sociologia da educação

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E ua e elae dco R add iS c l id Eua oio a a dco og

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA MARIA CENTRO DE EDUCAO CURSO DE GRADUAO EM PEDAGOGIA A DISTNCIA

SOCIOLOGIA DA EDUCAO II3 semestre

Presidente da Repblica Federativa do Brasil Luiz Incio Lula da Silva Ministrio da Educao Fernando Haddad Secretria da Educao Superior Maria Paula Dallari Bucci Secretrio da Educao a Distncia Carlos Eduardo BielschowskyMinistro do Estado da Educao

Reitor Vice-Reitor Chefe de Gabinete do Reitor Pr-Reitor de Administrao Pr-Reitor de Assuntos Estudantis Pr-Reitor de Extenso Pr-Reitor de Graduao Pr-Reitor de Planejamento Pr-Reitor de Ps-Graduao e Pesquisa Pr-Reitor de Recursos Humanos Diretor do CPD

Universidade Federal de Santa Maria Felipe Martins Mller Dalvan Jos Reinert Maria Alcione Munhoz Andr Luis Kieling Ries Jos Francisco Silva Dias Joo Rodolpho Amaral Flres Orlando Fonseca Charles Jacques Prade Helio Lees Hey Vania de Ftima Barros Estivalete Fernando Bordin da Rocha

Coordenao de Educao a Distncia Fabio da Purificao de Bastos Coordenador UAB Carlos Gustavo Martins Hoelzel Coordenador de Plos Roberto Cassol Gesto Financeira Daniel Lus ArenhardtCoordenador CEAD

Centro de Educao Helenise Sangoi Antunes Coordenador do Curso de Pedagogia Rosane Carneiro SarturiDiretora do Centro de Educao

Professor pesquisador/conteudista

Elaborao do Contedo Vantoir Roberto Brancher

Coordenadora da Equipe Multidisciplinar Materiais Didticos Desenvolvimento Tecnolgico Capacitao

Equipe Multidisciplinar de Pesquisa e Desenvolvimento em Tecnologias da Informao e Comunicao Aplicadas Educao Elena Maria Mallmann Volnei Antnio Matt Andr Zanki Cordenonsi Ilse Abegg

Produo de Materiais Didticos Designer Evandro Bertol Designer Marcelo KundeOrientao Pedaggica Reviso de Portugus

Diana Cervo Cassol Marta Azzolin Samariene Pilon Silvia Helena Lovato do Nascimento Cau Ferreira da Silva Natlia de Souza Brondani Emanuel Montagnier Pappis Maira Machado Vogt ndrei Camponogara Bruno Augusti Mozzaquatro

Ilustrao

Diagramao

Suporte Moodle

sumrioApresentAo dA disciplinA 5Objetivos da Disciplina 6 Programa 7 Ttulo e Discriminao das Unidades 7 Bibliografias Indicadas 8 Bibliografia Bsica 8 Bibliografia Complementar 8 Unidad e a

sociologiA: umA introduo

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A1 Cultura: Algumas Reflexes 11 A2 O homem um ser social? Existem humanos sem sociedade? 13 Unidad e B

A sociologiA do cotidiAnoUnidad e C

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B1 O cotidiano no tdio nem to somente repetio 19

Questes tericAs e metodolgicAs nAs pesQuisAs sobre FAmliA e escolA 21U nidad e d

mdiA-educAoU nidad e e

25

A violnciA como objeto de estudo sociolgico e investigAtivo Ao trAbAlho educAtivo do proFessor 29U nidad e F

A sociologiA contemporneA: um olhAr AcercA dA inFnciAF1 F2 F3 F4

36

A origem do conceito de infncia: introduzindo 36 O Conceito de Infncia nos Sculos XIX e XX 39 O Conceito de Infncia Contemporneo 41 Por uma Sociologia da Infncia 45

reFernciAs

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ApresentAo dA disciplinAA disciplina de Sociologia II, a partir dos fundamentos sociolgicos, pretende contribuir com um olhar ao fazer social contemporneo Para tal, na UNIDADE A: SOCIOLOGIA: UMA INTRODUO, problematizamos a importncia dessa disciplina tentando (re) memorar e contextualizar o educando com relao importncia dela. Assim no subtpico A1: CULTURA: ALGUMAS REFLEXES discutimos o conceito de cultura e a importncia desse na construo do indivduo. Continuando estas reflexes, trazemos o A2: O HOMEM UM SER SOCIAL? EXISTEM HUMANOS SEM SOCIEDADE?. Na unidade UNIDADE B: A SOCIOLOGIA DO COTIDIANO iniciamos nossas interlocues com autores e teorias acerca do cotidiano. No tpico B1: O COTIDIANO NO TDIO NEM TO SOMENTE REPETIO firmamos a tese de Mesquita (1995), enfocando o cotidiano como lugar da mudana e no apenas como lcus da repetio sem sentido. J na UNIDADE C: QUESTES TERICAS E METODOLGICAS NAS PESQUISAS SOBRE FAMLIA E ESCOLA observamos a Famlia nas suas mltiplas dimenses formadoras. Tambm em UNIDADE D: MDIAEDUCAO refletimos sobre a importncia da mdia na formao de educandos e educadores contemporneos. J em UNIDADE E: A VIOLNCIA COMO OBJETO DE ESTUDO SOCIOLGICO E INVESTIGATIVO NO TRABALHO DO PROFESSOR pensamos a violncia urbana e nossas possibilidades de interveno. Por fim com UNIDADE F: A SOCIOLOGIA CONTEMPORNEA: UM OLHAR ACERCA DA INFNCIA culminamos nossa discusso tendo em vista pensarmos a Sociologia da infncia com uma alternativa de reflexo ao educador contemporneo No tpico F1: A ORIGEM DO CONCEITO DE INFNCIA: INTRODUZINDO... problematizamos a ideia de que a infncia tal qual a conhecemos uma construo e social, sendo assim, nem sempre ocorreu da mesma forma No subttulo F2: O CONCEITO DE INFNCIA NOS SCULOS XIX E XX e F3: O CONCEITO DE INFNCIA CONTEMPORNEO apresentamos a infncia nos respectivos espaos temporais. Por fim F4: POR UMA SOCIOLOGIA DA INFNCIA trazemos uma distinta possibilidade de entendimento da infncia hoje

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objetivos dA disciplinAProporcionar aos acadmicos do curso de Pedagogia alguns aprofundamentos de estudos e debates referenciados em algumas correntes sociolgicas voltadas pesquisa e anlise do cotidiano e suas contribuies s questes educacionais e formao de professores. Possibilitar a construo de um olhar sociolgico para as questes formais e no formais da educao, nas diferentes possibilidades de atuao do (a) Pedagogo (a).

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progrAmA

t t u lo e dis cr im in Ao dA s unidAd esunidAde 1 A sociologiA do cotidiAno 1.1 A Observao do Cotidiano. 1.2 Prticas sociais e educacionais produzidas nos espaos educativos: entre a construo da prtica investigativa e produo de conhecimento educacional Processos de excluso e incluso sociais unidAde 2 processos de sociAlizAo: espAos educAtivos FormAis e no FormAis 2.1 Questes tericas e metodolgicas nas pesquisas sobre famlia e escola 2.2 Questes tericas e metodolgicas nos estudos e pesquisas sobre mdias 2.3 Os desafios da mdia ao trabalho educativo do professor. 2.4 A violncia como objeto de estudo sociolgico e investigativo ao trabalho educativo do professor

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bibliogrAFiAs indicAdAsb i b l i o g rA FiA bs icACASTELLS, Manuel O Poder da Identidade: a era da informao, economia, sociedade e cultura 2 ed So Paulo: Paz e Terra, v2, 1999 MEKESENAS, Paulo Pesquisa Social e Ao Pedaggica: conceitos, mtodos e prticas So Paulo: Loyola, 2002 MESQUITA. Zil; BRANDO, Carlos Rodrigues (Org.) Territrios do Cotidiano: uma introduo a novos olhares e experincias. Porto Alegre/ Santa Cruz do Sul: UFRGS/ UNISC, 1995. NETTO, Jos Paulo e FALCO, Maria do Carmo. Cotidiano: conhecimento e crtica So Paulo: 1987 PETITAT, Andr Produo da Escola/Produo da Sociedade: anlise scio-histrica de alguns elementos decisivos da evoluo escolar no ocidente Porto Alegre: ARTMED, 1994

b i b l i o g rA FiA co m pl e m e n tA rAPPLE, Michael W Trabalho docente e textos: economia poltica das relaes de classe e de gnero em educao. Porto Alegre: Artmed, 1995 BELLONI, M L O que mdia-educao Campinas: Autores Associados, 2001 FISCHER, Rosa Maria Bueno Televiso e Educao: fruir e pensar a TV. Belo Horizonte: Autntica, 2003. FLEURI, R. M. Educao Intercultural: mediaes necessrias. Rio de Janeiro: DP&A, 2003 MCLAREN, Peter A Vida nas Escolas: uma introduo pedagogia crtica nos fundamentos da educao. Porto Alegre: Artes Mdicas, 1997

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unidA de A

sociologiA: umA introduosAibA mAis

O que soCiologia? O que cultura? O que sociabilidade? Quem so os principais tericos da sociologia? Quais as principais correntes sociolgicas? Existem socilogos brasileiros? Essas perguntas e muitas outras certamente voc deve ter dialogado e problematizado na Disciplina Sociologia I De qualquer forma, retomaremos alguns deles para que possamos estabelecer um dilogo mais profcuo com a temtica que vai efervescer nessa disciplina, qual seja o cotidiano e suas possveis inter-relaes com nossa vida, com nosso tempo Na obra A educao como Cultura, Carlos Rodrigues Brando explicita Eu me vejo como um ser da natureza, mas me penso como um sujeito da cultura (2002, p.16). Na citao podemos perceber claramente que o autor nos compreende como sujeitos Biolgicos, o que equivale a dizer que no nega a carga gentica e hereditria dos seres Mas preconiza fortemente a ideia de que somos seres da CUltUra. Que se humanizam e se constroem na constante interao com outros humanos. Ainda no referido texto, amplia sua definio trazendo que cultura :Tudo aquilo que criamos a partir do que nos dado, quando tomamos as coisas da natureza e as recriamos como os objetos e utenslios da vida social representa uma das mltiplas dimenses daquilo que, em uma ou outra, chamamos de cultura () tal como a natureza onde vivemos e de quem somos parte, tambm a cultura no exterior a ns. A diferena est em que o mundo da natureza nos antecede, enquanto o mundo da cultura necessita de ns para ser criado, para que ele, agindo como criador sobre os seus criadores, nos recrie a cada instante como seres humanos (idem, p22)

Para aprofundar as discusses de Sociologia, indicamos http://www. rbep.inep.gov.br/index.php/emaberto/issue/view/54 sAibA mAis Quer aprofundar a temtica, acesse os links abaixo: http://apps.unibrasil.com.br/revista/ index.php/educacaoehumanidades/ article/viewFile/52/45 http://www.tvebrasil.com.br/SALTO/ entrevistas/carlos_brandao.htm http://www.ig.ufu.br/revista/volume15/resenha01_vol15.pdf personAlidAde

aristteles, um filsofo que viveu por volta de (384-322 a.C.), j nos definia como seres sociais por excelncia. Ou seja, nos tornamos humanizados a partir do contato como outros humanos No se assuste, isso mesmo Todos ns nascemos da espcie Homo sapiens, mas nos humanizamos no contato com outros humanos Isso s acontece porque todos ns nascemos com uma capacidade humana denominada Sociabilidade Oliveira (2007, p 23) vai defini-la com capacidade natural da espcie humana para viver em sociedade e desenvolver um processo de socializao. Voc deve estar se perguntando, ento: isso quer dizer que, se no tivermos contatos com outros humanos, no nos tornaremos humanos? A resposta sim e no. Sim, pois sem Interao social no existe Educao (logo mais aprofundaremos esse conceito). Outro elemento importante para a Humanizao. E no, porque somente nos Humanizamos atravs dos Contatos soCiais primrios e seCUndrios

Outras informaes podem ser encontradas em http://pt.wikipedia. org/wiki/Arist%C3%B3teles

glossrio Oliveira (2007) vai definir como Contatos Sociais Primrios aqueles contatos diretos que se tem e que envolvem uma grande base emocional Ex.: Contatos entre pais e filhos. J os Contatos Sociais Secundrios o referido autor vai definir como aqueles contatos impessoais ou formais Ex: Motoristas de nibus e passageiros

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Dentro dessa perspectiva, vamos entender o homem como ser social, o que equivale a dizer que, enquanto estabelecemos relaes com outros seres humanos, aprendemos, ensinamos, enfim, somos socializados. em funo disso que Oliveira (2007, p. 10) vai explicitar, O indivduo aprende com o meio, mas tambm pode transform-lo em sua ao social. Nasce, assim, uma compreenso de homem produtor de cultura, entendendo-a como todas as formas de produo humana, ou indo prximo das concepes de Aranha Martins (2003, p06) nos aponta a cultura como um processo de autolibertao progressiva do homem, o que o caracteriza como um ser de mutao, um ser de projeto, que se faz medida que transcende, que ultrapassa a prpria experincia. Com isso, gesta-se uma concepo de educao. mile Durkhein, por volta de 1978, vai publicar Educao e Sociologia, na qual vai pontuar educao como a ao exercida pelas geraes adultas sobre aquelas no ainda amadurecidas para a vida social(1978, p.10). Podemos ainda respeitar essa definio incorporando a ideia da educao como um movimento processual formal ou no, que tem como meta primordial a humanizao. nesse sentido que tambm (LIBNEO, 2002, p. 64) vai pontuar A educao uma prtica social que busca realizar nos sujeitos humanos as caractersticas de humanizao plena. Todavia, toda educao se d em meio a relaes sociais. Acreditamos, dessa forma, que uma perspectiva educacional envolve educandos e educadores que podem e talvez devam situar-se num processo de mltipla aprendizagem, embora no de formao aptica. Assim, a Educao constituir-se- em um sistema que facilitar a apropriao dos saberes socialmente construdos em cada cultura atravs da interao entre indivduos. Carlos Rodrigues Brando vai iniciar sua obra, O que Educao afirmando:Ningum escapa da Educao. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos ns envolvemos pedaos da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender e ensinar Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias nos misturamos com a educao. Com uma ou com vrias (...) (BRANDO, 1995, p.07)

Assim, poderamos nos perguntar qual seria a melhor definio de Educao? Com qual das imagens abaixo voc se identifica?

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sAibA mAis Quer aprofundar, acesse http://www. faap.br/revista_faap/revista_facom/ facom_18/martin.pdf Figura 1

AtividAde dA semAnA Entre em contato com seu tutor para realizar as atividades da semana

A1 culturA: AlgumAs reFlexesAinda na perspectiva do humano como ser e construto social, Oliveira 2007, p 07 nos traz a histria do menino selvagem de aveyronEm 1797, um menino quase inteiramente nu foi visto pela primeira vez perambulando pela floresta de Lacaune, na Frana. Em 9 de janeiro de 1800, foi registrado seu aparecimento num moinho em Saint-Sernein, distrito de Aveyron. Tinha a cabea, os braos e os ps nus; farrapos de uma velha camisa (sinal de algum contato anterior com seres humanos) cobriam o resto do corpo Sempre que algum se aproximava, ele fugia como um animal assustado Era um menino de cerca de 12 anos, tinha a pele branca e fina, rosto redondo, olhos negros e fundos, cabelos castanhos e nariz comprido e aquilino. Sua fisionomia foi descrita como graciosa; sorria involuntariamente e seu corpo estava coberto de cicatrizes Provavelmente abandonado na floresta aos 4 ou 5 anos, foi objeto de curiosidade e provocou discusses acaloradas principalmente na Frana. Aps sua captura, verificou-se que Victor (assim passou a ser chamado) no pronunciava nenhuma palavra e parecia no entender nada do que lhe falavam Apesar do rigoroso inverno europeu, rejeitava roupas e tambm o uso de cama, dormia no cho sem colcho Locomovia-se apoiado nas mos e nos ps, correndo como os animais quadrpedesFonte: OLIVEIRA, P S de Introduo a Sociologia So Paulo: tica, 2007

Figura 2

Figura 3

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As Meninas-Lobo Na ndia, onde os casos de meninos-lobo foram relativamente numerosos, descobriram-se, em 1920, duas crianas, Amala e Kamala, vivendo no meio de uma famlia de lobos A primeira tinha um ano e meio e veio a morrer um ano mais tarde Kamala, de oito anos de idade, viveu at 1929 No tinham nada de humano e seu comportamento era exatamente semelhante quele de seus irmos lobos. Elas caminhavam de quatro patas apoiando-se sobre os joelhos e cotovelos para os pequenos trajetos e sobre as mos e os ps para os trajetos longos e rpidos Eram incapazes de permanecer de p S se alimentavam de carne crua ou podre, comiam bebiam como os animais, lanando a cabea para a frente e lambendo os lquidos. Na instituio onde foram recolhidas, passavam o dia acabrunhadas e prostradas numa sombra; eram ativas e ruidosas durante a noite, procurando fugir e uivando como lobos Nunca choraram ou riram Kamala viveu durante oito anos na instituio que a acolheu, humanizando-se lentamente Ela necessitou de seis anos para aprender a andar e pouco antes de morrer s tinha um vocabulrio de cinquenta palavras Atitudes afetivas foram aparecendo aos poucos Ela chorou pela primeira vez por ocasio da morte de Amala e se apegou lentamente s pessoas que cuidaram dela e s outras crianas com as quais conviveu. A sua inteligncia permitiu-lhe comunicar-se com outros por gestos, inicialmente, e depois por palavras de um vocabulrio rudimentar, aprendendo a executar ordens simplesFonte (B Reymond, Le dveloppement social de l enfant et de l adolescent, Bruxelas, Des-sart, 1965, p 12-14, apud C Capalbo, Fenomenologia e cincias humanas, Rio de Janeiro, J. Ozon Ed., p. 25-26.) apud ARANHA, M. L. de A.; MARTINS, M. H. P. Filosofando: introduo filosofia. 3. ed. rev. So Paulo: Moderna, 2003.

sAibA mAis

Feij (2009, p08) comentando o filme assim o descreve Em 1970, o cineasta francs Franois Trufaut realizou, a partir dos relatrios do mdico Jean-Marc Itard, um filme intitulado O Garoto Selvagem (LEnfant Sauvage), disponvel em DVD Tratase de uma obra-prima do fecundo cineasta que comeou como crtico na revista Cahiers du Cinema, foi participante destacado da nouvellevague, movimento do novo cinema francs dos anos 1960, e procurou com seu filme tratar mais uma vez da infncia abandonada, como j havia feito em Os Incompreendidos.

sAibA mAis Para aprofundar, veja: http://vestibularsociologia.blogspot.com/2007/03/ amala-e-kamala-as-meninas-lobo.html

Figura 5

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Podem ser encontradas algumas dvidas quanto veracidade do segundo caso, no entanto verdade e fico ainda podem ser pontos de vista ou de entendimento do leitor Como veremos a seguir: No dia 29 de maio de 2009 tivemos a publicao, em escala mundial, da seguinte noticia Menina criada com ces j brinca com crianas, mas no fala Leia a reportagem no link abaixo e contate seus tutores para saber de suas tarefas http://noticias.terra.com.br/mundo/interna/0,,OI3793449EI8142,00-Menina+criada+com+caes+ja+brinca+com+criancas+m as+nao+fala.html

A2 o homem um ser sociAl? existem humAnos sem sociedAde?Conforme Oliveira (2007, p 7-8) Victor de Aveyron tornou-se um dos casos mais conhecidos de seres humanos criados livres em ambiente selvagem. Com o surgimento de Victor, mais de uma perspectiva de entendimento foram dadas ao caso Mdicos franceses, como Jean tienne Esquirol (1772-1840) e Philippe Pinei (1745-1826), afirmavam que o menino selvagem sofria de idiotia, uma deficincia mental grave teria sido essa a razo pela qual os pais o haviam abandonado. O psiquiatra Jean-Marie Gaspard Itard, diretor de um instituto de surdos-mudos, no compartilhava da opinio dos colegas. Quais as consequncias, perguntava ele, da privao do convvio social e da ausncia absoluta de educao para a inteligncia de um adolescente que viveu assim, separado de indivduos de sua espcie? Itard acreditava que a situao de abandono e afastamento da civilizao explicava o comportamento diferente do menino. Discordava, assim, do diagnstico de deficincia mental para o caso (idem).AtividAde dA semAnA A partir das duas argumentaes e do estudado at o momento, confira com seu tutor a atividade indicada.

sAibA mAis Para os que quiserem aprofundar as temticas abordadas anteriormente, sugerimos o filme: NELL. Direo: Michael Apted. Produo: Renee Missel e Jodie Foster Protagonistas: Jodie Foster, Liam Neeson e Natasha Richardson FoxVideo, 1995 115 min Uma anlise do filme pode ser encontrada em: http://www.saberes.edu. br/arquivos/publicacao/professores/ analise_sobre_nell.pdf

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unidAde b

A sociologiA do cotidiAnoO que Sociologia para voc? E cotidiano? Existem diferenas de cotidiano? O cotidiano pode ser alterado? Essas e outras questes estaremos problematizando nesta unidade Vocs certamente viram, na Disciplina sociologia da educao i, ministrada no primeiro semestres deste curso, que a Sociologia uma cincia que estuda as relaes sociais e as formas de associao, considerando as interaes que ocorrem na vida em sociedade. A Sociologia envolve, portanto, o estudo dos grupos e dos fatos sociais, da diviso da sociedade em classes e camadas, da mobilidade social, dos processos de cooperao, competio e conflito na sociedade etc., segundo Oliveira (2007, p 11) Ou ainda, que () o estudo da vida social humana, dos grupos e das sociedades (GIDDENS), 2005. p.24. E, nesse sentido, percebem que o cenrio onde se origina esta cincia de mudanas radicais introduzidas por duas grandes revolues: a Revoluo Francesa e a Revoluo Industrial. Assim, sabemos que voc j consegue compreender que um dos principais objetivos para o conhecimento sociolgico criar instrumentos tericos que levem reflexo sobre os problemas da sociedade contempornea (idem, p.13). Nesse sentido, pode-se problematizar: como a Sociologia do Cotidiano surge nesse contexto? Se procurarmos no Dicionrio Houaiss Digital da Lngua portuguesa por cotidiano, veremos que: algo que 1 acontece diariamente; que comum a todos os dias; dirio 2 Derivao: por extenso de sentido. que comum; banal 3 que aparece ou se publica diariamente (diz-se de publicao) 4 o que se passa todos os dias; o que comum 5 conjunto de aes, geralmente pequenas, realizadas por algum todos os dias de modo sucessivo e contnuo; dia a dia Assim, podemos fazer uma primeira inferncia: a sociologia do Cotidiano vai os auxiliar a pensarmos a cotidianidade, os tempos e espaos que estamos vivendo e que, muitas vezes, sequer prestamos ateno. Como primeiro exerccio dessa unidade, indicamos que, por dois dias, vocs observe seu cotidiano e registre-o num bloco de anotaes. Voc j havia parado para pensar sobre ele? Existem coisas que voc realiza e no tinha pensado? Algumas de suas aes ocorrem sem reflexo? Voc se deu conta de que algumas vezes, simplesmente, agia desta ou daquela forma e no sabia o motivo da ao? Se a resposta a algumas delas foi positiva, seja bem-vindo a pensar a Sociologia do Cotidiano

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Leia o texto da msica abaixo e, posteriormente, oua-a no link indicado: CotidianoChico Buarque/1971

Todo dia ela faz tudo sempre igual Me sacode s seis horas da manh Me sorri um sorriso pontual E me beija com a boca de hortel Todo dia ela diz que pra eu me cuidar E essas coisas que diz toda mulher Diz que est me esperando pro jantar E me beija com a boca de caf Todo dia eu s penso em poder parar Meio dia eu s penso em dizer no Depois penso na vida pra levar E me calo com a boca de feijo Seis da tarde como era de se esperar Ela pega e me espera no porto Diz que est muito louca pra beijar E me beija com a boca de paixo Toda noite ela diz pra eu no me afastar Meia-noite ela jura eterno amor E me aperta pra eu quase sufocar E me morde com a boca de pavor Todo dia ela faz tudo sempre igual Me sacode s seis horas da manh Me sorri um sorriso pontual E me beija com a boca de hortel

sAibA mAis Na plataforma Lattes, temos a seguinte descrio da autora: Possui graduao em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1964), especializao em Planejamento da Educao pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1970) , mestrado em Planejamento Urbano e Regional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1976) e doutorado em Geografia (Geografia Humana) pela Universidade de So Paulo (1992) Atualmente Professora Adjunta da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Tem experincia na rea de Geografia , com nfase em Geografia Regional, atuando principalmente nos seguintes temas: Emancipaes Territoriais, Territorialidade, Conscincia Territorial. Disponvel em http://buscatextual. cnpq.br/buscatextual/visualizacv. jsp?id=K4787851D1

http://www.youtube.com/watch?v=WBwo5MzB7ioAtividAde dA semAnA Entre em contato com o tutor da disciplina para saber as atividades da unidade

mesqUita (1995, p. 13), uma das bibliografias dessa disciplina, indica-nos que, se formos buscar em variadas publicaes ou dicionrios acerca do conceito de Cotidiano, basicamente encontraremos trs definies.Primeiro, a ideia de hbito, do que se repete como tarefa ou exerccio, e que carrega em si implicitamente a ideia de durao. Segundo, a ideia de que o desejo, a evaso, d-se fora do cotidiano; que ele no o lugar, o territrio do desejo, do sonho, do imaginrio, da aspirao. H por isso implcita uma sugesto de escape do cotidiano. Portanto uma conotao negativa,

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pedagogia sociologiA dA educAo ii ou seja: no positiva no sentido de incluso, mas ao contrrio, alijante , excludente. Em terceiro lugar, h a conotao de montono e banal como o que se v todos os dias. Essa, ao acoplar o vocbulo ideia subentendida daquilo que enfadonho e comum, atribui prpria existncia um olhar entediado. Laforgue em sua frase ilustra essa acepo, chegando a utilizar cotidianidade como substituto monotonia, que est subentendida, referindo-se vida e imprimindo sua exclamao um tom de lamento.

glossrio No dicionrio Houaiss temos como Alijar: v. tr., bitr., intr. 1. Rubrica: termo de marinha lanar [ao mar] (carga, artilharia etc.), por fora maior, para aliviar o navio; arremessar (ao mar) ex.: o comandante mandou a (toda a carga) [ao mar] v. tr. dir. 2. tornar menos pesado; aliviar, tirando parte da carga ex: a um caminho v. tr. dir. pron. 3. Derivao: por extenso de sentido. lanar fora; livrar(-se) de ex.: v. tr. dir. 4. negar, desconhecer (dever, compromisso etc) v. tr. dir. 5. Derivao: por extenso de sentido apartar de si; afastar ex.: a as ms companhias

A autora posiciona-se contrariamente a ambas E perguntanos: Se ele assim to descabidamente sem importncia, repositrio do hbito, que pai da tradio e do costume e que por sua vez pode constituir-se nos embries do conservadorismo, por que eleger o cotidiano como um dos temas dessa coletnea? (idem p14) A coletnea referida a obra Territrios do Cotidiano: uma introduo a novos olhares e experincias. Foi organizado por ela e por Carlos rodrigUes Brando e publicada pela Edunisc, no ano de 1995. Na publicao, os autores instigam-nos a pensar sobre o cotidiano nas suas mais variadas facetas e sobre os territrios humanos Mesquita (1995) vai defender ardorosamente em seu texto a tese de que o cotidiano no pode ser percebido apenas como lugar da repetio sem sentido, mas como lugar da mudana. Nesse tica, no nega a ideia da repetio, mas, tambm assume o cotidiano como lcus da prtica, da aplicao continuada e repetida de determinados campos de conhecimento acumulado, portanto do hbito. Conhecimento este que exigiu inventividade e reflexo quando do seu advento e difuso, mesmo que depois tenha se atualizado em repeties automatizadas (ibidem p. 15). O que equivale a dizer que, mesmo se, em algum momento, nossa prtica tornou-se repetitiva, o cotidiano gesta-se e nasce como lugar da inventividade, da criticidade e, portanto, da criao. Nesse sentido, pode-se olhar as mais variadas aes humanas. Dirigir um carro pode ser um bom exemplo No incio, mal respiramos Alguns no gostam nem de ouvir msica No entanto, com o passar do tempo, a msica aumenta, o condutor relaxa e a tarefa torna-se mais ritimizada Depois de algum tempo, os mais ousados at descumprem as leis de trnsito e dirigem, ouvem msica, conversam com o carona, xingam os outros e falam ao celular, algumas vezes, concomitantemente. Ou seja, algum grau de economia de esforos foi ocasionado com o passar do tempo Se nos dermos ao trabalho de pesquisarmos em algum site de busca sobre imagens de cotidiano, teremos algo prximo do exposto a seguir:

personAlidAde

Quer saber um pouco mais desse grande mestre, veja como ele mesmo se descreve em seu Currculo Lattes descreve: bacharel em psicologia e psiclogo pela Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro (1965). Possui mestrado em Antropologia pela Universidade de Braslia (1974) doutorado em cincias sociais pela Universidade de So Paulo (1980) e livre docncia em antropologia do simbolismo pela Universidade Estadual de Campinas Aposentou-se da UNICAMP em 1997, aps 23 anos de

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Figura 7

Figura 6

trabalho Permanece como professor pleno do quadro de docentes do Doutorado em Antropologia e do Doutorado em Cincias Sociais da UNICAMP. Realizou estudos de ps-doutorado em antropologia junto Universidade de Pergia e a de Santiago de Compostela Desde quando aposentado, foi professor convidado da Universidade de Uberaba, professor convidado do Departamento de Cincias Florestais da ESALQ/USP, professor da Faculdade de Educao da Universidade Federal de Gois e professor convidado do Programa de Ps-graduao em Geografia da Universidade Federal de Uberlndia. Atualmente pesquisador visitante da Universidade Estadual de Montes Claros Possui experincia na rea de Antropologia, com nfase em Antropologia Rural, atuando principalmente nos seguintes temas: cultura, educao popular, campo religioso, rituais populares e religio Trabalha, tambm, desde 1963 com educao, sobretudo na rea da educao popular. membro do Conselho Internacional e consultor do Instituto Paulo Freire Divide sua obra escrita entre a antropologia, a educao e a literatura. Publicou ou coordenou a edio de cerca de sessenta livros nestas trs reas do conhecimento. comendador da Ordem do Mrito Cientfico, recebeu prmio do CNPq por sua obra em cultura popular. professor emrito da Universidade Federal de Uberlndia. Recebeu a medalha Roquette Pinto da Associao Brasileira de Antropologia e o Prmio Poesia-Liberdade pela Fundao Casa Alceu Amoroso Lima. Acesso em de Novembro de 2009, disponvel em: http://buscatextual. cnpq.br/buscatextual/visualizacv. jsp?id=K4780720Y4 Ou, ainda, leia uma entrevista com ele em: http://seer.ucg.br/index.php/habitus/article/viewFile/388/324

Figura 7

Figura 8

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sAibA mAis Quer saber mais, veja os artigos: http://www.cchla.ufrn.br/alipiosousa/ index_arquivos/ARTIGOS%20ACADEMICOS/ARTIGOS_PDF/Michel%20 de%20Certeau%20-%20fundamentos%20de%20uma%20sociologia%20do%20cotidiano.pdf Ou: http://egal2009.easyplanners. info/area02/2249_Amorim_Araujo_James.doc Ou ainda: http://www2. pucpr.br/reol/index.php/ IALOGO?dd1=1577&dd99=pdf Figura 9

Que definio de cotidiano lhes fica evidente nas imagens? Vocs pensam que so uma boa definio imagetica deste? Poderamos ainda nos perguntar: seremos ns, pela repetitividade e pelo hbito, condenados a executar no cotidiano aes mecnicas e automatizadas como faziam os trabalhadores do Contexto Taylorista e Fordista de produo, como pode ser percebido no personagem de Chaplin em tempos modernos?

sAibA mAis Quer saber mais, sobre o filme Tempos Modernos, veja no link http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=181 Ou em: http://www.65anosdecinema. pro.br/Tempos_modernos.htm

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b1 o cotidiAno no tdio nem to somente repetioPensar o cotidiano, como um espao/tempo que no implica necessariamente o tdio, a repetio e o fastio o que continua nos propondo Mesquita (1995). Mas afirma, (...) no estou negando que inmeras oportunidades de repetitividade mecnica no cotidiano passam a ter como efeito a morte da ateno, matria prima da criatividade. Assim, fica gritando a preocupao: Como pensarmos um cotidiano escolar, um cotidiano familiar, um cotidiano social que mesmo repetitivo possa ser o espao da ateno? Estamos trabalhando Leitura e Escrita com nossos alunos do Segundo Ano do ensino Fundamental, um Calor de Janeiro entra por nossa porta, os alunos esto cansados e pouco participativos Eis que repentinamente um pardal voa esbaforido porta adentro, buscando sombra e gua. Os alunos entram em polvorosa. Querem peg-lo. O que o professor faz? A repetio foi quebrada, o cotidiano foi alterado? Eis uma situao que pode ocorrer em uma sala de aula contempornea O professor ento pode optar por retirar o bichinho da sala de aula e voltar a seu trabalho, numa brochancia pedaggica. Ou pode, a partir do fato inusitado, repensar outros contedos e metodologias para seu ensino. Pode, por exemplo, trabalhar noes de conscincia ambiental, problematizando o porqu desses pssaros terem aumentando tanto, dentre infinitas outras possibilidades.AtividAde dA semAnA Entre em contato com seu tutor para realizar as atividades da semanaO pardal nome genrico dado aos pequenos pssaros da famlia Passeridae, gnero Passer e Petronia. Os pardais so aves cosmopolitas e adaptam-se bem a reas urbanizadas e convivncia com os seres humanos. Alimentam-se base de sementes durante a maior parte do ano e de inseto na poca de reproduo. O pardal-domstico foi introduzido pelo homem em todos os continentes e atualmente a espcie de ave com maior distribuio geogrfica. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/ Pardal

sAibA mAis

Assim, podemos pensar a Sociologia do Cotidiano como possiblidade de novas formas de construes de conhecimentos ao professor contemporneo E, desse modo, acabamos por pensar o cotidiano como nvel da realidade e o lugar, como dimenso geogrfica. Nessa perspectiva, percebe-se que a leitura das prticas rotineiras exigem outra forma de olhar e interao com o social, ou seja, passase a exigir mtodos no to convencionais (ARAUJO, 2008). Ou nas palavras de Mesquita (1995, p16):O que quero dizer que o cotidiano tambm ou pode vir a ser o lcus da ateno, da observao atenta de ns mesmos, do grupo ou grupos aos quais nos ligamos, das aes que executamos, do contedo e da diversidade de nossos pensamentos do dia a dia, dos territrios cotidianos em que habitamos. E esta observao atenta que contm a potencialidade de ser a inovao ou a transformao do cotidiano.

E continua

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pedagogia sociologiA dA educAo ii (...) O que quero assinalar no s o estigma que a noo de cotidiano - hbito, enquanto fastio-monotonia esteve submetida, como tambm, contribuir para desvelar outras feies desprestigiadas ou ignoradas do cotidiano Nesse sentido, o hbito pode ser resgatado como uma prtica repetitiva, mas no necessariamente igual e montona, de um sujeito ou grupo social atuante. Ele no est em contradio com a espontaneidade, caracterstica dominante e tendncia da cotidianidade (idem).

Assim o desafio que se estabelece de um novo olhar, um novo fazer que pense o cotidiano, tambm como possibilidade de mudana, pois no presente que podemos interferir para mudar a vida. Em suma uma sociedade para melhor se muda apelando ao presenteismo; ao estar e construir no presente, e no no passado ou no futuro, se estes forem vistos como um escape criao na vida de todos os dias (idem, p. 18). Por fim, podemos concluir pensando: no seria ento pertinente olharmos o vivido, o presente, como um lcus possvel de superao do tdio, da monotonia que no necessariamente so ento cotidiano e passarmos a nos perceber seres da mudana, que se inicia pela observao de si e de meus condicionantes? (MESQUITA, 1995). Qual dos cotidianos abaixo lhe chama ateno? Com qual deles voc se identifica? Frente a imagem abaixo, voc pensa ser possvel repensar o cotidiano?

Figura 10

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unidAde c

Questes tericAs e metodolgicAs nAs pesQuisAs sobre FAmliA e escolANa obra Sociologia de antonhy giddens, num capitulo intitulado Famlias, este plural vem bem destacado. Pergunte-se, caro leitor, por qu? Assim ele nos traz que famlias so:() um grupo de pessoas diretamente unidas por conexes parentais, cujos membros adultos assumem a responsabilidade pelo cuidado das crianas. Laos de parentesco so conexes entre indivduos, estabelecidas tanto por casamento como por linhas de descendncia, que conectam parentes consanguneos (mes, pais, irmos, prole, etc.). O casamento pode ser definido como uma unio sexual entre dois indivduos, socialmente reconhecida e aprovada Quando duas pessoas se casam, elas se tornam aparentadas; mas tambm o elo matrimonial conecta uma gama mais ampla de parentes Pais, irmos, irms e outros parentes consanguneos tornam-se parentes do cnjuge atravs do casamento As relaes familiares so sempre reconhecidas dentro de grupos de parentesco mais abrangentes Virtualmente, em todas as sociedades, podemos identificar o que socilogos e antroplogos chamam de famlia nuclear, dois adultos vivendo juntos num ncleo domstico com suas crianas ou com crianas adotadas. Na maioria das sociedades tradicionais, o ncleo familiar era parte de uma rede mais ampla de parentesco de algum tipo. Quando parentes prximos, alm do casal e de seus filhos, vivem juntos no mesmo ambiente familiar ou em um relacionamento prximo e contnuo uns com os outros, falamos em uma famlia ampliada. Uma famlia ampliada pode incluir avs, irmos e suas esposas, irms e seus maridos, tias e sobrinhos Nas sociedades ocidentais, o casamento e, portanto, a famlia, esto associados monogamia. ilegal para um homem ou uma mulher estar casado com mais de um cnjuge por vez Porm, no assim em todos os lugares. Em uma famosa comparao entre centenas de sociedades na metade do sculo XX, George Murdock (1949) descobriu que a poligamia, que permite a um marido ou a uma esposa ter mais de um cnjuge, era permitida em mais de 80% delas H dois tipos de poligamia: a poliginia, em que um homem pode ser casado com mais de uma mulher ao mesmo tempo; e apoli-andria, muito menos comum, em que uma mulher pode ter dois ou mais maridos, simultaneamenteFonte: GIDDENS, A. FAMLIA. IN GIDDENS, A. SOCIOLOGIA Porto Alegre ARTMED, 2005 4 ed p150-171

personAlidAde

Anthony Giddens considerado por muitos o mais importante filsofo social ingls do nosso tempo. Figura de proa do novo trabalhismo ingls e terico pioneiro da terceira via, tem mais de vinte livros publicados ao longo de duas dcadas Ocupa desde 1996 o prestigioso cargo de reitor da London School of Economics and Political Science Fonte http://www.travessa.com.br/ Anthony_Giddens/autor/A738498CFB7C-4C35-96C9-7EC44E976816 Quer saber mais, veja http:// pt.wikipedia.org/wiki/Anthony_Giddens

Com essa breve introduo, como voc inicia a conceituar famlia? Ser que j podemos criar uma definio de famlia? E uma delas pode ser considerada padro? Absoluta? nica? Mais importante? A partir das imagens abaixo, reflita sobre isso.

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Figura 11

Em outra obra do autor supracitado, temos ainda que:Qualquer pessoa num pas ocidental que decide se casar, hoje em dia, (...) sabe que a taxa de divrcios alta (e pode tambm, embora de maneira imperfeita ou parcial, conhecer um pouco mais sobre demografia do casamento e da famlia) O conhecimento da alta taxa de divrcios pode afetar a prpria deciso de se casar, bem como decises sobre consideraes relacionadas o regime das propriedades etc. A conscincia dos nveis de divrcio, alm disso, normalmente muito mais do que simplesmente a conscincia de um fato bruto. Ele teorizado pelo agente leigo de maneiras impregnadas pelo pensamento sociolgico Desta forma, virtualmente todos que consideram o casamento tm alguma ideia de como as instituies familiares vm mudando, mudanas na posio social relativa e no poder do homem e da mulher, alteraes nos costumes sexuais etc. tudo isto entrando nos processos de mudana ulterior que reflexivamente informa O casamento e a famlia no seriam o que so hoje se no fossem inteiramente sociologizados e psicologizados.(GIDDENS, 1991, p.42-43)

Convergindo nessa tica, Costa (2008, p24) vai trazer que se deve conceber a famlia como ponto de confluncia das realidades da criana, do adolescente, do jovem, da mulher, do homem, do deficiente e do idoso. E assim, que, em se tratando de Brasil, no poderemos falar de uma nica constituio familiar, ou um nico conceito de famlia Neder (2008, p 260) vai apontar que no Brasil o conceito de famlia um conceito plural tendo em vista a multiplicidade tnico-cultural que embasa a composio demogrfica brasileira. Na deClarao mUndial soBre a soBrevivnCia, a proteo e o desenvolvimento da Criana nos anos 90 fica definido que18. A famlia a principal responsvel pela alimentao e pela proteo da criana, da infncia adolescncia. A iniciao das crianas na cultura, nos valores e nas normas de sua sociedade comea na famlia. Para um desenvolvimento completo e harmonioso de sua personalidade, a

sAibA mAis Quer acessar a declarao na ntegra, veja em: http://www.dhnet.org. br/direitos/sip/onu/c_a/lex42.htm

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pedagogia sociologiA dA educAo ii criana deve crescer num ambiente familiar, numa atmosfera de felicidade, amor e compreenso. Portanto, todas as instituies da sociedade devem respeitar e apoiar os esforos dos pais e de todos os demais responsveis para alimentar e cuidar da criana em um ambiente familiar. 19. Todos os esforos devem ser feitos para evitar que a criana seja separada de sua famlia. Quando esse afastamento ocorrer por motivos de fora maior ou em funo do interesse superior da criana, necessrio que se tomem providncias, de modo que ela receba ateno familiar alternativa apropriada, ou seja colocada em alguma instituio, sempre levando em considerao a importncia de continuar a criao da criana em seu prprio meio cultural Os grupos familiares, os parentes e as instituies comunitrias devem receber apoio para poderem suprir as necessidades das crianas rfs, refugiadas ou abandonadas. Esforos devem ser envidados para evitar a marginalizao da criana na sociedade.

No Artigo 4 do estatUto da Criana e do adolesCente , temos ainda queArt. 4 dever da famlia, da comunidade, da sociedade em geral e do poder pblico assegurar, com absoluta prioridade, a efetivao dos direitos referentes vida, sade, alimentao, educao, ao esporte, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria.

sAibA mAis Quer acessar na ntegra, veja em: http://www.planalto.gov.br/ccivil/ LEIS/L8069.htm

Assim, a partir das referidas publicaes e se olharmos com mais afinco para as famlias, dar-nos-emos conta de que, apesar de sua distinta construo histrica, de modo geral, foram e continuam sendo espao privilegiado de socializao, de prtica, de tolerncia e de diviso de responsabilidades, de busca coletiva de estratgias de sobrevivncia e lugar inicial para o exerccio da cidadania (FERRARI; KOLOUSTIAN 2008, p.11). As referidas autoras continuam nos trazendo que consenso que a situao de vulnerabilidade das famlias encontra-se diretamente associada sua situao de pobreza e ao perfil de distribuio de renda no pas No Brasil, como tambm em outros pases, os programas de transio econmica e de ajustes macroeconmicos tm funcionado como um fator desagregador daquelas. Tm-se verificado, por exemplo, um aumento das famlias monoparentais, em especial aquelas onde a mulher assume a chefia do domiclio; a questo migratria, por motivos de sobrevivncia, atinge alguns membros, tornando-se motivo de desestruturao do espao domstico; o domiclio est sujeito a ameaas frequentes causadas pela degradao do meio ambiente; o acesso aos servios urbanos bsicos, aos recursos produtivos e aos diferentes mtodos de planejamento familiar problemtico Estas so algumas questes que afetam diretamente o entorno familiar, sobretudo daquelas famlias caracterizadas pela situao de pobreza e vulnerabilidade. (FERRARI E; KOLOUSTIAN, 2008, p.12).

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Fica evidente que, quando a famlia sofre desagregaes de ordem poltica, financeira social ou afetiva, essa ser explicitada por seus membros na sociedade, assim fica evidente a necessidade de investimentos pblicos nesse mbito, se quisermos uma sociedade mais humana, menos violenta e mais justa, pois, como lembra Marques (2007, p. 08), A questo que a violncia nasce da opresso que o capitalismo impe sociedade. Ele, como causador de uma violncia social, induz os indivduos a praticarem tal ato. Atuando atravs da violncia, nada mais natural do que termos indivduos violentos Ento questionamos Como pode um causador de violncia acabar com a prpria violncia?. Por fim apresentamos, talvez, uma das mais acertadas concepes de famlia brasileira, qual seja a de que() no existe, histrica e antropologicamente falando, um modelo-padro de organizao familiar; no existe a famlia regular. Menos ainda que o padro europeu de famlia patriarcal, do qual deriva a famlia nuclear burguesa (que a moral vitoriana da sociedade inglesa no sculo XIX atualizou historicamente para os tempos modernos), seja a nica possibilidade histrica de organizao familiar a orientar a vida cotidiana no caminho do progresso e da modernidade Pensar as famlias de forma plural pode significar uma construo democrtica baseada na tolerncia com as diferenas, com o Outro. (...) numa tentativa de desconstruo dos alicerces das concepes polticas e psicoafetivas que sustentam o racismo que, recrudescido, est to em voga nos tempos atuais, e que, sem dvida, constitui pano de fundo do debate sobre as famlias (NEDER,2008 p 28)

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unidAde d

mdiA-educAoPara iniciar nossa discusso acerca da Mdia e suas possibilidades ao educador contemporneo, assista aos vdeos abaixo: http://www.youtube.com/watch?v=PPCTCAFy42k&feature=fvw http://www.youtube.com/watch?v=FMIoEN9eY0g http://www.youtube.com/watch?v=L_IxBT_yZA0AtividAde dA semAnA Entre em contato com seu tutor para realizar as atividades da semana

No artigo 13 da Conveno da onU , sobre os direitos da criana e do adolescente (1989), temos que:A criana ter direito liberdade de expresso; este direito inclui a liberdade de procurar, receber e partilhar informao de todos os tipos, independentemente de fronteiras, seja oral, escrita seja impressa, na forma de arte ou atravs de qualquer outro meio de escolha da criana.

sAibA mAis Para acessar o documento completo acesse http://www.onu-brasil.org.br/ doc_crianca.php

Frente ao acima exposto, o texto que se segue busca efetivar uma discusso a partir do cotidiano da escola e da infncia na contemporaneidade. O que voc entende por mdia? Como a mdia se insere em sua vida? Como voc observa a mdia na vida das crianas com que voc convive? Maria Luiza Belloni, na sua obra o qUe mdia-edUCao, inicia sua obra afirmando queCrianas que durante anos consomem televiso de modo frentico (isto quer dizer quase todas) absorvem certo tipo de mensagens, especficas do discurso televisual, em termos de linguagens, estilos, aspectos tcnicos, elementos estticos, que so de natureza diferente dos contedos A televiso habitua o espectador a, por exemplo, privilegiar mensagens curtas (prottipo ideal: anncio publicitrio), a praticar o zapping e a desligar a ateno ou o aparelho quando um certo ritmo de sucesso de imagens e sons no respeitado (BELLONI, 2001, p06)

sAibA mAis Quer ler alguns fragmentos da obra, acesse http://books.google.com.br/ books?id=M8ymArfMU-4C&printsec= frontcover#v=onepage&q=&f=false

No fragmento a autora nos deixa claro que vivemos um tempo de profundas transformaes. Transformaes essas que tm sido produzidas por inmeros fatores, dentre eles a mdia O homem hoje tem elaborado distintas formas de se relacionar com os outros e com o mundo Na fala anterior, conseguimos perceber que um indivduo que permanece durante anos exposto mdia televisiva desenvolve determinadas habilidades. Dentre estas est a de prestar ateno to somente a variaes constantes de sons e imagens A pergunta que talvez possamos fazer : Fora do ambiente televisivo, as mensagens s crianas tm mantido o mesmo ritmo?

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Podemos dizer isso de outra forma. Nossas crianas tm sido condicionadas pela mdia a ouvir apenas frases curtas, com uma variao sonora constante, mas o universo, seu cotidiano, sua escola e sua famlia tm lhe possibilitado tal variao visual e sonora? Ser que no teria essa informao alguma relao com o fracasso da escola contempornea? Logicamente a generalidade no pode ser to rpida, mas a reflexo pode ser trazida. Continuando sua reflexo, a autora nos traz tambm elementos positivos da mdia, e para tal contextualiza:Em um estudo que marcou poca nos anos de 1980, Patrcia Greenfield mostrou que as crianas que veem muita televiso tm melhores aptides para construir conceitos de relaes espao-temporais, para compreender as relaes entre o todo e suas partes, e at para identificar os ngulos das tomadas de imagens (...) o que significa um reforo das faculdades de abstrao, pois qualquer teoria , antes de mais nada, uma maneira de ver as coisas (Greenfield, 1988). Parece incontestvel, hoje, que as crianas desenvolvem por impregnao novas capacidades cognitivas e perceptivas, como, por exemplo: fazer anotaes enquanto veem um programa de vdeo; inventar uma boa pergunta para animar um chat; saber intervir num programa de TV interativa (jogo, teleconferncia ou outro); reconhecer um quadro famoso ou estilo de um pintor; reconhecer e identificar um trecho musical, entre muitas outras j conhecidas (idem, p 06-07)

sAibA mAis Quer aprofundar, leia: http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2008/ anais/pdf/169_736.pdf ou: http://www.anped.org.br/ reunioes/25/ritamarisapereirat16.rtf ou ainda: http://virtualbib.fgv. br/ojs/index.php/reh/article/ view/2226/1365

O que se pode perceber com sua escrita que a mdia no um monstro a ser destrudo ou um problema que precisamos superar Todavia o limiar entre positivo e negativo pode ser uma linha muito tnue, com isso o educador precisa de muita reflexo e capacitao para tal percepo.

Figura 12

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Edmilsom Marques, no artigo Os Programas Informativos da Televiso e a Realidade, coloca-nos queA partir do final da dcada de 1920, a sociedade passou a conviver com uma coisa que foi permanentemente se desenvolvendo e chegou aos tempos atuais fazendo parte de nosso dia a dia e estando em constante contato com os indivduos, compartilhando o espao domiciliar e calando-nos para ouvir atentamente quilo que apresentado ininterruptamente diante de nossos olhos e ouvidos, ou seja, a televiso Os aparelhos de TV (televisores) foram postos venda no final da dcada de 1920; antes disso no foram objetos de muita discusso (1). Como diz Isleide Fontenelle o encanto das imagens em movimento, agora apreendidas privadamente, foi suficiente para seduzir milhares de pessoas para a frente da telinha (2). Assim, com seu desenvolvimento, vrios programas com finalidades e objetivos semelhantemente comuns foram sendo criados e desenvolvidos tecnologicamente para atender a anseios especficos mas com carter universal.

Perante a citao, podemos perceber que, nesta lgica, a mdia pode e talvez deva ser entendida como aparelho intencional de informaes. Assim, poderamos problematizar se quem sabe no seria papel do educador problematizar a intencionalidade das informaes veiculadas por estes meios? Talvez mais importante ainda, como conseguir tal formao ao educador? Marques (2005, 08) assim problematiza:A questo que a violncia nasce da opresso que o capitalismo impe sociedade. Ele como causador de uma violncia social, induz os indivduos a praticarem tal ato. Atuando atravs da violncia, nada mais natural do que termos indivduos violentos Ento questionamos Como pode um causador de violncia acabar com a prpria violncia? Algum programa jornalstico, porm, j tratou da violncia nesta tica? A televiso no ousa em falar negativamente do capitalismo, pois ela existe para a defesa dele, e exp-lo seria um suicdio

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Sem ler o texto no link indicado acima, voc percebe alguma intencionalidade na imagem?

Figura 13

Agora leia o texto acessando o link e tente se posicionar sobre qual a mensagem que esta implcita na imagem? http://www.forumseguranca.org.br/artigos/midia-e-violencia-opapel-da-imprensa-na-seguranca-publica

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unidAde e

A violnciA como objeto de estudo sociolgico e investigAtivo Ao trAbAlho educAtivo do proFessor

Figura 14

Vamos luta, aos melhores vitria, espao dos fortes, enfrentar os problemas, lutar para conquistar, esmagar a concorrncia, massacrar os investidores. Essas e outras tantas expresses tm demarcado um tempo e um espao do desenvolvimento e da implantao de aes e vivncias cada vez mais violentas na contemporaneidade. Com frequncia temos ouvido, a mdia violenta, a sociedade violenta, a sociedade consumista, produz lixo, a sociedade no pensa no coletivo Talvez tenhamos que perguntar quem mesmo que constri e / ou pensa nossa sociedade? Quem mesmo que assiste a programas violentos, se a mdia no tivesse tamanha audincia nesse tipo de programa ser que sua programao no seria alterada? Ribeiro e Chaveiro, (2009, p2) iniciam seu artigo intitulado VIOLNCIA URBANA, ESPAO URBANO E SUBJETIVIDADE: UMA LEITURA GEOGRFICA DA VIOLNCIA URBANA COTIDIANA problematizando algumas verdades talvez midiaticamente construdas, como, por exemplo, a violncia tem aumentado, e os atores que a protagonizam so, quase exclusivamente, componentes das classes menos favorecidas da sociedade capitalista em que vivemos. Ainda para eles a palavra violncia provm deviolentia, do latim, que significava a fora que se usa contra o direito e a lei. Vendo sob esse prisma, o violento (violentus, tambm do latim) era quem agia com fora impetuosa, excessiva, exagerada. Com o passar dos tempos, a complexificao da lingustica e a diversificao do uso desse termo, violncia passou a significar qualquer ruptura da ordem ou

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pedagogia sociologiA dA educAo ii qualquer emprego de meios para impor uma ordem Como podemos observar, violncia, em seu sentido etimolgico, aos poucos se aproximou dos conceitos de poder e dominao (idem).

Tais expresses, carregadas de poder simblico, levam-nos a construo de conceitos e pr-conceitos que necessitam, muitas vezes, de uma profunda reflexo. Assim, talvez tenhamos que comear a problematizar muitas das verdades institudas em ns. Um brilhante texto neste sentido, que inclusive tomo como referncia a esta escrita a produo de Edmilson Marques intitulada a Base da Violncia. Nela o autor nos ajuda a compreender o fenmeno Violncia. A partir dele sabemos que foi com a sada das pessoas do campo em direo s cidades e com o advento do modo de prodUo Capitalista que com ele expulsa o cidado do campo para a cidade que ocorre a exploso urbana. Com ela nascem novas formas de relaes sociais. Assim, nas palavras do autor, o espao urbano torna-se uma forma de diviso social do trabalho que separa o campo da cidade e que joga quem foi expropriado de seus meios de vida na convivncia com os despropriadores (MARQUES, 2007, p.21)

sAibA mAis Para aprofundar, veja: http://pt.wikipedia.org/wiki/Modo_de_ produ%C3%A7%C3%A3o

Figura 15

Sabemos que o espao produto e produtor da sociedade que o habita e, assim sendo, parte integrante dessa sociedade e, portanto, atua como mediador das relaes sociais que o circundam. no espao que a vida cotidiana acontece e no cotidiano que a violncia , pelo menos em parte, percebida, o que torna possvel a relao violncia urbana e espao urbano (Ribeiro e Chaveiro, (2009, p2) Assim nos damos conta que o capitalismo uma criao e com ele que criamos um tempo e um espao de

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pedagogia sociologiA dA educAo ii (...) separao e hegemonia das cidades em relao ao campo, j que a cidade movida pela fora do capital transforma o campo em um local de abastecimento de suas necessidades (alimento, combustvel, energia etc) Esse movimento logo traz como consequncia o surgimento da diviso social do trabalho e isso d origem ao fenmeno social denominado violncia urbana. (MARQUES, 2007, p.22)

Figura 16

Percebe-se assim que com essa separao que se estrutura nossa sociedade, ou seja uma sociedade capitalista dividida por classes, as quais, para perpetuar sua existncia, tero que manter um processo de luta desigual e desumana entre si No entanto, nessa luta, uma minoria coordena a vida e a existncia das demais classes. E da explorao do excedente de produo mais valia da maioria que uma minoria mantm seus privilgios e seus bens (idem)

Figura 17

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Assim, observem a imagem acima e perguntem-se: existe alguma violncia na mesma?

Figura 18

E, nessa imagem o que pode inferir? J parou para pensar porque muitas vezes, no temos problemas de esgotos a cu aberto e lixo nos centros das cidades? Porque estes fenmenos, em geral, aparecem de forma bem mais acentuada nas periferias? Veja a notcia publicada no jornal CinForm:Apesar dos avanos nos ltimos anos nas reas de educao e combate pobreza, o Brasil continua a ter uma das piores distribuies de renda do mundo, superando apenas Serra Leoa, na frica Foi o que mostrou um estudo divulgado na quarta-feira pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada (IPEA) O instituto, ligado ao Ministrio do Planejamento, apontou que, em 2003, 1% dos brasileiros mais ricos detinham uma renda equivalente aos ganhos dos 50% mais pobres. No mesmo perodo, cerca de um tero da populao (53,9 milhes de pessoas) foi considerado pobre, em critrio que inclui todos os que viviam com renda familiar per capita de at meio salrio mnimo (R$ 120 na ocasio) (JORNAL CINFORM 2009, sp)

sAibA mAis Para ler a noticia na ntegra, acesse http://www.cinform.com.br/ noticias/20769

Assim, um entendimento para a tamanha violncia que temos vivido na contemporaneidade, que nos provoca repensarmos a diviso social da renda como alternativa violncia, o que pode ser encontrado nos fragmentos retirados do texto() com o desenvolvimento do capitalismo, emergem, no seio deste, relaes sociais baseadas no conflito e na diviso da sociedade em classes sociais, onde uma classe domina e impe s outras uma estrutura social baseada nos seus valores Obviamente que, se h uma classe que domina, h tambm uma classe que dominada. Essa relao entre dominantes e dominados o que se denomina luta de classes e a base que d origem s diversas formas de violncia existentes na sociedade moderna,

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pedagogia sociologiA dA educAo ii incluindo a a violncia urbana. A partir da, as classes dominadas buscaro se defender Porm, o que acontece que a classe que domina cria mecanismos para legitimar a violncia que exerce sobre as classes dominadas. Da, qualquer reao das classes dominadas ser taxada de violenta. Por exemplo: o que faz uma pessoa ao mendigar por um pedao de po, seno expressar a violncia que recebe no dia a dia da rotina da vida nas cidades? O que est querendo dizer um adolescente quando furta, nos grandes centros, qualquer objeto que pertena a outra pessoa, seno que vivemos numa sociedade de profundas desigualdades sociais, e que aqueles que muito possuem, querem apenas que sua propriedade se perpetue afundando mais e mais a sociedade em profundas contradies? Que resposta uma criana d sociedade do consumo, de grandes propriedades e belas coisas, quando pede um trocado pelas ruas, seno a de que integrante da classe majoritria da sociedade que oprimida, explorada e jogada ao seu estado mais febril de desumanizao? Assim, ressalta o cientista social Ruben George Oliven o assaltante, o trombadinha -, poder-se-ia encarar a violncia como estratgia de sobrevivncia num contexto onde as desigualdades sociais so gritantes (...) Portanto, a violncia urbana a expresso da relao imposta pela classe dominante s classes dominadas a partir da organizao social estabelecida nas cidades, dominando outras localidades, que tm como base de sustentao o modo de produo. (MARQUES, 2007, p.23-24)

Assim, a violncia pode ser percebida como uma relao social de imposio e no se confunde apenas com a violncia fsica ou com a criminalidade, abrangendo, portanto, um conjunto de fenmenos que vo alm destes (VIANA, 2004, p. 29,). E, nesse sentido, podemos perceb-la como originria da produo e reproduo do espao urbano, que se d por meio das relaes sociais de produo, que por sua vez so impregnadas e envolvidas em relaes complexas de poder. Ribeiro e Chaveiro, (2009, p.8). Falamos at o momento de violncia explcita: violncia fsica, verbal, violncia da mdia. No entanto no podemos nos esquecer da violncia subjetiva, implcita, simblica, oculta. Essa, na maioria das vezes, passa despercebida e, no entanto, a maioria de ns vitimizada por ela grande parte do tempo Isso ocorre quando nosso patro no nos das condies de trabalho mnimas, quando atrasa nosso salrio, quando descumpre acordos que fazemos, quando nossos superiores nos obrigam a fazer coisas que no nos compete ou quando trabalhamos e ele recebe os louros de nosso trabalho Ou ainda quando nossas instituies criam um clima de insegurana tal que nos sentimos vigiados, observados, por poderes to fantasmagricos que j no conseguimos mais criar ou produzir com liberdade e discernimento E, ns, por medo de perdermos o emprego ou por motivos mil, simplesmente aceitamos essa violncia. Outras formas de violncia passam muitas vezes despercebidas. Voc j reparou que muitas pessoas na atualidade se alimentam de lixo? Esse no um ato de violncia? Por que no nos inconformamos mais?

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Figura 19

Nessa tica, podemos estabelecer tambm paralelo com as ideias de (SANTOS,1996, p. 15), que nos desafiam a pensar nosso tempo, tempo que vai denominar de[...] paradoxal. Um tempo de mutaes vertiginosas produzidas pela globalizao, a sociedade de consumo e a sociedade de informao. Mas tambm um tempo de estagnao, parado na grande discrepncia entre a possibilidade tcnica de uma sociedade melhor, mais justa e mais solidria e a sua possibilidade poltica Este tempo paradoxal cria-nos a sensao de estarmos vertiginosamente parados. Vivemos, de fato, num tempo simultaneamente de conflitos e de repeties.

Seus escritos fazem-nos olhar ao nosso redor e perceber os pequenos gestos e espaos que esto perdendo os sentidos. Ou ainda, nas palavras do autor estamos perdendo nossa capacidade de inconformismo e rebeldia Olhamos um sujeito se alimentando do lixo e isso se naturalizou, olhamos um filho maltratando uma me ou uma me no educando seu filho e no nos chocamos mais Ser que olhamos? Ser que ouvimos? A que se atribui esse olhar que no v? Essa escuta que no ouve? Esse humano humanizado ou to pouco desenvolve sua sociabilidade? O autor nos aponta que talvez essa banalizao possa ter uma explicao histrica ondeO passado foi sempre concebido como reacionrio e o futuro como progressista Foi assim que a burguesia viu a sua luta e foi assim tambm que a classe operria viu a sua luta Esta teoria da histrica fez com que facilmente fossem esquecidos o sofrimento, a injustia, a opresso, todos superveis num futuro prximo e radioso Foi assim que a classe operria se viu menos como herdeira de escravos do que como vanguarda dos libertadores A mesma teoria da histria contribuiu para trivializar, banalizar os conflitos e o sofrimento humano de que feita a repetio do presente neste fim de sculo. O sofrimento humano mediatizado pela sociedade de informao est se transformado numa telenovela interminvel em que as cenas dos prximos captulos so sempre diferentes e sempre iguais s cenas dos captulos anteriores. Esta trivializao traduz-se na morte do espanto e da indignao. (SANTOS,1996, p. 18)

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Nesse sentido, prope a construo de uma nova perspectiva histrica, que problematize nossa capacidade de espanto e indignao e que vise recuperao da rebeldia e do inconformismo. Tal processo estaria centrado na ideia da emancipao dos sujeitos. Emancipao como luta no combate ao sofrimento humano e degradao social. Tal prtica s ser concebida quando percebermos o processo cclico que se inicia com a observao sistemtica, com a racionalizao e com a construo de um novo senso comum.

Figura 20

Assim fechamos esse tpico acerca da violncia, mais especificamente da violncia urbana novamente nas palavras de (MARQUES, 2007, p.29)(...) a violncia urbana deve ser entendida como a relao social consequente da organizao das cidades, tendo em sua base a opresso e explorao que a maioria das pessoas sofre nos ambientes de trabalho pelos detentores do poder. A violncia urbana, ao contrrio do que acontece na atualidade, no ser solucionada utilizando-se da opresso ou da coao social. A superao da violncia urbana possvel com a superao desta mesma relao existente na base que lhe d origem, ou seja, da relao entre opresso e explorao.

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unidAde F

A sociologiA contemporneA: um olhAr AcercA dA inFnciAEm que a Sociologia pode contribuir para a infncia? O que infncia? A infncia sempre ocorreu da mesma forma? Todas as crianas tm inFnCia? Essas e outras questes sero trabalhadas na unidade que seguesAibA mAis O texto referente Sociologia da Infncia foi escrito a trs mos e j foi publicado previamente na revista http://www.revistas. udesc.br/index.php/linhas/article/ viewFile/1394/1191 assim e agradeo as colegas Professora Valeska Fortes de Oliveira e Claudia Terra do Nascimento por permitirem que nosso texto fosse incorporado a esse material

F1 A origem do conceito de inFnciA: introduzindo

Figura 21

De certo modo, demorou para que as Cincias Sociais e Humanas focassem a criana e a infncia como objetos centrais de suas pesquisas Demorou mais tempo ainda para que as pesquisas considerassem em suas anlises as relaes entre sociedade, infncia e escola, entendendo a criana como sujeito histrico e de direitos, tendo como eixo de suas investigaes o registro das falas das crianas. A busca pela interpretao das representaes infantis de mundo objeto de estudo relativamente novo, que vem objetivando entender o complexo e multifacetado processo de construo social da infncia e o papel que a escola vem desempenhando diante desta inveno da modernidade. Nesta direo, como afirmado anteriormente, os estudos so raros, ainda mais no Brasil (CORSARO, 2003) A anlise da produo existente sobre a histria da infncia permite afirmar que a preocupao com a criana encontra-se presente somente a partir do sculo XIX, tanto no Brasil como em outros lugares do mundo No entanto, mesmo a infncia constituindo-se em um problema social desde o sculo XIX, ainda no foi suficiente para torn-la um problema de investigao cientfica. Estudos apontam que, at o incio da dcada de sessenta, a histria da infncia e a histria da educao pareciam ser dois campos distintos e inconciliveis de pesquisa (ARIS, 1973)

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Com a publicao, na Frana, em 1960 e nos Estados Unidos, em 1962, do livro de Aris (1973) sobre a Histria social da infncia e da famlia, e na dcada seguinte, em 1974, acrescida da publicao do texto de De Mause (1991) sobre A evoluo da infncia, os historiadores da educao, principalmente os norte-americanos, encontravamse no processo de reconstruir a definio precisa de seu campo. No entanto, at este perodo, poucos historiadores haviam manifestado algum interesse pelo tema da infncia ou o tinham colocado como objetivo de suas pesquisas Somente uns poucos tentaram conhecer melhor a histria da infncia Mas, para Aris (1973) e De Mause (1991), a histria da infncia e as questes da aprendizagem humana j estavam relacionadas conceitual e socialmente Ambos os autores supracitados enfatizaram a simultaneidade no tempo do descobrimento ou reconhecimento da infncia moderna e da apario de instituies protetoras para cuidar e formar a gerao mais jovem.

Figura 22

A falta de uma histria da infncia e seu registro historiogrfico tardio so um indcio da incapacidade por parte do adulto de ver a criana em sua perspectiva histrica. Somente nos ltimos anos o campo historiogrfico rompeu com as rgidas regras da investigao tradicional, institucional e poltica, para abordar temas e problemas vinculados histria social (Aris, 1973). Narodowski (1993), aps ter realizado um trabalho indito, centrando suas anlises na relao entre infncia, poder e pedagogia, resultando em sua tese de doutoramento publicada sob o ttulo Infncia e poder: la conformacin de la pedagoga moderna, identifica um ncleo de consenso entre os historiadores acerca da definio de infncia Para o referido autor, a infncia um fenmeno histrico e no meramente natural, e as caractersticas desta no ocidente moderno podem ser esquematicamente delineadas a partir da heteronomia, da dependncia e da obedincia ao adulto em troca de proteo. Aceitando-se a tese de Aris (1973), preciso aceitar que a infncia, tal qual entendida hoje, resulta inexistente antes do sculo XVI

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A vida era relativamente igual para todas as idades, ou seja, no havia muitos estgios, e os que existiam no eram to claramente demarcados. Por exemplo, as crianas tinham muito menos poder do que atualmente tm em relao aos adultos. Provavelmente ficavam mais expostas violncia dos mais velhos (Aris, 1973). Tinham um dficit de poder sobre seus corpos. Inversamente, algumas pouqussimas crianas podiam ter um poder imenso, como Luiz XVI, rei da Frana, a ponto de ser tratado como adulto por seus criados e cortesos Tambm havia o caso de pessoas que no conseguiam durante a vida toda sair da infncia, como os escravos No sul dos Estados Unidos, escravos eram tratados igual aos meninos, come here, boy, assim eram conhecidos. Classificados como dependentes e tidos por seres inferiores, conforme nos conta Levin (1997)

Figura 23

Obviamente, isto no significa negar a existncia biolgica destes indivduos. Significa, em realidade, reconhecer que, antes do sculo XVI, a conscincia social no admite a existncia autnoma da infncia como uma categoria diferenciada do gnero humano. Passado o estrito perodo de dependncia fsica da me, esses indivduos se incorporavam plenamente ao mundo dos adultos (Levin, 1997) Utilizando uma fonte to heterodoxa como a arte da poca, Aris (1973) demonstra a existncia da infncia como categoria autnoma diferenciada somente depois de um processo, que pode ser caracterizado como devoluo nos sentimentos, ocorridos entre os sculos XVI e XVIII O retrato de famlia predominante na arte do sculo XVIII mostra estes sujeitos, antes inexistentes, formando parte do centro do mundo familiar A histria posterior permitir afirmar que a infncia pagar um preo muito alto por esta nova centralidade social: a incapacidade plena (social e, mais tarde, tambm jurdica) e, no melhor dos casos, converter-se em objeto de proteo-represso. Estas so suas caractersticas mais significativas.

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Figura 24

Figura 25

Durante a Idade Mdia, antes da escolarizao das crianas, estas e os adultos compartilhavam os mesmos lugares e as mesmas situaes, fossem eles domsticos, de trabalho ou de festa. Na sociedade medieval, no havia a diviso de territrios e de atividades em funo da idade dos indivduos, no havia o sentimento de infncia ou uma representao elaborada dessa fase da vida (Aris, 1973). Assim, foi durante o sculo XVII que se generalizou o hbito de pintar nos objetos e na moblia uma data solene para a famlia Pode-se afirmar que foi na Idade Mdia que as Idades da Vida comearam a ter importncia. Durante a Idade Mdia, ento, existiam seis etapas de vida. As trs primeiras, que correspondem a 1a idade (nascimento / 7 anos), 2a idade (7 / 14 anos) e 3a idade (14 - 21 anos), eram etapas no valorizadas pela sociedade Somente a partir da 4a idade, a juventude (21 - 45 anos), as pessoas comeavam a ser reconhecidas socialmente. Ainda existiam a 5a idade (a senectude), considerando a pessoa que no era velha, mas que j tinha passado da juventude; e a 6a idade (a velhice), dos 60 anos em diante at a morte Tais etapas alimentavam, desde esta poca, a ideia de uma vida dividida em fases (Aris, 1973)

F2 o conceito de inFnciA nos sculos xix e xxNa Idade Moderna, Descartes (2005) d origem a um novo tipo de pensamento, que revoluciona a histria da infncia Passam a ser analisadas, com existncias separadas, uma fisiologia para o corpo e uma teoria de paixes para a alma. a alma que d ordem ao corpo e comanda seus movimentos Com Descartes, ento, ocorreu a supervalorizao de dualismos, fortalecendo a viso positivista de conceber o mundo e o prprio homem (Levin, 1997)

sAibA mAis Quer aprofundar, veja: http://web.letras.up.pt/7clbheporto/ trabalhos_finais/eixo3/IC2018.pdf ou: http://redalyc.uaemex.mx/ pdf/263/26303702.pdf

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Em meio a este dualismo, surge, no sculo XVII, nas classes dominantes, a primeira concepo real de infncia, a partir da observao dos movimentos de dependncia das crianas muito pequenas O adulto passou, ento, pouco a pouco a preocupar-se com a criana, como ser dependente e fraco, fato este, que ligou este etapa da vida ideia de proteo, de acordo com Levin (1997). S ultrapassava esta fase da vida quem sasse da dependncia, ou pelo menos dos graus mais baixos de dependncia, e a palavra infncia passou a designar a primeira idade de vida: a idade da necessidade de proteo, que perdura at os dias de hoje. Pode-se perceber, portanto, que, at o sculo XVII, a cincia desconhecia a infncia. Isto se dava porque no havia lugar para as crianas nesta sociedade, fato caracterizado pela inexistncia de uma expresso particular a elas. Foi, ento, a partir das ideias de proteo, amparo, dependncia, que surge a infncia. As crianas, vistas apenas como seres biolgicos, necessitavam de grandes cuidados e, tambm, de uma rgida disciplina, a fim de transform-las em adultos socialmente aceitos (Levin, 1997). Nesse contexto, pode-se perceber que a criana era tida como irracional e, portanto, incapaz de movimentar-se com sobriedade e com coerncia no mundo. Observa-se, ento, que a primeira preocupao com a infncia ligou-se disciplina e difuso da cultura existente, limitando todo e qualquer movimento infantil destinado ao prazer e ao aprendizado. A criana, tida como irracional, no teria meios psicolgicos para realiz-los, bem como deixaria de aproveitar tal momento para aprender atitudes socialmente valorizadas, como nos aponta De Mause (1991) Passou-se, ento, a submeter o corpo da criana de vrias formas, o que, na poca, era considerado necessrio para evitar os seus movimentos, bem como para exercer um controle efetivo sobre o pequeno ser Assim, durante muito tempo, o nico caminho existente foi uma rgida disciplina infantil. Para exemplificar, utilizar-se- um provrbio da poca, que diz:Quem no usa a vara, odeia seu filho. Com mais amor e temor castiga o pai ao filho mais querido. Assim como uma espora aguada faz o cavalo correr, tambm uma vara faz a criana aprender (Levin, 1997, p. 230).

Porm, atravs de Rousseau (1995), considerado um dos primeiros pedagogos da Histria, a criana comeou a ser vista de maneira diferenciada do que at ento existia Rousseau (1995) props uma educao infantil sem juzes, sem prises e sem exrcitos. A partir da Revoluo Francesa, em 1789, modificou-se a funo do Estado e, com isso, a responsabilidade para com a criana e o interesse por ela Segundo Levin (1997), os governos comearam a se preocupar com o bem-estar e com a educao das crianas (p. 254).

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Embora indiferente aos ideais democrticos tributrios dos princpios de liberdade, igualdade e fraternidade promulgadas pela Revoluo Francesa, bem como contrrio necessidade de respeitar os elementos constitutivos do ser criana, tal como os concebemos hoje, Durkhein (1978), foi quem primeiro buscou tecer os fios da infncia aos fios da escola com objetivos de moralizar e disciplinar a criana. Segundo Durkhein (1978,), a criana, alm de questionadora, passa de uma impresso para outra, de um sentimento para outro, de uma ocupao para outra, com a mais extraordinria rapidez. Seu humor no tem nada de fixo: a clera nasce e aquieta-se com a mesma instantaneidade; as lgrimas sucedem-se ao riso, a simpatia ao dio, ou inversamente, sem razo objetiva ou sob a influncia da circunstncia mais tnue. Para controlar os humores endoidecidos das crianas, Durkhein (1978) props trs elementos fundamentais para desenvolver a educao moral das novas geraes, que devero ser capazes de adequar-se s regras do jogo social, poltico e econmico. Portanto, educar a criana passa a significar moraliz-la no sentido de inscrever na subjetividade desta os trs elementos da moralidade Explica o referido autor que educar inscrever na subjetividade da criana os trs elementos da moralidade: o esprito de disciplina (graas ao qual a criana adquire o gosto da vida regular, repetitiva, e o gosto da obedincia autoridade); o esprito de abnegao (adquirindo o gosto de sacrificar-se aos ideais coletivos) e a autonomia da vontade (sinnimo de submisso esclarecida) (Durkhein, 1978)

F3 o conceito de inFnciA contemporneoApenas com a institucionalizao da escola que o conceito de infncia comea lentamente a ser alterado, atravs da escolarizao das crianas. Podemos, ento, a partir do desenvolvimento de uma pedagogia para as crianas, falar em uma construo social da infncia (CORSARO, 2003) Em nosso tempo, as geraes vivem segmentadas em espaos exclusivos Na sociedade contempornea, facilmente constatamos a separao das faixas de idade. Crianas, adolescentes, adultos jovens e adultos velhos ocupam reas reservadas, como creches, escolas, oficinas, escritrios, asilos, locais de lazer, etc. A exceo se d na famlia Sem dvida, no contexto familiar que ocorrem mais frequentemente os encontros entre as geraes, ao menos por proximidade fsica, j que em muitas prevalece o distanciamento afetivo Por isso, a qualidade dessas relaes tem sido alvo de muitas discusses entre especialistas. A eficcia da famlia como instncia formadora de novos cidados tem sido muito criticada nos ltimos anos Principalmente as dificuldades da relao entre pais e filhos tm se caracterizado como o mais emblemtico tipo de conflito de geraes (ADATTO, 1998).

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Para alm das determinaes naturais, as culturas humanas produziram e prosseguem produzindo significaes para cada uma das etapas da existncia do homem. Regras de conduta so institucionalizadas para as diferentes fases da vida e so expressas atravs do desempenho de papis sociais Podemos, pois, considerar que as geraes so socialmente construdas. A construo social da infncia se concretiza pelo estabelecimento de valores morais e expectativas de conduta para ela. Podemos falar de uma inveno social da infncia a partir do sculo XVIII, em que h uma fundao de um estatuto para essa faixa etria, assim como a inveno da adolescncia no fim do sculo XIX (CORSARO, 2003). As crianas, atualmente escolarizadas logo cedo, como coloca Dolto (1993), e muitas, inclusive, desde os primeiros meses, passam todo o dia em creches ou em instituies assemelhadas, porque pais e mes trabalham durante todo o perodo Na falta destes ou por outros motivos, inmeras vivem permanentemente internadas em estabelecimentos especializados Embora nesses locais haja contato com adultos, esses so poucos e a esto principalmente para delas cuidar, fato que estabelece uma convivncia restrita e restritiva, porque marcada por papis bem definidos. Menos que amigos, esses adultos so cuidadores, so autoridades A passagem de uma sociedade agrria para uma sociedade industrializada caracterizou-se por importantes alteraes no grupamento familiar Nas sociedades baseadas na agricultura, a estrutura das chamadas famlias extensas era compatvel com a necessidade de mo de obra para a lavoura de subsistncia. Nesse tipo de famlia, contava-se com a convivncia de at quatro geraes, desde o bisneto at o bisav, alm da presena de parentes laterais e outros agregados J a famlia tpica da sociedade industrial a famlia nuclear, composta de um casal e poucos filhos, quando existem. Mas tanto o contingente de casais separados quanto o de solteiros que vivem sozinhos tambm considerado A necessidade de geis deslocamentos de mo de obra indstria e exiguidade de espaos nas grandes cidades tm determinado esse encolhimento do grupo familiar. Essas mudanas na estrutura da famlia tm contribudo para um maior distanciamento entre as geraes (LEVIN, 1997; TUCKER, 1991). Assim, a criana, j neste sculo, viu-se integrada em uma noo de desenvolvimento, a qual passou a mostr-la como um ser cujo crescimento um desdobrar-se numa sucesso de fases intelectuais e emocionais A questo primordial, diante desta anlise, relata o fato de que, em nenhum destes momentos, houve uma real preocupao em perceber e/ou estudar verdadeiramente as relaes entre o ser corporal e sua espacialidade e temporalidade Este fato esvaziou o sentido e o significado da infncia, assim como afirma De Mause (1991).

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Todo o dinamismo existente nas relaes do sujeito no mundo foi, ao longo da histria, deixado de lado Ainda que Sartre (1997), a partir de seu pensamento eu existo em meu corpo, tenha dado a este a dimenso fundamental do homem, porque justamente o corpo quem confirma a sua existncia, a corporalidade humana no foi devidamente valorizada. A preservao da famlia como algo privado, parte da vida social, uma ideia tipicamente burguesa, com o prprio desenvolvimento de noes modernas, como, por exemplo, o individualismo. A vida profissional e a vida familiar abafaram essa outra atividade, que outrora invadia toda a vida: a atividade das relaes sociais. Assim, na atualidade, a escola, embora por muito tempo ignorasse as diferenciaes de idade, concentra-se na disciplina, que tem uma origem religiosa e extremamente rgida Esse aspecto moral e de vigilncia ainda curiosamente responsvel pelo direcionamento das escolas (bem exemplificadas pelos internatos e liceus do sculo XIX) questo dos jovens e crianas. preciso lembrar, contudo, que esse no um fenmeno generalizado: enquanto alguns tm sua infncia delimitada pelo ciclo escolar, outros ainda se transformam em adultos sem ter condies para isso (crianas de rua, trabalho infantil, etc.). Para muito alm das questes escolares, especialistas em crianas e vida familiar perguntam se as mudanas no modo como os adultos contemporneos trabalham, vivem e recebem informaes no estariam transformando a infncia em algo obsoleto, numa relquia cultural antiquada As fronteiras entre a infncia e a fase adulta esto cada vez mais tnues, disse Adatto (1998, p. 5), diretor do Programa de Estudos da Criana na Universidade de Harvard:Estamos obcecados por crianas, mas isto no significa que estejamos preservando a noo de infncia. Estamos obcecados porque as barreiras entre a infncia e a idade adulta esto sendo rompidas, e no sabemos ao certo onde isto leva

Infncia um conceito cultural tanto quanto biolgico Em seu livro, Aris (1978) mostra que a arte medieval, at o sculo XII, no usou crianas como modelo. Na maior parte da histria, crianas com mais de sete anos foram tratadas como pequenos adultos Vestiam-se como eles, faziam os mesmos trabalhos e ingressavam na comunidade sexual dos adultos quando tinham idade inferior dos garotos e garotas de hoje. Mesmo nos Estados Unidos, a idade exigida para o consentimento de relaes sexuais ficava abaixo dos dez anos, at o fim do sculo XIX, conforme Feher (1992). Aris (1978) afirmou que a noo sobre um perodo de inocncia infantil se firmou pela primeira vez com o Iluminismo do sculo XVIII. Ele provavelmente chegou ao apogeu, nos Estados Unidos, no incio do sculo XX. Leis sobre o trabalho infantil, instruo obrigatria para todos e um sistema judicial para criminalidade juvenil defini-

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ram o modo como as crianas eram diferentes dos adultos e deviam ser tratadas de acordo com sua condio. Agora, grande parte disso parece estar desagregando-se Diante da epidemia de crack dos anos 80 e dos horrores cometidos por crianas, como os tiroteios em escolas em Jonesboro (Arkansas), Pearl (Mississippi) e Paducah (Kentucky), Estados americanos desmontam os sistemas de Justia para crianas e adolescentes num ritmo frentico (Adatto, 1998). Recentemente, quando Hurst (1998), diretor do Centro Nacional de Justia Juvenil, pesquisou a histria dos programas de Justia para a infncia, deu o seguinte ttulo ao seu relatrio: Tribunal Juvenil aos 100 Anos de Vida: O Fim do Otimismo Hurst (1998) destacou que, no final de 1996, foram aprovadas leis que autorizam a abertura de processo ou o julgamento de jovens de 14 anos como se fossem adultos Fizemos uma evidente mudana de rumo e procuramos agir como se, em matria de criminalidade, a infncia no existisse, opinou. Tambm Adatto (1998), estudando e examinando fotos de crianas americanas, afirma que houve marcante evoluo. At os anos 60, elas renderam homenagem inocncia infantil. Esta foi substituda por imagens de modelos infantis sempre mais jovens em anncios de produtos de forte carga sexual. Em funo da melhor nutrio e assistncia mdica, as crianas crescem mais rpido e entram em contato com as verdades do mundo em um ritmo mais acelerado Antes, os pais podiam controlar o que as crianas deviam ver e conhecer. Agora, com a televiso e as crianas do segundo ano usando a Internet, isso quase impossvel. Coontz (1997), afirma que, durante grande parte da histria, as crianas no foram excludas dos conhecimentos e da participao no mundo dos adultos. Depois, foram excludas de ambos Agora, tentamos exclu-las da participao, mas no conseguimos exclu-las dos conhecimentos, situao muito mais anormal. E, medida que mais mulheres trocam o lar pelo trabalho, a guardi da separao entre a idade adulta e a infncia tem cada vez menos condies de cumprir seu papel. J Postman (1999) argumenta que, perdendo a infncia, a sociedade corre um risco. Muitos psiclogos acham que a noo de moralidade depende da miscelnea de atividades da infncia Mas, se no existe opinio unnime sobre o que a infncia deve ser, todos concordam que mudanas importantes esto acontecendo. No conseguimos recolocar o gnio na garrafa ou recriar a infncia como ela foi; o que podemos fazer identificar as mudanas, explorar suas melhores facetas e controlar as piores, disse Fass (1998), professora da Universidade da Califrnia, que organizou uma antologia sobre a infncia nos Estados Unidos.

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F4 por umA sociologiA dA inFnciA

Figura 26

As pesquisas sobre a infncia, na atualidade, vm se organizando em uma perspectiva de estudo, designada Sociologia da infncia. Esta, embora muito recente em termos de produo e de constituio como rea de estudos e pesquisas, iniciou-se na Frana e na Inglaterra, atravs dos estudos de Sirota (2001) e Montandon (2001), respectivamente Independentemente da corrente, Mauss (1996) afirma que a constituio de uma sociologia da infncia deveu-se, principalmente, oposio concepo de infncia como simples objeto passivo de uma socializao regida por instituies e por adultos. Esse movimento geral da sociologia, seja ela de lngua francesa seja inglesa, que se volta para o ator e para os processos de socializao; a redescoberta de uma sociologia interacionista A viso da infncia como uma construo social foi iniciada pelo trabalho de Aris, a partir do qual um grande nmero de trabalhos comeou a surgir. Na dcada de 80, para Sirota (2001), o que havia de mais urgente era a prpria consolidao da sociologia da infncia, debate que ela mesma iniciou naquela dcada, focalizando a produo em lngua francesa A infncia, como objeto de pesquisa, resultou da constatao de carncias e fragmentao do objeto. J em relao concepo de infncia, a autora coloca que tanto na sociologia geral quanto na sociologia da educao, o que se teve foi uma concepo durkheimiana de infncia, considerando a criana um receptculo da vida adulta, um vir a ser A referida autora considera ainda a necessidade de um afastamento da concepo de infncia durkheimiana, pois trata-se de romper a cegueira das cincias sociais para acabar com o paradoxo

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da ausncia das crianas na anlise cientfica da dinmica social com relao a seu ressurgimento nas prticas e no imaginrio social (Sirota, 2001, p. 11). Opondo-se a essa concepo de infncia, considerada como simples objeto passivo da socializao adulta, prope a configurao de uma sociologia da infncia. Nas palavras de Demartini (2001), o desafio de levar a srio a criana, rompendo com a sociologia clssica (p. 3).

Figura 27

A outra grande corrente fundadora dos estudos da sociologia da infncia tem como grande representante Montandon (2001), que prope a emergncia da uma sociologia da infncia, porm, a partir da investigao do ofcio de criana. Parte da perspectiva da infncia como uma construo social especfica, com uma cultura prpria e que, portanto, merece ser considerada nos seus traos especficos (Demartini, 2001, p. 3). Montandon (2001) apresenta, em seus estudos, uma ruptura com as abordagens clssicas da socializao infantil e adota a concepo das crianas como atores. A referida autora deteve-se com afinco, em sua obra, na verificao das instituies (escolas e instituies sociais em geral) e seu papel social, buscando conhecer a influncia delas sobre as crianas. Parte da premissa de que preciso uma tomada de conscincia pelo interesse por uma sociologia da infncia, atravs de pesquisas que deem voz s crianas.

Figura 28

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Assim, num primeiro momento, a sociologia da infncia se mostra caracterizada por seu paralelismo, entre a esfera de lngua francesa e a de lngua inglesa. Sociologia da educao e sociologia da infncia aparecem, na esfera de lngua inglesa, como se constitudas de maneira autnoma, ao contrrio da sociologia da educao de lngua francesa, de onde, sobretudo, saram os socilogos que trabalham sobre a infncia (Sirot