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Saúde do Adolescente

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Saúde do Adolescente

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Atenção à Saúde do Adolescente: Mudança de Paradigma

Nas últimas duas décadas, a atenção à saúde do adolescente vem se tornando uma prioridade em muitos países, inclusive para instituições internacionais de fomento à pesquisa. Isto se deve à constatação de que a formação do estilo de vida do adolescente é crucial, não somente para ele, como também para as gerações futuras.

De forma geral, no que se refere a organização de serviços para o atendimento a este grupo etário, observa-se que os esforços realizados no sentido da criação de programas de qualidade, tiveram até certo ponto, resultados positivos. Implementou-se um modelo de atendimento baseado na prestação da atenção integral a esta clientela, partindo-se das experiências adquiridas nos programas pioneiros de atendimento à mulher e à criança. Contudo, ainda falta muito para que os programas nacionais dêem cobertura adequada a toda população de adolescentes e jovens e para que se possa considerar que estes programas estejam integrados ao sistema de saúde, de tal forma que permitam o acesso universal.

Dificuldades no desenvolvimento do programa

A especificidade da atenção ao adolescente é um aspecto da maior relevância na criação de um programa eficaz,

apresentando-se como um grande desafio aos gerentes. Como exemplo do que se apresenta como desafio, podemos apontar a necessidade de adequação da linguagem e da forma de atuação dos profissionais, para o alcance de um nível de compreensão dos vários segmentos que constituem esta população.

Neste sentido, a condição prévia para qualquer proposta de atenção é delimitar as características da população alvo. Trata-se de um grupo heterogêneo que exige uma implementação efetiva de uma política de atenção, levar em conta as diferenças que lhe são inerentes. Estas se apresentam em relação à faixa etária (adolescência inicial, intermediária e tardia), diferença de gênero, inserção no ambiente familiar (os que têm família e moram com ela e os que não têm), no âmbito educacional (os que freqüentam a escola e os que estão fora dela), condição social (os que vivem com parceiros ou não), quanto à sua condição física (portadores ou não de doenças mentais ou físicas), quanto à moradia (os que moram em zona urbana ou rural) e os que pertencem a minorias raciais, religiosas ou culturais.

Todas estas diferenças indicam que as necessidades de saúde do adolescente não podem ser encaradas de forma isolada, visto que estão intrinsecamente relacionadas com o contexto no qual está inserido. Muitas vezes, os problemas de saúde do adolescente, aos quais os profissionais desta área devem estar atentos durante o

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atendimento, decorrem de suas dificuldades sócio-econômicas, tais como pobreza, privações, falta de moradia, ausência da família, ausência de um sistema educacional adequado, falta de capacitação laboral, falta de empre- go, violência, entre outros. Não obstante, vale enfatizar que as necessidades imediatas de amor, comida, abrigo, segurança, desenvolvimento do raciocínio lógico e dos valores morais são responsabilidades de toda a sociedade: família, escola e comunidade.

O que um jovem vivencia de positivo ou negativo afetará sua vida presente e futura, mas, o que é mais importante, é a partir destas vivências que o adolescente poderá estabelecer novas práticas a serem assimiladas pela sociedade em geral. Todo jovem é influenciado pelos amigos e pelos adultos do mundo onde vive, e desta interação resultam mudanças comportamentais que vão pautar toda uma geração.

Adolescência e sociedade

Durante a adolescência ocorrem mudanças de ordem emocional que são de extrema importância para o indi-

víduo, tais como o desenvolvimento da auto-estima e da autocrítica; questionamento dos valores dos pais e dos adultos em geral. Trata-se de um período da existência em que o sujeito começa a interagir com o mundo externo de modo mais autônomo sem, aparentemente, ter de assumir as responsabilidades da vida adulta. Contudo, esta situação é de extrema ambivalência, visto que, se por um lado não lhe é exigido assumir os compromissos da vida adulta, por outro, não lhe é permitido “comportar-se” como uma criança. Na indecisão de como se conduzir, o adolescente se arrisca, oscilando entre condutas de risco “calculado” – decorrente de uma ação pensada – e do risco “insensato”, em que, gratuitamente, se expõe, com grande chance de ocorrerem insucessos, podendo comprometer sua saúde de forma irreversível.

A adolescência vai delineando para o sujeito, uma identidade sexual, familiar e laboral, permitindo que ele venha a exercer determinados papéis dentro da sociedade. Esta identidade é a imagem que o sujeito tem de si, e ela permanece constante e reconhecível apesar das mudanças evolutivas e dos vários papéis sociais que venha a desempenhar.

No entanto, a adolescência não pode ser considerada um período de transição, caracterizando-se muito mais como parte de um processo de amadurecimento e de intenso aprendizado de vida. A tendência de ver a adolescência como “um período de transição” tem favorecido o esquecimento das necessidades desta população, o desrespeito com relação a seus direitos, e uma exigência, muitas vezes inadequada, quanto ao cumprimento de seus deveres como cidadão. Para que seja possível outro enfoque sobre o adolescente, é preciso que a sociedade valorize seu potencial de contribuição e o apóie, permitindo que seus pensamentos, desejos, idéias e críticas sejam ouvidos. Dito em outras palavras, esta postura pressupõe a abertura de um espaço para o adolescente exercer sua liberdade e participar mais ativamente de seu processo de amadurecimento.

Atenção ao adolescente: uma questão ética?

Visto que a atenção ao adolescente remete para a questão da normatização dos costumes e condutas, tendo

como referência uma variação entre o tradicional e o correto, não se pode pensá-la fora do âmbito da ética. Neste caso, a sociedade definida como um conjunto de indivíduos adultos “donos” de uma ordem vigente em cada cultura, leva ao adolescente sua ideologia de normas, atitudes e práticas que sem dúvida irão influenciar positiva ou negativamente sua formação.

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Nesta discussão, a educação, o trabalho e a saúde passam a representar o “locus” onde a ideologia do mundo adulto é oferecida ao adolescente para ser absorvida e, dependendo de como esta relação acontece, verifica-se uma adesão sem questionamentos.

Mudança de paradigma na atenção à saúde do adolescente

O panorama atual das ações em saúde apresenta, ao lado da prevenção e do tratamento de doenças infecto-

contagiosas, a necessidade de se voltar prioritariamente para a questão da manutenção do bem maior da “saúde”, por meio da promoção de um estilo saudável de vida. Entende-se como promoção de saúde a possibilidade de “proporcionar aos povos os meios necessários para melhorar sua saúde e exercer um maior controle sobre a mesma”.

Conforme assinalamos na introdução deste capítulo, a saúde do adolescente tem representado um desafio para os profissionais de saúde que se dedicam a este grupo populacional. Inicialmente, buscou-se uma metodologia de atuação interdisciplinar por meio de programas de atenção integral. Esta proposta mostrou-se inovadora frente à prática médica vigente, já que até este momento a atenção se dava de forma tradicional, restringindo-se a oferecer tratamento aos pacientes a partir dos sintomas relatados. Entretanto, essa metodologia de atuação interdisciplinar não promoveu uma mudança significativa com respeito aos grandes problemas de saúde da população adolescente. Os problemas persistiram: média do Índice de Massa Corporal–IMC dos adolescentes dos países em desenvol- vimento mais baixo do que nos países desenvolvidos; uso abusivo de drogas como fumo, álcool, maconha etc.; suicídio e depressão; aumento da morbi/mortalidade decorrentes de situações de risco como acidentes, violência, gravidez e DST/aids etc. Deste modo, torna-se necessário e urgente uma mudança na forma de prestação de serviço, visando a uma atenção que promova, realmente, uma melhoria na saúde da população adolescente.

Propor uma mudança estratégica de atuação do profissional com relação ao adolescente, dentro de um enfoque de promoção da saúde e de participação juvenil efetiva, aponta para a necessidade de se refletir sobre a questão ética, na medida em que determina que não se tenha como paradigma um modelo normativo. A condição nor- matizante se caracteriza pelo pressuposto de que há uma distinção entre “fatos e valores”, onde o observador não está envolvido com a situação e o usuário deve se comportar de acordo com as normas estabelecidas, ou seja, sem participar efetivamente do processo.

É suficiente prestar uma atenção integral?

O programa brasileiro de saúde do adolescente foi concebido dentro de uma proposta de atenção integral jun-

tamente com as reflexões que surgiram no Programa da Mulher e da Criança do Ministério da Saúde. Trata-se, portanto, de um programa diferenciado, em que os profissionais ultrapassaram o modelo tradicional.

No modelo tradicional o indivíduo deixa de ser visto em sua singularidade, uma vez que o objetivo maior é a cura da doença (HERZOG, 1987). Dizendo em outras palavras, nesse modelo o profissional de saúde estabelece uma relação vertical com o cliente, outorgando-se o direito de ditar normas de conduta acreditando que, assim fazendo, proporciona ao usuário uma qualidade melhor de vida. Esta postura coloca o paciente numa posição de inferioridade e de passividade, retirando dele não só a liberdade de escolha, como também a responsabilidade por seus atos.

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No modelo de atenção integral o objetivo é ampliar a possibilidade de atuação do profissional, tendo como preocupação não só a singularidade do sujeito, mas também a organização dos serviços. Com isto transforma-se o espaço antes considerado como o “lugar, por excelência, do profissional” – um lugar de poder – em outro em que se busca uma interação maior dos profissionais com a população assistida. Esta política de atuação significou uma mudança com respeito ao modo de como se dava, até então, a relação profissional usuário. Em vez de considerar que o adolescente deveria pautar sua conduta segundo um modelo pré-estabelecido, o profissional passou a consi- derar o meio ambiente como um fator de importância capital na compreensão da problemática do adolescente. A dimensão ética que esta estratégia envolveu diz respeito ao fato de considerar, na relação, o adolescente como um sujeito e não mais como mero objeto de investigação.

Novo enfoque na atenção

O novo enfoque de atenção integral constitui um modelo dinâmico que comporta uma transformação contí-

nua, na medida em que se pauta nas necessidades globais de atendimento da população alvo. O desafio agora é aprimorar um modelo qualificado para alcançar outro mais eficaz, que amplie a participação dos adolescentes na gestão, avaliação e reconstrução dos serviços.

A mudança a ser efetuada no novo modelo deve corresponder a uma determinada atitude frente a opções a serem priorizadas com respeito à saúde/bem estar do adolescente. Trata-se, então, de incentivar o sujeito a fazer suas próprias escolhas, propiciando um espaço reflexivo para um encontro harmônico entre as diversas alternativas de conhecimento, para que as condutas sejam fruto de um novo saber.

A atenção ao adolescente deve ter como premissa uma reflexão sobre a liberdade. E isto é possível desde que se possa refletir, a partir das dimensões sociais e políticas, de que modo a população adulta, melhor dizendo, a socie- dade como um todo, permitirá que os jovens participem desse projeto? Infelizmente, por enquanto, as informações são escamoteadas, por meio de códigos e barreiras institucionais que impedem o adolescente de se posicionar e de verdadeiramente participar.

O esforço atual deve se dar na relação horizontal entre profissionais de saúde e usuário/adolescente, relação esta que vai permitir uma nova forma de abordagem com respeito à atenção à saúde do adolescente. Para que isto ocorra, é necessário que haja um despojamento dos saberes pré-estabelecidos. O autoritarismo que vem direcionando a ciência impede que o sujeito produza sua verdade, pois não lhe dá acesso ao conhecimento. Seria a partir desta possibilidade que o adolescente poderia vir a tomar decisões. De acordo com Garrafa (1995, p.13), “o extraordinário progresso técnico-científico constatado na área médico-biológica nos últimos anos não foi acompanhado com a mesma veloci- dade por um pertinente embasamento ético que dessa sustentação às novas situações que se criaram”.

A questão agora é como criar um serviço em que liberdade e responsabilidade sejam pertinentes tanto para o profissional quanto para o usuário?

Esta questão coloca a necessidade de se refletir como o profissional vai-se comportar com relação a este grupo, a maneira pela qual se dará a abertura para a participação dos jovens na gestão do serviço e que pressupõe oferecer todo tipo de informação necessária, bem como uma disponibilidade, por parte do profissional, para a escuta do adolescente. Esta postura deve desconsiderar regras pré-estabelecidas de comportamento e deve promover um esforço no sentido de criar, juntamente com o usuário, padrões que se adeqüem à realidade e à singularidade de cada situação.

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A informação, num sentido amplo, possibilita ao jovem dispor de um conhecimento que lhe permitirá tomar decisões quanto a sua conduta em lugar de ser submetido a valores e normas que o impedem de exercer seu direito de escolha na administração de sua própria vida. A proposta atual parte de um questionamento da qualidade da atenção que vem sendo prestada e aponta para a necessidade urgente de reformulação. Todavia, o caminho desta reforma não está claro, pois implica o repensar da participação juvenil em sua construção e de como esta participação é impedida por um código de ética gerontocrático, em que os adultos dão os desígnios dos valores e condutas sociais.

Vale a proposta de se repensar os papéis dos indivíduos dentro do organismo social, para que cada um se respon- sabilize por sua própria saúde e pela saúde da coletividade, evitando agravos desnecessários, oriundos de condutas de risco. Quanto ao programa de saúde dos adolescentes e jovens, deve dar início à abertura democrática dos serviços para uma real participação juvenil, com o objetivo de reverter o quadro epidemiológico que está posto.

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Atenção ao Adolescente: Considerações Éticas e legais

Aspectos legais da atenção ao adolescente. Confidencialidade, consentimento e privacidade. Abordagem ética da pesquisa científica, doação de órgãos, saúde reprodutiva e testagem para verificação do consumo de drogas. Complexidade frente a situações de morte.

A existência de diversos códigos que regulamentam a vida do cidadão, no Brasil e em outros países, não garante o discernimento claro dos direitos e deveres da população adolescente. Com relação ao atendimento integral à saúde, a falta de nexo entre os aspectos legais freqüentemente deixa o profissional sem parâmetros definidos para orientar seu paciente.

O desafio na formação do profissional que vai lidar com o adolescente é a transmissão de atitudes éticas e legais – dentro de uma lógica harmônica e com princípios claros – na medida em que não existe um código prescritivo definido.

Direitos humanos

A Declaração Universal de Direitos Humanos, assinada em 10 de dezembro de 1948, foi uma conseqüência

de fatos ocorridos durante a Segunda Guerra Mundial. Representantes da comunidade internacional de países da Organização das Nações Unidas (ONU) decidiram criar leis que protegessem os indivíduos de práticas autoritárias e que pudessem causar sofrimento. O documento reconhece o indivíduo como sujeito dos direitos internacionais e representa uma imposição constante para que a ONU mantenha um fórum permanente de vigilância da defesa dos direitos humanos.

O conteúdo básico da declaração, considerada o instrumento de direito internacional mais importante do século, diz respeito aos direitos à vida, a um processo criminal justo, à liberdade de consciência, de expressão, de pensamento, de privacidade, à família, ao casamento.

Apesar de o Brasil ter ratificado todas as declarações de direitos humanos e contra a discriminação racial nos últimos 50 anos, incluindo o Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, os jovens brasileiros continuam sem seus direitos assegurados. Informes sobre a situação brasileira de Direitos Humanos e do Departamento de Estado dos Estados Unidos afirmam que “... apesar das leis progressistas para proteção das crianças e adolescentes, milhões deles não podem ter acesso à educação, à saúde e devem trabalhar para viver. O homicídio é a maior causa de morte entre jovens de 15 a 17 anos”.

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O Estatuto da Criança e do Adolescente, no capítulo II, artigo 17, sobre

“do direito à liberdade, ao respeito e à dignidade” da criança e do adolescente, prescreve: “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais”.

Cabe aos profissionais de saúde ficarem atentos quanto à quebra dos direitos humanos dos adolescentes e jovens,

denunciando os infratores aos órgãos competentes e protegendo os adolescentes dos problemas que envolvem estas práticas. Muitas vezes, os médicos e outros profissionais de saúde são os únicos que podem testemunhar crimes e torturas de que são vítimas adolescentes, principalmente no sistema penal, mas preservando-se em nome de uma ética questionável, não denunciam. É importante que a equipe de saúde fique atenta e se una, frente a situações de confronto com autoridades, por um lado para proteger o adolescente que é o sujeito da atenção dos serviços e por outro, para se sentir fortalecida para não tomar atitudes omissas nessas circunstâncias.

Direito ao casamento e trabalho

O Código Civil Brasileiro, no que se refere à união civil, no artigo 183, estabelece que não podem casar: inciso

XII – “as mulheres menores de 16 anos e os homens menores de 18 anos”. Se assim mesmo se casarem, o casamento poderá ser anulado. Pelo artigo 185, para casamento de menores de 21 anos é “mister o consentimento de ambos os pais”. No artigo 215, o Código diz que “por defeito de idade não se anulará o casamento de que resultou gravidez”.

A legislação trabalhista dá permissão ao adolescente para exercer uma atividade laborativa, como aprendiz, somente a partir dos 16 anos. Contudo, lhe é permitido votar aos 16 anos, alistar-se nas Forças Armadas aos 17 anos e é considerado adulto perante a lei aos 21 anos.

Verificam-se como estas divergências entre as leis que lhes dizem respeito favorecem aos adolescentes adquirirem uma atitude ambígua frente a cada uma das situações que se apresentam. Por outro lado, os profissionais que lidam com este grupo etário nem sempre podem se respaldar na lei para ajudar o adolescente a enfrentar este impasse.

Direito à atenção e informação

Pela primeira vez a Constituição Brasileira, promulgada em 5 de outubro de 1988, no que se refere à saúde, declara a saúde um direito social, e a Lei Orgânica da Saúde, Lei n.º 8.080/90, indica a organização de um novo modelo assistencial com a prestação de serviços em nível local de promoção, proteção e recuperação da saúde. Neste modelo, a saúde é entendida como um requisito para a cidadania e envolve inter-relações entre o indivíduo, a coletividade e o meio ambiente.

Especificamente, o título VIII Da Ordem Social, capítulo II da Seguridade Social, seção II da Saúde e capítulo VII, estabelece os direitos da família, da criança, do adolescente e do idoso.

• Art. 198 – As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e constituem um sistema

único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: 1) descentralizar, com direção única em cada esfera de governo; 2) atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; 3) participação da comunidade.

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Capítulo VII. da família, da criança, do adolescente e do idoso. • Art. 226 – É dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança e ao adolescente com absoluta

prioridade o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência e opressão.

Respaldado pela Constituição Brasileira, o Estatuto da Criança e Adolescente restabeleceu o direito de o ado-

lescente receber informação de uma forma ampla e democrática, para que possa tomar decisões com liberdade de conhecimento.

De acordo com estes parâmetros, requer-se que o profissional de saúde possa lidar com esta nova demanda, de maneira participativa e interativa, para que o conhecimento emerja com tranqüilidade, sem as imposições de uma relação de poder, relação que não leva à proteção dos adolescentes e jovens nem à decisão pela preservação da vida.

Os adolescentes portadores de deficiências físicas e/ou mentais também têm seus direitos assegurados por leis internacionais e nacionais. As Nações Unidas, por meio da Resolução n.º 48/96, publicou as Normas Uniformes sobre a Igualdade de Oportunidades para as Pessoas com Deficiências. Já a Resolução 46/119 marca os Princípios para a Proteção dos Doentes Mentais e para a Melhoria da Atenção de Saúde Mental. Estes documentos procuram dar subsídios técnicos para que os países busquem formas próprias para proteger este grupo populacional e evitar intervenções arbitrárias ou abusivas.

Confidencialidade e Privacidade

O acesso ao serviço de saúde é fundamental para que o adolescente busque tratamento em tempo hábil. Além

disso, ele necessita privacidade e confidencialidade na relação com os profissionais de saúde como expressão de seu processo de individualização.

O importante não é se o profissional deve abrir uma informação oriunda de uma consulta, mas sim se o adoles- cente consente com a quebra do sigilo, quer seja para a família ou para representantes da lei. O sigilo da consulta deve ser assegurado por meio de um debate nos serviços visando a um consenso entre os profissionais sobre as situações onde deva ser violado.

A confidencialidade apóia-se no artigo 103 do código de Ética Médica, que veda ao médico “revelar segredo profissional referente a paciente menor de idade, inclusive a seus pais ou responsáveis legais, desde que o menor tenha capacidade de avaliar seu problema e de conduzir-se por seus próprios meios para solucioná-lo, salvo quando a não revelação possa acarretar danos ao paciente”. A obrigação de manter a confidencialidade não diminui apenas porque o paciente é um adolescente.

Independente de leis específicas que regem a questão de confidencialidade, alguns princípios devem ser respeitados para que os serviços se guiem com relação ao tema. Assim, na perspectiva ética, é importante que o profissional de saúde informe ao paciente, inicialmente, os limites que regem o serviço com relação à confidencialidade. Da mesma forma, é importante que a família compreenda que a comunicação e o encaminhamento das questões com o adolescente podem ficar prejudicados se houver quebra da confidencialidade, sem uma razão clara e consensual entre o profissional e o paciente/adolescente.

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Os limites legais fornecem uma base para a obrigação de denúncia, sendo necessário, em circunstâncias especiais, a quebra do sigilo em nome da segurança ou proteção do adolescente, nos casos de abuso sexual, risco de vida, dependência de drogas, entre outros. Nestas situações, é imperioso haver consenso da equipe multidisciplinar junto ao adolescente e sua família, para que fique clara a exceção de conduta adotada na abordagem do caso, evitando que os demais usuários do serviço percam a confiança na relação com a equipe.

Consentimento

A questão da confidencialidade está diretamente ligada ao consentimento, pois desvendar os motivos do aten-

dimento ou solicitar permissão aos pais ou responsáveis para os cuidados de saúde, na perspectiva do adolescente, são a mesma coisa.

Para que um adolescente receba tratamento médico, segundo a lei, os pais ou responsáveis devem firmar um termo de consentimento. No entanto, na prática, freqüentemente isso não ocorre, pois os serviços que se propõem a dar atenção especial ao adolescente precisam aproveitar sua vinda e atendê-lo sem esta formalidade. Cabe ao profissional, portanto, procurar uma solução de acordo com o bom senso, de preferência solicitando ao próprio adolescente que firme seu consentimento e que procure o envolvimento da família, sempre que possível.

Considera-se que, para fins legais, o adolescente pode se responsabilizar pelo seu tratamento em circunstâncias especiais, como gravidez, paternidade precoce, evasão da residência familiar, emancipação financeira, mesmo não sendo considerados plenamente emancipados (ENGLISH, 1990).

Existem situações em que até internações são realizadas sem a presença da família, nos casos de risco de vida, atendimento a meninos/meninas de rua e emergências, tanto médico-cirúrgicas, quanto sociais. Nessas circunstân- cias sugere-se que os profissionais registrem o ocorrido no Juizado de Menores, evitando serem flagrados agindo fora da lei.

O consentimento inclui o diálogo profissional/adolescente no sentido de ser respeitado o desejo do adolescente de ser examinado ou não por ocasião da consulta. Saito (1999) aponta que “não deve ser esquecido que cada adolescente é único e que o respeito a essa individualidade deve permear a consulta”.

Aspectos éticos na atenção à saúde reprodutiva

Uma situação que freqüentemente traz dificuldade para o profissional de saúde é ter que lidar com o início

da vida sexual do adolescente. Para que o/a adolescente receba informações e não se exponha a problemas relati- vos a atividade sexual desprotegida, os profissionais precisam demonstrar tranqüilidade e segurança ao prestar o atendimento. Neste âmbito, a mulher adolescente fica mais vulnerável, pois muitos profissionais evitam assumir a responsabilidade de informar e de prescrever contraceptivos, fundamentais para sua proteção.

A família, dependendo da forma com que encara o desenvolvimento de seus filhos adolescentes, também se coloca, algumas vezes, como uma barreira na possibilidade de dar liberdade ao adolescente de tomar decisão sobre o momento e com quem deseja se relacionar sexualmente, impedindo que ocorra um diálogo essencial para a busca de informação por ambas as partes. E, o que é pior, muitas vezes impede que os profissionais de saúde e de educação prestem informações a seus filhos, tornando-os possíveis vítimas de uma prática desprotegida. Como os profissionais, geralmente, dependem da família para o financiamento de seus serviços, ao se sentirem desautorizados

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para informar no momento ideal, tornam-se esquivos, deixando passar oportunidades importantes de ajuda que poderiam refletir em condutas saudáveis para o resto da vida do paciente.

Vale informar que já existem muitos documentos internacionais que dão aos profissionais instrumentos jurídicos de apoio e que se prestam a serem utilizados em caso de confronto com a lei. Neste contexto, um dos documentos mais importantes, publicado pela Assembléia Geral das Nações Unidas em dezembro de 1979, entrou em vigência em setembro de 1981. Trata-se da “Convenção Internacional Sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discri- minação Contra a Mulher”. Outros fóruns, tais como a Convenção da Criança e a Quarta Conferência da Mulher em Pequim, confirmaram os direitos das mulheres e adolescentes.

“Entre os direitos que a Convenção garante encontra-se o direito ao acesso ao cuidado de saúde, incluindo pla- nejamento familiar e a eliminação da discriminação neste campo de atuação - art. 12 (a). O artigo 12 (b) refere-se à obrigação de prestar serviços necessários durante a gravidez e no período posterior ao parto, prestando-se o serviço de forma gratuita quando for necessário e assegurando-se a adequada nutrição durante a gravidez e no período de aleitamento”.

O Departamento de Bioética e Adolescência da Sociedade de Pediatria de São Paulo (1999) publicaram a se- guinte recomendação: “Os pais ou responsáveis somente serão informados sobre o conteúdo das consultas, como por exemplo, nas questões relacionadas à sexualidade e prescrição de métodos contraceptivos, com o expresso consentimento do adolescente”.

Outro aspecto de conflito ético profissional diz respeito ao desejo manifesto da adolescente de interromper a gravidez. Neste caso, a lei brasileira se posiciona favorável ao aborto no artigo 128 do Código Penal:

I – se não há outro meio de salvar a gestante; II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz,

de seu representante legal.

É importante que os profissionais de saúde saibam atender a urgência e fazer o encaminhamento das vítimas de estupro com agilidade para a obtenção do Boletim de Ocorrência Policial e a realização de exame de corpo delito no Instituto Médico Legal ou por médico responsável por este procedimento Os profissionais devem prosseguir o acompanhamento, na medida em que esta adolescente necessitará de atendimento interdisciplinar por um certo período, independente de qual for à decisão tomada frente à possível gravidez. A família deve ser orientada para procurar o Conselho Tutelar.

Muitas vezes o profissional de saúde participa de toda uma fase de indecisão por parte da adolescente, seu par- ceiro e das famílias em relação à continuidade ou interrupção da gravidez, ficando sujeito, inadvertidamente ou não, a expressar sua opinião baseada em valores e idéias próprias. É extremamente importante que o profissional se abstenha de dar informações tendenciosas, pois só agravará a situação como um todo. Qualquer que seja a decisão da adolescente e de sua família, o profissional tem que estar preparado para escutar, apoiar e ajudar, indicando, se necessário, outros serviços ou profissionais para ajudar nos cuidados necessários a serem prestados e mostrando-se disponível para a continuidade do atendimento independente da decisão tomada.

Com relação ao adolescente portador de alguma doença sexualmente transmissível (DST), nas duas últimas décadas problemas éticos relacionados com os cuidados de saúde tomaram maior dimensão, devido ao surgimento da aids e às situações envolvidas com sua prevenção, diagnóstico e tratamento. As questões éticas ainda não estão

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muito bem definidas no manejo da aids no Brasil. Nos Estados Unidos sugere-se que os adolescentes que necessitam ser testados para aids, somente o façam após receberem aconselhamento pré e pós teste de forma apropriada, para o nível de compreensão de cada faixa etária e de acordo com suas características sociais e psicológicas.

Em que pese à falta de ampla cobertura e do atendimento especializado, é importante que o acesso de adoles- centes portadores de DST, em especial da aids, seja garantido nos serviços, bem como o diagnóstico oportuno e tratamento. É também fundamental que os profissionais de saúde dêem suporte à família, e/ou outros adultos responsáveis, para que ela consiga dar apoio emocional ao adolescente, razão pela qual os profissionais devem assisti-la durante o período de acompanhamento do adolescente na unidade de saúde.

Testagem para verificação do consumo de drogas

O consumo de drogas lícitas e ilícitas, que cresce assustadoramente no mundo, tem levado a um debate sem

precedentes entre os profissionais que lidam com adolescentes, familiares e líderes comunitários, visto que todos se sentem inseguros sobre qual seria a melhor forma de lidar com o problema.

De acordo com a lei, adolescentes na faixa etária de 10 a 18 anos estão proibidos de fazer uso de qualquer droga, mesmo fumo (tabaco) e álcool, configurando-se como um delito a venda para este grupo etário. Por outro lado, a propaganda dessas drogas e a facilidade do acesso a outras, como cola de sapateiro, maconha e cocaína, propiciam aos adolescentes e jovens uma desconfiança sobre seus reais malefícios e uma resistência quanto a abrir mão de experiências consideradas de sucesso entre seus pares.

A questão ética que se apresenta é se as escolas e instituições que trabalham com esse grupo poderiam, ou deveriam, utilizar testagem de rotina, sem prévio consentimento, para o registro de flagrante de seu uso entre adolescentes e jovens. Segundo a Organização Mundial de Saúde, esta medida deveria ser implementada somente se houver possibilidade de tratamento e se a população, indicada pela medida, concordar.

Silber (1987) aponta que “o uso de droga é mais uma faceta na miríade de dificuldades que uma pessoa jovem pode estar passando, como desemprego, pobreza, entre outras”. Considerando que o abuso de droga sempre inter- fere com o projeto de vida do adolescente, o profissional que lida com este grupo populacional deve desenvolver habilidades para detectar, precocemente, seu uso e se colocar disponível para auxiliar os jovens na luta contra a dependência.

Pesquisa científica

Um importante aspecto a ser debatido entre os profissionais que lidam com adolescentes e jovens se relaciona à

investigação científica. Pesquisas clínico-laboratoriais, bem como aquelas que utilizam instrumentos de entrevista ou questionários para auto-aplicação, seus protocolos e projetos de investigação, devem sofrer uma avaliação ante- rior por parte dos comitês de ética institucionais. O envolvimento do responsável ou de um familiar na pesquisa é importante visto que, tendo acesso aos detalhes dos procedimentos e investigações, eles poderão decidir pelo consentimento ou não da participação do adolescente.

No entanto, Strasburger (1998) observa que o consentimento ativo, isto é, firmado em folhas de consentimento pelos pais ou responsáveis, pode tornar-se uma burocracia que setores conservadores da sociedade utilizam para impedir a execução de pesquisas de qualidade de assuntos sensíveis, principalmente na área de sexualidade. Afirma

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ainda que, com esta conduta, um conjunto importante de adolescentes, muitas vezes aqueles que representam o de maior risco, deixa de dar informações significativas para o avanço do conhecimento.

As Diretrizes e Normas Regulamentadoras de Pesquisa Envolvendo Seres Humanos do Conselho Nacional de Saúde, Resolução n.º 201, de 7 de novembro de 1996, publicada pelo Ministério da Saúde em abril de 1997, abarcam quase todas as dúvidas que um pesquisador poderia ter em relação aos sujeitos de sua investigação.

Alguns itens, mais relacionados com a área de saúde do adolescente, podem ser destacados: Capítulo IV - Consentimento livre e esclarecido. “O respeito devido à dignidade humana exige que toda pesquisa,

após consentimento livre e esclarecido dos sujeitos, indivíduos ou grupos que por si e/ou por seus representantes legais, manifeste a sua anuência à participação na pesquisa”.

Capítulo IV.1-f) A liberdade de o sujeito se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em qualquer fase da pesquisa, sem penalização alguma e sem prejuízo ao seu cuidado; g) A garantia do sigilo que assegure a privacidade dos sujeitos quanto aos dados confidenciais envolvidos na pesquisa;

Capítulo IV.3 - a) Em pesquisas envolvendo crianças e adolescentes, portadores de perturbação ou doença mental e sujeitos em situação de substancial diminuição em suas capacidades de consentimento, deverá haver justificação clara da escolha dos sujeitos da pesquisa, especificada no protocolo, aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa, e cumprir as exigências do consentimento livre e esclarecido, por meio dos representantes legais dos referidos sujeitos, sem suspensão do direito de informação do indivíduo, no limite de sua capacidade;

Capítulo IV.3 - e) Em comunidades culturalmente diferenciadas, inclusive indígenas, deve-se contar com a anuência antecipada da comunidade por meio dos seus próprios líderes, não se dispensando, porém, esforços no sentido de obtenção do consentimento individual;

Capítulo V.1 – Não obstante os riscos potenciais, as pesquisas envolvendo seres humanos serão admissíveis quando:

Capítulo VI - a) Oferecerem elevada possibilidade de gerar conhecimento para entender, prevenir ou aliviar um problema que afete o bem-estar dos sujeitos da pesquisa e de outros indivíduos.

Em suma, cabe ao pesquisador buscar a aprovação de seu protocolo de pesquisa, nos conselhos de ética dispo- níveis, protegendo os sujeitos de sua investigação de possíveis danos inadvertidos. No que concerne à população adolescente, existe uma grande ambigüidade com relação ao consentimento livre e esclarecido. Compete ao coorde- nador da pesquisa procurar, em cada situação, a melhor forma de avançar frente ao estágio atual do conhecimento científico, sem promover riscos desnecessários, e com a apresentação expressa das vantagens do estudo para melhoria da qualidade de vida desta população.

Doação de órgãos

A doação de órgãos é facultada a adolescentes a partir dos 18 anos, devendo ser este desejo expresso à família, sendo esta, em última instância, quem decide. No entanto, esta questão encontra-se em debate entre os juristas e a sociedade, pois ainda não existe um consenso claro entre as autoridades, buscando-se o aumento de transplantes a partir da doação presumida (GROSSMAN, 1999).

Devido à grande vulnerabilidade do adolescente e jovem a traumas e acidentes, o profissional que trabalha em serviços de urgência freqüentemente enfrenta dificuldades neste âmbito. Na hora do evento de morte cerebral, a equipe de saúde passa por momentos de grande tensão e, por sua vez, a família vive momentos de angústia, insegura na tomada de decisão sobre a disponibilização de órgãos para doação.

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Nesta ocasião, outras variáveis entram em jogo, como questões religiosas e éticas, pois o profissional, por pre- conceitos próprios, pode tomar partido contra ou a favor da doação, impedindo que a família tenha acesso a todos os parâmetros necessários para tomar decisão de forma consciente.

Mais uma vez os profissionais devem ter estes aspectos da atenção trabalhados em equipe, antes da ocorrência de eventos como este, porque a família precisa de um profissional seguro e competente, e não de uma pessoa a mais para confundi-la e aumentar seu sofrimento.

Situações éticas com relação à morte

A possibilidade de morte de um adolescente ou jovem é sempre uma situação impensada pela sociedade e, como

não poderia deixar de ser, pelas equipes de saúde. Infelizmente, os profissionais que lidam com pacientes severa- mente doentes podem ter que encarar este tipo de situação. O ideal é que tenham elaborado, previamente, junto à sua equipe a melhor forma de atuar, sem procurar fugir de uma abordagem respeitosa e carinhosa com relação ao paciente, ou à família, no momento de maior aflição e em que eles mais necessitam de apoio.

Algumas situações merecem destaque nesta questão: 1) o adolescente decide abandonar o tratamento e mani- festa o desejo de morrer; 2) o adolescente não responde ao tratamento e quer viver, mas não existe outro esquema terapêutico disponível para ser substituído; 3) a equipe sabe que há alternativas de tratamento, porém o paciente vai morrer porque não existe disponibilidade hospitalar ou técnica na área e não é possível o encaminhamento para centros de excelência para que se proceda o tratamento adequado.

O avanço tecnológico das últimas décadas e a diversidade sócio-econômica deste mundo globalizado impõem ao profissional de saúde um problema ético que até bem pouco tempo era inexistente. A informação via internet leva aos mais longínquos cantos do País o constrangimento da falta de acesso às tecnologias de ponta. O confronto com a impotência para superar, o que antes era improvável, um prognóstico sombrio de seu paciente portador de doenças graves, muitas delas, passíveis de melhoras significativas ou mesmo cura com o uso das novas tecnologias, deixa tanto o médico quanto a equipe de saúde em um grande conflito.

É justo que o adolescente e sua família recebam todas as informações a que têm direito, mas é importante também que não sejam alvo de um repasse de responsabilidades frente a condutas a serem seguidas. Portanto, a equipe de saúde deve sempre pesar os benefícios de informar a clientela frente a um procedimento ou tratamento impossível de ser executado dado às condições locais.

Quando o adolescente decide abandonar o tratamento e faz uma opção de morrer, nem sempre o significado da morte está claro. O problema é magnificado quando a vida pode ser mantida ainda por longos períodos com o uso de procedimentos invasivos ou tratamentos penosos. Nestes casos encontram-se pacientes portadores de alguns tipos de neoplasias malignas, cardiopatias severas, patologias renais crônicas, entre outros. Novas tecnologias prolongam, mas não garantem qualidade de vida. Segundo Schowalter e cols. (1983), nestas situações passa a haver um embate entre a decisão médica de aliviar o sofrimento e a de prolongar a vida. Lantos (1989) discute que, da mesma forma que o adolescente pode ser considerado competente para decidir onde e como se tratar, ele deve ser ouvido no momento que desiste do tratamento.

Algumas vezes é evidente para todos que a morte é iminente, o sofrimento é grande e os esforços de prolongar a vida implicam somente estender o sofrimento. Existem casos, contudo, que o desejo de morrer está fora de proporções com relação ao sofrimento. Em todos estes casos o médico, junto com a equipe de saúde, deve ouvir o

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paciente e sua família e procurar colaborar prestando o máximo de informações, para que uma decisão precipitada não torne ainda mais penoso o luto que vem a seguir. Sempre que possível, um profissional de saúde mental deverá ser convocado para apoiar o adolescente, a família, ou mesmo a equipe de saúde, frente a estes dilemas.

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Promoção de Saúde e Protagonismo Juvenil

Histórico e marco conceitual da promoção de saúde. Importância do protagonismo juvenil nos programas de atenção à saúde do adolescente. Formação de lideranças juvenis. Organização de serviços na atenção primária.

As atividades de promoção de saúde direcionadas para a população jovem são mais eficazes quando desenvolvidas numa perspectiva de saúde coletiva, pois consideram o indivíduo dentro de seu contexto. Este enfoque facilita a abordagem de diversos problemas, como atividade sexual precoce, pressão de grupo, uso de drogas, prevenção de acidentes, violência urbana, escolha profissional, entre outros. Internacionalmente, intitula-se promoção de saúde as intervenções que permitem ao jovem adquirir competência e segurança na auto gestão de sua vida.

Marco histórico conceitual

Do ponto de vista histórico, a evolução do conceito de promoção de saúde acompanha a própria evolução do

conceito de saúde-doença. Terris (1975), revendo a literatura, revelou que William P. Allison, da Universidade de Edimburgo, Escócia, em 1820, descreveu pela primeira vez a estreita associação entre pobreza e enfermidade a partir de suas experiências com o tifo epidêmico (1827-28) e com uma epidemia de cólera (1831-32). Na mes- ma ocasião, Villermé (1826) escreveu sobre a relação entre a pobreza e a doença como influência importante na mortalidade nas várias regiões de Paris e, em 1840, publicou um estudo sobre as péssimas condições de vida como causa de morte prematura de trabalhadores de fábricas de algodão, lã e seda. Virchow (1847), na Alemanha, estu- dando uma epidemia nos distritos industriais de Silésio chegou à conclusão de que suas causas eram mais sociais e econômicas do que biológicas, recomendando prosperidade, educação e liberdade.

Na Grã-Bretanha, Ryle (1943), professor de Medicina Social de Oxford, correlacionou as doenças prevalentes com as condições sociais e ocupacionais. Entretanto, a terminologia “promoção de saúde”, de forma pioneira, foi usada por Henry Sigerist em 1945, quando determinou que as grandes tarefas da medicina eram as de promoção de saúde, prevenção de enfermidades e reabilitação do dano. Segundo Sigerist, promove-se saúde quando se facilita um nível de vida digna, boas condições de trabalho, educação, cultura física e recreação. Ele propôs uma ação integrada entre políticos, lideranças, trabalhadores, educadores e médicos.

Os dois grandes marcos da promoção de saúde podem ser considerados os Informes Lalonde e a Carta de Ottawa. No Informe de Mc Lalonde (1974), Canadá, foram definidos os campos de saúde em grandes compo- nentes: biologia humana, meio ambiente, estilo de vida e organização do cuidado médico. A Carta de Ottawa é um documento firmado em 1986, por ocasião da Conferência Internacional de Promoção de Saúde no Canadá, por representantes de 38 países que se comprometeram como sendo as condições fundamentais de saúde: paz,