revista paulista de cultura e politica n. 2

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1 REVISTA PAULISTA DE CULTURA E POLÍTICA ANO 2 Nº 2 Março/2012 MARÇO DE 2012

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Page 1: Revista Paulista de Cultura e Politica n. 2

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REVISTA PAULISTA DE CULTURA E POLÍTICA

ANO 2 Nº 2 Março/2012

MARÇO DE 2012

Page 2: Revista Paulista de Cultura e Politica n. 2

2

REVISTA PAULISTA DE CULTURA E POLITICA

Editorial ....................................................................................................................... 03 Entrevista com a Lega Nord .........................................................................................04 Geovana Lopes

A família e as bandeiras................... ........................................................................... 06

Cássio Forcignano Os caminhos fluviais e os paulistas..............................................................................09 Roberto Tonin

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3

Editorial

“A pior das corrupções não é aquela que desafia as leis,

mas a que se corrompe a ela própria”.

(Visconde Louis Bonald, escritor francês).

A importância de valorizar os recursos naturais, o rio. Sujar é falta de cultura.

Inconscientemente, ou intencionalmente, despreza a casa do paulista. Sujar a casa do

outro é desprezá-lo. Porque fazem isso?

A família sob ataque. Leis privilegiando mentes perversas, tornando crime a critica e a

opinião, facilidades, bolsas e auxílios para os desviados. E a família? Leis facilitando o

estupro, a pedofilia, o aborto e a prostituição, essa é a reforma do código criminal

brasileiro. A questão não é o porque dos esquerdistas defenderem essas idéias, isso já

é obvio. A questão real é porque as pessoas íntegras permitem essa barbárie

acontecer? Porque os honestos se calam. Porque os justos se acovardam. Porque os

esforçados se submetem. Porque os virtuosos transigem com a corrupção.

Pessoas que se calam, se acovardam, se submetem e transigem, não são

verdadeiramente honestas, íntegras, justas, esforçadas ou virtuosas.

O que esta acontecendo conosco?

Temos para começar uma entrevista com a Lega Nord¹ onde algumas dicas são

deixadas. É preciso maturidade para perceber o quanto simples e ao mesmo tempo

difícil é se manter integro, justo, honesto e conseguir fazer um trabalho correto para a

autonomia. A Lega é um exemplo de sucesso, um caminho a ser seguido, ela tem

falhas, é claro, mas as suas lições são valiosas.

O compromisso com a comunidade, o respeito pelo passado. Preservar é construir. O

passo lógico da Lega Nord, e tantas outras associações dedicadas ao bem público, é a

preservação dos valores, da cultura e da história. Essa é a base da civilização. Sem

esses elementos regredimos á barbárie, com depredação, violência e impunidade. Esse

é o retrato do Brasil, lamentavelmente.

É preciso um compromisso, entre cidadãos dignos, pelo resgate, defesa e divulgação

dos valores morais e éticos, da cultura e da história paulistas. Parece a descrição de

uma miragem nesse deserto de corrupção. Mas na realidade trata-se de um oásis. Um

oásis que precisa ser cultivado.

Eis nosso singelo propósito.

Nota: 1 – A Lega Nord é um movimento autonomista e partido político na Itália. Prega a autonomia plena da região

da Padania, defende os valores éticos e morais, e a luta incessante contra a corrupção.

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Entrevista com a Lega Nord.

Com Geovana Lopes.

(Geovana Lopes) No início vocês encontraram muitas dificuldades em relação às leis

nacionais e o objetivo do grupo? Quais? Como conseguiram lidar com essas

dificuldades?

(Dr. Roberto Marracini (Setor Instiucional da assessoria política Lega Nord)) Com

certeza, de inicio, quando nasceu a Lega Nord (no 1991), foram muitas dificuldades,

porque a nossa ideia básica, o federalismo, não era conhecida. E' muito difícil fazer

nascer e conhecer uma ideia nova e conseguir sucesso. As dificuldades foram

resolvidas com muito trabalho, muita boa vontade, muita proximidade com o povo e,

sobretudo, a convicção que a nossa ideia era certa.

(Geovana Lopes) Como conseguiram alcançar seus objetivos políticos?

(Dr. Roberto Marracini) Com espírito de sacrifício, espírito de serviço e com a certeza

de fazer o bem do nosso povo.

(Geovana Lopes) Como conseguiram novos adeptos a causa?

(Dr. Roberto Marracini) A pergunta è complicada, porque é preciso falar de toda

estratégia de comunicação da Lega Nord desde início até hoje a Lega Nord conseguiu

fazer novos adeptos, ficando sempre movimento popular perto do povo, procurando

uma correta interpretação das instâncias da população.·.

(Geovana Lopes) Em algum momento cogitaram a possibilidade de um modelo político

como a "confederação”? O que acham sobre esse modelo político?

(Dr. Roberto Marracini) Na década de 1990, quando a Lega Nord ganhou muitos votos

(eleições de 1992) se falou da criação de um estado federal formado para

três macrorregiões (modelo de Gianfranco Miglio

http://www.worldlingo.com/ma/enwiki/pt/Gianfranco_Miglio): tratava-se de um

modelo de estado semelhante de uma confederação. Obviamente è pra nòs um

modelo positivo, tambèm e, sobretudo, a nível europeu, para União Europeia.·.

(Geovana Lopes) Em sua opinião a partir de que momento um país começa a se dividir

culturalmente? Quais são as causas?

(Dr. Roberto Marracini) E' muito difícil oferecer uma resposta certa pra cada país e

cada contexto. Um país, por exemplo, pode começar a dividir-se culturalmente quando

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uma região desenvolve-se, economicamente ou industrialmente, de mais respeito a

uma outra. Na Itália, desde ano 1861(ano da Unidade da Itália), a diversidade cultural e

sócio-econômica entre as áreas territoriais foi sempre muito inequívoca. Por isso a

Lega Nord propõe a transformação da Itália em republica federal.·.

(Geovana Lopes) Como lidam com a opinião publica e as críticas internacionais?

(Dr. Roberto Marracini) Caminhamos rumo ao federalismo, porque o povo está

conosco e nos apoia.

(Geovana Lopes) Em sua opinião qual a maior conquista da Lega Nord até o momento?

(Dr. Roberto Marracini) Introduzimos no debate político italiano o conceito

de federalismo e agora, depois muitos anos, quase todos os italianos são convencidos

que é preciso transformar a Itália em um estado federal.

(Geovana Lopes) Na atualidade qual é o papel que a LN exerce na sociedade?

(Dr. Roberto Marracini) O papel da Lega Nord na sociedade é persuadir o povo de que

um estado diferente e, sobre tudo, uma sociedade diferente é possível. Por isso a Lega

Nord transmite cotidianamente aos cidadãos as ideias de justiça, legalidade, honradez

e transparência.

(Geovana Lopes) E depois do objetivo alcançado o que sucede?

(Dr. Roberto Marracini) Alcançado o objetivo, o federalismo (estado federal) e o

federalismo impostal (cada instituição será autônoma no imposto) não è possível saber

que coisa vai acontecer depois.

(Geovana Lopes) Um comentário sobre o atual momento da Lega Nord .

(Dr. Roberto Marracini) O momento atual é muito favorável pra nós. Depois o

extraordinário sucesso eleitoral do 2008 (eleições para o governo nacional, Câmara

dos deputados e Senado da Republica), depois o sucesso das eleições europeias

(2009), a Lega Nord ganhou muito bem também nas eleições regionais (2010).

Confiamos no futuro. O nosso papel é realizar o federalismo: por isso ficamos no

governo do país.

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A família e as bandeiras

por Cássio Forcignano

“Constituem virtudes militares, a coragem, energia, o hábito de comandar, características principais dos bandeirantes. Amparados na Família, sua base fundamental, organizam-se militarmente, para defender e conquistar a terra.” Os paulistas p. 70 João de Scantimburgo.

No trecho acima , podemos perceber que o autor cita as qualidades que um

bandeirante devia possuir, coragem , energia e hábito de comandar que segundo João

Scantimburgo eram as características principais dos bandeirantes e tudo isso era

amparado na família. Não me recordo de um estudo mais profundo sobre a família

paulista inicial que evidente formou o caráter do nosso povo, alguns autores ressaltam

a questão da miscigenação que foi comprovada, mas outros além do ponto

mencionado comentam sobre homem branco acabar tendo um número elevado de

índias como no caso de João Ramalho, supõem que ele teve mais de trinta nativas e

cerca de oitenta filhos. O padre Manoel da Nóbrega comentou tal escândalo em uma

carta. Porém não podemos nos esquecer que outrora era importante ter um grande

número de filhos, pois ajudariam no trabalho, qualquer que fosse outra questão que

podemos debater é o grande número de índios que seguiam com as bandeiras e a

contribuição que eles davam no tocante ao conhecimento do terreno , língua ,

reconhecimento dos diversos trocos indígenas, etc.

O índio cooperou com nossos antepassados, entre outras razões, devido ao parentesco

com alguns bandeirantes, pois quando um bandeirante tomava uma índia para si

acabava se tornando parte da tribo, aliado em uma visão mais moderna , outra

questão é que os chefes das famílias eram os cabeças das bandeiras esses capitães

comandavam um grande número de pessoas e se fosse necessário com a mesma mão

de ferro que conduziam suas famílias.

E hoje vivemos um choque muito grande entre o que entendemos como moderno,

avançado e o tipo de família inspirado nas tradições judaico-cristã cada dia mais cresce

uma tendência mundial onde crianças de oito, sete ou mesmo com apenas quatro

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anos respondem para os pais e pessoas mais velhas. Também notamos a habitual

rebeldia dos adolescentes que poderia ser muito positiva se fosse algo pensado,

coerente , mas na verdade tal rebeldia não passa de um jogo de forças não apenas

entre pais e filhos , mas entre o interesse apenas de um membro do grupo em prejuízo

de toda a sociedade, pois quando os pais tentam “punir” os filhos pelo não

cumprimento de uma determinada tarefa e o filho ou filha se recusa ou ainda desafia

que não ocorrerá nada com ela ou ele, na maioria das vezes os jovens saem vitoriosos

e os pais recuam de maneira displicente.

Contudo o mesmo pai ou mãe que “afrouxa” as regras da sua própria casa condena de

maneira veemente o estado por ser firme contra as diversas mazelas que supliciam

nossa sociedade, então os chefes das famílias se esquecem que a família ainda é a

base da nossa sociedade e que se os políticos e o estado influencia na mentalidade da

população e altera padrões de pensamentos , também é verdade que a família tem

poder enorme de conservar as tradições ou de modificá-las e o que podemos notar nas

ruas, escolas ou em qualquer outro local onde se encontrem um grande número de

pessoas é que existe uma dificuldade por parte da sociedade em respeitas regras e

normas.

E comparando a organizações das bandeiras com a sociedade contemporânea paulista

e tendo em mente as modificações mundiais ao longo dos séculos, afinal ninguém em

sã consciência pode imaginar que os bandeirantes iam entender costumes do século

XXI é como querermos que os antigos romanos agissem como os europeus do atual

século , contudo tanto os antigos romanos como os bandeirantes tiveram que

respeitar regras e se organizarem para obter sucesso em suas conquistas. Se hoje

vivemos um caos nas escolas que contamina toda a sociedade , também é verdade que

o insucesso das escolas também é culpa da família que também vive uma crise

enorme. Mas as empresas passando por momentos de dificuldades ainda conseguem

sobreviver, mas se pensarmos que se um jovem não tem limites dentro de casa e o

estado e sociedade fazem com que a escola não cumpra seu papel na sociedade,

fazendo com que o jovem saia da escola disposto a não obedecer regra alguma apenas

as que são de seus interesses individuais, porém as empresas ainda conseguem jovens

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dedicados , primeiro temos que ter em mente que nem todas as famílias foram

contaminadas por discursos que condenam o antigo modelo de família, mas não

apontam um caminho. Assim esses jovens mesmo em meio ao caos escolar se dedicam

não se fazendo de vitimas , também o mesmo jovem que não cumpria nenhuma regra

logo começa a notar que no trabalho ou ele muda ou perde o emprego e na maioria

das vezes mesmo mudando ele acaba ou sendo mandado embora ou ocupando cargos

de menor relevância por sua própria incompetência , não luta por um estado mais

liberal , pois sabe que da forma que foi criado nem tem capacidade para se manter em

um estado assim, também não luta pela manutenção ou aprimoramento de seus

direitos ou deveres trabalhistas, pois se viveu toda sua vida de pendente de leis que o

protegia como se protege um incapaz , logo tornou-se um individuo egoísta e incapaz

de lutar por um grupo.

Então devemos pensar bem na sociedade que queremos se olharmos para o nosso

passado notaremos que o povo paulista sempre se destacou por seu caráter

empreendedor as bandeiras foram o maior exemplo do que acabei de escrever nossos

antepassados não ficaram esperando favores da Coroa ao contrario se lançaram na

maior aventura que a espécie humana já viveu , onde um grupo pequeno conquistou e

defendeu um território de dimensões gigantescas coisa que não tinha sido alcançado

antes e que nunca foi superado. A tal “ conquista do oeste” que tanto se orgulham os

norte americanos comparada as façanhas dos bandeirantes parece coisa de criança.E a

espetacular conquista da “raça bandeirante” só foi possível graças a base fundamental

que João de Scantimburgo mencionou, isto é, a família que mesmo diferente da atual

tinha suas regras a serem seguidas assim como as bandeiras.

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Os caminhos fluviais e os paulistas.

por Roberto Tonin

“A serra abrupta (geografia estática), o planalto dinâmico (geografia

motora) e o Tietê que dava as costas para o mar (geografia móvel),

tiveram decisiva influência sobre o grupo de Piratininga”

(Cassiano Ricardo – Marcha para Oeste).

O paulista e os rios.

A lógica da ocupação da terra em São Paulo difere perpendicularmente á lógica da

ocupação estabelecida no litoral brasileiro em geral. No litoral os portugueses

adaptaram o ambiente á sua rotina comercial, através de suas experiências na África e

Ásia. Após algumas tentativas, foi com a implementação da cana-de-açúcar, originário

da Índia, que atingiram seu propósito comercial. E com seu mecanismo de produção -

o engenho, atingiram também o seu propósito de controle do espaço, não apenas

econômico, mas político.

O destino dos indígenas neste processo foi devastador. Não aceitando submeter-se a

esse sistema explorador, foram aniquilados, em lutas, por doenças ou obrigados a

evadir-se para os sertões.

Nas terras paulistas tudo foi diferente. A lógica comercial e social portuguesa não se

aplicava, seja porque as terras paulistas estavam num planalto quase inacessível pela

muralha de pedra da serra do mar, seja porque a restrita faixa litorânea era

demasiadamente distante das rotas marítimas, e seu solo pobre, em comparação ás

ricas terras nordestinas. Neste ínterim, nem o açúcar prosperou, tampouco o sistema

de engenho. Tal sorte permitiu um trato diferente aos indígenas, não vistos como

estorvo, mas como aliados, diante das constantes escaramuças que os colonos sofriam

diante de tribos hostis. Tibiriçá, chefe indígena, a quem São Paulo deve tudo, reuniu

legiões de índios para defender o recém-fundado povoado de São Paulo de tribos

indígenas hostis, no seu período mais vulnerável.

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Enquanto os primeiros povoadores das colônias britânicas, bases dos Estados Unidos,

idos do século XVII, tiveram atritos letais, com os locais, e a harmonia e aliança com

índios só existe na ficção e lirismo (nota: com “ação de graças” e o conto de fadas de

Pocahontas). Em São Paulo a aliança com índios foi real e sólida, representada pela

adoção de uma variante do tupi – a língua geral, como idioma oficial em São Paulo de

1550 até 1708, quando foi proibido por Portugal, embora tenha subsistido na pratica

por mais um século, e a adaptação de elementos indígenas, como a alimentação,

técnicas de sobrevivência na selva, alguns costumes, além do fator crucial - a

miscigenação, a maioria dos paulistas eram caboclos, provas da integração completa.

Algo inexistente na América do norte, e mesmo no litoral brasileiro, onde o fator de

dominação representado pela casa grande impedia a aceitação de famílias mestiças.

Se o litoral brasileiro, baseado na escravidão e produção de artigos para exportação,

cujas riquezas eram apropriadas pelos senhores de engenho brasileiros, mercadores

portugueses e banqueiros e mercadores judeus, uma fração da população, parte deles

sequer residente nestas terras. Em São Paulo pelo contrario o trabalho era executado

por famílias e tribos indígenas aldeadas, num mecanismo de trabalho semelhante a

‘encomienda espanhola, trabalho remunerado intermediado pelo cacique. O produto

do trabalho visava o comercio e abastecimento local e regional e seus lucros ficavam

com os produtores, ou seja, o grande numero de famílias. Disso resultou na falsa

impressão de que São Paulo era pobre.Na realidade, o paulista era autônomo e auto-

suficiente, a riqueza era distribuída entre habitantes, ao passo que no litoral, só alguns

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detinham toda a riqueza, os senhores de engenho, alguns agregados e mercadores

estrangeiros. Miséria em São Paulo não havia. Ricos também não. Enquanto que no

litoral havia alguns ricos com seus luxos e extravagâncias e um mar de escravos. Eis a

verdadeira miséria. A real miséria dos mais de 98% dos habitantes do Brasil, escravos.

No Brasil litorâneo as aparências de ordem social e a falsa prosperidade, que só existia

para os senhores de engenho, tudo inclinava para a vida fixa, rígida e sedentária, na

grande propriedade rural o mundo girava em torno das rodas dos moinhos de cana e

do preço do açúcar e nada mais. Em São Paulo, a “vocação estava no caminho, que

vencida ao movimento” (Sergio B. de Holanda, Monções, P. 160). A riqueza estava ao

alcance de qualquer um com coragem e vontade de trabalhar e pelejar. Mas a

empreitada das bandeiras exigia recursos além do alcance, e isso implicava numa rede

de parcerias e alianças. E foram estas condições que costuraram o tecido social

paulista. Radicalmente diferente do brasileiro. A sociedade paulista nos seus

primórdios, era notavelmente despossuída de centralização de poder, a vida e a

economia não girava em torno de um grande senhor. E sim de muitos. E todos eles

obtinham sua força de trabalho através de contratos com índios aldeados, ou por meio

da servidão de prisioneiros obtidos em combate. Dentro do contexto da época essa

força de trabalho era mais legítima do que os escravos comprados através de

contratos, pelos senhores de engenho aos mercadores judeus-lusitanos, que detinham

feitorias na África. A lógica do apresamento, sem óbices das tribos aldeadas,

enfrentava repúdio da coroa portuguesa, mais interessada nos impostos e nos favores

dos mercadores judeus-lusitanos envolvidos no comércio de escravos da África, do que

na auto-suficiência de seus súditos.

Fora da lógica colonial, a sociedade paulista buscou a riqueza de variadas formas,

através da mineração, que conseqüentemente acarretava demanda por gêneros

alimentícios e instrumentos, produzidos em fazendas ao redor da vila de São Paulo, e

com o tempo em seu próprio povoado. Essa dinâmica de descoberta, exploração,

desenvolvimento com auto-suficiência e expansão com a busca de novos

empreendimentos, foi e é a tônica da identidade paulista.

Um dos fatores essenciais nesta trajetória são os meios de comunicação e transporte.

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Os caminhos fluviais.

O uso de barcos e canoas para as monções foi imprescindível, ao contrário do que

ocorria nas bandeiras, além de ter sido pioneiro em abrir rotas fluviais de comércio e

comunicação regular da capital com os povoados interioranos. Grande parte do

transporte ainda era realizado a pé pelos caminhos nas matas. Na época das bandeiras

o barco era raramente usado, e mesmo o rio Tietê, chamado de Anhembi, era

conhecido e mapeado apenas para apontar pontos de travessia.

Essa confusão entre o uso dos rios e as bandeiras é enfaticamente abordado por

Alfredo Ellis Jr:

“Outro grande erro, do qual não tem escapado mesmo muitos historiadores de certo

renome, consiste na suposição de que o movimento expansionista das bandeiras se deu

pelas vias fluviais. O tiete, o velho Anhembi, que á primeira vista parece ter sido o grande

caudal que determinou o bandeirismo, foi desconhecido de grande parte do movimento”

(O Bandeirismo Paulista e o Recuo do Meridiano, pg. 44, Alfredo Ellis Jr).

No período das bandeiras, fase entre 1550 e 1720, o uso de barcos era apenas

providencial, para travessias de grandes cursos d água, ou para percorrer pequenos

trechos. Jamais houve caminhos fluviais nas bandeiras. É grosseiramente errôneo

apontar o Tiete e demais rios internos como caminhos de bandeirantes, ou mesmo

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que tivessem facilitado a expansão para o oeste. A conquista bandeirante foi

inteiramente realizada a pé, o uso de canoas ou barcos era esporádico, apenas para

travessias ou pequenos trechos, sendo abandonadas logo apos o uso.1

Como a bandeira tinha um caráter de desbravamento e ataques surpresas, o uso de

barcos não era adequado a estes propósitos, porque reduzia a flexibilidade das tropas,

e muitas vezes a velocidade era menor do que realizado por caminhos terrestres.2

Nas bandeiras do sul e no sertão (atual centro-oeste) os barcos eram utilizados com

mais freqüência, mas não para longas jornadas. Tal qual faziam os espanhóis na

mesma região. Embora havia uma rota fluvial entre as missões espanholas (nos atuais

Paraguai, Rio Grande do Sul e Paraná) e Buenos Aires. Foi por este mesmo caminho

que tomou o êxodo do Guairá (missão espanhola no norte do atual Paraná) por ordem

do pe. Montoya, em que mais de 12 mil espanhóis e índios fugiram das incursões

bandeirantes.

O transporte nas monções.

Monção, a palavra de origem árabe, significa “estação do ano em que se dá

determinado fato”. Em São Paulo o termo é atribuído ás grandes expedições fluviais

que se dirigiam para as minas de Cuiabá. Elas eram organizadas geralmente entre os

meses de abril e setembro, época considerada mais propícia.

Além das monções comerciais e de exploração, haviam também as monções oficiais,

chamadas de ‘Reiunas’, que eram organizadas para transportar tropas militares e

autoridades administrativas. A mais célebre, em 1726, transportou o governador

Rodrigo Cezar de Menezes, num total de 3.000 pessoas em 308 canoas.

1 Um fato notável da forma com que os barcos eram usados nas bandeiras, foi o ocorrido no rio Uruguai em 1640,

onde espanhóis avistaram balsas e canoas desgarradas após uma enchente, tais veículos produzidos rusticamente,

mas com precisão e esmero técnico, revelava a presença de Bandeirantes, se aproximando. Os espanhóis

mobilizaram suas tropas e surpreenderam os paulistas a vadear o rio Uruguai, no local chamado M´boré, a qual

ficou conhecida tal batalha, vencida pela Espanha 2 – há um caso de um viajante que indo de são Paulo parou num local próximo a Itu após 2 dias, e retornou de

cavalo em apenas algumas horas. Mostra que o transporte fluvial era penoso, lento e perigoso, e só tinha valor pela

elevada capacidade de carga a um custo reduzido

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A partida de uma Monção mobilizava toda a população dos locais de partida, como o

porto de Araritaguaba. Sob a tênue claridade da madrugada se reuniam os sacos de

mantimentos para serem comercializados. Constituíram-se basicamente de alimentos

não perecíveis, como farinha de milho e mandioca, feijão, toucinho, sal e carnes

salgadas; barris de aguardente; e também armas e munições. Tudo era embarcado nas

canoas e batelões3 pela tripulação da monção, auxiliados por soldados, escravos e

moradores locais. Mas tarde chegavam os chefes bandeirantes e a monção partia em

sua longa jornada.

“O desejo de enriquecimento rápido e o espírito de aventura pareciam lhes furtar, por

alguns instantes, a distância a ser vencida, os rios a transpor, a ferocidade dos índios e

tantos outros sofrimentos à sua espera. Antes da partida, todos recitavam uma

ladainha, sucedida pela benção final do sacerdote.

Momento de partir: todo o povo concentrado no porto. Tiros eram dados, rufavam os

tambores. Uma a uma, as canoas iam descendo o grande rio, tremulando bandeiras

coloridas. À sua frente, 3500 Km de águas para superar, dos rios Tietê, Paraná, Pardo,

Coxim, Taquari, Porrudos e Cuiabá, até atingirem a região das minas de ouro. O trecho

mais difícil era a subida do Rio Pardo, onde se gastavam até dois meses. Nas

cachoeiras, as canoas desciam seguras, amarradas por cordas, e as cargas, sobre os

ombros dos tripulantes.”

A áspera navegação do Tiete provocava fortes impressões nas narrativas dos

sertanistas e monçoeiros, revela Afonso Taunay (Relatos Monçoeiros). D. Luiz de

Céspedes narra suas desventuras em 1628 para o rei espanhol Felipe IV, para vencer as

“grandissimas corrientes y riesgos” onde era preciso muito esforço para impedir que as

canoas se destroçassem ou afundassem. No encontro do Jupiá com o rio Paraná. D.Luiz

resumia o infortúnio dos “grandíssimos remolinos y de mucho peligro” (Taunay, p. 44).

3 Batelão era uma embarcação baseada na piroga indígena. O material utilizado era um único tronco de

Peroba ou Ximbúva, madeiras muito resistentes. Eles tinham aproximadamente, 1,65 m de largura, 12 m de comprimento, 1,15 de profundidade e sua espessura em torno de 60 cm. Chegavam a acomodar 90 sacos de mantimentos. Os modelos posteriores possuíam coberturas de lona contra a chuva e alças de ferro. Geralmente sua tripulação era composta de piloto, contra-piloto, proeeiro e 6 remeiros.

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Num relatório de Gervasio Leite Rebelo em 1727, apontava que de Araraitaguaba até a

foz do Tiete tivera de vencer 160 obstáculos entre cachoeiras, correntezas, itaipavas,

trechos de cirga, despenhadeiros, contrassaltos, funis, jupiás, redemoinhos e

tucunduvas (Taunay, p. 44).

Os preparativos de uma monção demandava muito

preparo, relata Taunay, da saída de São Paulo para

Araraitaguaba a 2 de maio de 1751, só em 5 de

agosto partiu a monção. Sendo necessário colher o

milho e feijão, e produziu a farinha e reunir os demais

mantimentos. Alguns importados.

Em boa parte do traçado do Tiete ocorria densas

névoas, que obrigava a interrupção da viagem,

porque impedia o avistamento dos obstáculos. No

Tiete das monções se navegava das 8 às 17hs, mas as

vezes a névoa era tanta que só se obtinha visibilidade

perto do mio dia. Até a própria velocidade

representava riscos, nos traçados sinuosos cheios de

pedras afiadas. Os remeiros valiam-se de zingas como

freios para controlar a velocidade dos batéis.

Outro inconveniente era os insetos, voadores ou não, já que muitos caiam para dentro

das canoas durante os contatos com as matas que recobriam parte dos rios, ou arvores

apodrecidas que pendiam sobre o mesmo.

O trecho mais árduo, sem duvida era o desfiladeiro do Coxim, constituído de altíssimos

paredões verticais, e cheio de madeiras e troncos submersos. Era ali onde as canoas

eram puxadas por cordas, com os homens recostados nos penhascos, já que não havia

margem no rio.

Freqüentemente os remeiros eram obrigados a levantar as canoas e arrastá-las. Isso

ocorria nos ‘Zirgas’ – trechos rasos dos rios, onde as pedras podiam virar ou furar os

barcos. Em certas situações bastava retirar parte da carga, que seguia na margem,

Mapa de navegação dos rios – Estampa sem

n.º: Plano do Rio Tietê resumido com todas as

suas voltas donde se vê onde ficam as

cachoeiras, e a distância que há por linha reta

desde o porto de Araritaguaba até o Rio Grande

Paraná; como se mostra de linha A para B, para

cuja medição servirá o petipé que abaixo se

acha. Petipé de léguas.”

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carregadas pelos tripulantes, sendo reembarcadas quando da profundidade do rio era

favorável.

No varadouro de Avanhandava (no atual estado de Mato Grosso do Sul) os barcos

eram arrastados, conforme o trajeto utilizado, entre 300 e 800 metros morro acima,

vencendo um desnível de 11 metros, que ligava os afluentes. Para tanto colocavam

toras por baixo das canoas e iam puxando-as com cordas. Todos tinham de ajudar,

poupando-se apenas as mulheres, num esforço hercúleo.

Quando a noite chegava, os barcos eram embicados nas margens e amarrados,

geralmente com os próprios cipós ali existentes. Os tripulantes roçavam o mato e

construíam o abrigo. Redes amarradas a vigas com mosquiteiro ao redor. Tal como

representado na figura abaixo.

O retorno da monção era anunciado com um tiro de arcabuz. A cidade, antes

silenciosa, começa a sacolejar. O povo se dirige para o grande rio. A monção estava

chegando de Cuiabá. As pessoas, umas ansiosas pelas notícias de seus entes queridos

na longínqua colônia, outras inquietas para ter de volta seus filhos e maridos. Por

vários dias o porto permanecia movimentado, com a descarga das canoas, o ouro

recebido corria solto pela cidade, que logo voltaria ao seu estado pacato.

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A retomada do Tiete no papel central no transporte em São Paulo.

Com o fim das monções em 1838, data do ultimo comboio, e também de uma terrível

epidemia de tifo que se abateu sobre Porto Feliz, dizimando os últimos pilotos de

barcas. Esse evento marcou o inicio do interlúdio dos transportes fluviais paulistas.

Interlúdio que abrangeu todo o período do Café, no século XIX e inicio do século XX,

que priorizou o transporte ferroviário, mais eficiente na ligação das fazendas com o

porto de Santos, reduzindo drasticamente os custos de transporte.

Porém nos anos 1930 e 1940, São Paulo sofreu uma verdadeira ocupação militar, por

parte do governo federal do ditador Getúlio Vargas, onde todos os investimentos e

progressos conduzidos pelos paulistas há décadas foi paralisado e mesmo revertido. E

parte dele até confiscado, caso do porto de Santos, simplesmente roubado pelo

governo federal. Neste período de estagnação econômica e opressão política e moral,

plantou a semente da irracionalidade na condução dos transportes em São Paulo.

O período subseqüente, marcado por governos incompetentes e autoritários, o

transporte rodoviário teve não apenas a prioridade, mas a exclusividade, tendo em

vista o simples abandono pelo qual as ferrovias e rios foram relegados. Até hoje se

‘descobre’ trilhos de antigas ferrovias paulistas, em meio a campos cobertos por

vegetação ou enterrados sob as ruas nas cidades recém-expandidas. O mesmo

fenômeno se verifica com os rios. No caso, aventureiros que ‘descobrem’ marcas de

navegação gravadas nas pedras, ao longo do Tiete e de alguns afluentes.

Apesar disso, existem algumas tentativas de retomada do transporte fluvial em São

Paulo. A construção de barragens no rio Tiete, nos anos 80 e 90, permitiram vencer os

terríveis obstáculos á navegação convencional. E uma pequena proporção de

mercadorias paulistas volta a ser transportada por água, ainda de maneira insipiente,

mas um alento diante de tanto descaso das ultimas décadas.

Já o contemporâneo projeto do hidroanel, promete expandir o uso do transporte

fluvial, e incentivar o uso da própria hidrovia Tiete Paraná. Abrindo a possibilidade de

através de obras de engenharia, tornar a hidrovia acessível as vias diretas de

abastecimento nas cidades, substituindo em grande parte as rotas atualmente

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percorridas por caminhões. Com a construção de terminais multimodais, se racionaliza

o transporte de carga em são Paulo, não apenas em grandes percursos mas também

em rotas curtas, contornando o dilema do transito nas grandes metrópoles.

Somente o transporte multimodal de material de construção (areia, pedra, concreto,

entulho), cujas concreteiras estão todas as margens dos rios tiete, pinheiros e

Tamanduateí, poderiam transportar por pequenos cursos parte dos 120 milhões de

toneladas anuais de materiais. O que corresponde a 12 mil caminhões diariamente nas

ruas da metrópole. O uso de transporte multimodal, com barcaças transportando o

material dos locais de produção até os terminais para transferência para trens ou

caminhões, significaria a redução de 30 a 50% do numero de veículos em circulação,

ou seja, até 6 mil caminhões pesados por dia na grande são Paulo.

Este modelo é valido para todas as cidades paulistas, próximas do sistema hidroviário.

A construção de canais, eclusas, portos e terminais, farão parte das marcas dos

paulistas no espaço que ocupa. A racionalização do transporte, o controle das cheias, a

preocupação ecológica, a harmonização do homem com o ambiente. Essa é a nova

perspectiva do transporte fluvial em São Paulo.

Conclusão: O Tiete e o legado dos paulistas.

O imaginário da expansão bandeirante se aventurando por imensos espaços vazios,

pelo interior da pátria, submetendo as rarefeitas povoações indígenas, através de

caminhos fluviais, do qual o tiete, que nasce na serra do mar e corre em direção ao

interior, foi determinante para a expansão bandeirante. Essa hipótese é mais do que

superada. Os bandeirantes jamais se valeram dos rios para suas empreitadas, inclusive

o tiete, com suas inúmeras corredeiras, ziguezagues e diversos obstáculos a

navegação.

O tiete foi sim imprescindível na segunda fase de expansão paulista, as monções, cuja

essência era a atividade comercial e expansão das vilas no sertão. E seu eixo era o rio

tiete que conectava a capital, são Paulo, através do porto feliz, a 10 km da cidade, as

inóspitas regiões do interior, até Cuiabá, por meio dos rios e seus afluentes, com

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diversos trechos vencidos por terra, seja para conectar a outros rios, seja para vencer

as corredeiras, cachoeiras e outros obstáculos.

A civilização pode ser entendida como um conceito relacionado com a permanência

(Kenneth Clark, historiador da universidade de Oxford). Nesta perspectiva um povo

torna-se civilizado na medida em que resolve se fixar num local, e ao longo do tempo

busca moldar o espaço às suas necessidades e visão de mundo. As construções, a

relação que tem com as florestas, rios e topografia, alterando-os ou preservando-os,

representam a capacidade de evolução de sua cultura. Nesta perspectiva, a civilização

corresponde a marca que um povo é capaz de deixar num território. Por isso as

grandes construções que se fundem e confunde-se com o ambiente natural, tal como

os canais artificiais, e eclusas, são tão determinantes para a identidade de uma cultura,

e deixam uma marca mais significante do que as contribuições artísticas, que são

supraterritoriais.

Tietê, significa ‘mãe do rio’, os índios o chamava assim porque após os períodos de chuva, era possível pescar sem nenhum

esforço, os peixes ficavam ilhados nas poças e pequenas lagoas, nas várzeas do rio, e podiam ser apanhados com as mãos, como

um presente.

Neste aspecto a relação que um povo tem com o rio define bem o rumo de uma

civilização. Os primitivos habitantes de São Paulo devotavam ao rio um sentimento

religioso, o que garantiu sua preservação, mas implicou uma submissão a ele. Os

egípcios antigos devotavam ao rio um papel místico ainda mais intenso, e, no entanto

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a postura deste povo para com o rio foi inteiramente distinta. Os egípcios assinalaram

sua presença no território, e são suas construções, mais do que tudo, é que definiu sua

civilização. O seu esforço em controlar e moldar sua visão de mundo ao território, que

é por sua vez dominado pelo rio, bastou moldar e domar o rio, e puderam consolidar o

controle sobre o espaço em que se fixou, essa é a marca maior da civilização egípcia. E

elas foram particularmente construídas para a eternidade, que correlaciona com sua

visão de mundo, e por isso são as construções mais duradouras da historia humana.

Enquanto que inúmeros outros povos, surgiram e desapareceram sem deixar vestígios

de sua existência.

Quanto aos paulistas, por muitos séculos, a escolha cultural foi a transição, com a

constante movimentação de gentes e esforços, em busca de novos empreendimentos.

Tendo isso em consideração, é de se supor que as construções dos paulistas de outrora

eram efêmeras para atender este requisito de mobilidade. Desde a construção rápida

e improvisada de transportes fluviais, a instalação de povoados de apoio, os arraiais,

que tinham a função de dar suporte as bandeiras, e mais tarde as monções. Apenas

alguns arraiais sobreviveram e consolidaram-se, devido a posição estratégica, ou a

subida prosperidade do povoado. E a primeira construção marcante do território feito

por paulistas era sempre três – o estábulo, a igreja, e a granja. Bem diferente do Brasil

litorâneo que seguia as recomendações da civilização lusitana, onde os primeiros

edifícios eram o pelourinho, a sede do governo e a prisão. Marcas do domínio

português sobre o território.

São Paulo tinha uma identidade própria. Uma visão de mundo própria. E portanto um

destino diferente do Brasil litorâneo. Mas as amarras da dominação colonial prendiam,

e prendem ainda, os paulistas ao governo central.

O grande Tietê assistiu a passagem de bandeiras que desbravavam o sertão, e séculos

depois por suas águas navegaram as monções consolidando as cidades e vilas no

interior e assegurando as fronteiras da pátria. Mais tarde a terra roxa do basalto da

bacia do Tiete acomodou e alimentou as lavouras de café que deram a São Paulo

receitas vigorosas, e também assentaram os trilhos das estradas de ferro que ligavam

as lavouras aos portos. Os capitais oriundos do café permitiram aos paulistas investir

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na sua revolução industrial, e graças as águas do Tiete que impulsionaram as turbinas

de nossas hidrelétricas se forneceu a energia para as máquinas que garantiram uma

nova onda de riqueza e empregos para São Paulo.

Infelizmente o Tiete foi maltratado, com as invasões de seus mananciais, por

agenciadores políticos, que trazendo seu eleitorado de cabresto, para garantir suas

eleições ‘democráticas’. E também a poluição, o industrial embora já tenha sido

contido por estações de tratamento, o doméstico continua a envenenar suas águas,

quase que inteiramente oriundo de ocupações ilegais, não apenas favelas, mas

também mansões de ricos e prósperos invasores, além de certas cidades que não

obedecem aos parâmetros mínimos de urbanização, caso de Guarulhos, que despeja a

totalidade de seu esgoto no próprio rio.

Podemos acreditar que estas provações por que passa nosso amado Tiete seja apenas

mais um intervalo na história do povo paulista. Até que este acorde de seu estado de

torpor e responda ao chamado do sertão, apóie-se nas montanhas da serra do mar, e

seja novamente conduzido pelo rio, para descobrir o que o sertão destina para nós

paulistas.

Fontes:

Relatos Monçoeiros, Afonso de Taunay,

Caminhos e fronteiras, Sergio Buarque de Holanda, 3ª Ed, 2008,Cia das letras, SP.

Marcha para Oeste, Cassiano Ricardo,

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Neste número participaram: Cássio Forcignano,

Roberto Tonin e Geovana Lopes