revista racine (edição 117) - hepatites virais

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4 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

117Ano XXJulho/Agosto de 2010Hepatites Virais

Hepatites Virais: Silêncio a Ser Rompido

As hepatites virais são uma questão relevante em saúde pública, no Brasil e no mundo. Os principais vírus causadores das hepatites são os vírus A, B, C, D e E, e cada qual afeta o organismo humano de uma forma específica. A população em geral e os indivíduos infectados por estes vírus ainda detém pouco conhecimento acerca destas doenças.

A hepatite B é uma Doença Sexualmente Transmissível (DST) de alta incidência na população brasileira. Segundo o Ministério da Saúde, o total de casos confir-mados, entre os anos de 1999 e 2009, é de 96.044, sendo que mais de 50% dos indivíduos infectados estão na faixa etária de 20 a 39 anos e cerca de 90% destes apresentam a forma aguda da doença. A vacina está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) desde a década de 1990.

A hepatite C possui um total de casos confirmados no Brasil, de 1999 a 2009, de 60.908. É considerada uma doença silenciosa, pois os sintomas podem surgir muito tempo após o vírus ter se instalado no organismo humano. Quanto mais tardio o diagnóstico, maiores podem ser as complicações da doença. Aproximadamente 70% dos casos de hepatite C tornam-se crônicos.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que exista um subdiagnóstico dos vírus da hepatite B e da hepatite C no Brasil. Perante este quadro apresen-tado e devido à necessidade de se levar informações precisas à população sobre a gravidade destas doenças, suas complicações, os tratamentos medicamentosos disponíveis, bem como a importância de se modificar comportamentos como forma de prevenção, a 117ª edição da Revista Racine traz as Hepatites Virais como tema de capa.

No Dia Mundial do Combate a Hepatites Virais (28 de julho de 2010), o Minis-tério da Saúde apresentou uma série de compromissos para reduzir as hepatites virais no País. Entre as propostas está a ampliação em 163% do quantitativo de vacinas compradas para hepatite B, favorecendo a vacinação de jovens e adul-tos de 20 a 24 anos. Cabe aos profissionais da saúde, inclusive o farmacêutico, acompanharem e colaborarem para a implementação destas propostas, bem como cobrar dos setores responsáveis a efetividade das ações. Para isso, é imperioso adquirir conhecimentos acerca das formas de prevenção e identificação dos sin-tomas, para educar a população visando a proteção contra o contágio e a busca pelo diagnóstico precoce, única forma de amenizar as graves conseqüências em saúde que as hepatites virais podem representar, além de atuar na imunização, participando e/ou colaborando com as campanhas de vacinação.

Neste número 117 da Revista Racine apresentamos também um resumo sobre a 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia, 20ª Expo Farmácia e Eventos Integrados, que aconteceram no início de julho em São Paulo (SP), com o apoio de 38 instituições e entidades dos setores farmacêutico e da saúde, totalizando 25 eventos integrados de alto nível com mais de vinte mil participantes, coro-ando a celebração de duas décadas de sua realização e dos 20 anos de atuação do Grupo Racine.

Boa leitura! Nilce Barbosa

Presidente do Grupo Racine e Coordenadora Técnico-Editorial da Revista Racine

Editorial

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6 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

Correspondências

Expediente

Filiada

117

A Revista Racine (ISSN 1807-166X) é uma publicação bimestral da RCN Comercial e Editora Ltda., dirigida a empresas e profissionais das áreas farmacêutica, química, cosmética e da saúde.

PresidenteNilce Barbosa

Diretores ExecutivosArnivaldo DiasMarco QuintãoRenato Cintra Sérgio Slan

Coordenação Técnico-EditorialNilce Barbosa - CRF-SP 9.609

EditorAndré Policastro - MTb 42.774

Editora-Assistente e Jornalista ResponsávelKelly Monteiro - MTb 06.447

Colaboraram nesta EdiçãoAna Patrícia Pascoal Queiroz, André Cosme de Oliveira, Antonio Alci Barone, Bruna dos Santos Fromhertz, Carlos Eduardo de Melo, Cláudia de Fátima Gomes Teixeira, Daniela Vieira Baldini Batista, Danielli Botarelli Fragoso, Jeová Pessin Fragoso, José Costa Junior, Lia Maria Britto da Silva, Maíra Branco Rodrigues, Maria Helena Dobarco Raposeiras, Marisa do Nascimento, Mauricio Fernando de Almeida Barros, Patrícia Sodré Araújo, Raymundo Paraná Filho e Ricardo Gadelha de Abreu

EditoraçãoPercepção Design

Anúncios, Assinaturas e CorrespondênciasRua Padre Chico, 93Pompéia - CEP 05008-010São Paulo - SP - BrasilTel/Fax: 55 11 3670-3499E-mail: [email protected]

Artigos e matérias assinadas não refletem necessariamente a opinião da RCN Comercial e Editora Ltda.

ImagensGuilherme Bessa, arquivo Racine e divulgação

Agradecemos as manifestações enviadas de:

Associação Prudentina de Educação e Cultura (APEC), Presidente

Prudente (SP)

Faculdade de Medicina de Campos (FMC), Campos dos Goytacazes (RS)

Oficinallis Pharma, Jaú (SP)

Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), Porto

Alegre (RS)

Ano XXJulho/Agosto2010

Tiragem desta edição: 8.000 exemplares

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Índice

Roberto Rodrigues Ribeiro é graduado em farmácia industrial pela Universidade Camilo Castelo Branco (UNICASTELO), graduado em engenharia química pela Universidade de Mogi das Cruzes (UMC) e doutor em tecnologia bioquímica-farmacêutico pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP). Atualmente é coordenador do curso de farmácia da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).

“Acompanho a Revista Racine desde seu lançamento. Os temas abordados oferecem suporte para a atualização de alunos, de professores e de profissionais do mercado farmacêutico. A Revista Racine representa de forma coerente e compatível o Grupo Racine e destaca os principais assuntos abordados na área da saúde.

Chamou-me a atenção a edição 98, cujo tema de capa é Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), que elucida, entre outros aspectos, a percepção do aluno portador de TDAH pelo profissional da educação.”

Eu Leio a Revista Racine

Correspondências 6

Mesa-Redonda 14Desmistificando as Hepatites Virais: Aspectos Clínicos e Culturais

Panorama Geral Hepatite B Hepatite pelo Vírus B - Aspectos Atuais 30

Câncer de Fígado Carcinoma Hepatocelular: Origem, Incidência e Tratamento 40

Transplante Transplante de Fígado: Considerações e Dados Históricos 46

Especial de CapaFarmácia Aspectos Farmacêuticos Perante as Hepatites B e C 52

Pesquisa Clínica Papel do Laboratório Clínico no Diagnóstico e Manejo das Hepatites B e C 57

Nutrição Nutrição nas Hepatopatias 62

Psicologia Reflexões Acerca do Paciente com Hepatite e Atuação do Psicólogo 68

Serviço Social Aspectos Sociais das Hepatites: Abordagem Multiprofissional 72

Enfermagem Enfermagem e a AbordagemMultiprofissional na Hepatite C 75 Farmácia Clínica / Atenção Farmacêutica 78Pharmacotherapy Work-Up®: Processo Cognitivo de Tomada de Decisões Relacionadas à Farmacoterapia

Farmácia Hospitalar 84Insuficiência Renal Aguda Induzida por Vancomicina

Legislação 88Qual Lei Regulamenta a Distribuição de Medicamentos a Portadores de Hepatites Virais no Brasil e o que a Mesma Prevê? Como Funcionam os Pólos de Distribuição Desses Medicamentos?

Acontece 8920a Semana Racine - Congresso de Farmácia, 20a Expo Farmácia e Eventos Integrados

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Mesa-Redonda

Desmistificando as Hepatites Virais: Aspectos Clínicos e Culturais

Departamento de Moléstias Infecciosas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP)

Lia Maria Britto da Silva - psicólogaAntonio Alci Barone - médico infectologista Mauricio Fernando de Almeida Barros - médico cirurgiãoAndré Cosme de Oliveira - médico cirurgiãoCarlos Eduardo de Melo - farmacêutico Evaldo Stanislau de Araújo - médico infectologistaDanielli Botarelli Fragoso - farmacêuticaMarisa do Nascimento - enfermeiraMaria Helena Dobarco Raposeiras - assistente social

Coordenação

André Policastro - gerente de comunicação e relações institucionais do Grupo Racine e editor das Publicações RacineKelly Monteiro - editora-assistente e jornalista responsável das Publicações Racine

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ilenciosas e geralmente as-sintomáticas, as hepatites virais B e C atingem cerca

de 6 milhões de brasileiros, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).

As hepatites virais são doenças provocadas por diferentes agentes etio-lógicos e a distribuição das mesmas é universal, sendo que a magnitude dos diferentes tipos varia de região para re-gião, como explica a cartilha Hepatites Virais: o Brasil está Atento do Departa-mento de Vigilância Epidemiológica da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (DVR/SVS/MS). As hepatites virais são importantes de-vido ao número de indivíduos atingidos e pela possibilidade de complicações das formas agudas e crônicas.

A transmissão do Vírus da Hepatite B (VHB) ocorre por via parenteral, vertical (de mãe para filho) e, sobretu-do, pela via sexual, sendo considerada uma Doença Sexualmente Transmis-sível (DST). O Vírus da Hepatite C (VHC) é transmitido principalmente por via parenteral, sendo consideradas populações de risco os indivíduos que receberam transfusão de sangue e/ou hemoderivados antes do ano de 1993, usuários de drogas intravenosas ou usu-ários de cocaína inalada que compar-tilham os equipamentos de utilização, indivíduos com tatuagem, piercings ou que apresentem outras formas de expo-sição percutânea. A transmissão sexual é pouco freqüente, com menos de 3% em parceiros estáveis, e ocorre princi-palmente em indivíduos com múltiplos parceiros e com prática sexual de risco (sem utilização de preservativo), sendo que a coexistência de alguma DST, inclusive o HIV, constitui-se em um im-portante facilitador dessa transmissão.

Mesa-Redonda

S Para debater sobre as hepatites virais, tema desta 117ª edição, a Revista Racine foi até o Departa-mento de Moléstias Infecciosas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) e reuniu-se com a equipe multiprofissional deste centro de referência, que inclui médicos, farmacêuticos, enfermeira, psicólo-ga e assistente social. Os principais tópicos da Mesa-Redonda podem ser conferidos a seguir....................................................

Antonio Alci Barone, médico infectologista

“As hepatites virais são um grande problema de saúde pública. A quan-tidade de indivíduos acometidos por esta infecção no mundo é muito gran-de. Basta dizer que 1/3 da população mundial, em algum momento, esteve em contato com o VHB, e destes 2 bilhões de indivíduos cerca de 400 milhões permanecem com infecção crônica pelo VHB. O mesmo se diz do vírus da VHC. 170 a 200 milhões de indivíduos no mundo carregam infecção crônica pelo VHC. Esses indivíduos estão sob risco de desen-volverem hepatite crônica, doença progressiva que leva à cirrose hepá-tica. A cirrose hepática compromete progressivamente a condição do fíga-do, levando à insuficiência hepática e ao aparecimento de câncer de fígado. São doenças fatais que representam importante causa de mortalidade. No Brasil são a 8ª causa de mortalidade e representam a principal causa de transplante de fígado. A hepatite B representa cerca de 10% dos casos de transplante de fígado no mundo. Na maioria das vezes, não se confere a devida importância a essas doenças,

pois são doenças que evoluem silen-ciosamente. Os indivíduos são inter-nados, por exemplo, por causa de uma doença crônica e acidentalmente des-cobrem que são portadores de hepati-te. Descobre-se também a hepatite em uma doação de sangue e de órgãos, ou ao realizar check-up ou ao ir ao gine-cologista. O ginecologista é o grande descobridor de hepatites porque este especialista solicita vários exames, principalmente quando a mulher fica gestante e realiza o exame pré-natal. Aqueles indivíduos que descobrem a hepatite por manifestação clínica o fazem em uma fase adiantada. Ou estão com cirrose ou com câncer, o que representa uma situação em que o benefício terapêutico para esses pacientes é muito distante do ideal.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“Um complicador da hepatite C é o silêncio. Estima-se que haverá aumento da mortalidade causado por doença do fígado, aumento da deman-da por transplante de fígado, aumento do número de câncer de fígado. Estas doenças progredirão a menos que haja mecanismos para tratar e modificar a

Antonio Alci Barone, médico infectologista

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Mesa-Redonda

evolução das mesmas. Na população acima dos 55 anos de idade do Mu-nicípio de São Paulo, com base em estudo populacional, há 4% de posi-tividade para o anticorpo da hepatite C, contra a média geral de 1,4% em todas as faixas etárias. Os idosos, ao longo da vida, foram mais expostos aos procedimentos não seguros, como seringa de vidro, agulha de metal não descartável, transfusão de sangue antes dos anos 1990, quando o VHC não era conhecido, procedimentos médicos e odontológicos efetuados de maneira inadequada e compartilhamento de objetos como lâmina de barbear, ali-cate de unha e escova de dente. São situações corriqueiras e aparentemente ingênuas, mas que podem ter infectado determinada população. Para o futuro trabalha-se com os diagnósticos que estão sendo realizados e as novas in-fecções. As novas infecções de hepatite C se restringem a grupos que possuem comportamento de risco. São popula-ções marginalizadas, como a população carcerária, indivíduos institucionaliza-dos, indivíduos que possuem acesso a um sistema de saúde precário. São populações que merecem prevenção e que, no futuro, serão nas quais se perpetuará a hepatite C se não houver uma vacina. Para a hepatite B existe vacina disponível na rede pública. Caso haja um programa de vacinação eficaz, haverá, nas próximas décadas, a erradicação das transmissões do vírus da hepatite B.”

Antonio Alci Barone, médico infectologista

“A hepatite B se transmite por via vertical, de mãe para filho, e por via sexual. A hepatite C é transmi-tida por via parenteral, por meio de introdução do vírus no organismo

humano por artigos, instrumentos, agulhas e seringas. Em relação à hepatite B, fabricou-se uma vacina altamente eficiente, isenta de efei-tos colaterais. Porém, esta vacina é injetável e demanda três doses. Isso torna a sua utilização universal um pouco complicada. Há países que conseguem implementar a vacinação com eficácia, como Taiwan. Na Ilha de Formosa morria-se muito de câncer de fígado. Dez anos após a vacinação universal da população, a prevalência deste tumor na população caiu verti-calmente. A vacina imuniza também contra hepatite Delta. Na hepatite C as transmissões sexual e vertical, em-bora possam ocorrer, são tão pequenas que não possuem importância sob o aspecto epidemiológico.”

Carlos Eduardo de Melo, farmacêutico

“Cabe ressaltar também que apesar de silenciosa a infecção pelo VHC apresenta importante impacto sobre o sistema de saúde pública. O tratamento possui custo alto e o diagnóstico, além de também possuir custo elevado, ne-cessita de uma estrutura mais complexa em termos de insumos e de recursos humanos mais tecnicamente capacita-dos. Há ainda os custos associados a complicações da doença, por exemplo, quando existe a necessidade de um transplante hepático.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“O farmacêutico, às vezes, é mul-titarefa na ponta do sistema. A conser-vação da vacina da hepatite B necessita ser realizada em uma temperatura ideal, por exemplo. Na Região Amazônica realizou-se uma intensa imunização contra hepatite B, reduzindo-se dras-

ticamente a ocorrência da hepatite B e da hepatite Delta. Entretanto há infor-mações de que ainda há dificuldade de acesso dos indivíduos à vacina e que a conservação tem sido difícil. É neces-sário haver a preocupação da ponta do sistema para garantir a qualidade e a efetividade da vacinação.”

Mauricio Fernando de Almeida Barros, médico cirurgião

“É importante ressaltar que houve várias modificações na história das hepatites em termos de incidência. Quando se descobriu o VHB, houve uma queda na incidência. Quando se descobriu a vacina, houve outra queda. Quando se descobriu o VHC, em 1989, achou-se que haveria uma queda vertiginosa da incidência da doença hepatite C, que é uma en-fermidade de evolução muito longa, podendo demorar cerca de 30 anos para se manifestar, além de ser silen-ciosa. As projeções atuais - há mais de duas décadas do descobrimento do vírus - demonstram que não haverá redução da incidência de doenças que necessitem de transplante antes do final da década de 2040. O problema não será resolvido em curto prazo.”

Mauricio Fernando de Almeida Barros, médico cirurgião

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Mesa-Redonda

André Cosme de Oliveira, médico cirurgião

“Sabe-se que 90% dos pacientes que entram em contato com o vírus da hepatite B terão cura espontânea e 10% desenvolverão doença hepática crônica, evoluindo para cirrose ou câncer de fí-gado. Na hepatite C ocorre o contrário. 85% evoluirão para uma doença crônica e a minoria, 15%, evoluirá para cura es-pontânea. As duas curvas se sobrepõem ao se comparar a diferença de proporção entre o que será crônico e o que será curado. Qual é pior? Não há pior, as duas podem evoluir para complicações da doença.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“O resultado do investimento atual em hepatite viral será observado daqui

a cerca de dez, 20 ou 30 anos, diferen-temente do investimento realizado em estudos do Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), em que pesadamente se implantou um programa de contro-le com oferta de medicamento e em poucos anos reduziram-se a internação e as complicações. Em hepatite C o tratamento não é plenamente eficaz e como a história natural é longa, as complicações demoram a aparecer. Ao se desenvolver um planejamento estratégico para abordar hepatite viral crônica deve-se considerar que é um investimento para futuras gerações.”

Antonio Alci Barone, médico infectologista

“Estima-se que existam 3 milhões de brasileiros portadores de infecção crônica pelo VHC e que cerca de

30% evoluirão para uma doença grave e potencialmente fatal. Os números demonstram que foram tratados, até hoje, no Brasil, cerca de 20 a 30 mil pacientes de hepatite. Faltam somente 2,970 milhões para serem abordados. Porém, caso se efetue o diagnóstico da população em uma única vez, o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil não será suficiente para tratá-la. É um problema de difícil encaminhamento do âmbito da saúde pública. A hepatite B possui uma melhor perspectiva devido à vacina, mas mesmo assim a situação está muito longe da ideal. O próprio Programa Nacional de Imunização (PNI) ainda restringe a utilização da vacina para determinadas populações, como recém-nascidos, crianças e adolescentes até 20 anos de idade, indivíduos mais expostos ao vírus. A população por inteiro ainda não é alvo

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Mesa-Redonda

dos programas públicos de imunização. Para que a população toda seja imuni-zada ainda levará um período de tempo bastante prolongado. Portanto, muitos evoluirão para infecção crônica, cirrose hepática e câncer.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“Possuir hepatite viral crônica não representa que o indivíduo necessita de tratamento imediato. Há outras in-tervenções que podem ser realizadas e que modificam a história natural. Se o indivíduo com hepatite C for orientado por uma equipe multiprofissional po-derá inverter o comportamento sexual de risco e deixar de adquirir HIV. Se adquirir HIV possuirá dois problemas. A co-infecção HIV/VHC e as com-plicações de fígado são as principais causas de mortalidade na população portadora de HIV. Os indivíduos que possuem HIV estão com a doença con-trolada e morrem de doença hepática crônica. Os indivíduos que possuem HIV e que utilizam drogas, quase 100% são co-infectados, enquanto os que possuem HIV adquirido por com-portamento sexual de risco apresentam prevalência menor de hepatite C, reforçando a pouca relevância da trans-missão sexual da doença. A prioridade para tratamento é o paciente cirrótico. Prioridade zero é aquele paciente que necessita de transplante. Em seguida há o paciente quase cirrótico, grau dois ou três em termos de fibrose. Após serem diagnosticados, não somente não há PIB suficiente para tratar todos estes indivíduos, mas não há medicamento com eficácia suficiente para propor-cionar a resposta terapêutica que se pretende. É preferível o indivíduo ser vacinado contra hepatite A e hepatite B, ser orientado para que reduza os

comportamentos de risco, adotar um estilo de vida mais saudável, como não beber álcool, controlar a síndrome me-tabólica e manter um peso saudável. Há outras intervenções a serem realizadas para essa população diagnosticada en-quanto não se possui dinheiro, estrutura e medicamento com alta eficácia que justifique uma intervenção terapêutica coletiva.”

Mauricio Fernando de Almeida Barros, médico cirurgião

“Não é fácil desenvolver captação de órgãos. A necessidade de transplante de fígado na população urbana é, na média de necessidade baseada na incidência das doenças hepáticas, 20 transplantes por milhão de habitantes por ano. A Espanha é o país que mais capta órgãos no mundo: 35 doadores por milhão de habitantes por ano. A Itália chegou a 30 doadores, os Estados Unidos da América (EUA) chegaram a 25 doado-res por milhão de habitantes por ano. O Município de São Paulo, em 2009, chegou a 27 doadores em alguns picos. No Brasil, em média, há sete doadores por milhão de habitantes por ano. Na Bahia há de dois a quatro doadores. Conseguir um doador na Bahia é difícil.

Exige desenvolvimento de um programa de captação de órgãos e investimento. O hospital da periferia, que muitas vezes recebe um potencial doador, não possui estrutura - equipamentos e profissionais -, para cuidar do mesmo em condições adequadas para que este doador chegue à doação efetiva com um órgão também em condições adequadas. Isso exige in-vestimento e aculturamento de médico e de equipe. Os profissionais que atuam em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) em pronto-socorro, geralmente não estão habituados a lidar com o doador de órgãos. Um indivíduo que bateu a cabeça e provavelmente está morto, em um pronto-socorro. É trabalhoso o profissional que o atendeu imaginar que o indivíduo é um potencial doador, aplicar soro, realizar exame e ligar para a Central de Captação de Órgãos. Como a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP) desenvolveu esse aten-dimento? Alocando profissionais nos hospitais especificamente contratados para fazer isso. Por que a Espanha capta mais órgãos do que os outros países do mundo? Porque a Espanha entendeu, mesmo com serviço médico público, que dinheiro é o problema. Por isso, o indi-víduo que é responsável pela captação de órgãos, recebe grande parte do salá-rio por produtividade. Se por exemplo chega ao hospital um potencial doador e o plantão deste profissional acabaria, este profissional simplesmente não vai embora enquanto o doador não for para o centro cirúrgico. Se houver alguma intercorrência, a família mudar de idéia sobre a doação ou o soro do doador parar de correr; se perder o órgão e não efeti-var a doação, o profissional não recebe a parte correspondente em seu salário. Mexe-se no bolso das pessoas. Se o Bra-sil entender que funciona dessa maneira, acontecerá uma transformação.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

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Mesa-Redonda

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“Transplante de fígado não é ficção científica. Ao indicar-se um trans-plante é uma solução para o indivíduo que morrerá se o transplante não for realizado. Ao ser transplantado o in-divíduo terá grande chance de possuir uma sobrevida praticamente normal. Transplante é factível e é um bom procedimento. É necessário conversar sobre doação de órgãos. O momento de abordar a família para pedir uma doação de órgãos de um parente que fa-leceu é crítico. Os farmacêuticos, assim como todos os profissionais da saúde, necessitam conversar com os pacientes sobre este assunto. É necessário que as pessoas digam para alguém: ‘quando eu morrer pode doar todos os órgãos’”.

Maria Helena Dobarco Raposeiras, assistente social

“A prevenção para não chegar a pon-to de transplante é importante. A hepati-te causa impacto na vida do indivíduo: primeiramente ele não tem a doença, de repente descobre que está infectado pelo vírus, desenvolve cirrose e necessita de transplante. Mesmo realizando o trans-plante, que é um procedimento correto, que salva a vida do paciente, muitas

vezes é limitante, o paciente não terá a vida que tinha antes. Considerando-se que demora cerca de 20 anos até o in-divíduo descobrir que possui a doença, observa-se que o paciente está em uma fase produtiva da vida. É importante realizar campanhas de prevenção e de doação de órgãos para aumentar as possibilidades do paciente.”

Mauricio Fernando de Almeida Barros, médico cirurgião

“Indaga-se se o brasileiro doa órgãos menos do que os estrangei-ros, mas não é verdade. O boom da virada no Município de São Paulo foi há três anos. Antigamente não havia como efetuar diagnóstico de morte encefálica nos hospitais de re-ferência. Atualmente há uma equipe contratada pela Secretaria de Estado da Saúde que se dirige ao hospital para consultar o potencial doador, realizar Doppler transcraniano, ou seja, há uma série de procedimentos que melhoraram a captação. Quantos transplantes de fígado eram realizados há três anos no Brasil? Pouco menos do que 1 mil. Quantos transplantes de fígado são realizados nos EUA, por ano, há mais de dez anos? De 6 mil a 7 mil. Existe algo diferente, que é a captação, e não a doação. Não é uma questão de recusa familiar. No Brasil há 30% de recusa familiar, assim como no exterior. Em 1985 foi publicada uma lei que aponta que ‘a comunicação do potencial doador, do indivíduo que tem morte encefá-lica, é compulsória’. Não existe pena prevista para quem não comunicar o potencial doador. O profissional desinformado está de plantão na UTI de determinado hospital e aparece o potencial doador, que está morto, e é necessário realizar exames. Se o

profissional telefonar para a central de captação solicitarão que ele faça mais exames e ligue aparelhos e ele não tem tempo para fazer tudo isso porque tem dez pacientes para cuidar, sendo que os outros nove são mais graves do que o potencial doador. O problema é a estrutura da medicina brasileira.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“Realizar transplante não é apenas operar. É preciso possuir estrutura. Hospital que realiza transplante melhora seu nível e seu padrão de assistência. O transplante qualifica desde a porta de entrada até a mais alta complexidade. Isso demonstra que centros fora de São Paulo se qualificaram. Se em Maceió (CE) há um hospital credenciado para realizar transplante, o mesmo passou por uma rigorosa avaliação, foi au-torizado, auditado e cumpre padrões mínimos. A ferramenta importante para isso tudo é o Sistema Único de Saúde (SUS), que tem, entre seus princípios, a descentralização e o acesso universal. Descentralizar é começar a qualificar o serviço, capilarizar, o que deve ser realizado de acordo com a melhoria do poder econômico das regiões e com a melhoria do potencial científico.”

Mauricio Fernando de Almeida Barros, médico cirurgião

“Um hospital pequeno, da periferia, sem condições de realizar compro-vação da morte encefálica, recebia o indivíduo clinicamente morto, porém era preciso comprovar. Antes de com-provar a família queria transferir para o HCFMUSP, mas não havia vaga. O indivíduo morria e neste momento pensava-se em transferi-lo para o HCFMUSP para confirmar a morte en-cefálica. Se fosse confirmada, o indivíduo

Maria Helena Dobarco Raposeiras, assistente social

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Mesa-Redonda

seria levado para o centro cirúrgico para retirar os órgãos. Depois de três dias tentando transferir para o HCFMUSP a resposta era que não havia vagas. De-pois que a morte ocorria, surgia a vaga. O familiar aceitava a transferência para o HCFMUSP? A resposta é não. Este panorama mudou. Se há diagnóstico de morte encefálica, uma equipe se dirige ao local, comprova, opera e retira o ór-gão. Não se perde o órgão. Havia quatro hospitais de referência para se comprovar a morte encefálica em todo o Município de São Paulo. A Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo proibiu que os hospitais privados participassem, nome-ando quatro hospitais públicos que são os gerentes das Organizações de Procura de Órgãos: HCFMUSP, a Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Pau-lo, o Hospital São Paulo da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) e o Instituto Dante Pazanezze de Cardiolo-gia. Resolveu-se esta questão e, hoje, os hospitais devem encontrar sua própria solução, o que exige investimento.”

Maria Helena Dobarco Raposeiras, assistente social

“Quando o potencial doador chega ao hospital de referência, é mais fácil. O difícil é quando começa na rede primária. Imagine como é mais com-plicado em Municípios do interior. O retorno também é complicado, quando é necessário encaminhar o paciente para o Município de origem.”

André Cosme de Oliveira, médico cirurgião

“O investimento para se implemen-tar o tratamento primário - a profilaxia da infecção da hepatite C -, é alto, o medicamento é caro. Mas qual é o custo final do transplante de fígado, qual é o investimento? Será que para

de portadores de hepatite C. Tratou-se de 1 a 2% até hoje. Com qual índice de sucesso? Nos EUA, uma publicação recente no bairro do Bronx, em Nova Iorque, mostrou que em uma comunidade tratada com o melhor medicamento e os melhores exames, o sucesso da terapia ficou em torno de 14%. Isso significa que 86% dos pacientes tratados não obtiveram sucesso. Fala-se muito de transplante, mas antes é necessário aprimorar a qualidade da assistência. Mesmo em São Paulo há muita dificuldade de diagnóstico, não há o diagnóstico confirmatório. Se eventual-mente há o diagnóstico confirmatório, não há estadiamento. Quando há, não existe profissional. E se há todas as possibilida-des, pode ser que o paciente não possua dinheiro para ir ao hospital se consultar ou tomar o medicamento. Falo em mitos da hepatite C e um dos grandes mitos é que a doença é cara. Ela pode ser muito cara ou pode ser muito barata, depende de como se encara e de como se gerencia isso. O diagnóstico de triagem - a soro-logia -, é muito barato. A abordagem, o aconselhamento, o seguimento e as provas bioquímicas são relativamente baratos. O problema é possuir restrição financeira e ainda empregar mal o dinheiro que se gasta. É necessário haver investimento na equipe multiprofissional. Tratar hepatites virais essencialmente não é atividade do médico, mas da equipe multiprofissional. O transplantador é a via final. Os médicos clínicos estão no meio. Quem é relevante é o farmacêutico, que identifica o efeito ad-verso e a adesão, é a enfermeira, que torna o tratamento mais efetivo, é a assistente social, que facilita o acesso aos recursos e o psicólogo, pois o aspecto psicológico é muito relevante nas hepatites.”

Antonio Alci Barone, médico infectologista

“Prevenir doenças cujos mecanismos

André Cosme de Oliveira, médico cirurgião

o Estado da Bahia é mais barato tratar todo mundo ou transplantar os pa-cientes diagnosticados? É necessário investir nos dois opostos. É necessário cuidar, diagnosticar, tratar o paciente que ainda não possui complicações, e existe o outro aspecto que é haver um centro de qualidade para realizar o transplante de fígado.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“No Brasil faltam elementos para se realizar análise farmacoeconômica relevante em hepatites virais. É neces-sário estabelecer padrões de qualidade de vida para que se possa estabelecer o normal e, assim, implementar-se análi-ses farmacoeconômicas mais bem-feitas e baseadas em estudos internacionais adaptados. Talvez nem todas as inter-venções terapêuticas existentes hoje em dia sejam tão efetivas para o Brasil. O tratamento e o transplante talvez não sejam tão custo-efetivos como se gos-taria que fosse. Neste ponto insere-se toda complexidade de vários ‘brasis’ que a Maria Helena, como assistente social, conhece bem. Ao se analisar o resultado do tratamento, verifica-se que há em potencial de 3 a 4 milhões

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de transmissão envolvem situações para as quais é necessário modificar compor-tamento é difícil do ponto de vista prático. Ao se falar em hepatite B, assim como na aids, modificar o comportamento sexual, o comportamento do usuário de drogas endovenosas, é algo que o mundo inteiro anda não equacionou os resultados. Em relação ao uso de drogas, há lugares em que se utiliza a política de assustar e de restringir, e há outros lugares em que há uma política totalmente contrária, de liberar, pois acreditam que os usuários devem deixar de utilizar a droga espon-taneamente. A prevenção utilizando essa linha apresenta resultados muito pouco satisfatórios.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“Existem atitudes práticas que o far-

macêutico pode desenvolver. Por exem-plo, realizar atividades de prevenção e informar sobre determinados hábitos. O reforço positivo do contrário, para evitar a discriminação, também é necessário. O portador de hepatite viral crônica é extremamente discriminado. É neces-sário falar que não se pega hepatite ao conversar, que as hepatites virais não são doenças de transmissão social e tampouco de convívio social normal.”

Lia Maria Britto da Silva, psicóloga

“Há dois momentos importantes para os indivíduos contaminados pelo vírus da hepatite. O primeiro é quando recebe o diagnóstico, pois ele descobre que deixou de ser sadio e passou a ser um indivíduo doente. Esta descoberta traz conseqüências psicológicas im-

portantes. No decorrer da doença uma questão fundamental é que, muitas vezes, o médico pode garantir para o paciente como será daquele momento em diante. Mas em momento algum se garante a condição clínica de fato. O paciente passa a viver com a morte muito presente. Descobrir que possui o vírus da hepatite gera muita culpa. Muitos pacientes se questionam como foram contaminados, como contraíram o vírus e começam a apresentar fantasias em relação à doença: como pegou, onde pegou e principalmente se contaminou alguém. Sabe que é um doente crônico e passa a conviver com outra identidade: ‘tenho uma doença e essa doença pode me matar’. Isso faz com que mude sua essência, seus compromissos. Muitas vezes essas mudanças podem ser para pior, do âmbito médico. Muitos pacientes

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acabam utilizando mais drogas, álcool, elementos que vão contra a adesão ao tratamento. Lidar com essas questões, entender o que está acontecendo com o paciente, tentar dessignificar todas as questões em um atendimento psicológi-co, fará com que o paciente desenvolva uma melhor adesão ao tratamento. O grande objetivo do psicólogo que trabalha com o paciente de hepatite é fazer com que ele também se torne responsável pelo seu tratamento e que se envolva no tra-tamento no sentido de amadurecimento, para que possa entender o fato e possa se tratar da melhor maneira possível. Haverá dificuldades que poderão variar de indivíduo para indivíduo. Os pacientes atendidos no Ambulatório de Moléstias Infecciosas do HCFMUSP aderem ao atendimento psicológico muito bem. O paciente de hepatite precisa de um espaço para o qual possa trazer mais do que a sua doença. Ajuda muito no ama-durecimento, no caminho que necessita percorrer naquele momento, o indivíduo falar sobre os hábitos que possui e as dificuldades de mudanças destes hábitos. Mudar hábitos é extremamente difícil e complicado. A forma como ele lida com o mundo e com os seus relacionamentos irá ajuda-lo a aceitar a maneira com que lida com a doença. Avalia-se, juntos, se é uma forma adequada ou não.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“Sobre a culpa, é importante deixar claro que a maioria dos portadores de hepatite viral crônica é vítima e não culpada. 1/3 dos portadores de hepa-tite C, no Brasil, contraíram o vírus porque utilizaram drogas injetáveis ou inaláveis, ou substâncias injetáveis compartilhando seringa etc. 1/3 pegou porque tomou transfusão de sangue e 1/3 desconhece a fonte de contágio e provavelmente pegou por um contato inaparente. Ou seja, 2/3 dos portadores de hepatite C não foram ativos, ou seja, não foram atrás da doença. São muito mais vítimas do que os que pegaram por comportamentos não adequados. Em relação à hepatite B, muitos porta-dores contraíram o vírus por transmis-são vertical quando nasceram, ou por transmissão sexual, o que ainda ocorre, mas é menos importante sob o aspecto de se tornar uma doença crônica porque essa transmissão ocorre na vida adulta. Devemos trabalhar isso, invertendo a sensação de culpa do sujeito, mos-trando a ele que é mais vítima do que culpado nessa situação.”

Lia Maria Britto da Silva, psicóloga

“O sentimento de culpa é bastante freqüente. É muito comum, em qual-quer episódio adulto, se culpabilizar algo ou alguém. O paciente culpa-se também pelo sofrimento, ou seja, ‘porque eu fiz, por que eu’. O paciente pensa se contaminou outras pessoas ou não, se contaminou a esposa ou o marido. Outra questão é a discri-minação e o preconceito. A maioria desses pacientes encontra dificuldade em comentar que possui o vírus da hepatite. Sabe que será discriminado. Isso é comum a todas as doenças trans-

missíveis. Com o passar do tempo isso será superado. Por isso é fundamental o trabalho em equipe, pois a mesma auxilia no enfrentamento da doença, trazendo benefícios ao paciente.”

Mauricio Fernando de Almeida Barros, médico cirurgião

“Estatísticas do Centro de Controle de Doenças Americanas (CDC) de-monstram que de 2 a 6% de transmissão sexual ocorrem em um espaço de 20 anos, ou seja, se o marido ou a esposa tiverem o VHC e o outro não, e hou-ver relações sexuais sem prevenção, a chance do indivíduo que não possui o vírus ser contaminado, em 20 anos de vida sexual ativa, é de 2 a 6% no máximo. Em um período de 20 anos a probabilidade de contaminação é baixa. A chance de ocorrer transmissão vertical do VHC é de 5%.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“A transmissão sexual, além de ser baixa, ainda possui o fator confusional, pois o casal, em 20 anos de casamento, compartilha diversos objetos que podem conter sangue. Outro dado importante referente à transmissão vertical é que o parto é de indicação obstétrica. Exceto no período do tratamento e seis meses após o tratamento, tanto o homem quan-to a mulher podem ter atividade sexual reprodutiva normal e o parto pode ser cesárea ou vaginal, de acordo com a indicação obstétrica. O aleitamento materno não é contra-indicado.”

Danielli Botarelli Fragoso, farmacêutica

“É necessário considerar que o trata-mento interfere no aspecto psicológico do paciente. Deve haver acompanha-mento sempre, pois depressão, ansieda-

Lia Maria Britto da Silva, psicóloga

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de e irritação irão interferir realmente na vida do paciente e na família e muitos casais se separam durante o tratamento.”

Lia Maria Britto da Silva, psicóloga

“O paciente que inicia o tratamento psicológico e que está em tratamento medicamentoso, utilizando interferon, pensa se irá resistir ao tratamento ou não. Cada paciente terá determinada reação, tanto clínica quanto psicológica e emocional em relação à utilização do medicamento, o que é importante sob o aspecto farmacológico e também na maneira com que o paciente conseguirá lidar com a fantasia sobre o medica-mento. Alguns indivíduos sofrem, en-tram em depressão, pois normalmente o medicamento acentua alguma doença que existia anteriormente. Se o paciente possui perfil depressivo, confusional, estes poderão ser acentuados. Existe paciente que lida de maneira adequada com a utilização do interferon. Há pa-cientes que vêem as reações ao medi-camento como desafio e querem levar adiante. Pode haver uma variedade muito grande de reações após o início do tratamento, desde a adequação até a rejeição diante da nova sintomatologia que irá se apresentar.”

Maria Helena Dobarco Raposeiras, assistente social

“Há ainda a questão social e profis-sional em que o paciente está inserido. Ao iniciar o tratamento, o paciente pode entrar em depressão e não conseguir ir trabalhar, pois não quer que os colegas de trabalho saibam que ele está em trata-mento. Ou seja, o tratamento interfere na vida social do paciente e na família. Há o medo de que se souberem que está em tratamento para hepatite ele perca o em-prego e a renda financeira familiar caia.”

Marisa do Nascimento, enfermeira“O acolhimento dos pacientes pela

equipe multiprofissional auxilia no tra-tamento. A equipe de enfermagem, por exemplo, consegue efetuar um pré-diag-nóstico, encaminhando posteriormente ao médico responsável por este paciente para que continue o tratamento.”

Danielli Botarelli Fragoso, farmacêutica

“Atualmente, há dificuldades para se adquirir medicamentos para hepatite B e hepatite C. Estes medicamentos estão disponíveis na rede, mas seguem critérios para serem adquiridos, e isso demanda tempo, formulários, o

paciente necessita ir até o setor respon-sável para retirar o medicamento. No HCFMUSP os medicamentos podem ser retirados na farmácia, mas em de-terminados Municípios o paciente deve ir a um setor de assistência específico, ou a um pólo de aplicação. A liberação é demorada. Para a hepatite C há dois medicamentos disponíveis, que são inje-táveis, e o comprimido, a ribavirina. É o tratamento de excelência atualmente. Os resultados não são 100%, mas é o que há disponível. Para a hepatite B há novos medicamentos disponíveis, mas seguem alguns critérios, cada medicamento para um tipo de paciente, ou seja, a demanda ainda é um pouco reprimida e os pacien-tes estão começando a entender como receber os medicamentos.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“Ao se falar em tratamento medica-mentoso para hepatite viral, fala-se em medicamento de alto custo, inserido em um programa especial, cuja burocracia é muito grande. O que o profissional farmacêutico poderia fazer para faci-litar é organizar o serviço. Os medi-camentos são fornecidos não somente mediante preenchimento de papéis, mas também mediante comprovação de uma doença. O farmacêutico tam-bém pode orientar o paciente, explicar que os exames são importantes e que repetir exames custa caro e é um des-serviço para o sistema de saúde como um todo. Os farmacêuticos podem ser pró-ativos padronizando, conhecendo a Portaria e organizando o serviço, além de disponibilizar as apresentações dos medicamentos que são utilizados como coadjuvantes. O farmacêutico pode também adequar o bulário, solicitan-do as apresentações adequadas destes medicamentos.”

Marisa do Nascimento, enfermeira

Danielli Botarelli Fragoso, farmacêutica

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Carlos Eduardo de Melo, farmacêutico

“Sobre a atuação do laboratório clíni-co nas hepatites virais, este desempenha papel essencial tanto no diagnóstico quanto no manejo clínico. Estes papéis são uma importante ferramenta, mas tam-bém um grande problema porque há exa-mes muitos simples, fáceis e disponíveis em diversos locais. Exames de sorologia são de fácil acesso para o paciente, tanto em Municípios do interior quanto nas ca-pitais brasileiras. Com a realização destes exames se fecha o diagnóstico. Mas, após fechado o diagnóstico, como se trata o paciente? Há outro aspecto muito mais essencial que são os exames moleculares. Determinar a carga viral durante o trata-mento da hepatite B é muito importante. É importante também que o médico saiba se o tratamento está sendo efetivo, se o paciente não apresenta algum tipo de mutação ou contra-indicação àquele tratamento. Isso passa a ser um problema porque estes exames não estão disponí-veis em todos os serviços. Nas grandes capitais, no Estado de São Paulo, há uma rede de biologia molecular que oferece apoio aos serviços que tratam de hepatites virais. A hepatite C é uma doença mais problemática ainda porque o diagnóstico molecular é essencial para se fechar o diagnóstico. Somente sorologia positiva para hepatite C não fecha o diagnóstico. É necessário realizar teste diagnóstico para confirmar a presença ou não da infecção e após este procedimento realizar testes moleculares, como teste de genotipagem para determinar o tipo viral do paciente. É necessário determinar a carga viral antes, durante e na 12ª semana de tratamento, além de teste qualitativo na semana 4.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“É necessário haver critérios para tra-

tar hepatites virais e esses critérios devem ser analisados, porque o tratamento causa muito efeito colateral e possui efetividade limitada. Em casos de hepatite B, muitas vezes decide-se por um tratamento que durará a vida inteira, podendo haver intercorrências em termos de segurança e de resistência viral.”

Carlos Eduardo de Melo, farmacêutico

“Isto demonstra como é importante a atuação de uma equipe multidisciplinar no manejo das hepatites virais. Cada membro da equipe possui um papel fundamental para garantir uma adequada qualidade de vida aos portadores de he-patites virais. O farmacêutico consegue se inserir em dois pontos essenciais: no tratamento e no diagnóstico laboratorial.”

e ele não e acham que isso é antipatia do médico ou algo do tipo. Pacientes de hepatite lidam com a morte muito mais de perto, é a realidade que eles apresentam. Eles vêem o transplante como algo muito perigoso, de muito risco, e a finitude da vida muito próxima.”

André Cosme de Oliveira, médico cirurgião

“Quanto tempo demora uma cirur-gia de transplante de fígado? Quantas bolsas de sangue são utilizadas em um transplante de fígado? Qual é a sobrevida média de um paciente transplantado no Brasil, hoje, em um ano? Quantos pacien-tes estarão vivos após um transplante de fígado no período de um ano? Utiliza-se, em média, duas bolsas de sangue durante um transplante de fígado, sendo que cerca de 40 ou 50% dos pacientes não tomam sangue durante o transplante. O tempo cirúrgico da equipe de transplante do HCFMUSP é de quatro a seis horas. Em um ano os transplantados possuem mais ou menos 82% de sobrevida. Recebemos, em 2010, o prêmio de maior equipe de transplante do Estado de São Paulo. A equipe realizou 142 transplantes em 2009 e, segundo a previsão, para 2010, serão cerca de 200 transplantes.”

Antonio Alci Barone, médico infectologista

“Transplante é indicação terapêu-tica. Anteriormente era uma terapia experimental para casos de hepatites fulminantes, sub-fulminantes e hepati-te crônica, para as quais esgotaram-se todas as possibilidades.”

Evaldo Stanislau de Araújo, médico infectologista

“Ao indicar transplante não indico preocupado. Para um indivíduo que não possui opção, o transplante é a opção.”

Carlos Eduardo de Melo, farmacêutico

Lia Maria Britto da Silva, psicóloga

“Oriento os pacientes para que con-versem com o médico, tirem as dúvidas. Na cultura brasileira há esse receio. O paciente questiona se pode falar e se o médico irá escutá-lo. Não apenas pode como deve falar. No momento em que o paciente recebe estas informações, passa a lidar com a doença de uma maneira di-ferente. É bastante freqüente os pacien-tes entrarem no consultório e dizerem que há outros utilizando o medicamento

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Revista Racine: Como foi criado o Grupo Esperança e de que maneira atua a entidade?

Jeová Pessin Fragoso: O Grupo Espe-rança foi fun-dado em 19 de novembro de 1999, por meio de um

grupo de portadores de hepatite C, incentivado pelo infectologista Dr. Evaldo Stanislau de Araújo. O in-tuito inicial era trocar experiências pessoais, porém, nesse primeiro encontro, que reuniu 17 portadores do Vírus da Hepatite C (VHC) e alguns de seus familiares, emergiu o sentimento e a vontade de lutar por avanços no estabelecimento de uma assistência adequada, me-diante as inúmeras dificuldades que se apresentavam em relação ao tratamento e ao monitoramento da doença. Em fevereiro de 2000, o Grupo Esperança instalou sua sede no Sindicato dos Trabalhadores da Petrobrás do Litoral Paulista, local em que permanece até hoje, utilizan-do a infraestrutura dessa entidade sindical, cedida gratuitamente pelas diretorias que por lá passaram, com o endosso geral dos trabalhadores dessa categoria. O Grupo Esperan-ça, a quinta ONG de hepatite C no

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Entrevista com Jeová Pessin Fragoso, presidente do Grupo Esperança - grupo de apoio aos portadores do vírus da Hepatite C da Baixada Santista

Brasil e a primeira a constituir um corpo de voluntários com atuação corpo-a-corpo junto aos portadores, é referência nacional, registrando no seu quadro de filiados, somente da Baixada Santista, mais de 3 mil portadores de hepatite C. A atua-ção das ONG’s, seja pela busca de políticas públicas ou na prestação de serviços que complementam as demandas inexistentes nos órgãos de saúde, contribuem sensivelmente para o estabelecimento da assistên-cia aos portadores de hepatite C e dos demais tipos dessa incidente enfermidade, que se tornou uma das maiores preocupações de Saúde Pública no Brasil e no mundo. RR: Dados de 2009 do Ministério da Saúde (MS) sobre a incidência das hepatites virais no País indicam que apenas 5 mil dos 374.837 indi-víduos notificados com hepatite dos tipos A, B, C e D entre 1999 e 2008 recebem medicamentos do governo. Como analisa estes números? JPF: Primeiramente esse número de notificados é bem menor do que os infectados, pois infelizmente a notificação, que é obrigatória por lei, ainda é insatisfatória, e esse ain-da é um grande desafio até mesmo para o Ministério da Saúde. Com a sub-notificação o número de casos das hepatites virais no País tende a

ser somente de estimativas. Outro agravo nessa questão é a própria característica assintomática da enfermidade, quando são raros os casos que precedem com sintomas uma suspeita da infecção. Caso não haja sintomas, a divulgação para a testagem espontânea é tímida e a oferta para essa testagem é insu-ficiente. Obviamente não haverá tratamento para os indivíduos que estão infectados, mas que não sa-bem dessa sua condição. Esse fato é extremamente preocupante, pois os agravos, mesmo que silenciosos e lentos são implacáveis se não forem interrompidos com o tratamento, deixando um número alarmante de indivíduos sujeitos ao desenvol-vimento de cirrose hepática e até mesmo de câncer de fígado, fazen-do com que percam a qualidade de vida quando não a própria vida. RR: Quais são as principais di-ficuldades encontradas pelos portadores de hepatite referente ao acesso ao tratamento e quais são os resultados alcançados pelo Grupo Esperança em benefício desses pacientes? JPF: A primeira dificuldade é referente à oferta dos testes soro-lógicos, acompanhada pela divul-gação sustentada. Muitas regiões não disponibilizam o teste de

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capacitação de profissionais da rede pública, assim como distribuição de medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS). Os centros de referên-cia em doenças do fígado no Brasil estão presentes em quase todos os estados, todavia ainda há escassez de especialistas em hepatologia na Rede Pública. Trata-se de uma espe-cialidade clínica sem procedimentos. Assim, a remuneração pelos convê-nios e pelo SUS é parca, por isso os poucos hepatologistas atuam mais na clínica privada. Gastroenterologistas e infectologistas acabam atendendo muitos desses pacientes no SUS, mas o ideal seria haver mais hepatologis-tas nesta função. RR: Como analisa as atuais políticas públicas para prevenção da hepatite e quais seriam as sugestões da SBH? RPF: O Brasil é um dos poucos países do mundo que oferecem os medica-mentos para tratar as hepatites virais no sistema público de saúde. Por outro aspecto, há ainda problemas na vigi-lância epidemiológica e na capacitação de pessoal, incluindo educação médica no tema. As políticas públicas têm melhorado, mas é necessário avançar mais, pois a dívida referente a estas doenças no Brasil é muito grande devi-do à negligência com que as hepatites foram tratadas por décadas.

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detecção para a hepatite B e principalmente para a hepatite C, que são testes de triagem, e que necessitam ser confirmados por meio de outros procedimentos para fechar o diagnóstico e ser indicada a terapia. Cita-se como exemplo de atuação nessa ques-tão o Estado de São Paulo, onde dos 103 Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA), 100 disponibilizam esses testes, no entanto, o seguimento da investi-gação diagnóstica, que necessita, entre outros, de exames de biolo-gia molecular, de imagem, bióp-sia do fígado, ainda apresentam longas esperas, em todo o Brasil. Este fato retarda sobremaneira o início do tratamento, principal-mente àqueles que possuiriam indicação dos medicamentos, que são de alto custo mas totalmente disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), com dis-tribuição pelo MS. A melhoria desse atendimento e acesso ao tratamento poderia ocorrer com o estabelecimento de um fluxogra-ma padrão de atendimento, pactu-ado pelas Secretarias Municipais, Estaduais e MS, obviamente respeitando-se as características individuais de cada caso, bem como a atualização constante dos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas definidas pelo MS, e que fazem a gestão da dispo-nibilização dos procedimentos e medicamentos aos portadores das hepatites virais.

Entrevista com Raymundo Paraná Filho, presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH)

Acesse o Portal Racine (www.racine.com.br) e conheça os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas das Hepatites Virais

Revista Raci-ne: Como nas-ceu e quais são os objetivos da Sociedade Brasileira de Hepatologia (SBH)?

Raymundo Paraná Filho: A SBH nasceu há mais de 40 anos, por meio de um grupo de médicos que se dedi-cavam ao estudo das doenças do fíga-do no Brasil. Este grupo era liderado pelo Dr. Figueiredo Mendes, do Rio de Janeiro. Era uma época árdua para a hepatologia, pois pouco se conhecia sobre o diagnóstico e o tratamento destas doenças. Por isso, a hepatolo-gia, neste período, era tangenciada, muito diferente do que acontece hoje. RR: Há 3,7 mil casos por ano de hepatites virais no Brasil. Quais são as iniciativas da SBH referentes à prevenção e a informação da popu-lação acerca das hepatites virais? RPF: Estima-se que haja entre 2 e 4 milhões de brasileiros infectados pelos vírus das hepatites B ou C ou D . Há lacunas nas informações sobre estas doenças, assim como na prevenção. Somente em 2003 o Ministério da Saúde organizou um programa específico de combate às hepatites virais. Há programas de

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30 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

Panorama Geral / Hepatite B

Introdução

A importância das hepatites virais na saúde pública do Brasil e do mundo adquire magnitudes apreciáveis, não somente pela alta prevalência dessa infecção na popula-ção como também e principalmente pela gravidade dos quadros evolutivos das hepatites crônicas.

Referente à hepatite B, a vacinação dos recém-nasci-dos, das crianças e dos adolescentes, além dos indivíduos de maior exposição ao vírus propiciam uma diminuição sensível na prevalência. Na maioria das capitais do Brasil este índice está abaixo de 1% (por exemplo, 0,3% em São Paulo). Além da Amazônia Ocidental, em raras localida-des do Espírito Santo e de Estados da Região Sul do País, essas taxas são mais elevadas.

Entretanto, não se pode esquecer que é grande o nú-mero de indivíduos portadores crônicos da infecção e da doença hepática em seus diferentes estágios evolutivos, e cuja infecção inicial antecede o período de vacinação sistemática contra esse agente.

Aspectos virológicos

O Vírus da Hepatite B (VHB) é classificado como um Hepadnaviridae, apresentando-se na forma de partículas de 42 nm de diâmetro (partículas de DANE), envelopadas, cujo genoma é constituído de dupla hélice incompleta de DNA, com cerca de 3.200 nucleotídeos. Embora seja um dos menores vírus DNA capazes de causar doença para hospedeiros humanos, sua estrutura é extremamente com-plexa. A partícula de Dane, que representa o vírion com-pleto do VHB, é composta de um envelope lipoprotéico que representa o antígeno de superfície (AgHBs) e de uma estrutura central, o core, que contém dois antígenos, as proteínas AgHBc e AgHBe, e envolve a DNA-polimerase (enzima responsável pela replicação do VHB) e o genoma do vírus. Além do vírion completo, outras partículas cir-culam no sangue dos indivíduos infectados. Entre estas, estão duas proteínas do antígeno de superfície (AgHBs), que foram produzidas em excesso pelo hepatócito infec-tado, mesmo na ausência do core do vírion. Uma possui a forma de esferas de 17 a 25 nm de diâmetro e a outra o aspecto de filamentos longos. Estas partículas não

Hepatite pelo Vírus B - Aspectos AtuaisAntonio Alci Barone

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Panorama Geral / Hepatite B

não conhecidos, após o que o nucleocapsídeo transporta o seu conteúdo (VHB-DNA) para o núcleo, local em que o DNA é convertido em cccDNA (DNA circular cova-lentemente fechado). Este funciona como um template para a transcrição de quatro RNAs virais que são expor-tados para o citoplasma e funcionam como mRNA; no citoplasma são utilizados para a translação das proteínas do VHB; o mais longo deles (pré-genômico) funciona também como template para a replicação do VHB que ocorre em nucleocapsídeos no citoplasma. Algumas destas partículas voltam ao núcleo para re-alimentar a produção de cccDNA. Esta partícula, o cccDNA do VHB, permanece indefinidamente no núcleo das células hepáticas do hospedeiro humano que teve contato com o agente e com a respectiva infecção. A partícula pode ser responsável pela reativação da doença em pacientes con-siderados curados, se ocorrer uma depressão importante do sistema imunológico. As outras são envelopadas no retículo endoplásmico e secretadas após passarem pelo complexo de Golgi. Além disso, são secretadas partículas de AgHBe e AgHBs produzidas em excesso e encontradas livres em circulação.

Mutações ou variações moleculares do VHB podem ocorrer em diferentes níveis do genoma. Poucas mutações que ocorrem no processo normal do ciclo replicativo são viáveis; entretanto, pacientes com hepatites crônicas possuem diferentes seqüências de vírus co-circulando, as chamadas quasispecies, além do que algumas regiões do genoma são pobremente conservadas entre diferentes isolamentos. Essas mutações são explicadas por falhas da transcriptase reversa e permitem o escape dos vírus às respostas imunes.

Variação no pré-core - Observada em indivíduos DNA-VHB positivo no soro, porém com AgHBe ne-gativo. Esses pacientes são incapazes de sintetizar as proteínas core-pré-core, das quais o AgHBe é derivado, o que ocorre pela substituição de uma única base no nucleotídeo 1869 (ou mais raramente, por modificação nos codons 1894 e 15). No norte da Europa, pacientes que sofrem hepatite fulminante podem apresentar cepas AgHBe negativo (adquiridas inicialmente ou selecionadas após a aquisição). No Mediterrâneo, em pacientes gregos, quase todos os casos de hepatite por VHB, agudas ou crônicas, apresentam cepas AgHBe negativo circulando. Estudos seqüenciais mostraram que as mesmas derivam de infecções com cepas AgHBe positivo. As formas fulminantes também estão associadas a cepas AgHBe negativo. No extremo Oriente, tem sido demonstrada uma mudança de cepas e positivo para e negativo, durante o

são infecciosas e são produzidas em grande quantidade durante a infecção pelo VHB. Existem três formas de proteínas de superfície: large (L), middle (M) e small (S). S é o componente principal de todas as partículas (p24 ou gp27); M é um componente menor (gp33 ou gp36) e L existe no vírion e nas partículas filamentosas, raramente nas esféricas (p39 ou gp42). Estas proteínas possuem em comum um domínio S, sendo diferenciadas pela presença dos domínios pré-S1(apenas na L) e pré-S2 (nas L e M). Estas partículas apresentam importância fundamental na fixação e penetração do VHB no hepatócito do hospedeiro e explicam o porquê da necessidade da sua presença para a infecção do hepatócito pelo VHD ou delta, que é um vírus defeituoso ou um viróide.

O genoma do VHB é composto de quatro ORFs (Uni-dades de leitura aberta), a saber: P, S, C e X. Assim, ORF S alberga os genes que codificam as três proteínas HBs, ORF P codifica a DNA-polimerase viral e suas funções acessórias, ORF C codifica as proteínas do core HBc e HBe sendo que ORF X também parece codificar mais de uma proteína, as chamadas HBx, possivelmente com atividade transativadora e relacionadas com a capacidade carcinogênica do VHB.

A proteína HBc contém muitos aminoácidos hidro-fílicos e carregados, sendo sintetizada no citoplasma da célula infectada; é essencial no ciclo vital do vírus. A proteína HBe é a forma secretória da HBc e está relacio-nada com a replicação e a infectividade do vírus. Ela é solúvel e pode ser encontrada no soro de indivíduos com infecção ativa.

Figura 1 - Esquema estrutural do VHB

O ciclo vital do VHB se inicia com a ligação e a entrada na célula hepática por meio de receptores ainda

Proteína do core AgHBe

Proteína do envelope AgHBe

DNA

DNA polimerase

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Panorama Geral / Hepatite B

curso da doença. No Japão também ocorre relação entre formas graves e AgHBe negativo.

Variação no gene core - Alguns pacientes, particu-larmente no Senegal, na Espanha e Taiwan, possuem infecção pelo VHB caracterizada pela ausência de anti--HBc ou de anti-Hbe. Sugere-se que essas infecções sejam causadas por uma variante denominada VHB2. Apesar de apresentarem AgHBs no soro, esses indivíduos possuem DNA-VHB negativo e não manifestam doença.

Variação no gene pré-s - Anticorpos pré-s precedem o desenvolvimento do anti-HBs no soro, durante o cla-reamento do vírus. Existem evidências de que os amino-ácidos 21 e 47 da proteína pré-s1 são importantes para a entrada dos vírus nos hepatócitos. Mutações, deleções e recombinações são descritas em indivíduos com infecção crônica pelo VHB, porém não se sabe se originam vírus competentes e replicativos.

Variação no AgHBs - Em estudo realizado na Itália, verificou-se que 2 a 3% dos recém-nascidos de mães AgHBs positivo desenvolveram a infecção pelo VHB, apesar de imunização ativa e passiva adequadas. A aná-lise da seqüência do DNA em um desses bebês mostrou haver uma mutação no determinante a da proteína HBs. Esse mutante conserva a capacidade de replicação e de infecção, mas não é neutralizado pela imunização ativa e passiva. Aspecto mais intrigante refere-se aos indivíduos AgHBs negativos (low level), com DNA-VHB positivo, com presença de anti-HBc ou mesmo anti-HBs, entretanto mantendo a replicação e a capacidade infectante. Não se sabe se esses indivíduos possuem vírus mutante ou apenas possuem AgHBs em níveis muito baixos, não detectáveis.

Variação no AgHBx - Originam às chamadas variantes atenuadas, que replicam em taxas baixas e por isso são consideradas menos patogênicas.

Variações no gene P - É o gene que codifica a polime-rase, uma transcriptase reversa. As mutações são induzidas pelos medicamentos antivirais e conferem resistência aos medicamentos. Freqüentemente essa resistência é cruzada entre medicamentos do mesmo grupo, tais como nucleo-sídeo ou nucleotídeo análogos.

Genótipos do VHB - São conhecidos, atualmente, oito genótipos principais do VHB, porém a importância prática desses genótipos ainda não é suficientemente conhecida para que sejam utilizados na prática clínica diária. Entre-tanto, parece haver maior resistência ao tratamento com

o interferon em genótipos C e D. Na Figura 2 observa-se a distribuição universal desses genótipos.

Figura 2 - Distribuição universal dos genótipos do VHB

Genótipo Distribuição Geográfica

A Norte da Europa, África

B e C Ásia

D Sul da Europa, Meio Oeste

E África

F e H América do Sul e Central

G África

A, B, C, D, F e H Brasil

Epidemiologia

Do âmbito epidemiológico, existem similaridades e dessemelhanças entre VHB (e Vírus da Hepatite Del-ta - VHD) e Vírus da Hepatite C (VHC). Tratam-se de infecções transmitidas por via parenteral, transcutânea e transmucosa. Embora ambos sejam causadores de hepatite pós-transfusional e muito freqüentes em usuários de drogas endovenosas (EV), a hepatite por VHB (assim como a he-patite por VHD) é considerada uma Doença Sexualmente Transmissível (DST), enquanto a transmissão sexual do VHC também pode ocorrer, mas é de pequena importân-cia epidemiológica. O mesmo ocorre com a transmissão vertical, que é comum para o VHB, particularmente em mães AgHBe positivo e rara para o VHC (geralmente se associada ao HIV). Ao se controlar os modos mais comuns de transmissão, começam a criar outros mecanismos alter-nativos, por exemplo, a transmissão horizontal não-sexual, que ocorre em contactantes domiciliares, bem conhecida para o VHB e possivelmente, muito importante na forma

Enfrentar o importante problema de saúde pública que constituem, no Brasil, as doenças transmissíveis endêmico-epidêmicas continua sendo um grande desafio. Entre essas doenças salientam-se as hepatites virais. Fonte: Revista Brasileira de Epidemiologia

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Panorama Geral / Hepatite B

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esporádica (não parenteral) da in-fecção pelo VHC. Em profissionais da área da saúde, o VHB parece ser mais freqüente do que o VHC. A im-portância da transmissão nosocomial desses agentes ainda não é totalmente conhecida. A transmissão por trans-fusão de sangue é hoje considerada desprezível, graças à triagem dos candidatos a doadores realizada nos bancos de sangue.

A real prevalência da hepatite por VHB ainda não é conhecida. A maioria dos dados baseia-se em pesquisas realizadas com candidatos a doadores de sangue. Não há estu-dos populacionais de grande porte, a não ser alguns poucos realizados em capitais. Em geral, a prevalência na maioria dos Estados Brasileiros é menor do que 1% de pacientes com AgHBs positivo. Alguns Estados,

todavia, apresentam índices mais elevados, como é o caso da Amazô-nia Ocidental, que conta com taxas superiores a 10% da população e os Estados do Paraná, Santa Catarina e Espírito Santo, que apresentaram índices superiores a 5%. Estudo de prevalência com base populacional realizado em todas as capitais do Brasil, promovido pelo Ministério da Saúde (MS), está em fase final e poderá oferecer dados mais precisos e atuais sobre essa questão. Com base nos estudos publicados até o momen-to estima-se que existam cerca de 4 milhões de brasileiros com infecção crônica pelo VHB.

A epidemiologia da infecção pelo VHB também vem apresentando modificações ao longo do tempo. Além das maneiras clássicas de trans-missão parenteral, sexual e vertical,

a transmissão horizontal não-sexual nos domicílios e em contactantes próximos vem se tornando mecanismo importante, especialmente em crian-ças de pequena idade. É o que ocorre na Amazônia Ocidental, onde embora não ocorra transmissão predominan-temente vertical, crianças de até um ano de idade encontram-se infectadas.

A infecção aguda costuma ser benigna na maioria das vezes. Dois terços dos indivíduos apresentam for-mas assintomáticas e evoluem para cura; um terço possui manifestações clínicas e apenas 10% tornam-se portadores crônicos do vírus. Estes podem evoluir para hepatite crônica, cirrose hepática e hepatocarcinoma. Cerca de 1 a 2% dos casos agudos po-dem apresentar formas graves como a hepatite fulminante ou a necrose sub-fulminante.

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Panorama Geral / Hepatite B

Embora os indivíduos adultos imunocompetentes con-sigam clarear o vírus após a infecção aguda em mais de 90% dos casos, isso não ocorre com os recém-nascidos, com as crianças de baixa idade, com os idosos e com os imunodeprimidos, nos quais até 90% podem evoluir para a infecção crônica e com um agravante. Os recém-nascidos que adquirem a doença pela via vertical apresentam um longo período de tolerância imune, de até três décadas ou mais, enquanto as crianças que se expõem ao vírus nos primeiros anos de vida, podem evoluir para situações de hepatopatia grave ainda na infância ou na adolescência.

Figura 3 - História natural da infecção pelo VHB

podem ficar descoradas, amareladas ou esbranquiçadas, feito massa de vidraceiro. A anorexia se acentua, apare-cem náuseas e vômitos. Pode haver prurido na pele de todo o corpo. O fígado passa a ser palpado, com uma borda mole e dolorosa em 70% dos pacientes. O baço é palpável em 20% dos casos. Um adulto emagrece, em média, quatro quilos. Podem aparecer algumas aranhas vasculares, transitoriamente. Após alguns dias (uma a duas semanas), começa a convalescença, com retorno do apetite, desaparecimento das náuseas e dos vômitos e dos demais sintomas, diminuição lenta e progressiva da icterícia e da colúria. Geralmente, ao cabo de quatro a seis semanas, tudo volta ao normal.

Na forma hepatite aguda benigna anictérica, os sinto-mas são mais atenuados e não ocorre o aparecimento da icterícia franca, podendo haver discreta colúria.

A hepatite aguda grave pode evoluir para o óbito do paciente dentro de oito semanas do início do quadro (fulminante) ou para insuficiência hepática em mais de oito semanas (sub-fulminante). Indícios de gravidade são representados por distúrbios de comportamento (agitação, prostração, sonolência e coma), por fenômenos hemorrá-gicos (epistaxis, gengivorragia, hemorragias digestivas, equimoses e hematomas de partes moles) e por edemas, em membros inferiores e na cavidade abdominal (ascite).

A hepatite aguda prolongada é aquela que evolui por períodos de tempo longo, até seis meses, sem, contudo, apresentar características de cronificação.

A hepatite aguda colestática apresenta acentuados fe-nômenos de colestase, com icterícia mais intensa, prurido acentuado, colúria persistente, acolia fecal, evoluindo por períodos mais prolongados do que o habitual.

HISTÓRIA NATURAL DA INFECÇÃO PELO VHB

Sem infecção

Hepatite agudaassintomática

Forma agudagrave

Persistênciaviral

Portador “são”do AgHBs Hepatocarcinoma

Cirrose hepáticaHepatite crônicapor VHB

Clareamentoviral

1% 35%

10%

10-30%

70-90%

?

90%

65%

100%

Exposição ao VHB

Infecção aguda por VHB

Hepatite agudasintomática

Aspectos clínicos e diagnósticos O quadro clínico das hepatites virais, quando ocorre, é

semelhante para todas as hepatites, independentemente da etiologia. Do aspecto didático, pode-se classificá-lo em: hepatite aguda benigna ictérica, hepatite aguda benigna anictérica, hepatite aguda grave, hepatite aguda prolon-gada, hepatite aguda colestática.

A hepatite aguda benigna ictérica manifesta-se após um período de incubação variável que depende do agente etiológico, por meio de um período prodrômico insi-dioso, de duração variável, com manifestações gerais e inespecíficas. Febre, quando presente, geralmente é de baixa intensidade, a não ser em alguns casos de hepatite aguda por vírus da hepatite A (VHA). Cansaço, astenia, anorexia, dor em hipocôndrio direito, até o aparecimen-to da colúria, que marca o início do período de estado. Neste, a icterícia é o sinal predominante, caracterizado pela cor amarelada da pele e das mucosas, bem visível nas conjuntivas. A urina fica muito escura e as fezes

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Panorama Geral / Hepatite B

Ao atentar-se para aspectos clí-nico-evolutivos, observa-se que nos casos de hepatite por VHB, mais ou menos dois terços (65%) dos suscetí-veis apresentam infecção sub-clínica ou assintomática, tornando-se natu-ralmente protegidos. Cerca de um quarto (25%) apresentam hepatite aguda com ou sem icterícia, sendo que de 1 a 2% podem apresentar for-

mas agudas graves. Em média, 10% evoluem para a infecção crônica, sem eliminar o vírus.

Os grandes problemas das hepati-tes virais pelo VHB são as formas de infecção crônica, capazes de evoluir para hepatites crônicas e, a partir delas, para a cirrose hepática e para o hepatocarcinoma.

Outro aspecto que confere gravi-dade peculiar à hepatite B crônica é a sua rápida evolução para a cirrose hepática e para o hepatocarcinoma. Enquanto a infecção crônica pelo vírus da hepatite C pode levar duas ou três décadas para atingir graus avan-çados de fibrose, a hepatite crônica pelo vírus B o faz em cinco anos ou menos. É certo, porém, que a soro-conversão do antígeno e para anti-e e mesmo do antígeno s para anti-s podem ocorrer espontaneamente na infecção crônica, ao contrário do que acontece com o vírus C. Todavia, isto deve acontecer antes que a fibrose es-teja em fase irreversível da evolução, para que o hospedeiro se beneficie.

Sabe-se que o VHB provoca no hospedeiro imunocompetente, uma resposta imune humoral forte e efi-ciente, porém a resposta tecidual é re-

Quadro 1 - Diferenças entre as várias hepatites virais referente ao Período de incubação (Pi), evolução clínica para formas graves e cronificação

Agente etiológico Período de incubação Formas agudas graves CronificaçãoVHA 2 semanas a 2 meses 0,1 - 0,2% Não ocorre

VHB 2 a 6 meses 1 a 2% 10%

VHC 2 semanas a 2 meses raríssimas >85%

VHDCo-infecção = VHBSuperinfecção = ?

1 a 2%1 a 5%

2 a 7%70 a 90%

VHE 3 a 6 semanas 10 - 20% (gestantes) Não ocorre

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Panorama Geral / Hepatite B

tardada e menos eficiente e, ao mesmo tempo em que tenta eliminar o agente agressor, é a grande responsável pela lesão que ocorre nos hepatócitos, isto é, a morte celular por necrose ou apoptose. No hospedeiro imunocom-prometido (o portador de HIV/aids, por exemplo), o vírus geralmente não é eliminado e a infecção crônica possui características próprias. Em virtude de mecanismos de transmis-são semelhantes é freqüente o achado de pacientes com a co-infecção HIV--VHB. É uma situação de difícil ma-nuseio, especialmente no tratamento.

O diagnóstico diferencial das hepatites virais agudas deve ser feito com doenças febris e ictéricas, preva-lentes no meio, como a leptospirose e a febre amarela. A malária, princi-palmente as formas mais graves de priminfecção por P. falciparum, tam-bém deve ser lembrada. Os quadros sépticos, especialmente por bactérias gram-negativas e doenças não-infec-ciosas, como as hepatites auto-imunes e as lesões hepatocelulares por drogas hepatotóxicas, se constituem em diag-nósticos diferenciais importantes das hepatites virais agudas, às vezes de difícil realização, antes dos resultados dos testes sorológicos.

O diagnóstico laboratorial das hepatites crônicas pelo VHB baseia-se na demonstração de anticorpos desenvolvidos pelo hospedeiro na presença do vírus ou na detecção de antígenos que são partículas virais ou ainda por meio de métodos de biologia molecular, demonstrando-se seus ácidos nucléicos, sua quantificação e sua tipagem.

Na hepatite por VHB existem vá-rios marcadores séricos: o antígeno de superfície AgHBs, o antígeno do core AgHBc e o antígeno e (forma solúvel do c), AgHBe e seus respectivos anti-corpos: antiHBs, antiHBc, antiHBe. A

presença do AgHBs representa infec-ção aguda ou crônica, diferenciadas pelo antiHBc IgM, existente apenas na fase aguda. O AgHBe é um marcador de replicação viral e infectividade. O antiHBs significa imunidade natural ou induzida por vacina.

Alguns autores recomendam a determinação quantitativa do AgHBs para acompanhamento do tratamento dos pacientes com hepatite B crônica, especialmente aqueles que recebem Interferon peguilado.

Pode-se ainda determinar a pre-sença do DNA-VHB por meio da reação em cadeia da polimerase (PCR), que comprova a presença e a atividade do vírus. Esse vírus pode ser diferenciado em seus vários genótipos e pode ainda ser quan-tificado por diferentes métodos. A quantificação do DNA-VHB é, hoje, extremamente importante do âmbito clínico, sendo inclusive necessária para definir a necessidade ou não de tratamento da infecção.

A caracterização da infecção pelo VHB é complexa e envolve exames sorológicos, como a pesquisa dos antígenos e dos respectivos anticorpos, exames de biologia molecular com a detecção e a quantificação do DNA-VHB e a sua genotipagem, exames de imagem como a ultrassonografia e, eventualmente, a tomografia computadorizada, e a ressonância nuclear magnética e o exame anátomo-patológico do fragmento de fígado obtido pela biópsia. Poucos centros no Brasil possuem condições de realizar todo esse ritual diagnóstico. Isso decorre não apenas da falta dos recursos tecnológicos, devido ao custo elevado, como também da falta de recursos humanos, com profissionais devidamente treinados.

Tratamento

A abordagem terapêutica da hepa-tite B crônica é difícil, prolongada e cara. As indicações encontradas na literatura internacional são contro-versas. Os próprios consensos exis-tentes nem sempre são alicerçados em grandes casuísticas ou em evi-dências consagradas, mas refletem, no mais das vezes, a opinião pessoal dos pesquisadores ou de seus grupos.

A indicação de tratamento exige a presença de infecção crônica pelo vírus B, isto é, presença do AgHBs por mais de seis meses e positividade do DNA-VHB em títulos maiores do que 2000 UI/ml tanto nos AgHBe negativos como nos AgHBe positivos. Além disso, é necessária a comprovação de doença hepática crônica pela alteração das transaminases e, em caso de dúvida, pelo exame anátomo-patológico do fígado, por meio da biópsia hepática.

O tratamento pode ser feito com imunoestimulantes (Interferon, Inter-feron peguilado) ou com antivirais

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Panorama Geral / Hepatite B

orais (análogos dos nucleosídeos como a Lamivudina, o Entecavir e a Telbivudina ou nucleotídeos análo-gos como o Adefovir e o Tenofovir).

A opção entre um ou outro grupo depende de características do vírus (carga viral, genótipo), da evolução da doença (grau de fibrose) e do hospedei-ro (idade, presença de co-morbidades). Os imunomoduladores são administra-dos por tempo determinado (de quatro a seis meses ou um ano), porém os efeitos colaterais são muito intensos. Os antivirais são de fácil administração (são orais e sem eventos adversos, em geral), porém muitas vezes neces-sitam ser administrados por tempo indeterminado. Ambos são muito caros e a eficiência dos tratamentos ainda é muito baixa.

A utilização associada de imunoes-timulantes com antivirais não mostrou resultados satisfatórios. A associação de antivirais oferece um aumento na barreira genética, porém não aumenta a potência do esquema, pois os me-dicamentos atuam sobre um mesmo alvo, que é a polimerase do VHB. Da mesma forma, quando na presença de falência terapêutica, ainda há dú-vidas sobre o que é mais vantajoso: acrescentar um novo medicamento ou substituí-lo por outro, mais potente e que não seja alvo de resistência pelo vírus. Na associação, os medicamentos devem sempre pertencer a grupos dife-rentes, isto é, um nucleosídeo análogo deve ser associado a um análogo de nucleotídeo, por exemplo, Lamivudina com Adefovir ou Tenofovir.

Nos casos que se encontram em fase avançada de cirrose e caminham para a falência hepática, o transplante do fígado é, hoje, um método terapêu-tico que pode ser empregado com su-cesso considerável. Nessa indicação, o tratamento com antiviral associado à imuneglobulina anti VHB (HBIg)

deve ser administrado antes e depois do transplante, para evitar a recidiva precoce da hepatite no enxerto. Da mesma forma, as hepatites agudas graves pelo VHB, especialmente a forma fulminante, possuem no trans-plante de fígado o seu tratamento de escolha nos dias atuais.

Prevenção

Aspecto altamente positivo refere-se à prevenção por vacinação. A vacina contra o VHB, produzida por técnicas de engenharia genética, é um dos agentes imunizantes mais eficientes entre os disponíveis, e é praticamente isenta de eventos adversos. A vacina possui custo reduzido (menos de 1 real por dose) e deve ser administrada em três doses (entre zero e um mês de vida e aos seis meses), sem necessidade de reforços naqueles que respondem com títulos protetores (mais de 95% dos vacinados). Dispõe-se ainda da imuneglobulina contra o VHB (HBIg), para pós-exposição nos não-imunizados, para recém-nascidos de mães AgHBs positivas e para candidatos ao transplante de fígado por hepatopatia crônica pelo VHB. A utilização universal da vacina pode levar a uma situação de controle dessa infecção e até de sua erradicação. Na Ilha de Formosa (Taiwan), após dez anos de vacinação universal da população, conseguiu-se diminuição apreciável de morte por hepatocarcinoma nessa população.

Em conclusão, o problema da in-

fecção crônica pelo vírus da hepatite B é importante e necessita ser encarado de maneira séria pelos gestores da saúde no Brasil. Enquanto não se con-seguir imunizar universalmente a po-pulação, será necessário se preocupar de maneira intensa com a prevenção, com o diagnóstico e com o tratamento de cerca de 3 a 4 milhões de brasileiros que são acometidos por esse vírus.

Referências Bibliográficas

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Antonio Alci Barone é graduado em medicina, especialista, pós-graduado, mestre e doutor em infectologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Atualmente é professor titular do Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da FMUSP.

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40 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

Panorama Geral / Câncer de Fígado

câncer de fígado se origina das células hepáticas - os hepatócitos - e é denomina-

do Carcinoma Hepatocelular (CHC). É o câncer primário mais comum do mundo e, em sua grande maioria, o CHC acontece em um grupo de pa-cientes bem definido que é acometido por cirrose hepática.

A cirrose hepática é o evento final de várias doenças que agridem o fígado cronicamente levando a uma destruição progressiva dos hepatócitos e à formação de fibrose, como as hepatites virais (Vírus da Hepatite B - VHB e Vírus da Hepatite C - VHC), a hepatite pelo álcool, a esteato-hepatite não-alcoólica e a hemocromatose, dentre outras. De um modo geral, considera-se que um portador de cirrose possua risco de 5% ao ano de desenvolver CHC.

A primeira descrição científica do CHC foi feita por Eggel, em 1901, e atualmente ocupa o sexto lugar entre os cânceres mais comuns no mundo. Há uma grande variação geográfica no que se refere a fatores de risco e a inci-dência, sendo a cirrose, mais freqüen-temente devida à hepatite viral, o fator de risco dominante para o CHC. As diferenças geográficas são comumente devidas às variações epidemiológicas

de infecção pelo VHB e pelo VHC.

Nos Estados Unidos da América (EUA) a taxa de incidência, que é de aproximadamente três para cada 100 mil habitantes, cresce principalmente associada ao aumento das taxas de infecção por hepatite C, com casos adicionais relacionados com a cir-rose por álcool e a hemocromatose, assim como as cirroses idiopáticas e a esteato-hepatite não-alcoólica (NASH). A incidência de hepatite C no Norte e no Oeste da Europa, também atribuída ao VHC, é menor que cinco para 100 mil habitantes, enquanto no Sul e no Leste europeus

O

Carcinoma Hepatocelular: Origem, incidência e TratamentoAndré Cosme de Oliveira

a incidência é de aproximadamente 10 para 100 mil habitantes.

Na América Latina a incidência de CHC é de aproximadamente 0,7 a 9,9 casos por 100 mil habitantes por ano. De acordo com dados sobre mortali-dade por câncer no Brasil, de 1999, o CHC ocupava a sétima posição, sendo responsável por 4.682 óbitos.

No Japão, embora a prevalência de infecção por VHC seja similar à dos EUA, a incidência de CHC é 8 a 10 vezes maior. Isso pode ser devido à disseminação anterior de VHC no Japão, que aconteceu de 20 a 30 anos antes do que nos EUA. Estes dados fornecem evidência adicional para sustentar a previsão de que a incidên-cia de CHC continuará crescendo nos EUA e na Europa nos próximos anos.

No Leste Asiático e na África sub--saariana, onde a hepatite B é endêmi-ca, a taxa de incidência de CHC é de 20 a 28 casos por 100 mil habitantes. Nessas regiões, aproximadamente 10-20% dos casos de CHC acontecem em pacientes com infecção por hepa-tite B crônica na ausência de cirrose. Isso ocorre, provavelmente, devido à infecção por VHB em estados iniciais da vida e a exposição concomitante a outros fatores de risco como as aflato-

É relevante no diagnóstico do câncer do fígado o estágio muito avançado da doença com um período de evolução da sintomatologia muito curto.Fonte: Instituto Nacional do

Câncer (INCA)

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Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010 41

Panorama Geral / Câncer de Fígado

xinas. É um tumor altamente maligno, que dobra o seu tamanho a cada 180 dias em média, sendo fundamental que os pacientes cirróticos sejam acompanhados rotineiramente por um especialista habituado ao diagnóstico deste tipo de câncer ainda em suas fases iniciais (Figura 1).

Figura 1 - Fígado cirrótico (A) e fígado normal (B)

sanguíneos decrescem acentuadamen-te. Nos pacientes com CHC os níveis sanguíneos tendem a se elevar, o que contribui para o diagnóstico do CHC. Apresenta uma baixa sensibilidade para o diagnóstico do CHC (45 a 64%), porém possui ainda um grande papel diagnóstico naqueles pacientes cirróticos com nódulo hepático e ní-veis superiores a 200 ng/mL.

A combinação da alfa-fetoproteína

com a ultra-sonografia abdominal aumentam as taxas de diagnóstico de CHC, contudo também elevam os custos e as taxas de falso-positivos. A AASLD sugere a utilização da ultra-sonografia abdominal para o rastreamento do CHC 13 (Tabela 1).

Ultra-sonografia abdominal

Método acessível, de baixo custo e não-invasivo. Apresenta sensibili-

A maioria dos pacientes com CHC

não apresenta sintomas e se estes estiverem presentes são geralmente representados por icterícia, ascite e/ou edema, emagrecimento, dor em quadrante superior direito do abdome e encefalopatia hepática. A média de idade de aparecimento do CHC é de aproximadamente 49,3 anos e em uma proporção de 4,1:1 homens/mulheres.

O rastreamento do CHC nos pa-cientes com doença hepática crônica, principalmente naquela população de alto risco - cirróticos - deve ser uma preocupação constante, pois a insti-tuição de um tratamento precoce au-menta o potencial de cura do mesmo. A American Association for the Study of Liver Disease (AASLD) recomenda o rastreamento do CHC de cada três a seis meses nos pacientes de alto risco e anualmente naqueles de baixo risco.

Diversas formas de rastreamento são propostas e, atualmente, a mais utilizada, principalmente na Ásia e na Europa, é a associação da dosa-gem sanguínea da alfa-fetoproteína e a realização de ultra-sonografia abdominal. A alfa-fetoproteína é uma α-1-globulina sintetizada normalmen-te pelo organismo no período fetal e que, com o crescimento, seus níveis

dade entre 65% a 80% e especificida-de acima dos 90% se utilizada para o rastreamento do CHC 13. O aspecto do carcinoma hepatocelular é variável, sendo que os pequenos geralmente são lesões sólidas hipoecogênicas, circunscritas, com diâmetros entre 0,6 e 3,0 cm. À medida que o tumor cresce torna-se mais vascularizado, com áreas de necrose, fibrose e trans-formação gordurosa, adquirindo um aspecto heterogêneo.

Tomografia computadorizada

Com sensibilidade de 86,6%, per-mite avaliar algumas características do CHC, como o realce arterial pelo meio de contraste, a presença de cápsula peritumoral, o realce em mosaico, a infiltração de gordura, a presença de invasão vascular (principalmente da veia porta) e de fístulas arteriovenosas.

< 1,0 cm

NegativoPositivo

1,0 cm - 2,0 c m > 2,0 c m

Nódulo em paciente com cirrose na ultra-sonografia (USG)

Repetir USG a intervalos de 3-4 meses

Aumentando

Procedimento conforme o tamanho do nódulo

Dois estudos dinâmicos de imagem (TC/RM)

Um estudo dinâmico de imagem (TC/RM)

Padrão vascular típico em um estudo dinâmico apenas

Padrão vascular atípico em ambos estudos dinâmicos

Padrão vascular atípico

Padrão vascular típico ou AFP > 200 ng/mL

Biópsia (?)

Diagnóstico de CHC Outro diagnósticoSem diagnóstico de CHC

Padrão vascular típico nos dois estudos dinâmicos

Tabela 1 - Algoritmo sugerido pela AASLD para o rastreamento do CHC

Estável em 18-24 meses

Retorno ao protocolo de seguimento padrão (6-12 meses)

Repetir a biópsia ou seguimento por imagem

Mudança no tamanho ou no perfil

Repetir estudo dinâmico de imagem ou a biópsia

Tratar como carcinoma hepatocelular

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Panorama Geral / Câncer de Fígado

Ressonância magnética

O CHC na ressonância magnética geralmente apresenta hipersinal em T2, sinal variável em T1, com padrão de realce semelhante à tomografia computadorizada, apresen-tando uma sensibilidade de 90% para o seu diagnóstico. Diferem dos nódulos regenerativos que normalmente demonstram hiposinal em T2 e ausência de realce arterial pós-contraste. Cada próton tem seu próprio campo mag-nético, que começa a se desorganizar e a afetar núcleos vizinhos em uma reação simultânea, após cada pulso de RF, transferindo energia entre si e conseqüentemente saindo de fase. Essa relação próton-próton (ou spin-spin) é também chamada de Tempo 2 de relaxamento ou simplesmente T2. A aplicação de pulsos de RF adiciona energia ao sistema e faz com que os prótons mudem para um estado de maior excitação ou de maior energia. O processo de dissipação dessa energia, no ambiente magnético desses prótons, e o seu retorno ao estado de mais baixa energia, é chamado de Tempo 1 de relaxamento ou T1.

Tratamento do CHC

Com o diagnóstico inicial, a remoção cirúrgica é considerada uma modalidade potencialmente curativa para o CHC, porém somente 15% dos pacientes, apro-ximadamente, apresentam condições para isso. As taxas de sobrevida de cinco anos em pacientes que sofreram remoção são de 60-80%. Carcinomas hepatocelulares lo-calizados podem ser irremovíveis devido à localização do tumor ou à cirrose concomitante e estes pacientes podem ser candidatos ao transplante de fígado.

A função hepática é um parâmetro importante na seleção da terapia para CHC. A pontuação Child-Pugh é amplamente utilizada para avaliar pacientes cirróticos para cirurgia e para outras terapias. A pontuação inclui mani-festações clínicas da cirrose - a encefalopatia e a ascite - e também parâmetros laboratoriais que refletem a função sintética do fígado (albumina, tempo de protrombina (PT) ou INR, e bilirrubina), como observado na Tabela 2.

Tabela 2 - Classificação de Child-Pugh

A AASLD sugere que a escolha da terapia deve estar sempre baseada no estadiamento do tumor no momento do diagnóstico e no grau de disfunção hepática, determinada pela classificação de Child-Pugh. Aproximadamente 15-20% dos pacientes são candidatos a condutas terapêuticas radicais e o restante destes receberão terapêuticas paliativas ou sintomáticos. A biópsia do nódulo raramente é necessária e a disseminação pela punção pode ocorrer em 1 a 3% dos casos, devendo ser evitada se a lesão for potencialmente operável. Pacientes com doença localizada irremovível são usualmente tratados com alguma forma de terapia localizada.

Tabela 3 - Escore de performance status da Organização Mundial da Saúde (OMS)

0Atividade normal, capacidade de exercer todas as atividades pré-doença sem restrição;

1Restrição a atividades mais vigorosas, porém permanece ambulatorial, sendo capaz de trabalhos leves e de natureza sedentária;

2Capaz de cuidar de si próprio, mas incapaz de trabalhar. Ambulatorial e acamado em menos de 50% do tempo;

3Capacidade limitada de cuidar-se. Confinado à cama ou à cadeira em mais de 50% da horas diurnas. Ambulatorial 50% do tempo ou menos. Cuidados constantes;

4Acamado, totalmente incapaz. Não consegue cuidar de si próprio. Pode necessitar de hospitalização;

5 Morte.

Ressecção cirúrgica e transplante de fígado

A ressecção cirúrgica é o tratamento mais eficaz para o CHC e a primeira opção para aqueles pacientes não cirró-ticos. Nos pacientes cirróticos, apresenta alta morbidade e mortalidade operatória em torno de 10%, também com alto risco de recidiva e de outros focos no fígado remanescente que supera os 50% em cinco anos.

O paciente ideal para a ressecção cirúrgica é aquele

com menos de 70 anos, em bom estado nutricional, com tumor pequeno, periférico, bilirrubina normal, sem invasão vascular, plaquetas acima de 100 mil e sem hipertensão portal. Somente pacientes cirróticos Child-Pugh A são can-didatos à ressecção cirúrgica e ainda assim mais da metade destes evoluirá com descompensação no pós-operatório, principalmente com ascite.

O transplante de fígado é a única terapia curativa tanto para o CHC como da cirrose hepática subjacente, evitando assim a aparição de novos focos de CHC. Está indicado na-

Child 1 2 3

Ascite Sem Tratável Refratária

Encefalopatia Sem G I e II G III e IV

Albumina >3,5 3,4 a 2,8 <2,8

INR <1,7 1,7 a 2,3 >2,3

BT 1 a 2 2 a 3 >3

Chid A = 5 e 6 pontos / Chid B = 7 e 9 pontos / Chid C = 10 e 15 pontos

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Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010 43

Panorama Geral / Câncer de Fígado

queles casos em que há nódulo único de até 5 cm de diâmetro, ou aqueles com até três nódulos, cada qual destes com até 3 cm de diâmetro, sem inva-são vascular ou doença extra-hepática.

Injeção percutânea de etanol (alcoolização)

A alcoolização do nódulo de CHC provoca necrose coagulativa e trombose vascular transformando o nódulo tumoral em uma área necró-tica avascular. Esta técnica tem sido amplamente utilizada pela sua boa tolerância, baixo custo e facilidade de acesso em qualquer centro hospitalar.

Pode ser realizada em nódulos de 3/5 cm, com presença de até três nódulos, ausência de ascite, ausência de coagulopatia grave (TP acima de 40%, plaquetas acima de 40 mil), pre-sença de “janela” ultrassonográfica segura para abordagem do nódulo e ausência de doença extra-hepática, como apresentado na Figura 2.

Figura 2 - Esquema demonstrando uma punção de nódulo para a realização da alcoolização

A eficácia desta técnica varia de acordo com o tamanho do nódulo.

para 50% e é menor ainda em nódu-los maiores. Em pacientes cirróticos compensados com CHC menores que 5 cm apresentam uma taxa de sobrevida de 70-80% em três anos e 49-54% em cinco anos.

A recorrência de CHC com a alco-olização é tão alta quanto à ressecção cirúrgica e estimada acima dos 50% em três anos.

Radiofreqüência

Utiliza-se agulha especial, em forma de guarda-chuva, acoplada a um equipamento para promover a morte das células tumorais através de lesão térmica. A energia emitida produz agitação iônica que se conver-te em calor e quando se alcança uma temperatura acima dos 50° C se induz necrose coagulativa mais homogênea e a lesão do tecido cirrótico ao redor é menor, se comparada à alcoolização.

Pode ser realizada por via per-cutânea guiada por ultra-som, por via laparoscópica e também durante cirurgia. Até quatro lesões de até no máximo 5 cm de diâmetro, rodeadas por parênquima hepático, situados a mais de 1 cm da cápsula de Glisson e a mais de 2 cm das veias hepáticas ou da veia porta podem ser tratados com radiofreqüência.

Em tumores menores que 3 cm ocorre uma resposta completa supe-rior a 90%, ainda com a vantagem de necessitar de um número menor de sessões do que na alcoolização.

Quimioembolização

Baseado no fato que o CHC apre-senta uma rica vascularização arte-rial, a quimioembolização intrarterial hepática é uma opção terapêutica não-radical quando os demais trata-mentos não podem ser empregados.

A cateterização da artéria hepá-tica por meio da punção da artéria femural permite a identificação da artéria nutridora do nódulo e a administração de quimioterápicos no mesmo, combinados ou não com lipiodol. O lipiodol é captado seletivamente pelo tecido tumoral, não sendo captado pelo parênquima hepático. A oclusão subseqüente da artéria tumoral pode ser realizada com micropartículas ou gelfoam.

As contra-indicações a quimioem-bolização são a presença de invasão vascular, disseminação extra-hepática, trombose de veia porta, insuficiência renal, ateromatose avançada, trombo-se de artéria hepática ou tronco celíaco e massa tumoral superior a 50% do volume hepático.

Atualmente, utiliza-se a qui-mioembolização em pacientes em lista de espera de transplante de fígado com o objetivo de se evitar o crescimento do CHC, o que poderia impedir a realização do mesmo.

Terapêuticas alvos

Devido à baixa tolerabilidade aos medicamentos convencionais e ao fato de que na maioria das vezes a cirurgia não é possível, os pacien-tes com CHC apresentam poucas opções de tratamento. Apenas 20% a 30% dos pacientes são candidatos à cirurgia ou ao transplante de fí-gado, considerados procedimentos mais eficazes para a cura da doença. Os outros 70% são considerados avançados e precisam recorrer a tratamentos que até hoje não se demonstraram muito eficazes.

Diante desse cenário, um novo estudo clínico internacional traz esperança aos pacientes, podendo modificar a conduta médica no tra-tamento do CHC.

Em nódulos com diâmetro igual ou inferior a 3 cm a resposta completa se obtém em até 80% dos casos. Em nódulos entre 3 e 5 cm a resposta cai

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44 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

O tosilato de sorafenibe demons-trou que os pacientes tratados com o medicamento apresentaram aumento da taxa de sobrevida global em 44%, quase três meses a mais do que aque-les que receberam placebo (média de 10,7 meses versus 7,9 meses do grupo placebo).

Além do aumento da sobrevida, o estudo demonstrou a diminuição no risco de morte dos pacientes pelo CHC e um aumento no tempo de so-brevida livre de progressão da doença.

O estudo foi planejado para um período de seis meses de tratamento, mas foi concluído anteriormente, pois além do aumento da sobrevida, a taxa de controle da doença foi maior com o medicamento (43% versus 32%), fazendo com que todos os pacientes recebessem o medicamento, interrom-pendo-se o grupo placebo (Figura 4).

Figura 4 - Número de pacientes do estudo e o seu desenvolvimento

O tosilato de sorafenibe apre-sentou efeitos colaterais de baixa intensidade e de fácil manejo, apre-sentando-se como um medicamento com adequado perfil de segurança para o tratamento dos pacientes com CHC avançado, com uma incidência de 5% de efeitos adversos em rela-ção ao placebo.

Panorama Geral / Câncer de Fígado

André Cosme de Oliveira é graduado em medicina pela Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ), especialista em cirurgia geral pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP) e especialista em cirurgia hepatobiliar e transplante de fígado pela Universidade de São Paulo (USP). Atualmente é cirurgião do Serviço de Transplante de Fígado do Depar-tamento de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

Nos últimos 30 anos, mais de 100 estudos clínicos com outros medica-mentos foram realizados na tentativa de se encontrar um novo tratamento para o CHC e todos, até então, sem sucesso nos casos de pacientes com CHC avançado.

O Sorafenib HCC Assessment Randomized Protocol (SHARP), estudo clínico fase III comparativo, foi apresentado pela primeira vez em sessão plenária no American Society of Clinical Oncology (ASCO 2007), nos EUA, e em 24 de julho de 2008 publicou-se os resultados finais no The New England Journal of Medi-cine demonstrando a sua eficácia no tratamento do CHC avançado.

O SHARP foi construído para analisar cientificamente a eficácia do tosilato de sorafenibe em pacientes com CHC avançado.

O trabalho avaliou 602 pacientes portadores de CHC em todo o mundo (Figura 3) e, inclusive, 14 pacientes brasileiros no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de São Paulo (FMUSP), no Serviço de Transplante de Fígado do Departa-mento de Gastroenterologia.

Figura 3 - Estudo SHARP: critérios de inclusão, estratificação para análises interinas e grupos de pacientes

1:1

n=299

n=303

Critérios de inclusão• CHC avançado• ECOG PS 0-1• Child-Pugh Class A• S em QT sistêmica prévia

Estratificação• Invasão vascular

macroscópica (veia porta) e/ou doença extra-hepática

• ECOG PS (0 vs 1/2)• Região geográfica

Rand

omiza

ção

Nexavar400 mg bid

Placebo

Referências Bibliográficas

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602 pacientesrandomizados

13 pacientes randomizados

no Brasil

2a análise interina de sobrevida global321 eventos

17 de outubro de 2008

Comitê de Monitoramento de Dados recomendou interrupção do estudo

em fevereiro de 2007

SorafenibeN = 299

PlaceboN = 303

PlaceboN = 7

SorafenibeN = 6

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Panorama Geral / Transplante

Transplante de Fígado: Considerações e Dados HistóricosMauricio Fernando de Almeida Barros

Os transplantes são um grande avanço da ciência a serviço do homem e não são poucas aquelas pessoas que hoje devem suas vidas a um transplante de órgão.Fonte: Mensagem do Papa João Paulo II no XVIII Congresso Internacional de Transplantes, realizado em 29

agosto de 2000, em Roma, Itália

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Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010 47

Panorama Geral / Transplante

Introdução

O transplante de fígado possui iní-cio histórico na década de 1960 com Thomas Starzl, somente passando a ser largamente empregado em me-ados dos anos 1980 após o advento da ciclosporina. Atualmente, mais de 25 anos após a chamada “era da ci-closporina”, com o advento de novos medicamentos e tendo incorporado inúmeros avanços da medicina como um todo, o transplante de fígado tor-nou-se uma modalidade terapêutica absolutamente consolidada.

O transplante de fígado é o pro-

cedimento terapêutico mais comple-xo do arsenal cirúrgico atual. Esta complexidade é também resultado das graves repercussões clínicas multi-sistêmicas decorrentes da fa-lência hepática, além das dificuldades técnicas inerentes a um procedimento extenso, envolvendo múltiplas anas-tomoses vasculares, e complicado pela presença de coagulopatia às ve-zes incorrigível e hipertensão portal.

Os notáveis resultados atualmen-te obtidos com esse procedimento devem-se à melhor padronização técnica da cirurgia do receptor, à disponibilidade de medicamentos imunossupressores mais eficientes e menos tóxicos, aos avanços na tecno-logia de preservação de órgãos, aos melhores conhecimentos das altera-ções fisiopatológicas que ocorrem no período intra-operatório, aos avanços das técnicas anestésicas, ao suporte laboratorial e hemoterápico e também ao desenvolvimento dos cuidados médicos no período pós-operatório.

A maioria dos eventos responsáveis pela mortalidade e por grande parte da morbidade do transplante ocorre nos primeiros três a quatro meses de pós-operatório, quando a maior parte das complicações acontece. Nesses

pacientes criticamente enfermos, clinicamente frágeis e submetidos a um procedimento de tal magnitude, o sucesso do procedimento depende de um alto índice de suspeição das intercorrências, associado a uma ati-tude diagnóstica diligente e agressiva, de forma a permitir uma terapêutica precoce e mais eficaz.

O transplante hepático é o único meio de resgatar a vida dos pacien-tes portadores de doenças hepáticas agudas ou crônicas em fase terminal. Há que se considerar, entretanto, o papel exercido pela crescente falta de órgãos para atender a demanda dos receptores, fato até o momento sem solução. Quem deve ter prioridade para receber um órgão? Como deve ser feita essa seleção ou escolha? A quem cabe essa decisão? Quem deve escolher, dentre os candidatos, aqueles que devem ou não possuir uma nova chance de vida?

Há vários anos tenta-se estabele-cer índices ou escores prognósticos para definir o “momento” do trans-plante. Do aspecto prático, no entan-to, é difícil precisar o exato momento da história natural da doença em que, tendo-se ultrapassado o degrau de progressão das complicações e a ir-reversibilidade das lesões orgânicas, se compromete de forma inexorável o prognóstico da intervenção.

Dados históricos dos Estados Unidos da América (EUA)

No passado, a política de alocação de órgãos nos Estados Unidos da América (EUA) era realizada com base em experiências anedóticas, muitas vezes em defesa de interesses próprios e nas opiniões de um único centro. Trabalhava-se com poucas evidências científicas, não havia modelos matemáticos de sobrevida e, portanto, não se dispunha de dados

com validade que suportasse este tipo de política. Até o início da década de 1980 havia limitado número de cen-tros com programas de transplante hepático ativos, tanto nos EUA como na Europa, e os fígados dos doadores eram alocados por compaixão, de maneira experimental e de forma absolutamente não-profissional.

A partir do Consenso promovido pelo Instituto Nacional de Saúde dos EUA, em 1983, o transplante hepá-tico deixou de ser um procedimento de cunho experimental e passou a apresentar caráter terapêutico para doenças hepáticas agudas e crônicas.

Com o crescente número de pro-gramas naquele país, ficou clara a necessidade do desenvolvimento de uma política de alocação de órgãos. O primeiro sistema de alocação de órgãos empregou, com base na deontologia médica, um princípio ético para alocação: o critério sickest first, ou seja, gravidade em primeiro lugar, ainda que tenha concedido, de forma pontual, certa prioridade ao tempo de lista. Assim, empiri-camente e como em qualquer outro procedimento médico, o esquema de alocação foi inicialmente baseado no grau da necessidade de cuidados médicos dos pacientes, ou seja, pa-cientes internados em UTI recebiam a primeira prioridade, seguida dos pa-cientes continuamente internados em hospitais e, por último, aqueles que recebiam atendimento domiciliar.

Como a lista de espera apresentava crescimento exponencial, enquanto que o número de órgãos crescia de forma insuficiente para atender a demanda de receptores, o tempo de espera passou a ser fator da maior importância como determinante da prioridade e, conse-qüentemente, na escolha dos pacientes em lista. De modo geral, os pacientes passaram a ser listados com anos de

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Panorama Geral / Transplante

antecedência, de forma a assegurar lugar nessa priorização.

Esta prática levou ao crescimen-to exagerado das listas de espera, muitas vezes com pacientes que não obedeciam à necessidade imediata do transplante quando de sua inclusão, o que gerou imediata falência do sistema de captação. Gradualmente foram detectadas falhas graves por ausência de critérios uniformes para justificar a admissão nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI) ou mesmo uma internação hospitalar. Na ver-dade, muitas UTI foram criadas com a finalidade de priorizar pacientes na fila, e muitas internações foram feitas desnecessariamente. A fraude potencial estava institucionalizada de forma oficial. Esses fatos originaram a Conferência de Consenso, em 1996, organizada pelas sociedades médicas American Association for the Study of Liver Diseases, The International Liver Transplant Society e American Society of Transplantation.

Como conclusão do evento, de-

finiu-se que o critério de Child- Turcotte-Pugh (CTP) seria adotado como forma de medir a gravidade na alocação dos pacientes em lista de espera para transplante hepático. Uma categoria à parte, denominada de Status 1, foi criada para priori-zar os pacientes com Insuficiência Hepática Aguda Grave (IHAG), ou seja, hepatite fulminante, o mesmo se aplicando à falência primária do enxerto, trombose de artéria hepá-tica diagnosticada dentro de sete dias após o transplante e a Doença de Wilson em sua forma aguda de apresentação. Conseqüentemente, os pacientes com Status 1, isto é, os casos agudos, receberam a mais alta prioridade (Quadro 1).

Em 1997, o governo americano criou a Organ Procurement and

Por determinação do Senado Americano, então questionado pela sociedade, solicitou-se ao Institute of Medicine (IOM), entidade com a mais alta credibilidade na área da ciência médica naquele país, um estudo detalhado que justificasse as discrepâncias. O IOM, após este estudo da lista de espera com 18 mil receptores, concluiu que o tempo de espera não tem relação com o nú-mero de óbitos em lista e sim com a gravidade. Estudos subseqüentes comprovaram, da mesma forma, que o risco relativo dos pacientes em lista não são função do tempo em lista e sim da gravidade dos mesmos. Adicionalmente, obser-vou-se que o critério de CTP, por apresentar duas variáveis subjetivas (ascite e encefalopatia), por agrupar pacientes em apenas três catego-rias e por não ter sido validado em pacientes com doença hepática crônica, poderia ser facilmente su-perestimado, não se prestando para alocar com acurácia os pacientes na lista de espera para transplante hepático. De fato, cite-se o exemplo prático de um paciente com valor das bilirrubinas de 3,1 mg/dl, que recebe os mesmos três pontos nesse quesito que outro com bilirrubinas de 31 mg/dl, certamente em situa-ção muito mais grave.

Estádio 1

Hepatite Fulminante - Tradicionalmente Definida

Não Funcionamento Primário do Enxerto < 7 dias do Tx

Trombose de Artéria Hepática < 7 dias do Tx

Descompensação Aguda - Doença de Wilson

Estádio 2a Hospitalizado (UTI) Doença Hepática Crônica (Ex. V, 7 dias)

Estádio 2b Hospitalizado Continuamente (UTI) por 5 dias

Estádio 3 Requerendo Cuidados Médicos Continuamente / Hosp - Casa

Estádio 7 Inativo Temporariamente

Fonte: United Network for Organ Sharing - Implemented July 30, 1997

Transplantation Network (OPTN), entidade não-governamental incum-bida de desenvolver a política de captação e distribuição de órgãos naquele país. Desde então, a OPTN opera, por meio de contrato federal, em conjunto com a United Network for Organ Sharing (UNOS).

Houve adições de critérios (como os relacionados ao hepatocarcinoma), adaptações e novas modificações, mas o número de pacientes em lista de espera nos EUA continuou au-mentando, bem como o tempo médio da lista de espera e, infelizmente, a mortalidade na lista.

Quadro 1 - UNOS - Critério de acordo com gravidade da doença

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Panorama Geral / Transplante

Quadro 2 - Probabilidade de sobrevida na lista de espera

Finalmente, em 1998 o governo americano publicou o Final Rule Mandate, determinando que o tempo de espera em lista fosse desconsiderado e descontinuado como fator para alocação de órgãos.

A OPTN encomendou à Clinica Mayo a elaboração de um novo modelo que estimasse a mortalidade precoce em lista com as seguintes características: de ser aplicado à beira do leito, de ter poucas variáveis objetivas e padro-nizadas, e que fosse passível de fácil auditoria.

Desenvolveu-se, assim, um modelo matemático, inicial-mente descrito para predizer sobrevida de pacientes cir-róticos submetidos a shunt porto-sistêmico intra-hepático (TIPS), utilizando-se apenas três variáveis: dosagem sérica da bilirrubina total, dosagem sérica da creatinina e o tempo de protrombina, representado pelo Índice Internacional Normalizado (INR). Como se percebe, este modelo prevê a mortalidade do paciente no prazo de três meses e tam-bém em um ano, com escala de 10 a 40 de forma linear. Foi denominado de Model of End-Stage Liver Disease (MELD) para os adultos e Pediatric End-Stage Liver Dise-ase (PELD) para as crianças. Antes de sua implementação pela OTPN em 27 de fevereiro de 2003, este modelo foi tes-tado e validado em 2.278 pacientes cirróticos. Note-se que algumas modificações foram feitas à formula original no sentido de adaptá-la a alocação, para tanto arredondando-se para o valor 1,0 os dados com valor inferior, e limitando-se a creatinina ao máximo de 4. A fórmula (logarítmica) final é 11,2 log n (INR) + 3,78 log n (bilirrubina total) + 9,57 log n Creatinina) + 6,43, arredondando-se o valor para o próximo número inteiro.

O critério MELD/PELD é o critério utilizado para alocação de fígados para transplante nos EUA desde fevereiro de 2002.

Dados históricos da Europa

A política de alocação de órgãos na Europa apresenta evolução bastante diversa dentre os vários países da comu-

MELD escore Mortalidade (3o mês)

< ou = 10 2 - 8%

10 - 19 6 - 29%

20 - 29 50 - 76%

30 - 39 62 - 83%

> ou = 40 100%

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Panorama Geral / Transplante

nidade européia. Veja-se o exemplo da Espanha, onde o sistema de cap-tação mostrou-se ser o mais eficiente do planeta atingindo a marca anual de 40 fígados por milhão de habitantes, número apenas bem recentemente su-perado pela Itália. Isto possibilitou a utilização do critério cronológico para os pacientes com doença hepática crônica com bastante segurança, pois a média de tempo em lista era menor que seis meses e, conseqüentemente, a mortalidade em lista desprezível. Por aspecto, em outros países, por diversas razões, a captação abaixo das necessidades obrigou a utiliza-ção de outros critérios de alocação incluindo-se a gravidade. É de se notar que, mesmo na Espanha, em que a alocação obedece a um rodízio entre os serviços, cabe a cada serviço estabelecer seu próprio critério. As-sim, ainda que as listas sejam prima-riamente cronológicas, os pacientes mais graves são “passados à frente” e transplantados com prioridade em decorrência de sua maior gravidade. A tendência crescente, mesmo na Europa, é a utilização do MELD.

História da política de alocação no Brasil

No Brasil, o primeiro transplante hepático tecnicamente bem sucedido em humanos foi realizado no Hos-pital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), em 1968, por Machado MCC. e colaboradores. Ulteriormente, em 1985 e durante a “era da ciclosporina”, Raia S. e colaboradores iniciaram programa clínico no mesmo Hospital, totalizan-do 518 procedimentos até dezembro de 2001, incluindo retransplantes e transplantes em dominó, bem como o primeiro transplante intervivos.

A partir do início dos anos 1990, principalmente com a chegada de novos cirurgiões e hepatologistas de seus estágios de treinamento no exterior, houve um crescimento exponencial do número de transplan-tes realizados no País, bem como a multiplicação dos programas de transplante. Na atualidade, oito capi-tais dentre os 23 Estados brasileiros

dispõem de um ou de mais centros de transplante hepático.

De forma similar ao que aconteceu nos EUA, a alocação de órgãos no Bra-sil passou pela fase anedótica, em que os critérios de alocação foram ditados por um único centro com grande influ-ência política, atendendo a interesses pessoais e sem evidências científicas. O modelo organizacional e a legisla-ção, em consonância com o mundo moderno, evoluíram no decorrer do tempo. Entretanto, com a justificativa de inibir a perspectiva de fraude, em 1997 a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo estabeleceu, em sua Re-solução SS-091 (04/07/1997), critério cronológico para alocação de todos os enxertos, com critérios de prioridade médica apenas para dois dentre os ór-gãos críticos, isto é, coração e pulmão. Contudo, inexplicavelmente para o fígado, a prioridade foi apenas conce-dida aos casos de hepatites fulminantes que desenvolvessem edema cerebral e para os casos de retransplantes que ocorressem precocemente após o procedimento inicial. Em 1998, ape-

Quadro 3 - Relação entre MELD e mortalidade na lista de espera para transplante

Pred

icted

Risk

MELD Score

10

8

6

4

2

0

6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 32 34 36 38 40

Figure 2 - Box plots of mortality risk on the waiting list, by MELD score.

Table 1 - Unadjusted Liver Waiting List and TransplantRecipient Mortality Rates by MELD Score Category

MELDWaiting List Rate

per 1,000 PYPosttransplant

Rate Per 1,000 PY

Overall 217.3 183,5

6 - 11 44.8 163,3

12 - 14 52.5 127,4

15 - 17 146.4 164,7

18 - 20 271.9 174,1

21 - 23 514.9 178,4

24 - 26 840.7 176,9

27 - 29 1,663.8 195,9

30 - 39 4,634.1 245,5

40+ 13,152.7 264,6

When Is a Patient Too Well and When Is a Patient Too Sick For a Liver Transplant, Robert M. Merion, Liver Transplantation, 10 (10), Suppl2 (October), 2004: ppS69-S73

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Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010 51

Panorama Geral / Transplante

sar dos protestos de equipes transplantadoras, de algumas organizações não-governamentais (ONG), e de discussão no âmbito do Conselho Federal de Medicina (CFM), o Ministério da Saúde publicou portaria, em nível federal reiterando o documento elaborado em São Paulo.

Dessa forma, a mortalidade em lista de espera, que naquela oportunidade atingia a cifra assustadora de 40% na população de candidatos a receptores, passou a apresentar crescimento exponencial, contemplando uma população de 3.000 e 5.900 receptores para São Paulo e Brasil respectivamente, condenando sumariamente ao óbito todo paciente portador de doença hepática subaguda ou crônica em fase avançada de qualquer etiologia que necessite de um órgão para sobreviver. Análise de dados oficiais da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo entre 1997 e 2001 demonstrava que mais de 80% dos pacientes que morrem na lista o fazem antes mesmo de completar 1 ano de sua inscrição.

Criou-se uma injustiça social absurda, inédita no País, ferindo a ética médica, a justiça distributiva e os direitos humanos, condenando todos os pacientes públicos ou privados ao óbito por seleção natural, ou seja, sobrevive o mais capaz. Comparação grosseira e similar seria, talvez, a de um pronto-socorro atender inicialmente um quadro gripal, deixando de lado um paciente infartado ou acidentado grave, por este ter chegado um pouco depois.

Outra face da gravidade da situação era o fato de que, ao se operar pacientes menos graves, o que se estava fazendo era promover mortes que, de outra forma, não ocorreriam. Análises demonstravam que, para valores de MELD inferiores a 15, a chance de óbito pelo próprio procedimento do transplante é significativamente maior que a proporcionada pela doença de base, podendo o transplante, em tais casos, ser postergado.

Coerente com a tendência mundial, o Brasil aderiu ao Sistema MELD-PELD com a publicação pelo Ministério da Saúde da Portaria nº 1.160 em 2006 (Quadro 4).

Quadro 4 - Publicação do Ministério da Saúde

Mauricio Fernando de Almeida Barros é graduado em me-dicina pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Atualmente é responsável técnico do Serviço de Transplante de Fígado - Pró-Figado, do Hospital Oswaldo Cruz e médico assistente do Serviço de Transplante de Fígado do Hospi-tal das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

Pouca controvérsia há, nos dias atuais, quanto à justiça de se priorizar o mais grave e não aquele que, por circunstân-cias, chegou antes. O próximo problema a ser enfrentado é a “sintonia fina” desse critério. Pois o mesmo é bom mas não ótimo, pois consegue prever com razoável fidelidade a piora ou o óbito de 85% ou mais dos pacientes. Os restantes 15%, ainda que às vezes muito graves, não são “premiados” com uma pontuação que lhes permita a obtenção de um órgão em tempo hábil. Atualmente, esse papel arbitral de analisar casos de exceção cabe às Câmaras Técnicas Setoriais das Secretarias Estaduais de Saúde.

When Is a Patient Too Well and When Is a Patient Too Sick For a Liver Transplant, Robert M. Merion, Liver Transplantation, 10 (10), Suppl2 (October), 2004: ppS69-S73

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Aspectos Farmacêuticos Perante as Hepatites B e CDanielli Botarelli Fragoso

Os medicamentos adquiridos e distribuídos para o tratamento das hepatites virais seguem as regras do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica - estratégias de acesso a medicamentos no Sistema Único de Saúde (SUS).Fonte: Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde

Especial de Capa / Farmácia

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Especial de Capa / Farmácia

s hepatites B e C são um grave problema de saúde pública no Brasil e no mundo, afetando cerca de 500 milhões de indivíduos. No Brasil,

o índice de infecção está em torno de 3 milhões de casos para a hepatite C, enquanto estimadamente 4 milhões de indivíduos são atingidos pelo vírus da hepatite B.

Com o avanço dos conhecimentos científicos ao longo dos anos no campo da terapia para as hepatites, observa-se que os medicamentos utilizados sofreram interferências diretas da indústria farmacêutica, com a finalidade de aumentar a resposta frente às terapias disponíveis.

Por ser um tratamento que pode ser longo e passível de diversos obstáculos, como a própria aquisição do medicamento até a superação dos eventos adversos que possam acometer os pacientes submetidos à terapia me-dicamentosa, a atuação de uma equipe multidisciplinar comprometida também é motivo de discussão entre os gestores, os serviços de saúde e os profissionais envolvi-dos como uma tentativa de garantir a adesão ao tratamento e, assim, obter maiores taxas de resposta.

Medicamentos excepcionais

Aprovado por meio da Portaria GM/MS nº 2.981 de 26 de novembro de 2009, o Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (CEAF) é o responsável por disponibilizar medicamentos para o tratamento de doenças específicas que atingem um número limitado de pacientes e que são, na maioria das vezes, utilizados por períodos prolongados. O CEAF foi aprovado no sentido de aprimorar e substituir o Componente de Medicamentos de Dispensação Excepcional (CMDE), entendendo que o mesmo possui importância fundamental para o acesso da população brasileira aos medicamentos para agravos im-portantes, tanto do aspecto epidemiológico quanto clínico.

São medicamentos de custo unitário elevado e que implicam em um alto impacto financeiro devido ao tem-po de tratamento, cujo fornecimento depende de apro-vação específica das Secretarias Estaduais de Saúde. O paciente, após a elaboração de um processo burocrático (Tabela 1) que engloba a solicitação médica e os formu-lários próprios, bem como exames de diagnóstico para

A

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Especial de Capa / Farmácia

referida patologia, terá seu processo avaliado por membros do órgão ges-tor estadual identificado na região de moradia, de forma a cumprir os critérios de tratamento estabelecidos nos Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT), previstos para as doenças cobertas pelo CEAF.

Após análise e deferimento, uma Autorização de Procedimento de Alta Complexidade/Custo (APAC) será gerada liberando o tratamento para três meses. Em cada prazo de competência vencido, esta APAC deve ser renovada junto ao órgão autorizador, desde que necessária, apresentando nova solicitação mé-dica (prescrição médica e Laudo de Solicitação, Avaliação e Autorização de Medicamento - LME) e resultados de exames laboratoriais atualizados.

A terapia medicamentosa contem-

Tabela 1 - Processo de aquisição de medicamentos / CEAFDocumentos exigidos

1 Prescrição médica escrita em 2 vias

2 Laudo para solicitação, avaliação e autorização de medicamento preenchido

3 Termo de responsabilidade preenchido e assinado pelo médico / paciente

4

Cópia dos documentos pessoais

- RG

- CPF

- Comprovante de residência

- Cartão Nacional de Saúde

5 - Cópia dos exames clínicos / laboratoriais

Tabela 2 - Medicamentos disponíveis

Hepatite B

Medicamento (uso via subcutânea)e apresentação

-Interferon alfa-2a recombinante: 3 MUI / 4 MUI / 9 MUI

Interferon alfa-2b recombinante: 3 MUI / 4.5 MUI / 5 MUI / 9 MUI / 10 MUI

Medicamentos (uso via oral) e apresentação

Lamivudina: 100mg

Adefovir: 10mg

Tenofovir: 300mg

Entecavir: 0,5mg / 1,0mg

Hepatite C

Medicamento (uso via subcutânea) e apresentação

Interferon alfa-2a recombinante: 3 MUI / 4 MUI / 9 MUI

Interferon alfa-2b recombinante: 3 MUI / 4.5 MUI / 5 MUI / 9 MUI / 10 MUI

Interferon peguilado alfa-2a: 180mcg

Interferon peguilado alfa-2b: 80mcg / 100mcg / 120mcg

Medicamento (uso via oral)

Ribavirina: 250mg

plada no PCDT para o tratamento das hepatites virais engloba medica-mentos de uso oral e subcutâneo que apresentam aspectos diferentes entre si e cuja prescrição segue critérios de escolha especificados nos seus respec-tivos protocolos. Este tratamento pos-sui como principal objetivo prevenir o desenvolvimento de uma hepatopatia avançada, como cirrose e falência hepática e também evitar o surgimento do carcinoma hepatocelular.

Atualmente estão disponíveis os medicamentos descritos na Tabela 2.

Sabe-se, atualmente, que a indivi-dualização da dose consiste em uma ferramenta poderosa para a obtenção de uma resposta mais eficaz. Estudos clínicos demonstram que o paciente assistido de perto, tratado de acordo com suas características individuais, alcança resultados superiores ao pa-

ciente tratado de maneira generalizada.

O monitoramento laboratorial no acompanhamento clínico e a atuação do profissional farmacêutico junto ao paciente quando este é submetido à terapia visam e, conseqüentemente, geram um tratamento mais eficaz e com maiores índices de adesão. A identificação precoce e o controle adequado da evolução dos eventos adversos são importantes para preve-nir complicações, atenuar o impacto do tratamento na qualidade de vida do paciente e maximizar a eficácia do tratamento, principalmente quando se trata de hepatite C, cujo esquema terapêutico utilizado está sempre as-sociado a inúmeros eventos adversos.

Com a finalidade de garantir este acompanhamento, a publicação da Portaria nº 34, de 28/09/2007, da Secretaria de Vigilância em Saúde,

Hepatite B Hepatite C

- Perfil sorológico HBV (HBsAg, HBeAg, Anti-HBe) - PCR quantitativo

- Biópsia hepática - Genotipagem

- Sorologia para hepatite C - Biópsia hepática

- Sorologia para HIV - Sorologia para hepatite C

- Exames bioquímicos: ALT/AST, bilirrubina total e frações, TP, albumina, creatinina, glicemia - Sorologia para HIV

- Hemograma completo / plaquetas- Exames bioquímicos: ALT/AST, bilirrubina total e frações, fosfatase alcalina, TP, TSH, gama GT, albumina, creatinina, glicemia

Obs.: Teste quantitativo para pacientes com HBsAg (+), ALT elevada e HBsAg (-) - Hemograma completo / plaquetas

Obs.: Beta-HCG para mulheres em idade fértil

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Especial de Capa / Farmácia

estabeleceu a seguinte recomendação: aqueles pacientes que estiverem em tratamento com interferon peguilado devem ter suas doses semanais aplicadas em Serviços de Tratamento Assistido ou em serviço especialmente identificado para tal finalidade pelas Secretarias Es-taduais e/ou Municipais de Saúde. Assim, as ampolas ficarão em poder dos serviços mencionados e não dos pacientes em tratamento. Para facilitar o trabalho dos serviços identificados, sugere-se que os pacientes sejam agrupados e previamente agendados para a aplicação do medicamento. Dependendo da apresentação comercial disponível na Secretaria, indicação e peso do paciente, a utilização das ampolas do medicamento poderá ser compartilhada se adotadas as medidas técnicas de segu-rança de manipulação e aplicação do medicamento. Os serviços especialmente identificados para tal objetivo pelas Secretarias Estaduais e/ou Municipais de Saúde deverão possuir equipe multidisciplinar com o objetivo de facilitar e aumentar a adesão do paciente ao tratamento.

Após todo o trâmite burocrático para a aquisição do medicamento e a conseqüente liberação do mesmo, é que a equipe de atenção básica e multidisciplinar desempe-

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Especial de Capa / Farmácia

Danielli Botarelli Fragoso é graduada em farmácia com habilitação em análi-ses clínicas e especialista em farmacolo-gia pela Universidade de Santos (UNI-SANTOS). Atualmente é farmacêutica do Serviço de Atendimento às Doenças Transmissíveis (SADT) da Prefeitura Muni-cipal de Cubatão (SP) e coordenadora de estudos clínicos do Instituto de Me-dicina Tropical (IMT) do Laboratório de Investigações Médicas em Hepatites do Ambulatório de Doenças Infecciosas e Parasitárias do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

Referências Bibliográficas

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nhará um papel de suma importância no acompanhamento dos portadores de hepatites virais em tratamento.

Estratégias de ações coletivas para condução do tratamento medicamen-toso são comprovadamente eficazes se comparadas a um tratamento no qual o indivíduo portador desta patologia crônica encontra-se sozinho diante de tantas variáveis que influenciarão sua qualidade de vida neste período.

Ao tratar-se de ações coletivas, fala-se da atuação de uma equipe multidisciplinar cujo objetivo é facilitar e aumentar a adesão do pa-ciente ao tratamento. Os profissionais envolvidos, cada qual na sua área de atuação, visam um tratamento mais eficaz, pois tratam de aspectos relacionados não somente à ação farmacológica e farmacocinética do medicamento administrado, mas tam-bém de uma visão abrangente de todo o ambiente criado em volta daquele paciente devido ao acometimento da patologia. A atuação do médico, do enfermeiro, do farmacêutico, do psicólogo, do assistente social, entre outros, deve trazer, de acordo com as possibilidades inerentes à cada servi-ço, benefícios que serão observados em curto e em longo prazo.

O apoio familiar e a inserção do portador em um grupo de ajuda, que atualmente no Brasil somam oficial-mente em torno de 80 grupos, também servem de suporte para o enfrenta-mento da doença, pois fortalecem o lado emocional e moral do portador.

Conclusão

As hepatites virais constituem uma grande preocupação da saúde pública, pois são um tipo de infecção silenciosa, com uma evolução longa e que ainda acometem milhares de indivíduos anualmente, muitas vezes

sem que eles conheçam os programas de prevenção ineficazes.

Do âmbito terapêutico, novos medicamentos estão sendo estuda-dos e um arsenal medicamentoso mais amplo e seguro recebe pro-messas de efetivação. No tocante clínico, torna-se imprescindível a instituição de uma equipe multi-disciplinar atuante que, agregando os conhecimentos técnicos e cien-tíficos, priorize a elaboração de atividades que objetivem não apenas o manejo terapêutico adequado da infecção, mas também a tentativa de garantir adesão ao tratamento para a obtenção de resultados bem suce-didos. Como profissional da saúde e integrante desta equipe, o farma-cêutico está na posição ideal para melhorar o tratamento dos pacientes infectados pelos vírus das hepatites B e C por promover informação so-bre a doença, o tratamento e identi-ficar os eventos adversos produzidos pelos medicamentos, quantificar os riscos, caracterizar fatores de risco e prevenir iatrogenias. Esta defini-ção é ampla e não inclui somente a identificação e a quantificação dos eventos adversos e sim a avaliação de suas causas. É fácil compreender que os determinantes dos eventos adversos dos medicamentos não se devem apenas aos fármacos (ou seus excipientes), mas também à maneira como são utilizados.

Manter-se atualizado sobre a patologia capacita o profissional a acompanhar o paciente, o trata-mento e a resposta ao mesmo. O profissional será o elo entre estas variáveis e poderá intervir em di-versos momentos, sempre com o objetivo de assegurar o bem-estar físico e emocional do paciente, o seguimento adequado da conduta terapêutica e o desenvolvimento de novas estratégias de ação.

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Especial de Capa / Pesquisa Clínica

Laboratório Clínico desempenha papel fun-damental no diagnóstico e no manejo nas infecções causadas pelos vírus das hepatites B

(HBV) e C (HCV). As infecções causadas pelo HBV e pelo HCV são as causas mais comuns de doença hepá-tica no mundo 1. Apesar dos progressos na prevenção, no diagnóstico e no tratamento destas infecções, elas ainda são uma das principais causas de doença hepática crônica, cirrose ou carcinoma hepatocelular.

Os testes laboratoriais utilizados nestas infecções podem ser indiretos (testes sorológicos) ou diretos (base-ados em técnicas de biologia molecular). Os marcadores sorológicos, ou indiretos, são utilizados na triagem, prin-cipalmente em bancos de sangue. Os testes diretos são baseados em biologia molecular e são importantes para o diagnóstico da infecção e também para o acompanha-mento da resposta ao tratamento.

Testes sorológicos

Os testes mais utilizados no diagnóstico sorológico são os ensaios imunoenzimáticos (EIA) e há testes es-pecíficos para IgM e IgG. Estes ensaios são baseados na imobilização do antígeno ou do anticorpo em um suporte sólido, geralmente no fundo de microplacas. Antígeno ou anticorpo complementar, presente na amostra a ser testada é adicionado, então este complexo antígeno--anticorpo é detectado por outro antígeno ou anticorpo marcado com enzima. Esta enzima acoplada ao antígeno

ou ao anticorpo é capaz de catalisar a reação, quando o substrato é adicionado, produzindo uma reação que gera uma cor. Esta reação colorimétrica é medida e pode gerar resultados quantitativos ou qualitativos (reagente ou não reagente). Estes testes apresentam excelente sensibilidade e especificidade (próximo de 99%).

Testes moleculares

Os testes moleculares podem ser divididos em: téc-nicas de detecção e de quantificação e em técnicas para análise da variação da seqüência viral (genotipagem). As técnicas de detecção e de quantificação compreendem os testes que envolvem a amplificação dos genomas virais, como a reação em cadeia pela polimerase (PCR) ou a amplificação mediada pela transcrição (TMA), e os testes de amplificação de sinal, como o branched DNA (bDNA) ou a Captura Híbrida. Para a genotipagem há as reações de seqüenciamento e a hibridização reversa (Inno-LIPA) 2, 3.

O princípio das técnicas de amplificação do genoma alvo é sintetizar um grande número de cópias do genoma viral (amplicons), em uma reação enzimática cíclica.

A reação em cadeia da polimerase (PCR) utiliza várias temperaturas e uma enzima: a DNA polimerase termoes-tável. É uma reação que pode ser feita utilizando-se tanto DNA (como do VHB) ou RNA (como no caso do VHC). Quando a reação utiliza RNA com molde inicial, uma etapa inicial de transcrição reversa (RT) é requerida 2.

Papel do Laboratório Clínico no Diagnóstico e Manejo das Hepatites B e CCarlos Eduardo de Melo

O

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Especial de Capa / Pesquisa Clínica

Na Amplificação Mediada por Transcrição (TMA), a reação é iso-térmica e utilizam duas enzimas, a transcriptase reversa e uma T7 RNA polimerase. Os amplicons são fitas simples de RNA. Após a lise do enve-lope viral, o genoma viral é capturado por sondas ligadas a micropartículas magnéticas. Amplificação isotérmica envolve a produção autocatalítica de RNA com ação das duas enzimas 2.

A detecção dos amplicons gerados nas reações de PCR e TMA pode ser realizada por meio de técnicas de eletroforese ou pela hibridização com sondas de oligonucleotídeos, nos quais os híbridos podem ser imo-bilizados e revelados em uma reação enzimática, seguido por detecção de um sinal luminoso ou colorido.

A quantificação é baseada na am-plificação competitiva do genoma viral com uma quantidade conhecida de um padrão sintético adicionado a cada tubo de reação. As quantidades relativas do padrão e amplicons são medidas no final do processo, e os resultados são lidos em uma curva padrão.

Recentemente foram desenvol-vidas as reações de PCR em tempo (Real-Time PCR). Nestas reações cada ciclo de amplificação emite um sinal fluorescente e o número de sinais por ciclo é proporcional ao montante de cadeias de RNA-VHC presentes na amostra no momento em que são duplicadas. O princípio do método baseia-se na detecção de fluorescência no tubo de reação à medida que o DNA dupla fita é gerado. Ambos os sistemas de emissão de luz (sonda TaqMan e Sybr Green) podem ser utilizados para detecção e quantificação na PCR em tempo real. À reação acrescenta-se, além dos iniciadores utilizados na PCR tradicional, um terceiro oligo-nucleotídeo (sonda TaqMan), com sua extremidade 5’ ligada a um fluoróforo

em sua extremidade 3’ a uma molécula quencher, capaz de, por um fenôme-no físico denominado Fluorescence Ressonance Energy Transfer (FRET), que absorve a fluorescência emitida pelo fluoróforo após este ser estimu-lado por luz de comprimento de onda específico. Durante a PCR em tempo real a sonda Taq Man hibridiza com a seqüência da fita simples de DNA complementar alvo para amplificação. No processo a Taq Man é degradada devido à atividade exonuclease da Taq DNA polimerase, separando o quen-cher da molécula fluorescente durante a extensão. A separação do fluoróforo do quencher resulta em um aumento da intensidade da fluorescência, assim, durante o processo de amplificação a emissão de luz é aumentada de forma exponencial e lida pelo equipamento 2.

Nas técnicas de amplificação de sinal, os genomas virais são primeira-mente hibridizados em um suporte, por meio de sondas de captura. Em seguida, o sinal emitido pelos híbridos é ampli-ficado para detecção e quantificação.

No sistema de Captura Híbrida, o DNA é hibridizado com sondas es-pecíficas de RNA para criar híbridos RNA-DNA. Os híbridos são captura-dos em uma fase sólida revestida com anticorpos específicos para capturar híbridos RNA-DNA, e são detectados com múltiplos anticorpos (resultando em amplificação do sinal), conjugados a um sistema de revelação com base

em quimioluminescência 3,4.

No teste de branched DNA (bDNA), os genomas virais são especificamente capturados em um suporte sólido por hibridização com sondas de oligonu-cleotídeos. Sondas amplificadoras são adicionadas ao sistema, ocorrendo hi-bridização com as moléculas de DNA/RNA imobilizadas nos micropoços. Uma nova sonda pré-amplificadora é adicionada ao complexo bDNA. A amplificação do sinal é alcançada pela utilização de inúmeras sondas que hibridizam ao complexo bDNA, a somatória de sinais emitidos pelas son-das gera uma proporcionalidade entre a densidade ótica obtida na reação. A detecção é baseada na emissão de qui-mioluminescência catalisada fosfatase alcalina a partir de um substrato. A quantificação é baseada em uma curva padrão gerada simultaneamente com padrões conhecidos 3,4.

A análise da seqüência do genoma viral visa identificar as seqüências de identidade e/ou substituições de amino-ácidos em posições específicas. Na prá-tica, as seqüências são utilizadas para classificar as cepas virais em grupos filogenéticos de interesse clínico (ge-nótipos) e substituições de aminoácidos conhecidos que podem estar associados com a resistência à terapia 2.

A técnica de seqüenciamento con-siste na amplificação de parte do geno-ma viral pela PCR. Na continuidade da

O Brasil é classificado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um País com elevada prevalência para as hepatites B e Delta (D), particularmente na região da Amazônia Legal.Fonte: Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI)

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Especial de Capa / Pesquisa Clínica

reação, estes produtos são preparados a partir de uma nova amplificação e puri-ficação para leitura nos equipamentos de seqüenciamento. A quantidade de DNA e a alta pureza destes produtos são essenciais para o sucesso da reação. A leitura de ambas as fitas, positiva e negativa, é essencial para resolver pos-síveis ambigüidades durante a avalia-ção dos resultados. O seqüenciamento direto é o padrão-ouro para a análise da seqüência genômica. As seqüências fornecidas pelos equipamentos devem ser analisadas e para tal dispõe-se de bancos de dados internacionais que são acessíveis para consultas e simultane-amente funcionam como captação e centralizadores de seqüências. 2,3,4

O seqüenciamento direto é uma técnica trabalhosa e somente está dis-ponível em laboratórios especializados. Em função disso, técnicas alternativas foram desenvolvidas para uso clíni-co de rotina. A mais utilizada destas técnicas alternativas é a hibridização reversa. A hibridação reversa, descrita por Lieven Stuyver e cols. em 1993, emprega fitas de nitrocelulose, em que estão imobilizadas sondas de oligo-nucleotídeos complementares a cada tipo/subtipo específicos do vírus. Estas fitas são hibridizadas em condições de alta estringência com produto da PCR marcados com primers biotinilados no processo de amplificação. Após a hibridação, um conjugado de avidina possuirá a função de ligar-se ao híbrido biotinilado. O substrato proporcionará a formação de um produto colorido que irá precipitar-se na fita e revelar o tipo viral presente na amostra 5.

Hepatite B

O HBV é um vírus hepatotrópico da família Hepadnavirus, de aproxi-madamente 42 nm de diâmetro, com um nucleocapsídeo icosaédrico (27 nm) que contém o antígeno do core da hepatite B (HBcAg), envolto por

um envelope viral composto de proteínas, lipídeos e carboidratos. O HBcAg é um antígeno intracelular insolúvel que não é detectado no soro. Exposto sobre a superfície do envelope está um mosaico de glico-proteínas conhecido coletivamente como HBsAg (antígeno de superfí-cie). O genoma do HBV é uma fita dupla parcial de DNA circular com aproximadamente 3.200 pares de base e apresenta 4 ORFs que codifi-cam as diferentes proteínas do vírus. Um antígeno viral adicional, embora não seja um componente estrutural, aparece no soro durante o curso da infecção pelo HBV e é conhecido como antígeno e (HBeAg) 6.

Tabela 1 - Marcadores sorológicos e virológicos para HBV

HBsAg Indicador de infecção pelo HBV (aguda e crônica)

HBeAg Indica alto nível de replicação e infectividade. Marcador de resposta ao tratamento

HBV DNA Indica o nível de replicação do HBV. Marcador primário de resposta ao tratamento

Anti-HBc (IgM) Infecção aguda pelo HBV. Também encontrado na ocorrência de Flare na infecção crônica

Anti-HBc (IgG) Indica infecção crônica pelo HBV ou paciente curado

Anti-HBsIndica imunidade contra o HBV. É encontrado em pacientes curados ou vacinados (os títulos podem ser medidos para garantir a eficácia da vacinação)

Anti-HBe Indica baixo nível de replicação e infectividade. Marcador de resposta ao tratamento

Anti-HBc (IgG) e anti-HBs Indica infecção passada pelo HBV

Anti-HBc (IgG) e HBsAg Indica infecção crônica pelo HBV

Anti-HBc (IgG) e/ou anti-HBs e HBV DNA Infecção latente ou oculta

Tabela 2 - Principais testes qualitativos e quantitativos utilizados na hepatite B

Ensaio Fabricante Técnica Limite detecção Intervalo de quantificação (UI/mL)

Ultra Sensive HBV Digene

Hybrid Capture IIDigene Corp Captura Híbrida 4.700 cópias/mL 4.700-57.000.000 cópias/mL

Amplicor HBV Monitor Roche PCR manual 1.000 cópias/mL 1000-4.000.000 cópias/mL

Cobas Amplicor HBV Monitor Roche Semiaut PCR 200 cópias/mL 200-200.000 cópias/mL

Versant HBV DNA Assay Siemens MSD Semiaut. bDNA 700.000 eq.genoma/mL 700.000-5.000.000.000

eq.genoma/mL

A resposta imune em portadores do HBV imunocompetentes, cedo ou tarde, leva à produção dos correspon-dentes anticorpos contra os antígenos virais que são: anti-HBc, anti-HBe e o anti-HBs. Todos os antígenos e anticorpos podem ser identificados e utilizados no diagnóstico, durante o curso da infecção pelo HBV 6.

Os principais marcadores soro-lógicos e virológicos para o HBV estão indicados na Tabela 1.

Os principais testes qualitativos e quantitativos utilizados no diag-nóstico e manejo da hepatite B são sumarizados na Tabela 2.

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60 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

Especial de Capa / Pesquisa Clínica

Hepatite C

O VHC é um vírus da família Fla-viviridae. É um vírus envelopado com um diâmetro variando de 55 a 65 nm. O genoma viral é constituído por uma fita simples e de sentido positivo de RNA com aproximadamente 9,6 kilobases, divididos em uma região estrutural (core e envelope E1 e E2) e não estrutural (p7, NS2, NS3, NS4a, NS4b, NS5a e NS5b). Os HCVs estão divididos em seis tipos virais e diversos 5, 7.

O diagnóstico da hepatite C, roti-neiramente utilizado desde o início dos anos 1990, é realizado pela pesquisa de anticorpos anti-VHC que emprega antí-genos recombinantes do HCV derivados do core, NS3, NS4 e NS5 e apresenta alta sensibilidade e especificidade 7. Outro teste sorológico utilizado no diag-nóstico da infecção pelo VHC é o ensaio de immunoblot recombinante (RIBA),

Carlos Eduardo de Melo é graduado em farmácia pela Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF/USP), mestre em ciências médicas pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Atualmente é coordenador na área técnica do Laboratório de Hepatites Virais LIM-47 do Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da FMUSP.

Referências Bibliográficas

1. Rehermann B, Nascimbeni M. Immunology of hepatitis B virus and hepatitis C virus infection. Nat Rev Immunnol 2005; 5:215-29.2. Pawlotsky JM. Molecular diagnosis of viral hepat i t is . Gastroenterology. 2002;122(6):1554-68.3. Mangia A, Antonucci F, Brunetto M, Capobianchi M, Fagiuoli S, Guido M et al. The use of molecular assays in the management of viral hepatitis. Dig Liver Dis. 2008;40(6):395-404.4. Cavalheiro NP. Diagnóstico laboratorial da hepatite viral C. In: Araújo ES, Barone AA, editores. Hepatite C. 1ª Ed. São Paulo: Manole; 2010. p.76-90.5. Scott JD, Gretch DR. Molecular diagnostics of hepatitis C virus infection: a systematic review. JAMA. 2007 Feb 21;297(7):724-32.6. Liang TJ. Hepatitis B: the virus and disease. Hepatology. 2009;49(5 Suppl):S13-21.7. Ferreira-Gonzalez A, Shiffman ML. Use of diagnostic testing for managing hepatitis C virus infection. Semin Liver Dis. 2004;24 Suppl 2:9-18.

Tabela 3 - Principais testes qualitativos utilizados na hepatite C crônica

Ensaio Fabricante TécnicaLimite detecção

(UI/mL)Amplicor™ HCV 2.0 Roche Semiaut. RT-PCR 50

Real Time HCV Abbott Diagnostics Real Time 12 a 30

Cobas Taqman™ HCV Roche Semiaut. RT-PCR 15

Versant HCV RNA TMA Siemens MSD TMA 5 a 10

que foi desenvolvido como um teste para confirmar a infecção pelo vírus em indivíduos com teste para anti-VHC 7.

O diagnóstico é confirmado por métodos moleculares como PCR, TMA, bDNA e Real-Time PCR 2,5. Estes métodos também são utilizados no acompanhamento de terapia. Os principais testes qualitativos e quan-titativos utilizados no diagnóstico e manejo da hepatite C crônica são sumarizados nas Tabelas 3 e 4.

A identificação do genótipo viral é realizada por hibridização reversa (INNO-LIPA HCV II, Innogenetics, Siemens Medical Solutions Diagnostics, Tarrytown, NY, USA) ou por técnicas de seqüenciamento direto dos nucleotídeos que compõem o RNA viral (TRUGE-NE-SIEMENS HCV 5’NC Genotyping Kit, Siemens Medical Solutions Diag-nostics, Tarrytown, NY, USA) 4.

Tabela 4 - Principais testes quantitativos utilizados na hepatite C crônica

Ensaio Fabricante TécnicaLimite detecção

(UI/mL)Intervalo de quantificação

(UI/mL)Amplicor HCV Monitor v2.0 Roche Manual RT-PCR 600 600-850.000

Cobas Amplicor HCV Monitor v2.0 Roche Semiaut.

RT-PCR 600 600-850.000

LCx HCV RNA Quantitative Abbott Diagnostics Semiaut.

RT-PCR 25 25-2.630.000

Versant HCV RNA 3.0 Assay Siemens MSD Semiaut.

bDNA 615 615-7.700.000

Cobas Taqman HCV Test Roche Semiaut.

Real Time PCR 43 43-69.000.000

Abbott Real Time Abbott Diagnostics Semiaut.Real Time PCR 12 12-100.000.000

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62 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

Especial de Capa / Nutrição

fígado exerce papel central na manipulação e na metabolização dos nutrientes 1. As principais funções envolvem a formação da bile, a glico-

gênese e a glicogenólise, a gliconeogênese, a síntese de uréia, o metabolismo do colesterol, o armazenamento de ferro, as vitaminas lipossolúveis e B12, a síntese de proteínas plasmáticas e o processador de xenobióticos 2.

Diante da heterogenicidade funcional do fígado, o dano hepatocelular pode comprometer a estrutura hepáti-ca, a capacidade funcional dos hepatócitos e a circulação portal, com instalação de quadro clínico característico e Desnutrição Energético-Proteica (DEP) nos casos mais avançados de doenças hepáticas crônicas 2.

O termo Doença Hepática Crônica (DHC) compreende

a hepatite, a cirrose e a insuficiência hepática 2.

Dentre as várias doenças infectocontagiosas, as hepa-tites virais são reconhecidas como um grave problema de saúde pública, atingindo milhares de indivíduos, especial-mente em países pouco desenvolvidos. Atualmente, há pelo menos cinco vírus identificados como os principais causadores da hepatite: vírus A (HAV), vírus B (VHB), vírus C (VHC), vírus D (HDV ou Delta) e vírus E (HEV) 3. No Quadro 1 são observadas as principais características dos diversos tipos de hepatites.

Nutrição nas HepatopatiasMaíra Branco Rodrigues e Cláudia de Fátima Gomes Teixeira

Quadro 1 - Características principais das hepatites

Tipo de Hepatite Características

Hepatite ACausada pelo vírus A, possui período médio de incubação de 28 dias, transmissão feco-oral, não evolui para cronicidade;

Hepatite BCausada pelo vírus da hepatite B, possui período de incubação de 60 a 180 dias, transmissão parenteral, sexual ou vertical, entre 5 a 10% dos casos evolui para cronicidade;

Hepatite C

Causada pelo vírus da hepatite C, possui período de incubação de 30 a 120 dias, transmissão parenteral, as vias sexual ou vertical parecem ser pouco importantes, entre 70 a 80% dos casos evolui para cronicidade;

Hepatite D

Causada pelo vírus da hepatite Delta, possui período de incubação de 60 a 180 dias, transmissão parenteral, ocorre de forma simultânea à hepatite B ou em portadores crônicos da mesma, evolução para cronicidade é muito comum na superinfecção e pouco freqüente na co-infecção;

Hepatite ECausada pelo vírus da hepatite E, possui período de incubação de 30 a 60 dias, transmissão feco-oral, não evolui para cronicidade;

Hepatite auto-imune

Possui etiologia pouco definida, acomete crianças e adultos jovens, principalmente do sexo feminino, podendo causar graus variados de hepatopatia, inclusive cirrose hepática descompensada;

Hepatite alcoólicaUma das doenças hepáticas causadas pelo consumo abusivo de álcool, representa lesão grave do fígado, com elevada mortalidade.

fonte: Referências Bibliográficas 4, 5, 6

O

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Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010 63

Especial de Capa / Nutrição

Anúncio

para fora do fígado e é representada por esplenomegalia, circulação cola-teral e varizes esofágicas 7.

A sobrevida do paciente cirrótico apresentando complicações é de um a cinco anos. No entanto, se houver

Complicações

A cirrose hepática é o estágio ter-minal da doença hepática crônica e é acompanhada de alterações macro e microscópicas, com lesão hepatocelu-lar e necrose dos hepatócitos, colapso da reticulina e fibrose resultante do processo cicatricial de regeneração nodular. O estágio inicial da cirrose pode ser assintomático e, com o desenvolvimento das complicações, resulta em insuficiência hepática e hipertensão portal. A insuficiência hepática causa icterícia, encefalopa-tia hepática, ascite, baixa albumina sérica, alargamento do tempo de pro-trombina não corrigido por vitamina K, insuficiência renal e infecções. A hipertensão portal, síndrome ca-racterizada por aumento dos níveis pressóricos do sistema porta hepático, acarreta em desvio do sangue portal

Quadro 2 - Classificação de Child-Pugh

Medidas Clínicas e Laboratoriais

Pontuação para anormalidade crescente1 2 3

Encefalopatia (grau) Nenhuma 1-2 3-4

Ascite Nenhuma Leve ou controlada por diuréticos

Pelo menos moderada, apesar do tratamento com diuréticos

Tempo de protrombina (prolonga-mento em segundos) OU <4 4-6 >6

Relação normalizada internacional (INR) <1,7 1,7-2,3 >2,3

Albumina (g/dL) >3,5 2,8-3,5 <2,8

Bilirrubina (mg/dL) <2 2-3 >3

Grau A: 5-6 pontos; Grau B: 7-9 pontos; Grau C: 10-15 pontos

Fonte: Referência Bibliográfica 10

complicações graves como a Peritonite Bacteriana Espontânea (PBE) e ascite refratária, a sobrevida diminui para cer-ca de um ano. A avaliação da gravidade da doença hepática é realizada através do sistema de escore de Child-Pugh, conforme se observa no Quadro 2 8, 9.

Page 62: Revista Racine (Edição 117) - Hepatites Virais

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Especial de Capa / Nutrição

A encefalopatia hepática, síndrome clínica que se desenvolve na hepatopatia avançada, ocorre a partir da ruptura da barreira hematoencefálica por meio da ação de substâncias tóxicas presentes no sangue. A falha do fígado impede a desintoxicação da amônia em uréia, sen-do a amônia uma toxina cerebral direta. Existem quatro estágios de progressão da encefalopatia, sendo:I. Transtorno de sono, falta de atenção, confusão leve,

irritabilidade;II. Desorientação, comportamento impróprio, letargia,

tontura;III. Sonolência, agressividade, confusão, fala incom-

preensível;IV. Coma 9.

Avaliação nutricional

A doença hepática aguda raramente está associada a alterações significativas do estado nutricional. No entanto, nos pacientes com doença hepática crônica, encontra-se freqüentemente a Desnutrição Energético-Protéica (DEP). A prevalência e a gravidade estão relacionadas diretamen-te ao estágio clínico da doença hepática 11.

A DEP está presente em cerca de 20% dos pacientes com doença hepática compensada e acima de 60% nos indivíduos com doença hepática descompensada. Em pacientes submetidos a transplante hepático a DEP pode estar presente em 100% dos casos, sendo a desnutrição um importante fator de risco para a morbi-mortalidade após a cirurgia 2.

A avaliação do estado nutricional nos portadores de hepatopatia grave é complexa e controversa. Os parâme-tros utilizados como peso, circunferências, pregas cutâ-neas e albumina sérica, freqüentemente estão alterados por vários fatores típicos da doença. Para estes pacientes recomenda-se a combinação de métodos subjetivos e objetivos para o adequado diagnóstico nutricional, redu-zindo, assim, a margem de erro dos métodos utilizados 2, 12.

O exame físico deve considerar a presença de ascite, de edema e de sinais de deficiências nutricionais. Na presença de ascite e edemas, as avaliações que dependem do peso podem apresentar dificuldades de valor interpre-tativo. Portanto medidas antropométricas, como peso, circunferência da cintura, bioimpedância e IMC (índice de massa corpórea) são parâmetros insensíveis ou não aplicáveis devido a alterações corpóreas que ocorrem nestes pacientes e não permitem estimar a composição corporal de forma direta. A Circunferência do Braço (CB) e a Prega Cutânea Triciptal (PCT) podem ser utilizadas por sofrerem menos interferência perante edema e ascite nestes pacientes 1, 14.

Devido à limitação dos métodos objetivos de avaliação do estado nutricional dos pacientes hepatopatas a Avalia-ção Nutricional Subjetiva Global (ANSG) tem sido am-plamente utilizada. Quando combinada aos indicadores objetivos pode fornecer um diagnóstico nutricional mais preciso para o paciente hepatopata 2. A ANSG adaptada para candidatos a transplante hepático não apresenta pontuação e, por isso, não é utilizada na prática.

A Sociedade Européia de Nutrição Parenteral e Enteral (European Society for Clinical Nutrition and Metabolism/ESPEN) recomenda que os cálculos de necessidades energéticas e de macronutrientes sejam realizados com base no peso ideal na vigência de ascite e edema e, na ausência destes, a recomendação é que se utilize o peso atual do paciente 15, 16.

Necessidades nutricionais

Os pacientes com doença hepática toleram uma

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Especial de Capa / Nutrição

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dieta normal. A maioria dos pacientes não precisa de restrições dietéticas e podem até ser prejudicados por esta prática. Um padrão modificado de alimentação, com aumento do fracionamento e da redução do volume das refeições melhora a utilização de substratos em pacientes com cirrose hepática compensada 11.

Deve-se apresentar como meta primária a nutrição oral. Somente se as metas nutricionais individuais dos pacientes não forem atingidas mesmo com aconse-lhamento nutricional individualizado, deve-se utilizar suplementos orais, nutrição enteral ou parenteral 11. A alimentação por via oral deve ser sempre priorizada e, na prática, a combinação de mais de uma via de alimentação tem sido bem sucedida.

As recomendações de energia e de proteína nos pacien-tes hepatopatas variam de acordo com o tipo da doença e o estado nutricional do paciente 12.

Vale ressaltar que não existem motivos para restrição protéica até que surjam sinais de encefalopatia. Atu-

O fígado é o órgão responsável pelo processamento dos nutrientes absorvidos pela dieta e também participa da produção e síntese de nutrientes essenciais à vida, como as proteínas.Fonte: Centro Integrado de Terapia Nutricional -

www.citen.com.br

almente, não se indica restrição protéica na profilaxia e no tratamento da Encefalopatia Hepática (EH) 2, 12. Na ocorrência de EH deve ser alterada a qualidade da proteína, fornecendo uma dieta rica em Aminoácidos

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Especial de Capa / Nutrição

Maíra Branco Rodrigues é graduada em nutrição pelo Centro Universitário São Camilo, especialista nutrição clínica pelo GANEP Nutrição Humana, especialista em nutrição nas Doenças Crônico Não-Transmissíveis (DCNT) pelo Hospital Israelita Albert Einstein, especialista em atendimento multidisciplinar em geriatria e geronto-logia pelo Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Esta-dual (IAMSPE). Atualmente é nutricionista da Divisão de Nutrição e Dietética do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IC-HCFMUSP).

Cláudia de Fátima Gomes Teixeira é graduada em nutrição pela Universidade de Guarulhos (UNG), especialista em nutrição enteral e parenteral pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (SBNPE), especialista em administração hospitalar pelo HCF-MUSP. Atualmente é nutricionista da Divisão de Nutrição e Dietética do IC-HCFMUSP.

Referências Bibliográficas

1. Borges VC, Waitzberg DL, Silva AO, D’Albuquerque LAC, Camilo ME. Insuficiência Hepática Aguda e Crônica. In: Waitzberg D.L. Nutrição Oral, Enteral e Parenteral na prática clínica. 3. Ed. São Paulo: Atheneu, 2000.2. Mazza RPJ, Santana MLP, Oliveira LPM. Doença hepática crônica. In: Cuppari L. Nutrição nas doenças crônicas não transmissíveis. São Paulo: Manole, 2009.3. Matos CA, Silva ISS, Moutinho R, Ferraz MLCG. Epidemiologia das hepatites virais. In: Miszputen SJ. Gastroenterologia. 2.ed. São Paulo: Manole, 2007.4. Ferraz MLCG, Silva AEB. Hepatites virais - diagnóstico. In: Miszputen SJ. Gastroenterologia. 2.ed. São Paulo: Manole, 2007.5. Ferraz MLCG, Lemos LVB. Hepatite auto-imune. In: Miszputen SJ. Gastroenterologia. 2.ed. São Paulo: Manole, 2007.6. Parise ER, Oliveira AC, Carvalho L. Doença hepática alcoólica. In: Miszputen SJ. Gastroenterologia. 2.ed. São Paulo: Manole, 2007.7. Hasse JM, Matarese LE. Terapia nutricional para distúrbios do fígado, sistema biliar e do pâncreas. In: Mahan LK, Escott-Stump S. Alimentos, nutrição & dietoterapia. 11 ed, São Paulo: Roca, 2005. Cap. 31, p. 704 – 732.8. Mazza RPJ, Pereira CCA, Waitzberg DL. Doenças hepáticas. In: Cuppari L. Guias de medicina ambulatorial e hospitalar UNIFESP - Escola Paulista de Medicina: nutrição clínica no adulto. 2 ed. Barueri: Manole, 2005. Cap. 16, p. 313 – 348.9. Harris NG. Nutrição no envelhecimento. In: Mahan LK, Escott-Stump S. Alimentos, nutrição & dietoterapia. 11 ed, São Paulo: Roca, 2005. Cap. 13, p. 304 – 325.10. Davern TJ, Scharschmidt BF. Biochemical liver tests. In: Feldman M, Friedman LS, Sleisenger MH, eds. Sleisenger & Fordtran´s Gastrointestinal and liver disease: pathophisiology, diagnosis, management. 7 th ed. Philadelphia: Saunders, 2002:1227-38.11. Plauth M. Suporte nutricional na doença hepática. In: Sobotka L. Bases da nutrição clínica. 3.ed. Rio de Janeiro: Editora Rubio, 2008.12. Silva SMCS da, Mura JDAP. Tratado de Alimentação, Nutrição e Dietoterapia. São Paulo: Roca, 2007.13. Parolin MB, Zaina FE, Lopes RW. Terapia nutricional no transplante hepático. Arq. Gastroenterol., v. 39, n. 2, São Paulo, abr./jun, 2002. 14. Plauth M. et AL. ESPEN Guidelines on parenteral nutrition: hepatology. Clinical Nutrition 28 (2009) 436- 44.15. Plauth M. et AL. ESPEN Guidelines on enteral nutrition: liver diease. Clinical Nutrition 25 (2006) 285-94.

de Cadeia Ramificada (AACR). Não há evidências científicas da prevenção da ocorrência de EH com o uso de dietas ricas em AACR. No Quadro 3 observa--se as recomendações nutricionais nas diferentes fases da doença hepática.

Quadro 3 - Recomendações nutricionais

Situação clínicaRecomendação

energética (kcal/kg/dia)

Recomendação protéica

(g/kg/dia)

Hepatite aguda ou crônica 30-40 1-1,5

Cirrose compensado 30-40 1,2-1,5

Cirrose descompensado 40-50 1,2-1,8

Colestase 30-40 1-1,5

Encefalopatia hepáticaGrau I e IIGrau III e IV

25-4025-40

0,5-1,20,5 (Rica em AACR)

Transplante hepáticoPréPós

30-5030-35

1,2-1,751,0

Fonte: Referências Bibliográficas 15, 16, 1

A DEP e o balanço nutricional negativo são muito freqüentes em hepatopatas crônicos em decorrência da baixa ingestão alimentar, além de outros fatores. As-sim, ao invés de impor dietas restritivas que podem ser deletérias, a terapia nutricional deve garantir a oferta de nutrientes, visando a adequação e manutenção do estado nutricional.

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Especial de Capa / Psicologia

Reflexões Acerca do Paciente com Hepatite e Atuação do Psicólogo Lia Maria Britto da Silva

Se a chance de possuir as formas mais diferentes entre si de hepatites é diretamente proporcional ao modo-de-vida, até que ponto este modo de vida não deve ser ajustado para melhor nos servir?Fonte: Portal do Hospital dos Servidores do Estado (HSE) do Rio de Janeiro

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Especial de Capa / Psicologia

ste breve artigo pretende apre-sentar reflexões acerca do paciente com hepatite e os as-

pectos psicológicos envolvidos, consi-derando o sofrimento, as fantasias e os medos que estes pacientes apresenta, assim como a atuação do psicólogo com o paciente e com a equipe.

Diante da doença hepatite, apesar dos importantes avanços ocorridos nos últimos anos referentes ao diag-nóstico, à avaliação, à prevenção e ao tratamento da doença, ainda hoje existe carência de literatura sobre os aspectos psicológicos relacionados aos pacientes de hepatite(s). É neces-sário desenvolver e ampliar as formas de atendimento ao portador do vírus da hepatite (OMS apud Súmula, 2001). Abranger os aspectos psico-lógicos no tratamento da hepatite é de extrema importância para uma adequada adesão ao tratamento e para propiciar que o paciente lide com sua doença de uma maneira menos sofrida e menos angustiante.

O indivíduo com hepatite carrega consigo não somente um vírus, mas também um discurso a respeito da hepatite. Este discurso é constituído das informações científicas a respeito da doença, das informações “pouco científicas”, ou seja do que o paciente ouviu falar ou leu em algum lugar etc., assim como por todas as fantasias, as crenças e as idéias deste indivíduo sobre a hepatite, os preconceitos, os afetos, as dúvidas e muito mais.

Vive-se em uma sociedade na qual pouco se fala sobre o adoecer, pois a mesma palavra sugere a idéia de fracasso do corpo, de fragilidade e de vulnerabilidade. Adoecer comumente-mente traz a idéia da morte. Adoecer pode ser vivenciado como um trauma, como uma intrusão da realidade exter-na, que pode gerar um desequilíbrio em todos os sentidos e nos aspectos na

E vida do indivíduo. Como falar sobre sua doença, como lidar com as ques-tões provenientes deste adoecer? O indivíduo apresentará muitas dificul-dades para lidar com esta questão que necessitam ser avaliadas e trabalhadas psicologicamente.

A hepatite é uma doença que evolui lentamente demorando, em alguns casos, o aparecimento dos sintomas. Pode evoluir de forma assintomática, aguda ou crônica. A hepatite faz com que o paciente con-viva com a doença mesmo sem que se sinta doente, quando se encontra assitomático. Como lidar com isto? Como se relacionar com essa doença, com o médico, com o tratamento?

Entende-se por tratamento a eli-minação dos sintomas quando eles aparecem, assim como a busca da cura, ou seja, da eliminação do vírus no organismo. Mas o paciente de hepatite necessita de muito mais do que isto. Muitos pacientes, após o recebimento do diagnóstico, se sentem inseguros e com medos referentes ao seu futuro e à sua vida. O diagnóstico de uma doença crônica como a hepatite afeta todos os aspectos da vida de um indivíduo, acar-retando mudanças físicas, alterações nas atividades da vida diária, sociais, familiares e profissionais, que podem ser intermitentes ou permanentes. O

indivíduo questiona sobre como irá viver e como será daquele momento em diante. Torna-se fragilizados pelo grande impacto do diagnóstico, o que provoca profundas modificações na vida do indivíduos. Neste momento, muitas vezes vivencia-se uma “quebra” na existência do indivíduo, o que exige que ele se adapte a uma nova realidade e a uma percepção de si no mínimo inesperada: aquele que ora estava são e agora não mais está. Ao se deparar com sua nova condição, passa a vivenciar o sofrimento físico e emocional.

O paciente não sente nada na fase assintomática, mas ao receber o diagnóstico sabe que está doente e que mesmo sem sentir nada necessita modificar alguns ou muitos hábitos, o que não é nada fácil e gera muito so-frimento. Muitos questionam se devem ou não contar para alguém que foram contaminados com o virus em algum momento de sua vida, se devem contar para um novo pretendente amoroso, para o parceiro(a) atual, para a esposa/namorada ou para o marido/namorado, ou se devem avisar no trabalho. Muitos temem perder seu atual relacionamento ou não conseguirem um novo relacio-namento amoroso. Alguns temem per-der o emprego e/ou não conseguirem ser empregados novamente. Outros imaginam que perderão suas amizades, o que indica muitas fantasias, medos,

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Especial de Capa / Psicologia

incertezas e dúvidas. Há necessidade, neste momento, de uma intervenção psicológica.

Na fase do tratamento medicamentoso (medicamento utilizado - Interferon (IFN) alfa ou Interferon (IFN) alfa peguilado e ribavirina), sob os possíveis e variáveis efeitos colaterais da medicação (fadiga, dores de cabeça, depres-são, instabilidade de humor, irritação, perda de apetite, insônia, dentre outros), o paciente apresenta receio de como será com ele esta fase, se desenvolverá estes sinto-mas ou não, pois os mesmos podem variar de indivíduo para indivíduo. É interessante salientar, entretanto, que não são todos os pacientes tratados com IFN que apresentam sintomas psicológicos ou todos sintomas psicológicos ou um diagnóstico de transtorno psiquiátrico associado à utilização do medicamento.

Neste sentido, a comunicação do médico preferencial-mente e/ou de outro profissional capacitado da equipe de saúde com o paciente é muito importante para aliviar este sofrimento, esclarecendo as dúvidas, trazendo dados reais e científicos, fortalecendo a adesão ao tratamento e permi-tindo um espaço para que sejam manifestadas as fantasias, os medos etc., propiciando um olhar atento ao indivíduo.

O psicólogo possui atuação muito importante neste sentido, pois muitas vezes ele é quem exerce o papel fun-damental de facilitador desta comunicação entre o paciente e o médico/profissional de saúde, além de lidar com toda essa bagagem emocional presente em cada um desses pacientes, auxiliando o restabelecimento e elaboração psíquica do mesmo. Assim, psicólogos são solicitados a avaliar estes pacientes antes do início e durante o trata-mento, para monitorar sintomas psicológicos e intervir se necessário, além de atendê-los em psicoterapia.

Conclusão

O mundo humano perde de vista a condição humana, esquece-se, por exemplo, de que em algumas situações de sofrimento o indivíduo precisa de atenção. Atenção é uma possibilidade de se estar frente ao outro e se deixar afetar pelo outro, de ouví-lo e de responder a ele. A atenção exige tempo! O ser humano necessita da linguagem solidária, mas também precisa de tempo em atenção. O tempo e a atenção curam.

O acompanhamento psicoterápico muitas vezes se constitui como o espaço no qual o indivíduo encontra acolhimento, escuta diferenciada e especializada, com-preensão e possibilidade de re-significação para todos os aspectos do adoecimento promovido pela hepatite.

Lia Maria Britto da Silva é graduada em psicologia pela Facul-dade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), especialista em psicologia clínica pelo Conselho Regional de Psicologia de São Paulo (CRP-SP) e em psicologia hospitalar pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). Atualmente é psicóloga da Divisão de Clínica de Moléstias Infecciosas e Parasitárias do HCFMUSP e psicoterapeuta. Email:[email protected].

Referências Bibliográficas

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72 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

Especial de Capa / Serviço Social

Introdução

Ao falar-se em hepatite deve-se pensar no paciente com uma visão globalizada, inserido-o em um contexto, pois segundo a Lei Orgânica da Saúde nº 8080/90 a saúde possui como fatores determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, o trans-porte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais. Os níveis de saúde da população expressam a organização social e econômica do país.

Baseado nessas premissas, o serviço social deve-se pautar em três pontos principais para o atendimento. O primeiro refere-se ao levantamento dos dados dos pacien-tes atendidos para que haja uma visão mais ampliada da vida do mesmo. O segundo ponto é o entendimento dos recursos da comunidade para colaborar no acesso aos bens e serviços. O terceiro ponto é o entrosamento com a equipe multidisciplinar exercendo um papel de articulador entre paciente e equipe.

O paciente portador do vírus da hepatite pode passar

Aspectos Sociais das Hepatites: Abordagem MultiprofissionalMaria Helena Dobarco Raposeiras

por etapas distintas da doença, devendo o assistente social estar atento e orientar sobre as possíveis dificuldades que podem surgir em cada uma das etapas. Desta forma, o profissional do serviço social pode colaborar com a equipe na orientação dos direitos sociais, objetivando a continui-dade do tratamento e que este ocorra de forma tranqüila, diminuindo os fatores de estresse que contribuem para a desorganização da vida do paciente, como a perda do emprego, a queda da renda familiar, entre outros.

Na fase assintomática da doença, deve-se refletir com o paciente sobre a importância da continuidade de suas atividades, pois muitas vezes a discriminação interfere até mesmo na perda do emprego e, conseqüentemente, nas condições socioeconômicas da família. Na fase sintomática é necessário que os direitos dos pacientes sejam mantidos, visando uma melhor qualidade de vida e aderência ao tratamento.

Outro ponto importante da atuação do assistente social é a relação direta com os recursos da comunidade reali-zando a interação com outras instituições e facilitando, de acordo com a situação apresentada, meios que possam

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Especial de Capa / Serviço Social

assegurar a universalidade do acesso ao Sistema Único de Saúde (SUS), à outras políticas sociais e/ou setoriais como os benefícios de transferência de renda, encaminhamento para solicitação de transporte, sempre respeitando a condição de saúde do paciente e as necessidades do mesmo.

Objetivos

O objetivo do trabalho do ser-viço social é identificar e intervir nos problemas psicossociais. Para a realização deste trabalho, o as-sistente social realiza entrevista individual com formulário próprio chamada de relatório social. Neste, aborda vários aspectos como dados de identificação, familiares, trabalho, renda, habitação, previdenciário, en-tre outros. Os encaminhamentos são realizados pelos membros da equipe e as solicitações são diversas como: orientação sobre direitos, solicitação de transporte e etc.

Com relação à equipe multidisci-plinar o assistente social utiliza-se do seu conhecimento e linguagem para interpretar as problemáticas apresen-tadas pelos pacientes e ou familiares, contribuindo para a diminuição dos conflitos que podem surgir pela má interpretação ou falta de dados para um entrosamento adequado entre a equipe e o paciente.

O profissional de serviço social contribui para que suas ações garan-tam a aplicação de princípios básicos da Lei Orgânica da Saúde, conforme o Artigo 7, que são: a integralidade da assistência, a preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral, a igualdade de assistência, o direito a informação sobre sua saúde, a di-vulgação de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e sua utilização pelo usuário.

Portador do vírus da hepatite

O portador do vírus da hepatite pode não apresentar sintomas da doença e estar perfeitamente apto ao trabalho. Muitas vezes, des-cobre-se que é portador por meio de exame de sangue realizado em bancos de sangue.

Situação freqüente para a qual os pacientes buscam orientação está relacionada ao sigilo sobre o diag-nóstico da doença e se é obrigatório

contar sobre a infecção pelo vírus para evitar os riscos de contamina-ção para os demais indivíduos. É importante esclarecer sobre as vias de contaminação e sobre a necessi-dade de serem obedecidas às normas universais de biossegurança. Não há contágio nas relações sociais e estar infectado não significa limitação para o trabalho. Caso possua problemas de saúde que o impeçam de exercer determinada atividade, a situação deverá ser analisada e encaminhada a Previdência Social. Caso contrário, o paciente deve ser readaptado a nova função, pois ser portador de hepatite assintomático não gera incapacidade para o trabalho.

Neste momento é muito impor-tante o processo de aconselhamento sobre a doença, as formas de pre-venção e a manutenção da saúde. O assistente social deve estar atento e perspicaz às necessidades do usuário e orientar quanto à manutenção dos direitos sociais que possam interferir futuramente no suporte ao tratamento conforme a evolução da doença. Ao transmitir tais informações é necessá-rio que não se repasse orientações em demasia para os pacientes que ainda não estão preparados para recebê-las naquele momento.

Portador sintomático do vírus da hepatite

Nesta etapa da evolução da do-ença o paciente possui direitos que são importantes para a manutenção da saúde e, em alguns casos, podem garantir a continuidade do trata-mento. Assim, alguns pacientes que estão tomando medicamento, por exemplo, podem recorrer a direitos sociais como:• Direitos previdenciários: O auxílio-

doença é um benefício concedido ao segurado impedido de trabalhar por motivo de doença ou de aciden-

Uma em cada 12 pessoas no mundo está vivendo com hepatite crônica B ou C.Fonte: World Hepatitis Alliance -

www.worldhepatitisalliance.org

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Especial de Capa / Serviço Social

te por mais de 15 dias;• Direitos Trabalhistas: Seguro-desemprego e bilhete do

trabalhador desempregado (Companhia do Metropoli-tano de São Paulo - Metrô);

A atuação do assistente social nesta fase é realizar a avaliação socioeconômica do paciente e encaminhá-lo, de acordo com a demanda apresentada, para programas de transferência de renda (Bolsa Família, Renda Cidadã, Bolsa Escola, Benefício de Prestação Continuada, entre outros), para recursos da comunidade, transporte, forne-cimento de recursos materiais para manutenção de suas condições mínimas de vida.

Portador do vírus da hepatite com hepatopatia grave

A hepatopatia grave é a forma mais grave da doença e alguns pacientes podem ser indicados para transplante de fígado. Podem apresentar graves limitações para ativida-des cotidianas e, muitas vezes, tornam-se dependentes de outros indivíduos para continuidade do seu tratamento. O profissional de serviço social possui trabalho mais intenso neste período, pois existem mais alterações na vida do paciente influenciando em vários aspectos, como trabalho, renda, alimentação e transporte.

Os direitos sociais mais importantes são:• Auxílio-doença;• Aposentadoria por invalidez: Benefício concedido

àqueles que, por motivo de doença ou de acidente, foram considerados incapazes pela perícia médica da Previdência Social a exercer suas atividades laborais;

• Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS): Poderá ser retirado em casos de aposentadoria, de invalidez permanente, de acometimento de neoplasia maligna (ou possuir dependente com neoplasia), de estágio terminal de doença grave, mediante atestado médico com Código de Doenças (CID), hepatopatia grave também com diagnóstico de aids.

• Programa de Integração Social (PIS): Poderá ser re-tirado nas condições de aposentadoria, de invalidez permanente, por neoplasia maligna do titular ou do dependente. Além destes requisitos também possuem direito àqueles que recebem o Benefício Assistencial à Pessoa Portadora de Deficiência e ao Idoso.

• Tratamento Fora de Domicílio (TFD): Segundo a Portaria da Secretaria de Assistência a Saúde (SAS) nº 055/1999, o paciente poderá requerer, junto às Secre-tarias Municipais e Estaduais de Saúde, quando não houver em sua localidade o tratamento indicado pelo

médico, necessitando o deslocamento para outro centro de referência conveniado ao Sistema Único de Saúde (SUS). O TFD garante ajuda de custo para transporte, hospedagem e alimentação.

• Isenção Tarifária nos Transportes Coletivos: Concedida no caso de hepatopatia grave, somente se o paciente apresenta encefalopatia, inclusive com isenção para o acompanhante.

Conclusão

Para que o assistente social informe oriente ou desenvolva ações junto aos pacientes com hepatite, assintomáticos ou sintomáticos, é importante que este profissional possua conhecimento prévio sobre o diag-nóstico e fique atento para a evolução, pois para cada fase existem orientações específicas, e nem todos os pacientes apresentam a mesma forma de desenvolvi-mento da doença.

Assim, as demais orientações/informações podem estar atreladas a outras situações que devem ser avalia-das detalhadamente pelo profissional.

Maria Helena Dobarco Raposeiras é graduada em serviço social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), especialista em saúde pelo Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP). Atua como assistente social há 22 anos no HCFMUSP e atualmente é encarre-gada na Divisão do Serviço Social Médico do HCFMUSP.

Referências Bibliográficas

Lei Orgânica da Saúde - 1990 - Artigo 3. <www.previdenciasocial.gov.br> <www.caixa.gov.br>

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Introdução

As hepatites virais são um grave problema de saúde pública no Brasil e no mundo, apresentam transmissão inter-humana podendo ter evolução aguda e/ou crônica. Estas infecções compreendem um conjunto de vírus hepatotrópicos, identificados por le-tra do alfabeto. Os vírus da hepatite conhecidos são A, B, C, D e E, e há outros vírus hepatotrópicos que estão sendo identificados, tais como a he-patite pelo vírus G1 e recentemente o vírus TTV e SEN-V2, que diferem na etiologia, nos aspectos epidemio-lógicos e na evolução clínica.

Portanto, a hepatite viral crônica é uma doença que pode apresentar desde formas assintomáticas ou sin-tomáticas com evolução grave, como a hepatite fulminante. As manifesta-ções clínicas ocorrem com maior fre-qüência na fase aguda do que na fase crônica, geralmente acompanhadas de manifestações auto-imunológicas.

Enfermagem e a Abordagem Multiprofissional na Hepatite CMarisa do Nascimento

Atuação da enfermagem

A enfermagem desempenha pa-pel fundamental desde o diagnóstico da hepatite até o acompanhamento durante o tratamento, sendo de extrema importância na pré e pós--consulta de enfermagem. Após o diagnóstico da hepatite, o paciente necessita ser orientado sobre a do-ença e seu acompanhamento, sendo a pós-consulta o início do vínculo desse paciente com o serviço.

As hepatites B e C apresentam notificação compulsória no Brasil, cujo formulário pode ser preenchido pelos médicos ou enfermeiros.

Durante o tratamento, realiza-se, na pré-consulta, a verificação de sinais vitais, a mensuração de peso e de altura e os parâmetros impor-tantes para o tratamento, pois a dose do medicamento será administrada conforme o peso do indivíduo, indi-cador fundamental para o ajuste da

Especial de Capa / Enfermagem

dose ao longo do tratamento.

Na pós-consulta o paciente recebe da enfermagem todas as orientações sobre os exames laboratoriais e radio-lógicos, o preparo e a administração do medicamento e seus efeitos colaterais, bem como sobre a maneira correta de descartar as seringas e as agulhas.

Os pacientes que fazem a auto- aplicação utilizando seringas e agu-lhas são orientados a descartarem os objetos em um recipiente duro (por exemplo, em embalagem tetrapak) para que não ocorram acidentes com material biológico, podendo transmi-tir a doença a outros indivíduos.

No serviço de atendimento as-sistido, o hospital dia, o diagnós-tico de enfermagem é importante na observação das manifestações indesejáveis, que necessitam anteci-pação de atendimento médico para continuidade da aplicação ou sua interrupção.

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Especial de Capa / Enfermagem

Gráfico 1 - Fluxograma da rotina do ambulatório de hepatite C

Figura 1 - Locais para aplicação do medicamento

Ambulatório de

Moléstias Infecciosas

Agendamento do retorno

Enfermagem - Pré-consulta

Equipe médica

Enfermagem - Pós-consulta

Psicólogo

Assistente social

Tratamento

O Ministério da Saúde, por meio da Portaria nº 34/2007/SVS/MS em vigência, preconiza como indicação de tratamento para hepatite o Interfe-ron convencional (IFNC), o Interfe-ron pequilado (PEG) e a Ribavirina (RBV), sendo a dose individualizada de acordo com o peso do cliente.

O tratamento para hepatite viral crônica acarreta muitos efeitos co-laterais que podem oscilar ao longo do período tais como: hipertermia, mialgias, distúrbios psiquiátricos, anemia, plaquetopenia, neutropenia, doenças dermatológicas, tireoide-opatias, emagrecimentos, alopecia, anorexia, dor abdominal e outros. De acordo com os efeitos colaterais dos medicamentos, há necessidade da abordagem multiprofissional do tratamento da hepatite viral crônica.

É importante que seja realizado rodízio dos locais de auto-aplicação. Na Figura 1 estão representados os principais locais do corpo que podem ser utilizados para a auto-aplicação.

Locais de auto-aplicação

Locais para outra pessoa aplicar

Diagnóstico de enfermagem na hepatite

Os principais diagnósticos de enfermagem na hepatite C são sa-lientados individualmente, através do padrão de resposta humana, como exemplificado no Quadro 1.

Diagnóstico de enfermagem Característica definidora Fatores relacionados

“Trocar”Risco para temperatura corporal alterada

Acima da faixa normal (37,8 ºC medida oral, e 38,8º C retal)

Relacionado a viremia

Nutrição alterada Perda de pesoAnorexia, vômito, desejo de comer reduzido, intolerância a alimento

“Comunicar”

Isolamento socialSentimento de rejeição, inativi-dade física, ausência do suporte significativo familiar

Isolamento terapêutico

“Mover”

Intolerância a atividadeVerbalização de fraqueza, desânimo, dispnéia de esforço e letargia

Fraqueza generalizada, distúrbio metabólico

FadigaIncapacidade de manter rotinas normais

Metabolismo energético diminuído

“Sentir”

Conforto alteradoVerbalização de mal-estar, prurido, náusea, vômito

Alteração metabólica

A sistematização da assistência de enfermagem é de fundamental importância para um serviço de referência em hepatites virais, pois proporciona uma assistência planejada e organizada, refletindo na melhoria da saúde das pessoas infectadas, com base na integralidade da atenção.Fonte: Anais do 8º Encontro de Extensão da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), realizado em outubro de 2005, em Belo Horizonte (MG)

Quadro 1 - Diagnósticos de enfermagem

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trabalho em equipe multiprofissional também possibilita a organização do serviço para acolher melhor o pa-ciente, promovendo um atendimento mais qualificado e prazeroso, por isso atualmente valoriza-se os ser-viços que acolhem adequadamente os paciente melhorando a adesão e a compreensão destes.

Especial de Capa / Enfermagem

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Marisa do Nascimento é graduada em enfermagem e especialista em enfermagem e obstetrícia pela Universidade Bandeirantes (UNIBAN). Atualmente é enfermeira assistencial da Divisão de Enfermagem do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

Referências Bibliográficas

Veronesi R, Focaccia R. Tratado de Infectologia - 2ª edição São Paulo: Editora Atheneu, 2002.Souza M. Assistência de enfermagem em infectologia. São Paulo: Editora Atheneu, 2000.Ministério da Saúde: Hepatites Virais: O Brasil está atento - 3º edição. Brasília, 2008.Revista Eletrônica - artigo 331 Maire Libertad Soligo - Tatremoto Eliete Maria Silva. Acolhimento e transformação no processo de trabalho de enfermagem em unidades básicas de saúde de Campinas, São Paulo, Brasil, 2007.Revista Mineira de Enfermagem. vol. 11 nº 1. Belo Horizonte. Jan/Mar 2007. Hepatite C e enfermagem: revisão de literatura. Rosely Moralez de Figueiredo, Thais Helena Piai.

Conclusão

O importante para a equipe de enfermagem é a utilização do seu saber na tentativa de aumentar a expectativa de vida do paciente, orientar sobre os riscos de transmis-são da doença e esclarecer sobre os efeitos colaterais do medicamento. O

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Pharmacotherapy Work-Up®: Processo Cognitivo de Tomada de Decisões Relacionadas à FarmacoterapiaAna Patrícia Pascoal Queiroz e Patrícia Sodré Araújo

Farmácia Clínica / Atenção Farmacêutica

Introdução

Desde que a Atenção Farmacêutica (ATENFAR) foi definida, em 1990, por Hepler e Strand como a provisão responsável da farmacoterapia com o objetivo de alcançar resultados concretos que melhorem a qualidade de vida dos pacientes 1, a farmácia tem empenhado grande esforço para adquirir o status de ciência do cuidado e oferecer aos farmacêuticos uma estrutura de conhecimentos e instrumentos que os permita, com ética e competência técnica, desenvolver o exercício do cuidar profissional.

Vista como novo mandato social da profissão 2, cada vez mais a ATENFAR está presente no vocabulário do farmacêutico. O termo ganhou espaço em revistas cientí-ficas e, principalmente, em encontros e congressos da área farmacêutica 3. Atualmente, várias universidades, públicas e privadas, possuem a disciplina de Atenção Farmacêutica na matriz curricular dos cursos de farmácia. Além disso, muitos cursos de extensão e pós-graduação surgem com a proposta de capacitar os farmacêuticos para a implementação de modelos desta prática nos espaços de atuação profissional.

Todavia, muitos anos após a publicação do marco con-ceitual revolucionário que definiu a ATENFAR como uma nova filosofia de prática profissional 1, 4, muitos farmacêu-ticos, ainda, não a entendem dessa forma 5. A ausência de compreensão do seu significado, o desconhecimento acerca de seu conteúdo filosófico e a falta de uniformida-de nas condutas dificultam o reconhecimento da prática e do seu impacto na saúde da população beneficiada, além de impossibilitar a efetiva troca de experiência com profissionais que atuam em outros países e possuem uma prática clínica bem delimitada 5.

A prática da ATENFAR não é sinônimo de atividades relacionadas com o ciclo da Assistência Farmacêutica, nem se constitui no avanço das funções tradicionais do farmacêutico, mas é uma prática que está estruturada sobre os mesmos componentes básicos que determinam a construção de outras praticas em atenção à saúde (filosofia, processo de atenção ao paciente e sistema de gestão) sendo sua particularidade expressa apenas na necessidade social que irá satisfazer as necessidades farmacoterapêuticas 6, e isto se alcança mediante a identificação, a resolução e a prevenção de problemas farmacoterapêuticos 7.

Para que os problemas farmacoterapêuticos sejam identificados, solucionados e prevenidos e as necessida-des dos pacientes relacionadas à farmacoterapia sejam satisfeitas, é necessária a utilização de um método lógico e sistemático, que nada mais é que o processo do pen-samento racional para tomada de decisões clínicas que permitem ao profissional identificar qual(is) problema(s) farmacoterapêutico(s) está(ão) impedindo que os pacien-tes alcancem os melhores resultados com a utilização dos medicamentos, proporcionando uma prática consistente e permitindo a avaliação de seus resultados clínicos. Este método proposto, inicialmente, em 1988, por Cipolle, Strand e Morley, após algumas modificações é denomina-do, atualmente, de Pharmacotherapy Work-up® 8.

Embora existam diversos métodos empregados na prá-tica da ATENFAR, o objetivo deste trabalho é apresentar o método de Atenção Farmacêutica proposto por Strand e colaboradores, o Pharmacotherapy Work-Up®, também conhecido como Modelo Minnesota, para seguimento clínico de pacientes na prática da ATENFAR.

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Farmácia Clínica / Atenção Farmacêutica

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Processo de atenção ao paciente: o farmacêutico, o raciocínio clínico e o paciente

Pharmacotherapy Work-Up®

Antes de se discutir a respeito do Pharmacotherapy Work-Up® é importante esclarecer que a filosofia da prática da ATENFAR descreve, como um de seus elementos básicos, uma forma de trabalho a qual Linda Strand denomina de um modus ope-randis. Essa forma de cuidar ocorre por meio do encontro da dimensão tecnológica do cuidado com a di-mensão mais humana ou subjetiva que é a valorização do outro na relação terapêutica 9.

No processo de atenção ao pa-ciente essas duas dimensões se

encontram. O Pharmacotherapy Work-Up® é o trabalho cognitivo que ocorre na mente do farmacêutico durante esse processo enquanto a outra dimensão, a do paciente, é a que ocorre com este ao vivenciar a experiência de receber ATENFAR.

Utilizando o exemplo da prática médica, como analogia para compre-ensão do método Pharmacotherapy work-up®, observa-se que o método clínico desenvolvido para os médi-cos foi pensado para possibilitar a estes profissionais uma maneira de sistematizar o raciocínio clínico para tomada de decisões médicas. Dessa maneira, o modelo de Minnesota proporcionou aos farmacêuticos, provedores da ATENFAR, um cami-nho cognitivo para a identificação e a resolução de problemas farmaco-terapêuticos.

É comum a utilização de jargões que qualificam um bom médico como aquele que possui muitos casos em uma mesma especialidade. Isso ocor-re porque esse profissional é aquele que apresenta o raciocínio clínico mais exercitado na identificação de problemas médicos relacionados a sua especialidade.

Assim, o método de Minnesota foi pensado para ser universal e para pos-sibilitar que todos que o utilizassem na prática o fizessem guiados por um processo cognitivo denominado de raciocínio clínico. O exercício deste raciocínio independe da utilização de fichas ou de outros artifícios que guiem as etapas do processo de aten-ção ao paciente, pois a documentação nada mais é do que o registro das etapas de avaliação, plano de atenção e avaliação de seguimento 9.

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Farmácia Clínica / Atenção Farmacêutica

Processo de atenção ao paciente: aplicação do Pharmacotherapy Work-Up®

Para alcançar proficiência na to-mada de decisão na prática da ATEN-FAR, o desenvolvimento do raciocínio clínico em torno de Problemas Farma-coterapêuticos (PF) é imprescindível à atividade do farmacêutico, pois a qualidade da assistência depende, substancialmente, das habilidades de raciocínio.

Apresentando como base o rela-cionamento terapêutico, o Pharma-cotherapy Work-Up® é o raciocínio clínico desenvolvido pelo profissional no processo de atenção ao paciente, constituindo-se em um instrumento importante, pois orienta a coleta de informações para a avaliação das necessidades farmacoterapêuticas, auxilia nas decisões referentes às intervenções a serem implementadas no plano de atenção, além de contri-buir para a mensuração dos resulta-dos na avaliação de seguimento 9. É importante lembrar que essas etapas são devidamente documentadas em prontuário específico, eletrônico ou não (Figura 1).

Figura 1 - Processo de atenção ao paciente

Estabelecimento do relacionamento terapêutico

Avaliação das necessidades Plano de atenção Avaliação de seguimentoAssegurar farmacoterapia indicada, efetiva, segura e conveniente;

Resolver problemas farmacoterapêuticos;Avaliar o progresso em relação aos objetivos terapêuticos;

Identificar problemas farmacoterapêuticos. Conquistar os objetivos terapêuticos; Identificar novos problemas.

Prevenir problemas farmacoterapêuticos.

Feedback contínuoFonte: Strand, Cipolle and Morley, 1998.

O profissional inicia o processo mediante a avaliação das necessidades do paciente relacionadas à farmacote-rapia 10. O objetivo da avaliação inicial é verificar se as necessidades farmaco-terapêuticas estão sendo atendidas e se o paciente apresenta problemas reais ou potenciais relacionados à utilização dos medicamentos bem como suas respecti-vas causas 9. Nesta etapa, é fundamental conhecer o paciente e sua experiência com medicamentos 3. Todas as preocu-pações, conhecimentos e expectativas que o paciente possui acerca da sua enfermidade e de seu tratamento farma-cológico são documentadas, pois tais aspectos possuem influência direta na adesão ao tratamento, na recuperação da saúde e no bem-estar do paciente 3, 6.

O farmacêutico, por meio de entrevista clínica, deve coletar in-formações acerca do estado de saúde geral do paciente, sem fragmentação por enfermidade, com a finalidade de certificar-se da indicação, efe-tividade, segurança e adesão ade-quadas à farmacoterapia 11. Todo o processo cognitivo do farmacêutico se organiza de maneira a permitir que o farmacêutico avalie se toda a farmacoterapia do paciente é apro-priadamente indicada, efetiva, segura e conveniente. As informações sobre todos os medicamentos em uso, a história clínica atual do paciente, a história medicamentosa, a história médica passada, a história social e nutricional, os hábitos de vida, além de dados clínicos e demográficos são também documentadas.

A abordagem sobre os medica-mentos ocorre de maneira sistemá-tica de acordo com as necessidades farmacoterapêuticas percebidas pelo paciente, provenientes da experiên-cia vivenciada com medicamentos. Realiza-se também uma revisão por sistemas e órgãos com a finalidade de obter informações complementares 11.

Após a coleta de dados, os pro-blemas farmacoterapêuticos e as suas causas são identificados e clas-sificados de acordo com a taxonomia proposta pelo grupo de Minnesota (Figura 2).

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Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010 81

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Farmácia Clínica / Atenção Farmacêutica

Figura 2 - Taxonomia dos Problemas Farmacoterapêuticos Pharmacotherapy Work-Up®

indic

açã

o

Necessidade de farmacoterapia Farmacoterapia desnecessária

Condição não tratada

Sinérgica ou adicional

Preventiva ou profilática

Sem indicação médica válidaUso aditivo/recreacionalTratamento não-farmacológico não indicadoDuplicidade terapêuticaTratando PRM evitável

Efet

ivid

ade

Seleção inadequada de farmacoterapia

Subdose

Forma farmacêutica inadequadaCondição refratária ao medicamentoOutro medicamento é mais efetivo

Dose inadequadaFreqüência inadequadaDuração de tratamento inadequadaArmazenamento incorretoAdministração incorretaInteração medicamentosa

Segur

anç

a

Reação adversa medicamentosa Sobredose

Medicamento inseguro para o paciente

Contra-indicação presente

Reação alérgica

Interação medicamentosa

Dose inapropriadaAlteração rápida da doseEfeito indesejadoFreqüência inapropriadaDuração inapropriadaAdministração incorretaInteração medicamentosa

Ades

ão

Cumprimento

Medicamento não disponívelImpossibilidade de aquisiçãoImpossibilidade de ingerir, administrar o medicamentoOrientação não compreendidaPaciente prefere não tomarOutras causas

Statu

s do

paci

ente

Estado Definição

Resolvido Objetivos alcançados, tratamento completado

Estável Objetivos alcançados, continuar mesmo tratamento

Melhora Progresso ocorrendo, continuar mesmo tratamento

Melhora parcial

Progresso ocorrendo, necessitando de pequenos ajustes

Inalterado Nenhum progresso ainda, mas continuar mesmo tratamento

Piora Declínio na saúde, ajustar tratamento

Falha Objetivos não alcançados, iniciar novo tratamento

Óbito Paciente faleceu enquanto recebia tratamento

Fonte: Cipolle, Strand and Morley, 1998

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Farmácia Clínica / Atenção Farmacêutica

O problema farmacoterapêutico é um evento indesejável, experimentado pelo paciente, que está relacionado ou suspeita-se que esteja relacionado com a terapia medicamentosa e que interfere na conquista dos objetivos terapêuticos 6. Pode aparecer em qual-quer etapa do processo de utilização de medicamentos e sua classificação é um julgamento clínico e está rela-cionada com a conduta a ser adotada pelo profissional com a finalidade de solucioná-lo. A identificação e classifi-cação dos problemas farmacoterapêu-ticos possuem influência importante na assistência que o paciente necessita e recebe, pois orienta a elaboração de um plano de atenção ao paciente 10.

Construído conjuntamente entre o profissional e o paciente, o plano de atenção é um esboço das respon-sabilidades de ambos no sentido de alcançarem os objetivos terapêuticos traçados e realizarem as interven-ções, mutuamente, acordadas 6. Neste plano, devem constar os objetivos do tratamento, que necessitam ser claramente descritos, mensuráveis e

alcançáveis pelo paciente. É importan-te estabelecer um marco temporal para a avaliação do alcance dos objetivos terapêuticos, de maneira que as ex-pectativas sejam realistas. Após serem estabelecidos os objetivos, devem ser traçadas as intervenções para resolver e/ou prevenir os problemas farmaco-terapêuticos e alcançar os resultados desejados (clínicos, comportamentais e econômicos). Estas intervenções não são estabelecidas de maneira isolada, mas devem basear-se nas preferên-cias e nas necessidades do paciente e podem ser limitadas pela tolerância do mesmo. Vale ressaltar que, entre as intervenções construídas, estão as recomendações farmacológicas e não- farmacológicas, bem como o encami-nhamento a profissionais de saúde, educação em saúde, entre outras. As recomendações não-farmacológicas não devem ser desprezadas, pois em muitas enfermidades elas contribuem diretamente para alcançar os resulta-dos terapêuticos desejados.

O último passo do plano de aten-ção é o estabelecimento de um marco

temporal para programar a avaliação de seguimento. Esta avaliação é rea-lizada pessoalmente ou por telefone, permitindo ao profissional obter as informações necessárias para avaliar se as decisões tomadas e as inter-venções empreendidas nas etapas anteriores do processo de atenção produziram os resultados desejados ou se surgiram novos problemas farma-coterapêuticos, reais ou potenciais. A partir dessas novas informações, são planejadas novas intervenções. Essa etapa é contínua e cada novo fato en-volvendo a farmacoterapia gera uma nova avaliação e também um novo plano de atenção 3, 7.

Ao iniciar o processo de atenção ao paciente, o farmacêutico é respon-sável por dar continuidade à prática, observado-se que essa é uma prescri-ção filosófica da ATENFAR 7.

Considerações finais Está demonstrado que o método

Pharmacotherapy Work-Up® cor-responde ao raciocínio clínico para

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Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010 83

se consolidar como prática profissio-nal, que as discussões extrapolem questionamentos sobre qual método é mais eficiente para realização da prática. Avançar no sentido de estabe-lecer um raciocínio clínico uniforme para identificação de PF é importante para comunicar o significado da prá-tica para pacientes, profissionais de saúde e para o próprio sistema de saú-de, estabelecendo sua inclusão como prática no contexto das profissões da atenção à saúde.

Farmácia Clínica / Atenção Farmacêutica

Ana Patrícia Pascoal Queiroz é graduada em farmácia pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e especialista em metodologia e didática do ensino superior pela Faculda-de Católica de Ciências Econômicas da Bahia (FACCEBA). Possui experiência na área de farmácia, com ênfase em atenção farmacêutica (implementação de modelos, desen-volvimento da prática e avaliação dos resultados). Atualmente é professora das disciplinas atenção farmacêutica e farmácia comunitária do curso de farmácia da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e professora do estágio supervisionado VII: atenção farmacêuti-ca do curso de farmácia da União Metropolitana de Educação e Cultura (UNIME).

Patrícia Sodré Araújo é graduada em farmácia pela UFBA e mestre em saúde coletiva pelo Instituto de Saúde Coletiva da UFBA. Possui experiência na área de farmácia, com ênfase em assistência e atenção farmacêutica. Atualmente é professora efetiva da UNEB e professora da UNIME.

identificação e resolução de PF. Os profissionais de atenção à saúde utilizam raciocínio cientificamente validado e um conjunto de habilida-des e de conhecimentos necessários a conclusão do problema de saúde que o paciente apresente. No caso da ATEN-FAR, esses problemas se resumem aos problemas farmacoterapêuticos.

Um dos questionamentos feitos, com freqüência, em relação à prática da ATENFAR é se esta não se sobre-põe a outras práticas no contexto da atenção à saúde, até mesmo pelo fato do método Pharmacotherapy work-up® ter sido uma adaptação do método de raciocínio clínico médico descrito ainda na década de 1960, por Weed 13. No en-tanto, essa argumentação não procede, pois enquanto o pensamento clínico do médico vai organizar o conjunto de dados obtidos na avaliação para chegar à conclusão do problema médico do paciente, o farmacêutico da ATENFAR vai pensar se todos os dados colhidos do paciente na avaliação demonstrarão se os pacientes possuem ou não um problema farmacoterapêutico.

Assim, pode-se dizer que enquanto o médico procura identificar em uma tosse de um paciente qual a doença que ele teria, os farmacêuticos da ATENFAR procuram identificar se esta tosse possui alguma relação com algum medicamento que ele esteja utilizando ou se há necessidade de medicamento para tratar tal condição. Essa é a diferença básica do raciocínio clínico do farmacêutico da ATENFAR para a de qualquer outro profissional. Esse raciocínio é padrão e aplicável a qualquer cenário de prática no qual a ATENFAR se desenvolva.

O raciocínio clínico torna o farma-cêutico da ATENFAR autônomo e livre para realizar o processo de atenção ao paciente e documentar a prática realizada, seja utilizando formatos

Referências Bibliográficas

1. Hepler CD, Strand LM. Opportunities and responsibilities in pharmaceutical care. Am J Hosp Pharm. 1990 Mar;47(3):533-43.2. Ramalho de Oliveira D. Pharmaceutical care uncovered: an ethnographic study of pharmaceutical care practice. [PhD thesis]. Minneapolis, MN: University of Minnesota; 2003.3. Pereira ML. Atenção Farmacêutica: implantação passo-a-passo. Belo Horizonte: Eds. Farmácia Universitária, Faculdade de Farmácia da UFMG, 2005.4. Freitas EL, Ramalho de Oliveira D, Perini E. Atenção farmacêutica-teoria e prática: um diálogo possível? Acta Farm Bonaerense 2006;25(3):447-53.5. Funchal-Witzel MDR. Os métodos como caminho para a aplicação da filosofia da prática da atenção farmacêutica. Revista Racine. 2010;(114):70-72. 6. Cipolle RJ, Strand LM, Morley PC. editors. A new professional practice. In: The pharmaceutical care practice. New York: McGraw-Hill Companies, Inc; 1998. p. 3-35.7. Cipolle DJ, Strand LM, Morley PC. El ejercicio de la atención farmacéutica Madrid: McGraw Hill / Interamericana, p. 1-36, 2000.8. Pharmaceutical care: The Minnesota

Model. The Pharmaceutical Journal 1997, 258(6949):899-904.9. Cipolle DJ, Strand LM, Morley PC. Pharmaceutical Care Practice – The Clinician’s Guide. 2a. Ed. New York: McGraw-Hill, 2004.10. Cipolle DJ, Strand LM, Morley PC. Pharmaceutical Care Practice. 1st edition. New York: McGraw-Hill; 1998.11. Correr CJ. Métodos Clínicos para a prática da Atenção Farmacêutica. Curitiba: Departamento de Farmácia - Universidade Federal do Paraná, 2006.12. Cipolle DJ, Strand LM, Morley PC, Frake MJ. The impact of pharmaceutical care practice on the practitioner and the patient in the ambulatory practice setting: twenty-five years of experience. Curr Pharm Des. 2004;10(31):987-4001. 13. Weed LL. Quality control and the medical record. Arch Intern Med; 1971, 127:101-5.14. Weed LL. Medical records, patient care, and medical education. Ir J Med Sci. 1964 Jun;17:271-82.15. Weed LL The problem oriented record as a basic tool in medical education, patient care and clinical research. Ann Clin Res. 1971 Jun;3(3):131-4.

de documentação pré-estabelecidos ou não. Esse processo cognitivo para tomada de decisões tem sido universal em outras práticas profissionais, embo-ra em cada contexto específico exista espaço para incluir aspectos culturais e sociais ao modo de conduzir o pro-cesso de atenção ao paciente, mas isso não descaracteriza a universalidade do método.

É importante, em um momento em que a prática da ATENFAR busca

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Introdução

A Insuficiência Renal Aguda (IRA) é uma das grandes preocupações ao se tratar de pacientes com medicamentos potencialmente nefrotóxicos 1. A IRA é caracterizada por rápida queda na taxa de filtração glo-merular, manifestada clinicamente como um abrupto e contínuo aumento de uréia e de creatinina, resultando na impossibilidade dos rins em exercer suas funções básicas de excreção e de manutenção da homeostasia hidroeletrolítica e ácido-básica do organismo 2.

Estima-se que, atualmente, 7% das complicações intra-hospitalares estejam relacionadas ao desenvolvi-mento da IRA, representando altas taxas de mortalidade, além de prolongamento da internação hospitalar e dos custos de tratamento 1, 2.

A IRA por causas nefrotóxicas, se não evitáveis, são passíveis de monitoramento 1, especialmente ao se tratar da vancomicina.

Objetivo

O objetivo deste trabalho é realizar uma breve re-visão bibliográfica sobre a vancomicina, abordando o desenvolvimento de IRA induzida pela sua utilização.

insuficiência Renal Aguda induzida por VancomicinaBruna dos Santos Fromhertz, Daniela Vieira Baldini Batista e José Costa Junior

Farmácia Hospitalar

História e origem da Vancomicina

A Vancomicina foi descoberta em 1956 pelos cientis-tas do laboratório Ely Lilly & Co por meio do isolamento de um fungo denominado Streptomyces orientalis (pos-teriormente denominado como Amycoltopsis orientalis), microrganismo encontrado em amostras de solo coleta-dos em regiões da Índia e Indonésia 3-5. A necessidade de buscar novas alternativas para as cepas de bactérias gram-positivas resistentes à penicilina devido a sua utilização abusiva após a Segunda Guerra Mundial, fez com que a vancomicina se tornasse quase uma lenda devido a sua excelente capacidade bactericida frente às infecções causadas por estafilococos produtores de penicilinase, resistentes à ação da penicilina G 4, 5. Esse fato fez com que a aprovação da mesma para utilização clínica demorasse apenas dois anos após a descoberta 6, 7. Com o surgimento das novas penicilinas semi-sintéticas (meticilina, oxacilina) mesmo com a eficácia compro-vada, a vancomicina teve a sua importância médica diminuída devido a sua maior toxicidade se comparada aos novos agentes antiestafilococos 4, 5, 8, sendo assim, a vancomicina ficou restrita à pacientes com alergias graves em uso de beta-lactâmicos 5. As preparações iniciais de vancomicina possuíam uma quantidade gran-de de impurezas que conferia a característica marrom à formulação, e por isso foi apelidada de Mississippi mud

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insuficiência Renal Aguda induzida por Vancomicina

Farmácia Hospitalar

(Barro de Mississippi) pelos cientistas da Ely Lilly 8.Essa característica da formulação de vancomicina posterior-mente foi atribuída às reações de toxicidade da mesma, bem como a ototoxicidade e a nefrotoxicidade 6, 8. A partir dos avanços em processos de fermentação mi-crobiológica e em técnicas de separação, em 1986 foi possível a produção de vancomicina com alta pureza e conseqüentemente com a diminuição dos seus efeitos adversos 4, 7. A junção da purificação da vancomicina e o aparecimento de cepas de Staphylococcus aureus resistentes a meticilina (MRSA), fez com que, nos anos 1970 a utilização da vancomicina tivesse aumento considerável em prescrições médicas 7.

Mecanismo de ação

Mesmo após 50 anos, nos dias atuais a vancomicina é o fármaco de escolha para infecções por bactérias gram-positivas. Da mesma maneira que os antibióticos penicilínicos, a vancomicina afeta o metabolismo de construção da parede celular das bactérias, atuando como um antagonista competitivo através da ligação na porção terminal D-Ala-D-Ala de um pentapeptídeo encontrado na etapa de polimerização da cadeia de peptideoglicano, formador da parede celular, afetando a sua permeabilidade e inibindo a síntese de RNA, sendo assim, um agente bactericida 4, 5.

Mecanismos de nefrotoxicidade

O túbulo proximal é o principal local para a reabsor-ção renal, os epitélios são ricos em transportadores que fazem o papel de eliminação do medicamento 9. Estudos em ratos apontam que após altas doses administradas de vancomicina, essas funções foram diminuídas 9. A expo-sição da vancomicina nas células epiteliais dos túbulos proximais do rim gera aumento da proliferação celular, aumentando o consumo do oxigênio e da concentração de ATP 10. Esse fato apóia o papel da vancomicina como um estimulante da fosforilação oxidativa, modificando a função mitocondrial através do estresse oxidativo, poden-do resultar em necrose tubular 9. Alguns estudos em seres humanos apontam que a toxicidade da vancomicina não se limita apenas ao túbulo proximal, mas também podem envolver a região medular 11. Embora estudos apontem o estresse oxidativa como mecanismo de indução da ne-frotoxicidade, estes mecanismos ainda permanecem mal compreendidos e uma melhor apreciação pode ser útil na elaboração de estratégias para preveni-las 9.

Ainda em 2008, com os estudos de Dieteriche et al., novos genes de indução da nefrotoxicidade em ratos levantaram a especulação de que a lesão renal induzida pela vancomicina em altas doses estaria relacionada com

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Farmácia Hospitalar

a ativação do sistema complemento expressando a quimiocina e assim desencadeando o desenvolvimento de uma resposta inflamatória. Essa expressão do sistema complemento pode ser tornar um possível marca-dor no desenvolvimento da nefro-toxicidade se fossem identificáveis no contexto de uma infecção como a MSRA.

Casos de nefrotoxicidade induzida pela vancomicina

Publicações a partir da década de 1950 até metade de 1980 identi-ficaram 57 casos de nefrotoxicidade associada a vancomicina, com mais de 50% dos casos identificados durante os seis primeiros anos de utilização, se o produto fosse con-siderado impuro 10.

A taxa de nefrotoxicidade atribu-ível à monoterapia com vancomicina variou de 0% a 17% e de 7% para 35% com a administração concomi-tante com aminoglicosídeos (Rybak, 2009). Estudos demonstraram que

a utilização de vancomicina pode potencializar os efeitos nefrotóxi-cos dos aminoglicosídeos em três a quatro vezes mais se ocorrer a utilização concomitante dos dois antimicrobianos 12.

Por mais que os estudos encon-trem valores de 5-7% relacionados a nefrotoxicidade, eles são confli-tantes, pois não possuem evidência alguma suportada pela manutenção das concentrações séricas de van-comicina no intervalo de tempo do surgimento da nefrotoxicidade e da sua prevenção 10. Entretanto, estudo do tratamento com vancomicina por longos períodos e com concentrações séricas maiores (30-65mg/L) foi re-lacionado como fator de risco para a indução de nefrotoxicidade 10. A literatura aponta esses efeitos adver-sos como um aumento de 0,5mg/dL ou 50% na creatinina sérica em pelo menos dois ou três dias consecutivos em relação a linha de base dos valo-res séricos de creatinina durante a terapia com vancomicina, sem outra explicação para esse aumento 10. Por

esse motivo considera-se a nefroto-xicidade em seres humanos incomum e normalmente reversível em regime de dosagem típica 9.

Atualmente, a maior discussão relacionada à nefrotoxicidade da van-comicina está nas novas alternativas terapêuticas, pois estudos citam a ne-cessidade de tratamento com maiores dosagens de vancomicina ou infusão contínua para manter uma concen-tração ideal devido ao surgimento de cepas de MSRA com concentração inibitória mínima (MIC) superior a 1,0 mg/L 13, 14. Esses estudos investi-gam as relações entre a exposição ao medicamento e os resultados finais clínicos e microbiológicos e recomen-dam manter a razão área sobre a curva de concentração no tempo (AUC) para 24 horas de MIC estar entre 350 (desfecho clínico) e 400 (microbio-logicamente) e, sugere manter uma concentração sérica de vancomicina entre 15-20mg/L para tratamento das infecções por MSRA 13-14, porém a dose padrão (15 mg/Kg a cada 12 horas) não supera essas expectativas e

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Farmácia Hospitalar

Referências Bibliográficas

1. Pinto PS et al. Insuficiência renal aguda nefrotóxica: prevalência, evolução clínica e desfecho. J. Bras. Nefrol., São Paulo, v. 31, n. 3, Sept. 2009.2. Bernardina LD, Diccini S, Belasco AGS, Bittencourt ARC, Barbosa DA. Evolução clínica de pacientes com insuficiência renal aguda em unidade de terapia intensiva. Acta Paull Enferm. 2008;21(Spe):174-8.3. Goodman & Gilman. As bases farmacológicas da terapêutica. 10.ed. Rio de Janeiro: Mc Graw Hill, 2003; p.946-947.4. Silveira GP et al . Estratégias utilizadas no combate a resistência bacteriana. Quím. Nova, São Paulo, v. 29, n. 4, July 2006.5. Rodrigues AJ, Tubino M. Método espectrofotométrico para determinação de vancomicina. Campinas, 2008. 86 f. Dissertação (Mestrado em Química) - Instituto de Química, Universidade Estadual de Campinas. 2008.6. Levine DP. Vancomycin: a history. Clin Infect Dis. 2006; 42(suppl 1):S5-127. Cardoso, MB. Vancomicina inyectable: una aproximación a la metodología de studio de desvios de calidad. Lat. Am. J. Pharm. 2007; 26(1):134-9.8. Moellering RC Jr. Vancomycin: a 50-year reassessment. Clin Infect Dis. 2006 (suppl 1):S3-4.9. Dieterich C, Puey A, Lyn S, Swezey R, Furimsky A, Fairchild D et al. Gene expression analysis reveals new possible mechanisms of vancomycin-induced nephrotoxicity and Identifies gene markers candidates. Toxicol Sci 2009; 107(1):258-269 10. Rybak M, et al. Therapeutic monitoring of vancomycin in adult patient: A consensus review of the American Society of Health-System Pharmacists, the infectious Diseases Society of America, and the Society of Infectious Diseases Pharmacists. Am J Health Syst Pharm. 2009;66:82–98.11. Lodise TP, et al. Relationship between initial vancomcyin concentration-time profile and nephrotoxicity among hospitalized Patients. Clin Infect Dis. 2009;49:507–514.12. Rybak M. The pharmacokinetic and pharmacodynamic properties of vancomycin. Clin Infect Dis. 2006; 42(suppl 1):S35-913. Lodise TP, Lomaestro B, Graves J et al. Larger vancomycin doses (≥4 grmas/day) are associated with an increased incidence of nephrotoxicity. Antimicrob Agents Chemoter. 2008; 52:1330-614. Ingram, P. R., D. C. Lye, P. A. Tambyah, W. P. Goh, V. H. Tam, and D. A. Fisher. Risk factors for nephrotoxicity associated with continuous vancomycin infusion in outpatient parenteral antibiotic therapy. J. Antimicrob. Chemother 2008; 62:168-171.15. Pigrau, C, Almirante, B. Oxazolidinonas, glucopéptidos y lipopéptidos cíclicos. Enferm Infecc Microbiol Clin. 2009; 27(4):236-246.16. Silva LAM, Pansard HM, Rosa DB, Botton SR, Mezzomo NF et al. Níveis sanguíneos de vancomicina e adequação de seu uso em pacientes com insuficiência renal em tratamento dialítico. Jornal Brasileiro de Nefrologia 1998; 20:411-8.

Bruna dos Santos Fromhertz é graduanda de farmácia pela Uni-versidade Cruzeiro do Sul (UNICSUL) e estagiária de farmácia clínica no Hospital Cruz Azul de São Paulo (CRAZ-SP).

Daniela Vieira Baldini Batista é graduada em farmácia e bioquímica pela Universidade Camilo Castelo Branco (UNI-CASTELO), especialista em farmácia hospitalar pelas Faculda-des Oswaldo Cruz (FOC) e em farmácia clínica pelo Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein. Atualmente é farmacêutica clínica do CRAZ-SP.

José Costa Jr. é graduado em farmácia pela Universidade do Grande ABC (UniABC) e especialista em farmácia hospitalar e clínica pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Atualmente é farmacêutico supervisor do CRAZ-SP.

não alcança os níveis séricos esperados 13, 15, e se ocorre aumento na dosagem da vancomicina, existe maior risco para a indução de nefrotoxicidade 14, 15. Uma alternativa pode ser a substituição terapêutica da vancomicina por outro agente se o paciente obtiver infecções por MSRA com MIC superior a 1,0 mg/L 10, preservando assim o paciente contra a possível indução de toxicidade renal da vancomicina, principalmente se o paciente possuir predisposição para problemas renais (idade, obesidade, hipertensão, diabetes, insuficiência renal crônica, uso concomitantes com outros medicamentos nefrotóxicos e internação em centros de terapia intensiva) 10, 11, 14.

A indicação de monitorização sérica em pacientes

com maior probabilidade de nefrotoxicidade induzida é importante para a determinação do sucesso da terapia do medicamento, diante do fato de que a vancomicina é dose-dependente, necessitando que sejam mantidas as concentrações sustentadas equivalentes a quatro ou a cinco vezes o MIC por períodos prolongados com a finalidade de se obter uma eficiente ação bactericida 11,

12. Por esse motivo, a efetividade no tratamento pode ser prejudicada com doses baixas levando ao aumento da suscetibilidade à resistência bacteriana 13, 16. Neste contexto, a importância de se incluir pacientes renais crônicos em diálise 16, pacientes obesos, pacientes com situações pré-dispostas, sempre que há doses elevadas da vancomicina em sua monitorização sérica 10, 15.

Considerações finais

A prevalência de IRA nefrotóxica associada ao uso de vancomicina apresenta um percentual pouco expres-sivo se o medicamento for utilizado em monoterapia e na ausência de fatores predisponentes. No entanto, sua associação com outros medicamentos ou sua utilização em altas doses deve ser bastante criteriosa.

Outra consideração importante está na dosagem sérica de antibióticos que pode aumentar o desempe-nho significativamente. O parâmetro da relação entre AUC/MIC é recomendado por ser um método mais prático e preciso para controle dos níveis sanguíneos de vancomicina. O aumento da concentração sérica de vancomicina para 15-20 mg/L e a relação AUC/MIC ≥ 400 pode ser desejável, mas no momento não é indicado por dados clínicos, pois a utilização de níveis mais altos de vancomicina pode aumentar o potencial nefrotóxico, mas a experiência clínica adicional será necessária para determinar a medida deste potencial.

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Legislação

Qual Lei Regulamenta a Distribuição de Medicamentos a Portadores de Hepatites Virais no Brasil e o que a Mesma Prevê? Como Funcionam os Pólos de Distribuição Desses Medicamentos?

“Ao longo dos anos, os Estados ado-tavam medicamentos, independente-mente das recomendações do Minis-tério da Saúde (MS), o que levou a uma oferta de terapias diferenciadas entre as Unidades da Federação. Vi-sando a garantia de uma prescrição segura e eficaz, além da relação de custo-efetividade, o MS, por meio do Programa Nacional para a Prevenção e o Controle das Hepatites Virais (PNHV) e do Componente Especia-lizado da Assistência Farmacêutica (CEAF), tornou-se responsável, des-de 2006, pela aquisição e distribuição dos medicamentos para as hepatites virais no Brasil, assegurando o acesso dos portadores das hepatites virais ao tratamento, em estreita relação com os princípios da Constituição da República Federativa do Brasil e da organização do Sistema Único de Saúde (SUS). Os medicamentos ainda são conside-rados de alto custo e os Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas para as hepatites B, C e D são

Envie para o e-mail [email protected] sua dúvida ou questão relacionada ao setor farmacêutico, com seu nome completo, nome da instituição em que estuda e/ou da empresa em que trabalha, cargo que ocupa, cidade e estado.

atualizados considerando-se as evi-dências científicas mundiais, com o consenso dos experts brasileiros do Comitê Técnico Assessor do PNVH, composto por representan-tes das Sociedades Brasileiras de Hepatologia, Infectologia, Medicina Tropical, Patologia, Pediatria e pelas Organizações Não-Governamentais (ONG), além de outros membros do próprio MS, garantindo segurança e efetividade do tratamento. Atualmente, as terapias das hepatites B, D e C são regidas pela Portaria nº 2.561/GM, de 28/10/2009 e pela Portaria n° 34/SVS, de 28/09/2007, respectivamente, respeitando os cri-térios estabelecidos na Portaria n° 2.981, de 26/11/2009. Ambas devem ser seguidas rigorosamente pelos mé-dicos e outros profissionais da área da saúde, desde o diagnóstico, indicação de tratamento, inclusão e exclusão de pacientes, esquemas terapêuticos, até o acompanhamento dos pacientes. Os medicamentos contemplados pelo

Quem responde é Ricardo Gadelha de Abreu, coordenador do Programa Nacional para Prevenção e o Controle das Hepatites Virais (PNHV) do Ministério da Saúde

CEAF são distribuídos às Unidades Federadas e a liberação pelos ges-tores estaduais acontece somente se o paciente apresentar a doença e os critérios descritos nos Protocolos. O acesso ao tratamento é permitido após o cumprimento da documenta-ção levada pelo paciente à Secretaria Estadual da Saúde, Regional da Saú-de ou Secretaria Municipal da Saúde, conforme fluxo local. De maneira geral, esses medicamentos são ad-quiridos de forma centralizada pelo governo federal de empresas privadas e laboratórios oficiais, garantindo um tratamento baseado no uso racional do arsenal terapêutico, possibilitando o acesso universal no SUS.”

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Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP), José Mi-guel do Nascimento Junior, diretor do Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos Estratégicos da Secretaria de Ciências, Tecnologia e Insumos Es-tratégicos do Ministério da Saúde (DAF/SCTIE/MS), Maria Cecília Martins Brito, diretora, representando Dirceu Raposo de Mello, diretor-presidente da Agên-cia Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), Jaldo de Souza Santos, presidente do Conselho Federal de Farmácia (CFF), Isabel de Lelis Andrade Moraes, diretor técnico de Divisão de Saúde da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, representando Luiz Roberto Barradas Barata, secretário estadual de saúde de São Paulo, recentemente falecido, e Raquel Cristina Delfini Rizzi Grecchi, presidente do Conselho Regio-nal de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP).

As instituições apoiadoras e realizadoras de Eventos Integrados foram homenageadas por meio de uma placa oferecida a seus presidentes e representantes: Luiz Fernando Buainaim, presidente - Associação Brasileira do Atacado Farmacêutico (ABAFARMA),

Acontece

m comemoração às duas décadas de atividades do Grupo Racine, a Revista Racine traz, nesta 117ª edição, a cobertura especial da 20ª Expo Farmácia, 20ª Semana Racine - Congresso

de Farmácia e mais 23 Eventos Integrados realizados entre os dias 1º e 3 de Julho de 2010, no Expo Center Norte, em São Paulo (SP). Aproximadamente 20 mil visitantes estiveram na feira e muitos deles participa-ram das atividades de congresso, composta por uma rica e extensa programação científica que incluiu cursos teóricos e práticos, palestras, mesas-redondas, visitas guiadas, apresentação de trabalhos e Roteiro Universitário. No total os eventos obtiveram apoio institucional de 37 entidades do setor farmacêutico e a ele relacionado, sendo 21 instituições inseridas na programação por meio de eventos integrados.

A mesa diretora da solenidade de abertura foi composta por Nilce Barbosa, presidente do Grupo Racine, Marco Quintão, diretor executivo do Grupo Racine, Gilberto Luiz Pozetti, professor titular aposentado do Instituto de Química de Araraquara da Universidade Estadual

Eventos Racine Completam 20 anos de Realizações e Transformações no Setor Farmacêutico

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90 Revista Racine 117 - Julho/Agosto de 2010

Acontece

Pedro Zidoi, presidente - Associação Brasileira do Comércio Farmacêutico (ABCFARMA), Jadir Nunes, representando Alberto Keidi Kurebayashi, presiden-te - Associação Brasileira de Cosmetologia (ABC), Maria Helena Braga, presidente - Associação Brasi-leira de Ensino Farmacêutico (ABENFAR), Carlos Cecy, presidente - Associação Brasileira de Ensino Farmacêutico e Bioquímico (ABENFARBIO), Márcia Aparecida Gutierrez, presidente - Associação Brasileira de Farmacêuticos Homeopatas (ABFH), Sérgio Mena Barreto, presidente - Associação Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (ABRAFARMA), Saulo de Carvalho Junior, presidente - Associação Nacional de Farmacêuticos Atuantes em Logística (ANFARLOG), Maria do Carmo Garcez, presidente - Associação Nacio-nal de Farmacêuticos Magistrais (ANFARMAG), Walter Lerner, consultor - Conselho Regional de Administração de São Paulo (CRA-SP), Lais Santana Dantas, assessora de gabinete - Farmacopéia Brasileira (ANVISA), Célia Machado Gervásio Chaves, presidente - Federação Nacional dos Farmacêuticos (FENAFAR), Vidal Ser-rano Nunes Junior, presidente - Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC), Rosana Mastelaro, gerente de le-gislação industrial farmacêutica, representando Omilton Visconde Junior, presidente em exercício - Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (SINDUSFARMA), Paulo José Teixeira, presi-dente - Sindicato dos Farmacêuticos do Estado de São Paulo (SINFAR-SP), Dorival Ramos de Souza Junior, presidente - Sociedade Brasileira de Controle de Con-taminação (SBCC), José Ruben de Alcântara Bonfim, coordenador executivo - Sociedade Brasileira de Vigi-

lância de Medicamentos (SOBRAVIME), e Marilice Terezinha de Souza, presidente - União Farmacêutica de São Paulo (UNIFAR). Também receberam home-nagens a coordenadora da Comissão Científica, Maria Denise Funchal Witzel, e o coordenador da Comissão de Avaliação de Trabalhos Científicos, Luiz Carlos Silva, pela dedicação e contribuição ao evento.

Em seu discurso, Nilce Barbosa ressaltou o pa-pel desempenhado pelas Semanas Racine como formadoras de opinião “por meio de criteriosa seleção de temas, apresentação de conteúdos de altíssima qualidade, discussões conduzidas em clima de troca de experiências, motivando seus participantes a sobreporem as dificuldades e bar-reiras inerentes a toda e qualquer atividade que se caracterize fortemente como modificadora de modelos consolidados”.

A 20ª Expo Farmácia e a 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia consolidam-se, a cada ano, como os principais eventos do setor, e o apoio de entidades e instituições do setor farmacêutico, bem como a presença e a participação ativa de órgãos governamentais, como a Agência Nacional de Vigi-lância Sanitária (ANVISA) e o Ministério da Saúde, confirmam a importância e o destaque dos Eventos Racine e estimulam para que as próximas edições sejam aprimoradas.

Confira, nas páginas a seguir, os principais mo-mentos da 20ª Expo Farmácia, 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia e Eventos Integrados.

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primeira edição da Expo Farmácia foi realizada em julho de 1991 e atualmente é considerada a mais importante feira de negócios no Brasil para empresas, insti-

tuições e profissionais da grande e complexa cadeia do varejo farmacêutico. O objetivo da Expo Farmácia é promover a aproximação e a interação do merca-do fornecedor com todos os segmentos envolvidos na seleção, aquisição, distribuição, atendimento e dispensação de medicamentos, cosméticos, HPC e outros produtos para a saúde, bem como os serviços nestas áreas.

Produtores e distribuidores de produtos farmacêuti-cos, cosméticos, HPC e outros produtos para a saúde, insumos, equipamentos e outras empresas fornecedoras de produtos e serviços para este segmento, além de en-tidades profissionais e setoriais, se reuniram no evento, realizado no Expo Center Norte, em São Paulo (SP), entre os dia 1º e 3 de Julho de 2010.

Aproximadamente 20 mil profissionais de todo o País, da América Latina e de países ibéricos passaram pela feira realizada no 12 mil m² do Pavilhão Verme-lho e pelos 12 auditórios do moderno e versátil Centro de Convenções Center Norte. Além de conhecer os

20ª Expo Farmácia: Concentração de Profissionais e Empresas com Foco em Negócios

produtos e serviços disponibilizados pelas empresas e instituições, os visitantes tiveram a oportunidade de assistir a palestras e apresentações técnicas de empresas e instituições da área da saúde gratuita-mente em estandes como da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) e do Instituto Ra-cine, além do já tradicional Espaço Showcase, um auditório montado dentro da feira, onde os visitantes da 20ª Expo Farmácia puderam assistir, com acesso gratuito, a apresentações de empresas expositoras como Weleda, Nature’s Bounty, Embrafarma, Vita Derm, Galena, Supra Soy e Fisatom.

O ambiente é propício ao expositor que busca a realização de negócios, bem como a apresentação e o lançamento de produtos e de serviços voltados ao varejo farmacêutico. Para o público visitante, oriun-do de farmácias, drogarias, farmácias hospitalares e serviços de assistência domiciliar, distribuidoras de produtos farmacêuticos, cosméticos e HPC e de outros produtos para a saúde, da Assistência Far-macêutica dos Estados e Municípios e da área de educação em farmácia, a Expo Farmácia proporciona a ampliação da rede de contatos, a reciclagem de idéias, o conhecimento de novos fornecedores e o desenvolvimento da capacidade de inovar.

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Acontece

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Acontece

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Acontece

ompletando 20 anos de atividades, a Semana Racine - Congresso de Farmá-cia destaca-se como um dos eventos mais importantes do setor farmacêutico,

chegando a esta edição comemorativa com um perfil ampliado cujo foco são os profissionais de todo o País que atuam na prática farmacêutica que envolve a seleção, a aquisição e a distribuição de medicamentos, bem como o atendimento e a dis-pensação destes produtos.

Nesta edição foram realizadas mais de 500 horas de atividades científicas em 120 diferentes modali-dades, entre cursos, palestras, mesas-redondas, fó-runs, simpósios, apresentação de trabalhos, Roteiro Universitário, visitas guiadas e projeto de investiga-ção. As atividades contaram com a participação de renomados palestrantes nacionais e internacionais,

20ª Semana Racine Consolida-se como Congresso de Farmácia

C além possuírem relevante interesse para os profissionais e estudantes de farmácia, sejam atuantes ou interessados em atuar em farmácias, drogarias, farmácias com manipulação, farmácias hospitalares e serviços de assistência domiciliar, na área de educação, em distribuidoras de produtos farma-cêuticos e de outros produtos para a saúde e na Assistência Farmacêutica dos Estados e Municípios.

Pôsteres foram premiados em diversas áreas temáticas

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Acontece

Farmácia integrada: Foco no PDV e Atendimento a Pacientes

O evento também contou com a apresentação de trabalhos (pôsteres) relacionados à prática farmacêu-tica nos âmbitos da farmácia comunitária, logística, farmácia hospitalar e Assistência Farmacêutica dos Estados e Municípios. Foram mais de cem trabalhos inscritos, sendo 87 deles selecionados para exposição em pôster. Os trabalhos foram avaliados por uma Co-missão Científica e o melhor classificado foi agraciado com o Prêmio Maria Aparecida Pourchet-Campos.

Integrado à 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia, o 7º Encontro de Professores Universi-tários abordou, nesta edição, as possibilidades de

estande da Farmácia Integrada, instalado na 20ª Expo Farmácia, pelo sétimo ano consecutivo, foi um dos destaques do evento. O espaço foi projetado para apre-

sentar um conceito de farmácia que oferece produtos e serviços integrados de modo a atender às neces-sidades em saúde dos usuários de medicamentos, produtos para a saúde e serviços farmacêuticos. Este conceito de farmácia vem sendo incentivado pelo Grupo Racine há mais de dez anos, com o propósito

O

interseção e diálogo entre as ciências sociais e as ciências farmacêuticas no ensino e na pesquisa. A palestra estabeleceu conexões que aparentemente são pouco visíveis entre os dois campos. Foram discutidos pontos para inclusão em projetos peda-gógicos e de pesquisa de cursos de graduação e de pós-graduação em farmácia.

A Arena de Idéias, evento realizado em para-lelo ao Congresso pelo terceiro ano consecutivo, manteve a proposta de palestras nas áreas de marketing, carreira e economia, trazendo pales-trantes de renome para o evento.

de inspirar os profissionais, proprietários e/ou farmacêuticos de farmácias e drogarias a proje-tarem sua atuação para além de ser um espaço que apenas adquire, armazena e comercializa produtos, transformando-se em empresas com um mix de produtos diversificado, porém com foco em saúde, e caracterizado como espaço com serviços de saúde com alto valor e relevância para o público que atende.

Um roteiro guiado por monitores apre-sentando o conceito a partir de 18 painéis localizados em área próxima ao estande foi implementado nesta edição da Farmácia Inte-grada. Ainda no mesmo espaço da Farmácia Integrada, docentes e alunos - profissionais farmacêuticos - do Curso de Pós-Graduação - Especialização Profissionalizante em Atenção Farmacêutica - Formação em Farmácia Clínica do Instituto Racine, pelo quinto ano consecu-tivo, realizaram atendimento a pacientes enca-minhados pelo Instituto Paulista de Geriatria e Gerontologia José Ermírio de Moraes (IPGG) da Secretaria de Estado da Saúde do Governo do Estado de São Paulo.

Apoio

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Acontece

20ª edição da Expo Farmácia e da Semana Racine - Congresso de Farmácia contem-plaram em sua programação 21 Eventos Integrados realizados e organizados em

parceria com as principais entidades do setor farma-cêutico e industrial, reunindo, desta forma, todos os públicos do Canal Farma.

• Reunião Plenária do Conselho Federal de Far-mácia (CFF): O CFF realizou, em caráter ex-cepcional na 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia, demonstrando a importância do even-to, sua reunião plenária mensal com a presença de 100% dos Conselheiros Federais provenientes das 27 Unidades Federativas Brasileiras.

• Farma Meeting: A Associação Brasileira do Co-

mércio Farmacêutico (ABCFARMA), a Associa-ção Brasileira de Redes de Farmácias e Drogarias (ABRAFARMA) e a Associação Brasileira do Atacado Farmacêutico (ABAFARMA) reali-zaram a 2ª edição do Farma Meeting de forma integrada à 20ª Expo Farmácia, consolidando-se como um fórum de debates entre os diferentes players do Canal Farma.

Eventos integrados Reafirmam Participação de Entidades nos Eventos Racine

• 1º Ciclo Científico de Cosmetologia ABC: Realizado pela Associação Brasileira de Cosmetologia (ABC), teve a proposta de promover a atualização profissional na área cosmética, por meio de cursos e palestras sobre temas de destaque na área.

• 1º Encontro Internacional de Farmacêuticos Magistrais:

Evento realizado pela Associação Nacional de Farma-cêuticos Magistrais (ANFARMAG), reunindo renoma-dos palestrantes e autoridades nacionais e internacionais em debates sobre o processo magistral, a prestação de serviços farmacêuticos, as últimas tendências e as novidades em formulações e ativos, além de sistemas de garantia da qualidade e marcos regulatórios.

• Farmacopéia Brasileira: Sob coordenação geral da

Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), a Farmacopéia Brasileira também teve seu espaço ga-rantido nesta edição do evento e, por meio de palestras, abordou dois assuntos: Radiofarmácia e Plantas Medi-cinais da Farmacopéia Brasileira. A ANVISA repetiu a implantação de sua Unidade de Atendimento ao Público (UNIAP) em estande na 20ª Expo Farmácia.

• Departamento de Assistência Farmacêutica e Insumos

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Acontece

Estratégicos da Secretaria de Ciências, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde (DAF/SCTIE/MS): Confirmando a importância do conceito e da aplicação da Assistência Farmacêutica na busca de resultados em saúde, o DAF/SCTIE/MS levou para a 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia duas palestras cujos temas enfocaram os componentes da assistência farmacêutica e a estratégia de acesso a medicamentos do Sistema Único de Saúde (SUS) e a qualificação e o gerenciamento da assistência farmacêutica no SUS. Contou também com estande na 20ª Expo Farmácia, em que divulgou suas ações e atendeu ao público visitante.

• Vigilância Farmacêutica na Atenção à Saúde: O Con-

selho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo (CRF-SP) participou ativamente da 20ª Expo Farmácia, com um estande, e da 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia, com três palestras focadas em Vigilância Farmacêutica na Atenção à Saúde.

• 1º Ciclo de Palestras SINFAR-SP: Realizado pelo

Sindicato dos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (SINFAR-SP), foram abordados os temas Movimento Sindical: Origens e o Papel do Sindicato, CASF-SP/FARMEMPREG e Responsabilidade Civil/Criminal e Direito do Trabalho e Direito Previdenciário.

• Diversificando as Práticas Farmacêuticas: A Federação

Nacional dos Farmacêuticos (FENAFAR) realizou na 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia o painel Diversificando as Práticas Farmacêuticas, em que apresentou a visão de diversas áreas de atuação do pro-fissional farmacêutico e os desafios atuais da profissão.

• 1º Encontro Nacional de Farmacêuticos Atuantes em

Logística: Evento Integrado à 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia organizado pela Associação Nacional de Farmacêuticos Atuantes em Logística (ANFARLOG), que ofereceu aos participantes a oportunidade de conhecerem mais a respeito da ter-ceirização de serviços logísticos como fator de com-petitividade, das medidas de combate à falsificação, desvio e roubo de cargas de medicamentos e sobre as Boas Práticas em Rede de Frio.

• 2º Ciclo de Palestras SOBRAVIME: A Sociedade Bra-

sileira de Vigilância de Medicamentos (SOBRAVIME) realizou palestras focadas na promoção do uso racional

de medicamentos, destacando a utilização do Centro de Informações de Medicamentos (CIM), a adesão à farmacoterapia e as questões judiciais.

• Salas Limpas: As palestras realizadas pela So-

ciedade Brasileira de Controle de Contaminação (SBCC) destacaram as ações da entidade no sen-tido de ampliar o conhecimento em áreas limpas e em ambientes controlados. Uma “área limpa” - projeto itinerante - foi exposta no espaço da entidade na área da feira.

• 1º Simpósio SINDUSFARMA de Tecnologia,

Regulamentação e Marketing na Indústria Farmacêutica: O Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo (SINDUSFARMA) realizou o evento, com palestras abordando os temas tecnologia, regula-mentação e marketing na indústria farmacêutica.

• 1º Encontro de Atualização UNIFAR: Uma das

entidades mais antigas do setor farmacêutico, a União Farmacêutica de São Paulo (UNIFAR), existente deste 1913, levou aos participantes da 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia uma amostra dos assuntos para os quais atenta, ou seja, questões de fundamental interesse dos profissionais e empresas do segmento farma-cêutico como Desenvolvimento e Produção de Pellets e Farmacovigilância.

• 1° Encontro de Inverno da Associação Brasileira de Farmacêuticos Homeopatas: Evento Integrado realizado pela Associação Brasileira de Farma-

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Acontece

cêuticos Homeopatas (ABFH), que contemplou duas palestras, cujos temas foram Visitando as Origens dos Medicamentos Homeopáticos e Gestão da Qualidade em Homeopatia.

• Uso de Metodologias Ativas de Ensino- Aprendiza-gem em Educação Farmacêutica: Curso realizado pela Associação Brasileira de Ensino Farmacêutico e Bioquímico (ABENFARBIO) durante a 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia, cujo objetivo foi orientar e ajudar os professores do ensino de farmácia na melhoria da formação dos estudantes, abordando princípios das metodologias ativas de ensino-aprendizagem, as aplicações em educação superior, as principais metodologias e as ferramentas ativas disponíveis, promovendo uma reflexão sobre a avaliação da aprendizagem.

• Associação Brasileira de Ensino Farmacêuti-

co (ABENFAR): As palestras realizadas pela entidade tiveram como proposta apresentar os princípios e objetivos de atuação conjunta das Instituições de Ensino Superior e dos Serviços

Públicos de Saúde, as estratégias para consegui-los, os desafios e as perspectivas de sua implantação, bem como a importância dos mesmos no aprimoramento da formação do profissional farmacêutico.

• Código de Defesa do Consumidor: O Instituto Bra-

sileiro de Defesa do Consumidor (IDEC) participou da 20ª Semana Racine - Congresso de Farmácia com palestra sobre o Código de Defesa do Consumidor e as relações farmacêuticas.

• Excelência em Inovação na Gestão dos Negócios: Pales-

tra realizada pelo Conselho Regional de Administração de São Paulo (CRA-SP), cujo objetivo foi apresentar aos participantes de que forma as organizações poderão atuar, na prática, obtendo melhores resultados por meio de modelos de gestão otimizados tanto em pessoas como em sistemas de informações, e em absoluta sincronia de esforços globalizados centrados em competências.

A Expo Farmácia, a Semana Racine - Congresso de Farmácia e seus Eventos Integrados consolida-ram, nesta 20ª edição, sua posição como evento central do Canal Farma no Brasil, o que se confirma com a presença e a participação ativa de órgãos governamentais, como a ANVISA e o Ministério da Saúde, bem como de outras instituições e entidades da área farmacêutica - no total 37 instituições con-cederam oficialmente apoio institucional ao evento. As empresas e instituições participantes puderam manter contato direto com seu público e com par-ceiras atuais e potenciais, o que gerou negócios e networking, durante os três dias de realização do evento, e certamente continuará proporcionando desenvolvimento, negócios e contatos a posteriori.

Apoio Institucional

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