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1 ANA PAULA DIOLA DE OLIVEIRA SABERES E FAZERES DOCENTES NARRATIVAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL DO CURSO TÉCNICO EM SEGURANÇA DO TRABALHO UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO UNICID São Paulo 2014

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ANA PAULA DIOLA DE OLIVEIRA

SABERES E FAZERES DOCENTES – NARRATIVAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO

PROFISSIONAL DO CURSO TÉCNICO EM SEGURANÇA DO TRABALHO

UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO UNICID

São Paulo 2014

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ANA PAULA DIOLA DE OLIVEIRA

SABERES E FAZERES DOCENTES – NARRATIVAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO

PROFISSIONAL DO CURSO TÉCNICO EM SEGURANÇA DO TRABALHO

Dissertação apresentada como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Educação junto à Universidade Cidade de São Paulo, sob orientação da Profa. Dra. Ecleide Cunico Furlanetto

UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO UNICID

São Paulo 2014

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Sistema de Bibliotecas do Grupo Cruzeiro do Sul Educacional

O48s

Oliveira, Ana Paula Diola de. Saberes e fazeres docentes: narrativas de formação de professores da educação profissional do curso técnico em segurança do trabalho. / Ana Paula Diola de Oliveira. São Paulo, 2014. 120 p. Inclui bibliografia Dissertação (Mestrado) – Universidade Cidade de São Paulo - Orientadora: Profa. Dra. Ecleide Cunico Furlanetto. 1. Formação de professores - Curso técnico. 2. Aprendizagem de adultos. 3. Prática de ensino. 4. Formação tecnológica I. Furlanetto, Ecleide Cunico, orient. II. Título.

CDD 371.1

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ANA PAULA DIOLA DE OLIVEIRA

SABERES E FAZERES DOCENTES – NARRATIVAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES DA EDUCAÇÃO

PROFISSIONAL DO CURSO TÉCNICO EM SEGURANÇA DO TRABALHO

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo como requisito exigido para obtenção do título de mestre

Área de concentração: Educação Data da defesa: 28.10.2014 Resultado: BANCA EXAMINADORA: Prof. Dra. Ecleide Cunico Furlanetto ___________________________ Universidade Cidade de São Paulo-UNICID Prof. Dr. Julio Gomes Almeida ___________________________ Universidade Cidade de São Paulo-UNICID Prof. Dr. Fernando Cesar de Souza ___________________________ Centro Universitário Ítalo-Brasileiro

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Dedico este trabalho à minha mãe, responsável pela incansável vontade de

aprender que mora dentro de mim.

Ao meu marido e parceiro nesta jornada, constante apoiador, a quem admiro

e respeito profundamente.

Às minhas filhas, os maiores presentes que a vida me deu, que sempre

compreenderam e souberam lidar com meus momentos de ausência.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, que sempre ouviu minhas preces, zelando por mim e me amparando

nos momentos mais difíceis.

À Profª Drª Ecleide Cunico Furlanetto, por suas orientações e conselhos, que

me guiaram ao final deste trabalho.

Aos professores do Programa de Mestrado em Educação da Unicid, por suas

valiosas contribuições.

Ao Senac São Paulo, por mais esta oportunidade de desenvolvimento

profissional e acadêmico.

Aos meus familiares e amigos, pelas palavras de incentivo e acolhimento.

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Eu quero desaprender para aprender de novo. Raspar as tintas com que me pintaram.

Desencaixotar emoções, recuperar sentidos.

Rubem Alves

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RESUMO

O estudo reflete sobre a formação de professores atuantes no curso técnico em segurança do trabalho. Para isso, investiga os processos formativos dos docentes atuantes no curso Técnico em Segurança do Trabalho do Senac Vila Prudente e os saberes e fazeres utilizados em sala de aula, visando uma melhor compreensão sobre a formação do docente de curso técnicos e sobre a construção dos saberes e fazeres envolvidos em suas práticas de ensino. Para contextualizar a pesquisa, realizou-se um resgate histórico da educação e da educação profissional no Brasil; da criação do Senac São Paulo, discorrendo sobre sua proposta pedagógica, missão e visão de futuro; e do curso Técnico em Segurança do Trabalho. Além disso, foi construído um embasamento teórico, com base em autores que investigam a formação de professores, tais como Arroyo (2010), Nóvoa (2009), Furlanetto (2007, 2009), Ibernón (2005), Ferry (2004), Tardif (2002), Mizukami (2002), Perrenoud (2000, 2002) e Freire (1996), dentre outros. A pesquisa foi desenvolvida com sete professores atuantes no curso Técnico em Segurança do Trabalho do Senac Vila Prudente, com faixa etária e formação inicial diversas. Foram realizadas entrevistas individuais com base em um roteiro pré-definido sobre os tópicos a serem investigados. A análise dos dados permite melhor entendimento sobre a construção das matrizes pedagógicas dos professores atuantes no ensino técnico e quais saberes e fazeres dão suporte à atuação docente desses profissionais que migram do mercado de trabalho para as salas de aula. Palavras-chave: formação de professores de cursos técnicos, atuação pedagógica de docentes de cursos técnicos, aprendizagem de adultos.

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ABSTRACT The study reflects the teachers training working in the Work Safety technical course at Senac Vila Prudente. So it investigates the knowledge and practices that teachers mobilize to teach and how they were learned, besides identifying the perspective of teachers and which characteristics a teacher must have to act, and possible areas for improvement in their work. To contextualize the research, a rescue of historical and professional education in Brazil took place; from the creation of Senac, discussing their pedagogical proposal, mission and vision; and the Technical Course in Occupational Safety. In addition, we built a theoretical foundation, based on authors investigating teacher education, such as Arroyo (2010), Nóvoa (2009), Furlanetto (2007, 2009), Ibernón (2005), Ferry (2004), Tardif (2002), Mizukami (2002), Perrenoud (2000, 2002) and Freire (1996), among others. The research was conducted with seven teachers working in the Occupational Safety Technical Course at Senac Vila Prudente, with several ages and initial training. Many individual interviews were conducted based on a pre-defined script on the topics to be investigated, which analysis was based on a foundation in qualitative research methodology. The interpretation of research data allows better understanding of the construction of teachers pedagogical bases working in technical education, and which knowledge and practices are more relevant to teach these professionals, who migrate from the work market to the classrooms. Keywords: technical courses teacher development, knowledge and teacher practice, teacher training

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11

1. CONTEXTUALIZANDO A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL .............. 19

1.1 O Senac São Paulo e o Senac Vila Prudente .............................................. 30

1.2 O curso Técnico em Segurança do Trabalho no Senac São Paulo ................. 35

2. A FORMAÇÃO E OS SABERES E FAZERES DOCENTES ............................... 37

3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ........................................................... 45

3.1 Procedimentos de Produção de Dados ........................................................... 46

3.2 Perfil dos participantes da pesquisa ................................................................ 47

4. ANÁLISE DOS DADOS ...................................................................................... 50

4.1 Práticas bem sucedidas desenvolvidas pelos professores .............................. 50

4.2. O desenvolvimento dos saberes e fazeres ..................................................... 58

4.3 Conhecimentos que um docente deve ter ....................................................... 63

4.4 Necessidades de melhoria no trabalho docente .............................................. 70

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................ 75

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 78

APÊNDICE A - TRANSCRIÇÃO DAS ENTREVISTAS ............................................. 81

ANEXO A – CARTA ECONÔMICA DE TERESÓPOLIS ........................................... 89

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INTRODUÇÃO

Iniciei minha trajetória acadêmica em 1988, quando ingressei na Faculdade

de Psicologia, naquele momento tinha apenas 17 anos de idade. Gostei

imensamente do que encontrei: Filosofia, Sociologia, Antropologia, Anatomia,

Neuroanatomia e, enfim, a Psicologia, em especial Psicologia do Desenvolvimento e

Psicologia Educacional. Quando estava no quarto ano, me deparei com o início dos

estágios e percebi que não queria ser Psicóloga. Cada dia nos hospitais

psiquiátricos me trazia tristeza e angústia. Enfim, ao final do quarto ano, tomei a

decisão de trancar a matrícula, definitivamente não era o que eu queria para mim.

No entanto, foi uma importante experiência na minha vida pessoal, profissional e

acadêmica.

Em 1993 comecei a trabalhar no SENAC – Serviço Nacional de

Aprendizagem Comercial, instituição educacional sem fins lucrativos, com mais de

60 anos de história. Passei por vários setores da entidade, o que me permite hoje ter

uma visão global dos processos de trabalho desenvolvidos na instituição.

Trabalhar com educação despertou em mim uma paixão, até então latente,

que me fez buscar formação na área. Assim, ingressei na Faculdade de Pedagogia,

decisão precisa para o prosseguimento da minha carreira.

Concluída a Faculdade de Pedagogia, assumi a função de coordenadora de

cursos técnicos, de capacitação e de formação inicial e continuada, oportunidade em

que senti a necessidade de conhecimentos de gestão para exercer a minha função,

já que, além da coordenação técnico-pedagógica, também faz parte do meu trabalho

a gestão administrativa dos cursos sob minha coordenação.

Minha função exige o domínio de competências, conforme dimensões abaixo:

Orientação Estratégica que pressupõe planejar ações, analisar o negócio,

definir estratégias, estabelecer e monitorar metas, objetivos e resultados; Gestão de

Pessoas que implica gerir equipes alinhadas aos objetivos da Instituição, com base

na liderança educadora; Orientação Educacional cujo objetivo é colocar em prática a

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Proposta Pedagógica, o Regimento Escolar e demais normas institucionais,

promovendo o entendimento e a concretização das diretrizes educacionais da

Instituição; Prestação de Serviços Educacionais que visa planejar e gerenciar o

processo de prestação de serviços, de forma a assegurar a excelência;

Planejamento e Gestão da Oferta cuja proposta é gerir o portfólio de produtos e

serviços educacionais, em atendimento às demandas do mercado de trabalho local;

Articulação e Parcerias com a finalidade de prospectar, negociar e formalizar

parcerias para realização de ações de interesse comum e Gestão Orçamentária que

tem como objetivo planejar o orçamento e acompanhamento dos resultados e

metas.

Para ampliar minha formação, conclui, na Universidade Presbiteriana

Mackenzie, um curso Pós-graduação Lato Sensu em Gestão de Negócios em

Serviços, que contribuiu significativamente para o meu trabalho.

Na condição de coordenadora de cursos técnicos, de capacitação e de

formação inicial e continuada das áreas de Saúde Ocupacional e Enfermagem,

também sou corresponsável pelo processo de formação dos docentes destas áreas.

Observo que alguns docentes se destacam em sua atuação, contribuindo de forma

significativa para a formação de profissionais para o mundo do trabalho, enquanto

outros, por outro lado, enfrentam dificuldades para atingir este objetivo.

Há que se considerar que grande parte dos docentes que atuam em

educação profissional não possui formação pedagógica. São profissionais

especialistas, tais como engenheiros, administradores, dentistas, advogados,

contadores, fisioterapeutas, entre outros, que atuam em suas áreas de formação, e,

por motivos diversos, acabam tornando-se docentes. Além disso, percebo que os

docentes que têm formação pedagógica muitas vezes apresentam as mesmas

dificuldades que os demais, o que me leva a crer que a formação pedagógica não

garante uma boa atuação docente.

Como gestora de uma equipe de docentes, tenho sentido cada vez mais a

necessidade de auxiliá-los de forma mais assertiva em sua formação profissional.

Para tanto, fez-se necessário uma melhor compreensão sobre o processo de

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formação destes docentes. Movida por esta inquietação, ingressei no Programa de

Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São Paulo, objetivando, também

contribuir, de alguma forma, na disseminação deste conhecimento.

O Parecer CNE/CEB n° 16/99, que dispõe sobre as Diretrizes Curriculares

para a Educação Profissional de Nível Técnico menciona:

Cumpre ressaltar, ainda, o papel reservado aos docentes da educação profissional. Não se pode falar em desenvolvimento de competências em busca da polivalência e da identidade profissional se o mediador mais importante desse processo, o docente, não estiver adequadamente preparado para essa ação educativa.

Entende-se que o docente adequadamente preparado é aquele que além da

experiência profissional na sua área de atuação, também seja preparado para o

magistério, seja em serviço, em cursos de licenciatura ou em programas especiais

de formação.

É comum presenciar os professores reclamando do comportamento dos

alunos e da falta de interesse destes em sala de aula. Por outro lado, outros

professores relatam que o mesmo grupo de alunos reage em suas aulas de forma

totalmente diferente, apresentando comportamentos participativos, que sugerem

interesse na aula.

O mesmo acontece com os resultados das turmas. Um grupo de alunos

consegue, com a mediação de alguns docentes, atingir os objetivos propostos de

forma satisfatória e até superar as expectativas. Enquanto que com outros docentes

o referido grupo não consegue obter bons resultados ou, como dizem os professores

“não aprendem de jeito nenhum”. Aqui temos que considerar que não sabemos ao

certo se estes docentes utilizam diferentes estratégias para atingir estes alunos ou

se não ocorrem outras tentativas.

Isto tudo se reflete, também, no índice de faltas às aulas. Com alguns

docentes os alunos não apresentam faltas e relatam não querer perder a aula,

enquanto em outras aulas, o índice de faltas pode se apresentar altíssimo.

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Buscando entender esta situação, fui remetida à minha época de escola,

quando alguns professores conseguiam efetivamente prender nossa atenção,

utilizando estratégias que despertavam nosso interesse como alunos. Outros, no

entanto, se detinham ao falatório, enquanto os alunos divagavam em vários outros

pensamentos e assuntos.

Considerando o que foi exposto, surgem alguns questionamentos: que

estratégias/ferramentas os docentes que obtém bons resultados com os alunos

utilizam em suas aulas? Como estas estratégias foram aprendidas?

Importante ressaltar que a Educação Profissional, que tem como objetivo

principal a formação de profissionais técnicos para o mercado de trabalho, necessita

de docentes atuantes neste mercado, que possam trazer para a sala de aula

realidades e experiências profissionais diversas e atuais para os alunos.

Ainda, de acordo com o Parecer CNE/CEB n° 16/99, “em educação

profissional, quem ensina deve saber fazer. Quem sabe fazer e quer ensinar deve

aprender a ensinar”. Consideremos aqui que por se tratarem de profissionais

atuantes no mercado estes docentes sabem fazer, mas, na maioria dos casos,

precisam aprendem a ensinar. Isto pode ser possível em cursos de licenciatura ou

de formação pedagógica ou então na formação em serviço.

Conforme o Parecer CNE/CEB n° 16/99:

A escola deverá explicitar sua missão educacional e concepção de trabalho, sua capacidade operacional e as ações que concretizarão a formação do profissional e do cidadão, bem como as de desenvolvimento dos docentes. (grifo da autora)

Em minha atuação como coordenadora de cursos técnicos, um dos meus

papéis é incentivar e apoiar os docentes em sua formação. Surge daí a necessidade

de estudar este tema.

Tardif (2002) define o saber docente como saber plural. Segundo o autor, o

saber docente é composto de vários saberes provenientes de diferentes fontes.

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Assim, classifica estes saberes em quatro tipos ou classes: disciplinares,

curriculares, profissionais e experienciais, que explanaremos no capítulo teórico.

Barato (2004), diz que o saber não pode ser separado do fazer, assim como a

teoria não pode ser separada da prática. A autora faz uma crítica à supervalorização

dos saberes teóricos em detrimento aos saberes aprendidos no trabalho, na prática,

por meio dos fazeres.

Considerando esta característica de inseparabilidade, investigaremos, neste

trabalho, os saberes e fazeres docentes.

Sobre a formação docente e a profissão de professor, Ibernón (2006, p. 18)

diz:

Hoje a profissão já não é a transmissão de um conhecimento acadêmico ou a transformação do conhecimento comum do aluno em um conhecimento acadêmico. A profissão exerce outras funções: motivação, luta contra a exclusão social, participação, animação de grupos, relações com estruturas sociais, com a comunidade [...] E, é claro que tudo isso requer uma nova formação: inicial e permanente.

Junto com estas mudanças surgem novas exigências que envolvem o

desenvolvimento de novos saberes e fazeres.

Como diz Furlanetto (2007, p. 14):

Não podemos mais pensar em um professor abstrato, genérico, não podemos mais acreditar, de maneira ingênua, que a formação de professores acontece somente nos espaços destinados a esse fim. Cada vez fica mais claro que as professoras e professores, mulheres e homens inacabados, contraditórios e multifacetados - com histórias pessoais forjadas nas relações que estabelecem com o outro, a cultura, a natureza e consigo mesmos - fazem escolhas, criam-se e recriam-se encontrando formas de crescer e de se exercer profissionalmente.

No meu dia-a-dia de trabalho sinto-me impulsionada a auxiliar os docentes no

desenvolvimento de seus saberes e fazeres e, para tanto, preciso entender de forma

mais aprofundada como se dá esta construção. É necessário compreender, também,

quais são as necessidades apontadas pelos docentes.

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Furlanetto salienta (2007), p. 59:

Oferecemos pacotes prontos e esperamos que os professores se apossem desses conhecimentos e os transformem em ações pedagógicas. O que acontece, na maioria das vezes, é que, como esses novos conhecimentos não estão articulados às suas necessidades e, muito menos, a seus desejos, são descartados. Quando vemos isso acontecer, responsabilizamos os professores por resistirem à mudança.

Consultando teses e dissertações a respeito do assunto, identifiquei poucos

trabalhos sobre saberes e fazeres docentes com foco em educação profissional,

encontrando-se este estudo mais concentrado em educação superior, ensino

fundamental e alfabetização.

Entre os trabalhos a respeito da formação e dos saberes e fazeres docentes

destacam-se: a tese de doutorado de Simionato (2011), que analisou as políticas de

formação e as trajetórias de formação dos professores do ensino técnico, buscando

incoerências e contradições, propondo o estudo e a compreensão da cultura

docente a fim de promover melhorias na escola de ensino técnico; a dissertação de

mestrado de Martins (2011), cuja intenção foi demonstrar os fatores que interferiram

na constituição e desenvolvimento de profissionais da área de Nutrição para a

profissão docente, tendo como pano de fundo a ausência de uma formação

específica na área educacional; a dissertação de mestrado de Toledo (2010), que

buscou estudar a formação dos professores do curso superior de gastronomia,

investigando os saberes e fazeres que os professores mobilizam para lecionar e

como eles tem acesso a esses saberes e fazeres; a dissertação de mestrado de

Toledo (2011), que buscou refletir sobre o processo de construção da identidade

profissional de professores de cursos superiores de formação tecnológica.

Como objetivo principal deste trabalho pretende-se:

- investigar os processos formativos dos docentes atuantes no curso Técnico

em Segurança do Trabalho do Senac Vila Prudente e os saberes e fazeres utilizados

em sala de aula, visando uma melhor compreensão sobre a formação do docente de

curso técnicos e sobre a construção dos saberes e fazeres envolvidos em suas

práticas de ensino.

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Como objetivos específicos, o trabalho se propõe a:

Delinear o contexto histórico da educação profissional,

seus principais desafios e a Instituição Senac.

Dialogar com autores que investigam a formação e os

processos de construção dos saberes e fazeres docentes.

Identificar, por meio de entrevistas reflexivas, quais são

as estratégias e práticas docentes consideradas bem sucedidas e

como estas foram aprendidas.

Compreender, sob a ótica dos docentes, quais são os

saberes e fazeres necessários para atuação em educação profissional

e possíveis pontos de melhoria nos seus próprios trabalhos.

Para tanto, além da pesquisa bibliográfica, foi realizada uma entrevista

reflexiva com sete docentes atuantes no curso Técnico em Segurança do Trabalho,

do Senac Vila Prudente.

Este trabalho está estruturado em quatro capítulos:

O primeiro capítulo será composto de um levantamento teórico sobre a

história da educação profissional no Brasil e sobre os desafios na área de educação,

inserida em um mundo de constantes mudanças. Apresentará, também, o Senac

São Paulo - sua história, proposta pedagógica, missão, visão e valores; o Senac Vila

Prudente; e o curso Técnico em Segurança do Trabalho

O segundo capítulo traz uma investigação a respeito da formação docente na

perspectiva da construção de saberes e fazeres, dialogando com os principais

teóricos que tratam do assunto.

O terceiro capítulo explicita os procedimentos metodológicos da pesquisa,

apresentando o perfil dos sete docentes entrevistados.

O quarto capítulo aborda a análise dos dados produzidos, por meio de

interpretação das entrevistas realizadas com os docentes do curso Técnico em

Segurança do Trabalho, do Senac Vila Prudente.

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As considerações finais explicitam os resultados obtidos.

Considera-se que este trabalho poderá contribuir com o entendimento e a

disseminação de conhecimento sobre a formação, na medida em que investiga os

saberes e fazeres docentes que atuam na Educação Profissional.

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1. CONTEXTUALIZANDO A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL

Segundo Manfredi (2002), na época da chegada dos portugueses no Brasil,

os indígenas se preparavam para o trabalho por meio da socialização e da

convivência com os adultos, observando e participando indiretamente de atividades

de pesca, caça, plantio, colheita, confecção de objetos, dentre outras.

No início, os responsáveis pela educação formal no Brasil foram os jesuítas,

que chegaram ao Brasil em 1549, a princípio com a finalidade de catequizar os

índios. Ocorre que para que os índios fossem catequizados foi necessário alfabetizá-

los, além de ensinar o idioma português e alguns costumes europeus. Os jesuítas

também utilizavam a mão-de-obra indígena no desenvolvimento de atividades

agrícolas.

Em 1759 os jesuítas foram expulsos do Brasil por Marquês de Pombal,

acusados de conspiração contra o governo português. Então a educação passaria a

ser organizada pelo Estado, tendo como foco seus interesses, não mais os

interesses da fé.

Ainda, de acordo com Manfredi (2002), naquela época a educação para o

trabalho acontecia de maneira informal e a qualificação ocorria no próprio trabalho,

sem padrões ou regulamentações.

Tal afirmativa encontra eco nas palavras de Ribeiro (1992, p. 25), para quem:

A educação profissional (trabalho manual), sempre muito elementar diante das técnicas rudimentares de trabalho, era conseguida através do convívio, no ambiente de trabalho, quer de índios, negros ou mestiços que formavam a maioria de população colonial.

Segundo os Referenciais para a Educação Profissional do Senac (2004, p.

18):

País de economia baseada na monocultura, mantida pela exportação de produtos agrícolas para as metrópoles, o Brasil tinha um sistema de produção inicialmente dependente de mão-de-obra escrava e, posteriormente, dos colonos imigrantes, circunstâncias que dispensavam qualificação profissional.

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Mas os jesuítas foram além da catequização dos índios. Durante o período

colonial surgiram as primeiras escolas oficinas. De acordo com Manfredi (2002,

p.68):

Assim, os colégios e as residências dos jesuítas sediados em alguns dos principais centros urbanos foram os primeiros núcleos de formação profissional, ou seja, as “escolas-oficinas” de formação de artesão e demais ofícios, durante o período colonial.

Por volta de 1889, o Brasil passou por profundas mudanças socioeconômicas

devido à expansão da economia cafeeira. Em decorrência disso, o sistema

educacional acabou ganhando uma nova configuração e as poucas instituições

dedicadas ao ensino dos ofícios deram lugar a escolas criadas por iniciativa dos

governos estaduais e federal, da Igreja Católica e de membros da elite cafeeira.

Com relação à Educação Profissional, Gomes e Marins (2004), salientam que

quando o Príncipe D. João chegou ao Brasil foram criados os primeiros cursos

superiores não teológicos e os colégios das fábricas, que podem ser considerados o

início de um sistema de educação para o trabalho. Naquele momento o trabalho era

relacionado à escravidão e, com a Constituição de 1891, oficializou-se a divisão

entre a educação da classe dominante e a educação do povo, entre o trabalho

intelectual e o trabalho manual. Somente tinham direito a voto os cidadãos do sexo

masculino, maiores de 21 anos e alfabetizados. Isso intensificou mais ainda a

divisão de classes e a grande maioria da população sofreu intensa exclusão política.

A elite era preparada para o trabalho intelectual, enquanto os menos

favorecidos eram fadados ao trabalho braçal. O ensino manual era uma maneira de

controlar e disciplinar as classes populares. Esta dicotomia permanece ainda hoje,

um pouco mais velada, considerando que, com raras exceções, os que têm

melhores condições financeiras acabam ingressando nas universidades púbicas,

enquanto os menos favorecidos buscam ainda jovens uma profissão, muitas vezes

por meio dos cursos técnicos. Percebe-se, inclusive, que os alunos trazem este

estigma para a sala de aula, muitas vezes carregando baixa auto-estima e

comportamentos típicos de quem teve pouca ou nenhuma oportunidade.

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De acordo com Gomes e Marins (2004), em 1906 o ensino profissionalizante

passou a ser responsabilidade do Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio e

iniciou-se o incentivo à preparação de operários, basicamente da classe mais

desfavorecida.

O Estado de São Paulo foi o que mais se destacou no ensino

profissionalizante. Manfredi (2002, p.86) destaca: “Em 1911 começaram a funcionar

em São Paulo, capital, as primeiras escolas profissionais oficiais, destinadas ao

ensino das “artes industriais” para o sexo masculino e de “economia e prendas

manuais” para o feminino. ”

Na década de 20, uma série de debates sobre a expansão do ensino profissional, promovida pela Câmara dos Deputados, daria uma nova tônica à questão ao propor a extensão do ensino profissional a ricos e pobres, e não apenas aos “desafortunados”. (Referenciais para a Educação Profissional do Senac, 2004, p. 19)

Gomes e Marins (2004) salientam que em 1930, com o início do processo de

industrialização no país, a queda da bolsa de Nova York e a crise do café aumentou

a necessidade de profissionais para atendimento aos novos processos produtivos.

Foi proposta então a extensão do ensino profissional a pobres e ricos, além dos

desafortunados.

De acordo com Manfredi (2002, p. 98):

No campo da formação profissional, o modelo construído a partir de 30 combinou o cerceamento e o enquadramento institucional das associações de trabalhadores a uma política de convencimento e de disputa de hegemonia no plano ideológico.

Na sequência foram criados os Ministérios da Educação e Saúde Pública e do

Trabalho, Indústria e Comércio, além do Serviço de Remodelagem do Ensino

Profissional Técnico.

O Decreto Federal nº 20.158/31 organizou o ensino profissional comercial e

estruturou os cursos profissionalizantes em âmbito nacional.

O decreto nº 20.158/31, de 30 de junho de 1931, altera o ensino comercial, que passa a ter o curso propedêutico (três anos), seguido de cursos técnicos (de um a três anos) em cinco modalidades e o

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curso superior (três anos) de administração e finanças. (Ribeiro, 1992)

Percebe-se que ainda não havia uma formalização da educação profissional.

Para Gomes e Marins (2004, p. 37), “foi apenas na Constituição de 1937 que a

educação profissional se viu pela primeira vez contemplada, ao ser reconhecido,

através de documento oficial, o trabalho manual como parte da educação. ”

A este respeito, os Referenciais da Educação Profissional do Senac (2004, p.

19) explicitam:

Foi, contudo, somente na Constituição de 1937 que se tratou pela primeira vez das escolas vocacionais e pré-vocacionais como dever de Estado, que deveria ser cumprido com a “colaboração das indústrias e dos sindicatos econômicos” (classes produtoras), aos quais caberia “criar na esfera de sua especialidade escolas de aprendizes, destinadas aos filhos de seus operários e associados”.

Nos anos 40, Gustavo Capanema inicia a reformulação da educação

brasileira, com a criação do Senai (1942) e do Senac (1946), devido a uma forte

demanda de mão-de-obra para a indústria e para o comércio.

De acordo com Gomes e Marins (2004), em 1942, 1943 e 1946 foram

promulgadas, respectivamente, as Leis Orgânicas do Ensino Industrial, do Ensino

Comercial e do Ensino Agrícola, que propunham a estruturação do ensino técnico-

profissional. Paralelamente a isso foram criados o Senai e o Senac, objetivando a

formação de profissionais para a indústria e o comércio.

Em 1961 foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº

4021/61. Com ela, os alunos da educação profissional passaram a ter o direito de

prosseguir com os estudos em níveis subsequentes, sem necessidade de provas e

exames.

As Leis nºs 5.540/68 e 5.692/71, promulgadas num cenário marcado por pressões das camadas médias por educação, representariam uma estratégia governamental no sentido de conter a forte demanda por ensino superior. Nesse sentido, a Lei nº 5.692/71, em nome da necessidade de formação de técnicos de nível médio, atribui ao ensino de 2º grau um caráter de profissionalização compulsória. (Referenciais para a Educação Profissional do Senac, 2004, p. 21)

Em 1963, no Rio Grande do Norte, Paulo Freire desenvolveu um método

inovador de alfabetização de adultos e passou a ser admirado, em especial, por

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profissionais da educação, sociólogos e militantes políticos. Em 1964 foi preso e

exilado, acusado de subversão pelo regime militar. Mais tarde veio a influenciar

fortemente a educação, em especial a educação popular, com sua concepção da

Pedagogia Libertadora.

Em 1967 foi criado o Mobral – Movimento Brasileiro de Alfabetização, cujo

objetivo declarado era proporcionar alfabetização e letramento a pessoas acima da

idade escolar. Porém, muitos defendem que o objetivo oculto do Programa era impor

a ideologia ditatorial dominante na época.

No entanto, o caráter dualista da educação permanece com a formação da

elite para ser condutora do país e da classe menos favorecida para ingressar no

mercado de trabalho. O trabalho continua relacionado ao sofrimento e,

consequentemente, aos menos favorecidos e ainda carregamos esta herança hoje.

Segundo o Parecer CNE/CEB n° 16/99:

A formação profissional, desde as suas origens, sempre foi reservada às classes menos favorecidas, estabelecendo-se uma nítida distinção entre aqueles que detinham o saber (ensino secundário, normal e superior) e os que executavam tarefas manuais (ensino profissional). Ao trabalho, frequentemente associado ao esforço manual e físico, acabou se agregando ainda a idéia de sofrimento. Aliás, etimologicamente o termo trabalho tem sua origem associada ao “tripalium”, instrumento usado para tortura. A concepção do trabalho associado a esforço físico e sofrimento inspira-se, ainda, na idéia mítica do “paraíso perdido”. (p. 2)

Segundo Gomes e Marins (2004), com a Lei nº 5.692/71 o trabalho passaria a

ser parte integrante da formação de primeiro e segundo graus. A lei teve como

fundamentação a visão tecnicista trazida pela “teoria do capital humano”, segundo a

qual a educação escolar passa a ser vista apenas como uma maneira de formar os

indivíduos para disputas de posições no mercado de trabalho. No entanto, a lei ficou

só no papel e somente as escolas que já ofertavam cursos profissionalizantes

continuaram a fazê-lo, enquanto as demais continuaram com o ensino preparatório

para o prosseguimento de estudos.

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Referenciais para a Educação Profissional do Senac (2004, p. 21)

esclarecem:

Convém ainda salientar que as reformas educacionais dos anos 70 tiveram inspiração na teoria do capital humano, que creditava à educação o poder quase mágico de favorecer o desenvolvimento das nações e a ascensão social dos indivíduos. Essa teoria, surgida nos Estados Unidos e Inglaterra, nos anos 60, e no Brasil, nos anos 70, foi estruturada no âmbito das teorias do desenvolvimento ou ideologia desenvolvimentista do pós-guerra, como parte da estratégia de hegemonia americana. Sistematicamente criticada por educadores e economistas, a teoria do capital humano influenciou a própria prática educativa. Esta, à guisa de obter resultados mais imediatistas, passou a pautar-se por uma pedagogia fundamentada nos princípios da racionalidade e da eficiência que regem a lógica do mercado, dando ao trabalho escolar um caráter acentuadamente tecnicista, que se materializava em propostas fechadas, restritas a uma aprendizagem para o saber fazer.

Segundo a Teoria do Capital Humano quanto maior a escolarização, maior o

aumento de renda do indivíduo e maior sua qualidade de vida, ou seja, a educação é

fundamental para aumentar o capital humano.

Por essa razão, difundiu-se, no país, a necessidade de vincular a educação aos planejamentos econômicos globais, como forma de contribuir para o seu desenvolvimento econômico. E, para atingir essa meta, seria necessário adequar a educação às necessidades de qualificação de mão-de-obra demandada pelo mercado de trabalho. Nesse contexto, foram realizadas a Reforma do Ensino Superior (Lei n.º 5.540/68) e, posteriormente, a Reforma do Ensino de 1º e 2º Graus (Lei n.º 5.692/71). (Referenciais para a Educação Profissional dos Senac, 2004, p. 20)

De acordo com Gomes e Marins (2004), em 1975 o Conselho Federal de

Educação promulgou o Parecer nº 76/75, que expressa uma preocupação com uma

formação que preparasse o jovem para enfrentar o mundo de forma plena e integral,

não apenas com uma ocupação. A estrutura da educação profissional foi organizada

em habilitação plena, formação técnica, habilitação parcial, formação de auxiliar e

habilitação básica.

Na atual Constituição, promulgada em 1988, a educação passa a ser

encarada como direito fundamental do cidadão. O direito à educação aparece

intimamente ligado ao reconhecimento da dignidade da pessoa humana, o que

significou um grande avanço. A Constituição também trouxe princípios como

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gratuidade, qualidade e obrigatoriedade do ensino público e valorização do

magistério. Além disso, o dever do estado em proporcionar creches para crianças de

0 a 6 anos.

Nos anos 90, a reforma educacional do governo Fernando Henrique Cardoso

prevê a melhoria da oferta dos cursos de Ensino Médio e Educação Profissional.

Segundo Manfredi (2002), o objetivo principal é adequar a oferta às necessidades do

mercado e ao avanço tecnológico.

Em 1996, foi instituída a atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação, nº

9394/96 que, sob a ótica de Gomes e Marins (2004), trouxe inovações para a

educação profissional, focando o desenvolvimento de competências e integrando-a

às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia, conduzindo

ao permanente desenvolvimento de aptidões para a vida produtiva.

O parágrafo único do artigo 39 da atual LDB preconiza que “o aluno

matriculado ou egresso do ensino fundamental, médio e superior, bem como o

trabalhador em geral, contará com a possibilidade de acesso à educação

profissional”.

O Parecer CNE/CEB n° 16/99 traz a necessidade de uma nova formação

técnica, um novo perfil de egresso:

Do técnico será exigida tanto uma escolaridade básica sólida, quanto uma educação profissional mais ampla e polivalente. A revolução tecnológica e o processo de reorganização do trabalho demandam uma completa revisão dos currículos, tanto da educação básica quanto da educação profissional, uma vez que é exigido dos trabalhadores, em doses crescentes, maior capacidade de raciocínio, autonomia intelectual, pensamento crítico, iniciativa própria e espírito empreendedor, bem como capacidade de visualização e resolução de problemas.

Isso desperta a necessidade de um novo perfil docente, com visão

abrangente e capaz de aplicar estratégias de ensino inovadoras, que levem o aluno

a pensar processualmente e não só a fazer, visando às novas necessidades de um

mercado profissional em constante mutação.

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Segundo Manfredi (2002), em 1997 o Decreto nº 2.208 regulamentou a

educação profissional em três níveis, o Básico, destinado à maioria dos

trabalhadores e independente de escolaridade anterior; o técnico, destinado aos

matriculados ou egressos do Ensino Médio; e o Tecnológico, destinado aos

egressos do Ensino Médio ou Técnico.

Conforme Gomes e Marins (2004), a Resolução CNE-CEB nº 02/97, prevê

que a formação docente para a educação profissional deverá se dar em cursos de

licenciatura e em programas especiais de formação pedagógica, para suprir nas

escolas a falta de professores habilitados, em caráter especial.

Já a Resolução CNE-CEB nº 04/99, em seu artigo 17, trouxe a possibilidade

que a preparação docente para a educação profissional se dê em serviço, em cursos

de licenciatura ou programas especiais.

De 26 a 30 de abril de 1999, em Seul, na Coréia, aconteceu o segundo

Congresso Internacional sobre o Ensino Técnico e Profissional, organizado pela

Unesco, visando a renovação do ensino técnico e profissional (EPT), abordando a

questão do trabalho e outros desafios socioeconômicos dos primeiros anos do

século XXI.

O resultado deste Congresso foi um conjunto de recomendações sob o título:

“O Ensino e a formação técnico profissional: uma visão para o Século XXI”. Abaixo

são mencionados alguns trechos, selecionados em detrimento a outros já que

podem trazer mais contribuições para este trabalho.

“[...] a globalização e a revolução das tecnologias de informação e de comunicação mostram a necessidade de um novo modelo de desenvolvimento centrado no ser humano. Nós concluímos que o ensino técnico e profissional, parte integrante da aprendizagem ao longo de toda a vida, tem um papel decisivo a desempenhar nesta nova era porque ele constitui um instrumento eficaz para realizar os objetivos de uma cultura da paz, do desenvolvimento sustentável do ambiente, da coesão social e da cidadania internacional. ” (preâmbulo) “[...] É necessária uma abordagem holística de maneira que a educação para o Século XXI abranja todos os domínios da aprendizagem, incluindo a formação geral e profissional, permitindo

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ao formando do século XXI adquirir constantemente, ao longo da vida, conhecimentos, valores e atitudes, competências e qualificações. A finalidade desta abordagem seria a criação de uma sociedade educativa. ” (item 1.2) “Para dar uma contribuição máxima à aprendizagem ao longo de toda a vida, os sistemas de ETP devem ser abertos, flexíveis e centrados no formando. Eles devem não somente dotá-lo de conhecimento e de competências correspondendo aos empregos específicos, mas, também, de forma mais geral, preparar os indivíduos para a vida e para o mundo do trabalho. O ETP deve favorecer ao mesmo tempo o indivíduo, a sociedade e a economia. ” (item 2.2) “[...] cabe ao ETP assegurar educação e formação básicas sólidas que possibilitem ao formando “aprender a aprender”, o que constitui a competência mais preciosa para todos os cidadãos, jovens ou adultos. ” (item 2.5) “[...] é necessário elevar o “status” e o prestígio do ETP aos olhos de todos os membros da sociedade e em particular aos da mídia. Isto presume, entre outras coisas, que se melhore a condição dos professores do ETP observando suas próprias competências, qualificações e dotando-os dos recursos necessários para cumprir sua tarefa...” (item 2.10) “[...] É preciso repensar as qualificações exigidas ao formador do ETP do século XXI, inclusive o melhor equilíbrio entre a formação adquirida na universidade e no local de trabalho. [...]” (item 3.7) “Os programas de Ensino Técnico e Profissional deveriam ser concebidos como sistemas completos integradores a fim de responder às necessidades de todos os formandos, devem ser acessíveis a todos. Esforços particulares são necessários para atender grupos anteriormente marginalizados. Onde houver necessidade de programas especiais, estes devem ser concebidos de forma que facilite a entrada no sistema, assegurando assim um acesso contínuo à aprendizagem ao longo de toda a vida. ” (item 4.2) “[...] O Estado deveria também ser considerado como um patrocinador em última instância a fim de garantir que as populações em risco de exclusão não sejam negligenciadas e tenha efetivamente acesso aos programas de ETP [...]” (item 5.6)

Podemos perceber que o grande desafio da Educação Profissional é se

preocupar com o surgimento de novas tecnologias e acompanhar as mudanças que

vêm acontecendo no mercado de trabalho. Os Referenciais para a Educação

Profissional dos Senac (2004) destacam ainda: a mudança da faixa etária atuante no

mercado de trabalho, que dá preferência aos mais velhos e experientes, em

detrimento aos mais jovens e ainda sem qualificação; tendência de redução de

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emprego nos setores primário e secundário, e grande absorção pela área de

prestação de serviços; aumento do grau de informalidade no mercado; valorização

do desenvolvimento de competências e habilidades para o desempenho e atuação

no mercado de trabalho, em detrimento a formação de profissionais para ocupação

de postos específicos.

Tudo isso requer uma formação mais ampla dos alunos, que exige do

trabalhador a mobilização de determinadas competências para a solução dos

desafios profissionais enfrentados no dia-a-dia, se tratando de uma formação global,

não só para o trabalho, mas para a vida.

Na visão de Pimenta (2002), os três grandes desafios contemporâneos da

educação são: sociedade da informação e sociedade do conhecimento; sociedade

da esgarçadura das condições humanas, traduzida na violência, na concentração de

renda na mão de minorias, na destruição da vida pelas drogas, pela destruição da

relação interpessoal e sociedade do não-emprego e das novas configurações do

trabalho.

Os docentes necessitam atender a esta demanda, reestruturando seus

saberes e fazeres através de um trabalho reflexivo, de forma dinâmica e criativa, que

exige intervenções constantes, buscando despertar nos alunos a aprendizagem com

autonomia, o verdadeiro sentido do “aprender a aprender”.

Mas que competências os docentes precisam desenvolver para atender esta

demanda? De acordo com Libâneo (2002):

[...] O novo professor precisaria, no mínimo, de adquirir sólida cultura geral, capacidade de aprender a aprender, competência para saber agir na sala de aula, habilidades comunicativas, domínio da linguagem informacional e dos meios de informação, habilidade de articular as aulas com as mídias e multimídias. p.28

Nóvoa (2009), identifica cinco disposições essenciais à definição dos

professores de hoje. São elas: conhecimento (conhecer bem aquilo que se ensina),

cultura profissional (integrar-se em uma profissão); tato pedagógico (capacidade de

relação e comunicação); trabalho em equipe (trabalhar de forma coletiva e

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colaborativa); e compromisso social (princípios, valores, inclusão, diversidade

cultural).

Ou seja, os grandes desafios a serem enfrentados pelos docentes da

educação profissional referem-se às constantes mudanças no mercado de trabalho

em decorrência do surgimento de novas tecnologias, novas culturas profissionais, ao

aumento das exigências de qualidade e a questões relacionadas à ética,

responsabilidade ambiental e social.

Em 25/06/14, por intermédio da Lei 13.005/14, foi aprovado o Plano Nacional

de Educação - PNE, que estará em vigor até 2024.

Com relação à Educação Profissional, o PNE, em suas metas 10 e 11,

preconiza:

Meta 10: oferecer, no mínimo, 25% (vinte e cinco por cento) das matrículas de

educação de jovens e adultos, nos ensinos fundamental e médio, na forma integrada

à educação profissional.

A meta 10 tem por objetivo proporcionar oportunidade àqueles que não

tiveram acesso à escola na idade certa e evitar que esse tipo de exclusão continue

se repetindo.

Meta 11: triplicar as matrículas da educação profissional técnica de nível

médio, assegurando a qualidade da oferta e pelo menos 50% (cinquenta por cento)

da expansão no segmento público.

O estabelecimento da meta 11 implica na superação da dualidade da

existência de duas redes de ensino médio, uma para a educação geral e outra para

a profissional, que faz com que perdure a lógica de que alguns pensam e outros

executam.

Considerando esta proposta deve haver um aumento significativo na oferta da

educação profissional de nível técnico e as profissões de nível técnico tendem a ser

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valorizadas, trazendo mais um desafio para as escolas de educação profissional e

para seus docentes.

1.1 O Senac São Paulo e o Senac Vila Prudente

Em maio de 1945, momento em que o mundo passava por grandes

transformações econômicas, sociais e políticas, reuniram-se autoridades das áreas

do comércio, indústria e agricultura, em Teresópolis – RJ, visando debater os rumos

do país, frente aos desafios internos e externos.

O objetivo principal foi analisar e discutir a situação econômica nacional, além

das políticas em favor do bem-estar social, buscando soluções que atendessem a

coletividade. Estas discussões deram origem à Carta Econômica de Teresópolis, e

trouxeram como aspirações básicas o combate ao pauperismo, aumento da renda

nacional, desenvolvimento das forças econômicas, democracia econômica e justiça

social.

Os princípios levantados nesta conferência compreenderam várias

recomendações, dentre elas, a garantia ao homem a um salário real que lhe

permitisse viver com dignidade, a necessidade do aumento da produtividade e, com

elas, a intensificação e aperfeiçoamento do ensino médio e superior de comércio,

economia e administração, em decorrência da necessidade crescente de funções

especializadas. Além disso, foi sugerida a criação de fundações ou sociedades que

mantivessem, sem fins lucrativos, escolas, onde educadores e professores e

pudessem exercer a missão de preparar o homem para a vida.

Esses esforços culminaram na ideia de criação do Senac, que se deu no ano

seguinte. O Senac é uma instituição educacional com mais de sessenta anos de

existência, que busca promover o aprendizado como um desafio constante rico e

transformador. Foi criada por lei federal em 1946, a partir da reivindicação de

empresários do setor do comércio, diante da necessidade de preparar profissionais

para este setor.

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Seu principal compromisso era organizar e administrar, em todo o território

nacional, escolas de aprendizagem comercial, preparando menores de 14 a 18 anos

para o trabalho e oferecendo oportunidades de aperfeiçoamento de adultos.

Desde a década de 50 o Senac vem ampliando sua atuação, que hoje

contempla a oferta de títulos de várias áreas do conhecimento, em diferentes

formatos e modalidades, de cursos de formação básica até pós-graduações.

Atualmente o Senac São Paulo conta com 54 unidades educacionais no

estado, além de três campi universitários, dois hotéis-escola e uma editora. O

Conselho Regional do Senac é presidido pelo presidente da Federação do Comércio

de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo.

Hoje a programação do Senac São Paulo está concentrada nas áreas de

Comunicação e Artes, Design, Moda, Idiomas, Administração e Negócios,

Informática e Tecnologia aplicada à educação à distância, Turismo, Hotelaria,

Gastronomia e Lazer, Saúde, Meio Ambiente, Educação e Desenvolvimento Social.

A missão do Senac São Paulo é “proporcionar o desenvolvimento de

pessoas, por meio de ações educacionais que estimulem o exercício da cidadania e

a atuação profissional transformadora e empreendedora, de forma a contribuir para

o bem-estar da sociedade”.

Como visão de futuro o Senac São Paulo estabelece: “Até 2015, o Senac São

Paulo fortalecerá seu reconhecimento como instituição de excelência na prestação

de serviços educacionais inovadores, voltados à inclusão social e à formação

diversificada de profissionais-cidadãos”.

A concessão de bolsas de estudo sempre fez parte do cotidiano do Senac

São Paulo, mas, a partir de 2009, a Instituição, por meio do Programa Senac

Gratuidade intensificou essa ação, ampliando o alcance do seu trabalho social e

beneficiando pessoas socialmente excluídas. A previsão é que até o final de 2014,

sejam concedidas mais de 110 mil bolsas de estudos.

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Em 1946, quando o Senac São Paulo foi criado, existiam duas trajetórias

educacionais distintas, a da escola de educação geral e a da educação profissional.

A primeira preparava pessoas para o ensino superior e a segunda formava pessoas

para o mercado de trabalho. Naquele momento os educandos não eram vistos como

produtores da própria aprendizagem e construtores do conhecimento.

Uma das principais transformações educacionais ocorridas foi o

deslocamento da ênfase no ensino para a ênfase na aprendizagem, onde o aluno

está no centro do processo.

Com isso, a Proposta Pedagógica do Senac São Paulo determina:

A educação profissional no Senac São Paulo deve promover as pessoas, as organizações e comunidades, buscando fortalecê-las por meio de um processo que visa à inserção social e à ação participativa. Deve estar voltada para desenvolver as competências para o trabalho e para a melhoria da qualidade de vida.

De acordo com sua Proposta Pedagógica, o Senac São Paulo se propõe a

utilizar práticas pedagógicas inovadoras, que estimulem o aluno a construir o

conhecimento e a desenvolver competências. No âmbito dessa proposta são

utilizadas metodologias participativas, estruturadas na prática e baseadas em

situações reais de trabalho, através de estudos de caso, pesquisas, solução de

problemas, projetos e outras estratégias.

Nesta perspectiva, o docente cria ambientes e situações para que o aluno

atue e aprenda, como protagonista do processo de aprendizagem. Ele planeja e

estimula a ação dos alunos, promovendo a reflexão e organizando o trabalho

educativo, como mediador e orientador.

A Proposta Pedagógica do Senac São Paulo preconiza que o grupo de

docentes, além de ter sua competência assegurada, deve estar integrado à proposta

e aos planos de curso e projetos pedagógicos e necessita de acompanhamento

contínuo e sistemático, além de desenvolvimento pedagógico alinhado à

metodologia da Instituição.

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O Senac São Paulo mantém, em seu portfólio de cursos exclusivos para

funcionários, um programa para formação de docentes, denominado PDE –

Programa de Desenvolvimento Educacional. O PDE tem como objetivo favorecer a

consolidação da Proposta Pedagógica, atendendo às necessidades de formação

educacional dos profissionais que atuam na Instituição, com ênfase na prática

pedagógica voltada ao desenvolvimento da aprendizagem com autonomia. O

programa visa oferecer aos participantes as condições necessárias para o

desenvolvimento de uma postura profissional reflexiva perante as questões

suscitadas pela prática educacional, tendo como princípio o processo de ação-

reflexão-ação.

No portfólio deste programa há cursos destinados exclusivamente ao

desenvolvimento de professores, conforme títulos abaixo:

Pós-graduação: especialização em docência para a Educação Profissional

Integração Educacional: jeito Senac de educar

Proposta Pedagógica: um tesouro a explorar

Conhecendo as lousas interativas do Senac São Paulo

Acompanhamento do processo de ensino e aprendizagem: da intenção

à sistematização

Construindo competências por meio de projetos

Oficina de estratégias participativas de ensino e aprendizagem

Educar para a Paz

Planejando estratégias de ensino-aprendizagem para alunos com

deficiência auditiva

Planejando estratégias de ensino-aprendizagem para alunos com

deficiência física

Em 26 de outubro de 2011, com a sanção da Lei nº 12513/2011, pela

Presidenta Dilma Rouseff foi criado o PRONATEC – Programa Nacional de Acesso

ao Ensino Técnico e Emprego, com o objetivo principal de expandir, interiorizar e

democratizar a oferta de cursos de Educação Profissional e Tecnológica para a

população brasileira.

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Um dos parceiros escolhidos para oferta do Pronatec a partir de 2012 foi

Senac São Paulo, juntamente com o Senai, as instituições da Rede Federal de

Educação Profissional, Científica e Tecnológica e o Centro Paula Souza SP. Com

esta oferta diferenciada, o Senac São Paulo passou a atender gratuitamente, em

seus cursos técnicos, estudantes do Ensino Médio da Rede Pública. É importante

ressaltar que o Pronatec também tem alunos beneficiados na modalidade FIC –

Formação Continuada, nos cursos de capacitação, acima de 160h.

Esta parceria aumentou ainda mais o compromisso Social do Senac São

Paulo, trazendo enorme ganho para a população, já que proporcionou acesso aos

cursos a pessoas que dificilmente teriam esta oportunidade se não fosse a

realização do Programa.

O Senac Vila Prudente é uma das unidades do Senac no estado de São

Paulo. Está localizado na Zona Leste e fica a menos de dez minutos, a pé, da

Estação Vila Prudente do Metrô e foi inaugurado em 1987. Promove cursos técnicos,

de formação inicial a continuada, além de ser Polo de Pós-graduação na modalidade

EAD (Educação à Distância). Para proporcionar um aprendizado prático e dinâmico

da profissão, a Unidade conta, além de salas de aula convencionais, com

laboratórios de informática e salas-ambientes, nas quais os alunos conhecem a

realidade na prática.

Atualmente o Senac Vila Prudente atua nas seguintes áreas: Saúde e Bem-

Estar, Tecnologia da Informação, Segurança e Saúde no Trabalho, Desenvolvimento

Social, Administração e Negócios, Moda e Beleza, Comunicação Social.

O documento Recomendação Relativa à Condição Docente (1966) traz a

definição do termo docente que assim designa “todas as pessoas que nas escolas

assumem a responsabilidade de educação dos alunos”. (p.5) É neste sentido que

está sendo usada a denominação docente ou professor, considerando que no Senac

São Paulo o cargo utilizado para a função de professor ou docente é Monitor de

Educação Profissional.

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1.2 O curso Técnico em Segurança do Trabalho no Senac São Paulo

O curso Técnico em Segurança do Trabalho tem duração aproximada de 18

meses, com carga horária de 1.200 horas, distribuídas em sete módulos, conforme

abaixo:

Módulo I – Segurança e Saúde do Trabalho e Meio Ambiente – 240

horas

Módulo II – Higiene Ocupacional e Ergonomia – 280 horas

Módulo III – Riscos Ocupacionais em Segmentos Específicos – 184

horas

Módulo IV – Gerenciamento de Emergências – 132 horas

Módulo V – Sistema de Segurança e Saúde do Trabalho – 204 horas

Módulo VI – Gestão Empreendedora – 40 horas

Módulo VII – Sistema de Gestão Integrada – 120 horas

O curso tem por objetivo habilitar profissionais para atuar na prevenção de

acidentes do trabalho, em cumprimento à legislação pertinente à saúde e segurança

dos trabalhadores, atuando em empresas públicas e privadas ou como prestador de

serviços nas empresas em geral.

O curso é dirigido a egressos ou estudantes cursando a partir do segundo ano

do ensino médio, com idade mínima de 16 anos. E seus principais diferenciais são:

alinhamento ao mercado de trabalho, docentes experientes que enfatizem situações

de aprendizagem dinâmicas e interativas que privilegiem a formação de um

profissional crítico e criativo.

A faixa salarial para técnicos em segurança do trabalho é de R$ 2.000,00 a

R$ 3.000,00 e só podem ser contratados neste cargo os profissionais que tiverem

registro junto ao Ministério do Trabalho, e, consequentemente, só podem obter o

registro os concluintes do curso técnico.

A metodologia do curso prevê o desenvolvimento de um projeto, desenvolvido

no decorrer dos módulos, que considera contextos similares aos encontrados nas

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condições reais de trabalho e que estimulam a participação ativa dos alunos na

busca de soluções para os desafios que dele emergem.

São considerados aprovados neste curso os alunos que, em cada um dos

módulos, obtiverem menção “Bom” ou “Ótimo” e apresentarem, no mínimo, 75% de

frequência.

Estão habilitados para a docência neste curso, profissionais licenciados

(licenciatura plena ou programa especial de formação) na respectiva área

profissional. Poderão ainda ser admitidos, em caráter excepcional, profissionais com

a seguinte ordem preferencial:

Na falta de licenciados, os graduados na correspondente área

profissional ou de estudos.

Na falta de profissionais graduados em nível superior nas áreas

específicas, profissionais graduados em outras áreas e que tenham

comprovada experiência profissional na área do curso.

Na falta de profissionais graduados, técnicos de nível médio na área do

curso, com comprovada experiência profissional na área.

Na falta de profissionais de nível técnico com comprovada experiência,

outros reconhecidos por sua notória competência e, no mínimo, com

ensino médio completo.

Aos não licenciados é propiciada formação docente em serviço.

A área de Saúde e Segurança no Trabalho apresenta uma grande demanda

por profissionais técnicos, além disso, a remuneração é bem atrativa, considerando

o nível de escolaridade exigido. Estes fatores fazem com que as vagas ofertadas

sejam preenchidas com muita facilidade e que as listas de espera por vagas fiquem

cada vez maiores.

No Senac Vila Prudente temos, neste momento, oito turmas em andamento,

sendo duas no período da manhã e seis no período noturno, com uma média de

quarenta alunos por turma.

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2. A FORMAÇÃO E OS SABERES E FAZERES DOCENTES

O documento Recomendação Relativa à Condição Docente (1966) trata, entre

outras questões, da importância do docente no processo de aprendizagem. “Deverá

ser reconhecido que o desenvolvimento da educação depende, em grande parte, da

formação e da competência do docente, assim como de suas qualidades humanas,

pedagógicas e profissionais. ” ( p.6)

Isto justifica a necessidade de estudar a formação docente, e, para pensar a

formação e os saberes e fazeres docentes, é importante estabelecer diálogos com

autores que trabalham este tema.

Para Ferry (2004), a formação difere do ensino e da aprendizagem, que por

sua vez podem ser suportes para a formação. Segundo o autor, a formação consiste

em encontrar formas de cumprir certas tarefas para exercer uma profissão, um

trabalho. Seria semelhante ao atleta, que se coloca em forma para melhor se

desempenhar em sua prática esportiva.

Isto remete a conhecimentos, habilidades, representação do trabalho e da

profissão que vai se exercer como também concepção e imagem do papel a ser

desempenhado, entre outros. Assim a formação deve ser entendida como um

processo de desenvolvimento pessoal.

Ainda de acordo com Ferry (2004), a formação não se recebe e não se oferta.

O indivíduo se forma, ele é responsável pelo seu desenvolvimento que ocorre, por

meio das circunstâncias, dos acidentes da vida, da relação com os outros, entre

outros.

Nessa concepção, não se trata de formar-se fazendo. Formar-se é trabalhar

sobre si mesmo, refletir sobre o que faz e descobrir novas maneiras para fazê-lo. É

necessário, portanto, um espaço, um tempo e uma relação com a realidade para que

a formação aconteça, de maneira dinâmica. Há, então, o que o autor denomina de

movimento de alternância entre as práticas produzidas e a teorização decorrente

destas práticas. Ferry apresenta três modelos de formação, o modelo de aquisições,

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conhecer e saber transmitir os conhecimentos, o saber-fazer; o modelo do processo,

relacionado à visão de realidade, o caminhar; o modelo de análise, em que a prática

precisa ser fundamentada na teoria e a teoria precisa ser testada na prática.

O autor afirma que não há um modelo que seja melhor do que o outro e que

os modelos podem ser adaptados de acordo com as necessidades e situações.

Ferry destaca que os saberes possuem dimensões teóricas e práticas em diferentes

níveis. O primeiro nível, da prática, relacionado ao fazer; o segundo nível, do como

fazer, das técnicas, relacionado ao saber fazer; o nível praxiológico, relacionado ao

por que fazer, e o nível científico, de produção de conhecimento, de investigação,

sem a preocupação com a aplicabilidade, com as ações.

A questão da formação docente também foi abordada por Perrenoud (2000, p.

178), que afirma:

A profissionalização é uma transformação estrutural que ninguém pode dominar sozinho. Por isso ela não se decreta, mesmo que as leis, os estatutos, as políticas da educação possam facilitar ou frear o processo. O que significa que a profissionalização de um ofício é uma aventura coletiva, mas que se desenrola também, largamente, através das opções pessoais dos professores, de seus projetos, de suas estratégias de formação. Tal é a complexidade das mudanças sociais: elas não são a simples soma de iniciativas individuais, nem a simples consequência de uma política centralizada.

Ou seja, segundo o autor, ninguém se torna professor sozinho, trata-se de um

processo coletivo.

Corroborando com a ideia de Perrenoud, Freire (1996, p. 22), afirma: “[...]

quem forma se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao

ser formado [...]" O autor salienta que assim como ensinar não é transferir

conhecimentos, formar não é a ação pela qual um sujeito dá forma a outro.

Nesta mesma perspectiva, Furlanetto (2007) fala de duas interpretações

possíveis sobre o conceito de formação, a primeira considerando-se a ideia de

fôrma, onde o professor é “enformado”, segundo modelos preconcebidos. A segunda

relacionada à ideia de forma, onde o professor, por meio do processo formativo,

pode buscar seus próprios contornos.

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Na visão da autora, não é possível construir um único modelo de formação, já

que cada professor segue seu próprio eixo de formação, por meio de suas

experiências e vivências. Analisando suas pesquisas, Furlanetto (2007) menciona

que: “Observando a trajetória de alguns deles, pudemos perceber que pareciam

possuir um professor interno, uma base da qual emanavam suas ações pedagógicas

que não representava somente a síntese de seus aprendizados teóricos, mas

também de suas experiências culturais vividas a partir do lugar de quem aprende. ”

(p. 25).

Furlanetto (2007), ainda, nos traz o conceito de matrizes pedagógicas, que

são simbolicamente consideradas pela autora como “espaços nos quais a prática

dos professores é gestada” [...] “A matriz, além de configurar-se como local de

fecundação e gestação, também se apresenta como possibilidade de retorno em

busca da regeneração e da transformação. ” (p. 27)

De acordo com a autora, quando o professor atua, ele acaba acessando suas

matrizes pedagógicas que funcionariam como arquivos contendo imagens,

conteúdos coletivos e pessoais.

A autora, em suas pesquisas, constatou que os espaços e tempos em que a

formação ocorre são diversos. Algumas das experiências de formação são

planejadas, com finalidade bem definida e outras ocorrem espontaneamente e de

maneira quase imperceptível. Algumas acontecem de forma consciente e outras

inconscientemente. Defende, ainda, que para o professor entrar em contato com

suas matrizes pedagógicas precisa falar da prática, dos desafios e dificuldades

encontradas e do prazer que sente em ser professor. Furlanetto (2009)

Relata que ao fazerem este contato, os docentes percebem que suas

matrizes pedagógicas são construídas a partir sua história e de sua cultura e que

suas respostas às situações são singulares e estão enraizadas em conteúdos

profundos aos quais eles estão ligados. Pensar a formação nessa perspectiva

implica possibilitar que os docentes entrem em contato com suas matrizes e

possam, dessa forma conhecê-las e transformá-las caso considerem necessário.

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Segundo a autora, “Ao retornarmos às matrizes pedagógicas,

desconfigurando-as por vezes, reconfigurando-as em outros momentos,

ressignificando-as sempre, acreditamos que podemos desencadear movimentos de

regeneração e transformação. ” Furlanetto (2007, p. 32)

Ou seja, as matrizes pedagógicas podem ser modificadas, através da vivência

do professor, da reflexão e da investigação.

Perrenoud (2000, p. 15) apresenta o conceito de competência, considerada:

“uma capacidade de mobilizar diversos recursos cognitivos para enfrentar um tipo de

situação. ”

O autor apresenta dez novas competências para ensinar. São elas: organizar

e dirigir situações de aprendizagem; administrar a progressão das aprendizagens;

conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação; envolver os alunos em

suas aprendizagens e em seu trabalho; trabalhar em equipe; participar da

administração da escola; informar e envolver os pais; utilizar novas tecnologias;

enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão; administrar sua própria

formação contínua.

Tardif (2002), ao invés de falar de competências faz referência aos saberes

docentes. Diz que o saber se relaciona com a pessoa do professor (o que ele é) e

com seu trabalho (o que ele faz), que esse saber é plural e emerge de diferentes

fontes e naturezas. Além disso, o saber do professor é temporal, ou seja, é adquirido

no decorrer de sua história de vida e carreira profissional. A experiência do professor

fundamenta os saberes, transformando-os para a própria prática docente.

Considerando os saberes docentes plurais, Tardif (2002) os classifica em

quatro categorias: saberes da formação profissional - relacionados à formação

pedagógica, por meio da formação inicial e continuada; saberes disciplinares –

relacionados às diversas disciplinas, aos diversos campos de conhecimento e

transmitidos no ensino universitário; saberes curriculares – relacionados ao

planejamento docente, ou seja, programas curriculares, objetivos, conteúdos e

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métodos a serem aplicados em sala de aula e saberes experienciais – relacionados

à prática docente, incorporados pela experiência individual ou coletiva.

Conforme quadro abaixo, o autor relaciona, ainda, os saberes às suas fontes

de aquisição e ao modo de integração no trabalho docente.

Saberes dos professores Fontes sociais de aquisição

Modos de integração no trabalho docente

Saberes pessoais dos professores

A família, o ambiente de vida, a educação no sentido lato, etc.

Pela história de vida e pela socialização primária

Saberes provenientes da formação escolar anterior

A escola primária e secundária, os estudos pós-secundários não-especializados, etc.

Pela formação e pela socialização pré-profissionais

Saberes provenientes da formação profissional para o magistério

Os estabelecimentos de formação de professores, os estágios, os cursos de reciclagem, etc.

Pela formação e pela socialização profissionais nas instituições de formação de professores

Saberes provenientes dos programas e livros didáticos usados no trabalho

A utilização das “ferramentas” dos professores: programas, livros didáticos, cadernos de exercícios, fichas, etc.

Pela utilização das “ferramentas” de trabalho, sua adaptação às tarefas

Saberes provenientes de sua própria experiência na profissão, na sala de aula e na escola.

A prática do ofício na escola e na sala de aula, a experiência dos pares, etc.

Pela prática do trabalho e pela socialização profissional

Fonte: Maurice Tardif, Saberes docentes e formação profissional (Petrópolis: Vozes,

2002, p. 63)

Para Ibernón (2006) a formação exige um trabalho reflexivo e para isso é

necessário um processo ação-reflexão-ação, o qual deve partir de situações

complexas, integrantes da rotina do trabalho docente, e ocorrer, se possível, em um

grupo de interação. A este respeito, afirma Ibernón (2006, p. 16) “A aquisição de

conhecimentos deve ocorrer da forma mais interativa possível, refletindo sobre

situações práticas reais”. E ainda “Assim, o currículo de formação deve consistir no

estudo de situações práticas reais que sejam problemáticas”. O resultado das

reflexões deve ser possível de aplicação em sala de aula. Segundo Ibernón (2006,

p. 17) “Para que seja significativa e útil, a formação precisa ter um alto componente

de adaptabilidade à realidade diferente do professor”.

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No entanto, segundo Libâneo (2002, p. 95): “Atualmente, em boa parte dos

cursos de licenciatura, a aproximação do futuro professor à realidade escolar

acontece após ter passado pela formação “teórica” tanto na disciplina específica

como nas disciplinas pedagógicas. O caminho deve ser outro. [...]”

Corroborando com esta ideia, Barato (2004, p.47) afirma: “É importante

observar que ênfase na ação resulta em compreensões do aprender a trabalhar

bastante diferentes de leituras que privilegiam o discurso ou a linguagem. ” Isso

significa que dando ênfase à ação, o aprender a fazer torna-se mais fácil e

interessante.

O autor sugere que a insistência na crença da teoria-prática traz como

resultado um entendimento que a prática precisa ser iluminada pela teoria, o que,

segundo ele, é uma interpretação inadequada, que acarreta desvios de caráter

didático.

Mizukami (2002, p. 14) faz uma crítica ao modelo da racionalidade técnica

que geriu durante muito tempo os processos de formação e concorda com Ibernón

(2006) sobre a importância da reflexão nos processos de formação:

Espera-se que as teorias aprendidas seja poderoso guia na prática futura, mas no cotidiano o professor se defronta com múltiplas situações, com as quais não aprende a lidar nos cursos de formação. Isso exige uma forma de reflexão, construindo novas formas de agir na realidade da sala de aula. O modelo da racionalidade técnica peca ao desconsiderar a complexidade dos fenômenos educativos. A formação básica passa a ser vista como apenas um dos momentos do processo formativo.

Ainda assim, referida autora (p. 12) salienta que a aprendizagem da docência

não ocorre somente a partir de conhecimentos teóricos e técnicos ela pressupõe o

desenvolvimento de uma prática reflexiva:

Aprender a ser professor, nesse contexto não é, portanto, tarefa que se conclua após estudos de um aparato de conteúdo e técnica de transmissão deles. É uma aprendizagem que deve se dar por meio de situações práticas que sejam efetivamente problemáticas, o que exige o desenvolvimento de uma prática reflexiva competente. Exige ainda que, além de conhecimentos, sejam trabalhadas atitudes, as quais são consideradas tão importantes quanto os conhecimentos.

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No mesmo passo, a autora amplia o conceito de reflexão inserindo nesse

processo, além da dimensão racional, a afetiva. Para a autora: “A reflexão implica,

além do simples conhecimento dos métodos, o desejo e a vontade de empregá-los.

Implica intuição, emoção e paixão. ” (p. 18)

Cumpre salientar que os professores necessitam de tempos e espaços para

refletir e cabe à escola proporcionar este espaço para reflexão, incentivando os

docentes e possibilitando tempo e momentos específicos para discussões. A este

respeito, Ibernón (2006, p.23) afirma “A instituição educativa, como conjunto de

elementos que intervém na prática educativa contextualizada, deve ser o motor da

inovação e da profissionalização docente”.

No Senac Vila Prudente são garantidas a todos os docentes no mínimo duas

horas semanais dedicadas a atividades pedagógicas como planejamento, correção

de provas/exercícios, entre outras atividades. Além disso, temos um projeto

denominado “Refletir e Transformar”, que acontece no decorrer do ano e é dedicado

principalmente ao corpo docente, para o desenvolvimento de atividades pedagógico-

reflexivas, troca de experiências e boas práticas.

Reforçando esta afirmação, Gomes e Marins (2004, p. 119) salientam:

Os profissionais do mercado que migram para a docência, não só como opção, mas como complementação de realização pessoal, profissional ou como forma de extensão de sua função autônoma, não têm encontrado uma formação didática específica no seu curso regular de formação, necessitando de complementação no mercado de trabalho ou em programas destinados especificamente a esse fim, realizados pelas diversas instituições educacionais.

É necessário considerar que enquanto para alguns professores a docência

serve como complementação de renda, para outros é a fonte principal de renda.

A interação e a troca de experiências entre os docentes são imprescindíveis,

gerando uma reflexão coletiva a respeito da prática docente. Especialmente na

educação profissional, vários docentes atuam em diferentes módulos do curso, o

que torna ainda mais necessário o trabalho coletivo, o compartilhamento de

experiências e práticas.

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Com relação a isto, diz Ibernón (2006, p. 32) “A competência profissional,

necessária em todo processo educativo, será formada em última instância na

interação que se estabelece entre os próprios professores, interagindo na prática de

sua profissão”.

Referente à questão da troca, Mizukami (2002, p. 43) complementa:

A construção contínua dos saberes não ocorre de forma isolada. Ela deve se dar na parceria entre pessoas que estão em diferentes níveis de desenvolvimento profissional. Os desafios devem ser vencidos coletivamente, com cada participante do processo educativo apoiando os colegas e apoiando-se neles. Nesse processo, cada um oferece o que sabe e, estando aberto para ouvir e analisar posições diferentes das suas, adquire outras formas de ver o mundo de se ver nele e de compreender seu papel no exercício profissional.

Nos espaços e tempos reflexivos os professores poderão além de entrar em

contato com suas práticas também se conectar com os modelos nos quais elas se

espelham.

Arroyo (2010, p. 124) problematiza a aprendizagem da docência

questionando se “aprendemos o mestre que somos na escola, mas onde? Nos

livros, nos manuais? Através de lições, de discursos e conselhos? Aprendemos

convivendo, experimentando, sentindo e padecendo com a com-vivência desse

ofício. ”

Em busca de respostas para as questões acima formuladas comenta:

“Carregamos a função que exercemos, que somos e a imagem de professor (a) que

internalizamos. Carregamos a lenta aprendizagem de nosso ofício de educadores,

aprendido em múltiplos espaços e tempos, em múltiplas vivências. ” Arroyo (2010, p.

124)

Fato é que se faz necessária a formação continuada dos docentes, visando

possíveis mudanças e para que qualquer mudança aconteça, é necessário que o

docente esteja consciente desta necessidade e, para isto, tem que ter claro quais os

possíveis pontos de melhoria e isto só é possível por meio da reflexão constante

sobre sua atuação em sala de aula.

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3. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A pesquisa pautou-se na abordagem qualitativa. Segundo Moreira (2002), as

características básicas dessa abordagem são: interpretação como foco; ênfase na

subjetividade; conduta do estudo flexível; interesse no processo; contexto ligado ao

comportamento das pessoas na formação da experiência; reconhecimento da

influência da pesquisa sobre a situação e da situação sobre o pesquisador.

Considerando as características acima, entende-se que a abordagem

qualitativa permite ao pesquisador participar ativamente da investigação e interagir

com os participantes da pesquisa, aumentando a possibilidade de compreender o

problema de pesquisa e trazendo mais instrumentos para a construção de

conclusões. Daí a escolha por este tipo de pesquisa.

De acordo com Lüdke e André (1986), ao realizar uma pesquisa confrontamos

dados, evidências, informações coletadas a respeito de determinado assunto, além

do conhecimento teórico existente sobre esse mesmo assunto. Tudo isso tendo

como foco o estudo de um problema, que desperta o interesse do pesquisador.

Szymanski (2004) considera que a entrevista é um instrumento de

investigação, empregado em pesquisas qualitativas, que se dá pelo diálogo face a

face, mediante um encontro provocado pelo pesquisador. É um encontro entre duas

pessoas onde quem entrevista procura informações e quem é entrevistado detém

um conhecimento que é importante para o entrevistador. “Ao considerarmos o

caráter de interação social da entrevista, passamos a vê-la submetida às condições

comuns de toda interação face a face, na qual a natureza das relações entre

entrevistador/entrevistado influencia tanto seu curso como o tipo de informação que

aparece. ” (p. 11)

A coleta de dados foi feita a partir de entrevistas reflexivas realizadas com

docentes do curso Técnico em Segurança do Trabalho do Senac Vila Prudente.

De acordo com Szymanski (2004) a reflexividade presente neste tipo de

entrevista possibilita ao pesquisador refletir a fala do entrevistado e trazê-la para ele

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sua narrativa, a qual ele poderá modificar ou discordar, se for o caso. “Reflexividade

tem aqui também o sentido de refletir sobre a fala de quem foi entrevistado,

expressando a compreensão dela pelo entrevistador e submeter tal compreensão ao

próprio entrevistado, o que é uma forma de aprimorar a fidedignidade [...]” (p. 15)

Para o desenvolvimento da pesquisa, foram escolhidos sete docentes do

curso Técnico em Segurança do Trabalho, devido, especialmente, à diversidade de

formações e perfis que esses docentes possuem e também ao fato do curso

pertencer a uma das áreas de atuação que estão sob minha Coordenação. Estes

docentes são contratados em regime CLT e atuam em assuntos que se relacionam

com suas experiências no mercado.

Segundo Szymanski (2004, p. 20) “Seria desejável que parte do primeiro

encontro fosse tomada pela apresentação mútua, e que se buscasse esclarecer a

finalidade da pesquisa, abrir um espaço para perguntas e dúvidas, estabelecendo

uma relação cordial. ”

Como eu já conhecia os docentes a serem entrevistados, foi realizado um

contato inicial com os entrevistados solicitando a colaboração no desenvolvimento

da pesquisa, explicitando o tema e a finalidade do trabalho, bem como os

procedimentos e o tempo aproximado a ser dedicado à entrevista. As entrevistas

foram agendadas conciliando a disponibilidade de agenda do entrevistador e dos

entrevistados e foram realizadas individualmente, no período noturno, horário em

que acontecem a maioria das turmas.

3.1 Procedimentos de Produção de Dados

Foi elaborado um roteiro de entrevista, que constou de quatro tópicos abertos,

para que fosse possível deixar os sujeitos de pesquisa mais à vontade para fazerem

suas colocações. Os professores foram entrevistados oralmente e todas as

entrevistas foram gravadas em áudio, com autorização prévia dos participantes, e

transcritas na íntegra.

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No início das entrevistas foram colhidas informações a respeito dos

entrevistados, tais como idade, tempo de docência e formação.

Em seguida, os docentes foram convidados a refletir e discorrer sobre os

seguintes tópicos:

- Práticas/estratégias considerada bem sucedidas utilizadas em sala de aula.

- Onde/como estas práticas/estratégias foram aprendidas/desenvolvidas?

- Características que um docente deve reunir/ter para o exercício da docência

em Educação Profissional.

- Identificação de possíveis pontos de melhoria no trabalho.

Ao final das falas o entrevistador expôs para os entrevistados sua

compreensão do que foi dito, de forma a validar os relatos e oportunizar possíveis

“correções” por parte dos entrevistados.

3.2 Perfil dos participantes da pesquisa

Participaram da pesquisa sete professores, ressaltando que seis são do sexo

masculino e apenas uma do sexo feminino. O Técnico em Segurança do Trabalho é

um profissional cuja atuação é muito concentrada em “chão de fábrica” de indústrias

químicas, metalúrgicas, gráficas, e isto pode ser fator determinante para que seja

uma profissão em que predominam profissionais do sexo masculino. Os

profissionais com os quais o Técnico em Segurança do Trabalho se relaciona

também são, em sua maioria, do sexo masculino e isso pode ser outro fator

determinante.

A idade dos participantes é bem diversa, variando entre 37 e 63 anos de

idade, assim como o tempo de docência, que fica entre 2 e 13 anos. Com estes

dados, podemos entender que os docentes são profissionais com experiência no

mercado de trabalho.

A formação inicial dos entrevistados também é diversa. Temos formações em

direito, biologia, administração, engenharia e gestão ambiental. A diversidade de

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formações se dá ao fato de que cada docente concentra sua atuação aos assuntos

diretamente relacionados à sua formação inicial.

Com relação à formação pedagógica dos sete docentes entrevistados, temos

apenas dois docentes licenciados e um cursando pós-graduação em docência. Os

outros quatro não possuem formação pedagógica.

Dos sete docentes entrevistados, cinco têm formação na área ambiental, o

que pode refletir a tendência à responsabilidade ambiental por parte das empresas,

que está cada dia mais presente, seja por questões éticas ou por exigências legais.

Perfil dos docentes entrevistados

Sexo Idade Formação Tempo de

docência

Formação

Pedagógica

Professor 1 F

37 Bacharel em direito, bacharel e

licenciada em biologia, pós-graduada

em Engenharia Ambiental e Técnica

em Segurança do Trabalho.

3 anos

Licenciatura

Professor 2 M

54 Técnico em Segurança do Trabalho,

Direito, com especialização em

Direito Ambiental, cursando pós em

Docência

8 anos Cursando

Pós em

Docência

Professor 3 M 48 Administração, pós em Gestão

Ambiental e mestrado em Tecnologia

Ambiental

2 anos Não

Professor 4 M

45 Técnico em Segurança do Trabalho,

Bacharel em Direito, Tecnólogo em

Gestão Ambiental

4 anos Não

Professor 5 M 63 Técnico em Química, Engenharia

Química, pós-graduação em

Engenharia de Segurança do

Trabalho, Licenciatura

13 anos Licenciatura

Professor 6 M

53 Bacharel em Direito, Especialização

em Acidentes do Trabalho, Mestrado

em Direito Canônico

13 anos Não

Professor 7 M 39 Bombeiro Civil, Técnico em 3 anos Não

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Segurança do Trabalho, Tecnólogo

em Gestão Ambiental e Segurança

do Trabalho

Quadro 1 Fonte: Elaborado pela autora

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4. ANÁLISE DOS DADOS

Os dados coletados foram transcritos e analisados buscando compreender

em profundidade as falas dos entrevistados. Inicialmente foi feita uma leitura

criteriosa do material, visando identificar os pontos mais significativos emergentes

nas entrevistas e a incidência com que aparecem nas falas dos entrevistados. Em

seguida, os dados foram agrupados por categorias. De acordo com Szymanski

(2004, p. 78) “A categorização concretiza a imersão do pesquisador nos dados e sua

forma particular de agrupá-los segundo a sua compreensão. Podemos chamar esse

momento de “explicitação de significados”. ”

Como salientado anteriormente, a entrevista pautou-se em um roteiro pré-

elaborado, conforme tópicos abaixo:

Práticas/estratégias bem sucedidas utilizadas em sala de aula.

Onde/como estas práticas/estratégias foram prendidas/desenvolvidas?

Características que um docente deve reunir/ter para o exercício da

docência em Educação Profissional.

Identificação de possíveis pontos de melhoria no trabalho.

É importante destacar que cada tópico investigado na entrevista deu origem

a um quadro. Os quadros resultantes dessa etapa do trabalho serão apresentados a

seguir. Considera-se P1 como Professor 1, P2 como Professor 2, e assim por diante.

4.1 Práticas bem sucedidas desenvolvidas pelos professores

O primeiro quadro diz respeito às estratégias e práticas desenvolvidas pelos

professores em sala de aula, apontadas por eles como bem sucedidas. Estas

práticas são baseadas em atividades e estratégias, explicitadas abaixo.

Práticas bem sucedidas baseadas

em atividades e estratégias.

Atividades Estratégias P1 P2 P 3 P 4 P 5 P 6 P7

Exercícios

Pesquisa

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estudo de caso

aula expositiva

filmes, fotos

artigos técnicos

provocar o envolvimento dos alunos

percepção dos grupos

intervenções do professor

articulação teoria-prática

estimulo a autoestima dos alunos

Quadro 2 - Fonte: Elaborado pela autora

Quanto às atividades que dão suporte às práticas bem sucedidas foram

destacadas: exercícios, pesquisa, estudo de caso, aula expositiva, filmes e fotos e

artigos técnicos, cujas definições seguem no glossário abaixo.

Três docentes citaram a aplicação de exercícios como uma atividade bem

sucedida nas aulas. Segundo as falas dos docentes, é uma forma de aplicar a teoria,

de motivar e envolver os alunos no processo de aprendizagem.

[...] Então como o curso TST tem essa questão da teoria pesada, mas existe uma prática, você tem que balancear nesses dois lados aí. Isso a gente vê que surte muito efeito e a parte de exercícios, análise de acidentes, que é uma coisa mais técnica, mas enfim, análise de acidentes, exercícios, elaboração de tabelas, planilhas, os cálculos de taxa, essas coisas todas que no dia-a-dia ele vai ver e que ele tem que saber desenvolver isso. P1

[...] Se a sala estiver mais ou menos tranquila, cansada, você dá um tipo de atividade que ele possa trabalhar em grupo ou exercícios individuais. [...] P2

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[...] O caminho são as atividades para os alunos, estudar o assunto e dar atividades para os alunos entrarem em ação, para eles se envolverem. [...] P5

A aplicação de exercícios pode ser considerada uma atividade de

internalização dos conhecimentos construídos, por meio de uma aplicação prática.

A fala dos docentes retrata o que efetivamente ocorre no dia-a-dia. Quando

os alunos não têm oportunidade de aplicar os conteúdos que são desenvolvidos em

sala de aula, ficam insatisfeitos. Essa é uma característica do Ensino Técnico

Profissionalizante, os alunos necessitam de atividades que permitam aprender

fazendo, a teoria, nessa perspectiva, não pode ser desenvolvida de forma

desvinculada da prática como é comum acontecer, por exemplo, nos cursos de nível

superior.

Por outro lado, a aplicação de exercícios surge como uma forma de motivar o

grupo. Melhor dizendo, quando os alunos apresentam cansaço ou falta de interesse,

propor atividades mais dinâmicas parece favorecer o envolvimento dos alunos. A

maioria dos alunos deste curso trabalha durante dois períodos e estuda no outro. É

comum presenciar os alunos reclamando de cansaço e desânimo, o que mobiliza os

professores a planejarem atividades mais dinâmicas objetivando que as aulas

fiquem mais interessantes e atrativas.

A pesquisa também foi identificada por três docentes como prática bem

sucedida em sala de aula. Buscar informações faz com que os alunos também se

responsabilizem pela aprendizagem.

[...] Sai um pouco do professor ficar na frente falando, os alunos também têm a responsabilidade de buscar mais informações, e isso realmente acontece [...] P3 [...] jogo a temática para os alunos e os obrigo a pesquisar [...] P6 [...] Trabalho com pesquisas, faço com que eles busquem a informação e que isso faça sentido pra eles. P7

Libâneo (2002, p. 26) critica a escola como detentora do saber, afirmando:

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[...] A escola precisa deixar de ser meramente uma agência transmissora de informação e transformar-se num lugar de análises críticas e produção da informação, onde o conhecimento possibilita a atribuição de significado à informação. Nessa escola, os alunos aprendem a buscar a informação (nas aulas, no livro didático, na TV, no rádio, no jornal, nos vídeos, no computador, etc), e os elementos cognitivos para analisá-la criticamente e darem a ela um significado pessoal.

Com isso o autor reforça que o conhecimento não deve ser centralizado

apenas no professor e no material didático, é necessário considerar os

conhecimentos trazidos pelos alunos por outros meios, como, por exemplo, jornais

TV, rádio, Internet, entre outros.

Os alunos podem pesquisar, sob orientação do docente, diferentes temas, em

fontes diversas, tais como livros, internet, jornais, revistas, etc.

A proposta do Senac prevê que o aluno não se detenha no material didático e

no docente como únicas fontes de informação, incentivando a pesquisa e o aprender

a aprender. Quando os alunos forem atuar no mercado de trabalho, vão precisar

buscar informações com autonomia, em especial nesta área que está em constante

atualização. Normalmente os resultados das pesquisas são compartilhados com o

restante do grupo por intermédio de apresentações e seminários.

Ocorre que é necessário que o docente seja mediador neste processo,

fazendo intervenções sempre que necessário. Inclusive, para fazer estas

intervenções o docente precisa ter habilidade para que o aluno não se sinta exposto

ou constrangido.

Chama a atenção o fato de surgirem falas como “obrigo a pesquisar” e “faço

com que”. Talvez isso denote que a atividade de pesquisa assuma um caráter

obrigatório e seja proposta de forma coercitiva.

O estudo de caso foi apontado por dois docentes como sendo uma atividade

pedagógica que dá suporte às práticas bem sucedidas em sala de aula. Esta

atividade é apontada como uma maneira de fazer com que os alunos reflitam sobre

os problemas a serem enfrentados na realidade do mercado de trabalho.

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[...] Uma coisa que em Segurança do Trabalho dá muito resultado é a questão de estudo de caso, porque você traz um caso real, da vida real pra eles e põe eles pra pensarem e acaba desenvolvendo a questão do pensar mesmo, de como eu vou resolver um problema, o que eu faria numa situação dessas, pra eles também raciocinarem[...] P1

Tenho usado muito caso prático pra eles [...] P2

O estudo de caso é muito utilizado em cursos técnicos e superiores e tem

como ponto de partida a análise de uma situação específica, observando-se seus

aspectos e características. Visa contribuir para a compreensão de um fenômeno de

interesse.

Trata-se de uma atividade que coloca os alunos em situações próximas das

reais, problemáticas e desafiadoras, que envolvem soluções e decisões. Os desafios

do dia-a-dia são apresentados na atividade, em que o aluno, para resolver

determinado problema, necessita mobilizar conhecimentos diversos.

Segundo Perrenoud (2002) uma situação-problema leva o aluno a fazer

progressos, julgamentos e superar obstáculos, elaborando respostas, propostas ou

argumentações. “Trata-se, portanto, de uma alteração criadora de um contexto que

problematiza, perturba, desequilibra. ” (p. 115)

Salienta-se que somente um professor fez menção à aula expositiva.

Percebeu-se, no entanto, que durante toda a fala do docente, o mesmo reforça que

o aluno é quem gosta da aula expositiva, como se a aula expositiva não fosse uma

atividade didática adequada, como se estivesse justificando o fato de dar aulas

expositivas.

Olha, aluno ainda gosta de aula expositiva, existem as estratégias de aprendizagem, a gente procura modificar um pouco isso [...] Você ainda tem que passar conceitos, definições, interpretação da legislação, por conta das NR’s que a gente trabalha, então ainda eles gostam da questão da aula expositiva. P 1

Pela fala, esse professor considera que conceitos e definições necessitam ser

“passados”. Isto expressa vestígios da educação bancária em que o aluno era

considerado um mero depositório de informações e é questionado pelas teorias

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pedagógicas contemporâneas, que consideram que os conceitos não são dados a

serem passados e aprendidos por meio da memorização, mas conteúdos que

requerem estratégias de aprendizagem que possibilitem a construção conceitual,

Coll (1998). Apesar deste professor não parecer conhecer as teorias

contemporâneas, ele está em sintonia com um entendimento de que a aula

expositiva não é uma atividade didática apropriada, por estar associada a uma

metodologia ultrapassada, reprovada pelas práticas educacionais inovadoras.

Contrariando este ponto de vista, Libâneo (2002) lembra que a aula expositiva

é necessária, e não pode ser simplesmente e totalmente abandonada:

O ensino exclusivamente verbalista, a mera transmissão de informações, a aprendizagem somente entendida como acumulação de conhecimentos não subsistem mais. Isso não quer dizer abandono dos conhecimentos sistematizados da disciplina nem da exposição de um assunto. [...] p. 29

No Senac São Paulo a aula expositiva dialogada é uma das estratégias que

podem ser utilizadas no desenvolvimento das aulas e, no meu ponto de vista, pode

ser extremamente enriquecedora, dependendo da forma como é planejada e

realizada. A exposição dialogada permite que o aluno faça intervenções e

questionamentos, participando ativamente do processo.

Também foram citadas, somente, uma vez as seguintes atividades,

apontadas pelos docentes como bem sucedidas em sala de aula: uso de filmes e

fotos e de artigos técnicos.

Tenho usado muito caso prático pra eles, trechos de filmes que a gente usa, fotos do ambiente de trabalho, mas antes gosto de trabalhar bem com a percepção da sala. [...] P2 Gosto muito de trabalhar com artigos técnicos, voltados para o assunto que a gente está desenvolvendo naquele momento. [...] P3

Pode ser que estas atividades apareçam com menor frequência na fala dos

docentes por necessitarem de mais tempo de planejamento e envolverem recursos

diferenciados.

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No que se refere às estratégias que são suporte às práticas bem

sucedidas, os professores destacaram: provocar o envolvimento dos alunos,

perceber o grupo de alunos, intervenções do professor, articulação teoria-prática,

estimulo a auto-estima dos alunos.

Provocar o envolvimento dos alunos foi sinalizado cinco professores como

uma estratégia bem sucedida.

[...] e põe eles pra pensarem e acaba desenvolvendo a questão do pensar mesmo, de como eu vou resolver um problema, o que eu faria numa situação dessas, pra eles também raciocinarem [...] P1 [...] Oriento que eles façam uma leitura desse artigo, um estudo, e depois vamos debater, vamos trabalhar em cima desse artigo [...] P3 [...] Identifiquei que o primeiro período estava maçante e ao invés de estender a matéria pedi para explicarem em grupos o que tinham entendido da matéria. [...] P4 [...] dar atividades para os alunos entrarem em ação, para eles se envolverem. Quanto mais eles participam, mais eles gostam e aprendem, os alunos não têm mais paciência de ficar ouvindo muito. [...] P5 [...]Faço com que o aluno faça parte do processo, que ele se sinta dono do negócio [...] P7

Percebe-se, pela fala dos professores, a necessidade de envolver os alunos

no processo, de tirar os alunos de uma posição de expectador para uma posição de

protagonistas da própria formação. De acordo com Freire (1996, p. 76) “O mundo

não é. O mundo está sendo [...] Não sou apenas objeto da História, mas seu sujeito

igualmente [...]”

No meu dia-a-dia de trabalho posso identificar esta questão muito claramente.

Quando há o envolvimento dos alunos, a aprendizagem se torna muito mais fácil e

prazerosa tanto para os alunos quanto para os professores. Arrisco-me a dizer que

envolver os alunos é um dos grandes desafios do professor. O trabalho por projetos,

previsto os planos de cursos do Senac São Paulo é um grande facilitador na questão

do envolvimento.

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Três docentes citaram a percepção do grupo e as intervenções do

professor como atitudes docentes que potencializam o processo ensino-

aprendizagem. Essas atitudes estão articuladas, já que o professor, por meio da

percepção de como a turma se apresenta, se relaciona entre si, pode fazer

intervenções mais adequadas.

Tenho usado muito caso prático pra eles, trechos de filmes que a gente usa, fotos do ambiente de trabalho, mas antes gosto de trabalhar bem com a percepção da sala. Se a sala estiver mais ou menos tranquila, cansada, você dá um tipo de atividade que ele possa trabalhar em grupo ou exercícios individuais. [...] Fazendo também as intervenções quando estão trabalhando em grupo. P2 No intervalo do primeiro período para o segundo período, percebi que os alunos estavam um pouco dispersos e mudei a didática da aula. [...] P4 [...] Eu falo o mais objetivo possível e trabalho com atividades e vou observando porque tem dias em que eles estão mais inquietos, mais ativos, aí tem que redirecionar. P5

Segundo Pimenta (1999, p. 46), “As respostas do professor traduzem-se na

sua forma de intervenção sobre a realidade em que atua: a sala de aula. ”

Cada turma é única e um dia é diferente do outro, sendo assim, o professor

não pode ter a expectativa de que o que funcionou com uma turma vai funcionar

com a outra e que o que funcionou em um dia vai funcionar em outro. É necessário

que o professor tenha sensibilidade para poder fazer uma leitura dos grupos e

pensar na intervenção mais adequada, quando esta for necessária.

Quanto à necessidade de articulação entre teoria-prática, dois professores

fizeram menção. Para eles, é importante trazer a experiência do mercado de

trabalho para a sala de aula, conforme explicitam abaixo.

[...] Uma coisa que em Segurança do Trabalho dá muito resultado é a questão de estudo de caso, porque você traz um caso real, da vida real pra eles [...] porque também não adianta você ficar só falando da parte teórica se não põe em prática. [...] P1 Eu uso a prática [...] dou um exemplo [...] passo a minha vivência. P6

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Schon (2000, p. 40) considera que uma aula prática transforma-se em um

espaço de intersecção entre o mundo real e o mundo teórico.

Uma aula prática é um ambiente projetado para a tarefa de aprender uma prática, Em um contexto que se aproxima do mundo prático, os estudantes aprendem fazendo, ainda que sua atividade fique longe do mundo real do trabalho. [...] Uma aula prática é um mundo virtual, relativamente livre de pressões, distrações e riscos do mundo ao qual, no entanto, ele diz respeito.

Nos cursos técnicos os alunos vêm para a sala de aula ansiosos pela prática,

o foco destes cursos é esse. A expectativa é se inserirem rapidamente no mercado,

se possível iniciando um estágio durante o curso. Daí a importância da aplicabilidade

do conhecimento.

Estimular a auto-estima dos alunos foi apontada por um dos docentes

como uma atitude docente que potencializa a aprendizagem em sala de aula.

Faço com que o aluno faça parte do processo, que ele se sinta dono do negócio, mostro que ele é capaz. Os alunos vêm com uma deficiência, acreditam que não podem nada e eu tento mostrar pra eles que eles podem. [...] P7

É possível perceber no dia a dia de trabalho, que alguns alunos chegam ao

curso técnico trazendo problemas de auto-estima, relacionados, muitas vezes, a

dificuldades financeiras, problemas de aprendizagem ou por problemas familiares. O

professor precisa ter a habilidade de trabalhar esta questão no grupo de alunos.

4.2. O desenvolvimento dos saberes e fazeres

O segundo quadro diz respeito a como os saberes e fazeres se desenvolvem,

segundo a ótica dos entrevistados.

Desenvolvimento

dos saberes e

fazeres

P1 P2 P 3 P 4 P5 P6 P7

prática docente

cursos

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professores como modelo

feedback dos alunos

“dom” para lecionar

experiência no mercado de trabalho

Trocas com o docente coordenador

Quadro 3 - Fonte: elaborado pela autora

Segundo os relatos dos docentes, os saberes e fazeres que utilizam em sala

de aula foram adquiridos: pela prática docente, em cursos, tendo professores como

modelo, pelo feedback dos alunos, pelo “dom” para lecionar, com experiência no

mercado de trabalho e através de dicas do docente coordenador

Quatro docentes sinalizaram a prática docente como meio para o

desenvolvimento dos saberes e fazeres docentes.

Eu acho que é prática, tá Ana, [...] P1 Essa didática eu adquiri no curso do tempo [...] P4 Acho que essa estratégia aprendi aqui mesmo no Senac, [...] P5 Isso veio da experiência em sala de aula, aprendi a ser docente no trabalho. [...] P6

Segundo Gomes e Marins (2004), a sala de aula serve de laboratório de

aprendizagem, onde os segredos da profissão são descobertos. No entanto isto

depende de observação, análise e olhar crítico por parte do professor.

É comum, mesmo entre os professores que têm formação pedagógica,

ouvirmos que aprenderam de verdade a profissão docente dando aula, no contato

com os alunos e nas situações diversas e inusitadas que encontram no dia-a-dia.

Isto porque nos cursos de formação pedagógica, a prática é mínima ou inexistente,

ou ainda totalmente desvinculada da teoria. Ocorre que esta aprendizagem não

pode ser um processo estanque, ela deve acontecer continuamente e se mostram

disponíveis para aprender continuamente.

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Perrenoud (2002) afirma que, de um modo geral, os professores mais

experientes não prestam mais atenção ao seu cotidiano, ao passo que os

professores principiantes estão mais abertos à reflexão, à busca de explicações e ao

compartilhamento.

Quatro professores apontaram ter feito cursos que colaboraram no

desenvolvimento dos saberes e fazeres docentes.

[...] mas assim uma coisa que ajudou muito foi o PDE, lá sim eu tive mais contato com essa questão das estratégias de aprendizagem [...] P1 Quando eu comecei a trabalhar tinha facilidade com isso, aí comecei a fazer a pós e vi que essas ferramentas poderiam ajudar muito mais, aí eu comecei a aplicar isso e a ter o feedback dos alunos. [...] P2 Essa didática eu adquiri no curso do tempo nos cursos ministrados e com os próprios professores com os quais tive aulas. [...] P4 Acho que essa estratégia aprendi aqui mesmo no Senac, fui percebendo nos cursos que faço aqui, nas palestras, foi no dia-a-dia de trabalho [...] P5

Os professores citam a pós-graduação, os cursos que fazem no Senac, como

o PDE – Programa de Desenvolvimento Educacional, apresentado no capítulo 1,

como facilitadores na aprendizagem docente. O professor que citou a pós-

graduação está com o curso em andamento. Isto leva a crer que estes cursos foram

facilitadores, pois aconteceram ao mesmo tempo em que os docentes ministravam

aulas, não de forma desvinculada, o que permitiu aplicabilidade rápida dos conceitos

aprendidos nos cursos.

Três docentes relataram que utilizam professores (que tiveram quando

alunos) como modelo.

[...]como eu fiz o curso aqui tiveram alguns exemplos de professor que a gente acaba adotando,[...] P1 Isso já veio de alguns professores que trabalharam dessa maneira e eu, que era aluno, gostei, deu resultado [...] P3

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Essa didática eu adquiri no curso do tempo nos cursos ministrados e com os próprios professores com os quais tive aulas [...] P4

É comum, em todas as áreas de nossa vida, termos modelos, e isto não é

diferente na educação profissional. Há docentes que se espelham em outros

professores com os quais tiveram aulas, para desenvolver sua prática.

Mas, por outro lado, considerando que grande maioria de nós passou por uma

formação tradicional isso pode ser preocupante. É o que sinaliza Pimenta (2002, p.

211):

O paradigma tradicional, professor palestrante e aluno ouvinte, foi-nos ensinado pela nossa vivência de alunos, sendo, portanto, o que sabemos fazer, por experiência ou hábito, em contraposição a uma crescente necessidade da construção de um paradigma atual, em que o enfrentamento do conhecimento científico existente utilize um processo diferenciado, no qual a construção e a parceria sejam elementos fundamentais da relação.

Atentar ao feedback dos alunos, foi apontado por dois docentes como um

meio para desenvolvimento dos saberes e fazeres.

[...] você poder trazer alguma coisa da parte da literatura, digamos assim, pra sala de aula, mas em geral mesmo é a dinâmica do dia-a-dia, de rotina, o que você passa para o aluno, o que você tem de feedback e assim tentar, é importante para o professor deixar uma relação aberta com o aluno pra ele chegar e falar [...] , ter esse retorno do aluno. [...] P1 [...] vi que essas ferramentas poderiam ajudar muito mais, aí eu comecei a aplicar isso e a ter o feedback dos alunos. [...] P2

De acordo com Freire (1996, p. 113): “Somente quem escuta paciente e

criticamente o outro, fala com ele, mesmo que, em certas condições, precise de falar

a ele. [...] O educador que escuta aprende a difícil lição de transformar o seu

discurso, às vezes necessário, ao aluno, em uma fala com ele. ”

Ouvir e considerar o feddback dos alunos é questão essencial no processo

educacional, mas, mais importante ainda é o que o professor faz com as

informações obtidas nos feedbacks, ou seja, ele tem que estar predisposto a

melhorar efetivamente.

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Dois docentes demonstraram em suas falas acreditar que é necessário ter um

“dom” para lecionar, como se alguns docentes já tivesse um tipo de saber que os

predispõe a ensinar.

[...] mas didática é uma coisa que ou você tem ou você não tem, você pode melhorar isso com a reflexão, mas se a pessoa não tem a didática fica muito difícil dar aula. P1 Quando eu comecei a trabalhar tinha facilidade com isso, [...] P2

Essa é uma questão que merece ser melhor investigada, para explicitar no

que se ancora essa afirmação corrente de que alguns têm uma facilidade natural

para ensinar, mesmo não tendo formação pedagógica.

Dois dos docentes manifestaram terem trazido saberes e fazeres para a sala

de aula da sua experiência no mercado de trabalho.

[...] Acho que isso também veio dos treinamentos que eu dava nas empresas, porque treinamento é prática. P6 Aprendi no campo de trabalho, na minha experiência profissional precisei pesquisar muito para desenvolver minhas atividades na empresa [...] P7

Como já explicitado estes docentes atuam, em suas respectivas áreas, em

empresas ou consultorias e alguns se utilizam desta experiência para enriquecer sua

forma de trabalhar com os alunos.

Um dos entrevistados manifestou que as trocas com o docente

coordenador são uma forma de desenvolvimento de saberes e fazeres.

Acho que essa estratégia aprendi aqui mesmo no Senac [...] foi no

dia-a-dia de trabalho, recebendo dicas do docente coordenador. P5

No Senac São Paulo um dos docentes da área exerce a função de docente

coordenador, atuando junto à Coordenação principalmente nas questões técnicas

que se referem aos cursos. Este docente relata que as dicas do docente

coordenador o auxiliam no desenvolvimento do trabalho docente.

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Furlanetto (2007, p. 47) trata do contato com outros docentes ou

coordenadores como forma de desenvolvimento docente:

Pelos mais variados caminhos, alguns professores assumem sua própria formação, isso significa responsabilizar-se pelo seu próprio desenvolvimento, fazer suas escolhas, aproveitar as oportunidades que lhe são oferecidas pelas políticas públicas, pelas instituições escolares, pela própria vida. Utilizam os mais diversos recursos para estar em movimento: conversas com colegas ou coordenadores, busca de terapias, de supervisões ou de cursos de formação.

4.3 Conhecimentos que um docente deve ter

O terceiro quadro identifica, segundo a fala dos entrevistados, os

conhecimentos que um docente de Ensino Técnico deve ter para lecionar.

Características que o docente deve

ter

conhecimentos capacidades/

atitudes

P 1 P 2 P 3 P 4 P 5 P 6 P 7

experienciais

técnicos

relacionais

didáticos

perceber o grupo

amor pela profissão

flexibilidade

estimular a reflexão

relacionar teoria e prática

analisar o futuro

responsabilidade/ comprometimento

Quadro 4 Fonte: Elaborado pela autora.

Foram apontadas pelos entrevistados algumas características que o docente

deve ter para lecionar, que foram agrupadas em conhecimentos: experienciais,

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técnicos, relacionais e didáticos e em capacidades/atitudes: perceber o grupo,

amor pela profissão, flexibilidade, estimular a reflexão, relacionar teoria e prática,

analisar o futuro e responsabilidade/comprometimento.

Os conhecimentos experienciais emergiram com força nas falas dos

docentes que os consideram imprescindíveis para um bom desempenho em sala de

aula. Foram mencionados por quatro docentes.

Além do conhecimento teórico sobre o assunto que ele vai dar aula tem que ter vivência na área ou ter atuado bem próximo da área para que possa sentir o ambiente e trazer os assuntos com mais segurança. P3

Na minha percepção o professor tem que conduzir o aluno da sala de aula à prática, ao convívio do mercado de trabalho e vice-versa. Pegar a matéria que está ministrando e transportar para a realidade do mercado de trabalho. Na minha visão o professor tem que ter essa percepção e para fazer isso tem que ter experiência no mercado de trabalho. P4 O professor tem que atuar na área, conhecer a área [...] P5 Tem que ter experiência na área, pode até ser um teórico muito bom, mas se não tiver a experiência não dá resultado. A teoria qualquer um dá, mas a prática tem que ser alguém que já vivenciou. [...] Para o ensino profissionalizante a prática do docente no mercado de trabalho é essencial. P6

Esta questão é discutida por Gomes e Marins (2005, p. 117):

O docente do ensino técnico profissionalizante necessita construir os seus saberes na escola, onde ele poderá fazer uso da sua prática como profissional do mercado de trabalho, visando a criar metodologias capazes de facilitar a compreensão daqueles aprendizes da nova profissão.

Como já foi mencionado anteriormente, os alunos que buscam o ensino

técnico querem se apropriar da realidade do mercado de trabalho e, para tanto, os

docentes devem ter uma vasta experiência neste mercado para proporcionarem aos

alunos situações diversas do cotidiano de trabalho. Isto também é reconhecido pelos

professores.

Os conhecimentos técnicos foram apontados como necessários para o

docente por três dos entrevistados.

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[...] O professor tem que ter conhecimento técnico, precisa saber[...]

você tem que ter a base técnica[...] P1

[...] A questão principal é a leitura da sala, percepção, conhecimento técnico [...] P2 [...] Além do conhecimento teórico sobre o assunto que ele vai dar [...] P3

Segundo Freire (1996), o conhecimento e a competência profissional

legitimam a autoridade do docente e lhe dão segurança: “Nenhuma autoridade

docente se exerce ausente desta competência. [...] O que quero dizer é que a

incompetência profissional desqualifica a autoridade do professor. ” (p. 91)

Este apontamento dos docentes está estreitamento ligado ao anterior. A

experiência no mercado e os conhecimentos técnicos devem existir no docente para

que possa trabalhar com os alunos de forma completa. É como se precisasse existir

no docente a teoria e a prática. Se os alunos percebem a falta de conhecimento por

parte do professor, acabam perdendo o respeito e a confiança no docente.

Três docentes apontaram a importância de o professor saber se relacionar

de forma adequada com os alunos como fator necessário para exercer a docência.

[...] Tem que ter algum tipo de relação de proximidade com o aluno [...] mas ter uma relação de afetividade [...] Tentar ver essa química aí com o aluno, com cada turma, cada turma é diferente também. P1 [...] flexibilidade e mediação e ouvir bastante [...] P2 [...] de como interagir com os alunos, sentir o que eles querem. P5

Libâneo (2002) trata da importância de estabelecer uma relação afetiva com

os alunos:

A aprendizagem de conceitos, habilidades e valores envolve sentimentos, emoções, ligadas às relações familiares, escolares e aos outros ambientes em que os alunos vivem. Proporcionar aos alunos uma aprendizagem significativa supõe da parte do professor conhecer e compreender motivações, interesses, necessidades de alunos diferentes entre si, capacidade de comunicação com o mundo do outro, sensibilidade para situar a relação docente no contexto físico, social e cultural do aluno. (p. 44)

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Percebe-se que de nada adianta o docente ter a experiência no mercado e

conhecimentos técnicos se não souber se relacionar com os alunos, estabelecer um

vínculo, que dê suporte ao processo de ensino e aprendizagem.

Os conhecimentos didáticos foram considerados imprescindíveis para o

exercício da docência por três entrevistados.

[...] e a questão da didática, né Ana? É uma coisa muito pessoal, cada um tem um jeito de dar aula, fala de uma maneira, chega no aluno de uma forma. [...] P1 O professor tem que atuar na área, conhecer a área e tem que ter uma complementação mais didática, de como interagir com os alunos, sentir o que eles querem. P5 [...] A teoria qualquer um dá, mas a prática tem que ser alguém que já vivenciou. Tem que primeiro amar o que faz, tem que ter o dom pra dar aula, a didática. [...] P6

A concepção de didática dos professores parece não se aproximar da

concepção de didática dos pesquisadores que investigam a área. Para os

professores entrevistados, a didática aproxima-se do “jeito adequado” do professor

dar aula, algo que pode ser até considerado um dom, enquanto para pesquisadores

como Pimenta (2002, p. 66):

A didática é uma das áreas da Pedagogia. Ela investiga os fundamentos, as condições e os modos de realizar a educação mediante o ensino. Sendo este uma ação historicamente situada, a Didática vai constituindo-se como teoria do ensino. Não para criar regras e métodos válidos para qualquer tempo e lugar, mas para ampliar nossa compreensão das demandas que a atividade de ensinar produz, com base nos saberes acumulados sobre essa questão.

Entende-se, com isso, que não existem receitas prontas, mas que o professor

precisa ter em sua bagagem alguns conhecimentos didáticos, de forma que possa

enfrentar e superar as diferentes situações e desafios que surgem no dia-a-dia em

sala de aula.

A capacidade perceber o grupo de alunos também foi identificada por três

docentes como algo que o professor deve ter para exercer a docência.

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[...] facilita muito você chegar no aluno. E perceber o que ele te dá de retorno conforme você vai explicando [...] P1 [...] A questão principal é a leitura da sala, percepção [...] P2 O professor tem que atuar na área, conhecer a área e tem que ter uma complementação mais didática, de como interagir com os alunos, sentir o que eles querem. P5

De acordo com Freire (1996, p. 97):

Precisamos aprender a compreender a significação de um silêncio, ou de um sorriso ou de uma retirada da sala. [...] Afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser constantemente “lido”, interpretado, “escrito” e “reescrito”. Neste sentido, quanto mais solidariedade exista entre o educador e educandos no “trato” deste espaço, tanto mais possibilidades de aprendizagem democrática se abrem na escola.

Neste sentido voltamos à questão da sensibilidade para fazer a leitura do

grupo, já apontada anteriormente como estratégia utilizada em sala de aula.

O amor pela profissão foi apontado por dois docentes como imprescindível

para exercer a carreira docente.

Tem que primeiro amar o que faz [...] P6 [...] Tem que ter amor pela profissão [...] P7

Gomes e Marins (2004) abordam esta questão, dizendo que quem gosta do

que faz, é mais motivado, sente mais prazer e acaba fazendo muito bem e com a

melhor qualidade. “No caso dos docentes, isso fica evidente nas suas atitudes e

opções, tornando-se um elemento estratégico na sala de aula e significativo para a

instituição de ensino. ” (p. 109). Segundo Morin (2004, p. 102) “Onde não há amor,

só há problemas de carreira e de dinheiro para o professor; e de tédio, para os

alunos. ”

O amor pela profissão é fator primordial em todas as áreas de atuação. No

entanto, a responsabilidade do professor do ensino técnico é ainda maior, já que

atua e influencia diretamente no perfil do profissional que irá para o mercado de

trabalho. Ele é um modelo para seus alunos e precisa refletir e valorizar esse amor

pela profissão.

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A flexibilidade foi apontada como uma capacidade que o docente deve ter

para dar aulas.

[...], a questão da flexibilidade e mediação e ouvir bastante [...] P2

Pimenta (2002) aponta a necessidade de flexibilidade por parte do professor,

independente do tempo de experiência que o docente possa ter:

A profissão de professor exige de seus profissionais alteração, flexibilidade, imprevisibilidade. Não há modelos ou experiências modelares a serem aplicadas. A experiência acumulada serve apenas de referência, nunca de padrão de ações com segurança de sucesso. (p. 199)

O professor precisa ter a disponibilidade para mudar sua estratégia e suas

intervenções sempre que necessário, de acordo com as necessidades de cada

grupo. Entendo que esta característica está articulada à percepção da sala. O

professor que não estiver atendo à sala não terá a flexibilidade necessária para

intervir de outra maneira, se for o caso.

Estimular a reflexão dos alunos foi apontado por um dos docentes como

uma capacidade de o docente deve ter para dar aulas.

[...] não levar pronto, fazer com que o aluno pense o tempo inteiro. P2

Com relação a fazer os alunos pensarem, Freire (1996, p. 26) aborda esta

questão quando diz: “Percebe-se, assim, a importância do papel do educador, o

mérito da paz com que viva a certeza de que faz parte de sua tarefa docente não

apenas ensinar os conteúdos mas também ensinar a pensar certo. ”

Esta é uma forma de tornar o aluno responsável por sua aprendizagem. Ao

contrário do que ocorre na educação bancária, onde os conhecimentos são

passados ou transferidos aos alunos, desafiar, problematizar e mediar a resolução

dos problemas é um dos papéis mais importantes do professor.

Relacionar teoria e prática foi outra capacidade apontada por um dos

docentes.

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Na minha percepção o professor tem que conduzir o aluno da sala de aula à prática [...] P4

Esta capacidade está diretamente relacionada e articulada aos

conhecimentos experienciais já mencionados pelos docentes. O professor só

consegue relacionar teoria e prática se tiver experiência e vivência no mercado de

trabalho.

Analisar o futuro foi apontado por um dos docentes como uma capacidade

importante.

[...] Tem que ter amor pela profissão, tem que ter uma visão futurista. [...] P7

O docente de educação profissional deve estar sempre atento às tendências

do mercado, às novas tecnologias, de forma a utilizar estes conhecimentos em sala

de aula com os alunos. Assim os alunos também desenvolvem esta capacidade de

olhar para o futuro e para as tendências.

Um dos docentes apontou a responsabilidade e o comprometimento como

características que um docente deve ter para lecionar.

O professor tem que ter muita responsabilidade porque vai lidar com sonhos. [...] Tem que ter comprometimento com a profissão. P7

Segundo Perrenoud (2002):

A autonomia e a responsabilidade de um profissional dependem de uma grande capacidade de refletir em e sobre sua ação. Essa capacidade está no âmago do desenvolvimento permanente, em função da experiência de competências e dos saberes profissionais. (p. 13)

Pode-se entender que a responsabilidade e o comprometimento do professor

estão diretamente relacionados à sua capacidade de refletir sobre suas ações e de

se desenvolver continuamente.

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4.4 Necessidades de melhoria no trabalho docente

O quarto quadro traz os pontos de melhoria identificados pelos docentes em

seu próprio trabalho.

Possíveis pontos de

melhoria

P 1 P 2 P 3 P 4 P 5 P 6 P 7

planejamento

atualização

ampliação dos exercícios/atividades

novas estratégias

envolver o aluno com a prática

aprimorar a didática

aproveitar as diferenças dos alunos

Quadro 5 Fonte: Elaborado pela autora.

Como necessidades de melhoria surgiram nas narrativas dos docentes:

planejamento, atualização, ampliação dos exercícios/atividades, novas estratégias,

envolver o aluno com a prática, aprimorar a didática, aproveitar as diferenças dos

alunos e formação pedagógica.

A Importância do planejamento surgiu com força na fala dos entrevistados.

Foi apontado por quatro docentes.

Eu buscaria mais planejamento de aula por que como a aula é muito dinâmica, às vezes a gente acaba indo conforme o rendimento do aluno. Às vezes você programa alguma coisa, mas sempre tem uma intercorrência durante a aula, às vezes você tem que repetir ou você pode adiantar se a turma vai bem. Eu acho que eu podia planejar um pouquinho melhor essa coisa do dia-a-dia de aula [...] P1 Eu acho que a parte de planejamento eu teria que melhorar mais, por causa do tempo que eu não tenho, vou planejando em casa e vou trazendo pronto. Eu planejo mais quando eu faço a pós, vou aplicando o caso lá e foi trazendo. P2 [...] O segundo ponto é o planejamento, é necessário ter um planejamento de aula, embora muitas vezes o planejamento não é efetivo porque acontecem mil coisas no caminho, mas você tem que ter um norte, com começo, meio e fim. [...] P6 Estudar esta questão da formação pedagógica, o planejamento, estudar inglês. P7

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Perrenoud (2000) afirma que dominar os conteúdos a serem trabalhados em

sala é apenas o início. “Porém, a verdadeira competência pedagógica não está aí;

ela consiste, de um lado, em relacionar os conteúdos a objetivos e, de outro, a em

relacionar com situações de aprendizagem. ” (p. 26)

O planejamento é de extrema importância para a ação docente em sala de

aula. Quanto a esta questão, me pergunto se os docentes sabem realmente fazer

um planejamento e se o tempo dedicado ao planejamento tem sido suficiente.

A necessidade de atualização também emergiu na fala de quatro docentes.

[...] uma coisa que a gente precisa sempre fazer é atualização. [...] a legislação na nossa área sempre muda e isso é uma coisa que sempre tem que ver. P1 [...] Sempre estou atualizando com mais informações porque as informações estão vindo muito rapidamente, os meios de comunicação trazem isso pra gente e nós temos que buscar, a atualização é constante. [...] P3 Eu precisaria estudar mais, a essência do professor é estudar, hoje não tenho tempo. P6

Estudar esta questão da formação pedagógica, o planejamento, estudar inglês. P7

Segundo Freire (1996) o ser humano é inacabado e ensinar exige consciência

deste inacabamento, que possibilita a aprendizagem e permite que estejamos em

constante movimento. “Na verdade, o inacabamento do ser ou sua conclusão é

próprio da experiência vital. Onde há vida, há inacabamento. ” (p. 50)

Com relação à formação pedagógica, Pimenta (2002, p. 107) diz:

Os elementos constitutivos da profissão docente – a saber: formação acadêmica, conceitos, conteúdos específicos, ideal, objetivos, regulamentação, código de ética – têm características próprias que constituiriam a formação inicial, se ela ocorresse. Como ela não ocorre, esses aspectos devem ser considerados nos processos de profissionalização continuada.

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Neste apontamento surge a questão da aprendizagem contínua ou formação

continuada. Nenhum profissional, seja ele docente ou não, pode parar no tempo, é

necessário aprender sempre e isso exige disponibilidade para aprender.

A necessidade de dar mais exercícios/atividades para os alunos esteve

presente na fala de dois docentes.

Eu acho que eu podia planejar um pouquinho melhor essa coisa do dia-a-dia de aula, talvez elaborar um pouco mais de exercícios pra eles, a gente acaba sendo pegando os mesmos [...] P1 Melhorar a parte didática, implementar mais atividades para que os alunos participem, eu reflito muito sobre as aulas, para saber onde errei. P5

Este apontamento pode estar relacionado ao anterior, afinal, elaborar mais

exercícios/atividades está intrínseco na questão do planejamento.

Foi levantada, por um dos docentes, a necessidade de utilizar novas

estratégias em sala de aula.

Eu trabalho com artigos hoje, mas amanhã posso trazer outra técnica, usar outra estratégia para levar o conhecimento para os alunos. P3

Trazer outras estratégias, usar outras técnicas em sala de aula é

extremamente necessário para o bom desenvolvimento das aulas. De acordo com

Freire (1996) o primeiro saber necessário à formação docente é: “Saber que ensinar

não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria

produção ou a sua construção. ” (p. 47)

Outra estratégia de melhoria citado por um dos entrevistados foi envolver o

aluno com a prática.

Se eu pudesse mudar de imediato ou a longo prazo eu traria mais o aluno para a prática, mais para a visão prática não só a questão teórica [...] P4

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Esta necessidade já foi apontada anteriormente como imprescindível para a

educação profissional de nível técnico. O professor precisa trazer a realidade do

mercado para a sala de aula.

Aprimorar a didática também foi apontado por um dos docentes como um

ponto de melhoria em seu trabalho.

Melhorar a parte didática, implementar mais atividades para que os alunos participem, eu reflito muito sobre as aulas, para saber onde errei. P5

A reflexão permanente sobre o trabalho docente também se faz necessária e

é por meio dela que surge a necessidade de estudar. Se o docente não refletir sobre

o seu trabalho, ficará acomodado e estanque, e isso se refletirá na sala de aula. Em

especial, na área de Segurança do Trabalho a legislação está em constante

mudança, o que faz a necessidade de estudar ser ainda maior.

A este respeito, Freire (1996) sinaliza: “Por isso é que, na formação

permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a

prática. É pensando criticamente a prática de hoje ou de ontem que se pode

melhorar a próxima prática. ” (p. 39)

Com relação ao mesmo assunto Pimenta (2002) ressalta:

Pesquisar a própria prática na sala de aula é ação realizada com intencionalidade que revela a profissionalidade do docente: rever a própria prática, debruçar-se e refletir sobre ela é necessário a toda profissão. Uma ação profissional competente é diferente de uma ação resultante de uma ocupação, emprego ou bico. Pimenta (2002, p. 196)

Um dos docentes apontou aproveitar as diferenças entre os alunos como

um ponto de melhoria em seu trabalho.

E em terceiro, a experiência de sala também é importante, os alunos são diferentes e o professor tem que saber aproveitar essa riqueza, essa diversidade. P6

Com relação a isso, Libâneo (2003, p. 144) salienta:

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O aluno apresenta-se na situação de aprendizagem numa dupla condição: não sabe aquilo que necessita aprender (por isso vai às aulas), mas não é um desconhecedor absoluto. O trabalho docente constitui-se, portanto, de um processo também duplo: continuidade da experiência já trazida pelo aluno (experiência fragmentária, senso comum) e ruptura dessa experiência para elevá-lo a uma visão mais elaborada do conhecimento.

Saber aproveitar as diferenças entre os alunos, seus conhecimentos prévios,

suas experiências profissionais é essencial para o processo de aprendizagem. O

aluno aprende, também, pela troca com os colegas de sala.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa buscou investigar a formação dos docentes do curso Técnico

em Segurança do Trabalho, objetivando ampliar a compreensão sobre os saberes e

fazeres dos docentes atuantes no curso Técnico em Segurança do Trabalho. Por

meio dos apontamentos dos próprios docentes foi realizada uma análise sobre quais

saberes e fazeres mobilizam para exercer a docência; qual a origem destes saberes

e fazeres, que características identificam que um docente deve ter e quais seriam os

pontos de melhoria para seus próprios trabalhos.

Visando um embasamento teórico foi realizada uma pesquisa bibliográfica,

dialogando com autores que tratam da formação docente. Para contextualização da

pesquisa realizou-se um resgate histórico da educação e da educação profissional

no Brasil; da criação do Senac São Paulo, discorrendo sobre sua proposta

pedagógica, missão e visão de futuro; e do curso Técnico em Segurança do

Trabalho.

Foi realizada uma entrevista reflexiva com sete docentes atuantes no curso,

entrevistados individualmente, de acordo com um roteiro pré-definido, investigando

os pontos acima relatados.

O perfil dos docentes participantes da pesquisa revela que na docência no

curso Técnico em Segurança do Trabalho predominam profissionais do sexo

masculino, com idade entre 37 e 63 anos e tempo de docência entre 2 a 13 anos. A

formação inicial dos entrevistados é bem diversa, biologia, direito, administração,

engenharia e gestão ambiental.

Dos sete docentes, cinco têm formação inicial ou pós-graduação na área

ambiental, o que reflete a tendência à responsabilidade ambiental atual por parte

dos cidadãos e também das empresas. Apenas dois docentes são licenciados e um

cursa pós-graduação em docência, os demais não possuem formação pedagógica.

Com base na análise das falas dos docentes, foi possível perceber que em

suas aulas os professores têm grande preocupação em envolver os alunos no

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processo de aprendizagem, por meio da realização de atividades como exercícios,

estudos de caso, pesquisa e outras estratégias ativas de aprendizagem. Constata-

se, também, a preocupação dos docentes em fazer uma leitura do grupo, fazendo as

intervenções de maneira mais adequada.

Foi possível detectar que, conforme identificado por Tardif (2002), os

docentes constroem os saberes que mobilizam para ensinar em diversos momentos

da vida e por meio de diversas fontes. Segundo os docentes, as principais fontes de

construção dos seus saberes e fazeres são a prática docente, os cursos que

realizam, e os professores que tiveram como modelo. Atentar para o feedback dos

alunos, ter o que denominam como “dom” para lecionar, a experiência profissional

do mercado e trabalho e as dicas do docente coordenador também contribuem para

a formação docente.

Acrescente-se, também, o fato de que o curso técnico tem características

próprias e, portanto, exigem docentes com determinadas características para

desenvolver seu trabalho. Dessa forma, os participantes da pesquisa consideram

que o professor necessita, além de ter conhecimentos relacionados à experiência no

mercado, à didática, dominar técnicas e saber se relacionar com os alunos,

apresentar determinadas atitudes em sala de aula, como, por exemplo, perceber a

sala, amar o que faz, ser flexível, entre outras.

Além disso, entendem que a formação pedagógica é importante, mas não é

fator determinante para o exercício da docência no curso técnico profissionalizante.

Ter experiência e dominar os assuntos que desenvolve em sala de aula parece ser

mais importante e primordial para a atuação em educação profissional. Isto faz todo

o sentido, considerando que um docente com este perfil está em constante contato

com as inovações e transformações da área e pode compartilhar com os alunos seu

conhecimento e experiência.

Quanto às necessidades de melhoria, os professores dizem ser importante,

concentrar-se mais no que se refere a planejamento, atualização, ampliação dos

exercícios e atividades, trazer novas estratégias para a sala de aula, envolver os

alunos com a prática e aprimorar a questão didática. Levando em conta que cada

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turma e cada aluno são únicos, também surge a necessidade se saber aproveitar a

diferença dos alunos, fazendo com que essas diferenças trabalhem a favor da

aprendizagem do grupo. Entende-se que isto pode contribuir no processo de

formação continuada.

Com base na pesquisa realizada, pode-se dizer que são inúmeros os desafios

enfrentados pelo docente da educação profissional e que o professor necessita

refletir sobre sua ação, observar e perceber seus alunos e estar disposto a aprender

sempre, a fim de melhorar sua atuação em sala de aula.

Importante reforçar que não existe, neste trabalho, a pretensão de esgotar o

assunto nas reflexões aqui apresentadas, certamente são necessárias maiores

discussões e aprofundamentos sobre os processos de formação de docentes do

Ensino Técnico.

Pretende-se, como próximo passo, criar um espaço para compartilhar o

resultado desta pesquisa não somente com os entrevistados, mas também com os

docentes de outras áreas e cursos do Senac Vila Prudente, a fim de possibilitar

momentos de reflexão e fomentar uma discussão a respeito dos saberes

mobilizados em sala de aula, suas fontes e novas possibilidades de aprendizagem e

melhorias, visando contribuir com a formação continuada destes docentes.

Além disso, esta pesquisa será disponibilizada para o Senac São Paulo, a fim

de disseminar o conhecimento a respeito dos saberes na Instituição e colaborar

também com outras Unidades na formação contínua dos docentes de cursos

técnicos.

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APÊNDICE A - TRANSCRIÇÃO DAS ENTREVISTAS

Identificação de práticas/estratégias bem sucedidas utilizadas em sala de aula.

Professor 1

Olha, aluno ainda gosta de aula expositiva, existem as estratégias de aprendizagem, a gente procura modificar um pouco isso, mas principalmente na Segurança do Trabalho que é uma coisa muito técnica, eles não têm esse conhecimento mesmo que esteja em alguma indústria, alguma empresa, esse conhecimento mais aprofundado. Você ainda tem que passar conceitos, definições, interpretação da legislação, por conta das NR’s que a gente trabalha, então ainda eles gostam da questão da aula expositiva. É claro que a gente procura incrementar um pouco isso. Uma coisa que em Segurança do Trabalho dá muito resultado é a questão de estudo de caso, porque você traz um caso real, da vida real pra eles e põe eles pra pensarem e acaba desenvolvendo a questão do pensar mesmo, de como eu vou resolver um problema, o que eu faria numa situação dessas, pra eles também raciocinarem, porque também não adianta você ficar só falando da parte teórica se não põe em prática. Então como o curso TST tem essa questão da teoria pesada, mas existe uma prática, você tem que balancear nesses dois lados aí. Isso a gente vê que surte muito efeito e a parte de exercícios, análise de acidentes, que é uma coisa mais técnica, mas enfim, análise de acidentes, exercícios, elaboração de tabelas, planilhas, os cálculos de taxa, essas coisas todas que no dia-a-dia ele vai ver e que ele tem que saber desenvolver isso.

aula expositiva estudo de caso envolvimento dos alunos articulação teoria-prática exercícios

Professor 2

Tenho usado muito caso prático pra eles, trechos de filmes que a gente usa, fotos do ambiente de trabalho, mas antes gosto de trabalhar bem com a percepção da sala. Se a sala estiver mais ou menos tranquila, cansada, você dá um tipo de atividade que ele possa trabalhar em grupo ou exercícios individuais. Ao contrário, podemos entrar com conteúdo, trabalho um caso prático e depois a legislação, ele consegue visualizar melhor. Mostro a foto e ele consegue identificar o ambiente e a situação, as questões de segurança e como se aplica a legislação nesse caso. Fazendo também as intervenções quando estão trabalhando em grupo.

estudo de caso filmes, fotos percepção da sala exercícios intervenções

Professor 3

Gosto muito de trabalhar com artigos técnicos, voltados para o assunto que a gente está desenvolvendo naquele momento. Oriento que eles façam uma leitura desse artigo, um estudo, e depois vamos debater, vamos trabalhar em cima desse artigo para verificar se eles têm o conhecimento, se assimilaram realmente. Esses artigos são publicações em revistas técnicas

estudo de caso envolvimento dos alunos pesquisa

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como CIPA, Proteção, e outros. Sai um pouco do professor ficar na frente falando, os alunos também têm a responsabilidade de buscar mais informações, e isso realmente acontece, depois que eles fazem uma atividade com esse artigo, no dia seguinte vem comentando assuntos pertinentes e trazem mais informações. Isso eu já senti.

Professor 4

Uma prática que eu recentemente tive, uma experiência recente em que obtive um feedback legal dos alunos. No intervalo do primeiro período para o segundo período percebi que os alunos estavam um pouco dispersos e mudei a didática da aula. Pedi que eles apresentassem o que tinham visto na primeira parte da aula. Aí identifiquei que eles não estavam se dispersando, estavam só pedindo o intervalo para que pudessem entender a matéria. Identifiquei que o primeiro período estava maçante e ao invés de estender a matéria pedi para explicarem em grupos o que tinham entendido da matéria. Aí eu vi que realmente tinha atingido o objetivo.

percepção da sala intervenções envolvimento dos alunos

Professor 5

O caminho são as atividades para os alunos, estudar o assunto e dar atividades para os alunos entrarem em ação, para eles se envolverem. Quanto mais eles participam, mais eles gostam e aprendem, os alunos não têm mais paciência de ficar ouvindo muito. Eu falo o mais objetivo possível e trabalho com atividades e vou observando porque tem dias em que eles estão mais inquietos, mais ativos, aí tem que redirecionar.

exercícios envolvimento dos alunos percepção da sala intervenções

Professor 6

Eu uso a prática, eu passo a matéria e dou um exemplo, jogo a temática para os alunos e os obrigo a pesquisar, depois eu passo a minha vivência.

articulação teoria-prática pesquisa

Professor 7

Faço com que o aluno faça parte do processo, que ele se sinta dono do negócio, mostro que ele é capaz. Os alunos vêm com uma deficiência, acreditam que não podem nada e eu tento mostrar pra eles que eles podem. Trabalho com pesquisas, faço com que eles busquem a informação e que isso faça sentido pra eles.

envolvimento dos alunos auto-estima dos alunos pesquisa

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Investigação sobre onde/como os saberes e

fazeres envolvidos nestas práticas/estratégias

foram aprendidos/desenvolvidos.

Professor 1

Eu acho que é prática, tá Ana, como eu fiz o curso aqui tiveram alguns exemplos de professor que a gente acaba adotando, mas assim uma coisa que ajudou muito foi o PDE, lá sim eu tive mais contato com essa questão das estratégias de aprendizagem, isso sim acho que foi uma coisa mais de estudo, você poder trazer alguma coisa da parte da literatura, digamos assim, pra sala de aula, mas em geral mesmo é a dinâmica do dia-a-dia, de rotina, o que você passa para o aluno, o que você tem de feedback e assim tentar, é importante para o professor deixar uma relação aberta com o aluno pra ele chegar e falar olha, não gostei dessa aula, não entendi direito, a aula que você deu de estudo de caso foi melhor, as aulas de prática que você deu de espaço confinado foram melhores, ter esse retorno do aluno. O professor pode estudar pedagogia, pode fazer licenciatura, pegar essa parte mais de literatura, Paulo Freire, Rubem Alves, mas didática é uma coisa que ou você tem ou você não tem, você pode melhorar isso com a reflexão, mas se a pessoa não tem a didática fica muito difícil dar aula.

prática professores como modelo cursos feedback dos alunos “dom” para lecionar

Professor 2

Quando eu comecei a trabalhar tinha facilidade com isso, aí comecei a fazer a pós e vi que essas ferramentas poderiam ajudar muito mais, aí eu comecei a aplicar isso e a ter o feedback dos alunos. Percebi que quando eu entrava com a legislação, ao aluno não conseguia se visualizar nesse contexto, não fazia parte do processo. Quando eu trazia a coisa do lado contrário e mostrava a situação e ele se projetando no dia-a-dia, ele visualizava melhor, o entendimento da legislação ficava melhor.

“dom” para lecionar cursos feedback dos alunos

Professor 3

Isso já veio de alguns professores que trabalharam dessa maneira e eu, que era aluno, gostei, deu resultado e isso fez com que eu pesquisasse muito mais e eu quero passar isso para os meus alunos. Como prática estou adotando e está sendo bem correspondido pelos alunos.

professores como modelo

Professor 4

Essa didática eu adquiri no curso do tempo nos cursos ministrados e com os próprios professores com os quais tive aulas. Eu fui adquirindo aos poucos esse detalhe de ter essa percepção dos alunos.

prática cursos professores como modelo

Professor 5

Acho que essa estratégia aprendi aqui mesmo no Senac, fui percebendo nos cursos que faço aqui, nas palestras, foi no dia-a-dia de trabalho, recebendo dicas do docente coordenador. Os alunos atualmente têm muita informação, às vezes até mais do que o professor, então eu tinha muita dificuldade em atingir os alunos.

Prática cursos dicas do docente coordenador

Professor Isso veio da experiência em sala de aula, aprendi a ser Prática

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6 docente no trabalho. Acho que isso também veio dos treinamentos que eu dava nas empresas, porque treinamento é prática.

experiência no mercado de trabalho

Professor 7

Aprendi no campo de trabalho, na minha experiência profissional precisei pesquisar muito para desenvolver minhas atividades na empresa e tive bons resultados, me senti gratificado, desenvolvi confiança.

experiência no mercado de trabalho

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Apontamento dos conhecimentos que um docente

deve reunir/ter para o exercício da docência no

Ensino Técnico.

Professor 1

Primeiro: O professor tem que ter conhecimento técnico, precisa saber, por mais que traga experiências de fora, por mais que você tente introduzir uma metodologia um pouco mais diferente, mais dinâmica, você tem que ter a base técnica, porque se o aluno vier com uma pergunta e você não tiver esse conhecimento, você vai titubear e aí você já perde a confiança do aluno. Segundo: Tem que ter algum tipo de relação de proximidade com o aluno, isso é uma coisa que às vezes faz falta, não é ser amigo do aluno, mas ter uma relação de afetividade, isso é um canal que facilita muito você chegar no aluno e perceber o que ele te dá de retorno conforme você vai explicando, as dificuldades, talvez aonde a gente falhou, em algum ponto de conceito/definição alguma coisa que não foi bem clara pra ele, aí você vai corrigindo, e a questão da didática, né Ana? É uma coisa muito pessoal, cada um tem um jeito de dar aula, fala de uma maneira, chega no aluno de uma forma. Tentar ver essa química aí com o aluno, com cada turma, cada turma é diferente também.

conhecimento técnico relação com os alunos percepção da sala didática

Professor 2

Se eu tivesse que montar um curso primeiro ensinaria filosofia aos alunos, depois ética e depois a parte profissional. A questão principal é a leitura da sala, percepção, conhecimento técnico, a questão da flexibilidade e mediação e ouvir bastante, estar sempre trazendo as possibilidades, não levar pronto, fazer com que o aluno pense o tempo inteiro.

percepção da sala conhecimento técnico relação com os alunos flexibilidade fazer com que o aluno pense o tempo inteiro

Professor 3

Além do conhecimento teórico sobre o assunto que ele vai dar aula tem que ter vivência na área ou ter atuado bem próximo da área para que possa sentir o ambiente e trazer os assuntos com mais segurança.

conhecimento técnico vivência na área

Professor 4

Na minha percepção o professor tem que conduzir o aluno da sala de aula à prática, ao convívio do mercado de trabalho e vice-versa. Pegar a matéria que está ministrando e transportar para a realidade do mercado de trabalho. Na minha visão o professor tem que ter essa percepção e para fazer isso tem que ter experiência no mercado de trabalho.

relação teoria-prática vivência na área

Professor 5

O professor tem que atuar na área, conhecer a área e tem que ter uma complementação mais didática, de como interagir com os alunos, sentir o que eles querem.

vivência na área didática relação com os alunos percepção da sala

Professor 6

Tem que ter experiência na área, pode até ser um teórico muito bom, mas se não tiver a experiência não dá resultado. A teoria qualquer um dá, mas a prática tem que ser alguém que já vivenciou. Tem que primeiro amar o que faz, tem que ter o dom pra dar aula, a didática. Para o ensino profissionalizante a prática do docente no mercado de trabalho é essencial.

vivência na área amor pela profissão didática

Professor O professor tem que ter muita responsabilidade porque responsabilidade

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7 vai lidar com sonhos. Tem que ter amor pela profissão, tem que ter uma visão futurista. Tem que ter comprometimento com a profissão.

amor pela profissão visão futurista comprometimento

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Identificação de possíveis pontos de melhoria no

trabalho.

Professor 1

Eu buscaria mais planejamento de aula por que como a aula é muito dinâmica, às vezes a gente acaba indo conforme o rendimento do aluno. Às vezes você programa alguma coisa, mas sempre tem uma intercorrência durante a aula, às vezes você tem que repetir ou você pode adiantar se a turma vai bem. Eu acho que eu podia planejar um pouquinho melhor essa coisa do dia-a-dia de aula, talvez elaborar um pouco mais de exercícios pra eles, a gente acaba sendo pegando os mesmos e uma coisa que a gente precisa sempre fazer é atualização. Por exemplo surgiu um caso essa semana - o vazamento de nitrato de potássio no Porto de São Francisco do Sul – é legal trazer isso pra sala de aula. É importante ter um conhecimento de mundo e trazer essas coisas pra dentro da sala de aula. Quando teve aquele acidente de espaço confinado na Ponte Rio Niterói, a legislação na nossa área sempre muda e isso é uma coisa que sempre tem que ver.

planejamento mais exercícios para os alunos atualização

Professor 2

...(silêncio)... eu acho que a parte de planejamento eu teria que melhorar mais, por causa do tempo que eu não tenho, vou planejando em casa e vou trazendo pronto. Eu planejo mais quando eu faço a pós, vou aplicando o caso lá e foi trazendo.

planejamento

Professor 3

A todo momento, uma aula que eu passo para uma turma não vai ser a mesma para a próxima. Sempre estou atualizando com mais informações porque as informações estão vindo muito rapidamente, os meios de comunicação trazem isso pra gente e nós temos que buscar, a atualização é constante. Eu trabalho com artigos hoje, mas amanhã posso trazer outra técnica, usar outra estratégia para levar o conhecimento para os alunos.

atualização trazer outra técnica, usar outra estratégia

Professor 4

Se eu pudesse mudar de imediato ou a longo prazo eu traria mais o aluno para a prática, mais para a visão prática não só a questão teórica, porque as vezes determinado tema ou determinada disciplina ou competência fica muito maçante e chega um ponto em que determinado aluno não consegue compreender para que eu possa transportar esse aluno para a realidade da prática. Você passa o teórico mas o aluno não tem aquele feeling, aquele contato com mercado. Ele não tem o contato e vem para o curso profissionalizando técnico, mas está perdido. Você cita determinada matéria e ele se perde no tema. Na minha visão eu como professor deveria levá-lo mais pra prática.

Trazer mais o aluno para a prática

Professor 5

Melhorar a parte didática, implementar mais atividades para que os alunos participem, eu reflito muito sobre as aulas, para saber onde errei.

Melhorar a didática mais atividades

Professor Eu precisaria estudar mais, a essência do professor é estudar mais

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6 estudar, hoje não tenho tempo. O mundo do trabalho se moderniza toda hora. O segundo ponto é o planejamento, é necessário ter um planejamento de aula, embora muitas vezes o planejamento não é efetivo porque acontecem mil coisas no caminho, mas você tem que ter um norte, com começo, meio e fim. E em terceiro, a experiência de sala também é importante, os alunos são diferentes e o professor tem que saber aproveitar essa riqueza, essa diversidade.

planejamento saber aproveitar a diferença dos alunos

Professor 7

Estudar esta questão da formação pedagógica, o planejamento, estudar inglês.

formação pedagógica planejamento

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ANEXO A – CARTA ECONÔMICA DE TERESÓPOLIS