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história, histórias. Brasília, vol. 2, n. 4, 2014. ISSN 2318-1729 167 A (DES)CONSTRUÇÃO DE GÊNERO NOS FILMES SHREK CLÁUDIA MAIA Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) RENATA SANTOS MAIA Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes) RESUMO Este artigo compreende um estudo sobre as rupturas e permanências nas representações do feminino e do masculino através da sequência de filmes Shrek. Para tanto utilizamos abordagens dos estudos feministas e de gênero. A metodologia utilizada é a revisão bibliográfica, alguns procedimentos da análise do discurso de vertente francesa (AD), tomando por base as reflexões de Michel Foucault, a produção de sentidos no cotidiano, e a articulação entre historiografia, cinema e gênero. O conceito de representação social utilizado no trabalho parte da perspectiva de Denise Jodelet; e os pressupostos que dão base ao conceito de gênero são os abordados por Teresa de Lauretis. A partir do uso dessas teorias e metodologias compreendemos que o cinema é um poderoso formador de representações sociais e de subjetivação dos gêneros. Percebemos que as fontes escolhidas são recheadas de construções sociais que atuam na constituição dos sujeitos e são importantes instrumentos pedagogizantes. PALAVRAS-CHAVE: gênero; cinema; representações; discurso; produção de sentido. ABSTRACT This article includes a study on the ruptures and continuities in the representations of female and male through a sequence of Shrek films. For this purpose we use the feminist studies and gender. The concept of social representation used in the job part of the prospect of Denise Jodelet; and the assumptions that form the basis for the concept of gender mainstreaming are dealt with by Teresa de Lauretis. From the use of these theories and methodologies we understand that these media are powerful shapers of social representations and subjectivization of foodstuffs. We realized that the sources chosen are stuffed of social constructs that act in the constitution of subjects and are important pedagogical instruments. KEYWORDS: gender; cinema; representations; discourse; meaning production. .

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analise do filme

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  • histria, histrias. Braslia, vol. 2, n. 4, 2014. ISSN 2318-1729

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    A (DES)CONSTRUO DE GNERO NOS FILMES SHREK

    CLUDIA MAIA

    Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes)

    RENATA SANTOS MAIA Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes)

    RESUMO

    Este artigo compreende um estudo sobre as rupturas e permanncias nas representaes do feminino e do masculino atravs da sequncia de filmes Shrek. Para tanto utilizamos abordagens dos estudos feministas e de gnero. A metodologia utilizada a reviso bibliogrfica, alguns procedimentos da anlise do discurso de vertente francesa (AD), tomando por base as reflexes de Michel Foucault, a produo de sentidos no cotidiano, e a articulao entre historiografia, cinema e gnero. O conceito de representao social utilizado no trabalho parte da perspectiva de Denise Jodelet; e os pressupostos que do base ao conceito de gnero so os abordados por Teresa de Lauretis. A partir do uso dessas teorias e metodologias compreendemos que o cinema um poderoso formador de representaes sociais e de subjetivao dos gneros. Percebemos que as fontes escolhidas so recheadas de construes sociais que atuam na constituio dos sujeitos e so importantes instrumentos pedagogizantes. PALAVRAS-CHAVE: gnero; cinema; representaes; discurso; produo de sentido.

    ABSTRACT

    This article includes a study on the ruptures and continuities in the representations of female and male through a sequence of Shrek films. For this purpose we use the feminist studies and gender. The concept of social representation used in the job part of the prospect of Denise Jodelet; and the assumptions that form the basis for the concept of gender mainstreaming are dealt with by Teresa de Lauretis. From the use of these theories and methodologies we understand that these media are powerful shapers of social representations and subjectivization of foodstuffs. We realized that the sources chosen are stuffed of social constructs that act in the constitution of subjects and are important pedagogical instruments. KEYWORDS: gender; cinema; representations; discourse; meaning production. .

  • CLUDIA MAIA RENATA SANTOS MAIA

    A (Des) Construo de Gnero nos Filmes Shrek

    histria, histrias. Braslia, vol. 2, n. 4, 2014. ISSN 2318-1729

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    O cinema cresceu como campo de interesse da historiografia brasileira a partir, principalmente, da dcada de 1990, tornando-se um terreno frtil para problematizar o social dada a sua capacidade de atingir pblicos cada vez maiores e mais diversificados, assim como de articular fatores de ordem econmica, poltica, cultural e esttica. Esse campo cresceu tambm como preocupao dos estudos feministas, pois, conforme assevera Teresa de Lauretis, o cinema consiste numa importante tecnologia de gnero que, ao lado de outras tecnologias sociais e polticas, constitui sujeitos como masculinos e femininos de forma hierrquica e assimtrica. Assim, para essa autora o gnero no uma propriedade de corpos nem algo que existente a priori nos seres humanos, mas o conjunto de efeitos produzidos em corpos, comportamentos e relaes sociais.1 A construo de gnero se efetua na contemporaneidade no mesmo ritmo do passado e de forma mais evidente em espaos como a mdia. Por isso, faz-se necessrio questionar e desconstruir a histria, entender os mecanismos de excluso, de constituio de discursos e os aparatos de construo social e cultural do feminino e do masculino, at para poder romper com essa viso binria. Pois, de acordo com Tnia Navarro-Swain2, preciso conhecer os mecanismos de produo de assujeitamento ao sistema sexo-gnero para operar a sua desconstruo.

    Em consonncia com tal perspectiva, este artigo objetiva discutir as construes de gnero na srie de filmes de animao infantil Shrek, procurando entender as permanncias e rupturas operadas nos personagens desse tipo de cinema, nos sentidos historicamente associados ao feminino e ao masculino. A escolha dessa srie deve-se percepo de uma modificao na elaborao das animaes cinematogrficas, que passaram a inserir em seus roteiros problematizaes da contemporaneidade sobre as questes de gnero.

    O enredo dos filmes aqui estudados baseado em um conto homnimo do livro de William Steig. Neste conto contemporneo, questionam-se os valores antigos dos contos de fadas, como o maniquesmo que associa beleza e bondade em oposio feira e maldade, alm da crtica aos sujeitos da nobreza.

    Outros estudos j se ocuparam dos filmes Shrek. Entre eles podemos destacar a tese de doutorado de Liliane Machado, E a mdia criou a mulher: como a TV e o cinema constroem o sistema de sexo/ gnero, que empreende uma anlise das matrizes discursivas sobre as mulheres a partir das figuras femininas presentes nos filmes e desenhos por ela escolhidos, entre os quais esto Shrek e Shrek 2. O que a abordagem do presente estudo traz de contribuio, em relao aos anteriores, a problematizao que apresenta de outros temas como maternidade, casamento, famlia e valores patriarcais e que, por isso mesmo, fazem parte dos estratos mais profundos, altamente naturalizados na sociedade, cuja ultrapassagem demanda tempo e esforo.

    1 LAURETIS, Teresa de. As tecnologias de gnero. In: HOLLANDA, H. B. Tendncias e impasses: o feminismo como crtica da cultura. Rio de Janeiro: Rocco, 1994, p. 208. 2 NAVARRO-SWAIN, Tania. Identidade pra te quero? Disponvel em: .

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    Na srie de filmes Shrek, so feitas diversas pardias com cenas clssicas de outras produes bastante conhecidas como Matrix, As panteras e Misso Impossvel, alm de inferncias provocativas aos tradicionais contos infantis e a algumas animaes da Disney, como Branca de Neve e os sete anes e A Bela Adormecida. Traz apelos visuais e sonoros alm dos elementos estticos que promovem uma identificao ainda maior dos espectadores com os filmes.

    O primeiro filme da srie, lanado em 2001, conquistou o Oscar de melhor animao; o segundo, em 2004, alcanou um recorde de bilheteria. Em 2007, foi lanado Shrek terceiro, e em 2010 o quarto filme da srie - Shrek para Sempre - foi confirmado como o ltimo da franquia. Mas, alm da saga de Shrek nestes quatro filmes, vrios especiais foram produzidos durante esse tempo como Shrek 3D (2003), Shrek especial de Natal (2007), O susto de Shrek (2010), O natal shrektacular do Burro (2010) e Gato de Botas: a histria de um matador de ogros. Todos derivados do sucesso alcanado pelos primeiros longas-metragens. Cada um destes filmes possuiu diferentes diretores, e essa recorrente troca um exemplo do chamado filme de produtor, onde a figura do diretor no interessa tanto para os estdios3.

    A histria dos filmes constitui-se em um conto de fadas s avessas, Shrek o anti-heri que cativa o pblico por no ter preocupao alguma em ser agradvel; egosta, mal-cheiroso, no tem bons modos (no incio do primeiro filme j aparece soltando peidos e arrotos) e com sua aparncia verde e corpulenta causa repulsa nas demais personagens, fazendo inclusive murcharem as flores e vergarem as rvores por onde passa. At mesmo o motivo que o leva a salvar a princesa gira em torno de interesses prprios: ao ver seu pntano invadido pelos vrios personagens das histrias infantis e perturbado o seu sossego, Shrek vai em busca da princesa Fiona, condio imposta por Lord Farquaad para receber as criaturas mgicas novamente em seu reino, e devolver a quietude aos domnios do ogro.

    Os filmes apresentam ainda personagens singulares como uma Fada-Madrinha ambiciosa; um prncipe pedante, interesseiro e covarde (Farquaad) e outro vaidoso, artificial e extremamente preocupado com a aparncia (Encantado); um Lobo Mau que passa todo o tempo vestido de vovozinha e o Pinquio que gosta de usar roupas ntimas femininas; alm do drago que vigia o castelo, representante de fora e ferocidade, tradicionalmente constituinte do gnero masculino, e na obra trata-se de uma fmea que acaba se apaixonando pelo Burro, companheiro de aventuras de Shrek.

    Outro momento de ruptura com os tradicionais contos infantis e noes de gnero se d no resgate da princesa Fiona, que havia idealizado tal momento como sublime, onde o cavalheiro lhe recitaria um poema pico, a tomaria nos braos e desceria por uma corda at sua bela montaria. Mas Shrek, preocupado em terminar logo sua tarefa, a sacode violentamente para acord-

    3 O primeiro filme foi dirigido por Andrew Adamson e Vicky Jenson. O segundo sofreu o acrscimo de Kelly Asbury e Conrad Vernon. Shrek terceiro foi dirigido por Chris Miller e Raman Hui; e o quarto, Shrek Para Sempre, por Mike Mitchell, com roteiro de Tim Sullivan.

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    la do suposto sono e apenas a coloca sobre os ombros e sai correndo para fugir do drago, sem romantismo.

    A Princesa Fiona, apesar de apresentar, a princpio, um discurso idealizado em relao ao amor e ao cavaleiro que a salvaria, tambm uma mulher bastante prtica e independente, luta contra um grande nmero de homens sozinha, come ratos no espeto e at arrota, deixando Shrek e o Burro perplexos diante da sua postura auto-suficiente, bem diferente das princesas apresentadas nos contos tradicionais, que eram geralmente frgeis, romnticas e dependentes.

    Em Shrek Terceiro feita uma interdiscurso com o movimento feminista, quando as princesas se unem para lutar contra o Prncipe Encantado. Nessa cena, a rainha derruba as paredes da priso usando golpes com a cabea, Cinderela afia seus sapatinhos de cristal (para utiliz-los como arma), e as demais princesas rasgam as mangas e barras dos vestidos, queimam um suti, como forma de protesto, e vo luta para derrubar o usurpador do poder no Reino To To Distante.

    Por ter sofrido vrios desdobramentos, a histria de Shrek e Fiona mostra o que acontece depois do casamento e do felizes para sempre, problematizando as dificuldades do relacionamento e tambm a chegada dos filhos. No filme so abordadas ainda questes como alteridade, a intolerncia ao diferente, necessidade de se enquadrar em padres de beleza e comportamento fixados pela sociedade.

    Tambm so apresentadas, nessa nova configurao das histrias infantis, diferentes identidades de gnero e formas plurais de vivenciar a sexualidade, como o caso das personagens transgneras Dris e Mabel, originalmente as irms feias da Cinderela. Tudo isso pode ser entendido como reflexo das modificaes vividas na contemporaneidade, e que ganham uma visibilidade maior a partir do impacto da mdia e dos novos mecanismos tecnolgicos.

    Ao evocar a memria discursiva e tambm questes relativas ao relacionamento conjugal, que aparecem no terceiro filme e com maior nfase no seguinte (Shrek para sempre), fica claro que eles, embora sejam apresentados como um produto destinado s crianas, falam tambm ao pblico adulto, pois alguns cdigos presentes nas suas mensagens no produzem sentidos ao pblico infantil. Este no absorve a quantidade de informaes que remetem a um conhecimento prvio ou a uma vivncia que ainda no experimentaram.

    No primeiro filme um fato inusitado inverte a lgica esperada pelo pblico. No momento em que Fiona e Shrek se beijam, ao invs de assumir definitivamente a aparncia humana, provvel resultado do beijo do amor verdadeiro, a princesa toma a forma de uma ogra, contraponto com outros contos infantis, como A Bela e a Fera, onde se d o oposto e a Fera se torna humano novamente quando o encanto se quebra; e no filme A pequena Sereia, quando Ariel assume a forma humana para viver seu amor com o Prncipe Eric.

    Esse arranjo final sugere tambm que o relacionamento amoroso s funciona entre iguais. Assim, os pares assimtricos: mulher/fera, sereia/homem e princesa/ogro no so possveis, necessitando que um dos parceiros se

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    transforme para harmonizar a imagem do casal. Por outro lado h a relao entre o Burro e o Drago, que mesmo no pertencendo mesma espcie vivem um relacionamento feliz e harmonioso. Esse contraste faz parte das rupturas e continuidades apresentadas nos filmes.

    Tomamos esses filmes como documentos investidos de relaes de poder, so prticas discursivas que produzem efeitos, sentidos. Seguindo o que Michel Foucault diz, entendemos que o documento deve ser encarado como uma materialidade construda por diversas camadas sedimentadas de interpretaes; no uma matria inerte com a qual se reconstri o passado4.

    E foi com o intuito de analisar as camadas discursivas presentes nos enunciados dos filmes que nos lanamos a essa empreitada. Para tanto, utilizamos como metodologia alguns procedimentos da Anlise do Discurso de vertente francesa que considera o discurso no conjunto das prticas que constituem a sociedade e que no se encerra, mas est em constante fluxo, pois como afirma Eni Orlandi,

    a anlise do discurso no estaciona na interpretao, trabalha seus limites, seus mecanismos, como parte dos processos de significao. Tambm no procura um sentido verdadeiro atravs de uma chave de interpretao. No h essa chave, h mtodo, h construo de um dispositivo terico. No h uma verdade oculta atrs do texto. H gestos de interpretao que a constituem e que o analista com seu dispositivo, deve ser capaz de compreender5.

    O conceito de representao social utilizado neste estudo parte da

    perspectiva de Denise Jodelet que a concebe como fenmenos complexos em constante construo no meio social, [...] uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e partilhada, com um objetivo e concorrendo para a construo de uma realidade comum a um conjunto social6. Jodelet sublinha, ainda, que um dos locais onde possvel perceber essas representaes sociais so os meios de comunicao.

    Ainda com o objetivo de compreender os sentidos produzidos a partir das cenas e dos dilogos estabelecidos nos filmes utilizamos os estudos sobre as prticas discursivas e a produo de sentidos no cotidiano, a partir da compreenso de que o sentido uma construo social, um empreendimento coletivo e interativo7. Em vista dessas concepes, passamos anlise dos personagens masculinos e femininos presentes nos filmes.

    4 FOUCAULT, Michel. A arqueologia do saber. Rio de Janeiro: Forense-Universitria, 1987, p. 7. 5 ORLANDI. Eni. Anlise do discurso: princpios e procedimentos. So Paulo: Pontes, 2002, p. 26. 6 JODELET, Denise. Representaes sociais: um domnio em expanso. In: JODELET, Denise

    (Org.). Representaes Sociais. Rio de Janeiro: Eduerj, 2001, p. 22. 7 SPINK, Mary Jane; MEDRADO, Benedito. Produo de sentido no cotidiano: uma abordagem

    terico-metodolgica para anlise das prticas discursivas. In: SPINK, Mary Jane (org). Prticas

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    Representaes femininas

    Buscando observar as rupturas e permanncias contidas nos filmes Shrek, observamos vrias representaes que remetem a imagens tradicionais de mulheres, como a da maternidade. As personagens femininas mais significativas, com exceo das princesas Disney, so ou se tornam mes no decorrer das sequncias: Fiona, Rainha Llian, Drago e Fada Madrinha. E para cada uma delas so agregados perfis que produzem sentidos ligados a alguns tipos de mes que percebemos nos discursos do cotidiano: a zelosa, a culpada e a superprotetora. Mas, como os filmes buscam romper com os contos tradicionais, tambm temos representaes femininas mais autnomas como a de lder e da guerreira.

    Ao categorizar essas representaes tradicionais e as mais autnomas partimos da explicao dada por Mary Jane Spink e Vera Mincoff Menegon de que tal ao uma prtica social que faz parte da condio humana e por isso

    as ideias com as quais convivemos, as categorias que usamos para express-las e os conceitos que buscamos formalizar so constituintes de domnios diversos (da religio, da arte, da filosofia, da cincia) de grupos que nos so mais prximos (famlia, escola, comunidade, meio profissional etc.) e da mdia em geral8.

    Fiona, personagem feminina de maior destaque, passa por vrias

    transformaes na sua representao dentro dos filmes, e possui uma dupla forma: a humana e a ogra. A princpio, ela nos apresentada como uma donzela em perigo, esperando o seu prncipe salvador. Mas logo percebemos que se trata de uma princesa irreverente, pelo modo de se portar e se expressar quando Shrek chega para salv-la.

    Enquanto o ogro est preocupado em fugir do drago, a princesa se ocupa em tentar encaixar o momento aos moldes dos contos de fadas tradicionais, muito mais para seguir um modelo de princesa e um roteiro convencional, que no condiz com seu esprito altivo, do que por desejar que seja assim. Mas no consegue sustentar esse teatro por muito tempo.

    Fiona: Vs deveis me tomar em vossos braos, pular pela janela e descer por uma corda at a vossa bela montaria. Shrek: Teve muito tempo para planejar isso, no teve? Fiona: Hum, hum! (...)

    discursivas e produo de sentidos no cotidiano. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas sociais, 2013, p. 22. 8 SPINK, Mary Jane; MENEGON, Vera Mincoff. A pesquisa como prtica discursiva: superando os horrores metodolgicos. In: SPINK, Mary Jane (org). Prticas discursivas e produo de sentidos no cotidiano. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas sociais, 2013, p. 42.

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    Fiona: Mas ns devemos viver esse momento. Voc poderia recitar um poema pico para mim, um cancioneiro, um soneto, uma estrofe, qualquer coisa. Shrek: Eu acho que no. Fiona: Bom, pelo menos posso saber qual o nome do meu campeo? Shrek: Ah... Shrek. Fiona (estendendo um leno): Sir, Shrek. Rezo para que aceite este favor como prova de minha gratido. (Ouve-se um rugido) Fiona: Voc no matou o drago? Shrek: T na minha lista. Agora vamos. Fiona: Mas no est certo. Voc devia ter entrado com a espada em uma mo e na outra um estandarte, foi o que todos os outros fizeram. Shrek: , logo antes de ficarem torrados. Fiona: Isso no vem ao caso. Espera, pra onde vamos? A sada pra l. Shrek: Bom, eu quero tirar o meu da reta. Fiona: Mas que tipo de cavalheiro voc? Shrek: Um tipo nico9.

    Esse trecho do dilogo entre Fiona e Shrek faz uma stira aos contos

    tradicionais, mostrando o inconveniente dos formalismos criados para ornamentar o encontro dos protagonistas nessas narrativas. At mesmo o tipo de linguagem utilizada por Fiona, um rebuscamento forado, representa esse escrnio pelos romances convencionais. E apresenta as caractersticas que assinalam Shrek como o anti-heri que age em nome de interesses prprios e no tem preocupao em se destacar com atitudes de bravura, tanto que ele consegue se livrar do drago no por meio do enfrentamento corajoso, mas utilizando de artimanhas e habilidade de raciocnio. tambm uma forma de mostrar que o feminino identificado com o romantismo, enquanto o masculino com a praticidade e a razo.

    Fiona reproduz esses discursos porque foi assujeitada nesse sentido, acreditando tambm que ser ogra era algo ruim, que somente o beijo do amor verdadeiro a libertaria dessa condio e que nada podia fazer alm de esperar por ele. Em seu dirio de adolescente ela registra alguns desses ensinamentos: a mame disse que quando eu tiver idade, um lindo prncipe encantado ir me salvar da torre e me trazer de volta para a minha famlia. E vamos viver felizes para sempre10.

    A esses escritos seguem-se uma ilustrao feita por Fiona onde aparecem ela, um prncipe e trs crianas, e repetidos dizeres de Senhora Fiona Encantado. Em vrios momentos da histria ela reitera esse discurso e tambm o de como deve ser uma princesa:

    9 SHREK, PDI/DREAMWORKS, 2001. 10 SHREK, PDI/DREAMWORKS, 2004.

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    Eu sou uma princesa e no assim que uma princesa deve parecer [se referindo identidade ogra] (...) Olha bem pra mim, Burro. Pensa bem, quem poderia amar um monstro to nojento e feio. Princesa e feira no combinam. (...) Minha nica chance de viver feliz para sempre me casar com meu verdadeiro amor. assim que tem de ser11.

    O trecho em destaque deixa claro que Fiona condiciona sua felicidade ao

    matrimnio e se conforma com esse destino simplesmente porque assim que tem de ser, ela uma princesa, uma mulher, e isso que a vida reserva para o gnero feminino. uma concepo determinista diante da qual ela no v sada.

    Embora a Princesa Fiona tenha apresentado um discurso tradicional e idealizado sobre seu salvador e o momento sublime desse encontro, ela tambm tem seu lado impetuoso, e se mostra em outras ocasies como uma mulher de muita personalidade, que conhece golpes marciais e os utiliza para se defender, assim ela co-participa do seu salvamento. Essas habilidades so testadas no caminho de volta para Duloc, quando Fiona capturada por Robin Hood, que acreditava estar a princesa em perigo. Ento, utilizando tcnicas de luta semelhante s usadas no filme Matrix, Fiona desfere sozinha vrios golpes contra Robin e seus companheiros. Na cena seguinte feito um interdiscurso com a histria da Branca de Neve. Fiona comea a cantarolar e acompanhada de um pssaro, mas, ao entoar uma nota muito aguda, a ave explode e a princesa rouba seus ovos para comer junto com Burro e Shrek.

    emblemtico o fato de que mesmo sabendo lutar, Fiona no tenha tentado se livrar do drago e fugir do castelo. Ao invs disso, ela aguardou, pacientemente, seu salvador aquele que iria livr-la da maldio depois do casamento e do beijo do amor verdadeiro. Mesmo possuindo capacidade intelectual e habilidades fsicas, ela espera que um agente externo masculino traga a soluo para os seus problemas e para que seu destino seja cumprido. Isso acontece devido s representaes de gnero constitudas que atribuem ao homem a posio de sujeito ativo que toma as decises, por oposio passividade feminina.

    Mas sugere tambm, nesse caso, que a priso no apenas a torre, mas o corpo de ogra que ela assume ao cair da noite. O que ela espera livrar-se desse corpo/maldio, e para isso precisa assumir um comportamento de mulher passiva, a espera de um salvador, logo do amor verdadeiro, como se, para as mulheres serem felizes e amadas fosse necessrio um tipo de comportamento baseado na passividade e submisso, e um corpo que obedece ao padro esttico idealizado: magro e belo. Entretanto, o desfecho outro, Fiona vai encontrar a felicidade e o amor verdadeiro com o corpo de ogra e com uma imagem do feminino, comportamento e postura, ligada valentia, destemor e independncia.

    11 SHREK, PDI/DREAMWORKS, 2001. Grifos nossos.

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    O dilema vivido por Fiona ilustra o conflito de vrias mulheres que oscilam entre o que colocado socialmente como meta e ideal de beleza, inclusive por elas mesmas, encarnado na figura de Fiona humana, com sua silhueta delgada e curvilnea, e o pesadelo dos quilos a mais que as atormenta representado pela imagem de Fiona ogra.

    No segundo filme Fiona domesticada, passando a cumprir o papel tradicional de esposa. Toda a impetuosidade apresentada pela princesa no primeiro filme praticamente desaparece neste segundo, e ela assume mesmo a postura e o comportamento que tradicionalmente se espera de uma mulher casada: dcil, um tanto submissa e resignada, ela no mais se impe como no primeiro. Tal comportamento adotado por Fiona prevaleceu durante todo o sculo XIX, atribuindo s mulheres as caractersticas de delicadeza e fragilidade, e esperando-se delas obedincia. A mulher ou era vista como reprodutora ou, ao fugir dessa funo social, prostituta e transgressora da moral.

    Dentro dessa concepo patriarcal, a maternidade no questionada ou vista como uma opo para a mulher, mas algo que faz parte da sua natureza. Da mesma forma acontece com Fiona, por isso chega o seu momento de viv-la. Essa ocasio retratada no filme como uma etapa previsvel na vida da princesa, uma vez que j estava casada. Conforme argumenta Tnia Swain a instituio social do casamento e seu corolrio, a maternidade, aparecem como elementos constitutivos do ser mulher enquanto locus ideal do feminino12.

    Fiona tenta preparar o marido para receber a novidade, j que ele se mostra avesso a essa experincia e chega a se lamentar: eu no posso acreditar que vou ser pai. Como isso foi acontecer?. Shrek deixa a entender que no precisam de filhos, e diz a Fiona para serem racionais e prticos, pois: os bebs s comem, fazem coc e choram, a choram quando fazem coc, e fazem coc quando choram e sendo um beb ogro seria um mega choro e um mega coc. O que inferimos da cena e das falas que a vontade de ter filhos exclusiva da mulher, bem como a necessidade de formar uma famlia.

    Apesar de grvida, Fiona no se mostra frgil, ajudando a salvar o reino e o prprio Shrek das investidas do Prncipe Encantado. Fiona uma personagem paradoxal, pois evoca tanto representaes tradicionais do feminino, quanto da mulher moderna, emancipada e livre em seus movimentos e condutas. Assim, ao mesmo tempo em que refora alguns sentidos tradicionais, rompe com outros como na cena em que aparece se barbeando ao lado de Shrek, assinalando que mulheres e homens podem desenvolver as mesmas atividades sem que isso se constitua em um marcador da identidade sexual e de gnero.

    12 NAVARRO-SWAIN, Tania. A inveno do corpo ou a hora e a vez do nomadismo identitrio. Disponvel em: http://www.tanianavarroswain.com.br/chapitres/bresil/espelho,espelho.htm. Acesso em 18 set. 2012.

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    No quarto filme h uma tentativa de retomar a imagem de Fiona como figura de liderana e independncia. Ela reaparece como uma guerreira que comanda uma legio de ogros, organiza uma revoluo e traa estratgias de combate com o objetivo de tomar o poder no reino e libertar os ogros escravizados. A nova posio que Fiona passou a ocupar como lder de um exrcito de ogros, todos do gnero masculino, indica que ela s pde alcanar tal posto porque no se casou nem teve filhos. No entanto, ela parece infeliz e amargurada mesmo sendo admirada dentro do cl. O fato de ter precisado salvar a si mesma da priso em que vivia a transformou em uma mulher dura e implacvel.

    Algo semelhante acontece com o Drago fmea tambm neste filme, por no ter vivido seu romance com o Burro e nem ter tido filhotes com ele, ela surge como uma fera indomada e perigosa. Isso refora a ideia do matrimnio como um mecanismo disciplinador da conduta feminina.

    As imagens a seguir expressam uma ntida mudana na aparncia da ogra com o objetivo de dar a ela uma identidade no mais de princesa frgil e delicada, mas de imponente guerreira. A imagem da direita, com formato em delta para dar destaque propositalmente Fiona, evidencia algumas alteraes na sua aparncia a fim de represent-la como comandante da tropa: o clssico vestido longo substitudo por um conjunto composto de blusa de couro e uma saia xadrez assimtrica para facilitar os movimentos corporais; as delicadas sapatilhas so trocadas por botas feitas de couro e de cano alto prprias para combates; os cabelos aparecem soltos e ao vento para dar uma impresso de liberdade e de que nos campos de batalha no h tempo para ficar cuidando do penteado, abandonando a tradicional trana usada em todos os filmes anteriores, sendo que na imagem o nico elemento que transmite a impresso de movimento; por fim, um colar com dentes de animais aparece no lugar da delicada gargantilha com pingente em forma de corao, que antes enfeitava o pescoo da princesa.

    Imagem 1: Fiona princesa e Fiona guerreira. Fonte: http://jeniss.blogspot.com.br. Acesso em 23

    de janeiro de 2014.

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    Essa multiplicidade de papis desempenhados por Fiona tem a ver com a

    constituio da mulher contempornea que, mesmo sem ter conseguido se desvincular da maternidade como destino biolgico, tambm no fica mais restrita somente ao espao domstico e quer se ver representada de maneiras diversas.

    A Fada-Madrinha, em Shrek Terceiro, tambm me, caracterstica que no aparece em nenhuma referncia a essa personagem nos contos clssicos ou nas suas adaptaes para o cinema. As fadas so seres comumente reivindicados nas histrias infantis como cheias de boas intenes, mas no filme uma senhora interesseira e um tanto histrica. uma me excessivamente cuidadosa e preocupada, que mima o filho, Prncipe Encantado, projetando para ele um futuro como rei. Para tanto, ela utiliza vrias artimanhas para realizar o destino que havia traado para o filho.

    A etimologia da palavra fada vem de fata13 que em latim significa destino, e precisamente nessa questo que essas criaturas costumam intervir como faz esta personagem nos filmes. Longe de ser a senhora bondosa das histrias convencionais, essa Fada Madrinha uma empresria da magia, possui a sua fbrica de poes e explora seus funcionrios. por meio da chantagem que ela tenta galgar para o filho um lugar de destaque na sociedade. A Fada Madrinha figura aqui como uma das representaes de me que assinalamos anteriormente: a superprotetora que estraga os filhos com o excesso de mimos.

    O drago dos contos de fadas, por sua vez, nos aparece essencialmente como um guardio severo ou como um smbolo do mal e das tendncias demonacas. Ele , na verdade, o guardio de tesouros ocultos, e, como tal, o adversrio que deve ser eliminado para se ter acesso a eles14. Como a proposta dos filmes Shrek parece ser de subverter a lgica dos contos de fadas, o drago que aparece na histria alm de ser uma fmea, possui bons sentimentos e, enquanto guarda a princesa no castelo, espera, ela prpria, por seu grande amor. Percebendo no Burro o seu par romntico, ela quem toma a iniciativa de conquist-lo. O Drago tratado como uma integrante social do grupo de mulheres nos filmes, participa dos momentos de descontrao como o ch de beb de Fiona e das festas de encerramento dos filmes. Da relao entre ela e o Burro, nascem muitos filhotes, o que tambm a constitui como me. ela que fica com eles, enquanto o Burro sai para se aventurar com Shrek. , portanto, uma me zelosa que vive para os filhos e mais uma personagem feminina que se torna esposa e me durante a sequncia dos filmes, e, ao contrrio do burro falador, ela no tem fala.

    13 CHEVALIER, Jean. Dicionrio de smbolos mitos, sonhos, costumes, gestos, figuras, cores e nmeros. Rio de Janeiro: Jos Olympio, 2009, p. 415. 14 Id. Ibidem, p. 349.

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    A Rainha Llian em todos os filmes representada como uma esposa obediente e me carinhosa. Sua maior preocupao com a felicidade da filha e o bem-estar do marido. Ela tenta ser conciliadora quando Fiona apresenta o marido ogro aos pais e no consegue a aceitao da famlia. No entanto, em nenhum momento, mesmo estando a favor da filha, contraria o marido intransigente:

    Rei Harold: Eu no acredito nisso, Llian. Francamente, ele o ogro, no eu. Rainha Llian: Harold, eu acho que voc est levando isso a nvel pessoal. A escolha foi da Fiona Rei Harold: Sim, mas ela deveria ter escolhido o prncipe que escolhemos para ela. Olha, voc espera que eu d a minha bno a essa... essa... coisa? Rainha Llian: A Fiona espera, e ela nunca perdoar se voc no der. Eu no quero perder a nossa filha novamente, Harold. Ora, voc se comporta como se o amor fosse totalmente previsvel. No se lembra de quando ns ramos jovens e oh... costumvamos passear pelo lago com os lrios se abrindo... Rei Harold: Oh, nosso primeiro beijo no a mesma coisa! Acho que voc no percebeu que nossa filha se casou com um monstro! Rainha Llian: Deixe de fazer tanto drama15.

    Llian adota um dos comportamentos que apontamos no incio: a me

    culpada. Ela demonstra em todos os filmes no ter concordado com a deciso de trancar Fiona em uma torre por causa da sua dupla forma humana e ogra. Mas tambm no conseguiu ir contra a deciso do marido e por isso se sente culpada, procurando remediar as situaes de conflito. Pelo dilogo estabelecido entre o casal, percebemos que a tentativa de repreender o marido culmina em uma lembrana de quando eram jovens e apaixonados, desvirtuando o assunto inicial da discusso.

    Percebemos que as representaes femininas apresentadas nesse tipo de produo sofreram sem dvida uma reviso, acrescentando-se a elas elementos como fora, coragem, capacidade de liderar e independncia, caractersticas antes atribudas somente aos personagens do gnero masculino. Por outro lado, as representaes de me e esposa ainda esto muito presentes e se perpetuam no discurso social atravs da repetio at serem consideradas como uma condio natural do feminino como vimos ao longo destes filmes e como acontece em tantas outras mdias. Deste modo,

    o desejo de ter filhos biolgicos continua a compor o quadro de um feminino perfeito, pois as mudanas na ordem social parecem fazer-se de maneira sempre ambgua: as grades de

    15 SHREK, PDI/DREAMWORKS, 2004.

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    interpretao do mundo no se transformam de uma s vez e as representaes sociais de gnero delas so constitutivas16.

    Outro elemento a ser destacado em todos os filmes da srie, a exceo

    do ltimo, que quem sai para se aventurar e explorar lugares e situaes diversas o Shrek, acompanhado de outros personagens masculinos: o Burro e o Gato de Botas. Enquanto isso, Fiona fica no castelo junto com as demais personagens femininas ou com sua famlia, delimitando a tradicional separao entre os espaos pblico, associado ao masculino, e o domstico, associado ao feminino. Somente no ltimo filme da sequncia, em que Fiona no se casou porque Shrek no foi salv-la, que ela ultrapassa os limites do domstico e se torna lder de uma rebelio.

    Conforme sublinham Spink e Medrado: a compreenso das prticas discursivas deve levar em conta tanto as permanncias como, principalmente, as rupturas histricas, pela identificao do velho no novo e vice-versa, o que possibilita a explicitao da dinmica das transformaes histricas e impulsiona sua transformao constante17.

    Compreendemos, assim, que essas representaes no so totalmente

    novas e desvinculadas da tradio. Nesse caso, mesmo produzindo outros sentidos sobre o feminino, antigos so evocados e muitas vezes reforados.

    Representaes masculinas

    Ao contrrio das animaes tradicionais, em que se viam como representaes masculinas apenas o prncipe e, s vezes, o pai da princesa, nas animaes mais recentes, esses personagens se diversificaram. Nas fontes usadas neste artigo, identificamos alguns dos perfis que surgiram mais recentemente.

    Shrek, protagonista e anti-heri da srie que levam seu nome, tem um tipo fsico alegrico: careca, verde, corpulento e se veste como um plebeu, seus gestos so rudes, no possui traquejo social e no segue regras de etiqueta. Para deixar bem claro que este um personagem atpico, seus produtores e diretores j no princpio do filme colocaram-no tomando banho de lama, escovando os dentes com a gosma de uma lagarta, se divertindo

    16 NAVARRO-SWAIN, Tania. A inveno do corpo ou a hora e a vez do nomadismo identitrio. Disponvel em: http://www.tanianavarroswain.com.br/chapitres/bresil/espelho,espelho.htm. Acesso em 18 set. 2012. 17 SPINK, Mary Jane; MEDRADO, Benedito. Produo de sentido no cotidiano: uma abordagem

    terico-metodolgica para anlise das prticas discursivas. In: SPINK, Mary Jane (org). Prticas discursivas e produo de sentidos no cotidiano. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas sociais, 2013, p. 41.

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    espantando os outros seres da floresta e comendo larvas. Ele tenta a todo custo, manter as demais criaturas longe dos seus domnios atravs de avisos espalhados por toda parte dando conta de que ele um ogro terrvel e perigoso.

    Os ogros dos contos populares normalmente so retratados como viles, seres asquerosos e devoradores sedentos de carne humana. Ao colocar um ogro como protagonista, o filme inverteu o papel do heri e do monstro. Para Mirian Ramos, mostrar um personagem marginalizado como protagonista dar voz e valorizar as diferenas, permitir que o outro mostre seu universo ao invs de julg-lo precipitadamente por meio de critrios subjetivistas18.

    Shrek retratado ao longo das sequncias sob diversas representaes, inclusive de marido e pai, o que configura uma novidade nas animaes destinadas ao pblico infantil. Ele prprio se percebe como um ser mltiplo: H mais nos ogros do que se pensa. (...) Os ogros so como as cebolas, possuem camadas19.

    Os filmes alcanaram grande sucesso no somente pelo humor e a fantasia como forma de atrair o pblico, mas porque partem de experincias cotidianas das pessoas, seus medos e desejos. Assim, em diversos momentos, Shrek enfatiza o preconceito que sofre por ser um ogro:

    Burro: Ei, qual o problema, Shrek? O que tem contra todo mundo, afinal? Shrek: No sou eu que tenho problemas, o mundo que parece ter um problema comigo. As pessoas olham pra mim e (dizem) ah, socorro! Corram! Um ogro enorme e horrvel!Ah, elas me julgam antes de me conhecerem. por isso que estou melhor sozinho20.

    Esse enunciado sugere que a aparncia fsica considerada um aspecto

    importante para a aceitao e convvio social, e o indivduo que no se enquadra em um padro esttico aceitvel, encontra dificuldade para viver em sociedade.

    No decorrer da histria contada nos quatro filmes, Shrek vai se tornando mais autoritrio. No ltimo filme, por exemplo, o casal de ogros se desentende porque Shrek no consegue se adaptar rotina e quantidade de afazeres da casa. Os aldees o chamam de bobalho e dizem que ele no mais um ogro de verdade. O sentido produzido de que o casamento e a paternidade o moldaram. Por isso ele diz que quer ser como o antigo ogro, temido e feroz, ou seja, ele quer recuperar sua virilidade perdida para que o mundo volte a fazer sentido:

    18 SANTOS, Miriam Ramos. O diferente e o feminino em Shrek: uma anlise das formaes discursivas. Dissertao (Mestrado em Estudo de Linguagens) Universidade do Estado da Bahia, Salvador, 2009, p. 43. 19 SHREK, PDI/DREAMWORKS, 2001. 20 SHREK, PDI/DREAMWORKS, 2001.

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    Fiona: Eu no acredito nisso. Shrek: Ah, nem me fale. Esse pessoal... Fiona: Eu no estou falando deles. Estou falando de voc. assim que quer se lembrar do primeiro aniversrio dos seus filhos? Shrek: Ah, que timo! Agora a culpa minha. Fiona: ! Mas vamos deixar para discutir isso depois da festa, em casa. Shrek: Voc se refere quela atrao turstica em que a gente mora: olha pra ele, o ogro danarino (imitando um aldeo). No tenham medo, ele no morde. Eu j fui um ogro. Agora eu sou uma piada esverdeada. Fiona: T bem. Talvez voc no seja o ogro que costumava ser, mas isso no to ruim assim. Shrek: Voc no poderia entender. Voc nem ogra de verdade, passou metade da vida num palcio. Fiona: E a outra metade trancada numa torre. Shrek: Olha, eu s quero que as coisas voltem a ser como eram antigamente. Quando os aldees tinham medo de mim e eu podia tomar meu banho de lama em paz. Quando eu fazia o que eu bem entendia na hora em que eu queria. Quando o mundo fazia sentido. Fiona: Quer dizer antes de voc me resgatar da torre do drago? Shrek: isso a! (Grifos nossos)21.

    Os trechos em destaque indicam que Shrek quer se ver livre das tarefas

    domsticas porque isso o faz ser motivo de piada diante das pessoas, principalmente de outros homens. Ningum tem medo de um ogro que cuida de crianas e da casa, pois isso visto como um servio feminino. E para ter resgatada a sua masculinidade ele precisa voltar a ser o antigo ogro: solteiro e sem obrigaes, para fazer tudo o que quiser, na hora em que quiser. Na tica de Shrek, o mundo s faz sentido se ele puder impor suas vontades: se ela acha que eu vou voltar rastejando para pedir desculpas, pode tirar o cavalinho da chuva. Ela no manda em mim. Eu sou um ogro, e eu no vou pedir desculpas por agir como um22, ou seja, ele um macho e como tal tem o direito de falar o que quiser, mesmo que isso possa ferir os sentimentos da esposa. Shrek utiliza-se, portanto, de um discurso machista recorrente no imaginrio social que constri a ideia de que agir com grosseria natural. Por isso, entendemos que

    um enunciado no surge, magicamente, do nada. Ele constitui uma unidade do ato de comunicao, um dos elos de uma corrente de outros enunciados, complexamente organizados. Em outras palavras, ao produzir um enunciado, o falante utiliza

    21 SHREK, PDI/DREAMWORKS. 22 SHREK, PDI/DREAMWORKS, 2010.

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    um sistema de linguagem e de enunciaes preexistente, posicionando-se em relao a ele23.

    Alm desse perfil masculino autoritrio ainda muito presente nos dias

    atuais, a sociedade contempornea viu surgir tambm novos fenmenos comportamentais, e o metrossexual um deles. A metrossexualidade designa um tipo de comportamento que surgiu no final dos anos 1990 para designar homens demasiadamente vaidosos. De acordo com Lisiane Ethur, metrossexual resultado da unio das palavras Metropolitano e Sexual, constituindo uma gria que identifica um homem urbano excessivamente preocupado com sua aparncia e extremamente atento s tendncias da moda e dos novos produtos masculinos lanados no mercado24. Essas caractersticas revelam a ruptura com alguns esteretipos associados masculinidade e a insero de um trao sintonizado com as novas relaes estabelecidas entre homens e mulheres.

    Em Shrek 2, um personagem com essas caractersticas apresentado ao pblico: o Prncipe Encantado, um tipo bastante peculiar que, atrasado no intento de salvar a princesa, vai em busca de Fiona no quarto mais alto da torre mais alta depois de ter, supostamente, enfrentado uma srie de intempries como ventos terrveis e um deserto escaldante, mas s encontra o lobo mau vestido de vovozinha, na cama da princesa, lendo o livro dos trs porquinhos.

    Encantado foge, assim como os outros personagens masculinos presentes nos filmes, do modelo convencional de prncipe, ele declaradamente metrossexual, usa uma rede por baixo do capacete para manter os cabelos alinhados, usa gloss, desodorante bucal, polainas cor de rosa, faz as sobrancelhas, e sua me, a Fada Madrinha, quem ainda penteia seus cabelos, preocupaes e cuidados que no so comuns em personagens masculinos convencionais. um personagem caracterstico da ps-modernidade, na definio de Stuart Hall (2006), pois mostra-se mltiplo e no se pode atribuir a ele uma identidade fixa, essencial e unificada. Alm do que evidencia uma mudana no comportamento assumido pelos homens no mundo contemporneo, que esto cada vez mais preocupados em cuidar da aparncia.

    Por se tratar de um produto miditico que preza pela ironia, tambm percebemos que Encantado muitas vezes ridicularizado por apresentar tais comportamentos e hbitos que tradicionalmente eram considerados preocupaes estritamente femininas, como na cena final do segundo filme em que Shrek lhe diz: Gostei muito dessa tua malha (se referindo roupa usada pelo prncipe), onde comprou tinha para homem tambm?

    23 SPINK, Mary Jane; MEDRADO, Benedito. Produo de sentido no cotidiano: uma abordagem

    terico-metodolgica para anlise das prticas discursivas. In: SPINK, Mary Jane (org). Prticas discursivas e produo de sentidos no cotidiano. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas sociais, 2013, p. 28. 24 ETHUR, Lisiane. Metrossexualidade. Disponvel em: . Acesso em 3

    jun. 2013.

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    A sua caracterizao representa uma desconstruo da figura do prncipe dos contos de fadas literrios e do cinema, como um homem virtuoso e cheio de boas intenes. Encantado se posiciona como um antagonista nos filmes e todas as suas atitudes convergem para a busca de poder, prestgio e conforto. Ele oscila durante os filmes entre um garoto mimado pela me e um quase vilo, mas seus planos sempre do errado. narcisista e se auto-elogia todo o tempo. Em uma apresentao teatral, por exemplo, ele descreve a si prprio cantando: eu sou capaz, sou forte sem igual, viril, veloz, cabelo angelical25.

    Encantado utiliza adjetivos que na vida cotidiana so associados identidade masculina e feminina, o que mais uma vez o coloca como um personagem multifacetado. E ele desperta o interesse tanto da transgnera Dris como da princesa Rapunzel.

    O Burro tem a funo de personagem articulador da trama. Alm de ser bastante pitoresco por desenvolver longos monlogos irritando a todos com seu falatrio, d grandes lies sobre carter, amizade e respeito retomando uma das funes primordiais das fbulas que a transmisso de ensinamentos:

    Burro: Sabe, com voc sempre eu, eu, eu. Pois adivinhe, agora a minha vez. Ento cala a sua boca e presta ateno. Voc mau comigo, me insulta, no liga para nada do que eu fao. Est sempre me empurrando pra l, empurrando pra c. Shrek: Ah, ? Se eu te tratei to mal, por que que voltou pra c? Burro: Porque o que faz um amigo, ele perdoa o outro26.

    A relao entre o Burro e o Drago Fmea muito peculiar, ainda mais

    porque o drago no possui fala e demonstra seus sentimentos apenas por meio dos gestos. E h, a, tambm, uma subverso dos papis tradicionais, pois ela quem assedia o Burro:

    Outro personagem masculino que chama a ateno Lorde Farquaad. uma pessoa egocntrica com uma ideia fixa em possuir um reino perfeito, e por isso promove uma limpeza social para excluir de suas terras todas as criaturas mgicas. Ele tem tambm uma obsesso em ser rei e, para tanto, pretende se casar com alguma princesa, qualquer uma, a fim de adquirir o ttulo. Assim, a sua opo por Fiona como esposa acontece de forma aleatria. A escolha da princesa ocorre por meio de um espelho mgico, cuja voz e performance se parecem com as de um apresentador de programas televisivos, e quem apresenta trs opes de esposas ao Lorde: Cinderela, Branca de Neve e Fiona e suas respectivas habilidades, hobbies e caractersticas fsicas.

    Observamos no filme que os personagens masculinos com ttulos de nobreza: Lorde Farquaad, Prncipe Encantado e Rei Harold so representados como pessoas mesquinhas e sem escrpulos. O mesmo acontece com Rumpestilschen quando se torna rei de To To Distante. Essa construo alm

    25 SHREK, PDI/DREAMWORKS. 2007. 26 SHREK, PDI/DREAMWORKS, 2001.

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    de ser uma forma de crtica aos que representam cargos de poder, acaba funcionando tambm como uma maneira de desautorizar os centros.

    Notamos ainda que esses personagens costumam buscar o relacionamento com as mulheres como forma de legitimar seu poder ou posio social. Assim temos que Farquaad quer se casar com Fiona pelo nico motivo de se tornar rei; Prncipe Encantado deseja o mesmo, mas como no possui o seu prprio reino pretende herdar o trono do pai de Fiona. E Harold, que na verdade um sapo transformado em humano por uma negociata com a Fada Madrinha, conseguiu seu ttulo de nobreza aps se casar com a rainha Llian. Nesse sentido, o feminino se configura como objeto legitimador do poder masculino.

    possvel perceber que todos esses personagens masculinos desconstroem a representao idealizada que tradicionalmente foi difundida nos contos de fadas e tambm nas animaes cinematogrficas. Com exceo de Shrek, eles no so fortes, no tm interesse em salvar o reino e tampouco a mocinha. Este modelo de masculinidade contrape-se ao que predominou at o final do sculo XX, reforado inclusive pela difuso no cinema de imagens de homens dotados de uma fora descomunal ou poderes sobrehumanos como do Super-Homem, Rambo, Robocop e os vrios Exterminadores do Futuro, como salienta Eliane Teixeira Lopes27, e tambm pelas histrias encantadas da Disney, onde o prncipe-heri sempre aparece para ajudar a mocinha em apuros.

    na contramo dessa lgica que os personagens masculinos nos filmes Shrek so construdos, criticando as masculinidades e as representaes que tradicionalmente se fizeram dela. Assim, Shrek, que representa os marginais, no se molda aos padres de beleza e comportamento estabelecidos para um prncipe, constantemente mostra suas fragilidades, e no aceita se submeter s normas de boas maneiras da realeza, prefere seu pntano e despreza a forma de viver e agir da nobreza, com essa postura ele desqualifica o centro. O Prncipe Encantado aparece em uma verso metrossexual e no se pode atribuir a ele uma identidade sexual fixa; O Lobo Mau no sustenta sua imagem viril e ameaadora, mas se veste de vovozinha em todos os filmes da saga; e o Burro faz o tipo sensvel e sentimental. Com isso, o sujeito universal masculino descentrado, destruindo o referente e trazendo os que estavam s margens para o interior do discurso.

    Essa multiplicidade de representaes masculinas e a desconstruo do prncipe como dotado de uma nica identidade que falava em nome de todos os homens, aponta para o descentramento do sujeito moderno. E para isso, como ressalta Stuart Hall28, o movimento feminista teve grande contribuio, ao questionar o privado e o pblico, abrindo novas arenas da vida social que envolviam a sexualidade, a famlia, a diviso das tarefas domsticas e o cuidado com os filhos.

    27 LOPES, Eliane Teixeira. Prefcio V ao cinema! In: TEIXEIRA, Ins Assuno de Castro; LOPES, Jos de Sousa Miguel (orgs). A mulher vai ao cinema. Belo Horizonte: Autntica, 2008. 28 HALL, Stuart. A identidade cultural na ps-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A editora, 2006.

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    Assim, aquilo que comeou como um movimento dirigido contestao da posio social das mulheres expandiu-se para incluir a formao das identidades sexuais e de gnero29. O movimento tambm enfatizou, como uma questo poltica e social, o tema da forma como somos formados e produzidos como sujeitos generificados. Isto , ele politizou a subjetividade, a identidade e o processo de identificao (como homens/mulheres, mes/pais, filhos/filhas)30.

    Consideraes finais

    Quando traamos o percurso dos estudos feministas ao longo da histria tomamos conhecimento de como o gnero construdo e reconstrudo constantemente e atravs das mais variadas tecnologias. Dessa percepo surgiu o questionamento sobre as imagens transmitidas pelo cinema destinado s crianas e os discursos de subjetivao contidos nele, por isso os estudos de gnero e os escritos feministas foram imprescindveis como aportes terico-metodolgicos na pesquisa das nossas fontes.

    Foi possvel observar que os filmes, ao construrem as representaes masculinas e femininas contemporneas, se preocuparam em mostrar as contradies, dilemas e fraquezas dos personagens, e isso os aproximou mais dos seres humanos reais no tocante aos sentimentos e atitudes, com defeitos e qualidades. A diversificao nas representaes e nos comportamentos adotados por personagens femininos e masculinos fez com que uma gama maior de espectadores pudesse se identificar, e isso pode ser entendido tambm como uma estratgia da lgica de mercado que busca atingir pblicos cada vez maiores em diversos pases.

    Porm, vimos tambm que quando os homens so associados a caractersticas consideradas femininas como delicadeza e vaidade, e a servios pretensamente desempenhados por mulheres como cuidar dos filhos e dos servios domsticos, isso considerado algo pejorativo que interfere na sua masculinidade e na imagem diante de outros homens.

    Nosso objetivo, neste artigo, foi elucidar como essas tecnologias to difundidas e acessveis para variados pblicos se constituem em poderosos difusores e construtores de sentidos sobre os gneros no nosso cotidiano e instrumentos de pedagogizao, que podem ser utilizados tanto para reforar como para desconstruir os essencialismos e esteretipos baseados no sexo biolgico.

    Os feminismos atuam em uma luta constante. claro que existem retrocessos e obstculos dirios, e para super-los os estudos de gnero esto a postos problematizando e denunciando os mecanismos de submisso que se reinventam e atuam de forma sutil tentando aplacar as conquistas alcanadas

    29 Id. Ibidem, p. 45-46. 30 Id. Ibidem, p. 45.

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    pelas mulheres. Mas avanos tambm so perceptveis. E, no tocante ao cinema de animao, notamos que cada vez mais surgem personagens que desconstroem os essencialismos e rtulos atribudos social e biologicamente.

    Sobre as autoras Cludia Maia doutora em Histria. Professora da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Bolsista BIPDT/Fapemig. Renata Santos Maia mestre em Histria Social pela Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes). Professora de Ensino mdio. Artigo recebido em 23 de setembro de 2014. Aprovado em 19 de novembro de 2014.