sempe goscinny - o pequeno nicolau

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Conto infantil francês

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Semp/Goscinny

O PEQUENO NICOLAU

As divertidas aventuras do Pequeno Nicolau, um menino igual a muitos outros, so narradas com humor perspicaz por Goscinny, o inesquecvel autor do Asterix, e ilustradas pelo genial Semp. Em cinco ttulos, situaes como a visita do inspetor escola, os recreios tumultuados, as frias na praia, a chegada do irmozinho, a visita da vov so contadas com graa e sensibilidade. As travessuras do Nicolau e suas observaes hilariantes sobre os colegas, os pais, os professores e as situaes do cotidiano tm cativado crianas e adultos do mundo todo.

Obras da srie

O Pequeno Nicolau

As frias do Pequeno Nicolau

Novas aventuras do Pequeno Nicolau

O Pequeno Nicolau e seus colegas

o Pequeno Nicolau no recreio

Semp/Goscinny

O Pequeno Nicolau

Martins Fontes - So Paulo 2000

Ttulo original: LE PET1T NICOLAS.

Copyright Denol, Paris, 1960.

Traduo - LUS LORENZO RIVERA

Reviso da traduo - Monica Stahel

Reviso grfica - Andra Stahel M. da Silva - Clia Regina Camargo

Produo grfica - Geraldo Alves

Paginao Moacir Katsumi Matsusaki

Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Semp, Jean Jacques, 1932-

O Pequeno Nicolau / Semp, Goscinny ; [traduo Luis Lorenzo Rivera]. - 5- ed. - So Paulo : Martins Fontes, 1997. - (As Aventuras do Pequeno Nicolau)

Ttulo original: Le Petit Nicolas.

ISBN 85-336-0822-5

1. Literatura infanto-juvenil I. Goscinny, Ren. II. Ttulo. III. Srie.

97-5702 CDD-028.5

ndices para catlogo sistemtico:

1. Literatura infantil 028.5

2. Literatura infanto-juvenil 028.5

Todos os direitos desta edio reservados Livraria Martins Fontes Editora Ltda.

01325-000 So Paulo SP Brasil

http:llwww.martinsfontes.com

ndice

Uma lembrana para guardar com carinho 7

Os caubis 11

O Sopa 17

O futebol 22

A visita do inspetor 27

Rex 32

Djodjo 37

O lindo buqu 42

Os boletins 47

Luisinha 51

O ensaio para a visita do ministro 56

Eu fumo 60

O Pequeno Polegar 65

A bicicleta 69

Estou doente 74

Foi muito divertido 79

Fui visitar o Agnaldo 84

O sr. Bordenave no gosta de sol 89

Fugi de casa 94

Para Henri Amouroux, padrinho deste Nicolau

Uma lembrana para guardar com carinho

Hoje de manh todo o mundo chegou muito contente na escola, porque ns vamos tirar uma fotografia da classe, que vai ficar de lembrana para a gente guardar por toda a vida, como a professora disse. Ela tambm disse para todo o mundo vir bem limpo e penteado. Eu entrei no ptio do recreio cheio de brilhantina na cabea. Todos os meus amigos j estavam l e a professora estava brigando com o Godofredo, que veio vestido de marciano. O Godofredo tem um pai muito rico, que compra todos os brinquedos que ele quer. O Godofredo estava dizendo para a professora que ele queria de todo jeito ser fotografado de marciano e que, seno, ele ia embora.

O fotgrafo tambm j estava l com a mquina, e a professora disse para ele andar logo, porque seno a gente ia perder a aula de matemtica. O Agnaldo, que o primeiro da classe e o queridinho da professora, disse que seria uma pena no ter aula de matemtica, porque ele gosta muito e tinha feito todos os problemas. O Eudes, um colega muito forte, queria dar um soco no nariz do Agnaldo, mas o Agnaldo usa culos e a gente no pode bater nele tanto quanto gostaria. A professora comeou a gritar que ns ramos insuportveis, que se continuasse assim no ia ter mais fotografia e que ia todo o mundo para a classe. A o fotgrafo disse: "Vamos, vamos, calma, calma. Deixe que eu sei como se fala com criana, vai dar tudo certo."

O fotgrafo resolveu que a gente tinha que ficar em trs filas; a primeira fila sentada no cho e a segunda, em p em volta da professora, que ia ficar sentada numa cadeira, e a terceira, em p em cima de uns caixotes. Esse fotgrafo tem boas idias mesmo.

Fomos buscar os caixotes que estavam no poro da escola. Foi muito divertido, porque no havia muita luz no poro e o Rufino enfiou um saco velho na cabea e ficou gritando: "UUU! Eu sou o fantasma." E a a gente viu a professora chegar. Ela no parecia muito contente, ento samos depressa com os caixotes. O nico que ficou foi o Rufino. Com aquele saco ele no via o que estava acontecendo e continuava gritando: "UUU! Eu sou o fantasma", e foi a professora que tirou o saco da cabea dele. O Rufino levou um baita susto. Quando chegou de novo ao ptio, a professora largou a orelha dele, bateu com a mo na testa e disse: "Mas vocs esto imundos." Era verdade, a gente tinha se sujado um pouco fazendo palhaadas no poro. A professora estava zangada, mas a o fotgrafo disse que no fazia mal, que dava tempo de a gente se lavar enquanto ele arrumava os caixotes e a cadeira para a foto. O nico que estava com a cara limpa era o Agnaldo, e fora ele tambm o Godofredo, porque ele estava com a cabea dentro do capacete de marciano, que parecia um aqurio. O Godofredo disse para a professora: "Est vendo s, professora, se todos tivessem vindo vestidos como eu, no tinha acontecido nada disso." Eu vi que a professora estava com muita vontade de puxar as orelhas do Godofredo, mas no tinha jeito de segurar no aqurio. Essa roupa de marciano um arranjo incrvel!

Depois que todo o mundo se lavou e se penteou, ns voltamos. A gente estava um pouquinho molhado, mas o fotgrafo disse que no fazia mal, que no aparecia na fotografia.

O fotgrafo disse: "Bom, vocs querem deixar a professora contente?" Respondemos que sim, porque gostamos muito da nossa professora, ela boazinha demais quando a gente no deixa ela furiosa. A o fotgrafo disse: "Ento, vocs vo tomar os seus lugares para a foto, bem comportados. Os maiores em cima dos caixotes, os mdios em p, os pequenos sentados."

Ns fomos, e o fotgrafo comeou a explicar para a professora que com pacincia a gente consegue tudo das crianas, mas a professora no pde escutar at o fim o que ele estava dizendo. Ela teve que nos separar porque todo o mundo queria ficar em cima dos caixotes.

"Aqui s tem um grande, sou eu!", o Eudes gritava, e empurrava os que queriam subir nos caixotes. O Godofredo ficou insistindo e o Eudes deu um soco no aqurio dele e se machucou muito. Foi preciso juntar vrios meninos para arrancar o aqurio do Godofredo, que ficou entalado.

A professora disse que ia dar o ltimo aviso e que depois ia ser a aula de matemtica, ento achamos que era melhor ficarmos quietos e comeamos a ir para os lugares. Godofredo chegou perto do fotgrafo: "Que mquina essa sua?", ele perguntou. O fotgrafo sorriu e disse: " uma caixa de onde vai sair um passarinho, mocinho. bem velhinho esse negcio a, o Godofredo respondeu, o meu pai me deu uma com pra-sol, grande angular, teleobjetiva e, claro, os filtros..." O fotgrafo pareceu surpreso, parou de rir e disse para o Godofredo voltar para o lugar dele. O Godofredo perguntou: "O senhor no tem nem fotmetro? - Pela ltima vez, volta para o teu lugar!", gritou o fotgrafo, que, de repente, ficou muito nervoso.

A gente se instalou. Eu estava no cho, ao lado do Alceu. O Alceu um amigo meu que muito gordo e que come o tempo todo. Ele ia dar uma mordida num po com gelia quando o fotgrafo disse para ele parar de comer, mas o Alceu respondeu que precisava se alimentar. "Larga esse po!", gritou a professora, que estava sentada bem atrs do Alceu. Ele levou um susto to grande, que deixou o po com gelia cair na camisa. "Olha a o que aconteceu", disse o Alceu, que tentava raspar a gelia com o po. A professora disse que a nica coisa a fazer era colocar o Alceu na ltima fila pra ningum ver a mancha na camisa dele. A professora disse: "Eudes, d o lugar para o seu amigo. Ele no meu amigo, o Eudes respondeu, ele tem que ficar de costas para a fotografia para ningum ver a mancha nem a cara gorda dele." A professora ficou zangada e passou para o Eudes, de castigo, a conjugao do verbo "Eu no devo me recusar a ceder o lugar para um amigo que derrubou po com gelia na camisa." Eudes no disse nada, desceu do caixote e veio para a primeira fila, enquanto o Alceu ia para a ltima. Isso deu um pouco de confuso, principalmente quando o Eudes cruzou com o Alceu e lhe deu um soco no nariz. O Alceu quis dar um pontap no Eudes, mas o Eudes muito rpido e se desviou, e quem levou o chute foi o Agnaldo, mas felizmente num lugar onde ele no tem culos. Mesmo assim o Agnaldo comeou a chorar e gritar que ele no estava enxergando mais nada, que ningum gostava dele e que ele queria morrer. A professora consolou o Agnaldo, fez ele assoar o nariz, penteou ele de novo e passou um castigo para o Alceu, que vai ter que escrever cem vezes: "No devo bater num colega que no procura briga comigo e que usa culos. Bem feito", disse o Agnaldo. A a professora passou um castigo para ele tambm. O Agnaldo ficou to espantado que nem chorou. A professora comeou a distribuir castigos por todo lado, todos ns tnhamos uma poro de linhas para escrever e, afinal, a professora disse: "Agora, vamos ver se vocs resolvem ficar quietos. Se ficarem bonzinhos, eu tiro todos os castigos. Agora vocs vo fazer uma pose, dar um belo sorriso e o moo vai tirar uma linda foto da gente!" Como ningum queria deixar a professora triste, ns obedecemos. Todo o mundo sorriu e fez pose.

Mas a lembrana que a gente ia guardar por toda a vida no deu certo, porque o fotgrafo no estava mais l. Ele tinha ido embora sem dizer nada.

No alto, da esquerda para a direita: Martins (que se mexeu), Paulo, Dubed, Cossino, Rufino,

Adalberto, Eudes, Champinhac, Lefvre, Toussaint, Charlier, Sarigaut.

No meio: Paulo Bojojof, Tiago Bojojof, Marcos, Lafontan, Lebrun, Dubos, Delmont,

de Fontagns, Martineau, Godofredo, Mespoulet, Falot, Lafageon.

Sentados: Rignon, Guyot, Anbal, Croustsef, Bergs, a professora, Agnaldo, Nicolau, Faribol,

Grosini, Gonzales, Pichenet, Alceu e Mouchevin (que acaba de ser expulso).

Os caubis

Convidei os meus amigos para brincar de caubi hoje de tarde na minha casa. Eles chegaram com todas as coisas deles. O Rufino estava com todo o equipamento de policial que ganhou do pai dele, com o quepe, as algemas, o revlver, o cassetete branco, o apito de bolinha e tudo; o Eudes estava com o chapu de escoteiro do irmo mais velho dele e um cinturo com um monte de balas de madeira e duas cartucheiras com dois revlveres incrveis, que tinham cabo feito do mesmo tipo de osso que o estojo de p-de-arroz que o papai comprou pra mame depois que eles brigaram por causa da carne assada que estava muito assada mas que a mame dizia que era porque o papai tinha chegado muito tarde. O Alceu estava vestido de ndio; tinha um machado de pau e penas na cabea e estava parecendo um frango enorme. O Godofredo, que adora se fantasiar e que tem um pai muito rico que d tudo o que ele quer, estava inteirinho vestido de caubi, com uma cala de pele de carneiro, um colete de couro, uma camisa xadrez, um chapu grande, revlveres com espoleta e esporas bem pontudas. Eu estava com uma mscara preta que ganhei no carnaval, minha espingarda de dardos e um leno vermelho no pescoo, que era um cachecol velho da mame. A gente estava superlegal!

A gente estava no jardim e a mame tinha avisado que ia chamar para o lanche. "Bom, ento pronto, eu disse, eu sou o mocinho e tenho um cavalo branco e vocs todos so os bandidos, mas no fim quem ganha sou eu." Os outros no concordaram. Isso que chato, quando a gente brinca sozinho no to divertido, e quando a gente no est sozinho os outros ficam arrumando muita encrenca. "E por que que eu no posso ser o mocinho, o Eudes falou, e por que que eu no tenho um cavalo branco tambm? Com essa cara voc no pode ser o mocinho nunca", o Alceu falou. "E voc, seu ndio, cala a boca, seno te dou um chute no rabo", disse o Eudes, que muito forte e que gosta muito de dar socos no nariz dos colegas, e fiquei espantado com aquele negcio do chute no rabo, mas verdade que o Alceu estava parecendo mesmo um frango. "Em todo caso eu vou ser o xerife", disse o Rufino. "O xerife?, disse o Godofredo. Voc engraado, onde que j se viu um xerife de quepe?" O Rufino, que tem o pai que trabalha na polcia, no gostou nada de ouvir isso. "O meu pai usa quepe, ele disse, e ningum acha ele engraado! Se ele se vestisse desse jeito no Texas todo o mundo ia cair na gargalhada", disse o Godofredo, e o Rufino deu um tapa nele, e a o Godofredo tirou um revlver da cartucheira e disse: "Voc se arrepender disso, Joe!", e o Rufino lhe deu outro tapa e o Godofredo caiu sentado no cho fazendo pam! com o revlver dele; ento o Rufino apoiou as mos na barriga e fez uma poro de caretas e caiu dizendo assim: "Voc me acertou, coiote, mas eu serei vingado!"

Eu sa galopando pelo jardim dando umas batidas na minha cala para andar mais depressa, e o Eudes chegou perto de mim. "Desce desse cavalo, ele disse, quem tem o cavalo branco sou eu! No senhor, eu disse para ele, estou na minha casa, e quem tem o cavalo branco sou eu", e o Eudes me deu um soco no nariz. O Rufino apitou forte com o apito de bolinha. "Voc um ladro de cavalos, ele disse para o Eudes, e em Kansas City ns enforcamos os ladres de cavalos!" A o Alceu veio correndo e disse: "Espera a! Voc no pode prender ele, eu que sou o xerife! - Desde quando, galinceo?", perguntou o Rufino. O Alceu no gosta de briga, mas mesmo assim ele pegou o machado de pau e toe! bateu com o cabo na cabea do Rufino, que no estava esperando. Ainda bem que tinha o quepe na cabea do Rufino! "Meu quepe! Voc amassou o meu quepe", o Rufino gritou e saiu correndo atrs do Alceu, e eu comecei a galopar de novo em volta do jardim.

"Ei pessoal, parem! Tive uma idia, o Eudes falou. Ns vamos ser os bonzinhos e o Alceu vai ser a tribo de ndios, e ele tenta capturar a gente e depois ele pega um prisioneiro, a a gente chega e liberta o prisioneiro e a o Alceu vencido!" Todo o mundo estava a favor dessa idia que era legal mesmo, mas o Alceu no concordou. "E por que eu que vou ser o ndio?", o Alceu perguntou. "Porque voc tem penas na cabea, idiota!, respondeu o Godofredo, e se no gostou no brinca mais, isso a, porque voc t enchendo a gente! Ento, j que assim, eu no brinco mais", o Alceu falou e foi para um canto ficar emburrado e comer um pozinho com chocolate que ele tinha no bolso. "Ele tem que brincar, disse o Eudes, o nico ndio que a gente tem, e se ele no brincar eu depeno ele!" Ento o Alceu disse que tudo bem, que ele brincava, mas s se ele fosse um ndio bom. "Est bem, disse o Godofredo, mas voc tem que ser sempre do contra, hem! - E quem vai ser o prisioneiro?", eu perguntei. "U, vai ser o Godofredo, o Eudes disse, vamos prender ele na rvore com a corda de pendurar roupa. O que que h, ficou louco, ?, perguntou o Godofredo, por que eu? Eu no posso ser o prisioneiro porque sou o mais bem vestido de todos. - E da, o Eudes respondeu, no s porque eu tenho um cavalo branco que eu no vou brincar. - Quem tem o cavalo branco sou eu!", eu disse. O Eudes ficou bravo e disse que quem tinha o cavalo branco era ele e que se eu no estivesse gostando ele me dava outro soco no nariz. "Tenta", eu disse, e ele conseguiu. "No se mexa, Oklahoma Kid!", o Godofredo gritava e dava tiros pra todo lado; o Rufino apitava com o apito de bolinha e gritava: " isso a, eu sou o xerife, isso a, eu prendo vocs todos!", e o Alceu deu uma machadada no quepe dele dizendo que ele agora era seu prisioneiro e o Rufino ficou bravo porque o apito de bolinha caiu no gramado; eu chorava e dizia para o Eudes que eu estava na minha casa e que nunca mais queria ver ele: todo o mundo gritava, estava legal, a gente estava se divertindo pra valer, incrvel!

E a o papai saiu de dentro de casa. Ele no estava com uma cara muito contente. "Como , crianada, que gritaria essa, vocs no sabem brincar sem gritar? por causa do Godofredo, ele no quer ser o prisioneiro!", o Eudes falou. "Quer que eu te mande a mo na cara?", perguntou o Godofredo, e eles comearam a brigar de novo, mas o papai separou a briga. "Vamos, meninos, ele disse, vou mostrar para vocs como que se brinca. Eu que vou ser o prisioneiro." Ns ficamos muito contentes. Como o meu pai legal! A gente amarrou o papai na rvore com a corda de pendurar roupa e, mal a gente tinha acabado, vimos o sr. Durzio pular por cima da cerca do jardim.

O sr. Durzio o nosso vizinho que gosta de aborrecer o papai. "Eu tambm quero brincar, eu vou ser o pele-vermelha Touro-em-p! Sai daqui, Durzio, ningum te chamou!" O sr. Durzio estava fantstico, ele ficou na frente do papai com os braos cruzados e disse: "Que cara-plida segure sua lngua!" Papai fazia uma fora incrvel para se soltar da rvore e o sr. Durzio comeou a danar em volta da rvore dando gritos. Bem que a gente gostaria de continuar vendo o papai e o sr. Durzio se divertindo e fazendo palhaadas, mas no deu, porque a mame chamou para o lanche e depois ns fomos para o meu quarto brincar com o trem eltrico. Eu que no sabia que o papai gostava tanto de brincar de caubi. Quando a gente desceu, de noite, j fazia tempo que o sr. Durzio tinha ido embora, mas o papai ainda estava amarrado na rvore gritando e fazendo caretas.

legal saber brincar assim, sozinho!

O Sopa

Hoje a professora faltou. A gente estava em fila no ptio para entrar na classe quando o inspetor de alunos disse: "A professora de vocs est doente hoje."

Depois o sr. Dubom, que o inspetor de alunos, levou a gente para a classe. Ns chamamos o inspetor de Sopa, quando ele no est perto, claro. A gente chama ele assim porque ele diz o tempo todo: "Olhe bem nos meus olhos", e na sopa tem olhos. Eu tambm no tinha entendido logo, os grandes que me explicaram. O Sopa tem um bigode enorme, e ele sempre d castigo, com ele no d pra brincar. por isso que ns ficamos chateados quando ele veio tomar conta da gente, mas, por sorte, quando ele chegou na classe j foi logo dizendo: "Eu no posso ficar com vocs, tenho que trabalhar com o diretor, por isso, olhem bem nos meus olhos e prometam que ficaro bem comportados." Todo o nosso monto de olhos olhou nos dele e prometemos. Alis, a gente sempre se comporta bem.

Mas o Sopa estava com uma cara desconfiada, ento ele perguntou quem era o melhor aluno da classe. "Sou eu!", disse o Agnaldo, todo orgulhoso. E verdade, Agnaldo o primeiro da classe, tambm o queridinho da professora, e a gente no gosta muito dele, mas a gente no pode bater nele tanto quanto gostaria por causa dos culos. "Bom, disse o Sopa, ento voc vai vir aqui, vai se sentar no lugar da professora e vai tomar conta dos seus colegas. Eu voltarei de vez em quando para ver como vo as coisas. Recordem as suas lies." Agnaldo foi todo contente se sentar na cadeira da professora e o Sopa foi embora.

"Muito bem, disse o Agnaldo, ns devamos ter matemtica; peguem os cadernos, vamos fazer um problema. Voc est ficando louco, ?", perguntou o Clotrio. "Clotrio, cale-se!", gritou o Agnaldo com jeito de quem estava achando mesmo que era a professora. "Vem dizer isso pra mim aqui, se voc for homem", o Clotrio falou e a porta se abriu e a gente viu o Sopa entrar todo contente. "Ah, ele disse. Eu tinha ficado atrs da porta para escutar. Voc, a atrs, olhe bem nos meus olhos!" Clotrio olhou, mas parece que no gostou muito do que viu. "Voc vai me conjugar o verbo: eu no devo ser grosseiro com um colega que est encarregado de tomar conta de mim e que quer que eu faa problemas de matemtica." Depois de dizer isso o Sopa saiu, mas prometeu que voltaria.

Joaquim se ofereceu para vigiar o inspetor na porta, e ns concordamos, menos o Agnaldo que gritava: "Joaquim, para o seu lugar!" Joaquim mostrou a lngua para o Agnaldo, sentou na frente da porta e ficou olhando pelo buraco da fechadura. "No tem ningum, Joaquim?", perguntou o Clotrio. O Joaquim respondeu que ele no estava vendo nada. A o Clotrio se levantou e disse que ia fazer o Agnaldo comer o livro de matemtica dele, o que era uma idia engraada mesmo, mas o Agnaldo no gostou e gritou: "No! Eu uso culos! Voc vai comer os culos tambm!", disse o Clotrio, que queria de todo jeito que o Agnaldo comesse alguma coisa. Mas o Godofredo disse que no valia a pena a gente perder tempo com besteira, e que seria melhor a gente jogar bola. "Mas e os problemas?", perguntou o Agnaldo, que no parecia muito contente, mas ningum ligou, e comeamos a passar a bola, e superlegal jogar entre as carteiras. Quando eu for grande vou comprar uma classe para mim, s para jogar dentro dela. E a ouvimos um grito e vimos o Joaquim sentado no cho, segurando o nariz com as mos. Era o Sopa que tinha acabado de abrir a porta e o Joaquim no deve ter visto ele chegar. "O que que voc tem?", o Sopa perguntou muito espantado, mas o Joaquim no respondeu, ele s fazia uiui uiui, e ento o Sopa pegou ele no colo e o levou para fora. Ns pegamos a bola e voltamos para os nossos lugares.

Quando o Sopa voltou com o Joaquim, que estava com o nariz todo inchado, ele disse que estava comeando a ficar cheio e que se aquilo continuasse a gente ia ver s uma coisa. "Por que vocs no seguem o exemplo do colega de vocs, o Agnaldo?, ele perguntou, ele bem comportado." E o Sopa foi embora. Ns perguntamos para o Joaquim o que tinha acontecido com ele e ele disse que tinha pegado no sono de tanto olhar pelo buraco da fechadura.

"Um feirante vai a feira, disse o Agnaldo, levando numa cesta vinte e oito ovos a 10 francos*" a dzia... - Eu machuquei o nariz por tua culpa", disse o Joaquim. "Isso mesmo!, disse o Clotrio, a gente vai fazer ele comer o livro de matemtica dele, com o feirante, os ovos e os culos!" A o Agnaldo comeou a chorar. Ele disse que ns ramos maus e que ele ia contar para os pais dele e que eles iam fazer todos ns sermos expulsos, e o Sopa abriu a porta. Todo o mundo estava sentado no lugar e ningum dizia nada e o Sopa olhou para o Agnaldo que estava chorando sozinho sentado na cadeira da professora. "Como , o Sopa disse, agora voc que est aprontando? Vocs vo me deixar louco. Cada vez que volto aqui outro que est bancando o palhao! Olhem bem nos meus olhos, todos vocs! Se eu voltar aqui mais uma vez e perceber alguma coisa de anormal, vou dar castigo", e ele foi embora de novo. A ns achamos que era melhor parar de fazer palhaada porque quando o Sopa fica bravo ele d castigos terrveis.

* Moeda francesa.

Ningum se mexia, a gente s ouvia o Agnaldo fungando e o Alceu mastigando. O Alceu um colega que come o tempo todo. A ento a gente ouviu um barulhinho na porta. A gente viu a maaneta girar bem devagarinho e a a porta foi abrindo aos pouquinhos e rangendo. Todo o mundo ficou olhando sem respirar muito, at o Alceu parou de mastigar. E de repente teve um que gritou: " o Sopa!" A porta abriu e o Sopa entrou todo vermelho. "Quem disse isso?", ele perguntou. "Foi o Nicolau!", disse o Agnaldo. " mentira, seu mentiroso nojento!", e era verdade que era mentira, quem disse aquilo foi o Rufino. "Foi voc! Foi voc! Foi voc!", o Agnaldo gritou e comeou a chorar. "Voc vai ficar de castigo depois da aula", o Sopa disse pra mim. A eu comecei a chorar, eu disse que no era justo e que eu ia sair da escola e que todo o mundo ia sentir falta de mim. "No foi ele, p'ssor, foi o Agnaldo que disse o Sopa!", o Rufino gritou. "No fui eu que disse o Sopa", gritou o Agnaldo. "Voc disse o Sopa, eu escutei voc dizer Sopa, escutei muito bem: o Sopa! - Bem, chega, disse o Sopa, vocs todos vo ficar de castigo! Por que eu?, perguntou o Alceu. Eu no disse o Sopa, ora! Eu no quero mais ouvir esse apelido ridculo, entenderam?", gritou o Sopa, que parecia estar nervoso pra chuchu. "Eu no vou ficar de castigo!", o Agnaldo gritou e comeou a rolar no cho, chorando e soluando, e ficou todo vermelho e depois todo azul. Na classe quase todo o mundo estava gritando ou chorando e eu pensei que o Sopa tambm fosse fazer a mesma coisa, quando o diretor entrou. "O que est acontecendo So... senhor Dubom?", o diretor perguntou. "Eu j no sei mais, senhor diretor, respondeu o Sopa, um rola no cho, outro sangra pelo nariz quando eu abro a porta, o resto urra, nunca vi coisa igual! Nunca!", e o Sopa passava a mo nos cabelos e o bigode dele se mexia para todos os lados.

No dia seguinte a professora voltou, mas o Sopa faltou.

O futebol

Alceu combinou para hoje a tarde um encontro com uma poro de colegas da classe no terreno baldio que fica perto de casa. O Alceu meu amigo, ele gordo, gosta muito de comer, e ele marcou encontro com a gente porque o pai dele deu uma bola de futebol novinha pra ele e a gente ia fazer um jogo incrvel. O Alceu legal.

A gente se encontrou no terreno s trs horas da tarde, ns ramos dezoito. Primeiro tivemos que decidir como formar os times para ficar o mesmo nmero de jogadores de cada lado.

Escolher o juiz foi fcil. Ns escolhemos o Agnaldo. O Agnaldo o primeiro da classe, a gente no gosta muito dele, mas como ele usa culos a gente no pode bater nele, e isso para um juiz at que d certo. E tambm nenhum time queria saber do Agnaldo, porque ele no muito bom em esportes e chora toa. Discusso teve mesmo quando o Agnaldo pediu para a gente dar um apito pra ele. O nico que tinha apito era o Rufino, que tem o pai que da polcia.

"Eu no posso emprestar o meu apito de bolinha pra ele, o Rufino disse, lembrana de famlia." Ningum podia fazer nada. No fim a gente decidiu que o Agnaldo avisava e o Rufino apitava no lugar do Agnaldo.

"Como ? A gente vai jogar ou no? Eu j estou ficando com fome!", gritou o Alceu.

Mas o que complicou foi que, se o Agnaldo era o juiz, ento ns ramos s dezessete jogadores e na hora de dividir sobrava um. Mas a ns descobrimos um jeito: um ia ser juiz de linha e ia agitar uma bandeirinha cada vez que a bola sasse do campo. O escolhido foi o Maximiliano. Um bandeirinha s no chega para vigiar o campo todo, mas o Maximiliano corre muito depressa, ele tem as pernas muito compridas e magras com joelhos gordos e sujos. O Maximiliano no queria nem saber, ele queria jogar bola, isso sim, e alm disso ele falou que no tinha bandeira. Mesmo assim ele aceitou ser o bandeirinha no primeiro tempo. Em vez de bandeira ele ia agitar o leno dele, que no estava muito limpo; mas claro que, quando ele saiu de casa, no sabia que o leno dele ia servir de bandeirinha.

"Bom, vamos l?", gritou o Alceu.

Depois ficou mais fcil, ns ramos s dezesseis jogadores.

Precisava um capito para cada equipe. S que todo o mundo queria ser capito. Todo o mundo menos o Alceu, que queria ser goleiro, porque ele no gosta de correr. A gente concordou, o Alceu bom goleiro; ele muito largo e cobre bem o gol. Mesmo assim ainda eram quinze capites, e por isso iam sobrar muitos.

"Eu sou o mais forte, o Eudes gritava, o capito tem que ser eu e vou dar um soco no nariz de quem no concordar! O capito sou eu, eu sou o mais bem vestido!", gritou o Godofredo, e o Eudes deu um soco no nariz dele.

O Godofredo estava bem vestido mesmo; o pai dele, que muito rico, tinha comprado um uniforme completo de jogador de futebol pra ele, com uma camisa vermelha, branca e azul.*

*Cores da bandeira francesa.

A o Rufino gritou: "Se eu no for o capito vou chamar o meu pai e ele prende todo o mundo!"

Eu tive a idia de tirar a sorte com uma moeda. Com duas moedas, porque a primeira caiu na grama e nunca mais ningum achou. O Joaquim que tinha emprestado a moeda e ele no gostou nada de ter perdido ela e ficou procurando a moeda mesmo depois que o Godofredo prometeu que o pai dele ia mandar um cheque para reembolsar o Joaquim. Afinal os dois capites foram escolhidos: o Godofredo e eu.

"Escuta, eu no estou querendo chegar atrasado para o jantar, o Alceu gritou. Vamos jogar?"

Depois a gente teve que formar os times. No deu problema com ningum, s com o Eudes. O Godofredo e eu, ns dois queramos o Eudes, porque quando ele corre com a bola ningum segura. Ele no joga muito bem, mas d medo. O Joaquim estava muito contente porque tinha achado a moeda, ento ns pedimos ela emprestada para sortear o Eudes, e perdemos a moeda de novo. O Joaquim comeou a procurar de novo, louco da vida, e o Godofredo ganhou o Eudes no par ou mpar. O Godofredo escalou o Eudes de goleiro, ele achou que ningum ia ter coragem de chegar perto da trave e muito menos de enfiar a bola dentro. O Eudes fica zangado a toa. O Alceu estava comendo bolachas, sentado entre as pedras que marcavam o gol dele. Ele no parecia nada contente. "Como , vai comear ou no?", ele gritava.

Tomamos posio no campo. Como eram s sete de cada lado, sem contar os goleiros, no foi nada fcil. Nos dois times comeou a sair discusso. Uma poro de gente queria ser centroavante. O Joaquim queria ser zagueiro esquerdo, mas era porque a moeda dele tinha cado naquele lugar do campo e ele queria continuar procurando enquanto jogava.

No time do Godofredo tudo se organizou logo porque o Eudes deu um monto de socos e os jogadores foram para o lugar sem reclamar, esfregando o nariz. que o Eudes bate com fora!

No meu time, ningum chegava a um acordo at que o Eudes disse que ia vir dar uns socos nos nossos narizes tambm: a a gente se colocou.

O Agnaldo disse para o Rufino: "Apita!", e o Rufino, que jogava no meu time, apitou a sada. Godofredo no gostou. Ele disse: "Espertinho, hem! Ns estamos jogando contra o sol! No sei por que o meu time tem que jogar no lado ruim do campo!"

Eu disse pra ele que se ele no gostava do sol que fechasse os olhos e que era capaz at que ele jogasse melhor assim. A ns brigamos. Rufino comeou a soprar no apito de bolinha.

"Eu no dei ordem para apitar, gritou o Agnaldo, eu que sou o juiz!" O Rufino no gostou e disse que ele no precisava de permisso do Agnaldo para apitar, que ele ia apitar quando quisesse e que s faltava essa. E ele comeou a apitar que nem um doido. "Voc mau, isso que voc !", gritou o Agnaldo, e comeou a chorar.

"Ei gente!", disse o Alceu l do gol dele.

Mas ningum escutava ele. Eu continuava a brigar com o Godofredo, tinha rasgado a linda camisa vermelha, branca e azul dele, e ele dizia: "Ha, ha, ha! No faz mal! Meu pai vai comprar uma poro de camisas novas pra mim!" E ele me dava pontaps nas canelas. O Rufino corria atrs do Agnaldo que gritava: "Eu uso culos! Eu uso culos!" O Joaquim no ligava pra ningum, ele estava procurando a moeda dele, mas no tinha achado nada. O Eudes, que tinha ficado quieto no gol, ficou cheio e comeou a distribuir socos nos narizes que estavam mais perto dele, quer dizer, nos do time dele. Todo o mundo gritava e corria. Estava divertido mesmo, estava legal!

"Parem!", gritou o Alceu de novo.

Ento o Eudes ficou bravo. "Voc estava com tanta pressa de jogar, ele disse para o Alceu, ento estamos jogando. Se quiser dizer alguma coisa, espera o intervalo!"

"O intervalo do qu?, perguntou o Alceu. Acabei de me lembrar que a gente no tem bola, eu esqueci a bola em casa!"

A visita do inspetor

A professora entrou na classe muito nervosa. "O inspetor est na escola, ela disse, tenho certeza de que vocs vo se comportar e dar uma boa impresso." Ns prometemos que amos ficar bem comportados; alis, a professora no devia se preocupar, a gente quase sempre se comporta bem. " um inspetor novo, disse a professora, o antigo j estava acostumado com vocs, mas se aposentou..." E depois a professora fez uma poro de recomendaes, proibiu a gente de falar sem ser interrogado, de rir sem a permisso dela, pediu pra ningum deixar cair as bolinhas de gude, como na ltima vez que o inspetor veio e que ele caiu no cho, pediu para o Alceu parar de comer quando o inspetor estivesse l e disse para o Clotrio, que o ltimo da classe, para no chamar muito a ateno. s vezes eu fico pensando que a professora pensa que a gente bobo. Mas, como a gente gosta muito dela, todo o mundo prometeu para a professora tudo o que ela queria. A professora ficou olhando pra ver se ns todos e a sala estvamos limpos, e ela disse que a sala estava mais limpa do que alguns de ns. Ento ela pediu para o Agnaldo, que o primeiro da classe e o queridinho, para ele pr tinta nos tinteiros, para o caso de o inspetor resolver fazer um ditado. Agnaldo pegou o vidro de tinta e quando ia comear a colocar a tinta nos tinteiros da primeira carteira, onde sentam o Cirilo e o Joaquim, algum gritou: "Olha o inspetor!" Agnaldo ficou com tanto medo, que derrubou tinta na carteira inteira. Era brincadeira, o inspetor no estava l e a professora ficou brava. "Eu vi voc, Clotrio, ela disse. Foi voc o autor dessa brincadeira estpida. De castigo no canto!" Clotrio comeou a chorar, ele disse que se ele fosse pro castigo ia chamar a ateno e o inspetor ia fazer um monto de perguntas, e ele no sabia nada e ia chorar, e que no tinha sido brincadeira, que ele tinha visto mesmo o inspetor passar no ptio junto com o diretor, e como era verdade a professora disse: "Ento est bem, desta vez passa." O que no estava bem que a primeira carteira estava toda suja de tinta, e ento a professora disse que a gente tinha que pr a carteira na ltima fileira, pra ningum ver. Comeamos a trabalhar, e era muito engraado, a gente tinha que mudar todas as carteiras, e estava todo o mundo se divertindo muito, e a o inspetor entrou com o diretor.

Ningum precisou se levantar porque todo o mundo estava em p, e todo o mundo estava com cara de surpresa. "Estes so os pequenos, eles... eles so um pouco turbulentos", disse o diretor. "Estou vendo, disse o inspetor, sentem-se meninos." Ns todos sentamos e, como a gente tinha virado a carteira do Cirilo e do Joaquim para levar l pra trs, eles sentaram de costas para o quadro-negro. O inspetor olhou para a professora e perguntou se aqueles dois meninos ficavam sempre sentados daquele jeito. A professora ento fez a cara do Clotrio quando interrogado, mas ela no chorou. "Um pequeno acidente...", ela disse. O inspetor no parecia muito contente, ele estava com as grandes sobrancelhas bem perto dos olhos. "E preciso ter um pouco de autoridade, ele disse. Vamos, meus meninos, ponham esta carteira no lugar." Todo o mundo se levantou e o inspetor comeou a gritar: "Todos ao mesmo tempo no; s vocs dois!" O Cirilo e o Joaquim viraram a carteira e se sentaram. O inspetor deu um sorriso e apoiou as mos dele na carteira. "Muito bem, ele falou, o que vocs estavam fazendo, antes de eu chegar? - A gente estava mudando a carteira de lugar", respondeu o Cirilo. "No se fala mais dessa carteira!, gritou o inspetor, que estava com cara de muito nervoso. E, em primeiro lugar, por que vocs estavam mudando a carteira de lugar? - Por causa da tinta", disse o Joaquim. "A tinta?", perguntou o inspetor e olhou para as mos dele que estavam totalmente azuis. O inspetor deu um suspiro muito grande e limpou os dedos com um leno.

A ns vimos que o inspetor, a professora e o diretor no estavam achando graa nenhuma. Ns resolvemos ficar muito bem comportados mesmo.

"Estou vendo que a senhora tem problemas com a disciplina, o inspetor disse para a professora, preciso usar um pouco de psicologia elementar", e depois ele se virou para ns com um grande sorriso e afastou as sobrancelhas dos olhos. "Meus meninos, eu quero ser amigo de vocs. No precisam ter medo de mim, sei que vocs gostam de se divertir, e eu tambm, eu gosto muito de rir. Alis, ouam, vocs conhecem a histria dos dois surdos? Um surdo diz para o outro: voc vai pescar? e o outro diz: no, eu vou pescar. Ento o primeiro diz: ah, bom, eu pensei que voc fosse pescar." Foi uma pena a professora ter proibido a gente de rir sem a permisso dela, porque foi superdifcil segurar o riso. Hoje a noite vou contar pro papai essa histria e ele vai rir muito, tenho certeza de que essa ele no conhece. O inspetor, que no precisava da permisso de ningum, riu muito, mas como ele viu que ningum na classe dizia nada, ps de novo as sobrancelhas no lugar, tossiu e disse: "Bom, chega de rir, ao trabalho. - Ns estvamos estudando as fbulas, disse a professora, O Corvo e a Raposa. timo, disse o inspetor, pois bem, continuem." A professora fez de conta que estava procurando algum ao acaso e depois apontou para o Agnaldo: "Voc, Agnaldo, recite a fbula para ns." Mas o inspetor levantou a mo. "A senhora permite?", ele disse para a professora, e depois apontou para o Clotrio. "Voc a no fundo, recite-me essa fbula." Clotrio abriu a boca e comeou a chorar. "Mas o que que ele tem?", perguntou o inspetor. A professora disse que era preciso desculpar o Clotrio, que ele era muito tmido, ento foi o Rufino que foi interrogado. Rufino um colega, e o pai dele da polcia. Rufino disse que ele no sabia a fbula de cor mas que ele sabia mais ou menos do que se tratava e comeou a explicar que era a histria de um corvo que tinha um queijo roquefort no bico. "Um roquefort?", perguntou o inspetor, que parecia cada vez mais espantado. "Ah, no, disse o Alceu, era um camembert. Nada disso, disse o Rufino, o corvo no ia poder segurar um camembert no bico porque o camembert escorre e alm disso tem cheiro ruim! Tem cheiro ruim, mas bom para comer, respondeu o Alceu. E, depois, isso no quer dizer nada, sabonete cheira bem, mas muito ruim pra comer, uma vez eu experimentei. Bah! disse o Rufino, voc uma besta e eu vou dizer pro meu pai dar uma poro de multas pro teu pai!" E eles comearam a bater um no outro.

Todo o mundo estava de p e gritava, menos o Clotrio que continuava chorando no canto dele, e o Agnaldo que tinha ido l para a frente e estava recitando O Corvo e a Raposa. A professora, o inspetor e o diretor gritavam: "Chega!" Foi tudo muito divertido.

Quando tudo acabou e todo o mundo se sentou, o inspetor tirou o leno e enxugou o rosto, passou tinta pela cara toda e pena a gente no poder rir porque vamos ter que segurar at a hora do recreio e no vai ser fcil.

O inspetor chegou perto da professora e apertou a mo dela. "A senhora tem toda a minha simpatia, professora. Nunca percebi to bem como hoje o quanto a nossa profisso um sacerdcio. Continue! Parabns!" E ele foi embora, muito depressa, com o diretor.

A gente gosta muito mesmo da nossa professora, mas ela foi muito injusta. Foi por nossa causa que ela recebeu os parabns, e ela ps todo o mundo de castigo!

Rex

Na sada da escola eu segui um cachorrinho. O cachorrinho parecia perdido, ele estava to sozinho que eu fiquei morrendo de pena dele. Eu achei que ele ia ficar contente de encontrar um amigo e no foi fcil alcanar ele. Como o cachorrinho no parecia estar com muita vontade de vir comigo, porque ele devia estar desconfiado, ofereci para ele metade do meu po-de-mel; o cachorrinho comeu o po-de-mel e comeou a abanar o rabo em todas as direes, e a eu chamei ele de Rex, como num filme de detetive que eu tinha visto na quinta-feira.

Depois do po-de-mel, que ele comeu quase to depressa como o Alceu, que um colega meu que come o tempo todo, Rex me seguiu todo contente. Pensei que quando eu chegasse com o Rex em casa ia ser uma tima surpresa para o papai e para a mame. E depois eu ia ensinar o Rex a fazer coisas, ele tambm ia tomar conta da casa, ia me ajudar a descobrir os bandidos como no filme de quinta-feira.

Pois , aposto que vocs no vo acreditar; quando cheguei em casa, a mame no ficou to contente assim de ver o Rex, ela no ficou nada contente. Mas, tambm, a culpa foi um pouco do Rex. Ns entramos na sala e a mame veio, me abraou, me perguntou se tudo tinha ido bem na escola, se eu no tinha feito nenhuma travessura e depois ela viu o Rex e comeou a gritar: "Onde foi que voc achou esse bicho?" Eu comecei a explicar que era um pobre cachorrinho perdido que ia me ajudar a prender um monte de bandidos; mas o Rex, em vez de ficar quietinho, pulou numa poltrona e comeou a morder a almofada. E era a poltrona onde o papai no tem o direito de sentar, s quando tem visitas!

Mame continuou gritando, disse que ela j me tinha proibido de trazer bichos para casa (isso verdade, a mame me proibiu uma vez que eu trouxe um rato), que era perigoso, que esse cachorro podia estar com raiva, que ele ia morder ns todos e que ns amos ficar com raiva e que ela ia buscar uma vassoura para pr aquele bicho pra fora e que ela me dava um minuto pra tirar aquele cachorro de casa.

No foi fcil convencer o Rex a largar a almofada da poltrona e mesmo assim ele ainda ficou com um pedao nos dentes; eu no entendo como que o Rex pode gostar disso. A eu sa para o jardim com o Rex no colo. Eu estava com muita vontade de chorar, e ento foi isso que eu fiz. No sei se o Rex tambm estava triste, ele estava muito ocupado cuspindo os pedacinhos de l da almofada.

Papai chegou e viu ns dois sentados na frente da porta, eu chorando e o Rex cuspindo. "Como , o papai falou, o que est acontecendo aqui?" Ento eu expliquei para o papai que a mame no queria saber do Rex e que o Rex era meu amigo e eu era o nico amigo do Rex e que ele ia me ajudar a encontrar uma poro de bandidos, e ia fazer uma poro de coisas que eu ia ensinar para ele, e que eu estava to triste e eu comecei a chorar de novo um pouquinho enquanto o Rex cocava a orelha com a pata de trs; e olha que muito difcil fazer isso, uma vez a gente tentou fazer isso na escola e o nico que conseguiu foi o Maximiliano, que tem as pernas muito compridas.

Papai me fez um agrado na cabea e depois disse que a mame tinha razo, que era perigoso trazer cachorros pra casa, que eles podiam estar doentes e que eles comeam a morder a gente e depois pimba! todo o mundo comea a babar e a ficar com raiva, e que, mais tarde eu vou aprender na escola, Pasteur inventou um remdio, um benfeitor da humanidade, e a gente pode se curar, mas que di muito. Eu respondi para o papai que o Rex no estava doente, que ele gostava muito de comer e que era superinteligente. Ento o papai olhou para o Rex e cocou a cabea dele como ele faz em mim s vezes. " verdade que esse cachorrinho parece ter boa sade", o papai disse, e o Rex comeou a lamber a mo dele. Isso deixou o papai muito contente. "Ele engraadinho", o papai falou e depois estendeu a outra mo e disse: "A pata, d a patinha, vamos, a patinha, d!", e o Rex deu a patinha e depois lambeu a mo dele e depois cocou a orelha. O Rex estava mesmo muito ocupado. Papai ria muito e ento ele me disse: "Bom, espera aqui, vou ver se ajeito as coisas com a sua me", e ele entrou em casa. Papai legal! Enquanto papai ajeitava as coisas com a mame, eu fiquei brincando com o Rex, que sentava s nas patas de trs, e como eu no tinha nada para ele comer ele comeou a cocar a orelha, incrvel esse Rex!

Quando o papai saiu de casa, no parecia muito contente. Ele sentou do meu lado, cocou a minha cabea e disse que a mame no queria cachorro em casa, principalmente depois daquela histria da poltrona. Eu ia comear a chorar, mas tive uma idia. "Se a mame no quer o Rex em casa, eu disse, a gente podia deixar ele no jardim." Papai pensou um pouco e depois disse que era uma boa idia, que no jardim Rex no ia fazer estragos e que a gente ia fazer agora mesmo uma casinha pra ele. Ento eu dei um beijo no papai.

Fomos procurar tbuas no barraco e o papai trouxe as ferramentas dele. O Rex comeou a comer as begnias, mas no to grave como a poltrona da sala porque ns temos muito mais begnias do que poltronas.

Papai comeou a separar as tbuas. "Voc vai ver, ele disse pra mim, vamos fazer uma casa bem legal para ele, um verdadeiro palcio. E a, eu disse, a gente vai ensinar uma poro de coisas para ele e ele vai tomar conta da casa! sim, o papai falou, a gente vai ensinar a espantar os intrusos, como o Durzio, por exemplo." O sr. Durzio o nosso vizinho, ele e o papai gostam de implicar um com o outro. Rex, eu e o papai, a gente estava se divertindo muito! S ficou um pouco chato quando o papai deu um grito por causa de uma martelada que ele deu no dedo, e a a mame saiu de casa e perguntou: "O que que vocs esto fazendo?" Ento eu expliquei para ela que a gente tinha decidido, papai e eu, ficar com o Rex no jardim, que no tinha poltronas, e que o papai ia fazer uma casinha para ele e que ia ensinar o Rex a morder o sr. Durzio, para fazer ele ficar com muita raiva. O papai no falava muito, ele chupava o dedo e olhava para a mame. Mame no estava nem um pouco contente. Disse que no queria aquele bicho na casa dela e que olha s o que esse bicho fez com as minhas begnias! Rex levantou a cabea e chegou perto da mame abanando o rabo e depois ficou sentado s nas patas de trs. Mame olhou pra ele e depois ela se abaixou e agradou a cabea do Rex e o Rex lambeu a mo dela, e a bateram na porta do jardim.

Papai foi abrir e um senhor entrou. Olhou para o Rex e disse: "Kiki! At que enfim! Procurei voc por toda parte! Mas afinal, cavalheiro, o papai perguntou, o que o senhor deseja? O que que eu desejo?, ele disse. Eu quero o meu cachorro! Kiki fugiu enquanto eu estava passeando com ele de manh e me disseram que tinham visto um garoto traz-lo para estes lados. - No o Kiki o Rex, eu disse. E ns dois juntos vamos prender bandidos como no filme de quinta-feira e a gente vai treinar ele para pregar peas no sr. Durzio!" Mas o Rex parecia feliz da vida e pulou nos braos do moo. "Quem pode provar que esse cachorro seu, papai perguntou, um co perdido! - E a coleira, ele respondeu, vocs no viram a coleira dele? Tem o meu nome escrito! Jlio Jos Sovado, com o meu endereo, tenho vontade de dar queixa na polcia! Vem, meu Kiki, s faltava essa!", e o homem foi embora com o Rex. Ficamos todos surpresos, e a a mame comeou a chorar. Ento, o papai consolou a mame e prometeu para ela que um dia desses eu ia trazer outro cachorro.

Djodjo

Hoje tinha um aluno novo na classe. De tarde, a professora chegou com um garotinho que tinha o cabelo todo vermelho, sardas e olhos azuis que nem a bolinha de gude que eu perdi ontem no recreio, mas o Maximiliano roubou no jogo. A professora disse assim: "Meninos quero apresentar para vocs um novo amiguinho. Ele estrangeiro e seus pais puseram ele nesta escola para aprender a falar francs. Tenho certeza de que vocs vo me ajudar e ser bonzinhos com ele." Depois a professora se virou para o novato e disse: "Diga o seu nome para os seus coleguinhas." O novato no entendeu o que a professora disse, ele sorriu e ns vimos que ele tinha uma poro de dentes enormes. "Que sortudo, disse o Alceu, um colega gordo, que come o tempo todo, com esses dentes ele deve morder cada pedao!" Como o novato no dizia nada, a professora disse para ns que ele se chamava Jorge Mac Intosh. "Yes, o novato falou, Djorge. - D licena, professora, o Maximiliano perguntou, ele se chama Jorge ou Djorge?" A professora explicou para a gente que ele se chamava Jorge, mas que na lngua dele isso se pronunciava Djorge. "Bom, disse o Maximiliano, a gente vai chamar ele de Jojo. No, disse o Joaquim, tem que pronunciar Djodjo. - Cala boca Djoaquim", o Maximiliano falou, e a professora ps os dois de castigo.

A professora fez o Djodjo sentar ao lado do Agnaldo. O Agnaldo parecia que estava meio desconfiado do novato, como ele o primeiro da classe e o queridinho da professora, ele sempre tem medo dos novos, que podem ficar sendo primeiros e queridinhos. Com a gente, o Agnaldo sabe que pode ficar sossegado.

Djodjo se sentou, sempre com aquele sorriso cheio de dentes. "E pena que ningum fale a lngua dele", disse a professora. "Eu tenho alguns rudimentos de ingls", disse o Agnaldo que, pra dizer a verdade, sabe falar bem. Mas depois que o Agnaldo soltou os rudimentos dele para o Djodjo, o Djodjo olhou para ele e depois comeou a rir e bateu com o dedo na testa. Agnaldo ficou muito envergonhado, mas o Djodjo tinha razo. Depois a gente ficou sabendo que o Agnaldo tinha contado uma poro de coisas sobre um alfaiate que era rico e sobre o jardim do tio dele que era maior que o chapu da tia. O Agnaldo doido!

Tocou o sinal do recreio e ns samos todos, menos o Joaquim, o Maximiliano e o Clotrio, que esto de castigo. O Clotrio o ltimo da classe e no sabia a lio. Quando o Clotrio chamado, ele nunca vai para o recreio.

No ptio todo o mundo ficou em volta do Djodjo. Perguntamos um monte de coisas para ele, mas a nica coisa que ele fazia era mostrar montes de dentes. Depois ele comeou a falar, mas ningum entendeu nada, era um tal de "uenshuenshuenshuen" e s. O Godofredo, que vai muito ao cinema, falou:

"Acontece que ele fala em verso original. Ele precisava de legenda. Talvez eu possa traduzir", disse o Agnaldo, que queria ensaiar os seus rudimentos mais uma vez. "Ora, voc; voc doido!", disse o Rufino. O novato gostou disso, apontou o Agnaldo com o dedo e disse: "Aoh! Doidodoidodoido!" Ele estava todo contente. O Agnaldo foi embora chorando, ele chora o tempo todo. Ns comeamos a achar que o Djodjo era um cara muito legal, e eu dei pra ele uma ponta do meu pedao de chocolate do recreio. "Qual o esporte l do teu pas?", o Eudes perguntou. claro que o Djodjo no entendeu, ele continuava dizendo "doidodoidodoido", mas o Godofredo respondeu: "Mas que pergunta, eles jogam tnis no pas dele! O seu palhao, gritou o Eudes, no estou falando com voc! Seu palhao! Doidodoido!", gritou o novato, que parecia que estava se divertindo muito com a gente. Mas o Godofredo no gostou do jeito como o Eudes tinha respondido pra ele. "Quem que palhao?", ele perguntou, mas no devia, porque o Eudes muito forte e gosta muito de dar socos nos narizes e no falhou no do Godofredo. Quando o Djodjo viu o soco, parou de dizer "doidodoido" e "seu palhao". Olhou para o Eudes e disse: "Boxing? Bom!" E a ele ps os punhos na frente da cara e comeou a danar em volta do Eudes como os lutadores de boxe na televiso na casa do Clotrio, porque a gente ainda no tem televiso e eu queria muito que o papai comprasse uma. "O que foi que deu nele?", o Eudes perguntou. "Ele quer lutar boxe com voc, inteligente!", respondeu o Godofredo que esfregava o nariz. O Eudes disse: "T legal!", e tentou lutar com o Djodjo. Mas o Djodjo era muito melhor que o Eudes. Ele dava um monto de socos e o Eudes estava comeando a ficar chateado: "Como que vocs querem que eu brigue, se ele no pra com o nariz no lugar?", ele gritou e pimba! o Djodjo deu um soco no Eudes que fez ele cair sentado. O Eudes no estava zangado. "Voc duro!", ele disse enquanto se levantava. "Duro, doido, seu palhao!", respondeu o novato, que aprende incrivelmente rpido. O recreio acabou e, como sempre, o Alceu reclamou que no do tempo para ele comer os quatro pezinhos cheios de manteiga que ele traz de casa.

Depois que ns entramos na classe, a professora perguntou para o Djodjo se ele tinha brincado bastante; ento o Agnaldo se levantou e disse: "Professora, eles ensinaram palavres para ele! - No verdade, seu mentiroso nojento!", gritou o Clotrio, que no tinha sado para o recreio. "Doido, seu palhao, mentiroso nojento", disse o Djodjo todo orgulhoso.

A gente no dizia nada porque estava todo o mundo vendo que a professora no estava nem um pouco contente. "Vocs deviam ter vergonha, ela disse, se aproveitar de um colega que no sabe a lngua de vocs! E eu tinha pedido para vocs serem bonzinhos com ele, mas no se pode confiar em vocs! Vocs se comportaram como pequenos selvagens, como mal-educados!" A o Djodjo, que parecia estar cada vez mais contente por aprender tantas coisas, disse: "Doido, seu palhao, mentiroso nojento, selvagem, mal-educado!"

A professora olhou para ele com uns olhos bem redondos "Mas... mas, ela disse, Jorge, no se devem dizer essas coisas! - Viu, professora, viu professora, o Agnaldo falou, o que foi que eu disse?" Ento a professora gritou: "Se voc no consegue se controlar, Agnaldo, faa o favor de guardar as suas reflexes para voc!" O Agnaldo comeou a chorar. Ento algum gritou: "Traidor sujo!", mas a professora no descobriu quem era seno eu teria ido de castigo, ento o Agnaldo rolou no cho gritando que ningum gostava dele, que isso era horrvel e que ele ia morrer e a professora teve que sair com ele para passar gua na cara dele e fazer ele se acalmar.

Quando a professora voltou com o Agnaldo, parecia muito cansada, mas felizmente tocou o sinal e acabou a aula. Antes de sair a professora olhou para o novato e disse para ele: "S queria saber o que os teus pais vo pensar. Traidor sujo", o Djodjo respondeu dando a mo para ela.

A professora no precisava ficar preocupada porque os pais do Djodjo devem ter achado que ele tinha aprendido tudo o que ele precisava.

A prova que o Djodjo nunca mais voltou a escola.

O lindo buqu

Era o aniversrio da mame e eu resolvi comprar um presente como todos os anos, desde o ano passado, porque antes eu era muito pequeno.

Peguei as moedas que havia no meu cofrinho, e tinha bastante, ainda bem, porque, por coincidncia, a mame me deu dinheiro ontem. Eu j sabia que presente eu ia dar pra ela: flores pra pr no grande vaso azul da sala, um buqu incrvel, supergrande.

Na escola eu estava muito aflito para a aula terminar para eu poder ir comprar o meu presente. Eu ficava com a mo no bolso o tempo todo pra no perder as moedas, mesmo jogando futebol no recreio, mas como eu no jogo no gol no fazia mal. O goleiro era o Alceu, um colega que muito gordo e que gosta muito de comer, e ele me perguntou: "O que que deu em voc pra ficar correndo com uma mo s?" Quando eu expliquei pra ele que era porque eu ia comprar flores para a mame ele disse que, se fosse ele, preferia alguma coisa de comer, um bolo, bombons ou chourio branco, mas como o presente no era pra ele eu nem liguei e marquei um gol nele. Ganhamos de 44 a 32.

Quando a gente saiu da escola, o Alceu foi comigo at a floricultura comendo a metade do pozinho-de-mel dele que tinha sobrado da aula de gramtica. Ns entramos na loja, eu pus todas as minhas moedas no balco e disse para a moa que eu queria um buqu de flores muito grande para a minha me, mas nada de begnias, porque j tem um monto no nosso jardim e no vale a pena comprar fora. O Alceu disse assim: "Ns desejaramos algo fino", e depois foi enfiar o nariz nas flores que estavam na vitrina para ver se cheiravam bem. A moa contou as minhas moedas e disse que no podia dar muitas, muitas flores. Como eu fiquei com uma cara muito chateada, a moa olhou para mim, pensou um pouco, disse que eu era um garotinho engraadinho, me deu uns tapinhas na cabea e depois disse que ela ia dar um jeito. A moa escolheu flores por todos os lados e depois ps um monto de folhas verdes e o Alceu gostou porque ele achava que parecia com os legumes que vo na sopa. O buqu estava lindo e grande, a moa embrulhou num papel transparente que fazia barulho e disse para eu carregar com cuidado! Eu j estava com o meu buqu e o Alceu j tinha acabado de cheirar as flores, ento eu disse at logo e a gente saiu.

Eu estava muito contente com o meu buqu quando encontramos o Godofredo, o Clotrio e o Rufino, trs colegas da escola. O Godofredo disse assim: "Olha o Nicolau, parece um bobo com aquelas flores! - Sorte tua eu estar com as flores, seno te dava uma bolacha na cara!", eu respondi. O Alceu ento falou: "Me d aqui as flores que eu seguro pra voc enquanto voc d uma bolacha no Godofredo." Ento eu dei o buqu para o Alceu e o Godofredo me deu um tapa. A gente brigou e depois eu disse que j estava ficando tarde e a ns paramos. Mas eu ainda tive que ficar mais um pouco porque o Clotrio falou: "Olha s o Alceu, agora ele que parece um bobo, com as flores." A o Alceu bateu com toda a fora na cabea dele com o meu buqu, e eu gritei: "Minhas flores! Vocs vo quebrar minhas flores!" verdade, mesmo! O Alceu no parava de bater com o meu buqu e as flores voavam para todos os lados porque o papel tinha rasgado e o Clotrio dizia: "No t machucando, no t machucando!"

Quando o Alceu parou, o Clotrio estava com a cabea coberta com as folhas verdes do buqu e parecia mesmo um caldo verde. Ento eu comecei a juntar as minhas flores e eu dizia para os meus colegas que eles eram malvados. O Rufino disse: " mesmo, no foi legal o que vocs fizeram com as flores do Nicolau! Ningum pediu a tua opinio", respondeu o Godofredo e eles comearam a dar socos um no outro. O Alceu pegou e foi embora porque a cabea do Clotrio tinha dado fome nele e ele no queria chegar tarde para o jantar.

Eu fui embora com as minhas flores. Estavam faltando algumas, no tinha mais legumes nem papel, mas ainda era um buqu lindo; depois, mais na frente, encontrei o Eudes.

"Vamos jogar bolinha de gude?", ele perguntou. Eu respondi: "No posso, tenho que ir pra casa para dar estas flores para a mame." Mas o Eudes disse que ainda era cedo e eu gosto muito de jogar bolinha de gude, eu jogo muito bem, eu miro e pimba! quase sempre, eu ganho. Ento eu ajeitei as flores na calada e comecei a jogar com o Eudes, e muito legal jogar bolinha com o Eudes porque quase sempre ele perde. O chato que quando ele perde ele fica bravo e ele me disse que eu estava roubando e eu disse pra ele que ele era um mentiroso, ento ele me empurrou e eu ca sentado em cima do buqu, e isso foi muito ruim para as flores. Ento eu disse pro Eudes: "Vou contar pra mame tudo o que voc fez com as flores dela", e o Eudes ficou bem chateado. Ento ele me ajudou a escolher as flores que estavam menos amassadas. Eu gosto muito do Eudes, ele um bom amigo.

Comecei a andar de novo, meu buqu no estava mais muito grande, mas as flores que sobraram no estavam to mal assim; uma das flores estava um pouco amassada mas as duas outras estavam muito bonitas. Ento eu vi o Joaquim chegar de bicicleta. O Joaquim um amigo da escola que tem uma bicicleta.

Mas a eu resolvi que no ia brigar porque se eu continuasse a encrencar com todos os colegas que eu fosse encontrando na rua logo no ia sobrar nenhuma flor para dar pra mame. E depois, afinal, no da conta dos meus colegas se eu quero dar flores pra minha me, um direito que eu tenho e alm disso eu acho que eles tm inveja, isso sim, s porque a mame vai ficar muito contente e vai me dar uma sobremesa gostosa e vai dizer que eu sou muito bonzinho e, depois, por que todo o mundo tem que ficar me enchendo?

"Oi, Nicolau!", o Joaquim disse pra mim. "O que que tem o meu buqu?, eu gritei para ele. Bobo voc!" O Joaquim parou a bicicleta, me olhou com dois olhos assim redondos e perguntou: "Que buqu? Este aqui!", eu respondi e mandei as flores na cara dele. Acho que o Joaquim no estava esperando receber flores na cara, em todo caso ele no gostou nada daquilo. Jogou as flores na rua e elas caram em cima da capota de um carro que estava passando e elas foram embora com o carro. "Minhas flores, eu gritei. As flores da minha me! No liga no, o Joaquim disse pra mim, eu pego a bicicleta e alcano o carro!" O Joaquim bonzinho, mas no pedala muito rpido, principalmente quando subida, e ele est treinando para a Volta da Frana*" que ele vai fazer quando for grande. O Joaquim voltou dizendo que no tinha conseguido alcanar o carro, que o carro tinha deixado ele para trs numa subida. Mas ele me trouxe uma flor que tinha cado da capota do carro. Que azar, era justo a que estava amassada.

*"Tour de France": uma das mais famosas provas do ciclismo.

O Joaquim foi embora depressa, para ir para a casa dele descida, e eu fui para casa com a minha flor toda amarrotada. Parecia que eu estava com uma bola enorme na garganta, como quando eu trago o boletim cheio de zeros pra casa.

Eu abri a porta e disse pra mame: "Feliz aniversrio, mame", e comecei a chorar. Mame olhou para a flor, ela estava um pouco espantada, e depois ela me pegou nos braos, me abraou muitas e muitas vezes, disse que nunca tinha recebido um buqu to bonito e colocou a flor no vaso azul da sala.

Digam o que quiserem, mas a minha me superlegal!

Os boletins

Naquela tarde na escola ningum fez brincadeira porque o diretor veio distribuir os nossos boletins na classe. O diretor no parecia nada contente quando entrou com os nossos boletins embaixo do brao. "Trabalho h muitos anos como educador, o diretor falou, e nunca vi uma classe to turbulenta. As observaes que a professora de vocs escreveu nos boletins so prova disso. Vou comear a distribuir os boletins." E Clotrio comeou a chorar. Clotrio o ltimo da classe e todos os meses a professora escreve uma poro de coisas no boletim dele e o pai e a me do Clotrio ficam bravos e probem ele de comer sobremesa e de ver televiso. Eles j esto to acostumados, que uma vez por ms a me dele no faz sobremesa e o pai vai assistir televiso no vizinho.

No meu boletim estava escrito: "Aluno agitado, freqentemente distrado. Poderia fazer melhor." Eudes tinha: "Aluno turbulento. Briga com os colegas. Poderia fazer melhor." Para o Rufino era: "Insiste em brincar na classe com um apito, j confiscado diversas vezes. Poderia fazer melhor." O nico que no poderia fazer melhor era o Agnaldo. O Agnaldo o primeiro da classe e o queridinho da professora. O diretor leu o boletim do Agnaldo para ns: "Aluno aplicado, inteligente. Ter sucesso." O diretor disse que devamos seguir o exemplo do Agnaldo, que ns ramos uns meninos vadios, que a gente ia acabar na priso e que isso ia ser muito triste para nossos pais e nossas mes, que deviam ter projetos bem diferentes para ns. E a ele foi embora.

Ns estvamos muito chateados porque os nossos pais tm que assinar os nossos boletins e isso s vezes no tem graa nenhuma. Ento, quando tocou o sinal para a sada, em vez de sair todo o mundo correndo para a porta, se empurrando, dando encontro e batendo com a mala um na cabea do outro, como a gente sempre faz, ns samos devagar, sem dizer nada. At a professora estava com cara triste. A gente no fica com raiva da professora. verdade que este ms a gente fez um pouco de palhaada e depois o Godofredo no devia ter derramado o tinteiro no cho em cima do Joaquim, que tinha cado e estava fazendo uma poro de caretas porque o Eudes tinha dado um soco no nariz dele, mas quem tinha puxado os cabelos do Eudes tinha sido o Rufino.

Na rua a gente no andava depressa, e andava arrastando os ps. Na porta da confeitaria ns esperamos o Alceu, que tinha entrado para comprar seis pezinhos-de-mel que ele comeou a comer na mesma hora. "Preciso fazer provises, o Alceu disse para ns, porque esta noite, a sobremesa...", e a ele deu um grande suspiro, sem parar de comer. E verdade que no boletim do Alceu estava escrito: "Se este aluno dedicasse ao trabalho a energia que dedica a se alimentar, seria o primeiro da classe, porque ele poderia fazer melhor."

Quem parecia menos chateado era o Eudes. Ele disse: "Eu no tenho medo. Meu pai no me diz nada, eu encaro ele direto nos olhos e a ele assina o boletim e pronto!" O Eudes tem sorte. Quando chegamos na esquina, a gente se separou. O Clotrio foi embora chorando, o Alceu comendo e o Rufino apitando baixinho com o apito de bolinha.

Eu fiquei sozinho com o Eudes. "Se voc est com medo de ir pra casa, fcil, o Eudes me disse. Vem comigo e voc dorme l em casa." O Eudes mesmo um amigo. Ns fomos embora juntos e o Eudes ia me explicando como ele olhava o pai dele nos olhos. S que, quanto mais a gente chegava perto da casa do Eudes, menos o Eudes falava. Quando chegamos na porta da casa, o Eudes no dizia mais nada. Ficamos ali um pouco e a eu disse para o Eudes: "Como , vamos entrar?" O Eudes cocou a cabea e depois me disse: "Espera aqui um pouquinho. J volto para te buscar." Depois o Eudes entrou na casa dele. Ele tinha deixado a porta entreaberta e ento eu ouvi um paf e uma voz grossa que dizia: "Para a cama sem sobremesa, pequeno vadio", e o Eudes chorando. Acho que o Eudes no deve ter olhado direito nos olhos do pai dele.

O chato que agora eu tinha que ir para casa. Comecei a andar prestando ateno para no pisar nas riscas da calada, e era fcil porque eu ia andando devagar. Eu sabia direitinho o que o papai ia me dizer. Ele ia dizer que tinha sido sempre o primeiro da classe e que o papai dele tinha muito orgulho do meu papai e que ele trazia montes de menes honrosas da escola e de medalhas e que ele gostaria de mostrar elas para mim mas que tinha perdido tudo na mudana quando ele se casou. Depois o papai ia me dizer que eu no ia ser nada na vida, que eu ia ser pobre e que as pessoas iam dizer esse a o Nicolau, aquele que tirava notas baixas na escola, e iam me apontar com o dedo e todos iam rir de mim. Depois papai ia me dizer que ele se matava para me dar uma educao boa e para eu me preparar para a vida e que eu era um ingrato que nem tinha pena dos meus pais que sofriam tanto por minha causa e que eu no ia comer sobremesa e que, pra ir ao cinema, s depois do prximo boletim.

O papai vai me dizer tudo isso, como no ms passado e no outro, mas eu estou cheio. Eu vou dizer pra ele que eu sou muito infeliz, e j que assim, ento est bem, eu vou embora de casa e vou pra bem longe e todo o mundo vai sentir falta de mim e eu s vou voltar daqui a uma poro de anos e eu vou ter muito dinheiro e o papai vai ter vergonha de ter dito que eu nunca ia ser nada na vida e as pessoas no vo ter coragem de me apontar com o dedo para dar risada e com o meu dinheiro eu vou levar o papai e a mame ao cinema e todo o mundo vai dizer: "Vejam, o Nicolau, que tem um monte de dinheiro e ele que paga o cinema para o papai e a mame dele, apesar de eles no terem sido bonzinhos com ele", e tambm vou levar a professora e o diretor da escola ao cinema, e quando eu vi estava na frente de casa.

Eu estava pensando em tudo isso e me contando histrias legais e acabei esquecendo o boletim e andei muito depressa. Senti uma bola grande na garganta e achei que talvez fosse melhor ir embora logo e s voltar daqui a muitos anos, mas estava comeando a ficar escuro e a mame no gosta que eu fique fora quando tarde. Ento eu entrei.

O papai estava na sala conversando com a mame. Ele estava com uma poro de papis em cima da mesa, na frente dele, e no parecia contente. " inacreditvel, o papai dizia, pelo que se gasta nesta casa parece at que eu sou multimilionrio! Veja s estas notas! Esta do aougue! Esta do armazm! Ah, claro, quem tem que arrumar o dinheiro sou eu!" A mame tambm no estava contente e ela dizia para o papai que ele no tinha a menor idia do custo de vida e que um dia ele devia fazer as compras junto com ela e que ela ia voltar para a casa da me dela e que no se devia discutir isso na frente da criana. Ento eu dei o boletim para o papai. Ele abriu o boletim, assinou e me devolveu dizendo: "O menino no tem nada a ver com isso. S estou pedindo para algum me explicar por que o fil custa esse preo! - Sobe, Nicolau, vai brincar no teu quarto!", a mame me disse. "Isso mesmo, isso mesmo", o papai falou.

Eu subi para o meu quarto, me deitei na cama e comecei a chorar.

Isso verdade, se o papai e a mame gostassem de mim, eles me dariam mais ateno!

Luisinha

Quando a mame me disse que uma amiga dela vinha tomar ch com a sua filhinha, eu no gostei nem um pouco. No gosto das meninas. So bobas, no sabem brincar de outra coisa que no seja de boneca ou de vendedora e choram o tempo todo. claro que s vezes eu tambm choro, mas por coisas srias como daquela vez que o vaso da sala quebrou e o papai brigou comigo e no era justo porque eu no tinha feito de propsito, e tambm aquele vaso era muito feio e eu sei muito bem que o papai no gosta que eu jogue bola dentro de casa mas estava chovendo l fora.

"Voc vai ser bonzinho com a Luisinha, a mame me disse, uma garotinha adorvel e quero que voc mostre para ela como voc bem-educado."

Quando a mame quer mostrar que eu sou bem-educado, ela me veste com a cala azul e a camisa branca e eu fico parecendo um bobo. Falei para a mame que eu preferia ir com os meus colegas ao cinema ver um filme de caubis, mas a mame olhou para mim com os olhos de quando ela no est para brincadeiras.

"E faa-me o favor de no ser estpido com a garotinha, seno voc vai se ver comigo, entendeu?", a mame disse. s quatro horas chegou a amiga da mame com a filhinha dela. A amiga da mame me beijou, disse para mim, como todo o mundo diz, que eu era um mocinho, e ela tambm disse: "Esta a Luisinha." Eu e a Luisinha nos olhamos. Ela tinha cabelos amarelos com trancas, olhos azuis, um nariz e um vestido vermelhos. A gente se deu os dedos, bem depressa. Mame serviu o ch, e isso foi legal porque quando tem gente para o ch sempre tem bolo de chocolate e a gente pode repetir duas vezes. Durante o lanche eu e a Luisinha no dissemos nada. A gente comeu e a gente no se olhou. Quando ns acabamos, a mame disse: "Agora, crianas, vo brincar. Nicolau, leva a Luisinha ao teu quarto e mostra para ela os teus brinquedos." A mame disse isso com um grande sorriso, mas ao mesmo tempo ela me olhou com aqueles olhos de quando melhor no brincar. A Luisinha e eu fomos para o meu quarto, e l eu no sabia o que dizer para ela. Foi a Luisinha que disse, e ela disse assim: "Voc parece um mico." Eu no gostei nem um pouco, ento eu disse para ela: "E voc que no passa de uma menina!", e ela me deu um tapa. Eu bem que fiquei com vontade de comear a chorar, mas agentei firme porque a mame queria que eu fosse bem-comportado, ento eu puxei uma trana da Luisinha e ela me deu um chute na canela. A no teve jeito, eu tive que fazer "ui ui" porque doeu. Eu ia dar um tapa na Luisinha quando a Luisinha mudou de assunto; ela disse: "Como , voc vai me mostrar esses brinquedos?" Eu ia dizer para ela que eram brinquedos de menino, quando ela viu o meu ursinho de pelcia, aquele que eu tinha rapado s pela metade porque o barbeador do papai no agentou at o fim. "Voc brinca de boneca?" ela perguntou e a comeou a dar risada. Eu ia puxar uma trana dela e a Luisinha estava levantando o brao para meter a mo na minha cara quando a porta abriu e as nossas duas mames entraram. "Ento, crianas, a mame disse, esto se divertindo? - Estamos sim senhora", a Luisinha falou com os olhos bem arregalados e depois ela fez as plpebras mexerem bem depressa e a mame deu um beijo nela dizendo: "Encantadora, ela encantadora. Um verdadeiro coelhinho!", e a Luisinha dava duro com as plpebras. "Mostra para a Luisinha esses livros de figuras to lindos que voc tem", a mame me disse, e a outra mame disse que ns ramos dois coelhinhos e elas foram embora.

Eu tirei os livros da estante e dei para a Luisinha, mas ela nem olhou para eles e jogou todos no cho, at aquele que tem uma poro de ndios e que superlegal. "Os teus livros no me interessam, ela disse, voc no tem nada mais divertido?", e a ela olhou para o armrio e viu o meu avio, aquele bacana, o que tem um elstico, que vermelho e voa. "Deixa isso a, eu disse, isso no pra meninas, o meu avio!", e tentei tirar dela, mas a Luisinha se desviou. "Eu sou a convidada, ela disse, tenho o direito de brincar com todos os teus brinquedos, e se voc no deixar eu chamo a minha me e a gente vai ver quem est com a razo!" Eu no sabia o que fazer, no queria que ela quebrasse o meu avio, mas no queria que ela chamasse a me dela porque ia complicar. Enquanto eu estava ali, pensando, a Luisinha girou a hlice para enrolar o elstico e a ela largou o avio. Ela soltou ele pela janela do meu quarto que estava aberta e o avio foi embora. "Olha s o que voc fez, eu gritei. Perdi meu avio!", e comecei a chorar. "O teu avio no est perdido, bobo, a Luisinha disse, olha l, ele caiu no jardim, s a gente descer e pegar."

Descemos at a sala e eu pedi para a mame se a gente podia sair para brincar no jardim e a mame disse que estava muito frio, mas a Luisinha deu uma batida de plpebra e disse que queria ver as lindas flores. Ento a minha mame disse que ela era um coelhinho encantador e disse para a gente se agasalhar bem para sair. Preciso aprender esse negcio das plpebras, parece que esse truque funciona superbem!

No jardim eu apanhei meu avio que no tinha nada, ainda bem, e a Luisinha me disse: "O que que a gente vai fazer? Sei l, eu disse para ela, voc no queria ver as flores? Olha elas, tem uma poro ali." Mas a Luisinha disse que no estava nem a para as minhas flores e que elas eram ridculas. Bem que eu fiquei com vontade de socar o nariz daquela tal Luisinha, mas no tive coragem porque a janela da sala d para o jardim e as mames estavam na sala. "Eu no tenho brinquedos aqui, eu disse, s a bola de futebol, na garagem." Luisinha me disse que era uma boa idia. Ns fomos buscar a bola e eu estava preocupado, tinha medo de que os meus colegas me vissem brincando com uma menina. "Voc fica a entre essas duas rvores e tenta segurar a bola", ela me disse. A eu tive que dar risada e depois ela tomou distncia e bum! um chute incrvel! No consegui segurar a bola e ela quebrou o vidro da janela da garagem.

As mames saram de casa correndo. A minha me viu a janela da garagem e entendeu logo. "Nicolau!, ela me disse, em vez dessas brincadeiras brutas, voc devia dar mais ateno aos convidados, principalmente quando so delicados como a Luisinha!" Eu olhei para a Luisinha e ela estava bem mais longe, no jardim, cheirando as begnias.

De noite eu no ganhei sobremesa, mas no faz mal, a Luisinha legal e quando a gente for grande a gente vai se casar.

Ela tem um chute incrvel!

O ensaio para a visita do ministro

Fizeram todo o mundo descer para o ptio e o diretor veio falar. "Meus queridos alunos, ele disse para ns, tenho o grande prazer de anunciar que, por ocasio de sua passagem por nossa cidade, o Senhor Ministro vai nos dar a honra de visitar a nossa escola. Ele um exemplo para vocs, um exemplo que prova que quem trabalha direito pode ter as mais altas aspiraes. Fao questo de que o Senhor Ministro receba aqui uma acolhida inesquecvel e conto com vocs para isso." E o diretor mandou o Clotrio e o Joaquim para o canto de castigo porque eles estavam brigando.

Depois o diretor reuniu todos os professores e inspetores de alunos em volta dele e disse pra eles que tinha algumas idias sensacionais para a recepo ao ministro. Para comear, todo o mundo ia cantar o Hino Nacional e depois trs dos pequenos iam at a frente com flores e iam dar as flores para o ministro. verdade que o diretor tem idias legais e vai ser uma boa surpresa para o ministro receber flores; com certeza ele no est esperando. No sei por qu, mas a nossa professora parecia preocupada. Acho que ela anda nervosa nestes ltimos dias.

O diretor disse que a gente ia comear a ensaiar imediatamente e ns ficamos muito contentes porque no ia ter aula. A professora Vanderblergue, que d aula de msica, fez a gente cantar a Marselhesa. Parece que no estava dando muito certo, mas bem que a gente fazia um bocado de barulho. Est certo que ns estvamos um pouco na frente dos grandes. Eles ainda estavam no dia de glria que chegou* e ns j estvamos na segunda bandeira sangrenta que era erguida**, menos o Rufino, que no sabia a letra e ficava fazendo "lalal", e o Alceu, que no cantava porque estava comendo um croissant. A professora Vanderblergue fez uma poro de gestos com os braos para a gente ficar quieto, mas, em vez de brigar com os grandes que estavam atrasados, ela brigou com a gente que foi quem ganhou, e isso no justo. Talvez o que tenha deixado a srta. Vanderblergue furiosa foi que o Rufino, que fecha os olhos para cantar, no sabia que era para parar e continuou fazendo "lalal". A nossa professora falou com o diretor e com a srta. Vanderblergue e depois o diretor disse para ns que s os grandes iam cantar, os pequenos iam fazer de conta. Ensaiamos e deu tudo certo, mas fez menos barulho e o diretor disse para o Alceu que no precisava fazer tanta careta para fazer de conta que estava cantando e o Alceu respondeu que ele no estava fazendo de conta que estava cantando, que ele estava mastigando, e o diretor deu um suspiro muito comprido.

* Aluso ao 2 verso da Marselhesa, o Hino Nacional da Frana.

** Aluso ao 4 verso da Marselhesa.

"Bom, o diretor falou, depois da Marselhesa, vamos fazer trs dos pequenos virem para a frente." O diretor olhou para ns e depois escolheu o Eudes, o Agnaldo, que o primeiro da classe e o queridinho da professora, e eu. "Pena que no sejam meninas, o diretor falou, elas poderiam vir vestidas com as cores da bandeira, azul, branco, vermelho ou ento, como se v s vezes, poderiam pr um lao colorido nos cabelos, que faz um timo efeito. Se eles puserem uma fita nos meus cabelos, o pau vai quebrar", o Eudes disse. O diretor virou a cabea bem rpido e olhou para o Eudes com um olho muito grande e o outro pequeno, por causa da sobrancelha que ele ps em cima. "O que foi que voc disse?", perguntou o diretor, ento a nossa professora disse bem depressa: "Nada, senhor diretor, ele tossiu. No, professora, o Agnaldo falou, eu ouvi, ele disse..." Mas a professora no deixou ele acabar, ela disse que no tinha perguntado nada para ele. "Isso mesmo seu traidor sujo, ningum pediu a tua opinio", disse o Eudes. O Agnaldo comeou a chorar e a dizer que ningum gostava dele e que ele era muito infeliz e que estava se sentindo mal e que ia falar para o pai dele e que a a gente ia ver o que ia acontecer e a professora disse para o Eudes no falar sem permisso e o diretor passou a mo pelo rosto como se fosse se enxugar e perguntou para a professora se a conversa tinha terminado e se ele podia continuar; a professora ento ficou toda vermelha, e ela ficava muito bonita assim, ela quase to bonita como a mame, mas em casa principalmente o papai que fica vermelho.

"Muito bem, o diretor disse, esses trs meninos vo ao encontro do ministro e vo oferecer flores a ele. Preciso de alguma coisa parecida com um buqu de flores para o ensaio." O Sopa, que o nosso inspetor de alunos, disse: "Tenho uma idia, senhor Diretor, j volto", e ele saiu correndo e voltou com trs espanadores. O diretor levou um susto e depois disse que sim, que afinal de contas, para o ensaio, aquilo servia. O Sopa deu um espanador pra cada um de ns, pro Eudes, pro Agnaldo e pra mim. "Muito bem, disse o diretor, agora, meninos, vamos fazer de conta que eu sou o ministro, ento vocs vm ao meu encontro e me do os espanadores." Ns fizemos do jeito que o diretor disse e demos os espanadores para ele. O diretor estava com os espanadores nos braos, de repente ele ficou bravo. Olhou para o Godofredo e disse: "Voc a! Eu vi voc rir. Gostaria que voc dissesse o que h de to engraado, para todos podermos rir tambm. - Foi o que o senhor falou, senhor Diretor, o Godofredo respondeu, estou rindo por causa da idia de pr fita no cabelo do Nicolau, do Eudes e desse queridinho sujo do Agnaldo! - Voc quer levar um soco no nariz?", o Eudes perguntou. "Isso mesmo", eu disse, e o Godofredo me deu um tapa. Ns comeamos a brigar e os outros colegas tambm entraram na briga, menos o Agnaldo, que rolava no cho gritando que ele no era um queridinho sujo e que ningum gostava dele e que o pai dele ia se queixar para o ministro. O diretor sacudia os espanadores e gritava: "Parem! Querem fazer o favor de parar?!" Todo o mundo corria por todo lado, a srta. Vanderblergue se sentiu mal, foi incrvel!

No dia seguinte, quando o ministro veio, tudo correu bem, mas ns no vimos ele porque puseram a gente na lavanderia e mesmo que o ministro quisesse nos ver ele no ia poder porque a porta estava trancada com chave.

O diretor tem cada idia!

Eu fumo

Eu estava no jardim e no estava fazendo nada e o Alceu chegou e me perguntou o que eu estava fazendo e eu respondi: "Nada."

Ento o Alceu me disse: "Vem comigo, tenho uma coisa pra te mostrar, a gente vai se divertir." Fui com o Alceu na hora, a gente se diverte muito junto. No sei se j contei pra vocs que o Alceu um amigo meu que muito gordo e que come o tempo todo. Mas ele no estava comendo nada, estava com a mo no bolso e enquanto a gente ia andando na rua ele olhava para trs para ver se ningum estava seguindo a gente. "O que que voc quer me mostrar, Alceu?", eu perguntei. "Ainda no", ele me disse.

Finalmente, quando a gente virou a esquina, o Alceu tirou um charuto enorme do bolso. "Olha s, e de verdade, no de chocolate!" Que no era de chocolate ele nem precisava me dizer, se o charuto fosse de chocolate o Alceu no ia mostrar pra mim, ele j teria comido.

Eu estava um pouco decepcionado, o Alceu tinha dito que a gente ia se divertir. "E o que que a gente vai fazer com esse charuto?", eu perguntei. "Que pergunta!, o Alceu me respondeu, a gente vai fumar, ora!" Eu no sabia muito bem se fumar charuto era uma boa idia e depois eu tinha a impresso de que o papai e a mame no iam gostar daquilo, mas o Alceu perguntou se o meu pai e a minha me me tinham proibido de fumar charuto. Eu pensei, a verdade que o papai e a mame me proibiram de fazer desenhos nas paredes do meu quarto, de falar mesa sem ser interrogado quando tem visitas, de encher a banheira para brincar com o meu barco, de comer doces antes do jantar, de bater as portas, de enfiar o dedo no nariz e de falar palavres, mas de fumar charuto o papai e a mame nunca me proibiram.

"T vendo?, o Alceu me disse. Em todo caso, para a gente no ter problemas, vamos nos esconder em algum lugar onde d pra fumar sossegado." Eu disse que a gente podia ir ao terreno baldio que fica perto da minha casa. O papai nunca vai l. O Alceu disse que era boa idia e ns j amos atravessar a cerca para entrar no terreno baldio quando o Alceu bateu na cabea. "Voc tem fogo?", ele me perguntou, e eu respondi que no. "Bom, ento, como que a gente vai fazer pra fumar este charuto?" Eu disse que a gente podia pedir fogo para algum homem na rua, j vi o papai fazer isso e muito engraado porque o outro homem sempre tenta acender o isqueiro mas no consegue por causa do vento, ento ele d o cigarro dele para o papai e o papai apia o cigarro dele no cigarro do outro homem e o cigarro do homem fica todo amassado e o homem fica meio chateado. Mas o Alceu me disse que eu devo ter batido com a cabea em algum lugar e ficado doido porque nenhum homem vai querer dar fogo para a gente porque ns somos muito pequenos. Que pena, ia ser to divertido amassar o cigarro de um homem com o nosso charuto enorme. "E se a gente fosse comprar fsforos num bar?", eu disse. "Voc tem dinheiro?", o Alceu me perguntou. Eu disse que a gente podia fazer uma vaquinha como a gente faz na escola no fim do ano para comprar um presente para a professora. O Alceu ficou bravo, ele disse que estava contribuindo com o charuto e que o justo era eu pagar os fsforos. "Voc pagou o charuto?", eu perguntei. "No, o Alceu me disse, eu achei na gaveta da escrivaninha do meu pai, e como o papai no fuma charuto no vai fazer falta e ele nunca vai perceber que o charuto no est mais l. - Se voc no pagou o charuto, no tem motivo para eu pagar os fsforos", eu disse. Por fim eu aceitei comprar os fsforos mas s se o Alceu viesse comigo no bar, eu tenho um pouco de medo de ir sozinho.

Entramos no bar e a mulher do caixa, onde vende cigarro, perguntou para a gente: "O que que vocs querem, meus coelhinhos? Fsforos", eu disse. "E para os nossos pais", o Alceu falou, mas isso s atrapalhou porque a dona desconfiou e disse que a gente no devia brincar com fsforos, que ns ramos dois moleques. Eu preferia antes, quando eu e o Alceu ramos coelhinhos.

Samos do bar bem chateados. E muito difcil fumar charuto quando a gente pequeno! "Eu tenho um primo que escoteiro, o Alceu me disse. Acho que ensinaram ele a fazer fogo esfregando dois pedaos de pau. Se ns fssemos escoteiros, a gente ia saber como fazer para fumar o charuto." Eu no sabia que sendo escoteiros a gente aprendia essas coisas, mas no d pra acreditar em tudo o que o Alceu conta. Eu nunca vi um escoteiro fumando charuto.

"J estou cheio do teu charuto, eu disse para o Alceu, vou embora pra casa. E mesmo, o Alceu disse, alis estou comeando a ficar com fome e no quero chegar tarde para o jantar, vai ter pudim."

E de repente ns vimos uma caixa de fsforos no cho, na calada! Pegamos depressa e vimos que ainda tinha um fsforo dentro. O Alceu estava to nervoso que at esqueceu o pudim. E para o Alceu esquecer um pudim ele tem que estar muito nervoso mesmo! "Vamos depressa para o terreno!", ele gritou.

Samos correndo e atravessamos a cerca no lugar onde est faltando uma tbua. legal o terreno baldio, a gente vai quase sempre brincar l! Tem de tudo: mato, lama, pedras, caixas velhas, latas de conserva, gatos e, o que mais importante, um carro! E um carro velho, claro, ele no tem mais rodas, nem motor, nem portas, mas a gente se diverte um bocado l dentro, a gente faz vruum, vruum, e brinca de nibus desse jeito, ding, ding, ponto final, lotado. E superlegal!

"Vamos fumar no carro", o Alceu falou. Entramos no carro e quando a gente se sentou as molas do assento fizeram um barulho esquisito, como a poltrona do vov na casa da vov que a vov no quer mandar consertar porque faz ela se lembrar do vov.

Alceu mordeu a ponta do charuto e cuspiu. Ele disse que viu fazer assim num filme de bandidos. Depois a gente prestou muita ateno para no estragar o fsforo e deu tudo certo. O Alceu foi o primeiro porque o charuto era dele, ele aspirava fazendo muito barulho e fazia muita fumaa. O Alceu levou um susto com a primeira tragada e isso fez ele tossir e ele me passou o charuto. Eu aspirei tambm mas tenho que dizer que no achei to bom assim e me fez tossir tambm. "Voc no sabe, o Alceu me disse, olha! A fumaa pelo nariz!", e o Alceu pegou o charuto e tentou fazer a fumaa passar pelo nariz e isso fez ele tossir pra burro. Quando chegou a minha vez, eu tentei tambm e consegui fazer melhor, mas a fumaa me fez arder os olhos. A gente dava muita risada.

A gente estava ali passando o charuto um pro outro quando o Alceu disse: "Isso est me fazendo mal, no estou mais com fome." O Alceu estava verde e depois, de repente, ele ficou supermal. Jogamos o charuto fora, eu estava com a cabea zonza e estava com um pouco de vontade de chorar. "Eu vou com a minha me", o Alceu falou e saiu segurando a barriga. Acho que hoje ele no vai comer o pudim.

Tambm voltei para casa. Estava tudo ruim. Papai estava sentado na sala fumando cachimbo, a mame estava fazendo tric e eu me senti mal. A mame ficou muito preocupada, ela me perguntou o que que eu tinha, eu disse que era a fumaa, mas no pude continuar a explicar a histria do charuto porque eu ainda estava me sentindo mal. "Est vendo, a mame disse para o papai, eu sempre disse que esse cachimbo empesteava!" L em casa, depois que eu fumei o charuto nunca mais o papai teve direito de fumar cachimbo.

O Pequeno Polegar

A professora explicou para ns que o diretor da escola ia embora, ele ia se aposentar. Para comemorar estamos preparando coisas incrveis na escola, vai ser como na festa de fim de ano: vo vir os pais e as mes, vamos pr cadeiras no salo, poltronas para o diretor e os professores e um estrado para fazer as representaes. Os atores, como sempre, vamos ser ns, os alunos.

Cada classe prepara alguma coisa. Os grandes vo fazer ginstica, eles ficam uns em cima dos outros e aquele que fica bem no alto agita uma bandeirinha e todo o mundo aplaude. Eles fizeram isso na festa de fim de ano e foi muito legal, s que no fim no deu muito certo esse negcio da bandeirinha porque eles caram antes de agitar. A classe acima da nossa vai danar. Eles vo se vestir todos de camponeses, com tamancos. Vo fazer uma roda, bater no estrado com os tamancos, mas em vez de agitar uma bandeirinha eles vo agitar lenos e gritar "Iup-l". Eles tambm fizeram isso no fim do ano, no foi to legal como a ginstica, mas eles no caram. Tem uma classe que vai cantar Frre Jacques e um antigo aluno que vai ler um discurso e dizer para ns que foi porque o diretor deu bons conselhos que ele se tornou um homem e secretrio da prefeitura.

Legal vai ser a gente! A professora disse que vamos representar uma pea! Uma pea como nos teatros e na televiso do Clotrio porque o papai ainda no quis comprar uma.

O nome da pea O Pequeno Polegar e o Gato de Botas e hoje a gente fez o primeiro ensaio na classe, a professora ia dizer que papis ns vamos representar. Godofredo, por acaso, veio vestido de caubi, o pai dele muito rico e compra um monto de coisas para ele, mas a professora no gostou muito da fantasia do Godofredo. "Godofredo, ela disse para ele, eu j avisei que no gosto que voc venha fantasiado para a escola. Alis, nesta pea no tem caubis. - No tem caubis?, o Godofredo perguntou, e a senhora chama isso de pea? Isso vai ser uma chatice!", e a professora ps ele de castigo.

A histria da pea muito complicada e eu no entendi muito bem quando a professora contou ela para ns. Eu sei que tem o Pequeno Polegar que procura os irmos dele e ele encontra o Gato de Botas e tem o marqus de Carrabs e um ogro que quer comer os irmos do Pequeno Polegar e o Gato de Botas ajuda o Pequeno Polegar e o ogro derrotado e fica bonzinho e acho que no final ele no come os irmos do Pequeno Polegar e todo o mundo fica contente e eles comem outra coisa.

"Vamos ver, disse a professora, quem vai fazer o papel do Pequeno Polegar? - Eu, professora, o Agnaldo falou. o papel principal e eu sou o primeiro da classe!" E verdade, o Agnaldo o primeiro da classe. Tambm o queridinho da professora e um pssimo colega que chora toda hora e que usa culos e por causa disso a gente no pode bater nele. "E voc tem tanto jeito para representar o Pequeno Polegar quanto eu para fazer renda!", disse o Eudes, um amigo, e o Agnaldo comeou a chorar e a professora ps o Eudes de castigo, ao lado do Godofredo.

"Agora eu preciso de um ogro, a professora falou, um ogro que tem vontade de comer o Pequeno Polegar!" Eu disse que o ogro poderia ser o Alceu, porque