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RISCOS E AMBIENTE

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ÍÍÍÍ NNNN DDDD IIII CCCC EEEE

Inforgeo, 2007/2008

Teresa Sá Marques, José Luís Zêzere – Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Ana Monteiro, «As cidades e a precipitação – como mediar uma relação cada vez mais con-flituosa» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

S. Pereira, C. Bateira, M. Santos, «Base de dados de movimentos de vertente: um instru-mento de apoio ao PROT Norte» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

José Luís Zêzere, Catarina Ramos, Eusébio Reis, Ricardo Garcia, Sérgio Oliveira, «PerigosNaturais, Tecnológicos e Ambientais na Região do Oeste e Vale do Tejo» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Jorge Gaspar, José Fernandes Rodriguez, Margarida Queirós, Eduardo Brito Henriques,Pedro Palma, Teresa Vaz, «Determinação das vulnerabilidades humanas em situação de riscosísmico e tsunamis. O caso do Algarve» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Américo Reis, «Alteração ambiental e recursos naturais: fontes de desestabilização social ede risco e ameaça à segurança nacional e internacional» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Joaquim Condessa, José Luís Faustino, Maria do Rosário Ramalho, «Riscos naturais e tec-nológicos no Alentejo» . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

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Ficha Técnica

DirecçãoTeresa Sá Marques

Secretariado de redacçãoRui d’Alte

Conselho de redacçãoÁlvaro DominguesAna Ramos Pereira

Emília Sande LemosFernanda Cravidão

João FerrãoJosé Manuel Simões

João SarmentoJosé Alberto Rio Fernandes

José António TenedórioLúcio Cunha

Maria José RoxoMaria Leal Monteiro

Maria Lucinda FonsecaMário Vale

Teresa Pinto CorreiaTeresa Barata Salgueiro

Propriedade do títuloAssociação Portuguesa de Geógrafos

CorrespondênciaR. Professor Sousa Câmara, 170 – 1070-291 Lisboa

Tel/Fax: 21 387 87 87www.apgeo.pt

EdiçãoEdições Afrontamento / Rua Costa Cabral, 859 – 4200-225 Porto

ISSN0872-6825-20

ImpressãoRainho & Neves, Lda. / Santa Maria da Feira

Impressa em 2007

Depósito Legal109329/97

Revista de distribuição gratuita para sócio da APGPreço de venda ao público: 12 €

Tiragem: 800 exemplares

A opinião expressa nos artigos é da exclusiva responsabilidade dos autores

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AAAAPPPPRRRREEEESSSSEEEENNNNTTTTAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO

Teresa Sá Rodrigues

José Luís Zêzere

Inforgeo, 2007/2008, 5-7

Este número nasce da decisão tomada pela Associa-ção Portuguesa de Geógrafos de consagrar uma ediçãoda sua revista aos riscos e à protecção civil. Reconhece--se nesta decisão, por um lado, a importância científicado tema e a sua inequívoca associação à Geografia,enquanto disciplina centrada no conhecimento do terri-tório e, por outro lado, a importância política do tema,dadas as iniciativas legislativas nomeadamente emmatéria de planeamento e o ordenamento territorial,com resultados positivos na percepção e compreensãodos problemas associados aos riscos naturais e tecnoló-gicos e em matéria de intervenção através dos planos deprotecção civil com impactos na segurança e na quali-dade de vida das populações e recursos.

Ana Monteiro aborda o tema do risco climático, cen-trando-se no estudo de dois casos na região do Porto: asprecipitações excepcionais ocorridas em 2000-2001 e aseca observada em 2004. É enfatizado o incremento do

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cia territorial abrange uma grande parte da área deestudo.

Jorge Gaspar e co-autores desenvolvem uma metodo-logia quantitativa para estimar a população residente,com o objectivo da avaliar a vulnerabilidade humanaface ao risco sísmico e de tsunami no Algarve. Este tra-balho insere-se no Estudo do Risco Sísmico e de Tsuna-mis do Algarve, patrocinado pela Autoridade Nacionalde Protecção Civil.

Por fim, Américo Reis aborda o tema da segurançaambiental, destacando a importância crescente dos pro-blemas ambientais nas relações sociais, políticas e eco-nómicas, bem como as ameaças à segurança nacional einternacional que deles decorrem.

Trata-se, acreditamos, de um número oportuno, abor-dando um tema da maior pertinência e que ocupa umnúmero crescente de geógrafos, os quais, nas maisdiversas escalas e focos temáticos, têm vindo a sabercolocar o seu conhecimento em benefício da construçãode um país melhor ordenado e mais seguro.

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Riscos e ambiente

risco por aumento da vulnerabilidade, decorrente deintervenções desajustadas no território.

Susana Pereira e co-autores descrevem os procedi-mentos para a construção de uma base de dados demovimentos de vertente para a Região Norte de Portu-gal e destacam a importância deste instrumento noapoio à decisão na Protecção Civil e no Ordenamento eGestão do Território.

José Luís Zêzere e co-autores apresentam e discutemas metodologias e os resultados da avaliação de umleque de perigos naturais, tecnológicos e ambientaiscom incidência nas regiões do Oeste e Vale do Tejo(NUTS III do Oeste, da Lezíria do Tejo e do Médio Tejo),no âmbito da preparação do respectivo Plano Regionalde Ordenamento do Território.

No mesmo sentido, Joaquim Condessa e co-autoresdescrevem e discutem os riscos naturais e tecnológicosconsiderados no Plano Regional de Ordenamento doTerritório do Alentejo. Neste trabalho é dado um desta-que particular ao risco de desertificação, cuja incidên-

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Resumo

Os anos de 2000-01 e 2004-05 são doisexemplos igualmente dramáticos e incom-preendidos mas de índole diversa que servempara mostrar como os cidadãos urbanos serelacionam mal com a irregularidade da preci-pitação. Pretende mostrar-se que enquantoestas expressividades do sistema climático – aprecipitação intensa ou a seca – não foremmecanicamente compreendidas dificilmenteserão percebidas. E, continuarão a ser desvalo-rizadas em qualquer processo de decisão (indi-vidual ou colectivo). Ao ignorar o sistema cli-mático, o desenho urbano acrescenta vulnera-bilidade a uma equação (evento x vulnerabili-dade) onde temos de acreditar que só conse-guimos controlar um dos seus termos.

Abstract

The years of 2000-01 and 2004-05 are twodramatically examples of diverse nature thatserves to show how the urban citizens are

badly related with the irregularity of the preci-pitation. We intend to show that while theseclimatic system’s expressions – the intenseprecipitation or drought – are not mechani-cally understood they will hardly be perceived.They will continue to be forgotten in any deci-sion process (individual or collective). And ifwe ignore the climatic systemin planning weadd vulnerability to an equation (event x vul-nerability) where we only have control uponone of its terms.

1. Introdução

É já muito difícil imaginar algum lugar àsuperfície da Terra isento de risco porque aecúmena ampliou-se, substantivamente, nasúltimas décadas surgindo aglomerações urba-nas em contextos geográficos impensáveis atéhá poucas décadas. Por esse motivo, é naturalque um número crescente de cidadãos urbanosse sinta frequentemente bastante ameaçado,nomeadamente, pela conduta indesejável datemperatura, da precipitação, do vento, etc.Ameaças que, cada vez mais, transformam ostecidos urbanos em cenários caóticos e, quan-tas vezes, catastróficos. Al Gore no seu docu-mentário «Uma Verdade Inconveniente» diz

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AAAASSSS CCCCIIIIDDDDAAAADDDDEEEESSSS EEEE AAAA PPPPRRRREEEECCCCIIIIPPPPIIIITTTTAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO –––– CCCCOOOOMMMMOOOO MMMMEEEEDDDDIIIIAAAARRRR UUUUMMMMAAAA RRRREEEELLLLAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO CCCCAAAADDDDAAAA VVVVEEEEZZZZ MMMMAAAAIIIISSSS CCCCOOOONNNNFFFFLLLLIIIITTTTUUUUOOOOSSSSAAAA

Ana Monteiro*

Inforgeo, 2007/2008, 9-23

* Departamento de Geografia, [email protected]

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mesmo que «…a Natureza está a enlouquecer(…) e estamos a entrar na era das consequên-cias…». Afirmação que testemunha o modocomo tem sido tão interiorizada a ideia que aculpa das catástrofes com que vamos sendoconfrontados é, sobretudo, do clima. Senãovejamos quantas vezes lemos e comentamos:«a precipitação causou prejuízos…», «a ondade calor matou...», «ciclone ceifou…», «atromba de água destruiu...».

É neste quadro de referência em que osujeito é frequentemente o clima que preten-demos discutir a noção de risco e catástrofeclimática em espaços urbanos. Gostaríamos desublinhar a inocência do sistema climáticonamaioria dos casos e vincar a enorme responsa-bilidade do incremento da vulnerabilidade emcidades que são cada vez muito mais arte doque natureza.

2. Paroxismos, riscos climáticose vulnerabilidade em espaçourbano

A interpretação dos riscos climáticos a queestamos sujeitos em espaços urbanos é muitovariada e controversa. Sendo o risco1 – risk –uma medida da probabilidade e da intensidadedo perigo2 (Tobin, 1997, p.282), compreende-

-se que nos espaços urbanos a panóplia deprocessos ou eventos – hazard – potencial-mente geradores de perdas aumentou à medidaque o suporte biogeofísico foi sendo omitidono desenho urbano.

E, este alheamento progressivo do modusvivendiurbano relativamente a todas as com-ponentes do ecossistema nomeadamente aosistema climático, diminuiu a capacidade deantecipar, lutar, resistir e recuperar dos impac-tes negativos gerados por episódios de precipi-tação intensa, temperaturas elevadas ou muitobaixas, ventos velozes, etc. Em suma, a vulne-rabilidade das cidades aos riscos climáticostem crescido na proporção directa da alienaçãodo desenho urbano face ao sítio e à posiçãogeográfica.

A tolerância e a elasticidade social, econó-mica e política a um episódio climático extremocondicionam a gravidade do risco já que ele é afunção multiplicativa do episódio pela vulnera-bilidade. Assim, se não houver vulnerabilidade,ou se esta for muito fraca, não há risco aindaque ocorram paroxismos climáticos (Figura 1).Contudo, episódios vulgares e frequentes podemgerar consequências graves se a vulnerabilidadeindividual e colectiva aumentar.

Apesar dos riscos climáticos serem, maio-ritariamente, naturais, involuntários e localiza-

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1 Para explicar a diferença entre risk e hazard, algunsautores socorrem-se do exemplo de duas pessoas aatravessar o oceano: uma numa embarcação a remo,outra num barco a motor. Em ambos os casos o princi-pal hazardé a profundidade do oceano e a elevadaondulação enquanto que o risk é a probabilidade de seafundarem. Para a maioria dos autores anglo-saxóni-cos, risk é a probabilidade espacial e temporal da ocor-rência de um acontecimento que poderá originar con-sequências negativas, enquanto que hazardsignificaalgo de aleatório, ocasional, que não se pode prever eque afecta diferentes locais, isoladamente ou em con-junto, em diversos momentos. Este último conceito foitraduzido na bibliografia francófona pelo termo áleas.2 Segundo Vilela (2002) o substantivo risco deriva doverbo latino resecareque significa «cortar separando»

correspondendo na actualidade «à possibilidade deum acontecimento futuro e incerto»; «possibilidadede inconveniente ou fatalidade». O substantivo«perigo» provém da palavra latina «periculosu», esignifica «situação que ameaça a existência de umapessoa ou coisa»; «circunstância que prenuncia ummal para alguém ou para alguma coisa», «estado ousituação que inspira cuidado ou gravidade»; «Aquiloque constitui uma ameaça, que compromete a segu-rança, a saúde, o bem-estar das pessoas ou o desapa-recimento de alguma coisa».Segundo o mesmo autor, trata-se de esquemas ima-géticos diferentes: a palavra risco está primeiro queperigo, dado que «risco» se situa numa posição aindade segurança, embora haja probabilidade de algoocorrer enquanto «perigo» pressupõe maior proximi-dade da situação de ruptura.

Figura 1 – Variáveis intervenientes na definição de risco e vulnerabilidade

Figura 2 – Riscos ambientais

CARACTERÍSTICAS SOCIAIS

SexoIdade

EducaçãoEstrutura Familiar

Localização da ResidênciaOcupação

Bens

CARACTERÍSTICAS FÍSICAS DOS RISCOS NATURAIS

MagnitudeFrequênciaDuração

Extensão EspacialSazonalidade

Período de Retorno

INDIVÍDUO

– Proximidade da fontedo Risco

– Tipo de Estrutura– Nível de Autoridade– Diversidade de Escolha

INDIVÍDUO

– Proximidade da fontedo Risco

– Tipo de Estrutura– Nível de Autoridade– Diversidade de Escolha

FACTORES POLÍTICO/ECONÓMICOS

SOCIEDADE

– Padrões de uso do solo– Distribuição da riqueza– Padrão de gestão dos

recursos e história– Nível de desenvolvi-

mento

Definem o Risco

SismoTsunami

Erupção vulcânicaCiclone

TornadoAvalanche

InundaçãoSeca

IncêndiosAcidentes relacionados com meios comunicação

Explosões industriaisPoluição aquática

Emissões radioactivasAditivos alimentares

Fumar

Involuntário

Voluntário

Localizado

Difuso

Natural Criado pelo Homem

Definem a Vulnerabilidade

dos (Figura 2 e Quadro I), a concretização dorisco – catástrofe – e a sua magnitude e gravi-dade depende da tolerância da sociedade faceaos impactes negativos gerados. Por isso, nemsempre o risco real e o percebido coincidem.

Nas cidades, a avaliação qualitativa dosimpactes é muito mais importante do que aquantitativa. As pessoas tendem a avaliar os riscos multidimensionalmente, mas de formasubjectiva, fazendo com que alguns sejamsocialmente ampliados, enquanto outros sãoincompreensivelmente desvalorizados (Figura 3).

Nos espaços urbanos a excessiva crença naciência e na tecnologia para moldar o suportebiogeofísico aliada ao predomínio de vivênciasindoor, tem dificultado a observação e o armaze-namento de informações sobre o sistema climá-tico. As respostas, consequência do modo comoo risco é percebido e avaliado, traduzem precisa-mente esta grande incapacidade dos cidadãosurbanos para lidarem com os riscos climáticosapesar de confrontados com um número cadavez maior de impactes negativos (Quadro I).

Apesar do risco climático objectivo evi-

Fonte: Adaptado de Tobin, 1997, p. 324.

Fonte: Adaptado de Smith, 1992, p. 16

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Riscos e ambiente

denciar a necessidade de outras opções dedesenho urbano (ex: menor área impermeabi-lizada, menor artificialização dos cursos deágua, volumetrias menores, maior heteroge-neidade de materiais, etc.), a sociedade julgaque a tecnologia é capaz de a proteger de todosos tipos de expressões do sistema climático(Mileti, 1999). Por isso, a persistente desvalo-rização dos hazards climáticos tem contri-buído para incrementar a sua vulnerabilidade,acrescentando danos e perdas perfeitamenteevitáveis.

A concentração, nas cidades, de uma panó-plia de actividades e de pessoas faz com quecada complexo psicossocioeconómico avalie,perceba e exija do sítio e do sistema climáticodesempenhos muito diversos. Coexistem, nosespaços urbanos, grupos muito diversos noque respeita à avaliação e percepção dos riscosem geral e dos climáticos em particular. Umaparte substantiva da população urbana, geral-mente os de menor capacidade económica,tem uma fraca tolerância económica e social àimpulsividade do sistema climático. Por isso,estão expostos demasiadas vezes no sítio e nomomento errados (Figura 4).

A redução da vulnerabilidade da população

urbana ao comportamento do sistema climáticoexige mudanças estruturais na sociedade quepromovam um relacionamento mais atento emais humilde. De pouco serve culpabilizar oclima pelos danos e perdas durante os episó-dios inesperados, ou melhor, indesejados.Catapultar para o divino ou atribuir a responsa-bilidade ao sistema climáticopode aliviar tem-porariamente a tensão mas não auxilia os faze-dores urbanos a reduzir a exposição aos peri-gos (Figura 5). E isso só se consegue com umamudança estrutural nos paradigmas de desenhourbano excessivamente crentes nos milagres daciência, da técnica e da energia barata.

3. A precipitação – um dos riscosmais indesejados em meiourbano

Sabendo que os riscos climáticos são res-ponsáveis por cerca de 80% das perdas mate-riais e humanas (Mileti, 1999), e que emespaço urbano, são excepcionalmente amplifi-cados e geradores de caos e stress, elegemos, atítulo de exemplo, analisar dois episódioscatastróficos protagonizados pelo comporta-

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Quadro I – Totais globais dos principiais tiposde catástrofes naturais do CRED entre 1964-98

Figura 3 – Factores da Percepção do Risco Figura 4 – Modelo de mitigação

Figura 5 – Classificação dos acontecimentos climáticos extremos

Evento Número Percentagem

Inundação 456 33Ciclone Tropical 298 21Seca 205 15Sismo 133 10Tempestade 115 8Movimentos de Massa 65 5Onda Calor 29 2Vaga Frio 28 2Erupção Vulcânica 23 2Avalanche 10 1Tsunami 10 1Incêndio Florestal 6 0Proliferação de Insectos 2 0Total 1 380 100

Fonte: Adaptado de Smith, 1992, p. 34.

Fonte: Adaptado de Tobin, 1997, p. 149

Fonte: Adaptado de Tobin, 1997, p. 340

Fonte: Adaptado de Walsh, 1999, p. 52

Factoresde Situação

FactoresCognitivos

Ambiente Socioeconómico

Variáveis Psicológicas

Variáveis Atitudinais

Ambiente Físico

Res

post

a

MITIGAÇÃOMedidas Estruturais e Não Estruturais

MUDANÇAS ESTRUTURAIS DA SOCIEDADE

Reduzir a Exposição

Reduzir a Vulnerabilidade

Reduzir o Risco

PlaneamentoAbrangentePlaneamentoAbrangente

Reduzir as PerdasEconómicase as Mortes

Reduzir a Tensão Mudar as Percepções

Tipo

EventosClimáticosExtremos

Eventos ClimáticosAssociados

Fenómenos

Relativos

Ondas de Frio

Ondas de Calor

Tempestada de Neve / Nevão Avalanches

Cheias

Movimentos de vertentePrecipitações Intensas

Tempestade de Granizo

Tornados

Ventos Fortes Forte ondulação

Movimentos de vertente

«Storm surges»Ciclones Tropicais

Seca Diminuição do caudal dos rios

Mistos

Absolutos

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Quando rareia, a água, provoca também,nos espaços urbanizados, impactes negativosde grande magnitude ao nível da compactaçãodo solo geradora de rupturas nos edifícios einfra estruturas, do abastecimento de água e dosaneamento, da saúde pública, etc.

4. O Inverno 2000-2001 e a seca de 2004 no Porto – paroxismo ou vulnerabilidade acrescida?

Os Invernos de 2000-2001 e de 2004-2005foram, no Porto, dois exemplos da gravidadedos impactes provocados pela precipitação.Enquanto no primeiro caso a catástrofe acon-tece porque o episódio chuvoso foi excepcio-nalmente elevado à escala do século, nosegundo a magnitude dos danos deve-se àausência prolongada de precipitação (Figura 8).

Com este contributo, gostaríamos de ajudara avaliar a efectiva «excepcionalidade» destes

episódios mas, simultaneamente, aproveitarpara reflectir sobre a perigosidadeacrescidapelas modernas opções de planeamento.

Pretendemos demonstrar que o actual dese-nho urbano ignora o sítio e a posição geográ-fica, limitando-se a replicar modelos de qual-quer latitude e aumentando, com isso, as cau-sas de progressão da vulnerabilidade que trans-formam, por exemplo, alguns episódios chuvo-sos absolutamente vulgares em catástrofes.

O Inverno de 2000-2001

A precipitação intensa e frequentementeregistada no norte e centro de Portugal entreNovembro de 2000 e Março de 2001 (Figuras9, 10 e 11), paralisou várias cidades e provo-cou o deslizamento de terras engolindo pes-soas, casas e estradas. Os rios transbordaramdas suas margens e as pontes desabaram arras-tando consigo veículos em circulação e afo-gando dezenas de pessoas. E, a explicação

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Riscos e ambiente

mento da precipitação no Porto neste início doséculo XXI (2000-01; 2004-05). Escolhemosestes dois episódios porque nos parecem para-digmáticos da complexidade do caldo analí-tico individual e de grupo que despoleta cená-rios catastróficos.

Dentre o grupo de paroxismos climáticosque afectam a vitalidade urbana, a precipitaçãoé um bom exemplo do(s) enviesamento(s) ana-líticos que vingam na relação estreita existenteentre a vulnerabilidade criada e a dimensãodos danos causados.

A precipitação é um elemento climáticofundamental para a vida nas suas diversas for-mas mas também é responsável por elevadosprejuízos consoante a natureza, a intensidade ea duração do episódio. A sua presença ou a suaescassez é responsável, actualmente, por pre-juízos avultados sobretudo em espaços densa-mente ocupados.

No nosso contexto climático – temperadomediterrânico – a irregularidade da precipita-ção pode gerar situações muito críticas em

espaço urbano tanto se for concentrada eintensa como se for escassa.

Escolhemos este elemento climático preci-samente por esta característica intrínseca nonosso contexto climático – a irregularidade. Éque urge compreender porque é que sendo airregularidade da precipitação uma das princi-pais características, continuamos a ser cons-tantemente surpreendidos sempre que elaescasseia ou quando ocorre com grande fre-quência e intensidade.

Vejamos a este propósito como os registosseculares da estação climatológica do PortoSerra do Pilar ilustram bem a irregularidadecom que a precipitação tem brindado a regiãoportuense (Figuras 6 e 7).

A precipitação, quando ocorre com grandeintensidade e sobretudo quando se lhe associaminundações rápidas – flash floods– em rios eribeiros artificializados, pode paralisar comple-tamente uma cidade. Estes movimentos rápidosde água e massa podem atingir grandes veloci-dades (>6m/s) e arrastar consigo pessoas e bens.

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Figura 6 – Precipitação total anual no Porto-Serra do Pilar (1900-2006) Figura 7 – Localização geográfica da estação de Porto-Serra do Pilar.

Figura 8 – A relação entre a dimensão da catástrofe, a excepcionalidade do comportamento

da precipitação e a vulnerabilidade

Factos comprovados

Factos comprovados

Consequências

• cidades paralisadas;• congestionamento de tráfego;• movimentos de terra;• pessoas, casas e estradas

engolidas;• cheias;• pontes destruídas.

O Outono/Inverno 2000-2001 foi excepcional

• totais• sequência

• Carga nas albufeiras;• Abastecimento público

de água;• Fluxo subterrâneo de água;• Agricultura;• Incêndios;• etc.

O Outono/Inverno 2004-2005 não foi excepcional

• totais• sequência

Consequências

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(Figura 12). Até 2001, o total mensal de preci-pitação mais elevado havia sido 359,5 mm(Março de 1947). Os 587,4 mm de chuva tota-lizados em Março de 2001 ultrapassaram emmais de 60% o valor, até então, mais elevadodo século.

Para além de ter observado os totais men-sais de precipitação de Janeiro e Março maiselevados de que há memória (Figura 12), oOutono/Inverno 2000-2001, caracterizou-se

também, pela maior sequência de dias comprecipitação do século (Figura 13). Duranteeste período, choveu mais de 4 em cada 5 dias.Excluindo Fevereiro, que correspondeu a umintervalo na sequência quase interminável dedias com chuva, todos os outros meses regista-ram apenas 1, 2 ou 3 dias sem precipitação.

Além da elevada frequência de dias comprecipitação, convém notar, também, queJaneiro e Março de 2001, registaram uma con-

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Riscos e ambiente

para todas as catástrofes foi endereçada para o«mau tempo» e para a «excepcional» duraçãoe intensidade da precipitação.

Entre Outubro de 2000 e Março de 2001acumulou-se o maior total de precipitação doséculo (Figura 10). Durante os meses habitual-mente mais chuvosos do ano atingiu-se pelaprimeira vez, desde que há registos, no Porto

Serra do Pilar, mais de 1700 mm de precipita-ção (Figura 10).

Comparativamente com os totais mensaismais elevados do século, Janeiro e Março de2001 foram, no Porto SP, os mais chuvosos desempre (Figura 11). Destes dois, destaca-se,principalmente, Março de 2001 que foi excep-cional no total de precipitação que acumulou

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Figura 9 – Exemplo dos efeitos na circulação dentro da cidade do Porto causados por um episódiochuvoso particularmente intenso entre as 7-8h

Figura 11 – «Excepcionalidade» da precipitação durante o Inverno 2000/2001

Figura 13 – Sequência de dias com precipitação, no Porto SP, entre Novembro de 2000 e Março de 2001

Figura 12 – Totais mensais de Janeiro e Março no Porto SP

Figura 10 – Precipitação acumulada entre Outubro e Março no Porto-Serra do Pilar (1900-2005)

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muito peculiar porque tem uma progressãomuito lenta e imperceptível que se vai insta-lando sem ser detectada. A sua definição é

diversa (meteorológica, hídrica, política, etc.)consoante o objectivo do investigador e a ins-tituição de referência (Figura 17). Mesmo adefinição de seca meteorológica varia con-soante as instituições e os objectivos pretendi-dos com a avaliação da sua expressividade.

Embora o PDSI (IM, 2005) nos informe daseveridade extrema que entre Maio e Setem-bro de 2005 afectou Portugal (Figura 18), e aanálise das sequências de dias sem precipita-ção no período habitualmente húmido – Outu-bro a Março – evidencie que 68% dos dias

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Riscos e ambiente

siderável ocorrência de totais diários bastanteelevados (Figura 14).

Mais de 11 dias de Março de 2001, assisti-ram à queda de grandes quantidades de preci-pitação. Apenas, em 1947, havia ocorrido umnúmero semelhante, quando foram registados7 dias com mais de 20,8mm (percentil 95).

Dois dos três dias de Março com maiorprecipitação do século, aconteceram em 2001(dia 21 com 76,8 mm e dia 23 com 75, 4 mm).O dia de Março mais chuvoso, de que háregisto, ocorreu, porém, em 1979 (80,7 mm).

Apesar de se incluírem no período maispluvioso do ano, não é comum, nem em Março,nem em Janeiro, a precipitação diária ultra-passar os 10 mm. Todavia, em 2001, Janeiro

e Março registaram-se 16 dias com mais de 10 mm de chuva.

O Inverno de 2004-2005

O Inverno de 2004-2005 foi descrito pordiversos actores como um episódio catastróficode seca de grande gravidade. Contudo, quandoobservamos a série de mais de 100 anos deregistos de precipitação percebemos que operíodo 2004-2005 não foi o que registou omenor total de precipitação anual, nem o totalmais baixo no período húmido ou no períodoseco do ano (Figuras 6, 10 e 15 e Quadro II).

Como sabemos a seca é uma catástrofe

i n f o r g e o

18

Figura 14 – Total diário de precipitação em Março de 2001 no Porto SP

Figura 15 – Precipitação acumulada entre Abril e Setembro na estação de Porto Serra do Pilar (1900-2006)

Quadro II – Posição na série de precipitaçãomensal de Porto Serra do Pilar (1900-2006)

Outubro de 2004 5.º mais chuvoso desde 1900

Novembro de 2004 18.ºmais seco desde 1900

Dezembro de 2004 18.ºmais seco desde 1900

Janeiro de 2005 3.º mais seco desde 1900

Fevereiro de 2005 6.º mais seco desde 1900

Março de 2005 33.ºmais seco desde 1900

Figura 16 – Sequência de dias com e sem precipitação entre Outubro de 2004 e Março de 2005 na estação de Porto Serra do Pilar

Figura 17 – Algumas características e definições de seca meteorológica

Seca

progressão lentaimperceptível

WMO – Seca à quando uma região regista uma precipitação menor ou igual a 60% do valor normal durante maisde 2 anos consecutivos em mais de 50% da sua superfície

Protecção Civil – caracteriza-se pelo défice entre as disponibilidades hídricas do País e as necessidades de águapara se assegurar o normal abastecimento público

IMC – 5 categorias:Muito seco -<P20Seco -P20-P40Normal -P40-P60Húmido -P60-P80Muito húmido >P80

British Rainfall Organization – 3 categorias:Seca absoluta -15 dias consecutivos em que o total diário é < 0,25 mmSeca parcial -29 dias consecutivos em que o total diário é < 0,25 mmTemporada seca -15 dias consecutivos em que o total diário é < 1 mm

IM – Índice Meteorológico de seca = área afectada tendo emconta a P, a T°C e a capacidade de água no solo

seca fraca (-0,50 a -1,99)seca moderada (-2,00 a -2,99)seca severa (-3,00 a -3,99)seca extrema (-0,50 a -1,99)

ausência prolongadade precipitação

(total, n.º de dias, época do ano)

vulnerabilidade

?

+

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foram secos no Porto-Serra do Pilar (Figura19), não se tratou de um episódio único àescala do século (Figura 15 e Quadro II).

5. Considerações Finais

Estes dois exemplos igualmente dramáti-cos e incompreendidos mas de índole tãodiversa (Figura 8), servem para mostrar queenquanto estas expressividades do sistema cli-mático – a precipitação intensa ou a seca – nãoforem mecanicamente compreendidas dificil-mente serão percebidas. E, continuarão a serdesvalorizadas em qualquer processo de deci-são (individual ou colectivo).

Este quadro de grande incompreensão égeneralizável a outras escalas espaciais. Aimportância do(s) risco(s) associados às mani-festações de mudança climática global pade-cem desta mesma patologia – a distância entreos factos e as percepções.

A sociedade está razoavelmente sensibili-zada para a possibilidade de vir a ocorrer umaumento da temperatura média do globo masainda não consegue imaginar as consequênciascatastróficas geradas pela impulsividade dasrespostas que o sistema climáticoparece pre-ferencialmente adoptar para reagir às tensões(internas e externas).

O argumentário resultante do conhecimentodas pressões que estão a afectar o comporta-mento do subsistema climáticolocal e regionalportuense não é suficiente para informar todosos actores envolvidos, nem para os sensibilizara modificar atitudes de modo a que reduzam asua vulnerabilidade aos elementos climáticos. Aincerteza quanto ao peso relativo de cada umadas relações de causalidade envolvidas nas res-postas do sistema climáticoé uma fragilidadeno processo de comunicação em climatologiaque, depois, se tem repercutido insistentementeao nível da acção (Figura 20).

Esta lacuna só será colmatada quando osinvestigadores reorganizarem o discurso cientí-fico imprimindo-lhe também uma vocaçãopedagógica e uma linguagem própria para esta-belecer a comunicação com a sociedade. Pri-meiro, é necessário clarificar a multiplicidade defactores envolvidos nos cenários de catástrofeclimática (Figuras 1 e 3). Depois, é fundamentalenquadrar as reflexões em torno dos impactesnegativos gerados pelas manifestações de mu-dança climática numa teia pluridisciplinar ondeo conhecimento científico de climatologia é ape-nas um dentre uma miríade de outros saberes.

A qualificação das ferramentas – concep-tuais, metodológicas e instrumentais – dispo-níveis em climatologia não tem evitado, pelomenos tanto quanto seria desejável, os danos

21

Riscos e ambientei n f o r g e o

20

Figura 18 – Índice meteorológico da seca PDSI (IM, 2005)

% de território afectado 2004/2005Classes de seca 31

Out.0430

Nov.0431

Dez.0431

Jan.0528

Fev.0531

Mar.0530

Abr.0531

Mai.0530

Jun.0531

Jul.0531

Ago.0530

Set.05

5

47

22

20

5

1

0

0

0

1

47

47

5

0

0

0

0

30

48

20

2

0

0

0

0

25

53

22

0

0

0

0

23

44

33

0

0

0

26

22

28

24

0

0

0

15

22

20

43

0

0

0

4

28

20

48

0

0

0

0

3

33

64

0

0

0

0

0

27

73

0

0

0

0

0

29

71

0

0

0

0

3

36

61

c. moderada

chuva fraca

normal

fraca

moderada

severa

extrema

Figura 19 – Sequências de dias com e sem precipitação (2000-01, 2004-05 e 2005-06)

Figura 20 – A progressão da vulnerabilidade ao sistema climático

Variabilidade climática depende de:

Forçasexternas

Paroxismo climático

As condições de insegurança aumentaram?

O que mudou?

Factores de vulnerabilidade:

1 – Urbanização2 Aumento da população3 – Pressão4 – etc.

Vulnerabilidade

Catástrofe

Flutuações regulares

Flutuações aleatórias

Condições climáticas extremas

Catástrofes

Erupções vulcânicasAlterações no fluxo de energia solar

AtmosferaOceanoBiosferaSuperfície terrestre

Interacções internas entre ascomponentes do sistema climático

£££££@£££££¤

RRRRiiii ssssccccoooo ccccllll iiii mmmmáááátttt iiii ccccoooo

X

Combinação deelementos climáticos

i

i

i

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23

Riscos e ambiente

causados pelas secas, precipitações intensas,geadas negras, ondas de calor, vagas de frio,etc. Isto, pode dever-se ao modo como associedades modernas se relacionam com oecossistema, à forma como percebem e memo-rizam o comportamento de cada um dos ele-mentos climáticos, à curiosidade desmedidasobre uma realidade intrinsecamente variável,ao enorme incremento de informação sobre otema e também à dificuldade de comunicaçãodo conhecimento num domínio de grandecomplexidade como é a climatologia.

Os eventos climatológicos extremos,quando ocorrem, surpreendem uma sociedadeque interiorizou a ilusão de absoluta superiori-dade do Homem relativamente a todas asoutras componentes do ecossistema. Os resul-tados da ciência e as maravilhas da tecnologiaanimaram o Homem a acreditar que a suacapacidade de domínio sobre o ecossistema éilimitada e afastaram-no do convívio directocom o ar, a água, o solo, a flora e a fauna. Oscontactos passaram a ser filtrados pelos vidrosde abrigos cada vez mais sofisticados, inter-ceptados por aprimorados sistemas de drena-gem de águas, etc. Ao modificar a qualidadeda observação alteraram-se os processos dememorização e, consequentemente, a percep-ção das características sistémicas do funciona-mento de todas as componentes do Planeta.

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BBBBAAAASSSSEEEE DDDDEEEE DDDDAAAADDDDOOOOSSSS DDDDEEEE MMMMOOOOVVVVIIIIMMMMEEEENNNNTTTTOOOOSSSS DDDDEEEE VVVVEEEERRRRTTTTEEEENNNNTTTTEEEE:::: UUUUMMMM IIIINNNNSSSSTTTTRRRRUUUUMMMMEEEENNNNTTTTOOOO

DDDDEEEE AAAAPPPPOOOOIIIIOOOO AAAAOOOO PPPPRRRROOOOTTTT NNNNOOOORRRRTTTTEEEE

S. Pereira1; C. Bateira2; M. Santos3

Inforgeo, 2007/2008, 25-36

1. Introdução

Os principais riscos naturais que afectamcom maior frequência a Região Norte de Portu-gal são as cheias progressivas, as cheias repen-tinas, os movimentos de vertente e os sismos.Até ao momento não existia uma base de dadosque compilasse a localização das ocorrênciascom os danos verificados. Por um lado, as pou-cas bases de dados que existem estavam disper-sas em vários organismos, nomeadamente centros distritais de operações e socorro, corpo-rações de bombeiros e seguradoras. Destaforma, torna-se extremamente difícil realizaruma análise estatística das ocorrências.

As áreas afectadas por estes riscos naturaissão quase sempre alvo de prejuízos materiais,funcionais e humanos. Por essa razão, éimportante conhecer os factores que estão naorigem do seu desencadeamento para permitira criação de estruturas de alerta à população.Além disso, cartografia das áreas potencial-

mente afectadas, de acordo com as diferentestipologias de risco, servirá para promover oordenamento do território e, em certos casos,corrigir erros de planeamento preexistentes.

Quando estudamos os movimentos de ver-tente na Região Norte verificamos que asocorrências estão espaçadas no tempo e noespaço. Na maioria das vezes são desencadea-dos na sequência de períodos extremos de pre-cipitação.

O ano de 2001 com inúmeras ocorrênciasde movimentos de vertente impôs a necessi-dade do estudo dos movimentos de vertente noNorte de Portugal, nomeadamente a realizaçãode um inventário de todas as ocorrências demovimentos de vertente para fazer parte deuma base de dados uniformizada a nível nacio-nal (Bateira, 2001).

Soeters e Van Vesten (in Turner e Schuster,1996: 130) defendem também que é necessá-rio um rigoroso inventário dos movimentos devertente: tipo, actividade e distribuição espa-cial, antes de realizar qualquer análise dos fac-tores de ocorrência de movimentos de vertentee tomar conclusões sobre as suas relaçõesambientais.

A predição da perigosidade geomorfoló-gica em áreas sujeitas a movimentos de ver-tente é baseada no conhecimento da instabili-

1 Bolseira de Doutoramento da FCT, Departamentode Geografia da F.L.U.P. ([email protected])

2 Departamento de Geografia da Faculdade deLetras das Universidade do Porto.

3 Estudante do Mestrado de SIG e Ordenamentodo Território, Departamento de Geografia da F.L.U.P.

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Riscos e ambiente

dade passada, que pode fornecer-nos informa-ções úteis para a previsão da localização defuturas ocorrências (Soeters e Van Vesten,1996 in Turner e Schuster, 1996: 130).

O objectivo principal deste artigo é apre-sentar alguns resultados de uma base de dadossobre movimentos de vertente no Norte dePortugal, necessária para a elaboração de car-tografia de riscos a movimentos de vertente, adiferentes escalas, em ambiente de SIG. Estabase de dados fornecerá os elementos de par-tida para a definição dos critérios de diferen-ciação das classes de susceptibilidade geomor-fológica.

2. Fases da construção da basede dados

Para a construção da base de dados utilizá-mos o nível de modelação proposto por PeterChen (1977) na década de 70, a abordagementidade-relacionamento (E-R), baseada nosmodelos conceptual, lógico e físico. Elaborou--se um modelo conceptual e um modelo lógicoe definiram-se as entidades com os seus atri-butos, tendo em conta o nível de detalhe pre-tendido e os relacionamentos existentes. Aexecução dos modelos conceptual e lógicopassou por diversas fases de redefinição emelhoria do modelo, com o fim de o validar.

O modelo lógico, obtido a partir das regrasde derivação do modelo conceptual, apresentaos objectos, as suas características e relaciona-mentos de acordo com as regras de implemen-tação e restrições impostas pelo softwareutili-zado. O modelo lógico gerado a partir domodelo conceptual foi o modelo relacional.

Durante todo o processo de modelação(concepção do modelo conceptual e durante aderivação do modelo lógico) realizou-se a nor-malização para organizar a base de dados e eli-minar redundâncias de dados (Chen, P., 1977).Na fase final de modelação da base de dados,

no modelo físico de dados, os objectos sãorepresentados sob a forma de tabelas. Namodelação da Base de Dados foi utilizado oprograma Access. Posteriormente a base dedados foi ligada ao SIG (software ArcGis 9.1)através do ArcCatalog e passou a incorporarinformação gráfica e alfanumérica, organi-zando-se uma Geodatabase (Figura 2).

A base de dados foi concebida de forma aenglobar três temas centrais: 1) a informaçãohistórica composta pelas classes relacionadascom as ocorrências, elementos geográficos esocioeconómicos; 2) factores condicionantes e3) factor desencadeante.

a) Informação histórica

A base de dados contém as entidades quecaracterizam os movimentos de vertente: loca-lização, tipo, actividade, estilo, distribuição,material movimentado, intervenção antrópicae danos.

b) Factores condicionantes

Os processos de instabilidade de vertentesão condicionados por uma complexidade defactores inter-relacionados, como por exem-plo: as condições geomorfológicas (forma dasvertentes, declives), hidrológicas (circulaçãosuperficial, fluxo interno lento e fluxo internorápido), litógicas locais e as formações super-ficiais (tipo e espessura).

Os processos geodinâmicos (a frequência eintensidade da precipitação e sismicidade), avegetação, os usos do solo, as actividadeshumanas (construção, indústria, pastoreio,agricultura intensiva...), podem alterar a suadistribuição espacial e temporal.

Na análise da instabilidade de vertentes, asescalas de trabalho determinam a selecção dotipo de factores condicionantes da variabili-dade espacial da instabilidade de vertentes,

i n f o r g e o

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Figura 1 – Sistemas Geomorfológicos da Região Norte

Figura 2 – Estrutura da Geodatabase

INFORMAÇÃOHISTÓRICA

MOVIMENTOSDE VERTENTE

• eventos

• morfometria• material• fact. desencadeantes• fact. antrópicos• danos

• ponto, polígono

• ponto, polígono• ponto• ponto• ponto• ponto

• coordenadas, idade, velocidade, tipo, estilo, dis-tribuição, actividade, data, …

• comprimento máx., largura, área• distância, volume, …• tipo, data, fonte, …• tipo, data, fonte, …• tipo, mortos, feridos, desalojados, edif. danificados

• limites administrativos

• edifícios• uso do solo• estradas• energia

• ponto, polígono

• ponto, polígono• polígono• linha• linha

• cregião, cidades, áreas urbanas

• escolas, hospitais, habitações, …• agrícola, florestal, urbano, …• rede de estradas, categoria, km., …• hidráulica, redes de gás, …

• população• actividades económ.

• ponto, polígono• ponto, polígono

• habitantes, homens, mulheres, idade, …• tipo de actividade, emprego

• rede de estações• dados

• fontes

• ponto• ponto, linha

• ponto

• altitude, coordenadas, precipitação, …• data, hora, precipitação (horária, diária, mensal e

anual), períodos de retorno, …• instituição, período de funcionamento, …

• litologia• solos• formações superficiais• falhas• morfologia• altitude

• rede hidrográfica• bacia hidrográfica

• polígono• polígono• polígono• linha• polígono• linha, ponto

• linha• polígono

• tipo, idade, composição, …• tipo, composição, espessura, …• tipo, espessura, idade, …• tipo, geometria, idade, orientação, …• unidades, elementos morfológicos• curvas de nível, pontos cotados, MDT, declives,

exposição de vertentes, …

• nome do rio, número de ordem, …• tipo, área, perímetro, …

ELEMENTOSGEOGRÁFICOS

SOCIO-ECONÓMICOS

FACTORESCONDICIONANTES

FACTORDESENCADEANTE

TEMA CLASSES NÍVEIS ATRIBUTOS ENTIDADES

GEOMORFO-LÓGICOS

METEOROLÓGICO

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Riscos e ambiente

composto pelos seguintes campos: des-crição, código, link para fotos, link paramapas, ano, mês, distrito, concelho,código de freguesia, freguesia, coorde-nada X (HGM), coordenada Y (HGM),observações da localização, folha dacarta militar, tipologia, idade, velocidade,estado de actividade, estilo, distribuição,número de ocorrências, observações, datade início de actividade, hora de início deactividade, data de recorrência, hora derecorrência, fonte e data da fonte.

– Um formulário referente ao tipo de mate-rial movimentado com os seguintes cam-pos: código do movimento de vertente,código de material movimentado, distân-cia máxima percorrida, área afectada,volume do material afectado, larguramáxima, largura mínima, comprimento,diâmetro e observações.

– Um formulário que diz respeito ao tipo deintervenções antrópicas realizadas comos seguintes campos: código do movi-mento de vertente, descrição, código deintervenção antrópica, data da interven-ção, observações.

– E, por fim, um formulário sobre o tipo dedanos provocados, com os seguintescampos: código do movimento de ver-tente, descrição, código de danos, ocor-rência (descrição), número de mortes,número de feridos, número de desaloja-dos, corte de linha férrea, corte deestrada, edifícios destruídos e fonte.

a) Fontes de informação

Numa primeira fase deste trabalho reco-lheu-se o máximo de informação disponívelsobre a ocorrência de movimentos de vertente,datas de início de actividade, de recorrência,danos, tipo de intervenção antrópica, materialmovimentado, cartografia já realizada, fotogra-fias, ortofotomapas, entre outros. Recorremos à

consulta de várias fontes de informação, comopor exemplo: trabalhos de doutoramento e demestrado, a artigos publicados, a artigos de jor-nal, a fotografias, a jornais locais on-line, fontespopulares e aos Centros Distritais de Operaçõese Socorro (CDOS) da Região Norte (Porto,Braga, Viana do Castelo, Bragança, Vila Real,Viseu, Guarda e Aveiro) (Figura 3).

Os jornais diários constituem 83% do totalde fontes consultadas, seguidas pelas teses demestrado e doutoramento (6%), jornais detiragem mensal ou quinzenal e artigos cientí-ficos (3%).

O período temporal da pesquisa abarcou107 anos (1900 a 2007). Na Região Norte apu-ramos que existem 99 jornais de tiragensdiversas (nacional, regional e local). Para esteperíodo consultou-se de forma sistemática oJornal de Notícias, por ser um jornal diário degrande tiragem nacional e com uma série maislonga (desde 1888). Além deste, consultamosa série dos jornais O Público (1990-2007),também de tiragem nacional e O Correio doMinho (1980-2007) de tiragem regional. Pelofacto da pesquisa manual de jornais ser um tra-balho moroso não foi possível alargar a pes-quisa a mais periódicos.

Na pesquisa optamos por consultar prefe-rencialmente os meses mais chuvosos (Setem-bro a Maio) e nestes, apenas os meses com pre-cipitações significativas, obtidas a partir dosdados de precipitação das estações do INAG.

A consulta de periódicos é uma base depesquisa fundamental, principalmente quandoos vestígios no terreno já são pouco perceptí-veis ou quando pela sua reduzida dimensão egrau de destruição, os movimentos de vertentesão confundidos ou esquecidos pelas popula-ções com a passagem dos anos.

É importante realizar este levantamento e acaracterização dos movimentos registados,uma vez que pouco tempo após a sua ocorrên-cia deixam quase de ser reconhecidos na pai-sagem, visto que experimentam uma evoluçãogeomorfológica rápida (que elimina os vestí-

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utilizando-se diferentes níveis e grau de deta-lhe da informação a representar. Ao trabalharem diferentes escalas de análise é importantedecidir quais são os níveis de informação (oufactores) e as unidades de terreno mais repre-sentativas da instabilidade de vertentes emfunção da escala adoptada.

Para tal, elaborou-se uma hierarquia deunidades de terreno que abarca os factorescondicionantes e desencadeantes dos movi-mentos de vertente. A hierarquia de terrenoutilizada parte da região, que se divide em uni-dades territoriais, que podem ser analisadassegundo os diferentes elementos territoriaisque as compõem (Mitchel, 1991).

A região Norte de Portugal é constituídapor uma base geológica e geomorfológica. Asunidades territoriais caracterizam-se pela inci-dência de um conjunto de processos físicos epor uma dinâmica geomorfológica própria,responsáveis pelo desenvolvimento de umadeterminada morfologia, hidrologia e cobertovegetal, como por exemplo: a plataforma lito-ral, os vales do NW, o vale do Douro, o relevointermédio, as serras, o planalto transmontanoe as depressões tectónicas (Figura 1).

Os elementos territoriais são as áreas maispequenas da paisagem, onde predomina umprocesso geomorfológico resultante de condi-

ções particulares da morfologia, hidrologia,solo e estrutura, que são indivisíveis com basena forma.

c) Factores desencadeantes

A precipitação é o principal factor desen-cadeante dos movimentos de vertente no Nortede Portugal. No entanto, por vezes a precipita-ção quando combinada com a intervençãoantrópica é responsável pela alteração da dinâ-mica natural das vertentes e pela ocorrência demovimentações em áreas anteriormente está-veis. Perante condições de precipitaçãointensa e prolongada o tipo de intervençãoantrópica pode agravar os efeitos dos movi-mentos de vertente.

3. Preenchimento da base de dados

No Access, elaboraram-se quatro formulá-rios para facilitar a introdução de dados:

– Um formulário para a identificação, loca-lização e caracterização de cada movi-mento de vertente. Este formulário é

Figura 3 – Fontes de dados utilizadas na pesquisa de ocorrências

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gios da cicatriz e outros elementos identifica-tivos), associada ao crescimento da vegetação,à limpeza dos materiais mobilizados e até àreconstrução de habitações, patamares agríco-las, muros e estradas destruídas.

Durante a fase de pesquisa em jornais, nãofoi possível preencher a totalidade dos camposexistentes nos formulários, pois alguns neces-sitam de medições no terreno. Por outro lado,em determinados eventos mais antigos, actual-mente é impossível efectuar essas mediçõespor já não existirem vestígios suficientes ou oslocais terem sido alvo de reconstrução. Emalguns casos, por se tratar de movimentos devertente antigos temos consciência que algunsdados ficaram perdidos pela falta de registosescritos e fotográficos.

A utilização dos periódicos na recolha dedados apresenta algumas desvantagens. A prin-cipal corresponde à escassez de dados de ocor-rências fora das áreas urbanas. Estes, cobrempreferencialmente os acontecimentos que cau-saram danos conhecidos em áreas urbanas, ouem áreas rurais servidas por redes de transporte(linhas de caminho-de-ferro, auto-estradas,estradas nacionais), que foram afectadas poreventos que condicionaram a circulação depessoas e mercadorias. Normalmente, é dadamais ênfase à reactivação do processo, comono exemplo do movimento complexo de Ces-tães no concelho de Arcos de Valdevez, emDezembro de 2000 e Março de 2001.

Nos jornais, na maioria das vezes, a locali-zação dos eventos vem incompleta ou com des-crições vagas, excepto quando os eventos selocalizam nas linhas de caminhos-de-ferro e narede de estradas (AE, IP ou EN) onde geral-mente vem referido o quilómetro onde se regis-tou a ocorrência. São raros os casos em que osartigos de jornal referem uma estimativa econó-mica dos prejuízos, assim como o tipo de movi-mento, volume e área afectada. Normalmentefocam-se nos prejuízos humanos e materiais.

O factor desencadeante vem quase semprereferido, assim como o dia da ocorrência, mas a

hora exacta nem sempre é indicada e quando é,por vezes não é precisa. Encontram-se situaçõesem que para o mesmo movimento de vertente,vários jornais apresentam horas de ocorrênciadiferentes. F. Guzzetti e G. Tonelli (2004, p.215) referiram as mesmas limitações no uso dejornais para a recolha de dados históricos sobrecheias e movimentos de vertente para a base dedados Italiana SICI (Sistema de Informaçãosobre Catástrofes Hidrogeológicas).

A consulta de periódicos tem de ser reali-zada de forma crítica, tendo em conta váriosfactores que podem afectar a credibilidade dainformação. Referem-se os seguintes exemplos:

– Durante a época do Estado Novo (1933--1974) devido à existência da censurapolítica em Portugal, a liberdade deexpressão era bastante condicionada peloregime político. Neste período, a pes-quisa nos jornais revelou-se muitas vezesinfrutífera mesmo em anos hidrológicoscom precipitações importantes. Noscasos em que as ocorrências são relatadasfoi-lhes dada uma menor importância.

– Descrições vagas e sensacionalistas dosjornalistas que por vezes não permitemlocalizar com rigor os eventos e o tipo deprocesso.

– Evolução dos meios de circulação dainformação – no início do século XX orelato das ocorrências tinha em médiaum desfasamento de dois dias a umasemana em relação ao dia de desenca-deamento, em resultado das dificuldadesde transporte.

Nota-se uma maior rapidez na difusão dasnotícias com o uso do telégrafo (início doséculo XX), do comboio-correio e depois dotelefone. Hoje em dia, com as tecnologias dainformação e da comunicação a difusão dasnotícias é muito mais rápida e num espaço dehoras ou minutos as ocorrências passam a serdo conhecimento público. Além disso, a

riqueza da notícia é maior devido à existênciade fotografias e filmagens que são divulgadaspela imprensa escrita, televisão e internet.

– A percepção das pessoas sobre estes acon-tecimentos é altamente condicionada peladimensão do processo e das áreas afecta-das, número de ocorrências, grau de des-truição, grau de prejuízos materiais ehumanos (C. Bateira, et al.2005).

– As notícias recolhidas constituem umaínfima parte dos processos de evoluçãode vertentes que ocorreram na região,mas que pelo seu carácter destrutivo, tipode danos e influência no normal funcio-namento das actividades económicas ena circulação de pessoas e bens, merece-ram o devido destaque nos jornais.

Tendo em conta estas limitações, recolhe-ram-se vários artigos com referências sobre omesmo evento para cruzar a informação ainserir nos formulários da base de dados.

Os artigos científicos e as teses de mes-trado e doutoramento forneceram na sua maio-ria informação insuficiente, mas de qualidade.Raramente há uma caracterização completa domovimento de vertente e muitas vezes encon-tram-se apenas referências descritivas a casos,sem haver dados quantitativos de maior por-menor. Existem poucos registos de campo,alguma cartografia de base (morfologia, geo-logia, hipsometria), localização detalhada comas características do movimento e raramente oestudo dos eventos de precipitação que osdesencadearam.

As entrevistas foram pouco utilizadas, poisfornecem informações gerais sobre umnúmero limitado de ocorrências e para umcurto período temporal.

Nos contactos efectuados com os CentrosDistritais de Operação e Socorro (CDOS) veri-ficamos que as bases de dados destas institui-ções não estão concebidas de forma a registaros diferentes tipos de processos geomorfológi-

cos. Além disso, nem sempre apresentam apreocupação de localizar com exactidão asocorrências, excepto se estas forem em meiourbano. Normalmente aparecem as referênciasao nome da rua ou do lugar, a data e hora docontacto, o número de efectivos e meios utili-zados, o tempo de actuação, e uma breve des-crição grosseira do processo.

Verificamos que a estrutura das bases dedados e a codificação das ocorrências não sãouniformes entre os diferentes CDOS e que omaior detalhe nas descrições deve-se a casosisolados. A maioria das ocorrências dos CDOSnão foram georreferenciadas e a tipologia domovimento de vertente é dúbia, mas permitema identificação dos dias com maiores ocorrên-cias que depois foram confrontados com asnotícias dos jornais locais.

Por todas estas razões, o processo de reco-lha de dados foi moroso e trabalhoso e forampreenchidos apenas os dados disponíveis nomomento. Os restantes necessitam da realiza-ção de um trabalho de campo pormenorizado.É necessário salientar que estes dados estavamdispersos em vários arquivos e em váriossuportes (digital e analógico).

b) Distribuição espacial dos eventos

A base de dados contabiliza actualmente623 registos de movimentos de vertente, dosquais 77% estão georreferenciados com umponto (Sistema de Coordenadas HGM) e osrestantes estão localizados na freguesia ondeocorreram (Figura 4).

No processo de georreferenciação foiextremamente importante realizar uma leituraatenta das fontes para permitir a localização doponto superior da ruptura da vertente nas car-tas topográficas do Instituto Geográfico doExército (1:25 000) com diferentes datas depublicação, em ortofotomapas (escala 1:5000),em mapas de estradas e linha de caminhos-de--ferro ou no Google Earth. Nos casos mais

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recentes foi possível o recurso ao GPS para asua localização mais precisa.

Se em alguns casos, foi relativamente fácillocalizar o movimento na respectiva cartamilitar ou no ortofotomapa e depois calcularas coordenadas no sistema de CoordenadasHGM datum Cascais, noutros, a localização demuitas ocorrências foi baseada no nome dolugar referido e na configuração do relevo.Encontraram-se inúmeras situações de descri-ções que referiam toponímia que actualmentefoi modificada ou referências a lanços delinhas de caminho-de-ferro que se encontramdesactivadas. Nesses casos, a georreferencia-ção só foi possível com o auxílio de cartastopográficas mais antigas.

As metodologias utilizadas no processo degeorreferenciação introduzem um erro médioque pode ir desde 1 m com o recurso ao GPSno terreno até às dezenas de metros com basenas descrições.

A georreferenciação permitiu efectuar a lei-

tura da distribuição geográfica dos movimen-tos de vertente existentes na base de dados. Dototal de movimentos de vertente georreferen-ciados, 37,4% localizam-se no vale do Douro,23,2% nas serras, 22% na plataforma litoral e9,6% no relevo intermédio. Nas restantes uni-dades morfológicas a percentagem de movi-mentos de vertente é insignificante.

Para se avaliar os concelhos que possuemum historial de movimentos de vertente maisproblemático, calculou-se a densidade de movi-mentos de vertente por 10 km2, baseada em F.Guzzetti e G. Tonelli (2004). Esta densidadecorresponde ao número de movimentos de ver-tente registados por concelho entre 1900 e 2007,a dividir por uma área de 10 km2 (Figura 5).

Os concelhos com uma maior densidade demovimentos de vertente são: Baião, MesãoFrio, Peso da Régua e Santa Marta de Pena-guião no Vale do Douro e Porto, V. N. de Gaiae Gondomar na plataforma litoral. O primeirogrupo justifica-se pela existência de factores

Figura 5 – Densidade de movimentos de vertente por concelho no Norte de Portugal (1900-2007)Figura 4 – Distribuição dos movimentos de vertente no Norte de Portugal (1900-2007)

naturais: vertentes complexas, com fortesdeclives, existência de mantos de alteração;vertentes organizadas em terraços agrícolas eimportância dos factores estruturais.

No segundo grupo os factores naturaiscondicionantes da ocorrência de movimentosde vertente não são tão importantes, mas aintervenção antrópica no território tem sido agrande responsável pelo grande número deocorrências, nomeadamente com a construçãode aterros, construção em linhas de água, desa-terros, construção em áreas de forte declivesem estarem salvaguardadas as questões deestabilidade das vertentes (C. Bateira, 2001).

Os concelhos de Arcos de Valdevez,Braga, Guimarães, Amarante, Sabrosa, Carra-zeda de Ansiães, Valongo, Maia e Matosinhospossuem uma densidade de movimentos devertente importante, que está relacionada comas suas condições naturais ou com a interven-ção antrópica no território.

Num total de 86 concelhos da regiãoNorte, apenas em 17 concelhos não foramencontradas referências a movimentos de ver-tente, para o período em estudo.

c) Distribuição temporal dos eventos

Os eventos registados ao longo dos 107 anosde pesquisa estão distribuídos de forma irregu-lar, demonstrando três grandes picos de eventos:no início da década de 10 do século XX (1909,1910), final da década de 70 (1979) e início dadécada de 80 do século XX (1981) e início doséculo XXI (2000, 2001, 2003) (Figura 6).

Os anos com um maior número de eventosregistados na base de dados são por ordemcronológica, a título de exemplo: 1909 (42),1910, 1955 (15), 1966 (16), (17), 1979 (23),1981 (24), 2000 (18), 2001 (40), 2002 (21),2003 (28), 2006 (23).

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Para esta série de eventos a média de ocor-rências é de 5,4 movimentos de vertente/ano.Em apenas 6% dos eventos não foi possívelobter a informação precisa sobre o ano deocorrência.

No conjunto dos movimentos de vertenteexistentes na base de dados, em 91% dos casosfoi possível identificar o mês da sua ocorrência,permitindo uma análise da sua distribuição sazo-nal (Figura 7). Mais de 70% dos eventos regis-taram-se no Inverno e no Outono, com especialrelevância nos meses de Dezembro (31,8%) eJaneiro (24,5%). Esta distribuição sazonal for-nece indicações sobre a importância das condi-ções de precipitação antecedente na variação dapressão de água dos solos nas vertentes.

Os dias em que foram registados um maiornúmero de eventos são por exemplo e por ordemdecrescente: 22/12/1909 (35); 26/01/2001 (12);01/12/1981 (8); 01/02/1985 (8); 26/02/2002 (8)e 10/12/1910 (7), entre outros com um menortotal de ocorrências inventariadas. Do total deocorrências, apenas em 78% das ocorrências foipossível obter informação sobre o dia exacto dodesencadeamento.

d) Características dos movimentos de vertente

Relativamente à classificação dos movimen-tos quanto ao tipo, velocidade, idade, estado deactividade, estilo e material movimentado, nemsempre as referências encontradas permitiramuma clara distinção destas características.

No que diz respeito ao tipo de movimentospredominantes, em 50% dos casos estão regis-tados desabamentos (rocha ou solo) e em 13%fluxos de lama e detritos. Em 24,9% dos regis-tos da base de dados não foi possível identifi-car a tipologia, pelo facto das descrições seremduvidosas (Figura 8). A nível regional, a dis-tribuição dos movimentos de vertente em fun-ção da sua tipologia demonstra um padrãoespacial irregular.

5. Conclusões

Neste momento a base de dados de movi-mentos de vertente está em condições de nosfornecer uma visão espacial e temporal da dis-tribuição dos movimentos de vertente noNorte de Portugal, entre 1900 e 2007. Con-tudo, só estão registadas as ocorrências queprovocaram maiores danos nas populaçõese/ou perturbações nas actividades económicase serviços de transportes. Por esse motivo, éextremamente importante consultar fontes devários tipos e comparar as descrições de even-tos com os dados meteorológicos. Na reali-dade poderão ter ocorrido mais eventos quenão foram divulgados na imprensa.

Devemos ter consciência que o ambientemodelado é extremamente complexo e apre-senta algumas dificuldades práticas para o seupreenchimento, pela dispersão dos dados emvárias fontes, formatos e níveis de qualidade.Além disso, as ocorrências dizem respeito adiferentes unidades territoriais.

A maior dificuldade neste trabalho foiadquirir informação cartográfica de qualidade,uma vez que grande parte dos dados precisoude um pré-processamento (correcção topoló-gica, conversão de sistemas de projecção e deformatos de dados).

Neste momento a base de dados é umimportante instrumento de planeamento e ges-tão do território e de apoio às decisões da pro-tecção civil, pelas várias potencialidades quepossui:

– relacionar o tipo de movimentos de ver-tente com os seus factores condicionan-tes (litologia, fracturação, morfologia,ocupação do solo) e avaliar a importân-cia relativa de cada factor para a ponde-ração da susceptibilidade;

– identificar a distribuição espacial e tem-poral da tipologia, distribuição da activi-dade, actividade, estilo, material movi-

Figura 6 – Distribuição temporal dos movimentos de vertente no Norte de Portugal (1900-2007)

Figura 7 – Distribuição sazonal dos movimentos de vertente no Norte de Portugal (1900-2007)

Figura 8 – Tipos de movimentos de vertente no Norte de Portugal (1900-2007)

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PPPPEEEERRRRIIIIGGGGOOOOSSSS NNNNAAAATTTTUUUURRRRAAAAIIIISSSS ,,,, TTTTEEEECCCCNNNNOOOOLLLLÓÓÓÓGGGGIIIICCCCOOOOSSSS EEEE AAAAMMMMBBBBIIIIEEEENNNNTTTTAAAAIIIISSSS NNNNAAAA RRRREEEEGGGGIIIIÃÃÃÃOOOO DDDDOOOO OOOOEEEESSSSTTTTEEEE

EEEE VVVVAAAALLLLEEEE DDDDOOOO TTTTEEEEJJJJOOOO

José Luís Zêzere; Catarina Ramos; Eusébio Reis; Ricardo Garcia; Sérgio Oliveira*

Inforgeo, 2007/2008, 37-49

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1. Introdução

O sistema de prevenção e gestão dos riscosconstitui um dos três vectores do modelo territo-rial português preconizado no Programa Nacio-nal de Políticas de Ordenamento do Território(PNPOT, Lei n.º 58/2007, de 4 de Setembro).Com efeito, o PNPOT considera que a gestãopreventiva dos riscos constitui uma prioridadede primeira linha da política de ordenamento doterritório, representando uma condicionante fun-damental da organização das demais componen-tes do modelo e um elemento que deverá cons-tar, obrigatoriamente, nos instrumentos de ges-tão territorial de nível regional e municipal.

No quadro da Lei de Bases da Política deOrdenamento do Território e de Urbanismo(Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto com as altera-ções definidas pela Lei n.º 54/2007 de 31 deAgosto) e do Regime Jurídico dos Instrumen-tos de Gestão Territorial (Decreto-Lei n.º316/2007 de 19 de Setembro), os PlanosRegionais de Ordenamento do Território

(PROT) ocupam, entre o nível nacional e onível municipal, uma posição-chave para adefinição das estratégias e das opções dedesenvolvimento e de ordenamento dos espa-ços regionais. Neste contexto, a gestão pre-ventiva dos perigos e dos riscos representa uminstrumento fundamental de integração dasactividades humanas no território, garantindoa sua correcta utilização como recurso e salva-guardando a segurança de pessoas e de bens.

Neste trabalho apresentam-se as metodolo-gias e os resultados obtidos na avaliação dosperigos naturais, tecnológicos e ambientaiscom incidência no território do Oeste e do Valedo Tejo (OVT), correspondente às NUTS IIIdo Oeste, da Lezíria do Tejo e do Médio Tejo.A área de estudo abrange 33 concelhos e temuma população de cerca de 800 mil habitantes,que se distribuem de forma desigual numasuperfície total de 8 792 km2.

2. Aspectos gerais da Perigosidade Regional

O território abrangido pelo PROT-OVTencontra-se exposto a um leque variado de

* Centro de Estudos Geográficos, Universidadede Lisboa.

mentado, intervenção antrópica e danosdos movimentos de vertente;

– constatar o tipo de danos principais decada tipologia de movimentos de ver-tente e as suas consequências na popula-ção, infra-estruturas e funções;

– estudar os dados da precipitação dasestações meteorológicas localizadas maispróximo dos movimentos de vertente;

– determinar limiares críticos de precipita-ção para o desencadeamento de movi-mentos de vertente e avaliar a sua utili-zação pela protecção civil;

– a georreferenciação das ocorrência permiteainda a validação da cartografia da suscep-tibilidade geomorfológica a movimentosde vertente proposta no PROT Norte.

Actualmente ainda há uma fraca consciên-cia da importância do registo sistemático des-tas informações e do seu armazenamentonuma base de dados uniformizada. Só assim éque no futuro se poderão tirar conclusões váli-das sobre os riscos naturais em Portugal e criarestruturas de previsão mais eficazes.

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perigos, que inclui: (i) Perigos naturais, quecorrespondem a ocorrências associadas ao fun-cionamento dos sistemas naturais (e.g., sismos,maremotos, movimentos de massa, erosão dolitoral, cheias e inundações); (ii) Perigos tec-nológicos, que potenciam acidentes, frequente-mente súbitos e não planeados, decorrentes daactividade humana (e.g., potencial de acidentesindustriais graves, potencial de acidentes notransporte de substâncias perigosas); e (iii)Perigos ambientais, em que se combinam osresultados de acções continuadas da actividadehumana com o funcionamento dos sistemasnaturais (e.g., incêndios florestais).

Como é evidente, os oito tipos de perigosatrás referidos estão longe de esgotar as tipo-logias de fenómenos perigosos que podem serobservados no território do Oeste e Vale do Tejo.No entanto, os perigos considerados são os queapresentam maior relevância no quadro do Orde-namento do Território Regional e, em particu-lar, para o propósito de Planeamento Urbano.

No presente trabalho não são consideradosfenómenos naturais directamente ou exclusi-vamente relacionados com causas meteoroló-gicas, por se entender que a correcta gestãodos perigos e riscos associados não encontra aresposta mais adequada no quadro dos instru-mentos de ordenamento do território. Encon-tram-se neste caso as ocorrências de vagas defrio e de ondas de calor que, representandoinquestionavelmente ameaças sérias para avida das pessoas, são mais eficazmente acau-teladas no quadro do Planeamento de Emer-gência, do que no contexto das políticas doordenamento do território. De igual modo, nãosão considerados fenómenos como a geada oua queda de granizo, que deverão ser contem-plados no âmbito das políticas sectoriais dedi-cadas à agricultura e aos seguros agrícolas.

Por razões diferentes, o trabalho agoraapresentado não considera os fenómenos decontaminação de cursos de água e aquíferos.Embora seja evidente a relevância destestemas no quadro do Ordenamento do Territó-

rio, eles extravasaram as responsabilidades daequipa responsável pelos Riscos e ProtecçãoCivil, no quadro da realização do PROT-OVT.

3. Avaliação dos perigos naturais, tecnológicos e ambientais: metodologia e resultados

3.1. Sismos

A distribuição espacial das isossistas deintensidades máximas, com base na sismici-dade histórica, mostra que a região OVT sesitua nas zonas de intensidade IX a VIII, ouseja, uma das mais elevadas do territórionacional. Este facto é devido, não só à proxi-midade de estruturas activas submarinas quemarginam o território continental português aSW e a S, que têm o potencial de gerar os sis-mos máximos regionais (Grácia et al., 2003),mas também, à falha (ou zona de falhas) dovale inferior do Tejo, a qual se localiza na sub--região da Lezíria (Carvalho et al., 2006).

A Figura 1 representa a susceptibilidadesísmica na Região Oeste e Vale do Tejo, ava-liada numa primeira fase, pelo cruzamento dacarta de isossistas de intensidades sísmicasmáximas (Fonte: Instituto de Meteorologia)com a carta da distribuição das PGA (PeakGround Acceleration) para um período deretorno de 475 anos (Montilla e Casado, 2002).Neste contexto, as classes de susceptibilidadesísmica foram determinadas do seguinte modo,para o estabelecimento da situação de referên-cia: (i) susceptibilidade elevada – IntersecçãoIntensidade sísmica [IX] com PGA [3.2 – 4.0m/s2]; (ii) susceptibilidade moderada – Inter-secção Intensidade sísmica [IX] com PGA [2.4– 3.2 m/s2]; Intersecção Intensidade sísmica[VIII] com PGA [3.2 – 4.0 m/s2]; e (iii) perigo-sidade baixa – Intersecção Intensidade sísmica[VIII] com PGA [< 3.2 m/s2].

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Riscos e ambiente

Figura 1 – Susceptibilidade Sísmica na região Oeste e Vale do Tejo

Figura 2 – Susceptibilidade à inundação por tsunami na região Oeste

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Riscos e ambiente

Os efeitos de sítio produzem a amplificaçãoda susceptibilidade sísmica e foram definidosdo seguinte modo: (i) distribuição de forma-ções geológicas sedimentares superficiais comalgum grau de consolidação (e.g., depósitos deterraço e cascalheiras, diatomitos e linhitos),incremento de uma classe de susceptibilidade,relativamente à situação de referência; (ii) dis-tribuição de formações geológicas sedimenta-res superficiais não consolidadas (e.g., alu-viões, areias de duna e de praia), incremento deduas classes de susceptibilidade, relativamenteà situação de referência; (iii) faixa de 100metros relativamente às falhas activas, extraí-das da Carta Neotectónica de Portugal, incre-mento de uma classe de susceptibilidade, rela-tivamente à situação de referência.

3.2. Tsunamis

A geração de maremotos (tsunamis), asso-ciados não só a eventos sísmicos com epicentrono mar mas também a movimentos de vertentee erupções vulcânicas submarinas, pode terconsequências devastadoras nas áreas costeiras.Os principais focos potenciais geradores demaremotos correspondem a três zonas sísmicasregionais: Banco de Gorringe, a SW de Portu-gal Continental; estruturas tectónicas activas,de direcção N-S, na margem continental entreSetúbal e o Cabo de S. Vicente; e terminaçãooriental da falha Açores-Gibraltar, a sul doAlgarve. Considerando a simulação modelísticado maremoto gerado pelo sismo de 1755 (Bap-tista et al., 2003), o qual atingiu a magnitude de8,5, só igualada, de acordo com os registos his-tóricos, pelo sismo de 63 A.C., a faixa costeirada região OVT mais susceptível à ocorrência demaremotos corresponde a todo o litoral a sul dotômbolo de Peniche, particularmente nos troçosde costa baixa arenosa.

A Figura 2 representa o zonamento da sus-ceptibilidade de inundação costeira por tsu-nami, efectuado com base em critérios de aná-

lise geomorfológica, que tiveram em conside-ração: (i) tipo de litoral (e.g., arenoso, arriba,arriba com praia no sopé); (ii) a geometria dalinha de costa e sua relação com a direcçãoexpectável de propagação das ondas (SW);(iii) a altimetria da faixa litoral e a sua relaçãocom a altura das ondas de tsunami descritasem registos históricos (e.g., Baptista et al.,2003); e (iv) a presença e disposição de obstá-culos que canalizem o fluxo de inundação.

Da Figura 2 ressalta que a susceptibilidadede inundação por maremoto se estende à tota-lidade do litoral da região Oeste, sendo parti-cularmente relevante na Nazaré, Paul da Cela,S. Martinho do Porto, Lagoa de Óbidos, Peni-che, Atouguia da Baleia, Areia Branca, Foz doAlcabrichel e Foz do Sizandro.

3.3. Movimentos de massa em vertentes

As tipologias de movimentos de massa emvertentes, bem como os respectivos factorescondicionantes, são distintos nas três unidadesmorfoestruturais de Portugal Continental, queestão presentes na região OVT (Zêzere et al.,2007): Maciço Antigo, Orla Mesocenozóica, eBacia Cenozóica do Tejo e Sado.

Os terrenos do Maciço Antigo afloram nasub-região do Médio Tejo e são constituídosessencialmente por metassedimentos. No casodas vertentes talhadas em xisto, as múltiplasdescontinuidades presentes nestas rochas(estratificação, xistosidade e planos de frac-tura) favorecem movimentos de deslizamentoplanar, mesmo em vertentes com declivesmoderados. Quando o declive da vertente éforte, o movimento inicial de deslizamentopode evoluir rapidamente para escoada lama-centa ou de detritos, caracterizada por veloci-dades bastante elevadas e um grande poderdestrutivo (Zêzere et al., 2007).

Os terrenos da Orla Mesocenozóica Oci-dental ocupam toda a sub-região do Oeste, aparte oeste da sub-região do Médio Tejo e o

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extremo NW da sub-região da Lezíria. Nestaunidade, os movimentos de massa são contro-lados fundamentalmente pela litologia, estru-tura geológica e condições hidrogeológicas,enquanto o declive é um factor secundário.Neste contexto, destacam-se três unidadeslitológicas mais susceptíveis à instabilidadedas vertentes: (i) sequências de margas, argi-las, areias e arenitos do Cretácico superior; (ii)sequências de calcários e margas do Cretácicomédio; (iii) sequências margo-calcárias doJurássico superior.

Os terrenos da Bacia Cenozóica do Tejo eSado são os que ocupam maior área dentro daregião OVT. Nestes terrenos, os movimentosde massa têm uma distribuição relativamentecircunscrita, condicionada simultaneamentepelo declive e pela litologia. Identifica-se umaunidade litológica particularmente susceptível:os complexos greso-argilosos do Miocénicoinferior e médio da região de Santarém, osquais são bastante susceptíveis a deslizamen-tos superficiais e profundos, que afectam prin-cipalmente perfis de alteração, depósitos colu-viais e depósitos de antigos movimentos demassa. Na parte superior das vertentes, ondeafloram calcários do Miocénico superior eonde o declive é mais forte, têm origem movi-mentos de desabamento e tombamento.

Os movimentos de vertente ocorridos numpassado recente na região OVT foram maiorita-riamente desencadeados pela precipitação. Aschuvas intensas e concentradas desencadeiamdeslizamentos superficiais, frequentementecom evolução para escoada, e movimentosassociados ao trabalho de sapa dos cursos deágua. As chuvas abundantes e prolongadas notempo têm sido responsáveis pelo desencadea-mento de deslizamentos rotacionais, translacio-nais e movimentos complexos com planos deruptura mais profundos (Zêzere et al., 2007).

A avaliação da susceptibilidade a movi-mentos de massa em vertentes foi efectuadacom uma abordagem indirecta, a partir do cru-zamento dos dois principais factores condicio-

nantes da instabilidade das vertentes: litologiae declive (Figura 3).

A litologia foi obtida a partir do mapa geo-lógico, com agregação em oito grandes con-juntos litológicos espacialmente relevantes noOVT: depósitos superficiais, rochas carbona-tadas compactas, rochas sedimentares detríti-cas (grés, conglomerados), rochas sedimenta-res plásticas (margas, argilas), rochas graníti-cas e afins, rochas quartzíticas e afins, rochasxistentas, e rochas vulcânicas. Os declivesforam obtidos a partir do modelo numérico deelevação (MNE) construído a partir da altime-tria (curvas de nível com equidistância de10m) na escala de 1:25 000.

Para cada unidade litológica foi definido olimiar crítico de declive (em graus), acima doqual é expectável a ocorrência de fenómenosde instabilidade. Estes limiares são suportadospor bibliografia de referência especializada eforam estabelecidos com base no conheci-mento empírico da instabilidade das vertentesda região (Quadro 1).

A susceptibilidade à ocorrência de movi-mentos de massa em vertentes tem maior inci-dência em 7,5 % do território total do OVT(Figura 3), sendo particularmente importantenas regiões do Oeste e do Médio Tejo. Osmovimentos de massa afectam terrenos culti-vados levando à perda de produções agrícolas,originam cortes nas vias de comunicação, das

Quadro 1 – Limiares de declive críticos para a instabilidade das vertentes, em funçãodos tipos litológicos presentes na região OVT

Litologia Declive crítico (graus)

Depósitos superficiais 10

Rochas carbonatadas compactas 25

Rochas sedimentares detríticas (grés, conglomerados) 15

Rochas sedimentares plásticas (margas, argilas) 10

Rochas graníticas e afins 25

Rochas quartzíticas e afins 25

Rochas xistentas 15

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quais se destacam as rodoviárias, e danificamgravemente habitações e vários tipos de infra-estruturas.

3.4. Erosão do litoral

O litoral da região OVT é essencialmenterochoso, dominado por arribas talhadas em cal-cários, margas e arenitos da Orla Mesoceno-zóica Ocidental, muito artificializado e ocu-pado, onde existem algumas praias depaupera-das em sedimentos (Andrade et al., in Santos eMiranda, 2006). Os troços de litoral submetidosa erosão marinha mais intensa correspondem àsáreas de costa baixa arenosa; todavia, os siste-mas costeiros de arriba e de praia-arriba, sendo,à partida, menos susceptíveis à erosão marinhaque os anteriores (sistemas de praia ou de praia--duna), podem apresentar uma susceptibilidadede erosão elevada, dependendo da natureza e dadisposição estrutural dos materiais em que aarriba é talhada. Estas arribas podem estar sujei-tas a movimentos de vertente de tipo desaba-mento e deslizamento, como acontece emvários troços do litoral da região OVT.

A avaliação da susceptibilidade à erosãolitoral (Figura 4) foi precedida pela definiçãodos tipos de litoral presentes no Oeste e queincluem: (i) litoral arenoso (sistemas praia –duna e praia – planície aluvial); (ii) arriba mer-gulhante ou com plataforma rochosa de sopé(arriba 1); (iii) arriba com praia estreita nosopé (arriba 2); e (iv) litoral artificializado.

A susceptibilidade à erosão nos diferentestroços de litoral foi classificada como elevadaou moderada, tomando em consideração osseguintes aspectos: (i) caracterização dos tro-ços costeiros constante no POOC de Alcobaça– Mafra; (ii) caracterização da dinâmica geo-morfológica descrita na bibliografia científicadisponível (e.g., Marques, 1997; Neves,2004); (iii) tipos de litologia e respectiva resis-tência mecânica; (iv) pendor das formaçõesgeológicas e correspondente relação geomé-

trica relativamente à disposição da linha decosta; e (v) presença de pontos críticos, identi-ficados pelo INAG e por interpretação de foto-grafias aéreas e de ortofotomapas.

Da observação da Figura 4 resulta evidenteque o litoral da região OVT apresenta umasusceptibilidade à erosão média a elevada.

3.5. Cheias e inundações

Na região do OVT, as cheias podem serdesencadeadas por: (i) períodos chuvosos quese prolongam por várias semanas, diminuindodrasticamente o efeito regularizador das barra-gens, que podem potenciar picos de cheia comas respectivas descargas; (ii) episódios de preci-pitação muito intensa e concentrada em algumashoras; e (iii) ruptura de barragens, associadaou não a situações meteorológicas adversas.

No primeiro caso, as cheias são do tipoprogressivo e afectam essencialmente o rioTejo e os grandes afluentes da sua bacia hidro-gráfica, como o rio Zêzere, o rio Nabão, ou orio Sorraia. Durante as cheias de maior magni-tude, o Rio Tejo invade os fundos de vale dosseus afluentes originando o fenómeno das«cheias de jusante»; a inundação daí resultanteé a maior em todo o território nacional (áreasubmersa superior a 800 km2). Contudo, comosão cheias progressivas, permitem accionar,em devido tempo, os sistemas de alerta, possi-bilitando à população salvaguardar os seusbens e diminuir o grau de risco (Ramos e Reis,2001). As cheias do Tejo afectam as sub--regiões do Médio Tejo e, principalmente, daLezíria. Originam cortes de diversas estradasnacionais e municipais, interrupção da circula-ção ferroviária, alagamento de campos agríco-las e isolamento de populações. No entanto, acheia do Tejo é um fenómeno conhecido daspopulações ribeirinhas, que desenvolveramestratégias de adaptação bem conseguidas àsinundações de baixa e média magnitude.

No segundo caso, ocorrem cheias rápidas,

Figura 3 – Susceptibilidade aos movimentos de massa em vertentes na região Oeste e Vale do Tejo

Figura 4 – Tipos de litoral e susceptibilidade à erosão costeira na sub-região Oeste.

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as quais afectam pequenas bacias hidrográficasde reduzido tempo de concentração, que podemser mortíferas, especialmente nas áreas densa-mente urbanizadas e com ocupação indevidados leitos de inundação (Ramos e Reis, 2001).Este tipo de cheia pode interromper períodossecos, sendo de difícil previsão e, como aparecede forma repentina, torna muito difícil o accio-namento de sistemas de alerta, pelo que é parti-cularmente importante o correcto ordenamentodas áreas ribeirinhas no sentido de minimizar ograu de risco a elas associado. As cheias rápidasafectam essencialmente as Ribeiras do Oeste(e.g., rios Sizandro, Tornada, Baça e Alcoa) epequenos afluentes da margem direita do Tejo(e.g., rio de Alenquer).

No terceiro caso, a ruptura de uma barra-gem, seja por colapso estrutural ou por cedên-cia das fundações, induz uma onda de inunda-ção a jusante que pode provocar vítimashumanas e causar elevados prejuízos mate-riais. Na bacia do rio Tejo, em território portu-guês, existem 27 barragens com capacidadeútil superior a 1.000.000 m3, enquanto que noOeste apenas duas barragens (Óbidos e S.Domingos) atingem essa capacidade. No terri-tório do OVT a situação com maior potencialde risco corresponde à barragem de Castelo doBode, cuja capacidade de armazenamentoascende a 900.500.000 m3. No vale do Tejo, abarragem de Belver, com uma capacidade dearmazenamento de 8.500.000 m3 localiza-seimediatamente a montante (cerca de 1 km) dolimite do concelho de Abrantes. Por seu turno,o vale do Sorraia está particularmente expostoao perigo de rotura das barragens de Montargil(ribeira de Sôr; capacidade de armazenamentode 142.700.000 m3) e de Maranhão (ribeira deSeda; capacidade de armazenamento de180.900.000 m3).

A Figura 5 representa a susceptibilidade àocorrência de cheias e de inundações na regiãodo OVT. A delimitação das áreas inundáveisteve em consideração: (i) informação de basedigital do INAG e do LNEC, revista na escala

1:25 000; (ii) informação constante nos Planosde Bacia Hidrográfica do Tejo e das Ribeirasdo Oeste; e (iii) a análise geomorfológica dosfundos de vale, nomeadamente a individuali-zação de planícies aluviais, a partir da explo-ração da altimetria e topografia na escala de1:25 000. Adicionalmente, foram consideradosa extensão da inundação ocorrida no vale doTejo e seus principais afluentes em 1979, e aanálise da rede hidrográfica com consideraçãoda hierarquia fluvial, respectivamente, para adelimitação das áreas inundáveis em situaçãode cheia lenta e para a definição de troços crí-ticos em situação de cheia rápida. Deste modo,foram identificados 745 km2 de área inundávele 1010 km de troços fluviais sujeitos a cheiasrápidas no território do OVT (Figura 5). Oimpacto territorial das cheias e inundações éconfirmado pela inventariação de 450 pontoscríticos, correspondentes a áreas edificadas emrisco de inundação.

3.6. Potencial de acidentes industriaise no transporte de substânciasperigosas

Os estabelecimentos industriais que apre-sentam potencial de risco envolvendo uma oumais substâncias perigosas estão obrigados aodever de notificação e à apresentação de umRelatório de Segurança (Decreto-Lei n.º254/2007, de 12 de Julho, que transpõe para alegislação portuguesa as «Directivas Seveso»).Na região OVT foram identificados nove esta-belecimentos que reúnem estas condições, des-tacando-se os relacionados com produtos quí-micos e combustíveis. Os concelhos de Azam-buja e Cartaxo são os que apresentam maiorexposição ao tipo de perigo considerado.

A região do OVT é atravessada por duasinfra-estruturas fixas de transporte de substân-cias perigosas: o oleoduto que liga a Refinariade Sines ao Parque de Aveiras, localizado emAveiras de Cima; e o gasoduto em alta pres-

Figura 5 – Susceptibilidade à ocorrência de cheias e de inundações na região Oeste e Vale do Tejo

Figura 6 – Susceptibilidade a incêndios florestais na região Oeste e Vale do Tejo

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são, ao longo do qual se processa o transportede gás natural em estado gasoso. Os municí-pios de Azambuja e Benavente têm áreaspotencialmente afectadas por um acidente noOleoduto, enquanto os eventuais incidentes nogasoduto poderão afectar 13 municípios(Benavente, Azambuja, Arruda dos Vinhos,Alenquer, Torres Vedras, Rio Maior, Cha-musca, Constância, Vila Nova da Barquinha,Abrantes, Tomar, Alcobaça e Ourém).

3.7. Incêndios florestais

Os incêndios florestais ocorrem todos osanos e constituem o maior risco para as flores-tas do OVT, com graves consequências ambien-tais e socioeconómicas. Fustigam o territórioespecialmente no Verão mas, como se verifi-cou por exemplo em 2004-2005, podem ocor-rer em qualquer época do ano desde que esteseja seco.

A Figura 6 representa a susceptibilidade àocorrência de incêndio florestal na região doOVT. A situação de referência corresponde àcarta produzida pela Direcção Geral de Recur-sos Florestais (DGRF, actual Autoridade Flo-restal Nacional), que incorpora na respectivaconcepção os incêndios florestais ocorridos até2003 (inclusive). Esta carta considera para oterritório do OVT as seguintes 4 classes de sus-ceptibilidade: muito baixa, baixa, moderada eelevada. Numa segunda fase, foram incorpora-dos os efeitos da presença de povoamentos flo-restais, entendidos como núcleos críticos, apartir da carta dos Padrões de Ocupação doSolo que integra o PROT-OVT. A carta final dasusceptibilidade aos incêndios florestal resultada sobreposição dos núcleos críticos à carta daDGRF, assumindo-se que a presença de povoa-mentos florestais justifica o incremento de umaclasse de susceptibilidade relativamente àsituação de referência.

A área de susceptibilidade muito elevada eelevada abrange cerca de 33% do território do

OVT, concentrando-se, dominantemente, nosector NE da região e ao longo do alinhamentoMontejunto – Maciço Calcário Estremenho(Figura 6).

4. Conclusão

A Carta de Susceptibilidade da Região doOeste e Vale do Tejo está representada naFigura 7, tendo resultado de um processo deintegração cartográfica dos sete temas consi-derados, que maximiza a susceptibilidade ele-vada e moderada. Da análise deste mapa «mul-tiperigo» resulta evidente que a região doOVT se encontra exposta a um leque muitoamplo de perigos, que apresentam uma distintaincidência territorial.

O Quadro 2 representa a susceptibilidadede cada um dos 33 concelhos que constituem aRegião do OVT, relativamente a cada perigoabordado, obtida a partir da tabulação das áreassusceptíveis presentes nos mapas monotemáti-cos com a base territorial concelhia. A Figura 8resulta da reclassificação dos dados, depois deatribuir os pesos 3, 2 e 1 à susceptibilidade ele-vada, moderada e baixa, respectivamente. ACarta da susceptibilidade concelhia multirriscotem que ser analisada com bastante prudência,visto que ela, implicitamente, assume igualimportância para o conjunto dos perigos consi-derados. Sendo certo que os fenómenos natu-rais, ambientais e tecnológicos avaliados têmum potencial para gerar danos, económicose/ou sociais, marcadamente desigual, a com-plexidade das suas relações de magnitude/fre-quência não facilita a elaboração da hierarquiados perigos, o que, de resto, não constituiu umobjectivo deste trabalho.

Tendo presente a ressalva atrás referida, adistribuição da susceptibilidade multirriscocoloca em evidência 3 conjuntos territoriaismarcados por uma susceptibilidade mais ele-vada: (i) o conjunto de concelhos do litoralque inclui Alcobaça, Nazaré, Caldas da Rai-

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Figura 8 – Carta de susceptibilidade concelhia multirrisco da região Oeste e Vale do Tejo

Figura 7 – Carta de susceptibilidades da região Oeste e Vale do Tejo nha, Óbidos, Peniche e Torres Vedras, maissusceptíveis à erosão litoral, movimentos demassa, cheias rápidas e inundação em caso detsunami; (ii) o conjunto Benavente, Azambujae Alenquer, sujeito, especialmente, aos perigossísmico, tecnológico e de cheia progressiva; e(iii) o conjunto Constância, Vila Nova da Bar-quinha e Abrantes, mais susceptível aos peri-gos de ruptura de barragem, cheia rápida eincêndio florestal.

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DDDDEEEETTTTEEEERRRRMMMMIIIINNNNAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO DDDDAAAASSSS VVVVUUUULLLLNNNNEEEERRRRAAAABBBBIIIILLLLIIIIDDDDAAAADDDDEEEESSSS HHHHUUUUMMMMAAAANNNNAAAASSSS

EEEEMMMM SSSSIIIITTTTUUUUAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO DDDDEEEE RRRRIIIISSSSCCCCOOOO SSSSÍÍÍÍSSSSMMMMIIIICCCCOOOO EEEE TTTTSSSSUUUUNNNNAAAAMMMMIIIISSSS .... OOOO CCCCAAAASSSSOOOO DDDDOOOO AAAALLLLGGGGAAAARRRRVVVVEEEE1111

Jorge Gaspar; José Fernandes Rodriguez; Margarida Queirós; EduardoBrito Henriques; Pedro Palma; Teresa Vaz2

Inforgeo, 2007/2008, 51-66

1. Introdução

O Algarve apresenta uma perigosidade sís-mica elevada pela sua localização no encontrodas placas euro-asiática e africana. Este facto,juntamente com a crescente concentração popu-lacional e os elevados fluxos turísticos que ocaracterizam, justifica a necessidade de apro-fundar o conhecimento sobre as vulnerabilida-des sísmicas, de forma a poderem estimar-se osdanos directos e indirectos a elas associadas eassim poder dispor de instrumentos de minimi-zação dos riscos, através de intervenções antese após a ocorrência de sismo ou tsunami.

Tendo como preocupação a segurança daspopulações e a eficiência do sistema de protec-ção civil, a Autoridade Nacional de ProtecçãoCivil (ANPC), em parceria com diversas insti-tuições universitárias3, deu início ao Estudo doRisco Sismico e de Tsunamis do Algarve(ERSTA), um suporte para a elaboração de pla-nos especiais de emergência. No âmbito desteestudo, o Centro de Estudos Geográficos(CEG)4/Faculdade de Letras da Universidade

1 Em 2006 a ANPC celebrou um Protocolo coma Faculdade de Letras/Centro de Estudos Geográficosda Universidade de Lisboa para o estudo das vulne-rabilidades humanas no âmbito de um projecto alar-gado designado Estudo do Risco Sísmico e de Tsuna-mis do Algarve(ERSTA). O coordenador da equipade investigadores do CEG/FLUL é o Prof. Jorge Gaspar. Para mais informações: http://www.ceg.ul.pt/projectos.asp?id=98.

2 Centro de Estudos Geográficos. Faculdade deLetras da Universidade de Lisboa. Alameda da Uni-versidade. 1600-214 Lisboa. Tel.+ 351 217940218.

3 Universidade de Lisboa, Instituto de Meteorolo-gia, Instituto Nacional de Engenharia, Tecnologia e Ino-vação, Universidade do Algarve, Instituto de Ciênciasda Terra e do Espaço, Faculdade de Letras do Porto,Escola Superior de Tecnologia, Laboratório Nacionalde Engenharia Civil, Instituto Superior Técnico.

4 Este estudo aprofunda a metodologia já apli-cada, em 1999-2001, no estudo de Risco Sísmicoefectuado para Área Metropolitana de Lisboa, tam-bém coordenado pelo Prof. Jorge Gaspar, no âmbitodas actividades de investigação do CEG (1999/01:CEG: Estudo Caracterização e Estudos de Vulnera-bilidades para o Planeamento de Emergência sobre oRisco Sísmico na Área Metropolitana de Lisboa e nosMunicípios de Benavente, Salvaterra de Magos, Car-taxo, Alenquer, Sobral de Monte Agraço, Arruda dosVinhos e Torres Vedras, promovido pelo Serviço

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de Lisboa (FLUL) ficou responsável peladeterminação da vulnerabilidade humana. Avulnerabilidade humana é um conceito vitalpara entender o impacto e a magnitude dascatástrofes e corresponde ao potencial grau deperda de população perante um determinadoevento perigoso (Veyret, 2007; Zêzere, 2007).O conhecimento da natureza e dimensão davulnerabilidade humana e sua variação espa-cial e temporal é pois essencial à actividade deplaneamento.

No âmbito do estudo desenvolvido para oAlgarve, a determinação quantitativa da vul-nerabilidade humana corresponde ao cálculoda População Presente, residente e turista, porconcelho e intervalo de tempo, que se encon-tra actualmente em fase de conclusão.

Divulgar a metodologia desenvolvida ealguns resultados preliminares do ERSTA é oque neste texto se procura dar conta. Organi-zado em seis pontos, nos quais se apresenta ocontexto, a metodologia e alguns dos resulta-dos, o artigo procura informar todos aquelesque se interessam pela aplicação de métodosquantitativos para estimar a população pre-sente (por intervalo de tempo, período do anoe unidade espacial) e utilização desta informa-ção no desenvolvimento de um planeamentopreventivo e proactivo.

2. Os elementos humanos vulneráveis: pertinência do estudo

O território continental Português apresentadiferentes níveis de intensidade sísmica que,regra geral, aumenta de Norte para Sul pelaaproximação relativa à falha Açores-Gibraltar,que estabelece a fronteira entre as placas euro--asiática e africana e que constitui a principalfonte de tensão que influencia a sismicidade noterritório (Senos e Carrilho, 2003).

Segundo registos históricos (1719, 1722,1755 e 1969), o Algarve surge como a regiãodo país onde ocorrem mais sismos, sendo estestambém de maior intensidade. Esta sismici-dade histórica reforça a ideia de «perigosi-dade» a que o território nacional se encontrasujeito, em particular a faixa litoral do Algarvee a costa atlântica do Sul do país.

Com uma população residente de aproxi-madamente 420 mil habitantes, o Algarvepode, em determinados períodos do ano, apre-sentar valores de população presente superio-res a 1.400.000 indivíduos (MAOT, 2000;ARS, 2004). Trata-se de uma região marcadapor importantes fluxos populacionais sazo-nais, quer nacionais quer internacionais,sobretudo associados ao turismo sol e praia.Acresce que o Algarve foi, nos últimos anos, aRegião portuguesa que registou um maiorcrescimento da população residente (23,5%entre 1991 e 2006).

Para além dos referidos contrastes tempo-rais, a repartição espacial da população resi-dente é também muito contrastada, existindofreguesias com uma densidade na ordem dos2 hab/km2 no interior e no litoral Sudoeste, de1756 hab/km2 em determinadas zonas costei-ras (Figura 1). É precisamente nestas áreas quese localizam as grandes concentrações popula-cionais, com principal incidência na faixacompreendida entre Faro e Lagos (onde sedestaca igualmente a capacidade de aloja-

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Nacional de Protecção Civil). Jorge Gaspar fez parteda equipa que produziu o primeiro estudo e plano deminimização de risco sísmico para a cidade de Lis-boa, levado a cabo pelo SNPC; neste âmbito coorde-nou uma equipa que teve a seu cargo a componentedemográfica e migratória, parque habitacional e edi-fícios e funções com maior risco potencial em casode catástrofe sísmica, além dos relatórios e do plano,publicados. A este propósito ver: GASPAR, J.; COR-REIA, F.; MARIN, A. (1984), Lisboa: Espaço/Tempo.In III Colóquio Ibérico de Geografia – Acta, Ponen-cias y Comunicaciones, Barcelona, Universitat deBarcelona, pp. 314-321; GASPAR, J; OLIVEIRA, C.S.; MENDES VICTOR L. A.; SILVEIRA, G. (1988),Seismic Impact of Future Earthquakes in the Town ofLisbon: an Example of Application. In Proceedings9th WCEE, Tóquio.

Figura 1 – Densidade populacional, 2001

Figura 2 – Capacidade de alojamento hoteleiro turístico, 2007

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A referida concentração também se veri-fica em relação aos turistas nacionais. Em2006, de acordo com a DGT (2007), do totalde indivíduos que gozaram férias fora da suaresidência habitual, 75% fizeram-nas em Por-tugal e destes, 36,5% escolheram como des-tino principal a Região do Algarve.

A elevada procura turística existente noAlgarve explica porque é tão crítico estimar apopulação total presente, ao contrário, porexemplo, da Área Metropolitana de Lisboa,em que a dimensão mais crítica se associa àmobilidade quotidiana da população residente.

4. Metodologia

Os trabalhos que conduziram ao cálculo dasvulnerabilidades humanas foram estruturadosem duas fases. Na primeira, efectuou-se o levan-tamento dos elementos humanos vulneráveistendo por base uma recolha de informação esta-tística. O cálculo da população presente (porintervalo de tempo, período do ano e unidadeespacial) correspondeu à segunda fase da inves-tigação que foi estabelecido a partir dos padrõesde mobilidade crono-espacial da população resi-dente e turistas ao longo do ano, semana e dia.

4.1. Recolha de informação

No levantamento e caracterização dos ele-mentos vulneráveis procedeu-se à caracteriza-ção demográfica, do povoamento, da distribui-ção geográfica da população activa e doemprego, bem como à localização dos estabe-lecimentos comerciais, industriais, hoteleiros,cinemas, parques temáticos, bares, discotecase pubs, hospitais e estabelecimentos de ensino.

Para dar resposta aos objectivos da segundafase, e devido à lacuna de informação existenteem relação à mobilidade espacial no Algarve,procedeu-se a realização de inquéritos7 à popu-lação presente e ainda aos estabelecimentos

hoteleiros, de modo a obter dados que permitis-sem ajustar o comportamento da populaçãomóvel, na geração e distribuição das respectivasdeslocações no interior da Região ou de/parafora da Região. Estes dados permitiriam com-plementar a informação disponível no Recen-seamento Geral da População e Habitaçãode2001 (INE, 2002) sobre a mobilidade, segundoo local de trabalho ou de estudo, tempo gastonas deslocações para o local de trabalho ouestudo e principal meio de transporte utilizado.

No caso do Algarve, devido às suas carac-terísticas particulares relacionadas com a sazo-nalidade por motivo turístico, é fundamentalconsiderar vários períodos temporais por severificarem grandes diferenças comportamen-tais e quantitativas entre estes. É ainda neces-sário ajustar a procura potencial e as desloca-ções, por intervalo de tempo, da populaçãopresente – residente e turista –, no período emque se encontra na Região, entre as unidadesespaciais de análise consideradas, isto é, osconcelhos (e as freguesias). Para apoio à deter-minação da população presente conceberam--se e aplicaram-se dois tipos de inquéritos:

– Inquérito dirigido aos Gerentes dos Estabe-lecimentos Hoteleiros Classificados8, paraaferir o destino preferencial dos turistas eobservar a variação da procura dos estabe-lecimentos hoteleiros (Taxa de Ocupação),nas épocas alta e baixa.

– Inquérito, por amostragem, à PopulaçãoPresente no Algarve para aferir a mobili-

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7 O lançamento dos inquéritos foi efectuado emdois períodos distintos: em época alta (Julho e Agostode 2007) e em Janeiro e Fevereiro de 2008 (épocabaixa).

8 Através da Direcção Geral do Turismo (DGT) eda Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turís-ticos do Algarve (AHETA) foi possível obter umalista dos estabelecimentos hoteleiros. O inquérito foidirigido por e-mail e fax a aproximadamente 550 des-tes estabelecimentos do Algarve e obteve-se uma taxade resposta de 19%.

mento em estabelecimentos turísticos, commais de 90% da oferta). A Figura 2 evidenciaa desigualdade regional da distribuição dacapacidade de alojamento.

No cálculo da população presente noAlgarve deve ter-se presente que, em termosglobais, a referida oferta de alojamentos emhotéis e estabelecimentos turísticos classifica-dos pela Direcção Geral de Turismo (DGT) econsiderados pelo INE corresponde a umafracção limitada da oferta total. A Associaçãodos Hotéis e Empreendimentos Turísticos doAlgarve (AHETA), no seu mais recente relató-rio anual sobre a actividade turística refere-seque «o Algarve recebeu, em 2007, cerca de trêsmilhões de turistas estrangeiros e três milhõesde portugueses, dos quais dois milhões perma-neceram em casa própria, familiares ou ami-gos, enquanto cerca de 600 mil estrangeirosrecorreram igualmente a alojamentos alternati-vos para as suas férias» (AHETA, 2008: 28).

Se apenas forem considerados os aloja-mentos não classificados, se bem que não exis-tam dados estatísticos oficiais, o PROT doAlgarve (2007) refere valores entre as 320 mile as 500 mil camas e a AHETA um valor supe-rior a 330 mil camas.

De acordo com esta realidade, a estimativada população presente que se encontra numdeterminado local e momento (hora, dia,semana, mês…), é muitas vezes superior àpopulação residente, oficialmente conhecida.Como é evidente, o desenvolvimento do pla-neamento de emergência implica a identifica-ção da dimensão dessa diferença essencial,tanto para a prestação de um apoio rápido eeficiente, como para a mobilização eficaz dosrecursos em situação de emergência.

3. Mobilidade Turística e População Presente

De acordo com as normas internacionaisutilizadas nas Estatísticas do Turismo, publi-

cadas pelo INE, o «turista» corresponde a um«visitante»5 que permanece pelo menos umanoite num alojamento colectivo ou particularno lugar visitado. Pelo contrário, o «excursio-nista» é um indivíduo que não pernoita nolugar visitado. Por este motivo, e considerandoo dia (24h) como unidade de tempo de refe-rência, o ERSTA concentrou a sua atenção noconceito de turista, considerando-o de acordocom o tipo de alojamento6.

A importância do turismo na Região doAlgarve explica o elevado quantitativo depopulação presente não residente, nacional eestrangeira, nomeadamente nos concelhoscom mais equipamentos e serviços turísticos(CCDR ALG, 2007). Com efeito, de acordocom o INE, em Agosto de 2007, a Região rece-beu cerca de 690 mil hóspedes em estabeleci-mentos hoteleiros classificados e em Janeirode 2007, aproximadamente 184 mil (INE,Actividade Turística em Janeiro e Agosto,2007). De acordo com a ANA no mesmo ano,o Aeroporto Internacional de Faro registou 2,7milhões de passageiros desembarcados.

No que diz respeito aos alojamentos em esta-belecimentos hoteleiros, o Algarve é o destinocom maior capacidade de alojamento em camas(36,9% do total nacional, segundo as Estatísti-cas do Turismo, do INE, para 2006), represen-tando 37,7% das dormidas no país. Em relaçãoaos turistas residentes no estrangeiro, este valoré de 43% do respectivo total de dormidas.

5 Visitante – Indivíduo que se desloca a um lugardiferente da sua residência habitual, por uma duraçãoinferior a 365 dias, desde que o motivo principal daviagem não seja o de exercer uma actividade remu-nerada no lugar visitado (INE, 2007).

6 Turistas de acordo com o tipo de alojamento:PTC – População Não Residente (Turistas) em esta-belecimentos hoteleiros classificados; PTNC – Popu-lação Não Residente (Turistas) em estabelecimentosnão classificados; PT2H – População Não Residente(Turistas) em segunda habitação ou sazonal; PTAF –População Não Residente (Turistas) em habitaçõesde amigos e familiares.

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Onde,P é a proporção a estimar; p̂ é a estimativa dep; d é o erro ou desvio absoluto.

Os valores considerados foram os seguin-tes: p=0,01 e d=0,01, com um nível (1-α) deconfiança de 95%, de modo que a proporçãoestimada esteja, no máximo, a uma distância dda proporção verdadeira.

Para o referido erro absoluto de 0,01, o cál-culo das dimensões mínimas das amostras dapopulação presente, por categoria de aloja-mento, na Região teve por base os valores databela de 95% da amostragem baseada no erroou desvio absoluto (Abreu, 2006). As dimen-sões das amostras obtidas estão representadasno Quadro 1.

Definido o número total de inquéritos a rea-lizar considerou-se, após um pré-teste da téc-nica de amostragem estratificada, que a reparti-ção proporcional não permitiria levantar, emalguns concelhos, a necessária e confiávelinformação sobre a mobilidade diária da popu-lação presente em algumas categorias de aloja-mento. No sentido de ultrapassar a referidalimitação, considerou-se uma dimensão mínimada amostra da população presente, representa-tiva ao nível concelhio e em relação a cada umadas categorias de alojamento. No cálculo destadimensão mínima da amostra foram considera-dos os valores de p=0,01 e d=0,05, com umnível (1-α) de confiança de 95%. As dimensõesmínimas obtidas, para cada concelho e catego-ria, variaram entre 12 e 15 indivíduos, deacordo com a dimensão da população-alvo.

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Quadro 1 – Dimensão da Amostra por tipo de alojamento

Categorias População Alvo Dimensão daRegional Amostra

PR (População Residente) 421 528 384

TC (Turistas em Alojamentos Hoteleiros Classificados) 139 297 383

TNC (Turistas em Alojamentos Hoteleiros Não Classificados) 412 492 384

T2H (Turistas em Segunda habitação) 398 437 384

TAF (Turistas em Casa de Amigos e Familiares) 255 198 383

dade num dia útil e no fim-de-semana,no período de Verão e de Inverno (épocaalta e época baixa, respectivamente).

Este último9 permitiu analisar a propensãopara a saída e a permanência de população pre-sente concelhia, bem como os respectivos per-fis motivacionais das deslocações realizadasentre distintos pares de concelhos (origem//destino) da Região.

Os inquéritos à população presente foramestruturados de acordo com três conjuntos dequestões:

– caracterização geral do indivíduo – idade,nacionalidade, residência habitual enúmero de pessoas que acompanham oindivíduo em férias (a responder pelaPopulação residente e turista);

– caracterização do período de férias noAlgarve – período de férias, estabeleci-mento hoteleiro em que se encontra alo-jado e concelho de alojamento (a respon-der pela População turista);

– caracterização da mobilidade no períodode férias/num dia útil – com informaçãoda mobilidade por períodos horários reali-zados pela população inquirida (a respon-der pela População turista e residente).

4.1.1. População-alvo e Amostragem

De acordo com o descrito, o modelo con-ceptual utilizado10 para estimar a populaçãopresente regional e municipal, num dado dia,tem por base a seguinte igualdade:

PP= PR + PT (I)

Para uma dada unidade espacial, num dadodia, a população presente (PP) é igual à popula-ção residente (PR) mais a população turista (PT).Em alguns estudos, como no Plano de BaciaHidrográfica das Ribeiras do Algarve (MAOT,2000), faz-se referência ao conceito de popula-ção flutuante, que deve ser entendido generica-mente como sinónimo de população turista.

O subconjunto PT pode ser desagregadometodologicamente em vários subtipos demo-gráficos, de acordo com tipo de alojamentoutilizado pelos turistas. Analiticamente, repre-senta-se a referida aproximação através daseguinte formalização:

PP = PR + (PTC + PTNC + PT2H + PTAF) (2)

Onde,PP – População Presente;PR – População Residente;PTC – População Não Residente (Turistas) emestabelecimentos hoteleiros classificados;PTNC – População Não Residente (Turistas)em estabelecimentos não classificados; PT2H – População Não Residente (Turistas)em segunda habitação ou sazonal; PTAF – População Não Residente (Turistas)em habitações de amigos e familiares.

De acordo com a informação, directa eindirectamente disponível, sobre a dimensãoda oferta de cada uma das referidas categoriasde alojamento, procedeu-se ao cálculo dapopulação da amostra por concelho. A popula-ção-alvo da selecção da amostra correspondeao conjunto de indivíduos presentes por cate-goria e concelho de alojamento, constituindoas unidades estatísticas sobre as quais se reco-lheu informação.

Para o cálculo da dimensão da amostra (n)representativa da população-alvo, utilizou-se oerro ou desvio absoluto para uma dada propor-ção, de acordo com:

P[ |p – ̂p | ≤ d] = 1 – α

9 Obtiveram-se 3602 inquéritos válidos.10 Concordante, em termos gerais, com o modelo

utilizado no estudo de Terrier, Christophe (Dir.) 2007,Mobilité Touristique et Population Présente – LesBases de L’économie Présentielle des Départements.Ministère des Transports et de L’équipement, du Tou-risme et de la Mer, Paris.

Figura 3 – População presente inquirida, por categoria de alojamento nas épocas alta e baixa

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mentos turísticos, parques de campismo e pou-sadas de juventude, disponíveis nas estatísti-cas de turismo, relatórios da AHETA e tam-bém com base na informação obtida através doreferido inquérito aos gerentes dos estabeleci-mentos hoteleiros do Algarve, lançado emAbril de 2007.

Para cada dia de cada mês regista-se umapopulação turista presente (PTP), resultante doajustamento da oferta de alojamento em camaspela taxa de ocupação mensal. Assume-se quea PTP diária é fixa ao longo do mês.

PTP = PT * TO (4)

As taxas de ocupação das restantes ofertasde alojamento também variam ao longo doano, reflectindo a variação da procura turís-tica. Contudo, para além da informação avulsaque vai saindo na imprensa, não existem estu-dos que possam ser considerados válidos nesteâmbito. O aprofundamento do processo deajustamento implicou assumir para esses alo-jamentos turísticos um comportamento seme-lhante ao que foi determinado para os turistasalojados em estabelecimentos classificados aolongo do ano. Assume-se obviamente a exis-tência de uma margem de erro, nomeadamenteno caso da segunda residência que apresentauma tendência crescente para também ser ocu-pada na época baixa.

Após os referidos ajustamentos, a estima-tiva da população presente diária (PPd), numdado mês, por unidade espacial, será o resul-tado do somatório entre a população residenteestável (PRE) e a população turista presente(PTP).

PPd = PRE + PTP (5)

Considerando a estimativa da populaçãopresente diária (PPd) por concelho, no exercí-cio de estimar a população presente em dife-rentes alturas do dia – intervalos de tempo –assume-se que a população residente e turista

pernoita no concelho em estudo e realiza des-locações ao longo do dia (24h) dentro e fora doconcelho onde está alojado, independente-mente das motivações ou meios que utiliza naconcretização do motivo de deslocação.

Esse facto faz variar, positiva ou negativa-mente, o número de pessoas presentes em cadaconcelho por intervalo de tempo. Se assim nãofosse, poderia determinar-se, de forma simplese invariável, a população presente apenas atra-vés do valor da população residente no conce-lho e a população turista alojada.

A situação é na realidade muito distinta,pois uma parte da população presente desloca--se para outro concelho ou para fora da Região,para ir à praia, passear, jantar, fazer compras,visitar amigos, etc., e, no caso dos residentes,ainda para trabalhar e/ou estudar. Assim, adeterminação da população presente passa, emprimeiro lugar, pela identificação da popula-ção que se desloca para fora do concelho ouregião em relação ao total da população pre-sente diária e, em segundo lugar, pela popula-ção que é atraída por cada um dos concelhos.Esta aproximação pode ser representada daseguinte forma:

PPi = (PPd – PPMG) + PPMA (6)

Onde,PPi – População presente no concelho numdado intervalo de tempo;PPd – População presente num dia útil ou diade fim-de-semana;PPMA – População presente móvel atraída(Entradas), com origem em outros concelhos efora da região;PPMG – População presente móvel gerada(Saídas), com destino a outros concelhos epara fora da região.

Com,

PPNM = (PPd – PPMG) (7)

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4.1.2. O Trabalho de Campo

Uma equipa de 10 inquiridores foi encarre-gue de realizar inquéritos por toda a região doAlgarve, nos valores amostras estimados porconcelho em dois momentos distintos: Agostode 2007 e Janeiro de 2008.

No total, na época alta (Agosto de 2007) ena época baixa (Janeiro de 2008), foram apu-rados 3602 inquéritos válidos, dos quais 1720em Agosto e 1882 em Janeiro. Para além dapopulação presente directamente auscultada,consideraram-se os acompanhantes que apre-sentavam, em relação ao dia anterior, padrõesde mobilidade semelhantes. De acordo com oesperado, a forte sazonalidade associada à pro-cura turística condicionou o trabalho de campona época baixa, nomeadamente nas categoriasda população turista – Figura 3.

Tendo em atenção a dimensão mínima daamostra ao nível concelhio (12/15 indivíduospor categoria de alojamento da população pre-sente), deve referir-se que o reduzido númerode indivíduos da população alvo de algumasdas categorias em análise condicionou a repre-sentatividade das amostras parciais, principal-mente em concelhos de baixa densidade e dereduzida oferta de alojamento. Releva-se noentanto que, ao nível regional, a representaçãoda amostra foi garantida, de acordo com osreferidos níveis de erro e de confiança, paratodas as categorias de alojamento da popula-ção presente diária. No sentido de testar aamostra e o questionário, procedeu-se de igualmodo a um trabalho de campo prévio e ao lan-çamento de um inquérito-piloto.

Os dados obtidos nos inquéritos foramcodificados e armazenados em bases de dadosestruturadas de acordo com os objectivos doestudo. A partir deles, foi possível obter paratodos os concelhos i) os padrões de mobili-dade da População Residente num dia útil; ii)os padrões de mobilidade da População Resi-dente no fim-de-semana; iii) a identificaçãodos respectivos períodos de férias (ausência da

população residente); iv) os padrões de mobi-lidade da População Turista, em dia útil e diade fim-de-semana e v) a identificação dos«perfis motivacionais» da população presente.

4.2. Modelo Conceptual para a estimativa da População Presente

Com base nas informações recolhidas, pro-cedeu-se ao estabelecimento das vulnerabili-dades humanas, utilizando o modelo concep-tual que seguidamente se apresenta.

De acordo com (1) e (2), como relações debase do presente modelo conceptual, consi-dera-se que a população residente (PR) nãopermanece estática ao longo do tempo, isto é,sem realizar deslocações, para fora da unidadeespacial considerada, por motivos de férias,lazer, negócios, etc. Existe assim a necessi-dade de ajustar a PR em relação à populaçãoresidente ausente (PRA), que se desloca parafora da unidade espacial considerada, apli-cando as respectivas taxas de ausência men-sais11, permitindo identificar a população está-vel (PRE) por dia, para um dado mês.

PRE=PR - PRA (3)

Em cada dia do mês, a população residenteestável (PRE) é considerada como fixa. E éesta população residente ajustada que vai serutilizada, juntamente com os turistas, na esti-mativa da População Presente diária (PPd). Nomesmo sentido, a população turista é ajustadaao longo do ano, de acordo com o comporta-mento da procura turística. Este exercício temcomo suporte as taxas de ocupação (TO)12 daoferta hoteleira classificada em empreendi-

11Percentagem de residentes que se encontra forado concelho de residência, no seu período de férias,em relação ao total de residentes.

12Percentagem de camas ocupadas em relação aototal (capacidade), por categoria de alojamento.

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Onde,PPNM – População Presente «não móvel»(população não se desloca para fora do conce-lho), no intervalo de tempo;PPd – População presente num dia útil ou diade fim-de-semana;PPMG – População presente móvel gerada(Saídas), com destino a outros concelhos epara fora da região.

Considera-se a população presente «nãomóvel» (PPNM), como o conjunto de pessoasque não realizam qualquer deslocação parafora do concelho, num dado intervalo detempo. Deve-se no entanto salientar que numaestimativa espacialmente mais desagregada,por exemplo, a nível da freguesia, este sub-conjunto integra em cada intervalo de tempo apopulação presente «não móvel» por fregue-sia, como o conjunto de pessoas que não reali-zaram qualquer deslocação para fora da fre-guesia (PPNMf ) e a população presente móvelintraconcelhia (PPMintra ), correspondendo aosubconjunto da população móvel que realizauma deslocação, seja a pé ou através de ummeio motorizado, com início e fim nas fregue-sias do concelho. Estas deslocações ocorremem sistemas fechados, os concelhos, com umaigualdade entre as saídase entradas das/nasfreguesias.

Na determinação de cada um dos referi-dos subconjuntos da população móvel devereferir-se que a população presente não rea-liza apenas uma viagem ao longo do dia, oumesmo duas, se for considerada a viagem deretorno (ir para o domicílio) da deslocaçãoinicial, pois existem muitas outras desloca-ções ou etapas intermédias, como por exem-plo, ir almoçar, visitar familiares, fazer com-pras, etc. No entanto, em relação aos objecti-vos do ERSTA, essas deslocações inter-médias apenas foram consideradas se a popu-lação presente se deslocasse para fora do concelho onde se encontra, reside ou per-noita, deixando de ser contabilizada, num

dado intervalo de tempo, como presentenesse concelho13.

Finalmente, como a estimativa de basecorresponde à população presente no períodode um dia útil (24 horas), o total de viagensgeradas e o total de viagens atraídas ao longodo dia pelo conjunto dos 16 concelhos doAlgarve será tendencialmente semelhante.Trata-se de um «sistema fechado» (incluindouma zona «Fora da Região») quotidiano, quereflecte a importância da dimensão das via-gens de «retorno ao domicílio», após a realiza-ção das viagens motivadas, entre outros, pelotrabalho, lazer, compras, estudo, etc.

Na fase subsequente do estudo procedeu--se à desagregação espacial, ao nível da fre-guesia, dos valores estimados a nível conce-lhio, suportados na igualdade conceptual entreos totais concelhios e o somatório dos valoresobtidos ao nível das freguesias.

Todavia, o processo de desagregação nãose limitou a ponderar os resultados obtidos anível concelhio (PPi), procurando estabelecer--se para cada uma das categorias consideradasum ajustamento que atendesse à natureza dacategoria em análise e o respectivo padrão decomportamento espacial, a nível da freguesia.

A referida aproximação ao processo de desa-gregação espacial implicou a necessidade deperspectivar a PPNM ajustada à freguesia comouma realidade que integra três componentes:população presente não móvel da freguesia(PPNMf ), as saídascom destino às restantes fre-guesias de cada concelho e as entradasgeradasem outras freguesias do mesmo concelho. Estasduas últimas componentes correspondem àpopulação presente móvel da freguesia (PPMin-

tra), isto é, duas faces do mesmo sistema fechado

13 Como os padrões de deslocação ao longo dodia têm como referência o dia anterior ao inquérito,poderemos ter situações em que os indivíduos inqui-ridos só retornaram ao concelho de pertença no diaseguinte, não podendo ser contabilizados como popu-lação presente no último intervalo de tempo do dia.

(o concelho), com uma igualdade de valoresentre as saídas e as entradas intraconcelhias.

Por seu lado, as entradascorrespondem àdistribuição das saídas pelas freguesias doconcelho, implicando uma metodologia espe-cífica de redistribuição baseada nos motivosque geraram essas deslocações para fora dafreguesia de residência ou de estada, tambémaplicada à distribuição da PPMA concelhia,permitindo assim que os valores da PPMAf cor-respondessem à concretização das viagensgeradas em freguesias de concelhos diferentesdos da origem.

A referida metodologia tem por base osresultados obtidos nos inquéritos à populaçãopresente (residentes e turistas) de Agosto de2007 e Janeiro de 2008, que permitiram carac-terizar as deslocações dos inquiridos e acom-panhantes para outras freguesias que não as dealojamento e, ainda, de e para «fora daRegião», explicitando-se os motivos que asgeraram, por intervalo de tempo.

Entre os diversos motivos avançados pelosinquiridos e acompanhantes, procedeu-se àhierarquização dos três principais motivos,para além dos motivos «trabalho» da PRActiva e «Escola» da PR Estudante, que justi-ficavam as deslocações entre a freguesia dealojamento e a freguesia de destino (Quadro2). Para cada um dos intervalos de tempo esta-beleceu-se o perfil dominante, que permitiu

suportar o subsequente processo de distribui-ção das entradas (PPMintra ) e da PPMAf .

Cada um dos perfis motivacionais identifica-dos é representado por um conjunto de variáveis,que correspondem aos motivos geradores das des-locações. No sentido de facilitar a aplicação dosperfis motivacionais e reduzir a dificuldade da suaoperacionalização, isto é, o ajustamento da desa-gregação das estimativas concelhias, considerou-se necessário reduzir a informação (variáveis)incorporada em cada um dos Perfis, construindovariáveis compostas (factores), representativas decada um dos Perfis, mas de mais fácil aplicação.

Para reduzir, em cada perfil, a referidamultidimensionalidade das variáveis considera-das a apenas uma variável composta, procedeu--se à aplicação de uma análise factorial (ACP)14.

Quadro 2 – Perfis motivacionais das deslocações da População Presente, por Intervalos de Tempo

06:00-09:29Inquéritos 24:00-05:5919:30-23:5916:30-19:2914:00-16:2912:00-13:5909:30-11:59

Principais motivos por intervalo de tempo

Agosto 2007

Praia Praia Refeição Praia Refeição Refeição

Compras Refeição Praia Refeição Praia Café/Bar

Desporto Compras Compras Compras Compras Diversão/Convívio

Janeiro 2008

Compras Compras Refeição Refeição Refeição Refeição

Desporto Praia Praia Praia Compras Café/Bar

Praia Desporto Compras Compras Café/Bar Diversão/Convívio

Perfis Motivacionais

Época Alta A B B B B C C

Época Baixa A A B B B C C

14 Técnica estatística multivariada que permite,entre outras utilizações, reduzir a informação de múl-tiplas variáveis originais a um novo e menor conjuntode variáveis compostas (factores ou componentes prin-cipais). Este processo tem por base a existência de umaredundância ou sobreposição estatística na informaçãooriginal, denominada de variação comum. A formacomo esta é perspectivada permite distinguir duasabordagens clássicas – Análise de Componentes Prin-cipais (ACP) e Análise Factorial Comum (AFC).

No presente caso utilizou-se a ACP, assumindoque a variação total das variáveis é explicada pelocomportamento das variáveis originais, isto é, avariação comum, não havendo lugar a «resíduos» oua variância não explicada.

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Da sua aplicação obteve-se uma matriz de sco-res15 dos factores (perfis motivacionais) referi-dos. Nesta matriz, os scores representam arelação que existe entre cada um dos facto-res/componente principal (perfis motivacio-nais) e as unidades espaciais de análise (fre-guesias). Estes valores permitiram operaciona-lizar, como referido, o processo de desagrega-ção espacial dos valores estimados para asentradas intraconcelhias (PPMintra ) e entradasinterconcelhias (PPMAf ).

5. Estimativa da PopulaçãoPresente Concelhia, porintervalo de tempo, ao longodo ano: alguns resultados

A nível regional e considerando um cená-rio maximalista estimaram-se, para uma taxade ausência nula e uma taxa de ocupação de100%, os seguintes valores da população pre-sente diária (PPd), de acordo com (2):

1.692.952 = 421.538 + (139.297 * +412.492 + 398.437 + 255.198(8)

* - 27.079 (Parques de Campismo/Pousadas da Juventude)

Todavia, nem a taxa de ausência diáriamensal é nula, nem a taxa de ocupação diáriamensal é sempre de 100% em todos os conce-lhos. Existe, assim, a necessidade de ajustar aPR e a PT diárias máximas de cada concelho,de modo a obter respectivamente as estimati-vas da população residente estável (PRE) e dapopulação turista presente (PTP), que diaria-mente (dia útil) se poderão encontrar nos con-celhos da Região (Quadro 3).

Na presente estimativa assume-se que osvalores de PRE e a PTP diários são fixos aolongo de cada um dos meses, estimando-seque a população presente diária (PPd), numdado mês e num dado concelho, seja o resul-tado do somatório da população residenteestável (PRE) e da população turista presente(PTP), para esse mês e para essa unidadeespacial.

Considerando a estimativa da populaçãopresente diária (PPd), por concelho, para cadaum dos meses, procedeu-se aos cálculos emque assenta a estimativa da população presentediária, por intervalo de tempo (PPi)

16. Paracada um dos intervalos de tempo, estimaram-se os valores da população presente que se

desloca para outro concelho ou para fora daRegião, isto é, a população móvel gerada(PPMG), que não se encontra no concelho dealojamento ou de estada. Ao valor resultante –a população que fica no concelho, por inter-valo de tempo (PPNM) –, adiciona-se a popu-lação móvel atraída (PPMA ), para obtermos apopulação presente diária, por intervalo detempo (PPi).

O resultado final do referido processo decálculo é armazenado em fichas-síntese (Figura4), onde constam os dados mais relevantes rela-tivos a cada período estudado. Quer na épocaalta quer na época baixa, são distinguidos osdias úteis e os dias de fim-de-semana.

O Quadro 4 é um extracto de uma dasfichas concelhias a que esta metodologia per-mitiu chegar. Pelas diferenças acentuadas por

período e sobretudo por mês, foi seleccionadoo concelho de Albufeira nos meses de Janeiroe de Agosto, muito embora os cálculos tenhamsido efectuados para todos os meses do ano.

Os resultados obtidos, para cada um dosintervalos, devem ser perspectivados comosituações representativas da dimensão da «vul-nerabilidade humana» que se poderá encontrara nível concelhio e nos diversos intervalos detempo, tanto num dia útil como num dia defim-de-semana.

De acordo com os vários passos metodoló-gicos, técnicos e conceptuais descritos noponto anterior, apresenta-se um extracto, atítulo de exemplo, no Quadro 5, dos resultadosda freguesia de Albufeira (concelho de Albu-feira), num dia útil, nos meses de Janeiro eAgosto.

16 Os referidos intervalos de tempo foram previa-mente estabelecidos, de acordo com os comporta-mentos percebidos no trabalho de campo e em estu-dos semelhantes: 06:00h-09:29h; 09:30h-11:59h;12:00h-13:59h; 14:00h-16:29h; 16:30h-19:29h;19:30h-23:59h e 24:00h-05:59h.

Quadro 3 – Estimativa da população presentediária, nos concelhos do Algarve, Janeiro

e Agosto de 2007

Pop. presente Janeiro Agosto(Cenário

maximalista)

Albufeira 208 974 85 565 203 232

Alcoutim 16 594 3 225 14 308

Aljezur 29 972 9 147 28 287

Castro Marim 38 626 27 573 37 077

Faro 134 711 100 530 115 035

Lagoa 113 207 44 294 103 329

Lagos 116 587 42 110 104 985

Loulé 305 185 118 100 282 974

Monchique 21 300 8 363 17 835

Olhão 90 970 53 363 81 723

Portimão 164 421 72 461 150 421

S. Brás de Alportel 27 732 15 211 25 187

Silves 136 681 54 987 129 971

Tavira 97 237 46 056 85 862

Vila do Bispo 31 725 6 868 29 589

V. R. Santo António 93 032 73 793 88 903

ALGARVE 1 626 952 761 646 1 498 717

15 Os scorescorrespondem aos valores das uni-dades espaciais de análise – as Freguesias – nasnovas variáveis compostas (factores/componentesprincipais) e reflectem a combinação (espacial) dasvariáveis originais em cada um dos factores/compo-nentes principais (Perfis Motivacionais).

Figura 4 – Matriz das fichas-síntese

Dias:

A) Semana e B) Fim de Semana

Identificação, para cada intervalo de tempo, das principais concentrações

demográficas e dos principais fluxos

por concelho e freguesia

Relatório para cada concelho e freguesia,

por intervalos de tempo,da estimativa da

população presente

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6. Conclusões

Ao longo do processo de determinaçãoquantitativa davulnerabilidade humana(cor-respondente ao cálculo da população presente,residente e turista, por concelho e intervalo de

tempo) no Algarve utilizaram-se dados produ-zidos por instituições públicas e privadas; pro-cedeu-se ao levantamento directo de informa-ção através de inquéritos e aplicou-se um con-junto diversificado de instrumentos de mode-lação e parametrização estatística. Deste traba-

17 Uma leitura introdutória ao tema encontra-seno relatório do National Research Council(NCR) da

Quadro 5 – População presente na freguesia de Albufeira por intervalo de tempo, em dias úteis, nos meses de Janeiro e de Agosto

06:00 - 09:30 49.511 45.822 06:00 - 09:30 120.486 113.160

09:30 - 12:00 48.327 41.789 09:30 - 12:00 134.619 110.284

12:00 - 14:00 48.214 41.962 12:00 - 14:00 139.387 112.070

Albufeira 14:00 - 16:30 53.896 49.454 43.451 14:00 - 16:30 138.403 161.405 109.597

16:30 - 19:30 55.135 51.696 16:30 - 19:30 147.021 118.301

19:30 - 24:00 57.841 53.868 19:30 - 24:00 133.524 120.392

24:00 - 06:00 53.896 53.896 24:00 - 06:00 137.236 135.492

Intervalo de Tempo

População Presente diária

na freguesia(PPdf)

População Presente

na freguesia

(PPif)

População Presente

na freguesia

(PPif)

Intervalo de Tempo

População que

permanece na freguesia

(PPNMf )

População que

permanece na freguesia

(PPNMf )

População Presente diária

na freguesia(PPdf)

AgostoJaneiro

lho ressaltam alguns aspectos críticos que seprendem essencialmente com a informaçãoque se encontra disponível.

Em primeiro lugar, a inexistência de inquéri-tos à mobilidade da população no Algarve cons-titui uma importante limitação para o aprofunda-mento de qualquer estimativa da população pre-sente, o que obrigou ao desenho e lançamento deinquéritos a uma amostra representativa dapopulação presente. Apesar do rigor científicodeste estudo, os resultados obtidos apenas pode-rão ser vistos como informação de apoio às tare-fas de modelação e estimativa da populaçãopresente, não devendo ser perspectivados comoum estudo da mobilidade da Região do Algarve,necessariamente muito mais complexo.

A ausência de qualquer programa deâmbito nacional de lançamento de inquéritos àmobilidade, que de forma sistemática e perió-dica (por exemplo, quinquenais nas áreasurbanas e decenais nas rurais) permitisse acobertura ao nível das freguesias, continuará aser um dos principais entraves à quantificaçãoda população presente por unidade de tempo eà fundamentação dos planos de deslocaçõesurbanas ou de mobilidade.

Em segundo lugar, a falta de dados actua-lizados e fidedignos sobre o alojamento nãoclassificado. O facto de existirem poucos estu-dos e dados neste âmbito é um ponto crítico.

Por último, algumas das variáveis utiliza-das não se encontram disponíveis com o nívelde desagregação geográfica adequado aosobjectivos do estudo (freguesia), o que fazcom que a estimativa dos elementos humanosvulneráveis tenha de ser permanentementeajustada à natureza da informação existentee/ou disponibilizada. Para além da desejávelmelhoria das bases de dados disponíveis, anecessidade de adaptar o processo metodoló-gico à realidade estatística existente é recor-rente neste tipo de estudo17.

A necessária melhoria nas estimativas dapopulação em risco deve ser utilizada querpara o planeamento preventivo e reactivo (deemergência), bem como para uma adequadapreparação ao nível da gestão das situações deemergência. A metodologia e as estimativasque se apresentaram são igualmente importan-tes para as entidades com responsabilidades noordenamento do território e urbanismo para odesenvolvimento de uma estrutura globalorganizada de ligação entre os Sistemas deInformação Geográfica (por exemplo, o Simu-lador SIG integrado no ERSTA), os técnicosoperacionais e os decisores políticos.

Em síntese, as condições institucionais eorganizacionais são tão importantes como asinformações disponibilizadas, pois só comaquelas será possível actualizar e utilizar asestimativas realizadas da forma mais eficientee em benefício da população em risco.

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Quadro 4 – População presente no concelho de Albufeira por intervalo de tempo, em dias úteis, nos meses de Janeiro e de Agosto

06:00 - 09:30 8 182 77 383 5 333 82 715

09:30 - 12:00 12 035 73 530 8 954 82 484

12:00 - 14:00 11 873 73 692 8 691 82 283

Janeiro 14:00 - 16:30 85.565 11 113 74 451 8 376 82 827

16:30 - 19:30 2 590 82 975 4 484 87 459

19:30 - 24:00 41 85 524 4 345 89 869

24:00 - 06:00 0 85 565 0 85 565

06:00 - 09:30 22 642 180 591 9 505 190 095

09:30 - 12:00 25 148 178 084 31 200 209 284

12:00 - 14:00 23 731 179 501 34 978 214 479

Agosto 14:00 - 16:30 203.232 27 163 176 069 65 915 241 984

16:30 - 19:30 18 454 184 778 36 963 221 341

19:30 - 24:00 17 917 185 315 14 283 199 598

24:00 - 06:00 2 291 200 941 1 072 202 819

Intervalo de Tempo

População Presente diária

(PPd)(PPMG)

População que permanece no concelho

(PPNM)[PPd - PPMG]

(PPMA)

População Presente

(PPi)[PPNM + PPMA]

Academia das Ciências americana, publicado em2007, com o título Tools and Methods for EstimatingPopulations at Risk from Natural Disasters andComplex Humanitarian Crises.

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AAAALLLLTTTTEEEERRRRAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO AAAAMMMMBBBBIIIIEEEENNNNTTTTAAAALLLL EEEE RRRREEEECCCCUUUURRRRSSSSOOOOSSSS NNNNAAAATTTTUUUURRRRAAAAIIIISSSS ::::

FFFFOOOONNNNTTTTEEEESSSS DDDDEEEE DDDDEEEESSSSEEEESSSSTTTTAAAABBBBIIIILLLLIIIIZZZZAAAAÇÇÇÇÃÃÃÃOOOO SSSSOOOOCCCCIIIIAAAALLLL EEEE DDDDEEEE RRRRIIIISSSSCCCCOOOO EEEE AAAAMMMMEEEEAAAAÇÇÇÇAAAA ÀÀÀÀ SSSSEEEEGGGGUUUURRRRAAAANNNNÇÇÇÇAAAA

NNNNAAAACCCCIIIIOOOONNNNAAAALLLL EEEE IIIINNNNTTTTEEEERRRRNNNNAAAACCCCIIIIOOOONNNNAAAALLLL

Américo Reis*

Inforgeo, 2007/2008, 67-84

«It is evident that many wars are foughtover resources which are now becoming increa-singly scarce. If we conserved our resourcesbetter, fighting over them would not thenoccur… so, protecting the global environmentis directly related to securing peace… those ofus who understand the complex concept of theenvironment have the burden to act. We mustnot tire, we must not give up, we must persist».

Wangari Maathai (Prémio Nobel da Paz, 2004).

Introdução

Este artigo procura enquadrar sumaria-mente os roteiros da investigação sobre «segu-rança ambiental» (environmental security),trazendo à liça os desenvolvimentos maisrecentes sobre as ligações entre alteraçãoambiental, segurança e conflito ambiental-

mente induzido. Recorrendo a exemplos reti-rados de casos estudo, pretende salientar-se osaspectos mais significativos da investigaçãonesta temática e deixar no ar pistas para futu-ros desenvolvimentos que permitam identifi-car as áreas mais propensas a conflitos degénese ambiental, bem como as condições emque tais podem eclodir.

O artigo estrutura-se segundo quatro linhasfundamentais: i) redefinição do conceito desegurança; ii) percursos fundamentais dainvestigação; iii) relacionamento entre facto-res ambientais, riscos e conflito; e iv) o casoparticular do Espaço Euro-Mediterrânico.

No palco das relações internacionais, o dis-curso sobre segurança no período pós-guerrafria incorpora e reedita velhas premissas e tema particularidade de chamar a debate novasvariáveis, designadamente a ameaça à segu-rança decorrente das alterações ambientais.

O agudizar das alterações ambientais, ocrescimento populacional, a depleção e degra-dação crescentes de recursos naturais, oengrossar das fileiras de «refugiados ambien-* FL-UL, Departamento de Geografia (Assistente

Convidado) – [email protected]

i n f o r g e o

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violência tem vindo a divergir de conflitos deestado de grande intensidade para misturascomplexas de conflitos menos intensos, masem maior número, alimentados por gruposfiliados em facções de estado, em gruposrebeldes armados e em complexas redes denatureza obscura. As causas próximas à maio-ria dos conflitos recentes são questões deordem interna, muitas delas relacionadas coma escassez ou abundância de recursos. Porexemplo, inúmeros conflitos recentes em paí-ses africanos têm sido alimentados pelos dia-mantes e outras pedras preciosas (Congo,Serra Leoa, Libéria).

No período compreendido entre 1998 e2007 registaram-se apenas três conflitos entreestados: Eritreia – Etiópia (1998-2000); Índia– Paquistão (1998-2003); e Iraque versus EUAe aliados (2003). Os restantes 30 maiores con-flitos armados registados neste período trava-ram-se dentro das respectivas fronteiras(SIPRI 2008).

Que factores poderão estar por detrás eexplicar o actual padrão e tipologia de confli-tos armados violentos? A resposta a esta ques-tão não é simples, nem será consensual nosdiversos quadrantes científicos. No entanto, seatendermos a alguns factos que marcaram oevoluir recente da humanidade, talvez secomecem a desvendar algumas das causas pro-váveis para o aumento substancial de conflitosdomésticos nos vários cantos do mundo.

O século transacto registou um cresci-mento populacional e económico sem prece-dentes, com reflexos no forte incremento dostress ambiental. A dinâmica demográficamantém-se na actualidade, com os países emdesenvolvimento a registar ritmos de cresci-mento bastante elevados. No decorrer doséculo XX, a população mundial aumentou de1,6 mil milhões para 6,1 mil milhões. Apenasna segunda metade deste século, o planeta tevede absorver um acréscimo de cerca de 3,5 milmilhões de pessoas, com 85 por cento desteincremento a ocorrer nos países em desenvol-vimento e em transição (UNPD 2003).

O crescimento populacional por si só nãoconfiguraria qualquer risco ou ameaça à segu-rança, caso população e recursos andassem emparidade, ou não motivassem outro tipo de dis-putas. No entanto, pese embora algumas con-tra argumentações, a realidade está muito dis-tante deste desiderato desejável, porquanto ageografia da maioria dos recursos naturaisvitais não coincide com a geografia da popula-ção. Por outro lado, inúmeros estados não dis-põem do engenho suficiente para suprir ascarências da distribuição natural dos recursosnaturais. Acresce a tudo isto, o facto da pres-são crescente sobre os recursos, sob a forma deconsumo e degradação, agravar as situações destress sobre os mesmos (Figura 2).

O Bangladesh constitui um exemplo ade-quado do desequilíbrio entre população e

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Riscos e ambiente

tais» (environmental refugees)1, a difusão epropagação de novas endemias e a progressivaescassez de recursos naturais vitais [e.g. solo,florestas e, em particular, água potável] des-pertaram, em definitivo, a atenção dos deciso-res políticos, dos responsáveis militares e dediversos quadrantes da comunidade académicae científica em geral, para a problemática da«segurança ambiental».

As assimetrias de desenvolvimento, peseembora os Objectivos de Desenvolvimento doMilénio2, assumem um papel importante nosquadros da degradação ambiental e das alte-rações climáticas em curso. Os países maisdesenvolvidos, sendo agentes activos nosprocessos de alteração climática, serão, porventura, os mais capacitados para enfrentar asconsequências das mesmas. No reverso damedalha, os países menos desenvolvidos,maioritariamente agentes passivos no pro-cesso de alteração climática, serão os menoscapacitados para enfrentar as respectivas con-sequências, agravando-se ainda mais a preca-riedade dos sistemas que suportam a sua sub-sistência.

Segundo inúmeros analistas, a pobrezaendémica, que afecta cerca de dois terços dahumanidade, tenderá a perpetuar-se e a agra-var-se em consonância com o agudizar dasalterações ambientais, conforme destacaminúmeros estudos sobre consequências dasalterações climáticas (Smith e Vivekananda,2007; CSIS, 2007; Kolmannskog, 2008).

Diversos sectores da comunidade cientí-fica têm vindo a sustentar, em particular desdemeados da década de noventa, que a degrada-ção ambiental constitui já uma das principaisfontes de conflito, podendo o seu protago-nismo disparar num futuro próximo, devido aoagudizar da alteração e degradação ambiental

(Bächler 1998; Homer-Dixon 1999; Lonergan1999).

Os diferentes padrões de distribuição natu-ral de recursos, as crescentes necessidadesenergéticas e os hiatos entre a procura e a dis-ponibilidade e/ou capacidade de transforma-ção de recursos têm fomentado inúmeras ten-sões e disputas relacionadas com os recursosnaturais, fomentando as «guerras de recursos»(resource wars)3.

Porquê repensar a segurança?

Segurançaé um conceito difícil de definirobjectivamente. A noção de segurança temsubjacente uma noção implícita de vulnerabi-lidade, cuja avaliação requer considerar orisco de exposição, susceptibilidade de per-der, e capacidade de restaurar. É um conceitomais socialmente construído do que determi-nável objectivamente, importando distinguiras entidades vulneráveis, por exemplo, anação (segurança nacional), necessidadesbásicas (segurança humana), rendimento(segurança financeira), entre outras (Barnet2001). Em censo comum, segurança é a con-dição de estar protegido de ou não exposto aperigo (Figura 1).

Diversas correntes e abordagens teóricastêm vindo a questionar a concepção tradicio-nal de segurança, fundada na visão realista dasRelações Internacionais de risco de confronta-ção entre Estados. A análise da tipologia daconflituosidade recente evidencia que a maio-ria dos conflitos violentos têm uma génesedoméstica, em detrimento dos conflitos entreestados, quando o controle territorial era oprincipal objectivo e os confrontos eram trava-dos por soldados regulares.

De facto, a partir de meados da últimadécada do século XX o padrão principal de

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Figura 1 – Esquematização de ligações entre ambiente e segurança

SegurançaNacional

ConflitosAmbientais

Papel Militar?

SegurançaHumana

Redefiniçãode Segurança

1 Na literatura internacional também referidoscomo «climate refugees» (Kolmannskog, 2008).

2 http://www.un.org/millenniumgoals/reports.shtml 3 Veja-se, por exemplo, Klare, 2001.

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Os factores de contexto (e.g. políticos, reli-giosos, sociais) influenciam as respostassociais, explicando a razão pela qual situaçõessimilares de pressão desencadeiam respostasdiferenciadas. Por exemplo, a já referidamigração forçada do Bangladesh para Assam,Índia, motivada em grande medida pelo stressambiental, conduziu à violência na região dechegada, enquanto que a migração do Bangla-desh, pela mesma razão, para outros paísesAsiáticos ou mesmo outras partes da Índia nãolevaram à violência nos países de acolhimento(CCMS Report n.º 232).

Neste modelo conceptual de relaciona-mento entre alteração ambiental e segurança,os factores contextuais jogam diferentespapéis no seguinte trinómio: alteração ambien-tal __ consequências políticas, económicas,sociais e demográficas __ impacte na segu-rança.

Alguns autores agrupam os factores con-textuais em nove categorias, a saber: 1) per-cepção do grau de escassez; 2) vulnerabilidadeeconómica e dependência de recursos; 3)capacidades institucional, socioeconómica etecnológica; 4) factores culturais e etno-políti-cos; 5) violência interna e estruturas de segu-rança; 6) estabilidade política; 7) participação;

8) interacção internacional; e 9) mecanismosde resolução de conflitos (CCMS Report n.º232: 102-108).

Os factores contextuais podem ocorrer iso-ladamente ou combinados, potenciando-semutuamente neste caso. Para a maioria dassituações, a dependência de recursos naturais éo factor que mais se relaciona com o conflito,particularmente nos países em desenvolvi-mento, onde as dependências são mais acen-tuadas e propensas à eclosão de grupos deinteresse e de poder.

A resposta social mais frequente, face asituações de grande stress ambiental, progres-sivo ou brusco, assim como perante cenáriosde guerra, é a migração compulsiva e o acan-tonamento destas populações em campos derefugiados, espaços favoráveis à ocorrência dedegradação e stress ambiental.

Os diversos casos estudo analisados nabibliografia considerada permitiram identifi-car quatro tipos fundamentais de conflitosambientais: 1) conflitos de base étnica e polí-tica; 2) conflitos enraizados em fortes e súbi-tos movimentos migratórios; 3) conflitos ori-ginados pela disputa de recursos hídricosinternacionais; 4) conflitos relacionados com aevolução das mudanças climáticas globais.

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Riscos e ambiente

recursos. Com uma população actual estimadaem mais de 140 milhões, perspectivando-seque a sua população exceda os 180 milhõesem 20254, este território tem assistido a umaredução progressiva da superfície de cultivo,na sua disponibilidade absoluta e relativa. Asinundações frequentes, agravadas pelo pro-cesso de intensa desflorestação do território,têm agravado as condições de precariedadehumana nesta região.

Milhões de pessoas abandonam este terri-tório desde meados da década de 1950, parafugir às terríveis pressões populacionais,escassez de terras e inundações. Na sua maio-ria, deslocam-se para áreas vizinhas na Índia,particularmente para o estado de Assam, ondedos 22 milhões de habitantes cerca de 7milhões ou vieram do Bangladesh ou são jáseus descendentes (Homer-Dixon, T. F., 1991:4). Os confrontos violentos entre estas duascomunidades são recorrentes, estando emcausa a disputa de recursos progressivamentemais escassos.

O stress ambiental é responsável porimportantes consequências de ordem social epolítica, com realce para a pobreza, insegu-rança alimentar, degradação de condições desaúde, deslocações de populações (migraçõesou movimentos de refugiados), e disjunções

das instituições sociais e políticas. As conse-quências do stress ambiental potenciam confli-tos, verificando-se determinados factores con-textuais desfavoráveis, conforme se ilustra naFigura 3.

Numa abordagem muito genérica, saliente-se que o stress ambiental poderá desempenharpapéis diferenciados no decorrer da dinâmicade conflito, prestando-se à seguinte sistemati-zação5:

(1) Fonte Estrutural de Conflito: o stressambiental é percepcionado como umfactor permanente que afecta os inte-resses e preferências dos actores envol-vidos.

(2) Catalisador de Conflito: o stressambiental é futuramente exacerbadopor uma situação socioeconómicainsustentável existente, reflectindo-se oseu impacte no incremento da potencialincidência ou escalada de conflito.

(3) Disparadorde Conflito: quando ocor-rem mudanças bruscas negativas naesfera ecológica, o stress ambientalinstiga o conflito quando as causas quelhe estão por detrás são percepcionadascomo ameaças agudas a certos gruposde interesses.

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Figura 3 – Ciclo das Consequências do Stress Ambiental

Stress ambiental

PotencialIncidênciae Escaladade Conflito

ConsequênciasPolíticas

ConsequênciasEconómicas

ConsequênciasSociais

ConsequênciasDemográficas

Fonte: Adaptado a partir de: CCMS Report n.º 232

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Figura 2 – Stress Ambiental

Escassez ambiental de recursos

Degradação ambientalde recursos

Stress ambiental

4 2008 Population Reference Bureau.

5 Esta categorização é baseada em Baechler1997: 132-136.

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dos excertos das palavras de Kofi Annan, naqualidade de Secretário-geral das Nações Uni-das, no seu relatório de 2003 sobre a preven-ção de conflitos armados:

«Lastly, in addressing the root causes ofarmed conflict, the United Nations system willneed to devote greater attention to the potentialthreats posed by environmental problems». […]«The implications of the scarcity of certain natu-ral resources, of the mismanagement or deple-tion of natural resources and of the unequalaccess to natural resources as potential causes ofconflicts need to be more systematically addres-sed by the United Nations system. The UnitedNations system should consider ways to buildadditional capacity to analyze and addresspotential threats of conflicts emanating frominternational natural resource disparities»7.

De facto, se procurássemos olhar o mundosegundo duas visões distintas, numa perspec-tiva ecológica e numa de segurança, por certoverificaríamos que o rol de países considera-dos problemáticos em cada uma delas seriamuito similar, incluindo, por exemplo, Afega-nistão, Bangladesh, Haiti, Indonésia, Iraque,Somália, Nigéria, região dos Grandes Lagos,Mauritânia, Senegal e Ruanda.

O mapa dos conflitos internos recentes e omapa da distribuição espacial de recursosnaturais de valor elevado têm grandes simila-ridades, apresentando uma sobreposição nítidada geopolítica dos recursos naturais e da geo-política dos conflitos, configurando o espaçoque Michael Klare designa por «The NewLandscape of Global Conflict», na sua obra«Resource Wars» (Klare, M.T., 2001).

Diversas linhas de investigação envereda-ram pelo conceito alargado de segurança –Comprehensive Security– que esteve subja-cente à reformulação do conceito estratégico dedefesa de vários países europeus, dos EUA e daprópria Aliança Atlântica (1991 e 1999), legiti-mando a importância das ameaças não milita-res, nomeadamente de cariz social e ambiental8.

Em Abril de 2007, sob iniciativa do ReinoUnido, o Conselho de Segurança das NaçõesUnidas debateu profundamente pela primeiravez as alterações climáticas. Também em Abrilde 2007, um conjunto de generais de méritoreconhecido (aposentados) publicou um rela-tório onde ficou bem vincado que alteraçãoclimática constitui uma séria ameaça à segu-rança dos Estados Unidos, capaz de promovero extremismo e terrorismo, especialmente emregiões instáveis (CNA Corporation, 2007).Na Figura 5 procura-se esquematizar o con-ceito alargado de segurança.

O conceito alargado e as políticas actuais

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Riscos e ambiente

Esta classificação e tipologia de conflitosremete a sua origem para regiões com proble-mas estruturais de desenvolvimento, encontra-das particularmente em:

• Regiões áridas e semiáridas;• Áreas de montanha com fracas interac-

ções entre as terras altas e as de sopé;• Áreas com bacias hidrográficas partilha-

das internacionalmente;• Zonas degradadas pela exploração

mineira e por barragens;• Faixa de florestas tropicais;• Clustersde pobreza em áreas de expan-

são urbana marginais.

Áreas críticas similares foram encontradasnos casos de estudo desenvolvidos para anali-sar conflitos ocorridos em África, AméricaLatina, Ásia Central, Sudeste Asiático e Oceâ-nia, e que, à partida, estavam identificadoscom causas ambientais. No quadro seguinte, atítulo de exemplo, referem-se alguns conflitosde origem migratória (Figura 4).

O paradigma de segurançaambiental: riscos prementes

Repensar a segurança, porquê e com quefundamentos? A redefinição do conceito tradi-cional de segurança baseou-se na constataçãode que o crescimento populacional, a pressãocrescente sobre recursos naturais vitais e oagudizar de situações climáticas extremasencerram um triângulo de instabilidade e derisco, capaz de induzir e despoletar tensões efazer escalar a violência doméstica e interna-cional. Na fase inicial da investigação, asabordagens procuravam discernir sobre osmodos como a alteração ambiental poderiadespoletar conflito violento (Homer-Dixon1991, Kaplan 1994, Myers 1987).

Em 1994, o jornalista americano Robert

Kaplan escreveu «The Coming Anarchy,» umartigo amplamente difundido que pintou umaimagem sombria da África Ocidental a mergu-lhar num conflito endémico alimentado por umaespiral de crescimento populacional, degradaçãoambiental e acesso fácil a armas. Baseado nosestudos pioneiros sobre ambiente e segurança, ofuturo que ele retratou foi de «doença, excessopopulacional, crime, escassez de recursos,migrações de refugiados, erosão das fronteiras esoberania de estados, e o fortalecimento de exér-citos privados e cartéis da droga»6. Muito destecenário alarmista desenhado por Kaplan temvindo a verificar-se pelo mundo inteiro.

Perante a importância crescente do papeljogado pelos recursos naturais, em geral, ocampo da geopolítica será primordial para oestudo e compreensão da geografia dos recur-sos e dos conflitos. Assim, não será descabidoperspectivar que as «geopolíticas» do correnteséculo XXI poderão ser i) a geopolítica daescassez de recursos vitais – água potável, soloagrícola, alimentos; ii) a geopolítica da energia– localização de fonte e reservas, redes de dis-tribuição; iii) a geopolítica dos desastres natu-rais de grande intensidade – número crescentede incidências, de vítimas mortais, de desloca-dos; iv) a geopolítica dos conflitos violentosinternos – as guerras de recursos naturais.

Aceitando o argumento de que a alteraçãoambiental deve ser encarada como um assuntode políticas de segurança, o conceito de segu-rança, e a questão de qual a sua melhor con-ceptualização, continua a ser o aspecto maiscontroverso nos assuntos de política interna-cional (WBGU, 2008: 19).

Na arena política, degradação ambiental ealteração climática foram progressivamentepercepcionadas como um desafio à políticainternacional e segurança, conforme se deduz

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Figura 4 – Exemplificação de Conflitos Migratórios

País: Região Stress Ambiental Partes Envolvidas Intensidade de Conflito

Bangladesh e Índia:Província de Assam

México: Chiapas

Pressão populacional, crises de sub-sistência, «refugiados ambientais» e degradação de terra

Degradação dos habitats da popula-ção indígena

Governo de Assam, popula-ção local e imigrantes Ben-gali

Governo Mexicano e Zapa-tistas (EZLN)

Conflito violento, fraca inten-sidade, confrontos sociais,étnicos e políticos

Conflito violento, massacresem Dezembro de 1997

Fonte: Adaptado de Baechler 1998

7 United Nations. (2003, 12 September). Interimreport of the Secretary General on the prevention ofarmed conflict (Report of the Secretary General onthe Work of the Organization, A/58/365–S/2003/88812 September 2003).

8 À semelhança de outros países, também Portu-gal reformulou o seu Conceito Estratégico de DefesaNacional em 1994, e posteriormente em 2003.

6 Kaplan, R. (1994) «The Coming Anarchy –how scarcity, crime, overpopulation, tribalism anddisease are rapidly destroying the social fabric of ourplanet, «TheAtlantic Monthly, February, pp 44-76.

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(WBGU, 2007: 77). Segundo estes, as alteraçõesclimáticas em curso podem, seguramente, con-tribuir para o agudizar das situações de precarie-dade ecológica e de instabilidade social sentidasem inúmeras regiões do globo.

Por último, mas não menos importante nacena da política internacional, pelas conse-quências que daí podem advir, as novas abor-dagens estratégicas ao interesse nacional con-templam objectivamente as ameaças das alte-rações ambientais e a necessidade de asseguraro acesso e salvaguardar recursos naturaisvitais e energéticos. Os EUA são um exemploparadigmático dessa postura, sendo assumidaoficialmente às mais altas instâncias da gover-nação (CNA Corporation 2007; IISD 2007;GTZ 2008; TFCG 2008).

Paradoxalmente, como refere Soromenho-Marques (2005:78), em Outubro de 2003, oPentágono encomendou um estudo sobre asconsequências para a segurança nacional deuma eventual Mudança Climática Abrupta9.Este facto é tanto mais significativo quanto épublicamente conhecida a postura política daadministração Bush face às questões ambien-tais globais e face aos cientistas que sistemati-camente vêm alertando para os perigos quepodem advir das alterações climáticas.

As crescentes fileiras de refugiados ambien-tais (Environmental Refugees)10 são já um dosrostos por demais visíveis das consequênciasdas alterações ambientais globais, quer se tratede alterações difusas e progressivas, como porexemplo o avanço das regiões áridas ou semi-áridas, ou de fenómenos atmosféricos anormal-mente violentos, como por exemplo os tornadose furacões. As duas situações referidas contri-buem para o crescimento desmesurado de refu-giados ambientais, em paralelo com o agudizar

e degradar das condições e suportes de vidadestas populações (NRC, 2008).

As instabilidades política e social dos esta-dos fracos e frágeis tenderão a potenciar, aindamais, num futuro não muito longínquo, as ten-sões e clivagens entre grupos sociais diferen-tes e a contribuir para o aumento dos conflitosinternos, configurando novos riscos e ameaçasà ordem nacional e estabilidade internacional.

Percursos de investigaçãosobre «segurança ambiental»

A origem da investigação científica nosdesignados conflitos ambientais pode ser reme-tida para os anos de 1970. Nesta fase de arran-que, as ligações entre degradação ambiental eescala de conflito não passavam de vagasassunções. O esforço de investigação ganhounovas dinâmicas com o desanuviamento dasrelações Este-Oeste e fim da Guerra Fria.

Pese embora a diversidade das abordagens,sobressaem quatro grandes projectos de inves-tigação:

• Grupo de Toronto, em torno de ThomasHomer-Dixon;

• Grupo de Zurique, liderado por GünterBächler e Spillmann, dando origem ao«Environment and Conflicts Project»(ENCOP);

• Grupo de Oslo, em torno de Gleditsch,cujo trabalho se baseou em estudos quan-titativos;

• Global Environmental Change andHuman Security Project (GECHS), emtorno de Matthew, com sede em Irvine,Califórnia.

Os dois primeiros grupos são consideradosos pioneiros, tendo as suas abordagens sidobaseadas em estudos qualitativos desenvolvi-dos, essencialmente, ao longo da década de 90.

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Riscos e ambiente

de segurança não se restringem às capacidadesmilitares. Um dos aspectos mais importantesda política de segurança actual prende-se coma capacidade de neutralizar crises políticas esocioeconómicas que ameacem cruzar o limiarda violência, o mais precocemente possível,recorrendo a meios não militares e, se neces-sário, então a meios militares (WBGU 2008).

As assimetrias de desenvolvimento, conju-gadas com os processos de alteração ambiental,são progressivamente fontes de perturbação ede insegurança ao nível local e regional,podendo alcançar dimensões de natureza inter-nacional. Desertificação, alterações climáticas,desflorestação, perda de biodiversidade, perdade solo agrícola e problemas hídricos são ques-tões que se relacionam com a paz e a (in)segu-rança aos níveis local, regional e internacional.Problemas ambientais, com implicações na

(in)segurança, requerem acções colectivas ecooperativas, para além do estabelecimento demecanismos de regulação internacional quedirimam aspectos transfronteiriços, ou queponham em causa a ordem internacional.

O German Advisory Council on GlobalChange(WBGU) veicula este princípio no seuestudo sobre clima e segurança de 2008 (ClimateChange as a Security Risk), colocando a tónicana necessidade de prevenir a eclosão de conflitospor via de mecanismos de cooperação e formasde promoção efectiva do desenvolvimento nasregiões mais desfavorecidas. Este organismoAlemão identificou três grandes áreas nas quaisse espera que as alterações climáticas provo-quem desenvolvimentos críticos, a saber, o esgo-tamento dos recursos de água doce, o compro-metimento da produção de alimentos, e umaumento de condições atmosféricas extremas

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9 Peter Schwartz e Doug Randall, An Abrupt Cli-mate Change and its Implications for United StatesNational Security, 2003.

10 http://www.osce.org/documents/eea/2005/05/14488_en.pdf(Acesso 08/12/08).

Figura 5 – Conceito Alargado de Segurança

Conceito alargado de segurança

Segurança Abrangente(Comprehensive)

Segurança social,ecológica e militar

Degradação ambiental, rápido crescimento populacional, mudanças tecnológicas estruturais,

declínio económico, pobreza conjugada com carênc ia de direitos civis, clivagens étnicas

e religiosas, violação massiva dos direitos humanos e políticos basilares, propagação do crime

organizado, etc.

Raízes Causadoras de ConflitoRaízes Causadoras de Conflito

Cooperação Internacional Organizações Internacionais

Acordos

Prevenção de Conflitos

e Intervenções Pós-Crise

Abordagens multi-nível abrangendo

instrumentos diplomá-ticos, militares

e económicos afectosao desenvolvimento

Instrumentos

SegurançaColectiva/Comum

Segurança Preventiva

Fonte: Hipler 2003:300, a partir de: Faust, J./Messner, D. 2004: 8

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incluem Homer-Dixon, Baechler (1999), eKahl (2006).

Como fundador da teoria resource scarcity,Homer-Dixon identifica três dimensões deescassez: i) «Escassez induzida pela disponibi-lidade» (supply-induced scarcity); ii) «Escas-sez induzida pela procura» (demand-inducedscarcity); iii) «Escassez estrutural» (structuralscarcity). A interacção destes três tipos deescassez é mais propícia à eclosão de conflitosintraestados (domésticos) do que a conflitosinterestados (internacionais) (Homer-Dixon,1999: 47-52).

Não foram encontradas evidências de umaconexão directa entre escassez de recursos e aescalada violenta de conflito. No entanto, osestudos do Grupo de Toronto indicaram que aescassez de recursos ambientalmente indu-zida, em combinação com factores económi-cos, políticos e sociais, poderia destabilizarestados e sociedades, com intensidade sufi-ciente para causar conflitos. Na Figura 6esquematiza-se o processo de escassez e asrespectivas consequências.

Por seu lado, a investigação Suíça deu ori-gem a outro importante estudo, o Environment

and Conflicts Project(ENCOP) da SwissPeace Foundation, em Berna (Baechler, Boge,Klotzli, Libiszewski e Spillmann 1996). Ogrosso da investigação foi apresentado em1996, num relatório final baseado em casos deestudo de natureza qualitativa, sobre países emdesenvolvimento com problemas ambientais econflitos armados correntes.

Este projecto assumiu, à partida, que aalteração ambiental poderia levar indirecta-mente ao conflito, reforçando situações pree-xistentes de potencial de conflito socioeconó-mico, já numa fase de escalada de intensidade.Considerando este ponto de vista, os conflitosseriam, em primeira instância, motivadossocial ou politicamente, e não uma consequên-cia directa e irreversível da alteração ambien-tal (WBGU 2008:27).

Os investigadores do projecto ENCOPidentificaram cinco condições favoráveis àocorrência de conflito: 1) desenvolvimento«armadilhado» (trapped); 2) carência de meca-nismos sociais reguladores; 3) instrumentali-zação do ambiente; 4) capacidade organizacio-nal e oportunidade para se armar; 5) sobrepo-sições de padrão histórico de conflito.

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Riscos e ambiente

Os outros dois grupos, introduziram novasmetodologias, tendo enveredado pelo criti-cismo ao trabalho desenvolvido pelos primei-ros. O projecto GECHS concentrou-se na capa-cidade adaptativa das sociedades humanas.

A investigação Canadiana, coordenada porThomas Homer-Dixon (Peace and ConflictStudies Program of the University of Toronto),começou a desenhar-se no início da década de90, desde logo suportado por diversas institui-ções de investigação. Ao longo dos anos 90desenvolveu três grandes projectos, alguns emcolaboração com outras instituições exteriores.

No primeiro projecto, Alteração Ambientale Conflito Agudo (1990 a1993) (Environmen-tal Change and Acute Conflict), equacionam--se as circunstâncias que levam o stressambientalmente induzido a produzir conflitos,internos e externos.

O segundo Projecto em Ambiente, Popula-ção e Segurança (1994 a 1996) (Environment,Population and Security), produziu inúmeroscasos estudo, a maioria publicada por Homer--Dixon em co-autoria com os investigadoresenvolvidos.

O terceiro projecto, «Environmental Scarci-ties, State capacity, and Civil Violence», intro-duziu as dimensões estatais e institucionais nodebate sobre segurança ambiental, destacando a« capacidade adaptativa do estado» face aosdesafios colocados pela escassez ambiental.Esta nova linha de investigação foi divulgadanum artigo de Homer-Dixon, onde introduziu oconceito da possível «lacuna de engenho»11

(the ingenuity gap). Com este conceito, Homer--Dixon argumenta que os efeitos sociais daescassez ambiental poderão retirar aos estados acapacidade de adaptação para fazer face a situa-ções de escassez de recursos no futuro12.

As bases teóricas e conceptuais do trabalhode investigação foram apresentadas em dois

artigos publicados no jornal International Secu-rity (Homer-Dixon, T., 1991, 1994). O âmbitoda investigação incidia sobre três aspectos dosconflitos ambientalmente induzidos:

• Conflitos interestados, em parte devidoa escassez de recursos;

• Conflito subnacional ou intraestado,originado por escassez ambiental indu-zida pelos saldos bruscos de população; e

• Conflito subnacional ou intraestado(guerra civil ou insurreição), originado emparte pelo stress ambiental que exacerba aprivação económica e a não regulação dasinstituições sociais fundamentais.

A investigação empírica do Grupo deToronto teve como cenário os países emdesenvolvimento, assumindo que nesses aligação entre stress ambiental e conflito graveseria mais intensa. «Muitos dos países menosdesenvolvidos do Sul tendem a ter fraca capa-cidade para se adaptarem ao stress ambiental,a riscos biofísicos elevados e, frequentemente,comportam elevadas taxas de crescimentopopulacional» (Homer-Dixon, T., 1991:40).

A literatura produzida sobre «escassez derecursos» (resource scarcity) centrou-se emtorno de degradação ambiental, como causa deconflito, também identificada como o para-digma neomalthusiano (Homer-Dixon1994)13. Os trabalhos lideres neste campo

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Figura 6 – Fontes e consequências de escassez ambiental

Fontes de Escassez Ambiental

Decréscimo na Qualidade e Quantidade de Recursos

Renováveis

Crescimento da População

Desigual Acesso a RecursosRenováveis

Incremento da EscassezAmbiental

Enfraquecimento dos Estados

Decréscimo da Rendibilidade

Económica

Golpes de Estado

Conflitos ÉtnicosMigração Expulsão

Conflitos de Privação

Efeitos Sociais

11 cf. Soromenho-Marques, op.cit. (2005: 73)12 Homer-Dixon 1995b, «The Ingenuity Gap:

Can Poor Countries Adapt to Resource Scarcity?».

Para uma analise crítica deste artigo ver, por exem-plo: Leif Holsson, 1999, capítulo 5, pp. 146-173.

13 Soromenho-Marques, em relação às críticas fei-tas a Homer-Dixon, cujos trabalhos considera serem devalor referencial na última década, refere que Homer-Dixon é acusado de ter uma óptica neo-malthusiana,nomeadamente por sectores neo-marxistas. Soromenhorebate esta acusação de reducionismo com base no per-curso de investigação do professor canadiano, enalte-cendo um seu pensamento que considera ter atingido«um plano de autêntica filosofia da história, ao formu-lar a sua teoria da «lacuna de engenho» (the ingenuitygap)» (Soromenho-Marques 2005:73).

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mentam o risco de conflito interno violento eque os factores económicos e políticos sãocruciais para explicar a eclosão e intensidadedesses conflitos (Hauge e Ellingsen, 1998).

O Mediterrâneo: população,ambiente e segurança

Tendo por base as palavras de AbdallahSaaf, há várias décadas que a questão doespaço euro-mediterrânico está em constanteevolução (IEEI, Estratégia 2005).

O Mediterrâneo é o centro de gravidade dasrelações geopolíticas dos países que partilhamas suas margens, definindo o espaço EURO-MED. Os recursos naturais abundantes, parti-cularmente os energéticos, e as rotas maríti-mas, oleodutos e gasodutos conferem ao Medi-terrânico um valor geoestratégico inquestioná-vel, não só para os vizinhos Europeus comopara o resto do mundo. Mesmo os países maislongínquos, e/ou energeticamente auto-sufi-cientes, serão, directa ou indirectamente, afec-tados por disrupções graves que ali ocorram.

O espaço euromediterrânico (EUROMED)desempenha na actualidade um importantepapel no jogo das relações de políticas externa,de segurança e defesa, comerciais, energéticase migratórias europeias, entre outras de menorvisibilidade, numa lógica quer de relaçõesbilaterais ou de políticas e iniciativas euro-peias alargadas. Por outro lado, as diversasiniciativas comunitárias de cooperação e devizinhança com os países que integram esteespaço atestam, igualmente, a crescenteimportância da região mediterrânica.

Durante o período da Guerra Fria a RegiãoMediterrânica permaneceu num plano secun-dário em matéria de preocupações e políticasde segurança e defesa. No entanto, os aconte-cimentos políticos e sociais que marcaram asderradeiras décadas do século XX, e o alvor doséculo XXI, fomentaram mudanças importan-

tes no relacionamento do Ocidente com ospaíses mediterrânicos do Norte de África eMédio Oriente (MENA).

Os aspectos mais marcantes da sociedadeactual são por demais conhecidos, no entanto,não será descabido referir alguns dos maisimportantes, por também estarem associados,de alguma forma, a esta região: novos actoresinfluentes da Ordem e Paz Mundiais, terro-rismo transnacional, fundamentalismos eextremismos, insegurança, tensões étnicas ereligiosas, pobreza endémica, urbanizaçãocrescente, crises ambientais, escassez derecursos alimentares e energéticos.

O renascimento deste espaço em matériade segurança deve-se, em boa parte, à sua cres-cente importância nos cálculos estratégicos daEuropa, Estados Unidos da América (EUA) eMédio Oriente, onde o peso dos recursos natu-rais e energéticos tem uma grande relevânciano balanço político, económico e social16.

A margem sul do Mediterrâneo regista umaelevada pressão demográfica, que terá, certa-mente, consequências securitárias e ambientais.A demografia é um dos factores de maior dife-renciação entre os países das margens norte e sul.No sul, na região MENA, mantêm-se elevadosritmos de crescimento populacional; no norte,acentuam-se o declínio e o envelhecimentopopulacionais. Entre 1950 e 2000, a populaçãodo Norte de África triplicou, enquanto que apopulação dos então cinco países do Sul daEuropa17 cresceu apenas cerca de 33%.

O incremento populacional continuado con-tribui para o agravamento das condições ambien-tais naturais e sociais, acentuando a depleção de

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Riscos e ambiente

As principais evidências do grupo SuíçoENCOP foram ao encontro do trabalho doGrupo de Toronto, convergindo nos seguintesaspectos14: i) para eclodir um conflito, comoresultado de factores ambientais, seria neces-sário muito mais do que degradação ambiental(ou escassez ambiental); ii) a capacidade adap-tativa da sociedade em geral, e do estado emparticular, seria crucial; iii) o conflito seriamais provável em estados fracos, já de si comfragilidades étnicas, religiosas e regionais, oupadrões históricos de conflito; iv) ainda assim,o aspecto ambiental teria de ser suficiente-mente significativo para conseguir influenciare mobilizar grupos afectados por linhas deruptura, conjugando, em simultâneo, a clarapercepção de oportunidade e vantagem depegar em armas. Apenas nestas circunstânciasé que o conflito poderia ocorrer.

Os resultados da investigação do ENCOPforam apresentados em dois volumes de casosde estudo retirados de regiões montanhosas, daantiga União Soviética, Argélia e Quénia (Ohls-son, L., 1999: 48)15.

A investigação Suíça evidenciou que osconflitos ambientalmente induzidos mais vio-lentos se registaram em países em desenvolvi-mento, particularmente do Sul. Segundo Ohls-son, esta constatação não foi uma mera coinci-dência, salientando que existe uma estreitarelação entre a capacidade institucional, odesempenho técnico, e a capacidade de gestãodos recursos naturais de um país, não obstanteo país ser rico em recursos naturais.

O ENCOP aplicou aquela metodologia emdois projectos de seguimento, tendo por objec-tivo desenvolver procedimentos apropriadospara a cooperação e gestão de situações de poten-cial conflito no Corno de África (ECOMAN) ena Bacia do Nilo (ECONILE) (Bächler, 1998).

Quanto à investigação escandinava, osmaiores desenvolvimentos foram realizadospelo «Internacional Peace Research Institute ofOslo» (PRIO), liderado por Nils Petter Gleditsch.Iniciaram uma linha de pesquisa em 1988, como projecto «Studies in Environmental Security»,enveredando por uma abordagem quantitativa eindependente. Com esta abordagem, procura-ram contrariar a excessiva complexidade dosmodelos qualitativos, que esteve na base do seucriticismo, e proceder à correcção das deficiên-cias apontadas aos projectos pioneiros. A inves-tigação incidiu em casos de estudo selecciona-dos, sobre países com conflitos agudos relacio-nados com recursos (Gleditsch, 1998).

As correntes neo-malthusianas (grupos deToronto e Zurique) advogavam que o incre-mento da pressão populacional, conjugadacom a escassez de recursos, levaria à escaladade conflito, o que lhes mereceu algum criti-cismo. De forma contrastante, o Grupo deOslo argumentava que a abundância de recur-sos era mais favorável à eclosão de conflitosviolentos, referindo que os grupos rebeldes,por exemplo, se financiavam através da apro-priação dos ganhos da exploração de recursosnaturais (WBGU 2008: 28).

Tal como já o tinham feito antes os gruposde Toronto e de Zurique, os estudos quantitati-vos do Grupo de Oslo confirmaram o linkbásico entre problemas ambientais e conflitosarmados (Hauge e Ellingsen, 1998; Diehl eGleditsch, 2000).

A abordagem Norueguesa encarava ostress ambiental apenas como um dos váriosfactores que poderiam contribuir para a esca-lada de conflito, salientando que outros facto-res ambientais, tais como desflorestação,degradação do solo e escassez de água, incre-

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16 Para um estudo aprofundado do Mediterrâneo,abrangendo as dimensões política, social, económica,física, segurança entre outras, enquadradas numaperspectiva de segurança e ambiente, recomenda-se aconsulta de «Security and Environment in the Medi-terranean: Conceptualising Security and Environ-mental Conflicts», Coordenação de Hans GunterBrauch, Springer, 2003, 1136 páginas.

17 França, Grécia, Itália, Portugal, Espanha.

14 Adaptado de Hohlsson, 1999:48.15 Conforme referido, este grupo produziu diversos

casos de estudo, como por exemplo: ENCOP Occasio-nal Paper N.º 11, Klötzli, 1994. «The Water and SoilCrisis in Central Asia – a Source for Future Conflicts?»;ENCOP Occasional Paper Nº. 12, Lang, C.I., 1995.«Environmental Degradation in Kenya as a cause ofPolitical Conflict, Social Stress, and Ethnic Tensions»;ENCOP Occasional Paper N.º 13, Libiszewsky, S. 1995.«Water Disputes in the Jordan Basin Region and theirRole in the Resolution of the Arab-Israeli Conflict».

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ção, e as mudanças de uso operadas nas terrasmais férteis resultam em perdas de solo, trans-porte de sedimentos, e descarga no mar.

Mainguet (1994) faz a distinção entre cau-sas naturais das secas recorrentes e causashumanas da degradação dos solos. O cresci-mento descontrolado da população exerceenormes pressões no uso e utilização do soloagrícola, fazendo disparar o sobre cultivo,sobre pastoreio e a sobre exploração de solosmarginais, com a redução dos regimes de pou-sio. Os aspectos ambientais no Mediterrâneoforam considerados em primeiro plano naestrutura do esquema do Plano de Acção parao Mediterrâneo (Mediterranean Action Plan),ainda em meados da década de 197020.

Em síntese, este século levanta inúmerosdesafios aos países do Médio Oriente e Nortede África, que se confrontam com inúmerosconstrangimentos físicos (naturais), técnicos,económicos e sociais, entre outros, e que ten-derão a agravar as condições e qualidade devida de facções significavas das respectivaspopulações locais. O agravamento extremadodas condições de funcionamento dos sistemasde suporte de vida e sobrevivência terãoimpactes económicos e sociais muito signifi-cativos nos países MENA, cujas repercussõesse irão sentir com grande intensidade nos paí-ses da Europa Comunitária, com inevitáveisrepercussões nos níveis e padrões de segu-rança humana e colectiva.

Espaço EUROMED: Desafios, RiscosPartilhados e Cooperação

Os principais desafios e riscos que se colo-cam no espaço EUROMED, perante os cená-rios de alteração e degradação ambiental, sãode duas naturezas: a alteração física e osimpactes nas sociedades. A alteração do meiofísico e os principais reflexos sociais e políti-cos nos países da região MENA já foramsumariados anteriormente.

O acentuar de algumas das característicasassociadas à desertificação (falta de água e ari-dez dos solos) é um dos grandes desafios e ris-cos comuns a toda a Região Mediterrânea,ainda que diferenciadamente, que estes paísesterão de enfrentar e superar na geração actuale vindouras.

Os países da frente norte do Mediterrâneotambém já estão a sentir o acentuar, com maiorou menor intensidade, de alguns dos efeitosdas alterações ambientais globais em curso,nomeadamente ao nível do incremento desituações pontuais de escassez hídrica, comopor exemplo a situação vivida na Catalunha,para além da acentuação da aridez de solos.

No entanto, e sem negligenciar os aspectosfísicos, para cuja adaptação e mitigação de efei-tos dependerá a verificação ou não de «lacunade engenho», como referido, os aspectos huma-nos edificarão os maiores desafios e riscos nodecorrer das décadas vindouras. Por exemplo,atente-se aos já referidos acontecimentos, aindarecentes, de agitação social e tumultuosa vivi-dos em Paris e noutras cidades Francesas.

Baseado em diversos autores e relatórios, éseguro afirmar-se que os fluxos migratóriosem curso dos países ribeirinhos da margem sulmediterrânica para os países da margem nortedispararão, quer os de origem local quer osoriundos de latitudes mais austrais, que miramchegar à Europa através do Mediterrâneo.

O aspecto positivo destes afluxos migrató-rios, visto pelo lado do Norte, será o contri-buto que estes imigrantes darão para a revita-

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solo e floresta, declínio das condições de saúde,propagação de endemias, êxodo rural, urbaniza-ção e fluxos migratórios para as áreas desenvol-vidas. A degradação ambiental, agravada peloscenários de alteração climática, reflecte-senegativamente no desempenho económico,repercutindo-se na segurança local e regional.Os fenómenos migratórios ilegais e os diferen-tes tráficos, incluindo humano, alimentam redesclandestinas de crime organizado, induzeminsegurança, alimentam tensões raciais e podemexacerbar fundamentalismos e radicalismos nospaíses de acolhimento, conforme se viu recen-temente em várias partes de França.

Desafios ambientais e consequênciasno Mediterrâneo

Entre os desafios regionais que afrontam oMediterrâneo, na alvorada deste século XXI, aalteração climática (climate change) assumeuma das posições cimeiras, pelo impacte quepoderá ter na precipitação, erosão do solo edesertificação, agravando ainda mais as situa-ções de fragilidade ecológica e social já sen-tida em muitas regiões. A interacção destestrês factores físicos afectará significativa-mente as potencialidades agrícolas na região,nomeadamente ao nível da disponibilidade equalidade de solo agrícola e da produtividadedas safras.

Adicionalmente a estes factores físicos,três padrões de evolução humana terão de sertomados em conta: crescimento populacional,urbanização e a crescente procura de água e dealimentos. Tal como diversos estudos do IPCC(Intergovernmental Panel on Climat Change)indicaram, estes seis factores, que definem o«hexágono de sobrevivência» (survival hexa-gon)18, não podem ser separados nem analisa-

dos isoladamente os impactes da mudança cli-mática, no rol da definição de políticas futurasde segurança (AFES-PRESS 2002).

Determinadas características são comuns atodos os países mediterrânicos, a saber: des-vios significativos nas normais climáticasregionais, agravamento e intensificação decondições climáticas extremas (secas, inunda-ções), acentuação de situações de escassezhídrica (veja-se o caso de Barcelona), erosãodo solo e acentuação de condições de semiari-dez e aridez19. No entanto, também se podemestabelecer diferenças significativas entre ospaíses, a saber: padrões demográficos, escas-sez e excedentes alimentares, padrões de urba-nização e índices de poluição. Em termosmédios, toda a região comporta níveis escas-sos de água potável, em termos absolutos erelativos. A disponibilidade de água por habi-tante tem vindo a diminuir desde 1960, verifi-cando-se decréscimos significativos da quanti-dade de água disponível para produzir alimen-tos em diversas regiões, com inevitáveis reper-cussões negativas nos níveis de produção dealimentos.

O deserto do Sara limita o solo agrícola detodos os países do Norte de África, o qualrepresenta apenas cerca de 5% da superfícietotal desta região. Além disso, mais de 45% daárea dedicada à agricultura enfrenta algumaforma de degradação. A sobre exploração daterra, devido à especialização e à intensifica-ção de colheitas, torna o solo ainda mais vul-nerável à erosão. A salinização do solo e a ero-são hídrica são consequências da desfloresta-

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20 Em 1975, três anos após a Conferência deEstocolmo que estabeleceu o Programa Ambientaldas Nações Unidas (UNEP), 16 países Mediterrâni-cos e a Comunidade Europeia adoptaram o Mediter-ranean Action Plan (MAP), cujo principal objectivoera controlar a poluição marítima (http://www.unep-map.org/index.php?module=content2&catid=001001002); http://195.97.36.231/dbases/webdocs/BCP/MAPPhaseI_eng.pdf

18 Brauch considera a existência de seis factoresque contribuem para a mudança global ambiental(GEC) e que se combinam num «hexágono de sobre-

vivência»: 1) crescimento populacional; 2) padrão deurbanização; 3) disponibilidade agrícola e procuraalimentar; 4) alteração climática; 5) escassez e degra-dação de água; e 6) degradação e erosão do solo(Brauch 2000, 2002, 2003).

19 Para definições de escassez de água (waterscarcity) e secas (droughts) e qual o ponto de situa-ção no Mediterrâneo ver: MED WS&D WG, 2007(http://www.emwis.net/topics/WaterScarcity).

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vos da prevenção visarão o fim último deesbater as assimetrias de desenvolvimentoentre os dois mundosque, paradoxalmente,coabitam neste espaço, progressivamente maisestrangulado, que é o Planeta Terra.

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Riscos e ambiente

lização e rejuvenescimento das estruturasdemográficas e produtivas desta envelhecidaEuropa Comunitária.

Sendo esse um aspecto positivo para asociedade e economia europeias, convém nãoesquecer que as duas margens mediterrânicascomportam diferenças culturais, religiosas ede costumes muito significativas, o que iráconsubstanciar desafios e riscos para os regi-mes europeus, exigindo esforços e políticasconcertadas de imigração e de inserção social,sob pena de se induzirem e agravarem situa-ções de tensão e ruptura, baseadas em diferen-ças étnicas, culturais e religiosas.

Por último, um breve enunciar dos princi-pais mecanismos e instrumentos de coopera-ção que incidem sobre este espaço. Ao nível dacooperação em matéria de segurança, desta-que-se o «Diálogo Mediterrânico» (Mediterra-nean Dialogue) estabelecido em 1994 entre aAliança Atlântica (OTAN) e os paísesMENA21. Parceria com a Organização para aSegurança e Cooperação na Europa (OSCE),seis países mediterrânicos integram os «Par-ceiros Mediterrânicos para a Cooperação»(Mediterranean Partners for Co-operation)22.«Iniciativa 5+5», inicialmente «5+3», parceriade defesa entre 5 estados mediterrânicos daEU (Portugal, Espanha, Itália, França e Malta)e cinco estados mediterrânicos da MENA(Mauritânia, Marrocos, Argélia, Tunísia eLíbia)23. «Processo de Barcelona», que visapromover as relações entre a União e os paísese os territórios da bacia mediterrânica. EsteProcesso, fundado em1995, constitui um quadroregional que reúne parceiros a nível técnico epolítico, com o objectivo de promover e dedesenvolver os interesses comuns. O Processode Barcelona apoia-se numa rede de relações

bilaterais entre cada país parceiro mediterrâ-nico e a União, sob a forma de Acordos deAssociação. Por último, «Política Europeia deVizinhança», que visa o estreitamento de rela-ções entre a EU e os seus vizinhos24.

Notas Finais

A estruturação e desenvolvimento desteartigo teve presente o ensejo de estimular acomunicação e veicular a mensagem sobre aimportância crescentes dos problemas ambien-tais nas relações sociais, políticas e económi-cas e consequências nos padrões de segurança.A sucinta revisão bibliográfica pretendeu,antes de mais, estimular o interesse sobre estamatéria e fornecer pistas para desenvolvimen-tos futuros.

Ficou bem claro que as consequências dasalterações ambientais, e da (in)segurançaambiental em geral, poderão assumir magnitu-des muito diferenciadas nos países desenvolvi-dos e nos em desenvolvimento, configurandodesafios e oportunidades aos diferentes actoresem jogo. Esta diferenciação decorrerá, em boaparte, daquilo que Homer-Dixon intitulou de«the ingenuity gap» ou «lacuna de engenho»,como escreve com mestria Soromenho-Mar-ques. Tal assumpção remete para os planosgovernativo, institucional e académico, muitada responsabilidade política, social e científicaque preside a esta matéria, essencialmente emtrês planos distintos mas indissociáveis: iden-tificar, prevenir e atacar – as origens e conse-quências da insegurança ambiental.

A prevenção deverá ser o veículo de exce-lência para atacar a génese da «segurançaambiental» e dos conflitos ambientalmenteinduzidos, em estreita consonância com a suaidentificação e detecção precoces. Os objecti-

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21Consultar: http://www.nato.int/med-dial/home.htm22 Consultar:http://www.osce.org/about/19293.html23 Consultar: http://www.eu2007.pt/NR/rdonly-

res/7F64435C-1ADF-4DCE-8FC2-1C319028821D/0/PgPESDPT.pdf

24 Consultar, por exemplo: http://europa.eu/scad-plus/leg/pt/s05052.htm

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RRRRIIIISSSSCCCCOOOOSSSS NNNNAAAATTTTUUUURRRRAAAAIIIISSSS EEEE TTTTEEEECCCCNNNNOOOOLLLLÓÓÓÓGGGGIIIICCCCOOOOSSSSNNNNOOOO AAAALLLLEEEENNNNTTTTEEEEJJJJOOOO

Joaquim Condessa; José Luís Faustino; Maria do Rosário Ramalho*

Inforgeo, 2007/2008, 85-90

1. Introdução

De acordo com uma análise territorial dosacidentes naturais ocorridos em Portugal e daperigosidade a eles associada, o interior alen-tejano é a região mais segura do país (Zêzereet al., 2007).

Na região Alentejo, de entre os riscos natu-rais e tecnológicos, de gravidade e extensãodiferenciadas, destacam-se as alterações aociclo hidrológico (secas e cheias), o risco deincêndio, o risco sísmico, o risco associado aotransporte de materiais perigosos e o risco dedesertificação. Este último risco, sendo umfenómeno generalizado em grande parte doAlentejo, será objecto de uma abordagemespecífica apresentada mais adiante.

2. Perigosidade natural e tecnológica no Alentejo

No Alentejo, as áreas identificadas comode elevada perigosidade sísmica– correspon-dendo apenas a cerca de 7% da região – loca-lizam-se no litoral e em parte do concelho deAlmodôvar. Os concelhos mais ameaçados são

Alcácer do Sal, Grândola e Almodôvar,embora Santiago do Cacém, Sines e Odemiratambém possam ser parcialmente afectados.

O risco de inundação por cheias, comumàs quatro principais bacias hidrográficas daregião (Tejo, Guadiana, Sado e Mira) está,normalmente, associado a precipitações inten-sas concentradas em curtos espaços de tempo,em que se verifica uma manifesta incapaci-dade da rede hidrográfica para dar resposta aoescoamento torrencial (Figura 1).

Foram identificadas diversas áreas comriscos de inundação, de entre as quais, se des-tacam as seguintes localidades:

– Na bacia do Sado, Funcheira, Garvão eCarregueiro, nos concelhos de Ourique ede Aljustrel;

– Na bacia do Guadiana, Odeleite, Alber-noa, Beliche, Azinhal, Sobral da Adiça,Quintos, Cabeça Gorda e Baleizão;

– Na bacia do Mira, Santana da Serra,Santa Clara, Sabóia e Santa Clara-a-Velha.

Tendo em conta as importantes estruturashidráulicas construídas no Alentejo, existeainda o perigo de inundação de algumaspovoações por eventual ruptura das barragens.Estão nesta situação, a povoação de Alcácer doSal, que poderá ser afectada pela ruptura dabarragem de Pego do Altar; Odemira, situada a

* Comissão de Coordenação e DesenvolvimentoRegional do Alentejo

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jusante da Barragem de Santa Clara; e aspovoações de Moura e de Mértola, localizadasa jusante da Barragem de Alqueva.

Num outro contexto, as zonas baixas doLitoral Alentejano (praias e formações duna-res), estão sujeitas ao risco de inundaçãoemconsequência da ocorrência de eventuais tsu-namis. Portugal está actualmente ligado a umsistema de alerta precoce de tsunamis, cujoequipamento de monitorização se encontrainstalado a SW do Cabo de S. Vicente.

Relativamente ao recuo da linha de costa,na região Alentejo, foram considerados os sec-tores identificados na «Carta de Risco do Lito-ral». Assim, no sector Sado-Sines, foram iden-tificadas duas áreas com «baixo risco de ero-são»: uma talhada em formações dunares, naPraia Atlântica-Península de Tróia, e outralocalizada na zona central do troço em causa,relacionada com erosão subaérea das arribasareníticas (Figura 2).

No que respeita ao sector costeiro com-preendido entre Sines e Odeceixe, verifica-seque o mesmo se encontra integralmente

incluído na categoria de «baixo risco de ero-são». Aqui, o recuo da linha de costa corres-ponde ao eventual colapso de blocos rochososprovenientes da erosão das arribas alcantiladas.

Em nenhum dos casos se verificam situa-ções que coloquem em risco pessoas e bens.Contudo, a ocupação destas áreas deve serencarada com precaução.

Os períodos de seca recorrentes, associa-dos a vagas de calor, elevam os índices derisco de incêndioa valores extremos durantelargos períodos. Nos últimos anos, tem-severificado um aumento da área ardida comincêndios de grande dimensão (superiores a100 hectares; Figura 3). Foi no Verão de 2003,que ocorreu o pior período de incêndios flo-restais no território regional, tendo-se regis-tado no distrito de Portalegre seis incêndiosflorestais que resultaram em cerca de 82 milhectares ardidos.

Com base na informação fornecida pelaAutoridade Florestal Nacional (ex– DGRF),constata-se a existência de risco de incêndioalto a muito alto:

– no Norte Alentejano, designadamentenos concelhos de Gavião, Ponte de Sôr,Alter do Chão, Crato, Portalegre, Mar-vão, Castelo de Vide e Nisa;

– e mais a Sul, no litoral, na serra do Cer-cal e nos concelhos que dão continuidadeà serra algarvia: Odemira, Ourique eAlmodôvar.

Tendo em conta o elevado grau de vulne-rabilidade à contaminação de importantesreservas de água subterrânea, do ponto vistanacional e regional – de que se destacam osaquíferos localizados na Bacia Terciária doTejo-Sado, e os aquíferos de Elvas-Vila Boim,de Estremoz-Cano, de Moura-Ficalho, dosGabros de Beja e de Sines –, importa acautelar

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Figura 1 – Escoamento torrencial no Pulo do Lobo/Mértola (fotografia cedida pelo PNVG) Figura 2 – Erosão subaérea das arribas areníticas na Praia da Galé – Fontaínhas

Figura 3 – Área ardida/ n.º de ocorrências (AFN, ex-DGRF)

1980 1981 1982 1983 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 19992000 2001 20022003 2004 2005 2006

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entidades relevantes. Também à escala daregião, dever-se-á promover a sinergia, a con-vergência e a articulação de estratégias nacio-nais relacionadas com:

– Luta contra a desertificação;– Desenvolvimento sustentável;– Biodiversidade;– Alterações climáticas.

O combate à desertificação é também umaluta pelo desenvolvimento ambientalmentesustentável. É uma luta contra a pobreza, con-tra a exclusão social, pela educação, pormelhores condições de saúde para as popula-ções, pela diversificação das actividades eco-nómicas, privilegiando as de maior valoracrescentado, tirando partido de adequadosincentivos para as áreas mais susceptíveis, deforma a viabilizar o seu futuro.

Passa também pela prevenção, contenção,mitigação e adaptação às alterações climáti-cas, às secas e a outros fenómenos naturaisextremos e aos riscos naturais e tecnológicos.

Realiza-se através de acções e medidas deconservação do solo, da água e da biodiversi-dade, pela protecção ambiental e pela salva-guarda e valorização da paisagem.

Fundamenta-se no aprofundamento doconhecimento científico, através de investiga-ção séria e consequente e na sua aplicaçãopragmática.

O combate à desertificação exige aindadivulgação de informação e efectiva-se atravésda participação pública na discussão do pro-blema da desertificação e na procura e na apli-cação de soluções.

4. Conclusão

A Figura 4 representa a incidência territo-rial dos diferentes tipos de fenómenos perigo-sos considerados neste trabalho.

A insuficiente informação disponível rela-tivamente à temática dos riscos naturais e tec-nológicos, aponta para a necessidade de apro-fundamento do conhecimento e para o desen-volvimento e implementação de um sistemaintegrado de informação e monitorização dosvários riscos, que permita a identificação eabordagem das áreas críticas, o acompanha-mento da sua dinâmica e o estabelecimento debases de intervenção preventiva.

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a sua preservação, evitando a infiltração dediversos tipos de substâncias poluentes.

Do ponto de vista do risco tecnológico,Sines é o concelho que apresenta mais perigospor concentrar um maior número de estabele-cimentos industriais susceptíveis de provocaracidentes resultantes de emissões, incêndiosou explosões de grandes proporções.

A região é ainda atravessada por dois gaso-dutos (um em exploração e outro em constru-ção) e por um oleoduto.

3. O problema da desertificação

A desertificação consiste num processocomplexo de degradação ambiental da Terra(solo, água, biodiversidade e paisagem) naszonas de clima árido, semiárido e sub-húmidassecas, em resultado de vários factores,incluindo as variações climáticas e as activida-des humanas. Em Portugal, a erosão, os incên-dios florestais, o despovoamento, o agrava-mento dos efeitos das secas e a debilidade eco-nómica do interior são expressões evidentes dedesertificação. Este fenómeno ocorre porqueos ecossistemas das zonas secas são extrema-mente vulneráveis à sobreexploração e utiliza-ção inapropriada do solo e da água. Factorescomo a desflorestação, o sobre-pastoreio, airrigação mal conduzida, as más práticas agrí-colas, conjugados com condições climáticasadversas contribuem para o agravamento dosproblemas de erosão, compactação e saliniza-ção dos solos, assim como para a degradaçãodos recursos hídricos, perda de biodiversidade,despovoamento e debilitação socioeconómica.

Cerca de um terço do território continentalportuguês e quase todo o Alentejo é susceptí-vel ou muito susceptível à desertificação(clima, solo, vegetação e uso do solo). Umaárea de mais de 3/4 do Alentejo (77%) apresentasusceptibilidade à desertificação, sendo que60% do Alentejo é mesmo muito susceptível.

Têm sido identificados como sinais do pro-

cesso de desertificação, de entre outros, a uti-lização de técnicas agrícolas inadequadas, aerosão do solo, a degradação do coberto vege-tal, a aplicação de políticas agrícolas inade-quadas e o despovoamento do espaço rural.

Como causas e barreiras têm sido aponta-das a falta de informação, a inadequação desubsídios, a falta de coordenação entre entida-des, a falta de visão política, a falta de espíritoassociativo, o envelhecimento da população,os aspectos culturais e baixos níveis de quali-ficação, a resistência à mudança e os fracosíndices de inovação e de espírito empresarial.

Como soluções, tem-se avançado com anecessidade de aplicação efectiva das boas prá-ticas ambientais, agrícolas, florestais e pecuá-rias; a florestação e reconversão do tipo de flo-resta (para azinheira e sobreiro e povoamentosmistos); o melhoramento das pastagens e apro-veitamento do subcoberto com pastorícia; aredução do escoamento torrencial e a preserva-ção e recuperação da rede hidrográfica e davegetação ripícola; a melhoria das acessibilida-des, equipamentos e infra-estruturas de apoiosocial; a valorização dos produtos regionaiscomo o turismo, a caça, produtos da actividaderural, o cultivo de frutos secos e de aromáticas.

Face a esta situação, os diversos níveis deplaneamento territorial e sectorial com inci-dência regional terão de incorporar orienta-ções de combate à desertificação, designada-mente nos seguintes domínios:

– Conservação do solo e da água;– Fixação de população activa nas zonas

rurais;– Recuperação de áreas degradadas;– Envolvimento das populações.

Para isso, verifica-se a necessidade deactualizar e desenvolver os objectivos da lutacontra a desertificação, adaptando-os à reali-dade do Alentejo, desenhando e aplicandomedidas articuladas num programa de acçãoregional, através da actuação concertada das

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Figura 4 – Cartografia dos riscos naturais e tecnológicos na região Alentejo

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