rio d'ouro: caminho de ferro, caminho das Águas - ihgbi

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DIGITAL Resenha Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá ANO 1 | Nº 2 | GRATUITO | JANEIRO – FEVEREIRO – MARÇO 2012 RIO D’OURO: RIO D RIO D OURO: OURO: Caminho de Ferro Caminho das Águas Caminho de Ferro Caminho de Ferro Caminho das Caminho das Á Á guas guas Olhem Bem as Torres da Igreja da Penha! Olhem Bem as Torres da Igreja da Penha! Al Al é é m de Iraj m de Iraj á á : Inha : Inha ú ú ma, Sub ma, Sub ú ú rbio Carioca rbio Carioca Vaz Lobo: Cinema, Bairro, Resgate e Patrimônio Vaz Lobo: Cinema, Bairro, Resgate e Patrimônio Dona Ivone Lara: Na Academia e no Imp Dona Ivone Lara: Na Academia e no Imp é é rio rio

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Page 1: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

DIGITALResenha

Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá

ANO 1 | Nº 2 | GRATUITO | JANEIRO – FEVEREIRO – MARÇO 2012

RIO D’OURO: RIO DRIO D’’OURO: OURO: Caminho de Ferro

Caminho das ÁguasCaminho de FerroCaminho de Ferro

Caminho das Caminho das ÁÁguasguas

Olhem Bem as Torres da Igreja da Penha!Olhem Bem as Torres da Igreja da Penha!AlAléém de Irajm de Irajáá: Inha: Inhaúúma, Subma, Subúúrbio Cariocarbio Carioca

Vaz Lobo: Cinema, Bairro, Resgate e PatrimônioVaz Lobo: Cinema, Bairro, Resgate e PatrimônioDona Ivone Lara: Na Academia e no ImpDona Ivone Lara: Na Academia e no Impéériorio

Page 2: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

Resenha

DIGITALPublicação e-magazine trimestral do

Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá

História, geografia e demais ciências na Baixada de Irajá e seus bairros.

Aberto à publicação de colaborações

Distribuição Gratuita pela Internet

Ano 1 Numero 2 Janeiro - Fevereiro - Março

2012

Produção e EditoraçãoColegiado de Fundação do IHGBI

Fernanda de Oliveira Nascimento Costa Gilson B. de Gusmão - José Carlos Joaquim

Karen Barros - Maria Celeste.Ferreira Roberto Mattos - Ronaldo Luiz-Martins

Rolf de Souza - Vanderley Giarola

Colaboradores nesta ediçãoGuilherme Peres de Carvalho

Rachel Gomes Lima Sonia Rabelo

COLABORE COM A Resenha

ENVIE SEU TRABALHO PARA PUBLICAÇÃO

BAIXADA DE IRAJÁ: Acari – Anchieta - Barros Filho - Bento Ribeiro - Brás de Pina – Campinho - Campo dos Afonsos - Coelho Neto - Colégio - Cordovil - Costa Barros - Deodoro – Guadalupe - Honório Gurgel - Irajá - Jardim América - Sulacap - Madureira - Marechal Hermes - Olaria - Oswaldo Cruz - Parada de Lucas – Parque Anchieta - Parque Columbia - Pavuna - Penha - Penha Circular - Ramos - Rocha Miranda – Ricardo Albuquerque - Turiaçu - Vaz Lobo - Vicente Carvalho - Vigário Geral - Vila da Penha - Vila Kosmos – Vila Valqueire - Vista Alegre.

EM: História – Geográfia - Arquitetura – Arqueologia – Antropologia – Geologia – Urbanismo – Cartografia – Mineralogia – Engenharia – Sociologia – Museologia – Literatura e Biblioteconomia – Biomedicina – Botânica – Zoologia – Musica – Teatro/Dança – Pintura/Desenho – Direito – Economia – Comunicação – Comércio – Serviço – Indústria – Transporte

NÃO ACADÊMICO E ACADÊMICO: Memorista – Pós Universitário – Universitário – Médio – Fundamental

SEÇÕES ESPECIAIS: Academia: produção na formação acadêmica

Ensaio: produção na formação médio e técnicaPrimeiro Passo: produção na formação fundamental

Comentando: estimulo à livre produção da crônica social e urbana –Lembrando: estimulo à livre produção da memória popular.

Além de Irajá: espaço da baixadas VizinhasHistória em Imagem : a memória icnográfica da baixada de Irajá

ASSINATURA DO E-MAGAZINE

Resenha

DIGITAL

Envie seu e-mail para [email protected]

e receba as edições Adobe Reader (.pdf) em sua caixa postal

CENTRO CULTURAL DE CENTRO CULTURAL DE ARTES CÊNICA E AUDIO ARTES CÊNICA E AUDIO

VISUALVISUAL

Page 3: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

NESTA EDIÇÃO

FALA A EDIÇÃOGilson GusmãoTESTEMUNHO DA HISTÓRIA – CAMINHANDO...

AGENDAAconteceu e o que vai acontecer na Baixada de Irajá

OPINIÃO DO LEITORCorrespondência para a redaçãocaixa postal [email protected]

ARTIGO

RIO D’OURO: CAMINHO DE FERRO E CAMINHO DAS ÁGUASRonaldo Luiz-Martins

COMENTANDO

OLHE BEM AS TORRES DA IGREJA DA PENHASonia Rabelo

DONA IVONE LARA – UM ESTUDO DE DOIS CASOS: NA ACADEMIA E NO IMPÉRIO SERRANORoberto Mattos

ALÉM DE IRAJÁ

CONTRIBUIÇÃO A HISTÓRIA DE INHAÚMA: ELITES, USOS E FORMAS DE APROPRIAÇÃO DAS TERRAS, RELAÇÕES SOCIAIS E ECONÔMICASRaquel Gomes de Lima

CONTRIBUIÇÃO À HISTÓRIA DO SUBÚRBIO CARIOCAGuilherme Peres

ACADEMIA

CINE VAZ LOBO EM DIALOGO COM O MEIO AMBIENTE E A EDUCAÇÃO PATRIMONIALKaren Basto

ERA UMA VAZ... O RESGATE DE UM SUBÚRBIO ESQUECIDOFernanda de Oliveira Nascimento Costa

HISTÓRIA EM IMAGEM

O BAIRRO DE RAMOS EM 1959Redação da resenha Digital.

ESPAÇO FINAL

BONDE DO CARNAVALRonaldo Luiz-Martins

ENSAIO

Espaço da formação média e técnica - Resenha e ensaios

PRIMEIRO PASSO

Espaço da formação fundamental – Redação

LEMBRANDO

Espaço da memória popular.

PPáág. 61g. 61

PPáág. 04g. 04 PPáág. 06g. 06

PPáág. 07g. 07

PPáág. 09g. 09

PPáág. 17g. 17

PPáág. 21g. 21

PPáág. 37g. 37

PPáág. 24g. 24

PPáág. 50g. 50

PPáág. 45g. 45

PPáág. 57g. 57PPáág. 56g. 56PPáág. 55g. 55

PPáág. 58g. 58

Page 4: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

FALA A EDIÇÃO

TESTEMUNHOS DA HISTÓRIACAMINHANDO...

Gilson Gusmão *

RIO D'OURO - a estrada a qual conduziu a riqueza que contribuiu, de Irajá ate o grande centro urbano que é hoje a capital Rio de Janeiro. Encontro de dois rios.

RIO D'OURO - nascido nas plagas de Nova Iguaçu - que em Tupi-Guarani significa “grande quantidade de água” ou "água grande" - no seu curso, alem da riqueza mineral e vegetal, alimentos que brotavam das terras da Grande Irajá, rastreou o progresso da estrada de ferro que recebeu seu nome e da romântica " Maria Fumaça" que no seu caminho vislumbra-se a igreja da Penha que, num trabalho de Sonia Rabelo - vereadora e professora de Direito da UERJ, cutuca, num ensaio premonitivo o progresso que se interpõe entre a comunidade de singelas residências ofuscando a visão pelos portentosos "arranha-céus", plutocracia macro econômica de, algumas vezes, duvidoso gosto, sufocando a fé. Caminhando mais, temos monografias capturadas de trabalhos científicos, belíssimos, que versam sobre o estiloso, porem firme, CINE VAZ LOBO, objeto de nossa bandeira inicial. A passos largos adentramos em nova seção de nossa revista - ALEM DE IRAJA - dissertando sobre a Freguesia de Inhaúma - bairro do mesmo nome, complementando com HISTORIA EM IMAGEM, onde buscaremos, com fotos antigas, a evolução social no solo da "grande Irajá, e seus bairros, neste segundo numero da nossa Revista Resenha.

Assim buscamos dar testemunho aqueles que construíram a historia da região que habitamos.

* GUSMÂO, Gilson: Advogado, membro fundador do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá e do Movimento Cine Vaz Lobo: Preservação, Cultura e Memória.

IGREJA DE N. Srª. da APRESENTAÇÃO DE IRAJÁ1613 - QUARTO CENTENÁRIO - 2013

A MAIS ANTIGA MATRIZ DE FREGUESIA EM VOLUMETRIA ORIGINAL DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO

PLANO PROGRAMA DOINSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BAIXADA DE IRAJÁ

AÇÃO PELA REVISÃO DO TOMBAMENTO DO IMÓVEL NO PATRIMÔNIO HISTÓRICO NACIONAL E TOMBAMENTO DOS BENS MÓVEIS E INCORPORADOS

RESTAURAÇÃO EM PROXIMIDADE AO ORIGINAL

PROSPECÇÃO HISTÓRICA DOS LIVROS DA MATRIZ E SUA DIVULGAÇÃO PARA A PESQUISA

Page 5: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

PARCEIROS DO INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO BAIXADA DE IRAJÁ

AssociaAssociaçção Comercial ão Comercial do Grande do Grande

Mercado de MadureiraMercado de Madureira

Rua Conselheiro Galvão, 58 sl. 407Madureira - Rio de Janeiro – RJ

www.acogramm.com.br

CENTRO CULTURAL CENTRO CULTURAL CASARTICASARTI

Cineclube Cineclube -- Oficinas de capacitaOficinas de capacitaçção em ão em ááudio, cinema e vudio, cinema e víídeodeo

Rua Ponta Porã, 15 SobradoVista Alegre - Rio de Janeiro – [email protected]

BICUDA ECOLÓGICARÁDIO COMUNITÁRIA BICUDA FM – 98,7 FM

Associação em Defesa da Qualidade de Vida, do meio Ambiente e do Patrimônio Histórico, Cultural e Artístico.

Av. Min. Edgar Romero, 896 / 302 e 303 Vaz Lobo – Rio de Janeiro – RJ

[email protected]

CINECLUBE SUBÚRBIO EM TRANSE

ALMA SUBURBANADocumentário

Filmes e documentários em sessões para apaixonados por cinema

Rua Ponta Porã, 15 SobradoVista Alegre - Rio de Janeiro – RJ

Page 6: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

agenda

ACONTECEU :

Caminhada Pela Cultura e Pela Paz - Realizada em 6 de novembro em Rocha Miranda, a Caminhada Pela Cultura e Pela Paz, promovida pelo Movimento Cultural Pró Cine Guaraci e o Movimento União das Comunidades – MUC, teve por meta obter a revisão da anulação do tombamento patrimonial do antigo cinema Guaraci, a preservação e recuperação do seu prédio, e a sua transformação em Centro Cultural. O evento teve inicio com uma caminhada com saída da praça Profª. Virginia Cidade em Coelho Neto e chegada à praça 8 de Maio em Rocha Miranda, local onde foram realizadas atividades de exposições, teatro, cinema, circo, música, dança, hip- hop e samba. Presente ao evento pelo o IHGBI esteve a professora e historiadora Maria Celeste Ferreira.

Semana Paixão de Ler - Participando da semana Paixão de Ler promovida pela Secretaria Municipal de Cultural, em 11 de novembro foi realizada no auditório da Biblioteca Municipal João do Rio, em Irajá, a palestra “Caminhos de Comércio”. Baseada no livro “Mercadão de Madureira: Caminhos de Comércio” e apresentada pelo seu autor Ronaldo Luiz-Martins, com a participação da professora e historiadora Karen Barros, tendo por público alvo estudantes do ensino fundamental a palestra teve por objetivo o estimulo a leitura e a busca do conhecimento histórico. Com apoio do IHGBI e do Mercadão de Madureira, o evento contou ainda com a exposição de posteres sobre o livro citado, o Movimento Cine Vaz Lobo e o IHGBI.

Dez anos da Revista Pilares da História. Em Seção Solene da Câmara Municipal de Duque de Caxias e do Instituto Histórico de Duque de Caxias realizada 5 de dezembro, foram comemorados os Dez Anos da Revista Pilares da História. No evento, no qual o IHGBI foi representado pelos membros de seu Colegiado de Fundação Maria Celeste Ferreira e Ronaldo Luiz-Martins, foi feito o lançamento da edição especial “Revista Pilares da História – 10 Anos”.

Lançamento do Livro “O Rapto Ideólogico da Categoria Subúrbio” Na Livraria Travessa do prédio do IPHAN - Av. Rio Branco, em 13 de dezembro o Prof. Dr. Nelson Nóbrega Fernandes realizou a noite de autógrafo e lançamento do seu novo livro “O Rapto Ideólogico da Categoria Subúrbio” - Editora Apicuri. Presentes ao evento os representantes do IHGBI Maria Celeste Ferreira e Ronaldo Luiz-Martins

Dotação de Verba Orçamentária Municipal para o Cine Vaz Lobo. Em dezembro, por iniciativa da Vereadora Sonia Rabello (PV), foi incluído ao Orçamento Municipal da Cidade Rio de Janeiro 2012, emenda orçamentária no valor de R$ 80.000,00 para a implantação de unidade cultural no bairro de Vaz Lobo, especificamente no já existente Cine Vaz Lobo.

Transferência de Recursos da União para a desapropriação do prédio do Cine Vaz Lobo. Em dezembro, ação da Prefeitura do Rio para a transferência de dotação do Ministério da Cultura – orçamento 2011, no valor de R$ 500.000,00 da emenda orçamentária de iniciativa do Deputado Federal Miro Teixeira (PDT-RJ), especifica para a desapropriação do prédio do Cine Vaz Lobo e a sua aplicação como Centro Cultural

Não se realizou a Assembléia de Solene Fundação do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá. O Comitê de Fundação entendeu pela melhor formulação do futuro estatuto em acordo com o disposto na Lei 9790 de 23 de março de 1999, a qual dispõe quanto a qualificação como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público.

VAI ACONTECER:

Ciclo de Palestra “História Do Lugar: Um Novo Caminho” - Terá inicio em abril de 2012, um novo ciclo de palestra sobre a “História do Lugar”, agora com o tema “Um Novo Caminho”. Projeto de parceria do IHGBI e Terranova / Consórcio Construtor Transcarioca e apoio logístico da Secretaria Municipal de Educação, o ciclo de palestras, que contará também com exposição de pôster, será realizado em escolas municipais e instituições na áreas de interferência da construção do Corredor Transcarioca. A montagem de método, conteúdo e material estará sendo desenvolvido por equipe do IHGBI formada por seus componentes Fernanda Costa, Karen Barros, Maria Celeste Ferreira, Gilson Gusmão, Joaquim Justino dos Santos, Roberto Mattos e Ronaldo Luiz-Martins. .

I Foro Grande Irajá - Esta planejado para ser realizado no mês de abril de 2012 o I Foro Grande Irajá com a realização de seminários, exposições, atividades de teatro, música, cinema e desenho, tendo por objetivo a pesquisa, produção e divulgação do conhecimento multifário da Baixada de Irajá. O evento, de iniciativa da parceria do IHGBI e CASARTI – Casa do Artista Independente, tem por coordenadores os membros fundadores de IHGBI Rolf de Souza e Flávio Lima.

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OPINIÃO DO LEITOR

É com imensa satisfação [...], e aproveito a oportunidade para parabenizá-los pela nobre iniciativa de resgatar, restaurar, preservar e divulgar a história e pontos culturais de Irajá. - Rubens Quintella – Movimento pela preservação do Cine Teatro Cachambi - Cachambi – Rio de Janeiro - [10/10/2011 – por e-mail]

Adorei a revista do Instituto e peço o favor de sempre receber a mesma, e sobremodo, gostaria se possível é claro, de ser sócio correspondente do instituto. (*) - Carlos Artur Esteves Gomes dos Santos – Teresópolis - [03/11/2011 – por e-mail]

Permita-me parabenizá-los pela iniciativa admirável do IHGBI e por suas atividades. - Nelson Nóbrega Fernandes – Prof. Dr. em Geografia Humana da UFF – Rio de Janeiro - [07/12/2011 – por e-mail]

Sou historiador e escrevi um TCC para licenciatura em História sobre o bairro de Vigário Geral, bairro que é originado da antiga freguesia de Irajá. Gostaria de saber o procedimento e as normas para que eu confeccione um artigo para apreciação do corpo editorial da revista. (**) - Leonardo Moreira Casquilho. Vigário Geral - Rio de Janeiro - [10/12/2011 – por e-mail]

Parabéns pela continuidade de seus empreendimentos. - Gloria Hissa – Copacabana – Rio de Janeiro - [12/12/2011 – por e-mail]

Primeiro, queria parabenizá-los pela iniciativa do projeto, tanto do IHGBI quanto a da Resenha Digital. Sou historiador, morador da Pavuna e, como disse, gostei muito dessa iniciativa e queria saber de que forma posso participar e contribuir para o projeto. (*) (**) - Marcelo Alves – Pavuna – Rio de Janeiro - [18/12/2011 – por e-mail]

Amigos do IHGBI, essa edição da REZENHA DIGITAL está muito bem elaborada, iremos aguardar a 2ª edição que estará saindo em breve. - Joaquim Luiz de Jesus Moreira – Membro Correspondente do IHGBI – Rocha Miranda – Rio de Janeiro – [08/01/2012 - Pelo blog RESENHA DIGITAL]

Fiquei muito feliz em saber do trabalho de vocês, quanto mais gente interessada na história dos subúrbios, melhor, pois o foco na pesquisa da História da cidade parece ser sempre a zona sul e o centro do Rio. - André Luis Mansur – Autor de “O Velho Oeste Carioca” – Campo Grande – Rio de Janeiro. - [25/01/2012 – por e-mail]

(*) Carlos Artur Esteves Gomes dos Santos e Marcelo Alves já são membros Correspondentes do IHGBI.(**) Respondido por e-mail: Todos que queiram publicar artigos na RESENHA DIGITAL, podem entrar em contato por e-mail para [email protected]. Os trabalhos apresentados serão publicado de acordo a estrutura e capacidade de cada edição, respeitadas as ordem de apresentação.

BAIRRO DA BAIXADA DE IRAJÁ

ACARINome de origem tupi: akaray = akara (acará) + y (água, rio) = “água de acará” ou “rio do acará”

Área: 160,55 Hectares - População: 27.347 habitantes (2010)

Rua RibeyrollesPortal Geo / Pref. Cid. Rio de Janeiro Street View - Google Heath

Page 8: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

INSTITUTO INSTITUTO HISTHISTÓÓRICO E GEOGRRICO E GEOGRÁÁFICOFICOBAIXADA DE IRAJBAIXADA DE IRAJÁÁ

--

EM FORMAEM FORMAÇÇÃO ÃO --

PESQUISA, PRESERVAÇÃO, MEMÓRIA E DIVULGAÇÃO DO PATRIMÔNIO E CONHECIMENTO MULTIFÁRIO DOS 38

BAIRROS DA PRIMEIRA GRANDE ÁREA SUBURBANA DA CIDADE DO RIO DE JANEIRO

Acari Anchieta Barros Filho Bento Ribeiro Brás de Pina Campinho Campo dos Afonsos

Coelho Neto Colégio Cordovil

Costa Barros Deodoro Guadalupe Honório Gurgel Irajá

Jardim América Jardim Sulacap Madureira Marechal Hermes Olaria

Oswaldo Cruz Parada de Lucas Parque Anchieta Parque Columbia Pavuna

Penha

Penha

Circular Ricardo de Albuquerque Ramos

Rocha Miranda Turiaçu

Vaz Lobo Vicente Carvalho Vigário Geral Vila da Penha Vila Kosmos

Vila ValqueireVista Alegre

COMPARTILHE O CONVÍVIO MULTIDISCIPLINARDO NÃO ACADEMICO AO PÓS ACADEMICO

PUBLIQUE SUA PESQUISA, SUA OPINIÃO OU SUA MEMÓRIA QUANTO À

BAIXADA DE IRAJÁ

INSCREVA-SE COMO MEMBRO PERMANENTE OU CORRESPONDENTESolicite adesão em [email protected]

Page 9: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

RIO D”OURO: CAMINHO DE FERRO E CAMINHO DAS ÁGUAS *1Ronaldo Luiz-Martins *2

*1. Resumo do capitulo “O Caminho das Águas ao Longo de um Caminho de Ferro” do livro ““De Mby-ry-ty a Yacare-upa-guá: Caminhos e Desenvolvimento Urbano” em elaboração pelo autor.

*2. LUIZ-MARTINS, Ronaldo: Analista de Sistemas e pesquisador não acadêmico da história da Baixada de Irajá; Autor de “Mercadão de Madureira: Caminhos de Comércio” – 2009; Membro Fundador do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá e Movimento Cine Vaz Lobo: Preservação, Cultura e Memória.

Hy! Hy! Hy!... Era o pregão, em tupi-guarani, dos índios aguadeiros que, nos primeiros anos da Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, anunciava à população a oportunidade de aquisição da água necessária ao seu consumo. Das iguaçabas ou talhas de barro enchidas nos rios próximos ao atual complexo sistema de abastecimento, a Cidade passaria por três séculos de escassez de água. Na segunda metade do século XIX, as ações para busca de solução do problema vieram concorrer para o fecho do ciclo rural da Baixada de Irajá e ao seu desenvolvimento em área urbana de alta concentração populacional.

No final do século XVI, com a cidade em alto de morro e cercada de mangues, alagados e lagoas salobras, sua pouca população usava de poços de água imprópria à alimentação e a água potável era obtida em jornada de dois quilometros à foz do Rio Carioca, próxima ao Outeiro da Gloria.

Jose dos Reis Carvalho - 1851 Biblioteca Nacional

Nos três séculos seguintes, tendo como fonte principal os mananciais do Maciço da Tijuca, a ação governamental realizou diversas obras como dutos, aquedutos e chafarizes destinados ao abastecimento de água à cidade. Dentre elas, permanece como marco histórico o grande aqueduto, construído no governo de Antônio Gomes Freire de Andrade – Conde de Bobadela (1733- 1763) pelo engenheiro José Fernandes Pinto Alpoim, hoje conhecido como Arcos da Lapa. Para essas obras muito contribuíram as pedreiras, caieiras e olarias da Baixada de Irajá, fornecendo pedras, cal, tijolos e manilhas de barro.

Em 1856, tendo a cidade uma população de mais de 115 mil habitantes na área urbana, a captação já utilizava quase todos os mananciais da vertente fronteira do Maciço da Tijuca. Esse sistema só atendia, e de forma pouco eqüitativa, as chamadas freguesias urbanas, sendo mais privilegiadas as mais antigas e formadoras da área central da cidade. Nas chamadas freguesias rurais, as povoações que se formavam no entorno das grandes fazendas contavam apenas com o fornecimento por aguadeiros, sendo muito pouca a existência de bica ou chafariz.

Produzidas destacadamente na olaria instalada no local onde hoje se encontra a comunidade Para Pedro, as manilhas de barro usadas nos encanamentos de água eram feitas por escravas a partir de duas metades côncavas que as moldavam à mão sobre as suas coxas. Depois eram as duas unidas, formando o gargalo de encaixe e ajustada as suas dimensões aos padrões usados. Secas durante algum tempo ao sol, eram então queimadas em piras de lenha.

Na primeira década do século XIX a situação do abastecimento de água da cidade passava a ser critico. Em 1808, com a transferência da Corte para o Rio de Janeiro, a população da área central dobrava sem que houvesse maior acréscimo no processo de captação. Ao mesmo tempo, com o café se tornando o principal produto de exportação, as plantações deste se estendem pelo Maciço da Tijuca provocando a derrubada de matas ciliares de seus mananciais, o que nos meses de estiagem mais agravavam a crise de abastecimento.

Chafariz do Catumbi: Até a primeira metade do século XIX, os principais componentes do sistema de abastecimento de água do Rio de Janeiro eram fontes e chafarizes localizados em praças e pontos centrais às maiores concen trações habitacionais.

Para uso nas residências, aos escravos era dado o trabalho de nelas encher vasilhas e tonéis com a água necessária. Para ordenar essa demanda, no Chafariz da Carioca foi criado um grupamento de guardas, mais tarde conhecida como Guarda Velha.

Page 10: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

Na Baixada de Irajá, pobre em bacia hidrográfica, os pouquíssimos mananciais do Maciço da Misericórdia, por falta de pressão de queda, não prestavam a construção de dutos e as bicas eram bem mais raras. Os maiores rios locais tinham suas margens formadas pelo que os índios chamavam “upaba una” (Pavuna), “lago preto”, de pântanos e alagados de águas imprestáveis ao consumo. Além dos transportes de águas obtidas das melhores fontes e rios, nos pontos de solo mais baixo, com um lençol freático a cerca de um metro e meio, eram de uso poços de relativa qualidade de água.

Reconhecendo o grande crescimento populacional da cidade até o final do século XIX e o colapso do sistema existente, em 1870 o Governo Imperial estimulou a formação de um grande projeto de abastecimento, sendo esse elaborado pelo engenheiro André Rebouças. Identificando a precariedade de novas fontes próximas a cidade, no projeto foi definido serem feitas as captações em mananciais da Serra do Tinguá, na Província do Rio de Janeiro e a mais de 45 km da Corte. Para a sua execução, foi sancionado Decreto Nº 2639 de 22 de setembro de 1875 autorizando o Governo a gastar 19 mil contos de reis com desapropriações e obras necessárias, estabelecendo ser a Administração Pública a executora, a qual poderia contratar com terceiros as obras necessárias.

Obra gigantesca para sua época, foi necessária a compra de tubulações e demais equipamentos no mercado externo, particularmente na Inglaterra, e algumas peças encomendadas nas fundições de Ponta da Areia. Para o recebimento do material vindo da Europa foi construído um porto junto a Imperial Quinta do Caju, antiga Casa de Banho de D. João VI, onde as peças, particularmente os largos canos, seriam inspecionadas. Materiais menores e mais leve, em particular oriundos da Ponta da Arreia, seriam conduzidos ao Porto de Maria Angu, localizado a margem da Penha na Freguesia de Irajá. O peso e dimensões de canos e registros estabeleciam sérias dificuldades de transporte ao longo da implantação da rede e chegar aos pontos de captação. Para solução deste problema, os projetistas apresentaram a proposição de construção de uma ferrovia, com bitola de 1 metro e rampa máxima de 4%, tipicamente de baixo custo de construção, com leito acompanhando o trajeto das tubulações até os mananciais.

Em resoluções seguintes ficou estabelecido que as tubulações fossem assentadas, em traçado mais curto possível, ao longo de estradas e caminhos já existentes. No território da Corte, estabelecido ser no Pedregulho, em São Cristóvão, o principal reservatório, os dutos ficariam instalados ao longo da Estrada Real de Santa Cruz, e atravessando a Freguesia de Inhaúma pelo Caminho da Pavuna, vencendo o Maciço da Misericórdia pela Garganta do Juramento, passar a Freguesia de Irajá para, seguindo ainda o mesmo caminho, alcançar o arraial da Pavuna, de onde, atravessando o rio de mesmo nome e passando a Província do Rio de Janeiro, a margem da Estrada do Comercio chegar aos mananciais.

Contratada as obras e ferrovia ao empreiteiro Antonio Gabrielli, em final de 1876 eram iniciados os trabalhos do cais e do pátio e leito inicial da ferrovia. Ainda na primeira metade de 1877 a leito já alcançava a proximidade do ponto em que seria construído o reservatório do Pedregulho. Deste ponto em diante a fixação do lastro e trilhos da ferrovia foi desenvolvido paralelamente ao assentamento das tubulações.

Em construção – 1879 Vista aérea atual – 2011Reservatório do PedregulhoTerminado em 1880, a sua construção é de excepcional arquitetura de pedra de cantaria em arcadas sustentando a laje de cobertura em alvenaria, compondo se de duas caixas em diferentes níveis. Tendo sido inaugurado pelo Imperador D. Pedro II e localizado à Rua Marechal Jardim, 455, São Cristóvão, encontra-se até hoje em pleno funcionamento, sendo ainda o grande abastecedor da área central da cidade. O Reservatório do Pedregulhos foi tombado pelo INEPAC em 9 de dezembro de 1998.

Mac Ferrez - Coleção Thereza Cristina Biblioteca Nacional

MapLink / Tele AtlasGoogle Earth

Page 11: RIO D'OURO: CAMINHO DE FERRO, CAMINHO DAS ÁGUAS - IHGBI

Não há registros conhecidos da data em que a tubulação e a ferrovia atravessaram a Garganta do Juramento entrando na Baixada de Irajá, mas certo é que antes de 1879 já estava em operação uma parada em terras do fazendeiro Vicente Carvalho, na qual eram embarcados materiais mais leves trazidos por carros de boi do Porto de Maria Angu. Estariam também já implantadas outras paradas ao embarques de material de alvenaria e alimentos para os canteiros de obras. Em 1878 já chegava à ferrovia aos mananciais em Rio D’Ouro e era iniciado o abastecimento de água. Em 1880 todo o sistema principal entrava em operação e o reservatório do Pedregulho era oficialmente inaugurado. Terminada a implantação do tronco base e restando as obras de captações secundárias, em janeiro de 1883 o Governo determinou a abertura da ferrovia ao transporte de passageiros e cargas, sendo feita a aprovação definitiva da sua planta em agosto de 1884, encerrando, quanto a ela, a empreitada contratada a Antonio Gabrielli. Logo a seguir, em inicio de 1885, já por empreitada direta do Departamento de Obras, foi iniciada a construção de um ramal da ferrovia de Vicente Carvalho ao Porto de Maria Angu.

A abertura da ferrovia ao trafego de passageiros e cargas foi autorizada pela Decisão de Governo – Ministério da Agricultura, Commercio e Obras Publicas Nº 1 de 3 de janeiro de 1883 e a aprovação da sua planta definitiva pelo Decreto Nº 9268 de 23 de agosto de 1884. Somente a partir destes documentos é que, em substituição ao referenciamento com tramway, passa a ferrovia ser denominada como Estrada de Ferro Rio D’Ouro.

Para a Baixada de Irajá, que era área basicamente agrícola e industrial extrativista, a E. F. Rio D’ouro deu origem a um novo caminho de escoamento da sua produção e maior integração como pólo atravessador da agropecuária existente ao longo da Estrada do Comércio. Até a primeira metade do século XIX, a maior parte da exportação desta produção era feita pela baia de Guanabara, em transporte por carros de boi, tropas de burro e, pelos rios, em canoas, sendo o porto de Maria Angu o principal ponto de convergência para os mercados no centro da cidade. Parte menor era comercializadaatravés do pólo de Campinho e conduzida à cidade pela Estrada Real de Santa Cruz. Após a inauguração da Estrada de Ferro D. Pedro II em 1858, Campinho foi substituído pela Estação de Cascadura sendo essa parte da produção transportada por trem. Para a área central da Baixada de Irajá ambas as rotas eram de alto custo e grande demora.

Com paradas em Pavuna, Colégio, Irajá e Vicente Carvalho, antes mesmo da autorização para ferrovia fazer transporte de cargas e passageiros, no retorno das composições para a Ponta do Caju com vagões vazios, por acordos informais com os fornecedores locais, eram transportados para São Cristóvão produtos destinados aos mercados do centro da cidade. Motivado pelo potencial econômico destes transportes e, conforme exposto na Decisão Nº 1 de 3 de janeiro de 1883: Convindo reduzir as despezas do custeio da estrada [...] e attendendo as diversas representações dirigidas ao Governo Imperial pelos habitantes dos povoados à margem da mesma estrada [...], deixando a condição de meio de apoio ao sistema de abastecimento, passou a Rio D’Ouro a condição de Estrada de Ferro comercial.

Com o transporte ferroviário regular, na Pavuna formou-se um pólo de comercialização da produção do seu entorno, no qual se incluíam as dos atuais municípios de Nilópolis, São João de Meriti e parte de Caxias. Por Colégio, parada próxima de grandes olarias e linha direta das caieiras da Água Grande, eram despachados principalmente tijolos, telhas e cal. Na parada de Irajá, em que no entorno se formaria a centralidade que foi por muitos anos conhecida como a Estação, além de produtos agrícolas eram também embarcados leite, pedra e peças de granito. Ainda antes desse momento, como fornecedor a empreitada, de Irajá foram embarcadas peças de cantaria para a construção da arcada interior do reservatório do Pedregulho.

Mac Ferrez – 1878 – Coleção Thereza Cristina – Bib. Nacional

Construção do Reservatório de D. Pedro IIEntre 1878 e 1880, embarcadas na Parada de Irajá e transportadas pela E. F. Rio D’Ouro, peças de pedra talhadas de pedreiras da Baixada de Irajá foram empregadas na construção das arcadas internas do Reservatório de D. Pedro II, no Morro do Pedregulho.

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Para região de Vicente Carvalho a Penha, particularmente favoreceu o ramal para o Porto de Maria Angu. Saindo das terras da Família Carvalho, então atravessadores de boiadas e porcadas vindas do Sul de Minas, por ele multiplicou-se o embarque de carne pelo porto, favorecendo a implantação ali de matadouro e indústria de curtume. Não houve por esse ramal regularidade de transporte de passageiros, mas ele fez-se destacado nas Festas da Penha, quando, em conexão com o serviço de barcas da Cantareira e Viação Fluminense, fazia o transporte de romeiros entre o Porto de Maria Angu e os atuais Largo da Penha e Rua dos Romeiros. O ramal de Maria Angu, que tinha seu leito nas margens das atuais avenidas Vicente Carvalho e Brás de Pina, e que desde 1886 teve a concorrência da Estrada de Ferro Norte (Leopoldina) que cruzava seu leito na Penha, chegou a possuir as paradas de Vila Ypiranga, próxima a hoje Praça Marco Aurélio. Penha, no largo frente ao adro da Igreja e Fazenda Grande, de serviço ao matadouro. O ramal existiu até 1930, quando, com a evolução de transporte de carga por bonde, trem e caminhão, também perdia operacionalidade o Porto de Maria Angu, sendo, a partir de 1937, substituído pela linha de bonde Madureira x Penha (linha 97), que correu sobre parte do seu traçado.

Sendo feita, da Ponta do Caju para a Praça da Bandeira, uma conexão de tráfego mútuo com a Companhia Ferro-Carril de São Cristóvão e, em 1929, com a transferência da estação inicial para Francisco Sá junto a esta, tornou-se facilitado o fluxo de passageiros para as localidades a margem da Rio D’ouro, na área central da Baixada de Irajá rapidamente se desenvolveu o processo de loteamento urbano das antigas fazendas e chácaras.

Nas duas primeiras décadas do século XX, ao longo da linha tronco da Rio D’Ouro surgem os loteamentos formadores dos bairros de Irajá, Vicente Carvalho, Vaz Lobo, Colégio e Pavuna e pelo ramal de Maria Angu são feitos os loteamentos da Vila da Penha e Vila Ypiranga, tendo a Baixada de Irajá, entre 1906 e 1920, 263% de crescimento populacional. De 1930 a 1950 surgem novos loteamentos que darão origem ao desmembramento desses primeiro bairros, destacadamente os de Vila Florença, hoje Vila Kosmos, e Vista Alegre. Neste mesmo período, acompanhando o desenvolvimento populacional, nos estorno da Rio D’Ouro se desenvolve um parque industrial expressivo, o que foi intensamente acentuado durante o evento da Primeira Guerra Mundial. Até ao final da década de 70 do século XX estavam instaladas grandes industrias, como a Sociedade Anonyma Hipet (1920), Baush & Lomb, Brasividro, Standard Elétrica, Lustrene, Fundição Suburbana, Cimento Branco Irajá, Aeroquip, CIBA, Vulcan, Formiplac, Companhia Federal de Fundição (1901) e, no extremo do ramal de Maria Angu, a S. A. Cortume Carioca.

Parque Industrial da S. A. Cortume CariocaDesenvolvido a partir de um pequeno curtume que processava couros de animais abatidos no matadouro próximo, em 1920 tomava forma de industria de grande porte a S. A. Cortume Carioca no bairro da Penha. Para o seu desenvolvimento concorreu a E. F. Rio D’Ouro com o seu ramal de Maria Angu, pelo qual seus cargueiros transportavam gado para o Matadouro da Penha e, em retorno, os produtos de couro nele produzido. Na década de 50 do século XX, já extinto o ramal da Rio D’Ouro e utilizando a E. F. Leopoldina, a Cortume Carioca chegou ao seu apogeu conquistando 70% do mercado brasileiro de couro e empregando cerca de 3.500 funcionários.. Em 1990 a S. A.. Cortume Carioca encerrou suas atividades e atualmente grande parte do seu parque fabril já foi demolido. .

Autor não identificado – Acervo Ronaldo Luiz-Martins - 1958

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Durante a primeira metade do século XX, com a ligação ao porto do Rio pelo Ramal de Arará, trecho da linha tronco original para a Ponta do Caju, composições da Rio D’Ouro faziam chegar as matéria primas às industrias e delas levavam os seus produtos a embarques. Trens misto com vagões de passageiros, por eles tornou-se possível aos trabalhadores do Cais do Porto terem por moradia os bairros nascentes na Baixada de Irajá, muito em particular no de Vaz Lobo, no Morro da Serrinha. Por estes portuários viria a ser criada a Escola de Samba Prazer da Serrinha, da qual teve origem o Império Serrano, e, a exemplo do ocorrido com os criadores da Escola de Samba Portela em suas viagem pela Central do Brasil para Oswaldo cruz, com suas confabulações sobre a sua escola e o canto de seus sambas em viagem do Porto para Vicente Carvalho e Irajá, também teve a Rio D’Ouro o seu Trem do Samba.

Tendo sido o caminho de ferro da Rio D’Ouro importante fator ao desenvolvimento da região central da Baixada de Irajá, o seu caminho das águas lhe foi, em alguns aspectos, gerador de problemas. Com milhares de litros a passar por seu território, até cerca de 1980 foi grande estigma da sua crescente população as constantes faltas de água ou a sua total ausência em muitos pontos mais elevados, locais esses, em sua totalidade, não acima de 75 metros, altura insignificante considerada a da adução na fonte. Até a metade dos anos de 1930, sendo a Baixada de Irajá já área urbana, contrariando ao Decreto que estabelecia que as tubulações de água deveriam, a conta do órgão público e sem ônus aos moradores, serem estendidas por todas as vias urbanas, somente as vias principais possuíam rede de distribuição e em pontos de maior frequência haviam instaladas as chamadas “bicas”.

Ao final da década de 40 do século XX, a Estrada de Ferro Rio D’Ouro, incorporada em 1930 a Estrada de Ferro Central do Brasil e sendo o menos econômico ramal desta, sem investimentos de modernização e longe de perspectiva de eletrificação, permanecendo com seu leito aberto em via de tráfico urbano, locomotivas e material rodante desgastados e, com a sobreposição do seu leito por trens elétricos em seus percursos da estação inicial a Del Castilho e de Pavuna para o interior do Estado do Rio, com poucas estações de influencia e concorrência dos transporte de bondes, ônibus e lotações, entrava em sua decadência. No final dos anos 1950, deficitária, seus trens, reduzidos a apenas duas composições em tráfego, passaram a circular gratuitamente, sendo em 1974 extinta. Atualmente o seu traçado pela Baixada de Irajá é totalmente coberto pela Linha 2 do Metrô.

Destas “bicas” algumas tiveram especial destaque. Ramal sangrado em uma das adutoras em local próximo a estação de Colégio, uma única linha de tubulação inferior a 6 cm de diâmetro se estendia pela Estrada do Colégio, Monsenhor Felix e Água Grande para, dividindo-se em sub-ramais chegar a Brás de Pina, Parada de Lucas e Cordovil. Na praça lateral a Igreja de N. Srª. da Apresentação, tirando desta linha um cano e aproveitando a coluna de granito de um antigo pelourinho, nela foi instalada uma grande torneira, sem com tudo fossem retiradas da antiga coluna de justiça as argolas laterais para o aprisionamento de sentenciados. Era objetivo também dessa “bica” alimentar um então já quase tricentenário tanque de pedra que servira a população e aos animais das tropas de burro que, no passado, ali estacionavam. Muito concorrida por ser a única no local, enorme quantidade de água vazava para o chão, tornando o seu entorno um grande atoleiro. Essa “bica” existiu até cerca de 1960 quando foi destruída em reforma do entorno da Igreja.

Ultimo TremApós mais de 90 anos cruzando a Baixada de Irajá, em 1974, com destino a Belford Roxo, onde ainda por algum tempo estaria em funcionamento, circulava o ultimo trem a percorrer o antigo leito da Estrada de Ferro Rio D’Ouro de Vicente Carvalho á Pavuna. Com ele findava o primeiro ciclo do desenvolvimento urbano da área central da Baixada de Irajá.

Autor não identificado – Acervo RFFSA - 1974

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A terceira e que mais permanece na memória popular, foi a instalada da linha de canos que, saindo da estação de Irajá e seguindo pela Estrada do Quitungo, destinava-se a Penha e sua vizinhança. Foi ela montada em grande largo no cruzamento desta via com a atual Av, Brás de Pina, que por associação era, como consta em mapa de 1909, então chamada Estrada da Bica. Em um pilar de granito um pouco mais alto que os normais, foi instalada, sem que se possa entender os motivos, uma torneira de dimensão bem maior que as normais, o que daria origem ao atual topônimo de Largo do Bicão. Porem essa “bica” não fugia a regra e seu entorno era um lamaçal.

Mesmo em pontos próximos as adutoras, como a Vila Santa Cecília, loteamento feito em 1928 pela Sociedade Condomínio Irajá, que localizado no triangulo entre a Av. Monsenhor Felix e a antiga Automóvel Clube, e sendo cortado, em paralelo e esta ultima, pela Rua do Encanamento onde elas passam, a despeito de ter o incorporador em seu panfleto anunciado lotes com água, nos finos canos que por suas ruas passavam, a pressão não era suficiente para encher caixas d’água a três metros de altura e eram os moradores obrigados a encher vasilhas em torneiras a entrada de seus lotes. Em paralelo surgia a figura do manobreiro, funcionário do DAE (Departamento de Águas e Esgoto) que estabelecendo um comercio paralelo do fornecimento de água, por propinas, fechando válvulas em seguimentos da rede distribuidora, favorecia a um dado setor com maior pressão e deixava outros em total falta d’água. Queridos por quem pagava e odiados pelos que não podiam pagar, de muitas brigas e até agressões, foram esses manobreiros alvo. Assim era comum a passagem pelas ruas de homens e mulheres carregando latas d’água na cabeça ou com duas penduradas à haste em balanço as costas. Para encher estas latas, salvava a Fonte da Carioca ao final da Rua “A”, atual Coronel Leitão, e formadora do Rio Bicas. Ainda nos anos de 1960, na atual Rua Samim, antiga Rua Quarta da Vila Souza, em seu ponto mais alto (cerca de 50 metros) não havia pressão para encher cisternas e alimentar torneiras de jardim, restando aos que ali moravam recorrer as água da Carioca.

Outra linha de igual calibre saia próxima a estação de Irajá pela Monsenhor Felix para Madureira. Nesta linha, no Largo de Vaz Lobo existiu outra “bica” que se tornou famosa. Montada em frente aos currais da Linha Circular Suburbana de Tramways, empresa de bondes de burro de Madureira a Irajá, junto com o esterco desses animais fazia ela uma terrível combinação. Sempre com defeito de fechamento e nunca consertada até o sua desativação, em constante vazamento alagava todo o entorno, dissolvendo e misturando nele as fezes dos animais sobre a linha. Sendo ali o local de troca das parelhas dos carros que seguiam para Madureira, era comum que, sem cerimônias, fossem estes burros placidamente disputar a água com a população. Tão grande era o lamaçal formado a frente da atual Rua Manoel Machado, que a população passou a denominar o local como “tombadouro”, pois comum eram os escorregões e quedas sobre o lamaçal. Esta bica existiu, já desativada, até urbanização do Largo de Vaz Lobo em 1942.

O “Tombadouro” em Vaz LoboInstalada uma “bica” no atual Largo de Vaz Lobo em cerca de 1900, em decorrência desta por muitos anos receberia o local a denominação popular de Tombadouro. Constantemente desbordando água em seu entorno, próximo a ela se formava um grande lamaçal onde sempre ocorriam escorregões e quedas de transeuntes.

Augusto Malta – 1922 – Publicada em Rio Ilustrado 1937 – Bib. Nacional

Magalhães Correa – Em “Sertão Carioca”Revista do IHGB – Vol. 167 - 1933

Lata d’águaComo na Baixada de Jacarepaguá, e registrado por Magalhães Correa em 1933, nesta mesma época ainda era a busca de água em fontes e bicas uma necessidade constante da população da Baixada de Irajá. Cena comum era jovens e crianças carregando latas com água na cabeça ou em balança nos ombros, para muitos uma obrigação diária antes da escola.

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Por fim, a partir dos anos 1980 ganharia a Baixada de Irajá usufruir por completo das águas que por ela passam. Regularizado o abastecimento, com farta oferta de água e as adutoras passando abaixo das calçadas e ruas as margem da linha 2 do Metrô, do Rio D’Ouro, caminho de ferro e caminho das águas, muito pouco resta visível. No Metrô, o constante passar de suas composições para muitos faz lembra ainda o ‘plac-tplac’ do trem puxado pela velha maria-fumaça, a cruzar de Vicente Carvalho a Pavuna, enchendo o ar com seu apito e a fumaça preta de sua chaminé. Da tubulação e válvulas de compensação que se via pela faixa de terra que semelhante a uma rua era a do encanamento, resta ainda um conjunto de caixas de pedra e canos de ferro entre as ruas General Ribas e a Coronel Alencastro. Dela ainda, que muitos persistem em fazer ser do Encantamento, perdem-se historias de dramas e paixões de quando, sem casa que lhe desse frente, sem trafego de carros e pessoas durante o dia e sem nenhuma iluminação à noite, foi cena de crimes e suicídios e, “das estrelas”, motel quando estes ainda não existiam.

Mesmo após 1949/1950, com os reforços ao Sistema Acari, denominação atual do sistema Rio D’Ouro, pela a entrada em operação do Sistema Ribeirão das Lajes e a construção do Reservatório de Honório Gurgel, pouco se modificou o critico abastecimento de água a população da Baixada de Irajá. Por outro lado, com as novas pressões de adutagem, se intensificava para ela o contraste de não ter e assistir ao se perder. Pela Rua Encanamento, que tem atualmente as adutoras abaixo da capa de asfalto, passavam os canos na superfície, tendo em vários pontos grandes caixas de pedra com válvulas que se abriam quando a pressão interna da adutagem aumentava em resposta a redução do consumo na rede distribuidora. Era então comum, particularmente aos sábados à tarde, que estas válvulas se abrissem enchendo as caixas e transbordando alagasse seu percurso e as ruas vizinhas. Era caso o permanente lamaçal no entroncamento da Rua Oliveira Álvares com a Automóvel Clube, local onde por registro oficial deveria existir uma praça, e por não haver então solução ao problema, nunca foi ela urbanizada, sendo hoje ocupada por um posto de gasolina. Nestes momentos, enquanto em muitas ruas faltava água por ausencia de pressão em sua rede, ali na Rua do Encanamento, por excesso de pressão jorrava água em esguichos, as vezes tão alto que molhavam os telhados das casa que para ela davam fundos. Idêntico fato ocorria em Vila Kosmos quando, depois da construção da Elevatória do Juramento no Morro da Bicuda em 1948, reduzindo a pressão de adução nas torres, eram elas sangradas para o Rio Quitungo ao centro da Avenida Meriti, enchendo por completo a sua calha e algumas vazes, por obstruções em sua passagem sob a Praça Aquidauana, sem sequer um pingo de chuva, fosse grande parte do bairro inundado, mesmo que muitas caixas d’água ali estivessem vazias.

Os Antigos Encanamentos e Caixas de VálvulasRua para passagem de águas, ela é do Encanamento, mesmo que em uma de suas placas diga que é do Encantamento, pois ainda ali passam as adutoras do Rio D’Ouro. Da construção do sistema até a década de 70 do século XX, as adutoras estavam acima do solo e ao longo da rua existiam várias caixas de pedra com válvulas de pressão, antigo sistema de segurança contra estouro da tubulação quando em brusca redução de consumo ou excesso de volume adutado. Modernizado o sistema e trocados os canos de ferro por tubulações de aço, enterrado esses, a rua recebeu asfalto. Dos antigos canos e caixas de válvulas, como patrimônio histórico a Companhia Estadual de Águas e Esgotos – CEDAE, conserva ali um pequeno trecho.Street View - Google Earth - 2001

BIBLIOGRAFIA

COELHO NETTO, Ana Luiza & FIGUEIRÓ, Adriano Severo - Das Nascentes da Tijuca às Águas do Paraíba do Sul: Uma História de Dependência no Abastecimento Urbano de Água da Região Metropolitana do Rios de Janeiro - Revista Ensino & Pesquisa, Vol. 12, Nº 2 pag. 1 a 21 - Universidade Federal de Santa Maria – Santa Maria - 2008;

GERSON, Brasil – Memória das Ruas do Rio - 5º edição - Editora Nova Aguiar - Rio de Janeiro – 2000;

CORREA, Magalhães – O Sertão Carioca - Revista do IHGB – Volume 167 – 1933 / Terra Carioca – Fontes e Chafarizes - Revista do IHGB – Vol. 170 – 1935;

FERNANDES, Nelson Nóbrega – O Rapto Ideológico da Categoria Subúrbio – Rio de Janeiro – 1858 / 1945 – Apicuri / FAPERJ – Rio de Janeiro – 2011;

LUIZ MARTINS, Ronaldo - Memórias de um Ferroviário (em produção - ainda não publicado) – Notações das memórias de Octávio Luiz Martins (1893 – 1988), ferroviário da Estrada de Ferro Central do Brasil.

RODRIGUES, Agostinho – Meu Irajá – Cadernos Datilografados – Biblioteca Municipal João do Rio (Irajá) – Rio de Janeiro – 1996 / site agrocon.sites.uol.com.br – 2004

RODRIGUES, Helio Suêvo – Formação das Estradas de Ferro no Rio de Janeiro: O Resgate de Sua Memória – Sociedade de Pesquisa Para a Memória do Trem – Rio de Janeiro – 2004;

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TRADIÇÕES DA BAIXADA DE IRAJÁ

CARNAVAL DE BAIRRO95 anos de manifesta95 anos de manifestaçções e festejos carnavalescos na ões e festejos carnavalescos na

Baixada de IrajBaixada de Irajáá e bere berçço de grandes agremiao de grandes agremiaçções ões carnavalescascarnavalescas

““O ano de 1917 O ano de 1917 éé documento vivo da importância do carnaval documento vivo da importância do carnaval na comunidade na comunidade IrajaenseIrajaense ... “Agostinho Rodrigues - Meu Irajá - 2004

MADUREIRA MADUREIRA –– 19561956Coreto tema “Carmem Miranda”

Foto Ultima Hora Arquivo do estado de São Paulo

RAMOS RAMOS –– 1959 1959 Bloco de “Sujo”

Foto Ultima Hora Arquivo do Estado de São Paulo

IRAJIRAJÁÁ –– 1971 1971 Coreto tema “Tricampeonato -

Copa do Mundo de 1970”Foto Associação Brasileira de Imprensa - ABI

VAZ LOBO VAZ LOBO –– 20112011Coreto tema “Cine Vaz Lobo 70 anos”

Projeto de Fernanda Costa cedido pelo Movimento Projeto de Fernanda Costa cedido pelo Movimento Cine Vaz Lobo ao organizadores do Carnaval 2011.Cine Vaz Lobo ao organizadores do Carnaval 2011.

Foto Ronaldo Luiz-Martins – Acervo IHGBI

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OLHEM BEM AS TORRES DA IGREJA DA PENHA!OLHEM BEM AS TORRES DA IGREJA DA PENHA!OLHEM BEM AS TORRES DA IGREJA DA PENHA !

OLHEM BEM AS TORRES DA IGREJA DA PENHA!OLHEM BEM AS TORRES DA IGREJA DA PENHA !

Uma referencia simbólica ameaçada

COMENTANDO I

Nossa senhora da Penha Minha voz talvez não tenha

O poder de te exaltar Mas dê benção padroeira Pra essa gente brasileira

Que quer paz pra trabalharBaião da Penha

David Nasser e Guio de Morais (1951)

Sonia Rabello ¹

A igreja é também um centro agregador, em torno do qual se constituiu um bairro tradicional da cidade. E, somando-se a isso tudo, ela está impressa no imaginário de todos os brasileiros devotos e não devotos: no alto do morro com suas longas escadarias, ilustrando cartões, revistas e calendários, a exemplo de Notre Dame de Montmartre, em Paris, se impõe como um símbolo reconhecido por todos.

Breve histórico

Longe de pretender narrar detalhada e exaustivamente a história da Igreja de Nossa Senhora da Penha, mencionamos apenas os marcos que confirmam sua importância como centro do futuro bairro e referência religiosa e geográfica da cidade e do país.

A ermida de Nossa Senhora da Penha foi construída, em 1635, por Baltazar Abreu Cardoso, sesmeiro da Fazenda Grande, ou de Nossa Senhora da Ajuda, região onde hoje se situa o bairro da Penha.

Em 1644, a Fazenda Grande, ou de Nossa Senhora da Ajuda, juntamente com outras terras passaram a constituir a Freguesia de Irajá, da qual a região e, posteriormente, o bairro da Penha só se emancipariam em 1919.

Desde a sua construção, a igreja conquistou muitos devotos e, em 1728, foi criada a Venerável Irmandade de Nossa Senhora da Penha, que passou a administrar o patrimônio e a organizar a festa da padroeira que, à época, já atraía multidões. A tal ponto que, em 8 de setembro de 1816, a Festa de Nossa Senhora da Penha foi oficializada por D. João VI.

A construção da escadaria da igreja, que teve todos os seus 382 degraus esculpidos na pedra por escravos, foi finalizada em 1819, e foi restaurada quase um século depois, em 1913.

A igreja passou por reformas e, na que foi realizada 1902, seu campanário original foi destruído, tendo sido construídas suas duas torres - com carrilhão vindo de Portugal – que, fazendo conjunto com a sua fachada neogótica, concluída em 1906, constituem um marco na paisagem urbana do Rio de Janeiro, reconhecido na proximidade e na distância.

Mesmo que não fosse tombada pelo Patrimônio Municipal, a Igreja da Penha, por todos os valores que encerra, seria um bem histórico e cultural da população carioca. Sua situação geográfica privilegiada segue a cartilha dos antigos padrões urbanísticos portugueses, que reservava o topo dos montes e colinas aos templos e às fortalezas, ou seja, à proteção espiritual e à proteção física da população. Sua escadaria é o símbolo da ascensão espiritual dos peregrinos, conquistada pelo esforço físico, por sua vez, recompensado pelas graças alcançadas.

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Uma referência ameaçada

Referência religiosa, física, geográfica e paisagística, a Igreja da Penha corre o risco iminente de ser riscada do panorama concreto e afetiva do bairro. Mesmo que tombada pelo Patrimônio Municipal, seu entorno – cujas características urbanas e paisagísticas deveriam ser inquestionavelmente preservadas –, bem como várias áreas do bairro, encontram-se ameaçados pela aprovação, pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro, do Plano de Estruturação Urbana da Penha (PEU da Penha), que permitirá a alteração substancial da altura (gabaritos) das edificações no bairro. Com isto, a visibilidade da Igreja da Penha, para os que circulam pelo bairro, e mesmo para os que a contemplam de longe, estará parcialmente empachada pela massa de espigões que serão construídos! Após três séculos, a visão da Igreja, um dos símbolos da cidade do Rio, ficará obstaculizada por uma massa de concreto.

Mesmo que a prefeitura realize as anunciadas melhorias na Igreja – construção de dois novos planos inclinados sobre trilhos com cabine panorâmica e capacidade para 25 passageiros por viagem, recuperação de da fachada e telhados, limpeza geral, pintura e a recolocação do piso externo e troca dos guarda-corpos da escadaria – ; nada disso, se concretizado, será capaz de neutralizar o dano maior, representado pela alteração da altura (gabarito) das edificações propostas para o bairro.

A Igreja da Penha foi o símbolo da Paz nas ações de pacificação da região. Desde 1988, é Área de Especial Interesse de proteção cultural e ambiental, não só do bairro, mas também da cidade. A alteração de sua visibilidade deveria ser vedada pelo parágrafo único do art.69 do Plano Diretor da Cidade, se este artigo do Plano Diretor fosse efetivamente aplicado!

Autor desconhecido – Acervo IHGBIPenha 1920: Na bucólica região a visão da

Igreja predomina sobre o raro casario.

A triste história do PEU da Penha

Em janeiro de 2010, o PEU da Penha foi enviado pelo prefeito do Rio à Câmara Municipal. O plano foi objeto de inúmeros comentários na imprensa, uma vez que o aumento do gabarito na área envolvia o comprometimento da visibilidade da Igreja da Penha.

Qualificado como revitalizador da área, o plano se estruturava sobre dois pontos: o aumento de gabaritos de altura e do potencial construtivo dos terrenos, e a eliminação da Área de Especial Interesse do entorno da Igreja Nossa Senhora da Penha, criada “para efeito de proteção das edificações e locais de interesse para o patrimônio cultural dos bairros”, conforme decreto em vigor.

Penha 2011Já no atual gabarito de

altura e do potencial construtivo dos terrenos, as edificações, já concluídas, reduziram, em parte, a visibilidade da igreja e suas torres em pontos menos distantes.

A contemplação mais próxima de todo o conjunto - prédio, adro e penhasco - permite observar detalhes do equilíbrio e da beleza que marcam a Igreja de N. Srª. da Penha.

2011 - Foto Equipe - Acervo IHGBI

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Fica a constatação que, em nossa cidade, a luta pela preservação do patrimônio histórico e cultural e a consciência da necessidade do planejamento urbano ainda têm um longo caminho pela frente.

Diante disso, temos de nos conformar em contemplar as torres da Igreja da Penha, enquanto é tempo. Enquanto os espigões não se interpuserem entre nós e elas. Será que ainda conseguiremos impedir este dano?

Portanto, o PEU alterava, substancialmente, o planejamento da Penha e arredores, e contrariava o disposto nos artigos. 68 e 69 do novo Plano Diretor da Cidade, aprovado em fevereiro de 2011 pela Câmara Municipal do Rio de Janeiro.

Se fosse necessário um novo planejamento para área, seria imperioso respeitar o Plano Diretor da Cidade, e que, também, fosse prevista a captação de recursos para os investimentos na infraestrutura urbana que o bairro tanto necessitava.

Contudo – apesar de todos os esforços que ensejamos ao encaminhar emendas, visando a proteção do entorno da Igreja da Penha do adensamento de construções, que viriam a prejudicar a perspectiva de sua paisagem –, o PEU da Penha foi aprovado em 25 de outubro de 2011, incluindo, na última hora, uma nova emenda que permitia edificações de até 12 pavimentos, para empreendimentos específicos a serem edificados na área delimitada pelas ruas Quito, do Couto, Panamá, Belisário Pena e Praça Panamericana.

Mesmo os protestos dos moradores das áreas afetadas, presentes no plenário da Câmara durante a votação do PEU da Penha, não conseguiram demover a deliberação da maioria de vereadores que aprovaram o projeto.

Conheça mais em: http://soniarabello.blogspot.com/2011/11/olhe-bem-as-torres-da-igreja-da-penha.html

1. Sonia Rabello é vereadora, líder do PV na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, Professora Titular de Direito Administrativo da UERJ, e professora convidada do "Lincoln Institute of Land Policy" (Cambridge, Mass. EUA) no "Programa de Capacitação Técnica na América Latina e Caribe" para políticas públicas em uso e gestão de solo urbano e cidades. É autora de “O Estado na Preservação de Bens Culturais” (Rio, Renovar, 1991)

Na rua Curuá, atualmente tem-se a visão total da igreja e da formação rochosa em que esta assentada. Bastará um único prédio dentro do gabarito proposto para que apenas restem em visão as pontas das duas torres, ficando escondidas a sua volumetria e a penha que dá nome ao bairro.

O ATUAL E O FUTURO PREVISTO

Foto montagem – Gabinete da vereadora Sonia Rabello

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IGREJA DE N. Srª. da PENHA

TREZENTOS ANOSVISTA SOBRE PENHASCO QUE DÁ NOME AO BAIRRO

PLANO PROGRAMA DOINSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO

BAIXADA DE IRAJÁ

VISIBILIDADE TAMBÉM É

PATRIMÔNIO

AÇÃO PELO NÃO LICENCIAMENTO DE EDIFICAÇÕES QUE POSSAM OBSTRUIR A VISÃO DO CONJUNTO

PENHA ‒

ADRO -

IGREJA

MOVIMENTO IGREJA DA PENHA SEM COBERTURA VISUAL

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* MATTOS, Roberto: Professor e historiador (UERJ), Pós-graduado em História do Rio de Janeiro (UFF) – Membro Fundador do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá.

COMENTANDO II

DONA IVONE LARAUM ESTUDO DE DOIS CASOS: NA ACADEMIA E NO IMPÉRIO SERRANO

Roberto Mattos *

Homenageada em dois frontes, aos noventa anos, com a devida reverência, pela academia dos letrados por meio de Kátia Santos, Doutora em Literatura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pelo veio popular – uma escola de samba, o Grêmio Recreativo Escola de Samba Império Serrano –, o ano de 2012, estará marcado para sempre na memória da “Dama da Melodia”.

A lembrança pela academia surgiu da vontade de Kátia Santos querer saber mais sobre a vida cultural privada dos negros envolvidos com o mundo do samba. Primeira mulher a furar o bloqueio masculino, machista, da ala de compositores, Dona Ivone carrega com ela esse título honorífico que a torna importante no cenário cultural brasileiro.

Kátia Regina da Costa Santos é Bacharel em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC/RIO), possui Mestrado em Literatura Portuguesa e é Ph.D em Literatura e Cultura Brasileiras, após ter concluído o Pós- Doutorado em Estudos Culturais do Programa Avançado de Cultura Contemporânea da UFRJ, em 2011.

Por ser professora do Conservatório Brasileiro de Música, nada mais natural do que Kátia Santos se enveredar pelo mundo da cultura musical, onde entra Dona Ivone. Aliar prazer com trabalho resultou em uma obra literária intitulada Ivone Lara: a dona da melodia, editada, em 2010, pela Fundação Biblioteca Nacional.

O livro é composto por oito capítulos que transcorrem, com leveza, a trajetória privada e cultural de fazer música de Dona Ivone. Iniciando com um depoimento de Paulão 7 Cordas, no qual o elogio ao talento natural da diva do samba, superdotada de talento musical, é uma constante, Kátia descreve o início da vida particular de Dona Ivone, informando-nos o meio no qual ela estava inserida. Seu ambiente familiar era rodeado de musicalidade. Seu pai, João da Silva Lara, tocava violão de sete cordas e sua mãe, Emerentina Bento da Silva, era crooner de um rancho carnavalesco, Flor do Abacate.

O Jornal do Paiz, em 30 de dezembro de 1928, anunciava que “as lindas borboletas do conhecido club do Cattete terão, nessa noite, a oportunidade de, mais uma vez, mostrar aos seus admiradores que o carnaval na Flor do Abacate será por ellas movimentado com ruidosa alegria”. Isso demostra o grau de prestígio em que sua mãe cantora estava inserido e, consequentemente, o estímulo que Dona Ivone tinha, em casa, para ingressar no mundo da música.

A formação musical tem início no internato do Colégio Orsina da Fonseca, no Rio de Janeiro, onde aprende canto orfeônico pelas mãos de ninguém menos do que Heitor Villa-Lobos, nosso maestro da ópera brasileiríssima O Guarani. É nesse período que compõe sua primeira música, Tiê-Tiê, em homenagem a um passarinho que ganhara de presente, cuja letra introduz uma expressão moçambicana herdada de sua avó ex-escrava, oia lá,oxá!, demonstrando sua inicial sensibilidade de guardiã da memória doméstica.

Anos 1970 - Foto divulgada no blog Ivone Lara A Dona da Melodia de Kátia Santos - 2011

Ivone Lara da Costa (1921): Cantora, instrumentista e compositora, destacou no mundo samba como a primeira mulher a participar de uma ala de compositores. Pertencente a ala das baianas do Império Serrano, na década de 1960 era presença na roda de samba do Clube Castelo Branco, que ficava próximo a Serrinha, na Av, Min. Edgar Romero.

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Ao sair do internato, aos 17 anos, Dona Ivone vai morar, em Inhaúma, com seu tio Dionísio e, posteriormente, em Madureira, no morro da Serrinha, com uma tia que gostava de jongo, e não de samba. É nesse ambiente que conhece seu marido, Oscar Costa, filho de Alfredo Costa, fundador da Escola de Samba Prazer da Serrinha, anteriormente denominada Cabelo de Mana, cujas cores eram verde, amarelo e branco. Disposta a dar um rumo diferente a sua vida, por pouco, não transformou-se em operária tecelã. Teve como exemplo uma prima formada em Enfermagem e graduou-se pela Escola de Enfermagem Alfredo Pinto, fez Pós-Graduação na Escola de Enfermagem Ana Néry e, logo após, foi contratada pelo Serviço Nacional de Doenças Mentais, onde trabalhou com a revolucionária Dra. Nise da Silveira, aplicando musicoterapia com muito sucesso.

Sua proximidade com o Império Serrano se deu quando seu sogro, Alfredo Costa, passou a integrar a direção da nova escola de samba em 1950, ano em que foi campeão e que, a partir de então, nunca mais saiu. A fundação da Escola foi realizada por estivadores presentes no plano político do Sindicato do Cais do Porto do Rio de Janeiro, que até hoje é dirigida por gente do Império.

Em 1965, Dona Ivone atinge o posto mais alto, uma mulher que convivia com homens sambistas, ao ganhar um concurso de samba-enredo juntamente com o mestre Silas de Oliveira e Bacalhau. Os Cinco Bailes da História do Rio de Janeiro foram o passaporte carimbado para sua permanência no mundo masculino do samba carioca com o qual o Império conquistou o quarto lugar.

É notório que se registre a parceria mediúnica entre Dona Ivone e Delcio de Carvalho, nascida após a morte de Silas de Oliveira, em 20 de maio de 1972. A aproximação deu a Dona Ivone a oportunidade de encontrar um letrista a altura de suas melodias. Durou muitas tardes de sábados a feliz comunhão entre ambos, resultando em belas canções que estão sendo regravadas até hoje.

Kátia Santos narra como Dona Ivone chegou ao Império Serrano e seu reconhecimento pela comunidade sambista, com uma premonição no final do capítulo. Lamentou que a escola de samba ainda não tivesse feito um enredo homenageando-a..

Pois é. Para alegria dela e de todos, o GRES Império Serrano tem como enredo para 2012 a grande Dama do Samba – Dona Ivone Lara: o enredo do meu samba. “É o Império na Sapucaí, que exalta sua própria essência, personificada por Dona Ivone Lara”.

Mauro Quintaes, o carnavalesco da escola, assina um texto emocionante de como estarão os Imperianos no dia do desfile, 19 de fevereiro de 2012. Iluminados, majestosos, emocionados, aguerridos em prol de um final feliz para todos os embalados pelo samba cheio de nuances e lará-iás surgidos com brilho pelos mãos dos compositores Arlindo Cruz, Arlindo Neto Tico do Império Serrano.

A escola que viu nascer, hoje, abre alas para exaltá-la como a grande dama, pioneira, artista, cantora e, sobretudo, Imperiana – esse é o texto de abertura do site do Império Serrano, que reconhece, em Dona Ivone, adjetivos que são comungados pela comunidade da Coroa Imperial.

Salve Dona Ivone Lara!

Bibliografia:

DUNCAN, Zélia. Álbum de Retratos: Dona Ivone Lara. Rio de Janeiro: Edições Folha Seca, 2007.

SANTOS, Kátia. Ivone Lara: a dona da melodia. Rio de Janeiro: Fundação Biblioteca Nacional, 2010.SITES:

www.cnpq.br

www.gresimperioserrano.com.br

www.arlindocruz.com.br

www.donaivonelara.com.br

Dona Ivone Lara na alas das baianas – 1972

Foto divulgado no site Passarela, Avenida, Salão e Terreiro de Julio César Barros em 16/11/2010

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PATRIMÔNIO RELIGIOSO DA BAIXADA DE IRAJPATRIMÔNIO RELIGIOSO DA BAIXADA DE IRAJÁÁ

CATEDRAL ASSEMBLÉIA DE DEUSSede Nacional do Ministério de Madureira

Madureira

Inaugurada em 1º

de maio de 1953

Rua Carolina Machado, 174 – Madureira – Rio de Janeiro

* Fotos Street View – Google earth - 2010

Tenda espírita Estrela DO MAR

Terreiro de Umbanda

Irajá

Inaugurada em 27 de setembro de 1951

Rua Barão de Serro Largo, 11 – Irajá – Rio de Janeiro

Igreja de nossa senhora De Nazaré

Católica Apostólica Romana

Anchieta

Inaugurada em 29 de junho de 1920

Praça N. Srª de Nazaré, 18 – Anchieta – Rio de Janeiro

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Além de irajá

I

CONTRIBUIÇÃO A HISTÓRIA DA FREGUESIA DE INHAÚMA:Elites, Usos e Formas de Apropriação das Terras, Relações Sociais e Econômicas *1

Rachel Gomes de Lima *2

Apresentação

A história da freguesia rural de São Tiago de Inhaúma esteve ligada em vários momentos com a freguesia rural de Nossa Senhora da Apresentação de Irajá. Um fato que exemplifica nossa afirmação é a própria trajetória de fundação da freguesia de Inhaúma: em 1743, foi elevada à categoria de paróquia a Fazenda de São Tiago de Inhaúma, anteriormente propriedade dos jesuítas, sendo seu território desmembrado da freguesia de Irajá. (SANTOS, 1965: 76). Desta forma, Inhaúma fazia fronteira direta com a freguesia de Irajá (sendo algumas propriedades rurais localizadas entre as duas freguesias), Jacarepaguá, São Cristóvão e Engenho Velho (e em 1870 com o Engenho Novo) e possuiu com estas freguesias relações sociais e econômicas. Não temos como objetivo de discutir aqui a questão dos limites territoriais. Nosso trabalho foca a estrutura fundiária da freguesia rural de São Tiago de Inhaúma em meados do século XIX e a análise das elites que faziam parte de sua população neste mesmo período.

Resumo

O presente artigo tem como objetivo analisar as relações sociais e econômicas nas elites agrárias da freguesia rural de São Tiago de Inhaúma, no século XIX. Partindo deste, iremos abordar questões relativas às suas propriedades e o uso da terra a partir das influências econômicas do período. A freguesia de São Tiago de Inhaúma é analisada no contexto histórico do Rio de Janeiro entre o final do século XVIII e primeira metade do XIX. As transformações do perfil das propriedades neste último século e as formas de apropriação destas pela elite proprietária da freguesia são abordadas a partir do mecanismo de trabalho e das relações entre os proprietários, observando as relações econômicas, sociais e políticas. Deste modo o perfil social das elites abrange, dentre outros aspectos, as influências das atividades econômicas na vida destes membros.

Palavras-chave: Freguesia de São Tiago de Inhaúma; Propriedades e uso da terra; Elite proprietária.

Keywords: Parish of St. Tiago from Inhaúma; Properties and use of the land; Elite owner.

*1. O estudo apresentado neste artigo foi iniciado em monografia de conclusão de curso para Bacharel em História pela Universidade Gama Filho e está sendo continuada no curso de Mestrado do Programa de Pós Graduação da Universidade Federal Fluminense com financiamento pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES. Este artigo foi publicado pela primeira vez na revista eletrônica História em Reflexão, vol 5 – n. 9, Jan. – Jun. 2011.

*2. LIMA, Rachel Gomes de – Historiadora, Mestranda em História pela UFF e Bolsista CAPES. – Correspondente convidada do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá.

FAZENDA CAPÃO DO BISPO

Localizada no atual bairro de Del Castilho na Baixada de Inhaúma, e antiga freguesia rural de São Tiago, a casa grande da Fazenda Capão do Bispo e destacado Patrimônio Histórico desta região e da Cidade do Rio de Janeiro. Atualmente abriga o Instituto Brasileiro de Arqueologia - IBA.

Foto Ronaldo Luiz-Martins – Acervo do IHGBI – 19/03/2011

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I. A Freguesia de São Tiago de Inhaúma

O estudo sobre a Freguesia Rural de São Tiago de Inhaúma será apresentado neste artigo a partir da análise de suas elites existentes no século XIX, destacando o uso e as formas de apropriação das terras, além de suas relações sociais e econômicas. O fato de Inhaúma ter sido considerada a “freguesia rural mais importante” da cidade do Rio de Janeiro (SANTOS, 1965: 76) torna sua análise ainda mais interessante para a História Agrária.

Os vestígios de existência de Inhaúma datam do século XVI quando foram concedidas sesmarias por Estácio de Sá a jesuítas nesta localidade e em outras próximas. Segundo Fridman, quando os jesuítas chegaram ao Brasil “receberam várias concessões entre as quais todas as terras desde o Rio Catumbi até Inhaúma, a sesmaria do Iguaçu e suas águas” (FRIDMAN, 1999:74). Através da análise Livro de Tombo do Colégio dos Jesuítas [1] é possível perceber que além dos jesuítas, proprietários leigos [2] também receberam concessões diretas ou por meio de herança e compra. A partir do ano de 1647 o local que na época era conhecido como Tapera de Inhaúma passou a fazer parte da primeira freguesia do sertão do Rio de Janeiro, a freguesia de N. S. da Apresentação de Irajá. A Tapera de Inhaúma estava então inserida na dinâmica agrícola da cana de açúcar. Em 1684 foi elevada a Curato de Inhaúma.

A proximidade de Inhaúma com o “centro” da cidade do Rio de Janeiro fez com que o local “sofresse” influências “sócio-econômicas” de uma forma mais intensa. Desde o século XVI as sesmarias foram se “transformando” e dando origem à criação de grandes fazendas no século XVII e XVIII, aumentando assim as relações econômicas com o centro e entre os proprietários. A queda das exportações do açúcar e o grande fluxo de ouro na região das minas fizeram com que as produções agrícolas das freguesias rurais do Rio de Janeiro se direcionassem principalmente para o mercado de subsistência não extinguindo, portanto, a atividade agrícola das relações econômicas da colônia. Segundo Lobo, os maiores benefícios trazidos pela exploração de metais e pedras preciosas couberam ao Rio de Janeiro, que era o principal escoadouro para Europa e o centro da zona abastecedora da região mineira (LOBO, 1978:28) que tinha áreas “esterelíssimas de tudo que se há mister para a vida humana” (ANTONIL, 1963: 73).

O Curato de Inhaúma era cortado pelo caminho existente entre o centro da cidade e as Minas Gerais estando, desta forma, sempre presente pelas vias de comunicação ao movimento que girava em torno da atividade mineradora (SANTOS, 1987: 39). Além de rotas terrestres existiam pelo litoral de Inhaúma, seu porto e suas ilhas rotas de valiosa função para o transporte de “cargas” agrícolas mais pesadas e leves em direção ao porto do Rio de Janeiro, com destino ao abastecimento deste centro. Este fato foi, provavelmente, um dos que ajudaram na expansão de um pequeno comércio local e de novas atividades, principalmente ao redor destas estradas que se direcionavam para as Minas (SANTOS, 1987:39). Esta relação provavelmente contribuiu também para a elevação de Inhaúma em freguesia no ano de 1743, desmembrando seu território da freguesia de Irajá, sendo composta pelos seguintes bairros atuais: Olaria, Ramos, Bonsucesso, Manguinhos, Benfica, Jacaré, Rocha, Riachuelo, Sampaio, Engenho Novo, Lins de Vasconcelos, Méier, Cachambi, Maria da Graça, Higienópolis, Del Castilho, Todos os Santos, Engenho de Dentro, Água Santa, Encantado, Piedade, Quintino de Bocaiúva, Cascadura, Engenho Leal, Cavalcante, Tomás Coelho, Pilares, Abolição, Engenho da Rainha, Inhaúma, e, parte dos bairros do Caju, São Cristóvão, da Mangueira e de São Francisco Xavier. (SANTOS, 1987: 18)

O século XVIII traria algumas transformações para a colônia dentre elas a mudança da capital para o Rio de Janeiro, em 1763, e a denominada crise “aurífera”. Paralelamente a esta queda da produção do ouro estava a política econômica do fomento agrário brasileiro, que interpretamos como uma alternativa baseada na diversificação do mercado de produtos tropicais com o objetivo de exportação de gêneros e também de substituição de importações. Deste modo, muitos gêneros até então desconhecidos na colônia foram inseridos em sua produção agrícola. Outros, como o açúcar, eram valorizados e produzidos em larga escala, principalmente entre finais do século XVIII e início do século XIX por uma conjuntura internacional favorável devido à crise do açúcar antilhano. As lavouras de Inhaúma orientavam-se não somente em relação ao mercado externo (com exportações de açúcar, farinha, feijão, milho, arroz e também café, por exemplo), mas também para o mercado interno, particularmente o do centro da cidade do Rio de Janeiro (SANTOS, 1987:54). Tais situações ligaram mais ainda a economia e a vida social de Inhaúma ao centro do Rio de Janeiro. O contato desta freguesia com o centro se tornou mais dinâmico com o declínio da atividade mineradora e o “retorno” da agroexportação no Brasil na virada do século XVIII para o XIX. Para Santos, o retorno às lavouras de cana de açúcar e a introdução do café em Inhaúma representaram um importante crescimento na vida econômica e mudanças significativas na vida social (SANTOS, 1987:65). O estímulo à produção do café em meados do século da produção açucareira após sua boa conjuntura do início do século, locomoveu as plantações que inicialmente ocupavam as áreas das freguesias rurais para o interior da província do Rio de Janeiro, mais especificamente para o Vale do Paraíba o que trouxe modificações às propriedades das freguesias rurais da cidade do Rio de Janeiro.

As transformações econômicas ocorridas na transição para o século XIX influenciaram as estruturas fundiárias da freguesia de Inhaúma. As grandes propriedades existentes nesta importante freguesia rural iniciaram seu processo de fragmentação. Novos proprietários se apropriaram dessas terras por meio de herança ou mesmo pelo ato da compra e venda estimulando nova dinâmica territorial à região.

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Para autores como Santos (1987) a transferência de produto “base” de exportação, do açúcar para o café, no início do século XIX, influenciou as produções da Freguesia de Inhaúma que, como foi dito, tinha no início deste século a cana-de-açúcar como principal gênero agrícola produzido em seu território. Para este autor, essa influência econômica aconteceu em Inhaúma em três pontos distintos: a provocação do abandono das grandes áreas de cultivo da cana, o que teria ocasionado o declínio do escravismo na região; o estímulo (ou em nossa interpretação, o aumento da importância) de novas atividades agrícolas ligadas à pequena lavoura e ao trabalho livre em suas terras; e o surgimento de novas formas de ocupação da terra, a partir de meados do século XIX, como arrendamentos e chácaras, além de loteamentos para fins habitacionais que deram início a um importante processo de urbanização local (SANTOS, 1987: 89).

As mudanças na conjuntura econômica e na sociedade do início do século XIX fizeram com que a freguesia de Inhaúma também alterasse sua forma de produção agrícola e reorganizasse a ocupação de seu território e de seus habitantes. Em meados do século XIX, há uma mudança populacional na freguesia, aumentando o número de residentes e invertendo a proporção de escravos e homens livres (ver tabela I). O fato nos chama a atenção, pois predominavam as médias e pequenas propriedades com utilidades diversas e de proprietários convivendo neste mesmo espaço.

II. Elites proprietárias e suas formas de apropriação e uso da terra

A crise das lavouras do açúcar e o avanço das lavouras de café no Vale do Paraíba foram fatores fundamentais para a reorganização econômica de Inhaúma [3]. Se naquele local o café era o principal produto e ocupava as grandes propriedades, em Inhaúma o contrário acontecia. Se no “Vale do Café” [4] “a pequena propriedade necessariamente não desapareceu, mas se inseriu, de forma subordinada, no complexo econômico dominante” (SANCHES, 1989: 263) o oposto ocorreu na freguesia de Inhaúma: as grandes propriedades foram se fragmentando, mas não desapareceram por completo. Na verdade se inseriram no complexo econômico local, diversificando sua produção e os perfis de seus proprietários. Para Sanches:

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“A rede fundiária teve o seu perfil definido ou alterado em função da atividade econômica e não preexistindo a ela. Kátia Mattoso destaca o 'desmembramento das propriedades' como problema da economia baiana no século XIX, em conseqüência da crise da produção açucareira. O crescimento do número de engenhos até o último quartel do século resultou de desmembramento por vendas ou heranças, gerando 'propriedades relativamente pequenas”. (SANCHES, 1989: 272).

A fragmentação das propriedades é também um indicador da mudança de perfil da atividade econômica. A freguesia de Inhaúma se caracterizava no século XIX principalmente pela produção de abastecimento local e do Rio de Janeiro. Porém não existiam somente as lavouras: havia também fábricas, vendas e hospedarias [5] que se desenvolveram ao longo da primeira metade deste século e muitas vezes coexistiam com a propriedade da residência, localizando-se ao lado de plantações de café e de criação de animais mostrando que o proprietário deixava de ser, em alguns casos, um mero fazendeiro e se transformava também em um homem de negócios.

A fazenda do Engenho de Dentro, por exemplo, possuía estas características. Conforme Santos (1987:51) o engenho existia desde o século XVIII e fazia confrontações com o Engenho Novo e, juntamente com este, ocupava a maior parte das terras da freguesia, incluindo terras a sudeste, sul, sudoeste, oeste e noroeste da mesma, em maior parte entre as serras do Andaraí Grande e Jacarepaguá e a Estrada de Santa Cruz.

A propriedade dos doutores Francisco Correa Leal e Francisco Fernandes Padilha [6] no ano de 1856 [7] sofreu também pequenas fragmentações, mas manteve a maioria de seu território unida. No ano de 1863 a fazenda do Engenho de Dentro ainda era propriedade dos doutores e possuía de frente 350 braças e de fundos mais de 2000 braças. A fazenda foi avaliada em 100 mil réis a braça, totalizando o seu valor em 35:000//000 [8]. Além de possuir engenhos de açúcar, possuía também dois fornos de queimar carvão e um forno de queimar louça, um pequeno cafezal, dito “já estragado”, porém com uma colheita de 150 arrobas de café, criação pequena de animais como vacas e vitelas. Ao que se percebe, havia uma atividade de subsistência na fazenda, pelo menos de alguns produtos básicos como o leite das vacas e a produção de farinha, além do açúcar, de carvão, louças e café. Parte desta produção era destinada à venda, como o carvão, por exemplo. A fábrica de carvão em furna chamada “Dr. Leal e Padilha” existente na fazenda foi anunciada no almanaque Laemmert [9] entre os anos de 1856 e 1861. Percebe-se aqui o índice de novo perfil econômico na freguesia. Além da lavoura existia uma fábrica, fazendo com que os proprietários não fossem apenas fazendeiros e profissionais liberais, mas também homens de negócios. A conjuntura econômica não foi, contudo, o único motivo para que as grandes propriedades fossem se fragmentando ao longo do século XIX. Além disso, é importante salientar as transformações sociais que influenciaram as formas de aquisição das terras naquele período, sobretudo após a chegada de Dom João VI, em 1808, que intensificou a aglomeração populacional nos centros urbanos do Rio de Janeiro. Para Fridman (1999:125), este fenômeno fez com que surgisse uma maior valorização da terra e um aumento nas concessões de sesmarias muitas vezes condicionadas por interesses políticos. Porém, este aumento ocasionou também a proliferação de conflitos entre proprietários e posseiros. Muitas vezes as terras concedidas pelo Estado aos sesmeiros não eram trabalhadas pelos mesmos e acabavam sendo ocupadas pelos posseiros. Em 1822, Pedro I decretou o fim da concessão de sesmarias no Brasil, mas somente após 28 anos foi que surgiu uma lei que iria regularizar a situação agrária no Império.

A Lei de Terras ou Lei n° 601 foi promulgada no dia 18 de setembro de 1850 e regulamentada em 30 de janeiro de 1854. Esta Lei possuía nove capítulos e 108 artigos e tinha como objetivo abranger diversas situações relacionadas à ocupação das terras, dentre elas a repartição das terras públicas e como poderiam ser medidas, a revalidação e legitimação das terras particulares, preocupações com as terras devolutas, com aldeamentos indígenas e normas para os registros das terras. Para a conservação, divisão, administração, descrição e medição das terras devolutas foi criada a Repartição Geral das Terras Públicas. Cabia também a esta Repartição fazer os registros das terras possuídas. Estes registros eram obrigatórios para todos os proprietários de terras e os vigários de cada freguesia ficavam responsáveis para receber as declarações necessárias para a produção dos registros. Tais declarações deveriam ter duas cópias iguais contendo o nome dos proprietários, a freguesia onde se localizava a terra, o nome desta propriedade (se o tivesse), a extensão da mesma (se a tivesse) e os limites.

A lei de terras é considerada por muitos historiadores uma definidora da terra como mercadoria. É uma lei que mercantiliza a terra e foi interpretada como expressão única da classe dominante e um instrumento que faz com que o ato da compra seja o único e o novo meio da apropriação da terra. Murilo Marx, um dos defensores desta idéia afirma que:

A Lei de Terras de 1850 inaugurou um novo sistema geral de obtenção e de transmissão de terras entre nós. Tal sistema, significativamente, muito tardou, tem sido o de sesmarias suspenso uma geração antes, porém não substituído até o seu advento. A Lei de Terras estabeleceu como única forma possível de adquirir ou de transmitir a outrem que não os herdeiros a compra e venda de terras (...) (MARX, 1991: 143).

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A interpretação de Murilo Marx leva em consideração a existência de um mercado de terras somente criado em 1850 [10]. A partir deste momento a única possibilidade de se adquirir terras do Estado seria pelo meio da compra, não existindo mais a concessão pública. Não era raro, porém, observarmos certos tipos de negociações das propriedades por possuidores de sesmarias que vendiam suas concessões desde o período colonial. Desde o século XVI sesmarias eram vendidas e compradas em Inhaúma, além de serem doadas. Os jesuítas compraram a sesmaria de Domingos Machado e sua mulher Anna Rodrigues [11]. Além disso, no próprio século XIX encontramos propriedades que já tinham tido lotes vendidos a terceiros que não faziam parte da família. Um exemplo claro é o do Engenho da Pedra (fazenda que originalmente fez parte de uma sesmaria concedida a Antonio da Costa no século XVI – localizada nos atuais bairros de Olaria, Ramos e parte da Penha). Este engenho mudou de proprietários ao longo dos anos e na primeira metade do século XIX teve seus lotes vendidos a pessoas que não eram da família das irmãs Mascarenhas, proprietárias naquele momento.

Outra interpretação desta Lei de 1850 e sua regulamentação de 1854 é que ambas tinham como objetivo uma regularização da estrutura fundiária no país. Sem dúvida a Lei foi um instrumento que tranqüilizou alguns conflitos entre posseiros e proprietários, por exemplo, e trabalhou a questão das terras devolutas do Estado. Todavia o que se percebe é a variedade de interpretações desta por parte dos proprietários da época, o que muitas vezes podia gerar novos tipos de conflitos entre eles. Isto derruba as visões tradicionais que acreditam que ela seja apenas uma expressão jurídica da classe dominante. Até porque muitos membros desta classe não gostavam da idéia de demarcar as suas terras, pois “fazenda demarcada é propriedade finita, expansão dificultada; a indefinição dos limites da propriedade é aposta no futuro, esperança de usurpação do público e do alheio” (CHALHOUB, IN: MOTTA, 1998: 11). Assim, para um senhor de terras a posse sobre seu território está atrelada à capacidade do exercício de poder sobre seus domínios, suas terras e homens que trabalhavam nela, fossem escravos, moradores ou homens livres. A possibilidade de “expandir a cerca” de suas terras ocupando áreas devolutas ou pertencentes a outros, possibilitaria também a expansão de seu domínio. Para Motta (1998:38) os senhores “resistiam em medir e demarcar suas terras porque tal limitação territorial implicava um limite ao exercício de seu poder sobre vizinhos e posseiros e uma subordinação ao poder externo representado pela Coroa”. Esta citação da historiadora é referente ao sistema de sesmarias, mas percebemos que a não medição de terras também ocorre em alguns registros de terras em Inhaúma após 1850. Encontramos declarações que apenas mencionam informações sobre os confrontantes sem as medições das terras e também o caso contrário, aqueles que possuem apenas as medições e não informam seus confrontantes:

Francisco José Ferreira Rego possue huma dacta de terras no lugar denominado Pedra com sessenta e seis braças e sete palmos de testada, com trezentos de fundos, por escrituras de compra feita a Francisco Leite de Brito e outros em os annos de 1837 e 1848 (...). [12]

A não obrigatoriedade de mostrar o documento da medição das terras declaradas, por exemplo, abriu uma brecha para que estes casos ocorressem. Isto pode ter sido um gerador de conflitos entre proprietários quando queriam estabelecer suas fronteiras e seus limites de poder já que não afirmavam a medição exata das áreas das propriedades que alegavam possuir.

Outro fato comum era o não reconhecimento dos confrontantes da propriedade. No momento do registro, os proprietários poderiam ou não reafirmar o domínio de outro proprietário da região, já que não eram obrigados a citar os confrontantes. Esta medida não deixa de ser um instrumento de poder, como nos diz Motta (1998: 167) era “um eficaz instrumento sobre as terras de outrem ou sobre seus dependentes”.

Em Inhaúma, José Ferreira Pinto declarou possuir um sítio conhecido por Boa Vista localizado na Estrada que:

(...) vai da Freguezia para o porto de Inhaúma’, tendo 100 braças de frente e confrontando de um lado com o sítio de Joaquim Gomes de Aguiar e o do outro com o sítio de João Domingues Pereira, e nos fundos o morro do Capim Molhado. [13]

Logo, José Ferreira Pinto reconhece como seus confrontantes Joaquim Gomes de Aguiar e João Domingues Pereira. Ao analisarmos a declaração de Joaquim Gomes de Aguiar [14] percebe-se que o mesmo também reconhece José Ferreira Pinto como confrontante. Porém, o mesmo não ocorre com João Domingues Pereira que, por sua vez, não citou o nome de José Ferreira Pinto, relatando apenas que confrontava os fundos com terras pertencentes a ele mesmo, de um lado com terras de Joaquim Mendes Freire e, por outro, com terras das vendedoras [15]. Por outro lado, ao procurarmos este proprietário citado na declaração de João Domingues, vimos que ele, Joaquim Mendes Freire, não possui registro de terras na Freguesia de Inhaúma.

Aqui percebemos ainda mais um caso: aqueles proprietários que são citados como confrontantes, mas não possuem registro de terras. No caso de João Domingues não podemos afirmar se este estava dizendo a verdade em sua declaração, se realmente os limites de sua propriedade confrontavam com terras de Joaquim Mendes Freire ou se apenas não reconhecia como confrontante José Ferreira Pinto, preferindo alegar que suas terras faziam limite com o primeiro. Márcia Motta (1998:163) completa aqui esta idéia quando diz que o relator da Repartição Geral das Terras Públicas (relatório do ano de 1855) dizia estar ciente de que muitas das informações dos senhores de terras não eram apenas incompletas, mas também estavam longe de serem verdadeiras. Este fato, dentre outros de razões diversas,

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relativas às especificidades de cada localidade, fez com que os relatórios dos Presidentes da Província do Rio de Janeiro e do Ministério da Agricultura e Obras Públicas diagnosticassem o fracasso da regularização da estrutura fundiária do Brasil, tendo como base os registros paroquiais de terra. Márcia Motta acredita que muitos proprietários não registravam suas terras por uma dúvida existente em suas cabeças: o registro seria vantajoso ou não? Até porque as brechas existentes na Lei, como a não obrigatoriedade de informar a medida certa da extensão da terra (declarando apenas se fosse conhecida), não garantiriam a rigor, que o registro pudesse de fato confirmar na prática o domínio do proprietário sobre a sua terra.

É provável que esta “dúvida” da garantia de domínio sobre a terra tenha sido um dos motivos pelos quais muitos proprietários de Inhaúma citados nas declarações de outros não tenham declarado suas propriedades. Observamos o caso de Casimiro Barreto de Pinho [16]. Proprietário de um sítio na Serra do Engenho Novo, Casimiro declarou como confrontantes Joaquim Teodoro, de um lado e, por outro, Jose Amaro, e entre estes a divisa de D. Luisa, viúva do falecido Machado. Nenhum dos três proprietários citados por Casimiro registrou terras em Inhaúma. Nenhum destes aparece também no Almanaque Laemmert entre os anos de 1844 e 1863. Logo não podemos saber mais informações destes proprietários. Outro motivo pelo qual os proprietários não declaravam suas terras seria a existência de títulos das mesmas, o que lhes garantia a segurança jurídica sobre suas propriedades.

Se por um lado alguns proprietários não realizavam os registros por não crerem ou por duvidarem da eficiência da Lei na garantia dos domínios sobre as propriedades, por outro, muitos acreditavam que esta era um instrumento que faltava para a realização de uma verdadeira colonização no Brasil. Costa Porto também levanta este ponto e diz que:

Fruto de seu funcionamento desordenado, o sesmarialismo brasileiro sofrera fundas distorções, donde a conclusão de que, em vez de aumentar a agricultura, como se pretendia, na verdade havia se estreitado e dificultado a povoação progressiva e unida. (PORTO, 1979: 139)

Segundo o autor, existiam sesmarias possuídas por “homens de cabedais e sem escravos” que não cultivavam, nem vendiam ou repartiam estas para outros que poderiam trabalhá-la, o que dificultava realmente as povoações já que ficavam muitas vezes isoladas umas das outras devido a estas imensas terras de sesmeiros sem cultivo. Para Costa Porto, com o surgimento da lei, muitos posseiros que trabalhavam nessas terras aparentemente desocupadas (dos sesmeiros), poderiam regularizar sua situação e garantir domínio pleno sobre a terra desde que obedecessem as condições estipuladas pela Lei.

Por outro lado, a Lei de Terras também era um instrumento de proteção contra “invasões” de posseiros e outros proprietários ou ainda movimentações das fronteiras das terras. Assim percebemos que os senhores das maiores propriedades em Inhaúma possuíam um cuidado rigoroso na demarcação destas. Além do número de braças e dos proprietários que confrontavam, forneciam pontos de referência e medidas em graus. Percebemos então, a existência de uma vulnerabilidade na interpretação da Lei pelas brechas que esta possuía (como dissemos da não obrigação de se terem declaradas as medidas), o que em muitos momentos causou problemas em regiões diversas. Alguns destes problemas podem ser perceptíveis na Freguesia de Inhaúma. E apesar de ser obrigatório o registro das terras, independentemente de cargo ou pessoa, vimos que muitos proprietários não registravam suas terras ou não registravam todas as que possuíam, não citavam todos os confrontantes ou não citavam as braças.

A análise de todos os registros de terras na freguesia nos permitiu observar fatos ainda mais específicos. O livro dos Registros Paroquiais de Terras da Freguesia de São Tiago de Inhaúma possui 139 registros nos três prazos dados pelo governo para a efetuação dos mesmos. Foi iniciado no dia 28 de fevereiro do ano de 1854 pelo então vigário da freguesia, Vicente Ferreira do Rego que se declarou “encarregado da organização dos registros de terra segundo a Lei 601 de 18 de setembro de 1850 [17]. Porém o primeiro registro data de 3 de dezembro de 1855. O último registro foi realizado no dia 27 de janeiro de 1863, não mais pelo vigário paroquial, mas sim por Carlos Eugenio Valério de Araújo na Repartição Geral de Terras Públicas. Nele percebemos uma grande variedade de propriedades, formas de aquisição e de uso das mesmas.

Tendo como base a medição das grandes propriedades (como o Engenho da Pedra e o Engenho de Dentro, por exemplo), com cerca de 2000 braças em um dos lados, notamos que coexistiam na freguesia de Inhaúma pequenas, médias e grandes propriedades. Nas maiores era comum a presença de grandes lavouras como a do açúcar e a do café, existentes no Engenho de Dentro e no Capão do Bispo (atuais bairros de Del Castilho e parte de Inhaúma), por exemplo. Nas pequenas e médias propriedades prevaleciam as pequenas plantações de frutas e outros gêneros destinados ao comércio de alimentos da cidade do Rio de Janeiro, e também uma maior destinação de moradias.

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As maiores propriedades possuíam medições precisas, não apenas em braças, mas também com a utilização de outros instrumentos de medição. Aliás, dos 139 registros declarados na freguesia, 90 possuíam algum tipo de medição como o de uma das laterais, a frente ou os fundos do terreno, por exemplo. Isto significa que 65% dos terrenos registrados possuíam uma medição. Destes 90 (ou 65%), 15% apresentava pontos de referências geográficas que seriam bastante conhecidas na região, como grandes pedras, valas, rios, morros e outros caminhos, além de medidas em graus, o que demonstra grande interesse e preocupação dos proprietários em delimitar a demarcação de suas terras, provavelmente já existente antes mesmo da regulamentação da Lei 601 em 1854. Esta preocupação na demarcação pode ser um indicador do receio de “invasão” nas terras como dissemos anteriormente, ou mesmo um modo de afirmar o poder do proprietário sobre elas.

As formas de aquisição destas propriedades são variadas, porém a grande maioria dos registros não possui, declaradamente, como os proprietários adquiriram seus terrenos, e dentre estes estão os donos das maiores propriedades em Inhaúma. A explicação para este fato pode ser a existência de títulos de terras pelos proprietários e de legitimação das áreas pelos mesmos.

A compra é a forma de aquisição mais citada nos registros, seguida pelo arrendamento e pela herança. Muitos proprietários demonstram uma expansão de suas terras, expandindo também seu poder sobre elas e, de certa forma, sobre seus confrontantes.

Outra forma de expansão de terras na freguesia era o arrendamento. D. Emília Duque Estrada Meyer era “proprietária” de 14 terrenos em Inhaúma sendo 10 pertencentes ao sítio de outros proprietários. Quatro propriedades são declaradas como dela sendo uma local de sua residência [18] e outra ocupada pelo Doutor Sierra [19]. O mesmo acontece com D. Adelaide Duque Estrada Meyer [20] que dos seus seis terrenos, quatro eram do sítio de outros proprietários.

Não podemos, no entanto, caracterizar a freguesia e seus proprietários apenas pelos fatos encontrados no livro dos Registros Paroquiais de Terras. Essas fontes apresentam lacunas e como sabemos nem sempre estes registros são expressões da verdade, podendo muitas vezes omitir determinados fatos. Além disso, não há uma homogeneidade nas formas de aquisição das terras, no seu uso e no perfil de seus proprietários, existindo casos específicos destes que só podem ser analisados com um estudo comparativo de diversas fontes. A comparação dos registros paroquiais de terras com os nomes de proprietários listados no Almanaque Laemmert permitiu que identificássemos o perfil da elite da Freguesia de Inhaúma. As funções arroladas desse grupo social nos permitiram observar a diversidade deste grupo, por nós denominado de elite pelo fato de terem em comum o reconhecimento de serem proprietários de terras na região, de possuir um poder sobre elas e de terem consequentemente este status de proprietário. Mas não podemos deixar de lado a heterogeneidade e a hierarquia que existia neste grupo, pois como vimos há proprietários de grandes propriedades, assim como há pequenos proprietários que arrendam terras para poderem produzir, ou mesmo expandir seus limites de poder. Desta forma a análise destes proprietários se mostrou de grande importância para o entendimento das diferenças nos tipos de propriedades e nas formas de acumulação das terras.

A freguesia de Inhaúma era uma das freguesias rurais mais povoadas na segunda metade do século XIX. Logo as relações sociais entre os grupos de indivíduos que dividiam esta localidade foram, provavelmente, sendo fragmentadas ao longo do tempo devido ao aumento progressivo deste grupo social. Hanneman trabalha esta idéia quando afirma que:

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(...) El tamaño es critico para la estructura de las relaciones sociales a causa de los recursos limitados y las capacidades de que cada actor dispone para construir y mantener lazos. A medida que el grupo crece, la proporción de todos los lazos que pudiesen (lógicamente) estar presentes – densidad- diminuirá u muy probablemente emergerán grupos y facciones diferenciados (HANNEMAN, 2000:9)

Os diversos tamanhos das redes sociais e as formas de conexão dos atores presentes nelas ajudam a entender os diferentes perfis dos proprietários imersos em uma sociedade e também em que ponto as relações sociais dos proprietários escolhidos influenciavam nas formas de aquisição da propriedade, nas ligações públicas e econômicas da região [22].

A análise de cinco proprietários afunilou ainda mais nossa observação. Os dados dos registros paroquiais de terras, do Almanaque Laemmert (entre os anos de 1844 e 1863), das Habilitações Matrimoniais e de Inventários diretos ou indiretos dos indivíduos, permitiram visualizar as redes sociais de profissionais liberais e de cargos públicos exercidos por estes proprietários. Foram eles Augusto Duque Estrada Meyer, João Ferreira da Silva Braga, Francisco José Ferreira Rego, Manoel Ignáscio de Aguiar, Francisco Correa Leal e indiretamente Francisco Fernandes Padilha. Assim, foi possível localiza-los em redes familiares através da análise das Habilitações Matrimoniais e dos Inventários, além de identificarmos as redes econômicas pela análise do Almanaque Laemmert - no caso de proprietários listados como “empresários”, como os doutores Francisco Correa Leal e Francisco Fernandes Padilha, que eram profissionais liberais, donos de fábrica e proprietários de terras. Outro caso foi o de Francisco José Ferreira Rego que possuía uma fábrica de louça vidrada em suas terras.

Porém, após a análise do perfil destes cinco proprietários identificamos uma rede social que não abarca apenas o campo econômico ou a situação de proprietário de terras na freguesia de Inhaúma. Destes cinco proprietários, quatro possuíam uma ligação direta ou indireta com cargos públicos em um mesmo período de tempo. Por exemplo: Augusto Duque Estrada Meyer foi vereador em 1850 e, além disso, foi juiz de paz em um mesmo período de tempo que João Ferreira da Silva Braga e que João Francisco Ferreira Rego, filho de Francisco José Ferreira Rego, sendo também em uma época posterior suplentes de juiz de paz na freguesia, o que indica uma sociabilidade entre eles. Do mesmo modo, João José Ferreira Rego provável irmão de Francisco José Ferreira Rego, foi suplente de subdelegado e seu sobrinho e filho de Francisco José Ferreira Rego foi inspetor de quarteirão. Manoel Ignáscio de Aguiar também pertenceu a este meio público ao ser inspetor de quarteirão entre os anos de 1852 e 55.

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Percebe-se que cada indivíduo se encontra em múltiplas redes de sociabilidades que ora se excluem ora se encontram: a primeira a ser percebida é a rede familiar, que se encontra melhor definida nos documentos por nós analisados. As demais são percebidas a partir da comparação das cinco linhas de vida de cada proprietário da freguesia. As interações locais, sejam elas econômicas ou sociais, permitem o encontro entre estes indivíduos.

Conclusão

As transformações da conjuntura econômica e da sociedade na primeira metade do século XIX ocasionaram uma interferência na Freguesia de Inhaúma, alterando sua estrutura fundiária. Os grandes engenhos foram se fragmentando tendo seus lotes vendidos ou legados por meio de heranças, fazendo com que predominassem, nesta freguesia, as médias e pequenas propriedades voltadas para as lavouras de abastecimento alimentar da cidade.

A compra das propriedades foi o meio mais declarado nos registros de terra, sendo seguida pelo arrendamento e pela herança. A aglomeração populacional que ocorreu após a transferência da Família Real em 1808 (nos centros urbanos) também contribuiu para a fragmentação de grandes propriedades da Coroa na região que foram arrematadas em “hastas” do Banco do Brasil, por exemplo. Outra modificação ocorreu na composição de sua população ao longo do século: se nas primeiras décadas do século XIX a maioria da população era escrava, na segunda metade desta centúria passava a ser composta de homens livres.

A dita conjuntura ocasionou também uma modificação do perfil econômico na Freguesia de Inhaúma. Ocorreu o desenvolvimento de atividades comerciais paralelas à atividade agrícola, tais como a criação de fábricas, vendas, hospedarias na região, levando-nos a crer que as produções agrícolas para o abastecimento alimentar e as produções fabris formaram um novo perfil de proprietário ao longo do século: o “empresário”, ou melhor, o “homem de negócios”. Este proprietário é mais do que um fazendeiro e utiliza suas terras para atividades de lavoura e para atividades manufatureiras. Pode-se dizer, também, que há uma diversificação da produção, pois havia propriedades que possuíam fábricas, criavam gado e possuíam plantações diversas. Mas é importante salientar que este perfil de proprietário e de propriedade não é geral, mas sim de uma parte do grupo.

Houve a percepção de formas de expansão do domínio sobre as terras através de compras contínuas em um mesmo local, ou através de famílias que possuem irmãos, filhos, e outros parentes como confrontantes e juntos possuíam um número de propriedades considerável. Há, então, um exercício de poder dos proprietários sobre seus domínios, suas terras e homens que trabalhavam nela, fossem escravos, moradores ou homens livres. Os proprietários das maiores propriedades possuíram um cuidado maior em demarcá-las apresentando confrontantes, medidas em graus, pontos geográficos, testemunhas e até mesmo desenhos com as medidas em braças. Este fato mostrou uma preocupação destes proprietários em demarcar suas terras que algumas vezes são desmembradas de outras maiores. E, por último, foi possível observar que cada indivíduo encontrava-se imerso em múltiplas redes de sociabilidades; redes que ora se excluem ora se encontram dependendo das limitações e das oportunidades que surgem em suas vidas, além da influência do local em que se encontravam inseridos.

NOTAS:

Livro de Tombo do Colégio de Jesus do Rio de Janeiro. Biblioteca Nacional. Divisão de Publicações e Divulgação. Rio de Janeiro, 1968.

Adotamos o termo utilizado por Joaquim Justino dos Santos (SANTOS, 1987: 28).

Não podemos negar, porém, que o açúcar continua desempenhando um papel econômico na freguesia ao longo do século XIX, mesmo com sua “crise”.

Utilizando o termo de Lúcia Neves e Humberto Fernandes Machado. (NEVES, Maria Lúcia Bastos & MACHADO, 2002: 143).

Existiam fábricas de louça vidrada, fábricas de "Colla", telhas e tijolos, aguardente, hospedarias, fábricas de carvão em furna e vendas. Almanaque Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro. (Almanaque Laemmert). Anos 1848 – 1861. http://www.crl.edu/content/almanak2.htm. Último acesso dia 02/12/08.

Os doutores Leal e Padilha eram tutores de suas esposas D. Maria Flora Carneiro de Azambuja Leal e Thereza Henriqueta Casimiro Azambuja Padilha que teriam herdado a propriedade de D. Thereza Alexandrina de Azambuja, mãe de ambas. Ao que consta, nenhum dos proprietários residiam na freguesia, porém aparecem como médicos (no Almanaque Laemmert) evidenciando que exerciam sua atividade na mesma.

Registro Paroquial de Terras número 61, fl 33 – 33 v.

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CONTRIBUIÇÃO A HISTÓRIA DA FREGUESIA DE INHAÚMA - NOTASInformações presentes em Inventário. Maria Flora Carneiro Azambuja Leal. Ano: 1863. Procedência: Juízo de Órfãos. Inventariante: Francisco Correa Leal. Cód de Fundo: 3J; NOT. 5808; MAÇO: 0315. Arquivo Nacional.

Informações presentes no Almanaque Laemmert entre os anos de 1856-1861.

Há autores que discordam desta posição de Marx (1991) e de José de Souza Martins (1986) de que o mercado fundiário foi estabelecido após a Lei de Terras. Dentre estes destacamos Cristiano Cristillino (2010) que defende que o mercado de terras não poderia ser reduzido a um único fator ou marco legal. Deste modo, o autor afirma que a Lei de Terras de 1850 não criou o mercado fundiário no Brasil (CRISTILLINO, 2010:196). Márcia Motta também faz uma pequena discussão historiográfica sobre estas posições em seu verbete sobre a mesma lei (MOTTA, 2005:279).

Citado no Livro de tombo do Colégio de Jesus do Rio de Janeiro. Págs. 121, 122, 123.

Conforme o Registro de Paroquial de Terras número 71, fl. 39.

Conforme o Registro Paroquial de Terra número 42, fl 22 v.

Conforme o Registro Paroquial de Terra número 7, fl 2.

Conforme o Registro Paroquial de Terras número 59, fl 31. “As vendedoras” citadas como confrontantes de João Domingues Pereira são Dona Mariana Josepha Mascarenhas e sua irmã. Logo esta terra de João Domingues também faz parte da antiga Fazenda da Pedra.

Conforme o Registro Paroquial de Terras número 34, fl 16.

Conforme o Livro dos Registros de Terras da Freguesia de São Tiago de Inhaúma, fl 1.

Conforme o Registro Paroquial de Terras número 83, fl 45 v.

Conforme o Registro Paroquial de Terras número 89, fl 48 v.

Conforme os Registros Paroquiais de Terras números 98 ao 103.

Há trabalhos como os de Manoela Pedroza (2008) que analisam as redes de parentela no Rio de Janeiro Rural (neste caso na Freguesia de Campo Grande). João Fragoso também destacou relações de hierarquias rurais entre proprietários na freguesia rural de Irajá (FRAGOSO - IN: ALMEIDA E OLIVEIRA, 2009:170).

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

Fontes Manuscritas:

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Arquivo Nacional.

Publicações Históricas do Arquivo Nacional. Correspondência ativa e passiva dos Vice-Reis. Códice 69; V- 8; no 117 e Códice 69 – v. 9 – fl 141.

Livro de Registros de Terras da Freguesia de São Tiago de Inhaúma 1855-1856. Fundo/Coleção: Registro de Terras – Corte de Apelação. Seção de guarda: CODES; Cód de Fundo 20.

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Inventários:

Augusto Duque Estrada Meyer. Ano 1883. Fundo: Juízo de Órfãos da 1ª Vara; Inventariante: Gustavo Miguel Duque Estrada Meyer. Cód. De Fundo: 3J; NOT. 509; cx. 4018. Seção de Guarda: Codes/ SDJ.

Francisco José Ferreira Rego. Ano: 1859. Procedência: Juízo Municipal da 3ª Vara; Inventariante: Clara Alexandrina de Carvalho Rego. Cód. De Fundo: 3J; NOT. 192; CX. 0286.

João Ferreira da Silva Braga. Ano 1862. Procedência: Juízo de Órfãos; Inventariante: Doutor João Carlos de Oliva Maia. Cód. De Fundo: 3J; NOT. 1742; CX. 4153.

Maria Flora Carneiro Azambuja Leal. Ano: 1863. Procedência: Juízo de Órfãos. Inventariante: Francisco Correa Leal. Cód de Fundo: 3J; NOT. 5808; MAÇO: 0315.

Arquivo da Cúria Metropolitana do Rio de Janeiro.

Habilitações Matrimoniais:

Francisco Corrêa Leal e Maria Flora Carneiro Azambuja. CX. 2406; NOT. 48901.

Francisco José Ferreira Rego e D. Clara Alexandrina de Carvalho. CX 2321; NOT. 45926.

Gustavo Miguel Duque Estrada Meyer e Luiza Roza Pereira. CX. 1753; NOT: 25996.

João Ferreira da Silva Braga e D. Ignascia Francisca Maia. CX. 3112; NOT. 76146.

Manoel Ignascio de Aguiar e Maria Ignascia de Aguiar. CX. 2010, NOT. 34288.

Fontes Impressas:

Almanaque Administrativo, Mercantil e Industrial do Rio de Janeiro. (Almanaque Laemmert). Anos 1848 – 1861. http://www.crl.edu/content/almanak2.htm. Último acesso dia 02/12/08.

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Baixadas de Irajá e Inhaúma Recorte do mapa hipsométrico Atlas Escolar da Cidade do Rio JaneiroInstituto Pereira Passos / Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro - 2000

IRAJÁ e INHÚMA Baixadas e Freguesias

Litorâneas a baia de Guanabara, separa as baixadas de Irajá e Inhaúma o Maciço da Misericórdia. Suas ocupações foram Iniciada no final do século XVI, com a produção de açúcar e plantações de abastecimento ao Rio de Janeiro.

Em 1644 Irajá torna-se a primeira freguesia rural da cidade, tendo por matriz a Igreja de N. Srª da Apresentação, edificada em 1613, sendo a ela subordinada a capela de São Tiago de Inhaúma. Um século depois, 1743, desmembrado-se da Freguesia de Irajá, foi criada a Freguesia São Tiago de Inhaúma, tendo por matriz, agora igreja, a antiga capela desse orago.

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PLANO PROGRAMA DOINSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO

BAIXADA DE IRAJÁ

MOVIMENTO CINE VAZ LOBOPRESERVAÇÃO, CULTURA E MEMÓRIA

MORADORES E AMIGOS DA BAIXADA DE IRAJÁ EM AÇÃO PELA TRANSFORMAÇÃO DO CINE VAZ

LOBO EM CENTRO CULTURAL DE ARTES CÊNICA E AUDIO VISUAL

EXTERNAMENTE PRESERVADO EM SUA

ARQUITETURA ORIGINAL

INTERNAMENTE ADAPTADO PARA A NOVA ATIVIDADE

CINE TEATRO COM 800 LUGARES, MANTENDO TODA A TRADIÇÃO DOS FLORÕES, CORTINAS E

JOGO DE LUZES ORIGINAIS

TRÊS SALAS DE MULTIUSO

SALÃO DE EXPOSIÇÕES

LOJAS DE SERVIÇOS

SALAS DE CURSOS, BIBLIOTECA, CENTRO DE EDIÇÃO AUDIO VISUAL

E ACERVO HISTÓRICO.

EVENTOS E INTEGRAÇÃO SÓCIO- CULTURAL COM A POPULAÇÃO.

PRESERVAÇÃO HISTÓRICA

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Além de irajá

II

CONTRIBUIÇÃO À HISTÓRIA DO SUBÚRBIO CARIOCAGuilherme Peres *1

Dentre os inúmeros viajantes que contribuíram para o conhecimento da região Sudeste do Brasil no início do século XIX, destaca-se o botânico Auguste de Saint-Hilaire, publicando na Europa o resultado de suas pesquisas.

Permanecendo nesse país durante os anos de 1816 a 1822, iniciou sua viagem partindo do Rio de Janeiro visitando várias Províncias, colhendo material botânico e zoológico, registrando observações de interesse histórico, geográfico e etnográfico.

Acompanhado do cônsul geral da Rússia no Brasil Sr. George Von Langsdorff, que em setembro de 1816 havia comprado a fazenda Mandioca em Inhomirim, Baixada Fluminense, iniciaram a viagem no dia 7 de dezembro do mesmo ano seguindo uma pequena tropa de muares, “um negro e um mulato que pertenciam ao Sr. Ildefonso”, responsável pela expedição.

*1. PERES, Guilherme – Formação e licenciatura em Arte Gráficas, Imprensa Nacional – Membro Fundador e Secretário do Instituto de Pesquisas, Análises Históricas e Ciências Sociais da Baixada Fluminense – IPAHB – Autor, entre outros, de: “Tropeiros e Viajantes na Baixada Fluminense” (2000); “Um Lugar no Passado” (2007); “Queimados – Uma História da Cidade” (2008); e “Perfis Meritienses” (2011) - Correspondente convidado do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá.

Prosseguindo pelo “Caminho de Terra” passaram diante do palácio São Cristóvão, cuja visão à direita era a Baia de Guanabara e à esquerda “um vale semeado de colinas e casas de campo”, tendo ao fundo as montanhas da Tijuca cobertas de matas virgens. “Talvez cousa alguma no mundo se compare em beleza aos arredores do Rio de Janeiro” diz Saint-Hilaire, elogiando as florestas “tão velhas como o mundo”, e “que todos os meses do ano estão ornadas de flores vistosas”.

Descrevendo a estrada que saía da Capital, o botânico afirma que durante duas léguas “não deixamos de encontrar homens a pé e a cavalo, e negros que conduziam descarregados os cargueiros que pela manhã haviam levado à cidade com provisões”. Em meio à poeira “rebanhos de bois e varas de porcos tocados por Mineiros avançavam lentamente”. Nas tabernas o ruído dos escravos era ensurdecedor, misturado aos “homens livres de classe inferior.

TROPEIROS

Observado por Saint-Hilaire ter encontrado pelo caminhos “descarregados os cargueiros”, eram esses carros de bois e tropas de burros que retornavam aos centros produtores nas baixadas do interior, em particular nas de Irajá e Inhaúma.

Aquarela de Joaquim Cândido Guillobet – 1814 Biblioteca Nacional – Rio de Janeiro – Brasil.

INHAÚMA

Depois de caminharem duas léguas os viajantes avistaram a paróquia de São Tiago de Inhaúma, cujo edifício “construído isoladamente sobre uma plataforma, de onde se descortina um panorama muito agradável”. Comentando sobre essa denominação, Saint-Hilaire explica que: “Inhaúma, não passa provavelmente, duma corrupção de inhuma que se dá no Brasil, à ave curiosa que os naturalistas chamam de “palamedea cornuta”... é provável que tal ave, hoje em dia extremamente rara fosse outrora muito comum; mas foi dizimada com o fito de obter-se essa saliência córnea que traz à cabeça e à qual se atribuem virtudes imaginarias.”

Surpreso com a densidade populacional da região, o viajante comenta que a “paróquia de Inhaúma, cujo raio não é maior que meia légua, conta com duzentos fogos (casas) e mil e seiscentos habitantes adultos”, revelando que ninguém ficava bastante afastado da Igreja, incluindo as tabernas às margens do caminho. “Artífices, mercadores, botequineiros, tratam também de se aproximar do local em que se reúnem os proprietários, e é assim que se formam, na maioria, as povoações do interior.”

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Ao se afastarem de Inhaúma, as habitações e as tabernas na beira da estrada iam rareando, encontrando-se menos terrenos cultivados. “Os bosques tornam-se mais comuns, e como uma vez mais nos aproximamos das montanhas, o aspecto da região toma caráter mais grave”.

IRAJÁ

Continuando a viajem os caminhantes foram dormir em Irajá, “outra paróquia mais importante”. Ali chegando admiraram-se de ver uma casa toda iluminada por numerosas lanternas de papel, cujo dono era devoto de N. S. da Conceição sua padroeira, antecipando-se à festa que haveria em sua homenagem no dia seguinte.

No outro dia, ao acordarem pela manhã, foram surpreendidos à porta da casa, com um grupo de “doze ou quinze” índios Coroados, homens e mulheres, que estavam de passagem em direção ao Rio de Janeiro, “para reclamar do Rei uma légua quadrada de terras em que desejavam se estabelecer e da qual pretendiam expulsá-los. Não sei o que foi feito deles, mas é provável que ninguém tenha ligado a menor consideração às suas queixas”.

Após arrumarem a bagagem nos animais, a pequena tropa continuou sua marcha para atravessar o leito do rio Meriti, em busca de Freguesia de Santo Antônio de Jacutinga (Nova Iguaçu) novamente despertando admiração de Saint Hilaire a flora que compunha as matas à margem do caminho: “depois de Irajá o caminho torna-se menos igual e em alguns lugares corta-se terrenos pantanosos em que florescem várias “Ponteiderias”, belas “Sagittarias” e “Rhexias’ ornadas de lindas flores”. Nas capoeiras um pouco mais úmidas, observei a espécie de “Bignoneácea” que chamam vulgarmente ipê,...estava então coberta com uma intensidade de belas flores amarelas que a faziam notar de longe”

Ao sair do Rio de Janeiro, o botânico registra o fim das chácaras em volta das casas e o início dos canaviais circulando os engenhos de açúcar, que fumegavam tocados pelo braço escravo, “em número de cinco na paróquia de Inhaúma, e já em Irajá atingem a doze, e onze na de Santo Antônio de Jacutinga, paróquia que vem depois de Irajá, e cujas terras baixas e úmidas convém perfeitamente à cultura da cana- de-açúcar”.

UM POUCO DA HISTÓRIA DE INHAÚMA

Segundo Monsenhor Pizarro registrou ainda no período colonial, em Inhaúma se acha a Paroquial Igreja de São Tiago, cujo templo foi fundado por Custódio Coelho e doado em 1684, por Agostinho Pimenta de Morais ao Vigário Geral, Clemente Martins de Matos, para ser Capela Curada do território de Inhaúma. Se desunindo da Freguesia de N. S. da Apresentação de Irajá, seu primeiro pároco foi o padre Francisco Galvão Taborda, desde que essa Igreja entrou na categoria de perpétua em 27 de janeiro de 1743.

Reconstruída com paredes de pedra e cal em 1780, pelo vigário Padre Antônio da Fonseca Pinto, seu interior era composto de três altares sendo o maior, ao centro, dedicado ao Santíssimo. Seus limites assinalavam a Freguesia de N. S. da Apresentação de Irajá e S. Francisco Xavier do Engenho Velho, havendo duas Capelas filiadas: A 1ª. de Santo Antônio, fundada na fazenda da Pedra antes do ano de 1638. A 2ª. de Santa Ana, nas proximidades da Matriz.

“Cinco fábricas de açúcar e algumas olarias subsistem nesse território”, diz monsenhor Pizarro, “cultivado com cana doce, mandioca, milho, feijão, vários legumes, arroz, café, cacau, hortaliça e arvores de espinho frutíferas”.

A produção “mais pesada” era conduzida através dos portos da Olaria e das Mangueiras, ou as praias de Maria Angu e de Inhaúma, sendo os gêneros de fácil condução transportados pelo “caminho de terra firme”. Fertilizado por “dois pequenos riachos” que atravessavam a região, denominados por Farinha e Gombitimbó, ambos mansos em tempo seco mas “temíveis e soberbos em estações chuvosas, em que negam passagem aos viandantes”.

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Segundo Theodoro Sampaio em uma versão mais consistente, Inhaúma é uma corruptela de “nhan-um”, ave preta (palmidia cornuta), habitante de lugares pantanosos. Vieira Fazenda registra que esta região figura nas cartas de sesmarias cedida aos jesuítas em 1555 por Estácio de Sá: “cem braças ao largo do mar, e mil pela a terra adentro da tapera de Inhaúma. É de concluir-se, pois que Inhaúma teria sido uma aldeia de tupinambás, pelo que se chamara antes “Tapera”.

Brasil Gerson nos dá outra versão dizendo que Inhaúma era o mesmo que barro de olaria, afirmando que “durante algum tempo na sua vasta Freguesia predominaram a cana de açúcar e outras lavouras”, dedicando-se também ao fabrico de tijolos e telhas, nas inúmeras cerâmicas que se espalhavam em seu território.

As cartas do século XVIII assinalam no litoral dessa região, o nome da grande Freguesia várias vezes repetidas: “Porto de Inhaúma; Saco de Inhaúma; Bonsucesso de Inhaúma; etc.” onde seis anos depois os jesuítas abriram caminho afastando-se para o interior em busca das regiões secas, e estabelecer lavouras e engenho.

CRISTÃOS NOVOS

Antes de prosseguirmos contando um pouco da história de Inhaúma, queremos chamar atenção para a ocupação de “cristãos novos” (Judeus convertidos ao catolicismo) nessa região, desde o século XVII.

Divididas em freguesias por seu caráter religioso, o recôncavo fazia-se presente na economia da capitania, criando na parte ocidental da Baia, as freguesias de Irajá, São João Baptista de Meriti, Jacutinga, Campo Grande e Jacarepaguá.

As roças de mandioca para atender os engenhos de farinha, o milho, as hortaliças e as frutas também faziam parte desse celeiro, beneficiado pelo solo humoso, fertilizado pelo leque de rios, que serviam de escoamento da colheita abundante em direção ao Rio de Janeiro. Criação de gado, engenhos de aguardente, olarias e extração de lenha, completavam a atividade dessa gente que se instalavam na cidade, e tinham como fonte de renda, o campo.

Segundo o padre José de Anchieta, no final do século XVI, 3.850 almas faziam parte dessa população "sendo três mil de índios, setecentos portugueses e uma centena de índios africanos". Durante o século seguinte, a riqueza que se acumulava com uma economia essencialmente agrária, criou a figura do senhor de engenho, "lavradores de partido, e homens brancos que exerciam funções técnicas nos engenhos, como mestre de açúcar, e nas cidades eram artesãos, intermediários na exportação, importadores de bens de consumo e escravos, pertencente aos quadros da burocracia colonial, e os profissionais liberais, como advogados e médicos”, compunham o alvorecer dessa burguesia fluminense. Constituindo essa pequena população branca, "os Lucena, os Cardoso e os Barros, tinham seu lugar como proprietários de terras" fazendo parte, durante o século XVIII "do grupo dos "homens bons" e participantes da burocracia colonial", diz Lina Gorenstein.

Combinando atividade agrária no campo com a burocrática na cidade, os cristãos novos valiam-se dos familiares para administrar o engenho. Era impossível "dissociar esse grupo urbano, daquele ligado a produção do açúcar: assim, essa incipiente burguesia cristã-nova fluminense de início do século, tinha raízes na grande propriedade agrícola monocultora e escravista do açúcar, com o qual se encontrava profundamente relacionada".

A propriedade da terra no recôncavo, foi desde cedo, cedida a cristãos novos, Antonio de Lucena recebeu do governador Salvador Correia de Sá, "uns chãos devolutos", segundo as "cartas de sesmarias do Rio de Janeiro (1595-1606) também a Diogo de Montarroio, Manoel Gomes, Miguel Cardoso e Antonio de Barros, casado com d. Brites Lucena".

O mais antigo engenho de cristãos novos no Rio de Janeiro, do qual existe descrição, segundo Gorenstein, "pertencia a Sebastião de Lucena Montarroio e sua esposa Beatriz de Paredes, em meados do século XVII. Era um engenho de três paus em Maragoí, sob a invocação de N. Sra. do Rosário, coberto de telhas e com moenda".

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Com a construção de uma capela dedicada a N. Sra. da Apresentação, nos arredores do Rio de Janeiro, era criada em 1647 a freguesia do Irajá, pelo padre Gaspar da Costa, tornando-se paróquia independente no mesmo ano. Ocupada por vários engenhos de açúcar, "Irajá parece ter sido preferida por muitos dos cristãos novos que no Rio de Janeiro se dedicaram a atividades agrícolas, tais como os Paredes e os Ximenes”, diz Vivaldo Coraci.

Em São João de Meriti, paróquia também criada em 1647 com a denominação de Trairaponga, tinha por limites ao norte, a freguesia de Jacutinga ao sul a de Irajá, a oeste com Campo Grande e a leste com a baia de Guanabara. A presença de cristãos novos nessa região, foi bastante intensa durante todo o século XVII, "Alexandre Soares Pereira era dono de um engenho no sitio da Pavuna, em São João de Meriti, engenho herdado de seu pai João Soares Pereira. José Gomes Silva, homem de negócios, contratador, era também senhor de engenho em Meriti, tendo como sócio o Capitão Pereira Galvão". João Correia Ximenes, casado com Brites de Paredes, filha do senhor de engenho Agostinho de Paredes, "era senhor de engenho em Meriti, com escravos, boa fábrica, e sem gados". Nesta freguesia João Correia Ximenes ergueu uma capela, dedicada a Nossa Senhora da Conceição, antes de 1708, no porto da freguesia.

Cerca de 30 senhores de engenhos foram denunciados ou presos nesta paróquia, diz Lina Gorenstein, "vários desses senhores eram aparentados" com proprietários de outros engenhos que se aninhavam nos vales do Meriti, Irajá, Sarapuí, Iguaçu e em Jacarepaguá, aliados com os lavradores "de partido", membros da família, ou "da nação". Esses lavradores arrendavam terras para o plantio de cana ou mandioca e usavam o engenho do proprietário para moagem, deixando como pagamento parte de sua colheita.

O PÁROCO DE INHAUMA

Vieira Fazenda informa que embora os engenhos de farinha e açúcar já produzissem no início do século XVII, “a fazenda de Inhaúma só se tornou paróquia em 1687,” graças a construção da capela feita por Agostinho Pimenta de Morais, “templo esse levantado nas terras de Custódio Coelho, em louvor a Nossa Senhora da Conceição”. Em seu altar, recebeu a imagem de São Thiago Mayor, vinda da Espanha, cujo primeiro vigário foi o padre Clemente Martins de Matos.

Esse sacerdote era judeu. Formado em Direito Canônico, teve que fugir de Portugal para não cair nas garras do “Santo Ofício” no final do seiscentos, quando eram mais terríveis a caça às comunidades judaicas para serem “julgados” e sacrificados no fogo da Inquisição.

“Peregrinou por vários países da Europa até chegar em Roma. Homem de talento, inteligente, dinâmico” e, apesar de não ter “sangue limpo”, padre Clemente soube penitenciar-se diante do poder papal e receber seu aval para exercer o sacerdócio numa colônia bem distante da Europa. Viajando para o Rio de Janeiro foi designado para a Paróquia de Inhaúma “à qual deu muitos benefícios de sua piedade e de sua bolsa”, onde permaneceu por alguns anos sem ser “incomodado”.

ENGENHO DA RAINHA

A moradia do Engenho da Rainha já existia quando D. Carlota Joaquina, esposa de D. João VI a comprou depois de sua chegada em 1808. Segundo Brasil Gerson em sua “História das Ruas do Rio de Janeiro”, essa grande casa pertencia a Freguesia de Inhaúma e apesar de composta de um só pavimento, “dispunha de 15 quartos, e diante delas via-se 2 fileiras de esguias palmeiras, numa pequena elevação até onde chegaria à Rua D. Luísa. O engenho era embaixo, na planície”.

Descendentes do Coronel Joaquim de Souza Pereira Botafogo, último de seus proprietários já no final do Segundo Império, quando Inhaúma havia perdido “fazia muito, a sua velha riqueza agrícola, da qual havia participado também os jesuítas à partir do século XVIII, lembravam-se do resto do fausto Real deixado sob seu teto. Coisa assim como a cama da Rainha, de grossos pés de madeira esculpida; uma carruagem que a trazia do porto de Inhaúma; fardas de seus soldados e cocheiros, e as iniciais da Casa Real num marco de pedra à sua porta”.

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RIOS, CAMINHOS E POVOADOS.

No Dicionário Histórico e Geográfico de Moreira Pinto publicado no final do Império, encontramos detalhes do Rio Inhaúma, que nascia nas vertentes das serras que se formam a Oeste da cidade recebendo o pequeno rio Faria, e despejava suas águas na baia de Guanabara atrás da ponta do Caju chamada de baia de Inhaúma. “Apesar de pouco importante, este rio deve orgulhar-se de ter o seu nome ligado ao herói da guerra do Paraguai, nas batalhas Curupaity e Humaytá, o almirante Joaquim José Ignácio, que possuía uma modesta propriedade junto a sua embocadura”.

No mesmo dicionário vemos os limites dessa freguesia: ao Norte limita-se com as Freguesias de São Cristóvão e Engenho Novo; ao Sul com a de Irajá; a Este com a de Jacarepaguá e a Oeste com o mar. “Conta com sete centros populosos: Cascadura, Cupertino, Encantado, Engenho de Dentro, Pilares e Praia Pequena. Possui uma linha de bondes (tração animal), um hospital e duas capelas. A Igreja Matriz conta com a invocação de São Thiago; ao lado dela fica o cemitério em péssimas condições tanto em tamanho como em asseio”.

O livro assinala os “prédios nobres da Freguesia”: As oficinas da Estrada de Ferro Central do Brasil; a fábrica de fósforo; a olaria José dos Reis; a fábrica São Lázaro; a Sociedade Particular de Música Progresso do Engenho de Dentro; a Escola Pública dos Operários; o palacete D. Silvana no Encantado; o Hospício de N. Sra. das Dores, em Cascadura.

Faziam parte os seguintes povoados e lugarejos: Apicú, Amparo, Amorim, Arraial dos Bíblias, Amazonas, Braz de Pina, Barreiros, Bonsucesso, Cascadura, Coqueiros, Capão do Bispo, Caneleira, Cardoso, Cupertino, Catete, Engenho de Dentro, Engenho da Pedra, Engenho do Mato, Engenho da Rainha, Freguesia, Frecheiras, Itaguati, Juramento, Maria Angú, Manguinhos, Madalena, Olaria, Oficinas, Piedade, Pilares, Praia Pequena, Pedra do Juramento, Pedreiras, Ramos, Tabôa, Serra do Urubú, Tererê, Terra Nova, Vendinha, Viana, Venda Grande e Zumbá.

Os caminhos mais importantes eram: Estrada da Penha, Estrada da Freguesia, Estrada de Santa Cruz, Estrada das Oficinas, Estrada da Pavuna, Estrada de Todos os Santos. Alguns portos também faziam partedessa Freguesia: Porto da Pedra, Porto de Inhaúma, Porto do Mocanguê e Porto de Maria Angú.

Estabelecendo pequenos portos fluviais e nas praias urbanas da baia de Guanabara, durante os primeiros séculos de ocupação intensificou-se o curso de cabotagem com barcos e faluas que transportavam a produção dos engenhos periféricos do “sertão carioca”. À foz e ao longo dos rios Meriti, Irajá e Inhaúma, o intenso movimento de mercadorias e passageiros, misturavam-se com pescadores que iam vender sua mercadoria a população mais afastada do litoral.

Os caminhos de penetração em direção ao Norte deve-se a expansão dos engenhos e roças que se estabeleceram entre São Cristóvão, Inhaúma, Irajá, Pavuna e Santa Cruz. “O caminho de Itaoca que no Bonsucesso de hoje se prolongava até as praias de Inhaúma, Apicú e Maria Angu”, era a continuação dos caminhos de Manguinhos, Inhaúma e Engenho da Pedra, alcançando o Porto Velho de Irajá através da estrada do Quitungo.

ESTRADA REAL

Em 1725, o coronel Rodrigo César de Meneses recebeu da Coroa, autorização para abrir um caminho terrestre que ligasse o Rio de Janeiro à São Paulo, aproveitando a trilha já aberta pelos jesuítas desde São Cristóvão ate a fazenda de Santa Cruz, o que suscitou protestos dos Inacianos alegando prejuízos. Entretanto o trabalho continuou e a estrada foi concluída em 1754.

Anteriormente também conhecida como estrada das Minas, devido a crença dos primeiros habitantes, que haviam encontrado ouro nas nascentes do rio Guandu, pertencentes aos jesuítas.

Com uma extensão de mais de 60 quilômetros, esse caminho longo e sinuoso começava no atual largo da Cancela em São Cristóvão, e terminava nos campos alagados de Santa Cruz. Passando por vários engenhos pertencentes a freguesia de Irajá, era usada para o transporte de produtos da lavoura, e cerca de 500 cabeças de gado anuais, que os jesuítas enviavam para venda e destinados a manutenção do Colégio no Rio de Janeiro, pertencente à Ordem.

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Na Carta Topográfica do Rio de Janeiro ”Feita por ordem do Conde da Cunha, por Manoel Vieira Leão” em 1767, vê-se o trecho fluminense dessa estrada que, partindo do centro urbano seguia por Campinho, Engenho dos Afonsos e inúmeros outro engenhos. Passando pela freguesia de Santa Cruz, (assinalado no mapa por eng. D’el Rei, pois os inacianos haviam sido expulsos em 1759), Guarda, sobre o rio Guandú, e Itaguaí, deixando o litoral em busca da Guarda do Pouso Frio, Ribeirão das Lages, Pouso do Vigário (rio Piraí) e a Guarda do Coutinho, entrando no sertão paulista através de florestas.

No mapa de João Jorge Lobo, datado de 1778, essa estrada saía do centro da cidade com o nome de Caminho de Inhaúma, passava pelo engenho do Fr. Miguel em Campo Grande, Santa Cruz, Guarda da Ponte no rio Taquarí, Pouso Frio, Caveiras, São João Marcos, Passa-Vinte, Passa Três e Guarda do Coutinho entrando na Capitania de São Paulo pela região registrada no mapa como sertão.

Em outro mapa datado de 1801 “da Capitania do Rio de Janeiro oferecido a D. Antônio Roiz de Aguiar”, a estrada de Santa Cruz inicia-se no Caminho de Terra Firme entre as terras do Eng. Novo e os “Campos de Irajá”, até atravessar a fazenda, assinalado no mapa com o nome de Santa Cruz D’el Rei.

Por essas terras transitou com suas tropas em 1710 o Capitão-de-Fragata francês Jean François du Clerc, comandando todo o corpo de uma esquadra composta de cinco navios de guerra e 1500 homens para atacar o Rio de Janeiro, desembarcados em Guaratiba. Segundo um manuscrito da biblioteca da Ajuda em Portugal referindo-se a essa invasão: “Guaratiba era um porto que fica perto da Vila da Ilha Grande 4 léguas por terra à cidade, a qual não tinha muita resistência por ser pouco capaz de desembarque, e só os moradores que ali se achavam com os seus negros lhe deram algumas cargas de mosquetaria e se retiraram”.

O Governador do Rio de Janeiro, Coronel Francisco de Castro Morais assinala em seu relatório, que os franceses continuaram por terra “vencendo os embaraços do caminho até alcançarem o engenho dos padres da Companhia”.

Em outra versão, os franceses seguiram para a cidade “guiados por negros fugitivos das casas de seus senhores...vindas da Ilha grande pela Guaratiba, submeteram a ruínas e destruições os Engenhos da Vargem Grande e do Camori”.

OCASO DA FREGUESIA

Ainda no período do Império havia um colégio no Caminho dos Pilares (hoje rua Álvaro Miranda), do Prof. Cintra Vidal, que segundo Brasil Gerson, no largo, perto da escola, ficava a Venda dos Pilares, dizendo-se na versão popular que essa “era uma denominação inspirada nuns adornos de pedra que enfeitavam a casa do vendeiro e muito se destacavam”.

Os rios assoreados e os portos já desnecessários com a abertura dos caminhos perderam sua importância também com a extinção da produção de farinha, açúcar e aguardente. As engenhocas abandonadas eram presas fáceis do matagal, que invadia seus terreiros num abraço mortal. Em lugar das lavouras apareceram algumas pequenas indústrias como a cerâmica de José Moutinho dos Reis no lugar que ficou conhecido como Olaria.

Em Terra Nova e Pilares onde o trem passava, o casario se agrupava desmembrando-se da grande paróquia, perdendo aos poucos várias localidades de sua jurisdição que alcançava Benfica e São Cristóvão. Partindo daí, “o Caminho de Inhaúma se alarga. A estrada da Freguesia melhora”. Surge a Av. Automóvel Club no início do século XX. “Valorizam-se as terras à beira da tradicional Estrada Velha da Pavuna. A igreja ganha uma bonita praça antes chamada Adolpho Bergamine, depois: 24 de Outubro. Na Rua Padre Januário, em sede própria, funcionou durante muitos anos, o Grêmio Dramático de Inhaúma, animando as tardes domingueiras com espetáculos teatrais que atraíam grande parte da população.”

“Os bondes puxados por uma parelha de burros e dois vagões que faziam o trajeto Madureira-Inhaúma, também alcançavam a Penha através de Irajá”, diz em depoimento oral dona Maria Perez, que durante a década de vinte, fez esse trajeto muitas vezes com sua família para acompanhar enterros no cemitério de Inhaúma, ou participar das festas de outubro na igreja da Penha.

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No final da década de trinta, esses veículos foram substituídos por tração elétrica, deixando na saudade das pessoas mais velhas da região, a visão bucólica das pequenas cidades do interior, que no passado abrangiam a enorme região de Inhaúma, hoje limitado a um pequeno conjunto de casas aninhadas em torno de sua matriz.

BIBLIOGRAFIA:

GERSON, Brasil – “O Ouro, o Café e o Rio” - Editora Brasiliana, 1970 – Rio

SAINT-HILAIRE, Auguste de – “Viagem pela Província do Rio de Janeiro e Minas Gerais” – Ed. Itatiaia 1975 - SP

GERSON, Brasil – “Histórias das Ruas do Rio” - 5ª. Edição - Lacerda Editores – 2000 - RJ

VIEIRA FAZENDA, José - “Antiqualhas e Memórias do Rio de Janeiro” Rev. do I.H.G.B.- V. 142 – 1940 – RJ

SILVA, Moacir - “Kilometro Zero” - 1934 – RJ

PIZARRO e ARAÚJO, José de Souza Azevedo – “Memórias Históricas do Rio de Janeiro” – I.N.L. – Imprensa Nacional, 1945 – RJ

COARACY, Vivaldo - “O Rio de Janeiro no Século Dezessete” José Olympio Editora – 1965 – RJ

FERREIRA DA SILVA, Lina Gorenstein – “Heréticos e Impuros”. Col. Biblioteca Carioca – 1995 - RJ

FRAGOSO, Augusto Tasso – “Os Franceses no Rio de Janeiro”. Biblioteca do Exército – 1965 – RJ

Depoimento oral: D. Maria Perez, moradora em Duque de Caxias

Desenho obtido de folha esparsa de um livro didático não identificado Autor desconhecido – Data e local desconhecidos

ENGENHO DE AÇUCAR

A produção de açúcar foi a principal atividade econômica das baixadas do Rio de janeiro nos século XVII e XVIII. Muitos desses engenhos, em particular na Baixada de Irajá, foram propriedades de cristão- novos, que, fugindo da Inquisição em Portugal, neles aplicaram as fortunas de suas origens judaicas. Entre os senhores de engenhos cristão novos citados por Lina Gorenstein, Miguel Cardoso foi bisavô materno de Antônio José da Silva, nascido em 1705 no engenho de sua família na Grande Irajá. Teatrólogo em Lisboa, conhecido como “O judeu” e autor da peça “As Guerras de Alecrim e Manjerona”, Antônio José da Silva foi preso pela Inquisição e condenado a fogueira, sendo executado 19 de outubro de 1739.

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PATRIMÔNIO CULTURAL DA BAIXADA DE IRAJPATRIMÔNIO CULTURAL DA BAIXADA DE IRAJÁÁ

MUSEU AEROESPACIALCampo dos Afonsos

Inaugurado em 18 de outubro de 1976

Sediado em área de 15.195 m² de prédio de dois andares e cinco hangares da antiga Escola de Aeronáutica da Base Aérea do Campo dos Afonsos Campo, preservando a memória e cultura da aeronáutica brasileira, além da coleção de aeronaves de valor histórico e tecnológico equiparado as de grandes museus internacionais, o Museu Aeroespacial possui em exposição coleções históricas quanto Bartolomeu de Gusmão, Santos-Dumont, Primórdios da Aviação Brasileira, FAB na Segunda Guerra, Esquadrilha da Fumaça, Armas, Serviço de Busca e Salvamento da FAB, A Mulher na Força Aérea, Embraer, Sistema de Controle do Espaço Aéreo Brasileiro, Motores e Simuladores de Vôo.

O Museu Aeroespacial integra o Campus da Universidade da Força Aérea e está subordinado ao Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica.

Foto Ronaldo Luiz-Martins – Acervo IHGBI - 2010

Foto Lgtrapp – Site Wikipédia - 2011

Campo dos Afonsos, "Berço da Aviação Militar"

Av. Marechal Fontenelle, 2000 Campo dos Afonsos Rio de Janeiro - RJ

Tels.: (21) 2108-8954 (21) 2108-8955

www.musal.aer.mil.br

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Assim sendo, esperamos contribuir para o bairro de Vaz Lobo, comunidades e adjacências com a formação do Centro Cultural de acordo com as necessidades do local e visões patrimoniais o recuperando, preservando e dando utilidade, além de caminhar ao lado do desenvolvimento urbano da área, através do diálogo harmônico com o “projeto 2 traçado do Transcarioca” [2] que respeita a pré-existência do cinema ao invés de o demolir pelo “progresso” se colocando em consonância as Cartas Patrimoniais [3]:

“Carta de Atenas – aprovada no Quarto Congresso de Arquitetura Moderna – CIAM, 1931, Atenas – Grécia.Os objetos e monumentos artísticos que possuam valor para a civilização devem ser cuidados.Devemos propiciar a manutenção dos monumentos e respeitar todas as obras, independente de seu estilo.Os monumentos devem ser utilizados com o fim para o qual foram concebidos, se isto for possível. Prevalece o direito da coletividade frente aos direitos privados.

Carta de Veneza – aprovada pela Assembléia do II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos, 1964, Veneza – Itália.Amplia a noção de monumento histórico, não só para a obra isolada, mas para o ambiente em que estiver inserida.Ratifica a importância da interdisciplinaridade dos grupos de trabalho no campo da preservação do patrimônio.Considera que o monumento deve ter uma função útil à sociedade e não somente a da permanência de sua função original.”[4]

De acordo com o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), o significado corrente do termo patrimônio, neste caso, é o de bem material que é possuído por alguém, ou, muitas vezes, legado por sua família. Quando acrescentamos o adjetivo “cultural” ao referido termo, mudamos profundamente o significado do mesmo. Assim, a expressão “patrimônio cultural” designa a atividade de atribuição de valores históricos e artísticos, coordenada por uma autarquia federal que representa os interesses de uma coletividade. Os bens culturais, que através dessa atividade, são selecionados para o patrimônio são aqueles que servem melhor para a construção de identidades culturais. [1]

De acordo com o INEA, Instituto Estadual do Ambiente, 06 de outubro de 2010, através da Comissão Estadual de Controle Ambiental - CECA, no uso de suas atribuições concedeu Licença Prévia a Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro, aprovando a concepção e localização do corredor viário denominado Corredor Transcarioca, com 28 km de extensão, com suspensão de vegetação em áreas equivalente a 0,41 hectares no seguinte local: diversos logradouros – Barra da Tijuca, Jacarepaguá, Cascadura, Madureira-Vaz Lobo, Vicente Carvalho e Penha, Município Rio de Janeiro com licença válida até 06 de outubro de 2013, respeitadas as condições nela estabelecidas e entre essas, encontramos no item 6.12 a “preservação da edificação do antigo Cinema Vaz Lobo”. [5]

CINE VAZ LOBO EM DIÁLOGO COM O MEIO AMBIENTE E A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL

Karen da Silva Barros *

ACADEMIA I

*. Barros, Karen da Silva: Historiadora e professora; Membro Fundador do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá e Movimento Cine Vaz Lobo: Preservação, Cultura e Memória.

Movimento Cine Vaz Lobo: Criado em abril de 2010, com objetivo de atuar na defesa da não demolição do Cine Vaz Lobo, após o seu alcance em outubro de 2010, ampliando a meta inicial, tem atualmente por meta a desapropriação doprédio e a sua incorporação ao patrimônio público, tendo por utilização a instalação de um centro cultural. Em 1º de junho de 2011, o Coletivo deliberou pela ampliação de seus objetivos e, buscando a formação de uma instituição jurídica de utilidade pública e sem fins lucrativos, foi criando o Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá, no qual se incorporou, como plano/programa, o Movimento Cine Vaz Lobo.

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Segundo Ana Maria Mauad a “memória tem um papel fundamental, no sentido de criar essa identidade social e de estabelecer, às vezes dentro do próprio grupo, parâmetros para gerenciar os conflitos sociais”.[6] Não há história sem memória, mas as duas coisas não são sinônimos e marcando a diferença entre História e memória, Mauad pontua que temos um trabalho de rememoração, “quando eu rememoro com os meus filhos a trajetória daquilo que gerou a nossa família. Então, isso é um trabalho de rememoração. Ele constrói identidade, cria significado e cria coesão de grupo”. [7]

O Movimento Cine Vaz Lobo propõe que o cinema seja revitalizado e que de fato seja construída a praça ao seu redor integrando o largo. Para todas as nossas manifestações, as memórias e a “história do lugar” [9] foram importantes instrumentos das análises históricas de nossas pesquisas de campo que ratificaram a importância do cinema por tudo que já foi exposto e seu potencial para centro cultural. O trabalho de rememoração foi importante para que aproximássemos os moradores a causa, o que não foi difícil por não ter sido forçado nem forjado, logo se identificaram com o Movimento, além de ser unânime as reclamações sobre a falta de um centro de cultura e lazer, como Fernanda Costa fez representar como arquiteta e moradora do bairro:

“Quando a história toma a memória como objeto, ela cria um olhar distanciado. E faz a seguinte pergunta: por que é importante lembrar? E por que as sociedades históricas são lembradas? Em diferentes momentos da trajetória humana, os usos do passado são diferenciados.” [8]

Afinal, segundo a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente celebrada em Estocolmo, em 1972, definiu-se o meio ambiente como não só conjunto de componentes físicos, químicos, biológicos, mas também sociais capazes de causar efeitos diretos ou indiretos, em um prazo curto ou longo, sobre os seres vivos e as atividades humanas. O Cine Vaz Lobo seria assim um componente social da ambiência urbana predominante do bairro de Vaz Lobo e que identifica parte de sua história e memória.

O bairro não possui um meio de cultura. A classe média vai toda para Madureira, Vicente de Carvalho, Centro, Barra. Precisamos retomar a cultura local e, assim, desenvolver o comércio da região - afirma o advogado Gilson Buarque, morador do bairro há mais de 60 anos, que também participa do movimento e nos disponibilizou sua entrevista com Medes Filho, falecido herdeiro do cinema, a seu jornal de bairro Interação, expressando profundo orgulho e satisfação caso um dia o Cine Vaz Lobo fosse tombado pelo IPHAN como patrimônio cultural para que, no futuro, outros o possam conhecer.

“Como arquiteta e urbanista, interessada por patrimônio cultural e ainda moradora da região, vejo com grande pesar a ociosidade do prédio. Acredito que o potencial de uso dele é muito grande, devido seu porte, sua localização e seu histórico[...] Acredito que é justamente o significado cultural que o prédio carrega no seu processo histórico que dá a ele a importância nos dias atuais e gera boas perspectivas para a retomada de seu funcionamento no futuro como um local de desenvolvimento de atividades culturais. O seu entorno é bastante carente de espaços de lazer, convivência e cultura adequados para a população e, sendo assim, espero que as intervenções que serão feitas, devido a implantação do Corredor Viário Transcarioca, possam trazer melhorias não só para a revitalização do prédio do cinema, mas também para a localidade em geral.” [10]

Espaço Público de Referência: No relatório Revisão 10 do Patrimônio Cultural ao Longo do T5 – Vaz Lobo, da Gerencia de Intervenção Urbana (Subsecretaria Municipal de Patrimônio Cultural), no qual foi apresentada ao Executivo Municipal a proposição de preservação do prédio do Cine Vaz Lobo pela alteração de traçado do Transcarioca, foi também apresentada a proposição da construção de um “Lugar de Encontro e Manifestações Culturais”, esse compreendido pela formação de uma ampla praça em terrenos a frente a futura estação Vaz Lobo e a extensão da Rua Oliveira Belo entre este e o prédio do Cine Vaz Lobo. A grande praça, cercada por expressivo conjunto arquitetônico, substituirá o Largo de Vaz Lobo que desaparece pelas obras, tornando-se um novo patrimônio social e cultural local.

Composição Gráfica Ger. Intervenção Urbana / Pref, Cid. Rio de Janeiro

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“O cinema pode ser considerado como a representação da história do bairro de Vaz Lobo, do subúrbio e da cultura carioca. Ele foi construído no período de crescimento dos subúrbios e de efervescência cultural dos cinemas de rua na cidade, funcionou como um atrativo cultural importante para a população da região e, posteriormente, também provou do processo de desvalorização e decadência de todo este conjunto nas últimas décadas. Porém, ele foi e ainda é um marco espacial importante, que está inserido em uma ambiência ainda harmônica de paisagem urbana típica do subúrbio carioca. Sua linguagem estética também é testemunho de uma época específica, apesar de não apresentar grande requinte e sofisticação, como outros cinemas apresentavam. E, como já falei,apesar do estado de degradação, ainda possui um potencial muito interessante para abrigar novas atividades sócio-culturais.” [12]

Fábio Kobol afirma em seu artigo, “Cinema, uma questão de Estado”, que cerca de 90% dos filmes exibidos pela TV nacional são produzidos nos EUA; cerca de 75% do mercado exibidor está ocupado por filmes norte-americanos e mais de 90% dos municípios não possuem salas de exibição. Mas também nos diz que nosso cinema já deu provas de vitalidade e ao longo do século passado, muitos pressionaram o Estado e lutaram pelo cinema. Kobol finaliza chamando atenção que cabe aos cineastas, produtores, exibidores, distribuidores e, por que não, aos espectadores, levar essa luta adiante. [14]

Quanto ao processo de crise dos cinemas de rua, Alice Gonzaga, em seu livro “Palácios e Poeiras”, aponta como causa uma crise cultural gerada por inúmeros fatores, como: a transferência da capital federal pra Brasília, a diminuição dos investimentos no setor, o período de censura da ditadura militar, a diminuição do poder aquisitivo da população, a mudança de hábitos sócio-culturais, o aumento da violência, a difusão da televisão, o surgimento dos shopings centrers, etc. [13]

Conforme a Secretaria de Patrimônio Cultural, Intervenção Urbana, Arquitetura e Design, a maioria dos cinemas das décadas de 1940-50 foram concebidos como grandes palácios cinematográficos, muito em função do glamour hollywoodiano: “Foram construídos, [...], verdadeiros palácios cinematográficos em grande estilo, como era o caso do Cine Vaz Lobo, inaugurado na década de 1940 no Bairro de Vaz Lobo. [...] a sala, uma das mais belas da cidade, [...] foi a única que combinou elementos art- nouveau e art-déco.” [11]

O interessante da fala da Alice Gonzaga e Fábio Kobol está em relacionar com a entrevista do Mendes Filho, falecido herdeiro Cine Vaz Lobo que havia dado continuidade ao trabalho do pai, ao jornal do bairro de Vaz Lobo, Interação, em que responde a Gilson Gusmão com um balanço das diversas interpretações de acordo com sua experiência e sabedoria, entre as quais definir ser sonho seu poder, em futuro, ser o Cine Vaz Lobo um Centro Cultural.

Visto isso, não faz parte do nosso objetivo reabrir o cinema comercialmente, com fins lucrativos. O Cine Vaz Lobo como Centro Cultural ou Ponto de Cultura tem amplo potencial de servir ao fim para o qual foi concebido, cultura e lazer, com possibilidades de abrigar diversos projetos que atendam questões educacionais, culturais, entre outros como a rememoração, mesmo ainda fechado, e o estudo da educação patrimonial como:

“processo permanente e sistemático de trabalho educacional centrado no Patrimônio Cultural como fonte primária de conhecimento e enriquecimento individual e coletivo. A partir da experiência e do contato direto com as evidencias e manifestações da cultura, em todos os seus múltiplos aspectos, sentidos e significados, o trabalho da Educação Patrimonial busca levar as crianças e adultos a um processo ativo de conhecimento, apropriação e valorização de sua herança cultural, capacitando-os para um melhor usufruto destes bens, e propiciando a geração e a produção de novos conhecimentos, num processo contínuo de criação cultural.” [15]

“O conhecimento crítico e a apropriação consciente pelas comunidades do seu patrimônio são fatores indispensáveis no processo de preservação sustentável desses bens, assim como no fortalecimento dos sentimentos de identidade e cidadania. Nada substitui o objeto real como fonte de informação sobre a rede de relações sociais e o contexto histórico em que foi produzido, utilizado e dotado de significado pela sociedade que o criou. Todo um complexo sistema de relações e conexões está contido em um simples objeto de uso cotidiano, uma edificação, um conjunto de habitações, uma cidade [...].” [16]

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“configuram aquilo que Marcel Mauss (1974) chamou de “fatos sociais totais”. Tais bens são, simultaneamente, de natureza econômica, moral, religiosa, mágica, política, jurídica, estética, psicológica e fisiológica. Constituem, de certo modo, extensões morais de seus proprietários e estes, por sua vez, são partes inseparáveis de totalidades sociais e cósmicas que transcendem sua condição de indivíduos.” [18]

Não querendo fugir das “reflexões sobre as limitações e as possibilidades que a noção de “patrimônio” oferece para o entendimento da vida social e cultural”, mas sim o visualizando como “categoria de pensamento extremamente importante para a vida social e mental de qualquer coletividade humana”, conforme José Reginaldo, em sua obra “O patrimônio como categoria de pensamento” [17], o Cine Vaz Lobo transborda a delimitação precisa de patrimônio cultural, visto que tal divisão é mais uma construção histórica, dando ênfase às relações sociais ou mesmo nas relações simbólicas, e não apenas ao monumento:

Por tudo isso, não buscamos nada além do que nos é de direito desde a constituição de 1988 CAPÍTULO III - DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DO DESPORTO - Seção II - DA CULTURA, em seus artigos 215 e 216, em que cito os tópicos:

“Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referencia à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais incluem: [...]

IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artísticas-culturais;

“§ 1º - O Poder Público, com a colaboração da comunidade, promoverá e protegerá o patrimônio cultural brasileiro, por meio de inventários, registros, vigilância, tombamento e desapropriação, e de outras formas de acautelamento e preservação. [...]

§ 3º - A lei estabelecerá incentivos para a produção e o conhecimento de bens e valores culturais.” [19]

Prédio do Cine Vaz Lobo: Proposto Centro Cultural de Artes Cênica, Áudio e VídioFoto de Ronaldo Luiz-Martins – Acervo IHGBI - 2010

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CINE VAZ LOBO EM DIÁLOGO COM O MEIO AMBIENTE E A EDUCAÇÃO PATRIMONIAL - NOTAS

Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN. Conceito Patrimônio. Disponível em: <http://portal.iphan.gov.br/portal/montarPaginaInicial.do> Obtido 23/11/2010.

Secretaria de Cultura; Subsecretaria de Patrimônio Cultural, intervenção urbana, Arquitetura e design; Gerência de Intervenção Urbana. O patrimônio cultural ao longo do T5: Vaz Lobo. Projeto disponível nos arquivos do Movimento Cine Vaz Lobo: Preservação, Cultura e Memória.

As Cartas Patrimoniais foram escritas, desde o início do século XX, com o objetivo de esclarecer, contextualizar e dar diretrizes ou recomendações sobre o que deve ou não ser feito, quando se empreende um trabalho de restauração ou conservação. Estas, que são resultados de congressos, seminários e encontros periódicos de instituições internacionais voltadas para o tema de preservação, ampliaram os conceitos difundidos mundialmente, relacionados ao patrimônio histórico, patrimônio cultural, objeto artístico, sobre o que vem a ser um monumento, entre outros conceitos.

CALDAS, Wallace. Pinturas Murais: Restauração e Conservação. Rio de Janeiro: In-Fólio, 2008. (Coleção Artes e Ofícios). P 36.

Licença Previa Nº IN002896 – Comissão Estadual de Controle Ambiental – CECA / Instituto Estadual do Ambiente – INEA / Secretaria do Ambiente / Governo do Estado do Rio de Janeiro – Antônio Carlos Freitas de Gusmão / Presidente da CECA – 06 de Outubro de 2010.

MAUAD, Ana Maria. “Salto para o Futuro” - TV Escola. Disponível em: <http:// tvbrasil.org.br/saltoparaofuturo/entrevista.asp?cod_Entrevista=82> Obtido: 23/062010

MAUAD, Ana Maria. “Salto para o Futuro” - TV Escola. Disponível em: <http:// tvbrasil.org.br/saltoparaofuturo/entrevista.asp?cod_Entrevista=82> Obtido: 23/062010

Ibdem.

SANTOS, Joaquim Justino M. dos – “História do Lugar: Um método de ensino e pesquisa para as escolas de nível médio e fundamental” in: História, Ciências, Saúde – Manguinhos – Rio de Janeiro, vol. 9 (1) > 105- 24, jan-abr -2002

Entrevista de Fernanda Costa cedida 03/08/2011. Arquivo de áudio do Movimento Cine Vaz Lobo. Acervo AHCLV [010100] A 00001 00016

GONZAGA, Alice. Palácios e Poeira – 100 anos de cinema no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Record/Funart. Apud: Secretaria de Cultura; Subsecretaria de Patrimônio Cultural, intervenção urbana, Arquitetura e design; Gerência de Intervenção Urbana. O patrimônio cultural ao longo do T5: Vaz Lobo. Projeto disponível nos arquivos do Movimento Cine Vaz Lobo: Preservação, Cultura e Memória.

Ibdem.

GONZAGA, Alice. Palácios e Poeira – 100 anos de cinema no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Record/Funart.

KOBOL, Fábio. Cinema, uma questão de Estado. In: Revista de História da Biblioteca Nacional Ano 5, Nº 52, Janeiro 2010. Pág 34 a 37.

HORTA, Maria de Lourdes Parreiras; GRUNBERG, Evelina; MONTEIRO, Adriane Queiroz. Guia Básico de Educação Patrimonial. Brasília: Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Museu Imperial, 1999. p. 6.

Ibdem, p 6 e 9

GONÇALVES, José Reginaldo Santos. O patrimônio como categoria de pensamento. In: CHAGAS, Mário; ABREU, Regina (orgs.) Memória e patrimônio: ensaios contemporâneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. p 22 e 23.

GONÇALVES, José Reginaldo Santos. O patrimônio como categoria de pensamento. In: CHAGAS, Mário; ABREU, Regina (orgs.) Memória e patrimônio: ensaios contemporâneos. Rio de Janeiro: DP&A, 2003. p 27.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm obtido 20/04/2011

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O artigo aqui apresentado é uma pequena parte do Trabalho Final de Graduação, defendido na Escola de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal Fluminense, no primeiro semestre de 2010. O objetivo principal do trabalho foi a elaboração de proposta de reabilitação e conservação do Cine Vaz Lobo, e de requalificação urbana do Largo de Vaz Lobo e entorno próximo, conservando o máximo possível da configuração urbana existente, com a implantação do projeto viário Transcarioca, propiciando a salvaguarda e valorização do bem cultural e de seu entorno. O trabalho original possui um campo de abordagem muito mais amplo, porém aqui serão descritas apenas as características relativas, mais diretamente, ao edifício do Cine Vaz Lobo.

O projeto original, muito peculiar em relação a outros cinemas, previa a criação de um imóvel de uso misto com salão de projeções grandioso, com capacidade para, aproximadamente, 1800 pessoas entre térreo e mezanino, sete lojas comerciais térreas e um edifício, em volumetria separada, com quatro apartamentos residenciais, divididos em dois pavimentos sobre o térreo.

Em entrevista concedida no ano de 1996, para o jornal de bairro “Integração”, um dos herdeiros do cinema, o Sr. Mendes Jr., relatou que seu pai, o Sr. Antônio Mendes Monteiro, era um homem simples, de origem portuguesa, que trabalhou como carpinteiro e empreiteiro de obras e tinha muito gosto por teatro, o que certamente o motivou a ter a idéia de construir um cinema em Vaz lobo.

ERA UMA VAZ... O RESGATE DE UM SUBÚRBIO ESQUECIDO

Fernanda de Oliveira Nascimento Costa ¹

O terreno irregular, em forma de triângulo foi totalmente aproveitado pelo projetista, que utilizou o ponto mais estreito para a entrada na sala de projeção e o fundo da construção, mais largo, ficaria como lugar da tela. Um comprido corredor de circulação, com 23m, faria a ligação entre as partes.

ACADEMIA II

O cinema está localizado no bairro de Vaz Lobo, um bairro pequeno do subúrbio carioca, predominantemente residencial e posicionado entre os bairros de Madureira, Irajá e Vicente Carvalho. As vias principais que fazem a ligação entre estes bairros vizinhos encontram-se no Largo de Vaz Lobo, formando assim, um centro de bairro, cujo elemento de maior destaque é o prédio do antigo Cine Vaz Lobo. Assim como o subúrbio em geral, este conjunto passou por um processo de segregação e descaso, cuja conseqüência é o cenário de abandono e desvalorização que predomina nos últimos anos.

O Cine Vaz Lobo surgiu já no final da “Época de Ouro” dos cinemas do Rio de Janeiro, período em que ocorre a consolidação das salas fora do centro da cidade. Localizado na Avenida Vicente Carvalho, nº. 4, em frente ao Largo de Vaz Lobo, o projeto assinado pelo Engenheiro e Arquiteto Accácio F. M. Corrêa Jr. teve a aprovação para a construção pelo Depto. de Licenciamento e Fiscalização da Prefeitura em 1939.

*1. COSTA, Fernanda de Oliveira Nascimento: Arquiteta e Urbanista; Membro Fundador do Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá e Movimento Cine Vaz Lobo: Preservação, Cultura e memória.

Imagem Google Earth - 2010

Largo de Vaz Lobo: Centralidade do bairro homônimo, o Largo de Vaz Lobo é formado pelo entroncamento das avenidas Ministro Edgar Romero, Monsenhor Félix e Vicente Carvalho, respectivamente oriundas dos bairros vizinhos de Madureira, Irajá e Vicente Carvalho. Urbanizado em meados dos anos de 1930, sendo nele implantada a circular de distribuição de bondes para os bairros vizinhos, em seu entorno desenvolveu-se um movimentado pólo comercial. Em 1941 nele foi inaugurado Cine Vaz Lobo, sendo o seu prédio a mais destacada edificação. Após o final da década de 1970, entrou o Largo de Vaz Lobo em processo de decadência urbana.

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A concepção plástica escolhida para o edifício seguiu as características do Art Déco, mesmo que tardiamente – conforme classificação presente no Guia de Arquitetura Art Déco do Rio de Janeiro - e pouco sofisticada esteticamente. Mesmo o projeto tendo sofrido algumas alterações ao longo da construção pode-se observar atualmente que, de maneira geral, a linguagem estilística proposta não foi alterada.

Alguns itens destacáveis da arquitetura do cinema são:

As características arquitetônicas do Cine Vaz Lobo são marcantes na paisagem do bairro e, principalmente, do Largo, por ser este um ponto de convergência de vias importantes na região – Avenida Monsenhor Félix (ligação com Irajá), Avenida Ministro Edgard Romero (ligação com Madureira) e Avenida Vicente Carvalho (ligação com Vicente Carvalho). Os vários planos de fachada formam um jogo volumétrico dinâmico e interessante, não tendo no entorno próximo qualquer outro que chame maior atenção de quem passe pelo local, até mesmo pela homogeneidade das alturas das edificações existentes – entre dois e três pavimentos, assim como o cinema.

O Art Déco, termo abreviado de ART DÉCORATIF, foi um conjunto de manifestações estilísticas que nasceu na Europa, sendo lançado oficialmente em Paris no ano de 1925, na Exposition Internationalle des Arts Décoratives et Industrielles Moderne. Na mesma década acontece a expansão para as Américas do Sul e do Norte, em meio a um período de grande desenvolvimento cultural e intelectual. No caso do Brasil, o Art Déco representa o ponto de interseção entre o Ecletismo e o Modernismo, com maior representatividade entre os anos 30 e 40. Suas características principais foram: simetria, acesso central, valorização das esquinas, escalonamento, volumes geometrizados e simplificados, linguagem formal abstrata, composição com linhas e planos contrastados; articulação entre arquitetura, design e interiores (valorização de acessos e portarias), estrutura em concreto armado, revestimentos nobres e mescla de técnicas construtivas e decorativas antigas e modernas, e iluminação cenográfica (influência cinematográfica).

• Fachada principal concluída por escalonamento em degraus;• Fachada lateral marcada por elementos verticais em estuque (atualmente verdes); • Inscrição em estuque, trama de elementos geométricos em alto relevo e friso retilíneo;• Varandas dos apartamentos no 2º e 3º pavimentos da fachada frontal, sendo as laterais

dos guarda-corpos abaulados; • Vãos de portas e janelas retilíneos – madeira e vidro e basculante de ferro e vidro,

respectivamente;• Acesso principal em destaque, com 2 colunas que conferem aspecto de monumentalidade.

1978 - Autor Desconhecido – Acervo do IHGBI

Cine Vaz Lobo – Final dos anos 1970: Em estilo Art Déco Tardio, o prédio do Cine Vaz Lobo, ocupando uma área triangular com 7 metros de frente e 34 metros ao fundo, possui 63 metros de comprimento, sendo 40 metros correspondentes a sala de projeção, na qual tinha o cinema 1.200 lugares em platéia e 600 lugares em mezanino..

A construção do Cine Vaz Lobo foi de responsabilidade técnica do Arquiteto e Construtor Augusto Rodrigues de Mattos, cuja atuação profissional era mais voltada para construções na zona sul da cidade e deu origem a uma construtora, hoje sediada em Niterói e administrada por seus herdeiros com o nome de Mattos & Mattos.

A obra durou certa de dois anos, sendo a sala inaugurada em 1941 como uma das maiores da cidade na época e também como representação clara da passagem do bairro para a modernidade. Segundo o Sr. Mendes, a execução do projeto foi cercada por muitas críticas em relação à segurança da edificação, devido ao grande vão livre da platéia e às escolhas relativas à estrutura e materiais.

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Na ocasião, o proprietário dedicou a nova sala de cinema à todas as famílias da cidade, com um pequeno discurso relatado por seu filho:

Segundo os relatos gravados em conversa com o livre historiador Ronaldo Luiz Martins, inicialmente, o Cine Vaz Lobo não era um cinema que acompanhasse os lançamentos imediatos. Normalmente, o cinema naquela época era feito de poucas cópias, por estas serem muito caras. Sendo assim, as projeções chegavam a Vaz Lobo na 3ª ou 4ª semana após o lançamento em outras salas, mas não deixava de ter dois filmes por semana - um de quinta a sábado e outro de domingo a quarta. E o cinema de então não era como atualmente, onde só existe trailer e depois o filme. A sessão do cinema era composta de um jornal, de um suplemento e do filme propriamente dito, com duração de, pelo menos, 2h30min.

Nesta época, o bairro estava em processo de crescimento, apresentando uma movimentação bastante intensa. O comércio, assim como alguns colégios importantes, se estabelecia no entorno do Largo, fazendo conjunto com o cinema e conferindo ao local uma interessante característica de centralidade de bairro, cuja marca principal era a arquitetura imponente do imóvel, de volumetria expressiva naquela ambiência.

A abertura do cinema mobilizou a população local, que na época só tinha as passagens dos circos pela região como opção de lazer. O letreiro anunciava a exibição do filme norte-americano “Primeiro Amor”, com Deanna Durbin e Robert Stack, de 1939. E, além disso, a presença da Sra. Darci Vargas, esposa do então Presidente da República Getúlio Vargas, tendo como objetivo arrecadar fundos para benefício da “Cidade das Meninas”.

De fato, não há registros oficiais de que a sala de projeção do Cine Vaz Lobo tenha servido para outro tipo de atividade cultural. Mas houve, como em alguns outros cinemas, atividades distintas da artística. Como pode ser observado no local, há indícios que o amplo salão do térreo tenha tido os assentos removidos para funcionar como estacionamento de veículos.

Segundo o Sr. Mendes Filho, os herdeiros do cinema sempre tiveram interesse de alugar o prédio para uso cultural, mas não tiveram sucesso. Ele acreditava que a época do cinema havia acabado por conta da evolução e do progresso da TV, assim como devido ao grande valor necessário para custear as despesas do imóvel.

“Ao construir o Cinema Vaz Lobo, tive em mira proporcionar-vos horas de recreio e de encantamento aliados ao máximo conforto. Devo, portanto, assegurar que esta nova casa de espetáculos exibirá os melhores filmes exibidos no mundo. O filme escolhido, que tem como estrela a encantadora Deanna Durbin, é bem a prova do critério que irá presedir a escolha dos programas. Entregando-vos desde hoje o Cine Vaz lobo, que talvez não seja à altura do vosso bom gosto, em que peço desculpa, mas que representa toda a minha dedicação e boa vontade e bem em servi-los, o faço como presente de festa no ano novo de 1941.”

O cinema passou a ser então a melhor e mais próxima opção de lazer para a população local, tornando- se o principal ponto de encontro da juventude que morava e / ou estudava nas redondezas, local de namoros, diversão e travessuras.

Jornal A Noticia – 29/10/1996 – Acervo do IHGBI

Placa de inauguração do Cine Vaz Lobo: Em 5 de janeiro de 1941, como marco da inauguração do Cinema, no salão de entrada do Cine Vaz Lobo foi colocada um placa com o trechos finais do discursos de Antônio Mendes Monteiro. Esta placa ainda se encontra no lugar original da sua fixação.

Possivelmente, não houve outras transformações físico-espacias, além da liberação de espaço com a retirada de mobiliário, visto que as características externas observadas hoje em dia são muito similares as verificadas nos registros fotográficos históricos do prédio.

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A respeito da possibilidade de tombamento do Cine Vaz Lobo, o Sr. Mendes Filho afirmou que sentia orgulho e satisfação pelo reconhecimento do trabalho que o pai realizou no passado. Na ocasião também comentou que a reabertura do cinema seria boa, principalmente para os jovens que não conheceram o seu funcionamento, mas sempre conviveram com o edifício fechado.

No final de 2009, a desapropriação do imóvel foi aprovada por meio do Decreto Municipal nº. 31567 e a reconfiguração viária original previa a demolição do cinema e de muitas outras edificações, para o alargamento das ruas. No entanto, alguns estudos já foram desenvolvidos pela equipe de patrimônio da prefeitura municipal, não só para a preservação específica do imóvel, mas da ambiência urbana que o cerca e que pode gerar interferência direta, tanto positiva quanto negativamente. O último projeto teve por objetivo manter o bem, modificando o traçado da nova via, e criando no local um novo pólo de lazer e cultura para a comunidade. Este material já foi apresentado para o atual prefeito, Eduardo Paes.

Há algum tempo, a principal preocupação em relação à sobrevida do Cine Vaz Lobo, assim como à configuração urbana de seu entorno, é a implantação do Corredor Transcarioca (T5). Este corredor de ligação rodoviária expressa entre os bairros da Barra da Tijuca e Penha funcionará com o Sistema BRT (Bus Rapid Transit), com ônibus articulados similares aos existentes em Curitiba/ PR, e será uma das principais intervenções de transporte na cidade para a Copa do Mundo e as Olimpíadas.

Este processo, de luta pela salvaguarda do imóvel e reabilitação de seu uso enquanto equipamento cultural vem sendo fortalecido pelo envolvimento do assunto em estudos e discussões acadêmicas e através da criação do Movimento Cine Vaz Lobo, que tem buscado, por diferentes iniciativas, a preservação do cinema através da divulgação da sua importância histórica e social. E, como resultado oficial de todo este esforço, temos a inclusão da preservação da edificação do antigo Cine Vaz Lobo como uma das condições de validade específicas presentes na licença prévia (LP nº IN002896), concedida pelo INEA (Instituto Estadual do Ambiente) para a construção do Corredor Viário Transcarioca pela Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro.

O cinema já teve algumas propostas de preservação elaboradas. A primeira foi em forma de Projeto de Lei (n.º 2199/2004), de autoria da Vereadora Rosa Fernandes, que autorizaria o poder executivo a desapropriar o imóvel e a elaborar, mediante ato expropriatório, projeto de recuperação física do imóvel e de desenvolvimento em suas instalações de atividades socioculturais para assegurar o interesse social da Comunidade de Vaz Lobo. Apesar de ter sido considerado de boa iniciativa, este projeto foi vetado pelo Prefeito César Maia em 2005, pois além de gerar despesas públicas não planejadas no orçamento municipal, foi considerado impróprio por apresentar interferência, não autorizada pela Constituição, do Legislativo em atividade típica do Executivo.

Posteriormente, a iniciativa partiu da própria PCRJ, através da então Sedrepahc. O órgão, responsável pela proteção do patrimônio municipal, organizou um cadastro do imóvel, pelo seu valor individual, e deu entrada ao processo de tombamento (Processo 22/000235/06 Data 26/09/2006), que se encontra paralisado junto a Subsecretaria Municipal de Patrimônio Cultural.

Jornal A Noticia – 29/10/1996 – Acervo do IHGBI

Mendes Filho: Não desejando que o Cine Vaz Lobo tivesse destinação diferente a para qual foi criado, Mendes Filho por várias vezes tentou alugar o prédio, como confirma a matéria do jornal A Noticia de 29 de outubro de 1996: “... ele colocou uma faixa na frente do prédio em que propõe negócio para quem quiser abrir um novo cinema, teatro ou casa de espetáculos.”. Nesta reportagem declara Mendes Filho: “Ele revela que seu grande sonho é reabrir o espaço como um centro cultural.”

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CINE VAZ LOBO: PATRIMÔNIO DA BAIXADA DE IRAJÁ

Toda esta mobilização em favor do Cine Vaz Lobo pretende, enfim, proporcionar a região uma área pública qualificada, como forma de respeito em relação ao seu passado e de preocupação com a situação presente e com o que poderá ocorrer no futuro. Mas, no mínimo, todo este trabalho cumpre o papel de registro e garantia de que este subúrbio poderá ser sempre relembrado pelas próximas gerações.

“O Cine Vaz Lobo, inaugurado em 5 de janeiro de 1941, com a presença da então primeira-dama do Brasil, Srª. Darcy Vargas, iniciou sua atividade com uma seção beneficente com renda destinada a instituição Cidade das Meninas, à partir da qual marcou forte presença na vida social e urbana do bairro de Vaz Lobo e Baixada de Irajá. Durante seus anos de vida ativa, o Largo de Vaz Lobo se destacava como centro de comércio, educação e lazer, no qual gerações desenvolveram suas vidas, formando seus valores sociais e culturais, para os quais, marco e fortemente presente na memória local, concorreu o Cine Vaz Lobo. Seu prédio, símbolo da arquitetura dos anos 1930, é atualmente um dos últimos exemplares do estilo art déco tardio dos subúrbios e rara edificação na qual se apresenta um conjunto formado de residências, lojas e cinema com instalações aptas também a teatro. Fechado o cinema em 1982, o prédio conserva suas características iniciais da atividade a que foi destinado, guardado o especial valor de cinema de rua a ser reservado e valorizado.” *

* Folheto de divulgação do Movimento Cine Vaz Lobo: Preservação, Cultura e Memória, de 20 de novembro de 2010, para evento no Largo de Vaz Lobo ao lado do Cinema.

Atualmente, a situação física do imóvel é, aparentemente, precária, mas analisando sua trajetória e o tempo que se encontra fora de funcionamento, isto é, sem grandes intervenções de manutenção, pode-se considerar que sua construção foi de boa qualidade. Sobre a utilização das dependências do conjunto, apenas uma loja - voltada para a Av. Vicente de Carvalho - está em funcionamento, o Bar Cine Café e, dos quatro apartamentos, apenas um ainda serve como moradia, ocupado pela filha de uma das herdeiras do cinema.

Inauguração do Cine Vaz Lobo

Foto cedida por Mendes Junior para o jornal Interação de Janeiro de 1996Acervo Instituto Histórico e geográfico Baixada de Irajá

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PATRIMÔNIO EDUCACIONAL DA BAIXADA DE IRAJÁ

Instituto de educação carmela dutraMadureira

Instituída em 22 de julho de 1946

Criada pelo Decreto Lei Nº 8546 de 22 de junho de 1946, com a denominação de Escola Normal e pertencente à rede oficial do então Distrito Federal, a Carmela Dutra foi inicialmente anexo ao Instituto de Educação, tornando-se unidade autônoma em 31 de julho de 1953. Sua primeira sede foi no numero 31 da Estrada Marechal Rangel, atual Av. Ministro Edgar Romero, passando em 6 de março de 1967 para sua atual sede na Av. Ministro Edgar Romero 491.

Ensino MédioMODALIDADE NORMAL

FORMAÇÃO DE PROFESSORES

Espaço destinado a produção na formação de nível médio e técnico

Professor, oriente. Estudante, produza sua resenha ou ensaio com foco na Baixada de irajá.

Em todos os campos das ciências, pesquise, construa, divulgue.

Nos publicamos.

ENSAIO

Avenida Ministro Edgar Romero, 491 – Madureira - Rio

* Fotos: streel View – Google Earth - 2009Primeira sede da Carmela Dutra. Primeira sede da Carmela Dutra.

Atual E. M. Ministro Edgar Romero.(*)Atual E. M. Ministro Edgar Romero.(*)

66 ANOS FORMANDO E INFORMANDO EM FORMA

DE AMOR

HISTÓRICAESCOLA NORMAL CARMELA DUTRA

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PATRIMÔNIO EDUCACIONAL DA BAIXADA DE IRAJÁ

ESCOLA MUNICIPAL SÃO PAULOBrás de Pina

Inaugurada em 07 de março de 1934

Prédio escolar do período 1931 / 1936 e pertencente ao conjunto de 28 prédios escolares denominados “Escolas de Escolas de AnAníísio Teixeirasio Teixeira”, concepção arquitetônica de Enéas Trigueiro Silva.

Tipo Platoon 16 salas da Serie “Nome de Estados”, e uma das primeiras construções com estrutura própria ao abrigo de escola de educação primária da Cidade do Rio de Janeiro, na época Distrito Federal.

4ª CRE – 112824 salas – 1.150 alunos

Educação Infantil – 1ª a 9ª série fundamental – Classe especial – 2 turnos

Estrada Tailândia, 169 – Brás de Pina – Rio de Janeiro – RJ CEP 21620-000Tel.: (21) 2485-5145 - [email protected]

Espaço destinado a produção na formação fundamental

Professor, incentive. Estudante, produza sua redação com foco na Baixada de irajá.

Estude, pesquise, construa, divulgue.Nos publicamos.

Primeiro passo

* Fotos e pesquisa: “Guia das Escolas de Anísio Teixeira – Centro de Referência da Educação Pública da Cidade do Rio de Janeiro – SME – Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro – 2006 -

Com 78 anos de atividade, e mesmo tendo a sua capacidade ampliada em mais oito salas, o prédio da Escola Municipal São Paulo conserva a quase totalidade das características originais, sendo uma das Escolas de Anísio Teixeira que mais preservam sua concepção arquitetônica. A E. M. São Paulo é destacado patrimônio histórico da Baixada de Irajá.

Em fase final de construção em janeiro de 1934 *

Fevereiro de 2010 – Vista da Rua / Google earth

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PATRIMÔNIO CULTURAL DA BAIXADA DE IRAJÁ

BIBLIOTECA POPULAR MUNICIPAL BIBLIOTECA POPULAR MUNICIPAL JOÃO DO RIOJOÃO DO RIO

IrajáCriada em 16 de julho de 1959

Em 18 de dezembro de 1992 foi transferida para a sua atual sede, sendo a primeira biblioteca da rede municipal a funcionar em prédio construído para essa finalidade, com área de 750 m², constando de dois andares de salão de leitura, espaço de exposições, auditório, instalações de guarda do acervo atualmente em cerca de 11.000 obras e central de distribuição do serviço de Bibliotecas Volantes.

Aberta para consulta, pesquisa e acesso a Internet de segunda a sexta das 9 h as 17 horas.

Avenida Monsenhor Felix, 512 - Irajá – Rio de Janeiro - RJtel: (21) 3351-4386

Fotos Secretaria Municipal de Cultura Prefeitura da Cidade do Rio de janeiro

lembrando

Espaço destinado a livre produção da memória popular

Você lembra da infância, juventude, pessoas, fatos ou evento ligado a qualquer um dos 38 bairros da Baixada de Irajá?

Conte, escreva, divulgue.Nos publicamos.

Com a denominação de Biblioteca Popular de Irajá e contando com acervo de 1.400 obras, a Biblioteca Popular João do Rio teve sua primeira sede instalada em pequena loja na Avenida Monsenhor Felix 420.

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RAMOS EM 1959 – PASSAGEM DE NIVEL SOBRE AS LINHAS DA E.F. LEOPOLDINA NA ESTAÇÃO DE RAMOS ENTRE AS RUAS URANOS E LEOPOLDINA REGO

HISTÓRIA EM IMAGEM

Fotos de autor desconhecido - 1959 - acervo do Conselho Nacional de Geografia (CNG 4592 e CNG 4593)

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A primeira foto tem por foco o lado esquerdo da estação e a Rua Uranos, tendo em primeiro plano a ponta da plataforma da estação e a frente desta o fosso de segurança para evitar a entrada de animais e passageiros burlando o pagamento de passagem, que era conhecido como “mata burro”. Apesar de serem largos e relativamente profundos, não de todo os mata-burros evitavam os não pagantes, pois sempre havia os capazes de se equilibrarem sobre os trilhos vencendo o obstáculo, em alguns casos facilitados, como na foto, pela localização da plataforma logo após o fosso.

Após o fosso, a passagem de nível com piso de paralelepípedos, sem meio fio. Logo à frente desta, a calçada para pedestres, entretanto muitos trafegam às margens da pista. Na entrada da passagem de nível à esquerda, o alto poste preto dos sinalizadores luminosos e sinal sonoro de aviso da passagem de trem. A frente desse a cancela, aberta, com sua longa haste de madeira, tendo do lado oposto o suporte de seu apoio quando fechada.

A esquina da passagem, antes do fosso, o fundo de um dos antigos “varejos”, boxes comerciais, da E. F. Leopoldina, já demolido, tendo a seu lado, por trás dos cartazes, um carrinho de “camelô” que ali era tradicional. Na esquina oposta, após o poste dos sinalizadores, um bar em loja de prédio de dois pisos. Este prédio e todos os demais que lhe seguem entre a Rua Uranos e o leito da ferrovia foram demolidos para a construção da pista de acesso aos viadutos São Cosme e São Damião.

Para o fundo, a direita segue o leito de quatro trilhos da E. F. Leopoldina, tendo mais ao extremo um trecho da Rua Leopoldina Rego. À esquerda a Rua Uranos. Nesta, bem mais ao fundo, esta um bonde, possivelmente 94 – Penha, onde era seu ponto, antes da esquina da Rua Euclides Faria. Antes do bonde dois ônibus tendo ao meio destes um lotação. Estacionado junto à calçada um carro de entrega tradicional da época. Os prédios à esquerda na Rua Uranos são ainda existentes, sendo destaque na esquina da Rua Euclides Faria o Edifício Iza de especial valor arquitetônico em art déco.

Na segunda foto, tendo por foco o lado direito da estação, o principal destaque é a passagem de uma composição de cargueira em direção à estação de Olaria e ao interior, sendo possível ser visualizada, no extremo ao fundo, a fumaça de sua locomotiva à vapor. Estando no momento a passagem de nível fechada, pessoas aguardando sobre as linhas, tendo por traz da composição o telhado da cabine do guarda sinaleiro e o poste de sinalização aceso. O trem esconde a haste da cancela arriada e a do lado oposto esta fora do foco da câmara.

Registro fotográfico do bairro de Ramos em 1959. As duas fotos do acervo do Conselho Nacional de Geografia foram realizadas com o fotografo sobre a antiga ponte de acesso à estação da então Estrada de Ferro Leopoldina, tendo foco, no sentido, para a estação de Olaria, a passagem de nível de carros e pedestres que existiu entre as ruas Uranos - a esquerda, e Leopoldina Rego – a direita, sendo na primeira localizada na curva pouco antes da Rua Euclides Faria, e na segunda pouco antes da Rua Pereira Landim. A passagem de nível não mais existe e atualmente o leito ferroviário é cercado, em ambos os lados, por gradis de ferro. A travessia de veículos é feita pelos viadutos gêmeos São Cosme e São Damião e de pedestres por passagem subterrânea ao meio da estação. .

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Quanto a composição cargueira, o vagão em primeiro plano e dois à sua frente são tanques de transporte de Álcool de uma destilaria patrocinada pelo Instituto do Açúcar e do Álcool. À frente destes um vagão de carga fechado, seguindo igual conjunto de vagões tanques e cargueiros. Esta característica de formação do comboio possivelmente teria por objetivo ter cada conjunto destino diferentes, sendo o último, no caso o de primeiro plano na foto, para o destino mais próximo, sendo ali desengatado, e o seguinte á locomotiva para o destino final.

Sendo o atual Ramal de Saracuruna da Supervia, eletrificado e com bitola de 1,60 m, em 1959 a Estrada de Ferro Leopoldina era de bitola métrica e tração à vapor. A linha em que está a composição era de expresso e cargueiros no sentido Estação Barão de Mauá para o interior, sendo a anterior de igual trafego no sentido interior para Barão de Mauá. As duas à esquerda dos trens suburbanos, respectivamente Duque de Caxias – Barão de Mauá e inverso.

O LOCAL NA ATUALIDADE

A direita da foto, a Rua Leopoldina Rego sendo nela destaque, após prédio na esquina da Rua Pereira Landim, o prédio em art déco do Cine Rosário, desativado em 1992. Ainda conservando seu estilo original, o Cine Rosário é alvo de movimento popular pela sua preservação e transformação em Centro Cultural, sendo este de pleno apoio pelo Instituto Histórico e Geográfico Baixada de Irajá. O prédio antes do cinema foi demolido estando em seu lugar um prédio de quatro pisos residenciais e lojas. Os prédios em primeiro plano ainda existente com algumas descaracterizações. À frente destes prédio um ônibus do qual não é possível identificar o numero de registro e a sua possível linha.

Foto Street View – Google Earth - 2012

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Bonde do CarnavalRonaldo Luiz-Martins *

Época de sambas e marchas, o carnaval na Cidade do Rio de janeiro, além das grandes escolas de sambas, é hoje de muitos blocos que, mesmo antes dos dias oficiais, ganham as ruas arrastando multidões, no resgate de uma tradição por algum tempo quase esquecida. Mas, se diferenciam dos antigos blocos de rua por serem previamente planejados e organizados com caminhões de som, bandas e com seus mais contumazes participantes formado alas. Quem os seguem já sabem a hora e local onde eles estarão em desfile. Até banheiros públicos são previamente instalados. Tudo certinho, perfeito. Não são mais chamados de blocos, e com a denominação de bandas daqui e dali, aparentemente herdam eles as formas da famosa Banda de Ipanema de quem foi musa Leila Diniz, de 1964 e fruto da intelectualidade de Albino Pinheiro, Ferdy Carneiro, Ziraldo e Jaguar e não carioca de inspiração, a seguir o modelo da “Banda da Mula Manca Em Boca Dura” da mineira Ubá. Mas, notabilizada pela suas ironias e deboches aos Anos de Chumbo a Banda de Ipanema é apenas mais uma das muitas manifestações a fazer a alegria e descontração do carnaval do Rio

Antes da manifestação de carnaval de rua organizado em Ipanema, excetuando-se legendário Bola Preta, blocos antes sem nenhuma outra forma se não uma bateria e dirigentes improvisados, organizando um quadro social base, fantasias e sambas próprios, formaram os chamados “Blocos de Embalo”, definindo normas de desfile e competição. Destes, o pioneiro Bafo da Onça, que em 1958 na onda... acabou de chegar, marca a transição da Avenida Rio Branco do carnaval espontâneos ao grandes blocos.

Presente neste processo organizacional dos blocos de carnaval, a Baixada de Irajá veio a concorrer com a formação de dois dos mais expressivos deles: Cacique de Ramos e Boêmios de Irajá´. Formados entre 1961 e 1967, ambos, como outros tantos existentes, ganham força após a extinção dos bondes no Rio de Janeiro, tendo as suas raízes neles formada.

ESPAÇO FINAL

*. LUIZ-MARTINS, Ronaldo: Já citado nesta edição em “Rio D’Ouro: Caminho de Ferro e Caminhos das Águas”.

Do pós-guerra, 1945 até o final dos anos 1950, quando o carnaval carioca passa a ter notoriedade internacional, foram os bondes os grandes alimentadores do carnaval de rua no centro e nos bairros. Nos bares e esquinas pequenos grupos, muito deles de componentes de times de futebol amador, montavam baterias com bumbos de barrica e tamboris de “couro de gato”. Depois de algumas bebida para animar, saiam então pelas principais vias dos bairros. A eles gradativamente se juntava foliões, com os quais por não usarem roupas ou fantasias esmeradas, formavam os chamados “bloco de sujo”. Após algumas voltas pelo bairro o bloco embarcava em um bondes em destino a um bairro maior ou ao centro da cidade.

Na Baixada de Irajá, em especial de um grupo de índios de Olaria-Ramos e do time amador “Papa com Lombo” de Irajá, pelos bondes das linhas passantes para Madureira ou Penha, iam embarcar nos de linha 78 (Cascadura) e 94 (Penha) e, com pelo menos uma passagem por esses bairros, tomavam rumo do centro. Nessas linhas, com unidades de maior capacidades, os bondes chegavam a reunir dois ou três blocos em uma só viagem. Ambas as linhas com ponto final no Largo de São Francisco, ali chegando os blocos, agora formando um só ou mesclando seus componentes, descendo a Rua Sete de Setembro iam então fazer desfile ao longo da Rio Branco. Subindo e descendo a Avenida varias vezes, eram então voltar ao Largo e, com a mesma animação, retornar de bonde as origens. Para os seus foliões eram então hora de um banho e uma refeição, e depois, para a noite, ir a formar um “bloco de limpo” e brincar junto ao coreto do carnaval de seu bairro.

Acabaram os bondes e com eles quase desapareceram os blocos de rua que agora ressurgem na figura dos blocos e bandas daqui e dali. Como a eles chegam os seus foliões? Sem o mesmo pitoresco que deles era modo, estarão os trens do Metrô a substituir os bondes?

Autor desconhecido - Divulgações na Internet

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