semmais 18 abril

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www.semmaisjornal.com semanário - edição n.º 807 • 6.ª série - 0,50 € região de setúbal Sábado | 18. Abr.2014 Director: Raul Tavares Distribuído com o VENDA INTERDITA Pub. Quarenta anos depois de o eclodir da Revolução dos Cravos, fazemos contas às principais memórias que a região guarda da sua genética abrilista. E recorremos também às nossas, recuperando uma edição de 22 Abril de 1999, onde apresentámos retratos fiéis, em várias áreas, de como o distrito e as suas gentes viveram essa epopeia militar. Arquivo Américo Ribeiro/CMS Memórias de Abril na Região 40 anos da Revolução

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Page 1: Semmais 18 abril

www.semmaisjornal.comsemanário - edição n.º 807 • 6.ª série - 0,50 € • região de setúbalSábado | 18. Abr.2014 Director: Raul Tavares

Distribuído com o

VENDA INTERDITA

Pub.

Quarenta anos depois de o eclodir da Revolução dos Cravos, fazemos contas às principais memórias que a região guarda da sua genética abrilista. E recorremos também às nossas, recuperando uma edição de 22 Abril de 1999, onde apresentámos retratos fiéis, em várias áreas, de como o distrito e as suas gentes viveram essa epopeia militar.

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Memórias de Abril na Região

40 anos da Revolução

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2 . SEMMAIS . Edição Evocativa do 40.0 Aniversário do 25 de Abril de 1974 . 18 abril

40 anos Memórias de abril

Com esta edição especial, na evocação do quadragésimo aniversário da Revolução de Abril de 74, procurámos retratar as principais memó-rias de uma epopeia que guindou o país à liberdade, democracia e desenvolvi-mento. Não foram momentos fáceis e as suas múltiplas histórias e episódios fazem

parte, e sempre farão, da nossa genética social.E também fomos ao nosso baú de memórias, recupe-rando uma edição de 22 de Abril de 1999, vinte cinco anos passados sobre a Revolução dos Cravos, que sistematiza, em várias áreas da nossa vida colectiva, como o distrito e as suas

gentes viveram e partici-param nessa jornada que virou o país do avesso.É a nossa contribuição para o fortalecimento da história da região, com a chancela Semmais, desapaixonada, factual e rigorosa, num documento que vai certa-mente servir para ler, inter-pretar e guardar.

Hoje, vivemos um tempo de incerteza, com novos problemas e desafios. Mas a região mudou, numa metamorfose inapelável, porque, apesar das crises, Abril deixou-nos o mais importante de tudo: a capa-cidade de sermos nós, cada um de nós, a marcar os passos do futuro.

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ficha técnica

Director: Raul Tavares; Editor--Chefe: Roberto Dores; Redacção: Anabela Ventura, António Luís, Marta David, Roberto Dores; Dep. Comercial: Cristina Almeida (coordenação). Projecto Gráfico e Paginação: Natália Mendes. Serviços Administrativos e Financeiros: Mila Oliveira. Distribuição: José Ricardo e Carlos Lóio. Propriedade e Editor: Mediasado, Lda; NIPC 506806537 Concessão Produto: Mediasado, Lda NIPC 506806537. Redacção: Largo José Joaquim Cabecinha nº8-D, (traseiras da Av. Bento Jesus Caraça) 2910-564 Setúbal. Tel.: 265 538 819 (geral); Fax.: 265 538 819. Email: [email protected]; [email protected]. Administração e Comercial: Telem.: 93 53 88 102; Impressão: Lisgráfica. Tiragem: 45.000 (média semanal). Distribuição: VASP e Mediasado, Lda. Reg. ICS: 123090. Depósito Legal; 123227/98SSTAF: Coordenação Paineis: Vanda Pinto; Secretariado: Mila Oliveira; Cristina Almeida, Mafalda Correia e Sofia Correria; Fotografia: Humberto Sousa e Green Media; Comunicação: Green Media. Especial agradecimento a Sérgio Mateus (Câmara de Setúbal) e equipa técnica do Fórum Municipal Luísa Todi.

Índice 4-5 Mensagens

6-7 Alta tensão sobre as águas do Tejo

11 Festival de canções contra o regime

12-13 Quando o Vitória esteve perto de ser municipalizado

Agitação no caldeirão de liberdade3

14 Comemorações

Entrevista Carlos Beato

8-9

10 Quando o distrito (re)nasceu d’Abril

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Abril sempre novo Cumprem-se 40 anos da r e v o l u ç ã o democrática do 25 de Abril. Uma revolução

cujo profundo significado teve reflexos e influências positivas sobre todos os aspetos da vida nacional.

Nesta indissociável ligação entre os valores da Liberdade da

Democracia e da Justiça Social que o 25 de Abril preconizou e as lutas dos trabalhadores pela conquista de direitos políticos, económicos, sociais, laborais e culturais, histo-ricamente simbolizadas nas come-morações do 1º de Maio, se foi percorrendo um longo e prodi-gioso caminho, cheio de vitórias e derrotas, avanços e recuos, na história dos trabalhadores e do povo português.

A par deste processo de mudança e transformação social, têm vindo a ser desferidas contra os trabalhadores fortes investidas com consequências tão graves no

plano social criando um enorme fosso entre pobreza e riqueza, a desvalorização dos salários e pensões, a supressão de direitos fundamentais, a ameaça às liber-dades, o alastramento da corrupção, a crise na justiça, o avanço da explo-ração, o cerco à escola pública, o ataque à Administração Pública (desmantelando serviços e atacando os seus trabalhadores), a privati-zação de importantes setores da nossa economia, o ataque à nego-ciação colectiva, ao serviço nacional de saúde e à segurança social, a destruição do nosso aparelho produtivo.

É tempo de encarar o futuro.Em nome do Município de

Alcácer do Sal, a que presido esta-remos sempre de portas abertas para receber este abril novo, para agarrar estes ideais da revolução e traduzi-los numa Alcácer de exce-lência.

É por isso que estamos ao lado da população na luta e na defesa das suas causas mais justas.

Todos unidos, por um ABRIL SEMPRE NOVO!

Presidente da Câmara Municipal de Alcácer do Sal

Vitor Proença

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continua nas páginas 4, 5 e 9

Page 3: Semmais 18 abril

SEMMAIS . Edição Evocativa do 40.0 Aniversário do 25 de Abril de 1974 . 18 abril . 3

Agitação no caldeirão de liberdade

Com a revolução nas ruas, centrada na capital, Almada foi onde se registaram as maiores manifestações

espontâneas. Buzinava-se e gritava---se ‘liberdade’, já não havia retorno, embora a vizinha Lisboa vertesse sustos em catadupa, com os agentes da PIDE a recusarem entregar as armas. Mas as horas de medo, essas passaram.

Setúbal, a capital do distrito, desertificou. Pelo menos foi esse o testemunho dado ao Semmais, numa edição especial em Abril de 1999 pelos casais Quintas, socialistas, e Lobo, comunistas desde sempre. «Eram 8h30 da manhã», quando Victor e Conceição Quintas souberam do golpe pela rádio, o meio de comu-nicação privilegiado na época. «Eu fui para a escola, não dei aulas», lembra Conceição. E à noite, o casal decidiu jantar fora encontrando aberto o ‘David dos Frangos’, uma tasquinha sadina, onde apenas se encontrava Francisco Lobo, que viria a ser eleito presidente da Câmara de Setúbal, e a esposa. Acabariam a passear pelas ruas desertas. «Falá-vamos sobre o futuro democrático e sobre a alegria de podermos falar livremente e em liberdade», contaram ao Semmais.

Com o avanço sucessivo da Revolução, a 28 de Setembro, com a derrota dos ‘spinolistas’, o PCP começa a ganhar força. As lutas labo-rais subiram ao palco político, com Barreiro e Almada na crista da onda. «Spínola defendia a liberdade sem partidos, uma liberdade condicio-nada, isso era impensável», lembrava na mesma edição, Américo Leal, eleito deputado para a Constituinte.

E o PCP movimentava, com a robustez das suas forças e a expe-riência organizativa de décadas na clandestinidade, a luta popular. «Era difícil as massas não exigirem que o PCP estivesse representado num governo para o qual tinha contri-buído», Afirmava Leal.

Por seu lado, o PS travava a luta para agarrar o movimento social e garantir eleições para a Assembleia Constituinte, enquanto que o PSD afirmava a social-democracia como via para o socialismo democrático reformista e o CDS aceitava o socia-lismo como objectivo da revolução. Em causa, ao sabor da genética revo-lucionária estava a vivenciar-se um fenómeno de esquerdi-zação global da política nacional. «Todos os partidos se posicionaram na sua ala esquerda», lembrava em 1999 Cardoso Ferreira, um dos ‘barões’ do PSD de Setúbal e experimentado deputado da nação. E isto porque, sublinhava, «Nos primeiros anos da revolução quem se posicionasse à direita era votado ao ostracismo». Só mesmo com o amadurecimento da democracia as matrizes ideoló-gicas se recentraram.

Com o PCP na mó de cima, surgem os primeiros confrontos físicos. «Provocações de direita», clamavam os militantes comunistas e mesmo da chamada extrema-

-esquerda, com sinal forte para o MRPP. Do lado oposto, a acusação de o PC não querer a «democracia parlamentar».

Há episódios que marcam este período prolongado até ao Verão quente de 1975, como o que ocorreu no boicote ao comício do PSD, a 7 de Março deste ano, no Clube Setu-balense, com actos de violência. «Magalhães Mota não chegou a falar e refugiámo-nos na sede, do Bairro Salgado, cercados por centenas de manifestantes de extrema-esquerda», recordava Cardoso Ferreira.

A vinda de Sá Carneiro à Praça de Touros de Setúbal na campanha de 1975, marcou as lutas pela colagem

e descolagem de cartazes e a «vigilância por turnos». Em Sesimbra, Freitas do Amaral foi banido da vila, antes de um comício no ginásio Local. E múltiplos

episódios do género assumiram o dia-a-dia e as rotinas políticas desse agitado período. «Nunca assaltámos sedes de outros partidos», assumia na edição do Semmais de 1999, o diri-gente comunista Américo Leal, partido que nessa altura degladiava a unici-dade sindical, contra os desejos do PS, com turbulências constantes nas fábricas da região.

Retirados de texto de Humberto Lameiras

da edição de 22 de Abril de 1999

Entusiasmo ‘abrilista’, agitação nas ruas e muita violência partidária, assim se viveu a revolução na região. Um fervilhar que se agigantou até ao 25 de Novembro de 1975. O PS assume o poder e o PCP pinta o distrito de vermelho.

Nas eleições de 25 de abril de 75 realizam-se as eleições para a assembleia constituinte. O PS ganha com 38,9 por cento dos votos, seguido do PPD, PCP, CDS, MDP/CDE e da UDP. No 25 de Novembro dá-se um momento de grande tensão, «muitos militantes do PS fugiram do Barreiro para o Montijo», recordava em 99, o diri-gente do PS de então, José Bastos. Melo Antunes, quase ilegalizou o PCP, porque, recordava Cardoso Ferreira, do PSD, «por um fio não tomaram as rédeas do país».

A persistência dos comunistas levou à reconquista das comissões administrativas locais do distrito de Setúbal. Mas, nas primeiras legisla-tivas de 1976, o PS volta a ganhar, com 33 por cento, seguido do PSD e do PCP. O comunista Américo Leal, lembrava ao Semmais que o seu partido deixara-se «ultrapassar», lembrando a luta das autarquias nesse mesmo ano, com a então Aliança Povo Unido, a ganhar a maioria das câmaras da região, com excepção de Setúbal, Alcochete e Montijo.

PS ganha terreno nacional, PCP cria ‘distrito vermelho’

Manifestação na rua Capitão Leitão, em Almada, com moldura humana impressionante

Incerteza ideológica e lutas partidárias ao rubro

Retrato Sociedade

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4 . SEMMAIS . Edição Evocativa do 40.0 Aniversário do 25 de Abril de 1974 . 18 abril

40 anos Memórias de abrilMensagens

Continuaremos a construir Abril Comemoramos este mês os 40 anos do 25 de Abril, um dos mais importantes acon-tecimentos da história do nosso país e que em Grân-dola, Vila Morena, é vivido intensamente.

A revolução dos cravos pôs fim a 48 anos de ditadura fascista e operou profundas transformações democráticas politicas, económicas, sociais e culturais, sendo o poder local democrático umas das suas maiores conquistas.

A afirmação do Poder Local e as profundas transfor-mações operadas pela sua intervenção, melhorando bastante as condições de vida das populações, são insepa-ráveis das características profundamente democráticas e da dinâmica popular que se seguiu à Revolução.

Importa pois continuar a defender Abril e o Poder Local, numa altura em que este sofre um ataque sem precedentes na história da democracia através dos cons-trangimentos financeiros, da redução da autonomia, da extinção de Freguesias e do enfraquecimento das funções sociais do Estado que desqua-lificam os territórios tornando as populações mais vulne-ráveis.

Apesar das dificuldades e limitações, Grândola conti-nuará a construir Abril, traba-lhando para se tornar um concelho mais democrático, mais justo, mais solidário, mais fraterno e mais desenvolvido.

Presidente da Câmara Municipal de Grândola

António de Jesus Figueira Mendes

Comemora-se em 2014 a passagem de 40 anos sobre o movimento do 25 de Abril de 1974, 40 anos de liber-dade, marco absolutamente singular na história do povo português.

Para essas comemorações, a Câmara Municipal do Montijo decidiu promover um conjunto

de iniciativas comemorativas dos 40 anos do 25 de Abril de 1974, por meio das quais assinala, em articulação com diversas entidades locais, os valores fundamentais conquistados pela democracia, como os direitos humanos, os direitos cívicos, os direitos sociais e a liberdade, essenciais na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

Hoje, a crise em Portugal e em muitos lugares do mundo, está a transformar-se num instrumento de dominação, e serve para legitimar ideias que, de outra forma, nenhum de nós estaria disposto a aceitar. Serve para impor soluções, ditas inevi-táveis, que corrompem a nossa capacidade de decisão e a nossa liberdade.

Precisamos de recuperar a energia de Abril, porque

somos responsáveis pelo que fazemos, mas também somos responsáveis pelo que deixamos de fazer. Somos responsáveis pelas lutas que travamos, mas também por aquelas que renunciamos.

Temos de estar presentes em todos os debates sobre a sociedade, temos de realizar estudos, de preparar alternativas, de informar decisões. Temos de nos ligar à economia, ao desenvolvimento, à criação de emprego. Temos de construir espaços de trabalho com as empresas, de participar nos processos de mudança, de inovação tecnológica e do conhecimento. É neste vínculo, neste compromisso, entre o conhecimento e a sociedade, entre o conhecimento e a economia, que se encontra a chave para o futuro.

No Montijo, o espírito do 25 de abril continua vivo em todos nós, nas nossas decisões e atitudes, pelo que não nos resignamos ao desânimo, ao pessimismo ou à descrença. É precisamente nos momentos de crise que os governos e os governantes são chamados para a inovação, para a criatividade, para o desen-volvimento económico, pela criação de emprego e pelo bem-estar dos cidadãos montijenses.

Presidente da Câmara Municipal do MontijoNuno Canta

Um dia de reflexão 1974, vivemos seguramente os tempos mais difíceis dos últimos 40 anos. Vivemos num período que entra claramente em conflito com o que Abril representou de conquista, transformação, reali-zação e avanço. Estamos a atra-vessar tempos de um país em

profunda crise económica, social e também polí-tica. A Saúde e a Educação para todos, a Segurança Social universal e solidária, o Poder Local Demo-crático e todos os serviços públicos essenciais para o bem-estar e qualidade de vida dos portugueses estão ameaçados. Estes são, sem dúvida, os maiores ataques desferidos, depois do 25 de Abril, contra os direitos dos trabalhadores, o Poder Local, a auto-nomia administrativa e financeira das autarquias, os serviços públicos de qualidade. Comemorar Abril é renovar a esperança por melhores dias.O 25 de Abril de 2014 deve ser um dia de reflexão, de cele-bração e de debate de ideias para um Portugal melhor e com futuro para os nossos jovens. O Município de Santiago do Cacém comemora, em todas as suas freguesias, os 40 anos do 25 de Abril. São várias as iniciativas culturais, musicais, desportivas e popu-lares que a população tem à sua disposição e que serão promovidas em conjunto com as Juntas de Freguesia, Associações, Grupos Desportivos e Cole-tividades.

Viva o 25 de Abril, Viva o Poder Local, Viva a Luta dos Trabalhadores!

Presidente da Câmara Municipal de Santiago do Cacém

Álvaro Beijinha

40 Anos Passados: Olhar o Presente, Pensar o Futuro

Celebrar o 25 de Abril de 1974 quarenta anos passados deve ser, sobretudo, olhar o presente e pensar o futuro.

Ao golpe militar na madru-gada do dia 25, juntou-se quase de imediato o levantamento popular e da aliança Povo-

-MFA assim nascida resultou o poderoso processo transformador da Revolução de Abril, cujos efeitos perduram na nossa organização política e social, apesar dos anos de retrocesso e desman-telamento das conquistas da Revolução.

Neste tempo em que o nosso País vive uma profunda depressão social e económica, o povo português foi defraudado nas expectativas que Abril abriu. Afinal, não foi este o Portugal sonhado há quarenta anos; não foi este o Portugal por que lutaram gerações de resistentes ao fascismo; não foi este o Portugal esboçado nas conquistas da Revolução.

Mas é em Abril e nos seus valores que reside a esperança e a confiança de que o nosso futuro não tem que ser este triste fado a que nos querem condenar.

Este é o tempo de afirmar que é na epopeia de Abril e nos seus valores que podemos encon-trar os caminhos para devolver aos Portugueses a sua Pátria e o seu futuro.

Presidente da Câmara Municipal da Moita

Rui Miguel Marques Garcia

Um marco singular

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Alimentar a esperança de um país com futuro

Nesta festa dos 40 anos de Abril sabemos que somos

capazes de contrariar este caminho forçado por onde nos querem levar; sabemos que somos capazes de afirmar os ideais de justiça em que os capitães de abril nos fizeram de novo acreditar em 1974.

Sabemos tudo isto mesmo que nos digam, incessantemente, que só há o caminho do empobreci-mento, da negação das conquistas de Abril, do retrocesso social. A história ensina-nos que é falso que apenas existam inevitabili-dades. Os povos têm contrariado sistematicamente esta tese que apenas serve quem deseja o imobi-lismo social e político, apenas serve quem deseja perpetuar a desigual-dade e a injustiça do empobreci-mento forçado de muitos para assegurar o enriquecimento rápido de uns poucos.

Nestes 40 anos de Abril, temos a maturidade necessária, a sabe-doria imprescindível para sabermos que não há inevitabi-lidades no curso da história; não há caminhos únicos.

Nestes 40 anos de Abril, afir-mamos, ainda com alegria e vigor, que somos capazes de fazer uma sociedade melhor, mais justa; uma sociedade que trabalha para acabar com as desigualdades, onde os direitos sociais alcançados não são olhados como ilegítimos direitos adquiridos de quem quer viver acima das suas possibili-dades.

Queremos apenas viver digna-mente.

Os ideais que floresceram vermelhos nos canos das espin-gardas de Abril são a melhor garantia de que poderemos, todos, viver com a dignidade e a justiça a que temos direito.

Por isso, comemorar Abril, comemorar a Revolução é um dever nestes 40 anos de luta contínua, a luta que continua-remos a travar em defesa do que conquistámos tão arduamente.

Presidente da Câmara Municipal de Setúbal

Maria das Dores Meira

A passagem dos quarenta anos do 25 de Abril sugere-nos meditar no feito em toda a sua extensão. E, meditando, certamente não serão poucos aqueles que se surpreendem e se interrogam:

Como foi possível!? Liberdade de expressão, democracia, eleições

livres, descolonização, poder local, férias, subsídio de férias, subsídio de Natal, direito à greve, salário mínimo, reforma, subsídios de doença e de desem-prego, saúde, habitação, justiça, solidariedade social, educação, cultura e muitas outras palavras, temas ou expressões que ganharam naquela época um sentido novo e uma dimensão humana, até aí desco-nhecida da generalidade dos portugueses.

Foram momentos inolvidáveis!É verdade que nem tudo foi um mar de rosas,

enfrentámos e ultrapassámos enormes obstáculos. Portugal estava desestruturado em quase todas as áreas da vida política e social. Na setor da habitação, por exemplo, era dramática a falta de casas. Esti-mava-se o défice em meio milhão de fogos. Situ-ação complicada e agravada nos anos seguintes com a chegada de mais de meio milhão de retor-nados de África.

Nas cidades, vilas e aldeias do nosso país a Revo-lução construía escolas e jardins, abria estradas, fazia pontes e fontes, criava associações e cooperativas, proporcionava esclarecimento, acrescentava cultura ao povo que trabalhava nos escritórios e nas fábricas, nos campos e na pesca.

Foi assim no nosso país. Foi assim em Sesimbra. Foi assim na Quinta do Conde. Havia esperança. Esperança com letra maiúscula, assente na convicção da irreversibilidade do “25 de Abril” e das suas conquistas.

Mas... confiámos em excesso! Deixámo-nos “embarcar no conto do vigário” e, observamos agora,

que hipotecámos muitas das conquistas da Revo-lução. Portugal tornou-se desigual. Há muita pobreza. Há muita miséria. O Poder Local foi mutilado. O acesso à saúde está mais difícil. A educação pública está em causa. Tal como a justiça, a habitação, a soli-dariedade social, os direitos laborais. Com outras palavras, temos de regresso “a sopa dos pobres”. Parece que as palavras têm agora outro sentido. Parece que foram desvirtuadas. Em muitos portu-gueses a esperança e a confiança deram lugar à frus-tração e à resignação. Hoje, instrumentalizados por uma Comunicação Social dominada e controlada, são muitos os que acreditam na inevitabilidade das malfeitorias que nos aplicam.

Resignar? Ceder? Desistir? Trair o País e o 25 de Abril? Não! Portugal e os portugueses deram provas, noutras ocasiões dificeis da sua História, que são capazes, são competentes e bastantes para vencer as adversidades e os inimigos do progresso.

Trata-se, não apenas de um imperativo cons-titucional, e aproveito para destacar que a Cons-tituição da República tem no seu preâmbulo a frase lapidar e inspiradora que “afirma a decisão do povo português de defender a independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de estabelecer os princípios basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista, no respeito da vontade do povo português, tendo em vista a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno.”

Não é apenas um imperativo constitucional. É também dar sentido à vida. Lutar no presente para alimentar a esperança e construir um futuro digno, para nós e para os nossos filhos. Na nossa Terra.

Viva o 25 de Abril!

Junta de Freguesia da Quinta do CondeVítor Antunes

Para um 25 de Abril Sempre!Há 40 anos Portugal libertou-se de um dos períodos mais obscuros da sua história com uma revo-lução pacífica, que surpreendeu o mundo, e teve como símbolo uma flor. Quatro décadas depois,

o cravo vermelho continua a ser imediatamente asso-ciado ao 25 de Abril de 1974. Há, no entanto, outros símbolos da revolução, que estão de tal forma enrai-zados no nosso dia a dia que por vezes nos esque-cemos da sua importância, e sobretudo, das lutas que foram travadas para os conquistar. Falo do sane-amento básico, do abastecimento público de água, da eletricidade, que hoje chegam praticamente a todos os lares, da erradicação de barracas, das vias de comu-nicação, dos espaços verdes, da requalificação do parque escolar, do acesso à saúde, à cultura, ao desporto, aos apoios sociais, à cidadania e, sobre-tudo, do Poder Local Democrático, que permitiu que

uma comunidade passasse a escolher os seus repre-sentantes e o seu destino. Foram as câmaras muni-cipais e as juntas de freguesia que esteve ao lado das populações nos primeiros anos da revolução, ouvindo, partilhando, sugerindo. Foi o Poder Local que garantiu que as necessidades básicas de um povo que viveu mais de quatro décadas na pobreza, se tornassem numa realidade. Hoje, passados 40 anos, é o mesmo Poder Local que, mesmo com orçamentos reduzidos, que para além de todas as suas funções cria programas de apoio para famílias que estão a ser atiradas para a pobreza por um Governo que vive a miragem dos números. Tal como o cravo de Abril, que levantamos no ar com firmeza e orgulho, também estes símbolos da revolução devem ser enaltecidos e defendidos, não só em Abril, mas todos os dias! 25 de Abril Sempre!

Presidente da Câmara Municipal de SesimbraArqto. Augusto Pólvora

Afirmar Abril

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40 AnoS Memórias de Abril

Alta tensão sobre as águas do Tejo

Ainda a manhã acordava e já Almada se via invadida pela coluna militar oriunda da Escola Prática de Arti-

lharia de Vendas Novas que, mais tarde, havia de tomar o Cristo-rei.

O objectivo de Ferreira de Sousa, o capitão que comandava a coluna sob a coordenação do MFA, a partir da Pontinha, era muito claro: instalar uma bateria no ponto mais alto de Almada, para, caso fosse exigido, bombardear Lisboa, nomeadamente o Terreiro do Paço, onde se instalava o poder e os seus ministérios. Não foi necessário. Salgueiro Maia e as suas tropas já controlavam a situ-ação a norte do Tejo.

No seu percurso até ao sopé do

santuário, os militares de Vendas Novas nem se deram conta do episódio ocorrido com os seus cama-radas do Regimento de Infantaria do Onze, em Setúbal. Tomando conhe-cimento do avanço da coluna, o coronel Carvalho Fernandes (saneado posteriormente pelo MFA), que lide-rava o ‘Onze’, ordenou que uma companhia se fizesse à estrada, alega-damente para impedir a progressão das tropas revolucionárias. Cento e tal homens, liderados pelo major Serra, que deram apenas uma volta ao quarteirão, pela Luísa Todi.

O quartel do Onze desempenhou, segundo as fontes do Semmais, «uma neutralidade activa», o que signifi-cava, referem as fontes, que ninguém se colocara ‘de pronto’, ao lado do situacionismo, mas «havia muitos que não se importavam que o golpe fracassasse».

O grande papel dos aquartela-mentos sediados no distrito foi, no entanto, dos Fuzileiros de Vale de Zebro e do Batalhão de Transmis-sões da Trafaria, este último assegu-rando as codificações das investidas militares. «Sabíamos as cifras e íamos

Coluna que tomou Cristo-rei atravessou Setúbal nas ‘barbas’ do Regimento de Infantaria do ‘Onze. Os Fusos de Vale do Zebro foram mais activos e o Batalhão da Trafaria alinhou comunicações. Sem esquecer a fragata no Tejo. Resumo das operações militares na região.

Pub.

Retrato Militar

Os fuzileiros de Vale de Zebro desempenharam papel activo no apoio à coluna do Cristo-rei e na tomada da sede da PIDE

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SEMMAIS . Edição Evocativa do 40.0 Aniversário do 25 de Abril de 1974 . 18 abril . 7

fornecendo as melhores frequências para o êxito das operações no terreno nas várias frentes», contou um oficial com intervenção directa no processo.

Os Fuzileiros, por sua vez, além do apoio que deram à coluna de arti-lharia de Ferreira de Sousa, instalada no Cristo-rei, tomaram o Forte de Caxias e da sede da PIDE, por na véspera duas companhias do Regi-mento de Infantaria 1, da Amadora, se ter recusado a cumprir essa missão. As opera-ções foram lideradas pelo então comandante de destacamento, Abrantes Serra, e pelo Oficial de marinha, Vargas Mendes.

Um dos momentos de maior tensão ter-se-á passado nas águas do Tejo, com a presença da fragata Gago Coutinho que, integrada numa esquadra da NATO, à beira de zarpar para exercícios em Nápoles, sobe o rio e toma posição frente ao Terreiro do Paço, com as suas peças de guerra em posição de fogo. «Recebemos

ordens para sair da formatura e andarmos às voltas. Atendendo a que a marinha tinha tomado posição de neutralidade não entendemos quando o nosso almirante mandou abrir fogo, com tiros de salva. Avisei-o de que os oficiais se recusavam a cumprir a ordem», contou ao Semmais, Caldeira Santos, então ‘imediato’.

Tirando este facto maior, a força activa dos ‘fusos, a estratégica coluna

de Vendas Novas e o cari-cato episódio da compa-nhia do ‘Onze’, não há registo de outros episó-dios militares. Também

à época nesta área militar não havia muitos capitães.

A rede de contactos estava montada desde Janeiro de 74. O supe-rintendente Chumbinho, que exerceu depois altas funções na PSP, foi um dos capitães que assinou a célebre ‘folhinha azul’, que esteve na base da rebelião militar. O coronel Pontes Miquelina, teve papel «activo» no ‘Onze’ pró-golpe e após o eclodir da

revolução participou na organização militar S.O.I , importante na ligação do MFA com o povo, que funcionou na Praça do Bocage, em Setúbal.

No Distrito de Recrutamento, o ex-comandante dos Sapadores de Setúbal, Quaresma Rosa, então sargento-ajudante, ficou a noite em claro. «Acompanhei os movimentos

do golpe. Às oito da manhã, começou a chegar o pessoal e, contrariando alguns rapazinhos mais inquietos, começámos a retirar os quadros de Salazar e Caetano», recordou ao Semmais.

Retirados de texto de Raul Tavares da edição de 22 de Abril de 1999

Pub.

As forças do Destacamento Rural de Setúbal da GNR (similar ao actual comando distrital) entraram de prevenção por volta das três da madrugada. O golpe eclodira, mas as cúpulas da chamada guarda militar julgara que as escaramuças estavam controladas pela situação. A última chamada que recebi foi às cinco, seis da manhã. Depois nunca mais me ligaram, ficámos entre-gues ao bom senso», lembrou à reportagem do Semmais de 1999, o major Reis Moura, na altura jovem tenente inebriado pelos ventos revolucionários.

E a partir do meio-dia a guarnição ficou à disposição do novo poder. «Éramos uma força pequena que dependia de Évora e integrava Almada», acrescentava a fonte. Nos dias seguintes, e já sob o comando de uma ‘comissão administrativa’ militar nomeada pela Coordenadora do MFA, os soldados da GNR de Setúbal estiveram quase sempre recolhidos, sendo que a sua primeira saída de serviço ocorreu no dia 1 de Maio de 74.

A neutralidade da GNR

Canhões no Tejo apontados à capital

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40 AnoS Memórias de Abril

Carlos Beato recorda momentos ‘quentes’ da coluna de Salgueiro Maia na operação “Fim Regime”

Que memória guarda, nomeada-mente, dos primeiros passos que conduziram a sua coluna até ao Terreiro do Paço?As memórias que guardo, são es-pecialmente, do orgulho de ter tido a oportunidade de participar na “Operação Fim Regime”, integran-do a coluna da Escola Prática de Cavalaria, sediada em Santarém, e comandada pelo saudoso Capi-tão Salgueiro Maia e composta por cerca de 240 militares todos com pouco mais de 20 anos. Foi um enorme risco, mas também uma grande honra, poder ter participa-do de forma tão activa na devolu-ção ao nosso povo, da Liberdade e da Democracia.

De que forma viveu os dias que antecederam à revolução a par-tir do momento em que foi toma-da a decisão de avançar?Para mim, e para a maior parte dos Oficiais Milicianos, não foram dias, foi apenas um dia, o 24 de Abril. Pois, Salgueiro Maia, de quem tive o privilégio de ser Adjunto na EPC, “desafiou-me” nos finais de 1973, nos segredos e nos silêncios da Pa-rada Chaimite, para eu entrar numa acção militar que estava em pre-paração, e que não me explicou bem quais os contornos, destina-da a pôr fim ao estado a que o País tinha chegado.Eu nunca fui activista político-par-tidário, apenas pertencia ao vas-to conjunto de portugueses que eram “do contra”, mas a Salguei-ro Maia não se dizia que não, tal o seu carisma, o seu prestígio mili-tar e a sua liderança, em especial junto dos Milicianos. E, portanto, imediatamente lhe dis-se: “Pode contar comigo, meu Ca-pitão!”.Depois, ao longo dos meses que se seguiram, fomos tendo conheci-mento de várias reuniões clandes-

tinas do MFA – Movimento das For-ças Armadas, que era composto essencialmente por Militares do Quadro Permanente.Até que um dia, como diz o povo há sempre um dia, a 24 de Abril, por volta das 11h00 da manhã, o Capitão Salgueiro Maia, novamen-te na mesma Parada - e sozinhos - (é bom não esquecer que havia a PIDE) me sussurrou:“Rapaz Beato, é logo à noite!”A minha coluna verte-bral como que “gelou”….!É que uma coisa foi dizer que sim a essa grande figura de militar e de cidadão ainda no final de 1973. Ou-tra bem diferente, era e foi, a Ope-ração Militar ir ter lugar nesse mes-mo dia de Abril, à noite.

A partir desse momento, com um misto de satisfação e preocupação, foi também em total sigilo, come-çar a preparar o meu grupo de ho-mens, o meu Pelotão, o Sexto, e es-perar que, à meia-noite, como es-tava planeado, a Rádio Renascen-ça passasse a senha “Grândola Vila Morena”, como veio, de facto, a

acontecer para bem de Portugal, das Portugue-sas e dos Portugueses.

Reteve alguns momen-tos especiais que pos-

sam ter sido de ‘abalo’, por algu-ma ter corrido de forma menos espectável face ao que estava em causa?Bom, o grande e verdadeiro “aba-lo”, foram os cerca de 20 minu-tos, que mais pareceram 20 ho-

ras, em que desde a meia-noite, fechados no quarto do Capitão Salgueiro Maia, onde estavam reu-nidos os Oficiais da Coluna Mili-tar, para receber as últimas indi-cações sobre a operação, e os sons da bela cantiga de Zeca Afonso tei-mavam em não se fazer ouvir, na rádio.

Qual era o sentimento dos pra-ças e quando é que lhes foi co-municado a investida sobre Lis-boaAs Praças não sabiam, nem podiam saber, de nada. Só depois da “Grân-dola” é que o Capitão Salgueiro Maia ordenou, por volta da 1h00 da manhã, que se acordasse todo o pessoal e reunissem na Parada Môngua, onde falou às tropas e deu conta do que se iria passar.

«Se o M47 tivesse aberto fogo tínhamos morrido todos e Abril tinha acabado ali!»Ao lado de Salgueiro Maia, de que era adjunto, o então alferes Carlos Beato, ex-presidente da Câmara de Grândola e Comendador da nação, viveu por dentro, antes, durante e depois, todas as incidências da Revolução. São esses sentimentos e memórias que plasmamos nesta ‘apetitosa’ entrevista.

Carlos Beato, tornado Comendador da Liberdade, pelo presidente da República, na cerimónia de Évora, em 2013

Entrevista

Quando Salgueiro Maia mandou avançar quase que gelei

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Como adjunto de Salgueiro Maia, nos momentos mais quentes foi obrigado a tomar alguma inicia-tiva mais delicada?O Adjunto do Comando na Colu-na Militar era o Tenente Alfredo Assunção, que mais tarde, e em boa hora e por mérito próprio, veio a ser General. General de Abril.

Dois dos momentos que apaixo-naram os portugueses tiveram a ver com a presença do blindado M47, às ordens de Junqueira dos Reis, que ordenou fogo sobre a vossa coluna. O outro, terá sido a rendição de Marcelo Caetano. O regime tinha caído. Como viveu e que protagonismo teve nesses dois episódios?O momento do “tanque M47” nas imediações do Terreiro do Paço, para mim, é decisivo na vitória do 25 de Abril.Se o Cabo apontador Alves tivesse obedecido às ordens do Brigadei-ro Reis para fazer fogo, tínhamos morrido todos e a Operação Mili-tar “Fim Regime” tinha acabado ali, e o Sonho de voltarmos a ser Livres tinha ficado pelo caminho.Felizmente o Cabo Alves, que es-tava “do lado contrário” teve a co-

ragem e a visão de apenas obede-cer ao seu Alferes, que era o Co-mandante do Carro de Combate. Este é mais um exemplo do papel que os Militares Milicianos desem-penharam na Revolução.Eu e o meu Pelotão, que estáva-mos instalados junto à Câmara Mu-nicipal de Lisboa, assistimos a tudo. Sobre a Rendição do Presidente do Conselho de Ministros de então, Professor Marcelo Caetano, no Lar-go do Carmo, recebi ordens do Ca-pitão Salgueiro Maia, por volta das quatro da tarde, para deslocar os meus homens para o telhado do edifício da Companhia de Seguros Império e, de lá, fazermos as raja-das de tiro de aviso para a fachada do Quartel do Carmo, cujas marcas in-felizmente já foram apagadas, e com elas apagou-se também um pouco da história do 25 de Abril, nesse dia.No Largo do Carmo, o Capitão Sal-gueiro Maia, apenas com 29 anos, pôs, mais uma vez à prova toda a sua capacidade de comando mili-tar, toda a sua determinação, va-lentia, carisma e liderança. Um Grande, Grande Comandante. Um

Homem de “Palavra de Honra”. Um homem que viveu para servir e não para se servir.

Depois da vida militar, a vida cí-vica e política, que importância teve para o seu futuro e carreira essa vivência da revolução dos cravos?A importância, confesso que não teve muita. Mas, naturalmente, que acabou por ter alguma pois, em determinados momentos e a vários níveis, no exercício dos Car-gos Públicos e Privados que te-nho desempenhado, o estatuto de

Militar de Abril, para o Bem e para o Mal, aca-bou por marcar algu-ma coisa.

Como vê o país demo-crático de hoje e as conquistas al-cançadas nestes 40 anos?Quer se queira, quer não, há que reconhecer que o Portugal de hoje é muito diferente e não tem com-paração possível com o Portugal de 24 de Abril. Mas, ao assistirmos ao encerramento de algumas das “portas que Abril abriu”, é algo que começa a ser preocupante, para não dizer em certos casos, mes-

mo revoltante. Mas é preciso ter esperança, que como diz o povo, deve ser a últi-ma a morrer. Como? Reforçando os caminhos da cidadania. Quan-to mais cidadãos de corpo inteiro formos, melhor estamos prepara-dos para nos defendermos e po-dermos contribuir activamente para a construção de uma Socie-dade mais justa e solidária, em que as oportunidades possam estar ao alcance de todos. Também por isso se fez Abril.

Estarão em risco, porventura, al-gumas dessas conquistas no ac-tual quadro político e social?A minha resposta anterior diz qua-se tudo o que eu penso sobre isso. Mas, que temos que estar mais aten-tos ao que se passa à nossa volta, ai isso temos…!Uma mensagem que transmita o espírito abrilista para o futuro pró-ximo.A mensagem que quero deixar por ocasião da comemoração dos 40 anos do 25 de Abril é que, não obs-tante todos os problemas e vicis-situdes, não pode haver dúvidas QUE O 25 DE ABRIL VALEU A PENA!!!

O estatuto de militar de Abril marcou-me para a vida

Da esq. para a dta: Beato numa picada em Moçambique, em 72. Chegada a Santarém, na noite de 27 de Abril de 74. Numa comemoração de Abril no teatro Rosa Damasceno. E a foto ícone, com Salgueiro Maia, em plena operação.

A Revolução dos Cravos é o acon-tecimento mais importante da história contemporânea de Portugal. Os valores que o povo conquistou em Abril de 1974 continuam a ser os fundamentos da nossa democracia: liberdade de expressão, liberdade de associação, liberdade de voto. Quando nestes anos da crise se diz

que Portugal precisa de um outro 25 de Abril, isso traduz insatisfação com muitos aspetos do que é o estado atual do país, mas também significa que a revolução como a fizeram os capitães continua a ser uma refe-rência de ética pública e uma fonte onde a esperança se renova. Como representante do poder local demo-crático, o nível de poder que maiores e mais profundas mudanças operou na vida das comunidades, sinto o 25 de Abril muito próximo, e é guiados pelo seu espírito de abertura e diálogo com as populações que procuramos seguir o nosso rumo de governação deste concelho.

Presidente da Câmara Municipal de Sines

Nuno Mascarenhas

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«Houve muita coragem e determinação dos militares de Abril»

CORONEL JOãO ANDRADE DA SILVAOutro dos Capitães de Abril, regressou de África para Portugal em 1973, com a intenção de mudar o rumo do País. Integrou o primeiro movimento de capi-tães e chefiou a tomada à Escola

de Artilharia de Vendas Novas, às 22h55, ao som da 1.ª senha. «Prendemos o comandante, que julgávamos que estava armado. Não foi fácil, porque é uma unidade com grande potencial militar», recorda, acrescentando: «Saímos em direcção ao Pragal às 3 da manhã, com 250 homens. Virámos os canhões para o rio. Houve muita coragem e deter-minação por parte dos mili-tares de Abril. Felizmente, dominámos as situações difí-ceis sem tiros», concluindo: «O 25 de Abril é um acto de coragem de jovens e não se compadece com corrupção, empobrecimento e desprezo pelas pessoas com dificul-dades».

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Quando o distrito (re)nasceu d’Abril

A madrugada da revolução apanhou a maioria dos concelhos do distrito num profundo estado de miséria

fomentada ao longo de 48 anos de Estado Novo. O desemprego, a fome e o medo, grassavam um pouco por todo o lado, acompanhados da falta de água, energia e saneamento básico. Já para não falar dos equipamentos escolares, de saúde e habitação que eram, à época paupérrimos.

E por via disso, o 25 de Abril encontrou o distrito recheado de bairros de lata, onde, para lá se chegar, era preciso atravessar autênticos ‘caminhos de cabra’, uma vez que as vias internas de comunicação eram nesses locais praticamente inexis-tentes.

Tudo isso mudou, ao longo das décadas a seguir à revolução. E se o ’25 de Abril’ fez nascer Setúbal, aos olhos de quem assistiu a estas

mudanças vertiginosas na qualidade de vida da região, o poder local signi-fica uma das suas maiores conquistas. Na reportagem comemorativa do 25 de Abril de 1999, ao Semmais, Carlos Sousa, então edil da Câmara de Palmela e líder da Associação de Municípios do Distrito de Setúbal (assim designada à época) afirmava que «o distrito de Setúbal é dos que melhor pode testemunhar o que Abril nos trouxe», assumindo o trabalho das autarquias como essencial para «colocar nas mãos da população o direito de escolher livremente os seus representantes que têm contribuído com o melhor do seu esforço para a vida local tenha hoje mais qualidade».

Um das grandes mudanças operou-se na zona rural pobre, que passou para uma agricultura mais próspera, vieram empresas e criaram--se outras actividades que consoli-daram um novo tecido empresarial.

Mais poder cívico a caminho de novas mentalidades

Mas o mais importante adveio com um sentido de novas mentali-dades, através de uma participação mais activa dos cidadãos e das comu-nidades. Na altura a criação de orga-nismos, como os conselhos muni-cipais era trunfo. «Este é o caminho para dar cumprimento a Abril e dar sequência às conquistas dos cida-dãos», confessava na mesma repor-tagem de 1999, Arnaldo Fernandes, à época presidente da Assembleia Municipal de Alcochete. E acrescen-tava: «Agora é o povo que detém verdadeiramente o poder».

Em 1999, os autarcas da região eram unanimes em reconhecer que passados 25 anos da revolução ainda havia muito a fazer, como se veio a verificar, mas décadas seguintes. Era o pensamento de José Manuel Maia, um dos mais

reputados parlamentares do PCP e, na altura, presidente da Assem-bleia Municipal de Almada. «Apesar dos benefícios que a ligação a Lisboa, via pontem nos trouxe, Almada ainda tem carências a todos o níveis» mas, adiantava, «é preciso dar graças à revolução». É que este concelho ribeirinho pobre e quase em rede viária, saneamento, escolas ou habitação condigna, que viveu quase sempre subjugado ao poder empregador da Lisnave, foi conver-tido numa zona de «progresso e sustentado pelos seus cidadãos», sustentava o político.

E era também reconhecido que a região teve uma evolução meteó-rica, crescendo mais naqueles vinte cinco anos do que nos 75 anos ante-riores.

Retirados do texto de Etelvina Baia da edição

de 22 de Abril de 1999

Os primeiros 25 anos de Abril recuperaram a região de uma miséria confrangedora. Dizia-se na altura que o distrito evoluiu mais nesse período que nos 75 anos anteriores. O advento do poder local teve uma força decisiva.

O povo saiu à rua, sentindo o cheiro da liberdade e o início da recuperação social e política na região

Desenvolvimento local

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Dizer AbrilAbril é o quarto mês do calendário gregoriano e tem 30 dias. O seu nome deriva do Latim «Aprilis» que signi-fica «abrir», numa alusão à Prima-vera, época de germinações. No sentido figurado, «abril» pode referir--se à mocidade e à juventude, período de fulgores e pouca maturação.

Abril caracteriza-se pela insta-bilidade («Abril, ora chora ora ri») e pela muita pluviosidade («Em Abril, chuvas mil») que permite prever os tempos que se seguem («Abril

molhado, sete vezes trovejado»). Em Abril, nem todos os dias são

iguais: o mês começa com o Dia das Mentiras (dia 1) a que se segue o Dia Internacional do Livro Infantil (dia 2), em homenagem ao nascimento de Hans Christian Andersen e, ainda na linha da palavra, comemora-se a 23 o Dia Mundial do Livro e dos Direitos de Autor e a 26 o Dia Mundial da Propriedade Intelectual. O livro e a liberdade sempre se relacionaram, por isso os livros se queimam em épocas de dita-dura (dura de ouvido, dura de cabeça, dura de duração) e se promove a educação e a literacia em tempos de dita-livre, tempos de livro-pensadores.

Dia 25, em Portugal, é o «Dia da Liberdade» que deveria mais propria-mente ser chamado o «Dia da Liber-tação», uma vez que se tratou de um processo, de um contexto, de um

conceito e não de uma epifania.Sophia de Mello Breyner, a propó-

sito do 25 de Abril, escreveu: «Esta é a madrugada que eu esperava / O dia inicial inteiro e limpo / Onde emer-gimos da noite e do silêncio / E livres habitamos a substância do tempo.» A substância do tempo a destempo? A (in)atemporalidade de toda a liber-dade? «O dia inicial inteiro e limpo», uma espécie de Éden ainda imacu-lado. Todos os princípios são prenhes de sonho. Todos os sonhos levam a um princípio.

«Liberdade, Igualdade, Frater-nidade» — a trilogia da utopia. Mas não estará a Liberdade a um passo do Vazio? A Igualdade não será a forma mais perigosa de anular a Indi-vidualidade? E a Fraternidade, não nos ensina a História, a Religião e a Psicanálise que é o princípio da Inveja e da Condenação? As palavras só

existem intactas e inocentes nos «dias iniciais inteiros e limpos».

Mês 4, 40 anos depois. O número 4 é o número da Terra, da estabili-dade. 4 elementos, 4 humores, 4 esta-ções do ano. Moisés caminhou 40 anos no deserto, Jesus recolheu-se 40 dias no deserto, 40 dias durou o Dilúvio e foram 40 os Ladrões que acompanharam Ali Babá. Por cá, comemoramos agora 40 anos sobre o nosso mês 4 depois de 40 (e oito) anos de ditadura — «São cravos, Senhor, são cravos.» E vermelhos.

No último dia do mês de Abril comemora-se o Dia Mundial do Jazz. Esperemos que nunca se possa (voltar a) dizer sobre Portugal: «Aqui jazz a Liberdade», antes se possa, e a propósito do 1º dia do mês de Abril dizer: «Aqui jazz a Mentira».

Maria Teresa Meireles

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Festival de canções contra o regime

PPara trás ficaram os tempos dos encontros clandes-tinos, onde o mais difícil era juntar um cantor, uma

viola e algum público e forma discreta e sem suscitar a curiosi-dade da PIDE. Com a Revolução dos Cravos, conquistou-se o direito de cantar livremente e a realizar concertos que juntavam os diversos cantores de intervenção.

Em Setúbal, o Círculo Cultural (CCS) concentrou, antes do 25 de Abril de 1974, o foco de actividade contestatária do distrito. Mas, antes dele, as reuniões e as tertúlias conheceram outro espaço. Dimas Pereira (já falecido), presidente do CCS, chegou à cidade em 1967, já com largo historial de prisões e actividade política, contou na edição de Abril de 1999 ao Semmais que o primeiro local de encontro foi o Clube de Campismo de Setúbal. «Juntava-se o Zeca Afonso (também chegado a Setúbal em 67), o arque-ólogo Tavares da Silva e o actor Tito Lívio e diversas personalidades da região que agitavam a vida cultural», disse na altura. E foi mesmo Tito Lívio que teve a ideia de fazer nascer o Círculo, desejo que se viu realizado a 28 de Maio de 1969.

O primeiro passo estava dado para o surgimento deste espaço que traria uma nova dimensão educacional a Setúbal. Numa altura em que os operários se distinguiam dos ‘doutores’, ficando sempre numa situação de inferioridade

(por não poderem estudar durante o dia de trabalho) o Círculo operou uma revolução: o início das aulas nocturnas para os operários.

Para leccionar à noite, no Círculo organizaram-se profes-sores nas áreas mais diversas. Aos fins-de-semana, ocorriam debates com convidados, entre estes, António José Saraiva, Mário Castrim, Correia da Fonseca. E por entre as aulas e debates, não era difícil fazer chegar uma viola às mãos de José Afonso e reunir um coro de vozes.

O cantor Nuno Gomes dos Santos, que o Semmais foi encon-trar em 1999 em Almada, disse na altura que «este espírito de ‘asso-ciativismo’ com fortes tradições no distrito, e as sessões de cantares, tornaram as colectividades numa espécie de baluartes de resistência à ditadura fascista».

Era sessões vigiadas de perto por um agente da polícia política», explicou na reportagem do Semmais Dimas Pereira, entretanto falecido. Mas, continuou, «lá por isso, Manuel Freire, Adriano Correia de Oliveira e Pedro Barroso, não deixaram de vir cá cantar».

Distrito sempre na vanguarda da contestação

Mas havia muitos mais, como recordava Nuno Gomes dos Santos: «Quer em Setúbal, organizadas por José Afonso, quer em Almada, eram muitas as vozes que se faziam ouvir. Lembro de Luísa Basto, Francisco

Cela, Naia, João Fernando e Eduardo Paes Mamede».

Depois do 25 de Abril de 74, a explosão

foi ainda maior e não só nas artes musicais. Cantores de intervenção

como Vitorino, Sérgio Godinho, Fausto e José Mário Branco, juntavam-se, não raras vezes, a nomes das letras, como José Sara-mago, Baptista-Bastos, Manuel da Fonseca e António Lobo Antunes. Por isso, referia Nuno Gomes dos Santos, no tempo em que a cantiga e a cultura eram armas políticas de contestação, o distrito de Setúbal esteve sempre na vanguarda.

Retirados do texto de Helena Sousa Freitas

da edição de 22 de Abril de 1999

Zeca Afonso é ainda hoje um ícone da música de intervenção nos períodos antes e depois da revolução. E o distrito, com destaque para Setúbal e Almada, um dos berços mais vanguardistas da contestação por via dos homens da cultura.

Grândola e as suas gentes ficaram ligadas pelo ‘sangue’ da canção que deu senha à revolução. A canção, composta por Zeca Afonso, “Grândola Vila Morena”, foi utilizada pelo Movimento das Forças Armadas para o avanço das tropas. Refere-se à fraternidade entre o povo grandolense e foi passada pela Rádio Renascença à meia-noite e vinte minutos da madru-gada da revolução. Integrada no albúm “Cantigas do Maio”, gravada em 1971, e hoje um símbolo da Abril e de todas as contestações modernas.

Zeca Afonso cantou-a em 29 de Março de 1974, no encerramento de um espectáculo no Coliseu de Lisboa. Na assistência encontravam-se militares que viriam a fazer parte do MFA, que escolheram a canção para confirmar que a revolução estava em andamento.

Grândola como senha para confirmar andamento da revolução

Zeca Afonso é ícone da música de intervenção, e pelas suas mãos, antes e depois do 25 de Abril, passaram por Setúbal muitos dos cantores que fizeram história nessa época revolucionária

Retrato Cultura

Escola nocturna para operários no Círculo

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40 anos Memórias de abril

Quando o Vitória esteve perto de ser municipalizado

Para muitos se alguma coisa vivia em democracia antes do 25 de Abril era o clubismo. E a região era um potentado,

nomeadamente no futebol, o desporto nacional, com o Vitória de Setúbal à cabeça, secundado por clubes como a CUF, também na chamada primeira divisão e muitos outros a darem cartas no segundo escalão, como o Sesimbra, Almada, Cova da Piedade, Montijo e Vasco da Gama, entre outros.

Não foi a sequência do golpe militar que deitou por terra a impor-tância e o peso destes clubes, mas a marca da revolução fez-se sentir em episódios que marcam a história. «Foi um período conturbadíssimo, sobre-tudo quando a então comissão admi-

nistrativa tentou municipalizar o estádio do Bonfim», contou à repor-tagem do Semmais na edição de Abril de 1999, Silvério Jones, empresário e dirigente do Vitória de Setúbal, à época. Já falecido, Jones, lembrava, na altura dessas declarações, que fora Carlos Relvas, guarda de campo, que lutou para que o clube e o seu estádio não fossem parar às mãos dos polí-ticos de então que, acrescentava, «apelidavam tudo e todos de fascistas».

A importância do Vitória no pano-rama do futebol nacional estava em alta antes da revolução. Era um dos ‘grandes’ e o maior entre terras do sul. O regime sabia disso. Perante a sua hecatombe, quis-se tornar o clube

O Vitória sempre foi o emblema maior da região e os seus feitos colocaram- -no perto do antigo regime. ‘Aberto’ ao povo, esteve para ser municipalizado e foi claudicando, como muitos outros, exemplo da CUF, que perdeu o amparo de ser clube-empresa.

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Retrato Desporto

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ainda mais do povo. «O paradoxo é que antes em assembleias gerais o sócio fazia prevalecer a sua palavra, actualmente as SAD são uma dita-dura», contestava a fonte do Semmais na reportagem de 1999.

Em 1973, o Vitória de Setúbal recebeu no lotado estádio do Bonfim,

o Dínamo de Moscovo. E, recontava Silvério Jones, «uma multidão exultou com o facto de a bandeira soviética estar hasteada entre a do Vitória, a de Portugal e a da UEFA».

Retirados de texto de Fernando Santos da edição de 22 Abril 1999

À parte do ‘enorme’ Vitória, os clubes mais pequenos foram perdendo peso ao longo dos anos, sendo que uma das razões mais plausíveis para a sua desa-gregação teve muito a ver com as mudanças do paradigma económico. A CUF era um exemplo de um clube fabril, alavancado pelo poderio do complexo industrial da Companhia União Fabril, do Barreiro. Viveiros de talentos davam cartas a nível nacional. Muitos outros, já mencionados foram mais ou menos definhando pelas mesmas razões, embora o distrito tivesse assistido a uma explosão da prática desportiva, muitas vezes impulsionada pelas câmaras com a ideia do ‘desporto para todos’.

E não era só o futebol que alimentava o desporto na região. Também o andebol, no Vitória, e o hóquei na CUF e, mais tarde, no Sesimbra, faziam convergir grandes atenções.

Andebol e hóquei em patins também tinham força

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Homenagem à livraria Culsete e ao 25 de AbrilEste acrílico sobre o 25 de Abril, da autoria do pintor Nuno David, foi exposto na livraria Culsete em jeito de homenagem. Atende a duas reali-dades: um perfil estratigráfico, analisado de baixo para cima. Geométrico, desigual, encar-cerado, vivendo a cultura dos ‘livros’ como os seus mensageiros à mercê do ‘lápis azul’, cujos protagonistas, mais ou menos camuflados, passam escritos com subtileza.

Há também na mão cansada o cravo fresco de Abril de um povo que suporta a longa noite de quase cinco décadas de opressão. E alude, nas suas formas diversas, ao livre pensamento. O branco é ocupado a todo o momento, para marcar a felicidade colectiva. As expressões, formas e cores atendem às ruas, onde há casas, onde os livros são criados, moram e se espa-lham…

Retirado de texto do autor Tel

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Comemorações do 25 de Abril no Distrito de SetúbalALCÁCER DO SALA actuação do grupo Os Azeitona decorre no dia 25, às 22 horas, no Largo Luís de Camões, em plena cidade alentejana, seguindo-se, à meia-noite, o tão esperado espectáculo multimédia com fogo-de-artifício. A partir das 0h30, tem lugar a animação com DJ´s até de madrugada.

ALCOCHETE“Na Voz dos Jovens” volta a reunir, dia 24, os alunos das escolas numa apresen-tação de poesias alusivas ao 25 de Abril, no Largo de S. João e no Samouco; a “Poesia nas voz das Crianças” acon-tece a 28, na Praça da Repú-blica. A sessão solene da Assembleia Municipal realiza-se dia 25, às 21 horas, no Salão Nobre, com a inter-venção das principais forças políticas do concelho.

ALMADANo dia 24, os Terra de Abrigo trazem-nos a música da Ronda dos Quatro Cami-nhos com a Orquestra Sinfo-nieta de Lisboa e o Cantares de Évora como convidados. Após os foguetes, atuam os Clã. No dia 25 realiza-se o desfile de Homenagem aos Resistentes Antifascistas, às 9h30.

BARREIRONo dia 24, às 21 horas, decorre o Desfile da Liberdade. Uma hora mais tarde, no Parque da Cidade, actua Fausto. No dia 25, às 11h30, nos Paços do Concelho, tem lugar o Hastear de Bandeiras, seguindo-se concerto com a Banda do Barreiro, Coral TAB e fanfarras dos Bombeiros.

GRÂNDOLAO espectáculo “Dá Mais Força à Liberdade” tem lugar no dia 24, às 22h15, com coro e orquestra diri-gido pelo maestro Rui Massena. Segue-se, às 0h20, foguetes e a actuação de DJ´s pela noite dentro. A sessão solene acontece dia 25, às 11h30, no auditório municipal do cineteatro granadeiro.

MONTIJONo dia 25 tem lugar, a partir das 10h45, a Corrida e Cami-nhada da Liberdade. Às 16 horas a sessão solene “40 Anos de Liberdade” sobe ao palco do teatro Joaquim D´Almeida. A banda da Socie-dade 1.º de Dezembro actua, às 18h30, na Praça da Repú-blica.

MOITAVitorino actua no dia 24, às 22h30, junto à Igreja N.ª Sr.ª de Fátima, na Moita, e no dia 25, a partir das 10h30, realiza-se o Desfile da Liber-dade, sendo que às 18 horas decorre a sessão solene da Assembleia Municipal nos Paços do Concelho.

PALMELAO jardim José Maria dos Santos, na vila do Pinhal Novo, acolhe dia 24, às 22h30, um espectáculo com a cantora palmelense Celina Piedade. No dia 25, às 11 horas, decorre no teatro S. João, a sessão solene da Assembleia Municipal. Às 21h30, no mesmo teatro, realiza-se o espectáculo musical “Abril Jazz Mil”, com entrada livre.

SANTIAGO DO CACÉMO concerto dos Amor Electro tem lugar às 22 horas, no dia 24, no Parque Verde da Quinta do Chafariz, em Santiago do Cacém. Em Santo André, às 11h45 decorre a sessão solene da Assembleia Municipal.

SESIMBRAO concerto com Mafalda Arnauth decorre a 24, às 22h30, em Quinta do Conde. Segue-se espectáculo piro-musical e a actuação do Ecos. No dia 25, são inauguradas as esculturas Liberdade, no Jardim da Corredoura, e 25 de Abril e Liberdade, na rotunda de Quinta do Conde. De 24 a 26, será construída a instalação Abril, na Galeria Em Projeto. No dia 27 decorre o “40 Memórias de Abril”, no teatro.

SETÚBALSérgio Godinho actua no dia 24, na Praça do Bocage, pouco depois das 21h30. À meia-noite há fogo-de-arti-fício. A 25, às 9h30, nos Paços do Concelho, decorre a sessão solene da Assembleia Municipal. Às 21h30, no Fórum Municipal Luísa Todi, actua A Naifa.

SEIxALNo palco do Largo 1.º de Maio, no Seixal, actuam no dia 24, a Brigada Victor Jara e os xutos & Pontapés, às 22 e às 0h30, respectivamente. A sessão evocativa do 25 de Abril decorre dia 26, às 15 horas, no Fórum do Seixal.

SINESA dupla João Afonso e Rogério Pires sobem ao palco do Centro de Artes às 22 horas, para um espectáculo que conta com a envolvência do Coral Atlântico. No dia 25, às 22 horas, no mesmo local, os actores Carlos Paulo e Ana Lúcia Palminha, do Teatro Comuna, prestam homenagem ao actor Villaret. Mas antes, realiza-se a sessão solene da A M no Centro de Artes de Sines. E será projectado o documentário “Do Silêncio à Liberdade! O 25 de Abril em Sines”.

Comemorações

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SEMMAIS . Edição Evocativa do 40.0 Aniversário do 25 de Abril de 1974 . 19 abril . 15

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Aviso N.º 49António Jesus Figueira Mendes, Presidente da Câmara Municipal de Grândola, torna público, nos termos e para os efeitos do disposto nos Artigos 74º e 77º do Decreto – Lei nº 380/99, de 22 de setembro com a redação dada pelo Decreto-Lei nº 46/2009 de 20 de fevereiro e pelo Decreto-Lei nº 181/2009 de 07 de agosto que a Câmara Municipal de Grândola, em reunião realizada em 2014/03/27, deliberou dar inicio ao procedimento da 9ª alteração do Plano Diretor Municipal de Grândola, sua publicitação, aprovação dos termos de referência, abertura de um período de recolha de sugestões e dispensa da elaboração da Avaliação Ambiental Estratégica.- ------------------------------------------------------------------------------------------------------------Os cidadãos interessados dispõem do prazo de 15 dias úteis a contar da data da publicação do presente Aviso no Diário da República, para formulação de sugestões, bem como apresentação de informações sobre questões que entendam dever ser consideradas. ------------O respetivo processo poderá ser consultado no sítio eletrónico do Município (http://www.cm-grandola.pt) ou nas instalações da Divisão de Planeamento da Câmara Municipal de Grândola, todos os dias úteis entre as 9 e as 16h. --------------------------------------------------------------------------No âmbito do período de recolha de sugestões serão consideradas e apreciadas todas as sugestões e informações apresentadas, dirigidas ao Senhor Presidente da Câmara Municipal, por escrito, em que conste a identificação, o endereço dos seus autores, a qualidade em que se apresentam, e que especificamente se relacionem com a proposta da 9ª alteração do Plano Diretor Municipal de Grândola, sua publici-tação, aprovação dos termos de referência, abertura de um período de recolha de sugestões e dispensa da elaboração da Avaliação Ambiental Estratégica, sempre que necessário acompanhadas por planta de localização, remetidas por correio, en-tregues na Divisão de Planeamento ou remetidos através do endereço eletrónico [email protected]. ----------------------------------------------------------------------------------------------Para constar e para os demais efeitos se publica o presente Aviso na 2ª série do Diário da República, e outros de igual teor vão ser afixados nos locais de costume e divulgados através do sítio eletrónico do Município de Grândola e da comunicação social. -------------------------------

Grândola, Paços do Concelho, aos 3 do mês de abril de 2014. -------------------------------------------

O Presidente da CâmaraAntónio Jesus Figueira Mendes

No âmbito dos 40 anos do 25 de Abril e dos 70 anos de nascimento de Salgueiro Maia, a Âncora editora reeditou a biografia “Salgueiro Maia – Um Homem da Liberdade”, de António de Sousa Duarte.

Salgueiro Maia viveu obcecado com o desejo de “um mundo novo”, mal suportando a mesqui-nhez e a pequenez dos homens. Ao clamor intenso dos seus alertas, agregou um tributo à luz e um hino à tolerância e à diversidade. Havia euforia nas suas palavras, solidariedade na sua denúncia e entusiasmo no seu viver. Contra a inércia do silêncio e o conformismo da iniquidade, defendeu sempre as ideias em que acreditou.

Salgueiro Maia recusou ser membro do Conselho da Revolução. Não se deixou comprar pelos “novos senhores” do 25 de Abril. E, por isso, escassos 2 anos volvidos sobre a Revo-lução dos Cravos, foi atirado para o esqueci-mento dos serviços adminis¬trativos da Direcção da Arma de Cavalaria. Foi exilado para os Açores e “despromovido” a responsável pelo Presídio Militar de Santarém.

Biografia de Salgueiro Maia em edição comemorativa

O livro “O Movimento dos Capitães e o 25 de Abril”, da auditoria de três jornalistas que ficaram conhe-cidos como os ‘cronistas da revolução’ e editado pela primeira vez em Novembro de 1974, regressou este mês às livrarias, 40 anos depois, numa 5.ª edição revista e aumentada.

Sob a chancela do Grupo Planeta e escrito por Avelino Rodrigues, Cesário Borga e Mário Cardoso, o livro «mantém intactas as qualidades que fizeram dele um dos livros mais emblemáticos de quantos se publicaram no imediato pós 25 de Abril», segundo Boaventura de Sousa Santos, autor do prefácio.

“O Movimento dos Capitães e o 25 de Abril” apresenta um relato pormenorizado de todos os passos, reuniões, planos, êxitos e vicissitudes, até ao dia da operação que pôs fim ao Estado Novo e devolveu a liberdade aos portugueses.

Os autores escreveram outras duas obras: “Portugal depois de Abril” (1975) e “Abril nos quar-téis de Novembro” (1976). Jovens jornalistas em 1974, sempre lutaram por uma informação inde-pendente e ao serviço da sociedade.

Livro dos cronistas da revolução volta às livrarias

“Setúbal sob a Ditadura Militar. 1926-1333”, da autoria do historiador Albérico Afonso, com a chancela da Estuário, editada em parceria com o Instituto Politécnico de Setúbal-Escola Supe-rior de Educação e o município, conta a história dos primeiros sete anos de chumbo sob que Setúbal viveu, após o movimento que arrancou a 28 de Maio de 1926 e que prepara a transição para a ditadura salazarista.

Este livro continua a colossal saga iniciada pelo autor em “História e Cronologia de Setúbal. 1248-1926” que a Estuário editou, também, em Dezembro de 2011.

O autor dá-nos a oportunidade única de convi-vermos dia-a-dia com as personagens e assistirmos às acções que marcaram a História de Setúbal através de um vasto repositório cronológico reunido.

Além do rigor com que está elaborada, a obra inclui um útil e minucioso índice analítico para que o leitor se oriente a encontrar uma notícia de um determinado acontecimento ao longo das cerca das suas 300 páginas.

Acções que marcaram a História de Setúbal

“Em cada mudança há um abril! porque vale a pena

semmais...”

Dia 26 – sempre com a região, sempre pela região...

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16 . SEMMAIS . Edição Evocativa do 40.0 Aniversário do 25 de Abril de 1974 . 18 abril

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Imprensa descreve ‘manif’ ordeira em Setúbal

Uma reportagem de Rogério Severino, publicada no jornal “O Setubalense”, do dia 29 de Abril de 1974, com

o título “Setúbal viveu horas de emoção”, dava conta de uma concen-tração de pessoas na Praça do Bocage, em Setúbal, no dia 26, por volta das 19 horas.

“Homens de todas as idades, mulheres e crianças, rostos crispados de anos de suor, canseiras e priva-ções, estavam ali, nem sabiam bem porquê. Uma reunião assim, só o inte-rior espiritual de cada um, pode ditar”, descrevia Rogério Severino, que acres-centaria: “O povo estava lá. Aguar-

dando. E nem a chuva foi capaz de dispersar as gentes. Nada é suficiente para fazer calar a força que vem de dentro das pessoas que querem ser livres”.

A reportagem conta, pouco tempo depois do início da concentração, que um enorme grupo invadia a Praça de Bocage, ao som do Hino Nacional, empunhando “imensos cartazes”, onde se podia ler “Povo quer o julga-mento dos crimes da PIDE”, “Fim à Guerra”, “Viva a Liberdade”, “Vivam as Forças Libertadoras”, entre tantos outros.

À frente, saído nesse mesmo dia de Caxias, estava Adilo Costa, candi-

dato pela CDE às últimas eleições. “A eles se juntou a outra parte do povo que os aguardava na Praça de Bocage”. A palavra de ordem foi “Viva Portugal” e em frente ao edifício da Câmara, encerrado, cantou-se o Hino Nacional e “deram-se vivas”.

A manifestação percorreu a rua em frente ao Quartel do 11, ao som da “Portuguesa”, para saudar os mili-tares que “tão brilhantemente” actu-aram como forças de libertação. Seguiu depois por outras ruas de Setúbal, com intervenções de alguns elementos, terminando no Largo da Ribeira Velha, “onde operários e gente do povo se reuniu para falar aos

outros. Por todo o lado, lágrimas e sorrisos, lágrimas e suspiros. Situa-ções que só podem vir à face dos homens quando estes são livres”.

O jornalista Rogério Severino conclui que a manifestação decorreu de forma “ordeira” e com “civismo”, num mês de Abril, de Liberdade em Portugal.

A mesma edição de “O Setuba-lense” contava que colunas militares que participaram no Movimento Histórico do 25 de Abril ao deslo-carem-se para as suas unidades, no Sul, foram ”vitoriosamente” acla-madas pela população sadina, aquando da sua passagem por Setúbal.

DURAN CLEMENTEO Capitão de Abril Duran Clemente distribuiu um docu-mento, elaborado por si, contra o regime fascista, no congresso da Oposição Demo-

crática de Aveiro em 1973. Como tal, foi castigado e enviado para a Guiné, onde encontrou gente com vontade de acabar com a ditadura. Foi o primeiro documento, assi-

nado por 45 capitães, que foi enviado a Marcelo Caetano. O próprio Marcelo reco-nheceu, através desse docu-mento, que a situação em Portugal era «grave». Para

Duran Clemente, os inimigos de Portugal não eram os afri-canos mas sim o poder insta-lado em Portugal. «Salazar era suportado por 8 famílias poderosas», frisa.

Testemunho