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UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA Faculdade de Medicina Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde Sintomas de ansiedade e depressão: a remodelação psíquica na Insuficiência Cardíaca Juliana de Souza Andréo Uberlândia 2010

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  • UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLNDIA Faculdade de Medicina

    Programa de Ps-Graduao em Cincias da Sade

    Sintomas de ansiedade e depresso: a

    remodelao psquica na Insuficincia

    Cardaca

    Juliana de Souza Andro

    Uberlndia

    2010

  • Juliana de Souza Andro

    Sintomas de ansiedade e depresso: a

    remodelao psquica na Insuficincia

    Cardaca

    Dissertao apresentada ao Colegiado do

    Programa de Ps-graduao em Cincias da

    Sade, como parte das exigncias para obteno

    do ttulo de Mestre.

    Orientador: Prof. Dr. Elmiro Santos Resende

    Co-orientadora: Profa. Dra. Marilda de Oliveira Coelho

    Uberlndia

    2010

  • Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    A559s

    Andro, Juliana de Souza, 1979-

    Sintomas de ansiedade e depresso [manuscrito] : a

    remodelao psquica na insuficincia cardaca [manuscrito] /

    Juliana de Souza Andro. - 2010.

    79 f. : il.

    Orientador: Elmiro Santos Resende.

    Co-orientadora: Marilda de Oliveira Coelho.

    Dissertao (mestrado) - Universidade Federal de Uberlndia, Pro-

    grama de Ps-Graduao em Cincias da Sade.

    Inclui bibliografia.

    1. 1. Insuficincia cardaca - Teses. 2. Depresso mental - Teses. 3. Ansiedade - Teses. I. Resende, Elmiro Santos. II. Coelho, Marilda de

    Oliveira. III. Universidade Federal de Uberlndia. Programa de Ps-

    Graduao em Cincias da Sade.III. Ttulo.

    CDU: 616.12-008.315 Elaborado pelo Sistema de Bibliotecas da UFU / Setor de Catalogao e Classificao

  • Juliana de Souza Andro

    Sintomas de ansiedade e depresso: a

    remodelao psquica na Insuficincia

    Cardaca

    Dissertao apresentada ao Colegiado do

    Programa de Ps-graduao em Cincias da

    Sade, como parte das exigncias para obteno

    do ttulo de Mestre.

    Uberlndia, 26 de abril de 2010.

    ______________________________________

    Prof. Dr. Aguinaldo Coelho da Silva

    ______________________________________

    Prof. Dr. Rodrigo Sanches Peres

    ______________________________________

    Profa. Dra. Silvia Maria Cury Ismael

  • Dedicatria

    A minha me Alda, que me fez direcionar o

    olhar para a compreenso do universo dos

    pacientes cardacos.

    Aos pacientes que compartilharam comigo suas

    histrias.

  • Agradecimentos

    Diversas pessoas colaboraram direta ou indiretamente para a realizao deste trabalho com

    sugestes, idias, crticas e opinies. Outros contriburam com afeto, carinho e amizade,

    componentes essenciais para um bom trabalho. Agradeo a todos que me acompanharam

    durante a realizao deste estudo. Porm, gostaria de agradecer especialmente a algumas

    pessoas.

    Aos meus pais, Alda e Jeov, pelos valores a mim ensinados, entre eles a busca pela

    realizao de meus sonhos e o valor do estudo. Tambm pelo o esforo sem limites em busca

    do meu bem estar, manifestado por meio de amor, carinho e cuidado.

    Ao meu esposo Eduardo, por tornar minha vida to mais feliz na sua companhia, alm de me

    apoiar durante todo esse tempo, suportando minha angstia em tantos momentos.

    Aos meus irmos Jlio e Lucinia (Nia) pelo companheirismo, incentivo e exemplo. Em

    especial a Nia, pelo carinho e amor imensos que me fazem sentir mais segura e confiante.

    A minha cunhada Karine, por em ouvir com interesse, mesmo sendo de uma rea to

    diferente, e tambm por me auxiliar na formatao desse trabalho.

    Ao meu orientador, Dr. Elmiro, por me ensinar os caminhos da pesquisa cientifica, pela

    confiana, compreenso, carinho e por dividir comigo seu conhecimento. Ele representa a

    sabedoria em todos os sentidos.

    A minha co-orientadora Marilda, pelas oportunidades a mim oferecidas e pelo incentivo na

    busca da valorizao da nossa rea.

    Gislene por me escutar, por me ajudar a amadurecer e a me conhecer. Aprendi muitas

    coisas parceria que ficaro comigo para sempre.

    Aos meus sogros Luzia e Jos, por entender a ausncia, aceitando-me com tanto carinho.

    Bela, pela companhia em todas as tardes de escrita desse trabalho e por ser to bom voltar

    para casa para v-la.

    Aos novos amigos feitos durante essa trajetria, Ana Cludia, Fbia, Leandro, Priscila e

    tantos outros, pelas conversas, risadas, conhecimentos trocados e, acima de tudo, por

    compartilhar as dores e angstias em busca da concretizao deste trabalho.

    A todos os pacientes que aceitaram participar da realizao desta pesquisa, minha mais

    profunda gratido.

    Enfim, parece que, de tudo isso, o que mais valeu a pena foram os vnculos criados ou

    fortalecidos, seja com as pessoas, seja com o conhecimento.

  • Lista de abreviaturas e siglas

    IC Insuficincia Cardaca

    NYHA New York Heart Association

    QV Qualidade de Vida

    DSM-IV Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais

    BDI Inventrio de Depresso de Beck

    DSM-III Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais

    BAI Inventrio de Ansiedade de Beck

    HAD Escala Hospitalar de Ansiedade e Depresso

    CEP Comit de tica em Pesquisa

    UFU Universidade Federal de Uberlndia

    SCID-I Structured Clinical Interview

  • Lista de tabelas

    Tabela 1. Dados sociodemogrficos do grupo de estudo e do grupo controle.

    34

    Tabela 2. Escore mdio, desvio padro e probabilidades encontradas, quando da

    aplicao do teste de Mann-Whitney aos valores obtidos pelo grupo de pacientes e pelo

    grupo controle aos dados relativos depresso e ansiedade, medidos pela BDI.

    35

    Tabela 3. Dados relativos ao BDI do grupo de estudo e do grupo controle.

    35

    Tabela 4. Escore mdio, desvio padro e probabilidades encontradas, quando da

    aplicao do teste de Mann-Whitney aos valores obtidos pelo grupo de pacientes e pelo

    grupo controle aos dados relativos depresso e ansiedade, medidos pela BAI.

    36

    Tabela 5. Dados relativos ao BAI do grupo de estudo e do grupo controle.

    36

    Tabela 6. Escore mdio, desvio padro e probabilidades encontradas, quando da

    aplicao do teste de Mann-Whitney aos valores obtidos pelo grupo de estudo e pelo

    grupo controle aos dados relativos depresso e ansiedade, medidos pelo HAD.

    37

    Tabela 7. Dados relativos HAD do grupo de estudo e do grupo controle.

    37

    Tabela 8. Correlaes de Postos de Spearman entre os instrumentos psicolgicos e a

    classe funcional de IC.

    40

  • Lista de figuras

    Quadro 1. Classificao da NYHA. 13

    Quadro 2. Etiologia da IC. 13

    Quadro 3. Principais sintomas presentes na depresso. 15

    Quadro 4. Principais sinais e sintomas presentes nos transtornos de ansiedade. 17

    Quadro 5. Pontos de corte do BDI para pacientes psiquitricos. 20

    Figura 1. Principais sintomas avaliados pelas escalas de ansiedade. 22

    Quadro 6. Pontos de corte do BAI para pacientes psiquitricos.

    22

    Quadro 7. Critrios de incluso e excluso do grupo de estudo.

    28

    Quadro 8. Critrios de incluso e excluso do grupo controle.

    29

    Fluxograma 1. Nmero de sujeitos selecionados e excludos no grupo de estudo. 33

    Grfico 1. Distribuio percentual da etiologia das cardiopatias na IC. 38

    Grfico 2. Distribuio percentual da classe funcional dos pacientes do grupo de estudo

    com IC (NYHA). 39

  • Sumrio

    LLiissttaa ddee aabbrreevviiaattuurraass ee ssiiggllaass .......................................................................................................................................................................................................... 88

    LLiissttaa ddee ttaabbeellaass ...................................................................................................................................................................................................................................................... 99

    LLiissttaa ddee ffiigguurraass .................................................................................................................................................................................................................................................. 1100

    RReessuummoo .......................................................................................................................................................................................................................................................................... 1100

    AAbbssttrraacctt .......................................................................................................................................................................................................................................................................... 1111

    11 IInnttrroodduuoo .......................................................................................................................................................................................................................................................... 1155

    1.1 Insuficincia Cardaca ................................................................................................ 16

    1.2 Depresso e ansiedade ............................................................................................... 19

    1.3 Inventrio de Depresso de Beck ............................................................................... 22

    1.4 Inventrio de Ansiedade de Beck .............................................................................. 25

    1.5 Escala Hospitalar de Ansiedade e Depresso ............................................................ 26

    22 OObbjjeettiivvoo .................................................................................................................................................................................................................................................................. 2299

    33 MMaatteerriiaall ee mmttooddooss ................................................................................................................................................................................................................................ 3311

    3.1 Amostra ........................................................................................................................... 32

    3.1.1 Grupo de estudo ....................................................................................................... 32

    3.1.2 Grupo controle.......................................................................................................... 32

    3.2 Mtodos .......................................................................................................................... 33

    3.2.1 Aspectos ticos ......................................................................................................... 33

    3.2.2 Avaliao dos pacientes ........................................................................................... 33

    3.2.3 Anlise estatstica ..................................................................................................... 34

    44 RReessuullttaaddooss .......................................................................................................................................................................................................................................................... 3366

    4.1 Seleo dos participantes do grupo de estudo ................................................................ 37

    4.2 Dados sociodemogrficos ............................................................................................... 37

    4.3 Resultados dos instrumentos psicolgicos ...................................................................... 39

    4.3.1 Inventrio de Depresso de Beck ............................................................................. 39

    4.3.2 Inventrio de Ansiedade de Beck ............................................................................. 40

    4.3.3 Escala Hospitalar de Ansiedade e Depresso ........................................................... 41

    4.4 Etiologia da Insuficincia Cardaca ................................................................................ 42

    4. 5 Classe Funcional ............................................................................................................ 43

    4.6 Correlaes entre dados sociodemogrficos e os instrumentos psicolgicos. ................ 45

    55 DDiissccuussssoo ............................................................................................................................................................................................................................................................ 3366

  • 5.1 Dados sociodemogrficos ............................................................................................... 48

    5.2 Ansiedade e depresso .................................................................................................... 49

    5.3 Instrumentos psicolgicos: BDI, BAI E HAD. ............................................................... 52

    5.4 Efeitos das classes funcionais ......................................................................................... 53

    5.5. Etiologia da IC ............................................................................................................... 55

    66 CCoonncclluusseess ........................................................................................................................................................................................................................................................ 5566

    77 CCoonnssiiddeerraaeess ffiinnaaiiss .......................................................................................................................................................................................................................... 5588

    RReeffeerrnncciiaass bbiibblliiooggrrffiiccaass .............................................................................................................................................................................................................. 6633

    AAnneexxooss ............................................................................................................................................................................................................................................................................ 7700

    AAnneexxoo AA .......................................................................................................................................................................................................................................................................... 7711

    AAnneexxoo BB .......................................................................................................................................................................................................................................................................... 7755

    AAnneexxoo CC ........................................................................................................................................................................................................................................................................ 7766

    AAnneexxoo DD ........................................................................................................................................................................................................................................................................ 7799

    AAnneexxoo EE .......................................................................................................................................................................................................................................................................... 8800

    AAnneexxoo FF .......................................................................................................................................................................................................................................................................... 8811

  • Resumo

    A insuficincia cardaca (IC) uma condio clnica crnica e incapacitante que provoca

    repercusses emocionais importantes que, as quais podem levar a um prognstico pior da

    doena, baixa adeso do paciente ao tratamento, ao aumento das readmisses hospitalares e

    pior qualidade de vida. Esse estudo visou verificar a presena de sintomas de ansiedade e

    depresso em pacientes com IC e compar-las com as de um grupo de pacientes sem IC

    correlacionando-se esses achados com as principais caractersticas sociodemogrficas dos

    grupos estudados. Foram avaliados 100 pacientes, sendo 50 com IC (grupo de estudo) e 50

    sem IC (grupo controle). Verificou-se a presena de sintomas de ansiedade e de depresso

    utilizando-se trs instrumentos psicolgicos: Inventrio de Ansiedade de Beck, Inventrio de

    Depresso de Beck e Escala Hospitalar de Ansiedade e Depresso. Os pacientes foram

    submetidos a uma avaliao mdica e responderam um questionrio sociodemogrfico. No

    houve diferena significante entre os dois grupos em relao a ter ocupao e a ter filhos e

    nem quanto ao gnero. Os pacientes com IC demonstraram mais sintomas ansiedade e

    depresso do que o grupo controle em relao a todos os instrumentos. Entretanto o grupo

    com IC tinha idade mais avanada, menos lazer e menor escolaridade que o controle. O

    estudo aponta a importncia da utilizao de instrumentos psicolgicos para rastreamento de

    sintomas de ansiedade e depresso nessa populao de pacientes com IC e tambm a

    necessidade de assistncia psicolgica, principalmente para pacientes em classes funcionais

    mais avanadas.

    Palavras-chave: insuficincia cardaca, ansiedade, depresso.

  • Abstract

    Heart failure (HF) is a chronic disease that incapacitates and provokes emotional

    repercussions that may actually worsen the disease itself. Possible results include disinterest

    by the patient in pursuing treatment, increased hospitalization and reduced quality of life. The

    present study seeks to verify the presence of symptoms of anxiety and depression in patients

    with HF and compare them with a group of patients without HF for analysis in terms of

    principal socio demographic characteristics of the two groups. A total of 100 patients were

    evaluated. Fifty of these (the study group) had HF and 50 (the control group) without the

    disease. The presence of anxiety and depression were verified using three psychological

    instruments: Beck's Anxiety Inventory, Beck's Depression Inventory and the Hospital Scale of

    Anxiety and Depression. Patients were also submitted to a medical examination and

    responded to a socio demographic questionnaire. There was no significant difference between

    the two groups in terms of occupation, sex or number of children. The patients with HF

    demonstrated more anxiety and depression than the control group, as measured by all of the

    instruments. Further analysis revealed that the study group was older, had less leisure time

    and less education than the control group. The study thus revealed the importance of

    psychological instruments for the identification of symptoms of anxiety and depression

    among patients with HF. The need for psychological assistance, principally for upper working

    class patients was evident.

    Keywords: heart failure, anxiety, depression.

  • 11..IInnttrroodduuoo

  • IINNTTRROODDUUOO 16 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    1.1 Insuficincia Cardaca

    Por definio, a Insuficincia Cardaca (IC) uma condio clnica que tem como

    caracterstica principal a incapacidade de o corao suprir, com um volume sanguneo

    necessrio, as demandas do metabolismo tecidual. Essa incapacidade funcional est

    usualmente ligada ao comprometimento da funo contrtil do msculo cardaco (falncia

    sistlica). Em certas situaes, para que ocorra uma perfuso tecidual adequada, torna-se

    necessria uma presso de enchimento das cavidades cardacas anormalmente elevadas

    (FELKER et al., 2003). O quadro clnico , assim, dominado por manifestaes orgnicas

    secundrias ao processo isqumico ou congestivo com conseqente dispnia, edema e fadiga

    (FRANCIS, 2005).

    A IC caracteriza-se, portanto, como uma sndrome clnica complexa e decorre de

    processos lesivos progressivos do corao que, ao provocar disfuno ventricular,

    desencadeiam uma srie de mecanismos compensatrios que, uma vez exacerbados, passam

    de uma resposta inicialmente benfica para outra em que ocorre acentuao das leses e piora

    funcional (CLAUSELL, 2003).

    Nos ltimos anos, a incidncia de insuficincia cardaca vem aumentando no Brasil e

    no mundo e apesar de no existirem em nosso meio estudos epidemiolgicos suficientemente

    abrangentes, estima-se que at 6,4 milhes brasileiros apresentem IC (II Diretrizes da

    Sociedade Brasileira de Cardiologia para o Diagnstico e Tratamento da Insuficincia

    Cardaca, 2002). Alguns nmeros podem ser verificados em registros nacionais. No ano de

    2007, ocorreram 293.473 internaes hospitalares por IC, representando 3% dos custos totais

    de internao e 6% dos bitos no Sistema nico de Sade SUS. (III Diretrizes da Sociedade

    Brasileira de Cardiologia para o Diagnstico e Tratamento da Insuficincia Cardaca, 2009).

    Isso aponta a importncia dessa doena em nosso meio.

    bastante claro que, em qualquer sistema de sade, as internaes hospitalares

    representam um componente desproporcional nos gastos totais. Em pases industrializados, as

    altas taxas de hospitalizao para a IC e o tratamento contnuo e necessrio representam de

    1% a 2% de todo o dinheiro alocado para o sistema de sade. O custo da IC aumenta com a

    piora da disfuno sistlica e com a gravidade da doena. Em pacientes em classe funcional

    IV, os custos chegam a ser de 8 a 30 vezes maiores que nos pacientes com classe funcional II

    (ROSSI NETO, 2004).

  • IINNTTRROODDUUOO 17 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    No Brasil, a IC representa a terceira causa de mortalidade em diferentes grupos de

    doenas cardiovasculares, e tem sido motivo freqente de internaes hospitalares, que

    acarretam um elevado custo humano e financeiro (FREITAS et al, 2003).

    Apesar do grande desenvolvimento tecnolgico e maiores recursos farmacolgicos

    hoje disponiveis, este aumento da incidncia de IC, em parte, decorre do envelhecimento da

    populao, fase em que a IC mais frequente. De outra parte, pode-se considerar que, uma

    vez que se morre menos em decorrncia da cardiopatia de base, convive-se mais com a IC,

    sendo ela a fase final comum das doenas cardiolgicas (BARRETTO; RAMIRES, 1998).

    A IC tem sido classificada com base na intensidade da dispneia. Esta classificao

    proposta pela New York Heart Association (NYHA) identifica quatro formas clnicas de

    acordo com a intensidade dos sintomas. Essas classes estratificam o grau de limitao imposto

    pela doena para atividades cotidianas do indivduo. O Quadro 1 ilustra as caractersticas

    clnicas da classificao da NYHA. (III Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia para

    o Diagnstico e Tratamento da Insuficincia Cardaca, 2009).

    Classe I. Ausncia de sintomas (dispnia) durante atividades cotidianas. A limitao para

    esforos semelhante esperada em indivduos normais;

    Classe II. Sintomas desencadeados por atividades cotidianas;

    Classe III. Sintomas desencadeados em atividades menos intensas que as cotidianas ou

    pequenos esforos;

    Classe IV. Sintomas em repouso.

    Quadro 1. Classificao da NYHA.

    Como se v no Quadro 2, existem vrias etiologias possveis para a IC, sendo

    importante seu conhecimento para controle do fator que provocou a doena.

  • IINNTTRROODDUUOO 18 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Etiologia Situao clnica

    Doena isqumica Especialmente na presena de fatores de risco, angina ou

    disfuno segmentar

    Hipertenso arterial Freqentemente associada hipertrofia ventricular e a frao

    de ejeo preservada

    Doena de Chagas Especialmente na presena de dados epidemiolgicos

    sugestivos e bloqueio de ramo direito/bloqueio divisional

    antero-superior

    Cardiomiopatia Hipertrfica, dilatada, restritiva e displasia arritmognica do

    ventrculo direito

    Drogas Bloqueadores de canal de clcio, agentes citotxicos

    Toxinas lcool, cocana, microelementos (mercrio, cobalto e

    arsnio)

    Doenas endcrinas Diabetes, hipo/hipertireoidismo, Cushing, insuficincia

    adrenal, feocromocitoma, hipersecreo hormnio do

    crescimento

    Nutricional Deficincia de selnio, tiamina, carnitina, obesidade,

    caquexia

    Infiltrativa Sarcoidose, amiloidose, hemocromatose

    Doena extra-cardaca Fstula artrio-venosa, beribri, doena de Paget, anemia

    Outras Periparto, miocardiopatia do HIV, doena renal crnica

    Quadro 2. Etiologia da IC

    Fonte: (III Diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia para o Diagnstico e Tratamento da

    Insuficincia Cardaca, 2009).

    Pelo delineado at agora, verifica-se que pacientes com IC apresentam grande prejuzo

    na qualidade de vida (QV). Essa situao se torna muito evidente quando essa QV

    comparada de pacientes com outras doenas crnicas debilitantes, como diabetes melittus,

    angina pectoris e doena pulmonar crnica (STEWART et al, 1989).

    Vrias intercorrncias podem precipitar ou agravar a evoluo clnica de pacientes

    cardiopatas. Pacientes com doena cardaca compensada, de qualquer etiologia, podem

    desenvolver insuficincia cardaca aguda em resposta, inclusive, a fatores psicolgicos que

    resultam em efeitos diretos e/ou indiretos. Os efeitos diretos incluem estmulo emocional

    intenso, tais como ansiedade ou raiva, e sentimentos de depresso e desesperana. J os

  • IINNTTRROODDUUOO 19 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    indiretos resultam do comportamento do paciente e de negao da doena, que pode tomar a

    forma de no adeso ao tratamento mdico (KAPLAN; SADOCK, 1986).

    A IC uma doena crnica que pode evoluir durante anos e progredir de

    comprometimento fsico mnimo at atingir situaes graves. O tratamento bem sucedido

    exige, alm dos recursos farmacolgicos, modificaes no estilo de vida e interfere nas

    atividades e na vida dos membros da famlia e dos cuidadores. Os pacientes podem ter uma

    vida limitada, mas com qualidade razovel durante anos. Infelizmente a maioria est muito

    limitada tornando-se incapacitada e considerada, assim, como membros improdutivos para

    a sociedade (STARLING, 2005).

    Transtornos psquicos, como depresso e ansiedade, tm sido associados a um pior

    prognstico na IC, ao aumento das readmisses hospitalares, pior qualidade de vida e ao

    aumento da mortalidade (PERLMAN et al, 1971; FALK et al, 2009).

    Nesse sentido, pode-se perceber que a IC uma doena que, alm do

    comprometimento orgnico, traz tambm grandes repercusses emocionais para o seu

    portador e para sua famlia, pois demanda mudanas em hbitos, diminui a capacidade

    produtiva do paciente o que, muitas vezes, reflete-se na questo financeira e modifica a viso

    que o paciente tem de si como um ser autnomo vislumbrando em seu lugar uma pessoa

    limitada e dependente. Nesse contexto, talvez, o maior sofrimento seja a possibilidade de

    morte iminente que gera angstia e medo ao sujeito.

    1.2 Depresso e ansiedade

    Depresso um termo extensamente utilizado, porm existe certa ambiguidade na

    terminologia. Depresso uma doena, ou melhor, um transtorno do humor, com critrios

    diagnsticos que a diferenciam de qualquer outro e incluem sintomas somticos e afetivos.

    Em outro aspecto, est a tristeza, um afeto presente na vida de todas as pessoas, sendo

    considerado normal e adequado quando compatvel intensidade e durao do evento que a

    provocou. A tristeza uma reao s situaes de perda, frustraes, derrota e outras

    adversidades. uma resposta importante no sentido de que a pessoa entristecida poupa

    energia e volta-se para seu mundo interno buscando refletir sobre suas atitudes.

    De acordo com o DSM-IV - Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos Mentais

    (2002) vrias categorias nosolgicas so estabelecidas para a depresso, sendo a caracterstica

  • IINNTTRROODDUUOO 20 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    predominante uma perturbao no humor. Os sintomas presentes so, como se v no Quadro

    3:

    a) Humor deprimido na maior parte do tempo;

    b) Acentuada diminuio do interesse ou prazer nas atividades;

    c) Perda ou ganho significativo de peso sem estar de dieta, ou diminuio ou aumento do

    apetite;

    d) Insnia ou hipersonia;

    e) Agitao ou retardo psicomotor;

    f) Fadiga ou perda de energia;

    g) Sentimento de inutilidade ou culpa excessiva ou inadequada;

    h) Capacidade diminuda de pensar ou concentrar-se, ou indeciso;

    i) Pensamentos recorrentes de morte ou ideao suicida.

    Quadro 3. Principais sintomas presentes na depresso.

    O DSM-IV (2002) no tem a pretenso em estabelecer a etiologia dos transtornos e

    sim descrever os fenmenos, estabelecendo os critrios diagnsticos. Dessa forma, o DSM-IV

    no se compromete com nenhum pressuposto terico e pretende ser universal.

    Por outro lado, algumas teorias psicolgicas so propostas para explicar o fenmeno

    da depresso. A psicanlise, criada por Freud (1915), descreveu a melancolia, que se equipara

    hoje depresso e poderia ser caracterizada como:

    [...] um desnimo profundamente penoso, a cessao de interesse pelo mundo externo,

    a perda da capacidade de amar, a inibio de toda e qualquer atividade, e uma

    diminuio dos sentimentos de auto-estima a ponto de encontrar expresso em auto-

    recriminao e auto-envilecimento, culminando numa expectativa delirante de punio

    (Freud, 1915, p.276)

    Atualmente, na prtica clnica, toma-se com base dois referenciais clnicos opostos:

    depresso patolgica ou melancolia e depresso psicognica ou reativa (FONTANA;

    FONTANA, 2005a).

    Transtornos emocionais como a depresso, podem ter um efeito significante e negativo

    nos ndices de mortalidade, morbidade e qualidade de vida entre pacientes com doenas

    fsicas, como as cardacas (BAMBAUER et al, 2005).

    A prevalncia dos transtornos depressivos na populao, ao longo da vida, situa-se em

    torno de 15% nas mulheres, podendo chegar a 25% (KAPLAN; SADOCK; GREBB, 1987).

  • IINNTTRROODDUUOO 21 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Com relao aos pacientes de clnica geral, este nmero chega a 10%, podendo atingir 15%

    em enfermos internados por motivos mdicos gerais (FONTANA; FONTANA, 2005).

    Em relao ansiedade, ela considerada um estado emocional com componentes

    psicolgicos e fisiolgicos que faz parte do espectro normal das experincias humanas sendo

    tambm propulsora do desempenho. Ela passa a ser patolgica quando desproporcional

    situao que a desencadeia, ou quando no existe um objeto especfico ao qual se direcione

    (GORENSTEIN; ANDRADE, 1998). A maneira prtica de se diferenciar ansiedade normal

    de ansiedade patolgica avaliar se a reao ansiosa de curta durao, autolimitada e

    relacionada ao estmulo do momento ou no (CASTILLO et al, 2000).

    Os sinais e sintomas mais comuns relacionados ansiedade, de acordo com Fontana e

    Fontana (2005), so os listados no Quadro 4:

    Sintomas de excitao autonmica Palpitaes, batimentos cardacos fortes,

    taquicardia, sudorese, boca seca (no decorrente

    de medicao ou desidratao), tremor ou

    estremecimento.

    Sintomas envolvendo o trax e abdome Dificuldade de respirar, sensao de sufocao,

    dor ou desconforto torcico, taquipnia,

    dificuldade para engolir, nusea ou desconforto

    abdominal, aumento do peristaltismo (diarria),

    mico freqente.

    Sintomas relacionados ao estado mental Sentimentos de atordoamento, desequilbrio,

    desfalecimento, estonteamento, apreenso,

    sensao de que algo terrvel est para acontecer,

    dificuldade de concentrao, desrealizao,

    despersonalizao, medo de perder o controle, de

    ficar louco ou desmaiar, medo de morrer.

    Sintomas gerais Ondas de calor ou calafrios, arrepios de frio,

    sensaes de entorpecimento ou de

    formigamento, piloereo, vasoconstrio,

    midrase, sensao de tenso, dificuldade para

    relaxar, contraturas, dores diversas inespecficas.

    Quadro 4. Principais sinais e sintomas presentes nos transtornos de ansiedade.

  • IINNTTRROODDUUOO 22 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Os transtornos de ansiedade so estados, portanto, de fundo emocional e repetitivo, ou

    mesmo persistentes, nos quais a ansiedade patolgica constitui sintoma fundamental

    (FONTANA; FONTANA, 2005).

    Em seu trabalho intitulado Inibies, sintomas e ansiedade, Freud (1926) chegou

    concluso de que a ansiedade uma reao a uma situao de perigo, ou seja, os sintomas so

    criados a fim de evitar uma situao de risco sinalizada pela ansiedade.

    Melanie Klein (apud SPILLIUS, 1991) na sua teoria psicanaltica, postula que a

    ansiedade est presente desde muito cedo na vida do ser humano, numa etapa do

    desenvolvimento psquico denominada posio esquizoparanide. Segundo a autora, a

    ansiedade, nesse perodo, do tipo persecutria, o medo que objetos perseguidores externos

    invadam e destruam o mundo interno do sujeito. Desse modo, o medo da morte um herdeiro

    desse primitivo medo do aniquilamento presente na tenra idade.

    Existem vrios instrumentos propostos e utilizados na avaliao da ansiedade e

    depresso. No presente estudo foram escolhidos trs instrumentos para avaliao dos sintomas

    de ansiedade e depresso dos pacientes com IC. Eles esto descritos a seguir.

    1.3 Inventrio de Depresso de Beck

    O Inventrio de Depresso de Beck (BDI) (anexo A) universalmente conhecido para

    medida da intensidade de sintomas depressivos. Foi originalmente criado por Beck, Ward,

    Mendelson, Mock e Erbaugh em 1961 e revisado por Beck, Rush, Shaw e Emery entre 1979 e

    1982 (CUNHA, 2001). , provavelmente, a medida de autoavaliao de depresso mais

    amplamente usada, tanto em pesquisa como na clnica. Foi traduzido para vrios idiomas e

    validado em diferentes pases (GORESTEIN; ANDRADE, 1998). A verso em portugus foi

    desenvolvida por Cunha (2001).

    O instrumento foi inicialmente estruturado como uma escala sintomtica de depresso

    para uso em pacientes psiquitricos. Muitos estudos sobre suas propriedades psicomtricas

    foram realizados nos anos seguintes ao seu aparecimento, passando a ser utilizado

    amplamente, tanto na rea clnica como na de pesquisa e mostrando-se um instrumento til

    tambm para a populao em geral (CUNHA, 2001). O BDI uma medida sensvel para

    mensurar sintomas depressivos, mas no tem a inteno de ser um instrumento para

    estabelecer categorias nosolgicas (KENDALL et al, 1987).

  • IINNTTRROODDUUOO 23 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    De acordo com o manual da verso em portugus, o contedo dos itens do BDI foi

    analisado em relao aos critrios do Manual Diagnstico e Estatstico de Transtornos

    Mentais - DSM-III que, essencialmente, tambm constituem as caractersticas sintomticas de

    um episdio de depresso maior que podem ser assim resumidas:

    1) Humor deprimido;

    2) Perda de interesse ou prazer;

    3) Perda ou ganho de peso, ou diminuio ou aumento do apetite;

    4) Insnia ou hipersonia;

    5) Fadiga ou perda de energia;

    6) Sentimento de inutilidade ou culpa excessiva;

    7) Capacidade diminuda de pensar ou concentrar-se, indeciso;

    8) Agitao ou retardo psicomotor;

    9) Pensamentos de morte recorrentes.

    O BDI no abrange todos os 9 itens dos critrios diagnsticos sendo que, em relao

    ao apetite e ao peso, indaga somente sobre falta e perda deles, no questionando sobre o

    aumento de apetite ou de peso. Quanto ao sono, investiga somente sobre insnia e ignora a

    hipersonia. Percebe-se, por outro lado, a ausncia de itens que avaliem sintomas de agitao

    ou de retardo psicomotor. Porm, de acordo com Beck (1967 apud CUNHA, 2001, p.41), essa

    ausncia foi intencional, uma vez que pacientes deprimidos se queixam mais constantemente

    de perda de apetite e de peso e, em relao agitao, esta no foi includa por ser melhor

    avaliada na observao clnica.

    O BDI uma escala de auto-relato, de 21 itens, possuindo, cada um, quatro

    alternativas subentendendo-se, nelas, graus crescentes de gravidade de depresso

    (WILLIAMS; BARLOW; AGRAS, 1972), com escores variando de 0 a 3. Os itens do BDI

    referem-se : 1) tristeza; 2) pessimismo, 3) sentimento de fracasso, 4) insatisfao, 5)

    culpa, 6) punio, 7) auto-averso, 8) auto-acusao, 9) idias suicidas, 10)

    choro, 11) irritabilidade, 12) retraimento social, 13) indeciso, 14) mudana na

    auto-imagem, 15) dificuldade de trabalhar, 16) insnia, 17) fatigabilidade, 18) perda

    de apetite, 19) perda de peso, 20) preocupaes somticas e 21) perda da libido

    (CUNHA, 2001).

    O BDI constitudo por duas sub-escalas, que apresentam itens cognitivo-afetivos e

    itens que subentendem queixas somticas e de desempenho. Essa distino de padres

    sintomticos se torna til ao se avaliar depresso em pacientes da clnica mdica que podem

  • IINNTTRROODDUUOO 24 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    manifestar sintomas que costumam ser compartilhados com pacientes depressivos (CUNHA,

    2001).

    Segundo o Manual do BDI na verso em portugus (CUNHA, 2001), o escore total o

    resultado da soma dos escores individuais dos itens. O escore total permite a classificao de

    nveis de intensidade de depresso. Nessa mesma verso, os nveis descritos no Manual de

    Beck no so idnticos aos que devem ser usados em pacientes psiquitricos.

    Na verso em portugus, so estabelecidos os seguintes pontos de corte para pacientes

    psiquitricos, conforme se v no Quadro 5:

    Nvel Escores

    Mnimo 0 -11

    Leve 12 19

    Moderado 20 35

    Grave 36 63

    Quadro 5. Pontos de corte do BDI para pacientes psiquitricos.

    Os autores acreditam que os pontos de corte podem variar conforme o propsito do

    examinador e a amostra. No so sugeridos pontos de corte para populaes normais, embora

    Oliver e Simmons (1984) acreditem que o BDI poderia ser utilizado para triagem tipo de

    populao, sendo que um escore de 18 a 19 proporcionaria uma estimativa de depresso.

    Kendall e colaboradores (1987) sugerem que o termo depresso deve ser reservado somente

    para indivduos com escores acima de 20 e, preferencialmente, com diagnstico clnico j

    estabelecido. Os autores ainda afirmam que para avaliar os transtornos psquicos, seria

    desejvel utilizar mais de um instrumento na avaliao, o que poderia aumentar a confiana e

    acurcia dos resultados.

    No desenvolvimento da verso em portugus do BDI e do Inventrio de Ansiedade de

    Beck (BAI) descrito abaixo, foram empregadas trs amostras normativas: a) amostra

    psiquitrica (constituda por pacientes portadores de transtornos depressivos, transtornos

    ansiosos e outros transtornos psiquitricos); b) amostra mdico-clnica (constituda por

    pacientes portadores de doenas fsicas: cardiopatia, dor crnica, HIV+, disfuno ertil,

    obesidade, diabetes mellitus, doena pulmonar obstrutiva crnica e pacientes de unidades de

    cuidados primrios em sade) e c) amostra no-clnica (constituda por diferentes sub-

    populaes sem problemas de sade). Entretanto, os pontos de corte apresentados no manual

    da verso em portugus dos instrumentos em questo so referentes amostra psiquitrica.

  • IINNTTRROODDUUOO 25 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Apesar disso, esses pontos de corte tm sido utilizados em estudos nacionais voltados

    avaliao de ansiedade e depresso em pacientes portadores de diversos tipos de doenas

    fsicas, tais como pacientes submetidos a cirurgias eletivas de pequeno e mdio porte no

    estudo de Marcolino e colaboradores (2007) e cardiopatas com histrico recente de episdio

    agudo de doena coronria no estudo de Vilela (2008). Portanto este procedimento parece ser

    o mais comum encontrado na literatura.

    1.4 Inventrio de Ansiedade de Beck

    O Inventrio de Depresso de Beck (BAI) (anexo B) foi criado por Beck, Epstein,

    Brown e Steer em 1988 e uma escala de auto-relato, que mede a intensidade de sintomas de

    ansiedade (CUNHA, 2001).

    O instrumento, criado originalmente para uso em pacientes psiquitricos, mostrou-se

    tambm adequado populao em geral. A verso em portugus foi desenvolvida por Cunha

    (2001) e utilizada no s em grupos psiquitricos e no-psiquitricos, como tambm em

    trabalhos que envolvem outros sujeitos da comunidade.

    O construto ansiedade abrange vrios aspectos, sendo que, segundo Keedwell e

    Snaith (1996), os aspectos avaliados pelas escalas, de ansiedade podem ser agrupados de

    acordo com os seguintes tpicos: humor, cognio, comportamento, estado de hiperalerta,

    sintomas somticos e outros.

    A BAI d nfase aos aspectos somticos da ansiedade, conforme figura 1.

    Figura 1. Principais sintomas avaliados pelas escalas de ansiedade.

    Fonte: Andrade e Gorenstein, 1998.

  • IINNTTRROODDUUOO 26 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Segundo o manual do BAI, na verso em portugus, no desenvolvimento da escala

    houve a inteno de que seus itens fossem representativos de critrios diagnsticos do DSM-

    III para os transtornos de ansiedade, especialmente do pnico e ansiedade generalizada, o que

    justifica a validade de conceito do instrumento.

    O inventrio, de acordo com a verso em portugus, constitudo pelos 21 itens que

    so afirmaes descritivas de ansiedade e que devem ser avaliados pelo sujeito com referncia

    a si mesmo, numa escala de 4 pontos que refletem nveis de gravidade crescente de cada

    sintoma. So eles: 1) Absolutamente no; 2) Levemente: No me incomodou muito; 3)

    Moderadamente: Foi muito desagradvel, mas pude suportar; 4) Gravemente: Dificilmente

    pude suportar. O escore total o resultado da soma dos escores dos itens individuais que pode

    variar de 0 a 63.

    O Quadro 6 representa os pontos de corte do BAI, para pacientes psiquitricos, na

    verso em portugus, de acordo com o seu manual:

    Nvel Escores

    Mnimo 0 10

    Leve 11 19

    Moderado 20 30

    Grave 31 63

    Quadro 6. Pontos de corte do BAI para pacientes psiquitricos.

    Assim como no BDI, o ponto de corte da BAI deve ser considerado conforme os

    objetivos e amostra do estudo. No manual da verso em portugus, recomenda-se que, diante

    de um escore total classificado como moderado ou grave, pode-se pressupor a presena de

    indcios de uma ansiedade clnica.

    1.5 Escala Hospitalar de Ansiedade e Depresso

    Ansiedade e depresso so os distrbios psiquitricos mais freqentemente associados

    s doenas fsicas de uma forma geral (BOTEGA et al, 1998). Tanto a ansiedade como a

    depresso apresentam sintomas somticos e psquicos e existem vrios deles associados elas

    que tambm esto presentes em doenas fsicas.

  • IINNTTRROODDUUOO 27 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    A Escala Hospitalar de Ansiedade e Depresso (HAD) (anexo C) foi criada com a

    preocupao de avaliar somente os sintomas psquicos da ansiedade e depresso. Itens como

    insnia, fadiga, anorexia, perda de peso entre outros, que poderiam tambm ser sintomas de

    doenas fsicas, no figuram na escala, a qual se centra nos sintomas de anedonia (ZIGMOND

    E SNAITH, 1983), o que significa perda da sensao de prazer nos atos que costumavam

    proporcion-la.

    Inicialmente a HAD foi desenvolvida para identificar sintomas de ansiedade e

    depresso em pacientes internados no-psiquitricos, sendo posteriormente, a partir dos

    estudos realizados, utilizada em outros tipos de pacientes, em pacientes no internados e em

    indivduos sem doena (MARCOLINO et al, 2007).

    Em um estudo realizado por Marcolino e colaboradores (2007) para estudar a validade

    de critrio e a confiabilidade da HAD em pacientes em pr-operatrio, utilizou-se dos

    Inventrios de Depresso e Ansiedade de Beck como padro-ouro para a determinao da

    sensibilidade e da especificidade da HAD. Os resultados do estudo demonstraram uma

    correlao de 0,6 a 0,7, considerada como uma correlao de mdia para forte, concluindo-se

    que a HAD apresenta ndices de consistncia interna recomendveis para instrumentos de

    triagem.

    Bjelland e colaboradores (2002) realizaram uma reviso de literatura de 747 artigos

    que utilizaram a HAD para triagem de pacientes ansiosos e deprimidos e encontraram bom

    desempenho da escala na avaliao de pacientes com doenas fsicas, psiquitricas e de

    pessoas da populao em geral.

    A HAD avalia melhor a presena e severidade dos sintomas de ansiedade e depresso

    do que distingue entre diferentes tipos de transtornos. composta por 14 itens intercalados: 7

    de ansiedade (HAD A) e 7 de depresso (HAD D), 6 itens so codificados de 0 a 3 e 8 de

    3 a 0 (CACI et al, 2003).

    Zigmond e Snaith (1983) sugerem que quando a escala for utilizada para fins de

    pesquisa e forem includos casos que tenham uma alta probabilidade de sofrer de transtorno

    de humor, isto , uma baixa proporo de falsos positivos, o ponto de corte estabelecido deve

    ser 10/11 para cada subescala. Entretanto, quando a pesquisa exige a incluso de possveis

    casos, isto , uma baixa proporo de falsos negativos, o ponto de corte de 8/9 deveria ser

    usado.

    Em um estudo realizado por Botega e colaboradores (1998) no Brasil, com o objetivo

    de verificar a validade da HAD em pacientes epilpticos, tratados em ambulatrio, bem como

    em um grupo controle, foi possvel estabelecer o ponto de corte de 7/8 (ou seja, acima de 8

  • IINNTTRROODDUUOO 28 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    pontos) que, ao mesmo tempo, proporcionou boa sensibilidade e especificidade de ansiedade

    e depresso em ambas as escalas.

    Botega e colaboradores (1998) afirmam que a utilizao de uma escala simples, como

    a HAD, pode revelar, ao clnico, casos de transtorno de humor que freqentemente passam

    despercebidos e seguem sem tratamento especfico.

    Com base em todos os aspectos acima delineados e vinculados IC e s suas

    manifestaes afetivas, torna-se justificvel, luz dos conhecimentos atuais e dos

    instrumentos incorporados ao arsenal mdico e psicolgico, serem avaliados as manifestaes

    de ansiedade e depresso nesse grupo especial de pacientes portadores de um grave transtorno

    de sade.

  • 22 OObbjjeettiivvoo

  • OOBBJJEETTIIVVOO 30 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Verificar a presena dos sintomas de ansiedade e depresso em pacientes com IC.

    Comparar os resultados com aqueles de um grupo de pacientes sem IC.

    Correlacionar esses achados com as caractersticas sociodemogrficas dos pacientes.

  • 33 MMaatteerriiaall ee mmttooddooss

  • MMAATTEERRIIAALL EE MMTTOODDOOSS 32 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    O presente estudo do tipo caso-controle, sendo a coleta de dados realizada no

    perodo de julho/2008 a janeiro/2009.

    3.1 Amostra

    3.1.1 Grupo de estudo:

    Foi realizado um levantamento no Setor de Nosologia do Hospital de Clnicas de

    Uberlndia (HCU) referente aos pacientes com diagnstico de IC atendidos no ambulatrio,

    com idade entre 40 e 75 anos, no perodo de junho de 2006 a junho de 2007. Constatou-se que

    155 indivduos foram atendidos nessas condies.

    Foram os seguintes os critrios de incluso e excluso do estudo:

    Critrios de incluso Critrios de excluso

    Idade de 40 a 75 anos; Apresentar quaisquer outras doenas

    crnicas associadas;

    Diagnstico de IC em qualquer classe

    funcional da NYHA;

    Apresentar dificuldades em responder os

    questionrios devidos a problemas

    cognitivos;

    Frao de ejeo 40%, verificado por

    ecocardiograma empregando-se o

    mtodo de Simpson;

    Pacientes que faziam uso de

    medicamentos para tratamento de

    transtornos psiquitricos;

    Diagnstico de IC de qualquer etiologia. Pacientes que se recusassem a participar

    da pesquisa.

    Quadro 7. Critrios de incluso e excluso do grupo de estudo.

    3.1.2 Grupo Controle:

    Os participantes do grupo controle composto por 50 voluntrios foram selecionados ao

    acaso entre pacientes atendidos no Ambulatrio de Oftalmologia e de Dermatologia no HCU.

  • MMAATTEERRIIAALL EE MMTTOODDOOSS 33 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Critrios de incluso Critrios de excluso

    Idade de 40 a 75 anos; os mesmos do grupo de estudo.

    No apresentar IC.

    Quadro 8. Critrios de incluso e excluso do grupo controle.

    3.2 Mtodos

    3.2.1 Aspectos ticos

    O projeto foi aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal

    de Uberlndia (UFU) n28/2008/CEP (anexo F). Todos os participantes tiveram conhecimento

    prvio do estudo e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (anexo D).

    Quando havia necessidade de continuidade de acompanhamento mdico de qualquer

    paciente includo no estudo, este era encaminhado ao ambulatrio didtico de IC existente no

    prprio hospital. Quando se comprovava a necessidade de atendimento psicolgico, o

    paciente recebia um encaminhamento ao servio mais prximo de seu domiclio uma vez que

    o HCU no oferece este tipo de servio.

    3.2.2 Avaliao dos pacientes

    Os pacientes do grupo de estudo compareciam consulta previamente agendada por

    telefone e eram submetidos a uma avaliao clnica feita por uma profissional mdica da

    cardiologia no ambulatrio do HCU. A avaliao tinha o objetivo de registrar as condies

    clnicas do paciente e estabelecer a etiologia e a classe funcional de IC. Aps essa avaliao, o

    paciente era convidado a acompanhar a pesquisadora responsvel a uma sala reservada, para

    responder aos instrumentos BDI, BAI, HAD e ao questionrio sociodemogrfico (anexo E).

    Esse questionrio tinha como objetivo identificar os seguintes dados, em relao aos

    pacientes; ocupao, trabalho, distrao, gnero, data de nascimento, filhos, situao conjugal,

    suporte social e escolaridade.

  • MMAATTEERRIIAALL EE MMTTOODDOOSS 34 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Os instrumentos eram lidos pela pesquisadora, embora ambos sejam auto-aplicveis, em

    voz alta, tanto para o grupo de estudo, quanto para o grupo controle, uma vez que foi

    considerada a possibilidade de alguns pacientes apresentarem problemas de leitura, acuidade

    visual baixa ou dificuldade de entendimento.

    Quanto ao grupo controle, a pesquisadora responsvel entrava em contato com os

    pacientes no ambulatrio, esclarecia quanto aos pontos principais da pesquisa e, caso o

    paciente concordasse em participar, ela o conduzia a uma sala para leitura e assinatura do

    Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e dos demais instrumentos de avaliao (BDI,

    BAI, HAD, questionrio sociodemogrfico). Em outro momento, a pesquisadora realizava a

    anlise do pronturio do paciente para confirmar as informaes dadas por ele quanto ao fato

    de ser ou no o mesmo portador de doenas que se enquadrassem nos critrios de excluso.

    3.2.3 Anlise estatstica

    Para as anlises dos inventrios BDI e BAI, os pontos de corte utilizados foram os

    estabelecidos por Cunha (2001) na validao brasileira dos instrumentos. Sendo assim, o

    escore 20, em ambas as escalas, foram indicativos da presena de sintomas depressivos ou

    ansiosos.

    J a escala HAD, tanto para a subescala de ansiedade ou depresso, valores de escore 8,

    conforme recomenda Botega (1998), foram considerados como indicativos de presena de

    sintomas clinicamente significativos de depresso ou ansiedade.

    A estatstica descritiva foi utilizada para a caracterizao demogrfica e clnica dos

    participantes. Empregou-se o teste do Qui-quadrado para se verificar diferenas estatsticas

    entre o grupo de pacientes e o grupo controle em relao s variveis sociodemogrficas. Fez-

    se teste U de Mann-Whitney investigar a existncia de diferenas estatsticas significantes

    relativas aos resultados dos instrumentos psicolgicos (BDI, BAI e HAD) nos dois grupos.

    Para se detectar a existncia ou no de correlaes estatisticamente significantes entre a

    classe funcional de IC dos pacientes do grupo de estudo e os valores relativos depresso e

    ansiedade medidos pela HAD, pelo BDI e pelo BAI, foi aplicado o Coeficiente de Correlao

    por Postos de Spearman.

    O mesmo teste foi utilizado para verificao da presena de correlaes entre os dados

    sociodemogrficos (idade, ocupao, lazer, gnero, situao conjugal, escolaridade e apoio

  • MMAATTEERRIIAALL EE MMTTOODDOOSS 35 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    social) e os valores relativos depresso e ansiedade medidos pela HAD, pelo BDI e pelo

    BAI.

    Para todas as anlises foi considerada diferena estatstica significante quando p < 0,05.

  • 44 RReessuullttaaddooss

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 37 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    4.1 Seleo dos participantes do grupo de estudo

    Na constituio do grupo de estudo, os 155 pronturios dos pacientes selecionados

    foram analisados de acordo com os critrios de incluso e excluso. Desses, 30 foram

    excludos por apresentarem outras doenas associadas e 14 que haviam evoludo para o bito.

    Com os demais pacientes os 111 - restantes buscou-se contato, por ligao telefnica, para

    prestar esclarecimento sobre a pesquisa e fazer o convite para eles participarem,

    voluntariamente, do estudo. Desse total, 41 no foram encontrados nos telefones registrados

    nos pronturios e 20 se recusaram a participar do estudo. A amostragem acabou sendo

    composta por 50 pacientes.

    Fluxograma 1. Nmero de sujeitos selecionados e excludos no grupo de estudo

    4.2 Dados sociodemogrficos

    Os dados sociodemogrficos dos participantes esto descritos na Tabela 1.

    155

    pacientes

    Selecionados Excludos

    41 no

    encontrados

    e 20 se

    recusaram

    50

    pacientes

    30

    doenas

    14

    bito

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 38 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Tabela 1. Dados sociodemogrficos do grupo de estudo e do grupo controle.

    Dados sociodemogrficos Grupo de estudo Grupo controle P

    N % N %

    Gnero

    Masculino 24 48 15 30 0,065

    Feminino 26 52 35 70

    Filhos

    No 3 6 1 2 0,307

    Sim 47 94 49 98

    Estado Civil

    Casado 28 56 27 54

    ...

    Vivos 14 28 8 16

    Divorciados 5 10 8 16

    Solteiros 3 6 5 10

    Unio estvel 0 0 2 4

    Escolaridade

    No estudou 6 12 0 0

    0,001*

    1 grau incompleto 24 48 21 42

    1 grau completo 13 26 8 16

    2 grau incompleto 1 2 2 4

    2 grau completo 6 12 7 14

    Ensino superior incompleto 0 0 3 6

    Ensino superior completo 0 0 9 18

    Ocupao

    Sim 39 78 42 84 0,727

    No 11 22 8 12

    Opes de lazer (percebido)

    Sim 19 38 37 74

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 39 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Como pode ser observado na tabela 1, os grupos foram semelhantes em relao s

    variveis ocupao, gnero e filhos. No que se refere idade, escolaridade e ao lazer, os

    grupos foram estatisticamente diferentes, com o grupo de estudo apresentando idade mais

    avanada, referindo menos oportunidades de lazer e menor escolaridade.

    4.3 Resultados dos instrumentos psicolgicos

    4.3.1 Inventrio de Depresso de Beck

    O escore total mdio no BDI verificado para os pacientes foi de 18,50 e para o grupo

    controle de 10,28, sendo a diferena estatisticamente significativa (p

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 40 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Tabela 3. Dados relativos ao BDI do grupo de estudo e do grupo controle.

    Categorias do

    BDI

    Grupo de estudo Grupo controle

    n % n %

    Leve 16 32 12 24

    Mnimo 14 28 31 62

    Moderado 15 30 6 12

    Grave 5 10 1 2

    4.3.2 Inventrio de Ansiedade de Beck

    O escore mdio do grupo de estudo foi 20,46 e do grupo controle de 8,26, com

    diferena estatisticamente significante entre os grupos (p

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 41 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Tabela 5. Dados relativos ao BAI do grupo de estudo e do grupo controle.

    Categorias do

    BAI

    Grupo de estudo Grupo controle

    n % n %

    Leve 8 16 7 14

    Mnimo 16 32 37 74

    Moderado 17 34 6 12

    Grave 9 18 - -

    4.3.3 Escala Hospitalar de Ansiedade e Depresso

    Em relao ansiedade, os pacientes apresentaram, de acordo com a Tabela 6, escore

    mdio de 8,51. J os controles mostraram escore mdio de 6,28. Quanto depresso, os

    escores mdios foram 7,87 e 5,36, para pacientes e controles, respectivamente. Sendo a

    diferena entre os grupos estatisticamente significantes.

    Tabela 6. Escore mdio, desvio padro e probabilidades encontradas, quando da aplicao do teste de

    Mann-Whitney aos valores obtidos pelo grupo de estudo e pelo grupo controle aos dados relativos

    depresso e ansiedade, medidos pelo HAD.

    Variveis Analisadas G. de estudo G. controle P

    Escore mdio desvio padro

    HAD D 7,87 4,34 5,36 3,70 0,001*

    HAD - A 8,51 4,60 6,28 4,05 0,007*

    (*) Significativo para p

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 42 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Tabela 7. Dados relativos HAD do grupo de estudo e do grupo controle.

    Sub-escalas

    (escore8)

    Grupo de estudo Grupo controle

    n % n %

    Ansiedade 28 56 14 28

    Depresso 28 56 12 24

    Dessa forma, foram encontradas diferenas, estatisticamente significantes, entre os

    valores das variveis depresso e ansiedade medidos pelo HAD, BDI e BAI, sendo que os

    valores obtidos pelos pacientes foram mais elevados do que os obtidos pelo grupo controle,

    em todos os casos.

    4.4 Etiologia da Insuficincia Cardaca

    Em relao ao grupo de pacientes estudados, a etiologia identificada foi: chagsica

    (44%), hipertenso arterial (22%), isqumica (16%), hipertenso arterial e isqumica (8%),

    chagsica e isqumica (6%) e cardiomiopatia (4%) (Grfico 1).

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 43 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Grfico 1. Distribuio percentual da etiologia das cardiopatias na IC.

    4. 5 Classe Funcional

    A maioria relativa dos pacientes do grupo de estudo (24) estava na classe funcional II

    da NYHA (48%), seguidos por 16 (32%) na classe I, 9 (18%) na III e 1(2%) na II (Grfico 2).

    44%

    22%

    16%

    8%6%

    4%

    0%

    5%

    10%

    15%

    20%

    25%

    30%

    35%

    40%

    45%

    50%

    Etiologia da IC

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 44 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Grfico 2. Distribuio percentual da classe funcional dos pacientes do grupo de estudo com IC

    (NYHA).

    Foi realizada a anlise estatstica por meio de aplicao do Coeficiente de Correlao

    por Postos de Spearman aos valores relativos classe funcional dos pacientes e aos valores

    relativos depresso e ansiedade medidos pelo HAD, BDI e BAI. Encontraram-se

    correlaes estatisticamente significantes entre as classes funcionais e os escores relativos

    depresso e ansiedade (tabela 8).

    32%

    48%

    18%

    2%

    0%

    10%

    20%

    30%

    40%

    50%

    60%

    I II III IV

    Classe funcional

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 45 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Tabela 8. Correlaes de Postos de Spearman entre os instrumentos psicolgicos e a classe funcional

    de IC.

    Instrumentos psicolgicos

    HAD-D r 0,40

    p 0,01*

    HAD-A r 0.56

    p 0.0001*

    BDI r 0.52

    p 0.0005*

    BAI r 0.50

    p 0.0013*

    (*) Significativo para p

  • RREESSUULLTTAADDOOSS 46 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Tabela 9. Correlaes entre dados sociodemogrficos e clnicos do grupo de estudo e do grupo

    controle e os escores medidos pelos instrumentos psicolgicos (BDI, BAI, HAD)

    Grupo de estudo Grupo controle

    G SC E AS I O L G SC E AS I O L

    HAD-D r -0,09 0,22 -0,25 -0,10 -0,04 0,09 -0,36* -0,26 -0,26 0,05 -0,13 0,06 -0,01 -0,52*

    p 0,54 0,12 0,08 0,51 0,80 0,53 0,01* 0,07 0,07 0,73 0,35 0,66 0,94 0,00*

    HAD-A r -0,24 0,06 -0,02 -0,05 -0,11 0,07 -0,26 -0,18 -0,02 0,03 -0,14 -0,08 0,12 -0,37*

    p 0,09 0,66 0,88 0,75 0,46 0,62 0,07 0,22 0,88 0,83 0,33 0,57 0,42 0,01*

    BDI r -0,11 0,10 -0,30* -0,04 -0,02 -0,06 -0,27 -0,17 -0,27 0,03 -0,32* 0,13 -0,06 -0,38*

    p 0,44 0,48 0,04* 0,76 0,88 0,70 0,06 0,24 0,06 0,82 0,02* 0,36 0,66 0,01*

    BAI r -0,31 0,12 -0,13 -0,06 -0,06 -0,13 -0,30* -0,21 -0,19 0,03 -0,02 0,09 0,00 -0,34*

    p 0,06 0,40 0,37 0,70 0,68 0,36 0,04* 0,14 0,19 0,85 0,89 0,51 0,98 0,02*

    G gnero; SC situao conjugal; E escolaridade; AS apoio social; I idade; O ocupao; L

    lazer

    (*) Significativo para p

  • 55 DDiissccuussssoo

  • DDIISSCCUUSSSSOO 48 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    5.1 Dados sociodemogrficos

    Os pacientes do presente estudo mostram dados sociodemogrficos relativos a sexo,

    idade e estado civil, semelhantes aos registrados por outros estudos realizados com pacientes

    com IC (REDEKER, 2006; MULLER-TASCH et al, 2007; SCHERER et al, 2007). A mdia

    de idade dos pacientes do grupo de estudo, 64,18 8,28, foi compatvel com a literatura que

    confirma que a IC atinge principalmente os idosos (CARDOSO et al 2008).

    Quanto diferena de idade do grupo de estudo e de controle, nota-se que foi pequena;

    tambm no se encontrou correlao da idade com os escores de depresso e ansiedade,

    embora existam estudos demonstrando essa correlao (REDEKER, 2006).

    Os pacientes com IC desse estudo tm um nvel de escolarizao menor do que os do

    grupo controle. A maioria dos pacientes com IC do presente estudo tem como etiologia a

    cardiopatia chagsica, e devido origem rural, provavelmente tiveram menor acesso escola.

    Outro estudo encontrado (GOTTLIEB et al 2004) avaliou o grau de escolaridade desse tipo de

    pacientes e detectou-se que a maioria possua o 2 grau completo. Porm, preciso ressaltar

    que esse estudo foi realizado nos Estados Unidos, com uma populao com caractersticas

    sociais bastante diferentes do Brasil.

    A maioria dos pacientes com IC afirma no desfrutar de nenhum tipo de lazer,

    enquanto, no grupo controle, a grande maioria tem na sua rotina alguma forma de lazer. Esse

    dado pode estar vinculado prpria limitao fsica e social imposta pela IC e ao tratamento e

    tambm ao quadro depressivo, sendo que um dos seus aspectos o desinteresse do paciente

    por atividades antes geradoras de prazer com consequente isolamento social.

    A varivel lazer tambm mostrou correlao significante negativa com ansiedade e

    depresso na maioria dos instrumentos psicolgicos (BDI, BAI, HAD) em ambos os grupos.

    Isto quer dizer que quanto maiores so as possibilidades de lazer, menos sintomas de

    ansiedade e depresso os pacientes apresentam. Algumas atividades de lazer podem ter um

    potencial de reduo do estresse psicossocial possibilitando uma melhoria do humor positivo

    e a reduo do humor negativo (IWASAKI Y; MANNELL, 2000). Alguns estudos tambm

    mostram que o lazer tem um efeito positivo na sade fsica e na mental, o que, por sua vez,

    reflete-se nos nveis de depresso e ansiedade (SANTOS; RIBEIRO; GUIMARES, 2003).

  • DDIISSCCUUSSSSOO 49 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    5.2 Ansiedade e depresso

    Apesar do avano no tratamento da IC, a mortalidade dos pacientes em fase avanada

    da doena a mesma de muitos cnceres agressivos, em torno de 40% em um ano

    (MACMAHON; LIP, 2002). Os fatores psicolgicos implicam a precipitao das

    hospitalizaes de muitos pacientes com IC, sendo que conflitos emocionais ou perdas de

    entes queridos precedem admisso em 49% dos pacientes. A participao desses fatores em

    pacientes admitidos em hospitais com outras doenas de 24% (PERLMAN et al, 1971).

    Apesar dessas constataes, s recentemente tem sido feitos esforos no sentido de se estudar

    e entender melhor a influncia dos fatores psicolgicos na evoluo da IC.

    Em virtude da escassez de estudos nessa rea, os resultados encontrados no presente

    estudo no podem ser facilmente comparados a outros dados. Ao se delimitar a anlise da

    literatura s publicaes nacionais, percebe-se a inexistncia de estudos realizados no Brasil

    com o objetivo de avaliar os nveis de ansiedade e depresso em pacientes com IC. Nos

    estudos internacionais, diversos instrumentos so utilizados para medir os transtornos

    psquicos. Quando utilizado o BDI e o BAI, vrios pontos de corte so adotados, o que

    impossibilita, em alguns casos, a comparao dos resultados. Por fim, em muitos estudos

    somente so avaliados pacientes internados, o que pode representar um vis na seleo dos

    pacientes, uma vez que a literatura aponta a hospitalizao como fator causador da

    instabilidade emocional.

    Os pacientes do estudo apresentaram mdia dos escores na BDI e BAI, de 18,50 e

    20,46, respectivamente, mais elevados que na amostra de pacientes cardiopatas e com outras

    doenas relatados nas pesquisas realizadas por Cunha (2001) para validao das escalas na

    verso brasileira utilizando, para isso, uma amostra mdico-clnica. A mdia dos escores dos

    sujeitos no BDI foi, segundo Cunha (2001): cardiopatas (11), dor crnica (15), HIV+ (21),

    disfuno ertil (17), obesidade (9), diabetes mellitus (16) e doena pulmonar obstrutiva

    crnica (16). Pode-se perceber que somente os pacientes portadores de HIV+ possuem um

    escore mais elevado que os pacientes com IC. Na BAI, a mdia dos escores dos pacientes com

    IC apresentou-se sempre maior que todas as amostras mdico-clnicas avaliadas na validao

    no Brasil: cardiopata (11,77), disfuno ertil (13), obesidade (6,87) e doena pulmonar

    obstrutiva crnica (16).

  • DDIISSCCUUSSSSOO 50 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    Em relao s amostras dos grupos psiquitricos, os pacientes com IC do presente

    estudo tiveram mdia de escores mais elevados na BDI do que pacientes dependentes de

    lcool (16,54) e semelhantes a sujeitos com transtorno de agorafobia (19,37) e dependncia de

    outras substncias (19,95). Quanto BAI, a mdia dos escores dos pacientes com IC foi

    superior aos enfermos dependentes de lcool (12,94) e os de outras substncias (15,68). Esses

    dados mostram que pacientes com IC possuem nveis de ansiedade e depresso semelhantes

    ou piores quando comparados a pacientes com outras patologias graves e/ou crnicas.

    Os resultados desse e de outros revelam que a depresso comum em pacientes com

    IC. Gottlieb e colaboradores (2004) verificaram que 48% dos pacientes com IC avaliados pela

    BDI apresentavam depresso. Westlake e colaboradores (2005), tambm utilizando a BDI,

    encontraram prevalncia de depresso de 48,5% em pacientes com IC. Contudo, estes autores

    utilizaram um ponto de corte > 10. Utilizando a BDI no presente estudo e estabelecendo um

    ponto de corte > 20, 40% dos pacientes apresentaram um escore sugestivo de depresso.

    Haworth e colaboradores (2005) encontraram a prevalncia de 18,4% e 28,6% de ansiedade e

    depresso, respectivamente, em pacientes avaliados pela Structured Clinical Interview (SCID-

    I).

    Algumas hipteses explicativas so apontadas para justificar essa relao da depresso

    a IC. Cardoso e colaboradores (2008) relacionam as seguintes:

    - o fato de a IC ser uma doena crnica, incapacitante e de prognstico no favorvel;

    - insnia, fadiga ou pesadelos so reportados por alguns pacientes que tomam

    betabloqueadores;

    - vida sexual perturbada pela doena e tambm pela disfuno ertil ligada aos

    diurticos e aos bloqueadores adrenrgicos;

    - a utilizao de amiodarona, que pode provocar disfuno tireoidiana, pode contribuir

    para a instalao de um quadro depressivo secundrio.

    - no adeso ao tratamento, pelos efeitos colaterais e custo financeiro;

    - mecanismos fisiopatolgicos: ativao neurohumoral, alteraes do ritmo cardaco,

    inflamao e hipercoagulabiliadade.

    Quanto mdia dos escores da HAD, os pacientes do grupo de estudo obtiveram 8,51

    de ansiedade e 7,87 de depresso, sendo que, tanto os pacientes ansiosos quanto os

    deprimidos, representaram 56% da amostra. Esse resultado significativo, principalmente

    quando comparado ao estudo de Junger e colaboradores (2005), que avaliou pacientes com IC

    utilizando a HAD. Aps 24 meses da aplicao da escala, verificou-se o nmero de pacientes

  • DDIISSCCUUSSSSOO 51 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    sobreviventes e no-sobreviventes. Aqueles que no sobreviveram tiveram escore mdio de

    ansiedade de 7,83,6 e de depresso 6,14,3.

    A ansiedade uma condio geralmente presente em comorbidade com a depresso.

    Porm, nos estudos encontrados, h escassez de trabalhos que avaliem ansiedade nos

    pacientes com IC.

    O presente estudo demonstrou nvel de ansiedade com relevncia clnica nas duas

    escalas avaliadas: 56% na HAD e 52% na BAI e ambas apresentando diferena

    estatisticamente significante dos resultados obtidos no grupo controle. Majani, Pierobon e

    Giardini (1999), no encontraram diferena, em relao ansiedade, entre pacientes com IC e

    aqueles internados com outras doenas avaliados com a escala Cognitive Behavioral

    Assessment 2.0 Depression Scale. Porm, o estudo apresentou algumas limitaes e dentre

    elas a de avaliar somente sujeitos do sexo masculino. Em outro estudo, Friedman (2006)

    encontrou alta prevalncia de ansiedade e depresso em pacientes com IC, 45% (BDI -

    escore>13) e 36% (State Trait Anxiety Inventory - escore >40) respectivamente, sendo

    verificado por este autor que depresso, mas no ansiedade pode predizer a mortalidade

    independentemente de outros dados demogrficos.

    Konstam, Moser e Jong (2005) consideram que a ansiedade uma reao normal e

    com funo de adaptao ao diagnstico de uma doena crnica e que ela somente torna-se

    nociva se for persistente ou extrema.

    Apesar dessas suposies, os transtornos de ansiedade deveriam despertar a ateno

    dos pesquisadores, uma vez que a literatura cientfica demonstra, em estudos com populaes

    portadoras de doenas cardacas, o efeito negativo da ansiedade na fisiologia do corao.

    Quando se correlacionaram os escores de ansiedade e depresso dos pacientes do

    grupo de estudo e do grupo controle aos dados sociodemogrficos, no foi encontrada

    correlao em relao s variveis: gnero, idade, ocupao e situao conjugal. Rohyans

    (2009) tambm no encontrou correlao entre as variveis depresso, sexo e estado civil,

    numa pesquisa envolvendo 150 pacientes com IC. No mesmo estudo houve, entretanto,

    correlao negativa entre a idade e sintomas depressivos. Outro estudo analisado (FRASURE-

    SMITH et al, 2009) encontrou um risco maior de depresso para pacientes com IC no

    casados.

    Uma possvel explicao para a ausncia de correlao entre essas variveis

    sociodemogrficos e a ansiedade e depresso no presente estudo o fato de que os pacientes

    parecem atribuir suas dificuldades aos aspectos internos ao invs dos externos. A doena

  • DDIISSCCUUSSSSOO 52 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    provoca uma regresso psicolgica que leva o sujeito a retirar o investimento emocional dos

    objetos externos (pessoas e coisas) para investir no prprio ego, consistindo em uma tentativa

    de reconstituio do seu prprio eu (SIMONETTI, 2004).

    Um aspecto importante a ser mencionado a ausncia de correlao encontrada no

    presente estudo entre a existncia de algum tipo de suporte social e sintomas de ansiedade e

    depresso. Houve correlao significante negativa somente no grupo controle e os escores da

    BDI. Algumas pesquisas tm afirmado que o suporte social poderia ter um efeito amortecedor

    nos eventos estressantes da vida (ZIGMOND; SNAITH, 1983; ROHYANS, 2009). Em

    pacientes com IC sintomtica, verificou-se que o isolamento social constitui-se em preditor

    significativo da mortalidade (MURBERG, 2004).

    Desse modo, apesar de no ter havido correlao entre essas variveis no grupo de

    estudo, existem algumas evidncias de que a ausncia de suporte social possa contribuir para

    uma evoluo desfavorvel da IC.

    5.3 Instrumentos psicolgicos: BDI, BAI E HAD.

    Analisando-se os diversos instrumentos existentes e validados em nosso meio para

    avaliar a depresso e ansiedade, verifica-se que no existe consenso entre os pesquisadores a

    respeito de um ponto de corte que seja aplicvel para as diversas populaes mdico -

    clinicas. Percebe-se, porm, a partir dos resultados do presente estudo, que a amostra de

    pacientes com IC apresenta escores elevados que sugerem relevncia clnica da depresso e

    ansiedade.

    A avaliao de sintomas de ansiedade e de depresso apresenta dificuldades

    principalmente no que diz respeito escolha dos instrumentos de avaliao. Muitos deles

    avaliam os sintomas somticos e afetivos dos transtornos, o que pode causar confuso na

    anlise de populaes mdico-clnicas, pois doenas fsicas como a IC, por exemplo,

    compartilham sintomas somticos com os transtornos mentais. Apesar da dificuldade

    existente, importante discernir se o paciente apresenta ansiedade ou depresso para que se

    possa intervir de forma correta, visto que pacientes com sintomas psicolgicos no

  • DDIISSCCUUSSSSOO 53 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    observados tendem a no aderir aos tratamentos e a tornar crnicos seus sofrimentos

    emocionais.

    Botega e colaboradores (1998) verificaram a validade da HAD em indivduos

    epilpticos tratados em ambulatrio e a escala revelou-se potencialmente til como

    instrumento de rastreamento (screening) de pacientes. Os autores dizem ainda que o efeito

    linear mostrou-se significante nas duas subescalas da HAD, de ansiedade e depresso, ou seja,

    medida que a pontuao nas subescalas aumenta, cresce o nmero de diagnsticos de

    ansiedade e depresso feitos pelo DSM-III.

    Bjelland e colaboradores (2002) concluram, numa reviso de literatura acerca da

    validade da HAD, que o instrumento adequado para triagem de casos de transtornos de

    ansiedade e depresso e ainda consideram que ela tem as mesmas propriedades quando

    aplicada em amostras da populao em geral, da clnica mdica e da psiquiatria.

    Os instrumentos psicolgicos de Beck possuem o conveniente de serem largamente

    utilizados em pesquisas no Brasil e no mundo, porm so padronizados visando a utilizao

    restrita a profissionais da rea de sade mental (psiclogos). A HAD uma escala simples e

    curta; avalia somente os sintomas psicolgicos dos transtornos e pode ser utilizada por outros

    profissionais da sade, inclusive o cardiologista, facilitando o trabalho de identificao dos

    sintomas depressivos e ansiosos e o encaminhamento do paciente ao profissional da sade

    mental. A HAD tambm pode ser utilizada sem maiores dificuldades em indivduos com

    baixa escolaridade os quais constituem a maioria dos usurios da sade pblica no contexto

    nacional (DELFINI et al, 2009). No entanto, as pesquisas com a utilizao desse instrumento

    no Brasil encontram-se apenas no incio.

    5.4 Efeitos das classes funcionais

    No presente estudo, ocorreu predomnio de pacientes na classe II de IC, o que se

    mostra compatvel com o encontrado em outros estudos (JUNGER et al, 2005; HAWORTH et

    al, 2005; REDEKER, 2006). Uma vez que os pacientes foram convidados a participar da

    pesquisa, sups-se que aqueles que se sentiam melhor fisicamente aceitaram se deslocar de

  • DDIISSCCUUSSSSOO 54 __________________________________________________________________________

    Juliana de Souza Andro

    suas casas tanto para irem ao hospital como para participarem do estudo. Os pacientes nas

    classes III e IV muitas vezes esto muito debilitados e indispostos.

    medida que a classe funcional de IC avana, o paciente tambm se mostra mais

    deprimido e ansioso. Esses achados so compatveis a outros estudos como o de Haworth e

    colaboradores (2005), que consideram a classe funcional como um preditor de ansiedade e

    depresso. A diminuio da capacidade funcional do paciente resulta numa diminuio dos

    contatos sociais, aumento das limitaes de atividades, e aumento do sentimento de

    desamparo e solido.

    Jnger e colaboradores (2005) realizaram um estudo prospectivo com o objetivo de

    investigar a influncia da depresso na mortalidade de pacientes com IC utilizando a HAD.

    Eles descobriram que os pacientes que no sobreviveram estavam em classes funcionais mais

    avanadas e apresentavam maiores ndices de depresso e ansiedade. Em uma observao

    interessante, verificaram ainda, numa anlise multivariada, que a depresso pode predizer a

    mortalidade independentemente da classe funcional. Os autores relacionam alguns fatores

    para justificar essa descoberta, entre eles, a pouca aderncia ao tratamento por parte dos

    pacientes deprimidos. Se esse fato for real, pode impactar resultados a mdio e longo prazo,

    pois j sabemos que a adeso ao tratamento influencia diretamente na morbidade e

    mortalidade na IC.

    Na classe funcional I, o paciente no apresenta sintomas e limitaes nas suas

    atividades rotineiras. Os sintomas fsicos mais intensos repercutem em classes mais avanadas

    de maneira que, na classe IV, o paciente apresenta grandes limitaes fsicas, com sintomas

    presentes mesmo quando est em repouso. Contrariamente, na classe I, o paciente tem o

    conhecimento do diagnstico, tanto da doena de base que provocou a IC, como da prpria

    IC, porm no apresenta limitaes fsicas relacionadas doena.

    No presente estudo, foi verificado que o sofrimento emocional aumenta conforme

    ocorre a progresso da classe funcional, o que nos faz supor que essa condio est associada

    s limitaes fsicas que a IC impe ao paciente, uma vez que elas aproximam o doente da

    morte fazendo-o sentir-se ameaado em sua integridade fsica e psquica. Porm, uma vez que

    a BDI e a BAI avaliam os sintomas somticos e psquicos dos transtornos e a HAD somente

    os sintomas psquicos, e os pacientes apresentaram altos ndices de ansiedade e depresso nos

    trs instrumentos psicolgicos, pode-se perceber que os sintomas fsicos no so

    determinantes, isoladamente, para a composio dos quadros clnicos de ansiedade e

    depresso.

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