sociedade de antropologia estudos de antropologia

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SOCIEDADE DE ANTROPOLOGIA ESTUDOS DE ANTROPOLOGIA ORGÃO DE DIVULGAÇÃO DA S.A.M.G. SOB A RESPONSBILIDADE DE SUA DIRETORIA PRESIDENTE – Paulo Apgaua SECRETARIO – Marcos Magalhães Rubinger TESOREIRO – Alfredo Rondon Castro REDAÇÃO E ADMINISTRAÇÃO – Rua Piumhy, 119 Belo Horizonte Minas Gerais Brasil Belo Horizonte – 1962

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Page 1: SOCIEDADE DE ANTROPOLOGIA ESTUDOS DE ANTROPOLOGIA

SOCIEDADE DE ANTROPOLOGIA

ESTUDOS DE ANTROPOLOGIA

ORGÃO DE DIVULGAÇÃODA S.A.M.G.

SOB A RESPONSBILIDADE DE SUADIRETORIA

PRESIDENTE – Paulo Apgaua

SECRETARIO – Marcos Magalhães Rubinger

TESOREIRO – Alfredo Rondon Castro

REDAÇÃO EADMINISTRAÇÃO – Rua Piumhy, 119

Belo HorizonteMinas Gerais

Brasil

Belo Horizonte – 1962

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ESTRUTURA DA SOCIEDADE DE ANTROPOLOGIA DE

MINAS GERAIS E MUSEU

1) Belo Horizonte – Minas Gerais – Brasil.

2) Museu e sede da Sociedade: Rua Piumhy, 119 – tel. 4-4016

Transporte: Ônibus elétrico ou lotação Cruzeiro3) O pessoal é o da própria Sociedade de Antropologia de Minas Gerais.Presidente: Paulo Apgaua Paulo GuilhermeSecretário: Marcos Magalhães RubingerTesoureiro: Alfredo Rondon CastroCargos Técnicos:Antropologia Física, Cultural e Social: Marcos Magalhães RubingerLingüistica: Paulo Apgaua e Moacyr VasconcellosPsicologia e História Natural: Carlos Antônio JunqueiraGeografia Humana: Sigefredo Marques SoaresCiências Econômicas: Antônio Vieira Gutierrez, Alfredo Rondon Castro e José CoelhoBastosDesenho Acadêmico e Técnico: Joaquim Paulo GuilhermeColaboradores: Guilherme Antônio Vivacqua (Sociologia e Antropologia Cultural),Naftale Katz (Antropologia Física ou Biologia), E. Salle Cunha (Antropologia Física ouBiologia), Hélio Diniz Gomes (Antropologia Física ou Biologia), Mário MattosoSilveira (psicologia), Elzio F. Dolabella (Geografia), Pe. Angelo Venturelli(Antropologia Cultural ou Social), Nilo Oliveira Veloso (Antropologia Cultural),General Renato Rodrigues Ribas (Antropologia Cultural) e outros.Observação: Todas as funções são atualmente gratuitas.

4) VISITAÇÃO:Aos domingos, de 8 às 17 horasEntrada gratuita.

5) ESTATUTO: O Museu pertence à Sociedade de Antropologia de Minas Gerais, queé uma sociedade civil, de direito privado, constituída sem o objetivo de lucro, por prazodeterminado, administrada por diretoria de 3 (três) membros, eleita em AssembléiaGeral, conforme o contrato social, registrado sob o nº 1.415, no livro A-2, em26/05/1958, no Cartório Cível de Pessoas Jurídicas, da Comarca de Belo Horizonte,tendo por finalidade:a) Estudar as questões de Antropologia em geral,b) Promover e realiza pesquisas, congressos, conferências, excursões, cursos, tudo o

mais que disser respeito às investigações de caráter antropológicos, ou à divulgaçãode conhecimento sobre a matéria atinente à Antropologia

c) Compor e editar obras nacionais ou estrangeiras que forem reputadas de excepcionalvalor e relevante interesse para o aprimoramento cultural do povo brasileiro

d) Estudar e pesquisar tudo que disser respeito à cultural, especialmente, comunidadesem geral, costumes indígenas, inscrições rupestres, folclore e outros assuntoscorrelatos.

No 1º Festival Nacional do Índio por conveniência do local foi feita uma exposição deartefatos indígenas, em vitrine no centro da cidade, tendo sido feito um cálculo de umavisitação média provável de 5.000 (cinco mil) pessoas por dia, durante uma semana.Além disso, tem havido visitas na própria sede, de pessoas interessadas no assunto. Noque diz respeito a orçamento, não há base para apreciação quanto à receita e despesa,

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portanto o pessoal que cuida do Museu não é remunerado, pois trabalha em caráter decolaboração. A instalação da Sociedade se fez mediante de doações de móveis eutensílios. Não há despesas com aluguel e nem há verbas para conservação da sede, dascoleções, pesquisas ou viagens de estudo, que são realizadas mediante gastosparticulares dos sócios e interessados.

6) HISTÓRICO: O Museu da Sociedade Antropologia de Minas Gerais foi criado nodia 1º de maio de 1958, com a doação de uma coleção particular do sócio MarcosMagalhães Rubinger, que vinha coletando material desde 1947 e estava localizada àRua Alagoas, 851, compreendendo os setores de antropologia, etnologia, mineralogia,paleontologia, etc. Depois de sua criação, as coleções do Museu têm sido acrescidas dedoações constantes. A Sociedade de Antropologia de Minas Gerais está situada emsalão independente no andar térreo do prédio, cujo endereço foi indicado, depropriedade do sócio Paulo Apgaua, tendo sido a respectiva planta e construção feitaspelo Dr. José Christo Horta, Engenheiro Civil, residente e domiciliado nesta cidade.7) O Museu tem a finalidade de fornecer aso sócios e pessoas interessadas materialpara estudo, cursos e ilustrações de palestras e conferências. Natureza das coleções:a) Antropologia, etnologia, e arqueologia: 70% das peças do Estado de Minas Gerais;

30% de outros Estados do Brasil;b) Paleontologia: 90% da região de Lagoa Santa e 10% de outras regiõesc) Mineralogia: 70% do Estado de Minas Gerais e 30% de outros Estados. E outras

peças enquadráveis noutras classificações.

Peças raras no Museu: cerâmica (pote), adornada, dos índios Guaranis, do norte doEstado do Paraná; machado de pedra procedentes do Estado de Minas Gerais, Paraná eMaranhão, cachimbo de barro dos índios que habitaram a região da Serra do Cipó;minérios raros, tais como: de urânio, tório, zinco, cobre, níquel; fotografias e cópias depinturas rupestres inéditas, de diversas regiões; cocares, bordunas e flechas, artefatos dearte plumária; reprodução em cerâmica do pitecantropo; vestimentas incas; esqueletohumano, etc.

8) PUBLICIDADE: A Sociedade tem publicado artigos em jornais de Belo Horizonte,bem como trabalhos particulares, por iniciativa dos sócios. Contudo existem trabalhos jápreparados, para serem publicados, quando houver verbas suficientes para editá-los.

9) VISITAS GUIADAS: O Museu da Sociedade tem sido objeto de vistas por parte deintelectuais e de estudantes, sendo de assinalar-se o comparecimento das turmas do 4ºano primário do Grupo Escolar “Barrão do Rio Branco”, situado no mesmo bairro, sob aorientação das professoras D. Wanda Marilia Rocha e Lydia Monteiro. Nestas ocasiões,são prestadas informações e esclarecimentos, durante duas horas, por pessoa daSociedade de Antropologia de Minas Gerais. Por ocasião do 1º Festival do Índio, aSociedade Antropologia de Minas Gerais, em conseqüência do êxito de sua exposição,foi visitada por várias pessoas credenciadas no assunto, salientando as visitas do agenteda Viação Aérea de São Paulo (VASP), Sr. Adalberto Veloso; e mais a do Sr. PadreÂngelo Jayme Venturelli, S.D.B., organizador do Museu “Dom Bosco”, de CampoGrande, Mato Grosso, o qual esteve na sede da Sociedade durante várias horas, tendorecebido livros especializados em assuntos de fonética e lingüistica, fornecendo de suaparte fotografias dos índios Bororos. A exposição foi divulgada por iniciativaespontânea dos Diários Associados, em jornal e televisão, com longo noticiárioilustrado. Após o aludido Festival, a Sociedade Antropologia de Minas Gerais recebeuas visitas do Sr. Paulo Naves, do Serviço de Relações Públicas do Banco da Lavoura edo Sr. Geraldo Pitaguary, do S.P.I., que solicitaram empréstimos de peças do Museu,para efeito de exposição patrocinada por aquele Banco, a saber: quatro pares de brincos,

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uma borduna e um bastão de cerimonial, dez flechas, uma lança e um arco, de índiosCarajá; um enfeite de cabeça de índios Mujetire; um cocar de índios do Maranhão; doiscartazes com fotografias e letreiros, elaborados por esta Sociedade.

10) O Museu possui uma biblioteca, formada de acordo com a cláusula contratual nº 8 edoações atinentes a matéria de ciências sociais. A fonoteca é especializada em línguasmodernas (inglês, russo, italiano, sueca, hebraico, japonês, espanhol).

11) Os jornais “Diário de Minas” e “Diário da Tarde”, “Informador Comercial”,“Binômio”, etc. têm publicado notícias diversas sobre a Sociedade de Antropologia deMinas Gerais e o Museu.

12) Recentemente a S.A.M.G. vem sendo visitada com mais freqüência, fato querelaciona com a aceleração do desenvolvimento do País, que implica numa necessidadede melhor conhecer os problemas da cultura brasileira. Dentre muitas pessoas do nossomeio social ressaltamos a presenças das seguintes: Professor E. Salles Cunha, daUniversidade do Brasil; Padre Ângelo Venturelli, do Museu “Dom Bosco”, de CampoGrande, Mato Grosso; Dr. Alarico José Torres, indigenista; Padres Francisco A. Corrêae Ralitian Moses Salama; Dr. Ataulfo da Costa Ribeiro, psiquiatra; Dr. Jair LeonardoLopes, Diretor do Conselho Nacional de Economia; Jorge de Souza Lima, doDepartamento de Medicina Legal; Sra. Maria Lydia Goulart Cordeiro de Farias;Professor Elzio Dolabella, da Faculdade de Filosofia da U.F.M.G; Professor NiloOliveira Velloso, Diretor do Museu do Índio; Deputado Waldomiro Lobo; alunos dogrupo escolar “Barão do Rio Branco” (todos os alunos); Professora Lydia Monteiro,Wanda Marilia Rocha e outras; Professor Hélio Diniz Gomes; Guilherme Bruzzi,indigenista; Max P. Nascimento; Mário Matoso Silveira, psicólogo; General Renato R.Ribas; Dr. Roberto Otávio Gonçalves; Dr. Djalma Teixeira de Oliveira, psiquiatra; etc.

13) A S.A.M.G. tem recebido publicações das seguintes entidades:

Faculdade de Ciências Econômicas; Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais;Associação Soviética de Amizade e Cooperação Cultural com os Países da AméricaLatina; Confederação Nacional do Comércio e Administração Nacional do ServiçoSocial do Comércio; Associação Comercial de Minas Gerais etc.

14) Aos domingos a Sociedade promove Seminários de Antropologia e outras CiênciasSociais. Finalmente, este ano, juntamente com a Academia de Ciências de MinasGerais, a S.A.M.G. realizou uma exposição de arqueologia nos salões da CulturaInglesa.

PINTURAS RUPESTRES DA LAPA DA SICUPIRA NA SERRA DO CIPÓ

PAULO APGAUA

1. Os desenhos e símbolos gráficos existentes nesta pedra demonstram que os seusautores já estavam ultrapassando a fase puramente pictográfica da escrita paraatingir a representação do pensamento por meio de elementos estilizados, comcaracterísticas próprias, embora sem caráter fonético.

2. São notórios os exemplos que comprovam esta afirmação nossa; em especial,podemos apontar a série de pequenos traços, com perfeito lineamento que, à alturade uma pessoa, foi feita ao longo do paredão, num trecho de quase cem metros.Noutros desenhos, verificamos a subdivisão, intencional e variada, de círculos eretângulos, a qual, tantas vezes repetida em padrões semelhantes, outro sentido não

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pode ter senão o de autêntico simbolismo gráfico, subordinado a um sistemapeculiar de estilização. Isto se verifica em vários pontos da superfície da pedreira.

3. O grau evolutivo desta escrita não aprece ter atingido o fonetismo, que abrange osprincípios do rebus, do silabismo, do consonantismo e da literalidade, porque severifica uma certa inconstância e confusão nas tentativas de seguimento linear, oque nos leva a acreditar que não chegaram os autores desta escrita a registrarpalavras isoladas, mediante bloco de sinais semelhantes.

4. A escrita, como tem sido verificada em todos os exemplos clássicos, oferece, noperíodo do fonetismo, um aspecto de regularidade gráfica, uma ordenação em pautaideal, uma evidente freqüência de determinados desenhos. Tais elementos não seobservam no presente caso.

5. Não há, presentemente, um meio de saber-se a origem do grupo humano autordesses desenhos. Evidentemente, tratava-se de um povo que vivia na região já hábastante tempo quando fez os desenhos, pois há inúmeros casos de superposiçãorecente sobre os sinais antigos. As figuras dos animais comuns nos arredores, estãobem feitas e se prestam facilmente à identificação. Nada indica, porém, umacorrente cultural típica, estendendo-se a outras partes do País, dado o seu grau deespecificidade.

6. Ainda não foram copiados todos os desenhos, que são em grande quantidade. Otrabalho, difícil por sua natureza, mais difícil se torna em conseqüência dasconstantes investidas das abelhas, das quais há muitas colméias nas pedreiras.

7. Nossas observações dizem respeito à técnica da escrita propriamente dita.

LINGUAGEM, CONFORME “MERINGER”

PAULO APGAUA

Palestra em 11/05/1958

I. PARTE PSÍCO – FÍSICA

1. Pontos-de-vista:

a) De quem escuta: Impressões auditivas;

b) De quem fala: Acontecimentos psíquicos – seguido de movimentos de órgãos defonação.

2. Nesses movimentos, o ar sofre choques e vibrações que produzem ruídos e sons. Oar passa por uma série de órgãos, especialmente a laringe (pomo de Adão), que pode sertotal ou parcialmente cerrada, pela aproximação ou afastamento de duas cordas elásticas(cordas vocais).Verificação: M, com a boca cerrada e R, no pomo de Adão.

3. Depois da laringe, o ar passa à faringe: São 2 caminhos: Um para o nariz e outro aboca-fechada; o primeiro pelo véu palatal e pela úvula, resta o segundo. A úvula trepidae produz o R de “rue” e “Royal” (fala parisiense). O fechamento parcial das duas viasde passagem, produz o som nasal.

4. A língua é um músculo largo, que se acha capacitado para adotar diversas formas epressionar as paredes internas da boca em vários sentidos: Fecha o véu palatal, mantém-

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se próxima dele, forma uma calha de passagem do ar, estende-se em curvaturas paracima e para baixo, comprime a ponta contra os dentes ...Verificações: “K”, “G”, “CH”, “P”, “B”, “F”.

5. Os lábios, conjugam-se com os dentes entre si, para produzir os sons de correntes dear que passam pela cavidade bucal sem achar obstáculo.

6. Natureza dos sons:

Explosivos (oclusão)Fricativos (estreitamento)Soante (cordas vocais)Surdos (os restantes)(“áfonos” ou mudos)(W = F)

7. As vogais são soantes;

8. Essa aprendizagem mais tarde se consolida com a aquisição das imagens da escrita(ótica sensorial), e do escrever (motora).

9. Não há fidelidade integral na retenção de todas as imagens pelos sentidosrespectivos.

10. As imagens particulares da linguagem interior e das capacidades que lhe estãounidas são determinantemente localizadas no cérebro. Determinadas lesões produzemdeterminados efeitos.

11. O material idiomático é ordenado em vocabulário e regras de sua utilização e seemprega em função de associações de idéias: por semelhança e por contraste.

12. Categorias da razão e categorias gramaticais:

CoisaQualidade de coisaAçãoQualidade de açãoSubstituição de coisaLigação entre coisasLigação entre açõesExpressões de emoções e sentimentos;Desinências;Terminações variáveis;Formas irregulares.

13. As línguas variam:Pela alteração e substituição dos fonemas;Por segmentos de palavras novas;Por alteração nas regras da utilização do vocabulário, por modificações desinenciais enas terminações variáveis.

14. Linguagem das crianças e dos velhos. Linguagem dos escritores.

15. Não foram encontradas as regras ou leis gerais do desenvolvimento de todos osidiomas. Apenas se descobriram leis fonéticas de casos isolados de fonemas, que têmevidente caráter descritivo. Acontecem, de fato, grandes regularidades. Não tomam,porém, o caráter de leis naturais ou leis jurídicas. Elas são mais perceptíveis nas

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palavras mais usadas. As menos usadas, no entanto, são mais facilmente regulamentadaspelos gramáticos, através de processos de integração por analogia (o latim).

16. Há passagem de uma categoria para outra, ou lenta intromissão de recursosdestinados a evitar dubiedade de sentido, nas frases. De outras vezes, influi asignificação mágica ou religiosa, porventura surgida, que converte a palavra em tabu.

a) A imitação, dentro de grupos exclusivistas, provoca a transformação de vocabuláriose intonações especiais: O aristocrata; o homem rude; o político; o professor; osacerdote etc.

17. Aí já se acham os rudimentos da dialetização no corpo de uma língua:

DialetosLínguas locaisLíngua escrita

Predominância de uma sobre as demais, decorre de particulares fundamentos literáriosou políticos.

18. Não há língua ou dialeto puro; sempre existem palavras estrangeiras,principalmente as de povos fronteiriços.

19. A Bíblia:AdãoBabelNoé: Caim (egípcios, etíopes, bérberes).SemJafet (Indo-européia).Não é cientificamente possível derivar todas as línguas de um idioma único.

20. Famílias principais:

a) Indo-européia – do Ganges à Islândiab) Indo-altaico – do Amur até a Turquiac) Malaio-polinésia – de Waigh até Madagascard) Semítica – de Babilônia a Marrocose) Camita – egípciosf) Galasg) Bérberesh) Etíopesi) Bântuj) Indochinesak) Australiana

21. Pela formação:Flexivas (nossa)Aglutinantes ( palavras sufixas)Isolantes (chinês).

22. Origem: natural, espontânea, biológica.

Específica do homem por ser articulada, não sendo exatas nem a teoria da onomatopéia,nem a do sentido próprio para determinar sons.

23. Jacob: origem místico religiosa, conupção absolutiva.Scheicher: decadênciaF. Bopp: enfermidade, mutação e amor à eufonia

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Curt: idemScherer: caráter do povo

Indo-europeu:GermânicoRomance (sardo – provençal)SlavaLituanoCélticoAlbanêsGregoInduIrânioArmênio

PALESTRA SÔBRE LINGÜÍSTICA

I. A escrita é a forma usual de representar o pensamento, de maneira permanente.Ela se realiza:a) por processos mineumônicosb) por processos ideográficosc) por processos fonéticosd) por processos mistos.

II. Tanto os processos ideográficos como os processos fonéticos são bastanterudimentares e não alcançam os seus fins com absoluta fidelidade. Isso acontece porqueaqueles são em número limitado enquanto estes são infinitos. Para que atendam, maisou menos esses fins, tais processos se valem de recursos comparativos, associações deidéias, representações por semelhança ou por oposição, sinais auxiliares, etc.

III. Os mais conhecidos dos processos mineumônicos é o quipus.- O mais generalizado dos processos ideográficos é o chinês.- O mais recente dos processos alfabéticos é o latino.- O mais científico é o internacional.

IV. A evolução da escrita tem sido, até agora, a seguinte:

a) Pictografiab) Ideográficac) Rebusd) Acrofoniae) Silabismof) Consonantismog) Alfabetismoh) Braquigrafiai) Taquigrafia

V. Em qualquer desse casos é de considerar-se que o costume do povo e aimposição dos entendimentos fixaram determinadas formas e critérios, estabelecendo ocerto e o errado: Surgiu assim a ortografia.

VI. A maneira mais simples e mais direta de entender-se os fenômenos da fala(fonação) está em analisar os processos da ortografia fonética, que se instaurou de formadefinitiva a partir do rebus, atingindo atualmente o grau mais apurado que é o sistemaalfabético.

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VII. Já nos referimos aos diversos fonemas e às suas origens, nos órgãos da fala:

ConsoantesVogaisSoantesLuminares.

VIII. Os fonemas influenciam uns sobre os outros e desta maneira se estabelece umaescala de freqüência deles e dos grupos respectivos. A ortografia tem intentadoacompanhar essa influência, mas não o tem conseguido por ser de caráteressencialmente conservador.

IX. É por isso que, fonema por fonema, podemos apresentar casos curiosíssimos:

a) Em inglês, a pronúncia de a, e, i, o, u;b) Em francês, 15 a 20 maneiras de escrever ê: ait, ais, haie, hais etc; 40 a 50 maneiras

de escrever o: au, eau, haut, oh etc.c) Em português:o como oo como ue como ee como imb, mp, mnc, ss, ç, xdf, phg, gu, ga, ge, gi, go, ghj, g,k, q, c, chl, ll, lhmn, nhp,q, k, chr, rr, rhs, z, x, ç, ct, thv, bx, chz, s, x

X. Na história da escrita o problema das vogais foi focalizado pela primeira vezentre os povos semíticos e camíticos, que instituíram o sistema de aproveitar asconsoantes para representar os sons vacálicos. As consoantes assim aproveitadas deu-seo nome de matres lectionis.

XI. A influência de uns fonemas sobre os outros dá origem aos seguintesfenômenos:

a) Assimilação de:

Vibrações: Sonora Surda

ExameDe timbre (harmonia)

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b) Dissimilação (correção do eco)c) Metátesed) Prótese.

XII. Com estes elementos é que passamos ao estudo de:

a) Sílabasb) Palavrasc) Expressões freqüentesd) Frases

XIII. Fonética: trata do modo de produção e características dos fonemas.

Fonologia: trata das relações funcionais entre os fonemas.

XIV. Estes estudos só assumiram uma feição metódica peculiar no século IV antes deCristo, com Panini, na Índia. Também os sofistas produziram considerações a respeito,embora sem metodização que lhes desse algum renome. Seguiram-se, depois na mesmaorientação os romanos e ainda os alexandrinos, patrística, lexicógrafos, dicionaristas eretóricos. (III a.C.). Na Idade Média os escolásticos. Na Renascença, os humanistas.

XV. Nomes que se integram na história da lingüistica até o século XVIII:

PaniniProdicus – Denys de HalicarnassoVarronDonatPriscienEstiermeCondillacSassettiWilliam Jones

XVI. Método histórico e comparativo (Século XIX):

SchlegelBoppGrimmZeussSchleicherBurnoufPottMax MüllerCurtiusA. MeilletSaussureGilliéronCorssenDiezGaston ParisOsthoffBrugmannHumboldtPaulWundt

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EM RESUMO:

1. A escrita que é expressão permanente ou duradoura do pensamento.2. Utiliza processo ideográficos e fonéticos, ainda deficientes;3. Sujeito a regras ortográficas, das quais:4. A mais útil, para a lingüistica tem sido a fonética;5. Em que se representam os fonemas;6. Para estudo da fonação ou faculdade de falar com intuito de representações mentais,sendo de assimilarem-se.7. As bizarrias ortográficas, as origens e representações das vogais, os fenômenosdecorrentes da influência recíproca entre fonemas,8. Os elementos fundamentais deste estudo são:

As sílabas – as expressõesAs palavras – as frases.

ANTROPOLOGIA

MARCOS MAGALHÃES RUBINGER

Que é Antropologia? Dentro de uma conceituação etimológica Antropologia é ciênciado homem (anthropos + homem; logos + ciência) Todavia, sendo o homem um serextremamente complexo, esta definição simplista pouco explica, isto porque diversasciências, também, têm o homem como objeto do conhecimento. A sociologia, apsicologia, a economia, a geografia humana, a biologia humana, a psiquiatria, a história,etc., estudam também o homem, seu comportamento ou suas atividades. Nestascondições, a Antropologia seria uma das muitas ciências que tratam do homem.Entretanto, a Antropologia é uma ciência cujo campo de estudos apresenta uma grandecomplexidade. Daí a necessidade de conceituá-la de forma mais profunda e objetiva.

Uma Antropologia legítima tem que saber que existe uma espécie humana com seusantecedentes filogenéticos senão, também, raças e culturas; não somente umaconsciência individual senão, também, uma consciência coletiva; não somente uma vidahumana, senão, também, idades de vida; só abarcando estas e outras diferenças, sóconhecendo a dinâmica de cada particularidade, e só mostrando, sempre, a presença de“um” no diverso, poderá compreender e explicar a totalidade do homem. AAntropologia tem que instalar seriamente o homem no mundo da natureza, tem quecomparar o homem com as coisas, com os seres vivos, com os demais seres conscientes,para, desta forma, poder assinalar, com segurança, seu lugar correspondente.

A verdadeira Antropologia tem que abarcar o comportamento bio-cultural e social dohomem, através de sua herança biológica, que são seus traços físicos hereditários, e desua herança social, que é o seu comportamento aprendido e traduzido em hábitos,linguagem, costumes, usos, tradições, ou, ainda, maneiras de pensar, sentir, fazer, crer.Nestas condições delineiam-se os dois grandes campos da Antropologia: o biológico e ocultural. O primeiro campo é o da Antropologia Física ou Biológica, o segundo pertenceà Antropologia Cultural ou Social.

Para Franz Boas, a Antropologia estuda comparativamente, sincrônicamente, trêsfenômenos de natureza diversa, ou seja, a raça, a linguagem e a cultura. A raça éestudada pela Raciologia ou Antropologia Racial, um dos ramos da Antropologia Física;é um fato essencialmente biológico, cujo conceito abrange o conjunto de traços físicoshereditários, que caracterizam e distinguem, entre si, os grupos humanos. A cultura é

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fato essencialmente social: designa, na conduta humana, a parte que o homem aprendeucom a convivência no grupo a que pertence; é um sistema integrado de traços decomportamento aprendido característico de uma dada sociedade, e constitui o objeto daAntropologia Cultural. Conforme o aspecto em que se estuda a linguagem, seu aparelhobiológico ou a linguagem propriamente dita, sua colaboração pode ser feita, ora naAntropologia Física, ora na Antropologia Cultural. Evidentemente, o ramo daLingüistica trata da linguagem nos seus aspectos biológicos (anatomia e fisiologia dosórgãos de fonação e da zona de Broca no cérebro) e social. Estudam-se os órgãos parasaber o processo de produção de sons, sua classificação, suas tonalidades etc. Todavia,alguns antropólogos consideraram que a linguagem e a cultura pertencem a umcategoria especial de fenômenos; são por excelência, fatos sociais. Tais fatos não seadquirem por vias de herança genética, pois a língua que o homem fala, seus hábitos,suas idéias, seus sons e seus costumes, ele os aprendeu na sociedade de que faz parte.Para Evans Pritchard, a Antropologia Física tende a separa-se da Antropologia Cultural.Enquanto a primeira se aproxima da genética, a segunda caminha em direção da históriae das ciências sociais. Mas, para Ilse Schwindetzky, tal é a estreita vinculação entreesses dois ramos da Antropologia que, antes, é necessário a criação de um campo que osunifique. Esse campo é o da Etnobiologia, ciência que tem por objeto o estudo de todosos processos que condicionam e modificam a parte biológica das comunidadeshumanas. A Etnobiologia estuda a influência que o habitat e a cultura exercem naformação e transformação do tipo racial humano. A propósito, diversos inquéritos epesquisas tem sido executados, nos Estados Unidos e na Europa, no sentido deinvestigar os efeitos que os fatos sociais, como, por exemplo, o exercício de certasprofissões, produzem em indivíduos que apresentam o mesmo equipamento biológico.Em suma, podemos dizer que, em face de todas essas considerações, a Antropologiadeve ser conceituada como a “ciência que estuda as semelhanças e diferençasfundamentais anatômicas e culturais dos homens, para formular conclusões e leis geraisbásicas para o conhecimento do comportamento humano, tendo como foco primacial anoção de cultura”.

ANTROPOLOGIA E POLÍTICA

FÁBIO DO NASCIMENTO MOURA

1) Pede-me um artigo para a Revista de Estudos Antropológicos, que ora se lança, meuprezado amigo Marcos Rubinger, um dos fundadores da mesma.

Devido às características de que se reveste e à distribuição do assunto, duas condiçõesme foram impostas:

I. Concisão – condição básica em virtude da natureza da revista que pretendecolecionar o máximo de matéria; concisão que quer dizer, porém, simplicidade, clareza,pequenez e leveza. Difícil de se obter;

II. Que verse sobre assunto político correlacionado com a Antropologia.

Justamente essa Segunda condição é que veio servir de tema para este artigo.

De inicio, pode-se fazer uma pergunta: Há possibilidade de haver correlação entreAntropologia e Política?

A resposta é afirmativa e categórica. Não é difícil constatar o fato. Vejamos.

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2) Como centro, vamos examinar um página (com a devida adaptação) de RaymondBarre, Professor da Faculdade de Direito de Caen, na França (“Économie Politique”, dacoleção “Thémis”, da Presses Universitaires de France, Paris, 1957) que faz umacolocação excelente para o problema em pauta (págs. 3 a 5).

Existe hoje uma distinção bem nítida entre as Ciências da Natureza e as Ciências Físicase as Ciências do Homem, ou Ciências Sociais.

As primeiras tratam das relações entre as coisas, das ligações entre os fenômenosnaturais: assim é a geologia, a física ou a química. As segundas concernem à ações dohomem, à relações entre os homens e as coisas e às relações entre os homens; seusdados têm um caráter subjetivo, porque não podem se definir em termos materiais eobjetivos, mas por referências aos intentos, opiniões e crenças do homem.

As ciências do homem são múltiplas: ciência da população; ciências sociológicas(psicologia social (!), sociologia dos grupos, das tensões; sociologia política,econômica, religiosa); ciências geográficas; ciências históricas; ciência política;economia política.

Da realidade social, diversificada e complexa, cada ciência social não exprime senão umaspecto; cada uma corresponde a um ângulo de vista sobre atividade global do homem.

Seria errôneo, entretanto, pensar que as ciências sociais dividem a realidade emsegmentos que são justapostos; sua meta consiste em aclarara e analisar um aspecto docomplexo global das relações sociais.

A caracterização de cada ciência social baseia-se na tarefa de precisar o campo de seuestudo, de constatar seu caráter de estudo parcial de uma realidade global.

Toda ciência social escolhe o real: corresponde à feliz fórmula de J. Ullmo “Contra aescola idealista que dizia: inventamos o real, contra a escola realista que dizia:Submetemo-nos ao real, (sob) a análise do pensamento cientifico responderão:escolhemos o real” (revue Philosophique, nov-déc – 1936 – pág. 339).

Uma ciência social decompõe o real: privilegia fatos, quantidades, atos, organismos, elalhe dá uma certa qualificação. É uma abstração que se apodera da realidade a partir decertos termos de referência, segundo um certo esquema de interpretação. Propõe umateoria que serve para organizar fatos isolados ou constatações esparsas e constitui umfio de Ariadne na complexidade desorientadora da realidade.

Um exemplo, emprestado de K. Boulding (Economic Analysis – pág.5), darácompreensão a este ponto: é um fato que Oliver Cromwell tinha uma verruga no nariz.Mas o que é que tem este fato?

Do ponto de vista do químico, é um conglomerado de átomos e de moléculas; dobiologista, uma certa impropriedade do funcionamento das células; do psicólogo, podeesclarecer o caráter do homem; do historiador, pode ser um fato importante ou semvalor; do economista, a verruga é negligenciável, a menos que Cromwell dispendesseuma certa quantia para removê-la.

Este exemplo mostra que um fato pode ter significações diversas, segundo o ponto devista em que é colocado: o sentido que lhe atribui depende do esquema geral deinterpretação no qual se situa. Não há fato bruto, todo fato é constituído. Cada ciênciasocial é uma reconstrução racional e parcial da realidade.

Um texto de Marc Bloch, tirado de seu livro “Apologie pour l’historie ou métierd’historien”, constitui o melhor discurso sobre o método das ciências sociais:

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“A ciência não decompõe o real, senão para melhor observar, graças a um jogo de luzescruzadas cujos raios constantemente se combinam e se interpenetram.

“Homo religiosus, Homo economicus, Homo politicus, toda essa fieira de homens emUR ... e será grave de os tomar por outra coisa que, na verdade, são: cômodosfantasmas, com a condição (ainda) de não se tornarem importunos. O único ser de carnee osso é o homem, sem mais nem menos, que reúne tudo isto de uma só vez...” (pág.76).

“Nada mais legítimo, nada de mais salutar que centralizar o estudo de uma sociedadesobre um de seus aspectos particulares, ou melhor ainda sobre um dos problemasprecisos que levanta tal ou tal de seus aspectos particulares” (...) (pág.78)

Constatamos assim que as ciências, de um modo geral, visam a realidade global, comcaráter parcial, focalizam-na de prisma e planos diferentes. Têm em mira setores dessarealidade, que apenas é dividida, decomposta esquemática e metodologicamente paraestudos, através da abstração. As ciências naturais estão assentadas num outro plano dasciências sociais, e estas, por sua vez, têm óticas especificas; assim, a Antropologia –com suas roupagens “culturais” – que é a parte que nos interessa imediatamente, têm emmira, dentro da realidade do homem, sua “obra” , sua “herança social”; e a Política porseu turno, apesar de controvérsia a respeito de seu objeto, visa, essencialmente ao“poder político” e às relações decorrentes do mesmo ou correlacionadas com ele.

No plano das ciências naturais, mesmo havendo grandes e precisas delimitações doscampos específicos e mais ou menos solidificados, as mesmas não se apresentam comocompartimentos estanques, impenetráveis; comumente, vemos uma seara sendoinvadida por outra – ex.: “bioquímica”, “físico-química”, “biofísica”.

Com maior agudeza vemos esse fenômeno se dar no plano das ciências do homem, quefocam o ser humano como uma realidade concreta e histórica.

O objeto é único – o homem – mas é poliédrico: apresenta as faces mais diversas,dependendo dos esquemas gerais; os raios focais, quando incidem sobre objeto,intercruzam-se , interpenetram-se, como frisou Bloch, e nesse objeto constata-se nãouma área completamente nítida e distinta, aclarada por um desses focos, mas, pelocontrário, apresentam-se como circunferências secantes, promovendo, entre ambos,claro-escuros que tanto podem pertencer tanto a um quanto a outro.

A característica das ciências sociais é de não serem departamentos fechados, isolados,mas o inverso: baseiam-se na teoria dos vasos comunicantes.

Ponto focal de uma, quase sempre se relaciona com o de outra, isto devido a naturezaespecial de que se revestem, de olharem o homem e suas obras através de suasaspirações, de seus desejos, de suas opiniões, de suas crenças.

Em geral, uma estudando, pesquisando em seu próprio campo, mirando parcialmente arealidade global, com seus próprios métodos de abordagem, fornece elementos,subsídios inestimáveis para outra.

O estudo em ciência social pode ser comparado à visão através de dois funis ligadospelos bicos: quanto mais se estuda, mais precisão vai sendo obtida: mais o campo vai setornando restrito, até chegar a um ponto em que não pode, sozinha, se bastar a simesma, isto porque um problema suscita dez outros, o que eqüivale dizer, horizontesvão se abrindo, descortinam-se novas paragens, perde-se no finito de nosso olhar e nofinito da progressão.

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Não vamos examinar detidamente, como é obvio, as mútuas relações existentes entre osdois campos de estudo, uma vez que a própria natureza de artigo não permite.Acentuemos, com tudo, uma ou outra ligação. Vejamos, como exemplo, algumascontribuições da Antropologia à Política.

O “método de observação participante” é uma conquista antropológica que possibilita apesquisa direta do fenômeno a ser estudado, no próprio campo, advertindo, inclusive, oobservador dos possíveis erros por estar integrados no próprio fenômeno de queparticipa, com seus preconceitos, com seus prejuízos, suas viseiras.

O “método comparativo etnográfico”, correlacionando os fenômenos sociais, tendo emvista as diferenças culturais dos povos, é um outro instrumento importante às ordens daPolítica.

Um ponto, que tanto é do campo de uma como da outra, é o estudo das “instituiçõespolíticas” – padrões de comportamento destinados a regular as relações dos homensentre si – relações de poder.

Mas o ponto-chave das relações existentes – contribuição direta à Política, - é o estudodas “sociedades primitivas”, cogitações não só dos antropólogos e cientistas políticos,como também historiadores, psicólogos e sociólogos modernos.

Desses estudos enormes esclarecimentos a respeito das instituições políticas foram eestão sendo prestados pelos pesquisadores antropólogos.

Podemos verificar, finalmente, que as ciências sociais, sendo um produto da realidadesocial – brotados do social devido ao condicionamento das necessidades estruturais, -têm sua vigência em função da eficácia social. Determinados estudos têm uma maiortônica em determinado momento histórico, devido ao próprio momento histórico.

E justamente esse momento histórico pode acentuar mais ou menos as ligaçõesexistentes entre dois campos de estudo – não só especulativa, mas praticamente.

Podemos tirar alguns tópicos do livro de Clyde Kluckhohn “Antropologia” (Fondo deCultura Económica – “Breviários” – México – 1957 – págs. 182 e seguintes).

“É evidente que os antropólogos possuem conhecimentos especiais e determinadasdestrezas para ajudar aos governos a dirigir as tribos primitivas e os habitantes de suasdependências. Nesse sentido têm sido empregados pelos governos da Inglaterra,Portugal, Espanha, Holanda, México, França e outros países (...) Durante a últimaguerra floresce a antropologia aplicada. Antropólogos ingleses ocuparam cargosimportantes na Secretaria de Negócios Estrangeiros, no Almirantado, no Serviço Inglêsde Informação, no Estudo Social da Guerra (...) (...) Nos Estados Unidos, osantropólogos trabalharam em sua especialidade nos serviços de Inteligência Militar, noDepartamento de Estado (...)”.

Esses exemplos bem demonstram as correlações existentes e permitem que voltemos aoinicio, isto é, a ligação existente entre a Antropologia e a Política – não só no campoespeculativo, como no prático, é um fato.

A resposta à pergunta é, como frisamos, afirmativa e categórica.

PERSONALIDADE BÁSICA

ANTÔNIO OCTÁVIO CINTRA

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Entre os mais sérios e promissores estudos da moderna Antropologia Cultural,particularmente desenvolvida nos Estados Unidos, situam-se os referentes àpersonalidade de base. Já na velha idéia de “caráter” ou de índole “nacional” pode-senotar presente a intuição da importância de uma matriz de personalidade numdeterminado povo, explicativa de sua história, de sua cultura. Mas somente os trabalhosde Abram Kardiner e do Ralph Linton, frutos de um seminário da Universidade daColúmbia, vieram situar em termos científicos – embora ainda não definitivos – aimportante problemática dos tipos de personalidade básica. Os trabalhos conjuntos deKardiner e de Linton vêm expostos em duas obras, uma datando de 1939 (O indivíduo esua sociedade), e outra de 1940 (Fronteiras Psicológicas da Sociedade).

No prólogo de Fronteiras Psicológicas, Linton oferece-nos uma visão sintética daproblemática da personalidade básica, indicando os postulados – e as principaisconseqüências destes – em que se funda a elaboração do conceito.

São os seguintes postulados:

1) O efeito duradouro das primeiras experiências do indivíduo sobre a personalidade,especialmente dos seus sistemas projetivos.

2) Tendências de as experiências similares produzirem configurações similares napersonalidade dos indivíduos que a elas se sujeitam.

3) O emprego de técnicas padronizadas culturalmente (semelhantes mas não tãoidênticas) da parte dos membros de uma sociedade no trato e criação dos filhos.

4) Diferença, de uma para outra sociedade, dessas técnicas padronizadas culturalmente.

Da aceitação desses postulados seguem-se que:

1) Os membros de uma determinada sociedade terão muitos elementos comuns nassuas primeiras experiências.

2) Terão muitos elementos de personalidade em comum.

3) As normas de personalidade diferirão de sociedade a sociedade, pois que asprimeiras dos indivíduos diferem de uma sociedade a outra.

Assim define Ralph Linton a personalidade básica:

“O tipo de personalidade básica para qualquer sociedade é a configuração depersonalidade, compartilhada pela maioria de seus membros, como resultado dasprimeiras experiências que tiveram em comum. Não corresponde à personalidade totaldo indivíduo, antes aos sistemas projetivos; em outras palavras, ao sistema de valores eatitudes que são básicos para a configuração da personalidade do indivíduo”.

Pela utilização do conceito de personalidade básica, os padrões sociais, valores, idéias,ideais e atitudes coletivas tomam sentido do ponto de vista das personalidades dosindivíduos que a eles se submetem, que os criam, influem, vivem e realizam, ou que osinfringem, anulam, jogam por terra, põem-nos em xeque ...

... Daí a razão de Kardiner tomando como ponto de referência as constelações dapersonalidade básica, dividir as instituições sociais em primárias e secundárias.Primárias são as que criam para o indivíduo problemas fundamentais de adaptação:tabus e disciplinas de toda sorte, que o indivíduo “não pode controlar diretamente; podesomente adotar uma atitude frente a eles”. Surgem, então, na personalidade doindivíduo, certas constelações fundamentais, tocando diretamente as maneias de pensar,aos sistemas de valor ao superego, aos princípios religiosos; constituem a sua

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personalidade básica. Estão na raiz de certas instituições – secundárias na terminologiade Kardiner: - sistemas de tabus, religião, ritos, técnica de pensamento etc.

Não se funde a divisão de instituições, que faz Kardiner, com um corte mecânico nacultura: primário e secundário são dois ângulos que oferece a cultura, apresentada àpersonalidade e conformando-a, ou por ela sendo vivida. Donde não se estranhar agrande dificuldade na especificação dos conteúdos do primário e secundário religião e ofolclore, caracterizados como instituições secundárias, são também primárias, poisestão, quando não explícitos, pelo menos subjacentes às técnicas educativas e deadestramento cultural dos indivíduos em sociedade.

Muitos são os problemas que o conceitos de personalidade básica vem suscitar, e aindanão suficientemente esclarecidos ou não rigorosamente tratados: a historicidade dapersonalidade básica, a sua caracterização numa sociedade complexa e plurisegmentadacomo o é a sociedade ocidental capitalista, etc.

Sem embargo disso, pode-se afirmar, sem demasiada ousadia, que o conceito,principalmente pela sua grande operacionalidade, deverá estar no centro do todo esforçoe preocupação atuais das ciências do homem, contribuindo com eficácia para aexplicação e compreensão de seus problemas fundamentais.

O problema básico, na Antropologia Cultural, da “integração” parece ter, no conceito depersonalidade básica, solução bem mais satisfatória e rigorosa que a apresentada pelosconceitos de “configuração”, “temas”, etc., todos eles pecando por um certonominalismo, caindo, enfim, no erro de supor a existência de um misterioso“paideuma”, integrando os padrões de cultura. Em Sociologia, o conceito vemcontribuir, para melhor colocação de problemas tais como o do “conflito” indivíduo-sociedade, na relações entre fenômenos psíquicos totais, das interconexões dos sistemasde conhecimento, das regulamentações sociais com as estruturas sociais cujos equilíbriosustentam: a personalidade dos indivíduos passa a ser o ponto de enfoque do social, ofim e a origem de toda a armadura institucional, que é vivida e dinamizada nas volições,sentimentos e intelecções desses indivíduos. Foi o que o livro de Mikel Dufrenne – “Lapersonnalité de base – un concept sociologique” - pôs bastante em evidência. Também,na História, há muito de se esperar da utilização desse conceito, como está a indicar oestudo de Kardiner em “Fronteiras Psicológicas”: “personalidade básica e história”.

Não resta dúvida de que novas vias estão abertas para importantes elaborações teóricase confirmações empíricas.

ASPECTOS DA QUESTÃO RACIAL

GUILHERME VIVACQUA

SUMÁRIO

1ª Parte

Origem do racismo

2ª Parte

Influência do meio social sobre os estados afetivos e a adoção de juízos de valores;

Conseqüências dos estados afetivos e dos juízos de valores na questão racial brasileiraem relação ao “negro”.

ORIGEM DO RACISMO

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O racismo surgiu para defender “status” econômico, religioso, político, social em crise.Comprovemos esta assertiva através de breves exemplos. De início, cumpre-nosdestacar os ensinamentos históricos, segundo os quais todas as regiões, onde florescemcivilizações proeminentes, constituíram cenários de conquistas de um povo por outro e,em conseqüência, foram palco de profundas miscigenações. Alexandre da Macedônia,por interesses políticos, em todas as áreas por ele subjugadas, ordenavam aos seusguerreiros que se casassem com as mulheres que aí habitavam. “As conquistas”, dizJuan Gomes, “Foram seguidas pela desagregação de castas e a criação de um novoamálgama, considerando como uma nação racialmente homogênea, ainda que, narealidade, se tratasse de um novo povo constituído por raças diferentes.”

Na história da humanidade destacaram-se três doutrinas racistas. A doutrinaantropométrica de Lapouge e Ammon, segundo a qual a inteligência e o vigor do caráterdependem do tamanho do crânio. A doutrina da herança de Galton e Pearson, tratandode formular regras para uma política “eugenésica”. Diziam que o gênio e o talento sãoherdados e só seria possível uma melhoria racial no gênero humano quando os brancosbanissem as gentes inferiores. Finalmente, as doutrinas com pretensões de uma Filosofiada História de Gobineau e Chamberlain, a que nos referiremos mais detalhadamente.

A mais antiga referência a uma discriminação racial contra os negros foi encontradanuma inscrição gravada, num monumento, por ordem de Faraó Sesostris III, em 18871849 a. C. Nela havia, as seguintes palavras:

“Fronteira Sul. Monumento monolítico erigido no ano VIII, sob o reinado de SesostrisIII, Rei do Alto e Baixo Egito, que vive desde sempre para toda a eternidade. Estáproibido cruzar esta fronteira por terra e por água, em barca ou rebanhos, a todos osnegros, com a única exceção daqueles que descem a margem para vender ou comprarem algum estabelecimento comercial. Estes últimos serão tratados de uma maneirahospitaleira, mas estão, em todo o caso, proibidos de navegar além do rio”.

Na China e na Índia sempre houve uma rígida estratificação social em que uma classedominante, ascendendo religiosa, social e economicamente, considera as classes deextratos inferiores como párias. Podemos ver, neste exemplo, que o interesse, parapreservarem “status”, chega a ponto de criar uma separação, até mesmo dentro de umpovo racialmente igual. Conforme acentua Marx – “As classes e as castas são, pois, aomenos na sua origem, outros tantos grupos de atividade e produtos da organizaçãoeconômica que, distinguindo-se pela sua identificação de função, se separam,sobrepondo-se e, às vezes, opondo-se, pela diferença, hierarquia ou antagonismo desituação. Nas épocas que precederam a nossa, vemos, quase por toda a parte, asociedade oferecer toda uma organização complexa de classes distintas e encontramosuma hierarquia de categorias sociais múltiplas. São, na Roma antiga, os patrícios, oscavaleiros, a plebe, os escravos; na Idade Média, os servos, e quase cada uma dessasclasses comporta, por sua vez, uma hierarquia particular”.

Constatamos que o esforço de conservação de um “status” vem dos primórdios dacivilização. Esta situação é o ponto central, o eixo, onde gira o carrossel dos interessesdos mais poderosos. Surge, porém, bem mais tarde, a Consciência Racial bastanteacentuada, mormente com o nascimento das ciências sociais e biológicas que vieramquebrar tabus tradicionais ante a instabilidade do grupo dominante na Europa. Tanto aConsciência de Classes como a Consciência Racial têm pontos que a distinguem:todavia, elas confluem para colimarem o mesmo alvo, isto é, preservação de “status”adquiridos. Harry Shapiro diz:

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“Parece-me impossível estudar a mescla de raças sem fazer referência à ConsciênciaRacial. A consciência das distinções raciais é universal”. Mais adiante, continua: “Aomesmo tempo, as pressões dos mestiços, para se elevar na escala econômica e paramelhorar sua educação, parecem ameaçar o grupo dominante que reage contra o quejulga uma opressão, a que deve opor-se”. Esta Consciência Racial só surgiu com todo oseu vigor, há dois séculos atrás, ao passo que a luta de classes e a consciência deoposição, em que cada um está estratificado socialmente, existem há séculos. É com oadvento da revolução industrial, coincidente com a revolução francesa, que se acentuaeste morbo social. Lança o Conde de Gobineau, em 1852, em quatro volumes, o EnsaioSobre a Desigualdade das Raças Humanas. Uma obra interessante, mas cuja dimensãode idéias não conseguiu se contrapor ao conceito científico e moderno de Raça. Defendeele, nesse trabalho, a superioridade da raça ariana. Considera o referido autor que seisdas grandes civilizações da humanidade, a hindu, a egípcia, a assíria, a grega e agermânica são produtos do ramo ariano. Continuando sua preleção, diz haver raçassuperiores e inferiores, sendo que: “as primeiras são capazes de progresso, as segundassão votadas a vegetar ingloriamente”. Desolado, julgava que o declínio da civilizaçãoera inevitável, pois, sua miscegenação, a raça ariana se tornaria diminuta. “Rebanhoshumanos”, acrescentava em tons de tragédia, “e não mais nações, acabrunhados em umafatal sonolência, atolar-se-ão na inutilidade, como os búfalos que ruminavam nospantanais”. Mais tarde,Gobineau, ao publicar suas memórias, demonstrou ter profundaversão contra os republicanos franceses, que lutavam contra a aristocracia reinante.Sendo monarquista ferrenho, era natural que se deixasse conduzir por admiração pelosingleses, cujas tradições monárquicas vêm até os dias atuais. Sua argumentação,empavonada de profunda falsidade, vingou. Apesar de ser refutada, longe de atenuareste conflito social, ela o incentiva cada vez mais. Chamberlain, anos depois, seguindoteorias de Gobineau, enveredou-se pela mesma trilha. Em seu livro Fundamentos doSéculo XIX, afirmava o estadista inglês que têm sido quatro os fatores da civilizaçãouniversal:

a) O grego a quem devemos a poesia, a arte e a filosofia;

b) O romano que nos legou o direito, a política, a ordem social, etc.;

c) Os teutônicos compreendidos neste grupo, os germanos, os celtas e eslavos,criadores do descobrimento da civilização ocidental;

d) O judeu que legou a religião de caráter universal; primeiro a judaica, após, a cristã.

Darwin, lançando os postulados de sua teoria da evolução, exerce a mesma influênciamarcante sobre a ideologia racista. Ao proclamar a sobrevivência dos mais fortes, elefoi mal interpretado pelos racistas, que se valeram de sua tese num vasto programa deagressão. Spencer, na sua apreciação sociológica do assunto, fala da sobrevivência domais apto e Nietzsche cria seu Super-Homem. Sabe-se hoje que a seleção naturaldepende de vários fatores, como alimentação, tratamento médico, ambiente climatérico,etc. Várias teorias racista ainda perduram, procurando insistir sobre o fator étnico naformação das nações. O nacional-socialismo de Hitler, a cujas conseqüênciasassistimos, é o resultado da embriaguez destas idéias. Em nossas civilização temos doisgrandes exemplos dos males da discriminação racial, o dos Estados Unidos e da Áfricado Sul. Neste último país, onde os ingleses mantém o controle econômico, vemocorrendo fatos constantes que ferem a dignidade humana. Esta minoria branca,controlando economicamente o país, vendo-se ameaçada pelo movimento nacionalistaafricano, pratica o “apartheid”. Ainda agora, Tom Mboya, líder nacionalista do Kênia,disse estas palavras de grande conteúdo ético: “Refuto o racismo porque repudio tudo

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quanto não seja uma democracia baseada na igualdade dos indivíduos. Pedem osEuropeus que se salvaguardem os direitos das minorias. Que direitos? Referem aodireito de impedir que os africanos vivam nas altas terras brancas, praticando, também,segregação em vivendas e escolas. Há a bandeira da cor e nós replicamos que nãoexistem tais direitos. Não exigimos uma transformação da noite para o dia, masaspiramos a uma mudança com objetivos de uma democracia total”;.

Concluindo, podemos dizer, com J. Rumney e J. Maier, que o preconceito racial ou asegregação racial surgem tendo em vista as seguintes necessidades:

Psicologicamente – Canalizando a agressividade para um grupo em particular, cujasituação histórica o tenha conduzido a uma sanção social;

Economicamente – Coibindo outros a ascenderem financeiramente, para diminuir onível do salário médio e obstar melhores posições;

Politicamente – É manipulado por uma elite com o escopo de fortalecer o seu própriopoder, desviando a atenção para grupos menos indefesos;

Socialmente – Dá ao grupo majoritário vantagens sexuais tangíveis a uma série deracionalizações para conservar imaculados os imponderáveis de sua cultura e valorestradicionais.

Em suma, o preconceito e a discriminação racial, ainda que sem fundamentoscientíficos, ocorrem por serem vantajosos em diversos prismas.

O PROBLEMA RACIAL

MARCOS MAGALHÃES RUBINGER

O que se entende por raça? É um fato essencialmente biológico. Define certos gruposhumanos que apresentam em si maior freqüência de fatores hereditários comuns, atravésdos quais se distinguem fisicamente de outros da mesma espécie

A raça é o resultado de um processo genotípico e fenotípico extremamente complexo,em que atuam, principalmente, quatro forças de natureza diferente, a saber:

A Mutação ( modificação brusca no material genético);

A Seleção Natural (ação do meio que elimina no interior de cada espécie os indivíduosmenos dotados e favorece o desenvolvimento e proliferação dos melhores adaptados);

O Isolamento (fixação das flutuações genéticas por meio da endogamia, a que foram esão obrigados os grupos isolados);

As Migrações (movimento e contato de grupos diferentes favorecendo o cruzamento deindivíduos de tipos biológicos distintos);

Nestas condições, a mutação atua como fator biológico, a seleção natural como fatorfísico, o isolamento e as migrações (estas acarretando a fusão de populações) atuamcomo fatores históricos ou culturais, ou ainda, ecológicos. Tendo em vista estasconsiderações. A UNESCO difundiu a seguinte classificação racial: CAUCASÓIDE,também chamada europóide pela circunstância de ser sua área de maior freqüência aEuropa; MONGOLÓIDE E NEGRÓIDE. Apresentado classificação duvidosa e por issonão se encontrando nem se compreendendo em qualquer desses troncos primários,temos as raças: AINO (povo primitivo que vive numa ilha ao norte do Japão e que seapresenta, ao que parece, como o tipo intermediário, entre os mongolóides e os

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caucasóides); POLINÉSIA ( apresenta características tanto mongolóides comonegróides); AUSTRALÓIDE (características negróides e caucasóides); VEDÓIDE OUINDOAUSTRALIANA (mescla de caucasóides e australóides); BOSQUIMANA(traços mongolóides e negróides). No estoque CAUCASÓIDES, estão compreendidosos nórdicos, os alpinos, os mediterrâneos e alguns grupos indus, no estoqueMONGOLÓIDE , os mongóis, os malaios e os ameríndios, finalmente no estoqueNEGRÓIDE, temos os negros africanos, os negros oceânicos e os melanésios, osnegritos (pigmeus) e, há quem enquadre os bosquimanos nesta classificação.

Conforme Dobzhansky, para fins de classificação, achou-se conveniente e útil tomar osindivíduos como variantes de tipos raciais (médios) aos quais hipoteticamenteacreditava-se pertencerem. Desta forma, fala-se que certos indivíduos se correlacionamou se afastam dos “tipos nórdicos, melanésios, mongolóides ou de “outras raças”. O tipocontudo, é uma abastração, isto é, uma elaboração conceitual arbitrária, à qual se podechegar através da verificação de médias estatísticas de caracteres, tomando-se amostrasde indivíduos que são em muitos aspectos, abstraídos. Tal procedimento é convenientena elaboração do catálogo da diversidade humana, mas é enganoso quando aspopulações humanas são confundidas com as abstrações. A feliz descoberta de Mendelde que o fenômeno da hereditariedade não se dá através do sangue, mas através de“gens”, coloca em evidência que não são os tipos, mas as populações formadas deindivíduos e cruzando-se entre si, que constituem as verdadeiras realidades biológicas.Nesta base, cada ser humano é membro de uma população e possui característicaspróprias e peculiares em sua constituição genética. Essa não é idêntica a de qualqueroutro indivíduo atualmente vivo, ou já existente no passado, constituindo exceções osgêmeos univitelinos. Aceita-se que as raças humanas são populações que diferem entresi na freqüência de certos gens. Aceita-se porque “raças puras”, com a significação degrupos de indivíduos geneticamente idênticos, só são possíveis em espécies assexuadas.As raças humanas constituem um “mito”, e qualquer tentativa de descrever aspopulações humanas atuais, como mistura de diferentes proporções de antigas raçaspuras ou “tipos Primários”, é enganoso e utópico. Sabe-se que as diferenças genéticasentre populações humanas não são absolutas, mas preponderantemente relativas. Taisdiferenças raciais são condicionadas por determinados gens que não raramente diferementre os próprios indivíduos de uma mesma raça. Essas diferenças manifestam-se dediferentes maneiras. As massas humanas que se encontram geograficamente afastadasexibem diferenças genéticas relativamente mais acentuadas na média, do que aspopulações que se situam contiguamente. Em suma, chega-se à conclusão de que é umaquestão arbitrária dividir-se a humanidade para fins de classificação, em algumas ouinúmeras raças. É evidente , que o número de raças conhecíveis é uma mera questão deconveniência. Todavia, apesar do número de raças conhecíveis ser arbitrário, aexistência de diferenças raciais como já salientamos, é um fato objetivamenteverificável. Ralph Linton, em vista disso, acha que o problema racial deve ser estudadotendo em vista a sua caracterização como “breeds”, “raças” e “ stoks”. Para oantropólogo norte-americano, “breeds” são pequenos grupos com muitas característicasidênticas; “raças” são grupos maiores com algumas características idênticas; e “stoks”são grupos enormes com poucas características idênticas. Essas características podemser: a cor da pele, a cor da Íris, a cor do cabelo, o tipo do cabelo, a morfologia dacabeça, a forma do nariz, a forma dos lábios, a fenda palpebral, o pavilhão da orelha, aestatura, os dentes, os grupos sangüíneos, o índice radiopélvico, etc. Finalmente, ahumanidade não constitui uma única população. É um sistema complexo decomunidades cujos indivíduos são inter-férteis. Tais comunidades, são mantidas porbarreiras geográficas, econômicas, culturais, são realmente distintas quando diferem na

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freqüência de características hereditárias. Porém, as diferenças genéticas entre as raçashumanas são menos profundas do que entre as raças de várias outras espécies. Há quemconsidere as raças como produtos do processo histórico da evolução. A evolução daespécie humana, é verdade, foi bastante influenciada por uma história cultural. Destaforma, para se chegar a uma compreensão profunda da natureza humana, incluindo asdiferenças raciais, deve-se levar em conta essa situação, além de outras. Justamente,porque todo indivíduo carrega consigo uma herança biológica, todos os grupos raciaisexistentes no mundo são, por exemplo, portadores de características simiescas de umantepassado comum. Barnett coloca a pergunta: “Qual dos três grupos raciais(caucasiforme, mongoliforme e negriformes) será o mais primitivo? Há quem respondaque é o dos negriformes, isto porque, de modo quase geral, não chegaram a constituirsociedades tão evoluídas quanto as dos outros. Todavia, a anatomia comparadademonstra que as coisas não são assim tão simples. É importante, definir,primeiramente, o que entendemos por “primitivo”, termo a que é costume agregar umsentido pejorativo. Cientificamente, um tipo é mais primitivo do que o outro,racialmente falando, quando mais se aproxima do ancestral comum de ambos. Levandoem conta que os ancestrais do homem sejam identificados como macacosantropomorfos, primitivos deverão ser os homens que mais se assemelharem a eles.Todavia, sabemos muito pouco dos antropomorfos, que teriam dado origem tanto aoshomens como aos macacos atuais, desta forma, temos comparado o homem com os seusafins atuais: o chipanzé e o gorila. Mas estes também passaram por modificaçõesevolutivas semelhantes às do homem e não podem portanto servir de índice deprimitividade. Mas, se apesar disso, fizermos a comparação, não chegaremos a umaconclusão decisiva.

Os caucasiformes seriam macacóides portanto têm, relativamente, muitos pelos nocorpo, cabelos ondulados e lábios finos; de outra parte, no que se refere a disposição daface, seriam os menos macacóides de todos. Os negriformes seriam macacóides no quediz respeito à largura do nariz, mas menos macacóides do que os caucásicos, quanto àgrossura dos lábios, estrutura e distribuição dos pelos, etc. É evidente que não podemosdizer, com precisão, qual dos três grupos principais, é o mais primitivo. AdamsonHoebel estabeleceu um quadro onde procura demonstrar que todos os três grandesgrupos raciais apresentam a mesma proporção em características simiêscas.

Finalmente, os homens e as mulheres, de quaisquer raças citadas, podem entrecruzar-see dar origem a uma prole de caracteres mistos, sem quaisquer outras dificuldades senãoas criadas pelas barreiras sociais, das quais falaremos em outra oportunidade quandoabordarmos o problema do preconceito racial.

TODOS OS TRÊS GRANDES GRUPOS RACIAIS APRESENTAMCARACTERÍSTICAS SIMIÊSCAS (conforme Hoebel)

Características Mais simiesco Menossimiesco

Pouco simiesco

Índice cefálico Mongolóide Caucasóide Negróide

Capacidade craniana Negróide .. .. .. .. .. .. .. Mongolóide,Caucasóide

Cor dos olhos Negróide,Mongolóide

.. .. .. .. .. .. .. Caucasóide

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Índice nasal Negróide Mongolóide Caucasóide

Forma do cabelo Mongolóide Caucasóide Negróide

Comp. do cabelo Caucasóide,Mongolóide

.. .. .. .. .. .. .. Negróide

Pelo do corpo Caucasóide .. .. .. .. .. .. .. Negróide, Mongolóide

Forma dos lábios Mongolóide Caucasóide Negróide

Cor dos lábios Mongolóide Caucasóide Negróide

Prognatismo Negróide Caucasóide Mongolóide

Forma dos olhos Caucasóide,Negróide

.. .. .. .. .. .. .. Mongolóide

Não há raças superiores ou inferiores, como também não se pode classificar as culturasdentro do mesmo esquema de graduação mental. Em todas as raças há indivíduos maisinteligentes e menos inteligentes, demonstrando os testes psicológicos até hojerealizados a intercorrência de fatores ambientais (culturais) em muito maior grau do queas pretensas virtualidade natas desse ou daquele grupo racial.

IDENTIFICAÇÃO FILOGÊNICA DO HOMEM

1. Reino – Animal

(Grau Metazoários)

2. Fila – Cordatas

a – Subfila – Vertebrados

3. Classe – Mamíferos

a - Subclasse - Euthéria

4. Ordem – Primatas

a – Subordem – Catarríneos

5. Família – Hominóides

a - Subfamília – Hominoídes

6. Gênero – Homo

7. Espécie – Sapiens

8. Variedade – Raças: Caucasóide

Mongolóide

Negróide, etc. ...

a - Subvariedade: Alpina,

Mediterrânea

Nórdica, etc. ...

Hoebel: Man in the Primitive World – MacMillan.

Page 24: SOCIEDADE DE ANTROPOLOGIA ESTUDOS DE ANTROPOLOGIA

G. Morant: Les Différence Raciales et leur Signification - UNESCO

P. H. Saldanha: As Diferenças Raciais Humanas – Ver. Ciência e Cultura, n.º 1 Marçode 1959 – S.P.

A. Barnett: A Espécie Humana – IBRASA – 1959

C. Rebello Horta: A Herança Biológica do Homem, Conceito e Preconceito de Raça –Apostilhas da F. C. E. da UFMG.

R. Linton: O Homem – Fondo de Cultura Econômica

L. C. Dunn y Th. Dozhansky: Herencia, Raza y Sociedad – Fondo de C. Economica.

GRUPOS SANGÜÍNEOS HUMANOS – SISTEMA “A B O”

NAFTALE KATZ

Se tomarmos hemácias de uma pessoa e misturarmos com o plasma ou soro de outra,poderá ou não haver aglutinação. Landsteiner (1900) baseado nesta experiênciaestabeleceu a noção de grupos sangüíneos. Trata-se do chamado sistema A B O.

Causas – Sabemos que a isohe-moaglutinação (aglutinação entre sangue de seres damesma espécie), é devido a dois fatores:

1 – aglutinógeno, que é encontrado nas hemácias;

2 – aglutinina, encontrado no plasma.

Nomenclatura – Temos dois tipos mais importantes de aglutinógenos (A e B) e dois deaglutinia (alfa e beta) distribuídos da seguinte forma, nos quatro grupos sangüíneos:

GRUPO AGLUTINÓGENO AGLUTININA

O - ? e ?

A A ?

B B ?

AB AB -

Segundo a Liga das Nações (1928) que determinou a nomenclatura oficial indica-se osgrupos assim:

O ? ? , A ? , B? , AB

Anteriormente indicava-se por algarismos romanos (nomenclatura de Jansyk – 1907 – eMoss – 1910). Podemos estabelecer o seguinte quadro comparativo:

Nomenclatura Internacional (1928) O ? ? A ? B? AB

Jansky (1907) I II III IV

Moss (1910) IV II III I

Importâncias nas transfusões – Nas transfusões de sangue é essencial que as hemácias(aglutinógeno) do doador não sejam aglutinadas pelo plasma (aglutinina) do receptor.Esta é a lei ou regra de Ottemberg. O caso da aglutinina do doador aglutinar as

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hemácias do receptor não é tão perigosos (embora não seja conveniente) devido osangue do primeiro ficar em grande diluição. O ideal é fazer-se transfusões entrepessoas que pertençam ao mesmo grupo sangüíneo. Baseando-se na regra de Ottembergtemos o esquema da compatibilidade sangüínea:

O grupo O é considerado doador universal pois não é aglutinado pelos outros grupos,pois não possui aglutinógeno. Pode doar sangue aos outros três e só recebe do própriogrupo. O grupo AB é receptor universal, pode receber de todos, pois não possuiaglutinina e só doa a seu próprio grupo. O grupo A doa a A e a AB e recebe de O e A. Ogrupo B doa a B e a AB e recebe de O e B.

Determinação dos grupos sangüíneos – Se faz por “soros-tipos” estabelecidos pelaorganização das Nações Unidas. Tomamos uma lâmina e colocamos em cadaextremidade uma gota de soro do grupo A e outra do grupo B. Em seguida a cada umadestas acrescentamos uma gota de sangue do grupo que se quer determinar. Mistura-se eespera-se até vinte minutos. A leitura é feita a olho nu, ou ao microscópio. Se somente osoro A aglutina as hemácias, o sangue pertence ao grupo B. Se for o soro B, o sangueserá do grupo A. Se ambos os soros (A e B) aglutinam-se as hemácias, o sangue será dogrupo AB. Finalmente, se nenhum dos dois sofrer aglutinação o sangue será do grupoO. Além destes aglutinógenos (A e B) temos ainda A1, A2 e A3 (raro) que têm certaimportância, pois determinam subgrupos, como A1B, A2B, etc.

Herança – Os grupos sangüíneos são hereditários e como tal seguem as leis de Mendel.Segundo Bernstein, parecem existir três fatores genéticos alelomorfos: A, B e r, dosquais um homem pode possuir dois deles. A e B são genes dominantes independentes eindicam a presença dos aglutinógenos A ou B. Por sua vez, r é recessivo e indica aausência destes aglutinógenos. Assim as possíveis formulas genéticas serão:

FENÓTIPO GENÓTIPO

(Caráter aparente) (Realidade genética)

O rr

A B BA

O

BBA B

O

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A AA ou Ar

B BB ou Br

AB AB

É baseado nestas fórmulas que é possível fazer-se a exclusão de um indivíduo, no casoda paternidade duvidosa. Note-se que dissemos exclusão, pois não podemos provar(através dos grupos sangüíneos) que tal pessoa seja ou não pai de determinada criança.Podemos sim, se for o caso, negar ou melhor excluir a sua paternidade. Suponhamosque uma criança seja do grupo A. Que sua mãe também seja do grupo A, e aquele aquem acusam de paternidade seja do grupo O . Há possibilidade deste homem ser paidesta criança? Sim. Pois, baseado nas leis de Mendel teremos:

1ª Hipótese ( ? AA x r r (? )

Ar Ar

2ª Hipótese (? ) Ar x r r (? )

Ar r r

? AA – mãe - dominante pura do grupo A

? Ar – mãe - dominante híbrida do grupo A

? r r – pai - recessivo do grupo O

Nestas condições, vemos que o filho pode ser do grupo A ou O. Isto, contudo, não nosindica que esta pessoa seja realmente o pai, mas mostra-nos a possibilidade de ser. E sea criança fosse do grupo B? Imediatamente excluiríamos este homem (do grupo O) dorol dos suspeitos, pois, vimos acima, que o filho deste indivíduo só poderia ser A ou O(no caso da mãe ser A).

Com os quatro grupos sangüíneos clássicos (A, B, AB e O) um homem sobre cada 7(sete) tem possibilidades de provar que não é o pai de um suposto filho. Mas, podemosusar outros sistemas como o MN e reduziremos a possibilidade a 1: 3. Se usarmostambém Rh e Hr, podemos chegar à conclusão de uns 50% dos casos.

Variações raciais – A proporção relativa dos grupos sangüíneos varia com os gruposétnicos. Exemplos:

O A B AB

Italianos .............. 37,35 44,95 11,45 6,25

Russo .................. 32,80 39,60 19,60 8,00

Alemães do Oeste 39,20 46,60 9,50 4,30

Árabes ................ 35,10 44,10 11,30 9,50

Portugueses ........ 41,64 47,17 8,25 2,93

(Dados segundo Varella – Fundamentos de la Hematologia)

Observação: Todos esses grupos pertencem a um único “stock” racial: caucasóide.

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Fato interessante a notar é que, em populações que viveram muito tempo isoladas, comomuitas tribos de nosso país, constata-se que são 100% do grupo O. Assim, também nossubgrupos, o A1 é 4 a 6 vezes mais comum que o A2 nos brancos. O A2 é maisfreqüente nos negros e ausente nos mongolóides. (Houssay)

Variedades conhecidas – Com os grupos e subgrupos conhecidos tínhamos até poucotempo atrás 288 tipos (seg. Varella), agora se reconhecem 2.560 variedades possíveis desangue (seg. Snyder) e classificado os Hr se chega a 8.640 (Houssay). Note-se que atendência é crescer, devido a novos aglutinógenos que se descobre a cada dia.

O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DO NORDESTE DE MINAS

MARCOS MAGALHÃES RUBINGER

A necessidade do Estudo Interdisciplinar das áreas “Alto Jequitinhonha e Pardo” e“Vale Jequitinhonha”.

Dentro de critérios econômicos, é possível definir o nordeste de Minas como “áreas desistema binário”. Este sistema é formado por duas áreas gravitantes de característicapolar. A primeira área corresponde ao “Alto Jequitinhonha e Pardo”, e a segunda ao“Vale Jequitinhonha”. No seu conjunto, o sistema encerra um potencial adormecido, aespera da pesquisa, do planejamento e dos investimentos de vulto para um realintegração no desenvolvimento econômico de Minas e do Brasil.

Dentro de uma focalização histórica, tão logo os bandeirantes devassaram os nossossertões, na era dos andarilhos, dos aventureiros e dos tropeiros, a região teve sua faseáurea com a exploração incipiente das lavras e a criação de rebanhos mais ao sul.Todavia, o progresso vertiginoso de outras regiões do Estado e do País, maisdiretamente beneficiados pelos transportes e pelos capitais, foi sufocando, pouco apouco, uma região que, desde muito, em situações planejadas, poderia ter se arrancadoda drástica situação de subdesenvolvimento em que se encontra. Porém, quando aspossibilidades de desenvolvimento crescem dia a dia; quando uma BR-4 já atravessatoda a vasta região, servindo de ponte para estreitas vinculações da economia nordestinacom a do centro-sul, não se justifica mais uma situação quietista frente ao assombrosopotencial do Vale do Rio Jequitinhonha. Em termos econômicos, sugerimos que apesquisa e o planejamento para a decolagem das áreas do nordeste de Minas, sejamexecutadas obedecendo à moderna técnica de levantamento interdisciplinar de áreas.Tendo em vista que as condições geográficas e os recursos naturais se diversificam aoponto de constituir um sistema binário, e cujos dois componentes gravitantes constituemáreas de potencial econômico e sociológico de certa disparidade, a focalizaçãointerdisciplinar da região deveria contar com a participação de economistas, geógrafos,engenheiros, médicos, antropólogos e sociólogos.

Como colocação preliminar do problema, elaboramos uma síntese da situação globaldas duas áreas que caracterizam o nordeste de Minas Gerais:

Área do Alto Jequitinhonha e Pardo

Caracteriza-se por um pequeno aproveitamento das terras seja para culturas ou pastos(menos de 30%), em face da má qualidade dos solos derivados de rochas arqueanas ealonquianas, bem como, por causa do relevo bastante acidentado que se estende pelaserra do Espinhaço ou serra Geral até o limite com a Bahia. Os sistemas adaptativos dacultura traduzem a característica de propriedade ecologicamente dividida. A zona deMinas Novas, até Diamantina, parte da serra Geral, a zona de Salinas, a de Espinhosa,

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Monte Azul e Rio Pardo, constituem antiga região de mineração do ouro e diamantesdesbravada por bandeiras (século XVIII). Essas localidades conservam, ainda hoje,embora de forma decadente, a indústria extrativa mineral como principal atividadeeconômica e que constitui a sua vocação futura. É uma área de pequenas propriedades.As fazendas e os sítios abrangem em Minas Novas apenas 14,5% da área municipal, eem Diamantina, atingem 15%. Nesses municípios, as subáreas de terras devolutas eimprodutivas, bem como o número de fazendas não exploradas são muito grandes. Épossível supor que a divisão da propriedade foi aí indiretamente provocada pelaeconomia mineradora. Nessa área de comunicações difíceis, gerou-se em torno doscentros de mineração uma corrente de pequenos sítios dedicados a uma incipienteagricultura de subsistência: pequenas plantações de milho, mandioca, feijão, arroz, parao abastecimento dos faiscadores e garimpeiros. A densidade de população é aí, muitorarefeita; relacionando a população rural com a área total dos municípios de MinasNovas e Diamantina, a sua densidade seria em média, 6 habitantes por quilometroquadrado. Tendo em vista o problema da mão de obra, é impossível compreender umaárea de pequenas propriedades com uma população tão rala. Nestas condições, deve-serelacionar a população rural somente com a área ocupada, ou seja 24 habitantes porquilometro quadrado de área preenchida em Minas Novas e Diamantina. Por outro lado,há uma grande subdivisão da propriedade nos municípios localizadas nascircunjacências da serra Geral, tais como: Rio Pardo, Monte Azul e Espinosa. Nos doisúltimos, grande parte é tomada pela mata da Jaíba nos vales dos rios Verde Grande eVerde Pequeno. Ali grassa a malária endêmica e, por isso mesmo, é quase desocupada.Ao sul de Minas Novas, no vale de Suaçui Grande, localizam-se os seguintesmunicípios: Santa Maria do Suçui, Peçanha, São João Evangelista e Rio Vermelho; novale do Mucuri: Malacacheta, Teófilo Otoni e Poté. Todos esses municípios localizam-se em zonas de solos mais aproveitáveis, derivados da decomposição de rochascristalinas. Sem perder a sua característica de pertencer a uma área de mineração,apresentam, contudo, maior parcela da terra aproveitada e aproveitável (70% parapastagens e outra parte agrícola). Além da agricultura de subsistência, existemplantações de algodão e mamona. A área total mantém relações com Montes Claros ouDiamantina, servidas por rodovias e pela Estrada de Ferro Central do Brasil; comGovernador Valadares pela BR-4 e outras incipientes estradas; com a área do ValeMédio Jequitinhonha pela BR-4, pequenos trechos navegáveis e outras incipientesestradas. Finalmente, a vocação marcante da Área do Alto Jequitinhonha é a “indústriamineral”.

Área do Vale Médio do Jequitinhonha

Localiza-se no extremo nordeste do Estado, e caracteriza-se, ao contrário da suacomponente binária, como uma área de grandes propriedades que se estende para o sulaté o rio Mucuri. Por isso, mesmo, até hoje, alguns grupos indígenas, encontram ali,rincões perdidos onde conseguem sobreviver. A principal atividade econômica dessaárea é a pecuária. Os municípios com ampla criação e dotados de maior espaço empastos, mais de 70%, situam-se no Vale do Jequitinhonha, são eles: Almenara,Jequitinhonha, Pedra Azul e Medina. É preciso salientar o processo de inter-relaçõescom outros sistemas de áreas. É o caso do gado criado nesses municípios que vai quasetodo engordar nas invernadas de Montes Claros, de Curvelo e de Corinto. Por sua vez,grande parte do abastecimento dos mercados de Belo Horizonte e Rio de Janeiro épreenchida pelo gado criado na Área do Vale do Jequitinhonha, fato este, que reclamaum maior atendimento das suas necessidades econômicas para que a oferta possaatender ao crescente aumento de procura sulina. Nessa área, a lavoura é bastante

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reduzida, ocupando menos de 6% do espaço produtivo. Mais ao sul, na zona de Mucuri,densidade de população é insignificante, e as matas preenchem mais de 40% do espaçoprodutivo. A principal atividade econômica é a extração de madeiras. Justifica-se aí,então, um certo incremento da indústria extrativa mineral que, já existe em pequenaescala. Extrai-se mica, pedras coradas e cristal de rocha. Há grande deficiência dosmeios de transporte. A insalubridade da região é marcante, constituindo sério impecilhoao desenvolvimento. A fixação do homem nas terras por fazendas e sítios está abaixo de50%; em Itambacuri apenas 15,3% do espaço municipal são ocupados pelaspropriedades rurais. Todavia, a área tem grandes possibilidades econômicas dedesenvolvimento, devido ao seu solo fértil, ao volume pecuário e as suas enormesextensões de matas.

Conclusão: O sistema binário formado pelas duas áreas econômicas que estãolocalizadas no nordeste de Minas Gerais, em face das preliminares acima estabelecidas,reclama uma urgência aceleração no seu desenvolvimento.

São áreas que servem a outros sistemas econômicos do Estado e do País, e pelaspossibilidades industriais que apresentam com reais vantagens para a economianacional, devem ser colocadas numa ordem de prioridade mais vantajosa quanto aodesenvolvimento econômico. Este desenvolvimento deverá se fazer tendo em vista asvocações das duas áreas acima delineadas. É importante frisar aqui o constantedescobrimento de jazidas de minérios atômicos em diversos pontos dessas áreas. Emsuma justifica-se novo estudo de campo em toda a região, isto porque, os existentes nãoobedeceram às técnicas modernas de pesquisas que o planejamento racional exige.Vimos, sucintamente que os problemas das áreas são de naturezas: geográfica,econômica, sanitária, humana, etc., por conseguinte, a focalização da pesquisa deve serde caráter disciplinar.

Numa região onde ainda vivem indígenas (tribo de Maxakali, à qual o serviço deproteção aos índios juntou, recentemente, um grupo de índios Crenaks), não se podepromover o desenvolvimento econômico fora da focalização interdisciplinar.Evidentemente, é possível modificar uma economia, implantar uma infra-estruturaeconômica e dar-lhe o desenvolvimento almejado, sem que se modifique o homem.

É uma conclusão pacífica a de que nenhuma economia pode estabelecer-se enquantonão surge o correspondente tipo humano. Pela mesma forma, nenhuma mudança naestrutura social das duas áreas que focalizamos poderá ser realizada sem o elementohumano para esse fim. Fato relevante que deve ser salientado, é a crescente formaçãode cientistas e profissionais filhos de inumeráveis famílias da região Nordeste de Minas.Esta circunstância é bem o retrato da inquietação pela qual está passando o Vale doJequitinhonha na ânsia de arrancar do marginalismo criado por um sistema econômicoarcaico e obsoleto.

Economistas, sociólogos, antropólogos e geógrafos é que vão dizer, conjuntamente,como o povo de Minas vai sair do subdesenvolvimento e ingressar numa fase deprosperidade. Compete ao governo a iniciativa.