revista vaidapé #02

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A luta pela mudança da realidade. A luta pela justiça. A luta pelo poder popular. A luta pelo fim dos muros. A luta por um transporte digno. A luta contra a violência policial. A luta pelo vinagre. A luta pelo fim das desigualdades. A luta por uma transformação radical. A luta pela livre manifestação. A luta pelas máscaras. A luta anti-sistêmica. A luta por um país honesto. A luta para mostrar que desonestidade é mais profunda que a capa do jornal. A luta pelo espaço público. A luta pelo futebol de várzea. A luta contra a especulação imobiliária. A luta através da arte. A luta para mostrar que a arte não é crime. A luta das margens. A luta dos marginalizados. A luta pela informação. A luta pela liberdade de expressão. A luta contra-hegemônica. A luta para crer: lutar é viver. O povo resiste, vai à luta e Vaidapé!

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REVISTA #02VA DAPÉ

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A luta pela mudança da realidade. A luta pela justiça. A luta pelo poder popular. A luta pelo fim dos muros.

A luta por um transporte digno. A luta contra a violência policial. A luta pelo vinagre. A luta pelo fim das desigualdades.

A luta por uma transformação radical. A luta pela livre manifestação. A luta pelas máscaras. A luta anti-sistêmica.

A luta por um país honesto. A luta para mostrar que a desonestidade é mais profunda que a capa do jornal.

A luta pelo espaço público. A luta pelo futebol de várzea. A luta contra a especulação imobiliária.

A luta através da arte. A luta para mostrar que a arte não é crime. A luta das margens. A luta dos marginalizados.

A luta pela informação. A luta pela liberdade de expressão. A luta contra-hegemônica. A luta para crer: lutar é viver.

O povo resiste, vai à luta e Vaidapé.

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Ao desistir de resistiro homem negA suA existênciA,pois A resistênciA éo princÍpio de suA essênciAdesde o inÍcio, resistindo como um vÍcio. vemos que o trAtAmento é difÍcil,então o que temo étudo isso.que o homem Aprendepor meio dA educAção, escolAs pArecem clÍnicAsde reAbilitAção,que trAnsformAm nAturezAem sociedAdee do homem tirA A cApAcidAdede entender seu estAdo livree o fAz pensArser livredA formA que ele vive.

pedro alves

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MeuTrampo

EntrEvista com toddy grafitEiro do grupo opni

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fotos joão miranda

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são Mateus. Realidade muito triste? Mas como já diziam os mestres, “há grandes que persistem”. Esse é o caso do Toddy, 29, grafiteiro e morador da comunidade de São Mateus, extremo leste da cidade

de São Paulo. Integrante do Grupo OPNI, Toddy e seus parceiros já vem desenvolvendo o grafite pela cidade de São Paulo há 17 anos e não pre-tendem parar tão cedo.

por joão reis

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recentemente visitamos sua comunidade e fomos recebidos de braços abertos pelos mo-radores da região, que de esquina em esquina – conforme íamos andando – abordavam o ar-tista e o intimavam para grafitar suas casas.

“A gente não tem que ganhar dinheiro com

essa ‘troca’ dentro da comunidade. esse é um trabalho que a gente tem que doar mesmo”. na contramão do individualismo que anda consu-mindo multidões hoje em dia é que se glori-ficam discursos como este. Toddy se sustenta com trabalhos de decoração e design assim como grande parte dos grafiteiros do grupo OPNI, que entendem que o grafite é uma ativi-dade mais espiritual do que material.

não é de se espan-tar. O grafite por si só já é uma fonte de reflexão para a socie-dade. quem trabalha todo dia e se loco-move constantemente pela cidade sabe mui-to bem o que é vol-tar cansado para casa e olhar uma parede, uma ponte, um muro, um prédio, uma car-roça e analisar aque-la informação, aquele

desenho, aquela obra prima

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que um dia foi pensada por outro ser.

enquanto muitos traba-lham tendo o dinheiro como recompensa, Toddy investe na felicidade: “Se o grafite que a gente faz muda alguma coisa, se ele repercute, a gente não sabe. eu sei que a sociedade que está imposta não me satisfaz e eu tenho

que me sentir contemplado com quem eu sou.”

Há um porém, Toddy se apegou a isso quando tro-camos ideia ali dentro do barraco dos grafiteiros: o sentimento de querer mudar é muito grande, mas sabem que não é possível partir apenas deles, do grafite. Toddy diz que sim, a sa-

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tisfação é grande por mu-dar de algum jeito, arran-car um sorriso, mas o que muda mesmo é educação, sa-neamento básico, comida na mesa. isso sim que realmen-te muda. mas o cara sabe, acima de tudo, que o bem que ele, seus amigos, sua arte, trazem a todos, no fi-nal, é recompensador.

“a gente não tem que ganhar dinheiro com essa ‘troca’ dentro da comunidade. Esse é um trabalho que a gente tem que doar mesmo”

O trampo de Toddy só traz mais alegria pra comunidade e pra todos que acabam o co-nhecendo pela cidade... fe-licidade recíproca, onde o grafiteiro dá cor, recebe e transmite alegria. No fim, só quer contemplar-se, mudar al-guma coisa, já que a coisa não anda fácil pra ninguém.

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foto gAbrielA bAtistA // fotoenquAdro

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QUAL É A SUA REVOLUÇÃO?

PESADELO DO SISTEMA

VEM PRA RUA

DESMISTIFICANDO O BRASILEIRO

OCUPADOS E INV

ISÍVEIS

JORNALIS

MO DO FU

TURO

foto drago // selvasp

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vem pra ruapor paulo motoryn

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A submissão de todas as esfe-ras da vida humana às imposições do mercado e a perpetuação de um modelo de sociedade consumista e individualista foram fatores que silenciosamente repeliram a po-pulação da ocupação dos espaços públicos e da luta política. com o desabrochar das ruas, findou-se a letargia política que cas-trava os questionamentos à forma de vida social, às instituições políticas e aos princípios filo-sóficos nascidos na Europa no sé-culo xviii e tidos como soluções definitivas para os grandes pro-blemas da humanidade.

o número cada vez maior de se-res humanos, aspirados e arras-tados pelas necessidades diretas ou indiretas da indústria, deu origem às grandes aglomerações urbanas. são as grandes cida-des, artificiais e desumanizadas, vandalizadoras e vandalizadas, o centro da questão que levou a cabo tamanha intifada pelo ter-ritório nacional.

Ao evidenciar laços complexos que unem a cena política aos in-teresses econômicos e de clas-se, em artigo recente, a filósofa marilena chauí elencou fatores que constituem são paulo como um inferno urbano. dentre eles, a indústria automobilística, que satura o trânsito e consolida a “cultura do carro”, imposição do automóvel como elemento funda-mental para a felicidade no mun-do moderno; e a máfia das empre-sas de transporte público, ponto

em junho, a cidade de são paulo desencadeou uma onda de protestos que se espalhou e ainda reverbera em todo bra-

sil. o grito das ruas por mais direitos e liberdades, que ecoa há tempos na luta da população pobre pela sobrevivência em um dos países mais desiguais do planeta, é o primeiro passo para a efetivação do povo como ator político de importância primor-dial na construção de uma país justo e sem opressões.

foto rafael mattar // selvasp

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central no diálogo sobre a implementação da tarifa zero, bandeira do movimen-to passe livre, que puxou as manifestações em são paulo.

na tarde anterior ao pri-meiro grande ato contra o aumento da tarifa do trans-porte público em são paulo, a revista vaidapé promoveu um debate na puc-sp com o pro-fessor eduardo fagnani, dou-tor em economia pela unicamp e especialista em políticas públicas, e o militante da tarifa zero caio martins, estudante de história. Ainda sem o protagonismo dos noti-ciários, a presença do mpl às vésperas de sua primeira manifestação não trouxe um

grande público ao evento, mas foi espaço de debate reflexivo e aprofundado.

A discussão refletiu a ne-cessidade de um maior ímpeto dos movimentos sociais pelo aprofundamento das trans-formações nos campos eco-nômico e social realizadas no brasil nos últimos dez anos. em acordo, o artigo de ermínia maricato, no livro “cidades rebeldes”, publi-cado pela editora boitempo no mês seguinte ao início das manifestações, ponde-ra: “nem toda melhoria das condições de vida é acessí-vel com maiores salários ou com melhor distribuição de renda. (...) dependem, fre-quentemente, de políticas públicas urbanas”.

no primeiro grande ato contra o aumento da tari-fa em são paulo, convocado pelo mpl, os manifestantes ocuparam a Avenida paulis-ta. A revolta dos motoristas e a intensa repressão poli-cial fizeram com que o pro-testo transformasse o cartão postal da cidade em cenário de uma tarde de violência. A utilização de armas não-le-tais (menos letais, já que seus danos podem ser profun-dos e até levar à morte) pela pm contra um grupo totalmente desarmado foi apenas um de-talhe para a grande impren-sa, que estampou em manchete no dia seguinte: “vândalos destroem a paulista”.

foto rafael mattar // selvasp

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A total desaprovação da imprensa aos atos em vias públicas se motivava por um suposto “vandalismo”, mas também por questões ideoló-gicas claras. o comentarista político Arnaldo Jabor, por exemplo, havia chamado os ma-nifestantes de “filhinhos de papai, arruaceiros e inú-teis” em comentário para a rádio cbn. A criminalização e desqualificação dos protes-tos pelos grandes veículos de informação mudou de sentido quando a violência policial ficou escancarada, a luta pas-sou a ganhar ainda mais força e também quando seus próprios

jornalistas foram atingidos pelo aparelho repressivo.

no entanto, a partir do momento em que a mídia passou a simpatizar com o movimen-to, alguns perigos passaram a ser concretos, como a apro-priação e transformação das

pautas colocadas em questão pelo aparelho midiático he-gemônico. Nas ruas, o reflexo já era visível: nacionalismo exacerbado e esquecimento de pautas populares, como a pró-pria questão da passagem de ônibus, colocada em segundo plano pela imprensa e pela classe média paulistana.

mesmo assim, a rua saiu vitoriosa. com um ar de constrangimento incalculá-vel, ainda no mês de junho, o prefeito fernando haddad e o governador geraldo Alck-min anunciaram, em coletiva de imprensa, a diminuição do

preço das passagens para o valor anterior: três reais.

vitória das ruas, da mobi-lização popular, da longa luta por uma cidade mais igual e humana, sem muros entre centro e periferia, sem barreiras en-tre nós e nossos sonhos.

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pesadelo do sistema

por victor santos

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As manifestações de 2013 possuem uma série de pe-culiaridades que abrem novas discussões. em grande parte dos protes-

tos ocorridos em anos anteriores, os chamados “atos de vandalismo” eram atribuídos aos manifestantes de forma geral.

A principal mudança nas cober-turas dos grandes veículos, de-pois da quinta-feira, 13 de ju-nho – dia de maior repercussão da violência policial –, foi criar uma separação entre o cidadão que protesta de forma “digna” e aque-les que promovem os “atos de van-dalismo”. tal divisão nunca foi feita por quem fazia parte dos atos. o mpl, que convocou as mani-festações, não fez essa divisão, a “baderna” também não impediu os telespectadores do programa do datena, naquele mesmo 13 de junho, de se colocarem a favor da manifestação e até mesmo os professores em greve no rio de Janeiro aprovaram, em assembleia realizada no dia 11 de outubro, apoio incondicional ao chamado black bloc.

esse período de forte movimen-tação política nas ruas brasilei-ras elucidou, para muitos, outras formas de atuar politicamente pe-rante a sociedade. A expressão que causou maior polêmica, servindo de pautas para revistas de diferen-tes linhas editoriais e promoven-do o debate, em setores conserva-dores e na militância da esquerda, foi justamente o black bloc.

segundo o pesquisador do núcleo de sociabilidade libertária (nu-sol) e professor de política da puc-sp, Acácio Augusto, o chamado black bloc não é um grupo, ideo-logia ou partido, é uma tática de atuação em manifestações que ele-ge, como alvo, símbolos ligados ao capitalismo global e não promovem a violência física, ou seja, não faz parte dessa tática atacar pes-soas. é uma atuação com viés an-ticapitalista que promove a ação direta, implementando o conceito denominado desobediência civil.

Aqueles que aderem a essa táti-ca têm a necessidade de cobrir o rosto e o corpo. em primeiro lu-gar para garantir sua integrida-de física, afinal, como ficou mais claro para uma parte da população a partir das jornadas de junho, o uso das armas chamadas “menos letais”, pela polícia militar, traz sérias consequências ao cor-po humano, seja pelo impacto de uma bala de borracha, pela ina-lação do gás tóxico de uma bomba, ou por outros danos. outro motivo de se cobrir é o fato de fazerem algo que não é tolerado pelo po-liciamento, logo, esconder o ros-to é essencial para preservação da identidade.

A origem dos black blocs está no movimento autonomista alemão da década de 1970 e sua atuação na Alemanha ocidental com a cria-ção de regiões autônomas, ocupan-do espaços vazios com aglomera-ções humanas, com funcionamento

foto drago // selvasp

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próprio, alheio ao poder do esta-do, concentrado em acampamentos an-tinucleares no interior do país e ocupações urbanas.

As autoridades alemãs não viram com bons olhos essas formações e pro-moveram ofensivas policiais que de-sarticularam essas zonas autônomas e a movimentação antinuclear. para se proteger das autoridades, e manter seu modo de vida, esses grupos ata-cavam as forças coercitivas do esta-do. baseada em sua estética a mídia alemã apelidou o grupo de “schwarzer block”, ou bloco preto em português.

essa tática ganhou notoriedade na mídia internacional nas manifes-tações em seattle, no ano de 1999, durante uma reunião da organização mundial do trabalho, quando alguns grupos de manifestantes optaram por atacar símbolos do capitalismo, como mc donalds e starbucks.

A escolha pelo ataque aos símbolos capitalistas aconteceu em uma época de forte expansão dos valores neoli-berais. o receio dos movimentos so-ciais, nessa época, era que a reu-nião da OMC servisse para flexibilizar ainda mais as condições trabalhistas no mundo inteiro e fornecer mais fer-ramentas para a expansão das grandes marcas e exploração dos mais pobres.

Acusada de antidemocrática a tá-tica black bloc traz uma outra forma de interpretar o regime democrático. “trata-se de um julgamento moral que vê a democracia apenas como princípio de maioria e é insensível ao anúncio do intolerável, como a limitação e os controles na vida das cidades e as assimetrias e desigualdades perpe-tradas por bancos e instituições re-

presentativas. tenta-se reduzir tudo à violência como valor negativo, de um lado, e a democracia como valor positivo, de outro”, afirma Acácio.

Ao assistir um programa noticioso, seja na tv aberta ou não, atualmente é inevitável se deparar com a cri-minalização dos black blocs, o ata-que ao patrimônio público e privado é mais problematizado do que viola-ções aos direitos humanos. As ações

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nos, “[A constituição] dá até mais ênfase à proteção da dignidade hu-mana, que é fundamento da república brasileira, mas, na prática, valem os ditames desse sistema que se orga-niza a partir da produção desenfre-ada de mercadorias. não à toa vemos pessoas mais chocadas com os vidros quebrados de grandes conglomerados bancários do que com pessoas mortas na rua por conta do frio”.

de “vândalos” e “baderneiros” foram noticiadas com muito mais drama do que o sumiço de Amarildo, no rio, e o assassinato de ricardo, em santos.

A preservação do patrimônio mate-rial é, perigosamente, levado mais a sério do que a preservação da vida, a constituição da república, em te-oria, protege ambos. para rodolfo valente, advogado e coordenador do instituto práxis de direitos huma-

foto drago // selvasp

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equal é a sua rEvolução?

por paulo motoryn, pedro ferrari e victor labaki

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dizia emma goldman que se não pudesse dançar não seria a sua revolução. pois bem: se não podemos jogar, não é a nossa. é

assim, transformando o futebol em fator de luta social e atuação política, que o autônomos fute-bol Clube consegue caminhar na contramão das demais equipes de várzea e ganhar cada vez mais no-toriedade nos campos de terra da capital paulista.

em meados de 2006, um grupo de fanáticos pelo futebol, e com inspiração anarco-punk, cunhou o nome da equipe em homenagem ao movimento autonomista, surgi-do na europa no século passado. fiel ao espírito revolucionário do marxismo, mas renegando o po-der das burocracias sindicais e partidárias, o autonomismo sig-nifica se manter à margem do modo de vida dominante imposto pelo capitalismo.

como buscar alternativas à rea-lidade imposta é o primeiro passo para sofrer estigmatização e pre-conceito, não é difícil entender porque os jogadores da equipe são jocosamente chamados de “roquei-ros da lapa” ou “doidões anar-quistas” pelos adversários. para romper paradigmas, buscar o feixe de resistência na equipe varzeana e entender sua dinâmica, a repor-tagem acompanhou algumas parti-das do Auto – como é carinhosa-mente chamado –, do apito inicial ao churrascão de comemoração.

A militância do Autônomos co-meça antes mesmo da bola rolar. privilegiando sempre a disputa nos enlameados campos de várzea, a equipe costuma jogar no bento bicudo, campo vizinho à marginal tietê, na lapa, e dentro da comu-nidade bicudão. fazendo apologia aos campos de terra, que estão sorrateiramente sendo eliminados da paisagem paulistana, o Auto consolida sua luta contra a es-peculação imobiliária, que, além dos campos, inferniza e incendeia os mais pobres.

o uniforme mais tradicional do time também exemplifica a ideo-logia do Auto: suas cores são o vermelho e o preto, dispostos de maneira exatamente igual à ban-deira adotada tanto pelo movi-mento anarcossindicalista quan-to pelos comunistas libertários. mesmo assim, engana-se quem pen-sa que a luta política da equipe acaba nas faixas libertárias e antifascistas que são penduradas no gramado antes dos jogos.

Além de reacender o debate so-bre o anarquismo, levando seus símbolos e suas ideias para os mais inóspitos campos de vár-zea da cidade, o time possui uma atuação muito forte fora das quatro linhas. organizados, es-tão presentes em diversos atos, manifestações e protestos. des-de mobilizações contra a rea-lização da copa de 2014 até as manifestações contra o aumento da passagem de ônibus.

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o Auto possui uma relação ín-tima e profunda com diversos mo-vimentos sociais, dentre eles o movimento passe livre, o movi-mento dos trabalhadores sem-te-to, o comitê popular da copa, entre outros. Ao fim dos jogos do time, que se reúne todos os sábados, não é difícil ver cami-setas, conversas e menções aos mais diversos coletivos e movi-mentos políticos da cidade.

foi em uma manifestação pro-movida pelo passe livre em ju-nho deste ano, que um dos seus jogadores ficou detido por 3 dias e só foi liberado após o pagamento de uma fiança de apro-ximadamente 5 mil reais. moti-vo de vergonha para a equipe? Que nada. “Em 2011, fizemos em-baixadinhas na frente da tropa de choque da polícia militar em um dos momentos mais tensos do protesto”, relembra matusa, um dos fundadores e mais experien-tes jogadores do Auto.

Além obviamente da crítica à violência estatal por meio da polícia, as bandeiras defendidas pelo Autônomos são claras: a luta contra o racismo, o machismo – o Auto já atuou diversas vezes com equipes mistas –, e as de-mais opressões que constituem o preconceito dentro do futebol e também em toda a sociedade.

A homofobia também é um pon-to discutido pela equipe. quan-do, neste ano, o atacante emer-son sheik, do corinthians, foi bombardeado de críticas por ter publicado uma foto dando um se-

linho em um amigo, o Auto não deixou por menos: logo viralizou na internet um retrato de dois jogadores do elenco se beijando, em claro gesto de solidariedade à causa.

em função de uma viagem à in-glaterra em 2008, custeada por um time com inspiração política similar de londres, conheceram uma casa que sediava o clube in-glês e voltaram determinados a ter o seu próprio espaço. foi assim que surgiu a casa mafal-da. localizada na lapa, é um es-paço sócio cultural autogerido que promove debates, discussões, festas e oficinas.

hoje em dia, a gestão da casa mafalda se divide entre diversos coletivos anarquistas, não mais apenas o Autônomos, mas ainda se-dia diversos encontros da equipe rubro-negra. um dos jogadores do time, contudo, mostra preocupa-ção: “A veja publicou uma matéria sobre os black blocs e o repór-ter disse que esteve em uma fes-ta na mafalda, o que muito nos assusta”, disse um dos atletas, fazendo menção ao caráter pouco popular da revista semanal.

o modelo adotado pelo Auto tam-bém é o da autogestão: não existe hierarquia dentro do time e todos cooperam, divididos em núcleos, para fazer o time continuar exis-tindo e resistindo.

A VÁRZEA RESISTE

A várzea, celeiro de muitos craques brasileiros, não é o pal-

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kco ideal para o gingado perfeito ou para lances de mágica com a bola nos pés. salários, direi-tos de imagem, empresários, nada disso existe nos campos e terrões castigados da várzea. o futebol mercantilizado não passa pela grade do bicudão.

Na final da Taça Aziz Vanzolini, conquistada pelo time rubro-negro após vitória por 1 a 0 sobre o ime, da usp, a reportagem presenciou uma discussão entre um membro do time e um torcedor na arquibancada. en-tendendo que a torcida estava exa-gerando nas críticas ao juiz da partida, um jogador do Auto mandou sua pequena legião de fãs calar a boca. em resposta, ouviu: “Joga bola sua besta quadrada”. Ao fim do jogo, os dois se abraçaram e co-memoraram o título como se aquela tivesse sido mais uma cena de um espetáculo inóspito.

o sentimento pelo título, após anos de esforço, emocionou os jogadores: "vocês não tem ideia de quantos sábados perde-mos sorrindo, ainda em um espí-rito nem tão competitivo, para chegar aqui. Apesar de ser vár-zea, é sério. isso é um sonho realizado", disse matusa.

A várzea é uma ferramenta de resistência ao futebol subor-dinado às imposições do mer-cado, da televisão e do di-nheiro. o Autônomos, por sua vez, uma incansável trincheira contra o que chamam de geração Neymar: “Outro dia tivemos que passar fita isolante na chutei-ra de um dos jogadores. Acre-dita que ele veio jogar de chu-teira amarela? maldito futebol moderno”, lembra um atleta.

fotos João mirAndA

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ni brissant

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por Harumi visconti

desmistificandoo brasileiro

uando pensamos em povo brasileiro, o que nos vem à mente? Adjetivos como tranqüilo, cordial e acomodado aparecem quando analisamos a imagem que temos de nós mesmos. essas referências fazem parte do imaginário brasileiro e perpetuam uma ideia que definitivamente não corresponde ao real. esse estereótipo que há décadas nos é atribuído, é reforçado principalmente na ditadura varguista (1937-1945), em que o estado tenta apagar do ima-ginário social qualquer vestígio de resistência.

q

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segundo o sociólogo edson martins, a imagem do brasilei-ro como um povo tranqüilo teve origem principalmente na vira-da do século xx. Autores como Gilberto Freyre (1900-1987) ajudaram na construção desse esteriótipo. tomados por uma onda ufanista, principalmente com o despontar da moderniza-ção, idéias como as de casa Grande e Senzala, de Freyre, consolidaram a noção de povo tranqüilo. Martins afirma que o pensador sérgio buarque de hollanda (1902-1982), autor do raízes do brasil, que cunhou o termo homem cordial, teve um papel fundamental na desmisti-ficação do brasileiro tal como ele era vendido pela mídia.

com o apoio de uma histo-riografia que há séculos revela apenas um lado da história - a dos vencedores - o passado de luta do brasileiro fica esque-cido, dentre as vitórias da-queles que tentam calar a voz dos eternos excluídos de nossa sociedade. “não é um proble-ma específico da historiografia brasileira não dar voz aos mo-vimentos sociais. A historio-grafia ocidental não tem objetos a não ser grandes reis, grandes batalhas e grandes homens. essa é a historiografia oficial”, ex-plica o historiador da puc-sp, lauro Ávila pereira.

edson martins, entretanto, contesta: “não podemos culpar as historiografias. É preci-so contextualizá-las. em que momentos histórico, econômico e social elas foram lançadas? Felizmente, essa historiografia romântica está em decadência no universo acadêmico”, afirma.

basta, entretanto, revirar-mos as páginas de nossa his-tória para resgatarmos a tra-dição de protestos, lutas e levantes que acontecem desde o brasil colonial. não pode-mos achar que a única geração que lutou por direitos foi a de 1968. muito menos a nos-sa, que neste ano reacendeu o desejo por mudanças e foi às ruas. não. nossas lutas e rei-vindicações são centenárias. não podemos nos esquecer das greves do século xx, das re-voltas da vacina, contestado, da chibata. há canudos e a revolta dos 18 do forte. mas para além de protestos histó-ricos, temos ainda hoje movi-mentos que, desde a origem, não tiveram suas reivindica-ções atendidas. As bandeiras são muitas. os movimentos – negro, indígena, sem-terra, estudantil, feminista, campo-nês – exigem que suas vozes sejam ouvidas. e já está mais do que na hora de escutarmos o que eles têm a nos dizer.

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uem passa hoje pelo parque do ibirapuera, referência de lazer para uma parcela dos paulistanos, enxer-ga uma distorção da paisagem urbana cotidiana. uma lona protege da chuva cerca de 10 barracas que abrigam há dois meses manifestantes em frente à Assembleia legislativa do estado de são paulo, casa dos deputados esco-lhidos pelos cidadãos paulistas.

há quem passe e estranhe, levante o nariz e dê de ombros; há quem re-jeite, desaprove e xingue; há quem tente tirá-los de lá; há quem apoie e ajude com doações, ideias e de-bates; há também quem passe e nem note o acampamento, mas o fato é: o grupo de pessoas já forçou a inter-dição da entrada principal da Alesp e continua intervindo no cotidiano dos deputados da casa.

A quantidade de acampados varia constantemente, porém aproximadamen-te 15 pessoas se mantêm diariamente no local, saindo apenas para funções relacionadas ao movimento. entre os

acampados, estudantes universitá-rios, trabalhadores, desempregados e pessoas de todos os cantos do brasil, do interior de santa catarina ao ma-ranhão – alguns vieram apenas para participar das mobilizações.

A maior parte do grupo se identifica como anarquista e as relações e res-ponsabilidades, além das decisões, são manejadas de maneira horizontal, por meio de diálogos que encontram seu fim em um consenso. As delibe-rações vão desde o local em que vão deixar as barracas até os rumos polí-ticos do movimento. A princípio, as reivindicações eram por uma reforma política e pela desmilitarização da polícia militar, por exemplo.

periodicamente, um membro da ocu-pação visita as lideranças dos par-tidos e apresenta a eles propostas definidas pelo grupo em reunião, a fim de que sejam protocoladas e envia-das à brasília. A reportagem acom-panhou o estudante de direito ira-nildo, um dos manifestantes, em uma

q

ocupados einvisíveis

por victor labaki, carolina piai e thiago gabriel

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dessas tentativas de diálogo com os deputados e presenciou a dificuldade de atravessar a burocracia e a "boa vontade" dos congressistas.

depois de se reunirem e enxergarem nas pautas antigas uma contradição com o que acreditam e buscam, remode-laram o encaminhamento do movimento. Agora, eles se veem em uma segun-da fase de organização, onde preten-dem ampliar a integração com outros coletivos e organizações sociais e incorporar suas pautas. o caráter reformista, dito por eles como “co-xinha”, será substituído por ideias e projetos que serão construídos mais alinhados com suas convicções.

Cada membro é identificado como um indivíduo único e possui sua pró-pria maneira de pensar. nesse prisma de ideias, apenas uma coisa parece certa: o povo é o poder! Afirmação

que, para eles, não corresponde ao momento atual, por conta do sistema que privilegia o capital e as insti-tuições que o conferem legitimidade, com sua burocracia.

“Aqui a gente não estabelece regras absolutas porque já vimos que isso não funciona. As pessoas que chegam aqui passam por um processo de descobri-mento de si mesmo e das dificuldades. Eu mesmo mudo todos os dias”, afirma um dos ocupados.

depois de alguns meses e pouco reco-nhecimento do movimento, qual seria a reação destes manifestantes se a ocu-pação terminasse amanhã sem atingir as mudanças desejadas, forçando cada um a voltar à sua vida cotidiana? um deles é enfático: “Prefiro morrer pela cau-sa a continuar vivendo nessa mentira, onde as pessoas veem um mendigo como se fosse uma peça de móvel na rua”.

fotos brunA brAvo

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A maneira com que transmi-timos dados e nos rela-cionamos com eles é or-gânica. conforme passa o tempo e a tecnologia

permite, mudam-se sistemas na ten-dência de facilitar o acesso de informação ao consumidor final. No entanto, esse processo nem sempre se traduz em simplificação. Na ver-dade, nunca foi tão complexo en-tender os fluxos de conteúdo.

com a popularização de sistemas de compartilhamento de dados gra-tuitos, indústrias baseadas na ta-xação de acesso a conteúdo mudaram suas estratégias para manterem-se lucrativas. talvez o maior exemplo disso seja o advento do napster e a derrocada da indústria fonográfica – pelo menos nos moldes do século passado. de maneira assustadoramen-

te similar ao que aconteceu com a música, a distribuição online difi-culta a capitalização referente ao conteúdo jornalístico disponível em portais, sites e blogs.

nesse caso, a indústria que é pre-judicada com isso é a da imprensa. dai vêm a justificativa para demissões em massa, precarização do trabalho dos jornalistas, salários baixos, uso de estagiários para cumprir tarefas que antes eram de responsabilidade de profissionais contratados.

uma problemática muito próxima a da produção cultural bate a porta do jornalismo: como pagar a conta?

todos os quatro jornalistas en-trevistados para esta reportagem têm acordo em um ponto: financeiramente falando, o custo para produzir ma-

jornalismo do futuro

por guilherme almeida

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terial jornalístico de qualidade é muito maior do que se consegue como retorno. na plataforma impressa a entrada referente à compra em banca e de assinaturas não chega perto do suficiente para sustentar a publica-ção. na tv e no rádio a publicidade determina o financiamento e a audiên-cia determina a publicidade. na in-ternet os dois métodos se misturam, contudo, continuam longe de pagar as contas satisfatoriamente.

fábio zanini, editor de mundo da

folha de s. paulo diz que o maior jornal em circulação no brasil – cerca de 300 mil exemplares no do-mingo – depende de diversos meios de captação de recursos. “A folha tem financiamento múltiplo; o cara que compra na banca, quem assina o site, a publicidade privada e a estatal. quanto mais você diversi-

ficar suas fontes de financiamento, melhor. isso vale pra folha, pra globo e pro mídia ninJA”, respon-de fábio quando perguntado sobre o mais recente fenômeno da imprensa alternativa: o narrativas indepen-dentes, Jornalismo e Ação.

de acordo com o ex-editor da re-vista trip e idealizador do projeto, bruno torturra, o mídia ninJA foi responsável por “colocar em um campo mais aberto as discussões sobre jor-nalismo”, entre elas o financiamento. no entanto, no caso deles é essa é uma discussão muito delicada. isso porque o mantenedor do ninJA é o fora do eixo. envolvida em uma série de confusões midiáticas a “rede” – ter-mo adotado pelos integrantes – está no campo daquelas coisas que são tão difíceis de definir, que é melhor co-meçando pelo que eles não são:

foto gabriela batista // fotoenquadro

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o fde não é um par-tido político, não é uma empresa cotada em bolsa de valores, não é uma ong e, mais impor-tante, o fora do eixo não é uma única coisa. difícil, não? de fato, é complicado entender

o sistema em que eles operam pensando apenas em modelos clássicos de produção, circulação e gestão de bens cultu-rais e informação. o que é empreendedoris-mo para uns é falta de ética e neoliberalismo disfarçado para outros.

para não navegar por águas tão impetuosas é melhor se ater ao que o jornalismo pode tirar da gestão de bens cul-turais. Ao mesmo tempo que o mercado de tra-balho passa pela sua maior crise dos últi-mos anos uma rede que entendeu e cresceu em cima do declínio da indústria fonográfica

agora adentra o campo da comunicação a todo vapor. coincidência?

para o jornalista e professor leonardo sakamoto, não há uma única solução e muito menos um único proble-

ma. “crowdfunding, pu-blicidade, financiamen-to estatal, doações, financiamento direto para reportagens e fi-nanciamento cruzado, nenhum desses sistemas mantém um bom jornalis-mo sozinho, é necessá-rio cruzar todos esses meios e ao mesmo tempo não depender de nenhum deles”. é dessa manei-ra que a ong repórter brasil, coordenada por sakamoto, se mantém.

Joaquim ernesto pa-lhares, diretor-pre-sidente da agência de notícias carta maior adiciona mais um método de capitação de recursos a cobertura de eventos.

no caso da carta maior a experiência de reportar o fórum social mundial abriu caminho para ou-tras prestações de ser-viço similares. Apesar de balancear as finanças do site com empreendedo-rismo jornalístico pa-lhares destaca que isso só é necessário porque a distribuição de publi-cidade é injusta. “nós achamos que o dinheiro da publicidade é públi-co e que todos têm di-reito a receber uma par-cela desses recursos”, reivindica palhares.

enquanto o setor pri-vado for responsável por regular os fluxos de publicidade, esse pano-rama não mudará. essa é a tese de fábio zanini. porém, ele considera que para veículos tra-dicionais como a folha “o futuro passa muito pela cobrança de conte-údo na internet”.

por um lado os que querem cobrar pela in-formação, de outro os que acreditam que in-formação é um bem publi-co e deve ser gratuita. uma coisa todos nós te-mos em comum: dívidas.

"crowdfunding, publicidade, financiamento estatal, doações, financiamento direto para reportagens e financiamento cruzado, nenhum

desses sistemas mantém um bom jornalismo sozinho"

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allan vaz

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autor: rodrigo maluf

o trabalho foi produzido

para a disciplina

sociologia marxista

contemporânea, da

faculdade de filosofia,

letras e ciências Humanas

da universidade de são

paulo, em 2013

“NA MEDIDA EM QUE SÃO hISTORICAMENTE NECESSáRIAS, AS IdEOlOgIAS TêM UMA VALIDADE QUE É VALIDADE 'PSICOLóGICA':

ELAS 'ORGANIzAM' AS MASSAS hUMANAS, FORMAM O TERRENO SOBRE O QUAL OS hOMENS SE MOVIMENTAM, ADQUIREM

CONSCIêNCIA DE SUA POSIÇÃO, LUTAM, ETC.”

grAmsci, concepção diAléticA dA históriA, 1978

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I – O que é ideologia?

em um famoso excerto do prefácio de para crítica da economia política, Karl marx surpreende aqueles que redu-zem sua concepção de ideolo-gia à mera falsa consciência ao dizer que as ideologias expressam uma vontade que nenhuma mudança histórica é capaz de suprimir.

baseando-se notoriamen-te no prefácio de 1859, o marxista italiano Antônio gramsci sustenta que a ide-ologia não é apenas um fenô-meno econômico, nem conjun-to de ideias abstratas, nem falsa consciência. ela é a unidade entre uma concepção de mundo e uma conduta ade-quada a essa concepção.

como a ideologia está li-gada a sociedade de clas-ses, há múltiplas ideolo-gias contraditórias entre si, já que elas são raciona-lidades de classe em deter-minado momento histórico, i.e., os interesses sociais historicamente conflitantes se manifestam através de discursos ideológicos.

II – Os aportes de Itsván Meszaros

contudo, na linha de pen-samento em que conduzimos a atual pesquisa, é a percep-ção do húngaro istván més-záros que, de maneira mais

contundente e detalhada, aborda as repercussões do pensamento ideológico para a construção de uma “práxis revolucionária”. mészáros acredita que a ideologia “não é ilusão nem supersti-ção religiosa de indivídu-os mal-orientados, mas uma forma específica de consci-ência social, materialmente ancorada e sustentada.”.

A natureza da ideologia, segundo o filósofo marxista, está marcada pelo “impera-tivo de se tornar pratica-mente consciente do confli-to social fundamental (...) com o objetivo de resolvê-lo pela luta.” com isso, torna-se perceptível que as ideologias possuem implica-ções práticas em todos os campos – arte, filosofia, li-teratura, etc – independen-temente de sua vinculação sócio política ,i.e., de eventuais posições progres-sistas, conservadoras ou revolucionárias.

A ideologia é a “cons-ciência prática inesca-pável” das sociedades de classe, uma vez que ela é forma – nos termos marxia-nos – específica de consci-ência social que articula os valores e estratégias visando o controle do meta-bolismo social. como as so-ciedades de classe são do-tadas de uma divisão social do trabalho demasiadamente

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segmentada, as ideologias pre-cisam definir posições “totali-zadoras” em suas explicações e “alternativas estratégicas” uma às outras.

A natureza da ideologia é de-terminada pelo fato de que a partir dos pontos de vista con-traditórios das alternativas ideológicas, é possível tor-nar-se praticamente consciente do conflito social fundamental e resolvê-lo pela luta. esta orientação prática define a ra-cionalidade necessária ao dis-curso ideológico, já que seus interesses não devem se mani-festar apenas como teórico-abs-tratos e sim como práxis fun-damentada com efeitos reais de mobilização, voltados às ações socialmente possíveis dos su-jeitos coletivos reais.

dessa maneira, é impossível separar a racionalidade ideo-lógica do “reconhecimento dos

constrangimentos objetivos, nos quais as estratégias alterna-tivas são formuladas a favor, ou contra, do prosseguimento da reprodução de determinada ordem social”. As principais ideolo-gias adotam como referência as práticas produtivas dominantes – v.g. os discursos dos patrões de que a redução da jornada de trabalho seria economicamente inviável tendo em vista a con-sequente diminuição de produti-vidade e perda de competivida-de no mercado, sendo assim não conseguiriam pagar os salário dos funcionários que seriam to-dos demitidos. A “falsa consci-ência” é um instante posterior e subordinado dessa consciência prática restringida pela época e por suas múltiplas contradições específicas que devem ser ana-lisadas mediante as “condições concretas de cada batalha”.

não se deve esquecer que as ideologias estão atreladas a épo-

mÉsZÁros estabeleCe 3 posiÇÕes ideolÓgiCas distintas:

Conservadora_busca bloquear a percepção das contradições para

manter a ordem social vigente

progressista ou reformista_reconhece os

conflitos, mas sua “crítica é viciada

pelas contradições da sua própria posição

social”

revoluCionÁria_os conflitos são insolúveis e para a superação das contradições é

necessário substituir a estrutura vigente por uma que não seja fundamentalmente contraditória

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cas específicas, em um duplo sen-tindo. A época, em seu primeiro sentido, refere-se a sociedade de classes como um todo – i.e. ao capitalismo, já que a consci-ência prática dessas sociedades não pode deixar de ser ideológi-ca como consequência do caráter insuperavelmente contraditório de suas estruturas sociais. em sua segunda acepção, o caráter específico da época influencia di-retamente as ideologias, pois, ao longo do desenvolvimento his-tórico, os conflitos e suas ne-cessidades aparecem de maneiras distintas em íntimas ligações com a “emergência de meios mais avançados de satisfação das exi-gências fundamentais do metabo-lismo social”.

Apenas o terceiro tipo de ide-ologia é capaz de ousar supe-rar as limitações atinentes à produção do conhecimento práti-co, numa sociedade dividida por classes – sem garantia alguma de êxito. Apoiado em Marx, o fi-lósofo manifesta a necessidade de uma transcendência, ou seja, ir além da sociedade de clas-ses como tal, e não apenas supe-rar uma espécie de sociedade de classes em detrimento de outras.

O verdadeiro “fim da ideolo-gia” implica obrigatoriamente em ir além das sociedades de clas-ses, pois só assim não haveria necessidade de “resolver pela luta” os conflitos emanados das contradições reproduzidas pelos interesses de classe antagôni-cos, assim como a “destruição do Estado” para a superação defini-

tiva da divisão capitalista do trabalho. Analogamente, assim como é imprescindível a apro-priação das funções vitais do Estado para seu definhamento, é preciso que a ideologia revolu-cionária, capaz da emancipação, torne-se dominante.

III – Quebrando o feitiço

imaginar que o discurso ide-ologicamente isento existe fa-vorece somente o adversário, que de fato tem interesse em apresentar sua própria posição como atinente ao gênero huma-no, objetiva e completamente sem viés ideológico.

o poder da ideologia dominan-te é gigantesco sobre as classes dominadas, o que ocorre devido à vantagem da mistificação, pela qual os indivíduos explorados podem ser induzidos a endossar práticas que são contrárias aos seus interesses de classe.

A ignorância desse poder, a crença de que é possível estar livre da ideologia na socieda-de de classes, não consegue ser mais realista do que a ideia do barão munchhaüsen, o qual acreditava ser possível salvar-se de um afogamento puxando sua cabeça com as próprias mãos, ignorando a ideia da gravidade. ela afeta tanto aqueles que ne-gam sua existência como os que reconhecem abertamente os inte-resses e os valores relativos à diversas ideologias.

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BRASIL BARRACA

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brasilia chapada dos veadeiros

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no mês de julho o

Brasil

Barraca montou a

campamento

no alto paraíso, o

nde,

entre os dias 19 e

27,

aconteceria mais

um Encontro

de culturas tradic

ionais da

chapada dos veade

iros

VIAGEM ESCRITA POR: Marco Belotti e Henrique Santana

no meio da vida caótica das grandes metrópoles um pensa-mento vigora dentro das nos-sas cabeças, aquele momento em que colocaremos de lado a loucura da correria diária, dos trens, ônibus e metros lotados, do concreto inces-sante e dos congestionamentos intermináveis para a chegada das tão esperadas férias.

passagens compradas, tudo pronto para a partida no dia 17, as 6h40 da manhã com des-

tino à brasília, onde pegarí-amos um ônibus para Alto pa-raíso, go. no entanto, apenas um de nós embarcou no vôo. Acontece que na noite do dia 16 percebemos que das quatro passagens compradas as pres-sas, três estavam marcadas para as 18h40. o avião partia do aeroporto de guarulhos, e nós que havíamos saído de casa as 16h, esquecemos que estávamos em são paulo, e que a marginal pára.

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As 18h40 no relógio e ainda não tínhamos passado da ro-doviária do tietê. não tinha mais jeito, cancelamos nossas passagens aéreas e fomos de ônibus para brasília, partin-do às 22h do dia 17 de julho com previsão de chegada as 13h do dia 18.

Apesar de todas as frustra-ções devido aos imprevistos de tempo, nos reencontramos todos na vila de são Jorge no dia 19 (acabamos dormindo em Alto paraíso no dia 18 pois chegamos a noite e não con-seguimos nenhuma carona para a vila). o Encontro de Cul-

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turas Tradicionais da Chapada dos Veadeiros tinha começado, o clima estava incrível e já nos parecia inconcebível lem-brar da vida que se leva na ba-bilônia paulista. muito amor, uma energia muito positiva no ar, muito diferente daquele tratamento de indiferença, re-corrente na cidade grande.

A vila tinha cerca de 600 re-sidentes, a grande maioria de fora, que acabou se instalando ali pelos mais diferentes mo-tivos. muitos inclusive de são paulo, com faculdade e aque-la coisa toda, mas que optaram por uma vida feita para ser vi-vida, onde não se trabalha in-

cessantes oito horas diárias, dez contando com o transito para ir e voltar, para no fim da semana ser compensado com dois dias de folga, quando muito.

em uma conversa com uma pau-lista que mudou para lá há pou-co mais de dois anos, essa, com mestrado em sociologia pela usp, disse que trabalhando como professora, consegue, em suas quatro horas de trabalho diá-rias, mais dinheiro do que o necessário para sua sobrevivên-cia, e com a qualidade de vida de quem tem 65 mil hectares de área preservada, repletos de cachoeiras, no quintal de casa.

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REVISTA #02VA DAPÉ

Já o terceiro desistente conseguiu uma carona até bra-sília, porém no meio do caminho o simpático casal que o levava resolveu parar em uma cachoeira antes da volta à babilônia. en-quanto isso, nós também nos di-rigíamos à outra cachoeira com algumas cariocas que conhecemos lá, mau sabendo a surpresa que o destino havia nos reservado. Ao nos aproximarmos da queda d’água uma voz familiar ecoava por entre as árvores da trilha, nesse momento percebemos que todos nós tínhamos nos dirigido à mesma cachoeira!

diante desse sinal divino e

inesperado, a vontade de per-manecer na chapada falou mais forte. No final das contas o último de nós acabou colocando os pés na rodoviária do tietê apenas no dia doze de agosto. As lembranças das experiências vividas, as cachoeiras, rios e lagoas geladas, o festival e as pessoas que o completavam, o calor e a secura do cerrado contrastavam agora com o con-creto, a pressa e a indiferen-ça paulistana. lembrávamos do bar do Waltinho, de todas as trilhas, dos pulos dos pare-dões de pedra para um mergulho revigorante nas águas da cha-pada e sabíamos que a vida em são paulo não era para nós.

voltamos, mas só a estrada sabe o que os próximos ca-minhos nos aguardam. e que venha a babilônia!

nos instalamos em são Jorge no amigável camping casa Ama-rela. conhecemos muita gente, um casal que levava um e.t (em tamanho real) feito de papel machê no banco de trás do carro, músicos que viaja-vam pelo mundo tocando, outro casal que vinha de uma viagem de três meses pelo brasil em uma bicicleta de dois luga-res, tinha de tudo.

A maravilha da energia da chapada era contagiante, éra-mos quatro indivíduos comple-tamente diferentes daqueles que tinham saído de são paulo uma semana atrás, irreconhecí-veis, da cor da pele ao as-tral que carregávamos. porém, como tudo que é bom uma hora se esvai, na segunda semana três de nós tomaríamos as rédeas de volta a selva de pedra.

desses três apenas um em-barcou. um cancelou sua pas-sagem de volta e o outro, mais ingênuo, depois de con-seguir uma carona de são Jor-ge à brasília, em um momento de reflexão num gole de café no aeroporto, percebeu, como num insight, que aquela não era a hora de partir.

no dia seguinte nos depa-ramos com o retorno de nosso heróico desistente ao camping casa Amarela. o poder de per-suasão da chapada era forte e intenso, e ficava cada vez mais evidente o que se passava na cabeça daqueles que iam para lá e não voltavam.

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A N D R É C O E L H O F E R N A N D E SENTREV ISTA COM O ART ISTA CONVIDADO

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vAidApé_Quais os materiais mais utilizados para a construção de suas obras?

_eu vario muito. como a maioria dos meus de-senhos são feitos durante as aulas, então a maior parte é no grafite e nanquim mesmo. Quan-do tem cor é principalmente lápis aquarelável, mas caneta nanquim e grafite são mais fáceis de trabalhar e ter na mão a qualquer momento.

vdp_O que você procura ouvir ou pensar ao botar a mão na massa?

_desenho muito durante aulas, desde sempre. mas quando estou em casa e paro para desenhar eu tenho que estar ouvindo minhas músicas, de-testo desenhar com silêncio. normalmente de-senho de memória e sem rascunhos. começo com uma noção do tema ou do estilo e conforme vou desenhando vão surgindo outras ideias e ele-mentos. Difícil ter alguma coisa fixa na cabe-ça quando eu começo. gosto de pensar em coisas que os interligam, existem diversos objetos e elementos que se repetem, mesmo em diferentes estilos de desenho. também gosto de esconder coisas - pequenos detalhes que passam desper-cebidos por não terem uma interação com a cena - imaginar que um dia alguém vai percebê-los e dizer "que porra é essa". nesse ponto o foco vira a criação.

vdp_Acredita que a arte tem alguma função específica na sociedade?

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_na minha humilde opinião, acho que varia mui-to. vivemos cercados por coisas que foram pen-sadas e representadas, portanto arte está em tudo que o homem cria. Eu curso Design Gráfi-co, onde a função da arte é comunicar. Já a maioria dos meus desenhos, que não são feitos para o curso, não tentam comunicar alguma coi-sa, existe um envolvimento emocional do momen-to que eu posso nem saber explicar. e isso não importa para a pessoa que está vendo a revis-ta, por exemplo, porque eu não estou do lado dela para explicar a minha visão. A interpre-tação deles vai ser livre, variando para cada indivíduo conforme suas peculiaridades.

vdp_Qual é sua visão do mundo pós-2012 - a nova era, segundo os maias - e para o quê acha que estamos caminhando?

_Aos poucos as pessoas parecem estar mudando. todo mundo está interessado em saber mais de como somos manipulados, enganados e roubados, para poder se revoltar. espero que estejamos caminhando para um colapso. isso não é neces-sariamente ruim. se tivermos a chance de re-construir tudo depois.

vdp_Acredita que no final tudo vai dar pé?

_claro que vai dar pé! só precisamos de um pouco mais de braço para fazer algo melhor...

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"a Arte não possui uma função específica na sociedade, é um componente inevitável dela"

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“A economia val mal." "A economia está aqueci-da!" "Não, a economia está só passando por uma marola."

O que é economia? Um discurso? Uma ciência?

Se a economia é uma ciência, os economistas só podem ser cientistas. Essa é a visão que a maior parte dos economistas têm de si mesmos. O ob-jeto que estudam são os "bens econômicos", que são qualquer coisa que seja ao mesmo tempo escassa e útil. A lei fundamental dessa ciência seria a "Lei da Oferta e da Demanda", e a partir dela os economistas tentam enxergar padrões que permitam organizar os bens da forma mais eficiente. Mas, se o problema é organizar-los, faz sentido dizer que a economia se trata de coisas? Não seria mais correto dizer que se trata de como os seres humanos se organizam para produzir, distribuir e consumir o resultado da produção?

Esse embate tem consequências fortes. Quando se fala sobre economia é extremamente difícil separar o que está sendo dito dos interesses que encabeçam a pesquisa. Ao se tratar de "pessoas estudando pessoas", análises econômicas refle-tem toda a complexidade que seres contraditó-rios nós podem fornecer.

Mas se a economia enfrenta essas questões com seu próprio objeto, por que nos jornais os eco-nomistas sempre falam com tanta segurança, dizendo não apenas o que vai acontecer como quem são os responsáveis e quais as medidas a serem tomadas? Na realidade, eles têm certeza pois se valem de que poucas pessoas domi-nam o discurso e os canais de comunicação, excluindo de partida a maioria e bloqueando o que poderia ser um debate público. Poucos conseguem transformar suas opiniões em um discurso nos termos necessários para ser

considerado "científico" aos olhos da sociedade e da mídia.

Assim, a especialidade do discurso econômico é a de transmitir um enorme autoritarismo com a aparente imparcialidade de uma afirmação científica. Quase qualquer opinião torna-se ma-gicamente aceitável com a introdução correta: "Economista diz que brasileiro trabalha pouco", "Segundo estudo de economistas, salários estão altos demais".

E é por isso que ao apoderar da capacidade de entender o funcionamento da economia é pos-sível romper amarras rumo a um país mais justo. Fica necessário confiar menos nos grandes noti-ciários, e mais na disseminação do conhecimento sobre como a sociedade se organiza, justamente para os mais afetados pelo funcionamento débil dos atuais mecanismos.

O ponto central é que não existem fórmulas, e o modo com que as pessoas podem se organizar para lidar com seus impasses não se limita a ape-nas o convencional. Os economistas não estão tão certos como nos fazem acreditar, e há mais a ser descoberto a partir da inserção de novas pessoas no debate do que as autoridades que-rem admitir. Quanto mais conseguirem se inserir nos assuntos econômicos buscando soluções para os problemas da realidade em que vivem, mais estaremos próximos de caminhar para uma compreensão verdadeira da situação de cada parcela da população do país, e mais capacidade de solucioná-los também teremos.

23 anos, mestrando emhistória econômica pela unicamp

CoLunI

STAS

thomas contiA ECONOMIA E O PODERDO DISCURSO

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REVISTA #02VA DAPÉ

É incrível como a criança carece de medo. Ela pula de lugares altos, sobe em muros, escala árvores, se enfia em buracos sujos, mete a mão em qualquer coisa. É uma exploradora nata do ambiente e de suas capacitações. Ela age de forma inconsequente pois não possui noções perceptivas e cognitivas su-ficientes para analisar os riscos de suas ações. ELA NÃO TEME PORQUE NÃO CONHECE.

Por isso o adulto se faz tão importante. Ele livrará a criança dos perigos que ela oferece a si mesma. Não há necessidade de colocar a mão no fogo para saber que queima. Tem alguém para lhe avisar, ou que se queimara antes.

O adulto, portanto, é o mediador nesse começo de vida. Ensina a planejar e ver além da situação apa-rente. ''Se você subir no muro pode cair, quebrar um osso, sentir dor.''

Querendo ou não, a princípio o que ensinamos a esse exército de pequeninos pirado é a TEMER.

Utilizamos um dos mecanismos de sobrevivência mais fortes e naturais do homem. O MEDO.

Um exemplo clássico é o ''homem do saco''. Um método de impor o medo como proteção. Previ-nindo nesse caso, um comportamento: Conversar com estranhos.

Agora o que acontece em muitos casos e que con-serva uma grande contradição em nós adultos, é o hábito de temer.

É uma grande igenuidade achar que esse costu-me de desconstruir algo e remontá-lo em forma de proibido (e proibido pelo medo) limita-se apenas a aquela situação ou idade.

O que antes servia de proteção, agora serve de censura. É aquela historia do pai que diz ''não porque não, se não você vai ver''. A conse-quência da tomada não é mais o choque, mas

o castigo ou a palmada. EU ESTOU ENSINANDO A CRIANÇA A TEMER O QUE NÃO SE CONHECE.

Pois então lhe pergunto. Não seria esse um hábito nosso?

Vejo pseudo-adultos por toda a parte. Pessoas exarcebadamente cautelosas, indecisas, apavora-das diante do futuro, estagnadas em seus costu-mes, mortas por dentro, carentes de objetivo e de novidade. Pessoas que não conseguem curar seu pŕoprio mal estar.

Ora... Ser adulto não é exatamente o contrário? Ser adulto é saber que pode-se subir no muro, mas da maneira correta. Ser adulto é estar ciente das consequencias de seus atos, mas é estar ciente também que não existe futuro. Que este é apenas uma projeção desses atos e portanto dessas conse-quências.

Maturidade não vem com a idade!

Maturidade vem da experimentação e do conhe-cimento. Conhecimento em suma, de si mesmo. Do por que algo lhe causa medo. Não pode-se enfrentar o que não se conhece. Ser adulto é saber de suas capacidades! É saber que você pode e que você consegue subir na árvore sem quebrar a cara no chão. Mais que isso! É saber que quando o galho vem abaixo, não acontece nada além do que era possível. Era um risco.

Um adulto vive de riscos, porque coloca na balan-ça seus objetivos. Ele SENTE o medo mas não se SUBMETE a ele.

Sabe que o medo não passa de um susto. Uma brincadeira de criança.

O verdadeiro adulto consegue deixar o medo para trás, porque sabe, diferentemente da criança, que não precisa mais dele o tempo todo.

21 anos, graduando em psicologia pela unesp

lucas pazettoO CRIME DE SER ADULTO

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PASSA A BOLAé muito gratificante saber que tem gente vendo o fruto de tanto trabalho e investimento!

você, ao segurar este exemplar, está permitindo que a vaidapé exista.

foi um ano de muita luta e muito esforço para conseguir consolidar uma equipe e publicar este exemplar.

como qualquer mídia alternativa que se preze não há veículo sem luta e correria. não dá tempo de fazer mais nada: apenas o presente. e o nosso presente é este aqui.

escolhemos criar uma revista que pudesse realmente satisfazer o leitor. uma revista que literalmente traduza a sociedade em que vivemos e lute por uma melhoria nas ruas em que andamos.

e na guerrilha da informação, cada leitor é uma conquista. entre nessa luta e passe a revista adiante!

informação não é mercadoria!

uma revista sem muros. um papo sem curva!

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Entrevista

increva-se JAhno nosso canaldo Youtube.

LeonardoSakamotohttp://Youtu.be/vgm0hlqcz_e

“As pessoas que es-tão dando aula [de jornalismo] são for-madas em uma outra matriz, uma matriz de papel. uma matriz que acredita que da-qui a trinta anos as pessoas vão estar pegando a folha de são paulo de manhã e lendo o seu jornal-zinho, enquanto toma seu cafézinho e come sua margarina com pão. não, não vão!

MC Sombrahttp://Youtu.be/9soWggi2Am0

“não existe um certo ou errado, temos que saber ter um discer-nimento sobre as coi-sas e saber distin-guir o que é bom pra si. cada um tem uma escolha, né? Acho que é isso, cada um sabe o que está fa-zendo. é muito louco o bagulho, boto fé.”

youtube.Com/user/vaidape

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foto rafael mattar // selvasp

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