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Projeto Revista da Universidade Federal do Espírito Santo UFES Fev 2014 • Ano 2 • Nº 3 Pesquisadores da Ufes integram o maior estudo da América Latina para identificar riscos de doenças crônicas em adultos Elsa

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Revista de Jornalismo Científico, Cultura, Variedades produzida pela Superintendênica de Cultura e Comunicação da Universidade Federal do Espírito Santo

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Projeto

Revista da Universidade Federal do Espírito Santo • UFESFev 2014 • Ano 2 • Nº 3

Pesquisadores da Ufes integram o maior estudo da América Latina para identificar riscos de doenças crônicas em adultos

Elsa

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Fotos: Arquivo Ufes

Compromisso com a qualidade da educação

Conhecimento e inovação a serviço da sociedade

Foto: Thaiana Gomes

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Fotos: Arquivo Ufes

Compromisso com a qualidade da educação

Conhecimento e inovação a serviço da sociedade

Foto: Thaiana Gomes

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4 UNIVERSIDADE - Revista da Ufes - Fev 2014

A p r e s e n t A ç ã o

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5UNIVERSIDADE - Revista da Ufes - Fev 2014

Imperativo é, para uma instituição pública de ensino e pesquisa como a Univer-sidade Federal do Espírito Santo, que a produção de ciência e tecnologia esteja associada à divulgação de seus processos e resultados. Entretanto, esse movi-mento somente se consolida se a instituição tiver uma consistente política de sustentação aos variados grupos e linhas de pesquisa, com eficiente e necessá-ria capilaridade nas diferentes áreas do conhecimento.

Assim, a revista Universidade traduz esse novo perfil institucional, em que a Ufes assume o compromisso de direcionar as suas energias na elevação da pro-dução acadêmica, seja na graduação e na pós-graduação. É reconhecidamente notável o desempenho dos nossos pesquisadores, e deve-se destacar que alcan-çamos excelentes patamares nesse processo, pois cerca de metade dos profes-sores da Instituição estão diretamente envolvidos em grupos de pesquisa na pós-graduação, e que igualmente cresce a participação dos graduandos em pro-jetos de iniciação científica. Esse fator eleva significativamente a qualidade da formação que oferecemos.

Nesta edição, a Universidade aborda temas muito importantes da história recente do ensino e da pesquisa na Ufes, como o estudo e monitoramento sobre a saúde do adulto – o projeto Elsa Brasil – que envolve 150 pesquisadores da Ufes e de outras cinco instituições brasileiras. Trata-se de uma investigação cien-tífica continuada em um contingente de cerca de 15 mil participantes de várias regiões do País, e que busca detectar os fatores que provocam doenças crônicas não transmissíveis, como o diabetes e as complicações cardiovasculares. Desse modo, a Ufes está integrada à maior e mais abrangente pesquisa epidemiológica desenvolvida na América Latina, e que possibilita um importante instrumento para a saúde pública, propiciando mais qualidade de vida para as próximas gerações.

A Universidade também nos apresenta a pesquisa que desenvolve ferramentas para aplicação na acessibilidade das pessoas com deficiências, desenvolvida no Laboratório de Automação Inteligente do Departamento de Engenharia Elétrica, e que envolve graduando e pós-graduandos no estudo da robótica e biotecno-logia. Outra abordagem relevante é sobre o desenvolvimento na Ufes do ensino na modalidade a distância, em que a nossa Instituição é protagonista no cená-rio da EAD nacional, sendo uma das pioneiras entre as universidades federais.

Assim, a Ufes avança, constrói novos caminhos, busca diferentes ações, de modo a cumprir a sua missão de oferecer educação pública de qualidade. A revista Uni-versidade é um convite para que o leitor conheça mais sobre a nossa produção aca-dêmica e a atuação qualificada em diferentes áreas em todos os centros de ensino.

Reinaldo CentoducatteReitor

O desafio da sustentação à pesquisa

Foto: Thaiana Gomes

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6 UNIVERSIDADE - Revista da Ufes - Fev 2014

Universidade Federal do Espírito Santo • Ufes

ReitorReinaldo CentoducatteVice-ReitoraEthel Leonor Noia Maciel Pró-Reitor de AdministraçãoAmarílio Ferreira NetoPró-Reitor de ExtensãoAparecido José CirilloPró-Reitora de GraduaçãoMaria Auxiliadora de Carvalho CorassaPró-Reitora de Gestão de Pessoas e Assistência EstudantilMaria Lucia CasatePró-Reitor de Planejamento e Desenvolvimento InstitucionalMaximilian Serguei MesquitaPró-Reitor de Pesquisa e Pós-GraduaçãoNeyval Costa Reis JuniorSuperintendente de Cultura e ComunicaçãoRuth Reis

UNIVERSIDADERevista de Jornalismo Científico • Cultura • Variedades produzida pela Superintendência de Cultura e Comunicação da Universidade Federal do Espírito Santo

Secretária de Comunicação Thereza MarinhoCoordenadora do Núcleo de Divulgação Científica Emília ManenteCoordenador do Núcleo de Comunicação InstitucionalLuiz Vital

Conselho editorial José Gerado Mill • Alberto Ferreira De Souza • Alberto Fernandes • José Antonio Martinuzzo • Ruth Reis • Emília Manente

Coordenação geralRuth ReisEditoraEmília Manente ReportagemEmília Manente • Maíra Mendonça • João BritoBolsistaMaíra MendonçaFotografiaThaiana Gomes • Arquivo SupeccDesignJuliana Braga • Samira Bolonha GomesRevisãoMárcia RochaFoto da CapaThaiana Gomes

Distribuição • gratuitaImpressão • Gráfica UniversitáriaTiragem • 6.000 exemplares

Universidade Federal do Espírito SantoSuperintendência de Cultura e Comunicação - SupeccAv. Fernando Ferrari, nº 514, Campus de GoiabeirasPrédio da Reitoria, 1º andar, CEP: 29075-910,Vitória/ES - BrasilTelefone: (27) 4009-7835E-mail: [email protected]

O conteúdo desta revista pode ser reproduzido para fins didáticos, desde que citada a fonte.

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7UNIVERSIDADE - Revista da Ufes - Fev 2014

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56 Educação a distânciaOportunidade de aprendizagem em todos os cantos do Estado

SumárioPrezado leitor, O dia a dia da academia não se resume às salas de aula. No universo da Ufes, as aulas fazem parte do tripé: ensino, pesquisa e extensão. Sem esses três pilares, não existe universo acadêmico. E uma revista de jornalismo que pretende ser reconhecida como divulgadora da ciência não pode e nem deve esquecer dessas três vertentes. Por isso, sempre que-remos exercitar a multidisciplinaridade.

Neste número, demos uma atenção maior ao espaço da graduação. A primeira matéria que gostaríamos de salientar é sobre educa-ção a distância. Quando começou, lá pelos anos 2000, pouca gente apostava e/ou acredi-tava na modalidade. Nestes 13 anos, o ensino a distância tem feito uma verdadeira revolu-ção. Pessoas, jovens e adultos, de cidades do interior do Estado que nunca imaginaram cur-sar uma graduação em uma universidade, hoje possuem um diploma e viram suas vidas serem modificadas por causa dele. Histórias para contar é o que não faltam. Muitas, de fazer chorar. Nos casos aqui relatados, de alegria.

Outra abordagem, também do universo da graduação, é o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência, o Pibid. Atu-almente o programa, ligado à Capes, engloba 24 cursos de licenciatura da Ufes, disponi-bilizando mais de 500 bolsas, que são dis-tribuídas entre estudantes e professores da Universidade, além de educadores de 32 esco-las municipais e estaduais do Espírito Santo. O objetivo do programa é desenvolver uma política de incentivo à formação de docen-tes a partir da garantia de maior permanên-cia dos licenciandos nas escolas.

Entre os assuntos abordados nesta edição estão os movimentos sociais que ganharam as ruas nos últimos meses, particularmente o que reuniu mais de cem mil pessoas pelas ruas da capital, Vitória, e milhões pelo País em mea-dos de 2013. Entrevistamos o professor de Psi-cologia Sávio Queiróz, que nos apresenta suas primeiras análises desse fenômeno e diz que “por enquanto, estamos longe de entendê-lo.”

Boa leitura e até a próxima edição.

Emília ManenteEditora

12ElsaEstudo Longitudinal da Saúde do Adulto

Estudos em Paleontologia

LabTAR

Cosmologia e Gravitação

Os riscos da dieta hipercalórica

Entrevista: sociedade em movimento

PIBID: bolsas de inicação à docência

Robótica de reabilitação

PET: Programa de Educação Tutorial

Pesquisa sobre café conilon

Artigo: Fragmentos de uma vida bonita

Curso de História faz 60 anos

LabPetro: mais uma patente reconhecida

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Gigantes

É no Centro de Ciências Agrárias, em Alegre, Sul do Espírito Santo, que se encontram os pesquisadores do Núcleo de Estudos em Paleontologia e Anatomia

Comparada, dedicados a desvendar o Pterossauro, que viveu na era Mesozoica

p e s Q U I s A

Maíra Mendonça

Voadores

Para a Física, o tempo é uma grandeza; já para a Filosofia, trata-se de uma percep-ção humana que, real ou não, dá origem a extensas discussões. Independentemen-

te da ciência que o estuda, na vida cotidiana, é o tempo que auxilia os indivíduos a determinarem a duração dos fatos, períodos e épocas. E é por meio dele também que a natureza cria, transfor-ma e evolui. Por se tratar de algo tão distante da nossa época, pensar na existência da vida na Terra há milhões de anos seria uma possibilidade remota se não houvesse profissionais que se dedicassem a isso. Esse é o caso dos pesquisadores do Núcleo de Estudos em Paleontologia e Anatomia Compa-rada, do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da Ufes, em Alegre, que há quase três anos tem como obje-to de análise o Pterossauro, réptil voador pré-his-tórico que viveu entre 220 e 65 milhões de anos, na era Mesozoica.

Um dos principais resultados ao longo da pes-quisa foi a descoberta do maior e mais completo fóssil de Pterossauro gigante já encontrado no Hemisfério Sul e o terceiro em todo o mundo. O achado é resultado de uma parceria entre pes-quisadores da Ufes, da Universidade Regional do Cariri (URCA/CE), do Museu Nacional da Universi-dade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Universi-dade Federal de Pernambuco (UFPE). Com cerca de 8,5 metros de comprimento da ponta de uma asa à outra, o fóssil estava localizado na Chapada do Araripe, entre os estados do Ceará, Pernambuco e Piauí. Este lugar guarda rochas cuja idade é de até 110 milhões de anos e nas quais os fósseis estão

preservados em nódulos calcários com pouca ou nenhuma distorção: um raro depósito de fósseis conhecido como Formação Romualdo.

No entanto, apesar da importância dessa des-coberta, a professora do Departamento de Biolo-gia do CCA e coordenadora do Núcleo de Pesquisa em Paleontologia, Taissa Rodrigues, explica que o foco do Núcleo não é a busca por novas espécies, mas, sim, a análise de materiais já descobertos e que ainda estão dentro das gavetas aguardando para serem estudados, o que deixa diversas lacunas em termos de conhecimento na área. “São espé-cimes que já existem, mas que ninguém estuda, e que podem auxiliar, inclusive, a explicar a evo-lução dos Pterossauros e o modo como se diver-sificaram, além do fato de eles terem alcançado tamanhos tão grandes, com cerca de oito, nove ou dez metros de envergadura”, reforça a professora.

Taissa foi também a responsável pela criação do próprio Núcleo, que hoje é financiado pela Funda-ção de Amparo à Pesquisa do Espírito Santo (Fapes) e conta com seis estudantes de Iniciação Científica. Quando foi concursada para dar aulas na Ufes, em 2011, ela decidiu continuar as pesquisas sobre Pte-rossauros que já vinha desenvolvendo durante seu mestrado e doutorado em Ciências Biológicas na UFRJ. Segundo Taissa, o trabalho dos participan-tes do grupo consiste em estudar partes do corpo dos Pterossauros a partir de um contexto evolutivo, analisando sua anatomia e filogenia. Só no último Congresso Nacional de Paleontologia, ocorrido em outubro de 2013, foram apresentados seis traba-lhos gerados pelo Núcleo.

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Paleoarte composta, também em exibição no Museu Nacional da UFRJ. A pintura é de Maurílio Oliveira e a escultura é de Orlando Grillo. Foto: Orlando Grillo

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Além das instituições já citadas, os pesquisa-dores da Ufes também realizam parcerias com pesquisadores de outras universidades nacionais, como a Universidade de São Paulo (USP) e a Uni-versidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS). Já em nível internacional, o Núcleo acaba de iniciar um projeto com duração de dois anos em parce-ria com o Museum für Naturkunde, em Berlim, e o Bayerisches Staatssammlung für Paleontologie und Geologie, em Munique, ambos na Alemanha. O objetivo dos estudos é tomografar as espécies de Pterossauros alemãs para compreender o fun-cionamento de seu cérebro e, assim, poder inferir características sobre seu modo de vida. Outra pes-quisa está sendo feita junto ao Instituto de Pale-ontologia de Vertebrados e Paleoantropologia de Pequim, na China. Neste caso, busca-se entender o surgimento e a evolução dos Pterossauros, que existem em grande diversidade no país.

O estudante de Licenciatura em Ciências Bio-lógicas Richard Santos Buchmann de Oliveira e a graduanda em Geologia Maria Emília Gomes Vieira Reis participam do Núcleo de Estudos em Pale-ontologia há cerca de um ano. Richard investiga tomografias computadorizadas de vértebras de Pterossauros a fim de identificar ossos pneumáti-cos, isto é, ossos ocos encontrados geralmente em aves, responsáveis por diminuir o peso dos animais e, consequentemente, auxiliá-los a voar. Já Maria Emília pesquisa sobre a diversidade morfológica de uma estrutura conhecida como notário – formado pela fusão de vértebras dorsais e da última vérte-bra cervical – presente em alguns Pterossauros. Para se ter uma ideia, existem mais de 200 espé-cies desse réptil encontradas no mundo.

Para ambos, ingressar no grupo lhes trouxe novas oportunidades de desenvolver estudos cien-

tíficos, participar de congressos e outros eventos e conhecer importantes pesquisadores da área. “O que mais gosto é saber sobre toda a diversidade que já habitou o planeta durante todas as eras, tanto no ambiente marinho, quanto no terrestre, desde animais recentes até animais muito anti-gos e plantas extintas também”, salienta Richard.

A importância de investimentosA opção do Núcleo de Estudos em Paleontolo-

gia e Anatomia Comparada por trabalhar com fós-seis já encontrados foi também uma necessidade de se adaptar à falta de recursos necessários para a descoberta de novos materiais. Segundo a pro-fessora Taissa, ao contrário de estados como Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, que possuem uma tradição em pesquisas na área de Paleontolo-gia, o Espírito Santo ainda caminha um pouco atrás. “A Paleontologia que fazemos é do mesmo nível do resto do Brasil. Mas não temos um laboratório de preparação. Então, o que eu busquei foi fazer um trabalho que não exija, no momento, a estrutura física de um laboratório, pesquisando um material que já está pronto para ser estudado. Quando mon-tarmos um laboratório, será possível ir a campo e trazer espécimes para cá, iniciando uma coleção na Ufes”, pontua Taissa.

Nesse sentido, a professora lembra que a am-pliação do Museu de História Natural de Alegre – inaugurado no início de 2013 – poderia ser um passo importante para o fomento de pesquisas nessa área, desde que conte com uma estrutura fí-sica laboratorial para abrigar professores e alunos de diferentes cursos. “A população da região está frequentando muito o Museu. Ainda temos uma

Pensando em dar visibilidade ao Espírito Santo e estimular a for-mação de paleontólogos no Estado, o Núcleo de Estudos em Pale-ontologia e Anatomia Comparada está organizando o IX Simpósio Brasileiro de Paleontologia de Vertebrados, que acontecerá em Vitó-ria e Vila Velha, no período de 25 a 29 de agosto de 2014. Desti-nado a pesquisadores que estudam fósseis de animais vertebrados, o encontro reunirá acadêmicos nacionais e internacionais, que minis-trarão palestras, minicursos e fóruns de discussão. A expectativa é de que o evento reúna cerca de 350 participantes. “Cada vez que vamos a um congresso e vemos pessoas pesquisando o mesmo que nós, saímos ainda mais motivados”, justifica a professora Taissa.

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coleção pequena, mas as pessoas se interessam em visitá-lo. Outro dia, um senhor que foi com a família conhecer o Museu me ligou para doar um fóssil que ele havia ganhado há 20 anos, igual a um que estava exposto dentro de um nódulo. Essa divulgação tão simples que a gente pode fazer já muda o modo como as pessoas enxergam as pes-quisas”, alerta Taissa.

A Paleontologia no BrasilDe onde viemos? Para onde vamos? Essas são

algumas das perguntas que a Paleontologia, ciência que se dedica ao estudo da vida antiga no planeta através da análise de fósseis animais e vegetais, busca responder. Por meio dela, torna-se possí-vel a descoberta de fatos e aspectos relacionados ao surgimento, evolução, adaptação e desapareci-mento de espécies que já habitaram a Terra, auxi-liando-nos a remontar partes do quebra -cabeça de nossa história que ainda estão perdidas.

“Ela é importante para conhecermos o que tínhamos de vida na Terra há milhões de anos. O nosso planeta foi completamente mudado. Por-tanto, entender o surgimento e a evolução desses animais ajuda a explicar o que tínhamos, o que temos hoje e o que pode acontecer”, argumenta a professora Taissa.

De acordo com Max Langer, presidente da Socie-dade Brasileira de Paleontologia (SBP), o cenário de estudos nessa área no Brasil pode ser avaliado de maneira positiva, uma vez que, principalmente a

partir dos últimos 10 anos, tem havido um aumento expressivo de vagas destinadas a paleontólogos em função do surgimento de novas universidades. Apesar disso, Max alerta que alguns problemas ainda necessitam ser superados. Entre eles estão a falta de investimentos em pesquisas e a existência de uma legislação ineficiente no que diz respeito ao patrimônio de fósseis, o que acaba facilitando o seu contrabando.

Outra discussão levantada pela SBP refere-se ao modo como a Paleontologia é estudada nas Ins-tituições de Ensino Básico. Conforme explica Max, essa ciência, assim como as demais ciências da terra, apresenta, de forma geral, um ensino defi-citário, sendo passada aos alunos mais em nível de curiosidade. Por outro lado, Max afirma que as teorias criacionistas, quando utilizadas como contraponto às teorias da evolução, também con-tribuem para uma certa desvalorização da área. Nesse sentido, uma das preocupações da Socie-dade é fomentar a criação de políticas que pro-movam o ensino formal da Paleontologia de forma mais aprofundada.

Após começar a desenvolver seus trabalhos na Ufes, a professora Taissa se reuniu com outros co-legas de profissão e, juntos, propuseram a criação de uma chapa para o Núcleo da SBP, representan-do o Rio de Janeiro e o Espírito Santo. O objetivo é dar visibilidade à paleontologia nesses estados, fo-mentando pesquisas e promovendo uma maior ar-ticulação entre os pesquisadores.

Pesquisadores durante trabalho em campo na Chapada do Araripe, entre os estados do Ceará, Pernambuco e Piauí

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De acordo com os dados do Ministério da Saúde, as doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes e as cardiovasculares, são as prin-cipais causas de morte e de morbidade no Brasil, além de responderem pelos maiores gastos com assistência hospitalar do Sistema Único de Saúde (SUS). Já imaginou o quanto tais índices poderiam ser reduzidos caso os sinais dessas doenças fos-sem detectados antes de elas se manifestarem? Pois para os pesquisadores do Estudo Longitudi-nal da Saúde do Adulto, o Elsa Brasil, isso é fun-damental. Realizando testes em 15.105 pessoas das regiões Nordeste, Sul e Sudeste do País, este é o maior estudo epidemiológico já feito na Amé-rica Latina. Seu objetivo é investigar a incidên-cia e os fatores de risco para doenças crônicas na população brasileira na faixa etária entre 35 e 74 anos. O conhecimento dessas informações é fun-damental para a gestão da saúde pública no Bra-sil e para garantia de uma maior qualidade de vida para as futuras gerações.

É sempre melhor prevenir do que remediar. Esse é o pensamento que norteia os mais de 150 pes-quisadores que atuam no Elsa, distribuídos em seis instituições brasileiras: Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRS), Universidade Federal da Bahia (UFBA), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade de São Paulo, Fiocruz e Ufes.

Segundo o coordenador do Elsa na Ufes, pro-fessor José Geraldo Mill, antes que uma doença apareça, surgem preditores no organismo dos indivíduos, ou seja, sinais que podem indicar que uma doença está por vir e que, quando identifi-cados, são usados para impedir que ela se mani-feste efetivamente, causando maiores danos. Um exemplo de preditor bastante conhecido é o colesterol NDL, que está associado ao apareci-mento de disfunções cardiovasculares. O grande problema é que os preditores de muitas doenças ainda são desconhecidos. Sendo assim, o Elsa surge justamente em busca desses sinais em cinco grupos de patologias crônicas: cardiovasculares, metabólicas, cânceres, doenças renais e doenças degenerativas.

No entanto, entre os preditores de uma doença e o seu desfecho há um espaço de tempo signifi-cativo. Por esse motivo, o Elsa – que é financiado em grande parte pelo Ministério da Saúde e pelo Ministério da Ciência e da Tecnologia –, enqua-dra-se nos chamados estudos de coorte, nos quais a saúde de um grupo de pessoas passa a ser acom-panhada periodicamente durante um longo tempo. No caso do Elsa, estima-se que o tempo ideal para a duração da coorte seja de 25 anos. A cada qua-tro anos, inicia-se uma nova onda de estudos com todo o grupo analisado.

Elsa Brasil:

Pesquisadores da Ufes integram o Estudo Longitudinal da Saúde do Adulto, que investiga os fatores de risco para doenças crônicas em cerca de 15 mil

pessoas das regiões Nordeste, Sul e Sudeste do País

pensando no futuro das próximas gerações

Maíra Mendonça

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Exames antropométricos, pressão arterial, ele-trocardiogramas, ecocardiogramas, ultrassono-grafias, coletas de sangue, fezes e urina. Esses são alguns dos testes aos quais os voluntários do projeto são submetidos a cada onda de estu-dos. Como o projeto visa não apenas investigar associações entre doenças crônicas e fatores bio-lógicos, mas também comportamentais, ambien-tais, ocupacionais e sociais, os voluntários passam ainda por entrevistas feitas por telefone, em que se pretende identificar aspectos como a histó-ria familiar dessas pessoas, suas formas de conví-vio no meio social, relações no trabalho e com a vizinhança, gênero e especificidades alimentares, entre outros fatores. O questionário é aplicado a cada onda de estudos, mas também é feito anual-mente de forma resumida.

“Algumas pessoas que entraram no Elsa já têm doenças, outras não. Como fazemos exames periódicos, é possível identificar nesses voluntá-rios o que chamamos de modificadores de efeito. Se o indivíduo tem diabetes, quais os comporta-mentos que ele pode ter para que as consequên-cias do diabetes apareçam menos? Por isso, nós estudamos fatores biológicos, comportamentais

e sociais”, explica o professor Mill. E exemplifica: “A depressão, por exemplo, é uma doença extre-mamente relacionada a problemas como diabetes e cânceres. Então, a gente estima que as pes-soas que têm um suporte social menor tendem a desenvolver mais doenças. Mas isso é uma ideia. Deve ser comprovada cientificamente.”

Segunda onda de estudosA partir de dezembro de 2012, o Elsa iniciou

sua segunda onda de estudos. Na Ufes, dos 1.055 voluntários do projeto, atualmente 800 já passa-ram pelo processo de reavaliação. A previsão é de que a segunda onda seja concluída até março deste ano. O professor Mill reforça a importância de que os voluntários – que são todos servido-res públicos das universidades que participam do projeto – permaneçam no Elsa até o final, visto que para registrar a incidência de doenças crôni-cas, bem como os preditores a elas associados, é preciso que todos os indivíduos passem por, no mínimo, quatro ondas de estudo. “Num estudo de coorte, o projeto é mais para o outro do que para eles mesmos. É mais um serviço do que um bene-fício”, aponta Mill.

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Foi justamente nisso que pensou Júlio César Kill Guerzet, diretor do Departamento de Orçamento e Gestão da Informação da Ufes, quando decidiu tor-nar-se um dos mais de 15 mil voluntários do Elsa. Júlio iniciou sua carreira na Universidade em 1979 como técnico-administrativo no Departamento de Ciências Fisiológicas, em Maruípe, Vitória. Por ter conhecido de perto o trabalho realizado por pro-fessores e pesquisadores desse setor, quando teve a oportunidade de participar do Elsa, ele não pen-sou duas vezes. Encaixando-se nas cotas de sexo, faixa etária e função na Instituição – dividida em superior, técnico e apoio –, que buscam garan-tir a representatividade das amostras, o servidor se voluntariou desde a primeira onda de estudos.

“Espero estar contribuindo para as pesquisas que estão sendo feitas, permitindo que tenhamos no Brasil um histórico das causas das doenças, principalmente as cardiovasculares, em função do meio ambiente, hábitos alimentares, atribulações da vida, cargos que desempenhamos, etc. Desejo a toda a equipe do Elsa sucesso nestes trabalhos e que tenhamos uma vida longa para atingirmos o objetivo deste grande projeto”, almeja Júlio.

O professor Mill também destaca a importân-cia dos estudos de coorte para os avanços da medi-cina. Segundo ele, um exemplo claro de eficiência desse tipo de investigação refere-se à relação entre tabagismo e doenças cardiovasculares. Quando, em 1948, a Coorte de Framingham teve inicio nos Estados Unidos, o uso de cigarros – que produ-zem um efeito relaxante em função da nicotina – era recomendável para evitar infartos, que tinham como principal causa o estresse. “Existia até propa-ganda na época: faça como seu médico, para evi-tar infartos, fume”, lembra Mill. Em 1961, 13 anos após o início da coorte, foi publicado o primeiro estudo comprovando que quem fumava tinha risco três vezes maior de sofrer um infarto. Em conse-quência dessa descoberta, já em 1967, a Mega Heart Association estabeleceu em suas diretrizes que pacientes coronários deveriam abandonar o cigarro. “Então, uma coisa que é muito evidente hoje e que qualquer criança sabe, surgiu de uma coorte”, acrescenta o professor.

O incentivo a pesquisasTodas as informações obtidas pelas seis ins-

tituições que participam do Elsa são acumuladas e encaminhadas à Universidade Federal do Rio Grande do Sul, dando origem a um grande banco de dados. Este, por sua vez, torna-se um berço para

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Professor José Geraldo Mill (acima), coordenador do Projeto Elsa Brasil no Espírito Santo, e pesquisador armazenando material coletado de pacientes

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a realização de inúmeras pesquisas científicas em diferentes áreas. De acordo com o professor Mill, atualmente existem cerca de 80 pesquisadores no País utilizando os dados obtidos no Elsa Brasil em seus estudos.

Esse é o caso de Taísa Sabrina Silva Pereira, mestranda em Saúde Coletiva e supervisora de Exames Clínicos do Elsa no Espírito Santo. For-mada em Nutrição, Taísa, que participa do estudo desde 2009, hoje desenvolve sua dissertação utili-zando os dados da linha de base ou primeira onda de estudos do Elsa. Seu objetivo é analisar a con-cordância entre métodos de avaliação de consumo de sódio e potássio em participantes do projeto. “Nesse tempo pude ampliar meus conhecimentos na área de Epidemiologia e Epidemiologia Nutri-cional, bem como o conhecimento em pesquisa científica, muitas vezes pouco conhecida. Hoje compreendo os benefícios que as pesquisas tra-zem para a população e as dificuldades encontra-das na prática”, afirma.

Segundo a professora Dóra Chor, que participa do Elsa Brasil na Fiocruz desde 2005, lá os dados do estudo também estão sendo utilizados na elabora-ção de artigos científicos, dissertações de mestrado e teses de pós-doutorado. “O potencial é enorme. Impossível prever hoje quantos trabalhos científi-cos serão publicados com os dados já disponíveis e com os dados da segunda etapa de coleta de dados que será concluída em 2014”, enfatiza Dóra.

Outro ponto positivo evidenciado pelo pro-fessor Mill é que a escolha das universidades que compõem o Elsa foi feita pensando em abarcar a diversidade de pesquisas com potencial para serem desenvolvidas nos âmbitos biológico, social e comportamental. Além disso, os resultados obti-dos no Brasil podem ser comparados com resul-tados de coortes de outros países, identificando preditores diferentes e semelhantes e sua inter-ferência no aparecimento de desfechos. “Esse é um tipo de pesquisa em rede. Nenhuma universi-dade sozinha é capaz de tocar um projeto assim. E montando um projeto em rede, cada um contribui com a sua expertise. Por exemplo, o foco de inte-resse do grupo Elsa da Bahia é a Epidemiologia Social, o nosso foco aqui é na área da Fisiologia cardiovascular”, explica ele. Já a professora Dóra aponta ainda outra vantagem na realização de um estudo multicêntrico: “ele une esforços de vários pesquisadores seniores do Brasil e insere varia-bilidade regional, o que é importante num país tão grande e diverso como o nosso”, conclui.

Pesquisadores analisam amostras que compõem o banco de dados do projeto

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O LabTAR reúne pesquisadores nas áreas de gestão da inovação, gerenciamento de projetos, gestão do conhecimento e design da informação

Duas cabeças pensam melhor do que uma. Esse conhecido dito popular adquire cada vez mais força e significado dentro da Ufes, que, por ser um espaço privilegiado

para a interação e a troca de experiências, cami-nha rumo a um objetivo: a construção coletiva do conhecimento. É nessa perspectiva que sur-giu, em 2010, o Laboratório de Tecnologias de Apoio a Redes de Colaboração (LabTAR), que reúne competências nas áreas de gestão da inovação, gerenciamento de projetos, gestão do conheci-mento e design da informação como elo central de

Laboratórios cidadãos: da cocriação à inovação

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Fotos: Thaiana Gomes

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outra iniciativa, o Living Lab Habitat. Este, por sua vez, é uma rede que integra a comunidade acadê-mica com outras instituições públicas, privadas e a sociedade civil. O propósito da rede Living Lab Habitat é buscar soluções para melhoria das condi-ções habitacionais de populações urbanas de baixa renda, integrando competências de todos os envol-vidos, incluindo os beneficiários diretos.

Tanto o LabTAR quanto o Living Lab Habitat são considerados laboratórios cidadãos. Segundo a professora do Departamento de Engenharia de Produção e coordenadora do LabTAR, Miriam de Magdala Pinto, os laboratórios cidadãos caracte-rizam-se como ambientes de geração de conhe-cimento e de novas tecnologias, que incluem a participação de universidades, empresas, organiza-ções não governamentais (ONGs), e fundações, com um diferencial: neles, é preciso que haja o envolvi-mento por parte dos usuários desde a concepção dos projetos até sua finalização.

“Esse envolvimento próximo do usuário é uma diferença considerável. Trabalhamos muito para promover a cidadania através da participação na criação, retirando um pouco essa ideia de que só quem cria são as pessoas da universidade com for-mação superior. Todos somos capazes de criar, estando juntos e colaborando uns com os outros é bem mais fácil. É justamente a colaboração, o envolvimento do ‘diferente’ do ‘outro’ que torna um Living Lab um ambiente rico para a criação de novos conhecimentos e tecnologias”, ressalta Miriam.

A professora Miriam lembra que, quando se fala em melhoria de condições habitacionais – principal objetivo do Living Lab Habitat –, não se está falando apenas da provisão de casas ou de saneamento básico para a população, mas tam-bém de educação, lazer, segurança, mobilidade urbana, acesso à internet, do direito de ser cria-tivo e de influir na sua realidade, da cidadania, enfim. “Tudo que está relacionado ao bem-viver. E por isso são desenvolvidos diferentes projetos, explorando as diversas áreas abarcadas pelo labo-ratório, de acordo com a necessidade das comuni-dades”, completa.

LabTARPor se tratar de um projeto multidisciplinar,

hoje atuam no LabTAR cinco professoras (Miriam de Magdala Pinto, Renata Silva Souza Guizzardi, Patrícia Alcântara Cardoso, Letícia Pedruzzi Fon-seca e Roberta Lima Gomes) e 10 estudantes dos cursos da Ufes: Engenharia de Produção, Desenho

Industrial e Informática. Em projetos específicos realizados pelo LabTAR estão envolvidos profes-sores do Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes) e da Universidade Tecnológica de Berlim, Alema-nha (TU/Berlim).

A professora do Departamento de Desenho Industrial Letícia Pedruzzi Fonseca recorda-se de um fato que considera marcante. “Logo que come-çamos a fazer as reuniões do Living Lab Habi-tat, sempre dizíamos que o propósito do trabalho seria melhorar a qualidade de vida das pessoas de baixa renda. Isso sempre era falado nas reuniões, até que uma pessoa perguntou para o grupo como alguém pode julgar o que é ‘melhoria de qualidade de vida para outra pessoa’. Isso nos levou a rede-finir o propósito do Living Lab para a melhoria de condições habitacionais em vez de qualidade de vida. Quando começamos a trabalhar em conjun-to, com o outro e não para o outro, a coisa muda de perspectiva”, observa Letícia.

Participantes da Varal Agência de Comunicação, do projeto Território do Bem, que é promovido

pela Associação Ateliê de Ideias

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e X t e n s ã o

Exemplos de projetos do LabTAR são o Conecte Ideias e uma minifábrica móvel para reciclagem de resíduos da construção civil, ambos desenvolvidos em parceria com a Associação Ateliê de Ideias, uma agência de apoio ao desenvolvimento de comuni-dades urbanas de baixa renda da Grande Vitória, que atua em quatro núcleos principais: finanças solidárias, habitação, desenvolvimento comunitário e difusão de tecnologias sociais. O Conecte Ideias é uma plataforma on-line de inteligência coletiva que está sendo desenvolvida juntamente com a comunidade do Território do Bem e a empresa de Tecnologia da Informação Prosperi. Já a Mini-Fábrica Móvel consiste no desenvolvimento de um caminhão-caçamba para reciclagem de resí-duos da construção civil, que está sendo desenvol-vido conjuntamente pelo LabTAR, a Universidade Tecnológica de Berlim, o Ifes, a empresa social Bem Morar e a construtora Morar.

Juliana Merçom França é formada em Publici-dade e Propaganda pela Ufes e participa do LabTAR desde novembro de 2012. Sua função é desenvol-ver atividades relacionadas à assessoria de comuni-cação interna e externa do projeto, mantendo todos

os envolvidos cientes dos avanços e das ações rea-lizadas. Para ela, a oportunidade de trabalhar em um projeto que foge aos padrões encontrados no mercado de trabalho está sendo muito importante para o seu crescimento profissional e pessoal.

“A interação multidisciplinar acrescenta no desenvolvimento e resultado dos nossos traba-lhos. Sair um pouco da nossa zona de conforto e ter que lidar com ideias e pensamentos diferen-tes só têm a enriquecer o conhecimento. Uma das atividades mais difíceis nos dias de hoje é apren-der a conviver com pessoas. O LabTAR sempre pro-porcionou um ambiente agradável onde os alunos, bolsistas e professores trabalham de forma cola-borativa e estão dispostos a aprender uns com os outros”, relata Juliana.

De onde vem esse nome?O nome Living Lab está relacionado à organiza-

ção europeia The European Network of Living Labs (ENoLL). Criada em 2006 e atualmente sediada em Bruxelas, essa associação sem fins lucrativos foi responsável pela difusão deste conceito que nasceu no Media Lab no Massachusetts Institute

Integrantes da Varal Agência de Comunicação junto aos pesquisadores do LabTAR

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Embora o LabTAR tenha sido criado inicialmente para gerenciar os projetos do Living Lab Habitat, o surgimento de novos trabalhos e mudanças em sua gestão o levaram a desenvolver outros projetos de pesquisa e extensão desvinculados dessa rede de pesquisa. Um exemplo é a participação da coor-denadora do LabTAR na Rede Ibero-Americana de Pesquisa sobre Laboratórios Cidadãos, que engloba países como Espanha, Argentina, Colômbia, Para-guai, Uruguai, Chile e México.

Por isso, em agosto de 2013, a Ufes sediou o evento “Primeiras Jornadas Ibero-Americanas de Laboratórios Cidadãos”, que reuniu cerca de 50 pesquisadores de universidades nacionais e internacionais, com o in-tuito de trocar experiências relacionadas à implanta-ção de laboratórios cidadãos. Segundo a professora Miriam de Magdala Pinto, coordenadora do LabTAR, os resultados do encontro foram muito positivos, ge-rando, inclusive, novas parcerias entre os laboratórios.

Uma das proposições originadas do evento diz respeito à produção de um documento solicitando o apoio das Fundações de Amparo à Pesquisa (Fapes) de todo o País para esse tipo de projeto, além de evi-denciar a necessidade de discussões quanto à pro-priedade intelectual, visto que muitos pesquisadores acreditam que seja preciso pensar em novas formas de proteção intelectual pelo fato de os projetos cria-dos pelos laboratórios cidadãos serem desenvolvidos de forma colaborativa e interinstitucional.

Outra preocupação dos pesquisadores do LabTAR refere-se à necessidade de adequação dos procedi-

mentos burocráticos da Uni-versidade para abrigar projetos interdisciplinares. Um dos mo-tivos é o fato de ela ainda não contemplar a possibilidade de um projeto de pesquisa ou de extensão estar vinculado ou ser coordenado por mais de um departamento ou centro. “A outra coisa é que sempre te-mos que optar se o que esta-mos fazendo é um projeto de ensino, pesquisa ou extensão. E não é. Muitas vezes fazemos os três juntos em uma mesma ação”, pontua Miriam.

of Technology (MIT). Trata-se de uma metodolo-gia de trabalho em pesquisa e extensão que reúne membros da academia, de empresas, da adminis-tração pública, de agências de financiamento e da sociedade civil organizada, a fim de gerar inova-ção. Todo ano, a ENoLL disponibiliza editais para que os laboratórios que se identifiquem com essa proposta se inscrevam e, caso sejam aprovados, recebam o selo Living Lab.

Existem 13 Living Labs no Brasil. Desses 13, dois estão na Ufes: o Living Lab Habitat e o Núcleo de Cidadania Digital (NCD), o primeiro laboratório cidadão do Espírito Santo. Os demais laboratórios estão espalhados por estados como Amazonas, Maranhão, Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo. Além disso, por meio de um levanta-mento feito através das bases de dados dos proje-tos de extensão de universidades de toda a região Sudeste, os pesquisadores do LabTAR identifica-ram mais 10 laboratórios cidadãos não cadas-trados pela ENoLL. Entre eles, mais dois são da Ufes: o Projeto Sossego e o Grupo Célula Emau. O Projeto Sossego é conduzido pelo Laborató-rio de Gestão de Recursos Hídricos e Desenvolvi-mento Regional (Labgest), do Departamento de Engenharia Ambiental, e sua proposta é traba-lhar o papel da ciência e da tecnologia na criação de soluções para uma produção agrícola susten-tável na bacia do Córrego Sossego, em Itarana. O Grupo Célula, ligado ao escritório modelo de Arquitetura e Urbanismo, visa à integração entre estudantes do curso de Arquitetura e Urbanismo da Ufes, comunidades organizadas e movimentos sociais que não possuem acesso ao mercado for-mal de arquitetura.

Ufes integra Rede Ibero-Americana

Foto: Arquivo Labtar

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O conhecimento se transforma e se amplia com o passar dos anos. São os avanços científicos que nos permitem aproximar cada vez mais da compreensão do uni-

verso em que vivemos, ainda cercado de tantos mis-térios. É com o objetivo de expandir as fronteiras do conhecimento e explorar novas possibilidades que pesquisadores do Grupo de Pesquisa em Cos-mologia e Gravitação, do Departamento de Física da Ufes, dedicam-se ao estudo teórico de fenômenos ligados às questões gravitacionais, que vão desde a formação e estruturação do universo, até a aná-lise de teorias recentemente formuladas, como a existência da matéria escura e de buracos negros.

UniversoGrupo de Cosmologia e Gravitação da Ufes contribui, há mais de 30 anos, para a compreensão dos mistérios que cercam o universo

p e s Q U I s A

Descobrindo o

Fotos: Thaiana Gomes

Maíra Mendonça

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Fundado em meados da década de 1970 pelos professores Antônio Brasil Batista e José Plínio Baptista, o grupo de Cosmologia e Gravitação é um dos mais antigos da Universidade e, ao longo desses mais de 30 anos, acumula cerca de 2.500 citações em trabalhos científicos na área. Atu-almente, o grupo é composto pelos professores Alan Velazquez-Toribio, Antônio Brasil Batista, Davi Rodrigues, Júlio César Fabris, Oliver Piattella, Sergio Gonçalves e Wiliam Hipólito-Ricaldi. No momento, o grupo também conta com um pesqui-sador visitante especial do CNPq, professor José Antônio de Freitas Pacheco; com dois bolsistas Jovens Talentos do Programa Ciências sem Fron-teiras (Hermano Velten e Betti Hartmann); com os professores visitantes Winfried Zimdahl, Luciano Casarini e Rafael Perez; além de 23 estudantes de graduação e quatro pesquisadores pós-doutores. Só nos últimos cinco anos, foram publicados pelo grupo cerca de 70 artigos e defendidas 10 teses de doutorado e 15 dissertações de mestrado.

Para se compreender esse campo de estudos, o coordenador do grupo, professor Júlio César Fabris, explica que, embora seja uma das mais antigas teorias físicas, a teoria gravitacional é também uma das mais problemáticas. Desenvolvida ini-cialmente por Isaac Newton, no século XVII, ela foi muito bem-sucedida, explicando, até o final do século XIX, praticamente todos os fenômenos conhecidos, desde a queda dos corpos na Terra, até a órbita dos planetas. No entanto, com a evo-lução dos estudos, ela já não dava mais conta de explicar certos fatos, como, por exemplo, a rota-ção lenta (uma volta por cerca de 3 milhões de anos) da órbita de Mercúrio (a chamada precessão do periélio) que sobrava mesmo depois de consi-derar a influência de outros planetas.

Teoria da RelatividadeSurge então, no século XX, a Teoria da Relativi-

dade geral de Einstein, interpretando a força gravi-tacional, responsável por manter os corpos presos à superfície da Terra, como o resultado da curva-tura do espaço-tempo, ente que aparece ao tratar as relações espaciais e temporais em pé de igual-dade. “Esse é um dos principais alicerces da física moderna”, pontua Fabris. E continua: “a princípio a teoria da relatividade geral era muito bem-suce-dida, mas hoje várias correntes de estudos apontam problemas, que tornam a compreensão de certos fenômenos um pouco delicada. Para se enten-der, por exemplo, o comportamento de objetos

como galáxias, aglomerados de galáxias e a forma-ção de estruturas no universo, é preciso introduzir um componente que não se sabe o que é. Sabe- se que ela deve ter determinadas características, mas ainda não foi possível detectá-la diretamente. Chama-se isso de matéria escura. Ela só se mani-festa através de seus efeitos gravitacionais, daí o termo escuro”, afirma o professor.

Sobre a matéria escura, o professor Davi Rodri-gues ressalta que ela é fundamental, inclusive, para a compreensão da dinâmica das galáxias, que só se explica se houver mais matéria do que a que é atri-buída à matéria usual, que compõe estrelas, gases diretamente detectáveis e planetas, entre outros. A matéria escura é supostamente composta por par-tículas ainda não diretamente detectadas. Em prin-cípio, ela seria cerca de cinco vezes mais abundante do que a matéria usual (constituída, em maior parte, de prótons, elétrons e nêutrons). “É como se algo te empurrasse, mas não se sabe o que é”, exempli-fica o russo Vladimir Strokov, pesquisador do grupo.

Um enigma investigado pelo grupo é a exis-tência da energia escura, um componente do conteúdo energético do universo com efeitos gravitacionais repulsivos. Os estudos sobre ener-gia escura se intensificaram quando se descobriu, em 1998, que a expansão do universo ocorre de forma acelerada, fato que contraria a concepção atrativa da gravitação. Tal descoberta indica que

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p e s Q U I s A

deve haver outro componente no universo que provoque essa expansão, causando um efeito repulsivo, ao invés de atrativo.

Para o professor Fabris, a evolução do grupo de Cosmologia e Gravitação se deu em função da evo-lução da própria área, a partir do desenvolvimento de estudos e tecnologias para a observação do universo. “Inicialmente o grupo era muito teórico e pouco a pouco foi se diversificando. Em primeiro lugar, passou a se aproximar mais das questões de observação, voltando-se principalmente para a Cosmologia e analisando os dados de maneira mais sistemática. Hoje podemos dizer que estamos muito próximos dos dados observacionais”, destaca. Outra mudança que surgiu a partir da década de 1990 refere-se ao estudo das propriedades e efei-tos quânticos dos buracos negros, objetos astrofí-sicos com um campo gravitacional tão forte que é capaz de deixar presa até mesmo a luz.

Uma outra vertente de estudos sobre a qual os pesquisadores do grupo se dedicam diz respeito ao fato de que, se a teoria da relatividade geral é correta e se a teoria da mecânica quântica (que estuda os fenômenos atômicos e subatômicos, ou seja, os que envolvem as moléculas, átomos e par-tículas fundamentais) também é correta e univer-sal, existem possibilidades de uni-las, formulando assim uma teoria quântica da gravitação. Essa é uma questão que ainda não foi entendida, pois casar as duas coisas traz inúmeros desafios con-ceituais, teóricos e técnicos. Atualmente tenta-se entender como se daria essa fusão”, afirma Fabris.

Pioneirismo no EstadoO grupo de Cosmologia e Gravitação foi o único

grupo de pesquisa do Espírito Santo contemplado pelas bolsas de Pesquisador Visitante Especial e de Jovens Talentos. Ambas fazem parte do pro-grama Ciências Sem Fronteiras, promovido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

José de Freitas Pacheco, ganhador da bolsa de visitante especial, foi o fundador do Programa de Pós-Graduação em Astronomia da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Instituto Astro-nômico e Geofísico da instituição, do Observató-rio Nacional e do Observatório da Côte D’Azur, na França. Atualmente lecionando na Universidade de Nice, na França, Pacheco voltou ao Brasil com o objetivo de atuar na Ufes para auxiliar no desen-volvimento de pesquisas voltadas para a Cosmo-logia, em especial na análise de dados obtidos em

Compartilhando o conhecimento

Saber os passos que estão sendo dados na área de pesquisa é fundamental para o avanço do conhecimento por permitir o compartilhamento de experiências. É por isso que o grupo de Cosmologia e Gravi-tação mantém parcerias com grupos de pesquisa de vários países, incluindo Argen-tina, Chile, França, Alemanha, Rússia, Itá-lia, Bélgica, Croácia e Benin (na África). Na opinião do croata Neven Bilic, pesquisador do Instituto de Rudjer Boskovic de Zagreb, o grupo coordenado pelo professor Fabris é um dos mais ativos na área de Cosmolo-gia em todo o mundo, tendo dado contri-buições importantes para a formulação de modelos de unificação de matéria e ener-gia escura. Já no Brasil, os pesquisadores mantêm colaboração com a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF/MG), o Cen-tro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), a Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Pensando nessas redes de colabora-ção, são organizados também eventos de cunho internacional. Em 2014, acontecerá em Pedra Azul, município de Domingos Martins, a segunda Escola Plínio, encontro destinado a pesquisadores e estudantes de Física, que tratará do tema da Radia-ção Cósmica de Fundo, sobre a qual fala-rão estudiosos da Dinamarca, Alemanha, Inglaterra e Rússia.

Nos anos ímpares – ao contrário da Es-cola Plínio, que ocorre nos anos pares – será realizado também o evento denominado Verão Quântico, em Ubu, município de An-chieta. Nele são apresentados painéis so-bre estudos em Gravitação e Cosmologia tanto do ponto de vista clássico, quanto do ponto de vista quântico. Para além, o gru-po mantém uma programação intensa e va- }riada de minicursos destinados ao público interno do curso de Física da Ufes.

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simulações cosmológicas – simulações da estru-tura do universo – baseadas em cálculos numéri-cos feitos em supercomputadores. A bolsa prevê que o pesquisador especial passe três meses no Brasil anualmente, por um período de três anos. Pacheco já está em seu segundo ano.

Ele afirma que o conhecimento dessas áreas nos permite aproximar a teoria da compreensão da natureza. “Isso é o que se procura. Há cerca de 50 anos, havia um grande intervalo, de quase duas décadas, entre o conhecimento teórico e sua apli-cação prática. Com pesquisas desse tipo, esse inter-valo diminuiu bastante, podendo ser uma questão de meses”, explica.

Nesse sentido, investimentos em educação e a disponibilização de recursos para o desenvolvi-mento desses estudos são apontados por Pacheco como fundamentais para garantir a competitivi-dade do Brasil frente aos demais países, permitindo que ele invista em produtos tecnológicos, que são mais valiosos, e que surgem justamente a partir do conhecimento gerado pela Física quando aplicado em outras áreas, como a Engenharia. “Essa necessi-dade de transformar o conhecimento adquirido em aplicação é crucial para um país manter sua ativi-dade econômica”, analisa.

“Esse é o tipo de ciência que não desenvolverá um produto. É a ciência que está na fronteira do conhecimento, e cujo objetivo é avançar essa fron-teira. E, com isso, ela culmina na geração de novas tecnologias, que acabam sendo aplicadas em novos produtos”, esclarece Hermano Velten, vencedor da bolsa de Jovens Talentos, mostrando que a Física está muito mais próxima do cotidiano das pessoas do que se imagina.

Atualmente com 29 anos, Hermano retornou à Ufes – onde cursou graduação, mestrado e douto-rado em Física –, em junho de 2013, após concluir seu pós-doutorado na Universidade de Bielefeld, na Alemanha. Sua pesquisa está relacionada aos pri-meiros dados divulgados recentemente pelo saté-lite Planck, da Agência Espacial Europeia, sobre a Radiação Cósmica de Fundo, um dado em Cos-mologia considerado fundamental por auxiliar na compreensão do comportamento do universo em grande escala.

“Sempre fizemos pesquisas em paralelo aos dados da Radiação Cósmica de Fundo, e essa sub-ciência dentro da Cosmologia nunca foi trabalhada. Talvez fosse o que faltava para colocar o nosso grupo em um patamar ainda mais alto”, enfatiza Hermano.

Integrantes do Grupo de Pesquisa em Cosmologia e Gravitação. À esquerda, o professor visitante especial José Antônio de Freitas Pacheco

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p e s Q U I s A

nem sempre visívelEstudos realizados por

pesquisadores do Laboratório de Anatomia Humana do Ceunes

mostram que o consumo de alimentos hipercalóricos pode

ocasionar sérios danos morfológicos e funcionais aos órgãos do

sistema gastrointestinal

Muitas vezes nos preocupamos com o as-pecto físico de nossos corpos por acre-ditar que ele atue como um indicador de nosso estado de saúde. No entanto, exis-

tem fatores de risco que, justamente por não serem detectados precocemente, tornam-se ainda mais pe-rigosos. Um exemplo deles é a gordura visceral, que envolve os órgãos internos do corpo. Um estudo de-senvolvido por pesquisadores do Departamento de Ciências da Saúde, do Centro Universitário Norte do Espírito Santo (Ceunes), comprovou que, além de problemas cardíacos e vasculares, o consumo fre-quente de alimentos hipercalóricos é responsável por um grande aumento da gordura visceral, po-dendo comprometer, inclusive, o funcionamento dos órgãos do sistema gastrointestinal inferior.

A pesquisa desenvolvida ao longo de 2010 pelos alunos Raphael Castiglioni, Haryanne Mabel e Bruna Queiroz, e coordenada pela bióloga e professora Roberta Paresque, foi publicada em junho de 2013 no periódico International Journal of General Medi-cine, revista internacional caracterizada pelo rápido relato de opiniões, publicação de pesquisas origi-nais e estudos clínicos em todas as áreas. Seu obje-tivo era comparar a morfologia (estudo da forma dos seres vivos) dos órgãos do sistema gastrointestinal inferior, tais como estômago, intestino delgado, intestino grosso e rins, em indivíduos submetidos e não submetidos a dietas hipercalóricas, isto é, ao

Um perigo

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consumo diário de calorias acima do necessário em relação ao seu gasto energético total.

Para tanto, foram selecionados dois grupos com-postos por 12 ratos machos de mesma procedência e características fisiológicas semelhantes, como a idade. O primeiro, chamado de grupo controle, foi alimentado com ração comum, enquanto o segundo, denominado grupo hipercalórico, foi alimentado com uma mistura de ração, chocolate, biscoito de maisena e amendoim. O experimento foi realizado por 10 semanas, período ao longo do qual eram medidos o consumo, o peso corporal, a distância entre a boca e o estômago, a distância entre a boca e o pescoço, a distância entre o pescoço e a cauda e a circunferência abdominal dos animais.

HipercaloriaUm fato surpreendeu os pesquisadores: eles

acreditavam que o grupo hipercalórico ganharia muito mais peso, o que não aconteceu por algum tempo. Somente ao longo das 10 semanas, o grupo hipercalórico começou a apresentar um aumento superior da circunferência abdominal em relação ao grupo controle, embora o peso de ambos tenha se mantido praticamente o mesmo. A explicação para isso é o fato de que, enquanto o grupo con-trole teve mais facilidade em adquirir massa mus-cular, que é mais pesada, o grupo hipercalórico adquiriu mais gordura, que é mais leve, o que torna a diferença de peso quase nula.

Já na segunda fase do experimento, quando os ratos foram dissecados, observou-se que a quan-tidade de gordura visceral do grupo hipercalórico era muito superior a do outro grupo. Um dos órgãos mais afetados foi o estômago, que praticamente dobrou de tamanho, adquirindo um aspecto defor-mado. Além disso, em função do espaço ocupado pela gordura, órgãos como os rins deslocaram-se do seu lugar morfologicamente habitual. Com a pesagem da gordura, a diferença entre os dois gru-pos mais que triplicou: no hipercalórico, foram 17 gramas, enquanto, no grupo controle, foram apenas cinco gramas. “Observamos também que o órgão fica com uma dificuldade de se desenvolver normal-mente, o que impede o seu funcionamento. A apli-cação desses resultados é direta, pois a semelhança fisiológica entre homem e rato é muito grande, o que os difere é a proporção”, explica a coordenadora da pesquisa, professora Roberta Paresque.

Ela também alerta que justamente por demo-rar a ser percebida e, portanto, controlada, a gor-

dura retroperitoneal ou visceral é a mais perigosa. Mesmo estando magra, uma pessoa pode possuir grande quantidade de gordura sem perceber. “Al-guns estudos afirmam que em certos casos o peso nem é tão importante, mas a circunferência abdo-minal sim. Às vezes vemos pessoas até um pouco magras, mas com uma barriguinha. E nesse estudo conseguimos comprovar que a região abdominal é onde há maior concentração de gordura”, enfatiza.

A dieta hipercalórica também foi o tema do mestrado e do doutorado da professora do curso de Nutrição da Ufes Luciane Bresciani, cujo foco era o aumento do risco cardiovascular. Ela afirma que o excesso de gordura produzida pela metaboliza-ção das colorias que não são queimadas pelos indi-víduos pode acarretar ainda outros problemas de saúde, como síndrome metabólica (que tem como base a resistência à ação da insulina), esteatose hepática (acúmulo de gordura no fígado), hiperten-são, dislipedemias (presença de níveis elevados ou anormais de lipídios no sangue) e diabetes tipo II, fatores que, se somados, podem aumentar os ris-cos de problemas no coração. “A dieta hipercalórica é indicada para indivíduos com baixo peso ou com risco de desnutrição, no caso de alguns pacientes hospitalizados em alguns casos de complicações provenientes de estados hipercatabólicos causa-dos por doenças graves. Nessas situações, ela deve ser prescrita por um nutricionista e balanceada em macro e micro nutrientes tendo em vista as pato-logias de base”, pontua Luciane.

Para Raphael Castiglioni, um dos idealizadores do estudo sobre os impactos da dieta hipercaló-rica sobre o sistema gastrointestinal inferior, pes-quisas experimentais como esta são importantes, pois seus resultados são utilizados diretamente na resolução de problemas de saúde pública. “Durante a vida acadêmica, o estudante que participa de pes-quisas desenvolve competências como disciplina e avaliação crítica, que certamente serão um diferen-cial no exercício profissional”, avalia ele. Raphael já é formado em Enfermagem e agora cursa Medicina. O estudante afirma que as investigações nessa área continuarão, já que ele pretende analisar amostras de porções terminais do intestino delgado e do intestino grosso coletadas dos animais para veri-ficar se a dieta hipercalórica pode ocasionar tam-bém alterações neuronais. Já a professora Roberta conclui: “o que fica para nós, principalmente, é que devemos tomar cuidado com aquilo que estamos ingerindo no nosso dia a dia.”

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e n t r e V I s t A

e o ‘declínio do grande outro’

Psicologia e os movimentos sociaisBom, do ponto de vista psicológico,

pelo menos duas teorias do meu conhe-cimento explicariam algumas nuances

do que está ocorrendo. A primeira delas é a Teoria das Trocas Sociais, que tem como repre-sentante Jean Piaget na sua abordagem que leva o nome do livro, que são os Estudos Sociológicos. Toda a nossa ação é entendida como uma troca social, ou seja, eu faço uma ação para o outro ou contra o outro e eu verifico o quanto aquele su-jeito tem de dívida para comigo ou o quanto eu tenho de dívida para com ele. É uma relação de dívida que se estabelece. Então deveríamos parar para pensar até que ponto as pessoas que estão indo para a rua fazer manifestações estão “afe-rindo” um certo tipo de dívida que o outro tem para com elas. Ou seja, se eu recebo truculên-cia policial na minha comunidade o tempo todo, como é que eu enxergo essa dívida? Não será que as autoridades estão em dívida com aquele que pratica a manifestação e por isso ele se manifesta dessa maneira? Da mesma forma, se ele não tem serviços adequados de assistência à saúde, edu-cação, entre outros, será que não é afronta de-mais para ele ver o outro ter transporte privado, motorista, carro oficial, enquanto ele anda em

um transporte coletivo precário? Será que não é ofensa demais para ele ver que uma determinada autoridade tem livre acesso a tecnologias sofisti-cadas de saúde, enquanto ele é obrigado a se de-bater por um atendimento precário em postos de saúde, e mesmo utilizando convênios particula-res, mas que têm um atendimento precário? Não é disso que eles reclamam?

Temos também o que a Psicanálise chama de “declínio do grande outro”, o declínio da fun-ção paterna e vários temas correlatos. A Psica-nálise adverte há muito, desde Freud, que não se faz o declínio do grande outro impunemente. Então, se a sociedade vem promovendo o declí-nio do grande outro, ela pode esperar conse-quências decorrentes desse declínio. Uma delas é a impossibilidade de vigorar um julgamento moral adequado para os sujeitos. Eles se perdem na hora de efetuar julgamentos morais, pois, na verdade, vemos exemplos sucessivos de quebras de parâmetros de moralidade. Então, não se faz isso impunemente. Se esses parâmetros de mora-lidade são quebrados – aqueles mesmos que o filósofo Emanuel Kant tinha como sua máxima – o que seria a máxima do entendimento? Seria que o sujeito agisse conforme ele gostaria que o mundo funcionasse –, então isso determina parâmetros

O capixaba Sávio Silveira de Queiroz é doutor em Psicologia Escolar e Problemas de Aprendizagem pela Universidade de São Paulo (USP), professor do Departamento de Psicologia Social e do Desenvolvimento, e também do Programa de Pós-Graduação

em Psicologia, ambos da Ufes. Atualmente seu tema de pesquisa é Afetividade e Moralidade. Nesta entrevista para a revista Universidade, o professor faz um balanço dos movimentos que tomaram as ruas do País em meados de 2013 e afirma: “temos de procurar entender o fenômeno e nós estamos longe, por enquanto, de entendê-lo”.

Os principais trechos da entrevista podem ser conferidos a seguir.

os movimentos sociaisEmília Manente

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de atuação das pessoas em relação à moralidade, que é outra teoria importante na Psicologia.

Hoje nós temos a Psicanálise estudando muito a moralidade. Como Lacan dizia, “é preciso colo-car uma pitada de vergonha nas relações sociais”. Então, nós estamos, na realidade, deixando de colo-car essa pitada de vergonha. Isso começa desde o político mais graduado, até a pessoa que burla leis de trânsito, que rouba os outros, que dá “cartei-rada” etc. Então, toda vez que alguém faz isso na sociedade, ele está infringindo regras morais que aparecem para o outro como uma dívida, pois eu estou sendo desrespeitado em minhas possibili-dades morais, por quebra de regras, de contratos e por aí vai. Então, é ingênuo a sociedade pensar que não pagará um preço pela quebra dos contra-tos, das regras morais; é ingênuo a sociedade pensar que, ao não dar oportunidade ao desenvolvimento do entendimento da razão, tudo correrá impune-mente. Nós, antes de simplesmente reclamarmos, com um estardalhaço midiático acerca das manifes-tações, deveríamos entender que elas são parte de um processo muito maior do que a mera vontade de um grupo de fazer bagunça, de criar vandalismo. Isso é um resultado social. O que nós vemos hoje é um resultado social. Agora, a sociedade pode em alguns momentos condenar, ou em outros momen-tos apoiar, mas deve procurar entender o fenômeno, e nós estamos longe, por enquanto, de entendê-lo.

As redes sociais e o Grande OutroExiste um termo atualíssimo que a Psicaná-

lise usa que é a extimidade, que seria exatamente o oposto mais virulento, mais evidente da intimi-dade. A intimidade nos preserva moralmente e se somos incentivados a nos expor de forma tão viru-lenta, tão forte, tão frenética, até que eu possa expor aquilo que há de mais íntimo em mim, pro-movendo a extimidade, onde fica alojada a minha vergonha? Em que eu posso, por exemplo, temer uma autoridade? E as consequências da falta de pudor e de vergonha para a sociedade são impre-visíveis. E essa ideia de extimo, aquilo que é nada íntimo, é um fenômeno social.

Com reações imprevisíveis, se vai levar ao caos a gente não sabe, mas é imprevisível. Ao passo que de alguma forma, como é muito bem sistematizado por Kant e por todos que estudaram Kant, inclusive a Psicologia Moral, se temos alguma possibilidade de regulação social por meio do pudor, da vergo-nha, e tal, temos mais previsibilidade em relação ao comportamento em grupo. Então, imagine, se o

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comportamento em grupo já nos predispõe a agir sob determinadas tendências que seriam inimagi-náveis, imagine esse comportamento em grupo com toda essa extimidade possível. Agora, de alguma forma isso é ensinado. Por exemplo, um Big Brother é uma boa forma de se ensinar às pessoas os princípios da extimidade. Abandona-se toda perspectiva de zelo íntimo e todos se expõem numa nova perspec-tiva que até então era desconhecida. Aqui estamos frente a mais um fenômeno de hipermodernidade.

Previsão do movimentoNós jamais conseguimos prever as consequên-

cias de um ato, pois elas sempre estão a posteriori. Mas, de qualquer maneira, logo que as manifesta-ções começaram, eu alertava, em discussão com os colegas, sobre o perigo que se incorria no atingi-mento das autoridades, sobretudo. Não demorou muitos dias, sem querer atuar como bruxo que faz previsões, mas rapidamente eles começaram a che-gar muito perto das autoridades, o que levou até a uma agressão grave a um comandante, que, se não fosse pela intervenção de um policial, ele teria morrido. Agora, quem faz isso não faz pela mera vontade de desordem, ele está fazendo motivado por algo muito grave, pois ninguém corre esse tipo de risco se não tiver uma motivação muito grave. Bem antes de tentar entender a coisa do ponto de vista jurídico, precisamos começar a executar o papel de ir a essas pessoas para tentar entender o fenômeno. Só há um jeito de entender o fenô-meno: é perguntando ao sujeito que o provoca, que o emite, que o deixa claro.

Então, da parte da Psicologia, da mídia, da Socio-logia, precisa-se perguntar aos sujeitos por que eles agem assim. Nós ouvimos muito as autoridades fala-rem na mídia “mas eles não querem o diálogo”. Quem disse que eles não querem? Alguém foi lá conversar? Alguém já foi lá perguntar? Agora, mais que um diá-logo, estamos precisando de uma abordagem cien-tífica desse fenômeno. E isso não está sendo feito. É um fenômeno que mostra suas facetas de forma muito rápida e, vamos dizer assim, em metamorfo-se constante. Quando nós pensamos que é a passa-gem de ônibus já é uma outra coisa e quando você vai investigar aquela outra coisa tornou-se uma outra. Então, a dinâmica do processo é muito forte.

Violência policialEm primeiro lugar, há um despreparo muito evi-

dente por parte da polícia. Os próprios sindicatos policiais vêm denunciando essa falta de preparo.

Há outro aspecto quando dizem que quem faz isso é o pessoal das periferias. Mas nós assistimos isso ser feito em pleno Leblon (bairro nobre da cidade do Rio de Janeiro). E quando você nota a movimen-tação dos grupos, é uma movimentação de quem conhece muito bem os locais, o que torna a polícia impotente na sua tentativa de repressão, uma vez que enquanto ela vai para um lugar tentar reprimir, já há um outro grupo que sabe se deslocar muito bem naquela região e que já está fazendo outro ato do chamado vandalismo.

Parece haver uma tentativa de mostrar a pos-sibilidade de um protesto exatamente no núcleo econômico, naquele lugar onde as pessoas são mais evidentes e onde as coisas acontecem com mais evidência. Agora, se existe uma resposta à violência policial, haverá sempre uma resposta a toda violência. Ela pode tardar, mas sempre há uma resposta forte à violência.

Nós e as redes sociais As pessoas em grupo sempre vão se comportar

de forma diferente do que são individualmente. O grupo faz amálgama, então ele pode reunir, fazer interseções de determinadas características que as pessoas não manifestam claramente, mas que em conjunto, no funcionamento, na dinâmica do grupo, pode aparecer uma linha de interseção. Nos casos em que a violência aparece, tanto em um jogo de futebol, quanto na periferia, quando uma bala perdida mata alguém da comunidade, um determinado traço aparece como algo uníssono e que pode unir as pessoas inclusive com relação à violência também. E isso não ocorre só na espécie humana; outros animais fazem agrupamentos com sentimentos também. Não se pode esperar que um agrupamento como o Facebook, que faz um agru-pamento de ideias e não exatamente de pessoas, que você possa prever o movimento disso. Qual-quer centelha, vamos dizer assim, que apareça nesse meio como interseção de vários pensamen-tos vai gerar um determinado tipo de situação.

Mascaramento x identidade x pertencimentoVários aspectos poderiam ser pensados. Pri-

meiro, porque ele, o manifestante, não quer que isso seja incluído na relação de troca social. Ele não quer que o rosto dele seja incluído nesse aspecto de troca social, ele prefere que a máscara seja incluída nesse aspecto de trocas. Mas há também um aspecto de esperteza. Por que uma pessoa vai querer ser identificada praticando vandalismo?

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A política tenta reverter esse tipo de argumento, tentando dar uma liderança para os movimentos ou dizendo que são mercenários, ou dizendo que é um ato de vandalismo para roubar. Isso tudo pode estar incluído dentro da manifestação, mas não é a totalidade dela. Então, certamente existe uma grande possibilidade de essas pessoas esta-rem com esse espírito político de não deixar a todo custo, nem pela identificação pessoal, que o movi-mento tenha um pai, lembrando que no começo de nossa conversa eu falava que nós fizemos o declí-nio do pai. Nada mais natural que as pessoas uti-lizem deste artifício para não mostrarem um pai no movimento. É um movimento sem paternidade.

Copa do Mundo e eleição para presidente É impossível prever os desdobramentos, mas

com certeza a resposta violenta gerará mais vio-lência. Toda vez que alguém age sobre o outro de forma heterônoma, que é algo da moralidade, impondo as regras sem discuti-las, eu tendo a criar aspectos heterônomos de resposta por parte da sociedade. O que nós deveríamos procurar fazer insistentemente é a busca pela autonomia dos sujeitos. O indivíduo autônomo é aquele que não só sabe as regras que ele deve seguir, mas aquele que pauta sua vida por aquilo que ele gostaria que fosse seguido. Há duas perguntas fundamen-tais que a Psicologia da Moralidade usa muito: que vida eu devo viver? E que vida vale a pena viver? Se alguns vão viver bem a Copa do Mundo, com felicidade de assisti-la, com certeza haverá. Mas também haverá aqueles que assistirão à Copa do Mundo, mas não abrirão mão do direito de reivin-dicar e também não abrirão mão da reivindicação violenta, posto que a violência é contaminante.

É preciso que as autoridades entendam que há abordagem científica em alto nível para quase tudo. Tratar de aspectos morais é uma determinada abordagem, que a rigor não é feita em nossos sis-temas de educação. Tratar a violência requer abor-dagem própria; melhorar as trocas sociais requer abordagem própria. Nosso problema maior é que as autoridades insistem na heteronomia. E nas relações heterônomas tudo se torna muito impre-visível, pois dá margem a explosões. Por exem-plo, eu questiono publicamente a validade do voto obrigatório. Há pouco tempo eu deveria ter comparecido às votações de determinados Con-selhos da profissão. Como o voto era obrigatório, eu não só deixei de votar, como justifiquei meu voto dizendo que não posso concordar que uma

instituição democrática tenha voto obrigatório. O voto facultativo é um dos melhores exemplos de autonomia que uma nação desenvolvida pode ter, e as autoridades se recusam a discutir o voto obri-gatório. Então, o que pode acontecer numa eleição para presidente em que o voto é obrigatório não se sabe, pois nós podemos mostrar nossa indignação inclusive de ter que votar de forma heterônoma e não autônoma. No fim das contas, quase nada que é destinado à população é destinado com base no princípio de autonomia, tudo vem pela via de uma heteronomia. A educação é heterônoma, a política é heterônoma, a manutenção da ordem e da lei é heterônoma, então, está esperando o quê, não é?

Continuidade dos movimentosA Psicanálise nos ensina que não adianta escon-

der o mal-estar. Então, quem se manifestará segu-ramente é aquele capaz de denunciar com mais força o seu mal-estar. É preciso de fato tomar cons-ciência sobre que mal-estar é esse e sobre quem está falando sobre ele.

Há exemplos muito práticos disso. Se eu ligo para a polícia e ela demora a me atender, isso traz em mim um sentimento de descontentamento que vai acumulando mal-estares além dos meus pró-prios constituintes estruturais humanos. Uma pes-soa que precisa do Samu e ele demora quatro horas para aparecer. Isso provoca indignação e uma atu-alização de um mal-estar que é próprio da nossa constituição subjetiva, inerente à condição humana, e que aparece à medida que for instigado. Normal-mente aparece por esses traços de interseção do qual falávamos; são vários mal-estares que se jun-tam e que num efeito de grupo podem se juntar de maneira muito evidente.

Conceito de moralidadeEu chamo de moralidade todo processo pelo

qual passa um indivíduo em relação às reflexões que ele faz a partir das suas ações em direção ao outro. Então, eu sempre preciso considerar o outro em minhas ações. Por isso eu tenho que ter um certo parâmetro, se podemos chamar assim, de um outro, de um Grande Outro, que é invisível, que é autori-dade e que faz parte da minha constituição, como eu preciso considerar o outro que está aqui do lado, que é meu colega, ser-humano. A esperança, e nem pre-cisa usar o termo moralidade, é que se incentive os cidadãos a viverem uma vida que vale a pena viver. Pois uma vida em que eu prejudi-que o outro, será que vale a pena ser vivida?

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a docênciareinventando24 cursos de licenciatura da Ufes disponibilizam mais de 500 bolsas para o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência, que são distribuídas entre professores e alunos da Universidade

Fotos: Thaiana Gomes

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A mpliar as interfaces entre a univer-sidade e a escola básica é cada vez mais um caminho vasto e desafiador diante da busca por educação de qua-

lidade em todo o Brasil. Nesse sentido, estreitar os laços que unem professores e futuros profes-sores, fazendo com que busquem soluções para as demandas que surgem tanto no meio acadê-mico, quanto nas salas de aula é a proposta do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência, o Pibid, promovido pelo Ministério da Educação (MEC). Atualmente, o programa engloba 24 cursos de licenciatura da Ufes, disponibili-zando mais de 500 bolsas, que são distribuídas entre estudantes e professores da Universidade, além de educadores de 32 escolas municipais e estaduais do Espírito Santo.

O Pibid nasceu na Diretoria de Educação Básica da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) – instituição pela qual é financiado –, com o objetivo de desenvolver uma política de incentivo à formação de docentes a par-tir da garantia de maior permanência dos licencian-dos nas escolas. De acordo com a coordenadora institucional do programa, professora Mirian Jonis, antes da sua criação, a vivência desses licencian-dos no ambiente escolar era assegurado somente pelo estágio obrigatório exigido pelos cursos, o que muitas vezes não se mostrava suficiente para que eles se inserissem e explorassem sua formação na prática. O Pibid surgiu como uma forma de suprir tal necessidade, estruturando-se por meio de par-cerias entre Instituições de Ensino Superior (IES) e de Ensino Básico (IEB), nas quais os futuros profes-sores têm a oportunidade de exercitar sua docência junto aos professores dessas instituições, atuando da Educação Infantil ao Ensino Médio, além da Edu-cação para Jovens e Adultos (EJA).

O primeiro edital do Pibid foi lançado em 2007, ocasião em que a Ufes iniciou sua participação no programa. No começo, foram priorizados os proje-

tos dos cursos de Licenciatura em Física, Química, Biologia e Matemática, áreas em que o déficit de professores é considerado crônico no País. Com o tempo, outros cursos foram incluídos, tais como Letras-Português, Letras-Espanhol, Artes Visu-ais, Pedagogia, Educação Física, Ciências Sociais, Música, História e Geografia, dos campi de Goiabei-ras (Vitória), Alegre e São Mateus. Os únicos cursos não contemplados são as licenciaturas a distância, por estarem em fase de recredenciamento, e os cursos de Letras-Francês e Letras-Italiano, por não serem componentes curriculares da escola básica.

BolsasO programa oferece cinco modalidades de

bolsa: Iniciação à docência – para estudantes de licenciatura; Supervisão – para professores de escolas públicas que supervisionam os licencian-dos; Coordenação de área – para professores da licenciatura que coordenam subprojetos; Coorde-nação de área de gestão de processos educacio-nais – para o professor da licenciatura que auxilia na gestão do projeto na IES; e Coordenação ins-titucional – para o professor da licenciatura que coordena o projeto na IES. Também são concedi-das verbas de custeio para a produção de materiais didáticos inovadores e para a participação dos alu-nos em congressos. Hoje, a Ufes possui 462 bol-sistas de iniciação à docência, 39 professores dos cursos de licenciatura atuando como coordenado-res e 64 professores de escolas dos municípios de Alegre, São Mateus, Vitória e Serra. Os estudantes disponibilizam em média 16 horas semanais para participar do programa, tempo dividido entre a sala de aula e atividades formativas, que incluem o pla-nejamento das aulas e a realização de pesquisas.

“Temos feito um diálogo produtivo na hora de elaborar essas propostas. Para nós é um exercício muito enriquecedor pensar um projeto institucio-nal a tantas mãos, com tantos olhares e perspec-tivas diferentes de formação. E aí o que fica não

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são as especificidades de cada área, mas um olhar que busca identificar que professor nós queremos formar para as escolas do Espírito Santo”, frisa a professora Mirian, que enfatiza ainda a importân-cia de os professores atuarem além de sua própria área, firmando seu papel de formadores de cida-dãos críticos, aptos a participar dos processos de tomada de decisão.

Especificidades O processo de transformações econômicas,

sociais e ambientais nas escolas tem motivado a criticidade nos cursos ligados ao Pibid, que bus-cam pensar, dentro das especificidades de sua área, questões ligadas à inovação tecnológica e metodo-lógica do ensino e às demandas sociais em torno da formação de professores. “Quando se costura tudo isso, temos um olhar muito abrangente e muito complexo na Universidade para a formação

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de professores no Espírito Santo. Então imagina-mos que o Pibid não tem só a dimensão de opor-tunizar a formação prática dos licenciandos. Ele, mais do que isso, quer ocupar um lugar institucio-nal para pensar em currículos de formação e no encaminhamento de licenciaturas. O que a gente quer mesmo é juntar todo mundo para reinventar a docência, é pensar em um novo jeito de ser pro-fessor neste País”, esclarece Mirian.

No entanto, embora enfatize a importância do Pibid, Mirian reconhece que um programa de con-cessão de bolsas não é suficiente para impulsionar a carreira docente no Brasil. Para tanto, é preciso também estimular a profissionalização e formação continuada dos professores e investir na criação de políticas salariais, planos de carreira e melho-res condições de trabalho, buscando fazer com que os jovens enxerguem na docência a sua primeira opção de formação e de carreira profissional. Nesse sentido, a luta por uma política nacional de valori-zação do magistério em todos os âmbitos torna-se uma das principais bandeiras levantadas pelos par-ticipantes do Pibid.

ResultadosPara a professora Mirian, um dos pontos posi-

tivos gerados em função do Programa Institucio-nal de Bolsas de Iniciação à Docência é a queda da evasão dos cursos de licenciatura da Ufes, em espe-cial nos campi do interior do Estado. Mirian ressalta ainda o aumento do número de trabalhos e de publi-cações que surgem motivados pela participação dos licenciandos no Pibid e o interesse tanto dos estudantes, quanto de professores já formados em ingressar em cursos de pós-graduação, dando conti-nuidade à sua formação. “Isso mostra que a pesquisa em ensino é um campo vasto, pouco explorado, e que estamos conseguindo avançar”, observa.

Desde agosto de 2012, a estudante do oitavo período de Licenciatura em Música Heloísa Helena Souza Silva tornou-se bolsista do Pibid. Sua inser-ção no programa surgiu a partir de um projeto desenvolvido em seu curso, que lhe permitiu ter o primeiro contato com escolas, estimulando-a a

Carolina Demétrio Ferreira, coordenadora do Pibid de Biologia no CCA, em Alegre

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continuar. Segundo Heloísa, um dos questionamen-tos dos estudantes de Música é como inserir esta disciplina ao ensino regular, tarefa que muitas vezes não conseguem solucionar apenas com o estágio obrigatório. Já o Pibid permite ampliar essa visão por garantir uma vivência maior nas escolas. Além de intervenções durante as aulas de Artes, Inglês e História, Heloísa e os demais integrantes do Pibid de Música têm também a oportunidade de dar ofi-cinas de instrumentos para os alunos, trabalhos que realizam na EMEF Escola Experimental, locali-zada no campus de Goiabeiras da Ufes. Por meio do Pibid, Heloisa, que já havia sido aluna de Iniciação Científica, encontra tempo para continuar desen-volvendo suas pesquisas. “Todas essas intervenções são muito ricas e nos ajudam a pensar na música a partir de outras possibilidades”, acrescenta.

A irmã de Heloísa, Elaine Cristina de Souza Silva Bravo, também foi bolsista do Pibid durante os dois últimos anos de sua Licenciatura em Química, con-cluída em 2010. Ela chegou a trabalhar em duas escolas, onde teve a oportunidade de auxiliar na montagem de um laboratório de química e de dar

aulas práticas relacionadas ao tema. Apesar de não lecionar atualmente, Elaine afirma que o Pibid foi muito importante para a sua formação. “Durante a participação no programa, apresentei trabalhos em congressos sobre a importância de aulas prá-ticas no ensino de Química para um melhor apren-dizado do aluno. Gostava muito de dar aulas no laboratório e ensinar conteúdos para os alunos, porém não segui a área. Contudo, sou voluntária do Instituto Viva Vida, em Vila Velha, e dou aulas de reforço em Química e Matemática para os alu-nos que se interessam e que necessitam. Pretendo fazer mestrado e quem sabe mais para frente me tornar professora”, planeja Elaine.

Na outra ponta desse processo está a pro-fessora Aline de Paula Nunes, que leciona há 12 anos. Cinco anos atrás iniciou sua participação no Pibid e, há cerca de um ano, tornou-se super-visora do programa na escola onde trabalha – a EEEM Irmã Maria Horta, situada em Vitória –, com

O Seminário Institucional do Pibid, realizado em novembro de 2013 no campus de Goiabeiras, reuniu

todos os bolsistas integrantes do projeto

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a incumbência de desenvolver e orientar os pro-jetos na escola, de forma que os estagiários parti-cipem efetivamente dos trabalhos da instituição. A experiência acumulada por Aline ao longo dos últimos anos permite que ela faça comparações entre o antes e o depois da inserção dos gradu-andos nas escolas básicas. Segundo ela, com o Pibid, os alunos passaram a ser mais bem assisti-dos, além de os temas explorados pelas disciplinas agora serem abordados de formas mais dinâmicas. “Anteriormente as atividades desenvolvidas pela disciplina de Biologia não eram tão bem explora-das, devido à falta de materiais didáticos, recursos e monitores”, exemplifica. “Com o Pibid na escola, as aulas práticas ficaram mais bem monitoradas e funcionais. As aulas tornaram-se diferenciadas e mais atrativas devido ao planejamento e aos recur-sos disponibilizados pelo programa em conjunto entre estagiários e professor”, observa.

Já a professora Mirian aponta outra experiên-cia que considera marcante: “entre os nossos alu-nos de Iniciação à Docência já temos ex-alunos de escolas públicas. Para mim, isso é um saldo muito positivo, pois ainda temos um número expressivo de estudantes no Ensino Médio que não fazem da educação superior o seu projeto de vida. Aí, quando o aluno do Pibid vai para essas escolas – não ape-nas para compartilhar o conhecimento científico, mas também para falar do seu percurso de for-mação –, e diz para esses alunos que eles tam-bém podem estar no seu lugar, acabamos fazendo com que jovens dialoguem com jovens sobre pro-jetos de vida. Ver esses alunos saindo das escolas e ingressando na Universidade dá todo o sentido ao nosso trabalho”, reflete.

Para a professora Mirian, uma das principais recompensas do programa é ver o professor de licenciatura ampliando seus olhares e se revendo em sua condição de formador. “Por muito tempo, prevaleceu na Ufes uma visão de que quem for-mava professor era o Centro de Educação. Os cur-sos trabalhavam com suas demandas específicas e, na hora de se tornar professor, tinha que ir para lá. Agora não temos mais o lá. A gente se forma aqui, na universidade-escola, neste espaço de inte-ração e de troca, onde as fronteiras estão se tor-nando cada vez mais tênues”, enfatiza ela.

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Práticas inovadoras

Somar. Esse é o objetivo dos licenciandos que vão para as escolas por meio do Pibid, em busca de novos métodos de ensino que se encaixam e complementam os conteúdos teóricos ministrados nas salas de aula, esti-mulando o interesse e a reflexão crítica dos alunos. Experiências em laboratórios, ativida-des de monitoria, criação de jogos e brinca-deiras didáticas são exemplos disso.

A coordenadora do Pibid de Biologia do Ceunes, Karina Mancini, relata que, quando o programa – que contempla também as áreas de Matemática, Física e Química – teve iní-cio em São Mateus, em 2009, havia um receio muito grande por parte das escolas de aceitar os estudantes de licenciatura, resistência que foi vencida à medida que as instituições per-ceberam a importância da presença dos estu-dantes para dinamizar a oferta das disciplinas e agregar novos conhecimentos. “Hoje todo mundo quer o Pibid nas escolas”, afirma Karina.

No entanto, como muitas vezes a carga horária oferecida pelas escolas não é sufi-ciente para a apresentação de todos os con-teúdos, os integrantes do Pibid do Ceunes tiveram uma nova ideia: a criação de uma sala de experiências dentro do próprio campus da Ufes, para que crianças e adolescentes pos-sam visitá-la em horários alternativos. O pro-jeto já está em processo de montagem. “Com isso a gente conseguiria, além de cumprir o papel que cabe ao Pibid, atrair novos alunos para os nossos cursos”, pensa Flávio Gimenes Alvarenga, coordenador do Pibid de Física. Em São Mateus, os professores têm utilizado os laboratórios dos cursos de pós-graduação como espaços de ensino e pesquisa voltados também para os licenciandos do Pibid.

Em Alegre, no CCA, essa perspectiva de inovação também é seguida. Conforme

explica a coordenadora do Pibid de Biolo-gia, Carolina Demétrio Ferreira, o programa é importante, pois permite a experimenta-ção e a avaliação quanto à eficácia de novos métodos de ensino. No caso, por exemplo, do Pibid de Biologia, que conta atualmente com 18 licenciandos, busca-se aproveitar tanto os espaços formais quanto os não formais, como hortas e viveiros, como lugares de aprendiza-gem. Além de premiações em congressos, des-sas vivências surgiu o livro Guia de Atividades Práticas para o Ensino de Biologia, destinado a professores da área, que já está em fase de finalização e será lançado neste ano.

Para Carolina, além de proporcionar aos graduandos uma boa experiência na área docente, o Pibid tem promovido mudanças den-tro do próprio curso, estimulando muitos alu-nos a continuarem na licenciatura, ao mesmo tempo que faz com que mais professores uni-versitários se voltem para a área de ensino, par-ticipando de projetos e orientando alunos que têm interesse na docência, o que é fundamen-tal para a construção de uma educação básica de qualidade, a médio e longo prazos.

Participantes do Pibid em Feira de Cursos na Ufes

Foto: Arquivo Pibid

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p e s Q U I s AFotos: Thaiana Gomes

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É no Laboratório de Automação Inteligente, pertencente ao Departamento de Enge-nharia Elétrica da Ufes, que um grupo for-mado por nove professores e cerca de 40

estudantes – de graduação, mestrado e douto-rado – dedica-se, entre outras pesquisas, à apli-cação de conhecimentos nas áreas de Robótica e Biotecnologia, a fim de desenvolver ferramentas que possibilitem uma maior autonomia de locomo-ção das pessoas com deficiência física. Uma soma de esforços na tentativa de fazer com que, em um futuro não tão distante, a acessibilidade esteja ao alcance de todos.

Criado em 1991 pelos professores Hans Schne-ebeli e Mário Sarcinelli Filho, a proposta inicial do

Pesquisadores do Laboratório de Automação Inteligente da Ufes desenvolvem pesquisas na linha de Robótica de Reabilitação, visando criar tecnologias de acessibilidade que auxiliem na movimentação de pessoas com deficiência

tecnoLogia

Laboratório de Automação Inteligente era a cria-ção de novas tecnologias para a indústria. Já em 1995, surge, dentro do Laboratório, o grupo Robó-tica de Automação Industrial, cadastrado no Con-selho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Com o passar do tempo, o sur-gimento da Robótica Móvel – de robôs terrestres e aéreos em tamanhos menores com sensores pelos quais é possível controlá-los –, permitiu o surgi-mento de uma nova linha de pesquisa nessa área: a Robótica de Reabilitação, cujo objetivo é justa-mente a aplicação de conhecimentos em robó-tica para a assistência a pessoas com algum tipo de deficiência. Exemplos de ferramentas desen-volvidas no Laboratório são braços mecânicos e

em prol da acessibilidadeMaíra Mendonça

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cadeiras de rodas robóticas, que facilitam o acesso dos deficientes a determinados lugares.

O professor e coordenador adjunto da Pós-Gra-duação em Engenharia Elétrica (PPGEE), Anselmo Frizera Neto, explica que, junto à Robótica de Rea-bilitação, desenvolvem-se outras linhas de estudo, como a de Tecnologia Assistiva – ferramentas, técni-cas ou processos que dão suporte à assistência, rea-bilitação e qualidade de vida das pessoas; e a Visão Computacional, que visa à elaboração de técnicas de processamento para ajudar na navegação de robôs, no reconhecimento de gestos, ambientes, compor-tamentos dos indivíduos e, além disso, no monito-ramento de fisioterapias. Apesar de diferentes, o objetivo é que todas funcionem de forma integrada.

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Um exemplo de técnicas desenvolvidas na área das Tecnologias Assistivas, a qual o profes-sor Anselmo se dedica a estudar, é o uso de sis-temas eletrônicos para verificar e quantificar as melhorias introduzidas por alguma ferramenta de reabilitação, como é o caso das órteses. Por meio de sensores inerciais, alguns deles desen-volvidos dentro do próprio laboratório, é possí-vel capturar e analisar, em milésimos de segundo, o tipo de movimento realizado por um indivíduo, bem como a atividade muscular associada a esse movimento, identificando problemas e disfun-ções ortopédicas.”

A preocupação quanto ao desenvolvimento de tecnologias de acessibilidade levou também à realização de um trabalho em conjunto entre os Programas de Pós-Graduação em Biotecnologia e Engenharia Elétrica. Desse modo, atualmente, o Laboratório atua em um nível transdisciplinar,

Abaixo, o Andador Robótico, aparelho desenvolvido pelos pesquisadores do grupo de Robótica de Reabilitação para auxiliar a movimentação de pessoas com artrose moderada de joelho

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reunindo tanto engenheiros, quanto enfermeiros, biólogos e fisioterapeutas.

“Eu acho que a importância dessas pesquisas para nós, desde o início, é conseguirmos dar alguma solução ou alternativa para o apoio de pessoas com deficiência e, também, para os idosos, que, no Bra-sil, são um número crescente. De alguma forma, temos de buscar soluções que aumentem a inde-pendência de pessoas com algum tipo de limita-ção de movimento ou em casos em que a própria idade acaba gerando tais limitações”, acredita o professor Anselmo.

Andador RobóticoDe acordo com a publicação “Osteoartrite – Ar-

trose – cenário atual & tendências no Brasil”, di-vulgada em 2012 e produzida por especialistas da Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT), da Sociedade Brasileira de Reumatologia,

da Associação Brasileira de Medicina Física e Rea-bilitação e da Sociedade Brasileira de Cirurgia do Joelho, a artrose ou osteoartrite, doença articular inflamatória crônica, caracterizada pela degenera-ção da cartilagem e do osso subcondral, já afeta 9,9 milhões de brasileiros. Estima-se que até 2015 esse número deve crescer para 24%, passando a atingir 12,3 milhões de pessoas.

Os pesquisadores do Laboratório de Automação Inteligente ligados à área de Robótica de Reabili-tação têm trabalhado especificamente na criação de ferramentas de auxílio à movimentação de pes-soas com artrose moderada de joelho. Para tanto, foi desenvolvido o andador robótico. Este pro-jeto começou a ser elaborado em 2011, quando Anselmo ingressava na Ufes como professor, após retornar de seu doutorado em Eletrônica junto a um grupo de pesquisa que trabalha com Robótica de Reabilitação, iniciado em 2006, na Espanha.

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O objetivo é construir uma plataforma robótica que permita saber como o paciente se relaciona com o andador, verificando se ele pode ou não auxiliá-lo e de que forma. Para isso, são feitos estudos como a medida do tamanho dos passos dados pelos pacien-tes e da força empregada, a fim de analisar a inte-ração entre os indivíduos e a máquina. Um novo projeto, iniciado em 2013, visa possibilitar uma assis-tência ainda maior a partir da criação de um robô que controle diretamente as pernas das pessoas.

“Muitas pessoas que têm uma deficiência in-completa, isto é, que são capazes de andar ainda que com dificuldades, são obrigadas a usar cadei-ras de rodas pela falta de opção de outras fer-ramentas de auxílio. É pensando em dar maior autonomia a elas que o grupo trabalha”, ressalta o professor Anselmo.

Arlindo Elias Neto é fisioterapeuta e atualmente

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cursa o doutorado em Biotecnologia. Em seu mes-trado nessa mesma área, ele avaliou, com senso-res inerciais, como o andador pode auxiliar em uma melhor movimentação dos usuários e constatou que os resultados são positivos. Através desse estudo, realizado em pacientes do Centro de Reabilitação Física do Espírito Santo (Crefes), com o qual o Labo-ratório mantém uma parceria, Arlindo descobriu também o potencial dos sensores como novas ferra-mentas de análise que lhe permitem atestar nume-ricamente o que e quanto melhorou nos pacientes com o tratamento. “Na fisioterapia, já estudamos biomecânica, só que clínica, estudada de uma forma qualitativa, em que avaliamos o paciente com as mãos, com observação. E eu sempre senti a neces-sidade de analisar os dados também de forma quan-titativa, provando numérica e mais claramente a melhora dos pacientes”, explica ele.

Pesquisadores do Laboratório de Automação Inteligente da Ufes, que se dedicam aos estudos na área de Robótica de Reabilitação. À direita, Anselmo Frizera Neto, um dos coordenadores do grupo

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Núcleo de acessibilidade

Em 2010, diferentes setores da Universi-dade criaram o Núcleo de Acessibilidade da Ufes (Naufes), que é coordenado pelo pro-fessor Reginaldo Célio Sobrinho. Organizado por professores, estudantes e técnico-admi-nistrativos que se reuniram para pensar na formação de um polo de referência em aces-sibilidade dentro da Universidade, o Naufes é composto atualmente por 15 integrantes de diversas áreas do conhecimento e está vin-culado à Pró-Reitoria de Gestão de Pessoas e Assistência Estudantil (Progepaes).

O Laboratório de Automação Inteligente participa do Núcleo desde 2013. O profes-sor Anselmo Frizera Neto integra o Conse-lho Técnico do Naufes visando contribuir, por meio das pesquisas do Laboratório, para o desenvolvimento do projeto.

O Naufes conta, desde o ano passado, com um espaço físico específico junto ao Restaurante Universitário (RU) do campus

ParceriasPara facilitar a troca de experiências quanto

ao desenvolvimento de novas tecnologias e pos-sibilidades na área de Robótica de Reabilitação, os pesquisadores do Laboratório de Automação Inte-ligente desenvolvem parcerias interinstitucionais com a Universidade de Brasília (UnB), a Universi-dade do Minho, em Portugal, e a Universidad Nacio-nal de San Juan, na Argentina.

Além disso, os membros do grupo participam das Redes de Robótica e de Novas Tecnologias para Portadores de Deficiência, ambas financia-das pelo Programa CYTED (Ciencia y Tecnología para el Desarrollo), que engloba nove universida-des ibero-americanas. Por meio do programa são realizadas reuniões anuais em que são discutidos e divulgados os trabalhos realizados pelos profis-sionais envolvidos. Em 2012, foi realizado na Ufes o Seminário CYTED de la Red IBERADA, que deu origem à publicação Experiências y Avances en Tecnologias de Accesibilidad para Personas con Discapacidad, reunindo os trabalhos expostos e as conclusões acerca do evento.

de Goiabeiras, que passa por uma reforma para atender pessoas com limitação física.

Além disso, o Núcleo conta também com três monitores, responsáveis por acompa-nhar e auxiliar pessoas com necessidades especiais no campus da Ufes. Segundo a vice-coordenadora do Naufes, Vânia Seidler Paulino, a proposta é torná-lo uma referência em questão de acessibilidade, trabalhando numa perspectiva de integração e de mobi-lização dos diversos setores da Universidade para a criação de políticas e ações voltadas para essas pessoas.

A etapa inicial do projeto consiste na apu-ração do número de estudantes e servidores com necessidades especiais existentes na Ufes, bem como quais são os tipos de deficiência e como essas pessoas se inserem nos diversos espaços da Instituição, tais como as bibliote-cas e o RU. A partir disso, serão iniciadas ações voltadas diretamente para esse público.

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e n s I n o

O Programa de Educação Tutorial reúne, nos diversos campi da Ufes, 13 grupos em 20 diferentes áreas do conhecimento. O objetivo é promover a integração

entre o ensino, a pesquisa e a extensão

Mais do que dominar o conhecimento existente, um dos desafios impostos às universidades contemporâneas é formar indivíduos capazes de buscar

novos saberes, aptos a encontrar as respostas para as interrogações que surgem ao longo de seu coti-diano. Formado por grupos tutoriais de aprendiza-gem, o Programa de Educação Tutorial (PET) tem justamente o intuito de propiciar aos estudantes de graduação condições para o desenvolvimento de atividades extracurriculares, promovendo a in-tegração entre ensino, pesquisa e extensão. Atu-almente, a Ufes possui 13 grupos PET, que reunem estudantes de 20 diferentes áreas do conheci-mento. Um instrumento valioso para o aprimora-mento de suas qualidades profissionais e para o estímulo a uma formação continuada.

O PET é um programa nacional desenvolvido pela Secretaria de Educação Superior do Ministé-rio da Educação em parceria com as universidades. Na Ufes, ele é vinculado à Pró-Reitoria de Gradu-ação (Prograd). O presidente do Comitê Local de Acompanhamento e Avaliação do PET, que na Ufes acumula as funções de Interlocutor Institucional

do Programa junto ao MEC, professor Itamar Men-des da Silva, salienta que o programa foi criado em 1979, inicialmente nomeado Programa Especial de Treinamento. Somente em 2005 foi institucionali-zado e, com a edição da Lei nº 11.180, sua nomen-clatura foi alterada, transformando-o no Programa de Educação Tutorial. O funcionamento do Pro-grama prevê a seleção de estudantes, que, sob a coordenação de um professor tutor, recebem bol-sas por tempo indeterminado – desde que man-tenham um bom desempenho acadêmico – para a realização de pesquisas científicas e atividades de ensino tanto dentro da universidade, quanto na comunidade externa.

Segundo Itamar, a mudança do nome trouxe também mudanças conceituais para o projeto: se antes ele era inteiramente voltado para a inserção dos estudantes no mundo do trabalho, agora sua função passa a ser atuar tanto no aprofundamento da formação dos alunos, quanto no desenvolvi-mento dos cursos de graduação e, consequen-temente, na ampliação das potencialidades dos estudantes nele envolvidos direta e indiretamente. Sendo assim, o fornecimento de bolsas visa criar

criar

Aprender, vivenciar,

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oportunidades para que os participantes se dedi-quem inteiramente à universidade. Para Itamar, “os cursos que possuem o PET têm um grande ganho, não apenas para os estudantes que atuam nele, mas pelo auxílio que fornecem ao próprio curso”. Isso porque a participação no PET inclui também o envolvimento dos bolsistas em discussões e na realização de ações dentro de seus cursos de gra-duação, como, por exemplo, a organização de even-tos, seminários, monitorias e minicursos, além da recepção de calouros.

ModalidadesExistem duas modalidades de PET. A primeira

refere-se ao PET de cursos, que reúne estudan-tes de uma mesma área de conhecimento, que se destacam em sua graduação. Já o PET Conexões agrega um objeto comum a todos com o investi-mento naqueles estudantes de baixa renda, com o objetivo adicional de garantir sua permanência nas instituições de ensino. Nessa modalidade está aberta a possibilidade de se formar grupos multi-disciplinares, envolvendo alunos de diferentes cur-sos. Atualmente, a Ufes possui oito PETs de curso, sendo eles Economia, Educação Física, Engenharia da Computação, Engenharia Elétrica, Engenharia Mecânica, Matemática, Psicologia e Serviço social; e cinco grupos PET Conexões, denominados Adminis-tração, Cultura, Educação, Licenciaturas e Prod-Bio.

Dos 13 PET da Ufes, 12 funcionam no campus de Goiabeiras, em Vitória. O Prod-Bio é o único PET composto por estudantes do Centro Universitário Norte do Espírito Santo (Ceunes), em São Mateus. O professor Itamar afirma que uma das principais metas do programa na Ufes é investir na expan-são do PET junto com a interiorização da Univer-sidade, possibilitando a criação de mais grupos tutoriais nos campi do interior do Estado, meta que faz parte, inclusive, do Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI), da Ufes. “Se tem uma coisa que qualifica um projeto de graduação, é a sua diver-sidade. Por isso, é preciso investir nesse tipo de programa. Isso leva os estudantes para a rua, ao mesmo tempo que traz a comunidade externa para dentro da Universidade”, destaca Itamar.

Membros da comunidade quilombola de Araçatiba, onde são realizados os trabalhos de pesquisa e extensão do PET Cultura

Fotos: Arquivo PETs

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Conheça alguns grupos que fazem parte do Programa de Educação Tutorial da Ufes:

PET Conexões Prod-bio: Criado em feve-reiro de 2013, o Prod-bio está em seu segundo ano de atividades. Ele envolve estudantes e professores dos cursos de Engenharia de Pro-dução e Ciências Biológicas. Segundo a pro-fessora tutora do Prod-bio, Marielce de Cássia Ribeiro Tosta, além de atuar no ensino e con-tribuir para a redução dos índices de evasão e retenção de estudantes, o objetivo central do programa é desenvolver atividades de exten-são e pesquisa que possam ajudar a comu-nidade de pesca da região Norte do Espírito Santo, que carece muito desse tipo de inicia-tiva. “Com esse trabalho, esperamos ajudar todos os envolvidos. Os alunos terão a oportu-nidade de aplicar na prática os conhecimentos adquiridos ao mesmo tempo que vivenciam o trabalho de extensão, e os professores e téc-nicos poderão cumprir seu papel de educado-res e agentes transformadores na sociedade”, completa Marielce.

Atualmente, o grupo é formado por 12 bol-sistas, sendo seis de cada curso. A professora Marielce conta ainda com a colaboração da professora Mônica Maria Tognella para tra-balhar no desenvolvimento e estruturação do programa. Até agora, já foram organizados o laboratório de trabalho dos estudantes e uma biblioteca. Também foram criadas monitorias em diferentes matérias e realizadas visitas dos estudantes às comunidades pesqueiras, a fim de que identifiquem os problemas locais, e busquem alternativas para ajudar a solu-cioná-los. Os estudantes estão envolvidos constantemente em atividades de formação, participando de eventos e seminários em sua área de pesquisa. Estão previstas ainda para este ano a participação no Entre Comunida-des, evento com a comunidade pesqueira e um curso de instrumentação em GPS para os pescadores, além de um curso de Autocad e de iniciação à Estatística para os graduandos.

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PET Conexões Cultura: Criado em 2010, o PET Cultura iniciou suas atividades em janeiro de 2011. Atualmente ele conta com a parti-cipação de graduandos dos cursos de Artes, Licenciatura em Artes, Geografia, História, Letras e Arquivologia. As atividades de ensino, pesquisa e extensão desenvolvidas pelo grupo centram-se em ações para o desenvolvimento social, cultural e econômico da comunidade externa à Universidade. Nesse sentido, suas atividades de pesquisa envolvem a reconstru-ção da comunidade quilombola de Araçatiba, em Viana, investigando seus aspectos his-tóricos, geográficos, linguagem, costumes e heranças. Já as atividades de ensino incluem a participação do grupo em palestras e organiza-ção de eventos junto aos cursos de graduação.

“Em nosso programa, há um aluno que tinha sérios problemas para escrever e se con-centrar quando iniciamos as atividades. Hoje, três anos depois, ele é um dos que mais produ-zem, tendo trabalhos aceitos em congressos nacionais e internacionais na área de Educa-ção e Artes”, exemplifica o professor tutor do

PET Matemática: Hoje com 11 bolsistas e tutorado pela professora Rosa Elvira Quispe Ccoyllo, este grupo foi criado em 1991. Neste PET, cada aluno participa individualmente do projeto de “Estudo Específico”, no qual tem a oportunidade de estudar temas que não per-tencem ao currículo do curso sob a orientação de um professor do Departamento de Mate-mática. Ainda em caráter individual, alguns integrantes do PETMAT se propõem a reali-zar “Monitorias Voluntárias” para alunos de períodos anteriores. Quanto ao trabalho cole-tivo, o PETMAT desenvolve minicursos sobre assuntos de interesse dos alunos do curso e de

PET Cultura, Aperecido José Cirillo, quando questionado sobre o impacto do programa na formação dos estudantes. E completa: “cer-tamente é comum ouvir dos professores do PET que seus alunos são excelentes, com uma maturidade acadêmica acima da média. Na realidade, basta entrar no Currículo Lattes deles e a resposta para essa questão está lá. O PET propicia ao estudante a vivência diá-ria supervisionada da realidade profissional de seus cursos, além de permitir a sua parti-cipação efetiva na estrutura organizacional da Ufes, o que lhes dá uma visão do Ensino Superior no país e das realidades para a via-bilidade de um curso de graduação”.

áreas afins, além da Semana do Pré-Calouro e a Semana do Calouro, realizadas com o intuito de dar boas-vindas aos recém-chegados. O grupo também produz o LeibNEWS, um jornal impresso criado em 2013 e que está em pro-cesso de desenvolvimento.

Eneas Mendes é bolsista do PETMAT desde 2011. Ele afirma que os integrantes do pro-grama estão em constante contato com os acontecimentos atuais da Matemática e têm acesso a eventos estaduais e nacionais, além de uma formação diferenciada graças aos pro-jetos e à experiência de trabalhar em grupo. “No momento em que ingressei no PETMAT não tinha ainda um objetivo definido, devido ao fato de ser calouro, e não tinha uma opinião formada nem mesmo a respeito do curso e da minha carreira acadêmica. O PETMAT influen-ciou de forma positiva os meus objetivos atuais. Decidi entrar no PET e, o que é mais importante, permanecer nele, pois encontrei uma oportu-nidade de me destacar como aluno da gradua-ção e futuramente de pós-graduação”, ressalta.

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PET Engenharia de Computação: Este PET existe na Ufes desde 1992 e já passaram por ele mais de 80 estudantes de graduação. Roberta Lima Gomes foi uma das bolsistas do programa de 1995 a 1998. Hoje ela é profes-sora do Departamento de Informática da Ufes e atua como tutora do PET, proporcionando a outros estudantes esta oportunidade. “O aluno integrante de PET passa a ter diferen-tes oportunidades de desenvolver habilidades técnicas e humanas que se tornarão diferen-ciais quando ele entrar no mercado de traba-lho. É importante observar que os alunos do PET se tornam agentes multiplicadores. Com isso, o programa passa a ter impacto também sobre os alunos do nosso curso em geral visto que, por meio de diferentes atividades extra-curriculares, é possível oferecer uma forma-ção mais ampla”, explica Roberta.

Atualmente com 12 bolsistas, o PET En-genharia da Computação desenvolve 10 di-ferentes projetos, entre eles o Introcomp, um

curso de algoritmos e programação de com-putadores destinado a 80 alunos de Ensino Médio da rede pública da Grande Vitória, que visa promover a inclusão digital desses jo-vens, além de desenvolver nos bolsistas ca-pacidades didático-pedagógicas; o Topcom, um torneio de programação de computa-dores idealizado, planejado e desenvolvido pelo grupo, que é realizado nos mesmos mol-des da Maratona Nacional de Programação e tem como objetivo envolver os graduandos na Programação Competitiva; e a Equipe de Robótica da Ufes, a Erus. Este último tem a função de colocar em prática o que os alu-nos das diferentes Engenharias e da Ciência da Computação aprendem em sala de aula. Tendo em vista a promoção da Robótica den-tro da Ufes, a equipe pretende criar e minis-trar minicursos e competições de Robótica, participando também de competições no âm-bito nacional e desenvolvendo atividades de pesquisa aplicada na área.

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PET Educação Física: Atuante na Ufes desde 1994, o PET Educação Física, sob a tutoria do professor Omar Schneider, envolve oito bolsistas atualmente. Entre os projetos do grupo, destaca- se a Colônia de Férias na Ufes, realizada anual-mente na segunda semana do mês de dezembro. Ela atende 80 crianças, de 6 a 12 anos, filhos de professores, servidores e alunos da Ufes, além de pessoas de fora, que vivenciam durante três dias atividades lúdicas e esportivas no Centro de Edu-cação Física e Desportos. Artes Circenses, Paint- ball, Judô, Capoeira, jogos aquáticos e gincanas são exemplos dessas atividades.

Outro importante projeto é o Agora PET, que busca proporcionar aos alunos de Educação Física conhecimentos sobre temas ou atividades que estão em foco no País, mas não fazem parte do cur-rículo acadêmico. Ele é realizado tanto em formato de ciclo de palestras, quanto por meio de minicur-sos. O Educação Física no Ar é um projeto desenvol-vido em parceria com a Rádio Universitária e visa divulgar os conhecimentos da área para os ouvin-tes da Universitária FM. Já Oficina de Rugby é uma forma de estabelecer o primeiro contato entre os acadêmicos e o Rugby, introduzindo um olhar peda-gógico sobre esse esporte, visando à sua inser-ção na escola. Nessa atividade, os petianos atuam como professores com a supervisão do tutor, tendo a oportunidade de vivenciar a docência.

Marciel Barcelos é recém-formado em Licen-ciatura em Educação Física e foi bolsista do PET. Para ele, o programa deu elementos para enxer-gar a sociedade de modo mais plural e, com isso, pensar em sua prática profissional de diferentes formas. “Hoje, posso dizer que fazer parte do PET mudou minha trajetória acadêmica. Graças a ele pude conhecer diversos professores da Ufes e de outras instituições; participar de eventos e de cur-sos fora do estado, organizar eventos de pequeno, médio e grande porte; ter contato com crianças da comunidade externa à Ufes e alunos da Ufes de outros cursos que também estão em grupos PET; organizar um livro; e publicar diversos arti-gos acadêmicos em parceria com os demais bolsis-tas. Muitos bolsistas que passaram pelas mesmas experiências que eu ingressaram nos programas de pós-graduação oferecidos pelo Centro de Edu-cação Física e Desportos. Espero em breve seguir o caminho deles”, almeja.

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p e s Q U I s A

Aroma marcante, que exala por todos os cantos, um convite para conversas e para a sociabilidade. Há muito tempo, “tomar um cafezinho” deixou de ser apenas

um simples hábito, tornando-se para muitos um momento de prazer. Atrelada à história do País e do Espírito Santo, a fruta, que chegou às terras brasi-leiras ainda no século XVIII, é hoje parte de nossa cultura e braço direito da economia, chegando a gerar mais de US$ 8 bilhões em exportações, anu-almente. Aumentar a produção de café tem sido a meta de pesquisadores de várias regiões do Brasil, que apostam no desenvolvimento de pesquisas e de avançados recursos tecnológicos nesta área. Na Ufes, o grupo Pesquisa e Difusão de Tecnologia em Café Conilon no Estado do Espírito Santo foi criado em 2010 justamente com este objetivo: promover diferentes estudos acerca do manejo e das proprie-dades do café Conilon, que permitam a ampliação e melhoria de suas condições de produção.

Da fisiologia à nutrição, passando pelo manejo, produção de mudas, melhoramento e qualidade do café. Esses são alguns dos estudos realizados pelo grupo de pesquisas em café Conilon, atualmente

Professores do Ceunes (São Mateus) e do CCA (Alegre) fazem parte do grupo de Pesquisa e Difusão de Tecnologia em Café Conilon, que tem como objetivo promover estudos sobre o manejo e as propriedades do produto

caFÉ: na história, na cultura e no bolso do capixaba

Fotos: Grupo de Pesquisa e Difusão de Tecnologia em

Café Conilon

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composto por 15 professores/pesquisadores e mais de 20 estudantes de Agronomia e de Pós-Gradua-ção do Centro Universitário Norte do Espírito Santo (Ceunes), em São Mateus; e do Centro de Ciências Agrárias (CCA), em Alegre, da Ufes. Eles estão dis-tribuídos em cinco linhas de pesquisa: Ferrugem do Cafeeiro Conilon; Manejo do Cafeeiro; Melho-ramento do Cafeeiro; Nutrição Mineral; e Quali-dade do Café. Em 2013, os integrantes do grupo chegaram a produzir mais de 30 artigos científi-cos apresentando resultados das pesquisas. No grupo também há professores e pesquisadores da Embrapa, do Incaper e da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf).

O professor do Departamento de Agronomia do Ceunes e coordenador do grupo Pesquisa e Difu-são de Tecnologia em Café Conilon, Fábio Luiz Par-telli, ressalta a importância de pesquisas na área de agricultura para o desenvolvimento do País, uma vez que este setor representa mais de 30% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e 36% do PIB capixaba. “A agricultura proporciona saldo médio superior a US$ 75 bilhões por ano – descontando máquinas, tratores e tecnologia importada –, per-mitindo que a balança comercial brasileira fique positiva (venda de US$ 95 bilhões e compra de US$ 16 bilhões em 2012). Graças à agricultura brasileira, que deve ser reconhecida e valorizada”, lembra. Nesse cenário, o café tem seu destaque. No Espírito Santo, é a atividade agrícola mais importante, gerando mais de R$ 3 bilhões e quase R$ 1 bilhão de impostos. Além disso, há ainda seu fator social: ele emprega cerca de 300 mil traba-lhadores. Assim, otimizar sua produção significa também propiciar melhor qualidade de vida a essas pessoas. “O café está no sangue, na história e na economia do povo capixaba”, reforça o professor.

O interesse pela realização de pesquisas que têm especificamente o café Conilon como objeto de análise tem muitas razões. Segundo dados da Com-panhia Nacional de Abastecimento (Conab), quase 80% da produção cafeeira do Espírito Santo é de Conilon, representando também cerca de 80% de todo o café Conilon produzido no Brasil. Por outro lado, o fato de o café Arábica ser o mais produzido por outros estados – entre os quais, Minas Gerais e São Paulo – o torna também a cultura mais inves-tigada por pesquisadores de instituições com tradi-ção na área de pesquisas agrícolas, como é o caso da Universidade Federal de Viçosa (UFV/MG), da Universidade Federal de Lavras (UFLA/MG) e do Instituto Agronômico de Campinas (IAC/SP).

“Estamos fazendo pesquisas, orientando diver-sos trabalhos de dissertação e teses com café Coni-lon, mas ainda somos pequenos em números e não temos instituições consagradas em pesquisa agrí-cola no Espírito Santo, se comparadas às regiões onde se cultiva café Arábica. Nesse sentido, vale o esforço para com essa cultura tão importante para nosso Estado, pois temos muito o que fazer, muito a contribuir com a cafeicultura e com o agricultor capixaba”, explica o professor Partelli.

Uma das pesquisas concluídas recentemente pelo grupo partiu de uma discussão em sala de aula, quando o professor Fábio Partelli ainda cur-sava graduação em Agronomia, em 1999. Trata-se da verificação de diferenças e semelhanças entre o sistema radicular de plantas de café – que é cons-tituído pelas raízes, órgãos especializados em fixa-ção, absorção, reserva e condução de nutrientes – propagadas por semente e plantas propagadas por estaca, ou seja, clonadas. Com o estudo, os pes-quisadores chegaram à conclusão de que, em ter-mos de sistema radicular, não existem diferenças de quantidade entre ambos os processos de planta-ção. No entanto, as plantas propagadas por estaca produzem em média 10 sacas por hectare a mais por ano, se comparada à propagação por sementes.

Uma vocação que vem de berçoNatural do município de Vila Valério, no Espí-

rito Santo, o professor Fábio Partelli cresceu em meio a plantações de café. Seus pais são agricul-tores, o que fez com que seu interesse pela área fosse despertado desde pequeno. Antes mesmo de iniciar o curso de Agronomia, ele já havia estudado na Escola Família Agrícola dos municípios de São Gabriel da Palha e Boa Esperança. Histórias seme-lhantes à de Fábio surgem dentro de seu próprio grupo de pesquisa, no qual grande parte dos alu-nos provém de famílias que trabalham com agri-cultura familiar e que buscam, na Universidade, a oportunidade de profissionalização no setor.

André Manzoli Covre é finalista do curso de Agronomia e, desde 2010, participa do grupo de pesquisas em café. Sua família mora na Bahia há 21 anos e lá possui uma fazenda cafeeira. Justa-mente por isso, a pesquisa de André consiste em comparar o crescimento de ramos e o acúmulo de nutrientes e de matéria seca no café Conilon plantado na Bahia com irrigação e sem irrigação. Com mais de 10 publicações científicas, André pode concluir que, em lugares onde ocorre maior precipitação de chuva, o crescimento das plantas

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p e s Q U I s A

acelera e elas apresentam maiores taxas de acu-mulação de matéria seca, o que lhes garante maior rendimento. Recentemente aprovado no mestrado em Agricultura Tropical no Ceunes/Ufes, o estu-dante pretende dar continuidade à sua pesquisa, propondo aos agricultores o parcelamento de adu-bação com base nos itens analisados. “Com isso, é possível traçar o perfil de desenvolvimento da planta, o que é muito importante, pois a conhe-cendo, o agricultor pode saber como trabalhá-la a fim de aumentar sua produtividade”, explica ele.

Em 1989, o pai de Danielly Dubberstein saiu do Espírito Santo com destino a Rondônia, onde iniciou sua plantação de café. Após formar-se em Agrono-mia na Universidade Federal de Rondônia, Danielly chegou ao Ceunes, em março de 2013, para cursar mestrado em Agricultura Tropical. Seu objetivo: rea-lizar um estudo comparado entre cafés adubados e não adubados produzidos em sua terra de origem, auxiliando no melhoramento da produção. Os pri-meiros resultados dessa investigação serão conhe-cidos entre os meses de abril e maio deste ano.

Cursando o oitavo período do curso de Agrono-mia, Gleison Oliosi participa do grupo de pesqui-sas em café praticamente desde o seu início, tendo passado a maior parte de sua graduação dentro do grupo. Nascido em Nova Venécia, Gleison pas-sou sua infância e adolescência muito próximo à

cafeicultura e, assim como o professor Fábio, estu-dou na Escola Família Agrícola. Ao longo do tempo em que participa do grupo, publicou mais de 10 tra-balhos. Ele realiza vários estudos, como a avaliação do desempenho de diferentes tipos de fertilizantes em lavouras de café e do desenvolvimento e produ-tividade de pés de café cultivados por meio de som-breamento, a qual se dá o nome de café arborizado. Atualmente, Gleison se dedica a um estudo compa-rativo entre clones de maturação precoce, média e tardia de seis lavouras de café, sendo três localiza-das em Nova Venécia e três em São Mateus. “Par-ticipar desse grupo contribuiu muito para minha formação, pois é uma atividade extracurricular que nos estimula a pesquisar, a desenvolver o registro escrito das pesquisas. Quando tivermos que fazer uma dissertação, já sabemos como se faz. A parte de campo também é muito interessante. Estar em con-tato com produtores constantemente, ir às lavou-ras e verificar se existe algum problema e tentar resolvê-lo é muito bom”, afirma ele.

O uso de avançadas tecnologiasNo início de 2013, o grupo Pesquisa e Difusão de

Tecnologia em Café Conilon no Estado do Espírito Santo adquiriu um novo equipamento de trabalho em projeto coordenado pelo professor Marcelo Bar-reto da Silva, com verba Fapes/CNPq: o Analisador

O pós-doutorando Marcos Goes Oliveira utilizando o Irga, Analisador de Gás Infravermelho

Foto: Thaiana Gomes

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de Gás Infravermelho – cuja sigla em inglês é Irga –, com custo entre US$ 50 mil e US$ 100 mil. O equipamento é capaz de analisar, entre outras coi-sas, como as plantas respondem fisiologicamente às variações climáticas. Trata-se, portanto, de um importante instrumento para pesquisas científi-cas, uma vez que a precisão e a quantidade de informações que gera, aliadas às informações que o grupo de pesquisa já possui, tornam os resulta-dos mais embasados e confiáveis. Outra vantagem é que o equipamento pode ser utilizado por dife-rentes grupos de pesquisa, já que permite a reali-zação de diversas análises. Também foi adquirido no final de 2013, por meio de projeto aprovado na Capes, uma câmera fotográfica que registra a tem-peratura, baseada em infravermelho.

O pós-doutorando Marcos Goes Oliveira, que veio para o Ceunes no final de 2012, hoje traba-lha diretamente com o Irga. Seu projeto visa de-

senvolver pesquisas a partir do Dris – um sistema integrado de diagnose do estado nutricional das plantas. Parte do trabalho avalia a produção de café em lavouras da Bahia e a outra parte, a produ-ção de lavouras do norte no Espírito Santo. “Nossa ideia é fazer um estudo do que temos em lavouras de alto nível, com produções muito boas, avalian-do qual é a condição nutricional da planta quan-do ela produz nesse nível e, a partir daí, fazer uma diagonse e recomendar para os produtores de ou-tras regiões, inclusive do Espírito Santo, situações parecidas com as da Bahia, a fim de potencializar a produção de muito mais pessoas”, ressalta Mar-cos. E completa: “Com a vinda da pesquisa de café para cá, aumentou muito a perspectiva de produti-vidade, pois os professores do Ceunes começaram a contribuir bastante com trabalhos de tecnologia relacionados à irrigação, à adubação, à fisiologia da planta e aos processos pós-colheita”, destaca ele.

Se o principal objetivo dos estudos na área de café é fornecer condições e suporte científico para que os produtores da fruta invistam no melhoramento de suas lavouras, promover a integração entre as comunidades agrícolas e a Ufes é fundamental para a eficácia das pes-quisas, que passam a ser utilizadas na prática. Pensando nisso, os membros do grupo Pesqui-sa e Difusão de Tecnologia em Café Conilon no Espírito Santo criaram o Simpósio do Produtor de Conilon, cujo próprio nome já diz a quem ele se dirige. O segundo simpósio, realizado em Agosto de 2013 no Ceunes, com o “Manejo da adubação e irrigação”, reuniu cerca de 600 pessoas, entre elas, produtores rurais de mais de 14 municípios vizinhos. Durante o evento, foi distribuído um livro escrito pelos palestran-

II Simpósio do Produtor de Conilon

tes, contendo os temas ministrados no primei-ro e no segundo simpósios. Uma forma de fazer com que os cafeicultores levassem o conheci-mento adquirido para suas casas.

Para o professor Fábio Partelli, a possibi-lidade de promover a interação entre pesqui-sadores e produtores foi muito interessante. “A maioria dos presentes eram cafeicultores, muitos dos quais entraram em uma universi-dade pela primeira vez. Foi muito gratificante, pois além de absorverem conhecimento sobre café Conilon, levaram também a perspectiva de que seus filhos, sobrinhos e amigos, e os próprios estudantes presentes podem, a curto e médio prazos, ingressar na Universidade, que é pública, de qualidade e também aces-sível”, salienta Partelli.

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A r t I g o

Vida Bonita!Ivone Martins de Oliveira • Sonia Lopes Victor • Alexsandro Rodrigues*

No inverno de 1994, Maria Aparecida Santos Cor-rêa Barreto, nossa querida Professora Cida, ingressou na Ufes como professora do antigo Departamento de Fundamentos da Educação e Orientação Educa-cional para ministrar disciplinas na área de Educação Especial. De pronto, foi convidada pela professora Denise Meirelles para compor o Grupo Emergente em Educação Especial, junto ao Laboratório de Estu-dos em Educação Especial, hoje Núcleo de Ensino, Pesquisa e Extensão em Educação Especial (Neesp).

Imediatamente à sua admissão, Cida foi atuar como docente no Centro Universitário Norte do Espírito Santo (Ceunes), onde permaneceu por al-guns semestres. No Ceunes, marcou sua presença de forma cativante na comunidade acadêmica e na sociedade civil, envolvendo-se em projetos de extrema importância para aquele espaço-tempo.

Em 1998, Cida iniciou seu doutorado em Edu-cação, na Universidade Estadual de Campinas (Uni-camp), em São Paulo. Seu compromisso com a escola e com os estudantes a levou a investigar a relação de crianças com a vida e a morte em uma escola situada num bairro marcado pela pobreza e pela violência.

Com a conclusão do curso de doutorado e com o seu retorno às atividades docentes na Ufes, Cida foi credenciada no Programa de Pós-Graduação em Educação, inicialmente na linha: “Educação

Especial: Abordagens e Tendências” e depois na linha “Diversidade e Práticas Educacionais Inclu-sivas”. Sua passagem pelo Programa de Pós-Gra-duação possibilitou-lhe o envolvimento maior com a pesquisa, a formação de pesquisadores e de professores.

O compromisso de Cida com a formação de pro-fessores pode ser evidenciado não só na orientação de seus alunos, mas também no incentivo, na com-preensão, na aposta, na solidariedade e na amorosi-dade para com eles, com condição docente e com a escola. As temáticas da Inclusão, da Educação Espe-cial e das Relações Étnico-raciais permeavam sua produção acadêmica, reforçando os diferentes senti-dos bonitos que Cida tinha da multiplicidade da vida.

Seu compromisso com a Universidade levou-a, também, a assumir cargos administrativos. A par-tir desse momento, sua contribuição para com a Universidade começou a ultrapassar os limites do Centro de Educação. Pode-se destacar, em seu tra-balho, sua participação na Câmara de Graduação, especialmente, nas discussões sobre as Diretrizes de Formação de Professores dos Cursos de Licen-ciaturas da Ufes, na assessoria a diferentes Cole-giados de Curso, na reformulação de seus projetos pedagógicos e na mediação das tensões decorren-tes dos diferentes posicionamentos.

Fragmentos de uma

“Oh que coisa bonita! Oh que coisa bonita! Sua luta ficou de forma infinita, oh que coisa bonita...”

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Pelo reconhecimento da qualidade de seus tra-balhos, Cida foi incentivada a se candidatar para a direção do Centro de Educação por muitos de seus pares. No final do ano de 2006, ela assumiu pela primeira vez o cargo de diretora do Centro de Edu-cação e, em 2011, iniciou seu segundo mandato à frente do Centro de Educação.

A atuação como diretora do Centro de Educa-ção e também coordenadora do Núcleo de Estu-dos Afro-brasileiro (Neab) possibilitou à Professora Cida ampliar seus conhecimentos sobre a Univer-sidade e os desafios na área da gestão, do ensino, da pesquisa e da extensão, os quais eram aborda-dos no vários fóruns de discussão e de delibera-ção a que tinha acesso como diretora.

Pela atuação nesses espaços, a visibilidade de seu potencial como gestora expandiu-se para além do Centro de Educação. Cida foi convidada a compor uma chapa como vice-reitora do can-didato professor doutor Reinaldo Centoducatte – convite inesperado, mas ao qual, de forma gene-rosa e determinada, disse sim, compreendendo a importância daquela campanha como uma nova experiência para o Centro de Educação, para a sua trajetória profissional e para a Ufes.

Novos desafios se colocaram para a Professora Cida Guerreira que, em 2012, assumiu a condição de vice-reitora. Aos poucos, a nova administra-ção foi implementando seu programa de gestão da Ufes e, como vice-reitora, Cida foi imprimindo, neste trabalho, sua marca característica de ale-gria, bom humor, ética, competência e capacidade de lidar com diferentes posicionamentos e de dia-logar com todos os segmentos da Universidade.

Seu compromisso e dedicação à Universidade se estenderam aos quatro campi e abarcaram desde a Prograd, com toda a política da gradua-ção, ao Projeto Pedagógico da Rádio Universitária, o ensino a distância, o acompanhamento decidido e comprometido com a política de inclusão e aces-sibilidade da Ufes.

O trabalho da Professora Cida sempre aconte-ceu no crescente e este crescente se abria em redes de conversas e parcerias com os órgãos governa-mentais nos três níveis da federação. Nessas con-versas e parcerias, Cida ampliava a abertura da Universidade à comunidade externa e às deman-das dos movimentos sociais.

Suas razões, ações, apostas, inquietações e pai-xões confirmavam na mais íntima relação com suas lutas diárias o que ela pensava de uma vida, sua vida. Cida pensava a vida como uma grande roda,

roda-ciranda, que só tem como dono o crescimento, o movimento e o eterno recomeço.

Cida sempre nos convidou a fazer a roda girar. Ela acreditava que as rodas possuem o poder de colocar em movimento: histórias de lutas, resis-tências e esperanças.

Cida via, em todas as rodas, suas dimensões estéticas e éticas. E afirmava, via exemplo, que as rodas têm por função vital somente crescer, se movimentar e trazer a força e a energia do mais um.

Ela nos dizia e nos ensinava, via exemplo, que as rodas estão presentes em nossas vidas e, por serem tão presentes, as tomamos por naturais e não culturais. Rodas-cirandas, de conversas, de his-tórias, de danças, de cantoria, de luta, de ginga, de oração, de gira, de olho-no-olho, de fala-que-te- escuto e te-sinto.

Cida pensava que o grande barato das rodas, de crianças e de gente grande é que “sempre se pode chegar”. O mais um é sempre bem-vindo. A roda, seu giro, seu ir e vir, seu movimento ritmado só se potencializa se ela for aberta à entrada do outro. Por isso que, para ela, a roda era um espaço cultu-ralmente político.

Segundo a Professora Cida, nas rodas, a entrada do outro amplia a potência de quem nela se encon-tra, anunciando amanheceres alegres, mais jus-tos e igualitários. E, como sabemos que tudo isso é pouco, seguimos seu exemplo, fazendo a roda girar. Vem, entra na roda e gira.

Saudades...

*Professores do Centro de Educação

este texto é uma homenagem da Administração Central e da equipe da revista Uni-versidade à vice-reitora da Ufes professora Cida Barreto, falecidaem setembro/2013

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Curso de História:

Investigar fatos do passado e da atualidade na busca pela compreensão dos rumos e processos políticos, sociais e culturais estabelecidos ao longo do tempo e que servem de base para as mudan-ças ainda em curso é o objetivo da História. É um campo de estudo que ocupa uma posição funda-mental dentro das Ciências Humanas e na forma-ção do conhecimento. Fundado em 1953, o Curso de Licenciatura e Bacharelado em História da Ufes completou 60 anos em 2013. Entre suas conquistas está o Programa de Pós-Graduação em História, que em 10 anos formou 173 mestres, mantendo atual-mente 44 alunos de mestrado e 24 de doutorado.

Maria Beatriz Nader é professora do Departa-mento de História há 33 anos. Segundo ela, a par-tir da implantação do mestrado, em 2003, a maior qualificação dos professores se refletiu também em um melhor desempenho dos estudantes de graduação, que passaram a se aproximar mais das pesquisas, além de terem a oportunidade de dar seguimento a sua formação acadêmica dentro da própria Universidade.

É isso o que confirma o professor Josemar Machado de Oliveira, coordenador do Colegiado do Curso de História e que nele trabalha há 21 anos: “Nós saímos de uma universidade que era pouco preocupada com a pesquisa e mais cen-trada na sala de aula. De alguns anos para cá, o corpo docente de História passou a ampliar sua for-mação, com professores mestres e doutores. Isso tem como consequência uma densidade maior dos temas abordados, com professores especialistas em determinadas áreas, permitindo que os alunos tenham contato com o que há de mais atual em termos de conhecimento na área”, reforça.

O Programa de Pós-Graduação em História tem como área de concentração a História Social das Relações Políticas. Para dar conta desse amplo campo de investigação foram desenvolvidas três linhas de pesquisa: Sociedade e Movimentos Polí-ticos; Estado e Políticas Públicas; e Representa-ções e Ideias Políticas. Além disso, o programa mantém parcerias com universidades do exterior, como a Université Paris, na França, a Universidade

do Minho, em Portugal, e a Università Ca’ Foscari, na Itália. Em 2010, foi aprovado o doutorado. O processo de defesa de teses ainda não foi iniciado, mas, de acordo com Maria Beatriz, os resultados já podem ser observados dentro do curso. Isso porque os doutorandos também são responsáveis por dar aulas na graduação e, com isso, trazem outras pos-sibilidades de estudo. “Desde o início do Programa de Pós-Graduação até agora, nosso ensino deu um salto muito grande”, acrescenta a professora.

Atualmente com 19 professores, o curso de História desenvolve 18 projetos de pesquisa e 38 orientações de Iniciação Científica em diferentes áreas, distribuídos em sete laboratórios compos-tos por professores-pesquisadores, doutorandos, mestrandos e alunos de graduação. Entre eles, destacam-se o Laboratório de Estudos de Histó-ria Política e das Ideias (Lehpi) – que, coordenado pelo professor Antonio Carlos Amador Gil, foi um dos precursores do estudo da história política no Espírito Santo ao longo dos últimos 15 anos – e o Laboratório de Estudos de Gênero, Poder e Violên-cia. Sob a coordenação da professora Maria Beatriz, este laboratório desenvolve pesquisas institucio-nais e outras atividades acadêmicas acerca das re-lações de gênero, e de poder e sobre a violência de gênero contra a mulher e contra o homem.

Alex Silva Ferrari é ex-aluno de licenciatura em História da Ufes e agora está concluindo seu bacha-relado no mesmo curso, além de já ter sido apro-vado no mestrado da Ufes. Desde 2009, ele faz parte do Laboratório de Estudos de Gênero, Poder e Violência, tendo completado três ciclos de Inicia-ção Científica. Sua pesquisa se concentra no estudo da construção da masculinidade e sua relação com a violência contra a mulher.

“Participar do programa de Iniciação Cientí-fica abre novos horizontes e, acima de tudo, é uma forma de se fazer presente na História, o que pos-sibilita o maior contato com a disciplina”. E con-clui: “Posso dizer que o curso de História foi uma grata surpresa na minha vida e, apesar de incerta no começo, considero que foi também a decisão mais correta que tomei.”

g r A d U A ç ã o

há 60 anos formando professores e pesquisadores

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p A t e n t e

Labpetro: O setor de Petróleo e Gás é considerado um dos

mais importantes para a economia capixaba, e a Ufes, com suas reconhecidas linhas de pesquisas e metodologias no setor fomentadas pelo Labo-ratório de Pesquisa e Desenvolvimento de Meto-dologias para Análises de Petróleos (LabPetro) é uma das grandes responsáveis por essa garantia.

Coordenada pela pesquisadora do LabPetro Maristela Araújo Vicente, a última patente deposi-tada foi resultado de uma pesquisa elaborada pelo Laboratório em parceria com o Centro de Pesqui-sas Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes), da Petrobras, que visa criar uma nova metodolo-gia para estudar as frações de petróleo. O Equi-pamento e Métodos para a Preparação e para Fracionamento de Amostras de Compostos Com-plexos de Absorção Seletiva foi construído por seis pesquisadores. Com esse instrumento criou-se um método que encurta o tempo desse estudo e reduz a exposição do técnico a produtos químicos.

Com as metodologias usadas atualmente no mercado, os estudos sobre as frações do petróleo demoram cerca de uma semana para serem con-cluídos. Já com o equipamento desenvolvido no LabPetro, os processos duram cerca de uma hora. Além dessa otimização do tempo de processo, a questão ecológica também foi uma preocupação do estudo. Por isso, nele, todas as substâncias uti-lizadas são recuperadas, minimizando o impacto que poderiam causar ao meio ambiente. Maristela afirma que a patente traz novos desenvolvimentos. “O aparato, que hoje ainda é um protótipo de vidro, será automatizado a ponto de não precisar de téc-nicos para operar seu funcionamento, e também reduzir drasticamente o uso de solventes”, explica. Atualmente, o modelo automatizado é utilizado somente no Cenpes, porém, segundo Maristela, a ideia é expandir para todo o País.

Todas essas qualidades foram reconhecidas. A patente, depositada em 2012, foi agraciada com o Prêmio Inventor Petrobras, na edição de 2013. A cerimônia, que existe desde 2001, é de abran-gência nacional e tem o objetivo de estimular a

concepção de tecnologias inovadoras. Em 2012, quando sete universidades foram homenageadas com os prêmios, três deles foram da Ufes.

Para o professor e coordenador do LabPetro, professor Eustáquio Vinícius Ribeiro de Castro, a patente, além de todas as suas qualidades, repre-senta um símbolo muito forte para o Estado. “Se, antigamente, as indústrias siderúrgicas e de papel e celulose traziam mão de obra capacitada de fora, importando inteligência, a indústria do petróleo não; ela vem priorizando emprego para os capixa-bas. E a patente carrega esse simbolismo, de ser feita aqui e por conterrâneos”, afirma.

Foto: Thaiana Gomes

patente reconhecida

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Em 13 anos, o Ne@ad já formou mais de dez mil pessoas na graduação, na especialização e em cursos de aperfeiçoamento

Em sua terceira carta pedagógica, Paulo Freire escreveu: “se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda” (FREIRE, 2000, p. 67).

Fazendo jus às palavras do educador, a ninguém deve ser negado o direito de aprender, independen-temente de sua etnia, classe social ou a posição que ocupa, geograficamente, em nosso espaço. Sob essa perspectiva de inclusão, alicerça-se o Núcleo de Edu-cação Aberta e a Distância da Ufes – Ne@ad –, cuja missão é levar oportunidades de ensino a popula-ções de lugares que, afastados dos centros urbanos,

ficaram por muito tempo à margem do processo de desenvolvimento. Em 13 anos de existência, o Ne@ad já formou 10.182 pessoas em cursos de graduação, especialização e aperfeiçoamento, espalhadas por todos os municípios do Estado do Espírito Santo.

Atualmente, o Ne@ad atende a 3.533 pessoas, ofertando cursos de Licenciatura em Artes Visuais, Educação Física, Química, Física e Bacharelado em Ciências Contábeis. Recentemente, a Ufes recebeu do MEC provimento de 33 vagas de novos docen-tes para fortalecer sua política de Educação Aberta e a Distância (EAD). Mas, até chegar esse estágio,

não é barreira para aprenderQuando a distância

I n s t I t U C I o n A L

Maíra Mendonça

Fotos: Thaiana Gomes

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foram necessários anos de empenho. É o que conta a professora Maria José Campos Rodrigues, diretora administrativa do Núcleo, que nele atua desde a sua implantação. Segundo ela, a história do Ne@ad começou na Ufes, no ano 2000. Na época, por meio de um projeto desenvolvido em parceria com a Uni-versidade Federal de Mato Grosso, a Ufes passou a oferecer, pela primeira vez, um curso superior a dis-tância: o de Licenciatura em Pedagogia.

Esse é o ponto de partida que credenciou e im-pulsionou a Ufes a iniciar seu próprio projeto de Educação a Distância. Para tanto, a Universidade re-estruturou seu Programa de Interiorização para nele alocar sua política de oferta de cursos na modalida-de de Educação Aberta e a Distância e, com ela, criar o Ne@ad. Conforme explica Maria José, seu princi-pal objetivo, na época, era atender a uma demanda do do Espírito Santo, no qual, de acordo com da-dos da Secretaria de Estado da Educação, cerca de 12.000 professores do Ensino Básico atuavam nas redes estadual e municipais de ensino, sem, no en-tanto, terem formação em nível superior. Além dis-so, havia a exigência prevista pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) de que todos os profes-sores deveriam possuir formação em nível superior.

A partir daí, foram implantados 13 Centros Regionais de Educação Aberta e a Distância, os Cre@ads, distribuídos estrategicamente em cida-des das mais diversas regiões do Estado do Espírito Santo – Alegre, Barra de São Francisco, Cachoeiro de Itapemirim, Colatina, Guaçuí, Linhares, Mon-tanha, Nova Venécia, Santa Teresa, São Mateus, Venda Nova do Imigrante, Vila Velha e Vitória. Teve início uma parceria entre as prefeituras dos muni-cípios onde se instalaram os Cre@ads e a Ufes: enquanto as prefeituras eram responsáveis pela estrutura física dos locais, a Ufes ficava respon-sável pela sua manutenção e custeio, inclusive, por fornecer todo o material de consumo. Com a oferta do Curso de Licenciatura em Pedagogia nos Cre@ads, foram formados 6.171 professores.

Universidade AbertaEm 2006, a Ufes fez adesão ao Projeto Piloto

da Universidade Aberta do Brasil (UAB) para ofer-tar o Curso de Bacharelado em Administração. Esse projeto, estabelecido em parceria entre o Ministé-rio da Educação (MEC) e o Banco do Brasil, visava formar servidores da Ufes, das prefeituras do Espí-rito Santo e daquele banco. A UAB é um programa que se constitui como um sistema integrado por universidades públicas para a oferta de cursos de

A inclusão de outros programas

Além do UAB, também foram englobados pelo Ne@ad programas vinculados à Coor-denação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), a fim de aumen-tar e de diversificar os cursos ofertados pelo Núcleo, como: o Programa de Forma-ção Inicial para Professores dos Ensinos Fundamental e Médio, também conheci-do como Pró-Licenciatura, um esforço do Governo Federal, por meio do MEC, em prol da melhoria da qualidade do ensino na educação básica; o Programa Nacional de Administração Pública (PNAP), que visa a ofertar cursos voltados para a formação de gestores e profissionais na área de Gestão Pública; e o Plano Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR), que também objetiva fomentar a oferta de educação superior gratuita para professores em exercício na rede pública de educação básica e para a demanda social em geral.

Por meio da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), são ofertados outros seis cursos destinados à promoção de uma edu-cação inclusiva, a partir da formação de profissionais conscientes quanto à neces-sidade de valorização das diferenças e da diversidade nas escolas. Um exemplo des-ses cursos é o de Especialização em Gestão de Políticas Públicas em Gênero e Raça e os de aperfeiçoamento em Educação Ambien-tal, Educação para a Diversidade, Educação para as Relações Etnicorraciais; Gênero e Diversidade na Escola; Educação em Direi-tos Humanos e Educação do Campo.

nível superior e incentivo à formação continuada, em especial para a parte da população que não teve a oportunidade dessas formações. Atualmente em acelerada expansão, a UAB prioriza a formação de professores da educação básica.

A chegada do projeto da UAB ao Ne@ad trouxe ainda grandes mudanças. O programa iniciou a criação de polos de apoio presencial, unidades aca-dêmicas instaladas nos municípios, a fim de dar o

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suporte pedagógico, tecnológico e administrativo necessário para os cursos a distância. Diferente-mente dos Cre@ads, os polos são custeados pelas prefeituras municipais, às quais cabe a sua manu-tenção. Em dois editais, foram criados 26 polos de apoio presencial, que interligam todas as regiões do Estado, potencializando a Política de Educação a Distância da Ufes e tornando-a acessível a muito mais pessoas. Os polos-UAB englobam municípios vizinhos num raio de até 60 quilômetros e estão ligados diretamente ao Ne@ad.

É importante ressaltar que no Estado só exis-tem duas instituições públicas federais credencia-das pelo MEC para ofertar cursos da UAB: a Ufes e o Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes). No entanto, por tratar-se de uma rede nacional, caso um gestor de polo ache necessário ofertar cursos que, no momento, não podem ser oferecidos pelas instituições locais, estes podem ser dados por ins-tituições de outros estados vinculados à UAB.

Para o diretor pedagógico do Ne@ad, professor Júlio Francelino, a possibilidade de levar o conheci-mento para lugares distantes é fundamental. “Não se trata de um benefício. Trata-se da conquista de um direito”, enfatiza ele.

Maria José traz consigo algumas recordações: “o mais encantador para mim foi quando nós fize-mos uma cerimônia no auditório do Centro de Ciên-cias Exatas (CCE), no campus de Goiabeiras, em

que estava se formando uma turma grande de alu-nos em Física pela Universidade. E isso com qua-lidade atestada até pelos concursos públicos nos quais obtiveram êxito, cujas aprovações temos acompanhado.”

Estrutura e funcionamentoElaborar e pôr em prática um curso a distância de

qualidade requer um esforço conjunto para a organi-zação de estruturas e de processos, que ampliem as possibilidades de interação entre educadores e edu-candos. Justamente por isso, o Ne@ad conta com uma equipe multidisciplinar para orientação aca-dêmica dos licenciandos, além de investir na cria-ção de ambientes reais e virtuais de aprendizagem.

Todo o material didático entregue aos alunos, como livros e CDs, é produzido por uma equipe do próprio Ne@ad, composta por professores com conhecimentos diretamente relacionados às disci-plinas previstas pelos currículos. Cada curso conta também com dois tutores: um a distância e um presencial, ambos professores da rede pública de ensino. Ao tutor presencial cabe a função de esta-belecer uma ponte entre os polos e a Ufes, acom-panhando de perto os alunos – os cursos ofertados se encaixam na modalidade bimodal, uma vez que os estudantes têm a obrigatoriedade de ir aos polos no mínimo uma vez por semana –, aplicando pro-vas e gerenciando reuniões. Já o tutor a distância

O Encontro Regional de Cordenadores de Polo UAB: Desafios x Possibilidades reuniu, em outubro de 2013, coordenadores e mantenedores de polos de EAD do Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia

Foto: Arquivo Ne@

ad

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está mais próximo aos professores na Universidade, auxiliando-os em todas as fases dos processos de oferta das disciplinas e no manuseio das platafor-mas virtuais destinadas aos alunos.

A inclusão digital é uma grande preocupação dos cursos de educação a distância. A professora Maria Goretti Moro Gomes, que é coordenadora do Polo UAB de Aracruz desde 2007, conta que a maioria dos alunos chega aos polos com mui-tas dificuldades em relação ao manuseio de equi-pamentos eletrônicos, como o computador, com o qual poucas vezes tiveram contato. Mas o fato de os cursos a distância possuírem plataformas on-line faz com que, aos poucos, essas barreiras sejam ultrapassadas. Através delas os estudan-tes podem se comunicar com seus tutores e pro-fessores, encontrar novos materiais de estudo e

Levar oportunidades de ensino a moradores de regiões interioranas representa uma possi-bilidade de melhoria de qualidade de vida, de concretização de sonhos e de mudanças em nível coletivo. Para o professor Júlio France-lino, é preciso pensar no impacto positivo que os cursos a distância causam nas escolas e nas comunidades, uma vez que atuam na forma-ção de indivíduos capazes de contribuir para o desenvolvimento das regiões onde vivem.

É sobre isso que fala a coordenadora do Polo Maria Goretti: “a maioria dos alunos são professores de Aracruz ou das regiões do entorno. Eu acredito que hoje eles tenham uma oportunidade maior de ter informações e com isso poder educar de uma forma diferen-ciada. Uma outra realidade que muda é a pre-sença da Universidade no município. O Polo desenvolve atividades em que a comunidade em geral é envolvida. Nós tivemos, por exem-plo, uma mostra cultural em que os professo-res de Artes e de Física trabalharam com os alunos do Ensino Médio. Então é uma oportu-nidade maior de envolver a comunidade em ati-vidades que antes nós não tínhamos”, acredita.

O assessor de Projetos Especiais da Ufes, Paulo Roberto de Souza, é Mestre de Cerimô-nia das formaturas do Ne@ad e, desde o iní-cio, acompanha tanto a história do Núcleo,

participar de webconferências, além de contar com bibliotecas e laboratórios de informática em seus polos. “Nós conseguimos acompanhar todo o desenvolvimento desses alunos. Eles estão se for-mando e hoje conseguem ser muito bem classifica-dos em concursos públicos”, ressalta Maria Goretti.

Hoje o polo de Aracruz oferece 15 cursos da Ufes, do Ifes e da Universidade Federal Flumi-nense (UFF) a 400 pessoas de comunidades situa-das em seu entorno. Segundo Maria Goretti, apesar da diversidade de estudantes existentes no Polo, a maioria apresenta um aspecto em comum: a opor-tunidade de cursar o Ensino Superior em localida-des onde não existem instituições de modalidade presencial. “A principal característica é realmente a democratização do acesso ao Ensino Superior”, pontua Maria Goretti.

Contribuindo para o desenvolvimento regional

quanto a das pessoas que através dele viu serem formadas. Ele se recorda de que, logo quando os cursos a distância foram iniciados, havia lugares onde não existiam sequer ban-cas de revista. Uma realidade que foi alte-rada com a chegada dos cursos. “Eles buscam ascensão social, melhor qualidade de vida, melhores salários, etc. Mas não é só isso. Buscam superar os próprios limites, realizar sonhos pessoais, sonhos de quem não teve a oportunidade de ter acesso à Universidade pela distância, pela falta de recursos e por outros motivos. Não só do ponto de vista des-sas pessoas terem acesso a um curso superior, mas de terem acesso a cursos que desejam, porque, muitas vezes, as pessoas fazem cursos ofertados por faculdades particulares em suas cidades de origem mesmo não sendo aqueles nos quais almejavam se formar. As pessoas, às vezes, não têm a oportunidade de trilhar determinados caminhos, e o curso a distância ajuda-as a encontrar isso”, ressalta.

Paulo lembra também o quão forte é a presença da comunidade nas formaturas dos cursos a distância. “Quanto menor a cidade, maior a importância que se dá a isso. É um evento social para a cidade. Estão lá as autori-dades, os amigos, todos participando. É muito bacana, é muito emocionante”, conclui.

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I n s t I t U C I o n A L

Andreia de Andrade Dalbo, 28 anos Ex-aluna do curso de Artes Visuais, Venda Nova do Imigrante“Sou professora de Artes na rede estadual e pro-fessora de Educação Infantil na rede municipal. Antes de iniciar o Curso de Artes Visuais, eu atu-ava como estagiária em uma escola de Educa-ção Infantil e cursava o Curso de Pedagogia presencial em outra cidade. Fui informada por uma colega de trabalho sobre o Curso de Artes ofertado pela Ufes, a distância, em um polo na cidade vizinha, e me inscrevi. Em princípio, não tive muitas expectativas em relação ao Curso, pois nem sabia direito o que eu estudaria e o que viria pela frente. Na verdade, eu tinha certo preconceito a respeito da educação a distância.

De início, o principal desafio para mim foi usar a Internet e o computador como ferramen-tas de estudo, já usava e-mail e acessava sites de relacionamento, mas estudar usando o com-putador como ferramenta principal, isso não passava pela minha cabeça. Minha colação de grau foi em outubro de 2012. Foi uma realização muito grande para mim e para minha família, que me acompanhou em todo o meu percurso.

O Curso contribuiu muito para o estímulo à pesquisa e isso enriqueceu minha prática docente. Nunca tive o hábito de ler muito, e foi pela necessidade desse curso que busquei ler mais. Agora, concluído o curso, vejo sentido em cada etapa, vejo com clareza o porquê de cada disciplina, a sequência em que elas nos foram sendo propostas. Com o tempo tudo se encaixou e vejo que ainda tenho muito que buscar e aprender, pois a pesquisa continua e tenho muito a contribuir com o ensino da Arte em nossas escolas.”

Albino Coppo, 73 anosEx-aluno do curso de especialização em Gestão de Saúde, Nova Venécia“Sou cirurgião-dentista formado no ano de 1968. Trabalho como dentista no CEO – Centro de Especia-lidades Odontológicas – CEO – de Nova Venécia. Iniciei o Curso de Gestão em Saúde em fevereiro de 2011 e terminei de apresentar o Trabalho de Conclusão de Curso em julho de 2013. Como toda a famí-lia sempre me deu apoio, e eu sempre gostei de desafios, decidi iniciar o curso. Já havia feito o Curso de Atenção Primária à Saúde pela Univen, Faculdade de Nova Venécia, que concluí em 2011. São poucas as oportunidades de estudos mais adiantados que a minha cidade oferece, mas através de cursos a distân-cia como esse fornecido pela Ufes, a gente vai melhorando a nossa capacidade. Concluí faltando ape-nas um mês para completar 73 anos de idade. Resolvi fazer esse curso, pois foi uma oportunidade para adquirir mais conhecimentos na área da saúde pública, de que tanto se fala neste país. Durante o perí-odo do curso, minha vida transcorreu normalmente trabalhando e estudando, pois sempre fui bastante organizado com minhas tarefas, não deixando nada interferir no meu objetivo. Aprender coisas diferentes sempre aprendemos quando estudamos em qualquer área. Só tem a acrescentar em todos os aspectos.”

A Câmara de Documentos é um dos instrumentos utilizados pelos professores do Ne@ad para escrever

e reproduzir imagens durante as webconferências

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Evanilda Bispo dos Santos, 42 anosEx-aluna do curso de especialização em Gestão de Pessoas, Linhares“Concluí minha graduação em 2010. Trabalhava em dois turnos como Técnica em Enfermagem, pois, por ser plantonista, tinha a chance de angariar maior poder aquisitivo. Foi quando um amigo que fizera os cursos de Gênero e Diver-sidade (GDE) e Educação em Direitos Humanos (EDH) junto comigo me encaminhou o Edital do Curso Gestão em Saúde dizendo-me: “acho que deveria tentar”. Foi uma correria só, pois tinha que enviar documentos e eu não teria tempo para fazer tudo sozinha. A família toda se mobilizou a ajudar. O primeiro dia de aula foi emocionante, tinha vontade de chorar de tanta alegria de imaginar que estava reali-zando um sonho, uma pós-graduação em uma universidade pública, e mais, no segmento que sempre sonhei em poder atuar. O Curso de Ges-tão em Saúde teve inicio em março de 2012. E que espetáculo de que participei: de mestres especialistas com quem tive a oportunidade de adquirir conhecimento, equipe competente, solidária, e, quando se tratava de tomar deci-sões, éramos democráticos. Meu entendimento é que a educação a distância tem a mesma qua-lidade e conteúdo da presencial, nos dando a oportunidade de ser incluídos neste espaço de aprendizagem que o mundo nos cobra. Hoje sou Assistente Social na área de saúde men-tal em minha cidade.”

Fabiano Rodrigues de Oliveira, 36 anos Ex-aluno do curso de Artes Visuais, Ecoporanga“Tenho 36 anos e sou cabo da Policia Militar do Estado do Espirito Santo. Meu Curso iniciou-se no final de 2008 e terminou em 2012. Antes, eu já era policial militar. Tenho 15 anos de ser-viço na corporação. Eu já tinha feito outros ves-tibulares e tentado outros cursos. Por exemplo, passei em oitavo lugar em Educação Física, na Faesa, mas não pude fazer pela distância e pelo valor da mensalidade. Foi quando conheci o sistema EAD. Fiz uma inscrição para um Curso de Administração, mas tive problemas pesso-ais e fiz a metade do curso.

Como sou brasileiro e não desisto nunca, abriram o vestibular para o Polo de Ecoporanga, no Curso de Sistema de Informação pelo Ifes. Fiz a inscrição e passei. Éramos 20 alunos. No meio do curso, quase todos desistiram, mas fiquei até que o Ifes acabou com o curso por falta de alunos. Quando surgiram os cursos oferecidos pela Ufes, vi a minha grande chance de, enfim, concluir o nível superior. Pesquisei sobre os cursos e me identifiquei com o de Artes Visuais, pois percebi que poderia mudar algo na cultura da minha cidade.

Por ser policial, todas as pessoas com quem eu falava me diziam que não tinha nada a ver comigo, mas alguma coisa me dizia para não desistir. Eu precisava provar para mim que poderia concluir um curso superior. Foram três anos e meio de muita correria para entregar as tarefas no dia certo, fazer atividades que nunca imaginava fazer, mas com a ajuda dos colegas, tudo foi saindo dentro do previsto.

Destaco aqui a importância da Educação a distância, que, com certeza, podemos dizer que nos revolucionou e nos fez adotar uma nova maneira de pensar, agir e interpretar o mundo, pois tivemos que aprender a aprender, e quase sempre sozinhos. Com certeza minha vida mudou totalmente. Hoje, quando viajo com minha família, procuro visitar museus, galerias, exposições, e, sempre que posso, con-verso com eles sobre culturas locais e do Espí-rito Santo. Hoje, com certeza, posso dizer que a missão foi dada e foi cumprida.”

Maria José Campos Rodrigues, diretora administrativa, e Júlio Francelino, diretor pedagógico do Ne@ad

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Tomie Otake – Gravura 1993, de 67 x 94 cm. Nº de tombamento 204.1.76

Acervo da Universidade Federal do Espírito Santo na Galeria de Arte Espaço Universitário