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1 Saber Militar e Marxismo [1*] Leão Trotsky 8 de Maio de 1922 Primeira Edição: ........ Fonte: Problemas da Guerra Civil, Antídoto, 1977 Tradução de: ........ Transcrição de: Alexandre Linares HTML de: Fernando Antônio de Souza Araújo, novembro 2005. Direitos de Reprodução: Marxists Internet Archive (marxists.org), 2005. A cópia ou distribuição deste documento é livre e indefinidamente garantida nos termos da GNU Free Documentation License I – Introdução Permitam-me declarar aberta a reunião da Associação Científica-Militar – a 518, segundo acabam de me dizer. O tema da nossa discussão de hoje será o lugar do saber e da habilidade militares no sistema dos conhecimentos humanos em geral. Reconheço, antes de mais, que a responsabilidade da iniciativa desta discussão me cabe pessoalmente em grande parte. Não porque considere que este problema complexo, abstrato, teórico e filosófico – no melhor e – no pior sentido dos termos – é o mais urgente e atual da nossa instrução militar, mas tive a impressão de que estas questões se nos impunham, a par com a evolução ideológica e com certa luta teórica nas altas esferas do nosso exército. Numa das nossas publicações, bastante próxima da nossa Associação, li dois artigos [1], um dos quais demonstrava que a ciência militar não podia ser edificada segundo os métodos do marxismo, que era impossível utilizá-los para resolver os seus problemas particulares, uma vez que a ciência militar faz parte das ciências naturais. Este artigo era acompanhado dum outro, polêmico- crítico, que exprimia sem dúvida mais de perto o ponto de vista da redação.

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Saber Militar e Marxismo [1]

Leatildeo Trotsky

8 de Maio de 1922

Primeira Ediccedilatildeo Fonte Problemas da Guerra Civil Antiacutedoto 1977 Traduccedilatildeo de Transcriccedilatildeo de Alexandre Linares HTML de Fernando Antocircnio de Souza Arauacutejo novembro 2005 Direitos de Reproduccedilatildeo Marxists Internet Archive (marxistsorg) 2005 A coacutepia ou distribuiccedilatildeo deste documento eacute livre e indefinidamente garantida nos termos da GNU Free Documentation License

I ndash Introduccedilatildeo

Permitam-me declarar aberta a reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar ndash a

518 segundo acabam de me dizer

O tema da nossa discussatildeo de hoje seraacute o lugar do saber e da habilidade

militares no sistema dos conhecimentos humanos em geral Reconheccedilo antes

de mais que a responsabilidade da iniciativa desta discussatildeo me cabe

pessoalmente em grande parte Natildeo porque considere que este problema

complexo abstrato teoacuterico e filosoacutefico ndash no melhor e ndash no pior sentido dos

termos ndash eacute o mais urgente e atual da nossa instruccedilatildeo militar mas tive a

impressatildeo de que estas questotildees se nos impunham a par com a evoluccedilatildeo

ideoloacutegica e com certa luta teoacuterica nas altas esferas do nosso exeacutercito

Numa das nossas publicaccedilotildees bastante proacutexima da nossa Associaccedilatildeo li

dois artigos [1] um dos quais demonstrava que a ciecircncia militar natildeo podia ser

edificada segundo os meacutetodos do marxismo que era impossiacutevel utilizaacute-los para

resolver os seus problemas particulares uma vez que a ciecircncia militar faz parte

das ciecircncias naturais Este artigo era acompanhado dum outro polecircmico-

criacutetico que exprimia sem duacutevida mais de perto o ponto de vista da redaccedilatildeo

2

Neste pelo contraacuterio tratava-se de tentar provar que os meacutetodos do marxismo

eram meacutetodos cientiacuteficos universais e que por conseguinte a sua competecircncia

se estendia igualmente agrave ciecircncia militar Peccedilo desculpa mais uma vez mas

pessoalmente creio que ambas as opiniotildees satildeo falsas a ciecircncia militar natildeo

pertence agrave categoria das ciecircncias naturais porque nem eacute natural nem eacute

ciecircncia Talvez a discussatildeo de hoje nos aproxime um pouco mais do fundo do

problema

Mas mesmo que admitamos que a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia natildeo

podemos de modo algum admitir que ela possa ser construiacuteda por meacutetodos

marxistas porque o materialismo histoacuterico natildeo eacute um meacutetodo universal paacutera

todas as ciecircncias Este eacute um enorme erro que me parece acarretar as mais

nocivas consequumlecircncias Podemos com ecircxito dedicar-nos durante toda a nossa

vida aos assuntos militares sem nunca refletir sobre os meacutetodos teoacutericos do

conhecimento dos assuntos militares ndash tal como podemos olhar todos os dias

para o reloacutegio ignorando o seu mecanismo interior e a disposiccedilatildeo das suas

molas e engrenagens Conhecendo os algarismos e o movimento dos ponteiros

sobre o mostrador natildeo corro o risco de me enganar Mas se natildeo me sentir

satisfeito com o movimento dos ponteiros sobre o mostrador e se quiser falar da

estrutura do reloacutegio devo conhececirc-la como deve ser e natildeo haacute qualquer lugar

para incluir coisas da minha lavra

Numa outra discussatildeo (a propoacutesito da doutrina militar unitaacuteria) jaacute me

referi a um episoacutedio da vida de Gueacuteorgui Valentinovitch Plekhanov [1N] ndash o

primeiro cruzado do marxismo na Ruacutessia homem de inteligecircncia rara e

altamente dotado Quando notava que algueacutem opunha os problemas do

materialismo filosoacutefico e histoacuterico ou pelo contraacuterio os confundia ndash Plekhanov

protestava violentamente O materialismo filosoacutefico eacute uma teoria que estaacute na

base das ciecircncias naturais ao passo que o materialismo histoacuterico explica a

histoacuteria da sociedade humana O materialismo histoacuterico eacute um meacutetodo que natildeo

explica todo o universo mas sim um grupo estritamente definido de fenocircmenos

que condicionam o desenvolvimento do homem histoacuterico O materialismo

filosoacutefico explica o movimento do universo enquanto mudanccedila e transformaccedilatildeo

da mateacuteria e leva o seu raciociacutenio ateacute agraves mais altas manifestaccedilotildees do espiacuterito

Ser politicamente marxista sem conhecer o materialismo histoacuterico eacute difiacutecil para

natildeo dizer impossiacutevel Ser politicamente marxista e natildeo conhecer o materialismo

filosoacutefico eacute possiacutevel ndash e haacute tantos exemplos destes quantos quiserem

3

E quando algum marxista (chamado outrora social-democrata)

divagava pelo domiacutenio da filosofia e comeccedilava a confundir tudo o defunto

Plekhanov atacava-o sem piedade Quantas vezes lhe disseram Eacute um jovem

Gueacuteorgui Valentinovitch natildeo teve tempo de estudar filosofia combatia na

clandestinidade Mas Plekhanov respondia aliaacutes com toda a razatildeo Se natildeo

sabe que se cale Ningueacutem o obriga a falar O nosso programa natildeo prevecirc que

um social-democrata tenha de ser um apaixonado do materialismo filosoacutefico Eacute

preciso que seja um membro ativo do partido um combatente corajoso pela

causa da classe operaacuteria ndash mas quando uma pessoa se aventura no domiacutenio da

filosofia natildeo deve confundir tudo E erguia-se em toda a sua estatura tomando

na matildeo a sua maravilhosa pena polecircmica Se folhearmos a histoacuteria do partido

veremos que numerosos satildeo aqueles que ainda mostram os seus vestiacutegios

No domiacutenio da filosofia militar considero que devemos seguir a boa

tradiccedilatildeo do defunto Plekhanov De modo algum somos obrigados a tratar de

questotildees ditas gnosioloacutegicas teoacuterico-cognitivas ou filosoacuteficas mas se

acontece que jaacute nos preocupamos com elas natildeo devemos confundir nada nem

comprometermo-nos num ou outro domiacutenio com armas inadequadas

esforccedilando-nos por aplicar diretamente o meacutetodo marxista aos assuntos

militares no sentido mais estrito do termo (e natildeo na poliacutetica militar) Esforccedilar-

se por edificar um domiacutenio militar especial atraveacutes do meacutetodo marxista

constitui o maior dos erros que em nada cede agrave tentativa de incluir o saber

militar no domiacutenio das ciecircncias naturais Se natildeo me engano os representantes

destas duas tendecircncias preparam-se para tomar hoje a palavra explicaratildeo sem

duacutevida melhor do que eu as suas ideacuteias ndash e depois discutiremos

Natildeo penso camaradas que cheguemos hoje agrave miacutenima soluccedilatildeo geral e

obrigatoacuteria desta questatildeo Mas se conseguirmos clarificar certas coisas e se se

impuser a conclusatildeo de que temos de ser mais prudentes quanto agrave utilizaccedilatildeo

direta do marxismo nos domiacutenios particulares da criaccedilatildeo jaacute natildeo seraacute mau Toda

a gente sabe que com a nossa doutrina militar ndash um tanto ligada agrave discussatildeo

atual ndash andamos principalmente em ciacuterculos e emitimos as opiniotildees mais

diversas natildeo penso contudo que por isso nos tenhamos enriquecido a natildeo ser

num sentido negativo toda a gente pocircde convencer-se que nada de especial daiacute

saiu Tiacutenhamos prometido a noacutes proacuteprios criar uma doutrina militar unitaacuteria

numa base proletaacuteria e marxistae depois de termos discutido chegamos a uma

conclusatildeo anterior ndash rever os nossos regulamentos em funccedilatildeo da experiecircncia

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acumulada Estamos a revecirc-los ndash lentamente cambaleando porque as nossas

estradas satildeo caminhos de aldeia e numerosos satildeo os trilhos

Mas espero firmemente que a revisatildeo dos regulamentos seraacute realmente

uacutetil natildeo vamos inventar uma nova doutrina militar por via de decreto pelo

contraacuterio vamos desembaraccedilar-nos de muitas coisas inuacuteteis e formular mais

claramente outras Quanto agrave reuniatildeo de hoje a utilidade de uma larga discussatildeo

consagrada agraves relaccedilotildees entre os assuntos militares e o marxismo seraacute por assim

dizer mais de ordem intelectual e higiecircnica e permitiraacute eliminar certas

confusotildees A tarefa praacutetica eacute a seguinte aprendamos a falar mais simplesmente

da cavalaria eacute inuacutetil sobrecarregar as nossas discussotildees sobre a aviaccedilatildeo com

uma pedante terminologia marxista com termos sonoros com problemas

altamente significativos ndash que se revelam muitas vezes um envelope sem

conteuacutedo nem essecircncia

Camaradas eis as observaccedilotildees introdutoacuterias que me permito fazer No

interesse do auditoacuterio que compreende camaradas diversamente versados nos

problemas filosoacuteficos peccedilo encarecidamente a todos os relatores e participantes

nos debates que se se exprimam da maneira mais concreta mais precisa mais

simples e mais compreensiacutevel possiacutevel Penso estar proacuteximo da verdade ao

afirmar que nem todas as pessoas aqui presentes estudaram a filosofia de A a Z

e eacute mesmo provaacutevel que alguns de noacutes natildeo tenham lido nunca os mais

elementares livros de filosofia Penso que o fato de nos dirigirmos a um

auditoacuterio natildeo iniciado em filosofia apresenta mais uma vantagem permite

verificar a bagagem de cada um dos relatores pois a terminologia filosoacutefica eacute

tambeacutem um processo que se parece muito com o teatro A maquilagem pode

ser impressionante mas acontece agraves vezes que natildeo haacute nada por baixo Aliaacutes

esse ocultismo para augures e outros iniciados essas tradiccedilotildees e meacutetodos

medievais segundo o que eu pude observar satildeo ainda respeitados em

numerosos artigos das nossas publicaccedilotildees militares Peccedilo-vos pois que se

dignem exprimir mais simplesmente as suas ideacuteias

Permitam camaradas que passemos agora aos debates Na ordem dos

relatoacuterios previstos peccedilo ao camarada Loukirski que apresente a sua exposiccedilatildeo

II ndash Encerramento

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Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer

algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em

proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam

contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias

A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns

outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem

em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia

militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a

ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia

O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a

questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-

cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se

satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o

chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma

operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante

que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo

eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas

uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas

sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-

se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se

compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os

soldados ndash era a ciecircncia de vencer

Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares

com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte

praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo

Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que

em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash

mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma

importacircncia histoacuterica utilitaacuteria

Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies

no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode

natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente

teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de

ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume

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dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com

finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro

criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]

conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao

propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida

[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo

proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu

autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo

tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo

arte

Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de

vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar

de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos

militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A

manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de

infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia

Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu

acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve

conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar

limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o

soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os

assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal

Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a

conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos

e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute

tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso

satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia

E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade

dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da

utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a

utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade

dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil

quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de

tudo natildeo devemos confundi-los

7

Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima

anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir

dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb

Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a

vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se

definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O

marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de

acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro

definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma

seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte

limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros

fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O

marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar

como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o

mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a

pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista

E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel

Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave

atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar

natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O

comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a

criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus

proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla

contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial

etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia

ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de

uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua

Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo

eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo

explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o

substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de

maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade

Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado

da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o

marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes

escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos

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domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras

palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a

contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie

de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-

marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo

sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo

histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um

certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos

tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento

humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo

marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do

materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como

o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo

eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir

meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem

de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um

maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem

que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo

Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel

da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente

justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia

eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas

noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas

para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees

fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de

vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo

substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade

militar

Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do

xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do

gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais

tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos

intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro

jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes

jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os

9

oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

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do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

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como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

2

Neste pelo contraacuterio tratava-se de tentar provar que os meacutetodos do marxismo

eram meacutetodos cientiacuteficos universais e que por conseguinte a sua competecircncia

se estendia igualmente agrave ciecircncia militar Peccedilo desculpa mais uma vez mas

pessoalmente creio que ambas as opiniotildees satildeo falsas a ciecircncia militar natildeo

pertence agrave categoria das ciecircncias naturais porque nem eacute natural nem eacute

ciecircncia Talvez a discussatildeo de hoje nos aproxime um pouco mais do fundo do

problema

Mas mesmo que admitamos que a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia natildeo

podemos de modo algum admitir que ela possa ser construiacuteda por meacutetodos

marxistas porque o materialismo histoacuterico natildeo eacute um meacutetodo universal paacutera

todas as ciecircncias Este eacute um enorme erro que me parece acarretar as mais

nocivas consequumlecircncias Podemos com ecircxito dedicar-nos durante toda a nossa

vida aos assuntos militares sem nunca refletir sobre os meacutetodos teoacutericos do

conhecimento dos assuntos militares ndash tal como podemos olhar todos os dias

para o reloacutegio ignorando o seu mecanismo interior e a disposiccedilatildeo das suas

molas e engrenagens Conhecendo os algarismos e o movimento dos ponteiros

sobre o mostrador natildeo corro o risco de me enganar Mas se natildeo me sentir

satisfeito com o movimento dos ponteiros sobre o mostrador e se quiser falar da

estrutura do reloacutegio devo conhececirc-la como deve ser e natildeo haacute qualquer lugar

para incluir coisas da minha lavra

Numa outra discussatildeo (a propoacutesito da doutrina militar unitaacuteria) jaacute me

referi a um episoacutedio da vida de Gueacuteorgui Valentinovitch Plekhanov [1N] ndash o

primeiro cruzado do marxismo na Ruacutessia homem de inteligecircncia rara e

altamente dotado Quando notava que algueacutem opunha os problemas do

materialismo filosoacutefico e histoacuterico ou pelo contraacuterio os confundia ndash Plekhanov

protestava violentamente O materialismo filosoacutefico eacute uma teoria que estaacute na

base das ciecircncias naturais ao passo que o materialismo histoacuterico explica a

histoacuteria da sociedade humana O materialismo histoacuterico eacute um meacutetodo que natildeo

explica todo o universo mas sim um grupo estritamente definido de fenocircmenos

que condicionam o desenvolvimento do homem histoacuterico O materialismo

filosoacutefico explica o movimento do universo enquanto mudanccedila e transformaccedilatildeo

da mateacuteria e leva o seu raciociacutenio ateacute agraves mais altas manifestaccedilotildees do espiacuterito

Ser politicamente marxista sem conhecer o materialismo histoacuterico eacute difiacutecil para

natildeo dizer impossiacutevel Ser politicamente marxista e natildeo conhecer o materialismo

filosoacutefico eacute possiacutevel ndash e haacute tantos exemplos destes quantos quiserem

3

E quando algum marxista (chamado outrora social-democrata)

divagava pelo domiacutenio da filosofia e comeccedilava a confundir tudo o defunto

Plekhanov atacava-o sem piedade Quantas vezes lhe disseram Eacute um jovem

Gueacuteorgui Valentinovitch natildeo teve tempo de estudar filosofia combatia na

clandestinidade Mas Plekhanov respondia aliaacutes com toda a razatildeo Se natildeo

sabe que se cale Ningueacutem o obriga a falar O nosso programa natildeo prevecirc que

um social-democrata tenha de ser um apaixonado do materialismo filosoacutefico Eacute

preciso que seja um membro ativo do partido um combatente corajoso pela

causa da classe operaacuteria ndash mas quando uma pessoa se aventura no domiacutenio da

filosofia natildeo deve confundir tudo E erguia-se em toda a sua estatura tomando

na matildeo a sua maravilhosa pena polecircmica Se folhearmos a histoacuteria do partido

veremos que numerosos satildeo aqueles que ainda mostram os seus vestiacutegios

No domiacutenio da filosofia militar considero que devemos seguir a boa

tradiccedilatildeo do defunto Plekhanov De modo algum somos obrigados a tratar de

questotildees ditas gnosioloacutegicas teoacuterico-cognitivas ou filosoacuteficas mas se

acontece que jaacute nos preocupamos com elas natildeo devemos confundir nada nem

comprometermo-nos num ou outro domiacutenio com armas inadequadas

esforccedilando-nos por aplicar diretamente o meacutetodo marxista aos assuntos

militares no sentido mais estrito do termo (e natildeo na poliacutetica militar) Esforccedilar-

se por edificar um domiacutenio militar especial atraveacutes do meacutetodo marxista

constitui o maior dos erros que em nada cede agrave tentativa de incluir o saber

militar no domiacutenio das ciecircncias naturais Se natildeo me engano os representantes

destas duas tendecircncias preparam-se para tomar hoje a palavra explicaratildeo sem

duacutevida melhor do que eu as suas ideacuteias ndash e depois discutiremos

Natildeo penso camaradas que cheguemos hoje agrave miacutenima soluccedilatildeo geral e

obrigatoacuteria desta questatildeo Mas se conseguirmos clarificar certas coisas e se se

impuser a conclusatildeo de que temos de ser mais prudentes quanto agrave utilizaccedilatildeo

direta do marxismo nos domiacutenios particulares da criaccedilatildeo jaacute natildeo seraacute mau Toda

a gente sabe que com a nossa doutrina militar ndash um tanto ligada agrave discussatildeo

atual ndash andamos principalmente em ciacuterculos e emitimos as opiniotildees mais

diversas natildeo penso contudo que por isso nos tenhamos enriquecido a natildeo ser

num sentido negativo toda a gente pocircde convencer-se que nada de especial daiacute

saiu Tiacutenhamos prometido a noacutes proacuteprios criar uma doutrina militar unitaacuteria

numa base proletaacuteria e marxistae depois de termos discutido chegamos a uma

conclusatildeo anterior ndash rever os nossos regulamentos em funccedilatildeo da experiecircncia

4

acumulada Estamos a revecirc-los ndash lentamente cambaleando porque as nossas

estradas satildeo caminhos de aldeia e numerosos satildeo os trilhos

Mas espero firmemente que a revisatildeo dos regulamentos seraacute realmente

uacutetil natildeo vamos inventar uma nova doutrina militar por via de decreto pelo

contraacuterio vamos desembaraccedilar-nos de muitas coisas inuacuteteis e formular mais

claramente outras Quanto agrave reuniatildeo de hoje a utilidade de uma larga discussatildeo

consagrada agraves relaccedilotildees entre os assuntos militares e o marxismo seraacute por assim

dizer mais de ordem intelectual e higiecircnica e permitiraacute eliminar certas

confusotildees A tarefa praacutetica eacute a seguinte aprendamos a falar mais simplesmente

da cavalaria eacute inuacutetil sobrecarregar as nossas discussotildees sobre a aviaccedilatildeo com

uma pedante terminologia marxista com termos sonoros com problemas

altamente significativos ndash que se revelam muitas vezes um envelope sem

conteuacutedo nem essecircncia

Camaradas eis as observaccedilotildees introdutoacuterias que me permito fazer No

interesse do auditoacuterio que compreende camaradas diversamente versados nos

problemas filosoacuteficos peccedilo encarecidamente a todos os relatores e participantes

nos debates que se se exprimam da maneira mais concreta mais precisa mais

simples e mais compreensiacutevel possiacutevel Penso estar proacuteximo da verdade ao

afirmar que nem todas as pessoas aqui presentes estudaram a filosofia de A a Z

e eacute mesmo provaacutevel que alguns de noacutes natildeo tenham lido nunca os mais

elementares livros de filosofia Penso que o fato de nos dirigirmos a um

auditoacuterio natildeo iniciado em filosofia apresenta mais uma vantagem permite

verificar a bagagem de cada um dos relatores pois a terminologia filosoacutefica eacute

tambeacutem um processo que se parece muito com o teatro A maquilagem pode

ser impressionante mas acontece agraves vezes que natildeo haacute nada por baixo Aliaacutes

esse ocultismo para augures e outros iniciados essas tradiccedilotildees e meacutetodos

medievais segundo o que eu pude observar satildeo ainda respeitados em

numerosos artigos das nossas publicaccedilotildees militares Peccedilo-vos pois que se

dignem exprimir mais simplesmente as suas ideacuteias

Permitam camaradas que passemos agora aos debates Na ordem dos

relatoacuterios previstos peccedilo ao camarada Loukirski que apresente a sua exposiccedilatildeo

II ndash Encerramento

5

Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer

algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em

proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam

contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias

A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns

outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem

em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia

militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a

ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia

O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a

questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-

cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se

satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o

chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma

operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante

que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo

eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas

uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas

sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-

se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se

compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os

soldados ndash era a ciecircncia de vencer

Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares

com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte

praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo

Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que

em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash

mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma

importacircncia histoacuterica utilitaacuteria

Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies

no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode

natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente

teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de

ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume

6

dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com

finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro

criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]

conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao

propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida

[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo

proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu

autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo

tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo

arte

Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de

vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar

de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos

militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A

manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de

infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia

Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu

acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve

conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar

limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o

soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os

assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal

Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a

conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos

e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute

tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso

satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia

E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade

dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da

utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a

utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade

dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil

quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de

tudo natildeo devemos confundi-los

7

Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima

anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir

dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb

Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a

vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se

definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O

marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de

acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro

definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma

seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte

limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros

fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O

marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar

como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o

mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a

pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista

E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel

Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave

atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar

natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O

comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a

criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus

proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla

contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial

etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia

ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de

uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua

Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo

eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo

explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o

substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de

maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade

Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado

da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o

marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes

escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos

8

domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras

palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a

contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie

de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-

marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo

sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo

histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um

certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos

tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento

humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo

marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do

materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como

o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo

eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir

meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem

de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um

maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem

que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo

Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel

da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente

justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia

eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas

noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas

para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees

fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de

vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo

substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade

militar

Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do

xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do

gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais

tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos

intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro

jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes

jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os

9

oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

3

E quando algum marxista (chamado outrora social-democrata)

divagava pelo domiacutenio da filosofia e comeccedilava a confundir tudo o defunto

Plekhanov atacava-o sem piedade Quantas vezes lhe disseram Eacute um jovem

Gueacuteorgui Valentinovitch natildeo teve tempo de estudar filosofia combatia na

clandestinidade Mas Plekhanov respondia aliaacutes com toda a razatildeo Se natildeo

sabe que se cale Ningueacutem o obriga a falar O nosso programa natildeo prevecirc que

um social-democrata tenha de ser um apaixonado do materialismo filosoacutefico Eacute

preciso que seja um membro ativo do partido um combatente corajoso pela

causa da classe operaacuteria ndash mas quando uma pessoa se aventura no domiacutenio da

filosofia natildeo deve confundir tudo E erguia-se em toda a sua estatura tomando

na matildeo a sua maravilhosa pena polecircmica Se folhearmos a histoacuteria do partido

veremos que numerosos satildeo aqueles que ainda mostram os seus vestiacutegios

No domiacutenio da filosofia militar considero que devemos seguir a boa

tradiccedilatildeo do defunto Plekhanov De modo algum somos obrigados a tratar de

questotildees ditas gnosioloacutegicas teoacuterico-cognitivas ou filosoacuteficas mas se

acontece que jaacute nos preocupamos com elas natildeo devemos confundir nada nem

comprometermo-nos num ou outro domiacutenio com armas inadequadas

esforccedilando-nos por aplicar diretamente o meacutetodo marxista aos assuntos

militares no sentido mais estrito do termo (e natildeo na poliacutetica militar) Esforccedilar-

se por edificar um domiacutenio militar especial atraveacutes do meacutetodo marxista

constitui o maior dos erros que em nada cede agrave tentativa de incluir o saber

militar no domiacutenio das ciecircncias naturais Se natildeo me engano os representantes

destas duas tendecircncias preparam-se para tomar hoje a palavra explicaratildeo sem

duacutevida melhor do que eu as suas ideacuteias ndash e depois discutiremos

Natildeo penso camaradas que cheguemos hoje agrave miacutenima soluccedilatildeo geral e

obrigatoacuteria desta questatildeo Mas se conseguirmos clarificar certas coisas e se se

impuser a conclusatildeo de que temos de ser mais prudentes quanto agrave utilizaccedilatildeo

direta do marxismo nos domiacutenios particulares da criaccedilatildeo jaacute natildeo seraacute mau Toda

a gente sabe que com a nossa doutrina militar ndash um tanto ligada agrave discussatildeo

atual ndash andamos principalmente em ciacuterculos e emitimos as opiniotildees mais

diversas natildeo penso contudo que por isso nos tenhamos enriquecido a natildeo ser

num sentido negativo toda a gente pocircde convencer-se que nada de especial daiacute

saiu Tiacutenhamos prometido a noacutes proacuteprios criar uma doutrina militar unitaacuteria

numa base proletaacuteria e marxistae depois de termos discutido chegamos a uma

conclusatildeo anterior ndash rever os nossos regulamentos em funccedilatildeo da experiecircncia

4

acumulada Estamos a revecirc-los ndash lentamente cambaleando porque as nossas

estradas satildeo caminhos de aldeia e numerosos satildeo os trilhos

Mas espero firmemente que a revisatildeo dos regulamentos seraacute realmente

uacutetil natildeo vamos inventar uma nova doutrina militar por via de decreto pelo

contraacuterio vamos desembaraccedilar-nos de muitas coisas inuacuteteis e formular mais

claramente outras Quanto agrave reuniatildeo de hoje a utilidade de uma larga discussatildeo

consagrada agraves relaccedilotildees entre os assuntos militares e o marxismo seraacute por assim

dizer mais de ordem intelectual e higiecircnica e permitiraacute eliminar certas

confusotildees A tarefa praacutetica eacute a seguinte aprendamos a falar mais simplesmente

da cavalaria eacute inuacutetil sobrecarregar as nossas discussotildees sobre a aviaccedilatildeo com

uma pedante terminologia marxista com termos sonoros com problemas

altamente significativos ndash que se revelam muitas vezes um envelope sem

conteuacutedo nem essecircncia

Camaradas eis as observaccedilotildees introdutoacuterias que me permito fazer No

interesse do auditoacuterio que compreende camaradas diversamente versados nos

problemas filosoacuteficos peccedilo encarecidamente a todos os relatores e participantes

nos debates que se se exprimam da maneira mais concreta mais precisa mais

simples e mais compreensiacutevel possiacutevel Penso estar proacuteximo da verdade ao

afirmar que nem todas as pessoas aqui presentes estudaram a filosofia de A a Z

e eacute mesmo provaacutevel que alguns de noacutes natildeo tenham lido nunca os mais

elementares livros de filosofia Penso que o fato de nos dirigirmos a um

auditoacuterio natildeo iniciado em filosofia apresenta mais uma vantagem permite

verificar a bagagem de cada um dos relatores pois a terminologia filosoacutefica eacute

tambeacutem um processo que se parece muito com o teatro A maquilagem pode

ser impressionante mas acontece agraves vezes que natildeo haacute nada por baixo Aliaacutes

esse ocultismo para augures e outros iniciados essas tradiccedilotildees e meacutetodos

medievais segundo o que eu pude observar satildeo ainda respeitados em

numerosos artigos das nossas publicaccedilotildees militares Peccedilo-vos pois que se

dignem exprimir mais simplesmente as suas ideacuteias

Permitam camaradas que passemos agora aos debates Na ordem dos

relatoacuterios previstos peccedilo ao camarada Loukirski que apresente a sua exposiccedilatildeo

II ndash Encerramento

5

Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer

algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em

proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam

contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias

A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns

outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem

em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia

militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a

ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia

O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a

questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-

cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se

satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o

chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma

operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante

que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo

eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas

uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas

sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-

se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se

compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os

soldados ndash era a ciecircncia de vencer

Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares

com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte

praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo

Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que

em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash

mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma

importacircncia histoacuterica utilitaacuteria

Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies

no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode

natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente

teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de

ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume

6

dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com

finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro

criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]

conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao

propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida

[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo

proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu

autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo

tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo

arte

Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de

vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar

de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos

militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A

manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de

infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia

Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu

acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve

conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar

limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o

soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os

assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal

Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a

conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos

e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute

tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso

satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia

E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade

dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da

utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a

utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade

dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil

quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de

tudo natildeo devemos confundi-los

7

Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima

anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir

dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb

Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a

vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se

definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O

marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de

acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro

definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma

seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte

limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros

fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O

marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar

como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o

mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a

pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista

E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel

Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave

atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar

natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O

comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a

criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus

proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla

contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial

etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia

ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de

uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua

Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo

eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo

explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o

substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de

maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade

Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado

da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o

marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes

escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos

8

domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras

palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a

contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie

de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-

marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo

sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo

histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um

certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos

tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento

humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo

marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do

materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como

o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo

eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir

meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem

de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um

maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem

que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo

Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel

da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente

justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia

eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas

noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas

para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees

fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de

vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo

substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade

militar

Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do

xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do

gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais

tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos

intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro

jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes

jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os

9

oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

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como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

4

acumulada Estamos a revecirc-los ndash lentamente cambaleando porque as nossas

estradas satildeo caminhos de aldeia e numerosos satildeo os trilhos

Mas espero firmemente que a revisatildeo dos regulamentos seraacute realmente

uacutetil natildeo vamos inventar uma nova doutrina militar por via de decreto pelo

contraacuterio vamos desembaraccedilar-nos de muitas coisas inuacuteteis e formular mais

claramente outras Quanto agrave reuniatildeo de hoje a utilidade de uma larga discussatildeo

consagrada agraves relaccedilotildees entre os assuntos militares e o marxismo seraacute por assim

dizer mais de ordem intelectual e higiecircnica e permitiraacute eliminar certas

confusotildees A tarefa praacutetica eacute a seguinte aprendamos a falar mais simplesmente

da cavalaria eacute inuacutetil sobrecarregar as nossas discussotildees sobre a aviaccedilatildeo com

uma pedante terminologia marxista com termos sonoros com problemas

altamente significativos ndash que se revelam muitas vezes um envelope sem

conteuacutedo nem essecircncia

Camaradas eis as observaccedilotildees introdutoacuterias que me permito fazer No

interesse do auditoacuterio que compreende camaradas diversamente versados nos

problemas filosoacuteficos peccedilo encarecidamente a todos os relatores e participantes

nos debates que se se exprimam da maneira mais concreta mais precisa mais

simples e mais compreensiacutevel possiacutevel Penso estar proacuteximo da verdade ao

afirmar que nem todas as pessoas aqui presentes estudaram a filosofia de A a Z

e eacute mesmo provaacutevel que alguns de noacutes natildeo tenham lido nunca os mais

elementares livros de filosofia Penso que o fato de nos dirigirmos a um

auditoacuterio natildeo iniciado em filosofia apresenta mais uma vantagem permite

verificar a bagagem de cada um dos relatores pois a terminologia filosoacutefica eacute

tambeacutem um processo que se parece muito com o teatro A maquilagem pode

ser impressionante mas acontece agraves vezes que natildeo haacute nada por baixo Aliaacutes

esse ocultismo para augures e outros iniciados essas tradiccedilotildees e meacutetodos

medievais segundo o que eu pude observar satildeo ainda respeitados em

numerosos artigos das nossas publicaccedilotildees militares Peccedilo-vos pois que se

dignem exprimir mais simplesmente as suas ideacuteias

Permitam camaradas que passemos agora aos debates Na ordem dos

relatoacuterios previstos peccedilo ao camarada Loukirski que apresente a sua exposiccedilatildeo

II ndash Encerramento

5

Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer

algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em

proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam

contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias

A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns

outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem

em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia

militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a

ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia

O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a

questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-

cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se

satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o

chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma

operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante

que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo

eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas

uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas

sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-

se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se

compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os

soldados ndash era a ciecircncia de vencer

Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares

com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte

praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo

Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que

em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash

mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma

importacircncia histoacuterica utilitaacuteria

Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies

no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode

natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente

teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de

ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume

6

dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com

finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro

criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]

conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao

propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida

[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo

proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu

autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo

tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo

arte

Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de

vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar

de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos

militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A

manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de

infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia

Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu

acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve

conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar

limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o

soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os

assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal

Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a

conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos

e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute

tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso

satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia

E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade

dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da

utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a

utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade

dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil

quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de

tudo natildeo devemos confundi-los

7

Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima

anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir

dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb

Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a

vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se

definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O

marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de

acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro

definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma

seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte

limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros

fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O

marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar

como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o

mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a

pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista

E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel

Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave

atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar

natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O

comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a

criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus

proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla

contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial

etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia

ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de

uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua

Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo

eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo

explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o

substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de

maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade

Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado

da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o

marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes

escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos

8

domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras

palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a

contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie

de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-

marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo

sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo

histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um

certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos

tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento

humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo

marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do

materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como

o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo

eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir

meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem

de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um

maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem

que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo

Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel

da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente

justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia

eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas

noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas

para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees

fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de

vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo

substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade

militar

Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do

xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do

gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais

tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos

intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro

jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes

jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os

9

oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

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pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

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como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

5

Estaacute esgotada a lista dos oradores Para concluir permitam-me dizer

algumas palavras a favor de uma arte em minha opiniatildeo maltratada em

proveito da ciecircncia militar que por sua vez alguns camaradas defenderam

contra as nossas afrontas ndash que aliaacutes considero imaginaacuterias

A uacuteltima pessoa a tomar palavra o camarada Ogorodnikov [2] ndash e alguns

outros antes dele ndash atacou particularmente o camarada Sveacutetchine com quem

em tempos eu proacuteprio polemizei como eacute que um homem tatildeo versado na ciecircncia

militar daacute de repente provas de uma tal abnegaccedilatildeo e comeccedila a denegrir a

ciecircncia militar declarando que ela natildeo eacute de maneira nenhuma uma ciecircncia

O camarada Polonsky [3N] efetuou um movimento giratoacuterio para abordar a

questatildeo Vejamos ndash disse ele ndash o conhecimento pode ser cientiacutefico ou natildeo-

cientiacutefico Se os assuntos militares satildeo cientiacuteficos trata-se de uma ciecircncia se

satildeo natildeo-cientiacuteficos natildeo valem um caracol O camarada Polonsky comparou o

chefe militar a um cirurgiatildeo A comparaccedilatildeo natildeo eacute maacute O cirurgiatildeo faz uma

operaccedilatildeo E uma accedilatildeo que exige um haacutebito uma certa arte ndash e para o estudante

que segue a operaccedilatildeo ndash diz o camarada Polonsky ndash eacute uma ciecircncia Claro que natildeo

eacute nada assim Tambeacutem para o estudante a operaccedilatildeo natildeo eacute uma ciecircncia mas

uma aprendizagem Se um pintor desenha eacute arte em redor dele haacute pessoas

sentadas copiando para essas pessoas para os alunos em vossa opiniatildeo trata-

se de uma ciecircncia Natildeo Um haacutebito natildeo eacute ainda uma ciecircncia Era assim que se

compreendia a ciecircncia no tempo de Souvorov quando se espancavam os

soldados ndash era a ciecircncia de vencer

Um dos oradores declarou natildeo se podem comparar os assuntos militares

com a arte porque ndash pretende ele ndash a arte tem criteacuterios esteacuteticos E a arte

praacutetica E a arte de construir pontes de construir casas a arte da canalizaccedilatildeo

Natildeo esqueccedilamos poreacutem que a arte praacutetica tem bases cientiacuteficas E evidente que

em uacuteltima anaacutelise todas as ciecircncias vieram da praacutetica do artesanato da accedilatildeo ndash

mas depois libertaram-se dos seus laccedilos diretos e grosseiros mantendo uma

importacircncia histoacuterica utilitaacuteria

Ao realizar experiecircncias quiacutemicas ou ao observar cruzamentos de espeacutecies

no laboratoacuterio o saacutebio pode prosseguir um fim unicamente praacutetico mas pode

natildeo o prosseguir Por outro lado em uacuteltima anaacutelise uma conclusatildeo puramente

teoacuterica enriquece tambeacutem a praacutetica A arte pode apoiar-se numa quantidade de

ciecircncias Um elabora uma ciecircncia enquanto ciecircncia pura como eacute costume

6

dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com

finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro

criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]

conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao

propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida

[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo

proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu

autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo

tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo

arte

Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de

vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar

de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos

militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A

manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de

infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia

Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu

acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve

conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar

limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o

soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os

assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal

Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a

conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos

e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute

tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso

satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia

E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade

dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da

utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a

utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade

dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil

quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de

tudo natildeo devemos confundi-los

7

Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima

anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir

dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb

Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a

vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se

definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O

marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de

acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro

definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma

seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte

limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros

fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O

marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar

como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o

mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a

pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista

E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel

Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave

atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar

natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O

comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a

criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus

proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla

contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial

etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia

ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de

uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua

Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo

eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo

explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o

substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de

maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade

Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado

da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o

marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes

escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos

8

domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras

palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a

contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie

de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-

marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo

sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo

histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um

certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos

tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento

humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo

marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do

materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como

o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo

eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir

meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem

de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um

maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem

que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo

Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel

da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente

justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia

eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas

noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas

para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees

fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de

vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo

substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade

militar

Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do

xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do

gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais

tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos

intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro

jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes

jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os

9

oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

6

dizer-se enquanto outro opera apenas com as conclusotildees da ciecircncia com

finalidades praacuteticas um terceiro entrevecirc intuitivamente graccedilas ao seu faro

criador aquilo de que necessita na praacutetica O camarada Snessarev [3]

conseguiu melhor do que outros aproximar-se da essecircncia do problema ao

propor que utilizaacutessemos para os assuntos militares o termo de arte aprendida

[4] Eacute evidente que se podem inventar dezenas de outros termos e natildeo

proponho a legalizaccedilatildeo do termo de Snessarev mas em minha opiniatildeo o seu

autor mostrou-se mais livre de preconceitos corporativos declarando Natildeo

tenho medo do termo artesanato e portanto ainda menos medo tenho do termo

arte

Muitos camaradas examinaram o problema que nos ocupa dum ponto de

vista aristocraacutetico do ponto de vista do chefe militar do comandante militar

de hoje ou de amanhatilde- mas se considerarmos conjuntamente os assuntos

militares todos os soldados devem ser capazes de executar a sua manobra A

manobra conhecida que deve ser conhecida de ndash cada simples soldado de

infantaria eacute ou natildeo uma ciecircncia

Vocecircs dizem que Q comandante deve conhecer a geografia a histoacuteria ndash e eu

acrescentaria natildeo seria mau se conhecesse tambeacutem a economia poliacutetica ndash deve

conhecer a histoacuteria militar pelo menos do uacuteltimo seacuteculo Mas o domiacutenio militar

limita-se apenas ao comandante Natildeo Natildeo esqueccedilamos que existe ainda o

soldado o comandante de companhia e o comandante de secccedilatildeo neles os

assuntos militares permanecem no domiacutenio da habilidade artesanal

Se o soldado natildeo conhece a manobra natildeo passa de carne-para-canhatildeo se a

conhece eacute um artesatildeo Mais longe trataacute-se de uma arte baseada nos meacutetodos

e conclusotildees de numerosas ciecircncias exploradas pelo saber militar A estatiacutestica eacute

tambeacutem obrigatoacuteria E necessaacuteria a etnografia bem como a histoacuteria Tudo isso

satildeo ciecircncias Mas a atividade militar em si mesma natildeo eacute uma ciecircncia

E preciso diferenciar por um lado a ciecircncia que estabelece a conformidade

dos fenocircmenos agraves leis as suas causas ndash e por outro a arte que se ocupa da

utilidade dos processos Natildeo eacute a mesma coisa e natildeo devemos confundir a

utilidade dos processos dos automatismos e dos meacutetodos com a conformidade

dos fenocircmenos objetivos agraves leis Posso elaborar um meacutetodo tanto mais uacutetil

quanto melhor conheccedila a conformidade dos fenocircmenos agraves leis mas apesar de

tudo natildeo devemos confundi-los

7

Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima

anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir

dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb

Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a

vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se

definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O

marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de

acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro

definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma

seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte

limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros

fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O

marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar

como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o

mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a

pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista

E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel

Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave

atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar

natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O

comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a

criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus

proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla

contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial

etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia

ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de

uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua

Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo

eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo

explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o

substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de

maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade

Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado

da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o

marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes

escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos

8

domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras

palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a

contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie

de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-

marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo

sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo

histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um

certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos

tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento

humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo

marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do

materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como

o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo

eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir

meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem

de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um

maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem

que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo

Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel

da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente

justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia

eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas

noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas

para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees

fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de

vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo

substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade

militar

Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do

xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do

gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais

tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos

intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro

jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes

jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os

9

oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

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pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

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como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

7

Na Repuacuteblica Sovieacutetica o nosso meacutetodo militar define-se em uacuteltima

anaacutelise pela teacutecnica pelas relaccedilotildees de classes etc Mas eacute impossiacutevel deduzir

dessas justas teses marxistas as estruturas de um regimento de cavalaria Gleb

Ouspenski [2N]mostrou maravilhosamente em A Forccedila da Terra que toda a

vida e todo o pensamento do camponecircs dependiam da posse da terra e se

definiam inteiramente pelo estado dos meios de produccedilatildeo do camponecircs O

marxismo pode responder agrave seguinte pergunta porque eacute que o mujique haacute de

acreditar nos espiacuteritos enquanto usar botas de feltro As botas de feltro

definem o modo camponecircs de produccedilatildeo por sua vez este uacuteltimo provoca uma

seacuterie de fenocircmenos estreitamente ligados agrave botas de feltro ndash um horizonte

limitado uma dependecircncia de escravo face agrave chuva ao sol e aos outros

fenocircmenos naturais elementares que em conjunto criam os preconceitos O

marxismo pode seguir tudo isso e explicaacute-lo Mas poderaacute ndash o marxismo ensinar

como se fazem botas de feltro Natildeo natildeo pode Pode explicar porque eacute que o

mujique usa botas de feltro ndash porque em sua volta haacute apenas floresta a lama e a

pobreza ndash mas natildeo eacute possiacutevel coser botas de feltro segundo o meacutetodo marxista

E eacute justamente isso que o camarada Akhov quer fazer Impossiacutevel

Um dos oradores protestou contra a designaccedilatildeo de arte conferida agrave

atividade militar baseando-se ndash vejam bem ndash no fato de que a atividade militar

natildeo se submetia aos cacircnones da beleza Trata-se do mais puro mal-entendido O

comeacutercio sobretudo na rua Soukharevska natildeo se submete certamente a

criteacuterios esteacuteticos e contudo a arte do comeacutercio existe O comeacutercio tem os seus

proacuteprios meacutetodos complexos ligados a certas teorias pseudo-cientiacuteficas a dupla

contabilidade italiana [5] a correspondecircncia comercial a geografia comercial

etc Que eacute o comeacutercio eacute ou natildeo uma ciecircncia Marx fez do comeacutercio uma ciecircncia

ndash estabelecendo as leis da sociedade capitalista fazendo do comeacutercio o objeto de

uma pesquisa cientiacutefica Mas poder-se-aacute fazer comeacutercio segundo Marx na rua

Soukharevska Natildeo eacute impossiacutevel Um dos princiacutepios mais estaacuteveis se natildeo

eternos do comeacutercio eacute a regra Natildeo se vende sem enganar O marxismo

explica donde vem tal princiacutepio como eacute que a dupla contabilidade italiana o

substitui ndash a sua significaccedilatildeo eacute absolutamente a mesma mas expressa de

maneira mais delicada Mas poderaacute o marxismo criar uma nova contabilidade

Ou seraacute que o marxista que quer ocupar-se a seacuterio do comeacutercio estaacute dispensado

da necessidade de aprender contabilidade As tentativas de proclamar o

marxismo um meacutetodo vaacutelido para todas as ciecircncias e para todas as artes

escondem muitas vezes uma maacute-vontade persistente de natildeo abordar novos

8

domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras

palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a

contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie

de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-

marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo

sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo

histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um

certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos

tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento

humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo

marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do

materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como

o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo

eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir

meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem

de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um

maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem

que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo

Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel

da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente

justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia

eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas

noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas

para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees

fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de

vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo

substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade

militar

Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do

xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do

gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais

tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos

intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro

jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes

jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os

9

oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

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forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

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todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

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utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

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histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

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pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

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como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

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operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

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domiacutenios eacute efetivamente muito mais faacutecil ter um passaporte ou por outras

palavras uma chave que abra todas as fechaduras do que aprender a

contabilidade a arte militar etc Eacute muito perigoso querer atribuir uma espeacutecie

de caraacuteter absoluto ao meacutetodo marxista Marx opunha-se a esses quase-

marxistas e numa das suas cartas declarou mesmo muito simplesmente Natildeo

sou marxista quando lhe apresentaram em vez da explicaccedilatildeo dum processo

histoacuterico duma observaccedilatildeo atenta e conscienciosa daquilo que se passava um

certo itineraacuterio para a histoacuteria Com a sua teoria histoacuterico-social muito menos

tinha a intenccedilatildeo de substituir todos os outros domiacutenios do conhecimento

humano Quer isto dizer que um responsaacutevel marxista natildeo precisa do meacutetodo

marxista De modo nenhum Seria absurdo negar a grande importacircncia do

materialismo para a disciplina do pensamento em todos os domiacutenios Tal como

o darwinismo o marxismo eacute uma escola superior do pensamento humano Natildeo

eacute possiacutevel a partir da teoria de Darwin ou da lei da seleccedilatildeo natural deduzir

meacutetodos de guerra mas um responsaacutevel militar que estudou Darwin seraacute aleacutem

de outras qualidades mais instruiacutedo seraacute mais largo o seu horizonte teraacute um

maior espiacuterito de oportunidade observaraacute aspectos da natureza e do homem

que antes natildeo via Isto eacute tanto mais vaacutelido para o marxismo

Uma observaccedilatildeo a propoacutesito do que disse o camarada Akhov sobre o papel

da anaacutelise histoacuterica na explicaccedilatildeo de tal noccedilatildeo ou hipoacutetese Eacute absolutamente

justo ndash o ponto de vista histoacuterico eacute extremamente fecundo e a histoacuteria da ciecircncia

eacute mais instrutiva do que toda a gnose kantiana O homem deve polir as suas

noccedilotildees e os seus termos tal como o dentista pule os seus instrumentos Mas

para isso natildeo tem nenhuma necessidade da gnose kantiana que toma noccedilotildees

fixadas de uma vez para sempre ndash eacute preciso considerar os termos do ponto de

vista histoacuterico Mas a histoacuteria dos termos das hipoacuteteses e das teorias natildeo

substitui a proacutepria ciecircncia A fiacutesica eacute a fiacutesica e a atividade militar eacute a atividade

militar

Pode-se mesmo com o maior ecircxito aplicar o marxismo agrave histoacuteria do

xadrez Graccedilas ao marxismo podemos estabelecer o que era a antiga nobreza do

gecircnero Oblomov [6] que a preguiccedila impedia mesmo de jogar o xadrez mais

tarde quando as cidades se desenvolveram deu-se o aparecimento dos

intelectuais e dos comerciantes ndash e veio a necessidade de exercitar o ceacuterebro

jogando o xadrez E agora entre noacutes satildeo os operaacuterios que vatildeo para os clubes

jogar xadrez Os operaacuterios jogam hoje xadrez porque derrubaram aqueles que os

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oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

9

oprimiam O marxismo explica perfeitamente tudo isso Pode seguir-se todo o

desenvolvimento da luta de classes fazendo a histoacuteria da evoluccedilatildeo do jogo de

xadrez Afirmo que eacute possiacutevel escrever seguindo o meacutetodo de Marx um livro

maravilhoso sobre a evoluccedilatildeo do jogo de xadrez No entanto eacute impossiacutevel

aprender a jogar o xadrez de maneira marxista O jogo de xadrez tem as suas

leis os seus princiacutepios Eacute verdade que li recentemente que no tempo de

Napoleatildeo o xadrez se baseava nas manobras ndash e assim continuou ateacute meados

do seacuteculo XIX para assim permanecer na eacutepoca da paz armada ndash desde a guerra

franco-prussiana ateacute agrave uacuteltima guerra imperialista ndash estritamente um jogo de

posiccedilatildeo ao passo que hoje parece ter-se tornado mais flexiacutevel e prestar-se agraves

manobras Eacute pelo menos o que afirma um jogador americano Eacute possiacutevel que as

condiccedilotildees sociais por caminhos invisiacuteveis tenham penetrado ateacute ao ceacuterebro do

jogador de xadrez que por sua vez os reflete no seu estilo de jogo sem mesmo

disso se dar conta Um psicoacutelogo materialista encontraria sem duacutevida neste

fato um certo interesse Mas apesar de tudo continua a ser impossiacutevel aprender

a jogar o xadrez de maneira marxista O marxismo natildeo ensina como utilizar a

surpresa quando necessaacuteria para levar a melhor sobre o inatingiacutevel Makhno

A essecircncia da atividade militar eacute oacute conjunto das regras para vencer Essas

regras ndash e seraacute isso um bem ou um mal ndash estatildeo resumidos nos nossos

regulamentos Seratildeo estes uma ciecircncia Penso que eacute impossiacutevel qualificar de

ciecircncia os nossos regulamentos Satildeo um conjunto de regras e processos dum

artesanato ou duma arte

Aos camaradas que desejam edificar a atividade militar pelo meacutetodo

marxista eu propunha que relessem deste ponto de vista os nossos

regulamentos e que indicassem claramente quais as modificaccedilotildees a introduzir

do ponto de vista marxista agraves regras de reconhecimento de vigilacircncia de

preparaccedilatildeo de artilharia ou de ataque Gostava muito que me dissessem uma soacute

palavra nova que fosse neste domiacutenio utilizando o meacutetodo marxista ndash natildeo uma

ideacuteia ou alguma coisa mas apenas uma palavra nova e praacutetica

Tais satildeo os erros do jovem pensamento marxista no plano da teoria militar

Opotildeem-se-lhes os erros dos acadecircmicos militares metafiacutesicos Dizem-nos que a

ciecircncia militar descobre e formula os princiacutepios eternos da atividade militar

Que significam esses princiacutepios Satildeo generalizaccedilotildees cientiacuteficas ou instruccedilotildees

praacuteticas Em que sentido pode dizer-se que satildeo eternos

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

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como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

10

A guerra eacute uma certa forma de relaccedilotildees entre as pessoas Por conseguinte

os meacutetodos e processos da guerra dependem das qualidades anatocircmicas e fiacutesicas

do indiviacuteduo da forma de organizaccedilatildeo do homem coletivo da sua teacutecnica da

sua situaccedilatildeo fiacutesica cultural e histoacuterica etc Assim os meacutetodos e processos da

guerra satildeo definidos por condiccedilotildees mutaacuteveis e eacute por isso que em caso nenhum

podem ser eternos

No entanto eacute absolutamente evidente que haacute nesses meacutetodos e processos

elementos de maior ou menor estabilidade Por exemplo nos meacutetodos da

cavalaria reencontraremos os elementos comuns agrave eacutepoca de Aniacutebal [7] ou

mesmo de uma eacutepoca anterior Eacute evidente que os meacutetodos de aviaccedilatildeo satildeo de

origem mais recente Nos meacutetodos de infantaria podemos reencontrar

elementos comuns agraves accedilotildees das hordas e das tribos mais primitivas que se

guerreavam antes mesmo de terem domesticado o cavalo Enfim nas operaccedilotildees

militares em geral podemos igualmente encontrar os processos mais

elementares que satildeo comuns aos homens e aos animais que se batem Escusado

seraacute dizer que nestes casos tambeacutem estamos perante verdades eternas isto eacute

de generalizaccedilotildees cientiacuteficas decorrentes das propriedades da mateacuteria mas

muito simplesmente de processos mais ou menos estaacuteveis dum artesanato ou

duma arte

O conjunto dos princiacutepios militares natildeo forma uma ciecircncia militar pois

esta uacuteltima natildeo existe ndash do mesmo modo que natildeo haacute uma ciecircncia de serralharia

Haacute toda uma seacuterie de ciecircncias que o comandante militar deve conhecer para se

sentir absolutamente agrave vontade na sua arte Mas a ciecircncia militar natildeo existe haacute

sim um artesanato militar que pode elevar-se ateacute ao niacutevel da arte militar

A histoacuteria cientiacutefica da guerra natildeo eacute a ciecircncia militar eacute uma ciecircncia moral

ou uma parte da ciecircncia social A histoacuteria cientiacutefica da guerra explica porque eacute

que numa eacutepoca determinada com uma organizaccedilatildeo social determinada as

pessoas se batiam de determinada maneira e porque eacute que tais processos

levaram nessa eacutepoca agrave vitoacuteria enquanto que determinados outros processos

originaram a derrota A partir da situaccedilatildeo geral das forccedilas de produccedilatildeo a

ciecircncia histoacuterica da guerra deve ter em conta todos os fatores secundaacuterios

inclusive os planos e os erros do comando Mas eacute absolutamente evidente que a

histoacuteria cientiacutefica da guerra estaacute pela sua proacutepria essecircncia eixada na explicaccedilatildeo

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

11

do que muda e do porquecirc dessas mudanccedilas e natildeo no estabelecimento de

verdades eternas

Que gecircnero de verdades pode a histoacuteria fornecer-nos O papel e a

importacircncia do crescimento das cidades na Idade Meacutedia para o

desenvolvimento da atividade militar a invenccedilatildeo da arma de fogo a queda do

regime feudal e a importacircncia dessa revoluccedilatildeo para o exeacutercito etc

A economia poliacutetica de Marx eacute uma ciecircncia indiscutiacutevel mas natildeo eacute uma

ciecircncia que ensine como dirigir a economia ou como fazer concorrecircncia no

mercado ou ainda como elaborar trustes E uma ciecircncia que explica como em

certa eacutepoca se desenvolveram certas relaccedilotildees econocircmicas (capitalistas) e quais

eram as condiccedilotildees interiores e as leis de tais relaccedilotildees As leis econocircmicas

estabelecidas por Marx natildeo satildeo verdades eternas caracterizam apenas uma

eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica do mundo e em todo o caso natildeo satildeo

princiacutepios eternos ndash ao contraacuterio do que pretende a escola burguesa de

Manchester (NOTA A Escola de Manchester Eacute a escola dos economistas

ingleses do iniacutecio do seacuteculo XIX ligados ao comeacutercio internacional que

combatiam pela livre troca e contra o protecionismo aduaneiro (Cobden e

outros) que proclama que a propriedade privada dos meios de produccedilatildeo a

compra e venda a concorrecircncia etc satildeo princiacutepios eternos da economia

decorrentes da natureza humana (que quanto a ela natildeo eacute eterna)

Qual eacute o erro teoacuterico fundamental daacute escola liberal de Manchester no

domiacutenio da economia poliacutetica A escola de Manchester transforma as

generalizaccedilotildees (leis) ao definir a praacutetica econocircmica humana na eacutepoca da

economia mercantil em princiacutepios eternos que deviam por assim dizer presidir

aos destinos da atividade econocircmica ateacute ao fim dos seacuteculos

Escusado seraacute dizer que os economistas de Manchester sabem muito bem

que os princiacutepios da concorrecircncia e do comeacutercio natildeo existiram desde sempre

fizeram a sua apariccedilatildeo num determinado estaacutedio da evoluccedilatildeo Mas os

doutrinaacuterios de Manchester torneiam a dificuldade tomando como ponto de

partida da ciecircncia econocircmica o aparecimento das relaccedilotildees capitalistas

Anteriormente a humanidade estava submersa na imundiacutecie da ignoracircncia ou

da barbaacuterie feudal mas descobriu depois a verdade do livre comeacutercio e tal

verdade continua a ser um princiacutepio eterno do progresso humano Para os

defensores da escola de Manchester as suas leis econocircmicas tecircm a importacircncia

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

12

das leis da quiacutemica Na Idade Meacutedia a humanidade vivia sob o jugo feudal no

meio dos particularismos e preconceitos religiosos natildeo conhecia nem as leis da

quiacutemica nem as do mercado livre descobriu mais tarde umas e outras O seu

valor objetivo e a eternidade destas leis natildeo satildeo comprometidos pelo fato de

outrora natildeo serem conhecidas

Os doutrinaacuterios militares adotaram exatamente a mesma atitude para com

as verdades militares Transformam em verdades eternas as generalizaccedilotildees

militares ou melhor os processos utilizados em determinada eacutepoca Se dantes

essas verdades eternas eram ignoradas tanto pior para aqueles que viviam na

barbaacuterie Mas a partir do momento em que foram descobertas essas verdades

tornaram-se no plano militar princiacutepios eternos Adotando uma escala

adequada notamos imediatamente que eacute absolutamente falsa esta maneira de

colocar o problema A economia da Idade Meacutedia natildeo era de modo algum um

produto da ignoracircncia possuiacutea a sua loacutegica interna decorrente da situaccedilatildeo da

teacutecnica humana dessa eacutepoca agrave qual estava ligada a estrutura de classes da

sociedade

Leis muito simples que definiam as relaccedilotildees econocircmicas do feudal ou do

senhor com os seus camponeses ou do artesatildeo com o seu mestre satildeo tatildeo

legais do ponto de vista da ciecircncia econocircmica como as leis mais complexas da

economia capitalista umas e outras possuem um caraacuteter temporaacuterio

Os exeacutercitos da Infantaria alematilde do Seacuteculo XV os exeacutercitos permanentes

dos Seacuteculos XVII e XVIII o exeacutercito nacional saiacutedo da revoluccedilatildeo francesa

correspondem a uma eacutepoca determinada da evoluccedilatildeo econocircmica e poliacutetica e

baseiam-se numa certa teacutecnica da qual dependem as estruturas e os meacutetodos de

accedilatildeo A Histoacuteria militar pode e deve determinar a interdependecircncia social entre

o exeacutercito e os meacutetodos que ele utiliza E que faz a filosofia militar Regra geral

estuda os meacutetodos e os processos utilizados no decurso do periacuteodo anterior que

considera verdades eternas finalmente descobertas pela humanidade e que

devem conservar a sua importacircncia por todos os tempos e por todos os povos

Depois apercebemo-nos de que esses meacutetodos ou princiacutepios foram jaacute utilizados

numa menor escala por Aniacutebal e Ceacutesar nas suas operaccedilotildees A Idade Meacutedia

transforma-se num precipiacutecio durante o qual caiacuteram no esquecimento os

princiacutepios eternos da guerra bem como a ciecircncia e a filosofia antigas

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

13

Haacute todavia uma diferenccedila entre os erros dos defensores da escola de

Manchester e os doutrinaacuterios partidaacuterios dos princiacutepios eternos da ciecircncia

militar que se situa ao niacutevel da diferenccedila existente entre as duas espeacutecies de

atividade As relaccedilotildees econocircmicas da sociedade capitalista formaram-se

segundo Marx nas costas das pessoas devido agrave sua atividade econocircmica de

formigas e depois as pessoas encontram-se frente a relaccedilotildees de propriedade jaacute

formadas que determinaram as relaccedilotildees entre os homens

Na atividade militar eacute incomparavelmente mais importante o elemento de

edificaccedilatildeo Planificada e de vontade dirigente consciente do homem Plano

vontade caacutelculo previsatildeo e iniciativa formam-se na sociedade capitalista

dentro dos limites da economia individual As leis da economia capitalista

resultam das relaccedilotildees que existem entre as economias individuais eacute por isso

que elas se elaboram nas costas das pessoas O exeacutercito na sua essecircncia eacute um

empreendimento governamental e por conseguinte plano e ideacuteia satildeo utilizados

neste domiacutenio no interior dos limites governamentais Isto natildeo exclui

evidentemente uma dependecircncia decisiva entre a atividade militar e a

economia mas o elemento subjetivo que se encarna noacutes responsaacuteveis da

atividade militar adquire uma envergadura que natildeo pode ter no domiacutenio

econocircmico

No entanto tal diferenccedila natildeo pode de modo algum possuir um caraacuteter

incondicional ou variaacutevel A accedilatildeo do princiacutepio eterno da livre concorrecircncia

levou como eacute sabido ao monopoacutelio agrave criaccedilatildeo de poderosos trustes nacionais e

mesmo internacionais As pessoas que os dirigem tecircm perante si um campo de

manobras estrateacutegicas tal que pode comparar-se ao teatro das operaccedilotildees

militares da uacuteltima grande guerra Eacute evidente que Rockefeller dispotildee de uma

extensatildeo muito mais vasta para manifestar a sua livre vontade no domiacutenio da

construccedilatildeo econocircmica do que qualquer industrial ou comerciante de haacute 50 ou

100 anos Mas RockefeIgraveler natildeo eacute uma violaccedilatildeo arbitraacuteria das leis de

Manchester eacute sim o seu produto histoacuterico e ao mesmo tempo a sua viva

negaccedilatildeo

Do personagem de barbicha de Gogol [8] ateacute ao bem barbeado

Rockefeller cada industrial ou comerciante possui as suas verdadezinhas

eternas para as operaccedilotildees comerciais Natildeo se vende sem enganar etc ndash ateacute

aos caacutelculos mais complicados do truste do petroacuteleo Seraacute desnecessaacuterio dizer

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

14

que a contabilidade italiana natildeo eacute uma ciecircncia mas um conjunto de

automatismos artesanais Utilizada por um gigantesco truste pode atingir o

niacutevel de uma arte Os processos e automatismos de direccedilatildeo de uma empresa

industrial os seus meacutetodos de aprovisionamento em mateacuterias-primas os

meacutetodos de organizaccedilatildeo taylorista do trabalho os meacutetodos de caacutelculo de preccedilos

etc representam um sistema praacutetico extremamente complexo a que podemos

mesmo chamar doutrina porque eacute um conjunto de automatismos processos

meacutetodos e meios que permitem da melhor maneira pilhar o mercado Muito

evidentemente natildeo se trata de uma ciecircncia Digamos mais simplesmente que a

economia poliacutetica ndash isto eacute uma ciecircncia real ndash estuda as relaccedilotildees internas da

sociedade capitalista e natildeo fornece qualquer receita para enriquecer agrave certa

Cientificamente concebida a histoacuteria militar estuda as caracteriacutesticas

tiacutepicas da organizaccedilatildeo do exeacutercito e da guerra numa eacutepoca determinada em

interdependecircncia com o regime social ndash mas de modo nenhum ensina nem

pode ensinar como edificar a artilharia e como garantir a vitoacuteria

A arte militar do nosso tempo estaacute resumida nos regulamentos Estes

exprimem a essecircncia da experiecircncia passada transformada em moeda utilizaacutevel

para amanhatilde Eacute um conjunto de processos artesanais ou artiacutesticos E do mesmo

modo que o conjunto dos manuais de organizaccedilatildeo das empresas industriais de

caacutelculo de contabilidade e de correspondecircncia comercial natildeo forma uma

ciecircncia do regime capitalista o conjunto das instruccedilotildees das ordens e dos

regulamentos militares natildeo podem tambeacutem formar uma ciecircncia militar

Para nos convencermos de quatildeo grandes satildeo a confusatildeo e a contradiccedilatildeo no

plano dos chamados princiacutepios eternos da atividade militar (que satildeo tambeacutem as

leis da ciecircncia militar) consideremos o livro do maior chefe militar vitorioso da

nossa eacutepoca o marechal Foch ndash Os Princiacutepios da Guerra [9]

Na sua introduccedilatildeo de 1905 apoiando-se nas primeiras informaccedilotildees sobre a

guerra russo-japonesa Foch escreve A ofensiva manobrista vence finalmente

todas as resistecircncias Foch considerava esta ideacuteia uma das verdades eternas da

arte militar opondo-se ndash diga-se de passagem ndash a alguns dos nossos

inovadores que vecircem na estrateacutegia ofensiva de manobra caracteriacutesticas

proacuteprias da guerra revolucionaacuteria Veremos mais tarde que ambos os pontos de

vista satildeo falsos enganam-se tanto Foch que considera a ofensiva manobrista

um princiacutepio eterno como os camaradas que nela descobrem um princiacutepio

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

15

especiacutefico do Exeacutercito Vermelho No seu prefaacutecio agrave primeira ediccedilatildeo Foch cita

com simpatia as palavras de Von der Golz [10] Se eacute verdade que satildeo eternos

os princiacutepios da arte militar os fatores de que essa arte se ocupa com os quais

temos de contar estatildeo submetidos a uma evoluccedilatildeo constante Esses princiacutepios

eternos da arte militar no seu conjunto formam a teoria da guerra E

precisamente a presenccedila dessa teoria que segundo Foch faz da guerra uma

arte Assim podemos afirmar que a teoria da guerra representa o conjunto dos

princiacutepios utilizados no decurso de todas as operaccedilotildees cuja violaccedilatildeo leva ao

falhanccedilo e que deveratildeo ser utilizados em todas as guerras futuras Assim

existem princiacutepios (eternos) que se encontravam na base das operaccedilotildees

militares da guerra de Troacuteia quando os espertinhos dos gregos se esconderam

no interior de um cavalo de madeira que vamos reencontrar na nossa eacutepoca em

que as esquadrilhas de aviotildees descarregam sobre as cidades milhares de

toneladas de explosivos com um poder de destruiccedilatildeo incomparaacutevel ou

substacircncias envenenadas Que satildeo entatildeo eles enquanto princiacutepios

Natildeo se trata de leis anatocircmicas ou psicoloacutegicas E evidente que nestes

planos a mudanccedila natildeo eacute tatildeo radical Um Grego ou um Troiano de coraccedilatildeo

trespassado morria como morrem os nossos soldados O medricas tinha medo

e evitava o combate O comandante arengava os seus combatentes etc A base

fundamental psicofisioloacutegica e anatocircmica do ser humano natildeo mudou laacute muito

Inuacutetil dizer que as leis da natureza satildeo as mesmas Mas mudou radicalmente a

interdependecircncia do ser humano e da natureza O meio artificial que o homem

coletivo estabeleceu entre ele e a natureza ndash instrumentos maacutequinas ndash

desenvolveu-se tanto e tatildeo bem que transformou completamente os processos

de trabalho e sua organizaccedilatildeo bem como as relaccedilotildees sociais Sem duacutevida

nenhuma desde a eacutepoca de Troacuteia os grupos humanos (naccedilotildees e classes)

conservaram sempre esta aspiraccedilatildeo a aniquilar-se a vencerem-se e a

conquistarem-se uns aos outros O meio artificial ou a teacutecnica humana ndash no

sentido mais lato da palavra ndash transformaram a guerra bem como todas as

outras relaccedilotildees humanas E verdade que jaacute na eacutepoca do cerco de Troacuteia natildeo se

atingia essa finalidade apenas com unhas e dentes mas tambeacutem graccedilas a

instrumentos artificiais que o homem colocava entre ele e o adversaacuterio Esta

base mais vasta permanece imutaacutevel Por outras palavras ndash a guerra eacute um

afrontamento hostil entre grupos humanos armados de instrumentos de morte

e de extermiacutenio que tem por finalidade conseguir graccedilas agrave forccedila fiacutesica a

dominaccedilatildeo do grupo inimigo

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

16

Esta definiccedilatildeo restringe a noccedilatildeo de guerra a limites histoacutericos e sociais E

evidente que a indicaccedilatildeo das principais caracteriacutesticas da guerra ndash em primeiro

lugar o afrontamento de grupos humanos em segundo lugar a utilizaccedilatildeo de

instrumentos em terceiro lugar a finalidade que eacute a obtenccedilatildeo duma vantagem

sobre o inimigo ndash natildeo fornece ainda nenhum princiacutepio da arte militar Contudo

esta mesma definiccedilatildeo limita jaacute a eternidade da proacutepria guerra na eacutepoca em

que o homem natildeo tinha ainda aprendido a bater-se com a estaca ou com a

pedra quando natildeo estava ainda organizado em hordas (clatildes ou tribos) ndash natildeo

podia evidentemente falar-se de guerra porque o afrontamento na floresta de

dois dos nossos remotos antepassados quando se atiravam um contra o outro

por causa de uma fecircmea natildeo pode ter nada de comum com a arte militar no

sentido indicado pelos princiacutepios eternos Assim eacute preciso logo de princiacutepio

reduzir a eternidade da arte militar abrindo-lhe uma conta corrente a partir do

momento em que o homem se ergueu solidamente sobre as suas patas traseiras

se armou de um pau e comeccedilou a agir coletivamente tanto no combate como na

economia em destacamentos de estruturas ainda natildeo solidamente

estabelecidas

Von der Golz e Foch depois dele reconhecem que os fatores estudados pela

arte militar mudam (pau espingarda espingarda automaacutetica pistola-

metralhadora metralhadora etc) mas os princiacutepios da arte permanecem ndash se

natildeo eternos pelo menos invariaacuteveis desde que a guerra existe

Em que consistem No prefaacutecio agrave segunda ediccedilatildeo do seu livro Foch parece

dar como princiacutepio fundamental a ofensiva manobrista Na primeira liccedilatildeo

responde desta maneira Haacute pois uma teoria da guerra no primeiro plano ela

comporta os seguintes princiacutepios

ndash Princiacutepio da economia das forccedilas

ndash Princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

ndash Princiacutepio da livre disposiccedilatildeo das forccedilas

ndash Princiacutepio da seguranccedila etc

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

17

Mais adiante para se tranquumlilizar a si proacuteprio Foch apresenta algumas

citaccedilotildees entre as quais estas palavras do marechal Bugeaud Os princiacutepios

absolutos satildeo poucos mas existem [11]

Em que consiste entatildeo o primeiro desses princiacutepios absolutos acerca da

economia das forccedilas Finalidades secundaacuterias e preparatoacuterias e ao mesmo

tempo da guerra aniquilar a forccedila viva do inimigo Mas natildeo se pode fazecirc-lo

sem atacar Para o fazer eacute necessaacuterio concentrar as suas proacuteprias forccedilas Mas

antes de poder atacar eacute indispensaacutevel saber onde o inimigo se encontra evitar

um ataque imprevisto assegurar as comunicaccedilotildees etc Para isso eacute preciso

desdobrar os seus proacuteprios regimentos (reconhecimento vigilacircncia etc) O

princiacutepio da economia de forccedilas consiste em natildeo retirar dos destacamentos

fundamentais mais forccedilas do que as que o cumprimento das tarefas exige

assegurar a possibilidade de dispor desses grupos secundaacuterios no momento

decisivo para poder efetuar um ataque concentrado Assim o princiacutepio eterno

da economia de forccedilas caracteriza apenas segundo Foch a estrateacutegia da

manobra Natildeo eacute aliaacutes nada de surpreendente uma vez que ele apenas aceita

no santo dos santos da arte militar as operaccedilotildees ofensivas manobristas

considerando que as teorias ateacute agora em vigor eram falsas Tomando como

ponto de partida a ofensiva manobrista como uacutenica estrateacutegia Foch prediz que

no decurso da proacutexima guerra as primeiras operaccedilotildees militares seratildeo

decisivasrdquo (paacuteg 10) De acordo com esta opiniatildeo Foch conclui que ela (a

proacutexima guerra) natildeo poderaacute durar muito tempo e que seraacute necessaacuterio fazecirc-la

com uma rude energia para atingir rapidamente a sua finalidade sem o que ela

natildeo teraacute nenhum resultado (paacuteg 38)

Basta de fato citar estas conclusotildees para que os princiacutepios eternos de Foch

pareccedilam bastante lastimaacuteveis a nossos olhos agrave luz dos acontecimentos

ulteriores

Durante a uacuteltima guerra depois das tentativas ofensivas que muito caro

lhe custaram o exeacutercito francecircs passa agrave defesa posicional

ndash os insucessos iniciais natildeo determinaram o resultado da guerra

contrariamente agraves previsotildees de Foch

ndash a guerra durou quatro anos

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

18

ndash no seu conjunto a guerra conservou sempre um caraacuteter posicional que se

estendeu agraves trincheiras

ndash o primeiro periacuteodo de campanha de manobra provou simplesmente a

necessidade de se enterrar na terra

ndash o uacuteltimo periacuteodo de campanha natildeo fez mais do que confirmar o que as

trincheiras jaacute tinham provado o esgotamento das forccedilas de resistecircncia da

Alemanha

Esta experiecircncia tecircm poreacutem um certo valor Se como diz Foch as teorias

que dominavam ateacute 1883 na escola militar francesa eram falsas e se a luz dos

verdadeiros princiacutepios jorrou no fim do seacuteculo passado ndash os acontecimentos

provaram no entanto alguns anos depois da publicaccedilatildeo do livro que a guerra

se tinha travado em total contradiccedilatildeo com as conclusotildees que Foch tinha

deduzido desses princiacutepios eternos

Pode evidentemente afirmar-se que Foch se enganou simplesmente por

natildeo ter sabido tirar as conclusotildees necessaacuterias de princiacutepios fundamentalmente

justos Mas na realidade se abstrairmos do princiacutepio eterno da economia de

forccedilas natildeo resta muito de tudo isso Na ideacuteia de Foch ndash que utiliza aqui em

grande parte a experiecircncia napoleocircnica ndash eacute preciso antes de tudo encontrar o

inimigo e proteger-se a si proacuteprio colocando agrave frente atraacutes e no flanco um

certo nuacutemero de destacamentos de defesa e de reconhecimento em seguida

depois de determinada a principal linha de forccedila englobar todas as forccedilas na

unidade duma accedilatildeo ofensiva fulminante De fato o princiacutepio da economia de

forccedilas natildeo tem nada a ver com isto Tudo se resume ao esquema da manobra

ofensiva napoleocircnica ao passo que todas as consideraccedilotildees secundaacuterias satildeo

submetidas ao momento da concentraccedilatildeo para dar o golpe decisivo

Assim o princiacutepio da economia das forccedilas consiste numa distribuiccedilatildeo

racional das forccedilas fundamentais e dos destacamentos secundaacuterios

conservando ao mesmo tempo a possibilidade de utilizar estes uacuteltimos para

aniquilar as forccedilas vivas do inimigo Todavia o proacuteprio Foch daacute outra

interpretaccedilatildeo mais concreta e particular da economia de forccedilas baseando-se

numa discussatildeo muito conhecida entre Bonaparte e Moreaul [12] No seu

regresso do Egito Bonaparte explicou a Moreau como tinha assegurado a sua

vantagem apesar duma menor forccedila numeacuterica lanccedilou primeiro todas as forccedilas

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

19

contra um flanco e utilizou em seguida a confusatildeo provocada para lanccedilar o

conjunto das suas forccedilas contra o outro flanco Seraacute que isto significa que o

princiacutepio da derrota sucessiva dos flancos decorre do teorema (como diz Foch)

da economia de forccedilas Evidentemente que natildeo Estamos aqui perante o caso

particular duma operaccedilatildeo bem sucedida que se caracteriza por uma seacuterie de

elementos importantes a forccedila numeacuterica o armamento o estado de espiacuterito a

situaccedilatildeo o comando etc Em condiccedilotildees concretas Napoleatildeo escolheu uma das

soluccedilotildees possiacuteveis para resolver o seu problema O ecircxito provou que Napoleatildeo

soube utilizar as suas forccedilas no caso particular ou se preferirem que as utilizou

economicamente ou que utilizou o princiacutepio da economia de forccedilas E eacute tudo

Mas nesta interpretaccedilatildeo o princiacutepio da economia de forccedilas eacute simplesmente

uma outra designaccedilatildeo do princiacutepio da racionalidade Este princiacutepio aconselha

Age de maneira refletida sem perder forccedilas inutilmente Eacute um pouco no estilo

dos princiacutepios de Kouzma Proutkov [13] Se natildeo percebo nada de atividade

militar este princiacutepio natildeo me ensinaraacute nada de novo Quando uma lei

matemaacutetica enuncia que o quadrado da hipotenusa eacute igual agrave soma do quadrado

dos catetos com esta ideacuteia eu vou ao encontro de todo o fenocircmeno adequado e

posso aplicar praticamente esse teorema Mas se conhecer apenas o princiacutepio

da economia de forccedilas que posso fazer dele Natildeo passa de um sinal

mnemoteacutecnico que apenas podemos utilizar se possuirmos jaacute os conhecimentos

e automatismos praacuteticos correspondentes A instantaneidade a economia de

forccedilas a liberdade de accedilatildeo a iniciativa etc natildeo passam com efeito de sinais

mnemoteacutecnicos para aquele que eacute versado em assuntos militares Os sinais

distintivos da corporaccedilatildeo dos maccedilons transformaram-se em sinais franco-

maccedilocircnicos De igual modo a experiecircncia acumulada no domiacutenio militar tem

um certo nuacutemero de nomes simboacutelicos e convencionais eacute isto e mais nada

Foch prova o caraacuteter absoluto ou eterno do princiacutepio da liberdade de accedilatildeo

por esta citaccedilatildeo de Xenofonte [14] A arte militar consiste na habilidade de

preservar a liberdade de accedilatildeo Mas qual eacute o conteuacutedo dessa liberdade Antes de

mais eacute preciso preservar a nossa liberdade de iniciativa em relaccedilatildeo ao inimigo

isto eacute natildeo lhe dar a possibilidade de atar a nossa vontade Dito de modo tatildeo

geral isto eacute absolutamente incontestaacutevel Mas serve tambeacutem para a esgrima o

xadrez para todo o tipo de desportos que implicam dois parceiros ndash e

finalmente para os debates parlamentares ou judiciaacuterios

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Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

20

Mais adiante Foch apresenta outra interpretaccedilatildeo deste mesmo princiacutepio

Soacute o comandante-chefe conserva a sua liberdade de accedilatildeo Os outros

comandantes natildeo satildeo livres pois agem em funccedilatildeo de tarefas impostas Por

conseguinte a sua vontade eacute restringida natildeo soacute pela situaccedilatildeo material mas

tambeacutem por instruccedilotildees formais Poreacutem a economia de forccedilas ou o bom senso

ou a racionalidade ndash chamem-lhe o que quiserem ndash exigem que os limites

impostos pelo alto comando aos comandos subalternos natildeo sejam demasiado

estreitos por outras palavras ndash eacute preciso indicar claramente a finalidade

deixando aos comandantes subalternos uma liberdade maacutexima na escolha dos

meios para a execuccedilatildeo da tarefa fixada Formulado de maneira tatildeo geral este

princiacutepio eacute tambeacutem totalmente incontestaacutevel A dificuldade consiste poreacutem em

encontrar ao dar a ordem a definiccedilatildeo da finalidade que natildeo seja uma tutela

inuacutetil na escolha dos meios Em si proacuteprio este teorema natildeo oferece nenhuma

soluccedilatildeo jaacute pronta No melhor dos casos contenta-se com recordar que o

comandante deve encontrar uma soluccedilatildeo qualquer para este problema

Aleacutem disso eacute absolutamente evidente que Foch daacute uma dupla interpretaccedilatildeo

ao princiacutepio da liberdade de accedilatildeo por um lado eacute o grau de iniciativa militar que

garante a independecircncia indispensaacutevel em relaccedilatildeo agrave vontade do inimigo e por

outro lado eacute uma liberdade de manobra suficientemente grande para o

comando subalterno dentro dos limites das finalidades e objetivos designados

pelo alto comando

Todavia nem uma nem outra destas interpretaccedilotildees podem em caso

nenhum ser chamadas teorema mesmo no sentido mais lato do termo Em

matemaacutetica entende-se por teorema uma relaccedilatildeo de grandezas variaacuteveis que

permanece a mesma apesar de todas as mudanccedilas quantitativas destas uacuteltimas

por outras palavras quaisquer que sejam os valores aritmeacuteticos que se decirc agraves

grandezas algeacutebricas a igualdade permanece Que significa quanto a ele o

princiacutepio da economia de forccedilas ou da liberdade de accedilatildeo tratar-se-aacute realmente

dum teorema que permita tirar conclusotildees praacuteticas justas utilizando valores

concretos De modo nenhum Se tentarmos dar a este princiacutepio uma

importacircncia realmente absoluta isto eacute transformaacute-lo em teorema dele sai

apenas vento no gecircnero de eacute preciso utilizar racionalmente todas as forccedilas eacute

preciso conservar a iniciativa das operaccedilotildees eacute preciso dar ordens racionais e

realizaacuteveis e por conseguinte natildeo incluir nelas condiccedilotildees inuacuteteis etc Sob esta

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

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histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

21

forma natildeo satildeo jaacute princiacutepios militares mas axiomas de toda a atividade humana

em geral

Na realidade os teoacutericos militares datildeo uma interpretaccedilatildeo mais concreta

desses princiacutepios isto eacute subentendem (abertamente ou natildeo) regimentos corpos

e exeacutercitos estruturados e armados de certa maneira agindo em funccedilatildeo de

numerosos regulamentos e instruccedilotildees que resumem por sua vez as

experiecircncias do passado Sob esta forma os princiacutepios eternos natildeo tecircm em si

proacuteprios nada de eterno e nada tecircm a ver com teoremas satildeo apenas os sinais

convencionais de certos processos de automatismos empiacutericos e de

experiecircncias positivas ou negativas De fato nenhum teoacuterico militar consegue

sair dos limites da seguinte contradiccedilatildeo para provarem a eternidade dos

princiacutepios da arte militar excluem toda a experiecircncia histoacuterica viva e reduzem-

nos a pleonasmos a lugares comuns aos postulados de Euclides ou aos axiomas

loacutegicos Para provarem por outro lado a importacircncia desses princiacutepios no

plano militar inserem neles o conteuacutedo duma eacutepoca determinada duma certa

etapa da evoluccedilatildeo do exeacutercito conseguindo assim dar-lhes o caraacuteter uacutetil e

praacutetico de auxiliares de memoacuteria Natildeo se trata de generalizaccedilotildees cientiacuteficas mas

de diretivas praacuteticas natildeo satildeo teoremas mas regulamentos Natildeo satildeo eternos

mas temporaacuterios A sua importacircncia eacute tanto maior quanto menos absolutos satildeo

isto eacute quanto mais concreto eacute o seu conteuacutedo em funccedilatildeo do periacuteodo

determinado vivo das particularidades de organizaccedilatildeo e da teacutecnica deste Natildeo

satildeo absolutos mas convencionais Natildeo tecircm nada a ver com a ciecircncia satildeo

instruccedilotildees praacuteticas para uma arte Eacute falsa a afirmaccedilatildeo de Frederico II A guerra

eacute uma ciecircncia para os gecircnios uma arte para o homem meacutedio e uma profissatildeo

para o ignorante Natildeo haacute nem pode haver ciecircncia da guerra no sentido mais

estrito da termo Haacute uma arte da guerra Aliaacutes uma profissatildeo supotildee uma

aprendizagem e aquele que fez uma aprendizagem deixou de ser um ignorante

Seria mais justo dizer que a guerra eacute uma profissatildeo para o homem meacutedio e uma

arte para o gecircnio Quanto ao ignorante eacute apenas a mateacuteria-prima da guerra a

carne para canhatildeo e de modo algum eacute um profissional

Como pudemos ver natildeo foi feliz a tentativa de eternizar os princiacutepios

napoleocircnicos Provou-o a guerra imperialista Natildeo podia ser de outra maneira ndash

que mais natildeo fosse porque as guerras da revoluccedilatildeo e mesmo as guerras

napoleocircnicas que dela resultaram caracterizavam-se pela imensa vantagem

moral e poliacutetica do povo francecircs revolucionaacuterio e do seu exeacutercito em relaccedilatildeo a

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

22

todos os outros povos da Europa Os Franceses atacavam em nome duma ideacuteia

nova ligada aos interesses vitais das massas populares Os exeacutercitos inimigos

defendiam pouco convictamente algo de antigo Durante a uacuteltima guerra

imperialista nenhuma das duas partes era portadora dum novo princiacutepio

encarnado por uma nova classe revolucionaacuteria A guerra tinha de ambos os

lados um caraacuteter imperialista Mas ao mesmo tempo ameaccedilava em igual

medida a existecircncia das duas partes nomeadamente da Franccedila e da Alemanha

O golpe fulminante que teria provocado a imediata desmoralizaccedilatildeo e baixa do

moral no outro campo natildeo foi nem podia ser bem sucedido devido agrave grande

forccedila material e humana dos dois campos que gradualmente punham em jogo

todas as suas forccedilas e todos os seus meios Por isso eacute que contrariamente agraves

previsotildees de Foch as primeiras operaccedilotildees natildeo determinaram em nada o

resultado da guerra Por isso cada ofensiva se quebrava contra outra ofensiva e

os exeacutercitos sustentados pelas retaguardas se enterravam Foi tambeacutem por isso

que a guerra durou tanto tempo ndash ateacute ao esgotamento dos recursos materiais e

morais de uma das partes Assim a guerra imperialista travou-se do iniacutecio ao

fim em contradiccedilatildeo com o princiacutepio eterno da manobra ofensiva decretado

por Foch Esta circunstacircncia eacute ainda sublinhada pelo fato de que Foch venceu

contra os seus proacuteprios princiacutepios Para o explicar eacute preciso lembrar que se os

princiacutepios de Foch jogavam contra ele ele tinha aliaacutes a seu favor os soldados

ingleses e americanos e principalmente as municcedilotildees os tanques e os aviotildees

anglo-americanos

Podemos eacute claro pretender que o princiacutepio da economia de forccedilas

conserva toda a sua importacircncia na guerra de posiccedilatildeo pois tambeacutem nesta eacute

preciso ter uma reparticcedilatildeo judiciosa das forccedilas entre as unidades de primeira

linha e as diferentes unidades de reserva Eacute absolutamente indiscutiacutevel Mas

nesta interpretaccedilatildeo muito geral natildeo resta nem um vestiacutegio do esquema de

reparticcedilatildeo das forccedilas com vista a uma concentraccedilatildeo para um golpe fulminante

O princiacutepio eterno dissolve-se em lugar comum Quer a guerra seja de posiccedilatildeo

defensiva de manobra ou ofensiva eacute sempre necessaacuterio ter uma reparticcedilatildeo

racional e econocircmica das forccedilas em funccedilatildeo do objetivo a atingir Eacute

absolutamente evidente que esse princiacutepio eterno eacute tatildeo vaacutelido para a guerra

como para a induacutestria e o comeacutercio Eacute sempre preciso utilizar economicamente

as forccedilas por outras palavras obter os maacuteximos resultados com um miacutenimo de

energia Toda a evoluccedilatildeo humana estaacute baseada nesse princiacutepio eterno

nomeadamente a teacutecnica foi precisamente por isso que o homem comeccedilou a

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

23

utilizar o machado de pedra e o pau para obter maiores resultados agrave custa dum

menor esforccedilo Foi por isso que ele passou do pau agrave picareta e agrave espada depois agrave

espingarda e agrave baioneta mais tarde ao canhatildeo etc Pela mesma razatildeo passa

hoje agrave charrua eleacutetrica O princiacutepio eterno da guerra reduz-se pois ao

princiacutepio motor de toda a evoluccedilatildeo humana Quanto agrave interpretaccedilatildeo concreta

do princiacutepio da economia de forccedilas apresentada por Foch eacute apenas uma

tentativa mal sucedida de conferir um caraacuteter absoluto a uma manobra

napoleocircnica ofensiva para dar um golpe decisivo

Assim pois na medida em que eacute eterno o princiacutepio da economia de

forccedilas nada tem de militar E na medida em que eacute interpretado militarmente

nada tem de eterno

Mas porque eacute que se fala entatildeo com tanta insistecircncia de princiacutepios

eternos Porque como jaacute dissemos na base existe o homem As qualidades do

homem mudam pouco As suas qualidades anatocircmicas fisioloacutegicas e

psicoloacutegicas mudam muito lentamente em comparaccedilatildeo com as mudanccedilas das

formas sociais A relaccedilatildeo dos peacutes e das matildeos do homem bem como a estrutura

da sua cabeccedila satildeo sensivelmente as mesmas na nossa eacutepoca e na eacutepoca de

Aristoacuteteles [15] Sabemos que Marx lia com prazer Aristoacuteteles E se fosse

possiacutevel propor a Aristoacuteteles regressado agrave nossa eacutepoca a leitura dos livros de

Marx sem duacutevida que ele os compreenderia perfeitamente

A base anatocircmica e psicofiacutesica do homem eacute incomparavelmente mais

estaacutevel do que as formas soacuteciais Haacute dois aspectos que podemos reter a este

respeito para o domiacutenio militar o princiacutepio individual que se exprime por

certos automatismos e processos em grande parte determinados pela natureza

bioloacutegica do homem natildeo eterna mas estaacutevel o segundo histoacuterico-coletivo

dependente da organizaccedilatildeo social do combatente E justamente este aspecto

que acarreta a decisatildeo porque a guerra comeccedila onde o homem socialmente

organizado e armado se bate contra um outro homem socialmente organizado e

armado se natildeo fosse assim seria um combate de animais

O camarada Loukirsky equacionou o problema da seguinte maneira existe

por um lado a experiecircncia a observaccedilatildeo empiacuterica um meacutetodo imperfeito por

outro lado existe a razatildeo pura que por deduccedilatildeo e por processos loacutegicos tira

conclusotildees absolutas e assim enriquece o domiacutenio militar Enquanto

materialista estou habituado a considerar a razatildeo como um oacutergatildeo do homem

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

24

histoacuterico no processo da sua adaptaccedilatildeo agrave natureza Natildeo posso opor a razatildeo agrave

mateacuteria natildeo estou de acordo em pensar que a razatildeo possa fazer nascer por si

mesma aquilo que a experiecircncia material previamente natildeo criou A nossa razatildeo

coordena e combina apenas as conclusotildees da nossa praacutetica o homem natildeo pode

extrair da razatildeo pura algo de novo que natildeo seja alimentado pela experiecircncia

Claro que a experiecircncia natildeo se acumula mecanicamente damos-lhe um

bocado de ordem uma ordem que corresponde agrave dos proacuteprios fenocircmenos e que

leva ao conhecimento das leis desses fenocircmenos Mas pensar que a razatildeo pode

dar arbitrariamente origem a uma conclusatildeo que natildeo eacute preparada e baseada na

experiecircncia ndash eacute absolutamente falso E uma vez que o eacute natildeo pode haver duas

espeacutecies de princiacutepios ndash os praacuteticos e os eternos

Dito isto permitam que conclua

Jaacute discutimos acerca da doutrina militar hoje atingimos os uacuteltimos

cumes filosoacuteficos Desccedilamos de novo agora ao estudo praacutetico Tiacutenhamos

pensado num Manual para o Comandante de Companhia mas de momento natildeo

estaacute ainda feito O que seraacute mais difiacutecil escrever ndash teses abstratas ou um manual

para o comandante de companhia Este uacuteltimo eacute cem vezes mais difiacutecil mas eacute

mil vezes mais uacutetil Aproveito a presenccedila nesta reuniatildeo de muitas pessoas

competentes para reiterar a minha proposta demos as instruccedilotildees gerais para o

comandante de companhia criemos o nosso pequeno livro exemplar A ciecircncia

de vencer Seria uma escola maravilhosa para todos noacutes ndash expor a nossa

experiecircncia militar em regras claras e niacutetidas a fim de que o comandante de

companhia possa natildeo soacute lecirc-las com proveito mas ainda apreendecirc-las

Com os mesmos tijolos pode construir-se uma faacutebrica uma casa ou um

templo Eacute apenas preciso que os tijolos sejam feitos de material bom e que

estejam bem cozidos Podem-se repetir e utilizar os mesmos regulamentos com

os mesmos automatismos e os mesmos dados para as mais diversas tarefas

estrateacutegicas e taacutecticas eacute apenas necessaacuterio que a ceacutelula fundamental ndash a

Companhia ndash seja soacutelida e flexiacutevel A tarefa de todas as tarefas eacute atualmente

educar esse comandante de companhia Educar um comandante de companhia

proletaacuterio natildeo significa de modo algum repetir-lhe continuamente que ateacute

agora havia a taacutectica burguesa que doravante haveraacute a taacutectica proletaacuteria Natildeo

esse tipo de ensino desorientaacute-lo-ia Criar um comandante de companhia

proletaacuterio significa ajudar o nosso atual comandante de companhia a assimilar

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

25

pelo menos a soma de conhecimentos e de automatismos que hoje possui o

chefe de secccedilatildeo dos exeacutercitos burgueses para os utilizar conscientemente no

interesse da classe operaacuteria

Notas

[1] Discurso Pronunciado na Reuniatildeo da Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar

Adjunta a Academia Militar do Exeacutercito Vermelho Operaacuterio e Camponecircs ndash O

estenograma deste discurso estava muito incompleto Foi difiacutecil retificaacute-lo

Encontrei nos meus velhos papeacuteis bastantes notas para um artigo inacabado

sobre o mesmo assunto a ciecircncia militar as leis eternas o marxismo etc Esse

artigo inacabado e ineacutedito foi comeccedilado pouco tempo depois da reuniatildeo da

Associaccedilatildeo Cientiacutefica-Militar em que pronunciei o presente discurso Utilizei as

minhas velhas notas para substituir as passagens pouco claras do estenograma

O discurso melhorou um pouco com isso e penso que pode ser publicado sob

esta forma (voltar ao texto)

[1] Tratam-se dos artigos A Propoacutesito de uma Paixatildeo Teoacuterica e Acerca do

Artigo de Kvanine publicados na revista Exeacutercito Vermelho No 12 Marccedilo de

1922 (voltar ao texto)

[2] Ogorodnikov ndash oficial que combatera na guerra contra a Polocircnia Autor

de O Exeacutercito Vermelho na Guerra Contra a Polocircnia A Revoluccedilatildeo e a Guerra

Nordm 6 e 7 (voltar ao texto)

[3] Snessarev ndash antigo oficial de cossacos nomeado em 1918 chefe do

Distrito Militar do Caacuteucaso do Norte chamado a Moscoso em Julho de 1918 por

incapacidade (voltar ao texto)

[4] A palavra russa original obigravenaoutchennoie eacute intraduziacutevel em francecircs a

sua raiz eacute naouka ndash ciecircncia a junccedilatildeo de um sufixo e de um prefixo originou uma

palavra nova A rigidez do francecircs natildeo se presta a tais experiecircncias bastante

correntes no russo sendo a palavra receacutem-criada imediatamente compreensiacutevel

para todos (Nota do tradutor francecircs) (voltar ao texto)

[5] Dupla contabilidade italiana ndash A contabilidade dupla nasceu nas

empresas comerciais italianas no Seacutec XVI Consiste em completar o extrato das

entradas e saiacutedas de valores monetaacuterios com o extrato da sua afetaccedilatildeo agrave entrada

26

como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

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como agrave saiacuteda O simples balanccedilo de contas eacute assim acompanhado duma visatildeo de

conjunto das operaccedilotildees agraves quais as contas correspondem (voltar ao texto)

[6] Oblomov llia llitch ndash personagem do romance de Ivan A Goutchanov

Oblomov siacutembolo da negligecircncia praacutetica combinada com os projetos

imaginaacuterios (voltar ao texto)

[7] Aniacutebal (247-183 AC) ndash General de Cartago combateu Roma sem

treacuteguas Atravessou a Espanha e os Alpes e bateu os Romanos em Cannes e

Caacutepua depois teve de regressar a Cartago para defendecirc-la contra CipiSo que o

venceu em Zama Suicidou-se por envenenamento (voltar ao texto)

[8] Gogol Nicolau (18O9-1852) ndash Romancista e poeta satiacuterico russo autor

das Almas Mortas e de O Revisor cuja influecircncia sobre a literatura russa foi

imensa (voltar ao texto)

[9] Dos princiacutepios da Guerra Conferecircncias realizadas em 1900 na

Escola Superior de Guerra pelo tenente-coronel de artilharia Foch publicado

em Paris Berger-Levrault em 1903 A segunda ediccedilatildeo citada por Trotsky eacute de

1905 A terceira eacute de 1911 e a quarta de 1917 (voltar ao texto)

[10] Golz Baratildeo Colmar Von der ndash General e escritor militar alematildeo

comandou duas divisotildees na guerra franco-prussiana de 187O Foi em seguida

membro do Alto Estado-Maior Autor de obras traduzidas em francecircs La nation

armeacutee (em 1889) Rosbach et leacutena (em 189O) Gambetta et ses armeacutees (em

1877) (voltar ao texto)

[11] Bugeaud Thomas (1784-1849) ndash Tendo entrado em 1804 na Guarda

Imperial participa nas batalhas de Ulm Austerlitz leacutena Putulsk Foi assim

mandado para a guerra de Espanha em 1808 como tenente Coronel no

momento da queda de Napoleatildeo retira-se para o Peacuterigord e dedica-se a

experiecircncias agriacutecolas Em 1831 reintegrado em diversas missotildees

(nomeadamente de repressatildeo anti-operaacuteria em 1834) eacute nomeado em 1836 para

chefiar as tropas da Argeacutelia onde consegue destruir as forccedilas de Abd-el-Kader

Nomeado governador em 1841 dedicou-se agrave pacificaccedilatildeo do paiacutes pela forccedila e

pela colonizaccedilatildeo militar Feito marechal de Franccedila em 1847 demite-se desse

posto Em Junho de 1848 chefia em Paris a luta contra a revolta republicana e

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operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho

27

operaacuteria Luiacutes-Napoleatildeo Bonaparte nomeou-o Comandante do Exeacutercito dos

Alpes Morto viacutetima da coacutelera em 1848 (voltar ao texto)

[12] Moreau Jean-Victor (1763-1813) ndash General comandante do Exeacutercito

do Reno em 1796 e em Itaacutelia Rival de Bonaparte exilado regressou da

Ameacuterica para combater Napoleatildeo Morto na batalha de Dresde (voltar ao texto)

[13] Proutkov Kouzma ndash Personagem inventada por Alexis

Constantinovitch Tolstoi (1817-1875) e dois amigos para simbolizar o ingeacutenuo

russo Publicaram em conjunto vaacuterios escritos sob o nome deste personagem

(voltar ao texto)

[14] Xenofonte ndash Ateniense disciacutepulo de Soacutecrates (Seacutec V AC) implicado

na luta contra os Persas com Ciro e Esparta Autor de Anaacutebase (ou retirada dos

dez mil) depois da morte de Ciro de Tratados de Caccedila e Cavalaria bem como

de uma Econocircmica (voltar ao texto)

[15] Aristoacuteteles (384-322 AC) ndash Filoacutesofo grego aluno e depois adversaacuterio

de Platatildeo Preceptor de Alexandre o Grande Um dos maiores espiacuteritos que

jamais existiram autor de muitos tratados que forneceram os alicerces do

pensamento ocidental Organon (loacutegica e meacutetodo) Metafiacutesica Fiacutesica Poliacutetica

Econocircmica Eacutetica (voltar ao texto)

[1N] Plekhanov (1856-1918) ndash passou 40 anos de sua vida no exiacutelio

introduziu o marxismo na Ruacutessia

[2N] Ouspenski ndash (1843-1902) Escritor russo ceacutelebre por uma recolha de

novelas ldquoOs costumes da rua da desordemrdquo Representante do populismo em

literatura

[3N] VP Polonsky ndash diretor da editora do Exeacutercito Vermelho