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24 Dezembro 2010 / Janeiro 2011 • www.revistacultivar.com.br

Soja

Há uma nova dinâmica na ocorrência de lagartas-da-soja e, portanto, imperam a ne-

cessidade de mudanças no manejo dessas pragas e a redução dos riscos de danos. Esse enfoque se deve às novas épocas de ocorrência e à proporção de espécies de lagartas desfolhadoras. Também devem ser consideradas as características das novas cultivares de soja (mais precoces e de hábito indeterminado) e os menores Índices de Área Foliar (IAFs) que aqueles já testados para desfolhadores no passado. Somam-se, ainda, as respostas negativas às práticas de manejo de plantas daninhas, de doenças da soja e das pragas, atualmente verificadas na cultura.

A ocorrência de lagartas da soja tem apresentado grandes alterações na propor-ção de espécies e da fase predominante dos picos populacionais, ao longo do ciclo da cultura e, portanto, implicando em riscos de redução da produtividade. Essa altera-ção na ocorrência de lagartas, associada às

características das cultivares de soja, pre-dominantemente de ciclo mais curto, com florescimento mais precoce e de menores IAF, contribui para a menor tolerância da soja ao desfolhamento. Nesse período tam-bém mudou o manejo fitossanitário, com controle mais efetivo de plantas daninhas, expondo a soja recém-emergida às espé-cies cortadoras e desfolhadoras; ao amplo uso de fungicidas que impactam sobre a incidência de fungos entomopatogênicos, como Nomuraea rilleyi (doença-branca), que reduziam as populações de lagartas. De outro lado, o maior risco de perdas determi-na ações mais frequentes e agressivas para o controle de pragas (controle químico) que muitas vezes se mostram pouco efetivas para a sua redução.

Últimos acontecimentosEstudos recentes do Grupo de Estudos

em Manejo Integrado de Pragas (Gemip) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) detectaram alterações da compo-

sição de espécies de lagartas da soja, com aumento da população e importância das lagartas-falsa-medideira e das lagartas-pre-tas e redução da população da lagarta-da-soja, que por décadas foi a lagarta predo-minante na soja brasileira. No Rio Grande do Sul, nas safras 2007/08 e 2008/09, entre as lagartas-falsa-medideira já havia sido constatada a predominância de Rachiplusia nu, sobre Pseudoplusia includens, que se esperava fosse a mais comum.

Com base em amostragens de lagartas-da-soja efetuadas no Rio Grande do Sul, Paraná e Mato Grosso do Sul, na safra 2009/10, foram constatadas estas altera-ções populacionais. No Rio Grande do Sul a lagarta-da-soja representou mais de 50% da população de lagartas e as lagartas-falsa-medideira (agora predomínio de P. inclu-dens sobre Rachiplusia nu) e lagarta-preta (Spodoptera eridania) representaram 20% cada espécie. Nos estados do Paraná e Mato Grosso do Sul houve menor ocorrência de lagarta-preta (entre 11% e 13%) e menor ocorrência de lagarta-da-soja. Nesses esta-dos a lagarta-falsa-medideira (P. includens) variou entre 28% e 43% da população de lagartas-da-soja (Figura 1).

Esses dados, embora restritos a uma safra e aos estados do Sul e ao Mato Grosso do Sul, indicam uma alteração na compo-

Nova dinâmicaAlterações na época de ocorrência, intensidade e proporção de espécies de lagartas desfolhadoras na cultura da soja estão entre os fatores que exigem mudanças nas

estratégias de manejo adotadas para enfrentar o problema

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sição de espécies e um crescimento popu-lacional daqueles de mais difícil controle em soja. Tais alterações apontam para a so-brevivência das lagartas mais tolerantes aos inseticidas usados em soja. Possivelmente em muitos casos seriam necessárias doses maiores para controlar as lagartas-falsa-medideira e Spodoptera eridania, do que para controlar a lagarta-da-soja.

O uso inadequado de doses de in-seticidas por erro de identificação da praga-alvo ou por redução da quantidade de inseticida que atinge o inseto, sempre favorece os insetos ou as fases mais tole-rantes. Possivelmente a sucessão desses eventos tenha contribuído para, ao longo dos últimos anos, permitir, o aumento da população das espécies mais tolerantes aos inseticidas (Plusinae e Spodoptera spp.). A sobrevivência de lagartas desses dois grupos demanda outras aplicações que acabam por pressionar ainda mais a espécie mais suscetível às doses utilizadas e, portanto, contribuem para a redução da proporção de lagarta-da-soja (menos tolerante a in-seticidas) no total de lagartas.

la niña, desenvolvimento dacultura e a ocorrência de pragasSabe-se que em anos com influência

do fenômeno La Niña, tanto o regime e a distribuição das chuvas no Centro-Sul do Brasil é menor como mais irregular. Esses menores índices de precipitação determina-ram efeito danoso sobre o desenvolvimento da cultura da soja (menor área foliar) e redução nos índices de produtividade. Já o conhecimento sobre a influência do evento La Niña sobre a ocorrência de insetos é pequena, apesar de haver informações de campo que em anos com chuvas irregu-lares ocorre mais insetos que em anos do

fenômeno El Niño. Na região Sul do Brasil esta informação é corrente entre técnicos e produtores, fato também confirmado por observações do Gemip-UFSM. Estes dois aspectos somados, ou seja, de maior risco de ocorrência de lagartas e o menor desenvolvimento da soja, devem servir de alerta ao produtor para um maior rigor no monitoramento das populações, no seu reconhecimento e se necessário no manejo das pragas desfolhadoras da soja.

momentos de maior risco de danosAs diversas espécies de lagartas-da-soja

normalmente ocorrem uma sucedendo a

outra e, eventualmente, em algumas áreas ocorrem populações de distintas espécies sobrepostas. A ocorrência simultânea am-plia o risco de danos (maior população) e dificulta o manejo (diferentes doses para o seu controle), permitindo e facilitando a sobrevivência das lagartas mais toleran-tes, que chegam a representar 50% das populações. A Figura 2 ilustra de forma genérica esta ocorrência, eventualmente sobreposta, com indicações do período de maior risco de danos à soja, especialmente durante o florescimento e enchimento de grãos. Por sua vez, na safra 2009/10, em algumas áreas de soja do Sul do Brasil, foi verificada a ocorrência de grandes popu-lações de lagartas-pretas (Spodoptera spp.) em R5 e R6 de soja, com desfolha e em alguns casos ataques aos legumes, para a qual não se conhecem os riscos de danos e/ou nível de dano econômico e os inseticidas para seu controle.

amostragem e novos níveis de dano econômico para lagartasA amostragem de lagartas da soja deve

começar ainda no período vegetativo da cultura. No início do ciclo a soja é muito sensível ao corte e ao desfolhamento, podendo ocasionar atraso no desenvolvi-mento ou até a morte com a consequente redução na população de plantas. Em algumas localidades, principalmente em anos de La Niña, verifica-se a ocorrência de picos populacionais no início da fase vegetativa, antes do fechamento das entre-

Figura 1 - Percentual de espécies de lagartas-da-soja nos diferentes estados produtores de soja

Folha de soja severamente danificada pelo ataque de lagartas

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Figura 2 - Períodos críticos de ocorrência e danos para as distintas lagartas da soja.

deração com as fases mais sensíveis da cultura;

• Utilização do “cheirinho” com inseticidas de amplo espectro, após a emergência da soja;

• Desconhecimento das espécies de lagartas-da-soja;

• Erros na identificação das espé-cies-praga, implicando em erros nas do-ses dos inseticidas e escape das espécies mais tolerantes;

• Pulverização de inseticida junto com a aplicação de herbicidas, portanto “fora” do momento populacional ade-quado, determinando a perda de ação do produto antes dos picos de lagartas;

• Pulverização de inseticidas junto com a aplicação de fungicidas, portanto, uma aplicação muitas vezes tardia para percevejos e ácaros;

• Utilização de doses elevadas, com efeito negativo sobre inimigos naturais;

• Utilização de doses insuficien-

Novo cenário da incidência de lagartas em lavouras de soja exigeque produtores e técnicos busquem alterações no manejo

tes para a praga-alvo, permitindo sua sobrevivência, novo crescimento e reinfestação;

• Erros na escolha de inseticidas para as pragas-alvo mais importantes.

manejo das lagartas-da-sojaNão há um modelo ou padrão de

manejo indicado para todas as regiões produtoras do Brasil que seja adequado a uma região ou mesmo a um município, dada a grande quantidade de situações que se manifestam em cada local, como resultados da interação dos fatores que interferem na ocorrência de pragas e das iniciativas de manejo para a sua supressão.

Entretanto, é reconhecido pela maioria dos técnicos e produtores que a cultura da soja é atualmente um cenário caracterizado pela maior fragilidade da cultura ao ataque de lagartas, benefi-ciadas especialmente pelo manejo fitos-sanitário (plantas daninhas e doenças) atualmente praticado na cultura.

Assim, toda a decisão de manejo deve ser tomada com base na amostra-gem e no reconhecimento das espécies ocorrentes. O controle deve considerar as espécies, o momento de ocorrência no ciclo da cultura, o custo do controle e o valor resultante da produção, além de pre-conizar a utilização de inseticidas menos agressivos aos organismos não alvo.

Jerson Carús Guedes,Cristiane dos Santos Stecca,Rodrigo Borkowski Rodrigues eMauricio Bigolin,Gemip - UFSM

linhas, quando a área foliar da soja ainda é pequena. A amostragem deve continuar ao longo de todo o ciclo da cultura, com verificação semanal dos índices populacio-nais, com o objetivo de avaliar os riscos de chegar ao nível de controle das diferentes pragas.

Atualmente há muita discussão sobre a manutenção ou a redução dos níveis de controle (NC) de algumas pragas da soja no Brasil, obtidos com base no Nível de Dano Econômico (NDE). De fato, o que não mudou foi o dano causado pelas espé-cies de lagartas em soja, ou seja, quanto de área foliar cada lagarta consome, porém, a questão é muito mais ampla e rica de fatores a serem discutidos.

Por sua vez, a conhecida equação que “determinaria” o momento populacional de controle leva em conta muitos fatores que sofreram grandes alterações recente-mente. Nos últimos anos tem se observado uma grande redução no custo do controle de insetos na cultura da soja, em função do decréscimo dos preços dos inseticidas. Por sua vez, o valor da produção cresceu fortemente, seja pelo aumento do potencial produtivo da cultura, como também pela valorização do preço da soja. Estes fatores, pela posição que ocupam na equação, contribuem para menor tolerância aos danos dos insetos. Ou seja, o valor do NDE, neste cenário, é muito mais baixo que o preconizado em épocas anteriores, indicando menor tolerância da soja ao desfolhamento, exigindo maior atenção e controle desses insetos.

práticas inadequadas de manejo• Falta de amostragem de pragas

(população e localização);• Falta de conhecimento e consi-

CC

Jerson Guedes