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Departamento de Filosofia
SCHOPENHAUER, KANT E VEDĀNTA
Aluno: Daniel Rodrigues Braz
Orientador: Pedro Duarte de Andrade
Introdução
Arthur Schopenhauer é amplamente reconhecido como grande tributário de Immanuel
Kant e do “divino Platão”. Contudo, outra de suas inspirações nem sempre é mencionada com
a ênfase devida, apesar de o próprio autor ressaltá-la incontáveis vezes ao longo de toda sua
vida e obra: o Oriente. É bastante argumentável que Schopenhauer tenha sido o primeiro
filósofo no Ocidente a ter se apropriado de concepções vindas da tradição oriental, mais
notadamente a de matriz indiana, na construção de seus conceitos centrais. “Eu confesso que
não acredito que minha doutrina poderia de algum modo ter surgido antes que as Upanishads,
Platão e Kant tivessem simultaneamente lançado seus raios dentro da mente de um homem”
(#623) [1] – escreve Schopenhauer no seu caderno, em 1816, dois anos antes da publicação da
obra que lança ao mundo sua filosofia madura, O mundo como vontade e como representação
(1818). Mas qual teria sido exatamente o papel do Oriente na formulação de suas ideias? E de
que maneira – e em que medida – se deu, em Schopenhauer, esse encontro entre Ocidente e
Oriente? E por meio de que chaves hermenêuticas? São essas perguntas que a presente
pesquisa procura responder. Como recorte metodológico, nos atemos, sobretudo, à relação
entre o Idealismo Transcendental de Kant e a doutrina das Upanishads, ou Vedānta.
Vivendo uma era da Filosofia Moderna que passara a se orientar pelo legado crítico do
Idealismo Transcendental de Kant nas áreas da epistemologia, da ética e da estética,
Schopenhauer começou sua carreira em um cenário onde figuras como Fichte e Schelling já
ditavam as tendências dos debates na academia em torno dessas questões. Especificamente,
reflexões acerca da dicotomia kantiana entre fenômeno e coisa-em-si, e acerca da relação
recíproca e condicionante entre sujeito e objeto na experiência moravam no âmago das
polêmicas. O conceito de um Absoluto incondicionado como coisa-em-si vinha, também,
ganhando cada vez mais espaço, conjuntamente aos esforços em provar como seria possível
acessá-lo através do conhecimento, rompendo a limitação inerente à consciência dos objetos
da experiência. Salvas semelhanças importantes entre eles, é notável, entretanto, que o
sistema filosófico reivindicado em O mundo como vontade e como representação não se
alinhava com este projeto de conhecimento dos idealistas, mas de fato expressava
pensamentos em larga medida inéditos, e se baseava aparentemente em fundamentos
metafísicos de natureza distinta daqueles que estavam em voga no debate contemporâneo.
Apesar do envolvimento evidente de Schopenhauer nas discussões próprias de sua
época, – prova simples disso é o tratado estritamente kantiano composto em sua tese de
doutorado Sobre a quádrupla raiz do princípio de razão suficiente (1813), com críticas diretas
aos grandes filósofos idealistas e seus “filosofemas” –, o vislumbre do conteúdo dos seus
manuscritos de juventude nos forneceu boas razões para crermos que suas aspirações mais
íntimas por respostas dentro da Filosofia podem ter raízes alhures. Chama atenção, de modo
geral, uma questão pessoal constante em seus cadernos desde sua remota juventude – por que
a vida está sempre marcada pelo sofrimento? E como seria possível superar esta condição? –,
e, mesmo que o Idealismo da época oferecesse soluções a esse problema, elas estavam longe
de serem bem sucedidas para Schopenhauer, que tinha suas próprias opiniões críticas e já
reconhecia de longa data a noção de esquecimento do “eu” pela arte ou pela ascese, tendo lido
românticos como Zacharias Werner e místicos cristãos como Jacob Böhme com muito zelo
quando jovem.
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É possível, contudo, que o interesse especial do jovem filósofo pelos tesouros
espirituais da Índia a partir do final de 1813, após seu encontro com o orientalista Friedrich
Majer em Weimar, tenha sido o elemento que finalmente levou suas ruminações sobre
sofrimento e salvação à formulação mais completa, sendo logo exposta em sua principal obra.
A esse respeito, um livro merece atenção redobrada para o estudo do desenvolvimento do
pensamento schopenhaueriano: a Oupnek’hat, de A. H. Anquetil-Duperron [2] – uma
tradução comentada em latim da pioneira tradução em persa (Sirr-i-Akbar, 1657) de 50
Upanishads originais em sânscrito, feita pelo príncipe persa Dara Shukoh e uma “equipe
especialista” de ascetas indianos. A partir de março de 1814, Schopenhauer leu com afinco os
dois volumes e no mesmo ano adquiriu seu próprios exemplares. Já em sua velhice, ele
confessou que a obra era o consolo de sua vida e que seria também o consolo de sua morte
(Parerga e Paralipomena, § 184) [3]. Entretanto, embora nem ele nem Anquetil soubessem
disso, o “livro favorito” de Schopenhauer tinha por toda a parte a marca da interpretação
pessoal de Dara, sobretudo em suas explicações dos versos que acabaram passando como
parte do texto original. De todo modo, longe de denunciarmos a ilegitimidade desse
documento como expressão verdadeira da doutrina das Upanishads, argumentamos que só é
possível compreender como as Upanishads teriam influenciado Schopenhauer se acolhermos
o conteúdo “impuro” de suas reais fontes, e não de outras traduções “mais fieis”.
Revendo, comentando e complementando conclusões passadas
No primeiro ano desta pesquisa, dedicamos nosso relatório, sobretudo, à justificação da
pertinência do projeto. Como alguém que entra em um quarto escuro sem saber onde ficam as
luzes, tateamos o que pudemos e fizemos muitas descobertas, mesmo sem ter ainda uma
noção razoavelmente exata do terreno mais amplo no qual estávamos pisando. Não entrando
em detalhes aprofundados sobre “comos” e porquês, demonstramos como a influência das
Upanishads parece, nos escritos de Schopenhauer, dar claramente suporte a soluções que
dificilmente seriam deduzidas da tradição ocidental. Juntar peças elucidativas de um quebra-
cabeça maior foi, pois, suficiente para demonstrarmos que nossa pesquisa possui, de fato,
relevância para uma compreensão alargada do pensamento schopenhaueriano. Agora
sabemos, por exemplo, que, em uma de suas primeiras citações explícitas à doutrina dos
Vedas em seus manuscritos (# 192) [1], Schopenhauer exalta o que ele chama de “método dos
indianos” (“die Methode der Indier”), que busca compreender a essência do mundo a partir da
investigação da natureza íntima do sujeito, e não dos objetos da experiência atrelada ao
princípio de razão suficiente. Na mesma nota, ele escreve: “Apenas de dentro [o entendimento
da essência do mundo] pode vir. O essencial não é quais objetos se apresentam ao homem,
mas sim como ele os vê e como ele é determinado por eles”. Como em seu próprio sistema
ainda em processo de formação, portanto, para os hindus o segredo do universo só poderia ser
desvendado por meio da compreensão daquilo que constitui o que chamamos de “eu” – no
qual, como formulara Schopenhauer, a coincidência do sujeito da vontade com o sujeito do
conhecimento constitui o milagre “par excellence” (κατ' ἐξοχήν) (p. 211) [4] –, discriminando
o que nele é ilusório e o que é real ou essencial. Tal meio de conhecimento que parte da
análise do sujeito, e não do objeto, foi por isso muito bem acolhido por Schopenhauer, que, na
sua tese de doutorado, apesar de sua análise exaustiva do conteúdo objetivo da experiência
possível à moda de Kant, já admitia que o grande desafio estava em explicar o “eu” que
conhece e quer, que se percebe, ao mesmo tempo, como causalidade e como motivação. Cada
vez mais, portanto, as coisas vêm fazendo sentido para nós.
Enquanto apontávamos, ano passado, algumas rupturas de Schopenhauer com o
pensamento kantiano na ética e na teoria do conhecimento, ressaltamos passagens de ‘O
mundo’ e de ‘Sobre a quádrupla raiz’ (de 1847) em que o autor lança mão de referências aos
Vedas e às Upanishads como endossos filosóficos de seus argumentos. Pois bem, veremos
mais afrente que o número de ocorrências similares aumenta muito quando se examina o
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conteúdo dos seus manuscritos. Por hora é suficiente apontar que estes confirmam que o ano
de 1814 aparece como significativo em dois sentidos:
1. Schopenhauer faz os primeiros contatos com seu “livro favorito”, a Oupnek’hat:
a. Em março, temos o primeiro registro de empréstimo da Oupnek’hat por
Schopenhauer na biblioteca de Weimar, sendo devolvido apenas no
momento em que o jovem doutor em Filosofia se muda para Dresden no
fim de maio. Dentre outras anotações curiosas deste período, na nota
#189 temos sua primeira menção à “Maya dos indianos”, na nota #192 já
citada é elogiado o “método dos indianos”;
b. Assim que se estabelece no dia 24 em Dresden, o primeiro livro retirado
na biblioteca é a Oupnek’hat, e, além deste, apenas um único outro livro
foi retirado nesse período – a Kritik der theorischen Philosophie de seu
antigo professor de filosofia em Göttingen, G. E. Schulze. Na nota #213,
Schopenhauer aponta a vontade em geral como origem do problema do
sofrimento (“o erro fundamental”) e a liberação dela como sua única
solução. Na mesma nota, Schopenhauer cita o verso da Oupnek’hat que
ele mais tarde utilizou como motto do livro quarto de sua obra principal
[5]: Tempore quo cognitio simul advenit amor e medio superssurexit
(“Quando o conhecimento sobrevier, ao mesmo tempo o amor se elevará
no seio das coisas”1); e diz “[...] aqui por ‘amor’ se quer dizer maya que
não é nada mais que aquela vontade, o amor (pelo objeto) cuja
objetificação ou manifestação é o mundo. Como o erro fundamental isto
[amor/ māyā] é ao mesmo tempo, por assim dizer, a origem do mal e do
mundo (na verdade, uma e mesma coisa).”;
c. Em algum momento do verão de 1814, Schopenhauer adquire sua
própria cópia dos dois volumes da Oupnek’hat, preservada até hoje no
Schopenhauer-Archiv, em Frankfurt. Neste exemplar, cerca de 840
páginas apresentam anotações ou marcações suas – número que equivale
a quase metade da obra completa –, acumuladas daquele ano até seus
dias de velhice. Uma curiosidade contada por seu amigo Wilhelm
Gwinner (p. 215), dois anos depois da morte de Schopenhauer, é que era
comum que o filósofo, logo antes de dormir, abrisse a Oupnek’hat para
fazer orações. A verdade encontrada nesta obra seguiu, portanto,
iluminando seu pensamento até seus últimos dias.
2. Quando Schopenhauer anunciou O mundo como vontade e como representação
a sua futura editora Brockhaus, em março de 1818, ele esclareceu: “[a] essência
dessa linha de raciocínio já existia há quatro anos em minha cabeça; mas, para
desenvolvê-lo e fazê-lo completamente claro para mim mesmo através de
incontáveis ensaios e estudos eu precisei de não menos que quatro anos
completos, durante os quais me ocupei exclusivamente com ele e com estudos
diretamente relacionados de outras obras” (carta 29) [7]. Ou seja, o próprio
Schopenhauer confessa que em 1814, ano em que ele descobriu e estudou
vigorosamente a Oupnek’hat, foi o mesmo ano em que o núcleo de sua filosofia
madura foi formado. Quem, hoje, estuda seus manuscritos relativos a esse
momento, pode notar claramente que tal “essência” – caracterizada, sobretudo,
(i) pela concepção do conceito cósmico e metafísico de “vontade” em
contraposição ao entendimento puramente psicológico do termo, (ii) pela
compreensão da natureza ilusória da multiplicidade, sendo em realidade apenas
1 Tradução de Jair Barboza.
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vontade objetivada2, (iii) pela importância dada ao corpo enquanto ponto de
acesso à essência do mundo que nada mais é do que a vontade, e (iv) pela
superação da vontade como única possibilidade de salvação – começa a ser
esboçada ao mesmo tempo em que os primeiros traços inegáveis de influência
da Oupnek’hat são também registrados em suas notas filosóficas.
Enfim, mesmo que as primeiras notas que apresentam óbvia influência da Oupnek’hat já
estabelecessem uma leitura da doutrina indiana dentro dos paradigmas idealistas pós-
kantianos, e, portanto, a fizesse confirmar por meio de outros conceitos o que Schopenhauer
já sabia, é a permanência do estudo desse texto seguida do esforço para colocar Platão, Kant e
a “sabedoria dos Vedas” (# 577) [1] em harmonia o que definiria o caráter acabado do sistema
de Schopenhauer em O mundo como vontade e como representação. Essa trinca metafísica
fundamental fica evidente não apenas na nota #623, já citada, mas de modo ainda mais
surpreendente na tabela montada por Schopenhauer em sua nota #577, na qual já se pode
enxergar toda a estrutura de sua obra principal consolidada.
É importante ressaltar também que, o exame do exemplar pessoal de Schopenhauer
evidencia que sua leitura da Oupnek’hat foi uma leitura crítica. Nele, por exemplo, vemos
diversas manifestações de suas rejeições aos traços teístas da obra. Um bom exemplo disso
ocorre no glossário de Anquetil-Duperron (ver imagem abaixo). O francês traduzira a palavra
sagrada “Oum” dos indianos por “Deus”, mas Schopenhauer riscou duas vezes a palavra
“Deus” e escreveu ao lado “Brahm, Omitto3, p. 15”. Logo abaixo na mesma página, Anquetil
traduz “Brahm = creator [‘criador’]”, mas Schopenhauer risca duas vezes a palavra
“creator”, e não escreve mais nada (p. 7) [2].
Para contextualizar o estabelecimento na Alemanha da cadeira acadêmica de estudos
orientais, dando origem ao chamado Orientalismo que influenciou tanto a visão que os
europeus tinham do Oriente no século XIX, dedicamos também seções inteiras do último
relatório. Para nossos propósitos, o enfoque em descrever essa época tinha como fim,
sobretudo, mostrar que uma nova ideia de Índia estava sendo formada na Europa, inicialmente
muito influenciada na Alemanha pelo pensamento romântico, notavelmente por Friedrich e
August Schlegel, e por filósofos como Voltaire [8] (APP, 2010, pp. 15-76) [9] e J. G. Herder,
que disseminaram a crença de que a região teria sido uma espécie de berço cultural da
humanidade. Schopenhauer, por sua vez, era desde jovem privilegiado por seu acesso
particularmente fácil à sociedade culta da época, que fazia do salão de sua mãe Johanna em
Weimar um ponto de encontro4. Por isso ele, que de costume também estava presente nesses
círculos, não demorou a ouvir as novidades do Oriente. No fim de 1813, suas sabidas
conversas intelectuais com o orientalista discípulo de Herder, Friedrich Majer – que “sem sua 2 Por questões de economia, deixemos por um momento de mencionar também o papel da ideia platônica nessa
teoria. 3 Omitto vem do sânscrito amita, que significa “ilimitado”.
4 Duas vezes por semana, o salão da casa de Johanna, a mãe de Schopenhauer, era local de encontros para
artistas e intelectuais. Dentre eles, podemos citar grandes poetas como Wieland, Zacharias Werner e Goethe.
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solicitação” o “introduziu à antiguidade indiana” (carta nº 251, p. 261) [7] – e sua “associação
íntima” [7]5 com o escritor Goethe, também profundamente fascinado pelo Oriente, indicam
que não é à toa que o despontar do interesse especial de Schopenhauer pela Índia, com a
leitura da Asiatisches Magazin [12], ocorreu logo em sequência.
Finalmente, logo no início de nossa pesquisa, introduzimos ainda a figura do orientalista
Paul Deussen, que, sendo até hoje reconhecido como um dos mais importantes e pioneiros
indólogos, foi um declarado discípulo de Schopenhauer e provavelmente seu maior
divulgador entre o fim do século XIX e o início do século XX, tendo sido o primeiro editor de
suas obras completas e o fundador da Schopenhauer-Gesellschaft. Consideramos a passagem
por Deussen um axioma metodológico de quem pretende entender os limites da comparação
efetiva entre o pensamento de Schopenhauer e a doutrina não-dualista do Vedānta. Afinal, há
mais de cem anos, e não muito longe da época do próprio Schopenhauer, Deussen passava a
maior parte de sua vida se dedicando à análise e à exposição sistematizada da doutrina do
Vedānta, à luz de sua influência metafísica idealista extraída da tríade Platão, Kant e
Schopenhauer. Além disso, ele foi um pioneiro em traduções do sânscrito para o alemão,
deixando para sempre a sua marca na tradição ocidental de leitura dos indianos, e, ao
contrário de Schopenhauer e até mesmo de Max Müller6, ele esteve na Índia, foi iniciado no
hinduísmo e era até mesmo amigo de mestres indianos famosos no Ocidente, como Swāmi
Vivekānanda. Sua amizade com um dos mais rebeldes discípulos de Schopenhauer, Friedrich
Nietzsche é ainda outro fator faz dele alguém que merece atenção. Tendo de forma corajosa
no século XIX trabalhado academicamente com questões próximas às que esta pesquisa
5 Schopenhauer e Goethe se reuniram diversas vezes, com o objetivo de estudar principalmente o fenômeno das
cores, fato que deu origem à obra Sobre a visão e as cores (1816) do filósofo. Goethe, que leu a tese de
doutorado de Schopenhauer, o descreveu, depois de um de seus encontros, como “um homem notavelmente
interessante”, que “com certa perspicaz obstinação” está jogando um coringa no jogo de cartas da filosofia
moderna (p.756) [11]. 6 Outro indólogo extremamente importante do século XIX. Demos a ele relativo destaque no relatório anterior.
GÖRRES, Joseph. Mythentafel der alten Welt, 1810. O grande círculo
destacado no mapa ilustra a região da Caxemira, na Índia, onde, acreditava-
se, teria se nascido o “mito original” (Urmyth) que constituiria a essência de
todas as culturas e religiões da Europa e da Ásia.
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mesma quer responder, Paul Deussen fez um livre e inédito diálogo entre Ocidente e Oriente,
ou melhor, entre Idealismo Transcendental e Vedānta, e soube tirar bons frutos dele.
Manteremos os olhos em Deussen, ainda que ele não seja o foco nesse presente relatório, que
se atém à análise histórica e biográfica do nascimento da filosofia de Schopenhauer.
Sobre os pontos abordados naquele primeiro ano, gostaríamos de fazer, da nossa atual
perspectiva, alguns adendos particulares importantes:
Em 2015, por ignorância de quais das fontes iniciais de Schopenhauer sobre a
Índia era a mais relevante, demos bastante ênfase à Asiatisches Magazin, devido
ao fato de a revista em que Friedrich Majer publicava seus artigos ter sido a
primeira de suas sucessivas leituras do gênero a partir de dezembro de 1813,
tendo permanecido em suas mãos por cerca de quatro meses. Porém, estamos
convencidos agora de que foi outra provável indicação de Majer que cumpriu o
mais decisivo papel nos futuros insights de Schopenhauer, a saber, a
Oupnek’hat. Por fim, outra influência de relevância comprovada é o periódico
publicado pela Asiatic Society of Bengal, as Asiatick Researches, cujos volumes
Schopenhauer estudou entre novembro de 1815 e maio de 1816. As Asiatick
Researches foram sabidamente responsáveis pelas primeiras informações mais
aprofundadas de Schopenhauer sobre o Budismo e o conceito de nirvāṇa, além
de ter sido a causa da reformulação de sua compreensão do conceito de māyā7,
traduzido em latim na Oupnek’hat, como amor (ishq, no persa), uma
interpretação marcadamente sufista do Príncipe Dara que ainda assim deixou
marcas irreversíveis na filosofia de Schopenhauer. Com as Asiatick Researches,
Schopenhauer passou a dar um viés mais idealista ao termo, como “ilusão”,
identificando ao fenômeno (Erscheinung) kantiano e ao mundo das sombras
platônico.
Embora tenhamos tido cuidado de fazermos o mínimo possível de afirmações
categóricas naquele momento, em nosso relatório anterior pode ter ficado
sugerido que as Upanishads tiveram uma função de mera confirmação do
pensamento de Schopenhauer, que já estaria com seu curso definido desde antes.
Boa parte dessa crença vem de termos observado o fato de que o sistema de O
mundo como vontade e como representação começa pela exposição de uma
teoria do conhecimento, com referência recorrente à tese de doutorado, Sobre a
quádrupla raiz do princípio de razão suficiente, publicada cinco anos antes, em
uma época em que Schopenhauer ainda não tinha tampouco familiarização com
a doutrina dos Vedas. Considerando que ainda permanecemos desconhecendo o
texto da tese original8 – carentes, pois, de instrumentos para diferenciar o que
era recente e o que era antigo na segunda edição, de 1847, em termos de reflexão
filosófica –, nos parecia razoável acreditar que o ponto de partida da filosofia de
Schopenhauer em sua obra principal era mesmo a epistemologia kantiana. Em
outras palavras, achávamos que, se o sistema metafísico da vontade fosse um
edifício, as teorias da percepção e do conhecimento teriam fornecido as vigas
mestras para sua construção. Em verdade, essa interpretação é em larga medida
disseminada na tradição de comentadores de Schopenhauer, e, em especial,
nossa leitura de um deles, John Atwell [12], reforçou ainda mais nossa opinião,
nos dando confiança de que estávamos no rumo correto. Contudo, a leitura da
brilhante obra de Urs App, que faz parte da nossa bibliografia principal neste
segundo ano, mudou nossa forma de ver a questão. A ordem de exposição dos
7 Essa mudança de interpretação é reconhecível a partir da nota #564.
8 Felizmente, Urs App dentre muitos outros serviços prestados a nossos estudos atuais, citou trechos bastante
esclarecedores da versão original em Schopenhauer’s Compass.
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assuntos em O mundo mostrou-se uma evidência insuficiente para sabermos
quais teorias dão as bases para a construção do sistema como um todo, ao passo
que o vislumbre dos manuscritos e da biografia intelectual de Schopenhauer de
modo geral nos indica que a linha de raciocínio que leva um filósofo a escrever
uma obra não necessariamente vem a sua mente da mesma forma como este
julga adequado e relevante que o seu público a aprecie. Assumimos, agora, pois,
que a Oupnek’hat, sobretudo, teve influência decisiva para que Schopenhauer
pudesse dar a coerência final necessária às suas reflexões de juventude, de modo
que atingissem a configuração completa de um sistema filosófico original e
maduro. Esta visão, portanto, se afasta daquela que vê a influência oriental em
Schopenhauer como um mero elemento afirmador de sua doutrina, ou seja,
como algo que, por uma feliz coincidência, apenas disse mais do mesmo que
Schopenhauer já tinha em mente em termos de epistemologia, sem agregar
novos significados. A propósito, mais do que a teoria do conhecimento, a ética e
a estética tiveram um papel originário mais fundamental para a definição do tom
e da urgência do projeto filosófico, pois é a partir delas que Schopenhauer
tentava pensar a possibilidade de superação do sofrimento.
Indo mais fundo nessa atual interpretação, está agora claro para nós que O
mundo como vontade e como representação é produto final de um processo de
reflexão motivado por uma perplexidade original – um θαύμα –, rastreável já em
suas primeiras anotações em 1804, e que a influência da Oupnek’hat tornou
possível que esse processo fosse selado, em 1814. Uma das muitas pistas que
apontam para essa direção, por exemplo, é o registro de uma conversa de
Schopenhauer ao poeta Wieland, em 1811, na qual aquele confessou a este que:
“A vida é um assunto miserável e eu decidi que quero despende-la pensando
sobre isso” (p. 22) [13]. A experiência contínua de insatisfação e angústia que é
a vida, com momentos extraordinários de superação temporários na
contemplação artística e permanentes na vida dos místicos e dos santos, desde
muito cedo já o instigava a buscar, na Filosofia, por explicações. Por sua vez, a
relevância do seu contato com a doutrina contida na Oupnek’hat é justamente o
fato de esta ter trazido à tona em Schopenhauer insights suficientemente claros
para que ele desse como concluída a partir daí sua explicação para a origem
última do sofrimento e para o fato de que é possível de superá-lo em
circunstâncias muito específicas.
Enfim, embora não seja comumente citada, a influência do Neoplatonismo
precisa também ser assumida como fundamental na gênese do pensamento de
Schopenhauer, sendo ela um elemento pervasivo no Idealismo do início do
século XIX de modo geral, contaminando filósofos e poetas. Mesmo que em
Schopenhauer isto tenha se dado em maior parcela de forma indireta, a
influência ocorreu, por certo, de múltiplas maneiras, como: (i) por meio de
Zacharias Werner, escritor e dramaturgo com influências do neoplatonismo e do
misticismo, ilustre amigo de Schopenhauer9 em sua juventude, que
“definitivamente” exerceu uma “influência positiva” neste (conversa 20) [13];
(ii) através das lições de seu primeiro professor de Filosofia ainda na faculdade
de medicina, Gottlob Ernst Schulze, que em seus cursos, em 1810, acusava
veementemente Schelling e Fichte de imitarem a doutrina dos neoplatônicos e
dos místicos (o que, embora expressamente exagerado por Schulze, está longe
9 Schopenhauer e Weiner efetivamente se conheceram no fim de 1807, em Weimar, e, durante os três primeiros
meses de 1808 se encontraram frequentemente no salão de Johanna Schopenhauer. Segundo Schopenhauer,
Zacharias Werner gostava dele e falava com ele frequentemente, inclusive “séria e filosoficamente”.
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de ser uma afirmação falsa, como sabe-se hoje); (iii) através das filosofias de
Fichte e de Schelling, cujos cursos Schopenhauer frequentou em Berlim, e cujas
obras estudou, principalmente as de Schelling; (iv) incorporado nas obras de
místicos cristãos, como em Mysterium Magnum (1623), de Jacob Böhme, que
inspirou não só Schopenhauer, mas inclusive Schelling, Goethe e Werner; (v)
em suas conversas com Goethe, também um leitor de Plotino; (vi) e, por fim, o
mais surpreendente... O Neoplatonismo foi elemento chave no espírito por trás
da tradução das Upanishads liderada e comentada pelo príncipe persa Dara
Shukoh em 1657, traduzida para o latim por A. H. Anquetil-Duperron em 1801,
e lida por Schopenhauer a partir de 1814; o Sufismo, tradição islâmica a que
Dara pertencia, traz desde suas raízes mais profundas inspirações do
Neoplatonismo10
, embora nem Anquetil nem Schopenhauer soubessem disso.
Há evidências conclusivas, portanto, de que todo o período de maturação da
filosofia de Schopenhauer é marcado positivamente pela forte presença do modo
neoplatônico de pensar, o que se reflete, por sinal, no conteúdo de seus
manuscritos. Não se trata, pois, de uma especulação, mas de um fato, que
merece atenção por parte dos pesquisadores. Fato este, aliás, que pode muito
bem explicar por que a Oupnek’hat – cuja leitura muitos orientalistas, inclusive
o excepcional Max Müller, relataram ser extremamente desagradável e quase
incompreensível – atraiu tão profundamente a atenção de Schopenhauer a ponto
de permanecer sendo sua tradução preferida das Upanishads, mesmo após sua
aquisição posterior de traduções mais modernas diretamente do sânscrito. Aliás,
nunca nenhuma tradução direta do sânscrito será capaz de se aproximar do texto
da Oupnek’hat por uma razão simples e curiosa: Anquetil-Duperron, que
traduziu o mais literalmente possível o texto dos manuscritos em persa, não
percebeu (embora isso estivesse expresso no prefácio de Dara Shukoh) que o
manuscrito estava constantemente atravessado por comentários e explicações
dos versos originais à luz do Sufismo e de seu ensinamento sobre unidade última
de todas as coisas em Allah (Tauḥīd). O resultado é que a formatação do texto
da Oupnek’hat não diferencia o que é śruti11
e o que é comentário, tornando-se
acidentalmente, para o desconhecimento de Anquetil e Schopenhauer, uma
grande mistura de Vedānta e Sufismo, que por sua vez possui fortes conexões
com o Neoplatonismo. Mas todos esses ingredientes tem algo em comum: a
concepção do mundo como essencialmente não dual, isto é, como
fundamentalmente um e único, denunciando, assim, toda a experiência da
multiplicidade objetiva e da individualidade subjetiva como um grande engano.
Na verdade, somos como a água na garrafa que boia no oceano12
. O conteúdo de
dentro da garrafa e o conteúdo de fora são exatamente o mesmo, e podemos
realizar essa unidade se quebrarmos o vidro que representa o apego à
experiência da individualidade e às demandas do “eu” e do “meu”.
A bússola de Schopenhauer
Até agora, vimos que a equação vida = sofrimento já era desde o início presente nos
escritos de Schopenhauer. Uma filosofia de negação do “ego” (ou da “egoidade”; Ichtung,
em alemão) já era reconhecível em seus cadernos desde jovem. Em 1813, o próprio autor já
era capaz de reconhecer que um pensamento coeso e uniforme estava em processo de
10
O grande pai fundador da doutrina Sufi, o místico espanhol Ibn Arabi (1165-1240) merece destaque por esse
fato. (APP, 2014, p. 132) 11
Palavra em sânscrito que designa as palavras das escrituras sagradas. 12
Alegoria contada ao antropólogo François Bernier, em algum momento entre 1656 e 1657, por um dos
indianos membros da equipe de tradução das Upanishads do Príncipe Dara. Cf.: APP, 2014, p. 131.
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elaboração. Mesmo que ainda não pudesse antecipar ainda a conclusão de todo o sistema, ele
tinha certeza de que estava no caminho certo. Isto fica evidente nas seguintes notas:
“Sob as minhas mãos, ou melhor, em minha mente, uma filosofia, que
será ética e metafísica em uma, está se desenvolvendo. Até o momento, elas
foram tão falsamente separadas quanto foi o homem em corpo e alma. A obra
se expande, e as partes tomam forma devagar e gradativamente como uma
criança no útero: eu não sei qual se desenvolveu primeiro e qual por último, tal
qual acontece com a criança no útero da mãe.” (#92) [1]
“Estou me tornando consciente de um membro, de um vaso sanguíneo, de
uma parte após a outra, quer dizer, eu anoto as coisas sem me preocupar em
como elas vão encaixar em um todo, porque eu sei que tudo nasceu de uma
única fundação. Assim é que um todo orgânico é formado, e apenas tal [todo
orgânico] pode viver.” (#92) [1]
Contudo, como já vimos acima, em 1818, Schopenhauer admitiu que a essência de sua
linha de raciocínio já existia quatro anos antes de forma esboçada. Ora, mas o que teria
ocorrido em apenas um ano para que o que era apenas um feto em desenvolvimento em 1813
já fosse no ano seguinte considerado um ente formado, com essência definida, que necessitava
apenas de um suficiente desdobramento que tornasse tal concepção “completamente clara”
para a pessoa que a concebeu, por meio de ensaios e outros estudos? Bom, já pudemos
perceber que a Oupnek’hat sem dúvida foi o evento mais relevante que aconteceu na vida de
Schopenhauer nesse meio tempo. Quanto à “criança no útero” descrita pelo jovem doutor em
filosofia, vimos também que na verdade podemos, ainda, remontar seu processo de formação
até um estágio mais embrionário. Em 1808 ou até antes, Schopenhauer se encantava com a
noção de esquecimento do “eu” através da arte e da religião que atravessou a obra de
Zacharias Werner e de dois outros escritores ainda não mencionados que o influenciaram
consideravelmente quando muito jovem: Wackenroder e Tieck. É possível especular também
que, desde ainda mais cedo, ele já tivesse alguma familiaridade com a obra de Jacob Böhme.
Chegamos então a um ponto em que podemos, enfim, introduzir a metáfora central presente
no livro do suíço Urs App: a “bússola”.
Baseado no estudo histórico da obra de Schopenhauer, Urs App propõe que o interesse
de Schopenhauer pela Filosofia respeita, desde o início, a direção apontada por uma espécie
de bússola interna. Como toda bússola, ela aponta para um “norte” e para um “sul”, que
representam os dois polos do pensamento de Schopenhauer: o “eu” e seu egoísmo intrínseco
são o “sul” do qual Schopenhauer quer se afastar, por entender que neles está a fonte do
sofrimento; o “norte”, por sua vez, é representado pela abolição do ego, que aponta para a
salvação (Erlösung) ou bem-aventurança (Seeligkeit). Todavia, embora ambos os polos
estivessem há tempos bem marcados no pensamento de Schopenhauer, o mecanismo de
funcionamento da bússola – aquilo que a fundamenta ontologicamente – permaneceu
incompreendido até 1814. Obviamente, o mecanismo em questão é o conceito de vontade
enquanto essência do mundo. Essa “descoberta” respondeu, finalmente, a pergunta mais
fundamental de sua filosofia, isto é, ‘qual é a origem última do sofrimento e por que me
parece que a única escapatória para ele é a negação temporária ou permanente da minha
individualidade?’.
Schopenhauer e os idealistas
Imediatamente antes que o conceito de “vontade” em Schopenhauer estivesse esculpido
da maneira como conhecemos e estudamos hoje, e ao mesmo tempo antes que a influência
indiana se cristalizasse em seus manuscritos, sua filosofia se limitava a diagnosticar e
descrever dois tipos de consciência. Havia a noção de “consciência empírica” (empirischen
Bewußtseyn), importada de Fichte, utilizada para descrever a consciência ordinária do sujeito
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amarrado aos objetos por seus desejos e inclinações. A outra é a “boa consciência” (beßre
Bewußtseyn), experimentada pessoalmente Schopenhauer em vivências de êxtase
contemplativo na natureza e na arte. Nestes momentos extraordinários, o autor diz que foi
elevado a “um mundo onde não há personalidade nem causalidade, nem sujeito nem objeto”
(# 81) [1]. Além disso, é claro, esse tipo de consciência é descrito também de uma forma ou
de outra por autores que influenciaram Schopenhauer, por exemplo, Platão (na formulação da
metáfora do sol e da alegoria da caverna13
), Kant (na explicação das experiências do belo e do
sublime14
), místicos cristãos como Böhme (na “iluminação”) e Madame Guyon (na “completa
abnegação”), escritores como Wackenroder, Tieck e Werner (em seus ideais de superação do
ego pela religião e pela arte) e, embora com muitas ressalvas, idealistas como o próprio Fichte
(em seu “conhecimento elevado”, höhere Wissen), e também Schelling (em sua “intuição
intelectual” intellektuale Anschauung). Apesar das duras críticas de Schopenhauer ao conceito
de um “Absoluto” intuível e atingível intelectualmente utilizado pelos filósofos idealistas
contemporâneos, a ideia de uma unidade fundamental e de sua contemplação como o objetivo
mais alto sem sombra de dúvida os aproxima do filósofo pessimista, como fica evidente em
passagens como as seguintes de Schelling, em cujo pensamento o querer, ou a vontade,
também são centrais:
“O eu, diz Fichte, é seu próprio ato [That], e a consciência se
autoestabelece – mas o eu não é algo diferente disto, mas na verdade consiste
precisamente no autoestabelecimento de si mesmo [Selbstsetzen]. Mas essa
consciência, na medida em que é concebida apenas como uma apreensão ou
cognição do eu, não é aquilo que é primário, pois já pressupõe, como todo
mero conhecimento, Ser em seu sentido mais próprio. Mas esse Ser que é
suposto como anterior ao conhecimento, um querer básico e original [Ur- und
Grundwollen] que se transforma em algo e constitui o fundamento e a base de
qualquer entidade essencial [Wesenheit].” (pp. 467-8)
“Na instância última e mais alta instância não há absolutamente outro ser
além do querer [Wollen]. O querer é o ser original [Urseyn], e a ele apenas se
aplicam todos os predicados que o caracterizam: ausência de fundamento
[Grundlosigkeit], eternidade [Ewigkeit], independência do tempo
[Unabhängigkeit von der Zeit], autoafirmação [Selbstbejahung]. A filosofia
como um todo visa nada mais que encontrar essa suprema expressão.” (p. 419)
Contudo, mesmo nessa época de formação de seu pensamento, Schopenhauer já
enxergava diferenças fundamentais entre os modos como ele próprio e como Schelling
compreendiam a possibilidade de conhecer essa vontade originária. Reconhecendo de algum
modo os méritos filosóficos deste, ele se esforçava para expressar de modo mais claro e
positivo sua própria visão.
“Eu nego uma intuição intelectual que, enquanto tal, dependa da vontade
empírica e da cultivação da mente. Mas isto não implica que eu nego – tal qual
Schelling – o que os entusiastas chamaram de ‘iluminação superior’ e Platão
(Res publica VII) de ‘elevação ao sol espiritual’. [Tal iluminação] não é nem
condicionada pela vontade empírica (apesar de ser uma com a vontade pura)
nem pelo cultivo da mente, que, em comparação com aquela, parece totalmente
insignificante; é a essência íntima do gênio.” (p. 311-2) [16] / “A intuição
intelectual de Schelling é, pois, algo diferente da boa consciência que eu
atribuo ao homem.” (pp. 326) [16]
Em sua tese de doutorado, Schopenhauer tenta fornecer uma explicação da condição
necessária de determinação da vontade empírica pela vontade básica que é seu fundamento
13
República, livros VI e VII. 14
Crítica à Faculdade do Juízo (1890).
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essencial. Para isso ele recorre a um conceito que permanece usando em O mundo como
vontade e representação.
“Talvez eu explique o que eu quero dizer melhor, ainda que mais
metaforicamente, se eu chamar isto de um ato atemporal e universal da
vontade, do qual todo ato temporal é apenas a emergência ou aparência. Kant
chamou isto de caráter inteligível. [...] Eu considero essa discussão uma das
mais admiráveis e inigualáveis obras-primas da profundidade humana. No
primeiro volume de seus escritos, pp. 465-473, Schelling nos deu uma
apresentação e uma explicação muito valiosa disto.” (p. 301-2) [16]
Vemos, pois, que a proto-filosofia de Schopenhauer – embora manifeste
expressamente o anseio de autodeterminação, de maneira a escapar dos problemas que
enxergava nas formulações de seus professores idealistas – não é ainda capaz de dar uma
resposta positiva satisfatória às suas questões mais urgentes. Em sua tese de doutorado Sobre
a quádrupla raiz do princípio de razão suficiente, ele faz uma análise que esgota a
experiência comum da “consciência empírica”, o que foi fundamental para abrir caminho para
a compreensão da “boa consciência”, o norte de sua bússola, que carecia ainda de
fundamentação. Porém:
“O que é a essência íntima do artista e do santo, e se elas poderiam talvez
ser idênticas, são questões que não podem ser discutidas aqui, já que isto iria
contra minha intenção de não tocar em questões da Ética e da Estética neste
tratado. Contudo, isto é capaz de em algum ponto possivelmente se tornar uma
obra maior, cujo conteúdo, quando comparado a este presente, seria como a
vigília quando comparada a um sonho.” (vol. 7, p. 91) [17]
A leitura de seus manuscritos e a confirmação de passagens contidas no texto original
de sua tese de doutorado nos mostraram também que a vontade do sujeito já se encontrava sob
os holofotes de seu pensamento, e que o conceito de “caráter inteligível” enquanto “ato
atemporal e universal da vontade”, do qual as ações temporais particulares são mero reflexo,
também já era algo concebido. No entanto, a vontade antes de 1814 não significava
exatamente a mesma coisa do que o que foi o caso a partir deste ano. O conceito de vontade
permanecia atrelado ao seu sentido estritamente psicológico, o que por certo podia ser
creditado ao legado kantiano de uma metafísica a priori dentro dos limites formais da
experiência, na qual o pensamento sobre a coisa-em-si estava totalmente interditado. Pensar
em uma vontade que, por analogia, se aplicasse à coisa-em-si certamente soaria bem
anacrônico para um idealista no começo do século XIX. Parece sutil, mas vejamos, por
exemplo, a maneira como o próprio Kant formula a noção de caráter inteligível (intelligiblen
Karakter) em uma passagem extraída das páginas da Crítica da razão pura (A 560-586) que
Schopenhauer cita em sua tese (vol. 7, p.76-7) [17]:
O princípio regulador da razão é, pois, relativamente ao nosso
problema, que tudo no mundo sensível tem existência empiricamente
condicionada, e que em parte alguma há nele, em relação a qualquer
propriedade, uma necessidade incondicionada; que não existe nenhum membro
da série de condições de que se não possa sempre esperar e investigar, até onde
for possível, a condição empírica numa experiência possível; e que nada nos
autoriza a derivar uma existência qualquer de uma condição exterior à série
empírica ou considerá-la, na própria série, absolutamente independente e
autônoma, sem que por isso se ponha em dúvida que a série inteira possa
fundar-se em qualquer ser inteligível (por conseguinte livre de toda a condição
empírica e sobretudo contendo o fundamento da possibilidade de todos os
fenômenos).
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Não há nisto, porém, a intenção de provar a existência
incondicionadamente necessária de um ser, nem também a de sobre ele fundar
a possibilidade de uma condição simplesmente inteligível da existência dos
fenômenos do mundo sensível, mas tão-só o propósito de, tal como limitamos a
razão para que não abandone o fio das condições sensíveis e não se extravie em
princípios de explicação transcendentes e insusceptíveis de qualquer
representação in concreto, também por outro lado limitarmos a lei do uso
simplesmente empírico do entendimento, de modo que este não decida da
possibilidade das coisas em geral e, apesar de o inteligível não nos poder servir
para a explicação dos fenômenos, não o declare por isso impossível. Apenas
nos limitamos a mostrar que a contingência universal de todas as coisas
naturais e de todas as suas condições (empíricas) pode muito bem coexistir
com o pressuposto arbitrário de uma condição necessária, embora puramente
inteligível; ou seja, que se não encontra verdadeira contradição entre estas
afirmações e que, por conseguinte, ambas poderá, cada uma por seu lado, ser
verdadeiras. Que um tal ser inteligível, absolutamente necessário, seja
impossível em si, é o que não se pode de modo algum concluir, nem a partir da
contingência universal de tudo o que pertence ao mundo dos sentidos, nem a
partir do princípio que nos impede tanto de nos determos em qualquer termo
particular deste mundo, na medida em que é contingente, como de invocar uma
causa exterior ao mundo. A razão segue o seu caminho no uso empírico e o seu
caminho particular no uso transcendental. (pp. 492-3) [18]
Neste trecho, Kant evoca a noção de que, embora não se possa de modo algum
estabelecer um vínculo causal de uma cadeia de fenômenos com um ser necessário qualquer
que não faz empiricamente parte desse mesmo processo, nada nos interdita a possibilidade de
pensar em um ser meramente inteligível que, fora das determinações empíricas do espaço e do
tempo, fundamente essa série de fenômenos enquanto sua essência imutável, não
condicionada pela sensibilidade. O filósofo de Königsberg, portanto, admite a possibilidade
de um ser inteligível, acima do mundo sensível, apenas enquanto pura ideia que explique a
contingência particular de uma determinada cadeia de fenômenos. O ser inteligível de modo
algum poderia receber um status ontológico, relativo à coisa-em-si e para além de sua
dependência transcendental da razão. Entretanto, foi exatamente assim que Schopenhauer
começou a pensar a partir de 1814. O que houve foi uma mudança fundamental em sua forma
de enxergar o problema: de uma proto-filosofia baseada no diagnóstico de duas versões da
natureza psicológica da consciência – a “consciência empírica” e a “boa consciência” –, surge
uma filosofia baseada na compreensão da existência de dois pontos de vista da realidade
metafísica do mundo – a saber, representação e vontade.
Ainda que o insight contido na compreensão da identidade do sujeito do conhecimento
com o sujeito da vontade tenha sido fundamental para que Schopenhauer pudesse conceber
um tal salto teórico, ela sozinha não autoriza a aplicação do conceito de vontade como
fundamento ontológico da natureza do reino mineral ao reino animal, nem identificação da
ideia platônica como sua objetidade adequada, nem tampouco permite que daí se erga uma
ética baseada na compreensão de que todo ser em essência é expressão da mesma vontade e
que, por isso, a compaixão seja o princípio que deve orientar a ação virtuosa. É a Oupnek’hat,
por sua vez, que prepara o terreno para o florescimento de todas essas noções que formam o
núcleo da filosofia de Schopenhauer. Há de se admitir que não seja incorreto que muito do
que filósofo já pensava tenha sido meramente confirmado pela obra, caso contrário,
convenhamos, seria improvável que mobilizasse tão profundamente os seus interesses. Porém,
a expressão particular ali contida carregada de interpretações sufistas da doutrina esotérica
védica – tão distante, mas de algum modo tão próxima em essência de diversas visões da
tradição metafísica ocidental, por motivos que já foram expostos – possuía os ingredientes
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que faltavam para a definição precisa da “linha de raciocínio” que Schopenhauer vinha
perseguindo há tempos sem obter o sucesso esperado. A Oupnek’hat não nega o ponto
fundamental do Idealismo Transcendental de que só podemos produzir discurso sobre as
aparências e nunca sobre as coisas em si mesmas, sendo o que chamamos de mundo
dependente da forma como ele nos aparece a priori; ao mesmo tempo a reflexão sobre o
modo pelo qual as aparências e em particular o sujeito, enquanto partes de um todo que
escapam à consciência, têm sua natureza radicada nesse mesmo todo é algo que teria instigado
Schopenhauer a procurar outras maneiras possíveis de pensar o Idealismo.
Brahman e māyā
Maïa existe, em seres particulares – isto é, nessas aparências, formas – [e
aparece como] o desejo de criação, o amor, a estima, o gosto por seres
particulares, da mesma maneira como ocorre em Brahm. O erro do homem
consiste em acreditar – porque ele engendra, produz, e vê produção,
nascimento, e começo – que na natureza existe algo mais além de Brahm e
diferente de Brahm. Com seus olhos ele vê apenas formas; e em virtude de
Maïa ele as toma como substâncias separadas. Ele deveria ver em tudo a
substância universal, a única e verdadeira substância. Ainda que ele nomeie
apenas seres particulares, ou melhor, aparências, sem realidade. Esse é o
homem que, quando vê uma corda no chão, confunde com uma cobra, e,
quando vê uma cobra, confunde com uma corda.15
Neste trecho da explicação de Anquetil-Duperron do conceito de māyā16
contida em sua
primeira tradução da obra do Príncipe Dara – a princípio não para o latim, mas para o francês
–, o autor aponta o caráter ontológico, e não meramente ideal, desse conceito. Māyā é o
desejo de Brahman de ser conhecido, interpretação que foge um pouco daquela transmitida
pela tradição do Vedānta, mas que, por sua vez, está em consonância com um conhecido
verso da tradição profética islâmica Hadith, que influenciou bastante o misticismo Sufi, no
qual Allah diz: “Eu era um tesouro oculto, e desejei ser conhecido. Então, Eu criei criaturas e
assim Me fiz conhecido a elas”17
. O desejo, pois, não tem origem em nós mesmos enquanto
indivíduos, mas em Brahman, que é o princípio de tudo, e nós indivíduos, por sermos
idênticos a Ele, também desejamos. Nessa interpretação, māyā é utilizado em sentido idêntico
à palavra persa ishq, que significa justamente esse amor divino pelas criaturas, mas o fato é
que Dara tinha consciência dessa equivalência. Em verdade, para o príncipe herdeiro do
império Mughal, as diferenças entre o Sufismo e a doutrina “monoteísta” indiana eram apenas
de ordem terminológica, ou seja, para ele ambos em essência expressavam exatamente a
mesma verdade.
15
ANQUETIL-DUPERRON, Abraham Hyacinthe. Oupnek’hat, traduit littéralement du person, mêlé du
samskrétam. In: Bibliothèque Nationale: Nouvelles acquisitions françaises NAF 8857. França (Paris): Fond
Anquetil-Duperron, 1787. (pp. 305-6) 16
As grafias são muitas nessas traduções antigas, mas a transliteração correta do termo segundo os padrões
atuais é mesmo māyā. 17
Mais detalhes em APP, 2014, pp.135-6
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Enfim, a ideia de māyā como causadora do erro do indivíduo e expressão de um desejo
originário e anterior à existência desse mesmo indivíduo teria influenciado muito
Schopenhauer. Embora contrário à concepção divina desse desejo, o filósofo era simpático à
sua existência não meramente ideal, mas como coisa-em-si, eterna e indeterminada. Outra
evidência disto (ver imagem acima18
:) é a definição, naquele mesmo glossário da Oupnek’hat
já citado, de māyā (Maïa): voluntas æterna; quod causa ostensi sine fuit (existentid) est
(“vontade eterna, a razão da manifestação daquilo que não possui realidade (existência)”). Em
tal definição, curiosamente, Brahman não é mencionado, se encaixando perfeitamente com a
noção de vontade que aparecerá na obra de Schopenhauer. Para este, Brahman não poderia
significar nada mais do que a “vontade cega” que em essência é o motivo pelo qual todo o
mundo da representação é o que é.
A superação dessa vontade pode ocorrer justamente por meio da contemplação nos seres
particulares dessa vontade eterna universal, contemplação essa que será mediada pelas ideias
platônicas enquanto um meio termo entre os objetos particulares, atados ao princípio de razão
suficiente devido à sua relação com nossa vontade, e a vontade eterna, que em si não tem
forma, mas é apenas um esforço cego que visa apenas à perpetuação de si mesmo. Através da
contemplação das ideias na natureza, desde as forças mais básicas que comandam o mundo
inorgânico, até os princípios que regem a vida das plantas, depois de cada espécie de animal, e
finalmente a humanidade, seria possível contemplar que tudo é manifestação de uma mesma
vontade.
De acordo, então, com esse caminho aberto pela Oupnek’hat em que o conceito de
vontade torna-se aplicável a toda e qualquer coisa no mundo, Schopenhauer passa a entender
que a solução de seus antigos problemas deve passar pela demonstração da “identidade do que
é aparentemente diferente” (Identität des verschieden Scheinenden) (# 280) [1]:
Assim, se apenas nós ganhássemos o ponto de vista certo, o mundo
inteiro gradualmente apareceria como um, e este aqui como apenas a
visibilidade da vontade. Essa demonstração da identidade do que é
aparentemente diferente deveria substituir a derivação de uma coisa diferente
da outra baseada no princípio de razão suficiente.
Conclusão
Neste ano, tomamos consciência do modo como, efetivamente, Schopenhauer absorveu
a princípio a doutrina das Upanishads de modo a utilizá-la na construção de seu próprio
sistema filosófico. Vimos que sua principal influência foi a tradução latina Oupnek’hat de A.
H. Anquetil-Duperron e mencionamos a interferências e adições no texto original que
escaparam ao conhecimento do francês ao realizar seu trabalho. Comentamos que tais
“deturpações” podem ter sido responsáveis pela recepção mais entusiástica de Schopenhauer,
sobretudo se considerarmos o toque neoplatônico que o Sufismo do Príncipe Dara deixava
transparecer. Entendemos, ainda, por que há uma série de razões para crermos que, sem a
Oupnek’hat, Schopenhauer não teria tido à época recursos já para elevar o conceito de
vontade a um patamar tão alto e nuclear do ponto de vista de sua metafísica. Guiado pelo
princípio de que a natureza última de todas as coisas é uma e única vontade, o filósofo
pessimista, enfim, realiza seu projeto de conceber uma metafísica que fosse também uma
ética, como vimos na nota # 92. Com isso, a miséria da “egoidade” do sujeito comum e a sua
negação temporária ou permanente realizada respectivamente pelos artistas e pelos santos são,
enfim, ontologicamente estabelecidos às bases da fórmula “afirmação ou negação da
vontade”.
A pesquisa detalhada exposta no livro Schopenhauer’s Compass, de Urs App [19], foi a
grande benção desse ano de pesquisa. Sem ele não teríamos tido acesso à grande maioria das
18
Marcações do próprio Schopenhauer.
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referências trazidas neste relatório. Este é um tipo de pesquisa que requer o acesso, por
exemplo, a fontes históricas indisponíveis para nós aqui no Brasil. A principal delas é a cópia
da Oupnek’hat que Schopenhauer possuía, que Urs App consultou em Frankfurt. Entretanto,
como o próprio autor suíço sugere, a Oupnek’hat poderia muito bem já estar digitalizada,
dado o seu alto grau de interesse para a pesquisa em Schopenhauer. Em outro sentido, outra
fonte primordial, os manuscritos de Schopenhauer, traduzidos e publicados em múltiplos
volumes em inglês sob o título Manuscript Remains (1988), também é de difícil acesso
devido ao seu custo exorbitante. Mas, enfim, de modo geral, temos agora uma noção
extremamente mais clara da influência das Upanishads em Schopenhauer. E não apenas a
temos como um fato, mas sabemos de que modo isso provavelmente ocorreu. Para que isso
acontecesse, foi preciso que nos rendêssemos ao método de estudo baseado em fontes
históricas, de modo a sair do terreno da mera especulação teórica para entrar no campo das
evidências concretas.
É urgente um estudo de Schopenhauer que não apenas se atenha a sua influência
tradicional via Kant e Platão, mas que, de maneira honesta e comprometida, investigue
também outros ingredientes importantes para a origem do seu pensamento. O que defendemos
aqui é que um melhor conhecimento da Oupnek’hat é crucial se quisermos compreender e
discutir O Mundo Como Vontade e Como Representação e toda a obra schopenhaueriana
posterior com real profundidade. De todo modo, é indispensável, antes de julgarmos o valor
de uma filosofia, que saibamos sobre que bases se apoiaram suas teses. E que evidências
robustas como as encontradas na presente pesquisa sejam ainda academicamente pouco
divulgadas só pode ser, além do mais, efeito de graves problemas metodológicos, e talvez
sinalize um sintoma patológico da realidade prática da pesquisa acadêmica, i.e., a preguiça
intelectual de se desapegar dos paradigmas de estudo tradicionalmente estabelecidos.
Finalmente, há uma última conclusão decisiva para os rumos desta pesquisa: a análise
da relação entre Schopenhauer e Vedānta não pode ser feita pelo mero cruzamento entre
traduções contemporâneas das Upanishads – ainda que, talvez, mais fieis aos originais – e os
escritos daquele. Havemos de, em vez disso, levar em consideração as traduções a que
Schopenhauer teve efetivamente acesso, a fim evitar conclusões precipitadas. Logo, em tal
tarefa, um mergulho no Orientalismo do século XIX e em suas raízes será por certo inevitável.
Referências
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Manuscripts (1804-1818). Trad. E. F. J. Payne. Oxford / Nova Iorque / Hamburgo: Berg,
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13 - SCHOPENHAUER, Arthur; HÜBSCHER, A. (ed.). Gespräche. Stuttgard: Friedrich
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15 - SCHELLING, F. W. J. F. W. J. Schelling’s philosophische Schriften, erster Band.
Landshut: Philipp Krüll, 1809.
16 - SCHOPENHAUER, Arthur. Manuscript Remains in Four Volumes, Volume 2:
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1988.
17 - SCHOPENHAUER, Arthur; HÜBSCHER, A. Sämtliche Werke. Mannheim:
Brockhaus, 1988.
18 - KANT, Immanuel. Crítica da razão pura. Trad. Manuela Pinto Dos Santos e Alexandre
Fradique Morujão. Portugal (Lisboa): Fundação Calouste Gulbenkian, 2001.
19 - APP, Urs. Schopenhauer’s Compass: An introduction to Schopenhauer’s Philosophy
and its Origins. Wil: University Media, 2014.