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Ementa e Acórdão 05/03/2015 PLENÁRIO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 586.224 SÃO PAULO RELATOR :MIN. LUIZ FUX RECTE.(S) : ESTADO DE SÃO PAULO PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SÃO PAULO RECTE.(S) : SINDICATO DA INDÚSTRIA DA FABRICAÇÃO DO ÁLCOOL DO ESTADO DE SÃO PAULO - SIFAESP ADV.(A/S) : ÂNGELA MARIA DA MOTTA PACHECO E OUTRO(A/S) RECDO.(A/S) : CÂMARA MUNICIPAL DE PAULÍNIA ADV.(A/S) : FRANCISCO ANTONIO MIRANDA RODRIGUEZ E OUTRO(A/S) RECDO.(A/S) : MUNICÍPIO DE PAULÍNIA PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO MUNICÍPIO DE PAULÍNIA EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO EM AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE ESTADUAL. LIMITES DA COMPETÊNCIA MUNICIPAL. LEI MUNICIPAL QUE PROÍBE A QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-AÇÚCAR E O USO DO FOGO EM ATIVIDADES AGRÍCOLAS. LEI MUNICIPAL Nº 1.952, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1995, DO MUNICÍPIO DE PAULÍNIA. RECONHECIDA REPERCUSSÃO GERAL. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 23, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO, Nº 14, 192, § 1º E 193, XX E XXI, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SÃO PAULO E ARTIGOS 23, VI E VII, 24, VI E 30, I E II DA CRFB. 1. O Município é competente para legislar sobre meio ambiente com União e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja e harmônico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI c/c 30, I e II da CRFB). 2. O Judiciário está inserido na sociedade e, por este motivo, deve estar atento também aos seus anseios, no sentido de ter em mente o objetivo de saciar as necessidades, visto que também é um serviço público. Supremo Tribunal Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n° 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento pode ser acessado no endereço eletrônico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número 8046321. Supremo Tribunal Federal Supremo Tribunal Federal Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 75

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  • Ementa e Acrdo

    05/03/2015 PLENRIO

    RECURSO EXTRAORDINRIO 586.224 SO PAULO

    RELATOR : MIN. LUIZ FUXRECTE.(S) :ESTADO DE SO PAULO PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SO PAULO RECTE.(S) :SINDICATO DA INDSTRIA DA FABRICAO DO

    LCOOL DO ESTADO DE SO PAULO - SIFAESP ADV.(A/S) :NGELA MARIA DA MOTTA PACHECO E

    OUTRO(A/S)RECDO.(A/S) :CMARA MUNICIPAL DE PAULNIA ADV.(A/S) :FRANCISCO ANTONIO MIRANDA RODRIGUEZ E

    OUTRO(A/S)RECDO.(A/S) :MUNICPIO DE PAULNIA PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO MUNICPIO DE

    PAULNIA

    EMENTA: RECURSO EXTRAORDINRIO EM AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE ESTADUAL. LIMITES DA COMPETNCIA MUNICIPAL. LEI MUNICIPAL QUE PROBE A QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-ACAR E O USO DO FOGO EM ATIVIDADES AGRCOLAS. LEI MUNICIPAL N 1.952, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1995, DO MUNICPIO DE PAULNIA. RECONHECIDA REPERCUSSO GERAL. ALEGAO DE VIOLAO AOS ARTIGOS 23, CAPUT E PARGRAFO NICO, N 14, 192, 1 E 193, XX E XXI, DA CONSTITUIO DO ESTADO DE SO PAULO E ARTIGOS 23, VI E VII, 24, VI E 30, I E II DA CRFB.

    1. O Municpio competente para legislar sobre meio ambiente com Unio e Estado, no limite de seu interesse local e desde que tal regramento seja e harmnico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, VI c/c 30, I e II da CRFB).

    2. O Judicirio est inserido na sociedade e, por este motivo, deve estar atento tambm aos seus anseios, no sentido de ter em mente o objetivo de saciar as necessidades, visto que tambm um servio pblico.

    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046321.

    Supremo Tribunal FederalSupremo Tribunal FederalInteiro Teor do Acrdo - Pgina 1 de 75

  • Ementa e Acrdo

    RE 586224 / SP

    3. In casu, porquanto inegvel contedo multidisciplinar da matria de fundo, envolvendo questes sociais, econmicas e polticas, no permitido a esta Corte se furtar de sua anlise para o estabelecimento do alcance de sua deciso. So elas: (i) a relevante diminuio progressiva e planejada da utilizao da queima de cana-de-acar; (ii) a impossibilidade do manejo de mquinas diante da existncia de reas cultivveis acidentadas; (iii) cultivo de cana em minifndios; (iv) trabalhadores com baixa escolaridade; (v) e a poluio existente independentemente da opo escolhida.

    4. Em que pese a inevitvel mecanizao total no cultivo da cana, preciso reduzir ao mximo o seu aspecto negativo. Assim, diante dos valores sopesados, editou-se uma lei estadual que cuida da forma que entende ser devida a execuo da necessidade de sua respectiva populao. Tal diploma reflete, sem dvida alguma, uma forma de compatibilizao desejvel pela sociedade, que, acrescida ao poder concedido diretamente pela Constituio, consolida de sobremaneira seu posicionamento no mundo jurdico estadual como um standard a ser observado e respeitado pelas demais unidades da federao adstritas ao Estado de So Paulo.

    5. Sob a perspectiva estritamente jurdica, interessante observar o ensinamento do eminente doutrinador Hely Lopes Meireles, segundo o qual se caracteriza pela predominncia e no pela exclusividade do interesse para o municpio, em relao ao do Estado e da Unio. Isso porque no h assunto municipal que no seja reflexamente de interesse estadual e nacional. A diferena apenas de grau, e no de substncia." (Direito Administrativo Brasileiro. So Paulo: Malheiros Editores, 1996. p. 121.)

    6. Funo precpua do municpio, que atender diretamente o cidado. Destarte, no permitida uma interpretao pelo Supremo Tribunal Federal, na qual no se reconhea o interesse do municpio em fazer com que sua populao goze de um meio ambiente equilibrado.

    7. Entretanto, impossvel identificar interesse local que fundamente a permanncia da vigncia da lei municipal, pois ambos os diplomas legislativos tm o fito de resolver a mesma necessidade social, que a

    2

    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046321.

    Supremo Tribunal Federal

    RE 586224 / SP

    3. In casu, porquanto inegvel contedo multidisciplinar da matria de fundo, envolvendo questes sociais, econmicas e polticas, no permitido a esta Corte se furtar de sua anlise para o estabelecimento do alcance de sua deciso. So elas: (i) a relevante diminuio progressiva e planejada da utilizao da queima de cana-de-acar; (ii) a impossibilidade do manejo de mquinas diante da existncia de reas cultivveis acidentadas; (iii) cultivo de cana em minifndios; (iv) trabalhadores com baixa escolaridade; (v) e a poluio existente independentemente da opo escolhida.

    4. Em que pese a inevitvel mecanizao total no cultivo da cana, preciso reduzir ao mximo o seu aspecto negativo. Assim, diante dos valores sopesados, editou-se uma lei estadual que cuida da forma que entende ser devida a execuo da necessidade de sua respectiva populao. Tal diploma reflete, sem dvida alguma, uma forma de compatibilizao desejvel pela sociedade, que, acrescida ao poder concedido diretamente pela Constituio, consolida de sobremaneira seu posicionamento no mundo jurdico estadual como um standard a ser observado e respeitado pelas demais unidades da federao adstritas ao Estado de So Paulo.

    5. Sob a perspectiva estritamente jurdica, interessante observar o ensinamento do eminente doutrinador Hely Lopes Meireles, segundo o qual se caracteriza pela predominncia e no pela exclusividade do interesse para o municpio, em relao ao do Estado e da Unio. Isso porque no h assunto municipal que no seja reflexamente de interesse estadual e nacional. A diferena apenas de grau, e no de substncia." (Direito Administrativo Brasileiro. So Paulo: Malheiros Editores, 1996. p. 121.)

    6. Funo precpua do municpio, que atender diretamente o cidado. Destarte, no permitida uma interpretao pelo Supremo Tribunal Federal, na qual no se reconhea o interesse do municpio em fazer com que sua populao goze de um meio ambiente equilibrado.

    7. Entretanto, impossvel identificar interesse local que fundamente a permanncia da vigncia da lei municipal, pois ambos os diplomas legislativos tm o fito de resolver a mesma necessidade social, que a

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    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046321.

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  • Ementa e Acrdo

    RE 586224 / SP

    manuteno de um meio ambiente equilibrado no que tange especificamente a queima da cana-de-acar.

    8. Distino entre a proibio contida na norma questionada e a eliminao progressiva disciplina na legislao estadual, que gera efeitos totalmente diversos e, caso se opte pela sua constitucionalidade, acarretar esvaziamento do comando normativo de quem competente para regular o assunto, levando ao completo descumprimento do dever deste Supremo Tribunal Federal de guardar a imperatividade da Constituio.

    9. Recurso extraordinrio conhecido e provido para declarar a inconstitucionalidade da Lei Municipal n 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Municpio de Paulnia.

    A C R D O

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sesso Plenria, sob a Presidncia do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigrficas, decidindo o tema 145 da Repercusso Geral, por maioria, vencida a Ministra Rosa Weber, em dar provimento ao recurso extraordinrio para declarar a inconstitucionalidade da Lei n 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Municpio de Paulnia/SP. Por unanimidade, o Tribunal firmou a tese de que o municpio competente para legislar sobre o meio ambiente com a Unio e Estado, no limite do seu interesse local e desde que tal regramento seja harmnico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, inciso VI, c/c 30, incisos I e II, da Constituio Federal).

    Braslia, 5 de maro de 2015.Ministro LUIZ FUX Relator Documento assinado digitalmente

    3

    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046321.

    Supremo Tribunal Federal

    RE 586224 / SP

    manuteno de um meio ambiente equilibrado no que tange especificamente a queima da cana-de-acar.

    8. Distino entre a proibio contida na norma questionada e a eliminao progressiva disciplina na legislao estadual, que gera efeitos totalmente diversos e, caso se opte pela sua constitucionalidade, acarretar esvaziamento do comando normativo de quem competente para regular o assunto, levando ao completo descumprimento do dever deste Supremo Tribunal Federal de guardar a imperatividade da Constituio.

    9. Recurso extraordinrio conhecido e provido para declarar a inconstitucionalidade da Lei Municipal n 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Municpio de Paulnia.

    A C R D O

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sesso Plenria, sob a Presidncia do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigrficas, decidindo o tema 145 da Repercusso Geral, por maioria, vencida a Ministra Rosa Weber, em dar provimento ao recurso extraordinrio para declarar a inconstitucionalidade da Lei n 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Municpio de Paulnia/SP. Por unanimidade, o Tribunal firmou a tese de que o municpio competente para legislar sobre o meio ambiente com a Unio e Estado, no limite do seu interesse local e desde que tal regramento seja harmnico com a disciplina estabelecida pelos demais entes federados (art. 24, inciso VI, c/c 30, incisos I e II, da Constituio Federal).

    Braslia, 5 de maro de 2015.Ministro LUIZ FUX Relator Documento assinado digitalmente

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    Supremo Tribunal Federal

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  • Relatrio

    05/03/2015 PLENRIO

    RECURSO EXTRAORDINRIO 586.224 SO PAULO

    RELATOR : MIN. LUIZ FUXRECTE.(S) :ESTADO DE SO PAULO PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SO PAULO RECTE.(S) :SINDICATO DA INDSTRIA DA FABRICAO DO

    LCOOL DO ESTADO DE SO PAULO - SIFAESP ADV.(A/S) :NGELA MARIA DA MOTTA PACHECO E

    OUTRO(A/S)RECDO.(A/S) :CMARA MUNICIPAL DE PAULNIA ADV.(A/S) :FRANCISCO ANTONIO MIRANDA RODRIGUEZ E

    OUTRO(A/S)RECDO.(A/S) :MUNICPIO DE PAULNIA PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO MUNICPIO DE

    PAULNIA

    R E L A T R I O

    O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR): Cuida-se de Recurso Extraordinrio, interposto pelo Estado de So Paulo, com fulcro no art. 102, III, a da Constituio da Repblica, contra deciso do rgo especial do Tribunal de Justia do mesmo Estado, no julgamento de Ao Direta de Inconstitucionalidade estadual. Eis a ementa do aresto hostilizado:

    AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL QUE PROBE A QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-ACAR E O USO DO FOGO EM ATIVIDADES AGRCOLAS. COMPETNCIA MUNICIPAL RECONHECIDA APS A NFASE CONFERIDA AO MUNICPIO PELA CONSTITUIO DE 1988. INTERESSE LOCAL DO MUNICIPIO QUE NAO DIFERE DO PECULIAR INTERESSE CONSAGRADO NA ORDEM JURIDICA. AO IMPROCEDENTE.

    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046322.

    Supremo Tribunal Federal

    05/03/2015 PLENRIO

    RECURSO EXTRAORDINRIO 586.224 SO PAULO

    RELATOR : MIN. LUIZ FUXRECTE.(S) :ESTADO DE SO PAULO PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SO PAULO RECTE.(S) :SINDICATO DA INDSTRIA DA FABRICAO DO

    LCOOL DO ESTADO DE SO PAULO - SIFAESP ADV.(A/S) :NGELA MARIA DA MOTTA PACHECO E

    OUTRO(A/S)RECDO.(A/S) :CMARA MUNICIPAL DE PAULNIA ADV.(A/S) :FRANCISCO ANTONIO MIRANDA RODRIGUEZ E

    OUTRO(A/S)RECDO.(A/S) :MUNICPIO DE PAULNIA PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DO MUNICPIO DE

    PAULNIA

    R E L A T R I O

    O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR): Cuida-se de Recurso Extraordinrio, interposto pelo Estado de So Paulo, com fulcro no art. 102, III, a da Constituio da Repblica, contra deciso do rgo especial do Tribunal de Justia do mesmo Estado, no julgamento de Ao Direta de Inconstitucionalidade estadual. Eis a ementa do aresto hostilizado:

    AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI MUNICIPAL QUE PROBE A QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-ACAR E O USO DO FOGO EM ATIVIDADES AGRCOLAS. COMPETNCIA MUNICIPAL RECONHECIDA APS A NFASE CONFERIDA AO MUNICPIO PELA CONSTITUIO DE 1988. INTERESSE LOCAL DO MUNICIPIO QUE NAO DIFERE DO PECULIAR INTERESSE CONSAGRADO NA ORDEM JURIDICA. AO IMPROCEDENTE.

    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046322.

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  • Relatrio

    RE 586224 / SP

    QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-ACAR. MTODO RUDIMENTAR E PRIMITIVO, QUE PODE SER VANTAJOSAMENTE SUBSTITUDDO PELA MECANIZAO. EVOLUO JURISPRUDENCIAL DO ORGO ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTICA. PRECEDENTES QUE EVIDENCIAM ESSA EVOLUO. AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE IMPROCEDENTE.

    QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-ACAR. AVANO DECORRENTE DE NOVA POSTURA DO RGO ESPECIAL DO TJSP QUE LEVOU O SETOR A ADMITIR REDUO DO PRAZO PREVISTO PARA ELIMINAO DAS QUEIMADAS. CONSTATAO DE QUE MTODOS ARCAICOS ANTIAMBIENTAIS CONSTITUIRO BARREIRAS AO INGRESSO DO ETANOL NO PRIMEIRO MUNDO. MUDANA DE RUMO INSPIRADA POR REAO DO ESTADO-JUIZ E POR OPO PRAGMTICA. DE QUALQUER FORMA, A BENEFCIO DO MEIO AMBIENTE.

    Os usineiros lcidos e conscientes no desconhecem de que o mtodo rudimentar, primitivo e nefasto da queima da palha de cana-de-acar fator dissuasivo da aceitao o do etanol no Primeiro mundo. As barreiras ambientais podero conseguir aquilo que a educao ecolgica e uma Constituio pioneira no trato do meio ambiente ainda no obteve em termos de efetiva tutela a natureza na ptria brasileira.

    No basta produzir etanol, combustvel verde e obtido a partir de fontes renovveis, se ele chegar ao mercado do mundo civilizado eticamente contaminado pela fuligem das queimadas ou obscurecido pela acusao de que o setor sucroalcooleiro dos pases emergentes ainda se utiliza de mo-de-obra anloga de patamares inferiores aos das conquistas laborais do sculo XX.

    Na origem, a representao de inconstitucionalidade foi proposta pelo Sindicato da Indstria da Fabricao do lcool do Estado de So Paulo SIFAESP e pelo Sindicato da Indstria de Acar no Estado de So Paulo - SIAESP, impugna a Lei Municipal n 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Municpio de Paulnia, que proibiu totalmente a queima da

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    Supremo Tribunal Federal

    RE 586224 / SP

    QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-ACAR. MTODO RUDIMENTAR E PRIMITIVO, QUE PODE SER VANTAJOSAMENTE SUBSTITUDDO PELA MECANIZAO. EVOLUO JURISPRUDENCIAL DO ORGO ESPECIAL DO TRIBUNAL DE JUSTICA. PRECEDENTES QUE EVIDENCIAM ESSA EVOLUO. AO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE IMPROCEDENTE.

    QUEIMA DE PALHA DE CANA-DE-ACAR. AVANO DECORRENTE DE NOVA POSTURA DO RGO ESPECIAL DO TJSP QUE LEVOU O SETOR A ADMITIR REDUO DO PRAZO PREVISTO PARA ELIMINAO DAS QUEIMADAS. CONSTATAO DE QUE MTODOS ARCAICOS ANTIAMBIENTAIS CONSTITUIRO BARREIRAS AO INGRESSO DO ETANOL NO PRIMEIRO MUNDO. MUDANA DE RUMO INSPIRADA POR REAO DO ESTADO-JUIZ E POR OPO PRAGMTICA. DE QUALQUER FORMA, A BENEFCIO DO MEIO AMBIENTE.

    Os usineiros lcidos e conscientes no desconhecem de que o mtodo rudimentar, primitivo e nefasto da queima da palha de cana-de-acar fator dissuasivo da aceitao o do etanol no Primeiro mundo. As barreiras ambientais podero conseguir aquilo que a educao ecolgica e uma Constituio pioneira no trato do meio ambiente ainda no obteve em termos de efetiva tutela a natureza na ptria brasileira.

    No basta produzir etanol, combustvel verde e obtido a partir de fontes renovveis, se ele chegar ao mercado do mundo civilizado eticamente contaminado pela fuligem das queimadas ou obscurecido pela acusao de que o setor sucroalcooleiro dos pases emergentes ainda se utiliza de mo-de-obra anloga de patamares inferiores aos das conquistas laborais do sculo XX.

    Na origem, a representao de inconstitucionalidade foi proposta pelo Sindicato da Indstria da Fabricao do lcool do Estado de So Paulo SIFAESP e pelo Sindicato da Indstria de Acar no Estado de So Paulo - SIAESP, impugna a Lei Municipal n 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Municpio de Paulnia, que proibiu totalmente a queima da

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  • Relatrio

    RE 586224 / SP

    palha de cana-de-acar em seu territrio. O dispositivo impugnado assim prev:

    Art. 1- Fica proibido, sob qualquer forma, o emprego de fogo para fins de limpeza e preparo do solo no Municpio de Paulnia, inclusive para o preparo do plantio e para a colheita de cana-de-acar e de outras culturas.

    Em apertada sntese, alegavam os Arguentes que a norma vergastada na Representao vulnerava o art. 23, caput e p. u., art. 14, art. 192, 1, e art. 193, incisos XX e XXI, todos da Constituio do Estado de So Paulo. Transcrevo, por oportuno, os parmetros constitucionais tidos por violados, verbis:

    Artigo 23 - As leis complementares sero aprovadas pela maioria absoluta dos membros da Assemblia Legislativa, observados os demais termos da votao das leis ordinrias.

    Pargrafo nico - Para os fins deste artigo, consideram-se complementares:

    (...)14 - o Cdigo de Proteo ao Meio Ambiente;

    Artigo 192 - A execuo de obras, atividades, processos produtivos e empreendimentos e a explorao de recursos naturais de qualquer espcie, quer pelo setor pblico, quer pelo privado, sero admitidas se houver resguardo do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

    1 - A outorga de licena ambiental, por rgo, ou entidade governamental competente, integrante de sistema unificado para esse efeito, ser feita com observncia dos critrios gerais fixados em lei, alm de normas e padres estabelecidos pelo Poder Pblico e em conformidade com o planejamento e zoneamento ambientais.

    Artigo 193 - O Estado, mediante lei, criar um sistema de administrao da qualidade ambiental, proteo, controle e

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    RE 586224 / SP

    palha de cana-de-acar em seu territrio. O dispositivo impugnado assim prev:

    Art. 1- Fica proibido, sob qualquer forma, o emprego de fogo para fins de limpeza e preparo do solo no Municpio de Paulnia, inclusive para o preparo do plantio e para a colheita de cana-de-acar e de outras culturas.

    Em apertada sntese, alegavam os Arguentes que a norma vergastada na Representao vulnerava o art. 23, caput e p. u., art. 14, art. 192, 1, e art. 193, incisos XX e XXI, todos da Constituio do Estado de So Paulo. Transcrevo, por oportuno, os parmetros constitucionais tidos por violados, verbis:

    Artigo 23 - As leis complementares sero aprovadas pela maioria absoluta dos membros da Assemblia Legislativa, observados os demais termos da votao das leis ordinrias.

    Pargrafo nico - Para os fins deste artigo, consideram-se complementares:

    (...)14 - o Cdigo de Proteo ao Meio Ambiente;

    Artigo 192 - A execuo de obras, atividades, processos produtivos e empreendimentos e a explorao de recursos naturais de qualquer espcie, quer pelo setor pblico, quer pelo privado, sero admitidas se houver resguardo do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

    1 - A outorga de licena ambiental, por rgo, ou entidade governamental competente, integrante de sistema unificado para esse efeito, ser feita com observncia dos critrios gerais fixados em lei, alm de normas e padres estabelecidos pelo Poder Pblico e em conformidade com o planejamento e zoneamento ambientais.

    Artigo 193 - O Estado, mediante lei, criar um sistema de administrao da qualidade ambiental, proteo, controle e

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046322.

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  • Relatrio

    RE 586224 / SP

    desenvolvimento do meio ambiente e uso adequado dos recursos naturais, para organizar, coordenar e integrar as aes de rgos e entidades da administrao pblica direta e indireta, assegurada a participao da coletividade, com o fim de:

    XX - controlar e fiscalizar obras, atividades, processos produtivos e empreendimentos que, direta ou indiretamente, possam causar degradao do meio ambiente, adotando medidas preventivas ou corretivas e aplicando as sanes administrativas pertinentes;

    XXI - realizar o planejamento e o zoneamento ambientais, considerando as caractersticas regionais e locais, e articular os respectivos planos, programas e aes;

    O pedido foi julgado improcedente pelo Tribunal de Justia de So Paulo, sob o fundamento de que a queima de palha de cana-de-acar mtodo rudimentar e primitivo, que pode ser vantajosamente substitudo pela mecanizao, tendo sido reconhecida a competncia do Municpio para tratar do tema, pois est aumentando a proteo ao meio ambiente que foi estabelecida na Lei Federal n 6.766/79.

    Contra o decisium, o Estado de So Paulo interps recurso extraordinrio, sob a alegao de que a deciso recorrida afronta: (i) o art. 24, VI, da CRFB, que outorga competncia Unio, Estados e Distrito Federal para legislarem concorrentemente sobre proteo ao meio ambiente, e no aos Municpios; (ii) o art. 30, I e II, da CRFB, que atribui ao Municpio competncia meramente suplementar da legislao federal e estadual, desde que no contrarie a legislao estadual; (iii) o art. 23, VI e VIII, da CRFB que atribui Unio, aos Estados, Distrito Federal e Municpios competncia administrativa para proteger o meio ambiente e combater a poluio em qualquer de suas formas e fomentar a produo agropecuria e organizar o abastecimento alimentar.

    Alega-se que a legislao municipal vergastada interfere na implementao das polticas pblicas estaduais previstas na Lei estadual

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    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046322.

    Supremo Tribunal Federal

    RE 586224 / SP

    desenvolvimento do meio ambiente e uso adequado dos recursos naturais, para organizar, coordenar e integrar as aes de rgos e entidades da administrao pblica direta e indireta, assegurada a participao da coletividade, com o fim de:

    XX - controlar e fiscalizar obras, atividades, processos produtivos e empreendimentos que, direta ou indiretamente, possam causar degradao do meio ambiente, adotando medidas preventivas ou corretivas e aplicando as sanes administrativas pertinentes;

    XXI - realizar o planejamento e o zoneamento ambientais, considerando as caractersticas regionais e locais, e articular os respectivos planos, programas e aes;

    O pedido foi julgado improcedente pelo Tribunal de Justia de So Paulo, sob o fundamento de que a queima de palha de cana-de-acar mtodo rudimentar e primitivo, que pode ser vantajosamente substitudo pela mecanizao, tendo sido reconhecida a competncia do Municpio para tratar do tema, pois est aumentando a proteo ao meio ambiente que foi estabelecida na Lei Federal n 6.766/79.

    Contra o decisium, o Estado de So Paulo interps recurso extraordinrio, sob a alegao de que a deciso recorrida afronta: (i) o art. 24, VI, da CRFB, que outorga competncia Unio, Estados e Distrito Federal para legislarem concorrentemente sobre proteo ao meio ambiente, e no aos Municpios; (ii) o art. 30, I e II, da CRFB, que atribui ao Municpio competncia meramente suplementar da legislao federal e estadual, desde que no contrarie a legislao estadual; (iii) o art. 23, VI e VIII, da CRFB que atribui Unio, aos Estados, Distrito Federal e Municpios competncia administrativa para proteger o meio ambiente e combater a poluio em qualquer de suas formas e fomentar a produo agropecuria e organizar o abastecimento alimentar.

    Alega-se que a legislao municipal vergastada interfere na implementao das polticas pblicas estaduais previstas na Lei estadual

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  • Relatrio

    RE 586224 / SP

    n 11.241/02, que dispe sobre a eliminao do uso do fogo como mtodo despalhador e facilitador do corte da cana-de-acar e estabelece um cronograma para a cessao do mtodo da queima da palha da cana-de-acar, incorrendo, portanto, em vcio formal de inconstitucionalidade.

    Para o Estado de So Paulo, a Resoluo n 237/97 do CONAMA no atribuiria competncia administrativa aos Municpios para tratar do assunto. Sustenta que a Lei Municipal prejudica a economia do Estado e atrapalha o controle ambiental da atividade, tornando impraticvel as colheitas anuais que se estendem at o final do ciclo de produo do canavial.

    Aduz que as consequncias prticas da proibio pura e simples da queima da palha da cana transcendem os limites dos interesses do Municpio de Paulnia, afetando a ordem econmica estadual, a arrecadao tributria do Estado e gerando abalo social decorrente da dispensa de empregados do setor canavieiro e do desemprego.

    Todos os produtores, segundo relata, teriam de adquirir mquinas colhedoras, tratores e transbordos, alm de substituir as carrocerias de caminhes, que transportavam a cana inteira, por carrocerias prprias para cana picada, bem como adaptar o solo e a forma de plantao da cana. Registra que, como a vida de uma plantao varia de cinco a oito anos, nesse nterim seria impossvel a substituio pela colheita mecanizvel. As indstrias tambm seriam afetadas, j que, no recebendo o seu insumo, a cana-de-acar, deixaro de pagar os produtores de cana. A produo de acar e lcool restaria, em razo desse quadro, comprometida.

    O Sindicato da Indstria da Fabricao do lcool do Estado de So Paulo SIFAESP e o Sindicato da Indstria de Acar no Estado de So Paulo SIAESP tambm interpuseram recurso extraordinrio. Sustentam que o acrdo recorrido merece ser anulado, pois o Tribunal de Justia

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    RE 586224 / SP

    n 11.241/02, que dispe sobre a eliminao do uso do fogo como mtodo despalhador e facilitador do corte da cana-de-acar e estabelece um cronograma para a cessao do mtodo da queima da palha da cana-de-acar, incorrendo, portanto, em vcio formal de inconstitucionalidade.

    Para o Estado de So Paulo, a Resoluo n 237/97 do CONAMA no atribuiria competncia administrativa aos Municpios para tratar do assunto. Sustenta que a Lei Municipal prejudica a economia do Estado e atrapalha o controle ambiental da atividade, tornando impraticvel as colheitas anuais que se estendem at o final do ciclo de produo do canavial.

    Aduz que as consequncias prticas da proibio pura e simples da queima da palha da cana transcendem os limites dos interesses do Municpio de Paulnia, afetando a ordem econmica estadual, a arrecadao tributria do Estado e gerando abalo social decorrente da dispensa de empregados do setor canavieiro e do desemprego.

    Todos os produtores, segundo relata, teriam de adquirir mquinas colhedoras, tratores e transbordos, alm de substituir as carrocerias de caminhes, que transportavam a cana inteira, por carrocerias prprias para cana picada, bem como adaptar o solo e a forma de plantao da cana. Registra que, como a vida de uma plantao varia de cinco a oito anos, nesse nterim seria impossvel a substituio pela colheita mecanizvel. As indstrias tambm seriam afetadas, j que, no recebendo o seu insumo, a cana-de-acar, deixaro de pagar os produtores de cana. A produo de acar e lcool restaria, em razo desse quadro, comprometida.

    O Sindicato da Indstria da Fabricao do lcool do Estado de So Paulo SIFAESP e o Sindicato da Indstria de Acar no Estado de So Paulo SIAESP tambm interpuseram recurso extraordinrio. Sustentam que o acrdo recorrido merece ser anulado, pois o Tribunal de Justia

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    RE 586224 / SP

    julgou a compatibilidade da norma municipal direta e unicamente em face da Constituio da Repblica, algo que vedado em sede de controle abstrato estadual. Lembram que, na ADI 347, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 74, XI, da Constituio do Estado de So Paulo, que previa a possibilidade de representao de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo municipal, contestado em face da Constituio Federal. Neste aspecto, o Tribunal de Justia de So Paulo teria inobservado o art. 125, 2, da Lei Maior, onde est a diretriz da competncia dos Estados para a instituio de representao de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituio Estadual.

    Por outro lado, os recorrentes apontam violao aos artigos 24, VI, e 30, I e II, da Constituio da Repblica, na medida em que o Municpio carece de competncia para editar lei que proba a queima de palha de cana-de-acar. Anota que esta Corte, no julgamento da ADI 2.142-7, rel. Min. Moreira Alves, DJ 09.02.01, j entendeu que no cabe aos Municpios legislar sobre meio ambiente, por fora do aludido art. 24, VI, da CRFB.

    Invocaram o precedente da ADI 2.396/MS, rel. Min. Ellen Gracie, que questionava a Lei estadual n 2.210/01, do Mato Grosso do Sul, que dispunha sobre a proibio da comercializao de amianto e produtos base de amianto no territrio daquele Estado, sendo que a Lei Federal n 9.055/95 j tratava do tema em mbito federal.

    Pedem, ao final, o reconhecimento da nulidade do julgamento da ADI estadual n 129.132-0, e a reforma do acrdo recorrido, para declarar a inconstitucionalidade do art. 1 da Lei n 1.952/95 do Municpio de Paulnia.

    A Cmara Municipal do Municpio de Paulnia apresentou contrarrazes, no sentido de que:

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    RE 586224 / SP

    julgou a compatibilidade da norma municipal direta e unicamente em face da Constituio da Repblica, algo que vedado em sede de controle abstrato estadual. Lembram que, na ADI 347, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 74, XI, da Constituio do Estado de So Paulo, que previa a possibilidade de representao de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo municipal, contestado em face da Constituio Federal. Neste aspecto, o Tribunal de Justia de So Paulo teria inobservado o art. 125, 2, da Lei Maior, onde est a diretriz da competncia dos Estados para a instituio de representao de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos estaduais ou municipais em face da Constituio Estadual.

    Por outro lado, os recorrentes apontam violao aos artigos 24, VI, e 30, I e II, da Constituio da Repblica, na medida em que o Municpio carece de competncia para editar lei que proba a queima de palha de cana-de-acar. Anota que esta Corte, no julgamento da ADI 2.142-7, rel. Min. Moreira Alves, DJ 09.02.01, j entendeu que no cabe aos Municpios legislar sobre meio ambiente, por fora do aludido art. 24, VI, da CRFB.

    Invocaram o precedente da ADI 2.396/MS, rel. Min. Ellen Gracie, que questionava a Lei estadual n 2.210/01, do Mato Grosso do Sul, que dispunha sobre a proibio da comercializao de amianto e produtos base de amianto no territrio daquele Estado, sendo que a Lei Federal n 9.055/95 j tratava do tema em mbito federal.

    Pedem, ao final, o reconhecimento da nulidade do julgamento da ADI estadual n 129.132-0, e a reforma do acrdo recorrido, para declarar a inconstitucionalidade do art. 1 da Lei n 1.952/95 do Municpio de Paulnia.

    A Cmara Municipal do Municpio de Paulnia apresentou contrarrazes, no sentido de que:

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    RE 586224 / SP

    (a) o Tribunal de Justia pode aferir a compatibilidade da Lei Municipal em face da Constituio da Repblica;

    (b) o Municpio legislou com base nos poderes conferidos pelo art. 23, VI, e 30, I e II, da CRFB, visto que apenas editou norma suplementar ao ordenamento federal e estadual, sobre assunto de interesse local;

    (c) o art. 27 do Cdigo Florestal dispe que proibido o uso de fogo nas florestas e demais formas de vegetao, e seu pargrafo nico prev uma exceo pontual, rezando que Se peculiaridades locais ou regionais justificarem o emprego do fogo em prticas agropastoris ou florestais, a permisso ser estabelecida em ato do Poder Pblico, circunscrevendo as reas e estabelecendo normas de precauo, o que evidenciaria que a Lei municipal vergastada no afronta a legislao federal;

    (d) a queima da palha da cana-de-acar tambm importa em prejuzos econmicos, pois obriga a populao a aumentar o consumo de gua no perodo da safra, com a finalidade de manter a limpeza das casas, alm de gastos com medicamentos com as alergias respiratrias;

    (e) a Lei estadual n 11.241/02 prev a reduo gradual da queima da cana-de-acar, dispondo sobre a extino do mtodo apenas para o ano de 2.031, o que no atende s necessidades locais do Municpio de Paulnia;

    (f) alm do Cdigo Florestal, outros diplomas federais serviriam de supedneo para a Lei municipal, como o art. 38 da Lei de Contravenes Penais, que prev a contraveno de Provocar, abusivamente, emisso de fumaa, vapor ou gs, que possa ofender ou molestar algum, e a Lei Federal n 6.938/81, que dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente, cujo art. 3, III, define a poluio como a degradao da qualidade ambiental resultante de atividade que direta ou indiretamente prejudique a sade, a segurana e o bem-estar da populao, crie condies adversas s

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    (a) o Tribunal de Justia pode aferir a compatibilidade da Lei Municipal em face da Constituio da Repblica;

    (b) o Municpio legislou com base nos poderes conferidos pelo art. 23, VI, e 30, I e II, da CRFB, visto que apenas editou norma suplementar ao ordenamento federal e estadual, sobre assunto de interesse local;

    (c) o art. 27 do Cdigo Florestal dispe que proibido o uso de fogo nas florestas e demais formas de vegetao, e seu pargrafo nico prev uma exceo pontual, rezando que Se peculiaridades locais ou regionais justificarem o emprego do fogo em prticas agropastoris ou florestais, a permisso ser estabelecida em ato do Poder Pblico, circunscrevendo as reas e estabelecendo normas de precauo, o que evidenciaria que a Lei municipal vergastada no afronta a legislao federal;

    (d) a queima da palha da cana-de-acar tambm importa em prejuzos econmicos, pois obriga a populao a aumentar o consumo de gua no perodo da safra, com a finalidade de manter a limpeza das casas, alm de gastos com medicamentos com as alergias respiratrias;

    (e) a Lei estadual n 11.241/02 prev a reduo gradual da queima da cana-de-acar, dispondo sobre a extino do mtodo apenas para o ano de 2.031, o que no atende s necessidades locais do Municpio de Paulnia;

    (f) alm do Cdigo Florestal, outros diplomas federais serviriam de supedneo para a Lei municipal, como o art. 38 da Lei de Contravenes Penais, que prev a contraveno de Provocar, abusivamente, emisso de fumaa, vapor ou gs, que possa ofender ou molestar algum, e a Lei Federal n 6.938/81, que dispe sobre a Poltica Nacional do Meio Ambiente, cujo art. 3, III, define a poluio como a degradao da qualidade ambiental resultante de atividade que direta ou indiretamente prejudique a sade, a segurana e o bem-estar da populao, crie condies adversas s

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    RE 586224 / SP

    atividades sociais e econmicas, afete desfavoravelmente a biota, as condies estticas ou sanitrias do meio-ambiente, ou lance matrias ou energia em desacordo com os padres ambientais estabelecidos;

    (g) as queimadas so responsveis por boa parte das mortes dos cortadores por meio da inalao de gases cancergenos;

    (h) no AgRg no AI n 377.119, rel. Min. Nelson Jobim, 2 Turma, julgado em 06/08/2002, o STF teria entendido que a queima da palha da cana-de-acar causa danos ao meio ambiente.

    A Municipalidade de Paulnia tambm apresentou contrarrazes, sustentando, em preliminar, inadmissibilidade do Recurso Extraordinrio em virtude da no especificao dos dispositivos constitucionais violados, bem como da ausncia de prequestionamento.

    Em seu parecer, o Ministrio Pblico Federal manifestou-se pela nulidade do julgado ora atacado, porquanto o controle de constitucionalidade realizado foi em face da Constituio da Repblica e no a do Estado de So Paulo. Quanto ao mrito, pelo provimento do recurso, na medida em que os Municpios no teriam competncia para legislar sobre questes ambientais de interesse local e sobre a poltica de desenvolvimento e planejamento urbano (art. 30, I, II e VIII, 124, 2, da CRFB).

    A Repercusso Geral foi reconhecida (fls. 798).

    Aps a manifestao de diversos rgos especializados na matria ambiental, foi realizada audincia pblica, haja vista o caso extrapolar os limites jurdicos, envolvendo tambm questes ambientais, polticas, econmicas e sociais.

    Dentre tantas informaes valiosssimas e elementos extrajurdicos

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    RE 586224 / SP

    atividades sociais e econmicas, afete desfavoravelmente a biota, as condies estticas ou sanitrias do meio-ambiente, ou lance matrias ou energia em desacordo com os padres ambientais estabelecidos;

    (g) as queimadas so responsveis por boa parte das mortes dos cortadores por meio da inalao de gases cancergenos;

    (h) no AgRg no AI n 377.119, rel. Min. Nelson Jobim, 2 Turma, julgado em 06/08/2002, o STF teria entendido que a queima da palha da cana-de-acar causa danos ao meio ambiente.

    A Municipalidade de Paulnia tambm apresentou contrarrazes, sustentando, em preliminar, inadmissibilidade do Recurso Extraordinrio em virtude da no especificao dos dispositivos constitucionais violados, bem como da ausncia de prequestionamento.

    Em seu parecer, o Ministrio Pblico Federal manifestou-se pela nulidade do julgado ora atacado, porquanto o controle de constitucionalidade realizado foi em face da Constituio da Repblica e no a do Estado de So Paulo. Quanto ao mrito, pelo provimento do recurso, na medida em que os Municpios no teriam competncia para legislar sobre questes ambientais de interesse local e sobre a poltica de desenvolvimento e planejamento urbano (art. 30, I, II e VIII, 124, 2, da CRFB).

    A Repercusso Geral foi reconhecida (fls. 798).

    Aps a manifestao de diversos rgos especializados na matria ambiental, foi realizada audincia pblica, haja vista o caso extrapolar os limites jurdicos, envolvendo tambm questes ambientais, polticas, econmicas e sociais.

    Dentre tantas informaes valiosssimas e elementos extrajurdicos

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    RE 586224 / SP

    dos diversos rgos especializados colhidos na ocasio, destaco, por oportuno, o que se segue:

    1. O Ministrio do Meio Ambiente ressaltou que a Lei n 12.651/12 (novo Cdigo Florestal) probe o uso do fogo na agricultura, mas excepciona em locais ou regies cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em prticas agropastoris ou florestais, mediante prvia aprovao do rgo estadual ambiental competente. Neste sentido, importa observar que 62,4% da produo de cana do pas esto no Estado de So Paulo e que em suas ltimas safras h a substituio do fogo pela colheita mecanizada, sendo certo que a partir de 2006, quando o uso do fogo comeou a diminuir consideravelmente. Em Paulnia, especificamente, 26% da cana era colhida sem o uso do fogo em 2006, enquanto que em 2011 esse nmero subiu para 70%. Relatou ainda que 80.000 trabalhadores tiveram sua fora de trabalho substituda na colheita da cana. Em contrapartida, o custo de produo diminui 25% com a colheita mecanizada. Portanto, sugere o controle ambiental adequado pelos rgos de fiscalizao competentes, quando o uso do fogo se fizer necessrio.

    2. J a EMBRAPA chama ateno que, embora os danos ao meio ambiente com a queimada ou a utilizao de mquinas sejam equivalentes, a produo de cana 25% maior sem a queimada. Desta forma, se resolvido o problema da compactao do solo, desejvel a eliminao do mtodo da queima.

    3. No concernente questo prtica do cultivo, a COAGRO informa que ofereceu curso de qualificao para os seus cooperados operarem as mquinas, mas a qualificao desses trabalhadores muito baixa, dificultando o aproveitamento na prpria atividade. Por isso, necessrio certo perodo de tempo para sua alfabetizao, antes de qualificados para serem reinseridos na atividade. Sob o ponto de vista do cultivo em si, preciso atentar para o fato de que muito difcil manobrar as maquinas

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    dos diversos rgos especializados colhidos na ocasio, destaco, por oportuno, o que se segue:

    1. O Ministrio do Meio Ambiente ressaltou que a Lei n 12.651/12 (novo Cdigo Florestal) probe o uso do fogo na agricultura, mas excepciona em locais ou regies cujas peculiaridades justifiquem o emprego do fogo em prticas agropastoris ou florestais, mediante prvia aprovao do rgo estadual ambiental competente. Neste sentido, importa observar que 62,4% da produo de cana do pas esto no Estado de So Paulo e que em suas ltimas safras h a substituio do fogo pela colheita mecanizada, sendo certo que a partir de 2006, quando o uso do fogo comeou a diminuir consideravelmente. Em Paulnia, especificamente, 26% da cana era colhida sem o uso do fogo em 2006, enquanto que em 2011 esse nmero subiu para 70%. Relatou ainda que 80.000 trabalhadores tiveram sua fora de trabalho substituda na colheita da cana. Em contrapartida, o custo de produo diminui 25% com a colheita mecanizada. Portanto, sugere o controle ambiental adequado pelos rgos de fiscalizao competentes, quando o uso do fogo se fizer necessrio.

    2. J a EMBRAPA chama ateno que, embora os danos ao meio ambiente com a queimada ou a utilizao de mquinas sejam equivalentes, a produo de cana 25% maior sem a queimada. Desta forma, se resolvido o problema da compactao do solo, desejvel a eliminao do mtodo da queima.

    3. No concernente questo prtica do cultivo, a COAGRO informa que ofereceu curso de qualificao para os seus cooperados operarem as mquinas, mas a qualificao desses trabalhadores muito baixa, dificultando o aproveitamento na prpria atividade. Por isso, necessrio certo perodo de tempo para sua alfabetizao, antes de qualificados para serem reinseridos na atividade. Sob o ponto de vista do cultivo em si, preciso atentar para o fato de que muito difcil manobrar as maquinas

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    RE 586224 / SP

    nos minifndios, e que sua utilizao exige uma srie de padronizaes impossveis de cumprir em curto prazo. Ento a eliminao da queima precisa ser gradativa.

    4. A ORPLANA sustenta que o agricultor no ter condies de manter a sua propriedade com a colheita mecanizada. E com isto, os agricultores tm arrendado as suas terras e sado da atividade, porque as mquinas no funcionam em pequenas propriedades. Assim, h um processo de reforma agrria ao contrrio, pois ou os pequenos produtores se agrupam, ou esto fora do setor.

    5. A UNIDA alerta que 61% da rea de cultivo de cana em Pernambuco e Alagoas os maiores produtores do Nordeste no comporta a colheita mecanizada por conta de sua topografia. Aponta ainda que a proibio da queima extinguir duzentos e dezoito mil postos de trabalho e vinte e dois mil pequenos proprietrios, sendo grande parte dos produtores inseridos no regime de economia familiar. Por fim, afirma que 32% dos trabalhadores so analfabetos, o que exigiria tempo para sua qualificao, alm de inexistir outra opo de cultura para substituir a cana, haja vista a irregularidade de precipitao e a topografia acidentada tpicos da regio. Sendo assim, o corte da cana crua deve ser gradual e apenas em reas onde possvel a colheita mecanizada, restando inalteradas as demais reas.

    6. A Esalq/USP afirma que 20% dos trabalhadores agrcolas do Brasil esto na atividade da cana. Porm, com a baixa escolaridade e a irreversvel mecanizao, restringe-se muito a sua reinsero no mercado de trabalho formal. Portanto, a mecanizao deve ser gradativa.

    7. A ASCANA exps que h o desenvolvimento de uma tecnologia que diminua o processo erosivo da terra, mas no imediatamente. Tambm informou sobre o impacto da queima da cana na sade do trabalhador, concluindo que a concentrao de agentes qumicos nesta

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    nos minifndios, e que sua utilizao exige uma srie de padronizaes impossveis de cumprir em curto prazo. Ento a eliminao da queima precisa ser gradativa.

    4. A ORPLANA sustenta que o agricultor no ter condies de manter a sua propriedade com a colheita mecanizada. E com isto, os agricultores tm arrendado as suas terras e sado da atividade, porque as mquinas no funcionam em pequenas propriedades. Assim, h um processo de reforma agrria ao contrrio, pois ou os pequenos produtores se agrupam, ou esto fora do setor.

    5. A UNIDA alerta que 61% da rea de cultivo de cana em Pernambuco e Alagoas os maiores produtores do Nordeste no comporta a colheita mecanizada por conta de sua topografia. Aponta ainda que a proibio da queima extinguir duzentos e dezoito mil postos de trabalho e vinte e dois mil pequenos proprietrios, sendo grande parte dos produtores inseridos no regime de economia familiar. Por fim, afirma que 32% dos trabalhadores so analfabetos, o que exigiria tempo para sua qualificao, alm de inexistir outra opo de cultura para substituir a cana, haja vista a irregularidade de precipitao e a topografia acidentada tpicos da regio. Sendo assim, o corte da cana crua deve ser gradual e apenas em reas onde possvel a colheita mecanizada, restando inalteradas as demais reas.

    6. A Esalq/USP afirma que 20% dos trabalhadores agrcolas do Brasil esto na atividade da cana. Porm, com a baixa escolaridade e a irreversvel mecanizao, restringe-se muito a sua reinsero no mercado de trabalho formal. Portanto, a mecanizao deve ser gradativa.

    7. A ASCANA exps que h o desenvolvimento de uma tecnologia que diminua o processo erosivo da terra, mas no imediatamente. Tambm informou sobre o impacto da queima da cana na sade do trabalhador, concluindo que a concentrao de agentes qumicos nesta

    10

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046322.

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  • Relatrio

    RE 586224 / SP

    operao est abaixo dos limites de tolerncia exigidos pela legislao pertinente.

    8. O Ministrio do Trabalho alerta para o risco de doenas cardacas e ergonmicas devido ao tipo de atividade exercida pelo trabalhador.

    9. O INPE demonstra muitos dados sobre mapeamento via satlite das reas de cana. possvel verificar a gradual mecanizao do cultivo da cana, ressaltando que Paulnia detm pouca rea dedicada ao cultivo da cana, sendo que 80% no apresentam queima.

    10. Os Instituto de Estudos Avanados da USP - IEA e Instituto Tecnolgico Vale ITV demonstraram que no havendo queima, o apodrecimento da cana gera gs metano, que muito mais prejudicial ao meio ambiente, pois gera o efeito estufa.

    11. A ASSOMOGI assevera que a poluio causada pelo ser humano pelo simples fato dele existir, independente de sua atividade. Portanto, com a proibio da queima, surgiriam ervas daninhas, haveria uso de pesticidas e fungicidas, que tambm causam poluio.

    12. A SINDACAR lembra que a exposio ao calor do trabalhador agrcola no se restringe ao cultivo da cana e esclarece que 90% das reas de cultivo de cana no Estado de Pernambuco tm o declive com mais de 12%, inviabilizando o uso das mquinas. Com eventual proibio, extinguir-se-ia a produo local.

    13. SIFACAR e SIFAEG apontam que apenas quatro fbricas no pas produzem as colheitadeiras de cana e nenhuma est apta a atua com declive acima dos 12%, alm de no haver capacidade de fornecimento imediato para satisfazer toda demanda.

    14. Para o Ministrio Pblico Federal, as consequncias do cultivo da

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    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046322.

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    RE 586224 / SP

    operao est abaixo dos limites de tolerncia exigidos pela legislao pertinente.

    8. O Ministrio do Trabalho alerta para o risco de doenas cardacas e ergonmicas devido ao tipo de atividade exercida pelo trabalhador.

    9. O INPE demonstra muitos dados sobre mapeamento via satlite das reas de cana. possvel verificar a gradual mecanizao do cultivo da cana, ressaltando que Paulnia detm pouca rea dedicada ao cultivo da cana, sendo que 80% no apresentam queima.

    10. Os Instituto de Estudos Avanados da USP - IEA e Instituto Tecnolgico Vale ITV demonstraram que no havendo queima, o apodrecimento da cana gera gs metano, que muito mais prejudicial ao meio ambiente, pois gera o efeito estufa.

    11. A ASSOMOGI assevera que a poluio causada pelo ser humano pelo simples fato dele existir, independente de sua atividade. Portanto, com a proibio da queima, surgiriam ervas daninhas, haveria uso de pesticidas e fungicidas, que tambm causam poluio.

    12. A SINDACAR lembra que a exposio ao calor do trabalhador agrcola no se restringe ao cultivo da cana e esclarece que 90% das reas de cultivo de cana no Estado de Pernambuco tm o declive com mais de 12%, inviabilizando o uso das mquinas. Com eventual proibio, extinguir-se-ia a produo local.

    13. SIFACAR e SIFAEG apontam que apenas quatro fbricas no pas produzem as colheitadeiras de cana e nenhuma est apta a atua com declive acima dos 12%, alm de no haver capacidade de fornecimento imediato para satisfazer toda demanda.

    14. Para o Ministrio Pblico Federal, as consequncias do cultivo da

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  • Relatrio

    RE 586224 / SP

    cana esto sendo suportadas pela sociedade, no pelos empreendedores. A atividade precisa incorporar seus custos ambientais e sociais.

    Instado a se pronunciar novamente nos autos, o Parquet Federal entende que o Tribunal de Justia de So Paulo incorreu em error in procedendo ao examinar a compatibilidade da Lei Municipal em face da Constituio da Repblica, o que exigiria a anulao do acrdo, devendo outro ser proferido, limitando-se a aferir a constitucionalidade da norma municipal em face da Constituio estadual. Caso ultrapassada a preliminar, opina pelo provimento dos recursos, visto que, com base em precedentes da Casa (RE 280.795 e RE 280.867), a competncia dos Municpios para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I, CRFB) deve ser exercida sem contrariar a legislao ambiental dos Estados e da Unio, que detm competncia concorrente para normatizar o Direito Ambiental (art. 24, VI, CRFB).

    o relatrio.

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    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046322.

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    RE 586224 / SP

    cana esto sendo suportadas pela sociedade, no pelos empreendedores. A atividade precisa incorporar seus custos ambientais e sociais.

    Instado a se pronunciar novamente nos autos, o Parquet Federal entende que o Tribunal de Justia de So Paulo incorreu em error in procedendo ao examinar a compatibilidade da Lei Municipal em face da Constituio da Repblica, o que exigiria a anulao do acrdo, devendo outro ser proferido, limitando-se a aferir a constitucionalidade da norma municipal em face da Constituio estadual. Caso ultrapassada a preliminar, opina pelo provimento dos recursos, visto que, com base em precedentes da Casa (RE 280.795 e RE 280.867), a competncia dos Municpios para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30, I, CRFB) deve ser exercida sem contrariar a legislao ambiental dos Estados e da Unio, que detm competncia concorrente para normatizar o Direito Ambiental (art. 24, VI, CRFB).

    o relatrio.

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    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046322.

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  • Voto - MIN. LUIZ FUX

    05/03/2015 PLENRIO

    RECURSO EXTRAORDINRIO 586.224 SO PAULO

    V O T O

    O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR): Senhor Presidente, Ilustres pares, o Recurso Extraordinrio ora analisado representa a controvrsia relativa possibilidade de Lei Municipal proibir a utilizao do fogo como mtodo despalhador no cultivo de cana-de-acar.

    Conforme impem as regras processuais, inicio estas razes pela anlise das preliminares suscitadas pelas partes. Sendo assim, cumpre aferir se o Tribunal de Justia de So Paulo realmente desbordou da sua competncia, apreciando a constitucionalidade de Lei Municipal em face da Constituio Federal.

    Deveras, muito embora encontradas em diversas as citaes de dispositivos da Constituio Federal. Importa observar, no entanto, que o voto vencedor, em seu fundamento, analisou efetivamente cada dispositivo suscitado na Ao Direta de Inconstitucionalidade a nvel Estadual, conforme destacado a seguir:

    Cabe examinar, na seqncia, as pontuais alegaes de inconstitucionalidade por parte do artigo 1, da lei 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Municpio de Paulnia, por afrontar aos artigos 23, pargrafo nico, n 14, 192, pargrafo 1, e 193, incisos XX e XXI, da Constituio do Estado.

    (...)7. preciso, no entanto, como insistentemente

    ressaltado, ter presente que a Constituio Estadual ajusta-se a tal entender, no inibindo a legislao e a atuao municipais, ao contrrio, priorizando-as em atividade conjugada. Fundamental, nesse sentido, o artigo 191, da Constituio do Estado de So Paulo Textualmente essa norma

    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046323.

    Supremo Tribunal Federal

    05/03/2015 PLENRIO

    RECURSO EXTRAORDINRIO 586.224 SO PAULO

    V O T O

    O SENHOR MINISTRO LUIZ FUX (RELATOR): Senhor Presidente, Ilustres pares, o Recurso Extraordinrio ora analisado representa a controvrsia relativa possibilidade de Lei Municipal proibir a utilizao do fogo como mtodo despalhador no cultivo de cana-de-acar.

    Conforme impem as regras processuais, inicio estas razes pela anlise das preliminares suscitadas pelas partes. Sendo assim, cumpre aferir se o Tribunal de Justia de So Paulo realmente desbordou da sua competncia, apreciando a constitucionalidade de Lei Municipal em face da Constituio Federal.

    Deveras, muito embora encontradas em diversas as citaes de dispositivos da Constituio Federal. Importa observar, no entanto, que o voto vencedor, em seu fundamento, analisou efetivamente cada dispositivo suscitado na Ao Direta de Inconstitucionalidade a nvel Estadual, conforme destacado a seguir:

    Cabe examinar, na seqncia, as pontuais alegaes de inconstitucionalidade por parte do artigo 1, da lei 1.952, de 20 de dezembro de 1995, do Municpio de Paulnia, por afrontar aos artigos 23, pargrafo nico, n 14, 192, pargrafo 1, e 193, incisos XX e XXI, da Constituio do Estado.

    (...)7. preciso, no entanto, como insistentemente

    ressaltado, ter presente que a Constituio Estadual ajusta-se a tal entender, no inibindo a legislao e a atuao municipais, ao contrrio, priorizando-as em atividade conjugada. Fundamental, nesse sentido, o artigo 191, da Constituio do Estado de So Paulo Textualmente essa norma

    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046323.

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  • Voto - MIN. LUIZ FUX

    RE 586224 / SP

    diz que "o Estado e os Municpios providenciaro, com a participao da coletividade, a preservao, conservao, defesa, recuperao e melhoria do meio-ambiente natural, artificial e do trabalho, atendidas as peculiaridades regionais e locais e em harmonia com o desenvolvimento social e econmico". Evidencia-se, dessa regra, reitere-se, da prpria Constituio do Estado, que, para tais prticas, Estado e Municpio (registre-se a expressa incluso deste ltimo) convergiro legislativamente, porque, caso contrrio, o contedo e a finalidade do dispositivo se mostrariam inteis Para uma real participao da coletividade e para uma real preservao, conservao, defesa, recuperao e melhoria do meio ambiente natural, artificial e do trabalho, essencial a legislao em todos os nveis, mormente, como ainda diz esse mesmo artigo 191, para o atendimento das peculiaridades locais. (grifei)

    Desse modo, mostra-se evidente a devida anlise da ao direta luz dos parmetros estabelecidos constitucionalmente, sem a alegada usurpao de competncia deste Supremo Tribunal Federal.

    de se salientar, ainda, que a utilizao da Constituio da Repblica pelo Tribunal a quo na fundamentao, em momento algum, vedada, sendo perfeitamente entendido como argumento obter dictum, pelo que no h que se falar em ilegalidade do acrdo recorrido.

    Como sabido, o art. 125, 2, da Carta Magna autoriza os Estados a instituir representao de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos municipais em face da Constituio estadual. Tal fato, conforme bem preleciona em sede doutrinria o Min. Gilmar Mendes, no deve levar ideia de que o controle de constitucionalidade da lei estadual ou municipal em face da Constituio estadual no se mostra apto a suscitar questo federal que deva, eventualmente, ser dirimida pelo Supremo Tribunal Federal (Curso de Direito Constitucional. 6 ed. So Paulo: Saraiva, 2011. p. 1433).

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    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046323.

    Supremo Tribunal Federal

    RE 586224 / SP

    diz que "o Estado e os Municpios providenciaro, com a participao da coletividade, a preservao, conservao, defesa, recuperao e melhoria do meio-ambiente natural, artificial e do trabalho, atendidas as peculiaridades regionais e locais e em harmonia com o desenvolvimento social e econmico". Evidencia-se, dessa regra, reitere-se, da prpria Constituio do Estado, que, para tais prticas, Estado e Municpio (registre-se a expressa incluso deste ltimo) convergiro legislativamente, porque, caso contrrio, o contedo e a finalidade do dispositivo se mostrariam inteis Para uma real participao da coletividade e para uma real preservao, conservao, defesa, recuperao e melhoria do meio ambiente natural, artificial e do trabalho, essencial a legislao em todos os nveis, mormente, como ainda diz esse mesmo artigo 191, para o atendimento das peculiaridades locais. (grifei)

    Desse modo, mostra-se evidente a devida anlise da ao direta luz dos parmetros estabelecidos constitucionalmente, sem a alegada usurpao de competncia deste Supremo Tribunal Federal.

    de se salientar, ainda, que a utilizao da Constituio da Repblica pelo Tribunal a quo na fundamentao, em momento algum, vedada, sendo perfeitamente entendido como argumento obter dictum, pelo que no h que se falar em ilegalidade do acrdo recorrido.

    Como sabido, o art. 125, 2, da Carta Magna autoriza os Estados a instituir representao de inconstitucionalidade de leis ou atos normativos municipais em face da Constituio estadual. Tal fato, conforme bem preleciona em sede doutrinria o Min. Gilmar Mendes, no deve levar ideia de que o controle de constitucionalidade da lei estadual ou municipal em face da Constituio estadual no se mostra apto a suscitar questo federal que deva, eventualmente, ser dirimida pelo Supremo Tribunal Federal (Curso de Direito Constitucional. 6 ed. So Paulo: Saraiva, 2011. p. 1433).

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  • Voto - MIN. LUIZ FUX

    RE 586224 / SP

    Outro ponto nodal do exame de admissibilidade do presente recurso a identificao das normas questionadas, no tocante sua natureza obrigatria de reproduo da Constituio Federal na Constituio Estadual (v.g. RE 592612 AgR/SP. Rel. Min. DIAS TOFFOLI, j. 25/06/2013).

    Quanto a este aspecto, inexiste dificuldade em observar que a reserva de competncia estadual para legislar sobre meio ambiente cumpre perfeitamente a exigncia da sistemtica aplicvel, porquanto se encontra expressamente prevista na Carta Magna a necessidade de lei estadual para disciplinar a matria, com a respectiva obrigatoriedade, in casu, de edio um cdigo estadual do meio ambiente mediante lei complementar, como determina o art. 42 da Constituio do Estado de So Paulo1.

    Por ltimo, cabe asseverar que o recurso foi corretamente admitido tendo em vista o seu recebimento e a anlise da reconhecida repercusso geral por esta Corte, conforme se verifica a partir da transcrio dos seguintes trechos do julgamento:

    Sob o ngulo da repercusso geral, sustenta-se a relevncia das questes constitucionais discutidas do ponto de vista econmico, jurdico e poltico, merecendo o devido crivo pelo Supremo.

    (...)Reitero o que venho consignando sobre a importncia do

    instituto da repercusso geral, devendo-se resistir tentao, no exame, de formar juzo dobre a procedncia ou a improcedncia do que revelado nas razes do extraordinrio. Cumpre encar-lo com largueza. O instrumental viabiliza a adoo de entendimento pelo Colegiado Maior, com o exerccio direito de defesa.

    1 Artigo 42 - O Estado, no exerccio da competncia prevista no artigo 24, incisos VI,

    VII e VIII, da Constituio Federal, no que couber, elaborar, atendendo suas peculiaridades,

    o Cdigo de Proteo ao Meio Ambiente, no prazo de cento e oitenta dias.

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    RE 586224 / SP

    Outro ponto nodal do exame de admissibilidade do presente recurso a identificao das normas questionadas, no tocante sua natureza obrigatria de reproduo da Constituio Federal na Constituio Estadual (v.g. RE 592612 AgR/SP. Rel. Min. DIAS TOFFOLI, j. 25/06/2013).

    Quanto a este aspecto, inexiste dificuldade em observar que a reserva de competncia estadual para legislar sobre meio ambiente cumpre perfeitamente a exigncia da sistemtica aplicvel, porquanto se encontra expressamente prevista na Carta Magna a necessidade de lei estadual para disciplinar a matria, com a respectiva obrigatoriedade, in casu, de edio um cdigo estadual do meio ambiente mediante lei complementar, como determina o art. 42 da Constituio do Estado de So Paulo1.

    Por ltimo, cabe asseverar que o recurso foi corretamente admitido tendo em vista o seu recebimento e a anlise da reconhecida repercusso geral por esta Corte, conforme se verifica a partir da transcrio dos seguintes trechos do julgamento:

    Sob o ngulo da repercusso geral, sustenta-se a relevncia das questes constitucionais discutidas do ponto de vista econmico, jurdico e poltico, merecendo o devido crivo pelo Supremo.

    (...)Reitero o que venho consignando sobre a importncia do

    instituto da repercusso geral, devendo-se resistir tentao, no exame, de formar juzo dobre a procedncia ou a improcedncia do que revelado nas razes do extraordinrio. Cumpre encar-lo com largueza. O instrumental viabiliza a adoo de entendimento pelo Colegiado Maior, com o exerccio direito de defesa.

    1 Artigo 42 - O Estado, no exerccio da competncia prevista no artigo 24, incisos VI,

    VII e VIII, da Constituio Federal, no que couber, elaborar, atendendo suas peculiaridades,

    o Cdigo de Proteo ao Meio Ambiente, no prazo de cento e oitenta dias.

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  • Voto - MIN. LUIZ FUX

    RE 586224 / SP

    (...)Na espcie, est em questionamento a atuao normativa

    da Cmara Municipal quanto ao meio ambiente. Tudo recomenda o crivo do Supremo, definindo-se o alcance da Carta da Repblica.

    Portanto, conheo do presente recurso extraordinrio e passo ao seu exame de mrito.

    A matria de fundo deste recurso versa sobre os limites da competncia legislativa do municpio quanto ao meio ambiente, que pode ser estendida para uma tentativa de identificar parmetros objetivos de limitao do conceito de interesse local frente competncia legislativa estadual.

    Entretanto, este leading case no poder ser apartado da influncia de sua soluo em diversas reas do conhecimento, que vo alm da cincia jurdica.

    Assim, cumprindo um papel assaz importante na resoluo do caso, preciso analisar todos os dados colhidos em sede de audincia pblica, de maneira a desenhar o quadro apresentado, a fim de que se possa formar um paradigma mais efetivo, em consonncia com todas as necessidades expostas, diante do seu carter ecltico e multidisciplinar, envolvendo questes sociais, econmicas e polticas inerentes ao caso.

    Apesar de j antecipado no relatrio, farei um breve resumo das principais opinies dos diversos rgos especializados que participaram da audincia, traando uma ordem direta dos fatos e consequncias que cercam a deciso.

    Basicamente, destaco que (i) j existe relevante diminuio progressiva e planejada da utilizao da queima como mtodo despalhador de cana-de-acar; (ii) a maior parte das reas nas quais

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    RE 586224 / SP

    (...)Na espcie, est em questionamento a atuao normativa

    da Cmara Municipal quanto ao meio ambiente. Tudo recomenda o crivo do Supremo, definindo-se o alcance da Carta da Repblica.

    Portanto, conheo do presente recurso extraordinrio e passo ao seu exame de mrito.

    A matria de fundo deste recurso versa sobre os limites da competncia legislativa do municpio quanto ao meio ambiente, que pode ser estendida para uma tentativa de identificar parmetros objetivos de limitao do conceito de interesse local frente competncia legislativa estadual.

    Entretanto, este leading case no poder ser apartado da influncia de sua soluo em diversas reas do conhecimento, que vo alm da cincia jurdica.

    Assim, cumprindo um papel assaz importante na resoluo do caso, preciso analisar todos os dados colhidos em sede de audincia pblica, de maneira a desenhar o quadro apresentado, a fim de que se possa formar um paradigma mais efetivo, em consonncia com todas as necessidades expostas, diante do seu carter ecltico e multidisciplinar, envolvendo questes sociais, econmicas e polticas inerentes ao caso.

    Apesar de j antecipado no relatrio, farei um breve resumo das principais opinies dos diversos rgos especializados que participaram da audincia, traando uma ordem direta dos fatos e consequncias que cercam a deciso.

    Basicamente, destaco que (i) j existe relevante diminuio progressiva e planejada da utilizao da queima como mtodo despalhador de cana-de-acar; (ii) a maior parte das reas nas quais

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  • Voto - MIN. LUIZ FUX

    RE 586224 / SP

    ocorrem o cultivo so acidentadas, impossibilitando o manejo de mquinas; (iii) grande parcela do cultivo de cana se d em minifndios; (iv) em geral, os trabalhadores tm baixa escolaridade; (v) e a poluio, independentemente da opo escolhida, sempre existir.

    Nesse passo, possvel notar a existncia de dados concretos reveladores acerca da situao da queima de cana no Estado de So Paulo. O Ministrio do Meio Ambiente ressaltou na audincia pblica que em 2006 34% da cana eram colhidos de maneira crua, ou seja, sem a queima; em 2011, 65% da cana estavam sendo colhidas sem o uso do fogo. Especificamente em Paulnia, nota-se que 73% da cana estavam sendo colhidos com a queima. De 2006 para 2011, esse dado foi para 23,7%.

    Entretanto, foi apontado que essa diminuio teve seu incio somente aps a instituio de um planejamento de eliminao da queima realizado pelo Estado de So Paulo.

    no mbito deste planejamento que tambm merece relevo a distino de seu conceito com a completa e imediata proibio. No primeiro caso, do planejamento, h uma preparao prvia perpetrada pelo poder pblico a fim de tornar concreta uma situao desejvel. De outro plano, encontra-se uma simples proibio, que identifica o problema e tenta resolv-lo, porm, sem um dimensionamento das consequncias advindas de um comando normativo simples e reto.

    Sob esse prisma, mister se faz perquirir a viabilidade da extino imediata do mtodo questionado para vislumbrar se o atual panorama tem condies de se adequar a esta nova realidade.

    Primeiramente, no se pode olvidar que o cultivo da cana-de-acar ocorre em terrenos acidentados, com inclinaes, que obstaculizam o uso de maquinrio para a colheita sem a queima. H que se atentar, igualmente, para o fato de que ainda se desenvolve tecnologia capaz de

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    Supremo Tribunal Federal

    RE 586224 / SP

    ocorrem o cultivo so acidentadas, impossibilitando o manejo de mquinas; (iii) grande parcela do cultivo de cana se d em minifndios; (iv) em geral, os trabalhadores tm baixa escolaridade; (v) e a poluio, independentemente da opo escolhida, sempre existir.

    Nesse passo, possvel notar a existncia de dados concretos reveladores acerca da situao da queima de cana no Estado de So Paulo. O Ministrio do Meio Ambiente ressaltou na audincia pblica que em 2006 34% da cana eram colhidos de maneira crua, ou seja, sem a queima; em 2011, 65% da cana estavam sendo colhidas sem o uso do fogo. Especificamente em Paulnia, nota-se que 73% da cana estavam sendo colhidos com a queima. De 2006 para 2011, esse dado foi para 23,7%.

    Entretanto, foi apontado que essa diminuio teve seu incio somente aps a instituio de um planejamento de eliminao da queima realizado pelo Estado de So Paulo.

    no mbito deste planejamento que tambm merece relevo a distino de seu conceito com a completa e imediata proibio. No primeiro caso, do planejamento, h uma preparao prvia perpetrada pelo poder pblico a fim de tornar concreta uma situao desejvel. De outro plano, encontra-se uma simples proibio, que identifica o problema e tenta resolv-lo, porm, sem um dimensionamento das consequncias advindas de um comando normativo simples e reto.

    Sob esse prisma, mister se faz perquirir a viabilidade da extino imediata do mtodo questionado para vislumbrar se o atual panorama tem condies de se adequar a esta nova realidade.

    Primeiramente, no se pode olvidar que o cultivo da cana-de-acar ocorre em terrenos acidentados, com inclinaes, que obstaculizam o uso de maquinrio para a colheita sem a queima. H que se atentar, igualmente, para o fato de que ainda se desenvolve tecnologia capaz de

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    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046323.

    Inteiro Teor do Acrdo - Pgina 20 de 75

  • Voto - MIN. LUIZ FUX

    RE 586224 / SP

    superar a dificuldade trazida pela irregularidade do solo, porm, com previso de concluso e implantao superior a (10) dez anos.

    Desta forma, sem uma tecnologia que possa atender s necessidades inerentes atividade e com a proibio imediata da queima da cana, chega-se a uma situao em que o agricultor deve forjar um novo meio de sustento. Isto quando se constata que grande quantidade da rea reservada ao plantio da cana, est tecnicamente impedida de se realizar a colheita por outra forma. Interessante notar, v. g., que no Estado de Pernambuco, um dos maiores produtores de toda regio Nordeste, 90% do cultivo se d em topografia semelhantemente acidentada.

    Por esse motivo, caso reconhea a legitimidade e/ou a constitucionalidade da proibio imediata da queima de cana, este Supremo Tribunal ter observado e entendido como razovel o impacto econmico da perda de substanciosa fatia da gerao de renda e emprego em todo pas, haja vista o reconhecimento de repercusso geral por esta Corte.

    Outro impedimento tcnico da exigncia imediata de extino do mtodo tradicional de colheita da cana tambm diz respeito rea de cultivo, pois boa parte das reas dedicadas ao cultivo da cana so minifndios, cujas dimenses so inapropriadas para manobrar colheitadeiras, o que obrigaria diversos agricultores a arrendar suas terras e deixar a atividade.

    Acrescendo a esse quadro brevemente exposto, um fator que considero ser de grande relevncia e que tem imperiosa influncia na deciso a baixa escolaridade dos trabalhadores do cultivo da cana-de-acar. Afinal, o aspecto socioeconmico no pode, de maneira alguma, ser desconsiderado no presente caso.

    Em um primeiro plano, deve-se ter em mente que a substituio do

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    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046323.

    Supremo Tribunal Federal

    RE 586224 / SP

    superar a dificuldade trazida pela irregularidade do solo, porm, com previso de concluso e implantao superior a (10) dez anos.

    Desta forma, sem uma tecnologia que possa atender s necessidades inerentes atividade e com a proibio imediata da queima da cana, chega-se a uma situao em que o agricultor deve forjar um novo meio de sustento. Isto quando se constata que grande quantidade da rea reservada ao plantio da cana, est tecnicamente impedida de se realizar a colheita por outra forma. Interessante notar, v. g., que no Estado de Pernambuco, um dos maiores produtores de toda regio Nordeste, 90% do cultivo se d em topografia semelhantemente acidentada.

    Por esse motivo, caso reconhea a legitimidade e/ou a constitucionalidade da proibio imediata da queima de cana, este Supremo Tribunal ter observado e entendido como razovel o impacto econmico da perda de substanciosa fatia da gerao de renda e emprego em todo pas, haja vista o reconhecimento de repercusso geral por esta Corte.

    Outro impedimento tcnico da exigncia imediata de extino do mtodo tradicional de colheita da cana tambm diz respeito rea de cultivo, pois boa parte das reas dedicadas ao cultivo da cana so minifndios, cujas dimenses so inapropriadas para manobrar colheitadeiras, o que obrigaria diversos agricultores a arrendar suas terras e deixar a atividade.

    Acrescendo a esse quadro brevemente exposto, um fator que considero ser de grande relevncia e que tem imperiosa influncia na deciso a baixa escolaridade dos trabalhadores do cultivo da cana-de-acar. Afinal, o aspecto socioeconmico no pode, de maneira alguma, ser desconsiderado no presente caso.

    Em um primeiro plano, deve-se ter em mente que a substituio do

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    Supremo Tribunal Federal

    Documento assinado digitalmente conforme MP n 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura de Chaves Pblicas Brasileira - ICP-Brasil. Odocumento pode ser acessado no endereo eletrnico http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o nmero 8046323.

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  • Voto - MIN. LUIZ FUX

    RE 586224 / SP

    homem pela mquina nos trabalhos de grande esforo fsico , sem dvida, uma marcha progressiva, inevitvel e desejvel, pois assim se preserva a sade do trabalhador e se obtm maior produtividade com o consequente aumento do lucro. Entretanto, preciso pensar em que medida este processo se desenvolver, a fim de acomodar da melhor forma todos os interesses juridicamente tutelados.

    A insero das colheitadeiras no plantio da cana exige mo-de-obra qualificada para oper-las. Todavia, se os trabalhadores no tm conhecimento tcnico para tanto, certo concluir que a proibio imediata dispensar os servios de muitas pessoas. Sobre o tema, vale atentar para os dados apresentados pela Dra. Mrcia Azanha Ferraz Dias de Moraes em seu estudo especfico sobre O mercado de trabalho da agroindstria canavieira: O mercado de trabalho da agroindstria canavieira desafios e oportunidades2, cujo trecho peo vnia para transcrever:

    A questo que emerge que a mecanizao da colheita altera o perfil do empregado: cria oportunidades para tratoristas, motoristas, mecnicos, condutores de colheitadeiras, tcnicos em eletrnica, dentre outros, e reduz, em maior proporo, a demanda dos empregados de baixa escolaridade (grande parte dos trabalhadores da lavoura canavieira tm poucos anos de estudo), expulsando-os da atividade. Este fato implica a necessidade de alfabetizao, qualificao e treinamento desta mo-de-obra, para estar apta a atividades que exijam maior escolaridade.

    Segundo estimativas da UNICA, sem se considerar os funcionrios envolvidos na gesto e administrao da produo, no Estado de So Paulo, entre as safras de 2006/2007 e 2020/2021, o nmero de empregados envolvidos com a produo de cana-de-acar, acar e lcool passar de 260,4 mil para 146,1 mil, ou seja, haver uma reduo de 114 mil empregos neste perodo, conforme exposto na Tabela 1.

    Observa-se que na indstria esperado um aumento de