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4ª edição 2014 Leonardo de Medeiros Garcia Coordenador da Coleção Rafael Barretto Mestre em Direito. Advogado e Professor. [email protected] www.rafaelbarretto.com.br DIREITOS HUMANOS DIREITOS HUMANOS COLEÇÃO SINOPSES PARA CONCURSOS

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4ª edição2014

Leonardo de Medeiros GarciaCoordenador da ColeçãoRafael BarrettoMestre em Direito.Advogado e Professor.rafaelconstitucional@hotmail.comwww.rafaelbarretto.com.br

DIREITOSHUMANOS

DIREITOSHUMANOS

C O L E Ç Ã O S I N O P S E SP A R A C O N C U R S O S

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Guia de leitura da Coleção

A Coleção foi elaborada com a metodologia que entendemos ser a mais apropriada para a preparação de concursos.

Neste contexto, a Coleção contempla:

• DOUTRINA OTIMIZADA PARA CONCURSOS

Além de cada autor abordar, de maneira sistematizada, os assuntos triviais sobre cada matéria, são contemplados temas atuais, de suma importância para uma boa preparação para as provas.

Ora, se em nenhum caso poderão invocar-se circunstâncias excepcionais como justifi cação para a tortura, aparenta que a tortura é uma prática vedada em toda e qualquer situação, havendo sim de se lhe reconhecer um caráter absoluto.

Agora, atenção, o caráter absoluto desse direito é uma exceção à regra da relativização dos direitos humanos e, de maneira geral, não costuma ser explorada em provas objetivas de concurso, que costumam afi rmar a relatividade como característica dos direitos humanos.

• ENTENDIMENTOS DO STF E STJ SOBRE OS PRINCIPAIS PONTOS

No Brasil, um dos mais importantes julgados do STF sobre o tema, talvez o primeiro em que realmente se deu um destaque ao debate da efi cácia horizontal é o Recurso Extraordinário 201.819, no qual a Corte fi rmou posição que a exclusão de um sócio de uma entidade associativa deve observar o devido processo legal.

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• PALAVRAS-CHAVES EM OUTRA COR

As palavras mais importantes (palavras-chaves) são colocadas em outra cor para que o leitor consiga visualizá-las e memorizá-las mais facilmente.

O procedimento para adoção de uma medida não convencional é disciplinado pela Resolução 1503 do Conselho Econômico e Social da ONU, e se inicia por uma petição, apresentada por qualquer indi-víduo, à Comissão de Direitos Humanos da ONU, denunciando a vio-lação sistemática de direitos.

• QUADROS, TABELAS COMPARATIVAS, ESQUEMAS E DESENHOS

Com esta técnica, o leitor sintetiza e memoriza mais facilmente os principais assuntos tratados no livro.

Eixo orientador Diretrizes

Objetivos estratégicos

Ações pro-gramáticas

• QUESTÕES DE CONCURSOS NO DECORRER DO TEXTO

Através da seção “Como esse assunto foi cobrado em concurso?” é apresentado ao leitor como as principais organizadoras de concurso do país cobram o assunto nas provas.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova do 16º concurso do Ministério Público do Trabalho trouxe a seguinte proposição: “O sistema interamericano de proteção dos direi-tos humanos tem como principal instrumento a Convenção Americana de Direitos Humanos, que estabelece a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana”. Está correto!

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TEORIA GERAL DOS DIREITOS HUMANOS

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Teoria geral dos direitos humanosSumário • 1. O que são direitos humanos. Direitos humanos e direitos fundamentais – 2. Centralidade dos direitos humanos. Por que direitos humanos são tão importantes? – 3. Quais são os direitos humanos. Tipos de direitos – 4. Direitos e garantias. Tipos de garantias – 5. Características dos direitos humanos: 5.1. Historicidade. A expansão dos direi-tos humanos. A proibição de retrocesso; 5.2. Univer-salidade. A universalidade e o relativismo cultural; 5.3. Relatividade. A relativização de direitos e os direitos absolutos; 5.4. Irrenunciabilidade. A não faculdade de dispor sobre a proteção da dignidade humana; 5.5. Inalienabilidade; 5.6. Imprescritibili-dade; 5.7. Unidade, indivisibilidade e interdepen-dência dos direitos humanos – 6. Evolução histórica dos direitos humanos. As gerações (ou dimensões) de direitos humanos: 6.1. A 1ª geração de direitos humanos; 6.2. A 2ª geração de direitos humanos; 6.3. A 3ª geração de direitos humanos; 6.4. Qua-dro comparativo entre as 3 grandes gerações de direitos humanos; 6.5. Outras gerações de direitos humanos; 6.6. Gerações ou dimensões de direitos humanos? – 7. Efi cácia vertical, horizontal, diago-nal e vertical com repercussão lateral dos direitos humanos – 8. Limitação de direitos humanos: 8.1. Primeiras observações; 8.2. Limitação pelo Legisla-tivo, pelo Executivo e pelo Judiciário; 8.3. Teoria dos limites da limitação; 8.4. Proporcionalidade como limite à limitação de direitos.

1. O QUE SÃO DIREITOS HUMANOS. DIREITOS HUMANOS E DIREITOS FUN-DAMENTAIS

Numa primeira abordagem, é possível defi nir direitos humanos como conjunto de direitos que materializam a dignidade humana; direitos básicos, imprescindíveis para a concretização da dignidade humana.

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É extremamente comum utilizar também a expressão “direitos fundamentais” para se referir aos direitos que materializam a digni-dade humana, cabendo perquirir se haveria, entre os direitos huma-nos e os direitos fundamentais, alguma diferença.

Em essência, não há basicamente diferença: direitos humanos e direitos fundamentais representam, muitas vezes, os mesmos direitos.

Entretanto, construiu-se uma diferenciação quanto ao plano de positivação; a expressão “direitos fundamentais” fi cou reservada aos direitos positivados na ordem jurídica interna do Estado, enquanto a expressão “direitos humanos” passou a ser utilizada para referir aos direitos positivados na ordem internacional.

Ilustrativamente, a constituição brasileira, ao positivar direitos, se refere, no Título II, aos “Direitos e Garantias Fundamentais”; de outro modo, no art. 5º, § 3º, menciona tratados internacionais sobre “direitos humanos”.

Importante!Direitos humanos e direitos fundamentais se diferenciam, essencialmente, no plano de positivação; os primeiros são positivados em documentos internacionais, os segundos são positivados na ordem jurídica interna de cada Estado.

É possível haver direito humano que não seja consagrado como direito fundamental e vice-versa; basta que um tratado internacional preveja um direito não previsto na ordem jurídica interna do Estado ou que ocorra o contrário.

De todo modo, essa não é a regra, pois, atualmente, a maioria dos direitos previstos nas constituições têm previsão, outrossim, em documentos internacionais.

A liberdade de expressão, v.g., está positivada na constituição brasileira, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, sendo, portanto, um direito humano e um direito fundamental.

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TEORIA GERAL DOS DIREITOS HUMANOS

Importante!É possível haver direito humano que não seja direito fundamental e haver direito fundamental que não seja direito humano, mas, na maioria das vezes, existe coincidência, pois muitos dos direitos consagrados nas constituições encontram positivação, outrossim, nos tratados internacio-nais.

2. CENTRALIDADE DOS DIREITOS HUMANOS. POR QUE DIREITOS HUMANOS SÃO TÃO IMPORTANTES?

Os direitos humanos constituem ponto central nos Estados Cons-titucionais, sendo inerentes à ideia de Estado Democrático de Direito, e a razão é simples.

Um Estado no qual as pessoas não tenham liberdades básicas reconhecidas é um Estado arbitrário e, como bem demonstra a Histó-ria, onde há arbitrariedade estatal, não há vida harmônica em socie-dade, mas sim temor, perseguição e desrespeito ao ser humano.

Paz social somente é possível em Estados cuja ordem jurídica limite o poder e proclame direitos humanos, permitindo às pessoas o pleno desenvolvimento da dignidade e a busca da felicidade, e, justamente por isso, os Estados Democráticos proclamam a digni-dade humana e afi rmam direitos fundamentais.

Nessa esteira, o Estado Brasileiro adota a dignidade humana como um dos seus fundamentos, conforme positivado no art. 1º, III/CF, a denotar um comprometimento com a afi rmação dos direitos humanos.

3. QUAIS SÃO OS DIREITOS HUMANOS. TIPOS DE DIREITOS

a relação de direitos que materializam a dignidade humana é bastante ampla, abrangendo vida, liberdade, igualdade, saúde, edu-cação, acesso à cultura, proteção ao ambiente, e tantos outros.

Os diversos direitos estão “agrupados” sob a seguinte rubrica:

• Direitos civis

• Direitos políticos

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• Direitos sociais

• Direitos econômicos

• Direitos culturais

• Direitos difusos

Como exemplo de direito civil tem-se a liberdade de expressão; de direito político o direito de sufrágio; de direito social, a educação; de direito econômico a proteção ao trabalho; de direito cultural o fomento às praticas culturais; e de direito difuso o meio ambiente.

Esses direitos foram sendo reconhecidos gradativamente no curso da História, tendo sido institucionalizados em diferentes momentos históricos, daí surgindo a teoria das gerações, que será analisada mais adiante.

4. DIREITOS E GARANTIAS. TIPOS DE GARANTIAS

Um direito representa um determinado bem em si, atrelado ao valor nele existente, enquanto que as garantias representam bens de caráter instrumental, bens que estão atrelados a outro valor, visando protegê-los, sendo as garantias instrumentos de proteção de direi-tos.

Em exemplo, a liberdade de locomoção é um bem em si, consti-tuindo, pois, um direito, ao passo que o habeas corpus é um instru-mento de proteção desse direito, sendo, portanto, uma garantia.

Importante!Direitos são bens em si mesmo; garantias são bens de caráter instrumen-tal. A liberdade de locomoção é um direito e o habeas corpus é uma garantia desse direito.

Para identifi car se determinado bem consagrado na Constituição é um direito ou uma garantia basta perscrutar se o bem é um bem em si ou um instrumento de proteção de outro bem. Se for um bem em si, é um direito; se for um instrumento de proteção de outro bem, é uma garantia.

A inviolabilidade de domicílio, por exemplo, é uma garantia, pois o que se protege não é a casa das pessoas, mas a privacidade delas;

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é dizer, visando proteger o direito à privacidade das pessoas, a norma constitucional (art. 5º, XI/CF) torna o domicílio inviolável.

Bem por isso, o STF entende que a noção de domicílio abrange qualquer unidade de habitação na qual a pessoa esteja reserva-damente, ainda que se trate de habitação temporária ou coletiva, como hotéis e pensionatos, e, também, o local onde a pessoa exerce, reservadamente, sua atividade profi ssional, eis que, em todas essas situações, a pessoa se encontra em sua privacidade.

Existem garantias da constituição, garantias institucionais e garantias de direitos subjetivos, as primeiras atreladas à defesa da constituição, as segundas ao livre funcionamento de determinadas instituições e as terceiras ao livre exercício de direitos fundamentais.

As garantias da constituição são instrumentos de proteção da ordem constitucional, visando preservá-la de situações que coloquem em risco sua supremacia e a normalidade constitucional, podendo ser citadas a rigidez constitucional, a jurisdição constitucional e os mecanismos de legalidade extraordinária (estados de defesa e sítio).

As garantias institucionais constituem verdadeiras prerrogativas das Instituições, podendo ser citadas, como exemplos, a autonomia administrativa e fi nanceira de cada Poder, a imunidade processual penal do Presidente da República, as imunidades parlamentares e a vitaliciedade dos juízes.

As garantias de direitos subjetivos constituem instrumentos de proteção de direitos subjetivos, extremamente importantes na busca da efetivação dos mesmos, pois de nada adiantaria reconhecer direitos se não houvesse instrumentos capazes de torná-los efetivos e protegê-los de atuações arbitrárias.

Algumas das garantias de direitos subjetivos possuem feição típica de ação processual e, bem por isso, são conhecidas como ações constitucionais. São o habeas corpus, o habeas data, o mandado de segurança, o mandado de injunção e a ação popular.

O habeas corpus é uma garantia do direito à liberdade de loco-moção; o habeas data, do direito à liberdade de informação de caráter pessoal; o mandado de segurança, de direitos em geral; o mandado de injunção, de direitos inviabilizados por falta de regu-

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lamentação; a ação popular, do direito de proteção ao patrimônio público.

5. CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS HUMANOS

Os direitos possuem diferentes características, mas se costuma indicar, no plano de uma teoria geral, características que seriam ine-rentes aos direitos humanos como um todo.

Essas características gerais são:

• Historicidade;

• Universalidade;

• Relatividade;

• Irrenunciabilidade;

• Inalienabilidade;

• Imprescritibilidade;

• Unidade, indivisbilidade e interdependência.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova do Ministério Público do Acre, de 2008, trouxe a seguinte propo-sição: “São características dos direitos humanos a universalidade, a histori-cidade e a indivisibilidade”. Está correto!

Vejamos em seguida cada uma dessas características.

5.1. Historicidade. A expansão dos direitos humanos. A proibição de retrocesso

A historicidade é, já dizia Bobbio, na clássica obra "A Era dos Direitos"¸ talvez a mais marcante característica dos direitos humanos.

Ela signifi ca que os direitos humanos são frutos do processo his-tórico; resultam de uma longa caminhada histórica, marcada muitas vezes por lutas, sofrimento e violação da dignidade humana.

Os direitos humanos que hoje estão reconhecidos não surgiram “do nada”, a partir de uma concessão de algum governante ou de

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um ser divino, senão que resultaram de lutas da humanidade no pro-cesso histórico, muitas vezes indo de encontro justamente à vontade dos governantes.

Essa característica denota ainda que os direitos humanos não surgiram todos ao mesmo tempo, mas, sim, gradativamente, em dife-rentes momentos históricos. Em outras palavras, em cada momento da Histórica, determinados direitos foram reconhecidos.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova da Defensoria Pública do Piauí, de 2009, da Cespe, trouxe a seguinte proposição: “Os direitos fundamentais surgem todos de uma vez, não se originam de processo histórico paulatino”. Evidente que a propo-sição está errada!

Os direitos foram reconhecidos historicamente no momento em que surgiram as condições para que passassem a se reconhecidos, é dizer, no momento em que se tornou possível que determinada aspiração social deixasse de ser uma mera aspiração e passasse a ser reconhecida como direito.

Ilustrando, o direito ao ambiente não foi reconhecido no século XVIII, juntamente com os direitos liberais, mas apenas no século XX, e isso porque as condições sociais para o reconhecimento desse direito só surgiram no século XX; no século XVIII proteção ao ambiente não integrava a pauta de reivindicações sociais.

Como as condições sociais para o reconhecimento do direito ao ambiente só surgiram no século XX, foi nesse período que ele foi institucionalizado, donde se depreende que os direitos não surgiram todos de uma vez só, mas sim, em diferentes momentos históricos.

Importante!Os direitos humanos não surgiram todos ao mesmo tempo; surgiram gradativamente ao longo dos anos, é dizer, em cada período da História determinados direitos foram sendo institucionalizados.

A compreensão de que os direitos humanos são direitos históri-cos refuta a tese de que eles seriam direitos naturais, decorrentes da própria natureza das coisas, de uma autoridade moral superior, como já se chegou a defender no período das revoluções liberais.

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Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova do Ministério Público do Acre, de 2008, trouxe a seguinte pro-posição: “São características dos direitos humanos serem direitos naturais, emanados de autoridade superior”. Está errado!

O que é natural é atemporal, ahistórico, sempre existiu, “sempre esteve lá”, como acontece com os eventos e forças da natureza, mas não é isso que ocorre com os direitos humanos, que não “estiveram sempre lá”, senão que foram sendo reconhecidos gradativamente ao passar dos anos, com muita luta da Humanidade.

Deve ser recordado que, no curso da História, pessoas foram tor-turadas, escravizadas, mulheres não puderam votar etc e somente com muita luta e com o passar dos anos é que tais condutas, e outras tantas, foram abolidas, de modo que as pretensões de respeito ao ser humano foram sendo convertidas em direitos, não naturais, mas, sim, positivos, positivados, conquistados.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova do Ministério Público do Acre, de 2008, trouxe a seguinte pro-posição: “São características dos direitos humanos sua atemporalidade em relação à historicidade de cada nação”. Está errado!

De todo modo, é de reconhecer que a concepção de direitos humanos como direitos naturais, apesar de equivocada, teve impor-tância histórica, pois serviu de base fi losófi ca para as revoluções liberais, que levaram à queda do absolutismo, representando, talvez, o primeiro passo na caminhada da afi rmação dos direitos humanos.

Aspecto importante da historicidade dos direitos humanos é que ela é expansiva, o que signifi ca dizer que a caminhada histórica é sempre no sentido de reconhecer novos direitos e ampliar a prote-ção à pessoa, não se admitindo suprimir direitos já reconhecidos na ordem jurídica, pois isso confi guraria um retrocesso.

A compreensão de que não seria possível suprimir direitos, sob pena de retroceder, é objeto da tese da PROIBIÇÃO DE RETROCESSO, segundo a qual suprimir direitos já incorporados ao patrimônio jurí-dico da Humanidade corresponderia a um retrocesso na afi rmação da dignidade humana.

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Em exemplo, suprimir a proibição de tortura equivaleria a igno-rar os sofrimentos que a Humanidade passou até que essa prática fosse vedada, restaurando uma situação abominável, que atingiu inúmeras pessoas durante a história, o que confi guraria um retro-cesso em termos de proteção à dignidade humana.

Importante!A proibição de retrocesso é identifi cada na doutrina também como princípio da proibição de evolução reacionária e proibição de efeito cliquet.

Cabe observar que a proibição de retrocesso obsta a supressão de direitos, mas não impede que sejam feitas restrições a direitos, e até mesmo que medidas estatais já adotadas sejam restringidas, eis que, de uma maneira geral, os direitos comportam limitações.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova do 25º Concurso de Procurador da República considerou errada a seguinte proposição: O princípio da proibição de retrocesso veda qual-quer restrição de políticas públicas que já tenham concretizados direitos sociais constitucionalmente positivados.

5.2. Universalidade. A universalidade e o relativismo cultural

A universalidade dos direitos humanos é compreendida em dois sentidos.

Um no sentido de que esses direitos se destinam a todas as pessoas sem qualquer tipo de discriminação, de qualquer ordem que seja. Direitos universais aqui no sentido de direitos de todos os seres humanos, pouco importando a etnia, a opção religiosa, sexual etc, exatamente como afi rmado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU, de 1948.

Outro no sentido de abrangência territorial universal, de vali-dade em todos os lugares do mundo, de validade universal, cosmo-polita, de inexistência de limitações territoriais à proteção da digni-dade humana. É dizer, direito válidos em qualquer lugar do planeta, direitos pertencentes a uma sociedade mundial.

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Nesse segundo sentido, o respeito aos direitos humanos deixa de ser apenas uma questão interna de cada Estado com seus nacio-nais e atinge o patamar de uma temática mundial, que demanda atuação da comunidade internacional, refl etindo um novo paradigma mundial, com o surgimento de documentos internacionais protetivos de direitos humanos.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova da Defensoria Pública do Piauí, de 2009, da Cespe, trouxe a seguinte proposição: “O princípio da universalidade impede que determi-nados valores sejam protegidos em documentos internacionais dirigidos a todos os países”. Está errado!

A universalidade pode ser ilustrada na Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU, de 1948, que enuncia direitos comuns a todos os homens pela simples condição humana, sem nenhuma dis-criminação, e que afi rma que todos os seres humanos integram uma família única – a família humanidade –, merecedora de respeito e dignidade em todos os lugares.

Importante!A universalidade passa a ideia de direitos comuns ao ser humano sem nenhuma discriminação e, ainda, de dever de proteção como algo comum ao mundo inteiro, havendo a existência de uma família humanidade, e tudo isso é ilustrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos.

A concepção universalista dos direitos humanos costuma ser confrontada com o relativismo cultural, argumentando-se que as vicissitudes culturais de cada país seria um entrave à afi rmação da validade de um mesmo grupo de direitos em todos os Estados.

Em exemplo, no cenário internacional constata-se um movimento cada vez mais expansivo de afi rmação de direitos das mulheres, o que contrasta com práticas culturais de alguns países que restringem sensivelmente a liberdade feminina, como a obrigação de utilizar algumas vestimentas e o não reconhecimento da capacidade eleito-ral passiva.

Daí cabe a pergunta: se a proteção à mulher for realmente uni-versal, como admitir tais condutas? Elas seriam inválidas por violar

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a ordem jurídica universal dos direitos humanos? E, sendo inválidas, agentes internacionais poderiam intervir nos países em que elas são praticadas para assegurar a efetivação dos direitos?

Mas, por outro lado, tais condutas não constituem práticas cul-turais da sociedade na qual são admitidas? Assegurar às mulheres a liberdade de se vestir livremente num País cuja cultura é de mulhe-res usarem vestimentas longas não confi guraria uma grave violação à sedimentação cultural desse povo?

O embate entre relativismo cultural e universalidade passa pela difi culdade de afi rmar uma concepção de sociedade que seja uni-versal, com os mesmos padrões culturais, ainda que mínimos, eis que cada sociedade apresenta suas idiossincrasias, e isso há de ser respeitado, observando-se a autodeterminação dos povos.

A questão central é defi nir até que ponto o relativismo cultural pode justifi car práticas internas que, sob a ótica internacional, sejam lesivas aos direitos humanos.

Em linhas gerais, prevalece a ideia de forte proteção aos direi-tos humanos e fraco relativismo cultural, no sentido de que varia-ções culturais não justifi cam a violação de direitos humanos.

Importante!Prevalece a ideia de forte proteção aos direitos humanos e fraco relati-vismo cultural, concepção que afi rma que o relativismo cultural não pode ser ignorado, mas que não pode ser defendido ao ponto de legitimar violações a direitos humanos.

Reforça essa ideia o fato de que diversos Países que adotam ou adotaram práticas lesivas a direitos humanos aderiram à ONU e às convenções internacionais sobre direitos humanos, se obrigando a rever as medidas internas que sejam incompatíveis com as obriga-ções internacionais.

Nessa esteira, práticas culturais internas de um Estado não mais justifi cam a violação de direitos humanos, mormente se o Estado estiver fi liado à ONU e for signatário de convenções internacionais sobre direitos humanos.

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Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova da Defensoria Pública da União, de 2010, da Cespe, trouxe a seguinte proposição: “Os documentos das Nações Unidas que tratam dos direitos políticos das mulheres determinam que elas devem ter, em condi-ções de igualdade, o mesmo direito que os homens de ocupar e exercer todos os postos e todas as funções públicas, admitidas as restrições que a cultura e a legislação nacionais imponham”. A proposição está errada, pois a cultura nacional não pode restringir os direitos das mulheres.

Enfi m, cabe uma refl exão no sentido de que a universalidade dos direitos humanos pode ser compreendida em termos de univer-salidade da ideia de proteção e respeito à pessoa humana e, não, na afi rmação universal de um determinado direito.

Dito de outra forma, o que se deve entender por universal é a ideia de que o ser humano é titular de um conjunto de direitos, inde-pendentemente das vicissitudes de cada Estado, e, não, a ideia de que o direito “x”, “y” ou “z” tem que se reconhecido em todos os Estados.

Essa concepção torna admissível que determinados direitos sejam reconhecidos em alguns Estados, mas não em outros, mas reputa imperioso que todos os Estados afi rmem a proteção das pes-soas, reconheçam a elas a titularidade de um conjunto de direitos e tornem essa realidade efetiva.

Nesses termos, a universalidade dos direitos humanos seria compreendida, em verdade, como universalidade da ideia de que toda pessoa é titular de determinados direitos, sendo merecedora de consideração e respeito pela ordem jurídica do Estado.

5.3. Relatividade. A relativização de direitos e os direitos absolutos

A característica da relatividade passa a ideia de que os direitos humanos podem sofrer limitações, podem ser relativizados, não se afi rmando como absolutos.

A ideia de relativização dos direitos humanos surge da necessi-dade de adequá-los a outros valores coexistentes na ordem jurídica, mormente quando se entrechocam, surgindo a necessidade de rela-tivizar e harmonizar os bens jurídicos em colisão.

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Em exemplo, o direito à liberdade de expressão pode ser relati-vizado para se harmonizar com a proteção da vida privada, não se admitindo que a expressão chegue ao ponto de ofender a imagem de alguém; o direito ao desenvolvimento pode ser relativizado para compatibilizá-lo com o direito ao ambiente e assim por diante.

O próprio direito à vida, que é pressuposto para exercer os demais direitos, pode ser relativizado nos casos de legítima defesa ou de pena de morte, essa última apenas nos países que admitem tal prática.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova da Defensoria Pública do Piauí, de 2009, da Cespe, trouxe a seguinte proposição: “É característica marcante o fato de os direitos funda-mentais serem absolutos, no sentido de que eles devem sempre prevalecer, independentemente da existência de outros direitos, segundo a máxima do “tudo ou nada”. Está errado!

De todo modo, não obstante os direitos sejam, de uma maneira geral, relativizáveis, há sim direitos de caráter absoluto, como, por exemplo, os direitos à proibição de tortura e proibição de escravi-dão, não se me aparentando possível relativizar tais direitos.

Quanto à proibição de tortura, veja-se o que consta do art. 2º da “Convenção Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes”, da ONU:

Artigo 2º

1. Cada Estado tomará medidas efi cazes de caráter legisla-tivo, administrativo, judicial ou de outra natureza, a fi m de impedir a prática de atos de tortura em qualquer território sob sua jurisdição.

2. Em nenhum caso poderão invocar-se circunstâncias excep-cionais, como ameaça ou estado de guerra, instabilidade política interna ou qualquer outra emergência pública, como justifi cação para a tortura.

3. A ordem de um funcionário superior ou de uma autoridade pública não poderá ser invocada como justifi cação para a tortura.

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Ora, se em nenhum caso poderão invocar-se circunstâncias excepcionais como justifi cação para a tortura, aparenta que a tortura é uma prática vedada em toda e qualquer situação, havendo sim de se lhe reconhecer um caráter absoluto.

Agora, atenção, o caráter absoluto desse direito é uma exceção à regra da relativização dos direitos humanos e, de maneira geral, não costuma ser explorada em provas objetivas de concurso, que costumam afi rmar a relatividade como característica dos direitos humanos.

Importante!De uma maneira geral, as provas costumam afi rmar que os direitos humanos são relativos, e isso está certo! A ideia de que a proibição de tortura é um direito absoluto é uma exceção à regra e essa informação deve ser trabalhada numa prova discursiva ou oral. Se uma prova obje-tiva trouxer que os direitos humanos são relativos se deve assinalar a questão como CORRETA!!!

5.4. Irrenunciabilidade. A não faculdade de dispor sobre a prote-ção da dignidade humana

A irrenunciabilidade transmite a mensagem que as pessoas não têm poder de dispor sobre a proteção à sua dignidade, não pos-suindo a faculdade de renunciar à proteção inerente à dignidade humana.

Essa característica materializa a compreensão de que a simples pertença ao gênero humano torna a pessoa titular de direitos e merecedora de consideração e respeito, não sendo possível renun-ciar à dignidade inerente à condição humana.

Como esse assunto foi cobrado em concurso?A prova da Defensoria Pública do Piauí, de 2009, da Cespe, trouxe a seguinte proposição: “A irrenunciabilidade dos direitos fundamentais não destaca o fato de que estes se vinculam ao gênero humano”. Está errado!

Da irrenunciabilidade decorre que eventual manifestação de vontade da pessoa em abdicar de sua dignidade não terá valor jurí-dico, sendo reputada nula.