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diz o pesquisador Silvio Ferraz, da Uni-versidade Estadual de Campinas (Uni-camp) e da Pontifícia Universidade Ca-tólica de São Paulo (PUC-SP), principalarticulador do instituto virtual. "Comisso, vamos dar peso, prestígio e um nor-te comum a essas linhas de pesquisas,respeitando, logicamente, as individua-lidades de cada uma delas", comentaJosé Fernando Perez, diretor científico daFAPESP. Inicialmente, quatro grandesvertentes de trabalho serão estimuladas:o estudo da acústica de salas de concer-to; a análise de obras com o auxílio decomputador; a promoção de composi-ções e performances que se utilizem,em tempo real, do micro ou de outrosequipamentos como se fossem instru-mentos musicais; e uso de técnicas deinteligência computacional no estudoda cognição e da criatividade musical.À medida que o instituto virtual ganhecorpo, outros temas poderão se incor-porar à sua pauta.

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.Nrimeiraatividade promovi-da pelo instituto, que con-tará em breve com um sitepara integrar seus mem-bros e respectivos proje-

tos, será o evento Ircarn-Brasil, entre 8e 14 de agosto, em São Paulo. Durantesete dias, dez pesquisadores do centrofrancês darão palestras e concertos eparticiparão de reuniões científicascom seus colegas brasileiros. Com exce-ção da palestra do dia 8, que será noInstituto das Artes da Unicarnp, duran-te o 9° Simpósio Brasileiro de Com-putação Musical, as demais serão rea-lizadas no Instituto Itaú Cultural, nacapital paulista, que cedeu suas instala-ções para o evento. Sempre à noite, asapresentações musicais serão no Teatroda Aliança Francesa e Teatro CulturaArtística, em datas ainda não confirma-das. Embora tenham sido concebidasespecialmente para os pesquisadores daárea, as atividades do workshop tambémserão abertas ao público em geral, me-diante prévia inscrição no Itaú Cultu-ral. "Queremos aumentar o intercâmbiocom instituições internacionais que sãoreferência na pesquisa em música e ciên-cia': comenta Ferraz. Eventos nos mol-des do Ircam-Brasil, que conta aindacom o apoio do consulado francês emSão Paulo e do Centro Franco-Brasilei-ro de Documentação Técnica e Cientí-fica (Cendotec), deverão se repetir nos

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o PROJETO

Laboratório deInterfaces Gestuais

MODALIDADEPrograma jovem pesquisador

COORDENADORJÔNATAS MANZOLLI - Nics/Unicamp

INVESTIMENTOR$ 44.176,01

próximos anos, trazendo ao país, porexemplo, pesquisadores do Centro deNova Música e Tecnologias em Áudio,de Berkeley (EUA), e o Grupo de Músi-ca Experimental de Marselha (Gmem).

O Brasil não tem muita tradiçãoem fomentar pesquisas que juntamarte e ciência, duas formas distintas,mas não incompatíveis de conhecimen-to, de sentir e interpretar o mundo.Mas isso não significa que o institutovirtual de música e tecnologia parte dozero em sua missão de estreitar asamarras entre esses dois campos. Partejustamente de projetos que já existem ese mostram instigantes. E o que já exis-te, somente em São Paulo, é um peque-no guarda-chuva de idéias capaz dedar abrigo ao cruzamento da pesquisae criação musicais com áreas tão dis-tintas, como ciências da computação,física, biologia e matemática, para nãomencionar os flertes com outras disci-plinas do terreno das artes, corno dan-ça e teatro.

Com 20 anos de existência quase si-lenciosa para quem não transita nouniverso da música e tecnologia, o Nú-cleo Interdisciplinar de ComunicaçãoSonora (Nics) da Unicamp faz muitobarulho em uma de suas vertentes depesquisa: a criação de dispositivos - in-terfaces, no jargão da área - que reali-zem a transferência de um modelo abs-trato (pode ser o movimento na dança,modelos matemáticos ou do códigogenético) para o agente sonoro, em ge-ral um instrumento musical digitalou o computador. Falando assim, tudoparece complicado, fora do tom. Umexemplo ajuda a entender o tipo de tra-balho feito pelo núcleo, composto porcerca de 30 pessoas, entre professores ealunos, tanto da música como de outrasáreas (matemática, ciências da compu-tação e engenharia).

O PROJETO

Projeto e Simulação Acústicade Ambientes para Escuta Musical

MODALIDADEProjeto temático

COORDENADORFERNANDO IAZZETTA - ECAlUSP

INVESTIMENTOR$ 123.205,00

Na primeira imagem usada para ilus-trar esta reportagem, dá para ver umabailarina dançando de traje escuro, ilu-minada por um spot de luz à sua di-reita e envolvida por grafismos verme-lhos que parecem sair de seu corpo,num belo efeito visual criado pelo fotó-grafo a partir de um conjunto de luzespreso à roupa da artista. Há ainda, aofundo, um teclado. Acredite: essa bai-larina, Andréia Yonashiro, está "tocan-do" o instrumento com os seus movi-mentos, com cada trajetória descritapor sua coreografia. Não, não se tratade ilusão de ótica, ficção científica ouassombração. A resposta a esse falso mis-tério está na superfície escura tocada pe-los pés de Andréia, que quase não apa-rece na foto: um tapete especial de ummetro quadrado, que está conectado aosintetizador.

O tapete é dotado de 12 sensores pie-zo-elétricos, que, quando pressiona-dos pelos deslocamentos da bailarina,registram pequenas variações de po-tencial elétrico. Com o auxílio de umconversor analógico-digital, essas alter-nâncias elétricas, medidas em micro-volts, são transformadas em eventosdo protocolo Midi (Music InstrumentDigital Interface), uma espécie de lin-guagem musical que se utiliza de umatabela de números para representar asalturas das notas musicais (dó, ré, mi,fá, sol, lá, si...) e sua intensidade. "Essesnúmeros podem acionar qualquer ins-trumento eletrônico compatível com oprotocolo Midi, como um teclado': ex-plica o músico e matemático IónatasManzolli, coordenador do núcleo, quedesenvolveu o tapete no âmbito do pro-grama Jovem Pesquisador, financiadopela FAPESP. Além do piso que fazmúsica, a equipe do Nics criou luvas esapatilhas de dança que também fun-cionam como interfaces sonoras. Em-

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bora de caráter experimental, todos es-ses dispositivos já foram usados em es-petáculos artísticos concebidos pelospesquisadores e apresentados em even-tos no Brasile exterior.

Luthier digital - O Nics também de-senvolveu uma série de ferramentascomputacionais que podem ser usadaspara produzir eventos sonoros simplesou complexos - desde que seu usuáriosejahabilidoso e aprenda a usá-los cor-retamente. O Rabisco, por exemplo, éum programa que gera música a partirde traços feitos de forma livre numatelaem branco. "Somos uma espécie deluthier digital", afirma Adolfo Maia Jr.,professor do departamento de Mate-mática Aplicada da Unicamp e coor-denador associado do Nics. Curioso pa-radoxo entre o passado e o futuro, poisa luteria é a delicada e antiga arte dafabricação manual de instrumentos decorda com caixa de ressonância, comoviolinos, celos ou violões. Um proje-to inusitado da equipe de Manzolli eMaia Jr., tocado em parceira com o Ins-tituto de Neuroinformática da Poli-técnica de Zurique, Suíça, é uma espé-ciede instalação sonora que utiliza umrobô no controle de um instrumentomusical digital.

Trabalhando numa linha de estudodiferente do Nics, FIo Menezes, do Ins-tituto de Artes da Universidade Esta-dual Paulista (Unesp), é mais um pes-quisador que vai engrossar as fileirasdoinstituto virtual de música e ciência.Esse compositor paulistano se dedica aexplorar as possibilidades da chamadamúsica eletroacústica, uma vertente ex-perimental criada no final do anos 40na Europa (França e Alemanha), cujamaior referência histórica é o alemãoKarlheinz Stockhausen. Não confundir,por favor, a paixão e o objeto de traba-lho de Menezes, que toca piano desdeos 5 anos de idade, com a música ele-trônica, aquele som de bate-estaca queembala festas intermináveis de boa par-te da juventude. O artista que abraça amúsica eletroacústica, às vezes chama-da de música concreta ou acusmática,compõe obras que são uma elaboradamontagem de sons modificados pelosmodernos recursos da computação. Amaior parte dos sons é pré-gravada e seorigina de instrumentos musicais ou dequalquer outra fonte de áudio, comouma porta que bate, o soar de uma bu-

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o PROJETO

Aplicação da Idéia Filosóficade Ritornelo no Desenhode Interfaces Digitais para a Criaçãoe Tratamento de Áudio em TempoReal em Improvisações Livres

MODALIDADELinha regular de auxílio à pesquisa

COORDENADORSILVIO FERRAZ - PUC/SP

INVESTIMENTOR$ 47.949,68

zina. Os mais maldosos diriam que amúsica eletroacústica é mais eletroacús-tica do que música, mas tal estranha-mento se deve ao caráter vanguardistado movimento. "Muitos colegas meus,músicos inclusive, me vêem como o cien-tista maluco da música', comenta Me-nezes, em tom de brincadeira.

Umdos traços mais mar-c~n~es d~s obras eletroa-cústicas e a extrema preo-cupação com a forma dedifusão espacial das mú-

sicas diante da platéia num teatro oucasa de concerto. Um bom som esté-reo, com as tradicionais duas saídas deáudio, não basta. Músicos como o pes-quisador da Unesp, que estudou naAlemanha, Itália, Suíça e França (Ir-cam), querem, no mínimo, a quadrifo-nia, a possibilidade de espalhar sua mú-sica num palco dotado de quatro saídasindependentes de áudio. O ideal é até .mais do que isso. Para eles, o movimen-to do som pelos alto-falantes, o trajetode suas colagens sonoras pelas caixasacústicas, é parte indissociável de suasobras. Tanto que Menezes aguarda, comansiedade, a chegada de sua "orques-tra de alto-falantes" para construir o seu"teatro sonoro", este último um termoemprestado do Renascimento Italiano.Projeto financiado pela FAPESP, o Puts(PANaroma/Unesp: Teatro Sonoro) seráuma "orquestra" composta, inicialmen-te, por 12 alto-falantes de altíssima qua-lidade e quatro subwoofers, um tipo de

Montagens sonoras da músicaeletroacústica são concebidas para

serem excutadas por umaorquestra de alto-falantes

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caixa dedicada a reproduzir exclusiva-mente sons graves. "Com esse equipa-mento, que pode ser transportado paraos locais de apresentação, poderemosfazer concertos eletroacústicos de óti-ma qualidade sonora", afirma Menezes.

um software, com tecnologia nacional,para a realização de análises da dis-persão de sons em pequenos auditó-rios, locais com até 100 assentos naplatéia. Em princípio, a idéia é desen-volver um aplicativo para lugares dedimensões modestas e, num segundomomento, adaptá-lo para uso em am-bientes mais amplos. "Hoje, existemprodutos importados que fazem isso,mas podem custar até US$ 40 mil", dizIazzetta, que, no projeto, conta com acolaboração de pesquisadores dasáreas de matemática, arquitetura eengenharia civil. "Nossa meta é criarum programa de arquitetura aber-to, que poderá ser copiado por qual-quer pessoa."

Simulação acústica - Por falar emqualidade sonora, o estudo da acústicade salas de concerto, um dos alicer-ces do nascente instituto virtual demúsica e ciência, já é alvo de um pro-jeto temático desde o ano passado. Co-ordenada por Fernando Iazzetta, do de-partamento de música da Escola deComunicações e Artes da Universidadede São Paulo (ECA/USP), a iniciativatem como objetivo final desenvolver

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Como funciona esse tipo de aplica-tivo? O software roda num laptop dota-do de microfones especiais que captamsons, de freqüências previamente co-nhecidas, que foram emitidos no ambi-ente cuja acústica se deseja estudar. Emseguida, o programa compara a fre-qüência registrada na sala de concertocom a original do som e, dessa forma,fornece um parecer sobre o local. Essa éuma explicação esquemática. O proce-dimento, obviamente, não é tão sim-ples assim. Na verdade, o software nãose limitará a registrar e dar um veredic-to sobre as propriedades de propagaçãosonora de salas de concerto. Num am-biente virtual, ele funcionará tambémcomo um simulador da acústica de

qualquer lugar que se deseje estudar,desde que seja abastecido com as di-mensões e outras características físicasdo local. "Dessa forma, poderemos fazeralterações virtuais na planta dessa salade concerto e antever quais seriam asimplicações sobre a sua acústica", expli-ca Iazzetta. "O software pode ser uminstrumento útil para propormos repa-ros nos locais de apresentação:'

Vampiros de som - Antes de iniciar otemático sobre acústica, Iazzetta parti-cipou do programa Jovem Pesquisadorcom seu colega Silvio Ferraz, o articu-lado r do instituto virtual de música eciência. Na ocasião, ambos tentaramentender como a tecnologia interfere

o PROJETO

PUTS - PANaromalUnesp-Teatro Sonoro

MODALIDADELinha regular de auxílioà pesquisa

COORDENADORFLO MENEZES - Institutode Artes/Unesp

INVE':TlMENTOR$ 150.679,63

no processo de criação e explorar no-vas formas de compor e tocar. No iní-cio de suas carreiras como músicos,Iazzetta estudou percussão e Ferraz,trompa. Mas hoje ambos freqüente-mente se definem como tocadores delaptops. Isso porque atualmente os com-putadores os acompanham em quasetodas as suas performances, nas quaisutilizam muito material pré-gravado eprocessado pelos micros. "Tenho hojemuito interesse no desenvolvimentode softwares que compõem sozinhos,em programas que picotam o som",afirma Ferraz, que, no passado, chegoua atuar como músico de estilo maisclássico em orquestra dos estados deSão Paulo, Bahia e Paraná. "Somos vam-piros de sons, para usar uma expressãode meu colega Rogério Moraes Costa(da ECA/USP)."

Além de ser um músico adepto deperformances embaladas pelo som decomputadores, Ferraz, a quem caberáem grande parte o trabalho de fazer aequipe do instituto virtual tocar, jun-ta e afinada, os projetos dessa inicia-tiva interdisciplinar, desenvolve tam-bém um lado de pesquisador maisconceitual, teórico. Lançando mão dosensinamentos de áreas como a semió-tica (o estudo dos signos) e a cognição,gosta de discutir o que é música paraas pessoas. "Muita gente associa a idéiade música à existência de uma batida ede uma melodia", afirma ele. "Mas hácantos indígenas que não têm esses ele-mentos. Por que ao ler um poema, al-gumas pessoas o acham musical e ou-tras, não? O que transforma uma sopade sons em música?" Essas e muitas ou-tras indagações e buscas serão a pauta,a partitura, que irá reger a atuação doinstituto. •

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