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v.9 n.3 setembro/dezembro 2006 Salvador-BA

ISSN 1808-124x

Gest. Ao

Salvador

v. 9

n. 2

p.265- 426

set/dez. 2006.

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Qualquer parte desta publicao pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. Disponvel em: Editor: Dr. Jos Albertino Carvalho Lordelo. Redao: Universidade Federal da Bahia Centro de Estudos Interdisciplinares para o Setor Pblico Av. Adhemar de Barros, Campus Universitrio de Ondina. Pavilho IV- Salvador/BA Brasil CEP: 40170-110 Tel./Fax. (71) 3263-6479 e 3263-6494 homepage: http://www.gestaoemacao.ufba.br E-mail: [email protected]

Universidade Federal da Bahia Faculdade de Educao-FACED. Programa de Ps-Graduao em Educao Linha de Pesquisa Polticas e Gesto em Educao Av. Reitor Miguel Calmon, s/n - Vale do Canela Salvador/BA Brasil - CEP:40110-100 Tel./Fax. (71) 3263-7262

Conselho Editorial Nacional: Antonio Carlos Xavier (IPEA); Celma Borges Gomes (UFBA); Denise Gurgel (UNEB); Jorge Lopes (UFPE); Katia Siqueira de Freitas (UFBA); Lauro Carlos Wittman (FURB); Magna Frana (UFRN); Maria Eulina Pessoa de Carvalho (UFPB); Nelson Wanderley Ribeiro Meira (FABAC); Regina Vinhaes Gracindo (UnB); Vicente Madeira (UCP/RJ). Conselho Editorial Internacional: Abril de Mndez (ICASE - Universidade do Panam); Brigitte Detry Cardoso (U.Nova de Lisboa - Portugal); Ernestina Torres de Castillo (ICASE Universidade do Panam); Fbio Chacn (Empire State College-USA); Felicitas Acosta (IIPE/Argentina); Luiz Enrique Lopez (PROEIBCochabamba/Bolivia); Maria Clara Jaramillo (PROEIBAndes em Cochabamba -Bolvia); Rolando Lpez Herbas (Facultad de Humanidades Y Ciencias de La Educacion.Universidad Mayor de San Simon.Cochabamba-Bolivia). Comit Cientfico Nacional: Ana Maria Fontenelle Catrib (UNIFOR); Antnio Cabral Neto (UFRN); Avelar Luiz Bastos Mutin (GAMB); Dora Leal Rosa (UFBA); Edivaldo Boaventura (UFBA); Heloisa Lck (PUC/PR); Jernimo Jorge Cavalcante Silva (UNEB); Jos Vieira de Sousa (AEUDF); Katia Siqueira de Freitas (UFBA); Lourdes Marcelino Machado (UNESP/Marlia); Miguel Angel Garcia Bordas (UFBA); Nicolino Trompieri Filho (UFC); Nigel Brooke (GAME/UFMG); Robert Evan Verhine (UFBA); Rogrio de Andrade Crdova (FE/UnB); Romualdo Portela de Oliveira (USP); Theresinha Guimares Miranda (UFBA); Walter Esteves Garca (Instituto Paulo Freire). Comit Cientfico Internacional: Carlos Alberto Vilar Estvo (UMINHO- Portugal); Charlie Palomo (UNTREF- Argentina); Horst Von Dorpowski (The Pennsylvania State University EUA); Javier Murillo (UAM- Espanha) Jos Gregrio Rodriguez. (Universidad Nacional de Colmbia Colmbia); Marcel Lavalle (UQAM); Mirna Lascano (Northeastern University of Boston - EUA); Robert Girling (Sonoma State University EUA); Wayne Baughman (American Institutes for Research-EUA). Projeto Grfico: Helane Monteiro de Castro Lima. Normalizao: Jos Raimundo Paim de Almeida. Reviso: Katia Siqueira de Freitas, Charlie Palomo (Espanhol) e Robert Girling (Ingls). Diagramao e formatao: Helane Monteiro de Castro Lima. Capa: Maria Lcia Ganem Assmar e Helane Monteiro de Castro Lima. Produo Editorial: Helane Monteiro de Castro Lima. Impresso: Gesto em Ao/ Programa de Ps-Graduao da Faculdade de Educao da UFBA; ISP/UFBA. - v.1, n.1 (1998) - Salvador, 1998 Quadrimestral ISSN 1808-124x 1. Educao - Peridicos. I. Universidade Federal da Bahia. Faculdade de Educao. Programa de PsGraduao em Educao. 2. Universidade Federal da Bahia. Centro de Estudos Interdisciplinares para o Setor Pblico. CDU 37(05) CDD 370.5ACEITAMOS PERMUTAS

Indexada em: Bibliografia Brasileira de Educao-BBE, INEP. Biblioteca Nacional Organizacin de Estados Iberoamericanos para la Educacin, la Ciencia y la Cultura (CREDI/OEI)-Espaa. Citas Latinoamericanas en Ciencias Sociales e Humanidades da Universidad Nacional Autnoma de Mxico (CLASE/UNAM). Universitat de les Illes Balears (UIB) - Spain Inscrita em: Biblioteca Ana Maria Popovick (BAMP/FCC) Sumrios de Peridicos do Acervo FEUSP Afiliada Associao Brasileira de Editores Cientficos (ABEC) Avaliada pela Qualis/Capes - Nacional B em 2003 e em 2005. Disponvel no Portal Capes/MEC Gesto em Ao um peridico editado sob a parceria e responsabilidade da Linha de Pesquisa Polticas e Gesto em Educao do Programa de Ps-Graduao em Educao da FACED/UFBA e do Centro de Estudos Interdisciplinares para o Setor Pblico (ISP/UFBA). Aceita parcerias e colaboraes, reservando-se o direito de publicar ou no os textos enviados redao. Os trabalhos assinados so de inteira responsabilidade de seus autores. Periodicidade: Quadrimestral Tiragem: 1.500 exemplares Circulao: Janeiro/2007.

Os artigos enviados Gesto em Ao so encaminhados aos seus pares para avaliao, preservando-se a identidade dos autores.

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Sumrio/Summary

EditorialEditorial Jos Albertino Carvalho Lordelo

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Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RNInstitutional self evaluation guided to social responsability: the case of CEFET-RN Dante Henrique Moura

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Eleio de diretores escolares: avanos e retrocessos no exerccio da gesto democrtica da educaoThe election of school principals: advances and backward movements in the exercise of the democratic management Cludia Dias Silva

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La frontera: futuros imprevisibles, paradigmas en construccinThe border: unforseeable futures, paradigms in construction Srgio Gmez Montero

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A educao como mundo-vida: de professora diretora escolarThe education as world-life: of professor to school principal Amarildo Jorge da Silva Ana Oliveira Castro dos Santos Ricardo Roberto Behr

319

Transformao social e modo de produo: do sistema pr-industrial ao sistema capitalista de produoSocial transformation and way of production: from of the system pre-industrialist to the capitalist system of production Alexandre Shigunov Neto Lizete Shizue Bomura Maciel

339

O papel dos Conselhos Escolares no Sistema Municipal de Ensino do RecifeThe paper of the pertaining to School Advice in the Municipal System of Education of Recife Edson Francisco de Andrade

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267

Cultura nacional, cultura das organizaes escolares e a gesto democrtica: algumas reflexesNational culture, culture of the school organization and the democratic management: some reflections. Joyce Mary Adam de Paula e Silva

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O professor e sua formao: representaes de coordenadores pedaggicosTeacher and his education: pedagogical coordinators representations Renata C. O. Barrichelo Cunha Guilherme do Val Toledo Prado

381

A dupla relao: leitura e o imaginrio como valores culturaisThe double relation between reading and imaginary as cultural aspects Gicele Faissal de Carvalho

393

Gesto da Educao presencial e a distnciaClassroom and distance-learning administration Katia Siqueira de Freitas

407

Instrues editoriais para autoresPublishing instructions for Authors

419

Poltica Editorial Gesto em Ao (GA)Publishing policies

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Publicaes PermutadasExchange Publications

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Editorial

Nesta edio de Gesto em Ao os pesquisadores retomam os temas da agenda poltica da educao: avaliao institucional, gesto educacional, cultura e valores na organizao escolar e as relaes entre educao e sociedade, postos em relevo e analisados cientificamente. Dante Moura analisa as relaes entre a reforma da educao profissional e a identidade institucional, o contexto externo e o planejamento escolar e vai alm ao formular proposies para construir a nova identidade de uma instituio tomada como caso na sua pesquisa. Claudia Silva faz um balano da eleio de diretores escolares e conclui que, sozinha, a prtica da eleio do diretor no capaz de garantir o exerccio da democracia na escola e nos convida a propor caminhos para superar os atuais modelos de gesto. J Amarildo Silva, Ana Oliveira dos Santos e Ricardo Behr mergulham na fenomenologia hermenutica para compreender as relaes entre a formao social e histrica de uma professora e seu estilo de direo. Os autores mostram como essas dimenses esto imbricadas. Edson Francisco de Andrade analisa o papel dos Conselhos Escolares, centra sua discusso na questo da autonomia e sua relao com as instncias su-

periores, tomando com campo de anlise, o Sistema Municipal de Ensino de Recife. Recorrendo as metforas para analisar as organizaes, Joyce de Paula e Silva apresenta um estudo da organizao escolar como fenmeno cultural e aponta os fatores que dificultam o estabelecimento de uma cultura de participao na gesto escolar. Gicele Carvalho nos mostra a relao entre a leitura e o imaginrio como valores culturais, produto de suas observaes realizadas em salas de aulas e na biblioteca de uma escola particular. Katia Freitas aborda a gesto da educao presencial e a distncia. Ela mostra como a qualidade da educao est associada com a formao e o desempenho do gestor contudo, defende que a capacitao no fique restrita unicamente ao dirigente mas a toda equipe gestora. A pesquisadora finaliza seu artigo levantando novas questes e provocaes que representam um convite a novos estudos, anlises e pesquisas sobre esse tema recorrente da Gesto em Ao. Renata Cunha e Guilherme Prado discutem as representaes que o coordenador tem da ao do professor e de sua formao. A partir da escuta de cinqenta coordenadores os autores concluem que a comunica-

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Editorial

o indispensvel para a formao, ressignificao de prticas e interaes produtivas e que conhec-las anuncia a possibilidade de transformaes nas relaes e na escola. Alexandre Neto e Lizete Maciel nos ajudam a compreender as transformaes sociais ocorridas durante o processo de implantao do modo de produo capitalista a partir do sculo XV e como elas afetaram a vida humana, tornando-nos prisioneiros do capital e privando-nos de liberdade.

Do Mxico, Srgio Montero nos apresenta uma temtica sempre atual: a tensa situao na fronteira do Mxico com os Estado Unidos, mas projetando um olhar sob uma perspectiva diferente. Nesta edio, Gesto em Ao confirma sua tradio de peridico diverso e aberto, acolhendo contribuies e anlises de pesquisadores, docentes, gestores e psgraduandos que, direta ou indiretamente tocam no seu objeto central, a gesto educacional.

Boa leitura. Dr. Jos AlbertinoCarvalho Lordlo Editor

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Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

Dante Henrique Moura1

Resumo: Nas instituies educacionais brasileiras e, particularmente nas de educao profissional - EP, ainda no se consolidou a cultura da avaliao institucional. Alm disso, as experincias em curso tendem a privilegiar a busca por resultados em detrimento da anlise dos processos internos e da funo que essas instituies desempenham na sociedade. Assim, o artigo tem o objetivo de relatar uma pesquisa realizada no CEFET-RN voltada para a sua autoavaliao. Dentre as concluses, destaca-se a constatao de que o CEFET-RN aps a reforma da EP vem perdendo sua identidade como excelente agncia formadora de tcnicos de nvel mdio e ainda no conseguiu criar a nova imagem pretendida: a de um centro universitrio tecnolgico que alm da formar tcnicos de nvel mdio atua nos cursos superiores de tecnologia e desenvolve pesquisa aplicada e atividades de extenso. Palavras-chave: Educao profissional; Autoavaliao; Responsabilidade social.

mais profunda dos processos e da funo que essas instituies desempenham na sociedade. Apesar de essa ser uma viso generalizada, neste trabalho nos circunscrevemos apenas esfera pblica, mais especificamente, s escolas tcnicas e agro-tcnicas federais e aos centros federais de educao tecnolgica, domnio em que atuamos. Esse quadro vem se alterando ao longo dos ltimos anos, principalmente, na educao superior pblica, onde o Programa de Avaliao Institucional das Universidades Brasileiras (PAIUB), nascido nos anos 1993/1994, se encarregou de promover uma discusso mais profunda sobre avaliao institucional. Entretanto, no

INTRODUO Nas instituies educacionais brasileiras e, particularmente nas de Educao Profissional (EP), ainda no se implantou definitivamente a cultura da avaliao institucional. E, ainda mais, as experincias tendem a privilegiar a busca obsessiva por resultados em detrimento da anlise

abrangeu a maioria das instituies federais de EP, pois no pertencia a educao superior, fato que s ocorreu definitivamente a partir do Decreto n0 5.225/2004. Atualmente, no mbito da educao superior, o Sistema Nacional de Avaliao da Educao Superior (SINAES), aprovado pela Lei n0 10.861/2004, est sendo implantado e tambm abrange todos os CEFET's.

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Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

Com relao ao SINAES ressaltamos que apresenta algumas mudanas importantes em relao ao PAIUB. Algumas delas apontam na direo da prevalncia de dados estatsticos em relao aos aspectos mais qualitativos da avaliao, o que, em princpio pode sinalizar a inteno poltica de construir rankings das IFES via avaliao institucional. No que tange s ofertas dos cursos tcnicos de nvel mdio, a ento Secretaria de Educao Mdia e Tecnolgica (SEMTEC) tentou implantar o Sistema de Avaliao Institucional (SAI) a partir de 1996/1997 no mbito das escolas tcnicas, agro-tcnicas e CEFET's, entretanto, no obteve xito, abandonando a idia por vrias razes - algumas explicadas ao longo deste texto. Assim sendo, nosso objetivo central relatar uma pesquisa voltada para a autoavaliao do CEFET-RN 2 onde destacaremos a metodologia adotada e as concluses alcanadas, assim como as aes que se esto desencadeando como fruto desse processo. Com isso, objetivamos estimular a discusso, nas instituies de EP e demais centros educacionais, sobre esse tema na busca da consolidao de uma cultura da avaliao voltada para a melhoria dos processos educacionais e, conseqentemente, para a ampliao da responsabilidade social dessas instituies, que tm a funo social estreita2

mente vinculada ao mundo do trabalho, mas que no podem submeter suas aes a esse, tendo em vista que em vez de formarem "trabalhadores qualificados" devem buscar a formao integral de cidados crticos, reflexivos, competentes tcnica e politicamente, e comprometidos eticamente com as transformaes sociais voltadas para a construo de uma sociedade mais justa e igualitria. Para alcanar os objetivos previstos, dividimos o texto em quatro sees. Nesta primeira, esclarecemos seus objetivos e apresentamos as partes que o constituem. Em seguida, discutimos a concepo e o significado da avaliao institucional nas instituies educativas e, particularmente, nas de EP. Depois, apresentamos o modelo de auto-avaliao contextualizada e contrastada praticada no CEFET-RN2 e a metodologia adotada. Na quarta seo, discorremos sobre as principais concluses alcanadas, alm de discutirmos os prximos passos a serem seguidos. CONCEPO E SIGNIFICADO DA AVALIAO DE UMA INSTITUIO DE EP Avaliao interna, externa, auto-avaliao e heteroavaliao O termo avaliao externa est associado a processos que ocorrem a partir de um patrocinador externo, geralmente alguma

MOURA, D. H. La Autoevaluacin como instrumento de mejora de calidad: un estudio de caso (El Centro Federal de Educao Tecnolgica do Rio Grande do Norte/CEFET-RN / Brasil). 2003. 516 f. Tese (Doutorado em educao) Faculdade Educao da Universidade Complutense de Madrid. Madri. 272 Gest. Ao, Salvador, v.9, n.3, p. 271-288, set./dez. 2006

Dante Henrique Moura

instncia governamental com o objetivo de alterar a imagem, construir rankings ou tomar decises, entre outras possibilidades, sobre: programas sociais; uma instituio especfica; ou um conjunto delas (SOBRINHO, 1995; SIMONS, 1999; entre outros). No mbito das instituies pblicas de EP, um caso tpico e j mencionado foi o Sistema de Avaliao Institucional (SAI), o qual foi desativado, entre outros aspectos, porque foi concebido de forma que os agentes internos de cada instituio objeto de avaliao tinham o exclusivo papel de prestar informaes SEMTEC/MEC, a qual era responsvel pelo processamento, anlise e decises sobre a rede e cada instituio avaliada. Diante dessa realidade o sistema foi amplamente rejeitado por no fazer sentido para as instituies j que no lugar de estar orientado melhoria delas, tinha implcito um carter de punio/premiao, pois visava construo de rankings e, em conseqncia, a definio da matriz oramentria da rede. Afortunadamente, o SAI no teve vida longa, o saldo foi muito negativo. Em primeiro lugar, porque os gastos pblicos realizados com equipamentos em geral, computadores e perifricos de informtica em particular, alm de horas de consultoria, passagens areas e dirias foram muito elevados. Some-se a isso, a prpria energia perdida pelas instituies na tentativa de implant-lo ou ao na bus-

ca de estratgias para no atender ao que ele preceituava. Em segundo lugar, porque ao invs de contribuir para a criao de uma cultura avaliativa na rede, acabou produzindo o efeito contrrio, afastando, ainda mais, as instituies da avaliao institucional. Por outro lado, os processos de avaliao interna, normalmente, so de iniciativa da prpria organizao e perseguem outras finalidades, como a deteco de pontos fortes e debilidades dos processos e dos programas institucionais com o fim de aperfeio-los. Nesse caso, uma das possibilidades a heteroavaliao interna que patrocinada por um setor em direo a outros ou a toda organizao, situao em que, geralmente, a iniciativa parte dos nveis mais elevados da hierarquia em direo aos de menor status hierrquico. Outra possibilidade de avaliao interna que surge como alternativa democrtica e participativa a auto-avaliao - uma resposta crtica s duas posturas anteriormente apresentadas. Consiste em desenvolver um processo participativo, no qual, a partir de iniciativa da prpria instituio e de seus distintos atores, desenvolve-se a avaliao de alguns setores. Evidentemente, nesses processos, os prprios patrocinadores se confundem com a audincia/informantes, ou seja, cada unidade administrativa ou acadmica se auto-avalia. Quando isso se estende ao contexto institucional, produz-se273

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a auto-avaliao institucional (SANTOS GUERRA, 1995; RISTOFF, 1995; SIMONS, 1999). Infelizmente, esse tipo de avaliao padece de uma grande dificuldade. Trata-se da possibilidade e, mais que isso, a probabilidade do desenvolvimento de processos endgenos, nos quais se perde a finalidade original (melhoria dos processos e programas institucionais), convertendo-se numa forma de transferir todas as responsabilidades e culpabilidades relativas s deficincias da instituio aos agentes externos, geralmente s instncias de governo, no caso das organizaes pblicas (um verdadeiro muro de lamentaes). Desse contexto, e como resposta ao anteriormente mencionado, emerge a auto-avaliao contextualizada realidade de cada instituio e contrastada por agentes externos como linha de pesquisa adotada neste trabalho (SANTOS GUERRA, 1995; RISTOFF, 1995; SOBRINHO, 1995; DOMNGUEZ, 1999; SIMONS, 1999). A contextualizao cumpre a funo de particularizar o caso, pois cada coletivo, cada grupo especfico que conhece com mais profundidade sua prpria realidade. O contraste com os agentes externos tem mltiplas finalidades. Ressaltamos a de evitar os processos endgenos aos quais nos referimos previamente; a de estabelecer um

dilogo social com os segmentos sociais implicados na problemtica educativa; e a de garantir a qualidade tcnica do processo. A PESQUISA AUTO-EVALUATIVA CONTEXTUALIZADA E CONTRASTADA DO CEFET-RN O contexto da EP e do CEFET-RN Esse contexto muito desafiador, pois o ritmo dos avanos tecnolgicos e transformaes sociais no param como fruto da busca desenfreada por produtos tecnolgicos que "precisam alimentar o mercado para fortalecer a economia", segundo a apologia hegemnica ao modelo neoliberal de sociedade e globalizao dos mercados, vigentes em nossos dias3. Isso implica, para o CEFET-RN e outras instituies de EP, o risco de que os conhecimentos decorrentes dos processos formativos proporcionados pela Instituio possam tornar-se obsoletos em pouco tempo, dependendo de como se concebam e estruturem as distintas ofertas. Dessa forma, o CEFET-RN precisa organizar seu currculo, principalmente nos cursos tcnicos4 , a partir de uma slida base de conhecimentos cientficos e tecnolgicos prprios da etapa final da educao bsica e da respectiva formao

3 Em funo de no ser o objetivo fundamental do trabalho, no aprofundaremos a anlise sobre o neoliberalismo. Para isso, sugerimos ver ANDERSON (1996); FRIGOTTO (1999); e BURBULES e TORRES (2004). 4 Durante a coleta de dados e at a concluso da pesquisa em dezembro de 2003, essa era uma situao de difcil soluo, j que o Decreto n 2.208/97 impedia a integrao entre os currculos do ensino mdio/tcnico Entretanto, em 2004, a Instituio estudava outras formas de minimizar a separao mdio/tcnico medida que acompanhava o trmite do que seria o Decreto ne 5.154/2004. Assim, logo que entrou em vigor esse instrumento legal o CEFET-RN redirecionou suas atividades para a (re)construo do currculo integrado, que j vigora em 2005.

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profissional, a fim de garantir uma formao que proporcione aos estudantes as condies para uma efetiva participao social, poltica, cultural e no mundo do trabalho e que, uma vez nele, possam enfrentar as mudanas decorrentes de novos avanos tecnolgicos. Outro aspecto fundamental a obrigao institucional de interatuar com o entorno e, em conseqncia, conhec-lo profundamente a fim de que mais do que satisfazer s suas demandas, possa contribuir para transformaes, nesse mesmo entorno, orientadas aos interesses coletivos inerentes a cada realidade concreta, sem perder de vista suas inter-relaes com o local, o regional e o mundial. Ainda cabe destacar que o CEFET-RN atravessa nos ltimos anos um amplo processo de reconverso em seu campo de atuao. At 1997, a Instituio s oferecia, praticamente, cursos tcnicos de nvel mdio. Enquanto isso, na poca da coleta de dados (MOURA, 2003) j oferecia, alm dos cursos tcnicos, o ensino mdio, os nveis bsico e tecnolgico da EP5, alm de estar projetando dois cursos de licenciatura, os quais j foram implantados. A conceitualizao do processo de autoavaliao contextualizada e contrastada Em Moura (2003), assumimos e agora rati-

ficamos o conceito de avaliao de instituies educativas como sendo um processo de investigao auto-avaliativa contextualizada e contrastada, composta por quatro fases inter-relacionadas (inicial, processual, final e demorada). Assim, deve produzir dilogo entre os distintos participantes internos e entre a Instituio e a sociedade. Tambm deve promover a compreenso da realidade educativa em geral e a de um centro em particular. E, finalmente, deve estar orientado melhoria da qualidade educacional desses centros. Como o CEFET-RN atua, principalmente, na EP, o que pressupe uma estreita relao com o mundo trabalho, enfatizaremos dois dos aspectos acima mencionados. A compreenso do termo dilogo social (CABELLO, 1998) e o significado da expresso melhoria da qualidade educativa de um centro educativo. O dilogo social est orientado a envolver os agentes internos, trabalhadores, empresrios, associaes comunitrias e de classe, polticos, ONG etc. e, tambm, campos cientficos afins educao como a Filosofia, a Psicologia, a Sociologia, a Economia e outros envolvidos com a problemtica educativa. Evidentemente, essa pode ser considerada uma viso utpica, mas diante de um problema complexo como o da EP, no podemos procurar respostas que reduzam suas reais dimenses.

5 O Decreto n 5.154/2004, entre outros aspectos, alterou a denominao dos cursos da EP, os quais passaram a denominar-se: EP tcnica de nvel mdio; EP tecnolgica de graduao e de ps-graduao; e formao inicial e continuada de trabalhadores. Apesar disso, como poca da coleta de dados a denominao era distinta, em alguns casos, optamos por manter a nomenclatura de ento: nveis bsico, tcnico e tecnolgico da EP.

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Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

falta desse dilogo, permanecer a situao atual na qual prevalecem os interesses do ator mais privilegiado - o econmico. Esse dilogo pode ser estabelecido a partir da abertura dos centros de EP, com o objetivo de descobrir as reais demandas educativas da sociedade. Esse processo, desenvolvido atravs de uma metodologia participativa (SOBRINHO, 1995; RISTOFF, 1995; DOMNGUEZ, 1999; GAIRN, 1999) envolver os docentes e tcnicos do Centro na problemtica do entorno ao tempo em que esse se incorporar realidade do Centro. Ao combinar o dilogo social com as possibilidades concretas que tm os docentes e dirigentes de influenciar na concepo educacional praticada em cada instituio, se contribuir para a consecuo de resultados significativos, sendo necessrio[...] sair do enfoque que culpabiliza, exclusivamente, as Reformas e Contra-reformas e a seus efeitos: rigidez das normas, instabilidade nas polticas, crise econmica nos investimentos educacionais, [...] aos educadores e educadoras ainda lhes resta o controle de importantes condies internas aos processos educacionais; condies slidas, que repercutem diretamente sobre elementos como mtodo, avaliao, contedo, qualidade dos processos e dos resultados [...] (CABELLO, 1998, p.27).

empresrios, trabalhadores ou quaisquer outros atores sociais definam a concepo de educao praticada nos centros. Ao contrrio, a idia que atravs dele seja possvel conhecer mais profundamente os pontos de vista e os interesses do entorno e, ento, elaborar propostas educativas que possam atender s suas necessidades mais profundas. Isso significa que se pode, e se deve, ir alm do atendimento s demandas aparentes e imediatas. necessrio antecipar-se a essas demandas e atuar na direo de contribuir para mudanas sociais significativas orientadas s necessidades coletivas. O segundo aspecto que merece maior preciso a concepo de melhoria da qualidade educativa de um centro. Para falar sobre isso fundamental ter claro que as instituies de EP, principalmente as pblicas e o CEFET-RN em particular, alm dos problemas crnicos de financiamento6 enfrentam outros trs grandes desafios. Um deles est relacionado com as discrepncias de oportunidades e de nveis e perfis de conhecimentos prvios dos distintos grupos destinatrios que acorrem a esses centros. Uma Instituio como o CEFET-RN, por exemplo, atua no ensino mdio; nos cursos tcnicos, integrados ao ensino mdio e subseqentes; nos cursos superiores de tecnologia; nas licenciaturas; e na formao inicial e continuada de trabalhadores, de forma que tem alunos de

Para a autora a aproximao e o dilogo com o entorno no implica em deixar que

6 No nos aprofundaremos sobre o tema financiamento, por no ser objeto central neste momento. Entretanto, esse um dos maiores desafios para a as reas sociais do pas e, em conseqncia para a EP. Por outro lado, o financiamento do CEFET-RN est bastante discutido em Moura (2003). 276 Gest. Ao, Salvador, v.9, n.3, p. 271-288, set./dez. 2006

Dante Henrique Moura

todas as idades e procedncia scioeconmica-educativa e cultural. O segundo a demanda do mundo do trabalho por indivduos cada vez mais qualificados profissionalmente e capazes de gerar solues e estratgias para enfrentar para novos problemas; que tenham iniciativa e sejam criativos, entre outras caractersticas requeridas. Dessa forma, embora a Instituio no oriente seus processos educacionais pelas necessidades exclusivas do mundo do trabalho, no pode perder de vista essa dimenso sob pena de tornar-se disfuncional e, portanto, dispensvel para a sociedade. O terceiro repto a responsabilidade social com os egressos e a sociedade em geral, representada tanto pela capacidade de (re)insero sociolaboral de longa durao proporcionada pelas ofertas, como pela capacidade desenvolvida pelos egressos no sentido de atuar como agentes promotores de mudanas sociais em benefcio dos interesses sociais e coletivos. Diante do exposto, assumimos neste trabalho que orientar a auto-avaliao melhoria da qualidade educativa do CEFET-RN o mesmo que orient-la ao enfrentamento a esses desafios. As dimenses da investigao autoavaliativa Ao comear um processo avaliativo devemos elaborar e responder um conjunto de7

perguntas relacionadas com as dimenses ou elementos da avaliao. Embora no haja consenso sobre essas perguntas-chave as diferenas no so significativas (DOMNGUEZ, 1999; SOBRINHO, 1995; RISTOFF, 1995, entre outros). Em geral, podemos considerar as seguintes perguntas prvias: A quem avaliar?; Para quem avaliar?; O que avaliar?; Como avaliar?; Quem deve avaliar?; Com que se vai avaliar?; Quando avaliar?; Para que avaliar?. Elaborar e respond-las resulta em optar por uma determinada concepo de avaliao, ou seja, significa planej-la. Isso demanda a tomada de decises sobre metodologias, tcnicas e instrumentos e a opo por una poltica de avaliao, a qual pode ser dirigida verificao de resultados ou qualidade formal e poltica dos processos. Tambm significa, persuadir-se por processos que privilegiem o aumento de oportunidades educativas pblicas, gratuitas e de boa qualidade aos grupos menos favorecidos ou incrementar a eficcia daquelas destinadas aos j includos, entre outras. Em seguida, apresentamos as escolhas deste trabalho (Quadro 1). Sobre o Quadro 1 (p.278) esclarecemos que relativamente primeira pergunta as respostas apresentadas ainda precisam ser desdobradas, ou seja, temos que definir categorias (ou critrios)7 relacionados com o contexto, objetivos, planos e/ou outros elementos relacionados com o objeto de avaliao. Oportunamente apresentaremos a estratgia utilizada para definir tais categorias.277

Utilizaremos ao longo do texto o termo categoria Gest. Ao, Salvador, v.9, n.3, p. 271-288, set./dez. 2006

Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

QUADRO 1 - Dimenses da avaliaoPergunta O qu? A quem? Para quem? Como? Com que? Dimenso Objeto Pessoal Patrocinador Metodologia Tcnicas e Instrumentos Audincia Momento ou Fase Finalidade Respostas Contexto, objetivos, planos, estruturas, processos de formao, processos de gesto etc. Alunos, professores, equipe dirigente, sistema relacional etc. A equipe de direo, os alunos, os professores e a comunidade. Mista: quantitativa e qualitativa, com predomnio qualitativo. Estudo de caso. Entrevistas semi-estruturadas, questionrios e anlise documental. A equipe de direo, professores, tcnico-administrativos, alunos e agentes externos (auto-avaliao contrastada e contextualizada). Inicial, processual, final e demorada. Inovao e mudana orientadas melhoria da qualidade educativa do Centro.

Quem? Quando? Para que?

FONTE: Moura (2003), a partir de Domnguez (1999)

O planejamento da investigao de campo A noo de investigao avaliativa orientada melhoria da qualidade educativa de instituies educacionais permite-nos projetar dois processos que ocorrem ao mesmo tempo (DOMNGUEZ, 1999). A prpria

pesquisa auto-avaliativa e o desenvolvimento do plano de gesto. So dois processos inter-relacionados que constituem um macro-processo (Figura 1). Algo importante a ressaltar nessa Figura o carter infinito inerente aos planos de gesto e de avaliao institucional, representado pela espiral que se repete indefinidamente.

FIGURA 1 - Pesquisa auto-avaliativa e plano institucional de gestoP roce sso d o P lano estratg ico de gesto P rocesso de a va liati v a p esq uisa

2.

E laborao do program a de in terven o A p licao

1. A va liao inicial d iagn stica: esta do da q uesto sobre o cen tro (critrios e in dicadores) 4. A valia o form a tiva. processu al

3.

5 . A valia o som a tivade con traste. 6. A valiao do im pacto d a form ao

In ovao do plan o de gesto

Ino va o e m ud ana orienta da m elhoria da qualid ade educativa

FONTE: Moura (2003), a partir de Domnguez (1999).

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Dante Henrique Moura

Para concluir o planejamento da auto-avaliao falta-nos definir os critrios relacionados com o que avaliar. Na busca dessas respostas analisamos (MOURA, 2003) distintos modelos de avaliao de centros educativos (SANTOS GUERRA, 1995; SOBRINHO, 1995 e 2000; RISTOFF, 1995; DOMNGUEZ, 1999; GAIRN, 1999) e constatamos que, independentemente das questes epistemolgicas de cada um, existe um fio condutor relacionado com o objeto da investigao. Os modelos visitados consideram os elementos dinmicos da instituio, como os processos de relao com o entorno, de gesto, de formao e de avaliao. Na-

turalmente, cada um pode atribuir mais ou menos importncia a uns ou outros aspectos, alm de distintas denominaes, mas esses elementos esto sempre presentes. Alm disso, temos que considerar os elementos estruturais comuns a todas as organizaes como o contexto onde esto localizadas, objetivos e planos, estruturas, sistema relacional e o conhecimento que produz e transmite (MOURA, 2003). Assim, a combinao entre os elementos estruturais e dinmicos em um sistema de coordenadas (Quadro 2) resulta numa boa referncia para orientar a construo de categorias relativas ao que avaliar.

Quadro 2 - Possveis esferas de investigao sobre o funcionamento e desenvolvimento de uma instituio educativa Dimenso Estrutural Processos de Processos relao com de gesto o entornoProcessos de formao Processos de avaliao

Dimenso Dinmica

Aspectos contextuais especficos e caractersticas Objetivos e planos Estruturas Sistema relacional O conhecimento

FONTE: Moura (2003), a partir de Domnguez (1999).

Utilizando o Quadro 2 como roteiro e fazendo uma profunda reflexo e estudos de documentos institucionais, construmos as categorias que orientaram o processo de auto-avaliao.

Para isso, cruzamos cada elemento estrutural com todos os elementos dinmicos, produzindo as categorias da auto-avaliao, ou seja, definindo o que avaliaramos.279

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Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

Essas categorias no foram totalmente construdas previamente investigao de campo. Na verdade, aps a primeira varredura na Tabela 2, identificamos cerca de 80 categorias e com elas partimos para o campo. Durante o processo terico-prtico de confronto das categorias planejadas com os dados reais emergentes do processo investigativo, as categorias iniciais foram sendo alteradas atravs de um processo interativo. Em seguida, apresentamos o conjunto final de categorias, geradas a partir do Quadro 2: Aspectos contextuais e caractersticas versus Processos de relao com o entorno 1) Demanda do entorno pelas ofertas educacionais; 2) Imagem institucional; 3) Estudos do mercado de trabalho nas reas de atuao do CEFETRN. Aspectos contextuais e caractersticas versus Processos aspectos de gesto 4) Debilidades resultantes da reforma da EP e do PROEP8 e outras debilidades; 5) Fortalezas resultantes da reforma da EP e do PROEP e outras fortalezas. Aspectos contextuais e caractersticas versus Processos de formao 6) Implicaes da reforma da EP e do PROEP sobre a oferta educacio-

nal do CEFET-RN; 7) Grupos destinatrios prioritrios. Aspectos contextuais e caractersticas versus Processos de avaliao 8) A socializao dos resultados dos processos institucionais de avaliao; 9) Influncia da avaliao na retroalimentao da ao dos atores internos e no funcionamento institucional; 10) Relaes entre avaliao e mudana institucional. Objetos e planos versus Processos de relao com o entorno 11) As relaes com o entorno e o projeto institucional: a influncia das transformaes sociais, da reforma da EP e do PROEP. Objetos e planos versus Processos de gesto 12) Financiamento e funo social; 13) Elaborao e acompanhamento do planejamento institucional; 14) Coerncia entre os planos e os objetivos; 15) Plano de Informatizao. Objetos e planos versus Processos de formao 16) Planos de estudos: elaborao e socializao; 17) O ensino mdio;

8

Programa de Expanso da EP

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Dante Henrique Moura

18) O nvel bsico da EP/cursos SINE; 19) O nvel tcnico da EP; 20) O nvel tecnolgico da EP; 21) O uso das TIC na configurao e implementao das ofertas; 22) (Re)insero sociolaboral e acompanhamento dos egressos; 23) Plano de capacitao e formao dos dirigentes, dos docentes e tcnico-administrativos: elaborao, participao e retorno para a Instituio e para os profissionais. Objetos e planos versus Processos de avaliao 24) Plano de avaliao; 25)Avaliao do desenvolvimento do plano de gesto. Estruturas versus Processos de relao com o entorno 26) O Conselho Diretor: constituio e participao do entorno; 27) a FUNCERN9: objetivos e relaes com o CEFET-RN. Estruturas versus Processos de gesto 28) Adequao da estrutura aos objetivos do Centro; 29) Perfil profissional correspondente aos distintos nveis da estrutura; 30) Coordenao entre os rgos da estrutura.

Estruturas versus Processos de formao 31) As gerncias educacionais (departamentos acadmicos): funes e coordenao das atividades com as demais gerncias, rgos de apoio e diretorias; 32) O trabalho dos estudantes; 33) O trabalho docente; 34) O trabalho da equipe pedaggica; 35) As reunies pedaggicas-RP: temas protagonistas; 36) Influncia da estrutura no desenvolvimento de aes multi e interdisciplinares. Estruturas versus Processos de avaliao 37) Mecanismos de avaliao e auto-avaliao. Sistema relacional versus Processos de relao com o entorno 38) Fluxos de comunicao; 39) Conflitos com o entorno; 40) A cultura de se inter-relacionar com o entorno e sua influncia no clima institucional. Sistema relacional versus Processos de gesto 41) Comunicao entre os rgos que tomam as decises e os que no participam do processo decisrio; 42) Participao na tomada de deciso e conseqncias dessas;

9

Fundao de Apoio ao CEFET-RN Gest. Ao, Salvador, v.9, n.3, p. 271-288, set./dez. 2006 281

Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

43) Clima: influncia do contexto interno e externo; 44) Incentivo a uma cultura participativa e colaborativa. Sistema relacional versus Processos de formao 45) Inter-relaes entre a equipe dirigente, professores, tcnico-administrativos e alunos (valores, respeito e confiana mtua). Sistema relacional versus Processos de avaliao 46) Avaliao da interao entre os alunos, professores, tcnico-administrativos e dirigentes; 47) Auto-avaliao dos professores e tcnico-administrativos sobre sua prpria participao profissional no Centro; 48) Cultura de avaliao e auto-avaliao. Conhecimento versus Processos de relao com o entorno 49) Produo e transferncia do conhecimento a partir da interao com o entorno. Conhecimento versus Processos de gesto 50) Incentivo da gesto s atividades de pesquisa e extenso.10

Conhecimento versus Processos de formao 51) Planos de pesquisa e extenso e de transferncia do conhecimento produzido ao entorno e sociedade em geral. Conhecimento versus Processos de avaliao 52) Avaliao do Impacto da formao na melhoria da qualidade de vida dos egressos e do entorno institucional. A PESQUISA DE CAMPO: COLETA E ANLISE DOS DADOS Metodologicamente, optamos por um modelo misto, quantitativo e qualitativo, com predomnio qualitativo (Quadro 2). Adotamos trs tcnicas de coleta de dados: entrevistas semi-estruturadas; aplicao de questionrios e reviso documental 10 (GOETZ; LECOMPTE, 1988; PREZ SERRANO, 1994). Tendo em vista a opo pelo predomnio qualitativo, as entrevistas se constituram na principal fonte de informao da pesquisa. Na Figura 2 (p.283) representamos o percurso metodolgico da investigao. No Quadro 3 apresentamos a composio dos 12 grupos de informantes previamente definidos e o percentual que os sujeitos de cada um deles representa relativamente ao respectivo universo, tendo como referncia os dados institucionais de 2001.

A consulta a documentos foi utilizada para a coleta e para a anlise de dados Gest. Ao, Salvador, v.9, n.3, p. 271-288, set./dez. 2006

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Figura 2 Percurso metodolgico do processo de pesquisa auto-avaliativa da funcionamento institucional do CEFET-RN

Dante Henrique Moura

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FONTE: Moura (2003)

Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

QUADRO 3 - Grupos de informantes: composio e percentual sobre cada universoGrupos de informantes Diretores Gerentes [11] Docentes Tcnicoadministrativos Agentes externos Outros chefes de hierarquia inferior a dos gerentes Alunos do ensino mdio Alunos do nvel bsico da EP Alunos do nvel tcnico da EP Alunos do nvel tecnolgico da EPFonte: Moura (2003)

Entrevistados

Respondentes dos questionrios

Total de sujeitos

Universo institucional

% do universo

5 8 9 3 10 -

36 5 9 180 50 320 55

5 8 45 8 9 180 50 320 55

5 8 281 201 38 1.776 12.227 3.186 525

100 100 16,01 4 23,68 10,13 0,41 10,04 10,48

Sobre o Quadro 3, explicamos que os dados referentes aos tcnico-administrativos e alunos do nvel bsico no foram utilizados na anlise, pois a participao total deles no alcanou os 10% dos respectivos universos. Isso no gerou problemas, porque a informao proporcionada pelos outros 10 grupos foi suficiente para os fins da pesquisa. Coletados os dados, desenvolvemos vrios processos intermedirios de interpretao e anlise antes de realizar a triangulao entre as contribuies dos distintos grupos. Assim, previamente, transformamos os dados dos questionrios e das entrevistas na viso de cada um dos grupos com relao s 52 categorias.

Antes de analisar entrevistas, as transcrevemos, pois todas foram gravadas, mediante autorizao dos informantes (GOETZ; LECOMPTE, 1988; SIMONS, 1999). Feito isso, efetuamos a primeira ordenao temtica - agrupamento das contribuies de cada grupo com relao s categorias estabelecidas. Em seguida, procedemos segunda ordenao temtica na qual construmos a viso de cada grupo relativamente a cada categoria. Esse material foi a principal fonte de informaes para a triangulao entre os grupos de informantes, o qual foi complementado pelos questionrios e anlise documental. Acerca dos dados oriundos dos questionrios, o procedimento foi semelhante ao das entrevistas, de modo que tambm cons-

11 Na verdade, em uma linguagem mais adequada esfera educacional ,os gerentes so chefes de departamentos acadmicos ou administrativos. Entretanto, a legislao especfica dos CEFETs estabeleceu essa terminologia esdrxula ao campo educativo.

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trumos a viso de cada grupo relativamente s categorias de auto-avaliao. Depois, realizamos a triangulao, contrastando as vises de todos os grupos que responderam aos questionrios e os entrevistados, alm da anlise documental. Esta ltima, utilizada para complementar e aprofundar a anlise de algumas categorias cujas contribuies proveniente das outras fontes no foi suficiente para construir um indicador confivel relativo categoria abordada. Dessa maneira, a triangulao correspondeu fase final da anlise dos dados e funcionou como um operador que transformou a viso dos grupos de informantes, classificadas de acordo com as 52 categorias, em indicadores institucionais, ou seja, a partir de cada categoria construmos um indicador atravs da triangulao. Finalmente, a partir da sntese dos indicadores elaboramos as concluses da pesquisa e respectivas propostas de melhora (MOURA, 2003).

O primeiro eixo diz respeito postura institucional frente s demandas da sociedade e do mundo do trabalho em particular. Sobre isso, conclumos que a Instituio se conduz mais por reao s aes do entorno do que em funo de um planejamento prvio, elaborado a partir de seus objetivos, fins e prioridades. Alm disso, conclumos que isso ocorre porque o CEFET-RN e seus agentes no compreendem totalmente a sociedade onde esto inseridos, nem sabem utilizar adequadamente, os meios disponveis para melhorar essas relaes, por falta de capacitao/deciso poltica de faz-lo. Apesar disso, tambm apreendemos que muito boa a infra-estrutura e que parte do pessoal est capacitado/capacitando-se e motivado para realizar essa funo. O segundo relaciona-se com a reduo do financiamento pblico que resulta numa situao-problema: a manuteno e, inclusive, a tentativa de ampliar a funo social do CEFRET-RN versus a necessidade de buscar estratgias de complementao oramentria atravs da interao com o entorno. Nesta esfera, a concluso fundamental que o CEFET-RN e o governo federal esto de acordo que a Instituio deve ampliar a sua interao com o entorno e a sociedade em geral. Entretanto, para o CEFET-RN essa interao deve estar pautada pela ampliao de sua funo social, enquanto para a administrao federal o foco deve ser o aumento da capacidade institucional de autofinanciamento13.

CONCLUSES Para os fins deste trabalho resumimos as concluses em trs grandes eixos temticos, apesar de que, ao finalizar a pesquisa, em dezembro de 200312 , extramos muito mais concluses sobre o CEFET-RN do que as aqui tratadas.11 13

A ntegra do trabalho est em disponvel em http://www.cefetrn.br/academico/projeto_pedagogico/Projeto_Pedagogico.pdf Neste ponto cabe destacar que chegamos a essa concluso a partir da anlise de dados que foram coletados entre outubro e dezembro de 2001, portanto durante o governo FHC.

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Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

O terceiro eixo trata da identidade institucional. Nesse terreno conclumos que a Instituio estava deixando de ser referncia como excelente escola formadora de tcnicos de nvel mdio face reforma da EP e do PROEP, principalmente, separao do ensino tcnico/mdio estabelecida pelo Decreto n0 2.208/97, alm de outros aspectos mencionados nas concluses anteriores. Ademais, ainda conclumos que a aspirao institucional aponta na direo de consolidar-se como um centro de referncia em EP com perfil e atribuies bem mais ambiciosos, ou seja, consolidar-se e ser reconhecida como um centro que alm do ensino tcnico atua na educao superior, atravs dos cursos superiores de tecnologia, no nvel bsico da EP, na pesquisa aplicada e na extenso. Apesar desse desejo institucional firme em todos os segmentos internos, os prprios informantes reconheceram que essa nova identidade no estava sendo criada e que, portanto, a sociedade ainda no percebera as mudanas que o CEFET-RN atravessava. Alm disso, constatamos algo ainda mais preocupante. Parte da prpria equipe de direo, naquele momento, ainda no havia percebido a profundidade e as implicaes das mudanas. Ainda com relao a essa questo apreendemos que contriburam para consolidar esse cenrio, a reduo do financiamento pblico imposto pela administrao federal em decorrncia da aplicao14

da poltica neoliberal; as dificuldades internas da prpria administrao do Centro; e a inadequao do perfil de parte do pessoal docente e tcnico-administrativo frente s demandas da nova realidade institucional. Apesar dessas dificuldades, a pesquisa informa o grande potencial do CEFET-RN para enfrentar a situao. Os informantes esclarecem que a Instituio conta com muitos servidores capacitados/ capacitando-se para atuar nessa nova realidade. Que tambm dispe de infra-estrutura fsica de qualidade, alm de larga experincia na EP, o que lhe permite avanar em outros nveis desse segmento, atravs de um planejamento adequado e sem se afastar da luta pela recomposio oramentria institucional visando implantao de polticas educacionais acordes com as reais necessidades da classe trabalhadora. A partir das concluses propusemos estratgias para enfrentar o desafio de construir uma nova identidade institucional (MOURA, 2003) visando levar prtica a idia do centro federal que oferece o ensino mdio14, os trs nveis da EP e que realiza a pesquisa aplicada vinculada aos processos educacionais, assim como atividades de extenso, orientada pela noo de itinerrios formativos verticais. Para materializar essa idia, sugerimos direo do Centro que iniciasse um processo de construo coletiva de um novo

Na verdade, com relao ao ensino mdio, a idia recorrente ao longo da pesquisa (MOURA, 2203) a de que o CEFET-RN s deveria continuar oferecendo esse curso em funo da proibio legal de oferecer o tcnico integrados com o ensino mdio. Gest. Ao, Salvador, v.9, n.3, p. 271-288, set./dez. 2006

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projeto poltico-pedaggico com o fim de integrar todas as suas ofertas educacionais em um conjunto sistmico, consistente, coerente e intencionado de atividades acadmicas,orientadas, indissociavelmente, s do ensino, pesquisa e extenso, as quais, deveriam ocorrer em um ambiente de constante interao com o mundo do trabalho e a sociedade (MOURA, 2003). Aceita a proposta, comeamos uma nova fase do processo integrado do plano de gesto e de pesquisa auto-avaliativa do funcionamento do CEFET-RN 15 , a qual se desenvolve atravs de investigaoao na perspectiva da construo coletiva. Essa fase iniciou-se em 2004 e durante aquele ano as atividades coletivas nos permitiram acordar que a nova identidade institucional contemplaria:

dos planos dos novos cursos tcnicos de nvel mdio integrados, que voltaram a fazer parte da realidade acadmica institucional aps 7 anos em que foram proibidos por fora da legislao vigente. Dessa forma, em 2005, estamos construindo os planos dos cursos superiores de tecnologia e das licenciaturas, de forma que em futuros relatos trataremos do respectivo processo.Artigo recebido em: 08/09/2005. Aprovado para publicao em: 02/10/2006.

Institutional self evaluation guided to social responsability : the case of CEFET-RN Abstract: In Brazilian educational institutions, mainly in the professional and technological ones, are still not be consolidated the culture of the selfevaluation. Moreover, the experiences in course tend to privilege the search for results in detriment of the analysis of its internal processes and the function that these institutions have in the society. Thus, this paper has the objective to relate the self-evaluation research realized in the CEFETRN. Amongst the conclusions, it is distinguished that after the professional education reform of 1997 this Institution comes losing its identity as a school that form excellent technician of level average and still not had obtained the new intended image: a technological university center that beyond forming technician of level average also works in higher education and develops applied research and activities of extension. Keywords: Professional education; evaluation; Social responsibility. Self-

EP tcnica de nvel mdio nas formas integrada e subseqente; EP tecnolgica de graduao e ps-graduao; Formao inicial e continuada de trabalhadores; Formao de professores (Licenciaturas).

Naquele momento no foi possvel redimensionar todos planos de cursos das ofertas educacionais acima especificadas, de modo que nos concentramos nos princpios, fundamentos, concepes e diretrizes gerais para todo o currculo, alm15

Autoevaluation Institutional orientada a la aplicacin de la responsabilidad social: el caso del CEFET-RN Resumen: En las instituciones educativas brasileas y particularmente en las de educacin profesional

Nesse nterim, houve eleies para a direo geral do CEFET-RN e eu fui convidado para ocupar a direo de ensino do Centro e, em decorrncia, disso, coordenar o processo de (re)construo do projeto poltico pedaggico do CEFET-RN Gest. Ao, Salvador, v.9, n.3, p. 271-288, set./dez. 2006 287

Auto-avaliao institucional orientada ampliao da responsabilidade social: o caso do CEFET-RN

EP- todava no se consolid la cultura de la evaluacin institucional. Adems de eso, las experiencias en curso tienden a privilegiar la bsqueda de resultados en detrimento del anlisis de los procesos internos y de la funcin que esas instituciones desempean en la sociedad. As, el artculo tiene el objetivo de relatar una investigacin realizada en el CEFET-RN encaminado en su autoevaluacin. Entre las conclusiones, se destaca la constatacin de que el CEFET-RN despus de la reforma de la EP viene perdiendo su identidad como excelente agencia formadora de tcnicos de nivel medio y todava no consigui crear la nueva imagen buscada: la de un centro tecnolgico que adems de formar tcnicos de nivel medio actua en los cursos superiores de tecnologa y desenvuelve investigacin aplicada y actividades de extensin. Palabras-clave: Educacin profesional; Autoevaluacin; Resposabilidad Social.

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Sobre o Autor:1 Dante Henrique Moura Doutor em educao pela Universidade Complutense de Madri. Engenheiro eletricista pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte e Professor do Centro Federal de Educao Tecnolgica do Rio Grande do Norte (CEFET-RN). E-mail: [email protected]

Endereo Postal: Centro Federal de Educao Tecnolgica do Rio Grande do Norte/ Diretoria de Ensino. Av. Senador Salgado Filho n 1559. Morro Branco. CEP 59015-000. Natal/RN.

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Eleio de diretores escolares: avanos e retrocessos no exerccio da gesto democrtica da educao

Cludia Dias Silva1

Resumo: Este artigo aborda o tema da eleio de diretor escolar como um dos construtos que vm contribuindo para exerccio da gesto democrtica da educao, possibilitando o envolvimento da comunidade no processo decisrio sobre a organizao e o funcionamento da escola. Estabelece uma discusso sobre as diferentes formas de provimento do cargo de diretor e suas implicaes para o desempenho das atividades e o sucesso da escola, desvelando que a prtica da eleio do diretor no garante o exerccio da gesto democrtica, na qual o comprometimento com o sucesso da instituio deve estar no centro das aes. Palavras-chave: Eleio de diretores escolares; Gesto democrtica da educao.

modo que, em ordens sucessivas, a Unio, o Estado e o Municpio se vejam com parcelas diversas e conjugadas de poder e responsabilidade (TEIXEIRA, 1967, p.67).

INTRODUO A discusso sobre a participao da sociedade civil na gesto da educao no algo recente na literatura educacional brasileira. Na dcada de 1930, Ansio Teixeira j concebia a municipalizao da educao como um mecanismo de descentralizao, que dotaria as instncias pblicas de autonomia, favorecendo a democratizao da educao. Defendia para a administrao educacional[...] um regime especial de distribuio dos poderes pblicos encarregados de ministr-la, de

Alm disso, defendia para a administrao da educao local um modelo de gesto democrtica no qual rgos colegiados, de composio leiga, Conselhos de Educao, com um alto grau de autonomia administrativa, participariam do processo de tomada de deciso sobre o funcionamento do sistema educacional. Os conselheiros seriam representantes diretos dos pais de famlia e da comunidade, eleitos ou nomeados por autoridades eleitas, competindo-lhes a nomeao e superviso das autoridades executivas. A Constituio Federal do Brasil, promulgada em 1988, traz a gesto democrtica como um dos princpios norteadores da oferta do ensino pblico no pas. A incluso desse princpio no texto legal resultado de reivindicaes de movimentos populares, sindicais e outros segmentos da sociedade civil pela publicizao do Estado, uma vez que o pas passava por um regime289

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Eleio de diretores escolares: avanos e retrocessos no exerccio da gesto democrtica da educao

militar autoritrio e centralizador que se estendeu no perodo de 1964 at 1985. Em 1996, com a aprovao da Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional, Lei n 9.394/96, se intensifica a discusso sobre a participao da sociedade nas questes educacionais. Em seu Artigo 14, a Lei n 9.394/96 detalha os mecanismos de viabilizao da participao das comunidades escolar e local na gesto democrtica da escola.Art. 14 - Os sistemas de ensino definiro as normas de gesto democrtica do ensino pblico na educao bsica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princpios: I - participao dos profissionais da educao na elaborao do projeto pedaggico da escola; II - participao das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes.

agentes escolares, significando uma forma de toda a equipe escolar tornar-se co-responsvel pelo sucesso do aluno e, conseqentemente do funcionamento da unidade escolar. J o conselho escolar idealizado pela LDB deve compor a organizao da prpria escola, responsabilizando-se pela tomada de decises em todas os campos que envolve o trabalho na escola, no restringindo-se somente a gesto de recursos financeiros, como vem se percebendo com a criao e implementao dos rgos colegiados que executam, basicamente, a gesto dos recursos do Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE). Cury citando Antonio Gramsci (2001, p.50) define conselho como[...] o lugar onde a razo se aproxima do bom senso e ambos do dilogo pblico, reconhecendo que todos so intelectuais, ainda que nem todos faam do intelecto uma funo permanente (grifos do autor).

A idia de gesto democrtica expressa na Lei abrange a existncia de um projeto pedaggico da escola; a participao de professores e demais trabalhadores da educao da escola na sua elaborao e a gesto colegiada da implantao e execuo desse projeto, atravs de rgos colegiados compostos por representantes da comunidade escolar e outros segmentos da sociedade. De acordo com Libneo (2003) o projeto pedaggico tem por objetivo descentralizar e democratizar a tomada de decises pedaggicas, jurdicas e organizacionais na escola, buscando maior participao dos290

GESTO DEMOCRTICA E DESCENTRALIZAO DA EDUCAO Nos ltimos anos, a discusso sobre a gesto democrtica da educao vem constituindo-se em tema recorrente na literatura. Essa ateno decorrente do carter centralizador, burocrtico, autoritrio e cerceador de prticas participativas que caracterizam o sistema pblico educacional brasileiro. Por muitos anos, principalmente no perodo em que a administrao do Estado brasileiro esteve sob o poder dos

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Cludia Dias Silva

militares, a administrao educacional assumiu um carter tecnocrtico e capitalista. As escolas se configuravam como um lcus de formao dos trabalhadores necessrios para a consolidao do capitalismo no pas, reprodutores de uma ideologia que visava a construo de uma sociedade no-participativa e alienada, na qual seus integrantes no exerciam a sua cidadania. O incio da dcada de 80 est marcado como o perodo em que o debate sobre os temas da gesto e da autonomia escolar destacou-se nas discusses sobre o funcionamento da escola pblica. Esse perodo coincide com o momento de reconstruo da democracia na sociedade brasileira, que enfatizava a necessidade de descentralizao e democratizao dos processos sociais no Brasil, atribuindo uma forte reao ao centralismo do poder na administrao do Estado. No campo educacional, algumas das maiores conquistas foram a liberdade de ao e de deciso em relao aos rgos superiores da administrao e a maior participao da comunidade escolar nos espaos de poder da escola, por meio de instncias como os conselhos escolares. De acordo com Mendona (2001) o processo de democratizao da educao no Brasil passou por vrios estgios. Inicialmente, houve o direito universal ao acesso a escola e, posteriormente, o direito a um ensino de qualidade e participao democrtica na gesto das unidades escola-

res e dos sistemas de ensino, que para Vitor Paro pode ser concebida como aquela que est:Inspirada na cooperao recproca entre homens, deve ter como meta a constituio, na escola de um novo trabalhador coletivo que, sem os constrangimentos da gerncia capitalista e da parcelizao desumana do trabalho, seja uma decorrncia do trabalho cooperativo de todos envolvidos no processo escolar, guiados por uma 'vontade coletiva', em direo ao alcance dos objetivos educacionais da escola (PARO apud VINHAES; GRACINDO, 1995, p.161).

A realizao das primeiras eleies diretas para governador de Estados no Brasil, efetivadas em 1982, e a posse desses novos governadores no ano seguinte viabilizou a concretizao de muitas experincias de participao democrtica. Entre os projetos desenvolvidos entre 1983 e 1984, Gadotti (1993) destaca o Frum de Educao do Estado de So Paulo e o Congresso Mineiro de Educao. As Sesses Pblicas do Frum de Educao do Estado de So Paulo propiciaram, pela primeira vez na histria da educao brasileira, que educadores participassem do processo de elaborao das polticas pblicas de educao. A luta pela democratizao da gesto educacional foi intensa entre 1985 e 1988, ano da promulgao da Constituio que consagrou o princpio da "gesto democrtica do ensino pblico".A participao e a democratizao num sistema pblico de ensino a forma prtica de formao para cidadania. A educao para a cidadania d-se na participao no

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processo de tomada de deciso. A criao dos conselhos de escola representa uma parte desse processo. Mas eles fracassam se forem institudos como uma medida isolada e burocrtica. Eles s so eficazes num conjunto de medidas polticas, num plano estratgico de participao que vise democratizao das decises (GADOTTI, 1993, p.100).

criao de um colegiado/conselho escolar que tivesse tanto autoridade deliberativa quanto poder decisrio e repasse de recursos financeiros s escolas e conseqentemente aumento de sua autonomia. Para Vinhaes Gracindo (1995), uma vez que a administrao democrtica deve ser capaz de desenvolver processos e objetivos na delimitao de suas polticas, na elaborao de seus planejamentos e no desenvolvimento de sua gesto, faz-se necessrio o exerccio de prticas construtivas dessa gesto no sistema educacional. De acordo com a autora essas prticas devem envolver: a escolha de dirigentes pela comunidade escolar e local; a forma colegiada e descentralizada de administrao; a relao entre a escola e a comunidade com a decorrente participao popular; a liberdade propiciada aos estudantes e aos professores para a organizao de associaes e grupos representativos. Bobbio (2000) sinaliza que na gesto democrtica, as deliberaes coletivas devem ser tomadas por representantes governamentais e das organizaes da sociedade civil, em propores definidas pelos estatutos e regimentos internos de cada poltica que esteja sendo definida e/ou implementada. Isso atribui um carter institucional aos referidos rgos. Todavia, a forma de escolha e nomeao desses representantes deve assumir um carter democrtico. Discutindo sobre a concepo mnima de democracia e suas implicaes para o processo de tomada de deciso, o

A efetiva participao dos setores populares nas questes educacionais funcionaria como um instrumento de redistribuio do poder poltico, que resultaria na construo da cidadania. Nessa vertente, a autonomia e a democratizao so entendidas como processos indissociveis e necessrios para a construo de uma escola pblica de qualidade, garantindo o acesso de toda a populao ao sistema de ensino formal, bem como a construo das ferramentas necessrias para o convvio em sociedade.A democratizao e a descentralizao da gesto educacional so processos necessariamente indissociveis e trazem de forma implcita a necessria mudana nas relaes de poder. A descentralizao se constitui em processo necessrio democratizao e ambas so meios para se alcanar a efetiva participao dos cidados nas decises que dizem respeito sua vida individual e coletiva. Assim, essas se constituem em processos necessrios para o exerccio da cidadania (BORDIGNON, 1993, p.72).

Luck et al (1998) sinalizam que o movimento que visava a descentralizao e a democratizao da gesto das escolas pblicas concentrou-se em trs vertentes bsicas: participao da comunidade escolar na seleo dos diretores da escola,292

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autor argumenta que:(...) mesmo para uma definio mnima de democracia, como a que aceito, no bastam nem a atribuio a um elevado nmero de cidados do direito de participar direta ou indiretamente da tomada de decises coletivas, nem a existncia de regras de procedimento como a da maioria (ou, no limite, da unanimidade). indispensvel uma terceira condio: preciso que aqueles que so chamados a decidir ou eleger os que devero decidir sejam colocados diante de alternativas reais e postos em condio de poder escolher entre uma e outra. Para que se realize esta condio necessrio que aos chamados a decidir sejam garantidos os assim denominados direitos de liberdade, de opinio, de expresso das prprias opinies, de reunio, de associao etc (BOBBIO, 2000, p. 32).

MECANISMOS DE PROVIMENTO DO CARGO DE DIRETOR ESCOLAR A discusso sobre o processo de escolha de diretor escolar vem recebendo muita ateno dos pesquisadores na produo de reflexes terico-conceituais e polticas sobre a gesto democrtica da educao. Para Mendona (2001) a importncia dispensada a esse elemento da gesto democrtica pode ser compreendida atravs de dois processos. Um est vinculado ao prprio processo eleitoral como fator essencial no exerccio da democracia e o outro, ao espao que esse mecanismo ocupou dentre as reivindicaes dos movimentos sociais. Esse o processo que melhor concretizou a luta contra o clientelismo e o autoritarismo na gesto educacional. Apesar de a literatura pertinente ao tema fazer referncia a diferentes classificaes dos tipos de escolha de diretores escolares, nesse estudo ser utilizada como referncia bsica para discusso, as quatro classificaes apresentadas por Moacir Gadotti e Jos E. Romo (2004): a nomeao, o concurso pblico, a eleio e o esquema misto. O primeiro mecanismo utiliza-se da prtica da indicao do diretor por um agente externo instituio escolar para ocupar um cargo de confiana. Na maioria dos casos esse agente pode ser o prefeito ou o governador. Essa modalidade no traz segurana para o diretor, pois ele pode ser substitudo a qualquer momento, de acordo com os interesses polticos e com as convenincias

Os ideais dos movimentos que lutavam pela construo de uma sociedade mais justa envolviam a construo de um sistema educacional democrtico, no qual a gesto da escola fosse realizada pelos prprios representantes das comunidades escolar e local. As polticas educacionais deveriam partir de dentro da escola, sendo criada de acordo com cada realidade. Era imprescindvel modificar a estrutura do sistema pblico no pas, principalmente das escolas, a fim de garantir o exerccio de prticas menos autoritrias e mais democrticas. Essa reestruturao do sistema educacional deveria ampliar-se, possibilitando a participao dos educadores nas discusses sobre as polticas pblicas para a educao no pas.

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daqueles que o indicaram. Essa prtica baseia-se muito mais em critrios polticoclientelistas que tcnico-acadmicos. Segundo Paro (1996), o principal problema com relao nomeao como critrio de escolha do diretor a garantia de favorecimento dos interesses de polticos clientelistas. Pois, ao servir-se da prtica da nomeao sem adoo de outros critrios de escolha democrticos que garantam o respeito aos interesses da comunidade escolar e local, bem como a coibio de prticas que resultem em favorecimento ilcito de pessoas, o diretor tende a comprometer-se muito mais com os interesses do indivduo ou fora poltica que o nomeou, sem comprometer-se politicamente com os interesses da comunidade que compe a unidade escolar. At a promulgao da constituio federal de 1988 esse era o mecanismo que mais prevalecia para a ocupao do cargo de diretor escolar. A justificativa apresentada para a adoo do mecanismo de indicao do diretor escolar pelo executivo local est baseada, pelos que a praticam, na prerrogativa da democracia representativa. Uma vez que a sociedade civil elege seus representantes para deliberarem a respeito de questes que dizem respeito coletividade inteira, essa indicao tem legitimidade e evita o contraditrio na administrao. Entretanto, esse procedimento no garante uma administrao democrtica, ao contrrio, traz muito mais riscos de centralizao, autoritarismo, fisiologismo e nepotismo (GRACINDO, 1995).294

O concurso pblico pode ser realizado, pelo menos, de duas formas. Por meio de prova ou atravs de provas e ttulos, que se propem a aferir o grau de conhecimento tcnico e a comprovao de formao acadmica especfica para o exerccio das funes inerentes ao cargo de diretor de escola. Apesar de apresentar algumas virtudes necessrias ao diretor para o exerccio do cargo, tais como: a objetividade, a coibio do clientelismo e a possibilidade de aferio do conhecimento tcnico, esse mecanismo vem sofrendo crticas pela prpria comunidade escolar porque ele acentua a adoo de critrios objetivos e tcnicos e no afere a capacidade de liderana dos candidatos. Alm disso, o candidato aprovado, na maioria das vezes, escolhe a escola onde vai trabalhar, mas a comunidade escolar no participa do processo de seleo desse diretor. Dessa forma,o concurso acaba sendo democrtico para o candidato, que, se aprovado, pode escolher a escola onde ir atuar, mas antidemocrtico em relao vontade da comunidade escolar, que obrigada a aceitar a escolha do primeiro (GADOTTI; ROMO, 20 0 4, p.94).

A eleio pode ser realizada de diferentes formas: voto direto, representativo, uninominal ou por escolhas atravs de listas trplices ou plurinominais. A adoo desse mecanismo importante para o alcance do sucesso da escola e o exerccio de gesto democrtica e colegiada porque este favorece o desenvolvimento da pr-

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tica do dilogo na escola e resulta em maior distribuio de poder dentro e fora da escola, bem como o alcance do equilbrio entre a competncia tcnico-acadmica e a sensibilidade poltica necessrias ao diretor para o exerccio do cargo (GADOTTI; ROMO, 2004). Por ltimo, o mecanismo de esquema misto combina duas ou mais fases no processo de escolha dos diretores. Essas fases podem se constituir em provas que aferem a competncia tcnica e a formao do candidato, e eleies que verificam sua experincia administrativa, capacidade de liderana etc. Nesse mecanismo a comunidade escolar tem a possibilidade de participar de uma ou mais fases do processo de seleo, resultando em um maior vnculo e compromisso do diretor com aqueles que o escolheram. De acordo com Paro (1996) a defesa da eleio como critrio para a escolha de diretor de escola est baseada em seu carter democrtico. contraditrio pensar na existncia de uma sociedade democrtica, sem considerar a democratizao das instituies que compem essa sociedade, possibilitando, inclusive, populao controlar o Estado no provimento de servios coletivos em quantidade e qualidade compatveis com as obrigaes do poder pblico e em atendimento aos interesses dessa sociedade.Da a relevncia de se considerar a eleio direta, por parte do pessoal escolar, alunos e comunidade, como um dos critrios para a escolha do diretor de escola pblica (PARO, 1996, p.26-27).

Em uma pesquisa realizada em 1999 que objetivou fazer o mapeamento da descentralizao da educao brasileira nas redes estaduais do ensino fundamental, Parente e Luck (1998) constataram que os mecanismos mais utilizados para preenchimento do cargo de diretor escolar eram a indicao e nomeao direta pelas lideranas partidrias e dirigentes governamentais e a eleio direta e outras modalidades. O resultado do estudo apontou a seguinte situao nas escolas: das 26 unidades federadas pesquisadas, 17 realizavam eleio direta com a participao da comunidade escolar e local. Dessas, oito utilizavam como critrio de seleo e escolha apenas a eleio; cinco utilizavam um sistema misto adotando critrios tcnicos e eleio; duas adotavam somente prova de conhecimentos especficos; uma utilizava curso de qualificao com aprovao do candidato; uma adotava como critrio a anlise do currculo para selecionar os candidatos eleio. Outros seis estados recorriam a forma tradicional com indicao e nomeao de lideranas locais diretamente pelos dirigentes polticos. De acordo com as autoras supracitadas, a prtica da escolha de diretores escolares atravs de eleio teve incio no ano de 1984, no Estado do Paran. Posteriormente, entre 1985 e 1987, os Estados do Rio Grande do Sul, Acre, Mato Grosso e o Distrito Federal adotaram essa prtica. No Distrito Federal o processo foi interrompido por questes polticas e a eleio foi embargada, voltando a ser implementado no ano 1996. Foi no perodo compreendido entre os anos295

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1990 e 1997 que ocorreu uma expanso das eleies para diretor no mbito dos estados, com o incio de processo eletivo em oito sistemas estaduais de ensino no pas. A escolha pela eleio de diretor escolar destaca-se entre as prticas mais adotadas, como a que melhor representa o desenvolvimento de uma gesto democrtica. importante ressaltar que esse mecanismo no resolver sozinho todo o problema da escola, pois o verdadeiro exerccio desse modelo de gesto requer a participao da comunidade escolar e local no processo de tomada de deciso sobre as diferentes dimenses - poltica, pedaggica e financeira - da gesto da educao.A eleio de diretores no pode, todavia, ser tomada como uma panacia que resolver todos os problemas da escola e muito menos, em particular, os de natureza poltica. Esta, alis, tem sido a alegao mais freqente dos que resistem eleio como alternativa para a escolha do diretor, ou seja, descarta-se a eleio porque 'no possvel atribuir a existncia da democracia a apenas uma varivel, seja ela o concurso, os cursos, ou, menos ainda, a eleio' (PARO, 1996, p.28-29).

utilize o poder como instrumento de conquista e atendimento dos interesses da maioria. LIMITES E POTENCIALIDADES DO MECANISMO DE ELEIO DE DIRETOR Apesar de ser apontado por pesquisadores como o mecanismo que mais propicia o exerccio da democracia na gesto educacional, a eleio de diretor escolar apresenta algumas limitaes que pem em questio-namento a sua eficcia no que se refere ao exerccio da gesto democrtica. Estudos realizados em diferentes estados brasileiros, na ltima dcada, revelam algumas dessas limitaes. No Mato Grosso, foram desveladas prticas condizentes com a cultura poltica brasileira nos espaos escolares. O contrato clientelstico com os eleitores decorrentes de compromissos e acordos sigilosos pr-eleitorais termina por consolidar distores e privilgios que comprometem a gesto e o funcionamento da escola (TORRES; GARSKE apud LORDELO, 2003). A eleio tambm consolida o corporativismo de determinados grupos dentro da escola, que querem tirar proveito da situao, buscando o alcance de benefcios para o grupo, sem se comprometer com o coletivo da escola. Pode-se ainda acrescentar o fortalecimen-

Para a escola constituir-se verdadeiramente em um espao de exerccio da democracia preciso que ocorra mudana nas prticas de exerccio de poder. necessrio que os sistemas de ensino rompam com a verticalizao dos processos e com as relaes de dominao existentes na administrao da educao pblica, possibilitando que a comunidade296

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to de influncias dos professores no espao escolar, em detrimento da participao dos pais e de outros trabalhadores da escola com a instituio do processo de eleio direta de diretor escolar (GOMES apud LORDELO, 2003). Mdici apud Lordelo (2002), sinaliza que a forma como so organizadas as eleies de diretores termina por resultar em um crescimento do corporativismo dos professores nas escolas. Nas localidades onde os professores tm maior participao que a comunidade local, o desempenho profissional dos diretores est condicionado ao atendimento dos interesses dos docentes, comprometendo todo o seu trabalho com o sucesso pedaggico da escola. Ainda podem ser acrescentadas: a interferncia de poltica partidria que se constitua em fator de participao, a oposio dos professores aos diretores eleitos quando questes corporativas eram atingidas, os impasses criados com a eleio de diretores de oposio ao governo. Mendona (2001) acrescenta que outros problemas e limitaes deste processo, apontados em vrios estudos, abrangem fatores como excesso de personalismo na figura do candidato, falta de preparo de alguns deles, populismo e atitudes clientelistas tpicos da velha poltica partidria, aprofundamento de conflitos entre os segmentos da comunidade escolar, comportamento de apropriao do cargo pelo candidato eleito, dentre outros.

A adoo de eleio para diretor escolar contribuiu para a diminuio ou eliminao, nos sistemas em que foi implementada, de prticas tradicionalistas aliceradas no clientelismo e no favorecimento pessoal, prtica comum na escolha de diretor atravs de nomeao. Contudo, isso no significa dizer que o clientelismo no tenha deixado de exercer suas influncias na instituio escolar. Em algumas situaes, permaneceram aberturas para a penetrao da influncia do agente poltico na nomeao do diretor. Em outras, o interior da escola passou a comportar prticas clientelistas quer no processo de eleio, quer durante o exerccio de seu mandato (PARO, 1996). Para exemplificar a permanncia da influncia poltico-partidria na eleio de diretor, Paro (1996) cita Zabot (1984) e Canesin (1993) para relatar as experincias do estado do Paran e da cidade de Goinia, onde a eleio foi realizada atravs de lista trplice e a escolha definitiva do nome do candidato que ocuparia o cargo estava sob a responsabilidade do Poder Executivo. No estado do Paran o tempo exigido, por decreto estadual, para a escolha do nome do diretor pela Secretaria Estadual de Educao, possibilitou que muitos grupos pressionassem os responsveis para a nomeao de candidatos de seu interesse (ZABOT apud PARO, 1996).

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Em Goinia, apesar do estabelecimento de critrios, tais como avaliao de currculos, teste de avaliao, identidade com o projeto de melhoria do ensino, esprito de liderana e outros, alguns candidatos que obtiveram a classificao em primeiro lugar, no foram nomeados pelo Executivo, tendo sido nomeados candidatos indicados por vereadores (CANESIN apud PARO, 1996). O autor ainda faz referncia ao ocorrido no estado de Minas Gerais onde a eleio no foi realizada atravs de lista plurinominal, mas os polticos desrespeitaram as regras para a eleio de diretor. Nesse estado, em 1992, ano de eleies municipais, ocorreram muitas substituies de diretores escolhidos pela SECOM por outros pertencentes a esquemas eleitorais de alguns deputados e candidatos a prefeitos e vereadores a pedido dos mesmos (MELLO; SILVA apud PARO, 1996). Em relao s prticas clientelistas desenvolvidas no interior da unidade escolar, Paro (1996) relata casos ocorridos em Goinia, em 1984, de candidatos que, patrocinados por vereadores distribuam mimos e prometiam favores em troca de votos, alm do revezamento de alguns diretores e secretrios de uma mesma escola da rede para se alternarem na direo de unidades escolares por longos anos (CANESIN apud PARO, 1996). Outra expectativa com relao eleio era a possibilidade de essa conseguir eliminar298

o autoritarismo existente na escola e a falta de participao de professores, alunos, funcionrios e pais nas decises. Acreditava-se que, uma vez o diretor no tendo sido escolhido pela comunidade escolar e local, estaria mais comprometido com os interesses do Estado do que com as necessidades da escola e do grupo. Isso implicava em um distanciamento da comunidade escolar no funcionamento da escola. Todavia, a situao ocorrida no Distrito Federal mostra queo processo de gesto democrtica nas escolas no conseguiu sair, ainda, do rol dos modelos tradicionais, sem avanos na participao de pais e alunos, professores e servidores na tomada de decises, de forma mais ampla, envolvendo a distribuio de poder (COUTO apud PARO, 1996, p. 103).

Um passo muito importante para garantia da distribuio de poder na escola a mudana de comportamento do diretor, que deveria deixar de assumir um papel centralizador e autoritrio e assumir uma postura democrtica, oportunizando a todos os integrantes do corpo da escola a participao no processo de tomada de deciso, bem como a diviso de poder e responsabilidades para garantir o exerccio da gesto democrtica da escola. Paro (1996) acredita que o autoritarismo existente nas unidades escolares decorrente daconjuno de uma srie de determinantes internos e externos escola que se sintetizam na

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forma como se estrutura a prpria escola e no tipo de relaes que a tem lugar (PARO, 1996, p. 104).

pais, dos alunos e dos funcionrios de forma mais permanente. A experincia de outros pases com a implantao e o funcionamento do colegiado/conselho aponta que o maior envolvimento dos pais na unidade escolar tende a: elevar a resposta dos educadores; elevar a confiana das famlias na escola; promover maior aproximao entre professores e pais, pais e filhos, diretores e comunidade; atrair sugestes inovadoras para melhorar a qualidade do ensino (MURPHY apud SOBRINHO et al, 1994).

Um aspecto positivo apontado por Paro (1996) proporcionado pela adoo da eleio de diretor o comparecimento significativo dos vrios setores da escola nas eleies. O estado do Paran, quando na realizao das eleies em 1983, contou com comparecimento de 70% dos pais, os estudantes tambm tiveram presena macia. Tambm importante destacar que a implantao de eleio no garante a participao e o envolvimento das pessoas na conduo das aes na escola. muito comum ouvir reclamaes de diretores que se sentem solitrios, desacompanhados e sobrecarregados de trabalho nas unidades escolares, sem o apoio de outros integrantes do grupo da escola para dividir as tarefas e partilhar as responsabilidades e os problemas. Isso termina por reduzir o processo democrtico mera delegao de poderes. Sobrinho et al. (1994) atribuem ao processo de implantao do colegiado/conselho a maior possibilidade de mudana no funcionamento da escola, conferindo ao processo de eleio de diretor resultados mais otimistas. Este rgo possibilita que o diretor eleito tenha maior suporte institucional no exerccio de suas atividades, retirando-o do isolamento, uma vez que permite a participao dos professores, dos

CONSIDERAES FINAIS A viabilizao de uma gesto escolar que atenda a uma concepo progressista de educao, onde todos os sujeitos so vistos como cidados com direitos a serem atendidos pelo Estado e a participao nas questes educacionais, constitui-se em exerccio da cidadania, muito importante para o desenvolvimento da sociedade, bem como para o funcionamento da organizao escolar nesse meio. A gesto democrtica no resolver sozinha todos os problemas do sistema de ensino no Brasil, mas a sua implementao hoje uma exigncia da prpria sociedade que se quer mais justa e participativa. importante a garantia dos mecanismos necessrios para o exerccio desse modelo de gesto, bem como a criao de polticas299

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educacionais que partam de dentro da escola, atendendo s suas necessidades e assegurando a descentralizao do processo de tomada de deciso. O processo de eleio de diretores escolares apenas um dos componentes da gesto democrtica do ensino pblico, que s ter efeito prtico eficaz se associada a outras medidas que garantam a participao efetiva dos representantes dos segmentos escolares e da comunidade. A forma de escolha e a atuao do diretor escolar podem contribuir para a superao de conflitos, para a melhoria do trabalho, para as relaes intra-escolares e para a qualidade do ensino. Mas, para isso acontecer importante a conjuno de mudanas profundas na prpria estrutura da escola e nas relaes que nela se desenvolvem. Repensar os modelos de gesto atuais e a noo de democratizao da escola fundamental para o aperfeioamento dos mecanismos de participao existentes. preciso considerar a reestruturao dos espaos de exerccio da gesto democrtica da educao, atribuindo responsabilidades e significado aos diversos conselhos existentes nas escolas pblicas como o conselho/colegiado escolar, o conselho de classe, a coordenao pedaggica, o grmio estudantil e outros, que se constituem em espaos privilegiados de democracia na escola e, funcionam de maneira precria e deficiente.Artigo recebido em: 20/01/2006. Aprovado para publicao em: 03/11/2006.

The election of school principals: advances and backward movements in the exercise of the democratic management Abstract: This article discusses the election of school principals as one of the constructs that are contributing to exercise of democratic school governance, allowing for community involvement in the decision-making process concerning the organization and the running of schools. It discusses different forms of appointment to the post of principal and its implications for the development of the activities and the success of the school, revealing that the practice of electing the principal does not guarantee the exercise of democratic governance, which should comprehend commitment to the success of the institution as the center of all actions. Keywords: Election of school principals; Democratic education governanc. Eleccion de directores escolares: avances y retrocesos en el ejercicio de la gestion democratica de la educacion Resumen: Este artculo aborda el tema de la eleccin de director escolar como una de las construcciones que viene contribuyendo al ejercicio de la gestin democrtica de la educacin, posibilitando el involucramiento de la comunidad en el proceso decisorio sobre la organizacin y el funcionamiento de la escuela. Establece una discusin sobre las diferentes formas de cubrir el cargo de director y sus implicaciones para el desempeo de las actividades y el xito de la escuela, develando que la prctica de la eleccin del director no garantiza el ejercicio de la gestin democrtica, en la cual el compromiso con el xito de la institucin debe estar en el centro del las acciones. Palabras clave: Eleccin de directores escolares; Gestin democrtica de la educacin

REFERNCIASBOBBIO, N. O futuro da democracia. So Paulo: Paz e Terra, 2000. BORDIGNON, G. Democratizao e descentralizao: polticas e prticas. Revist