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SOCIOTERMINOLOGIA E ENSINO
Francisco Edmar Cialdine Arruda (URCA)
[email protected]; [email protected]
Resumo: A linguagem técnico-científica, como parte de uma língua, sofre o mesmo processo variacionista
da língua não especializada, ao mesmo tempo que cumpre um importante papel de mediação entre os
conceitos de uma disciplina e a realidade linguística do aprendiz. Não obstante, a inacessibilidade dos
alunos a tais conceitos, muitas vezes, ocorre por um despreparo docente, uma vez que é o professor o
principal articulador desse processo comunicativo: aluno e conceitos via termos. Há uma forte necessidade
dos professores possuírem uma base terminológica e, também, lidar com as diferenças entre o termo oficial
e demais variações terminológicas existentes no conhecimento de mundo dos alunos. O objetivo desse texto
é chamar a atenção dos estudos terminológicos de base variacionista e suas relações com o processo de
ensino e aprendizagem. Para tanto, conceituaremos os termos chave e campos de estudos, sempre
focalizando o ensino.
Palavras-chave: TERMINOLOGIA; SOCIOLINGUÍSTICA; ENSINO
Primeiras palavras
Todo e qualquer processo de aprendizagem é veiculado pela língua e, é fato, a
língua, sendo dinâmica, possui uma grande variação em si mesma. Dentro de uma sala de
aula, tal variação é tão viva que pode atingir até mesmo os textos das disciplinas
escolares e seus termos técnicos. Assim sendo, é de grande importância que o professor
saiba promover o diálogo entre a linguagem usada pelos textos escolares de cada
disciplina e a variação linguística de seus alunos. Mas como isso seria possível?
A dificuldade docente em intermediar tal diálogo se apresenta desde a formação
superior. Os cursos de Letras, de modo geral, pouco valor atribuem às questões lexicais,
haja vista a carência de disciplinas que estudam o léxico dentro de uma perspectiva
moderna. Pontes (2009) é categórico ao afirmar que a formação superior do profissional
da linguagem deixa a desejar no que se refere às Ciências do Léxico. Quando se trata das
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disciplinas que se debruçam aos estudos terminológicos, a situação é ainda mais difícil.
Muitas vezes a Terminologia se restringe a um (breve) tópico dentro das aulas de
Lexicologia. Dessarte, ao chegar em sala de aula, os novos professores reproduzem o
mesmo ensino tradicional e reducionista de base estritamente gramatical. Quando muito,
deparamo-nos com atividades de leitura de alguns poucos gêneros textuais mais comuns
que, a despeito da importância inquestionável de tais gêneros, não permitem o pleno
acesso aos usos mais formais da língua.
O trabalho com textos especializados, nesse sentido, se mostra como uma
necessidade para que o aluno, não só tenha acesso à informação, mas saiba processá-la e
sistematizá-la sob a forma de conhecimento. Para tanto, é mister que o aluno de Letras,
futuro professor, tenha contato com áreas que forneçam-lhes um arcabouço teórico e
ferramentas didáticas que viabilizem esse trabalho. Assim, objetivamos, nesse texto,
tratar de três campos de estudos basilares para a formação de um professor de línguas
(Variação Linguística, Ensino e Terminologia) e, ainda, a relação entre eles. Variação não
só enquanto existência de diferentes formas linguísticas, mas, principalmente, quanto seu
uso e função social; Terminologia enquanto conceitos técnicos que podem ser veiculados
por diferentes formas linguísticas dentro de níveis que vão do mais especializado ao mais
popular; e, por fim, Ensino como principal meio de acesso ao conhecimento
enciclopédico necessário para o desenvolvimento técnico, cultural e social do indivíduo.
Assim sendo, comecemos com a definição mais detalhada desses conceitos.
Terminologia
De modo simplificado, a Terminologia, ou Lexicologia especializada, é o campo
de estudos que trata das línguas de especialidade através da análise dos termos técnico-
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científicos e é esse caráter restrito de seu objeto que a diferencia, de modo geral, da
Lexicologia. Na verdade, a diferença do objeto de estudo terá grandes consequências no
distanciamento entre as duas áreas – ainda que, como defende Pontes (2009), todas as
disciplinas que estudam o léxico, em sua plenitude, se situam próximas entre si.
No que se refere à Terminologia, foi o engenheiro austríaco Eugen Wüster que
sistematizou esse campo, dando-lhe um caráter moderno, na década de 30. No entanto,
segundo Farias (2001), o interesse do homem pela linguagem especializada é bem mais
antigo. Krieger e Finatto (2004, p. 24) ao falarem do trabalho de Rondeau, afirmam que
tal autor também corrobora para o caráter antigo desse fenômeno:
Com efeito, tão longe quanto se remote na história do homem, desde que se
manifesta a linguagem, nos encontramos em presença de línguas de
especialidade, é assim que se encontra a terminologia dos filósofos gregos, a
língua de negócios dos comerciantes cretas, os vocabulários especializados da
arte militar, etc. (KRIEGER e FINATTO, 2004)
Não obstante, as mesmas autoras contrapõem a antiguidade da prática
terminológica à modernidade da sistematização dos estudos terminológicos, situando-os
em meados do século XX. Na verdade, o fenômeno terminológico é reflexo das
mudanças sociais, científicas e tecnológicas, que, a cada dia e de modo cada vez mais
dinâmico, fazem com que novos termos, os tecnoletos, apareçam:
As mudanças socioeconômicas e políticas tiveram repercussões em nível
vocabular: a cada nova invenção, a cada nova situação, atitude, produto,
serviço, reivindicação, lei, etc. surgiam novos termos correspondentes. O
universo lexical das línguas transformou-se, ampliando-se substancialmente, o
mesmo sucedendo com o conjunto terminológico que, aliás, cresceu em maior
proporção. (Barros, 2004, 26)
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Com o tempo e o aumento na divulgação das descobertas das ciências, a
comunidade científica mundial começou a se preocupar com uma forma de padronização
dessa linguagem de modo a facilitar a comunicação. Nesse sentido, um dos precursores
foi o sueco Karl Von Lineu (1707-1778) que propôs um sistema universal para as
espécies de flora e fauna em todo mundo. Esse sistema usava como base a língua latina e,
ainda hoje, é empregada com poucas modificações. Desse modo, ainda que tenhamos
várias palavras em diferentes línguas para designar “o mamífero carnívoro, domesticado,
cuja fêmea apresenta dez mamas, gestação de nove semanas e geralmente dá a luz entre
seis e dez filhotes, que atingem a maturidade sexual com um ano” (LAROUSSE, 2004, p.
124): perro, dog, hund, cão – o nome científico pelo qual essa espécie é
internacionalmente conhecida, Canis familiaris, é único aqui ou em qualquer outro país e
isso facilita sua identificação.
Foi exatamente com esse ideal de padronização que Eugen Wüster elaborou a
primeira grande teoria da Terminologia, a Teoria Geral da Terminologia, ou TGT. Tal
teoria iniciou a Terminologia no âmbito das ciências modernas. Para ele, cada conceito,
técnica ou ideia deveria ser rigorosamente nomeado por um único termo e ambiguidades,
polissemias e quaisquer outras variações na língua apenas comprometeriam a
comunicação científica e, por isso, deveriam ser eliminadas através de uma padronização
dos termos. De fato, essa visão perdurou por muito tempo e era até justificável em vários
contextos, como, por exemplo, em situações que a falta de uma univocidade da
comunicação científica possa gerar riscos para a vida humana. Por tal razão que Cabré,
ainda que critique a TGT, defende: “Em contextos prescritivos fortemente estruturados e
com o desejo prioritário de garantir uma univocidade comunicativa (padronização
nacional e internacional, documentação, inteligência artificial) a TGT é inquestionável.”
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(Cabré, 1998.]. Tradução livre)1. A partir de então, muitos países bilíngues e multilíngues
começaram a criar comitês terminológicos e a adotar políticas de planificação linguística
(KRIEGER e FINATTO, 2004).
Todavia, a natureza da língua, mesmo das línguas de especialidade, está além do
controle dos terminólogos e linguistas em geral. Temos uma mesma realidade delimitada
por termos diferentes (diarreia e disenteria); um termo utilizado em áreas diferentes (vírus
para a Computação e vírus para a Medicina); termos que se tornam palavras da língua
comum e vice-versa (biruta como louco e biruta como instrumento da Aeronáutica que
indica a direção do vento). Os motivos que levam a essa fluidez, é que os termos, ainda
que façam parte de uma linguagem especializada, esta linguagem está inserida na língua
de uma comunidade e, portanto, estão passíveis de sofrerem os mesmos processos que a
língua comum sofre. Essa perspectiva é defendida pela Teoria Comunicativa da
Terminologia, TCT, de Cabré:
Com fundamentos epistemológicos distintos, a TCT articula-se baseada na
valorização dos aspectos comunicativos das linguagens especializadas em
detrimento dos propósitos normalizadores, bem como na compreensão de que
as unidades terminológicas formam parte da linguagem natural e da gramática
das línguas. De acordo com o princípio comunicativo, uma unidade lexical
pode assumir o caráter de termo em função de seu uso em um contexto e
situação determinados. Consequentemente, o conteúdo de um termo não é fixo,
mas relativo, variando conforme o cenário comunicativo em que se inscreve.
Tais proposições levam a TCT a postular que a priori não há termos, nem
palavras, mas somente unidades lexicais, tendo em vista que estas adquirem
estatuto terminológico no âmbito das comunicações especializadas.
(KRIEGER e FINATTO, 2004, p. 35)
1 En contextos prescriptivos fuertemente estructurados y con la voluntad prioritaria de garantir una
univocidad comunicativa (estandarización nacional e internacional, documentación, inteligencia
artificial), la TGT es incuestionable. (Cabré, 1998)
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Os neologismos são exemplos de como ambos, palavras e termos, possuem
comportamentos linguísticos similares: o termo deletar, da Informática veio do termo
inglês também da Informática delete. Sendo um verbo, os usuários da língua acomodaram
esse termo dentro sistema verbal português, tornando-o um verbo da 1ª conjugação, a
única conjugação produtiva no que se refere à formação de novas palavras. Atualmente,
deletar pode ser usado como gíria de sentido de esquecer algo: “Entendeu? Não? Então
deleta, vai!”
Diante de tudo isso, não havia mais como negar as influências linguísticas a que
os termos estavam submetidos. Tais ideias romperam totalmente com o ideal de
padronização terminológica prescrito pela TGT, abriu espaço para as pesquisas
envolvendo os diversos fenômenos linguísticos encontrados na comunicação
especializada e, consequentemente várias perspectivas teóricas – além da TCT, já
exposta. Aqui, interessa-nos o fenômeno da variação linguística. Tal fenômeno, munido
das ideias sociolinguísticas e disciplinas afins chamaram a atenção da complexidade
social dentro das terminologias. Essa interseção entre os estudos terminológicos e
variacionistas fez com que, da década de 90, François Gaudin sistematizasse a
Socioterminologia. Esse modelo teórico se enquadra nas teorias que se opõem a visão
wüsteriana do termo. Como exemplo de um trabalho, podemos citar o artigo de René G.
Strehler (1995) sobre os termos da subárea de autopeças. Ele afirma:
O objetivo desta pesquisa é, justamente, mostrar que um trabalho
terminológico não pode deixar de lado o aspecto variacionista, a não ser sob
pena de guardar um valor limitado para um meio profissional limitado.
Portanto, um glossário contendo a terminologia de todos os meios profissionais
que trabalham com autopeças poderá ser de uma grande utilidade
principalmente para os que lidam com os dois níveis de linguagem – a do
fabricante e do mecânico.
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O autor aponta o vendedor de autopeças como usuário das duas variantes e
exemplifica com o termo anel de descarga que o mecânico conhece como biscoito. O
interessante neste trabalho, ressaltemos, são as problemáticas sofridas e levantadas pelo
autor ao final da pesquisa: a dificuldade na coleta das variantes por existirem apenas a
nível oral; a permanência ou não das variantes; se estas variantes são restritas à região
onde ele as coletou, dentre outras. Tais dificuldades nos levam a observar as semelhanças
metodológicas entre a Sociolinguística e a Socioterminologia: a necessidade da coleta de
termos a partir de um corpus oral, uma vez que as variantes estigmatizadas raramente
atingem o discurso oficial e sua escrita institucionalizada. Antes de darmos continuidade,
mencionemos um pouco mais sobre a variação linguística, a fim de que não haja dúvidas
quanto aos conceitos aqui tratados.
Variação Linguística e Terminologia
Encontramos em Labov e seus estudos sobre a fala dos negros americanos na
década de 1960 o início dos estudos variacionistas modernos. Contudo, já antes disso,
sabemos que a variação faz parte da linguagem. Saussure (1916), em seu Curso de
Linguística Geral, abrira espaço para tais questões ao tratar da dicotomia língua e fala –
ainda que o pai da Linguística moderna tenha se detido apenas aos estudos da língua –
podemos dizer que a falta de sistematicidade da fala remete à variação no uso da língua.
Mesmo os estudos prescritivistas como, por exemplo, manuais de uso “correto” da
língua, são uma forma de reconhecer – claro que a partir de uma visão negativa – a
existência de um uso da língua para além da forma padrão. Nesse sentido, o “Appendix
probi”, seria um exemplo ilustrativo: produzido por volta do século II d.C., esta obra era
uma listagem de palavras e expressões em latim vulgar e sua forma “correta” em latim
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clássico. Atualmente, essa obra é uma das principais fontes escritas da variação
linguística dentro da língua latina, ou seja, de certo modo, possui uma importância
inversa à sua função original.
Assim, podemos afirmar que a variação da língua faz parte de sua natureza
interpessoal e da própria natureza heterogênia da sociedade humana. Não usamos a
língua sempre da mesma forma, adequamos os nossos textos à situação comunicativa em
que estamos. Da mesma forma, os usos que damos a nossa língua é um reflexo, também,
da nossa própria história. Para falar exatamente da variação da língua que estou usando
eu deveria descrever como: um português relativamente formal de um cearense, nascido
na década de 80, de pais nascidos no interior, que atua como professor universitário e
possui mestrado – isso para não detalhar demais.
No Brasil, muitos pesquisadores se detêm a estudar a variação da língua
portuguesa. Nesse sentido, podemos citar autores como Marcos Bagno (1999) e seu livro
Preconceito Linguístico que é, talvez, uma das obras básicas de qualquer estudo
sociolinguístico; Fernando Tarallo (2003) e seu livro Pesquisa Sociolinguística em que
ele se detém a descrever o fazer metodológico dentro da área – apenas para citar alguns
autores.
Importante frisar que cada vez mais os estudos sociolinguísticos estão se voltando
para a educação linguística. Basta notar, para tanto, a polêmica gerada pela mídia por
conta de um livro didático de educação de jovens e adultos que contempla as variações
linguísticas. É claro que essa questão gerou um grande debate. O tema foi, inclusive,
debatido por nós e outros autores em uma revista de divulgação: Conhecimento Prático
Língua Portuguesa, edição 31. Cada autor, em seu próprio artigo, focalizou uma
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perspectiva. Em nosso caso, procuramos ressaltar que a variação, como fenômeno
linguístico é inerente à qualquer língua e que estimula suas mudanças no decorrer do
tempo (CIALDINE ARRUDA, 2011). O fato é que subjaz a essa polêmica toda a teoria
Sociolinguística e seu reflexo na educação. Falando em educação, vejamos como a
Terminologia se relaciona com ela na próxima seção.
A Terminologia aplicada ou Terminodidática
Como temos dito ao longo do texto, o desenvolvimento tecnológico e científico
que existe hoje mudou o modo como vemos a linguagem e seu uso, sendo o surgimento
de neologismos, tanto na linguagem especializada, quanto na linguagem do dia a dia, uma
das consequências desse desenvolvimento. Essas questões relativas à linguagem de
especialidade foram, aos poucos, chegando à sala de aula. Cada disciplina escolar possui
seu próprio repertório terminológico e é de fundamental importância que o aluno domine
tal repertório de maneira que ele possa utilizá-lo na produção de texto orais ou escritos
quando lhe for necessário. Laface (2001) e Cabré (1993) chamam a atenção para o ensino
da língua nas escolas: não há uma preocupação em desenvolver a competência
comunicativa dos alunos em contextos especializados, isto é, a escola apenas se preocupa
com aspectos formais da língua geral, não satisfazendo as necessidades dos alunos em
compreenderem conceitos-chave de determinadas disciplinas. Laface (2001) afirma:
Diz a autora [Cabré (1993)] que muitos estudantes escrevem de forma
medíocre, não porque desconhecem a língua, mas porque, às vezes, não têm o
que dizer ou não dominam o vocabulário especializado. A maioria deles e,
também dos professores, não se dá conta da interação das línguas e das áreas
de conhecimento. Em consequência, não prestam atenção suficiente no
delicado equilíbrio que existe entre a língua geral e as línguas especializadas,
mesmo sabendo que, nessa interação, temáticas pedagógicas devam responder
pela eficiência da aprendizagem e pela posterior utilização do conhecimento
adquirido na comunicação.
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Assim sendo, os termos de uma disciplina acabam se configurando como uma
espécie de língua estrangeira para o aluno e, por vezes, nem o livro didático, muito menos
os dicionários, dão conta de esclarecer a relação existente entre o conhecimento científico
e o universo cotidiano do aluno. De fato, um dicionário escolar, por mais completo que
seja, jamais dará conta de todas as necessidades de aprendizagem do estudante – e
quando nos referimos à terminologia das disciplinas concordamos com Guerra (2006):
Partimos, pois, do pressuposto de que a aquisição do saber científico é uma das
chaves para a formação da cidadania, e cabe à escola desempenhar o papel de
transmissora desse saber, que é fundamentado, principalmente nos livros
didáticos e em dicionários. Entretanto, não existem dicionários especializados
dirigidos a estudantes. As raras obras encontradas ou são traduções, ou não
estão adaptadas ao nível do público a que se destinam. Além disso, no que se
refere à comunicação, são poucos os estudos em Terminologia, focando a
aprendizagem das disciplinas especializadas incluídas nas grades curriculares
das escolas de ensino fundamental e médio.
Portanto, como destacamos acima, obras terminográficas não podem ser levadas à
sala de aula sem o devido tratamento, o qual já faz parte do cotidiano de quem pesquisa
dicionários escolares e que pode ser beneficiado com as questões sociolinguísticas.
Lembrando o que mencionamos antes sobre a linguagem despendida nesse texto: a
densidade terminológica aumentará ou diminuirá segundo meu público alvo. Se desejo
que apenas especialistas entendam, aumentarei a densidade, caso esteja tratando com
aluno de ensino médio, a linguagem será outra, mais leve. Dessa maneira, vejamos, por
fim, como essas questões se confluem.
Por uma Socioterminologia aplicada ao ensino...
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Resta-nos agora responder como a Socioterminologia pode contribuir com o
ensino. Antes de chegarmos ao ponto central desta questão, é importante lembrar que a
pergunta colocada não foi sobre o ensino de línguas ou mesmo de línguas maternas, mas
sim ao ensino de modo geral. Como já mencionamos, a Terminologia, como um todo,
possui uma grande importância para a Educação. Tivemos oportunidade de participar de
pesquisas anteriores que viabilizaram a produção de um dicionário sobre cajucultura
próprio para agrônomos e grandes produtores, bem como estudantes de agronomia
(PONTES e RIBEIRO, 2006). Com este instrumento, alunos e professores de nível
superior teriam uma ferramenta para ensino, pesquisa e estudo. Os exemplos têm surgido
cada vez mais. Glossários, vocabulários e dicionários técnicos produzidos possuem uma
grande aplicação didática. Este é o ponto-chave de nosso texto: o ensino de disciplinas
escolares de qualquer nível (superior, médio ou mesmo fundamental) seria otimizado se o
professor tivesse em mãos um material que esclarecesse o conjunto terminológico de sua
disciplina para seus alunos e se, esse mesmo vocabulário, tivesse uma linguagem
acessível aos alunos.
No entanto, a essa afirmação, somamos outro questionamento igualmente
importante: qual conjunto terminológico deve ser trabalhado com os alunos? A que nível
a língua de especialidade deve ser conduzida num ambiente escolar? Para ser mais exato,
qual a variante devemos ensinar, a variante dita oficial ou a variante conhecida em sua
comunidade? Eis onde Socioterminologia e o Ensino se confluem. Em um contexto de
aula ministrado em uma comunidade de pescadores, por exemplo, um professor de
Biologia teria menos dificuldade se tivesse domínio da variação terminológica da
comunidade. Através desse domínio, ele poderia conscientizar os alunos que, além de sua
variante, existem outras e, ao contrário do que se poderia pensar, nenhuma delas –
mesmo a variante elitizada – é mais importante que a outra, apenas cada uma terá um
contexto de uso mais adequado.
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Para que problemas de comunicação não ocorram, ainda que o professor tenha o
dever de apresentar os termos técnicos oficiais, é necessário que nós, professores
assumamos o papel de mediador entre a variação comum ao aluno e a variação
apresentada nos livros didáticos. Nesse sentido, como profissionais da linguagem, temos
que dar o primeiro passo para que essa noção chegue aos profissionais das demais
disciplinas e assim o estudante, seja ele de qual nível for, possa fazer o melhor uso da
língua dentro dos variados contextos que exijam o uso de uma linguagem técnica.
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Recebido Para Publicação em 30 de outubro de 2011. Aprovado Para Publicação em 25 de novembro de 2011.