samuel da silva a persuasÃo na propaganda de … da silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na...

70
SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE CERVEJAS: SOB O ENFOQUE SISTÊMICO-FUNCIONAL MESTRADO EM LINGUÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA LINGUAGEM PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO 2012

Upload: vobao

Post on 14-Jul-2019

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

SAMUEL DA SILVA

A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE CERVEJAS:

SOB O ENFOQUE SISTÊMICO-FUNCIONAL

MESTRADO EM

LINGUÍSTICA APLICADA E ESTUDOS DA LINGUAGEM

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

2012

Page 2: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

ii

SAMUEL DA SILVA

A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE CERVEJAS:

SOB O ENFOQUE SISTÊMICO-FUNCIONAL

Dissertação apresentada à Banca Examinadora

da Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo, em atendimento à exigência parcial para

obtenção do título de Mestre em Linguística

Aplicada e Estudos da Linguagem.

Orientadora: Profª. Dra. Sumiko Nishitani Ikeda

PUC – SP

2012

Page 3: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

iii

BANCA EXAMINADORABANCA EXAMINADORABANCA EXAMINADORABANCA EXAMINADORA

_______________________________________

_______________________________________

_______________________________________

Page 4: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

iv

DEDICATÓRIA

Aos meus pais, Marli e Abner, por

me ensinarem lições que nunca

encontrarei em livros.

Page 5: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

v

AGRADECIMENTOS

Primeiramente, agradeço a Deus por ter permitido trilhar este caminho e

pela força de seguir avante apesar das adversidades.

À Professora Doutora Sumiko Nishitani Ikeda, orientadora incrivelmente

incansável e competente que dedicou laboriosas horas de orientação, pelas

agradáveis aulas, pela leitura criteriosa e exigente da tese e também pelo afeto,

confiança, paciência e generosidade com que me conduziu pelo universo do fazer

científico. Sem sombra de dúvida, considero-me um afortunado por ter tido a boa

sorte de tê-la ao meu lado como co-autora no projeto e descobrindo as graças de

ser linguísta.

Aos professores Fátima Beatriz de Benedictis Delphino e Marcelo Saparas

pelas sugestões na Banca de Qualificação, que muito enriqueceram esta pesquisa,

revelando novas possibilidades.

Aos professores do LAEL, Angela Brambilla Cavenaghi Themudo Lessa,

Maria Cecília Pérez de Sousa-e-Silva e Tony Paulo Berber Sardinha pela forma

apaixonada e até mesmo bem humorada de ensinar linguística. Contribuíram com

leituras contemporâneas e funcionais que me fizeram ver e ouvir o mundo sem

inocência, de forma sempre atenciosa e com um sorriso amigo.

À Maria Lucia e Márcia, funcionárias do LAEL, pela atenção, simpatia e

constante auxílio em todos os momentos.

Aos meus colegas de sala pela ajuda, apoio e momentos de descontração.

À Giseli Gobbo pelo companherismo, por dividir e ouvir meus tropeços,

medos, alegrias e pelas caronas que renderam discussões elucidativas sobre

nossos projetos em meio à Avenida Paulista.

À minha amiga Natame Almeida pelo carinho, sensibilidade e auxílio.

Page 6: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

vi

À Danielle Cabral, executiva de conta e Marina Caetano, assistente de conta

da Skol na agência F/Nazca Saatchi & Saatchi pela atenção e informações

prestadas.

À minha mãe, Marina Aparecida de Oliveira da Silva, uma grande amiga,

incentivadora que sempre esteve de mãos dadas comigo a fim de amparar, ensinar

e aplaudir.

Ao meu pai, Salvador da Silva, colaborador efetivo para que eu chegasse até

o fim deste trajeto.

Aos meus amigos pelo estimulo à perseverança e pela compreensão.

Page 7: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

vii

Epígrafe

Nunca mais se porá o teu sol, nem a tua lua

minguará; porque o Senhor será a tua luz

perpétua, e os dias do teu luto findarão.

(Isaías 60:20)

Page 8: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

viii

SAMUEL DA SILVA

A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE CERVEJAS: SOB O ENFOQUE SISTÊMICO-FUNCIONAL

RESUMO

Em meus estudos de linguística, ao tratar da linguagem persuasiva, ocorreu-me

abordar um assunto que me tem interessado há algum tempo. Como seria feita a

propaganda1 de cervejas no Brasil, num mundo em que há evidente competição

entre inúmeras empresas? Os próprios fabricantes assumem que há certa

padronização nos anúncios. Xavier2 diz que, “no exterior, as campanhas de cerveja

recorrem ao humor de maneira inteligente”. Morici3,diretor de marketing da Femsa,

dona das marcas Kaiser, Sol e Xingu, diz que, se as propagandas se assemelhavam

muito umas às outras aos olhos dos consumidores, já há um claro movimento para

mudá-la. “A eficiência da comunicação está em causar impacto e todos estamos

atrás disso”, diz. Nesse contexto, sabe-se que a cerveja Skol, em 2011, venceu pela

décima vez o prêmio Top of mind. Já a Cervejaria Petrópolis, detentora da Itaipava,

alcançou o segundo lugar no mercado brasileiro de cervejas, de acordo com dados

mais recentes do instituto de pesquisas Nielsen, em setembro. O que as

diferenciaria de outras marcas? Qual seria o motivo dessa fixação na memória do

povo? Há vários caminhos para a análise de uma propaganda. Mas algumas

características são evidentes na sua elaboração. Trata-se primordialmente de uma

situação interacional entre a propaganda e o leitor, com forte apoio no uso de meios

implícitos de persuasão, já que a propaganda, hoje, dirige-se a uma comunidade já

cansada de ser invadida por recursos ultrapassados de persuasão. Segundo,

Fuertes-Olivera et al (2001), a propaganda parece mais bem representada como um

contínuo de funções textuais flutuando entre “informação” e “manipulação”, de

acordo com a ideia de que a propaganda é um exemplo de comunicação velada 1 Devemos esclarecer aqui que não faremos a distinção existente entre “propaganda” e “publicidade”: O termo “propaganda” vem de seu homônimo em latim propaganda, que significa semear idéias e ideais de cunho político, cívico ou religioso, tendo caráter ideológico e com o objetivo de fazer adeptos, seguidores e converter opiniões. Já a publicidade é a ferramenta que, utilizando os meios de comunicação e os espaços publicitários, com patrocinador identificado, tem como fim seduzir e tornar público, levando o consumidor à compra de determinado produto ou serviço (Dennys Monteiro: Internet). 2 Xavier, consultado na Internet. 3 Morici, consultado na internet.

Page 9: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

ix

porque dá a possibilidade aos seus autores de evitar a responsabilidade de suas

declarações. No exame desses meios, vou enfocar os papéis desempenhados e

papéis projetados (THOMPSON; THETELA, 1995), os tokens de Atitude (MARTIN,

2000), a fórmula AIDA (UNGERER, 2004), a imagem visual (MACKEN-HORARIK,

2004), os quais concorrem para a criação de “mundo textual” (DOWNING, 2003). O

objetivo desta pesquisa é o exame crítico da propaganda de cerveja, no caso, Skol e

Itaipava, para verificar a forma como é feita a persuasão nesse gênero. Para tanto,

deve responder às seguintes perguntas de pesquisa: (a) como é criado o “mundo

textual” no discurso da propaganda? (b) que elementos contribuem para tornar esse

“mundo” favorável à persuasão? e (c) como é feita a relação verbo-visual na

propaganda?

Palavras-chave: Persuasão. Propaganda. Linguística Crítica. Linguística Sistêmico-

Funcional.

Page 10: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

x

SAMUEL DA SILVA

PERSUASION IN BEER COMMERCIALS: A SYSTEMIC FUNCTIONAL APPROACH

ABSTRACT

In my studies of linguistics, when dealing with persuasive language, it occurred to me

to approach a subject that has interested me for some time. How would the

advertisement of beer in Brazil be, in a world where there is clear competition

between many companies? Even the manufacturers assume that there is some

standardization in the ads. Xavier says, "abroad, beer campaigns resort to humor

wisely." Morici, marketing director of FEMSA owner of the brands Kaiser, Sol and

Xingu, says that if the ads closely resembled each other in the eyes of consumers,

now there is a clear movement to change it. " The efficiency of communication occurs

by causing impact and we are all looking forward to it," he says. In this context, it is

known that Skol, in 2011, won the Top of Mind award for the tenth time. However the

Petrópolis brewery which owns the Itaipava brand, reached second place in the

Brazilian beer market, according to latest data from Nielsen research institute in

September. What differentiates them from other brands? What would be the reason

for this setting in memory of the people? There are several ways to analyze an

advertisement. But some features are evident in its preparation. It is primarily of an

interactional situation between advertising and reader, with strong support in the use

of implicit methods of persuasion, as advertising today is addressed to a community

already tired of being overrun by outdated resources of persuasion. According to

Fuertes-Olivera et al (2001), advertising seems best represented as a continuum of

text functions fluctuating between "information" and "manipulation," according to the

idea that advertising is an example of covert communication because it provides the

possibility for the authors to avoid responsibility for their statements. Examining these

means, I will focus on the enacted roles and projected roles (THOMPSON;

THETELA, 1995), the tokens of Attitude (Martin, 2000), the AIDA formula (Unger,

2004), the visual image (MACKEN-HORARIK, 2004) , which contribute to the

creation of "textual world" (Downing, 2003). The objective of this research is the

critical examination of beer advertisements, analyzing both brands: Skol and

Page 11: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

xi

Itaipava, to see how persuasuin in such genre occurs. For this we must answer the

following research questions: (a) How is a "textual world" in advertising discourse

created ? (b) what factors contribute to making this "world" favoring persuasion? and

(c) how does the verbal-visual relation in advertising occur?

KEYWORDS: Persuasion. Advertising. Critical Linguistics. Systemic Functional

Linguistics.

Page 12: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

xii

LISTA DE QUADROSLISTA DE QUADROSLISTA DE QUADROSLISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Frame-espaço de um anúncio (Fonte: CAMPOS PARDILLOS, 1995, p.66) ...............................................................................................11

Quadro 2 - Processos e Participantes........................................................................19

Quadro 3 - As três metafunções (Fonte: HALLIDAY, 1994).......................................19

Quadro 4 - Sistema interpessoal (Fonte: THOMPSON & THETELA ,1995) ..............22

Quadro 5 - Resumo do apoio teórico .........................................................................34

Quadro 6 - Recursos de APPRAISAL (Fonte: MARTIN, 2000) ..................................41

Quadro 7 - Análise da avaliatividade da cerveja Skol ................................................41

Quadro 8 - Análise da avaliatividade da cerveja Itaipava...........................................46

Quadro 9 - Texto das propagandas............................................................................49

Page 13: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

xiii

LISTA DE FIGURASLISTA DE FIGURASLISTA DE FIGURASLISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Anúncio de Chegou Skol 360º ...................................................................38

Figura 2 - Anúncio de Itaipava....................................................................................44

Page 14: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

xiv

SUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIOSUMÁRIO

1 . INTRODUÇÃO..........................................................................................................1

2 .APOIO TEÓRICO .....................................................................................................6

2.1 A propaganda como um tipo de discurso ..........................................................6

2.1.1 Funções da propaganda .........................................................................6

2.1.2 Estratégias discursivas textuais ..............................................................8

2.1.3 O tom conversacional do discurso da propaganda (DP).........................9

2.1.4 Elipse, pressuposição e conhecimento partilhado no discurso da propaganda...........................................................................................10

2.1.5 Uma divergência de opiniões sobre a propaganda velada ...................11

2.1.6 A comunicação velada e os tabus sociais em propaganda ..................14

2.2 A Linguística Crítica.........................................................................................16

2.3 A Análise do Discurso Crítica ..........................................................................17

2.4 A Linguística Sistêmico-Funcional...................................................................18

2.4.1 A função interacional ............................................................................21 2.4.1.1 Papéis desempenhados .........................................................22 2.4.1.2 Papéis projetados...................................................................23

2.4.2 A função pessoal - A Avaliatividade......................................................24

2.5 A fórmula “AIDA” .............................................................................................27

2.6 A criação do “mundo textual”...........................................................................28

2.7 Interação como o texto multimodal: reflexões sobre imagem e palavreado ....30

2.7.1 As ferramentas......................................................................................31

3 .METODOLOGIA .....................................................................................................35

3.1 Dados ..............................................................................................................35

3.2 Procedimentos de análise ...............................................................................36

3.2.1 Análise da verbiagem ...........................................................................37

3.2.2 Análise da imagem ...............................................................................37

4 .ANÁLISE.................................................................................................................38

4.1 A análise da verbiagem ...................................................................................39

4.1.1 A fórmula AIDA e a persuasão por convicção e por sedução...............39

4.1.2 Os papéis desempenhados e os papéis projetados .............................40

4.1.3 A avaliatividade.....................................................................................40

Page 15: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

xv

4.2 Análise do visual..............................................................................................42

4.2.1 O contato ..............................................................................................42

4.2.2 A distância social: proximidade.............................................................43

4.2.3 A atitude................................................................................................43

4.3 A análise da verbiagem ...................................................................................44

4.3.1 A fórmula AIDA e a persuasão por convicção e por sedução...............44

4.3.2 Os papéis desempenhados e os papéis projetados .............................45

4.3.3 A avaliatividade.....................................................................................46

4.4 Análise do visual..............................................................................................47

4.4.1 Contato .................................................................................................47

4.4.2 Distância social: proximidade................................................................47

4.4.3 Atitude...................................................................................................48

5 .DISCUSSÃO DOS RESULTADOS.........................................................................49

6 .CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................51

REFERÊNCIAS..........................................................................................................53

Page 16: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Introdução 1

A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE CERVEJAS: SOB O ENFOQUE SISTÊMICO-FUNCIONAL

1 INTRODUÇÃO

Em meus estudos de linguística, ao tratar da linguagem persuasiva, ocorreu-

me abordar um assunto que me tem interessado há algum tempo. Como seria feita a

propaganda4 de cervejas no Brasil, num mundo em que há evidente competição

entre inúmeras empresas? Há hoje no mercado nacional 17 marcas de cerveja (sem

contar as de menor porte) que brigam por um lugar na preferência dos

consumidores: Brahma, Antarctica, Skol, Kaiser, Kaiser Gold, Sol, Itaipava, Bohemia,

Polar, Crystal, Xingu, Brahma Black, Malt 90, Austria Bier, Fass, Wäls Dubbele e

Nobel.

Quanto à propaganda, as empresas fabricantes de cervejas admitem,

segundo Ribeiro5, que a fórmula atual está se esgotando e o público não diferencia

marcas. Segundo ela, embora o mercado cervejeiro nacional seja robusto o

suficiente para gerar ícones de comunicação, os próprios fabricantes assumem que

há uma certa padronização nos anúncios. As companhias têm até pesquisas sobre o

assunto, mas preferem não falar sobre elas. “A fórmula básica do anúncio de cerveja

oscila entre um clima de malandragem e uma bela bunda”, ironiza Adilson Xavier,

presidente da agência de publicidade Giovanni+Draft FCB.

Essa tendência, segundo Ribeiro, gerou uma receita básica que acaba por

confundir o público, como apontam as pesquisas feitas para avaliar a eficiência dos

comerciais - o consumidor identifica que é cerveja pelas condições gerais, mas não

distingue mais uma marca da outra. Esse resultado, na opinião de Xavier6, vem da

própria ditadura dos indicadores surgidos nas pesquisas de avaliação dos

4 Devemos esclarecer aqui que não faremos a distinção existente entre “propaganda” e “publicidade”: O termo “propaganda” vem de seu homônimo em latim propaganda, que significa semear idéias e ideais de cunho político, cívico ou religioso, tendo caráter ideológico e com o objetivo de fazer adeptos, seguidores e converter opiniões. Já a publicidade é a ferramenta que, utilizando os meios de comunicação e os espaços publicitários, com patrocinador identificado, tem como fim seduzir e tornar público, levando o consumidor à compra de determinado produto ou serviço (Dennys Monteiro: Internet). 5 Marli Ribeiro, consultada na Internet. 6 Xavier, consultado na Internet.

Page 17: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Introdução 2

comerciais. Xavier explica que esses indicadores mostram a constituição do universo

cervejeiro formado por homens que se juntam para falar de mulher. “Isso levou a

padrões de comportamento que acabam por dar um toque de mesmice aos

anúncios”, diz. “No exterior, as campanhas de cerveja recorrem ao humor de

maneira inteligente”.

Há, porém, elementos que justificam a diferença de comportamento dos

mercados nacional e estrangeiro. Um deles é o fato de que, no exterior, há uma

ampla variedade de tipos de cerveja e preços. Aqui, a expansão do mercado é

recente no setor, que sempre foi dominado pela cerveja do tipo pilsen. Morici7,

diretor de marketing da Femsa, dona das marcas Kaiser, Sol e Xingu, diz que, se as

propagandas se assemelhavam muito umas às outras aos olhos dos consumidores,

já há um claro movimento para mudá-la. “A eficiência da comunicação está em

causar impacto e todos estamos atrás disso”, diz.

A propósito, a revista VEJA, de 29.06.11, traz uma reportagem sobre o

publicitário Jader Rossetto, que para promover uma nova marca de cerveja, a

Proibida, da CBBP (Premium), adotou uma estratégia de propaganda com duas

lindas modelos que se faziam passar por duas turistas checas. O embuste fez

sucesso na internet e no programa Pânico na TV, mas descoberta a pegadinha, a

emissora entrou com uma ação no Tribunal de Justiça contra a CBBP. Diz Rossetto:

“Quero questionar a propaganda a que nos acostumamos no Brasil, muito

comportada e repetitiva. Os consumidores querem e precisam ser surpreendidos”.

Como pesquisador em linguística crítica, fiquei curioso em saber como é feita

a propaganda dessas cervejas, e também se haveria alguma diferença entre as

duas marcas em termos dos recursos utilizados para persuadir o público.

Há vários caminhos para a análise de uma propaganda. Mas algumas

características são evidentes na sua elaboração. Trata-se primordialmente de uma

situação interacional entre a propaganda e o leitor, em que se distinguem papéis

desempenhados e papéis projetados (THOMPSON; THETELA, 1995), com forte

apoio no uso de meios implícitos de persuasão, já que a propaganda, hoje, dirige-se

a uma comunidade já cansada de ser invadida por recursos ultrapassados de

persuasão. Assim, Hunston (1993a; 1993b, apud HUNSTON, 2000), com base nos

7 Morici, consultado na internet.

Page 18: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Introdução 3

trabalhos de sociólogos da ciência (i.e., LATOUR; WOOLGAR, 1979, apud

HUNSTON, 2000), mostra que é possível persuadir uma comunidade a aceitar as

afirmações de novos conhecimentos sem o uso de meios explícitos para essa

finalidade. Hunston (1994, p.193) propõe que:

para ser convincente a persuasão deve parecer ser uma

reportagem. Segue-se que a avaliação, através da qual a

persuasão é realizada, deve ser altamente implícita e,

assim, evitará a linguagem atitudinal normalmente

associada ao significado interpessoal8.

Segundo, Fuertes-Olivera et al (2001), a propaganda parece mais bem

representada como um contínuo de funções textuais flutuando entre “informação” e

“manipulação”, de acordo com a ideia de que a propaganda é um exemplo de

comunicação encoberta porque dá a possibilidade aos redatores de evitar a

responsabilidade por implicações em relação a tópicos socialmente problemáticos

como sexo ou esnobismo. Nesse sentido, os propagandistas enganam os

consumidores potenciais por meio de artifícios verbais ou não-verbais. Além de

metáforas, estilo disjuntivo, estilo coloquial, dialetos sociais e regionais, os escritores

também usam o metadiscurso, que é considerado uma característica pragmática

central. É o meio pelo qual os escritores organizam o discurso, cativa a audiência e

sinaliza sua posição atitudinal.

Um meio para a realização da avaliação explícita é o conceito de token de

atitude, proposto por Martin (2000), para denominar o modo pelo qual o significado

experiencial pode ser “saturado” em termos avaliativos, ou seja, interpessoais. A

propósito, Martin (2003, p. 173) adverte: “o apego a categorias explícitas significa

que uma grande quantidade de atitude implícita pelos textos será perdida”.

Outra característica da propaganda consiste no apoio em fórmulas

acronímicas, sendo a mais velha e mais conhecida a fórmula da AIDA (ATENÇÃO –

INTERESSE – DESEJO – AÇÃO). Ao aplicar esta fórmula nas propagandas para o

consumidor podem-se definir as funções da manchete e da ilustração para chamar a

ATENÇÃO e criar INTERESSE, os elementos pictóricos (geralmente contendo uma

8 To be convincing what is persuasion must appear only to be reportage. It follows that the evaluation through which the persuasion is carried out must be highly implicit and will, in fact, avoid the attitudinal language normally associated with interpersonal meaning.

Page 19: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Introdução 4

réplica do produto anunciado), parece querer despertar o DESEJO, um objetivo

também apoiado pelo texto do corpo do texto, geralmente uma lista de vantagens

sobre o produto ou um apelo (pseudo) lógico. A linha para assinatura e o logo são

usados para atrair DESEJO por determinada marca ou empresa, enquanto que os

detalhes como, endereço da empresa, ajudam a transformar o DESEJO em AÇÃO.

A interação no texto multimodal tem apoio de Macken-Horarik (2004), que

analisa a contribuição complementar entre imagem (ilustrações) e palavras (do texto)

no processo da construção de significados. Diz a autora que o fenômeno do texto

composto ou multimodal é um desafio para analistas do discurso.

Também concorre nessa tentativa de cativar e convencer o leitor, a criação do

que Downing (2003) chama de “mundo textual”. O potencial criativo da propaganda

como um tipo de gênero que desempenha a evocação de situações imaginárias com

finalidades persuasivas tem sido tratado por muitos autores. Segundo Cook (1992,

p. 105), a propaganda atual está menos interessada em alistar “propriedades

objetivas dos objetos” do que em ligar “o produto a alguma outra entidade, efeito ou

pessoa, criando uma fusão, que envolve o produto descaracterizado com

propriedades desejáveis”. A propósito, Downing (2003) fala em criação de “mundo

textual”, para o qual, concorrem as escolhas no sistema linguístico, que dão origem

a diferentes interpretações da realidade, ou seja, criam diferentes visões de mundo.

Assim, o discurso é uma prática que, longe de refletir com neutralidade a realidade

social e os fatos empíricos, intervém no que Berger e Luckmann (1976) chamaram

de “a construção social da realidade”.

O objetivo desta pesquisa é o exame crítico da propaganda de cerveja, no

caso Skol e Itaipava, para verificar a forma como é feita a persuasão nesse gênero.

Para tanto, deve responder às seguintes perguntas de pesquisa: (a) como é criado o

“mundo textual” no discurso da propaganda? (b) que elementos contribuem para

tornar esse “mundo” favorável à persuasão? e (c) como é feita a relação verbo-visual

na propaganda?

A presente dissertação está assim estruturada: 1. Introdução, em que

proponho um estudo da propaganda de cerveja com base na Linguística Crítica. 2.

Apoio Teórico, em que apresento a teoria/metodologia que embasa esta pesquisa, a

Linguística Sistêmico-Funcional, com enfoque em Martin (2000, 2003) sobre a

Page 20: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Introdução 5

Avaliatividade e os tokens de Atitude; além de propostas específicas sobre a

propaganda: a fórmula AIDA (UNGERER, 2004); o papel do visual (MACKEN-

HORARIK, 2004); o “mundo textual” (SEMINO, 1997; DOWNING, 2003). 3.

Metodologia, em que trato dos procedimentos de análise das cervejas Skol e

Itaipava. 4. Análise. 5 Discussão dos Resultados e, finalmente, 6. Considerações

Finais.

Page 21: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 6

2 APOIO TEÓRICO

Inicio este capítulo com considerações sobre a propaganda, suas funções e

estratégias, além de opiniões contrárias sobre questões persuasivas que cercam a

sua realização. A teoria que embasa a presente análise da propaganda das cervejas

Skol e Itaipava conta com as seguintes contribuições: Fowler (1991), que propõe a

Linguística Crítica; Fairclough (1992a), que trata da Análise do Discurso Crítica;

Halliday (1985, 1994) e a Linguística Sistêmico-Funcional, com enfoque especial na

metafunção interpessoal; Martin (2000, 2003) sobre a Avaliatividade e os tokens de

Atitude; Ungerer (2004) sobre a fórmula AIDA para a propaganda; Macken-Horarik

(2004) sobre o papel do visual na propaganda; e, finalmente, Semino (1997) e

Downing (2003) sobre a noção de “mundo textual”.

2.1 A propaganda como um tipo de discurso

Cook (1992) apresenta, sob a perspectiva funcional, um estudo detalhado da

propaganda como um tipo de discurso, e a compara com o discurso da literatura

(COOK, 1994). Campos Pardillos (1995) enfoca a função dos dêiticos na criação de

um chão comum entre o emissor e o receptor do discurso político e publicitário.

Ambos emprestam importância à descrição do contexto, juntamente com a

especificação das relações que se estabelecem entre emissor e receptor nesse

gênero, além da descrição de alguns artifícios textuais explorados pelo discurso da

propaganda (DP) na perseguição da meta comunicativa.

Seguindo o padrão dos trabalhos em abordagem funcional do discurso e

texto, Cook define discurso como “texto e contexto juntos, interagindo de modo que

é percebido pelos participantes como significativo e unido, em que os participantes

são ao mesmo tempo partes do contexto e também seus observadores” (COOK,

1992, p.2).

2.1.1 Funções da propaganda

Embora se considere na propaganda as funções conativa e persuasiva, que

pressiona as pessoas a comprar um produto, hoje (COOK, 1992, p.5) os estudiosos

Page 22: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 7

apontam outras funções: diversão, informação, conselho, defesa, entre as quais as

funções emotiva e fática desempenham funções significativas, fazendo parte de uma

função mais importante, o display (GOFFMAN, 1992, p.147-48 apud Cook, 1994),

que estabelece e mantêm identidade, diferenciando-a de outras. O display, como as

fórmulas mágicas, eleva o significante - o nome de um produto, um time ou de um

partido político - acima do que ele significa (COOK, 1992, p.148); em outros

contextos sociais ou de atividades como a oração, a magia, a depreciação, a

fanfarronice, os participantes desempenham uma parte ativa no discurso, já em

atividades como a da propaganda, os participantes apenas agem passivamente;

nesse sentido, “Expressamos nossa identidade, aceitando o produto, o programa

político, a proeza esportiva, a arte de outros, em vez de construirmos os nossos”

(COOK, 1992, p.148).

O processo de identificação entre receptor e a situação representada na

propaganda pode ser descrito como uma relação que envolve quatro participantes:

(1) o mundo do emissor, em que o produto é manufaturado; (2) o mundo ficcional,

em que as características apresentam o produto ou são associadas a ele; (3) o

mundo da fantasia do receptor e (4) o mundo real do receptor. Cook afirma que a

meta do emissor é “empurrar o produto, via mundo da ficção ou da fantasia, para o

mundo real do consumidor” (COOK, 1992, p. 177). Para tanto, o DP usa várias

estratégias, entre as quais, as estratégias do discurso-textual desempenham papel

significante. Na verdade, a manipulação criativa da linguagem, a exploração da

ambiguidade e da indeterminação e o apelo à experiência pessoal e emocional

(funções afetivas, avaliativas, estéticas) parecem trazer o Discurso da Propaganda

(doravante DP) para junto do discurso literário.

De acordo com Cook, uma das diferenças cruciais entre o discurso literário e

o DP é que, enquanto o primeiro realiza funções que o autor define como sendo de

mudança cognitiva, ou seja, a modificação ou o desafio do esquema de mundo do

leitor, levando-o a reavaliar conceitos, o DP tende a ser conservativo, no sentido de

reforçar esquemas já existentes e aceitos, reforçando, assim, o sentimento de

identidade de um grupo social.

Mas, segundo Downing, pode se afirmar também que esses anúncios

procuram de certo modo o objetivo do potencial de “mudar cognitivamente” ao

Page 23: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 8

convidar as pessoas a tomar parte de uma nova identidade social quando compram

um produto. Em muitos casos, é verdade que esse convite, para mudar o esquema

cognitivo em favor de outros novos, é ambíguo no sentido de que se propõe um

compromisso entre um esquema conservativo e um inovador. Este é o caso, por

exemplo, da criação de uma propaganda de carro no DP, em que um rapaz assiste à

missa e é mostrado com um piercing na língua quando recebe o sacramento da

comunhão. Nesse anúncio, o esquema conservador da crença religiosa é

apresentado como sendo compatível com um esquema mais desafiador do piercing

corporal, de modo que o proprietário do carro estará potencialmente apelando tanto

para as pessoas com sentimentos religiosos quanto para aqueles que são favoráveis

ao piercing corporal, ou, mais significantemente, as pessoas que portam

simultaneamente esses desejos aparentemente incompatíveis. Em última instância,

obviamente, a meta do produtor do anúncio é alcançar o máximo de consumidores

que puder, de modo que o display e o estabelecimento de identidade são meios para

o objetivo da persuasão.

O que está claro é que tanto o discurso literário quanto o DP, derrotam, em

geral, as expectativas referentes a traços textuais e linguísticos, assim desafiando o

que Cook define como esquema textual e esquema linguístico (esquema que

governa gêneros textuais e propriedades linguísticas de textos), que serão tratados

a seguir.

2.1.2 Estratégias discursivas textuais

Assim como outro discurso qualquer que faz um uso criativo da língua, tais

como, a escrita ficcional, a poesia, as piadas e o humor, o DP é “generoso no jogo

com o código” (COOK, 1992, p.277). Isso pode ser visto em diferentes níveis da

análise linguística, desde a grafologia e a fonologia até o léxico, a sintaxe e a

retórica textual, criando padrões discursivos idiossincráticos. Assim, por exemplo, os

trocadilhos são explorados para criar significados múltiplos, e a metáfora e a

metonímia são usadas para introduzir domínios e experiências desejáveis com os

quais o produto é associado. Assim, em um anúncio de uma companhia chamada

Infonet, podemos ler o seguinte:

Page 24: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 9

(1) Nas comunicações globais, um fornecedor é melhor que muitos.

A mensagem apóia-se na ambiguidade da estrutura que pode significar: (a)

ter apenas um fornecedor é melhor que ter muitos fornecedores, ou (b) ter um

fornecedor específico (a Infonet) é melhor que ter outros. Cook dá um exemplo de

associação metonímica (figura que responde pela continguidade) em um anúncio do

carro Ford Fiesta, que é mostrado numa situação fictícia em que os personagens

vão a uma fiesta. Consequentemente, não somente se vende um produto aos

receptores da mensagem, mas eles mesmos são vendidos “em uma pessoa

atraente, função ou circunstância” (COOK, 1992, p.108).

2.1.3 O tom conversacional do discurso da propaganda (DP)

Significados implícitos podem ser criados por meio de uma grande variedade

de recursos, alguns dos quais já foram mencionados, mas há três aspectos que

precisam ser discutidos, em especial o uso de pronomes , de elipse e de a

pressuposição . Esses meios linguísticos contribuem para a criação de um tom de

conversa que é típica da maioria dos DPs (COOK, 1992, p.171; CAMPOS

PARDILLOS, 1995, p.66). Esse tom dialógico conversacional está sempre presente

mesmo em texto aparentemente monológico, e seu efeito consiste em envolver o

receptor no discurso da situação, apelando diretamente para o seu conhecimento,

interesse e emoções (CAMPOS PARDILLOS, 1995, p.59-60).

Os pronomes pessoais desempenham papel crucial devido à sua natureza de

elemento dêitico, isto é, como itens linguísticos que têm um componente variável de

significado que lhes é atribuído contextualmente. Em interação face a face, a maioria

da informação dêitica relevante para a situação de discurso, tais como, tempo, lugar,

participantes, é diretamente observável no contexto físico imediato, e não precisam

ser mencionados. Contudo, na comunicação escrita, em que há uma combinação

confusa (mismatch) entre o tempo de codificação e o tempo de recebimento da

mensagem, os elementos dêiticos necessários para a compreensão da mensagem

são mencionados explicitamente. Isto é óbvio, por exemplo, na escrita ficcional, em

que os textos tornam explícito o tempo e o local dos eventos narrados. A

propaganda parece ser um modo misto, com mais traços da interação face a face.

Page 25: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 10

Esse efeito é criado, em parte, por meio de suporte visual, que fornece uma pista

ostensiva em relação à informação dêitica, e em parte pela relação direta com o

leitor, que tem o efeito de diretamente envolver o receptor na situação evocada pela

propaganda. Como argumenta Campos Pardillos (1995, p.60), “o papel de todos os

dêiticos é contextualizar e colocar o texto dentro de uma certa circunstância: a do

receptor”.

Assim, o “você” do anúncio refere-se tanto aos personagens da situação

fictícia do anúncio quanto aos (múltiplos) receptores; o “eu” é tanto o fabricante e o

interlocutor na situação fictícia, em geral, um expert ou um conselheiro; e,

finalmente, o “ele” ou “ela” é em geral a pessoa que não comprou o produto (COOK,

1992, p.155) uma empresa concorrente. A relação de intimidade e confiança é

estabelecida por meio de endereçamento direto com o uso de “você”, que pode

contrastar com referentes distantes na 3ª pessoa. O receptor é endereçado

diretamente por meio de “você”, estabelecendo, assim, um diálogo entre produtos e

receptor, e as companhias concorrentes são referidas por “elas”, estabelecendo,

desse modo, uma distância entre a empresa anunciadora e o receptor de um lado

(primeira e segunda pessoas da interlocução) e outras empresas do outro lado

(terceira pessoa da interlocução).

2.1.4 Elipse, pressuposição e conhecimento partilhado no discurso da propaganda

Elipse, pressuposição e conhecimento partilhado contribuem para criar um

tom de conversa, estabelecendo a relação entre as personagens do mundo fictício e

o receptor, baseado na suposição de que há quantidade suficiente de conhecimento

partilhado para determinar o sentimento de proximidade, confiança, informalidade e

intimidade. Assim, como afirma Cook (1992, p.176), o que não é dito é que é mais

importante, pois reflete o que as pessoas tomam por aceito. Nesse sentido, o papel

do conhecimento compartilhado torna-se particularmente significativo, já que a

propaganda joga com referências intertextuais - a outros tipos de texto como

canções, poemas, outros textos e outros anúncios - que são construídos sobre as

experiências compartilhadas dos interlocutores.

Campos Pardillos (1995) afirma ainda que os dêiticos exercem uma função

crucial na criação de significados pressupostos e, portanto, implicitamente

Page 26: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 11

compartilhados da propaganda. Assim, a função dos dêiticos como aqui e hoje não é

a função típica informacional de expressões como em Aqui está o livro de que te

falei. Pelo contrário, os dêiticos são em geral usados nas propagandas para criar um

espaço comum entre o produtor e o receptor em que os indexicais se referem “ao

lugar em que o receptor é convidado a entrar” (CAMPOS PARDILLOS, 1995, p.63).

Isso leva Campos Pardillos a propor uma modificação na classificação tradicional

dos dêiticos, que é feita em dois tipos principais, próxima e distante: “devemos

concluir que os frames indexicais não são dois; para os espaços que correspondem

aos participantes do discurso, devemos acrescentar um terceiro” em que o produtor

e o receptor se encontram (CAMPOS PARDILLOS,1995, p.66). Como ele afirma, os

anúncios, assim, criam “um frame tempo-espaço presumido (e obviamente falso) em

que o produtor e o receptor coexistem”. Isso é representado no Quadro 1:

Quadro 1 - Frame-espaço de um anúncio (Fonte: CAMPOS PARDILLOS, 1995, p.66)

Espaço 1 Espaço 2 Espaço 3

Eu Você aqui (lá) agora (então) onde você e eu nos encontramos

Aqui Lá

Agora Então

2.1.5 Uma divergência de opiniões sobre a propaganda velada

Crook (2004) não concorda com o trabalho de Tanaka (1994, 1999) sobre o

uso de comunicação velada nas propagandas e diz que essa maneira de encarar a

propaganda deve-se mais a idéias já ultrapassadas contidas em artigos como

Subliminal Seduction (KEY,1976 apud Crook, 2004) ou The hidden persuader

(PACKARD, 1981 apud Crook, 2004) do que a pesquisas recentes sobre o assunto.

Para mostrar que há falhas na argumentação de Tanaka (1994,1999), ele relaciona

a questão da comunicação velada com a teoria da relevância (SPERBER; WILSON,

1986).

De acordo com a teoria da relevância, a comunicação baseia-se amplamente

na capacidade de inferência do ser humano. Um enunciado fornece um input

(estímulo) para os sistemas centrais de processamento, suscitando hipóteses cujo

grau de certeza depende de estímulos seguintes. Se as hipóteses relacionam-se

Page 27: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 12

direta ou indiretamente ao estímulo – para que outras hipóteses sejam processadas

– depende de um princípio psicológico inato de relevância. Por outro lado, para

aumentar a eficiência cognitiva, o ser humano atribui intenções ao outro. A atribuição

de intenção é uma noção-chave para teoria da relevância.

Um ato comunicativo prototípico envolve um desejo de informar alguém sobre

alguma coisa. Assim, no exemplo seguinte, o falante tem uma “intenção informativa”

(SPERBER; WILSON, 1986, p.29). Compare os exemplos seguintes:

(2) Fairy liquid is soft on one´s hands [que é um resumo ou interpretação de (3)].

(3) Hands that do dishes can be soft as your face. (Mild Green Fairy Liquid) (a

propaganda).

Suponhamos que a audiência de (3) chegue à conclusão implicada de (2),

cuja derivação é resultado do input + processos inferenciais de (3) e as premissas

implicadas e requeridas para sua interpretação. Como é que essas premissas ficam

disponíveis? Para tanto, o ouvinte precisa ter meios para reconhecer a “intenção

comunicativa”, ou seja, uma intenção de segunda-ordem para poder reconhecer a

intenção informativa. Ou seja, ele precisa encaixar o enunciado num contexto

intencional: O propagandista tem a intenção de comunicar a informação de “mãos

que lavam pratos etc.”

Esse fato ocorre no nível verbal e, mais importante, no nível cognitivo,

manifestando-se através da criação ou ampliação do ambiente cognitivo do falante e

ouvinte. Nesse sentido, as hipóteses partilhadas são consequência, ao invés de pré-

requisito, para uma comunicação bem sucedida.

Sperber & Wilson (1995) ditam duas regras (Presumption of Optimal

Relevance):

(a) O estímulo ostensivo é relevante o suficiente para o endereçado se esforçar em

processá-lo.

(b) O estímulo ostensivo9 é o mais relevante e compatível com as habilidades e

preferências do comunicador.

9 Por “ostensão”, o autor refere-se ao fato de o falante tornar mutualmente manifestas as suposições que podem atuar como inputs aos processos cognitivos de inferência.

Page 28: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 13

De acordo com a teoria da relevância, o equilíbrio entre efeito (mudança no

ambiente cognitivo) e esforço (alocação de recursos cognitivos para processar) é

garantido pelas regras acima, que acompanham qualquer comunicação ostensiva.

A comunicação, então, envolve uma intenção informativa que está

encaixada em uma intenção comunicativa de segunda ordem.

Tanaka (1994, 1999) define “comunicação velada”: um caso de comunicação

em que a intenção do falante é alterar o ambiente cognitivo do ouvinte, sem fazer

essa intenção mutuamente manifesta.

A “comunicação deve ser diferenciada de formas veladas de transmissão da

informação” (WILSON, 1986, p.301 apud Crook, 2004). Ora, a teoria da relevância

constitui uma tentativa de caracterizar a comunicação como sendo atingida por

meios do reconhecimento de processos inferenciais. Conclui-se que a noção de

comunicação velada é incompatível com a teoria da relevância.

A visão de Tanaka é de que o propagandista tenta persuadir a audiência-meta

a comprar um produto, e que tal empreendimento requer algum tipo de fraude.

Contudo, segundo Sutherland & Sylvester (2000) “dos muitos mecanismos

psicológicos subjacentes à propaganda, a persuasão é em geral a menos relevante”.

Para eles, a propaganda é caracterizada por um “enviesamento mental suave” e não

tanto por uma “persuasão pesada”.

De fato, há um bom entendimento entre o propagandista e a audiência, e isso

permite ao primeiro ser bem mais aberto, espalhafatoso e brincalhão. É claro que

tudo isso não exclui a existência de alguma comunicação velada, mas o que Crook

(2004) pergunta é se há a possibilidade de cumplicidade, por que recorrer a

estratégias de comunicação velada.

Dizer que as pessoas não confiam em propaganda é uma afirmação forte

demais, segundo Crook. É mais certo dizer que há um quê de ceticismo. Mas a

confiança opera ao longo de um contínuo, indo do vendedor de dupla intenção até a

pessoa em quem confiamos. Uma pesquisa mostrou que os leitores têm o pé em

diversos campos ao mesmo tempo. Assim tornar públicas as intenções parece ser

uma estratégia viável para os propagandistas, especialmente se forem consistentes

com as opiniões de propagandas vistas por um público cada vez mais esperto.

Page 29: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 14

Sutherland & Sylvester discutem a ideia de que a consistência cognitiva

restringe as afirmações que uma propaganda pode fazer. De acordo com Brown et

al (1999 apud Crook, 2004), a luta para garantir a consistência cognitiva pode

também ser vista como um motivo inato para evitar a dissonância cognitiva. Quando,

no exemplo de Tanaka, o guarda diz aos prisioneiros “serei bom para vocês”, não é

tanto a falta de confiança, mas sim falta de consistência (ou presença de

dissonância cognitiva) que gera dúvida nos prisioneiros.

Numa propaganda, as afirmações em geral envolvem simplesmente um

direcionamento da atenção da audiência para uma determinada característica que,

embora exagerada, é mais ou menos inegável. E aqui é interessante notar que as

afirmações só são inegáveis porque são consistentes com alguma crença

intuitivamente aceita. Às vezes, um produto é envolto em atributos em que não

acreditamos, mas nesses casos recorre-se a afirmações abertamente atribuída a

uma autoridade.

Sperber (1996) trata de crenças, confiança e autoridade em sua abordagem

naturalística de representações culturais. Ao desenvolver sua epidemiologia das

crenças, ele distingue entre crenças intuitivas (exemplo: “cereal é saudável”) e

crenças reflexivas. Este requer um contexto de validação, tal como “o que a

professora diz é verdade”.

Não se está dizendo que os consumidores confiam sempre em propagandas.

Contudo, confiança em propagandas não é um caso preto no branco onde as

afirmações são cognitivamente consistentes, a confiança é menos importante.

Tanaka apresenta a falta de confiança como um problema para o qual a

solução preferida seria a comunicação velada. Contudo, parece que a confiança na

propagada é relativa à força da afirmação feita: e as afirmações são em geral fracas,

servindo mais para reforçar do que para persuadir (SUTHERLAND; SYLVESTER,

2000).

2.1.6 A comunicação velada e os tabus sociais em propaganda

De acordo com Tanaka, a segunda razão para o emprego de comunicação

velada em propaganda é “para evitar a responsabilidade por consequências sociais

Page 30: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 15

de certas implicações decorrentes da propaganda”. O exemplo dado pela autora é

uma propaganda de whisky através de uma jovem atraente: Something that is more

delicious than work. Tanaka acha que ´something´ é ambíguo (implicando sexo).

Segundo Crook (2004), o importante é que um instrumento captador de

atenção é exatamente isso. Somente em alguns casos, i.e., seguindo menção

implícita, pode dar margem à interpretações adicionais.

Imaginemos uma inglesa na Turquia, sem saber falar a língua, diante de um

vendedor que tenta comunicar algo. A intenção informativa está fracamente

evidenciada, mas está claro que existe uma intenção comunicativa.

Um caso semelhante acontece na propaganda (se bem que a incompreensão

pode ser considerada mais grave aqui do que na propaganda).

Não é raro ver uma propaganda opaca em termos informacionais, continua

Crook. Mas o uso da língua é um forte indício de que há intenção comunicativa, o

que fará a audiência persistir na tentativa de recuperar o conteúdo informativo. Além

disso, a mera presença de um outdoor fornece forte evidência da intenção

comunicativa, baseado no conhecimento do passante de propaganda como um

gênero. Um leitor, equipado com o conhecimento de que propaganda é gênero,

tende menos a esperar um grande retorno em termos de ganho cognitivo.

Expectativas de relevância estão ligadas ao gênero, de tal modo que os

propagandistas são constantemente forçados a superar limites na esperança de

conectar-se com a audiência que já viu muito antes.

O segundo caso - da força da evidência para atribuição de intenção - refere-

se à comunicação em que há forte evidência de intenção informativa, mas fraca em

intenção comunicativa. Somente nestes casos, haveria uma comunicação velada.

John Philip (1997, p.89 apud Crook, 2004) identifica três características de

uma propaganda bem sucedida:

(a) Eles são verossímeis e oferecem uma recompensa visual.

(b) São mais visuais que verbais.

(c) Dizem algo importante significativo sobre o produto.

Page 31: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 16

Uma imagem sexual é um instrumento captador de atenção, que pode

também servir de input para processos inferenciais. Contudo, esta segunda função

refere-se à propaganda como um todo, e não somente ao produto: faz parte da

dimensão de recompensa. Fala-se também em abordagens racionais e emocionais

na propaganda, e embora esta tenda mais para uma do que para outra, está claro

que ambas constituem dimensões necessárias de uma propaganda. As afirmações

sobre o produto tendem a apresentá-lo racionalmente (consistência cognitiva) e

emocionalmente (através da recompensa).

2.2 A Linguística Crítica

A abordagem crítica inclui a Linguística Crítica, de Fowler et al (1979, 1991), o

trabalho de Fairclough sobre linguagem e poder (1989, 1992a, 1992b), a abordagem

da análise do discurso desenvolvida por Pêcheux (1982), estudos culturais

desenvolvidos mais recentemente (SCANELL, 1991) e os trabalhos sobre linguagem

e gênero (CAMERON, 1985, 1990; CALDAS-COUTHARD e COUTHARD, 1996,

entre outros).

Hoje, rejeitam-se dois “dualismos prevalecentes e relacionados” na teoria

linguística tradicional: (i) o tratamento dos sistemas linguísticos como autônomos e

independentes de contexto, isto é, do “uso” da língua e (ii) a separação entre

“significado” e “estilo” ou “expressão” (ou entre “conteúdo” e “forma”). “A linguagem

na sociedade serve para confirmar e consolidar as organizações que a moldam”

(FOWLER et al, 1979, p. 190). Estende-se a 'hipótese Sapir-Whorf' - o determinismo

linguístico - de que a linguagem incorpora visões de mundo particulares a

variedades da mesma língua; os textos particulares incorporam ideologias ou teorias

particulares, e o propósito é a interpretação crítica de textos: “a recuperação dos

sentidos sociais expressos no discurso pela análise das estruturas linguísticas à luz

dos contextos interacionais e sociais mais amplos” (FOWLER et al., 1979, p.195-

196).

O ponto teórico principal na análise de Fowler é de que qualquer aspecto da

estrutura linguística carrega significação ideológica - seleção lexical, opção sintática

etc. – todos têm sua razão de ser. Há sempre modos diferentes de dizer a mesma

coisa, e esses modos não são alternativas acidentais. Diferenças em expressão

Page 32: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 17

trazem distinções ideológicas (e assim diferenças de representação). Mas, para

Fowler, na medida em que há, sempre, valores implicados no uso da língua, deve

ser justificável praticar um tipo de linguística direcionada para a compreensão de tais

valores. Esse é o ramo que se tornou conhecido como Linguística Crítica.

A análise crítica está interessada no questionamento das relações entre

signo, significado e o contexto sócio-histórico, que governam a estrutura semiótica

do discurso, usando um tipo de análise linguística. Ela, procurando e estudando

detalhes da estrutura linguística à luz da situação social e histórica de um texto, traz

para o nível da consciência os padrões de crenças e valores que estão codificados

na língua – e que estão subjacentes à notícia, para quem aceita o discurso como

“natural”. O autor indica a Linguística Sistêmico-Funcional como a teoria e a

metodologia mais adequadas para efetivar sua proposta.

2.3 A Análise do Discurso Crítica

Para que um método e análise do discurso sejam úteis teria de preencher

algumas condições mínimas, segundo Fairclough (1992).

Primeiro, seria necessário um método para análise multidimensional . A

abordagem tridimensional (de Fairclough) permite avaliar as relações entre mudança

discursiva e social e relacionar sistematicamente propriedades detalhadas de textos

às propriedades sociais de eventos discursivos como instâncias de prática social.

Segundo, seria necessário um método de análise multifuncional . Um bom

ponto de partida é uma teoria sistêmica da linguagem (HALLIDAY, 1978) que

considera a linguagem como multifuncional e considera que os textos

simultaneamente representam a realidade, ordenam as relações sociais e

estabelecem identidades. Essa teoria de linguagem pode ter aplicações úteis

quando combinada à ênfase nas propriedades socialmente construtivas do discurso

nas abordagens socioteóricas do discurso, como a de Foucault (1987).

Terceiro, seria necessário um método de análise histórica . Deve focalizar a

estruturação ou os processos “articulatórios” na construção de textos, e na

constituição a longo prazo de “ordens de discurso” isto é, configurações totais de

práticas discursivas em instituições particulares, ou mesmo em toda uma sociedade.

Page 33: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 18

Quarto, seria necessário um método crítico . “Crítico” implica mostrar

conexões e causas que estão ocultas; implica também intervenção - por exemplo,

fornecendo recursos por meio da mudança para aqueles que possam encontrar-se

em desvantagem. As relações entre a mudança discursiva, social e cultural não são

transparentes para as pessoas envolvidas.

Passo, então, a apresentar a Linguística Sistêmico-Funcional, indicada tanto

por Fowler como por Fairclough como tendo as características necessárias para

realizar uma análise crítica da linguagem. Essa abordagem será também a que

apoiará minhas análises das propagandas de cerveja.

2.4 A Linguística Sistêmico-Funcional

Segundo Eggins (1994), a abordagem da Linguística Sistêmico-Funcional

(LSF) considera que a língua serve para construir três significados: ideacional,

interpessoal e textual. A metafunção ideacional representa os eventos das orações

em termos de fazer, sentir ou ser, através do sistema da Transitividade [envolvendo:

Participantes - Processo - Circunstância]; a metafunção interpessoal envolve as

relações sociais com respeito à função da oração no diálogo, e referem-se a dar ou

pedir informação ou bens e serviços [envolvendo: Sujeito - Finito (mood e

modalidade) - Resíduo]. Finalmente, a metafunção textual organiza os significados

ideacional e interpessoal de uma oração, retrabalhando quais os significados que

são representados em primeiro lugar ou no final da oração [envolvendo: Tema e

Rema]. O conceito de metadiscurso aqui está fortemente influenciado pela distinção

de Halliday das três funções do uso da linguagem.

Essas metafunções agem juntas: cada palavra que dizemos realiza as três

metafunções. Em sendo assim, tudo que expressamos linguisticamente quer dizer,

simultaneamente, três coisas: alguma coisa (ideacional) dita a alguém (interpessoal)

de algum modo (textual).

Vejamos como o exemplo: “Elza comprou livros na exposição”, seria

analisado nessas metafunções, conforme apresenta o Quadro 3. Mas, antes

apresentamos o Quadro 2, que mostra o sistema da Transitividade, pertencente à

metafunção ideacional, que representa os eventos das orações em termos de fazer,

Page 34: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 19

sentir ou ser, envolvendo: (a) participantes; (b) processos; e (c) circunstâncias. Os

integrantes das demais metafunções podem ser visualizados no mesmo quadro.

Quadro 2 - Processos e Participantes

Processo Participantes

Material Ator, Meta, Extensão, Beneficiário

Comportamental Comportante, Comportamento, Fenômeno

Mental Experienciador, Fenômeno

Existencial Existente

Relacional Identificativo: Característica, Valor

Atributivo: Portador, Atributo

Verbal Dizente, Receptor, Verbiagem, Receptor, Alvo

Quadro 3 - As três metafunções (Fonte: HALLIDAY, 1994)

Elza compr- -ou livros na exposição

Ideacional Ator processo material Meta Circunstância

Mood Resíduo Mood Resíduo Interpessoal

Sujeito Predicador Finito Complemento Adjunto adverbial

Textual Tema Rema

Em relação à metafunção ideacional, o verbo “comprar” expressa um

processo material, “Elza” um participante “Ator”, “livros” um participante “Meta” e “na

exposição” uma Circunstância de tempo. Esses elementos representam a

Transitividade da oração.

Em relação à metafunção interpessoal, é uma sentença declarativa, na qual

“Elza” realiza o Sujeito, a terminação “–ou” (da forma verbal “comprou”) o Finito, e

“compr-“ (da forma verbal “comprou”) o Predicador. “Elza” ainda realiza o Mood e o

restante da frase forma o Resíduo (exceto o “ou”, que faz parte do Finito).

Em relação à metafunção textual, “Elza” realiza o Tema da frase e o restante,

o Rema. O Tema é o ponto de partida da mensagem e indica uma posição

importante na frase, ajudando a estruturar o discurso e a dar proeminência aos

elementos que o compõem.

Essa fusão dos três significados é possível, diz Halliday (1994), porque a

língua possui um nível intermediário de codificação: a léxico-gramática. É este nível

que possibilita à língua construir três significados concomitantes, e eles entram no

Page 35: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 20

texto através das orações. Por isso a afirmação de Halliday: “a descrição gramatical

é essencial à análise textual”.

A partir de cada metafunção, são realizadas muitas outras funções, cada uma

em um sistema diferente. Cada realização, por sua vez, é uma escolha. A escolha é

entendida aqui como um ato normalmente inconsciente, guiado por motivos

individuais, segundo nossas intenções, vontades, afetividade, subjetividade, mas

também por razões sociais, históricas e culturais, ditadas pelo contexto. Sendo

assim, a LSF é uma teoria que tenta explicar o funcionamento da linguagem por

meio da descrição de como as pessoas falam e escrevem e quais escolhas fazem

nesse processo.

A LSF explica o modo como esses significados são construídos nas

interações linguísticas do dia-a-dia. Por isso, requer a análise de produtos autênticos

das interações sociais (textos orais ou escritos), levando em conta o contexto

cultural e social em que ocorrem a fim de entender a sua qualidade: por que um

texto significa o que significa, e por que ele é avaliado como o é. Por outro lado,

ninguém usa a língua, isto é, fala ou escreve, sem um propósito (função) em mente.

Alguns fatos mostram que língua e contexto estão inter-relacionados, continua a

autora: (a) somos capazes de deduzir o contexto de um texto (um texto carrega

aspectos do contexto em que foi produzido); (b) somos capazes de predizer a língua

através de um contexto; e (c) sem um contexto não somos capazes, em geral, de

dizer que significado está sendo construído. Portanto, ao fazermos perguntas

funcionais, não é suficiente enfocarmos somente a língua, mas a língua usada em

um contexto. Mas quais as feições desse contexto afetam o uso da língua? Para

responder a essa questão, os sistemicistas lançam mão de dois conceitos: registro e

gênero.

O conceito de registro é uma explicação teórica da observação do senso

comum de que usamos diferentes linguagens em diferentes situações. Para a LSF, o

registro descreve a influência das dimensões do contexto situacional imediato sobre

a língua. Tais dimensões são três: Campo, Relações e Modo, que são, por sua vez,

organizados, respectivamente, pelas metafunções ideacional, interpessoal e textual.

A noção de gênero é devida a Bakhtin (1997), que o definiu como sendo

“tipos relativamente estáveis de enunciados elaborados por cada esfera de utilização

Page 36: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 21

da língua” e incluem desde o diálogo cotidiano até a exposição científica. Em

sistêmica, Martin (1984, p. 25) o definiu como “uma atividade, organizada em

estágios, orientada para uma finalidade na qual os falantes se envolvem como

membros de uma determinada cultura”. Menos tecnicamente, ele diz que gêneros

são como as coisas são feitas, quando a linguagem é usada para efetivá-las. No

caso desta pesquisa, examinaremos o gênero propaganda nas revistas Veja Rio, da

Lapa e VIP.

Além dessas dimensões contextuais, a ideologia, que é um nível superior de

contexto, tem chamado à atenção dos sistemicistas, na medida em que, em

qualquer registro, em qualquer gênero, o uso da língua será sempre influenciado

pela nossa posição ideológica (nossos valores, nossas tendências, nossas

perspectivas). Porém, por razões que são elas mesmas de natureza ideológica,

muitas pessoas não foram educadas para identificar a ideologia nos textos, e por

isso os “leem” como se fossem representações naturais e inevitáveis da realidade.

2.4.1 A função interacional

Thompson e Thetela (1995, p.103-127) afirmam que a função interativa da

linguagem ocorre não somente na modalidade falada, como muitos acreditam, mas

também na modalidade escrita. Para entender a questão, eles distinguem dois tipos

de abordagem na investigação da interação na escrita: (a) orientada-para-

informação (amiga do leitor): são as necessidades do leitor que são levadas em

consideração; (b) orientada-para-função (não amiga do leitor) (manipulativa): o

escritor conduz a interação, atribuindo papéis (perguntador e respondedor) e se

imiscuindo na mensagem através de comentários e avaliações.

Eles observam que a metafunção interpessoal, da LSF, envolve, na realidade,

duas funções: (i) pessoal (posição do falante) [a modalidade, da LSF] e (ii)

interacional (a relação entre os interlocutores) [o mood, da LSF]. Note-se que, na

LSF, o mood envolve a modalidade, fato contestado por Thompson e Thetela, já que

o mood se refere à interação e a modalidade refere-se ao posicionamento pessoal.

Veja Quadro 4:

Page 37: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 22

Quadro 4 - Sistema interpessoal (Fonte: THOMPSON & THETELA ,1995)

Modalidade10 responsabilidade aceita

responsabilidade camuflada pessoal (modalidade)

avaliação proposicional

encaixada

papéis desempenhados

direto indireto

INTERPESSOAL

interacional (mood)

papéis projetados nomeação atribuição

Os autores examinam a função interacional : (a) papéis desempenhados -

realizados pelo ato de fala por si (o participante não pode deixar de desempenhar

estes papéis: e.g., “perguntador” ou “respondedor”) e (b) papéis projetados - a

rotulação do falante/ouvinte (“você”, “leitor”).

Na análise da distribuição de poder na interação, é importante ter em mente

que a relação entre o escritor-no-texto e o leitor-no-texto é inversa da relação entre

escritor e leitor. Isto é, na realidade o agente de propaganda está em posição inferior

ao do leitor (pois precisa que este compre o produto etc.), mas, com exceção de

propaganda para fins de caridade, quando o escritor-no-texto se relaciona com o

leitor-no-texto de igual para igual ou colocando-se numa posição superior.

2.4.1.1 Papéis desempenhados

São as escolhas no elemento de mood da oração para atribuir certos papéis

aos participantes do evento linguístico: o escritor, ao escolher uma declarativa ou

interrogativa age no papel daquele que dá ou pede uma informação, colocando o

leitor no papel complementar daquele que aceita ou fornece. Os autores enfocam as

perguntas e as ordens.

(a) Perguntas

(i) Algumas perguntas exigem uma resposta mínima do leitor: sim, não.

(ii) Outras propagandas adotam uma estratégia mais arriscada:

10 Ex.: Subjetivo: Eu acho que esteja errado. Objetivo: Há a possibilidade de que ele esteja errado.

Page 38: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 23

(4) Enquanto alguns estão fazendo fila para comprar na loja X, o que você está

fazendo?

(iii) Em outros casos, as perguntas funcionam na interação como se fossem

realizadas pelo leitor à procura de informação.

(5) Mas você gostaria que seus filhos tivessem que pagar por isso?

(b) Ordens

Qualquer propagada pode ser vista na essência como uma ordem: uma

tentativa linguística para influenciar o comportamento de outros participantes. Mas a

maioria dessas ordens aparece suavizada através de referência a benefícios que o

leitor usufruiria se elas fossem seguidas, apontando, por outro lado, para a

responsabilidade dessa obediência.

(6) Complete o cupom abaixo.

2.4.1.2 Papéis projetados

São papeis atribuídos pelo escritor por meio de rótulos explícitos aos

participantes no evento linguístico e pode ser feitos através de: (a) nomeação e (b)

papéis atribuídos.

(a) Nomeação

O modo mais comum de os escritores se referirem a si mesmos é através de

nós ou do nome da companhia.

(7) As Casas Bahia vendem tudo sem juros.

(b) Papéis atribuídos

São os papéis atribuídos aos participantes no sistema da transitividade, da

LSF. Um dos papéis projetados no leitor-no-texto é bem previsível: o de Beneficiário

(“aquele para quem o processo acontece”).

(8) Enviaremos a você um livreto grátis.

Page 39: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 24

Este é o ponto em que o componente interpessoal se sobrepõe ao ideacional

no modelo de Halliday, já que, se o escritor projeta papéis, a pessoa sobre quem o

papel é projetado é simultaneamente um participante no evento linguístico e um

participante na oração: no caso, ele é nomeado de “você” e é o Beneficiário, no

sistema da Transitividade da oração.

2.4.2 A função pessoal - A Avaliatividade

Para Volosinov (1973), muitas abordagens linguísticas supõem que a função

mais comum da língua seja a proposicional, ou referencial. Porém, quando olhamos

para a ocorrência e a combinação reais de elementos gramaticais e lexicais da

conversa, o que vemos é que a expressão avaliativa feita pelo falante e seu impacto

na estrutura da interação não estão separados do relato dos acontecimentos e

atores do mundo.

Martin (2000) afirma que o que tendeu a ser omitido pelas abordagens da LSF

é a semântica da avaliação, isto é, o modo como os interlocutores estão se sentindo,

os julgamentos que eles fazem, o valor que eles atribuem a vários fenômenos de

sua experiência. Ele está interessado em mostrar que a avaliação é complexa para

operar, mas que pode ser reduzida a um pequeno número de conjuntos básicos de

opções: o que parece ser, a princípio, um grupo variado intratável de itens lexicais,

pode ser sistematizado. Ele demonstra que esses conjuntos de opções estão

relacionados consistentemente a outros conjuntos de opções no significado

potencial da língua. O autor valoriza o aspecto central da avaliação e a vê como uma

parte vital da negociação do significado que é o coração de toda a comunicação.

O sistema de escolhas usado para descrever essa área de significado é

chamado por Martin de Avaliatividade, constituído por três principais sistemas:

(a) ATITUDE, que envolve três sub-sistemas, a saber:

(i) AFETO, que trata da expressão da emoção (felicidade, medo etc.);

(ii) JULGAMENTO, que trata da avaliação moral do comportamento

(honestidade, bondade etc.); e

Page 40: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 25

(iii) APRECIAÇÃO, que trata da avaliação estética (sutileza, beleza

etc.).

Esses sub-sistemas se ligam a dois outros: (b) COMPROMISSO, que trata do

grau de compromisso do escritor à avaliação que expressa, o que é feito através da

modalidade e sistemas relacionados. O Compromisso foi detidamente estudado por

White (2003). Em termos amplos, o autor distingue entre enunciados heteroglóssicos

ou dialógicos (nos quais se sinaliza uma posição que explicitamente mostra

diversidade de opiniões, com implicação de conflito e luta entre as vozes); e

enunciados monoglóssicos (em que o escritor se posiciona, construindo a audiência

como partilhando a mesma visão de mundo); e, finalmente; (c) GRADAÇÃO, que

trata dos recursos para intensificar ou minimizar a força da avaliação (aumentando

ou diminuindo) ou o foco da avaliação (aguçando ou amenizando).

Diz o autor, que os sistemas de Avaliatividade também se ligam a outros

sistemas, no sentido de “redundar” com outras partes da léxico-gramática, cobrindo

a mesma área semântica com o uso de diferentes recursos linguísticos. Assim, por

exemplo, o significado apreciativo (metafunção interpessoal) em: (1) O filme era

muito triste, está próximo, em termos semânticos, ao do processo mental11 de

afeição (metafunção ideacional): (2) O filme me comoveu até as lágrimas.

Continuando, Martin diz que, quando a avaliação é realizada explicitamente, é

fácil analisar uma atitude sobre um evento como positiva ou negativa. Assim, por

exemplo, em (9) há a expressão de Afeto positivo e em (10), de Afeto negativo:

(9) Felizmente, Maria confrontou a autoridade.

(10) Infelizmente, Maria confrontou a autoridade.

Mas, há casos em que a avaliação não é realizada de maneira explicita como em:

(11) Maria confrontou a autoridade.

Diz ele que, em casos como (9) e (10), a decisão pela Avaliatividade de Afeto,

se positiva ou negativa, depende da posição de leitura. Assim, deve-se considerar o

fato de que o que conta como Avaliatividade depende do Campo do discurso. Por

11 Veja Transitividade (Halliday, 1994)

Page 41: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 26

isso, significados ideacionais, que não se valem de léxico avaliativo podem ser

usados para evocar apreciação, assim como afeto e julgamento.

Nesse sentido, Martin afirma que o significado interpessoal pode ser realizado

através de configurações ideacionais, e propõe a noção de token de atitude para

denominar o modo pelo qual o significado ideacional pode ser “saturado” em termos

avaliativos, ou seja, interpessoais. Dessa forma, enquanto os elementos de

Avaliatividade (Martin, 2000): Afeto, Julgamento e Apreciação – referentes ao

posicionamento pessoal do autor do texto – são frequentemente inscritos, explícita

diretamente em um texto (através de léxico como: medo, covardemente ou

significativo), o token de atitude é um termo que se refere à realização indireta de

avaliação. Essa noção possibilita à teoria dar conta de uma palavra ou conjunto de

palavras que são usados para disparar ou evocar um julgamento por parte do leitor.

Como Martin (1992, p. 553-559) e outros notaram, as realizações de

significados interpessoais, incluindo modalidades e atitudes, tendem a ser mais

“prosódicas” que as realizações mais segmentáveis e localizadas dos significados

ideacionais. Podemos interpretar esse fato, dizendo que componentes redundantes,

qualificadores e amplificadores ou restritivos, daquilo que é funcionalmente uma

única avaliação, espalham-se através da oração ou da oração complexa ou, mesmo,

de longos trechos de um texto. Quando isso acontece, eles se sobrepõem a outros

significados avaliativos, e os escritores experientes encontram meios de integrar

suavemente os resultados através de delicadas escolhas lexicais e

interdependências gramaticais. Ficará claro também que as avaliações de

proposições e propostas não são independentes, em longos textos, da avaliação de

participantes, processos e circunstâncias incluídos em proposições e propostas.

Por outro lado, Lemke (1998) fala em propagação sintática, isto é, o fato de a

avaliação em relação a um elemento estrutural poder-se transferir para outro

elemento. É interessante, diz o autor, que a Polaridade dessas avaliações pode ser

revertida durante a propagação (o Grau normalmente se propaga sem mudança) por

meio de várias locuções. Ele também propõe a noção de avaliação prospectiva e

retrospectiva estendida, em que, através da avaliação, estabelece-se uma cadeia de

referência catafórica e prospectivamente avalia o futuro conteúdo da cadeia

estendida, através de trechos do texto.

Page 42: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 27

2.5 A fórmula “AIDA”

Uma maneira de olhar a propaganda feita pelos fabricantes de cerveja é a

proposta de Ungerer (2004, p.307-328), que examina as características que, de um

modo geral, estão presentes em toda propaganda. As propagandas, segundo ele,

seguem uma estratégia, cujos objetivos sempre são condensados em fórmulas

acronímica, a mais velha e mais conhecida é a fórmula da AIDA (Atenção –

Interesse – Desejo – Ação). Ao aplicar esta fórmula nas propagandas para o

consumidor podem-se definir as funções da manchete e da ilustração para chamar a

ATENÇÃO e criar INTERESSE, os elementos pictóricos (geralmente contendo uma

réplica do produto anunciado), parece querer despertar o DESEJO, um objetivo

também apoiado pelo texto do corpo do texto, geralmente uma lista de vantagens

sobre o produto ou um apelo (pseudo) lógico. A linha para assinatura e o logo são

usados para atrair DESEJO por certa marca ou empresa, enquanto que os detalhes

como endereço da empresa, ajudam a transformar o DESEJO em AÇÃO.

Os consumidores atuais estão se tornando mais seletivos e sofisticados.

Tirando as propagandas criadas para chamar a ATENÇÃO e criar INTERESSE, o

componente do desejo tende a ser expresso muito indiretamente, geralmente pelo

meio de metáforas, enquanto que a AÇÃO é reduzida ao oferecimento de linha

direta para o consumidor.

A fórmula AIDA é aceita como uma maneira prototípica de estabelecer metas

estratégicas para as propagandas, apesar disto não significar que o peso dos

elementos individuais ou da motivação por trás deles. Enquanto fica claro que a

ATENÇÃO e o INTERESSE (que são inseparáveis) têm uma função introdutória

para o DESEJO, o elo para chamar a atenção é menos certo e obviamente depende

da força do DESEJO gerado. Isto aponta o desejo como elemento central da fórmula

AIDA, e ao mesmo tempo seleciona o DESEJO como um princípio motivador da

CREDIBILIDADE. Nesse sentido, propagandas de sucesso significam “liberar o

desejo adormecido do consumidor”, e isto pode ser alcançado de muitas maneiras

diferentes – por elementos visuais sugestivos, por argumentação lógica ou mais

genericamente. Usa-se, então, a credibilidade para apoiar o DESEJO e convertê-lo

em AÇÃO de compra, que é a meta principal da propaganda ao consumidor.

Notemos, porém, que nem todos os elementos de AIDA são factuais, encontradiços

Page 43: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 28

no mundo real. Daí a necessidade da criação de um mundo ficcional, como veremos

a seguir.

2.6 A criação do “mundo textual”

A teoria do mundo textual desenvolvida por autores como Semino (1997) e

Werth (1999) retoma as noções derivadas da tradição do texto linguístico. Essas

teorias veem o processamento de um texto como um evento dinâmico em que tanto

o autor quanto o leitor desempenham papéis ativos; nessa perspectiva, a

negociação é um elemento crucial de interação, já que antecipa e determina a

natureza do discurso que se desenrola. Assim, em Werth (1995b, p. 95), o discurso,

em linhas gerais, é um esforço deliberado e conjunto por parte do produtor e do

receptor para criar um “mundo” dentro do qual as proposições apresentadas são

coerentes e fazem sentido. Essa definição baseia-se na visão dinâmica do processo

da comunicação e na hipótese cognitiva de que os participantes em situação de

comunicação constroem ativamente os contextos partilhados, que surgem na

interação entre a informação do texto e o conhecimento trazido pelos participantes

para a situação discursiva.

Downing (2003) explora o modo como se criam mundos textuais no discurso

da propaganda, analisando as escolhas linguísticas e as feições de contexto, que

são cruciais na determinação das relações específicas entre produtor e audiência,

em particular, o frame, o conhecimento de mundo compartilhado por eles.

Argumenta-se que o modelo do mundo textual é adequado para a descrição da

maneira pela qual o discurso da propaganda é processado de modo ativo, dinâmico

e dependente de contexto. Nesse processo, o receptor reconstrói o mundo projetado

no discurso de acordo com seu próprio conhecimento cultural e pessoal, a partir de

pistas linguísticas e visuais da propaganda. Apesar de o discurso da propaganda

estabelecer relações complexas entre os componentes visuais e textuais dos

anúncios, a autora tem seu foco nos aspectos textuais e faz apenas algumas

referências a informação visual.

A teoria de mundo textual tal como desenvolvida, entre outros, por Semino

(1997) e Werth (1999, apud DOWNING, 2003) traz consigo noções derivadas da

tradição da linguística textual e noções de teorias mais recentes como a metáfora e

Page 44: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 29

espaços mentais. Essas teorias compartilham uma visão de processamento de texto

como um evento dinâmico em que tanto o autor quanto o leitor desempenham

papéis ativos; nessa perspectiva, a negociação é um elemento crucial de interação,

já que antecipa e determina a natureza do discurso que se desenrola. O discurso,

em linhas gerais, é um esforço deliberado e conjunto por parte do produtor e do

receptor para criar um mundo dentro do qual as proposições apresentadas são

coerentes e fazem sentido. Assim, recorre-se, por exemplo, à criação de um tom

conversacional no discurso da propaganda estabelecendo um relacionamento entre

personagens do mundo de ficção e destinatário com base na suposição de

conhecimento partilhado que determina um sentimento de urgência, confiança,

informalidade e intimidade.

A natureza cognitiva da noção de mundo textual é defendida por Semino

(1997, p.1): “Quando lemos, inferimos ativamente um mundo textual atrás do texto”.

Por mundo textual ele se refere ao contexto, ao cenário ou ao tipo de realidade que

é evocado em nossas mentes durante a leitura e que (concluímos) é referido pelo

texto. O mundo textual não é uma entidade fixa que é percebida da mesma maneira

pelos leitores; de fato, nem há garantia de que os receptores construirão o mundo

textual pretendido pelo produtor.

Nesse sentido, a noção de frame segundo Downing (2003), é fundamental

para a compreensão desses fenômenos. O frame é definido como estrutura

cognitiva de suposições culturalmente determinadas e expectativas desenvolvidas a

partir de experiências passadas em situações semelhantes. O frame evoca o

conhecimento pessoal e cultural relevantes para a coerência de um texto. O papel

do frame é crucial no processamento da informação do texto porque permite a

introdução de elementos default, isto é, a informação que se conforma a padrões já

existentes e que são apresentados como dados. A distinção entre informação dada

e nova é crucial na construção de mundos textuais da propaganda, já que o que é

apresentado como informação dada codifica pressuposições de um discurso, isto é,

a informação que é aceita como verdadeira, e que, como consequência, tem uma

base ideológica.

Por outro lado, é crucial nessa questão, a noção de escolha linguística,

explorada na linguística funcional (HALLIDAY, 1973, 1994): escolhas feitas no

Page 45: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 30

discurso em diferentes níveis linguísticos [léxico, morfologia, sintaxe, fonologia] são

significativos e determinam a criação de diferentes significados, diferentes

interpretações da realidade, ou diferentes visões de mundo. Como foi explicado por

Fowler (1991), as visões de mundo reproduzem tipicamente ideologias, neste

sentido, a língua como ferramenta para classificação e interpretação da realidade,

constrói as versões de “senso comum” de como as coisas são ou deveriam ser no

mundo.

Essa relação indireta entre a mente humana e a realidade, domínios que são

mediados pela língua, é salientada por abordagens cognitivistas recentes do estudo

da língua (LAKOFF; JOHNSON, 1980; VAN DIJK; KINTSCH, 1983; FAUCONNIER,

1985; SEMINO, 1997; WERTH, 1999). Assim, as teorias cognitivas baseadas em

noções como frame, modelos mentais e mundo enfatizam o papel ativo

desempenhado pelo leitor na construção de mundo que é evocado pelo texto em

sua mente. Portanto, falar em discurso entendido como texto em contexto significa

não somente tratar de fatores pragmáticos, mas também da criação de específicos

mundos mentais ou construções de uma dada realidade.

2.7 Interação como o texto multimodal: reflexões so bre imagem e palavreado

O fenômeno do texto composto ou multimodal é um desafio para analistas do

discurso, particularmente para os que trabalham com ferramentas linguísticas

moldadas para o texto verbal, diz Macken-Horarik (2004). Ela analisa a contribuição

complementar entre imagem (ilustrações) e palavras (do texto) no processo da

construção de significados. Apoiando-se principalmente na análise da

AVALIATIVIDADE praticada na Sydney School linguistics, ela propõe uma avaliação

mais rica da imagem e da verbiagem do que é feito atualmente em análises desses

modos. Uma gramática semiótica nesses moldes foi desenvolvida por Gunther Kress

e Theo Van Leeuwen em Reading Images (1996), em que, amparados pela

Linguística Sistêmico-Funcional, os autores fornecem um enquadramento teórico

consistente para a análise de textos visuais.

Primeiramente, diz Macken-Horarik, lidamos com textos multimodais

diariamente, sempre que lemos jornais, assistimos à televisão, jogamos videogame

Page 46: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 31

ou até mesmo quando lemos um livro. Nosso enquadre semiótico de análise deveria

permitir-nos compreender mais sobre a contribuição dos diferentes modos nas

nossas práticas da semiótica em mutação. Segundo, a multimodalidade está cada

vez mais incorporada ao currículo escolar, e precisamos abordá-la em nosso

trabalho educacional. A maior parte dos jovens alunos são mais hábeis do que seus

pais na utilização da tecnologia da informática nos contextos de lazer e na escola.

Porém, além do conhecimento prático, eles precisam ter acesso a ferramentas

analíticas que tornem as potencialidades e os limites dessas modalidades mais

aparentes e mais suscetíveis a desafios e ao seu redesenho onde necessário.

Nossos programas de letramento precisam facilitar o trabalho metasemiótico dos

nossos alunos.

Na pesquisa que faz, a autora notou que os espectadores em geral mudam

entre imagem e verbiagem quando reagem a cada obra. Muitos deles olham para as

imagens por um tempo, leem o painel de texto, depois voltam à imagem. Como eles,

a autora também usava a escrita como um meta comentário da imagem, uma

oportunidade de ver a obra do ponto de vista do artista-aluno. Ela reagia, num

primeiro momento, frequentemente de modo difuso, à imagem e depois a re-

enquadrava à luz do painel de texto, que dirigia seu olhar a certas qualidades da

obra. Quando voltava à imagem, havia mais significado do que antes.

2.7.1 As ferramentas

A fim de desenvolver uma gramática semiótica adequada para a análise do

discurso multimodal, temos de começar de algum lugar, afirma Macken-Horarik. A

Linguística Sistêmico-Funcional (LSF) de Halliday tem se revelado útil em vários

aspectos. Primeiramente, a LSF tenta relacionar as estruturas linguísticas ao

contexto social em que são produzidas. Halliday e seus colaboradores partem do

pressuposto de que a “língua é como é devido às funções que serve na vida das

pessoas, e assim precisamos proceder de fora para dentro, interpretando a língua

com referência ao seu lugar no processo social” (HALLIDAY, 1978, p. 4). A relação

das estruturas linguísticas com os processos sociais faz da LSF um recurso útil para

o estudo mais amplo de diferentes modos semióticos. O foco na relação entre

estruturas sociais e linguísticas tem lhe dado uma face “de aplicação” poderosa em

Page 47: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 32

relação a outras gramáticas, levando a pesquisas influentes na educação entre

outras áreas institucionais.

Segundo, como uma gramática, a LSF permite mapear não apenas palavras,

mas a combinação de palavras a que Halliday chama de ‘wordings’, e interpreta

esses sintagmas (grupos) linguísticos em termos funcionais. Até agora, tem havido

pouquíssimas análises sistemáticas de estruturas análogas em comunicação visual.

Como Kress et al. (1997, p. 260 apud Macken-Horarik, 2004) afirmam, a análise de

imagens tem se detido em itens de conteúdo, ou “léxico”, e não na estrutura interna

das imagens, ou “sintaxe”. Essa é uma tarefa importante se quisermos desenvolver

uma “gramática” que nos possibilite entender a relação entre as estruturas

linguísticas e não linguísticas.

Em terceiro lugar, a LSF é uma gramática orientada para escolhas em vez de

regras. As escolhas linguísticas são modeladas em termos de sistema de redes –

uma gama de opções relacionadas a diferentes significados, que são realizadas por

uma seleção léxico-gramatical (tipos de oração e frase). Embora não seja apropriado

para todos os tipos de estrutura de significado (prosódia, gradação e intensidade), o

sistema é um recurso útil de representação para a exibição de opções discretas de

sentido em diferentes contextos semióticos (fala, escrita e, a partir de agora,

imagem).

Em quarto lugar, a LSF incorpora três tipos de significados na análise da

comunicação humana. Essas metafunções incluem: o significado interpessoal

(relações sociais e de identidade que atuam e são usadas nos textos); ideacional (a

representação empírica da realidade experiencial ou, melhor, realidades nos textos);

e significados textuais (os modos pelos quais os textos são feitos coerentes e

relacionados ao seu contexto). O princípio das metafunções forneceu aos

semioticistas categorias abstratas e gerais para a análise de diferentes sistemas

semióticos.

Kress and Van Leeuwen consideram três sistemas principais para análise do

significado nas imagens interativas, que incluem: o sistema de contato , através do

qual a imagem age sobre o expectador de alguma maneira (exigindo uma resposta

ou oferecendo uma “informação” visual); o sistema de distância social , através do

qual o espectador é convidado a aproximar-se dos participantes representados

Page 48: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 33

(distância social íntima), mantida a uma distância razoável (distância social) ou “na

posição de afastamento” (distância impessoal); e dois grupos de sistemas dentro de

atitude: dimensão horizontal , que cria envolvimento dos espectadores (por meio da

frontalidade) ou afastamento (através da lateralidade), e da dimensão vertical , que

cria a relação de poder entre o espectador e participantes representados

(hierárquico ou solidário). Esses recursos visuais correspondem mais ou menos aos

sistemas linguísticos, tais como, os atos de fala, o modo, a pessoa e os recursos

como a avaliação.

A seguir, o Quadro 5 resume o apoio teórico que orientará minha análise das

propagandas de cerveja. A análise de cunho crítico tem apoio, em especial, da

Linguística Sistêmico-Funcional.

Page 49: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Apoio teórico 34

Quadro 5 - Resumo do apoio teórico

AS TEORIAS QUE APOIAM A ANÁLISE DAS CERVEJAS

Características gerais da propaganda Em resumo, a propaganda: (i) informa - diverte - aconselha - defende - etc. (ii) conservativa (apoio em valores aceitos) x inovativa (valores jovens) [para atingir máximo de público]

(iii) leitor ativo (interage com o texto) x leitor passivo (aceita a identidade imposta pela propaganda)

(iv) apoio em trocadilho, metáfora, metonímia, tom conversacional.

(v) apoio em pronome, elipse, pressuposição, dêiticos.

(cf.: COOK, 1992; TANAKA, 1994,1999; CAMPOS PARDILLOS,1995; JOHN PHILIP,1997; DOWNING, 2003; CROOK, 2004).

Ungerer (2004) Fórmula AIDA (Atenção - Interesse - Desejo – Ação)

Kitis & Milapides (1997) Persuasão [convicção - sedução]

Thompson e Thetela (1995) Modo interacional: papéis desempenhados [pergunta + ordem] e papéis projetados [nomeação + atribuição]

Martin (2000, 2003) Avaliatividade: (i) Compromisso [monoglossia - heteroglossia] (ii) Atitude [Afeto - Apreciação - Julgamento] (iii) Graduação [Força e Foco] Lemke (1998) Propagação sintática

Macken-Horarik (2004) e Kress & van Leeuwen (1996) Relação entre o visual e o verbal:

SISTEMAS

de contato de distância social de atitude

● chamam atenção ou ● oferecem informação

● aproximar (tamanho) ● afastar (idem)

● horizontal (envolvimento) ● vertical (hierarquia)

Os textos verbais e visuais, assim, criam tipos complementares de contato com seu destinatário.

Page 50: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Metodologia 35

3 METODOLOGIA

3.1 Dados

Analisarei duas propagandas:

a) Propaganda da Skol “Chegou Skol 360ºgraus” - veiculada na Revista Veja Rio -

edições de 18 de maio e 15 de junho de 2011 e Revista da Lapa - edições de

maio e julho de 2011.

A AmBev lançou em São Paulo a Skol 360º. Após três anos de pesquisas, a

companhia promete ao consumidor uma cerveja que “não estufa”, fruto de antiga

reivindicação do público cervejeiro, segundo detectou a empresa. A comunicação

trouxe o conceito do “homem baiacu”, relacionado ao grupo de pessoas que quando

toma cerveja se sente estufado.

Para desenvolver a Skol 360° , a equipe de mestres-cervejeiros da AmBev

trabalhou em conjunto com profissionais da AB-Inbev de todo o mundo. O produto

final só foi concluído depois de mais de 30 protótipos desenvolvidos, de acordo com

a AmBev. Mais de quatro mil consumidores foram ouvidos em pesquisas, cujos

resultados mostraram que uma parcela do público solicitava um líquido capaz de

reduzir a sensação de estufamento.

Nesse contexto, a classificação do Prêmio Folha Top of Mind, pesquisa

realizada pelo instituto Datafolha, elegeu, em 2011, a marca Skol, pela décima vez

na categoria cerveja na internet, com um índice de 41%. Skol é lembrada

principalmente pelos jovens (50%). Detentora do prêmio Top of mind, a cerveja Skol

está entre as 25 marcas mais valiosas do Brasil, segundo o ranking Interbrand, de

2011.

A Skol, cerveja que “desce redondo”, conquistou o quinto lugar no ranking e

aumenta consideravelmente o valor de marca, também renova a sua estratégia

focada na inovação. A área de inovações da Ambev já representa mais de 15% do

market share da empresa no Brasil, e a Skol representa a maior parte dessas

inovações. Em 2010 os executivos Skol decidiram destinar 15% do orçamento de

marketing em ações na internet. Esse é o maior investimento já feito pela marca no

Page 51: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Metodologia 36

ambiente digital. Além disso, o lançamento do Skol Cincão, primeiro barril com cinco

litros de cerveja do mercado, reforça o alinhamento entre marca e produto. Essa

diferenciação coloca a Skol como a 4ª cerveja mais vendida no mundo e a primeira

no Brasil.

b) Propaganda da cerveja Itaipava – veiculada na revista VIP - Edição de novembro

de 2011.

Um copo de cerveja num anúncio de cerveja poderia ser óbvio. Os novos

anúncios da Cerveja Itaipava, que trazem um copo com a bebida em close, fogem

desse óbvio e confirmam pela imagem que Itaipava é a cerveja que sempre coloca o

sabor e a qualidade em primeiro plano. Com essa imagem bastante inusitada, o

Grupo Petrópolis evidencia o apelo ao apetite da cerveja para seus consumidores.

Na vice-liderança do mercado brasileiro de cervejas desde o último mês de

setembro, o Grupo Petrópolis alcançou o posto não só tirando vendas de sua

concorrente direta, a Schincariol, como também vem batendo as principais marcas

da gigante Ambev nas duas principais regiões do país.

Segundo dados obtidos pelo Brasil Econômico, de 10/11/2011, junto ao

mercado para a venda de latas no varejo, a Itaipava, principal produto do portifólio

da Petrópolis, está na frente tanto de Brahma quanto de Skol para as vendas nas

regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro, que juntas somam mais de

30 milhões de habitantes.

De acordo com o levantamento, realizado pela Nielsen, a Itaipava lidera as

vendas nesse segmento em São Paulo com 31,7% de participação e uma boa

margem à frente das concorrentes Brahma (20,2%) e Skol (19,2%).

3.2 Procedimentos de análise

As propagandas das cervejas Skol e Itaipava serão analisadas, de acordo

com as seguintes etapas, com enfoque na linguística crítica.

Page 52: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Metodologia 37

3.2.1 Análise da verbiagem

Esta parte da análise verificará os seguintes itens:

(a) a aplicação da fórmula AIDA e a persuasão por convicção e por sedução;

(b) exame dos papéis desempenhados e papéis projetados;

(c) a avaliatividade.

3.2.2 Análise da imagem

A parte da imagem verificará:

(a) o fator contato;

(b) a distância social;

(c) a atitude.

Page 53: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 38

4 ANÁLISE

As análises deverão ser orientadas pelas perguntas de pesquisa: a) como é

criado o “mundo textual” no discurso da propaganda? (b) que elementos contribuem

para tornar esse “mundo” favorável à persuasão? e (c) como é feita a relação verbo-

visual na propaganda?

► A PROPAGANDA DA CERVEJA SKOL 360º GRAUS

Figura 1 - Anúncio de Chegou Skol 360º

Page 54: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 39

4.1 A análise da verbiagem

4.1.1 A fórmula AIDA e a persuasão por convicção e por sedução

A propaganda da cerveja Skol “CHEGOU SKOL 360º graus”, se a

considerarmos através da fórmula AIDA (Atenção, Interesse, Desejo, Ação), chama

a Atenção, à direita da propaganda, pela figura de um jovem, de camiseta sob a

camisa xadrez, como é moda hoje, bermuda azul e calçando havaianas. Ele tem na

mão um copo em que se vê a marca Skol 360º. Atrás, vê-se uma construção

especial para churrascadas, simples, porém convidativa, com o telhado coberto com

uma trepadeira verde sob o qual estão jovens, alguns sentados, outros de pé,

curtindo uma bela tarde.

O Interesse fica a cargo do lado esquerdo do anúncio, com os dizeres:

“Chegou SKOL 360º”, em letras garrafais, sob as quais se vê uma lata e uma garrafa

da Skol, juntamente com uma tábua, ostentando um farto pedaço de churrasco,

além de algumas fatias. O que seria a “Skol 360º”? E o anunciante espera que o

leitor se detenha nas letras menores, esperando encontrar uma resposta. E lê:

Não estufa

e não empapuça.

É produzida pelo

inovador processo

de fermentação 360º.

E assim seu churrasco dura muito mais.

Skol 360º.

A cerveja com

churrascabilidade.

A leitura desses dizeres acirra o Desejo do leitor em experimentar uma

cerveja que “não estufa”, que, como se sabe, é fruto de antiga reivindicação do

público cervejeiro. É aqui que a Skol aposta no conhecimento pressuposto sobre a

aspiração do consumidor. Daí para a Ação, esperam os anunciantes, não deve

demorar.

NOTA: (em letras pretas em fundo branco, muito discreto em relação ao colorido do

resto da propaganda, estão os dizeres (“SE FOR DIRIGIR, NÃO BEBA.”)

Page 55: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 40

4.1.2 Os papéis desempenhados e os papéis projetados

Com referências aos papéis desempenhados, a propaganda da Skol 360º não

apresenta perguntas ou ordens. Na realidade, creio que ela responde à pergunta do

consumidor por uma cerveja que não empapuce, estando, pois, a pergunta

subjacente ao anúncio. Assim, também, a ordem é feita metaforicamente, através

de: “Chegou SKOL 360º”, enunciado que não é apenas uma informação, como

parece à primeira vista, mas encerra um convite, que pode ser completada com:

“Então, vamos beber.”

Os papéis projetados, de nomeação e de atribuição, realizam-se da seguinte

maneira.

(i) Há na verbiagem da propaganda, um tom de conversa em que o anúncio refere-

se ao consumidor, pela nomeação, falando em “seu churrasco dura muito mais”,

ao mesmo tempo que sugere em tom amigo que o churrasco, isto é, a reunião

ao redor da churrasqueira durará mais com a relaxante bebida.

(ii) Na atribuição, no sistema da transitividade, o consumidor é na oração, o

“convidado”, como vimos acima, o participante META de “Skol convida”,

anunciando a chegada da SKOL 360º; no evento linguístico, “você” em “seu

churrasco” (= churrasco de você).

4.1.3 A avaliatividade

Inicio a análise da Avaliatividade na propaganda da Skol, lembrando no

Quadro 6, o sistema de Avaliatividade:

Page 56: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 41

Quadro 6 - Recursos de APPRAISAL (Fonte: MARTIN, 2000)

COMPROMISSO

monoglóssico heteroglóssico

ATITUDE

Afeto Julgamento Apreciação

FORÇA

aumenta diminui

APPRAISAL

GRADUAÇÃO

FOCO

aguça suaviza

A análise será feita no texto que transcrevemos novamente, agora em formato

para análise, indicando com (+) para Avaliatividade de Atitude positiva e com (-) para

a versão negativa:

Quadro 7 - Análise da avaliatividade da cerveja Skol

Chegou SKOL 360º Não estufa e não empapuça. Apreciação (+) Apreciação (+) É produzida pelo inovador processo de fermentação 360º. Apreciação (+)

E assim seu churrasco dura muito mais. Afeto (+) token Graduação de força

Skol 360º. A cerveja com churrascabilidade. Apreciação (+)

A cerveja é apresentada com duas Apreciações positivas, mas negando

Apreciações negativas: “não estufa”, “não empapuça”. Notemos que “estufar” e

“empapuçar” remetem a questões em voga na sociedade contemporânea, presentes

no frame que o leitor traz na sua interação ativa com o texto: a saúde e a estética,

que fazem parte do mundo do consumidor moderno e exigente.

A afirmação em tom monoglóssico é justificada com um dado, aparentemente,

científico, com a finalidade de lhe dar credibilidade: “inovador processo de

fermentação 360º”. Notemos, porém que, se esse passo pode ser aceito, o mesmo

não acontece com a afirmação seguinte: “E assim seu churrasco dura muito mais”, já

Page 57: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 42

que o fato de um processo evitar estufamento e empapuçamento nada tem a ver

com a duração do churrasco. Notemos que “churrasco” invoca Afeto (+), pois para a

nossa cultura, churrasco é sinônimo de festa, amigos, alegria, relaxamento.

Assim, se considerarmos a prosódia, isto é, o fato de as avaliações

espalharem-se através do texto, formando uma corrente de Avaliatividade, podemos

ver que, em nome da Apreciação positiva prosódica, a propaganda recorre a

“churrasco” como um prolongamento natural da cerveja, dois itens conjugados no

frame do brasileiro. Além disso, o anunciante conclui que, com a Skol 360º, o

churrasco dura “muito mais”, uma graduação de força, que se liga

retrospectivamente (LEMKE, 1998) à boa qualidade da cerveja e prospectivamente a

churrasco. Assim, ao finalizar com “A cerveja com churrascabilidade”, em que

“churrascabilidade” - uma invenção da propaganda - tem seu efeito positivo, já que

se apoia em “churrasco”, avaliado anteriormente com Afeto (+) e que, por conta da

prosódia, traz para a cerveja as avaliações positivas que percorreram o texto.

4.2 Análise do visual

A parte da imagem, verificará:

(a) o fator contato;

(b) a distância social;

(c) a atitude.

4.2.1 O contato

O contato se faz através de um representante do segmento do público a que

se destina a propaganda. Vemos, assim, um jovem de idade entre 25 e 30, talvez

um graduado universitário em início de carreira, vestido confortavelmente como

requer uma open party, com churrasco e regada à boa cerveja. Atrás, estão seus

amigos, em frente a uma churrasqueira, com um telhado coberto de hera e uma

chaminé fumegante. Ele olha para o leitor, sorridente, com um copo de cerveja na

mão, ao lado de uma tábua com o churrasco pronto, um convite a momentos felizes,

relaxados e em boa companhia. E, é claro, a propaganda espera uma resposta

positiva a esse convite.

Page 58: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 43

4.2.2 A distância social: proximidade

A imagem sugere intimidade, considerando o público a que se destina. O fato

de ser um rapaz e não uma moça a figura em destaque mostra que a maioria dos

apreciadores de cerveja seja do sexo masculino. Mas há, ao fundo, igual número de

mulheres, todos jovens. Assim, eles se vestem e se mostram à vontade, em papo

informal, em um visual que convence porque reúne itens normalmente constantes de

um fim de semana agradável, ensolarado, desse segmento de público. Há, assim,

uma identificação total com os jovens, a quem a cerveja Skol 360º. tem como meta

persuadir.

4.2.3 A atitude

Contribuindo com o contato e a proximidade, que já aproximaram a cerveja

Skol 360º do leitor, o fator atitude mostra o rapaz com o copo de cerveja na mão

olhando de frente o observador da propaganda, o que, segundo Macken-Horarik

(2004), sugere envolvimento e proximidade. Além disso, ele sorri amigavelmente,

numa atitude que demonstra tranquilidade e descanso, como que em um momento

de total felicidade e de entrega à boa bebida.

Page 59: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 44

► A PROPAGANDA DA CERVEJA ITAIPAVA

Figura 2 - Anúncio de Itaipava

4.3 A análise da verbiagem

4.3.1 A fórmula AIDA e a persuasão por convicção e por sedução

Ungerer (2004) afirma que os anúncios seguem estratégias diferentes, cujas

metas têm sido, frequentemente, condensadas em fórmulas acronímicas - sendo a

mais antiga e mais conhecida a fórmula AIDA (Atenção – Interesse - Desejo - Ação).

Page 60: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 45

O close up no copo com cerveja Itaipava atrai a atenção do leitor fatigado por

anúncios que oscilam entre mulheres, samba, futebol, churrasco e praia. O interesse

é criado pelos dizeres, no lado esquerdo: “Quem descobre nossa qualidade nunca

mais esquece o nosso nome”, seguido por um texto em letras menores:

Produzida com malte e lúpulo importados e àgua de excelente

qualidade. Itaipava é uma cerveja única, feita especialmente

para você. Por isso, a cada dia ela conquista mais e mais

consumidores que sabem reconhecer um produto de qualidade

superior. Itaipa. A cerveja sem comparação.

O texto aguça o Desejo de vivenciar o prazer de uma “cerveja sem

comparação”. Notemos como será difícil para um leitor amante de cerveja resistir a

tantos apelos presente no anúncio. Daí para ação, esperam os anunciantes, não

deve demorar.

NOTA: (em letras pretas em fundo branco, discreto, estão os dizeres “SE FOR

DIRIGIR, NÃO BEBA.”).

4.3.2 Os papéis desempenhados e os papéis projetados

Sob o enfoque dos papéis desempenhados, notemos que a propaganda da

cerveja Itaipava também não apresenta perguntas ou ordens explicitamente. Nesse

contexto, acredito que ela responde à reivindicação do cervejeiro por uma cerveja

com qualidade, estando, pois, a pergunta subjacente ao anúncio. Nesse sentido, a

ordem é feita metaforicamente, por meio de “Quem descobre nossa qualidade nunca

mais esquece o nosso nome”, enunciado que à primeira vista parece uma

informação, porém encerra um convite, que pode ser entendido como: “Descubra as

qualidades de Itaipava”.

Os papéis projetados, de nomeação e de atribuição, realizam-se da seguinte

maneira.

Page 61: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 46

(i) Há na verbiagem da propaganda um tom de conversa em que o anúncio refere-

se ao apreciador de cerveja, pela nomeação “você” e “consumidor”,

simultaneamente sugere em tom de intimidade que Itaipava é única e feita para

consumidores especiais.

(ii) Na atribuição, no sistema da transitividade, o consumidor é BENEFICIÁRIO da

oração: “Itaipava é uma cerveja única, feita especialmente para você” Já

“consumidor” é META no evento linguístico: “consumidor” especial como “você”.

4.3.3 A avaliatividade

Inicio a análise da Avaliatividade na propaganda da Itaipava, lembrado no

Quadro 6, o sistema de Avaliatividade

A análise será feita no texto que transcrevemos novamente, agora em formato

para análise, indicando com (+) para Avaliatividade de Atitude positiva e com (-) para

a versão negativa:

Quadro 8 - Análise da avaliatividade da cerveja Itaipava

Quem descobre nossa qualidade nunca mais esquece o nosso nome. Apreciação (+)

Produzida com malte e lúpulo importados e água de excelente qualidade. Apreciação (+) Apreciação (+) + Gradação de força (+)

Itaipava é uma cerveja única, feita especialmente para você. Apreciação (+) Afeto (+)

Por isso, a cada dia ela conquista mais e mais consumidores Graduação de força (+)

que sabem reconhecer um produto de qualidade superior. Apreciação (+)

Itaipava. A cerveja sem comparação. Apreciação (+)

A cerveja é avaliada positivamente por meio de afirmações monoglóssicas em

que o escritor se posiciona, construindo a audiência como compartilhando a mesma

visão de mundo dele, não admitindo - embora sutilmente - opiniões contrárias

(WHITE, 2003).

Page 62: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 47

Notemos que “qualidade”, embora possa admitir os epítetos “boa” ou “má”

como atributos, é entendido em nossa cultura como envolvendo Apreciação (+).

Assim, também, “importados” significa necessariamente qualidade de Apreciação

(+). E nesse contexto, por força da prosódia avaliativa, o epíteto “única” também é

entendido com Avaliatividade de Apreciação (+), da mesma forma que o é “sem

comparação”.

Assim vemos as Apreciações (+) são assim percebidas pelo leitor, porque a

propaganda lança mão de avaliações bem conhecidas pelo público. Além disso,

essas avaliações positivas são reforçadas por Gradação de força (+), como

“excelente” qualidade e “mais e mais” consumidores, contando também com

avaliações de Afeto como “feita especialmente para você”.

4.4 Análise do visual

A parte da imagem verificará:

(a) o fator contato;

(b) a distância social;

(c) a atitude.

4.4.1 Contato

O contato age sobre o leitor oferecendo a informação visual de uma cerveja

engajada em exaltar uma indiscutível qualidade. O close up no copo que

transparece um líquido dourado, borbulhante com o “colarinho” descendo pelo nome

Itaipava que o estampa, configura-se em um objeto de contemplação que,

estabelece uma conexão fortemente imediata com o leitor da propaganda em um

gesto de exigência a fim de descobrir a qualidade da cerveja sem comparação.

4.4.2 Distância social: proximidade

O anúncio adotou a distância pessoal próxima, a linguagem da intimidade que

o close-up propicia ao observador. É oferecido pela imagem, um privilegiado apelo

estético e verossimilhança. O artifício é um recurso para co-criar uma cerveja única

Page 63: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Análise 48

que foca em essencias como combinação perfeita de ingredientes para um sabor

inconfundível.

4.4.3 Atitude

O fator atitude representa alto “envolvimento” (um ângulo frontal) o que induz

uma solidariedade maior do leitor. A imagem instiga o leitor cuja observação se dá

de cima para baixo, verticalemente.

Page 64: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Discussão dos resultados 49

5 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A análise das propagandas das cervejas Skol e Itaipava (cujos textos repito

abaixo) juntamente com as imagens visuais criam um “mundo textual” com a

concorrência da Avaliatividade. As avaliações lançam mão de crenças e usos

arraigados na cultura popular - no frame do leitor - e são feitas por meio de tom

monoglóssico, e assim podem ser feitas porque vão exatamente ao encontro das

expectativas do leitor. Nesse sentido, as imagens visuais acrescentam o que as

palavras não diriam de maneira suficiente: um ambiente relaxante e refrescante

entre amigos, um copo gelado de cerveja.

Quadro 9 - Texto das propagandas

CHEGOU SKOL 360º ITAIPAVA

Não estufa e não empapuça. É produzida pelo inovador processo de fermentação 360º. E assim seu churrasco dura muito mais. Skol 360º. A cerveja com

churrascabilidade.

Produzida com malte e lúpulo importados e água de excelente qualidade. Itaipava é uma cerveja única, feita especialmente para você. Por isso, a cada dia ela conquista mais e mais consumidores que sabem reconhecer um produto de qualidade superior. Itaipava. A cerveja sem comparação.

Esses elementos têm, assim, a força persuasiva ancorada na fórmula AIDA,

chamando a Atenção e o Interesse, por cervejas que prometem não só prazer, mas

também prometem evitar efeitos indesejáveis como o estufamento e o

empapuçamento, graças à fermentação 360º, construídas por meio de um gênero

híbrido entre marketing e ciência. Se, então, evitam o indesejável, tornam-se

desejáveis, convidando o leitor à Ação, adquirindo e bebendo a cerveja.

Quanto aos papéis interacionais, graças ao tom monoglóssico, são frequentes

as ordens, camufladas com convites ao leitor com expressões como “seu churrasco”

ou “feita especialmente para você”, dirigindo um tom conversacional ao endereçado.

O clima que reina nas duas propagandas é de conforto, ambiente familiar, lazer e

prazer. E convincente.

Afinal não deve ser fácil fazer propaganda de uma bebida alcoólica, que em

altas doses pode provocar muita infelicidade. Se analisadas friamente, ambas as

Page 65: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Discussão dos resultados 50

propagandas trazem elementos inexplicados em seu bojo. Assim, o que é

“fermentação a 360º”? O que teria de bom a “churrascabilidade”, se o próprio

churrasco não é o alimento mais saudável, propícia a evitar “empapuçamento”? E

“malte e lúpulo importados”? Por si, o fato de serem “importados” não garante muito.

Afinal, pode-se perguntar “importados” de onde? E assim vai.

Mas o “mundo textual”, construído com apoio avassalador de Avaliatividade

positiva, ancorado em imagens extremamente agradáveis, acaba dominando a

capacidade de raciocínio, e resiste até ao obrigatório “Se for, dirigir não beba”.

Assim, ficam respondidas as perguntas de pesquisa: a) como é criado o

“mundo textual” no discurso da propaganda? (b) que elementos contribuem para

tornar esse “mundo” favorável à persuasão? e (c) como é feita a relação verbo-visual

na propaganda?

Page 66: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Considerações finais 51

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa está interessada em mostrar o modo como a linguagem constrói

papéis e relações sociais sob o potencial da persuasão, para a realização da qual

concorrem as avaliações explícitas ou implícitas que o produtor do texto faz, ao se

posicionar em relação não só ao conteúdo da mensagem, mas também em relação

ao endereçado. Para tanto, enfoquei a teoria sistêmica por ter seu alcance ampliado

com visões mais recentes de abordagens.

Nesse sentido, com base na natureza propagativa e cumulativa da atividade

avaliativa, espero ter demonstrado como as propagandas das cervejas Skol e

Itaipava podem ser explicadas por teorias cognitivas baseadas em noções como

frame de tal forma que, falar em discurso, entendido como texto em contexto,

significa não somente tratar de fatores pragmáticos, mas também da criação de

específicos “mundos mentais” ou construção de dada realidade (DOWNING, 2003,

p. 3). Nesse processo, entram com força as imagens visuais que provocam o desejo

do consumidor. A “propaganda é um gênero em que o estabelecimento de contextos

discursivos vívidos é crucial para o alcance das metas dos produtores de texto”

(SEMINO, 1997, p. 53).

Dito isso, o motivo de pesquisar as propagandas de duas marcas de cerveja

tão populares no Brasil é, por um lado, como pesquisador, interagir com a

população, fora dos centros de pesquisa e ensino superior, a relevância social da

linguística e, por outro, como professor de Língua Portuguesa, trazer à luz, a

questão da porção não só explícita, mas também, e principalmente, implícita de um

texto. Por outro lado, a multimodalidade que está cada vez mais incorporada ao

currículo escolar, e precisamos abordá-la em nosso trabalho educacional na medida

em que a língua é usada, na maioria das vezes, aliada a outros modos de

persuasão.

Em minha vida profissional já percebo a diferença que faz o conhecimento

das teorias que ampararam o exame do corpus dessa pesquisa em minhas aulas.

Em 2011, foi desenvolvido e aprovado, na escola onde leciono, o projeto

“Entrelinhas” com o objetivo de desenvolver estratégias específicas de leitura e

interpretação, formando leitores competentes para um resultado mais efetivo em

Page 67: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Considerações finais 52

tarefas e provas de cada disciplina, apoiado nas teorias da linguística sistêmico-

funcional.

Contudo, não chego ao fim dessa dissertação de mestrado com sentimento

de missão cumprida, pois, a pesquisa trouxe-me inquietações, mais curiosidades e

novos caminhos para percorrer de modo que muito ainda poderia ter sido feito. O

que me deixou com a sensação de que a análise poderia ter sido mais bem feita foi

a questão pictórica. Sei que esta parte não tem merecido, ainda, a consideração

devida, mas há alguns títulos que somente agora tive acesso mostram que ela é

uma área que está em franco desenvolvimento. Por fim, acredito que esse trabalho

me impulsiona a aprofundar e avançar nas pesquisas no doutorado.

Page 68: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Referências 53

REFERÊNCIAS REFERÊNCIAS REFERÊNCIAS REFERÊNCIAS

BAKHTIN, M. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

BERGER, P. & LUCKMANN, T. The Social Construction of Reality. Harmondsworth: Penguin, 1976.

CALDAS-COUTHARD, C.R. e M.Couthard. Texts and Practices: Readings in Critical Discouser Analysis. Londres: Routledge, 1996.

CAMERON, D. Feminism and Linguistic Theory. Londres: Routledge, 1985.

------------------- (ed.) The feminist critique of language, A Reader. Londres: Routledge, 1990.

CAMPOS PARDILLOS, M. A. "Deixis as a reference to an alleged shared situation in persuasive discourse." Revista Alicantina de Estudios Ingleses 8, 1995.

COOK, G. The Discourse of Advertising. London: Routledge and Kegan Paul, 1992.

------------------ Discourse and Literature. London: Routledge and Kegan Paul. 1994.

CROOK, J. On covert communication in advertising. Journal of Pragmatics 36 (715-738), 2004.

DOWNING, Laura. Text world creation in advertising discourse. Universidad Autonoma de Madrid ([email protected]), 2003.

EGGINS, Suzanne. An Introduction to Systemic Functional Linguistics: Londres: Pinter, 1994.

FAIRCLOUGH, N. Language and Power. London: Longman, 1989.

------------------- Discourse and social change. Cambridge: Polity Press, 1992a.

------------------- (ed.) Critical Language Awareness. Londres: Routledge, 1992b.

------------------- Discurso e Mudança Social. Editora UnB, 1992.

------------------- Critical discourse analysis. London: Longman, 1995.

FAUCONNIER, G. Mental Spaces. Cambridge: Cambridge University Press, 1985.

FOUCAULT, M. A arqueologia do saber. RJ: Forense-Universitária, 1987.

FOWLER, R. Language in the news. Londres: Routledge, 1991

FOWLER, R., HODGE, R., KRESS, G. & TREW, T. Language and Control. London: Routledge & Kegan Paul, 1979.

Page 69: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Referências 54

FUERTES-OLIVERA, Pedro A.; Velasco-Sacristán, Marisol; Arribas-Bafio, Ascensión e Samaniego-Femández, Eva. Persuasion and advertising English: Metadiscourse in slogans and headlines. Journal of Pragmatics 33 (1291-1307), 2001.

HALLIDAY, M.A.K. Exploration in the Functions of Language. London: Arnold, 1973

-------------------. Language as a Social Semiotic. Londres: Edward Arnold, 1978.

-------------------. Introduction to Functional Grammar. London: Edward Arnold, 1985.

-------------------. Introduction to functional grammar. Londres: Edward Arnold, 1994.

HUNSTON, S. Evaluation and organization in a sample of written academic discourse. In Coulthard, M. Advances in Written Text Analysis. Londres: Routledge, 1994.

KEY, W. B. Media sexploitation. New York, NY: Signet, 1976.

KRESS, G. and VAN LEEUWEN, T. Reading Images: The Grammar of Visual Design. London: Routledge, 1996.

LAKOFF, G. e M. Johnson. Metaphors We Live By. Chicago: The University of Chicago Press, 1980.

LEMKE, Jay L., Resources for attitudinal meaning – Evaluative orientations in text semantics. Functions of Language, 1998.

MARTIN, J.R. Language, register and genre. In: F. CRISTIE (ed.) Language studies: children’s writing: reader. Deakin University Press,1984.

------------------- English Text. Amsterdam: John Benjamins Publ.Co., 1992.

------------------- Beyond exchange: APPRAISAL System in English. In: Susan Hunston e Geoff Thompson. Evaluation in Text - Authorial Stance and the Construction of Discourse. Oxford: Oxford University Press, 2000.

-------------------. Introduction. Text, v. 23, n. 2, p. 171-181, 2003.

MACKEN-HORARIK, M. Interacting with the multimodal text: reflections on image and verbiage in ArtExpress. Visual Communication3.1, p. 5-26, 2004.

PÊCHEUX, M. Language, Semanics and Ideology: Stating the Obvious, Londres: Macmillan, 1982.

SCANELL, P. (ed.) Broadcast Talk, Londers: Sage Publications, 1991.

SEMINO, E. Language and World Creation in Poetry and Other Texts. London: Longman, 1997.

SPERBER, D, Explaining culture. Oxford: Blackwell, 1996.

SPERBER, D & Wilson, D. Relevance. Oxford: Blackwell, 1986.

Page 70: SAMUEL DA SILVA A PERSUASÃO NA PROPAGANDA DE … da Silva.pdf · samuel da silva a persuasÃo na propaganda de cervejas: sob o enfoque sistÊmico-funcional mestrado em linguÍstica

Referências 55

SPERBER, D. & Wilson, D. Postface to the second edition of Relevance: Communication and Cognition. Oxford: Blackwell, 1995.

SUTHERLAND, M.; SYLVESTER, A. K. Advertising and the mind of the consumer: what works, what doesn’t and why. 2. ed. Australia: National Library of Australia, 2000.

TANAKA, K. Advertising language: A pragmatic approach to advertisements in Britain and Japan. Routledge, Londres, 1994/1999.

THOMPSON, Geoff & Puleng Thetela. The sound of one hand clapping: The management of interaction in written discourse. Text 15.1. (103-127)The Appraisal, 1995.

UNGERER, Friedrich. Ads as news stories, news stories as ads: The interaction on advertisements and editorial texts in newspapers. Text 24.3 (307-328), 2004.

VAN DIJK, T. A. e KINTSCH, W. Strategies of discourse comprehension. New York: Academic Press, 1983.

VOLOSHINOV, V. N. Marxism and the philosophy of language. MA: Cambridge University Pres, 1973.

WERTH, P. Text Worlds: Representing ConceptualSpace in Discourse. London: Longman, 1995.

-------------------.Text Worlds: Representing Conceptual Space in Discourse. London: Longman, 1999.

WHITE, P.R.R. Beyond modality and hedging: A dialogic view of the language of intersubjective stance. Text 23.2 ( 259-284), 2003.