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Page 1: Saúde coletiva uma “nova saúde pública” ou

32Universidade de São PauloFaculdade de Saúde Pública

VOLUME 32NÚMERO 4

JUNHO 1998

Revista de Saúde PúblicaJ O U R N A L O F P U B L I C H E A L T H

© Copyright Faculdade de Saúde Pública da USP. Proibida a reprodução mesmo que parcial sem a devida autorização do Editor Científico.Proibida a utilização de matérias para fins comerciais. All rights reserved.

p. 299-316

Artigo Especial Special Article

Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” ou campoaberto a novos paradigmas?

Collective health: a “new public health” or field opento new paradigms?

Jairnilson S. Paim e Naomar de Almeida FilhoInstituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia. Salvador, BA - Brasil

PAIN, Jairnilson S. e Naomar de Almeida Filho, Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” oucampo aberto a novos paradigmas? Rev. Saúde Pública, 32 (4): 299-316, 1998

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Artigo Especial Special Article

Saúde coletiva: uma “nova saúde pública” oucampo aberto a novos paradigmas?

Collective health: a “new public health” or field opento new paradigms?

Jairnilson S. Paim e Naomar de Almeida FilhoInstituto de Saúde Coletiva da Universidade Federal da Bahia. Salvador, BA - Brasil

Resumo

Trata-se de ensaio que apresenta um estudo exploratório da retóricaparadigmática da saúde com o objetivo de analisar os principais elementos dediscurso dos movimentos ideológicos que historicamente construíram o camposocial da saúde, particularmente na segunda metade do século XX. Sãodestacados os esforços empreendidos pela Organização Panamericana daSaúde para debater a teoria e a prática da saúde pública na região das Américascotejando-os com as demandas emergentes no contexto econômico, político esocial dos países latino-americanos. Neste particular, destaca-se a necessidadede construir uma agenda política comum, a partir da confluência de trêstemáticas - reforma setorial, “Renovação da Saúde para Todos” (RSPT) e “novasaúde pública”, contemplando os planos doutrinário, conceitual, metodológicoe operativo. Apresenta-se uma breve sistematização do marco conceitual dasaúde coletiva, em elaboração na América Latina, situando maisparticularmente as suas potencialidades de construção de um conhecimentotransdisciplinar. Conclui-se que, apesar de em si não constituir um paradigma,a saúde coletiva, enquanto movimento ideológico comprometido com atransformação social, apresenta possibilidades de articulação com novosparadigmas científicos capazes de abordar o objeto saúde-doença-cuidadorespeitando sua historicidade e integralidade.

Saúde pública, tendências. Medicina social.

Correspondência para/Correspondence to: Jairnilson S. Paim - Rua Padre Feijó, 29 – 4º andar - Canela - 40210-270 Salvador, BA - Brasil.E-mail: [email protected] em 23.1.1998. Reapresentado em 23.4.1998. Aprovado em 14.5.1998.

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Abstract

The present essay is an exploratory study of the historical and institutionalbackground of the so-called “crisis in public health”, aimed at identifying thenew trends and perspectives for the paradigmatic transformation of the healthfield in the context of the current international panorama of economic and cul-tural globalization. First, the rhetoric of health is analysed in historical per-spective, briefly considering the main elements of the discourse of the ideologi-cal movements that historically built the social field of health. Medical Police,Social Medicine and Public Health are included as representative of suchmovements in 19th century Western Europe. After the Flexnerian turn, thesemovements were followed by Preventive Medicine, Community Health, Pri-mary Health Care and Health Promotion, which dominated the scene particu-larly in the second half of the 20th century. The authors also summarise recentconcerted PAHO efforts to debate the theory and practice of Public Health inthe Americas, vis à vis the emerging demands of the economic, political andsocial context of Latin American countries. In this regard, the need for a com-mon political agenda is emphasized , with the convergence of three topics -sectorial reform, “Renovation of Health for All” and the “new public health”,covering the conceptual, methodological and operative domains. Secondly, abrief systematic account of the conceptual landmarks of the Collective Healthmovement, as carried through in the two last decades in Latin America, is pre-sented, focusing more particularly on its potential for building up both a do-main of transdisciplinary knowledge and a universe of practices. As a field ofknowledge, it contributes to the study of health-disease phenomena in popula-tions as a social process, investigating the production and distribution of dis-ease in society as an aspect of social reproduction, and analysing health prac-tices as a labor process integrated into the other social practices. As a universeof practices, Collective Health focuses on its models or action guidelines fourobjects of intervention: policies (forms of power distribution); practices (be-havior modification; culture; institutions; knowledge production; institutional,professional and relational practices); technologies (organization and regula-tion of productive resources and processes; bodies/environments), and instru-ments (means of production of interventions). Finally, it is concluded that, al-though not being in itself a paradigm, Collective Health, as a movement com-mitted to the social transformation of health, presents some possibilities of ar-ticulation with new scientific paradigms capable of approaching the health-disease-care object with due regard to its historicity and complexity.

Public health, trends. Social medicine.

INTRODUÇÃO

Nesta segunda metade do século XX, ahumanidade tem experimentado rápidas e profundastransformações em todas as esferas da vidaeconômica, cultural, social e política, talvez comonunca em sua história11,28,46. A internacionalização daprodução, distribuição e consumo, juntamente como avanço das tecnologias da informação, tem comoresultado a globalização da economia e suasconseqüências macroeconômicas: transnacionali-zação empresarial, desterritorialização da força detrabalho, desemprego estrutural, entre outras. Ao

mesmo tempo, verifica-se aumento das desigualdadesentre os povos e os grupos sociais, a eclosão demovimentos nacionalistas, a exacerbação dosconflitos étnicos, a agressão ao meio ambiente, adeterioração do espaço urbano, a intensificação daviolência e o desrespeito aos direitos humanos46.

No caso da saúde, o debate sobre as suas relaçõescom o desenvolvimento econômico e social quemarcou a década de sessenta amplia-se, nos anossetenta, para uma discussão sobre a extensão decobertura dos serviços. O reconhecimento do direitoà saúde e a responsabilidade da sociedade em garantiros cuidados básicos de saúde possibilitam oestabelecimento do célebre lema “Saúde para Todos

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no Ano 2000” (SPT-2000)85. Entretanto, enquanto aestratégia da atenção primária à saúde se difunde apartir da Conferência de Alma-Ata, os centroshegemônicos da economia mundial revalorizam omercado como mecanismo privilegiado para aalocação de recursos e questionam a responsabilidadeestatal na provisão de bens e serviços para oatendimento de necessidades sociais, inclusive saúde.A “nova ordem mundial” que se instaura na décadade oitenta, inspirada no neoliberalismo, provoca umamarcante fragilização dos esforços para oenfrentamento coletivo dos problemas de saúde.Particularmente, nos países de economia capitalistadependente, a opção pelo “estado mínimo” e o cortenos gastos públicos como resposta à chamada “crisefiscal do estado” em muito comprometem o âmbitoinstitucional conhecido como saúde pública.

Com base nesse quadro, constata-se uma “criseda saúde pública”, percebida de modo diferente pelosdistintos sujeitos atuantes neste camposocial28,33,39,46,60. Para a superação dessa crise, váriosaportes têm sido propostos, cada um deles apontandopara a necessidade de novos paradigmas no “campoda saúde pública”1.* Neste esforço, pode-se incluirdesde as iniciativas da Organização Panamericanada Saúde (OPS) de reavaliar a “teoria e prática dasaúde pública”65, até a proposição de uma Nova SaúdePública como parte do movimento de renovação daestratégia “saúde para todos”33,86, e ainda a iniciativado Banco Mundial de debater as “prioridades napesquisa & desenvolvimento em saúde”87.

Nesse contexto, faz-se necessário e urgentediscutir a questão da saúde no âmbito público-coletivo-social e as propostas de ação subseqüentes.No caso específico da América Latina, a emergêncianos últimos vinte anos de um campo que se designoucomo Saúde Coletiva61 permite a identificação depontos de encontro com os movimentos de renovaçãoda saúde pública institucionalizada, seja como campocientífico, seja como âmbito de práticas, e mesmocomo atividade profissional. Nessa perspectiva, aspropostas de consolidação do campo da saúde comoforma de superação da chamada “crise da saúdepública” podem significar uma oportunidade paraefetivamente incorporar o complexo “promoção-saúde-doença-cuidado” em uma nova perspectiva

paradigmática, aumentando assim a viabilidade dasmetas de Saúde Para Todos mediante políticaspúblicas saudáveis, através de maior e mais efetivaparticipação da sociedade nas questões da vida,saúde, sofrimento e morte.

Em pauta, encontra-se a necessidade deconstrução de um marco teórico-conceitual capaz dereconfigurar o campo social da saúde, atualizando-oface às evidências de esgotamento do paradigmacientífico que sustenta as suas práticas. No presentetexto, buscou-se compreender esse marco conceitualenquanto corpo doutrinário estruturador de um dadocampo científico (e seu paradigma dominante) e umâmbito de práticas. Trata-se de um estudoexploratório da retórica paradigmática do campo dasaúde, consubstanciada nas redes produtoras edifusoras dos seus elementos ideológicos. Pararealizá-lo, em primeiro lugar, analisa-seresumidamente os principais elementos de discursodos movimentos ideológicos que historicamenteconstruíram o campo social da saúde da II GuerraMundial até a conjuntura atual, em que se almejauma renovação das bases da saúde pública. Emseguida, apresenta-se uma tentativa de sistematizaçãodo marco conceitual da saúde coletiva, em construçãona América Latina, situando mais particularmente assuas potencialidades de constituição de umconhecimento transdisciplinar. Em conclusão,pretende-se propor que este movimento ideológicopode melhor se articular a novos paradigmascientíficos capazes de abordar o objeto complexosaúde-doença-cuidado respeitando sua historicidadee integralidade.

MOVIMENTOS NO CAMPO SOCIAL DASAÚDE

Terris (1992)81 atualiza a clássica definição desaúde pública elaborada por Winslow, na década devinte, nos seguintes termos: “a arte e a ciência deprevenir a doença e a incapacidade, prolongar a vidae promover a saúde física e mental mediante osesforços organizados da comunidade”. A partir dessaconcepção, esse autor prescreve quatro tarefasbásicas para a teoria e a prática de uma “Nova SaúdePública”: prevenção das doenças não infecciosas,

Observa-se cada vez mais uma ampliação do uso do termo paradigma para tratar de qualquer tipo de conhecimento humano e, de um modo ainda maisalargado, para referir-se a práticas sociais de qualquer natureza. Atualmente, pode-se encontrar desde uma equivalência do paradigma ao conceitoamplo de campo disciplinar, como na noção de “paradigma da saúde pública”, 1 até um tratamento mais regionalizado de paradigma no sentido da meraatitude perante uma instituição como, por exemplo, nos múltiplos usos que o termo vem adquirindo no campo das ciências da gestão77. Em nívelintermediário, no próprio campo da saúde, documentos oficiais de construção doutrinária têm feito uso do termo na conotação de modelo ou abordagemcomo, por exemplo, a noção de “paradigma da atenção primária à saúde”54. Como mencionado em outra oportunidade6, trata-se de utilização indevidade uma categoria cujo sentido técnico encontra-se razoavelmente estabelecido no campo teórico da filosofia da ciência, particularmente na abordagemde crítica histórica de Thomas Kuhn41.

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prevenção das doenças infecciosas, promoção dasaúde, melhoria da atenção médica e da reabilitação.

Frenk33 (1992) considera como campo deaplicação da “Nova Saúde Pública” as condições erespostas assentadas nas bases científicas das ciênciasbiológicas, sociais e comportamentais, tendo comoáreas de aplicação populações, problemas eprogramas. Para melhor delimitar o novo campocientífico, esse autor desenvolve uma tipologia dainvestigação em saúde, distinguindo os níveis deatuação individual e subindividual, onde seconcentram a pesquisa biomédica e a pesquisaclínica, em relação ao nível populacional que tomacomo objetos de análise as condições (pesquisaepidemiológica) e as respostas sociais frente aosproblemas de saúde (pesquisa em sistemas de saúde- políticas de saúde, organização de sistemas desaúde, investigação em serviços e recursos de saúde).

Testa83 (1992), ao analisar as respostas sociais nocampo da saúde pública, denomina “atençãoprimitiva à saúde” aquela adotada nos países quedispõem de serviços diferenciados para distintosgrupos sociais e que estão preocupados,fundamentalmente, em reduzir os gastos em saúdeorganizando serviços de segunda categoria para umapopulação considerada inferior. A partir de umareflexão sobre as políticas sociais82, e buscando oredimensionamento teórico da saúde como “campode força” e de aplicação da ciência, esse autorreconhece a saúde pública enquanto uma práticasocial, uma construção histórica, portanto.

A importante contribuição das abordagensetnográficas contemporâneas da prática científica,especialmente no contexto da chamada “viradahermenêutica”13, indica que os âmbitos da práticahumana não se configuram a partir de uma estruturaracional de base normativa ou prescritiva, nem pelavertente doxológica (da doutrina), com oestabelecimento de objetivos hetero-regulados, nempelo viés epistemológico formal. Em outras palavras,nem definições - mesmo aquelas exaustivas eobjetivas como por exemplo a definição Winslow-Terris, nem estruturas lógicas descritivas - como aclassificação de Frenk são capazes de dar conta doessencial dos campos científicos e seus respectivosâmbitos de prática. Mas se as proposições daspolíticas de saúde e as prescrições da saúde públicasão contextualizadas num “campo de força” comopode-se apreender a partir da crítica histórica deTesta, outros sentidos e significados podem serextraídos dessa retórica. Por isso, antes de analisaros elementos discursivos das novas propostas, énecessário uma contextualização das práticas e dos

discursos que, nos últimos cinqüenta anos, vêmconstituindo o campo social da saúde bem como seusefeitos sobre a estruturação dos discursos oficiaisnacionais e internacionais. Antes ainda, serãorepassadas brevemente as raízes históricas doselementos discursivos e pragmáticos dos movimentosideológicos do campo social da saúde.

A área da saúde, inevitavelmente referida aoâmbito coletivo-público-social, tem passadohistoricamente por sucessivos movimentos derecomposição das práticas sanitárias decorrentes dasdistintas articulações entre sociedade e Estado quedefinem, em cada conjuntura, as respostas sociais àsnecessidades e aos problemas de saúde. As basesdoutrinárias dos discursos sociais sobre a saúdeemergem na segunda metade do século XVIII, naEuropa Ocidental, em um processo histórico de disci-plinamento dos corpos e constituição das interven-ções sobre os sujeitos31,32. Por um lado, a higiene,enquanto conjunto de normatizações e preceitos aserem seguidos e aplicados em âmbito individual,produz um discurso sobre a boa saúde francamentecircunscrito à esfera moral. Por outro lado, aspropostas de uma política (ou polícia) médica estabe-lecem a responsabilidade do Estado como definidorde políticas, leis e regulamentos referentes à saúdeno coletivo e como agente fiscalizador da suaaplicação social, desta forma remetendo os discursose as práticas de saúde à instância jurídico-política70.

No século seguinte, os países europeus avançamum processo macrossocial da maior importânciahistórica: a Revolução Industrial, que produz umtremendo impacto sobre as condições de vida e desaúde das suas populações. Com a organização daclasses trabalhadoras e o aumento da sua participaçãopolítica, principalmente nos países que atingiram ummaior desenvolvimento das relações produtivas,como Inglaterra, França e Alemanha, rapidamenteincorporam-se temas relativos à saúde na pauta dasreivindicações dos movimentos sociais do período.Entre 1830 e 1880, surgem, nesses países, propostasde compreensão da crise sanitária comofundamentalmente um processo político e social que,em seu conjunto, receberam a denominação deMedicina Social70,78. Em síntese, postula-se nessemovimento que a medicina é política aplicada nocampo da saúde individual e que a política nada maisé que a aplicação da medicina no âmbito social,curando-se os males da sociedade. A participaçãopolítica é a principal estratégia de transformação darealidade de saúde, na expectativa de que dasrevoluções populares deveria resultar democracia,justiça e igualdade, principais determinantes da saúde

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social. Apesar de desbaratado no plano político, omovimento da medicina social gera importanteprodução doutrinária e conceitual que fornece asbases para os esforços subseqüentes de pensar aquestão da saúde na sociedade7,22,24,35,58,70,78.

Em paralelo, principalmente na Inglaterra e nosEstados Unidos, estrutura-se uma resposta a estaproblemática estreitamente integrada à ação doEstado no âmbito da saúde, constituindo ummovimento conhecido como Sanitarismo78. Em suamaioria funcionários das recém-implantadas agênciasoficiais de saúde e bem-estar, os sanitaristasproduzem um discurso e uma prática sobre asquestões da saúde fundamentalmente baseados emaplicação de tecnologia e em princípios deorganização racional para a expansão de atividadesprofiláticas (saneamento, imunização e controle devetores) destinadas principalmente aos pobres esetores excluídos da população24,35,78. O advento doparadigma microbiano nas ciências básicas da saúderepresenta um grande reforço ao movimentosanitarista que, em um processo de hegemonização,e já então batizado de saúde pública, praticamenteredefine as diretrizes da teoria e prática no campo dasaúde social no mundo ocidental22.

No início deste século, com o célebre RelatórioFlexner, desencadeia-se nos Estados Unidos umaprofunda reavaliação das bases científicas damedicina, que resulta na redefinição do ensino e daprática médica a partir de princípios tecnológicosrigorosos. Com sua ênfase no conhecimentoexperimental de base subindividual, provenientes dapesquisa básica realizada geralmente sobre doençasinfecciosas, o modelo conceitual flexneriano reforçaa separação entre individual e coletivo, privado epúblico, biológico e social, curativo e preventivo68.É nesse contexto que surgem as primeiras escolas desaúde pública contando com pesados investimentosde organismos como a Fundação Rockefeller ,inicialmente nos Estados Unidos e em seguida emvários países, inclusive na América Latina27. De fato,as referências paradigmáticas do movimento da saúdepública não expressam qualquer contradição peranteas bases positivistas da medicina flexneriana,conforme demonstrado pelo processo de seleção dasdemandas de subvenção destinadas àinstitucionalização dos centros de formação desanitaristas e epidemiologistas da época27,68.

Na década de quarenta, como uma conseqüênciade processos externos e internos ao campo da saúde(por um lado, os reflexos sociais da crise econômicade 29, e por outro lado, o incremento de custos devidoao aumento da especialização e da tecnologização

da prática médica) articula-se nos Estados Unidospropostas de implantação de um sistema nacional desaúde7. Pela ação direta do poderoso lobby dascorporações médicas daquele país, no lugar de umareforma setorial da saúde nos moldes da maioria dospaíses europeus, propõe-se mudanças no ensinomédico nele incorporando uma vaga ênfase naprevenção. Em 1952, realiza-se em Colorado Springsuma reunião de representantes das principais escolasde medicina norte-americanas (incluindo Canadá),ponto de partida para uma ampla reforma doscurrículos de cursos médicos no sentido de inculcaruma atitude preventiva nos futuros praticantes7,22.

No nível da estrutura organizacional, propõe-sea abertura de departamentos de medicina preventivasubstituindo as tradicionais cátedras de higiene,capazes de atuar como elementos de difusão dosconteúdos de epidemiologia, administração de saúdee ciências da conduta até então abrigados nas escolasde saúde pública45,78. Nesta proposta, o conceito desaúde é representado por metáforas gradualistas doprocesso saúde-enfermidade, que justificamconceitualmente intervenções prévias à ocorrênciaconcreta de sinais e sintomas em uma fase pré-clínica45. A própria noção de prevenção éradicalmente redefinida, através de uma ousadamanobra semântica (ampliação de sentido pelaadjetivação da prevenção como primária, secundáriae terciária) que termina incorporando a totalidade daprática médica ao novo campo discursivo. Que istotenha ocorrido somente no nível da retórica indicaapenas a limitada pretensão transformadora domovimento em pauta, efetivamente preso no queArouca7 com muita perspicácia denominou de“dilema preventivista”.

Com entusiasmo compreensível, organismosinternacionais do campo da saúde aderem de imediatoà nova doutrina, orquestrando uma interna-cionalização da Medicina Preventiva já franca-mentecomo movimento ideológico7. Na Europa, realizam-se congressos no modelo Colorado Springs em Nancy(França), no mesmo ano de 1952, e em Gotemburgo(Suécia) no ano seguinte, patrocinados pelaOrganização Mundial da Saúde (OMS); na AméricaLatina, sob o patrocínio da OPS, são organizadas osSeminários de Viña del Mar (Chile) em 1955 e deTehuacán (México) em 19567,22,37.

O sucesso deste movimento no seu país de origemé inegável: a única nação industrializada que até hojenão dispõe de um sistema universal de assistência àsaúde é justamente os Estados Unidos. Na AméricaLatina, apesar das expectativas e investimentos deorganismos e fundações internacionais, o único efeito

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deste movimento parece ser a implantação de depar-tamentos acadêmicos de medicina preventiva empaíses que, já na década de sessenta, passavam porprocessos de reforma universitária7,78. Na Europa oci-dental, em países que já dispunham de estruturas aca-dêmicas de longa tradição e que no pós-guerra conso-lidavam sistemas nacionais de saúde de acesso uni-versal e hierarquizados, a proposta da medicina pre-ventiva não causa maior impacto nem sobre o ensinonem sobre a organização da assistência à saúde37.

Os célebres anos sessenta marcam nos EstadosUnidos uma conjuntura de intensa mobilizaçãopopular e intelectual em torno de importantesquestões sociais, como os direitos humanos, a guerrado Vietnã, a pobreza urbana e o racismo. Diversosmodelos de intervenção são testados einstitucionalizados sob a forma de movimentosorganizados no âmbito local das comunidadesurbanas, destinados principalmente à ampliação daação social nos setores de habitação, educação esaúde (particularmente saúde mental), reduzindotensões sociais nos guetos das principais metrópolesnorte-americanas24. No campo da saúde, organiza-se então o movimento da saúde comunitária, tambémconhecido como medicina comunitária* , baseado naimplantação de centros comunitários de saúde, emgeral administrados por organizações não lucrativasporém subsidiados pelo governo federal, destinadosa efetuar ações preventivas e prestar cuidados básicosde saúde à população residente em áreasgeograficamente delimitadas7,22,24,42.

A proposta da saúde comunitária inegavelmenterecupera parte importante do arsenal discursivo damedicina preventiva, particularmente a ênfase nasentão denominadas “ciências da conduta”(sociologia, antropologia e psicologia) aplicadas aproblemas de saúde. Nesse caso, entretanto, oconhecimento dos processos socioculturais epsicossociais destina-se não a facilitar a relaçãomédico-paciente ou a gestão institucional em saúde,como no movimento precedente, mas sim apossibilitar a integração das equipes de saúde nascomunidades “problemáticas”, através daidentificação e cooptação dos agentes e forças sociaislocais para os programas de educação em saúde24.Em um certo sentido, o movimento da saúdecomunitária consegue colocar em prática alguns dosprincípios preventivistas58, evidentementefocalizando setores sociais minoritários e deixandomais uma vez intocado o mandato social da

assistência médica convencional.Desta feita, o fracasso do movimento da saúde

comunitária, artificial e distanciado do sistema desaúde predominante no país de origem, pareceevidente24,42,58. Neste particular, Desrosiers22 chega aser irônico, ao comentar que nos Estados Unidos,dado “o caráter parcial e muitas vezes temporáriodas experiências de medicina ou saúde comunitária,restou somente a expressão (...) no lugar da saúdepública tradicional”. Não obstante, mais uma vez,organismos internacionais do campo da saúderapidamente incorporam o novo movimentoideológico, traduzindo o seu corpo doutrinário àsnecessidades dos diferentes contextos de aplicaçãopotencial7,22,24. Com o endosso da OMS, os princípiosdesses programas comunitários de saúde passam aenfatizar mais a dimensão da assistência simplificadavisando à extensão de cobertura de serviços parapopulações até então excluídas do cuidado à saúde,principalmente em áreas rurais, sendo dessa maneiraincorporados ao discurso das agências oficiais(secretarias, ministérios) de saúde. Efetivamente, datade 1953 a definição dos “serviços básicos de saúde”da OMS86, cobrindo as seguintes atividades: a)atenção à saúde da mulher e da criança; b) controlede doenças transmissíveis; c) saneamento ambiental;d) manutenção de sistemas de informação; e)educação em saúde; e) enfermagem de saúde pública;f) assistência médica de baixo grau de complexidade.A revisão de 1963, desta definição, realizada por umacomissão de especialistas já engajados no movimentoda saúde comunitária, propõe incluir nesta relação aparticipação54.

Na América Latina, programas de saúdecomunitária são implantados principalmente naColômbia, no Brasil e no Chile, sob o patrocínio defundações norte-americanas e endossados pela OPS,na expectativa de que o seu efeito-demonstraçãopoderia influenciar positivamente o desenho dossistemas de saúde no continente24. Em um plano maisgeral, há mais de 20 anos (1977), a AssembléiaMundial da Saúde lança a consigna Saúde para Todosno Ano 2000, assumindo uma proposta política deextensão da cobertura dos serviços básicos de saúdecom base em sistemas simplificados de assistência àsaúde60,86. No ano seguinte (1978), em Alma Ata, aConferência Internacional sobre Atenção Primária àSaúde, promovida pela OMS, reafirma a saúde comodireito do homem, sob a responsabilidade políticados governos, e reconhece a sua determinação inter-

* Esta denominação é empregada na Europa e Canadá para designar departamentos de medicina preventiva e social, sem qualquer conotação de açãoassistencial em comunidades37.

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setorial85,86. Além disso, estabelece a AtençãoPrimária à Saúde como estratégia privilegiada deoperacionalização das metas da SPT-2000,implicitamente incorporando elementos do discursoda saúde comunitária. Mais tarde, já na década deoitenta, com o rótulo atualizado de SILOS (SistemasLocais de Saúde) e dentro de um modelodistritalizado com base em níveis hierarquizados deatenção, a retórica da saúde comunitária integra-seàs primeiras iniciativas de reforma setorial da saúdenos países subdesenvolvidos61.

Em 1974, no Canadá, o documento conhecidocomo Relatório Lalonde16 define as bases de ummovimento pela promoção da saúde, trazendo comoconsigna básica adicionar não só anos à vida masvida aos anos. Estabelece o modelo do “campo dasaúde” composto por quatro pólos: a biologiahumana que inclui a maturidade e envelhecimento,sistemas internos complexos e herança genética; osistema de organização dos serviços, contemplandoos componentes de recuperação, curativo epreventivo; o ambiente, que envolve o social, opsicológico e o físico; e, finalmente, o estilo de vida,no qual podem ser considerados a participação noemprego e riscos ocupacionais, os padrões deconsumo e os riscos das atividades de lazer. Propõecomo estratégias considerar a gravidade dosproblemas de saúde, a prioridade dos tomadores dedecisão, a disponibilidade de soluções efetivas comresultados mensuráveis, os custos e as “iniciativasfederais” centradas na promoção da saúde, naregulação, na pesquisa, na eficiência da atenção àsaúde e no estabelecimento de objetivos.

Com base nesses princípios e estratégias, e nocontexto do que veio a se chamar de revolutiontranquile, implanta-se em várias províncias doCanadá uma rede de centros comunitários de saúdee serviços sociais, efetivamente integrados a umsistema de medicina socializada, que representa umasíntese dos modelos de atenção precedentes. Deacordo com Desrosiers22, a reforma do sistema desaúde canadense teve como objetivos:

reunir os serviços sociais e os serviços de saúdesob a autoridade de um mesmo ministério chamadode Ministério dos Assuntos Sociais, nos mesmosestabelecimentos em âmbito local, os CLSC [CentrosLocais de Serviços Comunitários], com uma equipepluridisciplinar composta de agentes sanitários esociais; favorecer uma medicina global pela práticanos CLSC e através de laços estreitos entre clínicose especialistas da saúde pública no âmbito doshospitais; enfim, assegurar uma participaçãoimportante dos cidadãos na administração dos

serviços de saúde.A Carta de Ottawa17, documento oficial que

institucionaliza o modelo canadense, define osprincipais elementos discursivos do movimento dapromoção da saúde: a) integração da saúde comoparte de políticas públicas “saudáveis”; b) atuaçãoda comunidade na gestão do sistema de saúde; c)reorientação dos sistemas de saúde; d) ênfase namudança dos estilos de vida. Cronologicamente, estemovimento corresponde ao desmantelamento doNational Health Service da Inglaterra, na conjunturado “tatcherismo”, e à reforma dos sistemas de saúdee seguridade social dos países escandinavos, face aorecuo da socialdemocracia no continente europeu, oque restringe o seu potencial de expansão mesmoentre os países desenvolvidos. Nos Estados Unidos,na década de oitenta, desenvolvem-se programasacadêmicos levemente inspirados por essemovimento, sob a sigla HPDP (Health PromotionDisease Prevention), claramente indicando a opçãopela proposta mínima de mudança de estilo de vidapor meio de programas de modificação decomportamentos considerados de risco (como hábitode fumar, dieta, sedentarismo, entre outros). No quese refere à absorção do discurso da promoção dasaúde pelos organismos internacionais, deve-sereferir ao Projeto Cidades Saudáveis da OMS,lançado com bastante publicidade em 198685. Valeainda mencionar que o Banco Mundial, em conjuntocom a Organização Mundial da Saúde, patrocina em1991 atualização dos princípios do movimento dapromoção da saúde, nele incorporando a questão dodesenvolvimento econômico e social sustentadocomo importante pauta extra-setorial para o campoda saúde11,87. Além disso, no contexto da ConferênciaMundial pelo Meio Ambiente, conhecida como ECO92, promovida pela Organização das Nações Unidasno Rio de Janeiro, a saúde ambiental foi definidacomo prioridade social para a promoção da saúde,dentro da célebre Agenda 2185,86.

A essa altura, a receita neoliberal é adotada pelosorganismos financeiros internacionais e imposta aospaíses que pretendem inserir-se na “nova ordem” docapitalismo mundial, sobretudo depois da derrocadado leste europeu e dos impasses do “socialismo real”.Justamente nesse contexto a OPS promove, a partirde 1990, um debate sobre a crise da saúde públicaprivilegiando uma reflexão sobre os conceitos, teo-rias, metodologias, elementos explicativos, determi-nantes estruturais, repercussões operacionais e naspráticas de saúde, e perspectivas futuras para a saúdepública nas suas relações com o Estado e a socieda-de28,46,55-57,65. Paralelamente, a OMS patrocina uma

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reflexão articulada sobre as bases de uma “NovaSaúde Pública”, organizando um conjunto de seminá-rios e reuniões sobre formação avançada, liderançainstitucional, teoria e prática em saúde pública33,54,85.

A “NOVA SAÚDE PÚBLICA”

Presentemente, diversos países realizam reformaseconômicas, políticas e administrativas buscandoassegurar algum espaço na nova configuração dosmercados mundiais. A reforma do Estado, ainda quenão suficientemente explicitada, coloca-se na agendapolítica de governos com diferentes espectrospolítico-ideológicos e, nesse particular, emergempropostas setoriais como é o caso da saúde. NaAmérica Latina, muitas das reformas do setor saúdesão apoiadas por organismos financeirosinternacionais, a exemplo do Banco Mundial11, cujospressupostos e diretrizes divergem bastante dosprojetos originais de reforma sanitária. Portanto, faz-se necessário discernir os conteúdos substantivos decada um dos projetos para que, por exemplo, sejapossível compreender as especificidades do sistemade saúde canadense em comparação com o projetoClinton para a atualização do complexo de serviçosde saúde estadunidense, do mesmo modo que se faznecessário considerar as diferenças entre aorganização dos serviços de saúde em Cuba, comênfase na atenção primária, e as propostas de reformasetorial da Bolívia e da Colômbia.

Respostas pragmáticas a tal “momento deverdade”28 podem ser visualizadas, no caso daAmérica Latina, através das propostas do BancoMundial que valorizam a eficiência e a eficácia emdetrimento da eqüidade mediante políticas de ajustemacroeconômico e, no setor saúde, através da focali-zação e da cesta básica de serviços11,87. Assim, muitasdessas reformas setoriais não chegam a ser conce-bidas nem debatidas pelas escolas de saúde públicaou organismos assemelhados e, em certos casos,passam ao largo dos próprios ministérios da saúde,sendo negociadas diretamente entre as agênciasfinanceiras e a “área econômica” dos governos.

Nesse contexto, uma reflexão sobre a “NovaSaúde Pública” que procura examinar, de modocrítico e profundo, os determinantes da “crise dasaúde pública”, passa a ser identificada pejorativa-mente como “assunto de sanitaristas”, isto é, deescolas e pesquisadores do campo da saúde bemcomo de funcionários públicos comresponsabilidades operativas. A correlação de forçaspolíticas e institucionais vigente mantém afastadosdo cenário das reformas de vários países não só os

trabalhadores do setor como especialmente osdistintos segmentos da população que serão “objeto”dessas reformas. As conquistas democráticasalcançadas pelos povos latino-americanos ecaribenhos, especialmente a partir da década deoitenta, ainda não foram suficientes para garantir apublicização (isto é: controle público das políticas epráticas institucionais dos respectivos Estados) dosseus aparelhos e mesmo das suas burocracias.

A linha mais pragmática, prescritiva eintervencionista adotada por um painel convocadopela OMS para discutir a “Nova Saúde Pública”(Genebra, 1995)86, em consonância com as visões derepresentantes europeus e americanos da saúdepública, não parece dar conta dos impassesidentificados na região das Américas, particularmentena América Latina e Caribe. Como integram sistemasrelativamente estabilizados em que as regras de jogomudam lentamente, para eles a crise não é estruturale representaria apenas uma dada interpretação desanitaristas. Propõem assim a agregação de novostemas e habilidades ao campo da saúde pública ouao seu âmbito de práticas e de instituições54,86.Todavia, este enfoque pode resultar em reformascurriculares das respectivas escolas ou em reformasadministrativas nas instituições de saúde mas,seguramente, é insuficiente para dar conta de umapolítica de eqüidade, solidariedade e saúde tal comopropõe a própria OMS neste final de século85.

Conseqüentemente, as instituições acadêmicas ede serviços do campo da saúde não podem ignorar omovimento que se engendra em torno da formulaçãode uma política global de saúde como componentediretivo do corpo doutrinário elaborado em funçãode uma proposta de “Renovação da Saúde paraTodos” (RSPT)85. Desse modo, poderão reatualizarsuas concepções e práticas acerca da saúde públicae, simultaneamente, estarão em condições de exploraroportunidades de diálogo e de construção de aliançasentre organizações não governamentais e organismosde governo para o enfrentamento dos problemas desaúde. Entretanto, mais que diálogos e alianças, asinstituições acadêmicas e de serviços podem produzirnovos conceitos, teorias e práticas que, num processode “interfertilização”60 serão capazes de influir naprópria doutrina da RSPT e na política de saúde aser concebida quando se celebra 20 anos de Alma-Ata.

Diante das dificuldades óbvias de se dispor deuma concepção convergente sobre a “Nova SaúdePública”, faz-se pertinente sistematizar algumasquestões preliminares. Como os atores sociais queatenderam à convocação para este importante debate

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vêem o campo social da saúde e o perfil doprofissional que atuará nos distintos âmbitos de ação?Que conteúdos devem ser privilegiados? Se o campode conhecimento da saúde pública é tão amplo quenão comporta um tipo único de profissional para atuarnas instituições e serviços, qual o núcleo básico deconhecimentos e habilidades que deverão compor onovo perfil profissional num contexto que incorporanovos atores para o seu âmbito de ação, exigindocapacidade de negociação, agir comunicativo eadministração de conhecimentos?

Iniciativas recentes da OPS55 visando à liderançae à formação avançadas em saúde públicapossibilitaram uma discussão ampliada dessa questãona Região das Américas, incluindo, portanto, oCanadá, os EUA e os países do Caribe. Assim, noperíodo 1987-1988 procedeu-se à análise da infra-estrutura privilegiando as seguintes áreas críticas:políticas públicas, sistemas de informação edesenvolvimento da epidemiologia, economia efinanciamento, recursos humanos em saúde,desenvolvimento tecnológico e sistemas de serviçosde saúde. Nos anos 1989-1990 foram realizadosseminários para a análise da prestação de serviçosno que diz respeito a recuperação da saúde, prevençãode doenças e promoção da saúde65. Finalmente, noperíodo 1991-1995, a OPS encaminhou umambicioso projeto para reflexão e crítica sobre ateoria e a prática da saúde pública55, tendo comoreferência os textos básicos e a reunião do “Grupode Consulta” ocorrida em New Orleans, em 1991,culminando com a Primeira ConferênciaPanamericana de Educação em Saúde Pública8,realizada no Rio de Janeiro em 1994.

Esta breve resenha sugere um clima estimulantede efervescência teórica e crítica, propiciando pautasde ação apto para iniciar um processo demodernização conceitual apto para sustentar umanova prática da saúde pública. Segundo Rodriguez69,para esta nova prática, necessita-se de novosprofissionais, capazes de cumprir distintos papéis,desde uma função histórico-política de “resgatar, dopróprio processo histórico de construção social dasaúde, os conhecimentos, êxitos e fracassos dahumanidade em sua luta pela cidadania e bem-estar”até uma função agregadora de valor através daprodução e gestão do conhecimento científico-tecnológico; desde uma função de gerênciaestratégica de recursos escassos e mediadorestratégico das relações entre as necessidades eproblemas de saúde e as decisões políticas até umafunção de advocacy, utilizando o conhecimento“como instrumento de denúncia promovendo a

mobilização crescente da sociedade em demanda derealização do seu potencial de saúde e exercício dodireito de cidadania”69.

Nessa perspectiva, as escolas de saúde públicadevem fortalecer o seu processo de independización.A I Conferência Panamericana sobre Educação emsaúde pública (Rio de Janeiro, 1994)8 propôs oaprofundamento do debate em torno datransformação da estrutura organizacional dasrespectivas escolas, considerando a pertinência dadesvinculação administrativa em relação àsfaculdades de medicina. De fato, o conceito de“espaço transdisciplinar” tende a desestruturar a idéiade faculdade ou escola como organização auto-suficiente. Daí a proposta de criação de espaços deexcelência que, à semelhança das novas organizaçõesempresariais, funcionem como “redes institucionaisagregadoras de valor”8,69. A idéia básica é que sedesenvolvam processos de formação e capacitaçãosistemáticos, criativos e inovadores, cujos eixosfundamentais serão a investigação e a articulaçãocom os serviços de saúde. A produção de liderançassetoriais e institucionais passa a constituir um dospropósitos básicos das novas instituições acadêmicas:

Liderança setorial em saúde significa acapacidade do setor de transformar a saúde noreferente básico para a formulação de todas as outraspolíticas públicas. A política de saúde condicionaria,em grande parte, não só comportamentosindividuais, mas também ações coletivas, sociais epolíticas. A liderança institucional é definida comoa capacidade que possui uma organização deirradiar valores, gerar conhecimento e promovercompromisso com esses valores, por parte dapopulação e de outras organizações. Umaorganização líder produz diferenças fundamentaisna comunidade (...). Capacitar-se para a liderançaé, portanto, um produto de aquisição de novosvalores e habilidades, como o desenvolvimento denovos significados da missão e da filosofiainstitucionais. Como o objetivo da liderança épromover compromissos públicos com ideais básicos,o setor ou a instituição líder se reconhece não sópela qualidade de suas ações, mas principalmentepelo compromisso que gera nos setores, instituiçõesou atores que lidera”(OPS56).

Podemos destacar, no caso do desenvolvimentoda saúde pública na década de noventa, o seu caráterde movimento ideológico, seja utilizando o seu braçoacadêmico (Associação Latino-Americana deEscolas de Saúde Pública-ALAESP, por exemplo)seja acionando o seu braço político-ideológico (OPS).Assim, a reflexão sobre as possibilidades de

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incorporação de novos paradigmas inscreve-se,embora não integralmente, no capítulo das políticasde saúde. As inflexões produzidas no campo do saberencontam-se subordinadas às modificações no âmbitodas práticas, ainda que inovações conceituais edesenvolvimentos disciplinares, científicos etecnológicos possam afetar a formulação e aimplementação de algumas dessas políticas. Não setrata de uma determinação mecânica das políticassobre o campo mas, em última análise, uma decisivainfluência, já que é possível conceber situações emque produtos desse campo do saber exercemalterações, ainda que parciais, sobre a organizaçãodas práticas de saúde.

As modificações do panorama político e socialdo mundo e da situação de saúde (principalmente afalta de mudanças esperadas) põem em cheque aspremissas e previsões dos antigos modelos. Ou talvezo problema seja mais profundo, no nível não dosmodelos e sim do paradigma científico quefundamenta este campo de prática social e técnica2,5,69.Frente aos elementos discursivos e extra-discursivosligados à constatação de um esgotamento dosparadigmas vigentes, desafiados pela “crise da saúdepública”, surgem demandas por “novosparadigmas”28,46,54. No particular dos elementosdiscursivos, cabe destacar os pressupostos de que odesenvolvimento da saúde supõe a exclusão dadoença e que a ciência e a técnica dispõem de umpotencial inesgotável para superar a enfermidade.Como elementos extra-discursivos desse debateencontram-se as restrições econômicas quecomprometem a capacidade do Estado suportar, alongo prazo, o custo crescente da atenção à saúde,particularmente a assistência médico-hospitalar, alémdo fato de que esta assistência não garante melhornível de bem-estar ou produtividade social.Reconhece-se, ainda, a crescente iniqüidade dos“determinantes da saúde”85, seja no nível singular,relativo à qualidade do ambiente social, seja no nívelgeral, referente às disparidades da distribuição derenda e poder entre os segmentos sociais.

Entretanto, romper com os paradigmas vigentesnão significa recusa pura e simples. Impõemovimentos de crítica, elaboração e superação. Trata-se de uma construção no plano epistemológico aotempo em que se mobilizam vontades no âmbito dapráxis para alimentar o pensamento e a ação. Espera-se que, ao se debater a reforma do setor saúde nocontexto da RSPT, seja implementada uma práxisvoltada para os “determinantes de saúde” a partir daqual se poderia construir um novo paradigma da

saúde. A confluência das três temáticas - reformasetorial, RSPT e “nova saúde pública”, impõe-se pelanecessidade de uma agenda política comum,contemplando tanto os planos doutrinário econceitual quanto o plano metodológico operativo.

Nessa perspectiva, faz-se necessário reverparadigmas e propostas de ação, visando a estabelecerbalizamentos sobre a questão da saúde no âmbitocoletivo. No caso específico da América Latina, aconstrução nos últimos vinte anos do movimentodenominado saúde coletiva tem permitido um diálogocrítico e a identificação de contradições e acordoscom a saúde pública institucionalizada, seja na esferatécnico-científico, seja no terreno das práticas. Emoutras palavras, trata-se de considerar, no âmbito dointeresse específico, as seguintes questões: Será queo movimento da saúde coletiva pode se apresentarcomo um novo paradigma científico, em um sentidorigorosamente delimitado? Que pautasepistemológicas, teóricas, metodológicas e políticasdevem ser ativadas para alcançar mudançasparadigmáticas no campo da saúde?Pragmaticamente, que modelos de compreensão dasituação de saúde poderão ser produzidos? Maisainda, que efeitos terão tais transformações sobre aretórica e a prática no campo da saúde?

No restante do presente ensaio, será apresentadauma tentativa de sistematização do marco conceitualda saúde coletiva, em construção na América Latina,situando mais particularmente as suaspotencialidades de constituição de um conhecimentotransdisciplinar. Como conclusão, pretende-se proporque este movimento ideológico pode melhor searticular a novos paradigmas científicos capazes deabordar o objeto complexo saúde-doença-cuidadorespeitando sua historicidade e integralidade.

SAÚDE COLETIVA: CAMPO CIENTÍFICO EÂMBITO DE PRÁTICAS

Como ponto de partida, pode-se entender a saúdecoletiva como campo científico14, 67, onde seproduzem saberes e conhecimentos acerca do objeto‘saúde’ e onde operam distintas disciplinas que ocontemplam sob vários ângulos; e como âmbito depráticas61, onde se realizam ações em diferentesorganizações e instituições por diversos agentes(especializados ou não) dentro e fora do espaçoconvencionalmente reconhecido como “setor saúde”.Assumir a saúde coletiva como um campo científicoimplica considerar alguns problemas para a reflexão.Trata-se, efetivamente, de um campo novo ou de um

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novo paradigma dentro do campo da saúde pública?Quais os saberes que dão suporte ao campo e, conse-qüentemente, às práticas dos seus atores sociais?Quais os “obstáculos epistemológicos” que dificul-tam o seu desenvolvimento científico? Quais os “obs-táculos da práxis” face à reorganização dos processosprodutivos, à sociedade da informação, à reforma doEstado e das suas novas relações com a sociedade?

Algumas respostas provisórias a estas questõesserão apresentadas nesta seção, ainda que umaprofundamento sobre a temática exija um texto demaior fôlego.

Originalmente, o marco conceitual* propostopara orientar o ensino, a pesquisa e a extensão emsaúde coletiva no caso brasileiro, foi composto pelosseguintes pressupostos básicos (Paim59):

a) “A Saúde, enquanto estado vital, setor deprodução e campo do saber, está articulada àestrutura da sociedade através das suas instânciaseconômica e político-ideológica, possuindo,portanto, uma historicidade.”

b) “As ações de saúde (promoção, proteção,recuperação, reabilitação) constituem uma práticasocial e trazem consigo as influências dorelacionamento dos grupos sociais.”

c) “O objeto da Saúde Coletiva é construído noslimites do biológico e do social e compreende ainvestigação dos determinantes da produção socialdas doenças e da organização dos serviços de saúde,e o estudo da historicidade do saber e das práticassobre os mesmos. Nesse sentido, o caráterinterdisciplinar desse objeto sugere uma integraçãono plano do conhecimento e não no plano daestratégia, de reunir profissionais com múltiplasformações” (...).

f) “O conhecimento não se dá pelo contato coma realidade, mas pela compreensão das suas leis epelo comprometimento com as forças capazes detransformá-la”.

Não obstante a adesão que tais pressupostospossam, ainda hoje, estimular, cabe ressaltar que odesenvolvimento da saúde coletiva, enquanto áreado saber e campo de práticas, nos últimos anospermite recontextualizar alguns desses pressupostos.Assim, a definição do “objeto” acima apresentadasugere o entendimento da saúde coletiva comociência ou disciplina científica. Em um momentoposterior de discussão desse campo na AméricaLatina, Fleury 29 chega a definir saúde coletiva como“área de produção de conhecimentos que tem como

objeto as práticas e os saberes em saúde, referidosao coletivo enquanto campo estruturado de relaçõessociais onde a doença adquire significação”.

Entretanto, o trabalho teórico-epistemológicoempreendido mais recentemente aponta a saúdecoletiva como um campo interdisciplinar e nãopropriamente como uma disciplina científica, muitomenos uma ciência ou especialidade médica4,61,67.Cumpre ressaltar as influências mútuas entre essedesenvolvimento e os movimentos pelademocratização das formações sociais latino-americanas, especialmente os processos de reformasanitária desencadeados em alguns países da região.De fato, o marco conceitual da saúde coletiva, talcomo vem sendo construído a partir da década de70, resulta, de um lado, da crítica aos diferentesmovimentos e projetos de reforma em saúdeocorridos nos países capitalistas e, de outro, daelaboração teórico-epistemológica e da produçãocientífica, articuladas às práticas sociais.

A constituição da saúde coletiva, tendo em contaos seus fecundos diálogos com a saúde pública e coma medicina social, tal como vem se concretizandonas duas últimas décadas, permite uma delimitaçãocompreensivelmente provisória desse campocientífico, enquanto campo de conhecimento eâmbito de práticas. Enquanto campo deconhecimento, a saúde coletiva contribui com oestudo do fenômeno saúde/doença em populaçõesenquanto processo social; investiga a produção edistribuição das doenças na sociedade comoprocessos de produção e reprodução social; analisaas práticas de saúde (processo de trabalho) na suaarticulação com as demais práticas sociais; procuracompreender, enfim, as formas com que a sociedadeidentifica suas necessidades e problemas de saúde,busca sua explicação e se organiza para enfrentá-los.

Na América Latina, e no Brasil em particular,realiza-se nas duas últimas décadas um trabalho deconstrução de novas teorias, enfoques e métodos daepidemiologia e da planificação em saúde, além deinvestigações concretas buscando a aplicação demétodos das ciências sociais no campo da saúdecoletiva18,29,34,53,61. Desse esforço de reconstruçãoteórica, tem emergido no campo novos objetos deconhecimento e de intervenção, como por exemploos casos da comunicação social em saúde e davigilância em saúde. Nesse aspecto, cabe referir odesenvolvimento científico e tecnológico do campomediante importantes contribuições nas áreas de

* Entende-se marco conceitual como Juan César Garcia, no sentido da “apresentação de um fenômeno ou acontecimento atendendo só as suas linhas oucaracterísticas mais significativas, de modo a facilitar um certo nível de generalidade que o torna aplicável a situações distintas dentro de uma áreasemelhante”34.

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Epidemiologia Social12,15,19,43,44,66,79, Políticas ePráticas de Saúde19,24-26,29,30,36,40,49-51,59-64,73-76,Planificação em Saúde47,48,73-76,80,82-84, e Epistemologiae Metodologia em Saúde2-6,20-21,52,53,71-72.

Nessa perspectiva, a saúde coletiva pode serconsiderada como um campo de conhecimento denatureza interdisciplinar cujas disciplinas básicas sãoa epidemiologia, o planejamento/administração desaúde e as ciências sociais em saúde. Este contemplao desenvolvimento de atividades de investigaçãosobre o estado sanitário da população, a natureza daspolíticas de saúde, a relação entre os processos detrabalho e doenças e agravos, bem como asintervenções de grupos e classes sociais sobre aquestão sanitária67. São disciplinas complementaresdesse campo a estatística, a demografia, a geografia,a clínica, a genética, as ciências biomédicas básicas,entre outras. Esta área do saber fundamenta umâmbito de práticas transdisciplinar, multiprofissional,interinstitucional e transetorial.

Enquanto âmbito de práticas, a saúde coletivaenvolve determinadas práticas que tomam comoobjeto as necessidades sociais de saúde, comoinstrumentos de trabalho distintos saberes,disciplinas, tecnologias materiais e não materiais, ecomo atividades intervenções centradas nos grupossociais e no ambiente, independentemente do tipode profissional e do modelo de institucionalização.Abrange, portanto, um

conjunto articulado de práticas técnicas,científicas, culturais, ideológicas, políticas eeconômicas, desenvolvidas no âmbito acadêmico,nas instituições de saúde, nas organizações dasociedade civil e nos institutos de pesquisa,informadas por distintas correntes de pensamentoresultantes da adesão ou crítica aos diversos projetosde reforma em saúde61.

Contudo, mais do que definições formais, a saúdecoletiva requer uma compreensão dos desafios quese colocam no presente e no futuro que transcendemo campo institucional e o tipo de profissionalconvencionalmente reconhecidos como da saúdepública. A possibilidade de redimensionar objeto,instrumentos de trabalho e atividades, considerandosua articulação com a totalidade social reabrealternativas metodológicas e técnicas para pensar eatuar no campo da saúde coletiva no trânsito para onovo milênio. Conforme destacado em uma das maisfecundas contribuições a esse debate,

os avanços da epidemiologia crítica, aepistemologia política, os novos aportes das ciênciassociais, a planificação estratégica, a comunicaçãosocial e a educação popular têm constituído bases

fundamentais para a elaboração de novosinstrumentos de docência, investigação e cooperaçãocom as organizações e instituições da sociedade civildo Estado. A própria experiência de resistência eluta em saúde por parte de nosso povo nos tempermitido encontrar em nossa história e cultura oselementos fundamentais para o avanço de nossopensamento e ação(...). Não somente se necessitamconhecimentos para apreender a realidade, mastambém se deve realizar uma aproximaçãognoseológica distinta com vistas a encontrar narealidade - ademais de conhecimentos - saberes,desejos, sentidos, projeções de luta e mudança, queconstituem também aspectos fundamentais da açãohumana26.

A superação do biologismo dominante, danaturalização da vida social, da sua submissão àclínica e da sua dependência ao modelo médicohegemônico - cuja expressão institucional no âmbitodas universidades é a sua subordinação funcional,política e administrativa às faculdades de medicina -representam elementos significativos para o marcoconceitual da saúde coletiva. Faz-se necessária,portanto, a identificação de uma “nova positividade”na articulação das dimensões objetiva e subjetiva nocampo social da saúde. A retomada da problemáticado sujeito não significa a negação das estruturas, domesmo modo que a definição de um marco conceitualpara a saúde coletiva não implica a adoção de umquadro teórico de referência exclusivo e excludente.Isto porque, segundo Granda36,

tanto o mundo natural, quanto o mundo socialse encontram determinados e em constante devir,porém sua diferença radica em que no segundo oconhecimento se transforma em consciência e sentidode necessidade e necessidade de ação que encobreuma potencialidade para a ação; então, é necessáriopensar que para poder estudar o processo saúde/enfermidade se requer considerar os sujeitos sãos eenfermos não unicamente para explicá-los sim paracompreendê-los e conjuntamente construirpotencialidades de ação.

Conseqüentemente, a análise das relações entreas ciências sociais, a vida cotidiana e as ciênciasnaturais, ao tempo em que examina a constituiçãodos sujeitos sociais, pode localizar essa “novapositividade”, tanto na militância sociopolítica,quanto na incorporação tecnológica18,29,40. Avalorização da dimensão subjetiva das práticas desaúde, das vivências dos usuários e trabalhadores dosetor tem proporcionado espaços de comunicação ediálogo com outros saberes e práticas abrindo novasperspectivas de reflexão e de ação. A revisão crítica

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de algumas proposições tais como “campo desaúde”23, promoção da saúde (Carta de Ottawa,1984)17, vigilância em saúde48, confere novos sentidospara as reflexões sobre a saúde coletiva no continente.Donnangelo25 ilustra as potencialidades de taisredefinições:

A variedade e o caráter freqüentemente restritoe restritivo das conceptualizações do coletivo/socialnão invalidam o fato de que as práticas sanitáriasse viram constantemente invadidas pela necessidadede construção do social como objeto de análise ecomo campo de intervenção. Nem devem induzir àsuposição de que a vida social concreta acabe portornar-se mero produto dessas opções conceituais.Ela irromperá, certamente, sob outras formas,também no campo do saber, quando as malhasconceituais e sociais se revelarem estreitas face àconcretude dos processos sociais.

A discussão entre as finalidades das práticas desaúde e o seu objeto, meios de trabalho e atividades,bem como a análise das relações técnicas e sociaisdo trabalho em saúde como via de aproximação entreos modelos assistenciais e de gestão, constituemdesafios teóricos e práticos para a saúde coletiva. Istoresulta de uma ampliação dos objetos de intervenção,a partir da noção de prevenção e atenção primáriapara os conceitos de qualidade de vida e promoçãoda saúde, como observam Schraiber e Mendes-Gonçalves74 no seguinte trecho:

A atenção primária vem progressivamente setornando um complexo assistencial que envolvedifíceis definições de tecnologia apropriada. Não sóa medicina desenvolveu-se muito em seusdiagnósticos precoces e definições de riscosgenético-familiares, como epidemiologicamente adefinição de situação de risco também secomplexificou. Além dissso, a dimensão de ações quepromovem diretamente a saúde, mais que ações derestauração ou prevenção, tornaram a promoção àsaúde um conceito a ser melhor delimitado. Estanoção, mal esboçada nos anos 50, embora já presenteenquanto intenção, traz novas questões para aassistência, como por exemplo uma melhor definiçãodo conceito de qualidade de vida.

O fenômeno saúde tem sido também concebidocomo expressão do modo de vida (estilo e condiçõesde vida)66, capaz de explicar, juntamente com ascondições de trabalho e do meio ambiente, o perfilepidemiológico da população. O estudo da situaçãode saúde, segundo condições de vida, temprivilegiado as articulações com quatro dimensõesda reprodução social: a reprodução biológica ondese manifesta a capacidade imunológica e a herança

genética; a reprodução das relações ecológicas, queenvolve a interação dos indivíduos e grupos com oambiente residencial e do trabalho; a reprodução dasformas de consciência e comportamento, queexpressam a cultura; e a reprodução das relaçõeseconômicas, onde se realizam a produção,distribuição e o consumo19,72. A partir desse modelopodem ser identificados diferentes espaços eestratégias de intervenção sanitária: a) indivíduos(espaço singular) - estratégias de alto risco; b) grupossociais (espaço particular) - estratégias populacionais;c) modelos econômicos (espaço geral) - políticas desaúde19.

No que diz respeito às respostas sociais aofenômeno saúde/doença a vigilância à saúde constituiuma “prática sanitária que organiza os processos detrabalho em saúde, sob a forma de operações, paraconfrontar problemas de enfrentamento contínuo,num território determinado”47. O modelo davigilância em saúde contempla o processo saúde/doença na coletividade e fundamenta-se naepidemiologia e nas ciências sociais, ao contrário domodelo da história natural das doenças que privilegiao indivíduo e a fisiopatologia45. Ao consideraresquemáticamente danos, indícios de danos e deexposição, riscos e exposição propriamente dita e,last but not least, as necessidades e determinantessocioambientais, a vigilância em saúde permiteorientar intervenções visando ao “controle de danos”,“controle de riscos” e “controle de causas”(determinantes socioambientais)62. Abre, portanto,conforme Souza e Kalichman79, espaço para umareatualização da reflexão e da ação no que se refereà promoção da saúde e à qualidade de vida:

Considerando, para tanto, os problemas jácolocados relativamente à distribuição eqüânime noconjunto social das conquistas que beneficiam a vidacoletiva, não resta dúvida de que tal indagaçãoinicia-se obrigatoriamente pelo exame do quesignificará a qualidade de vida no plano coletivo,sem que isto anule as necessidades variadas que secolocam no plano individual (...). Transformando, apartir dessas mudanças, o modelo de organizaçãotecnológica do trabalho em saúde, a prática davigilância ousará, através dele, a inscrição de umoutro ‘modo de andar a vida’ em sociedade.

A adoção de novos paradigmas no campo dasaúde coletiva no âmbito das práticas enfrenta-se,portanto, com distintos desafios, na medida em que,de acordo com Paim61, as ações de saúde de alcancecoletivo expressam uma tensão entre Estado eSociedade, entre liberdades individuais eresponsabilidades coletivas, entre interesses privados

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e públicos. A extensão e profundidade dessas açõesdepende da dinâmica de cada sociedade, sobretudodiante das articulações que estabelece concretamentecom as instâncias econômicas, políticas eideológicas.

Portanto, a saúde coletiva privilegia nos seusmodelos ou pautas de ação quatro objetos deintervenção: políticas (formas de distribuição dopoder); práticas (mudanças de comportamentos; cul-tura; instituições; produção de conhecimentos; prá-ticas institucionais, profissionais e relacionais); técni-cas (organização e regulação dos recursos e processosprodutivos; corpos/ambientes); e instrumentos (meiosde produção da intervenção). Desse modo, mais doque qualquer outro movimento ideoló-gico, absorvea produção de conhecimentos inter/transdisciplinarescom grande capacidade de “interfertilização”60, sejapara a realização das suas funções essenciais, sejapara o exercício das suas funções possíveis edesejáveis. Finalmente, enquanto âmbito de práticas,a saúde coletiva contempla tanto a ação do Estadoquanto o compromisso da sociedade para a produçãode ambientes e populações saudáveis, através deatividades profissionais gerais e especializadas.

Pode-se admitir que a crise da saúde como parteda crise social gera contradições diversas. Os atuaisdesafios da saúde coletiva não se limitam à formaçãoprofissional, à produção de conhecimentos, àrenovação conceitual e epistemológica dentro docampo institucional presentemente ainda reconhecidocomo saúde pública. Tais desafios atravessam toda aorganização social, desde a produção, distribuição econsumo de bens e serviços até as formas deorganização do Estado e dos seus aparelhos nas suasrelações com a sociedade e a cultura61,82.

Enfim, a saúde coletiva, entendida como“conjunto de saberes que dá suporte às práticas dedistintas categorias e atores sociais face às questõesde saúde/doença e da organização da assistência”25,encontra seus limites e possibilidades nas inflexõesda distribuição do poder no setor saúde e numa dadaformação social. Sublinhar o caráter histórico eestrutural da saúde coletiva significa reconhecer,teórica e empiricamente, um conjunto de práticas(econômicas, políticas, ideológicas, técnicas, eoutras) que tomam como objeto as necessidadessociais de saúde. Representa um enfoque de práticasque não se submetem, acriticamente, ao modelo desaúde pública institucionalizado nos países centrais,seja enquanto tipo profissional ou modelo deorganização de serviços de saúde. A saúde coletivapreocupa-se com a saúde pública enquanto saúde dopúblico, sejam indivíduos, grupos étnicos, gerações,

castas, classes sociais, populações. Nada que se refiraà saúde do público, por conseguinte, será estranho àsaúde coletiva61.

CONCLUSÃO: CAMPO ABERTO A NOVOSPARADIGMAS

Pode-se concluir que, apesar de não preencher ascondições epistemológicas e pragmáticas para seapresentar, em si mesma, como um novo paradigmacientífico, a saúde coletiva se consolida como campocientífico e âmbito de práticas aberto à incorporaçãode propostas inovadoras, muito mais do que qualqueroutro movimento equivalente na esfera da saúdepública mundial. A partir destas reflexões, constata-se a afirmação de um campo interdisciplinardinâmico, renovado e recomposto a partir de umaprodução teórica ousada e consistente, aindaenfrentando diversas interrogações e dilemas. Defato, a conjunção das “crises da saúde” – científica,econômica, social e política - lança complexosdesafios para a saúde coletiva quanto ao que fazerpara efetivamente se articular aos novos paradigmasda saúde para o século XXI.

No âmbito da produção de conhecimento, o passomais importante será certamente re-configurar oobjeto privilegiado ‘saúde’. Isto deverá resultar deuma apreensão pragmática do objeto, não no senso-comum do imediatismo, e sim no sentido de que estedeve alimentar uma práxis em vez de constituir-seem mera produção e incorporação de tecnologia.Muito do que em um dado paradigma se pode tomarcomo um aparente paradoxo deve-se ao fato de quenão se lida com um objeto obediente àsdeterminações da predição, aquela das antecipaçõeslimitadas e limitantes, rigorosas e precisas.Efetivamente, o objeto da saúde coletiva é muito maistolerante a formas aproximadas de antecipação doseu processo, ressaltando a natureza não-linear dasua determinação e a imprecisão (ou borrosidade)dos seus limites. Então, será plenamente legítimobuscar a superação da prática preventiva preditivadesta saúde pública que tanto se conhece, tanto nosentido de sua aplicação ao indivíduo quanto em suaaplicação em geral, em direção a uma saúde coletivaprevisional ou, pré-visionária, quer dizer, uma saúdecoletiva capaz de propor visões, formas, figuras ecenários, em vez de predizer algumas poucas medidase seus pobres efeitos.

Em nível teórico, muitos autores já assinalam aimportância estratégica da re-construção do objetoda saúde coletiva. Acrescenta-se que este faz partede uma nova família de objetos científicos, construído

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enquanto objeto totalizado e complexo. Para clarificaresta idéia, em outra oportunidade4, propôs-se umaanalogia proveniente de um campo científico onde apredição é por definição relativizada, a meteorologia,onde ninguém acredita em predições mas muito sefala em previsões. O que é que define um furacão?Não é a medida da pressão barométrica, não é avelocidade dos ventos, não é a variação detemperatura, não é nada disso (que se pode estimarcom um alto grau de precisão) mas é tudo isso,unificado em uma totalidade integral que sereconhece como o furacão, porém que não se reduzàs suas medidas.

Por analogia, portanto, pode-se dizer que o objetopossível da promoção-saúde-enfermidade-cuidado,tal como um furacão, é um objeto de altacomplexidade e que só se define em sua configuraçãomais ampla, já que tem facetas, ângulos distintos e amirada de cada um destes ângulos não nos dá acessoà integralidade deste objeto. Pode-se chamá-lo deintegrais de saúde-enfermidade-cuidado4. Osintegrais de saúde-enfermidade-cuidado podem serreferenciados tanto como tecidos de pontos sensíveisou metáforas de representação social deenfermidades, quanto como estruturasepidemiológicas, cadeias de causalidade ou relaçõesde produção de risco. Em ambos os casos, trata-sede objeto por definição complexo e contextualizado,típico do neo-sistemismo das novas aberturasparadigmáticas assinaladas. A lógica que devepredominar em tais objetos possíveis é uma lógicamúltipla e plural que não se pode expressar de umamaneira codificada, mas que somente se podereconhecer por seus efeitos.

No âmbito dos processos de reprodução (ensino/formação) da saúde coletiva enquanto campo deconhecimento com facilidade reconhece-se opotencial da fractalidade como princípio organizadordo seu âmbito de práticas. Por um lado, em umaperspectiva dialética, a prática da saúde coletiva será“minimalista” e localizada e ao mesmo tempoholística e globalizante. Por outro lado, em umaperspectiva pragmática, a saúde coletiva enquantoâmbito de práticas se constituirá em um permanenteprocesso de autocriação, balizada primordialmentepelos seus efeitos concretos sobre a realidade desaúde. Nesse sentido, os processos de produção-reprodução deste campo poderão cumprir a seguintepauta de ação:

a) qualificar o conjunto de necessidades sociaisem saúde, entendendo-as não apenas como carênciasmas como “ideais de saúde” ou, alternativamente,como “projetos de vir a ser”; isto significa tomar a

saúde como “meta a ser conquistada, como um bemque se adquire através dos conflitos e da luta declasse52;”

b) pensar os diferentes meios e as atividadesnecessárias (o trabalho propriamente dito) para aten-der tais necessidades, ainda que não se restrinjam aoconhecimento científico e tecnológico da saúdecoletiva e da medicina61;

c) instaurar novas relações técnicas e sociaisorgânicas a tais práticas no campo social da saúde, aexemplo dos processos de distritalização emunicipalização, educação e comunicação social,grupos de pressão, organizações não governamentais,produtores culturais, entre outros64;

d) investir política e tecnicamente nos espaçosinstitucionais abertos por tais propostas, na medidaem que, enquanto as necessidades de saúde sãosocialmente determinadas, as práticas de saúdecoletiva são redefinidas tendo em conta o desenvol-vimento dos seus instrumentos de trabalho e a instau-ração de novas relações internas ao campo da saúde61.

Isto implica desenvolver programas de educaçãopermanente ou continuada em saúde coletiva63 nasinstituições que prestam serviços de saúde, com vistasa recompor e atualizar constantemente os elementosdas práticas de saúde - os objetos, os meios detrabalho, as atividades realizadas nessas práticas, etambém para que, a partir dessa experiênciademocrática, sejam instauradas novas relaçõestécnicas e sociais no processo de trabalho em saúde.Para além da produção de novos objetos deconhecimento e de práticas, trata-se ainda da criaçãode espaços institucionais e de momentos pedagógicospara a constituição de novos sujeitos sociais nointerior dos próprios serviços de saúde.

Nos níveis político e sociocultural de constituiçãodo campo da saúde coletiva, será convenienteexplorar formas de organização dos sujeitos sociaisnão redutíveis a partidos e sindicatos (embora semdescartá-los), capazes de dar ânimo (vida) aos sonhose esperanças de criar civilizações (ou socializações)pautadas no afeto, na solidariedade, na liberdade ena justiça. Conciliar este “mundo subjetivo” com o“mundo social” através de uma ação políticaemancipatória38 pode ser um dos maiores desafiospara a práxis da saúde coletiva nos tempos atuais. Aparticipação organizada dos grupos sociais, bemcomo o reconhecimento e o estímulo às iniciativascomunitárias, radicadas na solidariedade, constituempossibilidades de redefinição de relações sociais quepoderão auxiliar na redução do sofrimento humano,na elevação da consciência sanitária e ecológica, napreservação da saúde e na defesa da vida.

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