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Artigo a respeito de lavagem de dinheiro

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  • REVISTA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL

  • Ordem dos Advogados do Brasil Conselho Federal Setor de Autarquias Sul - Quadra 5 - Lote 1 - Bloco M Braslia - DF CEP 70070-913 Tel.: (61) 2193-9600 Tiragem: 1.000 exemplares Capa: Susele Bezerra Miranda Sugestes para colaborao podem ser enviadas para: [email protected] Informaes: (61) 2193-9606 e (61) 2193-9663

    Ficha Catalogrfica

    Revista da Ordem dos Advogados do Brasil - Ano 1, v. 1, 1969

    - Rio de Janeiro, OAB, Conselho Federal, 1969 - quadrimestral.

    Passou a ser editada em Braslia, sede do Conselho Federal, com periodicidade

    trimestral a partir do Ano 19/20, v. 18/19, n. 43/48, 1998. Periodicidade irregular a partir do Ano 22, v. 20, n. 55, 1991. A partir do Ano 24, n. 57, 1994, foi suprimida a indicao do nmero do volume. Periodicidade semestral a partir do Ano 25, n. 60, 1995. Periodicidade anual a partir do Ano 42, n. 94, 2012.

    Os artigos da Revista esto indexados na Bibliografia Brasileira de Direito sob a Coordenao da Biblioteca do Senado Federal.

    ISSN 1516-1331

    1. Direito Brasil Peridico. 2. Advocacia - Peridico. I. Ordem dos Advogados do

    Brasil, Conselho Federal. CDDDir: 340.05

    Suzana Dias da Silva - CRB1/1964

  • OAB

    REVISTA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL

    ISSN 1516-1331 CONSELHO FEDERAL DA ORDEM

    DOS ADVOGADOS DO BRASIL ANO XLIII - N. 95 JAN./DEZ. 2013

  • Revista da Ordem dos Advogados do Brasil Ano XLIII n. 95 Janeiro a Dezembro de 2013 Diretoria Marcus Vinicius Furtado Colho Presidente Claudio Pacheco Prates Lamachia Vice-Presidente Cludio Pereira de Souza Neto Secretrio-Geral Cludio Stbile Ribeiro Secretrio-Geral Adjunto Antonio Oneildo Ferreira Diretor-Tesoureiro Conselheiros(as) Federais AC: Erick Venncio Lima do Nascimento, Florindo Silvestre Poersch e Luciano Jos Trindade; AL: Everaldo Bezerra Patriota, Felipe Sarmento Cordeiro e Fernando Carlos Arajo de Paiva; AP: Ccero Borges Bordalo Jnior, Helder Jos Freitas de Lima Ferreira e Jos Luis Wagner; AM: Eid Badr, Jean Cleuter Simes Mendona e Jos Alberto Ribeiro Simonetti Cabral; BA: Andr Luis Guimares Godinho, Fernando Santana Rocha e Ruy Hermann Arajo Medeiros; CE: Jos Cndido Lustosa Bittencourt de Albuquerque, Jos Danilo Correia Mota e Valmir Pontes Filho; DF: Aldemario Arajo Castro, Jos Rossini Campos do Couto Correa e Marcelo Lavocat Galvo; ES: Djalma Frasson, Luiz Cludio Silva Allemand e Setembrino Idwaldo Netto Pelissari; GO: Felicssimo Sena, Joo Bezerra Cavalcante e Miguel ngelo Sampaio Canado; MA: Jos Guilherme Carvalho Zagallo, Raimundo Ferreira Marques e Valria Lauande Carvalho Costa; MT: Cludio Stbile Ribeiro, Duilio Piato Jnior e Francisco Eduardo Torres Esgaib; MS: Afeife Mohamad Hajj, Carlos Alberto de Jesus Marques e Leonardo Avelino Duarte; MG: Paulo Roberto de Gouva Medina, Rodrigo Otvio Soares Pacheco e Walter Cndido dos Santos; PA: Edilson Oliveira e Silva, Iraclides Holanda de Castro e Jorge Luiz Borba Costa; PB: Carlos Frederico Nbrega Farias, Jos Mrio Porto Jnior e Walter Agra Jnior; PR: Alberto de Paula Machado, Csar Augusto Moreno e Jos Lucio Glomb; PE: Henrique Neves Mariano, Leonardo Accioly da Silva e Pelpidas Soares Neto; PI: Jos Norberto Lopes Campelo, Margarete de Castro Coelho e Mrio Roberto Pereira de Arajo; RJ: Carlos Roberto de Siqueira Castro, Cludio Pereira de Souza Neto e Wadih Nemer Damous Filho; RN: Humberto Henrique Costa Fernandes do Rgo, Kalebe Campos Freire e Lucio Teixeira dos Santos; RS: Claudio Pacheco Prates Lamachia, Cla Carpi da Rocha e Renato da Costa Figueira; RO: Antnio Osman de S, Elton Jos Assis e Elton Sadi Flber; RR: Alexandre Csar Dantas Soccorro, Antonio Oneildo Ferreira e Bernardino Dias de Souza Cruz Neto; SC: Jos Geraldo Ramos Virmond, Luciano Demaria e Robinson Conti Kraemer; SP: Guilherme Octvio Batochio, Luiz Flvio Borges DUrso e Mrcia Machado Melar; SE: Evnio Jos de Moura Santos, Henri Clay Santos Andrade e Maurcio Gentil Monteiro; TO: Andr Luiz Barbosa Melo, Erclio Bezerra de Castro Filho e Gedeon Batista Pitaluga Jnior. Ex-Presidentes 1. Levi Carneiro (1933/1938) 2. Fernando de Melo Viana (1938/1944) 3. Raul Fernandes (1944/1948) 4. Augusto Pinto Lima (1948) 5. Odilon de Andrade (1948/1950) 6. Haroldo Vallado (1950/1952) 7. Attlio Vivqua (1952/1954) 8. Miguel Seabra Fagundes (1954/1956) 9. Nehemias Gueiros (1956/1958) 10. Alcino de Paula Salazar (1958/1960) 11. Jos Eduardo do P. Kelly (1960/1962) 12. Carlos Povina Cavalcanti (1962/1965) 13. Themstocles M. Ferreira (1965) 14. Alberto Barreto de Melo (1965/1967) 15. Samuel Vital Duarte (1967/1969) 16. Laudo de Almeida Camargo (1969/1971) 17. Membro Honorrio Vitalcio Jos Cavalcanti Neves (1971/1973) 18. Jos Ribeiro de Castro Filho (1973/1975) 19. Caio Mrio da Silva Pereira (1975/1977) 20. Raymundo Faoro (1977/1979) 21. Membro Honorrio Vitalcio Eduardo Seabra Fagundes (1979/1981) 22. Membro Honorrio Vitalcio J. Bernardo Cabral (1981/1983) 23. Membro Honorrio Vitalcio Mrio Srgio Duarte Garcia (1983/1985) 24. Membro Honorrio Vitalcio Hermann Assis Baeta (1985/1987) 25. Membro Honorrio Vitalcio Mrcio Thomaz Bastos (1987/1989) 26. Ophir Filgueiras Cavalcante (1989/1991) 27. Membro Honorrio Vitalcio Marcello Lavenre Machado (1991/1993) 28. Membro Honorrio Vitalcio Jos Roberto Batochio (1993/1995) 29. Membro Honorrio Vitalcio Ernando Uchoa Lima (1995/1998) 30. Membro Honorrio Vitalcio Reginaldo Oscar de Castro (1998/2001) 31. Membro Honorrio Vitalcio Rubens Approbato Machado (2001/2004) 32. Membro Honorrio Vitalcio Roberto Antonio Busato (2004/2007) 33. Membro Honorrio Vitalcio Cezar Britto (2007/2010) 34. Membro Honorrio Vitalcio Ophir Cavalcante Junior (2010/2013). Presidentes Seccionais AC: Marcos Vincius Jardim Rodrigues; AL: Thiago Rodrigues de Pontes Bomfim; AP: Paulo Henrique Campelo Barbosa; AM: Alberto Simonetti Cabral Neto; BA: Luiz Viana Queiroz; CE: Valdetrio Andrade Monteiro; DF: Ibaneis Rocha Barros Jnior; ES: Homero Junger Mafra; GO: Henrique Tibrcio Pea; MA: Mrio de Andrade Macieira; MT: Maurcio Aude; MS: Jlio Cesar Souza Rodrigues; MG: Lus Cludio da Silva Chaves; PA: Jarbas Vasconcelos do Carmo; PB: Odon Bezerra Cavalcanti Sobrinho; PR: Juliano Jos Breda; PE: Pedro Henrique Braga Reynaldo Alves; PI: Willian Guimares Santos de Carvalho; RJ: Felipe de Santa Cruz Oliveira Scaletsky; RN: Srgio Eduardo da Costa Freire; RS: Marcelo Machado Bertoluci; RO: Andrey Cavalcante de Carvalho; RR: Jorge da Silva Fraxe; SC: Tullo Cavallazzi Filho; SP: Marcos da Costa; SE: Carlos Augusto Monteiro Nascimento; TO: Epitcio Brando Lopes.

  • APRESENTAO

    A Revista da Ordem dos Advogados do Brasil um instrumento que tradicionalmente trata de interesses da advocacia brasileira e dos operadores do Direito. A publicao revela a histrica misso da OAB no somente por tratar de assuntos pertinentes agenda nacional, mas tambm por expor as atividades da nossa Entidade no tocante ao seu papel corporativo e em defesa da justia, da cidadania e da democracia.

    Oferecendo um generoso registro de decises e de atos normativos deste Conselho Federal, os quais so oriundos do Conselho Pleno, do rgo Especial e das trs Cmaras e Turmas da Instituio - o leitor desta edio, de n. 95, encontrar tambm estudos firmados pelos mais qualificados autores no campo profissional.

    Em Discurso sobre os 90 anos da morte de Rui Barbosa, o Conselheiro Federal Paulo Roberto de Gouva de Medina, decano da Instituio e recentemente eleito em Plenrio para a outorga da Medalha Rui Barbosa, aborda a atualidade do pensamento do honorvel jurista que tanto ensinou s geraes brasileiras, resultando um texto precioso pela reflexo e contemporaneidade. Da lavra de Pierpaolo Cruz Bottini, o estudo intitulado Advocacia e lavagem de dinheiro analisa o papel do advogado em consonncia com o novo texto da lei de lavagem de dinheiro (Lei n. 9.613/98) aprovado em meados de 2013 - sem dvida, um artigo sobre tema de grande relevncia e atualidade em nossa sociedade. Finalmente, a investigao de Guilherme Rodrigues Abro, Rafael Klarmann e Renata Jardim da Cunha Rieger, apresentada em Breves consideraes sobre a garantia da fundamentao judicial: o mito da neutralidade, mostra-se um brilhante estudo acerca do dever de fundamentao das decises judiciais, garantida expressamente no art. 93, IX, da Constituio da Repblica.

    Os trabalhos mencionados e os arestos transcritos confirmam o alto nvel tcnico e acadmico desta produo e das publicaes da Ordem dos Advogados do Brasil, que visam, sobretudo, informar e apresentar discusses que acompanham os desafios contemporneos, capazes de fornecer tambm uma coletnea de estudos de valor prtico dirigida aos advogados brasileiros no cumprimento de sua funo social.

    MARCUS VINICIUS FURTADO COLHO Presidente do Conselho Federal da OAB

  • SUMRIO

    DOUTRINA

    PAZ NA PALESTINA

    Paulo Castelo Branco ............................................................................................................... 17

    BREVES CONSIDERAES SOBRE A GARANTIA DA FUNDAMENTAO JUDICIAL: O MITO DA NEUTRALIDADE: Requisitos e Vcios da Deciso

    Guilherme Rodrigues Abro

    Rafael Klarmann

    Renata Jardim da Cunha Rieger .............................................................................................. 19

    DISCURSO SOBRE OS 90 ANOS DE MORTE DE RUI BARBOSA

    Paulo Roberto de Gouvea Medina ........................................................................................... 31

    A INVASO DA SEDE DA OAB/DISTRITO FEDERAL PELO REGIME MILITAR

    Esdras Dantas de Souza...........................................................................................................39

    ADVOCACIA E LAVAGEM DE DINHEIRO

    Pierpaolo Cruz Bottini.............................................................................................................47

    ATOS NORMATIVOS

    Provimento n. 150/2013 ...................................................................................................... 59

    Provimento n. 151/2013 ...................................................................................................... 60

    Provimento n. 152/2013 ...................................................................................................... 61

    Provimento n. 153/2013 ...................................................................................................... 62

    Provimento n. 154/2013 ...................................................................................................... 63

    Provimento n. 155/2013 ...................................................................................................... 64

    Provimento n. 156/2013 ...................................................................................................... 65

    Provimento n. 157/2013 ...................................................................................................... 67

    Provimento n. 158/2013 ...................................................................................................... 68

    Provimento n. 159/2013 ...................................................................................................... 69

  • Resoluo n. 01/2013 ........................................................................................................... 70

    Resoluo n. 02/2013 ........................................................................................................... 71

    Resoluo n. 03/2013 ........................................................................................................... 72

    JULGADOS DO CONSELHO FEDERAL

    CONSELHO PLENO

    Proposta de adin. Limite de despesa de educao do imposto de renda da pessoa fsica. ....................................................................................................................................... 75

    Imunidade tributria das CAAs. Jurisprudncia STF. Propositura da medida judicial ................................................................................................................................... 83

    PJE. Obrigatoriedade de tramitao. Realidade tecnolgica de cada regio. .............. 91

    Lei de desapropriao. Amicus curiae. .............................................................................. 103

    Simples Nacional. Escritrio de advocacia. Projeto de Lei. .......................................... 107

    Proposta de alterao do Provimento n. 113/2006. Membros da OAB. Inscrio. Proibio. Renncia. ........................................................................................................... 114

    Proposta de ajuizamento de ADI. Lei de cartrios. Restrio de abertura de concurso pblico. ................................................................................................................................. 118

    Processo Judicial Eletrnico. Anlise e pendncias. ...................................................... 124

    Proposta de emenda constituio. Limitao da capacidade do STF....................... 134

    Quarentena de magistrado. Impedimento. Extenso aos demais scios da sociedade de advogados. ..................................................................................................................... 143

    Quarentena. Inscrio de membros do poder judicirios aposentados ou exonerados. ......................................................................................................................... 146

    Cargo de conciliador e cargo de juiz leigo ocupados por advogados em seleo pblica. Incompatibilidade. Impedimento. .................................................................... 150

    Competncia. Lei estadual. Depsitos judiciais. ............................................................ 158

    Arbitragem. Modificao de entendimento do rgo especial. ................................... 163

    Proposta de ADIN. Art. 20, 4 do CPC. Honorrios advocatcios. ........................... 170

    Limitao de vagas para mulheres em Concuso Pblico da Polcia Militar do estado do Piau. ............................................................................................................................... 177

    Biografias no autorizadas. ADIN 4815/STF. Amicus curiae. ....................................... 181

    Rejeio ao Projeto de Lei n. 4.774/2009. Acolhimento da nota tcnica. .................... 184

    Dirio eletrnico da OAB. Necessidade de alterao legislativa. ................................ 187

  • RGO ESPECIAL

    Impugnao de chapa pelo pagamento de anuidade de advogado. Prtica por terceiro no candidato........................................................................................................ 193

    Alegao de dupla sano pelo mesmo fato inexistente. .............................................. 198

    Processo disciplinar. Alegao de exerccio de advocacia em conjunto com escritrio com sede nos Estados Unidos. .......................................................................................... 206

    Servidores da estrutura do tribunal de contas. Incompatibilidade. ............................ 211

    Processo disciplinar. Audincia de instruo. ................................................................ 217

    Participao de advogados em rgos de julgamento de processos administrativos. Exerccio da advocacia. ...................................................................................................... 226

    Processo eleitoral. Abuso de poder. Extenso do impedimento de participao do processo eleitoral que sucede eleies anuladas. ........................................................... 236

    PRIMEIRA CMARA

    Pedido de inscrio. Inidoneidade moral ....................................................................... 241

    Pedido de inscrio principal. Cargo de educador social. Incompatibilidade. ......... 246

    Bacharel em direito ocupante de cargo de agente de trnsito do Detran. Incompatiblidade. ............................................................................................................... 260

    Pedido de inscrio. Fiscal federal agropecurio. Incompatibilidade ........................ 267

    SEGUNDA CMARA

    Grave violao aos preceitos ticos. Valores retidos indevidamente.......................... 287

    Pretenso cassao de ato de rgo da OAB, sob o fundamento de contrariedade ao Estatuto. Impossibilidade. ................................................................................................. 291

    Ausncia de demonstrao dos pressupostos de admissibilidade. No conhecimento. .. 296

    reteno ou extravio de autos. Prescrio da pretenso punitiva disciplinar. Inocorrncia. ........................................................................................................................ 301

    Pedido injustificvel de afastamento de Presidente de Seccional. Cerceamento de produo de provas inexistente. ....................................................................................... 311

    Pedido de reviso. Inadmissibilidade por fora da regra. ............................................ 320

  • PRIMEIRA TURMA

    Decadncia do direito de representar. Recurso no provido. ...................................... 328

    Inconstitucionalidade da cobrana de anuidades pelos Conselhos Seccionais da OAB. Inocorrncia. ........................................................................................................................ 335

    Matrias apreciadas exclusivamente pelo TED. Competncia recursal do Conselho Seccional. .............................................................................................................................. 342

    Recurso ao Conselho Federal. Prescrio da pretenso punitiva. ............................... 346

    Deciso unnime de Conselho Seccional. Alegao de violao ao Estatuto, ao CED, ao Cdigo Civil e CF no configurado. ........................................................................ 350

    Nulidade de processo disciplinar. Participao de julgador. ....................................... 354

    SEGUNDA TURMA

    Decadncia. Direito representao disciplinar. ........................................................... 363

    Representao apresentada por ex-cliente. Processo tico-disciplinar instaurado. Prescrio. ............................................................................................................................ 370

    Pedido de reabilitao. Cumprimento de pena ainda em curso. ................................. 376

    Preliminar de cerceamento de defesa. Inocorrncia. Intimao do recorrente para a sesso de julgamento por aviso de recebimento. ........................................................... 378

    Embargos de declarao. Omisso. Prescrio da pretenso punitiva. Acolhimento. ... 388

    Ausncia de infrao disciplinar. Exerccio da profisso. Liberdade. Recurso improvido. ........................................................................................................................... 393

    TERCEIRA TURMA

    Deciso unnime de Conselho Seccional. Anuidade. Dbito. Notificao. Nulidade. Quitao. Extino da punibilidade. ................................................................................ 396

    Processo administrativo de natureza tica e disciplinar. Prescrio. .......................... 399

    Processo disciplinar. Prescrio da representao. ........................................................ 404

    Publicidade na advocacia. Matria veiculada em meio televisivo. Anlise objetiva do fato. ....................................................................................................................................... 410

    Preliminar. Cerceamento de defesa. Ausncia de anlise ou indeferimento de pedido de adiamento de julgamento. ............................................................................................ 415

    Processo disciplinar. Ausncia de pagamento de anuidade. ....................................... 422

  • TERCEIRA CMARA

    Impugnao de chapa. Alegao de prtica de abuso de poder econmico, poltico e dos meios de comunicao. ............................................................................................... 427

    Pena de suspenso. Alegao de dupla sano pelo mesmo fato inexistente. .......... 431

    Recurso eleitoral. Impugnaes. Inscrio incompleta de chapa. ............................... 439

    Pedido de auxlio financeiro CAASP. Inteno de prorrogao vitalcia do benefcio. .............................................................................................................................. 442

    Pedido de registro de chapa. Indeferimento da inscrio. Chapa incompleta. ......... 445

    Recurso eleitoral contra deciso unnime. Substituio de candidatos impugnados. ...................................................................................................................... 448

    MEMRIA

    NOTCIAS

    Retrospectiva 2013: o ano da defesa da Constituio da Repblica ............................ 455

    Valorizar o advogado respeitar o cidado: 2013 e as prerrogativas ......................... 459

    2013: o ano da defesa dos honorrios advocatcios ....................................................... 462

    2013: o ano da defesa da Constituio da Repblica ..................................................... 465

    OAB lana em ato pblico coleta de assinaturas para a Reforma Poltica ................. 469

    Rio sediar a XXII Conferncia dos Advogados, decide Pleno da OAB .................... 469

    Colgio de Presidentes de Seccionais da OAB divulga a Carta de Belm .................. 470

    Carta de Braslia: constituio deve assegurar direitos do investigado ..................... 470

    Advogado: a voz do cidado contra injustias e pelos direitos ................................... 471

    DOCUMENTOS

    Ato Pblico de lanamento da Campanha por Eleies Limpas no Brasil:

    PELO FINANCIAMENTO DEMOCRTICO DE CAMPANHAS ELEITORAIS ..... 472

    Colgio de Presidentes dos Conselhos Seccionais da OAB

    CARTA DE BELM Maio 2013 ...................................................................................... 473

    Seminrio 25 anos da Constituio Federal de 1988

    CARTA DE BRASLIA ....................................................................................................... 474

  • Colgio de Presidentes dos Conselhos Seccionais da OAB

    CARTA DE JOO PESSOA Setembro 2013 ................................................................. 476

    Manifesto de Apoio Reforma Poltica

    CARTA NAO ............................................................................................................ 477

  • DOUTRINA

  • REVISTA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL ANO XLIII N. 95 JANEIRO A DEZEMBRO 2013

    17

    PAZ NA PALESTINA1

    Paulo Castelo Branco2

    As limitaes so muitas, mas a vontade de ser livre maior. Esta a

    sensao que se tem quando se chega a Ramallah, Palestina. Por indicao do presidente, Marcus Vinicius Furtado Coelho do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, este escriba-advogado e o presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros no DF, Carlos Mrio Velloso Filho, desembarcamos em Tel Aviv, Israel, com destino aos territrios ocupados, a convite da Palestinian Bar Association, rgo que congrega os advogados que atuam perante os tribunais palestinos e, tambm, no esforo em garantir os direitos dos cidados, controlados pelas foras armadas israelenses.

    O tema da paz na Palestina est sendo observado pela comunidade internacional, destacando-se a atuao do presidente americano Barack Obama, do Papa Francisco, da Unio Europia e de tantos outros pases como o Brasil, que buscam uma soluo pacfica para o impasse que gerou um dos mais longos perodos de ocupao do territrio de um povo.

    A Palestinian Bar Association, fundada em julho de 1997, tem como lema Promover a Justia, o Estado de Direito e os Direitos Humanos. A entidade nasceu a partir de trs organismos: Comit de Advogados rabes na Cisjordnia, a Jordnia Bar Association - Jerusalm, e da Sociedade de Advogados em Gaza.

    A Palestinian Bar Association regida pela Lei n. 3 de 1999, alterada pela lei n 5 de 1999. Inicialmente, a entidade foi administrada por um conselho fundador at as primeiras eleies no ms de Julho de 2003, quando um novo conselho, eleito com 15 advogados assumiu a direo.

    O conselho da PBA composto por 15 membros eleitos, sendo nove conselheiros na rea norte da Cisjordnia (West Bank) e seis na zona sul ( Faixa de Gaza ) . A direo apoiada por comits regionais, designados pelo conselho e chefiadas por um membro do conselho . Quatorze comits de filiais existentes na zona norte e dois na Faixa de Gaza. H tambm 13 comisses especializadas de apoio PBA na realizao de seu mandato em diversas reas . A PBA possui dois escritrios principais, um em Ramallah , com oito filiais que cobrem a Cisjordnia, e um em Gaza com duas filiais , cobrindo a Faixa de Gaza. A PBA emprega 12

    1 Fonte: www.blogpaulocastelobranco.com.br 2 Advogado. Foi Presidente do Tribunal de tica da Seccional do Distrito Federal, Secretrio Geral da Comisso de tica na Poltica do Conselho Federal e Secretrio de Segurana Pblica do Distrito Federal. membro da Academia Brasiliense de Letras e do Instituto Histrico e Geogrfico do Distrito Federal. Presidente da Coordenao Paz na Palestina, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

    http://www.blogpaulocastelobranco.com.br/
  • REVISTA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL ANO XLIII N. 95 JANEIRO A DEZEMBRO 2013

    18

    funcionrios na sede Ramallah , 12 em filiais e seis funcionrios na Faixa de Gaza. A entidade possui hoje cerca de 5.000 advogados militantes.

    Os objetivos da PBA, como promulgadas pela lei de 1999, so defender o interesse da associao e os advogados, proteger a profisso de advogado, garantir seus direitos de acordo com os princpios legais, promover princpios do Estado de direito e os direitos humanos, organizar os esforos dos membros para contribuir para o desenvolvimento de princpios legais e legislaes de apoio Justia, promover e incentivar a pesquisa jurdica, melhorar o nvel profissional e educacional de seus membros.

    As dificuldades impostas pelos dirigentes das foras de ocupao acarretam prejuzos incalculveis ao exerccio da advocacia, pois os cidados palestinos em suas relaes com os ocupantes no so submetidos a tribunais civis, e sim legislao militar. Com esta imposio, muitos cidados so levados s cortes militares sem assistncia jurdica que possa impedir arbitrariedades das autoriades.

    Quanto s questes entre os cidados palestinos, a atividade dos advogados exercda dentro dos prncipios dos estados democrticos e de direitos. O Poder Judicirio funciona com eficincia em todas as suas instncias, decidindo com imparcialidade as causas a ele submetidas.

    A cordialidade dos Palestinos digna de ser divulgada, pois difcil um povo que sofre, desde 1949, pela ocupao do seu territrio, manter a calma, a ponderao e a pacincia na soluo do conflito com Israel que, parece, estar longe de se concretizar.

    A sistemtica construo de residencias formando pequenas cidades na rea ocupada, com a remoo da populao nativa, desoladora. Se no bastasse o uso da fora para expulsar os palestinos, o poder ainda constroi altos muros, impedindo a circulao das pessoas.

    A nossa misso foi concluda oferecendo ao PBA a nossa solidariedade; e a Ordem dos Advogados do Brasil, mais uma vez, refora a sua posio como entidade defensora dos direitos humanos, do estado de Direito e da democracia.

  • REVISTA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL ANO XLIII N. 95 JANEIRO A DEZEMBRO 2013

    19

    BREVES CONSIDERAES SOBRE A GARANTIA DA FUNDAMENTAO JUDICIAL: O MITO DA NEUTRALIDADE

    Requisitos e Vcios da Deciso

    Guilherme Rodrigues Abro1

    Rafael Klarmann2

    Renata Jardim da Cunha Rieger3

    Resumo: O objeto de estudo o dever de fundamentao das decises judiciais, calcando-se tal dever em verdadeira garantia expressa na Constituio Federal (art. 93, IX). Demonstrou-se que por meio da motivao que se torna vivel a anlise de vrias outras garantias fundamentais atreladas ao devido processo legal. Mostrou-se, tambm, que a motivao do magistrado no somente um discurso pautado pela racionalidade, como se houvesse uma frmula matemtica para tanto. dotada de racionalidade e de certa subjetividade, pois a emoo tambm integra decisium judicial, devendo reconhecer-se que, consciente ou inconscientemente, aspectos psicolgicos do julgador compem a motivao. Por derradeiro, demonstrou-se que, se no observados os requisitos da motivao, se estar diante de uma nulidade absoluta que macula indelevelmente o devido processo legal. Palavras-chave: Fundamentao judicial. Racionalidade. Subjetividade. Emoo. Requisitos da fundamentao. Nulidade absoluta.

    1 A FUNDAMENTAO ENQUANTO GARANTIA: O CONTROLE DA RACIONALIDADE E DA SUBJETIVIDADE DAS DECISES

    O dever de fundamentao das decises judiciais transcende a uma garantia tcnica, representando, antes e acima disso, o resultado de determinada concepo sobre o exerccio do poder estatal. Isso porque atravs da motivao que possvel avaliar a atividade jurisdicional, verificando-se as escolhas e selees feitas pelo

    1 Advogado criminalista, Mestrando em Cincias Criminais (PUC/RS), Especialista em Direito Penal Empresarial (PUC/RS) e em Cincias Criminais (Rede LFG), Professor de Direito Penal da Ulbra. 2 Advogado criminalista, Mestrando em Cincias Criminais (PUC/RS), Especialista em Direito Penal e Processual Penal (Faculdade IDC) 3 Advogada criminalista, Mestranda em Cincias Criminais (PUC/RS), Especialista em Direito Penal e Processual Penal (Faculdade IDC).

  • REVISTA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL ANO XLIII N. 95 JANEIRO A DEZEMBRO 2013

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    julgador, a observncia de regras do contraditrio e as circunstncias factuais que formaram a verdade do juiz.4

    Nesse contexto, a fundamentao no interessa apenas s partes, que podem verificar se suas razes foram objeto de anlise pelo julgador, mas tambm ao magistrado, que demonstra a sua atuao, e sociedade, a qual verifica como est sendo distribuda a justia.5 Assim, com a motivao, asseguram-se objetivos polticos, como a participao popular, a legalidade, a previsibilidade do contedo das decises jurdicas, a separao dos poderes e a proteo dos direitos fundamentais.6

    Enfim, a fundamentao de rigor.7 E, nas palavras de Tourinho Filho, a sentena sem motivao uma no-sentena.8

    Nessa senda, parece acertada a posio Luigi Ferrajoli no sentido de que a motivao tem valor endoprocessual e extraprocessual. Mais, no exagerada sua afirmao de que a motivao pode ser considerada como o principal parmetro de legitimao interna, ou jurdica, e externa, ou democrtica, da funo judiciria.9

    Ao abordar que a fundamentao uma garantia extraprocessual, Ferrajoli refere-se publicidade. E inegvel que ambas fundamentao e publicidade esto umbilicalmente ligadas. H, nas palavras de Gomes Filho, uma [...] relao de instrumentalidade recproca, que decorre do objetivo comum de possibilitar a comunicao entre a atividade processual e o ambiente social.10

    A fundamentao e a publicidade esto expressamente consagradas na Constituio e reafirmadas na legislao infraconstitucional. No que tange publicidade, est prevista, com expressa ressalva para situaes de interesse pblico, entre os direitos e garantias fundamentais nos arts. 5, LX, c/c 37, caput, c/c art, 93, IX da Constituio Federal e no art. 792 do Cdigo de Processo Penal.

    Nesse contexto, no processo penal brasileiro, a regra a publicidade absoluta. E nem poderia ser diferente, pois, em um Estado que se diz Democrtico de Direito, no h espao para o mistrio. Nas palavras de Paulo Rangel, deve-se rejeitar o

    4 POZZEBON, Fabrcio Dreyer de vila. A crise do conhecimento moderno e a motivao das decises judiciais como garantia fundamental. In: GAUER, RUTH Maria Chitt (Coord.). Sistema penal e violncia. Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2006. p. 242. 5 POZZEBON, loc. cit. 6 GOMES FILHO, Antnio Magalhes. A motivao das decises penais. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 82 et seq. 7 TOURINHO FLHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. So Paulo: Saraiva, 2009. p. 20. 8 TOURINHO FLHO, loc. cit. 9 Segundo Ferrajoli, La presencia y, sobre todo, la exposicin al control de la motivacin gracias a su forma lgica y semntica tienen por consiguiente el valor de una discriminacin entre mtodos procesales opuestos y, como reflejo, entre modelos opuestos de derecho penal: entre lo que Carrara llamaba conviccin autocrtica porque estaba basada en la mera inspiracin del sentimiento y la conviccin razonada por haberse expuesto las razones tanto jurdicas como fcticas. y, em consecuencia -segn la alternativa enunciada desde el comienzo de este libro-, entre cognoscitivismo y decisionismo penal, entre verdades y valoraciones, entre garantismo y sustanciaiismo penal. Al mismo tiempo,en cuanto asegura el control de la legalidad y del nexo entre conviccin y pruebas, la motivacin tiene tambien el valor endo-procesal de garanta de defensa y el valor extra-procesal de garantia de publicidad. Y puede ser considerada como el principapl parmetro tanto de la legitimacin interna o jurdica como de la externa o democrtica de la funcin judicial. (FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razn. Madrid: Trotta, 1995. p. 623). 10 GOMES FILHO, 2001, p. 104.

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    poder que oculta e no se tolerar o poder que se oculta, consagrando-se a publicidade dos atos e das atividades estatais.11,12

    No que concerne fundamentao, est prevista no art. 93, IX, da Constituio e no art. 382, III, do Cdigo de Processo Penal. S a fundamentao permite avaliar se a racionalidade da deciso predominou sobre o poder e, principalmente, se houve a observncia das regras do devido processo legal.13

    O processo, como se sabe, destina-se a comprovar se um determinado ato humano realmente ocorreu. Trata-se de uma atividade recognitiva: A um juiz com jurisdio que no sabe, mas que precisa saber, d-se a misso (mais preciso seria dizer Poder, com o peso que o substantivo tem) de dizer o direito no caso concreto, com o escopo (da sua parte) pacificador [...].14 Mais:15

    [...] intermedeia, do seu conhecimento do caso concreto (notio; cognitio) sentena (no esquecer, jamais, que, do latim, a palavra decorre de sentire, gerndio sentiendo, s para que se no pense em mquinas judicantes), um conjunto de atos preordenados a um fim. Ora, tais atos (e o radical continua latino e em actio), tomando em conta aquele escopo, tm, por evidente, o fim de sanar a ignorncia, razo pela qual se vai falar em instruo (do latim instructione) [...]

    Em outras palavras, o saber- enquanto obteno de um conhecimento

    sobre o fato o fim a que se destina o processo, o qual deve ser um instrumento eficaz para a sua obteno. Da a imprescindibilidade da motivao judicial, ressaltada por Lopes Jnior:16

    [...] a motivao serve para o controle da racionalidade da deciso judicial. No se trata de gastar folhas e folhas para demonstrar erudio jurdica (e jurisprudencial) ou discutir obviedades. O mais importe explicar o porqu da deciso, o que levou a tal concluso sobre a autoria e a materialidade. A motivao sobre a matria ftica demonstra o saber que legitima o poder, pois a pena somente pode ser imposta a quem racionalmente pode ser considerado autor do fato criminoso imputado.

    11 RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 9. ed. Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2005, p. 12 et seq.. 12 Ressalva-se que, excepcionalmente, admitida a publicidade especial ou restrita, desde que seja necessria a restrio para o interesse social ou para a defesa da intimidade das partes (TOURINHO FLHO, 2009, p. 20). E no demais lembrar a imprescindibilidade da motivao nas decises que restringem a publicidade. Em outras palavras, mesmo naqueles casos em que a limitao da publicidade permitida (ar. 5, LX, e 93, IX), sem uma expressa justificao sobre fatos que caracterizem as excees constitucionais, no possvel ao juiz determinar o segredo (GOMES FILHO, 2001, p. 105). 13 LOPES JNIOR, Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. 1, p. 195. 14 COUTINHO, Jacinto Nelson Miranda de. Glosas ao Verdade, dvida e certeza, de Francesco Carnelutti, para os operadores do direito. Revista de Estudos Criminais, Porto Alegre, v. 4, p. 77-94, 2004. p. 80 et seq. 15 COUTINHO, loc. cit. 16 LOPES JNIOR, 2008, v. 1, p. 195.

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    Juntamente ao controle da racionalidade das decises judiciais, necessrio observar o controle da subjetividade. Durante perodo da histria do pensamento moderno - mais precisamente durante o Estado Liberal - buscou-se um tipo de saber isento de qualquer imperfeio humana. Defendeu-se a idia de que o homem, enquanto sujeito cognoscente, poderia anular-se completamente nas relaes de conhecimento: o sujeito limitar-se-ia a captar o objeto.17,18

    Buscava-se uma verdade absoluta, que s poderia ser alcanada atravs de um juiz mito (Deus), capaz de ser neutro. Enfim, nesta concepo, tinha-se o juiz enquanto um rgo neutro e imparcial que, por no ter interesse direto no caso, tutelaria a igualdade das partes no processo, atingindo a pacificao de conflitos de interesses e a justia.19

    A partir do sculo XX, quando a Fsica Clssica - baseada na ideia de continuidade - cede lugar Fsica Quntica -calcada na descontinuidade-, surge uma nova viso de mundo que rompeu o conhecimento at ento existente. Nesta nova concepo, no se fala em objetividade pura e nem em verdades absolutas: passa-se a admitir a existncia de espaos entre o parcial e o imparcial e certeza e incerteza.20

    Sobre esta nova viso de mundo, Pozzebon ressalta:

    Este novo conhecimento, com tal dimenso, que alterou toda uma viso de mundo, no pode mais ficar afastado do Direito e da forma de encarar as decises judiciais. Assim, a deciso no fruto de razo ou o da subjetividade, mas de razo e subjetividade, simultaneamente. O juiz no parcial ou imparcial, mas parcial e imparcial. A deciso no verdadeira ou falsa, mas verdadeira e falsa. tudo isso. humana .21

    Assim, hoje, reconhece-se que no existe racionalidade independentemente

    de sentimento, da subjetividade.22 No existe racionalidade sem sentimento, emoo, da a importncia da subjetividade e de todo o sentire no ato decisrio e da necessidade de assumir que a decisum um ato de crena, de f (abandono da verdade pela impossibilidade).23,24

    17 COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. O Papel do novo Juiz no processo penal. In: CRTICA teoria geral do direito processual penal. So Paulo: Renovar, 2001. p. 42. 18 Alguns fatores foram determinantes por esta busca pela neutralidade, tais como (a) a crena em uma razo que tivesse validade universal; (b) a necessidade de legitimar o discurso do Estado Moderno nascente (Estado de todos, que falava em nome de toda a nao); (c) a urgncia em ocultar que os reais interesses do Estado eram de classes e no do povo. Passa-se, ento, a falar de igualdade jurdica - todos so iguais perante a lei - e interesse pblico na resoluo de conflitos. 19 COUTINHO, 2001, p.44. 20 POZZEBON, 2006, p. 232. 21 POZZEBON, loc. cit. 22 Neste sentido, colaciona-se, ainda, trecho de Antnio Damsio: esse o erro de Descartes, a separao abissal entre o corpo e a mente, entre a substncia corporal, infinitamente divisvel, com volume, com dimenses e com um funcionamento mecnico, de um lado, e a substncia mental, indivisvel, sem volume, sem dimenses e intangvel, de outro; a sugesto de que o raciocnio, o juzo moral e o sofrimento adveniente da dor fsica ou agitao emocional poderiam existir independentemente do corpo. Especificamente: a separao das operaes mais refinadas, para um lado, e da estrutura e funcionamento do organismo biolgico, para o outro. (DAMSIO, Antnio R. O erro de Descartes: emoo, razo e crebro humano. So Paulo: Companhia das Letras, 1996. p. 280). 23 LOPES JNIOR, 2008, v. 1, p. 198.

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    E este sentire implica, essencialmente, a atividade (s)eletiva do juiz, que dever, na dimenso probatria, eleger entre teses apresentadas (acusatria e defensiva) qual delas ir acolher. J no plano jurdico, decidir o significado vlido da norma.25 E lhe cumprir deixar clara que opes foram feitas, possibilitando, reitera-se, s partes e sociedade o conhecimento de suas decises.

    E, como bem lembra Fabrcio Pozzebon, este dever de fundamentar tem trs importantes faces no Estado Democrtico e Social de Direito. So elas:26

    [...] a) uma garantia de defesa contra eventuais abusos do poder estatal, uma vez que o julgador dever explicitar os motivos que o levaram a decidir daquela forma ( um ponto de partida), alm de possibilitar a interposio do recurso cabvel; b) a materializao do direito subjetivo prestao jurisdicional por parte do Estado, aps um procedimento marcado por garantias, as quais devero estar traduzidas na fundamentao; e c) dever do Estado prest-la, assim como a educao, sade, segurana, em primeiro e segundo graus de jurisdio, devendo o juiz atuar materialmente no sentido de sua efetivao (juiz ativo do Estado Democrtico e Social de Direito), sempre sob pena de configurao de nulidade expressamente prevista no texto constitucional.

    Por derradeiro, insta referir que adequada a posio do autor, no sentido de

    que a fundamentao judicial - mesmo sem estar prevista no rol do art. 5 da Constituio27 - uma garantia fundamental. Mais, trata-se da garantia das garantias, garantia-me, ponto de partida para anlise do respeito a todos os demais direitos constitucionais do acusado28.

    2 REQUISITOS DA MOTIVAO: DOS ASPECTOS OBJETIVOS EMOO

    Importante salientar que h determinados requisitos para que uma motivao judicial seja considerada idnea, inclusive para assegurar a funo de garantia fundamental que possui o dever de fundamentao de todo o provimento jurisdicional (art. 93, inc. IX, CF/88). Para tanto, possvel identificar como requisitos da motivao alguns aspectos fundamentais como integridade, correlao, dialeticidade e racionalidade.29

    A integridade pode ser concebida como um inerente imperativo do prprio mandamento constitucional do art. 93, inc. IX, da CF/88, o qual estabelece que todos

    24 E, vale ressaltar, a denncia desta subjetividade no visa a deslegitimar a deciso judicial. Objetiva-se, reitera-se, apenas, revelar a necessidade de que o juiz se d conta de sua subjetividade assuma-a - e parta disso para julgar. 25 LOPES JNIOR, op. cit., p. 198 et seq. 26 POZZEBON, op. cit., p. 247. 27 No demais referir que os constitucionalistas firmaram entendimento de que o rol do art. 5 meramente exemplificativo. , portanto, possvel a existncia de direitos fundamentais em outros dispositivos da Constituio e, at mesmo, fora deste Diploma. Esta , alis, a nica interpretao que se coaduna com a clusula de abertura constante no 2 do art. 5 da Carta da Repblica. 28 POZZEBON, 2006, p. 247. 29 GOMES FILHO, 2001, p. 174 et seq.

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    os julgamentos dos rgos do Poder Judicirio sero pblicos, e fundamentadas todas as decises, sob pena de nulidade [...], isto dizer que todo e qualquer provimento jurisdicional deve ser sempre justificado.30

    O requisito da correlao entendido como a exigncia de que os elementos que servem de base para a deciso estejam no processo, no podendo o julgador valer-se de elementos extra autos para justificar sua deciso, sob pena de indelvel mcula ao princpio do devido processo legal.31 Assim, os elementos de convico que levam motivao devem obrigatoriamente se encontrar no processo judicial.

    Por seu turno, o imperativo da dialeticidade deve ser analisado a partir da idia de contraditrio no processo32, uma vez que tudo aquilo que for contra-argumentado pela parte dever ser levado em considerao na deciso judicial, ou seja, dever o julgador observar no s os argumentos, mas tambm os contra-argumentos da (s) parte (s) para balizar sua deciso. Da que:

    [...] evidente que o discurso justificativo dessa mesma deciso no pode ser algo semelhante a um monlogo, em que so apresentados argumentos de autoridade, mas, ao contrrio, deve possuir um carter dialgico capaz de dar conta da real considerao de todos os dados trazidos discusso da causa pelos interessados no provimento.33

    2.1 A RACIONALIDADE E A EMOO NA MOTIVAO JUDICIAL

    Outro requisito importante e fundamental para a motivao das decises a

    questo da racionalidade, entendida como um discurso coerente, harmnico e no-contraditrio. Este aspecto merece especial destaque, pois se tornam essenciais algumas ponderaes sobre a rdua tarefa de julgar e prolatar decises no dia-dia dos julgadores, especialmente para dar ateno a um ponto fundamental da atividade jurisdicional: a razo e a emoo na motivao.

    30 o que Gomes Filho (Ibid., p. 175) leciona ao afirmar que: vista disso, no se pode conceber uma fundamentao em que no estejam justificadas todas as opes adotadas ao longo desse percurso decisrio, sob pena de frustrar-se o imperativo constitucional, principalmente se consideradas as funes de garantia que consagra. [...] Nesse sentido, possvel dizer que a integridade supe a adequao do discurso justificativo aos temas que so efetivamente objeto de deciso. 31 Para Gomes Filho (2001, p. 178), a correlao seria denominada de correo e consistiria na [...] correspondncia entre os elementos considerados como base da deciso e aqueles efetivamente existentes no processo, bem como seria o [...] exigir que na articulao do raciocnio decisrio apenas sejam considerados elementos que efetivamente correspondam aos existentes no processo. 32 [...] o processo um procedimento do qual participam (so habilitados) a participar aqueles em cuja esfera jurdica o ato final destinado a desenvolver efeitos: em contraditrio, e de modo que o autor do ato no possa obliterar as suas atividades e, para tanto, [...] necessria alguma coisa a mais e diversa; uma coisa os arqutipos do processo nos permitem observar: a estrutura dialtica do procedimento, isto , justamente, o contraditrio. (FAZZALARI, Elio. Instituies de direito processual. Trad. Elaine Nassif. 1. ed. Campinas: Bookseller, 2006. p. 119). Na viso de Cordero, o [...] debate contradictorio requiere, por lo menos, dos personas que intervengam, ante uno que los modera, y presupone luchadores equivalentes, y triunfa el mejor. Ainda: [...] por lo menos dos personas que hablan delante de uno que las escucha y las regula: ambas niegan, afirman, aducen pruebas, elaboran los respectivos materiales, discuten; rigen reglas que tienden a establecer cul ES La hiptesis mejor. (CORDERO, Franco. Procedimiento penal. Bogot: Temis, 2000. t. 2, p. 201 et seq.). 33 GOMES FILHO, 2001, p. 177.

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    Inegavelmente, partindo-se da idia de que o dever constitucional de fundamentao das decises uma garantia fundamental, mister se faz reafirmar mais uma vez - que a motivao do julgador no um ato pura e simplesmente racional, mas sim, um ato dotado de certa subjetividade. Em outras palavras, certo que toda deciso judicial fruto (ou deveria ser, ao menos) de uma racionalidade. Contudo, h de se reconhecer que, na motivao, h uma carga de sentimentos que se alia racionalidade.34

    Assim, o julgador, ao formar seu convencimento daquilo que est nos autos, ir formular mentalmente um juzo de valorao juzo crtico acerca de algo sobre o qual ir decidir e buscar na motivao argumentos para justificar sua prpria deciso. E, como no poderia ser diferente, na formao desse juzo de valorao, h influncia de vrios fatores, at mesmo psicolgicos.35

    Dessa forma, a motivao, aquilo que leva o julgador a fundamentar sua deciso, no fruto apenas de certa dose de racionalidade, mas tambm influenciada, consciente ou inconscientemente, por aspectos psicolgicos, o que, ento, permite reconhecer que no h deciso judicial em que no haja racionalidade e emoo na motivao.

    E essa afirmao, ressalta-se, no coloca em risco a cincia do Direito, pautada na anlise das leis, princpios, normas e regras de forma abstrata. Nesse sentido, colaciona-se trecho de Ldia Almeida Prado:

    [...] a emoo dos juzes na prolao das sentenas no significa propor o drstico abandono da racionalidade no direito, mas a um uso equilibrado dela. [...] A sentena, embora baseada no conhecimento jurdico, uma deciso como outra qualquer. Como ponderei, do mesmo modo que ocorre em outras reas do saber, muito devagar surgem no Direito os indcios de uma valorizao da emoo no ato de julgar, sem ser desconsiderada a racionalidade.36

    3 OS VCIOS DA MOTIVAO E A SANO DE NULIDADE

    Uma vez no observados os requisitos anteriores acerca da motivao, possvel que haja a configurao de determinados vcios na deciso judicial que

    34 Isto dizer que: Com efeito, o ensino convencional no mais atende s presses exercidas pelas alteraes sociais dos ltimos cinqenta anos (entre as quais destacam-se as mudanas no comportamento feminino e na definio dos papis sexuais) que parecem estar, de modo gradativo, apontando para um novo padro de homem e, portanto, para um novo padro de juiz. Esse novo magistrado vou cham-lo de juiz racional-emocional -, poder ser um parmetro na formao dos julgadores do sculo XXI. (PRADO, Ldia Reis de Almeida. Racionalidade e emoo na prestao jurisdicional. In: ZIMERMANN, David; COLTRO, Antonio Carlos Mathias (Org.). Aspectos psicolgicos na prtica jurdica. Campinas: Millennium, 2007. p. 43-44. 35 o que leciona Zimermann ao aduzir que A formao do juzo crtico depende de uma srie de fatores conscientes e inconscientes dos quais, aqui, vamos considerar, separadamente, os seguintes: os valores impostos pelo Superego; as funes do Ego, como as de Percepo, Pensamento e Discriminao; o processo de identificao; os tipos bsicos de Personalidade e a Ideologia pessoal do juiz. (ZIMERMANN, David. A influncia dos fatores psicolgicos inconscientes na deciso jurisdicional: a crise do magistrado. In: ZIMERMANN, David; COLTRO, Antonio Carlos Mathias (Org.). Aspectos psicolgicos na prtica jurdica. Campinas: Millennium, 2007. p. 135). 36 PRADO, op. cit,, p. 47.

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    afetem a garantia fundamental elencada no art. 93, inc. IX, da CF/88, bem como o prprio princpio constitucional do due process of Law.

    Um dos vcios que representa, indubitavelmente, maior violao aos referidos comandos constitucionais a inexistncia de motivao, ou seja, a total ausncia de argumentos justificativos adotados pelo julgador quando da tomada de uma deciso.37 Isso se d, por exemplo, quando o juiz apenas se utiliza da reproduo de texto legal para justificar sua deciso ou, at mesmo, a consagrada expresso em muitos julgados: para evitar tautologia.

    Tambm possvel identificar casos de motivao incompleta, em desacordo com o requisito da integridade, quando no justificados alguns pontos da deciso judicial. Esse vcio de motivao ocorrer, nas palavras de Gomes Filho, [...] sempre que no seu texto no se apresentem justificadas as variadas escolhas que so necessrias para se chegar concluso, segundo as caractersticas estruturais do provimento examinado.38

    Ademais, a motivao pode ser incompleta por no abranger todos os argumentos e contra-argumentos existentes no processo, ou seja:

    O no-atendimento desse imperativo constitui vcio de particular gravidade, pois o silncio do discurso justificativo quanto s provas e alegaes das partes revela no s a falta de uma adequada cognio, mas, sobretudo a violao de um princpio natural do processo. [...] Assim, mais correto e adequado entender que a exigncia de dialeticidade da motivao diz respeito s atividades defensivas que objetivam efetivamente provocar a deciso sobre uma questo pertinente discusso da causa e que resultam, portanto, na ampliao da atividade cognitiva judicial.39

    Ainda, para que a deciso judicial seja idnea e devidamente fundamentada,

    dever o julgador observar que sua motivao dever partir sempre dos elementos acostados ao processo, devendo haver correlao, portanto, entre os elementos justificadores da deciso e os existentes nos autos.

    fundamental que a motivao seja fruto de uma racionalidade e consista em um discurso harmnico, coerente e no-contraditrio que possa justificar a deciso tomada. Assim, o que se pretende evitar so incompatibilidades, incongruncias, no discurso justificativo do julgador, como, por exemplo, casos em que o juiz reconhece a atipicidade da conduta, mas absolve o acusado por insuficincia de provas; juiz que discorre sobre posicionamento tido como correto, mas aplica tese oposta.40

    37 O primeiro e mais grave deles , sem dvida, a inexistncia de um discurso mnimo que seja em que o juiz enuncie as razes do provimento: a prpria omisso grfica de qualquer documento sobre o iter do raciocnio decisrio constitui a forma mais evidente de violao do dever constitucional, pois revela que a deciso no foi fruto de uma ponderada reflexo sobre os elementos de fato e de direito disponveis nos autos, mas representa ato de pura vontade pessoal do seu autor. (GOMES FILHO, 2001, p. 185). 38 Ibid., p. 187. 39 Ibid., p. 188. Vale referir que o autor considera esse vcio de motivao como sendo no-dialtico. 40 De qualquer modo, trata-se de vcio gravssimo, que, alm de revelar a falta de correo no desenvolvimento do raciocnio decisrio, torna invivel o prprio controle deste, pois uma argumentao que contenha asseres inconciliveis impede aos

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    J em relao aos aspectos subjetivos psicolgicos que afetam a deciso judicial, possvel sim que, em determinados casos, haja vcio de motivao. nesse sentido que o Cdigo de Processo Penal prev as causas de suspeio e de impedimento (artigos 252 e 254).

    Contudo, ainda que de difcil percepo dos aspectos subjetivos (sentimentais / psicolgicos) do julgador quando da prolao de sua deciso, tal caso de vcio de motivao no somente decorrente do impedimento ou suspeio do julgador, podendo, de acordo com o caso concreto, verificar-se pelo prprio teor da deciso. Isso acaba se coadunando com a prpria definio de sentena, seno vejamos:

    A palavra sentena origina-se do latim sententia, cuja raiz sentire, sentir. Da a associao com sentimento. Ou seja, at do ponto de vista etimolgico, a sentena est mais relacionada com sentimento e vontade, do que com cognio e razo. Na realidade, ambos os momentos esto presentes, pois a atividade decisional envolve no s a cognio e razo, mas tambm implica a necessidade de fazer escolhas e a o papel do sentimento e da vontade est presente, quer disso se tenha conscincia ou no.41

    Diante desses requisitos da motivao que, se no observados, constituem

    verdadeiro vcio de motivao e, por conseguinte, afetam a justificao do ato decisrio, inegvel que sero violados preceitos constitucionais, especialmente o princpio do devido processo legal. Ademais, o prprio artigo 93, inc. IX, da CF/88 estabelece a pena de nulidade para a deciso que no devidamente fundamentada.

    Deve-se, ainda, ter em conta que a nulidade mencionada absoluta, a qual poder ser declarada de ofcio pelos Tribunais, sem que haja necessidade de argio pelas partes. Mais, pode ser declarada a qualquer tempo, pois no preclui, e no necessrio (ou, ao menos, no deveria ser) fazer prova do prejuzo, eis que este evidente.

    A mcula ao princpio constitucional do devido processo legal e ao prprio art. 93, inc. IX, da CF/88, por si s, j justifica a configurao de nulidade absoluta quando houver o reconhecimento de algum dos vcios da motivao. isso que ensina Gomes Filho:

    A nulidade no caso absoluta, pois o ato processual inconstitucional, quando no juridicamente inexistente, no pode dar lugar nulidade relativa, uma vez que as garantias processuais-constitucionais, mesmo quando aparentemente postas em benefcio

    destinatrios da motivao conhecer claramente a ratio decidendi, frustrando a sua funo de garantia. (GOMES FILHO, 2001, p. 193). 41 FACCHINI NETO, Eugnio. E o juiz no s de direito... (ou A funo jurisdicional e a subjetividade). In: ZIMERMANN, David; COLTRO, Antonio Carlos Mathias (Org.). Aspectos psicolgicos na prtica jurdica. Campinas: Millennium, 2007. p. 413.

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    da parte, visam em primeiro lugar ao interesse pblico na conduo do processo segundo as regras do devido processo legal.42

    Portanto, de acordo com as razes expostas e com fundamento constitucional,

    tem-se que a sano prevista para os casos de vcios de motivao deve ser entendida - sempre e em qualquer hiptese - como nulidade absoluta. A fundamentao, reitera-se, garantia-me, ponto de partida para anlise do respeito a todos os demais direitos constitucionais, sendo inadmissvel conceder tratamento leniente sua ausncia ou sua deficincia.

    REFERNCIAS CORDERO, Franco. Procedimiento penal. Bogot: Temis, 2000. t. 2.

    COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. O Papel do novo Juiz no processo penal. In: CRTICA teoria geral do direito processual penal. So Paulo: Renovar, 2001.

    ______. Glosas ao Verdade, dvida e certeza, de Francesco Carnelutti, para os operadores do direito. Revista de Estudos Criminais, Porto Alegre, v. 4, p. 77-94, 2004.

    DAMSIO, Antnio R. O erro de Descartes: emoo, razo e crebro humano. So Paulo: Companhia das Letras, 1996.

    FACCHINI NETO, Eugnio. E o juiz no s de direito... (ou A funo jurisdicional e a subjetividade). In: ZIMERMANN, David; COLTRO, Antonio Carlos Mathias (Org.). Aspectos psicolgicos na prtica jurdica. Campinas: Millennium, 2007.

    FAZZALARI, Elio. Instituies de direito processual. Trad. Elaine Nassif. 1. ed. Campinas: Bookseller, 2006.

    FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razn. Madrid: Trotta, 1995.

    GOMES FILHO, Antnio Magalhes. A motivao das decises penais. So Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

    LOPES JNIOR, Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. v. 1.

    POZZEBON, Fabrcio Dreyer de vila. A crise do conhecimento moderno e a motivao das decises judiciais como garantia fundamental. In: GAUER, RUTH Maria Chitt (Coord.). Sistema penal e violncia. Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2006.

    42 GOMES FILHO, 2001, p. 202. J Fazzalari (2006, p. 519 et seq) trataria essa situao a partir do entendimento de que o ato seria anulvel, embora existente: [...] o provimento jurisdicional emitido pelo juiz incompetente, ou o de contedo disforme daquele que deveria ter sido dado em vista da ocorrncia de uma certa situao substancial pressuposta (e cujo vcio , em certos casos, colocado sob nome imprprio, mas sugestivo, de injustia da sentena), ou o provimento carente de motivao, ou o precedido de um processo viciado (no qual tenham sido colocados atos processuais viciados); existem como provimentos, mas so anulveis.

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    PRADO, Ldia Reis de Almeida. Racionalidade e emoo na prestao jurisdicional. In: ZIMERMANN, David; COLTRO, Antonio Carlos Mathias (Org.). Aspectos psicolgicos na prtica jurdica. Campinas: Millennium, 2007.

    RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 9. ed. Rio de Janeiro: Lmen Juris, 2005.

    TOURINHO FLHO, Fernando da Costa. Manual de processo penal. 11. ed. So Paulo: Saraiva, 2009.

    ZIMERMANN, David. A influncia dos fatores psicolgicos inconscientes na deciso jurisdicional: a crise do magistrado. In: ZIMERMANN, David; COLTRO, Antonio Carlos Mathias (Org.). Aspectos psicolgicos na prtica jurdica. Campinas: Millennium, 2007.

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    DISCURSO SOBRE OS 90 ANOS DE MORTE DE RUI BARBOSA

    Paulo Roberto de Gouvea Medina1

    O Conselho Federal da OAB rene-se nesta bela cidade de Salvador,

    nestas doces plagas onde dizia Rui -- minha me me embalou o primeiro e meus filhos me velaro, talvez, o ltimo sono2, para celebrar a passagem, a 1 de maro deste ano, do nonagsimo aniversrio de morte do patrono dos advogados brasileiros.

    Falando aos juristas aqui reunidos, nos idos de 1947, em memorvel Congresso, nosso futuro btonnier Prado Kelly aludiu s razes da nacionalidade, fincadas nas terras baianas, em palavras que me permito recordar:

    Pisando o cho mais velho do Brasil, mal resistimos ao impulso de pousar o ouvido na terra, como os seus primeiros filhos, menos para pressentir os acontecimentos em marcha do que para escutar as vozes venerandas das razes da Ptria.3

    Imbudos do mesmo esprito que voltamos, hoje, ao bero de Rui Barbosa, para, aqui, recolher, na pureza da fonte, sua palavra e seu exemplo, tomando-o como o guia que h de conduzir-nos pelos caminhos que estamos a trilhar.

    Noventa anos depois, Rui permanece vivo na memria dos que sabem cultuar os numes tutelares da nossa histria. Seu pensamento continua atual, no desapareceram os motivos por que se preocupava com a preservao de determinados valores, muitos dos seus anelos permanecem irrealizados.

    Paladino da liberdade, Rui Barbosa veria, hoje, que o pas, desde o seu desaparecimento do mundo dos vivos, passou por muitas crises, assistiu a diversos movimentos sociais, motivados, s vezes, pelo anseio de preservar aquele valor maior, mas dos quais resultaram longos perodos de privao das liberdades pblicas. Sua morte deu-se, alis, no momento em que um Presidente civil, Artur Bernardes, que tivera a posse ameaada, institua o estado de stio no pas, para poder govern-lo, em circunstncias que, realmente, pareciam justific-lo, como o prprio Rui reconheceu, mas que, pelo prolongamento das medidas de exceo adotadas e pelas duras restries impostas a tantos brasileiros, acabou redundando num regime autoritrio, cujas consequncias no chegaram a ser, por ele, presenciadas. Veio, em seguida, a Revoluo de 30, cujos ideais de renovao dos costumes polticos haveriam de merecer apoio da parte de quem, por duas vezes, em

    1 Professor Emrito da Universidade Federal de Juiz de Fora, de cuja Faculdade de Direito foi Diretor. Conselheiro Federal da

    Ordem dos Advogados do Brasil e ex-Presidente da Comisso Nacional de Ensino Jurdico. 2 BARBOSA, Rui. Visita Terra Natal, Discurso em Salvador, a 7 de fevereiro de 1893, in Rui Barbosa Escritos e Discursos Seletos. Rio de Janeiro: Editora AGUILAR, 1960, p. 173. 3 Misso do Advogado. Rio de Janeiro: Forense, 1977, p. 17.

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    1910 e em 1919, amargara o resultado distorcido das urnas, em consequncia de fraudes eleitorais escancaradas. Mas as reformas prometidas pelos revolucionrios de 30 somente se concretizaram a duras penas, depois que se desencadeou, em So Paulo, outro movimento armado, a Revoluo Constitucionalista de 1932. E, assim, mesmo, de forma precria, porquanto a Constituio de 1934 teve durao efmera e, j no ano seguinte, era emendada para dispor sobre a declarao de ocorrncia de comoo intestina grave, sujeitando a hiptese ao regime do estado de guerra, alm de estabelecer a perda da patente ou do cargo pblico por servidor militar ou civil a que se imputasse a prtica de ato subversivo. Era o prenncio de 1937. Rui, se aqui estivesse, teria vivido, ento, a noite do Estado Novo e ver-se-ia na contingncia de comparecer s barras do Tribunal de Segurana Nacional, para defender presos polticos, como fizera nos tempos de Floriano e Prudente de Moraes. Mas, alguns discpulos dele tomaram o papel do Mestre, especialmente seu grande mulo e sucessor, nesse campo, Sobral Pinto, alm de jovens advogados que, ento, despontavam no cenrio forense do pas, como Evandro Lins e Silva. Mais tarde, outros perodos turbulentos viveria o Brasil. de imaginar que no seria diferente o comportamento de Rui Barbosa, em face das restries s liberdades pblicas e individuais que se seguiram a 1964, mais agudamente aps a edio do AI-5, em 1968. Nunca, ao longo de nossa histria, o pas sentiu tamanha necessidade de recolher os ecos da Campanha Civilista, como naquela quadra. Rui teria manifestado, na ocasio, solidariedade e o mais decidido apoio ao Vice Pedro Aleixo, na divergncia por este oposta adoo do ato de fora. Assim como se colocaria ao lado dos denodados colegas Heleno Fragoso, Augusto Sussekind de Moraes Rego e George Tavares, em face da violncia ignominiosa de que foram vtimas, no exerccio da profisso. Do mesmo modo, no assistiria impassvel ao atentado que atingiu a entidade dos advogados, do qual resultou a morte da pranteada funcionria D. Lida Monteiro. Teria motivos de sobra, por outro lado, para orgulhar-se da contribuio de Raymundo Faoro ao restabelecimento do Estado de Direito, quando aquele nosso valoroso Presidente deu ao Chefe do Governo, empenhado nesse objetivo, mas cauteloso quanto reao dos radicais que a isso se opunham, a receita singela para tanto: bastava restituir o habeas corpus. E estaria a comemorar conosco, hoje, os 25 anos da Constituio de 1988, vendo o quanto valeram as suas lies de democracia e de que forma germinaram as sementes que lanara, ao seu tempo: o mandado de segurana, fruto de uma criao pretoriana por ele fomentada, a tomar nova verso, sob a forma do mandado de segurana coletivo; o habeas-data, a ampliar a garantia preconizada por este instrumento aos dados pessoais existentes em registros pblicos ou que, embora privados, sejam de acesso pblico; o controle da constitucionalidade a expandir-se extraordinariamente, no plano do sistema concentrado, sem prejuzo da continuada prtica do sistema difuso, cuja aplicao, no dizer de Joo Mangabeira, ele ensinara aos Ministros do Supremo Tribunal; os princpios republicanos, de que fora o grande arauto, sendo explicitados no texto constitucional em diferentes verses a legalidade, a impessoalidade, a moralidade administrativa, a publicidade e a eficincia administrativa --; todo o iderio, em suma, de um liberal, no pleno sentido do termo, tornado vitorioso com a democracia

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    social que a Carta vigente consagrou. Mais importante que tudo: Rui veria o civilismo, de que fora um cone, no seu apogeu, vivendo a nao um quarto de sculo em clima de segurana institucional, sem abalos ssmicos no campo poltico, sem tentativas de golpe ou de insurreies, sem pronunciamentos militares, sem censura imprensa, sem que se vede o acesso ao rdio ou TV a qualquer lder popular.

    Sob um aspecto, porm, o cenrio poltico dos dias atuais despertaria em Rui o desencanto que experimentara, na Repblica Velha. A corrupo continua a campear, com mais intensidade, alis, do que no seu tempo. comum, por isso, invocar-se a frase clebre que proferiu, num instante de revolta, levando ao paroxismo a sensao de desalento do homem comum diante da falta de seriedade e da inverso de valores observados na vida pblica.

    De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustia, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto.4

    Por outro lado, ningum contesta que o nvel da representao poltica caiu,

    sensivelmente, nos ltimos tempos. Comparado ao quadro de 1946, o regime da Constituio de 1988 no tem revelado a presena de grandes valores intelectuais ou de lderes com o perfil de estadista nas duas Casas do Congresso. Isso resulta de vrios fatores: 1) o longo perodo autoritrio que o pas atravessou, entre 1964 e 1985, no favoreceu o advento de novas lideranas; 2) as atividades privadas passaram a atrair os melhores valores com oportunidades mais promissoras de realizao, sobretudo no campo da advocacia; 3) as eleies tornaram-se por demais onerosas e o vulto dos gastos exigidos, em desproporo com os subsdios com que poder contar o candidato, caso eleito, lanam suspeitas, at, sobre seus reais propsitos.

    Que faria Rui, em face desse panorama? Porventura, recolher-se-ia ao exerccio da advocacia que, conforme salientou certa feita, a propsito da compra da manso da Rua So Clemente, no Rio de Janeiro, muito mais rendosa lhe seria se a atividade poltica no o tolhesse tanto, tomando-lhe boa parte do tempo? Haveria de resignar-se diante disso, continuando a fazer a sua parte, sem se preocupar com o que se passasse em torno?

    No, absolutamente no. Rui reagiria a esses fatores adversos, com a fibra que lhe era peculiar. E j teria tomado a iniciativa de propor ampla reforma, que contribusse para sanar as mazelas do meio poltico.

    difcil imaginar qual o modelo dessa reforma. Do pensamento de Rui Barbosa, no se podem extrair solues apropriadas aos problemas que hoje vivemos, que so bem diferentes daqueles que enfrentou.

    O voto secreto, a Justia Eleitoral, a representao proporcional, cujo formato no definiu eis os trs tpicos da reforma poltica que preconizava na Plataforma

    4 Discurso no Senado, a 17.12.1914, verberando as misrias do hermismo, in Obras Completas, vol XLI, 1914, tomo III, p. 86 (Discursos Parlamentares).

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    da Campanha Civilista, por ele lida no Teatro Politeama Baiano, a 15 de janeiro de 1910.5

    A essas propostas de reforma, poder-se-ia acrescentar a da adoo do sistema parlamentar de governo, a que Rui aderiu convencido de que O presidencialismo, seno em teoria, com certeza praticamente, vem a ser, de ordinrio, um sistema de governo irresponsvel.. Assim se pronunciou o Estadista da Repblica numa de suas mais aplaudidas conferncias, A Imprensa e o Dever da Verdade.6

    No tenho dvida em afirmar que, em vista da situao atual, Rui estaria alinhado com a nossa Ordem no combate ao financiamento de campanhas por pessoas jurdicas. Recordemos suas palavras acerca da corrupo, j por si bastante expressivas: A corrupo gravemente perniciosa a que assume o carter subagudo, crnico, impalpvel, poupando cuidadosamente a legalidade, mas sentindo-se em toda parte por uma espcie de impresso olfativa, e insinuando-se penetrantemente por ao fisiolgica no organismo, onde vai determinar diteses irremediveis.7 Ou, ento, estas outras, em que reafirma sua preferncia pelo sistema parlamentar:Com o governo parlamentar, as cmaras legislativas constituem uma escola. Com o presidencialismo, uma praa de negcios.8

    A preocupao com o aprimoramento do regime representativo foi uma constante na vida pblica de Rui Barbosa. Sem a autenticidade da representao popular, para ele, no haveria verdadeira democracia. Dizia, de forma simples e incisiva: sistema representativo quer dizer representao do povo no governo. ... democracia quer dizer governo do povo pelo povo. Se no o povo quem se governa a si mesmo, ento, legalmente, no h governo, e no governo o que h.9

    Creio que, entre as carncias que se observam, hoje, no cenrio poltico uma est diretamente relacionada nossa classe. O pas se ressente de maior presena dos bacharis em Direito na vida pblica. Do Imprio Primeira Repblica, a participao dos bacharis no exerccio dos mandatos parlamentares, assim como na administrao pblica e em muitos setores da iniciativa privada, caracterizou o fenmeno social do bacharelismo, to estigmatizado, depois, mas de to grande importncia para a formao dos nossos quadros dirigentes. No regime de 1946, embora o bacharelismo j no se traduzisse no predomnio dos bacharis em todos os campos de aplicao dos conhecimentos sociais, como antes, foram os bacharis que conduziram os destinos polticos do Brasil, pontificando na tribuna da Cmara dos Deputados, especialmente.

    Rui, ao empossar-se como membro do Instituto dos Advogados Brasileiros, a 8 de maio de 1911, proferiu discurso em que destacou a contribuio dos bacharis para a vida pblica, nas naes de instituies polticas slidas. Disse, ento:

    Na Inglaterra, Bryce quem observa que a classe dos

    advogados tem representado um papel s inferior ao da Igreja.

    5 In Escritos e Discursos Seletos, cit., pp. 339/395. 6 A Imprensa e o Dever da Verdade. Rio de Janeiro: Simes Editor, 1957, p. 27. 7 Temrio de Rui, organizado por N. Bastos Villaboas, in Escritos e Discursos Seletos, cit, p. 1.016. 8 Temrio de Rui, cit., in Escritos e Discursos Seletos, p. 1.074. 9 Temrio de Rui, cit., in Escritos e Discursos Seletos, p. 1.022.

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    (...) Ela deu, na Frana, Constituinte os maiores gigantes da palavra, Conveno os seus mais formidveis ditadores, ao Diretrio e ao Consulado vrios dos seus poderosos membros, Restaurao os seus mais eminentes estadistas, e na Monarquia de julho, na segunda Repblica, no imprio de Napoleo III, ao governo e oposio os seus mais insignes oradores, os seus mais preclaros caracteres, os seus mais notveis ministros.

    Assim, que em todas as naes livres, os advogados so, por via de regra, a categoria de cidados que mais poder e autoridade exercem. Em todos os governos livres, observa Tocqueville, qualquer que seja a sua forma, encontraremos sempre os legistas

    no primeiro posto de todos os partidos.10

    E Rui acrescentava, na sequncia de sua fala, ser prprio dos regimes de fora

    ou daqueles que no valorizam a palavra do homem do Direito, desdenhar dos bacharis, apodando sua influncia de bacharelismo. No faltar, talvez, ainda hoje, entre os que pouco apreo dispensam a um regime mais da lei do que dos homens, quem, repetindo o que foi dito quando do lanamento, em 1943, do Manifesto dos Mineiros, lance aos bacharis que se apresentem dispostos a servir ao pas, no exerccio de mandatos polticos, o epteto de leguleios em frias. A ironia ou o sentido pejorativo dessa qualificao revela o mesmo estado de esprito que Rui Barbosa censurava e evidencia o mesmo desapreo importncia da participao dos bacharis na vida pblica. O retorno destes, em maior nmero, cena poltica haver de contribuir, sim, para a elevao do nvel da representao popular. E, certamente, isso corresponderia a um dos desejos mais ardentes do nosso patrono.

    No s no que diz respeito s reformas polticas, Rui estaria, hoje, afinado com a nossa Ordem. Tambm com referncia ao ensino jurdico, necessidade de adequ-lo s exigncias da advocacia, ao imperativo de preservar-lhe a seriedade, impondo controle frequncia dos alunos, seu pensamento coincide com a orientao por que se tem batido a Comisso Nacional de Educao Jurdica da OAB.

    Antes de tudo, Rui se opunha aos exageros dos positivistas, que no admitiam a regulamentao profissional e, por isso, eram tolerantes quanto criao de estabelecimentos de ensino de qualquer grau, sem maiores exigncias de qualidade e propugnavam pela dispensa de registro prvio de diplomas para o exerccio de qualquer profisso liberal.

    No que tange aos cursos jurdicos, Rui pretendia atribuir-lhes fins profissionalizantes, de modo que proporcionassem adequada formao aos estudantes. Nessa linha de orientao, defendia o aperfeioamento dos estudos de medicina legal, disciplina que entendia devesse ser ministrada por mdicos especialistas, com conhecimento prtico da matria e no por juristas que a houvessem aprendido nos livros, entre as paredes do seu gabinete. Propunha o desdobramento das matrias Direito Criminal, Direito Comercial e Direito Administrativo, em mais de uma disciplina, respectivamente, de modo que se ampliasse o campo do seu estudo. Mostrava a importncia da instituio, nos

    10 In Escritos e Discursos Seletos, cit., pp. 548/549.

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    cursos, da Prtica Jurdica, a fim de que o estudo do Direito Processual no ficasse adstrito, como ento acontecia, exposio de sua teoria. Preconizava, em suma, segundo suas palavras,A remodelao do ensino jurdico, obedecendo a normas que lhe deem, a um tempo, mais extenso prtica e mais esprito cientfico, segundo os melhores tipos.

    Tais propostas de reforma do ensino do Direito Rui as fizera, ainda no Imprio, quando foi relator, na Cmara dos Deputados, do projeto de reforma do ensino, nos seus diferentes graus. E as defenderia, depois, no captulo da Instruo Pblica da Plataforma da Campanha Civilista11. Eram ideias da juventude, reafirmadas na idade madura. Ideias de um homem pblico de viso prtica e de esprito reformador. Ideias de plena atualidade, como tantas outras que Rui sustentou.

    Rui Barbosa no se tornou professor de Direito. Concludo o curso de bacharelado, em So Paulo, em 1870, no se interessou, nem mesmo por cursar o Doutorado. Alis, de sua brilhante turma, integrada, entre outros grandes nomes, por Rodrigues Alves e Joaquim Nabuco, apenas Afonso Pena seguiu aquele curso, preparando-se, assim, para ser professor o que, realmente, aconteceu, pois, ao tempo em que governava Minas, era tambm Diretor da Faculdade de Direito, ento sediada em Ouro Preto e, depois, transferida para Belo Horizonte, onde acabou consagrada como a Casa de Afonso Pena12. Todavia, a despeito de no haver seguido a carreira docente, foi Rui, na verdade, como dele dizia Pedro Lessa,

    o mestre extraordinrio do direito, que sem nunca ter tido uma ctedra em qualquer das nossas Escolas Superiores, o brasileiro que mais tem doutrinado os alunos e os prprios Mestres dos nossos Cursos Jurdicos, os nossos polticos, os nossos juzes, os nossos advogados, os cidados de todas as classes, a Nao inteira, ensinando pela tribuna, pelos livros, pelos jornais, o Direito em todos os seus ramos, principalmente os princpios, as regras e os corolrios das nossas instituies polticas, que a ele devem a sua aplicao mais benfica, e que sem ele teriam sido, muitas vezes, instrumentos de opresso e de vingana em vez de fator de

    progresso, de liberdade e de justia.13 Disse, em mais de um passo, que o pensamento de Rui o vincula nossa

    Ordem, mostrando-o afinado com a nossa orientao e com os nossos anseios. preciso que se acrescente que Rui Barbosa teve tambm atuao corporativa, podendo ser apontado como lder de classe, antes mesmo da criao da OAB. que ele presidiu a nossa entidade mater, o Instituto dos Advogados Brasileiros,

    11 V., sobre o tema, A Obra de Ruy Barbosa em Criminologia e Direito Criminal, organizada por Roberto Lyra. Rio de Janeiro: Editora Nacional de Direito, 1952, pp. 184/186; Rui Barbosa: Escritos e Discursos Seletos, cit., pp. 364/365, n. 12. 10. V. tambm Miguel Reale, Posio de Rui Barbosa no Mundo da Filosofia, in Escritos e Discursos Seletos, cit, p. 29. 12 Cf. LACOMBE, Amrico Jacobina. Afonso Pena e sua poca. Rio de Janeiro: Jos Olympio Editora, 1986, p. 28. 13 Apud Joo Mangabeira, Rui, o Estadista da Repblica. Rio de Janeiro: Livraria \Jos Olympio, 1943, p. 28.

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    empossando-se na sua direo a 19 de novembro de 1914, com magnfico discurso, em que versou o tema O Supremo Tribunal na Constituio Brasileira14.

    A obra de Rui Barbosa anda dispersa, consubstanciando-se em inmeros discursos, conferncias, artigos de jornal, pareceres, relatrios, justificativas de projetos de lei e documentos anlogos, quase todos, seno todos, reunidos nas suas Obras Completas, editadas pelo Ministrio da Educao, bem como em outras publicaes. Rui no deixou obra sistematizada nem ambicionava faz-lo, dividido, como sempre se achou entre os deveres de parlamentar e os encargos da advocacia. Mas um baiano dos mais ilustres e cultos, Homero Pires, amealhou toda a sua produo acerca da Constituio de 1891, de que fora o principal autor, compondo, assim, esta obra opulenta, em seis volumes, Comentrios Constituio Federal Brasileira coligidos e ordenados por Homero Pires --, como figura no frontispcio da coleo, editada em 1933, dez anos depois da morte de Rui15.

    Alis, os intelectuais baianos tm sabido preservar a memria e a obra de Rui Barbosa. Lembrem-se, entre outros, alm de Homero Pires, os nomes festejados de Lus Vianna Filho, grande bigrafo do nosso patrono, autor de A Vida de Rui Barbosa16 e de importantes conferncias sobre o Mestre17; Joo Mangabeira, que nos legou o primoroso ensaio Rui, o Estadista da Repblica18; Rubem Nogueira, de quem so os livros O Advogado Rui Barbosa19, Rui Barbosa Combatente da Legalidade20 e Histria de Rui Barbosa21.

    Esses escritores, junto a tantos outros, Brasil afora, prestam, ao pas, inestimvel servio, ao contriburem para que se conserve vivo e vivificante o pensamento de Rui Barbosa. Ns nos abeberamos nas fontes em que seus livros se transformaram e lhes somos gratos, por isso.

    Neles aparece, em sua justa dimenso, a figura polimorfa de Rui Barbosa, como advogado, poltico, parlamentar, estadista, fillogo, orador e escritor. No direi o artista da palavra, porque Rui no era simptico a essa qualificao. Lembro, porm, que Joaquim Nabuco, seu condiscpulo ele, prprio, um dos maiores estilistas brasileiros --, em Minha Formao, no deixou de observar, aludindo a Rui Barbosa: ningum sabe o diamante que ele nos revelaria, se tivesse a coragem de cortar sem piedade a montanha de luz, cuja grandeza tem ofuscado a Repblica, e de reduzi-la a uma pequena pedra. 22

    este admirvel Rui que cinzelou a palavra, que forjou ideais, que esgrimiu com as ideias, que semeou com a f de um apstolo e combateu com a fibra de um guerreiro, que est vivo, entre ns. a ele que havemos de seguir, no exerccio da

    14 In Escritos e Discursos Seletos, cit, pp. 562/588. 15 BARBOSA, Rui. Comentrios Constituio Federal Brasileira - coligidos e ordenados por Homero Pires. So Paulo: Saraiva, 1933. 16 A Vida de Rui Barbosa, stima edio. So Paulo: Livraria Martins Editora, 1965. 17 Rui Barbosa Seis Conferncias. Rio de Janeiro: Fundao Casa de Rui Barbosa, 1977. 18 Rui O Estadista da Repblica. Rio de Janeiro: Livraria Jos Olympio Editora, 1943. 19 O Advogado Rui Barbosa Momentos culminantes de sua vida profissional. Rio de Janeiro: Grfica Olmpica Editora, 1949. 20 Rui Barbosa Combatente da Legalidade. Rio de Janeiro: Distribuidora Record, edio promovida sob os auspcios da Academia de Letras da Bahia e da COPENE, Petroqumica do Nordeste S. A., 1999. 21 Histria de Rui Barbosa. Rio de Janeiro: Edies Casa de Rui Barbosa, 1999. 22 Minha Formao. Editora Universidade de Braslia, edio com introduo de Gilberto Freyre, Braslia, 1981, p. 65.

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    profisso e em eventuais misses na vida pblica. Neste instante, evocando o dia em que expirou, h noventa anos, podemos dizer, em testemunho do nosso compromisso para com o seu legado, o mesmo que ele disse, a 30 de setembro de 1908, junto ao atade de Machado de Assis, falando em nome da Academia Brasileira de Letras:

    Ao chegar da nossa hora, em vindo a de te seguirmos um a um no caminho de todos, levanto-te a segurana da justia da posteridade, teremos o consolo de haver cultivado, nas verdadeiras belezas da tua obra, na obra dos teus livros e da tua vida, sua idealidade, sua sensibilidade, sua castidade, sua humanidade, um argumento mais da existncia e da infinidade dessa origem de todas as graas, a onipotncia de quem devemos a criao do universo e a tua, companheiro e mestre, sobre cuja transfigurao na eternidade e na glria caiam as suas bnos, com as da ptria, que te reclina ao seu seio. 23

    Salvador, 25 / 11 /2013.

    23 BARBOSA, Rui. Adeus a Machado de Assis, in Escritos e Discursos Seletos, cit., p. 677.

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    A INVASO DA SEDE DA OAB/DISTRITO FEDERAL PELO

    REGIME MILITAR

    Esdras Dantas de Souza1

    Recebi minha carteira de advogado em 15 de outubro de 1979, das mos do ento Presidente do Conselho Seccional da OAB/Distrito Federal, saudoso advogado Maurcio Jos Correa.

    Fui testemunha do seu empenho na construo da sede da Ordem dos Advogados do Brasil, Seo do Distrito Federal.

    Aps uma longa e rdua luta liderada por Maurcio Corra, os advogados brasilienses conseguiram erguer, com muito sacrifcio, sua sede localizada na Capital da Repblica, na SEPN 516, na Avenida W3 Norte, concluda em 1983, cujo espao foi indispensvel para a realizao dos seus objetivos, ou seja, em defesa da cidadania, da busca de um Estado Democrtico de Direito e da redemocratizao do nosso Pas, entre outros.

    Foram muitos os obstculos que tiveram de ser removidos. Consolidada a obra definitiva, na sede, a partir de 1983, passou-se, j naquela

    poca, a desenvolver uma programao inteiramente dedicada aos altos interesses diretos dos advogados do Distrito Federal, abrangendo desde a ampliao dos servios materiais de assistncia, de modo geral, at a ativao da parte cultural, incluindo-se, assim, a sistemtica defesa das prerrogativas profissionais e a realizao constante de debates em torno dos interesses da profisso.

    Ento, como primeiro item para a busca de seus objetivos, a Diretoria da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal, em maro de 1983, resolveu designar os dias 21, 22 e 23 de outubro do mesmo ano para a promoo do I Encontro dos Advogados de Braslia.

    Seria um foro aberto para o debate de questes de magna importncia para todos, sobretudo porque, como base fundamental de discusso, seriam abordados temas como os honorrios profissionais, o salrio mnimo do advogado e as condies gerais de trabalho.

    Num mercado de trabalho constrito pelo aviltamento do ensino jurdico com as sequelas que ele acarretava, o profissional do Direito tinha nos honorrios, como at hoje, os recursos necessrios para a sua subsistncia. Da a concluso de ser imperiosa a necessidade de ampla discusso sobre a melhor forma de defend-los como frente natural da contrapartida pelos trabalhos que o advogado executa.

    Foram levadas discusso propostas que visavam ao seu resguardo e melhor forma de proteg-los, levando em conta o trabalho que realizava, o papel que desempenhava no meio social e os nus que o advogado suportava, tanto mais que,

    1 Advogado em Braslia. Foi presidente da OAB/Distrito Federal, Conselheiro Federal e Diretor do Conselho Federal da OAB.

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    em decorrncia de seu prprio status, a sua remunerao