sobre a ii - repositório aberto · vos dar um testemunho publico de minha eterna gratidão....

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ALEXANDRE PEREIRA CORTE-REAL A L l M A S C0SS1DERAÇÕES SOBRE A II Dissertação inaugural APRESENTADA i ESCOLA MEDICO-CIRÚRGICA DO PORTO PORTO TYPOGRAPHIA OCCIDENTAL 66, Rua da Fabrica, 66 1889 H*tz

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Page 1: SOBRE A II - Repositório Aberto · vos dar um testemunho publico de minha eterna gratidão. Acceitae este fructo escasso do meu es tudo; porque se é pequenaaofferta.grandé » o

ALEXANDRE P E R E I R A C O R T E - R E A L

A L l M A S C0SS1DERAÇÕES SOBRE A

II Dissertação inaugural

APRESENTADA i

ESCOLA MEDICO-CIRÚRGICA D O P O R T O

PORTO TYPOGRAPHIA OCCIDENTAL

66, Rua da Fabrica, 66

1889

H*tz

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ESCOLA MEDICÛ-CIRDRHICA DO TORTO CQNSELHEIRO-DIRECTOR

VISCONDE DE OLIVEIRA SECRETARIO

RICARDO D'ALMEIDA JORGE

CORPO D O C E N T E Professores proprietários / '

i.a Cadeira—Anatomia descriptiva , e geral João Pereira Dias Lebre.

2.a Cadeira—Physiologia <".,.. Vicente Urbíno de Freitas. J.a Cadeira—Historia natural dos

medicamentos e materia me­dica Dr. José Carlos Lopes.

4_a Cadeira —Pathologia externa e therapeutica externa Antonio Joaquim de Moraes Caldas.

5.a Cadeira—Medicina operatória. Pedro Augusto Dias. 6.a Cadeira—Partos, doenças das

mulheres de parto c dos re-cem-nascidos Dr. Agostinho Antonio do Souto.

7-;i Cadeira—Pathologia interna e therapeutica interna Antonio d'Oliveira Monteiro.

8.a Cadeira—Clinica medica . . . Antonio d'Azevedo Maia. 9-* Cadeira—Clinica cirúrgica . . Eduardo Pereira Pimenta.

io.a Cadeira—Anatomia pathologi-ca Augusto Henrique d'Almeida Brandão.

i i . a Cadeira—Medicina legal, hy­giene privada e publica e to­xicologia Manoel Rodrigues da Silva Pinto.

i2.a Cadeira—Pathologia geral, se-meiología e historia medica . Illidio Ayres Pereira do Valle.

Pharmacia Isidoro da Fonseca Moura.

Professores jubilados Secção medica S João Xavier d'Oliveira Barros.

3 | Jose d Andrade Gramacho. SecçSo cirúrgica Visconde de Oliveira.

Professores sixbstitatos Secção medica í Antonio Placidoda Costa.

} Maximiano A. d'Oliveira Lemos Junior. Secção cirúrgica Ricardo d'Almeida Jorge.

| Cândido Augusto Correia de Pinho. Demonstrador de Anatomia

Secção cirúrgica Roberto Belarmino do Rosário Frias.

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A Escola nao responde pelas doutrinas expendidas na dissertação c enunciadas nas proposições.

{Regulamento da Escola de 3} d'abril do 1840, art. 155).

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A MEMORIA

MINHA EXTREMOSA MÃE

MINHA BOA IRMÃ

Saudade eterna.

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A

MEU PAE

OíTerecendo-vos a minha these cumpro um dever, túii tendes o producto das mi­nhas vigílias e locubrações, e o fructo dos vossos generosos sacrifícios.

Se mais não pude conseguir, não foi por­que me faltasse o vosso auxilio.

Acceitae esta mesquinha offerta como um testemunho

Do acrisolado amor filial e eterna gratidão, que vos consagra o

vosso filho

Alexandre Pereira Valverde Tasconcellos Corte-Eeal.

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A meu irmão e Padrinho

José Pereira Valverde Vasconcellos Corte-Beal Foste para mim um segundo Pae ; à

vossa protecção e amisade verdadeiramente fraternaes, devo eu a ventura de ver hoje realisados os vossos ardentes desejos e as minhas gratas aspirações.

Pertence-vos um quinhão d'esta pagina, que vos offerece

o vosso affectuoso e sempre grato irmão

cA lexandre.

A MINHAS IRMÃS

íftaria José Gort^-Real Hnna Hlbina Cort^-Real

"Joaquina Julia <5ortç-Real E

A MEU IRMÃO

cÃanctócc c/e QJaAccnce/Zos Qor/e.Q/Zeaf A vós, que partilhaes da minha alegria,

um apertado abraço do

vosso irmão

çA lexandre.

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A MINHA TIA

DE M i l W M m CORTE-REAL E

A MEU TIO

PEREIRA VALMERDE I I M I D A VASCQNCELLQS CORTE-REAL

Nunca poderei pagar-vos com a minha dedicação o carinho e auxílios de toda a espécie, com que me ajudasteis durante a minha vida Académica.

Inscrevi os vossos nomes n'uma das pa­ginas d'esté meu humilde trabalho, para vos dar um testemunho publico de minha eterna gratidão.

Acceitae este fructo escasso do meu es­tudo; porque se é pequena a offerta.é grand» o sentimento que a acompanha.

Beija-vos as mãos o

vosso sobrinho muito agradecido

Alexandre Pereira Yairaâe Vascoacellos Corte-Eeal.

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A MINHAS TIAS

(Anna Albina Vasconcellos Carte~T(eal Maria Emilia de Miranda e Silva

A MEUS TIOS

oAntonio Justino Peixoto Miranda Vasconcellos (Abb.' Luiz (Antonio 'Peixoto [Miranda Vasconcellos

A MINHAS PRIMAS

A MEUS PRIMOS

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AO MEU PRESADISSIMO AMIGO

0 111.""1 e EX.™ SNR.

DR. PAULO MARCELLINO DIAS DE FREITAS

E A MEU "PRIMO

Dr. Lui^ de Vasconcellos Coríe-Real

Guiado pelos vossos sábios e úteis con­selhos, e amparado pela vossa protecção, consegui abraçar a mesma cruz, que vós abraçasteis.

E agora irei, como vós, prescrutar junto do leito da dôr os gemidos do enfermo, quer eu suba ao palácio dos reis, quer desça ao albergue dos pobres.

Irei, como vós, procurar ao centro da terra a historia d'um soffrimento ou o segredo d'um crime; mas não poderei receber, como vós tendes recebido, a gratidão d'uma mãe a quem salvasteis o filho ou da esposa a quem salvasteis o marido, se não continuar a ser guiado pela vossa mão intelligente n'esta nobre, mas por vezes espinhosa mis­são, que me confiaram.

Se a minha gratidão é pouco, para vos agradecer a vossa dedicação, permhti, ao menos, que vos offereça este insignificante trabalho

O vosso amigo muito reconhecido

^Alexandre 'Pereira Corte 'Tieal.

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AOS

raeus GonDiSGiPUiiOS

Chegamos a esta encruzilhada da vida, c só nos faltam dois companheiros; um que a morte nos roubou, e outro que a doença prostrou no leito, sem que elle po-desse acompanhar-nosna íueta, em que ví­nhamos empenhados.

Se não fora esta nota tão triste, eu teria hoje a felicidade d'offereccr este meu hu­milde trabalho a trinta e seis condiscípulos, que foram para mim outros tantos verda­deiros amigos. Vosso irmão no trabalho, cu compartilhei comvosco das mesmas ale­grias, e bebi o fel das mesmas dores; e tendo a felicidade de merecer sempre a vossa amisade não estranheis agora que cu deixe d'especïalisar os nomes d'alguns de vós, que considero como Íntimos, e guar­dai este mesquinho frueto do meu trabalho, não pelo que vale, mas pelo que significa, que vol-o offerece

o vosso condiscípulo

^Alexandre Pereira Cortc-cReal.

AOS MEUS AMIGOS

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AO SEU PRESIDENTE

o Ill.mo e Ex.™ Sr.

Lr. Antonio d'Aseyedo Maia Como testemunho de muita consi­

deração c respeito pelo seu elevado ca­racter, homenagem ao seu profundo saber e admiração pela sua muita de­dicação ao trabalho

Off.-O discípulo agradecido

(Alexandre 'Pereira Corte í̂ eaZ.

AOS EX."™ PROFESSORES

T)r. eA gostinho do Souto Eduardo 'Pereira, T'intenta [Manoel eRj>drigues da Silva 'Pinto T)r, José Carlos Lopes *Pedro (Augusto TJias Illidio oAires Pereira do Z)alle zAntonio Joaquim de Moraes Caldas oAugusto Henrique d'zAlmeida Brandão [Maximiano d'Oliveira hemos Junior.

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à IOSSà THESE

Tendo concluído os exames parciaes do nosso curso de Medicina e Cirurgia restava-nos a apre­sentação e defeza d'uma dissertação a que se dá o nome de —these;-assim nol-o impõe a ultima determinação da lei.

Bem longe de possuirmos os recursos neces­sários para podermos apresentar um trabalho de algum valor scientifico, não podia acudir-nos ao espirito a estulta pretenção de tentar sequer dar-Ihe o desenvolvimento, que a importância do as­sumpto nos exigia.

Á pobreza da nossa intelligencia accrescia uma escassez considerável de tempo; é, portanto, um trabalho de occasião, feito muito á pressa, apenas, com o fim de cumprir uma obrigação.

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Sirva-nos esta confissão de desculpa para po­dermos merecer a benevolência do illustrado jury, que hade julgar o nosso trabalho.

A cada momento eram suscitadas duvidas no seio de nossa família relativamente ao modo de alimentar e educar as creanças; e, se uma vez por outra, conselhos de medicos auctorisados vieram resolvel-as, outras vezes por demasiadamente tar­dios não poderam obstar a que algum dos entes, que hoje nos são caros, fossem victimas d'um certo numero de preconceitos, que por ahi correm á conta de rotina, a maior parte das vezes preju-dicialissimos e até perigosos.

Curar o mal que apparece é muito, mas pre-venil-o, e n'estas idades tão expostas, é muito mais ainda.

Se a vida do infante, como diz Bouchut, não é ura estado normal, mas sim um esforço para elle, quem não ajudará esse esforço n'um ente tão sus­ceptível, tão delicado e á mercê de tantos males?

Não pôde haver edifício solido sem alicerces solidamente cimentados.

Agora que nós procuramos instruir a mulher, abrindo-lhe as [tortas das nossas Academias para que possamos fazer d'ella uma educadora intelli­gente, cliamemos-lhe a atlenção para este assum­pto, que deve ser olhado como d'uma importância capital.

Não nos limitemos a incutir-lhe no espirito

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quaes as obrigações que ella tem a cumprir na sua funcção orgânica —a maternidade — ; mi-nistremo-lhe todas as noções as mais uteis, as mais praticas e as mais racionaes da hygiene da infância, para que ella possa tornar-se uma mãe exemplar no desempenho das suas funcções so-ciaes—a educação physica, moral e intellectual dos filhos.

Bem sabemos que se não podem apresentar re­gras fixas e absolutas, applicaveis a todos os ca­sos; mas se ao coração d'uma mãe intelligente jun­tarmos os esclarecimentos scientificos necessários, e umas certas noções de cousas que ella deve saber, teremos assim prestado um grande serviço em fa­vor da sociedade.

Não é apenas uma questão moral o problema da educação feminina, é também uma questão so­cial e económica.

A' educação da mulher está confiada a regene­ração da humanidade, e é a nós, os medicos, que nos cabe a restricta obrigação- de ensinar ás mães quaes os perigos, que podem advir aos filhos da transgressão cTum certo numero de preceitos hy-gienicos.

Importamos da sociedade costumes, e com el­les novos agentes modificadores, que, actuando desregradamente em nossa organisação, rompem, por vezes, o equilíbrio physiologico e criam apti­dões para moléstias, que mais tarde apparecem

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sob a influencia de causas bem insignificantes. A hygiene da primeira infância deve ser culti­

vada com todo o esmero e assiduidade. As pes­soas a quem fôr confiada a educação das crean-ças, deverão saber qual,a influencia dos agentes naturaes na nossa organisação, e o modo d'apro-veitar essa influencia em beneficio da perfeição physica. Só assim poderão concorrer com a sua illustrada e efficaz direcção para o bem d'aquelle cuja sorte futura depende em grande parte da ma­neira porque foram educados.

O poder da hygiene, mais do que o da thera-peutica, está no conjuncto de meios de que ella dispõe, e, para que esse poder produza os deseja­dos effeitos, é preciso vulgarisal-os.

Feitas estas considerações, parece-nos ter jus­tificado o nosso propósito na escolha do assumpto, que, por tantos títulos, nos é sympathico.

Passemos, pois, a traçar o plano do nosso tra­balho. Na primeira parte estudamos, embora rapi­damente, alguns dos preceitos hygienicos que mais de perto devem ser observados, relativos ao feto e ao recem-nascido.

Na segunda, referimo-nos aos diversos proces­sos d'alimentaçao; e occupamo-nos na terceira d'al-guns cuidados hygienicos que se devem às crean-ças, até ao período de desmamação.

Damos ao nosso trabalho uma feição prática e perfeitamente elementar, e, se não conseguimos

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trazer alguma novidade para a sciencia, nem ser methodicos na disposição dos assumptos para que dirigimos a nossa attenção, sirva-nos de desculpa a falta de tempo e a necessidade que tínhamos, de nos referir só áquelles pontos, que julgamos de maior importância.

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PRIMEIRA PARTE

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Hygiene da gravidez

Abrimos o nosso trabalho por um capitulo que intitulamos Hygiene da gravidez, e melhor fora tel-o precedido d'uni outro, que intitulássemos Hy­giene do casamento, seriamos até mais methodi-cos procedendo d'esté modo. Não o fazemos por­que as nossas obrigações diárias nos inhibera d'ir tão longe; o tempo de que dispomos é pouco e porisso preferimos dirigir a nossa attenção para outros pontos que prendem mais de perto com. o titulo da nossa dissertação, e que julgamos de maior utilidade prática.

Que alguém de maior competência, que a nos­sa, se incumba d'ir procurar nas condições do nos-

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so meio sociológico a origem d'um considerável depauperamento orgânico, que já herdamos e que temos de transmittir aos nossos filhos. E' nossa convicção, que a mortalidade sempre crescente dos recem-nascidos depende em grande parte da má escolha dos progenitores, e como assim seja não podemos esperar uma garantia segura para a per­fectibilidade da espécie.

Posto isto, vamos apresentar um certo numero de preceitos hygienicos que devem ser observados pela mulher, logo que para ella comece o papel de mãe.

Desde o momento da concepção até ao parto, espaço que comprehende, pouco mais ou menos, nove mezes, ella começa a alimentar inconsciente­mente o producto da concepção, e alimenta-o não com productos que ella possa voluntariamente es­colher, preparar e administrar, mas sim com aquelles que o seu organismo hygido ou mórbido prepara e ministra.

E' necessário, pois, que as suas funcções or­gânicas se executem com harmonia physiologica, e que a sua alimentação seja conveniente e apro­priada para evitar que no sangue possam circular princípios que lhe tornem o organismo doente.

O regimen alimentar da mulher gravida, deve, em regra, ser o mesmo que no seu estado normal, e em tempo nenhum ella deve observar com tanto rigor o preceito da temperança como durante

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a gravidez. Os alimentos devem ser de fácil diges­tão, nutrientes e pouco condimentados, e posto que a mulher gravida precise d'uma alimentação um pouco mais copiosa, é preciso que ella não so­brecarregue o estômago; porque pôde prejudicar a sua saúde, e, conseguintemente a do filho.

A quantidade dos alimentos deve ser regulada pelo appetite, e em proporção com o exercício; acontece porém algumas vezes que por uma per­versão do appetite a mulher gravida repugna os alimentos de que mais gostava, preferindo aquel-les que antecedentemente aborrecia, mas nem sem­pre é licito satisfazer taes caprichos, sobretudo quando a mulher deseja substancias que possam alterar-lhe a saúde, porque d'umas taes aberra­ções de paladar podem resultar-lhe verdadeiros estados pathologicos, com grave prejuízo da saú­de do filho.

Não ha justificação possível para que subsista a crença vulgar de que á mulher gravida se de­vem satisfazer todos os desejos, por mais extrava­gantes que pareçam.

As bebidas, que fazem parte da alimentação, devem ser usadas moderadamente, evitando-se sempre o abuso de bebidas alcoólicas e estimu­lantes, como vinho, chá ou café, que, accelerando consideravelmente a circulação, podem prejudicar a vida do feto.

Se a saúde da mãe fôr alterada por qualquer

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dos numerosos accidentes que acompanham o pe­ríodo da gestação, como nauseas, vómitos, ane-

, mia, plethora, etc., as modificações dos alimentos devem estar subordinadas á indicação therapeuti-ca, e n'este caso a intervenção do medico é indis­pensável.

Para que uma alimentação bem regulada lhe seja proveitosa, é necessário que ella faça exercí­cios de qualquer natureza, embora moderados; porque o exercício é um verdadeiro estimulante de todas as funcções; deve continuar a enlregar-se ás suas occupações habituaes, mas evitar sem­pre exercícios violentos ou esforços exaggerados que possam determinar uma conformação viciosa do feto, ou mesmo provocar o aborto.

Se a sua condição social lh'o permitte, deve dar passeios a pé, curtos e frequentes, mas pro­curar sempre fazel-o com socego e serenidade de espirito, sobretudo nos últimos períodos da gravidez; abster-se de corridas a cavallo ou em carro, e especialmente da dança, cujos movimen­tos precipitados lhe podem ser muito prejudiciaes.

Durante a gravidez, a mulher está mais ex­posta a quedas, sobretudo nos últimos mezes, por isso que o seu centro de gravidade fica sujeito a novas condições d'equilibrio ; portanto, o calçado deve ser largo e de tacão baixo, porque qualquer choque ou contusão sobre o ventre pôde pôr em risco a vida do feto.

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A hygiene do vestuário deve merecer-lhe todo o cuidado; os vestidos devem ser leves, quentes e largos, para que não exerçam pressão alguma so­bre o thorax ou. sobre a cintura, pois é necessá­rio que os movimentos respiratórios e a circula­ção se réalisera sem difficuldade, e que nada com­prima o abdomen.

A mulher gravida, cujos meios de fortuna lhe permitiam o viver no seio da sociedade elegante, deve abster-se d'uns certos rigores da moda, que a obrigam a andar entalada n'um sem numero de varas d'aço que fazem parte da confecção d'uns colletés a que se dá o nome d'um espartilho. Não sei mesmo se será possível calcular-se o perigo d'uma tal toilelle, tão ridícula e tão pouco hygie-nica.

Impõe-se claramente "ao espirito a gravidade d'uma compressão exaggerada, quer temporária quer permanente sobre órgãos que precisam de funccionar livremente para não haver ruptura de equilíbrio pbysiologico, que tão necessário se tor­na no período da gravidez.

A compressão sobre o thorax além d'outros inconvenientes pôde dar origem a inílammações e engorgitamentos dos peitos, e se o colleté se op-põe á elevação do utero, este órgão é natural­mente deslocado, o que pôde ompromelter a saúde e até a vida da mãe, além de produzir no feto deformidades por vezes incuráveis.

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E' pre,iso que a mulher gravida não sacrifique a sua vida e a do filho, com o fútil prelexto de satisfazer um certo numero d'exigencias creadas pelo meio ignorante em que vive.

Pelo facto de conceber, deixou de ser inteira­mente livre, para ficar em rigorosa dependência da nobre missão que a natureza lhe confiou.

Reprovamos em absoluto o uso do espartilho, e aconselhamos os vestidos largos ; mas não se se­gue d'aqui que o ventre da mulher gravida fique desprovido de qualquer amparo e protecção.

Nos últimos mezes da gravidez, ha casos em que a mulher tem necessidade de amparar o ven­tre com uma cintura propria, para que não seja compromettida a elasticidade das paredes abdo-minaes em virtude do peso do feto; dá-se isto muito especialmente nas mulheres mulliperas.

A propria cintura pôde favorecer a accommo-dação do feto, fazendo corresponder o seu maior eixo com o eixo longitudinal da mãe.

A mulher deve conservar durante todo o pe­ríodo da gravidez o uso dos banhos de limpeza mornos, e, quando não ha contra-indicação, tomar os de mar frios excepto nos dois primeiros e no ultimo mez da gestação.

O banho morno não deve exceder em tempe­ratura 3i° a 35°, e é conveniente que a mulher gravida se recolha á cama depois de o tomar.

As relações sexuaes durante a gravidez devem

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ser praticadas cora um certo numero de precau­ções, de modo a evitar a provocação do aborto cu dar origem a hemorrhagias accidentaes, sem duvida muito perigosas tanto para mãe como para o filho. Sem querermos privar a mulher gravida d'uma funcção tão importante aconselhamos com-tudo o seu uso moderado e abstenção completa nos últimos períodos da gravidez.

Em regra, não lhe convém frequentar os bailes e os theatros ou outros divertimentos que possam impressional-a vivamente, augmentando assim a susceptibilidade nervosa, já tão exaggerada espe­cialmente nos últimos mezes da gravidez.

Ser-lhe-hia melhor passeiar pelo campo, se o seu estado lh'o permittir, para fugir ao ar viciado dos grandes centros, que lhe é muito prejudicial.

Insistimos n'estes preceitos hygienicos durante a gravidez e referimo-nos, de preferencia, á mu­lher da cidade, porisso que, a robustez e condi­ções sociaes da mulher do campo dispensam um regimen tão rigoroso, que nos grandes centros con­stitue uma necessidade.

Nada se pôde dizer, em absoluto, relativamente a todas estas regras hygienicas, porisso que a gravidez se acompanha por vezes de um certo, numero de phenomenos que reclamam indicações especiaes, e só ao medico compete intervir em taes casos, para que não seja compromettida a saúde ou mesmo a vida da mãe e com ella a do filho.

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Il

O recem-nascido

Chegou a hora solemne, em que o novo ser vai travar conílicto com o mundo exterior.

Romperam-se os envolucros, que o revestiam, fez-se a dehiscencia e eil-o no começo d'uma nova vida.

O ar que o cerca precipita-se até ás ultimas ramificações bronchicas, os raios luminosos atra-vessam-lhe a pupilla até á retina, ouve-se o pri­meiro vagido e alguns dos órgãos, que até alli estavam em repouso entram em actividade.

O sangue influenciado pelas circumstancias em que de subito se encontra pára um momento no seu curso e muda de direcção nos systemas de canaes em que circulava.

3

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?A

Todo este complexo d'acçôes, que n'iim mo­mento se manifestaram, tornam muilo susceptível todo o seu organismo e demasiado melindroso cada um dos seus órgãos.

Se antes do nascimento a creança era credora da mais vigilante sollicitude, com mais rasão o deve ser agora, que numerosos e nocivos agentes modificadores começam a exercer directamente so­bre ella a sua acção.

Um engano, uma omissão por insignificante que pareça pôde influir consideravelmente na saú­de futura do recemnascido.

Da falta d'alguns soccorros de que elle imme-diatamente carece, das irregularidades no regimen a maior parte das vezes por ignorância das mães, é que resulta quasi sempre a fragilidade da infân­cia e por vezes a sua morte prematura.

E não se attribua a causa de muita dôr, que crucia famílias inteiras pouco depois das alegrias do nascimento, a uma condição inhérente ao ho­mem, como muita gente julga.

Seria fútil attribuil-a a um principio económico estabelecido pela Providencia para conservar um certo equilíbrio entre o numero de vidas e os meios de as conservar, como que para pôr um dique ao crescimento progressivo da população, receiando que no mundo não hovesse logar para tanta gente.

A natureza já preveniu um tal resultado creando a morte como uma consequência inevitável da vida.

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São muitas e muito complexas as causas da extraordinária mortalidade das creanças e debaixo do ponto de vista social, é esta uma questão que tem preoccupado vivamente todos os hygienistas e economistas.

Atlendendo á pouca resistência, que estes fra­cos organismos oppõem aos modificadores exter­nos, é necessário que a sua educação seja baseada nos mais rigorosos preceitos da hygiene.

Vamos referir-nos aos cuidados immediatos para com os recem-nascidos, o que constitue toda a doutrina d'esté capitulo.

Cuidados immediatos

Logo que a creança nasce, o primeiro cuidado da parteira ou do medico parteiro deve consistir em collocal-a de lado, de modo a evitar que o san­gue e os líquidos, que se escoam da vagina da mãe, possam estorvarlhe a respiração ou mesmo as-phyxial-a.

D'esté modo facilitamos a sahida de mucosida-des e agua, que ordinariamente se encontram na cavidade bocal, e quando assim o não consigamos totalmente, devem extrahir-se com a ponta do dedo ou com uma penna de gallinha.

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Se o cordão umbilical tiver dado alguma volta no pescoço desenrola-se, e em seguida procede-se â sua ligadura e secção.

A ligadura applica-se á distancia de 1res a quatro centímetros pouco mais ou menos da ori­gem do cordão, e quando se reconheça que elle está infiltrado de serosidade, comprime-se previa­mente com os dedos para que, do seu escoamento, não possa resultar o relaxamento ulterior da liga­dura.

Esta pôde fázer-sè com um fio de linho ence­rado bastante consistente, para que possa suppor­tai- o esforço necessário a produzir a constricçào das artérias umbilicaes; antes porém de aportar o fio é necessário verificar, que não haja alguma hernia umbilical, para que não seja envolvida por elle, pois que d'isso resultaria necessariamente a morte do recém-nascido.

Ligado o cordão, eorla-se com uma thesoura bem afiada para aquém da ligadura, logo depois envolve-se a creançan'uma llanella, e em seguida procede-se à sua lavagem.

Pôde acontecer que, durante estas operações preliminares, a creança não grite, nem mesmo dê indícios de que respira, levando-nos a crer que nasceu morta ou foi victima d'uma asphyxia pro­vocada por algum dos accidentes, que já aponta­mos ou por qualquer complicação no parlo.

N'este caso devemos procurar remover imme-

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chatamente tudo quanto possa embaraçar-lhe a en­trada do ar, borrifal-a com agua fria, e em seguida dar-lhe fricções com um panno aquecido ou com a mão ; isto basta muitas vezes para dissipar os nossos receios ; porque não é raro nascerem as creanças n'este estado de asphyxia apparente para se reanimarem d'ahi a pouco; comtudo, quando assim não aqpnteça, devemos recorrer á insuflação e á respiraçãp artificial.

A creançavsae do ventre materno com a pelle coberta por um enducto sebaceo, que se localisa de preferencia na cabeça, assilla, regiões nadegueiras e inguinal; d'aqui a necessidade de lhe dar um banho, para tornar mais livre a transpiração cuta­nea; e como a agua simples não basta para tirar este enducto, é preciso juntar-lhe algum sabão de­pois de termos previamente untado o corpo da creança com uma substancia oleosa como: óleo de amêndoas doces ou manteiga, e melhor ainda com uma gemma d'ovo.

A agua deve ser morna, e depois de introdu­zida a creança na banheira, devemos suspender-lhe a cabeça com uma das mãos e com a outra ba-nhal-a cuidadosamente com uma esponja fina.

O banho deve ser morno e dado o mais de­pressa possível, não deixando nunca arrefecer o corpo do recem-nascido.

Lavada a creança enxuga-se cuidadosamente com um panno de, linho quente e examinam-se-lhe

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as vias e aberturas naturaes com o fim de verifi­car se ha occlusão ou alguma deformação, que re­clame uma operação cirurgica immediata.

Em seguida cobre-se-lhe a cabeça e applica-se uma faxa de linho sobre o abdomen da largura de três a quatro dedos com o fira de sustentar a parte do cordão, que ficou adhérente ao umbigo, deitan-do-se depois junto da mãe onde ella certamente en­contra a temperatura de que cresce nos primeiros momentos da vida.

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IV

Enfaixamento

N'um capitulo especial trataremos do vestuá­rio da creança e teremos então occasião de nos re­ferir ás différentes peças, que fazem parte do seu enxoval.

Por agora referir-nos-hemos á pratica preni-ciosa da maior parte das parteiras relativamente ao modo de enfaixar as creanças, pratica esta con­tra a qual se insurgiram dous espíritos notáveis como Locke na Inglaterra e Rosseau na França, pelas deformidades por vezes incuráveis, a que pôde dar origem, quando não seja a causa mais fre­quente da sua grande mortalidade.

A hygiene moderna acompanha-os n'este pro­testo, e ao próprio senso commum repugna admit-

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tir, que seja util para uma creança aprisional-a com um sem numero de pannos, comprimindo-lhe os braços, estendidos ao longo do corpo, as per­nas immoveis e approximadas, e a cabeça firme­mente appoiada sobre a parte superior do peito.

É este um supplicio enorme que assim infli­gem ás creanças com receio que a liberdade de movimentos lhe seja nociva, deformando-lhe os membros e o tronco.

E querendo remediar um mal vão crear outro ainda maior; porque lhe applicam uma espécie d'apparelho de tortura, que lhe torna impossível o somno vivificador de que precisam, e que é mui­tas vezes causa d'aquelle vagir afflictivo e lasti­moso que nos confrange a alma e que as mães e amas ignorantes attribuera quasi sempre a cólicas, etc.

Este prejuízo tende, felizmente, a desapparecer e a educação physica terá feito um grande bem procurando eliminalo completamente.

Ë fácil conceber que uma tal compressão so­bre os ossos da creanca, que ainda estão mal li­gados e pouco desenvolvidos pôde dar origem a deformações, ou mesmo a fracturas, que ponham em risco a vida da creança.

As funcções da circulação, respiração e nutri­ção não podendo executar-se com regularidade, re­sulta daqui a transformação das creanças n'umas verdadeiras múmias, que a maior parte das vezes

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são victimas do rachitismo e de muitas outras doenças, que de futuro lhe podem produzir a morte.

Sendo impossível a transpiração da pelle é claro que a falta d'esta funcção importantíssima deve concorrer para comprometter a saúde e até a vida da creança.

Emfim seria um nunca acabar de prejuisos e perigos para a creança o resultado da prática d'um tal processo, e por isso vamos indicar aquillo que nos parece mais racional a tal respeito.

A parte do cordão que ficou adhérente ao um­bigo da creança, carece de ser amparada por meio d'um faixa, depois de coberta com uma compressa de linho fino, e não ha duvida que esta faixa pôde ser acompanhada por uma outra, que sirva para resguardar a creança da impressão do frio, que lhe pôde ser muito prejudicial.

Não ha porém necessidade de exercer compres­são, nem tão pouco prender-lhe os membros, que a creança carece de mover livremente ; porque para isso é que elles foram creados.

Percebe-se bem claramente, que a menor com­pressão no peito ou no abdomen pôde não só pro­duzir o desvio dVgãos importantes como estor-var-lhe o seu desenvolvimento, e a constricção dos vasos periphericos dar origem ás congestões por vezes perigosíssimas como são as dos pulmões e do cérebro.

A faixa deve ser de linho e não de flanella,

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porque esta conservasse sempre húmida pelo au­gmenta da transpiração, e não só a creança enfra­quece consideravelmente como pôde ser affectada de rheumatismo quando por qualquer circumstan-cia arrefeça, e porque o próprio contacto da fla-nella pôde irritar-lhe a pelle.

A ílanella só convirá ás creanças muito fracas pouco dispostas a transpirar ou quando a tempe­ratura esteja baixa.

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SEGUNDA PARTE

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Alimentação

Vamos entrar no estudo d'uni dos capítulos, em que dividimos o nosso trabalho, cuja importância é d'uma evidencia immediata, e muito embora nos seja impossível dar-lhe todo o desenvolvimento, de-morar-nos-hemos comtudo mais alguma cousa, que nos capítulos precedentes, sem procurarmos d'esté modo fugir á grave responsabilidade, que já pesa sobre nós pelo modo rápido como os havemos tra­tado.

Sendo o leite o único alimento do recemnas-cido, durante os sete ou oito primeiros mezes da sua idade, vamos referir-nos ao alleitamento natu­ral e artificial, tratando em primeiro logar da ama-

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mentação materna e pelas amas, e por ullimo da amamentação artificial e mixta.

Amamentação materna

A mulher, que na hora extrema de ser mãe soffreu os horrores acerbos da dôr e do perigo, contempla agora orgulhosa o fructo do seu amor, e ostenta com soberania o seu mais precioso pri­

vilegio —■ a maternidade; — e ella que é toda ter­

nura e dedicação, não pôde furlar­se ao dever de amamentar o filho, a quem já cedeu uma parte da sua vida, porque se fizer appello'aos seus senti­

mentos, o desejo de cumprir tão nobre missão im:

põe­se­lhe espontaneamente ao espirito. Ha infelizmente circumstancias fataes, que a im­

pedem de cumprir tão sagrado dever, mas quando assim não seja, ella não pôde subtrahir­se impu­

nemente ás leis da natureza deixando de ama­

mentar o seu filho; e, triste é confessal­o: ha mães que sacrificam os dulcíssimos sentimentos da ma­

ternidade ás exigências da sociedade e aos cuidados da formosura, entregando o filho a mãos mercená­

rias, sem se lembrarem que elle tem direito incon­

testável ao cumprimento d'esse doce dever, que é o complemento da maternidade.

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Prática fatal, que tantas vezes substitue as ale­grias e os enlevos do amor maternal, pelas lagri­mas inexhauriveis de saudade pungente por uma vida tão querida, que se finara.

E não nos queixemos da natureza, porque esta é sempre a mesma; queixemo-nos da epocha em que vivemos, porque esta fazemol-a nós, e mais tarde a posteridade pedir-nos-ha rigorosas contas quando ella se debata com o abatimento physico e moral, que o período sempre crescente da degra­dação de costumes, ha-de imprimir nas gerações vindouras.

Que se lembrem as mães, que os filhos podem mais tarde fazer pesar sobre a sua velhice, a indif­férence e o esquecimento, que lhe cercaram o berço.

Feitas estas rápidas considerações, que não nos pareceram fora de propósito, vamos entrar no as­sumpto; mas antes d'isso seja-nos permittida uma observação, para antecipar um pouco a opinião d'aquelles, que nos lerem.

Não se julgue, pelo modo um pouco duro, com que nos dirigimos ás mães, que não querem ama­mentar os filhos, que admittimos em absoluto a necessidade de podermos sempre exigir d'ellas o cumprimento d'um tal preceito, porque ha casos em que isso não é possível, e no decorrer d'esté capitulo procuraremos justificar o que avançamos.

É nossa convicção, que a mulher seria mais perfeita, que defeituosa, se um certo numero de

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doutrinas lhe fossem comesinhas e discretamente ministradas no decurso da sua educação.

Vamos principiar por nos referir á mãe, e depois referir-nos-hemos ao filho, pratica esta, que já se­guimos desde o começo do nosso trabalho; é cer­to porém, que as duas entidades, mãe e filho, es­tão tão intimamente relacionados, que não podem deixar de ser tratados simultaneamente, da saúde da mãe depende necessariamente a do filho.

A amamentação materna é uma lei imposta pela natureza, e que vemos verificada em todos os ma­míferos, ainda os mais ferozes e indomáveis, cujo in-stincto e excesso d'amor maternal os leva muitas vezes a sacrificar a sua propria vida em proveito da dos filhos. JVa espécie humana, torna-se o cumpri­mento d'esté sagrado dever mais sublime, pelo sen­timento moral que o caractérisa, e se a lactação é o complemento physiologico da gestação e par-turição, a amamentação materna é como já disse­mos o complement da maternidade.

O leite materno é o alimento mais próprio para a creança, não só pela graduação da sua força nu­tritiva, mas também pelo facto de ser elaborado n'uma organisação, que mais se assemelhe com a sua.

Por outro lado a existência do infante, que é tão melindrosa e fraca, e sujeita a milhares d'ac­cidentés carece dos mais minuciosos cuidados que só a mãe lhe pôde dispensar ; só a ternura e amor

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maternal poderão adivinhar-lhe as necessidades de todos os momentos e só a sua dedicação poderá completamente satisfazer lh'as.

Ninguém como ella o sabe acariciar, quando elle sorri, ninguém como ella o sabe estreitar nos braços para o beijar, e com um amor puro e sem egoísmo, ella dispensa-lhe toda a solicitude, porque n'este delirar d'alma, que só ella experimenta, por­que é mãe, nenhuns cuidados lhe parecem afano­sos, nenhumas attenções a enfadam e nenhumas vi­gílias a fatigam.

Assim nasce e se fortalece o reciproco amor entre mães e filhos, que é um dos mais firmes sus­tentáculos da família e da sociedade.

Algumas vezes porém, a mãe vê-se privada de satisfazer o seu ardente desejo d'amamentar o fi­lho, ou porque a sua saúde lh'o não permitle, ou porque a natureza lhe não forneceu o leite neces­sário, ou a tornou victima d'algum defeito orgâ­nico, que a inhibe de o poder fazer.

Nem sempre a amamentação maternal é com­patível com os interesses da mãe e do filho, e por isso vamos apresentar as indicações e contra-indi-cações do aleitamento materno.

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Indicações e contra-indicaçoes

São muitos os auctores, que julgara proveitoso para a mãe, o ella amamentar o seu filho, conside­rando uns essas vantagens exclusivamente moraes, e outros attribuindo-lhe mesmo o valor de conju­rar certos accidentes a que estão mais sujeitas as mulheres, que não alleitam.

Com effeito, sendo a secreção do leite uma func-ção natural, é claro que a sua retenção ou sup-pressão conservará no organismo os elementos, que deviam ser extrahidos do sangue e alterará mais ou menos as condições physiologicas da mulher que se eximir d'amamentar o filho. Ouçamos o que diz Gioux a este respeito.

« O leite é um liquido que para a mulher se torna, até certo ponto, de natureza excrementicia.

Para a formação d'esté liquido é que, pelo menos, conspiram todos os actos da economia pouco tempo depois do parto. Até então tinha o feto attrahido a si a quantidade de sangue bas­tante a prover ás necessidades do crescimento, e cessando este alíluxo com o parto, a natureza pro­tectora faz com que a corrente tome outra direc­ção. Da 30." ou 00.a horas em diante os seios in-tumecem-se, enchem-se e o mamilo augmenta de volume, e com o afíluir do leite para a glândula

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mamaria prnduz-se uma derivação salutar e pro­veitosa aos órgãos da gestação».

Se recorrermos á phisiologia reconhecemos bem claramente, qual a influencia que a falta da secreção do leite pôde exercer sobre os órgãos pélvicos e nomeadamente sobre a involução ute­rina; a falta d'aquelle derivativo pelas glândulas mamarias tão intimamente relacionadas com estes órgãos, dá occasião por muitas vezes a hemorrha-gias abundantes, metrites chronicas, nevralgias dos ovários, etc., que podem comprometter gravemente a saúde da mulher.

Demais, é da observação de todos os dias que o amamentar suspende muitas vezes, por algum tempo, a evolução de certas doenças, e casos ha em que se observa uma cura completa.

Não é raro encontrarmos mulheres, que tendo amamentado os filhos, arrostando com uma fra­queza apparente, foram pagas da sua dedicação com uma saúde melhor e com uma constituição mais robusta.

Para que a mãe amamente o filho não é con­dição necessária ter as qualidades de saúde, força e robustez que se exigem das amas mercenárias.

Por muitas vezes se observa que algumas mu" lheres, débeis e fracas em apparencia, teem ama­mentado os filhos e estes são sadios e robustos, tanto o leite da mãe é adaptado e próprio para a alimentação do filho.

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Nem sempre uma saúde mediocre é um obstá­culo ao alleitamento materno, por vezes mulheres chloro-anemicas, nevropathas e mais ou menos dyspepticas gosam d'uma excellente saúde em-quanto amamentam, e podem mesmo conserval-a terminado o alleitamento.

Pelo que temos dito se vê que o alleitamento materno é vantajoso para a mãe e para o filho, tanto debaixo do ponto de. vista moral como hygie-nico, mas existem casos em que ha necessidade de recorrer a uma ama ou ao aleitamento artificial, tal é o estado da mãe; ao medico compete intervir n'este caso para dar a sua opinião, sendo certo que o problema é muitas vezes difficil de resolver, por­que não é possível determinar com precisão quaes as condições de saúde a que deve satisfazer uma mãe para poder amamentar o filho.

O alleitamento materno é contra-indicado em certas affecções geraes como a escrophula, a diabe­tes, o mal de Biight, o rachitismo, e especialmente a tuberculose c a syphilis ; porque em taes casos prejudica quasi sempre tanto a mãe com » o filho.

Certos auctores como Nalalis, Guillote Archam-bault, crêem que nada deve impedir a mãe d'ama-mentar o seu filho ainda que ella seja escrophn-losa, tuberculosa ou syphilitica; porque, segundo elles, nada prova que estas diatheses sejam trans-miltidas peio leite á creança.

Outros porém são d'opiniao contraria, admit-

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tindo que a mãe nunca deve amamentar o filho, quando possa receiar-se o desenvolvimento ulte­rior d'estas affecções em virtude d'antécédentes he­reditários, embora até então não tenha apparecido quaesquer manifestações diathesicas.

Se não podemos admittir em absoluto a opi­nião dos primeiros, também achamos demasiada­mente exagerado o receio dos segundos. .

Detenhamo-nos um pouco na apreciação das diversas hypotheses, que podem apresentar-se rela­tivamente ás duas affecções geraes a que ligamos mais importância, a tuberculose e a syphilis.

Apresentemos primeiro a hypothèse que sup-pomos mais favorável.

O pae é manifestamente um tuberculoso. N'este caso não ha duvida nenhuma; porque

os factos o demonstram, que o filho pôde herdar a doença, e com quanto se não tenha precisado bem qual o meio de transmissão, admitíamos que foi o gérmen fecundante do pae.

Se n'esta hypothèse a mãe nos offerece todas as condições de saúde para poder amamentar o fi­lho, é claro que em nenhum outro leite poderá o filho reparar as perdas que o seu organismo já af-fectado possa experimentar.

Acontece porém algumas vezes, que a creança não vem affectada; mas é fácil conceber que muito embora a mãe esteja sã, ella pôde contrahir a doença durante o alleitamento pela cohabitação com

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o marido e n'este caso haver possibilidade de que ella a transmitia ao filho.

Portanto, o qne nos parece mais regalar é o seguinte: que n'este caso a mãe deve amamen­tar o filho quando seja dotada d'uma consti­tuição robusta e em quanto gosar boa saúde; ao menor resentimento no seu estado hygido deve consultar um medico para saber se pôde continuar, ou não, a amamentação.

Supponhamos agora, que a mãe é que está af-fectada de tuberculose hereditaria ou adquirida.

Poderá esta transmittir a doença ao ti lho du­rante a vida intra-uterina, ou por intermédio do leite ?

As experiências de Landouzy e Marlin e muito recentemente as de Sonchcz-Toledo, demons-tram-nos que a placenta deixou de ser uma bar­reira para a passagem do bacillo tuberculoso, com quanto ainda se não possa determinar bem, qual a natureza da lesão placentar, que dá passagem ao agente infeccioso.

Que a tuberculose pode ser transmissível pelo leite, demonstram-no claramente as experiências de Yilkmin, Ffcming, Klcbs, e muitos outros, sem que nos seja preciso admittir como Chauveau a existência dos tubérculos nas tetas dos animaes sujeitos á observação.

yPóde a creança não apresentar, nos primeiros tenpos da sua vida, alguma manifestação da tu-

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berculose; mas lá está o gérmen da doença, que mais tarde produz os seus terríveis effeitos ; e hoje já não se admitte a crença dos antigos pathologis-tas que suppunham ser muito rara esla doença nas primeiras idades.

As meningites tuberculosas, hoje tão frequen­tes nas creanças, podem ser consideradas a maior parte das vezes como uma manifestação da he­rança paterna ou materna.

Admittidos estes dous meios de transmissão da tuberculose é evidente que a mãe não deve amamentar o filho quando seja portadora d'esta doença, sem aggravar o seu estado de saúde ou compromelter a vida do filho.

Convém pois, entregar a creança a uma ama robusta e ver se com o auxilio d'uma boa alimen­tação, e dos outros meios que a hygiene indica, podemos neutralisar a predisposição nefasta com que ella nasceu.

A diathese syphilitica é pela sua gravidade e frequência, uma das que merece ser também mais especialmente estudada.

Não discutamos agora se um pae syphilitico pôde infeccionar o filho sem primeiro ter infeccio­nado a mãe, porque esse ponto é ainda muito controverso, admittamol-o; e demos como assente e demonstrado que uma mãe syphilisada dá ori­gem a um filho syphilitico.

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Podem alguns meios de transmissão ser obje­cto de contestação, como succède na tuberculose, porém, o que nos importa saber agora é se a mãe deve ou não amamentar o filho, quando ella tenha adquirido ou herdado a syphilis.

Estamos convencidos de que, ás difficuldades d'observaçào, se deve attribuir a opinião de mui­tos auctores relativamente á não possibilidade d'uma transmissão directa d'esta doença do pae para o filho.

É evidente que a mulher ignore quasi sempre o estado de saúde do marido, e n'estas condições não lhe é possível elucidar o medico a este res­peito.

Umas vezes fazem-se as observações em hospi-taes onde o marido é desconhecido e por isso não pôde ser interrogado directamente. Outras vezes é o receio do medico em fazer perguntas indiscretas que possam perturbar a paz d'uma família.

Quando a creança apparece infeccionada e a mãe não apresenta qualquer manifestação syphili­tica filiamos quasi sempre a doença n'uma ques­tão d'hereditariedade paterna.

Foi observado por nós e por um medico, com. quem temos relações de parentesco, um facto, que não podia deixar duvidas no nosso espirito relati­vamente á possibilidade d'uma transmissão directa do pae para o filho. O mais seguro pois, n'este caso, é a mãe não amamentar o filho para que

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não possa ser infeccionada por elje, e por isso temos dous caminhos a seguir: ou entregar a creança a uma ama ou amamental-a artificialmente.

Entregar a creança a uma ama seria sujeital-a a ser infeccionada pela creança; portanto deve­mos procurar amamental-a por um animal como por exemplo a cabra, porque nos seria fácil mi-nistrar-lhe por intermédio d'ella os medicamentos mais indicados para o tratamento da syphilis.

Quando não seja possível este processo d'ali-mentação recorremos enlão ao alleitamenlo artifi­cial com o auxilio do biberão.

Se a mãe está syphilisada e o filho nasce com symptomas syphiliticus pôde amamental-o; porque d'esté modo podemos curar a mãe e o filho ministran-do-lhe os medicamentos necessários, como já dis­semos ; se o seu estado de saúde lhe não permitte o amamentar, então devemos seguir o mesmo pro­cesso que acima indicamos.

São ainda contra-indicações para o alleitamen-to materno a pequenez do mamillo, fendas, ex-coriações, scirrhos ou cancros do peito, abcessos, etc., e por vezes a falta completa do leite ou a quantidade insufficiente.

Referir-nos-hemos á pequenez do mamillo e á falta do leite.

A pequenez do mamillo observa-se frequentes vezes nas primiperas, ou porque os peitos são

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muito volumosos e o mamillo fica muito retrahido ou por efïeitos de compressão exercida pelo espar­tilho, e n'este caso é preciso remediar este incon­veniente com antecipação para que a creança pos­sa exercer a sucção.

Já nos últimos mezes da gravidez a mulher pôde procurar dar uma certa conformação ao ma­millo com o auxilio dos dedos ou com umas ven­tosas especiaes como o tire-mamelon de Malhieu e em ultimo caso a sucção exercida por uma ou­tra pessoa até tornar o mamillo mais saliente, ou então a applicação d'um mamillo de cautchouc.

Desde os primeiros mezes da gravidez, e algu­mas vezes só nos últimos, as glândulas mamarias da mulher tornam-se túrgidas e a séde d'uma flu-xão, que persiste durante o período da gestação até que se produz a secreção d'um liquido quasi la­ctescente, que depois do parto se torna seroso e gosando de propriedades laxativas; liquido este que tem a propriedade de desembaraçar do meco-nio os intestinos do recem-nascido e a que se dá o nome de colostro.

Passados alguns dias torna-se mais espesso e nutritivo adquirindo todos os caracteres e proprie­dades do leite, variantes estas que se vão produ­zindo á medida das necessidades da creança acom­panhando o desenvolvimento e transformação na­tural dos seus órgãos.

Algumas vezes acontece que a secreção do leite

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não se réalisa ou a sua quantidade é insùfficiente, e n'este caso é conveniente recorrer a um certo numero de processos, que a maior parte das vezes dão bons resultados.

O mais racional e geralmente seguido é provo­car a excitação da mama pela sucção prolongada do mamillo, e podemos conseguil-o com o auxilio d'outra creança, quando o recem-nascklo o não pos­sa fazer, e nunca desanimemos quando as primei­ras tentativas sejam infructiferas porque com al­guma insistência conseguimos muitas vezes por este meio provocar a secreção do leite. Algumas vezes se tem. recorrido a diversos tópicos para pro­vocar a secreção láctea como são: cataplasmas, so­bre os peitos, das folhas de palma-Christi, pimpi-nella, etc., e por vezes com vantagem.

Alguns auctores como Auberí, Alfred Becque­rel, Foumier e outros citam casos em que obti­veram uma secreção abundante de leite com a ap-plicação da electricidade, porém, o primeiro pro­cesso que apontamos é certamente o mais fácil e aquelle que a maior parte das vezes dá resultado.

Da natureza e quantidade do leite depende cer­tamente a boa ou má nutrição da creança.

Quando estudarmos a amamentação pela ama teremos occasião de fazer algumas considerações sobre o modo de reconhecer a natureza do leite.

Já durante a gravidez nós podemos encontrar na mulher um certo numero de signaes, que pelo

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seu conjuncto nos podem garantir, com mais ou menos certesa, a quantidade e natureza do futuro leite.

Segundo Donné, Tournier e outros a mulher deve apresentar as glândulas mamarias sufficien-temente desenvolvidas e os mamillos salientes.

Pelos caracteres e quantidade do colostro nós podemos julgar o que será a secreção do leite nas suas qualidades essenciaes e na sua abundância, salvo o apparecimento de certas doenças consecu­tivas ao parto, que alteram todas as funcções e particularmente a da secreção láctea.

O estado habitual da menstruação antes da gravidez também nos pôde fornecer algumas pro­babilidades sobre a futura lactação. Quando o íluxo menstrual é pouco abundante e não apparece com regularidade ordinariamente a quantidade do leite é no geral pequena.

Não devemos confiar demasiadamente n'estes signaes e o nosso prognostico deve ser reservado, porisso que muitas vezes acontece diminuir ou che­gar mesmo a desapparecer a secreção do colostro nos últimos mezes da gravidez e comtudo o leite apparece depois em quantidade sufficiente e com todos os caracteres necessários para que a mulher possa amamentar convenientemente.

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Regimen hygienico durante o alleitamento

A mãe.—A mulher que amamenta necessita de toda a tranquillidade d'alma esocego d'espirito em virtude da influencia que a actividade moral exerce sobre a secreção do leite ; segundo Cooper toda a anciedade d'espirito, qualquer noticia desagradável, um accesso de cólera, etc., pôde diminuir a secre­ção do leite e até alterar-lhe as suas propriedades.

D'ArJenne cita o facto d'uma creança que, sen­do amamentada pela mãe, pouco depois d'esta ter experimentado um violento medo, morreu alguns instantes depois no meio de fortes convulsões.

Merlicor observou ataques epileptiformes n'uma creança, cuja mãe tinha experimentado grandes af-flições, e reconheceu por meio d'analyses que o leite d'esta se tinha tornado extremamente acido.

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Vcrnois e Becquerel, tendo analysado o leite d'uma mulher e sendo ella pouco depois acomet-tida d'uma forte commoção reconheceram n'uma segunda analyse, que elle continha mais agua e matérias albuminóides tendo diminuído considera­velmente a quantidade d'assucar, saes e sobretudo de manteiga, que estava reduzida quasi a \ das suas proporções normaes.

É conveniente que a mulher dê passeios mode­rados e pretira os alimentos de mais fácil digestão para que a sua nutrição seja activa e reparadora.

O seu regimen alimentar não deve ser exclusi­vamente animal ou vegetal, dando sempre prefe­rencia áquelles alimentos que constituíam a sua alimentação habitual.

As bebidas alcoólicas e outras excitantes como chá ou café devem ser usadas com moderação porque do seu abuso podem resultar graves incon­venientes tanto para a saúde da mãe como para a do filho.

Os peitos devem merecer-lhe cuidados particu­lares ; logo que a creança acabe de mamar é con­veniente lavar os mamillos com agua tépida para evitar que alguma quantidade de leite alli possa ficar depositada; porque da sua fermentação pôde resultar a producção d'uma espécie de cogumellos que passam facilmente para a mucosa boccal da creança.

As mamas devem ser resguardadas do frio e

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de qualquer espécie d'attrito ou compressões exa­

geradas; porque d'aqui podem resultar engorgita­

mentos ou abcessos da glândula e fendas ou ex­

coriações do mamillo, etc. As relações conjugaes devem ser raras, porque

ainda mesmo que não sejam seguidas de prenhez, pôde da sua frequência resultar graves inconve­

nientes para a secreção láctea. ■ Ainda debaixo do ponto de vista therapeutico

é digna d'attender­se a hygiene do alleitamento, por isso que existe um certo numero de medicamen­

tos, como são o sulphato de magnesia e de soda, saes de ferro e chumbo, iodeto de potássio, etc., que são eliminados pelo leite; porém ao medico compete dirigir o tratamento tanto em relação á mãe como ao filho.

O filho. —A natureza sempre previdente des­

tinou o leito para o primeiro alimento do recem­

nascido ; com effeito é este o único que lhe con­

vém attendendo ás condições de pouca resistência e funcionalismo, que nos offerecem os seus órgãos digestivos anatómica e physiologicamente conside­

rados. Salvos casos excepcíonaes só passados os oito

ou nove primeiros mezes é que o estômago da creança está apto para poder supportar uma ali­

mentação mixta. A ausência dos dentes é uma prova evidente de

que o recem­nascido deve beber e não comer.

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Posto isto vejamos quando hade a -creança ma­mar pela primeira vez.

E prática geralmente seguida dar agua assu-carada á creança durante as primeiras vinte e qua­tro horas depois do nascimento, sem que nada pos­sa justificar a crença vulgar de que a creança não deve mamar na mãe sem que se desenvolva n'esta a febre do leite. Ë este um preconceito que só pôde acarretar prejuízos tanto para a mãe como para o filho.

Logo que a creança desperta do primeiro so-mno consecutivamente ao banho, já nos revela a sensação da fome, quer pelos vagidos, quer pelos movimentos de sucção, que executa com os lábios, e quando a mãe não tenha ainda restaurado as fa­digas do parto, o que ordinariamente só acontece passadas cinco a seis horas, podemos, é certo, mi­nistrar á creança algumas colheres d'agua assu-carada com algumas gottas de leite de vacca ou melhor ainda de jumenta, até que a mãe se encon­tre em condições de poder amamental-a. Quando mesmo'o leite não tenha apparecido, a propria suc­ção da creança provoca um afíluxo de sangue ás glândulas mamarias, qua as predispõe para a se­creção do leite e concebe-se perfeitamente que uma creança estando vinte e quatro ou mais horas sem ser alimentada,"deve soffrer uma diminuição no seu peso inicial, que só tarde pôde recupar. Além d'isto o primeiro leite da mãe tem propriedades purgati-

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vas que provocara a sahida do meconio que existe no canal intestinal do recém nascido e quando a se­creção do leite seja muito tardia então é mais con­veniente entregar a creança a uma ama do que su-jeital-a a um alleitamento artificial.

Durante os primeiros quinze dias, a creança deve mamar de duas em duas horas pelo menos e de três em três o máximo.

Passado o decimo quinto dia, já a creança ma­nifesta mais claramente que tem fome, e a partir do segundo mez adormece geralmente quando está satisfeita e desperta quando quer mamar, o que não quer dizer que se lhe deva dar de mamar to­das as vezes que despertar.

Á medida que ella vae crescendo, é conveniente ir distanciando os intervallos das horas de mamar; porque a creança, mamando cada vez, mais carece também de maior espaço de tempo para que a di­gestão do leite se faça d'um modo regular e com­pleto.

De noute basta que mame quando muito duas vezes, porisso que a mãe carece pelo menos de cinco a seis horas de descanço contínuo para se refazer das muitas fadigas, que a creação do filho lhe acarreta quando não accresce ainda o cumpri­mento das suas obrigações diárias.

A regularidade nos intervallos do alleitamento, é um preceito hygienico, que muito contribue para o desenvolvimento da creança tendo mesmo uma

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determinada influencia sobre a sua educação phy-sica e moral, que por vezes é compromettida quan­do a mãe não faça da sua parte um esforço su­premo para deixar de amamentar o filho, sempre que elle chore.

É da observação de nós todos, o modo como a mãe se apressa em offerecer o peito ao filho sem­pre que elle chora,julgando que por este meio lhe minora todos os soffrimentos, quando mesmo es­teja convencida de que elle não possa ter fome porque mamou ha pouco tempo.

Esta pratica seguida pela maior parte das mães, quando não compromette a saúde dos filhos, col-loca-os no mau habito de se servirem mais tarde d'aquelle meio, para que lhe satisfaçam todos os seus caprichos e impertinências.

É preciso que a mãe se habitue a soffrer sem emoção os choros do filho.

Quando uma creanca chora, podemos affirmar, que ella tem uma necessidade, uma verdadeira dôr ou emfim um mal estar, mas è preciso que a mãe se revista d'um certo animo e sangue frio para poder procurar a causa dos choros; porque elles nem sempre são indicio de fome.

Se a creança está habituada a mamar a umas determinadas horas e o leite não é de má quali­dade ou em quantidade insulTiciente, deve a mãe verificar se as roupas ou a cama a podem magoar,

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se é falta de sorano ou a temperatura do ambiente, etc., que lhe provocam o choro.

Em geral, as creancas choram pouco nos três primeiros mezes, que se seguem ao nascimento quando sejam convenientemente cuidadas e não ti­verem doença, mas choram ordinariamente mais proximo do quarto mez quando começa o trabalho da dentição.

Muitas vezes o mudar a creança de posição é bastante para a calar, collocando-a do lado es­querdo ou de costas se estiver deitada do lado di­reito e reciprocamente.

Tem-se tentado deduzir do rythma, do timbre e da duração do choro, o caracter das doenças, que o provocam, mas exceptuando as doenças das vias aéreas, o crup ou o edema da glote, que dão ao choro ou grito uma forma especial, parece-me im­possível dar a este uma significação symptomatica.

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IV

Amamentação pela ama

Quando a mãe não possa amamentar, por qual­quer das circumstancias, que já apontamos no ca­pitulo precedente, e outras que ainda podem appa-recer, a alimentação do filho tem de ser confiada a uma pessoa estranha, a que se dá o nome d'ama; e triste é confe.ssal-o, tão pouca importância se liga a este facto, que a maior parte das vezes é uma parteira a encarregada da escolha da ama, quando a mãe se não limita a acceitar a primeira que lhe appareça — a questão é ter abundância de leite e ser fiel.

É nossa convicção que o abatimento physico e moral, que se revela claramente na nossa sociedade, está filiado em grande parte no pouco escrúpulo

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com que confiamos a uma pessoa estranha a ali­mentação e educação dos nossos filhos.

Desgraçadamente o nosso meio social tem-nos creado um certo numero de necessidades e d'ha-bitos, que uma mulher d'uma certa gerarchia e meios de fortuna difficilmmte se resigna a renun-cial-os para se entregar á creação dos filhos.

Como assim seja, nós quereríamos ao menos, que os poderes dirigentes atlendessem a esta parte da hygiene publica, cuja importância devia ser re­gulada pelos preceitos da sciencia, como acontece em França, onde a escolha das amas de leite con­stitue um ramo d'adminislraçào publica.

A mortalidade sempre crescente das creanças nas primeiras idades, é um facto que reclama a in­tervenção urgente aos poderes públicos.

Infelizmente a existência das amas de leite já constitue, entre nós, uma necessidade, e os esta­belecimentos de caridade, que temos para abrigo da infância desvalida, como são os hospícios e as creches tornar-se-hão um sorvedouro de vidas, se não houver uma rigorosa vigilância na admissão do seu pessoal, para que possam ser observados um certo numero de preceitos hygienicos, que a sciencia aconselha, já que nas condições actuaes da nossa sociedade não pôde a caridade publica deixar de supprir a falta dos soccorros particulares.

Se ha necessidade d'ouvir sempre a opinião do medico para decidir da possibilidade do alleitamen-

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to materno, também só ao medico compete o de­cidir da escolha d'uma ama; porque só elle se acha convenientemente habilitado para avaliar bem todas as condições e requisitos indispensáveis a uma mulher, que se destina a amamentar.

Não é indifférente que se entregue o infante a qualquer mulher, que se proponha a crial-o ; pelo contrario, é do mais alio interesse e utilidade a sua minuciosa escolha e o papel do medico n'este caso é muito difficil e melindroso.

Escolher uma ama é garantir á família, que a procura a sua boa constituição e a sua saúde e conseguintemente a sua felicidade; porisso o me­dico não deve esquecer as mais minuciosas inves­tigações; porque nem sempre deixa de ser illudido pela ama, que escolhe, a quem importa menos a saúde e a vida da creança que a futura remunera­ção do seu trabalho.

É uni dos actos mais difficeis da prática me­dica, e se é possível prevenir até um certo limite não só a quantidade e natureza do leite como a existência de certas doenças, que a ama poderia transmittir á creança, não acontece o mesmo com relação a costumes, porque não pôde o medico determinal-os n'uma pessoa que vê pela primeira vez e que é possível não torne mais a ver.

Não poderá a creança mamar com o leite, que lhe compraram, e não com o que a natureza lhe

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destinou, maus hábitos que a viciam, e que nunca mais poderá perder?

Se uma mãe comprehendesse e ponderasse bem o quanto tem de trabalhar, de cuidar, e de se mortificar quando dá o filho a crear a uma ama, não seria a vaidade e a ociosidade que a levaria a requisital-a tantas vezes.

Muitas mães não reconhecem ao menos a pos­sibilidade dos muitos perigos a que vão expor a saúde do filho com a escolha muito precipitada d'uma ama, e a maior parte ignora a sua gravi­dade, d'onde resulta muitas vezes a desgraça do individuo e certamente da família e da sociedade.

Feitas estas considerações passemos ás condi­ções physicas e moraes a que deve satisfazer uma ama.

Comecemos pelo habito externo. Deve ser ro­busta, ter uma presença agradável e um lypo de boa saúde e de intelligente; os peitos salientes e bem conformados, especialmente no mamillo, por que da sua conformação depende muitas vezes um obstáculo ao alleitamento.

Devemos verificar se ella tem feridas, ulceras ou cicatrizes e especialmente na garganta, no pes­coço ou debaixo das axillas, ou manchas na pelle; porque tudo isto nos poderia revelar um vicio or­gânico ou uma infecção syphilitica, ou escrophu-losa que a faça reprovar.

O exame deve ser muito rigoroso e não con-

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fiarmos demasiadamente nas informações que nos derem; porque é sabido o empenho com que ella procura muitas vezes occultar qualquer doença ou defeito orgânico.

Pelo que diz respeito á idade, é conveniente que a ama tenha de 20 a 30 annós, porque sendo mais nova é completamente inexperiente dos cuidados que é necessário dispensar a uma creança, e sendo mais velha é menos apta para criar, porisso que á medida que se vae approximando da idade cri­tica o leite será menos abundante e de peior qua­lidade.

Relativamente ao seu estado, devemos esperar d'uma mulher casada, melhores costumes que d'uma solteira e até mais critério para se cohibir de tudo aquillo que as creancas não devem apren­der.

Em igualdade de circumstancias, devemos pre­ferir sempre aquella que tenha vivido no campo, á que habita na cidade.

A sua constituição deve ser forte, ter um peito largo e bem desenvolvido, a respiração fácil, e não ser excessivamente gorda nem revelar extrema ma­greza.

Ao medico compete o verificar por todos os meios d'exploração, que tiver ao seu alcance, que não exista actualmente alguma affecpão aguda ou chronica, nem disposição para ella, muito princi-

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palmente pelo que diz respeito a certas diatheses como tuberculose, syphilis, etc.

Deve preferir-se ura temperamento modera­damente sanguíneo com quanto haja difficuldade em precisar bem, qual seja o mais adoptado; com-tudo, devemos excluir os excessivamente lympha-ticos ou nervosos.

Relativamente á idade do leite será mais con­veniente para a creança, aquelle, que menos se distancie da epocha do parto, para que elle conte­nha ainda algum colostro, cujas propriedades pur­gativas são úteis para a creança, pode aconselhar-se desde o segundo até ao sexto mez.

Ao exame da ama segue-se naturalmente o do leite.

Quando tratamos da amamentação materna dis­semos que nos havíamos de referir á composição e analyse do leite, e vamos fazei-o, muito resumi­damente, porisso que o caracter genérico, que ter­mos dado ao nosso trabalho nos não permitte en­trarem minuciosos detalhes sobre este ponto, que de per si só podia fazer objecto d'uma dissertação.

O leite da mulher não diffère essencialmente do leite dos outros animaes, mas distingue se d'elle por alguns caracteres, que lhe são peculiares.

Como já dissemos, o leite é o alimento exclusi­vamente destinado á nutrição nas recentes idades ; tão previdente foi a natureza em reunir n'este li-

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quido todos os elementos necessários, que elle é considerado como typo dos alimentos perfeitos.

Com effeito, encontramos no leite os três ty­pos d'alimentos: matérias albuminóides ou protei­cas, hydrocarbonadas e saes mineraes, que pelas suas propriedades concorrem para a nutrição e au­gmenta dos tecidos, para as necessidades da res­piração e para a formação das partes duras.

Este alimento, sendo formado de substancias que facilmente se separam, sem que a sua natu­reza se altere, é imminentemente próprio para adaptar os órgãos digestivos da creança ás condi­ções múltiplas da vida extra-uterina.

Vamos referir-nos ás suas propriedades physi-cas e chimicas, e depois occupar-nos-hemos dos diversos ensaios e analyses, que podem auxiliar-nos na apreciação das suas qualidades nutritivas.

É este o único meio de podermos reconhecer se elle estará ou não, nas condições de poder servir para a alimentação da creança, e nem sempre o mais rigoroso exame nos offerece uma garantia se­gura, tantas e tão variadas são as circumstancias, que podem alterar a sua composição, tanto na pro­porção como nas propriedades dos elementos que o constituem.

Nem sempre, ás suas propriedades physicas e chimicas correspondem os seus effeitos physiologi-cos, e nós vemo-nos por vezes extremamente em-

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baraçado, para decidir se um determinado leite po­derá ou não ser util á creanca.

Para umas será até prejudicial o leite, que phy-sica e chimicamente se approximar mais do typo normal, como para outras aquelle que mais se af-fastar d'esse typo.

O leite, seja qual fôr o animal de que proceder, contém sempre-manteiga, assucar de leite ou la­dina, uma substancia albuinoide o caseum, agua e saes, como o chloreto de sódio, phosphatos al­calinos e terrosos ; e gazes, como o oxigénio e acido carbónico.

Muitas outras substancias teem sido encontra­das, embora em fraca quantidade, como são : os ácidos láctico, butyrico e silicico, o fluor, a urca, a hematina e a cholesterina, e dois alcalóides a que Blyth chamou galactino e glactro-chomo no leite de vacca, e lecithina no da mulher.

Como nos estamos occupando das condições necessárias a uma ama, referir-nos-hemos agora especialmente ao leite de mulher, e quando tra­tarmos da amamentação artificial apresentaremos uma tabeliã comparativa relativamente aos elemen­tos constituintes do leite da mulher e dos outros animaes, para que possamos apreciar o valor nu­tritivo de cada um.

O primeiro leite da mulher consecutivo ao parto, a que se dá o nome de colostro, diffère pelos seus

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caracteres e pelas suas propriedades do leite pro­priamente dito.

É um liquido viscoso, amarello, de sabor nau­seabundo e alcalino tendo propriedades purgativas e contendo menos agua e mais matérias solidas que o verdadeiro leite.

Deixado em repouso separa-se em duas par­tes, uma serosa e outra viscosa, que forma á su­perfície um creme amarello e espesso em maior quantidade que no leite propriamente dicto.

Tractado pelo ammoniaco transforma-se n'uma polpa viscosa, em quanto que o leite fica comple­tamente límpido.

Se o examinarmos ao microscópio reconhece­mos a presença de muitos glóbulos de gordura na­dando no liquido com o volume de Yioo a h/m de millimetre

Este liquido vae passando por variantes nas proporções dos seus elementos, acompanhando passo a passo as necessidades da creança e o desen­volvimento e transformação natural dos seus órgãos.

Ás suas propriedades purgativas se attribue a evacuação d'um liquido verde, que existe no intes­tino do recem-nascido, chamado mecânico, com­posto de mucus intestinal e d'uma materia biliar, que apresenta as mesmas propriedades e reecções chimicas da bile.

Passados alguns dias depois do parto é que o colostro vae adquirindo as propriedades necessa-

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rias para se tornar o alimento adaptado ás primei­ras idades, constituindo assim o leite perfeito.

O leite é um liquido branco, levemente azulado, mais ou menos opaco, inodoro, mais pesado que a agua, d'um sabor doce e rom reação alcalina, comtudo estas propriedades podem variar conside­ravelmente debaixo da influencia d'um certo nu­mero de circumstancias e nenhum outro leite está mais sujeito a estas variações que o leite da mu­lher.

Em différentes horas do dia, antes e depois das refeições, antes ou depois de mamar a creança, se podem encontrar differenças bastante sensíveis na sua composição, apresentando-se umas vezes seroso e transparente, outras muito opaco, e revelando-nos mesmo alterações na proporção dos seus elemen­tos, o que justifica a diversidade de resultados a que teem chegado vários medicos e clínicos, que procederam à analyse d'esté liquido, como são: Simon, Becquerel, Vernon. Henri Fery, e mui­tos outros.

O leite de mulher compõe-se de parte liquida e parte solida.

A parte liquida é na sua maior parte agua, con­tendo, em dissolução o caseum, que constitue a base do queijo, matérias salinas e o assucar de leite ou ladina, que pela sua fermentação pôde dar ori­gem a acido láctico.

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A parte solida é formada exclusivamente pelos glóbulos de leite, que fluctuant! no meio do liquido constituídos por uma materia gorda ou butyrosa, que é a base da manteiga.

Yarios processos são indicados para avaliar as qualidades e a quantidade do liJite.

Pela analyse chimica e pela analyse optica po­demos nós apreciar as qualidades do leite d'uma ama procurando d'esté modo conhecer se este li­quido está ou não nas circumstancias de ser des­tinado á alimentação da creanpa.

Os progressos que modernamente tem realisado a chimica orgânica, e a invenção e uso do micros­cópio, garanlem-nos até uma certa medida o bom resultado das nossas investigações, ha porém um certo numero de modificações verificadas no leite, que a mais rigorosa analyse e o mais perfeito mi­croscópio não podem revelar-nos a natureza e quantidade dos princípios, que lhe deram origem ; e só podemos ter conhecimento d'elles pelos effei-tos que produzirem.

A prática medica exige processos simples, fá­ceis e promptos ; e d'aqui resulta uma grande van­tagem nos processos d'analyse optica porisso que uma analyse chimica rigorosa seria muito demo­rada, havendo mesmo um certo numero d'altera-ções mórbidas, que a chimica não revela como por

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exemplo a mistura com os glóbulos do pús, sub­stancias mucosas, etc, \

Já a olho nú nos podemos servir d'alguns pro­cessos, que nos auxiliam na apreciação das qualida­des do leite e a maior parte das vezes são aquel-las a que recorre o medico quando não pôde dis­por do microscópio.

Pela simples apparencia do leite vêr-se ha logo se elle é muito seroso e semi-transparente ou mui­to opaco; porque aquelle que nos offerecer pro­priedades intermédias em ambos estes casos, deve ser considerado como o mais próprio para alimen­tar a creança.

Também podemos julgar do valor nutritivo do leite a analysar deixando cahir uma gotta sobre uma superfície polida, corno por exemplo a unha do experimentador, quando elle deixe um traço branco á medida que vai escorregando por essa superficie sem que a percorra com extrema rapi­dez nem excessiva lentidão.

O mesmo podemos verificar observando o modo rápido ou lento com que se dispersam algumas gottas de leite lançadas n'uma porção d'agua fer­vida ou filtrada.

Á vista deve ser um liquido branco e homogé­neo e ao paladar ser ligeiramente doce.

Estes processos são muito superficiaes e de pouca confiança, porém, algumas vezes são o bas­tante para ajuizarmos do valor nutritivo do leite

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(fuma ama, quando ella reúna pelo menos uma. grande parte das condições a que já nos referimos.

Como são muitas e muito variadas as influen­cias, quer physiologicas querpathologicas, que po­dem alterar a densidade e composição do leite, quando o medico se limite a esaminal-o a olho nú, deve pelo menos attender á diversidade d'aspecto, que elle apresenta antes e depois da creança ma­mar.

Quando o leite permaneça por muito tempo na glândula mamaria torna-se seroso, claro e pobre em elementos nutritivos, ao passo que depois da creança mamar elle é mais opaco e mais nutriente.

Pelo exame microscópico é que nós podemos avaliar melhor as qualidades nutritivas do leite, bem como a natureza e quantidade de certos elementos estranhos, que o podem alterar como são : glóbu­los de colostro, pus e sangue ou certos organis­mos inferiores cuja presença pôde ser muito pre­judicial á creança.

1'elo numero, forma e volume dos glóbulos do leite, que constituem a sua parte gordurosa pode­mos nós ajuizar do seu valor nutritivo, porisso que á sua riqueza em glóbulos corresponde ordinaria­mente a proporção dos outros elementos, que en­tram na sua composição.

Um numero prodigioso de glóbulos d'um de­terminado volume e bem conformados, indicar-nos-ha que o leite é de boa qualidade, e o contra-

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rio acontece quando elles sejam pequenos e muito disseminados no liquido.

Os glóbulos mais volumosos teem approxima-damente um diâmetro de */300 de millimetre, e os ipais pequenos desde */s00 até Vsoo de millimetre,

Bouchut, indicando o processo para a conta­gem dos glóbulos n'um millimetre cubico de leite, procura determinar a relação que existe entre o numero de glóbulos contidos n'um litro d'esté Ilí­quido e a quantidade e peso da manteiga, valen-do-se dos dados que lhe fornece a analyse chimica do leite de vacca.

A densidade e a proporção dos outros elemen­tos pôde igualmente ser apreciada, comtudo só por uma analyse chimica rigorosa e com o auxilio do microscópio é que nós podemos chegar a con­clusões exactas muito embora só o microscópico possa já, dar-nos uma idéa muito aproximada das qualidades do leite d'uma ama.

Muitos instrumentos se teem inventado e qual d'elles o mais engenhoso para avaliar chimica-menle a natureza e proporções dos elementos, que entram na composição do leite.

D'entre muitos citaremos o lacloscopo de Don­né, o laclom.elro de Lecomte e bulyromelro de Merchant, etc.

Não entraremos na descripçâo d'estes appare-lhos nem nos processos d'analyse; porque isso le-var-nos-hia muito longe.

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Depois de estudarmos os diversos meios de po­dermos avaliar a qualidade do leite, restava-nos procurar saber se a ama tem ou não quantidade sufficiente de leite para alimentar convenientemen­te a creança.

E' este um problema de difficil resolução e á falta de meios rlirectos lançamos mão d'um certo numero d'observaçoes cujo conjuncto nos decidirá com muitas probabilidades a este respeito.

Se nos fôr possível poder examinar o filho da ama, nós podemos avaliar pelo seu estado não só a qualidade do leite, mas também certiticar-nos se elle terá sido em quantidade sufficiente.

Se reconhecermos que os peitos da ama contém bastante leite pelo pequeno esforço da creança para exercer a sucção, chegando mesmo a gotejar-lhe dos lábios, e que ella íica satisfeita depois de ma­mar, podemos affirmar que a ama tem leite em quantidade sufficiente.

Em ultimo caso recorremos á pesagem da creança, antes e depois de mamar, durante alguns dias, para avaliarmos quanto o seu peso augmen-tou.

Segundo Bouchut as creanças normalmente desenvolvidas mamam de oito a dez vezes por dia, e o peso do leite que absorvem é successivamente de 3, 15, 40 e 50 grammas nos primeiros quatro dias para cada refeição, de 60 a 80 nos primeiros mezes e de 100 a 130 depois dos cinco mezes.

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Quando nos primeiros mezes se pese a crean-ça, de dez em dez dias, e se reconheça que o seu peso tem augmentado 250 a 300 grammas pode­mos concluir que o leite é, não só em quantidade sufficiente como facilmente assimilável.

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V

Amamentação artificial

O processo d'alimentar as creanças com outro leite, que não seja o de mulher, é sem duvida d'uma inferioridade manifesta, e o seu empreg ) exclusivo deveria ser proscripto em absoluto, salvo casos ex-cepcionaes, em cpie a creança é portadora d'algu-ma deformidade, congenita ou temporária, que a impossibilite de poder exercer a sucção.

A mãe que não pôde amamentar a creança, ou não tem leite em quantidade sufficiente, recorre or­dinariamente a este meio quando lhe faltam os re­cursos necessários para pagar a uma ama, e infe­lizmente é nas grandes cidades, que este processo d'alimentar creanças é mais usado.

A multiplicidade de doenças a que se expõe a creança, e de que é victima a maior parte das ve­zes," é um facto que nos é revelado pelas estatisti-

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cas da mortalidade das creanças, que se eleva a 80 % quando amamentada, por este processo, ao passo que se reduz a 35 % quando alimentada naturalmente.

E' evidente que vamos ministrar á creança um leite cujas qualidades não são proprias aos seus órgãos digestivos, e cuja temperatura não podemos conservar constante.

Quando este processo d'alleitamento tem de ser adoptado, pela força da necessidade, deve ser con­venientemente dirigido e quanto possa ser combi­nado com o alleitamento da mulher constituindo assim uma alimentação mixta.

Em certos casos o processo, que parecia mais racionalmente indicado, seria a latação animal e entre as classes pobres temos visto substituir a ama por uma cabra, por ser este o animal, que melhor condições offerece não só pela confirmação e posição de tetas como pela abundância do leite.

Com quanto a cadella podesse substituil-a com vantagem é certo que já em epocha, muito remota, se escolhia a cabra para amamentar as creanças, e é do conhecimento de nós todos, que ella chega mesmo a affeiçoar-se-lhe, correndo a amamentar a creança quando lhe ouve os vagidos e procuran­do ageitar-se com todo o cuidado para que ella possa exercer melhor a sucção.

Este processo d'amamentaçao tem comludo bas­tantes inconvenientes; não só (loa bastante caro,

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especialmente nas cidades, como a experiência e a razão nos está indicando, que uma creança não pôde sem perigo, e especialmente nas primeiras semanas da vida, mamar um leite mais rico em matérias gordas e mais nutritivo que o de mulher.

Mas voltemos ao alleitamento artificial, que é o processo mais económico, e porisso mesmo o mais usado.

O leite de vacca, pelo seu baixo preço, e por ser de fácil acquisição, é o que geralmente se em­prega para alimentar a creança, sem comtudo ser aquelle que pela sua composiço mais se aproxima do de mulher.

Se percorrermos as diversas analyses que se teem feito, como as de Lehman, líegnaull, Be­cquerel, Bouchardat emuitos outros, encontramos differenças mais ou menos consideráveis nos resul­tados obtidos.

A tabeliã comparativa de Doyere dá-nos uma idéa approximadadas differenças que existem entre a composição do leite de mulher e o de vários ani-inaes, como a vacca, burra e cabra.

Mulher Vacca Burra Cabra 87,38 87,60 89,63 87,30 3,80 3,20 1,50 4,40 0,34 3,00 0,60 3,50 1,30 1,20 1,55 1,35 7,00 4,30 6,40 3,10 0,18 0,70 0,32 0,35

Agua . Manteiga Caseína Albumina Lactose Saes .

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Por aqui se vê a superioridade relativa do leite de mulher, considerando o fun a que é destinado; porisso que contém maior quantidade de manteiga e assucar; segue-se lhe o de burra, como porém é difíicil obtel o, raras vezes servirá para a alimen­tação da creança.

O leite de vacca e o de cabra, são certamente mais ricos que o da mulher, especialmente na ca­seína, que é a parle mais nutritiva d'esté liquido; esta riqueza, porém, é imprópria para um orga­nismo tão fraco, como o da creança, e dá oecasião a um certo numero d'accidentés, que iremos apon­tando no decorrer d'esté capitulo.

Além d'isso, o leite de vacca é quasi sempre acido, o que é uma condição desfavorável para a digestão, emquanto que o de mulher é sempre al­calino.

Comquanto não seja possível tornar o leite de vacca chimicamente egual ao da mulher, de modo a fazer desapparecer as differenças, que existem nos seus effeitos physiologicos, podemos comtudo, até uma certa medida, tornai-o de mais fácil di­gestão, e por isso mais em harmonia com as ne­cessidades nutritivas da creança, nas suas diversas idades.

Para isso deve misturar-se com agua de ceva­da, d'aveia, d'arroz, ou, o que é melhor, com agua simples.

Nos primeiros mezes, para lhe supprir a falta

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natural do assucar, deve juntar-se-Ihe uma peque­na porção d'elle, preferindo-se o de leite, que hoje se encontra no commercio por um preço módico.

A proporção do liquido, que se mistura, varia á medida que a creança vai crescendo em idade.

Nos três primeiros mezes misture-se o leite com duas terças partes d'agua, diminuindo gra­dualmente esta quantidade de modo que a creança mame leite puro quando se approxime da epocha do desmame.

O leite deve ser ministrado o mais fresco pos­sível, e melhor fora dal-o á creança na propria oc-casião em que é ordenhado, pela facilidade com que pôde alterar-se.

Quando se não possa renovar o leite mais que uma vez por dia, recommenda Trousseau que se dissolvam cinco decigrammas de bicarbonato de soda em cada litro de leite, e outros uma pequena quantidade de borax e agua de cal para obstar á sua coagulação e acidificação, que tantas vezes dá origem á diarrhea, que por vezes ataca as creanças sujeitas a esta espécie d'alleitamento.

Um meio simples e económico para evitar, até um certo ponto, este inconveniente é levar o leite á ebullição; porém nem todos os auctores são con­cordes n'este ponto.

Uns não querem que se ferva o leite; porque a ebullição far-lhe-hia perder a sua homogeneidade, e alterar mesmo a proporção d'alguns dos seus

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elementos constituintes, o que os tornaria de mais difficil digestão, e portanto o seu uso perigoso para a saúde da creança.

Julgam desnecessário aquecel-o de verão, e d'inverno recommendam que se aqueça apenas a agua que se mistura, e quando seja leite puro aquecel-o a banho maria.

Outros são d'opiniào que se deve ferver o leite; porque só d'esté modo podemos destruir todos os germens maléficos que elle contenha e bem assim todas as substancias, que possam servir de fermento o que provoca mais facilmente as diversas altera­ções porque pôde passar este liquido.

Para evitar a possibilidade de que qualquer doença, de que esteja affectada a vacca, se possa transmittir á creança, e acompanhando a opinião da maior parte dós auctores, é nossa convicção que o leito fervido põe a creança ao abrigo d'um certo numero de doenças, e especialmente a tuberculose, e não se altera com tanta facilidade.

Não é raro que a vacca esteja affectada d'aphtas, carbúnculo ou tuberculose e também se compre-hende facilmente, que na occasião d'uma epidemia possa a creança ser affectada por intermédio da agua, que se addiciona ao leite, de qualquer doen­ça infecciosa como por exemplo a febre typhoide.

Quando seja possível ter uma vacca em casa para fornecer o leite podemos d'algum modo mo-

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dificar as propriedades nutritivas d'esté liquido re­gulando a sua alimentação.

A experiência tem mostrado que as cenouras tem a propriedade de tornar o leite mais leve, e porisso de mais fácil digestão, e a beterraba mui forte e substancial.

D'esté modo podemos addiccionar-lhe ás forra­gens qualquer d'estes productos, conseguindo mo­dificar as propriedades nutritivas do leite, de for­ma a adoptal-as convenientemente á idade da creança.

A quantidade do leite a ministrar à creança pôde ser nas mesmas proporções que o leite de mulher, quando misturado com agua e em menor porção quando seja puro.

Moissenet e Tarnier fixam a quantidade de leite, por dia, em 300 grammas durante o primeiro mez, 600 desde o segundo ao quinto e 800 no sexto, augmentando-se depois a quantidade diária de 100 a 200 grammas.

Segundo Ufflemann pôde dar-se leite puro á creança, logo que ella tenha nove mezes; mas al­gum tempo antes é necessário ir diminuindo a quantidade da agua, que se addicciona, de modo que se vá procedendo por transições graduaes e successivas.

E' conveniente não ministrar o leite á creança sem o aquecer, especialmente d'inverno; nos pri­meiros tempos do alleitamento deve ter uma tem-

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peratura de 25 a 26° centígrados diminuindo-se depois até 15 ou 20°.

O leite pôde dar-se á creança por uma colher ou por um copo, porém o processo mais geral­mente seguido, e o mais indicado, é o do biberão, uma espécie de garrafa, munida de um mamillo, ordinariamente de cautchouo, por onde a crean­ça exerce a sucção, o que tem a vantagem de lhe desenvolver os músculos boccaes e respiratórios.

Antigamente fazia-se uso d'urn frasco de vidro munido d'um gargalo, onde se collocava uma es­ponja ou algodão em rama, coberto por uma pel-lica cheia de buracos, por onde a creanca extrahia o leite.

Hoje ha uma variedade considerável de bibe-rões, porém o mais usado é o biberão inglez, que pela sua simplicidade e por haver maior facilidade em se lavar de todas as vezes, é o mais usado.

O vidro deve ser bem transparente para se re­conhecer o seu estado de limpeza.

Para os lavar devemos servir-nos d'agua quente, areia, ou sal de cosinha, e nunca com chumbo como muitas mães costumam fazer ; quando isto não baste junto-se á agua uma pequena porção de carbonato de soda com o fim de saponificar a manteiga e neutralisar o acido láctico, de que se deixam impregnar os biberões quando não sejam lavados todas as vezes que tenha de servir.

O mamillo deve ser reformado frequentes ve-.

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zes, porque geralmente amollece rapidamente e quando não seja convenientemente limpo pôde ser a séde d'um sem numero de sporos do Odium al­bicans, o que pôde produzir uma estomatite á creança.

Muitos outros cogumellos e micro-organismos se podem formar á custa do leite alterado ; porisso quando se tenha de recorrer a este processo d'al-leitamento deve haver o mais rigoroso escrúpulo na observação dos preceitos e regras, que temos indicado.

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VI

Amamentação mixta

Este processo d'amamentaçâo é d'um incontes­tável valor, quando a pessoa, que amamenta, não tem leite em quantidade sufficiente nem pôde fa­cilmente ser substituído por outra.

Não o consideramos isempto de perigos, mas reputamol-o muito superior ao alleitamento exclusi­vamente artificial pelas vantagens que nos offerece em ce.tos casos, tanto para a pessoa que ama­menta, como para a creança.

A mulher, que não tem a quantidade de leite necessária para alimentar a creança, ou não pôde pela sua fraca organisação, supportar todas as fa­digas da amamentação, recorre ordinariamente a

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este meio, quando não tem os recursos necessários para pagar a uma ama, nem possibilidade de a encontrar em boas condições.

Alguns medicos são de opinião que o alleita-mento mixto deve estabelecer um período de tran­sição algum tempo antes da epocha do desmame, para que o estômago da creança melhor possa re­ceber depois outra espécie d'alimentos.

Não contestamos estas vantagens, com tanto que se observem rigorosamente todos os preceitos re­lativos á natureza e alimentação do leite, a que já nos referimos, quando estudámos a amamentação artificial.

O leite de que ordinariamente se faz uso é o de vaca, quando porém tenhamos de recorrer a este processo nos primeiros tempos de vida da creança, devemos antes ministrar-lhe o leite de ju­menta que é de mais fácil digestão, e que pela sua composição mais se aproxima do de mulher.

Não ha motivos para crer que a mistura de dois leites é prejudicial á creança, em virtude das perturbações digestivas a que fica exposta por este processo d'amamentaçao.

E' do conhecimento de nós todos o considerável beneficio prestado ás classes pobres pelos nossos es­tabelecimentos de caridade chamados Creches, cujo fim é ajudar a mãe a crear o filho, emquanto ella vae ganhar a subsistência por meio do seu traba­lho.

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TERCEIRA PARTE

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Cuidados de limpeza

Deve merecer-nos também particular attenção, a limpeza do corpo e vestuário da creança, o que muito contribue para o sen bem estar e desenvol­vimento.

A necessidade de lavar a creança não é apenas uma questão de aceio, e infelizmente ainda em algumas terras da província existe o injustificável preconceito de que nas primeiras idades se não deve dar banhos ás creanças.

O banho não só as fortica, como lhes limpa e tonifica a pelle cuja premeabilidade é indispensá­vel para a manutenção geral do seu perfeito esta­do de saúde.

Ninguém desconhece as importantíssimas fun-

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çòes do tegumento externo, e com o auxilio do banho não só o desembaraçamos de todos os pro-ductos, que estorvão o seu regular funccionamen-como o tornamos mais apto para poder suppor-tar melhor as impressões exteriores de tempera­tura, etc.

O banho deve ser de curta duração, havendo todo o cuidado em lavar bem certos pontos do corpo como: o pescoço, axillas, virilhas, curvas das pernas, artelhos, mãos e contornos dos orifí­cios naturaes.

Em alguns d'estes pontos existe grande quan­tidade de enducto sebaceo, e em outros pontos pôde a presença da urina ou corpos estranhos darem origem a irritações por vezes incommodas para a creança.

Depois de lavada enxugue-se convenientemen­te, e se houver algum ponto irritado pulvilha-se com pós d'arroz, de lycopodio ou murta e quan­do haja exfoliação epidérmica applique se-lhe um corpo gordo como, por exemplo, a glycerina ou a vazelina branca.

Dos cuidados de limpeza não deve ser isempta a cabeça, por isso que no couro cabelludo se for­ma geralmente uma crosta espessa, que é preciso eliminar com lavagens repetidas e o auxilio d'uma esponja, por isso que as erupções ('requentes no couro cabelludo podem ser causa do appareci-mento de certos parasitas que fazem cair o eabello-

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Relativamente á temperatura do banho diver­gem um pouco as opiniões dos hygienistas.

Uns querem que os banhos sejão mornos nos dois primeiros mezes da vida da creança, baixando depois a temperatura de forma que elle os chegue a tomar frios no verão, e no inverno apenas com uma temperatura de 15° a 16° centígrados.

Outros aconselhão os banhos frios passados os primeiros dias depois do nascimento, conside­rando esta medida como um meio prophylatico do rheumatismo.

Não ha duvida que os banhos frios são um excellente preceito hygienico, que tonifica a pelle da creança e lhes dá vigor, ao passo que os ba­nhos quentes as enerva e enfraquece.

Os banhos frios durante os dois primeiros me­zes da existenúa da creança, não são isemptos de perigo principalmente no inverno, e porisso é mais prudente que a creança tome banhos mor­nos com uma temperatura de 21° aproximada­mente, nos dois ou três primeiros mezes.

Estes banhos devem ser de curta duração e diários, tendo sempre o máximo cuidado em lim­par bem a creança e agasalhal-a depois do banho.

A' medida que a creança vai tendo mais idade deve-se ir baixando a temperatura, alé que che­gue a tomal-os frios no verão; e quando a creança tenha doença, que possa agravar-se pela acção da agua fria, ou mesmo seja tão fraca que não possa5

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supportar este banho em virtude do calor que o banho lhe rouba, então pôde juntar-se-lhe alguma agua quente assim como no rigor do inverno.

As loções, que é necessário praticar mais que uma vez ao dia, podem ser dadas vantajosamente com uma esponja fina e bem lavada.

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Vestuário

O vestuário da creança é composto de peças múltiplas e de natureza diversa.

Umas consistem em ligaduras muito compridas destinadas a envolver a creança, a que já nos re­ferimos quando tratamos do enfaixamento.

Outras são muito largas para cobrirem as ná­degas passando entre as pernas e vindo assentar sobre o ventre; são os cueiros.

Os membros inferiores são envolvidos por um outro panno, que vai desde as coxas até á planta dos pés.

Além d'isto temos a camisa que pôde ser de linho ou algodão, sempre curta, de modo a não passar o nivel das coxas.

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0 collar e punhos devem ser feitos de modo que possão obter-se facilmente, o que se conse­gue por meio d'uma fita ou cordão de correr.

Por cima da camisa applica se um chambre de lã ou algodão aberto pela parte de traz e preso por meio de laços e nunca com alfinetes, que teem o inconveniente de poder ferir a creança.

Exteriormente envolve-se a creança com uma baeta larga e comprida, desde as axillas até á planta dos pés; mas collocada de modo que não estorve os movimentos das pernas.

Todas estas peças se devem collocar de modo a não estorvar os movimentos da creança nem exercer compressão alguma para evitar os incon­venientes, que já apontámos quando nos referimos ao enfaixamento.

A cabeça é protegida do frio por uma touca, que é conveniente não ser de tecido muito quente para que não possam produzir-se congestões dos órgãos cephalicos.

Algumas parteiras teem por habito apertar a cabeça das creanças com uma faxa, o que pôde dar origem a deformações do craneo e a um sem numero de doenças, que fácil é filiar nos effeitos d'uma tal compressão.

Reprovamos portanto o uso de tal prática. Dos seis mezes por diante este vestuário deve

ir sendo gradualmente substituído por outro, cada vez mais simples, de modo a facilitar á creança os

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movimentos de translação que elle começa a exe­cutar.

Ás faxas e aos cueiros substituemse as calças, as saias etc., tendo sempre em vista não a deixar apanhar frio, sem a sobrecarregor de roupa.

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Desmame

Não é possível estabelecer uma regra geral re-lativmente á epocha do desmame; por depender de variadíssimas circumstancias tanto da parte da creança como da mãe ou ama.

O estado de saúde da mulher que amamenta, ou qualquer alteração na quantidade e natureza do leite, pôde antecipar a epocha do desmame, como o trabalho de dentição da creança ou as suas condições de saúde os podem retardar.

O apparecimento dos dentes é certamente um signal evidente de que a creança já pôde mastigar e portanto nutrir-se com outros alimentos, que não sfjam o leite.

A natureza parece indicar a idade na qual a

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creança deve deixar de mamar, quando principia a dar-lhe dentes com que ella possa comer.

A primeira dentição principia geralmente do sexto para o oitavo mez e só termina no fim do segundo anno.

Antes porém d'esta idade já a creança pode deixar de mamar; prolongar o alleitamento até então seria comprometter a saúde da mãe.

Para que a creança possa mastigar alimentos sólidos, é necessário que tenha pelo menos doze dentes, e como elles apparecem entre os dose me-zes aos desoito, é sem duvida esta a idade mais propria para terminar a amamentação.

Antes da epocha do desmame já a creança pode ser alimentada por varias espécies d'ali-mentos; é necessário porem não começar antes do oitavo mez e ministrar-lh'os, n'uma progressão lenta e regular, relacionada com a natureza dos alimentos e as forças nutritivas da creança.

O mais conveniente é começar por lhe minis­trar leite de vacca ministrado com uma terça parte d'agua, do sétimo mez por diante.

Depois d'isso devemos recorrer ás farinhas cosidas e dissolvidas pela fervura em agua ou misturadas com leite; porque d'esté modo são mais facilmente digeridas.

Vêem em seguida as sopas de pão fervido no leite.

Aos doze mezes já podemos recorrer aos cal-

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dos de carne, mas devemos ser muito prudentes na sua admnistração principiando por lhe dar a principio um caldo delgado e só uma vez por dia.

A' medida que augmentarmos o numero das refeições iremos diminuindo o numero de vezes que a creança costumava mamar durante o dia.

D'esté modo vamos estabelecendo gradualmente um periodo de transição para o desmame.

O uso do vinho que alguns medicos tem intro­duzido no regimen da primeira infância deve ser, segundo o nosso modo de ver, absolutamente pros-cripto.

Como bebida ordinária, a melhor é a agua pura.

Acabado completamente o desmame, a alimen­tação deve ir crescendo gradualmente em quanti­dade, e sendo cada vez mais variada.

A persistência no mesmo alimento enjoa a creança e faz-lhe perder o appetite.

No commercio apparecem muitos alimentos of-ferecidos ás creanças; deve haver o máximo cui­dado na sua escolha porque alguns são pouco nu­tritivos, contendo apenas amido ; outras chegam a ser nocivos.

As farinhas de trigo, de milho e d'avêa são as melhores.

O pão deitado no leite e no caldo, e os biscoi­tos d'agua e sal são muito nutritivos e de fal di­gestão.

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A carne não convém ás creanças sem que ellas tenham 22 dentes: experiências muito bem dirigi­das teem demonstrado que este alimento as pre­dispõe para o rachitismo.

Quando chega a idade de a poderem comer convém principiar pelas carnes brancas por serem de mais fácil digestão ; e só uma vez ao dia e no primeiro tempo.

Como porém esta alimentação já sai dos limi­tes que traçámos ao nosso trabalho d'amol-o por findo aqui.

FIM

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Proposições

Anatomia. - A apophyse coronoidea do maxiliar superior é normalmente lançada para fora da arcada dentaria.

physioiogia.—Não ha relação d'espécie alguma entre os movimentos cardíacos e os diaphragmaticos.

Materia medica.—Para o mesmo medicamento existem, o mais das vezes, duas acções de sentido opposto, uma dyna-mogenica, e outra inhibitoria.

pathoiogia externa As douches d'ar constituem um tratamento precioso nas doenças inflamatórias das trompas.

pathoiogia geral.—A predisposição individual é a causa primaria das doenças infecciosas.

Aperacões.—A laparatomia é uma operação innocente. partos'. —A amamentação materna ê proveitosa tanto

para a mãe como para o filho. pathoiogia interna.—A presença nos escarros do ba-

cillo de Koch ê o único symptoma característico da tubercu­lose pulmonar.

Anatomia pathologica.— Os abcessos frios são d'origem inílPTClllOSSL.

Hygiene.—Os banhos públicos são um precioso elemento de hygiene social.

V I S T A . PODE IMPRIMIR-SE. O director,

A. d'Azevedo Maia Visconde d'Oliveira.