simone alves de souza (g-unioeste) … · segundo koch e elias (2006, p.10), a atividade de leitura...
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“Balaio de histórias”: a leitura da literatura em foco
Guilherme Medeiros (G-UNIOESTE)
Simone Alves de Souza (G-UNIOESTE)
Dra. Ruth Ceccon Barreiros (Orientadora – UNIOESTE/CASCAVEL)
Resumo: Este trabalho tem como intuito apresentar o projeto “Balaio de histórias”, realizado
no Sesc – Serviço Social do Comércio, unidade de Cascavel – PR. O projeto visa divulgar, por
meio da contação de histórias, a literatura direcionada para crianças e jovens. Para conhecer
melhor o projeto e seus objetivos, foi realizada uma entrevista com a organizadora no Sesc. As
reflexões são relevantes, considerando que a contação de histórias desempenha um papel
importante na formação leitora infantil, além de encorajar e desenvolver o gosto pela leitura
literária. A concepção de leitura como um processo de interação (KOCH e ELIAS, 2006) irá
nortear as discussões sobre o tema. Além disso, as análises foram fundamentadas em autores
que versam sobre leitura, formação leitora e contação de histórias. Dentre eles, Aguiar e
Bordini (1993), Rodrigues (2011).
Palavras-chave: Leitura; Literatura; Formação Leitora; Contação de Histórias.
Abstract: This work intends to present the project "Balaio de histórias", which is carried out
in SESC - Social Service of Commerce, unit of Cascavel - PR. The project aims to present,
through storytelling, the literature aimed at children and young people. For the development of
our reflections, we took the basis of an interview with the project organizer at the SESC,
seeking to know the objectives of this work, considering that storytelling plays an important
role in children's reading instruction, as well as encouraging and developing the I like literary
reading. The conception of guiding reading of our reflections is the reading in a process of
interaction (KOCH and ELIAS, 2006). This research is based on reading, reading and
storytelling. Among them are: Aguiar and Bordini (1993), Rodrigues (2011).
Keywords: Reading; Literature; reader training; storytelling.
1. Introdução
Como o trabalho de Contação de Histórias, realizado pelo Serviço Social do Comércio
- Sesc, unidade de Cascavel - PR., contribui para a formação de leitores? A partir desse
questionamento, este artigo busca compreender a relevância do projeto “Balaio de Histórias”
para a formação leitora na infância, considerando que ao ouvir histórias as crianças
desenvolvem melhor o cognitivo, o emocional, e isso as prepara para a convivência em
sociedade.
A capacidade de comunicação ocorre gradativamente na infância, com a participação
nas conversas cotidianas, em situações que envolvem a fala, o canto, em brincadeiras com o
uso da linguagem, como aquelas ligadas à leitura de textos literários, por ocasião da contação
de histórias, por exemplo. Isso porque está entre as características do texto literário transfigurar
o real, como ocorre com todas as modalidades de arte. Esta exposição, às situações de realidade
recriada, colabora na formação leitora da criança, construindo-lhe o que Paulo Freire (1994)
veio a nominar de conhecimento de mundo, essencial para a leitura do texto escrito. Nessa
perspectiva, é possível despertar o interesse da criança pela leitura dos livros de literatura,
conquistando-a por meio da contação de histórias; contribuindo, dessa forma, com resultados
diferenciados na formação do indivíduo, ampliando o seu repertório para as leituras que serão
feitas no futuro.
Contar e ouvir histórias é uma tradição que existe desde muito tempo em várias culturas
e tribos de todo o mundo. Os povos se utilizam dessa narração oral como modo de divertir,
educar e ensinar para a vida àqueles que a escutam, transmitindo ideias e tradições culturais
pertencentes ao grupo. Essas experiências servirão como um dos pilares para a formação do
intelecto. Na construção do indivíduo, a contação de histórias precede a aprendizagem da
leitura e da escrita, pois a criança antes mesmo de aprender a ler e escrever já consegue
assimilar as informações presentes nas histórias, contadas em voz alta por um narrador. São
sob essa perspectiva as reflexões neste artigo.
É importante destacar que esta pesquisa integra o Projeto de Extensão: Ateliê de
Leituras: poesias e contação de histórias, coordenado pela professora Dra. Ruth Ceccon
Barreiros, do Colegiado de Letras, campus de Cascavel - PR., que conta com a participação de
acadêmicos dos cursos de Letras e de Pedagogia. Esse projeto tem como finalidade contribuir
para o processo de aprendizagem da leitura, por meio da declamação de poemas a da contação
de histórias, despertando leitores e estimulando a imaginação.
Quanto à metodologia de pesquisa para a construção deste artigo, trata-se de uma
pesquisa de natureza bibliográfica, que teve como objetivo reunir informações que serviram de
base para a elaboração das reflexões. Considerando a leitura de textos de pesquisadores que
tratam do tema leitura, leitura da literatura, formação de leitores e contação de histórias. Além
disso, a pesquisa apresenta um aspecto de pesquisa de campo, tendo em conta que foram
coletados dados no Sesc, unidade de Cascavel – PR, com a coordenadora Cultural sobre o
projeto “Balaio de histórias” e também a participação dos pesquisadores, como ouvinte, em
algumas das apresentações realizadas nessa primeira edição e que serão citadas no decorrer do
trabalho.
O texto deste artigo encontra-se organizado da seguinte forma: inicialmente, na seção
dois, serão apresentadas as discussões teóricas, Leitura da Literatura: a magia da contação de
histórias. Em uma terceira seção, intitulada: “Balaio de histórias”: a contação na prática, com
as informações coletadas em conversa com a coordenadora Cultural do Sesc e, por fim, as
considerações finais.
2 Leitura e literatura: a magia da contação de histórias
Nesta pesquisa, a leitura será entendida como um processo de interação entre autor-
texto-leitor e o leitor como um sujeito ativo diante da leitura. Angela Kleiman (1989, p.10)
conceitua a leitura como uma interação autor/leitor mediante o texto. Entretanto, a autora
ressalta que compreender um texto escrito não é apenas um ato cognitivo, pois a leitura é um
ato social, entre dois sujeitos – leitor e autor – que interagem, obedecendo a objetivos e
necessidades socialmente determinados. Para Kleiman (2004, p.13), é mediante a interação de
diversos níveis de conhecimento, como o linguístico, o textual e o de mundo, que o leitor
consegue construir o sentido do texto, uma vez que o leitor se utiliza de diversos níveis de
conhecimentos que interagem entre si, transformando a leitura em um processo interativo.
A leitura, na concepção interacional (dialógica) da língua, os sujeitos são
vistos como atores/construtores sociais, sujeitos ativos que – dialogicamente
– se constroem e são construídos no texto, considerado o próprio lugar da
interação e da constituição dos interlocutores (KOCH e ELIAS, 2006, p.10).
Segundo Koch e Elias (2006, p.10), a atividade de leitura e produção de sentido é
orientada pelo conhecimento de língua e das coisas do mundo, citada como “bagagem
sociocognitiva” do sujeito. Dessa forma, no processo de leitura o texto e o leitor dialogam e,
nesse contexto, o conhecimento de mundo do leitor será sempre relevante para a construção
dos sentidos. E como atividade interativa e produtora de sentidos, a leitura se realiza com base
nos elementos linguísticos e na organização do texto que requer um conjunto de saberes no
interior do evento comunicativo, por parte do leitor nele envolvido.
O texto - especialmente o literário - desperta sentimentos e emoções no momento em
que produz sentido em relação ao conhecimento de mundo do leitor. Assim, ao ouvir histórias
ou ler um texto o cognitivo é acionado para realizar “antecipações e inferências” e, conforme
Koch e Elias (2006), com indagações que geralmente passam pelos seguintes questionamentos:
O que se pode esperar desse texto? Qual será o desfecho? O mocinho se salvará? Quando se
trata da contação de histórias, as inferências e antecipações podem ser acionadas, também, a
partir do figurino e cenário da história. O tom e o foco que o contador fizer uso para narrar
produzirão um sentido para o ouvinte, que espera para descobrir o desenrolar do enredo. O
narrador deve sempre esperar que a criança (ouvinte) desperte o ato de questionar, o que deve
ser encarado como um momento importante da participação e da conclusão que se tem do
desfecho, envolto na atmosfera de emoções que o texto suscitou.
Considerar que o leitor e seus conhecimentos e que esses conhecimentos são
diferentes de um leitor para outro implica aceitar uma pluralidade de leituras
e de sentidos em relação a um mesmo texto. [...] como já afirmamos, o sentido
não está apenas no leitor, nem no texto, mas na interação autor-texto-leitor
(KOCH e ELIAS, 2006, p.20).
Durante toda vida do sujeito, são estabelecidas relações entre o que se conhece e o que
lhe é proposto em determinado momento. A partir dessas novas informações “fazemos
inferências, comparações, formulamos perguntas relacionadas com o seu conteúdo [...]
produzindo sentido para o que lemos. Em outras palavras, agimos estrategicamente, o que nos
permite dirigir e autorregular nosso próprio processo de leitura” (KOCH e ELIAS, 2006, p.20).
A contação de histórias também pode ser utilizada para despertar o gosto pela leitura.
Segundo Abramovich (1995, p. 17), como a literatura infantil prescinde do imaginário das
crianças, sua importância se dá a partir do momento em que elas têm contato oralmente com
as histórias, e não somente quando se tornam leitores. Sendo assim, a literatura torna-se uma
ponte entre histórias e imaginação.
Quando se trata da leitura da literatura, as pesquisadoras Aguiar e Bordini (1993),
asseveram que, qualquer livro colabora para a descoberta dos sentidos, mas os livros literários
fazem isso com muito mais abrangência. Isso porque a linguagem literária abriga
representações dos processos histórico-político-sociais, trazendo para o texto uma visão típica
da existência humana. Segundo Goes, a literatura, como arte, expressa a presença do homem
no mundo e eterniza os seus atos e os seus pensamentos “o ideal da literatura é deleitar, entreter,
instruir e educar as crianças, e melhor ainda quando há as quatro coisas de uma vez” (GOES,
2010, p.37).
Para a pesquisadora, ainda, a função primeira da literatura é a estético-formativa, assim,
tanto para as crianças quanto para os jovens, a beleza da palavra está intimamente ligada à
beleza das imagens. A qualidade de emoção é essencialmente necessária para que haja uma
ligação verdadeira com a criança e com o jovem, pois existem diversas emoções poéticas que
são diretamente acessíveis a todos. Para a autora, “a primeira experiência de crianças com livros
é escutando histórias. Começando a educação para a leitura com histórias lidas em voz alta,
[...] escutando histórias interessantes, o vocabulário da criança aumenta.” (GOES, 2010, p.69).
É possível deduzir que não apenas o vocabulário seja ampliado, quando as crianças e os jovens
ouvem histórias, mas também todo seu aparado de experiências, pois o processo catártico
possibilita a esses leitores viverem histórias, por meio dos seus personagens preferidos.
Na contação de histórias, as diferenças existentes no modo como cada personagem é
construído pelo narrador irá facilitar, à criança ou ao jovem, a compreensão de elementos
relevantes e básicos da conduta humana ou do convívio social. Através deles, a criança e o
jovem, agregam princípios que, desde sempre, reinam na vida humana.
O leitor ouvinte de histórias é levado a se identificar com os personagens e é contagiado
pelo desenrolar da narrativa. Porém, é imprescindível saber a distinção entre o real e o fictício,
pois, segundo Goes (2010), o objetivo deve ser formar um leitor consciente de que o livro
oferece informações, opiniões, conhecimentos, símbolos para serem assimilados e não
verdades inquestionáveis. Assim, este leitor deve ser capaz de refletir sobre o que foi lido,
analisando conceitos e opiniões ali emitidos. Neste sentido, “a dimensão lúdica aberta pela
literatura permite ao receptor, criança, jovem ou adulto, a livre reflexão e posterior ação sobre
a realidade e uma atitude espontânea para entrar e fazer parte do universo criado pela palavra
literária” (GOES, 2010, p.71).
Segundo Silva, quando se trata da formação em leitura, “não existe fórmula mágica [...]
Alguns se formam no seio da família, outros na instituição de educação infantil ou na escola e
outros, ainda, vida afora. Alguns se fazem leitores na infância, outros já adultos ou até mesmo
na velhice” (SILVA, 2015, p.50).
Ainda sobre ler literatura, é preciso considerar que todos têm uma grande necessidade
de fantasiar, imaginar, de criar mundos, e, nesse sentido, a literatura pode ser um espaço
privilegiado para que a criança vivencie a sua forma de ser e estar no mundo, ou seja, brincar,
a partir das histórias que lhe são contadas. Por meio dessas histórias de fantasia é possível
levantar e discutir assuntos relevantes, sem esquecer o lado humano e lúdico da história.
Nessa perspectiva de liberdade, importa colocar o quanto à literatura,
especificamente a literatura para crianças e jovens, concorre para a formação
desse ser em desenvolvimento, pelo fascínio e encantamento de transitar entre
a realidade e a fantasia e, como no jogo, propiciar uma “separação espacial
em relação à vida cotidiana” (GOES, 2010 p.71).
O aspecto apontado pela estudiosa é relevante, considerando-se os dias atuais, em que
não são poucos os motivos para gerar tensões. Muitos fatos políticos e sociais, que não saem
das mídias, acabam por abalar as emoções de crianças, jovens e adultos. Neste contexto, o
contato com a literatura, seja por meio da contação de histórias ou pela leitura direta, possibilita
ao leitor, pelo jogo criado pela leitura literária, afastar-se das tensões e, ao retornar à realidade
do dia a dia, estar mais preparado para enfrentá-las. Nesta perspectiva, a literatura mostra-se
libertadora.
Para Abramovich, “é ela [a arte de contar histórias] que equilibra o que é ouvido com o
que é sentido, e por isso não é nem remotamente declamação ou teatro. Ela é o uso simples e
harmônico da voz” (ABRAMOVICH, 1997, p.18)”. Desse modo, parece pertinente a
observação feita por Yunes (2012), com base na experiência vivenciada por Celso Sisto,
quando apresenta a diferença entre contar histórias e fazer teatro, a partir da experiência dele
como ator e também contador de histórias. Ele aponta que no palco o ator vive o personagem,
enquanto o narrador transmite um relato, sendo o contador um narrador que tem ciência de toda
a história, já o ator mostra no ato o que “vive” e o que se conta. (SISTO, 2001 apud YUNES,
2012).
É possível compreender então, segundo Yunes, que o envolvimento do narrador, na
contação de história é menor do que o envolvimento do ator, quando representa um
determinado papel em uma peça de teatro. Contudo, em ambas as situações, os artistas precisam
dispor de recursos que possam contagiar o público. A arte, de modo geral, e nela estão inclusos
o teatro, a declamação, a contação de histórias etc., tem a capacidade de encantar àqueles que
dela desfrutam, suscitando reflexões tanto pessoais como sociais.
Além disso, a arte de contar histórias se mantém como uma maneira de disseminar
conhecimentos. Na antiguidade, alguns povos se reuniam ao redor da fogueira para contar suas
lendas e contos, disseminando, assim, sua cultura e costumes. Neste contexto inserem-se as
histórias ou feitos heroicos de um povo, que eram contados por meio de poemas épicos,
declamados a população. É a partir dos séculos XVI a XVII que essa modalidade de leitura
passa a ser mais difundida, como aponta Rodrigues:
Nesse contexto, só quem detinha algum poder aquisitivo é quem sabia ler e
escrever, então essas pessoas liam em voz alta para os que não sabiam ler e
assim as histórias iam passando de boca em boca. Pela oralidade, a contação
de histórias foi sendo disseminada por todo o mundo, embora,
especificamente nesse tempo as histórias mais ouvidas eram religiosas
(RODRIGUES, 2011, p. 26 e 27).
A importância da oralidade é ressaltada também por SILVA (2015). Ele relata que, os
povos antigos utilizavam-se da narração oral para transmitir sabedoria às gerações mais novas,
“da boca desses narradores, ou seja, do próprio povo é que os ensinamentos, valores, costumes,
organização social, memória e identidade coletiva eram repassados, armazenados e
transmitidos a seus descendentes” (SILVA, 2015, p.19). Essa forma de transmissão de
conhecimentos ainda se faz presente em populações ágrafas, como muitas tribos indígenas
brasileiras e aldeias africanas.
A contação de histórias, como meio de aquisição de conhecimentos, foi mudando ao
longo do tempo, sobretudo devido à massificação de textos escritos e também do processo de
alfabetização. Entretanto, a arte de contar histórias se mantém presente no cotidiano das
pessoas, ainda nos dias de hoje.
[...] a arte de contar histórias ressurgiu com grande força na
contemporaneidade, dilatando suas fronteiras e horizontes de possibilidades,
ganhando outros espaços como no caso de teatros, bibliotecas, instituições
escolares e obtendo prestigio, principalmente, no que se refere ao processo de
formação do leitor (SILVA, 2015, p.21).
Revestida de modernidade, a contação de história ganha novas configurações e oferece
a oportunidade para o público ouvinte adquirir uma formação leitora, que amplia os
conhecimentos em literatura e cultura. Presente em saraus, apresentações orais, quando os pais
lêem uma história para o filho antes de dormir ou no momento em que a professora de educação
infantil lê em voz alta para a classe, são alguns dos exemplos de contações utilizadas no dia a
dia. A contação de histórias é uma arte de grande importância sociocultural, uma vez que ela é
responsável por preservar a memória de diversos povos, mesmo em uma era tão tecnológica.
Na educação infantil esse recurso é de suma importância para o desenvolvimento leitor e de
escrita da criança. Conforme Rodrigues,
Dentro desse contexto, a contação de histórias é preponderante no processo
de aquisição da leitura pela criança e, consequentemente, da escrita. É através
do “ouvir histórias” que a criança começa a sentir o gosto pela leitura, pelas
letras e passa a querer entender o que ali está escrito (RODRIGUES, 2011,
p.27).
Sendo assim, a contação de histórias adquire um papel chave no processo de
alfabetização e de formação leitora nas escolas. Em outras palavras, dentro do âmbito escolar,
as narrativas podem contribuir para o desenvolvimento da capacidade de produção e
compreensão textual.
No caso da instituição escolar, podemos afirmar que, mesmo com todas as
particularidades que a regem, ela tornou-se uma das principais motivadoras e
disseminadoras dessa arte, sendo os professores os seus principais
fomentadores. Tímidos ou mais expansivos, o fato é que estes docentes
pertencem à nova classe de contadores, ou seja, a dos contadores
contemporâneos (SILVA 2015 p.21).
A escuta de histórias favorece no processo de alfabetização e letramento ao despertar o
interesse da criança, além de ajudar na decodificação e desenvolvimento da linguagem e da
personalidade.
Segundo Rodrigues (2011), é muito importante na educação infantil desenvolver
atividades que incentivem o prazer em ler, para que, assim, as crianças possam ampliar os seus
conhecimentos e compreender o processo de escrita. Neste sentido, a contação de histórias
apresenta-se como um ótimo recurso.
2. “Balaio de histórias”: a contação na prática
Como uma das atividades desenvolvidas no Projeto de Extensão: Ateliê de Leituras:
poesias e contação de histórias, foram realizadas observações no Projeto “Balaio de Histórias”,
promovido pelo Serviço Social do Comércio – Sesc, unidade de Cascavel - PR.,. Esse projeto,
conforme informações da coordenadora do setor Cultural, foi desenvolvido com o intuito de
formar jovens leitores, por meio da contação de histórias.
As atividades do projeto aconteceram entre os meses de fevereiro e junho, de 2017, com
apresentações realizadas, semanalmente, as sextas-feiras, a partir das 19h. Assim, algumas
apresentações foram acompanhadas com o objetivo de observar a dinâmica da aplicação do
Projeto. Após o encerramento desta edição, pode-se conversar com a coordenadora do setor
Cultural, na unidade do Sesc de Cascavel - PR., como forma de conhecer melhor a proposta do
projeto.
De acordo com a coordenadora Cultural, o Projeto “Balaio de Histórias” é realizado em
diversas unidades do Sesc, por todo o Brasil. Em 2017, foi realizada a primeira edição na
unidade de Cascavel - PR. Ela explicou também que sua aplicação se deu “[...] de forma
Sistemática." A contação de histórias era realizada sempre nos mesmos dias e horários, nas
sextas-feiras, às 19h, no espaço de leitura do Sesc, próprio e ambientado, onde o público tem a
disposição sofás, cadeiras e almofadas para que assim pudessem assistir à contação de forma
mais agradável
Imagem 1. Balaio de histórias: O Pequeno Príncipe. Os atores e o contador da história em cena:
Pais e filhos assistem em ambiente propício. Local: SESC- Cascavel, 2017.
Fonte: foto feita pelos autores.
O sucesso de uma contação de história depende muito das pessoas envolvidas e do
espaço escolhido para esse momento. Uma história narrada com o uso da fala e de gestos, de
forma a imitar os personagens - ora sorrindo, ora chorando -, ou expor os sentimentos presentes
nos trechos da obra a ser contada, faz com que os ouvintes entrem nesse mundo de imaginação
e sintam-se atraídos pela leitura.
As apresentações foram destinadas, sobretudo, ao público infantil e juvenil, mas abertas
também a outros interessados, pois o Sesc possui um espaço atraente para todas as idades, com
clima propício para a apresentação das histórias para todos os gostos. O horário das
apresentações foi escolhido de maneira a permitir a participação dos pais e responsáveis pelas
crianças e pelos jovens; destacando, assim, a importância da participação destes no processo
de formação leitora. Essas atividades, bem como tantas outras promovidas pelo Sesc, eram
destinadas, especialmente, aos comerciários, mas livres e abertas ao público em geral, sem
custo. A responsável pelo projeto aponta também que nas próximas edições estão planejadas
apresentações em outros locais como escolas e praças, como forma de democratização e
acessibilidade destes espetáculos.
O projeto contou com um público expressivo: 25 pessoas em média, por apresentação,
com o máximo de 30 espectadores. O impacto alcançado pelo projeto, segundo a coordenadora,
foi positivo, “a principal meta quantitativa, foi superada”. Além disso, ouve um retorno dos
expectadores e o apoio das mídias locais.
Foram temas da apresentação histórias de livros, como: O Pequeno Príncipe (imagem1)
do escritor Antoine de Saint-Exupéry, A vendedora de Fósforos, do autor Hans Christian
Andersen e etc. E lendas indígenas como A Lenda do Pirarucu e também a Lenda de
Macunaíma. Para cada contação de história, havia um figurino diferente e recursos visuais e
sonoros, a exemplo: os chocalhos usados na apresentação das lendas indígenas, ou os envelopes
de cartas usados na apresentação da história do Pequeno Príncipe. Já na história da Vendedora
de Fósforos foi realizado um teatro de sombras.
Quanto à formação leitora, a responsável pelo Projeto aponta a importância dessas
ações, considerando-se que a contação de história é responsável por estimular diversos sentidos
do público, levando-os a adentrar “o mundo da fantasia”, favorecendo assim que a criança e o
jovem aproximem-se dos textos literários, os quais possibilitarão uma formação leitora e cidadã
crítica. Para ressaltar o papel do contador da história, a coordenadora comentou: “A forma que
se conta [a história], às vezes é mais importante do que é contado”. Pensamento compartilhado
pelos autores do artigo, uma vez que o contador da história, como já mencionado na parte
teórica, tem o poder de encantar ou não o público quando a ele se reporta. Ter habilidades para
exercer essa função é condição sine qua non para emocionar e seduzir o público ouvinte.
Considerações finais
A partir dos dados coletados no projeto de contação de histórias, realizadas no Serviço
Social do Comércio - Sesc, foi possível compreender como o trabalho com a contação histórias,
para crianças e jovens, contribui para a formação de leitores mirins. A arte de contar histórias
é uma atividade que incentiva a imaginação e a fantasia, convidando-os a refletir sobre as
próprias vidas ao mesmo tempo em que é capaz de transformar comportamentos.
No processo de ensino da leitura faz-se necessário uma atenção especial para aproximar
a criança do livro literário, respeitando a sua maturidade. Para estimular a criança à leitura basta
uma história interessante e um pouco de criatividade por parte do contador, além de muita
ludicidade para construir algo significativo no imaginário do leitor/ouvinte. Isso auxilia na
aprendizagem e no desenvolvimento das habilidades de leitura e escrita da criança ao longo da
formação.
O Projeto “Balaio de Histórias” integra as diversas programações literárias que
possuem como objetivo a formação de público e consumidores de artefatos artístico-culturais.
Dessa maneira, o relato de experiência objetivou demonstrar a relação entre a teoria e as
práticas de incentivo da leitura e acesso a literatura.
Assim, ressaltamos que a contação de histórias, quando bem trabalhada no ambiente escolar,
ajuda as crianças a aumentar o vocabulário, aprimorar a oralidade, além de ampliar os conhecimentos
para equilibrar melhor as emoções. Ademais, a criança desenvolve a habilidade de ouvir e reconhecer
uma sequência narrativa e com isso aperfeiçoa a escrita, aumentando a possibilidade de produzir
melhores textos. Com a leitura não é diferente, pois a literatura possibilita leitores cada vez mais
consistentes, com mais segurança para trabalhar questões éticas, por conseguinte, tornam-se cidadãos
expressivos, autoconfiantes, sem temer a exposição dos seus pensamentos e opiniões, intensificando os
aspectos autêntico e autônomo do sujeito.
A partir desta pesquisa, da entrevista com a responsável pelo projeto na unidade do
Sesc, de Cascavel – PR., bem como com das peças assistidas, por ocasião das contações de
histórias, foi possível desenvolver reflexões que se mostram fundamentais para o embasamento
das futuras ações do Projeto Ateliê de Leituras: poesias e contação, na Unioeste. Contribuindo,
ainda, de maneira extremamente rica com a formação acadêmica na graduação do Curso de
Letras.
Por fim, vale ressaltar a importância de ações como essa em um país onde o acesso à
literatura e à arte, em geral, ainda é restrito.
Referências
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