me cheirando a bucha. Jogaram um verde, pra ver se cola”, diz minha fonte.

Bem, talvez a emissora esteja correndo contra o tempo, juntando as economias aqui e ali, para pagar logo o débito. Para uma família cuja fortuna é estimada em mais de R$ 20 bilhões, uma dívida de R$ 1 bilhão não é nada de outro mundo. Para o povo brasileiro, contudo, é muito dinheiro. Suficiente para dar passe livre a estudantes de todo o Brasil, por um ou dois anos.

A minha fonte pergunta: “por que, após a procuradora da receita dar um voto dela – está lá no slideshare – recomendando que o processo fosse criminalizado, o Ministério Público não entrou em campo? Por que a Globo não foi inscrita na Dívida Ativa da União? A Globo é detentora de uma concessão pública, de maneira que o MP tem obrigação constitucional de investigar minuciosamente qualquer irregularidade.”

Mesmo que a Globo tenha pago a dívida, o que ela terá de provar mostrando o Darf, isso não a exime do crime contra o fisco. Quando um ladrão de galinha é flagrado com a galinha em sua panela, o fato de devolvê-la ao dono não lhe tira a desonra de ter roubado. A gente fica imaginando quantas vezes isso não aconteceu antes, quando sua influência junto às autoridades era ainda maior

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do que hoje. Sendo que sonegação fiscal é o menor crime da Globo. Seus crimes políticos são piores: mensalão dos EUA pra jogar contra o Brasil e apoiar um golpe de Estado; edição de debates em favor de Collor; tentativa de fraudar eleições no Rio de Janeiro, contra o Brizola; tentativas sucessivas de aplicar um golpe em Lula e agora em Dilma. A sonegação e o Darf são o menor problema. Vale um cartaz: não é só o Darf.

http://www.ocafezinho.com/2013/06/29/mensalao-da-globo-se-pagou-mostra-o-darf/

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Mensalão da Globo: a bomba principal ainda vai explodir

postado em 8 de julho de 2013

Com o vazamento de um processo que pode vir a ser o maior escândalo fiscal da história recente, e desmoralizar a Rede Globo, amigos e leitores ficaram bastante procupados com minha segurança física. Um leitor me ligou e perguntou, preocupado: “você tem ideia no que está se metendo? Fica atento a isso, eles fazem a pessoa desaparecer, ter um infarte na rua…”

O mesmo cidadão me deu um conselho, que achei inteligente: distribuir responsabilidades. Apesar da minha admiração por figuras como Assange e Snowden, não quero ficar preso por anos numa embaixada do Equador, nem ser perseguido mundo a fora pela CIA.

Segui os conselhos, e distribuí dicas e sugestões. Agora a matéria deixa de ser apenas um “furo” do Cafezinho: há mais gente de posse das informações. Com Rodrigo Vianna chutando o pau da barraca e revelando que os documentos que vazei são apenas uma pequena parte de uma ampla investigação sobre as atividades da Rede Globo em paraísos fiscais, o caso ganha uma dimensão mais explosiva. Pode ser, como observou Vianna, uma bomba atômica.

Agora todo mundo sabe que existe, em algum lugar, um relatório oficial da Receita que pode ferir gravemente o maior conglomerado de mídia da América Latina. Ainda não foi revelado a público onde está o processo. Mas todos sabem que está próximo, e farejam seu alto grau de radiotividade.

Jornalistas investigativos bem mais competentes do que este modesto blogueiro já estão em campo. O caso virou também uma guerra de gigantes: a Record, que tem antigas contas a acertar com a Globo, já decidiu usar o caso para detonar a rival, o que é ótimo para o Brasil.

As coincidências do caso Globo com as operações de lavagem de dinheiro registradas na “privataria tucana” sugerem ainda possíveis (e escusas) ligações financeiras entre o poder político à época (governo FHC) e a Globo. Não esqueçamos que a Globo não apenas apoiou o processo de privatização, ela foi uma de suas principais formuladoras e articuladoras políticas.

Quero registrar aqui a enorme quantidade de apoios que tenho recebido. Fernando Brito, do Tijolaço, postou-se à nossa porta armado até os dentes com sua verve feroz e agilidade mental incomparável. Altamiro Borges, presidente do Barão de Itararé, me ligou assim que a coisa explodiu para me dar apoio: “Miguel, se precisar de alguma coisa, grita!”

Felizmente, pude responder ao Miro que não precisava de nada, que tenho um exército poderoso, meus leitores, que divulgam o conteúdo, adquirem títulos-fantasia do blog e fazem assinaturas.

Estamos neste pé. Onde foi parar o documento da Receita Federal contendo a investigação completa sobre a Rede Globo? O documento que divulguei foi o único a que tive acesso.

Eu confirmo algumas informações dadas por Rodrigo Vianna:

1) De fato, minha fonte – o “garganta profunda” – afirma que os documentos vazados eram apenas um “aperitivo”. Que a bomba mesmo ainda vai explodir. A movimentação da sociedade e do Congresso será decisiva para exigir, em nome da transparência, que a íntegra destes documentos venha à tôna imediatamente.

2) Os documentos originais, que estranhamente jamais foram digitalizados, sumiram dos arquivos

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da Receita Federal. Ninguém sabe, ninguém viu. Com o caso estourando em toda parte, funcionários entraram em pânico. Eu tinha essa informação há alguns dias, mas preferi aguardar porque não encontrava um “gancho” jornalístico. Vianna conseguiu uma outra fonte que forneceu informações suplementares sobre as dificuldades financeiras que a Globo enfrentava no momento em que a Receita a flagrou com a boca na botija.

A máxima do jornalismo investigativo manda seguir o rastro do dinheiro, aí incluindo dívidas. O caso envolveria, além de lavagem de dinheiro, evasão de divisas, crime contra o sistema financeiro e sonegação fiscal, alguma tentativa de suborno para fazer o processo sumir do mapa, até prescrever? A próprio Globo dá a pista ao afirmar, em sua lacônica resposta, que tem débitos sendo “discutidos” junto ao Conselho de Contribuintes, um órgão civil ligado à Receita, que conta com a participação de membros de associações empresariais. Que dívidas da Globo estão sendo discutidas no Conselho de Contribuintes? Quais seus valores? Porque uma empresa de concessão pública tem direito a tanto sigilo? Quem fazia parte do Conselho de Contribuintes na época em que a tal dívida da Globo foi discutida?

Um auditor fiscal mandou um email para nosso blog para afirmar que acha um tanto estranho a Globo ter pago esta dívida sem esgotar as possibilidades de recorrer. Ou seja, pode ser que esta dívida ainda esteja sendo “discutida” no Conselho de Contribuintes.

Assim como o Globo conseguiu pressionar o Supremo Tribunal Federal a julgar às pressas a Ação Penal 470, para que nenhum crime prescrevesse, a sociedade também deve cobrar o Ministério Público, a Polícia Federal e a Receita, para que investigue o caso da sonegação da Globo antes que seus supostos crimes prescrevam. É inacreditável que a Globo continue pressionando o STF a mandar prender Henrique Pizzolato e Genoíno, sem provas (ou antes, com provas inocentando-os!), e saia impune de um crime fiscal para o qual existe uma ampla investigação já pronta, e concluída!

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Os mistérios da Globo no exteriorpostado em 7 agosto de 2013

Continuemos onde paramos no post anterior, intitulado “Pizzolato é inocente, já a Globo“. Eu divulguei o documento de criação da DTH, uma corporação na Flórida, controlada pela Globo. Apenas no documento de fundação encontramos a referência à Globo. Nos outros, porém, aparece o mesmo endereço da emissora carioca, rua Afrânio de Melo Franco 135. A mesma empresa é citada no processo de concordata requerida pelos credores contra Globo:

Os documentos podem ser todos baixados neste site:

http://search.sunbiz.org/Inquiry/CorporationSearch/SearchResultDetail/FeiNumber/forp-f96000004851-054ac567-f719-43b6-af65-88ec0922fc98/223466176/Page1

A princípio, não há nada demais em se criar uma corporação na Flórida ou Delaware. A Globo não é um ministro do STF, nem usou imóvel funcional como sede da empresa, como fez Joaquim Barbosa.

Meu interesse pelos negócios da Globo nos EUA é porque eles nos ajudarão a entender os motivos que poderiam levar a emissora a cometer um ato tão desesperado como mandar roubar o processo de sonegação na Receita Federal, onde constava uma dívida de R$ 615 milhões a ser paga em até 30 dias, conforme mostram os documentos que publicamos aqui.

Em 2004, o Supremo Tribunal Federal acatou (clique aqui) um pedido da Justiça suíça de enviar documentos relativos aos contratos da TV Globo e uma de suas empresas no exterior, a Globo Overseas Investments B.V. (citada no processo da Receita), com a firma suíça ISMM, posteriormente condenada duramente por corrupção e lavagem de dinheiro em negociatas dos direitos de transmissão da Copa de 2002.

No documento do STF fala-se na intenção da Suiça de participar de interrogatórios conduzidos pelo Ministério Público com os senhores Marcelo Campos Pinto e Fernando Viegas Rodrigues Filho. O primeiro era diretor da TV Globo e, segundo a Veja, o todo-poderoso da emissora na área de esportes. O outro é o diretor financeiro da Globo. Por que o Ministério Público investigava esses personagens? O que eles sabiam de tão importante a ponto de autoridades suíças gastarem dinheiro de seus contribuintes para se deslocarem até aqui, participar das audiências, com apoio de tradutores? Que documentos são esses, da Globo e Globo Overseas, que interessavam às autoridades suíças?

Na internet, encontro um livro de John Horne and Wolfram Manzenreiter, intitulado “The World Cup e television futball”, que traz algumas informações sobre o caso. Segundo os autores, a Fifa descobriu que US$ 60 milhões “supostamente pagos pela TV Globo pelos direitos da Copa de 2002 jamais puderam ser rastreados”.

Como assim?

Mas cruzemos o oceano e voltemos aos Estados Unidos, onde a Globo enfrentava um problemaço por causa de uma dívida de US$ 1,18 bilhão. Um grupo de credores entrara com uma ação para exigir a concordata da Globo nos EUA, alegando que a emissora possuía, desde 1996, uma empresa instalada no país, a DTH Corp., criada na Florida. O documento de criação da DTH, assinado pelo executivo Roberto Pinheiro, representante da Globo, foi apresentado no post anterior, e pode ser baixado na íntegra aqui.

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A Globo conseguiu, porém, uma liminar judicial para sustar o processo de concordata, que poderia gerar perda de patrimônio. As credoras apelaram novamente e conseguiram uma vitória que logo se tornou popular na literatura jurídica norte-americana.

Em 2004, o distrito sul da Justiça de Nova York cancelou a liminar da Globo e manteve o processo de concordata.

Se eu estiver errado, algum entendido me corrija, mas tudo leva a crer que a Globo estava em dificuldades crescentes ao final de 2004. A dívida de US$ 1,2 bilhão vinha sendo cobrada judicialmente em NY. Segundo notícia publicada na BBC Brasil, a dívida chegava a quase US$ 2 bilhões. Pouco mais de um ano depois, uma de suas operações em paraíso fiscal é flagrada pela Receita Federal do Brasil, que lhe aplica uma senhora multa, totalizando uma dívida de R$ 615 milhões em 2006.

Ou seja, a Globo tinha motivos para ficar, no mínimo, nervosa. A crise do mensalão, porém, lhe permitiu respirar por alguns anos, porque qualquer atitude das autoridades, naquele tempo, seria considerada uma retaliação do governo. A partir daí, tem início uma operação de larga envergadora para transformar o mensalão no símbolo da corrupção nacional, desviando a atenção da sociedade dos verdadeiramente grandes escândalos: o Banestado; a privataria; a concentração da mídia em mãos de oligarcas corruptos de um lado, e empresas ligadas ao golpe de 64, de outro; e sobretudo, uma coisa que só agora descobrimos, a existência de fortunas de brasileiros, de mais de R$ 1 trilhão, em paraísos fiscais, boa parte provavelmente fruto de sonegação e lavagem de dinheiro.

Enquanto isso, vende-se aos brasileiros que a prisão de Genoíno, que não tem um centavo no bolso, e de Pizzolato, que vive de sua aposentadoria de funcionário do Banco do Brasil, representa um marco na história da luta contra a corrupção no Brasil. Manipula-se descaradamente a justa indignação dos brasileiros, acumulada durante séculos de opressão e roubalheira, para criar uma ficção mal ajambrada, cheia de buracos, baseada na denúncia de um mentiroso. Enquanto isso, os verdadeiros corruptos, conforme se vê no escândalo do metrô em São Paulo, apontando superfaturamentos milionários desde 1998, continuam impunes! Enquanto isso, o roubo do processo da Globo não é sequer investigado pelo Ministério Público!

Um dia, porém, serão desmascarados.

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Tio Sam não aceitou o beiço da Globopostado em 13 de agosto de 2013

Lula ganhou sua primeira eleição presidencial em 27 de outubro de 2002. No dia seguinte, 28 de outubro de 2002, a Globo declara que não tem mais condições de pagar suas dívidas internacionais. O beiço da Globo, saberíamos algum tempo depois, através de uma reportagem da BBC (e depois confirmada pela própria Globo), remontava a quase dois bilhões de dólares. Em comunicado oficial, divulgado pela Folha de São Paulo, a Globo diria que a razão da moratória seria a “deterioração da situação econômica do Brasil”. A Folha apurou que “a Globo decidiu anunciar a suspensão do pagamento da dívida da Globopar apenas ontem, um dia depois do resultado das eleições presidenciais, para que isso não fosse usado por nenhum dos dois lados da campanha eleitoral.”

Deu inclusive no New York Times.

Diferentemente da Receita Federal do Brasil e do Ministério Público, os credores internacionais não aceitaram passivamente o calote da Globo, e entraram com uma ação judicial pedindo falência compulsória da empresa. A lei de concordata dos EUA é bastante dura com caloteiros de outros países, mas só quando os credores conseguem provar que o devedor tem patrimônio e negócios em território americano. Neste caso, a justiça americana tenta embargar inclusive patrimônio que o réu possua em outros países. Algo assim seria impensável para uma empresa cujo principal ativo é uma concessão pública de TV. Imagine a Globo nas mãos de agiotas de New Jersey?

Os platinados, com apoio do escritório de Sérgio Bermudes, esse mesmo que “pagou do seu bolso” uma festão de aniversário para o ministro do STF, Luiz Fux, e que emprega a filha de Fux e a esposa de Gilmar Mendes, conseguiram sustar a medida, alegando que não possuíam negócios ou propriedades nos EUA. E que os credores tinham que aguardar pacientemente um processo de reestruturação feito sob as leis brasileiras. Usando algumas brechas da lei da falência nos EUA, como o “Forum Non Conveniens” e a “personal jurisdiction”, segundo os quais a justiça americana entende que os EUA não são o melhor fórum para se discutir uma dívida, a Globo conseguiu, ao menos por um tempo, dar o maior beiço da história da mídia mundial.

Entretanto, entre os credores, havia um tal de W.R. Huff Asset Management Co., L.L.C., controlado por um sujeito com fama de durão, espécie de agiota de luxo dos ricaços de Nova York, que não aceitou o calote. A Globopar devia US$ 94 milhões ao fundo, ou 5% da dívida total, o suficiente contudo para enfurecer o velho William Huff. O investidor se uniu a outros prejudicados e o caso então foi para uma corte de apelação no distrito sul de Nova York. De vez em quando a Globo tromba com alguém corajoso. No Brasil, alguns meses mais tarde, o auditor fiscal Alberto Zilé daria um susto de R$ 615 milhões na Globo. Em Nova York, o enfrentamento veio do juiz Victo Marrero, ao tomar uma decisão logo convertida em modelo para casos similares, e objeto de estudos acadêmicos (outros estudos aqui e aqui). E que poderia gerar, aqui no Brasil, um questionamento que nunca aconteceu. A imprensa brasileira abafou fragorosamente a derrota judicial da Globopar em novembro de 2004.

Marrero aceitou o argumento dos credores, segundo os quais a Globopar tinha sim propriedades nos EUA: a DTH Inc, empresa criada sob as leis de Delaware, um conhecido paraíso fiscal em território americano. O endereço, conforme levantou o amigo Fernando Brito, fica na rua dos Laranjas (sic), ou Orange no original. Segundo os credores, essa DTH tinha importante participação acionária em três outras empresas do ramo de TV por assinatura. A própria sigla DTH (“Direct to Home”, ou direto para o lar) é usada para se referir ao negócio. A Globo havia fundado a NET no final da década de 90 e depois se tornaria sócia majoritária da Sky TV.

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Os credores também estranharam que a Globo tivesse obtido empréstimos tão grandes, e alegasse possuir apenas míseros US$ 30 mil no JPMorgan Chase Bank. De qualquer forma, este valor, mesmo pequeno, mais a existência da empresa em Delaware, eram suficientes para fazer a Globo cair na rede e entrar na lei de falência sob território americano.

A esta altura, o velho Huff provavelmente já descobrira que a Globopar controlava a Sky, uma das mais importantes empresas de tv por assinatura em operação no Brasil, e que esse negócio devia ter alguma a coisa a ver com a DTH Inc. Em outubro de 2004, a imprensa mundial trazia uma novidade ainda mais interessante aos credores da Globopar: a bilionário Rupert Murdoch decidira dar uma mãozinha aos irmãos Marinho e se juntar à SKY. A fusão entre a Direct TV, de Murdoch, e SKY, da Globopar, cimentaria a aliança entre os dois grupos de mídia mais reacionários do mundo, dominando 95% do mercado brasileiro. Um monopólio absurdo que seria vergonhosamente aprovado pelo CADE no ano seguinte.

Os olhos de Huff devem ter brilhado e ele foi à luta. E ganhou.

Com a nova decisão da Justiça americana, a Globo teve que sambar para quitar suas dívidas no exterior. Então ela contrata uma firma especializada, a Debevoise & Plimpton LLP, que promove uma brilhante reestruturação das dívidas da Globo. Tão brilhante que ganhou prêmios e se tornou, também, objeto de artigos e estudos, como um case de sucesso.

A reestruturação das dívidas da Globo é relativamente rápida. Boa parte dos débitos é convertida em bônus e ações para seus credores no exterior. Parte dela é paga com a venda da Net para outro rei do monopólio, Carlos Slim, cuja Telmex dominava então mais de 90% das linhas telefônicas do México.

Todos monopólios da área de mídia e telecomunicações das Américas se davam as mãos.

Ao final de julho de 2005, a Globo consegue, enfim, dar por encerrado o seu pesadelo financeiro, ao concluir acordo com seus credores. Na verdade, desde meados de abril, o processo já contava com aval dos principais credores. Os recursos de Murdoch e Slim foram fundamentais.

Fim do pesadelo, começo de outro. Os irmãos Marinho mal puderam descansar a cabeça no travesseiro, sonhando com novas estratégias para dominar o Brasil, quando recebem um telefone urgente de seus advogados que trabalham na Rua Afranio de Melo Franco 135. No dia 1 de agosto de 2005, poucos dias após a Globo dar por encerrada a sua “reestruturação financeira”, a Receita Federal envia uma intimação à empresa.

Mas aí a fortuna, até então cruel com os pobres irmãos Marinho, que tiveram inclusive que vender algumas centenas de imóveis que seu pai, Roberto Marinho, acumulara durante a vida, voltou a lhes sorrir. Algumas semanas antes, Roberto Jefferson dera uma entrevista bombástica à Folha de São Paulo. O escândalo caiu do céu para a Globo, que o abraçou com um senso de oportunidade digno da empresa que mais soube se aproveitar da ditadura. Tinha início o mensalão, que iria abalar o país e vergar o governo. Qualquer ação da Receita, neste momento, seria interpretada como uma retaliação autoritária e covarde de um governo corrupto contra a imprensa livre.

A Globo estava, mais uma vez, salva. Com a reeleição de Lula em 2006, porém, a Globo deve ter ficado apavorada com a possibilidade do presidente, fortalecido pela alta popularidade e pela vitória eleitoral, querer se vingar. Na primeira oportunidade, o processo de sonegação, que tinha implicações criminais bem mais pesadas do que a simples sonegação fiscal (se é que se pode chamar uma dívida fiscal de R$ 615 milhões de “simples”), desaparece, após, estranhamente, jamais ter sido digitalizado.

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Tudo ia muito bem, até que… o processo reaparece, ou ao menos parte dele, nas telas de um modesto blog chamado O Cafezinho. Não, senhores, o escândalo Alstom – Siemens é muito grave e merece ser punido com todo o rigor. O Cafezinho e toda a blogosfera, ao contrário da mídia e sua “dupla cautela” está reagindo com justa indignação contra uma roubalheira que já dura mais de 20 anos no estado de São Paulo. Mas não esqueceremos a sonegação da Globo, não enquanto os mistérios envolvendo possível evasão de divisas e lavagem de dinheiro em paraíso fiscal, e o posterior roubo do processo, não forem devidamente solucionados por nosso corajoso e ilibado Ministério Público. Não sei se o “gigante” realmente acordou, se voltou a dormir, mas esse blogueiro aqui permanece de olhos bem abertos!

http://www.ocafezinho.com/2013/08/13/tio-sam-nao-aceitou-o-beico-da-globo/

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As chicanas da Globopostado em 20 de agosto de 2013

Em sua coluna de terça-feira, Miriam Leitão põe de lado suas góticas análises econômicas e publica uma furiosa defesa de Joaquim Barbosa. A urubóloga diverge radicalmente da crítica feita na véspera por Ricardo Noblat, em sua coluna. Leitão diz que Barbosa é um homem muito educado, e que Lewandowski demora-se em falas “excessivamente longas que nada acrescentam de novo”.

Leitão chancela a agressão de Barbosa, a qual descreve gentilmente como um “conflito entre ele e o ministro Ricardo Lewandowski”.

Não vou me estender sobre a inacreditável arrogância de Leitão, expressa já no título,”Questão de ordem”, como se ela tivesse poder oficial de ingerência sobre o julgamento. A jornalista, subitamente arvorada em suprema jurista, diz que “agora, o alongamento não faz sentido.”

Claro, a grande mídia quer um desfecho urgente da Ação Penal 470, porque já identificou que as críticas aos erros do processo se avolumam de maneira assustadora nas redes. Se jamais houve debate nos jornalões bancados pela Secom, agora não se dá mais um pio. A mídia bloqueia qualquer mínima discussão em suas páginas e programas. E exige que o STF faça o mesmo.

É surreal. Joaquim Barbosa (com aval dos colunistas) quer que os ministros do STF chancelem tudo que ele diz. Seus pares devem ser submissos, obedientes, acríticos. E rápidos! Ninguém pode protestar. A ordem já foi dada. Quem divergir, será humilhado em público com as piores ofensas. No dia seguinte, a mídia irá fazer críticas delicadas à compostura do ministro, mas sempre concluindo que ele está com a razão.

O esforço de Lewandowski para debater os embargos é o último lampejo de independência e lucidez de um STF vergado, chantageado e humilhado pelo poder da mídia. O ex-presidente do STF nem terminou sua gestão e assinava prefácio do panfleto golpista de Merval Pereira, principal âncora político da Globo. O atual presidente, Joaquim Barbosa, acaba de empregar seu filho na Globo. Tá tudo dominado.

Eu gostaria apenas de pontuar uma coisa. Os barbosianos chamam de chicana a tentativa de Lewandowski para levar adiante um julgamento mais ponderado. Um julgamento em que os réus não sejam considerados inimigos, mas seres humanos com direito a magistrados imparciais, fiéis aos valores democráticos e humanistas da nossa Constituição.

Como os barbosianos qualificariam as desculpas grotescas da Globo para não pagar seus impostos?

O que pensa Miriam Leitão, Merval Pereira e outros globais, das chicanas de baixíssimo nível, quase caricaturais, usadas pela Globo para fugir ao pagamento dos tributos que sustentam a educação e saúde pública dos brasileiros?

Nem me refiro ao “crime contra ordem tributária”, conforme definiu Alberto Sodré Zile, quando dá a palavra final sobre a sonegação da Globo.

Estou me referindo à chicana da Globo, quando a Receita pede que a empresa se explique. Uma chicana ridícula. Ao invés de se retratar humildemente e pagar seu débito, a empresa tenta uma manobra decididamente hilária: diz que a dívida era da TV Globo, e não da Globo Comunicações. Sim, é isso mesmo.

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É que a TV Globo e a Globopar se fundiram em 2005, no bojo dos esforços do grupo para acertar suas contas na praça, depois que levara uma dura de um juiz de Nova York ao final do ano anterior. E daí nasceu a Globo Comunicação e Participações.

Trata-se da chicana mais cara de pau que jamais uma empresa cometeu na história mundial das sonegações. Autuada pela Receita porque não pagou os impostos da compra dos direitos de transmissão da Copa do Mundo de 2002, a Globo disse que a dívida era da TV Globo, não dela. É como se eu mudasse meu nome para Joaquim Barbosa e dissesse a meus credores que não lhes devo mais nada, porque a dívida deles era com Miguel do Rosário. É como se o Fora do Eixo mudasse seu nome para Dentro do Eixo, e nunca mais pagasse aquele restaurante de Cuiabá que apareceu na Folha.

Pausa para rir durante três meses.

Essa é genuinamente boa. Devo, não nego, mas não pago porque eu não sou mais eu.

A Globo inaugurou a chicana esquizofrênica!

E Miriam Leitão e cia ainda querem dar lição de moral à Lewandowski! E por que? Porque ele está tentando evitar que os réus sejam massacrados num tribunal de exceção, esse teatro ridículo dirigido pela Globo, no qual os ministros agem qual marionetes sem personalidade.

Olha que eu citei apenas uma de várias chicanas que a Globo tentou usar para ludibriar a Receita. Todas são ridículas e todas foram rejeitadas magistralmente pelos auditores da Receita Federal.

Além da chicana, eu e o Fernando Brito, do Tijolaço, inspirados na dupla que investigou o Watergate, estamos investigando uma outra ação “protelatória”. O roubo do processo da Globo.

Segundo o Ministério Público, o crime teve como objetivo “obstar o desdobramento da ação fiscal que nele se desenvolvia, cujo montante ultrapassava 600 milhões de reais”.

É uma chicana atrás da outra.

Os réus da Ação Penal 470 estão lutando, com ajuda dos autos, para mostrar aos ministros do STF que houve erros grosseiros no julgamento, porque ele foi feito às pressas, sob grande pressão da mídia. Documentos foram ocultados deliberadamente (como o Laudo 2828, e o contrato da Visanet), pelo procurador e pelo então relator do processo, Joaquim Barbosa. Não houve um debate satisfatório. Os embargos, por isso mesmo, são necessários, e os debates precisam se dar com serenidade, como deveria ser qualquer debate em que a vida e a honra de cidadãos estão em jogo.

As chicanas da Globo, por sua vez, são ações desprezíveis de uma concessão pública, que recebe bilhões de reais da Secom e de todos os governos, para não pagar o seu maldito imposto de renda!

É inacreditável que um empresa chicaneira, sonegadora e golpista pretenda dar lição de moral à mais alta corte do país. E mais incrível ainda que os ministros se curvem às suas ameaças e chantagens!

http://www.ocafezinho.com/2013/08/20/as-chicanas-da-globo-para-roubar-o-brasil/

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Os documentos da sonegação!

postado em 16 de julho de 2014

Com alguns dias de atraso, mas conforme o prometido pela fonte, recebemos as primeiras páginas da íntegra do processo administrativo da Receita Federal contra a Rede Globo.

As páginas vazadas abaixo constituem o “núcleo” de todo o processo. É o relatório-resumo da Receita Federal sobre o processo em questão. O relatório explica didaticamente como foi a “intrincada engenharia desenvolvida pelas empresas do sistema Globo” para “esconder o real intuito da operação, que seria a aquisição, pela TV Globo, do direito de transmitir a Copa do Mundo de 2002, o que seria tributado pelo imposto de renda”.

Ainda segundo a Receita, houve “em essência, um disfarce para o verdadeiro negócio realizado, que foi a aquisição do direito de transmissão dos jogos da Copa, em vez da compra das quotas da empresa sediada nas Ilhas Virgens Britânicas”.

A engenharia da Globo envolveu 11 empresas, constituídas em diferentes paraísos fiscais. Com exceção da suíça ISMM, empresa responsável por vender licenças de transmissão da Copa para fora da Europa, todas, pertencem, secretamente ou não, ao sistema Globo.

- Empire, Ilhas Virgens Britânicas.- GEE Eventos, Brasil.- Globinter, Antilhas Holandesas.- Globopar, Brasil.- Globo Overseas Investment B/V, Holanda.- Globo Radio, Ilhas Cayman.- ISMM Investments AG, ?.- Globosat, Brasil- Porto Esperança, ?.- Power Company, Uruguai.- TV Globo.

É um relatório duro para a Globo. Os auditores concluem que a empresa “participou, como já se demonstrou, de toda a engenharia praticada com o fito de simular e sonegar”.

Nossa fonte informa que há muitos outros documentos importantes a serem vazados, inclusive com assinaturas dos irmãos Marinho.

Em sua coluna de hoje, Ilimar Franco dá a uma nota (abaixo) que, à luz dessas revelações, criam uma situação irônica, perigosamente irônica, para a Globo.

“Será que é isso mesmo? – Muitos são os que atribuem a derrota do Brasil na Copa à direção dos clubes e das Federações. O craque alemão Schweinsteiger dedicou o título ao presidente do Bayern Munch, Uli Hoeness. O Bayern tem sete jogadores na seleção. E Uli está na cadeia, condenado a três anos e meio de prisão por evasão fiscal de 27,2 milhões de Euros.”

A Receita identificou que a Globo enviou ao exterior, de maio de 2001 a junho de 2002, um total de R$ 549,4 milhões, com o fito de comprar os direitos de transmissão da Copa de 2002, realizada no Japão e na Coréia.

Recentemente, a ONG Tax Justice divulgou que o Brasil é o país que mais sonega impostos no

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mundo. Anualmente, são quase US$ 300 bilhões sonegados, o que dá mais de R$ 600 bilhões, ou 13,4% do PIB.

Apenas a sonegação nos EUA apresenta um valor absoluto maior, mas como seu PIB está muito acima do brasileiro, a sonegação norte-americana corresponde a somente 2,3% do PIB.

Segundo uma pesquisa da Fiesp, a corrupção faz o Estado brasileiro perder de R$ 50 a 84 bilhões por ano, correspondendo a 1 ou 2% do PIB.

Por conta disso, creio que a sociedade civil, que tem se mobilizado de maneira tão enérgica contra a corrupção, deveria entender que, no Brasil, a pior das corrupções tem sido a sonegação.

Inclusive porque há ligação orgânica entre os dois crimes. As grandes empresas sonegam, e usam o dinheiro para pagar caixa 2 de campanhas eleitorais e subornar políticos e burocratas.

Além disso, não se trata apenas de sonegação. Não estamos falando de um zé ruela assalariado que “esquece” de pagar o imposto de renda, ou exagera o preço do dentista para enganar o Leão.

E não adianta apenas “mostrar o Darf”. É preciso esclarecer à opinião pública se houve crimes contra o sistema financeiro, evasão de divisas e lavagem de dinheiro.

Além disso, é preciso quebrar o silêncio criminoso da grande imprensa sempre que o assunto é ela mesmo, sobretudo se o personagem é a sua representante mais poderosa, a Globo.

Em se tratando de uma empresa que nasceu através de grandes empréstimos do Banco do Brasil, e que construiu seu império em cima de uma concessão pública, ela deveria ser a primeira a dar o exemplo da importância do pagamentos dos impostos. Afinal, a Globo, que talvez seja a empresa privada que mais recebe verba pública no país, deveria entender que os tributos servem para lhe sustentar.

Enquanto isso, trabalhadores e classe média vivem sufocados pelo peso dos impostos.

Leiam o documento abaixo e tirem suas próprias conclusões.

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Vazou tudo! Sonegação da Globo está na web!postado em 15 de agosto de 2014

A trágica morte de Eduardo Campos fez passar despercebido o vazamento da íntegra do processo de sonegação da Rede Globo.

Os documentos chegaram simultaneamente a diversos blogs e sites no mundo inteiro. Estão disponíveis nos links abaixo.

Doc 1: http://goo.gl/QaZJdZDoc 2 : http://goo.gl/NOOPpH

São centenas páginas, que agora devem ser analisadas pela inteligência coletiva das redes sociais.

Há páginas com transferências ilegais de valores da Globo e suas laranjas para o exterior, o que pode se configurar crime financeiro, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.

Se quiser uma orientação, leia esse post, que traz o relatório central que resume todos os documentos.

E agora não tem nada a ver com o Cafezinho. O vazamento veio do exterior, por fonte não-identificada, e só não explodiu por causa da comoção nacional causada pela morte de um candidato a presidente da república.

Neste momento, em que a Globo se arrepia toda com a possibilidade de realizar uma grande manipulação emocional da população, com a morte de Eduardo Campos, seria interessante mostrar ao povo brasileiro que a emissora não tem condição moral de ser “árbitro” de nenhuma disputa eleitoral.

É preciso aproveitar o momento para se iniciar uma grande campanha contra a sonegação de impostos.

A democracia brasileira precisa, sim, de um choque moral. Isso implica em rever alguns valores. Para nossa elite, não há interesse em patrocinar campanhas contra a sonegação, porque ela é a que mais sonega no mundo inteiro.

Para se ter uma ideia, em novembro do ano passado, o Valor deu uma notícia que nenhum grande jornal mais popular repercutiu.

A Rússia só está em primeiro lugar em percentual do PIB, e mesmo assim, em “empate técnico” com o Brasil. A sonegação russa corresponde a 14,2% do PIB; a nossa, a 13,4%.

Mas a sonegação brasileira, em valores, é bem maior: US$ 280 bilhões. Em reais, portanto, a sonegação brasileira, em 2011, foi de R$ 636 bilhões! Em 2011, imagina em 2014!

A sonegação russa, em valores, está estimada em US$ 211 bilhões/ ano.

O único país cuja sonegação supera o Brasil em valores são os EUA. A sonegação nos EUA totaliza US$ 337 bilhões, mas isso correspondeu a um percentual de apenas 2,3% de seu PIB.

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Agregando percentual de PIB e valor, portanto, pode-se afirmar que a sonegação brasileira é a maior do mundo!

Uma empresa que ganha dinheiro como concessão pública de TV deveria ser um exemplo, um modelo! E fazer campanha contra a sonegação!

É claro que o Brasil precisa passar por uma reforma tributária!

Os auditores fiscais estimam que, se a sonegação fosse reduzida, a carga tributária poderia ser brutalmente diminuída no país.

Ou poderia acontecer coisa ainda melhor: o Brasil contar com orçamentos sociais de país desenvolvido.

A campanha contra a sonegação deveria ser incorporada a todas as campanhas contra a corrupção, até porque envolve valores muito maiores, e as duas, sonegação e corrupção, estão ligadas organicamente. O dinheiro sonegado é o mesmo usado para corromper.

http://www.ocafezinho.com/2014/08/15/vazou-tudo-sonegacao-da-globo-esta-na-web/

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Não é só o Darf!postado em 2 de julho de 2013

Ontem eu tomei uns chopes com um fera do jornalismo investigativo, na área de finanças. Eu comecei a explicar a ele que eu acho até engraçado a gente detonar a Globo por causa de sonegação fiscal. Acho que me senti como Eliot Ness, quando um de seus subordinados diz que a melhor maneira de pegar Al Capone é através do fisco. Caramba, tanta coisa contra essa empresa: levou mensalão dos EUA para participar do golpe de 64; tentou fraudar eleições no Rio; editou debate entre Collor e Lula; manipula diariamente informações; etc. E a gente vai pegá-la por sonegação?

A figura, experiente em tempestades políticas, olhou para mim e sorriu: “Não é apenas sonegação, Miguel. É crime contra o sistema financeiro, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, formação de quadrilha, além da tentativa de enganar o fisco”.

Nossa senhora! Aí deixei de me sentir um Eliot Ness tupiniquim e passei a me sentir um daqueles garotos do Movimento Passe Livre, que foram às ruas contra o aumento de 20 centavos nas tarifas de ônibus, e viram milhões vir atrás por causa de todos os problemas do Brasil.

A situação da Globo nessa história é a seguinte: se correr o bicho pega, se ficar o bicho come. A emissora diz que pagou, mas não mostra o documento. No entanto, se mostrar o documento, ela confirma o seu crime contra o sistema financeiro. Se não mostrar, pior ainda: deixa no ar que está devendo mais de 1 bilhão de reais ao povo brasileiro; neste caso, deveria estar inscrita na Dívida Ativa da União e não receber mais recursos públicos.

Aí temos uma contradição incrível: segundo o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais, o Brasil perde, por ano, mais de R$ 400 bilhões em sonegação. A legislação brasileira é condescentente, em alguns casos quase conivente em relação aos crimes contra a Receita. Por que, então, os protestos “populares” nunca se lembram de mencionar a “sonegação”, que é um ralo bem maior de recursos públicos do que a corrupção? Pior, ainda vemos alguns coxinhas imbecis, senão mercenários, indo às ruas pedindo redução de impostos. Eu até concordaria com redução de impostos para setores estratégicos, como pesquisa, tecnologia, para os mais pobres, para setores da classe média. Mas aí teríamos que aumentar a tributação sobre os mais ricos: é assim que se faz nos países desenvolvidos.

Se queremos ver o Brasil mudar mais rápido, temos que arrecadar mais. A única maneira de aumentar a arrecadação sem aumentar os impostos é endurecendo contra a sonegação. Uma lei mais dura contra a sonegação de impostos seria muito mais eficiente, para os cofres públicos, do que uma lei mais dura contra a corrupção. Corrupto de verdade, em alta escala, não vai deixar de roubar porque a Constituição aumentou de 3 para 5 anos a penalidade. Na sua cabeça, ele nunca vai ser pego. Mas um sonegador, se for espremido, será obrigado a pagar, senão quiser fechar as portas de seu negócio.

Para uma empresa de concessão pública, como a Globo, a coisa é mais fácil: não pagou, então não recebe mais recursos públicos, e se insistir no calote, perde a concessão.

Independente dos crimes financeiros da Globo, todavia, não podemos perder de vista que o maior mal que a emissora causa ao país é ser a cabeça de um cartel midiático que trabalha dia e noite contra os interesses nacionais.

Ontem, no mesmo jantar com o grande jornalista investigativo, topamos com um grande colunista político da… grande mídia. Conversamos educadamente por um bom tempo, ele defendendo a sua

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empresa, nós ouvindo e discordando. Lá pelas tantas, quando se viu em apertos na questão do monopólio, ele lembrou que é difícil haver vários grandes jornais num país, e citou o New York Times. Eu rebati lembrando a Guerra do Iraque: matou mais de 1 milhão de iraquianos, e continua matando, e fez os EUA gastarem mais de 1 trilhão de dólares (dinheiro que foi para o bolso da indústria da guerra, que assim ficou mais poderosa e mais golpista), cavando o buraco onde o mundo iria submergir alguns anos depois. A guerra no Iraque aconteceu, entre outras razões, porque o New York Times chancelou a mentira do governo Bush de que Saddam tinha armas de destruição em massa. Um outro colunista da grande imprensa à mesa tentou me atacar, enquanto eu estava no banheiro, com o argumento de que eu defendia Saddam Hussein. Aí começou uma gritaria danada, entre os colunistas e os amigos que me defendiam. Quando voltei, estava instalado o caos. Achamos melhor nos despedirmos, e cada um foi para um lado.

O fato é o seguinte: em todas as grandes manifestações que vimos no país, havia muita crítica à mídia. No entanto, essa informação não chega à TV, não entra na pauta do congresso, nem no discurso da presidenta. Se há uma crise do modelo representativo, há uma crise muito maior do modelo midiático. As empresas de mídia, ainda mais em países em fase de consolidação democrática, caso do Brasil, tem características alarmantes: concentração em poucos proprietários; um poder enorme para desestabilizar governos; acobertam a corrupção de seus aliados; têm uma disposição ideológica profundamente anti-trabalhista, anti-nacional e anti-popular. E agora ficamos sabendo de uma outra face da mídia tupi: sonega impostos, comete crimes contra o sistema financeiro, lava dinheiro em paraísos fiscais.

Vivemos numa democracia aberta onde a liberdade de imprensa é um valor quase absoluto. Queremos continuar assim. Mas democracia também em implica em respeitar o poder soberano do povo de se autogovernar e fazer leis que o beneficiem. Então voltamos mais uma vez à necessidade de democratizarmos a mídia brasileira, através de uma lei moderna, que nos torne menos dependentes dos caprichos de meia dúzia de herdeiros da ditadura.

Repetindo: não é só o Darf. Não é só a sonegação. Queremos que o governo pare de injetar recursos públicos na conta dos bilionários da Globo. A Globo é concessão pública. Tem que botar os anúncios públicos de graça. O dinheiro que o Estado brasileiro gasta com a Globo deveria ir para a educação, para ensinar nossos jovens a pensarem com suas próprias cabeças, a não se tornarem massa de manobra dos golpistas da grande imprensa. Se o governo do PT quiser sobreviver ao “gigante”, terá que ouvir sua voz, que tem gritado forte nas ruas: “a verdade é dura, a Globo apoiou a ditadura!”

http://www.ocafezinho.com/2013/07/02/nao-e-so-o-darf/

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A mãe de todas as batalhaspostado em 4 de julho de 2013

Foi uma manifestação pacífica, mas com muito sangue nas veias! Não quebramos nada, mas xingamos. Ah, como xingamos! Imagine mil pessoas na porta da Globo mandando o Merval e Jabor pra aquele lugar. Imagine mil pessoas ouvindo discursos sobre o mensalão que a Globo levou dos Estados Unidos para apoiar o golpe de 64. Imagina mil pessoas exigindo que o Ministério Público investigue a sonegação bilionária da Vênus Platinada.

O microfone era aberto. Qualquer um que se inscrevia, podia falar, caracterizando o caráter genuinamente democrático da manifestação. Diferente de algumas recentes onde só diretores de Ongs tem voz… As pessoas que trabalham, aqui no Rio, com o tema da democratização da mídia estavam em estado de êxtase, porque conseguimos juntar um público mais diversificado e mais jovem.

Importante: foi uma manifestação com foco. Uma coisa é reunir 20 mil pessoas numa manifestação esquizofrênica, com um grupo pedindo a volta da ditadura, outro pedindo o anarquismo, outro espancando militantes partidários, outro pedindo socialismo, outro pedindo “bolsa Louis Vitton”. Não. Éramos mil pessoas com um foco: protestar contra a Globo, contra o monopólio da mídia.

Um estudante de economia da UFRJ, muito jovem, disse uma coisa bonita: “não estamos aqui para protestar contra a política, mas contra o poderio econômico que sequestra a política. Não estamos aqui para protestar contra a corrupção, mas contra os corruptores”.

O refrão mais cantado foi o mesmo que esteve presente nas grandes manifestações, mas que a grande mídia, naturalmente, escondeu:

“A verdade é dura! A Globo apoiou a ditadura!”

Fizemos uma verdadeira assembléia popular. Claudia de Abreu, coordenadora da Frente Ampla pela Liberdade de Expressão (Fale-Rio), um dos movimentos sociais que lideram os debates sobre democratização da mídia no estado do Rio, fez belíssimos discursos, sempre pontuando que não estávamos ali para uma catarse emocional, mas preparando ações concretas para acabar com o monopólio da grande mídia.

Eu mesmo fiz alguns discursos, explicando a denúncia contra a Globo feita no Cafezinho, sempre enfatizando que a ficha criminal da Globo vai muito além dessas estrepulias em paraísos fiscais. A Globo cometeu crimes históricos contra o Brasil. Lutou contra a criação da Petrobrás. Fez parte do golpe que levou ao suicídio de Vargas. Consolidou-se financeiramente, com dinheiro estrangeiro de um lado, e de golpistas internos, de outro, sobre o cadáver da nossa democracia. Essas coisas tem de ser ensinadas no colégio, para que nossas crianças, adolescentes e jovens parem de sofrer lavagem cerebral dos platinados.

Quantos milhões de brasileiros não deixaram de se alimentar porque a Globo patrocinou e sustentou um golpe de Estado que interrompeu o processo de modernização democrática que apenas se iniciava com João Goulart?

Quantos milhões de brasileiros foram humilhados pela miséria, pela fome, pela falta de escolas, hospitais e emprego, para que a família Marinho se tornasse uma das mais ricas do mundo!

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O ministro Paulo Bernando também foi alvo dos manifestantes. Todos muito indignados com a gestão reacionária, entreguista e covarde do Ministério das Comunicações. Sua recente entrevista à Veja, tentando dar uma facada nas costas dos movimentos que defendem a democratização da mídia, foi a gota d’água. A incompetência da ministra Helena Chagas que não propõe à presidenta a abertura de uma mísera conta de twitter, deixando a direita midiática pautar a agenda política nacional, também foi muito questionada pelos manifestantes.

Ficamos orgulhosos também com a participação dos jovens ativistas da mídia ninja, um dos movimentos mais atuantes nas grandes manifestações populares que tomaram conta do país nas últimas semanas. A manifestação foi toda exibida ao vivo. Tivemos mais de 10 mil pessoas assistindo via mídia ninja, mais uns dez mil pela Pos-TV. Ou seja, vinte mil pessoas acompanharam ao vivo a nossa manifestação!

O momento alto do evento foi quando centenas de pessoas levaram uma fita listrada e “lacraram” a Rede Globo, numa alusão ao que a Polícia Federal costuma fazer com as pequenas rádios comunitárias acusadas de alguma mísera irregularidade burocrática. A Globo pode dever bilhões, pode fraudar, e ninguém faz nada. A gente fez, simbolicamente. Lacramos a TV Globo.

A quantidade de policiais era impressionante. Havia mais PM na porta da Rede Globo do que protegendo a Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro naquela manifestação que terminou em depredação da Alerj. Mais do que em frente à sede do governo. A gente conversou com o major, explicamos o programa da nossa manifestação e nos comprometemos a não deixar nenhum “infiltrado” cometer atos de violência. Mas fizemos questão de pontuar, ao microfone, que o pior vandalismo no Brasil vem das Organizações Globo. Um vandalismo informativo, moral e político. Alguns garotos irresponsáveis quebraram alguns vidros da Alerj. Depredaram uma ou duas cadeiras. A Globo, ao apoiar o golpe de 64, ajudou a destruir os alicerces de todas as assembléias legislativas do país, inclusive da principal, em Brasília.

Houve muitas cantorias. Uma das mais fortes, mais emocionantes, foi “Amanhã vem mais! Amanhã vem mais! Amanhã vem mais!”, que deve ter feito os platinados tremerem com a possibilidade de trazermos dezenas ou mesmo centenas de milhares de pessoas para protestar à sua porta, e à porta de todas as suas filiadas Brasil à fora.

Foram distribuídas quase quinhentos exemplares da revista Retrato do Brasil, do jornalista Raimundo Pereira, que denuncia, com fartura de documentos, a farsa do mensalão, outro golpe patrocinado pela Globo. Vale lembrar que a Globo, aliada a forças obscuras, tem procurado manipular o sentido dos protestos para pressionar o Supremo Tribunal Federal a agir ao arrepio da Constituição. A Globo, além de sonegadora, é adepta de linchamentos – de seus adversários, é claro.

Saímos todos extremamente satisfeitos com o resultado da manifestação. Encerramos a noite num bar das redondezas, falando de política e mídia. O deputado Protógenes Queiroz deu as caras e se dispôs a criar uma CPI da Globo, ao que respondemos que daríamos nosso apoio, mas que, dessa vez, tinha que ser pra valer. Não adianta só colher assinaturas. Tem de ser efetivamente criada e conduzida com coragem, não por nenhum “Odarelo”.

Mais importante que tudo, porém, é que produzimos um ato político que por si só pode ajudar a conscientizar as pessoas de que a concentração da mídia, do jeito que existe no Brasil, representa um perigo à nossa estabilidade democrática. Porque a nossa mídia é golpista, reacionária e anti-trabalhista, de um lado; e detêm um poder financeiro monstruoso, de outro. A concentração apavorante da mídia brasileira em mãos de meia dúzia de herdeiros da ditadura é uma anomalia que os amantes da democracia devem combater com todas as suas forças.

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A presidenta Dilma tem de entender que, se não combater a mídia golpista, não vai conseguir fazer o Brasil avançar. A mídia já está patrocinando greves patronais de caminhoneiros, possivelmente está em conluio com alguns industriais para sabotar a economia, tenta manipular o sentido das manifestações, tudo para trazer a direita de volta ao poder em 2014. O plebiscito proposto pela presidenta, por exemplo, pode vir a se tornar um tiro no pé sem uma nova e mais ousada estratégia de comunicação, e sem um contraponto decente à Globo. A Vênus Platinada, que é a líder do principal partido conservador, quer enterrar o plebiscito, para desmoralizar o governo. Ou então levá-lo adiante, mas dominar o debate, fazendo aprovar seus itens mais nocivos ao povo, como o voto distrital.

Como uma amiga, presente à manifestação, me disse, enquanto observava orgulhosamente as pessoas protestando na porta da Globo: essa é mãe de todas as batalhas!

http://www.ocafezinho.com/2013/07/04/a-mae-de-todas-as-batalhas/

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Domínio do fato pega família Marinhopostado em 10 de julho de 2013.

A teoria do “domínio do fato”, defendida com unhas e dentes pela Globo para prender José Dirceu, pode se voltar contra a família Marinho. Agora que há provas de que documentos incriminadores foram roubados por uma servidora, a mesma teoria, tirada da cartola pelo procurador-geral da República para suprir a falta de provas na Ação Penal 470, pode ser aplicada aqui. Cui prodest? A quem interessava o sumiço dos documentos?

Ao final do post, leia os comunicados da Globo e do Ministério Público, que não trazem nenhum esclarecimento satisfatório à sociedade.

Por que este silêncio sepulcral na grande mídia? Em qualquer país civilizado, haveria equipes de repórteres na porta da casa da servidora que roubou os documentos. Os advogados citados seriam entrevistados. A notícia estaria em rede nacional, interrompendo a grade de programação.

O Ministério Público, em vez de fazer ameaças pueris contra o autor dos vazamentos, deveria estar agora oferecendo delação premiada à servidora. Que importa um vazamento diante de crimes infinitamente maiores: assassinatos, ocultação de provas, corrupção, evasão de divisas, fraudes fiscais bilionárias? O Ministério Público não é o primeiro a vazar documentos contra o PT, contra o governo, contra qualquer adversário da Rede Globo?

Não quero fazer acusações falsas à Globo. Sou um blogueiro humilde. Se a Globo é uma santa, se nunca sonegou, se jamais usou paraísos fiscais para enganar o fisco, se provar tudo isso, publico as explicações neste blog e ainda peço desculpas. Não sou como a Globo, que publica denúncias falsas, que são desmentidas no dia seguinte, e vira a página na maior cara de pau, sem sequer explicar a seus leitores porque agiu como agiu. Sem dar nenhum direito à defesa àquele que vilipendiu por meses. Eu quero ver a Globo pedir desculpas a Henrique Pizzolato, por exemplo. Está aí um dos réus da Ação Penal 470, que a Globo quer ver preso imediatamente, mas não quer mostrar a seus leitores, ao país, que existem provas que o inocentam. Que o dinheiro da Visanet jamais foi público, que os recursos supostamente “desviados” por Pizzolato foram na verdade usados devidamente em campanhas publicitárias. Por que o Globo não informa que o filho de Joaquim Barbosa também recebeu dinheiro de Marcos Valério? Por que Barbosa manteve o laudo 2424, onde constam as informações sobre a relação de seu filho com a DNA Propaganda, e também documentos que inocentavam réus do mensalão, em sigilo absoluto?

Essa história da fraude, todavia, tem contornos cinematográficos. Diferentemente da Globo, a tradição do Cafezinho é mostrar os documentos para depois fazer qualquer tipo de acusação. Mas há coisas para as quais não há documentos. Apenas depoimentos orais. Nos próximos dias, darei mais detalhes da história espetacular por trás do vazamento dos documentos. Isso ainda vai virar um filme de grande bilheteria! Já posso imaginar a fila na porta do cinema para assistir: Globogate, a queda de um império. Será um bom contraponto à Tropa de Elite I e II, bons filmes que mostram a corrupção policial. Falta mostrar uma corrupção que causou males muito mais permanentes ao país: a corrupção midiática. Orson Welles inaugurou o cinema moderno norte-americano com Cidadão Kane, inspirado no barão midiático William Randolph Hearst. Foi corajoso, foi perseguido, e venceu a todos. Quem sabe a gente não reiventa o cinema brasileiro com um filme de qualidade sobre a história e os golpes da família Marinho?

Quem terá coragem de enfrentar os nossos Kanes?

Do meu lado, espero que o exemplo dos blogueiros sujos, enfrentando um dos maiores impérios de

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mídia no mundo, ajude a injetar um pouco de coragem nas autoridades do Executivo, do Legislativo e do Judiciário. Quero ver os ministros do STF enfrentando as chantagens sujas da mídia em nome da Constituição e da Justiça! Quero ver se o Brasil é uma república de banana, onde a corte suprema condena réus sem prova, e inocenta outros para os quais existem farto material probatório, apenas porque a mídia mandou agir assim; ou é uma república soberana e democrática, com magistrados corajosos e independentes, movidos por suas convicções e inspirados numa tradição humanista.

Abaixo os comunicados da Globo e do MP:

Nota da Globo:

Globo rebate acusações falsas sobre processo na Receita Federal

As Organizações Globo divulgaram na noite desta terça-feira (9) um comunicado no qual rebatem as acusações falsas que circularam durante o dia sobre processo da Receita Federal relativo à aquisição de direitos de transmissão da Copa do Mundo de 2002.

A íntegra do comunicado é a seguinte:

Como é de conhecimento público, a Globo Comunicação e Participações adquiriu os direitos de transmissão da Copa do Mundo de 2002. Em 16/10/2006, a emissora foi autuada pela Receita Federal, que entendeu que o negócio se deu de maneira a reduzir a carga tributária da aquisição.

Em 29/11/06, a empresa apresentou sua defesa junto às autoridades, fundada em sua convicção de que não cometeu qualquer irregularidade, tendo apenas escolhido uma forma menos onerosa e mais adequada no momento para realizar o negócio, como é facultado pela legislação brasileira a qualquer contribuinte.

No dia 21/12/06, a defesa da Globo foi rejeitada pelas autoridades. Alguns dias depois da sessão de julgamento, para sua grande surpresa, foi a Globo informada de que os autos do processo administrativo se extraviaram na Receita Federal. Iniciou-se, então, a restauração dos autos, como ocorre sempre nos casos de extravio de processos. A empresa agiu de forma voluntária, fornecendo às autoridades cópias dos documentos originais, tornando com isso possível a completa restauração e o prosseguimento do processo administrativo.

Em 11/10/07, a empresa foi intimada da decisão desfavorável, apresentando recurso em 09/11/07. No dia 30/11/09, a Globo tomou a decisão de aderir ao Refis (Programa de Recuperação Fiscal) e realizar o pagamento do tributo nas condições oferecidas a todos os contribuintes pelo Fisco. O pagamento foi realizado no dia 26/11/09, tendo a empresa peticionado às autoridades informando sua desistência do recurso apresentado (o que ocorreu em 4/02/10).

Diante das informações mentirosas que circularam nesta terça-feira, a Globo Comunicação e Participações esclarece que soube, apenas neste dia 09/07, que uma funcionária da Receita Federal foi processada e condenada criminalmente pelo extravio do processo. A Globo Comunicação e Participações não é parte no processo, não conhece a funcionária e não sabe qual foi sua motivação.

O relato acima contém todas as informações relevantes sobre os fatos em questão que são do conhecimento da empresa. A Globo Comunicação e Participações reitera, ainda, que não tem qualquer dívida em aberto com a Receita. Como ocorre com qualquer grande empresa, a Globo Comunicação e Participações questiona autuações que sofreu, na via administrativa ou na judicial, o que é facultado a todos os contribuintes.

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A Globo Comunicação e Participações reafirma, ainda, acreditar que as autoridades competentes investigarão o vazamento de dados sigilosos. A empresa tomará as medidas judiciais cabíveis contra qualquer acusação falsa que lhe seja dirigida.

Globo Comunicação e Participações.

*

Nota do MP:

09/07/2013 – Nota de Esclarecimento – Procedimento fiscal da Rede Globo

O Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro, diante das recentes notícias veiculadas na mídia, internet e redes sociais, esclarece os seguintes pontos:

1 – Por determinação do Ministério Público Federal, nos idos de 2005, a Receita Federal foi instada a instaurar procedimento administrativo fiscal em relação à alegada sonegação envolvendo empresas da Rede Globo;

2 – Os fatos chegaram ao conhecimento do MPF em audiência realizada em processo de cooperação às autoridades estrangeiras que investigavam denúncias referentes a outras empresas e que não tinham relação direta com a suposta sonegação. Imediatamente, o MPF encaminhou documentos à Receita Federal para avaliação do interesse fiscal;

3 – Conforme estabelece o sistema normativo em vigor, não é possível ao MPF requisitar a instauração de inquérito policial antes da constituição definitiva do crédito tributário ou na hipótese de parcelamento ou quitação integral da dívida. Dessa forma, só cabia ao MPF o acompanhamento do procedimento fiscal, na eventualidade de se ter confirmada a suposta sonegação. Quanto aos demais tipos criminais aventados na mídia, o MPF entende que o enquadramento não seria aplicável por ausência de indícios;

4 – Cabe ressaltar que, em resposta a uma das requisições de acompanhamento do MPF, a Receita Federal informou o extravio dos autos do procedimento fiscal. Isto gerou investigação paralela para identificar os envolvidos, resultando em ação criminal – já com sentença condenatória – contra uma servidora da Receita Federal, bem como a identificação de inúmeras outras fraudes perpetradas por ela. O MPF ofereceu várias oportunidades para que a servidora cooperasse com as investigações e indicasse os eventuais co-autores do delito, porém a ré optou por fazer uso de seu direito constitucional ao silêncio. Quanto ao procedimento fiscal extraviado, foi providenciada a sua reconstituição, com novo tombamento, e a tramitação seguiu seu curso regular;

5 – Em conclusão, tendo em vista o caráter sigiloso da matéria, o MPF, ao zelar pela aplicação das normas em vigor no Estado Democrático de Direito, depara-se consternado com a profusão de documentos que, ao que tudo indica, se originam dos autos do procedimento fiscal criminosamente extraviado.

Assessoria de Comunicação Social

Procuradoria da República no Estado do Rio de Janeiro

http://www.ocafezinho.com/2013/07/10/dominio-do-fato-pega-familia-marinho/

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Polícia Federal confirma abertura de inquérito contra sonegação da Globo!postado em 27 de janeiro de 2014

Agora já temos um número e um delegado responsável. É o inquérito 926 / 2013, e será conduzido pelo delegado federal Rubens Lyra.

O chefe da Delegacia Fazendária da Polícia Federal do Rio de Janeiro, Fabio Ricardo Ciavolih Mota, confirmou à comitiva do Barão de Itararé-RJ que o visitou hoje: o inquérito policial contra os crimes fiscais e financeiros da TV Globo, ocorridos em 2002, foi efetivamente instaurado.

Os crimes financeiros da TV Globo nas Ilhas Virges Britânicas foram identificados inicialmente por uma agência de cooperação internacional. A TV Globo usou uma empresa laranja para adquirir, sem pagar impostos, os direitos de transmissão da Copa do Mundo de 2002.

A agência enviou sua descoberta ao Ministério Público do Brasil, que por sua vez encaminhou o caso à Receita Federal. Os auditores fiscais fizeram uma apuração rigorosa e detectaram graves crimes contra o fisco, aplicando cobrança de multas e juros que, somados à dívida fiscal, totalizavam R$ 615 milhões em 2006. Hoje esse valor já ultrapassa R$ 1 bilhão.

Em seguida, houve um agravante. Os documentos do processo foram roubados. Achou-se uma culpada, uma servidora da Receita, que foi presa, mas, defendida por um dos escritórios de advocacia mais caros do país, foi solta, após conseguir um habeas corpus de Gilmar Mendes.

Em países desenvolvidos, um caso desses estaria sendo investigado por toda a grande imprensa. Aqui no Brasil, a imprensa se cala. Há um silêncio bizarro sobre tudo que diz respeito à Globo, como se fosse um tema tabu nos grandes meios de comunicação.

Um ministro comprar uma tapioca com cartão corporativo é manchete de jornal. Um caso cabeludo de sonegação de impostos, envolvendo mais de R$ 1 bilhão, seguido do roubo do processo, é abafado por uma mídia que parece ter perdido o bonde da história.

Nas “jornadas de junho”, um grito ecoou por todo o país. Foi talvez a frase mais cantada pelos jovens que marchavam nas ruas: “A verdade é dura, a Rede Globo apoiou a ditadura”.

A frase tem um sentido histórico. É como se a sociedade tivesse dito: a democracia voltou; agora elegemos nossos presidentes, governadores e prefeitos por voto direto; chegou a hora de acertar as contas com quem nos traiu, com quem traiu a nossa democracia, e ajudou a criar os obstáculos que impediram a juventude brasileira de ter vivido as alegrias e liberdades dos anos 60 e 70.

O Brasil ainda deve isso a si mesmo. Este ano, faz cinquenta anos que ocorreu um golpe de Estado, que instaurou um longo pesadelo totalitário no país. A nossa mídia, contudo, que hoje se traveste de paladina dos valores democráticos, esquece que foi justamente ela a principal assassina dos valores democráticos. E através de uma campanha sórdida e mentirosa, que enganou milhões de brasileiros, descreveu o golpe de 64 como um movimento democrático, como uma volta à democracia!

A ditadura enriqueceu a Globo, transformou os Marinho na família mais rica do país. E mesmo assim, eles patrocinam esquemas mafiosos de sonegação de imposto?

O caso da sonegação da Globo é emblemático, e deve ser usado como exemplo didático. Se o Brasil

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quiser combater a corrupção, terá que combater também a sonegação de impostos. Se estamos numa democracia, a família mais rica no país não pode ser tratada diferentemente de nenhuma outra. Se um brasileiro comum cometer uma fraude fiscal milionária e for pego pela Receita, será preso sem piedade, e seu caso será exposto publicamente.

Por que a Globo é diferente? A sonegação da Globo deve ser exposta publicamente, porque é uma empresa que sempre viveu de recursos públicos, é uma concessão pública, e se tornou um império midiático e financeiro após apoiar um golpe político que derrubou um governo eleito – uma ação pública, portanto.

Esperamos que a Polícia Federal cumpra sua função democrática de zelar pelo interesse público nacional. E esperamos também que as Comissões da Verdade passem a investigar com mais profundidade a participação das empresas de mídia nas atrocidades políticas que o Brasil testemunhou durante e depois do golpe de 64. Até porque sabemos que a Globo continuou a praticar golpes midiáticos mesmo após a redemocratização, recusando-se a dar visilidade (e mentindo e distorcendo) às passeatas em prol de eleições diretas, manipulando debates presidenciais e, mais recentemente, tentando chancelar a farsa de um candidato (o episódio da bolinha de papel).

O Brasil se cansou de ser enganado e, mais ainda, cansou de dar dinheiro àquele que o engana. Se a Globo cometeu um grave crime contra o fisco, como é possível que continue recebendo bilhões em recursos públicos?

http://www.ocafezinho.com/2014/01/27/policia-federal-confirma-abertura-de-inquerito-contra-sonegacao-da-globo/

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A mídia brasileira não defende a liberdade de expressão!postado em 19 de janeiro de 2015

É preciso enterrar esta mentira.

A mídia brasileira não defende a liberdade de expressão.

Nem absoluta, nem parcial, nem nenhum tipo de liberdade de expressão.

A única liberdade que a mídia conhece é aquela que lhe interessa comercialmente.

A mídia brasileira não deu quase nada sobre a sonegação da Rede Globo.

Houve um sinistro pacto de silêncio em torno do assunto, apesar de envolver 1 bilhão de reais, roubo de processo e lavagem de dinheiro em diversas off shore no exterior.

A mídia brasileira apoiou o golpe, sustentou a ditadura e se enriqueceu à margem de um regime totalitário que censurava, matava e prendia quem tinha coragem de se expressar livremente.

Além disso, a liberdade de expressão não existe num regime de monopólio.

O sistema de comunicação brasileiro não é democrático e, portanto, não é livre.

E se não é livre, não existe liberdade de expressão.

O poder de poucas famílias sobre tvs, rádios e jornais, não encontra paralelo no mundo democrático.

O arcabouço legal, após o fim da lei de imprensa, também não colabora para a liberdade de expressão.

Ricos e poderosos podem processar judicialmente qualquer um que lhes incomode. Como não há lei, depende-se da opinião de juízes, que infelizmente ainda formam, no Brasil, um estamento patrimonialista a serviço da classe dominante

É o caso, por exemplo, de Ali Kamel, que processa vários blogueiros, por conta de ninharias. Ninguém lhe chamou de ladrão. Ninguém ofendeu sua família. Ninguém o desrespeitou como pessoa.

Houve apenas humor, chiste e, no meu caso, uma crítica política ao chefe do jornalismo do maior monopólio da América Latina.

Não existe liberdade de expressão nem na própria mídia.

Se alguém elogiar um político do qual a mídia não gosta, é demitido.

Se alguém fizer uma charge crítica ao político que a mídia gosta, é demitido.

O jornalismo brasileiro encontra-se cada vez mais oprimido por um patronato sectário.

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Não há liberdade nenhuma!

Enquanto todas as profissões liberais se expandem no Brasil (médicos, advogados, arquitetos, etc), o jornalismo declina.

Os salários são cada vez menores, há cada vez menos empregos. Os jornalistas se sentem cada vez mais oprimidos nas redações.

Não podem pensar, não podem falar, não podem desenhar, não podem sequer desabafar nas redes sociais.

Quer dizer, podem desabafar sim, desde que o desabafo seja agradável aos patrões!

Podem falar o que quiser, desde que toquem conforme a música dos barões da mídia!

E agora a mídia brasileira, uma mídia monopolista, conservadora, golpista, astutamente, toma para si a bandeira de Charlie, um jornalzinho nascido na luta contra os monopólios, contra os conservadores, e que sempre defendeu, de verdade, a democracia.

No enterro de Charb, seus amigos cantaram a Internacional, a famosa canção revolucionária, com os punhos erguidos, e Jean-Luc Melechon, uma das principais lideranças da esquerda francesa, fez o discurso principal.

Melechon foi o candidato a presidente da Frente de Esquerda, nas eleições de 2012. É um homem público extremamente sério e respeitado pela esquerda européia.

A esquerda francesa defende a Palestina, defende os imigrantes, defende todas as minorias, lança candidatos muçulmanos, contra uma direita cada vez mais racista, cada vez mais reacionária quando o tema é imigração.

A nossa mídia nunca fez um “Globo Repórter” em detalhes sobre o socialismo francês, que inclui um sistema tributário progressivo, leis sobre a herança e sobre as grandes fortunas, educação e saúde públicas para todos.

O socialismo francês hoje está em crise inclusive por seus excessos, e pelos vícios do próprio homem. Por exemplo, há 25 anos, o Estado francês, a partir de conselhos de psicanalistas, começou uma nova política em relação aos órfãos. Ao invés de orfanatos, as crianças eram alocadas em famílias que receberiam auxílio do Estado para criá-las. Resultado: uma quantidade crescente de famílias que rejeitavam os filhos quando este completavam 18 anos, e o Estado parava de pagar o auxílio.

Os terroristas do atentado são um exemplo. Eles foram criados por famílias que recebiam auxílio do Estado, e foram rejeitados em seguida, ingressando no mundo do crime e, depois, aderindo ao terrorismo.

A mídia brasileira é uma talentosa alquimista. Ela consegue inverter tudo. No primeiro dia da ditadura, os jornais diziam que a democracia tinha voltado.

Transformaram a democracia de Jango em ditadura, e a ditadura em democracia.

E agora transformam um jornalzinho comunista-libertário de Paris em ícone da sua visão distorcida, monopolista, hipócrita de liberdade de expressão!

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Os chargistas do Globo apenas podem fazer charges que corroborem a linha reacionária do jornal.

Nenhum chargista do Globo tem ou terá liberdade de expressão para praticar uma arte livre e irreverente!

Sobretudo se a crítica deriva de uma ideologia socialista, anarquista ou libertária, como era a dos chargistas do Charlie.

Ao contrário, a mídia demite imediatamente qualquer empregado que se manifeste com liberdade, sobretudo se esta liberdade se volta em defesa da classe trabalhadora.

O controle da narrativa permite à mídia criar um universo paralelo, para dentro do qual até mesmo a esquerda se vê abduzida.

No afã de ser contra a mídia, muitas vezes fazemos exatamente o jogo dela.

A mídia, malandramente, pegou o discurso de liberdade de expressão, que é um discurso vencedor, e passou a defender um Charlie e uma França que sempre representaram tudo que a nossa mídia não é: socialista e libertária.

No grande jogo da geopolítica mundial, um jogo hoje profundamente midiatizado, a mídia brasileira quer posar ao lado dos vencedores, mesmo que estejamos falando de um jornaliznho comunista e libertário de Paris.

No fundo, ela age certo.

A esquerda, neste caso, é que pode ter cometido um erro, ao se deixar levar por um pensamento binário (a mídia é favor, então sou contra), permitindo que a mídia brasileira se finja de paladina de valores que ela, a mídia, historicamente, nunca defendeu: a democracia e a liberdade de expressão.

A mídia brasileira, tal como ela é hoje, se consolidou na ditadura.

Jornalzinhos como Charlie Hebdo, havia de montão no Brasil nos anos 60 e 70, atendendo a atmosfera da época, profundamente libertária. Todos foram censurados. Os jornalistas e chargistas só encontraram emprego em dois ou três jornais do eixo Rio e São Paulo.

Sem concorrentes, sem outros jornais, empresas como Globo e Folha passaram a dar as cartas na opinião pública brasileira, durante décadas, e sua influência cresce vertiginosamente após a redemocratização.

Os poucos artistas do texto e da charge que sobreviveram à hecatombe da ditadura e às terríveis crises econômicas das décadas de 80 e 90, tiveram que se tornar submissos intérpretes do pensamento patronal.

Em suma, temos que deixar isso bem claro: a mídia brasileira é exatamente o contrário de tudo que se pode chamar de liberdade de expressão.

http://www.ocafezinho.com/2015/01/19/a-midia-brasileira-nao-defende-a-liberdade-de-expressao/

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A gosma purulenta e golpista da Globopostado em 9 de dezembro de 2014

Se você pegar os jornais de hoje e torcê-los, sairá um líquido esverdeado e mal cheiroso.

O Globo amanheceu manipulando como se não houvesse amanhã.

O ambiente é perfeito para quem não tem compromisso com nada.

Muita informação, boa parte oriunda de delações premiadas, algumas sem sequer ligação entre si, dando margem a todo o tipo de especulação golpista.

Misture tudo com bastante mensalão e Zé Dirceu e pronto!

O nomezinho de brincadeira, petrolão, vale só para o PT.

Para o PSDB (cujo nome sequer é citado), é “cartel” de trens.

Em editorial, o jornal insinua descaradamente que a defesa, pelo PT, do fim das contribuições legais de empresas a campanhas seria prova de corrupção.

Ou seja, a opinião da maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal, que já votaram a questão, a convicção de todos os movimentos sociais, das milhões de assinaturas recolhidas para reforma política, os milhares de artigos de intelectuais, tudo isso é solenemente desprezado pela Globo.

Todo mundo foi comprado pelo petrolão.

Menos a Globo, é claro, apesar de ser ela a empresa para onde escorrem todos os recursos do país, legais ou ilegais: é onde as empreiteiras anunciam, onde se defendem (pagando caro, obviamente), onde o governo anuncia e onde o governo se defende (pagando publicidade).

Não podemos esquecer que a maior parte do dinheiro do “mensalão”, os recursos da Visanet, também foram parar na Globo, na forma de publicidade. Há documentos comprovando que a Globo recebeu mais de R$ 5 milhões da DNA Propaganda, no contrato da Visanet.

O Bônus de Volume pago à DNA, considerado um dos crimes do mensalão, foi pago pela Globo.

A Globo tem uma vida fácil demais. Em virtude de sua posição monopolista, ela consegue a proeza de ser paga pelo próprio governo para… dar golpe no governo.

Ao cabo, a Globo conclui, no editorial de hoje de seu jornal impresso:

(…) “a expertise petista neste ramo vem de longe — das prefeituras paulistas e também da montagem da rede de apoio partidário à primeira candidatura Lula, em 2002. Já é parte da História o relato das negociações financeiras a portas fechadas entre José Dirceu e Valdemar Costa Neto, então PL, sobre o pagamento do dote de José Alencar, para o empresário ser o vice de Lula. Ali já era o mensalão.

Tudo pode estar interligado, de 2002 a 2014.”

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É um ataque político sórdido, à beira da insanidade. Lembra-me um documentário sobre o John Lennon, em que um maluco invade a sua chácara e dá com o músico no jardim, com alguns amigos. O maluco então grita: “John! Que bom te encontrar! Agora tudo faz sentido!”

Ao que John, delicadamente, responde: “Não, meu chapa, você é que está chapado”.

Se o Globo quiser “interligar” tudo, de 2002 a 2014, deveríamos lembrar todas as manipulações patrocinadas pelo próprio jornal, a começar pela Ação Penal 470.

Ontem Miguel Reale Jr, um respeitado teórico do direito, em artigo para a Folha, acusa o Judiciário e o Ministério Público de estarem, no caso da Lava Jato, recorrendo ao “veneno do arbítrio” e passando “por cima dos princípios constitucionais informativos do processo penal”, com vistas a um suposto combate a corrupção.

Reale, um jurista conservador, faz a mesma crítica que sempre fizemos ao julgamento do mensalão.

As mesmas forças, exatamente as mesmas forças, que forçaram a Ação Penal 470, repetem o modus operandi.

Pegam um escândalo real, e o distorcem integralmente.

As empreiteiras têm negócios com todas as prefeituras e com todos os governos estaduais, ou seja, com todos os partidos, fazem doações para todos, mas a culpa é somente do PT.

O principal delator agora é Augusto Mendonça Neto, da Toyo Setal, um dos fundadores da PEM Engenharia, que por sua vez é uma das sócias da TTrans, uma das principais réus no trensalão.

Parece até piada. O delator do petrolão é réu do trensalão.

O problema, como sempre, é a Babel midiática, a manipulação, que visa apenas confundir e gerar desgaste político contra o PT.

Os leitores se perguntam, perplexos, porque o PT não responde.

Ora, o PT não tem mais quadro. Simples assim.

O partido vem sendo desossado brutalmente desde que ganhou as eleições em 2002.

A única solução para o PT seria investir profundamente na formação de novos quadros.

O PT tem de deixar de ser muquirana e investir dinheiro em cursos de formação de lideranças, para gerar cérebros para si mesmo, que possam participar da luta política no país.

Investir em mídia.

Investir em think tanks.

Investir em juventude.

A mesma coisa vale para o governo.

O governo também foi desossado. E também tem de investir em formação política, em novas

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lideranças, em think tanks, para o bem da nossa democracia.

O terrorismo penal da Ação Penal 470, onde se condenou um porção de gente sem necessidade de prova, em cima de uma verdadeira ficção, deu um excelente resultado.

Apavorou os quadros políticos do governo.

O governo vive acuado, com medo.

Todo mundo orando para que seu nome não seja arrastado no “mar de lama”.

A pena imposta a Marcos Valério, duas vezes maior que a do goleiro Bruno, acusado de matar, esquartejar e dar aos cães a mãe de seu próprio filho, produziu um trauma no sistema jurídico brasileiro.

Por que trauma?

Porque se consumou ali um ato de terrorismo político, midiático e, por fim, judicial.

O governo e o PT ainda não sabem como lidar com isso.

Ambos saem de uma crise e mergulham em outra, sem tempo de respirar ou refletir.

Ganharam as eleições em virtude das políticas sociais, não porque tivessem desenvolvido uma resposta adequada ao golpe jurídico-político que foi a Ação Penal 470, e que, agora vemos, volta à baila.

A Globo quer martelar o termo “petrolão” porque entende que o “mensalão” foi um sucesso político.

Marcos Valério operou para o PSDB durante décadas. Operou um ano para o PT e recebeu uma condenação superior a 40 anos de prisão.

E olha que, com o PSDB, foi dinheiro público purinho da silva. Com o PT, foi verba privada, do Visanet.

Não interessa. Até isso conseguiram: transformar os recursos da Visanet em públicos. Ayres Brito, em explanação psicodélica, ao vivo no julgamento do mensalão, disse que a prova de que a Visanet era pública estava em seu nome: “Companhia Brasileira de Meios de Pagamento”.

Para sairmos desse atoleiro golpista em que estamos mergulhados desde 2005 será preciso investir em cultura também, denunciando a mídia como um ator político que se recusa a dizer ao público que ele é isso: um ator político.

A mídia finge que está na plateia, apenas descrevendo o que acontece no palco. Não está. A mídia está no palco, operando as luzes, pagando outros atores, subornando a equipe técnica.

O último filme de Murilo Salles, O Fim e os Meios, retrata a nossa decadência cultural, que por sua vez também sofre com o monopólio.

É um filme ruim, medíocre, porque não questiona a imprensa.

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O antagonista é um político caricato. A jornalista é uma heroína.

O primeiro filme moderno, Cidadão Kane, é um questionamento à imprensa e ao monopólio da mídia.

Desde então o cinema americano tem produzindo inúmeras obras para questionar o papel da mídia e da imprensa na democracia.

Aqui, não, porque a Globo também domina o cinema. Para o filme fazer sucesso, precisa ter ator da Globo. Para o filme vender, tem de anunciar na Globo.

Não há sequer literatura de ficção questionando o papel da mídia.

Vivemos uma ditadura branca, onde o assunto mais importante de uma democracia pós-moderna, a mídia, não pode ser debatido com liberdade.

Pelo Tijolaço, sabemos agora que o novo ataque midiático, via Gilmar Mendes, atacando Dilma pelo flanco eleitoral, é uma doação da Gerdau que também foi feita, em igual valor, para Aécio Neves e Marina.

Essa é razão pela qual os “técnicos do TSE” não querem aprovar as contas de Dilma.

Alguém aí ouviu a opinião dos “técnicos do TSE” sobre a mesma doação, da mesma Gerdau, para Aécio e Marina?

Alguém aí ouviu a opinião dos “técnicos do TSE” sobre o jatinho fantasma de Marina Silva?

Alguém aí leu os editorais da nossa mídia falando nisso?

Eu só sei que, quando Dilma tomar posse, em janeiro de 2015, e quando o novo ministério estiver formado, a pressão das bases será violentíssima para que o governo entre na luta pela democracia.

Falar em reforma política sem falar antes em democracia da mídia é piada.

Democracia da mídia é muito mais do que aprovar uma lei democrática no Congresso.

É investir na luta contra o monopólio da informação.

É parar de anunciar na grande mídia e investir na pluralidade, como manda a Constituição e o bom senso democrático.

Como será possível discutir reforma política, ou qualquer reforma, se a direita golpista, através do monopólio econômico, mantém o controle da agenda política nacional?

Vide o caso de Gilmar Mendes, prendendo há quase um ano (!), a votação sobre a doação de empresa a partido político.

Não dá mais para um país com essa magnitude ter uma agenda política pautada por duas ou três famílias que devem sua fortuna e poder à ditadura militar, e à toda corrupção inerente a um ambiente político autoritário.

http://www.ocafezinho.com/2014/12/09/a-gosma-purulenta-e-golpista-da-globo/

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Porque eu sou Charlie

postado em 12 de janeiro de 2015

Dante Alighieri, no Canto XXVIII, do Inferno, traça uma caricatura de Maomé infinitamente mais brutal e ofensiva do que jamais nenhum desenhista contemporâneo ousou fazer.

Ao chegar à região mais profunda do oitavo círculo do inferno, onde penavam as almas daqueles que, em vida, haviam semeado discórdias (para os católicos italianos, era o que Maomé tinha feito), Dante se depara com homens com membros retalhados, cabeças mutiladas, intestinos pendurados.

Entre eles, destaca-se Maomé:

Già veggia, per mezzul perdere o lulla,Com’io vidi un, così non si perdugia,Rotto dal mento infin dove si trulla:Tra le gambe pendevam le minugia;la corata pareva e ‘l tristo saccoche merda fa di quel che si trangugia.

Tradução literal:

Assim como um barril, que o meio perde ou o fundo,Eu vi um homem (não se fura assim um barril),Rasgado desde o queixo até onde se digere:Entre as pernas pendiam os intestinos;

Os pulmões apareciam expostos, e também o triste saco (estômago)que transforma em merda o que se come.

*

Não sei como nenhum jihadista não se lembrou de fuzilar membros das incontáveis associações de amantes da poesia de Dante.

Trata-se um ataque “terrível” ao principal ídolo do islamismo. Mas é arte, é expressão. Dante não merece morrer por causa disso. Ninguém merece morrer por causa de uma expressão artística.

A arte não precisa ter razão ou ser politicamente correta para ter direito à existir. Não precisa ser boazinha ou deixar de ofender os outros. Ela tem direito de existir, porque isso está expresso nos artigos 18 e 19 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, da qual o Brasil é um entusiasta signatário.

*

O assunto é muito sério, porque envolve não apenas uma discussão radical sobre liberdade de expressão, mas sobre o direito à vida!

Uma discussão radical, profunda e embebida em sangue.

O Charlie Hebdo foi acusado, nas redes sociais brasileiras, de racismo, islamofobia, e, de maneira

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geral, de extrapolar os limites da “decência” política.

Na França, a extrema-direita, que sempre foi vítima das charges do Charlie Hebdo, iniciou o movimento “je ne suis pas charlie” (eu não sou charlie).

Aqui no Brasil, curiosamente, parte da esquerda tomou partido contra Charlie Hebdo.

Leonardo Boff publicou texto de um “padre”, também intitulado “Je ne suis Charlie Hebdo”, que me provocou calafrios.

No texto, o autor diz que condena “os atentados em Paris, condeno todos os atentados e toda a violência, apesar de muitas vezes xingar e esbravejar no meio de discussões, sou da paz e me esforço para ter auto controle sobre minhas emoções…”

(…) “Não acho que nenhum dos cartunistas “mereceu” levar um tiro, ninguém o merece, acredito na mudança, na evolução, na conversão. Em momento nenhum, eu quis que os cartunistas da Charlie Hebdo morressem. Mas eu queria que eles evoluíssem, que mudassem… Ainda estou constrangido pelos atentados à verdade, à boa imprensa, à honestidade, que a revista Veja, a Globo e outros veículos da imprensa brasileira promoveram nesta última eleição.”

O autor queria que eles “evoluíssem, que mudassem”…

Como é que é?

Falar isso de um chargista assassinado covardemente com vários tiros, me parece uma falta de noção absoluta.

A esquerda vai adotar a posição de um autor que queria que os cartunistas do Charlie “evoluíssem”?

(Correção: Boff corrigiu seu post, o autor não é um padre, é sujeito chamado Rafo Saldanha. Não faz diferença nenhuma).

Isso é o que podemos chamar de “esquerda burra”.

Além do mais, quando alguém sente necessidade de repetir, tantas vezes, que “em momento nenhum, eu quis que os cartunistas da Charlie Hebdo morressem”, é porque no fundo sabe que emitirá uma opinião sectária e idiota.

Nenhum texto inteligente precisa repetir que “nenhum dos cartunistas mereceu levar um tiro”!

Ora, quanto as acusações de racismo, esse texto do Kiko Nogueira, no Diario do Centro do Mundo, dá uma resposta quase definitiva. As charges supostamente racistas contra uma ministra negra do governo socialista francês, na verdade eram uma defesa de Charlie à uma acusação a ela feita por um político da Frente Nacional, extrema direita francesa. A ministra agradeceu o Charlie e hoje é uma das estão na linha de frente em defesa de sua memória.

As charges contra um negro, também mostradas como racistas, não eram contra a negritude do sujeito, mas sim contra um humorista antissemita, amigo do Le Pen, conhecido por seu reacionarismo de direita, e que, por acaso, é negro.

Para mim, o racismo está na ignorância de não entender que negros também podem ser alvos de charges, não por serem negros, mas por suas ideias e posição.

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Outras capas estão sendo veiculadas, sem contextualização, e até mesmo com tradução apressada, num furor bizarro para descrever um jornal conhecido por suas opiniões progressistas como “racista” ou “preconceituoso”.

Luis Fernando Veríssimo, nosso último cronista de esquerda, afirma que o seu conceito de cidade civilizada é aquela onde se pode sair de madrugada e encontrar um lugar para comer uma sopa, e… comprar um jornal como Charlie Hebdo.

Veríssimo é habitué de Paris há décadas, humorista e desenhista, acompanha desde o início o trabalho do Charlie Hebdo. Diz que é um jornal “nitidamente de esquerda, mas que nunca a livrou das suas gozações. Seu alvo preferencial é a direita religiosa francesa”.

Seria, evidentemente, uma outra violência isentar Charlie Hebdo de críticas.

Há charges pesadas, agressivas, quiçá de mau gosto.

Não deve ser fácil manter um jornal impresso independente, que não explora concessão pública, como a Globo ou o SBT, não usufrui de nenhum monopólio, e quase não tem publicidade.

Há uma tendência pelo escândalo, para chocar o politicamente correto, que suponho ser inerente à sua estratégia de sobrevivência comercial.

Entretanto, devemos tomar cuidado com uma coisa.

Mesmo que o jornal fosse de extrema-direita, mesmo que as acusações de racismo fossem verdadeiras, mesmo que o objetivo do jornal fosse humilhar as minorias.

Mesmo assim, errados estariam aqueles que os mataram. Não o jornal.

O crime capital, em qualquer religião, é o assassinato, não a ofensa.

A liberdade de expressão pressupõe, evidentemente, o direito à qualquer um de dizer o que quiser. Mesmo as coisas mais horríveis.

Esta liberdade pode ser mais ou menos regulada pelo Estado, segundo a legislação de cada sociedade.

Mas jamais, em sociedade nenhuma, ela pode ser regulada pela morte e pelo terrorismo político.

Aqui no Brasil, Sheherazade, apresentadora do SBT, meio que defendeu o direito ao linchamento, quando alguns rapazes brancos de classe média acorrentaram um jovem negro a um poste, no Flamengo (meses depois, os mesmos rapazes foram presos por tráfico, mas sobre isso a Sheherazade não falou), e houve um movimento para que o SBT não mais recebesse verbas federais.

Não se tratava de censurar Sheherazade, mas de impor um limite civilizatório: ela pode falar o que quiser, mas então que não receba dinheiro público para defender linchamentos.

Entretanto, estávamos falando de uma concessão pública, na TV aberta.

O Charlie Hebdo é um jornal impresso, que vive de assinatura. Poucas semanas antes da tragédia,

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eles estavam pedindo ajuda financeira aos leitores.

Não eram nenhum tentáculo do “imperialismo americano ou europeu”. Eram jornalistas e desenhistas tentando ganhar honestamente a vida, usando a criatividade.

Eu entendo o politicamente correto. Entendo também o politicamente incorreto. São ambos necessários, e face da mesma moeda. Precisam conviver em harmonia.

Sem o politicamente incorreto, a vida seria insuportável.

Sem o politicamente correto, idem. Alias, sem o politicamente correto, o politicamente incorreto perderia a graça.

Mas é preciso traçar uma linha divisória entre a civilização e a barbárie. Porque é mais que uma linha. É um abismo, a separar a vida e a morte.

Matar alguém por causa de um desenho é uma barbaridade tão grotesca que deveria congelar imediatamente qualquer crítica que tivéssemos àquele desenho.

Eu sou um blogueiro, e vivo também da criatividade.

Um título, um desenho, um esforço para ser polêmico, pode causar confusão, pode ofender sensibilidades.

As pessoas têm o direito de se sentirem ofendidas, com ou sem razão.

Charges tucanas ofendem profundamente petistas. E vice-versa. Charges anti-católicas ofendem profundamente católicos.

Faz parte do jogo.

Os ofendidos tem o direito de usar a Constituição para responder à ofensa.

Tem o direito de reagir com emoção, com xingamentos.

Podem organizar manifestações e protestos. Em casos extremos, podem até pichar a fachada do jornal e revista.

Mas não tem o direito, evidentemente, de reagir com violência física contra desenhistas e jornalistas.

Nem de justificar a violência física ou reduzir a sua gravidade com argumentos falsamente políticos.

Quando se mata um desenhista, ataca-se toda a sua família, todos os seus amigos, todos os desenhistas do mundo, seja qual for a sua ideologia.

Dito tudo isso, falemos um pouco sobre a manifestação ocorrida em Paris, ontem.

Quase 4 milhões de pessoas!

A maior manifestação pela paz da história da França. A maior do mundo!

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Aqui no Brasil, tentou-se esnobar a manifestação por causa da presença do primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu. Ora, ele era um entre 4 milhões!

E estava ao lado de M. Abbas, o presidente da Autoridade Nacional Palestina.

Os dois, lado a lado, criam um símbolo que constitui um belíssimo gesto de paz.

Não, o terrorismo não está resolvido.

A paz não está resolvida.

O mundo não ficou uma maravilha depois da marcha em Paris.

Mas tudo é um processo.

A extrema-direita francesa não teve presença significativa na marcha em Paris. A Marie Le Pen teve que fazer a sua própria caminhada, mixuruca, numa cidadezinha francesa onde tem votos cativos. Uma marcha puxada pela polícia.

Entendo que setores um pouco viciados da esquerda brasileira, essa esquerda de sofá, confortavelmente instalada num sectarismo fácil, tenham reticência contra manifestações espontâneas, com bandeiras difusas, que terminam em quebra-quebra e que são manipuladas facilmente pela mídia e transformadas em arma política para se criar uma atmosfera de instabilidade.

Entendo, também já as critiquei, mas também já me autocritiquei por esse tipo de receio excessivo.

O que vimos em Paris, todavia, neste domingo, foram 4 milhões de pessoas marchando com um foco específico, pela paz.

A paz é a única bandeira realmente universal, transversal a todas as ideologias, que poderia reunir 4 milhões de pessoas numa mesma passeata.

Não houve um incidente. Não apareceu um único black bloc.

Isso é lindo!

O debate sobre a marcha foi perpassado pela crítica à sua suposta hipocrisia.

“Morreram 2 mil nigerianos hoje, porque ninguém marcha por eles?”

Ora, uma marcha pela paz significa uma marcha contra todo o tipo de guerra, contra todo o tipo de violência, contra todo tipo de terrorismo, seja aquele feito por fanáticos religiosos seja o terrorismo de Estado.

Não podemos cair nesse tipo de sofisma populista barato!

Também precisamos conversar um pouco sobre o islamismo.

Criticar o islamismo não é “islamofobia”.

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O Islã precisa ser criticado, e precisa aprender a ser criticado, inclusive duramente, com sarcasmo, acidez e violência simbólica.

Como todo radicalismo religioso, o islâmico é retrógrado, brutal, discrimina mulheres, gays, minorias e “infiéis”.

No Estado Islâmico (Isis), quase 4 ou 5 milhões de mulheres vivem sob o risco de amputação genital, porque é nisso que os radicais do Isis acreditam, que a mulher não pode ter prazer.

Como assim não podemos criticar isso?

É islamofobia fazer uma crítica radical a esse tipo de fanatismo brutal e desumano?

Há um agravante. O radicalismo islâmico experimenta, há anos, uma perigosa expansão.

O Ocidente, sobretudo os EUA, têm culpa nisso.

Os países mais laicos do Oriente Médio, Iraque e Líbia, nos quais havia separação rigorosa entre religião e política, e onde as mulheres gozavam de plena liberdade civil, foram invadidos e se tornaram, hoje, focos de fanatismo religioso e terrorismo.

A mesma coisa vale para o Irã. .

O Irã tinha um governo laico e democrático, chefiado pelo primeiro-ministro Mohammad Mossadegh, que nacionalizara as empresas petrolíferas. Os EUA não gostaram e patrocinaram um golpe de Estado, que resultou na ditadura pró-ocidental do Xá Reza Pahlevi (1953-1979), que destruiu a democracia, a liberdade de expressão, o laicismo, criando o caldo de cultura política para um contra-golpe dos aiatolás, a única força política nacional ainda organizada.

Antes da marcha deste domingo, o recorde deste tipo de manifestação pertencia à marcha contra a guerra no Iraque.

As guerras do Ocidente, seus golpes, são quase sempre profundamente antipopulares. Por isso, são organizados em segredo e são alimentadas à base de mentiras veiculadas pela mídia.

Sempre que a política internacional é debatida à luz do dia, ela melhora. Por isso a importância da marcha em Paris. Ela obriga os dirigentes a tirar o debate dos porões dos serviços secretos e levá-lo à opinião pública, à verdadeira opinião pública, não aquela viciada e corrompida por uma imprensa mantida sempre à beira da falência.

Aliás, é interessante observar que o principal ataque às populações árabes, palestinas, africanas, e a pobres de todo mundo, jamais aconteceu nas páginas de um jornalzinho de humor atrevido e esquerdista, como era o Charlie Hebdo, e sim nos grandes jornais sérios, que não publicam charges ofensivas, que mantém um comedimento politica e rigorosamente correto.

Entretanto, interessa aos povos que as mudanças se dêem de maneira pacífica e democrática. A violência apenas interessa aos barões da indústria bélica. A eles, e somente a eles, interessa o terrorismo, porque força os Estados a aumentarem seus gastos militares.

Para a direita, de maneira geral, o terrorismo oferece uma série de vantagens. Ele ajuda a abafar o debate político sobre direitos sociais. Afinal, quem se interessará por discutir esse tipo de coisa diante da ameaça à vida de inocentes? Diante da ameaça da barbárie e do caos?

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Para a maioria, para a esquerda, o terrorismo não oferece vantagem nenhuma. Diante do terrorismo, a esquerda encolhe eleitoralmente, e se intimida politicamente.

Mais uma razão para não cometer erros primários, como fazer críticas, algumas delas levianas, outras até mesmo injustas, ao trabalho de desenhistas mortos barbaramente por fanáticos da direita islâmica. Essas críticas, francamente, não tem importância neste momento, e confundem o debate. Fica parecendo falta de solidariedade, falta de respeito, falta de noção, falta de amor à liberdade.

Devemos focar todas as energias na análise das causas que levaram a um ato tão bárbaro. Entre elas, seguramente, está a promoção do ódio, de maneira que não adianta apenas entender a geopolítica.

É preciso reagir sem ódio, sem a tolice de sair distribuindo culpas. Cabe, sobretudo, não culpar as vítimas!

Objetividade, calma, lucidez, tolerância, inteligência, cultura são as únicas armas que possuímos para combater a indústria da guerra, da ignorância, do fanatismo e da morte.

http://www.ocafezinho.com/2015/01/12/porque-eu-sou-charlie-hebdo/

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Porque eu sou Charlie, parte II

postado em 15 de janeiro de 2015.

Tudo bem, eu aceito as críticas.

Até porque entendo que entramos num terreno extremamente perigoso.

Não sei até que ponto é um fenômeno brasileiro ou mundial, mas é impressionante a facilidade com que casos polêmicos se transformam, nas redes sociais, em processos de linchamento.

Alguém opina que o jornal Charlie Hebdo era racista, xenófobo, islamófobo, e todos começam a emitir a mesma opinião.

Quem discorda, entra no pau.

Baixemos as armas.

O que nos interessa é o debate, a polêmica. Esta dialética é a essência não apenas da democracia, mas da própria vida.

Mas é preciso participar sem ódio.

Então vamos começar de novo.

Quis a fortuna, por razões particulares várias, que eu viesse à Paris. Cheguei hoje. Aproveitei para comprar os principais jornais, que, na França, felizmente, trazem opiniões diversas, e tem um viés fortemente progressista.

Os jornais são apenas jornais, não braços de um monopólio que explora concessões públicas.

A França está profundamente consternada com o assassinato dos desenhistas e outros inocentes, no atentando ocorrido há poucos dias, em Paris. O evento é chamado de seu “11 de setembro”.

Consternada não apenas com a barbaridade, mas pelas perigosíssimas armadilhas interpostas diante de si.

Afinal, a França tem mais de 6 milhões de muçulmanos, ou quase 10% de sua população (que é de 66 milhões) para falar apenas nos que possuem cidadania legal. E está plantada diante de centenas de milhões de muçulmanos, vivendo logo ali, do outro lado do Mediterrâneo.

É evidente que o debate sobre liberdade de expressão remexe em feridas políticas e sociais ainda abertas, na França, na Europa, no mundo.

A França inteira se tornou uma grande e efervescente ágora.

O Liberación, nesta quinta-feira, discute a liberdade de expressão com bastante cuidado, sobretudo em face do desafio de explicar, aos franceses e ao mundo, porque se protege as charges de Charlie e se ataca as piadas do humorista Dieudonné, consideradas antissemitas e, no caso mais recente, apologia ao terrorismo.

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Em editorial, o jornal admite que há um equilíbrio tênue, em perpétuo estado de ajustamento, entre o direito à palavra livre e o respeito às crenças religiosas.

“É preciso repetir pela enésima vez: Charlie tem razão”, diz o editorial assinado por Laurent Joffrin, que traduzo e reproduzo abaixo:

“O princípio que nos governa em matéria de liberdade de expressão é claro: nós somos livres para falar, escrever, desenhar, publicar, mas também devemos responder pelo abuso desta liberdade. A regra é a liberdade. A exceção, que deve ser tão rara quanto possível, é o excesso, definido por lei.

Charlie e os jornais que publicam suas caricaturas são o excesso? Não.

Temos o direito, na França, de zombar das religiões, seus símbolos, e mesmo de blasfemar. Assim decidiram os tribunais ao termo de uma jurisprudência longa e evolutiva.

Então, o que são os excessos? A difamação contra pessoas, a incitação à violência ou ao ódio, o racismo no sentido lato, com seu irmão maléfico, o antissemitismo.

As proibições compreendem as injúrias feitas a indivíduos em razão de sua etnia ou religião. A lei é clara: aos indivíduos, vivos, de carne e osso, não aos dogmas e aos símbolos.

É por essa razão que se equivocam profundamente – ou deliberadamente – os que acusam a justiça de praticar dois pesos e duas medidas. Há duas medidas porque a sátira, tal qual a pratica Charlie Hebdo e o antissemitismo de Dieudonné, ou bem a sua apologia ao terrorismo, não se situam no mesmo plano.”

Em seguida, o jornal publica uma longa análise sobre liberdade de expressão. A França sempre viveu um debate feroz sobre o assunto. A reportagem lembra que Charlie Hebdo já foi condenado algumas vezes por seus excessos, assim como Dieudonné já foi absolvido e protegido pela Justiça francesa em várias ocasiões.

As decisões são analisadas caso a caso.

A lei que proíbe a apologia ao terrorismo é antiga, de 1881, mas só foi incorporada ao Código Penal em novembro do ano passado.

Sendo a Justiça uma instituição humana, é claro que a comoção do atentado faz os juízes reagirem com mais dureza.

Dieudonné comparou-se a um dos terroristas envolvidos nos atentados, apenas dias depois dos crimes. É lógico que ele procurou surfar na polêmica, num momento em que milhões de franceses ainda sofriam com a morte de seus artistas, e conseguiu.

A lei não é perfeita, sobretudo uma lei que flerta com o elemento subjetivo.

Mas Dieudonné terá direito à defesa, a recursos, dentro de um dos sistemas penais mais humanistas do mundo. Aos desenhistas e demais inocentes mortos no atentado da semana passada, não houve nada disso: foram executados a sangue frio.

*

O Le Monde também transpira a tensão do momento, e vai procurar a opinião do lado contrário, em

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jornalistas da esquerda síria, ainda traumatizados pela campanha criminosa patrocinada por EUA e Europa, com participação especialmente ativa da França, contra o presidente Assad.

A esquerda síria fazia oposição a Assad, mas viu-se obrigada a defendê-lo em face dos ataques imperialistas ao país.

“Charlie, uma ferida árabe-francesa”, diz matéria que entrevista jornais da esquerda e da direita sírias.

Le Monde lembra ainda do blogueiro saudita condenado a levar mil chicotadas e 10 anos de prisão, por ter “insultado o Islam”.

Na página de opinião, o jornalista Arnaud Leparmentier faz observações pertinentes sobre a necessidade da Europa de adaptar a sua laicidade à presença crescente do islamismo no continente.

Ele conta a história, na Europa, dos choques religiosos, que já produziram inúmeras guerras e milhões de mortos. E que só foram resolvidos após uma catástrofe, a II Guerra.

As leis francesas concernentes à laicidade foram feitas para o homem branco e católico, diz Leparmentier.

Não depreendi de seu texto que ele defenda qualquer recuo, por parte dos legisladores franceses, em relação à laicidade ou liberdade, mas simplesmente que a França procure uma abordagem mais sensível da questão do aumento da presença muçulmana, que já se consolidou como a segunda religião mais importante do país.

Ao final do texto ele sugere, por exemplo, que o Estado introduza feriados muçulmanos no calendário nacional. Uma iniciativa bem bobinha, admito, pois seria muito mais produtivo que a França revisse algumas posições internacionais que andou adotando, como o seu apoio à invasão da Líbia e o suporte aos rebeldes islâmicos que tentavam derrubar o governo sírio.

Um editorial, na mesma página, trata das mortes na Nigéria, mas fazendo uma observação que, acho eu, faltou em nossos debates. Os quase dois mil mortos nos últimos dez dias, na Nigéria, em atentados terroristas e execuções, foram vítimas de extremistas islâmicos, ou seja, foram vítimas do mesmo tipo de violência política, e da mesma ideologia, que matou os desenhistas do Charlie Hebdo.

*

Há o caso, por fim, da demissão de Sine um chargista do Charlie Hebdo, por “antissemitismo”, um fato que está sendo usado hoje no “tribunal moral” montado para condenar o Charlie. Não vou defender o jornal neste caso. Sine era um chargista premiado, e sua demissão se deu por notória pressão do presidente da República, Nicolas Sarkozy, em função de piadas feitas sobre seu filho, Jean Sarkozy, que iria se casar com uma rica herdeira judia.

Talvez tenha havido covardia da direção do Charlie, tanto é que Sine ganhou, na Justiça, uma indenização de 40 mil euros, por demissão injusta.

*

Agora que já pincelei como anda o debate em Paris, trato de dar a minha opinião sobre o tema.

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Explicarei porque aceito as críticas, e as responderei, humildemente.

Em primeiro lugar, limpemos a mesa de alguns conceitos envenenados.

Eu sei que quase todo mundo – em especial no Brasil – é contra a violência política. O nosso debate não é entre os que defendem a execução dos desenhistas e os que a condenam.

A nossa sociedade se tornou por demais complexa, por demais irritada com as mídias corporativas, para aceitar rótulos fáceis, como “je suis charles”.

Se há um movimento forte de “je suis charles”, cria-se logo uma força contrária, dissidente, daqueles que não se sentem confortáveis com esse tipo de slogan.

Isso é normal. A questão não é essa.

O debate sobre liberdade de expressão, no entanto, incendiou-se também no Brasil, e isso nos interessa profundamente.

Alguns disseram que foi um atentado terrorista, à vida humana, e não um ataque à liberdade de expressão.

Não concordo. Foi sim, um atentado precisamente à liberdade de expressão, porque eles foram mortos por causa de suas charges de Maomé.

No Brasil, houve uma enxurrada de acusações contra a revista, com a reprodução de charges e desenhos fora do contexto. É o tal processo de linchamento. Se o contexto de uma charge é explicado, a pessoa, ao invés de refletir, parece ficar ainda mais irritada, e então procura outro desenho, apresentando-o igualmente sem contextualização. Isso aconteceu até o ponto das pessoas começarem a divulgar uma capa do Charlie de 35 anos atrás.

*

Percebi, então, que o debate sobre liberdade de expressão corrompeu-se no Brasil. O entendimento sobre liberdade, tão forte na ditadura, envenenou-se após 20 anos de monopólio da mídia.

Criou-se, de um lado, uma classe, reduzidíssima, de jornalistas e intelectuais, com empregos na grande mídia, que passou a entender a liberdade de expressão como uma liberdade exclusiva das empresas.

De outro, temos um número crescente de pessoas que passou a associar a liberdade de expressão ao arbítrio da mídia para destruir reputações.

O editorial do Liberación, citado acima, trata bem deste ponto no conceito de liberdade de expressão. Busca-se a liberdade total para se criticar instituições, dogmas, religiões. Mas os indivíduos de carne e osso devem ser protegidos.

No Brasil, a mídia conseguiu a proeza de enfiar a injúria aos indivíduos, o assassinato de reputação, dentro do mesmo saco da liberdade de expressão.

No caso da militância petista, que sofre na pele desde 2003 uma guerra sem quartel da mídia contra suas lideranças, ela passou a associar liberdade de expressão às diatribes de Diogo Mainardi e Reinaldo Azevedo.

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Em função do monopólio, de um lado, e do abuso, de outro, a liberdade de expressão se tornou sinônimo, para setores da esquerda, da humilhação imposta pelos ricos e seus meios de comunicação, aos símbolos e representantes políticos das classes trabalhadoras.

Mas é um erro, claro. A liberdade de expressão sempre foi, e sempre será, uma grande conquista de todas as classes, e como qualquer conquista universal, beneficia muito mais o pobre, que é maioria, do que o rico. Desde que, é claro, se combata o monopólio, que provoca uma absurda e injusta desigualdade na distribuição do direito à opinião e ao humor.

*

Outro motivo de confusão, no debate, corresponde à sensibilidade do brasileiro.

Diante daquelas capas escandalosas do Charlie Hebdo, mostrando candidatos ao Vaticano enrabando-se uns aos outros, o presidente de pinto de fora, maomé mostrando a bunda, etc, os brasileiros tiveram, de maneira geral, a mesma reação de Leonardo Boff.

Nosso teólogo da libertação, em tese um religioso mais liberal, mandou-me um twitter, anexado a uma compilação de capas do Charlie, com a frase fatal: “para tudo tem um limite”.

Este é um erro, porém, gerado por um choque de culturas, e se nós sentimos isso, imaginem o choque entre a França e as sociedades ultraconservadoras do oriente médio?

Imaginamos o francês como um sujeito sóbrio, sério, moderado. Pode até ser, mas a sua tradição, no campo das artes, é profundamente anárquica, iconoclasta, escandalosa.

Estive relendo, justamente para escrever este post, os livros daquele que alguns clamam ser o fundador do francês moderno, e da literatura francesa, François Rabelais. Assim como temos nosso Camões, a Inglaterra tem Shakeaspeare, a Itália tem Dante, a França tem Rabelais.

Suas duas obras mais famosas são Gargantua e Pantagruel. Vou abordar, por economia de espaço, apenas o Gargantua.

Vê-se claramente que o Charlie praticava um humor rabelaisiano, a saber, radical, sarcástico, cruel, escatológico.

Um pequeno poema que abre o Gargantua vale como uma apologia eterna ao humor, à liberdade artística e à paz. Parece que Rabelais o escreveu pensando especialmente nos extremistas:

Amis lecteurs qui ce livre lisez,Dépouillez-vous de toute affection,Et le lisant ne vous scandalisez.Il ne contient mal ni infection.Vrai est qu’ici peu de perfectionVous apprendez, sinon em cas de rire:Autre argument ne peut mon coeur elire.Voyant le deuil, qui vous mine e consomme,Mieux est de rire que de larmes écrire.Pour ce que rire est le propre de l’homme.

Tradução literal minha:

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Amigos leitores que este livro lêem,Libertem-se de todo preconceito,e o lendo não se escandalizem.Ele não contém nenhum mal ou infecção.Verdade que tampouco nenhuma perfeiçãoeles vos ensina, é feito apenas para rir:e meu coração não poderia ter outro objetivo.Contemplando os sofrimentos, que vos consomem,melhor é escrever com risos do que com lágrimas.Porque o riso é o mais próprio do homem.

*

O livro, como já disse, é a história de Gargantua, uma espécie de Macunaíma nobre e francês. No capítulo 5, logo antes de Gargantua nascer, há um engraçadíssimo fluxo de consciência com loas ao vinho, e a seu consumo excessivo. “Or çà à boire, boire ç’à”. Beber por aqui, beber por ali! Sem culpa! Se eu montasse tão bem como eu bebo, estaria já cavalgando no ar! Eu molho a garganta, eu me afogo, eu bebo! E por medo de morrer. Beba sempre que você não morrerá jamais! Se eu não bebo, eu fico a seco. Eis-me morto. No seco, nenhuma alma habita. Sommeliers, ó criadores de novas formas, façam de mim, que não bebo, um bebedor! Ó bebedores! Ó alterados! Meu amigo garçom, encha o meu copo de vinho, eu te suplico! Natura abhoret vacuum. A natureza abomina o vácuo.

No capítulo 6, nasce Gargantua. Sua mãe, Gargamelle, sofre algumas complicações no parto e ele acaba nascendo via orelha esquerda. Só que, ao nascer, ele não grita como as outras crianças. Ao invés de berrar “buá, buá”, Gargantua gritava “a boire, a boire!”, a beber, a beber!, “como que convidando todo mundo a beber”.

Seu pai, Grandgousier, ficou maravilhado que as primeiras palavras do filho…

Daí temos alguns capítulos descrevendo a infância e adolescência de Gargantua, na qual ele se destaca por comer muito, além de cenas bastante pornográficas entre o pequeno Gargantua e suas criadas.

No capítulo 13, Grandgousier descobre que seu filho tinha um espírito refinado e criativo, porque Gargantua lhe ensina um método especial para limpar a bunda sem machucá-la.

Sim, limpar a bunda. E tudo é descrito em detalhes assombrosamente escatológicos.

Após muitas bebedeiras, Gargantua chega a Paris, onde ele se depara, segundo o texto, com um povo “tão idiota, tão embasbacado, e tão inepto por natureza: que um palhaço de rua, um artista de marionetes, um jumento carregando sinos, um tocador de viola, reunirá mais gente que jamais conseguiria um bom pregador evangélico”.

Daí que o povo, fascinado por Gargantua, que era um gigante, começa a segui-lo por toda a parte, obrigando-o a se refugiar no alto da Notre Dame.

E o que faz Gargantua, lá no alto, contemplando a multidão reunida abaixo?

Ele tira seu membro para fora e mija.

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Um xixi tão abundante que inunda a cidade inteira e afoga milhares.

Daí vem o nome de Paris. Gargantua inundou a cidade com xixi apenas por diversão, “pra rir”, ou em francês, “par ris”.

Em seguida, Gargantua conhece um monge que só pensa em beber, de manhã, tarde e noite, e mesmo assim é o monge mais corajoso e mais guerreiro. Após vencerem uma importante batalha, Gargantua permite que o monge funde um mosteiro só para ele, com regras especiais, onde todos poderão acordar a hora que quiser, comer e beber à vontade, casarem-se com as mulheres, e viverem em liberdade.

Obviamente que o livro de Rabelais foi considerado uma grande ofensa à religião católica.

Sua consolidação como um clássico, também é óbvio, se deu durante o processo da revolução francesa, em que se afirmou o princípio da laicidade do Estado.

*

Desde então as artes francesas sempre se notabilizaram pelo escândalo, pelos excessos, pelo enfrentamento atrevido a toda forma de autoridade, no Estado, na Igreja, nas convenções sociais.

Essa é a confusão. Os “leigos” em cultura francesa acham que estão se deparando com xenofobia, islamofobia, porque as charges são agressivas. Mas não é verdade. Os desenhos do Charlie são herdeiros da tradição estética francesa, voltada para a escatologia, o excesso, o escândalo.

Se você pegar as charges do mesmo Charlie Hebdo sobre a igreja católica, o Vaticano, o Papa, o presidente da república, encontrará exatamente o mesmo tipo de estética.

Por isso, eu aceito humildemente todas as críticas dos leitores, respeito todas as suas opiniões, entendo que todos, ou quase todos estão preocupados (às vezes mesmo sem ter consciência disso) com princípios democráticos, a saber, não haver dois pesos e duas medidas, mas insisto que ainda “je suis charlie”.

http://www.ocafezinho.com/2015/01/15/porque-eu-sou-charlie-parte-ii/

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Porque eu sou Charlie, parte 3 (final)postado em 17 de janeiro de 2015

Liberdade de expressão, para a Globo, vale só para blogueiros de Cuba e chargistas de Paris.

Para blogueiros do Brasil, é só porrada e processo na Justiça. De vez em quando morre um blogueiro assassinado, sem que haja qualquer repercussão em nossa mídia.

Eu sempre detestei essas ondas linchatórias das redes sociais, que não admitem o contraditório, e vão num crescendo que se transforma rapidamente numa grande fogueira inquisitória.

No caso do Charlie, com a sua redação dizimada, e seus desenhistas mortos, sem poderem se defender, fiquei particularmente indignado com as acusações apressadas contra seu trabalho.

E mais chocado ainda porque as acusações partiram principalmente da esquerda, absorvida por um rancor incrível contra os desenhistas. Mesmo depois de explicados os contextos das charges mais pesadas, e esclarecido que a linha do jornal era fortemente anti-racista, pró-socialista, pró-trabalhista, progressista, as pessoas agora torcem a boca para dizer que os desenhos “não são engraçados”, ou que são de “mau gosto”.

Como se isso tivesse alguma importância diante da conjuntura!

Humor é uma questão de gosto, evidentemente.

O francês tem um humor historicamente negro, talvez em vista de um passado com tantas tragédias. Enquanto pesquisava as edições do Charlie, numa mesa do centro George Pompidou, um senhor sentado a meu lado apontou-me uma notícia que ele lia no jornal.

O título era algo como: “Lucro da indústria de tranquilizantes dispara após atentados”.

Ele sorria maliciosamente. A notícia era um chiste puro de humor negro. Sempre haverá alguém faturando em cima da tragédia alheia.

O humor negro é um humor triste, como um palhaço olhando a si mesmo no espelho.

Aliás, pensando bem, nós, brasileiros, também temos humor negro. Só que ele não aparece nos jornais. Rimos de “memes” infames nas redes sociais, mas ficaríamos chocados de ver as mesmas imagens em nossos periódicos.

Mas voltemos para o caso Charlie Hebdo, cuja honra eu resolvi defender, sabe-se lá porque.

Através de uma pirueta cheia de incompreensão, alguns brasileiros passaram a comparar o humor libertário do Charlie ao humor reaça que eles tanto odeiam no Brasil.

É uma confusão fatal.

O humor reaça brasileiro é bancado pelos monopólios. Nem preciso ler a Globo para saber que a emissora tentou faturar politicamente com a tragédia, associando-se aos jornalistas mortos.

Não tem nada a ver.

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Charlie tinha muito mais a ver com a blogosfera do que com a mídia corporativa.

A Globo é propriedade da família Marinho, os maiores bilionários do país.

Charlie era um jornal pobre, que em novembro publicava editorial pedindo aos leitores para o salvarem da bancarrota.

Lembrei-me imediatamente dos frequentes e desesperados pedidos de SOS deste Cafezinho.

Charlie era um jornal de esquerda.

Um jornal que combatia de frente a extrema-direita e suas políticas racistas e anti-imigrante. Os desenhistas não tergiversam. A extrema-direita é o inimigo.

A partir de 2012, com a ascensão de François Hollande, do Partido Socialista, ao poder, Charlie passou a fazer um contraponto à esquerda ao governo, sempre protestando contra as concessões do presidente ao conservadorismo econômico.

Mas o fazia com muita estratégia, mantendo a artilharia pesada contra a Frente Nacional, a famigerada extrema-direita francesa, que está em ascensão, e a centro-direita representada pelo UMP, de Nicolas Sarkozy.

Eu analisei uma coletânea de edições do Charlie, publicada há alguns anos, com resumo de seus trabalhos desde sua fundação, em 1969, quando sucede um jornal mensal de humor, intitulado Haraquiri, até 2004. E depois analisei, com muita atenção, umas trinta ou quarenta edições mais recentes, além desta última, publicada após a tragédia, e que vem se esgotando dia após dia nas bancas de jornais, num fenômeno de sucesso editorial jamais visto em lugar nenhum do mundo.

Não era, de maneira alguma, um jornal “islamofóbico”. Era um jornal ateu, com tendência anarquista, o que é bem diferente.

Não há nenhuma charge ou desenho contra o Islã, mas somente contra os jihadistas que matam gente inocente, e mesmo assim, esse tema não é, nem de longe, dominante no jornal.

Pelas acusações nas redes, deu-se a impressão que o Charlie vivia para chocar e humilhar os muçulmanos na França. Outros o acusaram de sionismo.

Não é verdade. Não encontrei nenhum editorial em favor de Israel, mas vários textos em favor da Palestina.

O editorial de Charlie, de novembro do ano passado, critica o primeiro ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e os deputados da UMP (centro-direita francesa, partido de Sarkosy) por não reconhecerem o Estado palestino, lembrando que a OLP, a autoridade nacional palestina, reconhece o Estado de Israel.

Charlie também criticava o Hamas e as facções palestinas mais radicais, que advogam a destruição de Israel. Alguns desenhistas do Charlie eram judeus, como Wolinsky, um senhor de 80 anos cujo pai fugiu da Polônia durante a II Guerra, e que deve ter perdido inúmeros parentes e conhecidos nos campos da morte nazistas.

Não podemos esquecer que os judeus formam uma minoria na França. São 600 mil judeus, contra 6

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ou 7 milhões de muçulmanos na França. E que desde priscas eras, as vítimas dos atentados terroristas na França são sempre os judeus, não os muçulmanos.

Na Palestina, no Iraque, as vítimas são muçulmanos. Na França, ainda são judeus.

Claro que há uma questão de classe, muito forte na França.

Apesar do país não possuir um percentual significativo de miseráveis, e do Estado francês ainda ser socialista (ao menos em comparação com Brasil e EUA), com um sistema público de educação e saúde universal, inúmeros programas sociais, amplo seguro desemprego, transporte público de massa de altíssima qualidade, a vida não é um mar de rosas para os mais pobres, que vivem nas periferias.

Os jovens de ascendência árabe, misturados a uma população crescente de imigrantes ilegais, criaram uma cultura própria, rica, contestadora. Há muitos rappers muçulmanos na França, cujas músicas trazem títulos como: “Não ao laicismo” e “Sou muçulmano, não entre em pânico”. Não vou fingir que conheço todas as músicas, mas suponho que há canções interessantes, com letras agressivas e políticas, que tocam a juventude. Todos foram solidários com as vítimas e seus parentes, contudo.

Esses jovens odiavam, é preciso admitir, o jornal Charlie Hebdo, por causa da decisão dele de publicar as charges de Maomé. Eles não conheciam quase nada do jornal. Nunca leram uma edição. Tinham apenas uma visão simplista, construída pelo maniqueísmo típico de redes sociais, cujo exemplo vimos também no Brasil, de que Charlie era “islamofóbico”.

Este foi o caldo cultural que levou os terroristas a fazerem o que fizeram.

Também entre esses jovens, há um gigantesco ceticismo em relação à mídia tradicional. Teorias de conspiração proliferam rapidamente entre eles. Não se acredita que o atentado tenha sido cometido realmente por islâmicos, mas sim orquestrado por Israel, ou pelos EUA, ou pela extrema-direita, para jogar a França contra os muçulmanos.

Essas informações eu tirei do Le Monde de ontem, que entrevista vários jovens muçulmanos do sul da França.

A última edição de Charlie, pós-atentado, traz uma análise destas teorias. Elas não se sustentam, de nenhuma forma, diz o jornal.

Agora já se conhece a história pessoal dos terroristas. Eles efetivamente se ligaram a elementos com histórico no jihadismo internacional, e aderiram ao islamismo radical. Não eram, contudo, experts. Eram muito jovens, e o seu crime foi, de longe, a ação mais ousada que jamais empreenderam. Talvez por isso os detalhes mais patéticos, como esquecer a carteira de identidade perto do local do crime.

Não vou dispensar totalmente nenhuma teoria de conspiração porque sou blogueiro e, como tal, altamente sensível a elas. Mas da mesma maneira que não posso dispensá-las, também não posso abraçá-las.

E esta teoria é mais difícil de acreditar porque os terroristas admitiram as suas intenções , a Al Qaeda o reinvindicou, e a reação dos islamismo radical foi de júbilo. O Estado Islâmico chamou os terroristas de “heróis”.

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O jornal era crítico às políticas norte-americanas e europeias no Oriente Médio, e criticava frequentemente a política de ocupação de territórios de Israel.

Alguém falou que a França proibiu uma manifestação pró-Palestina no ano passado. Sim, e o Charlie foi contra essa proibição, prevendo, acertadamente, que aquilo apenas iria estimular os radicais e afugentar as pessoas de boa paz – maioria – que apoiam a Palestina. Acabou que houve a manifestação, mesmo sem autorização do governo, e foi liderada pelos grupos mais radicais e mais violentos.

Culpar Charlie por qualquer erro da política externa francesa, desde os mais antigos, na Indochina, passando pela guerra da Argélia, até os mais recentes, como o apoio à Otan na derrubada de Kadafi, e o apoio aos rebeldes sírios, seria como pretender culpar a Caros Amigos pela Guerra no Paraguai e pela privatização da Vale.

Charlie sempre foi contra as guerras.

O jornal trazia, frequentemente, desenhos contra o genocídio em Israel. Alguns são bem fortes, sempre na linha do humor negro que ele usava para tudo.

Numa das charges sobre o tema vemos escrito no chapéu do desenho: “Não nos deixemos comover!”

O texto que aponta para a barriga da mulher palestina diz: “Esconderijo de armas do Hamas”. E o soldado israelense no tanque fala ao rádio: “O colo do útero parece dilatado, um morteiro será lançado!”

São muitas charges assim! Não há nenhuma charge pró-Israel. Nenhuma!

Numa charge sobre a presença dos EUA no Iraque, a legenda no alto diz: “fim do embargo ao Iraque”. E mostra a chuva de mísseis caindo sobre Bagdá.

Em outra charge, uma denúncia terrível em forma de humor. O título diz: “pensem no material escolar de hoje”. A menina pergunta ao pai: “papai, precisa me comprar outras pernas”. Ao que o pai responde: “de novo?”

Não podemos, evidentemente, criar uma imagem edulcorada e santa que o Charlie jamais quis para si. Ao contrário, sempre buscou, deliberadamente, a malícia. Seu humor sempre foi cruel e sarcástico. Mas seu objetivo não era humilhar, e sim promover uma crítica libertária, uma crítica que liberta.

Haverá um tempo, no futuro, em que os principais intelectuais islâmicos admitirão que o trabalho de Charlie ajudou a religião a purgar suas franjas medievais e sectárias. Essa luta nunca foi apenas do Charlie. Nos países islâmicos, também se tenta criar espaços de liberdade, humor e autocrítica.

O Charlie mesmo foi atrás de periódicos de países muçulmanos que tentavam brincar com os dogmas de sua religião.

O título da matéria diz: “Piadas heréticas em terras muçulmanas”, e traz vários exemplos de charges e desenhos publicados em jornais de países islâmicos. Alguns são incrivelmente ousados politicamente, com críticas pesadas a um jihadismo que as elites árabes incentivam juntos aos mais pobres, mas do qual preservam seus filhos.

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É uma questão a se pensar. As elites árabes incentivam o jihadismo por razões bem distantes de uma guerra anti-imperialista, mas porque assim evitam que o povo produza uma consciência de classe que os levem a querer coisas como melhores salários e mais serviços públicos.

Se todos concordam que não há santos em geopolítica, então devemos admitir que nem a França é nenhuma santinha libertária, nem as elites árabes são movidas por puro idealismo anti-imperialista. Tanto que mandam seus filhos estudarem nas melhores universidades da Inglaterra, França e EUA, enquanto os pobres são incentivados a matarem outros árabes. As principais vítimas do terrorismo islâmico são os próprios muçulmanos.

Entre as charges que os acusadores do Charlie chamam de “islamofóbicas”, poderíamos incluir, por exemplo, as que mostram o “palhaço terrorista”?

O que querem os palhaços terroristas?, diz a legenda sobre o desenho. O palhaço responde: “quero arrancar um sorriso”.

Estou selecionando apenas as charges que tratam do tema Israel-Palestina ou de terrorismo. 90% das charges do Charlie tratavam de outros temas.

A mania de mostrar a bunda, ou enfiar objetos nos rabos de figuras públicas, que tanto horrorizaram o público quando o personagem atacado foi Maomé, é na verdade uma antiga marca do Charlie.

A capa do jornal mostra o presidente norte-americano, George Bush pai, e a legenda diz: “O primeiro presidente com uma palma de ouro enfiada no rabo”. Ainda na capa, um desenho simpático de Michael Moore, o cineasta americano que é o pesadelo da direita.

Claro, esse tipo de charge choca o público brasileiro. No post anterior, eu expliquei que as artes francesas têm uma antiga tradição em chocar, em escandalizar. Um século antes de Machado de Assis, com suas histórias pudicas da burguesia fluminense, a França tinha Marques de Sade, descrevendo cenas eróticas de personagens do submundo.

A igreja católica, maioria na França, era o alvo preferido do Charlie Hebdo, desde a sua fundação.

Muitos acusadores dizem que eles não desenharam profetas de outra religião com a mesma crueldade com que o fizeram com Maomé. Talvez.

Talvez eles devessem ser mais ousados e mostrar Jesus com a bunda de fora, com um sinal do crescente estampado em suas nádegas.

Mas quem disse que eles não o fariam?

Mortos, é que não farão mesmo.

De qualquer forma, é justo perguntar: por que eles fizeram charges tão agressivas contra Maomé?

Bem, já mostrei e provei que eles faziam charges em favor dos palestinos, e contra os EUA.

Mas, de fato, nos últimos meses, os editores de Charlie se mostravam preocupados com a expansão do Estado Islâmico. E acusavam o Ocidente de não ver que a fonte do islamismo radical estava na Arábia saudita, o verdadeiro estado islâmico.

Os editores do Charlie não estavam gostando nada da expansão do obscurantismo islâmico no

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oriente médio e na própria França. Como ficou provado pelo atentado, eles tinham absoluta razão.

Sabemos que o Ocidente tem culpa pelo surgimento do Estado Islâmico. Em posts anteriores, expliquei isso em detalhe. Mas isso não nos impede de criticar o Estado Islâmico por si e repetir que nem tudo é guerra social. A Arábia Saudita é um dos países mais ricos do mundo, e incentiva a proliferação de uma ideologia ultrarreacionária, contra a mulher, contra o homossexual, contra o laicismo.

A gente entende que há um fundo sócio-político no aumento do conservadorismo religioso em áreas pobres do Brasil, mas isso não pode nos fazer calar críticas contra as lideranças que florescem nesse meio, como o Pastor Malafaia.

Se houvesse um Charlie Hebdo no Brasil, teríamos uma profusão de charges contra as lideranças evangélicas e católicas, as quais, na minha opinião, seriam muito bem vindas!

*

Muito se falou da presença de Benjamin Netanyahu na marcha de domingo, que reuniu quase 4 milhões de pessoas. Ora, não se pode culpar os mortos pela presença do primeiro ministro de Israel. O governo da França chegou a pedir que ele não viesse, mas ele, oportunista, fez questão de vir. Ao cabo, acho que teve um lado positivo, de ver o primeiro ministro de Israel e o presidente da Palestina, marchando juntos.

Se um punhado de jornalistas de uma revista de esquerda do Brasil fossem mortos por radicais religiosos, e houvesse uma grande marcha no Rio ou São Paulo, em prol da paz e da liberdade de expressão, seria um absurdo culpar os jornalistas mortos pela presença de Kassab e Ronaldo Caiado!

Um texto na edição pós-atentado, um dos sobreviventes aborda com duro sarcasmo esse apoio generalizado que vem de todos os lados. Ele torce para o tempo passar e tudo voltar ao normal, quando os idiotas da direita atacavam o Charlie por sua posição política, e ele poderá contra-atacar do jeito que sempre fez, chamando-os de idiotas (em francês, “con”).

*

Lembram daquela polêmica sobre a charge da ministra da Justiça da França, uma senhora negra, retratada como macaca?

Explicamos mil vezes que a charge vinha no contexto de uma acusação a uma política da Frente Nacional, que havia xingado a ministra de macaca. O Charlie, antirracista, tomou a defesa da ministra.

Editorial atacando Anne-Sophie Leclere, política da Frente Nacional, que comparou a ministra Christiane Taubira a um macaco. O texto diz: Leclere, o macaco é você, até porque você veio do macaco como todos, embora no seu caso, parece não ter evoluído muito. Em seguida, o texto diz que o sistema político sonhado pela Frente Nacional lembra, em efeito, aquele dos babuínos e dos gorilas, com um chefe dominante se impondo pela força. Termina dizendo que alguns primatas são bem mais evoluídos que os membros da FN.

Uma charge comemora a condenação da política do FN pelo crime de racismo contra a ministra.

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Encontrei facilmente 4 charges de denúncia à violência israelense na Palestina, publicadas em edições recentes do Charlie: na primeira, o soldado israelense chama a senhora ferida, segurando uma perna: “Madame! Você esqueceu uma coisa”.

Na segunda, um israelense brinda com um palestino: “Em reconciliação, há Sion”, ao que o palestino, degolado, responde: “Há um idiota também”. Há um jogo de palavras e seus sons, intraduzível. Reconciliação em francês se pronuncia “reconciliacião”, ou seja, termina com o som de “sião”. Na mesma palavra, também há o fonema “con”, que significa idiota.

Na terceira, um retrato de casamento entre dois intransigentes: Netanyahu, primeiro-ministro israelense, e Mechaal, dirigente do Hamas.

Na quarta, o soldado israelense enrola nos braços as tripas de uma velhinha palestina, e fala: “quem faz a bagunça é que tem de arrumá-la”. Uma crítica à inutilidade de medidas paliativas depois que o estrago da guerra está feito.

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Encerro o post com a descrição de uma charge tipicamente charliana, de humor negro e pegada de dura crítica política e social. O desenho mostra um menino atrás das grades, com olhar triste. “Prisão aos 13 anos”. Diante dele, seus pais dirigem o carro com expressão eufórica. A legenda no alto explica a cena: “Enfim, férias tranquilas!”

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