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11 OPPIDUM número 1 - 2006 Sondagem arqueológica em Nespereira - Lousada: resultados preliminares de uma intervenção de emergência Joana Leite * , Manuel Nunes ** , Luís Sousa *** , Carlos Gonçalves *** * Arqueóloga. Colaboradora do projecto arqueológico para o estudo da ocupação humana de um vale interior do Entre Douro e Vouga da Proto-História aos começos da nacionalidade - PAIVAR. ** Arqueólogo. Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal de Lousada. *** Assistente de Arqueólogo. Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal de Lousada. 1 A intervenção foi designada pelo acrónimo CBO.05, correspondente à identificação do Lugar “Cabeço do Outeiro”, onde teve lugar a escavação, e ao ano em que se procedeu à abertura da sondagem e respectivo estudo de Sítio - 2005. Resumo A realização da intervenção arqueológica de emergência no Cabeço do Ou- teiro, freguesia de Nespereira, concelho de Lousada, pôs a descoberto um habitat rural dos séculos XVII-XVIII, revelando um considerável espólio, sobretudo cerâmico, e denunciador de um núcleo familiar com algum poder económico e eventualmente detentor de reconhecido prestígio local. Trata-se de uma dinâmi- ca sequencial de ocupação do sítio que apesar de ultrapassar os 200 anos surpre- endeu pelo efémero registo material perpetuado ao nível das estruturas. 1. Contextualização dos trabalhos arqueológicos A abertura de uma estrada municipal, no Verão de 2004, de ligação entre o lugar de Vila Verde e o lugar do Cruzeiro, no Cabeço do Outeiro (CBO. 05 1 ), na freguesia de Nespereira, concelho de Lousada, distrito do Porto, (I.G.E. 1: 25.000, folha n.º112), propiciou a descoberta de um sítio arqueológico iné- dito. Apenas detectado em 2005, no seguimento de uma acção de fiscalização o Gabinete Municipal de Arqueologia o local, registado então com as coor- denadas geográficas W 008º17’43,3’’; N 41º 15’18,1’’, (UTM 29 TNF 559032,4 /4567307,56) DATUM WGS/84, foi alvo de uma pronta inter- venção arqueológica cujos resultados damos agora a conhecer. Os vestígios ocupacionais visíveis revelaram-se desde então com alguma clareza nos cortes artifici- ais escavados pelas máquinas, aquando da abertura da via, especialmente no corte exposto a Sul onde era perceptível uma fiada de tijolos que se encon-

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CIAN MAGENTA AMERELO PRETO

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OPPIDUM número 1 - 2006

Sondagem arqueológica em Nespereira - Lousada:resultados preliminares de uma intervenção de emergência

Joana Leite*, Manuel Nunes**, Luís Sousa***, Carlos Gonçalves***

* Arqueóloga. Colaboradora do projecto arqueológico para o estudo da ocupação humana de um vale interior do Entre Douro eVouga da Proto-História aos começos da nacionalidade - PAIVAR.** Arqueólogo. Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal de Lousada.*** Assistente de Arqueólogo. Gabinete de Arqueologia da Câmara Municipal de Lousada.1 A intervenção foi designada pelo acrónimo CBO.05, correspondente à identificação do Lugar “Cabeço do Outeiro”, onde tevelugar a escavação, e ao ano em que se procedeu à abertura da sondagem e respectivo estudo de Sítio - 2005.

ResumoA realização da intervenção arqueológica de emergência no Cabeço do Ou-

teiro, freguesia de Nespereira, concelho de Lousada, pôs a descoberto um habitatrural dos séculos XVII-XVIII, revelando um considerável espólio, sobretudocerâmico, e denunciador de um núcleo familiar com algum poder económico eeventualmente detentor de reconhecido prestígio local. Trata-se de uma dinâmi-ca sequencial de ocupação do sítio que apesar de ultrapassar os 200 anos surpre-endeu pelo efémero registo material perpetuado ao nível das estruturas.

1. Contextualizaçãodos trabalhos arqueológicos

A abertura de uma estrada municipal, no Verãode 2004, de ligação entre o lugar de Vila Verde e olugar do Cruzeiro, no Cabeço do Outeiro (CBO. 051),na freguesia de Nespereira, concelho de Lousada,distrito do Porto, (I.G.E. 1: 25.000, folha n.º112),propiciou a descoberta de um sítio arqueológico iné-dito. Apenas detectado em 2005, no seguimento deuma acção de fiscalização o Gabinete Municipal de

Arqueologia o local, registado então com as coor-denadas geográficas W 008º17’43,3’’; N 41º15’18,1’’, (UTM 29 TNF 559032,4 /4567307,56)DATUM WGS/84, foi alvo de uma pronta inter-venção arqueológica cujos resultados damos agoraa conhecer.

Os vestígios ocupacionais visíveis revelaram-sedesde então com alguma clareza nos cortes artifici-ais escavados pelas máquinas, aquando da aberturada via, especialmente no corte exposto a Sul ondeera perceptível uma fiada de tijolos que se encon-

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2 A quem agradecemos todo o seu interesse, amabilidade e apoio prestado nas informações disponibilizadas.

Figura 1. Implantação da área intervencionada num excertoda folha 112 da Carta Militar de Portugal do IGE, 1998.

trava sensivelmente a 2,55 metros de profundidadeem relação ao solo original, e através de achadosavulsos de fragmentos cerâmicos dispersos pela áreaenvolvente, indiciadores de uma antiga ocupaçãohumana daquele espaço.

Trata-se de um sítio de altitude média (224 me-tros), dotado de uma considerável rede hidrográfica,uma vez que o rio Mezio (afluente do Sousa), quecorre nas suas proximidades, ramifica pela área al-guns cursos de água que tornam os solos em ques-tão bastante férteis e de uso agrícola.

Em termos geológicos, o sítio enquadra-se noâmbito dos granitos hercínicos, tardi e pós-tectó-nicos, em particular dos granitos monzoníticosporfiróides, de duas micas essencialmente biotíticos(C.G.P. 1:50.000 folha n.º 9D/Penafiel).

Dada a fragilidade com que se encontravam ex-

Figura 2. Corte exposto a Sul, rasgado pela passagem daestrada local, onde se encontravam evidenciados os vestí-gios arqueológicos.

postos os vestígios remanescentes, afigurou-se im-periosa uma acção arqueológica de emergência faceàs ameaças de conservação do sítio, nomeadamen-te a deterioração do perfil exposto aos agentes cli-máticos e a possibilidade de ocorrência de actos devandalismo, visto serem nítidos os tijolos que seperfilavam no corte.

Como resposta à exigência premente de salva-

guarda de informação arqueológica que uma inter-venção de emergência impõe, pelo frágil equilíbriodestruição/preservação, estabeleceu-se uma prontaparceria entre o Instituto Português de Arqueolo-gia, a Câmara Municipal de Lousada, o proprietá-rio do terreno - Sr. António Basílio Pimentel Car-neiro Leão2 e os arqueólogos envolvidos, Joana Leitee Manuel Nunes, vendo-se assim criadas as condi-ções para os trabalhos conducentes à investigaçãoarqueológica.

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2. Área intervencionada:metodologia aplicada

Para que fosse possível uma caracterização docontexto em perigo, por forma a confirmar-se o in-teresse arqueológico do local, avaliando-se aestratigrafia existente, eventuais estruturas arqueo-lógicas e a cronologia apontada com base nos ma-teriais de superfície, experimentaram-se várias abor-dagens à área em questão e fasearam-se os traba-lhos arqueológicos nas etapas que de seguida sedescrevem.

Numa primeira fase atribuiu-se uma atenção es-pecial ao registo da estratigrafia dos perfis postos adescoberto pela maquinaria (de ambos os lados daestrada). Assim, procedeu-se primeiramente a umalimpeza sumária dos dois cortes, a que se seguiu odesenho dos respectivos perfis, no sentido de de-tectar possíveis similitudes/continuidades estrati-gráficas, procedimento este que veio a apoiar o de-senvolvimento dos trabalhos e a interpretaçãoestratigráfica da zona intervencionada.

Após uma abordagem genérica de registo do sí-tio tal como o encontramos, avançou-se então parauma metodologia intrusiva que se afigura, nestescasos, como a única capaz de esclarecer contextosarqueológicos mais complexos. Assim, procedemosà marcação da quadrícula que permitiria a aberturade uma sondagem arqueológica de avaliação, res-peitando o alinhamento vertical do local onde eramvisíveis no perfil os tijolos referidos. As dimensõestotais da sondagem3, no seu topo4, fixaram-se nos12 m2, que se subdividiram em quadrículasalfanuméricas, mais pequenas (2m2) de apoio àreferenciação mais específica dos contextos a apu-rar, designadas de Este para Oeste e de Sul paraNorte com as codificações C6, C5, C4 e D6, D5 e

D4. Dada a impossibilidade de permanecer com otestemunho dos quatro cortes, uma vez que um dosalinhamentos da sondagem coincidia com o taludeprovocado pelas máquinas, a sondagem contou ape-nas com a leitura dos cortes Nascente, Sul e Poente.

A escavação avançou seguindo os procedimen-tos inerentes à utilização da Matriz de Harris,decapando gradualmente as unidades estratigráficase registando-as em diagrama com respectiva carac-terização. Desta forma não só se consegue umaindividualização mais personalizada das unidadesestratigráficas, respeitantes a todos os momentos daocupação do sítio em estudo, como se torna maisexplícita e clara a relação entre elas. Procurando oentendimento da inter-relação das unidades estra-tigráficas deixou-se uma banqueta como testemu-nho para os últimos níveis de ocupação que suge-rem um ritmo de vivência mais intenso e por issode mais delicada compreensão. Todas as unidadesforam cotadas, representadas em desenho e regis-tadas em suporte fotográfico.

Dada a profundidade a que se registavam os ves-tígios arqueológicos, os trabalhos em campo tive-ram a duração de aproximadamente dois meses (se-gunda quinzena de Junho, Julho, com interrupçãoem Agosto, e retoma na primeira quinzena de Se-tembro de 2005).

Finda a escavação5, iniciaram-se os trabalhos degabinete, igualmente meticulosos e de importânciafulcral para o estudo do contexto arqueológico. Oprocesso de tratamento do espólio iniciou-se pelalimpeza e inventariação dos fragmentos recolhidos,através da sua contabilização e marcação. Procu-rou-se formar agrupamentos de características ma-teriais afins (cerâmica, metal, líticos, etc.) e sub-grupos tecnológicos semelhantes, por exemplo, noagrupamento da cerâmica há que distinguir conjun-

3 Estas medidas foram determinadas tendo em atenção a manutenção de um perímetro de segurança em relação ao átrio da casada eira que lhe está próxima.4 Referimo-nos especificamente às medidas de topo da sondagem uma vez que à medida que a escavação avança para níveismais profundos, a sua área aumenta, visto que o perfil artificialmente criado pelas máquinas que abriram o caminho torna-semais proeminente em baixo.5 Aguardamos apenas o momento oportuno para a colocação da manta geo-têxtil sobre toda a área escavada por forma a garantira identificação clara da zona intervencionada. Será igualmente reposta a topografia original do terreno, como acordado com oproprietário.

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tos (preta, vermelha, vidrada, faiança) que revelamusos, intenções e produções diferentes e mesmodentro de cada um destes conjuntos há ainda queatentar em subconjuntos definidos por acabamen-tos ou decorações específicas, pela natureza daspastas e outros tantos elementos denunciadores no-meadamente de centros produtores locais do fabri-co das peças em análise. No caso dos metais, pelainstabilidade a que são expostos ao serem retiradosdo seu ambiente original, a nível de preservação,surgiu a necessidade do seu envio para um labora-tório6 especializado na limpeza e neutralização doseu processo corrosivo. Foi este o destino que se-guiram quatro elementos do espólio metálico, de queem capítulo próprio trataremos.

Seleccionámos ainda um conjunto de peças, quepela representatividade no universo do espólio, boascondições de conservação, perfis bastante comple-tos e características singulares, se mostraram alvode particular tratamento em registo fotográfico e dedesenho.

Por fim, e apoiando-nos no conjunto de infor-mações recolhidas e cruzadas procurámos uma in-terpretação global da funcionalidade dos espaços.

3. Sequência ocupacional do sítio

A análise da informação registada no decursodos trabalhos de campo (fotografia, desenho e es-crita) permite apurar a ordem dos acontecimentosarqueológicos, numa única sequência para a áreaintervencionada. O resultado final é a construçãode um diagrama (Matriz de Harris), onde cada UE7

encontre a sua posição de anterioridade, pos-terioridade ou mesmo contemporaneidade, em re-lação às outras.

A matriz se apresenta no Gráfico 1, mostra deforma esquemática e convencional a evolução daocupação na sondagem escavada e apoia-se na aná-

lise de cortes8 e planos elaborados em campo à es-cala 1:20. De apoio à caracterização das UE atente-se igualmente no Quadro 1 que as descreve sucin-tamente, atendendo a aspectos como a cor, compo-sição, granulometria, inclusões orgânicas, culturais,ou mesmo a mera caracterização de estrutura, quan-do desse caso se tratar.

Pode, portanto, inferir-se alguns traços genéri-cos caracterizadores da ocupação do espaço inter-vencionado, apesar da síntese interpretativa se re-velar de certa forma comprometida pela ausênciade estruturas clarificadoras de momentos estru-turantes da vivência no local em estudo. Todo o es-forço de reflexão que nos propomos realizar sobreo espaço vê-se, portando, grandemente condiciona-do pelo apoio precioso, mas limitado, que os ele-mentos materiais referentes ao espólio cerâmico nosproporcionam.

Tendo em conta as limitações acima enunciadase de forma a clarificar ritmos de ocupação do espa-ço consideramos pertinente, em primeira instância,estabelecer uma divisão genérica entre as unidadesestratigráficas encontradas até aos 2 metros de pro-fundidade (coincidente com o início da UE 026) eas unidades que a precedem em termos de antigui-dade (referindo-nos a todas as unidades estra-tigráficas compreendidas entre a 026 e a 037). Adiferença entre estes dois faseamentos é nítida einequívoca.

As primeiras unidades caracterizam-se por ní-veis sucessivos de aterro que resultam em camadasde composição homogénea, de potência significati-va de terras e consideravelmente regularizadas, defracos vestígios arqueológicos pontuados apenas porocasionais fragmentos cerâmicos e espólio metáli-co, muito dispersos pela sondagem, sem qualquerhabitat doméstico preservado em estrutura ou ne-gativo. Trata-se de uma utilização do local balizadaentre a segunda metade do século XVIII e a segun-da metade do século XIX e que em última instância

6 Laboratório de Conservação e Restauro do Museu Regional de Arqueologia D. Diogo de Sousa.7 Unidade estratigráfica.8 A propósito do registo dos três cortes em desenho e para uma mais fácil compreensão da estratigrafia, consulte-se as figuras 19,20 e 21

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Gráfico 1. Relação das Unidades Estratigráficas apuradas na sondagem aberta, entendendo-se como mais recente a 001 e amais antiga a 037.

Matriz estratigráfica CBO.05

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se estende aos nossos dias com a instalação do esta-leiro de apoio às obras para a construção da IC 25/variante à EN 106, que se iniciou em 2000 e termi-nou em 2002, momento este preservado nas duasprimeiras unidades estratigráficas da sondagem.

Toda esta conturbação no registo arqueológicoe pouco expressiva vocação funcional do espaçovêem-se reforçados com a abertura da vala [005]que interrompe parcialmente a UE 003 e totalmen-te a 004, pelo que foi necessário dividi-la na 004 e041, remexendo os contextos existentes e aumen-tando as deposições por aterro. Será no entanto im-portante frisar, para este primeiro faseamento doscontextos arqueológicos, um caso estratigráfico sin-gular, de análise complexa que exigiu a nossa parti-cular atenção. Referimo-nos à UE 012 que se es-tende por toda a quadrícula, manifestando uma ir-regular deposição (que contraria a tendência apla-nada de todos os depósitos anteriormente aborda-dos). Constituída por terras saibrosas amarelo-cla-ras, de textura granulosa, estéreis em termos de es-pólio, esta UE caracteriza-se por ter uma superfícieondulada, cortada por 11 valas de fraca consistên-cia estrutural, dispostas paralelamente entre si e nadiagonal em relação à quadrícula aberta, no sentidoNoroeste-Sudeste.

A este propósito, as interpretações podem serorientadas consoante se equacione, de origem natu-ral ou antrópica, a natureza das depressões destaunidade estratigráfica. Seguindo a primeira hipóte-se poderia ponderar-se uma abrasão dos terrenossaibrosos decorrente da acção erosiva das águas dachuva ou de outro tipo de escorrências, no entanto,não nos parece válida esta perspectiva uma vez que,como se pode constatar mais claramente nas figu-ras 3 e 16, algumas dessas valas rasgadas no saibro,não estando escavadas em forma de corredor, inter-rompem-se, alteando o saibro que as constituempara, na sua continuidade, se formar nova depres-são. Acreditamos antes, tratar-se de um nível deexploração dos solos de cariz agrícola que se repor-ta a finais do século XVIII, pelas características do

espólio encontrado na unidade estratigráfica 011 quepreenche e se sobrepõe às valas, composto por es-cassa cerâmica de uso doméstico e uma navalha emferro possivelmente enquadrável na faina agrícola,e pela própria constituição da unidade 012, que seafigura como depósito intencional, ausente de in-clusões culturais, de fraca consistência para servirde apoio a qualquer estrutura e pleno de raízes9. Aoque nos foi possível apurar, não existem paralelosarqueológicos publicados, enquadráveis na situação

9 A título de curiosidade, refira-se o tradicional cultivo do cebolo, que exige, em determinadas localidades, a deposição de umacamada de terras arenosas de preparação ao plantio.

Figura 3. Vista geral da unidade estratigráfica 012, perspec-tiva Este-Oeste.

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descrita, capazes de definir uma explicação clarapara o contexto estratigráfico em análise, pelo quea proposta apresentada não passa de uma mera hi-pótese especulativa.

Estas unidades, compostas sobretudo por níveisde aterro, contrastam grandemente com o segundofaseamento do sítio (genericamente consideradoentre as unidades 026 e 037), que se caracteriza poruma cadência de ocupação consideravelmente maisrápida, a avaliar pela sucessão dos estratos arqueo-lógicos que denunciam um contexto doméstico maisexplícito e rico. Apercebendo-nos da complexi-ficação da estratigrafia, e constatando a aproxima-ção ao nível dos tijolos detectados no corte abertopela estrada, optámos por deixar uma banquetaintermédia de apoio à leitura das unidades estra-tigráficas, preciosa para uma clarificação da sobre-posição dos níveis arqueológicos e para a conse-quente interpretação dos contextos.

Esta nova ambiência arqueológica que nos fazrecuar agora ao culminar do século XVIII e sobre-tudo ao século XVII afigura-se muito farta em es-pólio material cerâmico e de outra natureza, masmais uma vez, pobre em estruturas definidoras deespaços.

Tentaremos, no entanto, analisar esta última se-quência ocupacional preocupando-nos em salientaralgumas situações que nos merecem destaque pelasinformações que acrescentam e sobretudo pelasquestões que levantam.

Assim, as unidades 026 e 028, que se apresen-tam como fase de transição para a realidade maisantiga da escavação (século XVII), marcam o fimda tendência estruturante evidenciada pelas unida-des anteriores reveladoras de grandes deposições deterras, quer por se registarem tempos mais longosde determinada ocupação, quer por acções pontuaisde aterro intencional (nivelamento de terrenos, apoioa qualquer propósito de exploração dos solos, etc.).

Deparamo-nos, então, com as unidades 027, 029,030, 032, 033 e 034 que se distinguem por múlti-plos e variados elementos como a cor, a estrutura, acompactação, a granulometria, e aspectos deposi-cionais, mas que partilham de um denominador co-mum: representam uma intensa utilização do espa-ço, numa altura muito específica e concreta, com-preendida sensivelmente em 50 anos (2ª metade do

século XVII), apontando para áreas funcionais dis-tintas mas próximas no tempo.

Das unidades acima enunciadas, destaca-se aunidade estratigráfica 029, que para além de ser amais antiga entre os níveis de clara vivência domés-tica, é igualmente a mais expressiva pela abundân-cia e diversidade do seu espólio (244 fragmentoscerâmicos, entre os quais 16 fragmentos de faiançacom motivos de tradicional associação cronológicaà segunda metade do século XVII), frequente espó-lio metálico, de que se destaca meia ferradura, al-guma telha de meia cana, dois fragmentos de vidroe dois líticos (um movente de moinho manual e umapedra talhada de morfologia discóide). Outra dassuas mais relevantes características é a sua compo-sição sedimentológica, tratando-se de terras muitocompactas, predominantes em cinzas e de apreciá-vel potência estratigráfica. Ter-se-ia tratado de umincêndio? Excluímos à partida essa interpretaçãopela conjugação de duas vertentes: a grande espes-sura de cinzas concentradas no local (desproposita-da para que se equacione a referida ocorrência) e alimitação espacial da unidade, que se verifica ape-nas em sensivelmente 2/3 da sondagem. Encaramosportanto a hipótese de se tratar de uma área especí-fica reservada à combustão doméstica (lareira oudepósito de cinzas) para onde inclusivamente sedeitariam fora as peças danificadas ou que já não seusavam pelas mais variadas razões, ou ainda sim-plesmente perspectivamos a probabilidade de se tra-tar de uma área de apoio alimentar (cozinha?), umavez que de entre os fragmentos domésticos aí en-contrados, se destacam umas panelinhas de louçapreta, destinadas ao lume directo com fuligem emambas as faces. De qualquer forma, e em ambos oscasos ponderados, adivinha-se uma perpetuação dafunção pelo considerável volume de cinzas acumu-lado, não sendo despropositado considerar igual-mente a hipótese de ter existido, nas proximidades,um forno capaz de produzir tal quantidade de cin-zas, até porque a ocupação humana estudada nestasondagem encaixa-se em plena vala aberta na ro-cha de base, o que seria muito favorável a uma acu-mulação de calor que facilitaria uma utilização des-se cariz.

Parecem, pois, estar assim definidos dois espa-ços funcionais na sondagem escavada, um deles,

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partindo sensivelmente do meio da quadrícula e alar-gando-se por todo o seu lado Este, correspondenteàs quadrículas C6 e D6 (que se vê à margem destecontexto e de todos os outros supra citados, apre-sentando portanto uma estratigrafia mais simpli-ficada) e o lado Oeste (quadrículas C5, C4, D5 eD4) que abordamos aqui com particular ênfase porse estruturar de forma mais rica. As dúvidas persis-tem, sobretudo se atentarmos na continuação docorte Oeste da estrada, rasgado pela acção da ma-quinaria, que revela a continuação de um estratopreto em tudo semelhante à UE 029.

Os dois únicos elementos materiais encontradosque poderiam ajudar a clarificar o registo arqueoló-gico e funcionar como inequívocos estruturadoresde espaço, paralelamente à análise da larga profu-são do espólio pelas unidades em análise e da inter-relação entre si (que apenas permitem deambulaçõesteóricas incompletas), são as unidades 031 e 035,mas que ainda assim assumem contornos poucodefinidos, sem que qualquer estrutura clarifique fun-ções, espaços, gestos ou mesmo intenções. Trata-se, no caso da unidade 031, de um derrube signifi-cativo de pedras de médio porte, em granito, que seestendem de forma caótica pelas quadrículas C4,D5 e D4 sem que seja possível anteverqualquer alinhamento ou estrutura ori-ginal, e no que respeita à unidade 035de um nível alinhado e circunscrito detijolos e pedras que marcaram presen-ça, desde o início da escavação, por seterem revelado no corte artificial deabertura da estrada. Relativamente aesta estrutura, 035, importa tecer algu-mas considerações. Em primeiro lugar,salienta-se o seu relativo bom estadode conservação, enquanto estrutura, seatendermos ao volume significativo deterras que se depositaram ao longo dosséculos nas camadas superiores. Tra-ta-se de uma combinação de tijolos epedras, intercalados aleatoriamente,constituindo um plano rectangular deonde se destacam alguns tijolos commorfologia maneirista que claramentese interpretam como reaproveitamento de outrasconstruções da época. Estes materiais dispõem-se

em forma de piso sem que qualquer limite externoà estrutura promova tal organização, isto é, a uni-dade 035 que nos mostra pela primeira vez umaintenção material conservada e bem definida aonível do registo arqueológico, interrompe-se, numadas suas vertentes, pela destruição irreversívelprovocada pela abertura da estrada e na sua res-tante envolvência, enquadrada na sondagem, vê-se desapoiada de contextos arqueológicos que lhepossam atribuir qualquer significação ou que nosconduzam a uma função precisa da sua intençãode construção.

Apenas contamos com as unidades 030 e 032,que parecem estar-lhe associadas amparando o re-ferido piso com terras argilosas, alaranjadas, muitocompactas, dispostas de forma irregular à volta deuma das suas vertentes e contendo significativo es-pólio relativamente contemporâneo à sua constru-ção, e a unidade 033, de características bastante dis-tintas, caracterizada pela fraca compactação das ter-ras escuras de que é composta e que nos parece terfuncionado como uma espécie de piso de circula-ção de apoio ao nível dos tijolos. Construído sobrea UE 034, que se apresenta como uma camada quese estende por quase toda a sondagem mas já parca

Figura 4. Unidade estratigráfica 035, constituída por um ní-vel regularizado de tijolos e pedras.

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em espólio cerâmico, o piso 035 parece ter sidocontemporâneo à tão significativa unidade029, embora, pela análise da sequência estra-tigráfica seja de construção ligeiramente maisrecente10.

Equacionamos, portanto, o piso 035 comoum acesso marginal a um espaço habitacionalque se considera ter as suas dependênciasmenos nobres na área intervencionada ou nassuas proximidades, ou mesmo como forma decomunicação com o hipotético forno ponde-rado a propósito da unidade 029. A disposi-ção pouco cuidada e aleatória dos elementosque constituem o piso revela, por um lado, pou-ca preocupação com a sua apresentação11 e,por outro, um simultâneo descuido na con-cretização das motivações práticas relaciona-das com a funcionalidade de uma passagem,uma vez que apresenta espaços irregularesintermédios pela inclusão de pedras pouco ounada facetadas para o efeito.

Por fim, há ainda que referir uma última unida-de estratigráfica [036]12 que cobre a rocha de base[037], servindo-lhe de nivelamento e que se apre-senta praticamente estéril a nível de espólio. Curio-so é notar que na rocha de base, se verificam diver-sos entalhes (em número de 9 e a que foram atribu-ídas respectivamente, as UE representadas na figu-ra 17), que em certos casos seguem alinhamentossub-circulares entendidos como buracos de poste desustentação de estruturas efémeras, provavelmenteconstituídas maioritariamente por madeira. A gran-de quantidade de pregos e cravos que se fazem re-presentar em quase todas as unidades, mas com es-pecial destaque nas mais antigas, atestam por umlado a presença destas construções tão característi-cas destes períodos históricos, erigidas em materi-ais perecíveis e, por outro, explicam um pouco do

silêncio material a nível de estruturas que pautou ostrabalhos nesta sondagem.

4. Espólio exumado

4.1. Cerâmica

Para além de representar uma das mais frequen-tes categorias de espólio com que os arqueólogos sedefrontam, constitui sobretudo uma janela que abreperspectivas para a compreensão das sociedades queproduziram as peças e lhes deram utilização, paraalém de que nos propiciam um testemunho directoda realização das trocas comerciais e de contactosculturais entre regiões. É nessa perspectiva que o es-tudo dos 556 fragmentos recolhidos nesta interven-ção arqueológica se reveste de importância e muitonos acrescentam às considerações já expostas.

10 Para uma mais clara compreensão do seu enquadramento estratigráfico atente-se na figura 18.11 Se se pretendesse aprimorar o piso, conferindo-lhe equilíbrio estético, certamente se procuraria que os tijolos maneiristas,dispersos pelo pavimento, se concentrassem nas bermas do piso, onde se disporiam na vertical, rematando a área e conferindo-lhe outro valor simbólico.12 Pela profundidade que esta unidade apresentava na quadrícula D4, e pela nula informação que a sua escavação, já finalizadanas restantes áreas, vinha acrescentando à sondagem, considerou-se válida a interrupção da sua intervenção neste sector, econsequente termo dos trabalhos arqueológicos.

Figura 5. Rocha de Base (unidade 037), onde se podem ob-servar alguns entalhes e buracos de poste de sustentaçãode estruturas perecíveis.

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O estudo que aqui apresentamos apoia-se numtrabalho preliminar de lavagem, marcação, colageme triagem das peças com base em critérios tecno-lógicos, separando, por exemplo, cerâmica preta,cerâmica vermelha, cerâmica vidrada e faiança, paraque se tornem possíveis análises comparativas comoutros conjuntos, procurando seriações cronológi-cas, de distribuição espacial ou de natureza social efuncional.

4.1.1. Cerâmica preta

A olaria preta ou negra, assim referenciada in-distintamente na bibliografia da especialidade, co-nhecida desde tempos proto-históricos, caracteriza-se por ser produzida através de um processo de coc-ção em atmosfera redutora ou rica em carbono.

Em concreto, a redução acontece na fase finalda cozedura, desencadeada pela obstrução ou “aba-far” o lume. Em termos físico-químicos, esta acçãoimpede a entrada do oxigénio e promove a decom-posição do monóxido de carbono em dióxido du-rante a fase de arrefecimento, com a consequentedeposição de carbono nas cerâmicas na forma denegro de fumo, o que lhes confere a característicacor preta (Castro, 1997:12-14).

No entanto, a designação de louça preta congre-ga um universo diversificado de cerâmicas em quea própria coloração das superfícies pode variar dostons negros mais escuros até os cinzentos mais cla-ros, quer no cerne das peças como nas suas superfí-cies externas e internas, sejam elas foscas ou poli-das. A sua aparência final é por isso variável, medi-ante vários factores, como a natureza e composiçãodas argilas utilizadas, o seu grau de depuração, aca-bamentos finais que possa vir a receber ou aindafunções específicas a que se destinem as peças(Teixeira, 1997:20).

No entanto, e a título de curiosidade, referem-sealgumas características aglutinadoras deste tipo decerâmica preta: maior impermeabilização e maiorresistência ao lume do que as cerâmicas vermelhas,

simplicidade das suas técnicas de produção, econo-mia do combustível, sabor agradável conferido aoscozinhados sólidos e líquidos, higiene que propiciaà alimentação pelo alto teor de monóxido de carbo-no capaz de impregnar todos os poros evitando quea sujidade e os microorganismos penetrem na pas-ta, entre outras (Ribeiro, 2003:21).

Na sondagem em estudo apurou-se a totalidadede 57 fragmentos de louça preta, igualmente variá-veis na tonalidade apresentada (do preto ao cinzaclaro), com especial incidência nas unidadesestratigráficas 029, 030 e 032 onde se recolheram46 dos 57 fragmentos.

Gráfico 2. Percentagem do peso da louça preta no conjuntocerâmico recolhido no Cabeço do Outeiro.

Reconhecer a importância das áreas geográfi-cas de distribuição das produções de cada grandecentro produtor de cerâmica ajuda a compreenderdinâmicas de circulação de produtos em teias mui-to estruturadas de comércio e, neste caso particular,a equacionar a proveniência das peças do CBO. Ageografia dos locais de produção de louça preta,estabelecida sobretudo a partir da bibliografia pro-duzida nos séculos XIX e XX, define-se em doisgrandes eixos: um no litoral, que do centro de pro-dução do Prado13 segue até ao Porto e Gaia e depoiscontinua para Aveiro e Coimbra (áreas onde o fa-brico da louça preta convive com a vermelha evidrada), e outro mais interior (onde a louça pretase torna hegemónica), que se estende de Chaves a

13 A designação “Prado” reflecte, acima de tudo, uma afinidade geográfica e etnográfica de uma região, não se reportandoportanto a uma freguesia ou lugar específico; corresponde actualmente aos concelhos de Barcelos e Vila Verde.

Representatividade da louça preta

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Vila Real e do vale do Douro ao núcleo de Molelos14

(Ribeiro, 2003:18).O centro produtor do Prado15, que se afigura como

um importante centro produtor de louça (preta, ver-melha e vidrada) e telha, cuja produção aparece do-cumentada desde o século XIII e que continua aindahoje a ser uma importante área de extracção de barroe de fabrico cerâmico em Portugal (Fernandes,1997a:43), está representado em alguns elementoscerâmicos encontrados na sondagem aberta16.

A superior qualidade de fabrico quer na pasta,quer na decoração, que a louça preta do Prado reve-lava nos séculos XVI e XVII, impulsionou este cen-tro numa rede de abastecimentos a longa distânciaque deixa marcas um pouco por todo o Entre-Dou-ro-e-Minho (ob.cit.:43), como comprovam os resul-tados das escavações arqueológicas realizadas noMosteiro de Santa Maria de Tibães, na Casa do In-fante, no Porto (a 50 km de distância) e provavel-mente na escavação do Cabeço do Outeiro, emLousada, cuja análise aqui propomos.

De proveniência mais directamente relacionávelcom o centro de produção do Prado apenas possuí-mos um pequeno fragmento de pasta dura e depura-da, de fina espessura, com toque metálico, de cor cin-zenta escura (em ambas as faces), com um cerne detonalidade mais clara e de decoração impressa empequenos círculos preenchidos a moscovite (micabranca). Trata-se de uma peça singular, recolhida naunidade estratigráfica 027, (que raramente se vê re-presentada em contextos arqueológicos e só se ma-nifesta em casos excepcionais que exijam mesmoalgum requinte no seu manuseamento).

As pastas mais duras e depuradas do centro doPrado, com cerne cinzento ou castanho, conhecem,em casos raros, a par dos acabamentos alisados, areferida decoração com aplicação de palhetas de

moscovite. Trata-se de louça preta mais fina,vocacionada para se destacar num serviço de mesamais requintado, ou simplesmente como elementoisolado de natureza decorativa. As formas mais re-presentadas para estes casos são a bilha e a caçoilae geralmente são reconhecidas como pertencentesao 3º quartel do século XVII (Real [et. al.], 1995:89).

No entanto, como Luís Fontes e Isabel Fernandesalertam (1998:359,360), apesar da análise químicaaos exemplares conhecidos apontar para que essaspeças sejam provenientes do centro de produção doPrado (feitas com barro originário dessa região), nãoé linear afirmar-se que esse tipo de decoração sejaexclusivo desse centro, devendo mesmo evitar-seas generalizações, uma vez que se conhece a con-temporânea utilização da moscovite na decoraçãode peças em Guimarães, Felgar e Bisalhães e exis-tem mesmo outros exemplares do género espalhadospelo país. O que pode afirmar-se, segundo estes mes-mos autores, é que a utilização de moscovite na de-coração de peças correspondeu ao gosto de uma épo-ca, pelo que não nos admiraria se nos séculos XVI aXVIII a produção de peças decoradas com moscovite

14 Hoje em dia praticamente todos os centros de produção de louça preta estão próximosda extinção definitiva.15 Há no entanto que diferenciar, dentro da ampla realidade geográfica designada de “Pra-do”, como explica Araújo (1998:37), especificidades locais de tradição mais arreigada naprodução de louça preta, circunscritas às freguesias de Escariz e Parada de Gatim, queparecem ter ficado isoladas, no meio dessa vasta região como únicas freguesias de cerâmi-ca exclusivamente preta, até finais ao século XX.16 Sobretudo na cerâmica vermelha, que trataremos de seguida.

Figura 6. Fragmento cerâmico com aplicações de moscovite.

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se fizesse noutros centros oláricos e não apenas noPrado, apesar de este ser, até ao momento, o únicolocal onde podemos afirmar com forte probabilidadea efectiva produção deste tipo de decoração.

Relativamente à cronologia que propomos para operíodo de utilização do fragmento proveniente doCabeço do Outeiro será a segunda metade do séculoXVII, não só pelo restante contexto estratigráfico járeflectido mas também pelo demais espólio da unida-de em questão que remete para esse enquadramento, eque na proposta dos autores anteriores se encaixa naépoca de difusão plena deste tipo de decoração.

De idênticos acabamentos, denotando um fabri-co tecnicamente evoluído pela depuração na pasta,paredes pouco espessas, reduzidas dimensões e bru-nido caracterizado por um conjunto de linhas espa-çadas que atravessam perpendicularmente o bojo dapeça, mas sem qualquer decoração com moscoviteassociada, apuramos, na UE 029, o artefacto visí-vel na figura 22 que acreditamos ter sido igualmen-te produzido no centro do Prado.

Este centro conhece, no entanto, uma perda dedomínio relativamente ao seu controlo hegemónicoda produção, na passagem do século XVI para oséculo XVII, assistindo a uma afirmação progressi-va do pólo duriense que lhe passa a fazer concor-rência (Barreira; Dordio; Teixeira, 1997:93).

Disseminados pelo vale do Douro alguns cen-tros oláricos, como Mondrões, Lordelo, Gondar, Sta.Marinha, entre outros, ganham então importância eassentem na sua vocação da produção de cerâmicapreta. Entre eles, destacamos apenas a freguesia deGondar, em Amarante (activa na produção de lou-ça negra do século XVII à actualidade), por ser aque mais próxima se encontra de Nespereira –Lousada (em estradas actuais dista apenas 30 km),já estando confirmados como dois dos seus conce-lhos de comercialização Penafiel e Felgueiras(limítrofes de Lousada), e por se afirmar como umadas mais preponderantes a nível de produção(Fernandes, 1997b:30). A principal característica daolaria de Gondar é a sua superior resistência ao ca-

lor, propiciando às peças a capacidade de uma ex-posição directa ao fogo, o que direccionou as suasformas para utensílios culinários com especial des-taque para a panela, afamada pelo bom gosto dadoà comida nela cozinhada, observando-se geralmen-te abundantes restos de cinzas e marcas de fogo nassuas paredes. À semelhança do que se verificava narestante área geográfica partilhada pelos centrosoleiros durienses, a cerâmica era trabalhada em rodabaixa e cozida em soenga (ob.cit.:33).

Genericamente, estas produções caracterizam-se por serem muito porosas, friáveis e enegrecidas

pelo fumo (Real [et. al.], 1995:181). Facilmenteidentificáveis pelos abundantes restos de cinzas emarcas de fogo nas paredes exteriores, em resulta-do de uma prolongada utilização na preparação dosalimentos ao lume, reconhecemos vários fragmen-tos destas panelas na sondagem, sobretudo ao nívelda unidade estratigráfica 02917, pelas formas fecha-das, paredes que se adivinham altas e de perfil con-vexo estreitando para o fundo e para a boca (o quefacilita a cobertura com um testo)18. É uma forma

Figura 7. Conjunto de bordos de panelas visivelmente fusti-gados por uma utilização frequente em lume directo da se-gunda metade do século XVII.

17 Relembre-se a ponderação acerca da existência de uma cozinha, neste espaço.

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adaptada às cozeduras demoradas, que não neces-sitam de uma visualização permanente do anda-mento de cozedura dos alimentos em grande quan-tidade de meio líquido, como os caldos. (figuras 23e 24.

Gráfico 3. Percentagem das peças que apresentam marcasde fogo em ambas as faces, entre o universo das cerâmicasnegras.

Verifica-se portanto uma apetência especial daspeças negras, quando comparadas com as verme-lhas, para ambiências directamente relacionadascom a confecção dos alimentos ao lume, tendo emconta as características já enunciadas, o que se con-firma pela preponderante escolha deste tipo de lou-ça, em que as olarias do Douro se especializaram,para contextos de fogo.

4.1.2. Cerâmica vermelha (não vidrada)

A cerâmica vermelha, que se assume largamen-te preponderante no conjunto da cerâmica inven-tariada para a sondagem do CBO, é genericamentecaracterizada pela coloração vermelha ou alaranjadadas suas pastas que, ao contrário da cerâmica preta,gozaram de cozedura em ambiente rico em oxigé-nio (oxidante).

Mais uma vez, se verificarmos a distribuição dofabrico da louça, neste caso da vermelha, nos sécu-los XVII a XX, constatamos que percorre todo opaís com maior incidência no litoral, coexistindo

com a preta a Norte do Tejo e tendo o monopólio aSul deste rio (Fernandes, 1997b:33).

Aveiro e Ovar destacam-se como um importan-te centro de produção da louça vermelha na IdadeModerna e mesmo Contemporânea, apesar da acti-vidade olárica se achar já testemunhada desde a pri-meira metade do século XV (Silva, 1996:54). Ascaracterísticas geológicas desta região, em cujo soloabundam jazidas argilosas de qualidade reconheci-da (ob.cit.:54), e a natural rede de comunicaçõesfavorecidas por uma extensa rede de canais fluviaise pela proximidade do mar, propiciaram o desen-volvimento de um importante núcleo produtor e dis-tribuidor de cerâmica (Amorim, 1998:71). Este cen-tro chega mesmo a ganhar predominância, no quese refere à louça vermelha, na passagem do séculoXVI para o XVII, relativamente ao hegemónicocentro do Prado (Barreira; Dordio; Teixeira,1997:93). De tipologia19 muito própria, que conta-va sobretudo com as formas de tigelas, infusas,alguidares, púcaros e cântaros (Real [et. al.],1995:179), estas peças apresentavam uma cor vivaque tanto as ajuda a reconhecer. Foi por isso de fá-cil atribuição a este centro oleiro um conjunto depeças encontradas nesta escavação que partilhamdas suas características.

Tratam-se de peças “de barro formado em lou-ça encarnada, tão dura quase tão durável como pe-dra”, como nos descreve o P.e António Carvalho

19 A definição de uma tipologia estruturada para um conjunto de formas cerâmicas pode fazer-se utilizando distintos critérios,como sejam os resultantes da silhueta geral e abertura das peças.

Gráfico 4. Percentagem de fragmentos de cerâmica verme-lha, no conjunto total da cerâmica apurada.

Percentagem da cerâmica pretaexposta a lume directo

Representatividadeda cerâmica vermelha

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da Costa (cit. por Amorim, 1998:73), em que a ti-gela se assume como a principal forma deste con-junto artefactual. De facto, a morfologia dominan-te, sem grandes oscilações de tamanho, é a tigela,que apresenta sempre paredes espessas e de tendên-cia carenada, como se pode ver na figura 8, gozan-do de boa qualidade para conservar a água frescapela porosidade da pasta. Alguns destes produtoscerâmicos, como Fortunato Temudo (cit. por Nunes,1998:19) salienta, são bastante perfeitos, tanto nofabrico como na forma, apresentando um perfil ad-miravelmente simples e belo20.

Figura 8. Reconstituição em 3D de um fragmento de umatigela do centro produtor Aveiro-Ovar – respeitante à segun-da metade do século XVII (Auto-Cad 2006).

O cântaro, considerado a segunda categoria for-mal mais produzida por este centro, consegue, tal-vez, a sua representação mais aproximada entre oespólio cerâmico desta escavação, com o bordo quese mostra na figura 27, manifestando uma decora-ção simples, composta por linhas brunidas verticaisna sua superfície externa e paredes substancialmentemais finas relativamente às tigelas anteriormenteanalisadas.

Não será estranho considerar a presença destacerâmica em Lousada, uma vez que o Porto, um dosdestinos mais conhecidos desta produção, absorviacerca de um terço destas peças (Silva, 1996:60) ereenviava o excedente para outras regiões nor-tenhas21, funcionando de importante entreposto quechegava a conseguir difundir as peças até à Galiza

(Amorim, 1998:77). Estas transacções, arqueologi-camente confirmadas para o século XVII com asescavações na Casa do Infante, faziam circular ti-gelas calculadas em milheiros22, pelo menos até àdécada de 70 do século XVIII, altura em que a suacomercialização sofre um decréscimo fixando-semais num consumo local (Amorim, 1998:78). Estatendência, no entanto, não se verifica de forma tãolinear na sondagem intervencionada, que denotauma presença notável deste tipo de cerâmica aindaem níveis contemporâneos, parecendo mesmo apre-sentar uma certa constância durante todos os mo-mentos que nos foram possíveis determinar (desdea segunda metade do século XVII à segunda meta-de do século XIX).

A região das olarias de Aveiro e Ovar não pare-cem interessadas no abastecimento em louça de fogo,com a excepção de Aradas – onde se recorria ao tra-dicional fabrico da louça preta, preferida relativamen-te à de ferro – tendo portanto optado pelo abasteci-mento em louça vermelha (Dordio, 1999:51).

Quanto ao centro do Prado, vê-se novamenterepresentado no espólio aqui em estudo, agora comcerâmica vermelha, de boa cozedura, exterior cas-tanho ou laranja claro, paredes pouco espessas decerne acastanhado ou cinzento, onde o cântaro seafigura como forma maioritária. Em muitos casos,o tratamento das superfícies resulta de um brunidoou polimento cuidado (figura 28).

Outras peças, chegam mesmo a ostentar umagramática decorativa muito rica, visível pela perfu-ração intensa de toda a sua espessura em algumaspartes que as constituem e de que se destacam asasas (figura 29).

Estas asas, de cerne cinzento, tão característicasdeste centro, pertenceriam certamente a um cântarode dupla asa, em que a segunda - mais pequena -teria apenas uma função de apoio e orientação doslíquidos que conteria o recipiente. Curioso, é notarque o fabrico destas asas em particular, que cremosreportar-se a meados do século XVII, não dotaria a

20 A propósito destas peças, e para maior pormenor, consulte-se as figuras 25 e 26.21 Para além do Minho, a louça de Aveiro-Ovar tinha como destinos habituais a Beira Alta e a Beira Baixa (Amorim, 1998:73).22 Unidade de medida referente a mil peças.

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peça de grande resistência, uma vez que a sua apli-cação, posterior à moldagem do cântaro, como severifica pela análise do encaixe da asa, revestiria apeça de alguma fragilidade.

4.1.3. Cerâmica vidrada

Na totalidade do espólio cerâmico apurado, estaé a tipologia que claramente se revela menos ex-pressiva, correspondendo a apenas 19 fragmentosdispersos entre as unidades 026 e 036, afirmando-se, portanto, tendencialmente nos níveis mais anti-gos (segunda metade do século XVII).

Gráfico 5. Percentagem genérica da louça vidrada no con-junto cerâmico.

Para o distrito do Porto, os documentos de afora-mentos e sisas apenas aludem como únicoabastecedor da louça vidrada no século XVII (cit.por Real [et. al.], 1995:179) o centro de produçãodo Prado, que fabricava vidrados a chumbo em co-res de amarelo, laranja, verde e castanho.

No que concerne às formas apuradas reconhe-ceram-se sobretudo fragmentos que pertenceriam asertãs e frigideiras – peças que pelas característicasmuito próprias, inerentes à sua função, se incluemsempre neste conjunto cerâmico.

O grupo de fragmentos vidrados em análise en-quadra-se na tipologia das formas abertas, de fundoraso, paredes inclinadas para o exterior, rematadaspor asas, muitas das vezes horizontais, junto ao bor-

do para que a manipulação dos alimentos cozinha-dos saia facilitada (Barreira; Dordio; Teixeira,1998:164). Surgem, entre o espólio, algumas peças,de perfil mais baixo, com asas de cabo.

4.1.4. Faiança

Sendo a cerâmica um dos indicadores preciososdo nível de evolução tecnológica de uma socieda-de, do seu grau de riqueza e do gosto que a caracte-riza, a presença significativa de faiança na sonda-gem intervencionada, cuja proporção no conjuntodo espólio cerâmico se perspectiva no gráfico 6, sus-cita alguma reflexão relativamente a aspectos só-cio-económicos inerentes ao habitat rural que pro-curamos compreender.

Gráfico 6. Percentagem da faiança recolhida quando com-parada com os vários grupos de cerâmica comum.

Como salienta Isabel Maria Fernandes (1999:12),e para o período histórico que nos ocupa, a uten-silagem cerâmica das classes menos favorecidas erabem diferente da utilizada pelas classes detentorasde riqueza, quer em qualidade, quer em quantidadedas peças. As classes rurais e citadinas, de parcosrecursos económicos recorriam às singelas peças delouça preta ou vermelha fosca e vidrada para supri-rem as necessidades elementares, enquanto que anobreza ou a burguesia utilizavam para satisfaçãodas necessidades uma panóplia mais dilatada deutensílios. A faiança23, sobretudo a partir do século

Representatividade da cerâmica vidrada

Representatividade da faiança

23 Apesar de provir da França, deve o seu nome à cidade italiana de Faenza, onde começou a ser produzida com grandequalidade a partir de princípios do século XVI (Leão, 1999: 15).

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XVIII, caracterizada pelo seu vidrado estanífero(com ou sem pinturas) e pastas claras, era a ima-gem de marca dos seus detentores. Fosse de produ-ção mais grosseira ou mais fina, o que é certo é queo seu fabrico exigia uma técnica apurada e maté-rias-primas mais caras do que as da loiça vermelhae preta – era uma produção para as elites endinhei-radas (Fernandes, 2001:30).

A tendência a que se assiste ao longo do séculoXVII e especialmente com o advento do séculoXVIII é à da progressiva diminuição da louça co-mum (preta ou vermelha) em detrimento do cresci-mento da louça de faiança (Dordio, 1999:47), so-bretudo para contextos domésticos que revelem al-guma preponderância social.

A identificação e investigação dos centros deprodução de faiança em Portugal nos séculos XVIe XVII continua a revelar-se matéria muito obscu-ra, apesar de se terem identificado alguns centrosem Lisboa, que se considera ser um dos mais im-portantes núcleos de produção (Barreira; Dordio;Teixeira, 1998:151), e em Coimbra (Real [et. al.],1995:184).

No que se refere ao espólio proveniente desta in-tervenção e para facilitar a análise dos fragmentos defaiança optou-se por seguir a metodologia seguidana intervenção arqueológica da Casa do Infante(Barreira; Dordio; Teixeira, 1998:152-154), optan-do por dividir o conjunto em grupos de estudo, aten-dendo sobretudo a aspectos de índole decorativa.

Assim, consideramos um primeiro grupo, deapreciável representação no universo dos três con-juntos, constituído por louça grosseira, de esmaltebege/ amarelado muito fino que se degrada com al-guma facilidade, decorado de forma simples comfiletes azuis no fundo ou junto dos bordos, repor-tando-se sobretudo a duas formas que se identifica-ram às tigelas e aos pratos. Este grupo, de inspira-ção reconhecidamente europeia (sobretudo italianae espanhola), começa a aparecer no registo arqueo-lógico a partir do primeiro quartel do século XVII(Dordio; Teixeira; Sá, 2001:140), e prolonga-se notempo, sendo que no caso do nosso conjuntoestilístico se considera adequado enquadrá-lo emmeados de Seiscentos (fig. Xxx).

O segundo grupo, claramente mais representa-do pela quantidade de peças apuradas, alude a uma

louça igualmente de tradição europeia, mas maisfina, com motivos e figurações pintados em azulque mostra preferência por representações geomé-tricas ou figurativas vegetalistas. Uma forma deorganização decorativa muito frequente para estegénero de representações são as sobejamente co-nhecidas rendas e contas que preenchem com ban-das duplas ou simples as abas dos pratos remeten-do, com alguma segurança, para datas posterioresao segundo quartel do século XVII (ob.cit.:142) dozedos fragmentos cerâmicos encontrados na sonda-gem em Nespereira (figura 9)

Correspondendo ao último grupo de faianças,para o qual encontramos apenas dois fragmentos,destacamos um tipo de louça fina, igualmente comfigurações mas pintada a azul e vinoso, alternandoas duas cores.

Numa das peças constatamos, um motivo já co-nhecido – as contas –, mas que se salienta dos de-mais fragmentos pela superior qualidade, visívelquer pela consistente espessura e regularização doesmalte quer pelo cuidado aprimoramento da gra-mática decorativa pintada na sua face interna, tra-tando-se de três fiadas de contas azuis, descentradasentre si e separadas por finas bandas em tom vinosoque serpenteiam entre as contas (figura. 12).

Para o outro fragmento, (figura 13), de crono-logia mais tardia, encontramos um tipo de repre-

Figura 9. Faianças monócromas com filetes em dupla linhaa azul.

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sentação muito padronizada que conta semprecom duas linhas concêntricas em azul com umou dois espaços e, entre elas, surge o preenchi-mento com rabiscos alongados em vinoso. Esta lou-ça, em contraste com tendências decorativas domesmo período que denotam acentuada sobrieda-de, procura uma espécie de caricatura da tradiçãodecorativa barroca anterior (Barreira; Dordio; Tei-xeira, 1998:158).

Nas escavações realizadas na Casa do Infanteeste terceiro grupo surge apenas num depósito do3º quartel do século XVII, marcando para essa altu-ra o início da sua utilização nesse local (ob.cit.:154),o que se adequa plenamente ao nosso horizonte tem-poral para a unidade 026 (finais do século XVII,

Figigura 10. Fragmentos de faiança com decoração do tipo“rendas”.

Figura 11. Fragmentos de faiança com decoração do tipo“contas”.

Figura 12. Aba de prato em faiança com decoração do tipo“contas” a policromático.

Figura 13. Fragmento em faiança – louça do brioso.

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inícios do XVIII), onde apareceu o fragmento dotipo Brioso24 a que nos reportamos (ob.cit.:155).

A faiança encontrada na sondagem do Cabeçodo Outeiro ao distribuir-se sobretudo pelas unida-des 029, 030 e 033 mostra-se contemporânea aoperíodo áureo da difusão da faiança portuguesa –séculos XVII25 e XVIII. O século XVII que assistea um crescimento espectacular da faiança motiva-do pelas importantes inovações técnicas tendentesà qualidade das pastas, vidrados e moldagens acabamesmo por ser conhecido como “o século da faiançaportuguesa” (Dordio; Teixeira; Sá, 2001:138 -140).

Sobretudo correspondendo a duas formas aber-tas principais - tigelas e pratos - as peças recolhidasno decorrer da escavação destinavam-se ao serviçode mesa, contribuindo para esta função as caracte-rísticas intrínsecas da faiança relacionadas com aimpermeabilidade e limpeza. Deve-se no entantosalientar a multiplicação de formas que as peçasconhecem com a faiança, caminhando para umaespecialização (uma forma – uma função) divididapor preocupações quotidianas diversas (serviço demesa, cuidados de higiene, decoração, preparaçãode alimentos e farmácia), que contrasta com apolivalência funcional das peças de barro vermelhoou preto que ao longo de séculos serviram as neces-sidades básicas de uma população rural e pobre.Refinam-se os sabores, logo os pratos, como suge-re Paulo Dordio (2001:138).

4.2. Metal

Ao contrário do que sucede com a cerâmica queconstitui, grosso modo, um testemunho materialmuito resistente à passagem do tempo, outros ob-jectos, como é o caso do espólio metálico, sofremprocessos de degradação mais acelerados, acaban-do alguns por desaparecer quase sem deixar traçosarqueológicos.

Ainda assim conseguimos reconhecer várias for-mas e estabilizar algumas peças metálicas em avan-

çado estado de corrosão, com a ajuda de um labora-tório especializado na conservação e restauro deartefactos arqueológicos diversos. Referimo-nosconcretamente à lâmina de um canivete com doisapliques em cobre ou liga de cobre, (figura 14), aum colchete, a um hipotético compasso de pedrei-ro/marceneiro, a uma meia ferradura, a vários pre-gos e cravos, e a uma medalhinha.

Podemos considerar a generalidade deste espó-lio metálico em três momentos de ocupação do es-paço. Numa fase mais recente, correspondendo àunidade estratigráfica 011 que se afigura como oprimeiro estrato arqueológico escavado relativamen-te bem conservado, enquadram-se a lâmina de na-valha, o colchete e o compasso de pedreiro/marce-neiro (?) que certamente conheceram utilizaçõescompreensivelmente distintas em termos funcionais,mas temporalmente coevas entre si e que balizamosnos finais do século XVIII. Recuando aproximada-mente uma centúria, fixando-nos na segunda meta-de do século XVII, encontramos o segundo momen-to em que aparece espólio metálico, desta vez repre-sentado por meia ferradura (partida intencionalmen-te?), da UE 029, e por uma medalha, da UE 033, que

24 Estilo de louça muito característico de Coimbra com forte personalidade decorativa nas pinturas a azul e vinoso.25 Foi o início de uma “moda” propagada por todas as nações europeias que em experiências e tentativas durou, sem interrupção,até ao princípio do século XIX (cit. por Calado, 2001:17).

Figura 14. Lâmina de navalha em ferro com dois apliquesem cobre.

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com muitas probabilidades teriam igualmente parti-lhado o mesmo período de utilização. Definindo agorao terceiro horizonte cronológico para a dissemina-ção do espólio metálico pelos níveis de ocupação háque considerar um tempo longo que acompanha pra-ticamente a totalidade dos estratos arqueológicos,compreendido entre a unidade 011 e a 029, pontuadopela presença assídua de cravos e pregos, em ferro,denunciando provavelmente uma intencionalidadeconstrutiva efémera caracterizada por estruturas emmadeira ou pela frequente utilização deste recursoperecível como complemento a edificações pétreasque não nos foram possíveis identificar.

Pela singularidade do achado gostaríamos dedestacar, entre as restantes peças, a medalhinha emcobre descoberta na unidade 033 (figura 31).

Trata-se, provavelmente, de uma medalha deterço, pelo que consideramos pertinente a existên-cia de uma conta em azeviche nas imediações dolocal onde foi recolhida a medalha, equacionando-se a possível relação entre estes dois elementos.Apesar da elevada corrosão do cobre deixar poucoclaros alguns elementos iconográficos impressos nasfaces ovais da medalha, parecem-nos válidas algu-mas leituras. Na sua face principal verificamos umarepresentação de Nossa Senhora coberta por umalonga veste repleta de pregas com o menino Jesusao colo do seu lado esquerdo, sendo provável queambos se apresentem ostentando coroas (hipótesecolocada com muitas reservas). Aos pés de NossaSenhora pode observar-se uma cabeça de anjo ala-da (querubim), centrada na base da medalha, e porcima da cabeça de Nossa Senhora, no topo da me-dalha, suspensas no ar, duas pombas viradas umapara a outra. A componente particular desta repre-sentação prende-se com a alusão material a um edi-fício religioso confirmado pelas cruzes suspensasem cada um dos pináculos nas extremidades do te-lhado desse mesmo edifício, que na sua parede vi-sível se retalha em subdivisões quadrangulares erectangulares, sugerindo janelas de um mosteiro,

dispondo-se como imagem de fundo por trás deNossa Senhora. Esta combinação da vertente terrenacom a espiritual não nos parece muito habitual nes-te tipo de figurações e leva-nos a equacionar a hi-pótese de se tratar de uma representação de NossaSenhora de alguma forma relacionada com umaentidade monástica. No verso, encontramos a habi-tual representação de Cristo crucificado, onde, notopo e ainda dentro da cruz (desenhada com algumcuidado estilístico), parece vislumbrar-se um ténuearranque das siglas INR (Jesus Nazareno Rei dosJudeus), mas com uma margem grande de incerte-za. Mais nítida é a inclusão de dois anjos viradospara Jesus na parte inferior da medalha, sugerindouma postura de genuflexão.

A grande dúvida que permanece prende-se coma tentativa de identificação da representação daNossa Senhora, que aqui procuramos entender.

Como nos explica Carlos Alberto Ferreira deAlmeida (1979:10-13), o aumento da devoção àVirgem através da multiplicação das capelas e daestimulação do imaginário com a arte gótica, a par-tir de finais da Idade Média, motivou a multiplica-ção dos seus nomes. Uma das consequências é amudança do nome de Santa Maria, com que aindase designava habitualmente a Virgem no séculoXVI, para o de Nossa Senhora. Afirmam-se, porisso, em época Moderna, as devoções à Virgem doRosário, do Carmo e da Boa-Morte, contribuindopara este fervor o intensificar do culto às almas doPurgatório, que se impõe como uma das mais fortespráticas religiosas deste período no Norte de Portu-gal. Esta veneração, exclusivamente mariana, divul-ga e fomenta a fé em Nossa Senhora do Carmo, dasAlmas e do Rosário, sendo através de rezas a estaúltima invocação que a Alma poderia, sem perigo,chegar ao Céu26. É por isso que as Confrarias doRosário substituem em muitas terras portuguesas,nos séculos XVII-XVIII, as das Almas e passam aser, sem qualquer dúvida, as mais numerosas.

A medalha sobre a qual propomos aqui reflexão

26 É nestas crenças que se origina o hábito dos defuntos se fazerem sempre acompanhar por um terço que levariam para asepultura e da sua morte ser conduzida por velas acesas onde não faltaria a recitação do rosário.

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perpassa este horizonte religioso, por se enquadrartemporalmente na segunda metade do século XVII,e encarnaria, possivelmente, muitos dos anseios epreocupações desta época.

4.3. Material de construção

Considerando a importância da estrutura [035],como único pólo evidente de gestão de espaços ereconhecendo o potencial informativo que os tijo-los, neste caso, são capazes de nos fornecer, consi-deramos pertinente referir sucintamente algumas dassuas características.

A totalidade dos fragmentos pertencentes ao ní-vel dos tijolos que nos foi possível estudar, vistoque a abertura da estrada terá arrasado com umaparte desta estrutura, aponta para quase nove deze-nas de pedaços significativamente completos nassuas formas. Posto isto, facilmente compreendemosa necessidade da sua divisão em duas formas dis-tintas: o tradicional tijolo paralelipipédico e um ou-tro tipo a que vulgarmente se designa de tijolomaneirista.

Relativamente aos tijolos de tipologia tradicio-nal, foram apurados cerca de 60 fragmentos, afir-mando-se como a larga maioria entre os elementosconstituintes da UE 035. Estes tijolos caracterizam-se por apresentarem medidas entre os 9,5 e os 11,5cm de largura e uma espessura entre os 6 e os 8 cm.O comprimento e o peso foram apurados tendo emconta a forma mais completa, o que respectivamen-te se situa nos 25,5 cm de comprimento e nos 1,300kg de peso.

Os tijolos maneiristas, de que se destaca o exem-plar da figura 15, representam sensivelmente 27%da totalidade dos tijolos, reportando-se a larguras queoscilam entre os 10,5 e os 11 cm e a uma espessurafixa de 6 cm. A forma mais completa rondará os 18cm de comprimento (na sua medida mais longa) etem como peso 1kg.

Apesar das diferenças morfológicas, os tijolospartilham de algumas características comuns, como,a constituição da pasta (alaranjada, com poucos ele-mentos não plásticos, entre os quais quartzo leito-so, mica, chamota e palha), o desgaste no centro,não pela utilização mas pela técnica de fabrico, e opeso consideravelmente leve.

4.4. Outros achados relevantes

Apesar da reduzida expressão que alguns mate-riais manifestam, no contexto do espólio exumado,não queríamos deixar de os invocar como presentesna intervenção arqueológica decorrida. Referimo-nos particularmente aos líticos e aos vidros.

Não obstante os líticos pertencerem ao grupomaterial mais estável a nível da perpetuação de in-formação arqueológica pela sua resistência e dura-bilidade, existem apenas dois artefactos que foramrecolhidos na unidade 029. Trata-se de um moventede moinho manual oblongo de tipologia pré-histó-rica que se pode observar na figura 32 e de umapedra talhada de forma discóide de função indefini-da.

Os vidros vêem-se representados em duas pe-quenas lascas incolores muito finas e numa contaovalada igualmente translúcida, de pequenas dimen-sões, que rondará os 0,4 (0,8) cm de largura e os 0,8cm de altura.

Figura 15. Tijolo de morfologia Maneirista usado na constru-ção da estrutura [035].

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27 Para o aprofundamento deste tema sugere-se a consulta do artigo de Pedro Magalhães relativa à casa do Cáscere, publicadonesta revista, e cujos dados se afiguraram preciosos para a pequena nota histórica que procuramos aqui traçar.28 Cujo proprietário actual é o Sr. António Basílio Carneiro Leão, que amavelmente nos deu autorização para a realização dostrabalhos arqueológicos.

5. Contributo das fontes históricas

Apesar de toda a propriedade rústica ou urbanade Lousada se encontrar nas mãos de igrejas, mos-teiros e ordens militares a partir do século XIV,como refere Eugeneo Freitas (cit. por Magalhães2002:4 27), há que ter em conta uma antiga nobrezade grande linhagem possuidora de avultados recur-sos, que embora em muitos casos venha a desapa-recer ou se afaste do concelho, noutros permaneceapenas adormecida.

Parece-nos ser esse o caso da Casa do Cáscere,conhecida em períodos mais recuados como casaldo Carcere, detentora de grandes terrenos na IdadeModerna perpetuados num dilatado território queainda hoje domina Nespereira e de que é caso parti-cular a área afectada pela abertura da sondagem deque nos ocupamos.

No caso específico do casal do Carcere era aoMosteiro de Vilela do Concelho de Paredes que setinha concretizado a doação (ob.cit.:4), seguindo oimpulso religioso, tão comum na época, de salvaçãodas almas. O que acaba por acontecer, na maior par-te dos casos, é que a vastidão e a dispersão do patri-mónio fundiário do Mosteiro propiciam uma admi-nistração indirecta dos seus bens, alienando o direitoútil da terra a terceiros que mediante o pagamento deuma determinada quantia em géneros e/ou dinheiroas exploravam – reservando-se apenas o direito de asvender ou trocar ao mosteiro que as tutelava. Era entreesses lavradores, a quem se aforavam as terras, e aquem se refere Eugeneo Freitas (cit. por Magalhães2002: 5) como “homens plebeus, outros, porém per-tenciam já a famílias nobres, porventura ramos se-gundos ou decaídos de antigos troncos”, que se fir-mava a nova Nobreza de Lousada.

O poder local agitava-se portanto ao sabor davida económica das comunidades rurais que por suavez dependiam da agricultura, o que fazia com quea posse de terra fosse a condição por excelência para

o reconhecimento do prestígio social. Esta conjun-tura vê-se plenamente satisfeita com a Casa doCáscere que reúne todas as vertentes necessáriaspara que daí saíssem “as pessoas principais das ter-ras”, “melhores da terra” e as “pessoas de melhornobreza” que dominassem o papel da liderança re-gional. Não nos estranha portanto que na linhagemdo século XVII e XVIII, na casa do Cáscere, nosapareçam quatro personalidades ligadas a cargos su-periores do exército, ocupando o lugar de capitão esargento-mor de Lousada (ob.cit.:18), atestando aprimazia social alcançada.

É sobre este pano de fundo de relações de domi-nação / preponderância sócio económica da Casado Cáscere28 que se deve ponderar a vivência con-creta do Cabeço do Outeiro, para os séculos XVII eXVIII, e enriquecer as reflexões arqueológicas quetecemos sobre o sítio.

6. Conclusão

Considerando-se os trabalhos de abertura da viaque rasgaram em 15 metros de largura os terrenosafectos ao sítio arqueológico aqui estudado, impor-ta questionar a área de destruição irreversível que olocal sofreu.

A escavação revelou, no entanto, um habitat ru-ral da Idade Moderna com uma ocupação contínuado século XVII a meados do século XIX, com par-ticular incidência na sua utilização doméstica du-rante o século XVII. A clarificação deste horizontecronológico foi possível sobretudo pela análise dascerca das cinco centenas e meia de fragmentoscerâmicos provenientes, em muitos casos, de carac-terísticos centros de produção e reportando-se amotivos decorativos bem datados no tempo, de quese referem, a título de exemplo, as tradicionais con-tas e rendas na faiança. Este precioso contributomaterial não suprime, ainda assim, a ausência deestruturas, nem contorna o silêncio material que

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caracterizou a intervenção arqueológica, antespotenciando o grau de incerteza com que se pers-pectiva o local, pelo que são várias as questões quepermanecem em aberto. Porque se teria implantadoeste habitat numa vala tão apertada e de considerá-vel profundidade? Que funcionalidade concreta te-ria o piso incompleto que encontrámos? Que práti-ca se esconde por trás de tamanho volume de cin-zas representado pela UE 029?

Estas e outras perguntas só poderiam conhecernovas reflexões se uma nova sondagem fosse aberta

nas proximidades da actual (ou considerando mes-mo o alargamento da existente), o que mesmo assimnão seria condição sine qua non de novos resultados.

Ficam apenas lançadas renovadas perspectivasde estudo para a compreensão da ocupação humanade uma região que parece ter-se cristalizado numarede de povoamento rural dispersa baseada nos seuslaços telúricos, com pólos de liderança local gera-dores de prestígio e manipuladores de riqueza, deque se destaca ainda hoje a Casa do Cáscere e todosos amplos territórios que domina.

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Figura 17. Plano final dos trabalhos arqueológicos.

Figura 16. Plano do conjunto das valas abertas na unidade estratigráfica 012.

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Figura 19. Corte Esteda sondagem intervencionada.

Figura 20. Corte Oesteda sondagem intervencionada.

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Figura 23. Bordo de panelaem cerâmica preta, com caneluras,adaptado à cobertura com um testo.

Figura 24. Bordode panela em cerâmicapreta coberto de fuligem.

Figura 22. Fundo de tigela em louçapreta, de paredes finas, suavementebrunido e de ônfalo bem pronunciado.

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Figura 26. Fundo de tigela produzida no centro no centro Aveiro-Ovar.

Figura 27. Bordo brunido de cântaro do centro cerâmico Aveiro-Ovar.

Figura 25. Tigelas carenadas do centro de produção Aveiro-Ovar.

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Figura 29. Asa/bordo de cântaro em louça vermelha, do centro de produção do Prado, perfurada em toda a sua espessura.

Figura 28. Bordo de cântaro em louça vermelha, com decoração brunida arrastada, do centro de produção do Prado.

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Figura 30. Fundos de cântaros em louça vermelha, produzidos no centro de produção do Prado.

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Figura 31. Medalha de terço em cobre, de meados do século XVII, alusiva ao culto a Nossa Senhora (frente e verso).

Figura 32. Movente de moinho manual de tipologia pré-histórica.

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001 Unidade homogénea, de coloração cinzenta Nenhumas Ocupação - séc. XXIclara (esbranquiçada), composta por cimento (estaleiro de obras)e gravilha (tubenã)e por isso extremamente compacta.

002 Unidade homogénea, saibrosa, de coloração Nenhumas Ocupação - séc. XXIamarelo-clara e textura granulosa (estaleiro de obras)muito compacta.

003 Terras saibrosas, amarelas-acinzentadas Nenhumas Ocupação - séc. XIXde textura granulosa.

004 Terras acastanhadas, pouco compactas, Nenhumas Ocupação - séc. XIXde grão médio, idênticas às da EU 041.

005 Interface de vala que interrompe totalmente Nenhumas Interface de valaas UE 004/041 e parcialmente a UE 009, séc. XXcaracterizado pela forma côncavae pouco estruturada que apresenta.

006 Terras heterogéneas, saibrosas, Nenhumas Enchimento de valade textura granulosa e coloração amarelada. séc. XX

007 Terras muito compactas, Nenhumas Ocupação - séc. XXde coloração acinzentada e textura fina. (caminho de servidão)

008 Tubo de P.V.C. que serviria Nenhumas Estrutura - séc. XXde apoio à casa da eira próxima da sondagem.

009 Terra homogénea, de coloração castanha, Ocasional Ocupação - séc. XIXcom alguma compactação cerâmica domésticaàs suas cotas superiores (15 fragmentos)onde apresenta abundantes raízes. - séc. XIX

010 Terras amareladas heterogéneas Telha Enchimento de valana sua composição. séc. XX

011 Terras muito pouco compactas, Ocasional Ocupaçãode textura granulosa cerâmica doméstica séc. XVIIIe coloração castanho-claro. (10 fragmentos)

- final do século XVIIIe 4 metais, entre os quais,um colchete, um caniveteem ferro e um compasso

de pedreiro (?)

012 Terras saibrosas, pouco consistentes, Nenhumas Ocupação - séc. XVIIIde textura granulosa e deposição irregularpor acção antrópica ou natural,apresentando-se sobre a forma de valas paralelasentre si, em número de onze e de coloraçãoamarelo-claro. Contem abundantes raízes.

013 Interface da UE [012]. Nenhumas Interface da UE [012]Ocupação - séc. XVIII

Tabela de caracterização das unidades estratigráficas

UE Caracterização Inclusões culturais Interpretaçãoestratigráfica

Continua

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UE Caracterização Inclusões culturais Interpretaçãoestratigráfica

Continua

Continuação

024 Terras pouco compactas, de textura fina, Ocasional Ocupação - séc. XVIIIcoloração castanha. cerâmica doméstica

(16 fragmentos)- final séc. XVIII;

ocasionais metais

025 Terras saibrosas, pouco compactas, Nenhumas Ocupação - séc. XVIIIde textura granulosa e coloração amarelada(amarelo-claro). Por comparação à UE [012]que apresenta composição similar,a sua granulometria é mais fina.

026 Terras de coloração castanha, textura arenosa, Abundante Ocupaçãopouco compactas, homogéneas na sua composição. cerâmica doméstica séc. XVIII/XVIIContem algumas pedras de pequeno porte (79 fragmentos)e algumas raízes. (79 fragmentos)

- finais séc. XVII,princípios do XVIIII;

ocasionais metais e telhas

027 Terras castanho-escuras, Alguma cerâmica Ocupaçãode grão fino com manchas de carvões doméstica séc. XVIIe inclusões pontuais de raízes (29 fragmentos) 2ª metade(menos que na UE 026). - 2ª metade do séc. XVII;Comporta algumas pedras de pequeno porte. ocasionais metais

e telhas; uma contade colar em vidro

028 Terras castanho-escuras Alguma cerâmica Ocupação(ainda mais escuras do que as da UE 027), doméstica séc. XVIII/XVIIde aspecto lamacento, grão muito fino, (25 fragmentos)bastante homogéneas. - finais séc. XVII,

princípios do XVIII;ocasionais metais

029 Terras de coloração preta, bastante compacta, Abundante Ocupaçãomuito homogénea, com bastantes carvões cerâmica doméstica séc. XVII - 2ª metadee cinza na sua composição. (244 fragmentos)

- 2ª metade do séc. XVII;algumas telhas;

frequentes metais(meia ferradura em ferro),

2 líticos e ocasionais vidros

030 Terras de coloração laranja pela composição Abundante Ocupaçãoargilosa, bastante compactas. cerâmica doméstica séc. XVII -2ª metadeComporta algumas pedras de médio (51 fragmentos)e pequeno calibre. - 2ª metade do séc. XVII;

alguma telha e abundantesfragmentos de tijolos

031 Derrube constituído por pedras de granito Nenhumas Nívelde médio calibre sem qualquer alinhamento de derrube/abandonoa considerar. - ocupação

da 2ª metadedo séc. XVII

032 Terras laranjas com alguma compactação. Abundante Ocupaçãocerâmica doméstica séc. XVII -2ª metade

(43 fragmentos)- 2ª metade do séc. XVII

Page 35: Sondagem arqueológica em Nespereira - Lousada: resultados ...€¦ · teresse arqueológico do local, avaliando-se a estratigrafia existente, ... tos (preta, vermelha, vidrada, faiança)

CIAN MAGENTA AMERELO PRETO

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OPPIDUM número 1 - 2006

033 Terras muito heterogéneas, Alguma cerâmica Ocupaçãode coloração predominantemente castanha, domésticacom bastantes inclusões de carvões e cinza. (25 fragmentos)Comporta algumas pedras de médio porte. - 2ª metade do séc. XVII;

ocasionais metais(medalha de terço de cobre)

e uma conta de terço (?)- séc. XVII -2ª metade

034 Terras cinzentas-amareladas Ocasional cerâmica Ocupaçãocom significativo grau de compactação doméstica (4 fragmentos) séc. XVII -2ª metadee com algumas pedras de médio porte. - 2ª metade do séc. XVII

035 Estrutura constituída por um piso de tijolos 81 fragmentos de tijolos Estruturae pedras, intercalados aleatoriamente, e 12 fragmentos séc.XVII - 2ª metadeconstituindo um plano rectangular de onde de cerâmica domésticase destacam tijolos com morfologia maneirista. - 2ª metade do séc. XVII

036 Terras de coloração castanho-escura, Ocasional cerâmica Ocupaçãotextura fina, de composição argilosa. doméstica séc. XVII

(3 fragmentos) nivelamento– meados do séc.XVII para a rocha de base

037 Rocha de base constituída por granito Nenhumas Nível Geológicode grão grosso muito friável.

038 Terras acinzentadas com resquícios de saibro. Nenhumas Ocupação - séc. XIX

039 Terras castanhas escuras, de grão médio. Nenhumas Ocupação - séc. XIX

040 Terras bastante homogéneas, Nenhumas Enchimento de valade cor cinzenta e de granulometria fina. séc. XX

041 Terras acastanhadas, pouco compactas, Nenhumas Ocupação - séc. XIXde grão médio, idênticas às da EU 004.

042 Buraco de poste de morfologia Nenhumas Interface de buracoquadrangular bem definida. de poste - séc. XVII

043 Buraco de poste regularizado, de morfologia oval. Nenhumas Interface de buracode poste - séc. XVII

044 Buraco de poste regularizado, de morfologia circular. Nenhumas Interface de buracode poste - séc. XVII

045 Buraco de poste regularizado, Nenhumas Interface de buracode morfologia circular com pouca profundidade. de poste - séc. XVII

046 Buraco de poste regularizado, de morfologia oval. Nenhumas Interface de buracode poste - séc. XVII

047 Buraco de poste circular, Nenhumas Interface de buracobastante profundo, mas algo irregular. de poste - séc. XVII

048 Entalhe na rocha de base de sustentaçãode estrutura. Nenhumas Interface de entalhede sustentação

de estrutura

049 Entalhe na rocha de base de sustentaçãode estrutura. Nenhumas Interface de entalhede sustentação

de estrutura

050 Entalhe na rocha de base de sustentaçãode estrutura. Nenhumas Interface de entalhede sustentação

de estrutura

UE Caracterização Inclusões culturais Interpretaçãoestratigráfica

Continuação

Tabela 1. Descrição das Unidades Estratigráficas quanto à cor, composição, granulometria, inclusões orgânicas,culturais, etc.