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RSP Revista do Serviço Público o vol. 64, n 2 - Abr/Jun 2013 - ISSN:0034/9240 ENAP Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões Bernardo Alves Furtado O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo e Antoine Metten Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análise baseada nas contribuições de Kaldor Joanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro e Paula Felix Ferreira Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com o grupo de planejamento organizacional Flávia de Araújo e Silva, Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff RSP Revisitada: O sistema de exame para o serviço público e sua influência na civilização chinesa Paul F. Cressy

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RSP Revista do Serviço Públicoo

vo l . 64 , n 2 - Abr /Jun 2013 - ISSN:0034/9240

ENAPENAP

Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

Bernardo Alves Furtado

O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo e Antoine Metten

Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análise baseada nas contribuições de Kaldor

Joanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro e Paula Felix Ferreira

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com o grupo de

planejamento organizacionalFlávia de Araújo e Silva,

Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff

RSP Revisitada: O sistema de exame para o serviço público e sua influência na civilização chinesa

Paul F. Cressy

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RSP

ENAP Escola Nacional de Administração Pública

Brasília – 2013

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Missão da Revista do Serviço PúblicoDisseminar conhecimento sobre a gestão de

políticas públicas, estimular a reflexão e o

debate e promover o desenvolvimento de

servidores e sua interação com a cidadania.

ENAP Escola Nacional de Administração PúblicaPresidente: Paulo Sergio de CarvalhoDiretora de Formação Profissional: Maria Stela ReisDiretor de Desenvolvimento Gerencial: Paulo MarquesDiretor de Comunicação e Pesquisa: Pedro Luiz CostaCavalcanteDiretora de Gestão Interna: Aíla Vanessa de OliveiraCançado

Conselho EditorialAna Lúcia Aguiar Melo, Barbara Freitag-Rouanet,Fernando Luiz Abrucio, Helena Kerr do Amaral, HélioZylberstajn, Luiz Henrique Proença Soares, MarcelBursztyn, Marco Aurelio Garcia, Marcus André Melo,Maria Paula Dallari Bucci, Maria Rita G. LoureiroDurand, Nelson Machado, Paulo Motta, ReynaldoFernandes, Silvio Lemos Meira, Sônia Miriam Draibe,Tarso Fernando Herz Genro, Vicente Carlos Y PláTrevas, Zairo B. Cheibub.

PeriodicidadeA Revista do Serviço Público é uma publicaçãotrimestral da Escola Nacional de AdministraçãoPública.

Comissão EditorialPedro Luiz Costa Cavalcante, Aíla Vanessa deOliveira Cançado, Marizaura Reis de Souza Camões,Luis Fernando de Lara Resende, Claudia CristinaMuller, Ciro Campos Christo Fernandes, CarmenIsabel Gatto, Márcia Seroa da Motta Brandão eEmanuella Faria de Santana.

ExpedienteEditor responsável: Pedro Luiz Costa Cavalcante. Editoraadjunta: Marizaura Reis de Souza Camões. Editoraexecutiva: Márcia Knop. Colaboradores: João Tomacheski.Revisão: Renata Fernandes Mourão, Roberto Carlos R.Araújo e Simonne Maria de Amorim Fernandes. Projetográfico: Livino Silva Neto. Revisão gráfica: Ana CarlaGualberto Cardoso. Fotos: Alice Prina e Vinícius A.Loureiro. Editoração eletrônica: Maria Marta da R.Vasconcelos.

© ENAP, 2013Tiragem: 1.000 exemplaresAssinatura anual: R$ 40,00 (quatro números)Exemplar avulso: R$ 12,00Os números da RSP Revista do Serviço Público anterioresestão disponíveis na íntegra no sítio da ENAP:www.enap.gov.br

As opiniões expressas nos artigos aqui publicados sãode inteira responsabilidade de seus autores e nãoexpressam, necessariamente, as da RSP.

A reprodução total ou parcial é permitida desde quecitada a fonte.

Revista do Serviço Público. 1937 - . Brasília: ENAP, 1937 - .

v. : il.

ISSN:0034/9240

Editada pelo DASP em nov. de 1937 e publicada no Rio de Janeiro até 1959. A periodicidade varia desde o primeiro ano de circulação, sendo que a partir dos últimosanos teve predominância trimestral (1998/2007). Interrompida no período de 1975/1980 e 1990/1993.

1. Administração Pública – Periódicos. I. Escola Nacional de Administração Pública.CDD: 350.005

Fundação Escola Nacional de Administração PúblicaSAIS – Área 2-A70610-900 – Brasília, DFTelefone: (61) 2020 3096/3092 – Fax: (61) 2020 [email protected]

ENAP

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SumárioContents

Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializadospara a década de 2000 no Brasil e regiõesFamilies vulnerability index: spatialized results to the 2000s inBrazil and regions 147Bernardo Alves Furtado

O complexo produtivo da saúde e sua articulação com odesenvolvimento socioeconômico nacionalHealth Industrial Complex and national economic and social development 177Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado,Marcelo Santo e Antoine Metten

Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análisebaseada nas contribuições de KaldorBrazilian Economic Policy and the recent world crisis: an analysisbased on the contributions of Kaldor 201Joanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro e Paula Felix Ferreira

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: umaexperiência do Governo do Estado de São Paulo, BrasilThe principles of a virtual learning community: an experience ofthe Department of Public Administration of the State of São Paulo, Brazil 223Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

Redes organizacionais no contexto da governança pública: aexperiência dos Tribunais de Contas do Brasil com o grupo deplanejamento organizacionalNetwork organizations in the public sector: the case of the BrazilianAudit Courts and the Organizational Planning Group 249Flávia de Araújo e Silva, Túlio César Pereira Machado Martins eIvan Beck Ckagnazaroff

RSP Revisitada: O sistema de exame para o serviço público e suainfluência na civilização chinesa 273Paul F. Cressy

Para saber mais 277

Acontece na ENAP 279

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RSP

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EditorialCaro(a) leitor(a),

Mais uma vez a Revista do Serviço Público (RSP) apresenta artigos comdiversos temas atuais na área de administração pública. Os trabalhos deste núme-ro versam sobre: a vulnerabilidade das famílias brasileiras, o complexo produtivoda saúde, a política econômica nacional, a capacitação on-line para servidorespúblicos e as organizações em rede.

O artigo de abertura da Revista – Índice de vulnerabilidade das famílias: resul-tados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões – apresenta a situaçãode vulnerabilidade das famílias brasileiras a partir das respostas aos censosdemográficos de 2000 e 2010. Os resultados indicam que a vulnerabilidade dasfamílias brasileiras no período recuou em média 20%. Esse comportamento,todavia, é heterogêneo entre as dimensões analisadas, seus indicadores, as regiõese Estados do País. A contribuição do texto é, em grande parte, a identificaçãodessa heterogeneidade.

Aprofundar o conhecimento sobre o complexo econômico-industrial dasaúde (CEIS) e a dinâmica de seus subsistemas é o objetivo do artigo O complexoprodutivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional. Otrabalho identifica os principais desafios desse complexo no Brasil e chama aatenção para a importância de um olhar sistêmico sobre a saúde, relacionandoas dimensões econômica e social.

Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análise baseada nascontribuições de Kaldor é o terceiro artigo deste número. O trabalho avalia osresultados macroeconômicos recentes da economia brasileira por meio de uminstrumental analítico baseado em uma extensão geométrica e algébrica do artigoseminal de Kaldor (1971), que levou à criação do quadrado mágico. A abor-dagem adotada permite a comparação do desempenho pré-crise (2007-2008) edurante a crise (2009-2010). Entre outros aspectos, o artigo ressalta que éimportante ver a economia brasileira também do ponto de vista da qualidade devida e da sustentabilidade do processo de inclusão social.

A experiência de criação de uma comunidade virtual de aprendizagem noGoverno do Estado de São Paulo é apresentada no artigo Os suportes de umacomunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo,Brasil. A comunidade virtual de aprendizagem (CVA) foi utilizada como recurso

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para capacitação on-line de servidores públicos. Segundo os autores, um doselementos fundamentais dos setores público e privado está no domínio de sabertrabalhar em comunidades. As interações sociais virtuais têm a capacidade deconstruir, por meio do compartilhamento das informações e das experiênciasde seus membros, soluções inovadoras para a sociedade.

O quinto artigo buscou analisar as possibilidades de atuação integrada doGrupo de Planejamento Organizacional sob a perspectiva de organizações emrede. O grupo é formado por integrantes das áreas de Planejamento dos Tribunaisde Contas do Brasil, com objetivo de discussão da temática planejamento estra-tégico. Os autores concluíram que a atuação conjunta apresentou muitosbenefícios, uma vez que os resultados alcançados vão desde o aprimoramentodos procedimentos de gestão até a economia gerada ao erário.

O texto resgatado na seção RSP Revisitada – O sistema de exame para oserviço público e sua influência na civilização chinesa – trata da influência da sociedadechinesa no desenvolvimento do sistema de exame para ingresso no serviçopúblico. Esse modelo de seleção foi utilizado durante vários séculos na China,com alguns curtos períodos de descontinuidade. Conforme o modelo, os exameseram desenvolvidos para medir o conhecimento teórico, pois se entendia que aexperiência prática era adquirida durante o exercício profissional. O conheci-mento teórico e experiência prática são elementos até hoje discutidos quandose questiona a elaboração de processos seletivos para admissão no serviçopúblico.

Tenha uma boa leitura,

Paulo Sergio de CarvalhoPresidente da ENAP

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147Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Bernardo Alves Furtado

Índice de vulnerabilidadedas famílias: resultados

espacializados para a décadade 2000 no Brasil e regiões

Bernardo Alves Furtado

Introdução e literatura

A percepção corrente é a de que o Brasil se modificou substancialmente e

estruturalmente ao longo dos anos 2000 em vários aspectos1. De fato, os dados

do Censo 2010 comprovam essa percepção de mudança e confirmam a melhoria

média da qualidade de vida dos cidadãos em dimensões variadas.

Entretanto, essa redução da vulnerabilidade das famílias ocorre de forma

heterogênea e desigual entre as dimensões de análise e, especialmente, entre as

regiões do País, seus Estados, seus Municípios e, até, entre porções do território

municipal.

Essa riqueza de descrição das alterações sociais no período só é possível

porque os dados fornecidos decenalmente pelos censos permitem a identifi-

cação espacial em grande escala, com resultados construídos a partir do âmbito

familiar. Assim, o censo permite que se estimem indicadores temáticos, espacial-

mente detalhados, baseados nas respostas aos microdados da amostra.

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148 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

O presente texto – baseado na literatu-ra teórica e metodológica recente (BARROS,FOGUEL E ULYSSEA, 2007; SOARES, 2008,2009) e com intuito precípuo de atualizaçãodos dados com as novas informaçõesdisponíveis – objetiva contribuir com aleitura imediata, por parte de gestorespúblicos, pesquisadores e o público em geral,das informações subjacentes às respostas acentenas de perguntas feitas a milhares defamílias nos anos de 2000 e 20102. Concen-tra-se, portanto, este texto, na descrição daconstrução dos indicadores e na análise dosresultados das referidas pesquisas do Censo.

Índices que buscam descrever a quali-dade de vida das famílias ou, de formaoposta, a vulnerabilidade familiar, sãocomumente multidimensionais, de formaque não apenas a renda é vista comodeterminante das condições de vida, mastambém o são a habitação e o acesso àurbanidade, ao trabalho, ao conhecimento,enfim, às oportunidades. Esse tipo deopção de mensuração pode se enquadrarno que Soares define, sob a ótica dapobreza, como a “falta de oportunidadespara viver uma vida plena” (SOARES, 2009,p.13). De todo modo, índices de qualidadede vida multidimensionais se restringem àdisponibilidade de dados presentes naspesquisas domiciliares de larga cobertura.

De fato, pesquisadores costumam con-cordar que a vulnerabilidade das famíliasé fenômeno que circunscreve a família deforma ampla e pode restringir seu acesso aoportunidades de maneiras diversas, sejapela qualidade inadequada da habitação emsi ou pela sua precária localização, seja pelafalta de acesso à educação e ao conheci-mento, seja pelos efeitos dessa falta deconhecimento na prevenção e profilaxia dasaúde, por exemplo.

Parece haver divergência, contudo,entre as formas utilizadas de se agregar as

“dimensões da pobreza para a obtenção deuma medida escalar” (BARROS; CARVALHO;FRANCO, 2006). Alguns autores defendemque, no âmbito do combate à pobreza, pormeio de políticas públicas, fazem-se neces-sários critérios objetivos, mensuráveis, nãopassíveis de dúvidas e que, nesse caso, arenda líquida é o critério mais adequado paraseleção das famílias eleitas como alvo dapolítica em questão (OSORIO; SOARES; SOUZA,2011)3.

Se a ênfase do estudo, contudo, for ade sintetizar informações, permitir oordenamento e a comparação entre regiõesdistintas e aspectos de necessidades dife-rentes, então índices escalares, multidimen-sionais, podem também ser de utilidadepública.

De fato, no âmbito das Nações Unidas,tendo em vista a comparabilidade entrepaíses, a construção de índices de vulne-rabilidade em geral se remete ao Relatóriode Desenvolvimento Humano de 1996 eanos seguintes. No Brasil, também háalguma produção de indicadores, inclusivena escala intraurbana e intrametropolitana(NAHAS, 2002; ROCHA; VILLELA, 1990) e, noâmbito municipal, com intensa utilizaçãode dados (QUEIROZ; GOLGHER, 2008).

O procedimento mínimo de cons-trução de índices envolve a escolha devariáveis que retratem fenômenos de inte-resse e sua operacionalização, ou seja, aforma como se atribuirão valores asituações observadas e como essas infor-mações serão tomadas no seu conjunto.Essa operação, de construção de partes doíndice e de escolhas de composição aditivado índice, é central, porque é dessa cons-trução que derivam as possíveis obser-vações que, em última análise, retratam ofenômeno que originariamente se buscavadescrever. Decorre desse processo, portan-to, que a construção do índice não é única;

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Bernardo Alves Furtado

não é inequívoca e, assim, permite apenasinterpretações de indícios fenomenoló-gicos, condicionais ao desenho específicodo índice construído.

Ainda assim, a despeito das diferençasnos procedimentos de construção deíndices, pode se depreender que, observadoo desenho de construção do índice, infor-mações específicas para determinada facetade ação pública são explicitadas para oagente público.

Finalmente, vale esclarecer que, nocontexto utilizado neste texto, vulnerabi-lidade é o conceito associado àincapacidade da família de responderadequadamente, em tempo hábil, a eventosinesperados de ordem social ou ambiental4(SÁNCHEZ; BERTOLOZZI, 2007). Esta é adefinição utilizada oficialmente no Brasilpara a caracterização da Defesa Civil e desuas ações. “A intensidade de um desastredepende da interação entre a magnitude doevento adverso e a vulnerabilidade dosistema”(CASTRO, A. L. C., 1999, p. 2). Avulnerabilidade do sistema está intrinseca-mente ligada a questões específicas do local– sua geologia, sua infraestrutura, sua incli-nação, por exemplo –, mas também da or-ganização socioeconômica dos residentes –as instituições, os laços sociais e familiares,o grau de preparo e antecipação de situaçõespossíveis.

Essa vulnerabilidade se refere a ques-tões físicas, tais como inundações, porexemplo, mas também a questões sociais eeconômicas, tais como a perda de empregoe renda pelos adultos da família, doençado responsável ou inadequações tempo-rárias da residência.

A título de exemplo, note que a capaci-dade econômica permite que, em caso denecessidades, a família tenha recursos paratomar as providências de bem estar ime-diatas à situação de risco que se coloca.

Recursos monetários facilitam ainda atomada de decisão em relação a açõespreventivas e recuperativas.

Dado o contexto e objetivos do texto,a ênfase que aqui se dá é na descriçãometodológica, suas alterações e caracteri-zação empírica das famílias a partir dosdados. Assim, dialoga-se com Barros,Carvalho e Franco (2006), além de outrasreferências para a discussão da literaturamais aprofundada.

Sinteticamente, além desta introdução,o texto descreve a metodologia e os proce-dimentos para a construção do índice devulnerabilidade baseado nas dimensões de(i) vulnerabilidade social; (ii) acesso aoconhecimento; (iii) acesso ao trabalho; (iv)escassez de recursos; (v) desenvolvimentoinfanto-juvenil e (vi) condições habita-cionais. Essas dimensões – modificadas e

“O índice devulnerabilidade dasfamílias (...) indicaque houve, noperíodo, reduçãomédia davulnerabilidade dasfamílias poucosuperior a 19%.”

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

adaptadas do trabalho original – contem-plam um conjunto de 48 indicadores dife-rentes. Cada um deles, ou sua síntese, oíndice final, podem ser expressos para osrecortes geográficos de áreas de ponde-ração, internas aos municípios, até à sínteseglobal nacional.

Metodologia e procedimentos

Os indicadores e a metodologiaapresentados nesta seção buscam repetir aanálise feita para a Pesquisa Nacional porAmostra de Domicílios (PNAD) em anosanteriores (BARROS; FOGUEL; ULYSSEA,2007) naqueles quesitos cujas respostaseram suficientes para a construção do indi-cador. Em alguns casos, foram necessáriosajustes ou troca de indicadores, conformese descreve a seguir.

De acordo com a metodologia descritapor Barros, Carvalho e Franco (2006),procedemos ao cálculo de um “índicelinear”, calculado individualmente, paracada família (domicílio), de acordo com osmicrodados disponíveis. Como mencio-nado na introdução, são seis as dimensõesanalisadas, com o total de 48 indicadores.

Nos textos-base anteriores (BARROS,CARVALHO E FRANCO, 2006), apenas estãodisponíveis critérios gerais acerca dasdecisões de construção dos indicadores.Nesse trabalho, detalhamos, nas tabelasque seguem (Tabelas 1 a 6), especifica-mente os critérios utilizados na interpre-tação do indicador, bem como as variáveisdo Censo utilizadas para o cálculo paraos anos de 2010 e 2000.

A construção do índice, como descritooriginariamente por Barros, Foguel eUlyssea (2007), se baseia em série de indica-dores limiares de mensuração de vulnera-bilidades para as quais se calcula a ocor-rência ou ausência de aspecto específico.

Famílias abaixo do limiar para cada indi-cador recebem valores de 1. Caso contrá-rio, o valor é zero. As dimensões e o índicefinal são calculados de acordo com a agre-gação descrita mais abaixo. Esta seçãometodológica contém a descrição de cadaum dos indicadores de cada dimensão e aforma como a agregação foi feita.

A vulnerabilidade social é a dimensãoque busca quantificar a vulnerabilidade dafamília no seu aspecto mais geral (Tabela1). A Tabela 1 apresenta os critérios devulnerabilidade da família. A preocupaçãoprincipal é retratar a capacidade da famíliade prover sua sustentabilidade, tanto finan-ceira quanto de forma mais ampla, já queconsidera como parâmetros centrais apresença de bebês, crianças e idosos, côn-juges e sua proporção em relação aonúmero de dependentes no âmbito dafamília. Além disso, fatores como aausência de cônjuge ou presença de criançaque não viva com a mãe também impactamnegativamente essa dimensão. Mais do queobjeto de política pública, os resultadosdessa dimensão retratam a evolução ecomposição dos membros familiares e suacapacidade de reprodução. Ainda assim,para o gestor público, o conhecimento dapresença de famílias mais vulneráveis érelevante para a tomada de decisão da açãopública.

A dimensão acesso ao conhecimento(Tabela 2) quantifica, de um lado, apresença de adultos analfabetos ou baixaescolaridade e, de outro lado, a ausênciade adultos com maior escolaridade ouexercendo funções profissionais de maiorqualificação.

A dimensão acesso ao trabalho (Tabela3) busca identificar simultaneamente oacesso ao trabalho proporcionalmente noâmbito familiar, bem como avaliar a quali-dade (e formalidade) da ocupação, por meio

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Bernardo Alves Furtado

do tipo de ocupação e dos rendimentosauferidos individualmente.

A escassez de recursos (Tabela 4) écaracterizada especificamente para aque-las famílias cuja renda domiciliar percapita é ou inferior à linha de pobreza ouextrema pobreza (R$ 127,50) ou se épossível verificar dependência familiarem relação a programas de transferênciade renda.

Indicadores da componente

Vulnerabilidade social

V1. Alguma mulher teve filhonascido vivo no último ano

V2. Alguma mulher teve filhonascido vivo nos últimos doisanosV3. Presença de criança

V4. Presença de criança ouadolescenteV5. Presença de criança,adolescente ou jovemV6. Presença de idoso

V7. Ausência de cônjugeV8. Menos da metade dosmembros encontram-se emidade ativa

V9. Presença de pessoas comdificuldade grande ou impossi-bilidade de caminhar, enxergar,ouvir ou com deficiênciamental permanenteV10. Presença de criança nodomicílio que não viva com amãe.

Critérios

Existência de filho nascidovivo no período de referênciade 12 meses anterioresIdade do último filho tidonascido vivo

Considerada criança com 12anos ou menos idadeConsiderado adolescentecom 17 anos ou menosConsiderado jovens comomenores ou igual a 21 anosConsiderado idosos comomaiores de 64 anosNo domicílio, excluídos solteirosConsiderado pessoas idadeativa com 10 anos ou acimadividido pelo total no domi-cílio (excluídos empregadosdomésticos e familiares) émenor que meio

Ausência de cônjuge e adultomasculinho no domicílio

v4654

v4654

v4752

v4752

v4752

v4752

V0436v4752 v0402

v7100

v0410 v0411v0412 v0413

v0414

v0402 v0401

v6664

v6660

v6036

v6036

v6036

v6036

v0502v6036 v0502

v0614 v0615v0616 v0617

v0502 v0601

Censo 2000 Censo 2010

Variáveis

Fonte: Elaboração própria.

Tabela 1: Indicadores da componente vulnerabilidade social

Os indicadores da dimensão desenvol-vimento infanto-juvenil mensuramcrianças e adolescentes que trabalham emconsonância com aqueles que estão forada escola ou fora do padrão de regulari-dade desejável (Tabela 5). Além disso,inclui na ponderação elementos de pre-sença de óbito na família como fator rele-vante na estruturação do ambiente deconvivência familiar.

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152 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

Indicadores da componente

Acesso ao conhecimento

C1. Presença de adulto anal-fabetoC2. Presença de adulto analfa-beto funcional

C3. Ausência de adulto comfundamental completoC4. Ausência de adulto com se-cundário completoC5. Ausência de adulto comalguma educação superiorC6. Ausência de trabalhadorcom qualificação média ou alta

Critérios

Maior de 17 anos e ‘não sabeler e escrever’Maior de 17 anos e menos 7anos de estudo (fundamentalincompleto)Maior de 17 anos e fundamen-tal completoConsiderado ensino médiocompletoConsiderado acima de 11 anosde estudoClassificações de ocupaçõesequivalentes a 1, 2 e 3. Dirigen-tes em geral, profissionais dasciências e das artes e técnicosde nível médio (excluídos ofi-ciais forças armadas)

v0428 v4752

v4300 v4752

v4752 v4300

v4752 v4300

v4752 v4300

v4452

v0627 v6036

v6400 v6036

v6036 v6400

v6036 v6400

v6036 v6400

v6461

Censo 2000 Censo 2010

Variáveis

Fonte: Elaboração própria.

Tabela 2: Indicadores da componente acesso conhecimento

Critérios

Setor formal: Empregado comcarteira de trabalho assinada,militar, funcionário públicoestatutário, trabalhador domés-tico com carteira de trabalhoassinada, exclui empregador eempregado por conta própria

Salário Mínimo R$ 510 (defla-cionado IPCA 2010 para 2000,valor equivalente a R$ 268,95Salário Mínimo R$ 1.020(deflacionado IPCA 2010 para2000, valor equivalente aR$ 537,89)

Indicadores da componente

Acesso ao trabalho

T1. Menos da metade dos mem-bros em idade ativa encontram-se ocupados

T3. Ausência de ocupado nosetor formal

T4. Ausência de ocupado ematividade não-agrícola

T5. Ausência de ocupado comrendimento superior a 1 saláriomínimo

T6. Ausência de ocupado comrendimento superior a 2 saláriosmínimos

v4452

v0447 v0448

v4462

v4525

v4522

v6910

v6930

v6471

v6526

v6526

Censo 2000 Censo 2010

Variáveis

Fonte: Elaboração própria.

Tabela 3: Indicadores da componente acesso ao trabalho

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RSP

153Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Bernardo Alves Furtado

Tabela 4: Indicadores da componente escassez de recursos

Fonte: Elaboração própria.

Critérios

Considerada como sendo 1/4 dosalário mínimo, i.e., R$ 127,50(para 2000 R$ 67,24)Considerada como sendo 1/2 dosalário mínimo, i.e., R$ 255 (para2000 R$ 134,48)

Renda total menos renda traba-lho maior que renda trabalho

Indicadores da componente

Escassez de recursos

R1. Renda familiar per capitainferior à linha de extremapobrezaR2. Renda familiar per capitainferior à linha de pobreza

R3. Maior parte da renda fami-liar advém de transferências

v4525 v4614

v4525 v4614

v4525 v4614

v6525 v6527

v6525 v6527

v6525 v6527

Censo 2000 Censo 2010

Variáveis

Indicadores da componente

Desenvolvimento infanto-juvenil

D1. Presença de ao menos umacriança com menos de 14 anostrabalhandoD2. Presença de ao menos umacriança com menos de 16 anostrabalhandoD3. Presença de ao menos umacriança de 0-6 anos fora da escolaD4. Presença de ao menos umacriança de 7-14 anos fora da escolaD5. Presença de ao menos uma crian-ça de 7-17 anos fora da escolaD6. Presença de ao menos umacriança de até 14 anos com mais de2 anos de atrasoD7. Presença de ao menos um ado-lescente de 10 a 14 anos analfabetoD8. Presença de ao menos um jovemde 15 a 17 anos analfabetoD9. Presença de ao menos uma mãeque tenha algum filho que já tenhamorridoD10. Presença de mais de uma mãeque tenha algum filho que já tenhamorridoD11. Presença de mãe que já tevealgum filho nascido morto

Fonte: Elaboração própria.

Critérios

Considerado filhos e filhas (filhosnascidos vivos maior filhos aindavivos)

v4752 v0439

v4752 v0439

v4752 v0429

v4752 v0429

v4752 v0429

v4752 v0431

v4752 v0528

v4752 v0528

v4620 v0463

v4620 v0463

v4670

v6036 v6900

v6036 v6900

v6036 v0628

v6036 v0628

v6036 v0628

v6036 v0629

v6036 v0627

v6036 v0627

v6036 v0663

v6036 v0663

v0669

Censo 2000 Censo 2010

Variáveis

Tabela 5: Indicadores da componente desenvolvimento infanto-juvenil

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

Os indicadores que compõem adimensão de condições habitacionais(Tabela 6) buscam refletir de forma maisabrangente a moradia como instrumentode inserção social e elemento de suportecontra a vulnerabilidade. Nesse sentido, acondição de domicílio próprio, por exem-plo, reforça o fato de que, em evento dedesocupação laboral dos adultos do domi-cílio, não há necessidade imediata de arcarcom custos de aluguel da habitação. Outroscomponentes referem-se à qualidade intrín-seca da habitação e à disponibilidade deinstrumentos mínimos de acesso a serviços.Finalmente, buscou-se incluir na vulnera-

bilidade da habitação elementos de locali-zação espacial que são quantificados pelanecessidade de membros do domicílio dese locomoverem a outro município paraefeitos de acesso à educação ou ao trabalho.

Agregação de indicadoresOs indicadores de cada dimensão

precisam ser agregados para, na sequência,comporem o índice nacional. A agregaçãoescolhida segue a orientação teórica deconstrução dos indicadores. Ou seja,agrega-se de acordo com a escolha temáticacomum de grupo de indicadores e rele-vância para a vulnerabilidade, de acordo

Indicadores da componente

Condições habitacionais

H1. Domicílio não é próprioH2. Domicílio não é nem próprionem cedidoH3. Densidade de 2 ou mais mo-radores por dormitórioH5. Acesso inadequado à água

H6. Esgotamento sanitário inade-quado

H7. Lixo não é coletadoH8. Sem acesso à eletricidadeH9. Não tem geladeiraH10. Não tem ao menos um dositens: geladeira, televisão ou rádioH11. Não tem ao menos um dositens: geladeira, televisão, rádio outelefoneH12. Não tem ao menos um dositens: geladeira, televisão, rádio,telefone ou computadorH13. Mobilidade. Trabalha ouestuda em município diferente daresidênciaH14. Domicílio improvisado

Fonte: Elaboração própria.

Critérios

Pago ou “pagando”É alugado ou outra condição

Maior ou igual

Considerado não tem água canali-zada em pelo menos um cômodoConsiderado fossa rudimentar, vala,direto rio ou lago, outra forma

Nem direta, nem indiretamenteConsiderada somente elétrica

Considerada telefone fixo

v0205v0205

v7203

v0208

v0211

v0212v0213v0215v0215 v0214v0221v0215 v0214v0221 v0219

v0215 v0214v0221 v0219v0220v4276

v0201

v0201v0201

v6203

v0208

v0207

v0210v0211v0216v0213 v0214v0216v0212 v0214v0216 v0218

v0213 v0214v0216 v0218v0219v0660 v0636

v4001

Censo 2000 Censo 2010

Variáveis

Tabela 6: Indicadores da componente de condições habitacionais

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155Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

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com a estrutura proposta originalmente porBarros, Foguel e Ulyssea (2007). Pode-sequestionar se a escolha da agregação deindicadores e a junção de cada dimensãocom contribuições iguais à composição to-tal do índice seriam adequadas. Nesse caso,a título de teste e validação, realizamos al-guns exercícios de análise fatorial, cujametodologia delega ao conjunto de dadose suas relações internas as possibilidadesde agregação em fatores (ou componentes).Feitos os cálculos, a composição dasdimensões se deu de forma similar à adiçãopor quantidades iguais. Observar-se-iamalgumas inversões de algumas unidades daFederação (UF) no seu ranqueamento,porém, com alterações pouco significativasno nível absoluto do índice final. No casodos indicadores individuais, observe-se quea agregação interna a cada dimensão é feitaobservando-se a consistência teórica decada tema. Assim, optou-se pela agregaçãoteoricamente informada.

De todo modo, a intenção de agregarinformações em dimensões e no índicesíntese cumpre apenas o papel de facilitaro entendimento dos dados. Cada indicador,de forma individual, também pode serobjeto de análise, como demonstram asanálises das Tabelas 9 e 10.

Especificamente, em relação à agre-gação para o caso da vulnerabilidade social,por exemplo (Tabela 7), tira-se a média dosindicadores v1 e v2, soma-se a média dosindicadores v3, v4 e v5, soma-se v6, amédia de v7 e v8, soma-se ainda v9 e v10e tira-se a média geral, dividindo-se por 6.As outras dimensões são agregadas deacordo com o exposto na Tabela 7.

O índice geral é formado a partir damédia simples das seis dimensões.

Recortes geográficos possíveisO censo demográfico realizado

decenalmente pelo IBGE é a ferramenta quepermite o melhor desenho espacial amostralno âmbito das pesquisas domiciliares brasi-leiras. Diferentemente da anualmenterealizada, a PNAD, cuja amostra permiteanálise de regiões metropolitanas e unidadesda Federação, os microdados da amostra doCenso permitem análise por áreas deponderação, que é a “unidade geográfica,formada por um agrupamento de setorescensitários, para a aplicação dos procedi-mentos de calibração das estimativas comas informações conhecidas para a populaçãocomo um todo” (IBGE, 2010, p. 45). Ao todo,há informações diferenciadas por 10.184diferentes áreas de ponderação, com mais

Tabela 7: Forma de agregação de indicadores em dimensões

Fonte: Elaboração própria.

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

de mil Municípios com mais de uma áreade ponderação.

Resultados

O índice de vulnerabilidade dasfamílias – construído de acordo com as pre-missas observadas acima e a partir dosmicrodados da amostra dos censosdemográficos de 2000 e 2010 realizadospelo IBGE – indica que houve, no período,redução média da vulnerabilidade dasfamílias pouco superior a 19% (Tabela 8).

A redução foi influenciada diferente-mente pelas várias dimensões. Central paraa redução foi o aumento do acesso dapopulação ao trabalho e aos recursosfinanceiros, reduzindo em cerca de 29% e36% respectivamente tais indicadores.O desenvolvimento infanto-juvenilapresentou redução no índice da ordem de16,5%. Finalmente, as dimensões com piordesempenho foram as condições habita-cionais (14%), o acesso ao conhecimento– ainda com patamares altos em valoresabsolutos5 – e a vulnerabilidade social. Aanálise das alterações por indicadores decada uma dessas dimensões permite

antever indícios das razões destas altera-ções diferenciadas.

De fato, a análise da Tabela 9 indicaque somente a dimensão de acesso aoconhecimento obteve redução em todos osindicadores componentes. Ainda assim, osindicadores c5 e c6 (ausência de adulto comalguma educação superior e ausência detrabalhador com qualificação média ou alta)reduziram-se em ritmo lento, apenas 2,5%e 3,1% de melhora na década.

Em relação à dimensão de vulnerabi-lidade social, note que há aumento davulnerabilidade devido a maior presençade idosos, bem como maior número dedomicílios com ausência de cônjuge (v6 ev7). Além disso, há aumento do númerode residências nas quais há indivíduos comalgum tipo de deficiência, provavelmentepor melhorias na notificação dos casos dedeficiência. Finalmente, há quase estabi-lidade (aumento de 0,001) no indicadorreferente a crianças que moram em domi-cílios sem a presença da mãe.

Os indicadores de acesso ao trabalhoconfirmam a evolução da inserção nomercado de ocupação formal na década.De forma significativa, note a redução em

Tabela 8: Resultados da média índice geral e suas dimensões Brasil

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

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nível do indicador t1 – maioria dos adultosdesocupados – que passa de 0,392 a 0,032,com consequente redução de mais de 90%no indicador. Além da quantidade de deso-cupados por domicílio se reduzir, tambémmelhoraram aspectos relacionados à for-malidade da ocupação (t3) e da remune-ração percebida (t5 e t6). Ainda assim, maisdomicílios apresentaram no períodoocupações exclusivamente agrícolas (t4).

A dimensão de acesso a recursoscontribui de forma importante para aredução geral da vulnerabilidade dasfamílias. Todavia, a decomposição dadimensão em seus componentes revela que,embora os indicadores referentes aonúmero de domicílios com renda per capitaabaixo da linha de pobreza e extrema

pobreza se reduza em cerca de 40%, oindicador referente à dependência dessasfamílias de transferências governamentaisaumenta em quase 800%. Aliás, já foidemonstrado em outros textos (SOARES,2008) que a transferência direta (r3) éfundamental para retirar as pessoas dapobreza (r1 e r2). De todo modo, a dimen-são não falha em capturar ambos os fenô-menos de aumento da dependência eredução de famílias abaixo das linhas.

A dimensão de desenvolvimentoinfanto-juvenil apresenta componentesdíspares (Tabela 10). Se, de um lado, háaumento da vulnerabilidade dado o maiornúmero de crianças e adolescentes quetrabalham em média, de outro lado, apresença de mães com filhos que tenham

Tabela 9: Resultados para indicadores das dimensões vulnerabilidade social,acesso ao conhecimento e ao trabalho e escassez de recursos

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas de microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

morrido diminui fortemente. De maneirageral, também há melhora na presença decrianças e adolescentes nas escolas.

As condições habitacionais tambémevoluíram de forma heterogênea na décadaanalisada. Os indicadores que refletem anão propriedade do imóvel (d1 e d2) – e,

portanto, maior vulnerabilidade, por exem-plo, na ocorrência de desocupação dosadultos do domicílio e incapacidade dearcar com o custo imediato do aluguel –apresentaram aumento relevante. De outrolado, entretanto, condições de habitabi-lidade específicas, como acesso a água,

Tabela 10: Resultados para indicadores das dimensões desenvolvimentoinfanto-juvenil e condições habitacionais

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

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esgoto e tratamento de lixo, melhoraramno período. Assim como também forampositivos os resultados referentes à possede itens de conforto e comunicação noâmbito domiciliar. Se consideradosaspectos ligados à localização da residência– e à necessidade de que os indivíduos pre-cisem ir a outros Municípios para acesso àescola e ao trabalho – então houve piorasignificativa do indicador (43,8%).

Como se vê, embora a redução davulnerabilidade tenha ocorrido em todasas dimensões analisadas, há variaçãoimportante entre aspectos e magnitudesespecíficas dos indicadores de cadadimensão.

Da mesma forma, a análise regionaldemonstra variabilidade diferenciada entreas Grandes Regiões do IBGE, embora emmenor magnitude (diferença de 3,7 p.p). OSul é a região que apresenta queda mais

significativa do índice geral, com reduçãode 22,1% de vulnerabilidade. Aproxima-sedo patamar global da região Sudeste. ONorte é a região com menor evolução noperíodo, aproximando-se do patamar daregião Nordeste, com pior desempenho(0,311).

Em relação à dicotomia urbano-rural –de acordo com definições estabelecidas emlei municipal e incorporação do IBGE –,note que a redução percentual é maior nasáreas urbanas, entretanto, dado o nível inicialda vulnerabilidade rural ser mais alto, houve,de fato, redução na distância entre os indi-cadores no período, caindo de 0,155 pontospara 0,146.

A análise do indicador agregado porregiões metropolitanas deve considerarque o IBGE utilizou a definição oficial –estabelecida em leis estaduais – para regiõesmetropolitanas, que, na ocasião do Censo

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

Tabela 11: Resultados por região, urbano – rural e metropolitano – não-metro-politano

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

2010, constavam como 36 regiões metro-politanas, três aglomerações urbanas e trêsRIDE6 – que integram Municípios emfronteiras estaduais. Não se entenda,portanto, ‘metropolitano’ como fenômenoou processo imbuído de atividades dehierarquia superior, mas apenas como defi-nição entendida pelos legisladores estaduais– usualmente utilizada como ferramentade desenvolvimento regional. Todavia, o‘não-metropolitano’ ainda apresenta –assim como o rural – níveis do indicadorde vulnerabilidade mais altos que áreasmetropolitanas, embora com redução ligei-ramente mais acentuada.

Como reforçado anteriormente, namedida em que se detalha a análise porregiões geográficas, dimensões e indica-dores, o pesquisador pode observar hetero-geneidades interessantes. A Tabela 12, porexemplo, permite inferir que o Norte foi aregião que apresentou a pior evolução nadimensão infanto-juvenil (-12%); que oNordeste, por sua vez, teve desempenhoabaixo da média brasileira nas dimensõesde acesso ao trabalho (-26,2%) e escassez

de recursos (-30,5%), mas melhores emdesenvolvimento infanto-juvenil (-22%) econdições habitacionais (-20,7%). OSudeste apresenta a pior evolução emredução da vulnerabilidade social (-8,3%)e em condições habitacionais (-7,3%). OSul e o Centro-oeste alcançam redução devulnerabilidade importante na dimensão deescassez de recursos, 54,5 e 50,3%,respectivamente.

Mais uma vez em relação à dicotomiaurbano-rural, note que, enquanto o melhordesempenho em áreas urbanas é em relaçãoao aumento de acesso ao trabalho (31,3%),as áreas rurais apresentam melhorias signi-ficativas em relação à vulnerabilidade social(10,3%) e às condições habitacionais(18,8%).

Entre os resultados apresentados deforma segmentada entre regiões, urbano,rural e metropolitano e as dimensões, avariação mais baixa – de piora davulnerabilidade – ocorreu em relação àscondições habitacionais em áreas metro-politanas (5,2%), embora ainda em níveismelhores do que a média brasileira.

Tabela 12: Resultados para as dimensões por regiões, urbano e rural e metropo-litano, não-metropolitano

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

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A análise das unidades da Federaçãorevela que o estado que apresentou menorredução do indicador de vulnerabilidadefoi Roraima (Tabela 13). Ressalte-se,todavia, que o estado do Maranhão, aindaque com redução do indicador próxima à

média nacional, permanece como Estadocom pior indicador de vulnerabilidade. Asegunda e terceira colocações perma-necem com Piauí e Alagoas. Em termosrelativos, o Tocantins foi o Estado queconseguiu melhor desempenho no

Tabela 13: Resultados do índice por unidades da Federação

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

período, reduzindo seu indicador do nívelalto para mais próximo da média nacional.Estados do Sul, Sudeste e Centro-oesteapresentaram boa redução, acima dos20%, e aprofundaram sua distância emrelação à média nacional. A unidade daFederação com menor vulnerabilidadepermanece o Distrito Federal (0,183).

Novamente, advoga-se que infor-mações adicionais podem ser obtidas aodesagregar as dimensões analisadas noâmbito das unidades da Federação (Tabe-la 14). Os Estados do Nordeste, em espe-cial, tiveram reduções bem acima da média(da ordem de 6 ou mais p.p.) na dimensãode desenvolvimento infanto-juvenil. ABahia e o Tocantins apresentaram asmelhores reduções nas condições habita-cionais (-25% e -26,3%). Os Estados doSul e Centro-oeste, por sua vez, apresen-taram números de melhoria no acesso a

recursos cerca de 20 pontos percentuaisem relação à média nacional.

Alguns aspectos negativos merecemrealce. O Amazonas reduziu seu índice devulnerabilidade na dimensão de desenvol-vimento infanto-juvenil em apenas 4,85%.Os dois Estados seguintes com pioresresultados são Acre (5,73%) e Amapá (7,02).Roraima, por sua vez, apresenta destaquenegativo nas dimensões acesso ao trabalho(-18,39%) e escassez de recursos (-17%).

Na dimensão de condições habita-cionais, apenas dois Estados tiveram piorado indicador no período analisado: SãoPaulo, com piora de 1,09% no período, e oDistrito Federal, com aumento da vulne-rabilidade nessa dimensão de quase 20%.Ainda assim, ressalte-se que ambas as uni-dades da Federação apresentam valoresabaixo da média nacional de 0,14 em 2010(0,093 e 0,104, respectivamente).

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

Tabela 14: Resultados por unidades da Federação e dimensões

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Na dimensão de acesso ao conheci-mento, a melhora no período entre asunidades da Federação varia entre 17,11%e 10,53, com o melhor avanço observadoem Tocantins e resultados menos rápidospara os Estados do Pará, Paraíba, Pernam-buco, Alagoas e Rio de Janeiro.

A análise por regiões metropolitanas(RM) também pode ser detalhada. A Tabela15 demonstra a evolução dos índices paraas 51 subdivisões consideradas pelo IBGEem 2010. As RM do Agreste e CampinaGrande são as com piores indicadores para2000 e 2010 e, além disso, apresentamevolução no período menor do que a médiadas RM em geral. A RM de São Paulotambém apresenta comparativamente baixamelhora no período, apenas 15,95%.Entretanto, seu patamar em 2010 (0,196)ainda é melhor do que a média das RM(0,212) e nacional (0,246). Cinco RMtiveram boa evolução no período, da ordemde 25%: RM Belo Horizonte: ColarMetropolitano, RM Chapecó: NúcleoMetropolitano, RM Grande São Luís e RMNorte/Nordeste Catarinense: NúcleoMetropolitano.

Os resultados da dimensão condiçõeshabitacionais também são apresentados deacordo com o recorte de regiões metropo-litanas. Note que, no caso desta dimensãoespecífica, 13 entre as 51 RM apresentampiora do indicador no período com variaçãopercentual positiva. Entre estas, destaque-se ainda a RM Norte/Nordeste Catarinense:Núcleo Metropolitano (60,4%) e RM Valedo Itajaí: Núcleo Metropolitano (29,55%).De outro lado, várias RM tiveram reduçãode vulnerabilidade em condições habita-cionais da ordem de 20%, ressaltando-seduas áreas de expansão metropolitana: RMLages: Área de Expansão Metropolitana(-26,96%) e RM Vale do Aço: Colar Metro-politano (-24,53%).

Em relação ao comportamento deMunicípios, podem-se selecionar algumastabelas ilustrativas7. Em primeiro lugar,pode-se apontar aqueles Municípios daFederação que obtiveram as melhoresreduções da vulnerabilidade no período de2000 a 2010 (Tabela 16), muito emboraem sete dos quais o crescimento da popu-lação tenha ocorrido em taxa superior àmédia nacional de 1,17% a.a. no período.Todavia, a média dos seus valores abso-lutos, 0,258, ainda é superior à médiabrasileira (0,246) e a população média ébastante baixa: 4.907 habitantes.

Os dez Municípios com menorvulnerabilidade no País (Tabela 17)apresentaram média populacional de 413mil habitantes, com valores para o índicebem abaixo da média nacional, emboracom crescimento no período maior que amédia brasileira para seis deles.

Entre os piores Municípios em valoresabsolutos, cinco encontram-se no Mara-nhão, dois no Pará e ainda no Amazonas,Pernambuco e Roraima. Todos apresentamtaxa de crescimento populacional relativa-mente alta no período, média de 2,73% a.a.,contra 1,17% a.a. da taxa nacional. Apopulação média é baixa, de cerca de 15mil habitantes. A variação de melhoria noperíodo também é bem inferior à nacional(-19%), da ordem de 8%, em média.

Finalmente, vale notar que dois Muni-cípios de Roraima não melhoraram suavulnerabilidade no período: Amajari eIracema, ambos com altas taxas de cresci-mento populacional (Tabela 19).

Alguns indicadores selecionadostambém podem ser utilizados na análisemunicipal. A título de ilustração, as tabelasabaixo detalham os resultados dos indica-dores h3 e h13 da dimensão condiçõeshabitacionais. O primeiro (h3) refere-se àdensidade de dois ou mais moradores por

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

Tabela 15: Resultados por Regiões Metropolitanas

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Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

Tabela 16: 10 Municípios com melhor variação no índice no período

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

Tabela 17: 10 Municípios com melhor valor absoluto no índice no período

Tabela 18: 10 Municípios com menor variação no índice no período

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

dormitório, enquanto o segundo (h13)reflete a necessidade de deslocar-se a outromunicípio para estudar ou trabalhar. 393Municípios, por exemplo, apresentam valornulo para o indicador h3 em 2010, o queindica que, na amostra de famílias entre-vistadas pelo censo domiciliar, não havianenhuma ocorrência nesses Municípiospara domicílios com densidade maior ouigual a dois moradores por dormitório. Deoutro lado, Municípios no Amazonas, Paráe Roraima apresentam índices acima de 0,4nesse indicador8.

Em relação à necessidade de mobili-dade intermunicipal, vários Municípiosapresentam variação maior que 2000% noperíodo (Tabela 20). Finalmente, a Tabela21 apresenta 11 Municípios – próximos agrandes centros – nos quais o indicadorde mobilidade fica acima de 0,7. Os trêspiores resultados são para Municípios emSão Paulo.

O recorte espacial mais detalhadopossível é a análise das áreas de ponde-ração. A título de exemplo, dado o bomdesempenho do Distrito Federal no

resultado do índice, optou-se por ilustraras possibilidades da escala maior comBrasília e seu entorno (Figura 1). Note queo DF obtém, na média, valor de 0,183 noíndice de vulnerabilidade. De todo modo,se considerados os Municípios limítrofesao DF, que no conjunto compõem aRegião Integrada do Distrito Federal eEntorno, esse valor já aumenta para 0,207.Esses números médios não permitemobservar a heterogeneidade existentequando desagregada por áreas de ponde-ração. De fato, os dados da figura 1 indi-cam que a região central de Brasília, oPlano Piloto, o Lago Sul, o Park Way ouÁguas Claras, apresentam índices devulnerabilidade bem melhores, da ordemde 0,8 a 1,4. Regiões urbanas vizinhasconurbadas, por sua vez, apresentamvalores mais altos, da ordem de 0,28 a0,32, substancialmente maiores que amédia nacional (0,24)9.

Finalmente, a título de ilustração,apresenta-se o cartograma para o índicecompleto para áreas de ponderação para oano de 2010 (Figura 2).

Tabela 19: 10 Municípios com pior valor absoluto no índice no período

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

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167Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

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Tabela 20: 20 Municípios com maior variação no indicador h13 no período

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra dos censos demográficosIBGE 2000 e 2010.

Tabela 21: 11 Municípios com maior valor absoluto no indicador h13 no período

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

Figura 1: Índice de vulnerabilidade 2010. Distrito Federal e entorno

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra do censo demográficoIBGE 2010.

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169Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Bernardo Alves Furtado

Figura 2: Índice vulnerabilidade das famílias por áreas de ponderação

Fonte: Elaboração própria. Informações extraídas dos microdados da amostra do censo demográfico

IBGE 2010.

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170 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

Outros resultados, algumas limi-tações e ponderações

Dado que a elaboração deste trabalhobaseou-se em construção de metodologiaanterior, a própria manipulação dos dados,indicadores, dimensões e resultadosdesperta algumas considerações mais geraisque imaginamos seriam válidas paracompartilhar com o leitor. Em especial,seria possível pensar no rearranjo de algunsindicadores em dimensões distintas. Háquestões referentes à capacidade de con-sumo, por exemplo, abrigadas nas dimen-sões de condições habitacionais e acessoao trabalho.

Outra característica que reforça, emcerto sentido, a análise proposta (de inde-pendência entre os componentes do índice)é que a correlação entre as dimensões(Tabela 22) é relativamente baixa. Note que,à exceção da correlação entre acesso aoconhecimento e acesso ao trabalho, todosos outros pares apresentam valores abaixode 0,55. Isso indica que não está se mensu-

rando elementos repetidos nas várias dimen-sões, mas elementos distintos, fato que, decerto modo, reforça o caráter multidimen-sional da análise e as várias possibilidadesda qualidade de vida ser influenciada porgrande número de fatores. As relações decorrelação apresentam magnitudes similarespara os dois anos da análise.

Outra possibilidade que o modo deconstrução do índice nos permite realizaré a análise da desigualdade do indicadorinternamente a cada unidade da Federação.Como o índice é calculado por domicílio,para cada unidade da Federação é possívelcalcular a desigualdade do valor do índiceentre as famílias de determinado recortegeográfico de análise. Ou seja, para dadaunidade da Federação, é possível identificarse os valores do índice das famílias daquelaunidade são mais homogêneos ou maisheterogêneos. Em outras palavras, épossível calcular o coeficiente de Gini10 davariável calculada, o índice, para cadaunidade da Federação. Os resultados estãoapresentados na Tabela 23.

Tabela 22: Correlações entre as dimensões

Fonte: Elaboração própria.

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171Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Bernardo Alves Furtado

Tabela 23: Coeficiente de GINI do índice de vulnerabilidade das famílias, por UF

Fonte: Elaboração própria.

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172 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

Note que os Estados com maiorvulnerabilidade (MA, PI, AL) tambémapresentam maior homogeneidade entreas famílias componentes (coeficientes de0,242; 0,251 e 0,253; respectivamente). Ouseja, a vulnerabilidade entre as famíliasse encontra em patamares altos para oconjunto das famílias, com menos dispa-ridade entre os níveis de vulnerabilidade.De outro lado, unidades da Federação commenor vulnerabilidade apresentam maiorvariabilidade entre as famílias.

A análise da Figura 3 – que demonstraa correlação entre níveis de vulnerabi-lidade e o coeficiente calculado – emconjunto com o dado da evolução dessecoeficiente no período 2000-2010 explicitao fato de que, muito embora haja ganhossignificativos na melhoria da vulnerabilidadedas famílias na década, é crescente adesigualdade dessa vulnerabilidade, ou seja,proporcionalmente há mais famíliascom menor e com maior vulnerabilidade.Esse aumento se verifica com maior

magnitude nos Estados do Norte eNordeste. O Distrito Federal foi a únicaunidade da Federação no período a apre-sentar redução nesse índice, emborapermaneça em patamar bastante superioràs demais UF.

Considerações finais

Este texto buscou trazer ao leitorinformações acerca da vulnerabilidade dasfamílias escalonadas do geral para oespecífico. Observa-se, no conjunto,melhora considerável com diminuição davulnerabilidade das famílias no período2000 a 2010. Essa melhora se relativiza eé heterogênea na medida em que se anali-sam dimensões distintas da vulnerabilidadee indicadores específicos. De fato, asdimensões relacionadas ao trabalho e rendamelhoraram proporcionalmente mais quea vulnerabilidade social ou o acesso aoconhecimento. Foi diferenciada também amelhoria entre os Estados da Federação e

Figura 3: Correlação entre índice de vulnerabilidade das famílias e o coeficientede GINI do índice, por UF

Fonte: Elaboração própria.

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173Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Bernardo Alves Furtado

os Municípios. Por fim, fica fácil ver quemesmo porções do território com baixavulnerabilidade apresentam heterogenei-dades típicas da dicotomia centro-periferiaou urbano-rural.

De modo geral, o Nordeste e o Norteestão em patamares diferenciados emrelação ao restante do país. E no Nordeste,os Estados de Maranhão, Piauí e Alagoasmerecem atenção especial dos gestores depolíticas públicas.

Espera-se que, com esse conjuntoinformacional, contribua-se para a publi-cidade de fatores socioeconômicosmúltiplos subjacentes aos efeitos ora apre-sentados, de modo que se possa esclarecerà opinião pública, bem como aostomadores de decisão de política pública.

(Artigo recebido em setembro de 2012. Versãofinal em junho de 2013).

Notas

1 Veja, por exemplo, Neri (2010).2 Além dos inúmeros resultados ora apresentados, tabelas completas (de Municípios, por

exemplo) podem ser solicitadas ao autor.3 Essa abordagem pode ser criticada por não considerar o caráter de subsistência e redes

sociais presentes nas áreas rurais (LOPES; MACEDO; MACHADO, 2003).4 Em relação à questão ambiental, ressalte-se que apenas no quesito habitação incluem-se

temas como saneamento básico e tratamento adequado de resíduos sólidos. Essa limitação notrato da questão ambiental deriva da restrição imposta pelo conjunto de perguntas feitas naamostra do censo.

5 Dado que se trata de índices de vulnerabilidades variando entre 0 e 1, valores mais próxi-mos de 1 indicam maiores vulnerabilidades, enquanto valores baixos próximos a zero, indicamreduzida vulnerabilidade.

6 Regiões Integradas de Desenvolvimento: RIDE DF - Região Integrada de Desenvolvi-mento do Distrito Federal e Entorno; RIDE TERESINA - Região Integrada de Desenvolvi-mento da Grande Teresina e RIDE PETROLINA/JUAZEIRO - Região Administrativa Inte-grada de Desenvolvimento do Pólo Petrolina/PE e Juazeiro/BA.

7 A tabela completa está disponível por solicitação ao autor.8 Limoeiro do Ajuru, Pará; Oeiras do Pará, Pará; São Paulo de Olivença, Amazonas; Porto

de Moz, Pará; Breves, Pará; São Gabriel da Cachoeira, Amazonas; Tonantins, Amazonas,Barreirinha, Amazonas; Amajari, Roraima; Melgaço, Pará; Jordão, Acre; Barcelos, Amazonas;Portel, Pará; Maraã, Amazonas; Normandia, Roraima; Santa Isabel do Rio Negro, Amazonas;Bagre, Pará; Uiramutã, Roraima.

9 A área de ponderação com melhor resultado absoluto 0,086 fica em Brasília. As duasseguintes em Belo Horizonte. A pior no Pará, a segunda pior em Roraima e a terceira no Rio deJaneiro.

10 Cálculos feitos com o Índice de Theil T também confirmaram aumento na inequalidadedos valores dos índices no período analisado (0,139 em 2000 para 0,155 em 2010).

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Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

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175Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Bernardo Alves Furtado

Resumo – Resumen – Abstract

Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de2000 no Brasil e regiõesBernardo Alves FurtadoO objetivo deste texto é apresentar de forma imediata, mas também precisa e espacialmente

detalhada, a situação de vulnerabilidade das famílias brasileiras a partir das respostas aos censosdemográficos de 2000 e 2010. Dessa forma, espera-se oferecer aos gestores públicos em espe-cífico e a pesquisadores e ao público em geral material de acesso e referência ao conjunto – porvezes complexo e inacessível – de inferências possíveis a partir dos questionários dos microdadosda amostra dos censos. A metodologia utilizada para construção de indicadores sintéticos estáfartamente descrita na literatura anterior. A partir da construção de indicadores que denotampresença ou ausência de vulnerabilidades, agregam-se seis dimensões de análise, então reunidasno índice geral que pode ser descrito para o País, Estados, Municípios e áreas intraurbanas. Osresultados indicam que a vulnerabilidade das famílias brasileiras no período recuou em média20%. Esse comportamento, todavia, é heterogêneo entre as dimensões analisadas, seus indica-dores, as regiões e Estados do País. É exatamente na identificação dessa heterogeneidade dosefeitos percebidos na década que se encontra a contribuição do texto.

Palavras-chave: índice; vulnerabilidade; famílias

Los índices de vulnerabilidad de las familias: resultados espacializados para la dé-cada de 2000 en Brasil y regionesBernardo Alves FurtadoEl objetivo de este trabajo es presentar una investigación inmediata, pero también espacial-

mente precisa y detallada de la situación de vulnerabilidad de las familias brasileñas de lasrespuestas a los censos de 2000 y 2010. Por lo tanto, se espera ofrecer los gestores públicos einvestigadores en específico y el acceso del público en general material de referencia para elconjunto - a veces complejo y de difícil acceso – para las inferencias posibles acerca de loscuestionarios de los censos de muestras de microdados. La metodología utilizada para laconstrucción de indicadores sintéticos se describe ampliamente en la literatura. A partir de laconstrucción de indicadores que denotan la presencia o ausencia de vulnerabilidades, sumanseis dimensiones de análisis, a continuación, se reunieron en el índice que puede ser descrito porla nación, estados, condados y áreas intraurbanas. Los resultados indican que la vulnerabilidadde las familias brasileñas en el período cayó un 20% en promedio. Este comportamiento, sinembargo, es heterogéneo entre las dimensiones analizadas, sus indicadores, regiones y estados.Es precisamente esta heterogeneidad en la identificación de los efectos percibidos en la décadaque es la aportación del texto.

Palabras clave: índice; la vulnerabilidad; las familias

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176 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 147-176 abr/jun 2013

Índice de vulnerabilidade das famílias: resultados espacializados para a década de 2000 no Brasil e regiões

Families vulnerability index: spatialized results to the 2000s in Brazil and regionsBernardo Alves FurtadoThe objective of this paper is to make available information – precisely and spatially detailed

– about families’ vulnerabilities derived from questionnaires’ answers of census data for 2000and 2010. In doing so this paper fulfills the task of providing reference data – occasionallycomplex – accessible to public authorities and researchers so that inferences can be made fromthe micro data of the census sample interviews. The methodology used is by and large detailedin the literature. The actual construction of the indicators is based on the analysis of presenceor absence of vulnerabilities within families across six different dimensions, detailed for thecountry, states, municipalities and intraurban detail. Results indicate that Brazilian families’vulnerability reduced by nearly 20% in the period on average. This behavior, however, isheterogeneous among the dimensions analyzed, the indicators or the regions and states of thecountry. It is exactly the analysis of this perceived heterogeneity in the decade that makes thecore of the contribution of this paper.

Keywords: index; vulnerability; families

Bernardo Alves FurtadoÉ doutor em Geociências pela Utrecht University (2009), Diretor Adjunto e Técnico de Planejamento e Pesquisa daDiretoria de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais (Dirur) do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada(Ipea). Contato: [email protected]

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177Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 177-199 abr/jun 2013

Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo e Antoine Metten

O complexo produtivo dasaúde e sua articulação com o

desenvolvimento socioeconômiconacional

Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado,Marcelo Santo e Antoine Metten

Introdução

O protagonismo da saúde na agenda de desenvolvimento do Brasil tem sido

amplamente reconhecido e valorizado. Isso decorre do fato de que políticas e

ações de saúde, além de proporcionar o bem-estar da população, apresentam

benefícios que extrapolam a especificidade do setor, a exemplo de seu impacto

na geração de renda e emprego nacionais.

Não bastassem essas qualidades, o papel estratégico da saúde no processo de

desenvolvimento é realçado por articular um sistema produtivo, de base industrial

(química, biotecnológica, mecânica, eletrônica e de materiais) e de serviços, de

forma interdependente e sistêmica, designado como complexo econômico-

industrial da saúde (CEIS)1. O arcabouço conceitual do CEIS reconhece tanto a

importância social da saúde, como também sua função enquanto produtora de

insumos e produtos para a prestação de serviços essenciais, pontuando seu caráter

sistêmico.

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178 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 177-199 abr/jun 2013

O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

Nesse contexto, que relaciona a lógicaprodutiva e social, o complexo da saúde écapaz de apresentar oportunidades para asuperação da tensão observada entre asdimensões econômicas e sócio-sanitárias,uma vez mediados os interessesconflitantes envolvidos na saúde.

Não obstante a importância do CEISpara o desenvolvimento nacional e o seupotencial para estabelecimento de umarelação virtuosa entre os interesses diversosno campo da saúde (VIANA; NUNES; SILVA,2011), ainda persiste uma visão limitada doseu caráter sistêmico, conforme enfatizamGadelha et al. (2012). Essa limitação temimplicações negativas no desenvolvimentoda base produtiva nacional com reflexosinsatisfatórios para a saúde coletiva e para odesenvolvimento econômico, observadosno crescente déficit da balança comercialda saúde.

Tal realidade pontua desafios e ame-aças à manutenção de um sistema universaldo porte do brasileiro, em especial ao seconsiderar a transição demográfica e oscustos crescentes da saúde. Cabe observarque, sem a superação da fragilidade da baseprodutiva, persistirão obstáculos à ofertauniversal de bens e serviços, acentuando avulnerabilidade do sistema de saúde(GADELHA e COSTA, 2013).

A relevância desse estudo deriva dapercepção de que somente avançando noconhecimento sobre essa base produtivapoder-se-á aprimorar o entendimentosobre os desafios que se apresentam paraa efetividade do sistema nacional de saúdee, adicionalmente, qualificar a elaboraçãoe implementação de políticas públicas parao fortalecimento do complexo da saúde.

Dito isso, este artigo objetivaaprofundar o conhecimento sobre o CEISe a dinâmica de seus subsistemas, com ointuito de melhor entender os processos

inovativos da saúde. Vale notar que, aoconsiderar a institucionalidade do CEIS,que é, a um só tempo, pública e privada,adota-se neste artigo uma abordagemsistêmica propiciada tanto pelo arcabouçoda economia política, que envolve o estudodas relações sociais de produção e deacumulação de capital, quanto pelo instru-mental teórico dos sistemas de inovação(SI), que entende o caráter essencialmentesocial dos processos de geração de ino-vação (FREEMAN, 1987; LUNDVALL, 1988;NELSON, 1993).

Além desta introdução, o texto estru-tura-se a partir da relação estabelecida entresaúde e desenvolvimento e do detalha-mento dos subsistemas do complexo eco-nômico-industrial da saúde. Contextualizatambém a relevância do sistema nacionalde inovação em saúde, de forma a tornarsustentável o sistema de saúde como umtodo. Por fim, ressalta a importância dodesenvolvimento da base produtiva einovativa da saúde no País, de modo aatender às necessidades sociais, e, nessecontexto, enfatiza a influência do Estadonessa arena política.

O complexo da saúde na agendade desenvolvimento nacional

Este artigo analisa a saúde sob umolhar sistêmico que abrange, além da suadimensão social, seu contexto deprodução. Para isso, o recorte de análise éo complexo econômico-industrial da saú-de, uma vez que esse articula simultanea-mente variáveis sociais, econômicas einovativas, questões-chave no atual cená-rio mundial de globalização assimétrica ecompetitiva.

Adota a perspectiva teórica de Furtado(1964), para quem o desenvolvimentorepresenta “um processo de mudança

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179Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 177-199 abr/jun 2013

Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo e Antoine Metten

“... a saúde vemenfrentando desafiosque impõem claroslimites àconsolidação de umsistema de saúdeque se pretendeuniversal, integral eequânime ...”

social pelo qual o crescente número denecessidades humanas (...) são satisfeitasatravés de uma diferenciação no sistemaprodutivo, gerado pela introdução deinovações tecnológicas” (FURTADO, 1964,p. 27). Ou seja, trata de uma concepção dedesenvolvimento diferenciada que reco-nhece a influência de variáveis econômicase inovativas no bem-estar coletivo.

Ademais, chama-se atenção para o fatode que, na sociedade contemporânea doconhecimento, a inovação merece destaque,uma vez que se torna um diferencial estra-tégico na definição do posicionamento deordem econômica e produtiva de um paísdiante dos demais, exercendo, inclusive,forte influência nas condições de vida daspopulações.

Para Furtado (1998), um modelo dedesenvolvimento ideal deveria interrompera reprodução dos padrões de consumo dasminorias privilegiadas e buscar a satisfaçãodas necessidades fundamentais do con-junto da população (FURTADO, 1998). Nessesentido, a inovação tecnológica deveria serreorientada para a busca do bem-estarcoletivo.

Seguindo essa perspectiva, pode-seaferir que o desenvolvimento de um paísencontra-se intimamente relacionado àsoportunidades disponibilizadas à suapopulação com vistas ao seu bem-estar,reafirmando-se a necessidade tanto desubsidiar quanto de orientar a indução dataxa de progresso técnico, para que asnovas tecnologias sigam rumos social-mente desejáveis e sustentáveis (COSTA etal., 2012), chamando atenção para o fatode que um determinado padrão de desen-volvimento tecnológico representa ummodelo particular de sociedade, evice-versa.

Parte-se do reconhecimento de que o“desenvolvimento tecnológico não é

neutro” e que é estabelecida uma duplarelação de causalidade, em que tanto aorientação do desenvolvimento tecnológicoinfluencia um determinado padrão desociedade, como a orientação socioeco-nômica e as institucionalidades influenciamo desenvolvimento tecnológico de umadeterminada nação (TIGRE, 2006).

Esse enfoque nos remete à pertinênciado uso de uma abordagem estruturalistado campo da economia política e do

arcabouço teórico dos sistemas deinovação, uma vez que processos deinovação são, por natureza,contextualizados socialmente em econo-mias complexas do capitalismo (FREEMAN,1987; SOETE; VERSPAGEN; WEEL, 2010).Ademais, esses enfoques reconhecem opapel dos diversos atores, de suasinterações e interesses, que levam à

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180 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 177-199 abr/jun 2013

O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

conformação dos sistemas de saúde, bemcomo sua importância para a conformaçãode um modelo nacional de desenvolvi-mento.

Entre os trabalhos desenvolvidos nocampo da saúde utilizando essa linhateórica vale mencionar algumas análises.Viana e Elias (2007) reconhecem apossibilidade de combinar crescimentoeconômico, mudanças na estrutura pro-dutiva e melhora do padrão de vida dapopulação. Machado et al. (2008) chamamatenção para a relevância do estudo darelação entre saúde e desenvolvimento,necessária para instrumentalizar osgrandes objetivos da reforma sanitária.Gadelha (2007) alerta para a inadequaçãode uma abordagem que desconhece ocaráter sistêmico da base produtiva dasaúde. A desarticulação histórica entreesses elementos que conformam ossistemas de saúde apresenta impactosdeletérios para a instituição do modelo debem-estar social, conforme preconizadona Carta Magna de 1988.

A promulgação da ConstituiçãoFederal de 1988 (CF/88) realça e conso-lida no Brasil a interdependência mútuaentre saúde e desenvolvimento. Ao estabe-lecer que a saúde é um direito de todos eum dever do Estado, a CF/88 consagrou-a como um elemento estruturante doEstado de Bem-Estar, expressando deforma inequívoca sua importância comoparte inerente ao processo de desenvol-vimento. Acolhem-se, assim, os anseios domovimento reformador da saúde, especial-mente quanto à visão ampliada da saúde,entendida como um direito de cidadaniaque, em termos gerais, significa condiçõesdignas de vida, acesso igualitário e universalàs ações e serviços de promoção, proteçãoe recuperação da saúde em todos os seusníveis (PAIM, 1997).

No entanto, a promulgação da CF/88não foi suficiente para impulsionar oSistema Único de Saúde (SUS). A concre-tização da saúde como um direito funda-mental exige ainda um grande esforço,especialmente no que se refere ao acessoigualitário a bens e serviços de saúde paratoda a população.

Mendes (1996) ressalta que, no Brasil, ainstituição do modelo de bem-estar e auniversalização da saúde ocorreram nacontramão da história, dado que coincidiramcom a adoção do modelo hegemôniconeoliberal que, entre outras diretrizes, pregavaa diminuição da participação do Estado.

Nesse contexto, Gadelha (2006)aponta que o processo que culminou coma criação do SUS não considerou que umsistema de saúde que se pretenda universalé composto não somente pela demandasocial por bens e serviços de saúde, mastambém por organizações voltadas àprovisão desses serviços, pressupondo ofortalecimento de sua base produtiva. Aretração da participação do Estado naspolíticas industriais, assim como a aber-tura abrupta do mercado brasileiro, carac-terísticos da década de 1990 no Brasil(GADELHA; MALDONADO; COSTA, 2012),tiveram efeitos devastadores para a baseindustrial da saúde2. De acordo comManfredini (2006, p. 161), “uma série deprodutos que havia sido incorporada àprodução local nas décadas anterioresdeixa de ser produzida no País, como, porexemplo, marcapassos implantáveis,aparelhos de laboratório mais complexose equipamentos radiológicos”.

Considerando especificamente oimpacto desse contexto no estágio dedesenvolvimento do CEIS, Viana e Elias(2007) também identificam contradições noque tange à desmercantilização do acessoà saúde que pautou o aumento da demanda,

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Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo e Antoine Metten

concomitante à adoção de um modelopolítico liberal que afastou o Estado nacio-nal de sua função de indutor e mediadorda produção industrial da saúde e dosinteresses envolvidos na mesma.

Extrapolando a análise do CEIS,Faveret e Oliveira (1990) destacam que aausência ou inadequação de investimentosindutores de inovação tecnológica motivouo Estado brasileiro a transferir parte de suaresponsabilidade com o sistema de saúderecém-criado ao setor privado, polarizandoainda mais as dimensões sociais e econô-micas envolvidas no bojo da saúde.

Sobre os interesses públicos eprivados no âmbito dessa agenda, Ugá eMarques (2005) defendem a tese de queo SUS foi criado em um momento em queo setor privado já se encontrava consoli-dado no País. Essa linha de argumentocorrobora a percepção de que essa resig-nação do Estado, ou seja, a diminuiçãode seu protagonismo explica, mesmo quenão integralmente, o fato de que ainda nãose alcançou no Brasil o círculo virtuosoentre saúde e desenvolvimento. Questãoessa preocupante no que se refere tantoao atendimento das demandas de saúdeda população quanto à inserção competi-tiva internacional; ainda mais quando seconsideram as fragilidades enfrentadaspor um país do porte do Brasil e com omodelo institucional do SUS.

Ainda que iniciativas diversas estejamsendo empreendidas visando à superaçãodesse quadro via o fortalecimento do CEIS,a saúde vem enfrentando desafios queimpõem claros limites à consolidação deum sistema de saúde que se pretendeuniversal, integral e equânime, sugerindoa necessidade de se aprofundar o conheci-mento sobre a dinâmica desse complexo.A ideia é elevar a capacidade de análise parasubsidiar a formulação de políticas públicas

capazes não somente de lograr competiti-vidade internacional, mas também demediar os conflitos entre interesses econô-micos e sócio-sanitários envolvidos naagenda de saúde. Desse modo, espera-seminimizar a vulnerabilidade do sistema desaúde, assim como promover ocrescimento sustentado nacional.

A base produtiva da saúde

O complexo econômico-industrial dasaúde (Figura 1) é caracterizado como umaglomerado de atividades econômicasinseridas em um contexto institucional cujossegmentos industriais são responsáveis pelaprodução de insumos e produtos que vãoconfluir para a base produtiva envolvida naprestação de serviços de saúde.

Seu caráter estratégico é crescentementerelacionado ao fato de que o CEIS é inten-sivo em inovação. Tanto no Brasil quantono mundo, esse complexo constitui osegundo setor mais intensivo em atividadesinovativas, respondendo por mais de 20%do esforço em pesquisa e desenvolvimentomundial (GLOBAL BOOZ AND COMPANY’S,2012). Além disso, articula tecnologias deuso dual (RUNDVALT e ALBUQUERQUE, 2012)que, apesar de voltadas para um determi-nado setor, apresentam repercussões poten-ciais sobre a atividade econômica como umtodo, como é o caso da nanotecnologia,biotecnologia, entre outros cujo potencialde aplicação a outros setores da economia écada vez mais evidente.

Esse complexo produtivo diferencia-se, ademais, por envolver um arranjoinstitucional público e privado e se destacapelo caráter sistêmico, uma vez que reco-nhece não somente a demanda da socie-dade por bens e serviços de saúde, comotambém uma estrutura responsável pelasofertas dos mesmos.

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O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

Ademais, ao relacionar as dimensõessocial e produtiva, o CEIS apresentapotencial para a superação da dicotomiaobservada entre a lógica econômica e asanitária, no que se refere às políticas parao desenvolvimento nacional. É pertinenteobservar que as estratégias tecnológicasem países líderes, no âmbito internacio-nal, vêm passando por um processo deprofundas transformações estruturais noque tange ao seu padrão de competi-tividade (GADELHA; QUENTAL; FIALHO,2003). Essas transformações permitemtecer algumas constatações no que serefere ao complexo da saúde.

Uma dessas constatações é que, nossegmentos intensivos em tecnologia doCEIS, o espaço para pequenas empresasde base tecnológica, que não se associemou tenham parcerias para superar asbarreiras econômicas, tecnológicas eregulatórias vigentes no mercado global, é

bastante reduzido (GADELHA et al., 2012).Outra é a verificação de evidências indi-cando que empresas líderes estão interes-sadas em aproveitar as oportunidades quese abrem em economias emergentes queapresentam potencial de crescimentosustentado3, a exemplo dos BRICS (Brasil,Rússia, Índia, China e África do Sul)(GADELHA et al., 2012). Por último, tal comose evidencia nos diversos programas depolíticas públicas voltados para o fortaleci-mento do CEIS, os Estados nacionaisreconhecem que o complexo está setornando um espaço competitivo e que, noBrasil, inicia-se a busca de uma intervençãosistêmica entre a sua base industrial e deserviços.

Tais constatações justificam a necessi-dade de se adensar o conhecimento sobreessa base produtiva, para melhor com-preender os desafios e as oportunidadescolocadas ao complexo e qualificar a ação

Figura 1: Morfologia do complexo econômico-industrial da saúde

Setores Prestadores de Serviço

Hospitais Ambulatórios Serviços de Diagnósticose Tratamento

Indústriade Vacinas

Indústria deHemoderivados

Indústria deReagentes paraDiagnósticos

Indústria de FarmecêuticaFármacos/Medicamentos Hemoderivados

Indústria deEquipamentos

Médicos e InsumosAparelhos não-eletrônicos

Aparelhos EletrônicosAparelhos de Prótese e

ÓrteseMaterial de Consumo

ESTADO-PROMOÇÃO

E

REGULAÇÃO

Indústria Produtora de Bens

Fonte: Gadelha, 2003.

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pública voltada para o setor. Isso implica,por sua vez, conhecer as características e adinâmica da cada um de seus subsistemas.

A indústria de base química ebiotecnológica da saúde

O subsistema de base química ebiotecnológica é composto pelas indústriasfarmacêuticas e por aquelas responsáveispela produção de vacinas, hemoderivados ereagentes para diagnóstico. Esse subsistemaagrega um conjunto de segmentos produ-tivos que se destacam tanto por sua impor-tância econômica, como por sua relevânciano domínio de novas tecnologias em áreasestratégicas para o País (VARGAS et al., 2010).Entre os subsistemas do CEIS, o de basequímica e biotecnológica constitui o maisdinâmico em termos de geração e difusãode inovação. (GADELHA et al. 2012).

Por sua vez, vale notar que a indústriafarmacêutica lidera a dinâmica competitivado subsistema e se caracteriza por ser oprincipal segmento de geração e difusãode inovações de base química e biotec-nológica. Marcado por elevado grau deinternalização da produção e intensaconcentração de mercado, o segmentofarmacêutico pontua a existência de inte-resses diversos, além dos sanitários, relacio-nados ao seu processo produtivo detecnologias estratégicas, como a nanotec-nologia, biotecnologia e química fina(ANGELL, 2007). Tanto Temporão (2002)quanto Gadelha (2002) chamam atençãopara o acirramento competitivo dosubsistema de base química e biotecno-logia, em que as empresas líderes farma-cêuticas invadem e submetem os demaissegmentos às suas estratégias de inovação.Dados do IMS Health4 mostram que aconcentração de mercado no segmentofarmacêutico encontra-se adstrita a dezgrandes empresas que, no total de suas

vendas, somaram quase a metade de todoo mercado farmacêutico mundial em 20105.Essa liderança decorre de duas caracterís-ticas presentes em suas estratégias compe-titivas, quais sejam: barreiras a novosentrantes no mercado, devido aos vultososinvestimentos em P&D e marketing neces-sários, e o monopólio temporário mediantepatentes, operando sobre produtos cujademanda é particularmente inelástica(GADELHA et al. 2012).

Ainda sobre as estratégias das empre-sas líderes, é importante observar que emseus processos de internacionalizaçãoconcentram as atividades de maior densi-dade tecnológica e só descentralizam, aospaíses da periferia do sistema internacional,aquelas de menor valor agregado. Nessespaíses, observa-se uma dissociação entre asnecessidades locais e os esforços privados

“... pode-sedizer que avulnerabilidadeda base produtivada saúde – etambém do sistemade saúde comoum todo – decorreda baixa capacidadede inovação damesma.”

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O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

em P&D. Essa dinâmica é ressentida, espe-cialmente pela insuficiência – e, em muitoscasos, pela ausência – de pesquisas direcio-nadas aos principais agravantes da saúde, aexemplo de doenças tropicais (MALDONADO,2012; GADELHA; MALDONADO; COSTA, 2012).

A respeito da concentração desse mer-cado e dos prejuízos sofridos pelos paísesque não dominam essas tecnologias da baseprodutiva da saúde, Oliveira, Labra eBremudez (2006) destacam que as 100maiores empresas farmacêuticas sãoresponsáveis por 90% da produçãomundial, sendo que 75% é consumida nosEUA, Japão e União Europeia. Nos últimos10 anos, nenhuma das vinte empresas demaior faturamento bruto mundial lançouum único medicamento para qualquer umadas doenças negligenciadas (MÉDICOS SEM

FRONTEIRA, 2001).

A indústria de base mecânica,eletrônica e de materiais da saúde

O subsistema de base mecânica, eletrô-nica e de materiais envolve as indústriasde equipamentos e instrumentos mecânicose eletrônicos, órteses e próteses e materiaisde consumo em geral. Suas atividades sãofortemente associadas às práticas médicas,determinando muitas vezes a tecnologia in-corporada nos procedimentos adotados, noque se refere à prevenção, diagnóstico etratamento de doenças (GADELHA;MALDONADO; COSTA, 2012; MALDONADO etal., 2013).

Vale destacar, nesse subsistema, o papelda indústria de equipamentos – tanto peloseu potencial de inovação, ao incorporar osavanços associados ao paradigma micro-eletrônico, quanto pelo seu impacto nosserviços, – que representa, de acordo comGadelha, Maldonado e Costa (2012), umafonte constante de mudanças nas práticasassistenciais e que, por sua vez, municia a

tensão permanente entre a lógica da indústria(econômica) e a sanitária (social).

A exemplo do subsistema de basequímica e biotecnológica, o presente subsis-tema também se caracteriza como umoligopólio6 baseado na diferenciação de seusprodutos, bastante especializados e comconstantes atualizações tecnológicas emespaço de tempo relativamente curto (LEÃO;OLIVEIRA; ALBORNOZ, 2008). Essa atuali-zação pressiona sobremaneira os custos daatenção à saúde, em especial porque asindústrias desse subsistema geralmentecompetem por meio do lançamento de equi-pamentos mais modernos e sofisticados.

Uma importante diferenciação dosubsistema de base mecânica, eletrônica ede materiais, em relação ao previamenteestudado, refere-se ao fato de que ele agregaà sua estrutura outros segmentos bastantediversificados; envolve desde bens de capitalde alta complexidade (como diagnóstico porimagem), até materiais de consumo de usorotineiro, passando por instrumentos,material cirúrgico e ambulatorial, seringas,entre outros.

De acordo com Maldonado et al. (2012),essa heterogeneidade, ao contrário dosegmento farmacêutico, permite queempresas de menor porte oriundas de paísesem desenvolvimento ocupem posiçõesrelativamente importantes, abrindo-se,assim, nichos de mercado para a indústrialocal. No caso brasileiro, o subsistema debase mecânica, eletrônica e de materiaisbeneficia-se de uma base produtiva razoa-velmente bem estruturada, fruto da políticade substituição de importações vigente noperíodo entre 1950 e 1980. Apesar de essaindústria ter sido bastante prejudicada pelaabertura comercial da década de 19907, orecente movimento de ampliação de acessoaos serviços de saúde dinamizou a demandapor equipamentos e materiais hospitalares

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e odontológicos, levando ao crescimento de114,3% das vendas reais entre 1999 e 2009(MALDONADO et al., 2012, p. 32).

Serviços de saúdeO subsistema de serviços é aquele de

maior peso econômico do complexo dasaúde, uma vez que responde por 64% dageração de bens e serviços de saúde noPaís8 (IBGE, 2012; BRASIL, 2008). Suaimportância é enfatizada tanto por serestruturante do sistema de bem-estarquanto por seu papel na atividade econô-mica e no sistema nacional de inovação,uma vez que também articula novastecnologias que emergem no esteio da 3a

Revolução Industrial, designadas detecnologias portadoras de futuro, e que sereferem a atividades produtivas intensivasem C&T. Essas características dos serviçosde saúde reforçam a ideia de que esse com-plexo produtivo possui potencial tanto paraadensar o tecido produtivo quanto paradirecioná-lo, de modo a compatibilizar aestrutura de oferta com a demanda socialde saúde (GADELHA, 2007).

Vale notar que os serviços dinamizama relação estabelecida com os demaissubsistemas de base industrial do CEIS,estabelecendo o caráter sistêmico do mesmo,em especial por sua função de consumidore demandante, muitas vezes influenciandoe sendo influenciado pela produção deequipamentos médico-hospitalares, pro-dutos farmacêuticos, imunoderivados, sorose demais insumos (ALBUQUERQUE;CASSIOLATO, 2000; COSTA et al., 2012). Logo,é na interação entre setores com objetivosàs vezes não consonantes que se buscamsoluções para atender aos desafios postospela conjugação das novas característicasepidemiológicas e da necessidade de reduçãodos crescentes custos com cuidados desaúde (COSTA et al., 2012).

Note-se que não é trivial acomodar osinteresses públicos e privados situadosnessa agenda, não somente por sua impor-tância social e econômica, como tambémpor seu caráter estratégico e pelo porte eassimetria dos interesses envolvidos. Valeenfatizar que são vários os interesses emjogo quando se pensa em estruturar umsistema de saúde. Lassey et al. (1997 apudIBAÑEZ, 2011) chamam atenção, emespecial, para os interesses referentes aoacesso, relevância econômica, caracterís-ticas e tamanho do mercado industrial,pressão de custos, incorporação tecno-lógica, composição do financiamento ealterações das características epidemioló-gicas e demográficas.

Para se ter a dimensão desse mercado,Santos e Passos (2010) estimam que osgastos globais em serviços de saúdesomaram US$ 4 trilhões em 2007. No casobrasileiro, de acordo com o IBGE (2012),os serviços de saúde representam umademanda de aproximadamente R$ 250bilhões – se consideramos a manutençãoda participação dos serviços observada noPIB de 2009, de 5,6%, para o ano de 2012.

Assim, além das questões mais obvia-mente relacionadas à dinâmica dessesubsistema (acesso e perfil sanitário), todoo arcabouço político-institucional dasaúde, os interesses econômicos envol-vidos, as tecnologias articuladas pelasindústrias do complexo da saúde, e oscondicionantes da geração de conheci-mento influenciam sobremaneira a dinâ-mica dos serviços de saúde. Nesse sentido,cabe refletir sobre o papel da AgênciaNacional de Saúde Suplementar (ANS) noque tange à regulação dos planos de saúde,uma vez que os mesmos impactamsobremaneira o padrão de consumo e,logo, as tecnologias incorporadas nosistema nacional de saúde.

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O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

Justamente porque lidam com seg-mentos tão dinâmicos da economia, osserviços de saúde têm-se organizado cres-centemente como uma indústria, em basesempresariais de grande escala, tendo nacapacidade de inovação o principal fatorde dinamismo, competitividade e auto-nomia. Isso reafirma a importância de umaabordagem sistêmica e de seguir adensandoo conhecimento desse subsistema(GADELHA et al., 2012), sob risco de osinteresses privados manterem-se soberanosem relação aos sociais também nosubsistema de serviços de saúde.

O desafio da inovação no com-plexo produtivo da saúde

Nos últimos anos, vem-se observandono Brasil a expansão do acesso aos serviçosde saúde concomitante a mudanças nascaracterísticas epidemiológicas, resultante domodelo político institucional do SUS, daevolução das condições socioeconômicas dapopulação, da transição demográfica emcurso e da veloz incorporação tecnológicapor parte dos serviços de saúde. Comoconsequência, observa-se, entre outrascoisas, um expressivo aumento da deman-da por insumos relacionados à prestação ecuidados da saúde que, em contrapartida,ocasionou o crescimento das importaçõesde insumos e produtos de saúde, refletindouma situação de dependência, insustentávelno médio e longo prazo.

Nesse contexto, tornou-se evidente afragilidade da base produtiva da saúde,observada no crescimento do déficit dabalança comercial do CEIS, particular-mente a partir dos anos 2000. Tal cenáriorepresenta uma dupla ameaça, dado que,por um lado, decorre da fragilidadeprodutiva nacional em segmentostecnológicos portadores de futuro e, por

outro, traduz-se em um limitante para oprojeto de universalização do SUS. Aponta,dessa forma, para a necessidade de forta-lecer a dinâmica inovativa do CEIS, demaneira a desenvolver a produção nacionalde insumos de saúde.

Como reflexo dessas evidências, ocaráter estratégico do CEIS tem sidoreconhecido em distintas políticas públicasa partir dos anos 2000. A política industriale tecnológica e de comércio exterior(PITCE), lançada em 2003, foi pioneiranesse aspecto, ao reconhecer o potencialda cadeia produtiva farmacêutica paraalavancar a incorporação de tecnologiasportadoras de futuro, a exemplo dananotecnologia, biotecnologia e químicafina, entre outras (BRASIL, 2003). Em 2007,no âmbito do Programa Mais Saúde, foireconhecida a necessidade de fortaleci-mento da base produtiva do CEIS parareduzir a dependência externa em relaçãoaos insumos críticos para a saúde e,portanto, a vulnerabilidade da política desaúde brasileira (BRASIL, 2007).

Por sua vez, em 2008, a política dedesenvolvimento produtivo (PDP)priorizou o complexo da saúde ao estimulara transferência de conhecimento científico-tecnológico para a redução da vulnerabi-lidade do sistema nacional de saúde (BRASIL,2008). Em 2011, o Plano Brasil Maiordestacou o complexo produtivo da saúdecomo uma das prioridades estratégicas parao desenvolvimento nacional. Por fim, em2012, a Estratégia Nacional de Ciência,Tecnologia e Inovação enfatizou a necessi-dade de promoção de mecanismos deestímulo à inovação em saúde.

No entanto, apesar da crescenteinstitucionalização da importância da saúde,a fragilidade do CEIS permanece evidente,conforme se verifica pela evolução do déficitde sua balança comercial (Gráfico 1).

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Ressalte-se que esse déficit saiu de umpatamar de US$ 3 bilhões em 2003, paraultrapassar US$ 10 bilhões em 2012, reve-lando a vulnerabilidade do sistema de saúdeno Brasil e da inserção competitiva inter-nacional.

No que se refere à participação dos seg-mentos produtivos no déficit da balançacomercial da saúde em 2012 (Gráfico 2), osubsistema de base química e de biotecno-logia representa um saldo negativo de cercade US$ 8 bilhões9. Desse total, US$ 2,8bilhões são decorrentes do déficit com aimportação de medicamentos, US$ 2,4bilhões com a importação de insumosfarmoquímicos e US$ 1,8 bilhão com aimportação de hemoderivados. O restanterefere-se à aquisição externa de vacinas, dereagentes para diagnóstico e de soros etoxinas, que totaliza cerca de US$ 1 bilhão.

Conforme se observa no Gráfico 2, odéficit gerado pela importação de fármacose medicamentos foi responsável por cercade metade de todo o resultado negativo do

balanço comercial do CEIS. De tal modoque, atualmente, esse setor revela particularvulnerabilidade da saúde, representandorisco implícito para a implementação depolíticas universais e integrais de acesso aosbens e serviços de saúde.

Vale notar que essa debilidade, obser-vada nas indústrias do subsistema de basequímica e biotecnologia, é igualmentepercebida nas indústrias do subsistema debase mecânica, eletrônica e de materiais,especialmente naqueles segmentos demaior complexidade tecnológica, cujodéficit atingiu, em 2012, o montante deUS$ 2,2 bilhões (Gráfico 2).

A despeito da baixa competitividade,é importante mencionar que essesubsistema – que reúne um conjunto parti-cular de atividades com grande heteroge-neidade tecnológica – oportuniza aexistência de nichos competitivos em queo Estado pode atuar, no sentido de incen-tivar o fortalecimento da indústria nacional(GADELHA; MALDONADO; COSTA, 2012).

Gráfico 1: Evolução da Balança Comercial da Saúde – CEIS 2012(Valor em US$ bilhões, atualizado pelo IPC/EUA)

Fonte: Elaborado por GIS/ENSP/FIOCRUZ, a partir de dados da Rede Alice / MDIC. Acesso em janeiro/2013.

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O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

Quanto aos serviços de saúde, convémpontuar que os Gráficos 1 e 2 refletem,ainda que não completamente, a demandapelos insumos, produtos e bens que sãoutilizados nesse subsistema. Ademais, atransição demográfica em curso e as novascaracterísticas epidemiológicas10 implicarãotanto o aumento quanto a transformaçãodas condições de demanda. Consequen-temente, observar-se-á grande pressãosobre o sistema industrial por novasvacinas, medicamentos, equipamentos e,sobretudo, sobre a produção de serviçoshospitalares, ambulatoriais e de diagnós-tico, representando custos que o sistemade saúde, já subfinanciado11, não tem comosuportar.

Nesse sentido, no que tange às fragili-dades do CEIS, a principal questão a serenfrentada é como estimular o desenvolvi-mento de produtos com alto valor social,de modo a reverter o quadro de vulnera-bilidade ao qual o sistema de saúde encon-tra-se exposto, tendo em vista, inclusive, ainserção competitiva internacional. Vale

destacar que, no Brasil, se observa umabaixa competitividade do CEIS em face domercado mundial, em função de fatoresdiversos atinentes tanto ao próprio modeloe estrutura do Estado12 quanto a questõesmais setoriais.

O grande dilema que se apresenta aocomplexo é que o contexto nacional secaracteriza por uma dupla desarticulação.Por um lado, em que pesem todas as inicia-tivas governamentais recentes em relaçãoà saúde, esta ainda não é abordada de formasistêmica na agenda de desenvolvimentonacional. Por outro, a despeito da basecientífica instalada no País e da existênciade base industrial diversificada, esta não éinovativa, uma vez que a natureza e inten-sidade das interações estabelecidas entreambas não têm propiciado processosinovativos. Observa-se, dessa forma, oafastamento da empresa em relação à basecientífica do País, decorrente de caracte-rísticas e desarticulações do sistema nacio-nal de inovação, que está marcado por umabaixa capacidade inovativa. Por esses

Gráfico 2: Participação dos Segmentos do CEIS no Déficit da Balança Comercialda Saúde – 2012

Fonte: Elaborado por GIS/ENSP/FIOCRUZ, a partir de dados da Rede Alice/MDIC. Acesso em janeiro/2013.

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motivos, no Brasil, a base produtiva dasaúde é o elo fraco do sistema nacional deinovação em saúde.

Além disso, Chaves e Albuquerque(2006) apontam a existência de um “limiarde produção científica” necessário parainiciar circuitos virtuosos entre ciência etecnologia, situado em 150 artigos pormilhão de habitantes. De acordo com osautores, em meados dos anos 2000, o Brasilalcançava a marca de 63 artigos por milhãode habitantes, portanto abaixo do citadolimiar. Cabe lembrar que a produçãobibliográfica científica não basta por si sópara gerar inovações, uma vez que essaprecisa ser articulada com a base industrial.

Em função dessas evidências, pode-sedizer que a vulnerabilidade da base produ-tiva da saúde – e também do sistema desaúde como um todo – decorre da baixacapacidade de inovação da mesma.

Cabe ressaltar, ademais, que caracte-rísticas do arcabouço institucionaltambém não têm incentivado que asinovações se orientem socialmente. Apertinência dessa questão encontra eco emCosta e Gadelha (2012) e em Viana, Silvae Elias (2007), na medida em que sepercebe que a incorporação tecnológicano Brasil enfrenta forças assimétricasquanto aos interesses sanitários e econô-micos, responsáveis pelo estabelecimentode uma relação hierárquica mais favorávelaos interesses econômicos (VIDOTTI;CASTRO; CALIL, 2008).

Visando a aprofundar o entendimentosobre processos inovativos da saúde, tem-se utilizado o arcabouço teórico dosistema nacional de inovação em saúde(SNIS). A partir de estudos seminaiselaborados por Freeman (1987), Lundvall(1988) e Nelson (1993), autores diversos,a exemplo de Albuquerque e Cassiolato(2002), vêm propondo a aplicação do

conceito de sistema nacional de inovação(SNI) ao setor da saúde13. Dentro dessacorrente teórica, a geração, uso e difusãode inovações são percebidos comorespostas aos “processos sistêmicos quepermitem às empresas e demais organi-zações aprender, usar e acumular capaci-tações e desenvolver novos produtos eprocessos” (LASTRES; CASSIOLATO, 2007,p. 153). No caso do SNIS, essas interaçõesenvolvem atores diversos: universidadese instituições de pesquisa; hospitais,clínicas e postos de saúde; instituição deregulação (Agência Nacional de VigilânciaSanitária); indústria farmacêutica, deequipamentos e materiais hospitalares; eórgãos públicos voltados para a área dasaúde pública. A Figura 2 apresenta o con-junto dos atores envolvidos e suas intera-ções no caso de SNIS maduro.

Ressalta-se que, pelo fato de o SNISenvolver uma forte institucionalidadepúblico-privada, surge uma janela deoportunidade para potencializar oprocesso de geração de inovação emsaúde, dado o marcante protagonismo doEstado – que, a um só tempo, se confi-gura como importante demandante ecomprador de bens e serviços, comotambém responde pelo aparato institu-cional desse sistema, além de outrasquestões relacionadas a investimento,prestação de serviços de saúde etc.

Assim, numerosas iniciativas foramempreendidas visando ao fortalecimento doCEIS, que se configura como o elo frágildo SNIS, por meio da intensificação dasinterações entre atores públicos e privadose de medidas de fortalecimento das indús-trias nacionais relacionadas ao CEIS, aexemplo da transferência de tecnologia entreempresas farmoquímicas e laboratóriosoficiais, e programas para o fortalecimentoda base produtiva e inovativa nacional.

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O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

Vale ressaltar uma particularidadenacional, referente à existência de uma redede laboratórios oficiais capazes de poten-cializar a atuação pública e a orientação socialdo desenvolvimento tecnológico nacional.Um exemplo emblemático refere-se à expe-riência pioneira da produção do Efavirenzpelo laboratório público Farmanguinhos daFiocruz (em parceria com três empresasfarmoquímicas nacionais), que serviu de basepara que o Ministério da Saúde institucio-nalizasse, em 2009, uma política de desen-volvimento produtivo, viabilizando parceriassimilares com um marco legal mais estável.Destaca-se, ainda, a consolidação da redenacional de laboratórios públicos com a cons-trução da Hemobrás em Pernambuco, donovo Instituto Nacional de Traumatologia eOrtopedia (INTO) e do novo CampusIntegrado do Instituto Nacional do Câncer(INCA) no Rio de Janeiro, evidenciando amobilização do Estado no campo dainovação em saúde.

Por fim, as vultosas compras públicasde insumos de saúde para o funcionamento

do SUS também têm potencial para insuflara dinâmica inovativa do CEIS, por meiodo uso do poder de compra do Estado14.

No entanto, apesar dessas importantesiniciativas, ainda não se alcançou um nívelsatisfatório de interação entre os atoresenvolvidos, notadamente entre indústriae institutos de pesquisa/universidades noSNIS, de maneira a fortalecer a dinâmicainovativa do CEIS, como evidenciado pelocrescente déficit de sua balança comercial.

Adicionalmente, Costa et al. (2012)chamam atenção para limitações viven-ciadas por instituições de regulação, aexemplo da ANVISA15, assim como paraa necessidade de aprimoramento do marcoregulatório no que se refere às políticasvoltadas para o desenvolvimento produ-tivo (uso do poder de compra do Estado,transferência tecnológica, margem depreferência). Nessa mesma linha, sugere-se a revisão do papel da ANS no que serefere à mediação dos interesses público-privados vigentes na agenda da saúde, nosentido de incentivar um padrão de

Figura 2: Fluxos de informações científicas e tecnológicas no sistema de inova-ção do setor saúde: o caso de países com sistemas maduros

Fonte: Chaves e Albuquerque (2006, p. 525).

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consumo em saúde que seja socialmenteinclusivo.

Nesse contexto, o complexo mostra-se pouco articulado tanto com relação àbase de conhecimento nacional – reconhe-cidamente forte na área da saúde – quantopara o desenvolvimento de um sistemanacional equânime e universal em saúde.O que suscita, assim, a necessidade nãosomente de se definir prioridades nofomento à competitividade das indústriasnacionais de saúde (que muito avançounos últimos anos), como de se qualificare intensificar as políticas e mecanismosde fomento à capacidade produtiva e deinovação do CEIS. A ideia é conduzi-lopara patamares de maior densidadetecnológica e buscar uma produção queseja orientada socialmente, retomando oconceito de Furtado, para quem “desen-volvimento” relaciona-se tanto comhomogeneização social quanto com odesenvolvimento de um sistema produtivoeficiente que apresente uma relativa auto-nomia tecnológica (FURTADO, 1964).

Advoga-se, nesse sentido, pela supe-ração da histórica polaridade moderni-zação-marginalização nacional (FURTADO,1964; ALBUQUERQUE, 2007; SABOIA;CARVALHO, 2007). De forma análoga, casoo complexo da saúde não seja abordadode forma sistêmica e não se mediem osinteresses sociais e econômicos, corre-se orisco de se observar um crescente distancia-mento das indústrias da saúde em relaçãoaos princípios do SUS.

Considerações finais

A pertinência da utilização do arca-bouço teórico da economia política e doinstrumental dos sistemas de inovação naanálise é evidenciada quando se busca umolhar sistêmico da saúde, que inclui a sua

vertente social, mas não se limita a essa. OCEIS, ao relacionar também a dimensãoeconômica da saúde, revela seu carátersistêmico, apresentando potencial para asuperação da dicotomia observada entre alógica econômica e a sanitária.

Uma articulação virtuosa entre essasduas dimensões, em especial considerando-se o caráter estratégico das tecnologias porela relacionadas, pode orientar um padrãode inovação tecnológica, público e privado,que aproxime a produção das necessidadeslocais e que, adicionalmente, permita umsalto qualitativo em um ambiente interna-cional extremamente competitivo.

No entanto, na atualidade o CEISenfrenta um duplo desafio. Por um lado,apesar de ter sido objeto de uma série deprogramas de políticas públicas nos últimosanos, a saúde ainda não é abordada integral-mente de forma sistêmica na agenda dedesenvolvimento nacional. Por outro, suabase produtiva ainda não apresenta umadinâmica inovativa capaz de torná-la compe-titiva em nível internacional, como seevidencia ao analisar a evolução da balançacomercial do CEIS. Cabe destacar que essesdesafios não são exclusivamente relacio-nados às indústrias desse complexo, mascondicionam a capacidade do País parauniversalizar de fato seu sistema de saúde.

Para reverter esse quadro, é necessárioadensar o conhecimento acerca da dinâ-mica inovativa da base produtiva da saúde.Nesse sentido, o arcabouço teórico doSNIS constitui uma ferramenta conceitualrica em perspectivas para nortear umaagenda futura de pesquisa, com o intuitode formular políticas públicas capazes deorientar socialmente o desenvolvimentotecnológico e produtivo da saúde. Aintensificação e qualificação do uso dopoder de compra do Estado, das parceriaspara o desenvolvimento produtivo, além

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O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

do fortalecimento da rede de laboratóriospúblicos e o aprimoramento do marcoregulatório relativo ao fortalecimento doCEIS constituem opções promissoras paraalcançar tamanho objetivo.

A partir do exposto no artigo, sugere-se que se intensifique o uso de tais instru-mentos de ação pública, de maneira a

conferir autonomia à base produtiva dasaúde, tornando, dessa maneira, sustentávelo projeto de universalização do SistemaÚnico de Saúde, conforme estabelecido naConstituição de 1988.

(Artigo recebido em janeiro de 2013. Versãofinal em junho de 2013).

Notas

1 Neste artigo, as terminologias “complexo da saúde”, “complexo produtivo” ou “complexoeconômico-industrial da saúde” (CEIS) serão utilizadas como sinônimos ao se referirem aoconjunto de segmentos produtivos (industriais e de serviços) que estabelecem uma relaçãosistêmica entre si, envolvidos na prestação de serviços de saúde.

2 A retração do Estado e a falta de política industrial no período afetam todo o parqueprodutivo brasileiro. Além disso, dado a saúde ser intensiva em tecnologias portadoras de futuro,os efeitos deletérios da abrupta abertura comercial dos anos 1990 foram de grande alcance,também no que diz respeito à competitividade internacional da economia brasileira.

3 De acordo com a prospecção do mercado farmacêutico desenvolvida pelo IMS Health(2012), o gasto total dos países emergentes deve quase dobrar no período 2011-2016, passandode US$ 194 bilhões em 2011 para US$ 359 bilhões em 2016 (no mesmo período, o mercadobrasileiro deve dar um salto de US$ 30 bilhões para US$ 55 bilhões).

4 Dados extraídos da apresentação institucional da Secretaria de Ciência, Tecnologia e InsumosEstratégicos do Ministério da Saúde (2009).

5 Disponível em: www.Pharmexec/article/article. Acessado em: 20/12/2011.6 A concentração deste mercado é tamanha, que as vinte maiores empresas de equipamentos

e materiais médico-hospitalares respondem por cerca de 70% da produção em nível mundial(THE WORLD MEDICAL MARKETS FACTS BOOK, 2010).

7 De acordo com Maldonado (2012, p. 6), “a década de 1990 foi marcada por transfor-mações estruturais no funcionamento desta indústria [de equipamentos e materiais hospitalares]em decorrência do processo de abertura comercial, o que significou uma crescente dependênciado País em relação às importações de equipamentos, sobretudo de maior densidade tecnológica”.

8 Segundo dados do IBGE (2012), a saúde respondeu por 8,8% do PIB em 2009; desses,5,6% referem-se somente aos serviços.

9 Dados elaborados por GIS/ENSP/FIOCRUZ, 2012, a partir de dados da Rede Alice/MDIC. Acesso em: janeiro/2012.

10 As características epidemiológicas da população apontam para significativas transformaçõesno que tange ao aumento de doenças crônicas.

11 O subfinanciamento da saúde, em especial, no que se refere à parcela de origem pública,é incompatível em um país como o Brasil, onde 76% da população depende exclusivamente do

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Sistema Único de Saúde e a participação pública nos gastos sanitários gira em torno de 46%(GADELHA; COSTA, 2012). Este, inclusive, representa um dos principais desafios setoriais queprecisam ser vencidos para a superação da fragilidade do SUS.

12 A exemplo das características do sistema tributário nacional, da infraestrutura instalada, dosistema educacional e sua consequências para a formação das competências nacionais, entre outros.

13 Outros autores já tinham delineado pistas teóricas nesse sentido, a exemplo de Hicks e Katz(1996), ao apontar a existência de um sistema biomédico de inovação, e de Gelinjs e Roseberg(1995), ao estudar interações entre universidades e indústrias na geração de inovações médicas.

14 A Lei no 12.349/2010, regulamentada pelo Decreto no 7.546/2011, que prevê margem depreferência de até 25% para a compra a produtores nacionais (sendo possível considerar nocálculo geração de emprego e renda, impacto na arrecadação de impostos, desenvolvimentonacional), constitui um instrumento importante para materializar esse potencial.

15 O prazo médio de aprovação de um remédio por parte da Anvisa, afetada por uma estru-tura de recursos humanos subdimensionada, chegou, no final de 2012, a 640 dias, contra ummáximo de 180 dias para produtos considerados como estratégicos nos Estados Unidos (OEstado de São Paulo, 26/11/2012).

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Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo e Antoine Metten

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O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socioeconômico nacional

Resumo – Resumen – Abstract

O complexo produtivo da saúde e sua articulação com o desenvolvimento socio-econômico nacionalLaís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo e Antoine MettenO objetivo deste artigo é aprofundar o conhecimento sobre o complexo econômico-industrial

da saúde (CEIS) e a dinâmica de seus subsistemas, identificando os principais desafios dessecomplexo no Brasil e as ameaças à manutenção de um sistema de saúde que se pretende universal.A relevância desse estudo situa-se no reconhecimento de que, não obstante a importância dasaúde e de sua base produtiva na agenda de desenvolvimento nacional, sua fragilidade representacrescente vulnerabilidade para o sistema de saúde nacional, enfatizando, inclusive, a necessidadede adensar a base de conhecimento científico sobre o tema. Para a sua elaboração, adotou-seuma abordagem sistêmica, propiciada tanto pelo arcabouço da economia política quanto peloinstrumental teórico dos sistemas de inovação (SI).

Palavras-chave: saúde; complexo econômico-industrial da saúde; setor produtivo; desen-volvimento

El complejo productivo de la salud y su articulación con el desarrollo socioeconómiconacionalLaís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo y Antoine MettenEl objetivo de este trabajo es profundizar en el conocimiento del complejo económico-

industrial de la salud (CEIS) y de la dinámica de sus subsistemas, identificando los principalesdesafíos de este complejo en Brasil y las amenazas para el mantenimiento de un sistema de saludque se pretende que sea universal. La importancia de este estudio radica en el reconocimientode que, a pesar de la importancia de la salud y de su base de producción en la agenda nacional dedesarrollo, su fragilidad representa la creciente vulnerabilidad del sistema nacional de salud, conénfasis en la necesidad de aumentar la base de conocimientos científicos sobre el tema. Para suelaboración, hemos adoptado un enfoque sistémico, impulsado tanto por el marco de la economíapolítica como las herramientas teóricas de los sistemas de innovación (SI).

Palabras clave: salud; complejo económico-industrial de la salud; sector productivo;desarrollo

Health Economic-Industrial Complex and national economic and social developmentLaís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo and Antoine MettenThe aim of this paper is to deepen the knowledge about the Health Economic-Industrial

Complex (CEIS) and dynamics of its subsystems, identifying the main challenges of this complexin Brazil and threats to maintaining a health care system that is intended to be universal. Therelevance of this study lies in the recognition that despite the importance of health and itsproduction base in the national development agenda, its fragility means increased vulnerabilityfor the national health system, emphasizing the need to increase the base of scientific knowledgeon the subject. For its elaboration, we adopted a systemic approach, fostered by both theframework of political economy as the theoretical tools of innovation systems (IS).

Keywords: health; health economic-industrial complex; productive sector; development

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199Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 177-199 abr/jun 2013

Laís Silveira Costa, Carlos Augusto Grabois Gadelha, José Maldonado, Marcelo Santo e Antoine Metten

Laís Silveira CostaÉ doutora em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fiocruz (ENSP/Fiocruz) e mestreem Development Studies pela London School of Economicis and Political Science. É Analista de Gestão da Inovação emSaúde da Fiocruz, coordenadora adjunta do Grupo de Pesquisa de Inovação em Saúde da Fiocruz e coordenadora cientí-fica do Boletim Informativo do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. Contato: [email protected]

Carlos Augusto Grabois GadelhaÉ doutor em Economia pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Tem atuado comoSecretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, coordenador do mestrado profissionalem Política e Gestão de CT&I em Saúde da ENSP/Fiocruz e coordenador do Grupo de Pesquisa de Inovação em Saúdeda Fiocruz. Contato: [email protected]

José MaldonadoÉ doutor em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador adjunto domestrado profissional de Política e Gestão em CT&I em Saúde da ENSP/Fiocruz e pesquisador do Grupo de Pesquisa deInovação em Saúde da Fiocruz. Contato: [email protected]

Marcelo SantoÉ doutorando em Saúde Pública pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fiocruz (ENSP/Fiocruz) epesquisador do Grupo de Pesquisa de Inovação em Saúde da Fiocruz. Contato: [email protected]

Antoine MettenÉ mestre em Sciences de Gouvernement Comparées pela Institut d’Étude Politique de Grenoble e membro do Grupo dePesquisa de Inovação em Saúde da Fiocruz. Contato: [email protected] / [email protected]

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201Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 201-222 abr/jun 2013

Joanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro e Paula Felix Ferreira

Política econômica brasileirafrente à crise mundial recente:

uma análise baseada nascontribuições de Kaldor

Joanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro ePaula Felix Ferreira*

Introdução

O artigo de Kaldor (1971), “Conflicts in National Economic Objectives”, é

um estudo seminal para a compreensão das tensões sobre variáveis macroeconômicas

no processo de estabelecer metas e instrumentos da busca de resultados para a polí-

tica econômica. As preocupações de Kaldor sobre as dificuldades da economia britânica

no final da década de 1960 decorriam, principalmente, de considerações sobre técnicas

e estratégias inapropriadas de gestão que priorizavam o crescimento liderado pelo

consumo em vez de liderado pelas exportações1. A combinação dessas duas abordagens

está presente no tratamento histórico dos problemas da economia brasileira e também

daqueles mais recentes causados pela crise econômica internacional.

A versão original da teoria kaldoriana prioriza o crescimento do PIB,

impulsionado pelo aumento das exportações. Estas são dependentes do aumento

da renda mundial e da possibilidade de alcançar saldos na balança comercial. O

processo envolve especialmente a diversificação na pauta de exportações industriais,

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202 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 201-222 abr/jun 2013

Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análise baseada nas contribuições de Kaldor

o que depende de investimentos produtivostanto para sustentar o crescimento do setorcomo para atrair investimentos domésticos eexternos, além de incorporar o progressotecnológico. As exportações são um compo-nente exógeno da demanda agregada quedesempenha um papel fundamental.

Os países que atuam no ensejo deimplementar essa concepção macroeconô-mica buscam ampliar investimentos nosetor industrial, alcançar avanços noprogresso tecnológico para expandir aprodutividade e assim atender a novosmercados. A estratégia kaldoriana estásujeita a um debate teórico e empírico,pois a implementação dessa agendaenvolve um “pacote de medidas” de polí-ticas industrial, monetária e fiscal. Nessesentido, busca-se revigorar o setor indus-trial, medidas essas que nem sempre estãoem sintonia com a teoria estática (ricar-diana) das vantagens comparativas. Aabordagem envolve uma perspectivadinâmica, e, para se testar a mesma, têmsido utilizadas diversas versões no modelode Thirwall (1979), em que a elasticidade-renda da demanda por importações é obtidapela razão entre a taxa de crescimento dasexportações e a taxa de crescimento doproduto. Uma versão recente contemplaaspectos multissetoriais e dinâmicos domodelo, conforme salientam Teixeira eAraújo (2012).

Naturalmente, para um bom desem-penho industrial, é necessário prestaratenção em:

i) reduzir as incertezas do mercado pormeio de normativas consistentes e trans-parentes;

ii) estimular a eficiência na troca deinformações entre os agentes públicos eprivados, externos e internos;

iii)gerar uma política de câmbio quefavoreça o setor industrial;

iv)buscar uma política de juros combaixa rentabilidade do investimentoespeculativo, privilegiando assim oempreendedorismo produtivo; e

v) reduzir os custos de transação, esti-mulando assim a integração “forward” e“backward”da cadeia produtiva.

Críticos da abordagem kaldorianasugeriram, na época, mudanças no modelo.Posteriormente, foi sugerido um newdevelopment paradigm, no caso, domestic demand-led growth. Este se baseava na abordagem queprivilegiava o crescimento impulsionadopela expansão da demanda interna, e nãoapenas o consumo. Nesse contexto, policymakers buscariam desenvolver esforços nosentido de evitar a dependência exageradado comércio externo – a base do modeloexport-led growth. Isso exigiria uma guinadade direção da visão governamental, alme-jando desprender-se das condições impostaspelo investidor e o mercado externo.

Hoje em dia, os governantes não têmvislumbrado uma ruptura completa entreos dois modelos, mas sim uma diferençade ênfase dentro de uma totalidade econô-mica. Com efeito, busca-se atualmente umasíntese do enfoque doméstico e do enfoqueexportador, ao contrário de uma rivalidadeentre pensamentos opostos. Outro olharsobre o problema consiste em visualizarduas versões alternativas: uma baseada noregime de crescimento wage-led (quando umaumento da participação da massa salarialna renda nacional gera impacto positivo nocrescimento) e a outra no profit-led (quandoesse aumento dos salários gera um impactonegativo). Na perspectiva de estratégias decrescimento, uma questão relevante con-siste em determinar empiricamente qualtipo de regime de crescimento vigora emdeterminada economia. Contudo, esse é umproblema que envolve a distribuição fun-cional da renda, ganhos de produtividade

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e questões políticas contingentes aomomento histórico. Portanto, não se podegarantir uma conclusão unívoca sobre osucesso das estratégias em questão. Nossainclinação é pela validade condicional ereexame da abordagem kaldoriana original(export-led versus consumption-led growth), umavez que acreditamos que esse enfoquepossui um arsenal teórico mais compatívelcom fatos estilizados da realidade nospaíses emergentes. A saber, a perspectivada distribuição funcional da renda naversão convencional é do tipo jogo-soma-zero, em que as perdas se equivalem aosganhos – o que não tem ocorrido no Brasil.Nossa preferência de consumption-versus-export é condicional, pois percebermos quenão necessariamente a estratégia baseadana demand-led growth implica automati-camente a acomodação da oferta àdemanda. Esse tema escapa ao escopo dopresente trabalho2.

Destaca-se no trabalho de Kaldor ateoria circular de causação acumulativa(circular cumulative causation)3. Esta sintetizauma investigação dinâmica em que diversasvariáveis são analisadas simultaneamente,uma vez que suas relações são interligadas.Nessa perspectiva, como há grande interde-pendência entre as variáveis macroeco-nômicas, Kaldor sugere quatro variáveissimultâneas essenciais para analisar odesempenho macroeconômico: taxa decrescimento da economia, taxa de desem-prego, taxa de inflação e balanço de paga-mentos como percentagem do PIB.

Diversos economistas e policy makersperceberam que os instrumentos acima nãosão necessariamente associados a funda-mentos teóricos ou conceituais de con-textos específicos, mas consistem em umconjunto de propostas operacionais deampla validade. Nesse sentido, KarlSchiller, Ministro das Finanças da

Alemanha Ocidental entre 1971 e 1972,introduziu uma representação gráfica conhe-cida como quadrado mágico, que operacio-nalizava geometricamente as ideias deKaldor. Com pequenas modificações, essaanálise visual ganhou destaque internacionalem estudos e publicações da OCDE.Bernard et alii (1988) sumarizam a utilizaçãodesse instrumento de análise para a compa-ração do desempenho econômico pré-criseno período 1960-1973 e durante a crise no

período 1974-1980 na França, Japão eInglaterra.

Medrano-B e Teixeira (2012), emtrabalho fundamentalmente teórico, revisi-taram a construção dos quadrados mágicosbuscando mensurar o impacto de políticaseconômicas. Nesse sentido, eles estenderama construção gráfica original incorporandouma análise algébrica que quantifica a

“O contrasteentre a baixa taxa deinvestimentobrasileira e asdificuldadesgovernamentais pelocontrole da inflaçãorevela uma questãoparticular daeconomia brasileiraque não pode sercomparada aos seusparceirosemergentes.”

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geometria envolvida na elaboração desseinstrumento de avaliação macroeconômica.

No presente texto, buscamos utilizarparte do instrumental analítico reformu-lado (quadrados mágicos) para estudar oimpacto da crise recente a partir de dadosda economia brasileira nos períodos 2007-2008 e 2009-2010. A abordagem é conec-tada com a concepção kaldoriana centradano debate export-led versus consumption-ledgrowth mencionado. Na parte empírica,fazemos um diagnóstico período porperíodo (antes e durante a crise) para aeconomia brasileira.

Após essa introdução, na seção seguinteapresentamos elementos da concepçãoteórica, representação geométrica e contri-buição analítica dos quadrados mágicos comos indicadores econômicos para o Brasil(Gráfico 1), indicadores relacionados a polí-ticas econômicas implementadas em razãoda crise (Gráfico 2) e também revisitamoso debate kaldoriano sobre crescimentosustentado pelas exportações ou impulsio-nado pelo consumo. Em seguida, consi-deramos, especificamente, metas e instru-mentos utilizados nos dois períodos.Por fim, são apresentadas as conclusões,em que salientamos que a complexidadeda gestão macroeconômica tem sidosubestimada.

O quadrado mágico modificadocom representação da perspectivakaldoriana

Desde os esforços iniciais para seentender a crise de 2008, surgiram muitasanálises acerca de seu impacto no Brasil.Nesse contexto, também se levantaramquestões acerca da efetividade das medidasbrasileiras sequencialmente adotadas. Odesempenho de nossa economia pode sermedido via estudos econométricos, pela

construção de modelos matemáticos, ou pelasimples análise gráfica. Naturalmente, épossível analisar tais performances e osconflitos nas metas e instrumentos de polí-tica macroeconômica utilizando a aborda-gem de Kaldor (1971), que sintetiza umainvestigação em que diversas variáveis sãoanalisadas simultaneamente, uma vez quesuas relações são interligadas. Como hágrande interdependência entre as mesmas,é interessante introduzir a visualizaçãogeométrica na forma do quadrado mágico.Tal abordagem pode ser estendida emdiversas direções. Na Tabela 1, são apresen-tados os dados para a economia nos períodosrelevantes para a análise proposta:

Tabela 1: Dados para o quadrado deKaldor (médias dos períodos)

2007-08 2009-10

Inflação 5,18 4,81PIB 5,63 3,6Desemprego 8,55 7,4Transações Correntes -0,803 -1,863

Fonte: dados Ipeadata.

No presente trabalho, no intuito de seconstruir o quadrado mágico, os valorespara a economia brasileira, com base naTabela 1, têm os seguintes campos de vali-dade4:

σ – Crescimento (-2 ≤ σ ≤ 8)π – Inflação (IPCA) (2 ≤ π ≤ 7)ϕ Transações correntes (-2 ≤ ϕ ≤ 2)δ – Desemprego (5 ≤ δ ≤ 10)Esses valores de referência surgiram

da necessidade de se modelar um paísWonderland (ideal), que teria seus indica-dores otimizados, com base em umatransformação linear dos campos de vali-dade. Os valores-limite do espaço amostralsurgiram das amplitudes máximas e

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mínimas obtidas pelo Brasil na últimadécada, de forma a circunscrever o país “per-feito” kaldoriano ao limiar de uma repre-sentação realista. O desemprego inicia o seuespaço amostral a partir de 5% pela supo-sição de que os governos não estariam inte-ressados em reduzir esse índice para zero.

Para tal argumentação é útil trazer aspalavras de Kalecki:

“É falsa a suposição de que umgoverno manterá o pleno emprego numaeconomia capitalista se ele sabe comofazê-lo. Com relação a isso, é de crucialimportância a desconfiança dos grandesempresários acerca da manutenção dopleno emprego por meio do gastogovernamental (Kalecki, 1977, p.54).”

As palavras de Kalecki suscitam umaquestão difícil e fascinante que podedecorrer de três visões: i) reprovação àinterferência pura e simples do governo noproblema do emprego, utilizando gastospúblicos; ii) reprovação ao direcionamentoda despesa governamental que pode gerarcrowding-out (investimento público afastandoinvestimento privado) em vez de crowding-in (investimento público estimulandoinvestimento privado); e iii) os capitalistastendem a rejeitar o pleno emprego decor-rente do déficit orçamentário do governoque poderia gerar inflação (isto é, umaespiral viciosa de preços e salários). Esseprocesso só faria sentido se fosse possívelevitar inflação. Portanto, é necessário nãoforçar exageradamente o dispêndio públicoacima daquilo que for considerado umautilização adequada do trabalho e dos bensde capital. Além dos gastos suscitados pelocontínuo déficit orçamentário na sustentaçãodo pleno emprego, há a recusa dos empre-sários em perder seu poder de barganhaque determina o mark-up (KALECKI, 1944).

Retomando a perspectiva do quadradode Kaldor, com relação aos “quadrân-gulos” internos, indicados no Gráfico 1,quanto menores as respectivas áreas, menora performance de um país. Com o propósitode verificar quais foram as principaisestratégias estabelecidas e quais foram asrespostas da política macroeconômica,tendo como referência a crise internacional,foi construído o quadrado mágico norma-lizado. Ele trata das mudanças entre osperíodos pré-crise (média 2007-2008) eapós deflagração da recessão mundial (mé-dia no período 2009-2010).

Para uma análise gráfica correta, comoreconsiderada por Medrano-B e Teixeira(2012), tivemos que rever as unidadesdimensionais que estão sendo abordadas.Nesse sentido, selecionamos um índice quevai de 0 a 100, de modo que a seleção deuma constante numérica (100) possanormalizar a unidade da área. Esse novoíndice adimensional pode ser visualizadoda seguinte maneira:

ϕ -2 |- - - - - - - - - - - - - - -|2ϕ’ 0 |- - - - - - - - - - - - - - -|100

Percebe-se, na Figura 1, que qualquerponto no eixo ϕ’ pode corresponder a umponto no eixo ϕ. Isso nos possibilita res-ponder o problema de descobrir a retarelevante:

Figura 1: Normalização dos indicadores

-3 -2 -1 0 1 2 30

50

100ϕ’

ϕ

Fonte: Elaboração própria.

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Nesse caso, ϕ’ = 25(ϕ + 2).

Analogamente, a partir de um índicede 0 a 100, temos:

π’ = 20π − 40σ’ = 10σ + 20δ’ = 20δ − 100

Com base nas expressões algébricasacima, para , ϕ’, π’, σ’e δ’ além dos indica-dores da Tabela 1, podemos construir oquadrado mágico normalizado, como noGráfico 1 (ver página seguinte).

Percebem-se aqui os impactos geraisda crise: a retração da atividade econômicacomo um todo, evidenciada por meio deuma abrupta queda na taxa de crescimentodo PIB, um déficit nas transaçõescorrentes e relativa estabilidade no nívelde emprego. A inflação permaneceu sobcontrole, em face da baixa demandadoméstica e internacional. Via de regra,pode-se afirmar que o País sofreu umbaque com o novo cenário externo, masas medidas de política econômicaadotadas pelo Governo em resposta e amanutenção de um mercado interno relati-vamente fortalecido garantiram que o Paísnão entrasse em prolongada recessão.Contudo, as políticas adotadas não foramcapazes de impedir contrações significa-tivas na taxa de crescimento e o resultadonegativo das transações correntes.

Em um novo quadrado mágicobaseado nos dados da Tabela 2, propomosuma análise embasada em variáveismacroeconômicas diretamente relacionadasàs políticas aplicadas em razão da crise.

Com isso, é possível interpretar poroutro ângulo como foi a atuação governa-mental diante da crise e as respostas daeconomia no que se refere aos indicadoresdas finanças públicas. Para essa análiseforam selecionadas quatro variáveis5:

α – Operações de crédito ao setor públicoe privado (%PIB) 0≤α ≤60β – Taxa de investimento (%PIB) 0≤β ≤30θ – NFSP – variação da dívida líquida(%PIB) 0≤θ ≤40ε – Exportação FOB (%PIB) 0≤ε ≤18

Utilizando a normalização na formaanteriormente apresentada, temos os novosíndices associados à atuação do Governo:

Assim, tomando os valores dessasvariáveis no intervalo de um índice linearentre 0 e100, segue-se o Gráfico 2 (verpágina seguinte).

A política governamental de expansãofiscal e monetária torna-se, portanto,evidente nesse novo quadrado mágicomodificado. O Governo estimulou sensi-velmente a expansão do crédito paraconsumo e investimento. Isso foi decor-rente em parte da emissão de novos meiosde pagamento e também do aumento dosgastos financiados pelo BNDES, entre osanos 2009 e 2010. A resposta brasileiranesse período garantiu uma demandaefetiva aquecida em um período derecessão mundial, somada a uma alta nasexportações devido ao comércio com omercado chinês. Houve também um maiorestímulo às exportações, ainda que ocenário recessivo global tenha tido umainfluência mais contundente na redução dasexportações em 2010 e 2011. Assim, pode-se pensar que a estratégia adotada consistiu

α’ = 53 α

β’ =103 β

θ’ = 52 θ

ε’ = 59 ε(5 + )

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Fonte: Elaboração própria.

Gráfico 2: A atuação do Governo brasileiro

Fonte: Elaboração própria.

Gráfico 1: Indicadores do Brasil

Tabela 2: Quadrado modificado de Kaldor (médias dos períodos)

Fonte: dados Ipeadata e Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC).

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em uma combinação de export-led growth econsumption-led growth, porém a frequênciaalta e certa inconsistência de intervençõesdo Governo em setores da infraestrutura(políticas petrolífera, energética e de trans-portes etc.) trazem incertezas para poten-ciais investidores, prejudicando o proces-so de acumulação de capital (MYRDAL,1957; KALDOR, 1978).

Alguns acontecimentos positivos con-sistiram na crescente emissão de crédito,crescimento dos salários reais, políticas detransferência de renda etc., que permitirama ascensão social de 40 milhões de brasi-leiros. Todavia, surge a necessidade de segarantirem condições que possibilitem opagamento desses financiamentos, taiscomo o controle da inflação e uma ade-quada taxa de juros, que garanta a susten-tabilidade dessa empreitada.

Por outro lado, o Governo tem usadoincentivos, convencimento e pressão paraimpulsionar o investimento privado ereduzir os efeitos internos da crise inter-nacional. Não tem ocorrido muito sucessonessa área. Notemos que esses recursosestão sendo escassos e alocados sem umamelhora significativa na infraestrutura, esem o rompimento dos entraves burocrá-ticos que emperram os investimentospúblicos e privados. A necessidade de pla-nejar e gerar preços competitivos colocaem pauta a importância de termos uminvestimento produtivo mais eficiente,incorporando mudanças tecnológicas e exi-gindo maior fiscalização por parte dasagências reguladoras. No curto prazo, oinvestimento responde por parcela rele-vante da expansão da demanda interna.Mas a expansão da demanda doméstica temesbarrado na fraqueza do investimento. Amédio e longo prazo, as consequências dobaixo investimento (como proporção doPIB) são graves, pois afetam a capacidade

de crescimento sustentável. Salientamos aimportância da necessidade de um olhargovernamental que não responsabilizeapenas a recessão global pela timidez dainversão.

Existe uma controvérsia sobre as duasdinâmicas de crescimento, por estímulo àsexportações e/ou por estímulo ao consu-mo. Para Kaldor, a indústria era o principalmotor da economia, no sentido de contri-buir para uma alocação mais eficiente dosrecursos, introduzir novas tecnologias,estimular o processo de learn-by-doing, efavorecer o superávit na conta de transações.O estímulo às exportações tem sido umarationale que vem desde os clássicos, e éfavorecida por Kaldor. Entretanto, osucesso das exportações está estritamentevinculado à demanda agregada dos paísesimportadores. Além disso, Palley (2002)salienta que, na concorrência global, ospaíses emergentes podem incorrer numadisputa de abaixar seus custos até o “fundodo poço”. Nesse caso, fica claro o riscodessa estratégia, que pode ser prejudicadapor instabilidades financeiras no mercadoexterno (investimento fortemente especu-lativo em períodos de recessão global).

No que tange à estratégia baseada noconsumption-led growth, pode-se argumentarque, apesar das desejáveis mobilizaçõessociais para cima, nada garante que esseavanço na inclusão social seja continua-mente sustentável. Um aumento da renda,subsidiado seja pelo salário ou pelo crédito,que não seja acompanhado de um aumentona produtividade poderá gerar uma pressãoinflacionária e também inadimplência porparte dos tomadores de crédito.

A amplitude e sustentabilidade dasduas estratégias podem ser questionadas,o que tem levado a considerações conhe-cidas como “hiperatividade paralisante”: defato, um tratamento keynesiano hiperativo

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do governo que não esteja sustentado poruma capacidade produtiva avançada nãosurte efeitos. Segundo Lamounier (2005),o País precisa ser justo com o seu passadode forma a determinar o seu presente. Talfenômeno ocorre devido ao fato de que,ao longo do período em análise, parte sig-nificativa do investimento realizado no Paísfoi baseado em capital especulativo ou foialavancado por um cenário auspicioso,impulsionado pela demanda global porcommodities e por um contexto internacionalmais favorável vivenciado antes da crise.Adicionalmente, as descobertas de reservasde petróleo no pré-sal aumentaram ootimismo, e as políticas de inclusão social,juntamente com uma política fiscal expan-sionista, colaboraram para o dinamismo daeconomia brasileira. Porém, com a criseeconômica, o País teve as suas perspectivasde crescimento frustradas e o nível deatividade econômica acabou por declinar.

Além disso, outras questões precisamser respondidas: o interesse de quem, deveser levado em consideração na implemen-tação de políticas públicas? Quais interessesdevem ou podem ser sacrificados? Certa-mente, esses dois pontos envolvemquestões referentes à dominância e distri-buição do poder entre diferentes gruposna economia nacional e global.

Em um panorama mais detalhado arespeito das políticas econômicas aplicadasno país, podemos entender com mais cui-dado como ocorreu o desempenho da eco-nomia brasileira no período imediatamenteanterior à crise e nos anos subsequentes.

Políticas econômicas face à crisefinanceira internacional

Políticas pré-criseO Brasil passou por vários planos

frustrados de estabilização da inflação até

o projeto de implementação do Plano Real,quando se desenvolveu o conhecido tripémacroeconômico (superávit fiscal/metasde inflação/controle do câmbio). Porém,ficaram expostos flancos da balançacomercial, em especial o desequilíbrioexterno e o déficit fiscal. A sobrevalorizaçãodo câmbio gerou um déficit na balançacomercial e no setor de serviços que tornouo país dependente do investimento diretoestrangeiro. Embora a relação dívida

pública/PIB esteja diminuindo, esta nãoconsegue ser saldada, apesar dos superávitsprimários ocorridos ao longo dos anos. Talfenômeno ocorre porque, apesar do saldopositivo entre as despesas e receitaspúblicas, o resultado não é positivo o sufi-ciente para cobrir os juros, razão pela qualsurge déficit nominal. Essa retroalimentaçãoda dívida pública se dá pelos juros altos,que sustentam o investimento direto

“... a integraçãoentre as estruturasprodutivas de nossopaís deve ser o temade preocupaçãooriginal do Governobrasileiro ... ”

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estrangeiro responsável por compensar asnossas baixas sistemáticas da conta deserviços e rendas em nossa balança depagamentos. Adicionalmente, comoherança da política dos juros altos, os títulosda dívida pública emitidos apresentamrentabilidade tão alta que aplicar neles émais lucrativo que o capital investido naprodução, implicando em uma desestabi-lização do mercado financeiro e produtivo.

Temos, então, algumas das razões pe-las quais o País apresentava, desde os anos1990, várias trincheiras pelas quais umacrise externa poderia se alastrar. Essastrincheiras se deram pela variação bruscado câmbio, pelo preço das commodities e pelapreferência de investimento no mercadoespeculativo. No que tange à entrada derecursos externos, não apenas estes sevoltavam aos ativos especulativos degrande risco, como também estimularam,via apreciação da moeda nacional, oconsumo de importados.

Nos últimos 15 anos, a elevada taxade juros, mantida para evitar a fuga decapitais e tornar o rendimento de nossostítulos públicos um dos melhores do mun-do, terminou por ajudar no controle doregime de metas da inflação. Não obstante,esse benefício também se deu com muitoscustos à economia brasileira. A recusa daequipe econômica governamental em lidarcom um modelo abrangente e dinâmicocomo o de industrialização kaldorianadeixou à margem elementos fundamentaispara o desenvolvimento e a integração dossetores econômicos. A saber, o nível deinvestimento foi reduzido, sendo que, entre2000 e 2008, essa taxa obteve uma médiade 15,05%, em contraste com a própria taxade investimento da década perdida (anos1980), que foi de 22,5%.

O contraste entre a baixa taxa de inves-timento brasileira (ficando marginalizada em

prol do equilíbrio da balança de pagamentos)e as dificuldades governamentais pelocontrole da inflação revela uma questãoparticular da economia brasileira que nãopode ser comparada aos seus parceirosemergentes. Nossa economia possui umamaior heterogeneidade entre suas estruturasprodutivas com uma pauta de exportaçãovoltada à venda de commodities. Ainda, o preçodas suas exportações tende a se deteriorarem vista das diferenças das elasticidades-renda da demanda de seus parceiroscomerciais. Salientamos, pela perspectivakaldoriana apresentada neste trabalho, quea integração entre as estruturas produtivasde nosso país deve ser o tema de preocu-pação original do Governo brasileiro, emvez de uma pequena faceta do cenáriomacroeconômico que poderia ser resolvidaextraordinariamente com o controle dosjuros e a estabilidade dos preços. Nesse sen-tido, fica clara a nossa escolha do quadradomágico modificado de Kaldor (Gráfico 2),contendo simultaneamente as relações entretaxas de investimento, exportações, gastogovernamental e emissão de crédito. Essasvariáveis não devem ser consideradas secun-dárias na amplitude do cenário macroeco-nômico, mas sim as partes principais de ummecanismo governamental a ser examina-do e analisado em conjunto.

O lento progresso na produtividade dotrabalho acarreta contração da competi-tividade industrial e os termos de trocapodem se tornar desfavoráveis aos paísescom uma pauta de exportações compostaem grande parte pela agricultura; natural-mente, porque a elasticidade-renda dasimportações é sempre mais inelástica(THIRWALL, 2003 e 2008). Portanto, todasessas deficiências impostas ao Brasildeixam nossa economia sujeita a ciclosreflexos, em que só é possível crescer se equando a liquidez internacional é farta.

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Ainda, a sobrevalorização do câmbio realdificultava cada vez mais a inserção da pro-dução doméstica na economia mundial. Amoeda brasileira, no período pré-crise, es-tava relativamente sobrevalorizada por suanatureza financeira.

O Governo Lula trouxe uma novatransformação da economia, voltada a pro-jetos sociais e à expansão do investimento.Contudo, decidiu dar continuidade a certosesforços realizados no Governo de ItamarFranco e depois no Governo de FernandoHenrique Cardoso, de maneira a prosse-guir no patamar de investimento de baixorisco, que o país havia alcançado nomercado internacional. Para tanto, tentoumanter firme o tripé controle cambial(agora com bandas)/metas de inflação/austeridade fiscal (superávit). As medidasnão foram suficientes para barrar atormenta da crise de 2008, mas concederamao País um cenário econômico singularpara se tratar da crise nos anos seguintes.

Antes do deflagrar da crise, o Paísapresentava bons indicadores internos (vejaa Tabela 3): crescimento e inflação

moderados, déficit e endividamento inferiorà média mundial, consumo e crédito emexpansão, geração de empregos formais,aumento da massa salarial e redução dapobreza. No plano financeiro, pode-seperceber uma valorização intensa de ativos,uma apreciação na bolsa de valores, e umademanda relativamente aquecida.

Essa conjuntura se deu no períodoimediatamente anterior à crise, porque em2007 a política monetária continuou atendência já aplicada de ser moderada-mente flexibilizada para fazer frente a umcenário de aceleração de preços observadoem 2006. No decorrer de 2007, reduçõesna taxa de juros se nortearam pela percep-ção posterior de que a alta dos preços eradecorrente de fatores essencialmentetransitórios. Por isso, apesar de o ambienteexterno apresentar um cenário de menorliquidez e aumento da volatilidade dosmercados globais na segunda metade doano, o Comitê de Política Monetária(Copom) brasileiro considerou que aevolução recente da inflação em patamarconsistente com as metas era condizente

Tabela 3: Indicadores econômicos do Brasil e da América Latina

Fonte: World Bank Database e Ipeadata.

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com maiores reduções na taxa de juros.Assim, em outubro, a taxa de juros foiestabelecida em 11,25% ao ano.

A condução da política monetária foiorientada de forma que a inflação se manti-vesse dentro das metas estabelecidas. Issotambém permitiu que o País absorvesse deforma suavizada as turbulências do mer-cado financeiro internacional, iniciadas apartir de meados de 2007, e contribuiu paraque o aumento do dinamismo da demandainterna não se deteriorasse em resposta aum ambiente de elevação acentuada dospreços agrícolas.

Embora o crescimento dos níveis dedemanda tenha contribuído para aredução dos superávi ts da balançacomercial, o balanço de pagamentosobteve resultado global consistentementepositivo com recorde de US$ 87,5 bilhõesneste ano. Assim, os resultados favo-ráveis das contas externas permitiram aadoção de políticas mais consistentespara a administração do passivo externolíquido do País, cuja posição credora foiinfluenciada pelo aumento nas reservasinternacionais e pela redução do estoqueda dívida externa.

Essa estratégia de redução da expo-sição cambial do setor público e derecomposição das reservas, adotada desde2003, conferiu maior solidez às contasexternas do país e elevou a resistência daeconomia aos choques adversos externos,conforme pôde ser verificado pelo impactomarginal da crise no mercado subprime dosEstados Unidos sobre a economia brasi-leira neste ano. Com efeito, as reservas in-ternacionais passaram de US$ 85,8 bilhõesem 2006 para US$ 180,3 bilhões em 2007.Adicionalmente, o Tesouro Nacional conti-nuou a sua política de aquisição de recursos no mercado de câmbio para opagamento do serviço da dívida externa e

de recompra antecipada de bônus sobe-ranos a fim de fortalecer o perfil do endi-vidamento.

Em síntese, a melhoria dos funda-mentos macroeconômicos da economiabrasileira, juntamente com o recordealcançado pelas reservas internacionais, oaumento da corrente de comércio, a reduçãoda dívida pública externa vinculada à expo-sição cambial e o fluxo recorde de divisaspara o País, perfilaram entre os elementosfundamentais que conferiram maior solidezao País em um contexto de forte instabi-lidade dos mercados financeiros interna-cionais. No que tange ao mercado finan-ceiro doméstico, apesar da controvérsiaexibida por uma taxa de juros que rivali-zava com os investimentos produtivos eimpactava desfavoravelmente as finançaspúblicas, houve uma grande quantidade dereservas, oriundas do sistema normativo eregulamentário do País. Este cumpria comfolga os acordos de Basiléia, em que ocoeficiente de capital mínimo exigido(patrimônio líquido em relação aos ativosdos bancos ponderados pelo risco) era muitosuperior ao já previamente exigido noscomitês econômicos no período pré-crise.Entretanto, a crise se alastrou para o Paísdevido a outras fragilidades.

Políticas pós deflagração da criseEm 2008, o desempenho da atividade

econômica internacional passou a serafetado de maneira mais acentuada pelosdesdobramentos da crise oriunda domercado subprime nos EUA. Deste abaloeconômico, a manifestação inicial maisintensa no Brasil (porém não a única) foi adepreciação do real, um sintoma da escassezglobal de dólares e da piora dos termos detroca decorrente dos preços das commodities.A queda do preço das commodities tambémengendrou a redução do comércio. Em

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outubro de 2008, a moeda brasileira foiuma das primeiras a serem abandonadaspela contração de liquidez, o que ocasio-nou a variação brusca de R$1,60/dólar emagosto de 2008 para R$2,30/dólar emoutubro de 2008.

Na opinião de Silva e Resende (2008),nos períodos de reversão cíclica do nívelde liquidez (isto é, uma crise), o raciona-mento de crédito tende a ser muito maiorpara as economias em desenvolvimento.Portanto, a tendência do esgotamento dedivisas externas, em um mercado liberali-zado, tende a ser muito mais provável nospaíses em desenvolvimento do que empaíses desenvolvidos com um mercadofinanceiro consolidado.

Nesse sentido, para fazer frente a umcenário global marcado por escassez de cré-dito e indícios de uma crise muito maiornos investimentos produtivos externos denossa nação, o Governo brasileiro decidiuinterromper a trajetória de aumento dosjuros praticada no início do ano e passou apraticar uma política monetária maisflexível, fixando a taxa de juros em 13,75%no final de 2008.

A economia brasileira, após ter apre-sentado um cenário de expansão doconsumo e do investimento na maior partedo ano, passou a evidenciar no segundotrimestre os impactos do acirramento dacrise financeira internacional. Esses impac-tos foram sentidos fortemente no créditoe nas expectativas dos agentes. Nesse novocenário de redução do nível da atividadeeconômica, as principais políticas contra-cíclicas aplicadas na área monetária sedirecionaram para a expansão do crédito,com o objetivo de garantir as exportaçõese a liquidez no mercado por meio de em-préstimos pelo Banco Central em moedaestrangeira, e para a liberação de recursos,com a finalidade de regularizar a liquidez

do sistema financeiro nacional e incenti-var o crescimento dos empréstimos.

No que se referem ao setor externo, astransações correntes, após apresentaremresultados superavitários por cinco anosconsecutivos, registraram déficit em 2008.Esse resultado negativo se aprofunda até aúltima medição em 2011 e se deve ao fatode o crescimento das importações superaras exportações e ao aumento nas remessaslíquidas de lucros e dividendos. A grave

reversão da balança comercial foi um dosprincipais fatores relacionados à queda daperformance do País, como pode ser vistono quadrado mágico exibido no Gráfico1. Os efeitos do cenário econômico inter-nacional sobre o crédito também fizeramcom que o Banco Central tomasse medidasno mercado de câmbio por meio de inter-venções de compras de dólar no mercado

“A economiabrasileira deve servista também doponto de vista darelação de qualidadede vida esustentabilidade doprocesso de inclusãosocial.”

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Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análise baseada nas contribuições de Kaldor

spot. Convém destacar que, mesmo em umcenário de deterioração dos mercadosfinanceiros, as reservas internacionaiscresceram e atingiram ao final do ano US$206,8 bilhões.

Quanto ao setor bancário, as repercus-sões da crise foram diferentes do ocorridointernacionalmente em vista da diferentenatureza bancária que o Brasil vinhadesenvolvendo desde os anos 1990. Há umboom de crédito desde 2004, destacando-seo crédito pessoal, financiamento a veículose capital de giro das empresas, entre outros.Apesar da brusca redução do spreadbancário após o deflagrar da crise, ele aindapermaneceu elevado, permitindo aosbancos obter elevada lucratividade.

Entretanto, as instituições bancárias demenor porte sofreram uma contração deliquidez mais abrupta do que os grandesbancos, inclusive em moeda nacional. Umtermo cunhado para sintetizar esse caso é“empoçamento de liquidez” (MESQUITA eTORÓS, 2010). Nessas condições, o BancoCentral decidiu agir ativamente ao estabe-lecer um regime que liberasse mais liquidezpara os pequenos bancos, e permitir quebancos maiores pudessem comprar osativos dos primeiros. Essas mudanças noperíodo pré-crise alteraram significativa-mente a arquitetura do mercado bancáriobrasileiro.

No que concerne à atuação da equipeeconômica do Governo e não às norma-tivas do Banco Central, as medidas decombate à crise surgiram por váriosinstrumentos. Em 2009 o acirramento docenário recessivo nos mercados finan-ceiros demandou medidas adicionais nasesferas monetária, fiscal e cambial peloGoverno brasileiro. Basicamente, o obje-tivo das políticas econômicas adotadasconsistia em oferecer melhores condiçõesde liquidez interna e proporcionar

estímulos à demanda agregada que favore-cessem a retomada do crescimento.

A política monetária foi flexibilizadapor meio de sucessivos cortes na taxa dejuros, que terminou por ser fixada em8,65% em 2009. Na área fiscal, foi mantidae ampliada a política de redução de im-postos sobre produtos industrializadosincidentes sobre eletrodomésticos, auto-móveis, produtos da construção civil,móveis e bens de capital. Essas medidasvisavam a assegurar a estabilidade relativado nível de emprego nesses segmentosintensivos em mão de obra, e a fortalecero dinamismo da demanda doméstica.

No que concerne ao setor externo, aatuação do Governo se concentrou nacriação de instrumentos para assegurarliquidez em moeda estrangeira frente àcontinuada escassez de crédito interna-cional. Os efeitos recessivos da crisefinanceira sobre a economia mundialacabaram por contribuir para a continui-dade do resultado deficitário em transaçõescorrentes. Nesse contexto, o PIB registrouvariação negativa e terminou o ano em-0,32%. A inflação terminou o ano comvariação de 4,31%, pressionada peloaumento dos preços dos alimentos e daspolíticas econômicas mais expansionistaslevadas a efeito pelo Governo. Contudoesse limite esteve situado dentro do inter-valo de tolerância do regime de metas paraa inflação.

Em 2010, os mercados financeirosinternacionais registraram menor volatili-dade do que no ano anterior. Porém,presenciava-se um contexto de fortepressão sobre as cotações das commoditiesagrícolas a partir do segundo semestre doano, o que impactou diretamente o cresci-mento da taxa de inflação e o processo decondução da política monetária. Nessesentido, o Copom, após manter a taxa de

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juros (Selic) em 8,75% ao ano, terminou operíodo praticando uma política monetáriamais restritiva com uma taxa de 10,75% .

Adicionalmente, o Governo adotou, nofinal do ano, um conjunto de medidas denatureza macroprudencial com o objetivode aperfeiçoar os instrumentos de regu-lação, assegurar a estabilidade do sistemafinanceiro nacional e permitir a conti-nuidade do desenvolvimento sustentáveldo mercado de crédito. Entre as principaismedidas estão a elevação dos depósitoscompulsórios e o requerimento de capitalpara operações de crédito a pessoas físicascom prazos superiores a 24 meses.

No setor externo, foram adotadas polí-ticas que objetivaram criar condiçõesfavoráveis para o aumento da competiti-vidade das exportações brasileiras. A con-dução da política cambial foi orientada pormedidas que evitavam que a liquidez emmoeda estrangeira resultasse em excessivavolatilidade e desequilíbrios no mercadode câmbio. Apesar das incertezas quanto àefetiva melhora do cenário internacional,o processo de fortalecimento da economiabrasileira se traduziu em um crescimentode 7,5% no ano.

A economia brasileira moderou aexpansão em 2011, após o expressivoresultado registrado no ano anterior. Essaevolução esteve alinhada com o cenário dedeterioração do ambiente econômico inter-nacional, mobilidade social das classes De C e os ciclos de expansão do crédito.Como resultado, o PIB registrou aumentode 2,7% no ano.

Entretanto, é importante ressaltar que,em um ambiente de retração da demandaexterna, o crescimento da economia foisustentado pelo mercado doméstico, comdestaque para o dinamismo do consumodas famílias. Esse desempenho da demandadoméstica refletiu principalmente as

condições favoráveis do mercado de traba-lho e a manutenção dos programasgovernamentais de distribuição de renda.

A política de fortalecimento dademanda interna foi em sua maioria impul-sionada por linhas de crédito, com grandeparticipação do BNDES. Nesse sentido, emnosso quadrado mágico das atuaçõesgovernamentais (Gráfico 2), torna-seevidente o dilema kaldoriano entreconsumption-led growth (aqui coordenado como crédito) e export-led growth. As principaisvariáveis que sinalizam o melhor desempe-nho do Governo brasileiro estão associadasao eixo vertical crédito-exportações.

A redução do nível da atividade econô-mica ao longo de 2011 também foicompatível com as políticas econômicas apli-cadas desde 2010, visando a ajustar as con-dições de liquidez interna e o descompassoentre a oferta e a demanda agregadas. Comvistas a acomodar a perspectiva de consoli-dação de um cenário inflacionário, causadotanto pelo crescimento da demanda internaquanto pelo aumento do preço dascommodities, o Copom promoveu até meadosdo ano elevações na taxa de juros, que foifixada em 12,5% ao ano em julho. O traba-lho de Silva e Harris (2012) trata do tema.

Contudo, no decorrer dos demais me-ses, ante um cenário internacional cada vezmais restritivo, e devido aos recuos no nívelde capacidade instalada da economia, oCopom procedeu a sucessivos cortes nataxa de juros, que chegou a 11% ao ano.Assim, apesar do fraco desempenho daeconomia brasileira nesse ano, a relativasolidez das contas externas brasileirasneutralizou o impacto da volatilidade dosmercados financeiros internacionais.

Nesse sentido, a consistência da políticamacroeconômica brasileira, baseada nospilares metas de inflação, responsabilidadefiscal e câmbio flutuante, possibilitou

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alguma resistência aos choques adversosderivados da crise financeira internacional.Porém, visualizando o quadrado mágicoexposto no Gráfico 1, pode-se constatar quehouve contração dos indicadores econô-micos (observa-se isso nos losangos) entreos dois períodos, exceto no eixo referente àtaxa de desemprego. No Gráfico 2, perce-be-se a forte intervenção governamental (em2009-2010) na direção de um melhordesempenho por meio da agenda do con-sumo e gasto governamental. Quanto àsexportações, não fomos tão bem-sucedidos.

Analisando conjuntamente os resultadosapresentados nos dois quadrados mágicos,nota-se que a ênfase governamental está nosindicadores econômicos e a variável que causamaior preocupação é aquela referente à taxade crescimento da economia. Faz sentidoargumentar que o crescimento do PIB nãocontém informação relevante sobre aspectossociais no desempenho da economia.Segundo Delfim Netto (2012): “o queimporta é o crescimento econômico com ainclusão social. Temos crescido menos, masa inclusão continuou”.

Contudo, é necessário ter cuidado paraevitar a estagnação do PIB com tendênciada economia para o pleno emprego, pois talsituação dificultará a sustentabilidade doprocesso de inclusão social. Além disso,diversos economistas têm ressaltado anecessidade de evitar artifícios contábeis naimplementação da política econômica. Taisexercícios de alquimia não geram efeitossustentáveis, ademais podem ter um custopolítico devastador, pois geram insegurançae aprofundam as incertezas e desconfiançasquanto à seriedade dos policy makers.

Conclusão

A partir da análise dos quadradosmágicos, é possível evidenciar que o

impacto da crise não se constituiu emsimples “marolinha” como suposto porcertos economistas e governantes. Naverdade, a esperança de promover a recupe-ração sustentada no Brasil de modo a obterrelativo sucesso na taxa de crescimento daeconomia, assim compartilhado comaquele obtido pela maioria dos países emer-gentes na América Latina, não resultou noesperado. Notemos que a taxa de cresci-mento do produto contraiu de 7,3% em2010 para 2,7% em 2011, terminando em1% em 2012. A balança comercial brasi-leira teve em 2012 seu pior resultado em10 anos, sendo que a diferença entre asexportações e importações só não foi maisprofunda porque se reduziram as impor-tações, devido ao baixo PIB que diminuiuas compras externas brasileiras de insumos.O desempenho medíocre nas exportaçõesdo país se deve parcialmente à desace-leração do comércio mundial. A China,principal parceiro comercial do Brasil,reduziu suas importações em 7%. A Argen-tina contraiu suas importações de produtosbrasileiros em 20,7%. Notemos que, nocaso da Argentina, o destino de nossasexportações era predominantemente debens manufaturados. A taxa de inflação tempermanecido acima do centro da meta e aconta corrente do balanço de pagamentosnão tem melhorado. Contudo, a taxa dedesemprego tem sido surpreendentementebaixa.

Que julgamento pode-se fazer dapresente situação? Diversos economistasargumentam que, embora o governo venhamantendo inúmeros estímulos, essa hipera-tividade tem aspectos conflitantes. Alémdisso, são essencialmente pontuais, uma vezque não focam os conhecidos obstáculosestruturais ao crescimento sustentável,especialmente no que tange ao investi-mento produtivo. Soares (2012) salienta o

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Joanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro e Paula Felix Ferreira

problema da atual desindustrializaçãorelativa para enfatizar problemas estruturaisdo País: endividamento das famílias, baixocrescimento da produtividade, baixo inves-timento público e privado, infraestruturadeficiente, entre outros. Todas essas debi-lidades são crônicas, e apresentam umagravidade potencial no contexto da criseinternacional. Assim, fica caracterizada aimportância de se repensar a política dedesenvolvimento econômico, levando emconta a demanda mundial em direção dosmercados mais dinâmicos, entre os quaisos mercados das economias emergentes.

No debate entre consumption led-growthe export-led growth, o Brasil escolheu umacombinação de medidas. Ao se revisitar osquadrados mágicos, não pretendemossomente mostrar um referencial da atualconjuntura brasileira, mas salientar tambéma importância da aplicação simultânea demetas e instrumentos que não possuam umúnico vértice de ajuste. A abordagem deveter uma especificação (natureza) multidi-mensional. Afinal, a política macroeconô-mica não deve estar voltada somente paraa estabilidade de preços, mas deve contem-plar também o crescimento, a distribuiçãofuncional de renda, o pleno emprego, e acombinação de equilíbrio interno (estabi-lidade e crescimento econômico) e equilí-brio externo (sustentabilidade do balançode pagamentos). Consideramos que a visãoda equipe econômica governamental nãotem facilitado a superação da crise e a pre-paração do País para um futuro melhor.Prova disso é o insucesso no regime demetas de inflação em 2010, com diversosefeitos colaterais negativos que prejudi-caram o desempenho da economia. Essesefeitos, que ocorreram nessa circunstânciahistórica, na verdade deveriam ser contem-plados numa visão dinâmica e de longoprazo pelas políticas do Governo, e não

como pequenos desvios não antecipadosde trajetória. As autoridades econômicasdeveriam melhor aproveitar as oportuni-dades para ajustar dinamicamente a traje-tória de nossa economia, envolvendo noprocesso a expansão do investimento e doprogresso tecnológico, bem como a desbu-rocratização.

Certamente, a aplicação simultânea dasduas estratégias divide as benesses e osriscos de ambas; seja em parte pela depen-dência do mercado externo, ou devido àspressões inflacionárias domésticas. Natu-ralmente, a escolha dessas estratégias nãodeixa de ser vinculada à pressão exercidapor certos grupos de poder, potenciali-zando o efeito de comparações de nossodesempenho com o de outros países emer-gentes, que envolvem certos juízos de valor.A economia brasileira deve ser vistatambém do ponto de vista da relação dequalidade de vida e sustentabilidade doprocesso de inclusão social. Sem uma pers-pectiva dinâmica e sustentável de cresci-mento e distribuição, estaríamos mais umavez fadados a percorrer a esmo “em buscado tempo perdido”, e nos distanciando dopadrão de desenvolvimento socioeconô-mico desejado.

Ao apresentar a análise kaldoriana, nãosó avaliamos o desempenho geral de nossopaís como também salientamos a necessi-dade de políticas integradas com ospreceitos macroprudenciais e voltadas àdemanda. Embora os quadrados mágicossejam referenciais teóricos importantespara o estabelecimento de metas e instru-mentos operacionais para a política econô-mica e social, eles perdem relevância seforem implementadas políticas inconsis-tentes. Se as metas e os instrumentosfuncionarem adequadamente, o Governoganhará credibilidade, atenuará o custo dosajustes e reduzirá as incertezas sobre novos

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Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análise baseada nas contribuições de Kaldor

surtos de crise. Caso contrário, ocorrerãoturbulências e apresenta-se a perspectivade problemas futuros com amplas dificul-dades na compatibilização do equilíbriointerno com o equilíbrio externo.

É importante salientar as dificuldades,dilemas e conflitos na busca por garantira prosperidade compartilhada. Pode-se ar-gumentar que, às vezes, as políticas econô-micas utilizadas podem ser muito consis-tentes para serem inteligentes; outrasvezes, muito inteligentes para serem con-sistentes; e, finalmente, nem consistentesnem inteligentes. Afinal, estamos na pre-sença de incertezas e riscos nesse contur-bado modo de produção. As fragilidadesde propostas e a dificuldade de imple-mentação de políticas econômicas perti-nentes decorrem também do labirinto depressões contraditórias que requeremdiscernimento, competência e sustentaçãopolítica. Apenas assim reduziremos

insucessos e poderemos ter uma efetivarevitalização de nossa economia.

Em síntese, a partir do nosso ensaio,percebe-se que o Brasil necessita, dentrodo arcabouço teórico estudado, se esforçarpara promover e incentivar a expansão darenda, o investimento produtivo e a expor-tação, buscando produzir bens que tenhammaior elasticidade-renda da demanda,maior produtividade e melhor encadea-mento produtivo e economias de escala(THIRWALL, 2008). Nesse sentido, osesforços governamentais devem estarcentrados na adoção de políticas industriaisadequadas. Entre elas destacamos umcâmbio competitivo, melhorias na infraes-trutura, proteção comercial orientada parapromover melhorias na exportação e amelhoria estrutural necessária para odesenvolvimento sustentável.

(Artigo recebido em janeiro de 2013. Versãofinal em junho de 2013).

Notas

* Os autores agradecem a Cristiane Soares, Wellington Carlos e Rodolfo Marcílio Teixeirapela colaboração no desenvolvimento desse trabalho.

1 Seu argumento é que, no longo prazo, não há substituto para a ênfase na exportação debens manufaturados. Nesse caso, tanto o consumo quanto o investimento podem expandir si-multaneamente, eliminando um dilema aparente. Essas exportações são um componente dademanda agregada que gera saldo na balança comercial e potencializa maiores investimentosestrangeiros. Veja Targetti & Thirwall (1989), introdução, pp. 19 e 20.

2 Com referência a esses tópicos ver, por exemplo, Bhaduri e Marglin (1990), Bhaduri (2008),O’ Hara (2009).

3 A esse respeito, convém ressaltar que a tese de Myrdal sobre a teoria circular de causaçãoacumulativa (Myrdal’s thesis of cumulative causation - 1957) não é idêntica à de Kaldor. A visãode Myrdal tem muito em comum com a perspectiva estruturalista de economistas latino-ameri-canos, ligados à CEPAL. Observe que para Hunt (1989, p. 59): “This was quite quickly recognised,and as such his perspective on underdevelopment came to be regarded as complementary toother structuralist analyses and, thus, part of the corpus of structuralist literature”. Portanto,Hunt não faz qualquer menção a Kaldor como membro da escola estruturalista. Contudo,

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analisando a contribuição de Kaldor (1972), Hunt (1989, p.318) argumenta que: “In place of anirrelevant notion of general equilibrium, Kaldor proposes the reinstatement of the ‘theorem ofendogenous and cumulative change’ ... and revived in the 1950s by the development economistGunnar Myrdal, who called it ‘the principle of cumulative causation’.” Fundamentalmente, Myrdalestava usando o conceito como base para tratar do processo de desenvolvimento econômico,enquanto Kaldor usou o conceito em uma perspectiva mais ampla, como uma crítica funda-mental à teoria neo-clássica do equilíbrio geral.

4 Note que Kaldor está também preocupado com conflitos e “trade offs” nos objetivos emetas para a política econômica. Nos quadrados mágicos, representados na Figura 1, inflação edesemprego são plotados com o eixo invertido, porque quanto maior os seus valores, pior é aperformance do País (são negativamente correlacionados). Quanto à inflação, acreditamos que seela for relevada isso irá gerar uma série de distorções na economia.

5 Analogamente, aqui as variáveis tiveram seu limite máximo determinado pelo desempenhodo País na última década. No que tange à taxa de investimento, nos permitimos estender além oíndice máximo (ótimo). Tivemos como perspectiva o exemplo do México, que conseguiu obtera taxa de 25,2% no período 2005-11, segundo o Valor Econômico, outubro de 2012.

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221Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 201-222 abr/jun 2013

Joanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro e Paula Felix Ferreira

Resumo – Resumen – Abstract

Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análise baseadanas contribuições de KaldorJoanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro e Paula Felix FerreiraNeste trabalho avaliamos os resultados macroeconômicos recentes da economia brasileira

por meio de um instrumental analítico baseado em uma extensão geométrica e algébrica doartigo seminal de Kaldor (1971), que levou à criação do quadrado mágico. Essa abordagempermite a comparação do desempenho pré-crise (2007-2008) e durante a crise (2009-2010).Nossa análise levanta algumas dúvidas sobre as medidas de política econômica adotadas nabusca por contornar a presente crise e reduzir obstáculos estruturais no processo de desenvolvi-mento econômico no Brasil. Concluímos que a complexidade da gestão macroeconômica temsido subestimada. No que tange às estratégias econômicas, nossa abordagem está centrada nacontrovérsia entre export-led growth vs consumption-led growth.

Palavras chave: quadrado mágico; controvérsia Kaldoriana; gestão governamental; criseeconômica

Política Económica Brasileña y la Reciente Crisis: una Análisis Basado em lasContribuciones de KaldorJoanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro y Paula Felix FerreiraEn este artículo evaluaremos el resultado macroeconômico reciente de la economia brasileña,

por medio de un instrumento analítico en una extensión del trabajo seminal de Kaldor (1971),que condujo a lacreación del Cuadrado Mágico. Esta perspectiva permite la comparación de losindicadores anteriores (2007-2008) y durante (2009-2010) la crisis. Nuestro análisis plantea dudassobre la política econômica adoptada por el gobierno, en el anhelo de aplacar la crisis actual yreducir los obstáculos estrutucturales em el proceso de desarrollo econômico brasileño.Concluimos que la complejidad de la gestión macroeconómica ha sido subestimada. En lo quetoca a las estratégias economicas, nuestro enfoque se centra en el controverso tema de export-ledgrowth vs. consumption-led growth.

Palabras clave: cuadrado mágico; controversia Kaldoriana; gestión económica; crisiseconómica

Brazilian Economic Policy and the recent world crisis: an analysis based on thecontributions of KaldorJoanílio Rodolpho Teixeira, Danielle Sandi Pinheiro and Paula Felix FerreiraIn this paper we assess the recent macroeconomic results of the Brazilian economy through

an analytical instrument based upon an extension of Kaldor’s seminal work (1971), the “MagicalSquare”. This approach allows us to compare the performance pre-crisis (2007-2008) and duringthe crisis (2009-2010). Our analysis casts doubts on the economic policy implemented by thegovernment to address the present crisis and to reduce long-standing structural obstacles toBrazil’s economic developments. We conclude that the complexities of macroeconomicmanagement have been underestimated. Concerning the common strategies applied on thiscrisis, our study is based on the export-led growth and consumption-led growth controversy.

Keywords: magical square; Kaldorian controversy; economic management; economic crisis

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222 Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 201-222 abr/jun 2013

Política econômica brasileira frente à crise mundial recente: uma análise baseada nas contribuições de Kaldor

Joanílio Rodolpho TeixeiraProfessor Emérito. Departamento de Economia, Universidade de Brasília. Pesquisador 1A do CNPq. Contato:[email protected]

Danielle Sandi PinheiroDoutora e Mestre em Economia. Professora Adjunta do Departamento de Administração, Universidade de Brasília.Pesquisadora membro do Grupo de Pesquisa “Crescimento e Distribuição” do CNPq. Contato: [email protected]

Paula Felix FerreiraPós-graduação no Departamento de Economia, Universidade de Brasília. Contato: [email protected]

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223Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 223-247 abr/jun 2013

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

Os suportes de uma comunidadevirtual de aprendizagem: uma

experiência do Governo doEstado de São Paulo, Brasil

Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

Introdução

No âmbito corporativo de uma instituição como a Escola de Governo e

Administração Pública (Egap), da Fundação do Desenvolvimento Administrativo

(Fundap), que se preocupa com a formação de servidores da administração pública,

as questões de fundo que se colocam são:

• Como capacitar grande número de servidores e proporcionar-lhes uma

aprendizagem continuada mediante cursos on-line usando métodos e técnicas de

ensino que estejam de acordo com a especificidade da tarefa a ser realizada?

• Como incorporar, nos cursos baseados no paradigma da produção em

massa, suportes que contribuam para que o servidor seja capaz de construir, no

seu local de trabalho, as condições necessárias e propícias às mudanças profissionais

e de aprendizagem?

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Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

Nas instituições governamentaisbrasileiras, a implantação da Internet, alémde ter ajudado a obter respostas para essasindagações, vem facilitando a aprendizagemcontinuada dos servidores por intermédiode capacitações on-line. Isso tem permitidoimplantar uma nova abordagem de edu-cação, realizada no local de trabalho e comvárias vantagens, tanto para os servidoresquanto para o professor que ministra o curso(VALENTE e TAVARES-SILVA, 2003).

Certamente, a evolução tecnológicatem alcançado papel relevante no processode maturação da Educação a Distância(EaD) como uma alternativa no processode ensino e aprendizagem de grandenúmero de alunos, como é o caso dosservidores do Estado de São Paulo.

E é nesse contexto que as comunidadesvirtuais de aprendizagem (CVA) são hojeuma das ferramentas mais poderosas paradiscutir ideias e construir conhecimentoatualizado, em que se somam as expe-riências de muitas pessoas. Todavia,conforme destaca Dias (2007), o objetivode uma CVA

está para além do acesso à rede deinformação, a qual, só por si, repre-senta a entrada num ambiente enri-quecido de materiais e conteúdos, enão propriamente um fator de mu-dança e inovação para a aprendiza-gem. O desenvolvimento da inovaçãono interior da comunidade realiza-seatravés da capacidade de atribuirsentido a estes materiais no âmbitodo projeto da comunidade, contri-buindo para esta finalidade osprocessos de mediação colaborativana experiência das figurações enarrativas do conhecimento e doscontextos e práticas da sua aplicaçãoe utilização (DIAS, 2007, p.36).

Logo, não basta somente o acesso à redede informação, mas, sim, como essa redepoderá contribuir para desenvolver habili-dades que interessam ao bom desempenhodo servidor em seu trabalho, além de de-senvolver habilidades que têm a ver com apossibilidade de continuar a aprender.

Assim, nossa proposta neste artigo seráapresentar e discutir quais foram ossuportes que ampararam as CVA daFundap/Egap no período de 2000 a 2012e proporcionaram, com isso, a criação deum espaço de trocas de informação, deconstrução do conhecimento e de apren-dizagem significativa.

O que é a Fundap

A Fundap foi criada pela Lei no 435,de 24 de junho de1974, e teve seus esta-tutos aprovados em 1976, data de suaefetiva instalação e do início de seustrabalhos. Atualmente vinculada à Secre-taria de Gestão Pública do Estado de SãoPaulo, Brasil, a fundação tem personali-dade jurídica de direito privado e dispõede autonomia técnica para executar suasatividades; sua “missão institucional é ga-rantir um permanente movimento de atu-alização das estruturas, procedimentos epráticas administrativas” (FARIA, 1997,p. 192).

Para tanto, a Fundap/Egap repousasobre o seguinte tripé: ensino, desenvolvi-mento organizacional e pesquisa.

A Fundap possui, em sua estrutura, aEgap, que é um centro de capacitação deexecutivos do setor público para o exercícioda gestão pública, com vistas ao aperfei-çoamento de profissionais capazes deformular diretrizes e políticas governa-mentais, de implementar e gerenciarpolíticas, e de gerar e prestar bons serviçospúblicos à sociedade.

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Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

“... existem nasCVA uma fortemoral social e umconjunto deregulamentos nãoescritos entre os seusenvolvidos e nasinformações quecirculam nessesespaços.”

A metodologia educacional adotada nacapacitação enfatiza a prática profissional,à luz de conceitos e ferramentas queajudem a definir e superar os problemasque afetam o desempenho do serviçopúblico. Nesse sentido, a Fundap procuramanter estreita articulação com instituiçõese profissionais especializados que estejamproduzindo conhecimento e tecnologia deinteresse ao setor público. A própria estru-tura da Fundap favorece essa concepção,já que a instituição opera como uma“ponte” entre a administração pública e asinstituições universitárias. Seu Conselho deCuradores – instância máxima de direção– é composto de representantes daFundação Getúlio Vargas (FGV), daUniversidade de São Paulo (USP), daUniversidade Estadual de Campinas(Unicamp) e da Universidade EstadualPaulista (Unesp).

Até o ano de 2000, a Fundap/Egapvinha realizando cursos de capacitaçãobasicamente mediante ações presenciais,atendendo a uma pequena demanda de parti-cipantes por curso. A partir dessa data,pensando nos aspectos extremamenteimportantes para o desenvolvimento de pro-cessos educacionais com qualidade e consi-derando que a tecnologia computacional estácada vez mais presente nos postos de traba-lho dos servidores públicos, a Fundap/Egapiniciou estudos e ações voltados à aplicaçãodos recursos das tecnologias de informaçãoe comunicação (TIC) na educação.

O objetivo tem sido incorporar deforma sistemática e permanente as TIC nasatividades educacionais, principalmente naEaD via Internet, com a finalidade de tornaro participante um sujeito mais ativo noprocesso de aprendizagem e de recolocar acomunicação interpessoal no centro dosmétodos da educação, utilizando, para isso,diferentes abordagens de EaD.

O que é uma comunidade virtualde aprendizagem

Para Dias (2007), o surgimento de umaCVA acontece a partir da definição nego-ciada dos objetivos da aprendizagem, damediação colaborativa e do suporte dogrupo para as reestruturações das figu-rações do conhecimento.

Ainda conforme esse autor, o desafioproposto pelas comunidades de aprendi-

zagem “consiste na criação de uma peda-gogia baseada na partilha, na exposição dasperspectivas individuais entre os pares ena iniciativa conjunta orientada para ainovação e a criação” (DIAS, 2007, p. 35).

Para Lévy (2000), Palloff e Pratt (2002),a gênese de uma CVA baseia-se na afini-dade de interesses, de conhecimentos, deprojetos mútuos e de valores estabelecidos

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Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

por meio de um processo de colaboração.Assim, as CVA são hoje uma das ferra-mentas mais poderosas para discutir ideiase construir conhecimento, uma vez que sesomam as experiências de muitas pessoas.Conforme destaca Palloff e Pratt (2002,p. 47), uma comunidade de aprendizagemestabelece-se quando “unem-se pessoas quepossuem interesses e objetivos similares, ouseja, pessoas que não estão conectadas poracaso, como se verifica em outras áreas dociberespaço”.

Ademais, verificamos, mediante nossaprática, que a palavra comunidade apresentauma diversidade de sentidos e conotaçõesemotivas. Percebemos que o que une osparticipantes em uma comunidade não ésua estrutura, mas o estado de espírito e osentimento de pertencimento dos indivíduosdessas comunidades.

No diálogo com Lévy (2000), observa-se que as comunidades de aprendizagemconstituem-se nas relações interpessoaisimpregnadas de emoções, não distantes efrias. Em concordância com Lévy (2000),Tavares-Silva (2003) enfatiza que, nessascomunidades, o importante é resgatar afuncionalidade da emoção1 como condi-ção capaz de proporcionar circunstânciasadequadas aos anseios e desejos dos parti-cipantes, tornando esses ambientes adap-táveis aos seus integrantes e possibilitan-do uma boa interface de comunicação einteração.

Silva (1998, p. 95), por sua vez, com-plementa esse argumento, ao afirmar quea CVA é um “espaço de construção (umterritório simbólico) marcado pela exten-são e pela profundidade da interação entreos indivíduos de construir esse todo”.

Com isso, existem nas CVA uma fortemoral social e um conjunto de regulamentosnão escritos entre os seus envolvidos e nasinformações que circulam nesses espaços.

De acordo com Palloff e Pratt (2002),as relações e os limites individuais e cole-tivos estão ancorados em algumas regraspreestabelecidas e amplamente divulgadas,dentre as quais se destacam: honestidade,correspondência, pertinência, respeito,franqueza e autonomia.

Nessas comunidades, há um sistemade valores e um código de moral queproporcionam aos seus membros um sensode identidade e de pertencimento.

Percebemos também, com o olhar emnossa prática, que uma CVA só sobrevivese houver um foco – afinidades de interes-ses –, se houver participantes responsáveis,unidos espontaneamente, compromissados, quequeiram aprender, envolvidos com a colabo-ração (participação) e que objetivam umempreendimento coletivo. Nesse espaço, nãoexistem hierarquias, e a gestão do conheci-mento deve ser uma preocupação cons-tante. Os participantes dessa comunidadepossuem identidade na prática (reciprocidadena colaboração e no trabalho contínuo).

Todavia, os participantes, quando adultos,aprendem quando o assunto, o foco, possuium valor imediato, uma utilidade paraenfrentar problemas reais de sua vidapessoal e profissional. Esse foco cria cir-cunstâncias para o envolvimento, a presença,dos participantes e a visibilidade, pois elessabem que as informações estão disponí-veis no ambiente a qualquer momento.

Verificamos também, pela nossa prática,que os participantes passam a ser “donos”zelosos desses espaços e fazem de tudo paraque a chama das interações não arrefeça e,com isso, possam utilizar esse ambiente aolongo dos anos (continuidade), ou seja, osmembros dessas comunidades têm compro-misso de longo prazo com o seu desenvol-vimento (criação de valores).

Os participantes entendem que umacomunidade de aprendizagem é uma

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Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

poderosa ferramenta de trabalho, poispodem resolver os problemas do seu diaa dia de trabalho por meio da contribuição,de experiências dos colegas (diversidadede talentos dos seus membros). Tambémo interagir com os pares cria uma relaçãode confiança, amizade e bem-estar (pertenci-mento).

Todavia, enfatizamos, com base emnossa prática, que a espontaneidade podenão ser o meio eficiente para gerar conhecimento.Nesse caso, é imprescindível a presença dosmediadores técnicos e dos mediadores pedagógicos.O mediador deve ser um facilitador daaprendizagem; deve estabelecer relaçõesdialógicas e de parceria com os aprendizes;deve procurar valorizar a bagagem deconhecimento trazida por seus aprendizes.Os mediadores criam circunstâncias paratrabalhar melhor a informação e isso geramelhor qualidade de conhecimento. Nãoconseguimos vislumbrar uma comunidadesem esses intervenientes, pois, casocontrário, o “barco” pode afundar!

Além disso, as CVA da Fundap/Egappossuem diferentes níveis de participação.Também verificamos que há, como Wenger(1998) acena, três tipos grupais:

• um grupo nuclear (pequeno grupo quetem como tônica a paixão pelo que faz e,consequentemente, possui grande envol-vimento);

• um grupo com adesão completa (grupo queé reconhecido pela comunidade, em virtudede suas contribuições e envolvimentos, eque define o andar da comunidade);

• um grupo com participação periférica(grupo que pertence à comunidade, masque tem menor envolvimento; em algumasvezes, seus membros são novatos ou, então,não têm envolvimento com a prática).

Dessa forma, a sociedade do conheci-mento e a emergência de uma novaeconomia “informacional” e globalizada

demandam capital intelectual (CASTELLS,1996), pessoas com competência paraparticipar ativamente, saber trabalhar emgrupo, pensar e criar soluções para proble-mas complexos, e aprender continuamente.Essa nova mentalidade deve permear todosos cidadãos, produtores ou consumidoresde todos os segmentos sociais, incluindo osetor público.

Assim, é importante analisar as possi-bilidades de aplicar o conceito de comu-nidades de prática no contexto dos setorespúblico, privado e terceiro setor, uma vezque elas se constituem em uma ferramentaaglutinadora de ações individuais e organi-zacionais.

O desafio: como capacitar trêsmil servidores em um curso naabordagem broadcast e criarcircunstâncias para a construção doconhecimento via CVA

Como já afirmado, até o ano de 2000a Fundap/Egap vinha realizando cursosde capacitação basicamente mediante açõespresenciais, atendendo a uma pequenademanda de participantes por curso.

A partir dessa data, pensando nosaspectos extremamente importantes parao desenvolvimento de processos educacio-nais com qualidade, na educação conti-nuada, e considerando que a tecnologiacomputacional está cada vez mais presentenos postos de trabalho dos servidorespúblicos, a Fundap/Egap iniciou estudose ações voltados à aplicação dos recursosdas TIC na educação. O objetivo tem sidoincorporar sistemática e permanentementeas TIC nas atividades educacionais,principalmente na EaD via Internet, a fimde tornar o participante um sujeito maisativo no processo de aprendizagem e derecolocar a comunicação interpessoal no

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Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

centro dos métodos da educação, usando,para isso, diferentes abordagens de EaD.

Os primeiros cursos de EaD ofertadospela Fundap/Egap foram baseados naabordagem do estar junto virtual e no uso daplataforma TelEduc (ROCHA, 2002). O estarjunto virtual (VALENTE, 2009) prevê alto graude interação entre professor e aprendizes, eentre os próprios aprendizes. A Internetproporciona os meios para que essasinterações sejam intensas, permitindo o acom-panhamento do aluno e a criação de condi-ções para o professor “estar junto”, ao ladodo aluno, vivenciando e auxiliando-o aresolver seus problemas, porém virtualmente.

O TelEduc é um ambiente de suportea atividades de ensino e aprendizagem viaInternet, desenvolvido no Núcleo deInformática Aplicada à Educação (Nied) eno Instituto de Computação da Universi-dade Estadual de Campinas (Unicamp),São Paulo.

Cada curso ofertado pela Fundap/Egap, que utilizava o ambiente TelEducna abordagem estar junto virtual, envolviacerca de trinta participantes. Em 2002, aFundap/Egap foi consultada pela Secre-taria de Gestão Pública do Estado de SãoPaulo para realizar o Curso de Licitação eGestão de Contratos, mediado por com-putador, via Internet, para cerca de três milservidores do Estado.

Dada essa demanda, surgiu o grandedesafio: como sair de cursos para trinta alu-nos e partir para cursos com mais de trêsmil participantes, mas sem desperdiçar opotencial do aprendiz de interagir, pensare criar?

Esse desafio levou a uma série dequestões tendo em vista a experiência comas atividades de EaD da Fundap/Egap, queprimavam pela intensidade e qualidade dainteração e, consequentemente, peloprocesso de construção de conhecimento.

Uma das questões, por exemplo, eracomo incorporar, nos cursos a distânciadestinados a um grande número de partici-pantes, aspectos pedagógicos que contri-buíssem para que o servidor fosse capazde construir, no seu local de trabalho, ascondições necessárias e propícias àsmudanças profissionais e de aprendizagem?

A solução2 foi a criação de uma CVAamparada pelos seguintes suportes:

• criação de um curso na abordagembroadcast3;

• mediação pedagógica e técnica, à luzdo estar junto virtual;

• efetiva contribuição dos participantes;• aprendizagem continuada e

colaborativa.Para atender a esse primeiro desafio, a

equipe de EaD da Fundap/Egap, comoainda não dispunha, em 2002, de umaferramenta de EaD para atender a umgrande número de participantes, recorreuà criatividade e passou a utilizar uma ferra-menta estática4, desenvolvida em páginasHTML para abrigar o conteúdo programáticode seus cursos.

Ao iniciarmos a construção da ferra-menta estática (tutorial5), tínhamos aseguinte preocupação: o modelo educa-cional homogêneo não é vivenciado portodos os aprendizes da mesma maneira (osaprendizes diferem quando aprendem!).

Assim, a construção dessa ferramentaestática procurou contemplar as diversaspreferências de aprendizagem dos partici-pantes, uma vez que alguns participantesaprendem com textos e gráficos; outros,com imagens, filmes, análises de casos;outros ainda, interagindo com os seus paresem um ambiente de diálogo (comunidade)etc. (CAVELLUCCI, s.d.). Percebemos que umaúnica forma de apresentar o conteúdo docurso (por exemplo, somente uma apos-tila) não atingiria a todos os participantes

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de igual maneira. A ferramenta possibilitou,pois, contemplar diferentes dinâmicas deapresentação do conteúdo dos módulos e,assim, atingir cada um dos estilos de apren-dizagem.

As Figuras 1 e 2 mostram o cuidadoem contemplar diferentes formas de apre-sentar o conteúdo do curso (texto, figura,pop-up6, sites etc.).

O tutorial compõe-se de sete módulos7.Cada módulo organiza-se nos seguintessubcampos: conteúdo, tema, exercícios,apontamentos, pesquisa e saiba mais. Alémdisso, o curso conta com recursos extras:ajuda, midiateca, glossário, créditos equestões interessantes8.

Embora sequencial, o participantepode seguir essa ordem ou qualquer outraque lhe parece mais conveniente (não hábloqueio de módulos que obrigue o partici-pante a obedecer a sequência linear deapresentação dos módulos do curso).Entretanto, em todos os módulos, osassuntos estão relacionados e indicados pormeio de links, permitindo que o participanteretorne, quando necessário, aos conceitosapresentados nos demais módulos. Todosos módulos possuem a mesma estrutura,o que facilita a navegação do participantenos demais módulos depois de ter nave-gado em um módulo, conforme indicadona Figura 3.

Como não existe bloqueio de módulos,o participante é o responsável por seuaprendizado e pode escolher por ondecomeçar, quando, o que e como estudar.

Conforme mostra a Figura 3, cadamódulo contém doze exercícios (exceçãopara o Módulo 4, que conta com quatorzeexercícios). Esse curso disponibiliza 74 exer-cícios em formatos diferentes (animações,completar o texto, palavras cruzadas, arras-tar palavras, ouvir uma música ou assistir aum filme etc.). Todas as alternativas dos

exercícios são comentadas, possibilitandoque o participante aprenda com o seu erro.A Figura 4 mostra esse recurso.

Todavia, o objetivo da Fundap/Egapera transformar a metodologia bem-suce-dida do ambiente estático em um ambienteLMS dinâmico, com um design mais limpo,porém mantendo toda a facilidade denavegação até então adotada e aprovadapelos alunos (o segundo desafioencontrado).

Além da criação do tutorial (conteúdodo curso), a Fundap/Egap customizou umsoftware livre – Snitz (http://forum.snitz.com) –, que compreendeu a traduçãodo ambiente para o português, uma novaconfiguração de cores e a seleção e adap-tação de alguns dos recursos oferecidospelo software; com isso, criou o espaço deinteração (a CVA).

“... uma CVAsó sobrevive sehouver um foco;no caso, a criação deum curso, na aborda-gem broadcast,contextualizadoe significativo.”

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Figura 1: Diferentes formas de apresentar o conteúdo: texto e figuras

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

Figura 2: Diferentes formas de apresentar o conteúdo: pop-up

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

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Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

Figura 4: Diferentes formas de apresentar o conteúdo: exercícios

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

Figura 3: Estrutura dos módulos do curso

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

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Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

A seguir, veremos em detalhes ossuportes da CVA – do Curso de LicitaçãoSustentável Brasil –, ofertados pelaFundap/Egap em 2012.

O primeiro suporte da CVA:curso na abordagem broadcast(foco)

Verificamos, com o olhar em nossaprática, que uma CVA só sobrevive sehouver um foco; no caso, a criação de umcurso, na abordagem broadcast, contextua-lizado e significativo, uma vez que os par-ticipantes (alunos), quando adultos,aprendem se o assunto, o foco, possui umvalor imediato, uma utilidade para enfrentarproblemas reais de sua vida pessoal eprofissional.

Esse foco cria circunstâncias para oenvolvimento, a presença, dos participantese a visibilidade, pois eles sabem que asinformações estão disponíveis no ambientea qualquer momento.

A abordagem broadcast não permitenenhum tipo de interação com o aluno, maspode atingir grande número de aprendizes.O modelo preocupa-se em como a infor-mação é armazenada, representada e, prin-cipalmente, transmitida. O computadortorna-se, assim, poderosa ferramenta paraarmazenar, representar e transmitir ainformação. Essa abordagem baseia-se nomodelo tutorial, em que a informação éorganizada de acordo com uma sequênciapedagógica particular9, sendo apresentadaao participante segundo essa sequência.

Assim, o conteúdo é preparado e or-ganizado previamente, para só depois depronto ser oferecido ao aprendiz, que nãopode fazer nenhuma alteração. A interaçãodo participante com o computador ocorrepor meio da leitura da tela ou medianteuma teleconferência.

Esse modelo não nos fornece nenhumapista sobre o processamento da infor-mação, isto é, ele não permite certificar-nos de que o aluno está processando ainformação transmitida, nem diagnosticarcomo a aprendizagem está sendoprocessada.

O grande desafio na concepção decursos ou programas de capacitação, nessaabordagem, é o tratamento dado ao con-teúdo programático. Deve existir a preo-cupação com a linguagem extremamentedidática e sedutora para o participante. Aênfase é mesclar teoria e prática em totalsinergia com o fazer diário do participante.

Para Valente (2009), a limitação daabordagem broadcast é a ausência deinteração entre mediador e aprendiz. Comoo mediador não interage com o aluno, elenão recebe nenhum retorno do aprendiz e,portanto, não tem ideia de como essainformação está sendo compreendida ouassimilada. Nesse caso, o aluno pode estarou atribuindo significado e processando ainformação, ou simplesmente memori-zando-a. O professor não dispõe de meiospara verificar o que o aprendiz faz.

A Figura 5, a seguir, ilustra a aborda-gem broadcast utilizando a Internet.

A abordagem broadcast é bastanteeficiente para disseminar informação a umagama muito grande de alunos. No entanto,essa proposta não garante que o alunoesteja construindo conhecimento.

A interação do participante10 com oconteúdo consiste em ler a tela do cursono computador, responder a perguntas,buscar informação em diferentesmateriais de apoio, ou mesmo fazer odownload de um documento que contenhatodo o conteúdo tratado em um módulo.Essa abordagem não fornece pistas sobreo processamento da informação, isto é,ela não permite certificar-nos de que o

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aluno está processando a informaçãorecebida, nem diagnosticar como a apren-dizagem está ocorrendo.

Para contornar essas limitações, asolução encontrada pela Fundap/Egap foidesenvolver uma ferramenta na aborda-gem broadcast, porém com diferenciais napreparação do material didático (abor-dagem broadcast) e com a introdução daCVA à luz do construcionismocontextualizado11 e do estar junto virtual12

(VALENTE, 2009).Assim, vale ressaltar que a abordagem

broadcast adotada pela Fundap/Egap nãopressupõe um conteúdo fechado, já queo curso tem as informações atualizadassistematicamente, pois a comunidaderealimenta o tutorial, num processo con-tínuo, que retorna para a comunidade,favorecendo, também, a gestão doconhecimento em governo.

Os únicos pré-requisitos mínimosindispensáveis, para o servidor, são: sabernavegar na Internet; usar regularmente ocorreio eletrônico; ter prática com editor detextos; e saber baixar arquivos (fazer download).Além disso, quanto à infraestrutura compu-tacional, o participante deve ter acesso regulardiário à Internet, com conexão estável, e oequipamento a ser utilizado deve dispor deum navegador e um programa de correioeletrônico instalados.

A Figura 6 ilustra a segunda página deabertura do Curso de Licitação Sustentá-vel Brasil, mediado por computador e viaInternet, ofertado pela Fundap/Egap em201213.

O grande desafio na montagem docurso – na abordagem broadcast – foi otratamento dado ao conteúdo programático,com uma linguagem extremamente didáticae sedutora para o participante; o curso

Figura 5: Abordagem broadcast de EaD, utilizando a Internet

Fonte: Fundap/Egap (São Paulo, Brasil)

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mescla teoria e prática em total sinergia como fazer diário do servidor, a fim de promo-ver o processo de ensino e aprendizagem, emanter a motivação dos participantes.

Para isso, houve o cuidado em con-templar as várias preferências de aprendi-zagem no conteúdo programático do curso(imagens, textos, desenhos, gráficos, casospráticos, exercícios, pesquisa, filmes,interação etc.).

Conforme mostra a Figura 7, a seguir,o curso contém uma estrutura modular(sequência pedagógica particular), com afinalidade de poder atender a uma clientelabastante heterogênea, desde os servidoresque começam a trabalhar em determinadaárea (conforme o foco de cada curso), atéos que precisam ou queiram atualizar-se.

O curso não oferece, portanto, comofaz a maioria dos cursos tradicionais,“primeiramente” a apostila14, com cerca devinte a trinta páginas por módulo, uma vez

que sabemos que cada participante traz umreferencial teórico e prático. Assim, enten-demos que o participante traz algo para ocurso e, com isso, ele poderá desejarexplorar os módulos conforme a suanecessidade.

Não existe bloqueio dos módulos docurso. Dessa forma, o participante podeoptar ou pela sequência pedagógicasugerida pelo curso, ou qualquer outra quelhe pareça mais interessante.

O participante é responsável por seuaprendizado e pode escolher por onde equando começar, o que estudar e a maneiraem que prefere fazê-lo.

O material de apoio do curso é organi-zado em uma sequência de módulos,planejada por critérios pedagógicos; cadamódulo está organizado nos seguintessubcampos:

• Conteúdo, que apresenta os assun-tos do módulo, o número de exercícios

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

Figura 6: Segunda página de abertura do curso

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propostos, o número de casos práticos e onúmero de páginas da apostila (saiba mais).Informa também a autoria do módulo.

• Tema, o qual traz uma síntese dosassuntos trabalhados no módulo.

• Exercícios, propostos para que oparticipante do curso aplique e retenhanovos conteúdos/informações.

• Apontamentos, subcampo quefornece, em tópicos curtos, os principaisconceitos tratados em cada módulo docurso. Os apontamentos são os assuntosrelevantes do módulo. Esse item possui,no máximo, duas rolagens de página.Representa aquilo que o participante nãopode esquecer, ou seja, o participante nãopode sair do módulo sem saber osconteúdos abordados nos apontamentos.

• Atividades Complementares, asquais apresentam exemplos teóricos oupráticos sobre o conteúdo programático docurso.

• Pesquisa, subcampo que indicareferência bibliográfica sobre determinadomódulo e apresenta sugestões de ende-reços interessantes a visitar, na Internet.A pesquisa ajuda o participante a fazerum aprofundamento do conteúdo domódulo, caso ele tenha interesse duranteou após o curso.

• Saiba Mais, que traz uma apostilaem formato PDF, contemplando todas asinformações do módulo.

O curso oferece também espaços deapoio, como comunidade, fale conosco,glossário, midiateca, questões interessantes,ajuda e créditos, conforme ilustrado naFigura 7.

O Fale Conosco permite ao participanteobter informação sobre a parte adminis-trativa do curso (informa quando o parti-cipante poderá acessar o curso, resolveproblemas de navegação e dúvidas sobre acertificação). No Fale Conosco, o participante

Figura 7: Estrutura dos módulos do curso

Fonte: Curso de Licitação Sustentável Brasil, Fundap (2012)

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não pode tirar dúvidas sobre o conteúdoprogramático do curso.

O Glossário contém os principaistermos empregados em todos os módulosdo curso, com definições compiladas ouelaboradas por especialistas.

A Midiateca é uma biblioteca virtual.Contém material de leitura complementarindicado por mediadores e participantes.

Questões Interessantes são questõescolhidas pelo mediador técnico respon-sável pela comunidade, com base nainteração dos participantes nos fóruns daCVA. Essas questões são colhidas após ofechamento de cada fórum (gestão dainformação).

O subcampo Créditos, por sua vez, apre-senta a equipe multidisciplinar do ambientede capacitação (autores e mediadores).

No início de cada mês, uma nova turmaacessava o ambiente de aprendizagem(curso e comunidade). Cada turma, comno máximo trezentos participantes, podiarealizar o curso durante, no máximo, trêsmeses. Entretanto, após o encerramento docurso, os participantes manifestavam inte-resse de continuar a ter acesso à CVA, comoem outras comunidades ofertadas pelaFundap/Egap.

Comprovamos, pois, que o suporte da“aprendizagem continuada” é fundamentalem uma CVA. A ideia é tornar esse espaçodisponível aos servidores em seu dia a diade trabalho, como um meio de aprimorarseus conhecimentos técnicos e seu desem-penho profissional.

O segundo suporte da CVA:mediação técnica e pedagógica, àluz do estar junto virtual

Existe significativa diferença entremediação técnica e mediação pedagógica,conforme postula Tavares-Silva (2006).

Os mediadores técnicos15 são conhecedoresdo conteúdo programático do curso,contudo, para além disso enfatizam osurgimento de novas relações em detrimentoda clássica relação mediador-aluno. A inter-venção do mediador técnico deve ir aoencontro da proposta que procura rompere superar o paradigma da contradiçãomediador-aluno (modelo conducionista).

Nesse espaço, todos – aprendizes emediadores técnicos – detêm conheci-mentos específicos, diferenciados e rele-vantes. Todos são coautores e coprodutoresdo seu próprio conhecimento e, também,ambos são coautores e coprodutores doque está sendo produzido e incorporadoao ambiente, em um movimento contínuoe recursivo. Assim, o mediador técnico é oorganizador da troca de ideias, em vez dedetentor do conhecimento ou de instrutor,e os aprendizes passam a ter um papel maisativo ao explicitar seus conhecimentos eao revelar seus talentos. O mediadortécnico é diferenciado por ser a pessoaportadora de uma intencionalidade peda-gógica, a qual deve preservar os objetivosoriginais do curso (o barco tem umtimoneiro!).

Os mediadores pedagógicos não são“conhecedores” do conteúdo progra-mático, mas têm a função de facilitar aambientação dos alunos no curso (apresen-tam os fóruns de discussão, incentivam ainteração nesses fóruns, auxiliam os alunospara que postem contribuições conformeo conteúdo proposto em cada fórum etc.),ou seja, os mediadores pedagógicos auxi-liam o mediador técnico a conduzir os espa-ços de discussão.

Ainda conforme Tavares-Silva (2006),os mediadores pedagógicos, além de auxi-liarem o mediador técnico a conduzir osespaços de discussão, têm o papel deresgatar a funcionalidade da emoção como

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condição capaz de proporcionar circuns-tâncias adequadas aos anseios dos partici-pantes, tornando esse ambiente adaptávelao aluno e possibilitando uma boa interfacede comunicação e interação; porém, semnunca perder o foco do curso, o controle,o gerenciamento e a animação geral doambiente de aprendizagem.

Vale enfatizar que as atuações dosmediadores – pedagógicos e técnicos –estão amparadas na abordagem do estarjunto virtual16, na qual o aprendiz é estimu-lado a desenvolver uma atuação respon-sável e autônoma, sendo pedagogicamenteapoiado e orientado pelos mediadoresdentro dos propósitos estabelecidos, poisnão se objetiva ter um aluno autodidata,que não conta com uma proposta peda-gógica e didática para o estudo, como alertaLitwin (2001).

Destaca-se, na abordagem estar juntovirtual, a atuação dos mediadores; noentanto, acima de tudo, deve-se dar atençãoespecial ao fundamental papel dos apren-dizes, para os quais:

A mediação pedagógica enfrenta odesafio de criar situações que propi-ciem a presença virtual por meio deacompanhamentos, interações e orien-tações que aproximam professores ealunos, fazendo com que os alunosassumam o papel de mediadores dospróprios colegas e desenvolvendo aautoaprendizagem e a aprendizagemdos seus pares. (BEREHENS, apudMORAN, 2000, p. 82)

Para Dias (2007, p. 35), o desafio nessaabordagem é a “criação de uma pedagogiabaseada na partilha, na exposição das pers-pectivas individuais entre os pares e nainiciativa conjunta orientada para a ino-vação e criação”.

Nesse sentido, o estar junto virtual é a abor-dagem que oferece maiores condições paraimplantar situações de construção de conhe-cimento, mas ela exige o envolvimento, oacompanhamento e o assessoramentoconstantes do participante por parte damediação técnica e da mediação pedagógica.

A Figura 8, a seguir, ilustra a abor-dagem do estar junto virtual a partir daabordagem do construcionismo contextua-lizado17 utilizando a Internet.

Essa é, sem dúvida, a abordagem demaior custo, pois pressupõe acompanha-mento permanente dos aprendizes pormeio da mediação, pedagógica e técnica.

Portanto, a abordagem estar junto virtualnão representa o paradigma conducionista,tutorial, mas enfatiza as interações domediador com os aprendizes, priorizandosempre as condições para a construção deconhecimento.

O terceiro suporte da CVA:participantes (alunos) responsáveise envolvidos

Os participantes (alunos) são responsá-veis pelo surgimento de um novo tipo derelação, muito diferente da clássica relaçãoprofessor-aluno. Essa nova relação repre-senta uma outra forma de comunicação eenfatiza a interação participante-participan-te. Os participantes devem entender que osmediadores serão facilitadores do processode ensino e aprendizagem e não“entregadores” da informação. Eles devemestar cientes de que o mote da comunidadeé a interação participante-participante.

Na comunidade, há uma divisão deresponsabilidade, bem como posição deigualdade entre mediadores e participantes.O participante deve modificar sua atitudepara vir a ser um agente de busca e cons-trução do conhecimento, tornando-se

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coautor de seu aprendizado pessoal eprofissional, uma vez que dá a sua opiniãoa cada questão apresentada. Cada partici-pante é responsável pela construção doconhecimento de forma autônoma e deacordo com sua disponibilidade e ritmopessoal. O importante é despertar em todos– participantes e mediadores – a correspon-sabilidade pelo processo de construção doconhecimento.

O quarto suporte da CVA:aprendizagem continuada

Conforme já afirmado, mesmo após oencerramento do curso, os participantesmanifestavam interesse em ter acesso àcomunidade de aprendizagem do curso.

A ideia é tornar esse espaço disponível aosservidores em seu dia a dia de trabalho,como um meio de aprimorar seus conhe-cimentos técnicos e seu desempenho pro-fissional.

É nesse cenário e com base nos recur-sos descritos que a Fundap/Egap propor-ciona, por meio desse suporte, umacapacitação continuada e permanente, quevaloriza o servidor e elimina a cultura daescolarização formal clássica, comopassaporte único, para a sua capacitação.Esse suporte possibilita a valorização desua autoestima, melhoria do serviço emelhores oportunidades no mercado detrabalho.

A aprendizagem contínua e permanentefornece aos participantes os instrumentos

Figura 8: Abordagem de EaD que implementa o modelo do construcionismocontextualizado

Fonte: Fundap/Egap (São Paulo, Brasil)

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essenciais de que necessitam para participarativamente da sociedade globalizada, umavez que sabemos que a capacitação doindivíduo não pode ser pensada como algoque acontece entre os muros de uma escola.

Todavia, os ambientes que oferecemuma aprendizagem continuada de quali-dade devem atentar para vários aspectosdeterminantes, entre eles:

• que o participante tenha predispo-sição para aprender;

• que o ambiente de aprendizagem sejaadequadamente organizado e exista inter-veniente, agente de aprendizagem, quepossa ajudar os participantes no processode aprender;

• que o indivíduo, ao aprender, utilizea sua experiência de vida e os seus conheci-mentos adquiridos e, com isso, dê novossignificados à atribuição da informaçãoadquirida e, consequentemente, convertaessa informação em conhecimento18;

• que a ênfase seja “não” na trans-missão da informação, mas na discussãoem grupo, no compartilhamento da infor-mação, no cultivo da heterogeneidade deideias e experiências; especificamente,nesse curso, testes e provas são abolidose a certificação é opcional19 e de participa-ção20; ou seja, nesse curso não é feita aavaliação da aprendizagem, pois sabemos queos métodos tradicionais de avaliação(testes e provas, por exemplo) não são,muitas vezes, métodos eficientes paraavaliar a aprendizagem (entretanto, casoo cliente – demandante do curso – solicitecritérios de certificação tradicionais, comoprovas, a Fundap/Egap atenderá a essademanda);

• que os mediadores, agentes de apren-dizagem, sejam desafiadores, e não sótransmissores da informação, e contribuampara o desenvolvimento cognitivo, afetivoe social dos participantes;

• que o ato de aprender seja contro-lado pelo participante que quer conhecermais e é motivado pelo prazer de satisfazersuas necessidades e interesses;

• que o incentivo à colaboração leve àsatisfação de ser útil, de poder ajudar oscolegas, de poder resolver problemas e,muitas vezes, de realizar tarefas sofisticadas;isso gera o sentimento de empowerment (sen-sação de que podem desenvolver algo con-siderado quase impossível e, o mais impor-tante, de compreenderem como foirealizado). Esse tipo de sensação não é en-contrado nos ambientes educativos tradici-onais.

Considerando, como explicitadoacima, que os métodos tradicionais deavaliação não são, muitas vezes, métodoseficientes para avaliar a aprendizagem,entendemos que a avaliação da apren-dizagem é:

1) Ter um olhar na dimensão interacio-nista e social21.

2) Respeitar os diversos estilos deaprendizagens e as diferenças individuais(CAVELLUCCI, s.d.).

3) Entender que não consiste emreproduções da realidade e, sim, umainterpretação do mundo própria de cadaindivíduo, da estrutura do organismo, dasua constituição física, das percepçõessensoriais, da forma como experimenta edelineia os objetos (MORAES, 2004).

4) Refletir e aprender a respeitar o“silêncio virtual” no contexto do grupode discussão via rede. Para Gonçalves(2003), é necessário que se tenha abertura,mais receptividade nesses momentos.Ignorar o silêncio diante do que não estásendo comunicado pode ser uma posturasábia, produtiva, diante do silêncio, ouuma postura esterilizante, que exigeresposta rápida e que pode ser reflexo daansiedade do professor/tutor/moderador.

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5) Perceber a importância do erro nosprocessos de ensino-aprendizagem. Deacordo com Moraes (2004), o erro é umestágio do processo de construção doconhecimento, uma vez que repensar o erroé investigar sua correção; o indivíduoretroage e realimenta o seu processo deconstrução e corrige os desvios.

6) Entender que o ato de aprender nãoocorre em função dos estímulos externospor uma cadeia linear – causa-efeito. Con-forme ressalta Moraes (2004), a aprendi-zagem é um processo circular interativo erecorrente, que ocorre dentro de uma redeneuronal estruturalmente aberta, masorganizacionalmente fechada e queprovoca mudanças de condutas, de acordocom a história de interações recorrentesentre o sistema vivo e o meio.

7) Compreender que não existe umacorrespondência direta entre uma boadiscência e um bom resultado docente(MORAES, 2004).

8) Respeitar a diversidade que favorecea flexibilidade. A diversidade de um sistemade avaliação está mais de acordo com ocontexto, métodos e tratamentos curricu-lares variados e flexíveis (MORAES, 2004).

9) Adotar um processo de auto-orga-nização22, que implica mudança deconduta, é processual, contínuo no tempoe que valoriza a etapa intermediária.Segundo Moraes (2004), o aluno, ao seautoavaliar, estará automaticamente em umprocesso de autoformação, de desenvolvi-mento e de aprendizagem. Nesse caso, aavaliação é um instrumento importantepara o desenvolvimento da autoestima econquista da autonomia. Ressalta aindaMoraes (2004) que as situações imprevistase os objetivos não planejados são elementosimportantes para o conjunto de uma boaavaliação e para futuros ajustes desseprocesso.

10) Priorizar um processo de incentivoe motivação, e de acompanhamento doaprendiz em todo o seu processo de apren-dizagem. Segundo Masetto (2003),vivenciamos práticas de avaliação da apren-dizagem como identificadoras de resul-tados obtidos e não como incentivo àaprendizagem. Além disso, essa avaliaçãonão poderá vir ao final de determinadaetapa e apenas representada por uma nota.Representa um feedback contínuo erecursivo entre formador e aluno(MASETTO, 2003).

Conclusões

Com a criação de uma CVA, é ofere-cida a possibilidade de se organizar umespaço de colaboração, para discutir osconteúdos do curso e resolver problemasdo dia a dia de trabalho dos servidores.Com isso, tal facilidade explora os poten-ciais da Internet com vistas a poder criarespaço e condições para que se estabele-çam redes de aprendizagem colaborativa,nas quais é possível trocar informações eexperiências, e partilhar ideias ou tarefasentre servidores que trabalham em ativi-dades assemelhadas. A intenção é permitirque os servidores adotem novas posturasou práticas que promovam a tomada deconsciência e, então, mudem o modo decompreender o que fazem e, até mesmo,como aprendem.

Embora os cursos possam, na abor-dagem broadcast, atingir grande número departicipantes, eles não têm mecanismos quegarantam o máximo rendimento daformação obtida, isto é, indivíduos comautonomia intelectual, pensamento crítico,capacidade de equacionar e resolverproblemas, disposição para oferecersugestões e opiniões, iniciativa e capacidadede organizar-se para cumprir as tarefas no

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tempo e nas condições necessárias para omelhor aprendizado.

Para que essas habilidades e compe-tências sejam adquiridas, é necessárioincrementar as atividades previstas na abor-dagem broadcast com outras atividades,como a CVA. A comunidade passa a ser oespaço para a interação do grupo, localonde são trocadas informações e encami-nhadas dúvidas do dia a dia de trabalho.

A comunidade, porém, não se formaou se mantém de modo espontâneo. Elanecessita ser cultivada e incentivada, porintermédio de mediadores que atuam e sededicam fundamentalmente a solidificar aparticipação de todos os envolvidos nocurso. Em geral, as estratégias adotadaspelos mediadores, para desencadear aintegração e estabelecer a familiaridadecom os recursos técnicos, têm resultadossatisfatórios nas primeiras semanas e aolongo do curso, com tendência de forta-lecimento das relações interpessoais numclima solidário, cordial, de aceitação e, porfim, de segurança.

Contudo, para que esse espaço possasobreviver, é indispensável a figura doformador, não como único responsávelpelo processo de ensino e aprendizagem,mas como indivíduo que assume umaposição de igualdade ao lado dos demaisparticipantes do ambiente e entende quetodos – participantes e formadores – detêmconhecimentos específicos, diferenciadose relevantes. Ele é diferenciado por ser apessoa que tem uma intencionalidadepedagógica e que deve preservar os obje-tivos originais do curso – o barco tem umtimoneiro!

A partir do momento em que se esta-belece a confiança e a comunidade começaa ser fortalecida, é possível identificaralunos (participantes) que são verdadeirosespecialistas (talentos) e que passam a

assumir a responsabilidade de interagir eajudar os colegas. Com efeito, participantese formadores passam a ser coautores ecoprodutores do seu próprio conhecimentoe, também, ambos são coautores e copro-dutores do que está sendo produzido eincorporado ao ambiente, em um movi-mento contínuo e recursivo.

As intervenções dos mediadores têma função de facilitar o processo de ensinoe aprendizagem, incentivar a interação nosfóruns de discussão e auxiliar o participantea descobrir seu potencial intelectual. Esta-belecem relações entre as várias áreas deconhecimento, conexões relevantes entreos participantes e os mediadores. Alémdisso, as intervenções dos mediadores têmo papel de resgatar a funcionalidade daemoção como condição capaz de propor-cionar circunstâncias adequadas aosanseios e desejos dos participantes, tornan-do esse ambiente adaptável ao aluno epossibilitando uma boa interface de comu-nicação e interação; porém, sem nuncaperder o foco do curso, o controle, ogerenciamento e a animação geral dacomunidade.

Na comunidade, o participante (aluno)tem que modificar a sua atitude para vir aser um agente de busca e construção doconhecimento, tornando-se corresponsável,coautor do seu aprendizado pessoal eprofissional. Cada participante é respon-sável pela construção do conhecimento, deforma autônoma e de acordo com suadisponibilidade e ritmo pessoal. Nessecontexto, o participante pode colocar tantosuas dúvidas quanto os conhecimentos deque dispõe e, portanto, pode ser ao mesmotempo aprendiz e auxiliar do processo deaprendizagem do colega.

A criação da CVA, associada a umcurso que utilize a abordagem broadcast,propicia um ambiente de aprendizagem

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rico e permite que se entendam osdiferentes papéis que mediadores e parti-cipantes passam a desempenhar. Ademais,faz com que se possam identificar, entreos participantes, talentos que passam a terpapel fundamental na manutenção dacomunidade virtual, e não só nela, mas naprópria estrutura do governo, que, porintermédio dessa ação de formação, conse-guiu identificar diversos servidores comalto grau de especialidade (expertise).

Essa experiência mostra que o conhe-cimento que o governo quer incrementarencontra-se, de algum modo, imerso emsua própria estrutura. Os especialistas exis-tem, porém estão incógnitos e, possivel-mente, ignorados. A criação da CVA podeser a grande oportunidade de o governoresgatar o potencial intelectual e humano

de seus servidores, valorizando a capaci-dade de pensar, de criar e de se relacionarque eles detêm.

Por fim, percebemos que a economiaglobalizada expõe a sociedade e asempresas a uma competição acirrada e,nesse contexto, um dos elementos estraté-gicos dos setores público e privado estaráno domínio de saber trabalhar em comu-nidades virtuais, como uma alternativa deaproveitar e aglutinar o aprendizado dosenvolvidos. As interações sociais virtuais(CVA) têm o poder de construir, por meiodo compartilhamento das informações edas experiências de seus membros,soluções inovadoras para a sociedadecomo um todo.

(Artigo recebido em: maio de 2013. Versão finalem: junho de 2013.)

Notas

1 Piaget (1980) defende que a inteligência possui dois aspectos: o cognitivo e o afetivo. Esseautor considera improvável encontrar o comportamento oriundo da afetividade sem nenhumaspecto cognitivo. Porém, os fatores afetivos e cognitivos são indissociáveis no comportamento.Para o aprendiz desenvolver o conhecimento, é necessário haver interesses intrínsecos. Quandoo indivíduo inicia o processo de construção de conhecimento, ele experimenta estados de pra-zer, ansiedade, fadiga, esforço, aborrecimentos, desapontamento etc. Assim, para Piaget (1980),os aspectos afetivos têm influência no desenvolvimento intelectual de uma pessoa.

2 Essa solução – comunidade virtual de aprendizagem como apoio a uma capacitação – foivencedora do Prêmio Mario Covas – 2008: “Comunidade Virtual de Aprendizagem Saúde: criandouma rede ‘viva’ de colaboradores na área da saúde”. Categoria: Inovação em Gestão Pública. Paradetalhes a respeito, consulte Prêmio Mario Covas em http://www.premiomariocovas.sp.gov.br/2012/index.html.

3 Na abordagem broadcast, os meios tecnológicos são utilizados para apenas transmitir infor-mação aos aprendizes. O conteúdo do curso foi preparado e organizado previamente, para só depoisde pronto ser oferecido ao participante, que não pode fazer nenhuma alteração. Entretanto, o Cursode Licitação Sustentável (oferecido em 2012), na abordagem broadcast, apresenta um diferencial que é acomunidade virtual de aprendizagem, um espaço que permite a interação entre participantes eformadores. Assim, caso o participante sinta necessidade de interferir no conteúdo do curso, ele devediscutir na comunidade (com os mediadores e colegas) e, se houver pertinência, o conteúdo seráalterado pela coordenação do curso, uma vez que o conteúdo do curso estará sempre em construção!

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4 O conteúdo do curso é organizado em uma sequência de módulos, planejada por critériospedagógicos; cada módulo está organizado nos seguintes subcampos: conteúdo; tema; exercícios;apontamentos; atividades complementares; pesquisa; e saiba mais (campos estáticos). O cursooferece também espaços de apoio, como comunidade, fale conosco, glossário, midiateca, questõesinteressantes, ajuda e créditos.

5 No tutorial, o conteúdo do curso é apresentado por módulos sequenciais.6 A pop-up é uma janela extra que se abre no navegador ao visitar uma página web ou ao

acessar uma hiperligação específica.7 Módulo 1: Contratações ambientalmente sustentáveis; Módulo 2: Aspectos jurídicos;

Módulo 3: Prestação de serviços terceirizados; Módulo 4: Aquisição de materiais; Módulo 5:Obras e serviços de engenharia; Módulo 6: Responsabilidade social; e Módulo 7: Meio ambiente,sociedade e sustentabilidade.

8 Veja a descrição desses recursos na seção “O primeiro suporte da CVA” deste artigo.9 O conteúdo do curso é organizado em uma sequência de módulos, planejada por critérios

pedagógicos (bom exemplo é a comparação com uma “casca de cebola”); cada módulo compõe-se de subcampos: conteúdo; tema; exercícios; apontamentos; atividades complementares; pesquisa;e saiba mais. O curso oferece também espaços de apoio, como comunidade, fale conosco, glossário,midiateca, questões interessantes, ajuda e créditos.

10 O aluno é chamado de participante nos ambientes de aprendizagem a distância da Fundap/Egap.

11 O construcionismo contextualizado significa que a construção do conhecimento baseia-se narealização concreta de uma ação que produz um resultado palpável (um artigo, um projeto, umobjeto) de interesse pessoal de quem produz. É contextualizado porque o produto (a construção) estávinculado à realidade da pessoa ou do local onde vai ser produzido e utilizado (VALENTE, 1999).

12 Essa abordagem oferece condições para implantar situações muito favoráveis para a cons-trução do conhecimento e exige do participante envolvimento, acompanhamento e assessoramentoconstantes. Com base em situações práticas e concretas, mediadores e participantes podeminiciar, conjuntamente, a interaprendizagem e, por intermédio dessas relações intersubjetivas,produzir uma forma autêntica de reflexão e ação. Assim, nesse ciclo de pensar-agir e agir-pensar,toda a comunidade pode, afinal, começar a refletir sobre seu fazer diário.

13 Endereço do curso: http://www.governoemrede.sp.gov.br/ead/lictsustentavelbr/index.htm14 Note que, na estrutura de navegação dos módulos, a apostila (saiba mais) é o último item,

ao contrário, repita-se, da maioria dos cursos tradicionais.15 Os mediadores técnicos são geralmente os autores do conteúdo programático do curso e

também têm o encargo de mediar a comunidade durante três horas diárias. Nas CVA da Fundap/Egap, o aluno recebe um retorno (feedback) em até 24 horas.

16 Assim, o estar junto virtual é uma abordagem que favorece a aprendizagem, fundamentalpara a criação de comunidades virtuais de aprendizagem, e estimula a atuação do aprendiz comocoautor desse processo de construção.

17 O construcionismo contextualizado significa que a construção do conhecimento baseia-se narealização concreta de uma ação que produz um resultado palpável (um artigo, um projeto, umobjeto) de interesse pessoal de quem produz. É contextualizado porque o produto (a construção) estávinculado à realidade da pessoa ou do local onde vai ser produzido e utilizado (VALENTE, 1999).

18 Para Valente (2009, p. 1), “o conhecimento construído é o produto do processamento, dainterpretação, da compreensão da informação. É o significado que atribuímos e representamos

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em nossa mente sobre a nossa realidade. É algo construído por cada um, muito próprio eimpossível de ser passado – passamos informação que advém desse conhecimento, porém nun-ca o conhecimento em si”.

19 Para o adulto, a vontade de aprender não pode ser explicada somente por mudança deconduta em decorrência de um estímulo externo. Para aprender, o adulto interpreta a realidadede acordo com a sua história e, a partir dessa interpretação, passa a internalizar algo (o produtoda significação); são os fatores de ordem interna que criam circunstâncias para ele se motivar aaprender (autorrealização, autoestima, qualidade de vida etc.).

20 A certificação do Curso de Licitação Sustentável Brasil é de participação e opcional. Oparticipante que desejar certificar-se deverá realizar todos os módulos do curso e participarativamente da comunidade virtual de aprendizagem, com o envio de mensagens significativasde conteúdo técnico (conteúdo do curso), no período de dois meses de vigência de sua turma.Mensagens postadas nos fóruns “Café” e “Bem-vindo! Apresente-se e Colabore” não são con-sideradas para essa avaliação.

21 No que se refere à dimensão interacionista, as relações que possibilitam trocas intelectuaissão, segundo Moraes (2004), inexoráveis ao desenvolvimento do pensamento do sujeito. Paraessa autora, o conhecimento em sua essência é dialético, uma vez que toda interação implicadialogicidade e produção compartilhada. No que concerne à dimensão social, ainda conformeMoraes (2004), o indivíduo, no ato de conhecer, realiza algo, experimenta e reconstrói a suaprópria realidade e muda interiormente, por meio dessa relação consigo mesmo e ante a relaçãocom os seus pares. Para essa autora, a aprendizagem é um “processo de auto-organização e dereorganização mental e emocional”.

22 Os processos auto-organizadores do indivíduo acentuam a dimensão auto-organizadorada avaliação. Isso nos acena que a avaliação deve proporcionar informações imprescindíveispara a formação do aprendiz e não apenas oferecer informações sobre certo aluno em momen-tos determinados pelo formador. A avaliação, a partir dessas teorias, passa a ser também umaparte importante do processo de auto-organização, tanto no nível do indivíduo quanto da orga-nização. E os processos auto-organizadores acentuam, com base nesses enfoques, a dimensãoautoformadora da avaliação. Isso indica que ele deve oferecer informações importantes para oprocesso de autoformação do aluno, colaborando para o seu próprio processo de desenvolvi-mento e aprendizagem. Desse ponto de vista, a avaliação é um instrumento importante para aautonomia do aluno (MORAES, 2004).

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Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência do Governo do Estado de São Paulo, Brasil

Resumo – Resumen – Abstract

Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiência doGoverno do Estado de São Paulo, BrasilTania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando ValenteEste artigo apresenta os quatro suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: a

criação de um curso, na abordagem broadcast, contextualizado e significativo; a mediação técnicae pedagógica; participantes responsáveis e envolvidos; e a aprendizagem continuada. Criada pelaFundação do Desenvolvimento Administrativo e Escola de Governo e Administração Pública,instituições vinculadas à Secretaria de Gestão Pública do Estado de São Paulo (Brasil), a comu-nidade virtual de aprendizagem foi utilizada como recurso para capacitação on-line de servidorespúblicos. Dessa experiência singular, verificou-se que um dos elementos estratégicos dos setorespúblico e privado está no domínio de saber trabalhar em comunidades, como uma alternativa deaproveitar e aglutinar o aprendizado dos envolvidos. As interações sociais virtuais têm o poderde construir, por meio do compartilhamento das informações e das experiências de seus membros,soluções inovadoras para a sociedade como um todo.

Palavras-chave: aprendizagem continuada; capacitação on-line; comunidade virtual deaprendizagem; interações sociais; suportes de aprendizagem

Los soportes de una Comunidad Virtual de Aprendizaje: una experiencia delGobierno del Estado de Sao Paulo, BrasilTania Tavares-Silva, Paulo Dias y José Armando ValenteEn este trabajo se presentan los cuatro soportes de una comunidad virtual de aprendizaje: la

creación de un curso, el enfoque de la difusión, contextualizado y significativo; mediación técnicay pedagógica; los participantes responsables e involucrados; y el aprendizaje permanente. Creadapor la Fundación de Desarrollo Administrativo y la Escuela de Gobierno y AdministraciónPública, instituciones vinculadas con el Departamento de Administración Pública del Estado deSao Paulo (Brasil), una comunidad virtual de aprendizaje fue utilizada como un recurso para laformación en línea de los servidores públicos. Esta experiencia única se constató que uno de loselementos estratégicos de los sectores público y privado está trabajando en el campo delconocimiento en las comunidades, como una alternativa para aprovechar y unir el aprendizajede los participantes. Las interacciones sociales tienen el poder de crear, a través del intercambiode información y experiencias de sus miembros, las soluciones innovadoras para la sociedad ensu conjunto.

Palabras clave: el aprendizaje permanente; la formación en linea; la comunidad virtual deaprendizaje; las interacciones sociales; soportes de aprendizaje

The principles of a virtual learning community: an experience of the Departmentof Public Administration of the State of São Paulo, BrazilTania Tavares-Silva, Paulo Dias and José Armando ValenteThis article presents four principles of a virtual learning community: the creation of a

contextualized and meaningful course, in a broadcast approach; the technical and pedagogicalmediation; responsible and involved participants; and the continuous learning. Created by theAdministrative Development Foundation and the Government and Public Administration School,institutions linked to the Department of Public Administration of the State of Sao Paulo,Brazil, the virtual learning community was used as a resource for on-line training of public

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Tania Tavares-Silva, Paulo Dias e José Armando Valente

servants. From that singular experience, it was found out that one of the strategic elements ofpublic and private sectors is in the mastery of knowing how to work in communities, as a way toharness and unite the learning of those involved. Social interactions have the power to build,through the sharing of information and experiences of its members, innovative solutions tosociety as a whole.

Keywords: lifelong learning; on-line training; virtual learning community; social interactions;learning supports

Tania Tavares-SilvaÉ pós-doutora em Novas Tecnologias pela Universidade do Minho, Portugal. Técnica da Fundação do DesenvolvimentoAdministrativo (Fundap). Contato: [email protected]

Paulo DiasÉ doutor em Educação pela Universidade do Minho, Portugal. Reitor da Universidade Aberta, Portugal. Contato:[email protected]

José Armando ValenteÉ livre docente na área de Tecnologias Educacionais, pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Professor echefe do Departamento de Multimeios, Mídia e Comunicação do Instituto de Artes e pesquisador do Núcleo de InformáticaAplicada à Educação (Nied) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Contato: [email protected]

Edição e revisão técnica deste artigo

João VazÉ professor da Escola Diadema de Administração Pública (Edap) e da Uniesp/FaD. Mestre em Semiótica e LinguísticaGeral pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP); e especialistaem EaD pelo Senac/RJ.

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Flávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff

Redes organizacionais nocontexto da governança pública:

a experiência dos Tribunais deContas do Brasil com o grupo de

planejamento organizacional

Flávia de Araújo e Silva, Túlio César Pereira Machado Martins eIvan Beck Ckagnazaroff

Introdução

Novos paradigmas organizacionais surgiram nas últimas décadas, motivados

por fenômenos como a globalização e a crise fiscal do Estado. O movimento do

New Public Management é um exemplo de propostas de mudanças na adminis-

tração pública, suscitando modificações nas instituições em geral. Assim, alguns

valores foram incorporados aos valores tradicionais da cultura do serviço público:

eficiência, transparência, diversidade e orientação para o usuário.

Para Castells (1999), surgiu uma nova economia, que é informacional, global

e em rede. Novas estratégias e abordagens foram desenvolvidas como respostas

diante das mudanças percebidas. As organizações passaram a se concentrar mais

em suas “core competences”, desenvolver sistemas de informação apropriados e

estabelecer redes de cooperação com entidades externas. A associação de organi-

zações em rede, com troca de recursos e informações, é uma estratégia no sentido

de agregar valor adicional aos seus membros.

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

Nesse contexto, a governança públicaaparece como um dos temas principais quetêm sido discutidos recentemente, consi-derando as interações interinstitucionaispara a busca de melhores resultados daatuação governamental, e enfatizandoefetividade das políticas públicas, assimcomo maior transparência à sociedade dasações empreendidas com os recursospúblicos.

No cenário brasileiro, por exemplo, oPrograma de Modernização do Sistema deControle Externo dos Estados, DistritoFederal e Municípios Brasileiros (Promoex)contemplou como um dos objetivosalcançar maior intercâmbio e cooperaçãoentre Tribunais de Contas (TC), tendo emvista que o diagnóstico realizado em 2002pela Fundação Instituto de Administração(FIA/USP) apontou que havia baixaintegração técnica entre os tribunais, o quelevava ao desenvolvimento paralelo desoluções para problemas comuns, e incorriaem perda de tempo, recursos e conheci-mentos. Também foi apontado que nãoexistiam procedimentos e práticas consoli-dados para os tribunais, gerando diferentesinterpretações sobre os atos julgados(MAZZON; NOGUEIRA, 2002).

Com o advento do Promoex, foramcriados grupos temáticos compostos porrepresentantes dos tribunais para discutire alinhar entendimentos de temas diversos,como auditoria, Lei de ResponsabilidadeFiscal, planejamento estratégico etc. Essesgrupos temáticos podem ser consideradosredes de cooperação.

Desse modo, esta pesquisa buscaresponder à seguinte questão: que bene-fícios a adoção de uma rede de cooperaçãoentre os Tribunais de Contas trouxe paraos membros dessa rede?

Este trabalho tem por objetivoidentificar quais os benefícios da atuação

integrada entre instituições públicas sob aperspectiva das organizações em redes,tomando por base a recente experiência dogrupo de planejamento organizacional(GPL), considerado como uma rede decolaboração dos Tribunais de Contas,criada a partir do Programa de Moderni-zação do Sistema de Controle Externo dosEstados, Distrito Federal e MunicípiosBrasileiros (Promoex). Como objetivosespecíficos, propõem-se: a) descrever aforma como o grupo foi concebido;b) identificar quais foram os méritosalcançados; c) levantar quais foram asdificuldades na interação entre os atoresque compõem o GPL.

Adotou-se a metodologia baseada,principalmente, em pesquisa bibliográficae documental, além de entrevistas commembros do referido grupo.

As pesquisas sobre redes no setorpúblico não são tão desenvolvidas quantono setor privado, conforme apontam Isette Provan (2005). Dadas as diferenças exis-tentes entre os setores, faz-se necessáriopesquisar de forma mais aprofundadacomo se dá a interação por meio de redesno setor público.

A atuação das organizações em redesé um tema inovador para o serviço públicoe deve ser mais explorado, principalmenteno que tange aos resultados alcançadospelos integrantes da rede. A ideia de coope-ração precisa ser disseminada na adminis-tração pública. Nesse sentido, este trabalhopretende contribuir para os estudos nocampo das redes organizacionais públicas,por meio de uma reflexão sobre os bene-fícios proporcionados pelas mesmas aosatores que delas fazem parte.

A fim de atender aos objetivos pro-postos, este artigo está dividido, para alémdesta introdução, em cinco seções. A pri-meira busca discorrer sobre a governança

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Flávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff

pública, identificando os pressupostosdessa abordagem. A segunda apresenta ascaracterísticas das organizações em rede e,em seguida, faz-se a descrição da rede dosTribunais de Contas. Por fim, são apresen-tadas as considerações finais.

Governança no setor público

O advento da Administração PúblicaGerencial (APG) ou New Public Management(NPM), a partir dos anos 1980, trouxe umanova abordagem para a gestão pública aoimplementar ferramentas gerenciais atéentão utilizadas apenas na esfera privada,enfatizando a eficiência e o resultado(HOOD, 1995; PACHECO, 2010; SECCHI, 2009).A APG pode ser entendida como ummodelo pós-burocrático e está inserida nosquadros de reformas da administraçãopública (SECCHI, 2009). A nova gestãopública gerou forte mudança na cultura dasorganizações, invertendo a antiga orien-tação de inputs (entradas) para outputs(resultados).

No contexto de mudanças surgidas nagestão pública e ora mencionadas, desta-ca-se a temática da governança, um modelode gestão que enfatiza a transparência eaccountability. Tal tema, desenvolvido inicial-mente nas empresas privadas (governançacorporativa) como forma de disciplinar asrelações com os acionistas, tem sido disse-minado para a esfera pública, como destacaFontes Filho (2003), mas com um olharpara a sociedade.

A difusão desses modelos temcontribuído para ampliar a discussãoda governança para as demais organi-zações, as não mercantilistas, tais comoorganizações sem fins lucrativos, orga-nizações sociais e o terceiro setor, (...)e mesmo organizações públicas que

estão sujeitas a padrões de aceitaçãosociais tão importantes à sua sobrevi-vência quanto o próprio lucro. (FONTES

FILHO, 2003, p. 5)

Fontes Filho (2003) afirma que agovernança pública está associada a umamudança na gestão política. Ela pode serentendida como um novo modelo queapropria dimensões como negociação,comunicação e confiança. O propósito da

governança, para Kooiman e Van Vliet(1993), não é apenas lidar com problemas,mas também com as oportunidades dassociedades modernas.

Kissler e Heidemann (2006) afirmamnão existir um conceito único de gover-nança pública, mas, sim, uma série de consi-derações acerca de uma nova estrutura dasrelações entre Estado, iniciativa privada e

“Durante essesencontros, oficinas ereuniões técnicas, ogrupo tem aoportunidade de discutirproblemas comuns,compartilharexperiências e soluçõesde problemas e pensarem ações e projetos parabenefício de todos.”

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

atores da sociedade civil (coletivos e indi-viduais). A governança na administraçãopública pode ser entendida como um mo-delo horizontal de relações entre atores dasesferas pública e privada no processo deelaboração de políticas públicas (SECCHI,2009; KOOIMAN e VAN VLIET, 1993).

Para Kissler e Heidemann (2006), agovernança pressupõe definição de regrase institucionalização que sejam nem tãofortes, impedindo a capacidade de inova-ção, e nem tão fracas, com objetivos estraté-gicos mal formulados, o que poderiacomprometer a comunicação entre osmembros, além de não favorecer o investi-mento de pessoas em papéis-chave para acondução dos objetivos. O risco da aliançase perder quando essas pessoas se desvin-culam da rede é grande; portanto, Kisslere Heidemann (2006) defendem que:

(...) sem regras de jogo, o sucesso dagovernança pública se torna antes“obra do acaso” de pessoas engajadas,mas sem papéis vinculantes. As regrasdo jogo devem ser negociadas entre osatores; e, quando modeladas em con-junto, elas também podem fortalecero autocomprometimento. (KISSLER eHEIDEMANN, 2006, p. 497)

A governança, no contexto empresarial,está ligada a um conjunto de princípios paraaumentar a efetividade de controle pelosstakeholders sobre as instituições com que serelacionam, e também é vista como formade dirimir os conflitos de agência entreagente e principal. Ao considerar-se a ad-ministração pública, Fontes Filho (2003)destaca a necessidade de desenvolver ossistemas de controle interno e externo comoforma de monitorar a atuação dos gestorespúblicos no interesse da sociedade ougrupos de beneficiários.

Kissler e Heidemann (2006) tambémdestacam a ideia de transição de umEstado convencional para um novo mo-delo de Estado que: (i) serve de garantiaà produção do bem público, e; (ii) acionae coordena outros atores a produzir comele o bem público. Sob esse aspecto,Kissler e Heidemann (2006, p. 486) aindacomentam que “é decisiva a transição doEstado gestor (hierárquico), com ingerênciana sociedade, para o Estado cooperativo, queatua em conjunto com a sociedade e asorganizações empresariais, por meio deparcerias estratégicas”.

Castells (2001) propõe a definição deEstado-rede, que redefine o Estado-Nação,como aquele que compartilha autoridade(capacidade institucional de impor deci-sões) com um rol de instituições:

o Estado-Nação se articula cotidia-namente na tomada de decisões cominstituições supranacionais de distintostipos e em distintos âmbitos (...),também funcionam em rede nessamesma rede, instituições regionais elocais. E, inclusive, cada vez mais, delaparticipam organizações não governa-mentais (...) que se conectam com essarede interinstitucional, feita tantode negociação como de decisão, decompromisso como de autoridade, deinformação como de estratégia.(CASTELLS, 2001, p. 164)

Para Castells (2001), o Estado-rede éuma forma mais apropriada para processara complexidade de relações entre os dife-rentes níveis (global, nacional e local), aeconomia, a sociedade e a política. É aforma política que permite a gestão coti-diana da tensão entre o local e o global. Oautor propõe oito princípios de funciona-mento administrativo que sintetizam o

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Flávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff

processo de construção do Estado-rede: agestão administrativa deve situar-se noâmbito mais descentralizado possível;flexibilidade na organização e atuação daadministração; coordenação dos elementosque interagem com o Estado, com meca-nismos de cooperação, com as adminis-trações locais, regionais, nacionais e suprana-cionais de todas as instituições presentes narede operada pelo Estado; participaçãocidadã; transparência administrativa; moder-nização tecnológica; profissionalização dosagentes da administração; e retroação nagestão, permitindo às organizações corri-girem seus próprios erros.

Castels (2001) ainda aponta que oEstado-rede é a forma de sobrevivência doEstado na era da informação e daglobalização, e que seu instrumento indis-pensável deve ser uma administraçãoflexível e conectada.

Governança na administraçãopública por meio de redes

A rede interorganizacional é um tipode rede social, com caráter técnico eoperacional. Entre suas características, des-taca-se pouca hierarquia e grandeinteratividade entre seus atores. De Sordiet al. (2009) afirmam que a essência de umarede é o fenômeno da “coopetição”, ouseja, cooperação e competição entreempresas. Os elementos fundamentais darede são os atores e as relações que sãoestabelecidas entre eles.

Como diria Mintzberg (1998), ogoverno em rede pode ser entendido comoum sistema interligado, uma rede comple-xa de relações temporárias destinadas àsolução de problemas que a todo instantesurgem; uma rede ligada por canais infor-mais de comunicação, cujo lema seriaconectar, comunicar e colaborar.

Segundo Marini e Martins (2004), redeé uma estrutura de organização capaz dereunir pessoas e instituições em torno deobjetivos comuns. Sua base de formação éo compartilhamento da informação. Osautores expõem que o conjunto de redesdo governo matricial envolve alinhamentohorizontal e vertical. No alinhamentohorizontal, as redes podem conter ligaçõessimples, quando programas intrassetoriaissão implementados por uma única organi-zação, ou podem ser ligações complexas,em que os programas multissetoriais sãoimplementados por múltiplas organizações,incluindo entidades não governamentais eentes de outras esferas do governo.

Castells (2001) menciona que umarede não tem centro mas, sim, nós dediferentes dimensões e com relaçõesinternodais diferenciadas. Cada nó énecessário para a existência da rede. Oautor também afirma que as tecnologiasda informação e comunicação é quepodem proporcionar a articulação coti-diana de uma rede de instituições com-plexas, pois, de outra forma, a interativi-dade dos participantes estaria prejudicada.O autor acrescenta que “o funcionamentoem rede, assegurando descentralização ecoordenação na mesma organizaçãocomplexa, é um privilégio da era dainformação” (CASTELLS, 2001, p. 164).Castells ainda pondera que o grau deeficiência das administrações estataisdependerá de sua capacidade de processarinformações e assegurar o processo decompartilhamento de decisão, o quedemandará capacidade tecnológica,recursos humanos adequados e umaestrutura administrativa flexível.

Quando se discute redes, Ahmadjiane(2008) destaca também a criação ecompartilhamento do conhecimento entreas organizações que se relacionam, seja esse

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

relacionamento próximo ou distante, pormeio de vínculos fracos, mas de grandealcance.

Kickert e Koppenjan (1999) comen-tam que uma análise mais aprofundadaacerca da gestão de redes é necessária parase verificar como as redes podem ser utili-zadas para desenvolver políticas que bus-quem solucionar os problemas mais com-plexos. As organizações entendem que acooperação é a melhor maneira de atingirobjetivos comuns (KLINJ, 1999).

Kissler e Heidemann (2006) apontamque o desenvolvimento da confiança entreos membros de uma rede é um pressupostopara um estado de cooperação. Os autorestambém explicam que a estrutura de umarede de atores é composta por fios e nós,sendo os fios as expectativas, objetivos edemandas acerca da atuação dos atores eos nós seriam os próprios atores e suaatuação conjunta. Também expõem que afunção de uma rede é reunir atores cominteresses diferenciados, ou até conflitantes,para trabalharem em conjunto, buscandoagir de acordo com interesses do grupo, enão particulares. Os membros da rededevem negociar os interesses, ajustando-se uns aos outros.

Mas o que leva as instituições a se orga-nizarem em rede, tendo em vista essalimitação dos interesses particulares? ParaKissler e Heidemann (2006), a resposta aessa questão é que as redes protegem osatores, ou seja,

Isso quer dizer que elas possibilitamaos atores a resolução de problemasque representariam uma cargaexcessiva para um ator isolado, único.Em outras palavras: quem trabalhasozinho sucumbe. As redes evitam aqueda; possibilitam a solução dosproblemas, acima de tudo, pela ação

conjunta. Sua estabilidade resulta,assim, da pressão por cooperação e dobom êxito da cooperação. (KISSLER E

HEIDEMANN, 2006, p. 495)

Kissler e Heidemann (2006) ressaltamainda que a governança pública não podeser imposta: é um processo de troca queoscila entre o topo e a base em toda aorganização. Portanto, a nova cultura degovernança deve estar impregnada emtodas as organizações participantes daestrutura de governança. “Desse modo, osparceiros, liderando uma coalizão em redeou uma aliança, irão construir efetivamenteas bases para o desenvolvimento de umaconfiança mútua.” (KISSLER E HEIDEMANN,2006, p. 496).

Os estudos preliminares sobre redesde políticas públicas, por volta dos anos1960, focavam na importância das relaçõesde cooperação entre organizações, naforma como elas trabalhavam e no impactodessas relações na estrutura e comporta-mento organizacional. Acredita-se quegrupos interdependentes de duas organi-zações, colaborando e cooperando umacom a outra, são mais efetivos para proverserviços mais complexos à comunidade doque se atuassem de forma isolada. A lógicapor trás disso foi construída nos conceitosda Teoria dos Jogos, que aponta que acooperação tende a produzir resultadosmais favoráveis para ambas as partes doque se as mesmas competissem (PROVAN EMILWARD, 2001).

Recentemente, o foco de estudo foiampliado, buscando verificar a efetividadedas atividades da rede e considerando asvárias interações entre os atores. É neces-sário verificar se as redes no setor públicorealmente funcionam. Entretanto, a dificul-dade de avaliar a efetividade de uma rede éainda maior do que a de avaliar uma

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Flávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff

organização isolada. A avaliação daefetividade deve ser feita pela ótica dosstakeholders. Entretanto, existem diversosstakeholders com visões diferenciadas decomo o sucesso da rede deve sermensurado (PROVAN E MILWARD, 2001).

Além dos aspectos ora discorridossobre as redes de políticas públicas, cabedestacar que as redes de cooperação, deuma forma geral, apresentam alguns bene-fícios que surgem por meio do relaciona-mento cooperativo entre os diversos atoresque compõem a rede, conforme elencadopor Gameiro (2013):

a) melhor aproveitamento dos recursos;b) partilha de riscos;c) fortalecimento no poder de nego-

ciação (tanto em atividades de comprasquanto em atividades de venda), entre outros.

Aspectos metodológicos

Em termos gerais, a pesquisa possuium caráter descritivo, uma vez que pre-tende descrever os fatos e fenômenos deuma dada realidade para uma melhorcompreensão de como esse processo sedesenvolve (TRIVIÑOS, 2007).

Trata-se de uma pesquisa qualitativa,pois apresenta as seguintes características:foco nas percepções e nas experiências dosparticipantes; concentração no processoque está sob análise; dados são interpretadosem relação aos detalhes de um caso e nãoàs suas generalizações (CRESWELL, 2007).

Para atender ao objetivo proposto nopresente trabalho – qual seja: identificar quaisos benefícios da atuação integrada entre ins-tituições públicas sob a perspectiva dasorganizações em redes, tomando por base arecente experiência do grupo de planejamentoorganizacional –, foram utilizadas duastécnicas de pesquisa: documental e entrevista(MARTINS E TEÓFILO, 2009).

O grupo de planejamento organiza-cional (GPL/Promoex) é formado pormembros das áreas de planejamento dosTribunais de Contas dos Estados, DistritoFederal e Municípios do Brasil, assim comopor membros de outras instituiçõespúblicas, conforme descrição a ser apresen-tada adiante.

Inicialmente foi feito levantamento dedados por meio de pesquisa documentaldos relatórios de atividades, atas de

reuniões e encontros técnicos do grupo deplanejamento organizacional, disponíveisno Portal dos Tribunais de Contas.

A pesquisa documental também foirealizada por meio de consulta ao Relatóriode Progresso Promoex do primeirosemestre de 2012, como forma de identi-ficar dados que pudessem ser utilizados natriangulação com outras fontes de dados

“... váriosavanços desse grupopodem serdestacados, como ocompartilhamentode um mesmosoftware paramonitoramento daexecução doplanejamentoestratégico por 25tribunais...”

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

(entrevistas). Tal relatório encontra-sedisponível no site do Ministério do Planeja-mento, Orçamento e Gestão.

Em seguida, foram realizadas entre-vistas não estruturadas cujas característicassão a liberdade de desenvolvimento dassituações nas direções consideradas maisadequadas pelo entrevistador, de forma aexplorar amplamente uma questão(LAKATOS E MARCONI, 2010). As entrevistastinham a intenção de levantar as percepçõesdos membros do grupo de planejamentoacerca dos avanços alcançados, dificuldadesencontradas e ameaças à continuidade dostrabalhos do grupo temático.

Foram entrevistados seis membros doGPL, escolhidos aleatoriamente entre osdoze membros do grupo, sendo todosservidores de carreira técnica, que atuamnas unidades de planejamento dos respec-tivos tribunais. Foram preservadas asidentidades dos entrevistados.

Para Lakatos e Marconi (2010), a entre-vista é um importante instrumento deinvestigação social e apresenta comovantagens: oportunidade de obter dadosque não se encontram em fontes docu-mentais e que sejam relevantes e signifi-cativos; possibilidade de conseguirinformações mais precisas, entre outras.Entretanto, algumas limitações desse tipode pesquisa de campo, apresentadas pelasautoras, são a dificuldade de comunicaçãoentre as partes, retenção de dados impor-tantes devido ao receio de que a identi-dade do entrevistado seja revelada, alémde tomar muito tempo e ser de difícilrealização. Levando em conta as vantagense limitações desse e de outros métodos depesquisa, considerou-se que a entrevistaseria a forma mais adequada para atenderaos objetivos propostos neste trabalho.

O roteiro da entrevista foi elaboradosegundo a linha da análise SWOT, com

identificação dos pontos fortes e fracos dogrupo, assim como de oportunidades(desafios) e ameaças. As entrevistas ocorre-ram durante o mês de dezembro de 2011,direcionadas pelas questões listadas noQuadro 1.

A rede dos Tribunais de Contas

A proposta do presente trabalho éapresentar um estudo sobre o grupo deplanejamento organizacional, sob a pers-pectiva de organizações em rede de coope-ração entre organizações públicas,apontando os benefícios da rede a partirda percepção dos cooperados. Os compo-nentes da rede são servidores dos Tribunaisde Contas, entidades que atuam no mesmoramo (controle externo), mas que nãomantêm vínculo entre si. Trata-se de umarede formada principalmente por insti-tuições com jurisdição estadual/municipal,que conta também com membros de orga-nizações da esfera federal.

Os Tribunais de Contas no Brasil são osórgãos responsáveis pelo controle externo,tendo entre suas competências constitucionaisa de apreciar as contas prestadas pelos chefesdo Poder Executivo e julgar as contas dosadministradores e demais responsáveis pordinheiro, bens e valores públicos da adminis-tração direta e indireta (BRASIL, 2012).São órgãos da administração direta e quepossuem autonomia administrativa. Entre asprincipais características, tem-se o carátercolegiado das decisões e o poder coercitivode impor sanções.

Existem 33 Tribunais de Contas noBrasil: 26 referentes aos Estados daFederação, um do Distrito Federal e seisTribunais de Municípios (nem todos osEstados optaram por criar um tribunalespecífico para o município-capital). Cadainstituição atua de forma autônoma, não

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Pergunta

Quais os pontos fortes e fracos do grupode planejamento organizacional (GPL)?

Quais foram os avanços alcançados apóscriação do GPL?

Quais foram os maiores méritos do GPL?

Quais foram as maiores dificuldades encon-tradas pelo GPL desde sua concepção? Vocêconsidera que as dificuldades foramsuperadas?Existem ameaças/entraves à continuidadedo grupo? Quais são essas ameaças?Quais os principais desafios para o GPL queestão por vir?

Você considera que o GPL contribuiu paraas ações de modernização dos Tribunais deContas? Em que medida?

Objetivo

Identificar qual a opinião dos integrantesdo grupo acerca dos pontos fortes e fracosdeste, a fim de levantar características dogrupo estudado.Identificar quais foram os resultadosadvindos da atuação do grupo que não ha-viam sido atingidos antes da criação domesmo.Levantar, entre os resultados alcançadospelo GPL, aqueles que foram mais impor-tantes, ou seja, que tiveram maior impacto.Identificar quais foram as barreiras que ogrupo superou e quais as dificuldades queainda persistem para as ações integradas.

Identificar se existem aspectos que podemvir a interromper as atividades do grupo.Levantar a percepção dos integrantes acer-ca de questões complexas e desafiadoraspara o grupo.Identificar qual a opinião dos integrantesacerca dos benefícios para os Tribunais deContas por meio de ações de moderniza-ção, a saber: planejamento estratégico,redesenho de processos etc.

Fonte: Elaborado pelos autores.

Quadro 1: Perguntas para entrevista e objetivos das questões

tendo sido criado ainda um órgão centralque dite regras para todos os Tribunais deContas. Será contextualizado, a seguir, oprograma do governo federal, Promoex,que proporcionou, entre outras ações dedestaque, a criação do grupo de planeja-mento organizacional (GPL).

O programa Promoex

Pesquisa realizada em 2002 pelaFundação Instituto de Administração daUniversidade de São Paulo, com intuitode elaborar um diagnóstico dos Tribunais

de Contas, apontou a existência de um rolde problemas, entre eles: falta de planeja-mento e controle gerencial; falta de maiorintegração e homogeneização de proce-dimentos e decisões; baixo nível dedisseminação das melhores práticas entreos tribunais; prevalecimento do esforçoindividual em detrimento do coletivo,levando ao desenvolvimento paralelo desoluções para problemas comuns, comperda de tempo, recursos e conheci-mento; burocratização das atividades;lentidão das respostas (MAZZON E

NOGUEIRA, 2002).

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

Diante desse cenário, foi criado o pro-grama Promoex, com início no ano de 2006e previsão inicial de término para 2009, masestendido para junho de 2012, objetivando“a modernização do conjunto de Tribunaisde Contas que atuam nos Estados, DistritoFederal e Municípios, principalmente pormeio da capacitação de pessoal, introduçãode novos procedimentos e sistemasorganizacionais e investimentos eminformática” (PORTAL DOS TRIBUNAIS DE

CONTAS DO BRASIL, 2011). Inicialmentecomposto por 32 dos 33 Tribunais deContas do Brasil, o Promoex, em 2011, eracomposto por 28 deles.

Abrucio (2007) discorre sobre osprogramas de modernização comandadospelo Governo Federal, como o ProgramaNacional de Apoio à Modernização daGestão e do Planejamento dos Estados edo Distrito Federal (Pnage) e o Promoex:

Depois de duas décadas de reformasnas quais a redução do aparato e dosgastos estatais constituiu o fio con-dutor do processo, o Pnage e oPromoex priorizaram a reconstruçãoda administração pública em suasvariáveis vinculadas ao planejamento,aos recursos humanos, à sua interco-nexão com as políticas públicas e aoatendimento dos cidadãos. (ABRUCIO,2007, p. 78)

Abrucio (2007) também comenta asqualidades do programa, como a realizaçãode um diagnóstico sobre a situação dosTribunais de Contas, em vez da proposiçãode modelos fechados aos Estados. O autortambém comenta que

o maior avanço do Pnage/Promoexfoi construir tais programas por meiode ampla participação e discussão com

os Estados e Tribunais de Contas. Essemodelo intergovernamental einterinstitucional é mais participativoe funciona mais em rede do que deforma piramidal. (ABRUCIO, 2007, p. 78)

Segundo Loureiro, Teixeira e Moraes(2009), o programa está inserido no con-texto de modernização da administraçãopública e tem gerado grande impacto nosTribunais de Contas, pois, além de atuarna modernização tecnológica, tem alteradoas relações de poder internas entre conselhodeliberativo e corpo técnico. Os técnicostêm participado mais dos processosdecisórios, ao conduzirem o desenvolvi-mento do programa dentro dos tribunais eao manterem contato direto com o Minis-tério do Planejamento e organismos inter-nacionais. “Isso lhes traz visibilidadeexterna e lhes permite desenvolver açõesconjuntas e articuladas em nível nacionale mesmo internacional” (LOUREIRO;TEIXEIRA; MORAES, 2009, p. 754).

Um dos membros do GPL comentou,durante a entrevista, que “o Promoex foium marco para todos os Tribunais deContas”, na medida em que o cenário, quese pode verificar nessas cortes de contasapós o programa, é bem diferente daqueleencontrado antes do início do programa,uma vez que essas se tornaram maismodernas, em termos dos procedimentose modelos de gestão.

Um dos objetivos do Promoex é o for-talecimento e integração dos Tribunais deContas. Até o início do programa, cadatribunal atuava de forma isolada e compouco compartilhamento de experiênciase entendimentos técnicos. Uma dassoluções para aumentar a integração foi acriação de grupos temáticos formados porrepresentantes de cada tribunal de contas,com intuito de compartilhar informações,

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ferramentas de gestão e discutir assuntostécnicos para harmonizar o entendimentodessas instituições, principalmente no quetange à aplicação da Lei de Responsabi-lidade Fiscal.

Existe ainda a Associação dosMembros dos Tribunais de Contas doBrasil (Atricon), que também objetiva oentrosamento e a coordenação das ativi-dades das cortes de contas (PORTAL DOS

TRIBUNAIS DE CONTAS DO BRASIL, 2011).Porém, os encontros dessa associação sãodirecionados aos conselheiros dostribunais, ou seja, são encontros queapresentam cunho político. Já o escopo dosencontros dos grupos temáticos, em quese reúnem servidores/gestores das diversasáreas, é mais técnico, com intuito de estu-dar/aprimorar os procedimentos e práticas.

Os grupos temáticos nacionais focam nasseguintes áreas: grupo de responsabilidadefiscal; grupo de planejamento organizacional;educação corporativa; comunicação institu-cional; tecnologia da informação; gestão depessoas; auditoria operacional; atos depessoal; procedimentos contábeis; padroni-zação de relatórios; contas de governo;processo eletrônico e sistematização de infor-mações contábeis e fiscais.

O objeto de estudo desse trabalho seráo grupo de planejamento organizacional,detalhado a seguir.

Histórico do grupo de planejamentoorganizacional

O grupo de planejamento organi-zacional (GPL) foi criado no final de 2008com a finalidade de apoiar a efetivaimplantação do planejamento estratégicoe o aprimoramento gerencial, bem comocontribuir para a integração e o comparti-lhamento de conhecimentos e experiênciasentre os Tribunais de Contas (com o passardos anos, os objetivos foram expandidos,

como atuar no apoio ao redesenho deprocessos de trabalho e construção deindicadores de desempenho). Inicialmente,esteve sob coordenação de um servidor doTribunal de Contas do Estado de Tocantinspor um período de um ano. A partir doano de 2009, passou a ser coordenado poruma servidora do Tribunal de Contas doEstado de Minas Gerais. O grupo écomposto por 12 membros: dois doTribunal de Contas da União (TCU), um

da Atricon, um do Instituto Rui Barbosa(IRB), e por oito membros dos Tribunaisde Contas Estaduais. Para fortalecer asações do GPL, foi criado um grupo dee-mails chamado “GPLAN”, que éintegrado por cerca de 90 servidores dasáreas de planejamento de todos osTribunais de Contas, que também seencontram periodicamente nos eventos do

“Todos osentrevistadosconcordam que asações do grupocontribuíramefetivamente para asações demodernização dosTribunais deContas. ”

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GPL. Desse modo, os atores da rede sãotécnicos dos Tribunais de Contas ou deinstituições de apoio aos tribunais (Atricome IRB), além dos dois membros do TCU.

Antes mesmo da criação do GPL,representantes das áreas de planejamento jáhaviam-se reunido em dois momentos, noano de 2008, no Encontro de Planejamentono Tribunal de Contas do Estado deTocantins e na I Oficina de Capacitação doTCU, cujo tema foi plano estratégico emapeamento de processos. Após sua con-cepção, o grupo se reuniu em diversos mo-mentos, conforme descrição no Quadro 2.

Durante esses encontros, oficinas ereuniões técnicas, o grupo tem a oportuni-dade de discutir problemas comuns,compartilhar experiências e soluções deproblemas e pensar em ações e projetos parabenefício de todos. A possibilidade dos inte-grantes se conhecerem e interagirempessoalmente reforça o vínculo entre osmesmos. Cabe ressaltar que, considerandoque a extensão geográfica é um fatordificultador para que os encontros possamocorrer com maior frequência, tendo emvista, também, os recursos financeiros quesão necessários para o deslocamento dosparticipantes, o grande quórum desseseventos pode refletir a adesão e compro-

metimento dos Tribunais de Contas como grupo. Na maioria dos eventos estiverampresentes representantes da quase totali-dade dos Tribunais de Contas. Ainda comrelação a esse tema, Baker, Kan e Teo(2011) também mencionaram a questãogeográfica como uma barreira à colabo-ração entre os membros de uma redeaustraliana estudada, devido à impossibi-lidade de acontecerem contatos face a facecom frequência.

Além dessa interação durante osencontros presenciais, o grupo mantémcontato por e-mails, por telefonemas evisitas técnicas. Frequentemente, o grupotroca documentos (minutas de regulamen-tações e formulários), contatos de empresasde consultoria e treinamento, escopo deprojetos, entre outros. É utilizado, paraconsulta de documentos, o Portal dosTribunais de Contas do Brasil (ControlePúblico), que dispõe de um ambiente decolaboração em que podem ser encon-tradas, em ambiente restrito aos membros,atas de reuniões, apresentações dos encon-tros, guias e manuais de consulta.

No início do ano de 2009, apenas 14tribunais participantes do Promoex haviamelaborado plano estratégico. Uma das metasdo Promoex era que 100% dos participantes

Quadro 2: Eventos do grupo de planejamento organizacional

Fonte: Relatório de atividades do grupo de planejamento/Promoex.

Data

2009

Abril/2010

Agosto/2010Maio/2011Junho/2011Setembro/2011

Evento

Seminário de Soluções Compartilhadas e I Reunião Técnica, emCuritiba/PRI Encontro de Planejamento Estratégico, em Natal/RN, contandocom a participação dos conselheiros e técnicosII Oficina de Capacitação, no TCUII Reunião Técnica, no Distrito FederalReunião Técnica, no Distrito FederalII Encontro de Planejamento Estratégico, em Porto Alegre/RS

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tivessem o planejamento estratégico criadoe implementado até o final do programa.Essa meta foi alcançada no ano de 2012,em que dois tribunais restantes estavamimplantando o primeiro ciclo deplanejamento estratégico. Cabe ressaltar que,nesse processo de formulação do plano es-tratégico, vários tribunais trocaram informa-ção entre si, uma vez que alguns deles estãoà frente do processo e outros estavam co-meçando. Em pesquisa realizada nos Tri-bunais de Contas, Silva e Gonçalves (2011)pontuaram que oito dos 10 tribunaisrespondentes utilizaram como referênciapara elaboração do seu plano estratégico oplano de outros tribunais, sendo o TCU ci-tado por três dos respondentes.

O grupo de planejamento organiza-cional formou cinco grupos menores paradiscutir temas específicos como: (i) indi-cadores, (ii) redesenho de processos, (iii)monitoramento do plano estratégico pormeio de software, (iv) documentação e(v) eventos. Cada subgrupo interage pormeio de troca de e-mails e conversas portelefone, e apresentam os resultadosdiscutidos/pesquisas realizadas para todoo grupo em encontros presenciais.

Pontos fortes, avanços alcançadose méritos do GPL segundo os entrevis-tados

Em quase três anos de existência,vários avanços desse grupo podem serdestacados, como o compartilhamento deum mesmo software (adquirido e disponibi-lizado pelo IRB) para monitoramento daexecução do planejamento estratégico por25 tribunais, durante o ano de 20111. Essaação está em linha com o alcance de outrameta do Promoex, qual seja: 30% dosTribunais de Contas utilizando soluçõestécnicas compartilhadas. Cabe destacar,também, que o sistema informatizado foi

licitado com base em especificaçõestécnicas definidas de modo a atender àsnecessidades dos tribunais. Criou-se umgrupo eletrônico de discussão para compar-tilhar experiências e dúvidas comuns nessafase de implementação do software. Frequen-temente, um tribunal entra em contato comoutro, por telefone ou até mesmo em visitatécnica, para tirar dúvidas quanto àutilização do sistema.

A gestão em rede permite contrataçõesem maior volume, gerando economia deescala. Se cada tribunal fosse adquirir, deforma independente, um software de planeja-mento estratégico, o montante totaldesembolsado seria muito superior à cifrapaga pelo IRB para aquisição da soluçãocompartilhada. Cada tribunal adquirentepaga apenas um valor mensal referente asuporte e manutenção. Isso tambémdemonstra a força da atuação em conjunto,gerando economicidade para a máquinapública, além do compartilhamento deinformações, também referente à metodo-logia, durante a implantação dos softwares.

Outra ação que possibilitou economiade recursos foi o repasse da metodologiade elaboração e desdobramento do plane-jamento estratégico do TCU diretamentea vários tribunais por meio de oficinas detrabalho. Nesses encontros, os tribunaistiveram de arcar apenas com custos dediárias e passagens dos servidores do TCU.Se tivessem que contratar consultoria paratanto, além de incorrer em custos elevados,talvez não tivessem a experiência práticadaqueles que lidam com as especificidadesde um órgão público de controle externo.

Outro tema discutido pelo grupo é oredesenho de processos, que também é umadas metas do Promoex: 50% dos processosde trabalho finalísticos do tribunalredesenhados e manualizados até o finaldo programa. Praticamente todos os

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tribunais participantes do Promoex jáiniciaram procedimentos ou realizaramredesenho de algum processo, buscando,assim, reduzir desperdícios de recursos(tempo, dinheiro, mão de obra).

Um dos entrevistados ressaltou que osavanços alcançados pelo grupo tambémpodem ser creditados a uma coordenaçãoefetiva das atividades: “temos a sorte de teruma coordenadora atuante” (Entrevistado1). Esse entrevistado também destacououtro ponto forte: o grupo, atualmente,encontra-se muito unido e os participantessempre buscam ajudar uns aos outros.

Os grupos temáticos também perce-beram a necessidade da atuação conjuntaentre eles, por exemplo, o GPL atuando emconjunto com os demais grupos quando osassuntos se relacionarem. Por isso, a reuniãodo grupo de educação corporativa, realizadaem 2011, contou com a participação dacoordenadora do GPL para, juntos, planejarações para o ano de 2012, com intuito dealinhar os objetivos dos grupos.

Entrevistas realizadas com membros doGPL demonstraram que um dos grandesméritos do grupo foi a aproximação dostribunais, gerando a possibilidade deconhecer outras experiências e de enxergarnovas formas de aplicação prática em cadatribunal que participa do grupo por meiode um/vários representantes. Um dosentrevistados chegou a destacar que esse foio maior mérito, maior ainda que os recursosfinanceiros advindos do programa.

Antes da criação do grupo, essa comu-nicação entre servidores das áreas deplanejamento dos tribunais não era comum.Conforme explicou um dos entrevistados,metodologias podem ser implementadas pormeio de contratação de consultorias; porém,o compartilhamento de informações entremembros do GPL permitiu que os tribunaisverificassem a aplicabilidade dessas

metodologias, considerando as peculia-ridades desses órgãos que atuam no mesmosegmento. Os membros do GPL puderamverificar como as práticas estavam sendodesenvolvidas em contextos distintos, eadaptar a aplicação para cada tribunal, consi-derando situações semelhantes. A dissemi-nação do conhecimento entre os servidoresdos tribunais foi enorme, segundo os entre-vistados.

Outra grande conquista foi a criaçãoda base documental que, mesmo estandoainda incipiente, possibilita aos membrosdos grupos temáticos (não só do GPL) oacesso a uma gama de informações, comomodelos, práticas e metodologia de geren-ciamento aplicado aos tribunais. Trata-sede um rico acervo de conhecimentodisponível para os tribunais.

Todos os entrevistados concordam queas ações do grupo contribuíram efetiva-mente para as ações de modernização dosTribunais de Contas. Além do planeja-mento estratégico implantado em todos ostribunais que não haviam adotado a práticade gestão até então, e dos avanços acercada definição e mensuração de indicadoresde desempenho, o grupo discutiu tambémo redesenho de processos.

Dificuldades encontradas, pontosfracos e desafios para o grupo segundoos entrevistados

Esses méritos do grupo foram con-quistados mesmo em meio a várias dificul-dades encontradas. Informações obtidasnas entrevistas indicam que alguns dosentraves para uma melhor interação dogrupo foram devidos a barreiras na comu-nicação, características de estrutura hierár-quica rígida das instituições públicas. Essasdificuldades se destacaram bastante noinício das atividades do grupo: as solici-tações e/ou pesquisas sobre procedimentos

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e dados dos tribunais não eram facilmenteconseguidas; geralmente, tinha de ser elabo-rado um pedido formal para encami-nhamento às chefias superiores, mesmopara as solicitações mais simples. Essasbarreiras foram sendo quebradas ao longodo tempo, pois os membros do grupoforam conquistando confiança uns com osoutros. Atualmente, a comunicação entreos membros é mais fluida, proporcionandotroca de informação rica e ágil. Os entre-vistados acreditam que, de forma geral, osmembros do grupo já têm a consciênciado benefício da cooperação para todos ostribunais.

Quanto à dificuldade de comunicação,foram levantadas possíveis causas. Umadelas pode ser o receio da exposição defraquezas e debilidades da instituição, que,porventura, pudessem gerar repercussõesnegativas. Alguns atores podem preferirnão se comprometer a prestar informaçãosobre seu tribunal, já que não há obrigato-riedade, deixando, assim, de ter responsabi-lidade sobre a informação prestada epossíveis questionamentos.

Outra questão que dificultou a comuni-cação durante os primeiros passos do grupofoi o desconhecimento, por grande parte dosintegrantes, sobre o tema do planejamentoestratégico. A cultura de planejamento nãoera, e talvez ainda não seja, uma realidadeem todos os tribunais. Após várias reuniõese oficinas de trabalho para discussão do tema,este passou a ser de conhecimento geral dostribunais, ou seja, tem-se atualmente umnivelamento conceitual. Segundo a percep-ção dos entrevistados, o grupo está maishomogêneo e consegue evoluir paradiscussões mais aprofundadas sobre temascomo indicadores de desempenho, desdobra-mentos do planejamento, entre outros.

Conseguir manter a participação ativados integrantes do GPLAN é outra dificul-

dade apontada. Alguns membros são maisatuantes; entram em contato frequente-mente com os demais e participam daspesquisas. Entretanto, outros não se envol-vem tanto. Algumas pessoas que já tiveramparticipação consistente podem também sedesligar do grupo devido à perda de cargoem comissão ou transferência para outraárea do tribunal.

Outra questão pontuada por um dosentrevistados é que, em alguns períodos, aparticipação nas atividades do grupo podeser reduzida em virtude de um momentoespecífico pelo qual passa a unidade deplanejamento de determinado tribunal: aredução brusca do número de servidoreslotados na referida unidade é um fatorcomplicador para a conciliação das ativi-dades do órgão com as atividades do grupo,já que essa requer um envolvimento pormeio de participação em pesquisas, organi-zação de eventos, discussão de temas, entreoutros. Também foi destacada a dificuldadede conciliar as demandas do projetoPromoex (elaboração dos relatórios, acom-panhamento de execução, atendimento aauditorias, entre outros) – que é um traba-lho complexo e que demanda bastantetempo – com as atividades de monitora-mento. Geralmente, as atribuições da Coor-denação Técnica do Promoex são dirigidasaos servidores que compõem a unidade deplanejamento estratégico.

Um dos entrevistados, em contrapar-tida, ponderou como dificuldade o fato dea unidade de planejamento não ser aresponsável pela Coordenação Técnica doPromoex, ocasionando falta de uniformi-dade da informação acerca dos eventos/acontecimentos do Promoex.

Um dos entrevistados também destacaa questão da competitividade entre ostribunais como uma grande dificuldade a sersuperada pelo grupo. Um tribunal que adota

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

práticas de gestão desenvolvidas e inovadoraspode querer divulgar e disseminar seus proce-dimentos; entretanto, aqueles tribunais quenão estão tão desenvolvidos podem não terinteresse em disponibilizar informações. Essacompetitividade também gera bloqueio dasinformações, sendo um entrave à comuni-cação do grupo.

Outro ponto fraco, citado por algunsdos entrevistados, reside no fato de que ostribunais apresentam grandes diferençasentre si em relação à estrutura organiza-cional, ao porte (número de jurisdicio-nados), às normas processuais, entre outros.Esses fatores são dificultadores para a uni-formização de práticas e para a discussãoe adoção, por exemplo, de indicadorescomuns e benchmarks.

As entrevistas também revelaram que umgrande desafio para o GPL será a continui-dade da integração do grupo, após o encer-ramento do programa Promoex, que estavaprevisto para junho de 2012. Na época dasentrevistas, já estavam sendo estudadasmedidas para minimizar os efeitos do encer-ramento do programa e, também, contribuircom a continuidade dos grupos temáticos.Um dos entrevistados ponderou que énecessário fazer um trabalho de conscien-tização da importância da integração entreos representantes dos tribunais junto à altaadministração para dar respaldo e continui-dade às ações do grupo, principalmente apóso fim do programa, momento em que osrecursos do projeto, destinados aos encontrostécnicos deixariam de existir.

Resultados apurados no Relatóriode Progresso do Promoex

Como forma de verificar se os relatosdas entrevistas poderiam ser confirmadospelos relatórios oficiais do programa, foiconsultado o Relatório de Progresso

Promoex do 1º Semestre de 2012. Talrelatório apresenta os avanços do Promoex,considerando as execuções acumuladas atédezembro de 2011 e até junho de 2012.No relatório citado, no Quadro V – Exe-cução física por subcomponentes nacionaise locais –, estão apresentadas as mediçõesdas metas até as datas mencionadas. Apre-sentamos no Quadro 3 as metas referentesao componente nacional, pois estão maisdiretamente relacionadas com o objetodeste estudo.

Verifica-se, então, que 75% das metasdo componente nacional foram atingidas.Em relação à mensuração da meta dosubcomponente 1.3, consta uma explicaçãono Relatório de Progresso:

A mensuração física para verificaçãodo alcance da meta prevista para estesubcomponente iniciou-se somenteapós a realização dos Seminários deAções Compartilhadas, que ocorreramem agosto e novembro de 2009. OPortal Nacional dos TC disponibilizauma sugestão de termo de cooperação,visando facilitar, se necessário, asformalizações das ações comparti-lhadas. Como resultado das açõescompartilhadas, verificou-se umaredução no número de contrataçõesde terceiros, especialmente deconsultorias, cujo impacto econômicoainda será medido pelo Promoex(BRASIL, 2013, grifo nosso).

Desse modo, está explicitado no rela-tório que houve uma redução do númerode contratações de consultorias pelostribunais desde o advento do programa,passando, esses, a compartilhar infor-mações entre si, em consonância com oexposto pelos entrevistados em relação aosbenefícios proporcionados pelo Promoex.

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As soluções compartilhadas refletem umaredução de dispêndios que ainda não foimensurada pelo programa, mas que já énítida. De acordo com o Relatório deProgresso: “Considera-se como soluçãocompartilhada, quando há produto com-provado documentalmente, por meio dequalquer instrumento. Computa-se ocompartilhamento de solução para todosos partícipes da ação”.

Outros pontos destacados no Relatóriode Progresso (BRASIL, 2013):

a) Todos os 33 tribunais já se encon-tram cooperando em rede, inclusive os quenão participam atualmente do programa,apontando para um grande engajamentono fortalecimento do sistema de controleexterno brasileiro.

b) Vinte tribunais estão compartilhan-do soluções de TI e outras, a exemplo de

elaboração e implementação de planeja-mento estratégico, de sistemas de capturaeletrônica de contas, e de processos deanálises de contas de governo e de atos depessoal.

Reflexões a serem consideradas empesquisas futuras

Diante do cenário exposto, levantam-se algumas questões a serem analisadas commais profundidade: quais as formas de semanter o vínculo e a atuação efetiva dosintegrantes do grupo? Quais as estratégiaspara não perder pessoas com papéis-chavepara a condução dos objetivos do grupo?Qual a disposição das instituições paraatuação em rede? Como motivar os líderesdos grupos para que permaneçam exer-cendo a função?

Quadro 3: Metas estratégicas Promoex

Fonte: Relatório de Progresso 1º Semestre de 2012 – Quadro V: Execução física por subcomponentesnacionais e locais.

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

Cabe destacar que a função de coorde-nação dos grupos temáticos do Promoexé um trabalho extra, realizado por servi-dores de alguns tribunais, e não háremuneração adicional para tanto. Entre-tanto, para que as ações sejam efetivas,muito esforço é desprendido por esses co-ordenadores, que trabalham em prol deum objetivo maior, qual seja, a interaçãoe compartilhamento de informações en-tre os tribunais para desenvolvimentodesses. Uma opção a ser considerada, tal-vez, seja criar instrumentos de motivaçãopara participação nos grupos, como for-ma também de se reconhecer o mérito dosresultados alcançados por meio dos es-forços das ações realizadas, já que se tra-ta de um trabalho que consome bastantetempo e dedicação. O estabelecimento deincentivos (pecuniários ou não) poderia,por exemplo, mitigar os riscos de não con-tinuidade das ações do grupo com a per-da de uma liderança ativa. Algunscoordenadores de grupo tiveram deabdicar da função em virtude do acúmulode trabalho e da incompatibilidade de con-duzir as atividades do seu próprio cargocom as da função de coordenação.

Para responder a essas questões, neces-sário se faz elaborar um instrumento depesquisa muito bem estruturado, que possalevantar as percepções dos representantesdos tribunais que acompanham as ativi-dades do grupo.

Considerações finais

O presente trabalho se propôs adescrever a experiência de atuação inte-grada de colaboradores das áreas deplanejamento dos Tribunais de Contas, pormeio do grupo de planejamentoorganizacional/Promoex, respondendo àseguinte questão: que benefícios a adoção

de uma rede de cooperação entre os TCtrouxe para os membros dessa rede?

Foram realizadas entrevistas commembros do grupo para levantar aspercepções acerca dos avanços alcan-çados, dificuldades encontradas e ameaçasà continuidade dos trabalhos do grupotemático.

Um dos benefícios para os membrosda rede é a interação que os representantesdos tribunais passaram a ter após osencontros do grupo, ponto de méritodestacado por todos os membros do GPLentrevistados – trata-se de um resultado dedifícil mensuração, em termos de avaliaçãodos resultados do programa Promoex, masde vital importância para os servidores quefazem parte dessas organizações. Além detroca de informações, compartilhamento deexperiências e desenvolvimento em conjun-to, a mobilização do grupo proporcionoutambém economicidade ao erário, como, porexemplo, ao adquirir uma soluçãoinformatizada compartilhada, assim comoao receber consultoria de outros tribunais,em vez de efetuar contratação com empresaprivada. Tais aspectos vão ao encontro dopreconizado pela Teoria das Redes.

Os resultados das entrevistas apontamque a troca de informações entre o grupoproporcionou enriquecimento para asunidades de planejamento e, consequente-mente para os tribunais, uma vez que oplanejamento estratégico é um tema quetem implicações em toda organização. Avontade de colaborar uns com os outros éuma característica marcante dos membrosdo grupo estudado.

Verificou-se que os avanços alcançadospor essas áreas, promovendo uma atuaçãoconjunta e considerando valores comoeficiência e efetividade, dificilmente seriamrealizados caso tais instituições continuas-sem a atuar de forma isolada.

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Flávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff

Grande parte dos membros do grupoavançou para um estágio de desenvolvi-mento em que esses conseguem enxergarseus tribunais como “iguais”, no sentidode que seriam organizações com problemassemelhantes e que buscavam o desen-volvimento das práticas de gestão, paraalcançarem melhores resultados. Diantedos depoimentos dos entrevistados acercados resultados alcançados pelo grupo,pode-se entender que as ações do GPLforam positivas, proporcionando um avan-ço para a gestão dos Tribunais de Contas,além de terem atuado diretamente nosproblemas diagnosticados pela pesquisada FIA/USP, quais sejam: falta de plane-jamento, falta de integração e homoge-neização de procedimentos, baixo nível dedisseminação das melhores práticas entreos tribunais e prevalecimento do esforçoindividual em detrimento do coletivo.

Se, por um lado, essa interação entrerepresentantes dos tribunais resultana exposição das fraquezas da instituição,ao passo que nas discussões do gruposão feitos relatos da situação em que se

encontra cada órgão; por outro lado, é umaoportunidade de compartilhar problemascomuns para se pensar em conjuntosoluções adequadas. Essa é a ênfase quedeve ser dada para a cultura da cooperaçãoentre instituições públicas. Não faz sentidocada órgão atuar como uma ilha isolada,enfrentando problemas comuns a outrasinstituições, se pode haver troca de expe-riências entre elas para benefício mútuo.

Todos os resultados alcançados pelaatuação do grupo refletem uma atuação daadministração pública rumo à excelênciana prestação de serviços com qualidade,eficiência e eficácia.

Uma limitação deste trabalho é que aspercepções sobre a cooperação entre ostribunais restringiram-se apenas à atuaçãodo grupo de planejamento organizacional.Como existem vários outros grupostemáticos no âmbito do Promoex, ficacomo sugestão de pesquisa futura a aná-lise dos resultados alcançados por essesoutros grupos.

(Artigo recebido em maio de 2013. Versãofinal em junho de 2013.)

Nota

1 Alguns tribunais não aderiram ao convênio que foi assinado com o Instituto Rui Barbosa,muitos deles pelo fato de já possuírem um sistema informatizado.

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

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Flávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dos Tribunais de Contas do Brasil com ogrupo de planejamento organizacional

Resumo – Resumen – Abstract

Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiência dosTribunais de Contas do Brasil com o grupo de planejamento organizacionalFlávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck CkagnazaroffEste artigo buscou analisar as possibilidades de atuação integrada do grupo de planejamento

organizacional, sob a perspectiva de organizações em rede. Trata-se de um grupo formado porintegrantes das áreas de planejamento dos Tribunais de Contas do Brasil, com objetivo de discussãoda temática do planejamento estratégico. A metodologia foi baseada em consulta a documentos eentrevistas aos membros do grupo, realizadas em dezembro de 2011. Foi descrita a forma como sedeu a criação do grupo, os avanços alcançados e as dificuldades encontradas. Concluiu-se que aatuação conjunta apresentou muitos benefícios, pois os resultados alcançados vão desde aprimora-mento dos procedimentos de gestão, até a economia gerada ao erário.

Palavras-chave: redes organizacionais; cooperação; Tribunais de Contas; setor público;Promoex

Redes organizacionales en el contexto de la gobernanza pública: la experiencia delos Tribunales de Cuentas de Brasil con el grupo de planificación organizacionalFlávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins y Ivan Beck CkagnazaroffEl presente artículo se configura como una investigación de las posibilidades de actuación

integrada del grupo de planificación organizacional, desde la perspectiva de las organizacionesde la red. Desde un grupo formado por miembros de las áreas de planificación de losTribunalesde Cuentas de Brasil, con el objetivo de discutir la temática de la planificación estratégica. Lametodología se basó en los documentos de consulta, junto con entrevistas con los miembros delgrupo. Se describe la manera cómo fue la creación del grupo, los progresos realizados y lasdificultades encontradas. Al final, se concluyó que la acción conjunta tuvo muchos beneficios,por los logros que van desde la mejora de la gestión pública hasta la reducción del gasto generadoal erario.

Palabras clave: redes organizacionales; cooperación; Tribunales de Cuentas; sector público;Promoex

Network organizations in the public sector: the case of the Brazilian Audit Courtsand the Organizational Planning GroupFlávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins and Ivan Beck CkagnazaroffThis paper aims to analyze the possibilities of integrated acting within the Organizational

Planning Group under the perspective of network organizations. It is a group composed bymembers from the Planning Units of the Brazilian Audit Courts to discuss strategic planningissues. The methodological approach was based in documental research and interviews withmembers of this group. It was described the way the Group was created, the advances reachedand the difficulties met. It was concluded that the interaction of the members brought manyadvantages because the results go from improvement in management procedures to economygenerated to the exchequer.

Keywords: network organizations; cooperation; Audit Courts; public sector; Promoex

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271Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 249-271 abr/jun 2013

Flávia de Araújo e Silva; Túlio César Pereira Machado Martins e Ivan Beck Ckagnazaroff

Flávia de Araújo e SilvaÉ mestranda em Ciências Contábeis pela Universidade Federal de Minas Gerais e coordenadora no Tribunal de Contas doEstado de Minas Gerais. Contato: [email protected]

Túlio César Pereira Machado MartinsÉ especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais e em Controle Externo eAvaliação da Gestão Pública pela Escola de Contas e Capacitação Professor Pedro Aleixo. Tem atuado como assessor doTribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Contato: [email protected]

Ivan Beck CkagnazaroffÉ doutor em Doctoral Programme Aston Business School pela Aston University e professor associado IV da Universida-de Federal de Minas Gerais. Contato: [email protected]

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Paul F. Cressy

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RSP RevisitadaO sistema de exame para o

serviço público e sua influênciana civilização chinesa*

Paul F. CressyTexto publicado na RSP, vol. 1, no 3, março de 1942

Os exames padrão estão na base do sistema de seleção para a entrada no serviçopúblico brasileiro. Na China, esse modelo de seleção foi utilizado durante vários séculos,com alguns pequenos períodos de descontinuidade. Para muitos, a estabilidade doEstado chinês pode ser creditada, em parte, a esse sistema de “concurso público”. Umdos aspectos mais interessantes do exame era sua ênfase no conhecimento literário,literatura essa que tinha um conteúdo explicitamente didático e moral. Em alguns períodos,o conhecimento de poesia era um componente essencial da seleção. Esse modelo deseleção teria inspirado o Império Inglês a introduzir um processo de seleção baseado noconhecimento teórico. Nos dois casos, a experiência prática era adquirida durante o exer-cício profissional, como ocorre em muitas profissões até hoje e como sucede em todosistema de seleção que adquire uma relativa estabilidade (caso da Diplomacia no Brasil,por exemplo).

O sistema do exame literário, como técnica política, não foi dos menos impor-tantes. Por 20 séculos ocupou uma posição de destaque na sociedade chinesa. Constituíaa única porta pela qual se adquiria prestígio e distinção social, controlando todo o pro-grama educativo da nação; dominava toda a vida política e tinha grande importânciaeconômica. O sistema era uma das mais fortes características da civilização chinesa econstituía uma instituição jamais igualada por qualquer outra nação.

O sistema de exame para o serviço público desenvolveu-se, gradativamente, atravésde vários séculos, originando-se de alguns dos mais importantes costumes da sociedadechinesa. A “História Clássica” (compilada entre 1500 A.C. e 700 A.C. ) descreve ométodo empregado pelo Imperador Shum (2250 A.C.), pelo qual os seus funcio-nários eram submetidos a exame de três em três anos, sendo, após, demitidos oupromovidos de acordo com os resultados obtidos. No começo da dinastia Chou(1100 A.C.), o Governo examinou não somente os funcionários já em exercício, mas

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O sistema de exame para o serviço público e sua influência na civilização chinesa*

Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 273-275 abr/jun 2013274

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também os candidatos à nomeação. Soba poderosa dinastia Han (de 221 A.C. a220 D.C.), a qual centralizou o Governoe sancionou oficialmente as doutrinas deConfúcio, a primitiva forma de examesfoi organizada num sistema definitivo em29 A.C. Os exames foram reorganizadosem princípios do século VII pelo Impe-rador T’ang T’ai Tsung, e continuadosdesde então, com ligeiras alterações, até asua abolição, em 1905, pela falecidaImperatriz Dowager. Assim o sistema deexames desenvolveu-se gradativamentedos primitivos costumes da sociedadechinesa e adquiriu uma estrutura defini-tiva, servido por um grupo distinto defuncionários, os oficiais e letrados, que lhederam realce e o perpetuaram.

A educação na China clássica teve umcarater privado, mas prosseguiu tendo umúnico fim em vista, que foi o da aprovaçãonos exames governamentais. Ao êxito nosexames oficiais estava sujeito o critério dainstrução, assim como a aprovação obtidae o título de letrado. Como os exames sebaseassem nos clássicos de Confúcio, otrabalho das escolas limitava-se inteira-mente àqueles assuntos, não havendo omenor incentivo de investigação emquaisquer outros campos do conhecimento.Por 200 anos o serviço civil de examesdirigiu e moldou toda a forma educacionalna China.

O sistema de exames, além do mais,constituiu o único meio pelo qual seingressava na vida política. O fundamentoda instituição era selecionar os membrosdo Governo. Desde os tempos maisantigos, aos grupos acadêmicos eram con-cedidos lugares de direção na vida chinesa,sendo os literatos considerados unanime-mente como os mais próprios e intituladospara se tornarem membros do Governo.Todos os grandes eruditos e filósofos da

China foram membros do Governo,sendo que a maioria deles passou largotempo da sua vida em postos políticos.Somente aqueles que nos seus examestivessem obtido as notas mais altas setornavam aptos para a nomeação oficial.

Os meios mais seguros de adquirirfortuna obtinham-se por nomeação paracargos oficiais. Os clans de famíliasfrequentemente despendiam grandessomas na educação dos seus mais bri-lhantes estudantes, com a esperança de queeles pudessem eventualmente atingir umposto oficial e, uma vez aí, reembolsá-los, muitas vezes, daquilo que tinhamdespendido. Os negociantes e mercadoresnunca obtinham grande prestígio socialna sociedade chinesa e, embora algunsdeles, de tempos em tempos, ganhassemgrandes fortunas, eram os grupos oficiaisque alcançavam não somente as maioreshonras, mas também constituíam a classemais rica da China. O sistema de examesconstituiu assim o meio de assegurar osucesso econômico.

Finalmente, o início da posição derealce que o sistema de exames para oserviço público ocupava na vida chinesapode ser depreendido do prestígio socialque advinha para aquele que obtivesseêxito nas provas. As profissões liberais,tais como medicina, direito e religião, nun-ca existiram na China do modo por quesão conhecidas no Ocidente. Não haviasenão uma profissão de prestígio nosmeios sociais, a do erudito. A China nuncadesenvolveu uma classe nobre por here-ditariedade. Cada geração tinha que secontentar com seus próprios méritos efazer jus aos seus direitos a lugares eprivilégios. Por 20 séculos a maiorambição de cada chinês era tornar-se umerudito, obter aprovação em um ou maisexames e, assim, obter o direito de usar o

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Paul F. Cressy

Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 273-275 abr/jun 2013 275

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traje de mandarim, com um botãosimbólico no seu barrete, e colocar umpar de “insígnias do dragão” na fachadade sua casa. A aprovação nas várias etapasdo sistema de exames dava direito àadmissão aos ambicionados postos comos sucessivos graus de honra e prestígio;esse processo constituía o único caminhoseguro pelo qual o homem afirmava suapersonalidade, tornando-se respeitado ehonorificado por toda a sociedade, anga-riando para o nome de sua família umlustre imaculado. Jamais, nos tempos daantiga Grécia, houve vencedores olím-picos mais glorificados do que o triun-fador nos exames finais de Pequim.Grandes procissões iam ao encontro dovencedor que voltava. Todas as honrasque a sociedade pudesse proporcionareram suas, assim como os grandesbanquetes oficiais e festins...

As aspirações de toda a naçãoestavam ligadas àquela instituição. Odireito de competir nos exames consti-tuía o maior privilégio de cidadania e oImperador não poderia conceder maiorgraça do que admitir que nas provínciasse realizasse um exame a mais.

A China assim organizada poudemanter a sua unidade política e culturaldurante um longo período, o que cons-titui um acontecimento verdadeiramentedigno de admiração. As sementes dadesunião, contudo, sempre se fizeramsentir. O isolamento provocado pelagrande extensão territorial gerou nume-rosos dialetos em diferentes partes daChina, os quais eram quase incompreen-síveis para os outros chineses. O Governocentral foi enfraquecido pela autoridadesempre crescente dos governosprovinciais que a tanto eram levados peladiversidade de costumes. Houve igual-mente várias e frequentes revoltas

provinciais, assim como invasões estran-geiras. Apesar de tudo isso, havia, con-tudo, uma unidade espiritual que mantinhaíntegra a nação. Embora a linguagemfalada variasse, a linguagem escritapermanecia a mesma em todas as partesdo Império. Os eruditos, naturais dasregiões mais longínquas do país, contri-buíam para essa união ao se preparar paraos exames oficiais. Estudavam nosmesmos livros, recordavam os mesmosensinamentos de Confúcio, empregavama mesma linguagem escrita, tornando-se,assim, leais aos mesmos ideais de culturae de tradição. Os exames eram unifor-mes através de todo o Império e consti-tuíam uma ambição comum, atraindopara si a atenção dos dirigentes da socie-dade chinesa. Vemos, portanto, que osistema de exames contribuiu grande-mente para conservar a unidade da culturachinesa.

Os exames contribuíram, outrossim,para manter a estabilidade política danação. O seu caráter democrático habili-tava o Governo a recrutar os seus fun-cionários entre os súditos de maior capaci-dade intelectual do Império. Os lugaresde mando não podiam ser herdados porfilhos degenerados de famílias nobres,assim como não podia o Imperadordesignar ignorantes para cargos oficiaisdesde que fossem seus favoritos. Aos maisambiciosos, talentosos e irrequietosespíritos da nação, os exames ofereciama oportunidade de uma carreira honrosa.Logo que os candidatos aprovados assu-miam as suas funções públicas, os seusinteresses e energia eram adaptados àordem existente. Se, por acaso, abrigassemidéias ou fins revolucionários, esses desapa-reciam e os funcionários eruditos tornavam-se defensores da ordem reinante. Tendoalcançado suas honrarias por meio dos

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O sistema de exame para o serviço público e sua influência na civilização chinesa*

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exames, tinham todo o interesse em que oGoverno que lhas proporcionara fossemantido, a fim de que, indiretamente,ficassem protegidos. Os letrados, os gover-

nantes da nação, estavam sempre ao ladoda lei e da ordem, opondo-se a quaisquerrevoluções ou mudanças e prestigiando otrono imperial.

Nota

* “The Influence of the Literary Examination System upon the Development of Chinese Civilization”,American Journal Sociology, XXXV: 252-259 (Sept., 1929). In Social Control, por L. L. Bernard – (págs.432/434).

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RSPPara saber mais

277Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 277-278 abr/jun 2013

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Os suportes de uma comunidade virtual de aprendizagem: uma experiênciado Governo do Estado de São Paulo, Brasil

CHRISTOPOULOS, Tania P.; DINIZ, Eduardo H. Sustentação das comunidades virtuais deaprendizagem e de prática. Revista Organizações em Contexto-online, São Bernardo do Cam-po/SP, v. 4, n. 8, p. 74-99, 2009.

VOELCKER, Marta D. Autoria, cooperação e aprendizagem em comunidade virtual construída eprotagonizada por educadores e aprendizes de telecentros: uma possibilidade a partir da pedagogia

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RSP Para saber mais

Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 277-278 abr/jun 2013278

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Redes organizacionais no contexto da governança pública: a experiênciados Tribunais de Contas do Brasil com o grupo de planejamento organizacional

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Comentários, observações e sugestões sobre a RSP devem ser encaminhados à Editoriada Revista, pelo e-mail [email protected] ou por carta, para o endereçoSAIS Área 2-A – Sala 116 – CEP: 70610-900 – Brasília, DF, a/c editor(a) da RSP.

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Revista do Serviço Público Brasília 64 (2): 279-280 abr/jun 2013 279

RSPAcontece na ENAP

Acontece na ENAP

Portal do Software Público é premiado no 16º Inovaçãoe divulgado em Portugal

O Portal do Software Público Brasileiro foi uma das ini-ciativas premiadas no 16o Concurso Inovação na Gestão PúblicaFederal, promovido pela ENAP. Trata-se de um ambientecomum para compartilhar e reaproveitar soluções, raciona-lizar a gestão dos recursos de informática, diminuir custos e atividades redundantes,entre outros objetivos. O analista de tecnologia da informação Seyr Lemos de Souza,que atua na Coordenação de Inovações Tecnológicas do Ministério do Planejamento,Orçamento e Gestão (MP), foi convidado – como representante do Portal – a realizarvisitas técnicas em Portugal, de 27 a 31 de janeiro de 2013. Durante a missão interna-cional, houve reuniões e articulações com instituições ligadas à Ciência e à Tecnologia.

“Com o apoio do Ministério do Planejamento e muitas parcerias, o Portal do SoftwarePúblico está alcançando visibilidade internacional. Em Portugal, nossa primeira reuniãofoi realizada na Agência para a Modernização Administrativa (AMA). Um participantejá conhecia o Portal e solicitou informações mais detalhadas sobre o nosso trabalho. AAMA tem a incumbência de racionalizar o gasto público com tecnologia da infor-mação. A ideia é reduzir as despesas com aquisição de produtos e serviços. O país querutilizar a experiência do Brasil e apresentar seu próprio caso de sucesso, especialmenteno âmbito da União Europeia”, ressaltou Seyr Souza.

ENAP participa do VI Congresso Consad

Duas mil pessoas, representando 24 Estados brasileiros,participaram do VI Congresso Consad de Gestão Pública,realizado em Brasília/DF, de 16 a 18 de abril. Nesse período,houve painéis, palestras e atividades com o objetivo de forta-lecer a cooperação entre o Governo Federal e as administraçõesestaduais, por meio da troca de experiências.

Ao todo, foram apresentados 243 trabalhos em 64 painéis, sobre assuntos relacio-nados à gestão pública brasileira. A programação foi organizada com base nos seguintestemas: gestão de pessoas na área pública; gestão por resultados, monitoramento e avaliação;governança, participação e controle social; governo eletrônico e transparência; novosformatos organizacionais; orçamento, contabilidade, finanças, compras e patrimônio.

Alunos de Especialização conhecem funcionamentode ações e programas governamentais

Alunos da 2ª edição do curso de Especialização em Gestãode Políticas Públicas de Proteção e Desenvolvimento Socialparticiparam, em 23 de maio, de oficina para trocar experiências

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RSP Acontece na ENAP

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e impressões sobre visitas técnicas realizadas em diferentes Municípios brasileiros. Ao longodo mês, cerca de 30 alunos foram às seguintes localidades: Brasília/DF, Cuiabá/MT, Foz doIguaçu/PR, Londrina/PR, Olinda/PE e Santo André/SP.

Nos processos de vivência in loco, a turma conheceu o funcionamento de ações, siste-mas, programas e planos governamentais. Antropóloga e pesquisadora do Instituto Nacionalde Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Ana Elizabeth Maia deAlbuquerque viajou até Olinda/PE a fim de conhecer ações do Sistema Único de Assis-tência Social (SUAS). Ela ressalta a importância da metodologia de ensino-aplicação adotadapela ENAP, possibilitando que o aluno tenha contato com situações concretas, analisando-as a partir de um roteiro pré-definido: “Essa imersão permite que nós, do serviço públicofederal, tenhamos contato com a ponta e possamos ver os desafios e as respostas criativasdos Municípios”.

Começa 4a Edição do Curso de Especialização emGestão de Pessoas

A ENAP iniciou, no mês de maio, as atividades da4a Edição do Curso de Especialização em Gestão de Pessoasno Serviço Público. Ao todo, são 40 alunos, representantesde diversos órgãos federais. Participam servidores públicosdo Poder Executivo que atuam com gestão estratégica de pessoas ou que estejam sendopreparados e encaminhados para essa função.

No primeiro encontro, a Diretora de Formação Profissional da ENAP, Maria StelaReis, deu as boas-vindas aos estudantes, apresentou a equipe da Escola e fez uma sauda-ção inicial, destacando o caráter pioneiro do curso: “No Brasil, até onde sabemos, nãoexiste formação semelhante. Esta especialização foi concebida pela própria ENAP, afim de contribuir com o fortalecimento da gestão pública. Para tanto, consideramosa Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoal (PNDP)”.

O professor Amarildo Baesso proferiu a aula inaugural sobre os desafios da adminis-tração pública e da gestão de pessoas, e destacou a relevância do Curso.

Aspectos controversos da Lei 8.666 são debatidos emseminário

Seminário promovido pela ENAP, em 21 de junho, discutiuo seguinte tema: “Aspectos controversos em licitações, comênfase em elaboração e avaliação de formação de custos”.O palestrante Thiago Bergmann de Queiroz, do TribunalSuperior Eleitoral (TSE), que atua nas áreas de auditoria, licitações e contratos, apresentouelementos formadores dos custos envolvidos em licitações, com foco no ordenamentojurídico vigente, na jurisprudência do Tribunal de Contas da União (TCU) e em casos práticos.

Tendo em vista o escopo da Lei 8.666/93, Thiago destacou os pontos controversossobre o assunto. O intuito foi buscar capacitar gestores para o enfrentamento de situa-ções controvertidas na aplicação da legislação em relação à formação de preços, bemcomo esclarecer aspectos jurídicos relevantes à tomada de decisão com segurança e àcorreta execução das atividades relacionadas aos itens examinados.

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Normas para os colaboradores

A Revista do Serviço Público, editada pela Escola Nacional de Administração Pública há mais de 70anos, publica artigos inéditos sobre temas relacionados a Estado e Sociedade; Políticas Públicas eAdministração Pública. Os artigos passam por análise prévia de adequação pela editoria da revista eposterior avaliação de dois a três pareceristas por sistema de blind review.

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1. Artigos: 1. Artigos: deverão ter aproximadamente seis mil palavras (em torno de 20 páginas) e ser acompanhadosde resumo analítico em português, espanhol e inglês, de cerca de 150 palavras, que permita uma visão globale antecipada do assunto tratado, e de três palavras-chave (descritores) em português, espanhol e inglês queidentifiquem o seu conteúdo. Tabelas, quadros e gráficos, bem como notas, devem limitar-se a ilustrarconteúdo substantivo do texto. Notas devem ser devidamente numeradas e constar no final do trabalho e nãono pé da página. Citações de autores no corpo do texto deverão seguir a forma (AUTOR, data). Referênciasdevem ser listadas ao final do trabalho, em ordem alfabética, observadas as normas da ABNT.*

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* Exemplos de citação e referênciaCitação no corpo do texto: (ABRUCIO, 2009)Referências no final do trabalho:

LivroCOHEN, Ernesto; FRANCO, Rolando. Gestão Social: como obter eficiência e impacto nas políticas sociais.Brasília: ENAP, 2007.Artigo em coletâneaSARAVIA, Enrique. Introdução à teoria da política pública. In: SARAVIA, Enrique e FERRAREZI, Elisabete(Org.). Coletânea Políticas Públicas. Brasília: ENAP, 2006. v. 1 p. 21-42.Artigo em periódicoCOSTA, Frederico Lustosa da. História das reformas administrativas no Brasil: narrativas, teorizações erepresentações. Revista do Serviço Público, Brasília, ENAP, v. 59, n. 3, p. 271-288, jul. a set. de 2008.Monografia, dissertação ou tese acadêmicaMONTEIRO, Ana Lúcia de Oliveira. A Relação Estado e Sociedade Civil no Processo de Formulação e Implementaçãode Políticas Públicas. 2008. Dissertação (Mestrado em Administração Pública). Programa de Pós-Graduaçãoem Administração – PPGA, Universidade de Brasília, Brasília.Sítio da internetEscola Nacional de Administração Pública. Catálogo de Cursos 2009. Disponível em:www.enap.gov.br. Acesso em: 8 jan. 2009.

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Escola Nacional de Administração PúblicaDiretoria de Comunicação e PesquisaSAIS Área 2-A Brasília, DF – CEP 70610-900Tel: (61) 2020 3327 – Fax: (61) 2020 3178 – E-mail: [email protected]

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Para conhecer ou adquirir as Publicações ENAP, visite o sítio www.enap.gov.br

Caderno Fiscalização de Contratos

O servidor público encarregado de trabalhar com licitações econtratações públicas deve observar os princípios da legalidade,da eficiência, da probidade administrativa, da economicidade e dodesenvolvimento nacional sustentável. Na edição 36, dos CadernosENAP, o leitor encontrará orientações de como operar com alegislação pertinente ao tema e como aplicar sanções administrativaspelo descumprimento do contrato.

Ações premiadas no 17º Concurso Inovação na GestãoPública Federal

Este livro traz os relatos das 10 iniciativas premiadas no 17o ConcursoInovação na Gestão Pública Federal. Iniciativa da ENAP, em parceriacom o MP, o Concurso conta com o apoio, para as premiações,das embaixadas da França, da Noruega e da Nova Zelândia; daCooperação Alemã para o Desenvolvimento (GIZ); e da AgênciaBrasileira de Cooperação (ABC). Ao longo de 17 anos, o Concursotem cumprido seu objetivo de estimular a implementação deiniciativas inovadoras de gestão em organizações do governofederal; disseminá-las e valorizar servidores públicos que atuam deforma criativa em suas atividades.

Como escrever e usar estudos de caso para ensino eaprendizagem no setor público

De autoria do professor Andrew Graham, do Instituto de Adminis-tração Pública do Canadá (Ipac), a publicação representa mais uminvestimento da ENAP em novas metodologias de ensino deaplicação, que permitam a reflexão teórica a partir de situaçõesconcretas do setor público. O objetivo é estimular a investigação, ainovação e o compartilhamento de experiências profissionais,propiciando a reflexão crítica sobre a atuação dos servidores naadministração pública e sobre as políticas públicas.

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Cartão de aquisição de publicações

Para adquirir nossos periódicos, envie-nos este cartão preenchido atravésde fax ou correio juntamente com o comprovante de pagamento ou notade empenho.

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Exemplar avulso anterior a 1997: R$ 8,00

Cadernos ENAP

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Preço unitário: R$ 10,00(*)Caderno 33 (2 volumes): R$ 20,00

Outros

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Formas de pagamentoOs interessados em adquirir as publicações ENAP poderão dirigir-se diretamente à sede da Escolaem Brasília ou solicitá-las por fax ou pelos Correios, informando os títulos das publicações eendereço completo para entrega.O pagamento pode ser realizado por meio de uma das formas a seguir:1. Nas agências do Banco do Brasil:

• Compareça ao caixa e solicite o depósito do valor das publicações na Conta Única do Tesouro Nacional, Agência 1607-1 Conta 170.500-8, informe seu CPF ou o CNPJ de sua instituição e o código identificador 11470211401288187.• Posteriormente, encaminhe o comprovante de depósito juntamente com o Cartão de Aquisição para a ENAP.

2. No sítio do Banco do Brasil (www.bb.com.br), por meio de transferência entre contas correntes(para clientes do Banco do Brasil):• Acesse sua conta.• Na guia “Transferências”, clique em “para Conta Única do Tesouro”.• Digite o valor total das publicações solicitadas.• No campo “UG Gestão finalidade”, digite o código identificador: 11470211401288187.• No campo CPF/CNPJ, digite o seu CPF ou o CNPJ de sua instituição.• Em seguida, prossiga com a transação normalmente, como se fosse uma transferência comum entre contas correntes.• Imprima o comprovante e encaminhe-o para a ENAP juntamente com o Cartão de Aquisição.

3. Nos terminais de autoatendimento do Banco do Brasil (para clientes do Banco do Brasil):• Na tela principal, selecione a opção “Transferência”.• Na próxima tela, selecione a opção “Conta corrente para Conta Única do Tesouro”.• Em seguida, digite o valor total das publicações solicitadas e tecle Ok.• Na próxima tela, digite no campo Identificador 1 o código 1147021140128818-7 e no campo Identificador 2 o seu CPF ou o CNPJ de sua instituição.• Prossiga normalmente com a transação, como uma transferência comum.• Encaminhe posteriormente o comprovante de transferência juntamente com o Cartão de Aquisição para a ENAP.

4. Enviar nota de empenho (com original anexado) em nome de: ENAP Escola Nacional deAdministração Pública – CNPJ: 00.627.612/0001-09, UG: 114702, Gestão: 11401

5. Enviar por fax ou pelos Correios, a Guia de Recolhimento da União (GRU Simples) paga noBanco do Brasil com o valor das publicações. Acesse o link “Como adquirir” na página da ENAPpara mais informações.

Escola Nacional de Administração PúblicaDiretoria de Comunicação e PesquisaSAIS – Área 2-A70610-900 – Brasília, DFTel: (61) 2020 3096 / 2020 3092 / 2020 3186 – Fax: (61) 2020 3178CNPJ: 00 627 612/[email protected]