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UNIVERSIDADE DO CONTESTADO UnC PROGRAMA DE MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL CRISTIANY MARTINS PLANTAS MEDICINAIS: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA O DESENVOLVIMENTO DO MUNICÍPIO DE CANOINHAS (SC) CANOINHAS-SC 2015

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Page 1: (SC) - Cristiany Martins

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UNIVERSIDADE DO CONTESTADO – UnC

PROGRAMA DE MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL

CRISTIANY MARTINS

PLANTAS MEDICINAIS: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA O

DESENVOLVIMENTO DO MUNICÍPIO DE CANOINHAS (SC)

CANOINHAS-SC

2015

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1

CRISTIANY MARTINS

PLANTAS MEDICINAIS: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA O

DESENVOLVIMENTO DO MUNICÍPIO DE CANOINHAS (SC)

Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional pela Universidade do Contestado – UnC, Canoinhas, SC, sob orientação do Prof. Dr. Jairo Marchesan e Coorientação da Profa. Dra. Graciele Viccini Isaka.

CANOINHAS (SC)

2015

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PLANTAS MEDICINAIS: LIMITES E POSSIBILIDADES PARA O

DESENVOLVIMENTO DO MUNICÍPIO DE CANOINHAS (SC)

CRISTIANY MARTINS

Esta Dissertação foi submetida ao processo de avaliação pela Banca

Examinadora para a obtenção do Título de:

Mestre em Desenvolvimento Regional

E aprovada na sua versão final em 28 de fevereiro de 2015, atendendo às

normas da legislação vigente da Universidade do Contestado e Coordenação do

Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional.

_____________________________________ Prof. Dr. Sandro Luiz Bazzanella

Coordenador do Mestrado em Desenvolvimento Regional

BANCA EXAMINADORA:

_____________________________________ Prof. Dr. Jairo Marchesan – UnC

(Orientador)

_____________________________________ Prof. Dr. Milton Satoshi Matsushita – EMATER – PR

(Membro externo)

_____________________________________ Prof.ª Dra. Graciele Viccini Isaka – IFSC

(Co-orientadora e membro interno)

_____________________________________ Prof.ª Drª. Maria Luiza Milani – UnC

(Membro interno)

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3

Dedico este trabalho

às luzes mais brilhantes,

meus cristaizinhos, meus pedacinhos:

minhas filhas!

Page 5: (SC) - Cristiany Martins

4

AGRADECIMENTOS

À FAPESC/CAPES e UnC, pelo apoio financeiro à realização deste estudo.

Ao IFSC, por oportunizar esta empreitada e incentivar de diversas maneiras a

capacitação de seus servidores.

Ao meu orientador, professor Jairo Marchesan, pela confiança e liberdade ao

conduzir a orientação desta pesquisa.

À coorientadora e colega, professora Graciele Viccini Isaka, por ter aceitado

este desafio e pelas pertinentes considerações.

À professora Maria Luiza Milani, por não me deixar desistir, por sua exigência

e puxões de orelha, bem merecidos e oportunos.

Ao Daniel Uba, pelos esclarecimentos, por sua sempre pronta ajuda e por me

emprestar seu gravador. Muito obrigada!

À Aninha, pela incansável paciência, por me emprestar seus ouvidos atentos

e seu conhecimento para enriquecer este trabalho.

Aos agricultores do Grupo Nova Esperança e demais entrevistados, pelo

tempo e atenção dispensados a esta pesquisa e pela confiança do correto uso das

informações a mim confiadas.

Às mulheres da Pastoral da Saúde, em especial da paróquia do Campo

d’Água Verde, pela longa conversa e por seu trabalho voluntário junto à comunidade.

Aos colegas do IFSC, muitos dos quais me incentivaram durante a caminhada

e tornaram o caminho mais prazeroso.

Aos professores do programa de mestrado, pelo aprendizado e por me

abrirem as portas a um mundo inexplorado.

À Andressa pelo profissionalismo e aos colegas de mestrado, em especial os

do IFSC, que compartilharam pela amizade e companheirismo.

Ao professor Cesar Simionato, que em 2001 plantou uma semente. Este é

apenas um dos pequenos frutos da sua imensa colheita.

E um agradecimento especial aos meus familiares:

Page 6: (SC) - Cristiany Martins

5

Aos meus antepassados, que transmitiram seus conhecimentos sobre os

preciosos benefícios das plantas medicinais, fazendo-os chegar até esta geração e

além.

Ao Gert, pela paciência – quase esgotada – neste período em que estive mais

ausente que presente, mais promovendo o caos que zelando. Obrigada por sempre

me lembrar que “éramos apenas pedras”. Obrigada por estar por aqui.

Às minhas filhas, Isabela e Alice, por entenderem minha ausência. Por

correrem para mim com os braços abertos e me envolverem em abraços apertados.

Meu amor por vocês é sem fim.

Aos meus pais, Zélia e Luiz, e à minha sogra, “super” Renate, pelo cuidado

com minhas filhas, por estarem sempre prontos a me ajudar.

Sem vocês eu ainda estaria na página 2.

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“De onde vem a esperança, a sustança espalhando o verde dos teus olhos pela plantação?

Ô - ô Vem debaixo do barro do chão.”

(GILBERTO GIL)

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RESUMO

Este trabalho teve como objetivo pesquisar os limites e as possibilidades de uso das plantas medicinais no município de Canoinhas (SC), como alternativa ao desenvolvimento regional. Trata-se de um estudo de abordagem qualitativa, que se utilizou da revisão bibliográfica e documental e pesquisa de campo. Seus objetivos específicos foram: contextualizar o cenário socioeconômico, histórico e cultural canoinhense relacionado às plantas medicinais; identificar a articulação dos atores locais entre si e com a cadeia de produção, comercialização e utilização de plantas medicinais; e, analisar as fragilidades e potencialidades da cadeia de produção e aplicação de plantas medicinais no referido município, relacionadas à implantação de políticas públicas sobre o tema. Na pesquisa de campo, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com duas amostras distintas. A primeira compreendeu pessoas estratégicas com atuação na área de plantas medicinais e a segunda contou com agricultores familiares que compuseram um grupo de cultivo de plantas medicinais no município, além de um extensionista rural. Os dados coletados em entrevistas foram gravados e, posteriormente, transcritos, tabulados e analisados de acordo com os referenciais adotados. Algumas das conclusões do presente estudo foram: a dificuldade na interlocução entre Secretarias Municipais; a existência de um programa municipal estruturado com ações pontuais e descontinuadas e, por fim, parco investimento neste programa. Em contrapartida, o município de Canoinhas apresenta características de ordem técnica e ambiental que permitem a aplicação das políticas públicas de plantas medicinais e fitoterápicos nas esferas de saúde e agricultura, mediante a articulação e planejamento dinâmicos envolvendo os atores do município, compreendendo-a como alternativa para o desenvolvimento regional.

Palavras-chave: Plantas medicinais. Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. Desenvolvimento regional.

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8

ABSTRACT

This research aimed to investigate the limits and possibilities of action with medicinal plants in Canoinhas (SC) as an alternative to regional development. Was characterized as an applied research, with a qualitative approach, which used bibliographical and documentary review and field research as data collection instruments. Its specific objectives were to: contextualize Canoinhas socioeconomic, historical and cultural scenario related to medicinal plants; identify the articulation of local actors related to medicinal plants among themselves and with the production chain; and analyze the weaknesses and strengths of the production chain and application of medicinal plants in the municipality, related to the implementation of public policies on the subject. In the field research, semi-structured interviews were conducted with two different samples. The first included key stakeholders operating with medicinal plants, and the second comprised family farmers who formed a medicinal plants cultivation group in the city, and was attended also by a rural extension agent. Data collected in interviews were recorded and later transcribed, tabulated and analyzed so that they could be interpreted in accordance with the standard references. Some of the conclusions of this study were: the difficulty in communication involving municipal departments; the existence of a municipal program structured with punctual and discontinued actions and, finally, meager investment in this program. In contrast, Canoinhas presents technical and environmental characteristics that allow the implementation of public policies of medicinal plants and herbal medicines in health and agriculture spheres, through the articulation and dynamic planning involving stakeholders in the municipality, understanding it as an alternative for regional development. Keywords: Medicinal plants. National Policy of Medicinal Plants and Herbal medicines. Regional development.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Monge João Maria .............................................................................. 37

Mapa 1 – Localização da Comunidade de Matão/Canoinhas (SC) .................... 54

Mapa 2 – Localização do Planalto Norte Catarinense e do Município de

Canoinhas (SC) .................................................................................. 57

Figuras 2 e 3 – Hortas Medicinais Cultivadas em Escola Municipal de Canoinhas

(SC) – Projeto Interdisciplinar de Educação do Campo ...................... 73

Figura 4 – Demonstração dos Usos das Plantas no Conceito do Projeto

Interdisciplinar de Educação do Campo ............................................. 73

Figuras 5 e 6 – Construção de Estufa em Madeira para a secagem de plantas ...... 89

Figuras 7 e 8 – Estufa para a secagem de plantas medicinais em alvenaria ........... 89

Figuras 9 e 10 – Estufa de secagem adaptada em cômodo da residência da

agricultora 3 ........................................................................................ 90

Figura 11 – Primeira colheita de camomila, semeada a lanço ............................... 92

Figura 12 – Bandejas com calêndula, prontas para o início da secagem .............. 93

Figura 13 – Calêndula florescida e pronta para a colheita na propriedade ............ 93

Figura 14 – Preparação de área de plantio para a melissa com adubação verde

pronta para o corte .............................................................................. 94

Figura 15 – Área preparada com a palhada da adubação verde, recebendo mudas

de melissa ........................................................................................... 95

Figura 16 – Melissa pronta para a colheita ............................................................ 95

Figura 17 – Adaptação do plantio de camomila na segunda safra – 2008............. 97

Figura 18 – Colhedor de camomila desenvolvido por participantes do Grupo Nova

Esperança ........................................................................................... 97

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LISTA DE QUADROS E TABELAS

Quadro 1 – Referências Normativas Relativas às Plantas Medicinais ..................... 44

Quadro 2 – Perfil dos Entrevistados por Grupo de Amostragem .............................. 52

Quadro 3 – Principais Ações Institucionais com Plantas Medicinais no Município de

Canoinhas (SC) no período de 2005 a 2015 ......................................... 62

Quadro 4 – Metas da Secretaria Municipal de Saúde de Canoinhas (SC) –

Quadriênio 2010 a 2013 – Complexo de Plantas Bioativas ................... 70

Tabela 1 – Perfil Atual dos Agricultores Familiares Entrevistados e suas

Propriedades ......................................................................................... 78

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LISTA DE ABREVIATURAS E/OUSIGLAS

AMPLANORTE – Associação dos Municípios do Planalto Norte Catarinense

AMURC – Associação dos Municípios da Região do Contestado

ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária

APS – Atenção Primária de Saúde

AS-PTA – Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa

CAPS – Centro de Atenção Psicossocial

CEME – Central de Medicamentos

CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

EPAGRI – Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina

FIESC – Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina

FIEP – Federação das Indústrias do Estado do Paraná

FOM – Floresta Ombrófila Mista

ha - hectares

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

OMS – Organização Mundial de Saúde

ONU – Organização das Nações Unidas

MB – Microbacias

PDI – Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação

PM – Plantas Medicinais

PMF – Plantas Medicinais e Fitoterápicos

PMS – Plano Municipal de Saúde

PMDRS – Plano Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável

PNAF – Política Nacional de Assistência Farmacêutica

PNM – Política Nacional de Medicamentos

PNPIC – Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares

PNPMF – Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos

PP – Políticas Públicas

PPM – Programa de Plantas Medicinais

PRONAF – Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar

PT – Partido dos Trabalhadores

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RDC – Resolução da Diretoria Colegiada

RENAME-Fito – Registro Nacional de Medicamentos Fitoterápicos

SENAR – Serviço Nacional de Aprendizagem Rural

SINTRAF – Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura Familiar

SDR – Secretaria de Desenvolvimento Regional

SUS – Sistema Único de Saúde

TCLE – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

UBS – Unidade Básica de Saúde

UnC – Universidade do Contestado

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 14

2 REFERENCIAL TEÓRICO .................................................................................... 20

2.1PLANTAS MEDICINAIS E RACIONALIDADE TÉCNICA: APREENDENDO

CONCEITOS E COMPREENDENDO CAMINHOS .............................................. 20

2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS E DESENVOLVIMENTO LOCAL ................................. 39

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ......................................................... .... 51

3.1 CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL DE PESQUISA .............................................. 56

4 A PESQUISA DE CAMPO: RESULTADOS E ANÁLISE ................................. .... 59

4.1PLANTAS MEDICINAIS E AÇÕES DESENVOLVIDAS NO MUNICÍPIO DE

CANOINHAS (SC) .......................................................................................... .... 59

4.2 GRUPO NOVA ESPERANÇA: ANTES, DURANTE E DEPOIS DA EXPERIÊNCIA

COM PLANTAS MEDICINAIS ......................................................................... .... 76

4.2.1 Caracterização do Grupo ........................................................................... .... 77

4.2.2 Histórico e Análise de Atuação do Grupo ................................................... .... 83

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. .. 107

REFERÊNCIAS ................................................................................................... .. 113

APÊNDICE A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................ .. 124

APÊNDICE B – Instrumento de Coleta de Dados para Gestores Públicos ............ 126

APÊNDICE C – Instrumento de Coleta de Dados para Agricultores que Atuaram com

Plantas Medicinais em Canoinhas (SC) ........................................ 127

ANEXO A – Lei 4.565/2010 ................................................................................. .. 129

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14

1 INTRODUÇÃO

Este estudo analisa os limites e possibilidades que as plantas medicinais

oferecem ao município de Canoinhas (SC), enquanto ferramentas ao

desenvolvimento. Trata-se de um estudo do tipo exploratório e descritivo, com

abordagem qualitativa. Tem a finalidade de pesquisar as ações desenvolvidas com

as plantas medicinais no referido município, as contribuições oferecidas e as

possibilidades de implantação de políticas públicas referentes ao tema.

Desde os tempos remotos, diferentes civilizações utilizam plantas para fins

curativos e promoção da saúde humana e animal. Seu uso varia de acordo com as

circunstâncias históricas, os hábitos, as crenças culturais, as tradições, os modelos

de transmissão do conhecimento e a disponibilidade de espécies de determinado

espaço.

No Brasil há relatos de usos de plantas medicinais pelos nativos em épocas

anteriores à colonização portuguesa (CALAINHO, 2005; CAMINHA, 2014;

CARNEIRO, 2011). Durante a colonização, as missões Jesuíticas foram

disseminadoras dos saberes trazidos da Europa e também as responsáveis por

resguardar e se apropriar dos conhecimentos dos que aqui ocupavam originalmente

o território, utilizando-se da flora nativa, devido à escassez de recursos vindos do

além-mar.

Já no século XIX, o avanço da ciência na modernidade tornou possível a

síntese química, dando início a uma nova fase para o tratamento de enfermidades. A

industrialização dos medicamentos, principalmente após a Revolução Industrial1,

promoveu desigualdade no acesso aos tratamentos de saúde, principalmente nos

países com maior disparidade social. Os tratamentos mais onerosos foram,

gradativamente, destinados àqueles pertencentes aos estratos da sociedade

economicamente dominantes; as formas tradicionais e alternativas de tratamento e

cura, presentes na cultura popular, continuaram representando uma alternativa

viável aos estratos populares, marcadamente caracterizados por forte tradição oral

1 A Revolução industrial pode ser caracterizada como um conjunto de mudanças que inicialmente

aconteceram na Europa, nos séculos XVIII e XIX. Sua principal particularidade foi a substituição do trabalho artesanal pelo assalariado, com o uso das máquinas, fator que desencadeou profundas mudanças socioeconômicas (JAGUARIBE, 2001).

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na comunicação dos seus costumes para as gerações subsequentes2, entre os

quais encontramos o uso preventivo e terapêutico de plantas medicinais.

Com a redemocratização brasileira na década de 1980, estabeleceu-se um

ambiente favorável à discussão das questões que tangem aos direitos civis, políticos

e sociais, entre eles a luta por salvaguardar um Sistema de Saúde cujo acesso fosse

universal e irrestrito.

A realização da VIII Conferência Nacional de Saúde em Brasília (DF), em

1986, foi um marco histórico importante que antecede a Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988. Nesta Conferência, a concepção de saúde foi

modificada, passando a ser assim definida:

[...] Em sentido amplo, a saúde é a resultante das condições de

alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho,

transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso aos serviços de saúde. Sendo assim, é principalmente resultado das formas de organização social, de produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida [...] (BRASIL, 1986)

A Constituição Federal de 1988 e, posteriormente, a criação e implantação

do Sistema Único de Saúde (SUS), no início dos anos 1990, possibilitaram a

organização e sistematização dos serviços de saúde brasileiros sob a égide de cinco

princípios básicos: universalidade, integralidade, equidade, descentralização e

participação social. A saúde passa a ser oficialmente considerada como DIREITO

DO CIDADÃO, preconizado nos artigos 1963 e 198 da Constituição Federal de 1988,

cabendo ao Estado o dever do “atendimento integral, com prioridade para as

atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais” (BRASIL, 1988).

Desta forma, pode-se afirmar que desde o início da década de 1990, políticas

públicas visando a promoção da saúde com equidade à população têm sido

construídas e aprimoradas. Exemplos são a Política Nacional de Medicamentos

(BRASIL, 2001), a Política Nacional de Assistência Farmacêutica (BRASIL, 2004a) e

2 Aqui se considera a contribuição teórica de Thompson (1991), para quem a cultura representa a

tradição oral e a transmissão de experiências e sabedoria às gerações subsequentes. Embora o objetivo do presente trabalho não consista na análise dos conhecimentos e práticas populares a respeito das plantas medicinais, registra-se a importância do enfoque para futuras pesquisas. Mesmo assim, resgata-se o argumento nas considerações finais.

3 Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e

econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Page 17: (SC) - Cristiany Martins

16

o Programa Farmácia Popular (BRASIL, 2004b). Estas políticas e programas visam,

principalmente, ampliar o acesso da população aos medicamentos essenciais,

salvaguardando os princípios norteadores do SUS. Em virtude da desigualdade

social que se configura em sociedades ocidentais capitalistas, a execução dessas

políticas no Brasil apresenta desafios, entre eles a garantia do acesso aos

medicamentos a todos os brasileiros e, também, a disponibilização destes de forma

contínua e em quantidade adequada, por meio do SUS.

O uso de plantas medicinais representa uma via de tratamento satisfatória ao

SUS pela defesa de seus princípios norteadores, tanto quanto com apoio na

concepção de saúde da VIII Conferência Nacional de Saúde e também pelo fato de

integrarem a cultura popular. Além do potencial em saúde, as plantas medicinais são

interessantes do ponto de vista agrícola, principalmente para a agricultura familiar.

Este potencial pode contribuir devido à possibilidade de valor agregado na

comercialização e processamento dessas plantas.

No Brasil os estabelecimentos ocupados pela agricultura familiar chegam a

aproximadamente 4,4 milhões (BRASIL, 2010a). No estado de Santa Catarina, as

propriedades da agricultura familiar são a maioria, sendo que estas propriedades

predominam no município de Canoinhas (SC).

Considerando as disparidades econômicas existentes na realidade brasileira

e o perfil socioeconômico das famílias agricultoras, as propriedades da agricultura

familiar buscam alternativas às crescentes monoculturas. A estruturação de cadeias

de produtos alternativos proporcionam maiores chances de geração de renda e da

fixação das famílias no campo. O fomento às alternativas existentes além das

monoculturas e o desenvolvimento de ações mais profissionalizadas por parte dos

agricultores justificam a criação e implementação de políticas públicas neste sentido.

Em consonância com estas perspectivas e seguindo a recomendação de

órgãos internacionais, como a Organização Mundial de Saúde (OMS)4, nos últimos

dez anos políticas públicas interministeriais vinculadas ao desenvolvimento regional

foram instituídas pelo governo federal brasileiro. Para as plantas medicinais o ano de

2006 foi um marco, pela instituição da Política Nacional de Práticas Integrativas e

4 Organização Mundial de Saúde (OMS) é uma agência especializada subordinada à Organização

das Nações Unidas. A Organização das Nações Unidas (ONU) foi fundada logo após a Segunda Guerra Mundial para tentar manter a paz entre os países do mundo.

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17

Complementares (PNPIC) e da Política Nacional de Plantas Medicinais e

Fitoterápicos (PNPMF) (BRASIL, 2006b).

Mesmo antes da implantação das referidas políticas nacionais, alguns

estados e municípios da federação já haviam implantado suas políticas e programas

de utilização de plantas medicinais na rede pública de saúde. O estado de Santa

Catarina regulamentou o uso de plantas medicinais em 2002.

Passada quase uma década da instituição da PNPMF, sua implantação ainda

não é uma realidade e carece de força para se concretizar na maioria dos entes

federados.

No estado de Santa Catarina, municípios como Presidente Castello Branco,

Florianópolis (ANTONIO, 2013), Itajaí (ANTONIO, 2013; CAVALLAZZI, 2006),

Joinville, Bombinhas e Blumenau (CAVALLAZZI, 2006) oferecem tratamentos

baseados em plantas medicinais no serviço público de saúde. Alguns destes

programas desenvolvem ações que promovem a integração de outros setores de

importância.

O município de Canoinhas (SC), situado no Planalto Norte de Santa Catarina

é o único município desse território que apresenta legislação específica sobre

Plantas Medicinais. A Lei 4.565 de 2010, intitulada “Programa Municipal de Produção

de Fitoterápicos e Plantas Medicinais (PMPMF) “Vitalina de Lima”5, posteriormente

apresentado nesta dissertação, não representa a real implantação de uma política

de Plantas Medicinais (PM) no município, mas sim uma carta de intenções que

pode, ou não, ser representativa da vontade das forças presentes no território.

A partir do exposto, é pertinente questionar: as ações realizadas com plantas

medicinais no município de Canoinhas (SC) serviram para a efetiva implantação de

uma políticas públicas sobre este tema?

Esta dissertação apresentou como objetivo geral pesquisar os limites e

possibilidades de uso das plantas medicinais no município de Canoinhas (SC), como

alternativa ao desenvolvimento local.

A pesquisa investigou quais foram e são as facilidades e dificuldades

encontradas pelos atores locais (algumas pessoas que atuaram com plantas

medicinais na história recente do município de Canoinhas), para inserirem ações de

5 Ver mais informações sobre Vitalina de Lima na página 37 desta dissertação.

Page 19: (SC) - Cristiany Martins

18

implantação dos planos e programas governamentais relacionados às PM no

município e se estas fazem parte de um planejamento maior, motivado pela

priorização do governo local. Pretendeu-se reunir dados sobre as ações já

realizadas com relação aos programas e políticas de plantas medicinais em

Canoinhas, com o propósito de contribuir e fomentar reflexões pertinentes ao tema.

Como objetivos específicos, o estudo buscou: a) contextualizar o cenário

socioeconômico, histórico e cultural canoinhense relacionado às plantas medicinais;

b) identificar a articulação dos atores locais relacionados às plantas medicinais entre

si e com as cadeias de produção, comercialização e utilização; c) analisar as

fragilidades e potencialidades da cadeia de produção e aplicação de plantas

medicinais no referido município, relacionadas à implantação de políticas públicas

sobre o tema.

O estudo foi dividido em cinco capítulos. No primeiro é apresentada a

introdução e um panorama geral das questões que serão abordadas no decorrer do

trabalho escrito.

O capítulo seguinte fundamenta, do ponto de vista teórico, quatro grandes

questões. A primeira aborda um breve histórico da importância histórico cultural das

plantas medicinais no mundo, trazendo-as para o cenário brasileiro e local. Elegeu-

se como categoria de análise a Racionalidade Técnica Instrumental, enquanto

contraposição à primeira questão, para a compreensão do processo que

estabeleceu a hierarquia de tratamentos de saúde em curso atualmente e os meios

que levaram a este cenário, posto que a Racionalidade Técnica Instrumental propõe

a aplicação de soluções técnicas rápidas para questões ou situações problemáticas

(MARCHESAN, 2007). A terceira questão traz as políticas públicas e sua interface

com as plantas medicinais, para abordar, articuladamente, a quarta questão – o

desenvolvimento regional. Os dados históricos, geográficos e sociais do município

de Canoinhas (SC) apresentados, assim como o que são e representam as políticas

públicas sociais em arranjos societários como este, fundamentam a compreensão do

desenvolvimento regional sob a perspectiva da dinâmica socioespacial.

O terceiro capítulo delineia as opções metodológicas adotadas e esclarece

questões acerca do território no qual a pesquisa foi realizada.

Os resultados da pesquisa, juntamente com a respectiva análise e discussão,

são apresentados no quarto capítulo, apoiados na revisão da literatura realizada. A

Page 20: (SC) - Cristiany Martins

19

exposição dos resultados está dividida em duas partes. A primeira traz a

contextualização do cenário canoinhense e o registro das ações desenvolvidas no

município sobre plantas medicinais, oriunda dos levantamentos realizados através

de pesquisa documental e bibliográfica e de pesquisa de campo com pessoas

estratégicas. A segunda refere-se aos dados da pesquisa de campo realizada com

agricultores do município que formaram o Grupo Nova Esperança.

Por último, são apresentadas as considerações e análises finais, bem como

as recomendações para estudos futuros apontados por esta pesquisa.

Page 21: (SC) - Cristiany Martins

20

2 REFERENCIAL TEÓRICO

O presente capítulo apresenta conceitos teóricos para fundamentar a

pesquisa. Posteriormente, dialoga com os dados coletados em campo.

Para instituir e consolidar uma política pública efetiva relativa às plantas

medicinais é necessário estabelecer resistência ao modelo de saúde hegemônico e

à racionalidade técnica que o integra, compreender o significado e quais são os

fundamentos da racionalidade técnica é uma necessidade, assim como a

compreensão sobre o lócus das políticas públicas e sociais no âmbito das

sociedades ocidentais capitalistas, entre as quais o município de Canoinhas (SC)

está incluso.

Políticas públicas relativas às plantas medicinais podem também representar

uma estratégia de desenvolvimento local, fato que se pretende sinalizar neste

capítulo.

2.1 PLANTAS MEDICINAIS E RACIONALIDADE TÉCNICA:

APREENDENDO CONCEITOS E COMPREEDENDO CAMINHOS

Como toda a dinâmica das relações sociais estabelecidas no interior das

sociedades sustentadas sob a égide do capitalismo como modo de produção, a área

da saúde apresenta uma arena de disputa entre interesses distintos e/ou

contraditórios: um focado na prevenção, na atenção primária, universalizante e

inclusivo; outro – hegemônico e dominante – que privilegia a medicalização e as

instituições pertencentes ao complexo médico-hospitalar.

Pode-se afirmar que a realidade dos tratamentos de saúde revela duas

vertentes principais: a primeira relaciona-se às aplicações da medicina convencional

e seus tratamentos com medicamentos sintéticos. Esta vertente propõe soluções

técnicas imediatas e pode ser explicada à luz da Racionalidade Técnica

Instrumental. A segunda fundamenta-se nos conhecimentos empíricos de construção

histórica e cultural.

Para Shils (1978), a Racionalidade Técnica Instrumental pode ser

compreendida como um conjunto de teorias que se materializam em práticas

Page 22: (SC) - Cristiany Martins

21

derivadas da filosofia positivista moderna (SCHÖN, 2000). Donald Schön (2000),

sugere que a racionalidade técnica propõe as técnicas que solucionam problemas

instrumentais segundo os rigores científicos, optando pelos meios técnicos

específicos mais apropriados aos seus propósitos. Segundo o autor, a lógica

estabelecida pela racionalidade técnica instrumental estabelece que “profissionais

rigorosos solucionam problemas instrumentais, através da teoria e da técnica

derivadas do conhecimento sistemático, de preferência científico”.

Para melhor compreensão dos conceitos e implicações da Racionalidade

Técnica Instrumental, faz-se necessário entender os meios em que tais conceitos

são produzidos. Para Santos (2006), as técnicas e a forma como a humanidade

realiza ações por meios instrumentais e sociais são a maior expressão da relação do

homem com o meio (natureza).

Saint-Simon (1760-1825), teórico sobre o tema, associava o progresso

humano à ideia da força e da energia. Para ele, a garantia de existência da

sociedade era representada pela indústria, vista como fonte de riquezas e

prosperidade e como o mecanismo mais eficaz de dominação do homem sobre a

natureza (BONETI, 1998).

Pierre George (1974) explicita as dimensões que a técnica e a tecnologia

tomaram na sociedade atual, por meio de suas considerações acerca da distinção

entre a cidade atual e a cidade existente na metade do século XIX são oportunas.

Segundo o autor, a cidade anterior era um produto cultural e a cultura era nacional

ou regional. Recentemente, a cidade passa por uma rápida transformação, a

caminho de ser um produto técnico, posto que a técnica é universal (SANTOS,

2006).

Para Boneti (1998) a implantação do modelo de desenvolvimento tecnológico

acarreta na eliminação de fatores de produção ditos tradicionais, sem espaço para

sua incorporação ao modelo atual. Para o autor, os sistemas de produção

tradicionais são inseparáveis dos elementos que os constituem, como é caso dos

ciclos naturais e os hábitos culturais. O desenvolvimento tecnológico promove um

processo de exclusão em bloco, do homem (e seus hábitos culturais) e dos fatores

ecológicos.

Segundo Habermas (1988), os procedimentos técnicos orientam a lógica

racional. Grupos ou segmentos de uma estrutura social podem explicitar uma

Page 23: (SC) - Cristiany Martins

22

necessidade, demanda ou exigência histórica à qual a técnica deve responder. É o

interesse capitalista quem delineia e conduz o desenvolvimento científico-

tecnológico, uma vez que “as ciências modernas servem ao progresso técnico, ao

fomento de crescimento capitalista e à administração racional”.

Os conceitos sobre racionalidade técnica instrumental podem ser aplicados a

diversas áreas do conhecimento. Não apenas quanto ao interesse capitalista na

produção, mas as formas de transmissão e registros dos conhecimentos populares

podem ser abordados sob esta ótica.

O conhecimento que foge aos padrões científicos rigorosos pode ser

denominado de conhecimento tácito. Donald Schön (2000) descreve a importância

destes conhecimentos que muitas vezes, embora não possuam uma descrição

detalhada dos mecanismos que levam à ação, conseguem ser transmitidos pela

própria ação. Valorizar o conhecimento adquirido pela prática não significa

desvalorizar o conhecimento acadêmico científico.

Para Schön (2000, pág. 31):

qualquer que seja a linguagem que venhamos a empregar, nossas descrições do ato de conhecer-na-ação são sempre construções

6.

Elas são sempre tentativas de colocar de forma explícita e simbólica um tipo de inteligência que começa por ser tácita e espontânea. Nossas descrições são conjecturas que precisam ser testadas contra observações de seus originais [...]

Marchesan (2007) afirma que a separação entre a teoria e a prática, o sujeito

e o objeto, o corpo e a mente, o homem e a natureza são características da

racionalidade técnica instrumental, desde o princípio da modernidade. Reitera,

ainda, que a racionalidade técnica parece impedir a reflexão dos atores envolvidos

em alguns processos produtivos acerca de suas ações e práticas, que são, muitas

vezes, “nocivas à própria sociedade e à natureza”.

Santos (2006), comenta que no processo de difusão das técnicas e de sua

implantação seletiva sobre o espaço, estas podem se propagar de forma desigual, o

que implica na existência de subsistemas técnicos convivendo em sobreposição. O

autor faz referência a Perrin (1988), que afirmou que as estruturas pertencentes a

um sistema precedente podem ser absorvidas por um sistema técnico mais atual,

quando existe compatibilidade.

6 Grifo do autor

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23

No caso dos conhecimentos relativos às propriedades de cura pelas plantas

medicinais, não se faz objeção aos dados científicos. Estes são necessários para

embasar e substanciar os usos, garantir a ação e não toxicidade das plantas,

estabelecer padrões e dosagens, e permitir que se continue avançando no rol de

tratamentos disponíveis para a humanidade e seus males. Entretanto, a ciência

moderna conhecida atualmente, com seus recursos técnicos e tecnológicos, está em

curso há pouco mais de cem anos, enquanto os conhecimentos tradicionais são

datados de mais de 5 mil anos, segundo os compêndios escritos (PARKY, 1966;

TEIXEIRA, 1994; MIGUEL & MIGUEL, 1999, apud DEVIENNE; RADDI; POZETTI,

2004).

Neste sentido, conhecimentos têm sido transmitidos desde tempos remotos,

quando os indivíduos aprenderam a observar a natureza. Movidos pela necessidade

de suprir a demanda alimentícia e garantir sua sobrevivência, aprenderam a

distinguir entre compostos tóxicos e não tóxicos. Tais noções foram obtidas

experimentando e percebendo suas próprias reações e também observando o

comportamento de animais que obtinham melhoras após ingerir alguma espécie

vegetal. Não somente plantas benéficas foram descobertas, mas também aquelas

nocivas, capazes de intoxicar, matar e produzir alucinações. O que está presente na

humanidade são transmissões que passaram pela hereditariedade, através de

referências orais e comunitárias (PARKY, 1966; TEIXEIRA, 1994; MIGUEL &

MIGUEL, 1999, apud DEVIENNE; RADDI; POZETTI, 2004).

O ser humano trabalha com a técnica disponível em seu tempo. A medicina

tradicional modernizou-se, inclusive, em seu aparato técnico e tecnológico. O que se

produz atualmente por meio dela, tomando como exemplo os medicamentos

fitoterápicos, também é fruto da Racionalidade Técnica Instrumental sem, no

entanto, desvalorizar os conhecimentos tradicionais, históricos e culturais ali

contemplados.

Medicamentos fitoterápicos devem seguir as legislações específicas para sua

regulação. Apresentam embalagens, bula, controle de qualidade, dentre outras

formas de aplicação de conhecimentos, oriundos de necessidades e viabilizados

pela técnica e tecnologia. A fitoterapia conquistou espaço enquanto tratamento

devido à sua aceitação pela população e tradição de uso. Mas, também pelo fato de

que dados da ciência empírica de conhecimentos tradicionais foram confirmados por

Page 25: (SC) - Cristiany Martins

24

meio de pesquisas científicas. Não se pode separar a fitoterapia da ciência moderna.

Esta é formada pelas duas e pode-se até afirmar que, no decurso da história, a

medicina convencional apropriou-se dos conhecimentos oriundos do saber popular

para salvaguardar seus próprios interesses, incluindo a lucrativa indústria da

produção de medicamentos.

Como descrito anteriormente, a origem dos tratamentos tradicionais à base de

plantas com propriedades medicinais é antiga e acompanha a trajetória da

humanidade em todas as civilizações. Está fundamentada no acúmulo de

informações pelas sucessivas gerações (BRASIL, 2006a). Seu uso varia de acordo

com circunstâncias históricas, hábitos, crenças culturais, tradições, modelos de

transmissão do conhecimento e disponibilidade de espécies inerentes ao meio em

que se encontram.

As plantas são fontes importantes de compostos naturais biologicamente

ativos, contribuindo de forma considerável com a medicina moderna. Esses produtos

disponíveis na natureza, apresentam diversidade de estruturas, propriedades físico-

químicas e biológicas (WALL; WANI, 1996 apud VARANDA, 2006). Muitos destes

compostos constituíram modelos para a síntese de grande número de fármacos.

Tratamentos à base de plantas, minerais e animais de civilizações antigas

como a dos sumérios, egípcios, chineses e gregos foram descobertos registrados

em compêndios. Estes registros demonstram, por exemplo, que babilônicos e

sumérios (2.600 a.C.) faziam uso de frutos, flores, folhas, cascas e raízes de oliveira,

lótus e alho como remédios7.

Parky (1966) relata a descoberta, entre 2.500 a 2.000 a.C., de uma

compilação que descreveu 365 drogas utilizadas na cultura Chinesa. São citadas

plantas como o ginseng, cinamomo, ruibarbo, podofilo e efedra. Este foi o primeiro

Pen-ts’ao.8 (DEVIENNE; RADDI; POZETTI, 2004). O Pen-ts’ao foi atualizado ao

longo do tempo e suas versões foram se complementando até os dias atuais.

7 O mais antigo tratado de medicina que se conhece é a “Tabuinha Sumeriana”. Coleção de textos

redigidos em tabletes de argila, com as descrições dos primeiros sintomas de doenças e a prescrição para cada enfermidade. (PARKY, 1966; TEIXEIRA, 1994; MIGUEL & MIGUEL, 1999, apud DEVIENNE; RADDI; POZETTI, 2004). 8 Pen-ts´ao são documentos escritos, que sistematizam resultados de experimentos realizados com

plantas. O primeiro Pen-ts’ao foi corroborado pelo imperador chinês Shen-Nung, considerado o fundador e patrono da farmácia chinesa.

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25

Para os egípcios (1.500 a.C.), azeite, figo, cebola, alho, funcho, açafrão,

pimenta, ópio, hortelã, salgueiro, acácia e sedativos extraídos da efedra são alguns

exemplos de plantas e de derivados com poderes curativos. Eles, juntamente com

mais cerca de 700 drogas vegetais, minerais e animais, estão descritos numa

coleção contendo 811 prescrições, chamada “Papyrus Ebers”9 (PARKY, 1966;

TEIXEIRA, 1994; TAVARES, 1996; apud DEVIENNE; RADDI; POZETTI, 2004).

Na Europa do Renascimento, as práticas médicas interessaram-se em

compilar informações sobre plantas medicinais em coleções crivadas

cientificamente, dando origem às farmacopeias. Farmacopeias oficiais são o registro

de compostos e substâncias de origem vegetal, animal ou mineral com propriedades

terapêuticas reconhecidas cientificamente com suas preparações e formas de uso.

Apoiadas em estudos científicos de plantas e suas propriedades farmacológicas,

foram publicadas por juntas de órgãos oficias e utilizadas como referência para

estudos, políticas, regulamentações, dentre outros usos. Obteve-se a primeira

compilação da Farmacopeia Britânica no ano de 1618 (NARANJO, 1995; HALLER-

JR, 1982). Em língua portuguesa, a primeira farmacopeia – Farmacopeia Geral para

o Reino e Domínios de Portugal – data de 1794 e contava com 30 produtos de

origem mineral, 11 produtos de origem animal e aproximadamente 400 espécies

vegetais (SCHENKEL; GOSMANN; PETROVICK, 2003).

Dentre as plantas que marcaram o uso e as descobertas por meio de

produtos naturais, pode-se destacar o ópio (Papaver somniferum), utilizado como

analgésico desde a época dos Sumérios, em 4.000 a.C. O início dos primeiros

estudos sobre a constituição química do ópio deu-se em 1803, quando Derosne10

descreveu o “sal de ópio”. No ano seguinte, Armand Séquin conseguiu isolar o

constituinte majoritário do ópio – a morfina – e Sertürner tornou públicos seus

trabalhos a este respeito (principium somniferum). Esses são considerados pioneiros

na busca por utilizar substâncias naturais na forma pura (VIEGAS; BOLZANI;

BARREIRO, 2006).

9 Os Papyrus Ebers, ou Papiro de Ebers foi decifrado em 1873 pelo egiptólogo Georg Ebers. É o

primeiro tratado médico egípcio conhecido que descreve a utilização da fitoterapia como forma de tratamento, descrevendo plantas, fórmulas medicamentos e formas de utilização (SILVA, 2003, apud BASTOS, 2007) 10

Derosne foi um importante farmacêutico Francês, que viveu entre 1780 e 1846. Armand Seguin foi

um químico, também Francês, falecido em 1880. Satürner foi um importante farmacêutico alemão, falecido em 1841. Por serem contemporâneos, evidencia-se o ambiente intelectual e científico da época, marcado por grandes e importantes descobertas.

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26

A descoberta dos compostos ativos de plantas medicinais alavancou a

revolução científica e tecnológica acerca do cabedal terapêutico disponível para

tratamentos na época. Em 1820, cientistas isolaram das cascas de quina (Cinchona

officinalis) o composto quinina da (SCHENKEL; GOSMANN; PETROVICK, 2003;

VIEGAS; BOLZANI; BARREIRO, 2006). Este princípio ativo foi, por quase trezentos

anos, o único eficaz contra a malária. A quina, nativa da floresta Amazônica, também

denominada popularmente como china, casca dos Jesuítas ou cinchona, era

conhecida pelos Jesuítas desde a colonização espanhola do Peru (1630), por ser

utilizada pelos índios Amazônica no tratamento de alguns tipos de febre. Ambos os

princípios derivados do ópio e da cinchona ainda são utilizados atualmente

(VIEGAS; BOLZANI; BARREIRO, 2006).

Avançando no tempo e nas descobertas da química, cada vez mais

relacionadas intrinsecamente à medicina, foi o momento do salgueiro (Salix alba)

protagonizar o cenário. Em 1828, após anos de estudos sobre as propriedades

analgésicas e antipiréticas do extrato das cascas do salgueiro, cientistas alemães

conseguiram isolar a salicina11. Os estudos para melhorar seu rendimento e

qualidade prosseguiram até que, em 1860, Hermann Kolbe e seus alunos

sintetizaram o ácido salicílico e seu sal sódico, a partir do composto químico fenol.

Passados catorze anos, um destes pesquisadores (Friedrich Von Heyden) montou a

primeira grande fábrica para produção de salicilatos. Na sequência, em 1897/1898,

inspirados no modelo molecular do ácido salicílico, cientistas desenvolveram o Ácido

Acetil Salicílico (AAS), versão menos ácida e que apresentava menos efeitos

colaterais que seu precursor. Esta é a origem do primeiro fármaco totalmente

sintético e que vem sendo utilizado por mais de 100 anos, até os dias atuais

(VIEGAS; BOLZANI; BARREIROS, 2006; SCHENKEL; GOSMANN; PETROVICK,

2003). A partir daí, buscou-se na natureza inspiração para novas descobertas e

outros compostos foram sintetizados, abrindo caminho para o crescimento da

indústria farmacêutica.

A Revolução Industrial, ocorrida no século XIX, provocou profundas

mudanças sociais, comerciais, científicas e tecnológicas. Atreladas a elas,

cresceram e ganharam consistência as ciências modernas e as diversas disciplinas

11

Salicina é um composto químico fenólico que se obtém em estado puro da casca de salgueiro e de

algumas espécies de choupos; outrora usado em medicina como antipirético, anti-reumático e tônico.

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27

básicas e aplicadas envolvidas direta ou indiretamente com o cuidado em saúde. Os

progressos da ciência na área de medicamentos corresponderam aos avanços da

técnica instrumental. Os países que hoje detêm grandes investimentos de indústrias

farmacêuticas e conseguem acompanhar as necessidades do mercado são os

países com tradição de maiores investimentos nas áreas de Pesquisa,

Desenvolvimento e Inovação (PD&I) e altamente tecnificados.

A racionalidade técnica está presente, pois as novas drogas disponibilizadas

no mercado nas últimas décadas propõem soluções técnicas rápidas aos problemas

de saúde da humanidade, sem levar em conta os fatores culturais e os saberes

tradicionais. Além disso, implicam em efeitos colaterais e impactos ambientais

muitas vezes não mensurados. Este fato fez com que se estabelecesse uma lacuna

quanto aos usos e os conhecimentos sobre as plantas medicinais, que agem de

maneira menos específica e com ação farmacológica, muitas vezes, mais sutil e/ou

lenta. No período após a II Grande Guerra, a prosperidade dos fármacos sintéticos

era grande e houve queda de interesses e investimentos da indústria farmacêutica

nos produtos naturais. Os medicamentos de síntese ganharam a frente da

terapêutica (CARVALHO et al, 2007; DHAMI, 2013). Os pacientes, que também

podem ser entendidos pela lógica de mercado como consumidores, adaptaram-se a

esta nova realidade. Muitos dos jovens nascidos no final do século XX passaram a

conhecer a realidade dos fármacos sintéticos como a primeira opção de tratamento

de saúde.

Esta lógica condiz, também, com alguns representantes e setores da classe

médica. Estes e outros profissionais da área da saúde, como odontólogos e

enfermeiros, quando pesquisados por Tomazzoni (2004), demonstraram ter um

conhecimento mínimo sobre as propriedades terapêuticas, formas de preparo,

dispensação e utilização de plantas medicinais e fitoterápicos. A autora explica que,

muitas vezes, o conhecimento destes profissionais é adquirido em palestras, por

intermédio da abordagem indireta de professores em disciplinas não específicas

sobre o assunto ou até mesmo por meio do conhecimento empírico, como o restante

da população, sem terem cursado disciplina específica sobre o tema durante sua

formação acadêmica.

Alicerçados pelas propagandas das indústrias farmacêuticas a fazer uso

desta quantidade de produtos eficientes e lucrativos, muitos médicos tornam-se

Page 29: (SC) - Cristiany Martins

28

disseminadores da prática de uso dos medicamentos sintéticos, também conhecidos

como alopáticos ou convencionais, por serem a opção de escolha de prescrição

médica. Este fato ampliou a lacuna quanto ao uso de fitoterápicos.

Apesar dos avanços oferecidos pela indústria farmacêutica, o alto custo dos

medicamentos compromete a acessibilidade aos tratamentos convencionais. A

Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que 15% da população mundial

consome 90% da produção farmacêutica (OMS, 2004). De acordo com estimativa da

Organização das Nações Unidas (ONU), no início do século XXI, a cada três

pessoas no mundo, uma não dispunha de acesso aos medicamentos essenciais,

embora o acesso a estes medicamentos seja reconhecido como um dos cinco

indicadores relacionados a avanços na garantia do direito à saúde. Nos países que

contribuíram mais significativamente para o resultado deste índice, apenas em cerca

de um terço das vezes que os pacientes procuram os medicamentos essenciais, os

encontram nas instituições públicas.

Recentemente, a quantidade de novos compostos químicos e fármacos

sintéticos criados e disponibilizados no mercado não têm correspondido aos

investimentos (VIEGAS; BOLZANI; BARREIROS, 2006). Mesmo com orçamentos

estratosféricos direcionados à pesquisa e desenvolvimento (P&D) e testes clínicos

para novas drogas, os lançamentos ao mercado não avançaram significativamente

(BUTLER, 2004). A solução está sendo voltar os olhares para os conhecimentos

populares e tradicionais e buscar alternativas na biodiversidade (HALLER-JR, 1982).

Nas últimas três décadas, as terapias naturais, incluindo a fitoterapia,

ganharam notoriedade não apenas em países em desenvolvimento, mas também

naqueles considerados mais desenvolvidos. Este fato chamou a atenção de

companhias farmacêuticas, que antes deixavam o mercado de plantas medicinais e

de fitoterápicos para empresas menores. O mercado europeu é um dos principais

movimentadores desse setor. No ano de 1997, a comercialização de fitoterápicos na

Comunidade Europeia atingiu 7 bilhões de euros, e 50% deste valor corresponde ao

mercado alemão, país de tradição no uso de fitoterápicos e berço de outros

tratamentos tradicionais, como a homeopatia (CALIXTO, 2000) .

Atualmente, a utilização da fitoterapia encontrou respaldo em muitos

profissionais médicos, uma vez que ações e conceitos levantados por estes são

comumente interpretados pelo povo como legítimos e aceitos (VASCONCELOS,

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29

1996 apud ROSA et al, 2011). Neste intento, pressupõe-se politizar e publicizar o

debate a fim de mobilizar esses atores aos benefícios desta terapia medicamentosa,

socializando as informações sobre a segurança e a eficácia do uso de fitoterápicos,

a redução de custos dos tratamentos e suas formas de prescrição. Países ocidentais

como a Alemanha, a França e a Inglaterra têm como parte de sua cultura a utilização

de fitoterápicos, prescritos sem preconceitos por médicos, difundidos por

farmacêuticos e bem-aceitos pela comunidade em geral.

A apropriação da fitoterapia e de outras formas alternativas de tratamento

pelos profissionais médicos e pela indústria de medicamentos tem um viés positivo

no que se refere à segurança de administração, à minimização dos possíveis

agravos à saúde decorrentes do uso contínuo de drogas sintéticas, ao

reconhecimento de sua eficácia e, também, à validade dos conhecimentos

perpetuados oralmente pela população ao longo da história. Entretanto, há que se

considerar não estar isenta de uma intencionalidade econômica. O custo final dos

medicamentos nem sempre é acessível às classes populares, de onde o

conhecimento para a produção dos medicamentos partiu e foi apropriado.

Depreende-se disso, também, a necessidade da garantia do acesso irrestrito aos

medicamentos via SUS, possível pelo fortalecimento de uma política específica de

plantas medicinais e fitoterápicos, tendo em vista a amplitude, variação cultural e

socioeconômica da população brasileira.

De acordo com estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

(IBGE), a população brasileira é de mais de 202 milhões de habitantes (IBGE, 2014).

Há nesta população uma mistura de origens (nativos/índios, brancos/europeus,

negros/africanos), que acompanha o processo colonizador brasileiro. Desta

diversidade étnica surgiu uma cultura permeada de saberes e valiosos

conhecimentos tradicionais, que encontraram nas plantas o uso popular como

tratamento (BRASIL, 2006b). Ao longo dos mais de quinhentos anos desde a

chegada das naus portuguesas e de sua colonização, a população foi se moldando

por uma mistura de origens, que trouxeram consigo seus próprios saberes e valores

sobre as PM, que ultrapassaram as barreiras do tempo.

Os conhecimentos tradicionais sobre plantas e tratamentos alternativos são

vastos, como o é a biodiversidade mundial. A construção do conhecimento sobre o

uso de plantas medicinais é predominantemente oral e tem sua fonte principal na

Page 31: (SC) - Cristiany Martins

30

família na qual, historicamente, as mulheres desempenham papel fundamental

(CEOLIN, 2011).

São amplamente utilizadas tanto plantas nativas quanto exóticas, que podem

ser cultivadas nos quintais das casas, adquiridas na forma de plantas desidratadas,

bem como padronizadas em medicamentos fitoterápicos.

A transição entre o saber tradicional e o científico requer investimentos em

ciência, tecnologia e inovação. Ainda há um leque de conhecimentos a se descobrir.

Além disso, há benefícios a disseminar sobre as potencialidades do uso de plantas

medicinais. Estas potencialidades ainda estão longe de estar esgotadas, pois:

[...] novos conhecimentos e novas necessidades certamente encontrarão, no reino vegetal, soluções, por meio da descoberta e do desenvolvimento de novas moléculas com atividade terapêutica ou com aplicações tanto na tecnologia farmacêutica quanto no desenvolvimento de fitoterápicos com maior eficiência de ação (SCHENKEL, GOSMANN e PETROVICK, 2003).

Neste contexto, a biodiversidade brasileira é destaque no mundo todo. Cerca

de 20% do total de espécies do planeta encontram-se no Brasil (CALIXTO, 2003;

PRANCE, 1977 apud BRASIL, 2006b). É o país de maior biodiversidade do planeta

(BRASIL, 2006b; CALIXTO, 2003). Da ampla gama de plantas com potencial

farmacológico, apenas uma pequena parte já foi completamente estudada. Este

patrimônio genético precisa ser explorado com sustentabilidade, pois pode gerar

descobertas na área farmacêutica e, com isso, proporcionar desenvolvimento

socioeconômico e com preservação ambiental.

Várias são as espécies vegetais encontradas no Brasil que possuem

comprovada eficácia curativa. Da ampla gama de plantas com potencial

farmacológico, apenas uma pequena parte já foi estudada e elucidada.

Dentre os biomas brasileiros, a Mata Atlântica predomina no sul do Brasil e é

considerada como um dos 25 “Hotspots”12 mundiais, devido à biodiversidade e

endemismo de espécies. Pelos levantamentos apontados por Schaffer e Prochnow

12

O conceito Hotspot foi criado em 1988 pelo ecólogo inglês Norman Myers para resolver um dos maiores dilemas dos conservacionistas: quais são as mais importantes áreas para preservação da biodiversidade. Hotspot é, portanto, toda área prioritária para conservação, isto é, de alta biodiversidade e ameaçada no mais alto grau. (MYERS et al. , 2000; GALINDO-LEAL, CÂMARA, 2005)

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31

(2002), a cobertura florestal por Mata Atlântica em Santa Catarina, no ano de 1500,

era de 81,50% do território. Restam, atualmente, cerca de 17% da área inicial neste

estado.

Dentro desse bioma, uma das formações florestais é a Floresta Ombrófila

Mista (FOM), também conhecida como Mata de Araucárias. Essa formação e suas

subdivisões estão presentes no Planalto Norte Catarinense, incluindo o município de

Canoinhas (SC). Espécies vegetais medicinais nativas à FOM e exógenas,

adaptadas ao Planalto Norte Catarinense, constam da Relação Nacional de

Medicamentos Fitoterápicos (RENAME-Fito) que podem ser ofertadas pelos SUS.

Dentre elas estão a espinheira santa (Maytenus ilicifolia), a carqueja (Baccharis

trimera) e o guaco (Mikania glomerata) – nativas – além da camomila (Matricaria

recutita), do eucalipto (Eucalyptus globulus L.), calêndula (Calendula officinalis L.), e

da erva-cidreira (Melissa officinalis) – exóticas.

A utilização racional da biodiversidade brasileira tem na produção de

medicamentos fitoterápicos um emprego importante. Atualmente, em países pobres

ou ricos, estes medicamentos são amplamente comercializados como preparações

de extratos padronizados de uma ou mais plantas. Analisando o setor de

medicamentos, percebe-se que um terço dos medicamentos mais prescritos e

vendidos mundialmente foram desenvolvidos a partir de produtos naturais. Este

percentual sobe para cerca de 70% no caso de drogas anticancerígenas e

antibióticos (CALIXTO, 2003). A produção de medicamentos a partir de plantas

medicinais apresenta melhor relação custo-benefício se comparada aos produtos

sintéticos. Possuem ação biológica com baixa incidência de efeitos toxicológicos,

colaterais e reações adversas, além de apresentar custo de produção e venda

inferiores aos medicamentos convencionais (VIEIRA, 2008).

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) define medicamentos

fitoterápicos como sendo os medicamentos “obtidos com emprego exclusivo de

matérias-primas ativas vegetais, cuja eficácia e segurança são validadas por meio

de levantamentos etnofarmacológicos13, de utilização, documentações

13

Etnofarmacologia é a ciência que estuda o conhecimento específico sobre fármacos que determinado grupo étnico-social possui. O método etnofarmacológico investiga as possibilidades e hipóteses referentes aos conhecimentos tradicionais, buscando empiricamente o que provoca os efeitos dos fármacos tradicionais (LEITÃO, 2002).

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32

tecnocientíficas ou evidências clínicas”. A Resolução RDC14 nº 14/2010, dispõe

sobre o registro de medicamentos fitoterápicos. Diz ainda que “os medicamentos

fitoterápicos são caracterizados pelo conhecimento da eficácia e dos riscos de seu

uso, assim como pela reprodutibilidade e constância de sua qualidade” (BRASIL,

2010b).

Farmacopeias são compêndios nacionais, geralmente fomentados por órgãos

públicos. Nelas se estabelecem, dentre outras, os requisitos mínimos de qualidade

para fármacos, insumos, drogas vegetais, medicamentos e produtos para saúde.

Nem todos os países possuem farmacopeias estabelecidas. Nesses casos ou em

caso de ausência de alguma monografia oficial na farmacopeia, costuma-se adotar

como válidas outras farmacopeias oficiais. Na América Latina, apenas Brasil e

Argentina possuem farmacopeias. Outras farmacopeias oficiais são a Alemã,

Americana, Britânica, Europeia, Francesa, Internacional (OMS) e Portuguesa

(ANVISA, 201-).

A Farmacopeia Brasileira é o Código Farmacêutico Oficial e segue

rigidamente os padrões internacionais, procurando adaptações às necessidades do

país. A primeira edição da Farmacopeia Brasileira ocorreu em 1929, obra de um

único autor – Rodolpho Albino Dias da Silva- que descreveu aproximadamente 200

plantas medicinais, em sua maioria de origem brasileira. A segunda edição foi

publicada em 1959, a terceira em 1976 e, em 1988, a quarta edição. Até 2005, foram

produzidos fascículos de atualização desta edição. Em 2010, a quinta edição da

Farmacopeia Brasileira foi lançada, num projeto de revisão e inclusão de novas

monografias, e que revogou as demais edições anteriores (ANVISA, 201-).

As plantas medicinais podem ser estudadas do ponto de vista farmacológico,

voltado à saúde, mas também apresentam potencial sob a ótica do cultivo,

principalmente para a agricultura familiar. Este potencial existe devido ao alto valor

agregado na comercialização dessas plantas, fato que se evidencia quando se

compara ao preço no mercado externo de 1 Kg de soja (US$0,23) - uma

commodity15 tradicional, ao de 1 Kg de produtos oriundos da biodiversidade vegetal

14

RDC: Resolução de Diretoria Colegiada 15

A palavra Commodities é oriunda do inglês e significa “produto”. Commodities são, pois, produtos de exportação importantes à balança comercial, sujeitos às regras e intempéries do mercado internacional. Possuem características uniformes e que geralmente podem ser estocadas por um

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33

(US$41,10). Apesar da diversidade vegetal presente e do alto valor agregado, existe

um déficit comercial do segmento de plantas medicinais in natura no Brasil, já que os

interesses que ditam quais são os produtos prioritários à balança comercial

extrapolam os limites nacionais. No período entre 1996 e 2006 houve um

crescimento da ordem de 6,6% nas exportações de plantas medicinais in natura,

enquanto as importações cresceram 40,5% (JOLY et al, 2011).

No Brasil, aproximadamente 4,4 milhões de estabelecimentos rurais são

ocupados pela agricultura familiar (BRASIL, 2010a). No estado de Santa Catarina

(SC), em 2006, este número chegava a 168.544, correspondendo à 87%

estabelecimentos agropecuários. Em área, este percentual cai para 44%, sendo os

outros 56% pertencentes aos 13% de estabelecimentos agropecuários que não se

enquadram como agricultura familiar (IBGE, 2006). No município de Canoinhas,

assim como no estado de Santa Catarina, há uma predominância de propriedades

rurais vinculadas à agricultura familiar.

Para ir além da subsistência, as propriedades da agricultura familiar buscam

diversificação e dinamismo como alternativas às monoculturas. Em países europeus,

as pequenas propriedades rurais são vistas não apenas como opção de vida. Os

agricultores atuam com profissionalismo, atentos ao gerenciamento das

propriedades, algo ainda distante da realidade brasileira. Estruturar cadeias de

produtos alternativos podem ser possibilidades de geração de renda e manutenção

da fixação das famílias no campo (MATTEI, 2010).

As plantas medicinais e fitoterápicos foram tema de políticas públicas

interministeriais com grandes possibilidades ao desenvolvimento regional instituídas

pelo governo federal brasileiro ao longo da última década, alinhadas a estas

perspectivas e seguindo a recomendação de órgãos internacionais, como a

Organização Mundial de Saúde (OMS). Em 2006 foram instituídas a Política

Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) - que regulamenta,

dentre outras, o uso da fitoterapia como uma opção de tratamento a ser ofertado

pelo SUS na rede de atenção básica de saúde - e a Política Nacional de Plantas

Medicinais e Fitoterápicos (PNPMF), com intuito de “garantir à população brasileira o

período determinado de tempo, sem perda da qualidade do produto. As principais commodities produzidas e exportadas por nosso país são: petróleo, café, suco de laranja, minério de ferro, soja e alumínio (RICHARD, 1993).

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34

acesso seguro e o uso racional de plantas medicinais e fitoterápicos, promovendo o

uso sustentável da biodiversidade, o desenvolvimento da cadeia produtiva e da

indústria nacional” (BRASIL, 2006b). Em 2008 a PNPMF foi regulamentada pelo

Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.

No estado do Ceará, Matos (1994) registrou o início do programa de utilização

de plantas medicinais Farmácias Vivas, com hortos medicinais comunitários

cultivados próximos aos Postos de Saúde, agregando levantamentos bibliográficos e

experimentos científicos. Outros entes da federação com programas na área de

plantas medicinais com datas anteriores às políticas nacionais são: Brasília (DF),

Curitiba (PR), Vitória (ES), Salvador (BA) e Rio de Janeiro (RJ) (CAVALLAZZI,

2006). O estado de SC também apresenta regulamentação com data anterior às

políticas nacionais. Em 16 de agosto de 2002 foi aprovada pela Assembleia

Legislativa a Lei 12.386, que cria o “Programa Estadual de Fitoterapia e Plantas

Medicinais no Estado de Santa Catarina e adota outras providências”, com o objetivo

de:

[...] estimular o desenvolvimento de atividades intersetoriais voltadas à fitoterapia e contribuir para a promoção da saúde, à produção de plantas medicinais como insumos para a indústria farmacêutica e produtos de valor agregado, à adequação tecnológica dos setores farmacêutico e agronômico catarinenses e à geração de emprego e renda, fundamentadas no desenvolvimento sustentável e no manejo racional da biodiversidade do Estado, considerando-se os aspectos sociais, econômicos e ecológicos inerentes (SANTA CATARINA, 2002).

Um levantamento realizado pelo Ministério da Saúde no ano de 2004 apurou

que, dos mais de 5500 municípios da federação brasileira, somente em 116

municípios apresentavam ações institucionalizadas com plantas medicinais e

fitoterápicos na Atenção Primária de Saúde (APS), distribuídos em 22 estados

(BRASIL, 2006a).

No estado de Santa Catarina, municípios como Presidente Castello Branco,

Florianópolis (ANTONIO, 2013), Itajaí (ANTONIO, 2013; CAVALLAZZI, 2006),

Joinville, Bombinhas e Blumenau (CAVALLAZZI, 2006) oferecem tratamentos à base

de plantas medicinais no serviço público de saúde e alguns destes programas

desenvolvem ações que promovem a integração de outros setores de importância.

Dentre as principais ações podem ser citadas o treinamento de equipe de saúde

Page 36: (SC) - Cristiany Martins

35

(ANTONIO, 2013) e a gestão e implantação de hortos (ANTONIO, 2013;

CAVALLAZZI, 2006).

Neste contexto, o município de Canoinhas (SC) aprovou no ano de 2010 a Lei

4.565 – PMPMF “Vitalina de Lima”, já citado no capítulo introdutório.

Estudo realizado pela Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina

(FIESC) (FIESC, 2013) em parceria com o Sistema da Federação das Indústrias do

Paraná (FIEP) apontou os setores portadores de futuro16 para a indústria

catarinense, numa prospecção para o ano de 2022.

O estudo utilizou o recorte do IBGE (1990), em que o estado de Santa

Catarina é dividido em seis Mesorregiões, sendo que o município de Canoinhas está

inserido na Mesorregião Norte Catarinense. Dentre as tendências levantadas pelo

estudo para esta mesorregião está o setor de Fármacos, sendo que a produção de

Medicamentos Fitoterápicos e a valorização da biodiversidade por eles

proporcionada são citados como ações emergentes a serem trabalhadas para

dinamização dessa mesorregião (FIESC, 2013). Portanto, este é um setor que

merece atenção por parte dos gestores e interessados em investir na dinamização

socioeconômica e cultural da região.

No município de Canoinhas (SC) poucos dados foram encontrados na

literatura consultada sobre os usos das plantas medicinais. Destacam-se as marcas

deixadas pelos monges na região do conflito do Contestado, a ação de benzedeiras

e a ação da Pastoral da Saúde.

O senso comum e o pensamento mítico presentes nos discursos e nos

símbolos encontrados na comunidade Canoinhense trazem para o presente a figura

dos monges que por aqui passaram, mesmo que de forma mais sutil que em outros

tempos.

Dos marcos históricos do município, ressalta-se a importância da Guerra do

Contestado para a população. Vivenciada em todo o chamado “Vale do Contestado”

entre os anos de 1912 e 1916, a luta armada dos caboclos desprovidos de terras ou

“despossuídos” mediante a sessão de terras do governo para a companhia norte-

americana Lumber (Southern Brazil Lumber and Colonization Company) contra o

poder estadual e federal, em terras disputadas entre os estados de Santa Catarina e

16

Setores reconhecidos no referido estudo como promissores.

Page 37: (SC) - Cristiany Martins

36

Paraná, deixou marcas que remanescem acesas na memória do povo canoinhense.

Dentre elas o extrativismo madeireiro e o caráter religioso e místico do cotidiano da

vida sertaneja, simbolizado pelos monges.

Dentre os monges comumente citados, os relatos indicam que o primeiro a

passar pela região foi o italiano Giovanni Maria de Agostini, conhecido em território

brasileiro como monge João Maria. Este vivia de forma módica e frugal, habitando

perto de rios, realizando práticas mágico-religiosas ligadas ao tratamento de

enfermidades e à proteção. Ao deixar o local onde habitava para tomar novos rumos,

a população erguia cruzes e considerava o local e as águas “santos”. O monge

sumiu do território brasileiro e não se tinha mais notícias de seu paradeiro até

recentemente, quando o historiador Alexandre de Oliveira Karsburg (2012)

reconstituiu a trajetória do monge até a cidade estadunidense de Mesillas (Novo

México) onde veio a falecer em 1869, demonstrando por onde se tem registro de sua

passagem, o mesmo modo de vida por aqui registrado.

O segundo monge, João Maria de Jesus, tem sua identidade muitas vezes

confundida com o primeiro. Surge nos relatos que Valentini (2000) apreendeu sobre

a memória dos sertanejos da região do Contestado como conselheiro e curandeiro.

Segundo os relatos, ensinava religião e benzia a água que era usada como remédio.

Também fazia uso de ervas para alívio de enfermidades. A vassourinha do campo

(Baccharis dracunculifolia DC), que é popularmente chamada na região de erva ou

vassourinha-de-São-João-Maria era usada em forma de chás (LUDKA; FEITOSA;

FRAGA, 2012, VALENTINI, 2000). Esta erva é citada por Valentini (2000) como

curativo para “bronquite, gripe, febre e uma porção de coisas”.

Segundo Tomporoski (2013), o terceiro monge, José Maria, circulou pela

região na época em que foi deflagrado o movimento sertanejo do Contestado, tendo

se tornado seu líder religioso. O autor afirma, ainda, que a devoção, primeiramente

por João Maria “e, mais tarde, por José Maria, representava práticas religiosas

coletivas arraigadas ao modo de vida do morador do planalto contestado e

fomentaram a proximidade, a sociabilidade e a união dos sertanejos”.

A influência que curandeiros e benzedeiras ainda assumem na cultura popular

pode ser pontuada pela presença de imagens do Monge João Maria, como na

Figura 1, encontradas em residências e que também são avistadas em áreas

centrais de uso público, como no pátio de fundos do Museu Histórico Orty

Page 38: (SC) - Cristiany Martins

37

Magalhães Machado e no escritório do Sindicato dos Trabalhadores da Agricultura

Familiar de Canoinhas (SINTRAF).

Figura 1 – Monge João Maria

Fonte: http://www.uel.br/com/agenciaueldenoticias/fotos/11-7-2013-g-monge.jpg

Outro detalhe importante a ressaltar é a homenagem do vereador João Grein,

do Partido dos trabalhadores (PT) à Sra. Vitalina de Lima, que tem seu nome

associado ao Programa Municipal de Plantas Medicinais, projeto de lei deste

vereador. Vitalina residiu no Bairro Campo d’Água Verde, em Canoinhas, onde,

segundo esse verador, realizou mais de dois mil partos, além de ser benzedeira e

curandeira.

Atualmente, o número de pessoas que assumem procurar por benzedeiras é

pequeno. Saibel (2008) apurou que, dentre os usuários do Programa Bolsa Família

do Governo Federal do município de Canoinhas entrevistados, 98% procuram

atendimento médico quando apresentam problemas de saúde. Apenas 1% citou

procurar por benzedeiras. A autora constatou, com isso, que as famílias em questão

têm acesso a serviços de saúde ofertados no município.

A baixa procura por benzedeiras e curandeiros coincide com a popularização

dos medicamentos sintéticos, a crescente hospitalização dos partos, o maior acesso

da população ao SUS, que não abordava até 2006, ações institucionalizadas com

Plantas Medicinais.

Ainda, dentre as entidades mais atuantes com plantas medicinais no

município de Canoinhas está a Pastoral da Saúde. Esta Pastoral é uma organização

sem fins lucrativos da Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB). Esta, bem

Page 39: (SC) - Cristiany Martins

38

como outras Pastorais Sociais, possui atuação nacional e apresenta uma

organização cívico-religiosa. Quanto à ação na comunidade, tem como uma de

suasdiretrizes valorizar o conhecimento, sabedoria e religiosidade popular em

relação à saúde. Alicerça sua ação na organização da comunidade (CNBB, 2008).

Além desta, as diretrizes de atuação da Pastoral da Saúde são:

- priorizar ações de educação, implementando uma verdadeira cultura de saúde, com ênfase em ações preventivas, permeadas pelos valores da justiça, equidade e solidariedade;

- resgatar e valorizar a sabedoria e a religiosidade popular, relacionadas com a utilização dos dons da mãe natureza e conservação do meio ambiente;

- Refletir, à luz da fé cristã e da pessoa de Jesus, a realidade da saúde e da doença, bem como as implicações da ciência, tecnologia e bioética;

- incentivar e desenvolver a formação e capacitação contínua dos agentes de pastoral da saúde, nos aspectos humanos, técnicos, éticos e cristãos, criando-se centros regionais de formação de agentes de pastoral;

- estar atento para diferentes práticas alternativas de saúde, não pertencentes a nossa cultura, que são usadas sem a necessária fundamentação e comprovação científica e que causam estranheza, insegurança, desconfiança e descrédito da ação pastoral na comunidade, evitando-se assim o fanatismo e dogmatismo;

A Pastoral da Saúde age, muitas vezes, como elo de ligação entre a

população e os serviços de saúde locais. Outras vezes, supre carências geradas

pela ação da medicina convencional e da insuficiência das políticas públicas da

área, sobretudo no que se refere ao conhecimento e ao diálogo sobre as práticas e

saberes culturais, às ações preventivas e formas alternativas de tratamento. A

intencionalidade que rege a atuação da Pastoral é valorosa, integra a realidade do

município de Canoinhas; mas, por mais que se aproxime em alguns pontos do

preconizado na legislação que estabelece a Política Nacional de Plantas Medicinais

e Fitoterápicos, não pode ser considerada como uma Política Pública instituída. Seu

desenvolvimento depende de determinações distintas, sujeitado à vontade de quem

está à frente das ações propostas pela Igreja.

Afastar e até criar certo distanciamento entre os conhecimentos científicos

rigorosos e os tradicionais, no âmbito da saúde, principalmente em atenção primária,

não fez mais do que aumentar a desigualdade social. Ações de profissionais

Page 40: (SC) - Cristiany Martins

39

pautados na Racionalidade Técnica Instrumental ajudaram a criar compostos que

proporcionam alívio e cura para doenças. Mas, também, trouxeram agravos e

disparidades sociais relacionados ao acesso aos tratamentos, vinculados a custos

elevados. Recursos vegetais que estão disponíveis na natureza foram

negligenciados e carecem de estudos e comprovações ou, muitas vezes, de um

resgate dos conhecimentos populares ou tradicionais. Estas mesmas disparidades

instituídas no meio científico e pelas malhas econômicas requerem versatilidade,

criatividade e proatividade de ações destes profissionais que devem ajudar a

resolvê-las.

2.2 POLÍTICAS PÚBLICAS E DESENVOLVIMENTO LOCAL

Para analisar, quer a Política de Plantas Medicinais e Fitoterápicos em sua

totalidade, quer a especificidade desta e as configurações que assumiu e assume no

Município de Canoinhas, é importante compreender, por um lado, o que são e como

se estruturam as políticas públicas e sociais e, por outro, as singularidades

históricas, sociais e econômicas do município em questão.

Peters (1986) sinaliza que as políticas públicas são a soma das atividades do

governo, as quais influenciam a vida dos cidadãos, mediadas por interesses

distintos. Souza (2006) compreende na política pública o dever de “distinguir entre o

que os governos pretendem fazer e o que de fato fazem”, contemplando a

inatividade do governo como algo tão importante para a análise quanto a atividade.

Para Souza (2006), a política pública é o campo de conhecimento que busca, ao

mesmo tempo, colocar o governo em ação e propor mudanças nos rumos destas

ações, que são intencionais, apresentam objetivos a serem alcançados. Behring e

Boschetti (2006), entretanto, oferecem uma visão crítica mais aprofundada e

consistente, que tanto fundamenta as construções teóricas destes autores quanto

fornece subsídios para elucidar os encaminhamentos ocorridos no município de

Canoinhas.

Para Behring e Boschetti (2006) as políticas públicas e sociais são conquistas

civilizatórias que possuem um caráter histórico e cultural, perpassadas por

determinações econômicas e por interesses envolvidos em sua regulamentação,

desenvolvimento e efetivação. Ou seja: as políticas sociais e públicas

Page 41: (SC) - Cristiany Martins

40

representariam um espelho da história, dos caminhos e das decisões político-

econômicas de determinado país, estado e município, sendo pertinente o seu

desvelar para que a análise crítica seja o mais fidedigna possível. Para as autoras,

as políticas públicas e sociais revelam a interação entre as determinações

econômicas, políticas e culturais, assim como as relações que se estabelecem entre

Estado e Sociedade Civil, sempre tendo como pano de fundo os complexos

processos do modo de produção Capitalista.

Problematizar as políticas públicas e sociais a partir dessa perspectiva

implica, pois, em situá-las enquanto integrantes das relações sociais burguesas,

estruturalmente marcadas por interesses contraditórios e divergentes da sociedade

capitalista.

Na obra fundante desta perspectiva analítica – O Capital – Marx (1982)

esclarece que a essência dos fatos - no interior dessa sociedade contraditória e

excludente – pode estar escondida. Por isso, é importante negar a aparência e a

realização de mediações que nos conduzam à essência geradora desses. Isto

implica em considerar, também, que a essência e a totalidade da lógica das relações

sociais burguesas/capitalistas está contida em cada fato e/ou fenômeno, por mais

pequeno ou elementar que possa parecer ser – inclusive o mais minucioso dos

detalhes contido nas políticas públicas e sociais.

Behring e Boschetti (2006) esclarecem que:

[...] o estudo das políticas sociais deve considerar sua múltipla causalidade, as conexões internas, as relações entre suas diversas manifestações e dimensões. [...] do ponto de vista histórico, é preciso relacioná-las ao surgimento das expressões da questão social. [...] do ponto de vista político, reconhecer e identificar as posições tomadas pelas forças políticas em jogo e o confronto entre grupos que constituem as classes sociais e cuja ação é determinada pelos interesses das classes em que se situam. [...]

A natureza do Capitalismo, seu grau de desenvolvimento e as estratégias de

acumulação que prevalecem, são elementos a se contemplar na análise das

políticas públicas e sociais. Da mesma forma, pode-se identificar quais são as forças

políticas que interferem em sua conformação.

Dentre as políticas públicas voltadas para PM, a Política Nacional de Plantas

Medicinais e Fitoterápicos está vinculada à Política Nacional de Saúde e,

igualmente, possui interlocuções com a Política Agrária. Para que se possa realizar

uma análise consistente dos contornos que possui em uma realidade específica – o

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41

Município de Canoinhas – registram-se alguns aspectos das Políticas maiores às

quais está vinculada, iluminados pelos preceitos teóricos aqui expostos.

Prevalece, no âmbito da saúde, um modelo hegemônico, discutido

anteriormente. Com um pequeno retrocesso na história, torna-se fácil compreender

os motivos que fazem com que o hospital e o modelo curativo de assistência à

saúde, de modo geral, sejam os representantes.

Luz (1986) efetua uma análise histórica, esclarecendo que o Brasil possui

uma estrutura concreta e organizada, que estabelece relações de dependência. Sua

formação sócio-histórica denota o enfrentamento de uma longa e árdua caminhada

de dissociação entre trabalho e meios de produção, considerando sua emergência

na fase de transição do feudalismo português para o capitalismo17. Nesse contexto,

a saúde era concebida como questão de domínio privado, familiar, tendência que,

sobretudo nas classes populares, continuou prevalecendo como recurso de

sobrevivência.

Foi somente após 1898, com as primeiras campanhas sanitárias, que o

Estado passou a intervir nas questões pertinentes à saúde, objetivando não

exatamente atingir um patamar satisfatório de qualidade de vida, mas produzir e

reproduzir a força de trabalho existente no país. É preciso registrar que a ciência e a

tecnologia brasileiras não estavam suficientemente desenvolvidas nesse contexto,

sendo comum a importação de técnicas de países chamados desenvolvidos,

desconsiderando as diferenças existentes. A dependência e a subordinação às

influências externas imputaram ao Brasil um caráter liberal para o trato à saúde,

concebendo-a não como resultante de todo um contexto político, social e

econômico, mas como decorrente de uma condição e capacidade individual.

A pressão da sociedade civil organizada, a partir de 1930, na primeira

república, fez com que o então presidente Getúlio Vargas buscasse alianças

diversas, rumo à industrialização do país e aos direitos trabalhistas. No que se refere

à política de saúde, surge uma política nacional que a subdivide em saúde pública e

medicina previdenciária, fazendo com que os serviços cresçam e se desenvolvam

no território nacional.

17

Buscou-se aporte teórico em Chauí (2000) e Ianni (1992), nas obras “Brasil, Mito fundador e Sociedade Autoritária” e “A Ideia do Brasil Moderno”, respectivamente.

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42

As discussões acerca do processo brasileiro de industrialização passaram a

ocorrer com maior freqüência a partir da década de 1950, com a criação do

Ministério da Saúde. Esse período foi marcado por intensa busca de

desenvolvimento de instrumentais técnicos e, consequentemente, pela elevação dos

custos dos atos médicos, relacionados ao consumo dos produtos criados pelo

complexo médico-industrial18.

Em linhas gerais, é possível deduzir que o sistema econômico posto estimula

e ratifica situações determinadas como as empresas médicas, a privatização

paulatina, o ensino fragmentado, a predominância do atendimento hospitalar e a

assistência curativa.

Em contrapartida, como arena contraditória e de disputa que todas as

relações sociais representam – e não seria diferente com a saúde – há resistência

no sentido da garantia de outro modelo de saúde, fundamentado no conceito

elaborado na VIII Conferência Nacional (1986), ratificado na Constituição Federal de

1988 e com diretrizes de operação firmadas a partir da Lei 8080, que institui o

Sistema Único de Saúde – SUS.

Muito embora, desde 1988, a Constituição Federal garanta a saúde como

Direito do Cidadão, é preciso recordar que a análise das políticas públicas de saúde

implica na compreensão da concepção hegemônica de saúde da sociedade

brasileira, “historicamente marcada pelo modelo curativo, centrado na assistência

médica e nas especialidades, tendo como referência o hospital”. (SARRETA, 2009).

Para Sarreta (2009), os formatos atuais das políticas sociais e da política de

saúde brasileiras estão relacionadas com os formatos que vem adquirindo desde

suas origens. Concordando com a concepção do autor, de que embora haja a

garantia do preceito legal da saúde como direito instituído, o que se evidencia na

concretude do cotidiano é o embate entre interesses distintos por maiores espaços e

avanços, prerrogativa – infelizmente - aberta na própria legislação que institui o

SUS, quando trata da iniciativa privada, fato que não coloca em xeque o acesso

universal, gratuito e irrestrito à saúde, mas perpetua a arena de disputa econômica

pelos serviços prestados, extremamente onerosos e lucrativos.

18

Complexo médico-industrial é um termo que designa o conjunto das instituições pertencentes à indústria de equipamentos, medicamentos e aparatos médicos. Ele foi utilizado, pela primeira vez, em solo anglo-saxão nos anos 70. Cordeiro (1980) é a referência pioneira no Brasil na utilização do conceito de CMI. Seu objetivo primordial consistiu em pensar a inter-relação entre a lógica (econômica) da produção de bens e a lógica (social) da prestação de serviços na área da saúde.

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43

Trata-se da luta entre duas distintas propostas e modelos de saúde. Um

centrado na universalidade, no direito, no acesso irrestrito, na atenção básica e na

prevenção. Outro alicerçado na cura e nas possibilidades de lucratividade que

possam ser conquistadas. Todas as políticas públicas e sociais – e não seria

diferente na saúde – se configuram como mais ou menos democráticas, mais ou

menos inclusivas, mais ou menos universalistas, mais ou menos abrangentes,

dependendo das opções econômicas e da pressão dos interesses contraditórios em

jogo junto ao Estado.

No que se refere especificamente às políticas públicas relativas às plantas

medicinais e aos fitoterápicos, é importante registrar quais foram os marcos

históricos que resultaram na legislação instituída hoje no país, a começar pela I

Conferência Internacional sobre Cuidados Primários em Saúde, realizada pela OMS

em Alma Ata, no Cazaquistão, no ano de 1978. A mesma trouxe para a discussão a

necessidade de incluir nos cuidados primários à saúde, os conhecimentos

tradicionais inerentes às nações. De acordo com a Declaração de Alma Ata, dentre

outros, os cuidados em atenção primária:

Requerem e promovem a maximização da autoconfiança e a participação comunitária e individual no planejamento, organização, funcionamento e gestão dos cuidados de saúde primários, fazendo o mais pleno uso dos recursos locais, nacionais e outros disponíveis, e, para esse fim, desenvolvem, por meio de educação apropriada, a capacidade de participação das comunidades;

[...] Baseiam-se, a nível local e de encaminhamento, nos que trabalham no campo da saúde, incluindo médicos, enfermeiras, parteiras, auxiliares e agentes comunitários, quando aplicável, tanto quanto práticos tradicionais quando necessários, convenientemente treinados, social e tecnicamente, para trabalharem como equipes de saúde e para responderem às necessidades de saúde expressas pela comunidade.

Estes marcos históricos não aconteceram ao acaso, mas foram resultantes de

uma prévia movimentação da sociedade civil organizada por intermédio das diversas

instituições interessadas na defesa da construção e consolidação de políticas

públicas para a fitoterapia e as plantas medicinais, entre outras práticas

consideradas alternativas ou de uso popular. Neste sentido, no Brasil, o período de

maior movimentação e importância coincide com o já citado período de

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44

redemocratização da sociedade brasileira, vivenciado em meados da década de

1980 após a derrocada do Regime Militar.

A título de exemplificação, pode-se citar as iniciativas da Central de

Medicamentos (CEME), no Brasil. A CEME apoiou atividades de pesquisa em

produtos fitofarmacêuticos nas décadas de 1970 e 1980, chegando a promoverum

encontro sobre plantas medicinais em 1982, do qual resultou um documento

intitulado PPM – Programa de Plantas Medicinais - que desencadeou a realização

de inúmeros estudos na área.

Para melhor compreensão do movimento que envolveu e desencadeou a

trajetória das PM na história brasileira recente, de acordo com Cavalazzi (2006),

pode-se situar marcos e/ou referências normativas referentes às plantas medicinais

(Quadro 1).

Quadro 1 - Referências Normativas Relativas às Plantas Medicinais

Data Local Responsável Referência Normativa

1978 Alma-Ata /

Cazaquistão OMS

I Conferência Internacional sobre Cuidados Primários em Saúde

1988 Chiang Mai,

Tailândia

OMS, União Internacional de Conservação da Natureza e Recursos Naturais (IUCN) e

Fundo Mundial da Vida Selvagem (WWF)

Conferência Internacional sobre Conservação de Plantas Medicinais, que resultou no documento “Salvem as Plantas que Salvam Vidas”.

1988 Brasil Ministério da Saúde Resolução CIPLAN nº 8/88, que institucionaliza e normaliza a fitoterapia no Serviço Público de Saúde nas Unidades Federadas.

1991 Brasil CFM – Conselho Federal de

Medicina

Parecer nº 06/91 do Conselho Federal de Medicina, que torna a atividade de fitoterapia,desenvolvida sob a supervisão de profissional médico, como prática reconhecida pelo Ministério da Saúde.

1995 Brasil Secretaria de Vigilância

Sanitária Portaria 6/SVS -normatiza o registro de fitoterápicos

1996 Brasil

Presidência da República (responsável por convocar a

Conferência), Conselhos Nacional, Regionais e Municipais de Saúde

Relatório da 10ª Conferência Nacional de Saúde, que orienta a incorporar no SUS a fitoterapia, acupuntura, homeopatia e contemplar as terapias alternativas/práticas populares.

1998 Brasil Sub-comissão Nacional de

Assessoramento Técnico em Fitoterápicos – MS/ANVISA

Elaboração do Documento que resultou na RDC 17/2000, que “normatiza o registro de produtos fitoterápicos e define o medicamento fitoterápico tradicional”.

2002 Estado de

Santa Catarina Câmara dos Deputados

Lei 12386, de 16 de agosto de 2002, que autoriza o Poder Executivo a criar o Programa Estadual de Fitoterapia e Plantas Medicinais no Estado.

2003 Brasil Ministério da Saúde

Relatório da 1ª Conferência Nacional de Assistência Farmacêutica, que constitui o Grupo de trabalho para elaborar a Política Nacional de Medicina Natural e Práticas Complementares

2004 Brasil Conselho Nacional de Saúde Resolução Nº 338/04, que aprova a Política

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45

Nacional de Assistência Farmacêutica.

2004 Brasil ANVISA

Resoluções nº 88 e 89, determinando que todos os testes referentes ao controle de qualidade de fitoterápicos deverão ser realizados em rede credenciada no sistema REBLAS ou por empresas que possuam certificados de BPFC

2004 Brasil ANVISA Revogação da RDC 17 e publicação da Resolução Nº 48

2005 Brasil

Presidência da República

Definição de Grupo de Trabalho aprovação da Política Nacional de Plantas Medicinais

2006 Brasil MINISTÉRIO DA SAÚDE PNPIC 2006 Brasil MINISTÉRIO DA SAÚDE PNPMF 2008 Brasil MINISTÉRIO DA SAÚDE Programa Nacional de PMF

Fonte: Adaptado de Cavalazzi (2006)

Paralelamente às datas registradas no Quadro 1 deve-se imaginar as

diversas Unidades da Federação, organizadas, construindo os fundamentos de boa

parte das referências normativas e dos marcos históricos aqui registrados.

Hoje, o país conta com duas grandes políticas interministeriais, geridas pelo

Ministério da Saúde, que são a PNPMF e a PNPIC, para nortear as ações referentes

às plantas medicinais no SUS, incluindo a fitoterapia.

Em relação à Política Agrária, o raciocínio segue caminho semelhante. A Lei

de Política Agrícola (8.171 de 17.01.91), do ponto de vista formal, define os

princípios fundamentais, os objetivos e as competências institucionais, enfatizando a

questão econômica ao tratar de produtividade, incremento à produção e

regularidade do abastecimento. A Constituição Federal de 1988, por outro lado, tem

como referência a garantia da função social da propriedade19. No jogo de forças

travado entre essas propostas, na história da estrutura agrária brasileira, a opção

pelo produtivismo e pela tecnificação dos processos, à revelia dos impactos sociais

e ambientais que tenham ocasionado e continuem ocasionando, tem obtido

destaque.

Em contrapartida, uma conquista recente importante foi o Programa Nacional

de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), que objetiva maior

democratização do crédito rural para parte dos agricultores familiares, recursos para

infra-estrutura no município, capacitação de técnicos e agricultores familiares e

alocação de recursos para assistência técnica e extensão rural de infra-estrutura.

19

A concepção de função social da propriedade rompe com o individualismo e pressupõe que a propriedade passe a ser vista como instrumento de apoio à consecução dos fins sociais, cuja essência é o seu serviço à coletividade (DERANI, 1997, p. 239).

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46

Dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário, coletados no decorrer de

2014, apontam para o fortalecimento e crescimento do Pronaf desde o ano de 2003,

quando começou a ser executado. Entre os meses de junho de 2013 e junho de

2014, agricultores familiares de 5.462 municípios, dos 5.570 que integram o território

nacional, haviam recorrido aos recursos da iniciativa, totalizando um o volume

contratado de R$ 20,7 bilhões, o maior da história do programa (PAOLA, 2014;

GRISA; WEZS JUNIOR; BUCHWEITZ, 2014)

A opção sobre quais produtos, em nível local, são priorizados no cultivo dos

pequenos agricultores, entretanto, não está isenta da pressão exercida pelos

grandes interesses econômicos que alicerçam o agronegócio. Dados do município

de Canoinhas são ilustrativos. Nesse sentido, demonstram que justamente as

culturas de produtos que possuem maiores possibilidades de escoamento e venda,

determinada pelos interesses do mercado que não está restrito às fronteiras

nacionais, tem sido priorizadas pelos pequenos agricultores. De acordo com a série

de três reportagens publicada pelo Jornal Correio do Norte em agosto de 2014, a

principal atividade agrícola em importância econômica para o município de

Canoinhas é a cultura do tabaco. Canoinhas é o município que lidera o plantio de

fumo no estado. Atualmente, seu plantio responde por 64% do PIB agrícola

municipal e ocupa 2,7 mil famílias (CORREIO DO NORTE, 201420).

No município em questão, o alicerce sobre o qual a matiz produtiva se

difundiu sobre o espaço é caracterizado pela extração intensiva de madeiras nativas

que ali ocorreu sistematicamente, bem como no Planalto Norte Catarinense, desde o

início do século passado. Tal fato trouxe como consequência um retrocesso

econômico entre as décadas de 1980 e 1990. Com a estagnação deste ciclo, as

atividades agrícolas que passaram a ocupar o espaço rural da região foram,

predominantemente, as monoculturas de larga escala como o fumo, grãos e

reflorestamento (PETRENTCHUK; MARCHESAN; DALLABRIDA, 2014).

A matriz produtiva do município de Canoinhas (SC) evidencia que

predominam, ainda, atividades sustentadas na exploração de recursos florestais,

atividades com baixo potencial de agregação de renda regional. Estas atividades

extrativistas e de industrialização em madeira e celulose, contribuíram e contribuem

20

FUMO responde por 64% do PIB agrícola. Correio do Norte. Canoinhas, p. 20-22. 15 ago. 2014.

Disponível em: <http://www.adjorisc.com.br/jornais/correiodonorte/editorias/rural/fumo-responde-por-64-do-pib-agricola-1.1489081#.VNyCyuNdVWk>. Acesso em: 15 jan. 2015.

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47

para a redução da biodiversidade regional. Além disso, são atividades intensivas do

ponto de vista tecnológico. Mesmo que aumentem sua capacidade produtiva,

ocupam pouca mão de obra (DALLABRIDA, 2013).

A erva-mate (Ilex paraguariensis) também desempenha importante papel

social, econômico, histórico, cultural e ambiental. Segundo Souza et al (2013), há

mais de 152 anos ocorre a atividade comercial de erva-mate no Planalto Norte

Catarinense. De porte arbustivo, foi e continua sendo a principal atividade

extrativista alimentícia brasileira em quantidade produzida. Atualmente, o Planalto

Norte Catarinense responde por 55% a 60% da participação catarinense. Dados do

IBGE (2012) apontam que no ano de 2012, Canoinhas comercializou 4500 toneladas

de erva-mate cancheada. Neste território, a exploração da erva ocorre em ervais

nativos e naturalizados, manejados em formações da FOM. Ambientes manejados

podem apresentar maiores custos de produção, quando comparados com outras

regiões ervateiras, em que o sistema de monocultivo predomina (SOUZA et al,

2013). A erva-mate é um dos exemplos importantes de planta medicinal brasileira

(BRASIL, 2012).

O conhecimento tradicional que os agricultores de Canoinhas possuem em

relação a outras formas de cultivo e seus ganhos, como é o caso das plantas

medicinais, é preterido em virtude da necessidade de garantir, com o trabalho, a

sobrevivência da família. A inexistência de uma cadeia produtiva estruturada, focada

no cultivo e beneficiamento desses produtos, inviabiliza que a existente tradição

cultural do uso de plantas medicinais seja traduzida em ganhos materiais diretos,

colocando-a, no que diz respeito às opções sociais, políticas e econômicas

hegemônicas, no patamar de conhecimentos populares desimportantes.

Conforme aponta Thompson (1991), isto não significa uma submissão das

classes populares aos interesses hegemônicos. O conhecimento que lhes é próprio

continua existindo, sendo transmitido de geração a geração por intermédio da

tradição oral e representando, por um lado, resistência ao que lhes é imposto pelos

rumos econômico-políticos hegemônicos e, por outro, alternativa de resolução dos

problemas de saúde que denota clara divergência na lógica, intencionalidade e

forma do tratamento das enfermidades.

Torna-se, portanto, evidente que instituir uma Política Municipal de Plantas

Medicinais e Fitoterápicos efetiva geraria efeitos positivos não somente para as

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48

famílias, mas para a realidade econômica e social do Município ao melhorar a

atenção à saúde, fortalecer a agricultura familiar, gerar emprego e renda, promover a

inclusão social e minimizar a dependência tecnológica, conforme preconizado na

PNPMF. Outro relevante efeito positivo seria romper com as práticas extrativistas e

enfocadas em produtos que por suas características intrínsecas, ou pelos

desdobramentos de seu cultivo, extração e beneficiamento, trabalham na contramão

da garantia de uma saúde plena aos munícipes e moradores da região.

Quando se pondera sobre Políticas Públicas de Plantas Medicinais como

estratégias de desenvolvimento local, pensa-se primeiramente no desenvolvimento

como uma totalidade, indivisível. Desde a década de 1950, muitos autores

apresentam um olhar mais intenso aproximando o desenvolvimento ao crescimento

econômico, sem considerar primordialmente as mudanças qualitativas no modo de

vida das sociedades. Porém, este não é o único ponto de vista. O enfoque

socioeconômico vem perdendo espaço para abordagens que levam em conta outros

fatores emergentes, como os ambientais e sociais.

Embora existam diversos autores que propõe definições para o tema, não se

tem um único conceito mais aceito. Para Siedenberg (2006), o conceito de

desenvolvimento é ambíguo e difuso. O autor o aborda na tentativa de lapidar ou

estabelecer um conceito que seja o marco na explicitação definitiva do assunto, o

que ainda não foi alcançado.

O termo desenvolvimento regional apresenta-se como vertente

contemporânea dos conceitos de desenvolvimento. Está associado a escalas não

globais, como a região, o local, o território ou, ainda, ao termo endógeno. Pode

apresentar várias abordagens, que costumam variar de acordo com as múltiplas

áreas de conhecimento nele envolvidas. Boisier (2000) define desenvolvimento

regional como um processo permanente de mudança estrutural de um território,

associado ao progresso de uma região, comunidade ou sociedade local, bem como

de cada indivíduo lá presente.

Concordando com os autores, o desenvolvimento passa a ser entendido

como um modelo ou processo não estático. Está ancorado temporalmente ao

delimite estabelecido e carrega consigo a dinâmica daquele local, região ou

comunidade.

Page 50: (SC) - Cristiany Martins

49

A perspectiva de Dallabrida (2010) define desenvolvimento como “um

processo de mudança estrutural, situado histórica e territorialmente, caracterizado

pela dinamização socioeconômica e a melhoria da qualidade de vida de sua

população”. Nesse sentido, é a que mais se aproxima da defesa da direta

interlocução entre Políticas Públicas e desenvolvimento local e regional. A Política

Pública Municipal de Plantas Medicinais e Fitoterápicos poderia auxiliar na

construção das mudanças sociais, na dinamização socioeconômica e na melhoria da

qualidade de vida da população canoinhense.

Tendo a percepção de que desenvolver é mudar, transformar a realidade em

menor ou maior grau, de acordo com o dinamismo da coletividade em que está

contextualizada, cabe ressaltar a importância da cultura local para conceber ou

refutar mudanças propostas intrinsecamente, bem como por agentes externos.

Neste contexto, a importância da formação cultural pode levar em

consideração os conceitos do poder simbólico, apontados por Pierre Bourdieu. Com

referência à questão regional, Bourdieu (2004) relata o poder simbólico como “um

poder de consagrar ou de revelar as coisas que já existem”. Para ele

[...] um grupo só começa a existir enquanto tal, para os que fazem parte dele e para os outros, quando é distinguido, segundo um princípio qualquer, dos outros grupos, isto é, mediante o conhecimento e o reconhecimento (pág. 167).

Segundo Boisier (1999), para Bourdieu a cultura é o elemento que pode

simultaneamente acrescentar e separar, criando uma delimitação que unifica o que

se encontra dentro dele e o distingue do ambiente externo.

A abordagem de Bourdieu permite melhor compreensão da relação de

subordinação estabelecida em um meio. As relações culturais acontecem quando

uma classe dominada se apropria de um pensamento dominante, que é

estabelecido, normalmente, por alguém a quem este “poder” foi delegado, quer por

uma posição socioeconômica mais favorecida, ou por um reconhecimento intelectual

ou atitudinal em que a os demais indivíduos reconhecem em certas pessoas, e que

passa a ser reconhecido como verdade.

Para o autor, o capital simbólico não é outra coisa senão o capital econômico

ou cultural, onde a legitimação da ordem social resulta da percepção e apreciação

aplicadas pelos agentes às estruturas objetivas do mundo social, e não de uma ação

norteada propositalmente por propaganda ou por imposição simbólica. Em termos

Page 51: (SC) - Cristiany Martins

50

mais concretos, a legitimação da ordem social não é produto, como alguns

acreditam, de uma ação deliberadamente orientada de propaganda ou de imposição

simbólica: ela resulta do fato de que os agentes aplicam às estruturas objetivas do

mundo social estruturas de apreciação e percepção provenientes dessas estruturas

objetivas e tendem, por este motivo, a conceber o mundo como evidente

(BOURDIEU, 2004).

Trazendo a discussão para o município de Canoinhas (SC), objeto desta

investigação, para que a PMPMF se efetive e os rumos político-econômicos do

município sejam repensados, gerando benefícios à coletividade, a mudança que

deve ser empreendida passa pela ruptura com os interesses que extrapolam os

limites municipais e regionais, como a histórica prática extrativista de monoculturas e

produtos. Esta prática representa ganho ao município, referente à ampliada e

garantida possibilidade de comercialização, mas também representa e gera

problemas socioambientais, éticos e de saúde, como é o caso do fumo e da

celulose.

Tal mudança pressupõe, concomitantemente ao processo de ruptura com os

interesses supracitados, o fortalecimento da cultura local e a análise técnica crítica

sobre as possibilidades de desenvolvimento que a região natural ou potencialmente

possui, articulando setores e os diversos atores sociais dispostos a construí-la.

Como totalidade indivisível que a realidade social representa, o tema desta

pesquisa, que defende e propõe a necessidade de uma PMPMF, esclarece que

qualquer mudança não ocorre se o conjunto das relações sociais não sofrer

alterações. Retomando a contribuição de Marx (1982), anteriormente citada, de que

a essência e a totalidade da lógica das relações sociais capitalistas está contida em

cada fato e/ou fenômeno, demonstra-se que, se mudanças ainda não ocorreram,

além da Política de Saúde, deve-se problematizar o conjunto dos atores e das forças

em jogo no território.

Quais são as atividades prioritárias? Como estão estruturadas? Onde estão

os pontos inativos? Quem são os atores sociais? Quais são os dilemas e facilidades

existentes para a transição à necessária mudança? Estes são os tópicos detalhados

no capítulo de resultados da pesquisa.

Page 52: (SC) - Cristiany Martins

51

3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para estudar as ações desenvolvidas no município de Canoinhas sobre

Plantas Medicinais (PM) e suas orientações, que subsidiaram a proposição e

desenvolvimento de programas na área, realizou-se a pesquisa exploratória,

bibliográfica e documental. Também foi realizada pesquisa de campo, utilizando

questões semiestruturadas, aplicados a pessoas que tiveram atuação em PM no

município.

A definição pela abordagem qualitativa deveu-se ao interesse em aprofundar

os conhecimentos e os significados das ações praticadas pelos atores, não

perceptíveis por meio de equações, médias e estatísticas (MINAYO, 2003).

Os entrevistados foram escolhidos por sua relação direta com ações sobre

plantas medicinais no referido município. Por meio da abordagem qualitativa, a

escolha dos entrevistados foi realizada não tanto com relação à representatividade

numérica que possibilitasse a generalização dos conceitos teóricos (abordagem

quantitativa), mas considerando o aprofundamento e abrangência da compreensão

que refletisse a totalidade de suas múltiplas dimensões (MINAYO, 2004). Neste

caso, a autora recomenda que não se esgote o elenco de entrevistados antes que

se delineie o quadro empírico da pesquisa e que se permita “prever um processo de

inclusão progressiva encaminhada pelas descobertas de campo e seu confronto

com a teoria” (MINAYO, 2004).

Para a coleta de dados, optou-se pela realização de entrevistas individuais,

com apoio em roteiros semiestruturados (Apêndices B e C). Estes roteiros

envolveram questões previamente formuladas permitindo, porém, que o entrevistado

abordasse livremente o tema proposto, partindo das perguntas norteadoras

(MINAYO, 2003). Para o segundo grupo, questões fechadas complementaram os

dados da pesquisa. As entrevistas foram realizadas entre os meses de outubro e

dezembro de 2014.

Pelos levantamentos bibliográficos e documentais realizados, percebeu-se a

necessidade das entrevistas abrangerem não apenas a área da saúde, mas outras

de relevância para a implementação da cadeia de plantas medicinais no município,

como a de educação e o desenvolvimento rural, incluindo os agricultores familiares

Page 53: (SC) - Cristiany Martins

52

que estiveram envolvidos em projetos de cultivo de plantas medicinais, bem como as

entidades vinculadas aos agricultores.

Para melhor relatar os dados encontrados, as amostras de entrevistados

foram classificadas em duas divisões principais. A pesquisa foi realizada com sete

participantes na amostra de articuladores (Grupo 1) e seis participantes na amostra

de agricultores (Grupo 2). O Quadro 2 faz uma breve exposição dos participantes,

com ocupação e profissão que exercem, conforme descrito pelos próprios

entrevistados.

Quadro 2 - Perfil dos entrevistados por grupo de amostragem

Grupo Cód. Área de correlação Ocupação Profissão / Formação

1 A Legislativo Vereador Agricultor 1 B Executivo – Saúde Gestor municipal Assistente Social 1 C Executivo - Educação Gestor municipal Professor 1 D Executivo - Agricultura Gestor municipal Gestor Público

1 e 2 E Agricultura Extensionista rural Engenheiro Agrônomo 1 F Saúde Gestor de saúde em UBS Enfermeiro

1 G Agricultura Gestor de instituição de extensão rural e pesquisa e ex-gestor municipal

Engenheiro Agrônomo

2 1 Agricultura Aposentado Agricultor 2 2 Agricultura Agricultor Agricultor 2 3 Agricultura Agricultora Agricultora 2 4 Agricultura Agricultor Agricultor 2 5 Agricultura Agricultor Agricultor

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

O primeiro grupo foi composto por atores municipais e pessoas estratégicas,

incluindo gestores do executivo municipal e pessoas ligadas a instituições com

atuação na área de PM. A amostra envolveu atores que eram citados em cada

entrevista, levando a uma nova entrevista. Buscou-se abranger as pessoas que

desencadearam as ações citadas que foram consideradas relevantes. Quando os

fatos e ações citadas começaram a se repetir e não adicionar fatos novos, optou-se

por encerrar as entrevistas.

O início da pesquisa com o Grupo 1 foi a Lei municipal 4.565/2010 (PMPMF).

O primeiro entrevistado faz parte do legislativo municipal e teve ligação direta com a

elaboração da referida lei. A partir desta entrevista, foram sendo delineados os

estudos de campo e definidas novas pessoas para compor a amostra.

Compuseram essa amostra, ainda, articuladores das principais áreas

abordadas nesta pesquisa e que também são responsáveis pelo maior número de

ações com PM que ocorreram na última década no município. Na área da saúde,

Page 54: (SC) - Cristiany Martins

53

foram entrevistadas duas pessoas. Uma da área de gestão municipal, com mais de

dez anos de atuação nesta secretaria. A segunda foi responsável pelas decisões

dentro da Unidade Básica de Saúde (UBS) em que desenvolvia sua função de

enfermeira. Foi citada, ao longo das entrevistas, por sua participação em cursos e

ações realizadas junto à comunidade.

Na área da agricultura, participaram três entrevistados. Um destes atua como

gestor municipal na administração atual. O segundo entrevistado, extensionista rural

na Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina

(EPAGRI), foi citado pelos entrevistados por sua atuação junto aos agricultores

familiares que realizaram experiência de cultivo e comercialização de PM,

contribuindo com outras ações que ocorreram neste sentido no município. O terceiro

entrevistado teve atuação como gestor municipal ao longo da última década e

atualmente é gestor em uma instituição estadual, voltada à extensão rural e

pesquisa agropecuária.

Além das áreas da saúde e agricultura, principal foco de investigação deste

trabalho, foram encontrados trabalhos com PM na área de educação do município.

Por este motivo, decidiu-se incluir um gestor municipal desta área no Grupo 1.

A segunda amostra (Grupo 2) foi composta por famílias de agricultores

pertencentes à comunidade de Matão, situada na região Norte do município (Mapa

1) que formaram um grupo de cultivo e comercialização de PM, intitulado Grupo

Nova Esperança. Apenas as famílias que participaram do grupo e chegaram a

comercializar as plantas medicinais por meio dele fizeram parte da amostragem. A

não participação no grupo até o momento da comercialização foi o fator de exclusão.

Cinco famílias compuseram essa amostra. Além destes, foi incluído no Grupo 2 o

mesmo extensionista rural que fez parte da amostra de articuladores, por ter

acompanhado a implantação e evolução do grupo durante quase todo o período de

atividade do mesmo.

Apenas um participante de cada família de agricultores respondeu ao

questionário quantitativo. A própria família escolheu seu representante. Entretanto,

as entrevistas foram acompanhadas e tiveram a participação de todos os envolvidos

no processo que se fizeram presentes no momento da coleta dos dados. Para

melhor apresentação dos dados do Grupo 2, os relatos dos agricultores são

apresentados com um termo descritor seguido do código estabelecido para cada

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54

entrevista, variando de 1 a 5. Os termos descritores utilizados foram: agricultor(a),

família do agricultor, esposa(o) do(a) agricultor(a), propriedade, propriedade do(a)

agricultor(a).

Mapa 1 - Localização da Comunidade de Matão, no Município de Canoinhas (SC)

Fonte: Heloísa Dias Fuck (2014)

Localização do Município de Canoinhas / Matão

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55

Relacionou-se o perfil das propriedades e famílias que lá vivem ao acesso

que as famílias têm às PP da agricultura familiar e PM. Procurou-se obter, ainda,

informações relevantes sobre a experiência de cultivar plantas medicinais, os

ganhos e perdas que ocorreram, o que precisa ser superado para que as PM

possam fazer parte do rol de produtos em que estes se dedicariam e investiriam seu

tempo.

Foram extraídas das entrevistas informações relevantes aos objetivos desta

pesquisa. Quando transcritas fidedignamente partes das entrevistas, as falas dos

entrevistados encontram-se destacadas.

Os sujeitos do estudo, após informados sobre o projeto, concordaram em

participar da pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

(TCLE) (Apêndice A). Após o consentimento formal dos sujeitos da pesquisa, as

entrevistas foram gravadas e, posteriormente, transcritas na íntegra. Em relação ao

instrumento de registro, consideraram-se as contribuições de Queiroz (1991) sobre o

gravador, assim como as reflexões que fez sobre a sistematização do material

colhido, a transcrição e análise dos documentos e a arte contida na divisão das falas

e na construção final de um texto unificado sobre elas.

A partir da audição e leitura das entrevistas, a análise do contexto foi

realizada, buscando identificar aspectos significativos da temática, consensos e

dissensos entre os entrevistados. Os dados quantitativos auxiliaram na construção

de um perfil dos entrevistados, tornando possível a análise adequada das respostas

qualitativas obtidas.

O capítulo 4, no qual são abordados os resultados da pesquisa, foi construído

utilizando estilo redacional narrativo, a partir das questões que mais se repetiram

nos relatos dos entrevistados. Resguardou-se a identidade de cada entrevistado.

Nem todas as considerações e conclusões tecidas ao longo do texto depreendem-se

das falas dos entrevistados, mas também das observações efetuadas em campo

(falas descontinuadas, informações gestuais, não ditos) e de considerações tecidas

pelos próprios entrevistados quando, ao final das entrevistas, o gravador era

desligado.

As observações realizadas no momento das entrevistas, igualmente, foram

registradas em instrumento próprio (diário de campo), fomentando conexões teóricas

sobre o tema.

Page 57: (SC) - Cristiany Martins

56

A análise que se buscou construir tem a pretensão de alcançar a totalidade

dos fatos e acontecimentos. As falas dos entrevistados não foram consideradas

isoladas do contexto e do lócus social por eles ocupado – e este não foi analisado

de maneira independente da realidade na qual estão inseridos – o município de

Canoinhas (SC).

3.1 CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL DA PESQUISA

A presente pesquisa, realizada para a elaboração desta dissertação, limitou-

se a Canoinhas (SC) por ser o único município do Planalto Norte Catarinense a

apresentar Lei aprovada sobre plantas medicinais.

Canoinhas é um dos catorze municípios da região do Planalto Norte de Santa

Catarina (Mapa 2). Está situado a 26º10'38" Sul e 50º23'24" Oeste de Greenwich e

apresenta altitude média de 765 metros acima do nível do mar. Limita-se ao norte

com o estado do Paraná (municípios de São Mateus do Sul, Paulo Freitas e Paulo

de Frontin), ao sul com os municípios de Major Vieira e Timbó Grande, a oeste com

Irineópolis e ao leste com os municípios de Três Barras, Major Vieira e Bela Vista do

Toldo (TOKARSKI, 2001).

De acordo com a divisão política estadual, o município é sede da 26ª

Secretaria de Desenvolvimento Regional (SDR) de Santa Catarina, composta por

mais cinco municípios (Bela Vista do Toldo, Irineópolis, Major Vieira, Porto União e

Três Barras). Pertence, ainda, ao arranjo da Associação dos Municípios do Planalto

Norte Catarinense (AMPLANORTE), juntamente com os municípios da 26ª SDR,

além de outros quatro (Itaiópolis, Mafra, Monte Castelo, Papanduva). Esta

associação se sobrepõe à atuação da Associação dos Municípios da Região do

Contestado (AMURC) na qual Canoinhas também está inserida em posição

geográfica estratégica.

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57

Mapa 2 – Localização do Planalto Norte Catarinense e do município de Canoinhas (SC)

Fonte: Heloísa Dias Fuck (2015)

O território que compreende o município de Canoinhas (SC) apresenta clima

temperado mesotérmico úmido, com temperatura média anual de 17°C (TOKARSKI,

2001). Segundo estimativas do IBGE, o município de Canoinhas conta com uma

população de 54.079 habitantes (IBGE, 2014), com predominância urbana (cerca de

74%) e densidade demográfica de 47,4 habitantes por Km2, em uma área territorial

de 1.140,395 Km2 (IBGE, 2010).

Canoinhas está inserida no bioma Mata Atlântica, com formação florestal

nativa predominante da Floresta Ombrófila Mista (FOM), também conhecida como

Page 59: (SC) - Cristiany Martins

58

Mata de Araucárias. A cobertura original já foi amplamente suprimida devido aos

ciclos econômicos da madeira e erva mate, associados ao extrativismo. Restam,

atualmente, menos de 20% da cobertura original (SCHAFFER & PROCHNOW,

2002). A presença de erva mate e do pinheiro araucária (Araucaria augustifólia)

despertaram a cobiça dos colonizadores desde o final do século XIX. A exploração

vegetal foi o principal fator do ciclo econômico regional até a década de 1930

(MARCHESAN, 2013).

As áreas que sofreram a retirada das florestas nativas foram reflorestadas,

em sua maioria, com espécies exógenas de aplicação econômica, como o pinus ou

pinheiro-americano (Pinus elliiotti) e eucalipto (Eucalyptus globulus Labill). Segundo

Marchesan (2013), a opção por espécies exógenas para o reflorestamento está

firmada em parâmetros economicistas e utilitaristas, devido à demanda de mercado,

a exemplo da racionalidade técnica instrumental. Em um período de dez a quinze

anos, estas espécies já estão prontas para o corte, fato que significa alta

produtividade em reduzido tempo e espaço. Desta forma, oferecem lucros

significativos de forma rápida. De maneira geral, há predomínio destas monoculturas

florestais em grandes propriedades. Porém, em algumas pequenas propriedades

(até 25 ha), isto também já é realidade.

A motivação para a investigação sobre este município, além do protagonismo

que ele representa na região frente à normatização das PM, deu-se a partir da

constatação de que os tratamentos com plantas medicinais e fitoterápicos são

aceitos pela população. Fazem parte da cultura brasileira e regional, apresentam

legislação específica e são uma proposta concreta para o SUS rumo a um modelo

de saúde integrador e inclusivo. Além disso, as plantas medicinais permitem

aproveitamento nas propriedades e agroindústrias familiares, possuem alto valor

agregado de comercialização e, de acordo com a Federação das Indústrias do

Estado de Santa Catarina (FIESC, 2013), figuram entre os “setores portadores de

futuro” para a mesorregião Norte de Santa Catarina.

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59

4 A PESQUISA DE CAMPO: RESULTADOS E ANÁLISES

Neste capítulo, fez-se a apresentação e análise dos dados da pesquisa e

seus desdobramentos de forma a dialogar com o referencial teórico.

O capítulo foi separado em duas partes. A primeira – Plantas medicinais e

ações desenvolvidas no município de Canoinhas (SC) – apresenta os dados da

pesquisa realizada com o Grupo 1 e a cronologia das ações realizadas com PM que

permeiam os últimos dez anos no município. A segunda parte – Grupo Nova

Esperança: antes, durante e depois da experiência com plantas medicinais –

relata a pesquisa com o Grupo 2, isto é, de agricultores, como o grupo se formou,

quais eram suas expectativas e qual sua visão sobre as PM como alternativa para a

pequena propriedade da agricultura familiar.

4.1 PLANTAS MEDICINAIS E AÇÕES DESENVOLVIDAS NO MUNICÍPIO

DE CANOINHAS (SC)

No âmbito da gestão, a pesquisa procurou saber o que os entrevistados

conhecem e percebem das políticas e ações com plantas medicinais, tanto no

âmbito do trabalho que desenvolvem quanto para o município de Canoinhas.

Buscou-se investigar quais limitações são percebidas e precisam ser superadas

para o avanço das práticas com as PM e quais as possibilidades existentes. Durante

o processo de investigação, foram descobertas as ações realizadas nas áreas da

saúde, agricultura e educação, fato que permitiu traçar um histórico dos

acontecimentos recentes sobre as PM no município.

O conhecimento quanto à existência de políticas públicas voltadas ao tema

PM revelou-se superficial no Grupo 1, sem conhecer ou dominar o conteúdo dos

documentos em questão. O entrevistado B, da área da saúde, afirmou ter

“conhecimento das portarias interministeriais que instituem o uso de plantas

bioativas no SUS”. O contato dos gestores com as PP, em quase todos os casos,

ocorreu por tomarem conhecimento das experiências de outros municípios, nos

estados de Santa Catarina e do Paraná. Citaram as experiências de Curitiba (PR) e

Balneário Camboriú (SC). No ano de 2005, gestores municipais da área da saúde,

meio ambiente e desenvolvimento rural verificaram in loco a experiência deste último

Page 61: (SC) - Cristiany Martins

60

município, tendo sido este projeto a base para algumas ações que ocorreram na

sequência.

O entrevistado F, da área da saúde, afirmou ter conhecido as PP no curso que

participou, intitulado Escola de Formação em Ervas Medicinais (detalhes sobre o

curso são fornecidos na sequência), no qual um dos professores apresentou as

PNPMF, PNPIC e as plantas que poderiam ser trabalhadas no SUS.

Acerca da importância das plantas medicinais para o município de Canoinhas

e das possibilidades que elas representam em vistas ao desenvolvimento, todos os

entrevistados julgam ser uma área relevante. Ao implantar uma política efetiva de

PM, segundo eles, o município obteria ganhos econômicos, culturais e em saúde

pública. Foram citados ainda o baixo custo de implantação, a interdisciplinaridade de

abordagem, a pré-disponibilidade devido ao fator cultural e as parcerias.

O representante do legislativo entrevistado afirmou que a possibilidade de

diminuição do consumo de medicamentos alopáticos e, conforme suas palavras,

“fazer um contraponto à indústria da doença” foi um dos motivos que o levaram a

pensar em um programa de PM. Em sua concepção, tal “indústria” envolve o

tratamento compartimentalizado focado em sintomas, visando lucros econômicos e

não primeiramente à saúde. Também foi citado por este, pelo extensionista rural e

pela enfermeira entrevistados, a questão cultural que está permeada nos usos

regionais, sendo que o legislador citou que sua mãe “era curandeira e descendente

de índio”. Acrescentou ainda sobre a questão cultural:

[...] está muito presente nos índios, nos caboclos esta questão da cura pelas ervas e a gente cresceu vendo a mãe fazer toda aquela farmácia no quintal. Chazinho pra cá, chazinho pra lá. As crianças iam lá receber remédio, e ela era meio parteira também.

A saúde foi citada por todos os entrevistados como sendo a principal

beneficiada. As PM contribuiriam, segundo eles, como uma alternativa de tratamento

viável economicamente e que teria de fácil aceitação pela população que já faz uso

caseiro de plantas para tratar problemas de saúde. Conforme a enfermeira que

atuou na equipe de saúde da família:

[...] eu não tiro a necessidade de medicamentos sintéticos. [...] mas eu acho que ela [fitoterapia] melhora a qualidade de vida, ela tem menos efeitos colaterais, até a possibilidade de acesso [é melhor],

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61

diminuir a questão do custo. Acho que é uma reestruturação. Não é retroceder, é avançar.

Ainda com relação à saúde, a entrevistada citou a importância de ser

realizado um trabalho de educação, não somente com as equipes de trabalho, mas

com a população. Segundo ela, a população está cada vez mais habituada a usar os

medicamentos convencionais, que já estão prontos. Esta facilidade, juntamente com

a maior necessidade de preparo das PM para uso, requer um investimento em

resgate cultural e educação para o uso racional das PM.

Sobre a questão de capacitação e educação para concretizacão da PNPMF

como alternativa de tratamento de saúde no município, é fundamental que, ao

implantá-la, as equipes de saúde sejam capacitadas continuamente para prescrição,

dispensação, orientação aos usuários, entre outras competências necessárias para

que a política prospere. Também é pertinente que na implantação da política

municipal de PM, o mesmo empenho seja feito com treinamento sobre objetivos,

metas e execução do projeto. Demonstrar, aos gestores das equipes de saúde, a

importância e benefícios decorrentes da execução da política, dão respaldo e

adesão à política, favorecendo sua continuidade. Sobre o assunto, o gestor de

saúde apontou:

Aqui em Santa Catarina não tivemos treinamento, ainda, que fôssemos convidados para tal. Mas eu lhe digo que se nós estudarmos as portarias, não precisa nem de muito treinamento.

Vale ressaltar, novamente, que apenas em 2010 o município de Canoinhas

aprovou a Lei 4.565 – PMPMF, em conformidade com o Programa Nacional de PMF.

O programa engloba, dentre outras, diretrizes para a saúde e para a agricultura.

Para que possa tomar as proporções de uma política de governo e gere resultados,

precisa ser objeto de planejamento dos setores afins, de forma que permita ser

posto em prática e gerenciado, a fim de ser aprimorado de forma contínua, com um

ou alguns responsáveis por estas ações.

A aprovação da referida lei aconteceu após várias outras ações terem sido

realizadas em âmbito municipal, desde 2005. Quase simultaneamente, houve ações

com PM comandadas pelas secretarias de saúde, agricultura e educação, como

demonstra o Quadro 3. Embora possam passar a impressão inicial de um

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62

desencadeamento em sequência, estas ações não foram oportunizadas como parte

de um planejamento integrado, pertencentes a um objetivo maior.

A respeito de planejamento, anteriormente à aprovação do Programa

Municipal de PMF, as PM foram contempladas no Plano Municipal de

Desenvolvimento Rural Sustentável (PMDRS). O PMDRS foi elaborado entre julho e

agosto de 2005 pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Agropecuário, com

apoio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Rural e do escritório municipal da

EPAGRI, vigorando desde então, e lançado oficialmente em 2007.

Quadro 3 – Principais Ações Institucionais com Plantas Medicinais no Município de Canoinhas (SC) no Período de 2005 a 2015

Data Ação

2005

Março Instituição do Projeto Interdisciplinar de Educação no Campo

Julho Marco inicial do planejamento – PMDRS

Agosto I seminário de Plantas Bioativas do Planalto Norte SC

2006

Março Inauguração do Complexo de Plantas Bioativas

Julho Primeira versão do documento que rege o Programa de Plantas Bioativas Municipal

Setembro I Seminário Regional “Fortalecimento da Cadeia de Plantas Bioativas no Planalto Norte Catarinense”

2009

2009 Programa de Plantas Bioativas passa a ser denominado Campo de Laborterapia do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS)

Junho/2009 Dia de Campo em Itajaí com participação do Grupo Nova Esperança e trabalhos canoinhenses da Educação no Campo

2010 Julho/2010 Instituída Lei 4.565 – Programa Municipal de Plantas Medicinais e Fitoterápicos “Vitalina de Lima”

2011 Abril/2011 II Seminário de Ervas Medicinais

2012 Abril/2012 Formatura de 32 alunos da Escola de Formação em Plantas

Medicinais (56 horas)

Abril/2012 Palestra com o tema “Ervas Medicinais” na UBS COHAB I

Fonte: Dados da pesquisa (2014)

O PMDRS apresenta um diagnóstico do meio rural do município e aponta

necessidades, problemas e potencialidades. Descreve cada tema abordado, com a

composição das comissões, objetivos geral e específicos e tabelas com a definição

de ações por grupo temático, para dar encaminhamento à retomada do

desenvolvimento rural, pautado na sustentabilidade das ações. As comissões

elegeram ações de curto e médio prazo - previstas para acontecerem no período de

2005 a 2008 - e de longo prazo, para além de 2008 (CANOINHAS, 2007).

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Na relação de programas e projetos do referido plano, encontra-se a

Comissão de Alternativas para a Agricultura. Criar condições para permanência do

homem no campo, buscando novas alternativas de renda para as pequenas e

médias propriedades, visando diversificar o cultivo nas propriedades baseadas na

monocultura do fumo, é o objetivo da comissão. Dentre as alternativas apontadas

nos objetivos específicos, encontram-se as plantas medicinais, referidas no plano

como bioativas (CANOINHAS, 2007).

O plano de ação com propostas relacionadas às plantas bioativas

contemplou: a) a formação de associações em comunidades de agricultores e a

organização da cadeia produtiva, em curto prazo; b) a capacitação de produtores, a

organização das redes de comercialização, a construção de estufas, em médio

prazo, e; c) a expansão do número de produtores no município, em longo prazo

(CANOINHAS, 2007).

Embora consideradas no PMDRS, ações decorrentes não geraram uma

proposta concreta com PM que as incluíssem com continuidade no setor. Há que se

destacar que ocorreram desdobramentos do PMDRS, gerando ações com PM na

área agrícola do município. Dentre elas, a formação do Grupo Nova Esperança

(detalhes do grupo são fornecidos no item 4.2), em uma iniciativa da comunidade de

Matão em conjunto com a EPAGRI, por meio do projeto Microbacias II, fomentado

pelo governo do estado de SC até o ano de 2009, com a capacitação dos

produtores.

Diferentes capacitações também ocorreram de forma mais abrangente, em

conjunto com outras secretarias. Destacam-se a realização de seminários que

contaram com diversos apoiadores e permitiram o aprofundamento do debate sobre

as PM entre os participantes.

O I Seminário de Plantas Bioativas do Planalto Norte de Santa Catarina

ocorreu em 05 de agosto de 2005, realizado pela Prefeitura Municipal de Canoinhas

com o apoio da Secretaria de Desenvolvimento Rural, do Fórum dos Secretários da

Agricultura do Planalto Norte Catarinense e da Empresa Brasileira de Pesquisa

Agropecuária (Embrapa). Foram abordados temas que abrangeram a identificação,

etnobotânica, produção de mudas, pesquisa, legislação e experiências no serviço

público de saúde com plantas medicinais, envolvendo palestrantes das esferas

pública e privada. Oficinas de trabalho também fizeram parte deste seminário, que

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teve participação de aproximadamente 250 pessoas21. Seis anos se passaram entre

o primeiro e o segundo seminário. Neste período, ocorreram outras ações no âmbito

municipal.

Com pouco mais de um ano de intervalo, em 13 de setembro de 2006 foi

realizado outro evento – Seminário Regional “Fortalecimento da Cadeia Produtiva de

Plantas Bioativas no Planalto Norte Catarinense”. Foi organizado pelos escritórios de

negócios de Campinas (SP) e Canoinhas (SC) da Embrapa Transferência de

Tecnologia, em parceria com a EPAGRI e com o apoio da Prefeitura municipal de

Canoinhas, do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Bento do Sul e

Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa (AS-PTA). Este

seminário teve como principal foco a troca de informações e experiências entre

produtores, cooperativas, empresa e institutos de pesquisa. Estes temas foram

abordados durante o evento, que contou com a participação de cerca de 200

pessoas22, dentre as quais estavam agricultores do Grupo Nova Esperança.

Não só em caráter didático, mas também comercial, em 03 de junho de 2009,

a Secretaria do Estado de Agricultura e a EPAGRI promoveram um Dia de Campo

de Plantas Bioativas, sediado em Itajaí (SC). Com o objetivo de reunir os trabalhos

que vinham sendo realizados com PM no estado em todos os âmbitos, propiciou a

aproximação entre os elos da cadeia de PM. O município de Canoinhas foi

representado no evento pelos trabalhos da Educação do Campo23, com a

demonstração de seus projetos e uma comitiva do Grupo Nova Esperança, com os

produtos comercializados pelo mesmo. No evento, o grupo fez contatos comerciais e

trocou informações com outros produtores de PM.

Sobre a participação dos agricultores do Grupo Nova Esperança nos eventos

e capacitações apontados, percebe-se o intento e empenho para viabilizar a

capacitação dos produtores e a comercialização dos produtos, conforme metas do

PMDRS.

Em 2010, realizou-se no município um curso sobre PM, que foi denominado

Escola de Formação em Ervas Medicinais. Segundo o legislador entrevistado,

responsável pela iniciativa e organização deste curso, a escola foi proposta como

21

1o. Seminário de Plantas Bioativas reuniu mais de 250 pessoas. In: http://www.portaldecanoinhas.com.br/noticias/1447 22

Canoinhas sediou Seminário Regional sobre Plantas Bioativas. In: http://www.portaldecanoinhas.com.br/noticias/3834 SANTA Catarina (2006). 23

Ver dados sobre a Educação do Campo na página 71.

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forma de dar início à implantação da lei 4.565 – PMPMF “Vitalina de Lima”, tendo

como objetivos a capacitação da comunidade para a produção, manipulação e uso

correto e seguro das plantas medicinais. As vagas foram oferecidas a pessoas

ligadas às PM em Canoinhas e região, dentre as quais, representantes da saúde do

município, indicados pela secretaria de saúde. Deste setor-chave, participaram

efetivamente três pessoas das equipes de saúde do município de Canoinhas – uma

delas, a enfermeira que participou desta pesquisa. Também participaram do curso

representantes dos assentamentos da Reforma Agrária Mimo - do município de

Irineópolis - e Terra Livre, de Canoinhas; representantes da Pastoral da Saúde de

Canoinhas, uma técnica agroecológica e alguns agricultores. O curso teve 56 horas

de duração, contou com professores com diferentes enfoques e formou 32 pessoas.

Já em 2011, foi realizado o II Seminário de Ervas Medicinais, no pavilhão da

Igreja São Francisco, no bairro Campo da Água Verde. No evento, foram expostas

experiências bem sucedidas realizadas pela prefeitura de Araquari, pela Pastoral da

Saúde e pelo Centro de Atenção Psicosocial (CAPS) de Canoinhas, bem como a lei

que institui o PMPMF “Vitalina de Lima”; também foram definidas parcerias e início

da implantação do programa.

No que tange à esfera municipal, não existia um plano orçamentário com uma

rubrica específica para a realização das ações com as PM citadas; mas, segundo o

ex-gestor da agricultura entrevistado, que participou do planejamento e execução

destas ações, “existia a rubrica de apoio a pequenos agricultores, de onde saíam os

recursos para ações nesta área”. Atualmente, não há nenhuma ação ou

planejamento com PM por parte da iniciativa pública no município de Canoinhas.

O entrevistado da atual gestão municipal na área da agricultura corrobora

com a assertiva de que as PM podem ser uma opção viável para o desenvolvimento

do município. Esse entrevistado afirmou que existe a intenção de incluir as PM no

planejamento, pelos seus benefícios à saúde e como alternativa para agricultura

familiar, mas a ideia ainda está sendo pensada entre as secretarias de agricultura e

saúde. Reiterou não haver plano orçamentário para as PM e que as mesmas não

entraram em nenhum planejamento recente. Afirmou também que entre os

agricultores familiares, a monocultura do tabaco ainda é a primeira escolha, cabendo

ao município oferecer o revés para a transição. Segundo o entrevistado, dentre as

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alternativas que vêm sendo trabalhadas com estas famílias estão a piscicultura, a

horticultura e a fruticultura. As ervas medicinais seriam mais uma opção:

Preparando o produtor, tem campo. Porque a gente tem conhecimento de cidades onde exploram bem mais a medicina natural. Eu vejo que Canoinhas tem potencial, tem terreno pra isso, tem pessoas pra fazer isso. Então, agora cabe a nós montar um projeto, um plano, e dar sequência.

Retrocedendo no tempo e voltando o olhar mais para a área da saúde,

realizaram-se ações contempladas no projeto intitulado Programa Municipal de

Plantas Bioativas. Iniciado em março de 2006 e concretizado na forma do Complexo

de Plantas Bioativas, contou com a parceria de outras secretarias e instituições.

Segundo a pessoa da secretaria de saúde entrevistada para esta pesquisa, o projeto

foi idealizado em moldes similares ao vislumbrado no município de Balneário

Camboriú, após uma comitiva municipal conhecer a experiência daquele município.

Para início das atividades, contou com a consultoria de um participante do projeto

neste município (Prof. Lobato). De acordo com o Portal do Cidadão24, neste mesmo

ano, foram empregados vinte e três mil reais com a contratação de pessoa (Carmen

Maria Ribas) para prestação de serviços de assessoria, capacitação para produção,

manipulação e controle de qualidade de plantas bioativas no laboratório municipal.

O Complexo de Plantas Bioativas foi instalado no Parque Municipal de

Exposições Ouro Verde, às margens da BR 280, no bairro Piedade. Era composto, à

época, por um horto medicinal e uma construção em alvenaria, denominada de

“Laboratório de Manipulação” onde, após a coleta das plantas, eram realizadas as

operações de higienização, seleção, secagem, processamento e embalagem das

plantas e onde também eram produzidos xaropes, sabonetes, loção capilar. No

decorrer da pesquisa, um dos entrevistados apresentou a primeira versão do

documento (CANOINHAS, 2006). Segundo consta no documento, as plantas do

programa foram selecionadas:

[...] baseando-se em estudo realizados pelas farmacêuticas da SMS, buscando-se utilizar plantas com estudos científicos, que assegurem sua eficácia e ausência de toxicidade e que possuam a agrologia compatível com a região, e também considerando o perfil epidemiológico da população.

24

Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina (2006).

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O objetivo geral do projeto, segundo o documento, era “garantir à população

canoinhense o acesso seguro e o uso racional de plantas medicinais e fitoterápicas,

promovendo o uso sustentável da biodiversidade, o desenvolvimento da cadeia

produtiva e indústria”. É pertinente explicitar, ainda, os objetivos específicos do

projeto que constam no documento:

- Ampliar as opções terapêuticas aos usuários, com garantia de acesso a plantas medicinais, fitoterápicos e serviços relacionados a fitoterapia, com segurança, eficácia e qualidade, na perspectiva da integralidade da atenção à saúde, considerando o conhecimento tradicional e científico sobre plantas medicinais; - Estabelecer estratégias para produção, distribuição e uso de plantas medicinais e fitoterápicos a partir dos modelos e experiências existentes no Brasil e em outros países; - Promover pesquisa, desenvolvimento de tecnologias e inovações em plantas medicinais e fitoterápicos, utilizando plantas da região. - Estimular a agricultura familiar, com a produção de plantas como forma de renda. - Investigar os conhecimentos que a população do Município de

Canoinhas têm a respeito das plantas medicinais (CANOINHAS, 2006).

Segundo palavras do gestor da secretaria de saúde, “o programa se acabou

por falta de atuação das parcerias”. Percebe-se a ampla abrangência do projeto

proposto. O planejamento, porém, não amarrou as parcerias em um sentido comum,

nem estabeleceu ações sequenciais específicas com respectivos responsáveis para

atingir os objetivos propostos, o que pode ter contribuído para a descontinuidade do

programa. As primeiras ações descontinuadas foram a fabricação e a distribuição de

manipulados, pois o local onde eram realizadas as manipulações necessitava de

ajustes para entrar em conformidade com a legislação em vigor. Além disso, como

não foi nomeado um responsável técnico, não poderia caracterizar um laboratório

com manipulação de produtos. Foram mantidos o horto, secagem e distribuição de

chás em saquinhos com as plantas “a granel”.

Percebe-se que, ao colocar em prática o Projeto Plantas Bioativas, as ações

não contemplaram o treinamento sistemático e contínuo das equipes. As decisões

foram tomadas no âmbito da gestão, centralizadas na secretaria de saúde, sem o

envolvimento ativo dos gestores das UBS que seriam contempladas com o projeto, o

que também pode ter contribuído para sua descontinuidade.

A implantação do Programa de Plantas Bioativas, a exemplo de outras ações

com as PM no município, sofreu execução desarticulada. Verificou-se que uma das

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metas propostas no projeto era a “Implantação dos serviços de FITOTERAPIA (grifo

no original) em todas as unidades de Saúde do Município de Canoinhas, por meio

da capacitação dos profissionais de saúde e acadêmicos da UnC-Canoinhas”. As

capacitações ocorridas no período de funcionamento do programa, catalogadas com

base nas entrevistas e referências, foram seminários de abordagem multidisciplinar,

abertos à população em geral, com enfoque tanto em saúde quanto em agricultura.

Na tentativa de manter o projeto em andamento, a secretaria de saúde atuou

em conjunto com o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) do município, já não

contando com outras parcerias. Em meados de 2009, o horto medicinal passou a ser

utilizado como espaço para laborterapia, em que os pacientes do CAPS, com

capacidade para tal, faziam a manutenção dos canteiros. No ano de 2010,

esporadicamente havia distribuição dos chás, segundo o relato da enfermeira

entrevistada: “um dia chegaram uns pacotinhos pra deixar numa cesta pro pessoal

pegar”.

O Curso de Formação em Ervas Medicinais, já mencionado anteriormente,

ocorreu na fase final de vigência do projeto de Bioativas. A enfermeira entrevistada,

que participou do curso, relatou que a estrutura e os conhecimentos foram

adequados e proveitosos, mas poderiam ter sido mais bem aproveitados: “éramos

três ou quatro equipes de saúde da família [no município,] na época e nós éramos a

única [equipe] que estava lá e concluiu”.

Ainda a respeito das equipes de saúde, há que se considerar a aptidão para

trabalhar com PM. Como já foi escrito anteriormente, os profissionais da área da

saúde, em sua maioria, não possuem formação voltada para o conhecimento e a

valorização das PM. A racionalidade técnica presente no escopo das grades

curriculares dos cursos de saúde diminui o espaço dos métodos tradicionais e

chamados alternativos, que acabam por ser suprimidos da grade ou condensados

em pequenas pinceladas dentro de disciplinas afins. É o caso do curso de Farmácia

oferecido pela UnC, campus Canoinhas que, apesar de apresentar as PM como

tema de pesquisas e contemplar sua aprendizagem pontuadamente em algumas

disciplinas obrigatórias, não apresenta uma disciplina exclusiva para capacitar seus

alunos à atuarem com PM, acompanhando o que se vê em outros cursos

semelhantes.

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Para que projetos desta magnitude ganhem adeptos, muito pode ser sanado

com treinamentos bem planejados, explicitando os meandros e delineamentos do

projeto e a importância do mesmo para a saúde pública e para a população. Estas

assertivas se confirmam no discurso da entrevistada com atuação na equipe de

saúde da família, que ressalta que seu trabalho com PM não ganhou o espaço que

poderia ter alcançado pela baixa adesão de alguns profissionais, ao uso e à

prescrição de PM e fitoterápicos, até mesmo em decorrência da formação destes

profissionais que não era voltada para a aplicação destes recursos: “por mais que

todos estes trabalhos aconteciam dentro da nossa unidade de saúde, o próprio

médico, ele não era contra, ele não dizia eu não vou fazer, mas ele [demonstrava

que] não estava ali pra isso”.

A propósito do treinamento das equipes de saúde, percebe-se que não

sofriam constante repasse de informações sobre o projeto e seus objetivos. A

enfermeira entrevistada relata que trabalhos foram realizados na UBS em que esta

trabalhava, por iniciativa própria. A ideia surgiu após a participação no curso de

formação e ganhou força por uma questão cultural. Juntamente com as outras duas

participantes da escola de formação que compunham sua equipe na UBS, iniciaram

a elaboração de material que serviria como base para a implantação de um horto

medicinal na mesma, e para a orientação dos usuários. Concomitantemente,

organizaram e realizaram um evento no dia mundial da saúde – 07 de abril de 2011.

Os participantes assistiram à palestra sobre o tema e mudas de medicinais foram

entregues às famílias abrangidas pela UBS e para os demais interessados

presentes ao evento, o que gerou resposta positiva por parte da comunidade.

O material didático não foi concluído, principalmente devido à saída da

enfermeira do quadro de servidores municipais, que implica na rotatividade de

profissionais que devem ser constantemente preparados sobre as políticas que o

município deseja que prevaleçam à população.

Confirmando a desarticulação das ações entre gestão e equipes de saúde,

nem todos os servidores das equipes de saúde da família possuíam conhecimento

sobre o Complexo de Plantas Bioativas, existente à época no município e as ações

lá realizadas. A mesma entrevistada relata:

[...] eu não sabia que isso [Complexo de Plantas Bioativas no Parque de Exposições Ouro Verde] existia. Fiquei conhecendo esta estrutura

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através do curso de formação. (...) que o objetivo era conhecer a Farmácia Viva lá em Florianópolis com o professor Alécio. Mas daí a gente acabou indo aqui. Por uma questão de deslocamento nós acabamos visitando esta estrutura que eles tinham.

Faz-se pertinente, ainda, registrar que o Plano Municipal de Saúde para o

Quadriênio 2010-2013 (PMS 2010-2013) contemplou as plantas medicinais no seu

quadro de metas, conforme transcrito do documento para o Quadro 4

(CANOINHAS, 2010).

No PMS 2010-2013 consta também o Laboratório de Plantas Bioativas como

parte da Infraestrutura da Secretaria Municipal de Saúde.

Quadro 4 – Metas da Secretaria Municipal de Saúde de Canoinhas (SC) – Quadriênio 2010 a 2013 –

Complexo de Plantas Bioativas

ESTRATÉGIAS / AÇÕES INDICADORES METAS PERÍODO

1 Firmar parcerias com Sec. De

Agricultura, Sec, Meio Ambiente e EPAGRI

Cooperacao interinstitucional

Todos os parceiros envolvidos no projeto

2010/2013

2 Definição de responsável técnico

pelo programa municipal de Plantas Bioativas

Responsável Técnico nomeado

Indicar responsável técnico

2010

3 Definição de responsável pelo viveiro

de plantas bioativas Jardineiro nomeado

Nomear jardineiro, através do concurso

público 2010

4

Educação em saúde voltada ao uso adequado das plantas medicinais

pela população, através da promoção de cursos, seminários, confecção e

distribuição de materiais educativos e de divulgação

Cursos, seminários, materiais educativos

Realizar atividades educativas para

população 2010/2011

5 Educação continuada para

profissionais de saúde Curso de fitoterapia

realizado

Realizar curso de fitoterapia

2010/2013

6 Revisar projeto inicial, atualizando-o Projeto atualizado

Equipe multiprofissional

empenhada no serviço 2010/2011

7 Implantação de farmácia de manipulação de fitoterápicos

Farmácia de manipulação implantada

Implantar farmácia de manipulação de

fitoterápicos 2010/2011

8 Implantação de serviços de

fitoterapia em todas as unidades de saúde

Serviço de fitoterapia nas

unidades de saúde

Implantar serviço de fitoterapia nas

unidades de saúde 2011/2012

Fonte: adaptado de Plano Municipal de Saúde para o Quadriênio 2010-2013 (2010).

Em suma, as investidas da secretaria de saúde para com a inclusão das PM

no rol de tratamentos ofertados na atenção primária à saúde do município incluíram

a criação de um programa com manipulação e dispensação de PM (nele referidas

como bioativas), contribuições em seminários e outras capacitações de âmbito

municipal e regional, além do desejo de articulação com outros setores do município

e instituições afins. Porém, não foram encontrados dados que comprovassem que a

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implementação de políticas públicas com PM tenha apresentado um planejamento

articulado que a colocasse na pauta de prioridades do setor de saúde para a

população de Canoinhas (SC).

No âmbito educacional do referido município, também contemplada em 2005

no PMDRS, foram encontradas ações considerando as plantas medicinais tanto na

educação regular, quanto na educação do campo.

A educação do campo teve, como marco nas políticas públicas brasileiras

vinculadas ao Ministério da Educação (MEC), a aprovação conjunta da Resolução

001/2002 – Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo,

pelo Conselho Nacional de Educação (CNE) e Coordenação de Educação Básica

(CEB). O documento define a identidade da escola do campo, assim ancorada:

[...] pela vinculação às questões inerentes à sua realidade, ancorando-se na temporalidade e saberes próprios dos estudantes, na memória coletiva que sinaliza futuros, na rede de ciências e tecnologia disponível na sociedade e nos movimentos sociais em defesa de projetos que associem as soluções exigidas por essas questões à qualidade social da vida coletiva no País. (MEC, 2002, p. 37).

Nesse sentido, a escola pode representar um lugar privilegiado para a

formação de conhecimento, cultura, identidades e valores (ARROYO; CALDART;

MOLINA, 2004).

O Projeto de Educação do Campo do município de Canoinhas foi apresentado

pela Secretaria Municipal de Educação e Secretaria de Desenvolvimento Rural ao

Conselho Municipal de Educação em dezembro de 2005. Após sua aprovação,

passou a vigorar em 2006. Dentre os eixos norteadores da Educação do Campo,

estão as hortas, pomares e jardins, inclusos no Projeto Interdisciplinar trabalhado em

contraturno nas escolas do campo, desde 2006, até os dias atuais (CANOINHAS,

2007b).

A Educação do Campo representa uma oportunidade de inserir a educação

no contexto do cotidiano dos alunos do meio rural. Nesse processo de trabalho,

segundo Blaka (2010), os alunos se mostram mais interessados, melhorando o

aproveitamento educacional e reduzindo os índices de faltas.

Neste contexto, no município, as PM são trabalhadas inseridas nas hortas,

muitas vezes no formato de mandalas ou no formato de “relógio do corpo humano”.

Segundo a gestora em educação entrevistada, o relógio é um modelo didático que

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especifica algumas PM e as correlaciona ao melhor horário de uso e as partes do

corpo-humano beneficiadas.

[...] trabalha toda esta questão biológica com a criança, e também já está trabalhando os horários, pra ela entender o relógio, entender os números. Então veja, é a interdisciplinaridade. É o valor da erva, é o conceito da erva e as diversas, amplas, multifacetárias ações que elas possibilitam.

Segundo a entrevistada, cada escola trabalha o conteúdo com certa liberdade

e algumas não chegam a utilizar PM. A utilização depende fundamentalmente dos

professores e do perfil do técnico que atende as escolas, posto que alguns tenham

aptidão maior para lidar com as PM. Blaka (2010) afirma que a inserção de técnico

agrícola, a partir de 2006, por meio das experiências práticas e pesquisas

realizadas, contribuiu para o desempenho das atividades escolares e o

entendimento da teoria. Nas palavras da entrevistada, “depende muito também dos

professores e do técnico que entram, às vezes ele tem uma aptidão maior, gosta de

lidar com as ervas”.

A interdisciplinaridade é sempre o principal enfoque nos projetos. Alguns

professores trabalham a Matemática por meio do entendimento do processo de

colheita e secagem das plantas ou pela medição da área a plantar. Uma destas

escolas construiu um secador solar. Também é uma oportunidade de o professor sair

da sala de aula e levar os alunos para um ambiente natural. Diz a entrevistada:

[...] Isso tudo num trabalho pedagógico, plantando, cuidando, identificando, desidratando e conhecendo[...] Na verdade, é plantar, cultivar, conhecer, entender e saber trabalhar com esta erva, trabalhar matemática, trabalhar ciências. Ao invés de o professor trabalhar no livro o tipo da erva, ele vai trabalhar lá no pezinho mesmo, sentir o cheirinho, pegar na folhinha, entende? Identificar mesmo... quem sabe uns futuros biólogos também. Este é o objetivo.

Desta forma, as PM são introduzidas no cotidiano das crianças, que

reproduzem seus conhecimentos no ambiente familiar, trazendo-as para o cenário

de novas possibilidades. A gestora relata que em algum momento, no clube de mães

de uma das comunidades atendidas pela educação do campo, as PM foram motivo

de discussão, demonstrando que também podem ser uma alternativa de geração de

renda para elas e para as propriedades.

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Do ponto de vista educacional, contextualizar o ensino e aprendizagem na

escola pode despertar o empreendedorismo e a autonomia nos alunos, valores que

farão a diferença na fase adulta dos alunos (BLAKA, 2010).

Figuras 2 e 3 – Hortas Medicinais Cultivadas em Escola Municipal de Canoinhas (SC) – Projeto

Interdisciplinar de Educação do Campo

Fonte: arquivo pessoal da pesquisadora (2014)

Figura 4 – Demonstração dos Usos das Plantas no Conceito do Projeto Interdisciplinar de Educação

do Campo

Fonte: arquivo pessoal da pesquisadora (2014)

Plantas medicinais continuam sendo trabalhadas no âmbito da educação no

campo, de acordo com as possibilidades de cada escola e habilidades técnicas

oportunizadas pelo quadro de pessoal por período de atuação. A educação

municipal apresentou ainda projetos em algumas escolas do perímetro urbano.

No ensino técnico e superior, ofertados no município, as PM também são

abordadas. Na Universidade do Contestado (UnC), eventualmente, alunos e

professores realizam pesquisas com PM na grade do curso de Farmácia. Já foram

temas de pesquisa, dentre outras plantas, a erva-mate (Ilex paraguariensis) e o pau

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andrade (Persea cordata), nativos da região. As PM foram apenas tema de ações

pontuais realizadas pelo Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), como a Oficina

de Preparo e Uso Racional de Plantas Medicinais, oferecida na 2ª Semana de

Ciência e Tecnologia (SNCT) - Câmpus Canoinhas, em 2013; e como tema de

palestra em evento sobre Agroecologia, na mesma instituição, em 2014.

Cabe registrar os serviços gratuitos que a Pastoral da Saúde continua

prestando à população há mais de 20 anos. Com sedes na Igreja Matriz do Centro e,

mais recentemente, na Igreja do Campo da Água Verde, dentre os serviços estão

abordagens com PM.

Exceto no âmbito da educação, não foram encontrados registros de ações

específicas sobre PM na esfera municipal após 2012.

Para além das ações documentadas e relatadas pelas entrevistas, a pesquisa

buscou obter dos entrevistados sua visão acerca das limitações que precisam ser

superadas para que as PM façam parte do cenário canoinhense de forma a ser uma

ferramenta de desenvolvimento.

Foram citadas a falta de cooperação entre as secretarias municipais, a baixa

priorização, tanto na esfera municipal quanto nas instituições parceiras, e a

rotatividade de profissionais da área técnica e operacional.

A rotatividade de pessoal nas diversas áreas interligadas à implantação da

PNPMF tendem a diminuir com a efetivação do quadro de profissionais vinculados a

ela. Também é necessário que a equipe responsável priorize a política e acredite nos

seus resultados, delineando no projeto quais profissionais são necessários para que

se tenha uma política de continuidade.

Apreende-se, ainda, que a PNPIC e a PNPMF não foram o ponto de partida

para a elaboração de ações com PM em Canoinhas. Não houve instalação de um

grupo ou comissão, com discussões periódicas, que pudesse estabelecer ações

articuladas para gerar uma política perspicaz a ser revertida em benefícios

duradouros para a população.

Desta forma, as ações efetuadas no município com PM não promoveram

modificação do estado em que as políticas de saúde e agrárias se encontravam

antes das mesmas. Na esfera da educação, apesar de ser o único setor em que

ações com PM são recorrentes desde 2006, estimuladas por um programa de

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governo estabelecido, elas são trabalhadas ocasionalmente, conforme a aptidão e

oportunidade em cada escola.

Em suma, prevalece no discurso dos entrevistados o reconhecimento da

importância das PM e o desejo de torná-las uma realidade nas suas áreas de

atuação. Algumas ações realizadas demonstram o potencial das PM e o interesse da

população por elas.

Analisando do ponto de vista da Racionalidade Técnica Instrumental,

percebe-se que no âmbito da gestão do município de Canoinhas (SC) ainda

prevalecem ações pautadas nos saberes técnicos hegemônicos, de cunho

economicista, com resultados rápidos, em relação à utilização dos saberes

tradicionais e incorporação de técnicas que resgatam estes conhecimentos, como é

o caso da agricultura agroecológica para cultivo de PM, dos hortos e da utilização de

PM como opção terapêutica.

Os ganhos que uma política efetiva sobre PM traria ao município são

inúmeros e podem ser traduzidos pelos objetivos da política nacional: ampliação das

opções terapêuticas e melhoria da atenção à saúde aos usuários do Sistema Único

de Saúde (SUS); uso sustentável da biodiversidade brasileira; valorização e

preservação do conhecimento tradicional das comunidades e povos tradicionais;

fortalecimento da agricultura familiar; crescimento com geração de emprego e renda,

redução das desigualdades regionais; desenvolvimento tecnológico e industrial;

inclusão social e redução das desigualdades sociais; participação popular e controle

social; fortalecimento das cadeias e dos arranjos produtivos.

Para que os recursos vegetais disponíveis na flora brasileira, principalmente

das plantas nativas da região, presentes no município de Canoinhas, gerem os

benefícios apontados por estes objetivos da PNPMF, o conhecimento científico

tecnificado, com modelo na racionalidade técnica instrumental, precisa estar aliado

aos conhecimentos tradicionais, incorporando seus fatores de produção e tornando-

os compatíveis.

A falta de planejamento da secretaria municipal de saúde e falta de

articulação entre as secretarias municipais, entidades de apoio e demais atores

relacionados, levaram ao fracasso dos projetos propostos por iniciativa da esfera

municipal de saúde. Referenda esta afirmativa a existência de um Programa de

Plantas Bioativas e a contemplação deste no Plano Municipal de Saúde 2010-2013,

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sem que de fato tenha havido resultados consistentes e continuados, envolvendo um

desencadeamento de ações que vão desde a configuração de uma equipe técnica

dedicada à gestão do projeto, o cultivo de plantas medicinais em hortos

comunitários, a capacitação sistemática das equipes de saúde, até a gestão e

controle social da Política, passando por conselhos comunitários, instituições de

ensino, projetos de extensão e o controle social.

Utilizando o já citado enfoque dado por Milton Santos (2006), atingir esta

mudança requer reflexão dos atores e a modificação da sua relação com o meio

(natureza), concretizando ações com diferentes meios instrumentais e sociais.

Contudo, implica em garantir que os segmentos interessados na defesa da

construção de um modelo de saúde e de uma política agrária mais universalizantes

e inclusivos estejam organizados para repensar os rumos político-econômicos do

município.

Políticas públicas com propostas integradoras e multissetoriais podem

apresentar possibilidades de desenvolvimento local. As dificuldades de articulação

entre os diferentes atores e gestores presentes em cada região são conhecidas e,

muitas vezes, dificultam ou até mesmo inviabilizam ações. Ainda assim, a

implantação de políticas públicas é necessária e depende de um conjunto de

esforços que possam dar subsídio à legitimação e construção do saber local,

servindo de orientação para o modelo de implantação desejado.

A contraposição entre a racionalidade técnica e as plantas medicinais,

somada à possibilidade de conceber políticas públicas como estratégias de

desenvolvimento regional, sinalizam a construção desses caminhos.

4.2 GRUPO NOVA ESPERANÇA: ANTES, DURANTE E DEPOIS DA

EXPERIÊNCIA COM PLANTAS MEDICINAIS

Busca-se neste item desvelar os impactos que as Plantas Medicinais tiveram

nas propriedades e na vida dos agricultores familiares envolvidos com o Grupo Nova

Esperança.

Page 78: (SC) - Cristiany Martins

77

4.2.1 Caracterização do Grupo

Para traçar o perfil dos agricultores familiares e das propriedades onde estes

cultivaram e comercializaram PM, na comunidade de Matão, os dados objetivos

apreendidos nas entrevistas foram condensados na Tabela 1.

De acordo com os resultados apresentados na Tabela 1, a idade dos

principais responsáveis pelo cultivo nas propriedades varia entre 39 e 70 anos.

Apesar de 60% (três entrevistados) dos agricultores pesquisados terem filhos,

apenas 20% (um dos entrevistados) apresenta sucessor que reside na propriedade,

ainda em idade escolar. Não obstante à sucessão patrimonial, os agricultores

entrevistados demonstraram em seu discurso que os filhos não têm interesse em

suceder gerencialmente os pais. O agricultor 1 e a esposa, que tiveram sete filhos,

relataram que um deles possui uma casa ao lado da sua residência, pois

frequentemente vai à propriedade auxiliá-los na casa e no quintal de subsistência,

apesar de trabalhar na construção civil na cidade. Os demais não estão tão

próximos ao cotidiano da propriedade. Ambos são aposentados e apresentam uma

saúde que não lhes permite o cultivo de lavoura.

Os agricultores 2 e 3 são os de menor idade que integraram o grupo e

pretendem continuar na lavoura, sempre em busca de alternativas que permitam

melhorar a renda da família com o aproveitamento da propriedade. A agricultora 3 é

casada, vive na propriedade do sogro com o marido e o filho, sua mãe e seu tio,

cultivando uma pequena área desta. A filha mais velha do casal não reside

atualmente na propriedade e o filho está em idade escolar. O marido trabalha por

contrato para empresas da região e não cultiva mais a propriedade. Conforme relato

da agricultora, sua mãe e seu tio vivem na propriedade de favor.

O agricultor 2 reside na propriedade com a esposa e os pais, sendo um de

seus sucessores. O agricultor trocou o emprego anterior, em uma das indústrias de

celulose do município vizinho – de Três Barras (SC) – para voltar à propriedade dos

pais, na qual sua esposa, além de auxiliá-lo na lavoura, também cuida dos pais do

agricultor. Este possui um irmão que, segundo ele, não se interessa pelo cultivo na

lavoura. O casal ainda não tem filhos e relatou que, primeiramente, quer se

estabelecer na propriedade.

Page 79: (SC) - Cristiany Martins

78

Tabela 1 – Perfil Atual dos Agricultores Familiares Entrevistados e suas Propriedades

Cód. Idade

Sucessores que

residem na

propriedade

Número

de filhos

Total de

pessoas

na lavoura

Alimentos para

subsistência na

propriedade (%)*

Produtos

cultivados para

comercializar

Utilização de

agrotóxico

Utilização

do

PRONAF

Possível

retorno ao

plantio de PM

1 70 0 7 0 50% Pinus

Eucalipto Não Não Não**

2 44 0 0 2 < 50% Pepino

Hortaliças Sim Não Não

3 39 1 2 1 < 50% Pepino

Hortaliças Sim Sim Não

4 56 0 2 2 > 50% Pepino

Eucalipto Sim Não Sim

5 59 0 0 1 > 50% Pepino

Milho Sim Não Sim

* percentual estimado ** os agricultores não trabalham mais a lavoura como sustento da família. Fonte: dados da pesquisa

Page 80: (SC) - Cristiany Martins

79

Os agricultores 4 e 5 também cultivam a lavoura e buscam alternativas de

renda, porém apresentam idade mais avançada. O agricultor 4 reside na

propriedade com a esposa, aposentada. Sofre de problemas na coluna e está à

espera da aposentadoria. O casal de filhos migrou para a cidade e não pretende

retornar para a lavoura. O agricultor 5 reside na propriedade com sua mãe, idosa,

auxiliando-a e cultivando a lavoura. Este é o único dos agricultores entrevistados

que não possui veículo próprio para locomoção.

A análise destes dados, aliada aos relatos dos agricultores, leva a constatar

que há uma incerteza quanto ao processo de sucessão geracional nas propriedades

avaliadas.

Segundo Stropasolas (2011), a sucessão geracional vem ocupando espaço

como tema emergente, particularmente em Santa Catarina. No âmbito da produção

agrícola familiar, considera-se o processo sucessório como a transferência de poder

e do patrimônio entre gerações na qual, paulatinamente, há a retirada das gerações

mais idosas da gestão, com concomitante formação profissional de um novo

agricultor que executa a sucessão gerencial. Esta transmissão geracional implica

ainda em transmissão de um patrimônio histórico e sociocultural, que normalmente

se faz presente na agricultura familiar.

Observa-se que os filhos dos agricultores entrevistados buscaram alternativas

para traçar um novo caminho migrando para a cidade e para outros municípios,

desconectando-se da vida no meio rural, fato que evidencia a ruptura do processo

de sucessão gerencial.

A preocupação com o tema é evidente na fala da entrevistada 3. Ao iniciar a

entrevista, ela ressalta que a filha é técnica agrícola e está trabalhando em outro

município de Santa Catarina. Afirma também que pediu para a filha voltar a residir

com a família e tentar trabalhar na área de formação, para permanecer na

propriedade.

Ressalta-se que a ruptura da transmissão deste patrimônio histórico e

sociocultural, implícitos no processo sucessório, inclui a transmissão dos

conhecimentos tradicionais acerca dos usos e importância das plantas medicinais.

Com relação à finalidade de subsistência, percebe-se uma variação entre a

idade e a quantidade de mão de obra familiar e o percentual da alimentação da

família que vem das propriedades. As famílias dos agricultores 2 e 3 são as que

Page 81: (SC) - Cristiany Martins

80

garantem maior subsistência com a propriedade (mais que 50%), seguidos pela

propriedade dos agricultor 1 (50%). Os itens não produzidos e comprados por todos

os entrevistados, incluem commodities como farinha de trigo, óleo, açúcar, café e

arroz. Na propriedade do entrevistado 1, produzem itens para subsistência, como

hortaliças, frutas, algumas raízes, grãos, ovos e frango. Na propriedade 2, foram

citados hortaliças, leite, feijão, ovos, frango. Quanto à propriedade 3, em conjunto

com a área cultivada pelo sogro, a agricultora destacou ter para a subsistência

hortaliças, aipim, feijão, milho, ovos, carne de gado e porco, mel e algumas frutas,

restando poucos itens que necessitam adquirir fora da propriedade. O agricultor 4

possui uma pequena horta. Além dos itens da horta, pouco é produzido na

propriedade, como ovos e milho. O agricultor 5, por sua vez, relatou ter para a

subsistência feijão, aipim, milho, batata, ovos, pepino e algumas hortaliças. As duas

últimas propriedades são as únicas que adquirem mais de 50% dos itens em

comércios locais.

Quando questionados sobre o uso de agrotóxicos, atualmente apenas a

propriedade 1 não os utiliza na propriedade. O casal mantém a propriedade segundo

o que aprendeu cultivando as medicinais, com soluções agroecológicas. Segundo

relatos da agricultora, nenhuma árvore é derrubada, nenhum mato arrancado,

nenhum “veneno” é passado. Reitera ainda o esposo que “pras formigas eu uso

água quente, ela [a esposa] não deixa passar nada, já acostumei”. Mesmo estando

há cerca de cinco anos sem comercializar medicinais, nesta propriedade ainda é

possível encontrar ampla variedade de espécies no quintal cultivado pelo casal. As

PM são utilizadas para consumo próprio e para o preparo de produtos

disponibilizados à comunidade pelo trabalho do casal na Pastoral da Saúde de

Canoinhas.

Além do quintal cultivado, os entrevistados citam algumas das várias plantas

que são encontradas naturalmente na propriedade, sem nunca terem sido plantadas.

Dentre elas estão macela (Achyrocline satureioides), espinheira santa (Maytenus

ilicifolia), guaco (Mikania glomerata), guaçatonga ou erva de bugre (Casearia

sylvestris) e sabugueiro (Sambucus nigra), permitidas para uso em fitoterapia no

SUS; sassafrás (Ocotea odorifera), cujo óleo essencial pode ser utilizado em

medicamentos homeopáticos permitidos pelo SUS (ANVISA, 2010) e outras plantas

Page 82: (SC) - Cristiany Martins

81

que vêm sendo mais recentemente investigadas cientificamente por suas

propriedades, como pau andrade (Persea cordata).

Dentre os demais agricultores, todos utilizam agrotóxicos no plantio do

pepino. Porém, alguns deles fizeram questão de citar na entrevista que, para o

consumo da família, não fazem uso de agrotóxicos, mantendo a produção de modo

orgânico. Este é um fato considerado positivo pelo grupo acerca do cultivo das PM:

não estarem em contato com “veneno”:

Era um serviço bom pra lidar [...] até porque não vai veneno, né. O pepino, dia sim, dia não, tem que passar. (Agricultor 4) Pra nós eu separo uma área e planto orgânico, mas pra vender, a gente não dá conta, daí vai o veneno. (Agricultor 5, acerca do plantio de feijão)

Além dos dados já analisados, as fontes de renda familiar atuais também

foram apontadas. Percebe-se que, para os agricultores entrevistados, a propriedade

é fonte de sustento e arrimo familiar, subsistência, além de promover o vínculo com

a terra e a segurança. Atualmente, nenhuma família cultiva PM para

comercialização. Na Tabela 1, pode-se perceber que 80% dos entrevistados

migraram das PM para o cultivo do pepino, incluindo ou não, outras culturas na entre

safra. 20% (uma família) tem parte da propriedade coberta por reflorestamento de

pinus e eucalipto.

O entrevistado 1 e a esposa não cultivam mais a lavoura para a obtenção de

produtos para a comercialização. Além da aposentadoria, a comercialização do

pinus e do eucalipto, plantados na propriedade, complementam a renda familiar,

quando necessário. Por 16 anos, o casal teve sua principal renda atrelada à

comercialização de leite para a cooperativa de Canoinhas. Além disso, plantaram

milho, arroz, feijão e soja.

Para a agricultora 3, a renda familiar atual não depende exclusivamente da

propriedade. O plantio de pepino é realizado em uma pequena área que, na entre

safra, servirá para o plantio de hortaliças a serem comercializadas para o Programa

de Alimentação Escolar. Das demais áreas, uma parte é cultivada pelo sogro. Outras

estão arrendadas para terceiros. Ela relata que o marido, após sofrer seguidos

prejuízos no plantio de feijão, decidiu arrendar parte da terra e passou a trabalhar

para indústrias madeireiras da região, cortando toras.

Page 83: (SC) - Cristiany Martins

82

Avaliando a migração dos agricultores de PM para o cultivo do pepino,

percebe-se um desencadeamento em sequência. A agricultora 3 foi a primeira a

parar com as PM, após duas safras. Esta relata que um agricultor da região

comentou sobre os contratos com certa empresa de conservas, que estava

procurando mais agricultores para o plantio de pepino. A agricultora fez contato e um

representante da empresa veio à propriedade com a proposta, que incluía as

sementes, suporte técnico, atrelando a comercialização e abrandamento das dívidas

em caso de perda da produção por intempéries. A agricultora fornece até hoje sua

produção para esta empresa do município de Irineópolis (SC), que tem mais

contratos na região e revende esta matéria-prima para indústrias de conservas.

Na sequência, os agricultores 5 e 4 pararam com o cultivo de PM e iniciaram

o plantio de pepino, em modelo de contrato semelhante ao citado pela agricultora 3,

porém para outra empresa, situada em Blumenau (SC). O agricultor 2 foi o último a

deixar o plantio de medicinais. Sua propriedade também tem como fonte de renda

atual o pepino. A comercialização está atrelada à mesma empresa que a agricultora

3.

Para que uma pequena propriedade rural tenha um rendimento adequado às

necessidades de sustento da família, o agricultor familiar precisa superar alguns

obstáculos. Uma das dificuldades a enfrentar é a captação de recursos financeiros

que permitam o acesso a tecnologias e melhorias na propriedade. O Pronaf faz parte

de uma política que visa suprir estas dificuldades e diminuir as desigualdades no

meio rural.

Quando questionados sobre a utilização do Pronaf na propriedade, apenas

um agricultor citou ter feito uso deste programa.

Esta pesquisa não procurou elucidar os motivos pelos quais os agricultores

familiares da comunidade de Matão não conhecem devidamente, nem utilizem este

recurso com familiaridade. No entanto, para que uma política pública atinja seu

público-alvo, ela deve ser trabalhada em todas as esferas da administração pública,

sendo a administração municipal e as entidades de apoio de fundamental

importância para promover o acesso a elas.

Sobre a possibilidade de voltar a cultivar PM como alternativa de renda, dos

quatro entrevistados que continuam cultivando a terra para comercialização, metade

respondeu negativamente pela opção. Os 50% restantes (agricultores 4 e 5) se

Page 84: (SC) - Cristiany Martins

83

mostraram mais receptivos, desde que houvesse mais apoio na questão da

secagem. Maiores considerações sobre isso fazem parte da análise realizada no

item subsequente.

4.2.2 Histórico e análise da atuação do grupo

Tendo em vista situar o leitor no momento em que o grupo começou a se

articular, antes de iniciar a análise sobre ele, cabe uma pontuação a respeito do

Projeto Microbacias e seus desdobramentos em uma política pública que vigora há

vinte e quatro anos no estado de Santa Catarina.

Ele surgiu da vontade que movimentos ambientalistas e cientistas tinham de

trazer a temática ambiental para a pauta de discussões do desenvolvimento do

estado. Estes entendiam que a produção econômica tem como fatores primordiais o

meio ambiente e a profunda dependência humana à base biofísica para sua

sobrevivência (TREVISAN e BELLEN, 2009).

Este projeto desenvolvimentista teve início no ano de 1991, como Projeto de

Recuperação, Conservação e Manejo dos Recursos Naturais em Microbacias

Hidrográficas, mas ficou conhecido como Microbacias I. Iniciou-se com

financiamento de organismos financeiros multilaterais, com contrapartida de 50%

dos recursos do governo estadual. O acordo previa a duração do mesmo até o ano

de 1997. No entanto, foi prorrogado até o ano de 1999.

O segundo estágio (Microbacias II) ocorreu de 2002 a 2009, sendo a EPAGRI

sua principal executora. O objetivo geral era o de promover a redução da pobreza

rural. Visava, também, o desenvolvimento econômico, ambiental e social. Buscou a

participação da população rural no planejamento de ações locais, de modo a

organizar as comunidades ao coletivo, sendo que os projetos apenas recebiam

apoio financeiro, de cunho individual, para os agricultores familiares mais

vulneráveis.

Atualmente, uma terceira fase, com um enfoque mais amplo, está em vigor –

o SC Rural. Com início no final de 2010 e previsão de término em 2016, busca

qualificar os grupos de agricultura familiar, como os criados na etapa anterior,

fortalecendo e estruturando suas cadeias produtivas, tornando os agricultores mais

Page 85: (SC) - Cristiany Martins

84

competitivos, com estímulo à organização em seus empreendimentos rurais e

possibilidades de consolidação no mercado.

Enquanto política pública, o Microbacias se modificou ao longo do tempo. As

mudanças ocorreram para satisfazer as discussões, agendas e modelos mais

adequados às novas realidades socioeconômicas e ambientais do meio rural

catarinense, com foco na agricultura familiar, mediante o olhar dos atores inseridos

na referida discussão. Por não se tratar do objeto principal deste estudo, não se fará

aprofundamento sobre o tema, nem uma avaliação sobre a adequação ou não das

adaptações, a eficiência, eficácia e resultados alcançados pelo Microbacias.

Entretanto, é pertinente apontar que entre o fim de um estágio e início do

subsequente, houve uma lacuna de tempo. Para o percurso de mais de vinte anos

da referida política de governo, estas lacunas podem parecer pouco significativas.

Contudo, para as propriedades familiares ou grupos que estão em processo de

organização e construção de um novo saber e agir, estas lacunas podem significar a

ruptura no andamento dos projetos e uma brecha para a perda de interesse e

desmotivação.

Isto posto, a análise do conteúdo das entrevistas do Grupo 2 tem início pelo

relato da formação do Grupo Nova Esperança.

O princípio das atividades do grupo com as (PM) na comunidade de Matão

tem como pano de fundo a busca por alternativas de renda, que emerge nos

relatos dos agricultores familiares.

Os agricultores entrevistados citaram que, anteriormente às PM, trabalharam

com leite (entrevistados 1 e 2), grãos (entrevistados 3, 4 e 5), olerícolas como o

tomate e cebola (para comercialização das sementes- entrevistados 3 e 5). Um dos

agricultores (entrevistado 4) relatou ter trabalhado para terceiros em lavouras de

fumo, alternativamente à produção em suas próprias terras.

Percebe-se a abertura dos entrevistados a novas oportunidades de geração

de renda na propriedade. Além disso, a necessidade de que as alternativas

apresentadas cumpram com alguns requisitos, que podem variar de acordo com a

situação socioeconômica, apoio familiar e condições edafoclimáticas, dentre outras.

Sobre a possibilidade que as PM representaram e a escolha do grupo pelo

seu cultivo, ilustram a fala da entrevistada 3:

Page 86: (SC) - Cristiany Martins

85

[...] Nós mesmo [decidíamos o que queríamos plantar], cada família que dizia que queria uma alternativa de renda. Quem tinha interesse já ia participando das reuniões. [...] quando começou o projeto MB II, uma das coisas que a comunidade aqui precisava era alternativa de renda. [...] Como produtor, a gente tá sempre buscando alternativa [..]) participamo da produção de tomate. Alguns tiveram prejuízo, até pelo fato de não ter as técnicas. Nós tivemos muito problema com as estufa por causa do vento. Então, as olerícolas, que seriam uma alternativa, foi por água abaixo. Então, quando veio este projeto da MB, a gente [...] se jogou nessa ideia.

O extensionista rural da EPAGRI participou à época da formação do grupo.

De acordo com o mesmo, o grupo teve início após uma primeira troca de

informações entre a agricultora 1 e o escritório da EPAGRI local. Relata que a

agricultora participou de um curso que envolvia conceitos de Agroecologia e

procurou saber sobre as possibilidades de trabalhar com PM para a revitalização

destas na comunidade onde residia. Sua família participava ativamente da Pastoral

da Saúde e fazia uso de seus conhecimentos com a própria família e a comunidade

rural local. A iniciativa vinha como uma ferramenta para ampliar os conhecimentos

sobre PM e melhorar o acervo de plantas no horto medicinal da família, para

trabalhar as necessidades do uso com a Pastoral da Saúde, em uma iniciativa

pessoal da agricultora. Somou-se a isso o fato de que o cultivo poderia ser

transformado em fonte de renda para as famílias da comunidade local onde a

mesma residia.

Dentre os relatos dos agricultores entrevistados, alguns não apontam

precisamente quem lançou a ideia como alternativa para as propriedades.

Entretanto, três dos agricultores (entrevistados 1, 2 e 4) citam a EPAGRI, na figura

do extensionista entrevistado, como a origem da ideia para o grupo.

Sobre a visão de desenvolvimento rural na EPAGRI, Moro (2012) identificou a

existência de dois grandes modelos agrícolas inseridos na Instituição. Uma rede de

atores associada ao modelo que o autor chama de exógeno, ligada à agricultura

convencional, hegemônica; outra associada ao modelo endógeno e ao

desenvolvimento rural sustentável, ligada à agricultura não convencional, outrora

chamada de alternativa. O autor atenta para o fato de que despontam naturalmente

dentro da instituição grupos que priorizam a forma de trabalho que varia entre

agroecológica e orgânica e grupos que trabalham de forma convencional.

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86

Como já exposto anteriormente, as propriedades familiares requerem

versatilidade e agregação de valor para irem além da subsistência e conseguirem

dar conta das necessidades socioeconômicas familiares. Justifica-se, por este

motivo, as PM serem uma alternativa proposta pela instituição para as famílias que

se identificassem com o projeto.

Em dezembro de 2005, foi realizada a primeira reunião, que contou com a

presença de quase 20 famílias da comunidade. Segundo o extensionista, o escritório

da entidade no município não tinha muito conhecimento acerca do tema, mas foi

realizado um levantamento prévio para esta primeira reunião. O perfil do projeto de

medicinais se encaixava no projeto Microbacias II (MB II).

A presença das famílias neste primeiro encontro demonstrou o interesse delas

em conhecer mais uma possível alternativa de renda para as propriedades,

corroborando com a ideia de que as famílias da agricultura rural estão em constante

busca por alternativas.

Para melhor cumprir com as diretrizes do MB II e dar sequência nas

atividades, os agricultores se organizaram em grupo. Assim, teve início o Grupo

Nova Esperança. Constituído de maneira informal, ele não foi oficializado. As atas

foram arquivadas com os secretários do grupo e a presidência ficou ao encargo de

um dos agricultores presentes, que aceitou o desafio e se manteve na função até o

fim das atividades do grupo. Como equipe técnica de apoio e articulação, o grupo

contava com um técnico facilitador do MB II, além de um engenheiro agrônomo e um

extensionista da EPAGRI.

Desta forma, iniciou-se o processo de capacitação para a produção e

processamento de PM. As reuniões mensais do grupo tiveram início em dezembro

de 2005, com cerca de doze famílias presentes, número menor do que o da primeira

reunião. De acordo com o extensionista, a diminuição na participação não significou

desinteresse dos agricultores, mas insegurança perante o novo. O trabalho em

grupo era uma inovação para as famílias e o aspecto do cooperativismo e

protagonismo nas ações precisou ser trabalhado.

Desde a formação inicial, cinco famílias permaneceram no grupo a ponto de

produzir e comercializar as PM.

O extensionista acompanhou o desenvolvimento do grupo desde seu

embrião. Tomou a frente das reuniões mensais, com o aval do grupo. Organizou e

Page 88: (SC) - Cristiany Martins

87

conduziu-as, propôs pautas, delimitou áreas para o plantio, prospectou mercado e

trouxe os primeiros contatos comerciais até o grupo. Ele também proporcionou

treinamentos, capacitações e trouxe orientações técnicas. Tudo isto com o

acompanhamento e auxílio dos facilitadores da MB II, que trabalharam no projeto.

O primeiro ano serviu para a organização e planejamento de ações, tanto por

parte do grupo, quanto por parte dos apoiadores. A EPAGRI esteve à frente do

planejamento, realizado de acordo com a evolução do grupo, sem passos rígidos

pré-estabelecidos. Não houve produção naquele ano.

Para resgatar o uso das PM na comunidade e propiciar maior integração ao

grupo, foi realizada uma oficina de preparação de sabonetes, xaropes e infusões.

Ministrada na propriedade do casal de agricultores 1, pela própria agricultora, seguiu

os moldes das oficinas da Pastoral da Saúde, na qual o casal tem participação

voluntária.

Segundo o extensionista, além das reuniões mensais e da oficina citada, no

ano de 2006 foi realizada visita à propriedade modelo com PM em Canelinha (SC),

que contava com a EPAGRI Itajaí como parceira. Outra capacitação foi ministrada

pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), também na propriedade

dos entrevistados já citados. Nesta última, além de aprenderem sobre identificação e

utilização de algumas PM e sobre o cultivo, as famílias viram como construir um

pequeno secador caseiro a partir de uma secadora de roupas de varal. Outras

capacitações e visitas ocorreram, custeadas pelo MB II.

Quando começaram a estudar o cultivo das PM como uma alternativa, os

agricultores se depararam com a necessidade de adaptar as formas de cultivo ao

plantio em sistema agroecológico (uma novidade para a maioria), pois as plantas

medicinais não devem ser cultivadas com uso de agrotóxicos. Apenas o agricultor 1

e esposa possuíam algum conhecimento acerca do novo modo de cultivo.

Esta lacuna precisou ser superada com o repasse de técnicas e informações

por parte da equipe técnica. Enquanto capacitava os agricultores, a equipe de apoio

buscou informações que respaldassem técnica e comercialmente o grupo em sua

empreitada.

Foram estudadas quais culturas melhor se adaptariam aos fatores

edafoclimáticos da região e que também teriam viabilidade econômica. Após

descartar algumas opções, decidiu-se pela melissa (Melissa officinalis) como cultura

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88

de verão e pela camomila (Matricaria recutita) e calêndula (Calendula officinalis)

como culturas de inverno. Foi delimitada uma área de 1000m² para cada uma das

três plantas e mais uma área de igual dimensão para pousio. O grupo relata que

teve apoio técnico suficiente e encarou com naturalidade o desafio de se adaptar às

novas técnicas de produção:

Ficamo um ano e meio só em reunião, o que plantar o que não plantar, o que dá mais lucro. Optaram pela a melissa no verão e calêndula e camomila no inverno. (Agricultor 2)

Em 2007, as reuniões mensais continuaram na forma de rodízio nas casas

dos agricultores. Mais visitas foram realizadas para verificar a produção e o processo

de secagem e comercialização de PM. Foram feitas, ainda, capacitações em

Agroecologia. Alguns integrantes do grupo participaram de outras capacitações,

como o Simpósio de Plantas Medicinais em Joinville e o Seminário de Agroecologia,

em Lages. Os agricultores que, antes faziam uso de agrotóxicos quando havia

necessidade, passaram por uma adaptação ao sistema agroecológico, aprendendo

a utilizar biofertilizantes, preparar e manejar o solo de forma adequada ao sistema.

As PM são, em sua maioria, comercializadas desidratadas (secas). Algumas

das vantagens da utilização do processo de secagem são: aumento da vida útil,

manutenção de qualidade dos componentes químicos e menor volume e peso para

o transporte. Para atingir estas condições, a secagem deve ser realizada a baixas

temperaturas.

O MB II custeou algumas visitas de participantes do grupo e técnicos para

conhecer equipamentos que poderiam servir como modelo para o projeto.

Como já citado anteriormente, o grupo precisou decidir sobre a construção do

secador, que teria seus materiais custeados pelo MB II. Após deliberar e não se

chegar a um consenso de onde deveria ser construído o secador, os agricultores

optaram por dividir a verba igualmente entre as famílias. Cada família providenciou

seu próprio equipamento, dentro das suas possibilidades. Duas estufas foram

construídas, uma em alvenaria e outra em madeira. Outras três foram adaptadas em

cômodos das casas dos agricultores (Figuras 5 a 10).

Neste ponto, os dados levam ao entendimento de que as condições

financeiras variam entre os agricultores, sendo um empecilho maior para alguns

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investirem em processos que agregam maior valor aos produtos a serem

comercializados.

Figuras 5 e 6 – Construção de estufa em madeira para secagem de Plantas Medicinais

Fonte: acervo pessoal do agricultor 2 (2007)

Figuras 7 e 8 – Estufa para secagem de Plantas Medicinais em alvenaria

Fonte: acervo pessoal do extensionista da EPAGRI (2008)

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Figuras 9 e 10 – Estufa de secagem adaptada em cômodo da residência da agricultora 3

Fonte: Arquivo pessoal do extensionista da EPAGRI (2007)

Neste ponto, os dados levam ao entendimento de que as condições

financeiras variam entre os agricultores, sendo um empecilho maior para alguns

investirem em processos que agregam maior valor aos produtos a serem

comercializados.

Quanto à visão que os integrantes do grupo tiveram acerca da importância do

MB II para o andamento do projeto, existem opiniões diversas. Alguns agricultores

reconhecem o MB II como propiciador do conhecimento técnico. Outros citam que o

MB II concedeu pouca ajuda em recursos financeiros ao grupo. A alta rotatividade

dos técnicos facilitadores também foi citada como um fator negativo. São exemplos

das falas dos agricultores que ilustram estas afirmações:

No grupo de medicinais, o primeiro plantio que foi feito, foi com recurso do MB que foi comprado as sementes pra esses plantios [...] Também ajudou na orientação, que os técnicos eram pagos pelo MB. Ajudaram na assistência técnica, também no início da comercialização. Levando e também programando essas visitas técnicas que a gente fez. (agricultora 3) [Auxílio] financeiro, não tinha. Era pra vir um dinheiro, mas não veio.[...] O governo [estadual] liberava lá o dinheiro, não sei quantos mil por projeto. Mas pro grupo não veio nada. Ganhemo umas muda de melissa, só veio um pouco, acho que era uns vinte e cinco reais [por agricultor], era só uma diferença. (agricultor 2) Disse que ia ganhar um secador [para secar as PM], tinha que fazer um secador só pro grupo. Tinha que entrar em consenso e decidir onde e como que ia ser feito [...] daí virou em nada. Daí a gente resolveu dividir o dinheiro e cada um ia fazer o seu [secador]. (agricultor 2)

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Dinheiro não chegava [...] nem pra paga nossas muda.Tinha o microbacia, mas não funcionou [...] Minhas muda de melissa, a microbacia ia pagar. Pagou nada. Eu tive que pagar [...] Tinha muita gente esperta [...] (agricultor 1) Isso [o facilitador] trocava a cada passo. Teve um que foi o primeiro. Entrou uma, não sabia nada. Perguntava de medicinais, ela dizia que não sabia. Teve muita rotatividade. O outro era bom. (agricultor 2)

No decorrer da pesquisa, não se teve acesso a registros dos recursos que

chegaram de fato até o grupo. Percebe-se, entretanto, que o nível de compreensão

acerca dos objetivos e formas de operação do MB II divergem entre os agricultores.

Com os agricultores devidamente capacitados e as estufas providenciadas,

iniciou-se o plantio. No primeiro ano, as mudas e sementes não foram produzidas

pelos agricultores. Eles receberam um pequeno custeio do MB II para arcar com

parte das mudas e sementes.

A camomila e a calêndula foram as primeiras a serem plantadas. As maiores

dificuldades, segundo os agricultores, foram enfrentadas com a camomila, até que

se chegasse a um modelo de plantio e colheita satisfatórios. Neste primeiro ano,

quando foi semeada “a lanço” (Figura 11), conforme descrição do grupo, a colheita

foi muito trabalhosa. A planta era pisoteada à medida que se avançava a colheita.

Como ambas as plantas são baixas e somente as flores devem ser colhidas, a

ergonomia era prejudicada.

[...] camomila era difícil semear. A semente é bem ‘pequeninha’, semeava com umas ‘peneirinha’. (Agricultor 2 e sua mãe) No começo, o que dava serviço muito era a camomila, nós não ‘tinha’ como colher ela e eles queriam só a flor, foi difícil pra nós ‘colher’ aquilo lá. (Agricultor 4)

Logo após a colheita, iniciava-se o processo de seleção e separação em

bandejas, sendo que a calêndula era cortada ao meio para facilitar a secagem.

Alguns integrantes relataram que tiveram dificuldades com a secagem das plantas,

pois o secador não operou da maneira mais correta, como foi o caso do agricultor 5.

Pelos relatos dos agricultores, percebe-se que alguns tiveram mais facilidade

em realizar o processo de secagem e até se identificaram com o processo, enquanto

outros tiveram dificuldade e/ou citaram a secagem como um empecilho ao cultivo de

PM:

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92

Secar não era tão trabalhoso. Era coisa boa de fazer. Se fosse só secar, sem precisar ir pra roça, eu só secava. (Agricultora 3) Medicinal você tinha que providenciar lenha pra secar, daí no inverno tinha que levantar de noite várias vezes, no frio pra colocar lenha. (Agricultor 2) Eu levantava uma vez só a noite pra por um pau de lenha. Que tinha que ser três dias, dia e noite. Não podia passar de 40 graus. A gente já sabia como era, tinha uma janelinha, um termômetro, a gente nem precisava entrar lá pra ver [...]A secagem não era problema, é menos exigência que o fumo. [...] Eu gostava de lidar, eu senti a gente ter que parar. (Agricultor 1 e esposa) A minha [estufa] não funcionou direito. Eu fiz depois [do restante do grupo]. Eles tinham ido fazer visita, viram como fazia [a construção da estufa]. Eu copiei deles. (Agricultor 5)

Figura 11 – Primeira colheita de camomila, semeada a lanço

Fonte: arquivo pessoal do agricultor (2007)

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93

Figura 12 – Bandejas com calêndula, prontas para o início da secagem.

Fonte: arquivo pessoal do agricultor 2 (2007)

Figura 13 – Calêndula florescida e pronta para a colheita na propriedade

Fonte: arquivo pessoal do extensionista da EPAGRI (2008)

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94

Após a colheita das culturas de inverno, procedeu-se o plantio da melissa,

para a safra de verão. Os relatos dos agricultores demonstram que a melissa teve

uma boa aceitação pelo grupo, apesar de os agricultores 3 e 5 relatarem que

gostavam muito de trabalhar com a calêndula também.

A melissa foi a única PM que todos os agricultores do grupo cultivaram. Foi

também a de maior produção.

No início da comercialização, os produtores do grupo vendiam a melissa in

natura (sem passar pelo processo de secagem), para uma ervateira do município,

que a secava e adicionava à erva-mate para preparo da tradicional bebida

chimarrão. Dos cinco participantes da pesquisa, 80% tiveram a melissa como a

cultura de PM preferida, em termos de cultivo, comercialização, margem de lucro,

principalmente quando esta não precisava sofrer o processo de secagem para

comercializar.

Figura 14 – Preparação da área de plantio de melissa com adubação verde pronta para o corte.

Fonte: arquivo pessoal do agricultor 2 (2008)

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95

Figura 15 – Área preparada com a palhada da adubação verde recebendo as mudas de melissa.

Fonte: arquivo pessoal do agricultor 2 (2008)

Figura 16 – Melissa pronta para a colheita

Fonte: arquivo pessoal do extensionista (2010)

O grupo se fortaleceu à medida que os componentes precisaram um do outro

para encontrar soluções para problemas inesperados, ou para agilizar alguma etapa.

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96

Segundo os entrevistados, o grupo, apesar de algumas diferenças pessoais,

conseguia trabalhar bem em conjunto e isto não era um problema.

A camomila proporcionou ao grupo desenvolvimento de habilidades para

solucionar problemas, ocorridos no primeiro plantio. A semeadura foi realizada em

faixas com espaçamento e não mais a lanço, para evitar o pisoteamento. A

germinação foi melhorada com a compactação da terra logo após semear. Os

agricultores também projetaram e construíram um equipamento adequado à colheita

da camomila, que havia sido realizada de maneira lenta e não ergonômica na

primeira safra:

[...] camomila, por exemplo, que a gente não sabia: tinha que semear e depois compactar [a terra], senão ela não nascia. A gente não sabia. Daí a gente teve que inventar um rolo lá com uma tora, pra compactar, isso a gente aprendeu com os técnicos do Microbacias. (Agricultora 3) Antes era com os dedo, assim, ficava o dia inteiro e não colhia nada [...] daí inventaram um negócio lá. Aquele dava certo. [...] Nós ‘levava’ na mão. Era um carrinho com umas ‘roda’ de bicicleta, uma caixa, uns garfos na frente. Ia puxando e caia dentro da caixa. (Agricultor 4, sobre o equipamento construído pelo agricultor 2, com a ajuda de um tio)

O grupo também executou algumas tarefas em conjunto, como o caso das

mudas de calêndula que foram preparadas em 2008 na propriedade do Agricultor 4.

Apenas o agricultor 2 decidiu fazer as mudas sozinho, decisão que foi respeitada

pelo grupo. Outro exemplo é o caso da troca de dias para colheita da melissa. Como

a produção da PM dava maior rendimento, os agricultores se revezavam na colheita

entre as propriedades:

As mudas de calêndula chegaram a fazer juntos [...] nós achava que era melhor fazer aqui mesmo, pra não ficar puxando. Daí, às vezes, passava da hora de plantar, ou ficava muito grande as muda [...] (Agricultor 2) Eu ia lá, ajudava ele a colher, depois ele vinha aqui e me ajudava. (Agricultor 4) A melissa que apurava mais. Na época da melissa tinha que pegar até gente pra cortar [...] [nós] trocava serviço. Uns iam pra cá, depois iam pra lá. (Agricultor 2) Teve uma vez que um deles teve um problema de saúde e estava na época da colheita. O grupo se reuniu, foi até a propriedade e fez a colheita para ele. (Extensionista)

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97

Figura 17 – Adaptação do plantio de camomila na segunda safra - 2008

Fonte: arquivo pessoal do extensionista (2008)

Figura 18 – Colhedor de camomila desenvolvido por participantes do Grupo Nova Esperança

Fonte: arquivo pessoal do extensionista (2008)

Embora tenha realizado tarefas em conjunto, o grupo não demonstrou estar

preparado ou ter capacidade para evoluir a uma associação mais organizada em

termos de gestão. Até mesmo no que tange a decisões de organização do grupo

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98

com respeito aos processos, as decisões priorizaram ações individualizadas, a

exemplo da construção de secadores para cada propriedade, em detrimento da

baixa produção do grupo.

Sobre a cadeia de comercialização e o desenvolvimento do mercado, a

equipe técnica tomou a frente dos contatos. O mercado era prospectado e, quando

identificado um comprador interessado nos produtos, o contato era repassado para o

grupo, que fazia as negociações e a comercialização propriamente dita. Algumas

dificuldades neste ponto, apontadas pelo extensionista, eram a distância e até

mesmo o custo das ligações, minimizadas quando a EPAGRI disponibilizou a linha

telefônica do escritório para que o grupo concretizasse as negociações. No grupo,

quem assumiu a frente das finalizações foi seu presidente. Os entrevistados não

relataram problema em conseguir comprador para seus produtos. Salientaram a

questão da quantidade produzida que, mesmo no montante geral, era irrisória.

Quanto a este aspecto, a solução seria plantar uma área maior e para isso seria

necessário contar com mais mão de obra, que não estava disponível na esfera

familiar.

[...] e as medicinais é assim: tem gente que quer pouco e tem gente que quer bastante. Por isso que tem que trabalhar em grupo, porque se você trabalha sozinho e a pessoa quer 500 Kg, você não consegue atender. Por isso que o grupo era interessante. (Agricultor 2) [...] que lugar de vender tem. Quanto mais quantidade tiver, mais fácil de vender. Se tivesse de bastante, tonelada... até folhas colhidas no mato se vende. Até folha de Eucalipto se vende. (Agricultor 1)

Embora utilizassem as técnicas agroecológicas de cultivo, os agricultores do

grupo não possuíam nenhuma certificação que atestasse a qualidade orgânica dos

produtos comercializados. Este fato, segundo relato de três entrevistados

participantes do grupo, foi entrave na comercialização para alguns fornecedores,

que exigiam o selo. Segundo o extensionista, de certa forma, por serem um grupo

pequeno e por terem pouco volume para comercializar, o fato de não possuírem o

selo não foi de tamanha interferência, pois o grupo ainda encontrava empresas que

utilizavam PM sem esta exigência. As empresas que tinham o selo como um

requisito para o fornecimento, normalmente queriam comprar volumes maiores. Dois

integrantes do grupo acreditam que a rentabilidade poderia aumentar atrelada ao

selo. Independente disto, o grupo procurou uma certificação, conforme consta em

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99

ata. Estava em vias de obtê-la, em meados de 2010, quando o grupo foi se

dissolvendo:

Só que a nossa agricultura aqui, antes, não era agroecológica. Então, nós tava começando a trabalhar agroecologia junto, por causa das medicinais. Então a gente não conseguiu vender com o certificado de agroecológico. [...] a gente vendia pra outros que não exigiam. Mas chegou um momento que a gente já não conseguia (Agricultora 3). Nós já tava chegando no selo. A cada três meses tinha reunião, lá em Irineópolis. Eu ia a todas as reunião. No começo a facilitadora ia com nós, depois era só eu quase [...] (Agricultor 2).

A produção de PM do grupo encontrou escoamento por meio da venda direta

para empresas catarinenses processadoras de produtos naturais e alimentícios, e

erva mate. Tais empresas estão situadas em Canoinhas, Palhoça, Gravatal, Três

Barras e São Bento do Sul.

Quanto ao retorno financeiro da comercialização das PM, existem diferentes

opiniões nos relatos. Dos cinco agricultores entrevistados, quatro (80%) relataram

que a renda era insatisfatória e um dos agricultores relatou o contrário (20%). Para

ele, a renda das medicinais era suficiente para manter a família no campo e retornar

os investimentos sobre a atividade produtiva. Relata que teve retorno, inclusive,

sobre o investimento feito na construção da estufa e bandejas:

Na época era o que a gente tinha de renda. [...] A nossa aqui dava, se cuidasse dava. Mas o pessoal, daí, tinha uns que tiravam pouco. Mas a nossa era boa, a gente sempre produziu bem. Nunca deu pra dizer que não produziu. (...) alguns [outros agricultores] não tinham terreno [adequado], outros não queriam trabalhá. Daí, dava pouco lucro. Eles queriam começar e que desse lucro. O pessoal queria começar já ganhando um monte, começar grande. Isso não é bem assim, vai devagar. (Agricultor 2) O retorno que a gente teve economicamente com as PM não foi o que a gente esperava [...] se dependesse só das PM, a gente tinha passado fome. (Agricultora 3)

Na propriedade do entrevistado 1, as plantas medicinais, ainda presentes no

quintal e perpassando a propriedade, fizeram parte das alternativas da propriedade

por cinco anos, quando um problema de saúde os impediu de continuar o cultivo.

Mesmo assim, segundo o entrevistado e sua esposa, as plantas medicinais não

representaram parte significativa da renda familiar:

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100

Nunca dependimo das medicinais, nunca vivemos disso. Dava um dinheirinho, mas não era aquela coisa. E era um pedacinho de terreno.

Comparando a renda que obtinha com as PM e a opção atual pelo pepino, a

agricultora 3 afirma que não teve o retorno financeiro que precisava para se manter

no cultivo das PM e que o pepino gerava um retorno satisfatório:

[...] Porque o pepino dá uma renda boa em uma área pequena. Se fosse pra eu fazer a roça em tudo esse quadro aqui em baixo – plantar feijão, ou milho – quem sabe nem ia dar toda a renda desse pedacinho com pepino. O lucro líquido é melhor. Dá trabalho, mas dá retorno. São três meses, é a produção do pepino e ainda tem a alternativa de fazer a safrinha do pepino. Este ano eu não vou fazer a safrinha porque eu vou plantar outras hortaliças. Vou fornecer pra prefeitura, pra merenda escolar. Já fiz o cadastro, tá tudo certinho, vou fornecer no projeto da prefeitura de comprar da agricultura familiar.

Na propriedade do agricultor 2, o pepino sucedeu as PM no cultivo somente

em 2011. O agricultor (que presidiu o grupo desde sua primeira reunião) e sua

família participaram de todas as visitas técnicas, reuniões, feiras comerciais e cursos

de capacitação. Foram os últimos a parar com as plantas medicinais. Foram também

os produtores a obter maior produtividade com as PM.

Segundo o extensionista da EPAGRI, a respeito do acompanhamento contábil

da produção de PM, realizado por dois anos, a melissa tinha maior rentabilidade. As

demais culturas precisavam ser trabalhadas. Ainda, pesquisas estavam sendo

realizadas para verificar outras culturas que pudessem substituí-las.

Sobre estas diferenças de produtividade e investimentos, relata o

extensionista que o agricultor 2 sempre “puxou o grupo”. Nem todas as propriedades

tinham terras suficientemente preparadas para o cultivo, o que pode justificar o

destaque da propriedade 2 no rendimento de produção:

A produtividade do grupo estava dentro da média que a gente encontrava nas literaturas, estava dentro do esperado. O agricultor 2 tinha a terra mais fértil, mais bem preparada. Nada que, com o tempo, não desse pra melhorar a fertilidade nas demais. Mas ele sempre foi o top do grupo. Até por uma questão de fôlego financeiro, a gente percebia que ele tinha um pouco mais. Mas os demais se eforçavam. O agricultor 4, por exemplo, tudo o que se orientava, ele fazia. Ele seguia muito o agricultor 2.

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101

Os entrevistados relataram os principais motivos que os levaram a parar de

plantar medicinais. Dentre eles estão problemas de saúde (agricultor 1), problemas

com a comercialização, envolvendo atraso nos pagamentos e dificuldade em

conseguir as contra notas (agricultor 2) e renda insatisfatória (agricultores 3, 4 e 5):

[...] quando vc busca uma alternativa de renda, vc trabalha, trabalha e no final não vê a renda, vc acaba desistindo daquilo, né. (Agricultora 3)

Além do retorno financeiro insuficiente, a agricultora 3 também relatou outros

motivos que a levaram a desistir das PM, como conciliar os serviços domésticos e o

cuidado com os filhos, atrelados à desaprovação do marido pela escolha das

medicinais:

[...] pra mim foi um risco grande, porque o meu marido não se interessou. Eu tinha que lidar com as PM, vaca, casa, marido, filho. Tudo sozinha [...] Na verdade, bem nesta época era a época que o feijão estava indo bem e meu marido tinha uma loucura por plantio de feijão. Então, ele dizia, porque vc vai insistir numa coisa que não tá indo bem se outras coisas tão dando bem, que nem o feijão tá?

Como houve certa rotatividade no apoio técnico, principalmente no que

tange aos facilitadores do MB II que prestavam atendimento ao grupo, todos os

agricultores entrevistados citaram o extensionista da EPAGRI como esteio e

propulsor do grupo. No final de 2009, já no terceiro ano de produção de PM pelo

Grupo Nova Esperança, este anunciou que dentro de alguns meses precisaria se

ausentar, por motivos pessoais.

No período subsequente, ocorreu a investida na passagem gradativa do

protagonismo para o grupo. Em fevereiro de 2010, segundo as atas do grupo, foi a

última reunião com a participação do extensionista. Consta nesta ata, ainda, que a

prefeitura municipal e a EPAGRI dariam continuidade ao acompanhamento do

grupo. Este fato não se concretizou imediatamente, segundo relatos de alguns dos

entrevistados. Esta assertiva corrobora com o registro das atas do grupo, no qual

consta que, em julho de 2010, um novo representante da entidade se apresentou ao

grupo, cinco meses após a saída do anterior.

Com a leitura das atas de 2010, novos nomes apareceram como participantes

do grupo, provavelmente de agricultores que estavam buscando alternativas e

verificando se iriam partir para o cultivo de PM. Houve um início de plantio em uma

comunidade próxima denominada de Paula Pereira, mas sem registros de que

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102

tivesse havido a comercialização juntamente com o grupo do Matão. Estes nomes

não apareceram durante as entrevistas e não foram incluídos na pesquisa.

O grupo cita a saída do extensionista como motivo para a desarticulação e fim

do grupo. A rotatividade e interrupção, mesmo que temporária, dos serviços de apoio

técnico às famílias rurais em processo de aprendizado e imersão em um novo modo

de trabalho, bem como de programas governamentais, como o MB II, exposto neste

estudo, prejudicam o fortalecimento dos elos com o grupo e entre o grupo.

Instituições voltadas ao desenvolvimento do meio rural precisam atentar a este fator

e criar mecanismos que minimizem estes efeitos.

Voltar a cultivar medicinais como alternativa de renda não faz parte dos

planos dos quatro entrevistados que se mantêm no cultivo de pepino. Os

agricultores 4 e 5 se mostraram mais receptivos à ideia de retorno às PM,

principalmente se fosse para trabalhar somente com a melissa, descartando o

plantio da camomila e da calêndula. Porém, citaram a dificuldade na secagem como

um empecilho:

A melissa, se a empresa [ervateira de Canoinhas] tivesse continuado comprando, eu tava até hoje [cultivando]. Se alguém comprasse verde, eu plantava. (Agricultor 5)

Os mesmos entrevistados expuseram a necessidade de suporte técnico e

logístico na questão da secagem. A ideia que surgiu por parte de ambos os

entrevistados consistia em construir um secador para o grupo, em local de fácil

acesso, que funcionasse devidamente. Tal ideia expõe a fragilidade do grupo e

demonstra que alguns membros do grupo tenham tido suas necessidades mais

atendidas, em detrimento de outros, até mesmo por falta de consenso.

O agricultor 2 não se mostrou interessado em trocar a atual situação por uma

nova tentativa com PM. O mesmo desinteresse esteve presente na fala da

agricultora 3 durante quase toda a entrevista. Entretanto, em um momento final da

entrevista, falando sobre uma possibilidade de melhorar o preço de venda das PM,

com um projeto mais estruturado, abre uma brecha: “A gente tá sempre buscando

alternativa” (Agricultora 3).

Os agricultores 4 e 5 citaram outras motivações que os aproximariam de um

retorno ao cultivo de PM: a produção sem o uso de agrotóxicos (agricultores 4 e 5),

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103

fator negativo no cultivo do pepino; o fato de ser agradável cultivar PM. Porém, o

cultivo das PM só seria cogitado novamente mediante garantia de retorno financeiro.

Além do trabalho em grupo ter sido uma inovação para as famílias, que

desconheciam os meandros do associativismo e protagonismo nas ações, outro

fator que pode ter influenciado no menor número de famílias presentes é a falta de

uma proposta inicial de produção atrelada a um contrato de comercialização, caso

muito comum nas pequenas propriedades da região que trabalham com a cultura

tabageira.

Corrobora com esta assertiva o estudo realizado por Uba (2012) acerca da

produção de tabaco na região. Em sua pesquisa com agricultores familiares de

Monte Castelo (SC) – município pertencente ao Planalto Norte Catarinense, próximo

a Canoinhas – o pesquisador afirma que, ao longo do tempo, foi-se criando uma

homogeneidade produtiva, ditada pelo pacote tecnológico presente nos acordos

comerciais firmados entre produtor e agroindústria:

[...] os produtores produziam tabaco da mesma maneira, uma vez que seguiam o que estava determinado pelo pacote tecnológico, que incluía assistência técnica individualizada, planejamento de produção, definição de insumos e produtos a serem aplicados à lavoura, incentivos econômicos e instrumentos financeiros e jurídicos de estímulo, controle e punição.

No entender de Uba (2012), a “cultura do fumo” foi incorporada à vida dos

agricultores a ponto de ser distintiva do modo de vida do agricultor monte-

castelense. Partindo deste ponto e tecendo uma correlação entre este agricultor e o

agricultor familiar canoinhense, pressupõe-se que este se sente mais seguro em

arriscar novas alternativas mediante modos de produção semelhantes ao da “cultura

do fumo”.

Apesar de o fumo ser a cultura de maior volume entre as propriedades da

agricultura familiar do município de Canoinhas e da suposta incorporação do modo

de produção inerente a ela à vida dos agricultores, nas propriedades pesquisadas

não se registrou a presença do fumo como opção de renda.

Percebe-se que o aspecto gerencial do grupo não foi priorizado em toda a

sequência de ações proporcionadas ao grupo. A tentativa final de promover a

autogerência do grupo foi insatisfatória, pois, apesar da continuidade das reuniões

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104

registradas em atas, percebe-se mensalmente menor participação de integrantes do

grupo, até a extinção do mesmo.

Para o extensionista, os principais motivos para o término do grupo e o fim do

plantio das PM foram o fato de a cadeia produtiva ainda não estar fortalecida na

região; o grupo ter sido pequeno, bem como as áreas cultivadas – o que propicia

certas fragilidades; as práticas de manejo diferenciadas que tiveram que ser

aprendidas e adaptadas; e os apoiadores (EPAGRI e MB II) terem assumido a frente

em algumas situações iniciais do grupo e demorado a soltar as rédeas para que o

grupo desenvolvesse seus próprios percursos:

Faltou aparecer o protagonismo dos agricultores, mesmo eu tendo me afastado, se o grupo tivesse se fortalecido e se estruturado para o protagonismo das ações, não teria terminado.

Apreende-se que o protagonismo do grupo estava em estágio embrionário. O

potencial do presidente do grupo em despontar como ator principal era iminente,

mas dependia da motivação do grupo que já não estava satisfeito economicamente

com os resultados das safras de PM. Ainda sobre o fim do grupo, pressupõe-se que

a pouca experiência dos agricultores ao trabalho em conjunto dificultou o

desenvolvimento de habilidades na busca da melhor forma de evoluir enquanto tal. A

falta de um plano de trabalho dos apoiadores, devidamente delineado, prevendo as

etapas até chegar à autogestão pode ter sido um fator que contribuiu à interrupção

das atividades do grupo.

O fato de todos os agricultores terem migrado para a mesma cultura na

sequência à experiência com as PM leva a entender que o trabalho conjunto se

dissolveu enquanto grupo de medicinais; porém, continuam a existir semelhanças

socioculturais que os aproximam e os levam a confiar e se espelhar uns nos outros,

na tentativa de reproduzir experiências de sucesso.

Percebe-se, até este ponto, que os agricultores familiares da comunidade de

Matão estão em constante busca por alternativas que melhor correspondam às suas

expectativas sociais econômicas e culturais. O projeto de PM com os agricultores do

Grupo Nova Esperança foi delineado concomitantemente à formação do grupo o que

pode ter gerado insegurança, levando poucos agricultores a se sentirem confiantes

em investir nesta proposta.

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105

Os agricultores precisam de alternativas mais concretas, que apresentem

maior garantia do necessário retorno financeiro. Este fato fica evidente pela atual

opção do cultivo de pepino, atrelado a empresas que garantem a compra da

produção.

Preceitos da PNPMF são percebidos nos anseios dos agricultores, que

almejam permanecer no campo. Ainda, eles percebem o cultivo de PM e o pacote

tecnológico nele inserido - sem agrotóxicos - como promotores de melhor qualidade

de vida. Porém, a investida dos agricultores no cultivo de PM não ocorreu devido à

ação planejada a partir das políticas públicas federais evidenciadas neste estudo. A

experiência do grupo, com auxílio da EPAGRI/MB II, não suscitou no município

outras investidas, que poderiam agregar volume e alavancar a cadeia de PM na

região.

Das cultivares selecionadas para o grupo trabalhar, a melissa se mostrou a

opção mais viável por sua produtividade e manejo. Esta PM pode ser considerada

como uma possibilidade para o agricultor familiar da região, apesar de ser uma

espécie exógena. Atenta-se para o fato de que a biodiversidade da FOM apresenta

outras alternativas que podem ser pesquisadas quanto à viabilidade edafoclimática e

comercial, que podem ainda servir como forma de aproveitar remanescentes

florestais de preservação obrigatória dentro das propriedades.

O fomento financeiro, citado pelos entrevistados como um percalço e

deficiente à época de existência do grupo, passou por ajustes nas políticas públicas

afins. A terceira fase do Projeto Microbacias, denominado SC Rural, que apresenta

novas formas de fomento a grupos, anteriormente inexistentes, é um desses

exemplos.

Outra possibilidade de fomento mais recente diz respeito ao Edital da

Secretaria de Ciência e Tecnologia e Insumos Estratégicos do MS, para fomento a

Arranjos Produtivos Locais (APL) em plantas medicinais e fitoterápicos. Lançado em

2012, tem sido relançado anualmente. Qualquer cidadão pode enviar projetos, e

inclusive os municípios têm sido contemplados. Dados de 2013 do MS

demonstraram que, por falta de aprovação de projetos, neste mesmo ano cerca de

seis milhões de reais desta rubrica retornaram à União (BRASIL, 2013).

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106

Mais uma forma oficial de captação de recursos é representada pelo

Programa Nacional de Desenvolvimento Sustentável de Territórios Rurais –

PRONAT. O Ministério do Desenvolvimento Agrário, por intermédio deste programa,

é o gestor e responsável por selecionar projetos que recebem recursos financeiros

da CEF25. Pode-se concluir que, por parte do Governo Federal, as PP de PM estão

sendo postas em prática, havendo pendência na contrapartida dos municípios.

Contudo, a existência de fontes de fomento disponíveis não significa o amplo

acesso dos agricultores familiares. Para ser efetivo, cabe aos apoiadores,

facilitadores e sociedade organizada com ênfase nestes agricultores a tarefa de

transmitir estas informações, instruir as famílias e acompanhar o processo.

Frente ao exposto, mais atores capacitados estão presentes no município e

precisam se comprometer em aplicar as políticas agrárias disponíveis, que

necessitam ser pensadas e repensadas com e para os agricultores familiares.

25

http://www1.caixa.gov.br/gov/gov_social/municipal/assistencia_tecnica/produtos/repasses/pronat/saiba_mais.asp

Page 108: (SC) - Cristiany Martins

107

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A década de 1980 trouxe inúmeros avanços às políticas públicas e sociais,

condensados na Constituição de 1988, considerada a Constituição Cidadã. A saúde,

oficialmente tratada como Direito do Cidadão, passa a ser concebida tal qual a

definição da VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986, como

“resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio

ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e

acesso aos serviços de saúde. Sendo assim, é principalmente resultado das formas

de organização social, de produção, as quais podem gerar grandes desigualdades

nos níveis de vida” (BRASIL, 1986).

Data de 22 de junho de 2006 o Decreto Lei nº 5813, que cria a Política

Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, 18 anos após a promulgação da

Constituição Cidadã. Conforme registrado no decurso do texto, políticas públicas

sociais devem ser analisadas no horizonte dos contextos e das opções político-

econômicas que, muitas vezes, extrapolam os limites do território local, regional e

nacional, considerando a formação sócio-histórica brasileira e os vínculos

estabelecidos com outros países, sobretudo aqueles de capitalismo central.

Para qualquer que seja a Política Pública analisada, parte-se do princípio da

gestão e desenvolvimento inclusivo, agregador, sustentável, focado nos interesses

populares, que considera e salvaguarda os saberes e poderes locais e, via de regra,

estabelece resistência ao modelo oposto. Por outro lado, ações políticas possuem o

viés de gerar avanços lucrativos que, quando considerados prioritariamente, nem

sempre atentam para os desdobramentos destas ações. Especificamente em

relação às políticas de saúde e agrárias, às quais a PNPMF está diretamente

vinculada, evidenciou-se no estudo o embate entre diferentes interesses, propostas

e modelos de gestão e desenvolvimento, inerente ao modelo estabelecido nesta

sociedade.

As Políticas Públicas denotam as intenções de um governo e representam

decisões que visam reduzir os efeitos da descontinuidade administrativa ao apontar

rumos e linhas estratégicas de atuação, por meio do planejamento de programas,

projetos e ações, como proposto na PNPMF (BRASIL, 2006b). A efetivação de uma

Política Municipal de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, nestes termos, significa a

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108

opção por um modelo de desenvolvimento regional que prioriza as potencialidades

naturais ou latentes no município, extrapolando o aspecto econômico e, quiçá,

rompendo com interesses econômicos extraterritoriais.

Os relatos coletados em pesquisa de campo e as reflexões efetuadas no

decorrer da revisão bibliográfica e documental evidenciaram tratar-se de um embate

entre o direito, a inclusão, universalização e ações focalizadas, descontinuadas e

excludentes.

Quanto à esfera do desenvolvimento rural, isto ocorre não em virtude do

desconhecimento legal ou de limitação de ordem técnica, mas pelos interesses

hegemônicos e pela configuração político-econômica do município, prioritariamente

focalizada em cultivar monoculturas.

O PMDRS, elaborado como norteador de ações com prazos estabelecidos

para sua concretização no município no que tange às PM, não se consolidou de

maneira satisfatória. Embora ações pontuais tenham sido empreendidas com

relativo sucesso, a meta principal de lançar as PM como alternativa para o agricultor

familiar não foi alcançada. Considere-se que apenas a monocultura do fumo,

marcadamente atrelada no município ao pequeno agricultor, representa 67% do PIB

agrícola do município.

Conclui-se que as PM fazem parte do cenário canoinhense. O fato de ter

havido no município um grupo de agricultores que atuaram por quatro anos na

produção e comercialização de PM, traz experiências que precisam ser

consideradas em futuras investidas neste campo. Enquanto alternativa de renda

estratégica para o município em PM, o grupo teve sua atuação interrompida antes

de atingir maturidade, sem poder contar com uma cadeia bem estabelecida,

sofrendo as consequências de ações focalistas.

Com intuito de contribuir com planejamentos futuros relacionados às PM,

destacam-se a seguir as limitações e possibilidades vivenciadas pelo Grupo Nova

Esperança e apreendidas das experiências relatadas no município de Canoinhas

com PM.

Ressaltam-se as características das PM enquanto cultura agrícola,

associadas à estrutura das propriedades da agricultura familiar envolvidas. As PM

necessitam de cultivo orgânico ou agroecológico, manuseio com cuidados quanto a

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109

contaminações e teor de princípios ativos e secagem para armazenamento. Estas

necessidades, atreladas à parca mão de obra e a faixa etária relativamente

avançada tornam as PM uma alternativa pouco atrativa, quando desmembradas de

um planejamento bem estruturado.

Ainda, como limitações estão:

- necessidade de qualificação e infraestrutura para processar as PM;

- inexperiência dos agricultores familiares quanto ao trabalho associado;

- inexistência de cadeia integrada envolvendo desde produção, qualificação,

fomento financeiro, processamento para agregação de valor até comercialização;

- distância dos centros de comercialização;

- rotatividade dos técnicos de apoio;

- pouca capacidade de investimento por parte dos agricultores;

- falta de fomento e incentivo na esfera municipal;

- volume pequeno produzido;

- pouca rentabilidade em algumas culturas;

- limitado estudo das espécies elencáveis para plantio adaptadas à região;

- insuficiência no desenvolvimento das características de liderança e

autogestionamento do grupo.

Tais aspectos tomados como limitações podem ser trabalhados e

desenvolvidos para que se tornem fortes a ponto de viabilizar e balizar as PM como

fonte de renda para os agricultores familiares do município.

Já os aspectos positivos a destacar incluem:

- disponibilidade e interesse dos agricultores aos desafios que se

apresentaram;

- rentabilidade no cultivo da melissa;

- presença de ervateiras que utilizam PM em alguns produtos comercializados

no município e região;

- apoio técnico e treinamentos proporcionados pelas entidades de apoio.

- biodiversidade da FOM;

- presença de entidades técnico-científicas das esferas estadual e federal,

como EPAGRI, EMBRAPA, UnC e IFSC;

- a possibilidade de participar de editais de fomento de APL de PM e

fitoterápicos, disponibilizadas por meio das Políticas Públicas atreladas ao governo

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federal, que abre possibilidades aos municípios, em conjunto com parceiros

interessados (da esfera pública ou privada), para a execução de projetos envolvendo

toda a cadeia comercial, inclusive com possibilidade de aplicação conjunta à área da

saúde.

Em suma, a carência de alternativas viáveis e articuladas de renda para os

agricultores familiares do município ainda é latente, como foi destacado nas

discussões junto aos articuladores e agricultores pesquisados.

As PM apresentam potencialidades para cobrir algumas destas lacunas, no

que tange ao Desenvolvimento Rural do município. Uma delas é organizar a cadeia

de dentro para fora, formando parcerias com as já referidas entidades

representativas atuantes em nível local, agregando valor à produção de PM colhidas

no município, transformando-as de matéria-prima de base a ingredientes mais

elaborados e padronizados, como tinturas, óleos essências, dentre outros.

Pelo viés da saúde, quando se considera o conceito firmado pela VIII

Conferência Nacional de Saúde, torna-se claro que as condições econômicas,

sociais e culturais geram demandas de saúde às quais a Política pode apresentar

soluções ou representar resistência ao modelo hegemônico, amparado na cura.

Depreende-se disso a importância do presente trabalho: sinalizar para a

necessidade de discussão e construção de alternativas, que sejam coletivamente

delineadas.

A consolidação e efetivação da PNPMF e do Programa Municipal de PMF no

município, pelo que a pesquisa conduz a concluir, ainda não ocorreu. Muito embora

tenha havido um louvável movimento no sentido de antecipação à lei, traduzido em

um documento intitulado Programa Municipal de Plantas Bioativas, as ações foram

descontinuadas e paralisadas em virtude de divergências e insuficiências técnicas e

estruturais, assim como parco estímulo e envolvimento dos diversos segmentos que,

desde o princípio, poderiam garantir sua continuidade.

Tomando o desenvolvimento como um processo dinâmico, que carrega

consigo o esforço local, evidencia-se que a implementação e priorização da PNPMF

depende de mudanças estruturais que estão além dos programas e políticas de

saúde, já que a opção político-econômica do município direciona-se a outras

prioridades.

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Sem considerar a formação sócio-histórica e as opções político-econômicas

até o momento tomadas, o município de Canoinhas possui promissoras condições

alternativas de desenvolvimento socioeconômico e enfrentamento das

racionalidades técnicas envolvidas no processo de saúde exclusivamente em curso;

devido, entre outros fatores, à riqueza natural que o caracteriza e aos saberes que

configuram a cultura popular.

Desta forma, a criação e implementação da PNPMF no município é uma

possibilidade e, acredita-se, um mecanismo de desenvolvimento regional. Os

delimites e as continuidades desta política dependem não somente da vontade

política daqueles que se encontram em cargos eletivos na gestão municipal, mas da

pressão popular fundamentada em uma análise técnica séria e aprofundada sobre

quais são os caminhos político-econômicos alternativos, naturalmente colocados ou

potencialmente existentes no município, que possam substituir e superar os atuais.

Este estímulo pode ocorrer por meio do legislativo, como foi o caso do

PMPMF “Vitalina de Lima” (CANOINHAS, 2010) ou pela sociedade civil organizada.

Também pelas instituições de ensino, pesquisa e extensão, de diferentes formas,

dentre elas na formação técnica propriamente dita, na criação de projetos de

extensão que valorizem essa proposta diferenciada de desenvolvimento regional, e

no estabelecimento de vínculos com os diversos atores sociais que dão suporte à

construção desta realidade, ainda incipiente no município.

O município de Canoinhas (SC) foi pioneiro no Planalto Norte Catarinense por

apresentar a legislação que instituiu o PMPMF “com o objetivo de proporcionar à

população acesso a medicamentos naturais eficazes, com orientação e uso

corretos” (CANOINHAS, 2010), referendando a PNPMF. Decorridos cinco anos da

sua aprovação, contudo, não existe um planejamento em vigor, em nenhuma esfera

municipal que o coloquem em prática.

Em suma, esta pesquisa apontou limites e possibilidades das plantas

medicinais diante da realidade do município de Canoinhas (SC), assinalando frentes

de desenvolvimento principalmente para as áreas da saúde e agricultura.

Embora não fosse objetivo direto da pesquisa, a importância das dimensões

cultural e simbólica relacionadas às PM no município de Canoinhas, evidenciou-se

neste estudo. As PM integram, de modo geral, a cultura da população, nos termos

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que Thompson (1991) apresenta como tradição oral transmitida de geração em

geração ao longo do tempo, pertencente ao domínio oral. O autor trabalha o

conceito de cultura não como componente da superestrutura ou, como outros

marxistas, mero reflexo do nível econômico, mas como “[...] um conjunto de

diferentes recursos em que há sempre uma troca entre o escrito e o oral, o

dominante e o subordinado, a aldeia e a metrópole. É uma área de elementos

conflitivos [...]” (THOMPSON, 1991). Para ele, o conflito de classe se manifesta

também no campo dos saberes constituídos pelas classes.

O registro e especificidade das tradições culturais presentes no município, em

relação às PM, não foram aprofundados nesta pesquisa. Não obstante, é notório que

a cultura representa, muitas vezes, resistência ao saber e poder hegemonicamente

constituídos ou, conforme compreende Bourdieu (2008), a cultura é o elemento que

pode simultaneamente acrescentar e separar, ou unificar e distinguir do ambiente

externo. Neste aspecto, registra-se a importância de estudos futuros com enfoque

na interface entre as PM e a cultura local.

Uma segunda sugestão para futuras pesquisas inclui as PM nativas da FOM

que integram o rol de PM permitidas pela ANVISA, já citadas anteriormente, como a

espinheira santa (Maytenus ilicifolia), a carqueja (Baccharis trimera) e o guaco

(Mikania glomerata). As plantas nativas podem ser um elo entre o tradicional e o

legal, ampliando as opções de exploração sustentável da biodiversidade nas

propriedades familiares e servindo de estímulo ao desenvolvimento da cadeia de PM

na região.

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APÊNDICES

APÊNDICE A

TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO1

1 Identificação do Projeto de Pesquisa

Título do Projeto: Plantas medicinais: limites e possibilidades ao desenvolvimento do município de Canoinhas (SC)

Área do Conhecimento: multidisciplinar

Curso: Mestrado em Desenvolvimento Regional

Número total de sujeitos: quinze

Patrocinador da pesquisa:UnC

Instituição onde será realizado:UnCCanoinhas

Nome dos pesquisadores e colaboradores:CristianyMartins, JairoMarchesan

2 Identificação do Sujeito da Pesquisa

Nome:

Data de Nascimento:

Naturalidade/Nacionallidade:

Estado Civil: Profissão:

CPF:

Endereço:

Telefone: E-mail:

3 Identificação do Pesquisador Responsável

Nome: JairoMarchesan

Profissão: Geógrafo / Professor do Programa de Mestrado em Desenvolvimento RegionalUnC

Endereço: Rua RobertoEhlke, 86–Canoinhas (SC) CEP89460-000

Telefone: (47)3622 6696

E-mail:[email protected]

4 Identificação do Pesquisador Principal

Nome:CristianyMartins

Profissão: Farmacêutica / Professora

N. do Registro no Conselho: CRF(SC) 6228

Endereço: RuaEstanislauSchivinski, 52–Alto da Palmeiras, Canoinhas (SC) CEP 89460-000

Telefone: (47) 9955 0636 / 3622 6500

E-mail: [email protected]

Eu, Cristiany Martins, estou desenvolvendo a pesquisa Plantas medicinais: limites e possibilidades ao desenvolvimento do município de Canoinhas (SC), orientada pelo Prof. Dr. Jairo Marchesan, para a Dissertação de Mestrado em Desenvolvimento Regional da UnC. Esta pesquisa tem por objetivo analisar o nível de conhecimento e implantação das políticas públicas e programas, bem como o desenvolvimento da cadeia produtiva, de plantas medicinais, no município de Canoinhas (SC). Serão realizadas entrevistas, dirigidas aos profissionais que atuam ou atuaram em atividades com plantas medicinais no município de Canoinhas (SC), inseridos na gestão municipal, na produção e comercialização de plantas medicinais e nas ações de Atenção Primária à Saúde, visando conhecer as particularidades deste meio.

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Serão solicitados dados pessoais, de formação e de atuação profissional. Sob seu consentimento, a entrevista será gravada para maior fidedignidade na transcrição das informações, cujos tópicos principais serão também anotados. A qualquer momento a entrevista poderá ser interrompida ou não ser gravada, se assim o solicitar. Trata-se de um estudo experimental em que não há benefícios diretos aos participantes (sujeitos) e também não há despesas de nenhuma natureza para os mesmos. As informações serão utilizadas eticamente e os resultados da pesquisa poderão ser publicados, garantindo o anonimato dos entrevistados. Os resultados atualizados estarão disponíveis para seu conhecimento durante a pesquisa e após a mesma, ainda que isso venha a afetar a sua vontade de participação. Para obter mais informações, sanar dúvidas sobre a pesquisa e/ou retirar seu consentimento a qualquer momento que desejar, contate os pesquisadores (acima identificados) ou o Comitê de Ética em Pesquisa da UnC - CEP, com endereço na Av. Presidente Nereu Ramos, 1071- bairro Jardim do Moinho, Mafra (SC), telefone (47) 3641-5513, [email protected]. Se você leu atenciosamente este documento, discutiu e se sente adequadamente esclarecido da natureza do propósito desta entrevista, peço que assine o Termo de Consentimento abaixo. Atenciosamente,

Eu, ______________________________________________________, CPF ______________________, sujeito da pesquisa, considero-me suficientemente esclarecido sobre minha participação como voluntário na pesquisa acima descrita. Discuti com a pesquisadora responsável sobre minha decisão e concordo de livre e espontânea vontade em participar desta pesquisa. Declaro que obtive todas as informações necessárias e esclarecimento quanto às dúvidas por mim apresentadas e, por estar de acordo, assino o presente documento em duas vias de igual teor (conteúdo) e forma, ficando uma em minha posse.

_________________, ___ de ______________ de 201__.

________________________

Assinatura do entrevistado(sujeito)

_____________________

Prof. Dr. JairoMarchesan

Orientador / PesquisadorResponsável

Testemunhas:

________________________

CristianyMartins

Mestranda/PesquisadoraPrincipal

________________________

RG:

CPF/MF:

Telefone:

___________________________:

RG:

CPF/MF:

Telefone

_____________________________ 1 Adaptado de ANTONIO, G.D. Fitoterapia na atenção primária à saúde: interação de saberes e práticas de cuidado.

Florianópolis, 2013, 302f. Tese (Programa de Pós-graduação em Saúde Coletiva da Universidade Federal de Santa Catarina, nível doutorado. Florianópolis, 2013). Disponível em: <https://repositorio.ufsc.br/xmlui/handle/123456789/123015>. Acesso em 03 de setembro de 2014.

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APÊNDICE B

Instrumento de Coleta de Dados para Gestores Públicos (saúde, desenvolvimento

rural e educação)

Universidade do Contestado – UnC

Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional

Questionário no._______ Data da entrevista: __________

Dados do entrevistado:

Nome: ______________________________________________________________ Empresa/Secretaria/órgão:______________________________________________ Cargo / função: _______________________________________________________ Formação: __________________________________________________________ e-mail: ____________________________________ Fone: ____________________ Questões chave: 1. O que você conhece sobre as políticas e programas a respeito de plantas

medicinais e fitoterápicos?

2. Qual a importância das plantas medicinais e/ou fitoterápicos para o desenvolvimento do município de Canoinhas?

3. Qual a importância das plantas medicinais e/ou fitoterápicos para ações no setor em que atua?

4. No órgão em que você atua, quais atividades com plantas medicinais estão contempladas em planejamento específico?

5. Quem do seu setor participa de grupo voltado à discussão das políticas e programas sobre plantas medicinais?

6. Quais as possibilidades que você vislumbra para a implantação destas políticas e programas no município de Canoinhas?

7. Quais as limitações que você vislumbra para a implantação destas políticas e programas no município de Canoinhas?

8. Sobre políticas e programas de plantas medicinais e fitoterápicos, cite as principais ações desenvolvidas pelo seu setor (ação, data, forma de registro, responsável).

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APÊNDICE C

Instrumento de Coleta de Dados para Agricultores que Atuam ou Atuaram com

Plantas Medicinais em Canoinhas (SC)

Universidade do Contestado – UnC

Programa de Mestrado em Desenvolvimento Regional

Questionário no. Data da entrevista: __________

Identificação do entrevistado (principal responsável pela propriedade):

Nome: _____________________________________________________________

End.: ______________________________________________________________

Formação: ____________________________ Gen: ( )M ( )F Idade: _____

e-mail: ____________________________________ Fone: ____________________

Caracterização da propriedade: 1. Número total de membros na família:

________________________________________ 2. Quem reside na propriedade (pessoas/parentesco)? Descreva as principais tarefas:

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________ 3. Quantos assalariados emprega? ( ) 1 fixo ( ) 2 ou mais fixos ( ) temporários ( ) nenhum

4. Utiliza agrotóxicos na propriedade?

( ) em toda ( ) só em parte

( ) utilizo defensivos compatíveis com agric. orgânica, mas não sou certificado

( ) propr. certificada orgânicos ( ) propr. agroecológica certificada

5. Utiliza o PRONAF? ( ) sim ( ) não 6. Quanto da subsistência da família vem da propriedade?

( ) menos da metade do que necessitamos

( ) mais da metade do que necessitamos

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( ) metade do que necessitamos

7. Quais os principais produtos comercializados pela propriedade?

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

___________________________________________________________________

8. Faz parte de associação ou grupo de produtores? ( ) não ( )sim, descreva:

___________________________________________________________________

Questões norteadoras

9. Quais plantas medicinais você ou sua família conhecem e utilizam como

remédio?

10. Qual a importância econômica e de geração de renda das plantas medicinais,

para sua propriedade?

11. Quais plantas medicinais você comercializa/comercializou? De que forma?

12. Como foi que começou com a produção de Plantas Medicinais? Houve incentivo

ou algum auxílio?

13. Para quem você vende/vendia? Como se deu este processo de comercialização?

14. Como poderia ser estimulada a produção de plantas medicinais na sua

propriedade.

15. Quem você acha que seriam os responsáveis por essa ação?

16. Como você se capacitou sobre as formas de produção, armazenamento e

comercialização de plantas medicinais?

17. Que outras formas de capacitação / curso / instrução você recebeu sobre plantas

medicinais? Quem forneceu e quais eram os temas?

18. Quais os problemas que precisam de solução para que as plantas medicinais

façam parte dos produtos produzidos e comercializados pela sua propriedade?

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ANEXOS

ANEXO A – Lei 4.565/2010

LEI nº 4.565/2010 Institui o Programa Municipal de Plantas Medicinais e Fitoterápicos “Vitalina de Lima” e dá outras providências

O Povo do Município de Canoinhas, por seus representantes na Câmara de Vereadores aprovou, e eu, Leoberto Weinert, Prefeito Municipal, em seu nome, sanciono a seguinte: L E I Art. 1º Fica criado no Município de Canoinhas o Programa Municipal de Produção de Fitoterápicos e Plantas Medicinais “Vitalina de Lima”, com o objetivo de proporcionar à população acesso a medicamentos naturais eficazes, com orientação e uso corretos.

§ 1º Para os efeitos desta Lei, consideram-se medicamentos fitoterápicos aqueles resultantes de procedimentos realizados através do uso de plantas medicinais frescas ou dessecadas, sob a forma de infusões, tinturas, xaropes, pós, supositórios, pomadas, cremes, elixires, cápsulas gelatinosas, entre outras.

§ 2° Nos casos omissos nesta Lei o Município se utilizará das Diretrizes da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.

§ 3º Terão prioridade na produção de plantas medicinais e

fitoterápicos os pequenos produtores rurais (agricultura familiar), em especial aqueles que forneçam matéria-prima seguindo os preceitos da agricultura orgânica ou natural. Art. 2° São Objetivos do Programa Municipal de Produção de Fitoterápicos e Plantas Medicinais: 1. - Objetivo geral: garantir à população o acesso seguro e o uso de plantas medicinais através do SUS, promover o uso sustentável da biodiversidade e o desenvolvimento da cadeia produtiva. 2. - Objetivos específicos:

I. –Implantar o serviço de plantas medicinais no Município através da rede pública de saúde;

II. - ampliar as opções terapêuticas aos usuários da rede pública de saúde, possibilitando acesso às plantas medicinais, com segurança, eficácia e qualidade, respeitando os princípios do SUS, sabedoria popular e nos padrões que rege o Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos (PNPMF);

III. - construir o marco regulatório para a produção, manipulação e dispensação de plantas medicinais e fitoterápicos, a partir dos modelos e experiências bem sucedidas nacionais ou internacionais;

IV. - promover pesquisas, desenvolvimento de tecnologias e inovações com plantas medicinais , nas diversas fases da cadeia produtiva;

V. - promover o uso sustentável da cadeia produtiva, considerando a preservação da biodiversidade;e o manejo sustentável em áreas de reserva legal e áreas de preservação permanente;

VI. – incentivar e promover a capacitação de leigos nas diversas comunidades visando a produção sustentável e o uso correto de plantas medicinais na prevenção e promoção à saúde.

VII. – resgatar o saber popular e incentivar a produção e o uso correto de plantas medicinais e remédios caseiros dentro de princípios de boas normas de produção;

VIII. – criar e manter locais apropriados para a produção e manutenção de plantas medicinais (hortos);

IX. – promover e facilitar, através do programa de educação permanente, a formação e a atualização dos profissionais de saúde envolvidos com o programa de plantas medicinais da rede pública de saúde;

X. – criar um centro de plantas medicinais e fitoterápicos com a finalidade de fazer cumprir as normas reguladoras das políticas de normas integrativas e complementares com controle de qualidade da cadeia produtiva.

XI. – promover e exercer controle fitosanitário com a finalidade de assegurar a sanidade e qualidade da matéria prima vegetal a ser utilizada no programa municipal de plantas medicinais.

Art. 3° São diretrizes do Programa Municipal de Produção de Fitoterápicos e Plantas Medicinais, a serem desenvolvidas pela Prefeitura Municipal:

I. - Regulamentar e incentivar o cultivo, o manejo sustentável, a produção, a dispensação e o uso de plantas medicinais e fitoterápicos, dentro dos princípios das boas normas de produção;

II. - Promover através do processo de educação permanente a formação técnico-científica, capacitação e atualização dos profissionais (equipe multiprofissionais) da rede pública de saúde envolvidos no programa de dispensação de plantas;

III. - Divulgar e informar aos profissionais de saúde, gestores e

usuários os conhecimentos sobre plantas medicinais , considerando as metodologias participativas e o saber popular;

IV. - Promover a interação entre o setor público, escolas de ensino básico/médio e técnico, comunidades organizadas, universidades, centros de pesquisa e organizações não- governamentais na área de plantas medicinais e desenvolvimento de fitoterápicos.

V. - Reconhecer e promover as práticas populares seguras de uso de plantas medicinais e remédios caseiros.

VI. - Promover o conhecimento tradicional sobre plantas medicinais e incentivar o uso sustentável da biodiversidade, nos diversos segmentos da sociedade e níveis escolares;

VII. - Promover a inclusão da agricultura familiar, rural e urbana nas cadeias e nos arranjos produtivos das plantas medicinais, insumos com ênfase na agroecologia.

VIII. - Incentivar a produção local de plantas medicinais, agregando valores e direcionar para a demanda na fabricação de fitoterápicos pelo município.

IX. - Organizar e equipar dentro das normas sanitárias, laboratório para o recebimento e estocagem de matéria prima (plantas medicinais), manipulação de fitoterápicos, estocagem e dispensação do produto final.

X. - Fortalecer o programa de plantas medicinais e fitoterápicos, mantendo um processo de atualização constante de toda cadeia produtiva na intenção de preservar a qualidade do produto final.

XI. – Identificar demandas e adequar a utilização de plantas medicinais e fitoterápicos distribuídos na rede pública de saúde, de acordo com o perfil epidemiológico da população em consonância com a farmacopéia nacional ou outras validadas pela ANVISA;

XII. – Envolver os profissionais da rede pública incentivando a pesquisa cientifica com fitoterápicos e plantas medicinais, com base na biodiversidade regional e de acordo com a demanda e perfil epidemiológico do município.

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XIII. - Regulamentar e incentivar o cultivo, o manejo sustentável, a produção, a dispensação e o uso de plantas medicinais, dentro dos principio das boas normas de produção;

XIV. - Desenvolver o programa de acordo com a regulamentação do manejo sustentável e produção/cultivo de plantas medicinais que incentive o fomento, a organização e o associativismo e à difusão da agricultura familiar e urbana, das agroindústrias de plantas medicinais;

XV. – produzir as ervas medicinais e dispensar na rede pública de saúde conforme normas técnicas vigentes pela ANVISA, através do código sanitário;

XVI. – Elaborar protocolo de dispensação de plantas medicinais efitoterápicos para servirem de orientação para as equipes multiprofissionais

XVII. - Promover através do processo de educação permanente a formação técnico-científica, capacitação e atualização dos profissionais (equipe multiprofissionais) da rede pública de saúde envolvidos no programa de dispensação de fitoterápicos.

XVIII. - Fortalecer e integrar as redes de assistência técnica e de capacitação administrativa de apoio à cadeia produtiva de plantas medicinais e fitoterápicos;

XIX. – Envolver e integrar os órgãos de ensino que atuam na formação técnica/cientifica e social no processo de desenvolvimento do Programa Municipal de Plantas Medicinais e Fitoterápicos;

XX. – Incentivar e apoiar a participação de grupos organizados da sociedade no processo de aprimoramento do uso de plantas medicinais e fitoterápicos e fórum do setor.

XXI. - Divulgar e informar aos profissionais de saúde, gestores e usuários os conhecimentos sobre plantas medicinais e fitoterápicos, considerando as metodologias participativas e o saber popular;

XXII. – Promover debates com os vários segmentos da sociedade, gestores públicos e escolas de ensino das redes pública e privada, incentivando o resgate do saber popular;

XXIII. – Criar canais de informação com relação ao uso de plantas medicinais e fitoterápicos, utilizando linguagem e metodologias adequadas a cada segmento da população a ser beneficiada;

XXIV. - Apoiar eventos na área de plantas medicinais e fitoterápicos, buscando parceiros para otimizar a troca de experiências da cadeia produtiva;

XXV. – Criar memento para dispensação de plantas medicinais e fitoterápicos a ser utilizados pelas equipes de multiprofissionais da rede pública de saúde;

XXVI. – Elaborar protocolo de dispensação de plantas medicinais e fitoterápicos visando sua utilização pelas equipes multiprofissionais da rede pública de saúde.

XXVII. - Promover a interação entre o setor público, escolas de ensino básico/médio e técnico, comunidades organizadas, universidades, centros de pesquisa e organizações não- governamentais na área de plantas medicinais e desenvolvimento de fitoterápicos.

XXVIII. – Apoiar e incentivar os profissionais da rede pública envolvidos na pesquisa cientifica com plantas medicinais;

XXIX. – Identificar e promover a interação dos centros de pesquisas de plantas medicinais existentes na região;

XXX. – Incentivar a realização de parcerias em projetos depesquisas com plantas medicinais.

XXXI. – Incentivar a construção e manutenção de hortas deplantas medicinais nas escolas da rede pública.

XXXII. - Garantir a segurança, a qualidade e o acesso as plantas medicinais XXXIII - Promover o uso racional de plantas medicinais considerando a preservação da biodiversidade;

XXXIV. – Prestar rigoroso controle fitosanitário da cadeia produtiva de plantas medicinais e fitoterápicos com o objetivo de produzir um produto final de qualidade superior;

XXXV. – Monitoramento permanente através de análise laboratoriais dos marcadores ativos;

XXXVI. – Nomear responsável técnico capacitado para o acompanhamento à produção de ervas medicinais;

XXXVII. – Adequar a produção de ervas medicinais de acordo com a demanda da rede pública de saúde.

XXXVIII. – Ampliar a capacitação sobre fitoterápicos e plantas medicinais dos profissionais do SUS favorecendo a divulgação e o uso correto dos mesmos.

XXXIX. - Reconhecer e promover as práticas populares seguras de uso de plantas medicinais e remédios caseiros.

XL. - Criar parcerias do governo com movimentos sociais e produtores de plantas medicinais visando o uso sustentável da biodiversidade e a preservação do meio ambiente;

XLI. - Identificar e implantar mecanismos de validação/reconhecimento que levem em conta os diferentes sistemas de conhecimento (tradicional/popular X técnico-cientifico);

XLII. - Promover ações de salvaguarda do patrimônio cultural relacionado às plantas medicinais (transmissão do conhecimento tradicional entre gerações);

XLIII. - Apoiar as iniciativas populares que preservem as boas normas de conduta no uso de plantas medicinais e remédios caseiros;

XLIV. - Criar bancos de dados resgatando conhecimento popular sobre plantas medicinais;

XLV. – Promover através de entidades de ensino conveniadas cursos de aprendizagem sobre o manejo de plantas medicinais para leigos, produtores e demais segmentos da sociedade;

XLVI. – Criar e manter horto educativo de plantas medicinais;

XLVII. – Criar viveiros de mudas de plantas medicinais com matrizes de boa procedência para dispensação ao produtor.

XLVIII. - Promover o conhecimento tradicional sobre plantas medicinais e incentivar o uso sustentável da biodiversidade, nos diversos segmentos da sociedade e níveis escolares;

XLIX. – Apoiar as iniciativas setoriais que concorram para a disseminação da cultura de preservação do conhecimento popular sobre plantas medicinais;

L. - Facilitar e apoiar a implementação dos instrumentos legais relacionados à proteção dos conhecimentos tradicionais e científicos do uso de plantas medicinais e fitoterápicos;

LI. - Integrar as iniciativas governamentais e não-governamentaisrelacionadas à proteção dos conhecimentos tradicionais associados ao uso de plantas medicinais e fitoterápicos;

LII. – Elaborar projeto de inclusão do uso de plantas medicinais no ensino fundamental.

LIII. - Promover a inclusão da agricultura familiar, rural e urbana nas cadeias e nos arranjos produtivos das plantas medicinais, insumos com ênfase na agroecologia.

LIV. - Estimular a produção de plantas medicinais, insumos e fitoterápicos, considerando a agricultura familiar e urbana como componente dessa cadeia produtiva;

LV. - Estabelecer mecanismos de financiamento para estruturação e capacitação contínua da rede ATER ( Assistência Técnica de Extensão Rural);

LVI. - Promover e apoiar as iniciativas de produção e de comercialização de plantas medicinais e insumos da agricultura familiar e urbana.

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LVII. - Incentivar a produção local de plantas medicinais, agregando valores e direcionar para a demanda na fabricação de fitoterápicos pelo município.

LVIII. - Incentivar a agricultura familiar de plantas medicinais para servirem de matéria prima para a produção de fitoterápicos pelo município;

LIX. - fomentar o marketing do uso de plantas medicinais e a dispensação por parte das equipes multiprofissionais que atuam na rede pública de saúde;

LX. - fornecer assessoria aos produtores rurais e urbanos no manejo de plantas medicinais através de órgãos competentes;

LXI. – promover a cultura de plantas medicinais e condimentares, utilizando os meios de comunicação;

LXII. - criar um canal permanente de comunicação com as várias secretárias municipais, principalmente a de educação, com intuito de resgatar e divulgar o saber popular sobre plantas medicinais;

LXIII. - Organizar e equipar dentro das normas sanitárias, laboratório para o recebimento e estocagem de matéria prima (plantas medicinais), manipulação de fitoterápicos, estocagem e dispensação do produto final. a. – planejar e estruturar o laboratório municipal de manipulação,para a produção de fitoterápicos, de acordo com a demanda do município; b. – buscar junto aos órgãos municipais, estaduais e federal,verbas para a construção e aquisição de equipamentos para o laboratório de manipulação de fitoterápicos; c. – definir responsabilidade técnica do laboratório municipal de fitoterápico. Art. 4° Cabe ao Município:

I - Fortalecer o programa de plantas medicinais e fitoterápicos, mantendo um processo de atualização constante de toda cadeia produtiva na intenção de preservar a qualidade do produto final. a. estabelecer mecanismos creditícios e tributários adequados à estruturação das cadeias e dos arranjos produtivos de plantas medicinais e fitoterápicos; b. - estabelecer mecanismos para distribuição dos recursos destinados ao desenvolvimento regional da cadeia produtiva de fitoterápicos; c. - realizar análise prospectiva da capacidade instalada na região; d. - definir critérios diferenciados para alocação e distribuição dos recursos orçamentários e financeiros destinados às cadeias produtivas de fitoterápicos; e. - Selecionar projetos estratégicos na área de plantas medicinais e fitoterápicos, visando ao investimento em projetos pilotos;

II. - Utilização do poder de compra do município na área da saúde para o fortalecimento da produção de ervas medicinais.

III. - Identificar demandas e adequar a utilização de plantas medicinais e fitoterápicos distribuídos na rede pública de saúde, de acordo com o perfil epidemiológico da população em consonância com a farmacopéia nacional ou outras validadas pela ANVISA;

a. – analisar o perfil epidemiológico do município e demanda da

população local com relação ao uso de plantas medicinais; b. - buscar adequar o uso popular ao perfil epidemiológico; c. – listar as plantas medicinais e fitoterápicos a serem dispensados na rede pública de saúde, levando em conta a demanda e o perfil epidemiológico em concordância com

a farmacopéia brasileira ou outras validadas pela ANVISA; d. – fortalecer e incrementar o momento básico sempre que

assim exigir a demanda e a alteração do perfil epidemiológico; e. - Manter a produção municipal de ervas medicinais constante,

de acordo com a demanda e sazonalidade; f. - Adequar e controlar a produção agrícola de plantas

medicinais para a produção ininterrupta de ervas medicinais . IV - Envolver os profissionais da rede pública

incentivando a pesquisa cientifica com fitoterápicos e plantas medicinais, com base na biodiversidade regional e de acordo com a demanda e perfil epidemiológico do município.

a. – Incentivar o profissional da rede pública na elaboração de

pesquisas envolvendo o uso de plantas medicinais e fitoterápicos;

b. – apoiar financeiramente projetos de pesquisas com plantas

medicinais. Art. 5º Será realizado monitoramento e avaliação

das ações da Política Municipal de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, através da criação da Comissão de ética e pesquisa conforme a resolução nº 196/96 do Conselho Nacional de Saúde, que deverá criar instrumentos adequados à mensuração de resultados desta política além de incentivar parcerias técnicas com os vários setores da sociedade envolvidos com a implantação do programa de Plantas Medicinais e Fitoterápicos.

Art. 6° Fica instituído Grupo de Trabalho para elaborar, no prazo de cento e oitenta dias, contados da publicação desta Lei, o Programa Municipal de Plantas Medicinais e Fitoterápicos. §1º - O Grupo de Trabalho será constituído por:

I – Secretária da Saúde (saúde da família, vigilância sanitária, farmácia) II– Secretaria municipal de desenvolvimento agropecuário

III. – Rede ECOVIDA de agroecologia; IV. – Pastoral da Saúde;

V- Entidades religiosas idôneas que desenvolvam trabalhos com plantas medicinais;

VI. – Secretaria Municipal de Educação, Universidades, UNC,

UFSC,IF-SC e outras que desenvolvam pesquisa na área; VII. – Epagri – Empresa de Pesquisa

Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina;

VIII. – FUNDEMA – Fundação Municipal do Meio Ambiente;

IX. – Entidades governamentais e não governamentais que desenvolvam pesquisas e trabalhos na área.

X. – Conselho Municipal de Saúde § 2º O coordenador e os membros do Grupo de

Trabalho serão designados mediante indicação dos dirigentes máximos dos órgãos e entidades nele representados. §3º - O Grupo de Trabalho poderá:

I. - Constituir comissões e subgrupos de trabalho sobre temas específicos;

II. - Convidar profissionais liberais de notório saber na matéria ou especialistas de outros órgãos ou entidades e da sociedade civil para prestar assessoria às suas atividades.

4º - Caberá a Secretaria da Saúde prover o apoio administrativo e os meios necessários à execução das atividades do Grupo de Trabalho.

5º - A participação no Grupo de Trabalho será considerada prestação de serviço público relevante e não será remunerada.

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Art. 7º. As despesas decorrentes da aplicação

desta Lei correrão por conta de dotações constantes do orçamento vigente.

Art. 8º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.

Canoinhas, 07 de julho de 2010

Leoberto Weinert Prefeito João Grein Vereador Autor