sinopses jur dicas, volume 1, direito civil, parte geral

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SINOPSES JURÍDICAS CARLOS ROBERTO GONÇALVES Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Mestre em Direito Civil pela PUCSP Professor no Complexo Jurídico Damásio de Jesus. Volume 1 DIREITO CIVIL PARTE GERAL edição 2000 Editora Saraiva obra completa volume 1 Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Gonçalves, Carlos Roberto, 1938 Direito civil : parte geral, volume 1 / Carlos Roberto Gonçalves. São Paulo : Saraiva, 2000. - (Coleção sinopses jurídicas) 1. Direito civil I. Título. II. INTRODUÇÃO AO DIREITO CIVIL CAPÍTULO 1 CONCEITO E DIVISÃO DO DIREITO 1. Conceito de direito. Distinção entre o direito e a moral : 3 2. Direito positivo e direito natural : 4 3. Direito objetivo e direito subjetivo : 5 4. Direito público e direito privado : 6 CAPÍTULO 11 DIREITO CIVIL 5. A codificação : 7 6. O Código Civil brasileiro : 8 LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL 1. Conteúdo e função : 13 2. Fontes do direito : 14 3. A lei e sua classificação : 15 4. Vigência da lei : 17 5. Obrigatoriedade das leis : 20 6. A integração das normas jurídicas : 21 7. Aplicação e interpretação das normas jurídicas : 24 8. Conflito das leis no tempo : 26 9. Eficácia da lei no espaço : 28 PARTE GERAL DO CÓDIGO CIVIL TíTULO I DAS PESSOAS CAPÍTULO 1 DA PESSOA NATURAL 1. Conceito de pessoa natural....................................... 37

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SINOPSES JURÍDICASCARLOS ROBERTO GONÇALVESDesembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo. Mestre em DireitoCivil pela PUCSP Professor no Complexo Jurídico Damásio de Jesus.Volume 1DIREITO CIVILPARTE GERALedição 2000Editora Saraivaobra completa volume 1Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)Gonçalves, Carlos Roberto, 1938Direito civil : parte geral, volume 1 / Carlos Roberto Gonçalves. São Paulo : Saraiva, 2000. - (Coleção sinopses jurídicas)1. Direito civil I. Título. II.

INTRODUÇÃO AO DIREITO CIVILCAPÍTULO 1CONCEITO E DIVISÃO DO DIREITO1. Conceito de direito. Distinção entre o direito e a moral : 32. Direito positivo e direito natural : 43. Direito objetivo e direito subjetivo : 54. Direito público e direito privado : 6CAPÍTULO 11DIREITO CIVIL5. A codificação : 76. O Código Civil brasileiro : 8

LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL1. Conteúdo e função : 13

2. Fontes do direito : 14

3. A lei e sua classificação : 15

4. Vigência da lei : 17

5. Obrigatoriedade das leis : 20

6. A integração das normas jurídicas : 21

7. Aplicação e interpretação das normas jurídicas : 248. Conflito das leis no tempo : 26

9. Eficácia da lei no espaço : 28

PARTE GERAL DO CÓDIGO CIVILTíTULO IDAS PESSOASCAPÍTULO 1DA PESSOA NATURAL1. Conceito de pessoa natural....................................... 37

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2. Das incapacidades..................................................... 382.1. Incapacidade absoluta ....................................... 392.1.1. Os menores de dezesseis anos ................. 402.1.2. Os loucos de todo o gênero ..................... 402.1.3. Os surdos-mudos ..................................... 412.1.4. Os ausentes .............................................. 422.2. Incapacidade relativa ........................................ 422.2.1. Os maiores de dezesseis anos e menoresde vinte e um anos ................................... 432.2.2. Os pródigos .............................................. 432.2.3. Os silvícolas............................................. 443. Cessação da incapacidade ........................................45VIII4. Começo da personalidade natural ............................ 485. Extinção da personalidade natural ........................... 496. Individualização da pessoa natural ........................... 506.1. Nome.................................................................. 506.1.1. Conceito ................................................... 516.1.2. Natureza jurídica ..................................... 516.1.3. Elementos do nome (completo) ............... 516.1.3.1. Prenome ...................................... 526.1.3.2. Patronímico ................................. 526.1.4. Imutabilidade do nome ............................ 536.2. Estado................................................................. 556.2.1. Aspectos .................................................. 556.2.2. Caracteres ................................................ 556.3. Domicílio........................................................... 566.3.1. Conceito ................................................... 566.3.2. Espécies ................................................... 57CAPÍTULO 11DA PESSOA JURÍDICA7. Introdução................................................................. 588. Conceito.................................................................... 58

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9. Natureza jurídica....................................................... 589.1. Teorias da ficção................................................ 589.2. Teorias da realidade .......................................... 5910. Requisitos para a constituição da pessoa jurídica .... 5911. Classificação da pessoajurídica............................... 6112. Desconsideração da pessoa jurídica .........................6413. Responsabilidade civil das pessoas jurídicas ........... 6514. Extinção da pessoajurídica...................................... 67IXTÍTULO IIDOS BENS15. Noções introdutórias................................................. 6816. Classificação............................................................. 7016.1. Bens considerados em si mesmos ................... 7016.1.1. Bens imóveis e bens móveis............... 7016.1.1.1. Bens imóveis ....................... 7116.1.1.2. Bens móveis ........................ 7316.1.2. Bens fungíveis e infungíveis .............. 7416.1.3. Bens consumíveis e inconsumíveis .... 7516.1.4. Bens divisíveis e indivisíveis ............. 7616.1.5. Bens singulares e coletivos ................ 7616.2. Bens reciprocamente considerados ................. 78 16.3. Bensquanto ao titular do domínio ................. 81 16.4. Bens quantoà possibilidade de serem ou não comercializados............................................... 8316.5. Bem de família ...............................................84TÍTULO IIIDOS ATOS E FATOS JURÍDICOS17. Conceito.................................................................... 8618. Classificação dos negócios jurídicos........................8818.1. Unilaterais, bilaterais e plurilaterais ............... 8818.2. Gratuitos e onerosos, neutros e bifrontes ....... 8918.3. Inter vivos e mortis causa ............................... 9018.4. Principais e acessórios .................................... 9018.5. Solenes (formais) e não-solenes (deforma livre) 9018.6. Simples, complexos e coligados ..................... 9118.7. Negócio fiduciário e negócio simulado .......... 9219. Interpretação do negócio jurídico............................. 9220. Elementos do negócio jurídico ................................

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9421. Defeitos do negócio jurídico..................................... 9821.1. Erro ou ignorância .......................................... 9821.2. Dolo................................................................. 10421.3. Coação............................................................. 10621.4. Simulação........................................................ 11121.5. Fraude contra credores ................................... 11421.5.1. Hipóteses legais .................................. 11521.5.2. Ação pauliana ..................................... 11621.5.3. Fraude contra credores e fraude à execução. Principais diferenças ............... 11721.6. Lesão................................................................ 11921.7. Reserva mental ............................................... 12121.8. Negócio fiduciário ..........................................12222. Das modalidades dos negócios jurídicos ................. 12222.1. Condição.......................................................... 12322.2. Termo............................................................... 12922.3. Encargo ou modo ............................................ 13223. Da forma dos negócios jurídicos e da sua prova ..... 13323.1. Forma do negócio jurídico ............................. 13323.2. Provado negócio jurídico............................... 13624. Da ineficácia do negócio jurídico ............................14124.1. Ato inexistente, nulo e anulável ..................... 14224.2. Diferenças entre nulidade e anulabilidade ...... 14324.3. Disposições especiais......................................14625. Dos atos ilícitos......................................................... 14825.1. Conceito........................................................... 14825.2. Responsabilidade contratual e extracontratual 149XI25.3. Responsabilidade civil e responsabilidade penal 150 25.4.Responsabilidade subjetiva e responsabilidade objetiva............................................................ 15125.5. Imputabilidade e responsabilidade ................. 15325.5.1. A responsabilidade dos loucos ........... 15325.5.2. A responsabilidade dos menores ........ 155 25.6. Pressupostosda responsabilidade

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extracontratual................................................................... 155 25.6.1. Ação ou omissão................................. 15625.6.2. Culpa ou dolo do agente ..................... 15625.6.3. Relação de causalidade ....................... 15725.6.4. Dano ................................................... 15825.7. Atos lesivos não considerados ilícitos ............ 15825.7.1. A legítima defesa................................ 15925.7.2. O exercício regular e o abuso de direito 16025.7.3. O estado de necessidade ..................... 16226. Da prescrição............................................................ 16326.1. Introdução........................................................ 16426.2. Conceito e requisitos ...................................... 16526.3. Ações imprescritíveis .....................................165 26.4. Prescrição e institutos afins (preclusão, perempçãoe decadência) .................................. 166 26.5.Disposições legais sobre a prescrição ............. 168 26.6.Das causas que impedem ou suspendem aprescrição............................................................... 17226.7. Das causas que interrompem a prescrição ...... 174

INTRODUÇÃO AO DIREITO CIVILCAPÍTULO ICONCEITO E DIVISÃO DO DIREITO1. CONCEITO DE DIREITO. DISTINÇÃO ENTRE O DIREITO E A MORALNão há um consenso sobre o conceito do direito. Pode ser mencionado,dentre vários, o de Radbruch: "o conjunto das normas gerais epositivas, que regulam a vida social" (Introducción a la filosofíadel derecho, p. 47). Origina-se a palavra "direito" do latim directum,significando aquilo que é reto, que está de acordo com a lei. Nasceujunto com o homem, que é um ser eminentemente social. Destina-se aregular as relações humanas. As normas de direito asseguram ascondições de equilíbrio da coexistência dos seres humanos, davida em sociedade.Há marcante diferença entre o "ser" do mundo da natureza e o "deverser" do mundo jurídico. Os fenômenos da natureza, sujeitos às leisfísicas, são imutáveis, enquanto o mundo jurídico, o do "deverser", caracteriza-se pela liberdade na escolha da conduta. Direito,portanto, é a ciência do "dever ser".A vida em sociedade exige a observância de outras normas, além dasjurídicas, como as religiosas, morais, de urbanidade etc. Asjurídicas e morais têm em comum o fatode constituírem normas de comportamento. No entanto, distinguem-seprecipuamente pela sanção (que no direito é imposta pelo PoderPúblico para constranger os indivíduos à observância da norma, ena moral somente pela consciência do homem, traduzida pelo remorso,

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pelo arrependimento, porém sem coerção) e pelo campo de ação,que na moral é mais amplo. É célebre, neste aspecto, acomparação de Bentham, utilizando-se de dois círculosconcêntricos, dos quais a circunferência representativa do campo damoral se mostra mais ampla. Algumas vezes tem acontecido de o direitotrazer para sua esfera de atuação preceitos da moral, consideradosmerecedores de sanção mais eficaz.2. DIREITO POSITIVO E DIREITO NATURALDireito positivo é o ordenamento jurídico em vigor em determinadopaís e em determinada época. É o direito posto. Direito naturalé a idéia abstrata do direito, o ordenamento ideal, correspondente auma justiça superior.O jusnaturalismo foi defendido por Santo Agostinho e São Tomás deAquino, bem como pelos doutores da Igreja e pensadores dos séculosXVII e XVIII. Hugo Grócio, já no século XVI, defendia aexistência de um direito ideal e eterno, ao lado do direito positivo,sendo considerado o fundador da nova Escola de Direito Natural. A EscolaHistórica e a Escola Positivista, entretanto, refutam ojusnaturalismo, atendo-se à realidade concreta do direito positivo.Neste século, renasce e predomina a idéia jusnaturalista,especialmente em razão do movimento neotomista e da idéianeokantiana. É, realmente, inegável a existência de leisanteriores e inspiradoras do direito positivo, as quais, mesmo nãoescritas, encontramse na consciência dos povos.Para o direito positivo, não é exigível o pagamento de dívidaprescrita e de dívida de jogo. Mas para o direito natural essepagamento é obrigatório.3. DIREITO OBJETIVO E DIREITO SUBJETIVODireito objetivo é o conjunto de normas impostas pelo Estado, decaráter geral, a cuja observância os indivíduos podem sercompelidos mediante coerção. Esse conjunto de regras jurídicascomportamentais (norma agendi) gera para os indivíduos a faculdade desatisfazer determinadas pretensões e de praticar os atos destinados aalcançar tais objetivos (facultas agendi). Encarado sob esse aspecto,denomina-se direito subjetivo, que nada mais é do que a faculdadeindividual de agir de acordo com o direito objetivo, de invocar a suaproteção. Direito subjetivo é, portanto, o meio de satisfazerinteresses humanos e deriva do direito objetivo, nascendo com ele. Se odireito objetivo é modificado, altera-se o direito subjetivo.As teorias de Duguit e de Kelsen (Teoria Pura do Direito) integram asdoutrinas negativistas, que não admitem a existência do direitosubjetivo. Para Kelsen, a obrigação ju rídica não é senão aprópria norma jurídica. Sendo assim, o direito subjetivo não ésenão o direito objetivo. Predominam, no entanto, as doutrinasafirmativas, que se desdobram em: a) teoria da vontade; b) teoria dointeresse; e c) teoria mista. Para a primeira, o direito subjetivoconstitui um poder da vontade (Windscheid). Para a segunda, direitosubjetivo é o interesse juridicamente protegido (lhering). A teoriamista conjuga o elemento vontade com o elemento interesse. Jellinek odefine como o interesse protegido que a vontade tem o poder de realizar.Na realidade, direito subjetivo e direito objetivo são aspectos damesma realidade, que pode ser encarada de uma ou de outra forma. Direitosubjetivo é a expressão da vonta de individual, e direito objetivoé a expressão da vontade geral. Não somente a vontade, ou apenas ointeresse, configuram o direito subjetivo. Trata-se de um poderatribuído à vontade do indivíduo, para a satisfação dos seus

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próprios interesses protegidos pela lei, ou seja, pelo direitoobjetivo.4. DIREITO PÚBLICO E DIREITO PRIVADOEmbora a divisão do direito objetivo em público e privado remonte aodireito romano, até hoje não há um consenso sobre os seus traçosdiferenciadores. Vários critérios foram propostos, com base nointeresse, na utilidade, no sujeito, na finalidade da norma, nasanção, sem que todos eles estejam imunes a críticas. Narealidade, o direito deve ser visto como um todo, sendo dividido emdireito público e privado somente por motivos didáticos. Ainterpenetração de suas normas é comum, encontrando-se comfreqüência nos diplomas reguladores dos direitos privados normasatinentes ao direito público, e vice-versa.Costuma-se dizer, sempre, que direito público é o destinado adisciplinar os interesses gerais da coletividade, enquanto o direitoprivado contém preceitos reguladores das relações dos indivíduosentre si. Mais correto, no entanto, é afirmar que público é odireito que regula as relações do Estado com= outro Estado, ou asdo Estado com os cidadãos; e que direito privado é o que disciplinaas relações entre os indivíduos como tais, nas quais predominaimediatamente o interesse de ordem particular.O direito civil, juntamente com o direito comercial, integra o direitoprivado. Os demais ramos pertencem ao direito público, havendoentretanto divergência no tocante ao direito do trabalho, que algunscolocam no elenco do direito privado e outros o consideram integrantetambém do direito público.Normas de ordem pública são as cogentes, de aplicaçãoobrigatória. Normas de ordem privada ou dispositivas são as quevigoram enquanto a vontade dos interessados não convencionar de formadiversa, tendo, pois, caráter supletivo. No direito civil predominamas normas de ordem privada, malgrado existam também normas cogentes,de ordem pública, como a maioria das que integram o direito defamília.CAPÍTULO IIDIREITO CIVIL5. A CODIFICAÇÃONo período colonial vigoravam no Brasil as Ordenações Filipinas.Com a Independência, ocorrida em 1822, a legislação portuguesacontinuou sendo aplicada entre nós, mas com a ressalva de quevigoraria até que se elaborasse o Código Civil. A Constituiçãode 1824 referiu-se à organização de um Código Civil, sendo queem 1865 essa tarefa foi confiada a Teixeira de Freitas, que já haviaapresentado, em 1858, um trabalho de consolidação das leis civis. Oprojeto então elaborado, denominado "Esboço", continha cinco milartigos e acabou não sendo acolhido, após sofrer críticas dacomissão revisora. Influenciou, no entanto, o Código Civilargentino, do qual constitui a base.Várias outras tentativas foram feitas mas somente após áProclamação da República, com a indicação de ClóvisBeviláqua, foi o Projeto de Código Civil por ele elaborado, depoisde revisto, encaminhado ao Presidente da República, que o remeteu aoCongresso Nacional, em 1900. Na Câmara dos Deputados sofreu algumasalterações determinadas por uma comissão especialmente nomeadapara examiná-lo, merecendo, no Senado, longo parecer de Rui Barbosa.Aprovado em janeiro de 1916, entrou em vigor em 1°- de janeiro de1917.

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6. O CÓDIGO CIVIL BRASILEIROO Código Civil brasileiro contém 1.807 artigos e é antecedido pelaLei de Introdução ao Código Civil. Os Códigos francês (1804) ealemão (1896) exerceram influência em sua elaboração, tendo sidoadotadas várias de suas concepções.Contém uma Parte Geral, da qual constam conceitos, categorias eprincípios básicos, aplicáveis a todos os livros da ParteEspecial, e que produzem reflexos em todo o ordena mentojurídico.Trata das pessoas (naturais e jurídicas), como sujeitos dedireito; dos bens, como objeto do direito; e dos fatos jurídicos,disciplinando a forma de criar, modificar e extinguir direitos, tornandopossível a aplicação da Parte Especial. Esta é dividida emquatro livros, com os seguintes títulos: Direito de Família, Direitodas Coisas, Direito das Obrigações e Direito das Sucessões.Elogiado pela clareza e precisão dos conceitos, bem como por suabrevidade e técnica jurídica, o Código Civil brasileiro reflete asconcepções predominantes em fins do século passado e no iníciodeste, em grande parte ultrapassadas, baseadas no individualismo entãoreinante, especialmente ao tratar do direito de propriedade e daliberdade de contratar.Por essa razão, algumas tentativas para modificá-lo foramrealizadas, tendo sido apresentados projetos por grandes juristas, comoOrozimbo Nonato, Philadelpho Azevedo e Hahnemann Guimarães(Anteprojeto de Código de Obrigações), Orlando Gomes, Caio Márioda Silva Pereira (Código das Obrigações). Atualmente, encontra-seem tramitação no Congresso Nacional o Projeto de lei n. 634/75,elaborado por uma comissão de juristas sob a supervisão de MiguelReale, que procura unificar, parcialmente, o direito privado, trazendopara o bojo do Código Civil a matéria constante da primeira parte doCódigo Comercial.Muitas leis trouxeram modificações ao Código Civil brasileiro,sendo o ramo do direito de família o mais afetado. Basta lembrar a Lein. 4.121/62 (Estatuto da Mulher Casa da), a Lei n. 6.515/77 (Lei doDivórcio) e as recentes leis que reconheceram direitos aoscompanheiros e conviventes (Leis n. 8.971/94 e 9.278/96). A própriaConstituição Federal de 1988 trouxe importantes inovações aodireito de família, especialmente no tocante à filiação, bemcomo ao direito das coisas, ao reconhecer a função social dapropriedade. A Lei dos Registros Públicos (Lei n. 6.015/73), asdiversas leis de locações, o Código de Defesa do Consumidor, oCódigo de Águas, o Código de Minas e outros diplomas revogaramvários dispositivos e capítulos do Código Civil, em uma tentativade atualizar a nossa legislação civil, até que se ultime a reformado Código. Muitas dessas citadas leis atropelaram o referido Projetode lei n. 634/75, que terá de ser reestruturado.LEI DE INTRODUÇÃO AO CÓDIGO CIVIL1. CONTEÚDO E FUNÇÃOO Decreto-Lei n. 4.657/42, com dezoito artigos, revogou a antiga Lei deIntrodução ao Código Civil, que continha vinte e um. Trata-se delegislação anexa ao Código Civil, mas autônoma, dele nãofazendo parte. Embora se destine a facilitar a sua aplicação, temcaráter universal, aplicando-se a todos os ramos do direito. Acompanhao Código Civil simplesmente porque se trata do diploma considerado demaior importância. Na realidade, constitui um repositório de normaspreliminar à totalidade do ordenamento jurídico nacional.É um conjunto de normas sobre normas. Enquanto o objeto das leis em

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geral é o comportamento humano, o da Lei de Introdução ao CódigoCivil é a própria norma, pois disci plina a sua elaboração evigência, a sua aplicação no tempo e no espaço, as suas fontesetc. Contém normas de sobredireito, podendo ser considerada umCódigo de Normas, por ter a lei como tema central. Dirige-se a todosos ramos do direito, salvo naquilo que for regulado de forma diferentena legislação específica. Assim, o dispositivo que manda aplicar aanalogia, os costumes e os princípios gerais de direito aos casosomissos (art. 4°-) aplica-se a todo o ordenamento jurídico, excetoao direito penal e ao direito tributário, que contêm normasespecíficas a esse respeito. O direito penal admite a analogia somenteire bonam partem. E o Código Tributário Nacional admite a analogiacomo critério de hermenêutica, com a ressalva de que não poderáresultar na exigência de tributo não previsto em lei (art. 108, §19). Quando o art. 3-° da Lei de13Introdução prescreve que ninguém se escusa de cumprir a leialegando que não a conhece, está-se referindo à lei em geral. Talregra aplica-se a todo o ordenamento.Tem por funções regulamentar: a) o início da obrigatoriedade dalei (art. 19); b) o tempo de obrigatoriedade da lei (art. 2°); c) aeficácia global da ordem jurídica, não admi tindo a ignorânciada lei vigente, que a comprometeria (art. 3°-); d) os mecanismos deintegração das normas, quando houver lacunas (art. 4°); e) oscritérios de hermenêutica jurídica (art. 5°-); f) o direitointertemporal, para assegurar a estabilidade do ordenamentojurídico-positivo, preservando as situações consolidadas (art.6°-); g) o direito internacional privado brasileiro (arts. 7- a 17);h) os atos civis praticados, no estrangeiro, pelas autoridadesconsulares brasileiras.2. FONTES DO DIREITOA lei é o objeto da Lei de Introdução e a principal fonte dodireito. A expressão "fontes do direito" tem várias acepções.Podemos considerá-la o meio técnico de realiza ção do direitoobjetivo. A autoridade encarregada de aplicar o direito e tambémaqueles que devem obedecer os seus ditames precisam conhecer as suasfontes, que são de várias espécies. Fontes históricas sãoaquelas das quais se socorrem os estudiosos, quando querem investigar aorigem histórica de um instituto jurídico ou de um sistema, como oDigesto, as Institutas, as Ordenações do Reino etc. Atuais são asfontes às quais se reporta o indivíduo para afirmar o seu direito, eo juiz, para fundamentar a sentença.São consideradas fontes formais do direito a lei, a analogia, ocostume e os princípios gerais de direito (arts. 4°- da14LICC e 126 do CPC); e não formais a doutrina e a jurisprudência.Dentre as formais, a lei é a fonte principal e as demais são fontesacessórias. Costuma-se, também, dividir as fontes do direito emdiretas (ou imediatas) e indiretas (ou mediatas). As primeiras são alei e o costume, que por si só geram a regra jurídica; as segundassão a doutrina e a jurisprudência, que contribuem para que a normaseja elaborada.3. A LEI E SUA CLASSIFICAÇÃOA exigência de maior certeza e segurança para as relaçõesjurídicas vem provocando, hodiernamente, a supremacia da lei, da normaescrita, sobre as demais fontes, sendo mesmo considerada a fonte

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primacial do direito. Dentre as suas várias característicasdestacam-se as seguintes: a) generalidade: dirige-se a todos oscidadãos, indistintamente. O seu comando é abstrato; b)imperatividade: impõe um dever, uma conduta. Esta característicainclui a lei entre as normas que regulam o comportamento humano, como anorma moral, a religiosa etc. Todas são normas éticas, providas desanção. A imperatividade (imposição de um dever de conduta,obrigatório) distingue a norma das leis físicas. Mas não ésuficiente para distingui-Ias das demais leis éticas; c)autorizamento: é o fato de ser autorizante, segundo Goffredo da SilvaTelles, que distingue a lei das demais normas éticas. A normajurídica autoriza que o lesado pela violação exija o cumprimentodela ou a reparação pelo mal causado. É ela, portanto, queautoriza e legitima o uso da faculdade de coagir; d) permanência: alei não se exaure numa só aplicação, pois deve perdurar atéser revogada por outra lei. Algumas normas, entretanto, sãotemporárias, destinadas a viger apenas durante um certo período,como as que constam das dis15posições transitórias e as leis orçamentárias; e) emanaçãode autoridade competente, de acordo com as competências legislativasprevistas na Constituição Federal.Há várias classificações das leis. Quanto à imperatividade ouforça obrigatória elas se dividem em cogentes (de imperatividadeabsoluta ou de ordem pública) e dispositivas (ou su pletivas). Asprimeiras são as que ordenam ou proíbem determinada conduta de formaabsoluta, não podendo ser derrogadas pela vontade dos interessados. Asnormas que compõem o direito de família revestem-se dessacaracterística. Não pode a vontade dos interessados alterar, porexemplo, os impedimentos matrimoniais do art. 183, nem dispensar um doscônjuges dos deveres que a lei impõe a ambos no art. 231. Normasdispositivas em geral são permissivas, como a que permite às partesestipular, antes de celebrado o casamento, quanto aos bens, o que lhesaprouver (art. 256), ou supletivas, quando suprem a falta demanifestação de vontade das partes. Neste último caso, costumamvir acompanhadas de expressões como "salvo estipulação emcontrário" ou "salvo se as partes convencionarem diversamente" (ex.:art. 950).Quanto ao autorizamento (ou encaradas sob o prisma da sanção), podemclassificar-se em: perfeitas, menos que perfeitas e imperfeitas. Sãoperfeitas as que impõem a nulidade do ato, como punição aoinfrator, como a que considera nulo o ato praticado por absolutamenteincapaz. Leis menos que perfeitas são as que não acarretam anulidade ou anulação do ato, em caso de violação, somenteimpondo ao violador uma sanção, como no caso do viúvo que se casaantes de fazer inventário e dar partilha dos bens aos herdeiros docônjuge falecido (art. 183, XIII). E imperfeitas são as leis cujaviolação não acarreta nenhuma conseqüência, como asobrigações decorrentes de dívidas de jogo e de dívidasprescritas.Segundo a sua natureza, as leis são substantivas ou adjetivas. Asprimeiras são de fundo, também chamadas de16materiais, porque tratam do direito material. As segundas, tambémchamadas de processuais ou formais, traçam os meios de realizaçãodos direitos. Quanto à sua hierarquia, as normas classificam-se em: a)

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normas constitucionais: são as constantes da Constituição, àsquais as demais devem amoldar-se; b) leis complementares: as que sesituam entre a norma constitucional e a lei ordinária, porque tratamde matérias especiais, que não podem ser deliberadas em leiordinária e cuja aprovação exige quorum especial; c) leisordinárias: as elaboradas pelo Poder Legislativo; d) leis delegadas:elaboradas pelo Executivo, por autorização expressa do Legislativo,tendo a mesma posição hierárquica das ordinárias.4. VIGÊNCIA DA LEIA lei passa por três fases: a da elaboração, a da promulgaçãoe a da publicação. Embora nasça com a promulgação, sócomeça a vigorar com sua publicação no Diário Oficial. Avigência da lei compreende três momentos: o início, a continuidadee a cessação. Com a publicação, tem-se o início da vigência,tornando-se obrigatória, pois ninguém pode escusarse de cumpri-Iaalegando que não a conhece (art. 3°-).Segundo dispõe o art. 1 ° da Lei de Introdução ao CódigoCivil, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco diasdepois de oficialmente publicada, salvo disposi ção em contrário.Portanto, a sua obrigatoriedade não se inicia no dia dapublicação, salvo se ela própria assim o determinar. Pode, assim,entrar em vigor na data de sua publicação ou em outra mais remota,conforme constar expressamente de seu texto. Se nada dispuser a esserespeito, aplica-se a regra do art. 1'-' supramencionado. O intervaloentre a data de sua publicação e a sua entrada em vigor chama-sevacatio legis. Em matéria de duração do referido intervalo, foiadotado o17critério do prazo único, porque a lei entra em vigor na mesma data,em todo o país, sendo simultânea a sua obrigatoriedade. A anteriorLei de Introdução prescrevia que a lei entrava em vigor em prazosdiversos, ou seja, menores no Distrito Federal e Estados próximos, emaiores nos Estados mais distantes da Capital e nos territórios.Seguia, assim, o critério do prazo progressivo.Quando a lei brasileira é admitida no exterior (em geral quando cuidade atribuições de ministros, embaixadores, cônsules,convenções de direito internacional etc.), a sua obrigato riedadeinicia-se três meses depois de oficialmente publicada. Se durante avacatio legis ocorrer nova publicação de seu texto, paracorreção de erros materiais ou falha de ortografia, o prazo daobrigatoriedade começará a correr da nova publicação (LICC, art.1°, § 3°-). Se a lei já entrou em vigor, tais correçõessão consideradas lei nova, tornando-se obrigatória após o decursoda vacatio legis (art. 12, § 4°). Os direitos adquiridos navigência da lei emendada são resguardados. Admite-se que o juiz, aoaplicar a lei, possa corrigir os erros materiais evidentes,especialmente os de ortografia, mas não os erros substanciais, quepodem alterar o sentido do dispositivo legal, sendo imprescindívelneste caso nova publicação. O prazo da vacatio legis conta-se deacordo com o art. 125 do Código Civil, excluindo-se o dia do começo(o da publicação oficial) e incluindo-se o do vencimento. O prazo dequarenta e cinco dias não se aplica aos decretos e regulamentos, cujaobrigatoriedade determina-se pela publicação oficial. Tornam-se,assim, obrigatórios desde a data de sua publicação, salvo sedispuserem em contrário, não alterando a data da vigência da lei aque se referem. A falta de norma regulamentadora é, hoje, suprida pelo

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mandado de injunção.Salvo alguns casos especiais, a lei tem caráter perma-18nente, permanecendo em vigor até ser revogada por outra lei. Nistoconsiste o princípio da continuidade. Em um regime que se assenta nasupremacia da lei escrita, como o do direito brasileiro, o costume nãotem força para revogar a lei, nem esta perde a sua eficácia pelonão-uso. Revogação é a supressão da força obrigatória dalei, retirando-lhe a eficácia - o que só pode ser feito por outralei. Pode ser total (ab-rogação) ou parcial (derrogação). Se emseu texto, porém, constar o próprio termo, perde a eficáciaindependentemente de outra lei. A perda da eficácia pode decorrer,também, da decretação de sua inconstitucionalidade pelo SupremoTribunal Federal, cabendo ao Senado suspender-lhe a execução.A revogação pode ser expressa ou tácita. Expressa, quando a leinova declara que a lei anterior, ou parte dela, fica revogada. Tácita,quando não traz declaração nesse sentido mas mostra-seincompatível com a lei antiga, ou regula inteiramente a matéria deque tratava a lei anterior (art. 2°-, § 1°-). Desse modo, se todauma matéria é submetida a nova regulamentação, desapareceinteiramente a lei anterior que tratava do mesmo assunto, como aconteceucom a anterior Lei de Introdução, substituída pela atual. Ocorre,também, a revogação tácita de uma lei quando se mostraincompatível com a mudança havida na Constituição, em face dasupremacia desta sobre as demais leis. A lei nova, que estabeleçadisposições gerais ou especiais a par das já existentes, nãorevoga nem modifica a lei anterior (art. 2°-, § 2°-). Podem,portanto, coexistir. É possível, no entanto, que hajaincompatibilidade entre a lei geral e a especial. A existência deincompatibilidade conduz à possível revogação da lei geral pelaespecial, ou da lei especial pela geral.Preceitua o § 3°- do art. 2°- da Lei de Introdução ao CódigoCivil que a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadoraperdido a vigência, salvo disposição em contrá19rio. Não há, portanto, o efeito repristinatório, restaurador, daprimeira lei revogada, salvo quando houver pronunciamento expresso dolegislador nesse sentido. Assim, por exemplo, revogada a Lei n. 1 pelaLei n. 2, e posteriormente revogada a lei revogadora (n. 2) pela Lei n.3, não se restabelece a vigência da Lei n. 1, salvo se a n. 3, aorevogar a revogadora (n. 2), determinar a repristinação da n. 1.5. OBRIGATORIEDADE DAS LEISSendo a lei uma ordem dirigida à vontade geral, uma vez em vigortorna-se obrigatória para todos. Segundo o art. 3° da Lei deIntrodução ao Código Civil, ninguém se escusa de cumpri-Ia,alegando que não a conhece (ignorância legis neminem excusat). Taldispositivo visa garantir a eficácia global da ordem jurídica, queestaria comprometida se se admitisse a alegação de ignorância delei vigente. Como conseqüência, não se faz necessário provar emjuízo a existência da norma jurídica invocada, pois se parte dopressuposto de que o juiz conhece o direito (iura novit curia). Esseprincípio não se aplica ao direito municipal, estadual, estrangeiroou consuetudinário (CPC, art. 336).Três teorias procuram justificar o preceito: a da presunção legal,a da ficção e a da necessidade social. A primeira presume que a lei,uma vez publicada, torna-se conhecida de todos. É criticada por

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basear-se em uma inverdade. A da ficção pressupõe que a leipublicada torna-se conhecida de todos, muito embora em verdade tal nãoocorra. A teoria da necessidade social é a mais aceita, porquesustenta que a lei é obrigatória e deve ser cumprida por todos,não por motivo de um conhecimento presumido ou ficto, mas por elevadasrazões de interesse público, ou seja, para que seja possível a20convivência social. O preceito de que ninguém pode escusar-se decumprir a lei, alegando que não a conhece, seria uma regra ditada poruma razão de ordem social e jurídica, de necessidade social:garantir a eficácia global do ordenamento jurídico, que ficariacomprometido caso tal alegação pudesse ser aceita.O erro de direito (alegação de ignorância da lei) só pode serinvocado quando não houver o objetivo de furtar-se o agente aocumprimento da lei. Serve para justificar, por exem plo, a boa-fé emcaso de inadimplemento contratual, sem a intenção de descumprir alei. A Lei das Contravenções Penais, por exceção, admite aalegação de erro de direito (art. 8°-), como justificativa pelodescumprimento da lei. No direito mexicano tal alegação é admitidaem várias hipóteses, tendo em vista que a população daquelepaís é constituída, em grande parte, de indígenas.6. A INTEGRAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICASO legislador não consegue prever todas as situações para opresente e para o futuro. Como o juiz não pode eximir-se de proferirdecisão sob o pretexto de que a lei é omissa, deve valer-se dosmecanismos legais destinados a suprir as lacunas da lei, que são: aanalogia, os costumes e os princípios gerais de direito (LICC, art.4°-; CPC, art. 126).Verifica-se, portanto, que o próprio sistema apresenta soluçãopara qualquer caso sub judice. Sob o ponto de vista dinâmico, o daaplicação da lei, pode ela ser lacunosa, mas o sistema não. Istoporque o juiz, utilizando-se dos aludidos mecanismos, promove aintegração das normas jurídicas, não deixando nenhum caso semsolução (plenitude lógica do sistema). O direito estaticamenteconsiderado pode conter Ia21cunas. Sob o aspecto dinâmico, entretanto, não, pois ele próprioprevê os meios para suprir-se os espaços vazios e promover aintegração do sistema. Por essa razão é que se diz que osmencionados mecanismos constituem modos de explicitação daintegridade, da plenitude do sistema jurídico.Há uma hierarquia na utilização desses mecanismos, figurando aanalogia em primeiro lugar. Somente podem ser utilizados os demais se aanalogia não puder ser aplicada. Isto porque o direito brasileiroconsagra a supremacia da lei escrita. Quando o juiz utiliza-se daanalogia para solucionar determinado caso concreto, não estáapartando-se da lei, mas aplicando à hipótese não prevista em leium dispositivo legal relativo a caso semelhante. Nisto consiste oemprego da analogia. O seu fundamento encontra-se no adágio romano ubieadem ratio, ibi idem jus (ou dispositio). Com esta expressãopretende-se dizer que a situações semelhantes devese aplicar a mesmaregra de direito. Costuma-se distinguir a analogia legis da analogiajuris. A primeira consiste na aplicação de uma norma existente,destinada a reger caso semelhante ao previsto. A segunda baseia-se em umconjunto de normas, para obter elementos que permitam a suaaplicabilidade ao caso concreto não previsto, mas similar.

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A Lei n. 2.681, de 1912, é sempre mencionada como interessante exemplode aplicação da analogia. Destinada a regulamentar aresponsabilidade das companhias de estradas de ferro por danos causadosa passageiros e a bagagens, passou a ser aplicada, por analogia, a todasas espécies de transportes terrestres (bonde, metrô, ônibus eaté em acidentes ocorridos em elevadores), à falta de legislaçãoespecífica.O costume é, também, fonte supletiva em nosso sistema jurídico,porém está colocado em plano secundário, em relação à lei. Ojuiz só pode recorrer a ele depois de esgotadas as possibilidades dese suprir a lacuna pelo emprego da ana22logia. Diz-se que o costume é composto de dois elementos: o uso(elemento externo) e a convicção jurídica (elemento interno). Emconseqüência, é conceituado como sendo a prática uniforme,constante, pública e geral de determinado ato, com a convicção desua necessidade.Em relação à lei, três são as espécies de costume: a) osecundum legem, quando sua eficácia obrigatória é reconhecida pelalei, como nos casos mencionados, dentre outros, nos arts. 588, §2°-, 1.218 e 1.242 do Código Civil; b) o praeter legem, quando sedestina a suprir a lei, nos casos omissos (LICC, art. 4°-). Comoexemplo, pode ser mencionado o costume de efetuar-se pagamentos comcheque pré-datado, e não como ordem de pagamento à vista,afastando a existência de crime; c) o contra legem, que se opõe àlei. Em regra, o costume não pode contrariar a lei, pois esta só serevoga, ou se modifica, por outra lei.Não encontrando solução na analogia, nem nos costumes, parapreenchimento da lacuna, o juiz deve buscá-la nos princípios geraisde direito. São estes constituídos de regras que se encontram naconsciência dos povos e são universalmente aceitas, mesmo nãoescritas. Tais regras, de caráter genérico, orientam a compreensãodo sistema jurídico, em sua aplicação e integração, estejam ounão incluídas no direito positivo. Muitas delas passaram a integraro nosso direito positivo, como a de que "ninguém pode lesar a outrem"(art. 159), a que veda o enriquecimento sem causa (arts. 513, 517, 547,964 etc.), a que não admite escusa de não-cumprimento da lei pornão conhecê-la (LICC, art. 3°-). Em sua maioria, no entanto, osprincípios gerais de direito estão implícitos no sistemajurídico civil, como o de que "ninguém pode valer-se da própriatorpeza", o de que "a boa-fé se presume", o de que "ninguém podetransferir mais direitos do que tem", o de que "se deve favorecer maisaquele que procura evitar23um dano do que aquele que busca realizar um ganho" etc.A eqüidade não constitui meio supletivo de lacuna da lei, sendo merorecurso auxiliar da aplicação desta. Não considerada em suaacepção lata, quando se confunde com o ideal de justiça, mas emsentido estrito, é empregada quando a própria lei cria espaços oulacunas para o juiz formular a norma mais adequada ao caso. Éutilizada quando a lei expressamente o permite. Prescreve o art. 127 doCódigo de Processo Civil que o "juiz só decidirá por eqüidadenos casos previstos em lei". Isto ocorre geralmente nos casos deconceitos vagos ou quando a lei formula várias alternativas e deixa aescolha a critério do juiz. Como exemplos podem ser citados o art. 13da Lei do Divórcio, que autoriza o juiz a regular por maneira

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diferente dos critérios legais, se houver motivos graves e a bem domenor; e o art. 424, II, que permite ao tutor reclamar do juiz queprovidencie, "como houver por bem", quando o menor tutelado haja mistercorreção, dentre outros.7. APLICAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DAS NORMAS JURÍDICASAs normas são genéricas e contêm um comando abstrato, não sereferindo especificamente a casos concretos. O magistrado é ointermediário entre a norma e o fato. Quan do este se enquadra nanorma, dá-se o fenômeno da subsunção. Há casos, no entanto, emque tal enquadramento não ocorre, não encontrando o juiz nenhumanorma aplicável à hipótese sub judice. Deve, então, proceder àintegração normativa, mediante o emprego da analogia, dos costumes edos princípios gerais do direito. Para verificar se a norma éaplicável ao caso em julgamento (subsunção) ou se deve procederà integração normativa, o juiz procura descobrir o sentido danorma, interpretando-a.24Interpretar é descobrir o sentido e o alcance da norma jurídica.Toda lei está sujeita a interpretação, e não apenas as obscurase ambíguas. O brocardo romano in claris cessat interpretado não é,hoje, acolhido, pois até para afirmar-se que a lei é clara épreciso interpretá-la. Há, na verdade, interpretações maissimples, quando a lei é clara, e complexas, quando o preceito é dedifícil entendimento. A hermenêutica é a ciência dainterpretação das leis. Como toda ciência, tem os seus métodos.Quanto às fontes ou origem, os métodos de interpretaçãoclassificam-se em: autêntico, jurisprudencial e doutrinário.Interpretação autêntica é a feita pelo próprio legislador, poroutro ato. Este, reconhecendo a ambigüidade da norma, vota uma novalei, destinada a esclarecer a sua intenção. Neste caso, a leiinterpretativa é considerada como a própria lei interpretada.Interpretação jurisprudencial é a fixada pelos tribunais. Emboranão tenha força vinculante, influencia grandemente os julgamentosnas instâncias inferiores. A doutrinária é a feita pelosestudiosos e comentaristas do direito.Quanto aos meios, a interpretação pode ser feita pelos métodosgramatical (ou literal), lógico, sistemático, histórico esociológico (ou teleológico). A interpretação gramati cal étambém chamada de literal, porque consiste em exame do texto normativosob o ponto de vista lingüístico, analisando a pontuação, acolocação das palavras na frase, a sua origem etimológica etc. Nainterpretação lógica procura-se apurar o sentido e o alcance danorma, a intenção do legislador, por meio de raciocínioslógicos, com abandono dos elementos puramente verbais. Ainterpretação sistemática parte do pressuposto de que uma leinão existe isoladamente e deve ser interpretada em conjunto com outraspertencentes à mesma província do direito. Assim, uma normatributária deve ser interpretada de acordo com os princípios queregem o siste25ma tributário. Em determinado momento histórico, predominava oprincípio da autonomia da vontade. Com o surgimento dointervencionismo na economia contratual, a interpretaçãosistemática conduziu à proteção do contratante mais fraco. Ainterpretação histórica baseia-se na investigação dosantecedentes da norma, do processo legislativo, a fim de descobrir o seu

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exato significado. É o melhor método para se apurar a vontade dolegislador e os objetivos que visava atingir (ratio legis). Ainterpretação sociológica (ou teleológica) tem por objetivoadaptar o sentido ou finalidade da norma às novas exigênciassociais, com abandono do individualismo que preponderou no períodoanterior à edição da Lei de Introdução ao Código Civil. Talrecomendação é endereçada ao magistrado no art. 5°- dareferida lei, que assim dispõe: "Na aplicação da lei, o juizatenderá aos fins sociais a que ela se destina e às exigências dobem comum".Os diversos métodos de interpretação não operam isoladamente,não se repelem reciprocamente, mas se completam.S. CONFLITO DAS LEIS NO TEMPOAs leis são feitas para, em geral, valer para o futuro. Quando a leié modificada por outra e já haviam-se formado relaçõesjurídicas na vigência da lei anterior, pode instaurar-se o confli todas leis no tempo. A dúvida dirá respeito à aplicação ou nãoda lei nova às situações anteriormente constituídas.Para solucionar tal questão, são utilizados dois critérios: o dasdisposições transitórias e o da irretroatividade das normas.Disposições transitórias são elaboradas pelo legis lador, nopróprio texto normativo, destinadas a evitar e a solucionar conflitosque poderão emergir do confronto da nova lei com a antiga, tendovigência temporária. Irretroativa é a26lei que não se aplica às situações constituídas anteriormente.É um princípio que objetiva assegurar a certeza, segurança eestabilidade do ordenamento jurídico-positivo, preservando assituações consolidadas em que o interesse individual prevalece.Entretanto, não se tem dado a ele caráter absoluto, pois razões depolítica legislativa podem recomendar que, em determinadasituação, a lei seja retroativa, atingindo os efeitos de atosjurídicos praticados sob o império da norma revogada.A Constituição Federal de 1988 (art. 5°-, XXXVI) e a Lei deIntrodução ao Código Civil, afinadas com a tendênciacontemporânea, adotaram o princípio da irretroatividade das leiscomo regra, e o da retroatividade como exceção. Acolheu-se a teoriade Gabba, de completo respeito ao ato jurídico perfeito, ao direitoadquirido e à coisa julgada. Assim, como regra, aplica-se a lei novaaos casos pendentes e aos futuros, só podendo ser retroativa (atingirfatos pretéritos) quando: a) não ofender o ato jurídico perfeito,o direito adquirido e a coisa julgada; b) quando o legislador,expressamente, mandar aplicá-la a casos pretéritos, mesmo que apalavra "retroatividade" não seja usada. Na doutrina, diz-se que éjusta a retroatividade quando não se depara, na sua aplicação,qualquer ofensa ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e àcoisa julgada; e injusta, quando ocorre tal ofensa.Entre a retroatividade e a irretroatividade existe uma situaçãointermediária: a da aplicabilidade imediata da lei nova a relaçõesque, nascidas embora sob a vigência da lei anti ga, ainda não seaperfeiçoaram, não se consumaram. A imediata e geral aplicaçãodeve também respeitar o ato jurídico perfeito, o direito adquirido ea coisa julgada. O art. 6°- da Lei de Introdução ao Código Civilpreceitua que a lei em vigor "terá efeito imediato e geral,respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisajulgada". Ato jurídico per

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27jeito é o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que seefetuou (§ V). Direito adquirido é o que já se incorporoudefinitivamente ao patrimônio e à personalidade de seu titular.Coisa julgada é a imutabilidade dos efeitos da sentença, não maissujeita a recursos.Exemplo de efeito imediato das leis é o que se dá sobre a capacidadedas pessoas, pois alcança todos aqueles por ela abrangidos. Se a leireduzir o limite da maioridade civil para dezoito anos, tornaráautomaticamente maiores todos os que já tenham atingido esta idade.Por outro lado, se a lei aumentar o limite para vinte e quatro anos,verbi gratia, será respeitada a maioridade dos que já haviamcompletado vinte e um anos na data da sua entrada em vigor. No entanto,os que ainda não haviam atingido a idade de vinte e um anos terão deaguardar o momento em que completarem vinte e quatro anos.9. EFICÁCIA DA LEI NO ESPAÇOEm razão da soberania estatal, a norma tem aplicação dentro doterritório delimitado pelas fronteiras do Estado. Esse princípio daterritorialidade, entretanto, não é absoluto. A cada dia é maisacentuado o intercâmbio entre indivíduos pertencentes a Estadosdiferentes. Muitas vezes, dentro dos limites territoriais de um Estado,surge a necessidade de regular relações entre nacionais eestrangeiros. Essa realidade levou o Estado a permitir que a leiestrangeira tenha eficácia em seu território, sem comprometer asoberania nacional, admitindo assim o sistema da extraterritorialidade.Pelo sistema da territorialidade, a norma jurídica aplica-se noterritório do Estado, estendendo-se às embaixadas, consulados,navios de guerra onde quer que se encontrem,28navios mercantes em águas territoriais ou em alto-mar, naviosestrangeiros (menos os de guerra) em águas territoriais, aeronaves noespaço aéreo do Estado e barcos de guerra onde quer que seencontrem.O Brasil segue o sistema da territorialidade moderada. Pelaextraterritorialidade, a norma é aplicada em território de outroEstado, segundo os princípios e convenções inter nacionais.Estabelece-se um privilégio pelo qual certas pessoas escapam àjurisdição do Estado em cujo território se achem, submetendo-seapenas à jurisdição do seu país. A norma estrangeira passa aintegrar momentaneamente o direito nacional, para solucionar determinadocaso submetido à apreciação judicial. Denomina-se estatuto pessoala situação jurídica que rege o estrangeiro pelas leis de seupaís de origem. Baseia-se ele na lei da nacionalidade ou na lei dodomicílio. Dispõe, com efeito, o art. 7° da Lei de Introduçãoao Código Civil que "A lei do país em que for domiciliada a pessoadetermina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, acapacidade e os direitos de família" (grifo nosso).Verifica-se que, pela atual Lei de Introdução, o estatuto pessoalfunda-se na lei do domicílio, na lei do país onde a pessoa édomiciliada, ao contrário da anterior, que se baseava nanacionalidade. Em determinados casos, o juiz aplicará o direitoalienígena, em vez do direito interno. Por exemplo, se uma brasileirae um estrangeiro residente em seu país pretenderem casar-se no Brasil,tendo ambos vinte e um anos de idade, e a lei do país de origem donoivo exigir o consentimento dos pais para o casamento de menores devinte e dois anos, como acontece na Argentina, precisará ele exibir

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tal autorização, por aplicar-se no Brasil a lei de seu domicílio.No entanto, dispensável será tal autorização se o noivoestrangeiro aqui tiver domicílio. Aplicar-se-á a lei brasileira,porque o29casamento realizar-se-á no Brasil e o estrangeiro encontra-se aquidomiciliado. O conceito de domicílio é dado pela lex fori (lei doforo competente, da jurisdição onde se deve processar a demanda). Ojuiz brasileiro ater-se-á à noção de domicílio assentada nosarts. 31 e s. do Código Civil.O § 1 °- do art. 7°- da Lei de Introdução prescreve:"Realizando-se o casamento no Brasil, será aplicada a lei brasileiraquanto aos impedimentos dirimentes e às formalidades dacelebração". Ainda que os nubentes sejam estrangeiros, a leibrasileira será aplicável (lex loci atus), inclusive no tocante aosimpedimentos dirimentes, absolutos e relativos (CC, art. 183, I a XII).Não, porém, com relação aos impedimentos proibitivos oumeramente impedientes (art. 183, XIII a XVI), que não invalidam ocasamento e apenas impõem sanções aos nubentes. O estrangeirodomiciliado fora do país que se casar no Brasil não estará sujeitoa tais sanções se estas não forem previstas na sua lei pessoal.De acordo com o § 2°- do aludido art. 7°-, "o casamento deestrangeiros pode celebrar-se perante as autoridades diplomáticas ouconsulares do país de ambos os nubentes" (grifo nosso). Neste caso, ocasamento será celebrado segundo a lei do país do celebrante. Mas ocônsul estrangeiro só poderá realizar matrimônio quando ambos oscontraentes forem conacionais. Cessa a sua competência se um deles forde nacionalidade diversa. Os estrangeiros domiciliados no Brasil terãode procurar a autoridade brasileira. O casamento de brasileiros noexterior pode ser celebrado perante a autoridade consular brasileira,desde que ambos os nubentes sejam brasileiros, mesmo que domiciliadosfora do Brasil. Não poderá, portanto, ocorrer no consulado ocasamento de brasileira com estrangeiro.É também a lei do domicilio dos nubentes que discipli30na o regime de bens no casamento (§ 4-° do art. 7°-). Se osdomicílios forem diversos, aplicar-se-á a lei do primeirodomicílio do casal. O divórcio obtido no estrangeiro seráreconhecido no Brasil, se os cônjuges forem brasileiros, desde queobservadas as normas da Lei n. 6.515/77 e homologada a sentença peloSupremo Tribunal Federal. Sem a observância de tais formalidades,subsiste o impedimento para novo casamento.Regem-se ainda pela lei do domicílio a sucessão "causa mortis" (art.10) e a competência da autoridade judiciária (art. 12). Há,porém, um limite à extraterritorialidade da lei: as leis, atos esentenças de outro país, bem como quaisquer declarações devontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem asoberania nacional, a ordem pública e os bons costumes (art. 17).Segundo prescreve o art. 10 da Lei de Introdução ao Código Civil,a sucessão por morte ou por ausência obedece à lei do país emque era domiciliado o defunto ou o desaparecido, qualquer que seja anatureza e a situação dos bens. É a lei do domicílio do decujus, portanto, que rege as condições de validade do testamento porele deixado. Mas é a lei do domicílio do herdeiro ou legatário queregula a capacidade para suceder (§ 2°- do art. 10). A sucessão debens de estrangeiros situados no País será regulada pela lei

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brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos brasileiros, ou dequem os represente, sempre que não lhes seja mais favorável a leipessoal do de cujus (§ 1°-, com a redação dada pela Lei n.9.047, de 18-5-1995). O art. 12 resguarda a competência da justiçabrasileira, quando o réu for domiciliado no Brasil ou aqui tiver deser cumprida a obrigação, aduzindo no § 1-° que só àautoridade brasileira compete conhecer das ações relativas aimóveis situados no Brasil.As sentenças proferidas no estrangeiro dependem, para serem executadasno Brasil, do preenchimento dos requisi31tos mencionados no art. 15 da Lei de Introdução ao Código Civil:a) haver sido proferida por juiz competente; b) terem sido as partescitadas ou haver-se legalmente verificado a revelia; c) ter passado emjulgado e estar revestida das formalidades necessárias para aexecução no lugar em que foi proferida; d) estar traduzida porintérprete autorizado; e) ter sido homologada pelo Supremo TribunalFederal.Não dependem de homologação as sentenças meramentedeclaratórias do estado das pessoas (parágrafo único). Essecontrole ou juízo de delibação visa somente o exame formal documprimento daqueles requisitos e de inocorrência de ofensa à ordempública e à soberania nacional, para se imprimir eficácia àdecisão estrangeira no território brasileiro, sem que haja reexamedo mérito da questão. Mas não é necessário o juízo dedelibação para o cumprimento de carta rogatória estrangeira,porque não tem caráter executório, nem para a execução detítulo executivo extrajudicial oriundo de Estado estrangeiro (CPC,art. 585, § 2°-).Como exceção à lei do domicilio, admite a Lei de Introdução aaplicação da lex rei sitae (lei da situação da coisa) paraqualificar os bens e regular as relações a eles concer nentes (art.8`--'), embora determine que se aplique a lei do domicílio doproprietário, quanto aos móveis que trouxer ou se destinarem atransporte para outros lugares. Para qualificar e reger asobrigações, no entanto, aplicar-se-á a lei do país em que seconstituírem, segundo dispõem o art. 9°- e a regra locus regitactum. Também a prova dos fatos ocorridos em país estrangeirorege-se pela lei que nele vigorar (art. 13).O Código de Bustamante, que constitui uma sistematização dasnormas de direito internacional privado, foi ratificado no Brasil, comalgumas ressalvas, e, na forma de seu art. 2°-, integra o sistemajurídico nacional, no tocante aos chamados conflitos de lei noespaço, podendo ser invocado como32direito positivo brasileiro somente quando tais conflitos envolverem umbrasileiro e um nacional de Estado que tenha sido signatário daConvenção de Havana de 1928. Apesar de o Brasil tê-lo ratificado,a Lei de Introdução deixou de consagrar as regras fundamentais desua orientação.PARTE GERAL DO CÓDIGO CIVILTÍTULO I DAS PESSOASCAPÍTULO 1DA PESSOA NATURAL1. CONCEITO DE PESSOA NATURALÉ o ser humano considerado como sujeito de direitos e obrigações

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(CC, art. 2°). Para ser pessoa, basta que o homem exista.Todo homem é dotado de personalidade, isto é, tem capacidade parafigurar em uma relação jurídica. Todo homem (não os animais nemos seres inanimados) tem aptidão ge nérica para adquirir direitos econtrair obrigações (personalidade). O art. 2°, ao proclamar quetodo "homem é capaz de direitos e obrigações na ordem civil"(grifo nosso), entrosa o conceito de capacidade com o de personalidade.Capacidade é a medida da personalidade. A que todos possuem (art.2°-) é a capacidade de direito (de aquisição ou de gozo dedireitos). Mas nem todos possuem a capacidade de fato (de exercício dodireito), que é a aptidão para exercer, por si só, os atos da vidacivil, também chamada de "capacidade de ação". Os recém-nascidose os loucos têm somente a capacidade de direito (de aquisição dedireitos), po37dendo, por exemplo, herdar. Mas não têm a capacidade de fato (deexercício). Para propor qualquer ação em defesa da herançarecebida, precisam ser representados pelos pais e curadores.Capacidade não se confunde com legitimação. Esta é a aptidãopara a prática de determinados atos jurídicos. Assim, o ascendenteé genericamente capaz, mas só estará legitima do a vender a umdescendente se os demais descendentes expressamente consentirem (CC,art. 1.132).Quem tem as duas espécies de capacidade tem capacidade plena. Quemsó tem a de direito, tem capacidade limitada e necessita de outrapessoa que substitua ou complete a sua vontade. São, por isso,chamados de "incapazes".2. DAS INCAPACIDADESNo direito brasileiro não existe incapacidade de direito, porque todosse tornam, ao nascer, capazes de adquirir direitos (CC, art. 2°-).Existe, portanto, somente incapacidade de fato ou de exercício.Incapacidade, portanto, é a restrição legal ao exercício de atosda vida civil. E pode ser de duas espécies: absoluta e relativa.A absoluta (art. 5-) acarreta a proibição total do exercício, porsi só, do direito. O ato somente poderá ser praticado pelorepresentante legal do absolutamente incapaz, sob pena de nulidade (CC,art. 145, 1).A relativa (art. 6`-') permite que o incapaz pratique atos da vidacivil, desde que assistido, sob pena de anulabilidade (CC, art. 147, 1).Certos atos, porém, pode praticar sem a as sistência de seurepresentante legal, como ser testemunha (art. 142), aceitar mandato(art. 1.298), fazer testamento (art. 1.627),38exercer empregos públicos (art. 9°-, § 1°, 111), casar (art.183, XII), ser eleitor, celebrar contrato de trabalho etc.As incapacidades, absoluta ou relativa, são supridas, pois, pelarepresentação e pela assistência (arts. 7°- e 84). Narepresentação, o incapaz não participa do ato, que é praticadosomente por seu representante. Na assistência, reconhece-se ao incapazcerto discernimento e, portanto, ele é quem pratica o ato, mas nãosozinho, e sim acompanhado, isto é, assistido por seu representante.Se o ato consistir, por exemplo, na assinatura de um contrato, estedeverá conter a assinatura de ambos. Na representação, somente orepresentante do incapaz assina o contrato.O Código Civil contém um sistema de proteção aos incapazes. Emvários dispositivos constata-se a intenção do legislador em

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proteger os incapazes, como, por exemplo, nos capítulos referentes aopátrio poder (art. 387), à tutela, à prescrição, àsnulidades e outros. Entretanto, nesse sistema de proteção nãoestá incluída a restitutio in integrum (benefício derestituição), que existia no direito romano e que consistia napossibilidade de se anular o negócio válido, mas que se revelouprejudicial ao menor. Dispõe, com efeito, o art. 8°- do CódigoCivil que "Na proteção que o Código Civil confere aos incapazesnão se compreende o benefício de restituição". Assim, se onegócio foi validamente celebrado (observados os requisitos darepresentação e da assistência, e autorização judicial, quandonecessária), não se poderá pretender anulá-lo se,posteriormente, mostrar-se prejudicial ao menor.2.1. INCAPACIDADE ABSOLUTAO art. 5° do Código Civil traz o rol dos absolutamente incapazes: osmenores de dezesseis anos, os loucos de todo39o gênero, os surdos-mudos que não puderem exprimir a sua vontade eos ausentes, declarados tais por ato do juiz.2.1.1. OS MENORES DE DEZESSEIS ANOSSão os menores impúberes, que ainda não atingiram a maturidadesuficiente para participar da atividade jurídica. A incapacidadeabrange as pessoas dos dois sexos. O que se leva em conta, nafixação desse limite, que não é igual em todos os países, éo desenvolvimento mental do indivíduo. Alguns países não fazemdistinção entre incapacidade absoluta e relativa. Outros, como aArgentina, consideram absolutamente incapazes somente os menores dequatorze anos. O Código Civil italiano, no entanto, faz cessar talincapacidade aos dezoito anos, salvo casos especiais.2.1.2. OS LOUCOS DE TODO O GÊNEROEssa expressão abrange toda espécie de desequilíbrio mental enão foi mantida no Decreto n. 24.559/34, que trata da assistênciaaos psicopatas e permite que o juiz, no pro cesso de interdição,fixe os seus limites, podendo, assim, se entender que a curatela deveser limitada, considerar o louco uma pessoa relativamente incapaz.A nossa lei não admite os chamados intervalos lúcidos. Assim,declarado incapaz, os atos praticados pelo louco serão nulos, não seaceitando a tentativa de demonstrar que, naquele momento, encontrava-selúcido. É que a incapacidade mental é considerada um estadopermanente e contínuo. O processo de interdição segue o ritoestabelecido nos arts. 1.177 e s. do Código de Processo Civil, bemcomo as disposições da Lei n. 6.015/73, sendo a sentença denatureza declaratória de uma situação ou estado anterior. Paraassegurar a sua eficácia erga omnes, deve ser inscrita no re40gistro das pessoas naturais e publicada três vezes na imprensa local ena oficial.É nulo o ato praticado pelo louco, depois dessas providências.Entretanto, como é a doença mental e não a sentença deinterdição que determina a incapacidade, uma corren te sustenta queé sempre nulo, também, o ato praticado pelo louco, antes dainterdição. Outra corrente, porém, inspirada no direito francês,entende que deve ser respeitado o direito do terceiro de boa-fé, quecontrata com o louco sem saber das suas condições psíquicas. Paraessa corrente somente é nulo o ato praticado pelo amental se eranotório o estado de loucura, isto é, de conhecimento público

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geral.A velhice ou senilidade, por si só, não é causa de limitaçãoda capacidade, salvo se motivar um estado patológico que afete oestado mental, como a arteriosclerose.Os toxicômanos também estão sujeitos a internação einterdição, segundo o grau de intoxicação e dependência,inclusive os alcoólatras. A hipótese é regulada pelo Decreto Lein. 891/38, que prevê a possibilidade de se decretar a interdiçãoplena ou limitada do toxicômano. Neste último caso, seráconsiderado relativamente incapaz.2.1.3. OS SURDOS-MUDOSSomente são declarados incapazes os surdos-mudos que, por não teremrecebido educação adequada, não podem manifestar sua vontade. Se ativerem recebido, e puderem exprimir sua vontade, serão capazes.Como, algumas vezes, tal educação não chega a produzir osresultados esperados, embora melhore a capacidade de expressão dosurdo-mudo, pode o juiz, autorizado pelo art. 451 do Código Civil,estabelecer os limites da curatela, para41considerá-lo relativamente incapaz. Dependendo, pois, da suacapacidade de se expressar, o surdo-mudo será considerado capaz,relativamente incapaz ou absolutamente incapaz.2.1.4. OS AUSENTESAusente é a pessoa que desaparece de seu domicilio, sem deixarrepresentante e sem dar notícia de seu paradeiro.A lei permite que seja declarado ausente e interditado por sentença,nomeando-se-lhe curador. A finalidade principal é proteger o seupatrimônio. Se a ausência prolongar-se, permite-se a suatransmissão aos herdeiros. Se o ausente reaparecer, assumirá adireção dos seus negócios e de seu patrimônio. Tem-seconsiderado, por isso, um erro técnico a sua inclusão na categoriados absolutamente incapazes, pois não há propriamente umaincapacidade por ausência, mas somente uma necessidade de seprotegerem, em um primeiro momento, os interesses do ausente e, em umsegundo momento, os de seus herdeiros.2.2. INCAPACIDADE RELATIVAO art. 6°- do Código Civil considera incapazes, relativamente acertos atos ou à maneira de os exercer, os maiores de dezesseis emenores de vinte e um anos, os pródigos e os silvícolas. Como vimos,dependendo da situação individual, nesse rol podem ser incluídostambém os psicopatas, os toxicômanos e os surdos-mudos.Como as pessoas supramencionadas têm algum discernimento, não ficamafastadas da atividade jurídica, podendo praticar determinados atospor si sós. Estes, porém, consti tuem exceções, pois devem estarassistidas por seus representantes, para a prática dos atos em geral,sob pena de anu42labilidade. Estão em uma situação intermediária entre acapacidade plena e a incapacidade total.2.2.1. OS MAIORES DE DEZESSEIS ANOS E MENORES DE VINTE E UM ANOSOs maiores de dezesseis e menores de vinte e um anos são os menorespúberes. Já vimos que podem praticar apenas determinados atos sem aassistência de seus representantes: aceitar mandato, ser testemunha,fazer testamento etc. Não se tratando desses casos especiais,necessitam da referida assistência, sob pena de anulabilidade do ato,se o lesado tomar providências nesse sentido e o vício não houver

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sido sanado.Se, entretanto, dolosamente, ocultarem a sua idade ou espontaneamentedeclararem-se maiores, no ato de se obrigar, perderão a proteçãoque a lei confere aos incapazes e não poderão, assim, anular aobrigação ou eximir-se de cumprila (CC, art. 155). Exige-se, noentanto, que o erro da outra parte seja escusável. Se não houvemalícia por parte do menor, anula-se o ato, para protegê-lo. Comoninguém pode locupletar-se à custa alheia, determina-se arestituição da importância paga ao menor se ficar provado que opagamento nulo reverteu em proveito dele (CC, art. 157). O art. 156 doCódigo Civil também nega proteção ao incapaz que pratica atosilícitos, equiparando-o, para fins de responsabilidade civil, aomaior.2.2.2. OS PRÓDIGOSPródigo é o indivíduo que dissipa o seu patrimônio,desvairadamente. Trata-se de um desvio da personalidade e não,propriamente, de um estado de alienação mental. Pode ser submetidoà curatela (CC, art. 446, 111), se tiver cônjuge, as43cendente ou descendente. Em atenção a estes, e não ao pródigo,decreta-se a interdição. Só ficará privado, no entanto, depraticar atos que extravasam a mera administração (esta, poderáexercer) e implicam comprometimento do patrimônio, como emprestar,transigir, dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou serdemandado (CC, art. 459).O pródigo pode praticar, validamente e por si só, os atos da vidacivil que não envolvam o seu património e não se enquadrem nasrestrições mencionadas. Pode, assim, casar, fixar o domicílio docasal, dar autorização para casamento dos filhos etc.2.2.3. OS SILVÍCOLASSilvícolas são os habitantes das selvas, não integrados àcivilização. Nos termos do art. 6°, parágrafo único, doCódigo Civil, ficarão sujeitos à tutela, estabelecida por lei e regulamentos especiais, até se adaptarem à civilização do País,sendo enquadrados, enquanto isso, na categoria dos relativamenteincapazes.O diploma legal que atualmente regula a situação jurídica dossilvícolas no país é a Lei n. 6.001, de 19 de dezembro de 1973,que dispõe sobre o Estatuto do índio. Referida lei foi além doCódigo Civil, pois considera nulos (e não anuláveis) os negócioscelebrados entre um índio e pessoa estranha à comunidade indígena,sem a assistência da Fundação Nacional do índio (Funai),enquadrando-o, pois, como absolutamente incapaz. Entretanto, proclamaque se considerará válido tal ato, se o silvícola revelarconsciência e conhecimento do ato praticado e, ao mesmo tempo, tal atonão o prejudicar.A Fundação Nacional do índio foi criada pela Lei n. 5.371/67 paraexercer a tutela dos indígenas, em nome da União. A Lei dosRegistros Públicos (LRP-Lei n. 6.015/73)estabelece, no art. 50, § 2-°, que os "índios, enquanto nãointegrados, não estão obrigados a inscrição do nascimento. Estepoderá ser feito em livro próprio do órgão federal deassistência aos índios".A tutela do silvícola origina-se no âmbito administrativo. O índioque vive nas comunidades não integradas à civilização já nascesob tutela. É, portanto, independentemente de qualquer medida

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judicial, incapaz desde o nascimento, até que preencha os requisitosexigidos pelo art. 9°- da Lei n. 6.001/ 73 (idade mínima de 21 anos,conhecimento da língua portuguesa, habilitação para o exercíciode atividade útil à comunidade nacional, razoável compreensãodos usos e costumes da comunhão nacional) e seja liberado por atojudicial, diretamente, ou por ato da Funai homologado pelo órgãojudicial. Poderá também o Presidente da República, por decreto,declarar a emancipação de uma comunidade indígena e de seusmembros. Competente para cuidar das questões referentes aossilvícolas é a Justiça Federal.A tutela do índio não integrado à comunhão nacional tem afinalidade de protegê-lo, à sua pessoa e aos seus bens. Além daassistência da Funai, o Ministério Público federal funcio narános processos em que haja interesse dos índios e, inclusive, proporáas medidas judiciais necessárias à proteção de seus direitos.3. CESSAÇÃO DA INCAPACIDADECessa a incapacidade, em primeiro lugar, quando cessar a sua causa(loucura, menoridade etc.) e, em segundo lugar, pela emancipação. Amenoridade cessa aos vinte e um anos completos (CC, art. 9°-), istoé, no primeiro momento do dia em que o indivíduo perfaz os vinte eum anos. Se é nascido45no dia 29 de fevereiro de ano bissexto, completa a maioridade no dia 1"de março.A emancipação pode ser de três espécies: voluntária, judiciale legal. A voluntária é a concedida pelos pais, se o menor tiverdezoito anos cumpridos (art. 9°-, § 1°-, do CC). A judi cial é aconcedida por sentença, ouvido o tutor, em favor do tutelado que jácompletou dezoito anos. A legal é a que decorre de determinados fatosprevistos na lei, como o casamento, o exercício de emprego públicoefetivo, a colação de grau em curso superior e o estabelecimento comeconomia própria, civil ou comercial. A emancipação voluntáriadeve ser concedida por ambos os pais (arts. 89 da Lei n. 6.015/73 e 226,§ 5°, da CF). Se divergirem entre si, a divergência deverá serdirimida pelo juiz. Quanto à forma, malgrado alguns autores mencionemo instrumento público, para dar maior segurança ao ato, a verdadeé que o art. 90 da Lei n. 6.015/ 73 admite o instrumento particular.Tal espécie de emancipação só não produz, segundo ajurisprudência, inclusive a do Supremo Tribunal Federal, o efeito deisentar os pais da obrigação de indenizar as víti mas dos atosilícitos praticados pelo menor emancipado, para evitaremancipações maliciosas. Esta afirmação só se aplica àsemancipações voluntariamente concedidas pelos pais, não àsdemais espécies.Se o menor estiver sob tutela, deverá requerer sua emancipação aojuiz, que a concederá por sentença, depois de verificar aconveniência do deferimento para o bem do menor. O tutor não podeemancipá-lo. Evitam-se, com isso, emancipações destinadas apenas alivrar o tutor dos ônus da tutela.As emancipações voluntária e judicial devem ser registradas emlivro próprio do 1 °- Ofício do Registro Civil da Comarca dodomicílio do menor, anotando-se também, com remissõesrecíprocas, no assento de nascimento (LRP, art. 107,46§ 1'). Antes do registro, não produzirão efeito (art. 91,parágrafo único). Quando concedida por sentença, deve o juiz

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comunicar, de ofício, a concessão ao escrivão do Registro Civil. Aemancipação legal (casamento, emprego público etc.) independe deregistro e produzirá efeitos desde logo, isto é, a partir do ato oudo fato que a provocou.A emancipação, em qualquer de suas formas, é irrevogável. Nãopodem os pais, que voluntariamente emanciparam o filho, voltar atrás.Irrevogabilidade, entretanto, não se confunde com ineficácia do ato(nulidade ou anulabilidade decorrente de coação, p. ex.), que podeser reconhecida. O casamento válido produz o efeito de emancipar omenor. Se a sociedade conjugal logo depois se dissolver, pela viuvez oupela separação judicial, não retornará à condição deincapaz. O casamento nulo, entretanto, não produz nenhum efeito (CC,art. 207). Proclamada a nulidade, ou mesmo a anulabilidade (cf. v. 2, n.18.2.2), o emancipado retorna à situação de incapaz, salvo se ocontraiu de boa-fé. Neste caso, o casamento será putativo emrelação a ele e produzirá todos os efeitos de um casamentoválido, inclusive a emancipação (CC, art. 221).No tocante ao exercício de emprego público, malgrado ainda dominantea corrente que exige tratar-se de emprego efetivo, afastando osinterinos, contratados, diaristas, mensalis tas etc., têm algumasdecisões abrandado o rigor da lei, entendendo que deve prevalecer ostatus de servidor público, qualquer que seja o serviço oufunção administrativa e o modo de sua investidura. O fato de tersido admitido no serviço público já denota maturidade ediscernimento.A colação em grau científico em curso de ensino superior e oestabelecimento civil ou comercial, com economia própria, justificam aemancipação, por demonstrar maturidade do menor, afastando, naúltima hipótese, as dificuldades que a subordinação aos paisacarretaria, na gestão dos negócios,47ao mesmo tempo em que tutela o interesse de terceiros, que de boa-féestabeleceram relacões comerciais com o menor.O art. 9°-, § 2°-, do Código Civil dizia que, para efeito doalistamento e do sorteio militar cessará a incapacidade do menor quehouver completado 18 anos de idade. Tal dispo sitivo foi revogado pelaLei n. 4.375/64, art. 73, que proclama cessar a incapacidade civil domenor na data em que completar dezessete anos, para tais efeitos.4. COMEÇO DA PERSONALIDADE NATURALA personalidade civil do homem começa do nascimento com vida (CC, art.4°-) - o que se constata pela respiração (docimasia hidrostáticade Galeno). Se respirou, viveu (LRP, art. 53, § 2). Não se exige ocorte do cordão umbilical, nem que seja viável (aptidão vital),nem que tenha forma humana. Nascendo vivo, ainda que morra em seguida, onovo ente chegou a ser pessoa, adquiriu direitos, e com sua morte ostransmitiu.Antes do nascimento não há personalidade. Mas o referido artigoressalva os direitos do nascituro, desde a concepção. Nascendo comvida, a sua existência, no tocante aos seus interesses, retroage aomomento de sua concepção (suspende-se o inventário, em caso demorte do pai, estando a mulher grávida e não havendo outrosdescendentes, para se aguardar o nascimento). Os direitos assegurados aonascituro encontram-se em estado potencial, sob condição suspensiva:só terão eficácia se nascer com vida. Vários dispositivos doCódigo Civil protegem o nascituro: 353, 357, parágrafo único, 372,458, 462, 1.169, 1.718.

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O natimorto é registrado no livro "C Auxiliar", com os elementos quecouberem (Lei n. 6.015/73, art. 53, § 1°-). Se morrer na ocasiãodo parto, tendo porém respirado, serão feitos48dois assentos: o de nascimento e o de óbito (§ 2-). São obrigadosa fazer o registro, pela ordem: os pais, o parente mais próximo, osadministradores de hospitais ou os médicos e parteiras, pessoaidônea da casa em que ocorrer o parto e o guarda do menor (LRP, art.52).5. EXTINÇÃO DA PERSONALIDADE NATURALExtingue-se somente no caso de morte real, que pode ser tambémsimultânea (comoriência).Morte real: Código Civil, art. 10 - A sua prova faz-se pelo atestadode óbito ou pela justificação, em caso de catástrofe enão-encontro do corpo (Lei n. 6.015/73, art. 88). Acarreta aextinção do pátrio poder, a dissolução do vínculomatrimonial, a extinção dos contratos personalíssimos, aextinção da obrigação de pagar alimentos etc.Morte simultânea (comoriência): Código Civil, art. 11Se duaspessoas falecerem na mesma ocasião (não precisa ser no mesmo lugar),não se podendo averiguar qual delas morreu primeiro, presumir-se-ãosimultaneamente mortas.Alguns países adotaram outros critérios, como o de considerarfalecida antes a pessoa mais idosa, a do sexo feminino etc.Não há transferência de bens entre comorientes. Por conseguinte,se morrem em acidente casal sem descendentes e ascendentes, sem se saberqual morreu primeiro, um não herda do outro. Assim, os colaterais damulher ficarão com a meação dela, enquanto os colaterais do maridoficarão com a meação dele. Diversa seria a solução se houvesseprova de que um faleceu pouco antes do outro. O que viveu um pouco maisherdaria a meação do outro e, por sua morte, a transmitiria aos seuscolaterais.Morte civil - Existia no direito romano, especialmente para os queperdiam o status libertatis (escravos). Há um res49quício dela no art. 1.599 do Código Civil, que trata o herdeiro,afastado da herança por indignidade, como se "morto fosse". Massomente para o fim de afastá-lo da herança. Conserva, porém, apersonalidade, para os demais efeitos. Também na legislaçãomilitar pode ocorrer a hipótese de a família do indigno dooficialato, que perde o seu posto e respectiva patente, perceberpensões, como se ele houvesse falecido.Morte presumida - A dos declarados ausentes (CC, art. 10, 29 parte). Adeclaração de ausência somente produz efeitos patrimoniais,permitindo a abertura da sucessão provisória e, depois, adefinitiva. O ausente não é declarado morto, nem sua mulher ficaviúva (diferentemente do que ocorre com a justificação realizadanos termos do art. 88 da Lei dos Registros Públicos, cuja sentençaproduz o mesmo efeito do atestado de óbito, permitindo o seuregistro).A lei que concedeu anistia às pessoas que perderam os seus direitospolíticos por terem participado da Revolução de 1964 (Lei n.6.683, de 28-8-1979) abriu uma exceção, per mitindo aos familiaresdaqueles que desapareceram e os corpos não foram encontrados apropositura de ação de declaração de ausência para todos osefeitos, inclusive pessoais, sendo a sentença irrecorrível.

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6. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PESSOA NATURALA pessoa identifica-se no seio da sociedade pelo nome (em sentidoamplo), pelo estado e pelo domicílio.6.1. NOMEA palavra "nome", como elemento individualizador da pessoa natural, éempregada em sentido amplo, indicando o nome completo.506.1.1. CONCEITOÉ o sinal exterior (ou a designação) pelo qual a pessoaidentifica-se no seio da família e da sociedade. Os criadoresintelectuais muitas vezes identificam-se pelo pseudônimo.6.1.2. NATUREZA JURÍDICAPara uns, tem a natureza de um "direito de propriedade". Essa correnteé inaceitável, porque a propriedade é alienável e temcaracterísticas que não se compatibilizam com o nome. Outros falamem propriedade sui generis, o que é o mesmo que nada explicar. LimongiFrança, corretamente, considera o nome "um direito da personalidade".Tem um aspecto público. É disciplinado pelo Estado (LRP, arts. 54 a58), que tem interesse na perfeita identificação das pessoas; e umaspecto individual: o direito ao nome, que abrange o de usá-lo e o dedefendê-lo contra usurpação (direito autoral) e contraexposição ao ridículo. Basta o interesse moral. Trata-se dedireito inalienável e imprescritível, essencial para o exercícioregular dos direitos e do cumprimento das obrigações. A tutela donome alcança o pseudônimo, propiciando também direito àindenização em caso de má utilização, inclusive em propagandacomercial.6.1.3. ELEMENTOS DO NOME (COMPLETO)São três: prenome e patronímico ou apelido familiar (ousimplesmente nome, vulgarmente chamado de "sobrenome") e, em algunscasos, o agnome (Júnior, Neto, Sobrinho etc. é um sinal quedistingue pessoas de uma mesma família). Axiônimo é designaçãoque se dá à forma cortês de tratamento ou à expressão dereverência, como por exemplo: Dr., Exmo. Sr., Vossa Santidade etc.51cular, a ser arquivado em Cartório. E sempre irrevogável.6.1.4. IMUTABILIDADE DO NOMEO art. 58 da Lei dos Registros Públicos (redação de acordo com aLei n. 9.708, de 18-11-1998) dispõe que "o prenome será definitivo,admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicosnotórios". O parágrafo único aduz que "A substituição doprenome será ainda admitida em razão de fundada coação ouameaça decorrente da colaboração com a apuração de crime, pordeterminação, em sentença, de juiz competente, ouvido oMinistério Público" (cf. Lei n. 9.807, de 13-7-1999). Aalteração do prenome pode ocorrer, ainda:a) em caso de evidente erro gráfico (procedimento sumário, nopróprio Cartório, com manifestação do Ministério Público esentença do juiz -, cf. art. 110 da LRP);b) no caso do parágrafo único do art. 55, que proíbe o registro denomes que possam expor a ridículo os seus portadores. Tem ajuriprudência, nestes casos, admitido a retifi cação não só doprenome como também de outras partes do nome. O escrivão tem o deverde recusar o registro, com recurso para o juiz. Depende dedistribuição, perante o juiz, de procedimento de retificação denome (LRP, art. 109). Incluem-se neste caso as hipóteses de pessoas do

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sexo masculino registradas com nome feminino e vice-versa.A jurisprudência, entretanto, ampliou as possibilidades dealteração do prenome, autorizando-as também nos seguintes casos:c) tradução de nomes estrangeiros;d) prenome de uso - se a pessoa é conhecida de todos por prenomediverso do que consta de seu registro, a alteração pode ser feita,pois prenome imutável, segundo a juris prudência, é aquele que foiposto em uso e não o que consta do registro (RT, 537:75).e) Adoção plena ou estatutária. O art. 47, § 5°-, do Estatutoda Criança e do Adolescente (ECA) dispõe que a sen53tença que deferir a adoção poderá determinar, a pedido doadotante, "a modificação do prenome" do menor.Em outros casos, tem-se admitido a alteração do patronímico:a) No primeiro ano após a maioridade Permite o art. 56 da Lei dosRegistros Públicos que o interessado, no primeiro ano após teratingido a maioridade civil, altere o nome, pela via administrativa(LRP, art. 110), desde que "não prejudique os apelidos de família".Se o nome é ridículo, ou contém erro gráfico, pode ser mudadoantes disso, pela via própria. No caso vertente, costumam-seacrescentar nomes intermediários, como o patronímico materno, dosavós etc., bem como apelidos comuns, pelos quais a pessoa éconhecida: Luiz Inácio "Lula" da Silva, Maria da Graça "Xuxa"Meneghel etc.Decorrido o prazo decadencial de um ano após a maioridade, essasalterações ainda poderão ser feitas, não maisadministrativamente, mas, "por exceção e motivadamente", porsentença, conforme preceitua o art. 57 da Lei dos RegistrosPúblicos, que permite também, no § 1°-, a inclusão do nomeabreviado, usado como firma comercial. No § 7-, acrescentado pela Lein. 9.807, de 13 de julho de 1999, de proteção às vítimas etestemunhas ameaçadas, permitiu-se a averbação da sentençaconcessiva da alteração do nome, deferida como medida deproteção, sem menção ao nome alterado.b) Homonímia Esta pode ser a justificativa para a alteração donome, pois é causadora de prejuízos. Geralmente o problema seresolve com a inclusão do patronímico materno ou dos avós.c) Inclusão de alcunha ou apelido - É uma conseqüência doentendimento de que o nome de uso deve prevalecer sobre o de registro.Em vez de alterar o prenome, pode o in teressado requerer a adiçãodo apelido, como no caso já citado do político Luiz Inácio "Lula"da Silva.d) Adoção plena ou estatutária - A sentença de adoçãoconferirá ao adotado o nome (patronímico) do adotante (ECA, art. 47,§ 5°-).54O nome completo pode também sofrer alterações no casamento; naadoção civil (proibida a alteração do prenome, de acordo com aLei n. 3.133/57); no reconhecimento, no concubinato (LRP, art. 57, §2° e s.), na separação judicial e no divórcio (art. 25,parágrafo único, da LD, com a nova redação dada pela Lei n.8.408/92).6.2. ESTADOEstado é a soma das qualificações da pessoa na sociedade, hábeisa produzir efeitos jurídicos. É o seu modo particular de existir.6.2.1. ASPECTOS

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São três: estado individual ou físico, estado familiar e estadopolítico.Estado individual - É o modo de ser da pessoa, quanto à idade, sexo,cor, altura, saúde (são ou insano: incapaz) etc.Estado familiar É o que indica a sua situação na família, emrelação ao matrimônio (solteiro, casado, viúvo, divorciado) e aoparentesco (pai, filho, irmão, sogro, cunhado etc.).Estado político - É a qualidade jurídica que advém daposição da pessoa na sociedade política: nacionais (natos ounaturalizados) e estrangeiros.6.2.2. CARACTERESSão três: indivisibilidade, indisponibilidade e imprescritibilidade.Indivisibilidade - Ninguém pode ser, simultaneamente, casado esolteiro, maior e menor etc. O estado é uno e indivisível eregulamentado por normas de ordem pública.Indisponibilidade - Está fora do comércio, é inalienável etambém irrenunciável. Isto não impede a sua mutação, diante55teiro pode passar a casado, este pode tornar-se viúvo etc.Imprescritibilidade - Não se perde nem se adquire o estado pelaprescrição. É elemento integrante da personalidade e, assim, nascecom a pessoa e com ela desaparece. As chamadas ações de estado, noentanto, admitem prescrição ou decadência, como a negatória depaternidade, a impugnação do reconhecimento nos quatro anos que seseguirem à maioridade (CC, art. 362).6.3. DOMICÍLIOA palavra "domicílio" tem um significado jurídico importante, tantono Código Civil como no estatuto processual civil. É, em geral, noforo de seu domicílio que o réu é procurado para ser citado.6.3.1. CONCEITOÉ a sede jurídica da pessoa, onde ela se presume presente paraefeitos de direito. Onde pratica habitualmente seus atos e negóciosjurídicos. É o local onde responde por suas obrigações. Éconceito jurídico (CC, art. 950 e 1.578; CPC, art. 94).O Código Civil, no art. 31, considera domicilio o lugar onde a pessoaestabelece sua residência com ânimo definitivo. A residência é,portanto, um elemento do conceito de do micílio, o seu elementoobjetivo. O elemento subjetivo é o ânimo definitivo. O CódigoCivil brasileiro adotou o modelo suíço. Domicílio também nãose confunde com habitação ou moradia, local que a pessoa ocupaesporadicamente (casa de praia, de campo).Uma pessoa pode ter um só domicílio e várias residên56Civil admite a pluralidade domiciliar. Para tanto, basta que tenhadiversas residências onde alternadamente viva ou vários centros deocupações habituais (CC, art. 32). É possível, também,alguém ter domicílio sem ter residência (art. 33). É o caso dosciganos e andarilhos, que não têm residência fixa. Considera-sedomicílio o lugar onde forem encontrados.6.3.2. ESPÉCIESPode ser voluntário ou necessário (legal). O voluntário pode sercomum (fixado livremente) ou especial (fixado com base no contrato: forocontratual ou de eleição). O comum, escolhido livremente, pode sermudado, conforme prescreve o art. 34. O do contrato é previsto nosarts. 42 do Código Civil e 111 do Código de Processo Civil. A partepor ele beneficiada pode abrir mão do benefício e ajuizar a ação

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no foro do domicílio do réu. Não se tem admitido o foro deeleição nos contratos de adesão, salvo demonstrando-se ainexistência de prejuízo para as partes.Domicílio necessário ou legal é o determinado pela lei, em razãoda condição ou situação de certas pessoas. Assim, orecém-nascido adquire o domicílio de seus pais, ao nascer, pois osincapazes em geral têm o domicílio de seus representantes (CC, art.36); o funcionário público tem por domicílio o lugar onde exercesua função permanentemente (CC, art. 37), não perdendo contudo odomicílio voluntário, se o tiver (admite-se a pluralidade); omilitar em serviço ativo tem seu domicílio no local onde servir (CC,art. 38); o preso, no local em que cumpre a sentença. As mulherescasadas tinham por domicílio o do marido (CC, art. 36, parágrafoúnico). Em face da nova Constituição, que estabeleceu a igualdadeentre o homem e a mulher, especialmente no casamento, não têm elasmais domicílio legal.577. INTRODUÇÃOCada país adota uma denominação. Na Franca, chamase "pessoamoral". Em Portugal, "pessoa coletiva". No Brasil, na Alemanha, naEspanha e na Itália preferiu-se a expressão "pessoa jurídica".8. CONCEITOÉ entidade a que a lei empresta personalidade, capacitando-a a sersujeito de direitos e obrigações. A sua principal característicaé que atua na vida jurídica com personali dade diversa da dosindivíduos que a compõem (CC, art. 20).9. NATUREZA JURÍDICAVárias teorias procuram explicar esse fenômeno, pelo qual um grupode pessoas passa a constituir uma unidade orgânica, comindividualidade própria reconhecida pelo Estado e distin ta daspessoas que a compõem. Podem ser reunidas em dois grupos: o dasteorias da ficção e o das teorias da realidade.9.1. TEORIAS DA FICÇÃOPodem ser da "ficção legal" e da "ficção doutrinária". Para aprimeira (desenvolvida por Savigny), a pessoa jurídi58DA PESSOA JURÍDICACAPÍTULO IIca constitui uma criação artificial da lei. Para a segunda, umacriação dos juristas, da doutrina.Não são aceitas. A crítica que se lhes faz é que o Estado éuma pessoa jurídica. Dizer-se que o Estado é uma ficção é omesmo que dizer que o direito, que dele emana, também o é.9.2. TEORIAS DA REALIDADEOpõem-se às do primeiro grupo e se dividem em:a) Teoria da realidade objetiva - Sustenta que a pessoa jurídica éuma realidade sociológica, seres com vida própria, que nascem porimposição das forças sociais. A crítica que se lhe faz é a deque os grupos sociais não têm vida própria, personalidade, que éuma característica do ser humano.b) Teoria da realidade técnica - Entendem seus adeptos, especialmenteIhering, que a personificação dos grupos sociais é um expedientede ordem técnica, a forma encon trada pelo direito para reconhecer aexistência de grupos de indivíduos, que se unem na busca de finsdeterminados.c) Teoria da realidade jurídica - (ou institucionalista, de Hauriou) -

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Assemelha-se à da realidade objetiva. Considera as pessoas jurídicascomo organizações sociais desti nadas a um serviço ou ofício, epor isso personificadas. Merece a mesma crítica feita a esta. Nadaesclarece sobre as sociedades que se organizam sem a finalidade deprestar um serviço ou de preencher um ofício.10. REQUISITOS PARA A CONSTITUIÇÃO DA PESSOA JURÍDICASão três: vontade humana criadora (intenção de criar uma59entidade distinta de seus membros), observância das condiçõeslegais (instrumento particular ou público, registro e autorizaçãodo Governo) e liceidade dos seus objetivos (objetivos ilícitos ounocivos constituem causa de extinção da pessoa jurídica - cf. CC,art. 21, III).A vontade humana materializa-se no ato de constituição, que sedenomina estatuto, em se tratando de associações (sem finslucrativos); contrato social, em se tratando de socieda des, civis oumercantis; e escritura pública ou testamento, em se tratando defundações (CC, art. 24).O ato constitutivo deve ser levado a registro, para que comece, então,a existência legal da pessoa jurídica de direito privado (CC, art.18). Antes do registro, não passará de mera "sociedade de fato",equiparada por alguns ao nascituro, que já foi concebido mas que sóadquirirá personalidade se nascer com vida. No caso da pessoajurídica, se o seu ato constitutivo for registrado.O registro do contrato social de uma sociedade comercial faz-se na JuntaComercial. Os estatutos e os atos constitutivos das demais pessoasjurídicas de direito privado são registrados no Cartório deRegistro Civil das Pessoas Jurídicas (LRP, arts. 114 e s.). Mas os dasociedades civis de advogados só podem ser registrados na OAB (EAOAB,arts. 15, § 12, e 16, § 3°-).Algumas pessoas jurídicas precisam, ainda, de autorização doGoverno (CC, art. 20, § 19), como as seguradoras, montepios, caixaseconômicas, administradoras de consórcios etc.Prescreve o art. 20, § 2°-, do Código Civil que as sociedades defato "não poderão acionar a seus membros, nem a terceiros; mas estespoderão responsabilizá-las por todos os seus atos". Não tinham,portanto, legitimação ativa, só passiva. Mas essa situação foimodificada pelo art. 12, VII, do Código de Processo Civil, que prevêa representação em juízo, ativa e passivamente, das sociedades sempersonalidade jurídica, pela pessoa a quem couber a administraçãodos seus bens.6011. CLASSIFICAÇÃO DA PESSOA JURÍDICAa) Quanto à nacionalidade, divide-se em nacional e estrangeira.b) Quanto à estrutura interna, pode ser corporação (universitaspersonarum: conjunto ou reunião de pessoas) e fundação(universitas bonorum: reunião de bens). O que as distingue é que ascorporações visam à realização de fins internos, estabelecidospelos sócios. Os seus objetivos são voltados para o bem dos seusmembros. As fundações, ao contrário, têm objetivos externos,estabelecidos pelo instituidor. Nas corporações também existepatrimônio, mas é elemento secundário, apenas um meio para arealização de um fim. Nas fundações, o patrimônio é elementoessencial.As corporações dividem-se em associações e sociedades. Estaspodem ser civis e comerciais (mercantis). As associações não têm

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fins lucrativos, mas religiosos, morais, cultu rais, desportivos ourecreativos (clubes). As sociedades civis têm fim econômico e visamlucro, que deve ser distribuído entre os sócios. Sãoconstituídas, em geral, por profissionais de uma mesma área (grandesescritórios de engenharia, de advocacia etc.) ou por prestadores deserviços técnicos. Mesmo que eventualmente venham a praticar atos decomércio, tal fato não altera a sua situação, pois o que seconsidera é a atividade principal por elas exercida. As sociedadescomerciais também visam lucro. Distinguem-se das sociedades civisporque praticam atos de comércio, habitualmente.As fundações constituem um acervo de bens, que recebe personalidadepara a realização de fins determinados. Compõem-se de doiselementos: o patrimônio e o fim (estabele cido pelo instituidor enão lucrativo). São sempre civis. A sua formação passa porquatro fases:1) A do ato de dotação ou de instituição (reserva de bens61livres, com indicação dos fins a que se destinam (CC, art. 24).Faz-se por escritura pública ou por testamento.2) A da elaboração dos estatutos. A elaboração pode ser diretaou própria (pelo próprio instituidor) ou fiduciária (por pessoa desua confiança, por ele designada). Se o instituidor não elabora oestatuto, nem indica quem deva fazê-lo, o Ministério Públicopoderá tomar a iniciativa, submetendo o texto, nesse caso, àaprovação do juiz. O mesmo acontecerá se a pessoa designada nãocumprir o referido encargo, no prazo que lhe foi assinalado peloinstituidor, ou, não havendo prazo, dentro em seis meses (CPC, art.1.202).3) A da aprovação dos estatutos. Os estatutos são encaminhados aoMinistério Público para aprovação. Antes, verificará se oobjeto é lícito (CC, art. 26; LRP, art. 115) e se foram observadasas bases fixadas pelo instituidor e se os bens são suficientes (CC,art. 25). O Ministério Público, em quinze dias, aprovará oestatuto, indicará modificações que entender necessárias ou lhedenegará a aprovação. Nos dois últimos casos, pode o interessadorequerer ao juiz o suprimento da aprovação (CC, art. 27, parágrafoúnico). O juiz, antes de suprir a aprovação, poderá tambémfazer modificações no estatuto, a fim de adaptá-lo aos finspretendidos pelo instituidor (CPC, art. 1.201). Qualquer alteraçãonos estatutos deve ser submetida à aprovação do MinistérioPúblico, devendo-se observar os requisitos dos arts. 28 do CódigoCivil e 1.203 do Código de Processo Civil. Os bens da fundaçãosão inalienáveis. Mas a inalienabilidade não é absoluta.Comprovada a necessidade da alienação, pode ser autorizada pelo juizcompetente, com audiência do Ministério Público, aplicando-se oproduto da venda na própria fundação, em outros bens destinadosà consecução de seus fins. Feita sem autorização judicial énula. Com autorização judicial pode ser feita, ainda que ainalienabilidade tenha sido imposta pelo instituidor.624) A do registro. Indispensável o registro, que se faz no RegistroCivil das Pessoas Jurídicas. Só com ele começa a fundação ater existência legal.As fundações extinguem-se em três casos (CC, art. 30; CPC, art.1.204): se se tornarem nocivas (objeto ilícito); se for impossível asua manutenção; e se se vencer o prazo de sua existência. Nestes

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casos, o patrimônio terá o destino previsto pelo instituidor, no atoconstitutivo. Se não foi feita essa previsão, o art. 30 do CódigoCivil determina que seja incorporado em outras fundações, que seproponham a fins iguais ou semelhantes. A lei não esclarece qual odestino do patrimônio, se não existir nenhuma fundação de finsiguais ou semelhantes. Neste caso, entende a doutrina que os bensserão declarados vagos e passarão, então, ao Município, cincoanos depois da extinção da fundação, solução semelhante àprevista para os casos de extinção das associações de fins nãolucrativos, no art. 22 e parágrafo único do Código Civil.c) Quanto à função (ou à órbita de sua atuação), aspessoas jurídicas dividem-se em: de direito público e de direitoprivado.1) As de direito público podem ser: de direito público externo (asdiversas Nações, inclusive a Santa Sé, e organismosinternacionais, como a ONU, a OEA, a Unesco, a FAO etc.) e de direitopúblico interno. Estas, podem ser: da administração direta (CC,art. 14: União, Estados, Distrito Federal, Municípios) e daadministração indireta (autarquias, fundações públicas). Sãoórgãos descentralizados, criados por lei, com personalidadeprópria para o exercício de atividade de interesse público.2) As pessoas jurídicas de direito privado são as corporações(associações, sociedades civis e comerciais, partidos políticos,sindicatos) e as fundações particulares (CC, art. 16; CLT, art. 511;CF, art. 8°). As empresas públicas e as sociedades de economia mistasujeitam-se ao regime próprio das empresas privadas (CF, art. 173, §1°).6312. DESCONSIDERAÇÃO DA PESSOA JURÍDICAPrescreve o art. 20 do Código Civil que as pessoas jurídicas têmexistência distinta da dos seus membros. Essa regra, entretanto, temsido mal utilizada por pessoas desones tas, para prejudicar terceiros,as quais se utilizam da pessoa jurídica como uma espécie de "capa",para proteger os seus negócios escusos.A reação a esses abusos ocorreu no mundo todo, dando origem àteoria da despersonalização da pessoa jurídica (no direitoanglo-saxão, com o nome de disregard of the legal entity). Permite talteoria que o juiz, em casos de fraude e de má-fé, desconsidere aregra do art. 20 supramencionado e os efeitos da autonomia da pessoajurídica em relação à dos sócios, para atingir e vincular osbens particulares destes à satisfação das dívidas da sociedade.Como no Brasil não existia nenhuma lei que expressamente autorizasse aaplicação de tal teoria entre nós, valiamse os tribunais, paraaplicá-la, analogicamente, da regra do art. 135 do CódigoTributário Nacional, que responsabiliza pessoalmente os diretores,gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado porcréditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes deatos praticados com "excesso de poderes ou infração de lei, contratosocial ou estatutos".Atualmente, o Código de Defesa do Consumidor, no art. 28 e seusparágrafos, autoriza o juiz a desconsiderar a personalidade jurídicada sociedade em casos de abuso de direi to, excesso de poder,infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutosou contrato social, bem como nos casos de falência, insolvência,encerramento da pessoa jurídica provocado por má administração.E, ainda, sempre que a personalidade da pessoa jurídica for, de alguma

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forma, obs6413. RESPONSABILIDADE CIVIL DAS PESSOAS JURÍDICASO art. 1.522 do Código Civil diz que as pessoas jurídicas de direitoprivado respondem pelos atos de seus prepostos. Mas se refere às queexercerem exploração industrial. No início da vigência doCódigo Civil ainda se justificava a interpretação de que taispessoas jurídicas eram as de fins lucrativos e que, portanto, não seenquadravam no aludido dispositivo as que não os tinham, como asassociações. Hoje, entretanto, em face da evolução daresponsabilidade civil e da preocupação cada vez maior em não sedeixar as vítimas irressarcidas, sendo em grande número ashipóteses de responsabilidade objetiva, não se admite mais talentendimento. Assim, tenham ou não fins lucrativos, as pessoasjurídicas de direito privado respondem civilmente pelos atos de seusprepostos.A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito públicopassou por diversas fases: a) a da irresponsabilidade do Estado,representada pela frase universalmente conheci da: The King do notwrong; b) a fase civilista, representada pelo art. 15 do Código Civil,que responsabiliza civilmente as pessoas jurídicas de direitopúblico pelos atos de seus representantes, que nessa qualidade causemdanos a terceiros. Nesta fase, a vítima tinha o ônus de provar culpaou dolo do funcionário. Assegurou-se ao Estado ação regressivacontra este último; c) a fase publicista, a partir da ConstituiçãoFederal de 1946, quando a questão passou a ser tratada em nível dedireito público, regulamentada na Constituição Fe65deral. A responsabilidade passou a ser objetiva, mas na modalidade dorisco administrativo (não a do risco integral, em que o Estadoresponde em qualquer circunstância). Assim, a vítima não tem maiso ônus de provar culpa ou dolo do funcionário. Mas admite-se ainversão do ônus da prova. O Estado se exonerará da obrigaçãode indenizar se provar culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ouforça maior. Em caso de culpa concorrente da vítima, aindenização será reduzida pela metade. Alguns autores, por engano,afirmam que as nossas Constituições adotaram a teoria do riscointegral (v. g. Washington de Barros Monteiro, Maria Helena Diniz). Masé um engano apenas de ordem semântica, porque admitem que o Estadopode provar culpa exclusiva da vítima, caso fortuito ou força maior,para não indenizar.Atualmente, o assunto está regulamentado no art. 37, § 6°-, daConstituição Federal, que trouxe duas inovações em relaçãoàs constituições anteriores: substituiu a expressão "funcionários" por "agentes", mais ampla, e estendeu essa responsabilidadeobjetiva às pessoas jurídicas de direito privado prestadoras deserviço público (concessionárias, permissionárias).Embora afirmem alguns autores que a ação só pode ser movida contraa pessoa jurídica e não contra o funcionário, o Supremo TribunalFederal já decidiu que esse entendimen to se aplica unicamente àsações fundadas na responsabilidade objetiva. Mas, se o autor sedispõe a provar a culpa ou dolo do servidor (responsabilidadesubjetiva), abrindo mão de uma vantagem, poderá movê-ladiretamente contra o causador do dano, principalmente porque aexecução contra o particular é menos demorada. Se preferirmovê-la contra ambos, terá também de arcar com o ônus de

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descrever a modalidade de culpa do funcionário e de provar a suaexistência.66Embora o Superior Tribunal de Justiça proclame ser possível adenunciação da lide ao funcionário, mesmo que o Estado, nacontestação, alegue culpa exclusiva da vítima, os tri bunais deSão Paulo não a têm admitido, porque significaria introduzir umelemento novo na demanda, a discussão sobre a culpa ou dolo na lidesecundária (entre o Estado e o seu funcionário, regressivamente),retardando a solução da lide principal entre a vítima e o Estado.E também porque se entende não ser correto o Estado assumirposições antagônicas no mesmo processo: na lide principal, aocontestar, alegando culpa exclusiva da vítima; e, na lidesecundária, atribuindo culpa ou dolo ao seu funcionário.Cabe ação contra o Estado mesmo quando não se identifique ofuncionário causador do dano, especialmente nos casos de omissão daadministração. Estes casos são chama dos de "culpa anônima daadministração" (enchentes em São Paulo, que não foramsolucionadas pelas diversas administrações que a cidade teve).Malgrado a opinião de Bandeira de Mello, no sentido de que o Estadosomente responde de forma objetiva nos casos de ação (não deomissão), a jurisprudência não faz essa distinção.14. EXTINÇÃO DA PESSOA JURÍDICATermina a existência da pessoa jurídica pelas seguintes causas (CC,art. 21): convencional (por deliberação de seus membros, conformequorum previsto nos estatutos ou na lei); legal (em razão de motivodeterminante na lei - art. 1.399); administrativa (quando as pessoasjurídicas dependem de aprovação ou autorização do PoderPúblico e praticam atos nocivos ou contrários aos seus fins. Podehaver provocação de qualquer do povo ou do MP); natural (resulta damorte de seus67membros, se não ficou estabelecido que prosseguirá com osherdeiros); e judicial (quando se configura algum dos casos dedissolução previstos em lei ou no estatuto e a sociedade continua aexistir, obrigando um dos sócios a ingressar em juízo).TÍTULO 11 DOS BENS15. NOÇÕES INTRODUTÓRIASTodo direito tem o seu objeto. Como o direito subjetivo é poderoutorgado a um titular, requer um objeto. Sobre o objeto desenvolve-se opoder de fruição da pessoa.Em regra, esse poder recai sobre um bem. Bem, em sentido amplo, é tudoo que satisfaz uma necessidade humana. A palavra coisa é usada paradesignar os bens materiais ou con cretos, úteis aos homens e deexpressão econômica, suscetíveis de apropriação. Bem,portanto, é gênero e coisa é espécie. Assim entendem osdoutrinadores em geral, malgrado Silvio Rodrigues aponte coisa comogénero e bem como espécie.O Código Civil brasileiro, no entanto, não distingue, usando ora apalavra coisa, ora a palavra bem, ao se referir ao objeto do direito.Os romanos faziam a distinção entre bens corpóreos eincorpóreos. Tal classificação não foi acolhida pela nossalegislação. Corpóreos são os que têm existência física,mate rial e podem ser tangidos pelo homem. Incorpóreos são os quetêm existência abstrata, mas valor econômico, como o direitoautoral, o crédito, a sucessão aberta. Os primeiros po

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68dem ser objeto de compra e venda, e os segundos somente de cessão.Ambos integram o património da pessoa.Outros bens, além das coisas corpóreas e incorpóreas, podem serobjeto de direito, como certos atos humanos, que expressam umcomportamento que as pessoas podem exigir umas das outras, e que sedenominam prestações (de dar, fazer, não fazer). Os direitostambém podem ser objeto de outros direitos (usufruto de crédito,cessão de crédito). Assim também certos atributos dapersonalidade, como o direito à imagem.Em sentido amplo, o conjunto de bens, de qualquer ordem, pertencentes aum titular, constitui o seu património. Em sentido estrito, talexpressão abrange apenas as relações jurídicas ativas e passivasde que a pessoa é titular, aferíveis economicamente. Restringe-se,assim, aos bens avaliáveis em dinheiro.Não se incluem no património as qualidades pessoais, como acapacidade física ou técnica, o conhecimento, a força de trabalho,porque são considerados simples fatores de obtenção de receitas,quando utilizados para esses fins, malgrado a lesão a esses bens possaacarretar a devida reparação.Certas coisas, insuscetíveis de apropriação pelo homem, como o aratmosférico, o mar etc., são chamadas de coisas comuns. Não podemser objeto de relação jurídica. Portan to, sendo possível suaapropriação em porções limitadas, tornam-se objeto do direito(gases comprimidos, água fornecida pela Administração Pública).As coisas sem dono (res nullius), porque nunca foram apropriadas, como acaça solta, os peixes, podem ser apropriadas, pois acham-se àdisposição de quem as encontrar ou apanhar, embora essaapropriação possa ser regulamentada, para fins de proteçãoambiental. A coisa móvel abandonada (res derelicta) foi objeto derelação jurídica mas o seu titular a lançou fora, com aintenção de não69mais tê-la para si. Neste caso, pode ser apropriada por qualquer outrapessoa.16. CLASSIFICAÇÃOA classificação dos bens é feita segundo critérios deimportância científica, pois a inclusão de um bem em determinadacategoria implica a aplicação automática de regras pró prias eespecíficas, posto que não se podem aplicar as mesmas regras a todosos bens.O Código Civil brasileiro classifica, inicialmente, os "bensconsiderados em si mesmos".16.1. BENS CONSIDERADOS EM SI MESMOSSob esta ótica podem ser:16.1. l . BENS IMÓVEIS E BENS MÓVEISÉ a mais importante classificação, fundada na efetiva natureza dosbens. Os seus principais efeitos práticos são: os bens móveissão adquiridos por simples tradição, enquanto os imóveisdependem de escritura pública e registro no Cartório de Registro deImóveis; estes, exigem também, para serem alienados, a outorgauxória, o mesmo não acontecendo com os móveis; usucapião de bensimóveis exige prazos maiores do que o de bens móveis; hipoteca, emregra, é direito real de garantia reservado aos imóveis, enquanto openhor é reservado aos móveis; só os imóveis são sujeitos àenfiteuse, enquanto os móveis prestam-se ao contrato de mútuo; os

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imóveis estão sujeitos, em caso de alienação, ao imposto desisa,70enquanto a venda de móveis é geradora do imposto de circulaçãode mercadorias.16.1.1.1. Bens imóveisClóvis Beviláqua considera bens imóveis as coisas que não podemser removidas de um lugar para outro sem destruição. Esse conceitonão abrange, porém, os imóveis por determinação legal.Os arts. 43 e 44 descrevem os bens imóveis, que podem ser assimclassificados: imóveis por natureza, por acessão física industrialou artificial, por acessão intelectual (ou por destinação doproprietário) e por determinação legal.a) Imóveis por natureza - O inciso 1 do art. 43 descreve os bensimóveis por natureza: "O solo, com a sua superfície, os seusacessórios e adjacências naturais, compreendendo as árvores efrutos pendentes, o espaço aéreo e o subsolo". A rigor, somente osolo é imóvel por natureza. As árvores e tudo o mais a ele adereme deveriam ser classificados como imóveis "por acessão natural".As árvores, quando destinadas ao corte, são consideradas bens"móveis por antecipação". Mesmo que as árvores tenham sidoplantadas pelo homem, deitando suas raízes no solo são imóveis.Não o serão se plantadas em vasos, porque removíveis.b) Imóveis por acessão física industrial ou artificial - Acessãosignifica justaposição ou aderência de uma coisa a outra.Acessão industrial ou artificial é a produzida pelo tra balho dohomem. São as construções e plantações. Segundo o art. 43, 11,do Código Civil, é "tudo quanto o homem incorporar permanentementeao solo, como a semente lançada à terra, os edifícios econstruções, de modo que se não possa retirar sem destruição,modificação, fratura ou dano". Nesse71conceito não se incluem, portanto, as construções provisórias,que se destinam a remoção ou retirada, como os circos e parques dediversões, as barracas de feiras, pavilhões etc.Os materiais de construção, "provisoriamente separados de umprédio, para nele mesmo se reempregarem", não perdem o caráter deimóveis (CC, art. 46). Pois o que se consi dera é a finalidade daseparação, a destinação dos materiais. Coerentemente, aduz oart. 49: "Os materiais destinados a alguma construção, enquantonão forem empregados, conservam a sua qualidade de móveis.Readquirem essa qualidade os provenientes da demolição de algumprédio".c) Imóveis por acessão intelectual (ou por destinação doproprietário) - São os móveis por natureza que o proprietárioimobiliza por sua vontade, mantendo-os intencionalmente empregados emsua exploração industrial, aformoseamento, ou comodidade, como asmáquinas (inclusive tratores) e ferramentas, os objetos dedecoração, os aparelhos de ar condicionado etc. (CC, art. 43, III).Não aderem materialmente ao imóvel. Mas são consideradosimóveis, porque se leva em consideração a vontade do dono, demantê-los incorporados a um imóvel. O vínculo, entretanto, émeramente subjetivo, podendo, em conseqüência, retornarem àcategoria de móveis, pela mesma vontade. Dispõe, com efeito, o art.45 do Código Civil que "Os bens, de que trata o art. 43, n. III, podemser, em qualquer tempo, mobilizados".

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d) Imóveis por determinação legal - O art. 44 do Código Civilassim considera: I - os direitos reais sobre imóveis, inclusive openhor agrícola, e as ações que os assegu ram; II - as apólicesda dívida pública oneradas com a cláusula de inalienabilidade; III- o direito à sucessão aberta. Trata-se de bens incorpóreos,imateriais (direitos), que não são, em si, móveis ou imóveis. Olegislador, no entanto, para maior segurança das relaçõesjurídicas, os considera imóveis.72O direito abstrato à sucessão aberta é considerado bem imóvel,ainda que os bens deixados pelo de cujus sejam todos móveis. Arenúncia da herança é, portanto, renúncia de imóvel e deve serfeita por escritura pública ou termo nos autos (CC, art. 1.581),mediante autorização do cônjuge, se o renunciante for casado, erecolhimento da sisa.16.1.1.2. Bens móveisO art. 47 do Código Civil considera móveis "os bens suscetíveis demovimento próprio, ou de remoção por força alheia". Trata-se dosmóveis por natureza ou propriamente ditos. Incluem-se nessa categoriatodos os bens corpóreos que admitem remoção sem dano, porfòrça própria (como os semoventes: animais) ou alheia (como osobjetos inanimados, não imobilizados por sua destinação). O gáse a corrente elétrica são bens móveis, assim como os navios e asaeronaves. Estes últimos, no entanto, são imobilizados somente parafins de hipoteca (CC, art. 825; Código Brasileiro de Aeronáutica -Lei n. 7.565/86, art. 138).Os bens móveis podem ser classificados também em móveis pordeterminação legal, mencionados no art. 48 do Código Civil: 1 - osdireitos reais sobre objetos móveis e as ações correspondentes; II- os direitos de obrigação e as ações respectivas; 111 - osdireitos do autor.São bens imateriais, que adquirem essa qualidade jurídica pordisposição legal. Podem ser cedidos, independentemente de outorgauxória ou marital. Incluem-se, nesse rol, o fundo de comércio, asquotas e ações de sociedade mercantil, os créditos em geral etc.A doutrina distingue, ainda, uma terceira categoria de bens móveis: osmóveis por antecipação. São bens incorporados ao solo, mas com aintenção de separá-los oportuna73mente e convertê-los em móveis, como as árvores destinadas aocorte. Ou então os que, por sua ancianidade, são vendidos para finsde demolição.16.1.2. BENS FUNGÍVEIS E INFUNGÍVEISBens fungíveis são aqueles que podem ser substituídos por outrosdo mesmo gênero, qualidade e quantidade, como o dinheiro.Infungíveis os que não têm esse atributo, porque são encaradosde acordo com as suas qualidades individuais, em espécie (não emgênero), como o quadro de um pintor célebre, uma escultura famosaetc.A fungibilidade é característica dos bens móveis, como o mencionao art. 50 do Código Civil. Pode ocorrer, no entanto, em certosnegócios, que venha a alcançar os imóveis, como no ajuste, entresócios de um loteamento, sobre eventual partilha em caso dedesfazimento da sociedade, quando o que se retira receberá certaquantidade de lotes. Enquanto não lavrada a escritura, será elecredor de coisas determinadas apenas pelo gênero, qualidade e

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quantidade.A fungibilidade ou a infungibilidade resultam não só da natureza dobem como também da vontade das partes. A moeda é um bem fungível.Determinada moeda, porém, pode tor nar-se infungível, para umcolecionador. Um boi é infungível e, se emprestado a um vizinho paraserviços de lavoura, deve ser devolvido. Se, porém, for destinado aocorte, poderá ser substituído por outro. Uma cesta de frutas é bemfungível. Mas emprestada para ornamentação, transforma-se eminfungível (comodatum ad pompam vel ostentationem).A classificação dos bens em fungíveis e infungíveis temimportância prática, por exemplo, na distinção entre mútuo(fungíveis) e comodato (infungíveis) e também na fixação dopoder liberatório da coisa entregue em cumprimento da obri74gação. A compensação só se efetua entre dívidas líquidas,vencidas e de coisas fungíveis (CC, art. 1.010) etc.No direito das obrigações também se classificam as obrigaçõesem fungíveis e infungíveis. As ações possessórias sãofungíveis entre si. O direito processual admite, em certos casos, afungibilidade dos recursos.16.1.3. BENS CONSUMÍVEIS E INCONSUMÍVEISOs bens podem ser consumíveis de fato (naturalmente ou materialmenteconsumíveis) e de direito (juridicamente consumíveis). Taisqualidades levam em conta o sentido econômico dos bens.Com efeito, prescreve o art. 51 do Código Civil que sãoconsumíveis os bens móveis cujo uso importa destruição imediatada própria substância (de fato, como os gêneros alimen tícios),sendo também considerados tais os destinados à alienação (dedireito, como o dinheiro). Inconsumíveis, ao contrário, são os queadmitem uso reiterado, sem destruição de sua substância.Pode a coisa consumível tornar-se inconsumível pela vontade daspartes, como um comestível ou uma garrafa de bebida rara, emprestadospara uma exposição. Assim também, uma coisa inconsumível de fatopode transformar-se em juridicamente consumível, como os livros (quenão desaparecem pelo fato de serem utilizados) colocados à venda nasprateleiras de uma livraria.Certos direitos não podem recair, em regra, sobre bens consumíveis.É o caso do usufruto. Quando, no entanto, tem por objeto bensconsumíveis, passa a chamar-se "usufruto im próprio" ou"quase-usufruto", sendo neste caso o usufrutuário obrigado arestituir, findo o usufruto, o equivalente em gênero,75qualidade e quantidade, ou, não sendo possível, o seu valor, pelopreço corrente ao tempo da restituição (CC, art. 726).16.1.4. BENS DIVISÍVEIS E INDIVISÍVEISO Código Civil, no art. 52, considera divisíveis as coisas que sepodem partir em porções reais e distintas, formando cada qual umtodo perfeito. Um relógio, por exemplo, é bem indivisível, poiscada parte não conservará as qualidades essenciais do todo, se fordesmontado.De acordo com o art. 53, os bens podem ser indivisíveis por natureza(os que se não podem partir sem alteração na sua substância),por determinação legal (as servidões, as hi potecas) ou porvontade das partes (convencional). Neste último caso, o acordotornará a coisa comum indivisa por termo não maior de cinco anos,suscetível de prorrogação ulterior (CC, art. 629, parágrafo

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único). Se a indivisão for condição estabelecida pelo doador, outestador, entende-se que o foi somente por cinco anos (CC, art. 630).No primeiro caso, a indivisibilidade é física ou material; nosegundo, é jurídica; no terceiro, é convencional. Os imóveisrurais, por lei, não podem ser divididos em frações inferiores aomódulo regional. A Lei n. 6.766/79 (Lei do Parcelamento do SoloUrbano) também proíbe o desmembramento em lotes cuja área sejainferior a 125 mz, exigindo frente mínima de cinco metros (art. 4°-,II). As obrigações também se dividem em divisíveis ouindivisíveis conforme seja divisível ou não o objeto daprestação.16.1.5. BENS SINGULARES E COLETIVOSO art. 54 do Código Civil declara que as coisas simples ou compostas,materiais ou imateriais, são singulares ou coletivas.76Simples são as coisas cujas partes acham-se ligadas pela próprianatureza (coesão natural); compostas, as que têm suas partes ligadasartificialmente pelo homem (coesão artificial).Uma árvore é uma coisa simples, enquanto um navio é uma coisacomposta. Coisas materiais são as corpóreas, que têm 1 existência física (livro, veículo, casa etc.); imateriais são asincorpóreas, que têm existência abstrata, como o direito autoral.Simples ou compostas, materiais ou imateriais, elas serão singulares,quando consideradas na sua individualidade (uma árvore), e coletivas,quando encaradas agregadas no todo (uma floresta). A árvore pode ser,portanto, coisa singular ou coletiva, conforme seja encarada ouconsiderada individualmente ou agregada a outras, formando um todo.As coisas coletivas são chamadas, também, de universais ouuniversalidades e abrangem as universalidades de fato (rebanho,biblioteca) e as universalidades de direito (heran ça, património,fundo de comércio). Estas constituem um complexo de direitos ourelações jurídicas.Dispõe o art. 57 do Código Civil que o património e a herançaconstituem universalidades de direito, que subsistem ainda que nãoconstem de objetos materiais. Podem ser cons tituídos somente dedireitos e obrigações. Para que se tenha por extinta umauniversalidade, é necessário que desapareçam todos osindivíduos, menos um (CC, art. 55).Dispõe o art. 56 do Código Civil que "Na coletividade ficasub-rogado ao indivíduo o respectivo valor, e vice-versa". Trata-se doprincípio da sub-rogação real, que ocorre quando um bem toma olugar de outro, como objeto de direito. O efeito principal da referidaregra encontra-se na sobrevivência do regime jurídico da coisasub-rogada. Desse modo, por exemplo, o bem sub-rogado em um imóvelinalienável conserva o gravame da inalienabilidade (CC, art.771.677; CPC, art. 1.112, 11). Tem aplicação, também, nos direitosreais de garantia, em caso de perecimento ou desapropriação da coisa(CC, art. 762, §§ 1°- e 2-).16.2. BENS RECIPROCAMENTE CONSIDERADOSReciprocamente considerados, os bens dividem-se em principais eacessórios.Principal é a coisa que tem uma existência própria, que existe porsi só. Acessória é aquela cuja existência depende da principal.Assim, o solo é bem principal, porque exis te por si, concretamente,sem qualquer dependência. A árvore é acessório, porque sua

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existência supõe a do solo, onde foi plantada. Os contratos delocação, de compra e venda são principais. A fiança, acláusula penal, neles estipuladas, são acessórios.Prescreve o art. 59 do Código Civil que, "Salvo disposiçãoespecial em contrário, a coisa acessória segue a principal". Aregra, portanto, é a de que a coisa acessória segue o destino daprincipal (accessorium sequitur suum principale). Para que tal nãoocorra é necessário que tenha sido convencionado o contrário(venda de veículo, convencionando-se a retirada de algunsacessórios) ou que de modo contrário estabeleça algum dispositivolegal, como o art. 557 do Código Civil, pelo qual os frutos pertencemao dono do solo onde caírem (CC, art. 557) e não ao dono daárvore.As principais conseqüências da referida regra são: a) a naturezado acessório é a mesma do principal (se o solo é imóvel, aárvore a ele anexada também o é); b) o acessório acompanha oprincipal em seu destino (extinta a obrigação principal, extingue-setambém a acessória; mas o contrário não é verdadeiro); c) oproprietário do principal é proprietá78aplicações do aludido princípio podem ser mencionadas asconstantes dos arts. 498, 864, 1.066 do Código Civil, bem como todo ocapítulo referente às acessões (arts. 536 a 548).Na grande classe das coisas acessórias, conforme dispõe o art. 60 doCódigo Civil, compreendem-se três espécies: frutos, produtos erendimentos. Os últimos são considerados mo dalidades dos frutos, demodo que o direito à sua percepção também os abrange. Produtossão as utilidades que se retiram da coisa, diminuindo-lhes aquantidade, porque não se reproduzem periodicamente, como as pedras eos metais, que se extraem das pedreiras e das minas. Distinguem-se dosfrutos porque a colheita destes não diminui o valor nem a substânciada fonte, e a daqueles sim.Frutos são as utilidades que uma coisa periodicamente produz. Nascem erenascem da coisa, sem acarretar-lhe a destruição no todo ou emparte, como o café, os cereais, os frutos das árvores, o leite, ascrias dos animais etc.Os frutos dividem-se, quanto à origem, em naturais, industriais ecivis. Naturais são os que se desenvolvem e se renovam periodicamente,em virtude da força orgânica da própria natureza, como as frutasdas árvores, as crias dos animais etc. Industriais são os queaparecem pela mão do homem, isto é, os que surgem em razão daatuação do homem sobre a natureza, como a produção de umafábrica. Civis são as rendas produzidas pela coisa, em virtude desua utilização por outrem que não o proprietário, como os jurose os aluguéis.Clóvis Beviláqua censura com razão a inclusão da expressãorendimentos, acrescida às palavras frutos e produtos, pois rendimentossão frutos civis (Código Civil dos Estados Unidos do Brasilcomentado, 3. ed., obs. 3 ao art. 60). E classifica os frutos, quanto aoseu estado, em pendentes, enquanto unidos à coisa que os produziu;percebidos ou colhidos, de79pois de separados; estantes, os separados e armazenados ouacondicionados para venda; percipiendos, os que deviam ser mas nãoforam colhidos ou percebidos; e consumidos, os que não existem maisporque foram utilizados.

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São de grande importância esses conceitos, porque o legislador osutiliza nos arts. 510 e s. do Código Civil. Também se consideramacessórias da coisa todas as benfeitorias, qualquer que seja o seuvalor (CC, art. 62). Excetuam-se, apenas, a pintura em relação àtela, a escultura em relação à matéria-prima e a escritura ououtro qualquer trabalho gráfico em relação à matéria-prima queos recebe. O fundamento para essas exceções encontra-se no maiorvalor do trabalho em relação ao da coisa principal.O Código Civil brasileiro (art. 63) considera necessárias asbenfeitorias que têm por fim conservar a coisa ou evitar que sedeteriore; úteis, as que aumentam ou facilitam o uso da coisa (oacréscimo de um banheiro ou de uma garagem à casa); evoluptuárias, as de mero deleite ou recreio (jardins, mirantes,fontes, cascatas artificiais), que não aumentam o uso habitual dacoisa, ainda que a tornem mais agradável ou sejam de elevado valor.Essa classificação não tem caráter absoluto, pois uma mesmabenfeitoria pode enquadrar-se em uma ou outra espécie, dependendo dascircunstâncias. Uma piscina, por exem plo, pode ser considerada umabenfeitoria voluptuária em uma casa ou condomínio, mas útil ounecessária em uma escola de natação.Benfeitorias necessárias não são apenas as que se destinam àconservação da coisa (obras, medidas de natureza jurídica,pagamento de impostos), mas também as realizadas para permitir anormal exploração econômica da coisa (adubação, esgotamento depântanos etc.).80Benfeitorias não se confundem com acessões industriais, previstasnos arts. 545 a 549 do Código Civil e que se constituem emconstruções e plantações. Benfeitorias são obras ou despesasfeitas em coisa já existente. As acessões industriais são obrasque criam coisas novas e têm regime jurídico diverso, sendo um dosmodos de aquisição da propriedade imóvel.16.3. BENS QUANTO AO TITULAR DO DOMÍNIOO art. 65 do Código Civil considera públicos os bens do domínionacional pertencentes à União, aos Estados ou aos Municípios. Osparticulares são definidos por exclusão: todos os outros, seja qualfor a pessoa a que pertencerem.Os bens públicos foram classificados em três classes: a) bens de usocomum do povo; b) bens de uso especial; c) bens dominicais (CC, art.66). É uma classificação feita segundo a destinação dosreferidos bens. Os de uso comum e os de uso especial são bens dodomínio público do Estado. Os dominicais são do domínio privadodo Estado. Se nenhuma lei houvesse estabelecido normas especiais sobreessa última categoria de bens, seu regime jurídico seria o mesmo quedecorre do Código Civil para os bens pertencentes aos particulares. Noentanto, as normas de direito civil aplicáveis aos bens dominicaissofreram inúmeros desvios ou derrogações impostos por normaspublicísticas. Assim, se afetados a finalidade pública específica,não podem ser alienados. Em caso contrário, podem ser alienados pormeio de institutos do direito privado, como compra e venda, doação,permuta, ou do direito público. Tais bens encontram-se, portanto, nocomércio jurídico de direito privado e de direito público.Bens de uso comum do povo são os que podem ser uti81lizados por qualquer um do povo, sem formalidades. Exemplificativamente,o Código Civil menciona "os mares, rios, estradas, ruas e praças".

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Não perdem essa característica se o Poder Público regulamentar seuuso, ou torná-lo oneroso, instituindo cobrança de pedágio, comonas rodovias (CC, art. 68). A Administração pode também restringirou vedar o seu uso, em razão de segurança nacional ou de interessepúblico, interditando uma estrada, por exemplo, ou proibindo otrânsito por determinado local.O povo somente tem o direito de usar tais bens, mas não tem o seudomínio. O domínio pertence à pessoa jurídica de direitopúblico. Mas é um domínio com características espe ciais, quelhe confere a guarda, administração e fiscalização dos referidosbens, podendo ainda reivindicá-los. Segundo alguns autores, nãohaveria propriamente um direito de propriedade, mas um poder degestão.Bens de uso especial são os que se destinam especialmente àexecução dos serviços públicos. São os edifícios ondeestão instalados os serviços públicos (repartições públicas,secretarias, escolas, ministérios etc.). São utilizadosexclusivamente pelo Poder Público.Bens dominicais ou do património disponível são os que constituemo património da União, dos Estados ou Municípios, como objeto dedireito pessoal ou real de cada uma dessas entidades (CC, art. 66, III).Sobre eles o Poder Público exerce poderes de proprietário.Incluem-se nessa categoria as terras devolutas, as estradas de ferro,oficinas e fazendas pertencentes ao Estado. Não estando afetados afinalidade pública específica, podem ser alienados por meio deinstitutos de direito privado ou de direito público (compra e venda,legitimação de posse etc.).Os bens de uso comum do povo e os de uso especial apresentam acaracterística da inalienabilidade e, como conse82qüência desta, a imprescritibilidade, a 1mpenhorabilidade e aimpossibilidade de oneração.Mas a inalienabilidade não é absoluta, a não ser com relaçãoàqueles bens que, por sua própria natureza, são insuscetíveis devaloração patrimonial, como os mares, praias, rios navegáveis etc.Os suscetíveis de valoração patrimonial podem perder ainalienabilidade que lhes é peculiar pela desafetação (nos casos eforma que a lei prescrever - CC, art. 67). A alienabilidade,característica dos bens dominicais, também não é absoluta,porque podem perdê-la pelo instituto da afetação (ato ou fato peloqual um bem passa da categoria de bem do domínio privado do Estadopara a categoria de bem do domínio público).Segundo a Súmula 340 do Supremo Tribunal Federal, "Desde a vigênciado Código Civil, os bens dominicais, como os demais bens públicos,não podem ser adquiridos por usucapião". Trata-se de um daquelesdesvios que sofreu o regime jurídico dos bens dominicais.16.4. BENS QUANTO À POSSIBILIDADE DE SEREM OU NÃO COMERCIALIZADOSO art. 69 do Código Civil declara fora do comércio as coisasinsuscetíveis de apropriação e as legalmente inalienáveis.Incluem-se, aí, as coisas naturalmente indisponíveis(insuscetíveis de apropriação pelo homem, como o ar atmosférico,a água do mar), as legalmente indisponíveis (bens de uso comum e deuso especial, bens dotais, bens de incapazes) e as indisponíveis pelavontade humana (deixadas em testamento ou doadas, com cláusula deinalienabilidade - CC, arts. 1.676 e 1.723).A expressão "legalmente inalienáveis" do art. 69 abrange

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execução por dívidas, salvo as que provierem de impostos relativosao mesmo prédio. Morrendo o instituidor ou o seu cônjuge, o prédionão entrará em inventário nem será partilhado enquanto for aresidência do cônjuge supérstite ou de filho menor de idade,extinguindo-se com a maioridade deste.Exige o art. 71 do Código Civil que os instituidores, no ato dainstituição, não tenham dívidas cujo pagamento possa ser por elaprejudicado. O que não se admite é que o instituidor torne-seinsolvente, em razão da instituição. Se o patrimônio restanteé suficiente para cobrir as dívidas, elas podem existir.Insolvência posterior à instituição não prejudica o ato.A Lei n. 8.009/90 veio ampliar o conceito de bem de família, que nãodepende mais de instituição voluntária, mediante as formalidadesprevistas no Código Civil. Agora, resulta ele diretamente da lei, deordem pública, que tornou impenhorável o imóvel residencial,próprio do casal, ou da entidade familiar, que não responderá porqualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária oude outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhosque sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipótesesexpressamente previstas no art. 3°-, I a VII (fiança em contrato delocação, pensão alimentícia, impostos e taxas que recaem sobre oimóvel, excluídas as despesas condominiais etc.).A impenhorabilidade não alcança, porém, o imóvel do devedorsolteiro, que reside solitário (STJ, RT, 726:203).Praticamente a instituição voluntária do bem de família somentese faz necessária, agora, na hipótese do parágrafo único do art.5°- da referida Lei n. 8.009/90, ou seja, quando o casal ou entidadefamiliar possuir vários imóveis, utilizados como residência, enão desejar que a impenhorabilidade recaia sobre o de menor valor.Neste caso, deverá ser instituído o bem de família por escriturapública, registrada no Registro de Imóveis, na forma do art. 70 doCódigo Civil, escolhendose um imóvel de maior valor para tornar-seimpenhorável.85TÍTULO III DOS ATOS E FATOS JURÍDICOS17. CONCEITOO direito também tem o seu ciclo vital: nasce, desenvolve-se eextingue-se. Essas fases ou momentos decorrem !I de fatos, que sãodenominados "fatos jurídicos", exatamente por produzirem efeitosjurídicos. Segundo Agostinho Alvim, "fato jurídico é todoacontecimento da vida relevante para o !, direito mesmo que seja fatoilícito".Os fatos jurídicos em sentido amplo podem ser classificados em: fatosnaturais (fatos jurídicos em sentido estrito) e fatos humanos (atosjurídicos em sentido amplo). Os pri meiros decorrem da natureza e ossegundos da atividade humana. Os fatos naturais, por sua vez, dividem-seem ordinários (nascimento, morte, maioridade, decurso do tempo)Ie extraordinários (terremoto, raio, tempestade e outros fatos que seenquadram na categoria do fortuito ou força maior). Os fatos humanosdividem-se em lícitos e ilícitos. Lícitos são os atos humanos aque a lei defere os efeitos almejados pelo agente. Praticados emconformidade com o ordenamento jurídico, produzem efeitos jurídicos

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voluntários, queridos pelo agente. Os ilícitos, por serem praticadosem desacordo com o prescrito no ordenamento jurídico, emborarepercutam na esfera do direito, produzem efeitos jurídicosinvoluntários mas impostos por esse ordenamento. Em vez de direitos,criam deveres. Hoje se admite que os atos ilícitos integram acategoria dos atos jurídicos, pelos efeitos que produzem (geram aobrigação de reparar o prejuízo - CC, art. 159).Os atos lícitos dividem-se em: ato jurídico em sentido es86trito (ou meramente lícito) e negócio jurídico. Tanto um comooutro exigem uma manifestação de vontade. No ato jurídico, oefeito da manifestação da vontade está predeterminado na lei(notificação, que constitui em mora o devedor; reconhecimento defilho, tradição, percepção dos frutos, ocupação, o uso deuma coisa etc.), sendo que muitas vezes tal efeito não é buscado nemimaginado pelo agente, mas decorre de uma conduta e é sancionado pelalei, como no caso da pessoa que acha, casualmente, um tesouro. A condutado agente não tinha por fim imediato adquirir-lhe a metade, mas talacaba ocorrendo, por força do disposto no art. 607 do Código Civil.De modo geral, no ato jurídico o destinatário da manifestação davontade a ela não adere, como na notificação, por exemplo. Àsvezes, nem existe destinatário, como na trans ferência dedomicílio. O ato jurídico é potestativo, isto é, o agente podeinfluir na esfera de interesses de terceiro, quer ele queira, quernão.No negócio jurídico há uma composição de interesses, umregramento geralmente bilateral de condutas, como ocorre nacelebração de contratos. A manifestação de vontade tem umafinalidade negocial, que em geral é criar, adquirir, transferir,modificar, extinguir direitos etc. Mas existem alguns negóciosjurídicos unilaterais, em que ocorre o seu aperfeiçoamento com umaúnica manifestação de vontade. Podem ser citados como exemplos arenúncia da herança e o testamento, porque o agente procura obterdeterminados efeitos jurídicos, isto é, criar situaçõesjurídicas, com a sua manifestação de vontade (o testamentopresta-se à produção de vários efeitos: não só para otestador dispor de seus bens para depois de sua morte, como tambémpara, eventualmente, reconhecer filho havido fora do matrimônio,nomear tutor para o filho menor, reabilitar indigno, nomeartestamenteiro, destinar verbas para o sufrágio de sua alma etc.).87Verifica-se, assim, que o ato jurídico é menos rico de conteúdo epobre na criação de efeitos. Não constitui exercício daautonomia privada e a sua satisfação somente se concretiza pelosmodos determinados na lei.De acordo com a moderna doutrina, os atos que o Código Civil denomina,no art. 81, atos jurídicos, na verdade constituem negóciosjurídicos, por ver neles o intuito negocial. Talvez porque, àépoca de sua elaboração, não se encontrava ainda bemdesenvolvida a teoria dos negócios jurídicos, o referido estatutonão atentou para essas diferenças, limitando-se a conceituar o atojurídico, sem fazer nenhuma menção a negócio jurídico. Mas,quando trata dos defeitos dos atos jurídicos, das modalidades, daforma, das nulidades, na realidade está tratando do negóciojurídico, porque somente este é rico em conteúdo e justifica umapormenorizada regulamentação.

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18. CLASSIFICAÇÃO DOS NEGÓCIOS JURÍDICOSPodem ser classificados em:18.1. UNILATERAIS, BILATERAIS E PLURILATERAISUnilaterais são os que se aperfeiçoam com uma únicamanifestação de vontade, como o testamento e o codicilo. São deduas espécies: receptícios e não receptícios. Receptíciossão aqueles em que a declaração de vontade tem de se tornarconhecida do destinatário, para produzir efeitos (denúncia ouresilição de um contrato, revogação de mandato etc.). Nãoreceptícios, em que o conhecimento por parte de outras pessoas éirrelevante (testamento, confissão de dívida).88Bilaterais são os que se perfazem com duas manifestações devontade, coincidentes sobre o objeto. Essa coincidência chama-seconsentimento mútuo ou acordo de vonta des (contratos em geral). Podemexistir várias pessoas no pólo ativo e também várias no pólopassivo sem que o contrato deixe de ser bilateral pela existência deduas partes.Plurilaterais são os contratos que envolvem mais de duas partes, comoo contrato de sociedade com mais de dois sócios.18.2. GRATUITOS E ONEROSOS, NEUTROS E BIFRONTESNegócios jurídicos gratuitos são aqueles em que só uma daspartes aufere vantagens ou benefícios (doação pura). Nos onerososambos os contratantes auferem vantagens, às quais, porém,corresponde uma contraprestação (compra e venda, locação etc.).Há negócios que não podem ser incluídos na categoria dosonerosos, nem dos gratuitos, pois lhes falta atribuição patrimonial.São chamados de neutros e se caracterizam pela destinação dosbens. Em geral coligam-se aos negócios translativos, que têmatribuição patrimonial. Enquadram-se nessa modalidade os negóciosque têm por finalidade a vinculação de um bem, como o que o tornaindisponível pela cláusula de inalienabilidade e o que impede a suacomunicação ao outro cônjuge, mediante cláusula deincomunicabilidade. A instituição do bem de família também seinclui na categoria dos negócios de destinação, isto é, deafetação de um bem a fim determinado, não se qualificando comooneroso, nem como gratuito, embora seja patrimonial. A renúnciaabdicativa, que não aproveita a quem quer que seja, e a doaçãoremuneratória também podem ser lembradas.89Bifrontes são os contratos que podem ser onerosos ou gratuitos,segundo a vontade das partes, como o mútuo, o mandato, o depósito. Aconversão só se torna possível se o contrato é definido na leicomo negócio gratuito, pois a vontade das partes não podetransformar um contrato oneroso em benéfico, pois subverteria suacausa. Frise-se que nem todos os contratos gratuitos podem serconvertidos em onerosos por convenção das partes. A doação e ocomodato, por exemplo, ficariam desfigurados, se tal acontecesse, poisse transformariam, respectivamente, em venda e locação.18.3. "INTER VIVOS" E "MORTIS CAUSA"Os negócios celebrados inter vivos destinam-se a produzir efeitosdesde logo, isto é, estando as partes ainda vivas, como a promessa devenda e compra. Mortis causa são os negócios destinados a produzirefeitos após a morte do agente, como ocorre com o testamento.18.4. PRINCIPAIS E ACESSÓRIOSPrincipais são os que têm existência própria e não dependem,

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pois, da existência de qualquer outro (compra e venda, locaçãoetc.). Acessórios são os que têm sua existência su bordinada àdo contrato principal (cláusula penal, fiança etc.). Seguem odestino do principal. Nulo este, nulo será também o negócioacessório, sendo que a recíproca não é verdadeira.18.5. SOLENES (FORMAIS) E NÃO-SOLENES (DE FORMA LIVRE)Solenes são os negócios que devem obedecer à forma90prescrita em lei para se aperfeiçoarem. Quando a forma é exigidacomo condição de validade do negócio, este é solene e aformalidade é ad solemnitatem, isto é, constitui a própriasubstância do ato (escritura pública na alienação de imóvel,testamento etc.). Mas determinada forma pode ser exigida apenas comoprova do ato. Neste caso diz-se que se trata de uma formalidade adprobationem tantum (assento do casamento no livro de registros - CC,art. 195).Não-solenes são os negócios de forma livre. Como a lei nãoreclama nenhuma formalidade para o seu aperfeiçoamento, podem sercelebrados por qualquer forma, inclusive a verbal.18.6. SIMPLES, COMPLEXOS E COLIGADOSSimples são os negócios que se constituem por ato único. Complexossão os que resultam da fusão de vários atos com eficáciaindependente. Compõem-se de várias declarações de vontade, quese completam, emitidas pelo mesmo sujeito, ou diferentes sujeitos, paraa obtenção dos efeitos pretendidos na sua unidade. Como exemplo podeser mencionada a alienação de um imóvel em prestações, que seinicia pela celebração de um compromisso de compra e venda mas secompleta com a outorga da escritura definitiva; e, ainda, o negócioque exige a declaração de vontade do autor e a de quem deveautorizá-la.O negócio jurídico complexo é único e não se confunde com onegócio coligado, que se compõe de vários (arrendamento de postode gasolina, coligado pelo mesmo instrumento ao contrato de locaçãodas bombas, de comodato de área para funcionamento de lanchonete, defornecimento de combustível, de financiamento etc.).9118.7. NEGÓCIO FIDUCIÁRIO E NEGÓCIO SIMULADONo negócio fiduciário, o meio excede o fim. Verificase, por exemplo,quando alguém transfere a propriedade ou titularidade de um bem oudireito a outra pessoa, para deter minado fim (em geral, deadministração), com a obrigação de restituí-Ia ou transmiti-Iaa terceiro. Trata-se de negócio lícito e sério, perfeitamenteválido, e que se desdobra em duas fases. Na primeira, ocorreverdadeiramente a transmissão da propriedade. Na segunda, o adquirentefiduciário obriga-se a restituir o bem ao fiduciante. Esses negócioscompõem-se de dois elementos: a confiança e o risco. Quanto maior aconfiança, maior o risco. A transmissão da propriedade é atoverdadeiro. Tanto que, se o fiduciário recusar-se a restituir o bem,caberá ao fiduciante somente pleitear as perdas e danos, comoconseqüência do inadimplemento da obrigação de o devolver. Nãoé considerado negócio simulado, malgrado a transferência dapropriedade seja feita sem a intenção de que o adquirente torne-severdadeiramente proprietário do bem. Não há a intenção deprejudicar terceiros, nem de fraudar a lei.Negócio simulado é o que tem aparência contrária à realidade.Embora neste ponto haja semelhança com o negócio fiduciário, as

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declarações de vontade são falsas. As partes apa rentam conferirdireitos a pessoas diversas daquelas a quem realmente os conferem. Oufazem declarações não verdadeiras, para fraudar a lei ou o fisco.O negócio simulado não é, portanto, válido, podendo ser anuladopelos terceiros lesados ou pelos representantes do Poder Público, abem da lei, ou da fazenda (CC, art. 105).19. INTERPRETAÇÃO DO NEGÓCIO JURÍDICONão só a lei, mas o contrato, deve ser interpretado. Muitas92vezes a sua execução exige, antes, a interpretação de suascláusulas, nem sempre muito claras.A vontade das partes exterioriza-se por meio de sinais ou símbolos,dentre os quais as palavras. Nos contratos escritos, a análise dotexto conduz, em regra, à descoberta da intenção das partes.Parte-se, portanto, da declaração escrita para se chegar à vontadedos contratantes. Quando, no entanto, determinada cláusula mostra-seobscura e passível de dúvida, alegando um dos contratantes que nãorepresenta com fidelidade a vontade manifestada por ocasião dacelebração da avença, e tal alegação resta demonstrada,deve-se considerar como verdadeira esta última, pois o art. 85 doCódigo Civil declara que, nas declarações de vontade,atender-se-á mais à sua intenção que ao sentido literal dalinguagem. Portanto, o Código Civil brasileiro deu prevalência àteoria da vontade sobre a da declaração.Há outros poucos artigos esparsos no Código Civil e em leisespeciais, estabelecendo regras sobre interpretação de determinadosnegócios: os contratos benéficos são interpreta dos estritamente(art. 1.090); a transação interpreta-se restritivamente (art.1.027); a fiança não admite interpretação extensiva (art.1.483); sendo a cláusula testamentária suscetível deinterpretações diferentes, prevalecerá a que assegure melhor aobservância da vontade do testador (art. 1.666); as cláusulascontratuais serão interpretadas de maneira mais favorável aoconsumidor (art. 47 do CDC).Algumas regras práticas podem ser observadas, no tocante àinterpretação dos contratos. A melhor maneira de se apurar aintenção dos contratantes é verificar o modo pelo qual o vinhamexecutando, de comum acordo. Deve-se interpretar o contrato, nadúvida, da maneira menos onerosa para o devedor. As cláusulascontratuais não devem ser interpretadas isoladamente, mas em conjuntocom as demais.93Nos contratos de adesão, a interpretação das cláusulas duvidosasdeve ser feita sempre em favor dos aderentes.20. ELEMENTOS DO NEGÓCIO JURÍDICOAlguns elementos do negócio jurídico podem ser chamados de"essenciais", porque constituem requisitos de existência e devalidade. Outros, porém, são chamados de "aci dentais", porque nãoexigidos pela lei mas introduzidos pela vontade das partes, em geralcomo requisitos de eficácia do negócio, como a condição, otermo, o prazo etc. Assim, o negócio jurídico pode ser estudado emtrês planos: o da existência, o da validade e o da eficácia.Os requisitos de existência do negócio jurídico são os seuselementos estruturais, sendo que não há uniformidade, entre osautores, sobre a sua enumeração. Preferimos dizer que são osseguintes: a declaração de vontade, a finalidade negocial e a

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idoneidade do objeto. Faltando qualquer deles, o negócio inexiste.A vontade é pressuposto básico do negócio jurídico e éimprescindível que se exteriorize. A manifestação de vontade podeser expressa (palavra falada ou escrita, gestos, mí mica etc.) outácita (a que se infere da conduta do agente). A manifestação davontade nos contratos pode ser tácita, quando a lei não exigir queseja expressa (CC, art. 1.079). O silêncio pode ser interpretado comomanifestação tácita da vontade quando a lei der a ele tal efeito,como acontece nos artigos 1.166 (doação pura), 1.293 (mandato),1.147 (venda a contento) etc., ou quando tal efeito ficar convencionadoem um pré-contrato ou ainda resultar de uma praxe comercial (CC, art.1.084).Pelo tradicional princípio da autonomia da vontade as94pessoas têm liberdade de, em conformidade com a lei, celebrarnegócios jurídicos, criando direitos e contraindo obrigações.Esse princípio sofre algumas limitações pelo princípio dasupremacia da ordem pública, pois muitas vezes, em nome da ordempública e do interesse social, o Estado interfere nasmanifestações de vontade, especialmente para evitar a opressão doseconomicamente mais fortes sobre os mais fracos. Em nome desseprincípio surgiram as diversas leis do inquilinato: a Lei da EconomiaPopular, o Código de Defesa do Consumidor etc.A vontade, uma vez manifestada, obriga o contratante. Esse princípioé o da obrigatoriedade dos contratos (pacta sunt servanda) e significaque o contrato faz lei entre as partes, não podendo ser modificadopelo Judiciário. Destina-se, também, a dar segurança aosnegócios em geral. Opõe-se a ele o princípio da revisão doscontratos (ou da onerosidade excessiva), baseado na cláusula rebus sicstantibus e na teoria da imprevisão e que autoriza o recurso aoJudiciário para se pleitear a revisão dos contratos, ante aocorrência de fatos extraordinários e imprevisíveis.A finalidade negocial ou jurídica é a intenção de criar,conservar, modificar ou extinguir direitos. Sem essa intenção, amanifestação de vontade pode desencadear determi nado efeito,preestabelecido no ordenamento jurídico, praticando o agente, então,um ato jurídico. A existência do negócio jurídico, porém,depende da manifestação de vontade com finalidade negocial, istoé, com a finalidade de produzir os efeitos supramencionados.A idoneidade do objeto é necessária para a realização donegócio que se tem em vista. Assim, se a intenção é celebrar umcontrato de mútuo, a manifestação de vontade deve recair sobrecoisa fungível. No comodato, o objeto deverá95ser coisa infungível. Para a constituição de uma hipoteca énecessário que o bem dado em garantia seja imóvel, navio ou avião.Os demais bens são inidôneos para a celebração de tal negócio.Os requisitos de validade do negócio jurídico, de caráter geral,são: capacidade do agente (condição subjetiva), objeto lícito epossível (condição objetiva) e forma prescrita ou não defesa emlei (CC, arts. 82 e 145, 11). Os de caráter específico são aquelespertinentes a determinado negócio jurídico. A compra e venda, porexemplo, tem como elementos essenciais a coisa, o preço e oconsentimento.A capacidade do agente é a aptidão para intervir em negóciosjurídicos como declarante ou declaratário. A incapacidade de

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exercício é suprida, porém, pelos meios legais: arepresentação e a assistência (CC, art. 84). Os absolutamenteincapazes não participam do ato, sendo representados pelos pais,tutores ou curadores. Os relativamente incapazes já participam do ato,junto com os referidos representantes, que assim os assistem.A incapacidade não se confunde com os impedimentos ou falta delegitimação. Esta é a incapacidade para a prática dedeterminados atos. O ascendente não estará legitimado a ven der bensa um descendente enquanto não obtiver o consentimento dos demaisdescendentes (CC, art. 1.132), embora não seja um incapaz,genericamente, para realizar negócios jurídicos. A proibiçãoimposta ao tutor de adquirir bens do pupilo, mesmo em hasta pública,cria um impedimento ou falta de legitimação que não importa emincapacidade genérica.A validade do negócio jurídico requer, ainda, objeto lícito epossível. Objeto lícito é o que não atenta contra a lei, a moralou os bons costumes. Quando o objeto do contrato é imoral, ostribunais por vezes aplicam o princípio de direito96de que ninguém pode valer-se da própria torpeza (nemo auditurpropriam turpitudinem allegans). Tal princípio é aplicado pelolegislador nos arts. 97 (dolo ou torpeza bilateral) e 971 do CódigoCivil, que proíbe a repetição do pagamento feito para obter fimilícito, imoral, ou proibido por lei.O objeto deve ser, também, possível. Quando impossível, onegócio é nulo. A impossibilidade do objeto pode ser física oujurídica.Impossibilidade física é a que emana de leis físicas ou naturais.Deve ser absoluta, isto é, atingir a todos, indistintamente. Arelativa, que atinge o devedor mas não outras pes soas, nãoconstitui obstáculo ao negócio jurídico (CC, art. 1.091).Impossibilidade jurídica do objeto ocorre quando o ordenamentojurídico proíbe, expressamente, negócios a respeito de determinadobem, como a herança de pessoa viva (CC, art. 1.089), as coisas fora docomércio etc. A ilicitude do objeto é mais ampla, pois abrange oscontrários à moral e aos bons costumes.O terceiro requisito de validade do negócio jurídico é a forma.Deve ser a prescrita ou não defesa em lei. Em regra, a forma élivre. As partes podem celebrar o contrato por es crito, público ouparticular, ou verbalmente, a não ser nos casos em que a lei, para darmaior segurança e seriedade ao negócio, exija a forma escrita,pública ou particular (CC, art. 129). Em alguns casos a lei reclamatambém a publicidade, mediante o sistema de Registros Públicos (CC,art. 135).A formalidade é ad solemnitatem quando a lei a exige como condiçãode validade e aperfeiçoamento do negócio. Assim, a escriturapública nos negócios imobiliários (CC, art. 134) e oreconhecimento de filhos (CC, art. 357, e Lei97n. 8.560/92). E é ad probationem tantum, quando necessária à provado ato.21. DEFEITOS DO NEGÓCIO JURÍDICOEsse título diz respeito às hipóteses em que a vontademanifesta-se com algum vício que torne o negócio anulável. OCódigo Civil brasileiro menciona e regula cinco defeitos: dolo, erro,coação, simulação e fraude contra credores. Por seu turno, o

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art. 147 diz ser anulável o negócio jurídico que contenha taisdefeitos. A ação anulatória prescreve em quatro anos (CC, art.178, § 9°-, V).Os três primeiros (erro, dolo e coação) são chamados de víciosdo consentimento, porque provocam uma manifestação de vontade nãocorrespondente com o íntimo e verda deiro querer do agente. Criam umadivergência, um conflito entre a vontade manifestada e a realintenção de quem a exteriorizou. Os dois últimos (simulação efraude contra credores) não conduzem a um descompasso entre o íntimoquerer do agente e a sua declaração. A vontade manifestadacorresponde exatamente ao seu desejo. Mas é exteriorizada com aintenção de prejudicar terceiros ou de fraudar a lei.Embora não expressamente regulados no Código Civil brasileiro, alesão e a reserva mental constituem, também, defeitos do negóciojurídico e serão, oportunamente, comentados.21.1. ERRO OU IGNORÂNCIANo erro, o agente engana-se sozinho. Quando é induzido em erro pelooutro contratante ou por terceiro, caracteriza-se o dolo.98Poucas são as ações anulatórias ajuizadas com base no erro,porque difícil se torna penetrar no íntimo do autor, para descobriro que se passou em sua mente, no momento da ce lebração donegócio. Por isso, são mais comuns as ações fundadas no dolo,porque o induzimento pode ser comprovado e aferido objetivamente.O Código Civil equiparou os efeitos do erro à ignorância. Erro éa ideia falsa da realidade. Ignorância é o completo desconhecimentoda realidade.Não é, porém, qualquer espécie de erro que torna anulável onegócio jurídico. Para tanto deve ser substancial (ou essencial),escusável e real.Erro substancial é o erro sobre circunstâncias e aspectos relevantesdo negócio. Há de ser a sua causa determinante, ou seja, seconhecida a realidade, o negócio não seria cele brado. Segundo osarts. 87 e 88 do Código Civil, é o que: a) interessa à natureza doato (error in negotio). Exemplo: o contrato é de compra e venda e oadquirente imagina tratarse de doação; b) ao objeto principal dadeclaração (error in corpore). Exemplo: aquisição de um terrenoque se supõe valorizado porque situado em rua importante mas que naverdade tem pouco valor porque se situa em rua do mesmo nome, porém deoutra localidade; c) a algumas das qualidades essenciais do objeto(error in substantia). Exemplo: aquisição de candelabros prateados,mas de material inferior, como se fossem de prata; compra de umrelógio dourado como se fosse de ouro; d) o que diz respeito àsqualidades essenciais da pessoa a quem a declaração se refere (errorin persona). Exemplo: doação ou deixa testamentária à pessoa queo doador imagina, equivocadamente, ser seu filho natural ou, ainda, aque lhe salvou a vida.Embora a teoria dos vícios redibitórios se assente na existênciade um erro e guarde semelhança com o erro quanto99às qualidades essenciais do objeto, não se confundem os doisinstitutos. O vício redibitório é erro objetivo sobre a coisa, quecontém um defeito oculto. O seu fundamento é a obrigação que alei impõe a todo alienante de garantir ao adquirente o uso da coisa.Provado o defeito oculto, não facilmente perceptível, cabem asações edilícias (redibitória ou quanti minoris, respectivamente

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para rescindir o contrato ou pedir abatimento do preço), sendodecadencial e exíguo o prazo para a sua propositura (15 dias, se setratar de bem móvel, e 6 meses, se for imóvel). O erro quanto àsqualidades essenciais do objeto é subjetivo, pois reside namanifestação da vontade. Dá ensejo ao ajuizamento de açãoanulatória, sendo prescricional o prazo de quatro anos. Se alguémadquire um relógio que funciona perfeitamente, mas não é de ouro,como o adquirente imaginava (e somente por essa circunstância oadquiriu), trata-se de erro quanto à qualidade essencial do objeto.Se, no entanto, o relógio é mesmo de ouro mas não funciona emrazão do defeito de uma peça interna, a hipótese é de vícioredibitório.Erro escusável é o erro justificável, desculpável, exatamente ocontrário de erro grosseiro, de erro decorrente do não-emprego dadiligência ordinária. Para aferir a escusabi lidade do erro nãotem a jurisprudência observado o critério do homem médio (homomedius). Não tem, assim, comparado a conduta do agente com a damédia das pessoas, mas considerado o critério do caso concreto.Devem ser consideradas, em cada caso levado aos tribunais, ascondições pessoais (de desenvolvimento mental, culturais,profissionais etc.) de quem alega o erro. Assim, pode-se considerarescusável a alegação de erro quanto à natureza do negócio(celebração de contrato de compra e venda julgando tratar-se dedoação, p. ex.) feita por uma pessoa rústica e analfabeta e, poroutro100lado, considerá-la inescusável, injustificável, quando feita porum advogado.O erro, para anular o negócio, deve ser também real, isto é,efetivo, causador de real prejuízo para o interessado. Assim, o errosobre o ano de fabricação do veículo adquirido (1982, em vez de1992) é substancial e real, porque, se o adquirente tivesseconhecimento da realidade, não o teria adquirido. Tendo-o adquirido,sofreu um prejuízo efetivo. No entanto, se o erro dissesse respeitosomente à cor do veículo (preto, em vez de azul escuro), seriaacidental e não tornaria o negócio anulável.Acidental, portanto, é o erro que se opõe ao substancial e real,porque se refere a circunstâncias de somenos importância e que nãoacarretam efetivo prejuízo, ou seja, a quali dades secundárias doobjeto ou da pessoa. Se conhecida a realidade, mesmo assim o negócioseria realizado.O direito alemão considera tão grave o erro sobre a natureza donegócio e sobre o principal da declaração que nem os consideravícios do consentimento. São chamados de erro obstativo (erroobstáculo) ou impróprio, pois impedem ou obstam a própriaformação do negócio. No direito italiano e no francês assimsão chamados somente os erros sobre a natureza do negócio. Nodireito brasileiro, porém, não se faz essa distinção, pois seconsidera o erro, qualquer que seja a hipótese (in negotio, incorpore, in substantia, in persona), vício de consentimento e causa deanulabilidade do negócio.As hipóteses até aqui mencionadas configuram o chamado erro de fato,que decorre de uma noção falsa das circunstâncias. Admite-se, noentanto, a alegação de erro de direito (error juris), desde quenão se objetive, com isso, descumprir a lei ou subtrair-se à suaforça imperativa, pois ignorantia legis neminem excusat (LICC, art.

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3-°). Pode-se invocar o errode direito, por exemplo, para afastar a imputação de má-fé. Atítulo de exemplo, mencione-se o caso da pessoa que contrata aimportação de determinada mercadoria, ignorando existir lei queproíbe tal importação. Como tal ignorância foi a causadeterminante do ato, pode ser alegada para se anular o contrato, sem comisso se pretender que a lei seja descumprida.O Código Civil equipara o erro à transmissão defeituosa da vontade(art. 89). Se o declarante não se encontra na presença dodeclaratário e se vale de um intermediário (in terposta pessoa ounúncio) ou de um meio de comunicação (fax, telégrafo etc.), e atransmissão da vontade, nesses casos, não se faz com fidelidade,estabelecendo-se uma divergência entre o querido e o que foitransmitido erroneamente (mensagem truncada), carateriza-se o vícioque propicia a anulação do negócio.A causa do negócio não precisa ser mencionada, nem o motivo. Motivossão as idéias, as razões subjetivas, interiores, consideradasacidentais e sem relevância para a aprecia ção da validade donegócio. A causa é o motivo determinante do negócio. Em uma comprae venda, os motivos podem ser diversos: necessidade de venda,investimento, edificação de moradia etc. São estranhos ao direitoe não precisam ser mencionados. A causa é o escopo visado pelaspartes. Nela, há um fim econômico ou social reconhecido e garantidopelo direito. Para o vendedor, é o recebimento do preço; para ocomprador, o recebimento da coisa. Os motivos pelos quais o vendedordeseja receber o dinheiro não interessam ao direito.A causa também não está incluída entre os requisitos essenciaisdo negócio. O Código Civil não se refere à causa do negócio, anão ser, excepcionalmente, no art. 90, ao pres crever que só vicia oato a falsa causa quando expressa como razão determinante ou sob formade condição. Entretanto, nesta102hipótese, refere-se mais propriamente aos motivos do que-propriamenteà causa. Quando expressamente mencionados como razão determinante,passam à condição de elementos essenciais do negócio. O art. 90do Código Civil permite, portanto, que as partes promovam o erroacidental a erro relevante. Os casos mais comuns são de deixastestamentárias, com expressa declaração do motivo determinante,que entretanto revelam-se, posteriormente, falsos. Ou de aquisiçãode estabelecimento comercial, em que se insere como motivo determinantea perspectiva de bom movimento e numerosa freguesia, garantida pelovendedor, apurando-se, posteriormente, não ser verdadeira.Segundo dispõe o art. 91 do Código Civil, o erro na indicação dapessoa, ou coisa, não viciará o ato quando, por seu contexto e pelascircunstâncias, puder-se identificar a coisa ou pessoa cogitada. Nodireito das sucessões há regra semelhante (art. 1.670). Trata-se doerro acidental ou sanável. Por exemplo, o doador ou testador beneficiao seu sobrinho Antonio. Na realidade, não tem nenhum sobrinho com essenome. Apura-se, porém, que tem um afilhado de nome Antonio, a quemsempre chamou de sobrinho. Trata-se de dispositivo legal que complementao art. 86, segundo o qual a anulação de um negócio só éadmissível em caso de erro substancial.Questão pouco comentada, quando se estuda o erro, é a relativa aointeresse negativo, que decorre do fato de o vendedor ver-sesurpreendido com uma ação anulatória, julgada procedente, com osconsectários da sucumbência, sem que tenha concorrido para o erro do

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outro contratante - o que se afigura injusto, máxime já tendo dadodestinação ao numerário recebido.O Código alemão prevê, para esses casos, que a doutrina chama de"interesse negativo" uma compensação para o contratante que nãoconcorreu para o erro. O Código Civil103brasileiro não prevê a hipótese mas ela decorre dos princípiosgerais de direito, especialmente o que protege a boa-fé.21.2. DOLODolo é o induzimento malicioso à prática de um ato, prejudicial aoseu autor mas proveitoso ao autor do dolo ou terceiro.Dispõe o art. 92 do Código Civil que os atos jurídicos sãoanuláveis por dolo, quando este for a sua causa. É o dolo chamado deprincipal. O dolo é acidental quando "a seu des peito o ato se teriapraticado, embora por outro modo"; e "só obriga à satisfação dasperdas e danos" (CC, art. 93). Diz respeito, portanto, àscondições do negócio.O dolo pode ser proveniente do outro contratante ou de terceiro,estranho ao negócio (CC, art. 95). O dolo de terceiro, no entanto,somente ensejará a anulação do negócio "se uma das partes osoube" (CC, art. 95). Se o beneficiado pelo dolo de terceiro nãoadverte a outra parte, está tacitamente aderindo ao expedienteastucioso, tornando-se cúmplice. Por exemplo, se o adquirente éconvencido por um terceiro de que o relógio que está adquirindo éde ouro, sem que tal afirmação tenha sido feita pelo vendedor, eeste ouve as palavras de induzimento utilizadas pelo terceiro e nãoalerta o comprador, o negócio torna-se anulável. Entretanto, senenhuma das partes soube do dolo de terceiro, não se anula onegócio. Mas o lesado poderá reclamar perdas e danos do autor dodano, pois este praticou um ato ilícito (CC, art. 159).Vem do direito romano a classificação do dolo em bonus e malus.Dolus bonus é o tolo tolerável no comércio em geral. Éconsiderado normal, e até esperado, o fato de os co merciantesexagerarem as qualidades das mercadorias que estão104vendendo. Não torna anulável o negócio jurídico, porque de certamaneira as pessoas já contam com ele e não se deixam envolver, amenos que não tenham a diligência que se espera do homem médio.Somente vicia o ato o dolus malus, exercido com o propósito de causarprejuízo.O dolo tanto pode ser praticado por ação (dolo positivo) como poromissão (dolo negativo, reticência ou omissão dolosa). O últimoé definido, no art. 94 do Código Ci vil, como o silênciointencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que aoutra parte haja ignorado, provando-se que, sem a omissão, não seteria celebrado o contrato.Esteia-se tal dispositivo no princípio da boa-fé, que deve norteartodos os negócios. Tal princípio é reiterado em outrosdispositivos do Código Civil, que cuidam de hipóteses de omissãodolosa, como o art. 155, que pune o menor que oculta dolosamente a suaidade, e o art. 1.444, que acarreta a perda do direito ao recebimento doseguro, quando o estipulante de seguro de vida oculta dolosamente serportador de doença grave, quando da estipulação.O dolo do representante é tratado no art. 96 do Código Civil. Torna,também, anulável o negócio jurídico, se for a causa determinantedo negócio. Se o dolo for acidental, só obrigará à

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satisfação das perdas e danos. Responde pela indenização orepresentante, como autor do dolo. O representado somente responderácivilmente até à importância do proveito que teve, se não tomouciência do dolo do representante. Se, no entanto, teve conhecimento dodolo e nada fez para evitá-lo, é justo que também responda pelasperdas e danos.O dolo pode ser, também, bilateral, isto é, de ambas as partes (CC,art. 97). Neste caso, se ambas têm culpa, uma vez que cada qual quisprejudicar a outra, nenhuma delas pode105alegá-lo para anular o ato, ou reclamar indenização. Há umacompensação, porque ninguém pode valer-se da própria torpeza(nemo auditur propriam turpitudinem allegans).O chamado dolo de aproveitamento constitui o elemento subjetivo de outrodefeito do negócio jurídico, que é a lesão. Configura-se quandoalguém se aproveita da situação de necessidade do outrocontratante para obter um lucro exagerado, desproporcional.21.3. COAÇÃOO que caracteriza a coação é o emprego da violênciapsicológica, para viciar a vontade. Coação é toda ameaça oupressão exercída sobre um indivíduo para forçá-lo, contra asua vontade, a praticar um ato.Já o direito romano distinguia a coação absoluta ou física (visabsoluta) da relativa ou moral (vis compulsiva). Na coação absolutainocorre qualquer consentimento ou mani festação de vontade. Avantagem pretendida pelo coator é obtida mediante o emprego de forçafísica. Por exemplo: a colocação da impressão digital doanalfabeto no contrato, agarrando-se à força o seu braço. Embora,por inexistir nesse caso qualquer manifestação de vontade, osautores em geral considerem nulo o negócio, trata-se na realidade denegócio inexistente, por lhe faltar o primeiro e principal requisitode existência, que é a vontade.A coação que constitui vício da vontade e torna anulável onegócio é a relativa ou moral. Nesta, deixa-se uma opção ouescolha à vítima: praticar o ato exigido pelo coator ou correr orisco de sofrer as conseqüências da ameaça por ele feita.Trata-se, portanto, de uma coação psicológica.Embora o Código Civil não faça a distinção, a doutrina106entende existir coação principal e acidental, como no dolo. Aquelaseria a causa determinante do negócio; esta influenciaria apenas ascondições do negócio, ou seja, sem ela o negócio assim mesmo serealizaria, mas em condições menos desfavoráveis à vítima. Acoação principal constitui causa de anulação do negócio; aacidental somente obriga ao ressarcimento do prejuízo.Nem toda ameaça, entretanto, caracteriza a coação. O art. 98 doCódigo Civil especifica os requisitos para que a coação possaviciar o consentimento. Assim:a) deve ser a causa do ato - Deve haver uma relação de causalidadeentre a coação e o ato extorquido, ou seja, o negócio deve tersido realizado somente por ter havido gra ve ameaça ou violência,que provocou fundado receio à vítima de dano à sua pessoa, à suafamília ou aos seus bens. Sem ela, o negócio não se teriaconcretizado.b) deve ser grave - A coação deve ser de tal intensidade queefetivamente incuta ao paciente um fundado temor de dano a bem que

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considera relevante.Para aferir a gravidade ou não da coação, não se considera ocritério do homem médio (critério abstrato), ou seja, não secompara a reação da vítima com a do homem médio ou normal. Poresse critério, se a média das pessoas se sentiria atemorizada nasituação da vítima, então a coação será considerada grave.Segue-se o critério do caso concreto, ou seja, o de avaliar, em cadacaso, as condições particulares ou pessoais da vítima. Algumaspessoas, em razão de diversos fatores, são mais suscetíveis de sesentirem atemorizadas do que outras. Por essa razão, determina o art.99 do Código Civil que, ao apreciar a coação, "se terá em contao sexo, a idade, a condição, a saúde, o temperamento do paciente etodas as demais circunstâncias, que lhe possam influir na gravidade".107O art. 100 do mesmo diploma não considera coação "o simples temorreverencial". Assim, não se reveste de gravidade suficiente paraanular o ato o receio de desgostar os pais ou outras pessoas a quem sedeve obediência e respeito, como os superiores hierárquicos.O emprego do vocábulo "simples" evidencia que o temor reverencialnão vicia o consentimento quando desacompanhado de outros atos deviolência. Pode, entretanto, ter tal conseqüência, se acompanhadode ameaças ou violências. Assim, no casamento, considera-secoação, e não simples temor reverencial, as graves ameaças decastigo à filha, para obrigála a casar.c) deve ser injusta - Tal expressão deve ser entendida como ilícita,contrária ao direito, ou abusiva.Prescreve, com efeito, o art. 100 do Código Civil que "Não seconsidera coação a ameaça do exercício normal de um direito".Assim, não constitui coação a ameaça feita pelo credor deprotestar ou executar o título de crédito. O referido dispositivoemprega o adjetivo normal, referindo-se ao exercício do direito. Dessemodo, configura-se a coação não apenas quando o ato praticado pelocoator contraria o direito, como também quando sua conduta, conquantojurídica, constitui exercício anormal ou abusivo de um direito.Assim, é injusta a conduta de quem se vale dos meios legais para obtervantagem indevida. Por exemplo: a do credor que ameaça proceder àexecução da hipoteca contra sua devedora, caso esta não concordeem desposá-lo; a do indivíduo que, surpreendendo alguém a praticaralgum crime, ameaça denunciá-lo, caso não realize com eledeterminado negócio.d) deve ser de um dano atual ou iminente - A lei refere-se ao danopróximo e provável, afastando, assim, o impossível, remoto oueventual. Tem em vista aquele prestes a108se consumar, variando a apreciação temporal segundo ascircunstâncias de cada caso.e) deve acarretar justo receio de prejuízo igual, pelo menos, aodecorrente do dano extorquido Essa proporção ou equilíbrio entre osacrifício exigido e o mal evitado tem sido alvo de críticas e nãoconsta de outras legislações. Quando se trata de ameaça de danomoral, não há como comparar o seu valor com o sacrifício exigido.Assim, constitui coação a ameaça, feita por um rapaz a uma jovem,de revelar fatos relativos à sua conduta em determinada ocasião,atentatórios à sua moral, para obter dela determinada vantagemeconômica e mensurável, mesmo que o referido prejuízo moral sejainsuscetível de valoração econômica.

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Tal proporção somente pode ser exigida em se tratando de ameaça dedano patrimonial. Se menor o dano receável do ato extorquido que oresultante da ameaça, não se carac terizará a coação.Entretanto, mesmo neste caso não se deve exagerar, exigindo-se umequilíbrio matemático. Ao contrário, deve haver certa elasticidadena apreciação de cada caso, revelando-se importante analisar se apressão exercida contra o paciente foi capaz de lhe incutir fundadoreceio de dano ou não.f) deve constituir ameaça de prejuízo à pessoa ou bens davítima, ou a pessoas de sua família - O termo fàmília tem, hoje,acepção ampla, compreendendo não só a que re sulta do casamentocomo também a decorrente de união estável. Também não se fazdistinção entre parentesco legítimo ou ilegítimo ou decorrenteda adoção, qualquer que seja a sua espécie (CF, art. 227, §6-°). Para os fins de intimidação, incluem-se também asameaças a parentes afins, como cunhados, sogros etc.A moderna doutrina entende que a referência do texto a familiares émeramente exemplificativa, podendo-se admitir109uma exegese ampliadora. Aceita-se, assim, que a ameaça dirigida apessoa não ligada ao coacto por laços familiares, como um amigoíntimo, noiva ou noivo, pode caracterizar a coação, se ficardemonstrado que a ameaça foi bastante para sensibilizálo eintimidá-lo. Admite-se também que possa haver coação quando aameaça é de causar algum mal ao próprio coator, como na hipótesedo filho que ameaça suicidar-se ou envolver-se em atividade perigosapara obter a anuência do pai.A coação vicia o ato, ainda quando exercida por terceiro (CC, art.101). O legislador considera a coação mais grave do que o dolo. Odolo exercido por terceiro só vicia o ato se uma das partes, isto é,o beneficiado, o soube (CC, art. 95). Mas a coação exercida porterceiro torna anulável o negócio, mesmo que o beneficiado por elaignore a sua ocorrência. "Se a coação exercida por terceiro forpreviamente conhecida à parte, a quem aproveite, responderá estasolidariamente com aquele por todas as perdas e danos" (art. 101, §V). Se a parte prejudicada com a anulação do ato não soube dacoação exercida por terceiro, só este responderá pelas perdas edanos (art. 100, § 2°-).O Código Civil brasileiro não prevê o estado de perigo como formade coação. O exemplo clássico é o da pessoa que estáafogando-se e, desesperada, promete toda sua fortuna para ser salva.Segundo alguns, a vítima estaria agindo sob coação e poderáanular o ato. Neste caso, a pessoa beneficiada, e que não provocara oestado de perigo, será prejudicada. Outros, no entanto, acham querepresenta séria ameaça à segurança das relações jurídicasa anulação de ato ou negócio jurídico em virtude de vício doconsentimento, sem que a outra parte tenha colaborado para o estado deperigo. Nesta hipótese, não se anulando o ato, a vítimaexperimentará um empobrecimento desproporcional ao serviço prestado.Parece que a solução mais justa, de lege ferenda, seránão anular o ato, mas reduzir o valor do pagamento ao justo limitepelo serviço prestado.21.4. SIMULAÇÃOSimulação é uma declaração falsa, enganosa, da vontade,visando aparentar negócio diverso do efetivamente desejado. Negóciosimulado, assim, é o que tem aparência con trária à realidade. A

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simulação é produto de um conluio entre os contratantes, visandoobter efeito diverso daquele que o negócio aparenta conferir. Diferedo dolo, porque neste a vítima participa da avença, sendo induzidaem erro, porém. Na simulação, a vítima lhe é estranha. Échamada de vício social porque objetiva iludir terceiros ou violar alei.Pode ser absoluta ou relativa. Na primeira, as partes na realidade nãorealizam nenhum negócio. Apenas fingem, para criar uma aparência,uma ilusão externa, sem que na verda de desejem o ato. Em geral,destina-se a prejudicar terceiro, subtraindo os bens do devedor àexecução ou partilha. Exemplos: a emissão de títulos decrédito em favor de amigos e posterior dação em pagamento de bens,em pagamento desses títulos, por marido que pretende separar-se daesposa e subtrair da partilha tais bens; a falsa confissão de dívidaperante amigo, com concessão de garantia real, para esquivarse daexecução de credores quirografários.Na simulação relativa, as partes pretendem realizar determinadonegócio, prejudicial a terceiro ou em fraude à lei. Paraescondê-lo, ou dar-lhe aparência diversa, realizam ou tro negócio.Compõe-se, pois, de dois negócios: um deles é o simulado,aparente, destinado a enganar; o outro é o dissimulado, oculto, masverdadeiramente desejado. O negócio aparente, simulado, serve apenaspara ocultar a efetiva intenção dos contratantes, ou seja, o negócio real. É o queacontece, por exemplo, quando o homem casado, para contornar aproibição legal de fazer doação à concubina, simula a venda aum terceiro, que transferirá o bem àquela; ou quando, para pagarimposto menor e burlar o fisco, as partes passam a escritura por preçoinferior ao real.Simulação não se confunde, pois, com dissimulação, embora emambas haja o propósito de enganar. Na simulação, procura-seaparentar o que não existe; na dissimulação, oculta se o que éverdadeiro. Na simulação, há o propósito de enganar sobre aexistência de situação não-verdadeira; na dissimulação,sobre a inexistência de situação real.O art. 102 do Código Civil dispõe que haverá simulação: a) porinterposição de pessoa (relembre-se o exemplo do terceiro, queadquire bem do homem casado e o transfe re à concubina deste); b) porocultação da verdade, na declaração (declaração de valorinferior, na escritura, ao real); c) por falsidade de data.A simulação pode ser, ainda, inocente ou maliciosa, esta tambémchamada de "fraudulenta". O art. 103 do Código Civil considerainocente a simulação quando "não houver inten ção deprejudicar a terceiros, ou de violar disposição de lei". Seráfraudulenta, e defeito do negócio jurídico, quando houver essaintenção (CC, art. 104). No primeiro caso, não constitui defeitodo negócio jurídico. É a hipótese de doação feita pelo homemsolteiro à sua concubina, mas sob a forma de venda. Como não havianenhum impedimento legal para essa doação, a concretização doato sob a forma de venda é considerada simulação inocente, pornão objetivar fraude à lei. Sendo a simulação maliciosa oufraudulenta, ou seja, encetada com o intuito de prejudicar a terceiros,ou de infringir preceito de lei, "nada poderão alegar ou requerer oscontraentesem juízo quanto à simulação do ato, em litígio de um contra ooutro, ou contra terceiros" (CC, art. 104). O fundamento dessa

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proibição é o princípio de que ninguém pode tirar proveito daprópria torpeza (nemo auditur propriam turpitudinem allegans). Mas osprejudicados por ela podem argüi-Ia em juízo, pois o art. 105 doCódigo Civil dispõe que "poderão demandar a nulidade dos atossimulados os terceiros lesados pela simulação, ou os representantesdo poder público, a bem da lei, ou da Fazenda". Registre-se oequívoco do legislador ao usar a palavra "nulidade", quando se trata,na realidade, de "anulabilidade".Na simulação absoluta, anulado o negócio, que é sóaparência, "restituir-se-ão as partes ao estado, em que antes delese achavam" (CC, art. 158). Na relativa, em que há dois negócios,anulado o negócio simulado, aparente, pode subsistir ou não odissimulado, oculto e verdadeiro. Subsistirá somente se for lícito,como no caso da escritura lavrada por valor inferior ao real. Anulado ovalor aparente, subsistirá o real.Embora sejam anuláveis os atos simulados, têm a doutrina e ajurisprudência proclamado a nulidade de tais atos quando praticados emfraude a preceito de ordem pública, a norma cogente, como acontecequando o homem casado simula a venda de bem a interposta pessoa parafraudar a lei, que o proíbe de fazer doação à sua concubina; oudo homem de mais de sessenta anos, obrigado a se casar no regime daseparação legal, que simula, às vésperas do casamento, a vendade imóvel valioso à futura esposa, para violar a lei que proíbe adoação de bens entre cônjuges, no referido regime.Tendo em vista a dificuldade para se provar o ardil, o expedienteastucioso, admite-se a prova da simulação por indícios epresunções (CPC de 1939, art. 252; CPC de 1973, arts. 332 e 335).21.5. FRAUDE CONTRA CREDORESA fraude contra credores é, também, vício social. É praticadacom o intuito de prejudicar terceiros, ou seja, os credores. A suaregulamentação jurídica assenta-se no princípio do direito dasobrigações, segundo o qual o patrimônio do devedor responde porsuas obrigações. É o princípio da responsabilidade patrimonial.O património do devedor constitui a garantia geral dos credores. Seele o desfalca maliciosa e substancialmente, a ponto de não garantirmais o pagamento de todas as dívidas, tornando-se assim insolvente,com o seu passivo superando o ativo, configura-se a fraude contracredores. Esta só se caracteriza, porém, se o devedor já forinsolvente, ou tornar-se insolvente em razão do desfalque patrimonialpromovido. Se for solvente, isto é, se o seu património bastar, comsobra, para o pagamento de suas dívidas, ampla é a sua liberdade dedispor de seus bens.Ao tratar do assunto, o legislador teve de optar entre proteger ointeresse dos credores ou o do adquirente de boa-fé. Preferiu protegero interesse deste. Assim, se ignorava a in solvência do alienante, nemtinha motivos para conhecê-la, conservará o bem, não se anulando onegócio. Desse modo, o credor somente logrará obter a declaraçãode ineficácia da alienação se provar a má-fé do terceiroadquirente, isto é, a ciência deste da situação de insolvênciado alienante. Este é o elemento subjetivo da fraude: o consiliumfraudis ou conluio fraudulento. Não se exige, no entanto, que oadquirente esteja mancomunado ou conluiado com o alienante para lesar oscredores deste. Basta a prova da ciência da sua situação deinsolvência.A lei (CC, art. 107) presume a má-fé do adquirente quando ainsolvência do alienante for notória (títulos protestados,

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várias execuções em andamento) ou quando houver motivopara ser conhecida do primeiro (parentesco próximo, preço vil,continuação dos bens alienados na posse do devedor etc.).O elemento objetivo da fraude é o eventus damni (prejuízo decorrenteda insolvência). O autor da ação anulatória (pauliana ourevocatória) tem assim o ônus de provar, nas transmissõesonerosas, o eventus damni e o consilium fraudis.21.5.1. HIPÓTESES LEGAISNão só nas transmissões onerosas pode ocorrer fraude aos credores.O Código Civil regulamenta, também, a ocorrida em atos detransmissão gratuita de bens ou de remissão de dívidas, nopagamento antecipado de dívidas vincendas e na constituição dedireitos de preferência a algum credor quirografário.O art. 106 declara que poderão ser anulados pelos credoresquirografários os atos de transmissão gratuita de bens(doações), ou remissão de dívida (perdão) quando os prati queo devedor já insolvente, ou por eles reduzidos à insolvência.Nestes casos os credores não precisam provar o conluio fraudulento,pois a lei presume a existência do propósito de fraude. Tendo queoptar entre o direito dos credores, que procuram evitar um prejuízo, eo dos donatários (em geral, filhos ou parentes próximos do doadorinsolvente), que procuram assegurar um lucro, o legislador desta vezpreferiu proteger os primeiros, que buscam evitar um prejuízo. Aremissão das dívidas também constitui uma liberalidade, que reduzo patrimônio do devedor. Daí a sua inclusão no aludido dispositivolegal.Há fraude, também, quando o devedor já insolvente paga a credorquirografário dívida ainda não vencida. A intenção da lei écolocar em situação de igualdade todos os credores. Presume-se, nahipótese, o intuito fraudulento e o credor beneficiado ficaráobrigado a repor, em proveito do acervo, aquiloque recebeu (CC, art. 110). Se a dívida já estiver vencida, opagamento será considerado normal.Também se presume o intuito fraudulento na concessão de garantiareal (hipoteca, penhor, anticrese) pelo devedor já insolvente a algumcredor, colocando-o em posição mais vantajosa do que os demais, emdetrimento da igualdade que deve existir entre os credores. O que seanula, na hipótese, é somente a garantia, a preferência concedidaa um dos credores (CC, art. 111). Continua ele, porém, como credor,retornando à condição de quirografário.21.5.2. AÇÃO PAULIANAA ação declaratória de ineficácia do negócio celebrado emfraude contra os credores é chamada de "pauliana" (em atenção aopretor Paulo, que a introduziu no direito romano) ou revocatória. Sóestão legitimados a ajuizá-la (legitimação ativa) os credoresquirografários e que já o eram ao tempo da alienação fraudulenta(CC, art. 106 e parágrafo. ún1co). Os que se tornaram credoresdepois da alienação já encontraram desfalcado o patrimônio dodevedor e mesmo assim negociaram com ele. Nada podem, pois, reclamar. Oscredores com garantia real não podem ajuizá-la porque já existe umbem determinado, especialmente afetado à solução da dívida. Sefor alienado, o credor privilegiado poderá exercer o direito deseqüela, penhorando-o nas mãos de quem quer que esteja. No entanto,pode-se admitir a propositura da referida ação também peloscredores com garantia real, se evidenciada a insuficiência do bem dadoem garantia para satisfazer o crédito.

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A ação pauliana deve ser intentada (legitimação passiva) contrao devedor insolvente e também contra a pessoa que com ele celebrou aestipulação considerada fraudulenta, bem como contra terceirosadquirentes que hajam procedido de má-fé, conforme dispõe o art.109 do Código Civil. Embora o referido dispositivo legal use o verbo poderá, que dá aimpressão de ser uma faculdade de o credor propor ação contratodos, na verdade ele assim deverá proceder para que a sentençaproduza efeitos em relação também aos adquirentes. De nada adiantaacionar somente o alienante se o bem encontra-se em poder dosadquirentes. O art. 472 do Código de Processo Civil estabelece, comefeito, que "a sentença faz coisa julgada às partes entre as quaisé dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros". Sendo aação de natureza declaratória, e não desconstitutiva, não selhe aplica o prazo prescricional de quatro anos do art. 178, § 9°-,V, do Código Civil.21.5.3. FRAUDE CONTRA CREDORES E FRAUDE À EXECUÇÃO. PRINCIPAISDIFERENÇASA fraude contra credores não se confunde com fraude à execução,embora ambas visem à declaração de ineficácia da alienaçãofraudulenta. Encontra-se, hoje, superado o enten dimento de que a fraudecontra credores torna o ato anulável e a fraude à execução otorna nulo. Na realidade, a alienação é apenas ineficaz em facedos credores. Tanto que, se o devedor-alienante, que se encontra emestado de insolvência, conseguir, em razão de algum fato eventual(loteria, p. ex), pagar a dívida, mantém-se válida aalienação.A fraude contra credores é defeito do negócio jurídico, reguladono Código Civil. A fraude à execução é incidente do processo,disciplinado pelo direito público. A primeira ca racteriza-se quandoainda não existe nenhuma ação ou execução em andamento contrao devedor, embora possam existir protestos cambiários. A segundapressupõe demanda em andamento, capaz de reduzir o alienante àinsolvência (CPC, art. 593, 11). A jurisprudência dominante nostribunais é no sentido de que esta somente se caracteriza quando odevedor já havia sido citado, à época da alienação. Adoutrina, entretanto, considera fraude à execução qualqueralienação efetivada depois que a ação fora proposta(distribuída, segundoo art. 263 do CPC). Sem dúvida, é a corrente mais justa, por impedirque o réu se oculte, enquanto cuida de dilapidar o seu patrimônio,para só depois então aparecer para ser citado, e a que mais seajusta às expressões do art. 593, II, do Código de Processo Civil:"quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra odevedor demanda capaz de reduzi-lo à insolvência".A fraude contra credores deve ser pronunciada em ação pauliana,enquanto a fraude à execução pode ser reconhecida mediante simplespetição, nos próprios autos. A jurispru dência tem admitido,entretanto, a discussão da fraude contra credores em concurso decredores (CPC, art. 768) e em embargos de terceiro. O maior empecilhoà admissão de sua discussão em embargos de terceiro era o art. 109do Código Civil, que exige a presença do alienante na ação. E osembargos de terceiro têm por partes o terceiro adquirente, comoembargante, e o credor exeqüente, como embargado, que argúi a fraudena contestação, deles não participando o devedoralienante. No VIENTA (Encontro Nacional de Tribunais de Alçada) foi aprovada por

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maioria a tese (Conclusão n. 12) de que "A fraude contra credores podeser apreciada em embargos de terceiro, desde que todos os interessadosparticipem ou tenham sido convocados ao processo". Hoje, entretanto,superado o antigo entendimento de que o negócio é anulável, sendoapenas ineficaz em face dos credores (portanto, a sentença quereconhece a fraude contra credores não anula o ato, tendo naturezadeclaratória de ineficácia), temse admitido a sua discussão emembargos de terceiro, mesmo sem a participação do devedor-alienante.Já decidiu, com efeito, o Superior Tribunal de Justiça: "Fraudecontra credores. Apreciação em embargos de terceiro. Possibilidade.Revestindo-se de seriedade as alegações de `consilium fraudis' e do`eventus damni' afirmadas pelo credor embargado, a questão pode serapreciada na via dos embargos de terceiro, sem necessidade de o credorajuizar ação pauliana" (REsp 5.307-RS, 4á T., Rel. Min. AthosCarneiro, j. 16.6.1992, DJU,8 mar. 1993, p. 3119). Assim também já decidiu o 1°- Tribunal deAlçada Civil do Estado (RT, 566:107). No mesmo sentido as liçõesde Yussef Said Cahali (Fraudes contra credores, Revista dos Tribunais,1989, p. 365-73) e Alcides de Mendonça Lima (Comentários ao Códigode Processo Civil, Forense, v. 6, t. 2, n. 1.056, p. 476-7).Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula n. 195,do seguinte teor: "Em embargos de terceiro não se anula atojurídico, por fraude contra credores". Na rea lidade, não se anulanem em ação pauliana, mas apenas se declara a sua ineficácia. Talsúmula contraria o precedente supratranscrito e os entendimentosdoutrinários mencionados, pois os arestos que lhe servem de suporte,embora não unânimes, inadmitem até a declaração deineficácia do negócio jurídico (que não é originária) emembargos de terceiro, exigindo a propositura de ação pauliana, pornão se confundir a hipótese com a fraude à execução.Pode ser lembrado, por último, que a caracterização da fraudecontra credores, nas alienações onerosas, depende de prova doconsilium fraudis, isto é, da má-fé do terceiro (prova estadispensável somente quando se trata de alienação a títulogratuito ou de remissão de dívidas), enquanto a referida má-féé sempre presumida, na fraude à execução. Aduza-se que, se oadquirente, porventura, já transferiu o bem a outra pessoa, não sepresume a má-fé desta (a qual deve, então, ser demonstrada), salvose a alienação se deu depois do registro da penhora do bem.21.6. LESÃOA lesão é também um defeito do negócio jurídico, conforme oscódigos de diversos países. O Código Civil brasileiro não aincluiu no rol dos vícios do consentimento, em bora guardesemelhança com o dolo e a coação. Configurase quando alguém obtém um lucro exagerado, desproporcional,aproveitando-se da inexperiência ou da situação de necessidade dooutro contratante.Compõe-se, pois, de dois elementos: a obtenção do lucro exagerado,que é o elemento objetivo, e o aproveitamento da necessidade ou dainexperiência do outro contratante, queé o elemento subjetivo, também chamado de dolo de aproveitamento.No Brasil, a lesão vem sendo aplicada com base na Lei da EconomiaPopular (Lei n. 1.521/51), cujo art. 4°- considera crime contra aeconomia popular "Obter ou estipular, em qualquer contrato, abusando dapremente necessidade, inexperiência ou leviandade de outra parte,lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente ou justo da

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prestação feita ou prometida". Embora o dispositivo refira-se aoscontratos regidos pela apontada lei, por analogia vem sendo estendidaaos contratos em geral.O Código de Defesa do Consumidor considera "nulas de pleno direito",entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento deprodutos e serviços que:... "IV - estabeleçam obrigaçõesconsideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor emdesvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou aeqüidade". Essa redação oferece vantagem sobre a da Lei daEconomia Popular, embora restrita aos contratos de fornecimento deprodutos e serviços, porque não prevê o tarifamento da vantagemdesproporcional ("um quinto do valor corrente ou justo da prestaçãofeita ou prometida"), que representa um inconveniente, nãoestabelecido na legislação de outros países.Embora Silvio Rodrigues entenda que a lesão torna nulo o negócio,porque a aplicação no Brasil se faz com base em um dispositivo queconsidera crime o ato praticado (Direito civil, 21. ed., Saraiva, p.235), na verdade o negócio é apenas anulável, porque se admite queo vício possa ser sanado pelo seu autor, mediante a complementaçãodo necessário ao120restabelecimento do equilíbrio das prestações, evitando com isso arescisão do contrato. Nesse sentido a lição de Caio Mário daSilva Pereira (Instituições de direito civil, 8. ed., Forense, v. 1,p. 379).Como nos contratos aleatórios as prestações não precisam serequilibradas, pela própria natureza dos contratos que envolvem riscos,a lesão só é admitida nos contratos comu tativos, em que asprestações são certas e presumidamente equivalentes.21.7. RESERVA MENTALO instituto da reserva mental também não foi tratado na nossalegislação mas tem merecido a atenção dos estudiosos,especialmente por se aproximar, em certos casos, da simula ção. Nelaum dos declarantes oculta a sua verdadeira intenção, isto é, nãoquer um efeito jurídico que declara querer. Tem por objetivo enganar ooutro contratante ou declaratário. Se este, entretanto, não soube dareserva, o ato subsiste e produz os efeitos que o declarante nãodesejava. A reserva, isto é, o que se passa na mente do declarante,é indiferente ao mundo jurídico e irrelevante no que se refere àvalidade e eficácia do negócio jurídico.Se o declaratário conhece a reserva ilícita, o ato equipara-se àsimulação e pode ser anulado, mediante prova do prejuízo, com baseno art. 102 do Código Civil. Somente te rão legitimidade ativa paraa ação anulatória os terceiros prejudicados pelo negóciojurídico, pois os simuladores não têm ação um contra o outro(CC, art. 104). Assim, se o declarante, pretendendo enganar odeclaratário, que conhecia a reserva, objetivou lesar a FazendaPública, esta se encontra legitimada a propor a ação anulatória.Quando ocorre simulação, enganados são os terceiros ou o interessepúblico. Na reserva mental o enganado é o outro contratante. Pode-sedizer que nesta a simulação é unilateral. Mas, quando a reservaéilícita e se torna conhecida do outro contratante, é como sehouvesse um acordo simulatório e a reserva se equipara, então, emseus efeitos, à simulação maliciosa ou fraudulenta.Podem ser citados, como exemplos de reserva mental, a declaração do

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autor de obra literária, ao anunciar que o produto da venda dos livrosterá destinação filantrópica, com o único objetivo porém devender maior número de exemplares; o casamento realizado porestrangeiro com mulher do país em que está residindo, com a únicafinalidade de não ser expulso (se a mulher não tiver conhecimento dareserva, o casamento é válido e não poderá ser anulado; se tiverdela conhecimento, em tese poderá o casamento ser anulado).21.8. NEGÓCIO FIDUCIÁRIOTodo negócio em que prepondera a confiança pode ser chamado defiduciário. Quanto maior a confiança, porém, maior o risco. Aprincipal característica do negócio fiduciárioé que o meio excede ao fim. Hipótese característica é a dapessoa que transmite a outrem a titularidade de um bem, para determinadofim, obrigando-se este a restituí-Ia, uma vez alcançado o objetivoressalvado.Trata-se de negócio sério e válido, que não se confunde com asimulação, que tem o propósito de prejudicar terceiros ou fraudara lei. Se o fiduciário trair a confiança nele de positada, ofiduciante não recuperará o bem a ele transferido, mas terádireito a perdas e danos, com base no art. 1.056 do Código Civil, pelodescumprimento da obrigação.22. DAS MODALIDADES DOS NEGÓCIOS JURÍDICOSAlém dos elementos essenciais, que constituem requisitos deexistência e de validade do negócio jurídico, pode este122conter outros elementos meramente acidentais, introduzidosfacultativamente pela vontade das partes, não necessários à suaessência. Uma vez convencionados, passam porém a integrá-lo, deforma indissociável. Recebem a denominação de modalidades emodificam os efeitos normais dos negócios jurídicos.São três os elementos acidentais no direito brasileiro: acondição, o termo e o encargo (modo). Essas convençõesacessórias são admitidas nos atos de natureza patrimonial em geral(com algumas exceções, como na aceitação e renúncia daherança), mas não podem integrar os de caráter eminentementepessoal, como os direitos de família puros e os direitospersonalíssimos. Não comportam condição, por exemplo, ocasamento, o reconhecimento de filho, a adoção, a emancipaçãoetc.22.1. CONDIÇÃOO conceito de condição nos é dado pelo art. 114 do Código Civil:é a cláusula que subordina a eficácia do negócio jurídico aevento futuro e incerto. Os requisitos, portanto, para que se configureo negócio condicional são: a futuridade e a incerteza.Quanto à futuridade, pode-se dizer que não se considera condiçãoo fato passado ou presente, mas somente o futuro. Exemplo clássico éo de Spencer Vampré, em que alguém promete certa quantia a outrem seestiver premiado o seu bilhete de. loteria corrido no dia anterior.Neste caso, ou o bilhete não foi premiado e, então, a declaraçãoé ineficaz; ou o foi e a obrigação é pura e simples e nãocondicional. Malgrado chamadas de condições "impróprias", narealidade não constituem propriamente condições. O evento, a quese subordina a eficácia do negócio, deve também ser incer123to. Se for certo, como a morte, condição não haverá, mas simtermo.

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Há várias espécies de condições, que podem ser classificadasquanto:a) à licitude - Sob este aspecto, as condições podem ser lícitasou ilícitas. Dispõe o art. 115 do Código Civil que sãolícitas, em geral, "todas as condições que a lei não ve darexpressamente". A contrario sensu, serão ilícitas todas as queatentarem contra proibição expressa ou virtual do ordenamentojurídico. Não só estas, mas também as que atentem contra a morale os bons costumes. É ilícita, por exemplo, a cláusula que obrigaalguém a mudar de religião, por contrariar a liberdade de credoassegurada na Constituição Federal, bem como a de alguém seentregar à prostituição. Em geral, as cláusulas que afetam aliberdade das pessoas só são consideradas ilícitas quandoabsolutas, como a que proíbe o casamento ou exige a conservação doestado de viuvez. Sendo relativas, como a de se casar ou de não secasar com determinada pessoa, não se reputam proibidas. O CódigoCivil, nos arts. 115 e 116, proíbe expressamente as condições queprivarem de todo o efeito o ato (perplexas ou contraditórias), as queo sujeitarem ao arbítrio de uma das partes (puramente potestativas) eas impossíveis, que sejam quer fisicamente impossíveis, querjuridicamente impossíveis, sendo que a doutrina inclui entre estas ascondições contrárias à moral e aos bons costumes.b) à possibilidade - As condições podem ser possíveis eimpossíveis. Estas podem ser fisicamente ou juridicamenteimpossíveis. Fisicamente impossíveis são as que não po dem sercumpridas por nenhum ser humano, como a de tocar a lua com a ponta dosdedos, sem tirar os pés da terra, por exemplo. Desde que aimpossibilidade física seja genérica, não restrita ao devedor,têm-se por inexistentes (CC, art.124116), isto é, serão consideradas não-escritas. Condiçãojuridicamente impossível é a que esbarra em proibição expressado ordenamento jurídico ou fere a moral e os bons costumes. Comoexemplo da primeira hipótese pode ser mencionada a condição deadotar pessoa da mesma idade ou a de realizar negócio que tenha porobjeto herança de pessoa viva; e, da segunda, a condição decometer crime ou de se prostituir.O Código Civil atribui efeitos diversos a essas duas espécies decondições impossíveis. Se a impossibilidade é física, o atoprevalece, considerando-se não-escrita a condição; se jurídica aimpossibilidade, tanto a condição como o contrato são nulos (art.116). A estipulação contrária à lei, à ordem pública, àmoral e aos bons costumes contamina todo o contrato.c) à fonte de onde promanam - Sob este ângulo, as condiçõesclassificam-se em casuais, potestativas e mistas, segundo promanem deevento fortuito, da vontade de um dos contraentes ou, ao mesmo tempo, davontade de um dos contraentes e de outra circunstância, como a vontadede terceiro. Podem ser acrescentadas, também, as perplexas e aspromíscuas.Casuais são as que dependem do acaso, do fortuito, alheio à vontadedas partes. Opõem-se às potestativas. Exemplo clássico: "dar-te-eital quantia se chover amanhã". Potestativas são as que decorrem davontade de uma das partes, dividindo-se em puramente potestativas e emsimplesmente potestativas. Somente as primeiras são consideradasilícitas pelo art. 115 do Código Civil, que as inclui dentre ascondições defesas por sujeitarem todo efeito do ato "ao arbítrio

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de uma das partes", sem a influência de qualquer fator externo. É acláusula si voluero (se me aprouver), muitas vezes sob a forma de "seeu quiser", "se eu levantar o braço" e outras, que dependem de merocapricho. As simplesmente ou125meramente potestativas são admitidas, por dependerem não só damanifestação de vontade de uma das partes como também de algumacontecimento ou circunstância exterior que escapa ao seu controle.Por exemplo: "dar-te-ei tal bem se fores a Roma". Tal viagem nãodepende somente da vontade mas também da obtenção de tempo edinheiro. Tem-se entendido que a cláusula "pagarei quando puder" ou"quando possível" não constitui arbítrio condenável. Mistassão as condições que dependem simultaneamente da vontade de umadas partes e da vontade de um terceiro. Exemplos: "darte-ei tal quantiase casares com tal pessoa" ou "se constituíres sociedade com fulano".A eficácia da liberalidade, nesses casos, não depende somente davontade do beneficiário, mas, também, do consentimento de terceirapessoa para o casamento ou para a constituição da sociedade.O art. 115 do Código Civil inclui, entre as condições defesas, "asque privarem de todo efeito o ato". São as condições perplexas oucontraditórias. As condições puramente potestativas podem perderesse caráter em razão de algum acontecimento inesperado, casual, quevenha a dificultar sua realização. É, de início, puramentepotestativa a condição de escalar determinado morro. Mas perderáesse caráter se o agente, inesperadamente, vier a padecer de algumproblema físico que dificulte e torne incerto o implemento dacondição. Neste caso, a condição transforma-se em promíscua.As potestativas eram chamadas de promíscuas pelos romanos porque de ummomento para outro podiam deixar de sê-lo, passando a reger-se peloacaso. Não se confundem, no entanto, com as mistas, porque nestas acombinação da vontade e do acaso é proposital.Proclama o art. 117 do Código Civil que "Não se consideracondição a cláusula, que não derive exclusivamente da vontadedas partes, mas decorra necessariamente da na126tureza do direito, a que acede". Assim, a de alienar determinadoimóvel se for por escritura pública ou a fórmula "se o comodatofor gratuito" não constituem verdadeiramente uma condição, poistrata-se de elementos que fazem parte da essência desses negócios(escritura pública e gratuidade do comodato), sendo chamados deconditionis juris.d) ao modo de atuação - Assim considerada, a condição pode sersuspensiva ou resolutiva. A primeira impede que o ato produza efeitosaté a realização do evento futuro e in certo. Exemplo: "dar-te-eital bem, se lograres tal feito". Não se terá adquirido o direito,enquanto não se verificar a condição suspensiva (CC, art. 118).Resolutiva é a que extingue, resolve o direito transferido pelo ato,ocorrido o evento futuro e incerto. Por exemplo: o beneficiário dadoação, depois de recebido o bem, casa-se com a pessoa que o doadorproibira, tendo este conferido ao eventual casamento o caráter decondição resolutiva; ou alguém constitui uma renda em favor deoutrem, enquanto este estudar.As condições podem ser consideradas sob três estados. Enquantonão se verifica ou não se frustra o evento futuro e incerto, acondição encontra-se pendente. A verificação da condiçãochama-se implemento. Não realizada, ocorre a frustração da

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condição. Pendente a condição suspensiva, não se teráadquirido o direito a que ele visa. Na condição resolutiva, odireito é adquirido desde logo, mas pode extinguir-se se se der o seuimplemento (CC, art. 119). O art. 121 permite ao titular de direitoeventual, no caso de condição suspensiva, o exercício de atosdestinados a conservá-lo, como, por exemplo, a interrupção deprescrição, a exigência de caução ao fiduciário (art. 1.734,parágrafo único) etc.Verificada a condição, o direito é adquirido. Embora aincorporação ao património do titular ocorra somente por oca127sião do implemento da condição, o direito condicionalconstituir-se-á na data da celebração do negócio, como se desdeo início não fosse condicional. Frustrada a condição,considera-se como nunca tendo existido a estipulação. Preceitua oart. 120: "Reputa-se verificada, quanto aos efeitos jurídicos, acondição, cujo implemento for maliciosamente obstado pela parte, aquem desfavorecer. Considera-se, ao contrário, não verificada acondição maliciosamente levada a efeito por aquele, a quem aproveitao seu implemento". Como exemplo pode ser mencionada a condição depagar somente se a ação de determinada empresa alcançar certovalor, e houver manipulação na Bolsa de Valores, pelo interessado,para evitar que o valor estipulado se verifique.A condição resolutiva pode ser expressa ou tácita. No primeirocaso, opera de pleno direito; no segundo, por interpelação judicial(art. 119, parágrafo único). No primeiro, o pronunciamento judicialtem efeito meramente declaratório e ex tunc, pois a resoluçãodá-se automaticamente, no momento do inadimplemento; no segundo, temefeito desconstitutivo, dependendo de interpelação judicial. Emqualquer caso, no entanto, a resolução precisa ser judicialmentepronunciada. Em todos os contratos bilaterais ou sinalagmáticospresume-se a existência de uma cláusula resolutiva tácita (CC,art. 1.092, parágrafo único).Prescreve, por fim, o art. 122 do Código Civil que, "se alguémdispuser de uma coisa sob condição suspensiva, e, pendente esta,fizer quanto àquela novas disposições, estas não terão valor,realizada a condição, se com ela forem incompatíveis". Exemplo:doação sob condição suspensiva e posterior oferecimento empenhor, a terceiro, do mesmo bem; realizada a condição, extingue-seo penhor. Trata-se de aplicação do princípio da retroatividade dascondições, reafir128mado no art. 647 do Código Civil: "Resolvido o domínio peloimplemento da condição ou pelo advento do termo, entendem-setambém resolvidos os direitos reais concedidos na sua pendência, e oproprietário em cujo favor se opera a resolução pode reivindicar acoisa do poder de quem a detenha". Quem adquire domínio resolúvelestá assumindo um risco, não podendo alegar prejuízo se advier aresolução. Em regra, extinguem-se os direitos constituídospendente conditione, valendo apenas os atos de administração, bemcomo os de percepção dos frutos (CC, arts. 510 e s.). Aretroatividade da condição suspensiva não é aplicável,contudo, aos direitos reais, uma vez que só há transferência dodomínio após a entrega do objeto sobre o qual versam ou após oregistro da escritura.22.2. TERMO

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Termo é o dia em que começa ou se extingue a eficácia do negóciojurídico. Termo convencional é a cláusula contratual que subordinaa eficácia do negócio a evento futuro e certo. Difere dacondição, que a subordina a evento futuro e incerto. Apesar dessadistinção, pode ocorrer que o termo, embora certo e inevitável nofuturo, seja incerto quanto à data de sua verificação. Exemplo:determinado bem passará a pertencer a tal pessoa, a partir da morte deseu proprietário. A morte é certa, mas não se sabe quandoocorrerá (a data é incerta). Sob esse aspecto, o termo pode serdividido em incerto, como no referido exemplo, e certo, quando sereporta a determinada data do calendário ou a determinado lapso detempo. Termo de direito é o que decorre da lei. E termo de graça éa dilação de prazo concedida ao devedor.O termo pode ser, também, inicial (dies a quo) ou129suspensivo e final (dies ad quem) ou resolutivo. Se for celebrado, porexemplo, um contrato de locação no dia vinte de determinado mês,para ter vigência no dia primeiro do mês seguinte, esta data seráo termo inicial. Se também ficar estipulada a data em que cessará alocação, esta constituirá o termo final. O termo inicial suspendeo exercício, mas não a aquisição do direito (CC, art. 123). Porsuspender o exercício do direito, assemelha-se à condiçãosuspensiva, que produz também tal efeito. Diferem, no entanto, porquea condição suspensiva, além de suspender o exercício do direito,suspende também a sua aquisição. O termo não suspende aaquisição do direito mas somente protela o seu exercício. Asegunda diferença já foi apontada: na condição suspensiva, oevento do qual depende a eficácia do ato é futuro e incerto,enquanto no termo é futuro e certo.Em razão de tal semelhança, dispõe o art. 124 do Código Civilque "Ao termo inicial se aplica o disposto, quanto à condiçãosuspensiva, nos arts. 121 e 122, e ao termo final, o disposto acerca dacondição resolutiva no art. 119". Assim, o termo não obsta aoexercício dos atos destinados a conservar o direito a ele subordinado,como, por exemplo, o de interromper a prescrição ou de rechaçaratos de esbulho ou turbação.Termo não se confunde com prazo, também regulamentado pelo CódigoCivil. Prazo é o intervalo entre o termo a quo e o termo ad quem,estando regulamentado nos arts. 125a 127 do Código Civil, com as alterações introduzidas pela Lei n.810, de 6 de setembro de 1949. Na contagem dos prazos, exclui-se o diado começo e inclui-se o do vencimento (art. 125). Se este cair em diaferiado, considerar-se-á prorrogado o prazo até o seguinte diaútil (§ 12). Meado considerase, em qualquer mês, o seu décimoquinto dia (§ 2°-). Considera-se mês o período de tempo contadodo dia do início ao130dia correspondente do mês seguinte. Quando no ano ou mês dovencimento não houver o dia correspondente ao do início do prazo,este findará no primeiro dia subseqüente (Lei n. 810/ 49, quemodificou o § 3-° do art. 125 do CC). A mesma Lei n. 810 dispõeque "Considera-se ano o período de doze meses contados do dia doinício ao dia e mês correspondente do ano seguinte" (grifo nosso).Os prazos fixados por hora contar-se-ão de minuto a minuto (art. 125,§ 4°-), como no pedido de falência, por exemplo.Nos testamentos o prazo presume-se em favor do herdeiro (CC, art. 126).

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Assim, se o testador fixar prazo para a entrega do legado,entender-se-á que foi estabelecido em fa vor do herdeiro, obrigado aopagamento, e não do legatário. Nos contratos, presume-se em proveitodo devedor. Desse modo, pode ele renunciar ao prazo e antecipar opagamento da dívida, para livrar-se, por exemplo, de um índice deatualização monetária que estaria vigorando na data do seuvencimento, sem que o credor possa impedi-lo. No entanto, se o prazo foiestabelecido em benefício do credor, ou de ambos, tal renúncia nãopoderá ocorrer, salvo se a avença for regida pelo Código de Defesado Consumidor. Permite este, sem distinção, a liquidaçãoantecipada do débito, com redução proporcional dos juros (art. 52,§ 2°-).Os atos exeqüíveis, para os quais não se estabelece prazo, sãoexecutados desde logo. A regra, entretanto, não é absoluta, poisalguns atos dependem de certo tempo, seja por que terão de serpraticados em lugar diverso, seja pela sua própria natureza. Em umcontrato de empreitada para a construção de uma casa, por exemplo,sem fixação de prazo, não se pode exigir a imediata execução econclusão da obra, que depende, naturalmente, de certo tempo. Nacompra de uma safra, o prazo necessário será a época da colheita.A obrigação de entregar bens, como animais, por exemplo, quedeverão ser transportados para localidade distante, não pode sercumprida imediatamente.22.3. ENCARGO OU MODOTrata-se de cláusula acessória às liberalidades (doações,testamentos), pela qual se impõe um ônus ou obrigação aobeneficiário. É admissível, também, em declarações unilaterais da vontade, como na promessa de recompensa. É comum nasdoações feitas ao município, em geral com a obrigação deconstruir um hospital, escola, creche ou algum outro melhoramentopúblico; e nos testamentos, em que se deixa a herança a alguém,com a obrigação de cuidar de determinada pessoa ou de animais deestimação. Em regra, é identificada pelas expressões "para que","a fim de que", "com a obrigação de".Segundo dispõe o art. 128 do Código Civil, o "encargo não suspendea aquisição, nem o exercício do direito". Assim, aberta asucessão, o domínio e a posse dos bens trans mitem-se desde logo aosherdeiros nomeados, com a obrigação, porém, de cumprir o encargo aeles imposto. Se esse encargo não for cumprido, a liberalidadepoderá ser revogada.Dispõe o art. 1.180 do Código Civil que o donatário é obrigado acumprir os encargos da doação, caso forem a benefício do doador,de terceiro, ou de interesse geral. Se des ta última espécie for oencargo, o Ministério Público poderá exigir sua execução,depois da morte do doador, se este não o tiver feito. O art. 1.707acresce que ao legatário, nos legados com encargo, aplica-se odisposto no art. 1.180, o mesmo acontecendo com o substituto, porforça do art. 1.731. E o art. 1.181, parágrafo único, prevê quea doação onerosa ou com encargo poder-se-á revogar porinexecução do encargo, desde o momento em que o donatário incorrerem mora. Tal dispositivo aplica-se, por analogia, às liberalidadescausa mortis. O terceiro beneficiário pode exigir o cumprimento doencargo mas não está legitimado a propor ação revocatória.132Esta é privativa do instituidor, podendo os herdeiros apenasprosseguir na ação por ele intentada, caso venha a falecer depois do

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ajuizamento. O instituidor também pode reclamar o cumprimento doencargo. O Ministério Público só poderá fazê-lo depois damorte do instituidor, se este não o tiver feito e se o encargo foiimposto no interesse geral.O encargo difere da condição suspensiva, porque esta impede aaquisição do direito, enquanto aquele não suspende aaquisição, nem o exercício do direito. A condição suspen sivaé imposta com o emprego da partícula "se", e o encargo com asexpressões "para que", "com a obrigação de" etc. Difere, também,da condição resolutiva, porque não conduz, por si, àrevogação do ato. O instituidor do benefício poderá ou nãopropor a ação revocatória, cuja sentença não terá efeitoretroativo. O encargo pode ser imposto como condição suspensiva ecom efeitos próprios deste elemento acidental, desde que taldisposição seja expressa (art. 128).23. DA FORMA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS E DA SUA PROVANão se deve confundir forma, que é meio para exprimir a vontade, comprova do ato ou negócio jurídico, que é meio para demonstrar a suaexistência.23.1. FORMADO NEGÓCIO JURÍDICOPrescreve o art. 82 do Código Civil: "A validade do ato jurídicorequer agente capaz (art. 145,11), objeto lícito e fôrma prescritaou não defesa em lei" (arts. 129, 130 e 145) (grifo do autor). A formaé o meio pelo qual a vontade se manifes133ta nos negócios jurídicos. No sistema do Código Civil brasileiro,vigora o princípio da forma livre, podendo o ato ser praticado porqualquer meio, exceto quando a lei exigir a observância de determinadaforma. Dispõe, com efeito, o art. 129 do Código Civil que a"validade das declarações de vontade não dependerá de formaespecial, senão quando a lei expressamente a exigir". Aduz o art. 130que "Não vale o ato, que deixar de revestir a forma especial,determinada em lei (art. 82), salvo quando esta comine sançãodiferente contra a preterição da forma exigida". Não há,entretanto, outra sanção a não ser a nulidade, pois pelo art. 145do Código Civil é nulo o negócio jurídico quando "não revestira forma prescrita em lei" (inciso III) ou quando "for preterida algumasolenidade que a lei considere essencial para a sua validade" (incisoIV).Na mesma esteira, estabelece o art. 366 do Código de Processo Civil:"Quando a lei exigir, como da substância do ato, o instrumentopúblico, nenhuma outra prova, por mais especial que seja, podesuprir-lhe a falta". Por sua vez, estatui o art. 154 do mesmo diploma:"Os atos e termos processuais não dependem de forma determinadasenão quando a lei expressamente a exigir, reputando-se válidos osque, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial".Podem ser distinguidas três espécies de formas: forma livre, formaespecial (ou solene) e forma contratual.a) Forma livre - É a predominante no direito brasileiro. É qualquermeio de manifestação da vontade, não imposto obrigatoriamente pelalei (palavra escrita ou falada, escrito público ou particular, gestos,mímicas etc.).b) Forma especial (ou solene) - É a exigida pela lei, como requisitode validade de determinados negócios jurídicos. Em regra, aexigência de que o ato seja praticado com observância de determinadasolenidade tem por finalidade

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134assegurar a autenticidade dos negócios, garantir a livremanifestação da vontade, demonstrar a seriedade do ato e facilitar asua prova. A forma especial pode ser única ou múltipla (plural).Forma única é a que, por lei, não pode ser substituída poroutra. Exemplos: o art. 134, que considera da substância do ato aescritura pública nas alienações imobiliárias; o art. 1.742, queautoriza a deserdação somente por meio de testamento; os arts. 194 e195, que estabelecem formalidades para o casamento etc. Forma múltipla(ou plural) é quando o ato é solene mas a lei permite aformalização do negócio por diversos modos, podendo o interessadooptar validamente por um deles. Como exemplos podem ser citados oreconhecimento voluntário do filho, que pode ser feito de cinco modos,de acordo com o art. 1-° da Lei n. 8.560/92; a transação, que podeefetuar-se por termo nos autos ou escritura pública (CC, art. 1.028);a instituição de uma fundação, que pode ocorrer por escriturapública ou por testamento (art. 24); a renúncia da herança, quepode ser feita por escritura pública ou termo judicial (art. 1.581).c) Forma contratual - É a convencionada pelas partes. O art. 133 doCódigo Civil dispõe que, no "contrato celebrado com a cláusula denão valer sem instrumento públi co, este é da substância doato". Os contratantes podem, portanto, mediante convenção,determinar que o instrumento público torne-se necessário para avalidade do negócio.Há casos em que a forma determinada pela lei é completada pelapublicidade, como requisito de validade do negócio. Para aaquisição da propriedade imóvel, por exemplo, exige-se escriturapública (art. 134) e seu registro no Registro de Imóveis (arts. 530,I, e 676). Também se diz que a forma pode ser ad solemnitatem ou adprobationem tantum. A primeira, quando determinada forma é dasubstância do ato, indispensável para que a vontade produza efeitos.Exem135plo: a escritura pública, na aquisição de imóvel (art. 134). Asegunda, quando a forma destina-se a facilitar a prova do ato. ClóvisBeviláqua critica essa distinção, afirmando que não há maisformas impostas exclusivamente para prova dos atos. Estes ou têm formaespecial, exigida por lei, ou a forma é livre, podendo neste caso serdemonstrada por todos os meios admitidos em direito (CPC, art. 332).Entretanto, a lavratura do assento de casamento no livro de registro(art. 195) pode ser mencionada como exemplo de formalidade adprobationem tantum, pois destina-se a facilitar a prova do casamento,embora não seja essencial à sua validade.23.2. PROVADO NEGÓCIO JURÍDICOProva é meio empregado para demonstrar a existência do ato ounegócio jurídico. Deve ser admissível (não proibida por lei eaplicável ao caso em exame), pertinente (ade quada àdemonstração dos fatos em questão) e concludente (esclarecedorados fatos controvertidos).Não basta alegar: é preciso provar. Pois allegare nihil et allegatumnon probare paria sunt (nada alegar e alegar e não provar querem dizera mesma coisa). O que se prova é o fato alegado, não o direito aaplicar, pois é atribuição do juiz conhecer e aplicar o direito(iura novit curia). Por outro lado, o ônus da prova incumbe a quemalega o fato e não a quem o contesta, sendo que os fatos notóriosindependem de prova.

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A matéria relativa à prova encontra-se regulamentada no CódigoCivil e no Código de Processo Civil. Ao primeiro cabe adeterminação das provas, a indicação do seu valor jurídicoe as condições de admissibilidade; ao diploma processual civil, omodo de constituir a prova e de produzi-Ia em juízo.136Quando a lei exigir forma especial, como o instrumento público, para avalidade do negócio jurídico, nenhuma outra prova, por mais especialque seja, pode suprir-lhe a falta (CPC, art. 366; CC, art. 136, acontrario sensu). Por outro lado, não havendo nenhuma exigênciaquanto à forma (ato não-formal), qualquer meio de prova pode serutilizado, desde que não proibido, como estatui o art. 332 do Códigode Processo Civil: "Todos os meios legais, bem como os moralmentelegítimos, ainda que não especificados neste Código, sãohábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda ação oudefesa". Portanto, quando o art. 136 do Código Civil enumera os meiosde prova dos negócios jurídicos a que se não impõe formaespecial, o faz apenas exemplificativamente e não taxativamente. Sãoos seguintes:a) Confissão - Ocorre quando a parte admite a verdade de um fato,contrário ao seu interesse e favorável ao adversário (CPC, art.348). Pode ser judicial (em juízo) ou extrajudicial (fora doprocesso), espontânea ou provocada, expressa ou presumida (ou ficta)pela revelia (CPC, arts. 302 e 319). Tem, como elementos essenciais, acapacidade da parte, a declaração de vontade e o objeto possível.Não é válida, assim, a confissão feita por incapaz. Nasações que versarem sobre bens imóveis, a confissão de umcônjuge não valerá sem a do outro (CPC, art. 350, parágrafoúnico). Não vale, também, a confissão relativa a direitosindisponíveis (art. 351).b) Atos processados em juízo - São os que foram objeto de processo epronunciamento anterior. Podem ser lembrados: a coisa julgada, a provaemprestada (em geral, só ad mitida nos processos entre as mesmaspartes), as cartas de arrematação e de adjudicação, formais departilha etc.c) Documentos públicos e particulares - Têm função apenasprobatória. Públicos são os elaborados por autoridade pública,no exercício de suas funções, como as certidões,137traslados etc. Particulares quando elaborados por particulares. Umacarta, um telegrama, por exemplo, podem constituir importante elementode prova. Documentos não se confundem com instrumentos públicos ouparticulares. Estes são espécies e aqueles são o gênero. Oinstrumento é criado com a finalidade precípua de servir de prova,como, por exemplo, a escritura pública, ou a letra de câmbio. Osinstrumentos públicos são feitos perante o oficial público,observando-se os requisitos do art. 134 do Código Civil. Osparticulares são realizados somente com a assinatura dos própriosinteressados. Dispõe o art. 135 do Código Civil que o "instrumentoparticular, feito e assinado, ou somente assinado por quem esteja nadisposição e administração livre de seus bens, sendo subscritopor duas testemunhas, prova as obrigações convencionais de qualquervalor. Mas os seus efeitos, bem como os da cessão, não se operam, arespeito de terceiros, antes de transcrito no registro público" (grifonosso). Mesmo sem as testemunhas, no entanto, o documento particularvale entre as próprias partes, por força do art. 131 do mesmo

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diploma, que prescreve: "As declarações constantes de documentosassinados presumem-se verdadeiras em relação aos signatários".Estatui o art. 132 do Código Civil que a "anuência, ou aautorização de outrem, necessárias à validade de um ato,provar-se-á do mesmo modo que este e constará, sempre que ser possa,do próprio instrumento" (grifo nosso). Desse modo, só porinstrumento público pode a mulher casada outorgar procuração aomarido para a alienação de bens imóveis, pois é da substânciado ato a escritura pública (art. 134).Em princípio, o instrumento deve ser exibido no original. Estatui oart. 137 do Código Civil, porém, que farão "a mesma prova que osoriginais as certidões textuais de qual quer peça judicial, doprotocolo das audiências, ou de outro138qualquer livro a cargo do escrivão, sendo extraídas por ele, ou soba sua vigilância, e por ele subscritas, assim como os traslados deautos, quando por outro escrivão concea-tados". Esta regra érepetida no art. 365 do Código de Processo Civil. O art. 138 doCódigo Civil acrescenta que terão "também a mesma força probanteos traslados e as certidões extraídas por oficial público, deinstrumentos ou documentos lançados em suas notas". Certidão é areprodução do que se encontra transcrito em determinado livro oudocumento. Quando integral, abrangendo todo o conteúdo daanotação, chama-se verbo ad verbum. Se. abranger apenas determinadospontos indicados pelo interessado, denomina-se certidão "em breverelatório". Traslado é cópia do que se encontra lançado em umlivro ou em autos. A admissibilidade das diversas formas dereprodução mecânica de documentos hoje existentes, bem como osseus efeitos, está regulamentada no Código de Processo Civil, naseção que trata da força probante dos documentos (arts. 364 e s.).Valem como certidões sempre que o escrivão portar por fé a suaconformidade com o original (art. 385 do CPC). A cópia do documentoparticular tem o mesmo valor probante que o original, desde que oescrivão, intimadas as partes, proceda à conferência e certifiquea conformidade entre a cópia e o original (art. 385). Reputa-seautêntico o documento quando o tabelião reconhecer a firma dosignatário, declarando que foi aposta na sua presença (art. 369).Aduza-se, por fim, que os "escritos de obrigação redigidos emlíngua estrangeira serão, para ter efeitos legais no país,vertidos em português" (CC, art. 140).d) Testemunhas - Podem ser instrumentárias ou judiciárias. Estassão as que prestam depoimento em juízo. Aquelas são as que assinamo instrumento. A prova testemunhal é menos segura que a documental.Por essa razão, só se admite prova exclusivamente testemunhal noscontratos cujo139valor não exceda o décuplo do maior salário mínimo vigente noPaís, ao tempo em que foram celebrados (CPC, art. 401, que revogou oart. 141 do CC). A prova testemunhal é admissível quando houvercomeço de prova por escrito, qualquer que seja o valor do contrato(CPC, art. 402). Algumas pessoas, no entanto, não podem servir comotestemunhas. O art. 142 do Código Civil menciona os loucos de todo ogênero; os cegos e surdos, quando a ciência do fato, que querprovar, dependa dos sentidos que lhes faltam; os menores de dezesseisanos; o interessado no objeto do litígio, bem como os seus parentespróximos; e os cônjuges. O Código de Processo Civil, no art. 405,

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relaciona os incapazes para testemunhar, os impedidos e os suspeitos. Alei permite o testemunho de parentes, quando se trate de verificar onascimento ou o óbito dos filhos (art. 143), bem como nas hipótesesdos arts. 180, IV e 193. Ninguém é obrigado a depor sobre fatos acujo respeito, por estado ou profissão, deva guardar segredo (art.144).e) Presunção - É a ilação que se extrai de um fato conhecido,para se chegar a um desconhecido. Não se confunde com indício, queé meio de se chegar a uma presunção. Exemplo de presunção:como é conhecido o fato de que o credor só entrega o título aodevedor por ocasião do pagamento, a sua posse pelo devedor conduz àpresunção de haver sido pago. As presunções podem ser legais(juris) ou comuns (hominis). Legais são as que decorrem da lei, como aque recai sobre o marido, que a lei presume ser pai do filho nascido desua mulher, na constância do casamento. Comuns ou hominis são as quese baseiam no que ordinariamente acontece, na experiência da vida.Presume-se, por exemplo, embora não de forma absoluta, que asdívidas do marido são contraídas em benefício da família. Aspresunções legais dividem-se em absolutas (juris et de jure) erelativas (juris140tantum). Absolutas são as que não admitem prova em contrário. Apresunção de verdade atribuída pela lei a certos fatos é, nestescasos, indiscutível. Exemplo: a de que são fraudatórias dosdireitos dos outros credores as garantias de dívidas que o devedorinsolvente tiver dado a algum credor (CC, art. 111). Relativas ou juristantum são as que admitem prova em contrário. Por exemplo, apresunção de paternidade atribuída ao marido, em relação aofilho de sua mulher nascido na constância do casamento, pode serelidida por meio da ação negatória de paternidade, nas hipótesesdo art. 340 do Código Civil.f) Exames e vistorias - O Código de Processo Civil denomina"perícias" tais atos. Exame é a apreciação de alguma coisa, porperitos, para auxiliar o juiz a formar a sua con vicção. Exemplos:exame grafotécnico, exame de sangue nas ações de investigaçãode paternidade etc. Vistoria é também perícia, restrita porémà inspeção ocular. É diligência freqüente nas açõesimobiliárias, como possessórias e demarcatórias. A vistoriadestinada a perpetuar a memória de certos fatos transitórios, antesque desapareçam, é denominada ad perpetuam rei memoriam, reguladaatualmente no capítulo do Código de Processo Civil que trata da"produção antecipada de provas" (arts. 846 a 851).g) Arbitramento - É forma de avaliação. É o exame pericialdestinado a apurar o valor de determinado bem, comum nasdesapropriações e ações de indenização.24. DA INEFICÁCIA DO NEGÓCIO JURÍDICOA expressão "ineficácia" abrange a inexistência, a nulidade e aanulabilidade do negócio jurídico. É empregada para designar onegócio que não produz os efeitos desejados peIas partes, o qual será classificado pela forma supramencionada deacordo com o grau de imperfeição verificada.24.1. ATO INEXISTENTE, NULO E ANULÁVELO ato é inexistente quando lhe falta algum elemento estrutural, como oconsentimento (manifestação da vontade), por exemplo. Se não houvequalquer manifestação de von tade, o negócio não chegou a seformar; inexiste, portanto. Se a vontade foi manifestada mas encontra-se

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eivada por erro, dolo, coação ou vício social, o negócio existemas é anulável. Se a vontade emana de um absolutamente incapaz,maior é o defeito e o negócio existe mas é nulo.A teoria do negócio jurídico inexistente é, hoje, admitida emnosso direito. Concebida no século XIX para contornar, em matéria decasamento, o princípio de que não há nu lidade sem texto legal(porque as hipóteses de identidade de sexo, de falta de celebraçãoe de ausência de consentimento não estão catalogadas expressamentenos casos de nulidade), ingressou também no campo dos negóciosjurídicos. Por constituir um nada no mundo jurídico, não reclamaação própria para combatê-lo. Às vezes, no entanto, aaparência material do ato apresenta evidências que enganam,justificando-se a propositura de ação para discutir e declarar a suainexistência. Para efeitos práticos, tal declaração terá asmesmas conseqüências da declaração de nulidade.O ato é nulo quando ofende preceitos de ordem pública, queinteressam à sociedade. Assim, quando o interesse público élesado, a sociedade o repele, fulminando-o de nu lidade, evitando quevenha a produzir os efeitos esperados pelo agente. Quando a ofensaatinge o interesse particular de pessoas que o legislador pretendeuproteger, sem estar em jogo142interesses sociais, faculta-se a estas, se o desejarem, promover aanulação do ato. Trata-se de ato anulável, que será consideradoválido se o interessado conformar-se com os seus efeitos e não oatacar, nos prazos legais, ou o ratificar.24.2. DIFERENÇAS ENTRE NULIDADE E ANULABILIDADEO Código Civil brasileiro, no capítulo das "nulidades", que abrangeas absolutas e as relativas (anulabilidades), levando em conta orespeito à ordem pública, formula exigên cias de carátersubjetivo, objetivo e formal. Assim, considera nulo o ato quando"praticado por pessoa absolutamente incapaz" (art. 145, 1), quando "forilícito, ou impossível, o seu objeto" (inciso 11), quando "nãorevestir a forma prescrita em lei" ou "for preterida alguma solenidadeque a lei considere essencial para a sua validade" (incisos Ill e IV);e, finalmente, quando "a lei taxativamente o declarar nulo ou lhe negarefeito" (inciso V).Algumas vezes, com efeito, a lei expressamente declara nulo determinadonegócio (exs.: "Art. 1.125. Nulo é o contrato de compra e venda,quando se deixa ao arbítrio exclu sivo de uma das partes a taxaçãodo preço"; ainda: arts. 207, 208, 765, 823, 1.175, 1.176 etc.). Nestescasos diz-se que a nulidade é expressa ou textual. Outras vezes a leinão declara expressamente a nulidade do ato mas proíbe a suaprática ou submete a sua validade à observância de certosrequisitos de interesse geral. Utiliza-se, então, de expressões como"Não pode" (arts. 1.089 e 1.132), "não podendo" (art. 226), "Nãose admite" (art. 1.024), "Não vale" (art. 1.067), "ficará semefeito" (art. 1.123) etc. Em tais hipóteses, dependendo da natureza dadisposição violada, a nulidade está subentendida, sendo chamada devirtual ou implícita.143A anulabilidade visa à proteção do consentimento ou refere-se àincapacidade do agente. Assim, o art. 147 do Código Civil declaraanulável o ato jurídico por "incapacidade relativa do agente"(inciso 1) e por "vício resultante de erro, dolo, coação,simulação, ou fraude".

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Outras diferenças entre anulabilidade e nulidade podem ser apontadas:a) A primeira é decretada no interesse privado da pessoa prejudicada.Nela não se vislumbra o interesse público mas a mera conveniênciadas partes. A segunda é de ordem pública e decretada no interesse daprópria coletividade.b) A anulabilidade pode ser suprida pelo juiz, a requerimento das partes(CC, art. 146, parágrafo único, a contrario sensu), ou sanada,expressa ou tacitamente, pela ratifica ção (CC, art. 148). Anulidade não pode ser sanada pela ratificação, nem suprida pelojuiz.A ratificação pode ser expressa ou tácita e retroage à data doato. Expressa quando há uma declaração de vontade que contenha asubstância da obrigação ratificada, sendo ne cessário que aintenção de ratificar seja explícita (art. 149), devendo observara mesma forma do ato praticado. Tácita quando a obrigação já foicumprida em parte pelo devedor, ciente do vício que a inquinava (art.150), ou quando deixa prescrever a ação anulatória. Expressa outácita, importa renúncia definitiva à faculdade de anular o ato(CC, art. 151). A ratificação não poderá, entretanto, serefetivada se prejudicar terceiro (CC, art. 148). Seria a hipótese, porexemplo, da venda de imóvel feita por relativamente incapaz, sem estarassistido, e que o vendeu também a terceiro, assim que completou amaioridade. Neste caso, não poderá ratificar a primeiraalienação, para não prejudicar os direitos do segundo adquirente.144c) A anulabilidade não pode ser pronunciada de ofício. Depende deprovocação dos interessados (CC, art. 152) e não opera antes dejulgada por sentença. O efeito de seu reco nhecimento é, portanto,ex nunc. A nulidade, ao contrário, deve ser pronunciada de ofíciopelo juiz (CC, art. 146, parágrafo único) e seu efeito é ex tunc,pois retroage à data do ato, para lhe negar efeitos. Amanifestação judicial neste caso é, então, de natureza meramentedeclaratória. Na anulabilidade, a sentença é de naturezadesconstitutiva, pois o ato anulável vai produzindo efeitos, até serpronunciada a sua ineficácia. A anulabilidade, assim, deve serpleiteada em ação judicial. A nulidade quase sempre opera de plenodireito e deve ser pronunciada de ofício pelo juiz, quando tomarconhecimento do ato ou de seus efeitos (art. 146, parágrafo único).Somente se justifica a propositura de ação para esse fim quandohouver controvérsia sobre os fatos constitutivos da nulidade (dúvidasobre a existência da própria nulidade). Se tal não ocorre, ouseja, se ela consta do instrumento, ou se há prova literal, o juiz apronuncia de ofício.d) A anulabilidade só pode ser alegada pelos interessados, isto é,pelos prejudicados (o relativamente incapaz e o que manifestou vontadeviciada), sendo que os seus efeitos aproveitam apenas aos que aalegaram, salvo o caso de solidariedade, ou indivisibilidade (CC, art.152). A nulidade pode ser alegada por qualquer interessado, em nomepróprio, ou pelo Ministério Público, quando lhe couber intervir,em nome da sociedade que representa (CC, art. 146). Se o menor, entredezesseis e vinte e um anos, dolosamente ocultou a sua idade, inquiridopela outra parte, ou se no ato de se obrigar espontaneamente se declaroumaior, perderá a proteção da lei e não poderá eximir-se decumprir a obrigação, argüindo a sua anulabilidade (CC, art. 155).Também perderá tal proteção, sendo equiparado aos adultos,quando praticar algum ato ilícito (CC, art. 156).

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145e) A anulabilidade é prescritível, em prazos mais ou menos curtos. Anulidade prescreve no prazo máximo de vinte anos (prescrição longitemporis). Encontra-se superado o antigo entendimento de que a nulidadeé imprescritível. De acordo com o art. 177 do Código Civil, nenhumdireito pode sobreviver à inércia de seu titular por tempo maior devinte anos. Tal orientação foi consagrada na Súmula 494 do SupremoTribunal Federal, que prescreve: "A ação para anular venda deascendente e descendente, sem consentimento dos demais, prescreve emvinte anos, contados da data do ato".f) O ato anulável produz efeitos, até o momento em que é decretadaa sua invalidade. O efeito dessa decretação é, pois, ex nunc(natureza desconstitutiva). O ato nulo não produz nenhum efeito (quodnullum est nullum producit effectum). O pronunciamento judicial denulidade produz efeitos ex tunc, isto é, desde o momento da emissãoda vontade (natureza declaratória).Deve-se ponderar, porém, que a afirmação de que o ato nulo nãoproduz nenhum efeito não tem um sentido absoluto e significa, naverdade, que é destituído dos efeitos que normalmente lhe pertencem.Isto porque, algumas vezes, determinadas conseqüências emanam do atonulo, como ocorre no casamento putativo. Outras vezes, a venda nulanão acarreta a transferência do domínio mas vale como causajustificativa da posse de boa-fé. No direito processual, a citaçãonula por incompetência do juiz interrompe a prescrição e constituio devedor em mora (CPC, art. 219).24.3. DISPOSIÇÕES ESPECIAISA nulidade do instrumento não induz a do ato, sempre que este puderprovar-se por outro meio (CC, art. 152, parágrafo único). Assim, porexemplo, a nulidade da escritura de146mútuo de pequeno valor não invalida o contrato, porque pode serprovado por testemunhas. Mas será diferente se a escritura for dasubstância do ato, como no contrato de mútuo com garantiahipotecária.Segundo dispõe o art. 153 do Código Civil, a "nulidade parcial de umato não o prejudicará na parte válida, se esta for separável".Trata-se de aplicação do princípio utile per inutile non vitiatur.Assim, por exemplo, se o testador, ao mesmo tempo em que dispôs deseus bens para depois de sua morte, aproveitou a cédulatestamentária para reconhecer filho havido fora do casamento,invalidada esta por inobservância das formalidades legais não seráprejudicado o referido reconhecimento, que pode ser feito até porinstrumento particular, sem formalidades (Lei n. 8.560/92). Aineficácia da hipoteca, também, por falta de outorga uxória,impede a constituição do ônus real, mas é aproveitável comoconfissão de dívida.O referido art. 153 ainda prescreve que "A nulidade da obrigaçãoprincipal implica a das obrigações acessórias, mas a destas nãoinduz a da obrigação principal". A regra consiste em aplicaçãodo princípio accessorium sequitur suum principale, acolhido no art.58. Assim, a nulidade da obrigação principal acarreta a nulidade dacláusula penal (CC, art. 922) e a da dívida contratada acarreta a dahipoteca. Mas a nulidade da obrigação acessória não importa a daobrigação principal.Tratando dos efeitos da declaração de ineficácia do negóciojurídico, dispõe o art. 158 do Código Civil que, anulado o ato

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(havendo nulidade ou anulabilidade), "restituir se-ão as partes aoestado em que antes dele se achavam, e, não sendo possívelrestituí-Ias, serão indenizadas com o equivalente". A parte finalaplica-se às hipóteses em que a coisa não mais existe ou foialienada a terceiro de boa-fé. O Código abre exceção em favordos incapazes, ao dispor que "Nin147guém pode reclamar o que, por uma obrigação anulada, pagou a umincapaz, se não provar que reverteu em proveito dele a importânciapaga". Provado que o pagamento nulo reverteu em proveito do incapaz,determina-se a restituição, porque ninguém pode locupletar-se àcusta alheia. Sem tal prova, mantém-se inalterada a situação. Oônus da prova incumbe a quem pagou.A teoria das nulidades do negócio jurídico sofre algumasexceções, quando aplicada ao casamento. Assim, embora os negóciosnulos não produzam efeitos, o casamento putativo produz alguns.Malgrado a nulidade deva ser decretada de ofício pelo juiz, a"nulidade do casamento processar-se-á por ação ordinária, naqual será nomeado curador que o defenda" (CC, art. 222). E, embora anulidade em geral não possa ser sanada, a nulidade do casamentocelebrado perante autoridade incompetente ratione loci "se considerarásanada, se não se alegar dentro em dois anos da celebração" (CC,art. 208).25. DOS ATOS ILÍCITOSO capítulo referente aos atos ilícitos, no Código Civil, contémapenas dois artigos: o 159 e o 160. Mas a verificação da culpa e aavaliação da responsabilidade regulam-se pelos artigos 1.518 a 1.532(Das Obrigações por Atos Ilícitos) e 1.537 a 1.553 (DaLiquidação das Obrigações Resultantes de Atos Ilícitos).25.1. CONCEITOAto ilícito é o praticado com infração ao dever legal de nãolesar a outrem. Tal dever é imposto a todos no art. 159 do148Código Civil, que prescreve: "Aquele que, por ação ou omissãovoluntária, negligência ou imprudência, violar direito, ou causarprejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano".Ato ilícito é, portanto, fonte de obrigação: a de indenizar ouressarcir o prejuízo causado. É praticado com infração a umdever de conduta, por meio de ações ou omissões culposas oudolosas do agente, das quais resulta dano para outrem.25.2. RESPONSABILIDADE CONTRATUAL E EXTRACONTRATUALUma pessoa pode causar prejuízo a outrem por descumprir umaobrigação contratual (dever contratual). Por exemplo: o ator quenão comparece para dar o espetáculo contratado; o comodatário quenão devolve a coisa que lhe foi emprestada porque, por sua culpa, elapereceu. O inadimplemento contratual acarreta a responsabilidade deindenizar as perdas e danos nos termos do art. 1.056 do Código Civil.Quando a responsabilidade não deriva de contrato, mas de infraçãoao dever de conduta (dever legal) imposto genericamente no art. 159 domesmo diploma, diz-se que ela é extracontratual ou aquiliana.Embora a conseqüência da infração ao dever legal e ao devercontratual seja a mesma (obrigação de ressarcir o prejuízocausado), o Código Civil brasileiro distinguiu as duas espécies deresponsabilidade, disciplinando a extracontratual nos arts. 159 e 160,sob- o título de Dos Atos Ilícitos, complementando aregulamentação nos arts. 1.518 e s., e a contratual, como

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conseqüência da inexecução das obrigações, nos arts. 956 es. e 1.056 e s., omitindo qualquer referência diferenciadora. Noentanto, algumas diferenças podem ser149apontadas: a) na responsabilidade contratual, o inadimplementopresume-se culposo. O credor lesado encontra-se em posição maisfavorável, pois só está obrigado a demonstrar que a prestaçãofoi descumprida, sendo presumida a culpa do inadimplente; naextracontratual, ao lesado incumbe o ônus de provar culpa ou dolo docausador do dano; b) a contratual tem origem na convenção, enquantoa extracontratual a tem na inobservância do dever genérico de nãolesar a outrem (neminem laedere); c) a capacidade sofre limitaçõesno terreno da responsabilidade contratual, sendo mais ampla no campo daextracontratual.25.3. RESPONSABILIDADE CIVILE RESPONSABILIDADE PENALNa responsabilidade penal, o agente infringe uma norma de direitopúblico. O interesse lesado é o da sociedade. Na responsabilidadecivil, o interesse diretamente lesado é o privado. O prejudicadopoderá pleitear ou não a reparação.Se, ao causar dano, o agente transgride, também, a lei penal, eletorna-se, ao mesmo tempo, obrigado civil e penalmente. Aresponsabilidade penal é pessoal, intransferível. Responde o réucom a privação de sua liberdade. A responsabilidade civil épatrimonial: é o patrimônio do devedor que responde por suasobrigações. Ninguém pode ser preso por dívida civil, exceto odepositário infiel e o devedor de pensão alimentícia oriunda dodireito de família.A responsabilidade penal é pessoal também em outro sentido: a penanão pode ultrapassar a pessoa do delinqüente. No cível, hávárias hipóteses de responsabilidade por ato de outrem (cf. art.1.521 do CC, p. ex.). A tipicidade é um dos requisitos genéricos docrime. No cível, no entanto, qualquer150ação ou omissão pode gerar a responsabilidade, desde que violedireito ou cause prejuízo a outrem (CC, art. 159). A culpabilidade ébem mais ampla na área cível (a culpa, ainda que levíssima, obrigaa indenizar). Na esfera criminal exigese, para a condenação, que aculpa tenha certo grau ou intensidade. A imputabilidade também étratada de modo diverso. Somente os maiores de dezoito anos sãoresponsáveis criminalmente. Os menores entre dezesseis e vinte e umanos são equiparados aos maiores quanto às obrigaçõesresultantes de atos ilícitos em que forem culpados (CC, art. 156).25.4. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA E RESPONSABILIDADE OBJETIVAA teoria clássica, também chamada de teoria da culpa ou subjetiva,pressupõe a culpa como fundamento da responsabilidade civil. Em nãohavendo culpa, não há responsabilidade.Diz-se, pois, ser subjetiva a responsabilidade quando se esteia naidéia de culpa. A prova da culpa (em sentido lato, abrangendo o doloou a culpa em sentido estrito) passa a ser pressuposto necessário dodano indenizável.A lei impõe, entretanto, a certas pessoas, em determinadassituações, a reparação de um dano cometido sem culpa. Quandoisto acontece, diz-se que a responsabilidade é legal ou objetiva,porque prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo decausalidade. Esta teoria, dita objetiva ou do risco, tem como postulado

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que todo dano é indenizável, e deve ser reparado por quem a ele seliga por um nexo de causalidade, independentemente de culpa.Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de culpa doagente para que seja obrigado a reparar o dano.Em alguns casos, ela é presumida pela lei. Em outros, é de todoprescindível (responsabilidade independentemente de culpa).Quando a culpa é presumida, inverte-se o ônus da prova. O autor daação só precisa provar a ação ou omissão e o dano resultanteda conduta do réu, porque sua culpa já é pre sumida (objetivaimprópria). É o caso do art. 1.527 do Código Civil, que presume aculpa do dono do animal que venha a causar dano a outrem, masfaculta-lhe a prova das excludentes ali mencionadas, com inversão doonus probandi.Há casos em que se prescinde totalmente da prova da culpa. Sãohipóteses de responsabilidade independentemente de culpa. Basta quehaja relação de causalidade entre a ação e o dano.Uma das teorias que procuram justificar a responsabilidade objetiva éa teoria do risco. Para esta teoria, toda pessoa que exerce algumaatividade cria um risco de dano para ter ceiros. E deve ser obrigada arepará-lo, ainda que sua conduta seja isenta de culpa. Aresponsabilidade civil desloca-se da noção de culpa para a idéiade risco, ora encarada como "riscoproveito", que se funda no princípiosegundo o qual é reparável o dano causado a outrem emconseqüência de uma atividade realizada em benefício doresponsável (ubi emolumentum, ibi onus, isto é, quem aufere oscômodos (lucros) deve suportar os incômodos ou riscos); ora maisgenericamente como "risco criado", a que se subordina todo aquele que,sem indagação de culpa, expuser alguém a suportá-lo.O Código Civil brasileiro filiou-se à teoria subjetiva. É o que sepode verificar no art. 159, que erigiu o dolo e a culpa como fundamentospara a obrigação de reparar o dano. A res ponsabilidade subjetivasubsiste como regra necessária, sem prejuízo da adoção daresponsabilidade objetiva (imprópria), em dispositivos vários eesparsos (arts. 1.527, 1.528 e 1.529152r*aavuvaaauuuv uv uvaavdo animal, do dono do prédio em ruína e do habitante da casa da qualcaírem coisas, - além de outros, como os arts. 1.519, 1.520, 1.530 e1.531).Os casos de responsabilidade objetiva independentemente de culpaencontram-se em leis esparsas, como a Lei de Acidentes do Trabalho, oCódigo Brasileiro de Aeronáutica, a Lei n. 6.453/77 (que estabelecea responsabilidade do operador de instalação nuclear), o Decreto-Lein. 2.68 1, de 1912 (que regula a responsabilidade civil das estradas deferro) e outras.Isto significa que a responsabilidade objetiva não substitui asubjetiva, mas fica circunscrita aos seus justos limites. Na realidade,as duas formas de responsabilidade conju gam-se e dinamizam-se. Sendo ateoria subjetiva insuficiente para atender às imposições doprogresso, cumpre ao legislador fixar especialmente os casos em quedeverá ocorrer a obrigação de reparar, independentemente daquelanoção.25.5. IMPUTABILIDADE E RESPONSABILIDADEO art. 159 do Código Civil pressupõe o elemento imputabilidade, ouseja, a existência, no agente, da livre determinação de vontade.Para que alguém pratique um ato ilícito e seja obrigado a reparar o

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dano causado, é necessário que tenha capacidade de discernimento.Aquele que não pode querer e entender, não incorre em culpa e, porisso, não pratica ato ilícito.25.5.1. A RESPONSABILIDADE DOS LOUCOSA concepção clássica considera que, sendo o amental (louco oudemente) um inimputável, não é ele responsável civil153mente. Se vier a causar dano a alguém, o ato equipara-se à forçamaior ou ao caso fortuito. Se a responsabilidade não puder seratribuída ao encarregado de sua guarda, a vítima ficaráirressarcida.Pessoas assim geralmente têm um curador, incumbido de sua guarda ouvigilância. E o art. 1.521, 11, do Código Civil, responsabiliza ocurador pelos atos dos curatelados que estiverem sob sua guarda, salvose provar que não houve negligência de sua parte (art. 1.523). Se aresponsabilidade, entretanto, não puder ser atribuída à pessoaincumbida de sua guarda ou vigilância, ficará a vítimairressarcida, da mesma maneira que ocorreria na hipótese de casofortuito.Este capítulo da responsabilidade civil, no Brasil, está a exigiruma corajosa revisão, principalmente quando se trata de loucoabastado. Deve o juiz, por eqüidade, determinar que o patrimônio doamental responda pelo dano por ele causado a terceiro, quando o seucurador livrar-se da responsabilidade que a lei lhe impõe ou nãodispuser de meios suficientes, e não ficar aquele privado donecessário. Esta solução foi adotada nos códigos de váriospaíses (Suíça, Portugal, México, Espanha etc.) e consta doProjeto de lei n. 634B/75, em tramitação no Congresso Nacional.Aguiar Dias entende que, se o alienado mental não tem curador nomeado,mas vive em companhia do pai, este responde pelo ato do filho, não combase no art. 1.521, 1, mas sim no art. 159, pois decorre de omissãoculposa na vigilância de pessoa privada de discernimento, não afazendo internar ou não obstando ao ato danoso. E, se o amental nãoestá sob o poder de ninguém, responderão seus próprios bens pelareparação, pois "a reparação do dano causado por pessoas nessascondições se há de resolver fora dos quadros da culpa" (Daresponsabilidade civil, 4. ed., Forense, p. 561 e 574).15425.5.2. A RESPONSABILIDADE DOS MENORESPrescreve o art. 156 do Código Civil: "O menor, entre 16 (dezesseis) e21 (vinte e um) anos, equipara-se ao maior quanto às obrigaçõesresultantes de atos ilícitos, em que for culpado". O menor púbere,portanto, que pratica ato ilícito, perde a proteção que a leiconfere aos incapazes e fica equiparado ao adulto, respondendo com seupatrimónio pela reparação do dano.Sendo o menor impúbere, com menos de dezesseis anos, inimputável e,portanto, irresponsável civilmente, tem aplicação o art. 1.521, I,do Código Civil, que responsabiliza os pais pelos atos praticadospelos filhos menores que estiverem sob sua guarda. Deste modo, avítima não ficará irressarcida. O pai é responsável pelo atodo filho menor de vinte e um anos. Se o filho tiver idade entredezesseis e vinte e um anos, e tiver bens, poderá ser tambémresponsabilizado solidariamente com o pai ou sozinho. Se for menor dedezesseis anos, somente o pai poderá ser responsabilizado, pois écivilmente inimputável. Se o menor estiver sob tutela, aresponsabilidade nesses casos será do tutor (art. 1.521,11).

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Se o pai emancipa o filho, voluntariamente, a emancipação produztodos os efeitos naturais do ato, menos o de isentar o primeiro daresponsabilidade solidária pelos atos ilí citos praticados pelosegundo, consoante proclama a jurisprudência. O mesmo não acontecequando a emancipação decorre do casamento ou das outras causasprevistas no art. 9°,§ 1 °, do Código Civil.25.6. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUALA análise do art. 159 do Código Civil, que disciplina aresponsabilidade extracontratual, evidencia que quatro são os155seus elementos essenciais: ação ou omissão, culpa ou dolo doagente, relação de causalidade e dano.25.6.1. AÇÃO OU OMISSÃORefere-se a lei a qualquer pessoa que, por ação ou omissão, venhaa causar dano a outrem. A responsabilidade pode derivar de ato próprio(CC, arts. 1.531, 1.547, 1.548 etc.), de ato de terceiro que esteja soba guarda do agente (art. 1.521) e, ainda, de danos causados por coisas(art. 1.528) e animais (art. 1.527) que lhe pertençam. Neste últimocaso, a culpa do dono é presumida (responsabilidade objetivaimprópria).Para que se configure a responsabilidade por omissão é necessárioque exista o dever jurídico de praticar determinado fato (de não seomitir) e que se demonstre que, com a sua práti ca, o dano poderia tersido evitado. O dever jurídico de não se omitir pode ser imposto porlei (CTB, p. ex.) ou resultar de convenção (dever de guarda, devigilância, de custódia) e até da criação de algumasituação especial de perigo.25.6.2. CULPA OU DOLO DO AGENTEAo se referir à ação ou omissão voluntária, o art. 159 doCódigo Civil cogitou do dolo. Em seguida, referiu-se à culpa emsentido estrito, ao mencionar a "negligência ou im prudência". Doloé a violação deliberada, intencional, do dever jurídico. A culpaconsiste na falta de diligência que se exige do homem médio.Para que a vítima obtenha a reparação do dano, exige o referidodispositivo legal que prove dolo ou culpa stricto sensu (aquiliana) doagente (imprudência, negligência ou imperí cia), demonstrando tersido adotada, entre nós, a teoria subjetiva. Como essa prova muitasvezes torna-se difícil de ser conseguida, o Código Civil algumasvezes presume a culpa, como no art. 1.527, sendo que leis especiaisadmitem, em156hipóteses específicas, casos de responsabilidade independentementede culpa fundada no risco.A teoria subjetiva faz distinções com base na extensão da culpa.Culpa lata ou grave: imprópria ao comum dos homens e a modalidade quemais se avizinha do dolo; culpa leve: falta evitável com atençãoordinária; culpa levíssima: falta só evitável com atençãoextraordinária ou com especial habilidade. A culpa grave ao dolo seequipara (culpa lata dolus aequiparatur). Assim, se em determinadodispositivo legal constar a responsabilidade do agente por dolo, deve-seentender que também responde por culpa grave (CC, art. 1.057). Nocível, a culpa mesmo levíssima obriga a indenizar (in lege aquilialevissima culpa venit). Em geral, não se mede o dano pelo grau deculpa. O montante do dano é apurado com base no prejuízo comprovadopela vítima. Todo dano provado deve ser indenizado, qualquer que sejao grau de culpa. Em algumas poucas leis especiais, como na Lei de

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Imprensa (Lei n. 5.250/67), o grau de culpa pode ter influência noarbitramento do dano.25.6.3. RELAÇÃO DE CAUSALIDADEÉ o nexo causal ou etiológico entre a ação ou omissão doagente e o dano verificado. Vem expressa no verbo "causar", empregado noart. 159. Sem ela, não existe a obrigação de indenizar. Se houve odano mas sua causa não está relacionada com o comportamento doagente, inexiste a relação de causalidade e, também, aobrigação de indenizar.As excludentes da responsabilidade civil, como a culpa da vítima e ocaso fortuito e a força maior (CC, art. 1.058), rompem o nexo decausalidade, afastando a responsabilidade do agente. Assim, por exemplo,se o motorista está dirigindo corretamente e a vítima, querendosuicidar-se, atira-se sob as rodas do veículo, não se pode afirmarter ele "causado" o aciden157te, pois na verdade foi mero instrumento da vontade da vítima, estasim responsável exclusiva pelo evento.25.6.4. DANOSem a prova do dano, ninguém pode ser responsabilizado civilmente. Odano pode ser patrimonial (material) ou extrapatrimonial (moral), ouseja, sem repercussão na órbita financeira do lesado. O CódigoCivil consigna um capítulo sobre a liquidação do dano, isto é,sobre o modo de se apurarem os prejuízos e a indenização cabível(arts. 1.537 a 1.553).Mesmo que haja violação de um dever jurídico, e que tenha existidoculpa e até mesmo dolo por parte do infrator, nenhuma indenizaçãoserá devida, uma vez que não se te nha verificado prejuízo. Ainexistência de dano torna sem objeto a pretensão à suareparação. Às vezes a lei presume o dano, como acontece na Lei deImprensa, que presume haver dano moral em casos de calúnia, injúriae difamação praticadas pela imprensa. Acontece o mesmo em ofensasaos direitos da personalidade.Pode ser lembrado, como exceção ao princípio de que nenhumaindenização será devida se não tiver ocorrido prejuízo, aregra do art. 1.531 do Código Civil, que obriga a pagar em dobro aodevedor quem demanda dívida já paga, como uma espécie de penaprivada pelo comportamento ilícito do credor, mesmo sem prova deprejuízo. E, na responsabilidade contratual, pode ser lembrado o art.927 do Código Civil, que permite ao credor cobrar a cláusula penal,sem precisar provar prejuízo.25.7. ATOS LESIVOS NÃO CONSIDERADOS ILÍCITOSO art. 160 do Código Civil declara não constituírem atos158ilícitos os praticados em legítima defesa, ou no exercício regularde um direito, ou em estado de necessidade.25.7.1. A LEGÍTIMA DEFESAO art. 160, 1, do Código Civil proclama que não constituem atosilícitos os praticados em "legítima defesa ou no exercício regularde um direito reconhecido". O próprio "cum primento do dever legal",embora não explicitamente, nele está contido, pois atua noexercício regular de um direito reconhecido aquele que pratica um ato"no estrito cumprimento do dever legal".Em sentido oposto, o art. 1.540 mantém a responsabilidade do autor doato lesivo praticado em legítima defesa com dano a terceiro, pois aexpressão "crime justificável" abrangia, na legislação penal

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anterior, a legítima defesa.Portanto, se o ato foi praticado contra o próprio agressor, e emlegítima defesa, não pode o agente ser responsabilizado civilmentepelos danos provocados. Entretanto, se por en gano ou erro de pontaria,terceira pessoa foi atingida (ou alguma coisa de valor), neste caso deveo agente reparar o dano. Mas terá ação regressiva contra oagressor, para se ressarcir da importância desembolsada. Dispõe oparágrafo único do art. 1.520: "A mesma ação competirá contraaquele em defesa de quem se danificou a coisa (art. 160, n. 1)". Note-sea remissão feita ao art. 160, 1.Somente a legítima defesa real, e praticada contra o agressor, deixade ser ato ilícito, apesar do dano causado, impedindo a ação deressarcimento de danos. Se o agente, por erro de pontaria (aberratioictus), atingir um terceiro, ficará obrigado a indenizar os danos aeste causados, nos termos do art. 1.540, ficando, porém, com direitoà ação regressiva contra o injusto ofensor, como já dito.159A legítima defesa putativa também não exime o réu de indenizar odano, pois somente exclui a culpabilidade e não a antijuridicidade doato. O art. 65 do Código de Processo Penal não faz nenhumareferência às causas excludentes da culpabilidade, ou seja, àsdenominadas dirimentes penais. Uma vez que se trata de erro de fato,não há que cogitar da aplicação do art. 65 do Código deProcesso Penal. Na legítima defesa putativa, o ato de quem a praticaé ilícito, embora não punível por ausência de culpabilidade emgrau suficiente para a condenação criminal. No cível, entretanto,a culpa mesmo levíssima obriga a indenizar. E não deixa de havernegligência na apreciação equivocada dos fatos.Na esfera civil, o excesso, a extrapolação da legítima defesa, pornegligência ou imprudência, configura a situação do art. 159 doCódigo Civil.25.7.2. O EXERCÍCIO REGULAR E O ABUSO DE DIREITOA doutrina do abuso do direito não exige, para que o agente sejaobrigado a indenizar o dano causado, que venha a infringir culposamenteum dever preexistente. Mesmo agindo dentro do seu direito, pode, nãoobstante, em alguns casos, ser responsabilizado.Prevalece na doutrina, hoje, o entendimento de que o abuso de direitoprescinde da idéia de culpa. O abuso de direito ocorre quando oagente, atuando dentro dos limites da lei, deixa de considerar afinalidade social de seu direito subjetivo e o exorbita, ao exercê-lo,causando prejuízo a outrem. Embora não haja, em geral, violaçãoaos limites objetivos da lei, o agente desvia-se dos fins sociais a queesta se destina.O Código Civil brasileiro admitiu a idéia do abuso de direito noart. 160, 1, embora não o tenha feito de forma expressa. Sustenta-se aexistência c1a teoria em nosso direito160positivo, mediante interpretação a contrario sensu do aludidodispositivo. Se ali está escrito não constituir ato ilícito opraticado no exercício regular de um direito reconhecido, éintuitivo que constitui ato ilícito aquele praticado no exercícioirregular de um direito.É dessa forma que se tem encontrado fundamento legal para coibir oexercício anormal do direito em muitas hipóteses. Uma das maiscomuns enfrentadas por nossos tribunais era a reiterada purgação damora pelo inquilino, que passou a ser considerada abusiva pela

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jurisprudência, até ser limitada pela própria lei do inquilinato.Também serve de fundamento para a aplicação, entre nós, dareferida teoria, o art. 5°- da Lei de Introdução ao CódigoCivil, que determina ao juiz, na aplicação da lei, o atendi mentoaos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.É que a ilicitude do ato abusivo caracteriza-se sempre que o titulardo direito desvia-se da finalidade social para a qual o direitosubjetivo foi concedido.Observa-se que a jurisprudência, em regra, considera como abuso dedireito o ato que constitui o exercício egoístico, anormal dodireito, sem motivos legítimos, nocivos a outrem, contrários aodestino econômico e social do direito em geral.Vários dispositivos legais demonstram que no direito brasileiro háuma reação contra o exercício irregular de direitos subjetivos. Oart. 554 do Código Civil, inserido no capítulo do "direito devizinhança", permite que se reprima o exercício abusivo do direitode propriedade que perturbe o sossego, a segurança ou a saúde dovizinho. Constantes são os conflitos relativos à perturbação dosossego alegada contra clubes de dança, boates, oficinas mecânicas,terreiros de espiritismo e umbandismo etc. Podem ser mencionados, ainda,como exemplos, os arts. 394, 395, 1.530 e 1.531. O Código de ProcessoCivil também reprime o abuso de direito nos arts. 14a 18 e também no processo de execução (arts. 574 e 598).Observa-se que a teoria do abuso de direito tem aplicação em quasetodos os campos do direito, como instrumento destinado a reprimir oexercício anti-social dos direitos subjetivos.25.7.3. O ESTADO DE NECESSIDADENo direito brasileiro, a figura do chamado "estado de necessidade" foidelineada pelo artigo 160, 11, combinado com os arts. 1.519 e 1.520,todos do Código Civil.Dispõe o inciso 11 do art. 160 não constituir ato ilícito "adeterioração ou destruição da coisa alheia, a fim de removerperigo iminente". E o parágrafo único completa: "Neste últimocaso, o ato será legítimo, somente quando as circunstâncias otornarem absolutamente necessário, não excedendo os limites doindispensável para a remoção do perigo". É o estado denecessidade no âmbito civil.Entretanto, embora a lei declare que o ato praticado em estado denecessidade não é ato ilícito, nem por isso libera quem o praticade reparar o prejuízo que causou. Se um mo torista, por exemplo, atirao seu veículo contra um muro, derrubando-o, para não atropelar umacriança que, inesperadamente, surgiu-lhe à frente, o seu ato, emboralícito e mesmo nobilíssimo, não o exonera de pagar a reparaçãodo muro. Com efeito, o art. 1.519 do Código Civil estatui que, se odono da coisa (o dono do muro) destruída ou deteriorada não forculpado do perigo, terá direito de ser indenizado (somente se nãofor culpado do perigo). Entretanto, o evento ocorreu por culpa invigilando do pai da criança, que é responsável por sua conduta.Desse modo, embora tenha de pagar o conserto do muro, o motorista teráação regressiva contra o pai do menor, para ressarcir-se dasdespesas efetuadas. É o que162expressamente dispõe o art. 1.520 do Código Civil: "Se o perigoocorrer por culpa de terceiro, contra este ficará com açãoregressiva, no caso do art. 160, n. 11, o autor do dano; para haver aimportância, que tiver ressarcido ao dono da coisa".

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Pela nossa lei, os danos porventura decorrentes de ato praticado emestado de necessidade só podem dizer respeito às coisas e nunca àspessoas (cf. RT, 100:533). Embora o art. 160, 11, aparente estar emcontradição com o citado art. 1.519, explica-se o teor do últimopela intenção de não se deixar irressarcida a vítima inocente deum dano. Por outro lado, justifica-se a afirmação do primeiro, deque o ato praticado em estado de necessidade não é ilícito, porter o agente direito à ação regressiva contra o terceiro causadorda situação de perigo.O art. 65 do Código de Processo Penal (que proclama fazer coisajulgada, no cível, a sentença penal que reconhecer ter sido o atopraticado em estado de necessidade) não revogou os arts. 1.519 e 1.520do Código Civil. Sendo o réu absolvido criminalmente por ter agidoem estado de necessidade, está o juiz cível obrigado a reconhecertal fato. Mas dará a ele o efeito previsto no Código Civil e nãono Código Penal, qual seja, o de obrigá-lo a ressarcir o danocausado à vítima inocente, com direito, porém, à açãoregressiva contra o provocador da situação de perigo.26. DA PRESCRIÇÃOO Código Civil trata das disposições gerais sobre a prescriçãoextintiva nos arts. 161 a 167; e dos prazos prescricionais nos arts. 177(geral) e 178 (prazos especiais).16326.1. INTRODUÇÃOO decurso do tempo tem influência na aquisição e na extinçãode direitos. Distinguem-se, pois, duas espécies de prescrição: aextintiva e a aquisitiva (usucapião). Alguns países tratamconjuntamente dessas duas espécies em um único capítulo. OCódigo Civil brasileiro regulamentou a extintiva na Parte Geral, dandoênfase à força extintora do direito. No direito das coisas, naparte referente aos modos de aquisição do domínio, tratou daprescrição aquisitiva, em que predomina a força geradora. Em um eem outro caso, no entanto, ocorrem os dois fenômenos: alguém ganhae, em conseqüência, alguém perde.Na Parte Geral, o Código Civil refere-se apenas à prescrição. Noentanto, vários prazos ali estipulados são decadenciais, conformedistingue a doutrina. Por exemplo, os fi xados para a propositura deação negatória de paternidade (art. 178, §§ 3°- e 4°) epara a anulação de casamento, dentre outros.Como o elemento "tempo" é comum às duas espécies deprescrição, dispõe o art. 553 do Código Civil que as causas queobstam, suspendem, ou interrompem a prescrição também se aplicamao usucapião.O instituto da prescrição é necessário, para que hajatranqüilidade na ordem jurídica, pela consolidação de todos osdireitos. Dispensa a infinita conservação de todos os recibos dequitação, bem como o exame dos títulos do alienante e de todos osseus sucessores, sem limite no tempo. Com a prescrição, bastaconservar os recibos até a data em que se consuma a prescrição dadívida, ou examinar o título do alienante e os de seus predecessoresimediatos, em um período de vinte anos apenas.16426.2. CONCEITO E REQUISITOSPara Clóvis Beviláqua, prescrição extintiva "é a perda daação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva,em conseqüência do não-uso dela, durante deter minado espaço de

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tempo". Caio Mário da Silva Pereira, entretanto, entende que aprescrição é modo pelo qual se extingue um direito (não apenas aação) pela inércia do titular durante certo lapso de tempo.A prescrição tem como requisitos: a) a inércia do titular, ante aviolação de um seu direito; b) o decurso do tempo fixado em lei.26.3. AÇÕES IMPRESCRITÍVEISÀ primeira vista, tem-se a impressão de que não há açõesimprescritíveis, na sistemática do Código Civil, pois o art. 179preceitua que "Os casos de prescrição não previstos neste Códigoserão regulados, quanto ao prazo, pelo art. 177". Entretanto, adoutrina aponta várias ações imprescritíveis, afirmando que aprescritibilidade é a regra e a imprescritibilidade a exceção.Assim, não prescrevem: a) as ações que protegem os direitos dapersonalidade, como o direito à vida, à honra, à liberdade, àintegridade física ou moral; b) as que se prendem ao estado daspessoas (estado de filiação, a qualidade de cidadania, acondição conjugal). Não prescrevem, assim, as ações deseparação judicial, de interdição, de investigação depaternidade etc.; c) as ações de exercício facultativo (oupotestativo), em que não existe direito violado, como as destinadas aextinguir o condomínio (ação de divisão ou de venda da coisacomum), a pedir meação no muro vizinho; d) as ações referentes abens públicos de qualquer natureza, que são165imprescritíveis; e) as que protegem o direito de propriedade, que éperpétuo (reivindicatória); f) as ações para reaver bensconfiados à guarda de outrem, a título de depósito, penhor oumandato (CC, art. 168, IV).26.4. PRESCRIÇÃO E INSTITUTOS AFINS (PRECLUSÃO, PEREMPÇÃO EDECADÊNCIA)A preclusão consiste na perda de uma faculdade processual, por nãoter sido utilizada no momento próprio. Impede que se renovem asquestões já decididas, dentro da mesma ação. Só produz efeitosdentro do próprio processo em que advém.A perempção também é de natureza processual. Consiste na perdado direito de ação pelo autor contumaz, que deu causa a trêsarquivamentos sucessivos (CPC, art. 268, parágrafo úni co, do CPC).Não extingue o direito material, nem a pretensão, que passam a seroponíveis somente como defesa. Várias as tentativas de se encontrara linha divisória entre prescrição e decadência. Os critériossão, em geral, alvo de críticas, por não terem base científicaou por pretenderem fazer a distinção pelos efeitos ouconseqüências, quando o que se deseja saber é em que momento oprazo extintivo atinge a ação ou o direito.Assim, quanto aos efeitos, diz-se que a prescrição não correcontra determinadas pessoas, enquanto a decadência corre contra todos.A prescrição pode suspender-se ou interrom per-se, enquanto adecadência tem curso fatal, não se suspendendo nem se interrompendopelas causas suspensivas ou interruptivas da prescrição, sópodendo ser obstada a sua consumação pelo exercício efetivo dodireito ou da ação, quando esta constitui o meio pelo qual deve serexercido o direi166to. Aduza-se que a moderna doutrina admite a suspensão dos prazosdecadenciais (ou de caducidade), como se verifica no Código de Defesado Consumidor.

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O critério clássico, no direito brasileiro, consiste em colocar oelemento diferenciador no campo de incidência de cada um dosinstitutos. Assim, a prescrição atinge diretamentea ação e, por via oblíqua, faz desaparecer o direito por elatutelado (o que perece é a ação que protege o direito). Adecadência, ao contrário, atinge diretamente o direito e, por viaoblíqua, extingue a ação (é o próprio direito que perece).Hoje, no entanto, predomina o entendimento, na moderna doutrina, de quea prescrição extingue a pretensão, que é a exigência desubordinação de um interesse alheio ao interesse próprio. Odireito material, violado, dá origem à pretensão, que é deduzidaem juízo por meio da ação. Extinta a pretensão, não háação. Portanto, a prescrição extingue a pretensão, atingindotambém a ação. O instituto que extingue somente a ação(conservando o direito material e a pretensão, que só podem seropostos em defesa) é a perempção.Quanto à origem: na prescrição, o direito preexiste à ação,que só surge quando aquele é violado (ex.: direito autoral). Aprescrição não tem o seu início no momento do nascimento dodireito, mas, sim, a partir de sua violação, porque é nessemomento que nasce a ação, que pode prescrever. Em se tratando dedecadência, a ação e o direito têm origem comum. Começa acorrer o prazo extintivo desde o momento em que o direito nasce (prazoconcedido ao marido, no art. 178, § 3°-, do CC, para contestar alegitimidade do filho nascido de sua mulher).Ainda quanto à origem, a prescrição resulta exclusivamente da lei.A decadência, porém, pode resultar da lei, do contrato e dotestamento.O critério atualmente mais aceito é o apresentado por Agnelo AmorimFilho, denominado "critério científico", ba167seado na clássica divisão das ações em condenatórias,constitutivas e declaratórias. Somente as ações de naturezacondenatória, que reclamam uma prestação, estão sujeitas àprescrição. Estão sujeitas à decadência as açõesconstitutivas com prazo fixado na lei (negatória de paternidade),porque protegem direitos potestativos. As ações constitutivas quenão têm prazo especial fixado em lei são imprescritíveis(separação judicial, interdição). Também não prescrevem asações declaratórias, porque visam somente obter uma certezajurídica.26.5. DISPOSIÇÕES LEGAIS SOBRE A PRESCRIÇÃOO art. 161 do Código Civil não admite a renúncia prévia daprescrição, isto é, antes que se tenha consumado. Não se admitea renúncia prévia, nem de prescrição em curso, por que oreferido instituto é de ordem pública e a renúncia tornaria aação imprescritível por vontade da parte.Dois são os requisitos para a validade da renúncia: a) que aprescrição já esteja consumada; b) que não prejudique terceiro.Terceiros eventualmente prejudicados são os credores, pois arenúncia à possibilidade de alegar a prescrição pode acarretar adiminuição do património do devedor. Em se tratando de atojurídico, requer a capacidade do agente.A decadência resultante de prazo extintivo imposto pela lei não podeser renunciada pelas partes, nem antes nem depois de consumada, porquenão é lícito às partes derrogar os imperativos impostos pelo

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legislador. Mas, se a decadência resulta de prazos prefixados pelavontade do homem, em declaração unilateral ou em convençãobilateral, nada impede a sua renúncia, depois de consumada (cf. CamaraLeal, Da prescrição e da decadência, Forense, 4. ed., p. 14, n.84).Observados esses requisitos, a renúncia, isto é, a desis-168tência do direito de argüir a prescrição, pode ser expressa outácita. A renúncia expressa decorre de manifestação taxativa,inequívoca, escrita ou verbal, do devedor de que dela não pretendeutilizar-se. Tácita, segundo dispõe o art. 161, "é a renúnciaquando se presume de fatos do interessado, incompatíveis com aprescrição". Consumada a prescrição, qualquer ato dereconhecimento da dívida por parte do devedor, como o pagamentoparcial ou a composição visando à solução futura do débito,será interpretado como renúncia.Dispõe o art. 162 que a prescrição pode ser alegada, em qualquerinstância, pela parte a quem aproveita. Pode ser argüida em qualquerfase ou estado da causa, em primeira ou em segunda instância. Pode,portanto, ser alegada em qualquer fase do processo de conhecimento,ainda que o réu tenha deixado de invocá-la na contestação, nãosignificando renúncia tácita a falta de invocação na primeiraoportunidade em que falar no processo. Considera-se que, se essa defesanão foi, desde o primeiro momento, invocada, é porque o réu,provavelmente, teria confiado nos outros meios da defesa - o que nãotolhe o efeito da prescrição. A única conseqüência daserôdia alegação diz respeito aos ônus da sucumbência: sãoindevidos honorários advocatícios em favor do réu, se este deixoude alegar a prescrição de imediato, na oportunidade dacontestação, deixando para fazê-lo somente em grau deapelação, nos termos do art. 22 do Código de Processo Civil.Na fase de liquidação da sentença é inadmissível ainvocação de prescrição, que deve ser objeto de deliberaçãose argüida na fase cognitiva do processo. A que pode ser alegada mesmona fase de execução é a prescrição superveniente àsentença (CPC, art. 741, VI).Se a prescrição, entretanto, não foi suscitada na instânciaordinária (primeira e segunda instância), é inadmissível169a sua argüição no recurso especial, perante o Superior Tribunal deJustiça, ou no recurso extraordinário, interposto perante o SupremoTribunal Federal, por faltar o prequestionamento exigido nos regimentosinternos desses tribunais, que têm força de lei. Dispõe a Súmula282 do último que "é inadmissível o recurso extraordinário,quando não ventilada, na decisão recorrida, a questão federalsuscitada". Igualmente, no tocante à ação rescisória (RTJ, 71:1;RT, 488:145).Tanto as pessoas naturais como as pessoas jurídicas estão sujeitas(como credoras) aos efeitos da prescrição e podem invocá-los,sempre que lhes aproveitar (como devedoras), nos termos do art. 163 doCódigo Civil.Os privados de administrar os próprios bens têm ação regressivacontra os seus representantes legais, quando estes, por dolo ounegligência, derem causa à prescrição (CC, art. 164). Porexemplo: se o tutor do menor púbere, culposamente, permitir que aação do tutelado prescreva, deverá indenizá-lo pelo prejuízo

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ocasionado. Trata-se de uma regra de proteção dos incapazes, quereafirma a do art. 159. Entretanto, não abrange os absolutamenteincapazes, mencionados no art. 5°, porque contra estes não corre aprescrição (art. 169, 1).A prescrição iniciada contra uma pessoa continua a correr (accessiopraescriptionis) contra o seu herdeiro (CC, art. 165). Assim, o herdeirodo de cujus disporá apenas do prazo faltante para exercer a ação,quando esse prazo iniciou-se com o autor da herança. O prazo, dessemodo, não se inicia novamente, com a morte deste. Não só o prazocontra mas também o prazo a favor do herdeiro continua a correr. Apalavra herdeiro, segundo a doutrina, deve ser interpretada em sentidolato, no sentido de sucessor, que tanto pode ser a título universal(herdeiro) como a título singular (legatário).170Prescreve o art. 166 do Código Civil que o juiz não pode conhecer daprescrição de direitos patrimoniais, se não for invocada pelaspartes. Não pode, portanto, reconhecê-la de ofício. A contrariosenso, conclui-se que pode fazê-lo, se se tratar de direitosnão-patrimoniais. A hipótese, entretanto, é rara, porque osdireitos não-patrimoniais (direitos pessoais, de família) estãosujeitos à decadência ou caducidade. Esta pode ser declarada deofício, pelo juiz (CPC, art. 219, § 5°-). Ainda que se trate dedireitos patrimoniais, a decadência pode ser decretada de ofício(RTJ,130:1001; RT, 652:128 e 656:220). O juiz não pode decretar deofício a prescrição intercorrente.Se a parte, pessoalmente, não invoca a prescrição, poderáfazê-lo o representante do Ministério Público, em nome do incapaz,ou dos interesses que tutela. Não poderá, entre tanto, argüi-Ia,em matéria patrimonial, quando atua como mero custos legis (STF, REsp15.265-0-PR, DJU, 17 maio 1993, p. 9316, 14 col.; JTA, 102:287).Também poderá alegála o curador à lide, em favor do curatelado,bem como o curador especial e o defensor do vínculo matrimonial, noscasos em que lhes caiba intervir.Estatui, por último, o art. 167 que, "com o principal prescrevem osdireitos acessórios". Constitui nova aplicação do princípio deque o acessório segue o destino do principal (accessorium sequitursuum principale), acolhido no art. 59 e reafirmado em vários outros.Assim, prescrita a obrigação, prescritos ficam os juros, bem como acláusula penal; prescrita a dívida, prescrita estará também asua garantia. O contrário, entretanto, não é verdadeiro, pois aprescrição dos direitos acessórios não afeta o principal.Aduza-se que a prescrição em curso não cria direito adquirido,podendo o seu prazo ser reduzido ou ampliado por lei superveniente, outransformado em prazo decadencial. Não se admite, por outro lado,ampliação de prazo prescricionalpela vontade das partes. Importaria renúncia antecipada daprescrição, vedada pela lei. A possibilidade de se reduzir o prazoconstitui questão polêmica, sendo vacilante a jurisprudência.Entretanto, em se tratando de direitos patrimoniais, não háinconveniente em admiti-Ia.26.6. DAS CAUSAS QUE IMPEDEM OU SUSPENDEM A PRESCRIÇÃOO Código Civil agrupou as causas que suspendem e impedem aprescrição em um mesmo capítulo, entendendo que estãosubordinadas a uma unidade fundamental. As mesmas causas ora impedem,ora suspendem a prescrição, dependendo do momento em que surgem. Seo prazo ainda não começou a fluir, a causa ou obstáculo impede que

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comece (ex.: a constância do matrimônio). Se, entretanto, oobstáculo (casamento) surge após o prazo ter-se iniciado, dá-se asuspensão. Neste caso, somam-se os períodos, isto é, cessada acausa de suspensão temporária, o lapso prescricional volta a fluirsomente pelo tempo restante. Diferentemente da interrupção, queserá estudada adiante, em que o período já decorrido éinutilizado e o prazo volta a correr novamente por inteiro.A justificação para a suspensão da prescrição está naconsideração legal de que certas pessoas, por sua condição oupela situação em que se encontram, estão impedidas de agir. Assim,o art. 168 do Código Civil declara que não corre prescriçãoentre os cônjuges, na constância do casamento; entre ascendentes edescendentes, durante o pátrio poder; entre tutelados e curatelados eseus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela (o motivo,nestes três casos, é a confiança e amizade que existe entre aspartes); em favor do credor pignoratício, do mandatário e, em geral,das pessoas que lhes172são equiparadas, contra o depositante, o devedor, o mandante e aspessoas representadas, os seus herdeiros, quanto ao direito eobrigações relativas aos bens confiados à sua guarda (o motivoneste caso é de ordem moral, pois não podem as referidas pessoasprevalecer-se da confiança que lhes foi depositada para se negarem adevolver os bens cuja guarda lhes foi confiada).O art. 169 menciona que a prescrição não corre contra os incapazesde que trata o art. 5°; contra os ausentes do Brasil em serviçopúblico da União, dos Estados ou dos Municí pios; contra os que seacharem servindo nas Forças Armadas (denominação atual), em tempode guerra. Denota-se a preocupação de proteger pessoas que seencontram em situações especiais. Não corre prescrição contraos absolutamente incapazes (quando teriam direito de propor a ação).A prescrição contra o menor só se inicia após completardezesseis anos de idade. Mas corre a favor dos absolutamente incapazes(quando poderiam ser acionados).Outros casos de suspensão foram criados por leis especiais (v. art.440 da CLT; art. 147 da LF etc.). A jurisprudência admite asuspensão da prescrição em caso de obstáculo judicial, comogreve dos servidores etc.Estatui o art. 170 que a prescrição não corre pendendocondição suspensiva; não estando vencido o prazo; pendendoação de evicção. Nas duas primeiras hipóteses o direito aindanão se tornou exigível, não sendo possível, pois, falar emprescrição. Se terceiro propõe a ação de evicção, ficasuspensa a prescrição até o seu desfecho final. Neste dispositivoobserva-se a aplicação do princípio da actio nata dos romanos,segundo o qual somente se pode falar em fluência de prazoprescricional desde que haja uma ação a ser exercitada, em virtudeda violação do direito. Enquanto não nasce a ação, nãocomeça a fluir o prazo prescricional. É da vio173lação do direito que nasce a ação. E a prescrição começa acorrer desde que a ação teve nascimento, isto é, desde a data emque a violação se verificou.Dispõe ainda o art. 171 que suspensa a prescrição em favor de umdos credores solidários, só aproveitam os outros, se o objeto daobrigação for indivisível. A prescrição é benefício

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pessoal e só favorece as pessoas taxativamente mencionadas, mesmo nasolidariedade. Assim, existindo três credores contra devedor comum, deimportância em dinheiro, sendo um dos credores absolutamente incapaz,por exemplo, a prescrição correrá contra os demais credores, poisdinheiro é divisível, ficando suspensa somente em relação aomenor. Se se tratasse, porém, de bem indivisível, a prescriçãosomente começaria a fluir, para todos, quando o incapaz completassedezesseis anos. Sendo o direito indivisível, a suspensão aproveita atodos os credores.26.7. DAS CAUSAS QUE INTERROMPEM A PRESCRIÇÃOA interrupção depende, em regra, de um comportamento ativo docredor. Qualquer ato de exercício ou proteção ao direitointerrompe a prescrição, extinguindo o tempo já de corrido, quevolta a correr por inteiro. O efeito da interrupção daprescrição é, portanto, instantâneo: "a prescriçãointerrompida recomeça a correr da data do ato que a interrompeu, ou doúltimo do processo para a interromper" (CC, art. 173). Sempre quepossível a opção, ela se verificará pela maneira maisfavorável ao devedor.O art. 172 indica as causas que interrompem a prescrição. De acordocom o inciso 1, a prescrição interrompe-se "pela citação pessoalfeita ao devedor, ainda que ordenada174por juiz incompetente". Tal dispositivo foi alterado pelo Código deProcesso Civil, que assim dispunha, no art. 219, § 12: "Aprescrição considerar-se-á interrompida na data do despacho queordenar a citação". A interrupção decorria, portanto, dodespacho que ordenava a citação, e não mais da citação pessoaldo devedor.Entretanto, as modificações feitas ao estatuto processual civilpelas Leis n. 8.950 a 8.953/94 resultaram em nova alteração doreferido § 12, que está agora assim redigido: "A interrupção daprescrição retroagirá à data da propositura da ação". Porsua vez, estatui o art. 263 do Código de Processo Civil que"Considera-se proposta a ação, tanto que a petição inicial sejadespachada pelo juiz, ou simplesmente distribuída, onde houver mais deuma vara. A propositura da ação, todavia, só produz, quanto aoréu, os efeitos mencionados no art. 219 depois que for validamentecitado". A prescrição considera-se, assim, interrompida na data dadistribuição, onde houver mais de uma vara, ou do despacho. Masnão é este nem aquela, porém, que a interrompem, mas sim acitação, operando, porém, retroativamente, à referida data.O comportamento do credor vem previsto nos parágrafos do mencionadoart. 219. Cumpre-lhe promover, nos dez dias seguintes à prolaçãodo despacho, a citação do réu. Pro mover a citação épromover a extração do mandado de citação, com o recolhimentodas custas devidas, inclusive despesas de condução do oficial dejustiça. Frise-se que a parte não pode ser prejudicada porobstáculo judicial para o qual não tenha concorrido, isto é, pelademora imputável exclusivamente ao serviço judiciário (cf.Súmula 106 do STJ). Não sendo citado o réu, o juiz prorrogará oprazo até o máximo de noventa dias. Efetuada a citação nos dezdias ou nos noventa dias da prorrogação, a interrupção daprescrição retroagirá à data da propositura da ação. Se,entretanto, tais175

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prazos forem ultrapassados, nem por isso a citação válida deixa deproduzir os seus efeitos regulares, exceto quanto ao efeito deinterromper a prescrição retroativamente à data dadistribuição. Se o prazo prescricional já decorreu, "haver-se-ápor não interrompida a prescrição", não se efetuando acitação nos aludidos prazos.Para interromper a prescrição, a citação deve preencher osrequisitos de existência e de validade, segundo a lei processual. Épreciso, pois, que exista, ainda que ordenada por juiz incompetente, etenha-se completado. A citada ordenada por juiz incompetente interrompea prescrição, para beneficiar aqueles que de boa-fé peticionamperante juiz incompetente. Não se admitem, porém, fusos. Épreciso, também, que seja válida, isto é, que não seja nula pordefeito de forma, por circunduta ou por se achar perempta a instânciaou a ação (CC, art. 175).Considera-se nula a citação feita sem a observância dasformalidades legais estabelecidas no estatuto processual. Tornasecircunducta a citação, quando depende de acusação emaudiência, por determinação da lei processual, e o autor deixa deacusá-la; mas, para que a circundução se verifique énecessário que o citado a requeira em tempo hábil, fixado pelas leisprocessuais. O atual Código de Processo Civil não prevê essaespécie de citação, encontrando-se, pois, superado nessa parte otexto do art. 175.Tem-se entendido que a expressão "por se achar perempta a instânciaou a ação", adaptada ao atual Código de Processo Civil, aplica-sea todas as hipóteses de extinção do pro cesso, sem julgamento domérito (RTJ, 108:1105). Se, no entanto, houve exame do mérito, mas opedido restou a final desatendido, com a decretação daimprocedência da ação, a citação válida tem o condão deinterromper o lapso prescricional (RSTJ, 51:140).176Também se tem entendido que a citação ordenada em processo anuladoé idônea para interromper a prescrição, não tendo a nulidadesido decretada exatamente por vício de ci tação. Assim, decretadaa nulidade do processo, sem ser atingida a citação, houveinterrupção e continua eficaz.A prescrição também interrompe-se pelo "protesto, nascondições do número anterior" (art. 172, inciso 11). Trata-se doprotesto judicial, medida cautelar autorizada pelo art. 867 do Códigode Processo Civil, ainda que ordenado por juiz incompetente. Não seconfunde com o protesto cambiário. Segundo a Súmula 153 do SupremoTribunal Federal, "Simples protesto cambiário não interrompe aprescrição".A terceira modalidade de atos interruptivos da prescrição é a"apresentação do título de crédito em juízo de inventário,ou em concurso de credores". A habilitação do credor eminventário, nos autos da falência ou da insolvência civilconstitui comportamento ativo que demonstra a intenção do titular dodireito em interromper a prescrição.O inciso IV do art. 172 declara, ainda, que a prescrição pode serinterrompida por "qualquer ato judicial que constitua em mora odevedor". Diante da generalização, inclui-se na hipótese todamanifestação ativa do credor, em especial a propositura de medidascautelares, notadamente notificações e interpelações. Apropositura de ação pauliana, necessária para a cobrança eficaz

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do crédito, já foi considerada como hábil para interromper aprescrição.Por último, dispõe o inciso V do art. 172 que a prescriçãointerrompe-se por "qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial,que importe reconhecimento do direito pelo devedor". Esta é a únicahipótese em que a interrupção da prescrição ocorre sem amanifestação volitiva do credor. Incluem-se, nesses atos dereconhecimento da dívida, por exemplo, pagamentos parciais, pedidos deprorrogação do prazo ou de parcelamento, pagamento de juros etc.177Ressalte-se que outras causas de interrupção da prescrição sãoprevistas em leis especiais.A lei não restringe o número de vezes que se pode interromper aprescrição, podendo, assim, ser renovadas as interrupções. Há,entretanto, uma exceção, criada em favor da Fazenda Pública.Dispõe, com efeito, o Decreto-Lei n. 4.597, de 19 de agosto de 1942,art. 3°-, que "a prescrição das dívidas, direitos e ações aque se refere o Decreto n. 20.910, de 6 de janeiro de 1932, somente podeser interrompida uma vez, e recomeça a correr, pela metade do prazo,da data do ato que a interrompeu, ou do último do processo para ainàrromper; consumar-se-á a prescrição no curso da lide sempreque a partir do último ato ou termo da mesma, inclusive da sentençanela proferida, embora passada em julgado, decorrer o prazo-de dois anose meio".Desse modo, a prescrição das ações contra a Fazenda Públicasó pode ser interrompida uma única vez. Como o prazo é de cincoanos (art. 178, § 10), recomeça a correr, pelo prazo de dois anos emeio, da data do ato que a interrompeu (cf. Súmula 383 do STF). E aprescrição intercorrente, isto é, após a citação e no cursoda lide, consuma-se também no prazo de dois anos e meio.A interrupção pode ser promovida: a) pelo próprio titular dodireito em via de prescrição; b) por quem legalmente o represente;c) por terceiro que tenha legítimo interesse. A lei se refere, noúltimo caso, aos herdeiros do prescribente, seus credores e ao fiadordo devedor.Os efeitos da prescrição são pessoais. Em conseqüência, ainterrupção da prescrição feita por um credor não aproveitaaos outros, assim como aquela promovida contra um de vedor nãoprejudica os demais (CC, art. 176). Essa regra, porém, admiteexceção: a interrupção aberta por um dos credores solidários(solidariedade ativa) aproveita aos outros; assim como a interrupçãoefetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus herdeiros(solidariedade passiva, em que cada devedor responde pela dívidainteira). A interrup178ção operada contra um dos herdeiros do devedor solidário nãoprejudica os outros herdeiros ou devedores (o prazo para estescontinuará a correr), a não ser que se trate de obrigações edireitos indivisíveis. Neste caso, todos os herdeiros ou devedoressolidários sofrem os efeitos da interrupção da prescrição,passando a correr contra todos eles o novo prazo prescricional. Jádecidiu o Superior Tribunal de Justiça: "Se o direito em discussãoé indivisível, a interrupção da prescrição por um doscredores a todos aproveita" (RSTJ, 43:298).Por fim, dispõe o § 3°- do art. 176 que a "interrupçãoproduzida contra o principal devedor prejudica o fiador". Como a

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fiança é contrato acessório, e este segue o destino do principal,se a interrupção for promovida apenas contra o principal devedor ouafiançado, o prazo se restabelece também contra o fiador, que fica,assim, prejudicado. O contrário, entretanto, não é verdadeiro: ainterrupção operada contra o fiador não prejudica o devedor, poiso principal não segue o destino do acessório.Com respeito à retroatividade da lei prescricional, prelecionaCâmara Leal: "Estabelecendo a nova lei um prazo mais curto deprescrição, essa começará a correr da data da nova lei, salvo sea prescrição iniciada na vigência da lei antiga viesse acompletar-se em menos tempo, segundo essa lei, que, nesse caso,continuaria a regê-la, relativamente ao prazo" (Prescrição edecadência, 4. ed., Forense, p. 90, n. 67). O Código de Defesa doConsumidor, por exemplo, estabeleceu prazo prescricional de cinco anospara as ações pessoais. Os prazos vintenários do Código Civilque estavam em curso, referentes a relações de consumo,recomeçaram a correr por cinco anos, a contar da data da nova lei, noscasos em que o tempo faltante era superior. Quando a lei nova estabeleceum prazo mais longo de prescrição, a consumação se dará aofinal desse novo prazo, "contando-se, porém, para integrálo, o tempojá decorrido na vigência da lei antiga" (Câmara Leal,Prescrição e decadência, cit., p. 91).179Impressão e acabamento Editora SARAIVA Unidade Gráfica Av. AmâncioGaiolli, 1146 Guarulhos-SP