sistemas de informaÇÃo · 2018-10-29 · maior incentivadora, meu anjo e presente de deus......

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FACULDADE IMED SISTEMAS DE INFORMAÇÃO Anderson Ferreira Bueno Programação de Computadores no Ensino Fundamental: um potencializador para o desenvolvimento da criatividade através do FLOW Passo Fundo 2017

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FACULDADE IMED

SISTEMAS DE INFORMAÇÃO

Anderson Ferreira Bueno

Programação de Computadores no Ensino Fundamental:

um potencializador para o desenvolvimento da

criatividade através do FLOW

Passo Fundo

2017

2

Anderson Ferreira Bueno

Programação de Computadores no Ensino Fundamental:

um potencializador para o desenvolvimento da

criatividade através do FLOW

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à

Escola de Sistemas de Informação, da Faculdade

Meridional – IMED, como requisito final para

obtenção do grau de Bacharel em Sistemas de

Informação, sob a orientação do Prof. Me. Amilton

Rodrigo de Quadros Martins.

Passo Fundo

2017

3

Anderson Ferreira Bueno

Programação de Computadores no Ensino Fundamental:

um potencializador para o desenvolvimento da

criatividade através do FLOW

Banca Examinadora:

Prof. Me. Amilton Rodrigo de Quadros Martins

Profª. Me. Ariane Mileidi Pazinato

Profª. Drª. Thaisa Leal da Silva

Passo Fundo

2017

4

AGRADECIMENTOS

A Deus, por ter me dado saúde, força e fé para

superar os obstáculos. Seu fôlego de vida em mim

me deu coragem para questionar realidades e propor

sempre um novo mundo de possibilidades.

A IMED, seu capacitado corpo docente, direção e

administração que oportunizaram a janela que hoje

vislumbro um horizonte superior.

Ao meu orientador, Amilton Rodrigo de Quadros

Martins, pela paciência, dedicação e, por

continuamente ter apostado na minha trajetória

acadêmica. É um exemplo de ser humano e

profissional, que com certeza, está gerando impactos

positivos na área da educação. Gratidão às suas

generosas e sabedoras orientações, as quais nunca

mediu esforços para realizá-las, a fim de me amparar

no desenvolvimento desta pesquisa.

A minha família e amigos, que são o alicerce para a

vida... Grato pelo carinho e apoio que tiveram

comigo para a conclusão desta etapa da minha vida.

A minha esposa Francieli Sander Sartori, minha

companheira de todos os momentos, melhor amiga e

maior incentivadora, meu anjo e presente de Deus...

Aquela que faz tudo por mim e para mim, que me

apoia (e critica também) e me ama

incondicionalmente. Desde que nos conhecemos,

tudo o que sonhamos juntos torna-se realidade,

porque com amor, tudo é possível.

E a todos que, direta ou indiretamente fizeram parte

da minha formação e torceram por esta importante

conquista. O meu muito obrigado!

5

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo compreender qual o impacto da programação de computadores

na instituição escolar, a fim de potencializar o desenvolvimento da criatividade em estudantes

do Ensino Fundamental através do FLOW. Para tanto, discutiu-se sobre a criatividade como

uma das habilidades socioemocionais do século XXI, visto que um sujeito criativo é alguém

que sabe resolver problemas. Discorreu-se a Teoria do FLOW como aspecto potencializador

da criatividade, subsidiando-se nos estudos do professor de psicologia Mihaly

Csikszentmihalyi. O Estado de FLOW ocorre quando as habilidades se encontram em

equilíbrio com os desafios que a atividade apresenta, na qual o indivíduo mantém um grau de

concentração absoluta. Assim, parece que se tem o controle sobre o destino, sentindo uma

grande satisfação, já que a experiência é, por si só, prazerosa. Apresentou-se também a

programação de computadores como uma ferramenta educacional, alicerçando-se nas

investigações de Seymour Papert e Mitchel Resnick, buscando aliar criatividade e

aprendizagem utilizando a linguagem de programação gráfica e visual Scratch. Sendo a

metodologia de natureza qualitativa, para o recolhimento dos dados utilizou-se dois

instrumentos: o ESM – Experience Sampling Method, para compreender o nível de

engajamento instantâneo dos estudantes; e o Grupo Focal, sendo o material da conversa

videogravado e guiando-se pela análise de conteúdo. A pesquisa foi desenvolvida dentro do

Projeto Letramento em Programação do Instituto Ayrton Senna, e que é aplicado em escolas

públicas municipais na cidade de Passo Fundo/RS. Neste estudo, a investigação empírica

aconteceu na EMEF Professora Helena Salton, com 12 estudantes do 6º ano. A pesquisa

permitiu a elaboração das seguintes conclusões: os métodos de aprendizagem alcançam

resultados mais satisfatórios através de desafios, estes pertencentes do mundo real; o trabalho

coletivo se mostrou essencial para a aprendizagem, porque, por meio das ideias

compartilhadas, os estudantes avançam nas atividades propostas; nas situações em que os

sujeitos são desafiados, sentem-se mais motivados, devido a possibilidade de utilizarem sua

imaginação para criar as próprias respostas.

Palavras-chave: Criatividade. Teoria do FLOW. Programação de Computadores. Scratch.

6

ABSTRACT

The object of this paper is to comprehend the impact of computer programming in school, an

aim to enhance the development of creativity in elementary school students through FLOW. In

order to do so, it was discussed creativity as one of the social-emotional skills of the 21st

century, considering that the creative subject is someone who knows how to solve problems.

The FLOW Theory was discussed as a potentializer aspect of creativity, being subsidized in

the studies of the professor of psychology Mihaly Csikszentmihalyi. The state of FLOW

occurs when the abilities are in balance with the challenges presented by the activity, in which

the individual maintains a level of absolute concentration. Therefore, it seems that one has

control over destiny, feeling great satisfaction, since the experience is, by itself, pleasurable.

The computer programming was also present as an educational tool, based on the

investigations of Seymour Papert and Mitchel Resnick, seeking to combine creativity and

learning using the graphic and visual programming language Scratch. As the methodology has

qualitative nature, two instruments were used to collect the data: the ESM - Experience

Sampling Method, to understand the level of instant engagement of the students; And the

Focal Group, being the material of the conversation videotaped and guided by content

analysis. The research was developed inside the project Letramento em Programação,

from Ayrton Senna Institute, which is applied in municipal public schools in the city of Passo

Fundo / RS. In this study, the empirical research was conducted at EMEF Professor Helena

Salton, with 12 students from the 6th grade. The research led to the following conclusions: The

learning methods achieve more satisfactory results through challenges, these belonging to the

real world; Collective work proved to be essential for learning, considering that through shared

ideas, the students progress in the proposed activities; In situations where subjects are

challenged, they feel more motivated considering the possibility of using their imagination to

create their own responses.

Keywords: Creativity. FLOW Theory. Computer programming. Scratch.

7

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Cinco fatores da personalidade – Big Five .............................................................. 18

Figura 2 - Equilíbrio entre pensamento divergente e pensamento convergente ....................... 22

Figura 3 - O que pode ser criado com formas?......................................................................... 24

Figura 4 - A qualidade da experiência ótima como uma combinação entre Desafios e

Habilidades ............................................................................................................................... 34

Figura 5 - Modelo da flutuação da qualidade da experiência com oito estados experienciais,

definidos em função da relação entre desafio e competência (Fonte: adaptado de Delle Fave e

Massimini, 2005) ...................................................................................................................... 43

Figura 6 - Tela da linguagem LOGO........................................................................................ 53

Figura 7 - Passos para construir um quadrado com a linguagem LOGO ................................. 54

Figura 8 - Espiral do Pensamento Criativo de Resnick ............................................................ 57

Figura 9 - Lego Mindstorms (blocos montados) ...................................................................... 59

Figura 10 - Interface do usuário do Scratch 2.0 ....................................................................... 61

Figura 11 - Canais do FLOW ................................................................................................... 72

8

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - Número de periódicos encontrados no Portal do Scielo (2011 a 2015) .................. 42

Tabela 2 - Número de Dissertações e Teses encontradas na Biblioteca Digital Brasileira de

Teses e Dissertações (2011 a 2015) .......................................................................................... 44

Tabela 3 - Momentos do Experience Sampling Method - ESM............................................... 71

9

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Diferenças entre o pensamento convergente e o pensamento divergente .............. 23

10

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Média Aritmética OF2 (Todos os sujeitos) ............................................................ 73

Gráfico 2 - Média Aritmética OF3 (Todos os sujeitos) ............................................................ 74

Gráfico 3 - Média Aritmética OF4 (Todos os sujeitos) ............................................................ 75

11

LISTA DE SIGLAS

BDTD: Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

EMEF: Escola Municipal de Ensino Fundamental

EFM: Experience Fluctuation Model

ESM: Experience Sampling Method

MIT: Massachusetts Institute of Technology

TTCT: Torrance Tests of Creative Thinking

TCFI: Teste de Criatividade Figural Infantil

UFPR: Universidade Federal do Paraná

UNICAMP: Universidade Estadual de Campinas

12

S U M Á R I O

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 13

2. A criatividade como uma das habilidades socioemocionais do século XXI .................... 16

3. A Teoria do FLOW e seu potencial para desenvolver a criatividade ............................... 27

4. Programação de computadores como ferramenta educacional ......................................... 46

5. METODOLOGIA ............................................................................................................. 63

5.1 Sujeitos ........................................................................................................................... 64

5.2 Instrumentos ................................................................................................................... 65

5.3 Procedimentos ................................................................................................................ 66

5.4 Análise de Resultados ..................................................................................................... 68

6. ANÁLISE DE RESULTADOS ........................................................................................ 69

7. CONCLUSÃO .................................................................................................................. 93

8. REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 97

9. ANEXOS ........................................................................................................................ 101

13

1. INTRODUÇÃO

Com o acelerado avanço na área tecnológica e das múltiplas ferramentas de que os

sujeitos podem fazer uso, tanto para o seu bem pessoal quanto para o profissional,

evidenciamos que alguns instrumentos servem estritamente para a comunicação e não

propriamente para o desenvolvimento da mente.

Percebendo que o computador é uma máquina instalada na sociedade contemporânea

que está em evidência, pensamos também nas limitações desta ferramenta para a vida

humana, como por exemplo, ser simplesmente um sistema mecanizado e sem consciência,

além de não estabelecer interação e demonstrar um comportamento puramente racional, já que

não executa nada além do que foi programado para fazer. No entanto, investiremos nas

potencialidades dessa ilimitada máquina, no sentido de ter a função de recuperar a noção de

mente, concebendo o homem como um processador, que recebe, elabora e reage, não só com

a máquina em sua frente, mas com os companheiros que estão no ambiente, podendo ser

colegas ou professores.

Partindo do pressuposto de que tudo o que é automatizado existe uma programação

como “pano de fundo”, quanto mais cedo auxiliarmos à nova geração como se faz para

programar, mais cedo, por conseguinte, poderão encarar a realidade da tecnologia de

computadores não somente como diversão, mas também como um instrumento,

primeiramente pedagógico e, mais do que isso, de inovação para soluções do futuro.

Notamos que os estudantes, no cenário atual, estão sendo encaminhados para

encontrar uma resposta certa, o que acaba inibindo suas capacidades de criação.

Compreendendo que podemos pensar diferente, e achar respostas diferentes para o mesmo

objetivo, a aprendizagem da programação de computadores pode ser uma importante

ferramenta frente aos desafios da educação para o século XXI, sendo tão relevante como foi

aprender a ler e escrever nos séculos anteriores.

Nesse sentido, falaremos de adolescentes que frequentam o Ensino Fundamental, na

medida em que é preciso melhor prepará-los no desenvolvimento do seu poder criativo.

Pensamos que através de ferramentas como a programação de computadores, e a utilização de

algoritmos para desvendar passos para resoluções de problemas será significativa na hora de

criar soluções em outras áreas, pois assim como para se chegar a um endereço, os trajetos

podem ser vários, uns mais longos e demorados e outros mais curtos e rápidos, na

programação de computadores também é possível se fazer de várias formas para se chegar ao

mesmo resultado.

14

Os algoritmos servem para programar e, por isso, temos a hipótese de que se os

adolescentes/estudantes conseguem seguir os passos numa sequência lógica na programação

de computadores, eles podem avançar na resolução de problemas “fora” do computador, em

outras áreas do conhecimento e na própria vida. Nesse sentido, com o exercício da

programação, a criatividade pode ser mobilizada.

Na Psicologia Positiva, o FLOW tem se mostrado um grande potencializador da

criatividade, pois é um estado de excelência mental que reúne, ao mesmo tempo, alta

motivação, concentração profunda, satisfação e alto desempenho. Essa experiência está ligada

ao desafio, à habilidade e à capacidade do ser humano se realizar criando soluções para seu

cotidiano. E, com a programação de computadores, especificamente utilizando da linguagem

Scracth, os estudantes são mobilizados pelo desafio e precisam desenvolver sua habilidade

para resolver os problemas.

Na Teoria do FLOW, quando o sujeito tem um desafio (nesse caso, resolver um

problema), precisa desenvolver habilidades através de exercícios. Ao chegar em um patamar

de equilíbrio entre desafio e habilidade, sendo um desafio acima do convencional, onde é

necessária a mobilização do sujeito, se alcança o estado do FLOW, o que proporciona maior

engajamento por parte do indivíduo e reflete no potencial criativo. Logo, partimos da

premissa que, tendo felicidade o sujeito estará mais engajado com a ação.

Diante disso, o problema que norteia a pesquisa ora exposta se constitui assim: Qual o

impacto da programação de computadores na potencialização do desenvolvimento da

criatividade, entre os estudantes do Ensino Fundamental através do FLOW?

Como objetivo geral, procuramos compreender qual o impacto da programação de

computadores na instituição escolar, a fim de potencializar o desenvolvimento da criatividade

(habilidade socioemocional do século XXI) em estudantes do Ensino Fundamental através do

FLOW.

Com os objetivos específicos pretendemos: a) conhecer as habilidades

socioemocionais do século XXI; b) pesquisar a Teoria do FLOW e sua aplicação em

avaliação de engajamento de estudantes do Ensino Fundamental; c) conhecer o teste Torrance

de criatividade e sua aplicação brasileira chamada TCFI; d) avaliar o engajamento de

estudantes de Ensino Fundamental em oficinas de programação de computadores.

A fim de discutirmos no decorrer do texto, colocamos aqui um bloco de questões: qual

é o propósito do uso da programação de computadores nas escolas?; como essa ferramenta

vem sendo utilizada para a aprendizagem e desenvolvimento da criatividade dos estudantes,

por meio do FLOW?; de que forma os estudantes do Ensino Fundamental atingem o estado

15

de FLOW na programação de computadores?; e, se atingirem esse estado, eles terão mais

facilidade para criar soluções no cotidiano?.

O texto está organizado em sete seções, tendo como propósito aliar a esfera

psicológica e a pedagógica, utilizando a tecnologia. A primeira apresenta a introdução; a

segunda aborda as habilidades socioemocionais do século XXI, com ênfase na criatividade; a

terceira discute a teoria do FLOW e sua aplicação na área educacional, concebendo sua lógica

como potencializadora do aspecto criador; a quarta trata da programação de computadores na

educação, especificamente a linguagem Scratch, com vistas a subsidiar o desenvolvimento da

criatividade; a quinta discorre sobre o caminho metodológico; a sexta expõe a análise de

resultados dos dados recolhidos na pesquisa de campo, que foi desenvolvida na Escola

Municipal de Ensino Fundamental Professora Helena Salton, na cidade de Passo Fundo/RS,

com 12 estudantes pertencentes ao 6º ano, sendo 4 meninos e 8 meninas; por último, na

sétima, estão descritas as considerações a que este estudo chegou.

16

2. A CRIATIVIDADE COMO UMA DAS HABILIDADES

SOCIOEMOCIONAIS DO SÉCULO XXI

Nesta seção, discutiremos as habilidades socioemocionais, ou não cognitivas com foco

em traços de personalidade, demandadas para cidadãos do século XXI1, com destaque na

criatividade, a fim de mostrar sua relevância, para a obtenção de bons resultados na escola, e

mais ainda, para o sucesso no trabalho e na vida. As escolas do presente século precisam

descobrir como inspirar seus estudantes enquanto aprendem, pois, como notamos nas palavras

de Abed (2014, p. 6),

[...] não há como preparar as crianças e jovens para enfrentar os desafios do século

XXI sem investir no desenvolvimento de habilidades para selecionar e processar

informações, tomar decisões, trabalhar em equipe, resolver problemas, lidar com as

emoções.

Temos a compreensão de que mais exercícios, mais repetição e mais testes podem até

resultar em uma nota mais alta, entretanto, não prepararão o estudante de maneira integral e,

muito menos, darão conta de desenvolver todas as habilidades que a sociedade demanda. Pois,

enquanto o mundo abre espaço e postula que os sujeitos tornem-se protagonistas de seu

próprio desenvolvimento e de suas comunidades, o ensino tradicional ainda responde com

arquétipos criados para atender aos interesses escolásticos antigos.

Assim, ao visualizarmos um ser humano em toda a sua complexidade e almejando

auxiliar no seu desenvolvimento, é primordial a incorporação de estratégias de aprendizagem

mais flexíveis e abrangentes. Logo, “para que a verdadeira aprendizagem se dê, é preciso que

o aluno construa o seu próprio conhecimento, revestindo-o de sentidos pessoais, o que por sua

vez mobiliza a afetividade tanto do professor como dos alunos” (ABED, 2014, p. 61).

Abed (2014, p. 124) em seu estudo, retoma a fala de Viviane Senna no Fórum

Internacional de Políticas Públicas, ocorrido na cidade de São Paulo nos dias 24 e 25 de

março de 2014, e que contemplou a temática “Educar para as Competências do Século 21”.

Ela comentou que, “apesar da complexidade da mudança, é possível, sim, construir caminhos

que levem à superação dos desafios. Os professores clamam por ferramentas para lidar com os

1 Dado o potencial da abordagem socioemocional para aperfeiçoar os índices de educação

em geral, reduzindo desigualdades dentro dos sistemas educativos e promovendo a prosperidade

social e econômica, o Instituto Ayrton Senna e seus colaboradores se uniram ao Centro para

Pesquisa e Inovação Educacional (CERI) da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento

Econômico (OCDE) para elaborar um projeto pioneiro de medição de competências

socioemocionais no contexto escolar (SANTOS; PRIMI, 2014, p. 5).

17

aspectos socioemocionais dos seus alunos, como a indisciplina e a desmotivação para o

aprender”.

Nesse sentido, uma das soluções para fazer uma reconexão/contextualização do

indivíduo com a realidade passa pelo desenvolvimento das habilidades socioemocionais, já

que nesse processo, tanto crianças quanto adultos aprendem a operacionalizar as melhores

atitudes para regular emoções, alcançar objetivos, demonstrar empatia, sustentar relações

positivas e assumir decisões com comprometimento.

Ao verificarmos tal questão, encontramos nos escritos de Santos e Primi (2014, p. 11),

um dos aportes para esse estudo, visto que os autores salientam que

a escola reconhece [...] que o desenvolvimento dos alunos é multidimensional e que

o aprendizado envolve o domínio de competências “não cognitivas”, de natureza

afetiva e comportamental. No entanto, apesar do reconhecimento devotado à esfera

socioemocional por pais e professores, pouco esforço é dedicado ao seu

desenvolvimento intencional e à avaliação da efetividade das intervenções que se

destinam a promovê-lo.

A instituição educativa “entende” que os estudantes se desenvolvem dinamicamente e,

por isso, consideram-no como um todo, porém, as atividades que são realizadas no geral ainda

avaliam apenas as habilidades cognitivas, pois esse é um fator determinante para “passar” de

ano. Por outro lado, os autores defendem a importância das habilidades socioemocionais, que

por vezes, podem ser tão ou mais relevantes que as chamadas intelectivas ou cognitivas.

Assim como as capacidades cognitivas, as socioemocionais precisam ser estudadas

longitudinalmente, o que se refere ao termo “ao longo de”, pois o indivíduo no seu percurso

evolutivo vai desenvolvendo e aprimorando suas habilidades conforme as suas experiências

educacionais e de vida.

As habilidades socioemocionais incluem um conjunto de comportamentos e

sentimentos individuais como uma espécie de padrão constante ou tendência para responder

de determinada forma em certos contextos e situações diárias, ao gerenciar as próprias

emoções ou tentar atingir um objetivo. Abed (2014, p. 105) reitera que o desenvolvimento de

tais habilidades “[...] é fundamental para aprimorar o processo de ensino-aprendizagem,

promover o sucesso escolar e fomentar o progresso social dos indivíduos e das nações”.

Em geral, as habilidades socioemocionais são desmembradas em cinco fatores da

personalidade ou “cinco grandes” domínios, denominados os Big Five2: abertura a novas

2 “Os Big Five são construtos latentes obtidos por análise fatorial realizada sobre respostas de amplos

questionários com perguntas diversificadas sobre comportamentos representativos de todas as características de

personalidade que um indivíduo poderia ter” (SANTOS; PRIMI, 2014, p. 16).

18

experiências, conscienciosidade, extroversão, amabilidade, estabilidade emocional ou

neuroticismo. Em todos esses domínios, o lócus de controle está presente, referindo-se a

maneira como o sujeito atribui o desempenho a si mesmo ou a terceiros, ou seja, as

habilidades conativas, que são relativas à “vontade”, como a motivação e crenças.

Figura 1 - Cinco fatores da personalidade – Big Five

Fonte: elaboração do autor

Abaixo, explicitamos em tópicos suas características (Figura 1), tendo como alicerce

Santos e Primi (2014):

a) Abertura à novas experiências - “é definida como a tendência a ser aberto a

novas experiências estéticas, culturais e intelectuais. O indivíduo aberto a novas experiências

caracteriza-se como imaginativo, artístico, excitável, curioso, não convencional e com amplos

interesses” (2014, p. 18). Isto é, abertura é o interesse pela arte, aventura, ideias fora do

comum ou que não são costumeiras, que alteram seus padrões cotidianos;

b) Conscienciosidade - “é definida como a tendência a ser organizado, esforçado

e responsável. O indivíduo consciencioso é caracterizado como eficiente, organizado,

autônomo, disciplinado, não impulsivo e orientado para seus objetivos (batalhador)” (2014, p.

19). Este traço mostra uma preferência pelo comportamento planejado ao invés do

espontâneo, influenciando na maneira como controlamos e dirigimos os impulsos;

19

c) Extroversão - “é definida como a orientação de interesses e energia em

direção ao mundo externo e pessoas e coisas [...] O indivíduo extrovertido é caracterizado

como amigável, sociável, autoconfiante, energético, aventureiro e entusiasmado” (2014, p.

20). Este traço é marcado pelo profundo envolvimento com o mundo exterior, já que os

extrovertidos gostam de estar com pessoas, e são usualmente vistos como cheios de energia;

d) Amabilidade - “é definida como a tendência a agir de modo cooperativo e não

egoísta. O indivíduo amável ou cooperativo se caracteriza como tolerante, altruísta, modesto,

simpático, não teimoso e objetivo (direto quando se dirige a alguém)” (2014, p. 20). Este traço

reflete diferenças individuais na preocupação com a harmonia social, primando pela boa

relação com os outros.

e) Estabilidade emocional (ou neuroticismo) - “é definida como a

previsibilidade e consistência de reações emocionais, sem mudanças bruscas de humor. O

indivíduo emocionalmente instável é caracterizado como preocupado, irritadiço,

introspectivo, impulsivo, não autoconfiante [...]” (2014, p. 21). Aquele com um grau elevado

de neuroticismo é emocionalmente reativo e vulnerável ao estresse, podendo manifestar

depressão e desordens de ansiedade. No outro extremo da escala, o sujeito com baixo

neuroticismo é mais difícil de ser perturbado e é menos reativo emocionalmente. Por isso, ele

tende a ser calmo e, por conseguinte, emocionalmente estável.

Partindo de tais habilidades socioemocionais, trataremos com mais primor da

capacidade criadora do ser humano, pois como Santos e Primi (2014, p. 18) comentam

“dentre as facetas da Abertura, particular atenção tem sido dedicada à Criatividade, elencada

[...] como um dos principais atributos do Século XXI”.

Criatividade é uma conotação que, na maioria das vezes, gera ambiguidade, pois está

associada a diferentes propriedades e, por isso, precisamos encontrar a melhor maneira de

conceituá-la, no intuito de clarear seu conceito. Isto é,

criatividade é uma variável de difícil conceptualização, com inúmeros modelos

teóricos que procuram esclarecer a sua origem, funcionamento e manutenção. No

entanto, apesar de distintas, as teorias da criatividade expressam o potencial humano

para se ser criativo e as componentes que no seu conjunto constituem a criatividade

(JESUS et al., 2012, p. 2).

Sendo assim, o que significa ser criativo? Como tornar tangível o potencial criador

humano? Pinheiro (2013, p. 97) alega que “diferentemente do que se supõe, contudo, a maior

parte do que se sabe a respeito da criatividade não é fruto da imaginação de gênios

individuais, mas sim, da intersecção do conhecimento coletivo”, ou seja, nenhuma teoria

20

particular é tão persuasiva quanto ao acúmulo social contínuo de evidências com relação à

essa capacidade.

No artigo A criatividade e o processo criativo, Martins (2016) estabelece a distinção

entre as palavras criação, criatividade e inovação. Ele apresenta pois, o conceito de

criatividade como um atributo que pode ser identificado nos indivíduos, por meio de suas

ações, modos de pensar e também pela aptidão de inventarem saídas inabituais para resolver

os problemas, referindo-se aos meios pouco utilizados e inusitados para solucionar questões.

O autor menciona que desde os tempos primitivos, “o homem não é apenas um fazedor, o

homem é formador”.

Martins (2016) apresenta que a concepção de criatividade evolui desde o surgimento

do homem, e no percurso humano, passou por várias reformulações; logicamente podemos

pensar que, conforme vai se passando o tempo e mudando o ambiente, consequentemente as

visões de criatividade vão evoluindo e se especializando.

Aportando-se das ideias de Gurgel, o autor infere que esse conceito se desenvolveu

historicamente, partindo de uma visão espiritualista à uma visão racional e científica. Sobre

este pensar, Antunes (2014, p. 370) complementa que, durante muito tempo acreditava-se que

a criatividade era fruto de um “talento” das pessoas geniais e privilegiadas, o que dependia da

herança biológica ou da predestinação espiritual. Desse modo,

a ideia da escola desenvolver [...] alunos criativos é uma ideia plausível, ainda que o

aumento da criatividade pessoal não implique a “fabricação de gênios”. Em verdade,

quando o professor se interessa, o aluno tende a desenvolver sua criatividade. Todos

por certo evoluirão. Alguns chegarão, talvez, à genialidade. A proposta não deveria

ser fazer do aluno um gênio, mas sim favorecer a criatividade latente em cada um

como instrumento para uma vida melhor. O essencial, como enfatiza Gardner, não é

tornar-se “o melhor”, mas tornar-se melhor. Felizmente, vai longe o tempo em que

se acreditava que a criatividade nas pessoas ou estava previamente programada em

seus genes ou era atributo específico de um Deus seletivo (ANTUNES, 2014, p.

362).

Com isso, podemos perceber uma questão dualista entre criatividade e inteligência3,

visto que ser inteligente não quer dizer que o sujeito consiga resolver todos os problemas da

vida. Ser criativo está mais próximo de certa forma, ao engajamento em múltiplas conexões,

pois através de várias ideias é possível exercer a habilidade de criação, que pode ser

considerada como um potencial individual da mente humana. “Assim, a criatividade não

3 A criatividade é compreendida como um dos componentes da inteligência. “Criatividade e inteligência

constituem conceitos que se aproximam, mas não se confundem. Uma pessoa pode ser expressivamente

‘inteligente’ nesta ou naquela linguagem e, dessa forma, resolver problemas, superar desafios específicos e

compreender de forma abrangente, e, mesmo assim, não ser necessariamente, criativa” (ANTUNES, 2014, p.

374).

21

ocorre somente dentro dos indivíduos, ela é o efeito natural da interação entre os pensamentos

do indivíduo e o contexto sociocultural ao qual ele está inserido” (HOLANDA; RAMOS,

2013, p. 9).

Nesse sentido, voltamos a nos perguntar o que é a criatividade de fato? Com relação às

pesquisas realizadas, percebemos que a criatividade remete à capacidade de criar, produzir ou

inventar coisas novas, bem como, a capacidade de transformar situações e inovar no modo de

agir. Para tanto, Jesus et al. (2012) explicam que

o conceito de criatividade obteve um maior reconhecimento em Psicologia após o

artigo “Creativity” de Guilford (1950), no período em que foi Presidente da APA.

Guilford realizou um importante trabalho no âmbito da criatividade, propondo a

distinção entre produção convergente e divergente, usualmente traduzidas como

pensamento convergente e divergente, para além de ter realizado um trabalho

fundamental no âmbito da avaliação da criatividade (Guilford, 1967). No entanto,

Guilford considerava a criatividade como parte da inteligência, tendo sido Torrance

que propôs a autonomia do conceito de criatividade e que criou e desenvolveu o

“Torrance Tests of Creative Thinking” (Torrance, 1966, 1974), que tem sido o

instrumento mais utilizado para avaliar a criatividade. Outros autores, como Gardner

(1982, 1993), Runco (1997) e Sternberg (1988, 1999) também tiveram um

importante contributo no estudo da criatividade.

Guilford, que é considerado fundador da pesquisa moderna em criatividade, ressalta

que esta tem uma forte relação ao pensamento divergente, onde são geradas ideias diferentes

sobre determinado tema, buscando variedade, baixo julgamento e baixa limitação de

imaginação. Entendendo mais, Oliveira (1989, p. 64) enfatiza que “Guilford fala de

<inteligência divergente> podendo explicar-se a criatividade devido aos diversos estilos

cognitivos”, o que se refere às múltiplas formas de pensar; logo, vemos uma pessoa que

explora a capacidade criadora, e não somente a capacidade lógica. Desta maneira, o

pensamento divergente segundo Guilford, revela-se pela produção de respostas numerosas

(fluidez), variadas (flexibilidade), raridades (originalidade) e detalhamento das respostas

(elaboração). Para ele portanto, os indivíduos criativos se caracterizam por pensar através

destes quatro fatores.

Podemos exemplificar o pensamento divergente citando a cuia, no sentido de solicitar

que os sujeitos anunciem funções para além do que esse utensílio foi criado originalmente,

isto é, para tomar chimarrão. No entanto, quando o indivíduo investe no lado divergente do

cérebro, explora outras funcionalidades do objeto, mobilizando sua criatividade; logo, ele sai

do lógico e “viaja” para o inabitual.

Agora a cuia não é apenas uma cuia para tomar chimarrão, ela pode ser: um copo, um

vaso de flor, um chapéu, um microfone, um porta objetos, uma cadeira, uma peteca, um

22

reservatório de água, um pingente de colar, um instrumento musical, um funil, um fone de

ouvido, uma nave espacial, um taco de baseball, enfim, o pensamento divergente não pode ter

barreiras e nem julgamentos. A grande dúvida é se os métodos atuais de ensino estão

oportunizando situações em que os estudantes explorem e exercitem tal pensamento, de forma

intencional e planejada.

Por outro lado, existe o pensamento convergente, onde se analisa todas as ideias

geradas e o foco é direcionado para aquela ideia mais promissora como solução, buscando

lógica e julgamento assertivo. Isto é, neste caso, a partir de todas as opões que foram dadas à

cuia por exemplo, é chegada a hora do lado convergente agir, no sentido de filtrar o que é

realmente possível para tal objeto; logo, realiza-se um balanceamento entre os dois

pensamentos. Portanto, o equilíbrio entre pensamento divergente e pensamento convergente é

a lógica da condução do processo criativo, já que a motivação é a característica do ser

humano.

Figura 2 - Equilíbrio entre pensamento divergente e pensamento convergente

Fonte: <http://goo.gl/FfCead>

Com o apoio em Antunes (2014, p. 368), estabelecemos um link com a questão

cultural, isto é, o povo ocidental utiliza mais o hemisfério cerebral esquerdo, ou melhor, o

chamado lado convergente, já o povo oriental instala um equilíbrio, entre o hemisfério

cerebral esquerdo e o direito, o que remete ao lado divergente e também convergente. Nesse

sentido, percebemos que as fantásticas criações humanas estão no equilíbrio dos dois lados

cerebrais.

23

Para ilustrar essa lógica, Antunes (2014, p. 368) construiu um quadro a fim de

estabelecer relação das ações do cotidiano em que se utiliza preferencialmente o sistema

cortical ou límbico deste ou daquele hemisfério. Para o autor, a síntese é interessante por

orientar mudanças na maneira do sujeito “[...] ser e agir, buscando a sabedoria do equilíbrio”.

Ainda,

ao que tudo indica, o hemisfério esquerdo é o centro da racionalidade e da fala e,

para um troglodita caçador, a parte da mente essencial para que possa disparar sua

lança. O hemisfério direito, ao contrário, parece ser o centro da ternura e beleza, da

criatividade, dos sonhos e da fantasia. O esquerdo é texto, o direito é contexto.

Como não mais existem razões para viver no século XXI tal como troglodita

caçador, é importante que possamos unir a racionalidade à poesia, a síntese à

criatividade, à ordem ao entusiasmo (ANTUNES, 2014, p. 368).

Vejamos o quadro a seguir:

Quadro 1 - Diferenças entre o pensamento convergente e o pensamento divergente

Sistema límbico cortical esquerdo Sistema límbico cortical direito

Argumenta de maneira lógica e seleciona

fatos concretos e precisos. Gosta de “jogar conversa fora”, sonhar de

olhos abertos, pensar o impensável.

Sente-se envolvido por temas financeiros;

racionaliza o uso do dinheiro. Adora o que o dinheiro compra e encanta-se

com o gasto imediato.

Prefere o discurso, encanta-se com a

precisão das ideias e a magia das palavras. Pensa o falar como água que, indisciplinada,

despenca pela cachoeira.

Analisa todas as implicações de uma ação;

procura sempre planejar antes, depois agir. Sente que toda ação vale mais pela emoção e

pelo entusiasmo que desperta.

Preocupa-se com métodos de trabalho e as

etapas da organização de uma tarefa. Ama fazer “o que dá na telha”, caminhar à

toa, olhar, mas principalmente ver.

A tarefa proposta vale mais pela conclusão

que por sua realização. Encanta-se mais com a “jornada” que com o

sinal de seu fim.

Preocupa-se com detalhes, organiza agendas,

adora “receitas” perfeitas. Gosta da inovação, empolga-se com a

criatividade, adora inventar novos pratos.

Desespera-se com o tédio, apavora-se com a

ociosidade, exige movimento. Empolga-se com dolce far niente, ama

percursos indefinidos, o acaso.

Gosta de fazer de uma criança um pequeno

adulto. Prefere ir a um ponto definido. Teima em fazer de todos os adultos pequenas

crianças. Prefere viajar à solta.

Fonte: Antunes (2014, p. 369)

Dando continuidade, nos anos de 1960, o psicólogo norte-americano Torrance recebeu

grande influência das ideias de Guilford, principalmente quando se propôs a construir testes

para avaliação da criatividade, por meio do Torrance Tests of Creative Thinking (TTCT)4,

4 Para um melhor entendimento, o TTCT é constituído por 10 provas, verbais e figurativas, que recorrem

a tarefas como a colocação de questões e a descoberta de causas e consequências perante uma imagem, a

24

instrumento mais utilizado em nível internacional. Em seus testes, são reveladas formas

diversas de expressar o potencial criador, considerando os aspectos cognitivos e emocionais,

nas dimensões verbal, avaliando o modo como o sujeito se expressa pela linguagem (oral ou

escrita), formulando hipóteses ou perguntas e reconhecendo a capacidade de pensar em

metáforas ou conceitos; figurativa, avaliando o pensamento visual e espacial, concluindo

imagens que estão inacabadas (NAKANO, 2006, p. 56).

Dadas algumas formas gráficas simples, a pessoa é solicitada a usá-las ou combiná-las

ou a terminar uma figura incompleta. Desse modo, avaliadores julgam se os resultados são

mais ou menos criativos, como no exemplo a seguir da figura 3:

Figura 3 - O que pode ser criado com formas?

Fonte: site “Criatividade Aplicada”, por Jairo Siqueira com base no Teste de Pensamento Criativo de Torrance

<goo.gl/us4NFs>

Nakano explica (2006, p. 59-62) que, inicialmente Torrance fez em seus trabalhos a

diferenciação entre as quatro características de pensamento criativo, chamados indicadores

cognitivos, baseado na teoria de Guilford, sendo: a) fluência ou aptidão para produzir um

grande número de ideias; b) flexibilidade ou capacidade para produzir respostas bastante

enunciação de usos incomuns para um objeto ou o aperfeiçoamento e completamento de figuras, dando-se títulos

às mesmas. As tarefas fazem parte de duas baterias paralelas (Formas A e B) compostas, cada uma delas, por

sete provas verbais e três provas figurativas. As perguntas de cada prova são de carácter aberto. O teste

figurativo demora 30 minutos e para o teste verbal são necessários 45 minutos.

25

variadas; c) originalidade ou competência para produzir ideias que se afastam do comum/ ou

fora dos padrões; d) elaboração ou capacidade de resolver, ampliar e implementar as ideias,

para torná-las mas vívidas.

Foi então que, a partir de 1980, Torrance incluiu mais elementos, pois compreendeu

que indicadores emocionais também deveriam ser levados em conta:

e) expressão de emoção – leva em consideração os sentimentos adquiridos por meio

das experiências, funcionando como um efeito facilitador na hora da criação.

f) fantasia – grande parte da criatividade está relacionada a tudo aquilo que foi

vivenciado em um mundo imaginário.

g) movimento – está relacionado à dinâmica nas ações no momento da criação.

h) perspectiva incomum – habilidade de ver algo e apresentar vários pontos de vista;

ou seja, olhar de diferentes ângulos tendo múltiplas perspectivas.

i) perspectiva interna – habilidade do indivíduo representar partes de algo oculto, ou

seja, a visualização interna do objeto sob a forma de transparência.

j) uso de contexto – relaciona-se às preocupações da criação de um ambiente, no

sentido de estabelecer conexões no desenho e pensar que este encontra-se dentro de um

universo maior.

k) combinações – é representada por meio da síntese de elementos, com o objetivo de

formar uma imagem coerente, isto é, liberdade de criação para ir conectando as figuras.

l) extensão de limites – tem referência aos indivíduos que buscam criar soluções

assertivas e que quebram restrições frente a problemas incompletos ou sem saída e, não

conclusões imediatas, impulsivas, prematuras.

m) títulos expressivos – leva em consideração que uma ideia não pode ser somente

uma descrição básica, visto que vai muito além do que foi pensada. O sujeito mostra-se

extremamente detalhista, tentando expressar a essência da sua ideia.

n) analogias/Metáforas – aptidão de buscar similaridades/comparações entre

elementos distintos que venham a possuir o mesmo sentido, objetivando realizar novas

conexões.

Apresentamos também o Teste de Criatividade Figural Infantil (TCFI), feito com base

no estudo de Torrance em relação ao teste de criatividade – Torrance Tests of Creative

Thinking (TTCT), sendo que o TCFI é uma versão brasileira do mesmo. Refere-se à uma

medida que visa identificar características de uma pessoa criativa ou “compreender melhor a

função cognitiva da criatividade (NAKANO; PRIMI, 2012, p. 277)”. Os autores responsáveis

26

pelo desenvolvimento do teste foram Tatiana de Cássia Nakano, Solange Muglia Wechsler e

Ricardo Primi.

A partir de Nakano e Primi (2012, p. 278), o teste é formado por três atividades, de

forma que possibilita ao sujeito a elaboração de até 41 respostas sob a forma de desenhos. As

atividades consistem em:

1 - elaborar um desenho a partir de um estímulo pouco definido (fazer um desenho);

2 - completar o desenho a partir de 10 estímulos incompletos (acabar um desenho);

3 - fazer o maior número de desenhos a partir do mesmo estímulo repetido 30 vezes

(fazer desenhos a partir de um semiquadrado).

Diante disso, os atributos avaliados pelo teste de criatividade são (NAKANO; PRIMI,

2012, p. 278): fluência: quantidade de ideias expressivas entregue pelo sujeito; flexibilidade:

diversidade de ideias; elaboração: acréscimo de detalhes ao desenho básico; originalidade:

ideias atípicas; expressão de emoção: demonstração de sentimentos, tanto nos desenhos

quanto nos títulos; fantasia: acréscimo de seres fantasiosos, contos de fada ou ficção

científica; movimento: liberdade e leveza nas movimentações nos desenhos ou títulos;

perspectiva incomum: pessoas ou objetos desenhados sobre perspectivas inabituais;

perspectiva interna: visão interna de artefatos ou elemento do corpo das pessoas, sob a

forma de transparência; uso de contexto: criação de um espaço para o desenho; extensão de

limites: ampliar os estímulos antes de finalizar os desenhos; títulos expressivos: superar o

básico proposto do desenho, abstraindo-o.

Tendo em vista o que discutimos até o momento, e recuperando o assunto do ato

criativo, é possível mencionar que a “criatividade é qualquer ato, ideia ou produto que muda

um campo já existente ou que transforma um campo já existente em um novo”

(CSIKSZENTMIHALYI, 1998 apud HOLANDA; RAMOS, 2013, p. 9).

Diante disso, ao adensar seus estudos sobre as investigações do psicólogo

Csikszentmihalyi, Antunes (2014, p. 380-381, grifo do autor) reitera que este autor “[...]

analisa o momento criativo – a que chama de fluxo – em mentes geniais e em alunos comuns e

conclui que o mesmo sempre ocorre quando a atenção se volta de maneira intensa e

obcecada para a tarefa que se pretende cumprir”.

Sendo assim, na próxima seção, será detalhado o estudo da Teoria do FLOW,

investigando de que forma o sujeito age criativamente através dessa experiência.

27

3. A TEORIA DO FLOW E SEU POTENCIAL PARA DESENVOLVER

A CRIATIVIDADE

Atividades diferentes geralmente afetam a qualidade da experiência de maneiras bastante previsíveis. Se

durante a vida só fazemos coisas deprimentes, é improvável que no fim tenhamos vivido com muita felicidade.

Geralmente cada atividade possui tanto qualidades negativas quanto positivas (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 41).

Nessa seção, iremos apresentar a teoria do FLOW e procurar estabelecer relação com

as pesquisas na esfera educativa, apontando como potencializador da habilidade

socioemocional “Abertura à novas experiências”, mais especificamente a Criatividade.

Investiremos assim, em discutir sobre o FLOW, como a descoberta de Mihaly

Csikszentmihalyi e, com isso, a criatividade como consequência do FLOW.

FLOW é um termo que vem do inglês e que pode ser traduzido como “estado de

fluxo” ou “experiência de fluxo”5, conceito cunhado pelo professor húngaro Mihaly

Csikszentmihalyi, co-fundador do movimento conhecido como Psicologia Positiva, em

meados de 1970. Seu principal legado é sobre a felicidade, criatividade, bem-estar e a

diversão, porém seu trabalho mais famoso é a criação da Teoria do FLOW

(CSIKSZENTMIHALYI, 2004).

Ao estudarmos brevemente sua biografia, colocamos em destaque que, ele nasceu em

29 de setembro de 1934 (no período entre as duas grandes Guerras Mundiais), em Fiume

(atual Rijeka, Croácia), uma cidade incorporada ao Reino da Hungria, que foi ocupada e

anexada pela Itália após a Primeira Guerra Mundial. Sua família era húngara e seu pai era

membro do corpo diplomático húngaro. Cresceu em Fiume, Florença e Roma, falando

fluentemente húngaro, italiano e alemão (KAMEI, 2010).

A Segunda Guerra Mundial desestruturou completamente sua família e sua vida e,

apesar de ser criança, ficou preso em um campo de concentração italiano por um período. Um

dos seus irmãos morreu em combate e o outro foi preso pelos russos e enviado para um

campo de concentração na Sibéria. Quando criança, durante a Guerra achou que havia algo

errado em relação ao modo como os adultos organizavam seus pensamentos. Foi então que

Csikszentmihalyi assistiu a Jung e conheceu alguém que parecia lidar com alguns dos

aspectos positivos da experiência humana.

5 Em virtude de preservar a nomenclatura original e atenção à questão metodológica, ao invés da palavra

fluxo, que é a tradução de FLOW, optamos por utilizar somente FLOW no texto, por se tratar de um conceito.

28

Ficou deslumbrado pela Psicologia e passou a ler as obras de Jung e Freud, o que o

motivou a estudar Psicologia na América. Seu interesse na ideia de felicidade originou-se

quando conheceu húngaros que ficaram presos durante a União Soviética, questionando-se

como que alguns deles mantinham-se tranquilos e outros estavam completamente arrasados e

destruídos (KAMEI, 2010).

Graduou-se em 1959, ingressou no Doutorado em Desenvolvimento Humano e

recebeu seu Ph.D em 1965, na Universidade de Chicago, onde foi chefe do departamento de

Psicologia e onde lecionou por 30 anos, realizando projetos de pesquisa de longa duração em

longa escala, que forneceram subsídios para a construção de um modelo conceitual sobre a

experiência subjetiva ótima, ou melhor, quais são os princípios daquilo que faz a vida valer

apena (KAMEI, 2010, p. 46-47). Hoje, ele é professor de Psicologia na Universidade de

Claremont na Califórnia.

Em meio à desordem que Csikszentmihalyi viveu durante a Segunda Guerra Mundial,

mesmo sendo criança, aos 10 anos de idade, ele descobriu a primeira atividade de FLOW: o

xadrez. Nesta, “ele podia escapar do mundo caótico em que vivia e esquecer temporariamente

de todos os problemas, entrando em um mundo que tinha metas e regras claras, uma realidade

que, se você soubesse o que fazer, podia controlar e sobreviver nela” (KAMEI, 2010, p. 46).

Na adolescência, com seus 16 anos, descobriu a segunda atividade de FLOW: a pintura,

percebendo o quão envolvente era o trabalho artístico e criativo.

Csikszentmihalyi uniu pois, duas perguntas para desenvolver sua teoria: por que é tão

difícil ser feliz?; qual é o significado da vida?, analisando aqueles que encontram prazer e

contentamento duradouro em atividades que levam ao estado de FLOW, ou também, ao

momento criativo. Diante disso, ele interessou-se em descobrir quais eram os elementos que

contribuíam para trazer uma vida que valesse a pena ser vivida, explorando arte, religião,

filosofia e vários outros campos do conhecimento que poderiam auxiliar sua investigação. O

autor compreendeu por fim, que a psicologia poderia ser a ferramenta ideal para ajudá-lo a

descortinar suas inquietações.

Quando nos questionamos o que é uma vida boa, devemos associar a tudo aquilo que

se pode experimentar (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 14), isto é, a partir das novas

experiências é que encontraremos as atividades que trarão resultados satisfatórios. De certo

modo, quanto maior o número de atividades o sujeito se envolver, além de sentir qual, ou em

quais delas lhe gera maior felicidade, mais experiências ele estará disposto a explorar. Logo,

“viver significa experimentar – por meio de atos, sentimentos e pensamentos. [...]. Com o

29

passar dos anos, o conteúdo da experiência determinará a qualidade da vida”

(CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 17).

Csikszentmihalyi (1999) indica que, se meramente formos passivos, nossas chances de

alcançar a felicidade são baixas. É por isso que o autor propõe pensarmos no universo em

termos de ordem e caos. Em sua teoria, a espécie humana deduz que a organização é

prazerosa por si só e, esta constatação é peça chave da teoria do FLOW, já que a satisfação

dos seres humanos está no processo de trazer ordem e controle para as suas vidas.

Ao realizar uma comparação entre os babuínos africanos e os seres humanos,

Csikszentmihalyi (1999, p. 15) expõe que existem similaridades.

Os babuínos que vivem nas planícies africanas passam cerca de um terço de seu

tempo dormindo, e quando acordam dividem seu tempo entre viajar, encontrar

alimento e comê-lo, e momentos de lazer – que basicamente consiste na interação,

ou em catar pulgas nos pelos uns dos outros. Não é uma vida muito estimulante, mas

pouco mudou no milhão de anos desde que os seres humanos evoluíram de

ancestrais símios comuns. As exigências da vida ainda ordenam que passemos nosso

tempo de um modo pouco diferente dos babuínos africanos. Com uma diferença de

poucas horas, a maioria das pessoas dorme durante um terço do dia e usa o resto

para trabalhar, deslocar-se e descansar mais ou menos nas proporções que os

babuínos. [...]. Hoje, naturalmente, temos a televisão.

É claro que, além da televisão, hoje poderíamos citar uma diversidade de aparelhos

tecnológicos que nos prendem no cotidiano, por diversos motivos, sejam eles atrelados ao

lazer, estudo ou trabalho. Diante disso, o autor reitera que é necessário aprofundar os estudos,

no sentido de reconhecer a verdadeira diferença entre os babuínos e o ser humano, já que até

então, percebeu-se que os fatores externos podem “igualar”, vamos dizer assim, o homem e o

animal. Para melhor entender, “[...] saber todos os parâmetros externos não nos permitirá

prever como será a vida [...]” (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 17). O que fará a diferença

portanto, será a mente de cada um, em virtude da flexibilidade da consciência humana, pois

se tudo fosse determinado pela condição humana comum, pelas categorias sociais e

culturais e pelo acaso, seria inútil refletir sobre as maneiras para tornar a vida do

indivíduo excelente. Felizmente, existem oportunidades suficientes para a iniciativa

pessoal e escolha para fazer uma diferença real. E aqueles que acreditam nisso são

os que têm mais chance de se libertar dos grilhões do destino

(CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 17).

Os modos de pensar e de agir é o que torna a espécie humana dessemelhante. Se a

maneira de viver fosse estipulada pelos padrões que a sociedade dita e o indivíduo

simplesmente acatá-la, teríamos então, uma receita única da felicidade, um manual de

30

instruções. Saberíamos apenas que se vive e se pode ser feliz enquadrando-se em um

determinado padrão.

Se acreditarmos que existe uma maneira exclusiva de viver, então continuaríamos nos

assemelhando ao comportamento dos babuínos. Neste sentido, não se pode esquecer que o

pensamento do ser humano é ilimitado, e se ele estiver disposto a utilizar seu tempo a engajar-

se em outras experiências, por conseguinte, estará mais próximo de encontrar o verdadeiro

sentido para a sua vida.

Refletindo sobre a premissa “a experiência ocorre no tempo, por isso o tempo é o mais

escasso recurso que possuímos” (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 17), é que percebemos

que grande parte do tempo é utilizada para a nossa rotina e as poucas horas que sobram,

logicamente, é nós que decidimos o que fazer e como fazer. A grande questão é: como as

pessoas utilizam seu tempo quando não estão dormindo? (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p.

18).

Csikszentmihalyi (1999, p. 18-19) explicita que as atividades que praticamos no

decorrer de um dia corriqueiro podem ser divididas em três funções principais, que tomam a

maior parte da nossa energia psíquica: produção, manutenção e lazer, fornecendo a

informação que atravessa a mente dia após dia, do nascimento ao término da vida.

As atividades produtivas incluem o trabalho ou o estudo, já as atividades de

manutenção envolvem os cuidados com a casa, como cozinhar, limpar, fazer compras, com a

alimentação e com os aspectos pessoais, como tomar banho vestir-se, locomover-se), e as

atividades de lazer referem-se à mídia, hobbies, esportes, filmes, restaurantes, contato social,

descanso, etc.

Assim, em essência, nossa vida consiste em experiências relacionadas com o

trabalho, com o esforço para impedir que o que já temos caia em pedaços e com o

que quer que façamos com o nosso tempo livre. É dentro desses parâmetros que a

vida se desdobra, e ao modo como escolhemos o que fazemos, e a nossa abordagem

para fazê-lo, que determinará se a soma dos nossos dias será um borrão enorme ou

algo parecido com uma obra de arte (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 22).

A partir dessa citação, independente da atividade exercida, cabe a nós dar o máximo, a

fim de proporcionar experiências positivas e, que realmente valham a pena, caso contrário,

teremos a sensação que jogamos o tempo fora.

O pesquisador menciona que o método mais comum para desvendar o que os

indivíduos fazem com o seu tempo é por meio de pesquisas, estudos e análise do uso do

31

tempo. Em suas palavras, duas técnicas podem ser realizadas (CSIKSZENTMIHALYI, 1999,

p. 23-24):

A) uma técnica geralmente demanda que as pessoas preencham um diário ao final de

cada dia ou semana, que por um lado, são de simples manuseio, mas, por outro lado, por se

basearem em lembranças, não são muito precisos;

B) a outra técnica é o Método de Amostragem de Experiência (Experience Sampling

Method – ou ESM), desenvolvido por Csikszentmihalyi na Universidade de Chicago no início

de 1970, que consiste no uso de um pager ou relógio programável para avisar às pessoas que

está na hora de preencher duas páginas em um livreto que carregam consigo. Na execução

original, a programação do despertador foi criada para os sinais serem disparados

aleatoriamente, dentro de segmentos de duas horas, do começo da manhã até às 23 horas. Ao

tocar o sinal, a pessoa escreve em que lugar se encontra, o que está fazendo, no que está

pensando, com quem ela está e então classifica o seu estado de consciência naquele instante,

conforme várias escalas numéricas – nível de felicidade, nível de concentração, nível de

motivação, nível da autoestima, etc. No final da semana, cada pessoa terá preenchido 56

páginas do livreto ESM, sendo possível fornecer “[...] um diafilme virtual das atividades da

pessoa da manhã até a noite, dia após dia, durante uma semana, e podemos seguir suas

variações de humor em relação ao que a pessoa faz e com quem ela está”

(CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 24).

Realizando isso diariamente por semanas, com o passar dos anos, foram coletados

mais de 70 mil páginas, em média de 2.300 participantes de diferentes idades. “Um grande

número de respostas é importante por que nos permite observar a forma e a qualidade da vida

cotidiana em grandes detalhes e com considerável precisão” (CSIKSZENTMIHALYI, 1999,

p. 24).

A análise dos dados possibilitou saber, por exemplo, quantas vezes as pessoas se

alimentam e qual é o sentimento gerado ao fazer a refeição, seja adolescente, adulto ou idoso,

e até mesmo realizar comparações entre as culturas. Ao exemplificarmos,

[...] uma pessoa pode adorar seu trabalho e outra pode odiá-lo; talvez uma pessoa

aprecie seu tempo livre e outra fique entediada por não ter nada para fazer. Assim,

embora o que fazemos todo dia tenha muito a ver com o tipo de vida que levamos, o

modo como experimentamos o que fazemos é ainda mais importante

(CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 25).

Pensando assim, entendemos que a felicidade não tem um padrão/um modelo a ser

seguido, visto que cada indivíduo cria o seu próprio padrão de felicidade. Mesmo que as

32

pessoas mais próximas de nos desejem que sejamos felizes, elas não sabem como é a nossa

felicidade. Cada um tem o seu padrão de felicidade e o outro não sabe qual é esse padrão, e

mesmo se soubesse, não entenderia, porque esse padrão é só seu.

Crescemos e construímos dentro de nós mesmos, o nosso próprio padrão de felicidade,

incluindo sonhos, o que gostamos e o que também não gostamos. E aí o formato de felicidade

fica diferente das outras pessoas e, muitas delas não entendem. Por exemplo, o porque agora

almejamos coisas diferentes, um trabalho diferente, um estudo diferente, um estilo de vida

diferente e temos ideias diferentes.

Se formos pensar de fato, ficaríamos horas e horas refletindo sobre isso e, mesmo

assim, às vezes nem nós sabemos qual é o nosso padrão de felicidade, de tanto que escutamos

sobre essas outras formas de felicidade. Dependendo da circunstância, acabamos cedendo

diante das expetativas e tentando se encaixar nesse padrão de felicidade que alguém criou

para nós. Dessa forma, é preciso coragem e autoconhecimento para reconhecer e viver o

próprio padrão de felicidade de acordo com as experiências ao longo da vida, já que o que

importa realmente é a maneira como estamos experimentando as atividades.

Seguindo nessa linha, Csikszentmihalyi apresenta as emoções como os elementos mais

subjetivos da consciência, em virtude de apenas o indivíduo ser capaz de falar sobre os seus

sentimentos, como o amor, a vergonha, a gratidão ou a felicidade. Entretanto, uma emoção é

também o conteúdo mais objetivo da mente, “[...] porque as sensações físicas que

experimentamos quando estamos apaixonados, envergonhados, assustados ou felizes é

geralmente mais real para nós do que aquilo que observamos no mundo exterior, ou o que

quer que aprendamos com a ciência e a lógica” (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 25).

Neste sentido, é devido às experiências que conseguimos ter percepções do próprio

sentimento em relação às coisas externas; ou seja, é por meio das experiências que podemos

organizar e classificar o que sentimos.

As emoções compartilham uma dualidade básica: “[...] são positivas e atraentes ou

negativas e repulsivas” (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 26). Logo, são as emoções que nos

permitem fazer escolhas do que deve ser prazeroso ou não, não esquecendo que o ser humano

é a única raça que consegue manipular os próprios sentimentos, ao ponto de criar novos

paradigmas.

Diante disso, o autor infere que a felicidade é o modelo das emoções positivas. Como

muitos filósofos afirmam, desde a época de Aristóteles, tudo o que é realizado tem como

desígnio experimentar a felicidade. Porém, “se a felicidade é realmente o objetivo da vida, o

que sabemos sobre ela?” (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 26).

33

Conforme Csikszentmihalyi, tudo o que sabemos dos pensadores quando refletem

sobre a vida, é que ela é breve e dolorosa e, portanto, não fomos feitos para sermos felizes.

Mas tudo isso remete ao perfeccionismo de sentimentos pessoais entre eles e as imperfeições

do mundo que os incomodam. Não podemos assim, generalizar esses pensamentos, pois na

pesquisa efetivada em diversos países, a cada dez pessoas, somente uma se declara infeliz.

Para Csikszentmihalyi (1999), só vamos sentir a felicidade depois de atingir o estado

de FLOW, pois nesse momento não temos consciência de tal grandeza, já que a concentração

é profunda e qualquer distração poderia ser motivo para perdermos o foco de tal ação.

Somente depois de concluirmos as atividades, é que teremos consciência da experiência,

compreendendo o quão recompensador foi aquele momento, logo, nos sentiremos felizes.

Em sua obra, Csikszentmihalyi (1999, p. 39) faz uma analogia para um melhor

entendimento, ressaltando que “se o alpinista perder tempo se sentindo feliz enquanto executa

um movimento difícil, ele pode cair da montanha. O cirurgião não pode se sentir feliz durante

uma operação complicada, nem um músico quando toca uma partitura complexa”. Diante

disso, o pesquisador reitera que

só depois de completar a tarefa é que temos tempo para olhar para trás e ver o que

aconteceu, e então somos inundados com a gratidão pela excelência da experiência –

desse modo, retrospectivamente, somos felizes. Mas é possível ser feliz sem sentir o

fluxo. Podemos ficar felizes experimentando o prazer passivo de um corpo

descansado, a calorosa luz do sol, o contentamento de um relacionamento sereno.

Esses momentos também devem ser guardados, mas esse tipo de felicidade é muito

vulnerável e dependente de circunstâncias externas favoráveis. A felicidade que

segue o fluxo é criada por nós, e leva a uma complexidade e um crescimento cada

vez maiores da consciência (1999, p. 39).

Tal passagem elucida que a felicidade ocorre por duas vias, referindo-se aos fatores

internos e externos. Sobretudo, o que desejamos mostrar é que os elementos internos têm

relação com o FLOW, e tornam-se mais interessantes em virtude do sujeito poder decidir e

controlar suas ações, bem como, o tempo que pode ser investido. Ao contrário das condições

externas, já que o indivíduo não possui domínio sobre elas e o tempo é incerto.

O FLOW, também chamado de experiência ótima ou máxima, é uma combinação

entre desafio e habilidade. Logo, ao chegarmos à experiência máxima, entraremos no estado

do FLOW, um estado mental e emocional caracterizado por um profundo envolvimento em

uma atividade, em que a percepção de metas e desafios é compatível com os níveis de

habilidade do indivíduo, obtendo profunda concentração e gerando grande prazer. O que

Csikszentmihalyi descobriu pode ser representado no seguinte gráfico:

34

Figura 4 - A qualidade da experiência ótima como uma combinação entre Desafios e Habilidades

Fonte: adaptado de Massimini & Carli 1988, Csikszentmihalyi 1990 (CSIKSZENTMIHALYI 1999, p. 38)

Tal figura (Figura 4), ilustra a relação entre desafios e habilidades e a experiência

ótima do FLOW, formando uma construção lógica para compreender onde cada indivíduo se

encontra e quais comportamentos devem ser estimulados para buscar o FLOW.

São reconhecidos sete comportamentos básicos que estão à margem do FLOW,

norteados pelos eixos Desafios e Habilidades e uma composição ótima do que leva à

experiência de fluxo. É notável pois, “a qualidade da experiência como uma função do

relacionamento entre desafios e habilidades. A experiência ótima, ou fluxo, ocorre quando

ambas as variáveis estão elevadas” (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 38).

O eixo horizontal representa o nosso nível de habilidades e o eixo vertical representa

os desafios diante de nós. Quanto maior o desafio e o nosso grau de habilidade, maior a

tendência de atingir o FLOW, ou seja, no momento em que os desafios e habilidades

estiverem acima da média. Sendo assim, “a experiência de fluxo age com um ímã para o

aprendizado – isto é, para o desenvolvimento de novos níveis de desafios e habilidades”

(CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 39).

Pode ser que estejamos fazendo coisas muito diferentes de outras pessoas, mas para

cada indivíduo, o canal de FLOW, aquela área acima, acontecerá quando estivermos

realizando aquilo que realmente gostamos de fazer (CSIKSZENTMIHALYI, 2004). Em geral,

35

nos encontramos no ponto do meio. As outras áreas, portanto, se tornam menos e menos

positivas.

Excitação/exaltação é ainda válido, porque a pessoa se encontra altamente desafiada.

Suas habilidades não são tão completas como deveriam ser, mas pode-se ir ao estado de

FLOW facilmente, simplesmente ao desenvolver um pouco mais de habilidades. Então,

excitação/exaltação é uma área na qual as pessoas aprendem, pois são levadas para além da

área de conforto e para entrar – voltando ao estado de FLOW – terão que desenvolver

habilidades adicionais.

Controle também é uma área válida a se estar, por que lá o indivíduo se sente

confortável, mas não muito excitado. Não se trata de ser tão desafiador. Para ir de controle

para o estado de FLOW, é preciso ampliar os desafios.

As outras combinações entre desafio e habilidade tornam-se progressivamente abaixo

do ideal. Relaxamento é bom, pois ainda nos sentimentos bem. Tédio começa a se tornar

muito incômodo e apatia chega a ser muito negativo, visto que não nos vemos fazendo

qualquer coisa, não usamos nossas habilidades e não existem desafios

(CSIKSZENTMIHALYI, 2004).

A apatia, nesse sentido, é o ponto mais negativo de todos, por envolver um baixo nível

de desafios e de habilidades; está associada então, a um estado de desorganização psíquica e

entropia, caracterizado por baixos níveis de concentração e engajamento, e por uma

mobilização limitada.

Níveis de preocupação ou ansiedade acima do normal podem ocorrer quando o sujeito

possui baixa habilidade e a atividade tem alto desafio. Ao perceber que não terá condições de

realizar a atividade de forma satisfatória, o indivíduo recua para situações menos desafiadoras.

Csikszentmihalyi cita que os melhores momentos costumam ocorrer quando temos o

corpo e a mente completamente empenhados em um esforço voluntário para realizar algo

difícil que tenha significado pessoal, e nesses momentos, ocorre completa imersão nas

atividades.

O que há de comum nesses momentos é que a consciência está repleta de

experiências, e essas experiências estão em harmonia umas com as outras. Ao

contrário do que acontece demasiadamente na vida cotidiana, em momentos como

estes o que sentimos, o que desejamos e o que pensamos se harmonizam

(CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 36).

Complementando, o conceito de FLOW “é derivado do estudo de atividades que

Csikszentmihalyi considerou intrinsecamente motivantes, que proporcionam prazer em sua

36

realização e, por isso, levam o indivíduo a um estado de profundo envolvimento e a ter um

sentimento intenso de alegria e satisfação pessoal” (MASSARELLA; WINTERSTEIN, 2009,

p. 49).

Massarella e Winterstein (2009, p. 48), a partir do estudo em Csikszentmihalyi,

retomam que o FLOW acontece em circunstâncias específicas, quando a atenção está

direcionada inteiramente na atividade, na medida em que os desejos, sentimentos e

pensamentos encontram-se completamente alinhados. Diante disso,

foram identificados oito elementos que definem essa experiência: equilíbrio entre

desafio e habilidade; metas claras e retorno (feedback); concentração total na

atividade e no momento presente; fusão entre ação e consciência; sensação de

controle; perda da autoconsciência; perda da noção do tempo; experiência autotélica

(MASSARELLA; WINTERSTEIN, 2009, p. 48-49).

Helder Hiroki Kamei, em sua dissertação de mestrado FLOW: o que é isso? Um

estudo psicológico sobre experiências ótimas de fluxo na consciência, sob a perspectiva da

psicologia positiva (USP - 2010), orientada pelo Prof. Dr. Esdras Guerreiro Vasconcellos,

tinha como intuito verificar a qualidade da experiência subjetiva durante a prática de uma

determinada atividade intrinsecamente motivadora.

Nesse caso, a investigação foi realizada em seis escolas de dança de salão, na cidade

de São Paulo. Foram selecionados vinte participantes do gênero masculino e feminino, na

faixa etária entre 20 e 40 anos, dentre eles, 10 eram alunos que cursavam as aulas de dança

como atividade de lazer e os outros 10 eram os professores. O método escolhido foi

qualitativo com técnica na entrevista-narrativa, norteada por roteiro semi-estruturado, tendo o

estudo de Csikszentmihalyi como suporte à pesquisa.

Kamei (2010, p. 47-49) retoma em seu escrito, especificamente na parte em que

descreve sobre a gestação da concepção de FLOW, que Csikszentmihalyi chama o período

anterior a 1975 de pré-história do conceito de FLOW, sendo que o interesse sobre satisfação e

os princípios daquilo que faz a vida valer à pena começaram em 1963, momento em que

construía sua tese de doutoramento, intitulada Artistic problems and their solutions: na

exploration of creativity in the arts (concluída em 1965), tendo a criatividade artística como

núcleo investigativo.

A pergunta que guiou seu estudo foi: como pode um ato de criação ser explicado

diante das limitações humanas? Para tal, observou artistas trabalhando, tomando notas e

fotografando o desenvolvimento das pinturas; ao final, fazia questionamentos para melhor

entendimento do processo de criatividade. O que mais impressionou o estudioso foi ver

37

tamanho grau de concentração e envolvimento enquanto os artistas pintavam ou esculpiam,

parecendo esquecerem das dificuldades e obrigações sociais; a apreciação e fascinação

existiam enquanto ainda a ação estava sendo executada. Entretanto, quando o quadro estava

finalizado, o artista o largava e sua atenção já se voltava para a próxima tela.

Do ponto de vista do artista, constatamos que ele consegue ter a consciência da

felicidade apenas quando finalizar a pintura e, é por isso que se motiva a pintar outro quadro,

pois, para ter essa sensação novamente necessita de um novo desafio, atrelado à sua

habilidade.

Podemos entender que, se a meta do artista é pincelar um quadro, representando

através de cores os seus sentimentos, sua inspiração/ou estado de FLOW ocorre no momento

da execução, no processo de criação. Ao alcançar o escopo, que é a tela pronta, motiva-se

pelo desafio de pintar outro quadro. Kamei (2010, p. 49) cita que “obviamente nem todo

mundo gosta de dançar ou jogar futebol, mas aqueles que despendem muito tempo nessas

atividades o fazem geralmente porque a qualidade da experiência quando estão envolvidos

nelas é intrinsecamente compensadora”.

Tal aspecto é percebido também, quando um indivíduo joga videogame, pois ele está

mobilizando tanto o corpo quanto a mente, a fim de uma única ação, então o estado do FLOW

estaria relacionado à imersão em algo que nos desprende de tudo que está ao nosso entorno,

em uma concentração profunda, visto que focamos em um particular objetivo e, por vezes,

acabamos perdendo a noção do tempo e do espaço.

Kamei, baseado em Csikszentmihalyi6, descreve que a experiência do FLOW passa

por três momentos temporariamente distintos: condições do FLOW, que são as ações de pré-

requisitos para que o indivíduo alcance o estado de FLOW, de forma satisfatória e intensa;

características do FLOW, que são as sensações percebidas pelos sujeitos durante o seu

estado de FLOW; consequências do FLOW, referindo-se à algumas das possíveis

consequências atingidas pelas pessoas que relatam a presença de FLOW em grande

quantidade.

As condições do FLOW são agrupadas em dois grupos, assim sistematizadas

(KAMEI, 2010, p. 65-69):

a) As metas são claras e o feedback é imediato - metas precisas referem-se ao

conhecimento do que se deve fazer e o feedback imediato relaciona-se à forma de saber se

estamos operando de modo correto ou errado, e muito mais do que isso, o feedback imediato é

6 Ver obra Flow: The Psychology of Optimal Experience (1990), que foi lançada no Brasil como

Psicologia da Felicidade (1992).

38

o retorno do processo em sua execução. Exemplificando, a meta é ganhar o jogo e o feedback

é saber se estamos no caminho certo para chegar na meta, isto é, para ganhar o jogo.

b) Equilíbrio entre oportunidade de ação e capacidade - os desafios e as

habilidades percebidas são elevados e equivalentes, sendo o nível da ação e a capacidade

(desafio e habilidade) de esforço do indivíduo tem que ter um balanceamento, pois se o

andamento não for sincronizado, provavelmente perderá o foco e nunca atingirá estado do

FLOW. Para exemplificar, a partir da pesquisa de Kamei, digamos que uma pessoa inicie em

um curso de dança de salão e, na primeira aula, o professor solicita que ela movimente-se pelo

ambiente pisando alternadamente com o pé esquerdo e direito em sincronia durante uma

música de marcha. A tarefa nos parece bem simples, mas possivelmente a pessoa estará

bastante concentrada, em virtude das habilidades ainda serem elementares. Entretanto, se o

professor não avançar com os exercícios, chegará um momento em que o indivíduo ficará

entediado, pois o desafio terá se tornado fácil demais. A estratégia então, é aumentar os

desafios.

Após a compreensão das condições prévias para o alcance da experiência de FLOW,

apresentamos as seis características do FLOW durante a experiência, sendo elas (KAMEI,

2010, p. 69-78):

a) Sensação de controle – a pessoa tem uma intensa sensação de estar no

controle de suas próprias ações, chegando ao ponto de exercer domínio em circunstâncias

complexas, em um grau que esporadicamente acontece no cotidiano. Se os desafios e as

habilidades estiverem no mesmo nível, é provável que o sujeito experimente uma sensação de

controle. Quer dizer que, no momento do FLOW, não se pode ter o controle (realidade) e sim,

apenas a impressão de que ele está próximo, a possibilidade do controle. Dessa forma, quando

tivermos o controle de fato, mesmo que estejamos no máximo da habilidade, ainda não

estaremos no ápice do desafio e, por consequência, não estaremos em FLOW.

b) Concentração profunda: a ação se funde com a consciência - quando

atingimos o estado de FLOW, qualquer distração pode ocasionar a perda do sincronismo do

nível máximo entre desafio e habilidade, pois a atenção na atividade tende a fluir

naturalmente, quase que inconscientemente, onde a concentração profunda remete

exclusivamente à atenção dada na tarefa.

c) Foco temporal no presente: cessam-se as ruminações sobre passado ou

futuro – quando dedicamos nossos pensamentos ou a nossa atenção no que passou ou no que

sonhamos, logo investimos tempo e consciência. Mas, quando estamos em estado de FLOW,

no qual nossa atenção mergulha em uma concentração profunda, perdemos a noção de tempo,

39

pois o que permanece é a sensação da experiência e não o tempo que ela durou ou vai durar.

Isso é o que chamamos de foco temporal no agora, já que a experiência de FLOW oportuniza

uma escapatória ao caos da vida cotidiana.

d) Distorção da experiência temporal – como relatamos anteriormente, é por

meio das experiências vividas pelo indivíduo que se pode interpretar e tirar as próprias

conclusões da vida, do mesmo modo que, é por meio das atividades executadas que o sujeito

pode interpretar o que sente em relação ao tempo, pois como sabemos, o tempo não cessa, não

diminui e não aumenta, logo, não é possível manipulá-lo. Porém, a experiência de FLOW nos

remete à alteração da percepção da duração do tempo. A percepção do tempo adapta-se à ação

em curso, dependendo da meta do sujeito. O tempo parece acelerar, desacelerar ou até então,

parar.

e) Perda da autoconsciência reflexiva e transcendência das fronteiras do self

– quando atingimos o estado de FLOW, nos desprendemos de tudo aquilo que nos circunda,

podendo ser artefatos concretos e até a própria consciência, que tende a ficar temporariamente

suspensa; logo, a imaginação está além do meio físico. Nessa experiência máxima, é onde o

indivíduo não se preocupa e até mesmo não lembra da vida cotidiana, já que a sua identidade

é deixada inteiramente de lado, como nome, cargo, títulos e papéis sociais. Portanto, o sujeito

“esquece” da sua própria individualidade e o prazer pela experiência toma conta do seu

pensamento. Por exemplo, o pianista sente que ele e o piano são um só; o alpinista se sente

fundido com a pedra e a montanha; o marinheiro se sente em união com o barco, o mar e os

ventos; o cirurgião sente que ele e toda a sua equipe funcionam como se fossem um único

organismo.

f) A experiência torna-se autotélica – quando a maioria das dimensões

anteriores estiverem presentes, a atividade que está sendo efetivada, tende a ser autotélica, ou

seja, intrinsecamente compensadora, gratificante por si mesma, a ponto do objetivo final ser

apenas uma justificativa para o processo. A experiência será tão agradável, que o indivíduo

fará o máximo para que ela se repita. Uma atividade autotélica é feita pelo próprio indivíduo,

tendo como desígnio a própria experiência como meta principal. Entretanto, quando a

experiência for motivada por alguma meta externa, chamamos de exotélica. Para sabermos

pois, o quão autotélica é uma pessoa, observamos o tempo que ela empenha em suas

atividades por vontade própria, em situações desafiadoras.

Por fim, descreveremos outras duas dimensões, consideradas consequências imediatas

da experiência do FLOW (KAMEI, 2010, p. 79-82):

40

a) Crescimento pessoal: crescimento do self em direção a níveis maiores de

complexidade – como referido anteriormente, o FLOW aprimora a qualidade de vida,

fazendo-nos sentir melhor durante e por um período imediato posterior a experiência; essa por

sua vez, depende do esforço individual. Após entrarmos em uma concentração profunda,

estaremos aptos a organizar o self de forma mais complexa, o que nos deixa mais poderoso e

seletivo. Essa complexidade é fruto de dois processos psicológicos: diferenciação -

movimento que leva os indivíduos a serem dessemelhantes, logo o self torna-se diferenciado,

pois ao vencermos desafios, sentir-nos-emos ainda mais capazes e, por conseguinte,

singulares; integração – movimento contrário, visto que leva à união com outros sujeitos e

com o mundo e, nesse sentido, o FLOW auxilia a integrar o self, já que nesse estado, a

consciência fica incrivelmente organizada. Com isso, é necessário investir quantidades

similares de energia psíquica nesses dois processos, a fim do self crescer saudavelmente e,

cada vez mais complexamente. Uma vez por exemplo, experimentada a alegria de ter

superado uma meta, o esforço será reduplicado para repetir a sensação, o que leva ao

crescimento do self. Citamos pois, uma criança pequena que, depois de aprender a falar, terá

satisfação em fazer muitas perguntas ou, outra criança que, ao aprender a andar, explora suas

possibilidades motoras amplas e vai descobrindo que pode se mover em/para qualquer espaço.

b) Fortalecimento da autoestima – tendo em vista que a dimensão da autoestima

não era reconhecida por Csikszentmihalyi no FLOW, foi a partir dos estudos da pesquisadora

Anne Wells que se constatou que o momento no qual os indivíduos entravam em estado de

FLOW conquistavam uma maior autoestima em relação aos demais. No entanto, para

Csikszentmihalyi, essa dimensão não pode ser uma caraterística do FLOW, porque o sujeito

entra em uma concentração profunda e, por isso, não é possível ter autoconsciência desse

sentimento no momento da FLOW. O autor então, verificou que o sujeito consegue notá-la

após a experiência, ou seja, fora do FLOW, podendo refletir acerca da ação e sentir-se melhor

consigo mesmo, por superar expectativas internas e externas.

Localizamos um artigo/resultado proveniente de uma dissertação de mestrado,

chamado A Motivação Intrínseca e o Estado Mental Flow em Corredores de Rua, de

Massarella e Winterstein (UNICAMP - 2009), o qual citamos algumas questões

anteriormente. Ao elegerem como base a teoria do FLOW, desenvolvida por

Csikszentmihalyi, os autores atentam para o fato de que “as pesquisas envolvendo essa teoria

têm evoluído bastante em países como Estados Unidos, Canadá, Alemanha, Itália, Japão e

Austrália, mas, no Brasil, há relativamente poucos estudos” (2009, p. 48).

41

Participaram deste estudo qualitativo dez praticantes de corrida pedestre (seis homens

e quatro mulheres, entre 23 e 64 anos de idade). Os corredores não foram considerados atletas

de elite, em virtude de terem outra profissão para o seu sustento. A metodologia procedeu

com uma Carta-Convite para participação com informações sobre o tema, forma de coleta de

dados e outras orientações. Caso aceitassem, assinavam um termo de consentimento

autorizando o uso dos dados e recebiam um questionário, com elementos pessoais e

informações acerca do envolvimento com a corrida, o que forneceu um panorama geral para o

cruzamento dos dados com as respostas fornecidas posteriormente nas entrevistas. Estas

foram de tipo semiestruturada, com o intuito dos participantes manifestarem-se oralmente,

seguindo um roteiro básico de perguntas formuladas pelo entrevistador; para tanto, o material

foi audiogravado e transcrito para a posterior análise de conteúdo. As experiências, os

sentimentos e os pensamentos que os participantes declararam ter com a corrida, foi analisado

a partir da óptica das teorias da motivação intrínseca e do FLOW.

Os resultados revelaram a existência de um conjunto de motivos que agem para o

comportamento e engajamento dos corredores. A motivação extrínseca seria o ponto de

partida para que eles pratiquem atividades esportivas, entretanto, para haver uma continuidade

na atividade, é fundamental a motivação intrínseca. Relacionando com o FLOW, o prazer e a

satisfação são recompensas encontradas pelos praticantes, justificando o empenho e o

engajamento, pois quanto mais os sujeitos vivenciam essas experiências, mais tempo e

dedicação são investidos. Portanto, “um estado mental como o flow realça a experiência na

atividade, direcionando-a das demais experiências cotidianas e leva as pessoas a sentirem a

atividade como algo recompensador” (MASSARELLA; WINTERSTEIN, 2009, p. 65, grifo

dos autores).

A partir da inquirição sobre o FLOW, Massarella e Winterstein (2009, p. 48)

reafirmam que,

para Csikszentmihalyi (1999), quando estamos concentrados em uma tarefa,

formamos uma intenção, estabelecemos uma meta. O tempo que dedicamos a essa

meta e a intensidade com que a mantemos dependem de nossa motivação. As

pessoas demonstram se sentir melhor quando agem motivadas intrinsecamente, mas

ainda demonstram se sentir melhor quando motivadas extrinsecamente do que

quando agem motivadas, por não ter nada melhor para fazer.

Com essas palavras, percebemos que o melhor seria a motivação intrínseca, por partir

do próprio indivíduo, mas às vezes, por não possuir metas claras, este ainda se sente melhor e

mais seguro quando essa motivação parte de outros, isto é, de maneira extrínseca. “Assim,

42

tanto a motivação intrínseca (querer fazer) como a motivação extrínseca (ter de fazer) são

preferíveis ao estado onde se age por falta de coisa melhor, sem possuir qualquer tipo de meta

para focalizar a atenção” (CSIKSZENTMIHALYI, 1999, p. 30). Aqui, podemos perguntar:

como fazer com que o estudante conquiste autonomia para motivar-se intrinsecamente?

Em uma busca no Portal do Scielo, sobre o FLOW atrelado ao campo educativo. Para

termos uma visão geral do que foi produzido nos anos de 2011 a 2015, construímos uma

tabela quantitativa. Pelo o que pudemos observar, não há pesquisas sobre FLOW na

programação de computadores no Ensino Fundamental.

Tabela 1 - Número de periódicos encontrados no Portal do Scielo (2011 a 2015)

Descritores Total de Artigos

Flow 1963

Flow + Educação 72

Flow + Ensino Fundamental 10

Flow + Ensino Fundamental + Programação de computadores 0

Fonte: dados da pesquisa

Na busca de pesquisas, encontramos o artigo A Teoria do Flow na contribuição do

engajamento estudantil para apoiar a escolha de jogos no ensino de programação, de

Tedesco, Melo e Silva (2015). O trabalho tem o intuito de propor diretrizes para auxiliar o

professor na escolha adequada de jogos para o ensino de programação, baseada em técnicas

de engajamento, perfis de jogadores e características do estado de FLOW, para aumentar a

motivação dos acadêmicos do curso de Ciência da Computação. As autoras, ao tomarem por

base Csikszentmihalyi, retomam que o FLOW é “[...] um estado mental de funcionamento no

qual, ao realizar alguma atividade o indivíduo apresenta uma sensação de foco completo, com

um alto nível de diversão e satisfação” (2015, p. 612).

Manter e/ou promover o engajamento estudantil durante o período de ensino e

aprendizagem da disciplina de programação é um desafio que pode ser superado com a

utilização de jogos e técnicas de engajamento. Logo, se elegidos de forma apropriada, o

estado de FLOW dos acadêmicos será mantido ou promovido através dos jogos, aumentando

a chance de garantir o engajamento. Almeja-se que o sujeito conquiste a motivação intrínseca,

que é caracterizada pelo envolvimento, pela vontade própria de realizar atividades, aceitar

novos desafios, alcançar e aperfeiçoar as próprias capacidades.

Aproximando um pouco mais do nosso foco, localizamos ainda, um artigo intitulado

Qualidade da experiência subjectiva no quotidiano escolar de adolescentes: Implicações

43

desenvolvimentais e educacionais, no qual Lima e Freire (2009) debruçaram-se, em

particular, na qualidade da experiência subjectiva do adolescente num dos seus principais

contextos de vida diários: a escola, espaço privilegiado no qual os sujeitos passam um tempo

significativo do seu dia e da sua vida, logo, é considerado um contexto estruturante da sua

rotina diária, por desempenhar um papel essencial na organização da sua experiência. Nesse

sentido, “a escola é palco de inúmeras e diversificadas experiências e aprendizagens, as quais

têm um impacto significativo no desenvolvimento individual do adolescente e na definição

dos seus projectos de vida, influenciando largamente a sua trajectória futura” (2009, p. 523-

524).

Para tal, o modelo conceitual adotado na análise da qualidade da experiência, nesse

caso, entendida como todo e qualquer conteúdo da consciência, foi o Experience Fluctuation

Model - EFM, criado pelos autores Csikszentmihalyi e Massimini & Delle Fave. Figura 5.

Figura 5 - Modelo da flutuação da qualidade da experiência com oito estados experienciais, definidos em função

da relação entre desafio e competência (Fonte: adaptado de Delle Fave e Massimini, 2005)

Fonte: Lima e Freire (2009, p. 526)

Diante disso, o conceito de experiência ótima, que corresponde a um estado

experimental positivo e enriquecedor, promotor do funcionamento ótimo do indivíduo,

assume uma relevância particular, procurando demonstrar como o mesmo tem sido aplicado

no estudo da qualidade da experiência no contexto escolar. Salientou-se, em especial, o

44

contributo das experiências ótimas para a promoção da qualidade da aprendizagem e para uma

otimização do desenvolvimento do adolescente. Lima e Freire (2009, p. 526) explicam que o

modelo EFM que enquadra as experiências ótimas, o qual

[...] sofreu várias evoluções conceptuais ao longo do tempo (Csikszentmihalyi,

1975, 1988, 1990; Massimini & Delle Fave, 2000; Massimini, Inghilleri, & Delle

Fave, 1996), centra-se no estudo das flutuações da experiência subjectiva do

indivíduo na realização de diversas actividades, em diferentes contextos de vida. Os

autores deste modelo propõem que as experiências óptimas ocorrem em contextos

em que o indivíduo percepciona um equilíbrio entre desafios e competências, apenas

quando estes desafios e competências excedem o seu habitual nível de realização nas

experiências do seu quotidiano. Deste modo, um contexto que proporcione baixos

desafios e implique baixas competências, ou no qual se observem incongruências na

relação entre desafios e competências, não seria promotor de experiências óptimas.

O método escolhido foi a Amostragem de Experiência (Experience Sampling Method

– ou ESM), desenvolvido por Csikszentmihalyi. Com base nesse estudo, constatou-se que a

experiência ótima ajuda os adolescentes a criarem sua personalidade, em virtude dos desafios

propostos. Com isso, eles podem apresentar maior facilidade na hora de resolver algum

problema. E, ao vivenciarem com mais frequência experiências ótimas, revelam uma maior

satisfação com a vida, um maior envolvimento e criatividade, e uma maior abertura e

percepção de liberdade.

Em uma pesquisa realizada na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações (BDTD),

utilizando dos mesmos descritores antes elencados, destacamos a inexistência de estudos na

pós-graduação Stricto Sensu com relação aos descritores FLOW + Ensino Fundamental e

FLOW + Ensino Fundamental + Programação de Computadores, o que também seria uma das

condições para justificar a presente pesquisa. Visualizamos tal panorama, na exibição da

tabela abaixo:

Tabela 2 - Número de Dissertações e Teses encontradas na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações

(2011 a 2015)

Descritores Dissertações Teses Total

Flow 533 252 785

Flow + Educação 11 1 12 Flow + Ensino Fundamental 0 0 0 Flow + Ensino Fundamental + Programação de computadores 0 0 0

Fonte: dados da pesquisa

Citamos a dissertação de mestrado, acessada no mês de maio/2016, com o título

Experiências de fluxo na educação musical: um estudo sobre motivação, com autoria de

45

Mariana de Araújo Stocchero, sob orientação da Profª. Drª. Rosane Cardoso de Araújo (UFPR

– 2012). Baseada na perspectiva de Csikszentmihalyi, a autora analisou as relações entre os

tipos de atividades musicais e os níveis de envolvimento dos estudantes, que favorecem a

aprendizagem em sala de aula.

A metodologia apresentou caráter qualitativo/descritivo, optando-se pela pesquisa

quase-experimental, geralmente realizada quando não é possível a seleção aleatória dos

sujeitos. Os dados foram recolhidos com 12 crianças de 8 e 9 anos de idade, do 3º ano do

Ensino Fundamental em uma escola de ensino básico particular de Curitiba/PR. Durante 5

aulas, atividades musicais que contemplavam a apreciação, a execução e a composição

musical foram aplicadas a fim de observar as reações e o comportamento motivado dos

estudantes diante das propostas. As categorias de análise referem-se à relação existente ou

não, entre os alunos e as atividades desenvolvidas. São estas: desafios X habilidades,

objetivos claros, concentração, controle da situação, prazer e envolvimento. Os resultados

foram interpretados sob a perspectiva da professora/pesquisadora e complementados por meio

da avaliação de 3 juízes externos. Através das constatações e reflexões reveladas, buscou-se

colaborar com a área da Educação Musical apresentando novos caminhos e sugestões para

futuras pesquisas que aprofundem o tema; bem como orientações para professores de

educação musical que queiram enriquecer sua prática pedagógica por meio do estudo da

motivação, esta que foi considerada componente necessário para o desenvolvimento da

criatividade.

Na próxima seção, será apresentada a programação de computadores como uma

atividade para oportunizar e estimular o desenvolvimento da criatividade dos estudantes de

Ensino Fundamental, considerando o FLOW como potencializador.

46

4. PROGRAMAÇÃO DE COMPUTADORES COMO FERRAMENTA

EDUCACIONAL

Essa seção irá apresentar conceitos e trabalhos sobre a programação de computadores

como ferramenta de aprendizagem, a fim de retumbar o potencial dessa linguagem nos

espaços escolares. Para tanto, dedicar-nos-emos aos estudos de Seymour Papert (1928-2016),

um dos maiores visionários do uso da tecnologia na educação, considerado como o “pai” da

informática educativa e mentor da lógica construcionista, e às investigações de Mitchel

Resnick (1956), seguidor da teoria do construcionismo de Papert, o qual busca aliar

criatividade e aprendizagem utilizando a linguagem de programação gráfica e visual Scratch.

Iniciamos pela concepção do computador como uma ferramenta cognitiva, como

muito bem nos fala Jonassen (2007, p. 20).

A competência na utilização das ferramentas cognitivas irá certamente exigir prática.

No entanto, a prática necessita de ser inserida em alguma atividade significativa.

Quando utilizamos uma ferramenta para realizar uma tarefa significativa do ponto de

vista cognitivo, focamo-nos menos nas ferramentas e mais no que elas nos permitem

fazer. Memorizar as partes do computador faz pouco sentido se estes não são

utilizados para fazer algo útil. A compreensão surge de uma atividade significativa e

não da memorização.

Ancorando-nos das ideias de Manzano e Oliveira (2013, p. 25), um computador só

executará tarefas que forem programadas, sendo que “o processo de programação é uma

‘conversa’ controlada entre um ser humano (tecnicamente programado) e o computador

propriamente dito. O processo de comunicação se faz com o uso de uma linguagem de

programação que o computador ‘entenda’”.

Ao programar, o sujeito está operando com algoritmo, ou seja, uma sequência de

instruções, termo que causa geralmente estranheza entre as pessoas. É uma palavra

proveniente do latim, das expressões algorismos ou algorithmos, associada ao conceito de

números. Ainda, a palavra é aplicada e empregada, conforme o dicionário Aurélio, nas áreas

de matemática e computação, sendo no primeiro campo, conexa a um processo de cálculo e,

com relação ao segundo campo, relacionada a um conjunto de normas bem demarcadas e

organizadas, destinadas à resolução de um problema, ou de um grupo de problemas, em um

número limitado de passos (MANZANO; OLIVEIRA, 2013, p. 27).

47

Depois de entendermos de maneira breve e geral sobre a programação de

computadores, investiremos na programação educativa, a fim de mostrar o caminho

percorrido até chegar no que existe hoje.

Recuperamos da dissertação de Martins (2012) pontos categóricos sobre a biografia de

Seymour Papert e, seguidamente suas principais, que impulsionaram o campo da informática

educativa em todo o mundo.

Resumidamente, Papert é reconhecido internacionalmente como um dos principais

teóricos sobre as formas pelas quais o uso da tecnologia pode transformar a aprendizagem.

Foi um dos pioneiros da Inteligência Artificial e fundador da linguagem de programação

LOGO, em 1967. Na educação, o exímio matemático cunhou o termo Construcionismo,

vislumbrando na informática educativa a possibilidade de realizar seu desejo de criar

condições para mudanças significativas no desenvolvimento intelectual dos sujeitos.

Papert (1928-2016) nasceu em Pretória, na África do Sul. Formou-se em matemática

na Universidade de Cambridge (1949), e lá desenvolveu pesquisas em seu campo no período

de 1954 a 1958. Sua tese de doutoramento (1952) e a conquista do título de PhD (1959) na

respectiva Universidade, foi na mesma área, em virtude do grande interesse a ela direcionado.

Trabalhou e conviveu com Jean Piaget na University of Geneva de 1958 a 1963.

No começo dos anos de 1960, Papert vinculou-se ao Massachusetts Institute of

Technology - MIT7 e, juntamente com Marvin Minsky, fundou o Laboratório de Inteligência

Artificial. Nessa época, o renomado matemático já expunha que toda criança deveria ter um

computador em sala de aula, mesmo tendo consciência de que essa máquina era bastante

limitada, por não existir a interface gráfica e muito menos a internet.

Foi então que, entre 1967 e 1968, Papert desenvolveu uma linguagem de programação

totalmente voltada para a educação, a LOGO8. Mas a comunidade pedagógica só passou a

incorporar suas ideias a partir de 1980, quando ele lançou o livro Mindstorms: Children,

Computers and Powerful Ideas. Além desta obra, publicou The children's machine: rethinking

school in the age of the computer (1992), bem como, numerosos artigos referentes à

matemática, inteligência artificial, educação, aprendizagem e raciocínio.

7 Centro universitário de educação e pesquisa privado localizado em Cambridge, Massachusetts, nos

Estados Unidos. É um dos líderes mundiais em ciência e inovação tecnológica, além de outros campos, como

administração, economia, linguística, ciência política e filosofia (MARTINS, 2012, p. 18). 8 A palavra “LOGO” foi usada como referência a um termo grego que significa “pensamento, raciocínio

e discurso”, ou, também, “razão, cálculo e linguagem”, fazendo uma alusão à maneira livre e criativa pela qual a

matemática é implementada para resolver problemas em forma de algoritmos (MARTINS, 2012, p. 23). Brasão

(2009, p. 6) elucida que o LOGO nasceu do confronto entre o computador e a Ciência do Conhecimento. O seu

criador, Seymour Papert, durante cinco anos afastou-se do Departamento de Matemática do instituto M.I.T. para

estudar a psicologia da criança com Jean Piaget, em Genebra.

48

Ao mostrar caminhos e vantagens para utilização da máquina computador no ensino,

as escolas começaram a usá-lo. Mas isso não representou uma modificação na forma de

educar, já que o computador servia apenas como complemento para o papel tradicional de

professores e estudantes. No entanto, Papert visualizava uma mudança radical para “ontem”, e

não eram as escolas que seriam responsáveis por impulsionar as transformações e sim, as

crianças. Em suas palavras,

embora a tecnologia desempenhe um papel essencial na realização de minha visão

sobre o futuro da educação, meu foco central não é máquina, mas a mente e,

particularmente, a forma em que movimentos intelectuais e culturais se auto-

definem e crescem. Na verdade, o papel que atribuo ao computador é o de um

portador de “germes” ou “sementes” culturais cujos produtos intelectuais não

precisarão de apoio tecnológico, uma vez enraizados numa mente que cresce

ativamente (1985, p. 23, grifo do autor).

Seu objetivo era relacionar homem e tecnologia com vistas a uma apropriada

aprendizagem, auxiliando o estudante a construir, estruturar e a reestruturar o pensamento.

Seu estudo principal elucidava, pois, a preocupação de considerar o uso da matemática para

deflagrar “como as pessoas pensam e como aprendem a pensar” (PAPERT, 1985, p. 24).

Para Papert, a tecnologia é uma forma de resolver problemas. Partindo disso, e

compreendendo que as crianças de hoje vão atuar num futuro incerto, correndo o risco de não

saberem nem a profissão que vão escolher, querer ensinar um conteúdo para elas é

estrategicamente falho, já que deveria se ensinar a pensar como solucionar problemas

utilizando da criatividade, que é um comportamento humano e, sendo assim, frente a um

problema, pode resolver e atingir o sucesso. Nesse sentido, sua “[...] discussão difere em dois

aspectos, da maioria dos argumentos sobre ‘natureza versus criação’” (PAPERT, 1985, p. 24).

A principal ideia do grupo de pesquisadores do MIT, liderado por Papert, era

desenvolver uma linguagem de programação simples e sofisticada, a fim de atingir o campo

educacional. Foi então que o matemático “desenvolveu uma linguagem de programação,

chamada LOGO, de fácil compreensão e manipulação por crianças ou por pessoas leigas em

computação e sem domínio em matemática, usada por centenas de escolas nos anos 1980,

inclusive no Brasil” (MARTINS, 2012, p. 19).

Entendendo melhor, Papert propôs o uso do computador como uma ferramenta para

promover uma aprendizagem cooperativa, na qual crianças podem aprender explorando o seu

ambiente e aqui, no caso da utilização da programação de computadores, possibilitar a criação

de ambientes ou mundo com regras que elas mesmas atribuem. E isso permitia “[...] que

49

crianças programassem a máquina, em vez de serem programadas por ela, criando seu próprio

micromundo” (MARTINS, 2012, p. 23).

A LOGO indica uma ferramenta que busca, através de uma linguagem semelhante à

natural, facilitar a comunicação entre o usuário e o computador, proporcionando a criação de

modelos por meio de formas geométricas e do raciocínio lógico. “Com esta ferramenta, é

possível criar simulações, animações, apresentações, jogos gráficos, textos, controlar

dispositivos externos (robótica), com a vantagem de proporcionar a integração curricular”

(BRASÃO, [2009], p. 2). Deste modo, a ferramenta possui características que torna

compreensível o seu uso por sujeitos de diversas áreas e de diferentes níveis de escolaridade,

tendo sempre o intuito de ser utilizada por crianças.

Programar significa, nada mais, nada menos, comunicar-se com o computador numa

linguagem que tanto ele quanto o homem podem “entender”. E aprender línguas é

umas das coisas que as crianças fazem bem. Toda criança normal aprende a falar.

Por que então não deveria aprender a “falar” com um computador? (PAPERT, 1985,

p. 18).

Em sua obra Logo: Computadores e Educação (1985), Papert apresentava ideias

educacionais que envolviam uma abordagem muito interessante da escola e do que poderia ser

modificado pela presença dos computadores, buscando determinar como isso se relacionava

com a inteligência das máquinas e a inteligência das crianças. “Segundo a filosofia Logo, o

aprendizado acontece através do processo de a criança inteligente “ensinar” o computador

burro, ao invés de o computador inteligente ensinar a criança burra. Com esta proposta,

Papert inverte o atual quadro do uso do computador na escola” (PAPERT, 1985, p. 9, grifo do

autor).

Aqui estabelecemos uma analogia com o uso da calculadora, no qual o sujeito busca a

resposta por meio do cálculo matemático, produzido portanto, pela calculadora; ao solicitar a

resposta de 10 + 20, por exemplo, imediatamente aparece no visor o resultado 30, isto é, a

calculadora assume o papel de “inteligente” por ter comprovado o resultado. Já, com a

ferramenta LOGO, a resposta para uma solução dar-se-á exclusivamente através do mérito do

indivíduo, em virtude do instrumento oportunizar o desenvolvimento do pensamento. Diante

disso, a ferramenta LOGO em si, não traz nenhuma resposta pronta, já que a pessoa é a

protagonista de suas próprias criações e soluções para o problema; a LOGO é apenas o auxílio

que está ali, estática, e quem vai agir/movimentar o pensamento é o ser humano, então ele é o

“inteligente”. Papert coloca em evidência que,

50

em muitas escolas, atualmente, a frase “instrução ajudada por computador”

(computer-aided-instruction) significa fazer com que o computador ensine a criança.

Pode-se dizer que o computador está sendo usado para “programar” a criança. Na

minha perspectiva, é a criança que deve programar o computador e, ao fazê-lo ela

adquire um sentimento de domínio sobre um dos mais modernos e poderosos

equipamentos tecnológicos e estabelece um contato íntimo com algumas das ideias

mais profundas da ciência, da matemática e da arte de construir modelos intelectuais

(1985, p. 17-18, grifo do autor).

Mais uma vez, a visão de Papert (1985, p. 35) revela que, em grande parte das

situações escolares da contemporaneidade, as crianças são colocadas frente a um computador

exclusivamente para que este lhes aprovisione informações de acordo com o seu desempenho

e suas particularidades, dentro de um nível adequado de desafios. Entretanto,

no ambiente LOGO a relação é inversa: a criança, mesmo em idade pré-escolar está

no controle – a criança programa o computador. E, ao ensinar o computador a

“pensar”, a criança embarca numa exploração sobre a maneira como ela própria

pensa. Pensar sobre modos de pensar faz a criança tornar-se um epistemólogo, uma

experiência que poucos adultos tiveram (1985, p. 35).

As investigações de Papert dão ênfase ao fato de que, ao desenvolverem seu

aprendizado como verdadeiras epistemólogas, as crianças estariam “aprendendo a pensar

articuladamente sobre o pensamento” (1985, p. 45). O matemático muitas vezes verbalizou

suas ideias de maneira inspiradora, quase que poeticamente, parecendo enigmas, como sua

frase famosa, “você não pode pensar sobre o pensar sem pensar sobre pensar em algo” (2016).

É importante destacar que a linguagem LOGO tem uma filosofia educacional, o que

foi fortemente influenciada pelo método do construtivismo de Jean Piaget9, psicólogo e

filósofo suíço, conhecido por seu trabalho pioneiro no campo da inteligência infantil; criador

da Epistemologia Genética - teoria do conhecimento – a partir do estudo da gênese

psicológica do pensamento humano. Com base nisso, Papert criou o conceito de

“construcionismo”, que segundo ele, é uma reconstrução teórica a partir do construtivismo

piagetiano, diferenciando-se no que diz respeito à lógica da programação de computadores e

defendendo “[...] a teoria do conhecimento em vez do método de ensino” (MARTINS, 2012,

p. 22). Ao dedicar-se ao estudo do ilustre matemático, Martins (2012, p. 19) reafirma que

9 Em suas investigações, a aprendizagem se dá nas trocas que estabelecemos com o meio; essas trocas se

dão na atividade, uma ação que não é puramente empírica (que manipule material concreto); não é meramente

uma ação física e espontânea e sim, uma atividade orientada. Em sua visão, a criança desenvolve-se

intelectualmente, evoluindo de um sistema de operações lógicas mais simples para um sistema mais complexo,

processo realizado por meio da transformação e da interiorização da ação no pensamento (BRUNER, 2002, p.

215). Complementando, Papert (1994, p. 127), ao estudar a doutrina de Piaget, ressalta que o conhecimento não

pode ser “transmitido” ou “transferido pronto” para outra pessoa. Mesmo que alguém tente contar/ensinar algo

para o outro, este fará uma reconstrução pessoal das informações, construindo então, o seu conhecimento.

51

a atitude construcionista implica a meta de ensinar de tal forma a produzir o máximo

de aprendizagem, com o mínimo de ensino. A busca do construcionismo é alcançar

meios de aprendizagem fortes que valorizem a construção mental do sujeito,

libertando seu pensamento criativo apoiado em suas próprias construções no mundo,

fortemente alinhada com a lógica deweyana de experimentação contextualizada.

No livro A máquina das crianças: repensando a escola na era da informática (1994),

Papert aponta as contribuições e os benefícios da implantação dos computadores na educação,

dos anos de 1980 em diante. Além disso, assinala os obstáculos criadas pela escola para

aceitar a presença e as vantagens dos computadores para o processo de ensino e

aprendizagem.

Na obra referida, Papert explicita claramente o motivo da sua metodologia ser

denominada construcionismo, sendo uma mescla de instrucionismo e construtivismo. A

palavra instrucionismo visa significar algo diferenciado de pedagogia, ou a arte de ensinar,

demandando ser lida em um sentido mais ideológico, no intuito de expressar a crença de que

“[...] a via para uma melhor aprendizagem precisa ser o aperfeiçoamento da instrução – se a

Escola é menos que perfeita, então sabemos o que fazer: ensinar melhor.

O Construcionismo é uma filosofia de uma família de filosofias educacionais que nega

esta ‘verdade óbvia’” (1994, p. 124), não destituindo de modo algum a importância da

instrução. Em virtude disso, o sufixo ismo é um marcador do abstrato, e sua presença no título

reflete a modificação de estilo intelectual.

A lógica instrucionista delega para o computador a tarefa de ensinar, ou avigora as

atividades realizadas em sala de aula, por meio de informações na forma de tutorial, exercício

e prática, jogo. No entanto, na abordagem construcionista, o estudante constrói por intermédio

do computador, o seu próprio conhecimento. O computador portanto, passa a ser apenas um

suporte, em que o estudante ensina o computador por meio da exploração, interação,

investigação e descoberta.

Papert (1994, p. 125) estabelece uma relação entre o método do construcionismo e a

atividade de pescaria. Ele recupera um provérbio popular africano: “se um homem tem fome,

você pode dar-lhe um peixe, mas é melhor dar-lhe uma vara e ensinar-lhe a pescar”. O

construcionismo atenta então, para a hipótese de que as crianças farão melhor descobrindo

(“pescando”) por si mesmas, visto que “o tipo de conhecimento que as crianças mais precisam

é o que lhes ajudará a obter mais conhecimento”.

Na metodologia construcionista, percebemos que o controle do processo está nas mãos

do estudante, propondo que este seja construtor ativo de suas próprias estruturas mentais. O

professor mobiliza a reflexão do estudante, ao contrário do modelo tradicional onde impera o

52

autoritarismo. Desta forma, o princípio central deste paradigma é que os sujeitos constroem

conhecimento de forma mais eficiente quando estão ativamente engajados na construção de

coisas no mundo, e isso só acontece quando as coisas são palpáveis, podendo tocar, sentir e

medir, comparar... àquilo que faz sentido das experiências do dia a dia.

O construcionismo implica numa interação estudante-objeto, mediada por uma

linguagem de programação, como é o caso da LOGO, na qual o estudante programa, monta

suas estratégias e algoritmos e o computador executa a ação; nesse modelo portanto, o

professor não instrui, não é aquele que tem papel de “especialista de conteúdos”, e sim, é um

agente facilitador do desenvolvimento cognitivo do estudante, tendo por função a

investigação da sua estrutura mental.

A linguagem LOGO oportuniza o “aprender fazendo ou aprender construindo”,

resolvendo problemas, identificando o “erro” e corrigindo, configurando-se em uma

aprendizagem na qual há espaço para que se impulsione a construção do conhecimento. Sendo

assim, ao operar com a linguagem LOGO “[...] o erro é tratado como uma tentativa de acerto,

ou seja, uma fase necessária à nova estruturação cognitiva” (MARTINS, 2012, p. 24).

Entendemos aqui, que o conhecimento não é algo que se ganha, mas concebido como

resultado da relação entre sujeito e a ferramenta, em que o sujeito descobre, age e transforma,

de maneira criativa, o conhecimento e o pensamento.

A maioria dos interpretadores da linguagem LOGO, para estabelecer a interação,

utilizam um cursor em formato de tartaruga “[...] que obedece a alguns comandos simples,

particularmente de deslocamento e de rotação” (BRASÃO, [2009], p. 6).

A proposta original da linguagem LOGO era que a criança controlasse um pequeno

robô, ou melhor, a representação de um robô na tela do computador, “riscando” o chão por

onde passava. Diante disso, a similaridade do robô com uma tartaruga rapidamente chamou a

atenção e ele passou a ser chamado assim. Com a migração para a atmosfera virtual a

metáfora da tartaruga foi sustentada, tornando-se o símbolo da LOGO.

O efeito de trabalhar com a geometria da Tartaruga em algumas áreas da matemática

escolar é fundamentalmente afetivo ou relacional. Muitas crianças chegaram ao

laboratório LOGO detestando números, como se eles fossem seres alienígenas, e

acabaram por apaixonar-se por eles. Em outros casos, o trabalho com a Tartaruga

propicia modelos intuitivos específicos para complexos conceitos matemáticos que a

maioria das crianças acha difíceis. O uso de números para medir ângulos é um

exemplo simples. No contexto da Tartaruga, as crianças adquirem essa habilidade

quase que inconscientemente (PAPERT, 1985, p. 93, grifo do autor).

53

Imaginemos que a tartaruga fosse o robô. Exemplificando o processo, a criança

poderia dar os seguintes comandos10 em linha reta: “PARAFRENTE 10” (pontos), e a

tartaruga andaria para a frente 10 dez passos, “PARADIREITA 90” (graus), e a tartaruga

giraria no espaço, “PARAFRENTE 20” (pontos), e a tartaruga andaria mais 20 passos e

assim, a criança estaria realizando ações, seja para movimentar o robô ou para fazer um

desenho na tela do computador, produzindo um gráfico.

Na época portanto, na qual o linguagem LOGO foi criada, a finalidade era

potencializar o uso do computador, o que seria totalmente diferente dos tutoriais e da

instrução programada que tentava ensinar algo para a criança, não existindo “respostas

certas”. No caso da linguagem LOGO, a criança estava ensinando o computador. O usuário

interage livremente e o conhecimento é construído a partir da reflexão sobre as reações

decorrentes dos comandos dados.

Figura 6 - Tela da linguagem LOGO

Fonte: <goo.gl/n9w7or>

10 Papert (1985, p. 79) explica que “os comandos PARAFRENTE e PARATRÁS fazem com que a

tartaruga se movimente em linha reta, na direção da sua orientação: sua posição pode mudar, mas sua orientação

permanece a mesma. Dois outros comandos mudam a orientação sem afetar a posição: PARADIREITA e

PARAESQUERDA”, permitindo que a tartaruga gire em torno de si mesma para modificar a orientação sem sair

do lugar.

54

Figura 7 - Passos para construir um quadrado com a linguagem LOGO

Fonte: <goo.gl/7EKSmF>

Uma vez que aprender a controlar a Tartaruga é como aprender a falar uma língua, isto

mobiliza a experiência e o encanto da criança em falar, similarmente ao prazer nesse caso, de

comandar. Para fazer pois, “a Tartaruga desenhar um quadrado [como na figura acima], a

pessoa deve andar sobre um quadrado imaginário e descrever o que está fazendo, usando a

linguagem da Tartaruga. Assim, trabalhar com a Tartaruga mobiliza a experiência e o prazer

com o movimento” (PAPERT, 1985, p. 81).

Nesse sentido, da ferramenta LOGO provém a habilidade especial da Tartaruga de

servir como uma primeira representação da matemática formal para as crianças, visto que

“[...] podem identificar-se com a Tartaruga e, no processo de aprender geometria formal, são

assim capazes de usar o conhecimento sobre o seu corpo e de como ele se move” (PAPERT,

1985, p. 78, grifo do autor). Estamos falando aqui, de um conhecimento bem familiar à

criança, a “geometria do corpo”.

Vemos que, a partir do estudo de Papert (1985), o acesso aos computadores poderia

alterar completamente a situação oferecida pela sociedade às crianças, já que os ambientes

intelectuais eram “pobres em recursos que as estimulem a pensar sobre o pensar, aprender a

falar sobre isto e testar suas ideias através da exteriorização das mesmas”. E, com esta

percepção,

até mesmo o mais simples trabalho com a Tartaruga pode abrir novas oportunidades

para tornar mais acurado nosso ato de pensar sobre o pensar: programar a Tartaruga

começa com a reflexão sobre como nós fazemos o que gostaríamos que ela fizesse;

assim, ensiná-la a agir ou “pensar” pode levar-nos a refletir sobre as nossas próprias

ações ou pensamentos. E à medida que as crianças progridem, passam a programar o

computador para tomar decisões mais complexas e acabam engajando-se na reflexão

de aspectos mais complexos de seu próprio pensamento (1985, p. 45).

55

De tudo isso, vemos que Papert foi considerado o maior especialista do mundo sobre

como a tecnologia pode proporcionar novas maneiras de aprender e ensinar, e mesmo que

praticamente não utilizada mais nos dias de hoje, a LOGO criada pelo teórico, deve ser

valorizada pela sua importância histórica na informática na educação.

O matemático, que faleceu aos 88 anos de idade em 2016, com certeza deixa seu

legado à sociedade e, com ele, o que mais chama a atenção é a sua preocupação vívida há

mais de meio século, para com as crianças, a escola e a vinculação da tecnologia,

principalmente no uso de computadores como instrumentos para a aprendizagem, a fim de

mobilizar a criatividade e inovação, "concretizando" o pensamento computacional. Com a sua

extraordinária e séria investigação, ele “continua a inspirar milhares e a transformar o mundo

de milhões11”.

Na sequência, falaremos brevemente de Mitchel Resnick, nascido nos Estados Unidos,

no ano de 1956. Ele é visto como o sucessor, vamos dizer assim, de Seymour Papert, também

considerado uma referência mundial no uso criativo de computadores na educação.

Martins (2012) recupera de forma sucinta a sua história de vida, citando que ele é

graduado em Haverford High School na Pensilvânia, bacharel em física na Universidade de

Princeton (1978), realizou o mestrado (1988), doutorado (1992) em computação e o PhD em

ciência da computação pelo MIT (1992). Trabalhou durante cinco anos (1978-1983) como

jornalista de ciência para a revista Business Week, pesquisando amplamente sobre o uso de

computadores na educação. Resnick recebeu premiação com um National Science Foundation

Young Investigator Award, em 1993. Ele é coeditor da obra “Construcionismo na Prática: a

concepção, Pensamento e Aprendizagem em um Mundo Digital” de 1996, e coautor de

“Aventuras em Modelagem: Explorando sistemas complexos e dinâmicos com StarLogo” em

2001. Dr. Resnick foi listado como uma das 100 pessoas mais criativas nos negócios em 2011

pela Fast Company. Complementando as informações, como

pesquisador do MIT e seguidor da teoria do construcionismo de Papert, Mitchel

Resnick busca aliar criatividade e aprendizagem, partindo do princípio que, na

educação infantil, as crianças constroem brinquedos, instrumentos criativos que lhes

possibilitam pensar, testar e aprender. Também, no ensino fundamental e médio, o

caminho do aprender não deveria ser diferente. Os estudantes não são ouvintes

passivos, mas permanecem inativos em sala de aula, quando o professor os

sobrecarrega de dados e teorias (MARTINS, 2012, p. 25).

11 Fonte: <goo.gl/lIXQQZ>.

56

Resnick é diretor no MIT de um grupo chamado Lifelong Kindergarten, ou seja jardim

de infância para toda a vida, em livre tradução, no qual desenvolve tecnologias para promover

a criatividade entre os estudantes.

Martins (2012, p. 26) cita Resnick, apontando que as ciências da computação precisam

desenvolver materiais que impulsionem o crescimento das crianças, a com vistas a construir

soluções criativas que envolvam as várias áreas do conhecimento. Brinquedos assim, vão

adquirindo formas mais complexas, como pequenos robôs e engenhocas a serem montados e

programados pelas crianças. Nesse processo, o computador torna-se um grande aliado, uma

nova ferramenta para o aprendizado criativo.

Encontramos um site12 de Resnick com suas publicações, todas com idioma em inglês.

Dentre elas, destacamos o escrito Lifelong Kindergarten (2013). Deste, no geral apreendemos

a preocupação do pesquisador com a acelerada transformação no mundo em que vivemos,

ressaltando que as crianças de hoje terão de enfrentar um fluxo contínuo de novas questões e

desafios no futuro, visto que o que elas aprendem hoje será obsoleto amanhã e, por isso, para

progredirem, devem aprender a projetar soluções inovadoras para problemas inesperados.

Em sua matéria, Resnick deixa explícito que o sucesso e a satisfação serão baseados

na capacidade de pensar e agir criativamente das crianças. Diante disso, o conhecimento por

si só não é suficiente, já que elas devem aprender a usar seu conhecimento de forma criativa.

De acordo com ele, infelizmente, grande parte das escolas estão fora de sintonia com as

demandas da sociedade em rápida mudança, visto que não foram projetadas para ajudar os

estudantes a se desenvolverem como pensadores criativos. Mas há uma exceção importante: o

jardim de infância, por acreditar que todas as fases do aprendizado careceriam ser como esta.

É nesse sentido que Martins (2012, p. 25-26) retoma que, “em suas pesquisas sobre

aprendizagem, Resnick cita a lógica do ‘jardim de infância para toda a vida’”. Ele explica que

o propósito colocado pelo estudioso é aprender por toda a vida, pesquisando, movimentando-

se, isto é, deixando de lado as atividades paradas. Dessa forma, criam-se atividades que se

agregam às distintas áreas do currículo, para se alcançar uma maior compreensão do tema em

questão. No processo, as crianças vão desenvolvendo-se e descobrindo saídas para os

problemas do cotidiano.

De acordo com Resnick (2013), a abordagem do jardim de infância à aprendizagem se

apresenta como ideal para as necessidades do século XXI. Para melhor entender, o autor

exemplifica: imagine uma sala de aula do jardim de infância. Em um canto da sala, um grupo

12 Ver publicações de Resnick em: <goo.gl/W8KmTe>.

57

de crianças constrói uma série de torres com blocos de madeira; em outro canto, um grupo

cria um grande mural com pintura de tinta.

No processo, as crianças estão explorando pertinentes ideias: como fazer a torre

permanecer em pé sem o risco de cair?; como as cores se misturam?. Ainda mais importante,

as crianças desta faixa etária estão começando a se desenvolverem como pensadores criativos.

Em uma brincadeira ou outra situação escolar, as crianças estão sendo mobilizadas à

aprendizagem cooperativa, ou seja, aprendendo a trabalhar em grupo, bem como, a

explorarem todo o processo criativo: como imaginar novas ideias, criar, testar e refletir sobre

os limites e novas alternativas, obter feedback do outro e gerar novas ideias com base em suas

experiências.

Martins (2012, p. 26), apoiado nos estudos de Resnick, reforça que, no momento atual

busca-se evoluir para a “sociedade criativa”, sendo imprescindível saber dar uso à

informação. Os indivíduos, portanto, precisam continuar aprendendo a vida toda e

encontrando soluções criativas para seus problemas e necessidades. Na figura abaixo, mostra-

se o processo do pensamento humano, o qual necessita ocorrer em forma de espiral, para

atingir então, a aprendizagem criativa.

Figura 8 - Espiral do Pensamento Criativo de Resnick

Fonte: Passos (2014, p. 75) - adaptado de Resnik (2007)

58

Resnick (2013) ressalva que no centro deste processo criativo (Figura 8) está a

capacidade de criar. E, conforme sua visão, se queremos que as crianças se desenvolvam

como pensadores criativos, precisamos lhes proporcionar mais oportunidades para criar. O

que apreendemos da figura acima corrobora a importância de projetar, construir, engajar-se,

estabelecer trocas e negociações, pensar sobre e novamente projetar, impulsionando para o

novo, daí a ideia do processo do pensamento em espiral.

Na página especializada Porvir13, encontramos uma das entrevistas de Resnick,

ocorrida no mesmo dia em que palestrou no Transformar14 (2014), tomando por base a

discussão sobre a necessidade de se quebrar as barreiras da escola. Da entrevista, recuperamos

os pontos fundamentais.

O que nos chama atenção das palavras de Resnick é quando ele traz à tona: “eu sempre

busco inspiração no modo que o ensino é conduzido no jardim de infância. As crianças estão

constantemente criando em colaboração e, no processo, elas aprendem coisas importantes.

Infelizmente o restante da vida escolar não é assim”.

Para tanto, o especialista acredita que é preciso derrubar várias barreiras que têm

sufocado a escola: a de disciplina, para que os alunos possam aprender por projetos; a de

tempo, para que não sejam obrigados a dedicar somente 50 minutos ou uma hora à

determinada atividade; a de idade, para que colegas de séries diferentes possam aprender uns

com os outros; e a dos muros da escola. Ele afirma: “temos que fazer o aprendizado durar o

dia inteiro e provocar que o que é feito fora da escola influencie o que é feito dentro – e vice-

versa”.

Resnick crê sobretudo, que a programação deve ser ensinada para todos, já que essa

habilidade pode ajudar no desenvolvimento da sociedade. Por quê? Ele elenca três razões: os

códigos fazem com que as pessoas trabalhem colaborativamente, as ajudam a organizar o

pensamento de maneira sistemática e estimulam que tenham ideias criativas para resolver

problemas repentinos. Sua persuasão o faz comparar a importância de programar com a de ler

ou escrever e, ainda relaciona sua lógica com a que Paulo Freire usou décadas atrás. Na

época, o educador brasileiro dizia que ensinar a escrever era importante não por questões

13 Iniciativa de comunicação e mobilização social que mapeia, produz, difunde e compartilha referências

sobre inovações educacionais para inspirar melhorias na qualidade da educação brasileira e incentivar a mídia e a

sociedade a compreender e demandar inovações educacionais. Visitar página: <goo.gl/k0IJGU>. 14 Ver em: <http://transformareducacao.org.br/>. Transformar – mais do um evento, se configura em um

diálogo sobre as novas tendências da educação. Assistir palestra de Resnick na íntegra: <goo.gl/bjJtb0>.

59

práticas, mas também porque capacitava os cidadãos a se tornarem ativos em seus meios.

“Com programação é a mesma coisa”15.

Para fins de conhecimento, o grupo de pesquisa Lifelong Kindergarten no Media Lab

do Massachusetts Institute of Technology (MIT)16 é conhecido por ter inventado uma

tecnologia de grande sucesso que difundiu pelo mundo: o sistema LEGO Mindstorms,

lançado no ano de 1998; é uma linha específica para a área de Educação Tecnológica. Sua

utilização baseia-se no aprendizado lúdico, cuja função didática aborda a prática de conteúdos

da área de tecnologia. Os estudantes utilizam kits para desenvolver projetos de robótica. As

atividades realizadas com estes blocos possibilitam aos estudantes o desenvolvimento da

capacidade psicomotora e o mais importante, o raciocínio lógico.

Figura 9 - Lego Mindstorms (blocos montados)

Fonte: site “InfoEscola”, por Anna Adami <goo.gl/xOSfVw>

Para além do que foi dito, destacamos que Resnick é o criador do Scratch17, linguagem

de programação criada para atender a demanda de computação criativa contemporânea e que

já introduziu milhares de crianças no universo dos códigos. “A ferramenta Scratch foi

concebida e desenvolvida como resposta ao problema do crescente distanciamento entre a

15 Para complementar, indicamos conferir também a entrevista de Resnick na Revista Nova

Escola (ed. 273, jun./jul. 2014) com o título: A tecnologia deve levar o aluno a ser um pensador criativo. Fonte:

<goo.gl/xlYUr1>. 16 Para maiores informações, consultar o site oficial mit media lab: <http://www.media.mit.edu/>. 17 “O termo scratch provém da técnica de scratching, utilizada pelos disc-jóqueis do hip-hop, que

giram os discos de vinil com as mãos para frente e para trás, de modo a fazer misturas musicais originais” (ORO;

PAZINATO; TEIXEIRA, 2016, p. 29).

60

evolução tecnológica no mundo e a fluência tecnológica dos cidadãos” (ORO; PAZINATO,

TEIXEIRA, 2016, p. 29).

Com base no site oficial18, o Scratch é um ambiente gráfico e uma comunidade online

onde as crianças podem programar e compartilhar mídias interativas, tais como histórias,

jogos e animação com pessoas de todo o mundo, utilizando de blocos lógicos e itens de som e

imagem. Ele foi projetado especialmente para idades entre 8 e 16 anos, mas é usado por

indivíduos de todas as idades.

O Scratch é utilizado em mais de 150 países, está disponível em mais de 40 idiomas, e

é fornecido gratuitamente para os principais sistemas operacionais (Windows, Linux e Mac).

Tal linguagem ajuda os jovens a pensar de forma criativa, a raciocinar sistematicamente e a

trabalhar colaborativamente — competências essenciais à vida no século XXI.

Marji (2014, p. 21, grifo do autor) evidencia que “um programa de computador nada

mais é do que um conjunto de instruções que dizem o que um computador deve fazer. Essas

instruções são escritas por meio de uma linguagem de programação, e é aqui que o Scratch

entra em cena”. O autor enfatiza pois, que esta linguagem de programação gráfica “[...]

permite o desenvolvimento de habilidades relacionadas a resolução de problemas – o que é

importante em todos os aspectos da vida, e não só na programação. O ambiente oferece

feedback imediato, permitindo conferir a sua lógica de forma fácil e rápida” (2014, p. 17).

Para melhor compreender, a operacionalização do Scratch configura-se como

[...] uma linguagem de programação visual que oferece um ambiente de aprendizado

rico para pessoas de todas as idades. Ele permite a criação de projetos interativos,

ricos em recursos de mídia, incluindo histórias animadas, avaliações de livros,

projetos de ciência, jogos e simulações. O ambiente de programação visual do

Scratch possibilita explorar áreas do conhecimento que, de outro modo, seriam

inacessíveis. O Scratch oferece um conjunto completo de ferramentas multimídia

que pode ser usado para criar aplicações incríveis, o que pode ser feito muito mais

facilmente se comparado à situação em que outras linguagens de programação são

utilizadas (MARJI, 2014, p. 17).

No artigo Scratch: uma ferramenta construcionista no apoio a aprendizagem no

século XXI, Passos (2014, p. 74) esclarece que o projeto iniciou em 2003 e, somente em 2007,

o ambiente multimídia Scratch e o primeiro site foram lançados. Ele foi desenvolvido pelo

Grupo Lifelong Kindergarten no Media Lab do Massachusetts Institute of Technology (MIT),

com o auxílio financeiro da National Science Foundation, Microsoft, Intel Foundation,

Fundação MacArthur, Google, Iomega e MIT consórcios de pesquisa do Media Lab. A autora

destaca que

18 Ver: <https://scratch.mit.edu/>.

61

o Scratch dá aos alunos o poder de criar e controlar as coisas no mundo virtual. Para

muitos estudantes, a Web é essencialmente um lugar para navegar, clicar, e bater

papo etc. Com o Scratch, eles mudam de consumidores de mídia para produtores de

mídia, passando, então, a criar seus projetos que são muito diversificados, incluindo

jogos de vídeo, boletins informativos interativos, simulações científicas, passeios

virtuais, cartões de aniversário, concursos de dança animadas e tutoriais interativos,

e em seguida, compartilham suas criações na Internet e podem aprender e

desenvolver ideias matemáticas e computacionais (2014, p. 75-76).

França e Amaral reiteram em seu artigo Proposta Metodológica de Ensino e Avaliação

para o Desenvolvimento do Pensamento Computacional com o Uso do Scratch, que o

“Scratch apresenta-se como um ambiente que pode ser utilizado satisfatoriamente por

estudantes da Educação Básica no desenvolvimento de habilidades e conhecimentos tão

necessários na atualidade, como o Pensamento Computacional” (2013, p. 187).

Sendo assim, vemos que o Scratch é uma ferramenta pensada para o século XXI com o

propósito de dar sequência à metodologia construcionista de Papert (que utilizava a

linguagem de programação LOGO). Ou seja, o software Scratch apresenta um avanço

considerável para a informática educativa, por ter um caráter mais sofisticado, de fácil acesso

e, em várias línguas, bem como, a possibilidade de misturar diferentes tipos de clipes de mídia

de modos criativos.

Abaixo, inserimos o ambiente de programação do Scratch 2.0:

Figura 10 - Interface do usuário do Scratch 2.0

Fonte: figura adaptada pelo autor, com base no livro Aprenda a programar com Scratch: uma

introdução visual à programação com jogos, arte, ciência e matemática (MARJI, 2014, p. 23).

62

No Scratch, os comandos que dizem ao computador o que ele tem de fazer são figuras

que você pode arrastar e juntar como blocos de Lego para fazer os programas. Quer dizer,

“no software, a meta principal [...] é introduzir a programação para quem não tem

experiência no assunto. A programação é feita arrastando-se blocos de comandos que devem

ser encaixados uns aos outros” (FRANÇA; AMARAL, 2013, p. 181).

Descreveremos os três painéis que compõem o ambiente Scratch (Figura 10), com

base em Oro, Pazinato e Teixeira (2016), a começar pelo objeto (sprite) com a imagem de um

gato, que pode ser movimentado na tela utilizando alguns comandos dessa linguagem de

programação:

1) Stage (Palco) – “O palco é o lugar onde pode ser visualizada a execução de

eventos ou projetos; é o ambiente no qual os objetos estão inseridos. Pode ser, por exemplo,

um fundo com uma paisagem, um ambiente que represente um local, um período, como o dia,

a noite ou qualquer outro contexto no qual a história do jogo esteja inserida” (2016, p. 32).

2) Sprit List (Lista de sprits) ou atores/personagens – “O desenvolvimento de

qualquer aplicação é feito por meio de objetos denominados sprites, que se constituem em

imagens, desenhos, fotos ou qualquer outro objeto visual. A aparência de um sprite pode ser

modificada pela sua apresentação em uma fantasia diferente” (2016, p. 35).

3) Paleta de blocos ou roteiros – “Para determinar a execução de cada sprite,

devemos criar individualmente sequências de roteiros, arrastando blocos gráficos e juntando-

os em pilhas, chamadas scripts” (2016, p. 44). Os roteiros se diferenciam pelas cores; são 10:

Roteiros de movimento (Motion); Roteiros de controle (Control); Roteiros relativos a eventos

(Events); Roteiros relativos à aparência (Looks); Roteiros que se constituem em sensores

(Sensing); Roteiros para manipulação de som (Sound); Roteiros que implementam operadores

(Operators); Roteiros para uso da caneta (Pen); Roteiros para utilização de variáveis e listas

(Data); Mais Blocos (More Blocks).

Após o estudo da ferramenta Scratch, a mesma se mostra compatível com a presente

pesquisa, sendo escolhida para utilização em oficinas que serão descritas com vistas a

potencializar o pensamento criativo de forma engajadora e motivadora usando o FLOW como

base teórica, cuja metodologia será apresentada na próxima seção.

63

5. METODOLOGIA

A pesquisa não é uma máquina que processa fatos. A máquina mais importante em

qualquer pesquisa é o pesquisador. Ou uma equipe de seres humanos. [...]. Quando

pensamos em usar instrumentos em uma pesquisa, é necessário incluir os seres

humanos como alguns dos principais instrumentos (FLICK, 2009, p. 46).

Nessa seção, falaremos sobre as escolhas metodológicas em razão aos objetivos do

presente trabalho, a fim de respaldar o arcabouço teórico elegido, conduzir o caminho da

pesquisa e ampliar a visão científica.

Realizamos primeiramente um levantamento dos estudos produzidos na área, a fim de

verificarmos as aproximações existentes com o tema desse trabalho, explorando o que estava

sendo pesquisado e em quais concepções teóricas os autores se amparavam. Além de indicar

questões lacunares em relação ao tratamento de nosso assunto. Em nossa revisão

bibliográfica, detivemo-nos na busca por produções relacionadas ao presente trabalho.

Após essa primeira etapa, o desenho da pesquisa já passou a ganhar sentido, visto que

as questões foram estreitando-se. Além do estudo de cunho bibliográfico e, em virtude dos

desígnios do atual escrito, escolhemos a investigação qualitativa ou também denominada,

algumas vezes, de pesquisa interpretativa, por se tratar das relações humanas e de seus

múltiplos significados. A instituição escolar, de modo especial, tem sido uma das esferas mais

exploradas pela investigação qualitativa no Brasil19.

O estudo de natureza qualitativa é marcado por uma rica descrição de ações pessoais e

de espaços complexos. “Todas as pesquisas exigem interpretações e, na realidade, o

comportamento humano exige interpretações a cada minuto” (STAKE, 2011, p. 46). Logo, a

pesquisa qualitativa usa da interpretação dos pesquisadores, da interpretação dos sujeitos que

eles estudam e dos leitores dos relatórios da pesquisa (STAKE, 2011, p. 47).

Stake (2011, p. 21, grifo do autor) explicita que “qualitativa significa que seu

raciocínio se baseia principalmente na percepção e na compreensão humana”. E, por isso,

não existe uma única forma de pensamento qualitativo, mas uma enorme coleção de

formas: ele é interpretativo, baseado em experiências, situacional e humanístico.

Cada pesquisador fará isso de maneira diferente, mas quase todos trabalharão muito

na interpretação. Eles tentarão transformar parte da história em termos experienciais.

19 Dado extraído do estudo de Carvalho (2011, p. 207).

64

Eles mostrarão a complexidade do histórico e tratarão os indivíduos como únicos,

mesmo que de modo parecidos com outros indivíduos (STAKE, 2011, p. 41).

Essa investigação é empírica, pois está direcionada ao trabalho de campo. Nesse

sentido, “é a pesquisa não quantitativa ou não padronizada” (FLICK, 2009, p. 16, grifo do

autor), já que utiliza o texto como material empírico, ao invés de números, parte da noção da

construção social das realidades, se interessa pelas expectativas dos participantes, em suas

práticas do dia a dia e em seu conhecimento cotidiano sobre a questão em estudo. Portanto,

seja em ocorrências, eventos, casos, narrativas, situações e episódios acerca de como as coisas

individuais funcionam, “a pesquisa qualitativa exige principalmente microanálises e

microinterpretações” (FLICK, 2009, p. 50) dos valores e experiências humanas.

Stake (2011, p. 30) esclarece também, que na pesquisa qualitativa, “o próprio

pesquisador é um instrumento ao observar ações e contextos e, com frequência, ao

desempenhar intencionalmente uma função subjetiva no estudo, utilizando sua experiência

pessoal em fazer interpretações”.

Gatti e André (2010) acrescentam que a abordagem qualitativa busca dar voz aos

participantes, a fim de defender uma visão global dos fenômenos, valorizando todos os

membros de uma situação com suas interações e influências recíprocas. Em suas palavras,

essa pesquisa se estabelece como uma “[...] modalidade investigativa que se consolidou para

responder ao desafio da compreensão dos aspectos formadores/formantes do humano, de suas

relações e construções culturais, em suas dimensões grupais, comunitárias ou pessoais” (2010,

p. 30).

Sendo que “a pesquisa qualitativa muitas vezes é dirigida a pessoas ou grupos”

(FLICK, 2009, p. 50), com relação à amostragem da pesquisa, Flick (2009, p. 46) ressalta que

se “[...] trata não apenas da seleção das pessoas a serem entrevistadas, por exemplo, ou das

situações a serem observadas, mas também da seleção de lugares em que se espera encontrar

essas pessoas ou situações”.

5.1 Sujeitos

A pesquisa será desenvolvida dentro do Projeto Letramento em Programação do

Instituto Ayrton Senna, cuja metodologia será detalhada na seção procedimentos. No nosso

caso, a investigação empírica acontecerá na Escola Municipal de Ensino Fundamental

Professora Helena Salton, com 12 estudantes pertencentes ao 6º ano; logo, o

acompanhamento ocorrerá no Módulo I. No intuito de preservar a identidade dos participantes

65

da pesquisa, optamos por dar a eles codinomes, tanto para a professora, quanto para os

estudantes.

5.2 Instrumentos

O primeiro instrumento de coleta de dados será o ESM - Experience Sampling

Method, já citado e descrito no Anexo I. Tal procedimento nos permitirá compreender o nível

de engajamento instantâneo dos estudantes, pois será coletado individualmente em todos

participantes a cada 30 minutos de oficina, durante quatro momentos, por nós elencados como

momento 0, 1, 2, 3.

O segundo instrumento de coleta será o Grupo Focal, sendo executado no início da

pesquisa e no final da mesma, com todos os sujeitos participantes ao mesmo tempo,

realizando as mesmas perguntas em ambas as circunstâncias, com o intuito de constatar as

alterações no modo de pensar. As dez questões a serem feitas estão descritas no Anexo II.

O método do Grupo Focal (GATTI, 2005), é uma das técnicas da investigação

qualitativa, que tem por finalidade concretizar reuniões grupais, centralizando num tópico

específico a ser debatido entre os participantes. O pesquisador é o moderador que assume a

posição de facilitador do processo de discussão. Para melhor entender, nesse método,

significa ter grupos que incluam pessoas com uma relação específica com o que está

sendo estudado e com a mescla certa de pessoas, opiniões e posturas. [...] significa

ter grupos que sejam diferentes o suficiente para cobrir uma gama de experiências

com posturas diante do tema. Pode-se comparar no nível dos diferentes grupos, dos

conteúdos de suas discussões e de como essa discussão acontece (FLICK, 2009, p.

50).

O Grupo Focal como perspectiva interacionista, será utilizado para recolher dados

sobre as relações dos estudantes com a tecnologia e entre os pares, antes e depois das oficinas

de programação de computadores; para tal, o instrumento de coleta será a videogravação.

Após a aplicação dos dois Grupos Focais, será realizada a transcrição dos dados recolhidos

em campo, a fim de descrever detalhadamente a conversa entre pesquisador e estudantes,

procurando deflagrar concepções e aprendizagens acerca das oficinas de programação de

computadores das quais estão se envolvendo.

66

Faremos uso dos termos de ética20, solicitando o consentimento dos pais e/ou

responsáveis e assentimento dos sujeitos para participarem da pesquisa, no intuito de tornar

pública a investigação desenvolvida.

5.3 Procedimentos

A pesquisa se dará em 5 oficinas do 1º módulo do projeto nacional Letramento em

Programação do Instituto Ayrton Senna, que utiliza o software Scratch para desenvolver

projetos e acontece no contraturno escolar, com a duração de 1 hora e meia cada oficina,

conforme cronograma no Anexo III.

Para entender melhor, o projeto Letramento em Programação é uma parceria do

Instituto Ayrton Senna, Poder Público Municipal e Universidades, dirigido nacionalmente

por Mozart Neves Ramos, Diretor de Inovação do Instituto Ayrton Senna. O projeto foi

lançado no ano de 2015 em Itatiba, interior de São Paulo, e tem como objetivo desenvolver

habilidades para os cidadãos do século XXI, como fluência tecnológica, criatividade,

resolução de problemas complexos e empreendedorismo, utilizando como vetor o pensamento

computacional.

No ano de 2016, o Instituto Ayrton Senna firmou uma parceria com a IMED, criando a

primeira iniciativa do projeto no Rio Grande do Sul, chamado Núcleo de Programação Norte

Gaúcho, coordenado e executado pela equipe do InovaEdu – Laboratório de Ciência e

Inovação para a Educação da IMED. Atualmente, já são sete cidades que participam do

Projeto: Passo Fundo, Marau, Sananduva, Carazinho, Tapejara, Coxilha e Lagoa Vermelha.

Esclarecendo, são 22 escolas integrantes do projeto, sendo que São Paulo conta com o

envolvimento de 900 estudantes e Passo Fundo, com 300 estudantes.

A participação no projeto é altamente relevante, já que o objetivo não é formar

programadores, e sim, através da programação, inspirar e despertar os comportamentos que

potencializem essas habilidades. Acima de tudo, a finalidade é trazer inovação para a sala de

aula das escolas públicas brasileiras, impactando de forma sistêmica na educação formal e na

vida dos estudantes, uma vez que eles mudam de uma postura passiva e apática, para uma

postura de protagonismo e atitude em tudo que fazem.

Complementando, nas palavras de Adelmo Eloy, Coordenador do Projeto no Instituto

Ayrton Senna, o desígnio está em “desenvolver a capacidade de resolução de problemas, de

20 A presente pesquisa foi submetida à avaliação do Comitê de Ética da Pesquisa – CEP, através da

Plataforma Brasil, fazendo parte da pesquisa que foi aprovada sob o CAAE 56469516.6.0000.5319.

67

criatividade e trabalho em grupo. A programação é a forma de como a gente pode fazer isso.

Usando o computador da melhor forma possível para desenvolver habilidades que estarão em

todas as esferas da vida das pessoas”21.

O projeto colocou em prática uma nova forma de apresentar conceitos básicos de

lógica de programação de computadores para crianças e jovens, usando ferramentas

adequadas para a sua faixa etária. O projeto é executado em 4 módulos, que vão desde o 6º até

o 9º ano do Ensino Fundamental, sendo:

I) Módulo 1: As oficinas do módulo 1 são aplicadas no contraturno do 6º ano do

Ensino Fundamental público, tendo total de 60 horas anuais e objetivo de apresentar a

plataforma Scratch e desenvolver atividades de colaboração, liderança e comunicação, além

de fluência tecnológica para os estudantes na plataforma.

II) Módulo 2: As oficinas do módulo 2 são aplicadas no contraturno do 7º ano do

Ensino Fundamental público, tendo também um total de 60 horas anuais, e objetivando

desenvolver um jogo na plataforma Scratch, que utilize o conteúdo de alguma disciplina do

seu currículo, e que depois será compartilhado os todos usuários do Scratch do mundo todo.

III) Módulo 3: As oficinas do módulo 3 ainda não foram aplicadas no Núcleo do

Norte Gaúcho, mas serão executadas no contraturno do 8º ano do Ensino Fundamental

público a partir do próximo ano, cumprindo o total de 60 horas anuais e objetivo de apresentar

a plataforma AppInventor, que usa a mesma lógica do Scratch mas para desenvolver

aplicativos de celular. O intuito é resolver um problema real da comunidade, onde os

estudantes e seus professores usam a metodologia Design Thinking para buscar um problema

e criar uma solução, e após desenvolvem um aplicativo que implementa a solução.

IV) Módulo 4: As oficinas do módulo 4 serão aplicadas no 9º ano, e têm por objetivo

desenvolver soluções aliadas ao empreendedorismo social, usando como ferramenta as

tecnologias e metodologias dos FABLABs.

As atividades de cada ano encerram em um evento chamado Scratch Oscar, que

premia os melhores projetos desenvolvidos pelos jovens em algumas categorias, como

enredo, melhor personagem, efeitos visuais, entre outros. O evento em 2015, aconteceu no

salão nobre da Universidade São Francisco, com presença do Prefeito Municipal de Itatiba,

Secretária Municipal de Educação, Reitor e Pró-Reitores da USF, equipe de desenvolvimento

e comunicação do Instituto Ayrton Senna, Fundação Lemann, Pais, membros da comunidade

21 O Instituto Ayrton Senna é uma organização sem fins lucrativos que trabalha para ampliar as

oportunidades de crianças e jovens por meio da educação. Maiores informações no site:

<http://www.institutoayrtonsenna.org.br/todas-as-noticias/letramento-em-programacao-2/>.

68

e vários estudantes. No final do ano de 2016, ocorreu a formatura da primeira turma do

Núcleo do Norte Gaúcho, contando com a participação de pais, professores, comunidade

escolar e mais de 140 estudantes.

5.4 Análise de Resultados

Para análise do ESM, todos os resultados serão tabulados e será feita uma análise

estatística em cada uma das oficinas, comparando estados de FLOW de cada estudante em

cada momento das oficinas.

Para análise do grupo focal, nos basearemos no método de análise de discurso, que de

acordo com Farago e Fofonca (2004) apud Bardin (2009), é conhecida como Análise do

Conteúdo, sendo utilizada em pesquisas qualitativas e quantitativas. Segundo Bardin (2009, p.

15):

descrever a história da "análise de conteúdo" é essencialmente referenciar as

diligências que nos Estados Unidos marcaram o desenvolvimento de um instrumento

de análise de comunicações é seguir passo a passo o crescimento quantitativo e a

diversificação qualitativa dos estudos empíricos apoiados na utilização de uma das

técnicas classificadas sob a designação genérica de análise de conteúdo; é observar a

posteriori os aperfeiçoamentos materiais e as aplicações abusivas de uma pratica que

funciona há mais de meio século.

Com base nessas duas análises, consideradas de modo fragmentadas no primeiro

momento e depois, agregadas para ter uma visão do todo, almejamos obter um resultado

satisfatório que consiga responder o problema central que permeia esta investigação, bem

como, suscitar outras indagações para o desenvolvimento de futuras pesquisas.

A próxima seção se ocupará da análise e resultado dos dados produzidos na pesquisa

de campo, a qual investiremos no olhar apurado e crítico, procurando subsídio no referencial

teórico adotado.

69

6. ANÁLISE DE RESULTADOS

Nesta seção, analisaremos os dados recolhidos na pesquisa de campo, sistematizando

os resultados do ESM e do Grupo Focal, procurando dar visibilidade ao que encontramos nas

oficinas, deflagrando a relação dos estudantes com seus pares, dos estudantes com a

tecnologia, dos estudantes com o computador e com a respectiva linguagem de programação.

Torna-se importante pois, rememorar a questão que norteia a pesquisa ora exposta: Qual o

impacto da programação de computadores na potencialização do desenvolvimento da

criatividade entre os estudantes do Ensino Fundamental através do FLOW?

Descreveremos o caminho percorrido, a fim de relatar o que e de que forma foi

desenvolvido cada conteúdo em cada oficina de programação de computadores, no intuito de

mostrar a dimensão do todo.

Totalizaram-se 5 encontros nas terças-feiras, cada qual com a duração de 1 hora e

meia, com o conteúdo já programado pelo projeto Letramento em Programação; logo, a

professora da turma é a responsável por ministrar as oficinas. Na primeira oficina (OF1 -

25/04), o pesquisador explicou o motivo da sua presença na escola, entregou os termos de

consentimento e assentimento aos estudantes do 6º ano e, em seguida, organizou o Grupo

Focal para uma conversa “informal”, no qual os sujeitos sentaram-se em formato de

semicírculo e, esse processo de interação foi videogravado. No final do Grupo Focal, por

curiosidade da turma em saber se o pesquisador já havia criado algo em sua trajetória

acadêmica, foi combinado que ele iria trazer um desafio real de programação aos estudantes,

na última oficina.

Na segunda oficina de programação (OF2 - 02/05), a professora Diana iniciou a aula

convidando os estudantes para se posicionarem em pé, ficando um ao lado do outro, com

vistas à chegar na compreensão de como a programação de computadores funciona. Para tal,

partiu do mais simples, mostrando os comandos através de movimentos corporais e

estabelecendo relações com o mundo real dos estudantes. Neste momento, ela verbalizava por

exemplo: andem três passos para a direita, agora virem 180º e andem mais cinco passos para a

esquerda, etc. Em seguida, partiu para o complexo, isto é, colocar a “mão da massa” de fato,

manuseando o programa. No entanto, antes de começarem com a linguagem de programação

visual Scratch, as duplas acessaram o site denominado Code.org, no qual encontram-se vários

desafios e atividades com linguagens de programação e os indivíduos podem aprender de

forma autônoma. O método da professora para os estudantes trabalharem em dupla foi

70

justamente mostrar a importância da cooperação para o desenvolvimento da atividade; eles

interagiam e apresentavam-se dispostos a ajudar não somente o(a) parceiro da dupla, mas sim,

os demais pares.

Ainda na segunda oficina, o pesquisador também introduziu a aplicação do ESM, a

cada 30 minutos (10:00 – momento 0, 10:30 – momento 1, 11:00 – momento 2, 11:30 –

momento 3). A estratégia elegida para fazer os estudantes pararem a atividade e marcarem o

formulário, foi bater palmas; nestes momentos, o preenchimento do formulário do FLOW, era

indispensável para analisar o nível de engajamento dos estudantes com a tarefa desenvolvida.

A terceira oficina (OF3 - 09/05) foi dedicada a conhecer o programa Scratch. Nessa

aula, era preciso criar a sua conta, escolhendo o nome do usuário e senha, para terem o acesso.

Os estudantes demonstravam-se empolgados, pois conversavam entre si e chamavam a

professora Diana o tempo todo, para mostrarem o que estavam fazendo. Ainda, ela os orientou

a anotarem, em um caderno, ou no próprio celular, o login para acessarem a conta. Após essa

parte, na medida em que já estavam na página, os estudantes já começaram a explorar o

Scratch, familiarizando-se com sua interface e seus comandos, bem como, passaram a fazer

exercícios de repetição, baseados em exemplos do próprio Scratch. No andamento da oficina,

realizou-se a mesma metodologia, aplicando-se o ESM a cada 30 minutos.

Na quarta oficina (OF4 - 16/05), os estudantes foram desafiados pela professora, a

criarem uma história no Scratch, com a temática do Meio Ambiente, com cenário e

personagens, explorando outras funcionalidades do programa, como por exemplo, inserir

imagens e reprodução de áudio. A professora ressaltava: “usem da criatividade pessoal, vocês

vão usar os conectores do Scratch e mais alguns que vocês vão descobrir”. A cada 30

minutos, com a mesma esquemática das duas oficinas anteriores, ao bater palmas, os

estudantes pausavam a atividade e preenchiam o ESM.

Por fim, na quinta oficina (OF5 - 23/05), utilizamos a mesma metodologia da primeira

vez, porém já que a professora responsável pelas oficinas não pode estar presente, como o

prometido, o pesquisador levou um desafio para os estudantes, no qual tinham que programar

a sequência ou, ao menos, aproximar-se do funcionamento das luzes do semáforo, utilizando-

se do Scratch 4. Para tal atividade, o pesquisador levou a placa Arduino com LEDs para

simular a “sinaleira”. Primeiramente, ele mostrou à turma como a placa funcionava e

apresentou os comandos. Em seguida, eles se dividiram em três trios e uma dupla para a

execução da tarefa proposta; cronometrou-se quatro 4 minutos para cada grupo. Como

prêmio, a dupla ou o trio vencedor ganharia um troféu, construído de material reciclável e

cheio de guloseimas, o que lhes causou grande alegria. Ficaram impressionados e ainda mais

71

entusiasmados, pois iriam programar algo do mundo real. O resultado, entretanto, seria

divulgado apenas no final da aula.

Na sequência, foi realizado o Grupo Focal, organizando os estudantes em semicírculo,

na mesma ordem em que ficaram no primeiro dia, abordando os mesmos questionamentos; a

conversa foi novamente videogravada. Por fim, o pesquisador apresentou os nomes das

estudantes vencedoras do desafio. Mesmo tendo um grupo ganhador, o pesquisador mostrou a

importância da cooperação para solucionar um problema. Ao falar o resultado, explicou que o

trio das meninas levou o prêmio em virtude de ter conseguido programar o funcionamento do

semáforo de modo mais aproximado e, que os demais, também eram merecedores, pois, de

algum modo, fizeram acender as luzes. Mostraram, acima de tudo, que todos pensaram e

programaram de maneira distinta, para a resolução do desafio.

Agora, faremos a análise das três amostragens do ESM. Para entender melhor,

refletiremos sobre o engajamento e motivação dos estudantes, com base nos gráficos

apresentados. De início, analisaremos a turma de maneira geral, em relação à cada oficina

(OF1 à OF3) e seus momentos (M0, M1, M2 e M3). Em seguida, elegeremos alguns dos

sujeitos para uma reflexão individual, a fim de compreender se as oficinas estão atingindo

suas expectativas.

Para cada uma das oficinas OF2, OF3 e OF4 e cada um dos sujeitos da pesquisa,

foram coletados 3 amostragens de ESM, com tempos aproximados, conforme a tabela abaixo:

Tabela 3 - Momentos do Experience Sampling Method - ESM

Nº momento Tempo aprox.. desde o início (min) Descrição

M0 O Chegada

M1 30 Aquecimento oficina

M2 60 Oficina em desenvolvimento

M3 90 Final da oficina

Fonte: elaboração do autor

Conforme a tabela acima, em cada oficina foram coletados 44 amostragens, sendo de

1122 sujeitos e 4 amostragens por oficina, e no total de 3 oficinas deveríamos ter 132

amostragens, porém devido à algumas faltas dos estudantes, foram totalizadas 120

amostragens de ESM completas.

Em cada oficina, para detecção de FLOW, adotamos a análise em 4 canais, definidos

como canal C1 a C4, que é apresentado por Csikszentmihalyi and Larson (1984), e avalia os

estados em eixos, como: Feliz(-3)/Triste(+3), Fraco(-3)/Forte(+3), Passivo(-3)/Ativo(+3) e

22 Como já mencionado, o estudante Augusto desistiu, ficando somente 11 participantes.

72

Motivado(-3)/Entediado(+3), na ordem e posição que aqui foi descrito para embaralhar as

questões e evitar resposta automática do sujeito, configurando os 4 canais da seguinte forma:

Figura 11 - Canais do FLOW

Fonte: figura adaptada pelo autor

Antes das análises, os dados dos resultados do ESM coletados em papel foram todos

tabulados e conferidos entre os documentos originais e a planilha eletrônica. Com os dados

conferidos e organizados, foram criadas as fórmulas para cálculo dos canais C1 a C4

conforme a figura acima, respeitando os pesos das perguntas em cada um dos canais, sendo

que cada canal teve valor de 0 a 24 conforme sua pontuação. A seguir, seguem as análises: 1ª

Análise - Individual Oficinas; 2ª Análise – Grupos Focais; 3ª Análise – Geral Oficinas.

1ª Análise – Individual Oficinas: Gráfico para análise da média de todos os sujeitos

em cada uma das oficinas OF2 a OF4, sendo populado no eixo y com a média de cada canal

C1 a C4 e no eixo x cada momento M0 a M4, apontando também a intensidade do FLOW em

cada momento, no gráfico apontado pela variável F.

Abaixo, veremos a Figura 12, que apresenta o gráfico da média de respostas do ESM

de todos participantes durante a OF2.

73

Gráfico 1 - Média Aritmética OF2 (Todos os sujeitos)

No gráfico 1, é possível notar um aumento do C4 (FLOW) e diminuição do C1

(apatia) no decorrer dos momentos. A oficina iniciou com teoria, na qual a professora fazia

perguntas aos estudantes, com o intuito das respostas serem os comandos que, posteriormente

iriam conhecer e utilizar na linguagem de programação.

No M0, os estudantes estavam sendo instigados pela professora e não conseguiam

responder como o esperado. Por exemplo, ela os indagava assim: “quando a gente vai numa

festa, a gente tá indo num...?”; ao perguntar do que se tratava uma festa, a professora esperava

a resposta “evento” e, nesse sentido, ela almejava comparar a palavra-chave “evento” com um

dos comandos do Scratch denominado “evento”. Logo, os estudantes, iam falando outras

coisas, e isso comprova que o C2 (ansiedade) está maior do que o C3 (entediamento).

A partir do M1 ao M3, os estudantes começam a explorar o site de programação

Code.org, de modo a aprender e exercitar os comandos. Percebemos que, no transcorrer dos

momentos da OF2, ocorreu uma inversão dos canais C2 (ansiedade) e C3 (entediamento),

logo, com a prática começaram a superar desafios, desenvolver habilidades, a fim de concluir

a OF2 de forma equilibrada. Portanto, os estudantes finalizaram a OF2 motivados, muito

provavelmente com níveis relevantes de estado de FLOW, conforme observamos na linha F.

Abaixo, veremos a Figura 13, que apresenta o gráfico da média de respostas do ESM

de todos participantes durante a OF3.

74

Gráfico 2 - Média Aritmética OF3 (Todos os sujeitos)

No gráfico 2, os estudantes iniciaram as atividades no M0, com a criação de um login

para acessar o Scratch online, e encontravam-se entediados, conforme mostra o C3.

Quando a turma está no M1, aumenta o C4 (FLOW) em relação ao C1 (apatia),

apresentando um equilíbrio entre o C2 (ansiedade) e C3 (entediamento) chegando neste

momento, em um maior pico de engajamento e produtividade, de acordo com a variável F.

Para melhor entender, os estudantes estavam fazendo exercícios de repetição ultrapassando as

fases, fornecidos pela linguagem de programação Scratch, sendo que a cada tarefa executada

com sucesso, elevava o nível de desafio.

No M2, aumenta o C1 (apatia), provavelmente em virtude dos problemas de conexão

de internet, tirando-os do foco e deixando-os desanimados, pois tiveram que iniciar

novamente a atividade que haviam realizado. Isso explica pois, o aumento do C3

(entediamento) em relação ao C2 (ansiedade) e assim, permanece até o M3, visto que já

conheciam as respostas.

Abaixo, veremos a Figura 14, que apresenta o gráfico da média de respostas do ESM

de todos participantes durante a OF4.

75

Gráfico 3 - Média Aritmética OF4 (Todos os sujeitos)

Na OF4, não tínhamos conexão de internet, devido ao modem da escola ter queimado,

e, por isso, estávamos “quebrando galho” com a rede 3G do celular da professora Diana e do

pesquisador. A atividade proposta para este dia era a criação de uma história sobre o Meio

Ambiente, na qual a professora enfatizava a importância de usar a criatividade para fazer

projetos diferentes, mobilizando o pensamento divergente, pois a proposta era criar coisas

fora do comum, livre de julgamento ou modelo.

Os estudantes demonstraram-se entusiasmados, já que tinham a liberdade de poder

imaginar, criar brincando e descobrindo novas possibilidades de comando, como áudios e

imagens, poder compartilhar com os pares e refletirem sobre o que estavam construindo,

conforme o espiral do pensamento criativo de Resnick. No M1 pois, os estudantes

levantavam, iam até o colega para pedir ajuda ou mostrar o seu projeto, chamavam a

professora e o pesquisador para olhar, riam e se divertiam, interagiam com a linguagem de

programação e entre si, de forma a explorar a criatividade, elevando o nível de ansiedade

(C2), em relação ao entediamento (C3), chegando a um patamar máximo de engajamento no

C4 (FLOW) para a OF4.

No M2, aumenta o nível de apatia, como mostra no C1, em virtude dos estudantes

estarem desanimados. Isso é explicado devido à falta de conexão de internet dos celulares,

fazendo com que alguns sujeitos perdessem seus projetos, os quais não tinham sido salvos

pela maioria do grupo. Por sorte, como o pesquisador trabalha na área de redes de

computadores, estava com o seu equipamento junto, e acabou instalando e doando um novo

aparelho para a escola, para poderem retomar as atividades. Isso demorou aproximadamente

20 minutos, mas foi suficiente para quebrar o ritmo do grupo

Do M2 ao M3, alguns dos estudantes que haviam perdido a criação, reiniciaram seus

projetos, porém agora, de forma desmotivada. Como o tempo que tinham era curto, a tarefa já

76

não foi realizada na mesma intensidade do que haviam feito anteriormente; no gráfico,

percebemos isso no C3 (entediamento).

Acreditamos que, se não tivessem ocorrido problemas referentes à conexão da

internet, os resultados seriam positivos, devido ao comprometimento, motivação e

engajamento em que a turma se propõe, já que, para os estudantes, as oficinas de programação

de computadores se constituía como um tempo e um ambiente de aprendizagem diferenciado

na instituição escolar, como veremos nos Grupos Focais, mais adiante.

2ª Análise - Grupos Focais: Após as análises das oficinas, discorreremos sobre a

conversa e seus trechos principais, entre o pesquisador e os estudantes, nos 2 Grupos Focais

(G1 e G2).

Nos dois Grupos Focais a professora Diana não permaneceu na sala de aula, deixando

os estudantes mais tranquilos para explanarem suas percepções diante do assunto abordado

pelo pesquisador. Em ambos os dias, estavam presentes 11 estudantes.

Para tornar-se inteligível e objetivo, fizemos recortes das transcrições, porém com o

registro na íntegra, no Anexo IV. A cada indagação e participação dos estudantes, faremos

uma análise.

No Grupo Focal da oficina 1, o pesquisador agradeceu a acolhida da turma e pediu a

colaboração de todos para que a sua pesquisa fosse concretizada. Ele iniciou com uma

conversa informal, comentando que os estudantes poderiam falar e responder as perguntas

quando se sentissem a vontade para verbalizarem seus pensamentos. O tempo de duração da

conversa totalizou em 29min 36s.

Na P1, o pesquisador perguntou se os estudantes estavam gostando de fazer parte do

projeto de programação de computadores. Vejamos o trecho a seguir:

(...) (27) Pesquisador: Iniciaram esse ano. Tá, ããã, uma pergunta que eu queria saber... ((olhando para a

folha)). Se vocês (es)tão gostando ou não (es)tão gostando. Por que ele é novo na escola né? (28) Carina: É/ ((tom de voz baixo)). (29) Aline: ((balança a cabeça afirmativamente)). (30) Nilva: (inaudível). (31) Iuri: Mais ou menos, só tem que ficá fazendo aqueles joguinho repetitivo. (32) Nilva: ((riso discreto)). (33) Pesquisador: Sim... Então, precisava de outras coisas também? (34) Iuri: ((balança a cabeça afirmativamente)). (35) Pesquisador: Tá, alguém mais tem alguma ideia se tá gostando ou não?... Ele disse que acha que tinha

que ter mais coisas né? (36) Iuri: Ééé/ (37) Douglas: É, programar /.../ ((tom de voz baixo)). (38) Iuri: Ééé, a prô disse que a gente tá programando, mas é só colocá direita e esquerda ((erguendo os

ombros)). (...)

77

A partir do primeiro questionamento, notamos que somente a estudante Carina

responde: “é” (turno 28); a Aline apenas movimenta a cabeça, concordando com a colega

(turno 29); a fala de Nilva é ininteligível. A resposta de Iuri deixa nítido a necessidade de ter

desafios nas atividades de programação, visto que ele diz: “Mais ou menos, só tem que ficá

fazendo aqueles joguinho repetitivo” (turno 31) e, mais adiante, reitera: “Ééé, a prô disse que

a gente tá programando, mas é só colocá direita e esquerda” (turno 38). Ou seja, nas

verbalizações de Iuri, o exercício de ir para a direita e esquerda está fácil demais, gerando

entendimento, e a sua expectativa encontra-se além disso, visto que já almeja criar algo.

Na P2, o pesquisador desejava saber qual foi a motivação que levou os estudantes a

envolverem-se com o projeto. Vejamos o trecho a seguir:

A partir da P2, descobrimos que, de 19 estudantes da turma do 6º ano, somente 1223

revolveram participar das oficinas de programação de computadores, cada um por alguma

motivação. Nas palavras de Iuri, fica perceptível que a sua decisão em fazer parte das oficinas

decorreu da sua motivação intrínseca, isto é, partiu do seu “querer fazer”, da sua própria

23 O estudante Augusto participou somente das aulas iniciais, e logo desistiu, permanecendo apenas 11

sujeitos.

(...) (39) Pesquisador: Sim, mas vocês vão evoluir... Tá, e outra coisa que eu queria saber, como é que vocês

chegaram aqui, pra fazer isso aqui, através de quem, como que vocês chegaram aqui pra participar do

projeto. Qual que foi a motivação assim? (40) Iuri: Eu quero aprendê a fazê robô/ (41) Aline: Bom, na verdade, quem convidô a gente foi a Diana, na reunião de pais, eu acho que era. E daí

como já tinha uns pais de alguns alunos do... Enfim, do pessoal que já fazia o curso aí eles fizeram uma

apresentação sobre o que era o projeto e apresentou pra gente e aí a gente concluiu se a gente queria ou não

fazê o projeto. (42) Pesquisador: Ahhh, então não foi eles que, então foi decisão de vocês mesmos então? (43) Aline: É ((balançando a cabeça afirmativamente)). (44) Carla: É ((riso discreto)). (45) Pesquisador: Cada um, então tinha quantos mais ou menos lá na plateia? (46) Aline: De alunos? De alunos, eu acho que só tinha eu e a Yris ((riso discreto)). (47) Pesquisador: É, mas tava aberto, é aberto pra escola, pra alunos, pra turma de vocês todos? Vocês são

quantos na turma? (48) Alguns estudantes: Dezenove. (49) Pesquisador: Alguém mais quer falar o porquê que entrou? ((silêncio prolongado)). (50) Carla: Huuuum. A minha prima/ (51) Pesquisador: Pode falar! (52) Carla: Ela tava no sexto ano e ela fazia o curso com a prô Diana eeee ((gesticulando com as mãos)), e

daí ela fazia o curso e falava que era legal e agora ela passô pro sétimo ano e tá fazendo mesmo assim. E

daí, eu pensei que ia sê legal e daí eu vim. (53) Pesquisador: Ah legal! É interessante, porque vocês veem que cada um tem motivo né, vem pra alguma

coisa. Você ia falar o porquê que/ ((apontando para o Douglas)). (54) Douglas: Eu vim porque eu gosto de fazê essas coisinhas, eu gosto de mexê em computador. (...)

78

vontade, além de ter uma meta a ser atingida, que era aprender a construir um robô (turno 40).

Na verbalização de Douglas, também notamos uma motivação intrínseca em adentrar no

projeto, no entanto, ainda não apresenta uma meta clara, visto que diz apenas assim: “Eu vim

porque eu gosto de fazê essas coisinhas, eu gosto de mexê em computador” (turno 54);

mesmo não sabendo o que vai ter, nem o que vai aprender com as oficinas, ele já demonstra

que sabe alguma coisa sobre a ferramenta computador e que tem apreço em manusear objetos

do universo tecnológico, além de estar em busca de novidades.

Na sequência, observamos que Carla, ao contrário de Iuri e Douglas, teve uma

motivação extrínseca para participar das oficinas, já que, por meio dos relatos positivos da sua

prima com relação às atividades desenvolvidas, ela achou que seria “legal” (turno 52) e, sendo

assim, resolveu tornar-se integrante também. Portanto, a sua motivação surgiu de modo

externo, e, nesse caso, foi oriunda da fala de alguém. A estudante decidiu participar,

entretanto, em sua narrativa, ficou claro que ela não tinha objetivos a serem alcançados com a

programação, iria fazer parte apenas em virtude dos comentários da sua prima.

Na P3 e P4, o pesquisador almejava entender a importância do projeto Letramento em

Programação para a vida escolar e pessoal dos estudantes. Vejamos o trecho a seguir:

Observamos que, a partir desse questionamento, a maioria da turma acredita que o

projeto é importante para a vida escolar e pessoal, pois respondem que “sim” e balançam a

(...) (55) Pesquisador: É... Eu por exemplo, assim, quando eu quis fazer a faculdade de programação né, em

computador, pra mexer é porque lá também, na idade de vocês eu sempre olhava o computador e naquela

época não tinha muito né, mas eu sempre olhava e tinha curiosidade de mexer né, como é que funcionava e

por isso que hoje eu tô aqui também, praaaa cada vez melhorar nas tecnologias... Outra coisa que eu queria

saber de vocês, por que que vocês acham ou, se não acham importante esse projeto? ((olhando para a

folha)). Vocês acham que ele é importante pra escola? (56) Iuri: Acho que sim. (57) Pesquisador: A maioria acha que sim? (58) Alguns estudantes: Sim ((balançando a cabeça afirmativamente). (59) Pesquisador: Vocês saberiam me dizer o porquê que vocês acham que é legal? (60) Iuri: Pras pessoas serem mais evoluídas /.../ (61) Augusto: Pra gente também não ficá sempre na mesma coisa assim, de caderno e essas coisa assim.

Aprendê além da, além do, do ensino, tipo de matemá(tica), não, tipoooo de livro ((tira a mão do bolso do

casaco, gesticula e coloca novamente a mão no bolso)), essas coisa/ (62) Pesquisador: Sim, do normal, do dia-a-dia, uma coisa diferente. (63) Augusto: É. (64) Pesquisador: Por que as outras matérias são tudo um padrão. Isso! Também, legal. Alguém mais?

((silêncio prolongado)). Deixa eu perguntar pra vocês também... E, pra vida pessoal de vocês, por que vocês

acham que, isso vai mudar na vida de vocês, ou não? (65) Douglas: Depende. Se a gente aprendê a mexê em computador e usá essas coisas, eu acho ((balançando

a cabeça)). (66) Aline: Ou até mesmo pra melhorá o estudo, por exemplo, se a pessoa tira nota baixa, ela começa a

mexê, começa a pensá mais ((gesticula com a mão)) e consegue se concentrá mais nos estudos. Eu acho que

pode mudá. (...)

79

cabeça. Quando Iuri comenta: “pras pessoas serem mais evoluídas” (turno 60), nos parece

evidente que o estudante sente a necessidade da evolução tecnológica e, com isso, já enxerga

que a tecnologia pode trazer benefícios para a sociedade.

Augusto complementa a ideia de Iuri, dizendo: “Pra gente também não ficá sempre na

mesma coisa assim, de caderno e essas coisa assim. Aprendê além da, além do, do ensino, tipo

de matemá(tica), não, tipoooo de livro, essas coisa/” (turno 61). As palavras desse estudante

provocam reflexões acerca de como os métodos de aprendizagem estão ultrapassados,

ficando, em grande parte, na mesmice, com a utilização de livros didáticos e conteúdos

engessados, isto é, seu posicionamento reforça a necessidade de inovação e dinamização na

sala de aula, tendo as ferramentas tecnológicas como aliadas ao processo de aprendizagem.

Implicitamente, dá ao entender que, não significa que os livros não são importantes, e sim,

que a tecnologia parece ser mais atrativa, justamente por serem sujeitos nativos digitais.

Portanto, por meio da opinião de Augusto, as aulas ditas como “tradicionais” não mobilizam o

engajamento dos indivíduos.

O pesquisador, no momento em que questiona a turma com referência à importância

do projeto para a vida, Aline também expõe seu ponto de vista, mencionando: “Ou até mesmo

pra melhorá o estudo, por exemplo, se a pessoa tira nota baixa, ela começa a mexê, começa a

pensá mais e consegue se concentrá mais nos estudos. Eu acho que pode mudá” (turno 66).

Com a sua fala, é possível constatar que na visão da estudante, o mundo tecnológico oferece

muitas possibilidades de aprendizagem aos sujeitos, pois, quando ela infere que o indivíduo

começa a “pensá mais”, está querendo dizer que a participação no projeto oportuniza um

esforço maior de concentração nas atividades, e, por conseguinte, mais engajamento.

A P5 estava direcionada à noção do tempo nas aulas de programação de

computadores. Vejamos o trecho a seguir:

80

A respeito da indagação acima, a maioria dos estudantes não respondeu, visto que, por

duas vezes, o silêncio prolongou-se, o que significa que ainda não haviam tido aulas de

programação suficientes para opinar. Augusto concorda, mas não exemplifica; ele apenas fala:

“passa mais rápida” (turno 74). Já Douglas explica: “Parece que tipo, as coisa que a gente

gosta passa rápido” (turno 80), isto é, suas palavras remetem que a motivação intrínseca é

fundamental para desenvolver alguma tarefa com satisfação, perdendo assim, a noção do

tempo. Iuri ainda acrescenta: “se não tem desafio, é mais devagar” (turno 82), relevando que o

desafio é imprescindível para que as atividades tornem-se engajadoras.

A P6 trata da importância do computador e do aparelho celular no cotidiano dos

sujeitos. Vejamos o trecho as seguir:

(...) (73) Pesquisador: Que nem tu comentou que nas outras matérias, matemática, português. Vocês acham que

essa aqui que vocês tão fazendo, o tempo passa rápido, ou o tempo passa mais devagar? Qual é a sensação

assim, em relação quando vocês tão nas outras aulas? (74) Augusto: Passa mais rápida ((tira uma mão do bolso e coça a cabeça)). (75) Iuri: Passa mais rápido, porque a gente se diverte ((gesticulando com as mãos)). E, eu gosto de

informática, por causa queeee eu tenho um tio que ele faz tudo essas coisa aí, de editá vídeo, daí, às vez em

quando que eu vô na casa da minha vó, ele mora na frente, eu vô lá e fico lá com ele, vendo ele editá... (76) Pesquisador: Siiim. Vocês também concordam? Ou acham que não passa rápido? (77) Estudantes: ((silêncio)). (78) Aline: Mais ou menos ((tom de voz baixo)). (79) Pesquisador: Ou devagar, ou tanto faz, ou é a mesma coisa queeee das outras matérias? (80) Douglas: Parece que tipo, as coisa que a gente gosta passa rápido. (81) Pesquisador: Sim. Verdade. (82) Iuri: Se não tem desafio, é mais devagar ((com tom de voz baixo)). (83) Pesquisador: Verdade. Vocês também acham?... Ou não, ou acham que é mesma coisa? ((silêncio

prolongado)). Ou não deu pra notá ainda porque não deu tempo? ((silêncio prolongado)). Então, eu vou

passar pra próxima, mas já deu pra ter uma noção do que, do que vocês acham sobre o tempo. Porque ela é

uma matéria diferente das outras né, totalmente diferente. Ainda mais com tecnologia, a gente gosta né de

tá mexendo com computador. Mas a gente precisa, que nem você disse ((apontando para Iuri)), de desafio

né? (84) Iuri: ((balança a cabeça afirmativamente)). (...)

81

Deste questionamento, podemos abstrair que os computadores e celulares estão

inseridos em todos os campos. Iuri cita o lazer como exemplo: “Tem uns programa de celular

que passa tempo” (turno 94); já Douglas menciona a relevância dessas ferramentas

tecnológicas para o trabalho: “Tipo, tipo, os que trabalham, tipo que tem um, tipo o meu pai...

Ele sai vendê, ele sai, daí o pai tem empresa sabe, daí ele fala, tipo assim, se tem que ir num

lugar, daí a funcionária lá fala pra ele pelo whats... É bom” (turno 95); Aline conclui: “Acho

queee facilitô metade da vida, de tudo que a gente precisa fazê” (turno 96), isto é, o

computador e o celular podem estar presentes no lazer, no trabalho e nos estudos.

Augusto, em sua verbalização, deixa explícito que os computadores e celulares podem

unir as atividades descritas anteriormente, dando como exemplo, o youtube, uma junção de

lazer e trabalho. O estudante comenta: “A plataforma youtube, eu descobri que além dela

deixa você fazê vídeos, ela te dá tipo, trabalho pra você, porque tem gente que ganha, tipo,

bastante dinheiro em dólar no youtube” (turno 98).

Na P7, o pesquisador quer saber se a turma conhece o conceito de criatividade, bem

como, o que é ser um indivíduo criativo. Vejamos o trecho a seguir:

(92) Pesquisador: Tem que arrumar né. Ããã... Sobre o celular, o computador assim, ããã, vocês acham que é

importante no dia-a-dia das pessoas ou não? (93) Douglas: Eu acho que sim/ (94) Iuri: Tem uns programa de celular que passa tempo /.../ (95) Douglas: Tipo, tipo, os que trabalham, tipo que tem um ((gesticulando com as mãos)), tipo o meu pai...

Ele sai vendê, ele sai, daí o pai tem empresa sabe, daí ele fala, tipo assim, se tem que ir num lugar, daí a

funcionária lá fala pra ele pelo whats... É bom. (96) Aline: Acho queee facilitô metade da vida, de tudo que a gente precisa fazê. (97) Pesquisador: Pra comunicação né. (98) Augusto: A plataforma youtube, eu descobri que além deeela deixa você fazê vídeos, ela te dá tipo,

trabalho pra você, porque tem gente que ganha, tipo, bastante dinheiro em dólar no youtube. (99) Iuri: Apesar do youtube tá passando a crise agora. (100) Pesquisador: É, na verdade, é diversão, é trabalho que nem você disse, é, dá pra ganhar dinheiro

também né... Então, a tecnologia dá pra ser utilizada de várias formas né. Que nem você gosta bastante pra

trabalho, pra diversão. Quem que usa pra trabalho aqui, agora, hoje? ((silêncio)). (101) Iuri: A gente não ganha dinheiro, uso mais pra diversão mesmo, pro canal /.../ (102) Pesquisador: Pra diversão. A ideia é isso aí, a gente conhecer cada vez mais, pra no futuro trabalhar,

pra fazer novas soluções pra problemas né. Porque cada vez tu vê, tu olha assim, pra fazer uma pesquisa,

tem uma monte de soluções pra um monte de coisa né, o pessoal cria pra tecnologia né. Mas, então vocês

acham que é importante? (103) Estudantes: ((balançam a cabeça afirmativamente)). (104) Iuri: Sim.

82

Nessa questão, somente Iuri interage e tenta definir a concepção de criatividade,

expondo-se em dois momentos. Primeiro menciona: “Ããã, tipo teu pensamento, é tu pensá em

alguma coisa que não existe ainda, fazê acontecê alguma coisa que não existe” (turno 108) e,

logo em seguida, fala: “É que, quem é criativo sempre acaba na frente dos outros” (turno

115). Apesar do estudante tentar explicar o conceito de criatividade, ele demonstra não

conseguir se expressar de forma clara; além disso, cita que o sujeito criativo apresenta

vantagem perante os outros. Em virtude dos pares não se posicionarem verbalmente frente

esta pergunta e permanecerem silenciosos, constatamos que eles desconhecem o conceito de

criatividade.

Na P8, o pesquisador deseja saber quais são as caraterísticas de uma pessoa que

soluciona problemas. Vejamos os seguintes turnos de fala:

Mais uma vez, com essa pergunta, observamos a dificuldade de compreensão do

assunto abordado, visto que, a única resposta foi do Iuri; ele disse: “Se diferenciá das outras...

Maneira de pensá” (turno 123).

(...) (105) Pesquisador: Então tá bom... Outra coisa que hoje a gente fez, você fizeram um desenho e depois só eu

vou olhar né. Queria ver com vocês sobre criatividade ((olhando para a folha)). Vocês sabem o que significa

criatividade? (106) Iuri: Sim. (107) Pesquisador: Sabem? (108) Iuri: Ããã, tipo teu pensamento, é tu pensá em alguma coisa que não existe ainda, fazê acontecê

alguma coisa que não existe. (109) Douglas: Imaginação/ (110) Iuri: Desenho. (111) Pesquisador: Claro... Alguém mais? ((silêncio prolongado)). O que vocês acham que é, o que é ser

uma pessoa, que é bom ser criativo hoje em dia ou não? (112) Iuri: É bom. (113) Douglas: Ééé ((balança a cabeça afirmativamente)). (114) Aline: É que tem as críticas, mas é muito bom ser criativo sim/ (115) Iuri: É que, quem é criativo sempre acaba na frente dos outros. (116) Pesquisador: É vantagem/ ((balança a cabeça afirmativamente)). (117) Iuri: É não copiá. (118) Pesquisador: A criatividade... Vocês acham que é bom então? (119) Alguns estudantes: ((balançam a cabeça afirmativamente)). (120) Pesquisador: Claro, a gente ser inteligente é bom, mas ser criativo também, também é bom ou não? (121) Aline e Iuri: Sim. (...)

(...) (122) Pesquisador: Sim. E o que vocês acham que é uma característica de uma pessoa criativa assim?... (123) Iuri: Se diferenciá das outras... Maneira de pensá. (...)

83

O pesquisador, na P9, busca compreender se, na tarefa de programação de

computadores, existe um único modelo de resposta para um problema. Vejamos o trecho a

seguir:

Nesta pergunta, todos os estudantes concordam que as respostas são diferentes, porém,

não conseguem conceituar a razão de terem formas distintas de pensamento. Nesse momento,

o pesquisador cria uma situação, na qual a turma precisa encontrar soluções para um problema

específico, sendo o seguinte: de que forma iríamos chegar até o Shopping Bella Cittá, na loja

de games, tendo como ponto de partida, a própria escola? Os estudantes começam a se

pronunciar, dando exemplos de como poderiam ir no Shopping; eles vão interagindo e

começam a ficar empolgados com a proposta e, assim, vão lançando respostas diferentes e

inusitadas, como percebemos no trecho a seguir:

(...) (124) Pesquisador: É o que vocês fizeram hoje nos desenhos né. Vocês acham que os desenhos foram todos

iguais ou não? (125) Alguns estudantes: Não. (126) Pesquisador: Vocês olharam um do outro, ou não? (127) Síntia e Iuri: ((balançam a cabeça negativamente)). (128) Pesquisador: Não era pra olhar hein. (129) Síntia: ((ri)). (130) Douglas: ((olha para o lado e fala algo)) (inaudível). (131) Pesquisador: Não, tô brincando, só pra saber ((ri)). (132) Iuri: Eu olhei, mas daí eu fiz diferente. (133) Augusto: Eu não vi, mas tavam olhando meu desenho ((com a expressão fechada e com as mãos no

bolso)). (134) Iuri: Ela falô alto /.../ quando eu te chamei ((olhando para a colega Aline). (135) Nilva: Ah, é verdade... (...)

84

Com estes turnos de fala, em um momento de descontração e maior interação entre a

turma e o pesquisador, os estudantes exercitaram seus pensamentos convergente e divergente,

gerando ideias diferentes, com a finalidade de resolver o problema proposto.

Na P10 do Grupo Focal, o pesquisador desejava saber se os estudantes acreditavam

estar mais criativos, após o uso da programação de computadores. Vejamos o trecho a seguir:

De acordo com essa décima e última indagação, a maioria dos estudantes acredita que

não se tornaram mais criativos com as oficinas de programação de computadores. Vemos a

incerteza logo no começo do trecho, quando Douglas profere: “Não sei” (turno 204); em

seguida, os estudantes Iuri, Leila e, novamente Douglas verbalizam estarem sentindo-se a

“mesma coisa” (turnos 207, 209, 210). E essas respostas podem estar relacionadas ao fato de

(...) (149) Iuri: Dá também pra ligá um ventilador, subí nele e fazê óóó, uma mochila a jato ((imitando o

movimento do voo, com os braços e pernas)). (150) Estudantes: ((risos)). (151) Carla: Aqueles negócio que eu vi, sempre passam por aqui quando tem sol, que tem um balão, daí tem

atrás um motorzinho que é tipo assim, que vai andando e /.../ ((fazendo o movimento com a mão, como se o

objeto estivesse girando)). (152) Iuri: /.../ Pegá e pulá de um prédio, uhuuuu/ (153) Augusto: Eu usaria a tecnologia de uns carros, que eles usam pra flutuá ((fazendo o movimento com a

mão)) e botaria numa cama ((risos)). (154) Síntia: Comprá um tênis de rodinha/ (155) Augusto: (inaudível). (156) Iuri: /.../ Um celular assim, um joguinho, daí tu seguia assim, por trás numa curva ((fazendo o

movimento com o corpo e fazendo um gesto com a mão como se estivesse controlando o objeto)). (157) Douglas: ((imitando o movimento do colega Iuri)). (158) Pesquisador: Agora eu lembrei de um que a gente não falou, que... é bem legal e que ele voa ((fazendo

o movimento com a mão, como se o objeto estivesse voando)). (159) Douglas: Helicóptero? (160) Aline e Iuri: Balão? (161) Augusto: Drone? (162) Pesquisador: Drooone. (...)

(...) (204) Douglas: Não sei. (205) Augusto: (inaudível). (206) Pesquisador: A partir de hoje, com os desenhos, vocês tão mais criativos depois disso/ (207) Iuri: Tô a mesma coisa ((com uma mão na cabeça, mostrando posicionamento convincente)). (208) Pesquisador: Não, por quê? (209) Leila: Mesma coisa/ (210) Douglas: Mesma coiiiisa ((balançando a cabeça)). (211) Aline: Mas eu já era criativa ((com tom de voz baixo)). (212) Iuri: Por causa que, se tu for criativo, não tem como aumentá o nível /.../ (213) Aline: Às vezes a pessoa só é criativa, sei lá, por exemplo /.../ escrevê um livro /.../ ((gesticula com a

mão)). (214) Douglas: Ou tu fazê uma coisa... /.../ (...)

85

ainda não terem criado nenhum projeto por meio da programação de computadores e somente

terem aprendido os comandos básicos de como manusear o software Scratch.

O Grupo Focal da oficina 5 seguiu a mesma lógica do Grupo Focal da oficina 1,

portanto, conforme opção metodológica, foram realizados os mesmos questionamentos, para

ver se houve ou não, alteração nas respostas dos estudantes, já que, nesta quinta oficina, a

turma já estava “programando”. O tempo de duração da conversa foi de 18min.

Com relação à P1, a qual o pesquisador quer saber se a turma estava gostando de ser

integrante do projeto, apresentamos o seguinte trecho:

Neste primeiro momento, todos os estudantes respondem “sim” (turno 4), mostrando-

se entusiasmados com o envolvimento no projeto. Douglas logo comenta: “A gente já

aprendeu coisas novas, tipo ligá sinaleira” (turno 8), evidenciando que o desafio levado pelo

pesquisador, referente à programação do funcionamento de um semáforo pelo Scratch, o

motivou e marcou. Iuri complementa a fala do colega, dizendo: “Por causa que a gente

programa as coisas né” (turno 13), isto é, após poucas oficinas, ele mostra ampliar a sua visão

em relação ao funcionamento da lógica de programação de computadores, descobrindo que

esta não faz nada além daquilo que foi proposto ou imaginado pelo sujeito, sendo ele o agente

responsável pelas soluções para possíveis problemas.

A P2 fazia menção ao motivo que levou os estudantes a participar do projeto. Vejamos

o trecho a seguir:

(...) (3) Pesquisador: Sim, tá... Hoje eu vou fazer as mesmas perguntas pra vocês e então, se puderem me ajudar

nas respostas, se vocês mudaram a opinião, se vocês têm alguma coisa diferente, podem falar... A primeira

coisa que eu já tinha perguntado e queria perguntar pra vocês de novo ((olhando para a folha)). Se vocês

estão gostando de fazer parte desse projeto, ou não? (4) Estudantes: Sim ((em coro)). (5) Pesquisador: Bá, que bom hein! ((ri)). (6) Douglas: Ainda mais queee a última vez. (7) Pesquisador: É. (8) Douglas: A gente já aprendeu coisas novas, tipo ligá sinaleira ((referente ao desafio que haviam

participado no início, de acender o semáforo, por meio da programação com as placas do arduino)). (9) Estudantes: ((risos)). (10) Pesquisador: É, na prática é diferente né. (11) Iuri: Mas ainda a gente que aprendê a montá os negocinho /.../ ((referindo-se às placas do arduino)). (12) Pesquisador: Ah, os circuitos né. Mas, isso se aprende, é fácil também. Mas, o programar que é legal,

que dá vida pras coisas né, é diferente. Eeee, isso que eu ia perguntar, o porquê que vocês acham que é

legal... fazer essa oficina aqui? (13) Iuri: Por causa que a gente programa as coisas né. ((silêncio prolongado)). (...)

86

Nesta segunda indagação, ao participar do projeto, notamos que Iuri estava em busca

de desafios, ingressando pois, através de uma motivação intrínseca. Sua vontade tornou-se

explícita quando menciona: “Querê aprendê mais” (turno 15), bem como, no momento em

que apresenta uma meta clara: “O que motivô é que eu queria aprendê a fazê robô” (turno 17).

Já, Aline adentrou no projeto por meio da motivação extrínseca, ou seja, pelo que

observamos, a estudante decidiu se envolver por não ter algo mais “interessante” para fazer,

como expressa no turno 18.

Com referência à P3 e P4, o pesquisador quer entender qual a relevância do projeto

para a vida escolar e pessoal dos estudantes. Vejamos o sucinto trecho:

Com as falas acima, Iuri ao responder: “Que a gente pode usá pra programá coisas”

(turno 21) está enxergando que, por meio do projeto, ele vai poder usar a linguagem de

programação tanto nas diversas áreas do conhecimento, quanto fora do ambiente escolar. Ao

contrário da colega Síntia, que vê a programação como uma profissão para o futuro, pois diz:

“Trabalhá (turno 22).

A P5 está direcionada à velocidade temporal das oficinas. Vejamos o trecho a seguir:

(...) (14) Pesquisador: A outra coisa que eu tinha perguntado pra vocês era, o que levou vocês a fazerem parte

do projeto? (15) Iuri: Querê aprendê mais /.../ (16) Pesquisador: O que que motivou vocês a vim fazer, quando convidaram vocês? (17) Iuri: O que motivô é que eu queria aprendê a fazê um robô. (18) Aline: Principalmente porqueeee /.../ Mas é que pelo menos por causa pra quem foi tinha demonstração

né, e era muito interessante o jeito que eles mostravam e /.../ desse tipo/ (...)

(...) (20) Pesquisador: Tá, legal... Eeee ((olhando para a folha)), o que que vocês acham, qual que é a

importância, do projeto esse, da programação, pra vida e pra escola? Qual é a importância disso? (21) Iuri: Que a gente pode usá pra programá coisas. (22) Síntia: Trabalhá... (...)

87

Perante essa questão, a resposta dos estudantes é rápida e unânime: “Passa rápido”

(turno 24), o que denota o engajamento deles, e, por conseguinte, a perda de noção do tempo.

Além disso, a fala de Douglas nos faz pensar, pois verbaliza: “Rápido, porque é uma coisa

tipo, que a gente gosta... Tipo, as coisaaaa que a gente gosta passa bem rapidão. E as coisas

que a gente não gosta né ((olhou para baixo e balançou a cabeça))” (turno 25). Nas palavras

do estudante muitas reflexões estão imbricadas, como por exemplo: gostar pode referir-se a

ter novidades, abarcar desafios, ser protagonista da aprendizagem, criar algo que estabeleça

sentido com o contexto real, etc, ...

Em seguida, os colegas fazem comparações com as disciplinas presentes no currículo,

citando português, matemática, ciências, etc, ... Sobre tais áreas do conhecimento, a percepção

é de que as aulas passam mais lentamente, possivelmente em virtude do modelo pedagógico

ter ausência de inovação tecnológica, não provocando desafios. Outra ideia que poderia ser

discutida aqui, é que nem todo mundo gosta das mesmas coisas, nesse caso as disciplinas

escolares, além de terem habilidades/talentos para diferentes áreas.

Ao falarmos da P6, o pesquisador tinha o intuito de saber qual era a importância do

computador e do celular na rotina das pessoas. Vejamos o trecho a seguir:

(...) (23) Pesquisador: É o que vocês pensarem, podem falar. ((silêncio prolongado)). Tá, então deixa eu ir pra

próxima então... Ããã, que em eu tinha perguntado pra vocês assim, quando vocês (es)tão participando aqui,

que nem hoje, qual é noção do tempo assim, que vocês têm? A aula passa lenta ou a aula passa rápido?

((gesticulando)). O que que vocês/ (24) Estudantes: Passa rápido ((risos discretos)). (25) Douglas: Rápido, porque é uma coisa tipo, que a gente gosta... Tipo, as coisaaaa que a gente gosta

passa bem rapidão. E as coisas que a gente não gosta né ((olhou para baixo e balançou a cabeça)). (26) Nilva: Tipo português. (27) Estudantes: ((risos)). (28) Iuri: Matemática (29) Nilva: Ciências. (30) Leila: Ah, matemática não. (31) Pesquisador: Em relação ás outras matérias, isso? É diferente? (32) Alguns estudantes: Teeem ((balançando a cabeça afirmativamente)). (33) Síntia: Parece que as coisas que a gente não gosta passa devagar/ (34) Iuri: Poderia sê o contrário né. (35) Síntia: E as coisa que a gente gosta paaassa rápido. (...)

88

Com essa questão, fica perceptível que na visão de alguns estudantes, o computador e

o celular são ferramentas indispensáveis na vida do ser humano, dando exemplos para serem

utilizados no lazer, no trabalho e no estudo.

A P7 destina-se a analisar se os estudantes têm uma definição clara do conceito de

criatividade. Vejamos o trecho a seguir:

Nesta questão, os estudantes conceituam a criatividade como um pensamento único,

isto é, provém do sujeito e que é possível de tornar-se realidade. Diante disso, Iuri cita como

exemplo o “uber” como algo criativo.

Na P8, o pesquisador interroga quais são as características de um indivíduo criativo.

Vejamos o trecho a seguir:

(...) (36) Pesquisador: Ah, é verdade... Ããã ((olhando para a folha)), outra coisa que eu tinha aqui, falado com

vocês, o que que vocês acham, qual que é a importância do computador e do celular no dia-a-dia assim? Por

que eles são importantes? (37) Douglas: Ah, é bom ((balançando a cabeça afirmativamente)). (38) Iuri: Porque a gente tem acesso pra, praaa notícia, ficá bem informado. (39) Síntia: Pesquisá as coisas. (40) Aline: Ou até mesmo pra estudo. Hoje em dia tem tipo, tanto aplicativo de estudo, site, coisa assim/ (41) Iuri: Ficá bem informado. (42) Pesquisador: Tu ia falá alguma coisa ((direcionando-se à estudante Carla)). (43) Carla: Ããã, pra gente se conectá com outra pessoa que não mora, tipo em Passo Fundo /.../ (44) Douglas: Tipo, que nem meu pai sabe, ele usa o whats sabe? (45) Pesquisador: Aham. (46) Douglas: Ele tipo, ele se esqueceuuu de pegá alguma coisa da empresa, daí... eles passam uma

mensagem e ele volta. (47) Iuri: (inaudível). (48) Pesquisador: É um bom exemplo né. (49) Douglas: É, e também é mais fácil de se comunicá... (50) Pesquisador: É que tudo ficou com mais fácil com a internet, com o computador/ (51) Iuri: Minha /.../ não gostá de internet. (52) Síntia: ((riso discreto)). (53) Pesquisador: Então, todos acreditam queeee, é importante o celular, o computador no dia-a-dia então? (54) Estudantes: Sim ((em coro)).

(...)

(...) (55) Pesquisador: Ããã, outra coisa então ((olhando para a folha)). A gente falou bastante em criatividade né,

e hoje eu trouxe um negócio diferente ali pra vocês. O que vocês acham que é ser criativo? O que que é uma

pessoa criativa? Como definir criatividade? O que é ser criativo? (56) Iuri: É /.../ uma coisa autêntica, diferente. (57) Aline: É quando um homem consegue algo /.../ que ele ia acontecê/ (58) Iuri: Tipo uber. (59) Douglas: Imaginação também. Tipo, eles imaginam eeee conseguem criar. (...)

89

Nesta pergunta, não obtivemos sucesso, visto que, além dos estudantes não

responderem ao pesquisador, desviaram do assunto. Dessa forma, tal questionamento foi

invalidado, não sendo possível uma análise.

Na P9, o pesquisador quer saber se, quando a turma é desafiada à desenvolver uma

atividade de programação, as respostas para a solução de problemas são as mesmas. Vejamos

o trecho a seguir:

Com relação a esse questionamento, os estudantes observaram que as respostas para a

solução do desafio referente ao funcionamento do semáforo foram diferentes, de modo a

(...) (60) Pesquisador: Sim. Tudo isso que vocês (es)tão falando. E, quem mais acha que é ser uma pessoa

criativa?... Qual é a característica de uma pessoa criativa? (61) Síntia: (inaudível). (62) Pesquisador: ((ri)). (63) Iuri: O Einstein era burro, daí depois, ele ficou inteligente. (64) Pesquisador: É que a gente tem como criativo fazer coisas diferentes né. E, quando a gente fala em

inteligente é quando a gente faz alguma coisa e acerta né. Então, os dois podem tá aliados, porque tu pode

ser criativo, ou só inteligente, ou pode ser inteligente e criativo. (65) Síntia: Ou /.../ ((riso discreto)). (66) Pesquisador: É ((ri)). Quem mais quer dizer uma característica de uma pessoa criativa? (67) Carla: É um podê criá eeee, outro podê usá? (...)

(...) (68) Pesquisador: (...). Ããã, vamos ver o que vocês acham, quando vocês são desafiados a fazer uma tarefa,

que nem hoje ali, de aprender a simular o semáforo né, vocês acham que as soluções dos problemas, tinha

aquele problema que era fazer o semáforo funcionar, as respostas de cada um, dos trios ou da dupla, foram

iguais ou foram diferentes? (69) Estudantes: Diferentes. (70) Iuri: Uns ficaram aceso, uns ficaram aceso e piscando, ou beeem depois, acendeu uma cor. (71) Carina: ((ri)). (72) Pesquisador: E por que vocês acham que cada um faz diferente? (73) Iuri: Porque cada /.../ (74) Estudantes e Pesquisador: ((risos)). (75) Síntia: Cada um tem um jeito. (76) Pesquisador: Isso vocês notaram né. Viram, ninguém fez igual né. Vocês viram o jeito que eu fiz e cada

um fez diferente eeee funcionou, cada um fez acender o led. Vocês viram né? (77) Elena: É, não funcionou ((ri)). (78) Estudantes: ((risos)). (79) Iuri: É tipooo, vermelho e verde, pros carros passá e derrapá /.../ (80) Síntia: Daí uns param e outros andam. (81) Estudantes e Pesquisador: ((risos)). (82) Aline: Daí tipo, tem um /.../ ((gesticulando com a mão, como se estivesse mostrando uma rua)), daí uns

andam e outros ficam lá, parado. (83) Pesquisador: Então, se a gente pegar isso aí, vocês poderiam fazer outro tipo de semáforo, por que que

tem que ser essa ordem né? (84) Aline: Pode sê ((balançando a cabeça afirmativamente)). (85) Pesquisador: Poderia ser a ordem diferente. Poderia ser o vermelho que andasse e o verde que parasse. (86) Alguns estudantes: ((risos)). (87) Yris: Ou trocar as cor também.

(...)

90

terem um feedback imediato do desenvolvimento da lógica de programação, possibilitando

compreender que um problema pode ser resolvido de várias maneiras, não existindo um certo

e nem um errado na linguagem de programação.

Por fim, a P10 almejava descobrir se, por meio das oficinas, os estudantes tornaram-se

mais criativos. Vejamos o trecho a seguir:

A partir dessa última questão, logo de início, a turma responde em coro: “Sim” (turno

89), ficando nítido que os estudantes ampliaram a forma de pensamento, enxergando novas

possibilidades para criar.

Iuri, ao falar: “Porque a gente tá aprendendo mais coisas” (turno 91), demonstra

acreditar que o espaço de programação oportuniza o aprendizado de coisas que vão além do

cotidiano, além de, implicitamente, estar mencionando que a criatividade está relacionada aos

desafios que foram enfrentando e avançando no decorrer das oficinas, bem como, a liberdade

de poder construir caminhos e respostas para os próprios problemas. Também, quando Aline

infere: “Eu acho que, pra mim era algo muito novo, diferente do meu normal, e daí quando eu

comecei a vê, a fazê as coisas, eu me dediquei mais no estudo, pensá mais pra fazê as coisas

assim” (turno 93), observamos que as oficinas de programação estão auxiliando-a a aprimorar

sua habilidade para a criatividade, pois o tempo que ela participa do projeto é dedicado para

imaginar, criar, compartilhar e refletir, fazendo menção ao Espiral do Pensamento Criativo de

Resnick, apresentado na parte teórica do trabalho.

Antes de partir para a análise seguinte, destacamos que o Grupo Focal 2 foi mais

acelerado e com bem menos tempo de duração, com respostas objetivas, em virtude do

desafio concretizado antes, pois o pesquisador havia dito que iria revelar no grupo vencedor

no final da aula. E, sendo assim, os estudantes mostraram-se apreensivos e ainda eufóricos

para saber o resultado, uma vez que o desafio do semáforo, foi muito motivador para os

estudantes.

(...) (88) Pesquisador: (...) e a outra pergunta é, o que vocês acham, se tornaram mais criativos depois que

começaram a fazer a programação? Vocês acham que começaram a ser mais criativos? (89) Estudantes: Sim ((balançando a cabeça afirmativamente)). (90) Pesquisador: Por que que vocês acham que ficaram mais criativos? ((silêncio)). (91) Iuri: Porque a gente tá aprendendo mais coisas /.../ (92) Pesquisador: Boooa... Tem mais conteúdo, daí consegue mais combinações. Isso né. Alguém tem uma

outra opinião, o porquê que acha que se tornou mais criativo? ((silêncio)). (93) Aline: Eu acho que, pra mim era algo muito novo, diferente do meu normal, e daí quando eu comecei a

vê, a fazê as coisas, eu me dediquei mais no estudo, pensá mais pra fazê as coisas assim. (94) Pesquisador: Tu viu que tinha outro universo, outras coisas, outras combinações né. (95) Aline: ((balançando a cabeça afirmativamente)). (...)

91

3ª Análise – Geral Oficinas: nesta parte, faremos uma retomada dos 2 Grupos Focais

anteriores, a fim de comparar se as oficinas de programação de computadores influenciou os

estudantes na potencialização da criatividade, através do FLOW.

Na P1 dos Grupos Focais, constatamos que os sujeitos foram se motivando no decorrer

das oficinas, como mostra nos gráficos já analisados, além das respostas obtidas nos Grupos

Focais.

Na P2, observamos que, somente o estudante Iuri escolheu o projeto por uma

motivação intrínseca, por ter metas claras e já mostrar que possui uma relação com o âmbito

tecnológico, conforme reitera nas demais perguntas. Apesar do restante do grupo adentrar no

projeto por meio da motivação extrínseca, estavam satisfeitos com os desafios.

Na P3 e P4, os estudantes passaram a ter uma percepção diferenciada sobre a

importância do projeto para a escola, visto que sua visão ampliou-se para além da escola, bem

como, que a linguagem de programação de computadores se constitui como potencializadora

do poder criativo. Nesse sentido, eles veem as oficinas como um espaço de aprendizagem, no

qual a criatividade pode ser desenvolvida nos desafios propostos.

Na P5, todos os estudantes afirmam que quando estavam nas oficinas, perdiam a

noção temporal, e anda inferiram que quando executam atividades que gostam, o tempo passa

de modo mais acelerado, oferecendo indícios da existência de uma das características do

FLOW – Distorção da experiência temporal – o que significa que, quando estamos em estado

de FLOW, em virtude da atenção mergulhar em uma concentração profunda, perdemos a

noção de tempo, pois o que permanece é a sensação da experiência e não o tempo que ela

durou ou vai durar.

Na P6, a importância do celular e do computador no cotidiano dos sujeitos, está

relacionada a todos os aspectos da vida, seja no ensino, no trabalho, ou como uma ferramenta

de entretenimento, e isso, mostra que cada vez mais a linguagem de programação necessita

ser incorporada no currículo escolares, com vistas a habilitar os estudantes para criarem

soluções para problemas em todas as áreas.

Na P7, apesar de os estudantes apresentarem dificuldades de conceituar a palavra

criatividade, eles exemplificam a partir do que sabem, do seu conhecimento espontâneo,

citando o pensamento – pensar e criar algo que não existe. Isso é comprovado nos estudos de

Guilford, nos quais a criatividade está conexa ao pensamento convergente e divergente, ou

seja, criar opções e fazer escolhas.

92

Na P8, em ambos os Grupos Focais, não obtivemos êxito, e conjecturamos que os

estudantes não souberam responder ao pesquisador por falta de conhecimento ou também,

pela incompreensão da questão, já que mesmo na P7, não se apresentaram muitas respostas.

Na P9, ao programarem, os estudantes acreditam que as respostas dos desafios são

diferentes, em virtude de cada sujeito ser único e ter um jeito para realizar as tarefas. Isso

reforça que, na linguagem de programação, não existe uma resposta certa para um

determinado problema, pois podemos pensar diferente para as mesmas soluções.

Na P10, em relação ao Grupo Focal 1 e 2, os estudantes presumem terem se tornado

mais criativos, isto é, ao programar, eles têm um espaço para novas aprendizagens, que os

mobilizam através de desafios, fazendo com que se engajem ao entrar em estado de FLOW,

ampliando sua capacidade de criar algo.

A partir dessas considerações, podemos inferir que os sujeitos sentiram-se motivados e

desafiados nas oficinas de programação de computadores, porém, os resultados não foram tão

satisfatórios como esperávamos, devido às interrupções nos momentos em que eles estavam

no auge da experiência de FLOW.

93

7. CONCLUSÃO

Falamos da palavra “tecnologia” o tempo todo, em todo o lugar e para quase todos os

sujeitos, entretanto muitos desconhecem a amplitude deste universo. O conhecimento das

tecnologias da informação, de modo especial a programação, tem presença garantida em

qualquer projeção que se realize do futuro.

Com esta pesquisa tínhamos o objetivo de compreender qual o impacto da

programação de computadores na instituição escolar, a fim de potencializar o

desenvolvimento da criatividade (habilidade socioemocional do século XXI) em estudantes

do Ensino Fundamental através do FLOW.

Delineando o caminho percorrido, primeiramente discorremos sobre a criatividade

como uma das habilidades socioemocionais do século XXI, considerada como essencial para

sujeitos que almejam atingir sucesso em suas vidas. Um indivíduo criativo é alguém que sabe

resolver problemas e, diante disso, cada vez mais, tal característica é procurada para

preencher as vagas de emprego na sociedade. Nesta seção, ainda abordamos sobre o Teste de

Criatividade Figural Infantil (TCFI), criado com base no estudo de Torrance em relação ao

teste de criatividade – Torrance Tests of Creative Thinking (TTCT), sendo portanto, uma

versão brasileira do mesmo.

Na sequência, discutimos sobre a Teoria do FLOW como aspecto potencializador da

criatividade. Tal conceito foi proposto pelo professor de psicologia Mihaly Csikszentmihalyi,

referindo-se a um estado mental atingido quando se está totalmente envolvido em uma

atividade, isto é, a experiência de estarmos completamente imersos em uma atividade,

expandindo os limites do corpo e da mente para realizarmos algo que é, ao mesmo tempo,

desafiador e recompensador. Nesta seção, também realizamos uma busca pelo âmbito

acadêmico, para ver se existiam produções próximas à temática da presente pesquisa.

Com isso, seguimos apresentando a programação de computadores como uma

ferramenta escolar, dedicando-nos aos estudos de Seymour Papert, um dos maiores

excêntricos do uso da tecnologia na educação, conhecido como o “pai” da informática

educativa e mestre da lógica construcionista, e às investigações de Mitchel Resnick, seguidor

da teoria do construcionismo de Papert, o qual procura unir criatividade e aprendizagem

utilizando a linguagem de programação gráfica e visual Scratch.

94

Como procedimentos metodológicos, além da pesquisa ser de natureza bibliográfica,

ela se compõe como um estudo qualitativo, por tratar das relações e comportamento

humanos. A pesquisa foi desenvolvida dentro do Projeto Letramento em Programação do

Instituto Ayrton Senna. No nosso caso, a investigação empírica ocorreu na EMEF Professora

Helena Salton, com 12 estudantes do 6º ano.

Utilizamos dois instrumentos de coleta de dados: o ESM, para compreender o nível de

engajamento instantâneo dos estudantes, amostragem coletada individualmente a cada 30

minutos de oficina, durante quatro momentos (M0, M1, M2, M3); e o Grupo Focal,

realizando um na primeira e outro na quinta oficina de programação de computadores.

A análise de resultados foi dividida da seguinte forma: 1ª Análise – Individual

Oficinas; 2ª Análise – Grupos Focais; 3ª Análise – Geral das Oficinas. Sendo assim, para o

ESM, tabulamos os dados e fizemos uma análise estatística em cada uma das oficinas, dos

estudantes em geral. Para o Grupo Focal, utilizamos o método da análise de discurso, ou

análise de conteúdo, que utiliza procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do

conteúdo das mensagens, tendo como finalidade ultrapassar as incertezas e enriquecer a

leitura dos dados coletados.

Conforme o problema de investigação, constatamos que ele foi respondido,

entretanto, não na intensidade que esperávamos, em virtude das limitações percebidas na

pesquisa empírica, que será comentada posteriormente. Citamos assim, algumas das

estratégias de aprendizagem deflagradas no uso da programação de computadores, com vistas

a potencializar a criatividade dos estudantes, através do FLOW: lançar desafios aos sujeitos,

já que se sentem mais motivados e engajados ao programarem algo que advém do seu

cotidiano, que faz sentido/parte do mundo concreto, ou seja, é atingindo o estado de FLOW,

que os estudantes conseguem criar soluções quando são desafiados; o trabalho coletivo é

fundamental para a aprendizagem, bem como, para chegar ao equilíbrio entre o pensamento

convergente e divergente, visto que um colabora com o outro na resolução de desafios e, é

através das ideias compartilhadas que os estudantes conseguem avançar na atividade

proposta.

Neste sentido, comprovamos que, nas circunstâncias em que os estudantes são

desafiados, sentem-se mais motivados, em virtude de terem a oportunidade de utilizar sua

imaginação para criar suas próprias respostas, não sendo decoradas e, sim, construídas. É

nesse momento que rememoramos os princípios básicos da Teoria do FLOW: feedback –

saber se o sujeito está indo para o lugar certo; metas claras – ter um desafio para ser

95

resolvido; autocontrole – conseguir chegar onde se quer, sem depender totalmente do outro.

De acordo com a análise estatística do ESM, os estudantes se desmotivavam em

alguns momentos, devido aos problemas técnicos de conexão de internet e, isso, resultou na

dificuldade de fazer uma análise individual dos sujeitos, visto que alguns perdiam o projeto

que estavam desenvolvendo (Scratch online) e o pesquisador e a professora ficavam

auxiliando o grupo para restaurarem o sinal e conseguir dar continuidade à tarefa.

Como falha metodológica, apontamos a realização do desafio do funcionamento do

semáforo (levado pelo pesquisador) no mesmo dia do Grupo Focal (OF5), gerando

expectativas para saber o vencedor e, isso, fez com que a turma ficasse ansiosa e não

respondesse as perguntas com aprofundamento, reduzindo o tempo da “conversa” pela

metade do outro, feito na primeira oficina (OF1). Por demonstrarem-se engajados na

resolução do desafio proposto, permaneceram comentando, entusiasmados, sobre as possíveis

soluções que poderiam ter aplicado no momento da atividade.

Para pesquisas futuras, realçamos a importância do registro videogravado e escrito de

cada oficina com o conteúdo desenvolvido, com vistas a detectar todas as nuances,

expressões, sentimentos, movimentos, necessidades, etc. Além disso, o contato com a turma

foi restrito aos 5 encontros, sendo imprescindível a utilização de mais instrumentos de coleta

de informações, como por exemplo, um questionário do nível socioeconômico dos

estudantes, bem como, a aplicação do Teste de Criatividade Figural Infantil – TCFI, antes de

iniciar o projeto e no término deste.

Em virtude dos estudantes serem iniciantes do Projeto Letramento em Programação

(1º Módulo), sugerimos ainda, maior quantidade de acompanhamento das oficinas, pois nesta

investigação participamos apenas de 5 encontros. Para melhor explicar, neste primeiro

momento, devido aos sujeitos estarem começando, ainda aprendem mais conceitos de

comandos para a utilização da linguagem de programação Scratch e, demoram um pouco

mais para desenvolverem projetos mais desafiadores.

Ao nosso ver, o ideal para a pesquisa ficar mais consistente e atingir um nível de

resultados mais satisfatórios, seria o acompanhamento de no mínimo 8 oficinas ou até

mesmo, um estudo de alcance longitudinal. Ou seja, como vimos, na análise dos dados,

quando os estudantes estavam iniciando a programar de fato e mostravam-se motivados na

execução das tarefas, o tempo da pesquisa terminou. Eles deixavam transparecer a

necessidade de mais desafios nas atividades e, com certeza, potencial não lhes faltava, aliás,

era uma turma muita engajada e com muita vontade de aprender a criar.

96

Como percebemos nos relatos dos estudantes, durante os Grupos Focais, quando estão

participando das oficinas de programação de computadores, o tempo passa mais rápido em

relação às disciplinas do currículo. E, neste sentido, além das oficinas, consideramos

relevante a aplicação do ESM nas outras áreas do conhecimento, já que são tão importantes

quanto aprender a programar no computador. Para um posterior estudo, torna-se proeminente

compreender a necessidade de incorporar ferramentas tecnológicas para elevar o nível de

engajamento dos estudantes, nas disciplinas presentes na grade curricular.

Para finalizar esta discussão, acreditamos que a inserção do ensino de programação

nos níveis da Educação Básica pode ser articulada nas diversas áreas do conhecimento, de

maneira interdisciplinar, ganhando a visibilidade de uma ferramenta que mobiliza o sujeito à

reflexão crítica, o raciocínio lógico, a desenvoltura na resolução de problemas simples e

complexos, a interpretação do problema, o trabalho coletivo, e a curiosidade. Logo, a

introdução da programação, na grade curricular das escolas, terá um efeito demasiado no

processo de construção do conhecimento.

97

8. REFERÊNCIAS

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caminho para a aprendizagem e o sucesso escolar de alunos da educação básica. São

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101

9. ANEXOS

Anexo I

ESM: Experience Sampling Method24

24 Nas oficinas de programação de computadores, os estudantes preencheram esta Amostragem de

Experiência de modo completo, porém, pelo limite de tempo e para atingirmos um nível satisfatório na presente

pesquisa, optamos por analisar somente a primeira parte: feliz e triste; fraco e forte; passivo e ativo; motivado e

entediado. Os demais fatores marcados podem ser utilizados em projetos futuros.

102

Anexo II

Perguntas para o momento do Grupo Focal:

P1 - Vocês estão gostando de fazer parte do projeto de programação de computadores,

aliado ao projeto de letramento? Por quê?

P2 - O que levou vocês a escolher participar do projeto? Qual foi a motivação?

P3 - Qual é a importância desse projeto para a vida escolar?

P4 – Qual é a importância desse projeto para a vida pessoal?

P5 - Quando vocês estão participando das aulas de programação, qual é a noção da

velocidade do tempo? A aula passa lentamente ou rapidamente?

P6 - Qual é a importância do computador e do celular no dia-a-dia das pessoas?

P7- Como definir a palavra criatividade; o que significa ser uma pessoa criativa?

P8 - Quais são as características de uma pessoa que resolve problemas? Exemplifique.

P9 - No momento em que vocês são desafiados a resolver uma tarefa na programação,

as respostas para a solução do problema são iguais? Por quê? Exemplifique.

P10 - Você acredita que se tornou mais criativo(a) depois que começou a utilizar a

programação de computadores?

103

Anexo III

Cronograma – Pesquisa de Campo:

Data Dia da

semana

Período /

Tempo

Atividades

25/04/2017 Terça - Feira Manhã /

10:00 às 11:30

- Apresentação do pesquisador

- Grupo Focal - aproximadamente 25

minutos

02/05/2017 Terça - Feira Manhã /

10:00 às 11:30

- Início da oficina de programação -

aproximadamente 90 minutos

- Aplicação do questionário ESM

Início: Momento 0 – Momento 30

min – Momento 60 min –

Momento 90 min (final) da oficina

de programação

09/05/2017 Terça – Feira Manhã /

10:00 às 11:30

- Início da oficina de programação -

aproximadamente 90 minutos

- Aplicação do questionário ESM

Início: Momento 0 – Momento 30

min – Momento 60 min –

Momento 90 min (final) da oficina

de programação

16/05/2017 Terça – Feira Manhã /

10:00 às 11:30

- Início da oficina de programação -

aproximadamente 90 minutos

- Aplicação do questionário ESM

Início: Momento 0 – Momento 30

min – Momento 60 min –

Momento 90 min (final) da oficina

de programação

23/05/2017 Terça – Feira Manhã /

10:00 às 11:30

- Desafio da programação do semáforo

- Grupo Focal - aproximadamente 25

minutos

Início: Momento 0 – Momento 30

min – Momento 60 min –

Momento 90 min (final) da oficina

de programação

Siglas:

ESM: Experience Sampling Method

Responsáveis:

Oficina de Programação de computadores - Desiré de Meira

Grupo Focal e ESM – Anderson Ferreira Bueno

104

Anexo IV

Transcrição do Grupo focal – 25/04/2017 - 29min 36s (OF1) (1) Pesquisador: Bom, agora a gente vai fazer uma conversa e também eu vou fazer umas perguntas e vocês me

respondem, quando se sentirem a vontade pra participar, bem tranquilo. É só uma conversa, onde fala quem

quer e quando quer. Realmente, pra mim conhecer mais vocês e o que vocês estão aprendendo. Então, vocês já

começaram a programar, ou ainda não? ((olhando para a folha)). (2) Carla: A gente jogou um jogo/ (3) Douglas: Só jogamo uns joguinho lá, que /.../ (4) Pesquisador: Ah, no Scratch, do gatinho? É né? (5) Estudantes: Não! É no Code. (6) Pesquisador: Ah, é outro então. Mas vocês vão chegar lá também. Isso aí a gente aprende lá na faculdade

também pra fazer robótica sabem, pra fazer acender a luz, a gente usa pra, pode falar/ (7) Douglas: Na páscoa ainda, ããã, na outra ainda, tem um hotel lá, que a gente podia fazê essas robótica,

esses negócio. (8) Pesquisador: Tinha oficina/ (9) Douglas: Eu tenho um robozinho lá. (10) Pesquisador: Capaz? (11) Douglas: Aham ((balança a cabeça afirmativamente)). Ele sai andando por aí ((gesticulando com a mão,

como se o robô estivesse andando)). (12) Pesquisador: Mas era rápido, fácil? (13) Douglas: Éééé, foi mais ou menos, a gente tinha que ir montando as peça, e depois a gente programava

pelo computador ((gesticulando com as mãos a montagem do robô)). (14) Pesquisador: Bááá, que legal! Então, tu gostou já? (15) Douglas: ((balança a cabeça afirmativamente)). (16) Pesquisador: Bá, eu gosto de fazer isso, é uma área legal. Eu tenho umas placas lá e quero ver se eu trago

pra mostrar pra vocês também. Sabem o semáforo, a sinaleira, que tem a luz vermelha, a verde e a amarela? (17) Estudantes: ((balançam a cabeça afirmativamente)). (18) Pesquisador: Aquilo ali alguém tem programar sabe, do que ir lá e falar que ele tem que piscar né. Ele

não faz isso sozinho. (19) Iuri: Eu pensava que era automático. (20) Pesquisador: Ele é automático, mas depois alguém tem que fazer ele ficar automático. Eu vou trazer pra

vocês e vão achar legal, aí alguém vai me ajudar a programar, aí eu vou mostrar. (...). Ó, nós podemos criar um

canal também, no youtube. (21) Iuri: Eu tenho uns três já. Até o meu amigo tem. (22) Alguns estudantes: (falas paralelas). (23) Pesquisador: É, bem tranquilo. Até eu pedi, eu pedi pra prô não ficar junto, porque daí a gente pode falar

o que a gente quiser né. A gente não precisa, é eu também tenho medo, eu olho às vezes pra prô, bá eu também

penso, será que vou falar alguma coisa. (24) Alguns estudantes: ((risos discretos)). (25) Pesquisador: Então, ela não (es)tando aqui, a gente pode falar melhor né... Então assim ó, o que eu tenho

pra perguntar pra vocês assim. Esse projeto de programação vocês iniciaram quando, esse ano? (26) Alguns estudantes: Aham. (27) Pesquisador: Iniciaram esse ano. Tá, ããã, uma pergunta que eu queria saber... ((olhando para a folha)). Se

vocês (es)tão gostando ou não (es)tão gostando. Por que ele é novo na escola né? (28) Carina: É/ ((tom de voz baixo)). (29) Aline: ((balança a cabeça afirmativamente)). (30) Nilva: (inaudível) (31) Iuri: Mais ou menos, só tem que ficá fazendo aqueles joguinho repetitivo. (32) Nilva: ((riso discreto)). (33) Pesquisador: Sim... Então, precisava de outras coisas também? (34) Iuri: ((balança a cabeça afirmativamente)). (35) Pesquisador: Tá, alguém mais tem alguma ideia se tá gostando ou não?... Ele disse que acha que tinha que

ter mais coisas né? (36) Iuri: Ééé/ (37) Douglas: É, programar /.../ ((tom de voz baixo)). (38) Iuri: Ééé, a prô disse que a gente tá programando, mas é só colocá direita e esquerda ((erguendo os

ombros)).

105

(39) Pesquisador: Sim, mas vocês vão evoluir... Tá, e outra coisa que eu queria saber, como é que vocês

chegaram aqui, pra fazer isso aqui, através de quem, como que vocês chegaram aqui pra participar do projeto.

Qual que foi a motivação assim? (40) Iuri: Eu quero aprendê a fazê robô/ (41) Aline: Bom, na verdade, quem convidô a gente foi a Diana, na reunião de pais, eu acho que era. E daí

como já tinha uns pais de alguns alunos do... Enfim, do pessoal que já fazia o curso aí eles fizeram uma

apresentação sobre o que era o projeto e apresentou pra gente e aí a gente concluiu se a gente queria ou não

fazê o projeto. (42) Pesquisador: Ahhh, então não foi eles que, então foi decisão de vocês mesmos então? (43) Aline: É ((balançando a cabeça afirmativamente)). (44) Carla: É ((riso discreto)). (45) Pesquisador: Cada um, então tinha quantos mais ou menos lá na plateia? (46) Aline: De alunos? De alunos, eu acho que só tinha eu e a Yris ((riso discreto)). (47) Pesquisador: É, mas tava aberto, é aberto pra escola, pra alunos, pra turma de vocês todos? Vocês são

quantos na turma? (48) Alguns estudantes: Dezenove. (49) Pesquisador: Alguém mais quer falar o porquê que entrou? ((silêncio prolongado)). (50) Carla: Huuuum. A minha prima/ (51) Pesquisador: Pode falar! (52) Carla: Ela tava no sexto ano e ela fazia o curso com a prô Diana eeee ((gesticulando com as mãos)), e daí

ela fazia o curso e falava que era legal e agora ela passô pro sétimo ano e tá fazendo mesmo assim. E daí, eu

pensei que ia sê legal e daí eu vim. (53) Pesquisador: Ah legal! É interessante, porque vocês veem que cada um tem motivo né, vem pra alguma

coisa. Você ia falar o porquê que/ ((apontando para o Douglas)). (54) Douglas: Eu vim porque eu gosto de fazê essas coisinhas, eu gosto de mexê em computador. (55) Pesquisador: É... Eu por exemplo, assim, quando eu quis fazer a faculdade de programação né, em

computador, pra mexer é porque lá também, na idade de vocês eu sempre olhava o computador e naquela época

não tinha muito né, mas eu sempre olhava e tinha curiosidade de mexer né, como é que funcionava e por isso

que hoje eu tô aqui também, praaaa cada vez melhorar nas tecnologias... Outra coisa que eu queria saber de

vocês, por que que vocês acham ou, se não acham importante esse projeto? ((olhando para a folha)). Vocês

acham que ele é importante pra escola? (56) Iuri: Acho que sim. (57) Pesquisador: A maioria acha que sim? (58) Alguns estudantes: Sim ((balançando a cabeça afirmativamente). (59) Pesquisador: Vocês saberiam me dizer o porquê que vocês acham que é legal? (60) Iuri: Pras pessoas serem mais evoluídas /.../ (61) Augusto: Pra gente também não ficá sempre na mesma coisa assim, de caderno e essas coisa assim.

Aprendê além da, além do, do ensino, tipo de matemá(tica), não, tipoooo de livro ((tira a mão do bolso do

casaco, gesticula e coloca novamente a mão no bolso)), essas coisa/ (62) Pesquisador: Sim, do normal, do dia-a-dia, uma coisa diferente. (63) Augusto: É. (64) Pesquisador: Por que as outras matérias são tudo um padrão. Isso! Também, legal. Alguém mais?

((silêncio prolongado)). Deixa eu perguntar pra vocês também... E, pra vida pessoal de vocês, por que vocês

acham que, isso vai mudar na vida de vocês, ou não? (65) Douglas: Depende. Se a gente aprendê a mexê em computador e usá essas coisas, eu acho ((balançando a

cabeça)). (66) Aline: Ou até mesmo pra melhorá o estudo, por exemplo, se a pessoa tira nota baixa, ela começa a mexê,

começa a pensá mais ((gesticula com a mão)) e consegue se concentrá mais nos estudos. Eu acho que pode

mudá. (67) Pesquisador: Tem bastante recurso né, de pesquisa... Tá, isso aí ajuda. Gostariam de falá alguma coisa

aqui, ou não?... ((direcionando-se para as demais estudantes)). Ôpa, fiquem tranquilos, não é, aqui é assim. não

existe um certo e nem um errado, não é isso. É pra mim entender mesmo o que vocês pensam e o que acontece,

porque como é a primeira vez que eu tô aqui, eu não conheço ninguém sabe. Que nem a professora Diana já

conhece vocês, cada um... Então como eu não conheço, é por isso que tô fazendo essas perguntas, pra mim

saber. Até... Vocês moram todos ao redor da escola ou perto daqui ou alguém mais longe? (68) Alguns estudantes: (falas paralelas). Eu moro perto; Mais ou menos; Bem pertinho; Eu também... (69) Pesquisador: Tudo perto... É, mais pra entender mesmo a escola de vocês, porque cada escola é diferente

né... Então, a prô Diana falou muito bem de vocês, disse que vocês são dez, então por isso que a gente decidiu

fazer aqui. Ah, eu vou fazer com eles lá e agradeço por vocês (es)tarem me ajudando hein... Deixa eu fazer

106

outra, outra pergunta pra vocês... ((olhando para a folha)). Quando vocês tão naaaa, vocês não começaram a

programá ainda né? Vai ser legal a hora que vocês começarem a programá, vocês vão vê. (70) Douglas: ((balança a cabeça, expressando dúvida)). (71) Pesquisador: Mas nessas aulas assim, em relação às outras aulas, que nem ele comentou, como é que é teu

nome mesmo? (72) Augusto: ((rosto com expressão fechada, testa franzida e com as mãos no bolso)). (73) Pesquisador: Que nem tu comentou que nas outras matérias, matemática, português. Vocês acham que

essa aqui que vocês tão fazendo, o tempo passa rápido, ou o tempo passa mais devagar? Qual é a sensação

assim, em relação quando vocês tão nas outras aulas? (74) Augusto: Passa mais rápida ((tira uma mão do bolso e coça a cabeça)). (75) Iuri: Passa mais rápido, porque a gente se diverte ((gesticulando com as mãos)). E, eu gosto de

informática, por causa queeee eu tenho um tio que ele faz tudo essas coisa aí, de editá vídeo, daí, às vez em

quando que eu vô na casa da minha vó, ele mora na frente, eu vô lá e fico lá com ele, vendo ele editá... (76) Pesquisador: Siiim. Vocês também concordam? Ou acham que não passa rápido? (77) Estudantes: ((silêncio)). (78) Aline: Mais ou menos ((tom de voz baixo)). (79) Pesquisador: Ou devagar, ou tanto faz, ou é a mesma coisa queeee das outras matérias? (80) Douglas: Parece que tipo, as coisa que a gente gosta passa rápido. (81) Pesquisador: Sim. Verdade. (82) Iuri: Se não tem desafio, é mais devagar ((com tom de voz baixo)). (83) Pesquisador: Verdade. Vocês também acham?... Ou não, ou acham que é mesma coisa? ((silêncio

prolongado)). Ou não deu pra notá ainda porque não deu tempo? ((silêncio prolongado)). Então, eu vou passar

pra próxima, mas já deu pra ter uma noção do que, do que vocês acham sobre o tempo. Porque ela é uma

matéria diferente das outras né, totalmente diferente. Ainda mais com tecnologia, a gente gosta né de tá

mexendo com computador. Mas a gente precisa, que nem você disse ((apontando para Iuri)), de desafio né? (84) Iuri: ((balança a cabeça afirmativamente)). (85) Pesquisador: A gente precisa de algo, que a gente começa a criar. É que nem vocês viram hoje, no

desenho... Vocês foram desafiados pra, pra criar né. Então, no computador, daqui pra frente vocês vão ser

desafiados bastante, pra criar bastante coisa... Ããã, que queria ver a respeito do, do celular, todo mundo

conhece celular aqui? (86) Estudantes: Siiim ((em coro e risos discretos)). (87) Pesquisador: ((ri)). Ainda bem, eu pensei que todo mundo não conhecia, mas eu tenho que perguntá né, se

alguém não conhece, tudo bem também. Computador? (88) Estudantes: Sim ((em coro)). (89) Iuri: Inclusive, o HD do meu queimô. (90) Pesquisador: Báá, que azar. (91) Síntia: Que azar ((ri)). (92) Pesquisador: Tem que arrumar né. Ããã... Sobre o celular, o computador assim, ããã, vocês acham que é

importante no dia-a-dia das pessoas ou não? (93) Douglas: Eu acho que sim/ (94) Iuri: Tem uns programa de celular que passa tempo /.../ (95) Douglas: Tipo, tipo, os que trabalham, tipo que tem um ((gesticulando com as mãos)), tipo o meu pai... Ele

sai vendê, ele sai, daí o pai tem empresa sabe, daí ele fala, tipo assim, se tem que ir num lugar, daí a

funcionária lá fala pra ele pelo whats... É bom. (96) Aline: Acho queee facilitô metade da vida, de tudo que a gente precisa fazê. (97) Pesquisador: Pra comunicação né. (98) Augusto: A plataforma youtube, eu descobri que além dela deixa você fazê vídeos, ela te dá tipo, trabalho

pra você, porque tem gente que ganha, tipo, bastante dinheiro em dólar no youtube. (99) Iuri: Apesar do youtube tá passando a crise agora. (100) Pesquisador: É, na verdade, é diversão, é trabalho que nem você disse, é, dá pra ganhar dinheiro também

né... Então, a tecnologia dá pra ser utilizada de várias formas né. Que nem você gosta bastante pra trabalho,

pra diversão. Quem que usa pra trabalho aqui, agora, hoje? ((silêncio)). (101) Iuri: A gente não ganha dinheiro, uso mais pra diversão mesmo, pro canal /.../ (102) Pesquisador: Pra diversão. A ideia é isso aí, a gente conhecer cada vez mais, pra no futuro trabalhar, pra

fazer novas soluções pra problemas né. Porque cada vez tu vê, tu olha assim, pra fazer uma pesquisa, tem uma

monte de soluções pra um monte de coisa né, o pessoal cria pra tecnologia né. Mas, então vocês acham que é

importante? (103) Estudantes: ((balançam a cabeça afirmativamente)). (104) Iuri: Sim.

107

(105) Pesquisador: Então tá bom... Outra coisa que hoje a gente fez, você fizeram um desenho e depois só eu

vou olhar né. Queria ver com vocês sobre criatividade ((olhando para a folha)). Vocês sabem o que significa

criatividade? (106) Iuri: Sim. (107) Pesquisador: Sabem? (108) Iuri: Ããã, tipo teu pensamento, é tu pensá em alguma coisa que não existe ainda, fazê acontecê alguma

coisa que não existe. (109) Douglas: Imaginação/ (110) Iuri: Desenho. (111) Pesquisador: Claro... Alguém mais? ((silêncio prolongado)). O que vocês acham que é, o que é ser uma

pessoa, que é bom ser criativo hoje em dia ou não? (112) Iuri: É bom. (113) Douglas: Ééé ((balança a cabeça afirmativamente)). (114) Aline: É que tem as críticas, mas é muito bom ser criativo sim/ (115) Iuri: É que, quem é criativo sempre acaba na frente dos outros. (116) Pesquisador: É vantagem/ ((balança a cabeça afirmativamente)). (117) Iuri: É não copiá. (118) Pesquisador: A criatividade... Vocês acham que é bom então? (119) Alguns estudantes: ((balançam a cabeça afirmativamente)). (120) Pesquisador: Claro, a gente ser inteligente é bom, mas ser criativo também, também é bom ou não? (121) Aline e Iuri: Sim. (122) Pesquisador: Sim. E o que vocês acham que é uma característica de uma pessoa criativa assim?... (123) Iuri: Se diferenciá das outras... Maneira de pensá. (124) Pesquisador: É o que vocês fizeram hoje nos desenhos né. Vocês acham que os desenhos foram todos

iguais ou não? (125) Alguns estudantes: Não. (126) Pesquisador: Vocês olharam um do outro, ou não? (127) Síntia e Iuri: ((balançam a cabeça negativamente)). (128) Pesquisador: Não era pra olhar hein. (129) Síntia: ((ri)). (130) Douglas: ((olha para o lado e fala algo)) (inaudível). (131) Pesquisador: Não, tô brincando, só pra saber ((ri)). (132) Iuri: Eu olhei, mas daí eu fiz diferente. (133) Augusto: Eu não vi, mas tavam olhando meu desenho ((com a expressão fechada e com as mãos no

bolso)). (134) Iuri: Ela falô alto /.../ quando eu te chamei ((olhando para a colega Aline). (135) Nilva: Ah, é verdade... (136) Pesquisador: Então vocês veem, cada um pensa de uma forma né, e foi o que eu falei, não existe o que é

certo e errado. Então... pra criatividade, não existe um certo e nem um errado né, cada um faz do seu jeito, é

essa a ideia... Ããã ((olhando para a folha)), deixa eu ver outra coisa aqui pra vocês, pra mim saber... Então,

como a gente falou, ããã, criatividade serve pra resolver problemas né, a gente, ah, tu tem um problema, vamos

pensar um problema junto aê... Aãã, me ajudem agora, vamos pensar junto num problema. Eu tenho que,

alguém conhece lá o shopping, o Bella? (137) Estudantes: Sim. (138) Pesquisador: Todo mundo conhece o shopping. Tá, então vamos pegar ele de exemplo. Deixa eu pensá.

Tá, nós temos que ir lá. Todo mundo tem que ir agora lá, tá. (139) Estudantes: ((riem discretamente, mostrando estarem gostando da ideia)). (140) Pesquisador: Ããã, a missão que eu dou pra vocês hoje, é chegar lá, tá... Agora, eu pergunto pra vocês,

existe só um caminho pra gente chegar lá? ((gesticulando com o braço)). (141) Estudantes: Não ((em coro e balançando a cabeça negativamente)). (142) Pesquisador: Se a gente for até lá, será que todos vão pelo mesmo caminho? (143) Alguns estudantes: Não. (144) Iuri: Uns vão querê i pelo caminho mais curto, outros, pelo mais longo... Eu quero o mais curto ((ri)). (145) Pesquisador: Então, a gente tem um problema, qual é o meu problema? É tá lá. Se eu tenho aula lá tá,

como a gente resolve esse problema? (...) Neste momento, os estudantes começam a se pronunciar, dando exemplos de como podem chegar até o

Shopping. Eles vão interagindo e começam a ficar empolgados com a proposta e, assim, vão lançando respostas

diferentes e inusitadas (esta conversa perdura no tempo de 13:37 até 17:43).

108

(146) Pesquisador: Então assim, tudo o que vocês falaram assim, é... Tudo isso a gente, tudo isso é

criatividade, porque assim ó, que nem eu falei no início ali, a gente tem um problema, que era chegar lá no

Shopping pra... compra jogo. Vocês conhecem lá a loja de jogo? (147) Estudantes: Sim (falas paralelas). Eles conversam um pouco sobre os jogos. (148) Pesquisador: Então assim ó, o nosso problema era chegar lá e vocês viram que a gente já arrumou umas

duzentas formas de chegar lá né. (149) Iuri: Dá também pra ligá um ventilador, subí nele e fazê óóó, uma mochila a jato ((imitando o movimento

do voo, com os braços e pernas)). (150) Estudantes: ((risos)). (151) Carla: Aqueles negócio que eu vi, sempre passam por aqui quando tem sol, que tem um balão, daí tem

atrás um motorzinho que é tipo assim, que vai andando e /.../ ((fazendo o movimento com a mão, como se o

objeto estivesse girando)). (152) Iuri: /.../ Pegá e pulá de um prédio, uhuuuu/ (153) Augusto: Eu usaria a tecnologia de uns carros, que eles usam pra flutuá ((fazendo o movimento com a

mão)) e botaria numa cama ((risos)). (154) Síntia: Comprá um tênis de rodinha/ (155) Augusto: (inaudível). (156) Iuri: /.../ Um celular assim, um joguinho, daí tu seguia assim, por trás numa curva ((fazendo o movimento

com o corpo e fazendo um gesto com a mão como se estivesse controlando o objeto)). (157) Douglas: ((imitando o movimento do colega Iuri)). (158) Pesquisador: Agora eu lembrei de um que a gente não falou, que... é bem legal e que ele voa ((fazendo o

movimento com a mão, como se o objeto estivesse voando)). (159) Douglas: Helicóptero? (160) Aline e Iuri: Balão? (161) Augusto: Drone? (162) Pesquisador: Drooone. (163) Iuri: Ah, mas é que o drone é muito caro. (164) Douglas: Se pendurá no drone, assim ó, com uma cordinha e saí assim, ruuum ((balançando o corpo como

se estivesse dirigindo)). (165) Pesquisador: Alguém já mexeu com drone aqui, ou não? (166) Alguns estudantes: Não. (167) Aline: Eu tentei mexê uma vez, só que não deu certo/ (168) Iuri: ((risos)). Quase quebrô tudo hã? (169) Aline: Sim. (170) Douglas: Eu nunca, eu nunca/ (171) Iuri: /.../ o drone, daí tu pode saí xiiiiiiu ((gesticulando com o braço)). (172) Pesquisador: Então assim ó, o que eu queria falar pra vocês, com relação à criatividade que a gente tava

conversando, é bem isso aí, a gente tem um problema, pra nós chegar lá, não importa se um vai de espaçonave,

se um vai de skate, se o outro vai de balão, não interessa... Chegando lá, ganha a bandeirinha verde lá, de

território. Entende, se um vai por baixo/ (173) Iuri: Chegando lá, ganha um jogo primeiro, chegando primeiro. Vamo supor, só tem um jogo, vai tê

competição pra quem chegá primeiro. (174) Estudantes: (falas paralelas). (175) Pesquisador: Mas assim ó, deu pra vocês entenderem o que é criatividade agora, um pouquinho? (176) Alguns estudantes: Uhum ((balançando a cabeça afirmativamente)). (177) Pesquisador: Entende. A gente não precisaaa, ããã, ir pelo um caminho só. Ah, eu vou pela avenida aqui e

vou chegá lá, se quero ir pela BR, ou se eu quero ir por baixo. Cada um faz o caminho que quer e no seu tempo.

Tem uns que vão chegar mais rápido, que tão com pressa e vão na frente e tem uns que vão chegar mais

devagar né? O importante é chegar lá, resolver o problema e cada um vai fazer de uma forma. É que nem no

desenho, cada um fez de uma forma/ (178) Estudantes: (falas paralelas). (179) Pesquisador: E na programação ali do computador, vocês vão ver também que na hora em que vocês

forem desenvolver os projetos, cada um vai fazer de um jeito. A professora vai dar um problema pra vocês ali

né, e cada um vai desenvolver de um jeito. Não existe um certo e um errado. Na matemática, existe um certo e

um errado? (180) Alguns estudantes: Sim. (181) Iuri: Claro que existe, se as contas que tu fazê, se tu fazê dois vezes dois e colocá cinco, tá errado. (182) Estudantes: ((risos)). (183) Pesquisador: É... E, na programação de computadores, existe um certo e um errado? (184) Iuri: Huum, deve existir também.

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(185) Augusto: O computador na verdade é burro, é a gente que faz ele sê inteligente. (186) Estudantes: ((risos)). (187) Douglas: (inaudível) (188) Pesquisador: cada um faz de um jeito né, não existe um certo e um errado. É legal por causa disso né, e a

criatividade é assim também/ (189) Augusto: Nos primeiros computadores, você só podia digitá. (190) Douglas: Eu tenho aqueles lá, que são caixão de abelha ((mostrando o tamanho com as mãos)). (191) Estudantes: ((risos)). (192) Pesquisador: Aí, deixa eu fazê mais duas perguntas aqui pra vocês, daí a gente finaliza. Assim ó...

((olhando para a folha)). Que nem hoje, vocês foram desafiados a fazerem os desenhos né... Vocês viram que as

respostas foram diferentes... Aããã, vocês já me falaram que cada um fez diferente né. Bom, depois eu vou

analisar... Deixa eu ver aqui a próxima pergunta ((olhando para a folha)). ((silêncio prolongado)). Tá, então

essa aqui, pra gente finalizar, pra ver o que vocês acham, depois que vocês começaram, quando vocês

começaram com essas aulas de programação aqui? (193) Augusto: Umas três/ (194) Nilva: Acho que essa é a quarta. (195) Pesquisador: E vai até o final do ano? (196) Carla: Aham, e depois tem o sétimo ano, o oitavo ano, o nono ano... (197) Iuri: Aí tem/ (198) Pesquisador: Ah, então vocês vão passando de fase? (199) Iuri: Sim. Aí tem de programação e também acho que tem uma de criação de games, jogos/ (200) Augusto: Games e jogos é a mesma coisa. (201) Pesquisador: É lá no/ (202) Iuri: Sétimo. /.../ um aplicativo assim ((com o celular na mão)). (203) Pesquisador: Tá, o que eu tenho dúvida assim, eu não participei das outras né, vou começar a partir de

agora que nem eu falei pra vocês. Eu vou vim nessa, só pra vocês entenderem, e aí eu vou vim em mais quatro

aulas aqui com vocês e daí nas outras eu só vou acompanhar. Daí a prô vai dar a tarefa né, e eu só vou vim

junto acompanhar, ver o que ela tá dando de programação, como ela vai dar as aulas né... Mas a minha

pergunta assim, que eu queria saber é, desde que vocês começaram essa matéria aqui, vocês acham que ficaram

mais criativos, ou não? (204) Douglas: Não sei. (205) Augusto: (inaudível). (206) Pesquisador: A partir de hoje, com os desenhos, vocês tão mais criativos depois disso/ (207) Iuri: Tô a mesma coisa ((com uma mão na cabeça, mostrando posicionamento convincente)). (208) Pesquisador: Não, por quê? (209) Leila: Mesma coisa/ (210) Douglas: Mesma coiiiisa ((balançando a cabeça)). (211) Aline: Mas eu já era criativa ((com tom de voz baixo)). (212) Iuri: Por causa que, se tu for criativo, não tem como aumentá o nível /.../ (213) Aline: Às vezes a pessoa só é criativa, sei lá, por exemplo /.../ escrevê um livro /.../ ((gesticula com a

mão)). (214) Douglas: Ou tu fazê uma coisa... /.../ (215) Pesquisador: Sim. (216) Aline: ((comentando algo com o Douglas)); (inaudível). (217) Douglas: Que nem aqueles bicho, que nem aquele home que fizeram /.../ que derreteu tudo. (218) Alguns estudantes: ((risos discretos)). (219) Pesquisador: Criatividade tem/ (220) Iuri: /.../ o potinho da minha mãe. (221) Alguns estudantes: (falas paralelas). (222) Pesquisador: Então vocês veem, criatividade tem em várias áreas né... Tu pode ser criativo no desenho,

tu pode ser criativo num game ((apontando para o estudantes que tinham falado)), tu pode ser criativo,

criatividade não tem limite sabe... Daqui a pouco, eu tava pensando em fazer um, uma espaçonave aí, pra mim

ir pra casa. (223) Alguns estudantes: ((risos)). (224) Pesquisador: Por que que não né? Não é só eu que vou usar ((balançando os ombros)). E, vocês aqui

((direcionando-se para outras estudantes, no intuito de interagir)), vocês acham que... começando a matéria,

vocês acham que ficaram mais criativas, ou não? ((silêncio)). (225) Iuri: Eu acho que a gente que vai tê que usá nossa criatividade, pra ficá mais criativo com o tempo. (226) Pesquisador: Pode ajudar. Mas, no momento, até hoje digamos/ (227) Iuri: Não ((balançando a cabeça negativamente)).

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(228) Pesquisador: A resposta seria? (229) Iuri: Não ((balançando a cabeça negativamente)). (230) Pesquisador: E pra vocês, aqui?... ((direcionando-se para outras estudantes)). O que vocês acham? (231) Carina: Acho que não ((com tom de voz muito baixo)). ((silêncio prolongado)). (232) Pesquisador: Não, mas é isso aí mesmo, que nem eu disse, fala quem quer... Não tem problema. (233) Aline: ((riso discreto)). (234) Iuri: Quem mais falô aqui foi a Aline ((apontando para ela, entretanto, referindo-se às outras colegas)). (235) Alguns estudantes: ((risos)). (236) Nilva: Tu também falô bastante ((apontando para os colegas Douglas e Iuri)). (237) Iuri: Nós três ((apontando para os colegas Aline e Douglas)). (238) Aline: Eu falei mais que /.../ (239) Pesquisador: Ah, mas isso é importante. Até pelo menos pra gente conversar, pra mim conhecer vocês. E,

quando vocês tiverem uma pergunta pra mim também, se eu souber responder, porqueeee, eu vou aprender com

vocês aqui, um monte de coisa né. (240) Síntia: Já criô alguma coisa? (241) Pesquisador: Ã? (242) Síntia: Já criô alguma coisa? (243) Pesquisador: Já, já criei várias coisas. (244) Aline: O que tu mais gosta assim, da parte que você trabalha? (245) Pesquisador: Eu assim ó, o porquê que eu gosto dessa parte de criatividade, de computador, que nem eu

tava falando pra vocês... Porque, quando eu tô fazendo um programa, que nem o facebook. Todo mundo

conhece né? (246) Estudantes: Sim. (247) Pesquisador: Pois é, o facebook fui eu que ajudei a desenvolver. (248) Estudantes: ((silenciam e se olham, com expressão de dúvida)). (249) Pesquisador: Vocês acreditam, ou não? (250) Estudantes: ((risos)). (251) Pesquisador: Não sabem né... Então assim ó, quando a gente tá fazendo a programação de

computadores, quando eu comecei a estudar, pra vocês entenderem... Lá, não existe um certo e um errado, que

nem eu tava falando. O professor, ele dá um... ah, você tem que desenvolver ummmm programa queeee vai

captar áudio ((apontando para a voz)) de vocês né, e vai reconhecer qual que é o rosto naaa, no facebook.

Então, se ele falar o nome dele ((apontando para um estudante)), já vai aparecer pra todo mundo. (...). Então, o

que que acontece, que nem eu tava falando ali pra vocês do facebook, tu pode criar várias coisas e não existe

um certo e um errado. Entende? ((direcionando-se para a estudante Aline, que havia lhe questionado)). (252) Aline: ((balança a cabeça afirmativamente)). (253) Pesquisador: Eu quero trazer pra vocês, se der tempo, ahhh, o mesmo programa que vocês utilizaram, eu

tenho umas placas lá, de robótica, que dá pra criar um monte de coisa, não tem limite, sabe. Então, eu quero ver

se trago pra vocês/ (...) (254) Pesquisador: Mas assim né, que nem a prô falou ali, como vocês já tão no tempo de ir embora né, então

na próxima aula eu vo vim, daí vocês vão me perguntando e eu vou, aí eu termino, explico pra vocês direitinho

do que vocês têm curiosidade, aí eu vou trazer pra ti ver, algumas criações, o que dá pra gente fazer, eu vou/ (255) Iuri: Tu já criô um robô? (256) Pesquisador: Já, já... A gente cria, porque robô pode ser, ah, um elevador queeee, tu olhe pra ele e ele

sabe o andar que tu quer ir. (257) Carla: Nooossa ((rindo)). (258) Nilva: ((risos)). (259) Pesquisador: Éééé, viu, dá pra /.../. (260) Iuri: Não, eu tô falando daqueles robozinho de controle assim ((movimentando o celular, fazendo de

conta que é um controle remoto)). (261) Pesquisador: Sim, lá tem um combate lá na faculdade, no primeiro semestre/ (262) Iuri: Ahhh. (263) Pesquisador: Que tu cria o robô e faz uma lutinha um com o outro/ (264) Iuri: Tem até um negócio da TV que ééé, a batalha deeee robô/ (265) Pesquisador: Isso/ (266) Iuri: /.../ que fica girando lá /.../ ((fazendo o movimento no chão, com as mãos)). (267) Pesquisador: Isso! tem também, eles fazem lá. Eu vou ver se eu trago uns vídeos pra vocês, que cada um

cria seu robô e faz a batalha. Mas assim ó, por hoje eu quero agradecer, obrigado pela ajuda, que os pais t]ao

aí já. E aí, semana que vem, posso voltar então?

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(268) Estudantes: Sim; Pode; ((alguns balançam a cabeça afirmativamente)). (269) Pesquisador: Mas hoje muito obrigado aí, pela ajuda de vocês.

Transcrição do Grupo focal – 23/05/2017 – 18min (OF5) (1) Pesquisador: Então, como da outra vez que eu vim aqui, no primeiro dia, eu fiz as mesmas coisas né, fiz

aquele teste e fiz algumas perguntas pra vocês, não se vocês se lembram? (2) Estudantes: Sim. (3) Pesquisador: Sim, tá... Hoje eu vou fazer as mesmas perguntas pra vocês e então, se puderem me ajudar nas

respostas, se vocês mudaram a opinião, se vocês têm alguma coisa diferente, podem falar... A primeira coisa

que eu já tinha perguntado e queria perguntar pra vocês de novo ((olhando para a folha)). Se vocês estão

gostando de fazer parte desse projeto, ou não? (4) Estudantes: Sim ((em coro)). (5) Pesquisador: Bá, que bom hein! ((ri)). (6) Douglas: Ainda mais queee a última vez. (7) Pesquisador: É. (8) Douglas: A gente já aprendeu coisas novas, tipo ligá sinaleira ((referente ao desafio que haviam participado

no início, de acender o semáforo, por meio da programação com as placas do arduino)). (9) Estudantes: ((risos)). (10) Pesquisador: É, na prática é diferente né. (11) Iuri: Mas ainda a gente que aprendê a montá os negocinho /.../ ((referindo-se às placas do arduino)). (12) Pesquisador: Ah, os circuitos né. Mas, isso se aprende, é fácil também. Mas, o programar que é legal, que

dá vida pras coisas né, é diferente. Eeee, isso que eu ia perguntar, o porquê que vocês acham que é legal... fazer

essa oficina aqui? (13) Iuri: Por causa que a gente programa as coisas né. ((silêncio prolongado)). (14) Pesquisador: A outra coisa que eu tinha perguntado pra vocês era, o que levou vocês a fazerem parte do

projeto? (15) Iuri: Querê aprendê mais /.../ (16) Pesquisador: O que que motivou vocês a vim fazer, quando convidaram vocês? (17) Iuri: O que motivô é que eu queria aprendê a fazê um robô. (18) Aline: Principalmente porqueeee /.../ Mas é que pelo menos por causa pra quem foi tinha demonstração né,

e era muito interessante o jeito que eles mostravam e /.../ desse tipo/ (19) Iuri: (inaudível). (20) Pesquisador: Tá, legal... Eeee ((olhando para a folha)), o que que vocês acham, qual que é a importância,

do projeto esse, da programação, pra vida e pra escola? Qual é a importância disso? (21) Iuri: Que a gente pode usá pra programá coisas. (22) Síntia: Trabalhá... (23) Pesquisador: É o que vocês pensarem, podem falar. ((silêncio prolongado)). Tá, então deixa eu ir pra

próxima então... Ããã, que em eu tinha perguntado pra vocês assim, quando vocês (es)tão participando aqui, que

nem hoje, qual é noção do tempo assim, que vocês têm? A aula passa lenta ou a aula passa rápido?

((gesticulando)). O que que vocês/ (24) Estudantes: Passa rápido ((risos discretos)). (25) Douglas: Rápido, porque é uma coisa tipo, que a gente gosta... Tipo, as coisaaaa que a gente gosta passa

bem rapidão. E as coisas que a gente não gosta né ((olhou para baixo e balançou a cabeça)). (26) Nilva: Tipo português. (27) Estudantes: ((risos)). (28) Iuri: Matemática (29) Nilva: Ciências. (30) Leila: Ah, matemática não. (31) Pesquisador: Em relação ás outras matérias, isso? É diferente? (32) Alguns estudantes: Teeem ((balançando a cabeça afirmativamente)). (33) Síntia: Parece que as coisas que a gente não gosta passa devagar/ (34) Iuri: Poderia sê o contrário né. (35) Síntia: E as coisa que a gente gosta paaassa rápido. (36) Pesquisador: Ah, é verdade... Ããã ((olhando para a folha)), outra coisa que eu tinha aqui, falado com

vocês, o que que vocês acham, qual que é a importância do computador e do celular no dia-a-dia assim? Por

que eles são importantes?

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(37) Douglas: Ah, é bom ((balançando a cabeça afirmativamente)). (38) Iuri: Porque a gente tem acesso pra, praaa notícia, ficá bem informado. (39) Síntia: Pesquisá as coisas. (40) Aline: Ou até mesmo pra estudo. Hoje em dia tem tipo, tanto aplicativo de estudo, site, coisa assim/ (41) Iuri: Ficá bem informado. (42) Pesquisador: Tu ia falá alguma coisa ((direcionando-se à estudante Carla)). (43) Carla: Ããã, pra gente se conectá com outra pessoa que não mora, tipo em Passo Fundo /.../ (44) Douglas: Tipo, que nem meu pai sabe, ele usa o whats sabe? (45) Pesquisador: Aham. (46) Douglas: Ele tipo, ele se esqueceuuu de pegá alguma coisa da empresa, daí... eles passam uma mensagem e

ele volta. (47) Iuri: (inaudível). (48) Pesquisador: É um bom exemplo né. (49) Douglas: É, e também é mais fácil de se comunicá... (50) Pesquisador: É que tudo ficou com mais fácil com a internet, com o computador/ (51) Iuri: Minha /.../ não gostá de internet. (52) Síntia: ((riso discreto)). (53) Pesquisador: Então, todos acreditam queeee, é importante o celular, o computador no dia-a-dia então? (54) Estudantes: Sim ((em coro)). (55) Pesquisador: Ããã, outra coisa então ((olhando para a folha)). A gente falou bastante em criatividade né, e

hoje eu trouxe um negócio diferente ali pra vocês. O que vocês acham que é ser criativo? O que que é uma

pessoa criativa? Como definir criatividade? O que é ser criativo? (56) Iuri: É /.../ uma coisa autêntica, diferente. (57) Aline: É quando um homem consegue algo /.../ que ele ia acontecê/ (58) Iuri: Tipo uber. (59) Douglas: Imaginação também. Tipo, eles imaginam eeee conseguem criar. (60) Pesquisador: Sim. Tudo isso que vocês (es)tão falando. E, quem mais acha que é ser uma pessoa

criativa?... Qual é a característica de uma pessoa criativa? (61) Síntia: (inaudível). (62) Pesquisador: ((ri)). (63) Iuri: O Einstein era burro, daí depois, ele ficou inteligente. (64) Pesquisador: É que a gente tem como criativo fazer coisas diferentes né. E, quando a gente fala em

inteligente é quando a gente faz alguma coisa e acerta né. Então, os dois podem tá aliados, porque tu pode ser

criativo, ou só inteligente, ou pode ser inteligente e criativo. (65) Síntia: Ou /.../ ((riso discreto)). (66) Pesquisador: É ((ri)). Quem mais quer dizer uma característica de uma pessoa criativa? (67) Carla: É um podê criá eeee, outro podê usá? (68) Pesquisador: Siiim... Geralmente, a gente faz pra isso né. É que nem eu falei, lembram que aquele dia eu

falei pra vocês que, geralmente a gente cria pra resolver um problema né. Então, quando a gente tá resolvendo

um problema de alguém, a gente tá sendo criativo... Ah, eu tenho um problema e eu nem pensava, ninguém

consegue resolver aquele problema, daí vai lá e eu resolvo aquele problema. Eu tô sendo criativo, porque fui eu

que resolvi. É que nem nos desenhos que vocês fizeram... quando, vamos supor que todo mundo fez igual eeee,

ela ((referindo-se à estudante Aline))... Então quer dizer o quê? Que ela fez ummm, deu um passo mais criativo.

Deixa eu ver outra coisa aqui, que eu perguntei também ((olhando para a folha))... Ããã, vamos ver o que vocês

acham, quando vocês são desafiados a fazer uma tarefa, que nem hoje ali, de aprender a simular o semáforo né,

vocês acham que as soluções dos problemas, tinha aquele problema que era fazer o semáforo funcionar, as

respostas de cada um, dos trios ou da dupla, foram iguais ou foram diferentes? (69) Estudantes: Diferentes. (70) Iuri: Uns ficaram aceso, uns ficaram aceso e piscando, ou beeem depois, acendeu uma cor. (71) Carina: ((ri)). (72) Pesquisador: E por que vocês acham que cada um faz diferente? (73) Iuri: Porque cada /.../ (74) Estudantes e Pesquisador: ((risos)). (75) Síntia: Cada um tem um jeito. (76) Pesquisador: Isso vocês notaram né. Viram, ninguém fez igual né. Vocês viram o jeito que eu fiz e cada um

fez diferente eeee funcionou, cada um fez acender o led. Vocês viram né? (77) Elena: É, não funcionou ((ri)). (78) Estudantes: ((risos)). (79) Iuri: É tipooo, vermelho e verde, pros carros passá e derrapá /.../ (80) Síntia: Daí uns param e outros andam.

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(81) Estudantes e Pesquisador: ((risos)). (82) Aline: Daí tipo, tem um /.../ ((gesticulando com a mão, como se estivesse mostrando uma rua)), daí uns

andam e outros ficam lá, parado. (83) Pesquisador: Então, se a gente pegar isso aí, vocês poderiam fazer outro tipo de semáforo, por que que

tem que ser essa ordem né? (84) Aline: Pode sê ((balançando a cabeça afirmativamente)). (85) Pesquisador: Poderia ser a ordem diferente. Poderia ser o vermelho que andasse e o verde que parasse. (86) Alguns estudantes: ((risos)). (87) Yris: Ou trocar as cor também. (88) Pesquisador: Ou trocar as cores ((balançando a cabeça afirmativamente)). Entendem, que é isso que eu

queria dizer pra vocês, que não existe um certo, cada um faz diferente, cada um tem uma lógica diferente, cada

um cria diferente. Então, cada um dá o máximo pra ser criativo. Ããã ((olhando para a folha)), e a outra

pergunta é, o que vocês acham, se tornaram mais criativos depois que começaram a fazer a programação?

Vocês acham que começaram a ser mais criativos? (89) Estudantes: Sim ((balançando a cabeça afirmativamente)). (90) Pesquisador: Por que que vocês acham que ficaram mais criativos? ((silêncio)). (91) Iuri: Porque a gente tá aprendendo mais coisas /.../ (92) Pesquisador: Boooa... Tem mais conteúdo, daí consegue mais combinações. Isso né. Alguém tem uma

outra opinião, o porquê que acha que se tornou mais criativo? ((silêncio)). (93) Aline: Eu acho que, pra mim era algo muito novo, diferente do meu normal, e daí quando eu comecei a vê,

a fazê as coisas, eu me dediquei mais no estudo, pensá mais pra fazê as coisas assim. (94) Pesquisador: Tu viu que tinha outro universo, outras coisas, outras combinações né. (95) Aline: ((balançando a cabeça afirmativamente)). (96) Pesquisador: Começa a ver várias coisas né... Alguém mais? ((silêncio)). Pessoal é meio tímido né? (97) Estudantes: ((risos discretos)). (98) Pesquisador: Ah, mas é bem tranquilo, eu falei desde a primeira aula/ (99) Iuri: (inaudível). (100) Pesquisador: Fala quem quer. Não precisa/ (101) Alguns estudantes: (falas paralelas). (102) Pesquisador: Tá, então. Se lembram que eu tinha feito o desafio aquele dia pra vocês dos caminhos

diferentes né. (103) Estudantes: Uhum. (104) Pesquisador: Então, hoje eu vou fazer um desafio diferente pra vocês... Vocês conhecem cuia de tomar

chimarrão? (105) Estudantes: Sim ((em coro)). (106) Pesquisador: Tá... Aquela cuia, ela foi feita pra que? (107) Carina: Pra tomar chimarrão. (108) Pesquisador: Pra tomar chimarrão. Tá, fora isso, o que a gente pode fazer com ela? (109) Iuri: Tomá tererê. (110) Estudantes: ((risos)). (111) Iuri: Fazê casinha de passarinho. (112) Pesquisador: Fazer casinha de passarinho. Óóó, olha, ele falou uma coisa, ele foi criativo ali, ele falou

uma coisa diferente. Quem mais acha o que dá pra fazer com a cuia? (113) Síntia: Colocá flor. (114) Pesquisador: Colocar flor. (115) Nilva: Óóó! (116) Alguns estudantes: ((risos)). (117) Pesquisador: Beleza. Vamos lá, vamos ver... (118) Aline: Usá de decoração. (119) Pesquisador: Usar de decoração. (120) Estudantes: (falas paralelas). (121) Pesquisador: Fazer artesanato. O que mais, dá pra fazer de diferente com a cuia? (122) Carla: Flores, enfeites... (123) Iuri: Fazê de chapéu. (124) Estudantes: ((risos)). (125) Pesquisador: ((ri)). Booooa! Dá pra fazer de chapéu, é igual, coloca na cabeça aqui, não molha a

cabeça, esconde o cabelo. (126) Estudantes: ((risos)).

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(127) Pesquisador: Óóó, criativo hein... Vocês viram n[e, que a gente já falou umas quatro coisas que dá pra

fazer com a cuia né, além de tomar chimarrão. Dá pra fazer mais coisa ainda. Vamos chegar no dez então

((contando nos dedos)). (128) Iuri: Quando alguém tá apertado pra fazê xixi /.../ (129) Estudantes: ((risos)). (130) Pesquisador: ((ri)). Siiim. (131) Iuri: (inaudível). (132) Pesquisador: Serve de pinico né. Então, ó, é a quinta, falta cinco. (133) Carla: Botá bombom, bala, chiclé. (134) Pesquisador: Serve de pote, de bombom, bala, dá pra guardar lá. (135) Iuri: Serve de cofre de dinheiro. (136) Pesquisador: Cofre de dinheiro. Alguma coisa diferente de guardar... (137) Síntia: Joias. (138) Iuri: Quando tu não qué /.../ tu bota assim no ouvido /.../ (139) Estudantes: ((risos)). (140) Pesquisador: Siiim, de fone de ouvido. Claro, não quer escutar ninguém ali, coloca um tampão no ouvido

e tapa. Serve ou não? (141) Estudantes: Serve. (142) Pesquisador: Serve ((balançando a cabeça afirmativamente)). Então, não é só pra tomar mate. Já foram

seis, faltam quatro. (143) Douglas: Vocês aí, que nunca falam nada ((referindo-se às meninas)). (144) Carla: Eu falei, elas que não falaram ((rindo, apontando para as meninas Id3, Id5 e Id8)). (145) Pesquisador: Podem falar o que vocês imaginam. (146) Estudantes: (falas paralelas). (147) Aline: Usá de luva. (148) Pesquisador: Oi? (149) Aline: Usá de luva, luva de sapato. (150) Pesquisador: Luva de sapato. (151) Aline: Luva e sapato, não luva de sapato ((rindo)). (152) Pesquisador: Isso, então já foi dois aqui. Luva, ah, tá com a mão fria, coloca a mão ali e não gela a mão,

ou sapato, também. (153) Iuri: /.../ sapato. (154) Pesquisador: Salto alto. Aham, dá pra fazer. (155) Síntia: É que nem tipo, aquelas latinha de nescau, amarra assim e vai ((levanta e mostra como se

estivesse andando no brinquedo pé de lata)). (156) Pesquisador: Perna de pau. (157) Iuri: (inaudível). (158) Pesquisador: Ó, então já foi 9. Falta um, bem criativo. O que que dá pra fazer com a cuia? (159) Carla: Pode guardá anotações dentro. (160) Pesquisador: Pode ser também, pra guardar objetos... Dou lhe uma, ah, capaz ((ri))... Alguma coisa fora

do comum aí. (161) Iuri: (inaudível). (162) Estudantes: ((muitos risos)). (163) Pesquisador: Então, vocês entenderam que a criatividade é isso aí. Ah, depois se dá pra fazer ou não aí é

outra análise. Daí a gente vai ver, ah, dá pra fazer que nem ele falou ali? Dá, é criativo... Mas, depois a gente

vai filtrar se dá pra fazer ou não, né. Então, seria essas perguntas que eu tinha pra fazer com vocês. Queria

dizer também que hoje é o nosso último dia de vim aqui né. (164) Alguns estudantes: Ahhhh. (165) Pesquisador: Ahhhh. (166) Estudantes: ((risos)). (167) pesquisador: Mas eu posso trazer uns desafios diferentes pra vocês... Eu combino com a prô. (168) Iuri: Êêê, obrigado. (169) Pesquisador: Bom, eu queria agradecer. Obrigado mesmo, gostei bastante da turma assim. O que eu

tinha falado, todo esse projeto que a gente fez aqui, vai servir para o meu estudo, lá na faculdade... o estudo de

programação de computadores. A gente usa bastante isso né. Eu queria agradecer a vocês, pela ajuda. Bá,

muito obrigado mesmo, pelo apoio, pela dedicação de vocês, eeee, dizer que eu vou voltar aqui também né, vou

acompanhar aqui, só não vou dizer o dia, porque quando vocês verem eu tô aqui. E, vou tentar procurar coisas

diferentes, pra ajudar a prô e o que vocês precisarem também, se tiverem alguma dúvida, nessa questão de

computação, podem me pedir. Quem tem facebook, podem adicionar lá e a gente pode ir conversando daí. (170) Aline: Nós que agradecemos a visita ((bem sorridente)).

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(171) Pesquisador: Bá, muito obrigado. Fico feliz mesmo. Até eu falei pra prô, eu queria ficar até o final do

ano aqui com vocês. É muito legal, e não é só vocês, eu também gosto de fazer isso sabe. Me divirto aqui, tanto

é que, quando eu tô aqui, não vejo o tempo passar. Então, tanto pra vocês, quando pra nós é muito divertido né.

E a gente faz, erra, acerta, ajuda o colega e, por isso, é uma aula bem diferenciada né? (172) Estudantes: ((balançam a cabeça afirmativamente)). (173) Pesquisador: Então, a minha ideia é isso aí, é fazer com queeee, a gente tenha novos métodos de ensino

nas escolas, pois quanto mais coisas assim, usando tecnologia, melhor né. Imagina se a gente pudesse usar

programação pra matemática... Sabiam que já existe? (174) Iuri: Ah, a professora não deixa. (175) Estudantes: ((risos)). (176) Síntia: Então, tem que sê pra português. (177) Estudantes: ((risos)). (178) Pesquisador: Português ((balançando a cabeça afirmativamente)). Então, hoje tudo pode fazer no

computador, usar a informática pra matemática, pra português... Então, o meu estudo lá vai servir pra isso, pra

mostrar o quanto é legal, que nem vocês falaram né, que gostaram da programação ((apontando para os

estudantes)). É fazer isso aí, mostrar para as pessoas que é mais legal usar computador nas aulas né. Vocês

acham mais legal, ou não? (179) Estudantes: Sim ((balançando a cabeça afirmativamente)). (180) Pesquisador: Então tá beleza. Eu defendo muito essa ideia né, de a gente usar computador nas aulas. Bá,

sem computador hoje eu não vejooo, a gente vai google e pesquisa, facilita/ (181) Iuri: Imagina que eu fiquei quase um mês sem internet. (182) Pesquisador: O que a gente não deve fazer é copiar né, ou seja, olhar na internet e fazer igual. Mas a

gente deve olhar lá e aprender né. Isso facilita.