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REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA (Editada desde 1851) R. Marít. Bras. Rio de Janeiro v. 131 n. 04/06 p. 1-320 abr. / jun. 2011 v. 131 n. 04/06 abr./jun. 2011 DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA FUNDADOR Sabino Elói Pessoa Tenente da Marinha – Conselheiro do Império COLABORADOR BENEMÉRITO Luiz Edmundo Brígido Bittencourt Vice-Almirante

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REVISTAMARÍTIMA

BRASILEIRA(Editada desde 1851)

R. Marít. Bras. Rio de Janeiro v. 131 n. 04/06 p. 1-320 abr. / jun. 2011

v. 131 n. 04/06abr./jun. 2011

DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHA

FUNDADOR

Sabino Elói PessoaTenente da Marinha – Conselheiro do Império

COLABORADOR BENEMÉRITO

Luiz Edmundo Brígido BittencourtVice-Almirante

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Revista Marítima Brasileira / Serviço de Documentação Geral da Marinha.–– v. 1, n. 1, 1851 — Rio de Janeiro:Ministério da Marinha, 1851 — v.: il. — Trimestral.

Editada pela Biblioteca da Marinha até 1943.Irregular: 1851-80. –– ISSN 0034-9860.

1. M A R I N H A — Periódico (Brasil). I. Brasil. Serviço de DocumentaçãoGeral da Marinha.

CDD — 359.00981 –– 359 .005

A Revista Marítima Brasileira, a partir do 2o trimes-tre de 2009, passou a adotar o Acordo Ortográfico de 1990,com base no Vocabulário Ortográfico da Língua Portugue-sa, editado pela Academia Brasileira de Letras – Decretos nos

6.583, 6.584 e 6.585, de 29 de setembro de 2008.

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COMANDO DA MARINHAAlmirante de Esquadra Julio Soares de Moura Neto

SECRETARIA-GERAL DA MARINHAAlmirante de Esquadra Eduardo Monteiro Lopes

DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMENTAÇÃO DA MARINHAVice-Almirante (Refo -EN) Armando de Senna Bittencourt

REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRACorpo Editorial

Capitão de Mar e Guerra (Refo) Milton Sergio Silva Corrêa (Diretor)Capitão de Mar e Guerra (RM1) Carlos Marcello Ramos e Silva

Jornalista Deolinda Oliveira MonteiroJornalista Manuel Carlos Corgo Ferreira

DiagramaçãoArtífice de Artes Gráficas Celso França Antunes

Assinatura/DistribuiçãoTerceiro-Sargento-RM1-ES Mário Fernando Alves Pereira

Cabo-PD Franklin Marinho de CastroArtífice de Artes Gráficas Celso França Antunes

Departamento de Publicações e DivulgaçãoPrimeiro-Tenente (RM2-T) Luiz Cesário da Silveira do Nascimento

Apoio Administrativo e ExpediçãoSuboficial-CN Maurício Oliveira de RezendeSuboficial-MT João Humberto de Oliveira

Segundo-Sargento-SI José Alexandre da SilvaCabo-DA Mariana Rodrigues de Souza

Ilda Lopes Martins

Impressão / TiragemClicheria Cromos Ltda / 8.100

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A REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRA é uma publicação oficial da MARINHA DO BRASIL desde1851, sendo editada trimestralmente pela DIRETORIA DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO E DOCUMEN-TAÇÃO DA MARINHA. A opinião emitida em artigo é de exclusiva responsabilidade de seu autor, nãorefletindo o pensamento oficial da MARINHA. As matérias publicadas podem ser reproduzidas. Solicitamos,entretanto, a citação da fonte.

REVISTA MARÍTIMA BRASILEIRARua Dom Manoel no 15 — Praça XV de Novembro — Centro — 20010-090 — Rio de Janeiro — RJ

(21) 2104-5493 / -5506 - R. 215, 2262-2754 (fax) e 2524-9460

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Na internet:http://www.mar.mil.br/dphdm/public/rmb/rmb_revista.htm

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SUMÁRIO

NOSSA CAPA

8 JOGOS MUNDIAIS MILITARESComissão Desportiva Militar do BrasilDescrição sobre os Jogos, inéditos no País – oportunidade de desenvolver o esporte em

nível internacional, visando também às Olimpíadas em 2016. A escolha do Rio – legado dasarenas esportivas e das vilas de atletas. Desportistas ingressando nas Forças Armadas

16 A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA DE ONTEM E HOJE – 50 ANOSClaudio da Costa Reis de Sousa Freitas – Capitão de FragataHistórico da guerra de minas e da Força de Minagem. Cenário no Brasil e em outras

Marinhas

27 A BUSCA DE GRANDEZA (IV)Elcio de Sá Freitas – Vice-Almirante (Refo -EN)Continuação da série. Projeto versus construção. A construção de submarinos na

Alemanha e no Brasil, preparação de equipes; garantia de qualidade; fabricantes. Benefíciose conquistas. Necessidade da continuidade – Projeto da Nação

49 ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DOBRASIL

René Vogt – EngenheiroConceitos operacionais e de projeto. Comparação entre navios da classe. Sugestões para

a F-6000M: dimensões, pesos, qualidades náuticas, propulsão, armamento e eletrônica.Construção, manutenção, nacionalização e custos.

73 O CHANCELER BISMARCK E A MARINHA IMPERIAL BRASILEIRAAlvanir B. de Carvalho – ProfessorEvolução dos apetrechos de guerra – lança, catapulta, canhão, navio de madeira – ferro,

couraça. Bismarck e a Guerra do Paraguai. Os antecedentes da guerra – o canhão Krupp – aproibição de Bismarck

81 UMA IDEIA PARA O APERFEIÇOAMENTO DA MOBILIZAÇÃO MARÍTIMAElias Nicolau Buhamra Simões – Capitão de Mar e GuerraO Sistema de Mobilização – planejamento na Marinha. Mobilização versus logística.

Preparo necessário

89 NAVIO DE PROPÓSITOS MÚLTIPLOSRogério Ramos Lage – Capitão de Mar e Guerra (FN)Capacitação anfíbia e expedicionária do País. O investimento dos países em navios.

Situação na Marinha

98 AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLOJaime Florêncio de Assis Filho – Capitão de Mar e Guerra (FN-RM1)O navio-escola – propósitos. Resumo descritivo das 28 viagens de guardas-marinha.

Curiosidades – Quadro contendo dados sobre as comissões

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121 HERBERT RICHMOND E O COMANDO DO MAR (IV)Francisco Eduardo Alves de Almeida – Capitão de Mar e Guerra (RM1)Conclusão da série sobre os formuladores de estratégia naval –, Mahan e Richmond.

Princípios da estratégia. Obtenção do Comando do Mar

137 TORIANITA DO AMAPÁLeonam dos Santos Guimarães – Capitão de Mar e Guerra (RM1-EN)Investigação sobre evasão de minério no Norte do País nos anos 1986/89. Apreensões de

cargas contrabandeadas. Teor de urânio da torianita – uso comercial restrito. Artefatos nucleares

145 FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – Partes 2 e 3Alexandre Peres Teixeira – Capitão de Fragata (FN)Final da série. O Islã e a modernidade ocidental. Choque de civilizações ou perversão

minoritária? Conservadorismo intransigente. Abismo entre o Islã e o Ocidente

166 O COMITÊ ESPECIAL DE OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ DASNAÇÕES UNIDAS (C-34)

Eduardo Uziel – Primeiro-SecretárioJoão Augusto Costa Vargas – Segundo-SecretárioO Comitê como foro decisório sobre missões de paz das Nações Unidas. História e

papel atual. A interação com o Conselho de Segurança. Divisões políticas entre os paísesque contribuem com tropas

182 UMA EXPERIÊNCIA DE PRÁTICA INTERDISCIPLINAR NO COMANDO DAFORÇA AERONAVAL

Patrícia Helena R. de Souza Chagas – Capitão de Corveta (T)Movimentos sociais ligados ao portador de deficiência – legislação em 1989. Novos

paradigmas – campo de estudo – São Pedro da Aldeia – orientação à família

189 O EMPREGO DO CUSTEIO POR ABSORÇÃO NA MARINHA DO BRASIL: OCASO DAS ORGANIZAÇÕES MILITARES PRESTADORAS DE SERVIÇOS

Anderson Soares Silva – Capitão de Corveta (IM)Erivelton Araujo Graciliano – Capitão de Corveta (IM)José Ricardo Maia de Siqueira – EngenheiroO Sistema OMPS – contabilidade de custos e a sua apuração. Métodos empregados.

Análise – avaliação

205 POR QUE ADOTAR A GESTÃO POR COMPETÊNCIAS NA MARINHA DOBRASIL?

Aurora Telles Herkenhoff – Capitão de Corveta (T)Reflexões sobre conveniência da adoção na Marinha. Peculiaridades da profissão

militar – motivação com trabalho – equilíbrio entre valores adotados pela organização e osda nova geração. Dificuldades de captação e retenção de militares na MB

212 MANUTENÇÃO, SOBRESSALENTES E DISPONIBILIDADE NA MBFábio Andrade Batista dos Santos – Capitão-TenenteNecessidade de planejamento, preparo e disponibilidade de meios. Apoio logístico –

contratos de manutenção e de abastecimento

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216 ARTIGOS AVULSOS216 O SUBMARINO NUCLEAR COMO ARMA DE DISSUASÃO. O INVES-

TIMENTO COMPENSA O RESULTADO FINAL?José Domingos de Araújo Vallim – Capitão de Corveta (FN)Destaque no cenário internacional. Carência de recursos – necessidade do Poder Naval.

218 NECROLÓGIO

227 CARTAS DOS LEITORESCorrespondência do Vice-Almirante Luiz Edmundo Brígido Bittencourt, que analisou

o livro The Paraguayan War – Organization, Warfare, Dress and Weapons

230 O LADO PITORESCO DA VIDA NAVALGrumete passa a espia num cabeço que “roda”O cabo “safo” se complica na fonia

234 DOAÇÕES À DPHDM

236 ACONTECEU HÁ CEM ANOSSeleção de matérias publicadas na RMB há um século com o que acontecia em nossa

Marinha, no País e em outras partes do mundo

244 REVISTA DE REVISTASSinopses de matérias selecionadas em mais de meia centena de publicações recebidas e

lidas, do Brasil e do exterior

268 NOTICIÁRIO MARÍTIMOColetânea de notícias mais significativas da Marinha do Brasil e de outras Marinhas,

incluída a Mercante, e assuntos de interesse da comunidade marítima

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NOSSA CAPA

SUMÁRIO

Os Jogos Mundiais MilitaresJogos Mundiais Militares Rio 2011Estrutura Organizacional (Ministérios, CPO, CDMB)Força de Trabalho (OM, voluntários e IES)Vilas de AtletasLegados esportivosEntrevista com o Almirante Gambôa

JOGOS MUNDIAIS MILITARES 2011

OS JOGOS MUNDIAIS MILITARES

Os Jogos Mundiais Militares (JMM) doConselho Internacional do Esporte

Militar (Cism*) são o maior evento esporti-vo militar do mundo e acontecem a cadaquatro anos, sempre no ano anterior à rea-lização dos Jogos Olímpicos. A 5a ediçãoacontecerá no Rio de Janeiro, de 16 a 24 dejulho deste ano, e reunirá cerca de 6 milatletas e 2 mil delegados vindos de mais de

cem países. A amizade entre os povos élema da competição.

O Brasil foi escolhido como sede emmaio de 2007, em Burkina Faso, na ÁfricaOcidental. O País disputou com a Turquiao direito de sediar os Jogos. No julgamen-to final, a infraestrutura esportiva jáestabelecida no Rio de Janeiro para os Jo-gos Pan-Americanos, a experiência na rea-lização de grandes eventos e o apoio de-monstrado pelas três esferas de poder (fe-

COMISSÃO DESPORTIVA MILITAR DO BRASIL

* Cism – Conseil International du Sport Militaire.

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JOGOS MUNDIAIS MILITARES 2011

deral, estadual e municipal) ao projeto fo-ram decisivos para a vitória do Brasil.

A primeira edição dos Jogos aconteceuem setembro de 1995, em Roma, e reuniu maisde 4 mil atletas de 93 países, que disputaram17 modalidades esportivas. Na ocasião, osJogos celebraram o aniversário de 50 anosdo fim da Segunda Guerra Mundial e da assi-natura da Carta das Nações Unidas.

As edições seguintes aconteceram emZagreb (Croácia/1999), Catânia (Itália/2003)e Hyderabad (Índia/2007). Em 2010 houvea primeira edição dos Jogos Militares deInverno, no Vale de Aosta, localizado nosAlpes da Itália.

JOGOS MUNDIAISMILITARES RIO2011

Os Jogos Mundi-ais Militares Rio 2011abrem uma década es-portiva sem preceden-tes na história do Bra-sil. Em 2013, o País re-ceberá a Copa dasConfederações; em2014, a Copa do Mun-do de Futebol; e, em 2016, os Jogos Olím-picos. Por isso, o investimento maciço dasForças Armadas brasileiras no esporte nãose restringe apenas para a competição des-te ano. A intenção é manter alguns dos prin-cipais atletas, incluindo diversosmedalhistas olímpicos, até 2016, e contri-buir para transformar o País em potênciaesportiva mundial.

Vinte modalidades esportivas serão dis-putadas nos Jogos Rio 2011, sendo 15 olím-picas (atletismo, basquete, boxe, esgrima, fu-tebol, hipismo, judô, natação, pentatlo mo-derno, taekwondo, tiro, triatlo, vela, vôlei evôlei de praia) e cinco militares (orientação,paraquedismo, pentatlo aeronáutico, pentatlo

militar e pentatlo naval). Por ser o país sede,o Brasil será representado em todas as mo-dalidades, por cerca de 250 atletas.

As principais arenas esportivas da Ci-dade Maravilhosa serão utilizadas para re-ceber a competição. O Estádio OlímpicoJoão Havelange, o Engenhão, será o prin-cipal palco dos Jogos. Receberá, além dasCerimônias de Abertura e Encerramento, aspartidas finais de futebol e as provas deatletismo.

O Parque Aquático Maria Lenk, a ArenaHSBC, o Maracanãzinho, o Estádio de SãoJanuário, o Centro Nacional de HipismoGeneral Eloy Menezes, o Centro EsportivoMiécimo da Silva e o Centro Nacional de

Tiro Esportivo Tenen-te Guilherme Paraensetambém receberão osprincipais atletas mili-tares do mundo.

As belas paisagensdo Rio de Janeiro pro-metem ser outro gran-de atrativo. O Posto 6,em Copacabana, ondeacontecerão as compe-tições do triatlo; a Es-cola Naval, localizada

na Ilha de Villegagnon, com vista deslum-brante para o Pão de Açúcar, local das pro-vas de vela; a Praia do Leme, que receberáas partidas de vôlei de praia; e a orla maríti-ma, do Recreio dos Bandeirantes até o Par-que do Flamengo, trajeto que receberá a ma-ratona, prometem deixar os turistas e atletasque visitarão o País com uma agradável ememorável lembrança dos JMM Rio 2011.

Dois ginásios foram construídos especi-almente para receber os Jogos Mundiais Mi-litares do Cism e ficarão como legado para asForças Armadas, bem como para todo o povodo Rio de Janeiro. Na Vila Militar, foi erguidoo ginásio do 26o Batalhão de InfantariaParaquedista, que receberá as competições

A intenção é manter algunsdos principais atletas,

incluindo diversosmedalhistas olímpicos, até

2016, e contribuir paratransformar o País em

potência esportiva mundial

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JOGOS MUNDIAIS MILITARES 2011

da esgrima. O Centro de Instrução AlmiranteMilciades Portela Alves, o Ciampa, em Cam-po Grande, ganhou um ginásio com capaci-dade para 600 espectadores e que será o pal-co de competições de boxe.

Benfeitorias também foram feitas em di-versas unidades militares. O Centro de Edu-cação Física Almirante Adalberto Nunes(Cefan) ganhou uma nova pista de obstá-culos para o pentatlo naval, o ginásio foitotalmente reformado, foi construído umparque aquático com uma piscina olímpica(50 metros) e uma piscina para saltos, entreoutras reformas. A Escola de Educação Fí-sica do Exército (EsEFEx) recebeu um giná-sio totalmente novo e a Universidade daForça Aérea (Unifa), novos vestiários, ba-nheiros e sala de musculação.

A Base Aérea de Santa Cruz, o Campo dosAfonsos, o Centro de Instrução Almirante Gra-ça Aranha (Ciaga), o Campo de Instrução deAvelar (Paty do Alferes), a Floresta NacionalMário Xavier (Flona, em Seropédica), a Aca-demia Militar das Agulhas Negras (Resende)e o Aeroporto de Resende também receberãoos Jogos Mundiais Militares.

ESTRUTURA ORGANIZACIONAL(MINISTÉRIOS, CPO, CDMB)

Em junho de 2008, foi criado o ComitêInterministerial de Gestão das Ações Go-vernamentais nos Jogos Mundiais Milita-res Rio 2011, os Jogos da Paz, com o obje-tivo de promover a implementação das me-didas necessárias à garantia da atuaçãogovernamental no cumprimento dos com-promissos assumidos pelo Governo brasi-leiro para a realização do evento.

Presidido pelo Ministério da Defesa, oComitê Rio 2011 é composto, pelos minis-térios do Esporte; da Justiça; das RelaçõesExteriores; do Turismo; da Fazenda; do Pla-nejamento, Orçamento e Gestão; da Agri-cultura, Pecuária e Abastecimento; da Edu-

cação; das Comunicações; da Saúde; e daCiência e Tecnologia; Casa Civil da Presi-dência da República; Gabinete de Seguran-ça Institucional da Presidência da Repúbli-ca; Secretaria de Relações Institucionaisda Presidência da República; e Secretariade Comunicação Social da Presidência daRepública. O Comitê Gestor é formado, ain-da, pelos comandantes militares das For-ças Armadas, além do Governo do Estadodo Rio de janeiro e da Prefeitura Municipaldo Rio de Janeiro.

Seguindo o organograma, está o Conse-lho de Ministros, presidido pelo ministro Nel-son Jobim, a Comissão Executiva, coordena-da pela Secretaria de Organização Institucional(Seori) e a Secretaria Executiva, cujo diretor é oVice-Almirante Bernardo José PierantoniGambôa, presidente da Comissão DesportivaMilitar do Brasil (CDMB).

A CDMB é a entidade que representa oBrasil junto ao Cism e coordena os assun-tos referentes ao desporto militar no País.Criada em 1956, a CDMB tem sua sede emBrasília e integra a estrutura do Ministérioda Defesa.

Na sequência está o Comitê de Planeja-mento Operacional (CPO) dos Jogos Rio 2011.O coordenador-geral é o General de BrigadaJamil Megid Junior e o coordenador executi-vo, o Coronel Marcos Souza Pastori. Oorganograma do CPO inclui, ainda, nove áre-as funcionais. São elas: Grupo de Planeja-mento e Gestão Integrada, RelaçõesInstitucionais/Relações Públicas, Gestão dePessoas, Relações com as Delegações Es-trangeiras, Comunicação e Marketing, Ope-rações dos Jogos, Logística, Inteligência eSegurança, e Comando e Controle.

FORÇA DE TRABALHO (OM,VOLUNTÁRIOS E IES)

Os Jogos Mundiais Militares terão gran-de envolvimento das Forças Militares em

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JOGOS MUNDIAIS MILITARES 2011

sua operação. A principal força de trabalhoque auxiliará o Comitê de PlanejamentoOperacional (CPO) virá das OrganizaçõesMilitares (OM) sediadas no Estado do Riode Janeiro. Cada local de competição seráadministrado por uma organização deapoio, que ficará responsável pelas opera-ções das instalações e procedimentos diá-rios de uma competição esportiva.

Ficará a cargo das Organizações Milita-res (OM) indicar entre seu efetivo os ofici-ais que atuarão em cada função, seguindo aorganização já existen-te dentro do CPO pe-las áreas funcionais.

Além dos militares,civis também terão aoportunidade de traba-lhar nos Jogos. Estima-se que a Força de Tra-balho alcance o númerode 10 mil participantes.

Em março de 2011,começaram as inscri-ções para o Programade Voluntários dos Jo-gos Mundiais Milita-res. Os critérios para aseleção foram: ter aidade mínima de 18anos completados até30 de junho de 2011,estar cursando ou ter concluído o EnsinoMédio, ter disponibilidade de tempo parao treinamento, além do conhecimento deoutro idioma, preferencialmente o inglês.

O Programa de Voluntários seguiu asseguintes fases: inscrição; recrutamento eseleção; treinamento geral e específico àdistância (pela internet); treinamento es-pecializado (presencial); e, por fim, a de-signação dos selecionados para o traba-lho nos Jogos.

Os voluntários irão desempenhar ativi-dades em diversas operações de um even-

to multiesportivo, fazendo com que todosos participantes – atletas, dirigentes, es-pectadores, imprensa, turistas e visitantes– sintam-se bem-vindos. As inscrições en-cerraram-se no dia 30 de abril.

O CPO também realizou uma parceriacom Instituições de Ensino Superior (IES)interessadas em participar como parceirasna organização da competição. Denomina-do Projeto Rondon Esportivo, essa é umaoportunidade única para os jovens univer-sitários cariocas vivenciarem o dia a dia de

uma megacompetiçãoesportiva. O projetoconta com a adesão de19 IES.

VILAS DEATLETAS

Atletas, integrantesde comissões técnicase oficiais que participa-rão dos Jogos Mundi-ais Militares serão alo-jados em três Vilas deAtletas, que estão sen-do construídas em ter-renos da Marinha, doExército e da Aeronáu-tica: a Branca, no bair-ro de Campo Grande; a

Verde, em Deodoro; e a Azul, no Campo dosAfonsos. As instalações têm capacidadepara receber até 8.332 pessoas. Após o tér-mino das competições, os apartamentos se-rão destinados para moradia de oficiais epraças das três Forças Armadas.

Os projetos das Vilas Militares atendemàs orientações ambientais do município doRio de Janeiro e contemplam todas as exi-gências do Cism. São 106 edifícios com1.206 apartamentos de três quartos comunse um reversível. Cada imóvel tem aproxima-damente 100 m². O orçamento empregado

Atletas, integrantes decomissões técnicas e

oficiais que participarãodos Jogos Mundiais

Militares serão alojadosem três Vilas de Atletas.

Após o término dascompetições, os

apartamentos serãodestinados para moradia

de oficiais e praças das trêsForças Armadas

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JOGOS MUNDIAIS MILITARES 2011

para a construção das três vilas é de R$400 milhões.

As Vilas vão oferecer, durante os Jo-gos, serviços destinados a atender às ne-cessidades dos atletas, como o Clube Cism,com loja de lanches e de conveniência, cor-reios, bancos e casa de câmbio, lavanderiae posto telefônico. Outros serviços: cen-tros de serviços às delegações, centros deinformações esportivas (SIC), salas de reu-niões, postos de atendimento médico, sa-las de imprensa, centros de boas-vindas ecredenciamento.

A Vila Branca terá capacidade para re-ceber até 2.752 atletas. São 22 blocos,totalizando 396 aparta-mentos. A Vila Verdereceberá até 2.786 atle-tas, em 17 blocos comseis andares cada, so-mando 408 aparta-mentos. Já a Vila Azulpossui 67 blocos detrês andares cada. Po-derá receber até 2.794atletas divididos em402 apartamentos.

LEGADOS ESPORTIVOS

Além das Vilas de Atletas e dos legadossociais inerentes a um megaevento espor-tivo, como a promoção da paz e a confra-ternização entre delegações e sociedade,os Jogos Mundiais Militares do Cism tra-rão ao País incontáveis benefícios esporti-vos. O investimento das Forças Armadasnos atletas de alto rendimento e nainfraestrutura esportiva do Rio de Janeiroserve de herança para as futuras gerações.

“Estamos fazendo uma preparação fortecom atletas de alto rendimento que se junta-ram aos nossos. Queremos dar prossegui-mento a esse programa mesmo após as Olim-píadas de 2016 porque estamos seguros de

que esse apoio é um tijolinho na construçãode um Brasil esportivo de ponta”, disse oVice-Almirante Gambôa.

O legado em infraestrutura é extenso. Paraatender a requisitos de competições do Cism,os principais Centros de Treinamento da Ma-rinha, do Exército e da Aeronáutica passampor um processo de modernização.

Na Universidade da Força Aérea (Unifa)estão sendo realizadas obras de melhoria nasantigas instalações do Corpo da Guarda, ondefica sua entrada principal, além de outras re-formas. O objetivo é organizar melhor o aces-so de fora do efetivo, assim como colaborarcom a segurança do local. No ginásio, a parte

interna foi praticamenteextinta e foram constru-ídos novos vestiários ebanheiros e uma sala demusculação. Um novopiso emborrachado foicolocado para as qua-dras de basquete e vô-lei, e uma nova pista deobstáculos está sendoconstruída para a provado pentatlo aeronáutico.

No Centro de Edu-cação Física Almirante Adalberto Nunes,além do novo parque aquático e da pista deobstáculos para o pentatlo naval, foiconstruída uma pista de atletismo com pisoimportado do Canadá e instalados apare-lhos novos para ginástica. O alojamento dosatletas possui um total de 394 leitos, dividi-dos em alas masculina e feminina. O ginásiopoliesportivo receberá, ainda, um novo pisoe será climatizado.

Já o Centro de Reabilitação Físico-Funci-onal Desportivo conta com toda infraes-trutura necessária para se obter um bom de-sempenho nas atividades de fisioterapia epossuirá, ainda, laboratórios de biomecânicae fisiologia que auxiliarão nas pesquisas clí-nicas. Também estão sendo construídos dois

O investimento dasForças Armadas nos

atletas de alto rendimentoe na infraestruturaesportiva do Rio de

Janeiro serve de herançapara as futuras gerações

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JOGOS MUNDIAIS MILITARES 2011

vestiários com acessibilidade para portado-res de necessidades especiais.

Inaugurada em 10 de janeiro de 1922, aEscola de Educação Física do Exército(EsEFEx), por sua vez, está recebendomelhorias no estádio, que recebeu um siste-ma de irrigação e reposição da grama, e estásendo feita a elevação do mesmo para habi-litação de uma pista de atletismo.

O antigo ginásio poliesportivo da EsEFExfoi demolido e outrocom três andares estásendo construído. Oprimeiro piso irá com-portar um estaciona-mento com cerca de130 vagas. Já o segun-do piso terá um dojôcom 800 metros qua-drados, estande de tiroreduzido, alojamentos,estações de trabalho eauditório. O terceiroterá uma quadrapoliesportiva (com di-mensões para futsal ehandebol), arquibanca-da com capacidadepara mil pessoas e qua-dras auxiliares.

O Ginásio da Esgri-ma, localizado no 26o

Batalhão de InfantariaParaquedista, na Vila Militar, construído emuma área de 2.400m² e com capacidade paramil espectadores, já está pronto. O localterá duas quadras poliesportivas que, du-rante os Jogos Rio 2011, serão ocupadaspor sete pistas de esgrima. Um dos meza-ninos terá vista para a área de salto dosparaquedistas e poderá ser climatizado.

O destaque ecológico da obra é a ilumina-ção natural, feita por 104 luminárias solaresque captam a luz externa e dispensam o usode holofotes durante o dia. A tecnologia, re-

cente no País, foi utilizada nos Jogos Olímpi-cos de Pequim, em 2008. O índice de ilumina-ção por metro quadrado do sistema alcança,pelo menos, 500 lux, quando o mínimo exigi-do em competições esportivas é de 300 lux. AEscola Naval, por sua vez, receberá novas emodernas instalações para embarcações, quetambém ficarão como legado do evento.

Arenas esportivas já existentes, como oCentro Nacional de Tiro Esportivo (CNTE)

e o Centro Nacional deHipismo (CNH), rece-beram investimentosque incluem: novosalvos eletrônicos noestande de 25 metrose a remodelação doestande de 300 metros(no CNTE), novascocheiras, obstáculose um telão (CNH).Benfeitorias tambémserão realizadas emtodas as arenas espor-tivas que fazem parteda programação desta5a edição dos JogosMundiais Militares.

ENTREVISTA COMO ALMIRANTEGAMBÔA

O presidente da Comissão Desportiva Mi-litar do Brasil (CDMB), Vice-Almirante (VA)Bernardo José Pierantoni Gambôa, fala, nestaentrevista ao Comitê dos Jogos Mundiais Mi-litares 2011, sobre o evento.

JOGOS RIO 2011 – O que mudou noplanejamento da CDMB com a confirma-ção dos JMM para acontecer no Brasil?

VICE-ALMIRANTE GAMBÔA – O de-safio que se apresentava devia ser encara-do sob uma ótica absolutamente distintadaquela adotada para a participação nas

Um significativo aporte derecursos permitiu que se

cumprisse acuradoprograma de treinamento,em instalações modernas,

com equipamentos deúltima geração. Destaco,ainda, a possibilidade da

contratação de renomadostécnicos e fisiatras, bem

como a execução de um atéentão inédito plano de

participação emcompetições internacionais

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JOGOS MUNDIAIS MILITARES 2011

edições anteriores dos Jogos. Tratava-sede elevar os padrões de desempenho dasnossas equipes representativas. De coad-juvantes, tínhamos a obrigação de passara protagonistas. Isso implicou a encomen-da de estudos visando conhecer melhoros modelos adotados pelos países mais de-senvolvidos. Em última instância, essebenchmarking redundou no lançamentode editais para a convocação de atletas dealto rendimento, que foram incorporadosàs Forças Armadas.

JOGOS RIO 2011 – A estrutura de trei-namento e capacitação dos atletas recebeumelhorias? Quais?

VA GAMBÔA – A pretendida evoluçãodo desempenho implicava uma mudança es-trutural. Paralelamente às medidas para aconvocação de atletas, a CDMB, em con-junto com as Comissões de Desporto dasForças, envidou esforços para a implanta-ção do conceito de sustentabilidade no des-porto militar brasileiro. Um significativoaporte de recursos permitiu que se cumpris-se acurado programa de treinamento, em ins-talações modernas, com equipamentos deúltima geração. Por relevante, destaco, ain-da, a possibilidade da contratação derenomados técnicos e fisiatras, bem como aexecução de um até então inédito plano departicipação em competições internacionais.

JOGOS RIO 2011 – Com a realizaçãodos JMM no Brasil, a responsabilidade dosatletas militares aumenta?

VA GAMBÔA – Sim. Diferentementedas competições anteriores, eles estarãomais expostos. A visibilidade proporciona-da pela cobertura da imprensa popularizaos Jogos e, sem dúvida, as expectativas jásão maiores. Há ainda a questão dasustentabilidade à qual me referi. Nossoplanejamento transcende 2011 e se projetapara além dos Jogos Olímpicos no Rio deJaneiro. O desporto militar é parte do siste-ma nacional, não sendo um fim em si mes-

mo. O intenso relacionamento com o Mi-nistério do Esporte, com o Comitê Olímpi-co Brasileiro (COB) e com as Confedera-ções faz com que o desempenho do atleta,em uma competição da importância dosJogos Militares, dite sua permanência naelite do esporte brasileiro.

JOGOS RIO 2011 – As Forças Arma-das trouxeram para seu efetivo diversosatletas já consagrados do esporte brasilei-ro. O Brasil está seguindo o modelo deoutros países?

VA GAMBÔA – O incentivo ao despor-to universitário e o militar são as formasmais utilizadas pelos países para manterelevadas suas conquistas esportivas. Re-conhecidamente, americanos e britânicossão os que tiram maior proveito do primei-ro. Como disse anteriormente, estudamosdiversos modelos e, após uma depuração,adotamos um sistema baseado naquelesadotados por Alemanha, França e Itália.

JOGOS RIO 2011 – Esse modelo deconvocação de atletas civis vai continuarsendo usado no futuro? Qual o planeja-mento da CDMB para estes casos?

VA GAMBÔA – Minhas respostas an-teriores deixam claro que sim. O compro-misso é permanente. O nível alcançado nãopermite mais iniciativas sazonais. Este mo-delo está consolidado e não se deve es-quecer que, independentemente dos JMM,continuaremos participando de competi-ções nacionais e internacionais com asSeleções Militares, o que, por si só, já bali-za um constante interesse em arregimentaros melhores. No que respeita ao planeja-mento, como diretor do desporto militar,incentivo a mescla desse exitoso modelocom um de prospecção de talentos, nosdiversos programas sociais que vêm sen-do conduzidos, entre os quais cito o Se-gundo Tempo – Forças no Esporte.

JOGOS RIO 2011 – Quais os benefíci-os que os atletas militares não temporários

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JOGOS MUNDIAIS MILITARES 2011

terão com toda essa nova estrutura propor-cionada pela realização dos JMM no Brasil?

VA GAMBÔA – Eles são inúmeros. Nãohá distinção de tratamento entre os atletas,e o uso compartilhado de toda a estrutura jácitada só tem comofazê-los evoluir signi-ficativamente. Paraalém da parte tangível,refuto como mais im-portante a possibilida-de de troca de experi-ências com os compa-nheiros recém-convo-cados. Essa interaçãoque ocorre durante ostreinamentos e na con-vivência em competi-ções nacionais e inter-nacionais pode serapontada como um dos legados para asForças Armadas.

JOGOS RIO 2011 – A divulgação dosJMM atraiu a atenção de atletas civis paraingressar nas Forças Armadas. As Forçasestão preparadas parareceber mais jovensque veem nela a possi-bilidade de ascenderno esporte?

VA GAMBÔA –Concordo com sua afir-mação. A convocaçãode atletas atende a umantigo anseio da comu-nidade desportiva. Asnotícias acerca das ex-periências daqueles quejá ingressaram nas Forças Armadas repercu-tem, e seguidamente somos consultados so-

bre o lançamento de novos editais, o que,sem dúvida, atesta o acerto da medida. Portudo o que disse anteriormente, hoje as Co-missões de Desporto das Forças estão cadavez mais aparelhadas para receber estes jo-

vens e prepará-los paraobter grandes resulta-dos. Obviamente quehá um limite para o in-gresso, em função dadotação de pessoal, eele será condicionadopelas saídas dos atle-tas, quer por vontadeprópria, quer por com-pletarem o tempo máxi-mo de permanência.

JOGOS RIO 2011– Qual a perspectivada CDMB para os re-

sultados do Brasil neste JMM e qual a pro-jeção para os próximos Mundiais?

VA GAMBÔA – A expectativa é a me-lhor possível. Há cerca de três anos, imedi-atamente após a 4a edição dos Jogos Mun-

diais Militares, conti-nuávamos a obter re-sultados pouco expres-sivos. A participaçãoem competições inter-nacionais, ao longodesse tempo, evoluiuaté o estágio atual, emque colecionamos inú-meros títulos nas maisdiversas modalidades.A leitura analítica des-se avanço permite, de

maneira consistente, antever colocaçõesentre os primeiros no quadro de medalhas.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<EDUCAÇÃO>; Esporte; Jogos Mundiais Militares

A divulgação dos JMMatraiu a atenção de atletas

civis para ingressar nasForças Armadas

A convocação de atletas

atende a um antigo anseioda comunidade desportiva

Delegação brasileira na última edição dosJogos Mundiais Militares

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A Força de Minagem e Varredura realizou, em 17 de maio último, emSalvador (BA), a cerimônia de comemoração dos 50 anos de sua criação,presidida pelo comandante da Marinha, Almirante de Esquadra Julio Soaresde Moura Neto.

A Força de Minagem e Varredura, constituída inicialmente pelos Na-vios-Varredores Javari e Jutaí, foi criada pelo Aviso Ministerial no 0818, de12 de maio de 1961. Em seu primeiro ano de vida foi subordinada ao 1o

Distrito Naval.Posteriormente, nos anos de 1962 e 1963, já subordinada à Esquadra,

a Força recebeu os Navios-Varredores Juruá e Juruena e os Navios-Pa-trulhas Piranha, Piraquê e Pirapiá.

Em 1967, a Força passou a se chamar Esquadrão de Minagem e Var-redura e, em 1971, com a transferência dos navios-patrulha para o GrupamentoNaval do Sul, passou à subordinação do Comando do 2o Distrito Naval.

No ano seguinte, foram incorporados os varredores Aratu,Anhatomirim, Atalaia e Araçatuba. Três anos mais tarde, os varredoresJavari, Jutaí, Juruá e Juruena deixaram o Esquadrão para passar à subor-dinação do 2o Distrito Naval. Em 1976, chegaram os navios Abrolhos eAlbardão.

Finalmente, em 1977, ocorreu a alteração da denominação de Coman-do do Esquadrão de Minagem e Varredura para Comando da Força deMinagem e Varredura. (Fonte: Nomar Online – 25/05/2011)

FORÇA DE MINAGEM E VARREDURACOMEMORA 50 ANOS DE CRIAÇÃO

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SUMÁRIO

IntroduçãoAntecedentes históricos da guerra de minasAs minas no século XX

A guerra de minas na Marinha do BrasilO histórico da Força de Minagem e VarreduraO cenário atual na MB

Meios navais de CMMA Marinha dos EUAOutras Marinhas

Conclusão

A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURADE ONTEM E HOJE

– 50 ANOS

CLAUDIO DA COSTA REIS DE SOUSA FREITAS*

Capitão de Fragata

* N.R.: Comandante da Força de Minagem e Varredura.

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A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA DE ONTEM E HOJE – 50 ANOS

INTRODUÇÃO

Antecedentes históricos da guerra deminas

Os relatos históricos indicam que des-de a dinastia Ming, na China do século

XIV, o homem já idealizava a utilização deminas nas batalhas marítimas. Contudo, o pri-meiro grande salto tecnológico foi observa-do por ocasião da Guerra de Independênciados Estados Unidos da América (EUA) e con-funde-se com o desenvolvimento do subma-rino. Em 1776, David Bushnell inventou oBushnell’s Keg (Barril de Bushnell), a sertransportado inicialmente por um protótipode submarino. Esse veículo transportava ape-nas uma pessoa e possuía a capacidade deimersão de cerca de 30 minutos. A intençãode uso era a seguinte: o condutor do veículo

se aproximaria de um navio britânico atraca-do, lançaria a mina que se tratava de um barrilimpermeável, com grande quantidade de pól-vora e um detonador interno a fim de produ-zir uma faísca após determinado tempo, e seretiraria, dentro do tempo de imersão de 30minutos. Como é de se imaginar, não houvesucesso nessa operação.

Apenas em dezembro de 1777 esses bar-ris foram largamente utilizados. As “minas”foram lançadas no Rio Delaware1 a fim deque pudessem, eventualmente, ir de encon-tro à Esquadra britânica atracada no porto deNova York. Contudo, os danos causados li-mitaram-se à morte de dois garotos que ten-tavam recuperar um dos barris, fato que ser-viu para alertar a Esquadra britânica sobre osdispositivos. Todos foram destruídos em se-guida por disparos de armas e canhões.

Um outro americano, Robert Fulton, conti-nuou o desenvolvimento de minas marítimas.Em 1797, ele propôs à Inglaterra minassubmersas para atacar a Esquadra francesa,as quais possuíam um mecanismo de tempoque permitia a sua explosão num intervalo detempo de cinco a dez minutos após o lança-mento. Porém o experimento fracassou quan-do a França abriu fogo contra os pequenosnavios que carregavam essas minas, que tive-ram que ser lançadas precocemente ao mar.Após inúmeras tentativas de experimentos semsucesso de afundamento ou danos significa-tivos ao navio inimigo, Fulton concluiu que asminas deveriam ser submersas de modo que aonda de pressão formada pela explosão atin-gisse principalmente as obras vivas do navio.

Em 1812, o engenheiro russo PavelShiling explodiu uma mina debaixo d’águautilizando um circuito elétrico. Em 1854, oImpério russo utilizou contra a frota anglo-francesa um arsenal de 1.500 minas, desen-volvidas por Alfred Nobel e Moritz von

1 O Rio Delaware constitui uma parte dos limites territoriais entre os estados da Pensilvânia e de NovaYork, limita os estados de Nova Jersey e Pensilvânia ao longo de toda a faixa fronteiriça eestabelece a maior parte das limitações entre os estados de Delaware e Nova Jersey.

O American Turtlede Bushnell

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A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA DE ONTEM E HOJE – 50 ANOS

Jacobi no Golfo da Finlândia, durante aGuerra da Crimeia. Os navios britânicosHMS Merlin, HMS Vulture e HMS Fireflysofreram sérios danos em batalha causa-dos pelas minas navais russas.

A Guerra Civil americana também viu ouso bem-sucedido de minas. O primeiro na-vio afundado por uma mina foi o USS Cai-ro, em 1862, no Rio Yazoo. Nesse episódio,é famosa a frase do Almirante DavisFarragut: “Danem-se os torpedos, adiantetoda força!”, referin-do-se a um campo deminas colocadas emMobile, Alabama2.

Já difundido mun-dialmente, o uso dasminas também trouxeconsequências para oBrasil durante a Guer-ra do Paraguai: oEncouraçado Rio deJaneiro (1866) e oTamandaré (1868) fo-ram as vítimas dessesartefatos.

As minas no século XX

Já no início do século XX, as minas fo-ram utilizadas na Guerra Russo-Japonesa,em 1904, afundando o encouraçado russoPetropavlovsky e matando o comandanteda frota, o Almirante Makaroff, e a maioriada tripulação. Pelo lado japonês houve aperda de dois encouraçados, quatro cruza-dores, dois destróieres e um navio lança-minas, exclusivamente por campos minados.

Durante a Primeira Guerra Mundial, asminas foram utilizadas em larga escala paraa defesa de costas, portos e bases navais.Na tentativa de negar a saída norte do Mar

do Norte para os U-boats, os Aliados im-plantaram a Barragem Norte, com cerca de70 mil minas, algumas das quais continhamnitroglicerina em sua composição, enquan-to os alemães plantaram minas tanto ofen-sivamente, nas rotas de navegação britâ-nicas, quanto nos seus portos, para finsdefensivos. O número total de minas utili-zadas no conflito é estimado em 235 mil.

Na Segunda Guerra Mundial, um novotipo de mina foi introduzido pela Alema-

nha: a de influênciamagnética. O mecanis-mo da mina alemã pos-suía uma sensibilida-de ajustável, calibradoem miligauss, que ti-nha por princípio adetecção de uma per-turbação magnéticaproveniente de umgrande objeto de ferro(navio). Mais tarde, aalta sensibilidade dasminas alemãs se torna-ria uma grande des-

vantagem, pois facilitaria as operações devarredura por parte dos Aliados. Ao longodo conflito, as minas foram aperfeiçoadascom o uso dos princípios de acústica epressão, além do magnético, e dos dispo-sitivos contadores de navios, as primeiras“minas inteligentes”. Estima-se que foramlançadas cerca de 540 mil minas em todo oconflito, o que se deve, principalmente, aoemprego maciço de aeronaves para o lan-çamento desses artefatos.

Após a Segunda Guerra Mundial, ape-sar dos princípios de disparo permanece-rem quase inalterados (acústico, magnéti-co e pressão), percebemos a presença desistemas cada vez mais inteligentes e com-binados. Entre estes podemos citar:

2 Mobile é uma cidade do estado do Alabama (Estados Unidos), localizada em Mobile County.

O uso das minas tambémtrouxe consequências parao Brasil durante a Guerra

do Paraguai: oEncouraçado Rio deJaneiro (1866) e o

Tamandaré (1868) foram asvítimas desses artefatos

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A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA DE ONTEM E HOJE – 50 ANOS

Captor – Os Encapsulated Torpedossão minas antissubmarino para operaremem profundidades além de 3.000 pés. O seusistema é composto basicamente por umsonar passivo e um torpedo: em caso dedetecção de um submarino, automatica-mente, é lançado um torpedo MK 46 parabusca do alvo. SLMM (Submarine Launched Mobile

Mine) – O submarino lançador móvel de mi-nas foi desenvolvido para plantar minas emáguas rasas (até cerca de 100 m), inacessíveisa outros meios de transporte. Utiliza-se de mi-nas com autopropulsão, uma espécie de tor-pedo com alcance superior a 8 milhas náuticase de emprego basicamente ofensivo. ISLMM (Improved Submarine Laun-

ched Mobile Mine) – A versão moderniza-da do SLMM oferece maior alcance e pre-cisão de posicionamento das minas, capa-cidade de mudar o rumo, baixo custo e mai-or autonomia para o torpedo. Armado comduas ogivas, cada ISLMM é capaz de ata-car dois alvos distintos.

A GUERRA DE MINAS NA MARINHADO BRASIL

O histórico da Força de Minagem eVarredura

Criada pelo Aviso Ministerial no 0818 de12 de maio de 1961, a Força de Minagem eVarredura inicialmente era subordinada aoComando do 1o Distrito Naval e contavacom os Navios-Varredores Javari e Jutaí,recém-recebidos da Marinha americana.

Em 1963, contando também com os Navi-os-Varredores Juruá e Juruena e com os Na-vios-Patrulha Piranha, Piraquê e Pirapiá,passou à subordinação da Esquadra.

Em 1967, passou a chamar-se Esquadrãode Minagem e Varredura. Após quatro anos,em 1971, os navios-patrulha foram transferi-dos para o Grupamento Naval do Sul, e oEsquadrão, então restrito aos quatro navios-varredores, foi transferido para a Bahia, fi-cando sediado na Base Naval de Aratu. Poressa época, a Marinha decidiu renovar as

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A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA DE ONTEM E HOJE – 50 ANOS

unidades do Esquadrão, encomendando aconstrução de seis novos navios-varredoresà Alemanha. Entre novembro de 1971 e de-zembro de 1972 foram recebidos os quatroprimeiros, batizados com os nomes de Aratu,Anhatomirim, Atalaia e Araçatuba.

Em 1975, os antigos navios-varredoresdeixaram o Esquadrão e passaram à subordi-nação do Comando do 2o Distrito Naval, bemcomo o próprio Esquadrão, contando, naocasião, com os quatro navios-varredores.

Um ano depois, em fevereiro de 1976,chegam os Navios-Varredores Abrolhos eAlbardão, últimos da sua classe a seremrecebidos.

A Marinha do Brasil, atenta às necessida-des da Guerra de Minas, decidiu restaurar acapacidade operativa da Força de Minageme Varredura executando, no período de 2001a 2007, a revitalização dos seus meios.

Realizada nas instalações da Base Na-val de Aratu (BNA), a revitalização envol-veu a desmontagem e a retirada de bordode quase todos os equipamentos, seguidada docagem dos navios por meio do Siste-ma Elevatório de Navios (Selena). A partirda docagem, os navios foram deslocadospara um galpão coberto construído espe-cificamente para a revitalização.

Um dos principais itens dessarevitalização foi a substituição do madeiramedo convés principal e do tijupá, que, total-mente projetada e desenvolvida pela Base

Navio-Varredor Javari Navio-Varredor Jutaí

Naval de Aratu (BNA), consistiu na retira-da, em média, de 225 m² de madeira original(mogno-africano, ou kaya) e posterior ins-talação da nova madeira (itaúba). Tal subs-tituição apresentou vantagens em termosde custo e facilidade de aquisição no mer-cado nacional, mantendo as mesmas carac-terísticas da resistência estrutural.

Os demais projetos para o período derevitalização foram: substituição dosconversores, chaves do Sistema de Prote-ção Magnética (SPM) e do radar de buscade superfície; instalação de DGPS eecobatímetro; e substituição da supervi-são dos MCP por sistema digital de fabri-cação nacional, dos compressores de ar-condicionado e dos MCA. Ressalta-se tam-bém a revitalização dos equipamentos doSistema de Varredura de Influência, com asubstituição dos armários de regulação eprogramadores de varredura por unidadesmodernas desenvolvidas pelo Instituto dePesquisas da Marinha (IPqM).

O resultado dos testes e provas de marnos navios-varredores tem demonstradoque o processo de revitalização está apre-sentando resultados acima dos esperados,frutos do desempenho que vem sendo ob-servado, com a vantagem da facilidade deoperação e manutenção. Adquiridos nadécada de 70, os seis navios-varredoresnecessitavam dessa reforma para que per-manecessem em serviço, sem que sua ca-

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A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA DE ONTEM E HOJE – 50 ANOS

pacidade operativa fosse comprometidapelo estado físico do material ou pela defa-sagem tecnológica. Sempre abrindo cami-nho para a Esquadra, esse tipo de embar-cação desempenha um vital e árduo papel,possibilitando a passagem, com seguran-ça, de forças navais enavios mercantes poráguas onde haja ame-aça de minas.

O cenário atual naMB

Visando adquirirnovos meios e equipa-mentos para capacita-ção e aprimoramentodas técnicas de Con-tramedidas de Mina-gem (CMM), a partir doinício do ano de 2010os navios-varredores classe Aratu começa-ram a operar o VDS (Variable Depth Sonars)Sidescan, disponibilizado pela Diretoria deHidrografia e Navegação (DHN), a título deexperimento. Esse equipamento tem comoobjetivo mapear o fundo de áreas de interes-

se dos nossos portos e linhas marítimas aolongo do litoral, a fim de manter um banco dedados para futuras operações de CMM. Osresultados têm se mostrado bastante positi-vos, contribuindo, dessa forma, paraincrementar inovações tecnológicas no ades-

tramento das tripula-ções e elevar o grau deaprestamento dos nos-sos meios.

Um projeto inovadorcom 100% de tecnolo-gia nacional está sendodesenvolvido pela firmaArmtec Brasil em con-junto com a Universida-de de Fortaleza (Unifor),tendo a participação daMarinha do Brasil comoconsultora técnica – oSiri (Sistema Integradopara Resgate e Investi-

gação). O Siri é um minirrobô submarino, tam-bém controlado a distância, utilizado para ava-liar o meio ambiente e efetuar algumas opera-ções de inspeção de estruturas submersas,que atinge 300 metros de profundidade e podeperfeitamente ser utilizado nas CMM, a fim de

investigar minas.Também com o programa

nuclear da Marinha, uma aten-ção especial deve ser dada àsContramedidas de Minagem naárea da instalação da nova Basede Submarinos que seráconstruída em Itaguaí, no Esta-do do Rio de Janeiro, já que iráabrigar o submarino nuclear.Nesta área, a segurança torna-se fundamental, uma vez que aentrada e saída de portos des-ses tipos de submarinos seconstituirá em atividade estra-tégica vital para a segurançanacional.Navio-Varredor Albardão

Abrindo caminho para aEsquadra, esse tipo de

embarcação desempenhaum vital e árduo papel,

possibilitando a passagem,com segurança, de forçasnavais e navios mercantes

por águas onde hajaameaça de minas

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A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA DE ONTEM E HOJE – 50 ANOS

MEIOS NAVAIS DE CMM

A Marinha dos EUA

Iniciado em fevereiro de 2002, o programaamericano do Litoral Combat Ship (LCS) re-presenta uma redução significativa no tem-po de adquirir, projetar e construir navios emcomparação com qualquer classe de navio.

O LCS consiste em um monocascosemiplano, projetado e construído pelaLockheed Martin. Estas estrutura é equi-pada com módulos reconfiguráveis, cha-mados de Mission Packages, que podemser alterados rapidamente de acordo com aameaça vigente.

As Mission Packages serão apoiadas pordestacamentos especiais que irão organizare preparar veículos tripulados e não tripula-dos, sensores de apoio a mina e missões deguerra de superfície e antissubmarino.

O LCS funcionará como um centro decontrole de ações planejadas, dependen-do dos veículos tripulados e não tripula-dos para executar as missões atribuídas,objetivando realizar operações bem-suce-didas em um ambiente adverso, empregan-do armas tecnologicamente avançadas.

O LCS é um navio pequeno e de fácilacesso. Rapidez e agilidade são fundamen-tais para este tipo de navio, que deverá sercapaz de operar em baixas velocidades paramissões perto de costa (águas rasas), emvelocidade de cruzeiro durante o trânsitopara área de operação e em altas velocida-

des para reprimir pequenos barcos ou ame-aças submarinas.

Entre as capacidades do LCS, podemosdestacar a sua velocidade. Isto se dá pelodesenho do seu casco, cuja forma permiteque atinja velocidade de 40 nós.

Característica igualmente destacável doLCS é a sua reduzida tripulação. Os naviospodem operar com uma tripulação de 15elementos, acrescentando-se normalmen-te mais 25, consoante o tipo de missão queo navio desempenhe. O LCS tem capacida-de para alojar até 75 pessoas. A possibili-dade de redução de tripulação decorre doalto nível de automatização do navio.

Em resumo, o LCS é rápido, ágil e projetadopara operar em ambientes próximos de costae, se necessário, em mar aberto. Foi concebidopara derrotar ameaças assimétricas, como mi-nas, submarinos convencionais e embarca-ções rápidas de pequeno porte.

A operação do módulo de CMM dessenavio traz consigo a expectativa de elimi-nação da dependência dos convencionais

Equipamento Sidescan em perfil e em operação, a bordo do Navio-Varredor Araçatuba

Litoral Combat Ship USS Freedon

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A FORÇA DE MINAGEM E VARREDURA DE ONTEM E HOJE – 50 ANOS

navios varredores ou caça-minas. De for-ma mais impactante, pode representar a re-tirada total do elemento humano de dentrodos campos minados.

As razoáveis dimensões do LCS, o qualdesloca cerca de 3 mil toneladas, implicaoutro importante diferencial logístico. O na-vio, comparado aos demais projetados paraCMM, tem grande raio de ação, que exime anecessidade de seu traslado, dentro de ou-tro navio, para a área de operação.

Encerrando as questões logísticas, o fatode o navio operar eminentemente fora doslimites de um campo minado exige menorpreocupação com sua assinatura magnéti-ca, demandando menor esforço logístico noque concerne ao apoio de bases para trata-mento magnético de equipamentos e ao for-necimento de sobressalentes, os quais nãotêm de ser, obrigatoriamente, amagnéticos,fora das linhas de produção normais dosprincipais fornecedores.

Analisando os benefícios táticos do pro-jeto, destaca-se a capacidade de realizarprocedimentos de varredura ou de caça deminas por meio de helicóptero orgânico, oque possivelmente conferirá celeridade àfaina, além de minimizar o grau de impreci-são existente nos atuais procedimentos decaça de minas por meio de navios, em vir-tude da dificuldade de manutenção de suaposição a baixas velocidades em condiçõesdesfavoráveis de mar.

Todas essas expectativas dependem dosucesso da operação isolada de cadasubsistema de CMM instalado e, princi-palmente, de sua eficaz integração. Ressal-ta-se que, dos seis subsistemas do pacote,todos se encontram em fase de avaliaçãooperacional, mais precisamente em fase deavaliação técnica de protótipos.

Antes de passarmos a apresentar cada umdos subsistemas citados, vale destacar nova-mente que todo esse dispositivo inovador paraCMM orgânico baseia-se, basicamente, na

utilização do vetor helicóptero. Somente osubsistema RMS (sexto da lista abaixo) podeser operado diretamente do navio; todos osdemais dependem de aeronaves.

O pacote antimina do LCS é o seguinte:1. Equipamento de detecção sonar

(Sonar Mine Detecting Set – SMDS) AN/AQS-20A da Raytheon;

2. Sistema de Neutralização de Minas paraaeronave (Airborne Mine NeutralizationSystem – AMDS) AN/AQS-235 da Raytheon;

3. Sistema de Detecção de Minas a Laserpara aeronave (Airborne Laser MineDetection System – ALMDS) da NorthropGrumman;

4. Sistema de Neutralização de Minaspara aeronave (Rapid Airborne MineClearence System – RAMICS) AN/AWS-2da Northrop Grumman;

5. Varredura de Influência Orgânica(Organic Airborne and Surface InfluenceSweep – OASIS) AN/ALQ-220 da EDOCorporation (agora ITT); e

6. Sistema Remoto para caça de minas(Remote Minehunting System – RMS) AN/WLD-1 da Lockheed Martin.

Destaca-se que, com a operação do LCS,os veículos autônomos ganharão importân-cia nas operações navais e, por consequência,o investimento da indústria militar nesse se-tor aumentará consideravelmente em buscade novas tecnologias. O LCS parece ser umaplataforma ideal para os veículos não tripula-dos de superfície (USVs), veículos submari-nos não tripulados (UUVs) e veículos terres-tres não tripulados (UGVs).

Outras Marinhas

O Ministério da Defesa britânico infor-mou recentemente que a Royal Navy come-çou oficialmente a operar o sistema deContramedidas de Minagem Recce, basea-do no UUV (Unmanned Underwater Vehicle)

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Remus 600, produzido pela empresa ameri-cana Hydroid. O Recce é um equipamentocompletamente autônomo, que tem o forma-to de um torpedo, opera entre as profundi-dades de 30 a 200 metros e pode fazer bus-cas no leito marinho à procura de minas pormais de 20 horas, usando um avançado sis-tema de navegação, bem como sensoresacústicos e batimétricos para detectar e in-dicar a posição exata das possíveis amea-ças. Os dados obtidos, incluindo imagensde alta resolução, são transmitidos para ope-radores no navio lançador, reduzindo o ris-co do emprego de mergulhadores, que tra-dicionalmente executavam essas operações.Além disso, pode ser empregado em opera-ções de reconhecimento, pesquisas hidro-gráficas e monitoramento ambiental.

A Marinha da Suécia, por meio de suascorvetas classe Visby, construídas pela em-presa sueca Kockums (uma subsidiária daThyssenKrupp Marine Systems, da Alema-nha), que foram projetadas para realizar ope-rações superfície-superfície, antissubmarinoe de Contramedidas de Minagem, tem o seuconceito de CMM realizado por meio deveículos operados remotamente (ROV). Comeste tipo de conceito, um navio-escolta estásempre pronto a atuar na guerra de minas.

As Marinhas de França, Bélgica e Holandautilizam o caça-minas da classe Tripartite. AMarinha francesa, em 2002 e 2005, moderni-zou o sistema de detecção de minas dos seuscaça-minas com uma nova suíte de sonares(DUMBM21E e PDVS) produzidos pelaThales Underwater Systems (TUS), sendo omais efetivo caça-minas disponível na atuali-dade. Além desse novo sistema, está sendoestudada a inserção de novas tecnologias esistemas não tripulados, aos quais a indús-tria naval francesa promete trazer um novoconceito de guerra antiminas nos próximosanos, um ambiente em que as funções dedetecção de minas, classificação eneutralização poderão ser executadas de ma-

neira segura e remota por robôs-submarinoslançados por navios, aviões, helicópteros esubmarinos, também não tripulados.

No que se refere à varredura acústica, aMarinha Real australiana vem utilizando oIAAG, que é uma versão maior do GeradorAcústico Avançado (AAG). A versãostandart do AAG é capaz de simular a assi-natura acústica de navios de guerra do ta-manho de contratorpedeiros e navios mer-cantes abaixo de 50 mil toneladas. Singu-larmente, as duas AAG e IAAG são inde-pendentes de força externa ou controle epodem ser rebocadas por navios nãoespecializados, como um barco de pesca,por exemplo. A saída do controle doalgoritmo para uma missão em particularpode ser selecionada e copiada de um com-putador de mão para o módulo eletrônico abordo imediatamente antes do lançamen-to. Alternativamente, algoritmos podem sercopiados por um link rádio durante a mis-são pelo sistema de monitoragem do alvoda varredura fornecido com todos os IAAGe AAG. Como a comunicação pode ser per-dida em certos locais, programas alternati-vos podem ser carregados durante o lan-çamento por uma caixa de programação eum cabo de cópia remota por um boteinflável rígido ao lado.

Já a Marinha da Itália fez um contratode 198,7 milhões de euros com o estaleironaval Intermarine para modernizar seus oitonavios caça-minas classe Gaeta ao longode nove anos. A atividade mais importanteé a modernização do sistema de combate: aMarinha italiana tem planejado a substitui-ção do SQQ-14 IT (sonar de profundidadevariável) pelo Thales 2093 e a renovaçãodo sistema de comando e controle com aatualização da versão Datamat (V4). Tam-bém estão incluídos neste esforço: a reno-vação da suíte de comunicações, pela SelexComunications; a modernização dos siste-mas de degaussing dos navios; a substi-

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tuição do veículo de operação remotaSMIN Mk2 pelo Pluto Gigas e Miki, esteúltimo descartável por atuar com carga ex-plosiva para a detonação da mina; e umredesenho do Centro de Informações deCombate e Estação Rádio.

CONCLUSÃO

Ao longo dos 50 anos desde a criaçãodo Comando da Força de Minagem e Varre-dura, apesar de convenções e tratados queregulam e restringem o uso de minas, obser-vamos que, na prática, o uso deste tipo dearma continua presente nos conflitos arma-dos entre Estados, revelando-se uma pode-rosa arma, principalmente para as naçõescom menor poderio militar. A Guerra doVietnã (1964-1975), a Guerra Irã-Iraque (1980-1988), a Guerra do Golfo (1991) e a OperaçãoIraque Livre (2003) são alguns exemplosadicionais nos quais a utilização de minasse fez presente no teatro de operações marí-timo, contigenciando diversos meios navais

a se dedicarem em tarefas de CMM, geran-do um esforço adicional para a Marinha dosEstados Unidos da América.

A aquisição de novos meios de CMMprevistos no Plano de Articulação e Equi-pamento da Marinha (PAEMB) traduz apreocupação da MB em mais uma vez mo-dernizar-se e permanecer em uma posiçãomais confortável nesse tipo de guerra.

Em sua existência, a Força de Minageme Varredura tem se desempenhado na ma-nutenção de uma capacidade técnica eoperativa condizente com a evolução daarte da guerra de minas.

São anos de dedicação ao estudo, àmanutenção dos equipamentos, à forma-ção de várias gerações de oficiais e praçase ao aperfeiçoamento da técnica para quese pudesse cada vez mais aprimorar as var-reduras mecânica e de influência acústicaou magnética, confiantes no acerto daque-les que podem ser considerados “homensde ferro em navios de madeira”.

“Onde a Esquadra for, nós estivemos!”

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<FORÇAS ARMADAS> Força de Minagem e Varredura; Guerra de minas; Marinha doBrasil; Marinha dos EUA; Navios de guerra de minas;

REFERÊNCIAS

– Comittee for Mine Warfare Assesment; Naval Mine Warfare: Operational and Technical Challengesfor Naval Forces. Washington, DC, 2001.

– CORNISH, Gregory J.; U.S. Naval Mine Warfare Strategy: Analysis of the Way Ahead. US ArmyWar College, 2003.

– MATTOS, Leonardo Faria de; Uma Jeune École Brasileira. EGN, 2004.– Página: www.cmwc.navy.mil– Página: www.royalnavy.mod.uk– Página: www.pt.wikipedia.org– Página: www.cefala.org– Revista Jane´s International Defence Review, edição de Fev/2009.– Página: www.janes.com– Página: www.globalsecurity.org– Página: www.naval.com.br– Página intranet: www.comforminvar.mb

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)*

ELCIO DE SÁ FREITASVice-Almirante (Refo -EN)

* Matéria em continuação à série publicada no 3o trimestre de 2006, 2o trimestre de 2007 e no 1o

trimestre de 2011.O Almirante Elcio serviu na Diretoria de Engenharia Naval de dezembro de 1981 a agosto de

1990, tendo sido seu diretor de dezembro de 1984 a agosto de 1990.

SUMÁRIO

Projeto versus ConstruçãoBreve retrospectoComparação

Construção: Preparação de equipes e construção na AlemanhaGarantia de Qualidade na construção de submarinosPreparação de equipes do Arsenal e da DENSistema de Garantia de Qualidade da construção na AlemanhaSistema de Garantia de Qualidade de construção da HDWO BWBAção do BWB nos fabricantes de equipamentos e na HDWTreinamento da equipe do Arsenal na HDWTreinamento da equipe de Garantia de Qualidade da DEN no BWBProvas de mar do Submarino Tupi na Alemanha

Construção: produção de submarinos IKL no BrasilA decisão de fabricar as seções do casco resistente na NuclepFabricação e Garantia de Qualidade na NuclepPreparação da infraestrutura do ArsenalFabricação e Garantia de Qualidade no ArsenalRetaguarda técnicaCorte circunferencial do casco resistente

Programa Permanente de Projeto e Construção de Submarinos

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

PROJETO VERSUS CONSTRUÇÃO

Breve retrospecto

A construção de submarinos no Brasilnas décadas de 1980/1990 foi parte da

etapa marcante no desenvolvimento da Ma-rinha iniciada nos anos de 1970 com as fra-gatas classe Niterói, mas interrompida apósa última fragata. Pouco depois voltamos aprogredir: aqui projetamos e construímoso Navio-Escola (NE) Brasil e as corvetasclasse Inhaúma, projetamos navios de pa-trulha oceânicos de 1.200 toneladas, em-bora tendo que abandonar esse projeto, erealizamos a fase de concepção e a prelimi-nar do primeiro projeto nacional de subma-rino — o SNAC-I —,cancelado logo no li-miar do período deestagnação iniciadoem 1988. A partir daí,a marcha do progres-so rapidamente se re-duziu, e lutamos paraconsolidar pelo me-nos dois dos seusmarcos principais: aconstrução das cor-vetas classe Inhaúmaem estaleiro civil e aconstrução de quatro submarinos de pro-jeto alemão no Arsenal de Marinha do Riode Janeiro (AMRJ). Também reprojetamosas corvetas classe Inhaúma a partir da ex-periência operativa obtida com essascorvetas, todas elas equivalentes a um úni-co protótipo [2]. Esse reprojeto gerou acorveta Barroso, primeiro navio de guerranão protótipo de projeto e construção na-cional em todo o período republicano. Elefoi um passo histórico, tardio e indispen-sável para a evolução técnica da Marinhae para qualquer país que aspire à grandeza.Requer outros na mesma direção.

Comparação

Em qualquer produto importante, civilou militar, a construção é o que mais atrai aatenção. É nela que se concentram o inte-resse e o entusiasmo de quase todas aspessoas. Vendo-se algo complexo que seconstrói, pensa-se que o país “domina essatecnologia”. Não se percebe que a cons-trução é apenas a parte visível de umiceberg técnico-financeiro e, como tal, res-ponsável por apenas uma pequena partedo todo. Também não se percebe que, sema parte imersa, a parte visível afundaria atéque dela restasse um volume insignifican-te. A construção também é importante. Maso poder real reside no projeto e nos finan-

ciamentos. Grandesnações chegam a ab-dicar da construção,mas nunca do projeto.Vender projeto é ven-der dependência e re-ter a parte cérebro-in-tensiva do produto. Fi-nanciamentos geral-mente direcionam de-cisões sobre escolha ecompra de sistemas,componentes e apoiologístico. A este último

corresponde boa parte do custo total deaquisição e operação do produto durantetoda a sua vida útil. Isso é válido para qual-quer sistema complexo, civil ou militar.

Para construir no país um produto atéentão importado, normalmente compra-seo seu projeto, importam-se todos ou quasetodos os sistemas e equipamentos neleprevistos, pagam-se licenças de fabricação,empregadas repetitivamente, e ignoram-setodas ou quase todas as dificuldades quedevem ser vencidas para projetá-lo, espe-cificar e obter seus sistemas e equipamen-tos e planejar e montar seu apoio logístico.

A construção também éimportante. Mas o poder

real reside no projeto e nosfinanciamentos. Grandesnações chegam a abdicarda construção, mas nunca

do projeto

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Os gastos no exterior que se economizamsão apenas os de fabricação, fração docusto total. Também se geram empregos ese melhoram as técnicas de produção, onível da mão de obra direta e os métodosde administração. Esse procedimento é útilpara iniciar-se uma fase de desenvolvimen-to. Mas não permite ir além. Por isso mes-mo, ainda hoje não somos capazes de pro-jetar submarinos, embora tenhamosconstruído quatro no Brasil.

A importância de construir no País élimitada, a não ser que a construção sejaparte de um plano para progressivamentedominarmos e aperfei-çoarmos todo o ciclocriativo de um produ-to, mediante engenha-ria de projeto e inova-ção tecnológica, basesdo “milagre japonês”após a Segunda Guer-ra Mundial. Mas issodemanda longo tempoe esforços inteligentese contínuos. Tem quese transformar em há-bito. Tem que ser umexercício incessante.

Nossos navios de guerra foram sempreconstruídos no exterior, ou então no Brasilcom projeto e assistência técnica do exteri-or. Portanto, a tendência histórica nacionalé a de subestimar a importância do projeto,perpetuar dependências, limitar nosso pro-gresso tecnológico e enfrentar dificulda-des de apoio logístico que poderiam serevitadas ou minoradas.

No Brasil, consideramos que a constru-ção é a meta a ser alcançada e que será rela-tivamente fácil projetar quando assim deci-dirmos. Em geral, desconhecemos a impor-tância do projeto e suas relações de causa eefeito com o sistema técnico-científico e abase industrial no País e no exterior. Acima

de tudo, desconhecemos o longo tempo e atenaz e contínua vontade indispensáveispara estabelecer essas relações.

CONSTRUÇÃO: PREPARAÇÃO DEEQUIPES E CONSTRUÇÃO NAALEMANHA

Mesmo ficando longe da meta de proje-tar e construir submarinos no Brasil, a cons-trução dos IKL-1400 e do Tikuna foi umaetapa marcante no desenvolvimento técni-co da Marinha.

Para bem construirsubmarinos é necessá-rio dispor de organiza-ção e corpo técnico emduas áreas: a da cons-trução propriamentedita e a da Garantiade Qualidade da cons-trução. Para ambas, aMarinha preparou-secuidadosamente. Abase para a preparaçãofoi o primeiro e únicode nossos submarinos

IKL-1400 construído na Alemanha.

Garantia de Qualidade na construçãode submarinos

Garantia de Qualidade (GQ) é um concei-to amplo que comporta várias definições.Cada definição focaliza mais um determina-do aspecto. Garantia de Qualidade é um sis-tema técnico-administrativo para controlare minimizar riscos na produção e futura ope-ração de um produto, maximizar a probabili-dade de ele ter o desempenho desejado eaumentar a eficiência na sua obtenção.

O sistema técnico-administrativo volta-do para a Garantia de Qualidade denomina-se Sistema de GQ ou Sistema de Qualidade.

Mesmo ficando longe dameta de projetar e

construir submarinos noBrasil, a construção dos

IKL-1400 e do Tikuna foiuma etapa marcante no

desenvolvimento técnico daMarinha

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Ele abrange vários níveis das organizaçõesenvolvidas na fabricação de um produto.

Quanto mais complexo for um produto emaiores forem os riscos na sua operação,mais elaborado deve ser o Sistema de Ga-rantia de Qualidade para sua obtenção. Sub-marinos são produtos de alta complexidadetécnica e elevados riscos operacionais. Éessencial aplicar-se um sólido Sistema deGQ à sua obtenção.

Na década de 1970, obtivemos fragatas esubmarinos construídos na Inglaterra e fra-gatas construídas no Arsenal. Nas constru-ções na Inglaterra, aplicou-se o Sistema deGQ formulado e operado pelos ingleses, anós cabendo apenasas funções de cliente,em que certamente pu-demos ser muito maisativos no estaleiroconstrutor das fraga-tas, pois lá dispúnha-mos de equipes de en-genheiros e técnicosdo Arsenal em treina-mento para construí-las também no Brasil.Ao construí-las aqui,utilizamos os métodos ingleses e sua assis-tência técnica. Elevamos nossa capacidadeem construção naval militar e no setor deGQ de estaleiro, mas não chegamos aestruturar no Brasil dois outros setores im-portantes de Garantia de Qualidade: o docliente e o de um órgão independente e es-pecializado em GQ. Na Inglaterra, esse ter-ceiro setor pertencia ao Departamento deDefesa do Reino Unido. O mesmo ocorria eocorre na Alemanha.

Preparação de equipes do Arsenal e daDiretoria de Engenharia Naval (DEN)

Para construir os submarinos IKL-1400 noBrasil nas décadas de 1980/1990, a Marinha

cuidadosamente planejou e preparou o neces-sário corpo técnico. A construção do primeirodos IKL-1400 na Alemanha serviu como esco-la, semelhantemente ao que se fizera na déca-da de 1970 para construir as fragatas no Brasil.Também de modo semelhante, a Marinha va-leu-se dos melhores técnicos e operários deque o Arsenal dispunha, em geral remanes-centes da construção das fragatas. E aindaseguindo o método empregado para construiras fragatas, manteve engenheiros no Grupode Fiscalização e Recebimento de Submarinosna Alemanha. No entanto, a construção desubmarinos exige cuidados redobrados paragarantir a qualidade de materiais, equipamen-

tos, processos e pesso-al. Na Alemanha, essaGarantia de Qualidadeera feita em três níveis,a cargo de órgãos inde-pendentes entre si: o es-taleiro alemão HowaldtDeutsch Werft (HDW),o cliente (no caso, oGrupo de Fiscalização eRecebimento de Subma-rinos na Alemanha –GFRSA) e o BWB

(Bundesamt für Wehrtchnik und Beschaffung,Entwicklung, Erprobung von Wehrmaterial),um ramo da Diretoria-Geral de Armamentos doMinistério da Defesa da Alemanha, notávelorganização para técnicas de fornecimento,desenvolvimento e provas de sistemas e ma-teriais de defesa.

No Brasil, o Arsenal teria que assumir asfunções de GQ correspondentes às do es-taleiro HDW, e para isso contaria com osseus engenheiros e operários treinados naAlemanha como estagiários ou como inte-grantes do GFRSA. As funções de GQ anível de cliente teriam que ser assumidassomente pela tripulação do submarino, ago-ra desfalcada dos engenheiros e técnicosdo GFRSA que então estariam incorpora-

Quanto mais complexo forum produto e maioresforem os riscos na sua

operação, mais elaboradodeve ser o Sistema de

Garantia de Qualidadepara sua obtenção

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dos à equipe do estaleiro construtor, o Ar-senal. Não se previa nenhum órgão paradesempenhar no Brasil as funções de GQ acargo do BWB na Alemanha. Se o próprioBWB fosse contratado para atuar no Brasil,aumentariam nossos gastos em moeda es-trangeira e deixaríamos de adquirir capaci-dade indispensável a esse empreendimentoe a outros ainda mais complexos. Por outrolado, a Divisão de Garantia de Qualidade daDEN se estruturara continuamente desde oinício da construção do NE Brasil. Devida-mente informado, o diretor-geral do Materi-al da Marinha determinou que quatro enge-nheiros civis e um engenheiro militar da Di-visão de Garantia de Qualidade da DEN fos-sem treinados no BWB. Além disso, um dosoficiais dessa Divisão fez parte do GFRSAdurante dois anos.

Após mais de dez anos atuando nasobtenções do NE Brasil e das corvetas noArsenal, das corvetas na Verolme, do Na-vio-Transporte (NT) Marajó na Ishibrás edos primeiros IKLs brasileiros no Arsenal,a Divisão de Garantia de Qualidade da DENfoi extinta, tal como a Divisão de ApoioLogístico. A causa determinante foi o con-tínuo êxodo de engenheiros, resultante desalários e perspectivas profissionais pro-gressivamente piores. Dos cinco elemen-tos da DEN treinados e com experiência emGQ de submarinos, somente dois ainda es-tavam em serviço na Marinha em 2007.

Setenta e nove profissionais do Arse-nal foram treinados no estaleiro alemãoHDW. Desses, apenas 13, com idade médiapróxima à da aposentadoria, estavam aindaainda em atividade em 2008 [8]. Obstácu-los a contratações de pessoal, êxodo porbaixos salários e ausência de novas cons-truções impediram a manutenção e a reno-vação paulatina desse corpo técnico alta-mente especializado. Seu desempenho foiexcelente. Acompanhou atentamente todasas tarefas que teria que realizar mais tarde e

para cada uma gerou relatórios técnicos im-portantes para a construção no Brasil.

Engenheiros e técnicos dos órgãos daMarinha responsáveis pelos sistemas dearmas e comunicações também estagiaramna Alemanha. Com seus colegas do Arse-nal e da DEN — incluindo os que compu-nham o GFRSA —, formaram o núcleo docorpo técnico que aqui construiu três sub-marinos IKL-1400 e o Submarino Tikuna,com um mínimo de assistência técnica es-trangeira, apesar das inevitáveis perdas pordemissões que se agravaram com adesmobilização iniciada já no início da dé-cada de 1990.

Sistema de Garantia de Qualidade daconstrução na Alemanha

Para aumentar a eficiência do treinamen-to na Alemanha, vários dos engenheirosmilitares e civis realizaram cursos intensi-vos de idioma alemão ainda no Brasil. Saberalemão era importante para melhor apreen-der as técnicas e obter informações sobre aconstrução do submarino e de seus materi-ais e equipamentos. A língua contratual erao inglês, mas os operários da HDW e deseus fornecedores só falavam alemão e eramuma fonte valiosa de informações que nemsempre se podiam obter por outros meios.Em alguns casos, conseguiam-se informa-ções ouvindo os comentários e a livre trocade ideias entre eles.

O Sistema de GQ adotado na construçãode nosso submarino na Alemanha baseava-se nas normas da Organização do Tratadodo Atlântico Norte (Otan), as AQAP (AlliedQuality Assurance Publications), criadaspara obter meios militares. Delas originaram-se as normas ISO da série 9000, que se dis-seminaram no meio civil.

Como documento básico para Garantiade Qualidade da construção, utilizou-se oPDNP (“Plan der Nachweisprüfungen”) —

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o nosso Índice de Inspeções, Ensaios, Tes-tes e Provas, com algumas informações adi-cionais relevantes, como a relação desubcontratados e a classificação AQAP dossistemas de qualidade de cada um deles.

O Sistema de Garantia de Qualidade daconstrução da HDW

Na HDW, o Sistema de GQ da constru-ção tinha três setores distintos: FAT(Factory Acceptance Tests), HAT (HarbourAcceptance Tests) e SAT (Sea AcceptanceTests). O setor de FAT subdividia-se emFAT na HDW e FAT nas subcontratadas.Porém os inspetores de FAT da HDW even-tualmente compareciam às fábricas desubcontratadas para inspeções similares àsque realizavam na HDW (pintura, inspeçãodimensional, inspeção de soldas etc.) ou parasuprir alguma deficência de pessoal do se-tor FAT da HDW para as subcontratadas.

O setor FAT da HDW subdividia-se emcinco grupos tradicionais: estrutura; pin-tura; máquinas e equipamentos mecânicos;máquinas e equipamentos elétricos; e ele-trônica. Além desses, havia um grupo es-pecífico para medição de ruído e vibraçãoemitidos por cada equipamento. Quase to-dos os componentes do setor FAT eramtécnicos de 2o grau, normalmente operári-os que ascenderam à condição de mestre edepois à de inspetor.

O setor FAT da HDW era realmente in-dependente da produção. Em alguns ca-sos ele alertou nossos engenheiros sobreserviços insatisfatórios resultantes de ten-tativas de reduzir o tempo de construção.

Um mesmo inspetor de FAT da HDWcomparecia à maioria das inspeções e tes-tes nas subcontratadas. Provavelmenteformara-se em eletricidade, mas havia ad-quirido prática nas outras disciplinas, com-parecendo sempre aos mesmos testes, nasmesmas subcontratadas. Além dele, havia

mais um ou dois especialistas que se en-carregavam dos FAT de sistemas de armas(normalmente fabricados em França, EUAe Inglaterra). A não ser os especialistas, osdemais técnicos eram de nível médio (téc-nicos de 2o grau).

No setor HAT da HDW atuavam os seusinspetores de HAT e de SAT, além de re-presentantes dos fabricantes.

Diferentemente do que ocorria no setorFAT, no setor SAT da HDW havia uma gran-de quantidade de inspetores, todos, ou qua-se todos, de nível superior. Ele assim se sub-dividia: características marinheiras (curva degiro, crash down, velocidade máxima etc.);máquinas e equipamentos mecânicos; má-quinas e equipamentos elétricos; eletrôni-ca; sistemas de armas; e comunicações.

Contratualmente, os documentos de GQelaborados pela HDW tinham que ser apro-vados pelo BWB e pelo GFRSA. A aprova-ção do BWB geralmente era automática, poisele já trabalhava com os procedimentos daHDW há muito tempo. Porém os engenhei-ros do GFRSA normalmente solicitavam queos documentos fossem mais detalhados,para terem a necessária base a futuras exi-gências e para aperfeiçoar os formulários deteste que usariam nas construções no Bra-sil. A HDW emitia procedimentos lacônicos,considerando que todos os participantes já“tinham no sangue” o que estava omitido.Mas é claro que essa suposição não eraválida para nós, os principais interessados,empenhados em daí prosseguir com a máxi-ma autonomia possível.

Além das inspeções e testes contratuaisda HDW, a serem presenciados e aprova-dos pelo BWB e o GFRSA, a HDW realiza-va inspeções e testes prévios. A eles com-pareciam também os engenheiros e técni-cos do Arsenal, do Centro de Armamentoda Marinha e do Centro de Eletrônica daMarinha, que registravam suas observa-ções em relatórios técnicos.

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

O BWB

O BWB é um ramo da Diretoria-Geral deArmamentos do Ministério da Defesa daAlemanha. Juntamente com o IT-AmtBW(Bundesamt für informationsmanagementund informationstechnik der Bundeswehr),dedicado à administração de informaçõese tecnologia de informações, o BWB re-presenta o setor de armamento do gover-no alemão abaixo do nível ministerial.

O BWB é a maior autoridade técnica naAlemanha, responsável por assegurar queos sistemas e equipamentos das ForçasArmadas alemãs tenham a mais avançadatecnologia. Algumasde suas tarefas princi-pais são desenvolvi-mento, testes e obten-ção de material de de-fesa, além de gestão deprojetos de pesquisa etecnologia. Ele as exe-cuta mediante contra-tos com a indústria etambém por seus pró-prios meios. Como um“agente de compras”central do Ministérios da Defesa, o BWB éum importante cliente público.

Com sede em Koblenz, o BWB tem agên-cias em várias cidades do país e dispõe desete centros técnicos e três institutos depesquisa, além do Arsenal Naval, com ins-talações para manutenção e reparos denavios da Marinha de Guerra em Wilhems-haven e Kiel.

Ação do BWB nos fabricantes deequipamentos e na HDW

Em cidades com maior concentração defabricantes e fornecedores de material bé-lico, o BWB mantém escritórios de inspe-ção. Para inspeções em outros países, ele

tem convênios com os respectivos órgãosoficiais de inspeção da Otan.

Na HDW, o BWB mantinha um escritó-rio com um grupo de inspetores e abrangiadesde a inspeção de recebimento de mate-riais e equipamentos no estaleiro até asprovas de cais e de mar. Estas últimas eramrealizadas na cidade dinamarquesa deSkagen, no Mar do Norte, pois no Mar Bál-tico, onde fica a HDW, a profundidademáxima não ultrapassa 60 metros.

Ao chegarem na HDW, os materiais e equi-pamentos eram inspecionados na presençade um inspetor do BWB para verificar sua in-tegridade e confirmar o recebimento da docu-

mentação pertinente(manuais e documentosde inspeções e testes deFAT). Após a inspeçãode materiais ou equipa-mentos, eles iam para opaiol de armazenagem.

O BWB inspecio-nava os locais de ar-mazenagem, para veri-ficar se suas condi-ções atendiam aos re-quisitos especifica-

dos nas normas DIN e nas normas milita-res complementares. Durante o período dearmazenamento, comparecia a inspeçõesperiódicas de manutenção (troca deabsorvedores de umidade, giro de 45° doseixos das máquinas rotativas, medição detemperatura, verificação das resistênciasde aquecimento, rastreabilidade e inspe-ções e testes por amostragem, principal-mente de elastôme-ros (calços flexíveis eacoplamentos flexíveis de redes etc.), con-forme estabelecido nos procedimentos cor-respondentes.

Antes da montagem e instalação de equi-pamentos e componentes a bordo, o BWBpresenciava várias atividades: testes poramostragem de cabos elétricos, elastôme-

O BWB é a maiorautoridade técnica na

Alemanha, responsável porassegurar que os sistemase equipamentos das ForçasArmadas alemãs tenham amais avançada tecnologia

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

ros, juntas de dilatação e anéis retentores;inspeção visual de buchas e mancais; aná-lise de óleos e lubrificantes; e funciona-mento parcial em bancadas.

Após inspecionar um material ou equi-pamento, o inspetor do BWB assinava oformulário de inspeção ou teste correspon-dente, registrava a existência ou a ausên-cia de não conformidades e autorizava, ounão, a instalação a bordo.

Um inspetor do BWB presenciava as ins-peções para verificar se cada local do sub-marino estava em condições de nele se ins-talarem materiais e equipamentos. Caso hou-vesse pendências, elas eram registradas.Após ações corretivas suficientes e novainspeção, o local eraaprovado.

Os diversos deta-lhes do processo decada instalação eramsubmetidos à aprova-ção do inspetor doBWB. Nas inspeções deinstalação incluíam-se:verificações dimen-sionais; medidas deespaçamentos paraacesso, operação e ma-nutenção; inspeção dasconexões de cabos elé-tricos, redes, acessóri-os; inspeções de alinhamento, calçamento eisolamento acústico e térmico; inspeções depintura, limpeza, flushing de redes de alimen-tação; verificação da resistência de isolamen-to dos cabos de alimentação e controle; wiringchecks; marcação e identificação, iluminaçãodo local etc. Em seguida, realizavam-se os tes-tes de funcionamento, com medições de tem-peratura, rotação, parâmetros elétricos, va-zões, pressões, desempenho, ruído, vibração,estabilização térmica etc.

As inspeções e testes realizavam-se se-gundo os documentos de teste correspon-

dentes, previamente elaborados em con-junto pela HDW e o BWB e, finalmente,aprovados pelo BWB. Um representantedo BWB, técnico ou engenheiro, sempreestava presente nas inspeções e testes. Aaprovação final cabia ao engenheiro doBWB responsável pela respectiva área.

Todas as atividades acima foram execu-tadas de forma idêntica no Brasil. Os mes-mos documentos foram reelaborados emconjunto pelo Arsenal e a DEN, e finalmen-te aprovados pela DEN. Em seguida, foramaplicados a bordo e nas dependências doArsenal com a presença de inspetores doDepartamento de GQ do AMRJ e da Divi-são de GQ da DEN.

Treinamento daequipe do Arsenalna HDW

Para o treinamentona Alemanha, o Arsenalselecionou cerca de 80profissionais – enge-nheiros, técnicos e ope-rários, alguns deles re-manescentes da cons-trução das fragatas.Eles estiveram na HDWentre 1985 e 1987, emgrupos que acompa-

nharam as atividades da construção do Sub-marino Tupi, que seriam utilizadas para cons-truir IKLs no Brasil. O treinamento abrangeugerenciamento, planejamento, fabricação,montagem, inspeções, testes, provas e GQde estaleiro. Os grupos se organizaram porespecialidades: estruturas/solda, máquinas/redes, eletricidade/eletrônica, controle dequalidade, materiais, testes e gerência [4].

Cada grupo da equipe do Arsenal assi-milou os correspondentes métodos, técni-cas e a documentação da HDW, e elaborourelatórios que permitiram um máximo de au-

Melhor não poderia ser odesempenho da equipe do

Arsenal. Ela cumpriufielmente a missão

recebida. Registrou emcerca de 1.150 relatórios

técnicos todas asinformações que conseguiu

no treinamento

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

tonomia e confiabilidade na construção dosIKLs no Brasil.

Melhor não poderia ser o desempenho daequipe do Arsenal. Ela cumpriu fielmente amissão recebida. Registrou em cerca de 1.150relatórios técnicos todas as informações queconseguiu no treinamento. Além de permiti-rem a construção dos IKLs no Brasil com ummáximo de autonomia e confiabilidade, essesdocumentos são fonte de consulta e bancode conhecimentos para equipes de constru-ção de submarinos [4].

Treinamento da equipe de Garantia deQualidade da DEN no BWB

Em 1984 a DEN transferiu dois jovensengenheiros — um de estruturas e um deeletricidade -— do seu Departamento Téc-nico para a Divisão de Garantia de Quali-dade. Juntamente com um engenheiro deestruturas, um eletricista e dois mecânicosjá naquela Divisão, eles se preparariam pararealizar no Brasil as tarefas de GQ a cargodo BWB na Alemanha. O engenheiro ele-tricista mais jovem trabalhara durante umano na preparação para o projeto SNAC-I,levantando as características dos sistemaselétricos dos submarinos das classesHumaitá (Oberon) e Rio de Janeiro(Guppy), abrangendo geração, baterias,distribuição, iluminação, conversores deenergia etc. O outro engenheiro eletricistadistinguira-se por invulgar capacidade,muitas vezes demonstrada em diferentesfases de sua vida na Marinha. Todos osengenheiros, exceto os dois primeiros, ha-viam acumulado certa experiência em GQna construção do NE Brasil e das corvetasclasse Inhaúma, na qual todos continua-ram a trabalhar até sua ida para a Alema-nha. Essa combinação de experiências efaixas etárias foi importante.

Três grupos de engenheiros de GQ daDEN foram treinados na Alemanha. O trei-

namento de cada grupo durou cerca de umano. O primeiro grupo foi de um único en-genheiro de estrutura, que esteve na HDWdurante 1986, juntamente com o pessoaldo Arsenal. Seu treinamento abrangeu to-dos os aspectos da fabricação do cascoresistente: procedimentos de soldagem,tolerâncias dimensionais, tratamento tér-mico, montagem de “jigs”, qualificação desoldadores e ensaios não destrutivos.

O segundo grupo iniciou seu treina-mento de GQ no BWB em janeiro de 1987.Compunha-se do engenheiro eletricistamais jovem e de um dos dois engenheirosmecânicos.

Um engenheiro mecânico e o engenhei-ro eletricista mais experiente compunham oterceiro e último grupo a ser treinado em GQno BWB. Eles chegaram na Alemanha emabril de 1987 e regressaram em julho de 1988,após o termino das provas de mar do Sub-marino Tupi. Seu treinamento superpôs-separcialmente ao do segundo grupo.

O treinamento fez-se em duas etapas,uma teórica e outra prática, brevementeexplicitadas abaixo.

– Parte teórica – Sede do BWB emKoblenz: Conceituação, fundamentos,metodologia e procedimentos de garantiada qualidade. Neste módulo foram minis-trados conhecimentos sobre as normasAQAP e as práticas adotadas pelo BWBpara Garantia da Qualidade na obtençãode material militar para as três Forças Ar-madas alemãs.

– Parte prática – Escritório do BWB emKiel (BaBWB-Kiel – Bauaufsicht der BWBin Kiel), junto ao estaleiro HDW. Nestemódulo foram ministrados conhecimentospráticos sobre a aplicação de FAT, HAT eSAT. Os engenheiros de GQ da DEN acom-panharam todas as atividades dos inspe-tores do escritório do BWB em Kiel, reali-zadas na HDW e nas dependências dosfabricantes de equipamentos em várias

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partes da Alemanha. Elas abrangeram asinspeções e testes de fábrica (FAT), as ins-peções de recebimento e armazenagem naHDW, as inspeções prévias de comparti-mentos do submarino, a colocação em fun-cionamento de equipamentos, as provasde cais e as provas de mar.

O segundo e o terceiro grupo tiveram amesma parte teórica de treinamento. Porémo terceiro grupo pôde empenhar-se nas fa-ses mais avançadas e extensas das provasde mar, por chegar mais tarde e prorrogar-seo seu treinamento até o fim dessas provas.

As provas de marrealizaram-se em Ska-gen, na Dinamarca,duraram cerca de oitomeses e delas partici-param o segundo e oterceiro grupo de enge-nheiros de GQ da DEN.

Na parte prática, osengenheiros da DENobservaram in loco aaplicação dos proce-dimentos, a análisedos resultados, a to-mada de decisões di-ante dos resultados, aimposição de açõescorretivas e a realiza-ção de novas inspe-ções, testes e provaspara comprovação da eficácia das açõescorretivas.

Durante o treinamento, os engenheirosde GQ da DEN elaboraram sistemáticos ecuidadosos relatórios para servir de base àconstrução no Brasil com a menor depen-dência possível. Assim também fez o pesso-al do Arsenal, que treinava em construção,e os componentes do GFRSA. Esses docu-mentos são um patrimônio técnico valioso,útil não apenas para a construção de sub-marinos como também para grandes repa-

ros e modernizações que, tal como a cons-trução, devem basear-se em sólidos siste-mas de produção e de Garantia de Qualida-de. Estão arquivados no Centro de Projetode Navios (CPN) e na DEN.

Provas de mar do Submarino Tupi naAlemanha

As provas de mar do Submarino Tupiiniciaram-se em novembro de 1987. Comosempre, a Garantia de Qualidade realizou-se em três níveis independentes entre si: o

do estaleiro, o do cli-ente e o da autoridadede Garantia de Quali-dade — o BWB.

Num ambiente res-trito como o de umsubmarino, havia so-mente seis vagas parao cliente, a Marinha —representada peloGFRSA e por oficiaisdo Tupi. Para que otreinamento em GQpudesse realizar-se, oBWB cedeu duas desuas vagas. Ainda as-sim, embarcaram ins-petores de estruturas,de máquinas e de ele-tricidade do grupo de

GQ do BWB residente na HDW, chefiadospelo engenheiro Smolensky. Além de de-sempenhar suas funções, eles orientaramtecnicamente os dois engenheiros de GQda DEN em treinamento.

A missão dos engenheiros de GQ da DENera entender claramente o propósito de cadaprova e registrá-la de tal modo que pudesseser repetida no Brasil com um mínimo deassistência técnica alemã. A dos engenhei-ros e submarinis-tas do GFRSA era inspeci-onar, observar resultados e verificar se eles

Durante o treinamento, osengenheiros de GQ da

DEN elaboraramsistemáticos e cuidadososrelatórios para servir de

base à construção noBrasil com a menor

dependência possível.Assim também fez o

pessoal do Arsenal, quetreinava em construção, e

os componentes do GFRSA

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

atendiam aos requisitos contratuais. O tra-balho conjunto desses dois grupos e a com-petência da equipe de submarinos do Arse-nal criaram uma firme base para as provasde mar dos IKL construídos no Brasil.

Diferentemente do que ocorria nos FAT enos HAT, os SAT não eram precedidos dereunião prévia. Partindo de um cronogramageral das provas, a HDW submetia ao GFRSAe ao BWB um cronograma parcial com asprovas que seriam realizadas na semana se-guinte. No dia da prova, era feita uma reuniãopara planejar a sequência dos testes do dia.

Uma primeira etapa das provas realizou-se em águas rasas,próximo ao Canal deKiel. Serviu basica-mente para ajustes napropulsão e corridasnas raias acústicas ecorridas da milha. Du-raram cerca de um mêse meio.

A segunda etapaocorreu no Mar doNorte, em grandesprofundidades, combase na cidade dina-marquesa de Skagen.Abrangeu todos osdemais testes, excetoos do sistema de com-bate, realizados na terceira e última etapa.

Em Skagen, a HDW mantinha doiscontêineres que serviam de escritório e paiolde apoio à manutenção do submarino. Era co-mum solicitar-se assistência técnica dos fabri-cantes da Alemanha.

Alguns testes eram interrompidos ereprogramados, devido a pequenas falhasque normalmente eram corrigidas no mes-mo dia, após o retorno ao cais.

Um dos engenheiros de GQ da DEN as-sim descreveu a rotina de trabalho duranteas provas de mar:

“Para cada prova de mar era gerado umrelatório o mais completo possível. Foi umaépoca de muito trabalho. Como eram saídasdiárias, os relatórios tinham que ser escritosno próprio dia da prova, pelo menos em ras-cunho. Nossa rotina começava no submari-no às 7 horas da manhã. Durante o trânsitopara a área da prova (às vezes a quatro horasde navegação), o relatório da prova anteriorera passado a limpo, aproveitando a presen-ça do BWB a bordo para tirar dúvidas. Du-rante a prova, toda a forma de execução eraanotada. No trânsito de regresso, iniciava-sea elaboração do respectivo relatório. Na casa

em que pernoitávamos(estávamos na maioriadas vezes em Skagen –Dinamarca) acabáva-mos o relatório, às ve-zes trabalhando até demadrugada. No dia se-guinte a rotina se repe-tia. Foram em torno detrês meses nessa faina,com saídas de segun-da a sexta-feira. Aossábados de manhã, pe-gávamos a estrada paraKiel (oito horas de car-ro) para rever a família,retornando no domingologo após o almoço.”

Foram gerados cerca de 80 relatórios téc-nicos que abrangeram todas as provas daplataforma (isto é, todo o submarino, excetoseu sistema de combate), incluindo as pro-vas internas que a HDW fazia para ajustesprévios de sistemas.

O orgulho pelo dever bem cumprido dequase todos os engenheiros, operários etécnicos da Marinha em treinamento resu-me-se bem num parágrafo escrito por umdos engenheiros de GQ da DEN:

“Justificamos cada centavo gastoconosco pela Marinha para montar um Siste-

A atuação do BWB foisempre eficaz e correta,

seja como autoridadedecisória de GQ na

construção do SubmarinoTupi na Alemanha, seja

como fonte de treinamentopara a Garantia de

Qualidade dos submarinosIKL construídos no Brasil

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

ma de Garantia de Qualidade de submarinos.Não trouxemos uma dúvida sequer sobre arealização das provas no Brasil.” A constru-ção no Brasil, nos anos seguintes, provouque essas palavras eram verdadeiras. Rela-tos semelhantes seriamobtidos dos compo-nentes do GFRSA e dostripulantes do Subma-rino Tupi.

A atuação do BWBfoi sempre eficaz e cor-reta, seja como autori-dade decisória de GQ naconstrução do Subma-rino Tupi na Alemanha,seja como fonte de trei-namento para a Garan-tia de Qualidade dossubmarinos IKLconstruídos no Brasil.

CONSTRUÇÃO: PRODUÇÃO DESUBMARINOS IKL NO BRASIL

Pela sistemática vi-gente na época — apli-cada às construções doNE Brasil, das corvetasno Arsenal, das corve-tas na Verolme e de to-dos os demais naviosem obtenção na décadade 1980 —, cabia à DENelaborar a minuta e aespecificação de contra-to, licitar a construção eassinar e gerir o contra-to em nome da Marinha.Para construções no Ar-senal, excetuava-se ape-nas a fase de licitação e designava-se o con-trato por Norma de Construção.

A Norma de Construção do primeiro dosIKL-1400 construídos no Brasil foi assina-

da em 1987. Entre outras disposições, elaestabeleceu que a autoridade decisória so-bre Garantia de Qualidade era a própriaDEN. Para isso a DEN se havia preparado,da mesma forma que o Arsenal se prepara-

ra para construir.Assim, na constru-

ção do primeiros dosIKL-1400 no Brasil,mantiveram-se três ní-veis de GQ independen-tes entre si: o do Arse-nal (estaleiro), o daForça de Submarinos(cliente) e o da DEN(autoridade inspetora).Era evidente que emnenhum desses níveishavia a experiência e acompetência criadas eacumuladas nos níveiscorrespondentes na

Alemanha e nos demais países construto-res de submarinos. Tal deficiência seria com-pensada por assistência técnica estrangei-

ra. Mas quanto maiorfosse a assistência téc-nica, maiores seriam oscustos em moeda es-trangeira e menores asdisponibilidades paraapoio logístico e outrasnecessidades. Alémdisso, menor seria nos-sa iniciativa, essencialpara rapidamente pro-gredirmos. Decidimosusar somente a assis-tência técnica indis-pensável. Portanto, foinecessário aplicar cui-

dadosamente tudo o que aprendêramos,controlando riscos. E controlar riscos é par-ticularmente importante na construção desubmarinos.

Decidimos usar somente aassistência técnica

indispensável. Portanto, foinecessário aplicar

cuidadosamente tudo o queaprendêramos, controlandoriscos. E controlar riscos éparticularmente importante

na construção desubmarinos

O aproveitamento dacapacidade ociosa da

Nuclep foi uma vantagemsecundária, fora dos

propósitos e da missão daMarinha. Os benefícios econquistas que visamos econseguimos foram muito

mais importantes

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

A decisão de fabricar as seções do cascoresistente na Nuclep

Uma das mais importantes decisões noPrograma de Obtenção de Submarinos foia de construir as seções do casco resisten-te na Nuclep. O aproveitamento da capaci-dade ociosa da Nuclep foi uma vantagemsecundária, fora dos propósitos e da mis-são da Marinha. Os benefícios e conquis-tas que visamos e conseguimos foram mui-to mais importantes.

O primeiro benefíciovisado, mas não o maisimportante, foi econo-mizar recursos financei-ros. A possível necessi-dade de comprar máqui-nas e dispositivos parafabricar o casco resis-tente, no valor de 35 mi-lhões de marcos de1984, levou a uma sériede exames, negociaçõese decisões. A expectati-va inicial da HDW cer-tamente era a de que aMarinha, tendo treina-do engenheiros e técni-cos em sua “linha deprodução” de cascosde submarinos, simples-mente comprasse osdispositivos e máqui-nas dessa linha, pas-sando a repetir o proces-so nas instalações do Arsenal com assistên-cia técnica alemã, contabilizada à parte, no valoraproximado de US$ 25.000 mensais da época(cerca de US$ 47.000 mensais de dezembro de2006) para cada engenheiro ou técnico ale-mão. Com esse esquema, instalar-se-ia no Ar-senal uma verdadeira fábrica de cascos resis-tentes de submarinos. Ele teria, como vanta-gens, a rapidez de implementação e a redução

de riscos na fabricação. Porém haveria váriasdesvantagens: um dispêndio elevado, que nãose limitaria aos 35 milhões de marcos de 1984iniciais, pois seriam necessárias extensas obrascivis, além daquelas que depois fizemos noEdifício 17 para construir todo o submarino;segregação de grandes áreas no Arsenal parafabricar as seções dos cascos resistentes;indução a exagerada dependência de assis-tência técnica alemã; e reduzida vantagem noposterior emprego do capital investido e imo-

bilizado, dado o peque-no número de cascos re-sistentes e obrascongêneres a produzirem horizonte visível.Acresça-se a carênciade recursos, que já sedivisava para outrasáreas também críticas daobtenção, mormente ade aquisição de sobres-salentes. Diante disso— e da existência naNuclep de modernasinstalações e máquinas,bem como de engenhei-ros, técnicos e operári-os altamente qualifica-dos —, a Marinha deci-diu ali fabricar as seçõesdos cascos resistentes,reunindo-as e comple-tando-as no Arsenal.Essa decisão foi de umaaudácia bem medida e

possibilitou a fabricação satisfatória das se-ções do casco resistente na Nuclep.

O segundo benefício — indispensável parauma Marinha que aspirava a projetar e cons-truir uns poucos submarinos convencionais,daí passando a submarinos nucleares — foilançar seus engenheiros num grande e com-plexo empreendimento técnico conjunto coma indústria do seu país. Essa providência, in-

O segundo benefício —indispensável para umaMarinha que aspirava aprojetar e construir uns

poucos submarinosconvencionais, daí

passando a submarinosnucleares — foi lançar seusengenheiros num grande ecomplexo empreendimento

técnico conjunto com aindústria do seu país. Essaprovidência, indispensávelno caminho da grandeza,

nunca a tomáramos

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

dispensável no caminho da grandeza, nunca atomáramos.

O terceiro benefício foi evitar uma tutelaexcessiva de enge-nheiros e técnicos ale-mães durante a fabrica-ção do casco e induzirnossos engenheiros etécnicos, bem como osda Nuclep, a buscaremsoluções conjuntasantes de solicitar assis-tência técnica à HDW.Esse é um processoeducativo indispensá-vel à criação de tecno-logias próprias.

O quarto benefíciofoi imergir nossos en-genheiros e técnicosno ambiente nacional de mais alta prepara-ção em termos de Garantia de Qualidade —o da Qualidade da Indústria Nuclear —, noqual haviam sido treinados na Alemanha osengenheiros e técni-cos da Nuclep. Issoera essencial para con-trolar e reduzir o riscodo empreendimento.

Finalmente, masnão menos importante,foi o quinto benefício:deixar margem paraque engenheiros e téc-nicos do Arsenal, ago-ra não ocupados dire-tamente na fabricaçãodo casco resistente,pudessem dedicar-semelhor à montagemdas seções no Arsenale às outras diferentes áreas da construçãode submarinos.

Todos os propósitos foram atingidos.Seu foco principal não era a construção

caudatária de submarinos de projeto es-trangeiro, e sim nosso Programa de Proje-to e Construção de Submarinos no Brasil.

Foram passos no ca-minho da grandeza.

Fabricação eGarantia deQualidade naNuclep

A decisão de fabri-car as seções dos cas-cos resistentes naNuclep instituiu umameta de efeito multipli-cador. Efeitos multiplica-dores normalmente im-plicam riscos técnicos,de prazo e de custos.

Os riscos técnicos envolvidos na deci-são eram muitos, mas podiam ser controla-dos. O casco resistente de um submarino éuma das mais complexas estruturas de en-

genharia estrutural.Seu coeficiente de se-gurança é indispen-savelmente baixo, paraviabilizar o projeto detodo o submarino. Asimperfeições neleadmissíveis são míni-mas, mormente as decircularidade, mas éextremamente difícilobedecer às estritastolerâncias geométri-cas decorrentes doprojeto, pois o cascoé flexível e extensa-mente soldado. O pro-

jeto do casco resistente envolve a mais re-finada engenharia estrutural, e seu domí-nio é necessário para interpretar casos du-vidosos de imperfeições e anomalias que

Todos os propósitos foramatingidos. Seu focoprincipal não era a

construção caudatária desubmarinos de projeto

estrangeiro, e sim nossoPrograma de Projeto e

Construção de Submarinosno Brasil. Foram passos no

caminho da grandeza

O projeto do cascoresistente envolve a mais

refinada engenhariaestrutural, e seu domínio énecessário para interpretar

casos duvidosos deimperfeições e anomalias

que podem ocorrer nafabricação e durante a vida

útil do submarino

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

podem ocorrer na fabricação e durante avida útil do submarino. Finalmente, a inte-gridade do casco resistente é vital para onavio e sua tripulação. De tudo isso decor-rem riscos, superados mediante o efeitoconjugado de competente projeto e ade-quado processo de fabricação e garantiada qualidade. O projeto estrutural era daIKL. Na época da fabricação na Nuclep, játínhamos bons conhecimentos sobre o pro-jeto estrutural de submarinos, graças aosestudos que desde 1977 realizamos no Es-critório Técnico de Construção Naval emSão Paulo (ETCN-SP) e do trabalho da DENno projeto SNAC-I. Quando da assinaturado contrato com oconsórcio Ferrostaal-HDW, pressupunha-se que o processo defabricação seria total-mente transplantadoda HDW para o Arse-nal, supervisionadopor assistência técni-ca alemã. Ao decidir-mos não comprar boaparte de máquinas edispositivos da “linhade produção daHDW” e montar umalinha de produção naNuclep, automaticamente assumimos o ris-co de não conseguirmos resultadossatisfatórios, muito embora procurássemossempre tornar nossa linha semelhante à daHDW, graças à participação intensiva, den-tro da Nuclep, dos engenheiros e operári-os do Arsenal treinados na HDW.

A única forma de realizar seguramente afabricação do casco era analisar e planejarexaustivamente cada pequena parcela doseu processo antes de iniciá-la; e durantee após sua execução detalhadamenteexaminá-la, comparando seus resultadoscom os requeridos. Essas medidas de

minimização de riscos realizaram-se em trêsníveis de Garantia de Qualidade: o primei-ro, a cargo da própria Nuclep; o segundo,de responsabilidade do Arsenal, contratan-te da Nuclep; e o terceiro, da competênciada DEN, contratante do Arsenal e com ju-risdição sobre o assunto. A assistência téc-nica da HDW também foi usada, mas pou-co, tendo em vista que já não se tratava demeramente reproduzir sua linha de produ-ção — e também porque um dos benefíciosvisados era evitar tutela excessiva de en-genheiros e técnicos alemães durante a fa-bricação do casco e induzir nossos enge-nheiros e técnicos, bem como os da

Nuclep, a buscaremsoluções conjuntas,num processo educa-tivo indispensável àcriação de tecnologiaprópria.

Uma área vital nafabricação do cascoresistente era a de en-saios não destrutivos.Além da capacidadeexistente na Nuclep,convinha que a Mari-nha tivesse um con-sultor externo reco-nhecidamente capaz.

A DEN contratou o Engenheiro Paulo Go-mes de Paula Leite, ex-funcionário do Ar-senal e notável especialista no assunto,com uma longa carreira dentro e fora daMarinha. Já avançado em anos, ele atuoucom entusiasmo, competência e proveito.

Aceitação de riscos requer audácia.Controle de riscos requer cautela. Tendodecidido fabricar as seções do casco resis-tente na Nuclep, agimos cautelosamente.Entre outras providências, fabricaram-se naNuclep cavernas e seções cilíndricas deteste, para garantir que as indispensáveisadaptações ao processo de fabricação ale-

Em resumo, os riscosprevalentes eram técnicos,

pois os demais delesdecorriam. Todos foram

cuidadosamenteenfrentados, controlados evencidos. Não perdemos

uma única seção de cascoresistente

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

mão — realizadas com a decisiva participa-ção dos engenheiros e técnicos do Arse-nal treinados na HDW — produziriam re-sultados satisfatórios. Foi necessário ad-mitir prazos maiores. Acresça-se a isso otempo necessariamente longo para uma fir-ma introduzir um produto diferente em sualinha de produção.

Havia também riscos de custos, emborase visasse a economia. Caso não tivésse-mos sucesso na fabricação de qualquersecção do casco resistente, ela teria que sersucateada, implicando não apenas prazosmaiores, mas também custos mais altos. Issopoderia ocorrer até mesmo na HDW, masentre nós teria efeitos desestimulantes.

Em resumo, os riscos prevalentes eramtécnicos, pois os demais deles decorriam.Todos foram cuidadosamente enfrentados,controlados e vencidos. Não perdemosuma única seção de casco resistente.

Preparação da infraestrutura doArsenal [4]

Além de se construírem as seções docasco resistente na Nuclep, foi necessáriopreparar as instalações do Arsenal paratodas as demais etapas de produção dossubmarinos. Para isso, o Arsenal moderni-zou parte das suas instalações. Implodiuparte do Edifício 17 e, em seu lugar, cons-truiu um novo prédio que abrigou umamoderna oficina onde se concentrou aconstrução de submarinos, dotada de duaspontes rolantes com capacidade para até100 toneladas, bem como de equipamentose ferramental para serviços de tubulação,pintura e montagem mecânica. No anexodo Edifício 4 construiu-se uma oficina demontagem de grandes estruturas e conve-ses, ali instalando-se a máquina de corteautomático de chapas.

Para construir o submarino pelo proces-so modular de acabamento avançado, com

o casco dividido em quatro seçõesfabricadas separadamente e posteriormen-te unidas por solda num dique flutuante, oArsenal projetou e construiu o Dique Flu-tuante Almirante Schieck. E, além de ou-tras providências, criou setores adminis-trativos específicos para o empreendimen-to: a Gerência e a Divisão de Construçãode Submarinos.

Fabricação e Garantia de Qualidade noArsenal

Todos os equipamentos, sistemas emateriais para os submarinos IKL-1400 fa-bricados no Brasil foram especificados eencomendados pela própria HDW. Portan-to, seus FATs realizaram-se na Alemanha,tendo o BWB como autoridade inspetora.Excetuaram-se apenas as baterias de pro-pulsão principal, que a DEN nacionalizouna Satúrnia, num longo e cuidadoso pro-cesso em que a GQ teve importante papel.

Portanto, as atividades de GQ realiza-das no Brasil foram principalmente as deFAT no estaleiro e as de HAT e SAT.

Para a construção no Brasil, todos osdocumentos de GQ utilizados na Alema-nha foram reelaborados em conjunto peloArsenal e pela DEN, que os detalharam paranossas condições particulares. Após apro-vados pela DEN, eles foram aplicados nasdependências do Arsenal e a bordo, na pre-sença de inspetores do Departamento deGQ do AMRJ e da Divisão de GQ da DEN.

Dos cinco engenheiros de GQ da DENtreinados na Alemanha, um demitiu-se pou-co após seu regresso ao Brasil. Outro apo-sentou-se pouco mais tarde, mas sua con-tribuição para estruturar as provas de marfoi relevante. Os demais participaram ativa-mente da GQ na Nuclep e da GQ no Arsenal.

As inspeções de recebimento e as ins-peções e testes periódicos durante oarmazenamento de materiais e equipamen-

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

tos, vistas durante o treinamento na Alema-nha, certamente são ainda mais importantesem climas quentes e úmidos como o nosso.Prova disso foi a degradação aqui ocorridanos elastômeros de acoplamentos flexíveisde redes de alta pressão, apesar de eles te-rem sido armazenados conforme as reco-mendações do fabricante. Na inspeção pré-via à instalação a bordo, os elastômeros fo-ram submetidos a testes hidrostáticos embancada com a pressão de teste especificada.Todo o lote foi reprovado e substituído porum novo lote. Este, após passar pelos mes-mos testes, foi aprovado.

Três dos engenhei-ros de GQ da DEN trei-nados no BWB parti-ciparam da estrutura-ção de toda a sistemá-tica de garantia da qua-lidade dos submarinosem construção no Bra-sil. Na parte estrutural,a sistemática de GQ in-cluiu procedimentosde qualificação de pro-cessos de fabricação emontagem, controledimensional, qualifica-ção de operadores eensaios não destru-tivos dos cascos resis-tentes dos submarinos,tanto na Nuclep como no Arsenal. Em siste-mas mecânicos e elétricos, a sistemática deGQ abrangeu, entre outros aspectos, a ela-boração de todos os procedimentos de tes-te, a especificação de equipamentos de tes-te e instrumentos de medição, a espe-cificação de tolerâncias, o tratamento de nãoconformidades e defeitos etc.

Com base nas observações e anotaçõesfeitas durante os HAT e SAT, nossos enge-nheiros elaboraram um sistema computado-rizado de coleta de dados, semelhante ao usa-

do pelos engenheiros da HDW, para realizaras provas de mar com um mínimo de pessoase economia de tempo. Denominado Sistemade Monitoração e Aquisição de Dados(Sismad), compunha-se de diversos sensoresde pressão, temperatura, rotação, tensão cor-rente, RPM, torque, vazão etc., direcionadospara transdutores e conectados a placas deaquisição de dados com conversão analógica/digital. Ele enviava os dados obtidos para umcomputador HP (que na época media 800 x1100 x 250mm e pesava cerca de 30 kg). Pormeio de software especificamente desenvol-vido, permitia a aquisição, condicionamento,

processamento e arqui-vamento dos dados, eposterior geração de umrelatório de cada um dostestes realizados. Essesdados e relatórios en-contram-se devidamen-te arquivados no Arqui-vo Técnico do CPN. OSismad foi aplicado commuito bons resultadosno Submarino Tamoio,nos anos de 1992 e1993. Ele foi atualizado,utilizando o softwareLab View e notebook,com novas placas deaquisição de dados. Anova versão, denomina-

da Sismad-2, foi usada na construção doTimbira, do Tapajó e do Tikuna com ótimosresultados, a ponto de os técnicos da Siemensusarem os nossos próprios dados para reali-zarem os ajustes dos parâmetros do sistemade propulsão.

Todo o processo de construção de sub-marinos IKL no Brasil realizou-se sem per-das ou danos apreciáveis, nem pessoaisnem materiais. Sem dúvida, isso deveu-seao bom planejamento, ao ótimo treinamen-to e à cuidadosa aplicação de conhecimen-

Todo o processo deconstrução de submarinosIKL no Brasil realizou-se

sem perdas ou danosapreciáveis, nem pessoais

nem materiais. Sem dúvida,isso deveu-se ao bom

planejamento, ao ótimotreinamento e à cuidadosa

aplicação deconhecimentos

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

tos. A dedicação de cada um dos partici-pantes foi essencial. Mas não devemosesquecer que qualquer resultado é sujeitoà lei das probabilidades. Confiança exces-siva aumenta riscos.

Retaguarda técnica

Em 1977, o Escritó-rio Técnico de Cons-trução Naval em SãoPaulo (ETCN-SP) ini-ciou a criação de umaretaguarda técnicapara apoiar um Progra-ma de Obtenção deSubmarinos. Este veioa ser promulgado em1984. Como se pode-ria imaginar apoio paraum programa não co-nhecido e não formulado? A resposta é sim-ples: pela reflexão sobre os problemas pas-sados, as necessidades futuras e as opor-tunidades presentes. Foi isso o que fize-mos dirigindo oETCN-SP, diante dassistemáticas então vi-gentes dos PlanosNacionais de Desen-volvimento Científico-Tecnológico.

O Programa de Ob-tenção de Submarinosda Marinha nunca che-gou a ser detalha-damente explicitado,principalmente quantoàs interconexões com uma retaguarda técni-ca de antemão preparada para apoiá-lo, e queainda muito deveria expandir-se para outrasáreas. Não bastaria reproduzir no Brasil téc-nicas apreendidas no exterior. Partindo da de-pendência, buscávamos a autonomia. Por-tanto, era vital dominar os fundamentos das

técnicas apreendidas, para modificá-las etransformá-las conforme necessário ou con-veniente ao construirmos submarinos por nósprojetados. Para isso é indispensável umaretaguarda técnica. A explicitação das inter-

faces do Programa te-ria facilitado essa toma-da de consciência.

Em outro trabalhonarraremos a criação eo desenvolvimento daretaguarda técnica naassociação do ETCN-SPcom a Escola Politécni-ca da Universidade deSão Paulo (Epusp) paraapoiar o Programa deObtenção de Submari-nos, tanto no projetoquanto na fabricação enos testes de cascos re-

sistentes de submarinos. Quanto à fabrica-ção, desde o início de 1986, estudaram-se ques-tões importantes para a Garantia de Qualidadeda fabricação de cascos resistentes na Nuclep

e sua montagem no Ar-senal: qualificação deprocessos de mediçãode falta de circula-ridade; qualificação deoperadores para medirfalta de circularidade;determinação compu-tadorizada da falta decircularidade. Os resul-tados foram aplicadosdurante a fabricaçãodos cascos resistentes

na Nuclep e no Arsenal, presentes os enge-nheiros da Epusp. Nossos engenheiros e téc-nicos devem convencer-se plenamente da ne-cessidade de qualificações rigorosas basea-das em conhecimentos nacionais. Lembremossempre que, em condições extremas, os rigo-res na fabricação do casco resistente farão a

Em 1977, o EscritórioTécnico de Construção

Naval em São Paulo inicioua criação de uma

retaguarda técnica paraapoiar um Programa de

Obtenção de Submarinos.Este veio a ser promulgado

em 1984

E como aspirar asubmarinos nacionais,

nucleares ou não,confiando apenas em

técnicas estrangeiras cujosfundamentos não

conseguimos dominar?

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diferença entre vida e morte, vitória e derrota.E como aspirar a submarinos nacionais, nu-cleares ou não, confiando apenas em técnicasestrangeiras cujos fundamentos não conse-guimos dominar?

Corte circunferencial do cascoresistente

Uma de minhas primeiras tarefas comoengenheiro no Arsenal foi dirigir uma ope-ração de retirada e recolocação de um tam-pão rebitado no casco resistente de um ve-lho submarino classe Guppy, em 1964. Elese destinava à passagem de equipamentosde certo porte a serem reparados em terra.Era um trabalho difícil e importante. Essetampão, embora grande, não seria suficien-te para a retirada de equipamentos como osmotores do sistema de propulsão do sub-marino. Vinte anos mais tarde eu viria a de-frontar-me com problema semelhante, masnoutra posição e em melhores condições.

No início de nossa capacitação em re-paros de submarinos, ocorrida em 1965,intrigaram-me o instrumento e o processode medição de falta de circularidade querecebemos da Marinha americana e passa-mos a usar no Arsenal. Eu tivera, no MIT,uma boa introdução ao projeto estruturalde submarinos, e em minha tese tratara demecanismos de colapso de anéis sob pres-são externa. Não me agradava usar um pro-cesso sem conhecer seus fundamentos esem a possibilidade de evoluir por contaprópria diante de novas necessidades. Masas aspirações técnicas da Marinha e doBrasil naquela época eram mínimas.

Criando uma retaguarda técnica na as-sociação do ETCN-SP com o Departamen-to Naval da USP na década de 1970, nelaincluí uma linha de estudos, pesquisas eexperimentações sobre cascos resistentesde submarinos, que progrediu até interrom-per-se em 1993, com a estagnação do Pla-

no de Reaparelhamento da Marinha. Seteanos antes, em 1986, já era ponderável oconhecimento que nela se acumulara so-bre aspectos críticos de projeto e de con-trole geométrico em fabricação e avaliaçãode resultados de falta de circularidade decascos resistentes de submarinos. Mesmodepois que saí do ETCN-SP para a DEN,em dezembro de 1981, acompanhei e esti-mulei continuamente essa linha de estu-dos, realizada por engenheiros civis queforam meus alunos de graduação e pós-graduação, e continuamente impulsionadapor oficiais que me sucederam na direçãodo ETCN-SP.

Já como diretor da DEN, em 1986, recebiuma solicitação do consórcio HDW-Ferrostaal sobre a opção de comprarmos,ou não, o tampão removível para a retiradados motores dos submarinos a seremconstruídos no Brasil. Esse tampão deve-ria ser fixado no casco resistente por esto-jos produzidos pela HDW, e sua fixação evedação era complexa. A alternativa ao usodo tampão era apenas uma: seccionarcircunferencialmente o casco resistente noPeríodo de Manutenção Geral do submari-no, afastar entre si as seções resultantesdo corte, retirar todos os equipamentos aserem reparados em terra, repará-los,recolocá-los, unir e realinhar as seções,soldá-las com a mesma técnica usada naconstrução e medir e avaliar os efeitos dafalta de circularidade final. Essa alternati-va, embora exigindo muito maior capacida-de técnica própria, tornaria mais fácil a reti-rada, o reparo e a recolocação de equipa-mentos. Eu sabia que já havíamos conse-guido a capacidade própria necessária: ade soldagem e fabricação obtivéramos nacuidadosa preparação de técnicos e enge-nheiros do Arsenal na HDW; a de mediçãoe avaliação da falta de circularidade, obti-véramos nos estudos sobre submarinos re-alizados na associação do ETCN-SP com o

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Departamento Naval da Epusp, que eu pes-soalmente instituíra, estimulara e acompa-nhara nos últimos anos. Na realidade, es-távamos em vias de usar essa capacidadeprópria na fabricação das seções do cascona Nuclep. Portanto, eu dispunha de ele-mentos seguros para tomar pessoalmentea decisão: prontamente respondi que nãocompraríamos os tampões removíveis.

O corte do casco resistente para retira-da, reparo e recolocação de equipamentosdurante períodos demanutenção geral denossos submarinosclasse Tupi tornou-seprocedimento normaldo Arsenal, que tam-bém o utilizou em ser-viços no SubmarinoSanta Cruz da Mari-nha argentina.

PROGRAMAPERMANENTE DEPROJETO ECONSTRUÇÃO DESUBMARINOS

Não será demaisrepetir o que dissemosna primeira parte des-te trabalho [3], com al-terações próprias aomomento atual.

Longos anos depaz deixam abertos eemperram os portõesde qualquer fortaleza. Com a inexorávelescassez de recursos naturais e um siste-ma econômico mundial cuja lógica é cres-cer ou morrer, ricas fortalezas de portõesabertos e emperrados serão invadidas:cedo ou tarde; lentamente ou num assal-to; à força de marketing, diplomacia e fi-nanças; e também pelas armas. Escaparão

aquelas que conseguirem suficiente po-tencial bélico de dissuasão. E esse poten-cial é tão importante na frente diplomáticacomo na retaguarda extrema de defesa.

Não há dissuasão sem vontade nacionalbem conduzida. E a vontade nacional serábem conduzida se as obtenções de instru-mentos de defesa gerarem evoluçãotecnológica e riqueza no País. Portanto, alémde razões logísticas, é indispensável que asobtenções de navios de guerra sejam meios

de radicar e desenvol-ver no País conheci-mentos e recursos deprojeto, inovação, pro-dução, apoio e opera-ção. Nesse imperativoé que se baseou todoo programa de obten-ção de corvetas e sub-marinos das décadasde 1980/90. Ele é cadavez mais válido.

Submarinos sãoatualmente instrumen-tos fortes de dis-suasão, talvez os prin-cipais quando há dis-paridade de forças.Mesmo forças navaispoderosas são sensi-velmente vulneráveisa ameaças de moder-nos submarinos con-vencionais [5], [9],[11]. Avanços em dis-crição acústica e mag-

nética, capacidade de lançar mísseis antina-vio, e modernos sistemas de armas em sub-marinos convencionais levam Marinhaspoderosas a intensa procura de meios paraneutralizá-los [10], [12]. Entre esses, desta-ca-se o progresso contínuo na tecnologiade veículos submarinos não tripulados(undersea unmanned vehicles) [13], que

Com a inexorável escassezde recursos naturais e um

sistema econômico mundialcuja lógica é crescer ou

morrer, ricas fortalezas deportões abertos eemperrados serão

invadidas: cedo ou tarde;lentamente ou num assalto;

à força de marketing,diplomacia e finanças; e

também pelas armas.Escaparão aquelas queconseguirem suficiente

potencial bélico dedissuasão

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

certamente serão os principais obstáculosao sucesso de submarinos convencionaise nucleares como armas de dissuasão.

Nosso Programa de Projeto e Constru-ção de Submarinostem que ser perma-nente. Mas deve serevolutivo: é necessá-rio que grupos suces-sivos de submarinosincorporem novastecnologias que osmantenham sempre àfrente de outras desti-nadas a neutralizá-los.Portanto, crescerá aimportância de pene-trarmos na parte maiscérebro-intensiva doprojeto, e de progre-dirmos rapidamenteem sistemas de armas,que é o setor mais caroe de mais veloz evolu-ção tecnológica.

Mesmo mantendo um ritmo constante deprojeto e produção de um submarino a cadacinco anos — e supondo-se uma vida útil de

40 anos, com uma modernização de meia-vida—, não conseguiremos ter mais que oito sub-marinos em serviço, meta muito aquém de nos-sas necessidades. A continuidade, e só a con-

tinuidade, é que permi-tirá uma constante evo-lução de projeto, produ-ção, operação e apoiologístico, requisitos in-dispensáveis para umadissuasão eficaz.

Não podemos reini-ciar nossos esforços emprojeto de submarinosno ponto do qualregredimos há quase 20anos. Houve uma gran-de perda de capacidade,que requer tempo e de-terminação para ser su-perada. E a própria cons-trução de submarinos— que é apenas umaparte da capacidade ne-

cessária — perdeu quase todo o seu quadroaltamente especializado [6]. Nossa recupera-ção desponta. Mas há um caminho árduo apercorrermos, sempre com esforço próprio.

Nosso Programa deProjeto e Construção deSubmarinos tem que ser

permanente. Acontinuidade, e só acontinuidade, é que

permitirá uma constanteevolução de projeto,

produção, operação eapoio logístico, requisitosindispensáveis para uma

dissuasão eficaz

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<POLÍTICA> / Poder Nacional; Poder Militar; Poder Naval Brasileiro; Ciência e Tecnologia;Submarino; Submarino nuclear;

N.A.: Inicialmente escrito em dezembro de 2008.

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A BUSCA DE GRANDEZA (IV)

REFERÊNCIAS

[1] FREITAS, Elcio de Sá (Vice-Almirante-EN-Refo). “A Busca de Grandeza I”, Revista MarítimaBrasileira, set/2006.

[2] Idem. “A Busca de Grandeza II – Nacionalização”, Revista Marítima Brasileira, jun/2007.[3] Idem. “A Busca de Grandeza III – Projeto, Revista Marítima Brasileira, mar/2011.[4] O Arsenal e a Construção de Submarinos no Brasil – Subsídios Elaborados Pelo Arsenal de

Marinha do Rio de Janeiro, 2008.[5] CARVALHO, Roberto Guimarães (Almirante de Esquadra – ex-comandante da Marinha). “Sub-

marinos: a visão da Marinha”, Revista Marítima Brasileira, mar/2007.[6] SILVA, Othon Luiz Pinheiro da (Vice-Almirante-EN-RM-1) e MARQUES, André Luís Ferreira

(Capitão de Fragata-EN). “Enriquecimento de urânio no Brasil”, Revista Marítima Brasileira,jun/2006.

[7] CASTRO, Ronaldo Fiuza de (Vice-Almirante). “Armas que garantem a paz – a Diretoria deSistemas de Armas da Marinha”, Revista Marítima Brasileira, set/2003.

[8] BOTELHO, Mário Ferreira (Capitão de Mar e Guerra-EN). “Mostra de Armamento do Subma-rino Tikuna”, Revista Marítima Brasileira, mar/2006.

[9] POLMAR, Norman. “Back to the Future” U.S. Naval Institute Proceedings, mar/2006.[10] CARRIER, Robert P. (Captain, U. S. Navy). “No Class Jaw” U.S. Naval Institute Proceedings,

jun/2006.[11] SMITH, Robert H. (Captain-U. S. Navy-Retired). “The Navy and Its DDG-1000 – Heading

Wrong”, U.S. Naval Institute Proceedings, ago/2007.[12] PATTON JR., James H. (Captain-U. S. Navy-Retired) “Dominance: Awareness With Teeth”

U.S. Naval Institute Proceedings, jun/2008.[13] The Navy Unmanned Undersea Vehicle (UUV) Master Plan – USN, November 9, 2004.

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SUMÁRIO

IntroduçãoConceitos operacionais e de projetoMissões e requisitosComparação com outros meios navaisDimensões e pesos da F-6000MQualidades náuticasPropulsãoConstrução, manutenção, nacionalização, custosArmamentoEletrônicaConclusãoAnexo: Desenho da F-6000M

ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTAPARA A MARINHA DO BRASIL

RENE VOGT*

Engenheiro

* Segundo-Tenente (RM2), engenheiro civil (PUC-Rio/1975), empresário e membro da Sociedade deAmigos da Marinha de São Paulo (Soamar-SP).

INTRODUÇÃO

Diante da realidade da situação presen-te dos navios de combate e escolta da

Marinha do Brasil, urge tomarem-se provi-dências no curto prazo para a substituição

dos meios atuais. Fizemos um estudo com-parativo baseado nessa realidade, sobre ospossíveis navios a serem considerados.

Levando-se em conta a posição geográ-fica do Brasil, com sua extensa costa conve-xa projetando-se para dentro do Atlântico,

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ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DO BRASIL

abrangendo tanto o Atlântico Norte como oAtlântico Sul, os navios devem ser plena-mente capazes de operar em alto-mar nascondições mais adversas das altas latitu-des, considerando-se, principalmente, suasqualidades náuticas e sustentabilidade. OBrasil não possui mares confinados, dondedimensões maiores dos meios se impõem esão cruciais para sua eficiência operacional.

Segundo o atual Plano de Articulação eEquipamento da Marinha do Brasil (Paemb),o foco concentra-se no projeto de um novonavio de escolta e combate com desloca-mento padrão menor que 6.000 toneladasmétricas. Um dos principais requisitos donovo projeto é o emprego de tecnologiamoderna e consagrada,baseada em meios exis-tentes e operacionais,com mínimo risco deinvestimento, inician-do com o projeto deconcepção nacional eculminando com aconstrução no Brasil,com plena transferên-cia de tecnologia, apartir de um modelo escolhido.

Seguindo esta linha e por opção exclusivado autor, o estudo do novo escolta ora deno-minado hipoteticamente de F-6000M, apósexaustiva pesquisa e várias revisões, sugerecomo modelo e referência a fragata da classeF-124 Sachsen, da Marinha da Alemanha, nãosomente pelo sucesso de um projeto inova-dor e tamanho semelhante àquele propostopara a F-6000M, mas também pelos anos deexperiência acumulada na operação dessesmeios e das novas tecnologias surgidas noperíodo, que certamente deveriam ser incor-poradas para reduzir o risco do projeto e cons-truir um navio ainda mais moderno. Para darmaior realismo e credibilidade ao presente es-tudo, o autor citará marcas e modelos de arma-mentos e equipamentos em geral cujos dados

se encontram disponíveis na literatura osten-siva. O autor afirma que não tem quaisquerrelações comerciais com nenhum fabricanteou estaleiro, e as citações são de escolha aseu critério, refletindo apenas opiniões pes-soais baseadas em pesquisa livre.

Em abril de 2009, tivemos a oportunidadede conhecer a Fragata Sachsen em Salvador,Bahia, por ocasião da visita da Força-Tarefa501.01. Nessa oportunidade, pudemos avali-ar a F-124 em detalhes, além de ouvir as expli-cações dos oficiais alemães, muito cordiais ecooperativos com os oficiais e engenheirosda Marinha do Brasil. Estendendo-nos, agra-decemos igualmente à incansável colabora-ção do professor Eduardo Italo Pesce por

suas sugestões, dis-cussões e leitura críticado texto.

CONCEITOSOPERACIONAIS EDE PROJETO

Contrastando como crescente espectrode missões sob condi-

ções de contorno cada vez mais desafia-doras, os orçamentos de defesa, na maio-ria dos países, estão competindo com ou-tras prioridades, encolhendo ou sendo mes-mo congelados. Portanto, a maioria das fro-tas futuras demandará navios extremamen-te capazes e versáteis, a custos relativa-mente baixos, cobrindo uma gama maior demissões, outrora assumidas por navios de-dicados. Essa nova geração de belonavesé caracterizada por aptidões-chave, desta-cando-se as seguintes:

a) capacidade multimissão e reconfigu-rabilidade operacional;

b) maior capacidade de sobrevivência;c) grande mobilidade, autonomia e

sustentabilidade; ed) custo de ciclo de vida reduzido.

O Brasil não possui maresconfinados, donde

dimensões maiores dosmeios se impõem e são

cruciais para sua eficiênciaoperacional

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ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DO BRASIL

Particularmente os módulos de sensores earmamentos são as chaves da habilitação dascaracterísticas multimissão e reconfigurabi-lidade do navio. Além da modularização, apti-dões significativas podem ser adicionadas comhelicópteros, drones, botes especiais, AUVs(Autonomous Underwater Vehicle) de guerrade minas, etc. Aptidões típicas adicionais seri-am as operações de interceptação e aborda-gem, vigilância e coleta de inteligência ou mis-sões de contraminagem.

O nível de modularização imediatamen-te acima da entidade singular (navio) é aforça-tarefa composta de vários navios, quetem a capacidade de atuar como uma enti-dade localmente distribuída e com missãoespecífica. Conceitosde habilitação etecnologia da informa-ção estão evoluindopara o NCW (NetworkCentric Warfare) eCEC (Cooperative En-gagement Capability),no contexto de opera-ções combinadas.

Os requisitos deum moderno meio naval de combate basei-am-se em três pilares de igual importância:Autonomia, Mobilidade e Sobrevivência,que determinam a capacidade do navio deguerra de alcançar suas áreas operacionaisdistantes de forma rápida e eficiente, assimcomo sua permanência no setor operativo.Descreveremos cada uma delas a seguir:

– Autonomia – Além da sua capacidadede armazenar víveres, água, munição e com-bustíveis, o nível e a frequência de manuten-ção exigidos pelos diversos sistemas do na-vio e a estrutura da administração de logísticae de apoio têm papel fundamental e influenci-am a disponibilidade. Além disso, os regula-mentos da Organização Marítima Internacio-nal (IMO) impõem instalações de produçãode água potável e tratamento de efluentes e

resíduos sólidos sem, no entanto, prejudicara autonomia e a sustentabilidade do navio.

– Mobilidade – Primordialmente deter-minada pela geometria do casco em combi-nação com seu sistema de propulsão, sen-do subdividida como segue: mobilidade fí-sica, capacidade do meio de se mover maisrapidamente em relação a uma força hostil– mobilidade é um dos principais pré-re-quisitos para o sucesso em combate. Mo-bilidade física afeta diretamente a capaci-dade de deslocamento do navio/força-ta-refa; mobilidade tática, refere-se à capaci-dade do meio de navegar com sua veloci-dade máxima, sendo este um requisito fun-damental; mobilidade operacional refere-

se ao deslocamento,engajamento e redes-locamento de uma for-ça num teatro de ope-rações de maior abran-gência; mobilidade es-tratégica refere-se àcapacidade de deslo-camento mais rápidado que o inimigo deuma parte significati-

va de suas forças de um teatro de opera-ções para outro; mobilidade operacional eestratégica sendo altamente dependentesda máxima velocidade sustentada, exigin-do boa autonomia e alcance.

O requisito Sobrevivência pode ser dividi-do em três aspectos principais: vulnerabilidade,susceptibilidade e recuperação.

– Vulnerabilidade – Diante da grandevariedade de cenários de operações em queo navio pode se encontrar e da multiplicidadede ameaças, os tempos de reação podemnão ser suficientes para evitar um impacto.Portanto, o projeto do navio deve prever aredução dos efeitos primários e secundári-os de um impacto de qualquer natureza emanter sua integridade operacional. Estasmedidas são basicamente:

Os requisitos de ummoderno meio naval decombate baseiam-se em

três pilares de igualimportância: Autonomia,

Mobilidade e Sobrevivência

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ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DO BRASIL

a) concentração de equipamentos deuma mesma cadeia funcional e não redun-dantes dentro do menor volume possível edevidamente protegidos;

b) redundância das funções vitais;c) separação dos equipamentos redun-

dantes; ed) previsão de climatização interna com

uma sobrepressão atmosférica para impe-dir a entrada de ar com contaminantes NBC(Nuclear, Biological, Chemical).

– Susceptibilidade – Vem a ser a habili-dade de ocultação ou neutralização de ame-aças, expressa matematicamente como a pro-babilidade de não ser detectado ou atingidoe retaliar. Tenta-se melhorar ou otimizar es-tas habilidades com os seguintes requisi-tos: Projeto Stealth, que contempla a geo-metria angular do casco e da superestruturado navio, bem como o emprego de materiaisabsorventes de radiações eletromagnéticaspara a redução da RCS (Radar Cross Section);Assinatura RF, a escolha do tipo, arranjo emodo de operação dos equipamentos emis-sores de RF para melhorar a compatibilida-de eletromagnética; Assinatura Magnética,os cascos de aço deformam o campo mag-nético estático da Terra, criando uma assi-natura magnética – a redução deste efeito éobtida mediante bobinas de degaussing;Assinatura IR – especial cuidado com a tem-peratura da exaustão das turbinas e moto-res diesel, além da refletividade térmica dasuperfície do navio exposta ao tempo; Assi-natura Acústica – especial cuidado com amontagem em base elástica de todos os equi-pamentos que produzem ou são sensíveisàs vibrações, enclausuramento da turbina emotores para diminuir a reverberação dosom produzido; Hard Kill – armamento paraengajamento direto das ameaças, compre-endendo artilharia, mísseis, torpedos e heli-cópteros; Soft Kill – sistemas de vigilânciapassiva (ESM – Electronic SupportMeasures), contramedidas eletrônicas (ECM

– Electronic Counter Measures),despistadores (decoys) tipo chaff, IR, RF eASW; Alarme Antecipado – a missão AEW(Airborne Early Warning) é desempenhadapor aeronave dedicada do navio-aeródromo,pelos helicópteros e pelos drones de asarotativa embarcados nos escoltas. Fazemparte deste escopo os radares, ESM, ECM esonares e sonoboias lançadas dos helicóp-teros, sistema de comunicação integrado eseguro para transmissão de voz, imagem edados via satélite e demais frequências, ca-pacidade CEC (Cooperative EngagementCapability) e NCW (Network CentricWarfare).

– Recuperação – Flutuabilidade, contro-le de avarias e minimização dos efeitos dosdanos sofridos por um impacto ou ataque, eo tempo para retornar à condição operacio-nal, o que depende diretamente dos requisi-tos vulnerabilidade e suscetibilidade.

MISSÕES E REQUISITOS

Com uma plataforma comum, flexível emultifuncional, qual critério deverá ser usa-do na distribuição das missões e respectivonúmero de meios AAW (Anti Air Warfare),ASW (Anti Submarine Warfare) e SW(Surface Warfare)? Além do navio em si, umasérie de armas, sensores e sistemas serãocomuns a todas as fragatas. A diferença fun-damental será o nível de sofisticação dossistemas dedicados em cada um dos trêstipos de missão aqui mencionados.

Fragatas/destróieres AAW são usualmen-te os maiores e mais capazes dentre os meiosde superfície. Levam uma combinação de mís-seis de médio e longo alcance, radar 3-D debusca e vigilância e um MFR (Multi FunctionRadar), com alta capacidade para lidar com umambiente tático complexo e de rápida evolu-ção, tipicamente associado à missão AAW.Estes meios já satisfazem inerentemente aosrequisitos das demais missões.

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Para ser um meio eficaz em missõesASW, além dos itens comuns a todas asclasses, como sonar de casco, tubos lan-ça-torpedos, sistema de defesa contra tor-pedos e helicópteros com dipping sonar, énecessário acrescentar um sonar reboca-do e dois helicópteros para missões ASW.Os cuidados com a assinatura acústica, quenesse caso são críticos, já são previstosem todos os escoltas de qualquer forma.

Finalmente, a versão SW, ou de empregogeral, teria como missão principal a escoltade navios e o apoio de forças anfíbias, comênfase nos mísseis de cruzeiro ou SSM(surface to surface missile), com capacidadede atuar contra alvos em terra em ambientescomplexos como os litorais, além de artilhariade grosso calibre. Adicionalmente, missõescomo apoio a mergulhadores e forças espe-ciais, coleta de inteligência, contraminagem,missões de evacuação, abordagem e polícia,interdição e estabilização.

Entretanto, verificamos que mesmo os es-coltas especializadas em missões ASW e SWnecessitam de uma capacidade mínima de de-fesa AAW em geral, e também todas as clas-ses necessitam de um nível mínimo de prote-ção contra submarinos e torpedos.

Assim sendo, sugerimos que, obtendoum número relativamente modesto de navi-

os, a MB precisaria preparar suas fragataspara o maior número de missões possível,sendo poucos os itens não comuns. Mas aconstrução modular, flexibilidade inerente earquitetura aberta dos sistemas permitemmudanças rápidas de configurações de mis-sões, retirando ou acrescentando itens es-peciais e dedicados.

COMPARAÇÃO COM OUTROSMEIOS NAVAIS

Como reza a boa prática da engenharia,antes de elaborar um novo projeto deve-sepesquisar o que já existe e que possa servirde exemplo, aproveitando-o em benefício pró-prio. Assim sendo, elaboramos abaixo umatabela comparativa dos meios navais de su-perfície de escolta e combate mais recentes.

DIMENSÕES E PESOS DA F-6000M

A seguir, as características principais daF-6000M elaboradas neste estudo:

Comprimento total: 152,0 mComprimento WL: 141,0 mBoca na linha-d’água: 17,4 mBoca máxima: 19,4 mRelação L / B: 8,1Calado da quilha: 5,7 m

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* N.R.: O Navsea é o maior dos cinco comandos da Marinha dos Estados Unidos. O órgão constrói,compra e mantém navios e sistemas de combate da US Navy. (Fonte: www.navesea.navy.mil)

Calado máx. – Domo Sonar: 7,6 mCoeficiente de bloco: 0,48Deslocamento máx.: 6.712 t, inclusive

reservas = 300 tDWT: 1.473 tDeslocamento padrão: 5.892 t < 6.000 tPeso leve: 4.939 tPeso leve + Reservas ( 300 t ): 5.239 tPropulsão:53,0 MWDensidade de potência: 7,9 kW/tGeração elétrica: 8,0 MWVeloc. máx.: 30+ nósAutonomia: 7.290 milhas náuticas / 18 nósTripulação: 200 + 30 (autonomia manti-

mentos = 40 dias)DETALHES DA DWT :a) Mix de mísseis: 76 tb) Munição, torpedos e decoys: 89 tc) 2 x S-70B + drone: 16 td) Pessoal + pertences: 46 te) Mantimentos (40 dias): 70 tf) Líquidos, total: 1.100 t1) Diesel Naval: 820 t2) JP-5: 85 t3) Lubrificantes: 17 t4) Água: 60 t5) Tratamento de efluentes: 118 t

QUALIDADES NÁUTICAS

Propostas as dimensões gerais da F-6000M, procuramos mais argumentos para jus-

tificar o dimensionamento sugerido acima.Como consenso, a forma e o tamanho do cas-co de um navio de guerra têm influência deci-siva no seu poderio militar. Esses fatores influ-enciam não somente a capacidade operativadas tripulações e sistemas de armas, mas, prin-cipalmente, na escolha desses sistemas.

Mencionaremos um estudo realizado peloNaval Sea Systems Command (Navsea)* em1988. Foram comparados dois modelos no-vos: uma fragata (tipo 1) dimensionada eotimizada segundo o critério de sua carga útil(DWT) para um perfil de operações bem defi-nido; outra (tipo 2) definida segundo o critériode otimização de suas qualidades náuticas comlonga linha-d’água e DWT aproximadamenteigual à primeira; um terceiro similar à época aoprojeto da classe DDG-51 Arleigh Burke; e aclasse FFG-7 modificada com o emprego deestabilizadores ativos. Os estudos do Navseaforam baseados nos seguintes parâmetros:ondas com altura média de 5 metros e perío-dos de nove segundos, e os dados equivalemao estado de mar 6 com vento de força 7 naescala Beaufort, sendo que os diferentes ti-pos de meios estudados deveriam carregar omesmo equipamento de armas e sistemas euma propulsão equivalente.

O Navsea elaborou uma série de critériosde qualidades náuticas para comparar osdiversos tipos estudados. Esses critériosdevem ser considerados como valores limi-

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tes para os movimentos do navio que, seultrapassados, causarão restrições inacei-táveis ao bom desempenho dos seus tripu-lantes ou sistemas. Levando-se em contaampla base de dados de observações e me-dições do espectro das ondas no AtlânticoNorte, pode-se prever a disponibilidadepercentual da fragata numa determinada áreae época do ano, entendendo-se como dis-ponibilidade o número de horas de plenacapacidade operacional dentro de um perí-odo de permanência no setor operativo.

O gráfico ao lado compara o resultado dostestes efetuados pelo Navsea quanto à dispo-nibilidade (%) dos diversos meios estudadospara uma gama de velocidades entre 5 nós e25 nós, com uma velocidade média de 20 nós.

Comparando as dimensões da F-6000Mcom as das fragatas Tipo-2 e DDG-51 acima,podemos inferir que, nas condiçõesinvernais do Atlântico Norte, a F-6000Mapresentaria, com grande probabilidade, umadisponibilidade maior que 90%, argumentoreforçado em função do emprego de recur-sos como bulbo de proa, estabilizadores ati-vos e bolinas. O foco central dos estudosdo Navsea era o de achar o “compromissoótimo” entre “custo de aquisição mínimo” ea “máxima qualidade náutica”. Na busca pelamelhor relação custo x benefício, devemoster em mente que a redução do tamanho de

uma fragata fica limitada ao quesito “volu-me interno” mínimo necessário para abrigaro armamento e a propulsão especificados,lembrando, ainda, que quanto menor o na-vio piores ou mais limitadas serão suas qua-lidades náuticas.

PROPULSÃO

O sistema de propulsão Codag(Combination Diesel And Gas) propostopara a F-6000M é derivado do sistema depropulsão adotado na F-124. O trem de re-dução fabricado pela Renk combina seuacionamento com uma turbina a gás e doismotores diesel, movendo dois hélices. Oautor optou pelos seguintes equipamen-tos em função da pesquisa e informações:

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1 turbina MTU – GE LM 2500+G4 : 35,0MW, 2 motores MTU 20V 8000 M90 : 2 x9,0 MW, resultando numa densidade depotência máxima a plena carga = 7,90 kW/T, comparando com outros três modelosde navios: Fremm = 7,1 / Sachsen = 6,84 /A.Burke = 8,38.

Na planta de propulsão Codag da clas-se F-124 (e proposta para a F-6000M), am-bos os hélices de passo variável são acio-nados por uma turbina a gás e dois moto-res diesel. Este conceito de propulsão per-mite um máximo de flexibilidade na utiliza-ção do navio e otimização de custos. Osdois motores diesel ficam localizados entreos eixos dos hélices a ré do trem redutor ea turbina a vante do mesmo.

O conjunto-redutor é dividido em dois re-dutores principais e um redutor deinterconexão transversal dos eixos, dispondode três tipos de embreagens para a “entrada”dos motores diesel e turbina a gás,interconexões e absorção de desalinhamentos.Este arranjo permite acionar ambos os eixossimultaneamente com apenas um dos três ele-mentos propulsores ou uma combinação des-tes, ou mesmo apenas um dos eixos. Utilizou-se pela primeira vez o sistema PLC (PowerLogistic Control) para gerenciar e efetuar asmudanças de marchas.

A redução de custo com o emprego deredutores Codag se explica pelo requisitoadotado: velocidade de cruzeiro de 18 nóscorrespondendo a 67% da velocidade máxi-ma do navio, definiu a potência de operaçãodeste modo com apenas um motor diesel. Esteregime cobre cerca de 80% dos dias de mar.

Comparado à propulsão com dois moto-res diesel, o motor individual fica sujeito aodobro da demanda de trabalho e, portanto,mais econômica e eficiente. Se tomarmos porbase 2.500 horas de operação por ano, cadamotor diesel trabalhará cerca de 1.500 ho-ras/ano, o que resulta em apenas 45 mil ho-

ras para um período de 30 anos. Isto é me-nos do que o intervalo TBO (Time BetweenOverhauls) do motor. Uma reforma básica abordo ou mesmo uma custosa e demoradareforma com desmontagem dos mesmos nãoé mais necessária durante a vida útil do na-vio. Além da economia, importante é a maiordisponibilidade do navio.

Basicamente podemos definir quatro mo-dos de operação e suas faixas de velocidade:

Modo 1: 1 Diesel: 9,0 MW, V. Max = 18nós

Modo 2: 2 Diesel: 18,0 MW, V. Max =23+ nós

Modo 3: 1 Turbina: 35,0 MW, V. Max =28 nós

Modo 4: 1 Turbina + 2 Diesel: 53,0 MW,V. Max = 30+ nós

Desta combinação resultam os seguin-tes cálculos teóricos de consumo e autono-mia, sem levar em conta as correntes nem ovento, navio com casco limpo, sempre acio-nando os dois hélices CPP (ControllablePitch Propeller) simultaneamente. Abaixocalculamos apenas a autonomia para a ve-locidade de cruzeiro de 18 nós: a 1 motordiesel acionando os dois hélices, consumode combustível e autonomia:

8.000 kW x 0,190 kg/kWh x 1,10 = 1.672kg/hora (propulsão)

1.600 kW x 0,200 kg/kWh x 1,10 = 352kg/hora (geração elétrica)

820.000 kg/2.024 kg/hora = 405 horas x18 nós = 7.292 m.n. (milhas náuticas), cercade 17 dias de mar, autonomia teórica semvento, correnteza e casco limpo. Em condi-ções favoráveis, os cálculos feitos admi-tem uma velocidade de 20 nós com apenasum diesel em regime de potência máxima de9,0 MW. Se considerarmos um regime depatrulha, a autonomia nas mesmas condi-ções pode chegar a 24 dias de mar ou 7.040m.n. a 12 nós e 21 dias de mar ou 7.658 m.n.a 15 nós. Como temos uma reserva de pro-jeto de 300 t, admitindo-se ser possível

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disponibilizar dentro do casco adicional-mente 250 m3 de tanques, pode-se “roubarno jogo” e abastecer a fragata com 1.100 tde diesel naval, enquanto as reservas esti-verem disponíveis, donde os valores dasautonomias acima aumentariam em 34%.

Baseados na geração elétrica dos meiossimilares – A.Burke = 7,5 MW, Sachsen =4,4 MW – para a F-6000M adotamos: 4 xMTU 16V 4000 G81 = 4 x 2,19 MW = 8,76MW, trabalhando com três grupos e com oquarto de reserva. A distribuição adequa-da dos grupos-geradores e rede elétricadeve ser feita de forma a diminuir os riscosde pane e garantir o abastecimento no casode avarias.

Para a navegação e estabilidade, o na-vio é provido de dois lemes dispostos noeixo longitudinal dos hélices. Pode-se op-tar pelo sistema rudder roll stabilizer, emvez de um par de estabilizadores ativos.Completando os apêndices do casco, a fra-gata seria provida de bolinas para melho-rar a estabilidade.

No caso de uma emergência, a F-6000Mseria capaz de rebocar um meio de seu porte.Sem efetuar cálculos, podemos inferir que,para uma velocidade de reboque máxima iguala 8 nós, ajustando convenientemente o pas-so dos hélices e funcionando com dois die-sel em redução máxima, não haveria proble-mas em atender a este requisito.

CONSTRUÇÃO, MANUTENÇÃO,NACIONALIZAÇÃO, CUSTOS

Baseado na escolha do autor em sugerircomo ponto de partida a fragata F-124, oprincípio de construção é o consagradoMeko, da TKMS. Este método construtivomodular aumenta em muito a capacidade desobrevivência do navio, devido àestanqueidade do casco em caso de avari-as. Influencia, também, na diminuição dopeso e no custo das instalações elétricas,

rede de incêndio, ventilação, apenas paracitar alguns exemplos. Os principais elemen-tos do navio, como sensores e armamento,também constituem módulos autônomos.

A construção em blocos ou módulos re-duz o tempo necessário para a obtenção dosnavios e, fabricados em série, os custos ten-dem a diminuir. As compras e aquisições deequipamentos podem ser programadas, dis-tribuindo melhor o dispêndio financeiro aolongo do tempo de construção. A manuten-ção, futuras modernizações e a logística sãomais ágeis, menos custosas e, portanto, fa-vorecem a disponibilidade do meio.

O presente estudo sugere a adoção dealgumas técnicas inovadoras, como o del-ta hull, da TKMS, em que a boca aumentaem direção à popa. O projeto de um bulbode proa visa à melhora da estabilidade, re-dução da resistência e consumo de com-bustível. O conforto das tripulações é umitem prioritário, com acomodações moder-nas. Produção de água potável, tratamen-to de efluentes e resíduos sólidos e prote-ção NBC (Nuclear, Biological, Chemical)são mandatórios.

O controle da plataforma é feito pelo IMCS(Integrated Management Control System),sistema Siconta. A propulsão, geração elé-trica, máquinas auxiliares, o CAV (Controlede Avarias), lastro, estabilidade, flutuabili-dade, controle de líquidos etc. são geren-ciados a partir de consoles multifuncionais.Devido à arquitetura aberta da rede de co-municações a bordo, numa emergência é pos-sível efetuar este controle com um notebookconectado a qualquer tomada da rede decomunicações do navio, como veremos maisadiante. As funções do IMCS também po-dem ser controladas a partir da ponte inte-grada. Este sistema permite ao oficial-intendente controlar os estoques e as ope-rações logísticas relativas a mantimentos,combustíveis, água, munições e outros itensem tempo real.

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A nacionalização é hoje um critério ado-tado pelas Forças Armadas como cláusulapétrea. Não é mais possível se acomodarcom o papel de “cliente passivo” escravi-zado pela ocultação de aptidões-chave doequipamento que se opera. A compra dematerial ou um projeto implica a transfe-rência de tecnologia e construção dos mei-os no Brasil. Melhor seria dizer “absorçãode tecnologia” com participação ativa denossos engenheiros e oficiais do setoroperativo no novo projeto da F-6000M de-rivado da F-124, como sugerido pelo autor.Pode-se admitir a construção de um naviolíder de classe no estaleiro estrangeiro atítulo de redução de risco, mas com contra-partidas comerciais deoff-set. O Arsenal deMarinha do Rio de Ja-neiro (AMRJ) e outrosestaleiros que venhama ser aquinhoadoscom a construção demódulos precisam sermodernizados e suprira carência de mão de obra especializada.

No presente momento, o Paemb prevê ainstalação dos seguintes equipamentos na-cionalizados: tubos lança-torpedos, MSS(míssil superfície-superfície), SLDM (Siste-ma de Lançamento de Despistadores Mag-néticos), Mage Defensor, CME-2(Contramedidas eletrônicas), Siconta (Siste-ma de Combate) e alças ópticas. A Associa-ção Brasileira da Indústria de Material de De-fesa (Abimde) em São Paulo está fazendo umtrabalho contínuo de cadastrar ou desenvol-ver as indústrias com competência para fa-bricar material correlato ou realizar parceriascom firmas estrangeiras interessadas no mer-cado nacional. Bons exemplos de firmas es-trangeiras que já são fornecedoras da MB,antes mesmo deste atual programa exigir aimplantação de unidades fabris ou parceriasno Brasil, são a Thales, MTU, Renk, G&E,

Nexans, Siemens, Rolls & Royce e outras.Cumpre citar o exemplo do que já está sendofeito no quesito “transferência detecnologia”, sob a égide do Programa de De-senvolvimento de Submarinos (Prosub).

A eficiência de custo de um navio deguerra é determinada pelo seu custo de ci-clo de vida. Este representa a soma, em pri-meiro lugar, do custo operacional e, em se-gundo, do custo de aquisição. Em terceirolugar vem o custo de desenvolvimento. Ocusto operacional pode ser subdividido emcusto de manutenção, custo de pessoal ecusto logístico operacional (combustível,suprimentos e munição).

No custo operacional, o custo de manu-tenção representa maisde 50%, sendo 66%desta fração somentepor conta da platafor-ma e sua propulsão.Além disso, requisitosoperacionais mudam aolongo de 30 anos, de-mandando docagens e

reformas para prolongar a vida útil do meio.No projeto devem ser contempladastecnologias e critérios que reduzam afrequência e a abrangência desses trabalhos.

A manutenção regular é realizada noAMRJ e deverá ser feita com o apoiocontratual dos fornecedores de equipamen-tos. A padronização dos equipamentos re-duz custos de logística de sobressalentes efacilita os trabalhos de manutenção e trei-namento do pessoal especializado. Os tra-balhos a bordo ficam mais em nívelemergencial. Parcerias de longo prazo comos fornecedores obrigatoriamente instala-dos no País e contratos de manutenção co-brindo a vida útil do meio são procedimen-tos cada vez mais comuns nos dias atuais.

O custo de pessoal representa tipica-mente 33% do custo operacional de umescolta e o custo logístico operacional

A nacionalização é hoje umcritério adotado pelasForças Armadas como

cláusula pétrea

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(combustível, suprimentos, munição) ou-tros 17%. Conclui-se que tripulações redu-zidas e altamente especializadas implicamtecnologias de automação e são a tendên-cia para redução de custos.

O custo de aquisição e desenvolvimen-to deve contemplar a parceria com um es-taleiro estrangeiro para desenvolver o pro-jeto e a construção, um óbice inevitávelpara recuperar o tempo e a competênciaperdidas devido à ausência de políticasadequadas para a construção naval. Sobessa ótica, o autor propõe, a seu critérioexclusivo, como ponto de partida um pro-jeto existente e bem-sucedido, a classe ale-mã F-124 Sachsen, inserindo nele modifi-cações à nossa conveniência e benefician-do-se da experiência adquirida pela Mari-nha alemã desde 2004, visando à reduçãode custos e riscos.

No quesito custo de aquisição, cons-trução modular e seriada são fundamen-tais para redução dos custos. Como exem-plo oportuno e atual, citamos o caso donovo escolta classe Iver Huitfeldt, da Ma-rinha dinamarquesa. Construídas peloOdense Steel Shipyard pelo sistema de blo-cos modulares, distribuíram os trabalhosseriados entre suas subsidiárias, combina-dos com os demais trabalhos correntes denavios comerciais civis. A construção daclasse Absalon resultou em prejuízo devi-do a metas e prazos específicos, mas, comprazos mais longos e melhor produtivida-de, o preço por unidade custará ao contri-buinte dinamarquês 212 milhões de euros,excluídos os sensores e armamentos.

ARMAMENTO

Apesar de toda a tecnologia moderna dis-ponível, a artilharia continua sendo um ele-mento indispensável no armamento de umnavio de guerra. O custo das munições, mes-mo considerando as mais sofisticadas, é mui-

to inferior ao dos mísseis. Seu emprego visaao bombardeio de alvos na costa,engajamento de outros navios, defesa antia-érea e antimíssil, embarcações leves e rápi-das e alvos assimétricos. Canhões se carac-terizam por uma flexibilidade incomparável.Este é provavelmente o resultado de umaevolução secular e que recentemente ganhouum novo impulso graças ao desenvolvimen-to de novas munições mais avançadas.

Canhões de grosso calibre, atualmentelimitados ao calibre de 127 mm, são a me-lhor opção para bombardeio de costa. Al-vos de superfície nem sempre demandam ogasto de um míssil antinavio, um recursocaro e muitas vezes escasso a bordo.

A guerra nos litorais e ameaçasassimétricas demandam uma capacidade deengajar uma larga gama de alvos a curtas emédias distâncias e em condições em queo desempenho de um míssil antinavio seriamuito restrito.

Vamos citar duas opções de grosso ca-libre: BAe Systems 127/62 Mk-45 Mod.4 eo Oto Melara 127/64 LC. A maior cadênciado Oto, em alguns casos o triplo do BAe,redunda em maior saturação do alvo. Dis-põe da munição autopropulsada e guiadaVolcano, mas sua contrapartida americanaERGM (Extended Range Guided Munition)foi descontinuada pela US Navy em 2008,deixando o BAe inferiorizado em relaçãoao Oto. Para a F-6000M, a opção do autorrecai sobre o Oto 127/64LC com paiol para600 tiros de munição convencional.

Mísseis antinavio são considerados aprincipal ameaça a um navio de guerra. Emalguns cenários, especialmente nos litorais,distâncias e tempo de alerta reduzidos sãosérias limitações para o emprego eficaz desistemas normalmente poderosos comomísseis antiaéreos. Desta forma, a artilha-ria naval de médio calibre continua sendoum componente de importância capital naautodefesa de navios de guerra, sendo re-

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levantes na escolha de um canhãomultipropósito o alcance efetivo, densida-de de fogo, tipos de munições disponíveise tempo de reação.

Os canhões multipropósito constituema última opção de engajamento dos mísseis“penetras”, que lograram ultrapassar as ou-tras camadas de defesa (layered defence)constituídas pelos mísseis AAW de defesade ponto e de área. Fazem parte dessas ca-madas hemisféricas e concêntricas os siste-mas eletrônicos e despistadores de soft kill.Canhões de defesa AA são perfeitamenteadaptados para a interceptação de alvoscom tempos de detecção mínimos. Com al-cances menores e tempos de reação maisrápidos, a defasagem de tempo entre adetecção do alvo e o engajamento é defini-tivamente menos crítica. Devemos lembrarque os mísseis antinavio de nova geraçãosão maiores, mais pesados e supersônicos,donde uma distância de engajamento e des-truição maior e mais segura é vital.

Resumindo, quanto à vantagem relativade mísseis ou canhões na defesa antimíssilou AAW, a resposta não é simples. O de-sempenho de uma sistema AA baseado emartilharia depende não somente do canhãoem si, mas também do tipo de munição e dosistema de direção de tiro. Sistemas de arti-lharia média de maior alcance, providos demunições inteligentes 3-P e calibres maispesados, são mais adequados do que ca-nhões de pequeno calibre com alta cadên-cia de fogo. Portanto, a nossa escolha re-cai sobre 2 Bofors 57 mm Mk-3, cada umcom paiol de 2 mil tiros. Devemos ressaltarque a US Navy que introduziu primeiro oconceito CIWS (Close-In Weapon System)com seu Phalanx 20 mm, decidiu introduziro novo conceito de CIGS (Close-In GunSystem) com o canhão BAe 57 mm Mk-110e munição 3-P.

Para a artilharia de pequeno calibre, con-tra alvos assimétricos e de superfície, além

de limitada ação antiaérea, teríamos comoopções os BAe Systems Mk-38 Mod.2 25mm, Rheinmetall MLG-27 27 mm e o OtoMelara Marlin-30 30 mm, todos com alçasoptrônicas e reparo estabilizado. Finalizan-do, várias estações ao redor do navio paramontar canhões automáticos GAU-17/Acal. 7,62 mm, guarnecidos manualmente,para a autodefesa de curto alcance, utilizá-veis também nos helicópteros.

A escolha dos mísseis é atribuição doEstado-Maior da Armada (EMA) e develevar em consideração também a escolhados tipos de sensores e sistema de comba-te, notadamente no caso dos mísseis anti-aéreos. Esta escolha certamente tem umacomponente político-estratégica importan-te. Primeiramente devemos relacionar ostipos de mísseis em função de seu empre-go: AAW, PDMS (Point Defence MissileSystem) antimíssil, superfície SSM (Ship-to-Ship Missile), SLAM (Ship-to-LandAttack Missile) e ALSM (Aircraft LaunchedShip Missile), além dos ASW que carre-gam um LWT (Light Weight Torpedo). Nocaso da F-6000M, a multifuncionalidade domeio prevê a instalação de vários tipos delançadores, portanto o emprego de váriostipos de mísseis, sendo o navio rapidamen-te reconfigurado em função de suas mis-sões, melhorando a disponibilidade.

Para a defesa AAW de área estendida,citaremos apenas os modelos RIM-67 SM-2Block IV ER raio de ação entre 185 km a 370km, RIM-161 SM-3 Block I, este destinado aoprograma BMD (Ballistic Missile Defence),ambos de disponibilidade super-restrita.

No grupo defesa AAW de área, os mode-los RIM-66 SM-2 Block III/IIIA/IIIB deguiagem semiativa e com raios de ação até 90m.n. Neste grupo incluímos o míssil Aster-30com raio de ação, maior que 100 km, do tipofire and forget. Todos esses mísseis têm umavelocidade da ordem de Mach-4 e altitudesde interceptação maior que 20 km. Os meno-

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res são o Aster-15 com raio de ação maiorque 30 km, e o RIM-162 ESSM (Evolved SeaSparrow Missile). Detalhe digno de nota é ocanister quad-pack, que permite acomodarquatro ESSM numa mesma célula do lançadorMk-41. Há um novo míssil em desenvolvi-mento, o Barak-2, mas o autor não achou da-dos detalhados disponíveis. No stand da IAIna LAAD 2011, o autor obteve de um enge-nheiro israelense a informação de que o Barak-2 é aproximadamente equivalente ao SM-2 ecom guiagem por piloto automático (up-link)e aquisição final do alvo por guiagem RF. Ointerlocutor deixou transparecer uma vonta-de política de transferência de tecnologiamaior do que os americanos ou franceses.

No terceiro grupo para a defesa de pon-to, os modelos sugeridos seriam oUmkhonto, Mica-VL e RAM Block II. To-dos são do tipo fire and forget. Existemainda o Sea Wolf, com vida útil limitada, e oBarak-1, que têm como desvantagem anecessidade de uma diretora dedicada porserem de guiagem CLOS (Command to Lineof Sight), o que não diminui suas qualida-des. O Umkhonto e o Mica-VL são de lan-çamento vertical, e o RAM possui lançadordedicado.

Para a guerra de superfície, seja na moda-lidade antinavio ou ataque a alvos em terra,os mísseis são uma solução mais cara do queum canhão de grosso calibre, porém mais pre-cisos e com poder de destruição pontualmaior. Os lançadores podem ser dedicados,ou alguns modelos podem ser lançados ver-ticalmente. A MB emprega o Exocet, mas estáem desenvolvimento um MSS nacional, cujosdetalhes o autor desconhece.

A versão SM-2 LASM (Land AttackStandard Missile) pode ser acomodada aospares num canister dual pack por célulado lançador Mk-41. Demais opções inclu-em o Exocet MM40 Block III, BoeingHarpoon AGM84, incluindo a versão SLAM(Stand-off Land Attack Missile), Tomahawk

BGM-109 com lançador dedicado e a ver-são TLAM-VL (Tactical Land AttackMissile – Vertical Launch), Scalp Naval VL,RBS-15 Mk3 da SAAB, somente para citaralguns “ocidentais”. Quanto aos mísseisantinavio lançados de aeronaves ou heli-cópteros, podemos enumerar o Exocet AM-39, Harpoon AGM-84A e o Penguin AGM-119B, este adotado pela MB.

Para missões ASW, optamos pelo AsrocRUM-139B, por ser utilizado há muito tem-po pela US Navy e ser a única opção delançamento vertical para utilizar o VLS Mk-41 Tactical. Transporta um torpedo leve dotipo Mk-46 a uma velocidade de Mach-1,com um alcance suposto (informações im-precisas) de ASW intermediate range ou60 km, aproximadamente.

Existem dois tipos principais delançadores verticais no mercado, um deorigem norte-americana, da LockheedMartin Mk-41 Tactical, e outro de origemfrancesa, denominado Sylver A-50, daMBDA, este aplicado exclusivamente aosmísseis da família Aster. No presente estu-do optamos pelo americano da BAeSystems VLS Mk-41 Tactical, devido àquantidade de informações disponíveis eversatilidade. O VLS-41 Tactical permitelançar o ESSM, SM-2 Block II e III, e oAsroc. O autor não tem informação se oVLS Mk-41 é compatível com os mísseisAster ou Scalp Naval-VL da MBDA.

Como adotamos a classe F-124 como exem-plo, propomos os seguintes mísseis para a F-6000M neste estudo: ESSM, SM-2 Block III-B, montados nos lançadores Mk-41, e oUmkhonto em silos dedicados, porém no de-senho está ilustrado o lançador RAM ExocetMM40 Block III ou MSS nacional em desen-volvimento pela MB, PENGUIN lançado deHe (helicóptero). ASW: ASROC, montado noslançadores Mk-41.

O novo escolta deve receber doislançadores triplos de torpedos leves de

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fabricação nacional. Serão montados emcada bordo, respectivamente. Os torpedosusados pela MB atualmente são os Mk-46,tendo como opção o MU-90. Os torpedostransportados a bordo poderão armar oshelicópteros em missões ASW. O alcancetípico deste torpedo leve é de 25 km, inferi-or ao alcance dos torpedos pesados, con-dição explorada pelos submarinos inimigospara se manterem à maior distância possí-vel das fragatas. Assim sendo, o LWT lan-çado de bordo quase sempre será ineficazna missão ASW, mas pode ser muito útilno combate aos HWT atacantes, emborahoje já existam torpedos antitorpedos de-dicados, menores e mais rápidos. Conclui-se que o melhor emprego dos LWT em mis-sões ASW seria o lançamento por helicóp-teros ou com o míssil Asroc.

A F-6000M foi concebida para operardois helicópteros do porte do S-70B ou EC-725, podendo, naturalmente, operar helicóp-teros menores. No presente caso, estuda-mos a opção de dois S-70B. O estoque decombustível de aviação permite ao S-70Bvoar 23 missões por helicóptero. No casodo EC-725, seriam 16 missões por helicópte-ro, e Lynx até 54 por helicóptero. A combina-ção adequada de um ou dois helicópteros,dependendo do tipo, permitirá abrigar umou mais drones de asa rotativa (vide a se-guir). O convoo é provido de recursos paraoperações em qualquer tempo, dia e noite.O manuseio é feito com apoio do Rast(Recovery Assist, Secure and Traverse).

Os helicópteros teriam fundamental-mente a missão ASW e SW, sendo inclu-sive habilitados para missões SAR(Search and Rescue). Outro aspecto im-portante é a transmissão de dados de bus-ca e vigilância ao COC (Centro de Opera-ções de Combate) do navio, tanto de su-perfície como submarinos, dados do ra-dar, das sonoboias e pelo dipping sonara bordo do helicóptero.

O drone de asa rotativa é hoje uma rea-lidade inquestionável. No caso de navios,ele funciona como os olhos e ouvidos eum multiplicador do potencial militar domeio, no nosso caso, o de um escolta. Suasfunções englobam a vigilância, observa-ção, enlace de dados e comunicação,guiagem de mísseis, balizamento de arti-lharia, coleta de inteligência e outras. Amaior vantagem: custo bem inferior ao deum helicóptero, sem colocar em risco a vidahumana. Sensores típicos abrangem rada-res, alças IR/EO, suíte de comunicação paraenlace de dados, voz e imagem. Somentepara exemplificar, um observador que este-ja no convés mais alto ou 16,0 m acima dalinha-d’água observará o horizonte a 30 km,mas um drone pairando acima do meio a3.000 m estenderá o horizonte de vigilânciada fragata para 200 km, distância confortá-vel para lidar com qualquer ameaça de su-perfície ou mísseis sea skimmer.

O Camcopter S-100 já é um produto cor-rente e recentemente foi exaustivamentetestado com pleno sucesso pela Marinhaalemã a bordo da Corveta Braunschweig.Tem uma autonomia de seis horas e levauma carga útil de 50 kg, peso máximo de200 kg. O Fire Scout, da Grumman, está emfase final de testes de habilitação, e no dia10 de dezembro de 2008 um drone foi em-barcado na Fragata FFG-8 McInerney, pri-meiro embarque operativo efetivo. Temmenos da metade do tamanho de um S-70B,peso máximo na decolagem de 1.400 kg ecarga útil de 250 kg, para uma autonomiade oito horas.

ELETRÔNICA

Como o conceito da F-6000M é o de umnavio multifuncional, uma atenção especi-al deve ser dada às combinações de rada-res. Eles devem lidar tanto com alvos aére-os como com os de superfície. As missões,

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resumidamente, são, principalmente, vigi-lância, detecção, rastreamento, atribuiçãode prioridades, engajamento e guiagem demísseis e artilharia. Adicionalmente, a na-vegação dentro dos critérios de segurançapreconizados pela Organização MarítimaInternacional (IMO).

A escolha dos radares deve atender pri-meiro aos requisitos elaborados para o fu-tura escolta, escolha dos mísseis e o nívelde sofisticação desejado, considerando-seigualmente os aspectos orçamentários,políticos e comerciais na escolha e combi-nação dos sensores e armamentos.

Neste quesito, é imprescindível o estu-do da redução da incompatibilidade eletro-magnética dos diversos sensores. Este cri-tério nos leva à adoção do IMM(Integrated Mast Module), que abriga al-guns dos radares de bordo e os sistemasICAS (Integrated Communication AntennaSystem), ESM (Electronic SupportMeasures), IRST (Infra Red Search andTrack), LDS (Laser Detection Sensors) euma antena circular fixa IFF (InterrogationFriend-or-Foe). Não são integrados aoIMM as diretoras dedicadas, alças ópticas,as antenas ECM (Electronic CounterMeasures) e algumas antenas dedicadas,como, por exemplo, VHF/HF/Combat NetRadio.

A pesquisa feita com material disponí-vel e especializado tenta resumir em pou-cas linhas as conclusões que nos levaramà escolha do conjunto de radares. Anali-sando apenas os quatro principais siste-mas de maior porte, como o Apar, SPY-1,Empar e Sampson, sem entrar em detalhesque tomariam muito espaço e não fazemparte deste escopo, as melhores qualida-des dos MFR (Multi Function Radar) es-tão nos modelos de antenas (painéis) fixasde fase ativa. Radares de fase passiva e osgiratórios têm nítidas desvantagens em re-lação aos primeiros. Para corroborar tal afir-

mação, os americanos estão desenvolven-do a geração SPY-3 (Bandas I/J) + VSR (Vo-lume Search Radar – Bandas E/F) de faseativa e antenas estáticas. O Sampson (Ban-da E/F) é giratório de fase ativa com duasantenas back to back e o Empar (Banda G)é giratório, fase passiva e antena única.

Os três MFR europeus acima trabalhamem conjunto com um radar de busca e vigi-lância volumétrica de longo alcance. A so-lução Apar + Smart-L (Thales) foi a pionei-ra, e os outros dois utilizam o S1850M, de-rivado do Smart-L e produzido sob licençapela Selex e BAe Systems. A combinaçãodestes e do SPY-1 (e futuro SPY-3) com ossistemas de mísseis como ESSM + SM-2ou Aster 15 e 30 depende do up link paraguiá-los até o alvo. Embora o Smart-L e oS-1850M sejam giratórios e muito eficien-tes, há um estudo da Thales para desen-volver o mesmo radar com antenas de pai-néis fixos, como será o novo VSR america-no, dependendo apenas do interesse co-mercial de algum cliente.

Na nossa opinião e livre escolha para opresente estudo, a melhor opção que reú-ne os melhores aspectos técnicos seria acombinação do radar Smart-L 3 D de buscae vigilância até 400 km, operando na banda“D” de 1,0 a 2,0 GHz, Apar como MFR ope-rando nas bandas “I” e “J” de 8 a 13 GHz eup-link dos mísseis da família ESSM e SM-2, guiagem de mísseis segundo o princípioICWI (Interrupted Continuous WaveIlluminator), permitindo-lhe guiar mísseis eiluminar o alvo simultaneamente, eliminan-do a necessidade de iluminadores dedica-dos aos mísseis AAW. Essa combinaçãopode ser considerada o top de linha, sendoadotada nas classes F-124 – Alemanha, LCF– Holanda e Iver Huitfeldt – Dinamarca.Muito provavelmente o Canadá a escolhe-rá para sua futura classe Province, poiscooperou com o projeto Apar. A mesmacombinação de um MFR com um radar de

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vigilância S-1850M, derivado do Smart-L,encontra-se nas classes Daring e nos fu-turos CVF – UK, Horizon – França, Hori-zonte e Cavour – Itália e Dokdo – Coreiado Sul.

Na mesma linha de raciocínio, a nossasegunda opção, significativamente mais emconta, aplicar-se-ia aos meios classificadoscomo ASW e SW – seria uma combinaçãodo Sea Master 400 e Sea Watcher 100. OSea Master 400 oferece esta condição des-de que o up-link dos mísseis seja na bandaE/F da família Aster. Se forem empregadosos mísseis ESSM ou SM-2, o problema seresolve com a adição de diretoras phased-array dedicadas na banda I/J. Sea Master400 é um radar 3-D phased-array de quatrofaces para vigilância aérea e de superfície,controle do tráfego de helicópteros,rastreamento e engajamento de alvos econtrole de tiro. Trabalha nas bandas E/Fde 2,0 a 4,0 GHz em dois modos: vigilânciaaté 250 km e MFR até 150 km, elevação de70° para rastreamento de alvos e controlede tiro.

Completando as duas opções acima, re-comendaríamos a integração do SeaWatcher 100 no IMM. Radar de fase ativacom quatro painéis, funciona nas bandas“I” e “J”, com alcance até 40 km, radar 2-Dpara vigilância e rastreamento de alvos desuperfície críticos. Sua finalidade é a derastrear alvos difíceis, tais como periscópi-os, minas flutuantes, barcos infláveis e mer-gulhadores, alvos assimétricos em geral, quetêm uma RCS (Radar Cross Section) muitoreduzida e se deslocam a uma velocidadesemelhante à das ondas e se encontram par-cialmente submersos ou ocultos pelas cris-tas das ondas. São qualidades particular-mente importantes em águas litorais.

Igualmente, para arredondar a suíte deradares, dois Thales Scout Mk-2, a vante ea ré, giratórios e operando na banda defrequência “I” para navegação e busca de

superfície. Possuem capacidade LPI (LowProbability of Intercept), reduzindo suadetecção por ESM inimigas. Com alcancemáximo de 45 km, os dois radares permitemuma cobertura de 360° em volta do navio,auxiliando na aproximação e pouso doshelicópteros.

Todos os radares a bordo podem ser in-tegrados num sistema adicional de fusão dedados que soma e cruza todas as informa-ções dos diversos radares a bordo,disponibilizando uma imagem de alta reso-lução e redundância, mostrando a situaçãodo teatro de operações em tempo real. Estesistema pode integrar inclusive as informa-ções obtidas pelos sensores optrônicos.

Embora o controle de tiro do canhãoprincipal de 127 mm possa ser feito peloMFR, convém prever uma diretora dedicadade RF/TV/IR (Radio Frequency/Tele-Vision/Infra Red) até 35 km com muniçãoconvencional, aliviando a carga de traba-lho do MFR. Com a munição guiadaVolcano, a direção de tiro é efetuada peloMFR. No caso dos dois canhões de 57 mm,a direção de tiro com uma diretora dedicadaé imprescindível no engajamento antimíssil,em que feixes de pequena abertura ealtafrequência são indispensáveis para ilu-minar os mísseis. As diretoras dedicadassão amparadas pelo sistema IRST (InfraRed Search and Track) integrado ao IMMe alças ópticas de fabricação nacional. Ossistemas são redundantes, pois há situa-ções em que se precisa optar pela guiagemde RF, IR ou TV. O sistema IRST tambémefetua busca e vigilância, mesmo quandoestá engajando algum alvo.

No caso teríamos três diretoras leves LirodMk2, uma a vante na frente do IMM e outrasduas a ré em cada bordo. As três cobrem360°, com as três intercambiáveis em funçãodo sítio da arma selecionada e o azimute doalvo. Funciona nas bandas “I” e “K” comfeixes de 1,5° e 0,55°, respectivamente, sensor

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IR integrado na diretora, back-up do sistemaIRST modelo Artemis, que foi selecionadopara as fragatas classe Fremm, cobertura to-tal do navio para busca, vigilância,rastreamento e iluminação de alvos com IR.Alças ópticas de fabricação nacionalcomplementam a suíte de diretoras.

A vigilância passiva e a classificação dasemissões eletromagnéticas são efetuadas pelosistema ESM (Electronic Counter Measures),no caso da MB o Mage-Defensor (Medidasde Apoio à Guerra Eletrônica). Este sistema,desenvolvido pelo Instituto de Pesquisas daMarinha (IPqM), tem apoio industrial daOmnisys, subsidiária do grupo Thales no Bra-sil. O mesmo se aplica ao CME-2, equipamen-to de contramedidas. A identificação e a clas-sificação de alvos, amigos ou inimigos, sãofeitas pelo sistema IFF (Interrogation Friendor Foe), com equipamento integrado ao IMMe uma antena circular estática no topo do mas-tro. Completando a suíte de vigilância passi-va, temos os Laser-ESM para detectar feixesde raios laser inimigos que marcam o próprionavio no caso de uma ataque de mísseis ebombas guiadas a laser.

Comum a todos os navios, um sonar decasco é uma necessidade mínima para a suaproteção contra submarinos. A nossa es-colha recai sobre o sonar de médiafrequência Thales UMS 4110 CL, escolhi-do para as classes Fremm e Horizonte.Desempenha missões de ataque a subma-rinos e proteção contra minas e torpedos.Tem operação simultânea de dois canais,ativos e passivos, faixa de frequência de4,9 a 5,8 KHz e alcance máximo de 70 km.

Nas fragatas destinadas às missõesASW, seriam instalados os sonares reboca-dos de profundidade variável Captas 4249de baixa frequência, ativo/passivo para pro-fundidades até 250 metros, com proteçãoadicional antitorpedo. Entretanto, devido àconstrução modular e arquitetura aberta,todas as fragatas teriam a possibilidade de

embarcar o sonar rebocado com tempo mí-nimo de instalação e sem docagem.

Os dois sonares acima são, respectiva-mente, equivalentes aos sonares Thales,casco 2050 e rebocado 2087, que equipama classe 23 da Royal Navy, considerado omelhor e mais capaz meio na missão ASWnos dias atuais.

Os helicópteros ASW, comuns a todasas fragatas, embarcam um dipping sonar esonoboias, cujos sinais são enviados aonavio. No COC, os sistemas ASW proce-dem à fusão dos dados de todos ossensores de bordo e do helicóptero para aação de ataque ou de defesa. No caso deataque a submarinos, decide-se pelo lan-çamento de torpedos de bordo, do helicóp-tero ou por foguete Asroc. No papel dedefesa contra torpedos, aciona-se osdecoys ASW (softkill) ou os LWT de bor-do. Todos os navios da classe seriam equi-pados e complementados com um sistemarebocado de alerta e detecção antitorpedoe decoys ou soft kill antitorpedo.

A transformação das forças armadas sereflete na transformação de guerra centradaem plataformas para guerra centrada emrede. As operações centradas em rede tam-bém têm reflexos nas comunicações dasforças no mar, na terra e no ar. Nos projetosatuais e futuros de meios navais, a tendên-cia é a de construções compactas e modu-lares para emprego multifuncional. Os ca-nais de comunicação eletrônica não sãomais dedicados a um sistema de transmis-são dedicado, mas, ao contrário, configu-rados em função da necessidade de comu-nicação da respectiva missão.

Técnicas de comunicação em banda largacom altas taxas de transmissão de dados se-rão cada vez mais empregadas. Donde seránecessário que os sistemas de antenas se-jam de concepção universal em função dasfaixas de frequência e número de canais. Fun-ções inteligentes ou algoritmos de adminis-

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tração de redes de telecomunicações dãosuporte ao trabalho dos operadores e possi-bilitam a redução de pessoal especializado abordo. Os transceivers individuais dos res-pectivos canais de comunicação são combi-nados automaticamente (roteadores), e ossinais dirigidos para os elementos de trans-missão da antena integrada. Este é o princí-pio da multiplexação. Os rádios operados porsoftware podem empregar cada canal indivi-dual de forma universal.

Resumindo, o emprego de consolesmultifuncionais, central de comunicações comsistema de antenas integradas, servidores eequipamentos de criptografia e a tecnologiadigital permitem o emprego do InternetProtocol para a transmissão simultânea de voz,dados e imagem. Este sistema é essencial paraintegração de qualquer meio a uma NCW(Network Centric Warfare) e CEC (CooperativeEngagement Capability), informando a situa-ção tática e estratégica em tempo real.

Enumeramos os principais canais de co-municação de um meio naval: VLF (Very LowFrequency); UWT (Under Water Telephone)– comunicação com submarinos; HF (HighFrequency); VHF (Very High Frequency);UHF (Ultra High Fequency); VHF / UHF –recepção e processamento de sinais dassonoboias ASW, lançadas dos helicópteros;Satcom; SHF (Super High Frequency)Satcom; EHF (Extremely High Frequency)Satcom; e Link 11, 16 e 22 – padrão Otan. Hátambém os serviços civis, como: Inmarsat-B,AIS (Automatic Identification System); GPS(Global Positioning System), GMDSS (Glo-bal Maritime Distress and Safety System).

A bordo, os principais acessos ao siste-ma de comunicação integrado são os seguin-tes: MHS (Message Handling System), CaS(Collaboration at Sea), MCCIS (MaritimeCommand Control and Information System),BFEM (Battle Force E-Mail), MMHS (MilitaryMessage Handling System) e JDLMS (JointData Link Management System).

O Milsatcom (Military SatelliteCommunication) compreende o Milstar(Military, Strategic and Tactical Relay Satellite)e o UFO (UHF Follow-On Satellite); operamem EHF na banda L maior que 40,0 GHz GBS(Global Broadcasting Satellite) banda G de4,0 a 6,0 GHz. Soma-se a estes o DSCS(Defense Satellite Communication System)nas bandas “I” e “J” de 8,0 a 20,0 GHz.

O Commersat (Commercial Satellite)compreende as bandas “K” de 20,0 a 40,0GHz e “G” de 4,0 a 6,0 GHz, e o Inmarsat-B(International Maritime Satellite) na banda“D” de 1,0 a 2,0 GHz. Os terminais compre-endem: CWSP (Commercial WidebandSatellite Program); CBSP (CommercialBroadcasting Satellite Program); TV-DTS(TV-Direct To Sailors) e Inmarsat-B(International Maritime Satellite).

As comunicações via satélite Inmarsatseguem uma orientação da US Navy para suautilização em comunicações comerciais, co-municações para serviços logísticos e su-porte operacional, para reduzir a saturaçãodos canais dos satélites puramente militares.

Proposta de terminais/antenas para a F-6000M:

– 2 Terminais Principais MOD (US Navy)AN / WSC – 6 / 6 A (V) 9 : operação simul-tânea em SHF nas bandas “I” e “J” de 8,0 a20,0 GHz e EHF banda “K” e “L” de 20,0 a60,0 GHz (militar), e “G” e “H” de 4,0 a 8,0GHz (comercial). A configuração pode in-cluir Inmarsat UHF banda “L” de 1,0 a 2,0GHz. Os terminais oferecem comunicaçãoem banda larga de 2.048 mbps.

– 1 Terminal (US Navy) AN / USC - 38(V) EHF > 20 GHz, comunicações militares.

– 2 Inmarsat.– 1 GBS.– 1 TV-DTS.A ponte integrada, ou IBS (Integrated

Bridge System), é composta por trêssubsistemas: o VMS (Voyage ManagementSystem), que engloba ECDIS (Electronic

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ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DO BRASIL

Chart DIsplay) + Arpa (Automated RadarPlotting Aid) + SCS (Ship Control System).

O VMS é um sistema de navegação ele-trônico, planejamento de derrotas emonitoramento da navegação. Provê as fer-ramentas necessárias para a navegação ele-trônica. Funcionalidade: exibir cartas eletrô-nicas, planejamento e monitoramento da der-rota, padrão Resolução IMO A 817, ancora-gem de precisão, aviso de homem ao mar egravação e back-up da rota de viagem.

O Arpa localiza e rastreia alvos e conta-tos-radar automaticamente, provendo infor-mações precisas e em tempo real de todosos contatos no entorno do navio. Funcio-nalidade: localização automática de alvos,cálculo automático de rota, velocidade epontos de maior aproximação, manobras al-ternativas, padrão IMO A 823 (19), interfacecom VMS com recurso de radar overlay.

O SCS provê o comando e controle dapropulsão, sistemas do navio e monitora oseu desempenho. Funcionalidade: pilotoautomático, controle do leme e derrota econtrole da propulsão principal.

Nos meios navais, os COC concentramtodas as informações dos sensores do na-vio, inclusive da navegação. Com a modernatecnologia de pontes integradas, também épossível transferir, no sentido inverso, infor-mações do COC para a IBS. Assim, informa-ções táticas podem ser superpostas/subpostas na tela do radar Arpa ou Wecdis(Warship ECDIS) em qualquer consolemultifuncional. Desta forma, o oficial de ser-viço avalia regiões de significado tático, pla-nejamento tático de derrotas, marcação e dis-tância com sensores optrônicos, correlaçãode alvos, aviso de torpedos e minas, cálculoe representação de pontos de encontro.

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Sistema de Combate Siconta Mk-4 – Arede LAN (Local Area Network) de bordo per-mite a integração racional não só do sistemade combate com seus sensores e armamen-tos, mas também o sistema de propulsão emonitoramento da plataforma (elétrica, venti-lação, estabilidade etc.), o CAV, sistema deponte integrada e navegação. Estas redes in-tegradas a bordo funcionam com tecnologiadigital com fibra óptica, administradas por seusrespectivos servidores, com dois ou três tron-cos (loops), aos quais todos os consolesmultifuncionais são conectados viamultiplexadores, permitindo a qualquer opera-dor de qualquer especialidade acessar a redeintegrada de qualquer console a bordo medi-ante o uso de sua senha. Como redundância epor segurança, ainda é possível assessar arede com o auxílio de note books, utilizando-se os conectores especiais distribuídos portodo o navio. Neles ficam conectados, na con-figuração LAN, os sensores de superície (ra-dares e sistemas EO), os sonares, a comunica-ção, a navegação, sistema integrado de com-bate, a propulsão, a elétrica, o CAV etc. Estanova tecnologia traz a vantagem inerente deeconomia de cabos, equipamentos (volume epeso) e custos. Outra vantagem de vital im-portância é a redundância, pois, em caso deavarias localizadas, a rede de bordo pode sereconfigurar e continuar funcionando.

CONCLUSÃO

A limitação do número de meios por ra-zões orçamentárias nos levará à elaboraçãode critérios mais rígidos no trabalho de clas-sificar ou definir as atribuições de cada na-vio e o número destes. A plataforma e umasérie de itens serão um denominador co-mum, mas a diferença fundamental recairásobre os sensores, como radares e sonares,os tipos de mísseis a serem embarcados e onúmero e combinação de helicópteros edrones. O escolta que for classificado como

AAW será o mais completo e capaz. Os de-mais, ASW e SW, terão limitações na capa-cidade de defesa antiaérea e antimíssil, masserão mais eficientes na consecução de ou-tras missões que não a AAW.

Por tudo o que foi exposto, fica evidenci-ada a necessidade do requisito demultifuncionalidade, tanto na habilitaçãocomo na flexibilidade dos meios em cumprirsuas missões, admitindo que a Marinha doBrasil dificilmente terá o número de meiosnecessários. A modalidade da construção eas tecnologias escolhidas terão reflexos noscustos de modernizações futuras, manuten-ção e logística, procurando sempre obtermaior disponibilidade dos meios.

O tamanho adequado e as qualidades náu-ticas do novo escolta devem permitir a opera-ção irrestrita em qualquer mar e em qualquerregião do globo terrestre. Mesmo um meioconcebido para operar em “águas azuis” será,num dado momento, obrigado a operar emáguas costeiras e enfrentar ameaçasassimétricas. Donde, todas as missões devemser consideradas no projeto, e sua concepçãomodular permitirá a aquisição e instalação dearmas e sensores à medida das demandas, re-duzindo o custo de aquisição inicial. Além dis-so, deverão ser satisfeitas as condiçõesambientais da IMO-Marpol, sem prejuízo daautonomia do escolta.

Fala-se muito, na mídia, da classe Fremm.A França está na moda, entretanto o naviolíder da classe – Aquitaine – só deverá sercomissionado em 2013. Assim, parece-nosser inadequado enquadrar este navio noquesito “tecnologia operante e comprova-da” em sua respectiva parent navy. Emcontrapartida, a opção pela classe F-124 sejustificaria pelo fato dos três navios seremo resultado de um projeto inovador e játerem sido comissionados há mais tempo –Sachsen em 2004, Hamburg também em2004 e Hessen em 2006. Cumpre chamar aatenção para o fato de que esta experiência

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ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DO BRASIL

prática nada desprezível poderia ser incor-porada num projeto novo, moderno e deri-vado deste meio.

Reforçando a sugestão do autor, menci-onamos que a classe F-124 deve contratual-mente cumprir um mínimo de 130 dias de marpor ano, donde falamos atualmente no con-junto de 2.470 dias contratuais cumpridosmas que foram superados, pois a média dasmissões desde a sua incorporação foi de180 dias/ano. Na participação destes meiosem várias missões internacionais, ficou com-provada sua eficácia nas modalidades AAW,ASW e SW e no espectro completo de mis-sões de interdições marítimas. Destacamosa integração da Fraga-ta Hessen na CarrierStrike Group “Harry S.Truman” por oito me-ses, obtendo a certi-ficação de “StandbyAir Defence Comman-der” na qualidade de“shooter” na proteçãoda força-tarefa, inclu-indo missões no Atlân-tico, Mediterrâneo eMar Arábico, em 2010.Todos os requisitosrelativos a construção,propulsão, capacidade de sobrevivência,armamento e sensores foram postos à pro-va, plenamente satisfeitos e acima dos pa-drões internacionais, destacando-se a ca-pacidade de defesa aérea moderna no “es-tado da arte” e nivelada à americana, maspor um custo inferior.

A Marinha do Brasil dispõe naturalmen-te de várias opções ou referências, comomostrou a Tabela no 1, mas argumentare-mos: qual desses países de origem têm asprincipais indústrias fornecedoras correlatasestabelecidas no Brasil e há quantos anos?Mesmo antes dessa concorrrência atual comesta imposição de nacionalização? Convém

precaver-se contra os oportunistas. Exami-nando alguns artigos sobre os naviosconstruídos nos últimos anos, a maioriaapresentou problemas e atrasos, alguns exi-gindo revisão de projeto ou docagens paracorrigir falhas. Verificar qual dos projetosapresentou melhor desempenho é uma ques-tão importantíssima no processo decisório,ou iríamos gastar nossos parcos recursospara financiar a tecnologia dos outros?

As parcerias precisam ser cuidadosamenteavaliadas, e o processo de nacionalizaçãoidem. O projeto de concepção, detalhamentoe construção da F-6000M no Brasil, derivadada proposta como modelo e com plena ab-

sorção de tecnologiapelo engenheiros brasi-leiros é fundamentalpara o desenvolvimen-to nacional, com refle-xos positivos na logís-tica e manutenção dosfuturos escoltas daMB. Deve-se aplicar omesmo princípio em re-lação ao armamento eeletrônica, onde as li-ções do passado nãomuito distante mostra-ram o que acontece em

caso de conflito de interesses, tornando ocliente um refém incapaz de combater. No casode itens sensíveis como mísseis e torpedos,deve-se considerar a pesquisa e a fabricaçãonacional com recursos federais, mesmo a fun-do perdido, pois este é um quesito de segu-rança nacional, cujo valor estratégico sobre-puja o interesse comercial. Na medida do pos-sível, deve-se concentrar itens afins num mes-mo fornecedor, eliminando os riscos de con-flitos e problemas técnicos, cobrando res-ponsabilidades do mesmo. Na medida em queum fornecedor é exclusivo na sua especiali-dade, contratos de manutenção, disponibili-dade de equipamentos e transferência de

Num mundo superpopulosoe com escassez de recursosnaturais, em certa medida

abundantes no Brasil,somos obrigados a pensar

num poder dissuasórioconvencional minimamente

crível

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ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DO BRASIL

tecnologia podem ser contratados para operíodo da vida útil do meio. A escolha dosfornecedores e de parceiros dos armamentose eletrônica sensível irá esbarrar inevitavel-mente em aspectos políticos. Havemos deconsiderar quais países seriam os parceirosgeoestrategicamente alinhados com o Brasile que têm uma razoável independência emrelação às grandes potências polarizadoras.

Num mundo superpopuloso e com es-cassez de recursos naturais, em certa me-

dida abundantes no Brasil, somos obriga-dos a pensar num poder dissuasório con-vencional minimamente crível, com ou semapoio dos “aliados”. Assim, acreditamoster reunido neste estudo do escolta F-6000M o que achamos de mais atualizado eque o resultado final atende de maneiraadequada aos requisitos do Estado-Maiorda Armada. A decisão não será fácil e de-mandará muito empenho para aconcretização deste projeto.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<FORÇAS ARMADAS> Fragata; Escolta; Estudo; Pensamento militar;

REFERÊNCIAS

Annati, Massimo (CA-RM-1) – Marinha Italiana, ex-Diretor de Assuntos Internacionais & Coope-ração, ex-diretor Armamentos Navais.

Bricknell, David J., vice-presidente da Rolls&Royce Naval Marine Systems, 2005.Coelho de Souza, José Carlos (VA-EN RM1) – chefe do projeto de aquisição das fragatas classe Niterói.Dick Ooms, Captain RNIN (Holanda), diretor de C4I do Estado-Maior.Friedman, Dr. Norman, editor do Naval Institute Guide, USN War College.Kreisher, Otto, Naval Flight Officer USN Ret., NAFO North America Editor.Lundquist, Edward H., Capt. Ret. USNavy.Merk, Karl-Heinz, engenheiro mecânico, diretor aposentado da RENK AG.Nitschke, Stefan. Editor de Ciência & Tecnologia da Naval Forces.Peterson, Gordon, Capt. Ret. US Navy.Schütz, Heinrich. diretor aposentado do BWB (Bundesamt für Wehrtechnick und Beschaffung).Vego, Dr. Milan, professor de Operações, JMO Department, US Naval War College.Annati, Massimo, “Missile Launchers – is VLS the Best Option ?”, Nafo II/2004, pg. 31.Idem, ib. “Air Defence Guns and Missiles”, Nafo II/2004, pg. 52.Idem, ib. “Coastal Bombardment – New world Requirement for Littoral Warfare”, Nafo IV/2004, pg. 9.Idem, ib. “European Frigates and Corvettes”, Nafo V/2004, pg. 8.Idem, ib. “Evolution of Smart Naval Munitions”, Nafo IV/2005, pg. 46.Idem, ib. “Medium and Large Calibre Guns Compared”, Nafo V/2005, pg. 73.Idem, ib. “Air Defence Guns”, Nafo VI/2006, pg. 66.Idem, ib. “Multi-Role Vessels – concept and Realisation”, Nafo VI/2007, pg. 19.Idem, ib. “Improved Technology for Better Platforms”, Nafo I/2008, pg. 78.Idem, ib. “Weapons Optimised for Anti-Terrorist and Anti-Pirate Operations”, Nafo II/2008, pg. 54.Idem, ib. “The World Frigate and OPV Update 2008”, Nafo IV/2008, pg. 114.Idem, ib. “The World Frigate Update 2009”, Nafo IV/2009, pg. 48.Bricknell, David, “The Combining Force – Marine Gears”, Nafo III/2005, pg. 51.Coelho de Souza, José Carlos (VA-EN RM1), “Uma história das fragatas“, Clube Naval 2001.Deucker, Stefan, Naval Forces Special Issue 2006, Vol. XXVII, pgs. 14 a 19.Eden-Ehrbrecht, Ingo, “The Sea is no Garbage Dump”, Deerberg-Systems, Nafo III/2004, pg. 118.Eule, Klaus, “Water Treatment and Waste Mangement for Enduring Operations – Part II”, Nafo II/

2008, pg. 66.

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ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DO BRASIL

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2004, pg. 86.Idem, ib. “Combat Information Centre Connects Commanders to Display, Decide, Engage”, Nafo II/

2007, pg. 60.Idem, ib. “Naval Guns and Naval Missiles – Partners or Competitors ?”, Nafo IV/2007, pg. 100.Idem, ib. “Ships with Wings, Helicopter – Imperative Asset for Surface Ships”, Nafo I/2010, pg. 71.Idem, ib. “Frigates – Obsolete in the Current Geopolitical Situation ?”, Nafo IV/2010, pg. 24.Merk, Karl-Heinz, “Naval Marine Gear Systems”, Nafo IV/2004, pg. 68.Nitschke, Stefan, “Unmanned Aerial Vehicles”, Nafo II/2004, pg. 62.Idem, ib. “ESM and ECM for Defensive and Offensive Purposes”, Nafo IV/2004, pg. 20.Idem, ib. “Stealth in Modern Warfare”, Nafo VI/2004, pg. 37.Idem, ib. “Multi-Purpose Vessels – Ideal Assets Only for Smaller Navies ?”, Nafo IV/2005, pg. 53.Idem, ib. “Satellites for Naval Warfare”, Nafo V/2005, pg. 96.Idem, ib. “Naval Cruise Missiles”, Nafo VI/2006, pg. 32.Idem, ib. “The New Generation of Naval Electro-Optics”, Nafo II/2007, pg. 42.Idem, ib. “Active and Passive Phased Array Radars Compared”, Nafo II/2007, pg. 68.Idem, ib. “Maritime Conflicts in the 21st Century – Equipment Alternatives for Small and Medium

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2005, pg. 29.Petrie, Christopher, “Naval Propulsion Systems for Long Endurance Missions”, Nafo I/2009, pg. 78.Philips, Malcolm, “Smooth Operators, the History of Marine Gas Turbines”, Nafo II/2007, pg. 53.Idem, ib. “An agony of choice – Propulsion Systems for Modern Warships”, Nafo V/2007, pg. 90.Schütz, Heinrich, “The Development of Major Combat Ships”, Nafo V/2004, pg. 87.Idem, ib. “Shipbuilding Challenges to Small Series Production”, Nafo VI/2006, pg. 76.Terzibaschitsch, Setfan, Die AEGIS Zerstörer-Klassen DDG-51 und DDG-79, Leonberg 2003.Vego, Dr. Milan, “NCW in the Littorals”, Nafo II/2004, pg. 8.Idem, ib. “ECM and SOFTKILL requeriments in the Littorals”, Nafo VI/2006, pg. 9.Idem, ib. “The Role of Torpedoes in a Missile World”, Nafo V/2007, pg. 60.Idem, ib. “Littoral Warfare: Characteristics, Operational Concepts and Technical Requirements”,

Nafo IV/2008, pg. 8.Idem, ib. “Defining Priorities at Sea: Mobility, Versatility and Survivability”, Nafo IV/2009, pg. 18.Idem, ib. “Support of Troops Ashore: Gunas and Missiles”, Nafo IV/2010, pg. 16.Wolf, Peter, “Water Treatment and Waste Mangement for Enduring Operations – Part I”, Nafo II/

2008, pg. 64.Wood, Geoffrey, “Combined Propulsion Systems Compared and Assessed, Part I”, Nafo IV/2004,

pg. 95.

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ESTUDO E PROPOSTA DE UM NAVIO DE ESCOLTA PARA A MARINHA DO BRASIL

ANEXO

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SUMÁRIO

IntroduçãoEvolução dos apetrechos de guerraA invenção da catapultaNavios de casco de madeiraSurge a couraçaInvenção do canhão raiadoO Chanceler Bismark e a Guerra do Paraguai

Corrida bélica do ParaguaiA missão Candido BareiroOs monitores encouraçadosCanhões KruppA proibição do Chanceler Bismark

O CHANCELER BISMARK E AMARINHA IMPERIAL BRASILEIRA

ALVANIR B. DE CARVALHO*Professor

INTRODUÇÃO

A história da guerra revela que homenscorajosos se enfrentam, em batalha,

contra outros homens não menos cora-josos, resultando vencedores não ne-cessariamente os mais fortes ou os mais

destemidos, mas sim o grupo que dis-punha de armamento de melhor qualida-de e eficiência.

Afinal, destruir o potencial militar doinimigo com o mínimo de perda do seu pró-prio pessoal constitui o objetivo de qual-quer general que se preze.

* Professor de economia; modelista naval; colaborador da RMB.

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O CHANCELER BISMARK E A MARINHA IMPERIAL BRASILEIRA

Disso resulta o incessante esforço decada país em dotar suas Forças Armadasdaquilo que constitui, em cada momento, omais avançado e mais eficiente tipo de ar-mamento disponível.

EVOLUÇÃO DOS APETRECHOS DEGUERRA

Ao dotar seus soldados de uma pesadacouraça de ferro, Esparta predominou, du-rante meio século, sobre as demais cida-des-Estado gregas, até que surgiu o reiFelipe, da Macedônia, pai do famoso Ale-xandre Magno, que dotou suas tropas deuma revolucionária arma de combate, a lan-ça conhecida por Larissa, medindo 4 metrosde comprimento, pelo que os infantesmacedônios podiam acometer e ferir os in-fantes inimigos sem se exporem ao contatofísico com os mesmos, mantidos a distân-cia pela nova arma.

E assim foi que, depois de eliminar oexército tebano, aliado e vizinho deEsparta, o rei Felipe impôs sua vontade àsdemais cidades-Estado gregas.

A INVENÇÃO DA CATAPULTA

Num combate corpo a corpo, ambos oscontendores se expõem ao risco de saíremferidos pelo adversário. Daí que osplanejadores militares passaram a se preo-cupar em desenvolver armas que fossemcapazes de atingir os adversários a partirde uma certa distância, sem expor seus pró-prios soldados.

Foi então que surgiram as catapultasdos mais diversos tipos e modelos, desdeaquela empregada pela infantaria romana,para lançar lanças a uma grande distância(quem sabe, o precursor do canhão de cam-panha?), às pesadas catapultas que arre-messavam pedras destinadas a romper osmuros que defendiam uma cidade sitiada.

NAVIOS DE CASCO DE MADEIRA

No meio naval, desde a antiguidade osnavios também foram utilizados como meiode transporte de tropas, só que os naviosde então, salvo o emprego eventual de umgrosso esporão, o aríete, eram empregadosquase que como simples plataformas, oscombates sendo travados em desespera-das lutas do tipo corpo a corpo, no convésdo navio atacado, com riscos físicos paraos tripulantes de ambas as embarcaçõesenvolvidas.

Eram navios dotados de casco de ma-deira, pelo que não faltou aos estrategis-tas de então adaptarem catapultas especi-almente projetadas para lançar petardosincendiários contra os navios inimigos,conhecidos por “fogo grego”, capazes deproduzir incêndios catastróficos nas em-barcações porventura atingidas.

Foi quando apareceu em cena uma po-derosa arma de combate, denominada ca-nhão, que disparava balas redondas desti-nadas a destruir sobretudo a mastreaçãodo navio inimigo, que ficaria então impedi-do de manobrar, expondo suas partes maisvulneráveis a um ataque concentrado, de-cisivo para aquele entrevero, navio contranavio.

Por oportuno, é mister dizer que os com-bates navais entre navios dotados de ca-nhões que lançavam balas redondas podi-am durar muitas horas, às vezes sem umresultado conclusivo.

No ano de 1854, estalou uma guerra en-tre a Inglaterra e seus aliados, França eTurquia, contra a Rússia Imperial, naquiloque a História passou a denominar de Guer-ra da Crimeia.

A Marinha de Guerra britânica era co-nhecida, então, como a mais poderosa domundo. Somada à Marinha francesa, as for-ças navais combinadas atacaram a fortalezarussa de Kimburn, que defendia Sebastopol.

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Kimburn era dotada de poderosos ca-nhões que destroçavam os frágeis naviosde madeira utilizados pelas forças atacan-tes, levando vantagem sobre eles.

SURGE A COURAÇA

Foi então que Napoleão III, o novo im-perador dos franceses, adotando orienta-ção fornecida por um dos seus conselhei-ros militares, mandou construir três chatasartilhadas dotadas de uma couraça de pro-teção externa, que receberam os nomes deLave, Tonnante e Devastation, pelo quepuderam se aproximar, sem grandes riscos,das muralhas da fortaleza de Kimburn, queforam destruídas pelo impacto das balasdisparadas pelos canhões das chatas, pos-sibilitando sua invasão por tropas de in-fantaria, que dominaram aquela estratégi-ca posição fortificada.

O sucesso das baterias flutuantes fran-cesas foi tão marcante que os ingleses, emconstante disputa com seus aliados, tam-bém mandaram construir chatas artilhadasde estilo próprio, que receberam os nomesde Glatton, Meteor, Thunderer e Trusty.

INVENÇÃO DO CANHÃO RAIADO

Dizem que aprender às custas dos ou-tros é a maneira menos dolorosa de qual-quer aprendizado.

As balas disparadas pelos canhões dealma lisa (balas redondas), que constituí-am o padrão de uso mais comum naquelaépoca, tinham capacidade de penetraçãona madeira do casco dos navios de então,porém não eram capazes de perfurar a cha-pa de ferro da couraça dos navios que pas-saram a ser construídos.

Projéteis raiados dos canhões Whitworth

A Guerra da Crimeia foi umadas primeiras guerras da épocamoderna em que os jornalistasse faziam presentes em todaparte, divulgando tudo o queviam, incluindo-se aí comentá-rios sobre os efeitos da coura-ça de proteção das chatasartilhadas. Por força disso, logologo as principais Marinhas deGuerra de outros países trata-ram de construir navios dota-dos de couraça de ferro.

Durante algum tempo, a cou-raça de ferro serviu de antídotocontra os disparos dos canhõesde alma lisa. Entretanto, procu-Bateria flutuante Lave, da classe Tonnante, construída em 1855

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O CHANCELER BISMARK E A MARINHA IMPERIAL BRASILEIRA

rando contornar aquela situação, os fabri-cantes de canhões realizaram pesquisas eexperimentos que resultaram na fabricaçãode canhões de cano estriado, popularmentedenominados de canhões raiados.

Os novos canhões não apenas resulta-ram com maior precisão de tiro e de maioralcance de suas balas, como também seusprojéteis tinham uma força de impacto muitomaior, sendo capazes de perfurar a couraçados navios da época, tal qual poderá ser ob-

servado na foto de uma das chapas da cou-raças do Silvado,1 também em exposição noMuseu Histórico Nacional, aqui reproduzida.

O CHANCELER BISMARK E AGUERRA DO PARAGUAI

Aqui entra em cena o impoluto chanceleralemão Oto Von Bismark, por mim conside-rado, neste artigo, como protetor indiretoda Marinha Imperial brasileira.

O autor diante da couraça de um navio brasileiro da época da Guerra do Paraguai, em exposição noMuseu Histórico Nacional, marcada pelo impacto de balas redondas. O autor suspeita tratar-se da

couraça do Encouraçado Brasil (Fotografia de José Lobato Franco)

1 N.R.: Malgrado a realização de pesquisas nos registros dos combates ocorridos no decorrer da Guerra doParaguai envolvendo nossos navios, uma vez que não foram encontradas quaisquer referências aeventuais perfurações produzidas por balas raiadas na couraça de qualquer um dos navios brasileirosempregados naquela campanha, o autor deduziu que a perfuração da couraça do Silvado, conformeaparece na foto, decorreu de alguma experiência feita pela Marinha Imperial após o final da guerra,com a couraça que pertenceu ao Silvado tendo sido utilizada apenas como teste da potência de fogode um canhão raiado de grosso calibre, em uso em alguns dos nossos navios, e não do disparo de umcanhão raiado paraguaio, visto que, pelo que consta nos registros da época, o Paraguai dispunha deapenas dois canhões raiados de pequeno calibre.

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O CHANCELER BISMARK E A MARINHA IMPERIAL BRASILEIRA

Antes disso, um preâmbulo. As guerrastambém têm um outro aspecto menos evi-dente e menos belicoso, porém não menosletal, representado pelo conflito sigiloso re-alizado nos bastidores, quer por meio de in-formações coletadas por espiões plantadosno solo do inimigo, quer nos conchavos enegociações diplomáticas. A Guerra doParaguai também teve seus aspectos secre-tos, somente revelados algum tempo depois.

Corrida bélica do Paraguai

Agindo com muita discrição, o Presiden-te Solano López deu início, a partir de 1862,a uma política secreta objetivando armar oParaguai, preparando aquele país para umaguerra aparentemente ainda não definida.

Do lado brasileiro, os líderes nacionaisque detectaram indícios da vontade bélicado dirigente paraguaio achavam que aque-la atitude tinha por objetivo preparar oParaguai para um enfrentamento eventual

contra a Argentina, de onde haviam parti-do, no passado, duas iniciativas tentandodominar aquele país, unindo seus territóri-os com o propósito de formar uma Argenti-na maior, no estilo do antigo Vice-Reinadodo Prata.

Era uma época de desconfianças mútu-as. O Brasil temia a expansão da Argentina,que, nas últimas décadas, havia demons-trado intenções de incorporar não apenaso Paraguai, mas também o Uruguai, situa-ção essa que, caso de fato ocorresse, trans-formaria o Rio da Prata num “mar mediter-râneo argentino”, com todas as consequên-cias negativas, políticas e econômicas quedisso poderiam resultar.

Para o leitor menos avisado, convém nãoesquecer que, naquela época, os meios decomunicação, sobretudo aqueles de natu-reza econômica, com a distante provínciabrasileira de Mato Grosso, e também comalgumas cidades da fronteira gaúcha, den-tre as quais se destacava Uruguaiana, de-

Fotografia de uma das chapas da couraça do Silvado, perfurada pelo impacto de uma bala dispara-da por canhão raiado de grande calibre (Fotografia de José Lobato Franco)

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pendiam sobretudo do transporte fluvial,pelo que, se a Argentina passasse a domi-nar as duas margens do estuário do Rio daPrata, o Brasil ficaria sujeito à vontadeeventual dos dirigentes argentinos em dei-xar passar, ou não, os nossos navios.

Por conseguinte, do ponto de vista bra-sileiro, preparar o Paraguai para enfrentar aArgentina numa guerra nos era inteiramen-te conveniente. Deve ter sido este o raciocí-nio que levou o Brasil a enviar para oParaguai uma missão militar brasileira queajudou a reorganizar e treinar o exército doParaguai, sem esquecer do planejamento dealgumas das fortalezas às margens do RioParaná, as quais, anos mais tarde, tiveramque ser atacadas pelas nossas forças, com aperda de milhares de vidas brasileiras.

A missão Candido Bareiro

Todavia, a política brasileira era desentido pragmático. Com um olho namissa e outro no vigário, o governo bra-sileiro não deixou de se manter atento àestranha movimentação do Paraguai nocenário europeu.

Com efeito, nos primeiros meses de1864, o Presidente López enviou para aEuropa Don Candido Bareiro, designadopor seu governo para assumir as legaçõesdo Paraguai junto às cortes de Londres ede Paris, onde o próprio López passara maisde um ano, no período de 1861/62.

No ano de 1906, após a guerra, CandidoBareiro publicou um livro intitulado AnalesDiplomático y Militar de la Guerra DelParaguay, no qual confirmou a existênciados planos militares do Presidente López,comprovando o que dizia com a reprodu-ção da correspondência trocada entre ele eo referido Presidente.

Segundo Bareiro, sua missão na Europatinha como encargo adicional a compra dearmamento e de navios de guerra, entre os

quais dois moderníssimos monitoresencouraçados de primeira classe.

No ano de 1878, Candido Bareiro foi elei-to Presidente do Paraguai.

Os monitores encouraçados

No dia 21 de julho de 1864, o PresidenteLópez enviou uma carta a D. CandidoBareiro, na qual acusava o recebimento dosplanos de construção dos encouraçadospretendidos, elaborados pela empresa deconsultoria John and Alfred Blyth, de Lon-dres, porém reclamando que os referidosplanos estavam incompletos, pelo que de-legava ao próprio Candido Bareiro a auto-rização para adotar as soluções que se fi-zessem necessárias.

Os projetos dos futuros navios encou-raçados tinham sido elaborados pela em-presa John and Alfred Blyth, que agia tãosomente na qualidade de consultora, razãopela qual, ao receber autorização do gover-no paraguaio para a construção dos naviospretendidos, a empresa Blyth abriu uma con-corrência pública, de modo a poder esco-lher qual o estaleiro inglês que se disporia aconstruir os novos encouraçados.

Até então, os irmãos Blyth tinham agi-do com extrema discrição, pelo que nin-guém fora do governo paraguaio suspei-tava das encomendas então negociadas.Todavia, ao abrir uma concorrência, aquelainformação caiu no domínio público, le-vando o encarregado de negócios do Bra-sil – visto que as nossas relações diplo-máticas com a Inglaterra estavam rompi-das desde o incidente conhecido porQuestão Christie – a alertar o nosso paísquanto àquele aspecto.

Ainda que preocupados com o assun-to, uma vez que, supostamente, o Paraguaiera um país nosso aliado, nada mais pude-mos fazer a não ser acompanhar os aconte-cimentos a distância.

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O CHANCELER BISMARK E A MARINHA IMPERIAL BRASILEIRA

Canhões Krupp

O Brasil não tinha qualquer pretensãoterritorial em relação ao Paraguai, pelo quenos dispusemos a ajudar aquele país aconstruir fortificações de terra no RioParaguai. Todavia, ao descobrir, quase quepor acidente, que o Paraguai estava com-prando navios de guerra encouraçados,essa nova informação mudava inteiramen-te o aspecto da questão.

Com efeito, fortalezas de terra não semovem do lugar, pelo que não ameaçamninguém. Todavia, navios encouraçadospodem fazê-lo, pelo que se tornam umaameaça a terceiros, daí merecerem uma apre-ciação diferenciada.

Pouco depois, o Vis-conde de Itajubá, em-baixador brasileiro jun-to ao reino da Prússia –como a Alemanha eraentão conhecida –, to-mou ciência de que osparaguaios haviam en-comendado 36 ca-nhões raiados de gros-so calibre.

Alertados quantoaos aspectos bélicos das encomendasparaguaias, o governo imperial do Brasil ficouatento. Todavia, e uma vez que os dois paísesse encontravam em paz, quase nada poderiaser feito nesse sentido.

A proibição do Chanceler Bismark

Homem de visão no futuro, além de en-comendar navios encouraçados, de cujosprojetos participou pessoalmente, o Presi-dente López também mandou comprar ca-nhões raiados para serem instalados nasfortalezas montadas no Rio Paraguay.

Entretanto, ao que parece, o PresidenteLópez, como usualmente o fazem todos os

ditadores, também era um tipo de pessoadada a tomar decisões individuais, precipi-tadas, que de certo modo nos favoreceram.A apreensão do vapor comercial brasileiroMarquês de Olinda, em novembro de 1864,seguido da autorização para que o exércitoparaguaio invadisse Mato Grosso (ondetomaram o Forte de Coimbra) e a cidade ar-gentina de Corrientes, por onde pretendiafazer passar um forte exército em direção aoUruguai, precipitou a guerra vários mesesantes de estarem prontos os naviosencouraçados e também antes da chegadados 36 canhões raiados alemães ao Paraguai.

Todavia, a precipitação do PresidenteLópez nos foi extremamente favorável.

Pelo que se desco-briu posteriormente, aguerra contra oParaguai parecia inevi-tável. Todavia, se aMarinha do Paraguaidispusesse de naviosencouraçados, a Bata-lha Naval do Riachu-elo teria sido perdidapela Marinha do Bra-sil, com os encoura-çados paraguaios po-

dendo ameaçar bombardear Buenos Airesou Montevidéu, sem que ninguém os pu-desse impedir.

Vendo a questão por outro ângulo, mes-mo não contando com os naviosencouraçados, se os paraguaios tivessemao menos recebido os 36 canhões Kruppde cano raiado e os tivessem instalado nasfortalezas do Rio Paraguai, nem mesmo osfuturos navios encouraçados da MarinhaImperial teriam condições de enfrentaraquelas fortalezas do inimigo. Não teriahavido o forçamento da Passagem deHumaitá e, consequentemente, a guerrapoderia ter-se prolongado por mais de umdecênio, com tudo de ruim que um tal pro-

O Chanceler Bismarkcontribuiu, ainda que de

forma indireta, paraencurtar a guerra,

poupando a destruição daesquadra imperial

brasileira

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O CHANCELER BISMARK E A MARINHA IMPERIAL BRASILEIRA

longamento poderia acarretar para os doispaíses.

Ocorreu que, aproveitando-se da eclosãoda guerra, o Visconde de Itajubá, represen-tante brasileiro junto à corte prussiana, ma-nobrou, junto ao Chanceler Bismark, de modoa tentar impedir a saída dos canhões raiadosfabricados na Alemanha rumo ao Paraguai.

A atuação do embaixador brasileiro teveefeitos positivos. Daí que, no dia 7 de mar-ço de 1865, Gregório Benitez, encarregadode negócios do Paraguai em Berlim, enviou

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<GUERRAS> Guerra do Paraguai; Armamento; Construção naval; Relações internacionais;

correspondência ao Presidente López in-formando-o de que, no dia 9 de fevereirodaquele ano, o poderoso ChancelerBismark havia proibido a remessa dos ca-nhões Krupp para o Paraguai.

Desse modo, o Chanceler Bismark con-tribuiu, ainda que de forma indireta, paraencurtar a guerra, poupando a destruiçãoda esquadra imperial brasileira, salvandobem assim a vida de alguns milhares desoldados brasileiros que ver-se-iam envol-vidos numa guerra sem fim.

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SUMÁRIO

IntroduçãoO SimomarO planejamento da Mobilização MarítimaUm exemploMobilização x LogísticaConclusão

UMA IDEIA PARA O APERFEIÇOAMENTO DAMOBILIZAÇÃO MARÍTIMA

ELIAS NICOLAU BUHAMRA SIMÕES*Capitão de Mar e Guerra

INTRODUÇÃO

A Mobilização é um assunto que vemganhando relevância, e espera-se que pas-se a ocupar um lugar de destaque nos pla-nejamentos das Forças Armadas. Assim,pela importância da Mobilização para a ati-vidade fim das Forças Armadas, quais seri-am as providências que devem ser toma-das, desde já, para quebrar sua inércia?

As respostas a essa indagação não sãosimples. À primeira vista parece que asForças Armadas jamais se preocuparamcom Mobilização.

A prática tem demonstrado que os en-cargos de Mobilização, quando exercidoscumulativamente, tendem a ficar em segun-do plano, com prioridade mais baixa. Nasestruturas organizacionais, a Mobilização,normalmente, está acompanhada da

* Ex-encarregado da Divisão de Mobilização da Subchefia de Logística e Mobilização do Estado-Maior daArmada.

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UMA IDEIA PARA O APERFEIÇOAMENTO DA MOBILIZAÇÃO MARÍTIMA

Logística e da Ciência & Tecnologia, queacabam por absorver quase a totalidade dotempo disponível do planejador, por se tra-tar de atividades que exigem providências eresultados no curto prazo, ao contrário daMobilização, cujos planejamentos sãodirecionados para a defesa nacional, sendovistos como de aplicação extremamente re-mota, pouco provável, fruto de um senti-mento generalizado, não declarado, de quenão há no horizonte qualquer possibilidadede guerra, não havendo, portanto, necessi-dade de se planejar em detalhes o que fazerao ser decretada a Mobilização Nacional. Acausa desse comportamento é a pouca pri-oridade que as atividades de Mobilizaçãotêm recebido do Governo Federal ao longodos últimos anos, sem contar que o assuntofoi apenas recentemente regulamentado.

Em função desse sentimento, falta ali-mentar o Sistema de Mobilização Marítima(Simomar) com diretrizes e instruçõesatualizadas que permitam a elaboração deplanos padronizados pelas OrganizaçõesMilitares (OM) diretamente envolvidas coma Mobilização.

Para quebrar este paradigma, em facedo vulto das atividades ligadas ao preparoe à execução da Mobilização, e para aper-feiçoar a estrutura do Simomar, de forma aconferir-lhe maior dinamismo e eficácia noequacionamento das carências logísticasda Marinha do Brasil (MB), o Estado-Mai-or da Armada (EMA) julgou adequado, em

2008, separar os seus setores de Logísticae de Mobilização, criando a Divisão deMobilização, subordinada à Subchefia deLogística e Mobilização.

O SIMOMAR

O Simomar é um sistema integrante, nocampo da Defesa Nacional, do Sistema deMobilização Militar (Sismomil), componen-te do Sistema Nacional de Mobilização(Sinamob). O Sinamob foi criado pela Leino 11.631, de 27 de dezembro de 2007, eregulamentado pelo Decreto no 6.592, de 2de outubro de 2008.

O Simomar foi concebido para funcio-nar por meio de subsistemas específicos.Cada subsistema com um Órgão de Dire-ção Setorial Líder (ODSL), que deveinteragir com os demais Órgãos de DireçãoSetorial (ODS). Esses subsistemas e seusODSL são mostrados no quadro abaixo.

O Comando-Geral do Corpo de Fuzilei-ros Navais (CGCFN) é o ODSL dos assun-tos atinentes a material e recursos huma-nos específicos do CFN, efetuando a coor-denação necessária com os demais ODSL.

O PLANEJAMENTO DAMOBILIZAÇÃO MARÍTIMA

A sistemática de planejamento daMobilização Marítima prevê que, uma vez re-cebida a Diretriz Setorial de Mobilização Mili-

SUBSISTEMA ODSLRECURSOS HUMANOS Diretoria-Geral do Pessoal da Marinha – DGPMSAÚDE Diretoria-Geral do Pessoal da Marinha – DGPMMANUTENÇÃO Diretoria-Geral do Material da Marinha – DGMMSALVAMENTO Comando de Operações Navais – ComOpNavSUPRIMENTO Secretaria-Geral da Marinha – SGMTRANSPORTE Secretaria-Geral da Marinha – SGMENGENHARIA Diretoria-Geral do Material da Marinha – DGMMATIVIDADES MARÍTIMAS Comando de Operações Navais – ComOpNav

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tar (DSMM) do Ministério da Defesa (MD), oEstado-Maior da Armada, prevendo a ativa-ção do Sinamob, planeje a Mobilização Marí-tima, compatibilizando-a com as atividadesrotineiras desenvolvidas no âmbito da MB, eelabore sua diretriz de Mobilização Marítima.

O ODSL de cada subsistema, com basenessa diretriz e com a participação das Di-retorias Especializadas (DE) e demais OMdiretamente subordinadas, elabora, então,sua diretriz subsetorial.

Os Comandos de Distritos Navais(ComDN), o Comando em Chefe da Esqua-dra (ComemCh) e o Comando da Força deFuzileiros da Esquadra (ComFFE), após es-tudarem a diretriz de cada ODSL, confeccio-nam suas instruções e ordens particulares,visando ao planejamento das ações que con-tribuam para o preparo e o emprego, naMobilização, das OM operativas e demaisOM diretamente subordinadas, para a execu-ção das tarefas básicas do Poder Naval, de-vendo levar em consideração, no que for co-nhecido, o planejamento efetuado para fazerfrente a cada Hipótese de Emprego (HE)1.

De posse dessas instruções, cada OMelabora suas necessidades e as encaminhaao seu Comando Imediatamente Superior(ComImSup). Este, por meio da atribuiçãode prioridades para a aquisição e deremanejamentos possíveis de serem reali-zados, elabora suas “listas de carências” eas encaminha ao Escalão Superior. No fi-nal, as listas de carências, consolidadaspelos ComDN, ComemCh e ComFFE, serãoencaminhadas aos ODS, via DE, e, posteri-ormente, a cada ODSL.

Cada ODSL elabora, então, o PlanoSetorial de Mobilização Marítima do seu

subsistema e o encaminha ao EMA, ÓrgãoCentral de Direção do Simomar. O EMA,após estudar, consolidar e submeter à apro-vação do comandante da Marinha, elaborao Plano de Mobilização Marítima (PMM),por HE e por função logística. Este planoserá enviado ao Ministério da Defesa, res-ponsável pela confecção do Plano deMobilização Militar, consolidando as in-formações da MB, do Exército Brasileiro(EB) e da Aeronáutica.

Na prática, no entanto, o funcionamentodo Sistema ainda não ocorre da forma comofoi acima visualizado. Para que cheguemosàs “listas de carências”, é necessário, an-tes, termos os planos logísticos confeccio-nados para fazer frente a cada HE, pois paracada HE teremos um tipo de Mobilização.Assim, poderemos responder a perguntassimples, tais como, mobilizar para quê? Emobilizar o quê? Ou seja, caso não sejamatendidas as necessidades requeridas evisualizadas diante das disponibilidadescontempladas pela Logística, tomando-se,inclusive, o princípio da oportunidade, es-sas necessidades tornar-se-ão objeto deestudos da Mobilização, passando a serconsideradas como carências logísticas. Pormeio do fluxo de informações das necessi-dades e das carências logísticas, serão rea-lizados estudos e planejamentos deMobilização, nos níveis político, estratégi-co e, eventualmente, no operacional, com opropósito de identificar as ações estratégi-cas que venham a transformar o PotencialNacional existente em Poder Nacional, comvista a ser empregado na Fase da Execuçãoda Mobilização. Ações estratégicas estarãopresentes em programas, normas e procedi-

1 Hipótese de Emprego é a antevisão de possível emprego das Forças Armadas em determinada situaçãoou área de interesse estratégico para a Defesa Nacional. É formulada considerando-se o alto grau deindeterminação e imprevisibilidade de ameaças ao País. Com base nas hipóteses de emprego, serãoelaborados e mantidos atualizados os planos estratégicos e operacionais pertinentes, visando apossibilitar o contínuo aprestamento da Nação como um todo, e em particular das Forças Armadas,para emprego na defesa do País.

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mentos relativos à complementação daLogística Nacional e na adequação das Po-líticas Governamentais à Política deMobilização Nacional.

Pode-se dizer que, no que tange àMobilização Marítima, os Comandos dosDistritos Navais e das Forças Navais aindadesenvolvem seus trabalhos sem uma coor-denação mais efetiva. Esse fato acarreta di-vergências no Preparo da Mobilização Ma-rítima de procedimentos, com a falta de umfarol, de uma orientação doutrinária.

Uma solução encontrada pode ser, então,planejar a obtenção desses meios por inter-médio de aquisições, contratações ou loca-ções, respectivamente, com recursos alocadosemergencialmente para a MB. Dessa forma, aMB levaria em conside-ração que, no quadro deevolução de uma criseexterna, o tempo de rea-ção por parte do Gover-no para a decretação daMobilização Nacionalaté a sua real implemen-tação talvez não permi-ta que a Força Naval te-nha suas necessidadesmínimas satisfeitas, emtempo útil, para cumpriros prazos de empregooperacional previstos.

Se nesse ínterim for decretada aMobilização Nacional, melhor ainda. Basta,então, substituir as palavras aquisição/contratação/locação por requisição ou atéconfisco, conforme o caso. O importante ésaber que o material existe e onde pode serencontrado, com quais serviços a Força Na-val pode contar em seus planejamentos e queinstalações atendem a suas necessidades.Essas necessidades, naturalmente, devemestar baseadas nos planos de campanha dosdiferentes Teatros de Operações (TO)visualizados nas Hipóteses de Emprego.

Quanto à mobilização de pessoal, a MBirá se valer da Lei do Serviço Militar, que am-para a convocação de reservistas para reali-zar exercícios de adestramento em unidadesoperacionais. Hoje, podemos até inferir que,com a redução das baixas decorrentes da for-ma que os combates são realizados atualmen-te, a mobilização de pessoal não seja a maisproblemática. Entretanto, a área do pessoaldeverá ser objeto de análise especial, pois oserviço militar está inserido na Diretoria doServiço Militar do EB. Como o pessoal a sermobilizado pela MB deve atender não ape-nas à Força Naval, mas também aos naviosmercantes, eventualmente, mobilizados, há,assim, a necessidade de se manterem os di-versos cadastros atualizados, incluindo os

atinentes ao pessoal daMarinha Mercante, acargo da Diretoria dePortos e Costas (DPC).

Naturalmente, sãomuitos os óbices paraestruturação e funcio-namento do Simomarde maneira uniforme ecoordenada. Dentrodesse contexto, o es-forço da MB deve serno sentido de procu-rar alternativas para

superar as dificuldades, mantendo o Siste-ma de Mobilização Marítima oxigenado eatuante.

O objetivo maior é dar à Marinha as con-dições necessárias para atuar prontamenteem qualquer um dos TO visualizados em nos-sas Hipóteses de Emprego, antecipando-seà Mobilização Nacional, ou independentedela, no caso de um conflito inopinado.

UM EXEMPLO

Na área de material, por exemplo, aMobilização prevê o atendimento, num pri-

O importante é saber que omaterial existe e onde podeser encontrado, com quais

serviços a Força Navalpode contar em seusplanejamentos e que

instalações atendem a suasnecessidades

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meiro momento, das necessidades dos pos-síveis TO por meio de remanejamentos eaquisições. Em função disso, e tendo comoreferência os planos de campanha dessesTO, o primeiro passo é buscar respostasaos seguintes questionamentos: Quemremaneja o quê e para onde? E quem ad-quire o quê, para quem, onde e qual a ne-cessidade de recursos financeiros?

Em resumo, dando respostas às pergun-tas acima, o planejador estará viabilizandoos planos de campanha porque, além daidentificação das necessidades mais pre-mentes, será planejada a forma de satisfa-zer essas necessidades o mais rápido pos-sível, optando por remanejamentos ou aqui-sições, nessa prioridade.

De uma maneira geral, esse trabalho se-gue a seguinte linha de raciocínio:

– As OM operativas levantam suas ne-cessidades, considerando como falta tudoaquilo que não estiver disponível, mesmoque exista na OM, e as encaminham aoComImSup. As OM não operativas, por suavez, fazem um levantamento semelhante,informando ao ComImSup o material emcondições de ser remanejado, que pode serum percentual preestabelecido do dispo-nível ou outro parâmetro preestabelecidopelo ODS/ComDN/ComemCh/ComFFE.

– De posse dessas informações, os ODS/ComDN/ComemCh/ComFFE planejam osremanejamentos possíveis, de OM nãooperativas para as OM operativas, por meiode sua área logística, e fazem um levanta-mento do que pode ser adquirido no merca-do da sua área de jurisdição, por intermédiodo setor responsável pela mobilização, iden-tificando fornecedor, preço por unidade eos recursos financeiros necessários.

– Aquilo que não for atendido na suaárea de jurisdição, seja por remanejamentos,seja por aquisições, será solicitado às DEcorrespondentes, bem como os recursosnecessários para as aquisições previstas.

Os ComImSup procedem da mesma ma-neira em relação às OM subordinadas, pro-curando completá-las, também, porremanejamentos e aquisições. Aquele mate-rial que sobrar, à semelhança das OM nãooperativas, bem como aqueles itens aindadisponíveis no mercado local, com preçounitário e fornecedor, devem ser repassadosàs respectivas DE para que elas possam pla-nejar remanejamentos entre Comandos deForça ou aquisições centralizadas. Aquilo quecontinuar em falta, após todos osremanejamentos e aquisições possíveis, seráobjeto da Mobilização Militar, a cargo do MD.

Todas essas orientações devem estarcontidas em uma diretriz específica, quepode ser denominada, por exemplo, de Di-retriz de Mobilização Marítima de Supri-mento, para o caso do Subsistema de Su-primento, a cargo da SGM. Da mesma for-ma, outras diretrizes específicas seriamemitidas, tendo como objetivo regular asdiversas áreas de interesse da MobilizaçãoMarítima, todas afinadas com a nova con-cepção da Mobilização Marítima e de acor-do com os planos de operações e de cam-panha em vigor.

MOBILIZAÇÃO X LOGÍSTICA

É lugar comum representar a Mobiliza-ção e a Logística, didaticamente, por meiode dois círculos concêntricos, o menor paraa Logística e a coroa que o envolve repre-sentando a Mobilização.

Essa representação gráfica leva o ob-servador a concluir que a Mobilização sim-plesmente complementa a Logística, par-tindo da situação existente em um determi-nado momento, ou seja, o planejamento daMobilização é feito em função da Logística.

Por que não planejar a Logística em fun-ção da Mobilização ou, melhor dizendo, deacordo com o potencial mobilizável, desdeque conhecido?

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Considerando que é inviável dotar to-das as nossas OM com 100% do materialde emprego militar (MEM), a prioridadedeve recair naqueles materiais não existen-tes em território nacional, e, dentre eles, asprioridades serão aqueles que apresenta-rem maior dificuldade de aquisição. Valelembrar que os exportadores, em caso decrise, poderão suspender o fornecimento,por decisão unilateral, conforme a conve-niência política do momento.

Quanto àqueles itens passíveis de se-rem adquiridos no próprio país, de imediatoou a curto prazo, pode-se limitar a aquisi-ção, em tempo de paz, ao necessário para oadestramento dos mei-os subordinados e usonas operações previs-tas. Dessa forma, é im-prescindível saber comexatidão aquilo que omercado interno e oparque industrial po-dem oferecer. Paraesse levantamento,são de suma importân-cia as atividades reali-zadas na fase de pre-paro da Mobilização.

Por outro lado, asatividades de pesqui-sa devem voltar-se para os materiais de quea indústria nacional não detém a tecnologianecessária.

Para efeito de raciocínio, arbitra-se, porexemplo, em 30% a necessidade para oadestramento.

Assim sendo, aqueles materiais que po-dem ser mobilizados a curto prazo em quan-tidades próximas a 100% não precisam re-ceber da Logística, em tempo de paz, umaatenção especial, bastando prover as nos-sas OM com o necessário para o adestra-mento (30%). Os 100% serão perseguidospara os materiais não disponíveis em terri-

tório nacional, portanto de difícil aquisi-ção. Um planejamento com essa ótica sóserá possível se a MB souber com exati-dão o que a indústria e o mercado nacionalpodem oferecer.

O planejamento da mobilização poderá,então, desempenhar um importante papelno apoio à decisão nas áreas da Logística(aquisições) e da Ciência & Tecnologia(pesquisas).

Para que a Mobilização decole, é misterque os ODSL passem a trabalhar integra-dos com o ComOpNav/ComDN, porquetodo planejamento deve ter como principalobjetivo atender às necessidades opera-

tivas ditadas pelosplanos de operações ede campanha elabora-dos em função das Hi-póteses de Empregoou para atender a situ-ações específicas.

É a partir das de-mandas iniciais levan-tadas pelas OM queintegram os possíveisTeatros de Operações,em especial as subor-dinadas ao ComemCh/ComFFE, que devemser planejados os

remanejamentos e aquisições no âmbito daMB, bem como realizado o levantamentodas necessidades de instalações e servi-ços, com a identificação dos prestadoresde serviços e instalações disponíveis, comos devidos custos para as contratações oulocações que se fizerem necessárias, a fimde viabilizar as manobras idealizadas pelosComandos Militares e tornar exequíveis osplanejamentos operacionais realizados.

O Simomar e os bancos de dados gera-dos a partir dele não devem ter um fim em simesmo, daí a importância de se dar aos seuscadastros um uso dual, pelo menos parte

Para que a Mobilizaçãodecole, é mister que os

ODSL passem a trabalharintegrados com o

ComOpNav/ComDN,porque todo planejamento

deve ter como principalobjetivo atender às

necessidades operativas

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deles, ou seja, viabilizando o acionamentode meios tanto na guerra como em tempo depaz. Mesmo com esse emprego dual, queauxilia a oxigenação doSistema, há a necessi-dade de esses bancosde dados serem checa-dos por amostragemou nos exercícios degrande envergadura.

CONCLUSÃO

Este novo enfoquedado à MobilizaçãoMarítima tem a grandevantagem de pautarseus planejamentosem cima do que a MBde fato possui em suasorganizações militares espalhadas por todoo País e naquilo que o mercado nacionalpode disponibilizar no curto prazo.

Trata-se de uma ideia nova que mereceser levada adiante. Considerando que a MBdeva, em última análise, preparar-se para a

possibilidade de ocor-rência de uma das Hi-póteses de Empregovisualizadas, as faltasou vulnerabilidadesque persistirem apósos remanejamentos,aquisições, contrata-ções e locações plane-jadas, por absoluta fal-ta de oferta no curtoprazo, podem e devemorientar as ações estra-tégicas nas áreas deLogística e de Ciência& Tecnologia, em tem-po de paz, em especial

no que se refere à dependência de aquisi-ção no mercado externo e aos projetos depesquisa.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<ARTES MILITARES> Mobilização; Política Nacional;

As faltas ouvulnerabilidades que

persistirem, por absolutafalta de oferta no curtoprazo, podem e devem

orientar as açõesestratégicas nas áreas deLogística e de Ciência &Tecnologia, em tempo de

paz

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UMA IDEIA PARA O APERFEIÇOAMENTO DA MOBILIZAÇÃO MARÍTIMA

REFERÊNCIAS

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______. Lei no 8.239, de 4 de outubro de 1991, dispõe sobre a prestação do Serviço Alternativo.______. Lei no 11.631, de 27 de dezembro de 2007, dispõe sobre a Mobilização Nacional e cria o

Sistema Nacional de Mobilização – Sinamob.______. Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999, dispõe sobre as normas gerais para a

organização, o preparo e o emprego das Forças Armadas.______. Lei Complementar no 117, de 2 de setembro de 2004, estabelece novas atribuições subsidi-

árias para as Forças Armadas.______. Decreto no 57.654, de 20 de janeiro de 1965, aprova o Regulamento do Serviço Militar.______. Decreto no 63.704, de 29 de novembro de 1968, aprova o Regulamento da Lei de Prestação

do Serviço Militar pelos Estudantes de Medicina, Farmácia, Odontologia e Veterinária e pelosMédicos, Farmacêuticos, Dentistas e Veterinários.

______. Decreto no 1.265, de 11 de outubro de 1994, aprova a Política Marítima Nacional.______. Decreto no 4.780, de 15 de julho de 2003, dispõe sobre a reserva da Marinha.______. Decreto no 5.484, de 30 de junho de 2005, aprova a Política de Defesa Nacional.______. Decreto no 6.592, de 2 de outubro de 2008, Regulamento da Lei de Mobilização Nacional.______. Decreto no 6.703, de 18 de dezembro de 2008, aprova a Estratégia Nacional de Defesa, e dá

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SUMÁRIO

IntroduçãoPrincipais projetos

Estados Unidos da AméricaEspanhaFrançaItáliaAustráliaOutros países

Situação da Marinha do BrasilConclusão

NAVIO DE PROPÓSITOS MÚLTIPLOS

ROGÉRIO RAMOS LAGE*Capitão de Mar e Guerra (FN)

INTRODUÇÃO

O início da segunda década do séculoXXI tem apresentado um ambiente in-

ternacional conturbado, com o incrementoda ocorrência de conflitos, particularmentede baixa intensidade, e de desastres natu-rais, como foi o caso do terremoto econsequente acidente radiológico no Japão.

A crescente participação do Brasil nocenário internacional, consequência natu-ral de seu desenvolvimento econômico, temdemandado maior preocupação com rela-ção à salvaguarda de seus interesses noPaís e no exterior, particularmente na defe-sa da Amazônia Azul, na salvaguarda daintegridade física do crescente número decidadãos brasileiros no exterior – princi-

* Chefe do Departamento de Pesquisa e Doutrina do Comando-Geral do Corpo de Fuzileiros Navais.

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palmente em países com situação políticainstável – e na participação em operaçõeshumanitárias e em apoio a países que so-frem com desastres naturais.

Nesse contexto, as Forças Armadas bra-sileiras assumem um papel fundamental nadefesa desses interesses e a Marinha doBrasil (MB) ocupa um lugar de destaque, aopossuir capacidade de empregar um Conju-gado Anfíbio (Grupamento Operativo de Fu-zileiros Navais embarcado em uma Força Na-val) na realização deoperações anfíbias.

Além da tradicionalcapacidade de realiza-ção das operações an-fíbias clássicas, a MBtem se preparado para,caso seja necessário,atuar contra as chama-das “novas ameaças” eas “ameaças assimé-tricas” – caracterizadaspor serem cada vezmais difusas – quandoo caráter expedicionáriodas Forças de Fuzilei-ros proporciona uma enorme vantagem ao sedeslocarem rapidamente para a cena de açãoe serem empregadas prontamente. Assim,surge o conceito de um novo tipo de opera-ção anfíbia, que envolve, entre outras, asoperações de evacuação de não combaten-tes, as operações de paz de caráter naval e as

operações humanitárias, classificadas peloUnited States Marine Corps (Corpo de Fuzi-leiros Navais dos Estados Unidos) comoengagement e que, por impossibilidade deuma tradução adequada, foram denominadaspela MB como “projeção anfíbia”.

Para o sucesso dessas operações anfí-bias, faz-se necessário que o ConjugadoAnfíbio seja composto por meios navais,aeronavais e de fuzileiros navais perfeita-mente integrados. A existência desse con-

jugado bem preparadoreforça as capacidadesanfíbia e expedicioná-ria da Nação e a man-tém em condições deenfrentar os desafiosmodernos, que englo-bam um vasto espec-tro de operações, des-de ações de caráterdissuasório até opera-ções militares de gran-de envergadura.

Dentro do contex-to do planejamento doaumento da capacida-

de anfíbia, tem sido observada, nos princi-pais países do mundo, a elevada importân-cia do estudo e do desenvolvimento dosnavios anfíbios e, particularmente, dosNavios de Propósitos Múltiplos (NPM).Tais navios, além de transportar pessoal ematerial para a área de operações, devempossuir inúmeras capacidades, das quaisse destacam:

– servir de plataforma para lançamentode vetores de projeção de poder sobre terra,como os Carros-Lagarta Anfíbios (CLAnf),Embarcações de Desembarque sobre Col-chões de Ar (EDCA), embarcações de de-sembarque, embarcações pneumáticas etc.;

– desembarcar pessoal e material em umporto ou, caso necessário, com o empregode pontões;

O conjugado anfíbio bempreparado reforça ascapacidades anfíbia e

expedicionária da Nação ea mantém em condições de

enfrentar os desafiosmodernos, que englobam

um vasto espectro deoperações

Navio de Propósito Múltiplo

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– proporcionar condições para a realiza-ção de atividades de Comando e Controle;

– transportar e operar como plataformade lançamento de helicópteros e aeronavesShort Take off and Landing (Stol), estas comsuas variações, além de outros meios aére-os de transporte e de emprego tático;

– lançar mísseis;– serem utilizados como base marítima

para atividades logísticas (seabase) e comoLocal de Destino Seguro Intermediário(LDSI), no caso de uma Operação de Eva-cuação de Não Combatentes; e

– serem utilizados como hospital.A ampliação do espectro de missões a

serem cumpridas e, consequentemente, oincremento dos requisitos a serem atendi-dos têm demandado complexos projetos deconstrução de NPM, cujas dimensões es-tão diretamente relacionadas à capacidaderequerida e aos meios relacionados a cadacapacidade. Além disso, os NPM têm seapresentado como navios bastante versá-teis e aptos a realizar diversos tipos detransferências (desembarque diretamentena praia, helitransporte, desembarque emportos etc.), tanto para tropa quanto paracarga, blindados, apoio de fogo e logísticoe meios de comando e controle. Essa capa-cidade propicia à Força de Desembarque apossibilidade de evitar um ataque frontal,desembarcando seus meios em momento elocal mais apropriado, cumprindo uma for-te exigência existente nos conflitos atuais:a diminuição do número de baixas.

PRINCIPAIS PROJETOS

A quantidade de países que estão in-vestindo no desenvolvimento de projetose/ou na obtenção de NPM tem sido cres-cente. Além dos tradicionais países cominfluência global, algumas potências regi-onais também têm priorizado esse aspecto,principalmente para incrementar sua capa-

cidade de projeção de poder, servindo tam-bém como um poder dissuasório local. Ali-ada a isso, a participação cada vez maiordesses países em operações de paz tam-bém tem alterado sua prioridade na cons-trução desse tipo de navio.

A seguir será apresentada uma análisesucinta dos principais países que têm in-vestido em NPM.

Estados Unidos da América

Pelo fato de haver a necessidade deoperar 12 Expeditionary Strike Groups(ESG), os EUA têm investido muito em na-vios anfíbios. Seus principais projetos são:

Classe LPD 17 San AntonioEsta classe foi criada para substituir os

antigos Landing Platform Dock (LPD)Austin e Landing Ship Dock (LSD)Anchorage da US Navy (Marinha dosEUA) e, inicialmente, seriam 12 navios(LPDs 17 a 28). Atualmente, existem seis jáconstruídos e três em construção.

Foi projetada para transportar e desem-barcar pessoal e material de uma MarineExpeditionary Unit (MEU) – Força de De-sembarque nucleada em um Batalhão deInfantaria, denominada Unidade Anfíbia(UAnf) pela MB – por helicópteros, EDCAou viaturas anfíbias. O primeiro navio daclasse, o LPD 17 USS San Antonio, come-

LPD 17 San Antonio

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çou a ser construído em junho de 2000 pelaNorthrop Grumman Ship Systems (NGSS)e foi comissionado em 2006.

É um navio de grandes dimensões e comcapacidade de operar com independência oucom extrema interoperabilidade devido a seucomplexo sistema de Comando e Controle.

Suas principais características são:– comprimento: 208,5 metros;– deslocamento: 24.900 toneladas;– capacidade de lançamento de aerona-

ves: dois CH53E Super Stallion ou quatrohelicópteros CH-46 Sea Knight ou doisMV-22 Osprey, que podem ser lançados ourecolhidos simultaneamente;

– capacidade de transporte de Embar-cações de Desembarque: dois LandingCraft Air Cushioned (LCAC) ou umaLanding Craft Utility (LCU) ou Embarca-ção de Desembarque de Carga Geral(EDCG);

– capacidade de transporte de viaturasanfíbias: 14 Expeditionary FightingVehicles/Amphibious Assault Vehicles(EFV/AAV) ou CLAnf;

– capacidade de transporte de tropa: 699militares (66 oficiais e 633 praças).

Ainda que os custos para a sua execu-ção tenham ultrapassado em muito o orça-mento inicial e inúmeros problemas duran-te seu desenvolvimento tenham sido apre-sentados, o projeto tem sido consideradobem-sucedido.

Classe America (LHA-6)Esta classe foi criada para substituir os

navios das classes Landing HelicopterAssault (LHA) Tarawa e LandingHelicopter Dock (LHD) Wasp, esta consi-derada como uma continuação da anterior.Terá capacidade de transportar e desem-barcar uma Marine Expeditionary Brigade(MEB) – Força de Desembarque nucleadaem uma Brigada, denominada Brigada An-fíbia (BAnf) pela MB – e transportar e lan-

çar helicópteros do United States MarineCorps (USMC) e aeronaves V-22 Osprey eF-35B Joint Striker Fighter (JSF). O pri-meiro navio da classe está em construção esua entrega à US Navy está prevista para2013. Com um orçamento inicial de US$ 2,4bilhões, seu projeto está sendo executadopela Northrop Grumman Corporation’sIngalls Shipyard Division e traz algumasevoluções se comparado às classesTarawa e Wasp, tais como a otimização dasoperações aéreas e das atividadeslogísticas. A remoção do convés-doca pro-porcionou um extenso convés do hangarcom instalações de manutenção. Além dis-so, destacam-se as seguintes melhorias:facilidades de comando e controlereconfiguráveis, instalações para hospitala bordo, capacidade adicional de reabaste-cimento de aeronaves e espaços dedica-dos para a logística de aviação.

LHA-6 America

Suas principais características são:– comprimento: 257,3 metros;– deslocamento: 45.695 toneladas;– capacidade de lançamento de aerona-

ves: 12 MV-22 Osprey, quatro CH-53E SeaStallion, sete AH-1Z Super Cobra ou UH-1Y Huey e seis a oito F-35B Joint StrikeFighters (JSF);

– capacidade de transporte de tropa:1.687 militares.

Em adição, terá capacidade de lançamen-to de mísseis superfície-ar (MSA) RollingAirframe Missile (RAM) e Sea Sparrow e

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será dotado do sistema antinavio (com mís-seis superfície-superfície) Phalanx CIWS ede sete metralhadoras duplas calibre .50".Também terão capacidade de operar o RQ-8B Fire Scout, veículo aéreo não tripulado(VANT) com o formato de um helicóptero,desenvolvido pela Northrop Grumman-RyanAeronautical, de San Diego, Califórnia.

Espanha

Com o projeto orçado em US$ 434 mi-lhões, o Buque de Proyección Estratégi-ca (BPE) Juan Carlos I foi construído nosEstaleiros Ferrol-Fene e entregue à Mari-nha da Espanha em 2010. Seu deslocamen-to é de 24.700 toneladas carregado e tem202,3 metros de comprimento.

Possui várias novidades, como uma ram-pa tipo ski jump para operar as aeronavesVSTOL tipo Harrier e futuramente o F-35B.Além dessas aeronaves, pode operar o AV-8B Bravo Plus, o V-22 Osprey, o NH-90, oCH-47 e o AS 212. O convoo dispõe de seispontos de pouso, permitindo a operaçãosimultânea de pouso e decolagem de atéseis helicópteros. Dois elevadores para asaeronaves de asa fixa ligam o hangar aoconvoo.

Possui, ainda, um convés-doca com ca-pacidade para quatro embarcações de de-sembarque tipo Landing Craft Mechanized(LCM) ou Embarcação de Desembarque deViatura e Material (EDVM) ou outras em-barcações/veículos anfíbios, dependendo

de suas dimensões. É compatível como osLCAC, e as acomodações são projetadaspara 1.443 pessoas, sendo 902 espaços abordo reservados exclusivamente para atropa. Possui espaço para transportar blin-dados, obuseiros e outras viaturas.

Devido a sua infraestrutura embarcadacontar com ampla variedade de equipamen-tos, particularmente de comunicações, pos-sui grande capacidade de comando e con-trole a ser utilizada pelos estados-maioresembarcados. Possui instalações médicascom enfermarias, salas cirúrgicas e eleva-dores exclusivos para pacientes.

Seu sistema de armas é composto pordefesa antimíssil de ponto, quatro canhõesde 20 mm, duas metralhadoras, torpedosNixie e defesa contra minas.

França

Iniciou o processo de expansão de sua ca-pacidade anfíbia na década de 1990, com ocomissionamento de dois LPD da classeFoudre. Mais recentemente, em 2006 e 2007,comissionou dois LHD classe Mistral (BPC –Bâtiments de Projection et Commandement– navios de projeção e comando) que deslo-cam, cada um, 21.300 toneladas.

Seu convés-doca pode transportar qua-tro LCM ou dois LCAC e permite o movi-mento de carga entre a garagem e o hangar.Normalmente, embarca 230 viaturas ou oitohelicópteros e 60 viaturas. Sua capacidade

BPE Juan Carlos I

BPC Mistral

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de transporte de tropa é de 450 militares.Possui infraestrutura para comando e con-trole e, ainda, um hospital modular nohangar com área de 850 m², com capacida-de para 69 leitos, sendo 19 em Unidade deTratamento Intensivo (UTI).

Entre as várias configurações possíveis,existe a pesada, que permite transportar umbatalhão com 40 carros de combate Leclerc.Outras configurações mais equilibradaspermitem o transporte de até 59 veículosblindados.

Seu custo é de 650 milhões de eurospara os dois navios. Um terceiro navio daclasse foi adquirido em 2009. O custo seráreduzido na terceira e na quarta unidades,que empregarão o padrão de construçãocivil ao invés do militar. O BPC também éapresentado em várias versões, com 14 mil,16 mil ou 25 mil toneladas.

Itália

Tem investido, nos últimos anos, emseus navios anfíbios como parte do pro-grama de renovação de sua frota. Além depequenos LPD da classe San Giorgio, ematividade, e de LHD, em construção, queaumentam a capacidade de operações aé-reas e de comando e controle, foicomissionado em 2009 o Conde de Cavour,projetado como LPD, com característicasde navio de propósitos múltiplos e com umcusto de aproximadamente US$ 1,1 bilhão.

Com deslocamento de 27.500 toneladase capacidade de transporte de tropa para325 militares (além dos 451 da tripulação,203 do destacamento aéreo embarcado e140 do comando da força-tarefa anfíbia),possui hangar reconfigurável, capacidadede comando e controle para um estado-maior de 140 homens e centro hospitalar. Onavio não possui convés-doca, mas apre-senta capacidade roll-on/roll-off (ro-ro)para desembarcar blindados diretamente noporto. A defesa antiaérea é realizada commísseis Aster-15 e dois canhões de 76mm.

Possui capacidade de operar helicópte-ros e aeronaves STOVL (AV-8B e o futuroJSF). Além de aeronaves, seu hangar po-derá acomodar até cem viaturas terrestrese anfíbias.

Austrália

Com a compra de dois LHD (HMASCamberra e HMAS Adelaide), a Marinhaaustraliana iniciou a expansão de sua forçaanfíbia. Para o desenvolvimento do proje-to desses navios, concorreram a empresaCDNS-ADI, com uma variante do BPCMistral, e a Navantia-Tenix, com um deri-vado do BPE espanhol, que foi a vencedo-ra. As principais características do BPE queinfluenciaram esse resultado foram a capa-cidade de transporte de tropa (1.200 milita-res) e a presença da rampa tipo ski jump,

Conde de Cavour

BPE Juan Carlos I

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para uma eventual aquisição das aerona-ves F-35B. O navio possuirá instalaçõesmédicas dotadas de duas salas de cirurgia.

Outros países

No final dos anos 1990, a Holanda, emconjunto com a Espanha, desenvolveu oprojeto do LPD HLNMS Rotterdam, o pri-meiro da classe e origem da família Enforcer,com um convoo para helicópteros de gran-de porte e um convés-doca para grandesembarcações. O segundo navio da classe,o HLNMS Johan de Witt, foi comissionadoem 2007 e construído para se manter nomar por um período de até 30 dias, poden-do desembarcar um batalhão de fuzileirosnavais. Tem, ainda, capacidade para apoiaresse batalhão em terra durante dez dias,com um pequeno e bem equipado hospitale estoque de água e munição para a tropa.Baseado na família Enforcer, está sendodesenvolvido o novo navio holandês de26 mil toneladas, classe Zuiderkruis (tipoJoint Support Ship – JSS), com previsãode entrega para 2014 e capacidade de apoi-ar navios no mar, realizar transporte estra-tégico e atuar como base naval em opera-ções de apoio a crises internacionais.

A Coreia do Sul está desenvolvendo seusprojetos de navios anfíbios, com convés-doca, convoo preparado para aeronavesSTOVL e rampa tipo ski jump modular (nãoinstalada); transporte de tropa, viaturas blin-dadas e EDCA; e grande capacidade de co-mando e controle, características de um NPM.

A China, além de ter comissionado 15Landing Ship Tank (LST) da classe Yutinge dez Landing Craft Utility (LCU) ou Em-barcações de Desembarque de Carga Geral(EDCG) da classe Yubei nos últimos dezanos, lançou, recentemente, o LPD da clas-se Type 071/Yuzhao, com deslocamento de17 mil toneladas e um convés-doca que seestende por 2/3 do comprimento do navio.

O navio pode transportar e desembarcarquatro EDCA, e seu convoo e hangar degrandes dimensões podem transportar he-licópteros Z-8. Há previsão de aquisiçãode mais seis nos próximos anos. Além dis-so, a China vem desenvolvendo o projetoLHD Type 081, com consideráveismelhorias com relação ao projeto anterior,particularmente um convoo de grandes di-mensões e capacidade antissubmarina.

Outros países, ainda que com projetosmais simples, têm a intenção de operarNPM, como Índia, Rússia, Polônia, Áfricado Sul, Canadá, Turquia, Malásia, Dinamar-ca, Nova Zelândia, Indonésia e Argélia, sejapara ampliar a capacidade de realizar ope-rações anfíbias clássicas, seja para o apoioa missões humanitárias e operações de paz.

SITUAÇÃO DA MARINHA DOBRASIL (MB)

A Estratégia Nacional de Defesa (END)prevê que, “para assegurar sua capacidadede projeção de poder, a Marinha possuirámeios de Fuzileiros Navais, em permanentecondição e pronto emprego”, e que “a exis-tência de tais meios é também essencial paraa defesa das instalações navais e portuári-as, dos arquipélagos e ilhas oceânicas naságuas jurisdicionais brasileiras, para atuarem operações internacionais de paz, emações humanitárias, em qualquer lugar domundo”. [...] “O Corpo de Fuzileiros Navaisconsolidar-se-á como força de caráter expe-dicionário por excelência.”

LPD da classe Type 071/Yuzhao

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de Ar (VDCA), ou uma quantidade equiva-lente de CLAnf;

– capacidade de transporte de até 60viaturas, entre blindados, viaturas pesa-das ou carros de combate; e

– capacidade de transporte de cerca de700 Fuzileiros Navais.

Esses NPM, além de mobiliarem as es-quadras das regiões Sudeste e Norte/Nor-deste (a ser constituída), contribuirão natarefa de Controle de Área Marítima e se-rão o principal meio da MB para: projeção

de poder sobre terra;transporte de tropa deFuzileiros Navais;atendimento às opera-ções humanitárias e àsoperações de paz; etransporte de pessoale material para a regiãoamazônica, em caso decrise ou conflito.

A MB conta, atual-mente, com seus navi-os anfíbios que são dededicação exclusiva,sendo dois Navios de

Desembarque-Doca (NDD) e três Navios deDesembarque de Carros de Combate (NDCC),e que serão substituídos pelos NPM.

CONCLUSÃO

O transporte de pessoal e material paraseu emprego em conflitos em locais distan-

Prevê, ainda, que, no desenvolvimentode seus navios de alto-mar, “a Marinha de-dicará especial atenção ao projeto e à fa-bricação de navios de propósitos múltiplosque possam, também, servir como navios-aeródromos”.

Sendo assim, a necessidade da existên-cia de um Conjugado Anfíbio, com meios deFuzileiros Navais, em permanente condiçãode pronto-emprego, e a atenção especial dis-pensada aos NPM, por estarem registradasna END, caracterizam-se como determina-ções poder político danação à MB.

Para atender a essadeterminação, em rela-ção aos NPM, o Planode Articulação e Equi-pamento da Marinha doBrasil (Paemb) prevê aconstrução de quatrounidades, com a se-guinte configuração:

– grupo aéreo comaté três helicópteros demúltiplo emprego, até oito helicópteros deemprego geral de médio porte e até dois heli-cópteros de emprego geral de pequeno porte;

– capacidade de lançamento e recolhimen-to de Veículos Aéreos Não Tripulados (Vant);

– capacidade de transporte no convés-doca de quatro EDCG, ou oito EDVM, oudois Veículos de Desembarque por Colchão

Os navios de propósitosmúltiplos têm se mostrado

como a melhor solução,apresentando excelente

aceitabilidade, além de altograu de mobilidade

estratégica, independênciae permanência

NDD Ceará

NDCC Mattoso Maia

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tes tem sido, em sua maioria, por via maríti-ma. Para tanto, os navios de propósitos múl-tiplos têm se mostrado como a melhor solu-ção, apresentando excelente aceitabilidade,além de alto grau de mobilidade estratégica,independência e permanência. Como com-ponente do Conjugado Anfíbio, tem a capa-cidade de promover, ainda, autonomia àstropas de Fuzileiros Navais desembarcadas.

Além disso, tendo em vista as diversasoperações de guerra naval e de não guer-ra*, com suas variadas probabilidades deocorrência e com a gradação dos riscos en-volvidos em cada uma, os NPM se apre-

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<FORÇAS ARMADAS> Poder Naval; Navio de propósito múltiplo; Corpo de FuzileirosNavais;

sentam como um meio apto a participar degrande parte dessas operações.

Sendo assim, a MB, ao prever em seuPaemb o desenvolvimento desse tipo de na-vio, prepara-se para estar em condições deenfrentar os desafios contemporâneos e fu-turos, cada vez mais difusos, assimétricos eem escala global, e atuar, em excelentes con-dições, nos conflitos de baixa intensidade –como as Patrulhas Navais e as Operaçõesde Paz, de Busca e Salvamento, Humanitári-as, de Evacuação de Não Combatentes e deGarantia da Lei e da Ordem – e nos de altaintensidade.

* A denominação de não guerra tem sido ultimamente utilizada para se referir à operações em que asForças Armadas, embora fazendo uso do poder militar, são empregadas em tarefas que não envol-vam o combate propriamente dito, exceto em circunstâncias especiais, em que esse poder é usado deforma limitada, como, por exemplo, na garantia dos poderes constitucionais, na garantia da lei e daordem, em ações sob a égide de organismos internacionais, em apoio à política externa do País, ematribuições subsidiárias previstas em Lei, na prevenção e no combate ao terrorismo etc.

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SUMÁRIO

IntroduçãoO NE Custódio de Mello (PWJP)As viagens de GM – propósitosO Custódio de Mello como navio-escola

Os anos 50Os anos 60Os anos 70Os anos 80

Curiosidades das viagens do Custódio de MelloNo estrangeiroNo Brasil

Considerações finaisAnexos:

Quadro com duração e dias de mar das viagensQuadro sinóptico das 28 viagens realizadas

AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLACUSTÓDIO DE MELLO

JAIME FLORENCIO DE ASSIS FILHOCapitão de Mar e Guerra (FN-RM1)

INTRODUÇÃO

Em uma recente visita à cidade deBuenos Aires, tive a oportunidade de

conhecer o buque escuela da Armada ar-gentina – a Fragata Presidente Sarmiento,que foi convertida em navio-museu. O quemais me chamou a atenção no tour a bordo

e que me motivou para a elaboração desteartigo foram os murais expostos, com rique-za de detalhes, de todas as viagens de guar-das-marinha (GM) feitas por aquele navio.

Na qualidade de oficial da Marinha doBrasil (MB), que realizou a sua viagem deGM no Navio-Escola (NE) Custódio deMello, decidi pesquisar e registrar momen-

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

tos ainda resgatáveis de todas as viagensde instrução por ele realizadas enquanto NE,entre as quais tive a felicidade de participarem duas ocasiões: em 1974, como GM; e em1984, já como oficial encarregado da 3a Divi-são do Departamento de Convés.

O NE CUSTÓDIO DE MELLO (PWJP)*

O Custódio de Mello foi o quinto navioda MB no século XX a servir como esco-la1. Seu nome de batismo é uma homena-gem ao Almirante Custódio José de Mello,nascido em Salvador, Bahia, em 1840. Elo-giado por sua bravura na Batalha deHumaitá, durante a Guerra do Paraguai,Custódio de Mello notabilizou-se por dis-cordar politicamente e romper os laços como Presidente Deodoro da Fonseca e, maistarde, com Floriano Peixoto.

Liderou a Revolta da Armada em 1893,aliando-se aos gaúchos, partidários daRevolução Federalista. No governo deFloriano Peixoto exerceu o cargo de minis-tro da Marinha, a partir de 23 de novembrode 1891, assumindo cumulativa e interina-

mente, em algumas ocasiões, os ministéri-os do Exército e do Exterior.

A história do NE Custódio de Mellopode ser dividida em três fases:

Fase I – de 1953 a 1958Construído em 1953 pelo estaleiro

Ishikawajima, no Japão, foi projetado paraser um navio-transporte (ostentando nocasco o indicativo NTr 1). Foi adquiridopelo Brasil em 1954.

Suspendeu de Tóquio, em 23 de dezem-bro de 1954, como navio mercante em via-gem não comercial, tripulado por uma guar-nição japonesa e sob comando militar bra-sileiro, em conformidade com os termos docontrato de entrega ao Brasil.

No trajeto até aqui, fez as seguintes es-calas: São Francisco-Balboa (fundeio) –Cristobal (Panamá) – Saint Nicolas (Aruba)– Belém. Na chegada à capital paraense, oCapitão de Mar e Guerra (CMG) Raymundoda Costa Figueira assumiu o comando donavio, que passou a subordinar-se ao en-tão Serviço de Transportes Marítimos daMarinha.

* N.R.: PWJP é o indicativo internacional do navio.1 Seus predecessores como NE foram: o Benjamin Constant (1893-1926); o Almirante Saldanha (1934-

1954); o Guanabara (nos anos 1940, atuando apenas em águas nacionais); e o Duque de Caxias(1948-1957).

O Navio-TransporteCustódio de Mello

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

Até 1958, o Custódio de Mello realizoudiversas comissões, transportando cargacomercial e pessoal militar. Em 1956, por forçado Aviso Ministerial no 0676, de 21 de janeirode 1956, que criou a Força de Transporte daMarinha (FTM), passou à subordinação des-ta e, no ano seguinte, sob o comando doCMG Arnoldo Toscano, suspendeu do Riode Janeiro com destino a Port Said, no Egito,a fim de transportar o Batalhão Suez, que fezparte do contingente da Força de Paz da Or-ganização das Nações Unidas.

Fase II – de 1958 a 1986 (período comonavio-escola)

Com a edição do Aviso Ministerial 1.466,de 19 de junho de 1958,o navio foi desligadoda Força de Transpor-te e permaneceu nacondição de “naviosolto”. Nesse mesmoano, passou a realizaras viagens de instru-ção de GM, com oindicativo de costado G-15. Entretanto, sófoi classificado como NE em 13 de julho de1961, com base no Aviso Ministerial no

1.407, quando passou a ostentar oindicativo de casco U-262.

Nos intervalos entre as viagens de GM,transportou tropas de Fuzileiros Navais emdiversos exercícios de operações anfíbias.Ressalta a importância da sua participação,em 1965, no deslocamento para o porto deHaina, na República Dominicana, do materi-al do Destacamento Brasileiro da Força Ar-mada Interamericana (Faibras), integrante daForça Interamericana de Paz, sob a égide daOrganização dos Estados Americanos.

Durante os 29 anos em que desempe-nhou o papel de NE, o Custódio de Melloefetuou 28 viagens de GM. Faz-se necessá-rio mencionar que, em 1964, não houve via-gem de GM, devido às mudanças ocorridasna Escola Naval, em face de atualizaçõescurriculares, que redundaram na permanên-cia por mais tempo em Villegagnon das tur-mas que lá ingressaram a partir de 19603.

Fase III – de 1986 a 2002 (retorno à con-dição de navio-transporte)

Após prestar serviços como NE, o Cus-tódio de Mello foi reclassificado, em 25 denovembro de 1986, como navio-transportede tropa de assalto (seu indicativo passou

a ser G-20), conformePortaria no 1.056 doMinistério da Mari-nha, mantendo asmesmas característi-cas estruturais.

Em 8 de outubro de2002, após realizar3.776 dias de mar (DM)

e percorrer 997.834,89 milhas náuticas, dei-xou o serviço ativo da MB, em cerimôniade Mostra de Desarmamento que foi reali-zada no Cais Norte da Base Naval do Riode Janeiro.

AS VIAGENS DE GM – PROPÓSITOS

À semelhança com outras Marinhas deguerra, além de proporcionar aos GM detodos os Corpos (Armada – CA, FuzileirosNavais – CFN e Intendentes da Marinha –CIM) ensinamentos navais complementa-res aos adquiridos na Escola Naval, as via-gens de instrução têm outros propósitos:

2 A Ordem do Dia no 27, do Estado-Maior da Armada, datada de 30 de abril de 1959, fez com que oCustódio de Mello retornasse à subordinação da Força de Transporte da Marinha.

3 As turmas que ingressaram em Villegagnon em 1960 e 1961 cumpriram um currículo de três anos e meio.A partir de 1962, este passou a ser de quatro anos.

Durante os 29 anos em quedesempenhou o papel deNE, o Custódio de Mello

efetuou 28 viagens de GM

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

estreitar os laços de amizade com paísesamigos; ampliar os conhecimentos dos GMsobre as culturas das nações amigas; e,sobretudo, divulgar as coisas do Brasil.

Esse último, normalmente, era alcançadopor meio de exposições, nos países visita-dos, sobre a nossa cultura e tradições e, emalgumas ocasiões, pela distribuição de amos-tras de produtos brasileiros de exportação ematerial de propaganda turística.

O CUSTÓDIO DE MELLO COMONAVIO-ESCOLA

Os anos 50

Com a decisão de aposentar o velho NEDuque de Caxias, em 1957, o alto-coman-do da Marinha elegeu o então Gato4-15,Custódio de Mello, para substituí-lo. Compequenas alterações, o navio foi prepara-do para realizar a sua primeira viagem como

NE, em 1958, levando a bordo os GM-57(turma de Guardas-Marinha de 1957).

Conforme já comentado, o Custódio deMello só passou a usar o indicativo U-26 apartir da sua quarta viagem de instrução,em 1961.

A primeira viagem como NE – 1958No seu terceiro ano de governo, o Presi-

dente Juscelino Kubitschek tinha como pon-to de honra atender a um dos objetivos dapolítica externa brasileira – alcançar ahegemonia na América do Sul. Sem dúvida,isso norteou a elaboração do roteiro da via-gem, que privilegiou a passagem por diver-sos portos da América do Sul, como podeser visto no quadro sinóptico em anexo. Em-bora não oficialmente, comenta-se que setratava da Operação Pan-Americana.

A passagem por Antuérpia, na Bélgica,coincidiu com a realização da Feira Inter-nacional em Bruxelas, onde o stand do Bra-

4 Indicava, à época, à quarta letra do alfabeto, o “G”. Com a criação do alfabeto naval internacional, Gatofoi substituída por Golf.

Custódio de Mello, em sua primeiraviagem como NE – 1958

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

sil apresentou maquetes de sua futura ca-pital, Brasília, e foi visitado por alguns GM.

Depois de escalar em cinco portos eu-ropeus, ao deixar Le Havre o navio cruzouo Oceano Atlântico em direção à entradado Canal do Panamá e,após cruzá-lo, atracouem Balboa, no Panamá,de onde partiu pararealizar o périplo pelaAmérica do Sul.

No contorno docontinente sul-ameri-cano, aportou em vári-as cidades da costa doPacífico e cruzou o Es-treito de Magalhães, fato este que só volta-ria a acontecer em 1974, com os GM-73 daTurma John Taylor.

Depois de aportar em sete portos nacio-nais e de uma passagem por Trindade eFernando de Noronha,chegou ao Rio de Ja-neiro, após 161 dias deviagem.

Roteiro só comportos nacionais –1959

Os GM de 13 dedezembro de 1958eram 106 do CA (Tur-ma Dedo), 40 do CIMe 28 do CFN, estes úl-timos oriundos da Tur-ma Elmo, cujo curso da Escola Naval (EN)tinha um ano a menos de duração.

Em meio às dificuldades financeiras de-correntes da construção de Brasília, a via-gem foi programada, inicialmente, para serrealizada somente com visitas a portos na-cionais. Todavia, quase ao seu final, o ro-teiro foi estendido, incorporando, em uma

segunda fase, passagens em quatro cida-des da Europa e uma da África.

Em Roterdam, uma representação de GMvisitou o estaleiro Verolme, onde se encon-trava em reparo, para incorporação à MB,

o Navio-AeródromoLigeiro (NAeL) MinasGerais. Já em Nápoles,por força das “cochasmarinheiras” (diz-sede um GM parente doadido naval na Itália),o navio ficou atracadopor dez dias, dando atodos a grande chancede conhecer outros lu-

gares próximos.Por ocasião da visita a Roma, uma co-

mitiva do navio teve uma audiência espe-cial com Sua Santidade o Papa João XXIII.

Depois da travessia Dakar-Recife e deescalar, pela terceiravez, em Recife, regres-sou ao Rio de Janeiro.

Os anos 60

A viagem de GM de1960

Eram, ao todo, 184GM, sendo 112 do CAda Turma Elmo, 40 doCIM e 32 do CFN, daturma que entrou umano depois na EN, pe-

los motivos já citados. Foram convidadospara realizar essa viagem um segundo-tenenteda Marinha argentina e guardas-marinha dePortugal, da Nicarágua e da Colômbia.

Nesse ano, o “Custódio Maru”, apelidocarinhosamente atribuído ao navio pelosGM-595, iniciou o seu roteiro pela Europa.Após a escala de um dia em Recife, deman-

5 O batismo foi de autoria do GM Martins do Rego.

Em 1960, o “CustódioMaru”, apelido

carinhosamente atribuídoao navio pelos GM-59,

iniciou o seu roteiro pelaEuropa

A polícia interveio na formado “baixando o sarrafo”.Vários GM passaram o

restante da noite nadelegacia e ainda levaram

de herança, depois dedispensados, alguns

hematomas e até fraturas

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

dou Portsmouth e, na sequência, Hambur-go. Nessa famosa cidade alemã, segundoum membro da turma, ocorreu o inesquecí-vel episódio envolvendo guardas-marinha,no seu mais tradicional bairro, St. Pauli: de-pois de vários incidentes com os “leões dechácaras” das casas noturnas, que não seconformavam com o entra e sai de GM so-mente para “corujar” os shows mundialmenteconhecidos, a polícia interveio na forma do“baixando o sarrafo”. Vários GM passaramo restante da noite na delegacia e ainda le-varam de herança, depois de dispensados,alguns hematomas e até fraturas.

Após três escalas em capitais escandi-navas, seguiu para Antuérpia, onde umarepresentação de GM deslocou-se paraRoterdam, a fim de visitar o NAeL MinasGerais, já em fase final de modernização.

No retorno ao Brasil, depois de passarem cidades do Norte e do Nordeste, o na-vio passou ao largo do Rio de Janeiro emdireção a portos do Sul do país, aumentan-do o banzo6 de muitos GM.

O contorno da África e uma passagempelo Oriente Médio – 1961

Até 1974, ano da viagem de instruçãode minha turma de EN, nenhum roteiro ti-nha sido tão criticado quanto o de 1961. Odaquele ano também o seria, como vere-mos posteriormente. A renúncia do Presi-dente da República, Jânio da Silva Qua-dros, em agosto de 1961, colocou em riscoa realização da viagem dos GM-60.

O roteiro da quarta viagem, independen-temente da renúncia presidencial, foi re-cheado com cidades do continente africa-no (sem incluir a África do Sul) e do Orien-te Médio. Por muito pouco, os GM-60 nãoconheceram a Europa, pois somente ao seufinal ele foi reajustado para contemplar os

portos de Nápoles e Lisboa. A cidade deDar Es Salaan, na Tanzânia, foi canceladado roteiro original.

O périplo da África ofereceu aos GM-60oportunidades vivenciadas por poucas tur-mas, como a visita ao Egito (Alexandria), aoLíbano (Beirute), a Israel (Haifa) e ao Marro-cos (Tanger e Casablanca). Antes, porém,tiveram que pagar com “sangue e muitosuor” as visitas e representações por Gana,Camarões, Quênia e Etiópia, entre outras.

Já no Brasil, depois de Salvador, repe-tindo o feito do ano anterior, bordejou olitoral do Rio de Janeiro em direção ao por-to de Santos, após o que atracou na Cida-de Maravilhosa.

Apresentando o Brasil ao mundo – 1962A viagem nesse ano tinha por propósi-

to principal expor, nos países visitados, arealidade nacional, em termos de principaisindústrias e matérias-primas.

Ela estava com o início previsto para o dia1o de agosto. Contudo, em razão do faleci-mento do então secretário-geral da Marinha(Almirante de Esquadra Carlos Paraguassúde Sá), só se iniciou no dia seguinte.

Ao zarpar do Rio de Janeiro, o navio atra-cou em Vitória (por motivo não recupera-do); inesperadamente e após uma escala emRecife, iniciou a derrota em direção ao VelhoContinente, iniciando as visitas pelo portode Lisboa. Após a passagem por Londres,escalou em três capitais escandinavas, umadelas Helsink, incluída posteriormente à sa-ída do navio do Rio de Janeiro, em substi-tuição a Oslo.

Da Europa, demandando a Nova York cru-zando o Atlântico, e dirigiu para a América doNorte, quando, pela primeira vez, aportou nacosta leste dos Estados Unidos (EUA) e pos-teriormente, no México (Vera Cruz).

6 Termo que no uso naval tem o mesmo significado da época da escravidão: saudade da terra natal e deentes queridos.

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

No trecho Manaus-Salvador, o navio foiautorizado a atracar em Recife para umafaina de abastecimento de óleo. A chegadaao Rio de Janeiro, que estava prevista para24 de dezembro, foi antecipada para o dia23, mediante uma solicitação do comandodo navio, que foi atendida.

1963 – Turma RodinAlém dos 129 GM, foram convidados

dez militares de outras Marinhas. Essa foiuma das viagens em que os GM passaramfora de casa o Natal e o Ano Novo, poisteve início em dezembro de 1963 e termi-nou em abril de 1964.

Seu roteiro estava previsto para sercumprido em 97 dias,com início em agostode 1963. Contudo, umasérie de contratempospara a prontificação donavio resultou no adi-amento até dezembro.Foi necessária uma fa-ina de retubulação dacaldeira no 2 do navio.

No início, o NE des-ceu o litoral brasileiro,visitando a três portos da Região Sul, após oque seguiu para Recife, de onde partiu para ocontinente europeu em 1o de janeiro, diga-se,em pleno inverno no Hemisfério Norte.

O porto de Cabedelo, que estava pre-visto no roteiro, foi retirado para aumentara duração da escala em Recife de modo apossibilitar consertos na Base Naval local.Na “Veneza Brasileira”, a tripulação pas-sou as festas natalinas e de fim de ano.

Já em viagem, o roteiro foi alterado de 45para 90 dias no estrangeiro e passou a incluiras cidades de Beirute, Haifa, Barcelona, LeHavre, Hamburgo, Copenhague e Portsmouth.

Na Europa, depois de sete dias em Ná-poles, dirigiu-se para o Oriente Médio, vi-sitando Beirute e Haifa (à semelhança da

viagem de 1961), marcando a última esta-dia do navio em Israel e a penúltima noLíbano, onde retornou somente em 1972.

Um caso curioso narrado por um GMocorreu quando se navegava no Mar Me-diterrâneo, visto que se emitiu uma estra-nha mensagem no “boca de ferro” do na-vio: “U-26, disco voador por boreste”.

A chegada a Hamburgo também foi pi-toresca, pois, como era inverno na Europa,o Rio Elba estava, em parte, congelado, ten-do que se navegar em meio aos blocos degelo, num dia em que a sensação térmicaatingiu os 27º C negativos.

De Lisboa o navio cruzou o Atlânticorumo a Nova York e defrontou-se com tem-

pestades no mar, essasregistradas para sem-pre nas mentes dos jo-vens GM, pois, paraevitar um furacão, onavio retornou e aca-bou despendendo 11dias nessa travessia,com a aguada somen-te para a higiene bucal.

Enquanto conheci-am a “Big Apple”,

deflagrou-se no Brasil a Revolução de 31de Março. Em 1o de abril, os jornais nova-iorquinos apresentavam a notícia: “Brazilin war”. O comandante fez a tripulaçãoretornar e, após os devidos esclarecimen-tos, liberou o licenciamento.

O NE retornou ao Brasil, escalou emBelém, não aportou em Salvador (uma daspoucas viagens em que não se visitou acapital baiana) e realizou um fundeio nasproximidades de Guarapari (ES), antes dechegar ao Rio de Janeiro.

Uma viagem de pequena duração –1965 – Turma Mendes

Depois de um ano sem realizar viagemcom GM, o Custódio zarpou do Rio de Ja-

Em 1o de abril, os jornaisnova-iorquinos

apresentavam a notícia:“Brazil in war”. Ocomandante fez a

tripulação retornar

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

neiro logo após a visita ao navio do Presi-dente da República, Humberto de AlencarCastelo Branco.

Essa foi a primeira de duas viagens deinstrução cuja duração não excedeu a 90 dias,sendo superior somente à do ano seguinte.A viagem, que se estendeu por 87 dias (dosquais 55,5 foram dias de mar), aportou emquatro cidades brasileiras (Natal, anteriormen-te incluída, foi retirada do roteiro e substituí-da por Fortaleza) e iniciou a sua fase europeiapelo Mar Mediterrâneo, visitando Barcelo-na, Marselha e Nápoles, após o que escalouem Lisboa, seu último porto europeu.

Antes de regressar ao Brasil, fez umapassagem de duas jornadas em Dakar, noSenegal. Além de ter sido uma viagem cur-ta, ainda teve outros contratempos: foi ne-cessário antecipar sua entrada em Belémpara uma limpeza da fornalha da caldeira no

2 e teve sua saída postergada em Las Pal-mas e em Dakar por motivo de contamina-ção da aguada de alimentação. Findou oroteiro visitando Fortaleza e Salvador.

O Custódio visita pela primeira vez oCanadá – 1966

Os 104 GM formandos em janeiro de 1966,que concluíram o curso em 1965 – TurmaCentenário da Batalha Naval do Riachuelo(aspirantes de 1962) –, não tiveram a viagemque todo GM gostaria de ter: de longa dura-ção e escalando em bons portos. Todavia,não se pode afirmar que os locais visitadosnão tenham sido interessantes.

Pela primeira vez o NE brasileiro visitouo Canadá – portos de Halifax e de Montre-al e navegando no Rio São Lourenço. Aprimeira versão do roteiro incluía também a

navegação pelos Grandes Lagos da Améri-ca do Norte, quando seria visitada a cida-de norte-americana de Detroit e a canaden-se Quebec, o que não se concretizou.

Nos EUA foram visitadas as cidades deNova York, Boston, Filadélfia e Miami. Nes-sa última, o navio despediu-se dos EUAdando uma a recepção a bordo, conduzidaao som da Jazz Band do CFN.

Essa foi a mais curta de todas as viagensde GM do NE Custódio de Mello, pois fo-ram apenas 79 dias (dos quais 48,5 dias demar) e ficou restrita a portos nacionais e daAmérica do Norte, além de uma escala noCaribe, em San Juan de Porto Rico.

A Turma Moura7 – 1967A viagem desse ano voltou a ter a bor-

do GM de Marinhas amigas. Nela embarca-ram um representante equatoriano e doisvenezuelanos, bem como os segundos-te-nentes classificados em primeiro lugar noscursos do antigo Centro de Instrução deOficiais da Reserva da Marinha – Ciorm8.

Com 82 GM do CA, 16 do CFN (um dosquais um ex-marinheiro 2a classe ingressono Colégio Naval em 1960), e 17 do CIM, emum total de 115 GM, o navio partiu do Rio deJaneiro em 6 de maio, quando recebeu a bor-do o Presidente da República, MarechalArthur da Costa e Silva, a convite do Minis-tério da Marinha.

No decorrer da viagem, alguns dias apósdeixar Fernando de Noronha, arribou paraMindelo, no Arquipélago de Cabo Verde,para desembarcar um GM com graves pro-blemas de saúde.

Posteriormente, uma avaria noturbogerador motivou o cancelamento da

7 Recentemente a MB incorporou à Armada o Aviso de Pesquisa Aspirante Moura, nome em homenagema integrante dessa turma que faleceu em serviço em junho de 1966.

8 O curso do Ciorm equivalia ao Serviço Militar Obrigatório, sendo realizado nos finais de semana e nasférias na Ilha das Enxadas, até ser transferido para a Escola Naval, quando mudou sua denominaçãopara Escola de Formação de Oficiais da Reserva da Marinha – Eform.

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

visita a Copenhague, para que o navio pu-desse passar em Lisboa e deixar esse equi-pamento para conserto.

Em Le Havre, na França, os GM compa-receram a uma aposição de flores no mo-numento aos mortos da Segunda GuerraMundial. Ao deixar esse porto, o navio es-calou novamente emLisboa, onde ficou porquatro dias para rece-bimento e instalaçãodo turbogerador.

Já em águas territo-riais nacionais, no tre-cho Maceió-Salvador,socorreu o CruzadorLigeiro (CL) Barroso, que se encontravana região com avaria em suas máquinas.

A Viagem de Circum-navegação – 1968– Turma Comandante Didier*

A turma que se graduou em dezembro de1967 realizou a única viagem de circum-nave-gação do Custódio de Mello9. O ro-teiro, apesar do glamour de que sereveste uma viagem desse gênero,teve sua cota de sacrifício.

Embora tenham aportado emAcapulco, Honolulu e Tóquio, ti-veram dois percursos com 12 diasde mar, nas singraduras Honolulu-Tóquio e Colombo (Ceilão, hoje SriLanka)-Lourenço Marques (hojeMaputo, em Moçambique). Alémdisso, o roteiro não privilegiou pas-sagens em portos europeus, tendosido também a viagem que teve omaior índice de dias de mar (67% –foram 90 dias de mar) em relação atoda a viagem (135 dias).

Em 1968, o ano que nunca aca-bou, aconteceram inúmeros fatos

marcantes por todo o planeta, alguns dosquais muito próximos ou vivenciados pe-los GM. Segundo eles, era só o naviodesatracar que algo estranho acontecia,como por exemplo: ao deixarem Long Beach,poucos dias depois Bob Kennedy foi as-sassinado; ao suspenderem do Panamá,

problemas políticosabalaram aquele país;e a presença do fura-cão Lucy destruindocidades um dia após asaída do navio. Os fa-miliares sempre se as-sustavam com a pos-sibilidade de os tripu-

lantes estarem enfrentando situações difí-ceis – política e/ou meteorologicamentefalando –, mas logo respiravam aliviadosao saberem que o Custódio sempre se an-tecipava aos episódios nefastos, o que lhevaleu uma certa fama de “boa sorte”.

9 A viagem de 1968 foi a quinta viagem de circum-navegação realizada por navio da Marinha brasileira.A primeira foi feita pela Corveta Vital de Oliveira, no período de 1879 a 1881.

* N.R.: A RMB do 2o trimestre de 1987, pág. 45-66, publicou artigo detalhado sobre esta viagem.

O Custódio sempre seantecipava aos episódios

nefastos, o que lhe valeu umacerta fama de “boa sorte”

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

Na escala em Tóquio, oficiais, GM e pra-ças do navio participaram da cerimônia doYasukuni Shrine, sendo recebidos e purifi-cados, segundo o ritual xintoísta, peloGrande Sacerdote, o ex-príncipe imperialFujimaro Tsukuba.

Encerrando com chave de ouro a visita àcapital japonesa, GM e oficiais comparece-ram à cerimônia de inauguração do voo Bra-sil-Japão, do qual participou a primeira-damado Brasil, a Sra. Yolanda Costa e Silva.

Nessa viagem, que teve a duração de 135dias, foram visitadas dez cidades estrangeiras.

A Turma Almirante Cox – 1969Essa foi a viagem de ouro dos GM decla-

rados em 13 de dezembro de 1968 (data deassinatura do Ato Institucional no 5 – AI-5),e que contou com a presença do Presidenteda República no dia em que o navio se des-pediu do porto do Rio de Janeiro.

Nessa ocasião, o Ministério da Indús-tria e do Comércio solicitou o embarque dedois representantes e de material para aexposição intitulada “Brasil: o amanhã éhoje”, que foi inaugurada a bordo pelo Pre-sidente Costa e Silva.

O roteiro divulgado não privilegiou cida-des banhadas pelo Mar Mediterrâneo, mastinha escalas nos principais portos da Euro-pa e dos EUA, aí incluídos Estocolmo, NovaYork e Miami. Essa foi a única das viagensdo Custódio em que o navio aportou emPort of Spain, na Ilha de Trinidad.

O fato que mais marcou essa viagem foi,sem dúvida, a primeira alunissagem do ho-mem, ocorrida em 20 de julho de 1969, du-rante a travessia de 12 dias entre Londres eNova York, duramente castigada por ras-tros de furacão.

Os anos 70

Desde 1970, excetuando-se a viagem de1974, em que o NE não cruzou o Oceano

Atlântico, e até a última viagem, em 1986, aAlemanha e a França sempre foram incluí-das nos roteiros. Portugal (exceto em 75 e77, em decorrência da Revolução dos Cra-vos, ocorrida em 1974), Espanha continen-tal (exceto em 1978) e a Itália (exceto em1981) também fizeram parte dos roteiros doNE, com variações das cidades visitadas.

A Turma Grenfell – 1970No dia da partida do NE, esteve presente

o Presidente da República, Emílio GarrastazuMédici, despedindo-se dos GM que realiza-riam a 12a Viagem de Instrução, cuja dura-ção foi de 138 dias, dos quais 69 dias de mar.

Não foram visitados portos da África enem da América do Sul (excetuando-se osnacionais), mas tão somente cidades daAmérica do Norte (Miami e Nova York) eda Europa, aí incluídas as principais do MarMediterrâneo (Barcelona, Marselha e Ná-poles), duas da Escandinávia (Oslo e Co-penhague) e as tradicionais Portsmouth,Hamburgo e Lisboa. Portanto, foi um rotei-ro muito bom, isto sem considerar as esca-las em Las Palmas e em San Juan de PortoRico.

O evento marcante dessa viagem foi ocasamento de um GM. O requerimento so-licitando autorização para que a cerimôniaacontecesse durante a viagem tinha trami-tado sem indeferimento até chegar ao ga-binete do ministro da Marinha, que, sur-preendentemente para os GM, não apro-vou sua realização.

Já estava tudo certo e combinado. Namente dos jovens GM já não se podia darmais volta ao evento. Com o desconheci-mento total da oficialidade, surgiu o planoB, que previa, pelo menos, a participaçãode uma representação dos amigos maischegados ao noivo para comparecer aocasório. A festa ocorreria durante a estadaem Lisboa; entretanto, o noivo deveria ca-sar-se em Vigo, na Espanha.

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

Não foi fácil para os convidados desem-barcarem sem serem vistos, com jaquetão,espada e outros apetrechos necessáriospara a tão sonhada festa. Na volta de Vigo,a fronteira com Portugal estava fechada porordem do Presidente Salazar. Os poucosque se mantinham sóbrios conseguiramdemover os guardas para que todos con-seguissem chegar a Lisboa.

Segundo problema: os presentes de casa-mento do GM, que a partir daquele momento,pelas leis da Espanha, estava casado, tinhamque ser embarcados no NE e à surdina; qual-quer deslize denunciaria a contravenção dosGM. Felizmente deu tudo certo. Até os GMchamados à ordem pelo comandante do navionão titubearam em dizer com firmeza: não hou-ve casamento.

A ajuda foi comple-ta, uma vez que até asesposas dos oficiais,que no porto seguinte,Barcelona, estavamaguardando o navio, aose depararem com a doGM, que se apresentoucomo tal, mocozearamessa informação deseus maridos.

Foi sem dúvida umaviagem emocionante.

A Turma Ricardo de Moraes – 1971A 13a viagem de GM foi coroada de visitas a

cidades belíssimas, contemplando escalas naAmérica do Norte, na Europa e na África. Essafoi a primeira turma de GM do Custódio a aportarna Turquia (Istambul) e na Grécia (Pireus), ten-do também escalado na Escandinávia (Copen-hague) e na exótica Casablanca, no Marrocos.A partir desse ano, a visita à Grécia passou a serquase uma constante.

O aportamento na França deu-se emBrest, na única escala do navio nessa cida-de em sua história como NE.

Nessa viagem, os GM receberam tare-fas de apresentar palestras sobre a Supe-rintendência de Desenvolvimento do Nor-deste (Sudene) enquanto em águas nacio-nais. Em Barcelona, os GM realizaram umaaposição floral no monumento em home-nagem a Cristóvão Colombo, repetindo omesmo ato em Atenas, dessa vez noTúmulo do Soldado Desconhecido, ondedesfilaram também por ocasião da inaugu-ração de uma praça batizada com o nomede Brasil.

A convite do ministro da Marinha,Adalberto de Barros Nunes, embarcarampela primeira vez em viagens de instruçãode GM aspirantes do Exército Brasileiro(EB) e da Aeronáutica, prática essa que se

prolongou até a últimaviagem do Custódiode Mello (em algunsanos, aquelas forçassingulares declinaramdo convite).

A Turma Viscondede Ouro Preto – 1972

No ano do Sesqui-centenário da Indepen-dência do Brasil, o mi-nistro AdalbertoNunes denominou essa

viagem de “Viagem da Fraternidade”, quecontou com a presença de GM de naçõeslatino-americanas e de um GM português,além de três aspirantes convidados do Exér-cito Brasileiro e dois da Aeronáutica.

O roteiro foi variado, contando, em suamaioria, com os tradicionais portos da Euro-pa, três da África e um do Oriente Médio,ocasião em que o NE fez sua última visita aBeirute, no Líbano, por onde já havia passa-do nas viagens de 1961 e 1963, e em Tanger,no Marrocos (escala somente em 1961).

Além dos portos nacionais cotidianos,nessa viagem ocorreu a primeira e a única

Além de outros fatos, ficougravada a tradicional

compra de “goods”protagonizada por um GMque adquiriu, para mostrar

à família, um dispositivocom o ar engarrafado da

Torre Eiffel

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

visita do navio como NE à cidade de Natal,motivada, porém, por uma avaria que o fezficar atracado por três dias.

Um dos pontos altos da viagem foi aaudiência com Sua Santidade o Papa PauloVI, oportunidade em que recebeu das mãosdo comandante do navio uma lembrançado Brasil. Além de outros fatos, ficou gra-vada a tradicional compra de “goods”protagonizada por um GM que adquiriu,para mostrar à família, um dispositivo como ar engarrafado da Torre Eiffel.

A Turma Barão de Jaceguay – 1973A 15a Viagem de Instrução de GM dei-

xou várias lembranças que podem serrememoradas na leitura de um livro10 deautoria de um de seus integrantes.

Ficou como registro inesquecível a pas-sagem do NE por Barcelona, local ondeocorreu o Grande Prêmio de Fórmula-1, nocircuito de Montjuich, no interior de umparque da cidade. Foi uma festa total, combanda do navio e tudo, em que o brasileiroEmerson Fittipaldi chegou em primeiro lu-gar. A torcida brasileira foi ao delírio com avitória do piloto, que no mesmo dia foi re-cebido com honras a bordo do Custódiopara agradecer àquela torcida.

Não faltaram as aposições florais, comoa realizada em frente ao monumento de VitórioEmanuele II, em Civitavecchia. O comandan-te, parte da oficialidade e GM comparece-ram a uma audiência com o Papa Paulo VI.

Na visita a Pireus, na Grécia, ocorreu o fatomais pitoresco de toda a viagem. Nesse porto,os navios atracam, no linguajar jocoso mari-nheiro, “à baiana”, ou seja, de ré. Outro navio,fretado para um seleto time de lindas garotasuniversitárias britânicas, ficou popa com popacom o NE. As provocações insinuantes dasmeninas mexiam com a libido dos GM, até que

um deles, no regresso a bordo, e depois dealgumas cervejas em terra, aceitou a brinca-deira de uma delas, que previa a retirada depeças do vestuário – uma de lá e outra de cá. Ojogo só terminou quando um oficial do naviorecolheu o GM, a essa altura só com as roupasde baixo (a jogadora do outro navio já estavacompletamente despida). Resultado: 30 diasde cadeia para o GM, que perdeu bons portosna continuação da viagem.

Outro legado dessa viagem foi a inaugu-ração do ponto de encontro mais famoso dosEUA, protagonizado por um membro da tri-pulação não muito familiarizado com a línguainglesa. Dizem os GM que foi real quando,em uma recepção a bordo, um oficial combi-nou com outra pessoa um encontro na es-quina da “Don’t Walk” com a “One Way”.

A Turma John Taylor – 1974O roteiro inicial da viagem de GM para

1974 já havia sido divulgado pelo Estado-Maior da Armada e contemplava escalascomo nas viagens passadas recentes – Bra-sil e Europa – quando eclodiu de vez a crisedo petróleo. A negativa de alguns países emgarantir o abastecimento de combustível parao NE jogou por água abaixo o sonho aca-lentado nos quatro anos em Villegagnon.

Uma mudança radical excluiu todos osportos da Europa e reavivou na memória daMB aquela viagem realizada no continentesul-americano pela turma de GM-57 (porém,em sentido contrário), acrescentando trêsportos dos Estados Unidos da América,minimizando, em parte, a exclusão do VelhoContinente. O novo roteiro também foi alte-rado, trocando Buenos Aires por Mar DelPlata e incluindo La Guaira, na Venezuela.

A viagem foi uma mescla de frustrações,tristezas e alegrias. As frustrações ficarampor conta do roteiro, e as tristezas pela tro-

10 O livro, cujo título é Uma turma chamada Barão, tem como autor o CMG (RM1) Pedro Gomes dosSantos Filho.

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ca de comando do navio no primeiro portoestrangeiro, em decorrência de uma doen-ça respiratória que atingiu o comandante etambém um GM. A alegria maior foi devidoao encarregado da turma – Capitão deCorveta Paulo Roberto Calazans –, quesabiamente enturmou-se com os GM e ad-ministrou, de forma amena, os exaltadosânimos dos jovens candidatos a oficiais.

A passagem pelo Chile (Punta Arenas eValparaíso) foi bastante conturbada, devi-do à proximidade da queda de SalvadorAllende, ocorrida em setembro de 1973. Otoque de recolher era à meia-noite, e a re-pressão ainda era forte.

Em 25 de abril de 1974, ocorreu em Por-tugal a Revolução dos Cravos, o que pro-vocou no GM português embarcado o te-mor em ter que regressar imediatamente aoseu país, o que não ocorreu.

Depois de alguns meses de viagem, umaluz no fim do túnel sinalizou uma alteraçãono roteiro para visita a portos europeus,que ficou só na esperança, em decorrênciade problemas até hoje não divulgados.

Ficaram como grandes recordações aspassagens do navio nos canais chilenos,no Estreito de Magalhães e no Canal doPanamá e a visita à cidade de Nova Orleans,no estado norte-americano de Lousiania.

A Turma Esperança – 1975Segundo o roteiro original, a viagem dos

GM-74 tinha tudo para ser ótima. Infeliz-mente, sérias avarias ocorreram durante asingradura Nova York-Southampton, devi-do ao mau tempo provocado pela forma-ção de ciclones na derrota do navio. Comproblemas no condensador e na caldeira enavegando apenas com um eixo, a melhoropção foi retornar aos EUA para, na BaseNaval de Norfolk, sanar as avarias e resta-belecer o curso normal planejado.

Depois de 13 dias de mar, o navio atra-cou na Inglaterra, em Portsmouth, próximo

a uma antiga fragata onde serviu o Almi-rante Nelson. Como consequência dos diasperdidos no retorno do navio aos EUA epara se adequar aos dias de viagem reser-vados aos portos estrangeiros, as cidadesde Amsterdã e Lisboa foram suprimidas.

A passagem por Dem Helder, na Holanda,foi rápida, o suficiente apenas para uma fai-na de recebimento de munição em NieuweHaven, na base naval holandesa. Contudo,os portos contemplados na Europa e nosEUA foram bem aproveitados, principalmen-te os da Escandinávia (Oslo e Copenhague).

1976 – Turma Aspirante Cesar HenriqueO roteiro nesse ano excluiu os EUA, e de-

pois de quatro anos sem contemplar cidadesda África, incluiu Dakar, no Senegal. Os de-mais portos, excetuando-se Tenerife, nas IlhasCanárias (visitado pela primeira vez na histó-ria do NE), pertenciam ao Velho Continente.

Essa foi também a primeira vez em quese aportou, numa mesma viagem, duas ve-zes na França (Marselha e Le Havre). Talfato só voltaria a ocorrer nas duas últimasviagens do Custódio de Mello (1985 e 1986).Estavam presentes na viagem alguns GMda América Latina e dois aspirantes do Exér-cito Brasileiro.

1977 – Turma Aspirante CondeTal como no roteiro anterior, a única ci-

dade do continente africano visitada foiDakar. Depois de três anos sem se aportarem Portugal (provavelmente devido à Re-volução dos Cravos), Lisboa voltou paraficar, definitivamente, no roteiro até a últi-ma viagem do Custódio como NE.

Roterdam, por algum motivo, retornouao roteiro após 17 anos, quando o Custó-dio realizou sua derradeira atracação emterras holandesas. Passou pela segundavez em terras turcas, atracando em Istam-bul. Também contou com a presença de GMestrangeiros e de dois aspirantes do EB.

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1978 – Turma HumaitáO roteiro original da viagem foi alterado

antes do seu início, saindo a escala em Helsinke entrando a capital norueguesa, Oslo.

Após quatro anos, a viagem iniciou des-cendo o litoral brasileiro. Foi a última vez queo NE visitou os portos de Porto Alegre e deSantos (a passagem anterior nessa cidadedeu-se em 1961), de onde demandou o Nor-deste brasileiro. Essa foi a única de todas asviagens de instrução que não incluiu a Re-gião Norte, deixando de atracar em Manaus eBelém. Depois de Fortaleza, o navio seguiuviagem em direção às Ilhas Canárias, atra-cando em Santa Cruz de Tenerife.

A partir de então, visitou nove portos eu-ropeus, aí incluídosValência (pela primeira eúltima vez) e Londres,onde não atracava des-de 1969. Na África este-ve presente em três por-tos e no último deles, emLagos, na Nigéria, o na-vio teve problemas de-vido ao enroscamentoda espia no hélice, o queresultou em mais tempode permanência nessa cidade.

1979 – Turma CanecãoA viagem de GM em 1979 foi brindada

com um roteiro coalhado de excelentes ci-dades. Após quatro anos sem aportar nosEUA, o navio retornou àquele país atracan-do em Filadélfia e em Miami, e pela primeiravez visitou Hamilton, capital das Ilhas Ber-mudas, territórios britânicos ultramarinos lo-calizados no Oceano Atlântico, situados atrês dias de viagem da costa leste dos EUA.

Apesar da curta estada nessas ilhas, avida a bordo tornou-se complicada em ra-zão das rígidas regras de preservação daságuas e do ar locais. Lá as chuvas são amaior fonte de água doce e, portanto, fu-

maça negra (ramonagem) é proibida e pu-nida com multas altíssimas, assim como odespejo de dejetos no mar. Isso resultouem proibição, no segundo dia de porto, douso dos banheiros devido ao acúmulo dostanques reservados para esgotos.

Em consequência da ida aos EUA, a ci-dade de Funchal voltou, como em épocasanteriores, a ser o ponto de ressuprimentodo navio após a longa travessia do Atlân-tico em direção à Europa.

Os anos 80

1980 – Turma Almirante Alexandrinode Alencar

Nesse ano, e até omomento em que dei-xou de atuar como NE,os roteiros das via-gens de instrução re-tiraram definitivamen-te o porto de Le Havre,na França, passando aincluir, pela primeiravez, a cidade deRouen, proporcionan-do à tripulação a opor-

tunidade de navegar um pouco mais no RioSena.

Hamilton voltou a ser visitada e, tempo-rariamente, até 1984, o porto de Miami foisubstituído, na visita aos EUA, pela cida-de de Fort Lauderdale.

Lamentavelmente, os fatos que maismarcaram a viagem foram tristes. Na esta-da em Lisboa, um GM-FN faleceu vítima deacidente de carro quando em companhiade seus pais, que foram visitá-lo. Em Kiel,o imediato do navio foi vitimado por umataque cardíaco, tendo que desembarcarpara tratamento de saúde.

Muito tempo depois de iniciar a viagem,o GM Felix embarcou, pois havia ficado noRio de Janeiro para tratamento das quei-

Apesar da curta estada nasIlhas Bermudas, a vida a

bordo tornou-se complicadaem razão das rígidas regrasde preservação das águas e

do ar locais

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maduras sofridas durante o Curso de Com-bate a Incêndio, que normalmente os GMfaziam antes de iniciar a viagem.

Nesse ano o navio foi comandado peloCMG Jelcias Baptista da Silva Castro.

1981 – Turma SaldanhaO roteiro, depois de cinco anos, voltou

a incluir um porto francês da Cote d’Azur,a cidade de Toulon, até então nunca visita-da pelo NE. Nos anteriores, Marselha era omais cotado.

Outra característica foi a inclusão deCartagena, na Colômbia, única passagemdo navio nesse local em toda a sua históriacomo NE. A Colômbia fora visitada umaúnica vez na viagem de 1958, quando onavio atracou em Buenaventura.

Na travessia Barcelona-Toulon, o naviofoi atingido por fortes ventos, chegando a

rajadas de 37 nós, provocando avarias queforam sanadas em Toulon.

Na escala em Londres e em outras pos-teriores, o Custódio ficou a contrabordodo Cruzador HMS Belfast, atracado bempróximo à famosa Ponte de Londres.

Na saída do porto de Dakar, o navio in-tegrou um Grupo-Tarefa (GT) com a Fraga-ta Liberal, que só foi desfeito no porto deSalvador.

Essa viagem marcou a despedida donavio das cidades de Vera Cruz e NovaOrleans, por onde havia passado em 1974.

A viagem da Copa do Mundo naEspanha – 1982 – Turma Hildo Oliveira

Essa viagem que ficou consagrada pelaocorrência, naquele ano, de dois fatos im-portantes: a Guerra das Malvinas/Falklandse a Copa do Mundo de Futebol na Espanha,

Passando pela Ponte de Londres

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

esta pelo apoio prestado pela tripulaçãodo navio ao time da seleção canarinho.

O roteiro que previa escala em Barcelona,na Espanha, foi alterado, incluindo também acidade de Sevilha, onde o time brasileiro ini-ciou a competição. Ao suspender, após 11dias de atracação, uma avaria no mastaréu deré, na lança do pau de carga e em antenas decomunicações, ocasionada pelo choque daspartes altas do navio com a Ponte AlfonsoXIII (que passa por sobre o rio de acesso aoporto), resultou em uma escala não progra-mada, de emergência, em Cadiz, onde o navioficou atracado por três dias.

Com a passagem do time brasileiro paraas quartas de final, o navio seguiu paraBarcelona, onde já havia aportado, lá fi-cando por mais oito dias. Devido ao pro-longamento da escala em Sevilha, à escalaem Cádiz e à segunda visita a Barcelona,foram retirados da programação inicial osportos de Londres e Amsterdam.

Dentre todas as viagens do Custódio deMello, essa foi a mais longa, com um totalde 178 dias, perfazendo 99,5 dias de mar.

1983 – Turma Almirante Alvaro AlbertoOs GM declarados em 1982 foram agra-

ciados com cidades pouco conhecidas evisitadas por navios da MB.

A parte da viagem que mais contrastoucom as demais foi a passagem por um paísda cortina de ferro – a Romênia. O portoera Constanza, no Mar Negro. Com o paísainda sob regime autoritário, a visita a essacidade não foi das mais auspiciosas, poisos GM e a guarnição só podiam baixar àterra uniformizados.

O temor das autoridades romenas era aocorrência de evasão de cidadãos na condi-ção de clandestinos. Para completar, havia to-que de recolher, obrigando todos a retornarempara bordo muito antes da sua vontade.

Para compensar, embora tenha sidouma grande experiência, o navio já havia

aportado em Istambul e, logo após pas-sar pela Romênia, atracou em Alexandria,22 anos depois, e, na sequência, naTunísia.

O lance mais pitoresco, apesar de terocorrido também em outras viagens de ins-trução, foi a perda do navio por dois GM.Isso aconteceu em Istambul, onde o NEficou fundeado. A última lancha partia às22 horas, mas chegaram atrasados, e natentativa de não perderem o navio fretaramuma lancha local. Contudo, devido à gran-de quantidade de navios fundeados noEstreito de Bósforo, em frente à cidade,navegaram em vão a noite inteira, sem ob-ter sucesso. Como viajar para Constanza,o porto seguinte, era extremamente com-plicado, os GM só puderam reencontrar onavio em Alexandria.

A XXVI Viagem de Instrução – 1984 –Turma Almirante Torres e Alvim

A turma de GM-83 embarcou para reali-zar a sua viagem sabedora de um roteirotradicional, com portos na América do Nor-te e na Europa.

A caminho para os EUA, o navio fezuma atracação não prevista em Barbadospara desembarcar um membro da tripula-ção com problemas graves de saúde.

Desponta nesse roteiro a última passa-gem do NE por Hamilton, que já havia rece-

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bido o NE em 1979 e 1980. No Golfo deBiscaia, o Custódio enfrentou mau tempona travessia Lisboa-Londres, assim comona saída de Hamburgo, ao deixar o Rio Elbapara entrar no Mar do Norte.

Na passagem pela Itália, parte da tripu-lação do navio compareceu à audiência naPraça de São Pedro, no Vaticano, com oPapa João Paulo II.

As lembranças dos GM sobre a sua via-gem são muitas, algumas comuns às anterio-res, contudo registrarei as mais lembradaspor alguns deles: o banho para 180 GM em 30minutos; o safismo dos GM que dormiam notombadilho, livrando-se do calor das cober-tas, mas acordandopela manhã cobertos defuligem da ramonagemnoturna; e a grata lem-brança e homenagemao SG-AR Ademar, deolhos esbugalhados,que motivaram a alcu-nha de “Butuca”, sem-pre solícito aos GM ede bem com a vida.

No retorno ao Bra-sil, o Custódio escalouem Las Palmas, ilhapertencente ao Arquipélago das Canárias,para então se deslocar para Recife, o últi-mo porto.

A penúltima viagem do Custódio deMello – 1985 – Turma Barão de Melgaço

Essa talvez tenha sido a melhor de to-das as viagens do NE, pelas seguintes ra-zões: foi uma das mais longas, com dura-ção de 172 dias, contemplando mais de trêsmeses de estrangeiro; teve passagem pordois portos da França (Toulon e Rouen),em um total de nove dias em solo françês;visitou dois portos dos EUA (FortLauderdale e Baltimore); atracou em 11

portos da Europa, sendo dois naEscandinávia (Helsink e Copenhague); eainda teve um índice baixo de dias de mar(80,5 dias de mar), o que equivale a 47% datotalidade.

O roteiro incluiu Maceió, onde o navionão passava desde 1967.

Na travessia de Pireus para Civitavecchia,cruzou o Estreito de Corinto e, na derrotapara a Base Naval de Toulon, cruzou o Es-treito de Messina.

Atracou em Londres, como em tantasoutras passagens nessa cidade, acontrabordo do HMS Belfast. A caminho

de Helsink, cruzou oCanal de Kiel, ondeatracou na base navalhomônima.

No retorno ao Bra-sil, depois de escalar emPraia, no Arquipélagode Cabo Verde, passouem Mindelo, localizadaem outra de suas ilhas,a de São Vicente, pararestabelecer sua agua-da. O comando do na-vio foi atribuído aoCMG Celso LucierMiranda Leal.

A XXVIII Viagem de Instrução – A últi-ma como navio-escola – Turma Barão daPassagem

Antes de cruzar a barra da Baía deGuanabara, o Custódio de Mello passou a100 jardas do farol de Villegagnon e prestouhonras de passagem ao comandante da Es-cola Naval. O Corpo de Aspirantes, forma-do no tijupá, respondeu o cumprimento.Logo após, ambas as bandas de música to-caram “Adeus minha escola querida”. Inici-ava assim a sua derradeira viagem como NE.

No ano seguinte, dar-se-ia continuida-de às viagens de GM a bordo do Navio-

As lembranças dos GM: obanho para 180 GM em 30minutos; o safismo dos GM

que dormiam notombadilho, livrando-se do

calor das cobertas, masacordando pela manhãcobertos de fuligem daramonagem noturna

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

Escola Brasil, que se encontrava ainda emfase final de operacionalização.

O roteiro da fase de estrangeiro da via-gem foi, à exceção do porto de Mindelo, noArquipélago de Cabo Verde, contempladocom portos: no Canadá (Halifax), onde onavio só havia aportado uma única vez, em1966; nos EUA (Fort Lauderdale e Baltimore);e na Europa (em um total de 12).

A despedida foi honrosa para o intrépi-do navio. Com duas passagens na França– Rouen e Toulon – e duas escalas naEscandinávia – Oslo e Estocolmo –, foiindubitavelmente um excelente roteiro.

No caminho para Fort Lauderdale, atra-vessou o Canal de Mona Passage, entrePorto Rico e a República Dominicana. Naderrota para Baltimore, o Cústódio deMello entrou pela primeira vez na Baía deCheesapeake, mas pagou esse pioneirismocom sacrifício quando teve que enfrentaruma violenta tempestade, com ventos develocidade superior a 60 nós.

Diferentemente das viagens anteriores,em que aportou nos EUA, o navio, nesseano, realizou a travessia do Atlântico Nor-te sem visitar a cidade de Funchal, na Ilhada Madeira, despendendo nove dias demar na derrota Halifax-Rouen. Enfrentou,nessa travessia, ventos de força 7 na esca-la Beaufort, todavia sem afetar a sua nave-gação. Nessa singradura, teve que se apro-ximar do litoral inglês para que um helicóp-tero da Royal Navy pudesse resgatar ummilitar em estado grave de saúde.

Em águas do Mediterrâneo, cruzou osestreitos de Bonifácio e de Messina (estepor duas vezes) e o Canal de Corinto.

No retorno ao Brasil, escalou em SantaCruz de Tenerife e em Mindelo.

Às 5h57 do fuso Oscar de 26 de novem-bro de 1986, foi içada a flâmula de Fim deComissão, dando por encerrada a XXVIIIViagem de Instrução de GM, a última doNE Custódio de Mello.

Essa foi a segunda mais longa das via-gens do NE, contabilizando 173 dias e per-fazendo um total de 89,5 dias de mar, cor-respondente a aproximadamente 55% des-se total.

CURIOSIDADES DAS VIAGENS DOCUSTÓDIO DE MELLO

As viagens marítimas realizadas peloNE, permitindo a visita a diversas cidadesem quase todos os continentes, evocamnão somente passagens pitorescas por aci-dentes geográficos e cidades importantesde nosso planeta, mas também o relaciona-mento com fatos ocorridos e inter-relacio-nados a cenários de guerras e batalhasnavais, principalmente os localizados noestrangeiro.

Entre os vários lugares por que passouo Custódio de Mello, selecionei alguns emque poucos GM tiveram a oportunidade deestar, dada a singularidade auferida a de-terminadas viagens de instrução, a saber:

No estrangeiro

– Canal do Panamá – uma experiênciamarcante que apenas três turmas presenci-aram – viagens de 1958, 1968 e 1974.

– Estreito de Magalhães – turmas dasviagens de GM de 1958 e 1974, quando davisita à cidade mais austral do Chile, PuntaArenas.

– Canal de Suez – transposto apenaspela turma que realizou o périplo africano,em 1961.

– Estreito de Dardanelos – turmas dasviagens de 1971, 1977 e 1983, quando davisita ao porto de Istambul.

– Constanza – A turma de 1983 foi a úni-ca que visitou a Romênia.

– Cabo da Boa Esperança – turma de1961 e, posteriormente, a de 1968, queaportou em Capetown.

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

11 Esse quantitativo superior ao número de viagens realizadas deve-se ao fato, já comentado, da atracaçãodo navio em um porto, por mais de uma vez em uma mesma viagem de instrução.

12 Os dados de dias de mar foram obtidos nos termos de viagem do livro de estabelecimento do Navio-Escola Custódio de Mello.

– Canal de Kiel (98 km de extensão) eEstreito de Corinto (6,3 km de extensão) –este ligando o Golfo de Corinto ao MarEgeu– várias foram as turmas que conhe-ceram essas obras da capacidade humanade superar dificuldades: a primeira na pas-sagem do Mar Báltico para o Rio Elba (ouvice-versa) e a segunda no retorno dePireus em direção à Itália, evitando o con-torno pela Península de Corinto.

– Helsink – cidade que recebeu o NE emduas ocasiões: 1962 e 1985.

– Acapulco – a viagem de circum-nave-gação de 1968 foi aúnica a aportar nanominada “RivieraMexicana” e uma dasmais famosas cidadesdo México.

– Alexandria – emduas oportunidades oNE visitou o Egito:1961 e 1983.

– Honolulu, noHavaí, e Tóquio – so-mente a viagem decircum-navegação de1968.

– Haifa – foi visita-da em 1961 e em 1963.

– Canadá – foi umpaís que poucas vezes entrou nos rotei-ros: em 1966 e 1986.

– Nova Orleans e navegação no RioMississipi – uma das mais interessantescidades dos EUA, só foi visitada pelas tur-mas que realizaram a viagem em 1974 e 1981.

As demais regiões e cidades do planetapor onde passou o NE Custódio de Mellonão serão mencionadas devido a sua gran-de quantidade, mas deixaremos por conta

da curiosidade dos leitores em descobri-las, à luz do quadro sinóptico das 28 via-gens realizadas pelo navio e as respecti-vas cidades visitadas.

Os países que mais vezes receberam oNE foram a Espanha (38 vezes) e Portugal(35 vezes).

No Brasil

Em relação às curiosidades dos portosnacionais, é possível ver, por meio do qua-dro sinóptico, que os portos menos visita-

dos foram: Santana,no Amapá, com duasvisitas; e Santos,Maceió, Paranaguá eVitória, todos com trêsatracações.

Recife foi a cidademais visitada11 (32 ve-zes). Apenas a viagemde 1974 não teve pas-sagem pela “VenezaBrasileira”. Seguem-seas de Belém e Salvador,respectivamente com29 e 25 passagens.

A Ilha da Trindade,apesar de caracteriza-da apenas como local

de fundeio, foi alvo de visitação para algunsGM, que desembarcaram para uma visita.

Para os velhos marinheiros, é sempre in-teressante matar a curiosidade de ver quaisas turmas que mais tempo estiveram no mardurante as suas viagens de instrução, o quepode ser visto no quadro sinótico das via-gens, com os respectivos dias de mar12.

A viagem de maior duração ocorreu em1982, e a que percentualmente mais tempo

Os países que mais vezesreceberam o NE Custódio deMello foram a Espanha (38vezes) e Portugal (35 vezes).Dos portos nacionais, Recifefoi a cidade mais visitada (32

vezes), seguem-se as deBelém e Salvador,

respectivamente com 29 e 25passagens

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

permaneceu no mar foi a de 1968, com 90dias de mar em 135 dias de duração.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como resultado da análise dos roteirose dos demais dados relativos às 28 viagensde GM que o NE Custódio de Mello reali-zou, destaco cinco, pela singularidade emalgumas questões como roteiro e impor-tância turística das escalas (boa ou ruim)atribuída pelos GM, a despeito da impor-tância política de que se revestiram todaselas. São elas: viagens de 1958, 1961, 1968,1974 e 1985.

As de 1958 e 1974 foram as únicas querealizaram um périplo pelo continente sul-americano, com ligeira vantagem para a pri-meira, pela oportunidade de escalar em cin-co excelentes cidades da Europa, enquan-to a de 1974 teve que se contentar com trêsportos dos EUA.

A viagem de 1961 – o périplo africano –foi a que reuniu lugares com baixo potenci-al turístico, além de emplacar duas grandespernadas com 12 dias de mar. Em compen-sação, fez escala em Egito, Líbano e Israel.

A de 1968, conforme já comentado, foiuma viagem de circum-navegação e reves-tiu-se de um elevado espírito de aventurana passagem por portos africanos e asiáti-cos, sem, contudo, contemplar uma únicapassagem pela Europa.

A penúltima das viagens, a de 1985, foi ,em quase todos os aspectos, a melhor dasviagens de GM realizadas pelo Custódiode Mello.

Acrescente-se ainda que apenas trêsturmas não visitaram o Velho Continente:as que foram declaradas GM em 1965, 1967e 1973.

Findamos este artigo com a esperançade que, posteriormente, outros do gêneropossam surgir.

Nossa intenção foi resgatar para os lei-tores da Revista Marítima Brasileira umbreve histórico dos feitos desse imponen-te navio, o que só poderia ser obtido, par-cialmente, por meio da leitura do livro deestabelecimento do NE Custódio de Mello,além de proporcionar aos oficiais que reali-zaram suas viagens de GM neste navio mo-mentos de gratas recordações.

Viva a Marinha!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BITTENCOURT, Armando. “Primeira viagem de circunavegação da Marinha brasileira”. Revista doClube Naval no 324. Out/Nov/Dez 2002.

BRASIL, Livro de Estabelecimento do Navio-Transporte Custódio de Mello. Rio de Janeiro._______, Marinha do Brasil, Serviço de Relações Públicas da Marinha – Nomar n. XXX, 19XX.

n.141 e 175, 1968; n.269 e 281, 1971; 293, 1972; n. 329 e 330, 1973FERREIRA, Gil Cordeiro Dias. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 01 fev. 2011.LIMA, Celso Graça. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 14 ago. 2010.MARTINS, Cláudio José. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 17 mar. 2010.POPPIUS, Eduardo Bertil. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 8 out. 2010.QUADROS, Mario Augusto. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 24 set. 2010.SANTOS, Ubiratan Barbosa Ribeiro. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 14 jan. 2011.SILVA, Sidairton. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 6 ago. 2010.SOUZA FILHO, Carlos Alberto. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 25 ago. 2010.VAZ, Renato Frederico Corrêa. Entrevista concedida ao autor. Rio de Janeiro. 23 jul. 2010.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<FORÇA ARMADA> Marinha do Brasil; Navio-escola; Viagens de instrução;

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

Quadro sinóptico das 28 viagens realizadas

AF – África; AS – América do Sul; CA – América Central; EU – Europa; NA – América do Norte

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AS VIAGENS DE INSTRUÇÃO DO NAVIO-ESCOLA CUSTÓDIO DE MELLO

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SUMÁRIO

Os princípios da estratégia navalConcentração de forçasLinhas de comunicaçãoBases, possessões e colônias

A obtenção do comando do marConclusãoAgradecimentos

HERBERT RICHMOND E O COMANDO DO MAR (IV)

O almirante inglês Sir Herbert WilliamRichmond foi um inconformado com os

caminhos de sua amada Marinha Real britâ-nica no primeiro quartel do século XX. Comoseus amigos Sir Julian Corbett e Sir BasilLiddell Hart, ele formulou uma teoria estraté-gica que incluía concepções de Mahan e deoutros pensadores e ideias próprias, em umarcabouço teórico interessante.

O que se pretende discutir nesse artigoé a fundamentação teórica de Richmond,

seus princípios sobre estratégia naval e deque maneira podia ser obtido o comandodo mar.

OS PRINCÍPIOS DA ESTRATÉGIANAVAL

Sir Herbert Richmond afirmou que o pa-pel da Marinha de Guerra era obter o co-mando do mar. Para ele, o significado docomando do mar era que aquele Estado que

FRANCISCO EDUARDO ALVES DE ALMEIDA*Capitão de Mar e Guerra (RM1)

* Foi diretor do Serviço de Documentação da Marinha no período de 2005 a 2007. É graduado emHistória pela UFRJ (2007) e mestre em História Comparada (2009). Atualmente, é Doutorando emHistória pela UFRJ, instrutor na Escola de Guerra Naval (EGN) e Membro do Centro de Estudos dePolítica e Estratégia da EGN.

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o possuísse poderia utilizar o mar como umarota para o seu comércio e seus exércitos, epoderia impedir o inimigo de fazê-lo. O co-mando do mar não era apenas obtido como uso de navios de superfície. Segundoele, não se poderia afirmar, durante a Gran-de Guerra, que o Reino Unido tinha obtidoo comando do mar pleno, uma vez que ossubmarinos alemães operavam eficiente-mente contra o tráfego marítimo, prejudi-cando seriamente o esforço de guerra alia-do1. Para que o comando do mar fosse real-mente obtido, era ne-cessário o domíniodos três elementos,sobre a superfície, soba superfície e no arsobrejacente ao mar, ea capacidade de uti-lizá-lo em seu própriobenefício. O comandodo mar, para ele, seriaútil somente para o fima que se propusesse2.Um exemplo citado porRichmond a respeitodesse efeito foi o fatode a Alemanha, comsua postura defensiva na Grande Guerra,evitar o combate de superfície com a Mari-nha Real britânica, impedindo as vanta-gens inerentes ao comando do mar plenodo Reino Unido, preferindo atacar as linhasde comunicação dos britânicos com sub-marinos. Disse ele o seguinte:

Nós temos agora [durante a GrandeGuerra] um total comando do mar, nãoconsiderando as águas sob disputa comsubmarinos [inimigos], bem mais com-

pleto do que possuímos alguma vez emqualquer guerra naval do passado, eapesar disso fazemos pouco progressoe tiramos cada vez menos vantagensdisso3.

Sua percepção de comando do mar erasimilar à percepção de Mahan de que ocontrole do mar seria obtido pela obtençãoda superioridade marítima e do controle daslinhas de comunicação, impedindo que oinimigo fizesse o mesmo; no entanto, sua

ênfase estava na utili-zação e não necessa-riamente no seu con-trole absoluto. O pro-pósito principal eraimpedir o comérciomarítimo e o transpor-te dos exércitos inimi-gos pelas faixas demar em disputa.

De que maneiraRichmond imaginava aobtenção do comandodo mar? Ele certamen-te não desprezava abatalha decisiva como

instrumento para obter esse comando, noentanto considerava que ela não era a úni-ca forma possível de se obter esse coman-do. A tarefa fundamental de uma Marinhade guerra era proteger as linhas de comu-nicação e não procurar a batalha a qual-quer custo. A centralidade da batalha, tãocara a Mahan4, para ele não tinha nenhumsentido. Isso não significava dizer que aforça naval inimiga deveria ser ignorada.Isso seria um absurdo, e Richmond bem osabia. Dizia, inclusive, que a batalha deci-

1 RICHMOND, Herbert. The Naval Role in modern warfare. Oxford: Clarendon Press, 1940, p. 5.2 MARDER, Arthur. The Portrait of an admiral. Cambridge: Harvard University Press, 1952, p. 187.3 Ibidem, p. 142.4 TILL, Geoffrey. Maritime Strategy and the nuclear age. New York: St Martin Press, 1982, p. 100.

Para que o comando domar fosse realmente

obtido, era necessário odomínio dos três elementos,

sobre a superfície, sob asuperfície e no ar

sobrejacente ao mar, e acapacidade de utilizá-lo em

seu próprio benefício

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siva era um passo preliminar essencial paraa obtenção do controle do mar5. A vitóriana batalha, por si só, não conferia automa-ticamente esse controle, no entanto possi-bilitava uma grande chance para esse fim.Considerava também que a Marinha supe-rior não teria condições de forçar umengajamento a um adversário inferior, seele assim não desejasse.6 Alegava que amelhor maneira de se contrapor a uma for-ça naval inimiga era impedir a sua concen-tração em alguma base e, assim, anular suaação ofensiva. Não haveria necessidade dedestruí-la7. O posicionamento de forçasnavais em pontos-chave e a redução daschances de sortidas, por meio da conquis-ta de suas bases de apoio, teriam um efeitosimilar à destruição pura e simples do ini-migo em combate.

Para ele, faltou ao Almirantado britâni-co impedir qualquer ação ofensiva da Ma-rinha alemã e a iniciativa de se apoderar desuas bases. A ênfase exagerada da Mari-nha britânica na batalha decisiva durante aGrande Guerra foi um erro básico, segundoele. Os oficiais que se concentravam nabusca dessa batalha eram simplesmente“lutadores estúpidos”, conforme suas pró-prias palavras8. A tarefa dos oficiais eraexecutar planos estratégicos, e a batalhadecisiva seria um meio de se obter o co-mando e não um fim em si. Além disso, afir-

mava que a fixação estratégica na busca dabatalha decisiva, como ocorreu na GrandeGuerra de 1914, carreou recursos funda-mentais que melhor seriam empregados nadefesa do comércio e na busca de opera-ções navais afastadas do território inglês.9

Richmond contrastava Mahan ao afir-mar que o objeto principal da guerra maríti-ma era neutralizar a força naval inimiga enão necessariamente destruir essa força.10

Entretanto, reconhecia que Mahan tinharazão em alguns princípios fundamentaisligados ao comando do mar. Dentre essesavultava o princípio da concentração.

Concentração de forças

Para Richmond, existiam três princípi-os de guerra fundamentais derivados daexperiência de guerra e da análise de seusresultados. O primeiro era o princípio doobjetivo11 e a decisão de concentrar to-dos os seus esforços nesse objetivo. Osegundo era obter a superioridade no lo-cal decisivo (por meio da concentraçãolocal) e no tempo determinado e, assim,dispor e manobrar com superioridade,enquanto durar a ação, e por fim o tercei-ro princípio, proteger as bases e comuni-cações com economia de meios12, exer-cendo sempre a iniciativa para colocar oadversário na defensiva.

5 RICHMOND, Herbert. National Policy and Naval Strength. London: Longmans and Green, 1928, p. 124.6 BAUGH, Daniel. “Richmond and the objects of sea power.” In: HATTENDORFF, John; GOLDRICK,

James. Mahan is not enough. The proceedings on the works of Sir Julian Corbett and Sir HerbertRichmond. Newport: Naval War College Press, 1993, p. 30.

7 Mc LENNAN, Bruce. The historical lessons and intellectual rigour of Admiral Sir Herbert WilliamRichmond. Australian Defense Force Journal, no 168, 2005, p. 23.

8 RICHMOND, Herbert. The Navy in the war of 1739-1748. v. 1. Cambridge: Cambridge UniversityPress, 1920, p. Xii.

9 TILL, Geoffrey. The Development of British Naval Thinking. London: Routledge, 2006, p. 115.10 RICHMOND, Herbert. Naval Warfare. London: Ernest Benn, 1927, p. 25.11 O princípio do objetivo diz respeito aos efeitos desejados que se espera obter. A seleção e a clara definição

dos efeitos desejados são essenciais para a condução da guerra e para a realização das operações.12 O princípio da economia de meios abrange o uso econômico das forças, com o emprego judicioso de

meios para a obtenção do esforço máximo em locais e ocasiões decisivas.

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Como Mahan, Richmond considerava aconcentração, ligada ao objetivo, como o prin-cipal princípio da guerra no mar.13 Sua inter-pretação desse princípio era idêntica à visãode Mahan. Dizia que a concentração de es-forços era a condição primordial de sucessonão só na guerra naval, mas também em qual-quer atividade humana. O principal objetodas forças navais era, assim, atingir a con-centração das forças navais inimigas, sendoessa concentração exercida sobre qualquertipo de navios inimigos14. Para que essa con-centração fosse efetiva era necessária a dis-ponibilidade de bases. Entretanto, reconhe-cia que a batalha decisiva não deveria serperseguida por si só.

Richmond reconhecia o valor da con-centração naval britânica no Canal da Man-cha, não apenas para a proteção do comér-cio nessa área e contra a invasão provindado mar, mas principalmente para dispor deuma força naval poderosa e concentradapara se defrontar com um adversário quequisesse o forçamento de uma batalha de-cisiva.15 Ele se referia às guerras contra osholandeses e franceses entre os séculosXVII e XIX.

Um dos exemplos clássicos de Richmondda deficiência da Marinha Real britânica emconcentrar por condicionantes estratégicosfoi o ocorrido na Guerra de Independênciados EUA. Disse ele que a primeira fase daguerra terminou com a rendição de Saratoga,em 1777. Imediatamente a França preparou-se para lançar na balança o seu recentemen-te constituído poder marítimo em apoio aoscolonos americanos. Tornou-se impossívelpara a Marinha Real britânica ser superiorno Canal da Mancha perante a força france-sa localizada em Brest e ser superior no

Mediterrâneo contra os franceses baseadosem Toulon e, o mais importante, impedir queas duas forças se juntassem para apoiar osrebelados na América. Sendo obrigada a sedispersar, ela não foi superior em nenhumlugar; assim, não pôde impedir o desloca-mento de uma forte divisão naval francesaque suspendeu de Toulon em junho de 1778em direção à América do Norte. A falha eminterceptar essa força provocou uma con-centração naval francesa nas costas ameri-canas, tornando impotente a esquadra bri-tânica naquelas paragens16.

Dessa forma, Richmond concordava ple-namente com Mahan a respeito da impor-tância que o princípio da concentração ti-nha na guerra, tanto no campo tático comono estratégico.

Linhas de comunicação

Richmond percebia, da mesma maneiraque Mahan, a importância das linhas de co-municação para os contendores. Dizia queuma Marinha de guerra não poderia manterabastecido um exército operando afastadodo território nacional se não garantisse aslinhas de comunicação ligando portos dopróprio país. A população deveria sermantida com bens e abastecimentos, maté-rias-primas deveriam ser exportadas e im-portadas e, assim, esses recursos poderiamfinanciar o esforço de guerra. Dessa forma,a função principal era a proteção dessas li-nhas de comunicação, e qualquer ameaçaque as transformasse em vias insegurasafastaria os exércitos em combate da vitória,assim como traria carestia, que, em médiaduração, poderia provocar a rendição de umEstado diante de um adversário aguerrido.

13 RICHMOND, Herbert. National Policy and Naval Strength, op.cit., p. 233.14 RICHMOND, Herbert. Naval Warfare. London: Ernest Benn, 1927, p. 53.15 SCHURMAN, Donald. The education of a Navy. London: Cassell and Co Ltd, 1965, p. 142.16 RICHMOND, Herbert. Statesmen and Sea power. London: Oxford, 1946, p. 147 a 149.

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Logo, o principal propósito do poder maríti-mo era a proteção do comércio que transita-va nas linhas de comunicação.

Richmond considerava que as linhas decomunicação marítimas eram fundamental-mente diferentes das linhas de comunica-ção terrestres, pois as últimas ligavam ba-sicamente exércitos, enquanto no mar aslinhas podiam até ser disputadas peloscontendores, fato improvável com frentesterrestres de contato entre exércitos anta-gônicos. Citava o caso das linhas de co-municação do Reino Unido e da Alemanhadurante a Grande Guerra de 1914 que pas-savam pelas mesmas áreas no Mar do Nor-te e no Canal da Mancha. O Reino Unido,ao obter o comando do mar nessas áreas,tinha protegido as suas linhas, ao mesmotempo em que ameaçava as linhas alemãs17.

A melhor forma de proteger essas linhasde comunicação contra corsários de super-fície era posicionar cruzadores permanen-temente estacionados em bases, colôniase possessões britânicas, de modo a se con-trapor a esses inimigos. Assim, tornava-sefundamental a aquisição de colônias paralá serem estabelecidas bases, daí serem,para ele, elementos do poder marítimo.

Bases, possessões e colônias

As bases, possessões e colônias cons-tituíam para Richmond elementos fundamen-tais para o poder marítimo. A sua utilizaçãodetinha relevância política e estratégica.

Como discutido, as bases deveriam apoi-ar a Marinha com facilidades de reparos, ma-nutenção, descanso e abastecimentos, noentanto elas não atuavam apenas como pon-tos de apoio logístico. Existiam necessida-

des estratégicas associadas às bases. Elaspoderiam servir também como trampolins paraataques da força naval aliada, principalmentese estivessem localizadas em linhas interio-res18, que Richmond considerava fundamen-tais para a obtenção da vitória. Embora nãoespecificasse diretamente, considerava comoprimordial a posse de bases que impedissema união de esquadras inimigas por sua posi-ção estratégica privilegiada, como, por exem-plo, Gibraltar, em uma clara concordância como conceito de posição central.

Muitas vezes as bases logísticas nãoeram as mais apropriadas para servirem comobases estratégico-operacionais. Citava ocaso de algumas bases inglesas nos sécu-los XVII e XVIII. Não era de Portsmouth,uma base logística, que a Marinha Real in-glesa vigiava a esquadra francesa de Brest,mas a partir de Torbay ou Davenport, basesoperacionais. Da mesma forma, não era deChatham, uma base logística, que os holan-deses eram vigiados, mas sim de Yarmouthou Gunfleet, bases operacionais.

Outro fator que deveria ser observadoera a segurança que a base proporcionariapara os navios nela localizados. Richmondcitava o caso da base de Scapa Flow, naEscócia, onde se localizava a Home Fleet19

britânica. Existiam dificuldades de navega-ção na entrada da base, além da instalaçãode redes antitorpédicas para impedir a en-trada de submarinos, no entanto Richmondainda levantava dúvidas a respeito de suasegurança20. Quase como um alerta,Richmond clamou pela insegurança deScapa Flow. Dois anos depois desse aler-ta, em 1939, um submarino alemão, o U-47,comandado por um ousado oficial, não sóadentrou Scapa Flow, como afundou o

17 RICHMOND, Herbert. National Policy and Naval Strength, op. cit., p. 89.18 RICHMOND, Herbert. The Navy. London: W.Hodge & Co, 1937, p. 71.19 A Home Fleet era a principal esquadra britânica localizada no Reino Unido.20 Ibidem, p. 72.

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encouraçado inglês HMS Royal Oak, emuma ação destemida que demonstrou a fra-gilidade daquela base naval.21

Dessa maneira, seria importante paraRichmond que a base ou posição estratégicafosse dotada de uma proteção local, com-posta de campos de minas marítimas, artilha-ria de costa e redes de proteção, além de es-tar próxima o bastante das linhas de comuni-cação do inimigo, de modo a perceber a mo-vimentação adversária antecipadamente.

Richmond preocupava-se com a popula-ção civil que habitava próximo a uma basenaval, pela possibilidade de ser atingida pelobombardeio efetuado pelo inimigo, tanto poraviação como por navios, como ocorreu nasduas grandes guerras do século XX, em es-pecial na Segunda. Considerava esses atosde ataque a civis como inumanos, entretan-to achava que a retaliação seria validada,repetindo Lorde Nelson, que dizia que, casoos espanhóis destruíssem a cidade deGibraltar, “seria permitido que Cadiz e Málagae muitas outras cidades espanholas fossemdestruídas também”22.

Outra consideração estratégica relativaà posição das bases levantada porRichmond referia-se a sua proximidade decampos de aviação inimiga. Malta, por exem-plo, tornou-se vulnerável à aviação italia-na logo no início da Segunda Guerra Mun-dial, assim os navios não deveriam estar lálocalizados. A solução seria transferi-lospara Alexandria, perdendo-se, assim, a van-tagem de uma posição central de Malta.23

Como bases importantes no Índico,Richmond apontou que Trincomali, noCeilão, era relevante, pois de lá se poderiapatrulhar tanto a leste como a oeste noÍndico, em uma excelente posição central.Na China, Hong Kong assumiu uma posi-ção ímpar no século XIX, no entanto per-deu importância no século seguinte, pornão poder abrigar fisicamente uma forçanaval britânica de maiores dimensões. Poroutro lado, Cingapura localizava-se em umaposição fundamental, de modo a protegeros interesses do Reino Unido, tanto oÍndico, a oeste, como a Austrália, a leste,segundo Richmond. O Japão, antes da Se-gunda Guerra Mundial, considerou, em di-versas discussões multilaterais, que a basebritânica de Cingapura era uma ameaça asua segurança. Richmond contra-argumen-tava alegando que Cingapura não poderiaser considerada como uma ameaça, poisdistava 2.500 milhas náuticas do Japão, istoé, a mesma distância entre Gibraltar e osDardanelos24. Não imaginava que os pla-nos de expansão nipônicos incluíam umainvestida no Índico. Logo após o ataque aPearl Harbor, os japoneses tomaram a basede Cingapura, afundando previamente oHMS Prince of Wales e o Repulse.25 Osjaponeses continuaram acreditando naameaça que Cingapura significava para aexpansão nipônica na Ásia.

Da mesma maneira que Mahan,Richmond considerava fundamental a pos-se de bases, possessões e colônias para o

21 Essa ação ocorreu no dia 13 de outubro de 1939. O comandante do submarino era o Capitão-TenenteGünther Prien. O HMS Royal Oak deslocava 27.000 toneladas e tinha sido reformado em 1934.Nesse torpedeamento morreram 800 marinheiros e oficiais. Por ocasião da primeira explosão, amaioria da tripulação inglesa imaginou que a detonação ocorreu devido a um acidente e não emtorpedeamento, um erro fatal.

22 RICHMOND, Herbert. The Navy, op. cit., p. 80.23 Ibidem, p. 73.24 Ibidem, p. 76.25 Os dois afundamentos ocorreram no dia 10 de dezembro de 1941. Ambos foram atingidos por

torpedos e bombas lançadas por aviões japoneses, indicando a vulnerabilidade de navios sem prote-ção aérea.

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desenvolvimento de poder marítimo. Des-sa maneira, quais seriam os fundamentospara a obtenção do comando do mar, se-gundo Richmond?

A OBTENÇÃO DO COMANDO DOMAR

Como discutido, para que fosse obtido ocomando do mar Richmond não descartava abatalha decisiva, embora não a destacassecomo a única solução possível. Em situaçõesfavoráveis, a batalha deveria ser perseguida;para tal era importante balancear o segundoelemento do poder marítimo, as forças decombate, que se constituíam para ele o as-pecto “executivo” do poder marítimo.

O propósito principal quando duas for-ças se defrontavampara o combate decisi-vo era destruir uma aoutra. Assim, tornava-se natural que a massade meios componentesda linha de batalha fos-se composta dos maispoderosos navios dis-poníveis. Compunham essa massa osencouraçados. Esse grupo de navios irianecessitar de outra força de apoio, chamadade força esclarecedora, com navios que pu-dessem patrulhar a vante da linha de bata-lha, obtendo informações antecipadas emantendo as comunicações da esquadra,além de proteger as linhas de comunicaçãoamigas, conforme discutido anteriormente.26

Normalmente os navios inimigos desig-nados para atacar as linhas de comunicaçãoeram de pequenas dimensões, de modo aaproveitarem as características de velocida-de e dissimulação. O melhor meio para des-truir essas unidades era o cruzador, por sua

autonomia, flexibilidade e velocidade. Comoo propósito do poder marítimo era protegeressas linhas de comunicação tornava-senecessária a destruição desses corsários.Como consequência direta, o melhor naviopara compor uma esquadra era o cruzador enão o encouraçado, imaginava ele. E qualseria o número ideal de cruzadores necessá-rios a cada contendor no mar? Richmondrespondia que o número de cruzadores decada poder marítimo deveria ser o suficientepara a proteção das linhas de comunicaçãode cada país. Certamente que ele se referia àgrande discussão dos anos 20 do séculoXX, a Conferência Naval de Washington de1921 e 1922, em que se tratava do número eda tonelagem dos navios das principais po-tências navais após a Grande Guerra.

Para ele, o aumentodescomunal dos navi-os, a partir do final doséculo XIX, com oconsequente aumentoexorbitante nos cus-tos, não acompanhavaproporcionalmente oaumento de sua segu-

rança; muito pelo contrário, ocorrera umacorrida armamentista de enormes dimensões,que trouxe ainda mais insegurança interna-cional. A justificativa alegada por muitosespecialistas para o aumento das dimensõesdos navios era derivada da maior letalidadedas novas armas, torpedos e bombas.Richmond contra-argumentava que essajustificativa não tinha cabimento, pois osnavios já estavam se tornando enormes an-tes mesmo do desenvolvimento de novasarmas.27 O aumento nas dimensões dos na-vios só trouxera uma competição naval degraves resultados e, em consequência, umaguerra mundial sangrenta.

26 RICHMOND, Herbert. Sea Power in the modern world. London: G.Bell & Sons, 1934, p. 57.27 Ibidem, p. 61.

Richmond considerava ocruzador como o melhor

meio de combate emqualquer Marinha

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Richmond considerava o cruzador comoo melhor meio de combate em qualquer Mari-nha. O ideal seria um cruzador de 10 mil tone-ladas de deslocamento28, dotado de maioresvelocidades que o encouraçado e de um ar-mamento de calibre médio de 8 polegadas,pois ele congregava o poderio dos peque-nos encouraçados do século XIX, que con-siderava adequados para a guerra no mar,com o tamanho ideal dos cruzadores paracumprir ambas as funções – fustigar o adver-sário e proteger as linhas de comunicação.

Qual seria o papel do encouraçado naguerra moderna? – perguntava Richmond.Respondia contrariamente aos grandesencouraçados, alegando que o objetivo deuma Marinha de Guerra era impedir uma in-vasão pelo mar e prevenir o estrangulamen-to do comércio marítimo. Dizia que o au-mento no deslocamento dos navios, comcanhões de calibre maior, como no caso dosgrandes encouraçados, não traria, emconsequência, um aumento na mesma pro-porção de sua segurança a outros tipos dearmas, como o torpedo e bombas aéreas.Afirmava que era um “fato reconhecidamen-te conhecido a inutilidade de se perseverarem construir um navio invulnerável”29.

Alguns Estados, no final do século XIXe início do XX, construíram grandesencouraçados para garantir a sua seguran-ça, no que foram seguidos por adversáriospara o mesmo propósito, em um verdadeirocírculo vicioso que elevou os custos dra-maticamente, sem o aumento proporcionalda segurança e invulnerabilidade. Queria-se sempre “o maior e o melhor”.30 Os gran-des encouraçados surgiram. Os grandesnavios requeriam grandes bases de apoio emaiores profundidades nos canais de aces-

so. Se não existissem esses canais, deveria-se dragá-los, com o consequente aumentode custos. Por outro lado, diminuindo-se oscalados dos encouraçados, diminuiriam-seo seu tamanho e poder, em razão de incom-patibilidades técnicas de construção naval.Além disso, esses grandes navios requeri-am enormes diques secos para manutenção,o que fazia elevar ainda mais os custos.

A disputa entre o canhão e a couraçafoi também outro fator para o aumento dotamanho dos encouraçados. Esse aumen-to nos encouraçados não foi motivado ape-nas pelos torpedos ou bombas, mas simem razão das granadas de artilharia dosadversários serem cada vez mais potentes.Certamente que os torpedos e bombas ele-varam a letalidade da mesma maneira, ar-gumentou ele. O aumento do encouraçadoem relação a novas armas não trouxe a se-gurança requerida, logo o encouraçado po-deroso, como resposta ao comando do mar,não era o ideal. Não eram os navios quedeveriam aumentar de tamanho, mas deve-ria-se, sim, desenvolver novas táticas enovos métodos de combate e incrementarsua flexibilidade e mobilidade.31

Enfatizava também que, por serem es-ses navios muito caros, os almirantes temi-am arriscá-los a novas ameaças, diminuin-do, assim, a sua versatilidade e eficiência.Em 1920, logo após o término da GrandeGuerra, Richmond declarou o seguinte:

[O encouraçado] perdeu a sua mobilida-de, sua liberdade de movimento, seu raiode ação, seu grande poder ofensivo. Elenão é mais supremo no mar; seu propó-sito principal, se for para o mar, é prote-ger-se [e ser protegido]; ele não pode

28 Apenas como comparação, o encouraçado HMS Dreadnought deslocava 20 mil toneladas, comcanhões de 12 polegadas.

29 RICHMOND, Herbert. Sea Power in the modern world, op. cit., p. 83.30 Ibidem, p. 83.31 Ibidem, p. 218.

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mover-se sem navios auxiliares de todosos tipos... e... seu custo é proibitivo.32

Dessa forma, Richmond criticava a ênfaseexagerada no grande encouraçado, que po-deria ser uma arma vulnerável a outros ins-trumentos de combate, como o submarino ea aeronave, e o custo x benefício desses gran-des navios indicava a diminuição de suasdimensões em prol de navios menores e maisbaratos. Richmond não deixava de ter razão,pois houve, cada vez mais, preocupação naMarinha britânica após a Grande Guerra naforma como proteger os encouraçados dosataques de submarinos e aviões.33 Assim, suavisão da utilidade do encouraçado diferia davisão de Mahan. Sua preocupação maior eraa defesa das linhas de comunicação, e umacampanha bem conduzida por um adversárioresoluto contra o tráfego marítimo poderiatrazer o colapso do Reino Unido. Dessa ma-neira, insistia na construção de navios queprotegessem esse fluxo logístico, que eramos cruzadores e os contratorpedeiros. Paraele, os encouraçados não teriam a versatili-dade requerida, e, afinal, o poder marítimoexistia para a proteção das linhas de comuni-cação e não para o forçamento de uma bata-lha decisiva.

Mahan não teve a chance de observar odesempenho dos submarinos e da aviaçãonaval em combate durante a Grande Guerrae a Segunda Guerra Mundial34, ao contráriode Richmond, que faleceu em 1946. Era dese esperar que Richmond defendesse ardo-

rosamente ambos os instrumentos de com-bate, afinal apontara a vulnerabilidade doencouraçado em relação a esses instrumen-tos, no entanto sua percepção do que ocor-reria na guerra naval no período entre guer-ras foi totalmente enviesada em relação aessas duas eficientes armas de combate. Elenão foi um ardoroso defensor do avião e dosubmarino. Ele percebia paradoxalmente quea aviação iria mudar totalmente a guerra nomar, sem especificar sua profundidade. Dis-se o seguinte a respeito da aviação:

O que tem ocorrido como resultado dadescoberta da aviação não é que o po-der aéreo venha deslocar a importânciado poder marítimo, mas que um novoinstrumento do poder marítimo apare-ceu e modificou a conduta das opera-ções navais, como o vapor modificou aguerra e os torpedeiros e submarinosmodificaram a guerra igualmente.35

Apesar dessa afirmação, Richmond nãopropugnou energicamente o desenvolvi-mento da arma aérea no combate naval. Aconstrução de porta-aviões não entrou emdiscussão no seu pensamento estratégico.No fundo, acreditava que os porta-aviõeseram caros e vulneráveis, da mesma formacomo percebia os encouraçados36. Consi-derava que era melhor para um Estado comorçamentos limitados despender recursosem navios de superfície que pudessem aten-der a uma série de tarefas que os porta-avi-ões não poderiam.37 Rejeitava, ainda, a pre-

32 RICHMOND, Herbert. “The Future of the Battleship”. Naval Review, no 8, 1920, p. 368-369. Oprofessor Daniel Baugh considera esse artigo de Richmond como um dos mais brilhantes escritospelo autor sobre o assunto, e tudo o que Richmond predisse acabou ocorrendo na Segunda GuerraMundial. Fonte: BAUGH, op. cit., p. 34.

33 Idem.34 Mahan morreu em dezembro de 1914.35 RICHMOND, Herbert. Sea Power in the modern world, op. cit., p. 138.36 BAUGH, Daniel. Richmond and the objects of sea power, op. cit., p. 36.37 Richmond mencionou textualmente que os quatro porta-aviões custaram, em 1934, o total de 21 milhões

de libras, ou talvez mais. A mesma soma poderia proporcionar a compra de três grupos de navios desuperfície mais úteis. Fonte: RICHMOND, Herbert. Sea Power in the modern world, op. cit., p. 96.

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ponderância do poder aéreo em detrimentodo poder marítimo, principalmente a visãolargamente discutida de que por meio dobombardeio aéreo estratégico contra a Ale-manha, a partir de 1942, a vitória seria obti-da. Considerava fundamental a cooperaçãoentre as Forças Armadas e não a preponde-rância de uma sobre a outra.

Outro paradoxo de seu pensamento era autilização do submarino na guerra moderna.Correlacionava os submarinos com os cruza-dores, já que tinham a tarefa de agir contra ocomércio marítimo. Seu sistema de armas pro-porcionava dominar qualquer navio mercan-te em combate. Aceitava o fato de que o sub-marino era a arma do poder marítimo maisfraco e que, em razão de sua atuação furtivacontra as linhas de comunicação, desviavaforças importantes do adversário para a suadestruição. Avaliava, no entanto, que os da-nos infligidos ao comércio marítimo não eramgrandes nem decisivos e eles serviam maispara preservar a honra e enaltecer a coragemdos submarinistas. Considerava o submari-no uma arma cara, sendo o mais caro dosnavios se fosse considerado o preço tonela-da/custo38.

Afirmava que o submarino era ineficientepara a defesa do Reino Unido e que a suaposse não aumentava a segurança da Na-ção. Alegava que o poder marítimo tinhacomo propósitos defender o país de umainvasão naval e proteger as linhas de comu-nicação. Perguntava Richmond: Qual o pa-pel do submarino nesses dois propósitos?Seu papel na defesa da ilha contra a invasão

era menor que o da aviação,39 e o que iriadecidir a contenda era o uso de navios desuperfície, respondia ele. O submarino ser-viria apenas como auxiliar da defesa de arti-lharia de costa. No caso de defesa das li-nhas de comunicação, Richmond conside-rava o submarino totalmente ineficiente. Umcomboio não podia ser defendido por sub-marinos, afirmava.40 Quanto ao submarinoser uma arma eficiente contra o tráfego marí-timo inimigo, ele concordava, citando queeles foram os únicos meios britânicos capa-zes de atuarem no Báltico contra os alemãesna Grande Guerra. Apontava, no entanto,que o antídoto perfeito contra o submarinoera o contratorpedeiro, que operando emflotilhas, em grande número, poderia defen-der eficientemente as linhas de comunica-ção. Por isso sempre foi a favor da constru-ção de cruzadores e contratorpedeiros parauma dupla função: proteção contra corsári-os de superfície e contra submarinos. ParaRichmond, os submarinos eram armas per-feitas para poderes marítimos menos pode-rosos, o que não era o caso de sua Inglater-ra41. Propugnou, assim, ao Almirantado bri-tânico que defendesse a abolição desse meiodurante as discussões do Tratado de Wa-shington de 1922, o que foi imediatamentedescartado como impraticável.42

Para Richmond, assim como para Mahan,a proteção das linhas de comunicação erao propósito principal do poder marítimo.Como imaginava ser essa proteção?

Para Richmond existiam três medidas dedefesa do comércio contra ataques inimi-

38 MARDER, op. cit. p. 36.39 RICHMOND, Herbert. Sea Power in the modern world, op. cit., p. 174.40 Ibidem, p. 177.41 Ibidem, p. 182.42 Interessante e de difícil entendimento essa ideia de Richmond, pois não espelhou efetivamente o que

ocorreu nas duas Grandes Guerras do século XX, quando o submarino quase trouxe o colapso aocomércio aliado. Por que essa resistência de Richmond à utilização do submarino? A única respostapossível seria a sua formação em navios de linha, como os encouraçados e cruzadores, e a dificuldadeem lidar com novas tecnologias e as concepções táticas daí advindas.

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gos43. A primeira ele chamou de patrulha44,isto é, o posicionamento de navios de com-bate nas áreas nas quais se espera encon-trar as unidades inimigas. Essas áreas seri-am os pontos focais importantes, comoentradas de portos, estreitos e pontos deaterragem. Richmond utilizava, como exem-plo, a atuação da Marinha britânica na Gran-de Guerra, quando patrulhou com sucessopontos importantes de passagem dos sub-marinos alemães no Mar do Norte.

A segunda medida era o estabelecimen-to de comboios de navios mercantes, quetinham a vantagem da proteção de naviosde guerra, da concentração de navios comapoio mútuo e da dificuldade de serem des-cobertos pelo inimigo, ao contrário da dis-persão de navios mercantes, mais fáceisde serem encontrados pelos corsários esubmarinos inimigos, segundo imaginava.Como desvantagens apontava o atraso nasviagens, pois os navios deveriam aguar-dar a constituição do comboio, a dificulda-de de se controlar um grande número denavios, principalmente nas saídas e chega-das aos portos, e a da vulnerabilidade dese concentrar muitos navios mercantes emum único corpo ante a ameaça de uma for-ça atacante mais poderosa que a escolta aele determinada. Apontava, como medidade proteção do comboio, aeronaves base-adas em terra, sob coordenação naval, ope-rando cooperativamente, que teriam a tare-fa de atacar os navios inimigos e a consti-tuição de fortes escoltas de superfície parase contraporem aos atacantes.

Por fim, a terceira medida seria impedir oabastecimento dos navios inimigos. Para

Richmond, os navios inimigos poderiamobter apoio logístico de quatro modos di-ferentes: das próprias bases em colônias,de portos em seu território, de portos neu-tros e de suas próprias capturas. A tomadadessas bases coloniais deveria ser primor-dial, o que ele pôde comprovar durante aGrande Guerra, quando os alemães se vi-ram desprovidos de bases de apoio colo-niais atacadas pelas forças aliadas, tornan-do-se, assim, vulneráveis.

O bloqueio de portos inimigos e neu-tros seria outra ação a ser empreendida,embora considerasse que inexistia bloqueiototalmente eficaz.45 Essa ineficácia era mo-tivada pelo grande número de bases eportos a serem bloqueados e pela impos-sibilidade de prevenir a escapada de navi-os independentes46. O propósito do blo-queio seria impedir a saída de navios decombate inimigos para fustigar o comérciomarítimo, consistindo em estabelecer umgrupo de navios de guerra nas proximida-des de bases e portos do inimigo ou neu-tros.47 O bloqueio, além de afetar o moralde um adversário, podia enfraquecê-lo ma-terialmente. Citava o caso do bloqueio bri-tânico da base de Brest, nas guerras doséculo XVIII, quando a frota francesa lálocalizada tornou-se inútil.48 Outro exem-plo de bloqueio por ele mencionado refe-ria-se à frase conhecida de Tirpitz no finalde 1916, quando este disse que “se a guer-ra durar mais, nossa derrota será iminente.Economicamente, nós estamos em umaposição desfavorável nessa guerra deexaustão... nosso poderio está muito aba-lado. Questões de abastecimento de comi-

43 RICHMOND, Herbert. The Naval role in modern warfare, op. cit., p. 10.44 A palavra utilizada por Richmond foi cruising, traduzida pelo autor como patrulha, palavra que

conceitua essa tarefa na doutrina naval brasileira.45 Ibidem. p. 16.46 RICHMOND, Herbert. The Navy, op. cit., p. 88.47 RICHMOND, Herbert. Sea power in the modern world, op. cit., p. 109.48 RICHMOND, Herbert. Naval warfare, op. cit., p. 42.

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da causam grande ansiedade, assim comoquestões de moral”49. Considerava que,apesar de ser uma medida efetiva, o blo-queio não varreria o inimigo dos mares, noentanto teria um grande efeito na campa-nha naval. O estabelecimento de um blo-queio eficaz foi raro na história e de difícilaplicação, mesmo para os poderes maríti-mos prevalentes50. A sua eficácia seria pro-porcional à efetividade e ao rigor com queo bloqueio fosse estabelecido. Quanto maiseficaz, maior probabilidade de sucesso nacampanha naval, acreditava.

Por fim, o modo de impedir uma capturano mar seria armando os navios mercantes,um fato recorrente na história naval. Os navi-os mercantes poderiam, assim, se defender,tanto contra corsários como contra submari-nos, que normalmente atacavam na superfí-cie utilizando seus canhões nos conveses.

Mahan e Richmond concordavam lite-ralmente com o estabelecimento dos com-boios, inclusive utilizando argumentos si-milares, tais como a proteção armada con-tra a incolumidade aos corsários em alto-mar. Outro ponto de contato importante eraa visão que ambos tinham do bloqueio, noentanto os fins diferiam. Para Mahan, o blo-queio seria eficiente para destruir o tráfegomarítimo, com o que Richmond concorda-va, no entanto podia ser um instrumentonecessário para o forçamento da batalhadecisiva, o que não era a visão esposadapor Richmond, que via o bloqueio comouma forma de estrangular o adversário enão necessariamente de forçar um comba-te decisivo.

Ambos, no entanto, concordavam coma falta de efetividade da guerra de corso.Richmond, assim como Mahan, considera-va esse tipo de guerra como ineficaz e in-

capaz de alcançar sucesso em uma campa-nha naval. No curso da história naval mo-derna e contemporânea, essa concepçãoestratégica nunca trouxe vitória a quem aimplementou. A França, nos séculos XVIIIe XIX, utilizou largamente esse expedien-te, no entanto nunca alcançou um resulta-do final favorável, embora ambos concor-dassem que muitos estragos foram realiza-dos com essas ações. Richmond apontou,inclusive, que, entre 1797 e 1802, 154 cor-sários franceses de Boulogne apresaram201 navios, fazendo 1.967 prisioneiros in-gleses, com perdas de apenas 16 navios e775 homens. Um fato grave realmente, se-gundo ele, mas, “sério como foi, grandesas perdas provocadas, não foram, no en-tanto, grandes o bastante para serem deci-sivas”.51 Geralmente a utilização do corsoera praticada pelo poder marítimo mais frá-gil. Richmond chamava a guerra de corsode “guerra esporádica”, por variar de in-tensidade no tempo e no espaço.52

O conceito de “esquadra em potência”,muito discutido por Mahan, não teve o mes-mo efeito em Richmond. Ele pouco discutiuessa concepção estratégica, talvez porquenão a considerasse pertinente a sua Mari-nha Real britânica. Dizia, contudo, que eraimpossível destruir uma esquadra inimigaque adotasse essa concepção. Por outrolado, ao utilizar essa concepção, essa es-quadra estaria virtualmente bloqueada emseu porto de origem, o que não era a inten-ção original de uma esquadra de combate. Oque se desejaria era forçá-la ao combate paraque fosse destruída. Dessa maneira, cadacaso deveria ser analisado separadamente.O uso puro e simples da “esquadra em po-tência” não era o mais adequado, pois trariaa inatividade e imobilidade naval, o que con-

49 RICHMOND, Herbert. National policy and naval strength, op. cit., p. 63.50 RICHMOND, Herbert. Naval warfare, op. cit., p. 55.51 RICHMOND, Herbert. National policy and naval strength, op. cit., p. 310.52 Ibidem, p. 54.

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trastava com o próprio uso de uma Marinhade combate. Citava o caso da esquadra rus-sa na Manchúria que, por meio dessa con-cepção, procurou fixar as forças navais ja-ponesas na guerra de 1904, com desastro-sas consequências para os navios do czar.53

Dessa forma, tanto Mahan como Richmondviam essa concepção com reserva e de for-ma alguma como uma solução para a resolu-ção do conflito naval.

CONCLUSÃO

Herbert Richmondtem sido um teóricodesconhecido no Bra-sil. Eu, particularmente,desconheço qualquertrabalho que discutasuas ideias em nossopaís. Embora tenha sidoum historiador originale perspicaz, com muitoscomentadores na lín-gua inglesa54, no Brasilcontinua sendo ignora-do. Por outro lado, nasescolas de altos estu-dos militares, como, porexemplo, a Escola deGuerra Naval (EGN),estudos sobre AlfredMahan e Sir JulianCorbett continuam a ser incentivados. Nadamau, contudo não devem ser esquecidosteóricos do quilate de Richmond, John ePhillip Colomb e Raoul Castex e, nos tem-pos atuais, Geoffrey Till, Norman Friedmane Edward Luttwak. Todos têm sua importân-cia nos estudos estratégicos.

Se tivesse que indicar um roteiro para aleitura da bibliografia de Richmond que se

encontra ao final do texto, recomendaria aleitura do Statesmen and Sea Power comotexto inicial. Richmond considerava essaobra como uma de suas mais importantes,além disso ela pode ser acessada na Bibli-oteca da Escola de Guerra Naval. Para secompreender o seu pensamento analítico,indicaria o ótimo livro de Arthur Marder,Portrait of an admiral: the life and papersof Sir Herbert Richmond, também disponí-vel na EGN. O professor Marder publicouo diário de Sir Herbert que abarcou o perí-

odo de abril de 1909 aténovembro de 1920, umperíodo conturbado dahistória da MarinhaReal britânica. Todas asoutras referências cita-das só poderão ser ob-tidas no exterior, o queé uma lástima.

Não pode ser es-quecido que Richmondcontribuiu sobremanei-ra para o estudo da his-tória naval. Da mesmaforma que Mahan, eleutilizou como campo deprova a história daMarinha britânica. Di-ferentemente de seucolega norte-america-no, se preocupava com

o declínio de seu amado Reino Unido nosassuntos mundiais e com a perda de pre-ponderância do poder marítimo britânico.Suas ideias viriam para “corrigir” os pon-tos defeituosos da aplicação do poder na-val de seu país, pelo menos assim imagina-va. Mahan, por outro lado, embora utili-zasse a história naval da Grã-Bretanhacomo ferramenta, estava preocupado com

53 Ibidem, p. 227.54 Ver bibliografia sobre Herbert Richmond.

Richmond em Cambridge– professor e reitor – 1935

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a emergência dos Estados Unidos da Amé-rica no cenário internacional e o papel queo poder marítimo teria nesse despertar.

Mahan, por ter sido o primeiro a formularuma teoria de emprego do poder marítimo apartir dos estudos históricos, teve maior efei-to no meio historiográfico naval. Entretan-to, a importância deRichmond não deveser subestimada. Elefoi um intelectual rele-vante que, mesmo semdesejar, estabeleceuuma teoria consisten-te de emprego, comoseu grande influencia-dor Mahan, apesar denem sempre concordarcom suas ideias.

Ninguém melhor queo professor DonaldSchurman para explicara importância deRichmond para a histó-ria naval e a estratégia.Disse ele o seguinte:

Sua [de Richmond]exposição, algumasvezes supersimpli-ficada, era direta e certeira em seus al-vos. Acima de tudo ele combinou emsua pessoa uma rara união de homemde ação e acadêmico responsável em umgrau que excita a admiração de oficiaisde Marinha e de historiadores profissi-onais. Anteriormente, a Marinha britâ-nica tinha produzido homens capazesde entender e algumas vezes de realizargloriosamente as tarefas que o estadolhes outorgou, mas nunca antes ela [Ma-rinha Real] produziu um homem com acapacidade de explicar tanto a Marinha

para a Nação como a Nação para a Ma-rinha para vantagem de ambas.55

Tanto Mahan como Richmond estabele-ceram teorias de emprego de poder marítimocom pontos concordantes e discordantes,no entanto a importância dos dois pensa-

dores transcende aprópria criação dessasteorias de emprego depoder. Eles, certamen-te, como cientistas po-lítico-sociais, trouxe-ram à discussão o pa-pel que o mar teve nosdestinos das nações eas consequências quea perda de seu predo-mínio teria para a so-brevivência de seusEstados. A história e ahistoriografia navais,com esses dois inte-lectuais, atingiram oápice dentro da própriadisciplina da história.

AGRADECIMENTOS

Há pouco mais dedois anos fui convidado pelo diretor da Re-vista Marítima Brasileira, Capitão de Mare Guerra Milton Sérgio Silva Corrêa, paraescrever artigos sobre dois formuladores dopensamento estratégico-naval clássico,Alfred Thayer Mahan e Herbert WilliamRichmond. Os textos deveriam ser adapta-dos de minha dissertação de mestrado emHistória Comparada, que obteve avaliaçãomáxima pela banca estabelecida pelo pro-grama de pós-graduação da UniversidadeFederal do Rio de Janeiro (UFRJ). Aceitei oconvite, e daí nasceram estes nove artigos,

55 SCHURMAN, op. cit., p. 146.

Mahan e Richmond comocientistas político-sociais,trouxeram à discussão opapel que o mar teve nosdestinos das nações e as

consequências que a perdade seu predomínio teriapara a sobrevivência de

seus Estados. A história e ahistoriografia navais, com

esses dois intelectuais,atingiram o ápice dentro da

própria disciplina dahistória

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que tive o grande prazer de reescrever paraesta sesquicentenária revista.

Por um dever de justiça e necessidade,não poderia deixar de agradecer ao próprioComandante Corrêa e ao meu amigo Capi-tão de Mar e Guerra Carlos Marcello Ra-mos e Silva, da RMB, que me convidarampara apresentar minhas pesquisas e meacompanharam nessa empreitada, sugerin-do e propondo aperfeiçoamentos ao texto,diminuindo minhas limitações estilísticas etornando-o mais compreensível.

Agradeço também ao meu orientador e“padrinho” de História, professor doutorFrancisco Carlos Teixeira da Silva, titular deHistória Moderna e Contemporânea da UFRJ,por ter aceitado compartilhar comigo um cam-

po escorregadio e fascinante que é a HistóriaNaval. Em muitas situações, me apontou ca-minhos a serem seguidos e métodos compa-rativos para abordar questões que para mimnão tinham saída. Seu exemplo de historia-dor dedicado, pesquisador refinado e docen-te admirado me serve de estímulo a prosse-guir meus estudos. O mais reconfortante éque aceitou me orientar novamente nodoutoramento, dessa feita mergulhando co-migo na Marinha do século XVIII.

Por fim, dedico o conjunto dos textosproduzidos, em especial os relativos a SirHerbert Richmond, aos colegas, amigos eoficiais-alunos dos cursos da Escola deGuerra Naval. Eles foram os meus grandesincentivadores.

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8- MARDER, Arthur J. Portrait of an admiral: The life and papers of sir Herbert Richmond.Cambridge: Harvard University Press, 1952.

9- McLENNAN, Bruce. “The historical lessons and intelectual rigour of Admiral Sir HerbertWilliam Richmond”. In: Australian Defense Force Journal. n. 168, 2005, p. 19-29.

10- ROSKILL, Stephen. “The Richmond Lecture”. Naval Review. London: Naval Society, v.Lvii, n. 2, abr 1969.

11- SCHURMAN, Donald. The education of a Navy. London: Cassel and Company Ltd, 1965.12- TILL, Geoffrey. Maritime strategy and the nuclear age. New York: St Martin’s Press, 1982.13- _____________ . The development of British Naval Thinking. London: Rutledge, 2006.14- TREVELYAN, George Macaulay. Admiral Sir Herbert Richmond-1871-1946- From the

proceedings of the British Academy, v. XXXII. London: Oxford University Press, 1948.15- TUBBERVILLE, A.S. Johnson’s England; an account of the manners of his age. v. I. Oxford:

Oxford University Press, 1933.

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TORIANITA DO AMAPÁ

Nos anos 80, mais precisamente entre1986 e 1989, o Laboratório de Análise

Mineral da Comissão Nacional de EnergiaNuclear (Cnen), a pedido da Secretaria doConselho de Segurança Nacional, que es-tava investigando uma possível evasão deminério do norte do País, analisou amos-tras de torianita1. A investigação foiconduzida à época pelo Comandante Sér-gio Cruz Quintieri, já falecido.2

Este minério é muito semelhante àcassiterita, minério de estanho, até na for-ma dos cristais. A torianita já havia sidoencontrada em lotes de exportação decassiterita, como se fosse este minério, e

LEONAM DOS SANTOS GUIMARÃES*Capitão de Mar e Guerra (RM1-EN)

também em apreensões de contrabando poraeronaves destinadas à Guiana.

As investigações da Secretaria do Con-selho de Segurança foram interrompidas em1989, não se tendo informações sobre osresultados alcançados. A origem exata desteminério também não é de conhecimentopúblico, estando possivelmente associa-da à mina de pirolusita (dióxido demanganês) da Serra do Navio3, no Amapá,atualmente esgotada.

A análise então feita desse minério apre-sentou altíssimos teores de óxido de tório(acima de 80%), óxido de urânio (4 a 8%) ecerca de 10% de chumbo radiogênico (pro-

* Chefe de gabinete do presidente da Eletrobras Termonuclear S/A (Eletronuclear).1 http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=112212 http://istoevip.terra.com.br/reportagens/paginar/22273_CARTAS/13 http://pt.wikipedia.org/wiki/Serra_do_Navio

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duto de uma cadeia de decaimento radiativo),com predominância do isótopo Pb-2084, des-cendente do isótopo mais abundante dotório na natureza, o Th-2325, sobre os ou-tros isótopos naturais do chumbo, que sãoPb-204, Pb-206, Pb-207.

O chumbo natural tem, em média, a se-guinte composição: Pb-204 (1,4%), Pb-206(24,1%), Pb-207 (22,1%) e Pb-208 (52,4%).Entretanto, diferentemente do urânio, quena natureza tem uma composição isotópicapraticamente fixa, o chumbo pode ter umacomposição isotópica bem variada, depen-dendo da origem do minério. Note-se queo chumbo encontrado na torianita é 88%composto pelo isótopo Pb-2086, ou seja, é“naturalmente enriquecido” neste isótopo.

Notícias de apreensões de cargascontrabandeadas do Amapá com variadasquantidades de torianita têm surgido deforma recorrente na imprensa. Um consultano Google para as palavras-chave“torianita” e “Amapá” fornece 815 notíci-as7. Dentro do período 2000-2010, essasnotícias têm a distribuição temporal quan-titativa mostrada pela figura a seguir8.

no local “desde outubro de 1992” (vide re-produção a seguir).

4 http://www.matpack.de/Info/Nuclear/Nuclids/P/Pb208.html5 http://en.wikipedia.org/wiki/Thorium-2326 http://www.chicobruno.com.br/lista.php?idC=120997h t t p : / / w w w. g o o g l e . c o m . b r / s e a r c h ? q = t o r i a n i t a + a m a p % C 3 % A 1 & n u m = 1 0 0 & h l = p t -

BR&lr=&rlz=1R2ADFA_pt-BRBR383&prmdo=1&source=lnms&ei=2p5wTMSwCcP38AbmjvXwCg&sa=X&oi=mode_link&ct=mode&ved=0CBgQ_AU8 http://www.google.com.br/search?num=100&hl=pt-BR&lr=&tbo=1&rlz=1R2ADFA_pt-BRBR383&

p r m d o = 1 & t b s = t l % 3 A 1 & q = t o r i a n i t a + a m a p % C 3 % A 1 & b t n G = P e s q u i s a r & a q = f & a q i =&aql=&oq=&gs_rfai=

A reportagem especula que o materialseria contrabandeado para o Iraque, “queusaria o tório beneficiado para produçãode mísseis nucleares”. Não se tem informa-ções sobre o resultado das investigaçõesnem sobre a composição do material apre-endido então.

A reportagem investigativa mais amplaidentificada foi aquela publicada pela re-

Em 1993, a Folha de S. Paulo noticiavaa apreensão de 1.300 quilos do materialnuma casa no centro de Belém que estaria

2000 2002 2004 2006 2008 2010

2000-10 Pesquisar outras datas

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vista Isto É de 17 de maio de 2006 denomi-nada “O contrabando do urânio brasilei-ro”9. A reportagem se refere a uma apreen-são de 600 kg feita pela Polícia Federal em12 de julho de 200410. Segundo análise feitapela Cnen à época, essa torianita possuía75% de tório, 7,5% de urânio e 10% de óxi-do de chumbo em sua composição.

Conforme o próprio título da reportagem,o autor supõe que o interesse pela torianitadecorra do urânio nela contido. Chega mes-mo a avaliar o preço do quilo do material,“de US$ 200 a US$ 300”. Note-se que exis-tem pelo menos duas empresas internacio-nais11, 12 que comercializam pela internet atorianita bruta, supostamente originária dasminas de Sri Lanka13, a US$ 450 por quilo.

Estes valores, entretanto, são incompa-tíveis com os preços no mercado internaci-onal spot do diuranato de amônia (DUA)(yellow cake), que contém mais de 70% deurânio e é atualmente negociado a valoresinferiores a US$ 100 o quilo.

A torianita bruta tem um teor de urâniode 4 a 8%. Ainda que esse teor seja bastantesuperior aos teores dos minérios brutos deurânio em exploração comercial no mundo(inclusive pela INB – Indústrias Nuclearesdo Brasil – na mina de Cachoeira em Caitité,na Bahia), ele é muito menor ao teor de urâ-nio do yellow cake comercial, com preçomuito inferior. Além disso, o beneficiamentoda torianita para produção de urânio é umprocesso tecnologicamente difícil e caro.

Portanto, as possibilidades de que atorianita seria contrabandeada para extra-ção do urânio nela contido por países que

tivessem dificuldades de obtenção deyellow cake no mercado internacional, taiscomo o Iraque na década de 90 e o Irã atu-almente, parecem pouco prováveis.

Também careceria de fundamento suporque o interesse pela torianita viesse do tórionela contido, pois este mineral radioativo émuito abundante, particularmente nas arei-as monazíticas brasileiras e indianas, e tembaixa procura no mercado. Seu uso comocombustível nuclear é ainda experimental eseu uso como material fértil para produçãodo isótopo físsil do urânio U-233, potenci-almente aplicável a artefatos nucleares, épouco provável, pois os isótopos físseisU-235 e Pu-239 são muito mais eficazes ede aplicação muito mais fácil.

A torianita é um minério com uso comer-cial restrito, sem cotação no mercado inter-nacional, economicamente inviável paraextração de urânio e tório e que é encontra-do na beira de rios na forma de rochas.

A reportagem levanta ainda a possibili-dade de essa torianita ser usada moída, como objetivo de adulterar a columbita-tantalita(coltan)14, um minério usado na fabricaçãode óxidos de nióbio (nome mais comum docolúmbio) e tântalo, utilizado na produçãode ligas especiais em tecnologias de ponta(informática, aeroespacial, entre outras), eque tem significativa procura no mercadoe preços bastante elevados, da ordem demais de US$ 500 o quilo.

No Brasil, as maiores reservas de coltanencontram-se nos estados de Amazonas,Roraima (com predominância no sul do es-tado) e Amapá, com quase 52,1% das reser-

9http://www.istoe.com.br/reportagens/21854_O+CONTRABANDO+DO+URANIO+BRASILEIRO?pathImagens=&path=&actualArea= internalPage

10 http://noticias.ambientebrasil.com.br/clipping/2004/08/25/15802-policia-federal-no-amapa-apreen-de-minerio-extraido-ilegalmente.html

11 http://www.chinaqualitydigital.com/d-p1117589478965070400-thorianite_crude_powder/12 http://trade-metal.com/thorianite-crude-powder-p23297.html13 http://en.wikipedia.org/wiki/Thorianite14 http://pt.wikipedia.org/wiki/Coltan

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vas de todo o mundo. Entretanto sua explo-ração atual é feita somente pela empresaperuana Minsur, detentora da concessãominerária da mina de Pitinga – AM15. O mi-nério lá produzido é levado em caminhõespara Pirapora do Bom Jesus, próximo a SãoPaulo, onde é beneficiado e exportado.

Recentemente foi divulgado na mídia16

que a INB discute com a peruana Minsur,detentora da concessão minerária da reservade Pitinga, a possibilidade de desenvolveruma nova rota tecnológica para explorar ourânio na região, onde, estima-se, há cercade 150 mil toneladas do mineral. Uma técnicadiferenciada é necessária porque, nessa área,o urânio encontra-se associado a outros doisminerais, columbita e cassiterita, o que torna-rá o acesso ao elemento mais difícil. Amineradora peruana já explora nióbio e esta-nho. O Instituto de Energia Nuclear da Uni-versidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)será também um potencial aliado no desen-volvimento da nova rota tecnológica.

Não fica claro, portanto, qual coltan seriaadulterado pela torianita contrabandeada.Não faria muito sentido contrabandeá-la parao exterior, a não ser que o coltan a ser adulte-rado não fosse o nacional, ou que a adultera-ção do coltan nacional fosse feita fora doPaís, possibilidade que, apesar de não serdescartável a priori, parece pouco provável.

Em 2008, a Folha de S. Paulo publicounovamente matéria sobre o tema17. Nela é le-

vantada a possibilidade de que o interessepela torianita decorra do Pb-208 nela conti-do, que “seria utilizado para a refrigeração dereatores”, o que é coerente com pesquisasque vêm sendo desenvolvidas na Rússia18.Levanta também a possibilidade de o inte-resse decorrer de outro uso do Pb-208, queseria “o revestimento de bombas de nêu-trons19,20,2122, famosas pelo potencial de ma-tar seres vivos e ter um impacto menor sobreprédios e construções”, possibilidade que jáhavia sido levantada no passado23.

A possibilidade de que o interesse des-pertado pela tantalita do Amapá, que levaao seu contrabando a preços elevados, re-sida no seu terceiro componente majoritá-rio, que é o chumbo naturalmente enriqueci-do no isótopo Pb20824, é a mais provável.Note-se que a torianita normalmentecomercializada (vide notas 10 e 11) provémde Sri Lanka e de Madagascar25. Os minéri-os destes locais, entretanto, são pobres emchumbo (1,8% e 2,29%, respectivamente),em comparação com o minério brasileiro (cer-ca de 10%). Existem também ocorrênciasdeste mineral em Índia, Rússia, EUA, Cana-dá, África do Sul e Congo (vide nota 12),mas não foram obtidas informações sobreos teores de chumbo nesses minerais.

Cabe ainda registrar que a Rede Globolevou o tema ao horário nobre na série “Glo-bo Amazônia” apresentada no “Fantásti-co” de 4 de outubro de 200926. A reporta-

15 http://www.cnen.gov.br/lapoc/tecnica/inspmind.asp16http://www.energiahoje.com/online/eletrica/termo/2010/12/02/422190/tecnologia-para-uranio-no-

am.html17 http://www.chicobruno.com.br/lista.php?idC=1209918 http://www.world-nuclear.org/info/inf08.html19 http://nuclearweaponarchive.org/Nwfaq/Nfaq1.html20http://www.financialsensearchive.com/editorials/douglass/2003/0311.html21 http://nuclearweaponarchive.org/Library/Brown/index.html22 http://www.fact-index.com/n/ne/neutron_bomb_1.html23 http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=1122124 http://pintassilgo2.ipen.br/biblioteca/2009/inac/15187.pdf25 http://www.handbookofmineralogy.org/pdfs/thorianite.pdf26 http://www.globoamazonia.com/Amazonia/0,,MUL1329170-16052,00-RAFICANTES+DO+AMAPA+

VENDEM+MATERIAL+RADIOATIVO+OBTIDO+ILEGALMENTE.html

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gem cita que “no mercado regular paísesque obedecem a normas mundiais podemcomprar um quilo de urânio puro por 200reais. Nas negociações clandestinas, con-tudo, o quilo do urânio ainda misturado àtorianita, sem passar por nenhuma purifi-cação, pode chegar a R$ 2.500 – 12 vezesmais”. O repórter deve ter se referido à re-lação entre o quilo da torianita bruta e oquilo do yellow cake comercial, o que fazsentido. Nota-se, entretanto, que o preçodo material contrabandeado teria aumen-tado substancialmente desde 2004, quan-do a referência de reportagem da épocaseria “de US$ 200 a US$ 300”. O valor deR$ 2.500 também não é compatível com opreço de US$ 450 obtido atualmente (videnota 10).

Outro ponto relevante na reportagem do“Fantástico” é a declaração de um supos-to contrabandista que afirma ter como cli-ente recente “um pessoal do Iraque”. Ora,certamente esse “pessoal” nada teria a vercom o Governo do Iraque atual, sob ocu-pação americana. A afirmação, entretanto,levanta a possibilidade de envolvimentode algum país árabe, em especial o Irã, comoreceptador do material.

A possibilidade de o Irã ser o receptadordeste material para recuperação de urânio épreocupante. Entretanto, para isso ser ver-dade, seria necessário que o Irã tivesse de-senvolvido ou adquirido uma tecnologiaespecífica para beneficiamento desse mate-rial, que, como já foi dito, seria muito cara ecomplexa. Por não se dispor de informaçõessobre este aspecto específico, não se podedescartar essa possibilidade, principalmen-te quando se sabe que os estoques deyellow cake do Irã encontram-se pratica-

mente esgotados desde o final de 200827, 28,o que certamente deve estar levando o Go-verno de Teerã a buscar fontes de supri-mento “alternativas”, dadas as sanções daOrganização das Nações Unidas (ONU) àsquais está submetido.

Se este fato se confirmar, isso poderá acolocar o Brasil numa posição desconfor-tável junto à comunidade internacional.Entretanto, ainda que o fato não seja ver-dadeiro, ou seja, que a torianita do Amapátenha outros usos alheios ao urânio e aoIrã, o Brasil corre ainda o risco de ser en-volvido numa acusação do tipo daquelaque foi forjada para implicar o Iraque deSaddam Hussein numa suposta compraclandestina de yellow cake do Níger. Estafraude foi amplamente noticiada pela im-prensa após a invasão do Iraque29, 30, ten-do sido usada como suposta “prova” doenvolvimento de Saddam com “armas dedestruição em massa”, contribuindo comojustificativa para a própria invasão. A situ-ação hoje é muito semelhante com relaçãoao Irã, e tal ação de inteligência poderia serepetir, mas desta vez envolvendo o Brasil.

O chumbo raramente é encontrado noseu estado elementar31. O mineral de chum-bo mais comum é o sulfeto denominado degalena (com 86,6% deste metal). Outros mi-nerais de importância comercial são o car-bonato (cerusita) e o sulfato (anglesita), quesão mais raros. Geralmente é encontradochumbo com minerais de zinco, prata e, emmaior abundância, de cobre. Também é en-contrado em vários minerais de urânio e detório, já que vem diretamente da desintegra-ção radioativa destes radioisótopos. Os mi-nerais comerciais podem conter poucochumbo (3%), porém o mais comum é em

27http://www.timesonline.co.uk/tol/news/world/middle_east/article5576589.ece28 http://www.isisnucleariran.org/assets/pdf/Iran_Yellowcake.pdf29 http://en.wikipedia.org/wiki/Niger_uranium_forgeries30 http://cryptome.org/niger-docs.htm31 http://pt.wikipedia.org/wiki/Chumbo

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torno de 10%. Os minerais são concentra-dos até alcançarem um conteúdo de 40% oumais de chumbo antes de serem fundidos.

O chumbo tem quatro isótopos naturaisestáveis, que, com a respectiva abundâncianatural, são: Pb-204 (1,4%), Pb-206 (24,1%),Pb-207 (22,1%) e Pb-208 (52,4%). O Pb-206,o Pb-207 e o Pb-208 são os produtos finaisde uma complexa cadeia de decaimento quese inicia com o U-238, o U-235 e o Th-232,respectivamente. As correspondentes mei-as-vidas desses esquemas de decaimentosão: 4.47 x 109, 7.04 x 108 e 1.4 x 1010 anos,respectivamente. Cada um deles é documen-tado em relação ao Pb-204, o único isótoponatural radioativo não radiogênico. As es-calas de relações isotópicas para a maioriade materiais naturais são 14.0-30.0 para Pb-206/Pb-204, 15.0-17.0 para Pb-207/Pb-204 e35.0-50.0 para Pb-208/Pb-204, embora nume-rosos exemplos fora destas escalas sejamrelatados na literatura32.

Note-se que métodos de separação erecuperação do Pb-208 dos resíduos detório e terras raras gerados na unidade pi-loto de purificação de nitrato de tório queoperou no Brasil, mas já foi descomis-sionada, foram objeto de tese de doutora-do no Instituto de Pesquisas Energéticas eNucleares (Ipen)33.

O isótopo Pb-208 tem uma característicafísica única: ele é o mais pesado dos isótopos“duplamente mágicos”, que são hélio-4 (He-4), oxigênio-16 (O-16), cálcio-40 (Ca-40), cál-cio-48 (Ca-48), níquel-48 (Ni-48) e chumbo-

208 (Pb-208)34. Seus 82 prótons e 126 nêu-trons são arranjados em camadas comple-tas no núcleo atômico, o que lhe dá excepci-onal estabilidade, com mínimas seções dechoque (probabilidade de ocorrência) paraas reações nucleares, simultaneamente ten-do um elevado peso atômico.

Isso torna o Pb-208 o único material pesa-do que é praticamente transparente aos nêu-trons. Esta propriedade de transparência aosnêutrons o torna particularmente interessan-te para uso em aplicações nucleares que re-queiram a maximização do fluxo neutrônico,com mínimas perdas por absorção.

É o caso dos reatores nucleares rápidosresfriados a chumbo líquido35, tecnologiadesenvolvida pela URSS nos anos 70 paraemprego na propulsão nuclear de submari-nos (classe Alfa) e que hoje está sendoretomada por diversos países para desen-volvimento da chamada “Generation IV”36

de usinas nucleares e também para os cha-mados Accelerator Driven Systems – ADS37,reatores “incineradores” de actinídeosmenores (rejeitos nucleares de longa vida).O uso de chumbo enriquecido no isótopo208 como fluido de resfriamento do núcleodo reator nessas aplicações traz grandesvantagens38. O Pb-208 também é utilizadocomo fonte de nêutrons para sustentar areação em cadeia no núcleo dos ADS39.Nesse caso, ele compõe alvos para o ace-lerador desses sistemas, gerando nêutronspela reação de espalação induzida porprótons de alta energia40. Não se identifica,

32 http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0103-50532007000500014&script=sci_arttext33 http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/85/85134/tde-04062007-160337/34 http://en.wikipedia.org/wiki/Magic_number_(physics)35 http://www.sciencedirect.com/science?_ob=ArticleURL&_udi=B6V1R-50GC64W-1&_user=10&_

coverDate=11%2F30%2F2010&_rdoc=1&_fmt=high&_orig=search&_sort=d&_docanchor=&view=c&_acct=C000050221&_version=1&_urlVersion=0&_userid=10&md5=b50ff7885f5872f5bf1975834e11c40a

36 http://www.gen-4.org/Technology/evolution.htm37 http://www.world-nuclear.org/info/inf35.html38 http://elibrary.ru/item.asp?id=1360194139http://pelicano.ipen.br/PosG30/TextoCompleto/Sergio%20Anefalos%20Pereira_D.pdf40 http://www.emc2009.iprj.uerj.br/down.php?fid=295

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entretanto, uma razão para que a obtençãodo Pb-208 para essas aplicações seja feitapor vias ilícitas.

É também o caso de artefatos nucleares“Enhanced Radiation – ER”, que visammaximizar a geração de altos fluxos de nêu-trons com um mínimo efeito de calor, on-das de choque e geração de produtos defissão, as chamadas “bombas de nêutrons”.Os EUA desenvolveram e produziram trêsogivas de nêutrons – uma quarta foi can-celada antes da produção. Todas foram re-tiradas de serviço e desmanteladas.

A ogiva W66 para o míssil Sprint foi aprimeira a ser desenvolvida. Ela foifabricada durante 1974-75 e foi aposenta-da em agosto de 1975, após poucos mesesde serviço, quando o sistema Sprint foidesativado (cerca de 70 foram feitas). Elatinha uma energia de vários quilotons (20kt foi relatado) e, podem ou não ter usadocombustível DT (Deutério-Trítio).

A W70 Mod-3, desenvolvida comoogiva do míssil Lance, tinha uma energiatotal de cerca de 1 kt de fusão. Ela foifabricada durante 1981-83, sendo retiradade serviço em 1992, após serem fabricadas380 unidades.

A ogiva W79 Mod-0 foi desenvolvidapara projétil de artilharia de 8 polegadas.Tinha um rendimento variável de 100 t a 1,1kt. A de menor energia foi uma arma defissão pura41, a de maior energia foi de 800t de fusão (73%) e 300 t de fissão. Elasforam fabricadas durante 1981-1986. Essaversão começou a ser retirada de serviçoem meados da década de 80, sendo todasdescomissionadas em 1992. Foramconstruídos 325 artefatos deste tipo.

A W82 Mod-0 foi desenvolvida paraprojétil de artilharia de 155 milímetros, comenergia variável semelhante à W79. Foi

cancelada em outubro de 1983, sem ir paraprodução.

Rússia, China, França e Israel tambémdesenvolveram projetos de bomba de nêu-trons e podem tê-las em serviço. Algumasfontes afirmam que Israel também teria de-senvolvido esse tipo de artefato.

Outro conceito de artefato ER seria otipo fission-free, ou seja, um artefato defusão pura, conforme figura a seguir, emque o Pb-208 poderia ser usado como heavymetal liner ou como heavy metal driver.Não há informações se tal artefato efetiva-mente tenha sido desenvolvido ou estejaem desenvolvimento por algum dos paísesnuclearmente armados.

41 http://nuclearweaponarchive.org/Library/Brown/index.html42 http://es.wikipedia.org/wiki/Trit%C3%B3n_(qu%C3%ADmica)

O Pb-208 também poderia ainda ser uti-lizado para a produção de trítio, materialfundamental para a produção de artefatosde fusão, por meio de sua irradiação comíons de deutério, segundo a reação nucle-ar apresentada a seguir42. Restam, entre-tanto, dúvidas quanto à eficiência e à ca-pacidade industrial deste processo produ-

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zir quantidades significativas de trítio ne-cessárias a um artefato de fusão.

No caso da obtenção do Pb-208 paraessas aplicações em artefatos nucleares,podem ser identificadas razões para o usode vias ilícitas, dado o sigilo que estarianecessariamente envolvido.

O Pb-208 é também bastante utilizadoem pesquisa básica experimental em física

nuclear43, incluídas nessas pesquisas ageração de isótopos artificiais estáveisultrapesados. Note-se que existem empre-sas especializadas que fornecem comerci-almente chumbo enriquecido no isótopo20844, porém em pequenas quantidades.Não se pode, portanto, descartar a possi-bilidade de estas empresas buscarem suamatéria-prima no “mercado negro”.

43http:/ /web.if .usp.br/pesquisa/sites/default/f i les/Microsoft%20PowerPoint%20-%20Rubens_Lichtenthaler2009.pdf

44 http://www.americanelements.com/pb208.html

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<CIÊNCIA & TECNOLOGIA> Energia nuclear; Radiação; Pesquisa;

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SUMÁRIO

Parte 1**IntroduçãoAs origens do Islã

A morte das filhas de AláA revelação ganha o mundo e perde a inocênciaA divisão na revelação

Parte 2O Islã e a modernidade ocidental

Choque de civilizações ou perversão minoritária?O conservadorismo intransigenteO abismo entre o Islã e o Ocidente

Parte 3O Fundamentalismo Islamico: O mythos desfigurado

Os fundamentos da morteAs raízes do radicalismoAl Qaeda: a era do terrorismo catastrófico

Conclusão

FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO*

Partes 2 e 3

ALEXANDRE PERES TEIXEIRACapitão de Fragata (FN)

* N.A.: Trabalho apresentado à Escola de Guerra Naval – Curso de Estado-Maior para Oficiais Superio-res, em 2008, como exigência da disciplina de História do Tempo Presente.

** N.R.: Publicada na RMB do 1otrim/2011.

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O ISLÃ E A MODERNIDADE OCIDENTAL

“O sujeito islâmico não era mais criador, desde muitos séculos no domínio científico, etampouco era senhor da evolução técnica. Ele levou mais de um século para dominar atécnica que foi adquirida na fase pós-colonial, como já disse, a da americanização domundo, que autoriza essa aquisição; esta última pertence ao estágio do consumo e dofuncionamento, e não da produção e da invenção. Ela é útil para o desenvolvimento domercado. Entretanto, à parte as individualidades de origem islâmica, que trabalham nasinstituições ocidentais de pesquisa, o sujeito do Islã, no horizonte de sua própriaterritorialidade simbólica e linguística, permanece excluído do espírito científico; ele nãodomina o conceito do avião, nem na sua invenção, nem mesmo na sua fabricação, mas elepode conduzir admiravelmente o aparelho voador e chegar mesmo a desviar seu uso.”

(Abdelwahab Meddeb1)

1 Abdelwahab Meddeb, escritor, poeta e professor de Literatura Comparada na Universidade de Paris.Também é diretor da revista Dédale. (MEDDEB, 2003, p. 19)

Choque de civilizações ou perversãominoritária?

Ainda que o islamismo possua costu-mes e tradições que sejam estranhos à cul-tura ocidental, a abordagem de Samuel P.Huntington, diretor do Instituto de Estu-dos Estratégicos de Harvard e professorde Relações Internacionais, que ganhounotoriedade após os atentados de 11 desetembro de 2001, não só reforça o antago-nismo já existente entre as culturas, mastambém fomenta a antipatia dos gruposfundamentalistas islâmicos, dando-lhes ocombustível necessário para seus atos per-versos. Huntington resume sua tese daseguinte forma:

Minha tese é a de que a fonte funda-mental de conflito neste novo mundonão será essencialmente ideológica nemeconômica. As grandes divisões na hu-manidade e a fonte predominante deconflito serão de ordem cultural. As na-ções-Estado continuarão a ser os agen-tes mais poderosos nos acontecimen-

tos globais, mas os principais conflitosocorrerão entre nações e grupos de di-ferentes civilizações. O choque de civi-lizações dominará a política global. Aslinhas de cisão entre civilizações serãoas linhas de batalha do futuro.(HUNTINGTON, 1994, p. 120)

Huntington (1994) tenta resumir proble-mas complexos, de ordem social e até mes-mo econômica, a uma abordagem simplistaque privilegia o enfoque antropológico e,em certa medida, desconsidera questõeshistóricas de extrema importância, princi-palmente as relacionadas ao voraz imperia-lismo das potências europeias e dos Esta-dos Unidos da América, este último umpouco mais tardio.

Negar a ingerência destes imperialismosno processo de evolução do islamismo se-ria negligenciar a própria história. Segun-do Vesentini (2005), Huntington argumen-ta que os paradigmas existentes seriam in-suficientes para explicar a geopolítica atu-al e seus desdobramentos, pois “os povosjá não se agrupariam mais – a não ser muito

Parte 2

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parcialmente – em ricos e pobres, demo-cráticos e não democráticos, blocos capi-talistas ou comunistas, Terceiro Mundoetc”. (VESENTINI, 2005, p. 54), sugerindoa criação de um novo mapa-múndi.

As questões que levam às tensões maispreocupantes na atual ordem mundial sãomuito mais profundas que simples antago-nismos culturais. O fator humano e sua bus-ca incessante pela maximização do prazer eminimização da dor, associados ao estímulovoraz capitalista dentro de um mundoglobalizado, funcionam como verdadeirasarmas letais, aumentando as diferenças so-ciais, que já não são pequenas, e, em últimaanálise, legitimando, sob o enfoque fanáti-co religioso, a barbárie e a desordem.

Não se morre por cultura, como induzHuntington em sua tese, se morre por in-justiça, desigualdade na distribuição derenda, fome, intolerância e desrespeitomútuo e fanatismo religioso. Isto não seatém somente ao Islã, pois o fanatismo cris-tão já ceifou a vida de milhares de pessoasno curso da história.

Existe, sim, um grande problema associ-ado ao atraso que os defensores da revela-ção do profeta impuseram em seus nichosantropológicos culturais. A preocupaçãocom o mythos, em detrimento do logos, ge-rou um descompasso em relação aoracionalismo ocidental, que, com seu viésempreendedor, proporcionou a evoluçãotecnológica, que gerou melhoria na quali-dade de vida dos ocidentais. Mas quemdisse que o progresso pertence a uma ououtra civilização, que os inventos são res-tritos a uma ou outra cultura? Não, o que oser humano inventa pertence ao ser huma-no como um todo, sem partidarismo.

A modernidade está disponível tambémpara os donos e guardiões da revelação, maspara que isso seja uma realidade, esta culturadeve aceitar a modernidade e não permitirque grupos minoritários, empunhando uma

bandeira fundamentalista religiosa banhadaem sangue, atrasem cada vez mais a inser-ção, e o consequente aumento da qualidadede vida, de uma grande parte da populaçãomundial que habita o mundo mulçumano. Épreciso abandonar o conservadorismo intran-sigente, e com urgência!

O conservadorismo intransigente

Com a divisão do Islã entre sunitas exiitas, a tradição dos ensinamentos deMaomé ficou prejudicada. Sunitas questi-onavam o que eles chamavam de heresiaxiita, e os xiitas, por sua vez, não interpre-tavam as escrituras e doutrinas de formaliteral, apelando para o invisível, esotéricoe oculto. Armstrong discorre sobre isso daseguinte forma:

Os xiitas não interpretavam literalmentesuas escrituras e doutrinas. Toda a suaespiritualidade consistia numa buscasimbólica do invisível (al-ghayb)subjacente ao fluxo de acontecimentosexteriores (zahir). Os xiitas veneravamum Deus invisível, inescrutável, procu-ravam um significado oculto no Alco-rão, participavam de uma luta incessan-te mas perceptível por justiça, ansiavampor um imame escondido e cultivavamuma versão esotérica do islamismo queo mundo não podia conhecer. (ARMS-TRONG, 2001, p. 69)

Apesar dos questionamentos de ambasas facções, o xiismo englobava uma dosede racionalidade, não a racionalidade oci-dental, porém tanto o mythos quanto ologos faziam parte da visão xiita, ao passoque os sunitas encaravam as escrituras deforma mais intransigente e literal. Armstrong(2001, p. 72) diz que, “apesar de ter se trans-formado numa religião mitológica, o xiismonão era irracional. Na verdade tornou-se

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mais racional e intelectual que a Suna”. Esteracionalismo foi tão grande que chegou aatrair o interesse dos mutazilitas, um grupode teólogos sunitas que tentavam raciona-lizar a doutrina do Alcorão. Armstrong ex-plica este emaranhado de mythos com logos:

Mythos e logos, razão e revelação, nãose opunham: só eram distintos e comple-mentares. Enquanto nós, ocidentais mo-dernos, descartamos a mitologia e o misti-cismo como fonte da verdade e confia-mos unicamente na razão, um pensadorcomo Tusi considerava válidos e neces-sários os dois modos de pensar. Ele pro-curou mostrar que doutrinas que faziamsentido durante suameditação místicatambém eram razoá-veis num contextoislâmico. As técni-cas introspectivasde contemplaçãoproporcionavampercepções verda-deiras em seu pró-prio âmbito, mas im-possíveis de provar-se logicamente, comouma equação matemática produzida pelologo. (ARMSTRONG, 2002, p. 72)

Muhammad al-Mufid e Muhammad al-Tusi foram os eruditos do século XI que sepreocuparam com a autenticidade de algunsrelatos sobre o profeta e seus companheiros.Para Armstrong (2002), eles tinham a convic-ção que citações de doutrinas duvidosas,como as que questionavam, deveriam sersubstituídas pelo uso da razão e da lógica.Tusi acreditava que a divisão ocorrida na re-velação podia ter dado margem a tradiçõesescusas. Dessa forma, ao defender o uso darazão pelos clérigos, esperava obter maiorlegitimidade para o Islã e anular os erros co-metidos pela tradição tendenciosa.

Pode-se citar também a escola filosófi-ca de Mulla Sadra, discípulo de Mir Dimad.Esta escola iraniana também acreditava naperfeita relação entre razão e mitologia paraque um crente tivesse uma vida plena. Paraesta escola, afirma Armstrong (2001, p. 75),“o verdadeiro filósofo tinha de ser tão raci-onal quanto Aristóteles, mas deviaultrapassá-lo, chegando a uma apreensãoestática e imaginativa da verdade”. Perce-ba-se a filosofia ocidental sendo aludidapor um filósofo islâmico, o que comprovaque houve influência do pensamento oci-dental em alguns setores do islamismo. Aescola de Mulla Sadra vai influenciar, futu-ramente, o islamismo iraniano.

No século XVI, umanova hegemonia islâmi-ca tornou-se evidente.Com o surgimento dostrês novos impériosislâmicos, grandes con-quistas foram observa-das em diversos cam-pos, como arquitetura,pintura, organizaçãopolítica e burocrática.

Porém, apesar de modernizadas, tais socieda-des foram incapazes de realizar uma mudançaradical, tal como aconteceu no Ocidente porocasião do Renascimento. Ali é uminconformado com este atraso. Em uma cartapara um de seus leitores, ele faz a seguinteobservação:

A Europa ocidental foi incendiada porpaixões ideológicas, mas agora elas es-tavam sendo transcendidas. A moderni-dade estava no horizonte. Essa foi umadinâmica que a cultura e a economia doImpério Otomano nunca pôde imitar. Adivisão sunita-xiita tinha chegado cedodemais e se congelado em dogmas ri-vais. Nessa época, a dissensão já haviasido praticamente varrida do Islã. O sul-

Apesar de modernizadas,as sociedades foram

incapazes de realizar umamudança radical, tal comoaconteceu no Ocidente porocasião do Renascimento

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tão, flanqueado por seus eruditos reli-giosos, governava um Estado-Impérioque iria murchar e morrer. Se esse já erao caso no século XVIII, hoje é muitomais. Talvez o único modo de osmulçumanos descobrirem isso seja pormeio da experiência própria, como noIrã. (ALI, 2005, p. 432)

Apesar de certa influência da filosofiaocidental, o espírito conservador e tradici-onalista da religião impediu o progressotecnológico da cultura islâmica. Além defazerem uso da razão, este uso não tradu-zia uma liberdade realpara que a razão ga-nhasse corpo e revo-lucionasse o pensa-mento, como revoluci-onou no Ocidente. Aforça da doutrinaçãodo Corão, aliada a umcontexto antropológi-co, lançou um cimen-to que travou o pro-gresso do Islã, emcomparação ao queocorria no Ocidente.

O conservadorismo do Islã foi deixandoa civilização mulçumana para trás no quetange aos avanços tecnológicos percebi-dos no Ocidente. Esse descompasso iria in-fluenciar as gerações futuras e dar espaçoao surgimento do fundamentalismo islâmico.Sobre esse atraso, Armstrong discorre:

Não compartilhavam do etos revolucio-nário que se tornaria característico dacultura ocidental setecentista. Expres-savam o que o estudioso Marshall G. S.Hodgson chamou de espírito conserva-dor, marca de toda sociedade pré-mo-derna, inclusive da europeia. Os impéri-os constituíram de fato a última grandeexpressão política do espírito conser-

vador e, sendo também os Estados maisavançados do início da modernidade,representaram sua culminância. Hoje asociedade conservadora enfrenta pro-blemas. Ou foi efetivamente tomada pelomoderno etos ocidental, ou está pas-sando pela difícil transição do espíritoconservador para o moderno. Ofundamentalismo é, em grande parte,uma reação a essa penosa transforma-ção. (ARMSTRONG, 2001, p. 52, grifonosso)

O descompasso do mundo mulçumanodeve-se, em grandeparte, à intransigênciados setores religiososque defendem a pos-tura conservadora. Ali(2005) argumenta queexiste uma necessida-de premente de umaReforma Islâmica paravarrer o conservado-rismo enlouquecido eo atraso dos funda-mentalistas. Na visãode Ali, o Islã deve ser

aberto a novas ideias que sejam mais avan-çadas que o que está sendo oferecido peloOcidente. Para ele, esta mudança seria daseguinte forma:

Isso exigiria a separação entre Estado emesquita; a dissolução do clero; a afir-mação, por parte de intelectuaismulçulmanos, de seu direito de interpre-tar textos que são de propriedade cole-tiva de toda a cultura islâmica; a liber-dade de pensar livre e racionalmente e aliberdade de imaginação. Enquanto nósnão nos virmos nessa direção, estare-mos condenados a viver de novo bata-lhas antigas, um pensamento não numfuturo mais rico e humano, mas em como

Existe uma necessidadepremente de uma Reforma

Islâmica para varrero conservadorismo

enlouquecido e o atrasodos fundamentalistas

Tariq Ali

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podemos nos mover do presente para opassado. É uma visão inaceitável. (ALI,2005, p. 433)

O abismo entre o Islã e o Ocidente

Pautada na extrema dependência domythos em detrimento do logos, a culturamulçumana foi perdendo o compasso coma modernidade. No Egito e no Irã, segundoArmstrong (2001), a modernidade era vistacomo algo agressivo, invasivo e explora-dor. Atualmente não é incomum que osfundamentalistas islâmicos fiquem comchavões contra a sua cultura, “qualifican-do sua política de satânica, vilipendiandovalores como secularismo, democracia edireitos humanos”. (ARMSTRONG, 2001,p. 178)

Apesar dos ecosf u n d a m e n t a l i s t a sislâmicos bramirempalavras de ordemcontra os valores oci-dentais e, em algumassituações, afirmaremque o Islã e o Ociden-te são incompatíveis,estando em ladosdiametralmente opos-tos, para Armstrong (2001) isso é umainverdade, pois, em sua opinião, osislâmicos chegaram a descobrir “a sabe-doria da separação entre religião e políti-ca, desenvolveram uma concepção da li-berdade intelectual do indivíduo e perce-beram a necessidade de cultivar o pensa-mento racional” (ARMSTRONG, 2001, p.178), porém em menor escala, e isso nãofoi suficiente para produzir uma unanimi-dade no mundo islâmico voltada àmodernidade.

No final do século XIX alguns pensa-dores islâmicos descobriram que o Islãpossuía algumas similaridades com o Oci-

dente, ficando maravilhados com suas des-cobertas. Acreditavam que podiam repro-duzir os sucessos da sociedade ocidentalem sua sociedade.

Do Irã do século XIX, cita-se o círculo deintelectuais formado por Fathadi Akhundzada,Mulkum Khan, Abdul Rahim Talibzada e MirzaAqa Khan Kirmani, considerados rebeldes,sendo comparados aos sionistas. Esses inte-lectuais nutriam uma grande admiração pelomundo ocidental e compreendiam que o cami-nho para o progresso ocidental passaria pelalivre discussão das ideias e pelo debate cientí-fico, conceito totalmente impossível nomundo islâmico, devido ao conservadorismoreligioso.

Segundo Armstrong (2001), Kirmani seexpressava com especial franqueza e ques-

tionava que a religiãoera inútil, sem pratici-dade e não garantia atão buscada justiçasocial para os pobres.Nota-se que eram fer-renhos questionado-res do atraso do mun-do mulçumano e en-tendiam que isso sedevia à religião.

Apesar de serembem intencionados, Armstrong (2001) afir-ma que também eram ingênuos ao acredi-tar que a simples implantação de institui-ções jurídicas, educacionais ou políticaspoderiam levar, instantaneamente, o mun-do islâmico ao encontro da modernidade.Não percebiam a importância da industria-lização e da economia moderna no contex-to da época. Armstrong faz a seguinte ob-servação em relação a este aspecto:

Esses reformadores não percebiam aimportância da industrialização e da eco-nomia moderna. Uma educação europeiacertamente abriria novas portas para

Pautada na extremadependência do mythos em

detrimento do logos, acultura mulçumana foi

perdendo o compasso coma modernidade

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seus jovens compatriotas, mas de pou-co lhes serviria se a infraestrutura desua sociedade permanecesse intacta. Amodernização não estava engatinhandono Irã; os iranianos teriam ainda que pas-sar pelo doloroso processo de transfor-mar sua cultura agrária numa sociedadeindustrializada e técnica [...] Ainda quebenéficas, as instituições ocidentais nãopodiam, por si sós, transformar a men-talidade de um povo cujos horizontesainda eram os mesmos do período con-servador. (ARMSTRONG, 2001, p. 180)

No Egito do século XIX, surgiram trêsnomes importantes que enxergaram o atrasodo mundo muçulmano: o escritor Rifah al-Tahtawi, o iraniano xiita Jamal al-Din, apeli-dado de “al-Afghani”, e Muhammad Abdu,discípulo de Afghani. Esses três persona-gens também acreditavam que a modernidadeera compatível com a visão muçulmana. Cadaqual, à sua maneira, tentou influenciar a suaépoca no sentido de contribuir para que ofenômeno do progresso experimentado peloOcidente pudesse ser experimentado tambémno Egito do século XIX.

O escritor Tahtawi passou para sua obraliterária o entusiasmo que experimentouquando foi mandado por Muhammad Alipara Paris, a fim de aprimorar seus estudos.“Durante cinco anos estudou francês, his-tória antiga, mitologia grega, geografia, arit-mética e lógica. Encantou-se principalmen-te com as ideias do Iluminismo europeu, cujavisão racional julgou semelhante aoFalsafah2”. (ARMSTRONG, 2001, p. 182)

Ao retornar ao Egito, Tahtawi assumiuo Departamento de Tradução, por meio doqual os egípcios teriam acesso às obraseuropeias. Sua militância foi no sentido deconscientizar seus compatriotas da neces-

sidade de se aprender com o Ocidente. Suavisão era a de que a modernidade não cons-tituía uma ameaça ao Islã e o progresso eas inovações não deveriam ser detidos pelareligião. Ele realmente acreditava num fu-turo glorioso para o Egito, pautado na edu-cação europeia, com homens e mulherescom direitos iguais. Armstrong descreveuma parte da visão de Tahtawi:

Fascinado com a promessa de moder-nidade, escreveu um poema enaltecendoa máquina a vapor e classificou o Canalde Suez e as ferrovias transcontinentaisdos Estados Unidos como façanhas deengenharia que uniram os povos distan-tes da terra numa atmosfera de paz efraternidade. Que cientistas franceses ebritânicos se instalem no Egito! Isso sópoderá acelerar o ritmo do progresso.(ARMSTRONG, 2001, p. 182)

O iraniano xiita Jamal al-Din (“al-Afghani”) também teve a oportunidade deconhecer o Ocidente e também percebia queo Egito vivia um atraso em relação ao Oci-dente. Porém, ao contrário de Tahtawi,Afghani não morria de amores pelos euro-peus e tinha a convicção de que o Ocidenteiria expandir seu imperialismo para o Egito,por isso sentia-se no dever de doutrinar osegípcios para resistirem aos imperialistas. Agrande diferença de visão em relação aTahtawi consistia no fato de acreditar que omundo islâmico seria capaz de elaborar umaversão própria de modernidade, sem preci-sar imitar os padrões europeus, comoTahtawi preconizava. Porém, segundoArmstrong (2001, p. 184), Afghani teria iden-tificado um problema fundamental: “En-quanto a modernidade ocidental floresceraem grande parte graças à busca de inova-

2 Palavra árabe que significa “filosofia”; movimento filosófico esotérico que tentou conciliar a religiãorevelada do Alcorão com o racionalismo grego de Platão e Aristóteles. (ARMSTRONG, 2001, p. 413)

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ção e originalidade, os muçulmanos só po-diam modernizar sua sociedade mediante aimitação”. Afghani compreendia que umasimples reforma religiosa não bastaria paramodernizar o país, era necessária a industri-alização e a superação da estrutura agráriaque vigorava. A economia devia sofrer umchoque de gestão.

Na visão de Afghani, o Ocidente conse-guira atingir o progresso porque “os ideaismodernos de autonomia, democracia, liber-dade intelectual e tolerância eram produtostanto da economia quantos dos filósofos edos cientistas políticos” (ARMSTRONG,2001, p. 184). A resistência dos setores reli-giosos impedia que o mundo islâmico in-gressasse numa marcha em direção àmodernidade, e Afghani, ao tentar radicalizarseu discurso, acabou sendo expulso do Egi-to em 1879 e do Irã em 1891.

O caso de Muhammad Abdu, discípulode Afghani, se passou já no período decolonialismo britânico. Aproveitando-se doenfraquecimento do poder dos ulemás3 e dasubstituição da Shariah4 pelos tribunais ci-vis europeus, Abdu, indignado pelas críti-cas que os colonizadores faziam ao atrasodo Islã, despontou como um reformador re-volucionário e passou a tentar demonstrar“que o Islã poderia ser tão racional e moder-no como qualquer sistema ocidental”(ARMSTRONG, 2001, p. 189). Seguindo avisão de seu mestre, também acreditava queo Islã poderia criar sua própria estrutura deprogresso, sem precisar imitar o modelo oci-dental. Abdu tentou mudar, sem sucesso, osistema de ensino nas escolas egípcias.

Esses personagens citados até agora pos-suíam uma característica comum: todos eramreligiosos fervorosos e estavam comprome-

tidos com o mythos da religião e com as es-truturas religiosas da época. O discurso re-volucionário, de certa maneira, não ganhavaforça em decorrência do envolvimento deseus portadores com a religião. O que sentiucom mais intensidade a dificuldade que issorepresentava foi Afghani. Armstrong (2001)descreve a angústia de Afghani:

A tentativa de transformar uma verdadereligiosa em programa de ação políticaarrisca-se ao niilismo e ao desastre, eAfghani se expôs à acusação de usar oislamismo para justificar seu tresloucadoativismo revolucionário. Estava claro quenão conseguiria conciliar com suficienteprofundidade o imperativo religioso e suapolítica. Em 1896, quando incitou um deseus discípulos a assassinar Nasir ad-Din Shah, violou um dos princípios bási-cos de toda religião: o respeito pela san-tidade absoluta da vida humana. Fez oislamismo parecer não só ineficiente ebizarro, mas também imoral. (ARMS-TRONG, 2001, p. 186)

O Ocidente encarava o atraso islâmicocom uma dose de preconceito. Não bas-tassem as questões relacionadas ao con-fronto religioso entre revelações (a cristã ea islâmica), que encheu as páginas da his-tória de sangue, o afastamento cultural, de-vido aos rigorosos dogmas do Islã, era la-tente. Segundo Hourani (1980), LordCromer, cônsul britânico no Cairo no perí-odo de 1883 a 1907, durante a ocupaçãocolonialista, apresentou a seguinte obser-vação sobre o Islã da época.

“noble monotheism”, but a socialsystem it “has been a complete failure”:

3 Palavra árabe que significa guardiões das tradições jurídicas e religiosas entre sunitas e xiitas.(ARMSTRONG, 2001, p. 420)

4 Palavra árabe que significa “o caminho da fonte”; representava a lei sagrada dos muçulmanos, derivadado Alcorão, da Suna e dos Hadith. Para os fiéis, essa lei é imutável e, divinamente inspirada, constituiseu único guia seguro e regula todos os aspectos da vida.

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Islam keeps women in a position ofinferiority, it “crystallizes religion andlaw into an inseparable and immutablewhole, with a result that all elastic istaken out of the social system”; it doesnot encourage the development of thepower of logical thought. Thus,Muslims can scarcely hope to rulethemselves or reform their societies; andyet Islam can generate a mass feelingwhich, in a moment, can break whateverbrittle bonds the European reformer hasbeen able to establish with those he istrying to help. The fear of the “revolt ofIslam” is never far from Cromer’sthoughts. (HOURANI, 1980, p. 12)

Apesar desse notá-vel atraso e de muitaresistência, alguns Es-tados muçulmanosconseguiram caminharrumo à modernidade.Um bom exemplo é aTurquia, que obtevesua secularização apósa guerra de independência comandada porMustafa Kemal Ataturk, que, entre 1919 e1922, expulsou os europeus da Turquia ecriou um Estado forte e soberano. Em 1947,a Turquia possuía uma burocracia eficientee uma economia capitalista, sendo a primei-ra democracia secular pluripartidária do Ori-ente Médio.

A ocidentalização do islamismo e a suaredução a um credo privado, sem influên-cia legal, política ou econômica, foi a prin-cipal ideia de Ataturk. Sua visão preconi-zava uma religião subordinada ao Estado.Entre outras medidas, ele fechou todas asmadrasahs5 e escolas do Alcorão, promul-

gou uma lei que obrigava o uso de trajesocidentais e proibiu o véu para as mulhe-res e o fez* para os homens. Era de se es-perar que os clérigos reagissem com vio-lência a essas inovações, pois esses atosrepercutiam como uma bomba no OrienteMédio. “Motivado pela defesa do Islãpuro, o líder da ordem sufista, Shaykh SaidSursi, ainda tentou uma reação, mas estafoi esmagada em dois meses por Ataturk.”(ARMSTRONG, 2001, p. 220-221)

O processo de secularização no Irã teveinício no ano de 1905, quando o governadorde Teerã resolveu castigar os comercianteslocais devido aos altos preços. Como osulemás formavam a maioria da classe comer-

ciante, esta arbitrarie-dade provocou inqui-etação no povo e cau-sou uma mudança deregime com a institui-ção da primeira majlis(assembleia represen-tativa). Para Arms-trong (2001), isso foipossível porque, “ao

contrário dos seus colegas egípcios, que sefechavam nas madrasahs, os ulemás irania-nos estavam, com frequência, na vanguar-da das mudanças” (ARMSTRONG, 2001, p.224). Entre idas e vindas, com muita resis-tência por parte dos clérigos, a seculariza-ção se firmou e chegou ao seu ápice com achegada ao poder do Xá Reza Pahlevi, queconseguiu ser mais implacável do queAtaturk, na Turquia.

Pahlevi viria a se tornar um grande alia-do dos Estados Unidos e levaria o Irã auma secularização total não fosse a revo-lução iraniana desencadeada pelos jovensiranianos, que não só levou o aiatolá

5 Palavra árabe que significa “faculdade ou seminário islâmico, cujo currículo se concentra em disciplinasreligiosas, sobretudo na lei islâmica”. (ARMSTRONG, 2001, p. 416)

* N.R.: Barrete cônico usado especialmente por turcos.

A história mundial revelaque o desenvolvimento

econômico é consequênciado desenvolvimento

educacional

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Khomeini ao poder, mas também restabele-ceu o Estado Teocrático do Irã.

Existem alguns aspectos importantes quefizeram do Irã, apesar do retorno da religiãoao poder, um dos Estados muçulmanos maismodernos da atualidade. Um dos principaisfatores foi o desenvolvimento educacionalque se observou naquele país.

A história mundial revela que o desen-volvimento econômico é consequência dodesenvolvimento educacional. Podemosnotar que na África, por exemplo, as trans-ferências de fábricas são restritas. O apren-dizado em todo o planeta está crescendo, eos países mais pobres estão empenhadosem elevar os seus ín-dices e buscam o de-senvolvimento cultu-ral. A globalização eco-nômica aproveita essesurto para otimizar olucro dos países ricospoderosos, que bus-cam locais com abun-dância de mão de obraalfabetizada e barata.Dessa forma, o cresci-mento econômiconessas regiões é de-formado, mas acabaacontecendo e gera,ainda sim, um ciclo de desenvolvimentoeconômico e educacional, em que pese aforte exploração.

Esse desenvolvimento educacional na-turalmente contribui para o controle dafecundidade, cujos índices iniciam uma que-da. No entanto, essa transição demográficanão foi concluída; em certos paísesmulçumanos, o controle da natalidade estácomeçando. Na Palestina, existe uma ano-malia sociológica e histórica, segundo Todd:

Uma fecundidade de combate ligada àocupação, que por sinal tem sua

contrapartida na forte natalidade de ju-deus de Israel, anômala tratando-se deuma população ocidental de nível edu-cacional elevado. O apro-fundamentodas estatísticas sugere com efeito umaautêntica cisão cultural da populaçãojudaica, com uma taxa média de 2,4 nocaso dos leigos e dos religiosos mode-rados, mas de 5 no dos religiosos orto-doxos e ultraortodoxos, sendo este últi-mo valor resultado de uma recuperaçãode fecundidade. (TODD, 2003, p. 44).

Alfabetização e controle da natalidadefavorecem o desenvolvimento econômico,

além de proporcionaràs pessoas novasperspectivas culturaise mentais. Acompa-nhando essa evolu-ção, surgem movimen-tos violentos de popu-lações que se conside-ram fora desse proces-so. Todd (2003, p. 44)enfatiza que “o aces-so à modernidademental é frequente-mente acompanhadode uma explosão deviolência ideológica”.

Esse fenômeno aconteceu na Europa deforma violenta, segundo valores diversos:liberais e igualitários, autoritários e igualitá-rios, autoritários e desiguais, característicasrespectivas da Revolução Francesa, da Re-volução Russa e do movimento nazista. ARevolução Inglesa foi a primeira a revelar oparadoxo da modernização. Surgiu de umapopulação que foi alfabetizada precocementee gerou uma crise ideológica, política e reli-giosa que proporcionou a base para o pio-neiro desenvolvimento inglês, capaz de in-fluenciar, posteriormente, as revoluçõesmencionadas acima e suas sociedades.

O crescimento econômiconos países mais pobres édeformado, mas acaba

acontecendo e gera, aindasim, um ciclo dedesenvolvimento

econômico e educacional,em que pese a forte

exploração

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

Na revolução religiosa iraniana de 1979,a taxa de alfabetização do país já era eleva-da, o que pôs em movimento toda a popula-ção a uma modernização mental geral e auma queda de fecun-didade. Para Todd(2003), as questões ideológicas do islamismoxiita têm o mesmo sentido dos conflitos pro-testantes na época de Cromwell, porém, paraos ocidentais de tradição cristã, essa rela-ção é de difícil identificação.

Lutero e, mais ainda, Calvino, esses aia-tolás do século XVI, contribuíram parao nascimento de uma sociedade rege-nerada e purificada: a América, tão filhada exaltação religiosa quanto o Irã mo-derno. O Irã apresenta hoje uma estabi-

lização política, com eleições que, semserem livres, não deixam de ser essenci-almente pluralistas, com reformistas econservadores, uma esquerda e uma di-reita. (TODD, 2003, p. 48)

Todd (2003) defende que a jihad apresen-ta a mesma natureza das demais revoluções,está realmente longe de ser liberal, porém éuma crise de transição, em que a violência e odelírio religioso são apenas temporários. Omundo mulçumano, segundo o autor, efetuaa grande passagem: está abandonando arotina de um mundo analfabeto e caminhapara a alfabetização universal. Essa transi-ção seguirá a sequência clássica alfabetiza-ção-revolução-queda de fecundidade.

Os fundamentos da morte

Segundo Silva (2004, p.126), “a própriacivilização cria, ao construir em seus pila-res estruturas sociais baseadas no egoís-mo e no princípio da destruição, o contrá-rio dela própria (o contrário do processocivilizatório): a barbárie”. Se formos avaliaro estrago que esta inversão do processocivilizatório já causou para a humanidade,seremos obrigados a partilhar da tese queapresenta a raça humana como um equívo-co biológico.

O FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO: O MYTHOS DESFIGURADO

“– Está confirmado – ele disse – Está se curvando e inclinando para o sul.– Que torre é essa? – perguntou o operador – Um ou dois?– A torre que restou. A Torre Norte está se inclinando na direção sudoeste agora –

disse Hayes. –– Parece estar se curvando no canto sudoeste.”

(Nova York, 11 de setembro de 2001)6

Teixeira (2006), citando o embaixadorLindgren Alves, afirma que é muito importan-te a diferenciação de fundamentalismo e anti-imperialismo, uma vez que este se prende aquestões antineoliberais e de exclusão social,aquele não. Não se pode dizer que todos osfundamentalistas são terroristas, ou que têminspiração religiosa. Dos fundamentalismosatuais, religiosos, ideológicos, de gênero oucultural, nacional ou identitário, nenhum pos-sui preocupações de justiça universalistas ouprogramas abrangentes de emancipação so-cial. “Todos servem, ainda que não queiram, à

Parte 3

6 Diálogo entre dois bombeiros minutos antes de a Torre Norte desabar. (DWYER e FLYNN, 2005, p. 246)

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

fragmentação do nosso mundo ‘pós-moder-no’ e ‘pós-político’, adequada à afirmação domercado como força unificadora.” (TEIXEIRA,2006, p. 200)

Muito mais do que um processo revolu-cionário, ao menos aqueles conhecidos atéaqui, a tentativa desesperada de retornoao passado por parte dos grupos radicaisislâmicos desafia os Estados constituídos,na medida em que se vale dos avançostecnológicos para propagar sua mensagemneolítica. Apesar de não ser exatamente omal dos males, tendo em vista o desempe-nho do século XX, considerado para al-guns historiadorescomo o “Século Som-brio”, o terrorismocatastrófico irrompe oséculo XXI como umgrande desafio para aordem mundial. Silva(2004) segue tecendoo seguinte comentário:

Este é, na verdade, ogrande risco existen-te na Nova OrdemMundial. Hoje, paraa sociedade de pon-ta, onde o bem-estarsocial é almejado evivido, o risco deuma guerra moderna,mesmo que assimétrica, é pesado demais,como foi provado em 11 de setembro de2001. Entretanto, para as sociedades párias,vivendo formas organizacionais retriba-lizadas, marginais e excludentes da pros-peridade mundial, as perdas materiais emconflitos armados são irrelevantes, e asbaixas consideradas martírio heroico, tole-ráveis. (SILVA, 2004, p. 133)

A vida, para os fundamentalistasislâmicos, custa menos que a página do

Alcorão modificado tendenciosamente, deonde retiram mandamentos que envergo-nharia o próprio profeta. Pelos devaneiosde seres como Muhammad Ibn AbdulWahhab, Abul Ala Mawdudi, Sayyid Qutbe Osama Bin Laden, gerações inteiras fo-ram levadas ao engano e à distorção domythos. Cada um na sua época participoudeste projeto que hoje é gerenciado pelosaudita mais procurado do mundo.

As raízes do radicalismo

A secularização de parte do mundoislâmico deu vazão a um movimento religio-

so radical que incorpo-rou os ensinamentosde pensadores conser-vadores que, desde oséculo XVIII, com owahhabismo, procu-ram deturpar o espíritooriginal do Islã. OsamaBin Laden, líder da or-ganização terrorista daAl Qaeda, personificaeste espírito retrógra-do homicida.

Qualquer tipo defundamentalismo reli-gioso busca a restau-ração de princípiosfundamentais que

existiam à época da criação de determinadareligião e que sofreram distorções e altera-ções de valores devido à ação do tempo, àevolução e à modernização do mundo.

Segundo Teixeira (2006), ao contrário doque se imagina, o termo fundamentalismonão surgiu no islamismo, mas sim no cristi-anismo. A publicação do livro Os Funda-mentos, que foi patrocinada por empresári-os evangélicos dos EUA, no início do sé-culo XX, fez surgir o termo fundamentalis-mo cristão, relacionado ao protestantismo.

Qualquer tipo defundamentalismo religioso

busca a restauração deprincípios fundamentaisque existiam à época dacriação de determinadareligião e que sofreram

distorções e alterações devalores devido à ação do

tempo, à evolução e àmodernização do mundo

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

Este termo foi redefinido em virtude de tersido associado aos grupos terroristasislâmicos, como o palestino Hamas e o li-banês Hezbollah, e, a partir do início dadécada de 80, passou a ser um termo pejo-rativo, em decorrência da atuação violentados fundamentalistas islâmicos. (TEIXEI-RA, 2006, p. 201)

O fundamentalismo islâmico também nãoé um fenômeno exclusivo do século XXI.Suas raízes remontam ao século XVIII e en-contram em Muhammad Ibn Abdul Wahhabseu primeiro idealizador no mundo muçulma-no. Filho de um teólogo ortodoxo da cidade-oásis de Uyayna, Wahhab se levantou con-tra o que ele acreditavaser uma idolatria ao pro-feta e contra tudo o quenão era sunita. Ao de-fender o jihad proséli-to, os espancamentospúblicos, o apedre-jamento de adúlteras, aamputação de mem-bros como punição,Wahhab foi expulso desua comunidade, pas-sando a ser um viajan-te observador do queele chamava de deca-dência do Islã. Suasideias podiam ter pas-sado em branco por nãoserem tão originais, porém seu encontro como emir bandoleiro Muhammad Ibn Saud pro-porcionou uma grande oportunidade paraque Saud, por meio da mensagem radical deWahhab, consolidasse seus intentos políti-cos na região. Para Ali (2005), esta combina-ção de fanatismo religioso, implacabilidademilitar, vilania política e recrutamento força-do de mulheres para cimentar alianças foi apedra fundamental da dinastia que governaa Arábia Saudita hoje. Surgia então owahhabismo.

Em um passado mais recente, encontramosAbul Ala Mawdudi, jornalista paquistanês,cujas ideias inflamaram o Egito de Nasser, en-tre 1950 e 1960, exatamente no período queNasser exterminava o grupo conhecido comoIrmandade Muçulmana. Mawdudi se levanta-va contra o secularismo egípcio pregado per-seguido por Nasser. Acreditava este escritorque no Ocidente estaria em curso umamobilização para esmagar o Islã. A ideia demobilização de Mawdudi incluía a tentativade “fazer uma apresentação racional e siste-mática do islamismo, tentando transformar seucomplexo mythos e sua complexa espirituali-dade em logos, em um discurso racionalizado,

convincente e capaz deinspirar um ativismopragmático” (ARMS-TRONG, 2001, p. 269). Aideologia de Mawdudiera baseada na doutri-na da soberania deDeus, o que facilitavatodos os questiona-mentos das verdadessagradas. Dessa forma,defendia a jihad comouma via para imposiçãoda lei de Deus. Segun-do Armstrong (2001),“como todo ideólogo,Mawdudi não estavaelaborando uma teoria

erudita e confusa, e sim propondo a luta arma-da” (ARMSTRONG, 2001, p. 269).

As ideias de Mawdudi serviram de basepara Sayyid Qutb, o grande mentor e teóri-co da Al Qaeda de Osama Bin Laden. Po-rém não é possível fazer alusão a Qutb semconsiderar o grupo islâmico egípcio conhe-cido como Irmandade Muçulmana, célulamater da Al Qaeda.

A Sociedade dos Irmãos, ou IrmandadeMulçumana, como é mais conhecida, sur-giu como parte de uma reação da religião

O fundamentalismoislâmico também não é um

fenômeno exclusivo doséculo XXI. Suas raízes

remontam ao século XVIIIe encontram em

Muhammad Ibn AbdulWahhab seu primeiroidealizador no mundo

muçulmano

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

ao colonialismo do Egito. Um professorchamado Hasan Al-Banna foi o responsá-vel por levar as ideias dos reformadoresmais antigos, como Afghani, Abdu e Rida,para o povo. Este pensamento, até então,era restrito às elites egípcias. Al-Bannaacreditava na premência da modernização,com a utilização da ciência e da tecnologiaocidental, bem como na reforma no planopolítico, social e econômico. Porém, defen-dia que tais inovações deveriam ser prece-didas de uma reforma espiritual e psicoló-gica (ARMSTRONG, 2001, p. 250).Armstrong sintetiza a visão de Al-Banna:

Islamismo não era uma ideologia nosmoldes ocidentais, nem um conjunto decredos. Era um estilo de vida e, se fosseseguido com entusiasmo e sinceridade,traria de volta aquele dinamismo e aque-la energia que os muçulmanos tiveramno passado, antes da colonização es-trangeira. Para refortalecer a ummah, elesprecisam redescobrir sua alma islâmica.(ARMSTRONG, 2001, p. 251)

Banna formulou um programa de seis pon-tos: (1) interpretação do Corão no espírito daépoca; (2) unidade das nações islâmicas; (3)melhoria do padrão de vida e conquista dejustiça e ordem social; (4) combate ao analfa-betismo e à pobreza; (5) emancipação do do-mínio estrangeiro; e (6) promoção da paz e dafraternidade islâmica no mundo. Armstrong(2001) faz questão de ressaltar que Al-Bannaera “avesso à violência e ao radicalismo evisava, basicamente, à reforma fundamentalda sociedade muçulmana, abalada pela expe-riência colonial e apartada de suas raízes”(ARMSTRONG, 2001, p. 250). É importanteesta colocação, na medida em que a atualmilitância da Al Qaeda é originária desta so-ciedade egípcia, que, ao assimilar árabessauditas seguidores do wahhabismo, comoOsama Bin Laden, em paralelo com a ideolo-

gia distorcida de Sayyid Qutb, produziu oatual fundamentalismo islâmico que se utilizado terrorismo catastrófico.

A Irmandade Muçulmana de Al-Banna,inicialmente, era extremamente crítica emrelação ao wahhabismo, ao ponto de con-denar suas práticas arcaicas, confirmandoo viés fraternal em relação ao islamismo.Uma característica específica de Al-Bannapode ter sido a porta de entrada do radica-lismo enlouquecido na Irmandade: Bannanão gostava de delegar responsabilidadese era extremamente centralizador. Desta for-ma, após a sua morte houve disputas inter-nas na sociedade que, virtualmente, des-truíram a entidade.

O surgimento de uma unidade terroristadenominada Aparelho Secreto (al-Jihaz al-Sirri), que passou a atuar à margem da so-ciedade, iniciou a deturpação dos ideaisperseguidos por Banna enquanto vivo efoi responsável pela deterioração dos mes-mos após sua morte. Sabe-se, por meio deum estudo de Richard P. Mitchell, que esseaparelho concentrava cerca de mil membrose que foi responsável por diversas açõesviolentas na época. Na visão de Armstrong(2001), “todo movimento que começa ma-tando em nome de Deus toma um rumoniilista que nega os valores religiosos maisfundamentais” (ARMSTRONG, 2001, p.250). Não existem evidências que apontempara a participação de Banna nas ações doAparelho Secreto. Sabe-se, pelo estudo deMitchell, que ele as condenava veemente-mente. Porém, após o assassinato do juizAhmed al-Khazinder pelo Aparelho, foi ini-ciada uma violenta campanha de terror, queculminou com a dissolução da Irmandadee a prisão de cerca de 4 mil irmãos. Al-Bannaseria assassinado em fevereiro de 1949,deixando o caminho aberto para ativistascomo Sayyid Qutb.

Mawdudi inaugurara um tipo de militânciana qual a jihad ocupava uma posição central.

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Qutb foi altamente influenciado pelas obrasde Mawdudi e, graças ao período que passouna prisão devido à opressão do governo deNasser, pode expandir a sua revolta e aumen-tar o enfoque hostil da visão de Mawdudi.Considerado o criador do fundamentalismoislâmico, Qutb é descrito como guru intelectu-al da Al Qaeda. As obras de Qutb, recheadasde violência e radicalismo, formam a base cen-tral do fundamentalismo islâmico do séculoXXI. Nota-se nessas obras a perversão com-pleta dos ensinamentos do Alcorão, com umasupervalorização de conceitos relacionadosaos aspectos guerreirosdo profeta Maomé. ParaArmstrong (2001), esteé um grave erro, que le-vará ao fomento da in-tolerância:

Entretanto, ao colo-car a jihad no centroda visão islâmica,Qutb distorcera a bi-ografia do profeta.As biografias tradi-cionais deixam claroque, embora primei-ra ummah tivesse delutar para sobreviver, Maomé conquistoua vitória não com a espada, e sim com aengenhosa tática da não violência. O Al-corão condena a guerra em geral e permiteapenas autodefesa. Opõe-se firmemente aouso da força em questões religiosas. Temuma visão inclusiva, reconhece a validadede toda religião corretamente orientada eenaltece todos os grandes profetas do pas-sado. (ARMSTRONG, 2001, p. 276)

Na Arábia Saudita, os ensinamentos deQutb acirraram os ideais dos seguidores dowahhabismo, que viram na doutrina de Qutba salvação do Islã. No Egito, a IrmandadeMulçumana ganharia status de organizaçãoterrorista, exportadora de radicais para as

causas muçulmanas. A atmosfera de radica-lismo político e religioso fomentado por suasideias serviram aos objetivos da facção li-nha dura do Islã. O fundamentalismoislâmico tinha o cimento doutrinário para aoperacionalização dos fundamentalistas. Aresistência ao regime soviético noAfeganistão criaria um grupo coeso defundamentalistas islâmicos, que posterior-mente seria conhecido como Al Qaeda.

Al Qaeda: a era do terrorismocatastrófico

Ramonet (2003,p.48), de maneira intri-gante, afirma que,“como o Dr. Frankens-tein, os Estados Unidosviram, no dia 11 de se-tembro de 2001, a suavelha criação – OsamaBin Laden – erguer-secontra eles com uma vi-olência demente”. Emum atentado minuciosa-mente preparado, emsolo americano, com autilização de aviões co-

merciais e ampla e incessante divulgação namídia, Bin Laden chocou o mundo ao apre-sentar as credenciais do fundamentalismoislâmico do século XXI.

“Não me deixarei levar pela imagem dosdestroços das Torres Gêmeas, porque nãoquero cair na armadilha que o terrorismo,por sua natureza, nos prepara: assustar-nosa ponto de cedermos à suas chantagens”(BONANATE, 2001, p. 9). Apesar dessaspalavras emocionadas de Bonanate (2001),a imagem das Torres em chamas ainda cau-sa uma sensação estranha, mesmo após cer-ca de sete anos desde o catastrófico 11 desetembro de 2001. A ampla e constante co-bertura da mídia, que apresentou os even-

“Não me deixarei levar pelaimagem dos destroços das

Torres Gêmeas, porque nãoquero cair na armadilhaque o terrorismo, por sua

natureza, nos prepara:assustar-nos a ponto de ce-dermos à suas chantagens”

(BONANATE, 2001)

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

tos em tempo real, contribuiu para que aque-las cenas fortes permanecessem indefinida-mente nas memórias de um planeta.

Para Almeida (2006), a Revolução Irani-ana confirmava dois pontos centrais dosfundadores do islamismo radical: o de queo poder tinha que ser conquistado por meioda revolução e o de que os Estados Uni-dos, na sua condição de líder do mundoocidental, eram o inimigo principal do Islã(ALMEIDA, 2006, p. 1).

Segundo Teixeira (2006), a RevoluçãoIraniana foi a motivação para que osfundamentalistas radicais iniciassem seusplanos, que incluiriam auxiliar a resistênciacontra a União Soviética no Afeganistão.O autor faz o seguinte comentário:

O impacto das ideias produzidas com aRevolução Iraniana, em conjunto com afilosofia, já deturpada, da IrmandadeMulçumana de Al-Banna, criou o climaideal para a invasão da Grande Mesqui-ta de Meca por 200 militantes islâmicosque, armados, protestaram contra acorrupção do governo saudita e o seualinhamento com os EUA. (TEIXEIRA,2001, p. 202)

Teixeira (2006) comenta que, no auge daGuerra Fria, eram rotineiras tais interven-ções das grandes potências, com a finali-dade de resguardarem suas ideologias. Aaventura americana no Vietnã pode ser con-siderada um exemplo de ação similar, porparte dos EUA, com a mesma finalidade.

Desta forma, com apoio dos EstadosUnidos, a Al-Qaeda foi criada por OsamaBin Laden e pelo palestino Abdullah Yusuf.Inicialmente a organização se chamavaMaktab al-Khadamat (MAK), formada pormujihadines, como eram chamados os guer-

rilheiros7 mulçumanos que lutavam contraa ocupação soviética e a favor da instala-ção de um Estado islâmico no Afeganistão.

Segundo Almeida (2006), do Afega-nistão os mujihadines viram-se obrigadosa procurar outros campos de batalha. Al-guns efetivos se dirigiram ao Egito, outrosforam para Argélia. Um grande efetivo foilutar na Guerra da Bósnia, outra parte foipara a Caxemira e a Chechênia. Onde hou-vesse conflito envolvendo mulçumanos, láestavam os fundamentalistas islâmicos paraempreender a nova jihad, que até 1989 exi-gia aliança com o Ocidente. Após esse ano,voltou-se contra o próprio Ocidente.

Segundo Teixeira (2001), o sequestrodos aviões que foram utilizados como mís-seis, com a utilização de canivetes e facasimprovisadas; a meticulosidade do prepa-ro técnico dos agentes terroristas em con-dução de aeronaves; o simples sistema decomunicações usado para o planejamentodas ações, com larga utilização da internet;a facilidade de infiltração da célula em terri-tório americano, fazendo uso de leis e nor-mas internas de imigração; e o alto grau dedisciplina, capacidade de planejamento efanatismo religioso presentes nosperpetradores demonstram que o inimigoassimétrico atual é bem diferente daqueleencontrado nas selvas do Vietnã e daCoreia. Sobre a utilização dos aviões,Ramonet (2003) diz o seguinte:

Nesse aspecto, produz-se uma mudan-ça geopolítica maior, que vai afetar, in-discutivelmente, as nossas vidas. Tudocomeça, pois, nessa fatídica terça-feira,11 de setembro, com a descoberta deuma arma nova: um avião de carreira,cheio de combustível e transformado emmíssil de destruição. Desconhecida até

7 Elementos que conduzem uma “guerrilha”, tipo de conflito armado não internacional. Também consi-derados combatentes irregulares, por não pertencerem a uma força armada convencional.

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

então, essa monstruosa bomba incen-diária percute, de surpresa, a América,várias vezes no mesmo momento. O cho-que é de uma tal violência que o mundoficará efetivamente abalado. (RAMO-NET, 2003, p. 59)

Na manhã do dia 11 de setembro de 2001,uma série de atentados lançados pela redeterrorista Al-Qaeda em solo americano ti-rou a vida de 2.749 pessoas só na cidadede Nova York8. Foi o maior golpe recebidopela superpotência em solo pátrio. O ata-que da Al-Qaeda emNova York represen-tou o ponto culminan-te do terrorismo catas-trófico. A organizaçãojá havia realizado ou-tros ataques, porémnenhum atingiu me-lhor seus objetivoscomo o de 11 de se-tembro. Para Neto(2006, p.198) o terro-rismo catastrófico se-ria uma evolução doterrorismo ideológicopraticado por gruposcomo o IRA, na Irlan-da, e o ETA, na Espanha.

Enfatiza Neto (2006) que o terrorismoideológico seria caracterizado da seguinteforma: (1) ataques a alvos seletivos, rara-mente visando à matança indiscriminada;(2) o uso da violência era visto como ummeio necessário para a correção de rumoou reformulação de um sistema; (3) crençana justiça inerente à causa questionada,como forma de conduzir a uma vitória final;(4) os objetivos principais eram tangíveis,

conhecidos e divulgados; e (5) prontamenteassumiam a autoria de seus atos.

Neto (2006) segue apresentando as ca-racterísticas do terrorismo catastrófico daseguinte forma: (1) prática de atosindiscriminados, cuidadosamente planeja-dos para causar o maior número de vítimaspossível; (2) a demora para assumir a auto-ria, ou não assunção; (3) objetivos princi-pais obscuros e intangíveis; (4) atuaçãoglobal sob forma de redes transnacionais;(5) total incompatibilidade com valoresmorais e políticos vigentes; e (6) desen-

volvimento de esfor-ços para obtenção detecnologia para uso dearmas de destruiçãoem massa.

Além das caracte-rísticas citadas acima,M. Neto (2002) apre-senta outras para oque ele chama terro-rismo messiânico: (1)ignora a comunidadedas nações e ignora odireito internacional;(2) promete rendiçãopelo martírio; (3) usoimperativo e sem limi-

te da força; e (4) capacidade imaginativa ede correr riscos.

O principal alvo do terrorismo catastrófi-co são as mentes das pessoas que, por meioda mídia, acompanham perplexas o resulta-do das ações. A mídia é fundamental para osucesso das ações, portanto não se mede osucesso pelo número de vítimas, mas simpela repercussão na mídia. E como esta re-percussão está diretamente relacionada como número de vítimas, percebe-se que esta

8 Das 2.749 pessoas mortas, 147 eram passageiros ou tripulantes dos voos, cerca de 600 estavam nosandares do impacto, 412 pertenciam às equipes de resgate, 1.500 resistiram aos choques, masficaram presas em andares acima das áreas dos impactos (Dwyer e Flynn, 2005, p. 16).

O principal alvo doterrorismo catastrófico sãoas mentes das pessoas que,

por meio da mídia,acompanham perplexas o

resultado das ações.O marketing do terror seapoia no sucesso de suas

ações, e o produtooferecido é o medo

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

sistemática conduz a uma espiral macabra.O marketing do terror se apoia no sucessode suas ações, e o produto oferecido é omedo. M. Neto (2002) define marketing doterror da seguinte forma:

É uma modalidade de ação de comuni-cação de marketing que tem como ob-jetivo disseminar o terror em todo omundo. Seu propósito é claro: difundiro medo generaliza-do e, com isso, ga-nhar as manchetesda mídia internaci-onal, acirrar confli-tos entre países epovos, afrontar go-vernos e a políticainternacional. (M.NETO, 2002, p. 51)

A mídia serve per-feitamente aos inten-tos dos grupos terro-ristas do século XXI,que espalham suadestruição e sua men-sagem de pessimismo,talvez como forma deprovar que são capa-zes de levar o mundoà destruição completa.Seu marketing é total-mente voltado para um enfoque tenebrosoque não transmite outra mensagem senãoa de que o futuro será pior.

Segundo Teixeira (2006), o avançotecnológico dos meios de destruição emmassa faz com que o planeta, diariamente,adormeça em total perplexidade, sem sabercomo será o amanhã. Um único artefatonuclear, químico ou biológico seria capazde exterminar milhares de humanos. A ou-sadia dos grupos terroristas, minoritárioscombatentes da guerra assimétrica global,

cresce na mesma proporção na qual aumen-ta, no seio destes grupos, o ódio pelosEUA.

A violência e a frieza das ações terroris-tas realizadas em 11 de setembro de 2001podem ser constatadas por meio de umasimples análise dos fatos. Atos terroristasnão eram desconhecidos pelo mundo, po-rém o ataque sistemático aos símbolos deuma nação em solo pátrio, em tão grande

escala e reforçadopelo impacto tele-visivo introduz algoque figurava no cam-po das ideias, intangí-vel e imaterial: o medogeneralizado!

Em relação ao futu-ro do planeta, espera-se que os Estadospossam aprender acombater esse maca-bro fenômeno. Nãoresta dúvida de queeles realizarão umnovo ataque em gran-de escala. Onde equando são perguntasque especialistas fa-zem diariamente natentativa de, com a uti-lização dos meios deinteligência, tentar an-

tecipar as ações obstrutivas.O planeta não dorme mais em paz. A

perda do sentido do mythos, da revela-ção, atirou esses enlouquecidos funda-mentalistas em um destino de destruição.Como um câncer, suas redes, contatos eligações se expandem pelo mundoglobalizado. E nos mais recônditos pla-nos espirituais, o profeta chora pelo quefizeram de sua revelação.

Aqui no planeta Terra, profetas comoRamonet lançam suas profecias:

O planeta não dorme maisem paz. A perda do sentido

do mythos, da revelação,atirou esses enlouquecidos

fundamentalistas em umdestino de destruição.Como um câncer, suas

redes, contatos e ligaçõesse expandem pelo mundoglobalizado. E nos mais

recônditos planosespirituais, o profeta chora

pelo que fizeram de suarevelação

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

Todos sabem que os crimes do dia 11 de setembro, inaugurais, se reproduzirão. Emoutro lugar talvez, em circunstâncias diferentes, sem dúvida, mas eles se repetirão. A

história dos conflitos ensina que, quando uma nova arma aparece, ela é semprereempregada. Isso aconteceu com os gases de combate após 1918, e com a destruiçãodas cidades por bombardeios depois da Guernica, em 1937. Aliás, esse é o temor que

mantém, 56 anos depois de Hiroxima, o terror nuclear [...]”.(Ignácio Ramonet9)

CONCLUSÃO

O mundo muçulmano teve muita dificul-dade para aceitar a modernidade. Em algunspaíses a secularização se obteve com ati-tudes extremas de governantes ousados,em outros ela ainda se encontra em curso.O descompasso entreo Islã e o Ocidente égritante e refletiu na di-ficuldade de melhorade qualidade de vida.

A cisão precoce noislamismo acabou en-gessando e polarizandoa religião entre dogmasque valorizavam em de-masia o mythos em de-trimento do logos, limi-tando o progresso so-cial, cultural, político etecnológico.

O choque de civili-zações alardeado pelamídia envolve ques-tões mais complexasdo que simples incom-patibilidades culturais. O atraso na moder-nização do mundo muçulmano gerou dife-renças econômicas e sociais que fomen-tam o conflito entre as culturas muçulma-nas e ocidentais.

A priorização da revelação em detrimentoda razão é decorrente da falta do debate aca-dêmico, que inviabilizou o progresso da ci-ência e da tecnologia no mundo muçulmano.

Em resposta à secularização de algunsregimes muçulmanos, surgiram os gruposfundamentalistas que representam uma

oposição completa eirrestrita a qualquerinfluência do mundoocidental.

A involução deuma sociedade criadapara a exaltação dosvalores muçulmanosno Egito, a IrmandadeMuçulmana, proporci-onou condições parao surgimento dos gru-pos radicais.

O século XXI inau-gurou uma nova ame-aça representada peloterrorismo catastrófico,que sem a mídia perdetodos os seus efeitos.Osama Bin Laden, fiel

discípulo de Sayyid Qtub, incita a facçãofundamentalista do Islã a empreender umaguerra sem precedentes contra a civilizaçãoocidental. Os ataques perpetrados pela AlQaeda, associados à rapidez da informação

9 (RAMONET, 2003, p. 59-60 )

O choque de civilizaçõesalardeado pela mídiaenvolve questões mais

complexas do que simplesincompatibilidades

culturais. O atraso namodernização do mundo

muçulmano geroudiferenças econômicas esociais que fomentam o

conflito entre as culturasmuçulmanas e ocidentais

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FUNDAMENTALISMO ISLÂMICO – (Partes 2 e 3)

no mundo globalizado, alcançam os objeti-vos de marketing pretendidos.

Os fundamentalistas islâmicos são ca-pazes de usar armas de destruição em mas-sa em novos atentados catastróficos. Issorepresenta um futuro cercado de incerteza

e um desafio aos valores da sociedade li-vre. Dessa forma, o medo relacionado à pos-sibilidade de um ataque em grande escalacom armas nucleares possui total funda-mento, tendo em vista o descompromissocom o logos.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<POLÍTICA> Fundamentalismo; Política internacional; Religião; Terrorismo;

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SUMÁRIO

IntroduçãoEstabelecimento e desenvolvimentoComposição atual, métodos de trabalho e dinâmica negociadoraPrincipais temas debatidosRelações com outros órgãosConclusões

O COMITÊ ESPECIAL DE OPERAÇÕES DEMANUTENÇÃO DA PAZ DAS NAÇÕES UNIDAS (C-34)

EDUARDO UZIEL*Primeiro-Secretário

JOÃO AUGUSTO COSTA VARGAS**Segundo-Secretário

INTRODUÇÃO

As operações de manutenção da paz (oumissões de paz) são um dos instrumen-

tos mais conhecidos das Nações Unidas.Sua presença em quatro continentes, amobilização de cerca de 100 mil militares,policiais e civis e o papel central que desem-penham em contenção e solução de diver-

sos conflitos chamam a atenção da opiniãopública. A maioria das análises sobre as mis-sões de paz concentra-se em seus aspectosoperacionais, isto é, em como ospeacekeepers atuam nas áreas conflagra-das. O foco recai sobre as relações com apopulação local, a assistência humanitária,a proteção de civis e de grupos vulneráveis,a mediação entre grupos armados, eventu-

* Serve atualmente na Embaixada do Brasil em Tel Aviv, Israel.** Serve atualmente na Missão do Brasil junto às Nações Unidas.

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O COMITÊ ESPECIAL DE OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ DAS NAÇÕES UNIDAS (C-34)

ais atos abusivos daqueles a serviço dasNações Unidas e tantos outros temascorrelatos. Existe necessidade, porém, deinvestigar também os mecanismos decisóriosque, na sede das Nações Unidas, em NovaYork, estabelecem as missões de paz, mol-dam sua estrutura operacional, definem seusobjetivos e alocam os recursos necessáriospara seu funcionamento.

O Conselho de Segurança, responsávelatualmente pelo estabelecimento das mis-sões de paz, é o órgão mais evidente naestrutura decisória das Nações Unidas aesse respeito, mas há outros foros que de-sempenham papéis importantes na defini-ção de políticas e na condução das mis-sões. Um exemplo é o Secretariado, queimplementa, quotidianamente, as decisõesdos órgãos intergovernamentais; outro, aV Comissão da Assembleia-Geral (AGNU),que aloca recursos e fiscaliza o desempe-nho administrativo das operações. É o Co-mitê Especial de Operações de Manuten-ção da Paz (C-34), também subsidiário daAGNU, que merece consideração especial,porque formula políticas para as missões,discute a estrutura do Secretariado e esta-belece doutrinas operacionais.

O objetivo do presente artigo é analisaro papel desempenhado pelo C-34 e suacontribuição para o funcionamento dasmissões de paz. Para tanto, será traçadoum histórico de seu estabelecimento e de-senvolvimento. Serão investigadas suacomposição e sua estrutura atuais, bemcomo a dinâmica de suas negociações. Se-rão arrolados os principais temas de quetrata e, por fim, será feita breve análise desua interação com outros órgãos das Na-ções Unidas que também lidam com opera-ções de manutenção da paz.

ESTABELECIMENTO EDESENVOLVIMENTO

Embora pequenas missões observadorastenham sido enviadas, já na década de 1940,a Grécia, Palestina, Índia e Paquistão, a ideiade operações de manutenção da paz geridaspelas Nações Unidas somente ganhou im-pulso a partir da crise de Suez (1956) e doestabelecimento da Força de Emergência dasNações Unidas (Unef), para separar os exér-citos de Israel e Egito. A decisão de criar aUnef partiu da Assembleia-Geral e decorreude um conjunto de fatores políticos:

• as atividades do Conselho de Seguran-ça (CSNU) estavam praticamente paralisadasem função da polarização entre EUA e URSS,o que contribuiu, com encorajamentoestadunidense, para a gradativa transferên-cia de funções para a AGNU;

• o Secretariado, na figura do Secretá-rio-Geral Dag Hammarskjöld, estruturava-se e crescentemente ganhava autonomia ecapacidade operacional para atuar em situ-ações concretas;

• havia interesse dos pequenos e médi-os Estados em valorizar a Organização cri-ada em 1945 e participar ativamente de suasdecisões, bem como em influir na soluçãode conflitos1.

Essa convergência permitiu a atuação daUnef e da Operação das Nações Unidas noCongo (Onuc), a partir de 1960. No entanto,a atuação da Onuc foi vista como pró-oci-dental, e o crescente poder da AGNU eravisto pelo governo soviético como uma ten-tativa dos EUA de contornarem o poder deveto, sobre o qual residira a concordânciada URSS, em 1945, em integrar a Organiza-ção2. Como resultado, a URSS e, por razõessemelhantes, a França pararam de pagar

1 Uziel, E. O Conselho de Segurança, as Operações de Manutenção da Paz e a Inserção do Brasil noMecanismo de Segurança Coletiva das Nações Unidas. Brasília: Funag, 2010, pp. 45-48.

2 Claude Jr., I. “The Political Framework of the United Nations’ Financial Problems”. In. InternationalOrganization, vol. 17, no 4, 1963, pp. 839-841.

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O COMITÊ ESPECIAL DE OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ DAS NAÇÕES UNIDAS (C-34)

suas contribuições para as Nações Unidas,que foi lançada em uma crise política e fi-nanceira no início da década de 1960. Emprincípio, as opções pareciam ser radicais:privar a URSS, seus satélites e a França dodireito de voto, em ato entendido como hu-milhação que poderia levar à retirada dasNações Unidas de todo o bloco socialista3;ou permitir que a Organização encerrassesuas missões de paz por falta de recursos.

Como era perceptível que as duas possi-bilidades resultariam, na prática, nainviabilização das Nações Unidas como or-ganismo político de composição universal,um terceiro caminho foi escolhido, com a cri-ação de um Comitê Especial para debater to-dos os temas relativos a operações de manu-tenção da paz. A Resolução 2006 (XIX), apro-vada pela Assembleia-Geral em 18/2/1965,estabeleceu o Comitê, com a tarefa de“undertake as soon as possible acomprehensive review of the whole questionof peace-keeping operations in all theiraspects, including ways of overcoming thepresent financial difficulties of theOrganization”4. Com isso, o novo órgãoganhava duas funções: sugerir soluções para

a crise financeira e iniciar debates sobre anatureza, características e funções das ope-rações de manutenção da paz, cuja criaçãofora improvisada pelas Nações Unidas. Pou-cos dias depois, foi anunciada a composiçãodo Comitê, com 33 membros, que procuravaequilibrar países de diversos grupos regio-nais e blocos políticos (quadro abaixo)5.

Ao cabo de suas reuniões em 1965, oComitê Especial não havia chegado a umaconclusão sobre aspectos substantivos dasmissões de paz. Acordou, porém, recomen-dações sobre a crise financeira, baseadasem um plano do bloco afro-asiático, formu-lado no ano anterior: a AGNU não acionariao artigo 19, evitando o confronto com URSSe França, e as carências orçamentárias dasoperações em Suez e no Congo seriam su-pridas por contribuições voluntárias dosEstados (a maior parte foi feita pelos EUA)6.

Nessas circunstâncias, a Assembleia-Geral decidiu prorrogar o mandato do Co-mitê Especial por mais um ano (decisão quese tem repetido desde então), a fim de pros-seguir em sua outra tarefa, isto é, debater asubstância das missões de paz. As sessõesanuais do Comitê, porém, não apresenta-

3 Conforme o artigo 19 da Carta: “A Member of the United Nations which is in arrears in the paymentof its financial contributions to the Organization shall have no vote in the General Assembly if theamount of its arrears equals or exceeds the amount of the contributions due from it for thepreceding two full years. The General Assembly may, nevertheless, permit such a Member to voteif it is satisfied that the failure to pay is due to conditions beyond the control of the Member”.

4 Disponível no sítio http://www.un.org/documents/ga/res/19/ares19.htm, acessado em 5/8/2010.5 Entre 1965 e 1997, a composição do Comitê foi alterada, com a substituição de certos Estados por

outros: Brasil pela Guatemala (1977), Suécia pela Dinamarca (1969) e Tchecoslováquia pela Ale-manha Oriental (1977). Em 1988, a China ingressou no Comitê, perfazendo 34 membros e criandoa referência C-34. Dados constantes do documento A/AC.121/2010/INF/4.

6 Nações Unidas. Yearbook of the United Nations 1965. Nova York: Department of Public Information,1966, pp. 3-16; Review of the History and Evolution of the Special Committee on Peacekeeping.Texto fotocopiado, produzido pelo Secretariado das Nações Unidas. Nova York: 1999, pp. 6-7.

Os membros originais do Comitê Especial (33)

Afeganistão, Argélia, Argentina, Austrália, Áustria, Brasil, Canadá, El Salvador, Espanha, Etiópia,EUA, França, Hungria, Índia, Iraque, Itália, Iugoslávia, Japão, Mauritânia, México, Nigéria,Países Baixos, Paquistão, Polônia, Reino Unido, República Árabe Unida (Egito), Romênia, SerraLeoa, Suécia, Tailândia, Tchecoslováquia, URSS e Venezuela

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O COMITÊ ESPECIAL DE OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ DAS NAÇÕES UNIDAS (C-34)

ram muitos resultados nos anos seguin-tes. No período de 1966 a 1988, o ComitêEspecial investiu em uma tentativa denormatizar as operações de manutenção dapaz, por meio do estabelecimento deparâmetros e definições que esclarecessemas dúvidas inerentes a um instrumento es-sencialmente improvisado. Houve dificul-dades até mesmo em definir uma agenda,as quais só foram resolvidas em 1968. Noentanto, mesmo de-pois dessa definição,não foi possível che-gar a consensos paraalém da necessidadede renovar anualmen-te o mandato7.

Essa esterilidade doComitê Especial decor-reu de dois processoscorrelatos por que pas-sava a Organização. Emprimeiro lugar, após oencerramento da crisefinanceira e política queculminou em 1965, EUAe URSS gradativamente entraram em um acor-do tácito para que a Assembleia-Geral nãofosse mais utilizada como meio de contornaro Conselho de Segurança. Em segundo lu-gar, as missões de paz passaram a ser vistascomo um recurso a ser utilizado de modo res-trito, somente quando as duas superpotên-cias estivessem de acordo sobre sua conve-niência, normalmente em situações em quenenhum dos dois poderia atuar sem arriscar

uma confrontação com o outro ou em quenenhum dos dois tinha interesse em arcarcom os custos políticos e materiais8. Comoresultado, o Comitê passou a ser visto comoum foro para debates, sobretudo para venti-lar as ansiedades dos que não eram membrosdo CSNU, mas sem a capacidade real de to-mar decisões com efeitos práticos. Como des-creve Rikhye, o Comitê debatia, ano após ano,diversos temas estratégicos, operacionais e

institucionais, bemcomo diretrizes para asmissões, sem obterconsenso. Essas dis-cussões serviam paraalimentar o Secretaria-do, que continuava agerir as operações exis-tentes, mas os debatesnão resultavam em de-cisões formais9.

A dinâmica do Co-mitê acompanhou oprocesso político maisamplo das NaçõesUnidas e modificou-se

conforme a URSS passou, a partir de mea-dos da década de 1980 e mais claramenteem 1988, a adotar postura mais cooperati-va e a permitir a formação de consensosem diversos temas de paz e segurança in-ternacionais. A sessão de 1988 foi marcadapor gestos soviéticos positivos, mas oúnico consenso ao final foi a inclusão daChina no Comitê, que passou a contar com34 membros e assumiu a designação atual

7 Review of the History and Evolution of the Special Committee on Peacekeeping. Texto fotocopiado,produzido pelo Secretariado das Nações Unidas. Nova York: 1999, pp. 7-12; Novosseloff, A. “LeComité special des opérations de maintien de la paix”. Disponível no sítio: Le Réseau francophonede recherche sur les opérations de paix (http://www.operationspaix.net/Comite-des-34-ou-Comite-special-de, acessado em 22/5/2010).

8 Uziel, E. O Conselho de Segurança, as Operações de Manutenção da Paz e a Inserção do Brasil noMecanismo de Segurança Coletiva das Nações Unidas. Brasília: Funag, 2010, pp. 51-54; Claude Jr.,I. Swords into Plowshares. The Problems and Progress of International Organization. Nova York:Random House, 1964, pp. 295-302.

9 Rikhye, I. The Theory & Practice of Peacekeeping. Londres: C. Hurst & Company, 1984, pp. 180-200.

O Comitê passou a servisto como um foro paradebates, sobretudo para

ventilar as ansiedades dosque não eram membros do

CSNU, mas sem acapacidade real de tomar

decisões com efeitospráticos

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O COMITÊ ESPECIAL DE OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ DAS NAÇÕES UNIDAS (C-34)

de C-34. Em 1989, foi finalmente possíveladotar um relatório substantivo, com 12 re-comendações para os Estados e o Secreta-riado, em áreas como recursos humanos,treinamento, temas financeiros e relaçõescom os países anfitriões das missões. Con-cordou-se também que Estados interessa-dos poderiam participar dos debates comoobservadores10.

Além da maior flexibilidade demonstra-da para a obtenção deconsensos, o períodofoi marcado por inte-resse crescente de vá-rios Estados e do Se-cretariado pelos traba-lhos do C-34. Issopode ser explicado emrazão de as missões depaz terem sidocrescentemente utili-zadas pelo CSNUcomo instrumento demanutenção da paz.Por um lado, mais paí-ses passaram a contri-buir com tropas ou areceber as missões emseus territórios, tendo,logo, interesses claros em manifestar suaspreferências sobre como as operações de-veriam funcionar. Ao lado do Conselho deSegurança, de acesso restrito, o Comitê Es-pecial mostrou-se um foro adequado paraessas manifestações. Por outro, o Secreta-riado defrontava-se com novos obstácu-los práticos decorrentes do crescente nú-mero de operações e necessitava de orien-tação e apoio dos Estados membros paraconduzir o quotidiano das missões. No iní-

cio dos anos 1990, o C-34 paulatinamenteassumiu sua identidade como locus de de-bates na AGNU sobre políticas e diretrizesabrangentes para as missões de paz, en-quanto o Conselho dedicava-se, principal-mente, a estruturar as missões individuais.A maior parte dos métodos de trabalho doComitê foi também adotada nesse período.Com isso, o C-34, na prática, revolucionouseu mandato e abandonou a discussão fi-

nanceira e normativaque caracterizara seuestabelecimento, emfavor de orientaçõespragmáticas para umnúmero crescente deoperações de manu-tenção da paz11.

Em 1996, o C-34 to-mou outra decisãofundamental que expli-ca seu funcionamentoatual. Até então, o Co-mitê mantivera compo-sição restrita, tendoadmitido a China em1988 e trocado algunsmembros ao longo dadécada de 1970. No

entanto, a importância das operações demanutenção da paz ao longo dos anos 1990resultava em pressão constante de Estadosque gostariam de ter participação plena nostrabalhos, superando o status de observa-dores a que eram relegados. Muitos desseseram países contribuintes de tropas (TCCs)ou de policiais (PCCs), que representavam aespinha dorsal das missões. O Comitê final-mente concordou com sua admissão e esta-beleceu uma política para que, a partir de

10 Nações Unidas. Report of the Special Committee on Peace-keeping Operations (A/43/566). NovaYork: Nações Unidas, 1988; Report of the Special Committee on Peace-keeping Operations (A/44/301). Nova York: Nações Unidas, 1989.

11 Review of the History and Evolution of the Special Committee on Peacekeeping. Texto fotocopiado,produzido pelo Secretariado das Nações Unidas. Nova York: 1999 (?), pp. 12-16.

No início dos anos 1990 oC-34, na prática,

revolucionou seu mandatoe abandonou a discussão

financeira e normativa quecaracterizara seu

estabelecimento, em favorde orientações pragmáticaspara um número crescente

de operações demanutenção da paz

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O COMITÊ ESPECIAL DE OPERAÇÕES DE MANUTENÇÃO DA PAZ DAS NAÇÕES UNIDAS (C-34)

12 Fontoura, P. R. C. T. O Brasil e as Operações de Manutenção da Paz das Nações Unidas. Brasília:Funag, 1999, pp. 109-111.

1997, novos membros fossem integrados12.A entrada constante de novos membros (umtotal de 145 em 2010) modificou a dinâmicapolítica do C-34 e permitiu que ganhassemforça grupamentos políticos como a UniãoEuropeia (UE) e o Movimento dos PaísesNão Alinhados (MNA).

Ao fim dos anos 1990, o C-34 havia es-tabelecido as principais características deseu funcionamento atual no que concerne amétodos de trabalho e composição. Seu ni-cho na política da Organização consolidou-se, como foro político mais amplo para de-bater e decidir políticas gerais para as ope-rações de manutenção da paz e mudançasinstitucionais no Secretariado. Nesse senti-do, o C-34 foi elemento central nas discus-sões sobre o estabelecimento do Departa-mento de Operações de Manutenção da Paz(DPKO, em 1992), nas reformas relativas aoRelatório Brahimi (2000) e na criação do De-partamento de Apoio ao Terreno (DFS, 2007).

COMPOSIÇÃO ATUAL, MÉTODOSDE TRABALHO E DINÂMICANEGOCIADORA

A decisão de 1997 que permitiu o ingressode novos membros no Comitê alterou sensi-velmente sua dinâmica ao franquear a qual-quer país a possibilidade de integrar o órgão.É possível classificar os membros do C-34 emalgumas categorias, ainda que de forma apro-ximada e com grau significativo desobreposição entre os grupos. Há, em primei-ro lugar, os TCCs e PCCs, cujo interesse diretono gerenciamento das missões de paz é evi-dente e contribuiu em boa medida para o alar-gamento do Comitê. Para eles, a atuação do C-34 tem, em muitos casos, consequências emi-nentemente práticas, por exemplo, ao tratar dequestões como a segurança das tropas no

terreno, o treinamento dos efetivos, o reem-bolso por tropas e equipamentos e a compen-sação por ferimentos ou morte de soldados.

Há, em segundo lugar, os Estados anfitri-ões, ou seja, os países onde atuam as missõesde paz. Praticamente todos os Estados anfitri-ões das missões de paz ingressaram no Comi-tê depois de 1997. Assim como os TCCs ouPCCs, seu interesse é claro em participar dedecisões relevantes para operações militaresque atuam em seus territórios. No entanto,seus relacionamentos com as Nações Unidase com as missões de paz (em boa parte devidoàs percepções específicas sobre o caráter damissão em seu território) costumam ser muitodiversos, fazendo que sejam entre si um gru-po mais heterogêneo do que o dos contribu-intes de tropas e policiais.

Há, em terceiro lugar, vários membros doComitê que não são nem anfitriões, nem con-tribuintes de tropas ou policiais – ou cuja con-tribuição de tropas e policiais é pequena aponto de não constituir seu principal interes-se no trabalho do C-34. De imediato, parecehaver três explicações para sua decisão deintegrar o órgão: a) o desejo de participar maisativamente do funcionamento do sistema desegurança coletiva das Nações Unidas, tendoem conta a importância do sistema para alémdos países diretamente afetados; b) o interes-se político em certos “nichos” do tema de mis-sões de paz, como as questões de gênero e deviolência sexual ou a proteção de civis; e c) apreocupação em assegurar que a contribui-ção financeira significativa que fazem váriosEstados para o orçamento das missões de pazseja investida da maneira que percebem comomais adequada.

Essas motivações são reflexo de umarealidade mais ampla, a saber, o crescimen-to da dimensão e da importância relativadas operações de manutenção da paz. Tem

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aumentado, de forma substancial, o núme-ro de Estados envolvidos nessas missões,seu custo financeiro e a variedade de tare-fas que desempenham e seu impacto nasegurança sub-regional de várias partes doglobo. As missões de paz oferecem tam-bém oportunidades para os Estados de darexperiência de campo às forças armadas oude auferir ganhos financeiros por meio dereembolsos ou licitações e prestação deserviços para as missões. A importânciadas operações de manutenção da paz fazcom que muitos países queiram delas to-

mar parte como forma de influir nos confli-tos em que estão envolvidas ou, com mai-or frequência, projetar-se nas instituiçõesmultilaterais, isto é, opinar e decidir sobreseu funcionamento e o conteúdo de suasdecisões. Com isso, os Estados ganhammaior influência no sistema internacionalcomo um todo por meio das missões depaz e das Nações Unidas15. A ampliação doComitê foi também facilitada pelo fato deque a participação em seus trabalhos im-plica, na prática, poucos custos para osseus membros.

Membros do Comitê Especial em 2010 (145)

África do Sul, Albânia, Alemanha, Argentina, Austrália, Áustria, Bangladesh, Bélgica,Benin, Bolívia, Bósnia e Herzegovina*, Brasil, Bulgária, Burkina Faso, Burundi*,Camboja*, Cameroun, Canadá, Catar, Cazaquistão, Chade*, Chile, China, Colômbia,Congo, Coreia do Sul, Côte d’Ivoire*, Croácia*, Chipre*, Dinamarca, Djibuti, Egito*,El Salvador*, Equador, Eslováquia, Eslovênia*, Estônia, Espanha, Etiópia*, EUA, Fiji,Filipinas, Finlândia, França, Gâmbia, Gana, Granada, Grécia*, Guatemala*, Guiné,Honduras*, Hungria, Iêmen, Índia*, Indonésia*, Islândia, Irã, Irlanda, Israel*, Itália,Jamaica, Japão, Jordânia*, Lituânia, Macedônia*, Madagascar, Malaui, Malásia, Mali,Marrocos*, Moçambique*, Moldova, Mongólia, Montenegro*, Namíbia*, Nepal*, Níger,Nigéria, Noruega, Nova Zelândia, Países Baixos, Palau, Paquistão*, Paraguai, Peru,Polônia, Portugal, Quênia, Quirguízia, Reino Unido, República Centro Africana*, Re-pública Democrática do Congo*, República Tcheca, Romênia, Rússia, Samoa, Senegal,Serra Leoa*, Sérvia*, Cingapura, Sri Lanka, Suécia, Suíça, Tailândia, Tanzânia, Togo,Tunísia, Turquia, Ucrânia, Uganda*, Uruguai, Vanuatu, Zâmbia e Zimbábue

Afeganistão, Angola, Argélia, Bósnia e Herzegovina*, Burundi*, Camboja*, Chade*,Côte d’Ivoire*, Croácia*, Chipre*, Egito*, El Salvador*, Eritreia, Eslovênia*, Etiópia*,Geórgia, Grécia*, Guatemala*, Haiti, Honduras*, Índia*, Indonésia*, Iraque, Israel*,Jordânia*, Kuaite, Líbano, Líbia, Macedônia*, Marrocos*, Moçambique*, Montenegro*,Namíbia*, Nepal*, Paquistão*, República Centro Africana*, República Democrática doCongo*, República Dominicana, Serra Leoa*, Sérvia*, Síria, Sudão, Timor-Leste eUganda*

Arábia Saudita, Armênia, Azerbaijão, Belarus, Costa Rica, Cuba, Gabão, Guiana, Laos,Luxemburgo, Mauritânia, Maurícius, México, Suazilândia, Venezuela e Vietnã

TCCs ePCCs13

Anfitriões14

Outros

* Indica países que figuram em duas categorias

13 Segundo os dados do DPKO para junho de 2010, apenas quatro países são TCCs ou PCCs mas nãointegram o C-34: Brunei Darussalam, Guiné-Bissau, Ruanda e Tajiquistão. Dados disponíveis emhttp://www.un.org/en/peacekeeping/contributors/, acessado em 4/8/2010.

14 Indica países que contam ou contaram com operações de manutenção da paz em seus territórios emalgum momento desde 1948. Em casos como o da antiga Iugoslávia, todos os Estados sucessoresforam considerados anfitriões.

15 Uziel, E. “Três questões empíricas, uma teórica e a participação do Brasil em operações de paz dasNações Unidas”. In. Política Externa, vol. 14, no 4, 2006, pág. 98.

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Nos últimos anos, confirmou-se a práticapela qual o Comitê realiza uma sessão subs-tantiva por ano, que dura quatro semanas. Aprimeira semana é dedicada a escutar apre-sentações do Secretariado sobre diversostemas afetos às missões de paz. Boa partedessas apresentações costuma ter sido es-pecificamente solicitada pelo Comitê em seurelatório do ano anterior. Na segunda sema-na, não costuma haver reuniões formais: operíodo é reservado, essencialmente, para asconsultas internas dos grupos negociado-res, como a UE e o MNA. Além das apresen-tações, servem de base para negociações orelatório anual do secretário-geral sobre asmissões de paz e um adendo, em forma dematriz, que tem por objetivo listar as provi-dências do Secretariado em atenção às soli-citações dos Estados no ano anterior.

A terceira e a quarta semanas são reserva-das à negociação propriamente dita. O docu-mento negociado é um relatório extenso, or-ganizado em seções, que versa sobre amplagama de aspectos relacionados a operaçõesde manutenção da paz. O relatório busca,entre outras coisas: estabelecer e reiterar osprincípios e as diretrizes que devem reger asmissões de paz; solicitar ao Secretariado in-formações e relatórios sobre assuntos de in-teresse dos membros; dar parâmetros para otrabalho do Secretariado ao longo do anoseguinte, particularmente no que diz respeitoao desenvolvimento conceitual; avaliar dou-trinas operacionais formuladas pelo Secreta-riado; e dar orientações políticas à V Comis-são da Assembleia-Geral (que trata de orça-mento e administração).

As negociações ocorrem no âmbito doGrupo de Trabalho do Comitê. A distinçãoentre o Comitê propriamente dito e o seuGrupo de Trabalho diz respeito, sobretudo,à processualística da diplomacia parlamen-tar. Essencialmente, todos os membros doComitê integram o Grupo de Trabalho, masa presidência deste último cabe ao Canadá e

não à Nigéria, presidente do C-34. Além dis-so, os debates no Grupo são mais informais.

O primeiro projeto do relatório é monta-do pelo presidente do Grupo de Trabalhocom base nas contribuições dos membros.Por meio de seus grupos ou a título nacio-nal, os Estados submetem ao presidenteparágrafos que desejam inserir no relatóriofinal. Esses parágrafos podem ser simplesrepetições de parágrafos de anos anterio-res, quando se julga que continuam rele-vantes; atualizações de parágrafos de rela-tórios passados, com base na evolução dotema ao longo do ano; ou completamentenovos. Como as propostas são apresenta-das independentemente ao presidente, écomum haver vários parágrafos sobre ummesmo tema (muitas vezes com substânciacontraditória), que terão de ser consolida-dos durante o processo negociador. Esseprocedimento de elaboração do projeto dorelatório faz que haja parágrafos repetidosano após ano, seja porque representampara alguns países princípios imutáveis,seja porque representam o denominadorcomum possível em determinado tema, nãohavendo consenso sobre a reabertura deum texto considerado “equilibrado”. Háainda casos em que as providências solici-tadas não foram implementadas e é neces-sário reiterar o pedido.

A negociação em si ocorre nos chama-dos “subgrupos de trabalho”, estabeleci-dos pelo presidente, cada um encarregadode negociar certa parte do texto. O númerode grupos poderá variar de seis a nove, e,geralmente, dois ou mais grupos reúnem-sesimultaneamente. Os trabalhos de cadasubgrupo são conduzidos por um facilitador– delegado de algum Estado, convidado pelopresidente do Grupo de Trabalho a assumira função que, teoricamente, exercerá comisenção. Qualquer delegado do C-34 podeparticipar dos subgrupos. Na prática, po-rém, as delegações menores não costumam

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conseguir participar de todos ossubgrupos, por falta de pessoal, e acabamtendo de optar por algum.

A participação dos grupos negociado-res dá-se por meio dos “coordenadores”,escolhidos para representar o grupo em cadatema. Assim, um delegado do Irã pode re-presentar o MNA nas negociações sobrecooperação com organizações regionais, ouuma delegada da Finlândia poder falar emnome da União Europeia nas questões degênero. O MNA e a UE têm, também, coor-denadores gerais que supervisionam todasas negociações sem necessariamente parti-cipar de subgrupos específicos.

Os delegados do C-34 costumam ser umgrupo mais heterogêneo do que o habitualdas reuniões das Nações Unidas. Há tantodiplomatas quanto militares, cujas perspec-tivas e abordagens costumam ser distintas.A maioria dos negociadores pertence às mis-sões permanentes junto às Nações Unidas,mas alguns países costumam enviar tam-bém delegados da capital. Curiosamente, há,de modo geral, poucos delegados com ex-periência concreta em missões de paz.

Pode-se dizer que a grande tônica políticados debates é a tensão entre o MNA e a UE.Além deles, há participação importante dosoutros membros permanentes do CSNU(EUA, Rússia e China), do grupo Canz (Ca-nadá, Austrália e Nova Zelândia) e de algunspaíses agindo em sua capacidade nacional,em particular Brasil e Japão. Analisar as li-nhas de atuação política de cada um dessespaíses ou grupos foge ao escopo deste arti-

go, mas é possível fazer algumas colocaçõesgerais. As posições do MNA são marcadaspela presença, entre seus membros, da maiorparte dos países anfitriões das missões depaz, assim como dos maiores contribuintesde tropas. Enfatiza, nesse sentido, o respeitoà soberania do país anfitrião, a preservaçãodos princípios fundamentais das missões depaz (consentimento das partes, imparcialida-de, uso da força apenas em legítima defesa),reembolso aos contribuintes de tropas e apoioa treinamento. A União Europeia, por sua vez,costuma ter maior interesse por temas depossível repercussão junto a seu públicodoméstico, como proteção de civis, questõesde gênero ou combate a abuso e exploraçãosexuais. Enfatiza também a necessidade demissões de paz “eficientes” e “eficazes” – oque não raro se traduz em rejeitar propostasque possam ter implicações orçamentárias oucercear a independência de ação do Secreta-riado. Os membros permanentes, de modogeral, atuam unidos na defesa da indepen-dência e, na prática, da primazia do Conselhode Segurança em relação à Assembleia-Ge-ral. Rússia e China tendem, em certas áreas, ater posições mais convergentes com o Mo-vimento Não Alinhado, ao passo que os Es-tados Unidos e o Canz costumam atuar emlinha semelhante àquela da UE16.

No que se refere à atuação do Brasil noC-34 nos últimos anos, pode-se afirmar queengloba quatro vertentes. Em primeiro lu-gar, desde o início da participação brasilei-ra na Missão das Nações Unidas para aestabilização do Haiti (Minustah), em 2004,

16 Ver, por exemplo, “Statement on behalf of the European Union by H.E. Mr. Jan Grauls, PermanentRepresentative of Belgium to the United Nations”, disponível no sítio http://www.diplomatie.be/newyorkun/default.asp?id=30&ACT=5&content=150&mnu=30, acessado em 28/11/2010;“Statement by Ambassador Susan E. Rice, Permanent Representative of the U.S. to the UnitedNations, on Peacekeeping, at the Special Committee on Peacekeeping Operations, at UnitedNations Headquarters”, disponível no sítio http://usun.state.gov/briefing/statements/2010/137112.htm, acessado em 28/11/2010; e “Statement of M. Lotfi Bouchaara, Deputy PermanentRepresentative of the Kingdom of Morocco on behalf of the Non Aligned Movement, at the FourthCommittee under Agenda item 53 ‘Comprehensive review of the whole question of peacekeepingoperations in all their aspects’”, texto fotocopiado, Nova York: 22/10/2010.

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o País tem fortalecido sua defesa dos inte-resses derivados de sua condição de con-tribuinte de tropa, não só em termos mate-riais (por exemplo, reembolsos), como tam-bém políticos (a maior consulta aos TCCspelo Conselho de Segurança e o Secretari-ado). Outra vertente de atuação tem sido adefesa dos princípios consagrados na Car-ta das Nações Unidas e na ConstituiçãoFederal de 1988 – o que implica também adefesa dos princípios basilares das mis-sões de paz. Um terceiro elemento tem sidoa tentativa de assegurar a continuada rele-vância do Comitê, por entender ser ele foroprivilegiado para permitir discussão ampla-mente representativa nas missões de paz.Na prática, esse elemento traduz-se nosesforços de assegurar que o Comitê che-gue a consenso sobre seu relatório final,inclusive por meio da intermediação entreo MNA e a UE. Por fim, o Brasil advoga anecessidade de dar às missões de paz asferramentas adequadas para cumprirem seumandato – o que inclui a atuação no domí-nio social e econômico17.

Cabe observar que os métodos de traba-lho vêm sendo objeto de questionamento pordiversos membros do C-34. O relatório de 2010do Comitê contém, inclusive, parágrafo queencoraja seus membros a empreenderem diá-logo informal sobre o tema. Ainda não é pos-sível dizer, no entanto, se as deficiências dosmétodos de trabalho e, principalmente, as pro-postas de alterações para corrigi-las são per-cebidas pelo MNA, pela UE e pelos outrosatores de forma suficientemente convergen-te para permitir avanços na matéria18.

PRINCIPAIS TEMAS DEBATIDOS

Nos últimos anos, o Comitê Especial temdebatido temas contidos em cerca de 15 tópi-cos, que constituem uma agenda estável, em-bora estejam divididos em subtemas de ocor-rência mais flutuante. De acordo com o relató-rio de 2010, foram as seguintes as grandesáreas substantivamente debatidas: I) princípi-os, diretrizes e definições; II) reestruturaçãodas missões de paz; III) segurança; IV) con-duta e disciplina; V) fortalecimento da capaci-dade operacional; VI) estratégias para opera-ções complexas; VII) cooperação com TCCs;VIII) cooperação triangular entre o Secretaria-do, os TCCs e os PCCs; IX) cooperação comarranjos regionais; X) aprimoramento da ca-pacidade africana para missões de paz; XI)desenvolvimento de melhores arranjos deapoio ao terreno; XII) melhores práticas; XIII)treinamento; XIV) questões de pessoal; XV)temas financeiros; XVI) e outros assuntos.Tomando por base essa listagem e fazendocomparação com os quatro relatórios imedia-tamente anteriores, é possível estabelecer que13 dos 16 temas se repetiram nos cinco relató-rios, um tema (II) aparece em três e apenasdois foram incluídos em 2010 (VIII e XI).

Cada uma das grandes áreas desdobra-se, nas considerações do C-34, em seções, e,dentro dessas, são incluídos também aspec-tos diversos. Recorrendo novamente ao re-latório de 2010, é possível exemplificar. Noâmbito do tema “segurança” são menciona-das questões como violência contrapeacekeepers, adesão ao acordo sobre se-gurança do pessoal das Nações Unidas, aná-

17 Ver, por exemplo, “Statement by H.E. Ambassador Regina Maria Cordeiro Dunlop, Deputy PermanentRepresentative of Brazil to the United Nations”, disponível no sítio http://www.un.int/brazil/speech/10d-rcd-ivcommittee-peacekeeping-2202.html, acessado em 5/9/2010, e “Statement by H.E.Ambassador Maria Luiza Ribeiro Viotti, Permanent Representative of Brazil to the United Nations”,disponível no sítio http://www.un.int/brazil/speech/09d-mlrv-ivcommitee-specialcommitee-peacekeeping-operations-1802.htm, acessado em 28/11/2010.

18 Nações Unidas. Report of the Special Committee on Peace-keeping Operations (A/64/19). Nova York:Nações Unidas, 2010, pág. 42, § 228.

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lise de risco em áreas de conflito, uso inade-quado de tropas, contratação de segurançasprivados para missões e compartilhamentoda informação, entre outras. O título “Estra-tégias para Operações Complexas” – o maiorde todos no relatório – compreende dez se-ções, abarcando itens muito diversos, taiscomo mecanismos de consolidação da paz,desarmamento, desmobilização e reintegra-ção (conhecidos pela sigla DDR), reforma dosetor de segurança (SSR), Estado de direito,questões de gênero, crianças e missões depaz, HIV e outros temas de saúde, projetosde impacto rápido e proteção de civis19.

De modo geral, a estrutura do relatóriopouco se altera a cada ano. Há, entrentanto,algumas mudanças importantes, particular-mente no que diz respeito à inclusão de no-vos temas e seções no relatório. A introdu-ção de novos temas costuma ser proposta –em geral pelo Secretariado, por meio de rela-tórios do secretário-geral, mas às vezes porum ou mais Estados – como resposta a novi-dades no âmbito das Nações Unidas ou noterreno. No entanto, a forma pela qual isso éinternalizado pelo Comitê costuma variar.

Por exemplo, em 2009, o Secretariadopropôs aos Estados nova Estratégia Glo-bal de Apoio ao Terreno20. No relatório ne-gociado pelo Comitê no início de 2010, jáfoi possível incluir vários parágrafos so-bre o tema. Outros casos, no entanto, sãomais difíceis. Na questão de proteção decivis, por exemplo, o tema foi incluído naagenda do Conselho de Segurança em1999, e a primeira missão de paz com man-dato dessa natureza foi estabelecida nomesmo ano. No entanto, em função da con-trovérsia política em torno do assunto, sófoi possível incluir seção dedicada à maté-ria no relatório do C-34 de 2009.

As controvérsias políticas do Comitê porvezes têm resultados que vão além de impe-dir o tratamento de certos temas no relatório.Em 2007 e 2008, pela primeira vez desde queassumiu sua nova dinâmica de trabalho nosanos 1990, o Grupo de Trabalho do ComitêEspecial não conseguiu alcançar um consen-so sobre seu relatório durante a sessão regu-lar e prolongou seus debates por meses. Em2007, a divergência resultou da insistênciados EUA em modificarem os princípios bási-cos das missões de paz; em 2008, o MNAnão concordou com determinadas referênci-as ao papel das Nações Unidas no campo dareforma do setor de segurança e da proteçãode civis em conflitos armados. Dois fatoresparecem ter contribuído para a paralisia do C-34: a) os relatórios têm aumentado significa-tivamente de tamanho e sua dimensão em sidificulta o trabalho de um Comitê que so-mente decide por consenso; b) existem di-vergências substantivas sobre o mandato eos limites da atuação das missões (inclusiveno que concerne à relação com a soberaniados países anfitriões), que explicitam dife-rentes percepções do que são e podem seras operações de manutenção da paz.

Em 2011, novamente, o Comitê não ob-teve consenso tempestivamente acerca doseu relatório. Nesta ocasião, entretanto, opivô da crise não foi uma diferença subs-tantiva acerca do papel das missões depaz, mas sim a recusa dos países desen-volvidos – em particular da União Europeia– em aceitar menção no relatório da ques-tão do reembolso por tropas (troop cost),que não é reajustado há quase uma déca-da. Este desfecho insere-se em um con-texto político mais amplo, que perpassavárias áreas das Nações Unidas, marcadopelos esforços dos países desenvolvidos

19 Idem, pp. 18-28.20 Ver Nações Unidas. Implementation of the recommendations of the Special Committee on Peacekeeping

Operations (A/64/573). Nova York: Nações Unidas, 2010, págs. 12-14, §§ 56-61.

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de diminuírem o volume de suas contri-buições financeiras às Nações Unidas,ainda que manietando a capacidade da Or-ganização em cumprir seus mandatos. Noentanto, as divergências que causaram osimpasses em 2007 e 2008 persistem e po-derão ressurgir21.

RELAÇÕES COM OUTROSÓRGÃOS

Muito embora os últimos relatórios doC-34 tenham afirmado ser o Comitê “o únicoforo das Nações Unidas com mandato paraanalisar de forma abrangente toda a ques-tão das operações de manutenção da pazem todos os seus aspectos”22, o Conselhode Segurança também exerce importantepapel normativo que não raro se sobrepõeàquele do C-34. Tem exercido esse papel pormeio de declarações presidenciais e resolu-ções “temáticas”, que versam sobre assun-tos como a proteção de civis em conflitosarmados; estratégias de transição para mis-sões de paz; mulheres e paz e segurança; econsolidação da paz pós-conflito. A des-peito das preocupações de alguns paísesacerca da usurpação de competências daAssembleia-Geral pelo Conselho de Segu-rança23, este órgão parece disposto a cada

vez mais aumentar sua participação diretana gestão dos sistemas de manutenção dapaz das Nações Unidas. Essa tendência foievidenciada pela Declaração Presidencial S/PRST/2009/24, na qual, além de fazer váriasrecomendações específicas, o Conselho afir-mou que “continua comprometido com amelhoria do desempenho geral das opera-ções de manutenção da paz pelas NaçõesUnidas”. A interação do C-34 com o Conse-lho tem sido, de modo geral, extremamentelimitada. Ao contrário do que ocorreu emocasiões recentes, por exemplo, com a Co-missão de Consolidação da Paz (CCP) ou oConselho Econômico e Social (Ecosoc), opresidente ou outro representante do C-34não foram chamados a participar dos deba-tes do Conselho de Segurança sobre mis-sões de paz.

O Conselho conta, ademais, com o Gru-po de Trabalho sobre Operações de Ma-nutenção da Paz, composto por todos osmembros do Conselho, entre cujas funçõesestá a de servir como canal de comunica-ção com os países contribuintes de tropas,por meio da realização de reuniões para asquais alguns desses são convidados. Noentanto, o Grupo de Trabalho não tem lo-grado alcançar posição normativa mais re-levante. Isso se deve, por um lado, à relu-

21 É marcante, nesse sentido, o contraste entre os discursos da UE (“Statement on behalf of the EuropeanUnion by H.E. Mr. Jan Grauls, Permanent Representative of Belgium to the United Nations”, dispo-nível no sítio http://www.diplomatie.be/newyorkun/default.asp?id=30&ACT=5&content=150&mnu=30, acessado em 28/11/2010) e do MNA (“Statement of M. Lotfi Bouchaara, Deputy PermanentRepresentative of the Kingdom of Morocco on behalf of the Non Aligned Movement, at the FourthCommittee under Agenda item 53 ‘Comprehensive review of the whole question of peacekeepingoperations in all their aspects’”, texto fotocopiado. Nova York: 22/10/2010.) no debate da IVComissão sobre operações de manutenção da paz em 22/10/2010. Os princípios destacados e asprioridades listadas têm pouca convergência, e muitos aspectos salientados como centrais em umdiscurso sequer são mencionados no outro (por exemplo, a soberania, a melhor coordenação com ospaíses contribuintes de tropas; o robust peacekeeping e a reforma dos métodos de trabalho do C-34).

22 Ver, por exemplo, Nações Unidas. Report of the Special Committee on Peacekeeping Operations (A/64/19). Nova York: Nações Unidas, 2010, pág. 6, § 18.

23 Vide, por exemplo, “Statement by Ambassador Farukh Amil, Deputy Permanent Representative ofPakistan, in the open debate of the Security Council on UN Peacekeeping Operations”, disponívelno sítio http://www.pakun.org/statements/Security_Council/2009/08052009-01.php, acessado em28/11/2010.

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tância de alguns dos membros permanen-tes em expandir a participação dos contri-buintes de tropas no Conselho e, por ou-tro, ao fato de que os contribuintes nãoparticipam da definição da agenda dessasreuniões, nem da aprovação de relatóriosdo Grupo do Trabalho do CSNU24.

É digna de nota a relação do C-34 com aV Comissão da Assembleia-Geral, respon-sável por temas orçamentários e administra-tivos das Nações Uni-das. Por um lado, oRelatório do Comitêserve de subsídio paraa discussão orçamen-tária na V Comissão, aorepresentar decisãopolítica consensualque deve (de algumaforma) ver-se refletidanas decisões sobrealocação de recursos.Há, contudo, algumatensão entre os doisórgãos, no sentido deinexistir fronteira preci-sa entre suas compe-tências quando sãoanalisados os aspec-tos administrativos elogísticos das missõesde paz. Isso ficou par-ticularmente claro a partir do anúncio, peloDepartamento de Apoio ao Terreno, em 2009,do desenvolvimento de nova Estratégia Glo-bal de Apoio ao Terreno, que pretende trans-formar o apoio logístico às missões de paz.Por compreender uma série de mudançasadministrativas com potencial impactooperacional e militar, a nova Estratégia tem

sido objeto de escrutínio tanto pelo C-34quanto pela V Comissão25.

Cabe, ainda, uma palavra sobre a rela-ção do C-34 com o Secretariado das Na-ções Unidas, que é considerado um órgãoda Organização de acordo com a Carta. OSecretariado tem importante papelpropositivo diante do Comitê, uma vez que,por meio do relatório anual do secretário-geral sobre a implementação das recomen-

dações do C-34 e ou-tros relatórios, apre-senta aos Estadospropostas a seremconsideradas pelo Co-mitê. Muitas das inici-ativas do Secretaria-do, por dependeremde novos recursos ouexigirem respaldo po-lítico dos membros daOrganização, não po-dem ser levadas adi-ante sem o endossodos Estados.

É importante notar,no entanto, que o Se-cretariado é muito cio-so de sua autonomiaem relação aos Estados.Costuma valer-se deconsiderável flexibilida-

de hermenêutica ao interpretar o relatório doComitê e chega, em alguns casos, a levar adi-ante iniciativas que não foram aprovadas porfalta de consenso ou até mesmo a ignorarrecomendações que constam do relatório.Ademais, é relevante ressaltar que o C-34 nãotem influência e prestígio comparáveis ao doCSNU e, por isso, suas recomendações nem

24 Ver, por exemplo, Nações Unidas. Letter dated 27 July 2010 from the Chairman of the SecurityCouncil Working Group on Peacekeeping Operations addressed to the President of the SecurityCouncil (S/2010/424). Nova York: Nações Unidas, 2010.

25 Nações Unidas. Report of the Special Committee on Peacekeeping Operations (A/64/19). Nova York:Nações Unidas, 2010, pág. 34-35, § 177-183 e Resolução A/RES/64/269, parte VI.

O Comitê desempenhaatualmente a importantefunção de permitir que

mesmo os países que nãosão membros do CSNU,

mas têm interesse nodesenrolar das missões,

possam contribuir para seufuncionamento, mitigando,assim, eventuais críticas àlegitimidade do processo

decisório no campo de paze segurança internacionais

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sempre recebem prioridade adequada. OsEstados por vezes demonstram insatisfaçãocom a excessiva liberdade assumida pelo Se-cretariado, mas relutam em repreendê-lo ouem dar instruções estritas, que poderiam pre-judicar o funcionamento daquele órgão comocorpo burocrático responsável pela execu-ção quotidiana dos trabalhos das missõesde paz26.

CONCLUSÕES

Tanto do ponto de vista histórico quan-to do político, o Comi-tê Especial é parte in-tegrante do fenômenodas operações de ma-nutenção da paz comoinstrumento do siste-ma de segurança cole-tiva das Nações Uni-das. Assim como asmissões de paz, o C-34 surgiu em um mo-mento de crise, impro-visado para resolverproblemas específi-cos, mas foi institu-cionalizado como umforo permanente dedebates políticos. Amudança no papel das operações e em suarelevância, no fim da década de 1980,deslanchou, do mesmo modo, as modifica-ções que moldaram o formato e os méto-dos de trabalho do C-34 hoje. O Comitêdesempenha atualmente a importante fun-ção de permitir que mesmo os países que

não são membros do CSNU, mas têm inte-resse no desenrolar das missões, possamcontribuir para seu funcionamento, mitigan-do, assim, eventuais críticas à legitimidadedo processo decisório no campo de paz esegurança internacionais. Nessas condi-ções, as perspectivas futuras do ComitêEspecial estão irremediavelmente vincula-das ao destino das operações de manuten-ção da paz como um todo.

No período de 2003 a 2009, as missões depaz foram objeto de uma expansão constanteno número de militares, policiais e civis no

terreno – ainda que ototal de operações te-nha se mantido relati-vamente constante –,que passaram de cercade 40 mil a cerca de 100mil27. Esse crescimentoexigiu esforços dos Es-tados e do Secretaria-do e criou novos desa-fios, que demandaram aatenção do C-34. Nes-ses anos, o Comitê de-bateu e tomou decisõessobre temas com refle-xos diretos sobre asoperações de manuten-ção da paz, tais como o

reajuste do reembolso por equipamentos ce-didos, o crescente uso de policiais, o comba-te a abuso e exploração sexuais porpeacekeepers, o estabelecimento de umadoutrina operacional, a criação do Departa-mento de Apoio ao Terreno e a proteção decivis, para citar apenas alguns.

26 Para considerações teóricas sobre o tema, ver Abbot, K. e Snidal, D. “Why States Act through FormalInternational Organizations”. In. The Journal of Conflict Resolution, vol. 42, no 1, 1998. Para umexemplo de recomendação não cumprida, ver Nações Unidas. Report of the Special Committee onPeacekeeping Operations (A/64/19). Nova York: Nações Unidas, 2010, pág. 10, § 41.

27 Dados disponíveis nos sítios http://www.un.org/en/peacekeeping/contributors/documents/Yearly_Summary.pdf e http://www.un.org/en/peacekeeping/contributors/documents/Yearly06.pdf,acessados em 26/12/2010.

No período de 2003 a 2009,as missões de paz foramobjeto de uma expansãoconstante no número demilitares, policiais e civisno terreno – ainda que o

total de operações tenha semantido relativamente

constante –, que passaramde cerca de 40 mil a cerca

de 100 mil

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A relevância crescente das missões depaz para o sistema de segurança coletiva eas exigências da administração quotidianadas operações no mesmo período exacer-baram as tensões políticas no Comitê Es-pecial. Os impasses com que se defrontouo C-34 em 2007 e 2008 decorreram de diver-gências significativas nas percepções dediversos países e grupos negociadoressobre a natureza e as funções das missõesde paz. Embora o Comitê tenha podido, em2009 e 2010, obter acordos tempestivossobre seu relatório, controvérsias substan-tivas sobre a natureza das missões – emparticular sobre robust peacekeeping – ain-da demonstram a clivagem existente. Tam-bém as divergências sobre a revisão dosmétodos de trabalho do C-34 evidenciam apermanência de áreas de discordância28.

Desde 2009, é perceptível o movimentode alguns países, inclusive membros per-manentes do Conselho de Segurança, comoFrança e Reino Unido, para refrear o cresci-mento das missões de paz, tanto em vistade preocupações orçamentárias quantopara permitir que sejam superadas as difi-culdades enfrentadas para obter novas tro-pas e pessoal suficiente para o Secretaria-do. Essas duas preocupações não têm sidosempre compatíveis, conforme evidencioua não adoção de relatório pelo C-34 no pe-ríodo regular de suas sessões em 2011.

Nesse contexto, o CSNU passou a bus-car papel mais destacado nas discussõesgerais sobre operações de manutenção dapaz (doutrina, disciplina, recursos financei-ros etc.), que normalmente seriam conside-radas território do C-3429. Entre os mem-bros permanentes do Conselho parece ha-ver uma preferência crescente por um des-locamento dos debates em detrimento do

Comitê Especial. Mas o Comitê Especialcontinua a ser o foro privilegiado no qualos países contribuintes de tropas e polici-ais e os Estados anfitriões podem partici-par ativamente das discussões sobre asmissões que utilizam suas tropas e polici-ais ou agem em seus territórios. Sua fun-ção política no âmbito das Nações Unidasnão pode ser superada, no momento, poroutros órgãos nos quais não dispõem departicipação plena.

Os métodos de trabalho do Comitê, porseu turno, consolidados ao longo das últi-mas duas décadas em seu formato atual,refletem, em parte, as tensões e divisõespolíticas do órgão. Enquanto houver umadisputa sobre as funções e os poderes dasmissões de paz, é provável que o Comitêcontinue a sofrer críticas por seus méto-dos de trabalho. Mas a inércia típica dadiplomacia multilateral costuma adiar aomáximo as mudanças.

O agravamento das tensões no Comitêentre os contribuintes de tropas e os grandescontribuintes financeiros – dinâmica constan-te, mas acirrada pela crise financeira internaci-onal – traz consigo riscos para a capacidadedo C-34 de exercer plenamente sua funçãopolítica. A recusa em tratar no relatório do Co-mitê de temas fundamentais para os contribu-intes de tropas (como o reembolso) poderáfazer que os TCCs deixem de considerar que oComitê lhes permite real possibilidade de in-fluenciar nas políticas das Nações Unidas paraas operações de manutenção da paz. Nestecenário, restará observar qual será a disposi-ção dos TCCs de continuarem a contribuir paraum sistema sobre cujos destinos têm poucaoportunidade de influenciar.

Em conclusão, o Comitê Especial de Ope-rações de Manutenção da Paz é um compo-

28 Nações Unidas. Report of the Special Committee on Peace-keeping Operations (A/64/19). Nova York: NaçõesUnidas, 2010, pág. 21, § 65 (sobre robust peacekeeping) e pág. 41, § 228 (sobre métodos de trabalho).

29 Ver, por exemplo, http://www.un.org/News/Press/docs//2010/sc10006.doc.htm, acessado em 26/11/2010.

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nente integral desse instrumento do siste-ma de segurança coletiva. Seu caráter relati-vamente ancilar ao Conselho de Segurançae às operações no terreno faz com que suaevolução seja dependente desses outrosforos e atores, mas não de um modo mecâni-

co. Sua característica de permitir que se ex-pressem TCCs, PCCs e Estados anfitriõesgarantem certo grau de importância e fazemcom que sua opinião seja indispensável tan-to para outros órgãos e atores governamen-tais quanto para o Secretariado.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<RELAÇÕES INTERNACIONAIS> ONU; Operações de Manutenção da Paz; Política Inter-nacional; Pacifismo;

BIBLIOGRAFIA

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SUMÁRIO

IntroduçãoNovos paradigmasO campo de estudoConsiderações finais

UMA EXPERIÊNCIA DE PRÁTICA INTERDISCIPLINARNO COMANDO DA FORÇA AERONAVAL

PATRÍCIA HELENA R. DE SOUZA CHAGAS1

Capitão de Corveta (T)

INTRODUÇÃO

No Brasil, existem algumas leis volta-das para as necessidades da pessoa

com deficiência.Após muita luta empreendida pelos mo-

vimentos sociais ligados ao portador de defi-ciência, surgiu em 1975 a Declaração dos Di-reitos das Pessoas Deficientes, resolução ela-borada pela Organização das Nações Unidas(ONU) aprovada pela sua Assembleia-Geral

e mundialmente enfatizada em 1981 – o AnoInternacional da Pessoa Deficiente (AIPD),que teve como tema “Participação e PlenaIgualdade”.

Acompanhando esse movimento mun-dial, em 1989, o então Presidente da Repú-blica José Sarney sancionou a Lei 7.853,publicada em 24 de outubro, dispondo so-bre o apoio às pessoas portadoras de defi-ciência, sua integração social, sobre aCoordenadoria Nacional para Integração da

1 Assistente social. Encarregada do Núcleo do Serviço de Assistência Integrada ao Pessoal da Marinha doComando da Força Aeronaval.

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Pessoa Portadora de Deficiência (Corde),instituindo a tutela jurisdicional de inte-resses coletivos ou difusos dessas pesso-as, disciplinando a atuação do MinistérioPúblico e definindo crimes.

Visou a legislação em pauta garantir àspessoas portadoras de deficiência as açõesgovernamentais necessárias ao pleno exer-cício de seus direitos básicos, inclusive dosdireitos à educação, à saúde, ao trabalho,ao lazer, à previdência social, ao amparo, àinfância e à maternidade, e de outros que,decorrentes da Constituição e das leis, pro-piciem seu bem-estar pessoal, social e eco-nômico, afastadas as discriminações e ospreconceitos de qualquer espécie. Ademais,alçou a matéria a obrigação a cargo do Po-der Público e da sociedade, criando um di-reito público subjetivo.

Para a tutela jurídica dos interesses co-letivos e difusos dos portadores de defici-ência, foi outorgada ao Ministério Público,à União, aos estados, ao Distrito Federal,aos municípios, bem como às associaçõesconstituídas há mais de um ano (na formada lei civil), às autarquias, às empresaspúblicas, às fundações e às sociedades deeconomia mista a inclusão entre as suasfinalidades institucionais da proteção àque-las pessoas, legitimidade para proposiçãode ação civil pública.

Regulamentando a lei em questão, foipublicado o Decreto no 914, de 6/12/93, pos-teriormente revogado pelo atual Decreto no

3.298/99, que instituiu a política nacionalpara a integração da pessoa portadora dedeficiência. Assim como a lei em comento, ainstituição dessa política objetivou assegu-rar o pleno exercício dos direitos sociais eindividuais daquelas pessoas.

NOVOS PARADIGMAS

Velhas concepções e ideias damodernidade fizeram com que o homem esta-

belecesse o que é normalidade e também oque é anormalidade, explicitando um meca-nismo de vigilância que é, acima de tudo, ummecanismo de poder, definindo o que é sernormal e estabelecendo normas e padrões. Ohomem posiciona os indivíduos que vivemdentro da normalidade como sendo aquelesque têm mais direitos, já que causam menosconflitos e não quebram a ordem, como osoutros que estão fora do padrão. Há, portan-to, uma clara segmentação e marginalização– os donos do poder estabelecido são aque-les que passam uma imagem da normalidade;qualquer pessoa ou segmento que fuja aopadrão é uma potencial ameaça às relaçõessociais.

O novo paradigma proposto pela atuali-dade procura rever esta polarização entreas noções de normalidade e anormalidade.Esta polarização cede lugar ao entendimen-to de que a natureza humana comporta umainfinidade de condições existenciais. Naatualidade, é possível encontrarmos dis-cursos decorrentes do inconformismo comos critérios de exclusão. Esses discursossão pautados no reconhecimento e respei-to à diferença.

O novo paradigma é o da inclusão, quedefende uma sociedade livre das práticasdiscriminatórias e segregacionistas, con-forme nos informa Sassaki (1997, p. 41):

Conceitua-se inclusão social como oprocesso pelo qual a sociedade se adap-ta para poder incluir, em seus sistemassociais gerais, pessoas com necessida-des especiais e, simultaneamente, es-tas se preparam para assumir seus pa-péis na sociedade. A inclusão socialconstitui, então, um processo bilateralno qual as pessoas ainda excluídas e asociedade buscam, em parceria,equacionar problemas, decidir sobresoluções e efetivar a equiparação deoportunidades para todos.

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Para Neves (2002), a sociedade pós-mo-derna é, portanto, caracterizada pela diversi-dade cultural, ou seja, pela coexistência de di-ferentes e variadas formas de manifestação daexistência humana. Essas diversas formas deexistência não podem ser hierarquizadas pornenhum critério absoluto.

A nossa incapacidade de lidar com a di-versidade humana é construída e legitima-da, principalmente, em nossa formação es-colar e acadêmica. Nossa educação nos pre-para para lidar com o que se encaixa em nos-so padrão de normalidade preestabelecido.Estudamos sobre o outro de acordo com asconcepções e os conhecimentos que temosdesse outro, mas na realidade não o conhe-cemos, pois não o deixamos manifestar-se,emergir-se entre nós, ser conhecido de fato,uma vez que estamos sob a ilusão de nor-malidade que nos impede de conhecermosuns aos outros (SKLIAR, 2002).

Ferre (2001) elucida que não existem iden-tidades especiais, e sim diversidade humana,mas, lamentavelmente, a sociedade e suasorganizações, principalmente as educacio-nais, insistem em fazê-las existir. Esta existên-cia se faz a partir dos padrões de nor-malidade instalados previamente aossujeitos, antes mesmo de seu nasci-mento, pois não é permitido osurgimento de algo novo, inespera-do, e sim de algo antes determinado,definido e limitado ao desejado.

Diante desses pressupostos,constata-se que o Programa de Aten-dimento Especial é um campo profí-cuo para práticas interdisciplinares.

O CAMPO DE ESTUDO

O Programa de Atendimento Especial noNúcleo de Assistência Integrada ao Pes-

soal da Marinha do Comando da ForçaAeronaval (N-SAIPM/ComForAerNav) foiimplantado em 1995, objetivando atenderaos dependentes de militares e de servido-res civis.

O Programa previa a possibilidade de reali-zar convênios com instituições especializadasque prestassem atendimento específico a cri-anças com diversas deficiências.

No entanto, para ingressarem no Pro-grama, as crianças eram submetidas a umaavaliação pela equipe de profissionais daPoliclínica Naval Nossa Senhora da Glória,no município do Rio de Janeiro. Semestral-mente, todas as crianças eram reavaliadas.

No ano de 1996, quando a Diretoria deAssistência Social da Marinha (Dasm) foireativada, o Programa passou a sernormatizado pela Diretoria-Geral de Pesso-al da Marinha,2 DGPM-501, que regulamen-tava os programas sociais desenvolvidospela Marinha do Brasil.

Em São Pedro da Aldeia, no ComplexoAeronaval, o Programa iniciou com o in-gresso de duas crianças. Atualmente, são98 crianças em tratamento.

2 Norma sistematizada pela Diretoria de Assistência Social da Marinha que prevê as normas para presta-ção da Assistência Integrada afeta às áreas de conhecimento de Serviço Social, Direito e Psicologia.

De 1995 até 1997, as crianças eram enca-minhadas para a Associação dos Pais e Ami-

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gos dos Excepcionais (Apae) de São Pedroda Aldeia. Devido a dificuldades internas daprópria Apae, no ano de 1997 os pacientesdo programa passaram a ser atendidos emuma clínica extra-MB, no município de CaboFrio. Eram sessões ambulatoriais de 50 minu-tos, nas diversas modalidades terapêuticas.Os subsídios financeiros e a administraçãodo recurso para o pagamento da clínica eramrealizados pelo N-SAIPM.

Subordinado à Policlínica Naval de SãoPedro da Aldeia, foi inaugurado, no ano de2002, o então Núcleo de Avaliação, Acom-panhamento e Reavaliação de PacientesEspeciais de São Pedro da Aldeia, o N-Gaarpe/SPA. A equipe que compunha o ser-viço era formada por fisioterapeutas, psi-cólogas, fonoaudiólogo, médico, assisten-te social e enfermeira, em sua maioria civis,contratados por meio de uma cooperativa.

Além das avaliações e reavaliações parao ingresso no PAE, o N-Gaarpe passou arealizar o atendimento às crianças de até 5anos, conforme as normas internas da Ma-rinha. Naquela ocasião, cinco crianças com5 anos incompletos, que já estavam sendoatendidas em clínica extra-MB custeadapelo PAE, foram transferidas para o N-Gaarpe/PNSPA.

As demais crianças com idade igual ousuperior a 5 anos continuaram a ser enca-minhadas para a única clínica contratada.

O N-SAIPM promovia, sistematicamen-te, reuniões com os pais para discutir as-suntos afetos ao gerenciamento adminis-trativo do programa e temas de interesseem comum ao grupo. Nestas reuniões, ospais começaram a apontar para a necessi-dade de credenciamento de novas institui-ções, inclusive no município de São Pedroda Aldeia. A única instituição que prestavaatendimento aos usuários do Programa deAtendimento Especial localizava-se nomunicípio vizinho, Cabo Frio, situado a 15km de São Pedro da Aldeia. Para os pacien-

tes que não eram residentes em São Pedroda Aldeia, a locomoção até Cabo Frio eradispendiosa e demandava bastante dispo-nibilidade de tempo. A grande maioria dospacientes comparecia à clínica pelo menosduas vezes por semana.

Constatada, então, a necessidade de seabrir um processo de credenciamento, evi-denciou-se a necessidade de sistematiza-ção de um projeto básico para delimitar oobjeto da contratação.

Na prática cotidiana, para a viabilizaçãodo Programa de Atendimento Especial jáera necessário o envolvimento de três or-ganizações militares: O Comando da ForçaAeronaval, o Depósito Naval de São Pedroda Aldeia e a Policlínica Naval de São Pedroda Aldeia. Cada equipe tinha competênci-as muito bem definidas. Ao N-SAIPM ca-bia o gerenciamento dos recursos e a coor-denação geral do Programa. O DepósitoNaval de São Pedro da Aldeia era o res-ponsável pelo apoio administrativo. A Po-liclínica Naval de São Pedro da Aldeia rea-lizava as avaliações técnicas.

Para a elaboração do Projeto Básico, oComando da Força Aeronaval determinoua formação de uma equipe com profissio-nais das três organizações militares, com oobjetivo de, ao final do estudo, propor umúnico projeto.

A equipe foi composta da seguinte forma:Comando da Força Aeronaval, com um as-sistente social e um assistente jurídico; Poli-clínica Naval de São Pedro da Aldeia, comum pediatra e um psiquiatra; Depósito Navalde São Pedro da Aldeia, com um intendente.

Como competia ao N-SAIPM gerenciaro Programa, a coordenação dos trabalhoscoube ao oficial do N-SAIPM. Deve-se des-tacar aqui o perfil da equipe que facilitou aprática interdisciplinar. Eram profissionaisflexíveis que demonstraram competência e,sobretudo, vontade política em quebrarparadigmas e construir um projeto coletivo.

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Este foi um grande desafio para os pro-fissionais. Como afirma Vasconcelos:

As categorias e grupos profissionaisconstroem identidades que, como asoutras formas de identidades sociaisrelativamente compactadas, “filtram”os estímulos que recebem do ambiente,estabelecem os rituais de verdade epadrões de competência, organizam osdispositivos de ação e, dessa forma,dão segurança e status aos profissio-nais. A emergência histórica de novosparadigmas é geralmente percebida deinício pelos profissionais como uma“quebra” nessa segurança, como umaexposição à fragilidade e ao confrontocom as limitações da identidade jáestabelecida, e a situações de “nãosaber” e “não saber fazer”, ameaçan-do a estabilidade, o status adquirido.(VASCONCELOS, 2002, p. 63).

O trabalho se concretizou de forma in-tegrada, com o mínimo de burocracia, bus-cando atender às reais demandas dos usu-ários do Programa. Muitas questões dis-cutidas entre os profissionais advinhamdas reuniões que eram feitas com os res-ponsáveis dos usuários. Em consequência,foram realizadas pesquisas bibliográficas,estudos e visitas técnicas a instituiçõesespecializadas.

Enfim, a partir da identificação de umaproblemática comum, os profissionais pu-deram se permitir uma reciprocidade, umenriquecimento mútuo.

Sobre a relevância da participação dosusuários e da equipe interdisciplinar nasdiscussões sobre as demandas do projeto,Eduardo Vasconcelos afirma:

Nada é mais salutar para quebrar asespecialidades e as identidades profis-sionais parciais do que dar voz aos usu-

ários e seus familiares, para que reafir-mem a complexidade de suas realida-des, suas demandas e suas avaliaçõessobre a assistência. Para isso, os proje-tos sociais devem prever mecanismos deescuta e participação ativa dos usuári-os e seus familiares dentro e fora dosserviços. (VASCONCELOS, 2002, p.63).

O processo de credenciamento foi apro-vado pelo Núcleo de Assessoria Jurídicada União em dezembro de 2006. O editalprevia a possibilidade de credenciamentode instituições que prestassem atendimentoambulatorial interdisciplinar, sessão indi-vidual de 50 minutos, ou em regime de ex-ternato (meio período) ou internato (todoo dia). Naquele momento, muitas clínicasdemonstraram interesse, porém não con-seguiram atender às exigências paracontratação de pessoa jurídica com a Ad-ministração Pública. Outras clínicas, nomomento da inspeção técnica, foram repro-vadas. Instituições interessadas começa-ram a trabalhar na tentativa de se adequaràs exigências propostas. Os próprios paisempenhavam-se na divulgação da possibi-lidade de credenciamento.

Em março de 2007, foi feito o creden-ciamento da primeira clínica localizada emCabo Frio, com atendimento ambulatorial,inclusive na modalidade de hidroterapia.

Em maio do mesmo ano, a Associaçãode Terapia Equestre, localizada em SãoPedro da Aldeia, também foi credenciada,oferecendo a modalidade de equoterapia.

Em dezembro de 2008 e janeiro de 2009,foram credenciadas mais duas clínicas paraatendimento na modalidade ambulatorial emdiferentes modalidades terapêuticas, taiscomo: fonoaudiologia, fisioterapia, terapiaocupacional, psicologia, psicomotricidade,psicopedagogia e hidroterapia.

Em janeiro de 2009, havia quatro clíni-cas credenciadas para atender aos usuári-

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os, duas em São Pedro da Aldeia e duas emCabo Frio. Os responsáveis passaram a tera possibilidade de escolha, de acordo coma avaliação do Gaape. 3

Em todo o trabalho houve envolvimentode saberes múltiplos, pluralistas e hetero-gêneos, que objetivou atender às comple-xas demandas do Programa de Atendimen-to Especial.

Coutinho (1991), sabiamente, retorna aopostulado de que não há ciência que esgo-te o real, pois ela é sempre aproximativa.Também nos alerta de que o pluralismo, noentanto, não significa ecletismo ourelativismo moral, ou seja, a conciliação depontos de vista teóricos e éticos inconcili-áveis. O autor relata:

Pluralismo, nesse sentido, é sinôni-mo de abertura para o diferente, derespeito pela posição alheia, consi-derando que essa posição, ao nosadvertir para nossos erros e limites eao fornecer sugestões, é necessáriaao próprio desenvolvimento de nos-sa posição e, de modo geral, da ciên-cia. (COUTINHO, 1991, p. 14).

Concomitante a este processo, a equipetrabalhou para confecção de um folder so-bre o Programa de Atendimento Especial,

objetivando sensibilizar a tripulação para atemática da diversidade. Conceitos já dis-cutidos pelos teóricos da saúde mental tam-bém permearam o trabalho: a substituiçãoao modelo hospitalocêntrico, a reabilitaçãopsicossocial e a legitimidade da existênciana diferença.

Nesse sentido, o trabalho procurou nãosó a efetivação do tratamento, mas repen-sar o nosso modo de lidar com a diferença.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Enfim, todo o trabalho desenvolvido noPrograma de Atendimento Especial traz umdesafio: o de ser efetivado, sempre como prá-tica intercessora, entendendo por intercessor,segundo Deleuze (1992), algo ou alguém quefunciona intercedendo a favor do estranhoque nos habita, invocando-o e acolhendo-o,não como aquilo que há de monstruoso eperigoso, mas como aquilo que há de maispotente em cada um. Assim concebido, o tra-balho exige esta mudança em nosso modo desubjetivação, [...] esta abertura para o es-tranho-em-nós, que é mais do que o simplesrespeito democrático pelo outro em seusdireitos e deveres, pois é um desejo de sedeixar afetar pelo outro, é um amor pelaalteridade, pelo devir e incerteza criadora(DELEUZE, 1992, p.220).

3 A partir de 2007, de acordo com a DGPM-401 (2a revisão), o N-Gaarpe passou a ser denominado Gaape,Grupo de Avaliação e Acompanhamento de Pacientes Especiais.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<SAÚDE> Assistência Médica; Orientação ao homem;

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SUMÁRIO

IntroduçãoRelevância do tema e justificativa da pesquisaOrganização do estudo

Revisão de literaturaSistema OMPSContabilidade de custos

Custeio por absorçãoApuração de custos na administração pública

MetodologiaA contabilidade de custos no sistema OMPS

Esquema básico da contabilidade de custos das OMPSA análise gerencial e a avaliação do desempenho econômico-financeiro das OMPS

Considerações finais

O EMPREGO DO CUSTEIO POR ABSORÇÃO NAMARINHA DO BRASIL: O CASO DASORGANIZAÇÕES MILITARESPRESTADORAS DE SERVIÇOS

ANDERSON SOARES SILVA*

Capitão de Corveta (IM)ERIVELTON ARAUJO GRACILIANO**

Capitão de Corveta (IM)JOSÉ RICARDO MAIA DE SIQUEIRA***

Engenheiro

* N.R.: Mestre em Ciências Contábeis pela Faculdade de Ciências Contábeis (FACC)/Universidade Federaldo Rio de Janeiro (UFRJ). Serve na Diretoria de Finanças da Marinha (DFM).

** N.R.: Mestre em Ciências Contábeis pela FACC/UFRJ. Serve na Diretoria de Contas da Marinha(DOCM).

*** N.R.: Doutor em Engenharia de Produção pelo Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação ePesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPE/UFRJ). Coordenador doCurso de Mestrado em Ciências Contábeis da FACC/UFRJ.

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INTRODUÇÃO

A rapidez com que as mudanças têmocorrido no mundo, especialmente nas

últimas décadas, iniciada com a globali-zação, está exigindo das organizações a uti-lização de instrumentos rápidos e eficazespara aperfeiçoamento de suas técnicas decusteio dos produtos e serviços, de geren-ciamento de resultados e de apoio às suasdecisões (BRAGA, 2009, p.14).

Pereira (2006) afirma que a globalização,além de afetar as organizações privadas,acabou por atingir de forma semelhante aadministração pública, gerando questiona-mentos sobre seu modelo. Tais questiona-mentos têm demandado a busca de novassoluções a fim de atender a um cidadãocada vez mais informado e, por conseguin-te, exigente.

Nesse contexto, segundo Silva, Davis eViveiros (2008), entra em cena a questão daqualidade do gasto público, em que a efici-ência da administração pública torna-seessencial, dada a necessidade de reduçãode custos e de aumento da qualidade dosserviços prestados aos cidadãos. A afir-mação anterior encontra respaldo no pen-samento de Schwengber (2007) quandoeste diz que um dos três níveis de análiseda qualidade do gasto público é a eficiên-cia com que, uma vez alocados os recursospúblicos entre as distintas funções do go-verno, esses recursos são transformadosem bens e serviços públicos.

Diante do exposto, o presente artigodescreve o caso da criação do Sistema dasOrganizações Militares Prestadoras de Ser-viços (OMPS), no qual a Marinha do Brasil(MB) adotou o emprego da contabilidadede custos, por meio da utilização do cus-teio por absorção, no processo de contro-le gerencial de suas organizações industri-ais e prestadoras de serviços. Com isso, oobjetivo final deste estudo é verificar se a

utilização da contabilidade de custos naMB, por meio da adoção do custeio porabsorção em suas OMPS, encontra-se ali-nhada com os preceitos teóricos preconi-zados na literatura. Com o propósito depropiciar um melhor entendimento do pro-blema de pesquisa, na próxima seção é apre-sentada uma breve caracterização do Sis-tema OMPS.

Relevância do tema e justificativa dapesquisa

As tentativas de verificação empírica daaplicação de conceitos teóricos oriundosdo ambiente acadêmico são valiosas tantopara os teóricos quanto para os práticos,ressaltando-se que, quando uma dessastentativas refere-se a uma área de conheci-mento vital para o êxito de organizaçõesque dão sustentação à nossa sociedade, asua relevância fica ainda mais elevada.

Assim, de acordo com Moura (2003), omodelo de gestão do Estado, previstoconstitucionalmente, cria as condiçõespara se utilizarem os conceitos da contabi-lidade de custos, como um dos critérios deavaliação de desempenho. Isso decorre dofato de a contabilidade de custos ser umsistema de mensuração, que relacionainsumos (material, pessoal etc.) com resul-tados ou benefícios atingidos. A ausênciade um sistema de custos impede que a ad-ministração pública possa avaliar a utiliza-ção dos recursos alocados aos seus agen-tes e os resultados por eles atingidos, comoprevê o dispositivo constitucional(WIEMER; RIBEIRO, 2004, p. 5). Configu-ra-se, dessa forma, a importância da conta-bilidade de custos dentro do ambiente pú-blico, que tem na sociedade, ao mesmo tem-po, sua cliente e proprietária, e que cadavez mais exige um comportamento adequa-do de seus agentes a fim de que se obte-nha a efetividade da gestão pública no País.

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Diante do ora exposto, o tema abordadono presente trabalho reveste-se de impor-tância teórica e prática. Do ponto de vistateórico, o assunto estudado revela-seenriquecedor da moderna literatura volta-da para a administração pública, ao cons-tatarmos o pequeno número de trabalhosacadêmicos com foco na gestão de custosno âmbito da esfera pública federal. Talexiguidade de trabalhos se confirma pelapesquisa realizada por Almeida, Borba eFlores (2009), que analisaram publicaçõesem periódicos com avaliação Qualis/CapesNacional A e B (redistribuídos atualmenteentre as categorias A1 e B3), na área deciências sociais aplicadas, nos Encontrosda Associação Nacional de Pós-Graduaçãoe Pesquisa em Administração (Enanpad) eno Congresso Brasileiro de Custos, no pe-ríodo de 2000 a 2004, mostrando que sãopoucos os artigos científicos divulgados arespeito da aplicação das técnicas de ges-tão de custos na área pública. Na mencio-nada pesquisa, foram analisados 5.839 ar-tigos, tendo sido encontrados apenas 71que tratavam de custos na área pública.

Quanto ao aspecto da relevância em ter-mos práticos, o trabalho busca destacar osbenefícios decorrentes do possível aten-dimento de procedimentos apresentadoscomo eficazes pela teoria da contabilidadede custos por meio da comparação entreos mecanismos de custos utilizados pelasOMPS com os mecanismos sugeridos pelaliteratura. Assim, pode-se perceber a pos-sibilidade de preenchimento de uma lacu-na na área das ciências contábeis, no quetange a estudos e pesquisas sobre a apli-cação prática da gestão de custos na esfe-ra governamental.

Por fim, a presente pesquisa justifica-sepelas recentes demonstrações do aumento daimportância dada pelo Governo Federal aoemprego da contabilidade de custos na ges-tão pública, em especial no que diz respeito à

sua capacidade de contribuir para o incremen-to da qualidade do gasto público. Entre asmencionadas demonstrações, pode-se citar acriação de uma Comissão Interministerial deCustos, composta por servidores dos Minis-térios da Fazenda, do Planejamento e da Ciên-cia e Tecnologia, e outros funcionários. EssaComissão expediu seu relatório final em se-tembro de 2008, destacando a expectativa deque a implantação de sistemas de custos devacontribuir favoravelmente para o melhor apro-veitamento dos recursos públicos, especial-mente no contexto de restrição fiscal do Esta-do. Outro fato de destaque quanto à compro-vação da pertinência do tema na atualidade é adivulgação, em agosto de 2009, por parte daSecretaria do Tesouro Nacional (STN), da 2a

edição do Manual de Contabilidade Aplicadaao Setor Público, em que já consta um capítuloexclusivo dedicado à Contabilidade de Cus-tos. Além disso, a própria STN disponibilizou,em julho de 2009, pesquisa sobre Custos naAdministração Pública Federal, cuja finalida-de é obter a contribuição dos servidorespúblicos para a definição do futuro Sistemade Informações de Custos, a ser implemen-tado pelo Governo. A mencionada pesquisapode ser acessada por meio do websitewww.questionariocustos.fazenda.gov.br.

Organização do estudo

O presente estudo encontra-se organiza-do em cinco seções. Na primeira delas, aintrodutória, buscou-se realizar acontextualização do tema, bem como de-monstrar sua relevância e os motivos quejustificaram a execução da pesquisa. Alémdisso, foram elencados os objetivos que sepretende alcançar, visando responder ao pro-blema de pesquisa formulado. A segundaseção tem por objetivo apresentar o construtoteórico utilizado na pesquisa, que alicerçaráo estudo por meio de uma revisão bibliográ-fica com ênfase em Contabilidade de Custos

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e na Administração Pública, por constituí-rem-se nas pedras basilares da pesquisa.Nessa seção foi abordada a teoria relativa àcontabilidade de custos, apresentando-sealgumas abordagens consideradas como re-ferência no que se refere à análise de custosno setor público. Na terceira seção foram abor-dados os aspectos metodológicos de acor-do com os quais a pesquisa foi delineada. Naquarta seção foi realizada a caracterização docaso da utilização da contabilidade de cus-tos nas OMPS, abordando-se os aspectosrelativos ao seu desenvolvimento. Por fim,na seção 5, foram expostas as consideraçõesfinais, por meio de uma análise dos resulta-dos encontrados na pesquisa, bem como daformulação das conclu-sões e recomendações.

REVISÃO DELITERATURA

Sistema OMPS

O Sistema OMPS foiimplantado no âmbitoda MB visando soluci-onar a preocupaçãoexistente entre a AltaAdministração Navalquanto à incapacidadede mensuração doscustos das organiza-ções militares industriais e prestadoras deserviços. Tal preocupação encontrava ori-gem, principalmente, nos seguintes fatos:constantes deficits financeiros dessas orga-nizações e desconhecimento de outras posi-ções econômico-patrimoniais que possibili-tassem a identificação e a correta avaliaçãodas diversas atividades desenvolvidas nes-sas organizações (BRASIL, 2008, p. 1-1).

Diante de tal cenário, percebeu-se a ne-cessidade de criação de um sistema quepermitisse: a) conhecimento dos gastos

efetivos de operação dessas organizações,separados em custos de produção/presta-ção de serviços e gastos inerentes às ativi-dades administrativas; b) gerência dos ati-vos, isto é, domínio perfeito das disponibi-lidades financeiras e conhecimento dosfaturamentos efetuados e da imobilizaçãodos estoques (idem).

Assim, a Marinha criou as OMPS e oSistema OMPS no ano de 1994, na buscado aprimoramento dos controles internose da determinação mais eficiente dos cus-tos das organizações militares industriaise prestadoras de serviços (ibidem). Paraoperacionalizar a implantação do sistemaforam utilizadas duas ferramentas: o Siste-

ma Integrado de Admi-nistração Financeirado Governo Federal(Siafi) e a Contabilida-de de Custos. No quese refere à contabilida-de de custos, a MB,por ocasião da adoçãodo Sistema OMPS,pautou-se no métodode custeio denomina-do “tradicional” ou“por absorção”, emvirtude de esse méto-do apropriar todos oscustos incorridos naprodução aos produ-

tos/serviços que a OMPS produziu/pres-tou no período de apuração de custos (op.cit., p. 1-2). A utilização dessas ferramen-tas visava permitir que a Alta Administra-ção Naval passasse a visualizar tanto osreais custos dos serviços prestados poraquelas organizações quanto a necessida-de estratégica de suas existências (BRA-SIL, 2008, p. 1-2).

Adicionalmente, ocorriam distorçõesoriundas da transferência de recursos fi-nanceiros entre as Organizações Militares

A Marinha criou as OMPSe o Sistema OMPS no ano

de 1994, na busca doaprimoramento dos

controles internos e dadeterminação mais

eficiente dos custos dasorganizações militares

industriais e prestadoras deserviços

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(OM), gerando a dupla execução do mes-mo recurso. No intuito de resolver defici-ências relacionadas à dupla execução dadespesa e ao desconhecimento das posi-ções econômico-patrimoniais, a MB, como apoio da STN, adaptou o plano de con-tas criado para o Siafi e, em 1994, criou oSistema de Moedas Virtuais. Nesse siste-ma, as denominadas Fontes de RecursosEscriturais (FRE) passaram a ser utilizadascomo unidades monetárias de circulaçãointerna entre as OM para a efetuação dospagamentos, sendo somente convertidasem moeda corrente no momento do paga-mento aos fornecedores. Com isso, possi-bilitou-se à MB executar operações inter-nas, somente por meio escritural, e utilizarrecursos reais somente quando houvessea necessidade de efetuar desembolsos paraórgãos extra-MB. Ressalta-se que as FREsão operadas por intermédio de contascontábeis do grupo Compensado do Siafi.

Assim, conceitualmente, OMPS é a or-ganização militar que presta serviços a ou-tras organizações militares e, eventualmen-te, a organizações extra-Marinha, em umadas seguintes áreas: industrial; de ciência& tecnologia; e hospitalar (idem, p. 1-4).Vale ressaltar que uma OMPS não visa aolucro, pois isso oneraria a própria Marinha,que é o seu principal “cliente”, devendo,portanto, faturar o necessário para cobriros seus gastos, de acordo com o preconi-zado nas normas internas da Marinha.

Contabilidade de custos

Backer e Jacobsen (1974, p. 2) afirmamque a contabilidade de custos tem três fi-nalidades principais:

a) fornecer dados para a avaliação dosestoques e a determinação dos lucros;b) fornecer informações para o con-trole; e c) prover dados para o plane-jamento e a tomada de decisões.

Já para Martins (2003, p. 21):a contabilidade de custos tem duasfunções relevantes: o auxílio ao con-trole e a ajuda às tomadas de deci-sões. No que diz respeito ao controle,sua mais importante missão é forne-cer dados para o estabelecimento depadrões, orçamentos e outras formasde previsão e, num estágio imediata-mente seguinte, acompanhar o efeti-vamente acontecido para comparaçãocom os valores anteriormente defini-dos. No que tange à decisão, seu pa-pel reveste-se de suma importância,pois consiste na alimentação de in-formações sobre valores relevantesque dizem respeito às consequênciasde curto e longo prazos, sobre medi-das de introdução ou corte de produ-tos, administração de preços de ven-da, opção de compra ou produção etc.

Cada uma dessas finalidades busca in-formações diferentes, visando às diversasnecessidades dos usuários da contabili-dade de custos. Se os dados gerados parauma finalidade forem empregados para ou-tra, é possível chegar-se a conclusõesinsatisfatórias e inadequadas (FONSECA,2003, p. 14). Leone (2000) afirma que exis-tem vários tipos de custos, e que essa di-versidade existe para atender às diferentesnecessidades gerenciais que foram surgin-do com o passar dos anos. Tal afirmaçãoencontra respaldo no pensamento deHorngren, Datar e Foster (2005), ao afirma-rem que existem custos diferentes paraobjetivos diferentes.

Na administração pública, assim comona administração privada, torna-se impor-tante conhecer o custo daquilo que é pro-duzido. Contudo, na administração públi-ca, esse fator, até o momento, mereceu pou-cos estudos que viabilizassem sua aplica-ção. Os métodos de custeio mais utiliza-dos e que podem ser úteis para a melhoria

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do processo decisório por parte dosgestores são: custeio por absorção, cus-teio variável, custeio baseado em ativida-des e custeio padrão (SLOMSKI, 2006).

Assim, diante do objetivo do presentetrabalho, será apresentado o arcabouçoconceitual do custeio por absorção, quedará o embasamento teórico para o desen-volvimento da pesquisa.

Custeio por absorção

O custeio por absorção, segundoMartins (2003, p. 214), é um “critério ondese apropriam todos os custos de produçãoquer fixos ou variáveis, quer diretos ou in-diretos, e tão somente os custos de produ-ção, aos produtos elaborados”.

Os custos diretos (aqueles que podemser mensurados em cada produto) sãoalocados diretamente em cada objeto decusteio. Já os custos indiretos (aqueles quenão podem ser mensurados diretamente emcada produto) são alocados ao objeto decusteio por meio de critérios de rateio.

Em qualquer método, o que será discu-tido, trabalhado e analisado são os custosindiretos. Os críticos do custeio por absor-ção condenam o seu uso por entenderemque o rateio é arbitrário, que não identificacorretamente o custo a ser atribuído ao bemou serviço produzido (SLOMSKI, 2006).

O custeio por absorção utiliza centrosde custos e critérios de rateio para distri-buir os custos indiretos aos produtos. Oscentros de custos podem ser divididos emcentros de custos auxiliares e centros decustos produtivos. Os centros de custosauxiliares são aqueles que não atuam so-bre os produtos, servindo de apoio aoscentros produtivos. Já os centros produti-vos são aqueles com atuação direta sobreos produtos, ou seja, estão diretamenteenvolvidos na fabricação dos itens ou pres-tação dos serviços (MEGLIORINI, 2007).

As principais alegações que os críticos,representados neste trabalho por Martins(2003), tecem ao sistema de custeio porabsorção centram-se em três argumenta-ções, a saber:

a) Os custos fixos, independentementede haver ou não produção de determinadoproduto, existem dentro de determinadafaixa. Assim, os custos fixos podem serencarados como custos da estruturaorganizacional, que apenas dão condiçõesde produção para a organização;

b) Há necessidade de se proceder à uti-lização de critérios de rateio, justamentepor não se poder fazer uso de alocação di-reta, já que os custos fixos não pertencema um e outro produto em particular. Ressal-ta-se que, além dos critérios de rateio apre-sentarem certo grau de arbitrariedade, aprópria escolha de um critério também ésubjetiva e arbitrária;

c) O valor dos custos fixos a ser distri-buído a cada produto depende, além doscritérios de rateio, do volume de produção.A argumentação central, nesse caso, é queo custo de um produto pode alterar em fun-ção da variação da quantidade produzidade outro produto ou dele próprio.

Com relação às vantagens do custeiopor absorção, destacam-se as defendidaspor Maher (2001, p. 376), que são: a) o fatode o custeio por absorção reconhecer oscustos fixos e a importância de reconhecertodos os custos de um produto; e b) o fatode que sua implantação pode ser mais ba-rata, porque ele não exige a separação doscustos de produção em fixos e variáveis.

Por fim, Martins (2003) explica ametodologia de aplicação do custeio porabsorção por meio de três passos básicos:1o passo – separação entre custo e despe-sas, uma vez que despesas não podem seralocadas aos produtos, pois pertencem aoperíodo em que incorrem; 2o passo – apro-priação dos custos diretos, por meio da

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identificação dos custos que estão direta-mente relacionados com os produtos; e 3o

passo – apropriação dos custos indiretos,por meio de bases de rateio, já que estescustos não são identificáveis diretamenteaos produtos.

Apuração de custos na administraçãopública

Silva e Drumond (2004, p. 3) afirmam:[...] fundamentalmente, há duas verten-tes precípuas que justificam a apura-ção de custos no setor público, ambasem sintonia com o que propõe a Admi-nistração Pública Gerencial: primeira, aadoção dos custos como critério paraa formação de preços públicos e dereceitas de prestação de serviços; se-gunda, a redução de despesas e aconsequente utilização como mecanis-mo de aferição de eficiência.

Ao analisar essa segunda utilidade,Alonso (1999, p. 39) aponta o esgotamen-to do modelo de gestão tradicional ou bu-rocrático da administração pública, porenfatizar “os controles formais e o estritocumprimento das leis” e o surgimento decorrentes em defesa de um modelo de ges-tão de resultados, preocupado com a“melhoria do desempenho”.

Segundo Alonso (1999), para que os resul-tados e energias da administração pública es-tejam orientados para resultado, é necessárioque o perfil dos gerentes e os sistemas deinformações estejam totalmente alinhados comesta orientação. O mesmo autor (op. cit.)enfatiza que, para avaliar adequadamente odesempenho do serviço público, é crucial queos sistemas de informação do governo dispo-nham de uma informação gerencial mais refi-nada que a despesa: os custos.

Nesse sentido, Mileski (2000, p. 12) diz:o conhecimento dos custos é condi-ção para o cumprimento do princípio

constitucional da transparência, e tam-bém, da eficiência especialmente nosentido estrito da economicidade, que,em outras palavras, pode ser tomadacomo sinônimo de custo-benefício.

Por fim, ao defender a aplicação de cus-tos no setor público, Alonso (1999, p. 45)afirma que sua apuração e sua divulgaçãopodem exercer papel de “poderosos ins-trumentos de controle social”, por permitiraos usuários e à auditoria a avaliação deeficiência dos serviços prestados. Dessaforma, o mesmo autor destaca a utilidadedos custos como instrumento dedetalhamento do planejamento estratégi-co e seletividade de cortes orçamentários,quando da necessidade de se tomarem de-cisões de redução nos gastos públicos.

Para Alonso (1999), os custos estão en-tre os principais indicadores de desempe-nho das organizações. Assim, os sistemasde custo desempenham um papel impor-tante nos processos decisórios e na avali-ação do desempenho institucional.

No combate à ideia de alguns críticosque defendem que a contabilidade de cus-tos não teria serventia para as organiza-ções governamentais, em função de existira obrigatoriedade da prestação dos servi-ços, mesmo que seja deficitária, Leone(2000) afirma que o fato da prestação dealguns serviços públicos ser de caráterobrigatório não diminui a importância daimplantação da contabilidade de custos,pois ela não serve somente para verificar aviabilidade da manutenção de tais servi-ços, mas para controlar e comparar o custoda prestação dessa mesma atividade emperíodos diferentes, por exemplo: se o ser-viço for deficitário, a contabilidade de cus-tos pode demonstrar até que ponto ele édeficitário e até que ponto poderia se em-pregar outros meios mais baratos pararealizá-los, além do fato que saber o custodas atividades realizadas serve para reali-

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zação do planejamento e do orçamentopúblico (ALMEIDA; BORBA, 2005, p. 3).

Por fim, Almeida e Borba (2005) desta-cam que a realização da gestão de custosna administração pública pode proporcio-nar muitos benefícios relacionados com amelhor aplicação dos recursos, quandoorientada ao controle e à tomada de deci-são. Na questão do controle, ela pode serum poderoso instrumento para verificarquestões referentes a desperdício, rouboou má utilização desses recursos. Na ques-tão da tomada de decisão, pode produzirinformações importantes quando fornecedados sobre o custo das atividades reali-zadas, que poderão permitir decisões dotipo terceirizar, ou não, atividades que po-dem ter esta prerrogativa.

METODOLOGIA

Diante da existência de váriastaxonomias de tipos de pesquisa, no pre-sente trabalho será adotada a de Vergara(2003), que propõe classificar as pesqui-sas quanto aos fins pretendidos e quantoaos meios propostos. A mesma autora ob-serva, ainda, que os tipos de pesquisa “nãosão mutuamente excludentes”, sendo pos-sível utilizá-los de forma combinada (VER-GARA, 2003, p. 49).

Dessa forma, pode-se classificar a pre-sente pesquisa como exploratória e descri-tiva quanto aos fins. Exploratória porquevisou buscar a identificação da aplicaçãode conceitos teóricos sobre contabilidadede custos em organizações industriais eprestadoras de serviços do setor públicofederal, especificamente no âmbito da Ma-rinha do Brasil, tendo em vista que há pou-co conhecimento acumulado nesta área.Descritiva porque se buscou expor as ca-racterísticas do Sistema OMPS, em especi-al aquelas que se referem ao seu sistemade custeio e à utilização de indicadores

econômico-financeiros no processo decontrole gerencial das OMPS.

Quanto aos meios, trata-se de uma pes-quisa bibliográfica, documental e de cam-po, utilizando-se o estudo de caso comoestratégia de pesquisa, de acordo com Yin(2001). Bibliográfica, tendo em vista a im-portância da sua fundamentação teórica,que tomou por base importantes obrascujo reconhecimento se dá pelo notóriosaber de seus autores. Documental e decampo porque envolveu a coleta de da-dos primários por meio da análise de do-cumentos internos não acessíveis ao pú-blico em geral.

Outra fonte utilizada na coleta de dadosprimários foi a observação não participante,facilitada em grande parte pelo fato de umdos pesquisadores ser lotado na Diretoria deFinanças da Marinha. Segundo Richardson(1989, p. 213), “a observação é o exame minu-cioso ou a mirada atenta sobre um fenômenono seu todo ou em alguma de suas partes, é acapacitação precisa do objeto examinado”.O mesmo autor (op. cit.) afirma que de manei-ra geral a observação é a base de toda inves-tigação no campo social, podendo-se utilizá-la em trabalho científico de qualquer nível,dos mais simples aos mais avançados. Naobservação não participante, o pesquisadorafigura-se somente como um espectador aten-to a um grupo observado, sendo guiado pe-los objetivos da pesquisa e procurando re-gistrar o máximo de ocorrências que conve-nham ao seu trabalho (RICHARDSON, 1989).Diante do exposto, e tendo em vista que nãohouve qualquer tipo de interferência do pes-quisador nas atividades desenvolvidas pe-las organizações analisadas, fica configura-da a observação não participante.

Yin (2001) afirma que existem três fun-damentos lógicos que representam as ra-zões para se conduzir um estudo de caso.O primeiro configura-se quando represen-ta o “caso decisivo” ao se testar uma teo-

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ria bem formulada. O segundo é aquele emque o caso representa um “caso raro ouextremo”. Por fim, o terceiro fundamentopara um estudo de caso único é o “casorevelador”. Nessa situação, o pesquisadortem a oportunidade de observar e analisarum fenômeno previamente inacessível àinvestigação científica (YIN, 2001, p. 63).

Nesse sentido, é possível afirmar que apresente pesquisa, desenvolvida sob a ló-gica de um estudo de caso, fundamenta-sena natureza reveladora do caso em estudo,justificando-se, assim, a escolha feita. Di-ante do exposto, e tendo em vista o objeti-vo a que se propôs esta pesquisa, o estu-do de caso apresentou-se como a técnicamais indicada, por ser aquela que possibi-lita alcançar um maior nível de profundida-de sobre o assunto, permitindo, por con-seguinte, maior poder de análise.

A CONTABILIDADE DE CUSTOS NOSISTEMA OMPS

As OMPS utilizam-se do sistema de acu-mulação de custos por ordem de serviço(OS) ou ordem de produção (OP), haja vistaque trabalham sob encomenda. Os princi-pais conceitos envolvidos no processo decusteio, de acordo com as normas internasda Marinha, são: a) gasto – sacrifício finan-ceiro com que a entidade arca para a obten-ção de um produto ou serviço qualquer, sa-crifício esse representado por entrega oupromessa de entrega de ativos; b) custos –são os gastos (insumos) incorridos no pro-cesso produtivo ou na prestação de servi-ços; c) despesas – são os gastos incorridosnos Setores Administrativos (ADM) daOMPS, necessários ao funcionamento e àmanutenção da OM; d) perda – gasto nãointencional, decorrente de fatores externosfortuitos ou da atividade produtiva normalda OMPS. Corresponde a bens ou serviçosconsumidos de forma anormal e involuntária.

Com base no exposto, depreende-se que osgastos decorrentes de retrabalho e de ga-rantia dos serviços executados pela OMPSencontram-se enquadrados no conceito deperda; e) custos diretos – são os insumosde produção, reparo ou prestação de servi-ços que podem ser perfeitamente conotadosao produto ou serviço executado; e f) cus-tos indiretos – são os insumos de produ-ção, reparo ou prestação de serviços quenão podem ser conotados diretamente a umproduto ou serviço, sendo apropriados aoscentros de Produção/Atividade (PROD), deApoio à Produção/Atividade (APP). Taiscustos são incorporados aos serviços ouprodutos em elaboração, pela aplicação deum critério de rateio previamente estabele-cido (BRASIL, 2008).

Para a apropriação dos custos indiretosna contabilidade da OMPS, deverão ser uti-lizados os mesmos critérios adotados paraefeito de orçamento/faturamento, levando-se em conta, entretanto, os custos indiretosefetivos de cada mês. Por ocasião do esta-belecimento dos critérios de rateio, os se-guintes cuidados são tomados: a) análiseda adequação do critério de rateio, de formaa permitir que os custos reflitam a sua reali-dade. Essa adequação decorre da afinidadeentre os custos indiretos e a base escolhidapara seu rateio. O custo indireto deve, por-tanto, guardar a mais estreita correlaçãopossível de “causa e efeito” com os dadosescolhidos como critério de rateio; b) verifi-cação da relação custo-benefício na utiliza-ção do critério, uma vez que o sacrifício fi-nanceiro despendido em sua aplicação nãodeverá ser superior à utilização que se pre-tende dar à informação obtida. O esforço e ogasto realizados para a sua obtenção nãodevem ser superiores aos resultados que seespera alcançar com a aplicação do critério;e c) estabelecimento de uma periodicidadepara a revisão dos critérios de rateio, demodo a torná-los consistentes por um perí-

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odo preestabelecido. Qualquer mudança, senecessária, deverá ser adotada, preferenci-almente, no início do exercício.

Destaca-se que, de acordo com as nor-mas em vigor, mensalmente, as OMPS de-vem confrontar os valores reais de seuscustos indiretos e de suas despesas admi-nistrativas, apropriados em conformidadecom os procedimentos previstos nas nor-mas em vigor, com os respectivos valoresorçados/faturados para o período, a fim deverificar a correção dos índices e das taxasaplicados no seu faturamento para a recu-peração dos custos indiretos e despesasadministrativas incorridos no período.

Esquema básico da contabilidade decustos das OMPS

O esquema básico para apuração dos cus-tos empregado pelas OMPS, constante danorma sobre Contabilidade das OMPS, podeser apresentado, resumidamente, da seguin-te forma: 1o passo: separação dos gastos in-corridos pela OMPS entre custos e despesasadministrativas (pré-rateio). Nesse momen-to, essas despesas administrativas devem serapropriadas no Siafi diretamente às contascontábeis específicas destinadas a registraros acúmulos anuais desses gastos; 2o pas-so: apropriação dos custos diretos diretamen-te às OS/OP; 3o passo: apropriação dos cus-tos indiretos aos setores de produção (PROD)ou de apoio à produção (APP) aos quais po-dem ser perfeitamente vinculados, agrupan-do, à parte, os custos indiretos comuns (aque-les que não foram vinculados a nenhum se-tor PROD ou APP); 4o passo: rateio dos cus-tos indiretos comuns aos setores de produ-ção (PROD) e de apoio à produção (APP), deacordo com critérios escolhidos pela OMPS;5o passo: rateio dos custos acumulados nossetores de apoio à produção (APP) aos seto-res produtivos (PROD), de acordo comsequência e critérios escolhidos pela OMPS;

e 6o passo: distribuição dos custos indiretos,que agora se encontram concentrados ape-nas nos setores de produção (PROD), às OS/OP, segundo critérios de rateio fixados nasnormas internas da Marinha.

Na próxima seção será visto como a apu-ração dos custos/despesas é utilizada noprocesso de análise gerencial e avaliaçãode desempenho das OMPS.

A análise gerencial e a avaliação dodesempenho econômico-financeiro dasOMPS

A Diretoria de Finanças da Marinha(DFM), enquanto órgão central de conta-bilidade da Marinha do Brasil, tem por atri-buição realizar a análise gerencial dasOMPS, bem como acompanhar o desempe-nho econômico-financeiro destas. Um dosinstrumentos utilizados para o cumprimen-to da mencionada tarefa é o Relatório Eco-nômico-Financeiro (REF) das OMPS, ela-borado trimestralmente, com o propósitode prover os diversos setores da Alta Ad-ministração Naval de elementos sobre o de-sempenho econômico-financeiro dasOMPS nos períodos de janeiro a março;janeiro a junho; janeiro a setembro; e janei-ro a dezembro. Para a confecção do REF,são utilizados diversos demonstrativos,dentre os quais se destacam: Demonstrati-vo de Resultado do Período (DRP); De-monstrativo de Gastos Estruturais (DGE)das OMPS, que representam os gastos fi-xos dessas organizações; Demonstrativoda Mão de Obra (DMO) das OMPS, queconsolida os gastos com pessoal; e De-monstrativo do Prazo Médio de Renova-ção de Estoques (PMRE) das OMPS. Ape-sar da utilização de vários tipos de demons-trativos, como acima exposto, o presentese concentrará no DRP, dada a sua impor-tância dentro do processo de análise reali-zado pela DFM.

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Inicialmente, é preciso destacar que asOMPS, após a realização de todos os lança-mentos no Siafi, consolidam mensalmentesuas informações sobre custos, despesas efaturamentos no DRP. Tal documento, à se-melhança do Demonstrativo de Resultadodo Exercício (DRE), utilizado na iniciativaprivada, contribui para a análise do desem-penho econômico das OMPS. Então, o DRPé enviado para a DFM, que consolida asinformações, produzindo o REF. Esse rela-tório analisa os atos praticados pelosgestores das OMPS consubstanciados emregistros contábeis do Siafi e nos documen-tos comprobatórios encaminhados à DFM.O REF é submetido trimestralmente à apre-ciação do Conselho Financeiro e Adminis-trativo da Marinha (Cofamar), para efeito deavaliação do quadro geral das OMPS, emtermos de desempenho, bem como para ser-vir de subsídio ao processo decisório noâmbito da Alta Administração Naval.

Os principais conceitos relativos ao re-sultado econômico do período, utilizadosnos relatórios de análise emitidos trimes-tralmente pela DFM como subsídio à toma-da de decisão por parte do Cofamar, de acor-do com as normas internas da Marinha, pos-suem os seguintes significados: a)Faturamento – representa o somatório dasfaturas emitidas pela OMPS no período, in-

dependentemente de terem sido pagas pe-las OM clientes; b) Custo dos Produtos/Serviços Vendidos – representa o somatóriodos custos dos produtos ou serviços reali-zados, registrados como vendidos; c) Re-sultado Bruto – demonstra se o faturamentoda OMPS foi suficiente para cobrir os cus-tos dos serviços/produtos executados. d)Total de Despesas Administrativas – repre-senta o somatório das despesas administra-tivas com pessoal, serviços e material; e)Resultado Operacional – demonstra se ofaturamento da OMPS foi suficiente paracobrir os custos dos serviços/produtos exe-cutados e as despesas administrativas; f)Perdas – representa o montante de mão deobra direta e material que não foi aplicadocomo custo direto ou indireto dos serviços/produtos, nem utilizado pelos setores admi-nistrativos da OMPS; e g) Resultado Líqui-do – demonstra se o faturamento da OMPSfoi suficiente para cobrir os custos dos ser-viços/produtos executados, as despesas ad-ministrativas e as perdas. Este saldocorresponde ao montante de créditoescritural transferido da OM cliente acimado necessário à manutenção da OMPS.

No quadro 1 é possível visualizar osvalores consolidados dos DRP de todasas OMPS para o período compreendidoentre os anos 2000 e 2008. A escolha dessa

Quadro 1 – Demonstrativo do Resultado do Período Consolidado das OMPS

Valores atualizados monetariamente pelo IPCA para jan/2009.Fonte: Siafi

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moldura temporal é justificada por ques-tões de comparabilidade, pois entre 1994 e1999 algumas OMPS foram extintas e ou-tras foram criadas. Dessa forma, só a partirdo ano 2000 chegou-se à configuraçãomantida até os dias de hoje. Por fim, ressal-ta-se que da composição do quadro 1 fo-ram expurgados os valores de uma OMPStendo em vista a identificação de possí-veis inconsistências nos lançamentos fei-tos no Siafi, fato que poderia contribuir paraa ocorrência de distorções na análise a serrealizada. Assim, a amostra utilizada para aconfecção do quadro 1 representa cercade 96% do total das OMPS.

Diante de melhor visualização, obtida como uso do DRP, dos recursos consumidos, emdecorrência do conhecimento mais transpa-rente dos custos e despesas administrativasincorridos no processo produtivo, permitiu-se à Alta Administração Naval, por exemplo,a detecção de desperdícios com gastos e,principalmente, com as perdas referentes àmão de obra das OMPS. Deve-se citar tam-bém que, como decorrência da possibilidadede melhor análise do desempenho das OMPS,fruto da utilização do DRP, ocorreu inclusivea extinção de unidades que não estavam apre-sentando padrões satisfatórios de eficiência,tendo sido consideradas não estratégicaspara a Marinha.

Como principal exemplo de tal tipo dedecisão cita-se o caso da Imprensa Naval,no Rio de Janeiro, parque gráfico de gran-de porte que apresentava dificuldades re-lacionadas à eficiência e atualização

tecnológica, o que implicava um custo deprodução superior ao existente no setorprivado. Considerando-se os altos inves-timentos necessários à manutenção ou mo-dernização, foi decidida a extinção desseparque gráfico.

Outro aspecto que merece destaque foio fato de que, com as informações oriun-das do DRP, possibilitou-se o desenvolvi-mento e aperfeiçoamento dos indicadoresde desempenho econômico e financeiro.

Dentre os indicadores de desempenhona análise realizada trimestralmente pelaDFM, destacam-se os seguintes: a) Resul-tado Bruto/(Faturamento menos Descontos)– tem por finalidade indicar que percentualdo faturamento foi destinado a cobrir as des-pesas administrativas e as perdas; b) Des-pesas Administrativas/Custos dos Serviçosou Produtos Vendidos – tem por finalidadeavaliar o percentual dos gastos das OMPScom seus setores e atividades administrati-vas em relação aos custos dos serviços/produtos vendidos; c) Resultado Opera-cional/(Custos dos Serviços ou ProdutosVendidos mais Despesas Administrativas)– tem por finalidade avaliar a correção dofaturamento das OMPS. Este índice deveser de no máximo 5%, pois a OMPS somentepode faturar pelos serviços prestados emsuas atividades, além de seus custos e des-pesas administrativas, a taxa cujo percentualmáximo é de 5% sobre os custos e despesasadministrativas; e d) Perdas/Custos dosServiços ou Produtos Vendidos – tem porfinalidade avaliar o percentual de perdas

Quadro 2 – Faixas de Desempenho das OMPS

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(material e mão de obra) em relação aos cus-tos dos serviços/produtos vendidos.

Tais indicadores são analisados de acor-do com a realidade de cada organização,tendo sido estabelecido um parâmetro dereferência entendido como dentro da nor-malidade, faixa verde, para a realidade dasOMPS. Dessa maneira, existem quatro fai-xas de desempenho para avaliação dasOMPS, conforme será visto a seguir. Valemencionar que todos os conceitos acimadescritos constam do guia para o acompa-nhamento do relatório econômico-financei-ro (Garef) das OMPS, emitido pela Direto-ria de Finanças da Marinha.

O estabelecimento das quatro faixas dedesempenho teve como escopo permitir adistinção entre os pequenos desvios, emrelação aos padrões de normalidade esta-belecidos, e os resultados que efetivamen-te contribuíram para uma avaliação de de-sempenho negativa das OMPS, visandoauxiliar as análises a serem efetuadas pelaDiretoria de Finanças da Marinha.

A seguir serão apresentados os resulta-dos apurados pelas OMPS em alguns dosprincipais indicadores de desempenho utili-zados pela DFM para a elaboração das análi-ses gerenciais realizadas. Todos os valoresforam extraídos dos Relatórios Econômico-Financeiros das OMPS emitidos pela DFM.

A figura 1, a seguir exposta, contém os re-sultados apurados pelas OMPS para o Indica-dor do Resultado Operacional. A partir do exer-cício de 2003, os resultados obtidos encon-tram-se dentro da faixa de normalidade.

A figura 2 apresenta os resultados apu-rados para o Indicador das Despesas Ad-ministrativas. Tais valores apresentam umatendência de queda a partir do ano 2000,tendo entrado na faixa de normalidadeestabelecida desde o exercício de 2002.

A figura 3 contém informações sobre osvalores obtidos no que se refere ao Indica-dor das Perdas. Verifica-se que, também em

relação a tal indicador, as organizações ana-lisadas apresentaram uma tendência de que-da a partir do ano 2000, encontrando-se oreferido indicador, durante todo o períodoanalisado, dentro da faixa de normalidade.

Figura 1– Indicador do ResultadoOperacional das OMPS

Figura 2 – Indicador de Despesas Admi-nistrativas das OMPS

Figura 3 – Indicador de Perdas das OMPS

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo principal do presente artigo foiverificar se a utilização da contabilidade de

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custos na MB, por meio da adoção do cus-teio por absorção em suas organizações in-dustriais e prestadoras de serviços, encon-tra-se alinhada com os preceitos teóricos pre-conizados na literatura. Para tanto, buscou-se, em primeiro lugar, o embasamento teóriconecessário ao correto entendimento do temaem lide por meio da revisão de literatura, ex-posta na seção 2, que contribui para a defini-ção de um plano de referência utilizado comoelemento balizador do desenvolvimento dapesquisa. Além disso, foi realizada uma análi-se detalhada das principais características doSistema OMPS, com ênfase no uso do cus-teio por absorção.

Diante das características e propósitosdeste trabalho, optou-se pela adoção doestudo de caso, como estratégia de pes-quisa, por possibilitar o alcance de maiorprofundidade sobre o assunto. A estruturaanalítica consistiu na descrição do casoestudado, tomando-se por base as infor-mações contidas nos documentos dispo-níveis, seguida de uma análise qualitativa,em que se procurou relacionar os resulta-dos obtidos no trabalho de campo ao pla-no de referência desenvolvido.

Dos resultados encontrados, foi possí-vel depreender que os preceitos teóricosdo sistema de custos das OMPS da Mari-nha estão de acordo com as finalidadesprincipais da contabilidade de custos emconformidade com o pensamento de Backere Jacobsen (1974), uma vez que o referidosistema é capaz de gerar informações quepassaram a ser incluídas nos relatórios eco-nômico-financeiros das OMPS, servindocomo instrumento de planejamento e to-mada de decisão para a Alta Administra-ção Naval, no que tange às prioridades dealocação dos recursos da Marinha.

Assim, verificou-se que o emprego depreceitos teóricos contidos na contabili-dade de custos, em especial os que se refe-rem ao auxílio ao controle e à ajuda às to-

madas de decisões, de acordo com o de-fendido por Martins (2003), apresentou-secomo uma ferramenta adequada ao ofere-cimento de informações que permitam me-lhor tomada de decisão por parte dos ad-ministradores públicos, uma vez que reve-lam com maior clareza os pontos de des-perdícios cometidos, permitindo, por exem-plo, a redução das perdas no período ana-lisado. Tal pensamento respalda-se no fatode que, no período analisado, houve umatendência de queda no Indicador de Per-das das OMPS, que passou de um patamarde 2,5% dos custos para 0,9%.

Isso se confirma pela constatação deque a Marinha passou a utilizar os custosmensurados como indicadores gerenciais,que servem para apontar disfunções ouavaliar atividades. Assim, possibilitou àAlta Administração conhecer os valoresgastos para manter uma determinada ativi-dade e, em função disso, decidir pela suacontinuação, ou extinção.

Por óbvio, resta afirmar que essa deci-são não se baseia apenas na questão dosgastos, pois muitas vezes torna-se neces-sário manter em funcionamento determina-das organizações, ou alguns setores deuma organização, mesmo que deficitários,pois são importantes ou indispensáveispara o cumprimento da missão constituci-onal da Marinha.

Dessa maneira, pode-se depreender queo emprego apropriado do Sistema OMPSpermitiu à MB, mediante o melhor conheci-mento dos custos de suas organizações,decidir pela extinção da Imprensa Naval,que, além de deficitária, não era estratégicapara a Força.

Por fim, destaca-se que, mesmo diantedos propagados óbices oriundos da utili-zação do custeio por absorção em relaçãoa métodos mais modernos de custeio,como, por exemplo, o ABC, o qual permitedetectar as atividades que agregam ou não

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valor ao produto, a implantação do méto-do de custeio por absorção é mais simplese, portanto, menos onerosa que o ABC, hajavista que este último envolve grande volu-me de trabalho e necessita de profissio-nais que conheçam e saibam utilizá-lo, alémde exigir elevado nível de informatização,diante do grande número de cálculos reali-zados periodicamente.

Desse modo, é possível evocar Maher(2001), anteriormente mencionado, ao des-tacar maior facilidade na implantação docusteio por absorção. Lembre-se, ainda, queno âmbito da Administração Pública existe aquestão da quebra de paradigma culturalquanto à mensuração de custos. Tal fatopode apontar para a indicação da escolhade métodos de custeio mais simples, como éo caso do custeio por absorção. Nesse sen-tido, conforme se verificou, o método porabsorção implantado pela Marinha está aten-dendo com eficiência ao seu sistema de cus-tos. Tal situação mostra que o método decusteio por absorção não deve ser esqueci-do, podendo vir a contribuir eficientemente

como método de apuração de custos para osetor público, obviamente dependendo dosegmento em que seja aplicado.

Entretanto, faz-se necessário lembrarque a apuração de custos não encerra, porsi só, o problema da avaliação de desem-penho das entidades públicas. SegundoSilva e Drumond (2004, p. 10):

os trabalhos que melhor representama preocupação com custos no setorpúblico chamam a atenção para o fatode que o bom desempenho das orga-nizações públicas depende, primeiro,do uso racional dos recursos dispo-níveis na busca das metas priorizadasnos instrumentos de planejamento e,segundo, de ações que realinhem osobjetivos da organização com as as-pirações da sociedade.

Portanto, recomenda-se a replicaçãodeste estudo em períodos posteriores, in-clusive com a inclusão das organizaçõesque não foram incluídas na análise pelosmotivos já explicitados, no intuito de ratifi-car os resultados ora encontrados.

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<ADMINISTRAÇÃO>; Administração (governamental); Estudo;

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SUMÁRIO

IntroduçãoEm busca do comprometimento, considerando as

especificidades da profissão militarO novo trabalho: uma fonte promissora de motivaçãoA Geração Y no trabalhoPor que utilizar a Gestão de Pessoas por Competência?Conclusão

POR QUE ADOTAR A GESTÃO POR COMPETÊNCIASNA MARINHA DO BRASIL?*

AURORA TELLES HERKENHOFF**Capitão de Corveta (T)

INTRODUÇÃO

Existe uma preocupação comum ao mun-do corporativo relacionada a captação,

desenvolvimento e retenção de seu pes-soal. Diante das evoluções tecnológicas,da velocidade das informações, dos pro-cessos de globalização, todos os dias sur-

gem novos desafios que transformam anatureza do trabalho e o perfil das pessoasque o desenvolvem. As organizações ne-cessitam de pessoas proativas, motivadase comprometidas; enfim, precisam de com-petências para competir. Diante da moder-nização de seus meios, bem como da inser-ção de uma nova geração de trabalho em

* Artigo premiado no Concurso de Artigos Técnicos e Acadêmicos e de Redação do Sistema de EnsinoNaval e do Serviço de Seleção do Pessoal da Marinha e indicado para publicação pela Diretoria deEnsino da Marinha.

** N.R.: Encarregada da Divisão de Pesquisa do Serviço de Seleção de Pessoal da Marinha (SSPM).

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POR QUE ADOTAR A GESTÃO POR COMPETÊNCIAS NA MARINHA DO BRASIL?

seus Corpos e Quadros, com novas formasde pensar, de comunicar-se e de atuar, aMarinha do Brasil (MB) precisa preparar-se para lidar com essa nova realidadeorganizacional.

Em termos gerais, a competência para otrabalho engloba três requisitos básicos: osaber em termos de conhecimento, o saber-fazer no sentido depossuir a habilidade eo saber-ser a partir dassituações exigidas pelotrabalho (PICARELLI,2002 apud NERI, 2005).Entende-se que a eficá-cia não é garantida ape-nas mediante a aquisi-ção de um conjunto deconhecimentos e habi-lidades, e sim pela forma como a pessoa rea-liza suas atividades, diante dos desafios im-postos pelo meio. A competência está inti-mamente ligada à ação prática e proativa,dirigida para a obten-ção de resultados estra-tégicos. A consecuçãode tais ações, entretan-to, só é possível se oindivíduo se encontrarmotivado internamentepara empreender.

Pode-se dizer que ogrande desafio da ges-tão de pessoas na atu-alidade é gerar e sus-tentar o comprometi-mento do indivíduocom o trabalho e coma organização. A Ges-tão de Pessoas porCompetência (GPC)pode apresentar-se como uma alternativa,visto que nessa abordagem há um alinha-mento das competências individuais aosobjetivos estratégicos da organização.

EM BUSCA DOCOMPROMETIMENTO,CONSIDERANDO ASESPECIFICIDADES DA PROFISSÃOMILITAR

Pesquisa publicada no jornal O Globorevela que o comprometimento ainda está

muito distante da rea-lidade organizacionalcontemporânea. Den-tre uma amostra de 15mil trabalhadores de15 países, 50% delesdizem não se sentirnem um pouco envol-vidos com o que fazeme nem com a organiza-ção em que trabalham.

Ainda de acordo com o estudo, apenas34% dos trabalhadores se sentem totalmen-te comprometidos. Os 16% restantes divi-dem-se em duas categorias: 9% sentem-se

envolvidos com a or-ganização, mas nãocom o trabalho, en-quanto 7% estão mo-tivados com o que fa-zem, mas não com aempresa (DIAS, 2010).

Na tentativa demudar esse contexto,empresas buscam pro-postas de gestão quesubstituam o modelotradicional. Algumasempresas vêm conse-guindo bons resulta-dos articulando a ges-tão de pessoas base-ando-se em competên-

cias, mas essa implementação se mostratarefa árdua, visto que, para ser realizada, épreciso que as organizações passem porum processo de transformação. Na MB, a

O grande desafio da gestãode pessoas na atualidade é

gerar e sustentar ocomprometimento do

indivíduo com o trabalho ecom a organização

Nas organizações militares,a prontidão para o

combate determina umaestrutura baseada na

hierarquia, disciplina efortemente marcada pelos

valores de grupo que,diante da adversidade,

impulsionariam o militar aobter êxito

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adoção desse sistema implicaria revisão daforma de valorizar o seu pessoal e exigiriaalterações nos padrões culturais e políti-cos, sem perder de vista os objetivosorganizacionais e em prol de realizar comeficiência e eficácia o seu intento estraté-gico. Nas organizações militares, a pronti-dão para o combate determina uma estru-tura baseada na hierarquia, disciplina e for-temente marcada pelos valores de grupoque, diante da adversidade, impulsionari-am o militar a obter êxito. Nesse sentido,pela especificidade de sua estratégia, a MBrequer do seu pessoal competências indi-viduais bastante específicas e diferentesdas organizações que têm estratégia volta-da para inovação.

Autores são unânimes em afirmar que acompetência é situacional (ZARIFIAN, 2005apud FARINHA, 2009). As competênciasrequeridas dependem de muitos fatores, taiscomo: a cultura organizacional, o ramo deatuação, o porte da empresa e a tecnologiaadotada. Dentro dessa perspectiva, pode-se inferir que algumas competências (deno-minadas essenciais) deveriam ser observa-das no comportamento de todos os milita-res, em maior ou menor grau, independente-mente das tarefas desempenhadas por eles.Dentre elas, poderíamos citar a disciplina, aliderança, os valores de grupo e o compro-metimento com a organização.

O militar, ao ingressar na MB, faz umjuramento de defender a Pátria, mesmo queisso implique o sacrifício de sua própriavida. Nesse sentido, o comprometimento,além de ser um atributo indispensável àretenção de pessoas, traz um diferencialpara a organização, porque sem ele a mis-são não pode ser cumprida.

A captação e retenção de pessoasidentificadas com a MB não é tarefa fácil. Osindivíduos que seguem carreira militar sofremrestrições na sua liberdade pessoal, em bus-ca de um bem comum, e essa cultura de re-

núncia entra em contradição com o perfil danova força de trabalho, a denominada Gera-ção Y, que apresenta características peculia-res na sua relação com o trabalho: exige qua-lidade de vida, apresenta uma postura maisinformal, quer liberdade de expressão e umarápida vontade de ascender na carreira.

Atualmente, a MB vem realizando estu-dos com o fim de minimizar as dificuldadesenfrentadas para prover algumas áreas es-pecíficas, principalmente aquelas para asquais o mercado externo oferece oportuni-dades. Ainda que a MB aprimore as suaspolíticas de recrutamento, entende-se quea seleção de pessoas motivadas não serásuficiente para garantir o comprometimen-to delas com a organização, sem antes con-siderar dois aspectos no contexto do tra-balho atual: o avanço tecnológico e suasimplicações na natureza do trabalho atuale as peculiaridades da geração Y, que járepresenta 50% da força de trabalho den-tro das organizações.

O NOVO TRABALHO: UMA FONTEPROMISSORA DE MOTIVAÇÃO

Em princípios do século XXI, os avan-ços tecnológicos criaram um mercadoglobalizado e competitivo, exigindo umareestruturação das organizações. Houveuma redução no número de funções de bai-xa qualificação, mudando radicalmente asrelações das pessoas com seu trabalho. Atecnologia, ao mesmo tempo que possibili-tou um acesso mais amplo e rápido às in-formações, exigiu das pessoas maiordiscernimento e tomada de decisões na re-alização de suas tarefas. A natureza do tra-balho passou a ser mais complexa, ao re-querer das pessoas maior conhecimento eum perfil de habilidades, antes designadasexclusivamente aos gerentes (KENNETH,2010). O trabalho passou a ser uma fontede motivação, na medida em que exigia das

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pessoas maior autonomia e responsabili-dade na sua realização. O sucesso resul-tante da experiência pessoal com o traba-lho permite a construção de umaautoimagem positiva, que favorece o cres-cimento dos indivíduos.

Pesquisas recentes em planejamento dotrabalho oferecem evidências ainda maisfortes de que a maneira como os elementosdo trabalho são organizados pode aumen-tar ou reduzir a motivação. De acordo coma pesquisa, a maioria das pessoas satisfei-tas com a realização das suas atividadesdiárias quer permanecer no seu trabalho. Aoferta de aumentos salariais pela concor-rência ou remunera-ção injusta pode con-tribuir para a procurade novos empregos,mas são as recompen-sas vindas diretamen-te do trabalho, comoreconhecimento, res-ponsabilidade, realiza-ção e oportunidade decrescimento pessoal eprofissional, que pos-sibilitam o verdadeiroenvolvimento dos indivíduos com o traba-lho e, consequentemente, um nível maiorde comprometimento deles com a organi-zação (ROBBINS, 2004).

A motivação é afetada, ainda, por umadinâmica subjetiva e não deve ser avaliadade maneira estática por uma relação de es-forço e recompensa. De acordo com a Teo-ria da Expectativa de Vroom (LÉVY-LEBOYER, 1994), o comportamento de todotrabalhador, qualquer que seja sua qualifi-cação, é função da medida em que ele acre-dita que seu trabalho lhe permite atingirseus objetivos pessoais, da autoconfiançanas suas habilidades e potencialidades, dapercepção de que o trabalho representa ummeio eficaz de se obter ganhos e do valor

que esses ganhos têm em relação às suasnecessidades individuais.

A autoconfiança relativa às capacidadese o valor atribuído às vantagens que o tra-balho pode oferecer influenciam a motiva-ção e podem ser alterados pelas evoluçõessociais, culturais e profissionais. SegundoLévy-Leboyer (1994), acontecimentos exter-nos podem transformar a identidade profis-sional de um indivíduo, de um grupo de pro-fissionais ou de toda uma geração.

Entende-se que as modificaçõesprovocadas pelo desenvolvimento econô-mico e social resultante do avanço datecnologia podem contribuir para a cons-

trução de uma relaçãomais positiva do ho-mem com o trabalho,no sentido de favore-cer seu desenvolvi-mento pessoal. A mai-or oferta de trabalho,a chegada no mercadode profissionais maisqualificados e a con-corrência por profissi-onais com potencialdiferenciado facilitam

a consolidação de uma identidade profis-sional positiva, nutrindo a ambição e o de-sejo das pessoas de se aperfeiçoarem eascenderem socialmente. Apesar da novaconfiguração do trabalho favorecer o de-senvolvimento pessoal, ainda são eviden-tes as dificuldades enfrentadas pelos jo-vens em busca de seu primeiro emprego.As sequelas provocadas por essa frustra-ção afetam diretamente a construção daidentidade e personalidade, e podem refle-tir no futuro desempenho no trabalho a serrealizado por estes jovens.

As escolas de formação da MB preocu-pam-se em construir nos alunos uma identi-dade profissional militar. Uma das condiçõespara que essa formação seja revestida de

O sucesso resultante daexperiência pessoal com o

trabalho permite aconstrução de uma

autoimagem positiva, quefavorece o crescimento dos

indivíduos

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sucesso é que o aprendizado e as habilida-des adquiridas sejam percebidos. O reco-nhecimento contribuirá para a construçãode um autoconceito positivo em relação assuas capacidades e impulsionará o militar acrescer na carreira e a capacitar-se cada vezmais. Para isso, a MB precisará investir empolíticas de desenvolvimento de pessoal eaproveitamento de habilidades de maneiraparticularizada, que levem em conta não ape-nas as necessidades da organização, mastambém interesses e expectativas daquelesque a integram, tornando-se assim uma fon-te promissora de motivação.

A GERAÇÃO Y NOTRABALHO

A Geração Y, tam-bém denominada Ge-ração da Internet, nas-ceu entre os anos de1980 e 2000. São filhosda primeira geração depais que trabalhavamfora e que, em virtudedisso, adotaram umapostura de educação centrada nos filhos,menos tradicional e muito preocupada emdesenvolver maior proximidade no relacio-namento parental. Essa geração recebeudos pais apoio incondicional e meios paracrescer e expressar-se livremente (LIPKIN;PERRYMORE, 2010).

Devido à forma de criação que recebeue à cultura do período de sua formação, aGeração Y tem uma ética e postura profis-sional totalmente diferentes, assim comoum conjunto de valores que abala todas asestruturas existentes. Nesse sentido, nãopodemos falar de motivação e comprome-timento sem antes levar em consideraçãoas principais características dessa geração.

Em virtude da educação recebida, essesjovens tornaram-se bastante autocentrados e

individualistas. Suas expectativas em relaçãoao trabalho são pouco realistas e por isso cau-sam grande impacto no ambiente de trabalho.

É uma geração talentosa, muito estimu-lada, socialmente consciente, exigente, cri-ativa, com vontade de realizar e com ambi-ção internacional. Relaciona-se por meiode redes sociais, quer informação rápida einformalidade. A Geração Y valoriza o tem-po livre, a energia e a saúde no trabalho,que deve ser parte da vida, mas não a pró-pria vida.

Outra característica importante é ainformalidade nos diálogos com os níveisgerenciais mais altos, mudando a dinâmica do

relacionamento entre oscargos superiores daorganização. Os funcio-nários Y querem ser va-lorizados, não queremter apenas um chefe,querem um mentor.Quando não gostam dochefe deixam a empresa,mas, quando se identi-ficam, são extremamen-te leais. Essa lealdade

ao chefe ultrapassa qualquer lealdade à em-presa, e essa característica torna-se um fatorcrítico para a retenção de talentos.

A autoestima inflada dessa geração fazcom ela precise de constante aprovação erecompensas para se sentir segura e moti-vada a produzir. Como não é possível ficardependente de fatores externos para tra-balhar, o desafio das organizações comessa nova geração é ajudá-la a encontrar amotivação interna, o que significa promo-ver o envolvimento com seu trabalho. Assuas formas de pensar e de atuar revelamcompetências importantes para o mundocorporativo, mas também apontam paraoutras que precisam se desenvolver.

Em respostas às suas demandas, as gran-des organizações preparam-se para lidar com

A Geração Y é talentosa,muito estimulada,

socialmente consciente,exigente, criativa, com

vontade de realizar e comambição internacional

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essa nova realidade buscando novos méto-dos de gerir pessoas em suas organizações.

POR QUE UTILIZAR A GESTÃO DEPESSOAS POR COMPETÊNCIA?

Para atender à demanda do mercado detrabalho atual, algumas empresas adquiri-ram um comportamento proativo em rela-ção ao conhecimento. Citamos como exem-plo a criação de universidades corporativasque têm como proposta o desenvolvimen-to das pessoas. Nelas, o treinamento não éapenas centrado na aquisição de conheci-mento e habilidade, mas também no com-portamento e na liderança. A maior distin-ção entre os programas de treinamentostradicionais e os apli-cados pela GPC refe-re-se a sua preocupa-ção em dar sentido aosignificado do traba-lho das pessoas pe-rante a organização,oferecendo oportuni-dades de reflexão so-bre os projetos de suavida profissional.

O indivíduo dese-nha a sua trajetóriaprofissional de acordo com o contexto deoportunidades estabelecidas pela empre-sa. As ações de desenvolvimento profissi-onal são orientadas a partir da comparaçãoentre o desempenho esperado e avaliado,sem perder de vista essa trajetória. Acapacitação contínua e a transparência noscritérios de desenvolvimento profissionalpossibilitam que as pessoas projetem ofuturo delas na empresa, favorecendo o seuenvolvimento não só com o trabalho em si,mas também com a organização.

A MB possui um cenário favorável aesse modelo de gestão, porque realiza apreparação de seu pessoal para a vida mili-

tar em suas próprias escolas de formação.A instituição investe parcela elevada deseus recursos para formar, especializar eaperfeiçoar. Apesar do grande investimen-to, permanecem dificuldades na retençãode seu pessoal. É preciso que a MBcomplemente tais esforços mediante açõesde desenvolvimento por competência, con-siderando a acepção do trabalho atual, oque significa adotar condutas de valoriza-ção de seu pessoal condizentes com asnovas relações do homem com o trabalho.Para que isso seja possível, a Marinha deveincentivar ações que focalizem a motiva-ção interna, o que pode ser feito por meioda adequação das propostas do sistemade Gestão de Pessoas por Competências

ao seu âmbito de atu-ação, ou seja: valorizaros interesses indivi-duais sem perder devista os objetivos es-tratégicos, explorarhabilidades e não des-perdiçar talentos econscientizar os mili-tares de que as renún-cias não são inócuas,mas em prol de umamissão social, que é a

defesa da Pátria.

CONCLUSÃO

A relevância do aspecto motivacional paraa competência no trabalho é indiscutível. Naspalavras de Farinha (2009): “Competência dizrespeito à especificidade do indivíduo, suaoriginalidade, sua trajetória de vida, abran-gendo sua experiência profissional, suas ca-pacidades e potencialidades” (p. 4).

Como apresentado, as mudanças no con-texto atual das organizações requerem umanova relação do homem com o trabalho, queimplica uma visão de competência que vai

A MB possui um cenáriofavorável a esse modelo de

gestão, porque realiza apreparação de seu pessoalpara a vida militar em suas

próprias escolas deformação

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POR QUE ADOTAR A GESTÃO POR COMPETÊNCIAS NA MARINHA DO BRASIL?

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<ADMINISTRAÇÃO>; Gerência; Pensamento militar; Motivação; Preparo do homem; Se-leção de pessoal; Qualidade;

além do conhecimento e da experiência paraatender determinada função ou cargo. Nes-sa visão, a competência é definida como acapacidade de os pro-fissionais colocaremem prática o que sesabe em determinadocontexto, marcado ge-ralmente pelas rela-ções de trabalho, cul-tura da empresa, impre-vistos, limitações detempo e recurso (DU-TRA, 2009).

Dentro dessas pers-pectivas, as organiza-ções investem em polí-ticas de gestão de pes-soas baseadas em com-petências, com vistas adesenvolver a motiva-ção. Ela precisa ser desenvolvida porque im-pulsiona a aquisição de conhecimento e a

busca para a realização do indivíduo. Comovisto anteriormente, é a partir do desenvolvi-mento da motivação interna, ou seja, do

envol-vimento do serhumano com as ativida-des que realiza, que sepode garantir o com-prometimento das pes-soas com o trabalho e aorganização.

Enfim, para comba-ter as dificuldadesoriundas da captação eretenção de militares naMB, sem perder de vis-ta seus objetivos estra-tégicos, a Gestão porCompetência pode sig-nificar uma excelente al-ternativa para que osrecursos aplicados no

desenvolvimento de seu pessoal revertamem prol da instituição.

Para combater asdificuldades de captação eretenção de militares naMB, sem perder de vistaobjetivos estratégicos, aGestão por Competência

pode significar alternativapara que recursos

aplicados nodesenvolvimento de pessoalrevertam para a instituição

REFERÊNCIAS

DIAS, P. “Metade não tá nem aí”, O Globo, Rio de Janeiro, 28 de mar. 2010. Boa Chance, p. 1.DUTRA, J. S. Competências: conceitos e instrumentos para a gestão de pessoas na empresa

moderna. São Paulo: Atlas, 2009.DUTRA, J. S.; FLEURY, M. T. L.; RUAS, R. (Org.). Competências: conceitos, métodos e experiên-

cias. São Paulo: Atlas, 2008.FARINHA, C. A. “O conceito de competência no serviço de recrutamento e seleção de trabalhado-

res”. In: V Simpósio sobre Trabalho e Educação, 2009, Belo Horizonte. Disponível em:<http://www.portal.fae.ufmg.br/simposionete/sites/default/files/FARINHA,Corina.pdf>.Acesso em 26 de mai. 2010.

LÉVY-LEBOYER, C. A crise das motivações. São Paulo: Atlas, 1994.LIPKIN, N. A.; PERRYMORE A. J. A Geração Y no trabalho: como lidar com a força de trabalho

que influenciará definitivamente a cultura da sua empresa. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.NERI, A. (Org.). Gestão de RH por competências e a empregabilidade. 2a ed. rev. e atual. Campinas,

SP: Papirus, 2005.ROBBINS, S. P. Comportamento organizacional. 11a ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall, 2005.THOMAS, K. W. A verdadeira motivação: descubra os 4 elementos capazes de fortalecer o

envolvimento de seus funcionários para sempre. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010.

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SUMÁRIO

IntroduçãoAttainabilityA manutenção francesaConclusão

MANUTENÇÃO, SOBRESSALENTES EDISPONIBILIDADE NA MB*

FÁBIO ANDRADE BATISTA DOS SANTOSCapitão-Tenente

“Effective logistic support will not always guarantee success;lack of such support, however, inevitably will bring failure.”**

Naval Logistics

INTRODUÇÃO

Recentemente, o Brasil anunciou que de-volveria ao Paraguai um canhão de 12

toneladas construído com o metal dos si-nos das igrejas durante a Guerra doParaguai. O troféu de guerra, chamado deEl Cristiano devido à procedência de suamatéria-prima, é fruto dos improvisos nas

guerras daquele tempo. Já o combate mo-derno exige planejamento, preparo e dis-ponibilidade de meios, tendo as adaptaçõese improvisos um espaço cada vez menor.Esta disponibilidade está diretamente liga-da ao Apoio Logístico e, em especial, à ma-nutenção e ao suprimento1.

Além disso, toda força militar carece deduas características sine qua non: capaci-

* N.R.: Artigo publicado na Revista Passadiço de 2010 e classificado em 3o lugar no Concurso de MelhorArtigo do Centro de Adestramento Almirante Marques de Leão.

**N.R.: “Apoio logístico eficaz nem sempre garante o sucesso; a falta deste apoio, contudo, inevitavel-mente trará insucesso”.

1Para que a MB se adequasse à Doutrina de Logística Militar (DLM), abastecimento deixou de ser definidocomo função logística, passando a ser entendido, em sentido amplo, como um conjunto de ativida-des voltadas para o apoio de material às Forças e demais OM, englobando a função logísticasuprimento e parte da função logística transporte, além de relacionar-se estreitamente com afunção logística manutenção.

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MANUTENÇÃO, SOBRESSALENTES E DISPONIBILIDADE NA MB

dade e credibilidade. Ainda que tenhamosuma capacidade reduzida em virtude da re-alidade de nosso país, é essencial que nos-sa força tenha ao menos credibilidade, se-não estaremos assistindo ao desperdíciode recursos. Essa credibilidade depende depodermos manter essa capacidade, aindaque modesta, apoiada efetivamente na pazou na guerra.

ATTAINABILITY

A Marinha dos Estados Unidos adota oconceito de attainability, definindo-ocomo a aquisição do apoio logístico es-sencial mínimo para iniciar as operaçõesde combate. Este conceito engloba o riscoassumido, que é interpretado como a dife-rença entre o nível deapoio desejado pelocomandante e a neces-sidade mínima absolu-ta para atender aos re-quisitos da missão.

A Marinha do Bra-sil (MB) utiliza concei-tos parecidos, como aLista de Dotação deBordo e a Lista de Dotação de Base, queenvolvem a quantidade de material que deveser mantida em estoque nos depósitos enas unidades, para apoiá-las durante umdeterminado período de tempo, a fim de pre-servar a sua capacidade de manutenção ereparo. Além disso, existem as Dotaçõesde Paz ou de Guerra, relacionadas às muni-ções (mísseis, torpedos, foguetes, projetisetc.) e diretamente ligadas a nossa capaci-dade de combate.

Durante o Conflito das Malvinas, as for-ças argentinas inobservaram este precei-to, entrando em combate com a dotação deníveis de munição aquém do mínimo, emespecial os mísseis AM-39 Exocet. Este ar-mamento, que se mostrou fundamental no

conflito, estava restrito a cinco unidades,limitando sobremaneira o poder combatentede nosso vizinho. Supõe-se até mesmo quehouve uma tentativa frustrada de obten-ção junto à Líbia.

O ciclo logístico prevê as fases básicasde determinação de necessidades, obten-ção e distribuição.

Durante a determinação de necessidades,são respondidas as questões referentes atipo, quantidade, período de tempo, local ondeempregar e qual a prioridade de sobressalen-tes e itens de consumo a serem adquiridos.Essas necessidades são provenientes daanálise dos recursos apropriados ao cumpri-mento de missões da MB. Dessa forma, nãose pode negligenciar a existência de uma re-serva estratégica de sobressalentes críticos

fundamentais para oemprego eficaz dos sis-temas navais, mesmonos períodos de paz.

A obtenção, duran-te ou próximo ao lití-gio, exigirá esforçopolítico e possibilida-de técnica dos forne-cedores, normalmente

estrangeiros, dos quais obviamente não sedeve ficar à mercê. Lembra-se aqui umchavão comum da aviação: quanto maislonge da última guerra (ou acidente), maisperto da próxima estamos.

Para a existência dessa reserva estraté-gica, deve-se priorizar a nacionalização dosprodutos estratégicos de defesa, inclusivecom incentivos fiscais à indústria de defe-sa por meio de legislação compatível.

A MANUTENÇÃO FRANCESA

A Marinha da França encontrava-se, em2001, com grave problema de disponibili-dade de meios (taxa de 50%), agravadopelas baixas das unidades mais antigas.

Lembra-se aqui um chavãocomum da aviação: quanto

mais longe da últimaguerra (ou acidente), maisperto da próxima estamos

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MANUTENÇÃO, SOBRESSALENTES E DISPONIBILIDADE NA MB

Com a criação do Service de Soutien de laFlotte – SSF (Serviço de Apoio da Esqua-dra), procurou-se melhorar essa taxa e di-minuir os custos das manutenções em con-junto com os setores responsáveis pela suarealização (arsenais e firmas). O Ministérioda Defesa francês pretendia atingir estaeconomia e aumentar a disponibilidade pormeio da redução do tempo dos reparos, dadiminuição das incertezas inerentes ao pro-cesso de manutenção e da melhoria da qua-lidade dos serviços realizados.

A estatal DCN (Direction des Construc-tions Navales), principal responsável pe-los serviços de manutenção naval, mudouseu estatuto e tornou-se então uma empre-sa pública de direito privado, com partici-pação de outras firmas (como a Thales).Surgia um dos maiores conglomerados dedefesa europeu (atual DCNS), que passa-ria a ser remunerado não pelo trabalho rea-lizado, mas pelas disponibilidade dos mei-os sob sua responsabilidade contratual.Além disso, com esta modificação, regrasmais flexíveis de compras, gerenciamentode pessoal e acordos industriais passarama reger a nova empresa.

Os contratos de manutenção, supervi-sionados pelo SSF, previam um orçamentopreciso e multas em caso de metas (taxasde disponibilidade) não atingidas pelosprestadores de serviço. Vários tipos denavios eram agrupados sob um mesmo con-trato, com duração de vários anos. As rela-ções com os fornecedores de sobressalen-tes foram modificadas, tornando-se maiságeis, e uma hotline foi estabelecida entreusuários e técnicos responsáveis pelosequipamentos, de modo a permitir a solu-ção mais rápida das avarias. Essareestruturação permitiu, por exemplo, quecinco dos seis submarinos nucleares deataque estivessem no mar em determinadoperíodo, taxa inédita até então. Possibili-tou também que outras empresas passas-

sem a disputar contratos de manutenção,principalmente de unidades menos comple-xas, como navios-patrulha.

Atualmente, a DCNS possui três con-tratos de aproximadamente 310 milhões deeuros para a manutenção, em condiçãooperacional, de mais de 22 unidades fran-cesas, tendo atingido uma taxa de 74% dedisponibilidade em 2006. Estuda-se, ainda,empréstimo à MB de navios construídospelo estaleiro para impulsionar as vendasno exterior com o slogan “operado pelaFrança”. A BAE Surface Ships, inglesa, ini-ciou procedimento parecido, arrendandoquatro navios-patrulha à Royal Navy, fi-cando responsável por sua manutenção epelo apoio logístico.

As atividades de manutenção e supri-mento são interdependentes. Uma manu-tenção inadequada implica um aumento dasnecessidades de suprimento e, inversamen-te, a carência de suprimento exige maioresforço de manutenção.

CONCLUSÃO

Os conflitos modernos têm sido trava-dos sem declarações formais de guerra,normalmente têm curta duração e podemocorrer sem as antigas escaramuças de fron-teiras ou escaladas. Com isso, o processode mobilização deve ser feito, com a devidaatenção, desde o tempo de paz, conside-rando a intensidade e a rapidez dos com-bates atuais, pois, na maioria das vezes,ocorrerão guerras come-as-you-are – ve-nha como estiver.

Portanto, a existência de itens de poolcríticos e de eficientes organizações demanutenção é fundamental para disponi-bilidade dos meios. Esta condição nos tra-rá autonomia e, consequentemente, a ca-pacidade de exercício de nossa soberania,evitando-se a submissão a pressões políti-cas externas em momentos de crise.

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MANUTENÇÃO, SOBRESSALENTES E DISPONIBILIDADE NA MB

A fase atual de investimentos do Paísem Defesa é favorável, e a MB deve apro-veitar para consolidar conquistas, dotan-do-se das condições mínimas de logística,

* N.R.: Um plano logístico eficiente é o fundamento sobre o qual uma operação de guerra deve se basear.Se o mínimo necessário de apoio logístico não puder ser provido para as forças combatentesenvolvidas, a operação pode falhar, ou na melhor hipótese, alcançar sucesso parcial.

tanto no aspecto de capacidade de manu-tenção como de abastecimento de sobres-salentes, visando à disponibilidade dosmeios.

“A sound logistic plan is the foundation upon which a war operationshould be based. If the necessary minimum of logistic support cannotbe given to the combatant forces involved, the operation may fail, or

at best be only partially successful.”*Admiral Raymond A. Spruance, USN, Commander Fifth Fleet, 1946

CLASSIFICAÇÃO PARA ÍNDICE REMISSIVO:<APOIO>; Apoio logístico; Manutenção; Sobressalente;

BIBLIOGRAFIA

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www.senat.fr/rap/r04-426/r04-42615.html.• “DCN change de nom et devient DCNS” (http://www.meretmarine.com/article.cfm?id=104301).• “DCNS offers to loan vessel to French Navy” / DefenseNews April 5,2010 pag 11• Artigo “A Logística e as Operações Militares” – VA (Ref) Armando Amorim Ferreira Vidigal –

Revista Marítima Brasileira (2/1997)

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ARTIGOS AVULSOS

Esta seção divulga os artigos que não puderam ser publicados– na íntegra – na RMB e que passarão a fazer parte do acervo daBiblioteca da Marinha.

Aqui são apresentados o título, o autor, posto ou título, númerode páginas do trabalho completo, classificação para índice remissi-vo e o resumo do artigo.

O SUBMARINO NUCLEAR COMO ARMA DEDISSUASÃO. O INVESTIMENTO COMPENSA O

RESULTADO FINAL?

JOSÉ DOMINGOS DE ARAÚJO VALLIMCapitão de Corveta (FN)

Número de páginas: 08Identificação: AV 041/11– # 1900– RMB 2o/2011CIR: <FORÇAS ARMADAS>; Submarino nuclear;

Nos últimos anos, a estabilização da economia brasileira e as crescentes melhoriasnos níveis sociais, econômicos e administrativos elevaram o País a uma posição de desta-que no cenário internacional, particularmente no âmbito regional. Tal projeção traz a neces-sidade de um Poder Naval compatível com as aspirações nacionais de potência regional.Consequentemente, ampliou-se a necessidade de vigilância e proteção sobre tal região,cabendo à Marinha do Brasil (MB) buscar meios que lhe permitam patrulhar e assegurar aintegridade de tão valioso bem.

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ARTIGOS AVULSOS

Este trabalho apresentará subsídios que comprovam que, apesar do elevado custo depesquisa, desenvolvimento e construção de um submarino de propulsão nuclear, os bene-fícios tecnológicos na área de engenharia naval e engenharia nuclear, bem como a capacida-de de dissuasão bélica adquirida em benefício da defesa de nossos interesses no mar e denossa soberania, compensam a grande demanda inicial de recursos para sua construção.

É imperativo que seja tratado como projeto de Estado e de interesse vital para asociedade como um todo.

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NECROLÓGIO

† AE Valbert Lisieux Medeiros de Figueiredo† VA Fábio Soares Carmo† CMG Mário Augusto Pinto Cardoso de Castro† CMG Alfredo Costa da Cruz† CT Manoel Ramalho Medeiros Filho† CT José Raimundo Oliveira do Nascimento

VALBERT LISIEUX MEDEIROS DEFIGUEIREDO 07/12/1928 † 18/03/2011

Nasceu em Santa Catarina, filho deAmaury Poggi de Figueiredo e de GuiomarMedeiros de Figueiredo. Promoções: a se-gundo-tenente em 07/04/1953, a primeiro-tenente em 07/10/1954, a capitão-tenenteem 07/04/1957, a capitão de corveta em 08/06/1962, a capitão de fragata em 23/09/1966,a capitão de mar e guerra em 22/04/1971, acontra-almirante em 25/11/1977, a vice-al-mirante em 31/03/1983 e a almirante de es-quadra em 31/07/1986. Foi transferido paraa reserva em 25/11/1989.

Foi Ministro de Estado: Chefe do Esta-do-Maior das Forças Armadas.

Em sua carreira exerceu cinco coman-dos: Contratorpedeiro Pará; Base Almiran-te Castro e Silva; Força de Submarinos; 1o

Distrito Naval e Comandante de OperaçõesNavais.

Exerceu três direções: Diretoria deHidrografia e Navegação; ComissãoInterministerial para os Recursos do Mar eDiretoria-Geral do Pessoal da Marinha.

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NECROLÓGIO

Comissões: Corveta Imperial Marinhei-ro; Diretoria do Pessoal da Marinha; Coman-do da Flotilha de Submarinos; Base Almiran-te Castro e Silva (imediato); SubmarinoRiachuelo; Comando da Força de Submari-nos; Secretaria-Geral da Marinha; Gabinetedo Ministro da Marinha; Gabinete Militar daPresidência da República; Gabinete da Vice-Presidência da República; Estado-Maior dasForças Armadas; Escritório do Adido Navalem Portugal (Adido Naval); Estado-Maiordas Forças Armadas (subchefe).

Em reconhecimento aos seus serviços,recebeu inúmeras referências elogiosas eas seguintes condecorações: Ordem doMérito da Defesa – Grande Oficial; Ordemdo Mérito Naval – Grã-Cruz; Ordem do Mé-

rito Militar – Grande Oficial; Ordem doMérito Aeronáutico – Grande Oficial; Or-dem de Rio Branco – Grã-Cruz; Ordem doMérito Judiciário Militar; Medalha Militare passador de platina – Quarto Decênio;Medalha Naval de Serviços Distintos; Me-dalha Mérito Tamandaré; Medalha MéritoMarinheiro – 3 âncoras; Medalha do Paci-ficador; Medalha Mérito Santos Dumont;Ordem do Mérito Conseil InternationalSport Militare; Portugal – Medalha do Mé-rito Militar de 1a Classe; França – OrdemNacional do Mérito; e Portugal – MedalhaNaval de Vasco da Gama.

À família do Almirante Valbert LisieuxMedeiros de Figueiredo, o pesar da Revis-ta Marítima Brasileira.

HOMENAGEM AO ALMIRANTE VALBERT

Conhecemo-nos em 1941. Tínhamos 11ou 12 anos quando ingressamos no Inter-nato do Colégio Pedro II, o velho casarãobranco de São Cristóvão.

Na época, o Pedro II era o colégio pa-drão, se não do Brasil, pelo menos do Riode Janeiro, capital cultural do País. SeuCorpo Docente era constituído por profes-sores de grande prestígio nacional, nomesque até hoje, com grande saudade, possi-velmente permanecem nos meios acadêmi-cos pela competência, dignidade, austeri-dade e também, por que não afirmar, peloadequado rigor imposto a seus alunos.Valbert citava por completo seus nomes,acrescentando os dos chefes de disciplinae seus auxiliares, aos quais também muitodevemos pelo respeito e correção com quenos tratavam.

No Pedro II, ainda adolescentes, inicia-mos nossa formação moral e intelectual quebalizaram nossas vidas, não só as nossas,como também as de Luiz Carlos de Freitas,Henrique Octavio Aché Pillar e Luiz Carlos

de Albuquerque Santos, colegas queconosco optaram pela carreira na Marinha.

Naquela época, no Pedro II havia trêsclasses de alunos: os que nada pagavam,recebendo inclusive o material didático euniformes; os que pagavam apenas o ensi-no; e os que os responsáveis arcavam comtodas as despesas. Valbert se incluía entreos primeiros.

Valbert nasceu em Tubarão, SantaCatarina, primogênito de uma família semgrandes recursos, cabendo a sua mãe, viú-va, o sustento dos cinco filhos.

Em 1946, ao ingressarmos na Escola Na-val, não bem sabíamos que por opção haví-amos escolhido uma sublime carreira em quea vida acadêmica e as condições do regimede internato viriam aprimorar nosso carátere formação, plasmando-nos brasileiros cons-cientes de seus deveres e obrigações paracom a Nação. Formação que, pelo exemplopessoal, foi absorvida pelos nossos filhos eagora se transfere aos nossos netos tor-nando-nos indistintamente pessoas dignas,

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honradas e produtivas, entre os milhares deoutros brasileiros.

A Marinha, esta nobre instituição, es-tabelece aos seus integrantes direitos edeveres e objetivos a alcançar ao longo dacarreira. Valbert, por circunstâncias várias,notadamente de natureza política, mas so-bretudo pelos inegáveis atributos pesso-ais, foi o único a alcançar em nossa turma ocargo de ministro de Estado, no caso mi-nistro chefe do Estado-Maior das ForçasArmadas, comprovando, tão ao gosto denosso sincretismo, de nossa miscigenadacultura, os prognósticos que, na sua infân-cia, foram antecipados à sua mãe por umavidente, como contam seus familiares.

Conciliador por excelência, moderado etranquilo, por todos, ou pelo menos pelamaioria, fazia-se compreender, sem ter a pre-tensão de impor sua opinião. Aparência físi-ca, semblante e a voz pausada sem exacer-bações nos indicavam um ser generoso, mascom convicção, afirmo que não ingênuo. Odesejo de aceitar desafios foi uma de suascaracterísticas pouco percebida.

Cultivava suas amizades, as quais, inde-pendentemente de suas condições sociais,tratava com igualdade, mesmo quando situ-ado no topo da hierarquia profissional,assertiva verdadeira, notadamente para comuns poucos de nossos colegas do Pedro IIcujas vidas o destino não privilegiou.

Ao concluirmos a magnífica e inesque-cível Viagem de Instrução – a quarta circu-navegação da Marinha do Brasil –, poucosforam os guardas-marinha que não perma-neceram no Rio – a maioria foi designadapara a Esquadra.

Valbert foi servir no norte do País, no4o Distrito Naval, com sede em Belém (PA).Por cerca de um ano e meio serviu, na áreada Amazônia, na Corveta Carioca e noNavio de Transporte Garcia D’Ávila. Re-gressando ao Rio, embarcou noContratorpedeiro de Escolta Bertioga e no

Navio de Transporte de Tropas BarrosoPereira.

A partir de abril de 1958, quando se apre-sentou à Flotilha de Submarinos, passousua carreira a ser orientada para as ativida-des submarinas. Nessa ocasião, exerceufunções na Corveta Imperial Marinheiro(imediato), no Submarino Timbira (imedia-to e comandante interino) e foi instrutor doCurso de Subespecialização de Praças. Esteperíodo, no Governo Jânio Quadros, foiinterrompido por dez meses para que ficas-se à disposição do Ministério de Viação eObras Públicas para exercer, numa espéciede intervenção branca, a Superintendên-cia dos Serviços de Navegação da Amazô-nia e Administração do Porto do Pará.

Concluída a missão no norte do País,regressou à Flotilha, assumindo funçõesem seu Estado-Maior.

Em fevereiro de 1962, embarcou na BaseAlmirante Castro e Silva (Bacs), passando,em dezembro de 1964, a ser seu imediato e,em 1966, comandante interino. Em 1963,acumulou funções com outras no Submari-no Riachuelo. Tudo leva a crer que aFlotilha, por imposição da crônica falta deoficiais, vivia uma época em que todos osrecursos de pessoal tinham que serotimizados ao máximo.

Ao iniciar seu curso de especializaçãode submarino, cumpria-se o sonho do ado-lescente do Pedro II de entrar para a Mari-nha e ser submarinista. Talvez se tenhaempolgado com os iniciais sucessos dacampanha submarina alemã e a grande ehistórica proeza de Gunther Prier em ScapaFlow, tudo floreado de maneira exacerbadae com empolgante retórica pelo nosso pro-fessor de francês Monsieur Belair – pilotode caça da Força Aérea Francesa na Primei-ra Guerra Mundial.

O curso foi rigoroso, as notas eramaltíssimas, só um oficial foi aprovado com10, sendo a média da turma 9,3.

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Oficiais-Alunos do Curso de Especialização de Submarinos. À direita, sentado, o CT Valbert

Havia, entretanto, os momentos de jo-vialidade e alegria. O Tenente Valbert nãochegava a ser expansivo, comunicativo,mas convivia bem com todos, participan-do das gozações inerentes a todos os jo-vens quando reunidos.

Na ocasião, dispúnhamos dos meiossubmarinos no estado da arte que as con-dições econômico-financeiras permitiam aoPaís possuir. Neste quadro, um tanto ad-verso, o Tenente/Almirante Valbert tambémprestou sua colaboração. Na Força de Sub-marinos, à qual sempre esteve muito ligadoe na qual passou a maior parte de sua vidaoperativa, nunca desmereceu o lema “Ma-rinheiros até debaixo d’água”. Foi contem-plado com o privilégio de comandá-la demaio de 1980 a janeiro de 1982.

Em março de 1967, quando do início doGoverno Costa e Silva, seu destino passoua apresentar um forte componente políti-

co. Três anos antes, havia-se iniciado umperíodo difícil na vida política da Nação. Ojá Capitão de Mar e Guerra Valbert tornou-se mais discreto e reflexivo, sem nunca terperdido seus sentimentos humanitários,sua dignidade e sua exemplar conduta.

Após servir por um breve período naSecretaria-Geral da Marinha, exerceu fun-ções no Gabinete do Ministro da Marinha,inclusive como assessor parlamentar; noGabinete do Vice-Presidente da Repúblicae no Gabinete Militar da Presidência daRepública.

Este período na Alta Administração Na-val foi interrompido para que se matricu-lasse no Curso de Comando e Estado-Mai-or na Escola de Guerra Naval.

Em julho de 1970, por não haver subma-rinos disponíveis, assumiu o comando doContratorpedeiro Pará, voltando a seguirao Gabinete Militar da Presidência da Re-

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pública para assumir as funções desubchefe de Marinha.

Entre junho de 1971 e março de 1974, foisubchefe e chefe de Gabinete do Vice-Presi-dente da República, recebendo, ao final dagestão, elogio do Almirante AugustoHamann Rademaker Grunewald. Encerra-se,assim, sua participação na política nacional.

Inicia-se, a partir de agosto de 1974 ecom término em setembro de 1976, um novoperíodo de sua vida, integrado ao Ministé-rio de Relações Exteriores como adido na-val em Portugal e Espanha. Ao findar suapassagem pela Adidância em Portugal, foi-lhe concedido elogio formulado pelo Em-baixador Carlos Alberto Fontoura.

Em setembro de 1976, reintegrou-se àForça de Submarinos no cargo de coman-dante da Base Almirante Castro e Silva,quando foram realizados estudos para rea-lização do Plano de Desenvolvimento, Re-gulamento e Revisão da Tabela de LotaçãoAutorizada (TLA) da Base, assim comoincrementada a participação nos reparosdos submarinos e retirada das baterias dossubmarinos Bahia e Ceará.

O ano de 1977 foi dedicado à EscolaSuperior de Guerra na condição de estagi-ário do Curso Superior de Guerra Naval.Foi promovido a contra-almirante em 25 denovembro de 1977.

Em fevereiro de 79, assumiu as funçõesde subchefe de Marinha do Estado-Maiordas Forças Armadas (Emfa), representan-do-o na Comissão Brasileira de AtividadesEspaciais, ocasião em que realizou viagensa São José dos Campos, à Barreira do Infer-no e à região de fronteira norte do País.Consta de seus assentamentos ter contri-buído para a formulação da Estrutura Mili-tar de Guerra e para o planejamento de exer-cícios combinados. Por sua atuação noEmfa, recebeu elogios dos chefes com osquais serviu no período de fevereiro/79 amaio/1980.

Retornou à Força de Submarinos, assu-mindo seu comando em 28 de maio de 1980.Ao término de sua comissão, recebeu docomandante em chefe da Esquadra elogioque ressalta, dentre outros, a participaçãode unidades da Força em todos os exercíci-os, demonstrando elevado grau de eficiên-cia operativa, instruções para o controleoperativo dos submarinos e definição dastarefas dos mergulhadores de combate.Ressalta também seus diversos atributospessoais.

Em dezembro de 1981, assumiu o cargode diretor de Hidrografia e Navegação. Par-ticipou, como chefe da delegação, da XVSessão do Conselho Executivo da Comis-são Oceanográfica Intergovernamental,realizada em Paris.

Pela portaria no 0395, de março de 1982,foi designado para ficar às ordens do chefedo Estado-Maior da Armada de Portugal,Almirante Antonio Egidio de Souza Leitão.

Cumpriu com pleno êxito, como se fos-se um desafio, a transferência da sede daDiretoria de Hidrografia e Navegação daIlha Fiscal, no Rio de Janeiro, para a Pontada Armação, em Niterói. Numa evoluçãonatural, a simples transferência da sedeampliou-se para a dimensão de um comple-xo hidrográfico digno de elogios da comu-nidade hidrográfica internacional.

Participou, como representante, do Co-mitê Científico sobre Pesquisa Oceânica doConselho Internacional de Uniões Cientí-ficas e da Comissão OceanográficaIntergovernamental e, como secretário, daComissão Interministerial para os Recur-sos do Mar (Cirm). Em novembro de 1983,agora não mais cumulativamente, assumiuos cargos de representante do Ministérioda Marinha e de secretário da Cirm.

A condição de secretário da Cirmensejou a que proferisse palestras em di-versas instituições, como a Pontifícia Uni-versidade Católica do Rio de Janeiro, Clu-

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be Militar, Escola Superior de Guerra, RotaryClube do Rio de Janeiro, Fundação de Es-tudos do Mar (Femar) e Escola de GuerraNaval. Em abril de 1985, passou o cargo derepresentante do Ministério da Marinha esecretário da Cirm.

Em Ordem de Serviço, lhe é consignadoelogio pelo ministro da Marinha em que seressaltam sua dedicação e sua capacidadeprofissional.

Em março de 1985, assumiu o cargo decomandante do 1o Distrito Naval (Rio deJaneiro-RJ). Em setembro de 1986, passoueste cargo para assumir a direção-geral doPessoal da Marinha, dando início a umasérie de viagens a serviço para entendi-mentos com autoridades também da AltaAdministração Naval, proceder a inspe-ções administrativo-militares e para repre-sentar o Ministério da Marinha na Exposi-ção Defesa 87, em Lisboa.

Em 31 de junho de 1986, foi promovido aalmirante de esquadra. Ao deixar o cargode diretor-geral do Pessoal da Marinha,recebeu do ministro da Marinha, HenriqueSabóia, o seguinte “Agradecimento”, par-cialmente transcrito:

“... Por 20 meses, o Almirante Valbertexerceu essa direção. Devo de público quefoi motivo de satisfação e tranquilidade tercontado, em todas as ocasiões, com suaassessoria competente, franca, leal e, aci-ma de tudo, amiga.

Seu entusiasmo pessoal e sua dedica-ção ao serviço, associados ao seu conhe-cimento profissional, contribuíram signifi-cativamente para o bom andamento da AltaAdministração Naval. Entre os avançosobtidos, desejo ressaltar a revisão do Pla-no de Carreira dos Oficiais da Marinha, areformulação da legislação do Corpo Femi-

nino, os estudos preliminares para oguarnecimento dos submarinos de propul-são nuclear e as medidas referentes ao aces-so das praças integrantes da parcela espe-cial à Escola de Formação de Sargentos.

No seu retorno ao setor operativo, aoqual dedicou a maior parte de sua carreira,como bem demonstram seus mais de 4.600dias de embarque e quase 750 dias de mar,apresento ao Almirante Valbert os mais sin-ceros votos de êxito no importante cargode comandante de Operações Navais.”

Assumiu o cargo de comandante deOperações Navais, cumulativamente com ode diretor-geral de Navegação, em 6 de maiode 1988. Por razões de serviço, passou-osum mês e pouco depois, em 20 de junho,ascendendo ao cargo de ministro de Estadochefe do Estado-Maior das Forças Arma-das. Em 5 de janeiro de 1990, passou o car-go, encerrando, assim, um longo período desua vida profissional a exclusivo serviço dasForças Armadas brasileiras.

Por possuir profundas convicções reli-giosas herdadas e cultivadas por toda a suafamília, quando exerceu o cargo de diretor-geral do Pessoal da Marinha organizou oQuadro de Capelães Navais. Enquanto mi-nistro de Estado, empenhou-se pessoalmen-te para que o Governo brasileiro assinasse aconcordata sobre Assistência Religiosa nasForças Armadas Santa Sé-Brasil, ocorridaem outubro de 1989. O colega do Pedro IIque não saiu de nossos pensamentos e oAlmirante Valbert partiram, deixando-nossaudade e uma imagem altamente positiva.Aos seus irmãos, filhos e neto, nossos sen-timentos e incondicional apoio.

Odyr Marques Buarque de Gusmão Contra-Almirante (Refo)

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FÁBIO SOARES CARMO 01/10/1937 † 16/02/2011

Nasceu no Rio de Janeiro, filho de Jairde Souza Carmo e de Maria de LourdesSoares de Souza Carmo. Promoções: a se-gundo-tenente em 12/12/1959, a primeiro-tenente em 12/01/1961, a capitão-tenenteem 13/07/1963, a capitão de corveta em 08/08/1969, a capitão de fragata em 30/04/1976,a capitão de mar e guerra em 30/04/1983, acontra-almirante em 25/11/1988, a vice-al-mirante em 31/07/1993. Foi transferido paraa reserva em 15/04/1998.

Em sua carreira exerceu oito comandos:Navio-Varredor Javari; ContratorpedeiroBenevente; Contratorpedeiro Mato Gros-

so; 1o Esquadrão de Contratorpedeiros;Centro de Instrução Almirante Alexandri-no; 6o Distrito Naval; Força de Contratorpe-deiros; e 4o Distrito Naval. Foi diretor doPessoal Militar da Marinha.

Comissões: Contratorpedeiro Mariz eBarros; Navio-Aeródromo Ligeiro MinasGerais; Colégio Naval; ContratorpedeiroAmazonas; Aviso Oceânico Bauru; Escolade Aprendizes-Marinheiros do Espírito San-to; Diretoria do Pessoal Militar da Mari-nha; Comando do Grupamento Naval doSul; Grupo de Fiscalização e Recebimentode Fragatas; Arsenal de Marinha do Rio deJaneiro; Comando do 5o Distrito Naval; Ga-binete do Ministro da Marinha; Diretoriado Pessoal Militar da Marinha (vice-dire-tor); Comando em Chefe da Esquadra (che-fe do Estado-Maior); Estado-Maior da Ar-mada (vice-chefe); e Estado-Maior das For-ças Armadas (vice-chefe).

Em reconhecimento aos seus serviços,recebeu inúmeras referências elogiosas eas seguintes condecorações: Ordem doMérito da Defesa – Grande Oficial; Ordemdo Mérito Naval – Grande Oficial; Ordemdo Mérito Militar – Comendador; Ordemdo Mérito Aeronáutico – Comendador; Or-dem de Rio Branco – Grande Oficial; Or-dem do Mérito Judiciário Militar; MedalhaMilitar e passador de platina – Quarto De-cênio; Medalha Mérito Tamandaré; Meda-lha Mérito Marinheiro – 3 âncoras; Meda-lha do Pacificador; Medalha Mérito San-tos Dumont; e Ordem do Mérito Militar –Paraguai.

À família do Almirante Fábio Soares Carmo,o pesar da Revista Marítima Brasileira.

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É, para mim, uma insigne honra poderprestar esta homenagem a um grande ami-go que, recentemente, deixou nosso con-vívio – o Almirante Fábio Soares Carmo.

Fomos grandes amigos. Entretanto, ofato de termos sido amigos não contribuiem nada para exagerar em minha avaliaçãopessoal acerca da excelente pessoa, domaravilhoso amigo e do magnífico marinhei-ro que ele foi.

Entramos juntos para o Colégio Navalem 1954, na famosa Turma Dedo, e desdelogo me afeiçoei ao Fábio por sua simpatia,sua sinceridade e pela educação esmeradade que era dotado. Tornamo-nos amigos e,ao longo de nossas carreiras, pude apreci-ar suas qualidades.

Após o período escolar, que englobouos dois anos de Colégio Naval e os trêsanos de Escola Naval, fizemos juntos a vi-agem de instrução de guardas-marinha abordo do Navio-Transporte de Tropas Cus-tódio de Mello. No regresso, como segun-dos-tenentes, casamos com nossas noivase nossa amizade se estreitou mais ainda,pois passamos a frequentar as residênciasum do outro com nossas esposas, que tam-bém se tornaram amigas, bem como nossasfilhas, que nasceram em sequência e quaseque simultaneamente.

A partir do posto de primeiro-tenente,passamos a servir juntos (ou em naviosdas mesmas Forças) por muitas vezes. Ini-cialmente, servimos no Navio-AeródromoLigeiro Minas Gerais. A seguir, fomos ime-diatos de avisos oceânicos (o Fábio noBauru). No mesmo posto, comandamos

UM NOTÁVEL MARINHEIRO E UM GRANDE AMIGO

“A morte não é noite em alvorada,Nem dia sem amanhã,

É a própria vida que segue.”Leon Denis

navios-varredores (ele no Javari). Comocapitães de corveta, servimos juntos naDiretoria do Pessoal Militar da Marinha(DPMM). Depois, fomos aos Estados Uni-dos para sermos imediatos do recebimentode novos contratorpedeiros (o Fábio doMato Grosso). Em seguida, ele comandouo Aviso Oceânico Benevente. Depois, fize-mos juntos, na Escola de Guerra Naval(EGN), o Curso de Comando e Estado-Mai-or (C-CEM). Como capitães de fragata, co-mandamos, no mesmo período, contrator-pedeiros (o Fábio comandou o mesmo na-vio que havia recebido como imediato, oMato Grosso). No último ano como capi-tães de fragata, fiz o Curso Superior deGuerra Naval da EGN, enquanto ele optoupor cursar a Escola Superior de Guerra.

Depois do posto de capitão de mar eguerra, nossos caminhos profissionais sesepararam, muito embora, por nossa amiza-de, eu continuasse, dos cargos que exerci, aapreciar sua vitoriosa trajetória. Ele foi che-fe do Estado-Maior do Comando do 5o Dis-trito Naval (em Rio Grande-RS), comandan-te do 1o Esquadrão de Contratorpedeiros evice-diretor da DPMM. A escolha para pro-moção a contra-almirante coroou, com intei-ra justiça, sua excelente folha profissional.

Quando passei para a Reserva Remune-rada, pude, a partir de então, com admiraçãoe orgulho, continuar a acompanhar seu su-cesso como oficial-general, ao comandar oantigo Quartel de Marinheiros, a Força deContratorpedeiros e o 6o Distrito Naval (emLadário-MS). Veio, então, a honrosa e mere-cida promoção a vice-almirante, quando,

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sucessivamente, comandou o 4o DistritoNaval (em Belém-PA), foi vice-chefe do Es-tado-Maior da Armada (EMA) e exerceu ocargo de vice-chefe do Estado-Maior dasForças Armadas (Emfa), de onde foi transfe-rido para a Reserva Remunerada, após 47anos de dedicação extrema à Marinha.

O fato de termos sido amigos e a coinci-dência de comissões me deixam bem à von-tade para o avaliar com acuidade e ressal-tar sua elevada dedicação e seu extremoamor à Marinha. De meu relato acima, pode-se verificar que exerceu comandos no marpor cinco vezes em cinco postos consecu-tivos. Por outro lado, serviu, como oficial-general, por três vezes fora de sede, tendocomandado dois Distritos Navais, servidono EMA e no Emfa, onde, por motivo deenfermidade do ministro-chefe do órgão,respondeu interinamente pelo cargo porlongo período.

Manobrava um navio com grande perí-cia e segurança. Exerceu suas funções ecargos com êxito, mercê de sua grande com-petência, indiscutível seriedade profissio-nal e finura no trato, possuindo as qualida-des de ser querido por seus subordinados,apreciado por seus superiores e admiradoe estimado por seus colegas de turma. Con-quistou, em sua brilhante carreira, um con-siderável tempo de embarque e uma inve-

jável quantidade de dias de mar. Foi, mere-cidamente, agraciado com inúmeras con-decorações e recebeu de seus chefes mui-tos elogios por seu brilhante desempenhonos variados cargos e funções para osquais foi designado.

Sua indiscutível competência e seuprofissionalismo marcante eram aliados auma enorme alegria de viver e a uma notá-vel simpatia. Tinha sempre um sorriso afá-vel e uma boa vontade acima do normalpara ajudar aqueles que a ele recorriam.Sabia ser amigo daqueles a quem devota-va sua amizade. Todos devem se recordardele com carinho e saudade.

Continuamos amigos até o seu fim, viti-mado que foi por terrível enfermidade, quenos privou, lamentavelmente, de sua que-rida companhia e das agradáveis conver-sas que eu mantinha com ele, quase sem-pre falando de sua querida Marinha e deseu Flamengo, grandes paixões que teveem sua vida, além da família, naturalmente.

A Marinha perdeu um excelente mari-nheiro e eu perdi um amigo precioso einsubstituível...

Que Deus, todo poderoso, envolva seuespírito em Sua exuberante luz!

Egberto Baptista SperlingCapitão de Mar e Guerra (Refo)

02/08/1934 † 15/03/201129/07/1940 † 28/02/201119/04/1950 † 17/03/201128/02/1959 † 01/03/2011

A RMB expressa o pesar às famílias pelo falecimento dos assinantes:

CMG 51.1037.11 – Mário Augusto Pinto Cardoso de CastroCMG 61.1024.15 – Alfredo Costa da CruzCT 66.0155.11 – Manoel Ramlho Medeiros FilhoCT 76.3000.33 – José Raimundo Oliveira do Nascimento

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CARTAS DOS LEITORES

Esta seção destina-se a divulgar ideias e pensamentos e incentivar debates,abrindo espaço ao leitor para comentários, adendos esclarecedores e observa-ções sobre artigos publicados. As cartas deverão ser enviadas à Revista Maríti-ma Brasileira, que, a seu critério, poderá publicá-las parcial ou integralmente.Contamos com sua colaboração para realizar nosso propósito, que é o de dina-mizar a RMB, tornando-a um eficiente veículo em benefício de uma Marinhamais forte e atuante. Sua participação é importante.

A Biblioteca da Marinha acaba de ad-quirir a interessante obra The ParaguayanWar – Organization, Warfare, Dress andWeapons, de autoria de Terry D. Hooker. Olivro, o primeiro da série “Armies of theNineteenth Century: The Americas”, foieditado pela Foundry Books Publication,em 2008.

O autor tem a seu crédito outros 11 li-vros sobre o mesmo tema geral, tais como,The Armies of Bolivar and San Martin(1991), The revolt in Texas leading to itsindependence from Mexico 1835-36 (1994)

GUERRA DO PARAGUAI

e The spanish-american war: the cubanland campaign, order of battle (1996).

A obra tem 190 páginas, as primeiras 108dedicadas à narrativa da guerra e as de-mais tratando de “Organização e Unifor-mes”. Ambas as partes são fartamente ilus-tradas com desenhos, mapas (baseadosnos da obra de Tasso Fragoso) e inúmerasfotografias, algumas da época.

A organização do texto é extremamentedidática, daí estar ele apresentado em 34tópicos. Da primeira parte, destaco: O nas-cimento da nação paraguaia; Artigas e a

Recebida correspondência do Vice-Almirante Luiz Edmundo Brígido Bittencourt,nosso colaborador benemérito, que, a pedido da Direção da RMB, analisou o livro TheParaguayan War – Organization, Warfare, Dress and Weapons. Abaixo, transcrevemossua análise:

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CARTAS DOS LEITORES

Banda Oriental; A ascensão e queda deRosas; Uruguai até 1854 e Paraguai apósFrancia; Guerra do Paraguai: a contagemregressiva do tempo para a guerra; A guer-ra é iniciada; A Batalha do Riachuelo; OsAliados invadem; A Batalha de Curupaiti;A pausa na luta; Escaramuças e ações norio; Outras ações no rio; A queda dePeribebui, e A guerra no seu estágio final.

A segunda parte, “Organização e Uni-formes”, seguindo a mesma orientação di-dática, está apresentada em 241 tópicos,ilustrados com 241 desenhos, além de inú-meras fotografias.

O texto é de leitura agradável, comomostra o trecho abaixo, retirado do tópicoA Batalha do Riachuelo:

“Três navios paraguaios atacam oParnaíba, pois ele dava mostras de estartendo dificuldade em manobrar. São eles oTacuari, seguido do Marquês de Olinda edo Salto Oriental, o qual chega a tempode ver o Tacuari atracar a contrabordo doParnaíba com cerca de 12 homens da equi-pe de abordagem de pé em cima da caixa daroda, a qual estava na mesma altura do con-vés do navio brasileiro.

Contudo, todos os navios brasileirosestavam com as suas redes antiabordagemmontadas e por isso os dois únicosparaguaios que conseguiram atingir o con-vés do navio brasileiro tiveram que pularde volta para seu navio. Ao mesmo tempo,o Salto Oriental conseguiu atracar acontrabordo por bombordo do Parnaíba epular com 30 homens para o convés; aí elesviram oficiais e a guarnição correndo paraas diversas escotilhas sem esperar para vero que os invasores fizeram para se encon-trarem ali. Se os paraguaios tivessem ime-diatamente tomado as escotilhas, o desfe-

cho da batalha poderia ter sido diferente,mas eles não o fizeram.

O Amazonas cessou fogo e, navegando atoda força adiante, abalroou ambos os pe-quenos navios paraguaios. Após quatro ho-ras e meia de luta, no meio da confusão, osnavios paraguaios sobreviventes, apresen-tando grandes danos, lançaram-se à fuga.

O almirante brasileiro falhou em não ti-rar proveito de seu sucesso deixando deperseguir os remanescentes paraguaios,dois dos quais (Tacuari e Igurei) estavamseriamente danificados. Ao invés, temero-so porque o nível do rio estava baixando,os brasileiros retiraram-se Paraná abaixo.”

Vale ressaltar que a descrição da Batalhado Riachuelo inclui desenhos de uma chataparaguaia (tirada da obra de Tasso Fragoso),de todos os navios brasileiros do esqua-drão de Barroso e de todos da Marinhaparaguaia e a organização dos navios brasi-leiros e paraguaios que tomaram parte nabatalha, com seus respectivos comandan-tes e informações sobre armamento e núme-ro de homens embarcados.

O autor conta também, com algum deta-lhe, o forçamento de Humaitá.

O desembarque brasileiro acima deAngustura foi tratado particularmente, massem ressaltar a participação da Marinha,responsável pela eficiente travessia dequase 20 mil soldados com todo o seu ma-terial (inclusive cavalos) sem que houves-se a baixa de um só homem, nem morto nemferido. (Vide “O segundo Dia D da guerrado Paraguai”, na RMB do 1o trimestre de2009, p. 107-122)

Concluindo, o livro de Terry D. Hookeré interessante e deve ser lido e tratado,mais ainda, como excelente fonte de con-sulta dos uniformes da época.

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CARTAS DOS LEITORES

O ingresso nas Forças Armadas paraseguir carreira dá-se por meio de concursonacional, amplamente divulgado na mídia.Quem é ou foi militar, ou tem parentes mili-tares, ou mesmo mantém interesse ou rela-ções pessoais que permitam o acompanha-mento dos assuntos militares sabe o quan-to a seleção é concorrida.

A vida castrense requer dedicação inte-gral e interesse em aprimorar-se nos diver-sos cursos de carreira, mediante exames deseleção ou por voluntariado, que contri-buem para as futuras promoções, nomea-ções e exercícios de cargos.

Na Marinha tive colegas, inclusive na Es-cola Naval, de origem social humilde que, comesforço próprio, superaram as dificuldades,aproveitando a vontade de vencer com a ca-pacidade intelectual, que independe de clas-se social.

Muitos oficiais iniciaram a carreira navalingressando como marinheiro-recruta ouaprendiz de marinheiro e, com visão, esforçoe muito estudo conseguiram aprovação nosdisputadíssimos concursos do Colégio Na-val, Escola Naval ou mesmo para outros cor-pos e quadros, após cursarem faculdades.

Para ingressar ou ascender na Marinha nãohá óbices quanto a raça e origem social. Fru-tos de um Plano de Carreiras que estabeleceregras claras que norteiam os requisitos ne-cessários e meritórios, inúmeros são os exem-plos de oficiais de origem humilde que atingi-ram o almirantado, ressaltando-se os filhos demilitares do Corpo de Praças da Marinha. Demodo similar, isso acontece no Exército Brasi-leiro e na Força Aérea Brasileira. Por tantosexemplos ao longo da história, reputo as For-ças Armadas como belo exemplo de promoto-res de mobilidade social no Brasil.

MOBILIDADE SOCIAL PROMOVIDA PELASFORÇAS ARMADAS

Recebida correspondência do Capitão de Mar e Guerra Ronaldo dos Santos Santia-go a respeito da Mobilidade Social nas Forças Armadas, que a seguir transcrevemos:

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O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

As histórias aqui contadas reproduzem, com respeitoso humor, oque se conta nas conversas alegres das praças-d’armas e dos conveses.Guardadas certas liberdades, todas elas, na sua essência, são verídicase por isso caracterizam várias fases da vida na Marinha.

São válidas, também, histórias vividas em outras Marinhas.Contamos com sua colaboração. Se desejar, apenas apresente o caso

por carta, ou por e-mail ([email protected]).

Na segunda metade da década de 70, eraeu primeiro-tenente, além de encarregadodas oficinas da Base Naval de Natal, era tam-bém encarregado da Divisão Marítima, as-sumindo sempre essa função, durante umbom tempo, quando o encarregado desem-barcava para realização de cursos e/ou ou-tros motivos, até embarcar um outro oficialpara quem eu passava as funções.

Certo dia, fazia a docagem de um rebo-cador fretado à Petrobras. Em Natal, naépoca, havia mais de trinta unidades dessetipo de embarcação que dava apoio às pla-taformas de Ubarana, Guamoré e outras,todas com deslocamento em torno de miltoneladas. Devido ao período de férias, aguarnição do dique estava desfalcada. Fui,então, obrigado a requisitar alguns alunosda Escola de Formação de Reservistas Na-vais (EFRN), existente até hoje na BaseNaval, para participar da faina.

O dique flutuante era o famoso Cidadedo Natal, ainda existente. A faina trans-

corria normalmente quando, por influên-cia do vento, o navio, já na entrada dodique, teve uma tendência a cair para bom-bordo. Então ordenei ao suboficial demanobras e reparos (MR), meu braço di-reito na faina, e que estava no momentoafastado de mim, encontrando-se mais aré, que passasse a espia 1 de boreste dorebocador no cabrestante do dique, a fimde conter o indesejado seguimento. Foiquando um desses grumetes que partici-pava da docagem, e que teve pouquís-simas aulas de marinharia, pois estava noinício do curso, transmitiu para osuboficial: “O tenente está mandando pas-sar a espia no cabeço que roda!”

Pelo safismo escapou de um pesadotesa, tendo sido, após a docagem, orien-tado sobre o tal equipamento, ocabrestante.

João Márcio Barreto de Souza Capitão de Corveta (RM1-EN)

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O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

1 Abreviatura da especialidade Direção de Tiro.2 Condição de prontidão para entrada/saída de porto.3 Abreviatura da especialidade de Comunicações Navais.4 Abreviatura do curso de Operador Fonia.5 Abreviatura que significa interrogação.

Esta história passou-se na década de1990, durante comissão operativa da Es-quadra a bordo da Fragata Defensora (Deu-sa), no Centro de Operações de Combate(COC). Teve como protagonista um safocabo DT1.

Suspendemos de um porto fora de sede,logo bem cedo. No Detalhe Especial para oMar (DEM),2 o COC dos navios permanecetotalmente guarnecido e seus serviços sãodistribuídos conforme as especializações enecessidades do setor. Neste sentido, eracomum que o militar menos atarefado ficas-se incumbido de tomar nota das mensagensfonia da linha de manobras. Naquele mo-mento, competia ao “cabão” tal missão.

Nas comissões operativas, a função deoperador fonia é permanentementeguarnecida, no passadiço, por um CN3 cur-sado em Opfon4. O cabo esquadra, por serarmamentista, não tinha o referido curso enenhum conhecimento sobre os procedi-mentos das comunicações radiotelefônicas.

O COC permanecia às escuras, apenasse destacando a pouca iluminação emitidapelos equipamentos. Eram poucas as or-dens emanadas pelo circuito de comunica-ções exteriores, e o sono, nessa situação, éum inimigo real. O cabo DT lutava contraesse adversário enquanto guarnecia o con-

O TIGRE CHICOTEOU

sole da Direção de Tiro e mantinha o livrode anotações fonia ao seu lado.

Repentinamente, um sinal tático emitidopelo navio capitânia rompeu o silêncio.Modulação forte, mas com interferências edistorções que dificultaram a inteligibilidadeda mensagem ao final da transmissão. To-dos ficaram duvidosos sobre o que tinhamouvido, e as atenções se voltaram para osafíssimo cabo. Então, o chefe de quarto noCOC olhou na direção do console DT e per-guntou: “Fulano, você recebeu o final datransmissão?” Nesse instante, o cabão sen-tiu o peso que estava sobre seus ombros e arelevância de uma resposta positiva; eledesconfiou que o sinal recebido deveriadesencadear alguma ação do COC. Assim,respirou fundo, investiu-se de coragem, sen-so de cooperação e soltou a sentença: “Afir-mativo, chefe, o sinal recebido foi “O TigreChicoteou”. Todos ficaram perplexos, poisnão sabiam o que significava tal expressão.Solicitou-se por outra linha a confirmaçãoda mensagem e, como resposta, obteve-se aseguinte frase padrão: “INT5 Se Copiou”. Agargalhada foi geral, e a guerra repercuteaté hoje.

Eduardo Bezerra de Oliveira Junior Primeiro-Sargento (CN)

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O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

Ano: 1985. Eu já era Capitão de Mar eGuerra e exercia o cargo de Capitão dosPortos do Estado de Pernambuco e do Ter-ritório Federal de Fernando de Noronha.

Uma noite de sábado, em que eu haviapassado todo o dia viajando em inspeçãoà Escola de Pesca em Tamandaré, no Esta-do, cansado como estava, fui me deitar maiscedo, pegando no sono rapidamente. Acor-dei de madrugada com barulho na janelade meu quarto. Como eu estava precisan-do dormir, minha esposa havia desligado aextensão do quarto e, dessa forma, eu nãoouvi os diversos telefonemas que me havi-am dado, o que forçou a que um dos MNsque fazia a segurança externa de minhacasa recorresse ao recurso de atirar pedri-nhas no vidro, e, assim, acordei.

Tratava-se do seguinte: enquanto eudormia o sono dos justos, o Navio Tanquede Gás Jatobá, atracado ao cais de com-bustíveis do porto tinha sofrido uma ex-plosão em um dos tanques. O incêndio ti-nha aumentado de intensidade e estavafora de controle, ameaçando se propagarpara o cais, o que se constituiria em umacatástrofe de proporções inimagináveis,pois todo o complexo petrolífero portuáriopoderia explodir, o que representaria umaameaça para todo o Centro do Recife, quepoderia sofrer sérios danos.

Parti depressa para o cais, lá encontran-do uma boa parte do efetivo da Capitania,vários guardas portuários, diversos funci-onários das companhias de petróleo, mui-tos bombeiros e várias autoridades fede-rais, municipais e estaduais, inclusive opróprio Governador do Estado, RobertoMagalhães, que, ao me ver, anunciou-meser sua intenção procurar os meios de co-municação e concitar o povo a evacuar acidade. Pedi a ele um tempo e, através demeus Oficiais, soube que já existia um gru-po de voluntários composto por SGs, CBs

EXPLOSÃO NO PORTO DO RECIFE

e MNs da Capitania, além de um Prático doporto que, com o auxílio de um rebocadorde porto, tentariam resolver o problema.Assim foi feito: vários MNs subiram pelaespia de vante do NT e receberam o cabode reboque do rebocador, o encapelaramnum cabeço da proa e desceram novamen-te pela espia de vante. Ato contínuo, foramcortadas a machado todas as espias doNavio Tanque e o rebocador com o práticoa bordo começou a rebocá-lo em direção àsaída da barra. Após um período que pare-ceu uma eternidade, o rebocador com o NTa reboque já havia passado os arrecifes ese encaminhava para o alto mar. O Gover-nador respirou aliviado. Graças à iniciativade vários, principalmente do pessoal daMB, o porto do Recife e até a própria cida-de estavam salvos do perigo iminente. ONT foi largado à deriva a muitas milhas dacosta e o incêndio se apagou muitas horasdepois por si mesmo, vindo o navio a en-calhar em uma praia distante dois dias de-pois, permitindo fosse efetuada perícia parainstruir o Inquérito competente aberto nodia seguinte ao sinistro.

Considero que aquelas praças que, vo-luntariamente atuaram no sentido de fazerdesatracar o NT, arriscaram suas vidas,podendo ser chamados de heróis. Assimtambém o entendeu o então Comandantedo 3o Distrito Naval, o saudoso Vice-Almi-rante Wandyr das Neves Siqueira, que, aten-dendo ao solicitado no meu Ofício relatan-do o ocorrido, os elogiou nominalmentepela bravura demonstrada.

O fato foi disseminado por todo o país,através da imprensa, e se constituiu paratodos nós que o vivemos bem de perto emuma madrugada/manhã de domingo que,certamente, nunca esqueceremos!

Egberto Baptista SperlingCapitão de Mar e Guerra (Refo)

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O LADO PITORESCO DA VIDA NAVAL

Ano: 1969. Eu era Capitão-de-Corveta eminha função era Chefe do Departamentode Navegação do NaeL Minas Gerais. Es-távamos em uma grande Força-Tarefa, du-rante a Operação Unitas X. Em nossa co-bertura circular Contratorpedeiros brasilei-ros, norte-americanos e venezuelanos. Abordo do NAeL, diversos oficiais, que de-vem se lembrar desta breve história, princi-palmente os Aviadores Navais.

Fim de tarde. Um dia maravilhoso deoutono chegava ao fim. No convés de vôoalguns helicópteros faziam regulagens ehavia autorização para que os rotores fos-sem engrazados, mesmo sem estarem guar-necidos os “Postos de Vôo”. Cerca das18:00, já com todos os exercícios da tardeencerrados, eu estava no Passadiço, aguar-dando o pôr do Sol e me preparando paraobservar o azimute do Sol, nesse momen-to. O Comandante do navio, Capitão-de-Mar-e-Guerra Telmo Becker Reifschneider,resolveu se retirar do Passadiço para des-cansar um pouco em seu Camarote de Via-gem e, sabedor de que eu ficaria por lá, mepediu para ficar de olho nas experiênciascom os helicópteros no convés, só por

UM HELICÓPTERO FUJÃO...

desencargo de consciência, já que não ha-via, em hipótese alguma, autorização p aradecolagens. Ato contínuo, retirou-se.

Parecia que ele estava adivinhando. Al-guns minutos após, um dos helicópteros,um SH-3D, decolou do navio e rumou paraum sobrevôo da cobertura. Mandei o Ofi-cial de Quarto tocar “Postos de Vôo” eavisei ao Comandante pelo 1MC. Este vol-tou correndo para o Passadiço e avisou aoChefe do Departamento de Aviação, que játinha chegado à Torre, para que determi-nasse o regresso imediato do helicóptero“fujão” ao navio. O helicóptero voltou,pousou e seu piloto, um Capitão-Tenenteque tinha feito a “travessura”, teve de seexplicar ao Comandante. Alegou ter feitoum pequeno “hover” para checar um repa-ro terminado e que uma rajada de ventomais forte o havia forçado a decolar... Umsusto para ele e para todo o NAeL!...

Não soube de maiores detalhes quantoàs conseqüências de suas justificativas aoComandante, porém, no porto seguinte, elenão baixou terra!...

Egberto Baptista SperlingCapitão de Mar e Guerra (Refo)

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DOAÇÕES À DPHDMFEVEREIRO A MAIO DE 2011DEPARTAMENTO DE BIBLIOTECA DA MARINHA

DOADORESAmerican Bureau of Shiping (ABS)Academia Nacional de Estudios Políticos y Estratégicos de ChileArmées d’Aujourd’HuiAssociação Brasileira de Energia NuclearCasa da PalavraCentro de Integração Empresa-Escola (CIEE)Corpo de Fuzileiros NavaisEscola de Guerra NavalEdnéa do Marco PascoalFundação Arquivo e Memória de Santos

Grêmio de História e Geografia de Angra dos ReisInstituto Militar de EngenhariaInternational Container Terminal Services, Inc.Itaú CulturalProfessor José Cardoso de AndradeLuiz Alberto da Costa FernandesMuseu Histórico NacionalOrganização Marítima Internacional (IMO)Superior Tribunal Militar

PERIÓDICOS RECEBIDOS

CHILEGuerra: su conducción política y estratégia, La (livro) – 2010

ESTADOS UNIDOSActivies – dez./2010Surveyor – winter 2010/2011

FILIPINASInternational PORT folio – nov./2010

INGLATERRAMODU Code – 2010 edição (livro)Ships operating in polar Waters – 2010 (livro)

PORTUGALAnais do Clube Militar Naval – v. 140, no 4/6, abr./2010Revista de Marinha

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DOAÇÕES E PERIÓDICOS RECEBIDOS

BRASILO Anfíbio – v. 29, no 28, no 29, 2010Angra dos Reis 500 anos de História (livro) – 2010Arquivos Brasileiros de Medicina Naval – v. 71, no 1, jan./dez. 2010O Barão de Japurá e a Ilha de Paquetá (livro) – 2011Brasil Nuclear – v. 15, no 37, 2010Dragão do Mar (livro) – 2002Pesquisa Fapesp – no 180, 182, 183Pesquisa Naval – v. 1, no 3, 2010; v. 2, no 4, 2011Revista da Escola de Guerra Naval – no 14, dez./2009; no 15, jun./ 2010; no 16, dez./2010Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro – v. 171, no 447, abr./jun. 2010;

no 448, jul./set. 2010; no 449, out./dez. 2010Revista Militar de Ciência e Tecnologia – v. 26, out./dez. 2009SindaRio – v. 3, no 53, dez./2010Temas luso-brasileiros no Arquivo Nacional (livro) – 201050 Anos da Comunicação Social da Marinha – 2011 (livro)AAMHN – Associação dos Amigos do Museu Histórico Nacional – v. 6, no 32, abr. 2010Acervo: Revista do Arquivo Nacional – v. 23, no 1, jan./jun. 2010Antigas Famílias Amigas do Brigadeiro de Paquetá – 2010 (livro)Aventuras cariocas – 2010 (livro)Brasil: uma cartografia (livro)Casnav – Revista comemorativa dos 35 anos do Casnav (livro)Construção Naval Militar Brasileira no Século XX, A – 2011 (livro)Expedições rumos educação, cultura e arte 2008 – 2010 (livro)Informativo Cultural – v. 12, no 26, 2011Instituto de História MarítimaJoão Havelange: o dirigente esportivo do século XX – 2010 (livro)Jurisprudência do Superior Tribunal Militar – v. 17, no 1-2, jan./dez. 2008A Macega – v. 9, no 44, set./dez. 2010Marine Systems & Ocean Technology – v. 5, no 2, dez. 2010 (Jornal da Sobena)Memória da arquitetura de Santos no papel – IIMinistros nascidos no Estado do Ceará (folheto)Naufrágios no Cabo Horn – 2010 (livro)Nos limites da Amazônia Azul – 2010 (livro)Notanf – jan./fev./mar. 2011Porto Maravilha Rio de Janeiro – 2010 (livro)Revista Aeronáutica – no 274, jan./fev./mar. 2011Revista da Intendência – 2010Revista do Clube Naval – v. 118, no 356, out./nov./dez. 2010Revista Naval de Odontologia – v. 37, no 1, set. 2010A Saga de Bartolomeu Antunes – 2000 (livro)Trilogia de Defesa – no 1, abr./mai./jun. 2011

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ACONTECEU HÁ 100 ANOS

Esta seção tem o propósito de trazer aos leitores lembranças enotícias do que sucedia em nossa Marinha, no País e noutras partesdo mundo há um século. Serão sempre fatos devidamente reporta-dos pela Revista Marítima Brasileira.

Com vistas à preservação da originalidade dos artigos, observa-remos a grafia então utilizada.

O Brazil que, com louvavel estimulo, jaassumio logar proeminente entre os paizesmais progressistas quanto á adopção dotelegrapho sem fio, jaz, que contraste!, nomais lastimavel retrocesso no que concerneao socorro maritimo!

Nada, absolutamente nada, ha creadorelativamente a este assumpto capital, quetodas as nações civilisadas consideram comoponto de honra e de dever humanitario es-tabelecer efficazmente em varios portos dorespectivo litoral maritimo, e nos portosainda os mais insignificantes.

SOCCORRO MARITIMOSOCCORRO MARITIMOSOCCORRO MARITIMOSOCCORRO MARITIMOSOCCORRO MARITIMO(RMB, abr./1911, p. 1.751-1.760)

Augusto Vinhaes

No Brazil, na propria bahia deGuanabara, morre-se afogado a poucosmetros da praia, sem que ninguem acuda,nada existindo que, mesmo longinquamen-te, arremede qualquer apparelho dos maiscommummente usados em paizes onde sejulga de comesinho dever tudo envidar parao prompto socorro ao semelhante em perigo.

Nesse sentido o nosso indifferentismoé dos mais chocantes e inhumanos:accidentes repetidos, occorridos em diver-sos portos, naufragios proximos á costa emque quasi sempre ha victimas, verdadeiras

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

catastrophes como a do Aquidaban; nada,nada nos ha demovido do nosso cruel e ultracensuravel indifferentismo!

Difficil será explicar o esdruxulo proce-der de um paiz que estende por todo o seuvasto litoral e extensissimo hinterlandinterminaveis linhas telegraphicas e que, nãocontente com isso, estabelece, na costa, parauso dos navegantes e no interior, em zonasimproprias á collocação de postestelegraphicos, a radio-telegraphia, e conti-nua aphatico, em revoltante indifferentismo,no tocante ao soccorro maritimo, de que o ful-gurante invento de Marconi é o mais efficazauxiliar!

Quando as nações da Europa garantiramos seus navios de diversos perigos que os ame-açavam, taes como o ataque de piratas, a escu-

ridão das costas e os frequentesabalroamentos, devidos em grande parte áfalta de convenções internacionaes decollocação e cores de luzes a bordo dos navios,a attenção dos homens de governo e dos par-ticulares voltou-se para outra questão tambemimportantissima – a segurança do navegante,quer em alto mar, quer na proximidade dascostas e interior dos portos e bahias.

Essa segurança cresceu á proporção quese foram accentuando os progressos, issono tocante á navegação por altura e á gran-de e pequena cabotagem.

Esse progresso augmentou ainda maisquando ao navio foram dados os meios dese communicar facilmente com os seuscongeneres e com a terra.

(...)

MARINHA DE GUERRA NO BRAZIL XXVIIIMARINHA DE GUERRA NO BRAZIL XXVIIIMARINHA DE GUERRA NO BRAZIL XXVIIIMARINHA DE GUERRA NO BRAZIL XXVIIIMARINHA DE GUERRA NO BRAZIL XXVIII(RMB, abr./1911, p. 1.785-1.791)

Primeiro-Tenente Lucas A. Boiteux

A GUERRA CONTINUA – PREPARATIVOS ARGENTINOS – APRESAMENTODOS CORSARIOS “HIJO DE JULIO” E “ESTRELLA DEL SUD” – PERDA DO

BRIGUE “CACIQUE” – BRAVURA HEROICA DE UM MARUJO –APRESAMENTO DO CORSARIO “PATAGONES”

(...)24 DE MAIO24 DE MAIO24 DE MAIO24 DE MAIO24 DE MAIO

(RMB, mai./1911, p. 1.841-1.842)

Consagramos hoje esta nossa primeira pa-gina á commemoração da sempre gloriosa jor-nada de 24 de maio de 1866, na qual o deno-dado exercito brazileiro, efficazmente auxi-liado pelos seus dois fieis e bravos alliados esuperiormente dirigido pelo genio militar eindomita bravura do immortal Osorio, inscre-veu em letras de ouro a epopéa de Tuyuty nafecunda historia de nossos feitos militares.

Não se precisa ser soldado nem mari-nheiro para sentir-se vibrar ainda hoje ocoração á reminiscencia de tão estrondosotriumpho para as nossas armas. Basta ape-nas ser brazileiro, o que quer dizer patrio-ta. Essa data traz-nos, de facto, á mente,enchendo-nos de comprehensivel orgulhonacional, um dos feitos mais brilhantes dosnossos valorosos soldados, sem duvida mes-

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mo a sua acção mais culminante em toda aterrivel campanha que tivemos de susten-tar contra o valente povo paraguayo, sujei-to nessa quadra dolorosa de sua vidapolitica a uma das mais ferrenhasdictaduras de que ha memoria.

Nessa demorada e memoravel guerra, onosso exercito e a nossa marinha, quaes doisirmãos inseparaveis, filhos amorosos da mes-ma mãe extremecida, agindo sempre de mãosdadas, esforçadamente se coadjuvaram emtodas as circumstancias em que o permittiamas condições do terreno, convivendo duran-te toda ella fortemente unidos pelas inspi-rações do mesmo patriotismo, alimentadopela recordação e imagem da patria distan-te, mas continuamente presente a seus olhos,e de dia para dia cimentado pelo afancommum em bem servil-a, através das maio-res vicissitudes e provações de tão cruenta eprolongada campanha.

Relembrando nestes leves traços essa bellacamaradagem e tão auspiciosas communidadesde sentimentos, dahi em diante sempre viva-zes entre as duas classes irmãs, das quaes só sepode ufanar a nação brazileira, pelas innumerasprovas de desinteresse e verdadeira abnega-ção que ambas invariavelmente lhe têm dadodesde o inicio de nossa nacionalidade e nascircumstancias as mais melindrosas e premen-tes, – é nosso duplo intuito congratular-nosmais uma vez com os nossos valentes compa-nheiros por este feito glorioso, e deixar aquiconsignado o nosso sincero almejo de que essafeliz confraternidade, que tanto nos desvane-ce, cada vez mais se enraize em nossos peitos, afim de que dia a dia mais se opulente a seiva dafrondosa arvore das liberdades civicas, sob aqual, devido em grande parte aos seusinapreciaveis serviços e ao seu inquebrantavelpatriotismo, já de ha muito se abriga confiantea nossa querida patria.

MARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XXIXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XXIXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XXIXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XXIXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL XXIX(RMB, mai./1911, p. 1.929-1.937)

Primeiro-Tenente Lucas A. Boiteux

EXPEDIÇÃO Á BAHIA DE SAN BLAS – SEU FUNESTO RESULTADO – PE-QUENOS ENCONTROS COM SUCCESSOS VARIOS – NOVO MINISTRO DA

MARINHA – PROSEGUEM COM MAIS VIGOR AS OPERAÇÕES DE GUERRA

(...)

RELATORIO DA MARINHARELATORIO DA MARINHARELATORIO DA MARINHARELATORIO DA MARINHARELATORIO DA MARINHA(RMB, jun./1911, p. 2.017-2.081)

Vice-Almirante Joaquim Marques Baptista de Leão

Si ha orgão de publicidade a que maisdirectamente interessem os relatoriosannuaes do Ministerio da Marinha, esseorgão é por sem duvida a Revista Maritima

Brazileira. Reproduzindo, portanto, emnossas paginas, como temos feito nosultimos annos, as introducções a essesrelatorios, nada mais fazemos do que cum-

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prir o dever de officio, tanto mais gratoquanto nellas de ordinario se contêm ver-dadeiros programmas de melhoramentospara a nossa marinha: assumpto que nãopode deixar de attrahir muito especialmen-te a attenção e o interesse dos nossos leito-res habituaes.

Relativamente áintroducção ao rela-torio deste anno, quedamos a seguir, nadamais diremos além doque já é de todos co-nhecido, a saber: que,pela sua excepcionalimportancia, desdelogo chamou sobre si aattenção geral não sóno paiz como igual-mente em todas asmetropoles estrangei-ras em que se liga odevido apreço a documentos dessa ordem.

Aliás a impressão que nos causou asua leitura não a poderiamos traduzir aqui,uma vez que para external-a seriamos le-vados a fazer estudo critico que nos é ve-

dado pela propria natureza desta Revista;accrescendo que, alem de exorbitarmos denossas attribuições, poderiamos, caso fosseo nosso juizo inteiramente favoravel ásidéas contidas nessa introducção, ser acoi-mados de simples lisonjeadores.

Restringimo-nos,por tudo isso, a cum-prir apenas esse nossodever, archivando emnossas paginas o im-portante documento.

Exm. Sr. Presiden-te da Republica –Tenho a honra deapresentar-vos o rela-torio das principaesoccurrencias havidasno Ministerio a meucargo durante o annofindo.

(...)(N.R.: Segue relatório detalhado que

inclui as sublevações de navios de novem-bro/dezembro de 1910, assinado pelo Vice-Almirante Joaquim Marques Baptista deLeão.)

MARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXXMARINHA DE GUERRA DO BRAZIL – XXX(RMB, jun./1911, p. 2.095-2.103)

Primeiro-Tenente Lucas A. Boiteux

DESTRUIÇÃO DO CORSARIO “JENERAL MANCILLA” – RAPIDO ENCONTRO– TOMADA DE “19 DE OUTUBRO” – NOVAS LIDES – DESTRUIÇÃO DE

NAVIOS CORSARIOS – COMBATE DO BRIGUE “BOMFIM”– APRESAMENTO DO “NIGER” E DA “UNION”

– COMBATE NA LAGOA MIRIM – OUTROS SUCCESSOS

(...)

Exm. Sr. Presidente daExm. Sr. Presidente daExm. Sr. Presidente daExm. Sr. Presidente daExm. Sr. Presidente daRepublica – Tenho a honraRepublica – Tenho a honraRepublica – Tenho a honraRepublica – Tenho a honraRepublica – Tenho a honra

de apresentar-vos o relatoriode apresentar-vos o relatoriode apresentar-vos o relatoriode apresentar-vos o relatoriode apresentar-vos o relatoriodas principaes occurrenciasdas principaes occurrenciasdas principaes occurrenciasdas principaes occurrenciasdas principaes occurrencias

havidas no Ministerio a meuhavidas no Ministerio a meuhavidas no Ministerio a meuhavidas no Ministerio a meuhavidas no Ministerio a meucargo durante o anno findo.cargo durante o anno findo.cargo durante o anno findo.cargo durante o anno findo.cargo durante o anno findo.

(N.R.: O relatório do AlmiranteJoaquim Marques Baptista de Leão

inclui também as sublevações daRevolta da Chibata (nov./dez. 1910)

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MAIO – 1911

MUITO OBRIGADO! – Não posso ex-plicar como poude passar-me despercebido uminteressante topico do Army and NavyGazette que apparece reproduzido na secçãoProfessional Notes do United States NavalInstitute Proceedings,numero de março ulti-mo, sob o titulo – TheNaval Mutinies, cujatraducção é a que segue:

“A exacta razão dolevante de marinheirosno Brazil não é facil dedescobrir. A oppiniãoofficial é que foi elle oresultado de causastriviaes que podem serfacilmente remediadas.Todavia, depois do le-vante, o pedido feitopelos rebeldes pela abo-lição do castigo corpo-ral foi satisfeito, bemcomo o augmento da lo-tação das guarnições,sendo tambem concedi-da uma amnistia. Ago-ra é a guarnição do cruzador Rio Grande doSul, associada ao batalhão naval, na ilha dasCobras, que bombardeia a capital, estandotambem sendo bombardeada a ilha, morto umofficial e alguns homens, e provavelmenteaquelle novo navio avariado. Si as rebelliõestêm caracter politico, pode ser que estejamligadas a uma tendencia separatista fomen-tada pelo Sul. A mallograda revolução de

1893, chefiada pelo almirante Custodio deMello e levada ao mais extremo fim pelo al-mirante Saldanha da Gama, tinha porproposito conhecido a queda do governo domarechal Peixoto, e provavelmente a idéa dainstituição de um estado separado no Sul.Estavam envolvidos proeminentes officiaes,

no que parece terdifferido a revoluçãodas recentes rebelliões,porém o tempo mostra-rá si taes questões nãoestão enraizadas nomovimento.

Destes episodiospodem os brazileirostirar uma proveitosalição. E é que uma es-quadra não consisteem um par de couraça-dos apparelhados depopa a proa, da quilhaao tope do mastro, comos ultimos productosda sciencia, e acompa-nhados de um certonumero de cruzadorese destroyers. Consistemais ainda, de

officiaes patriotas, de proceder correcto,zelosos e efficientes, e de marinheiros dis-ciplinados e bem exercitados.

É de temer que os brazileiros tenham to-mado sob um ponto de vista muito materialsuas necessidades navaes, e tenham esqueci-do que o homem vale mais do que a machina.Si falta a fonte real da efficiencia naval, istoé, lealdade ao governo, nada ha mais que di-

REVISTA DE REVISTASREVISTA DE REVISTASREVISTA DE REVISTASREVISTA DE REVISTASREVISTA DE REVISTAS

Destes episodios podem osDestes episodios podem osDestes episodios podem osDestes episodios podem osDestes episodios podem osbrazileiros tirar umabrazileiros tirar umabrazileiros tirar umabrazileiros tirar umabrazileiros tirar umaproveitosa lição: umaproveitosa lição: umaproveitosa lição: umaproveitosa lição: umaproveitosa lição: uma

esquadra não consiste em umesquadra não consiste em umesquadra não consiste em umesquadra não consiste em umesquadra não consiste em umpar de couraçadospar de couraçadospar de couraçadospar de couraçadospar de couraçados

apparelhados com os ultimosapparelhados com os ultimosapparelhados com os ultimosapparelhados com os ultimosapparelhados com os ultimosproductos da sciencia, eproductos da sciencia, eproductos da sciencia, eproductos da sciencia, eproductos da sciencia, e

acompanhados de um certoacompanhados de um certoacompanhados de um certoacompanhados de um certoacompanhados de um certonumero de cruzadores enumero de cruzadores enumero de cruzadores enumero de cruzadores enumero de cruzadores e

destroyers. Consiste maisdestroyers. Consiste maisdestroyers. Consiste maisdestroyers. Consiste maisdestroyers. Consiste maisainda, de officiaes patriotas,ainda, de officiaes patriotas,ainda, de officiaes patriotas,ainda, de officiaes patriotas,ainda, de officiaes patriotas,de proceder correcto, zelososde proceder correcto, zelososde proceder correcto, zelososde proceder correcto, zelososde proceder correcto, zelosos

e efficientes, e dee efficientes, e dee efficientes, e dee efficientes, e dee efficientes, e demarinheiros disciplinados emarinheiros disciplinados emarinheiros disciplinados emarinheiros disciplinados emarinheiros disciplinados e

bem exercitados.bem exercitados.bem exercitados.bem exercitados.bem exercitados.

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

zer sinão que os brazileiros pagadores de im-postos foram enganosamente levados á com-pra de dispendioso material que parece maisser um perigo para elles mesmos do que paraoutro qualquer. A disciplina dos camarotes eda praça de armas, como disse Saint Vincent,é a disciplina da esquadra, e ahi é que as auto-ridades brazileiras devem instituir reformas,si á nova esquadra quizerem emprestar algu-ma utilidade.”

Há uma pequena correcção a fazer nanoticia do Army and Navy Gazette. Feliz-mente, e em boa hora o dizemos – nunca nasrevoluções e motins armados que nosinfelicitaram, houve a menor preoccupaçãode separar Estados do Brazil. Isso teria sidomais que lamentavel;seria uma calamidade,uma desgraça nacional.Pode ser que nos tenhafaltado algum juizo nomodo por que nos con-duzimos em epocas pri-meiras da Republica; acredito mesmo que ocriterio politico daquellas epocas estivessealgum tanto offuscado pelas ambiçõespessoaes. Mas a nossa boa estrella, mesmonesses ominosos tempos, nunca permittioque revolução alguma levantasse aimpatriotica bandeira da separação. Seriauma revolução de horas, condemnada aodesprestigio, desde o seu nascimento. O nos-so patriotismo baseia-se principalmente nagrandeza, na immensidade deste invejavelpaiz, onde em qualquer recanto, por maislonginquo, se descobre o mesmo brazileirocom as mesmas qualidades, os mesmos defei-tos de todos. Separação, meu caro redactordo Army and Navy Gazette, nunca, jamais!

Quanto á segunda parte do topico, é ellacom effeito uma lição, um ensinamento, mas

hade permittir que as alviçaras não lhe per-tençam. Aqui mesmo no Brazil houve muitoquem, antes do levante dos marinheiros, dis-sesse tudo que encerra essa segunda partedo topico. Contra, porém, a onda implacaveldos acontecimentos nada ha a oppôr.

A propria Republica dos Estados Uni-dos da America do Norte foi victima deuma sangrenta luta, a guerra de seccessão.

As nações nem sempre são governadas pe-los sãos principios do direito e da razão e simpela vontade de seus dirigentes. E aos paizesnovos, sobretudo aquelles que, como o Brazil,passaram ha apenas vinte annos por uma ra-dical transformação, não será de justiçaincrepal-os de povos indisciplinados, quando

são estes acontecimen-tos producto inevitavelde sua juventude, de suapouca idade.

A velha e poderosaAlbion, em periodoidentico de formação de

nacionalidade, tambem pagou o seu tributo,mesmo em materia de sublevação de marinhei-ros, e nem por isso perdeu a linha cuja róta jávinha seguindo – de potencia naval.

Não, não temos que desanimar; apenascumpre-nos aceitar modestamente os con-selhos que encerra a noticia acima, conse-lhos esses que nem de leve podem ferir nossasusceptibildade, porque, como acima disse,delles tambem se cogitou dentro do Brazile em data anterior ás sublevações.

No Brazil tambem se distingue o tortodo direito, o errado do certo, o bem do mal.Passamos pela nossa crise aguda; é precisodeixar passar a onda.

Depois da tormenta vem sempre a bo-nança. Os dias seguem-se, mas não se pare-cem. (A. Sampaio – Capitão de Corveta)

A disciplina dos camarotes eA disciplina dos camarotes eA disciplina dos camarotes eA disciplina dos camarotes eA disciplina dos camarotes eda praça de armas é ada praça de armas é ada praça de armas é ada praça de armas é ada praça de armas é adisciplina da esquadradisciplina da esquadradisciplina da esquadradisciplina da esquadradisciplina da esquadra

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

ABRIL – 1911

MARINHA NACIONALMARINHA NACIONALMARINHA NACIONALMARINHA NACIONALMARINHA NACIONAL

ESCOLA NAVAL – Por decreto n.8.650, de 4 de abril, foi approvado um novoregulamento da Escola Naval.

Deste novo regulamento que publica-mos na integra, em outro logar desta Re-vista, constam varias disposições de gran-de utilidade para o ensino naval, desta-cando-se entre todas a que se refere ácreação de um curso superior de marinha.

Não nos competindo fazer uma aprecia-ção mais ampla sobre o notavel trabalho oradado á publicidade, limitamo-nos a trans-crever o que a respeito publicou o Jornal doCommercio, em sua edição de 6 daquelle mez:

“Do regulamento da Escola Naval, ul-timamente approvado, constam varias dis-posições dignas do mais franco elogio. Den-tre todas, porém, destacaremos uma quemerece especial menção, não só pelasubstancia da medida, como pela fórma porque se a pretende executar – a creação docurso superior de marinha.

Ha muito tempo que se fazia sentir anecessidade de um curso para officiaes,onde fossem ensinadas materias que nãocabiam razoavelmente em um curso de as-pirantes e outras cuja creação era deindiscutivel necessidade.

Foi ao que se attendeu creando o cursosuperior de marinha, comprehendendo oestudo do direito internacional, da tacticae estrategia, dos serviços de estado-maiore de preparação para a guerra, daorganisação e administração naval, que, nãosendo de necessidade immediata para o

aspirante, não lhe despertaria o interesseque exige a sua importancia.

Sobre o modo por que se pretende exe-cutar o ensino do curso creado, folgamosem constatar o reconhecimento de uma ne-cessidade imprescindivel: – no contrato deprofissionais estrangeiros.

Essa disposição não só consta do texto doregulamento, como sabemos que o sr. minis-tro da Marinha já tem adiantadas as negoci-ações para o contrato de dois professores,um de tactica e estrategia naval, serviços deestado-maior e de preparação para a guerra,e outro de defesa de costas, comprehendendoo estudo de fortificações e de applicação dostorpedos, minas, submarinos e submersiveis.

Não menos para congratulações é o sigi-lo até agora mantido em tal negociação,cousa que, seja dito de passagem, escapaum pouco ás nossas normas.

A creação do curso superior de marinha,como a da Escola de Grumetes, a que já tive-mos occasião de nos referir, são provas sufici-entes de que já se cogita seriamente do ensi-no naval. Sobre a creação dessa ultima escolapodemos adiantar que não só já se acham ela-borados os projectos dos edificios e assentadaa escolha do local, como que já vão adiantadosos estudos sobre a regulamentação e mais me-didas indispensaveis á installação de tãonecessario estabelecimento.”

JAPÃOJAPÃOJAPÃOJAPÃOJAPÃO

INCIDENTE DESAGRADAVEL – OMoniteur de La Flotte noticiou um caso sin-gular que teria se passado em San Pedro(California) quando o almirante Iashiro es-teve ahi com os navios-escola Kasagi e Asama.

NOTICIARIO MARITIMONOTICIARIO MARITIMONOTICIARIO MARITIMONOTICIARIO MARITIMONOTICIARIO MARITIMO

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ACONTECEU HÁ CEM ANOS

A municipalidade local resolveu dar um bai-le em honra aos officiaes japonezes e os con-vites foram distribuidos pelas principaesfamilias; tendo porém percebido uma deci-dida opposição a esta festa por parte dasmoças convidadas, a municipalidade foi for-çada a desistir de seu gentil intento e des-fez de um momento para outro, com as devi-das reservas, os preparativos do baile.

O almirante, na ignorancia destaoccurencia, que naturalmente foi poucodivulgada, tinha organisado para um do-mingo proximo uma matinée dansante abordo do Asama. Só compareceram a estafesta convidados do sexo masculino, ven-do-se os rapazes na triste contingencia dedansarem uns com os outros.

Si non é vero...

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REVISTA DE REVISTAS

Esta seção tem por propósito levar ao conhecimento dosleitores matérias que tratam de assuntos de interesse maríti-mo, contidas em publicações recebidas pela Revista MarítimaBrasileira e pela Biblioteca da Marinha.

As publicações, do Brasil e do exterior, são incorporadasao acervo da Biblioteca, situada na Rua Mayrink Veiga, 28 –Centro – RJ, para eventuais consultas.

SUMÁRIO(Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)

ARTES MILITARESDEFESA

A defesa no Brasil – Dificuldades no horizonte (246)ESTRATÉGIA

Aprendendo a operar no ciberespaço (247)PENSAMENTO MILITAR

Nem tudo diz respeito aos litorais (250)

ATIVIDADES MARINHEIRASACIDENTE

45 minutos de combate submarino (250)

COMUNICAÇÕESCOMUNICAÇÕES

Escuta do Canal 16 em VHF (254)

EDUCAÇÃOPREPARO DO HOMEM

O talento – Estamos aplicando na Armada? (255)

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REVISTA DE REVISTAS

FORÇAS ARMADASAVIAÇÃO

Aviação de patrulha da FAB – O P-95 na vigilância e no controle do Mar Territorial brasileiro (256)FORÇA DE PAZ

Marinha brasileira envia navio ao Líbano (257)MARINHA DO BRASIL

Marinha – Para fazer frente a novas e maiores responsabilidades (257)MARINHA DOS EUA

Estamos às vésperas de um erro marítimo (258)NAVIO DE ESCOLTA

Fragatas e contratorpedeiros especializados – Vale a despesa? (258)OPERAÇÃO

Corrigindo o registro (259)

GUERRASGUERRA FLUVIAL

Guerra Fluvial – Operações, organização e meios (260)

MEIO AMBIENTEPOLUIÇÃO

Segurança marítima e derramamentos incontroláveis no mar (262)

RELAÇÕES INTERNACIONAISTRATADO

Alemanha e Brasil: Tratado de Cooperação em Matéria de Defesa (266)

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REVISTA DE REVISTAS

“O mundo ainda é um lugar perigoso paraas nações emergentes e caminha para umanova geopolítica internacional, e nós preci-samos estar nela inseridos, sem esquecer-nos de que parcerias estratégicas com de-terminados países também são importantes.”Esse talvez seja o pensamento do articulistaque melhor resume este seu texto, no qualbusca alertar para os riscos que os projetosna área de Defesa do Brasil correm por faltade continuidade de investimentos.

O autor demonstra preocupação com asconsequências do corte da ordem de al-guns bilhões de reais feito no orçamentode 2011, no qual uma das áreas mais afeta-das foi a do Ministério da Defesa, que per-deu a capacidade de dar continuidade delongo prazo na modernização das ForçasArmadas.

Para ele, a inexistência de orçamentoimpositivo para a área de Defesa implicaindefinição em relação ao futuro de proje-tos que demandam longos períodos e con-tinuidade permanente de recursos. Outroponto destacado por Stephani é ainexistência de garantias de compras míni-mas dos produtos de defesa, o que pode-ria servir de estímulo a empresários queacreditam ser possível manter-se no Paísum parque industrial de defesa de grandeporte, como o que existiu de 1970 até o fi-nal da década de 1980.

O autor finaliza o artigo listando algunsdos principais projetos na área de Defesado Brasil:

– Na Marinha• construção de quatro submarinos con-

vencionais da classe Scorpène;• construção de estaleiro onde serão

construídos os submarinos;

A DEFESA NO BRASIL – DIFICULDADES NO HORIZONTEExpedito Carlos Stephani Bastos

(Tecnologia Militar, Ano 33, no 1/2011, pág. 71-72)

• tecnologia para construção de um cas-co de submarino nuclear;

• construção de reator nuclear parasubmarino;

• licença da França para produção localde mísseis Exocet;

• aquisição de novas fragatas;• modernização dos aviões A-4

Skyhawk;• aquisição e modernização de oito avi-

ões Grumman C-1 Tracker;• reforma no Navio-Aeródromo São

Paulo; e• modernização dos blindados M-113

do Corpo de Fuzileiros Navais.

– No Exército• nova família média de blindados sobre

rodas Guarani e aquisição futura de 50 uni-dades, com previsão de aquisição de maisde 2 mil veículos em 20 anos;

• implantação da família Leopard 1 A5;• continuação do programa de mísseis

Alac e MSS 1 e do radar Saber 60 e 200;• modernização de 33 helicópteros AS-

350 Esquilo;• modernização dos veículos transpor-

te de tropas M-113;• continuação da modernização dos blin-

dados sobre rodas EE-9 Cascavel e EE-11Urutu;

• desenvolvimento de veículos aéreosnão tripulados (Vant); e

• modernização dos caminhões milita-res REO, EE-25, Unimog e Mercedes-Benz.

– Na Aeronáutica• modernização dos aviões P-3 Orion

MPA e EMB P-95;• desenvolvimento do míssil antirradar

MAR-1;

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REVISTA DE REVISTAS

• modernização de 12 aviões F-5 E/F;• desenvolvimento de Vants;• finalização do projeto de desenvolvi-

mento do míssil A-Darter;

• substituição da frota de aviões BoeingKC-137; e

• desenvolvimento do cargueiroEmbraer KC-390.

O direito de autodefesa no ciberespaçoainda não foi estabelecido plenamente,mas, segundo este artigo muito atual, asoperações no “quintodomínio” se avizinham.O autor esclarece queo termo ciberespaço,criado por WilliamGibson na obra de fic-ção Neuromancer, de1982, designa uma rede,“um tanto mística emutante”, de computa-dores, roteadores, cha-ves e pessoas.

Segundo o autor,para o Departamento deDefesa dos EstadosUnidos da América(DoD-EUA) o ciberes-paço é um domínio glo-bal dentro do ambien-te da informação for-mado pelas redes de in-fraestruturas de tecno-logia da informação(TI), inclusive a inter-net, pelas redes de te-lecomunicações, pelossistemas de computa-dores e pelos proces-sadores e controlado-res nelas embutidos. Ainda para o DoD, ecom o propósito as categorizar doutrinaria-mente, operações no ciberespaço são aque-

APRENDENDO A OPERAR NO CIBERESPAÇOContra-Almirante (EUA) William E. Leigher*

(Proceedings (EUA), fevereiro 2011, pág. 32-37)

las cujo propósito primário é a obtenção deobjetivos militares dentro ou por meio dociberespaço.

As definições se-guirão evoluindo, mas,segundo o AlmiranteLeigher, o verdadeirodesafio é o de descre-ver o modelo de opera-ção no ciberespaço demodo análogo ao quese faz para os domíni-os marítimo ou aéreo.“O ciberespaço é umdomínio, e a Marinhaprecisa reconhecer istocomo fato”, afirma. É aconscientização da im-portância dessa ques-tão um dos propósitosprincipais deste seu ar-tigo. Para isso, analisalongamente e em deta-lhes o modo como aMarinha dos EUAopera e provoca o lei-tor identificando a ne-cessidade de que sedesenvolvam princípi-os de guerra para estenovo domínio, já queafirma e apresenta

exemplos de que os métodos atuais de ope-ração no ciberespaço não estão servindoadequadamente à Marinha.

* Vice-comandante do U.S. Cyber Command, 10a Esquadra dos Estados Unidos da América.

O verdadeiro desafio é o dedescrever o modelo de

operação no ciberespaçode modo análogo ao que se

faz para os domíniosmarítimo ou aéreo

Novo brasão do U.S. Cyber Command,divulgado na cerimônia de sua ativação, em

maio de 2010

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REVISTA DE REVISTAS

Para Leigher, operar com sucesso nociberespaço envolverá a adoção de mode-lo diferente das práticas atuais. Apresentacomo exemplo a filosofia que vem sendodesenvolvida e implementada pela 10a Es-quadra dos EUA em apoio às operações edefesa em rede e em tempo real que, se-gundo ele, se baseia em três princípios:

– Garanta que o comando e controle (C2)esteja em funcionamento, de modo a queas forças possam ser usadas.

– Mantenha liberdade de manobra nociberespaço para que a Marinha possa lu-tar do modo desejado.

– Proveja meios não cinéticos de modoa obter o efeito desejado – ofensivo e de-fensivo – em apoio aos comandantes con-juntos ou navais.

“Essas três linhas de operação são tan-to paralelas quanto sequenciais”, explica oalmirante. A continuidade entre redes dedefesa e de operação se inicia a partir dorequisito de prover C2 contínuo e se esten-de para assegurar que a Marinha possa usaro ciberespaço a seu favor. Para o autor, “achave para o sucesso operativo será de-senvolver uma força de trabalho com a ca-pacidade de ‘habitar’ na rede”. Segundoele, a proficiência dos operadores das re-des em guerrear no ciberespaço tem queser desenvolvida. Também compara a di-

nâmica e as características desse domíniocom aquelas dos ambientes marítimo e ter-restre ao sofrerem os efeitos do clima e doterreno. “Esse senso do domínio se relaci-ona diretamente com a tática e a logísticaem apoio a campanhas”, assevera Leigher.

Passa então o almirante a analisar pos-síveis estratégias e ações, tanto defensi-vas como ofensivas, e aborda alguns as-pectos doutrinários. Assim, segundo suaanálise, doutrinariamente, as reações paradefesa de redes de computadores (CND-RA, do nome em inglês) representam a ha-bilidade de remotamente hackear de voltaum atacante ou intruso que penetrou numarede ou sistema de computadores. Mas,apesar de considerar importante se desen-volver essa capacidade, o autor asseguraque isso é secundário para a proteção darede enquanto ambiente operacio-nal e tam-bém para a negação do uso desse espaçopelo oponente.

“Para uma defesa ativa, os operadoresde rede devem ser capazes de ver e enten-der como nosso próprio sistema funcionae como a informação flui através dele, as-sim como devem visualizar o impacto deforças externas tentando nele penetrarusando ambientes cibernéticos amigá-veis”, afirma o almirante. E acrescenta: “Oconhecimento do ciberespaço em tempo

real e operadores expe-rientes com habilida-des on-net serão asbases para as opera-ções de defesa dinâmi-ca de redes e os princi-pais elementos paraproteção do ciberespa-ço como ambienteoperacional.”

No que diz respeitoaos aspectos ofensi-vos, argumenta a favorde se buscar limitar a

Ciberespaço, ambiente complexo de redes independentes de TI edomínio onde objetivos militares são buscados

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capacidade do adversário usar ociberespaço como primeira linha tática ofen-siva, embora reconheça a importância dese desenvolver a capacidade de realizar ata-ques contra alvos específicos. SegundoLeigher, no futuro, ações no ciberespaçopoderão vir a deslocar o centro de gravida-de do inimigo, como, por exemplo, degra-dando alguma capacidade específica dooponente como a sua logística de comba-te, o seu sistema financeiro ou o de servi-ços públicos.

Em análise feita no subtópico Comandoe Controle e Ciberespaço, o almirante in-vestiga a validade, para o domínio dociberespaço, de conceitos doutrinários oraexistentes. Cita, por exemplo, o termo C5I(comando, controle, comunicações, com-putadores, sistemas de combate [combatsystems] e inteligência), cunhado no pas-sado e que indicava um conjunto de pro-cessos de nível tático ou operativo, auxíli-os à decisão e ferramentas de visualização.Segundo ele, esse termo não contribui parao entendimento das operações nociberespaço, especialmente porque C2 éuma função que “está presente em todosos domínios da guerra”. Para Leigher, “ociberespaço tem suas próprias caracterís-ticas operacionais e táticas, técnicas e pro-cedimentos, bem como uma relação espe-cífica com os princípios de C2”.

Considerando-se que o comando é res-ponsabilidade inerente do comandante, aquestão se torna o controle das operaçõesno ciberespaço. Ou seja, explica o almiran-te, a capacidade do comandante de con-trolar no ciberespaço passa a guiar não sóo que acontece nesse espaço, mas tambémdeterminar que as ações devem ser sincro-nizadas com as operações nos outros do-mínios. Ele apresenta, então, os seis obje-tivos do comandante para o exercício docontrole (extraídos de artigo do AlmiranteRobert Willard):

– Mantenha alinhamento com a missãooperacional.

– Proveja conhecimento situacional doquadro operacional.

– Avance de acordo com o cronogramae se ajuste a desvios como apropriado.

– Obedeça aos procedimentos de modoa obter padronização e eficácia.

– Engaje com o inimigo e reaja aosurgimento de informações de inteligên-cia, vigilância ou reconhecimento.

– Redistribua meios e recursos, inclusi-ve o tempo.

Para Leigher, cada um desses seis obje-tivos se aplica às operações no ciberes-paço, e isso se torna claro por meio de com-paração com a guerra antissubmarino:“Como no ciberespaço, os submarinistassão desafiados a operar no mesmo ambien-te em que o submarino oponente. Entre-tanto, enquanto a guerra antissubmarinose desenvolve relativamente lenta, as ope-rações ‘ciber’ podem mudar de forma signi-ficativa em milisegundos.” Na medida emque as táticas, as técnicas e os procedi-mentos para se operar no ciberespaço fo-rem evoluindo, será crítico entender os as-pectos ímpares e os similares das funçõesde controle, acrescenta.

Em conclusão à sua detalhada análise,o Almirante Leigher, baseado em experi-ências recentes na 10a Esquadra, indicaque ficou demonstrado que se podemadaptar princípios operacionais de outrasáreas da guerra para o ciberespaço, ape-sar da distinção imposta pela velocidadede sua dinâmica. E afirma, finalizando: “Namedida em que nosso entendimento enossa visualização da guerra nociberespaço evoluem, a sua relação e seusincronismo com os outros domínios gui-arão para novas capacidades defensivase ofensivas, aumentando a eficácia tantodas armas cibernéticas quanto dascinéticas. O tempo é essencial”.

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“O termo litoral parece dominar o voca-bulário naval atual. Alguns acreditam quedevemos enfocar a supremacia em águasazuis, enquanto outros dizem que, quandochegar a hora de lutar nos litorais, nossaesquadra de águas azuis estará sob granderisco devido ao armamento antiacesso.”Com essa questão em mente, o Comandan-te Moses busca identificar neste artigo aforma pela qual a Marinha de seu país che-gou a esta encruzilhada e indicar a solução.

Segundo o autor, a partir do final daGuerra Fria, durante a qual pairava a expec-tativa de um confronto cataclísmico comos soviéticos em algum lugar do OceanoAtlântico, surgiu uma nova realidade, se-gundo a qual se passaria a operar a partirdo mar em apoio às operações em terra. Apalavra “litoral” se tornou ferramenta deanálise de orçamentos e palavra-chave demarketing. “Pena que os programas nãopudessem ser reinventados para a inser-ção da palavra em seus requisitos”, ironizaMoses.

NEM TUDO DIZ RESPEITO AOS LITORAISCapitão de Fragata (Reserva – EUA) James C. Moses*

(Proceedings (EUA), fevereiro 2011, pág. 10)

Usando argumentos históricos, entreoutros, o autor busca indicar sua posiçãona questão. Assim, cita que, em 1941, aMarinha de seu país era de “águas azuis,ponto”. Entretanto, prossegue, conduzia-se guerra antissubmarino costeira, lutava-se nas ilhas do Pacífico e, no Mediterrâneoe na Noruega, contratorpedeiros roçavamo fundo para prover apoio de fogo. E ques-tiona: “Será que corvetas com pequenocalado operando 100 jardas mais próximasàs praias seriam mais eficazes com seuscanhões de 3 polegadas?”

Ao concluir sua argumentação, finaliza oartigo afirmando que a história demonstra que“águas azuis” e “litoral” não são termosexcludentes; deixar-se uma palavra direcionartoda uma estratégia de investimentos ignoraessa lição. E garante: “É hora de pararmos deficar obcecados sobre o que pode acontecerem algum litoral no futuro e dirigirmos oenfoque para uma estrutura de força e capa-cidades que melhor sirvam à nação em quais-quer e em todos os ambientes operativos”.

* Graduado em 1969 pela U.S. Naval Academy, serviu em várias comissões na área ASW (GuerraAntissubmarino – AS) inclusive como oficial de Guerra AS de contratorpedeiro.

45 MINUTOS DE COMBATE SUBMARINOO Submarino General Carrera da Marinha do Chile enfrenta um tsunami

Capitão de Fragata (Marinha do Chile) Hernán Parga(El Snorkel.com – site da Comunidad Submarinista Latinoamericana

– publicado em 29 de março de 2010)

“A onda arrastou-o e o fez girar durantequase uma hora, junto com outros navios,como em um liquidificador.” A frase é doCapitão de Fragata Hernán Parga, 42 anos,comandante do moderno submarino chile-no General Carrera (SS-22), da classe

Scorpène, ao descrever como ele e sua tri-pulação enfrentaram um tsunami.

Pouco depois das 3h30 da manhã de sá-bado 27 de fevereiro de 2010, o ComandanteParga acordou abruptamente, como muitosoutros chilenos, devido a um forte terremo-

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to. Mal pôde colocar-se de pé, logo avalioua grande intensidade do tremor e foi buscarseus filhos, que dormiam no quarto ao ladodo seu, em sua casa em Talcahuano. “Tiveque acordar um deles, que sequer sentiu otremor”, conta. Poucos minutos depois, to-cou seu telefone celular. Era o oficial de ser-viço de seu submarino, que estava atracadona base naval para sua revisão de rotinanos diques de Asmar.

“Sentimos como se a água nos desse chi-cotadas. O submarino parecia saltar”, contao Cabo José Riffo, que estava de serviço. Ocomandante ordenou ao oficial de serviçoque usasse o procedimento que a Armadadetermina para terremotos: preparar-se parasuspender. Ele chegaria o mais rápido pos-sível para comandar a manobra. Parga pe-gou seu carro, deixou sua família em lugarseguro e se dirigiu ao navio. Haviam se pas-sado uns 30 minutos desde o tremor.

Embora ainda não houvesse informaçãooficial sobre um possível tsunami, já esta-vam junto a ele a bordo o imediato e osoficiais engenheiro e eletricista.

O General Carrera havia iniciado a ma-nobra de suspender quando Parga notouque o nível do mar estava baixando muito. ORebocador Fueguino, que auxilia rotineira-mente os submarinos em suas manobras deporto, estava rebocando o navio em direçãoà saída do porto quando se ouviu um ruído.O submarino havia pousado no fundo. Es-tavam encalhados!

Relata Parga: “Nesse instante, escuta-mos por nossa via de comunicação paraemergências que os navios que já haviamsaído do porto avisavam que o ‘mar’ esta-va chegando”. Diante da impossibilidadede fazer outra coisa, deu a ordem para quetodos entrassem no submarino, pois nãohavia opção senão esperar o golpe das on-das. “Éramos quatro no passadiço quandoo Tenente Álvarez viu, ao longe, a onda.Nos asseguramos de que todas as provi-dências haviam sido tomadas e entramosno submarino”, completa Riffo.

OS MINUTOS DE TERROR

“Encalhado, como es-tava, no fundo barrentodo porto de Talcahuano,o submarino não pôdeevitar o impacto”, prosse-gue Parga. “Com um gran-de estrondo, o navio foilevantado e jogado pelaprimeira onda váriosmetros para dentro dadoca do porto, que nor-malmente possui boascondições para a amarra-ção de embarcações, masque, naquele momento, setransformou em um verda-deiro campo de batalha.”

“Estávamos encalha-dos e sentimos quando aonda nos levantou”, dis-

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se Riffo. “A força do marnos jogou doca adentro,onde começamos a dar vol-tas”, acrescenta o coman-dante. Começou então o in-ferno, pois não somente oCarrera ficou confinado emum espaço de 300 x 300metros e cerca de 12 metrosde profundidade. A força domar fez com que quatro di-ques flutuantes, um naviomercante e um barco pes-queiro de grande porte par-tissem suas amarras e fos-sem arrastados para o mes-mo lugar.

“Movíamo-nos para to-dos os lados e batíamos emvárias coisas. Cada vez quealgo nos abalroava, soavaum grande barulho lá den-tro. Do compartimento de

manobra, percebíamos como os demais na-vios passavam por cima de nós, sem nostocar. O mercante passou a um metro e ten-tamos nos comunicar, mas pareciam ser chi-neses, e não nos entendiam. Sua âncorapassou roçando-nos”, conta Parga. Umdesses obstáculos não pôde ser evitado.Em um dos giros, o Carrera colidiu contraum dos diques flutuantes. A situação eragravíssima. O submarino seguia flutuan-do, mas não havia como saber a magnitudedas avarias. Durante 45 intermináveis mi-nutos, e quase sem sentido de orientação,os tripulantes manobraram para manter osubmarino estável, buscando evitar outrascolisões. “Havia medo, sim. Mas mantive-mos a frieza. Ao menos comprovamos quenão havia água aberta”, conta o cabo.

Depois disso, o nível de água baixou e acorrente começou a se acalmar. Como preci-savam sair dali, o Comandante Parga man-dou alguns homens ao passadiço para ver o

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que se passava. Nesse momento, a tripula-ção do Carrera se deu conta do que haviaacontecido. “Não se viam os barcos queantes estavam no estaleiro. Tudo estavadestruído na base. E não podíamos ver acidade”, disse o comandante.

O MILAGRE DO FUEGUINO

Entretanto, ainda estavam com proble-mas. Construídos para serem ágeis sob aágua, os submarinos têm poucamanobrabilidade na superfície e, usualmen-te, em águas restritas, utilizam uma embar-cação menor como apoio à manobra. Erapouco provável que o pequeno Fueguino(de apenas 4,5 metros de comprimento) hou-vesse sobrevivido ao tsunami... “Mas logoele se apresentou, intacto. Não podíamoscompreender como seus dois tripulantes ha-viam conseguido se esquivar de todos osobstáculos. Se algo os houvesse abalroado,teriam afundado imediatamente”, relata o co-mandante, ainda impressionado. Em segui-

da, usando as linhas de emer-gência para comunicação, fo-ram reiniciadas as manobrasde reboque.

A operação era delicada.Para sair das docas, oFueguino devia manobrar emum pequeno espaço entre ascomportas e o enorme pes-queiro, que estava atravessa-do, obstruindo a saída. “Masantes havia saído o navio-ofi-cina. E pensei: Se esse bichogrande passou, eu tambémpasso”, conta Parga. Em dezminutos já estavam fora doporto. Uma vez ali, só faltavaverificar o estado do subma-rino. Funcionariam as turbi-nas? As incertezas eram gran-des. A importante aquisição da

Armada do Chile – o General Carrera –corria o risco de necessitar passar por repa-ros em dique por muitos meses. Entretanto,o Carrera só havia sofrido avarias superfi-ciais e, com suas próprias máquinas, nave-gou até a Ilha Quinquina, onde fundeou,esperando que a calma se restabelecesse.

“Venho de uma família naval, mas nemmeu pai nem meu avô viram algo como isso.Minha tripulação agiu de forma extraordi-nária. Demonstramos estar prontos para oque precisa a instituição e para o que pre-cisa o Chile. Estou muito orgulhoso”, as-severou o comandante.

No domingo, ao regressarem à base,muitos dos tripulantes se deram conta deque não tinham mais suas casas. Assim,logo que pisaram em terra, foram ver suasfamílias e ajudar colegas. Todos, excetoHernán Parga. Ele permaneceu um dia maisa bordo. Como se temesse que algo pudes-se acontecer novamente.

O comandante em chefe da Força de Sub-marinos da Marinha chilena, Comodoro

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Ronald von der Welh Fisher, assegurou sobreo incidente que “a capacidade da força de sub-marinos está intacta. O Carrera iniciará seutreinamento na zona central do país depois daSemana Santa”. Acrescentou, ainda, que se

sente orgulhoso de seus comandantes e tri-pulações. Mas também reconheceu que o Chilepoderia ter perdido toda sua força de submari-nos, acrescentando, com humor: “Deus pare-ce que é submarinista... e chileno”.

Neste artigo, o autor expõe alguns avan-ços de tecnologia na área da comunicação nomar e busca identificar os motivos pelos quaiso tradicional Canal 16 em VHF continuará a serutilizado para comunicações de emergências.

Segundo ele, a partir da introdução doGMDSS (Global Maritime Distress andSafety System – Sistema Marítimo Globalde Alarme e Segurança), estava previsto otérmino da obrigatoriedade de escuta doCanal 16, para efeito de socorro e seguran-ça, a partir de 1o de fevereiro de 1999, datada entrada em vigor do GMDSS. Previa-se,então, que essas chamadas passariam a serfeitas automaticamente por transmissão dedados usando o Canal 70, por meio do DSC(Digital Selective Calling), mecanismo pas-sível de uso tanto na comunicação navio-navio como na terra-navio/navio-terra, per-mitindo chamadas seletivas dentro de umarede. Esse sistema permite acesso a todosos navios e estações costeiras e transmis-são digital de mensagens pré-formatadas(de socorro), além de oferecer outras facili-dades avançadas.

ESCUTA DO CANAL 16 EM VHFCapitão de Fragata (Portugal) Nuno Sardinha Monteiro

(Revista de Marinha, fevereiro-março-abril 2011, No 960, pág. 40)

Todavia, segundo o autor, o atraso nainstalação de infraestruturas em terra emmuitos países costeiros e a necessidadede comunicação com embarcações peque-nas, que não possuíam esses equipamen-tos, levaram o Comitê de Segurança Maríti-ma da IMO (Organização Marítima Inter-nacional) a decidir, em 1998, manter aobrigatoriedade de escuta do Canal 16, pelomenos até 1o de fevereiro de 2005.

A partir de então, segundo o Comandan-te Sardinha Monteiro, muito foi debatidosobre a cessação da escuta do Canal 16 nosnavios Solas (Safety of Life at Sea – con-venção internacional cuja primeira versãodata de 1914), que inclui aqueles aos quaisse aplica o GMDSS (genericamente, naviosde passsageiros e os com mais de 300 tone-ladas). Concluiu-se que, em caso de cessa-ção de uso do Canal 16 por esses navios,não haveria outra forma de se estabelecercontato com os demais em caso de emer-gência. Ademais, embora a IMO estimasseadesão em massa de navios pequenos aostransceptores VHF/DSC, ela não ocorreu, econtinuaram a ser fabricados e vendidos osequipamentos VHF sem capacidade DSC àsembarcações não sujeitas ao GMDSS.

É sabido que, em situações de risco, es-pecialmente de abalroamento, é essencialse dispor de canal de comunicação por voz,assevera Sardinha Monteiro, permitindo rá-pido esclarecimento das intenções das em-barcações envolvidas, o que só se conse-gue por canal de voz. Isso evidencia a ne-

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cessidade de um canal de escuta obrigató-ria para todos os navios, assegurando co-municações rápidas e passadiço-passadi-ço em situações de emergência entre to-dos os navios no mar.

Com as considerações acima em mente,prossegue o autor, o Comitê de Segurançada IMO aprovou, em 2002, nova resoluçãodeterminando a manutenção obrigatória daescuta permanente do Canal 16 até que oComitê “possa determinar a cessação des-se requisito”. Na prática, essa decisão re-vogou aquela que determinava cessar aescuta a partir de fevereiro de 2005. Poste-riormente, em maio de 2004, reunido em sua78a sessão, o Comitê de Segurança da IMOaceitou proposta de manter escuta no Ca-nal 16 por parte dos navios Solas “numfuturo previsível, a fim de permitir:

– emissão de alertas e estabelecimentode comunicações com navios não Solas; e

– comunicações passadiço-passadiçoentre navios Solas”.

Essa posição da IMO veio a ser acomo-dada pela União Internacional das Teleco-municações na Conferência Mundial deRadiocomunicações, em Genebra, em 2007,aprovando-se naquele fórum resolução con-firmando a obrigatoriedade de escuta doCanal 16 em VHF e apontando a reavaliaçãoda questão na próxima conferência, em 2012.

O Comandante Sardinha Monteiro, emconclusão, afirma: “Não se espera que en-tão se venha a eliminar a obrigatoriedadede escuta do Canal 16, pelo que ele conti-nuará, muito provavelmente, a fazer com-panhia a todos os navegantes no passadi-ço dos seus navios ou embarcações”.

“Há duas décadas aproximadamente co-meçaram a se incorporar na maioria das or-ganizações do mundo desenvolvido trêsnovos conceitos para gerenciamento de re-cursos humanos: a motivação, a liderançae o talento.” Essa afirmativa do autor faz aintrodução de seu artigo, no qual analisa aaplicação do terceiro conceito, o talento,na Armada de seu país, a Espanha. Ele en-tende que a motivação já está em aplicaçãohá mais de 12 anos e a liderança como con-ceito há pelo menos dois.

Ao longo de seu texto, Velasco buscaresponder se o significado do conceitode talento é claro e se existe verdadeiraconsciência dele em sua Marinha e apre-senta o que experts entendem por talento:“é o conjunto de capacidades humanas,aptidões e atitudes, usualmente inatas,que por meio de uma preparação permitemàs pessoas que o possuem desenvolver

O TALENTO – ESTAMOS APLICANDO NA ARMADA?Capitão de Mar e Guerra (Reserva – Espanha) Dionisio Huelin Martinez de Velasco

(Revista General de Marina, janeiro-fevereiro 2011, Tomo 260, pág. 61-70)

com especial habilidade e destreza deter-minadas atividades”.

Ele afirma que uma das principais carac-terísticas que distinguem uma pessoa comtalento é sua atitude e não os seus conheci-mentos. Para Velasco, a aptidão (conheci-mentos e habilidades) é um requisito sinequa non para qualquer profissional, mas nãodiferencia os profissionais com talento, jáque conhecimentos podem ser substituídosrapidamente por outros. Assim, para o au-tor, o verdadeiro diferencial dos profissio-nais com talento não está na quantidade deseus conhecimentos, mas sim na sua capa-cidade de aprender e, sobretudo, dedesaprender o já conhecido. E, afirma ainda,“a principal característica do profissionalcom talento é que alcança resultados supe-riores, que sempre vêm da inovação”.

Esses profissionais com talento inovadorsão capazes de fraturar o status quo das or-

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* Jornalista especializado em assuntos de Defesa e Segurança.

Este detalhado artigo apresenta a aerona-ve P-95 “Bandeirulha”, avião de projeto naci-onal produzido pela Embraer, e suas missões.O autor baseou sua pesquisa nas atividadesdo 2o Esquadrão do 7o Grupo de Aviação,sediado na Base Aérea de Florianópolis (SC).

O autor aborda o histórico da aeronave,cuja capacidade de voo de sete horas, gra-ças aos tanques de combustível em suas

AVIAÇÃO DE PATRULHA DA FABO P-95 NA VIGILÂNCIA E NO CONTROLE DO MAR

TERRITORIAL BRASILEIROKaiser Konrad*

(Tecnologia Militar, Ano 33, no 1/2011, pág. 114-116)

asas, permite se desincumbirem com efici-ência de manter patrulhada uma área de 3,5milhões de km2 de mar jurisdicional brasi-leiro, que será estendido em mais 950 milkm2, complementando a Amazônia Azul.

Além de abordar as várias missões atri-buídas a esse tipo de avião, em especial aPatrulha Marítima e a Busca e Salvamento(SAR – Search and Rescue), é ressaltadono artigo o processo de modernização peloqual essas aeronaves estão passando, aofinal do qual serão denominadas P-95 M,devendo iniciar sua operação até 2013. Namodernização, será instalado novo radarde busca e incorporado um Glass Cockpitcom aviônica moderna, com possibilidadede instalação de outros itens adicionais.

ganizações e de provocar mudanças, facili-tando sua adaptação ao entorno incerto ecambiante. Não obstante, Velasco cita doisinconvenientes do talento inovador: ele nãosobrevive em todas as organizações, já queos profissionais que o possuem se caracteri-zam por seu inconformismo e crítica, além deserem os mais exigentes, incomodando mui-tos chefes, mesmo que sendo os que maispodem aportar ideias novas; e ele é mais es-casso em países latinos, por existir nessespaíses uma consciência maior de fracassopessoal e o medo do que se dirá a seu respei-to, circunstâncias essas que condicionam asdecisões na hora de se correr riscos.

Em seguida, o Comandante Martinez deVelasco trabalha suas ideias sobre desen-

volvimento e gestão de talentos, passan-do por sua detecção, formação e avaliação(por meio do Feedback 360º, no qual o ta-lento é observado por superiores, compa-nheiros e subordinados), e conclui que otalento, como a liderança, pode ser criado:“O talento nasce, mas também se faz”.

Velasco finaliza o artigo fazendo refle-xões sobre dois exemplos de casos em quese deve aplicar talento inovador em rela-ção à Marinha de seu país: as dificulda-des existentes na conciliação da vida fa-miliar com a profissional, especialmente apartir da entrada das mulheres; e na bus-ca de navios que possam se contraporcom maior eficiência às novas e assimé-tricas ameaças.

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De acordo com a seção Noticiário da Re-vista General de Marina, a Marinha do Brasilenviará um navio com 300 homens ao Líbanopara sua inclusão na Unifil, a força das Na-ções Unidas naquele país do Oriente Médio.

Segundo o texto, o navio em questão seráuma fragata da classe Niterói. Esses navios“apesar de terem entrado em serviço antesde 1980, foram submetidos a um extenso pro-grama de modernização em meados dos anos90, denominado Modfrag, o que ampliou suavida operativa até o ano 2020”. É, ainda, in-formado que o navio permanecerá no teatrode operações por 90 dias e será substituídopor outro de sua classe, que permanecerápor tempo semelhante.

MARINHA BRASILEIRA ENVIA NAVIO AO LÍBANO(Revista General de Marina (Espanha), março 2011, Tomo 260, pág. 337-338)

É também noticiado que o Contra-Almi-rante Luiz Henrique Caroli é o primeiro almi-rante brasileiro a assumir o “mando maríti-mo” dessa missão, cujo objetivo principal éevitar confrontação entre as Forças Arma-das israelenses e a guerrilha do Hezbolah.Para tanto, a força marítima deverá, junto coma Marinha libanesa, inspecionar navios sus-peitos de contrabando de armas e muniçãocom destino a esse grupo terrorista.

A matéria é finalizada afirmando que oBrasil assumiu o posto no lugar daIndonésia, que, por ser uma nação islâmica,não teve sua petição de dirigir a Unifil acei-ta, já que sua neutralidade foi questionadapor Israel.

Destacamos nesta edição especial deTecnologia & Defesa esta matéria panorâmi-ca e elucidativa sobre a Marinha do Brasilque apresenta dados de seu estado atual e,em tópico denominado “O futuro desejado”,descreve vários dos projetos em andamentoou imaginados para o futuro próximo.

MARINHA – PARA FAZER FRENTE A NOVAS EMAIORES RESPONSABILIDADES

Paulo Maia(Tecnologia & Defesa, Ano 28, no 24, Especial LAAD 2011, págs. 26-34)

Devem ser também ressaltadas, porsuas abrangência e qualidade, outras duasmatérias editadas na mesma revista, umasobre o Exército Brasileiro, denominada“Um novo Exército”, págs. 36 a 48, e outrasobre a Aeronáutica, com o título “ForçaAérea – Visando o futuro”, págs. 50 a 58.

Fragata Niterói, quedá nome à classe

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Como os espanhóis no século XVII, osfranceses no século XVIII e os ingleses nasegunda metade do século XX, será agoraa vez de a América fazer a escolha errada?

Essa é a questão que o autor busca res-ponder nesta análise das opções diante deseu país, os Estados Unidos da América(EUA), em face do déficit federal e da neces-sidade de se manter uma Marinha global.

Segundo ele, os EUA serão bem servidospor uma Marinha distribuída e posicionadaglobalmente com capacidade de atender rapi-damente grande gama de exigências. E cita ascinco tendências que, para ele, são indicadorasda necessidade de uma Marinha global:

– crescimento populacional,– aumento da demanda por recursos

naturais,

ESTAMOS ÀS VÉSPERAS DE UM ERRO MARÍTIMOVice-Almirante (Reserva – EUA) John G. Morgan*

(Proceedings (EUA), fevereiro 2011, pág. 10)

– crescimento do transporte marítimo,– maior asserção da China,– crescimento da importância estratégi-

ca dos oceanos.Após uma análise sucinta de cada uma

dessas tendências, Morgan acrescentaque existe ainda a pirataria, que, por viada elevação de tarifas do transporte marí-timo, consequência do aumento dos pre-ços dos seguros, repassa esse custo aosconsumidores.

Por esses motivos, o Almirante Morganse opõe aos que defendem a diminuição daMarinha dos EUA, como, por exemplo, osecretário de Defesa, Robert M. Gates. Emsua conclusão, afirma: “Poder global re-sulta de uma Marinha global, o que a histó-ria demonstra”.

* Membro da Diretoria do U.S. Naval Institute.** Serviu ao longo de 38 anos na Marinha italiana, principalmente nas áreas de aquisição de armamento

e de cooperação internacional. Atualmente integra o grupo de trabalho europeu para armamentonão letal.

FRAGATAS E CONTRATORPEDEIROS ESPECIALIZADOS –VALE A DESPESA?

Contra-Almirante (Reserva - Itália) Massimo Annati**(Naval Forces, no 1/2011, Vol. XXXII, pág. 32-40)

De acordo com o Almirante Annati, otamanho das esquadras vem constante-mente diminuindo e, portanto, os poucosnavios de guerra remanescentes são incum-bidos de quantidade e variedade maioresde missões.

Algumas dessas missões, como a defe-sa aérea, serão ainda expandidas para de-fesa de mísseis balísticos, ele afirma. Ou-tras, como a guerra antissubmarino, sofremquestionamento devido à baixa percepçãode ameaça.

Novos papéis, antes desconhecidospela Marinha e certamente pelas fragatas,vêm surgindo, tais como estabilização,apoio a forças especiais e ataque a terra.Papéis menos exigentes, como interdição esegurança marítimas, são, a propósito, asmais frequentes tarefas das fragatas. Nes-te artigo, o almirante se propõe a, por meioda comparação de requisitos operativosversus orçamento disponível, prover a res-posta para o correto dimensionamento deforças.

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RMB2oT/2011 259

REVISTA DE REVISTAS

* Fez o curso de demolição subaquática (UDT – Underwater Demolition Team, precursor do Seal) em1958 e passou o restante de sua carreira na Marinha dos EUA em comissões de operações especiais.Recentemente, passou a compor a galeria de honra do Quartel-General de Operações Especiais dosEUA, na Flórida.

Este artigo, bastante tempestivo devi-do à recente operação contra o terroristaBin Laden, busca, segundo o autor, apre-sentar a história verdadeira do Seal (grupode operações especiais cujo nome vem dacontração de sea, air e land – mar, ar eterra) e corrigir asserções duvidosas feitaspelo Capitão de Corveta Roy Boehm pormeio de seu livro Primeiro Seal, de 1997.

O autor, que afirma ter sido o primeiro co-mandante do Time 1 do Seal (o primeiro grupoa ser criado) e ter servido na unidade nos últi-mos 16 anos de sua carreira ativa, apresentatoda a história da criação desse grupo de mili-tares especializados em operações especiais.

CORRIGINDO O REGISTROCapitão de Mar e Guerra (Reserva – EUA) David Del Giudice*

(Proceedings (EUA), fevereiro 2011, pág. 60-64)

Ele indica que a origem decorreu da ne-cessidade de se criar e manter uma forçacombatente relevante para a dinâmica daguerra no século XX e, em especial, que oSeal foi forjado por meio de “sangue, suore dedicação” dos milhares de Seals quelutaram e serviram na Guerra do Vietnã ealém.

Apesar de ter sido escrito comocontraponto ao livro acima citado e, por-tanto, se referir várias vezes a ele no senti-do de demonstrar suas impropriedades, otexto do artigo fornece inúmeros detalhesda formação dos Seals que podem ser úteisa pesquisadores.

Annati desenvolve extenso e profissio-nal artigo no qual analisa desde o que defi-ne uma fragata e um contratorpedeiro (oque, segundo ele, ninguém podeindicar corretamente) até o quejulga mais interessante: aquiloque define uma fragata ASW ouum contratorpedeiro AAW, porexemplo (ASW – guerraantissubmarino e AAW – guerraantiaérea), passando pelas defi-nições de navios de ataque a ter-ra, de emprego geral e de estabili-zação. O artigo aborda detalha-damente as várias missões a car-go desses navios e investiga ascaracterísticas necessárias parasua execução.

“A estrutura da força é clara-mente uma solução de compromisso entre

requisitos e orçamento disponível (apesarde muitos políticos afirmarem que os requi-sitos não se submetem ao orçamento) e, por-

tanto, não se aplicam regras uni-versais”, afirma o Almirante.

Para ele é evidente, após suaanálise, que no futuro veremosesquadras com combatentes al-tamente evoluídos para AAW eASW (sejam eles especializadosem uma, na outra ou em ambas),complementadas por fragatas deemprego geral e menos espe-cializadas, para a guerra de su-perfície. Ao final, o autor ad-mite ainda a possibilidade de usode fragatas modulares, reconfi-guráveis de acordo com a mis-são, mas coloca em dúvida a sua

relação custo/benefício.

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260 RMB2oT/2011

REVISTA DE REVISTAS

Neste completo artigo sobre operaçõesribeirinhas, o autor analisa as áreas de ope-rações – os rios –, a partir de uma posiçãoem que os considera pontos essenciais deinteresse para o assentamento e o progres-so humano.

Para o controle de grandes estuários e la-gos, que representa parte integral das guerrasterritoriais, na opinião do autor se faz necessá-rio, em especial, o caráter conjunto das forçasenvolvidas. Para ele, a evolução das forçasribeirinhas tem demonstrado a necessidadede se desenvolver capacidades especiais para

GUERRA FLUVIAL –OPERAÇÕES, ORGANIZAÇÃO E MEIOS

Capitão de Fragata (Reserva – Alemanha) Hartmut Manseck*(Tecnologia Militar, Ano 33, no 1/2011, pág. 80-84)

O delta do Amazonas

* Cursado em submarinos e membro da equipe da revista Naval Forces, do Grupo Mönch.

esse tipo de operação, cujo êxito depende, emboa parte, da criação de uma variedade de for-

ças operativas, talvez de tamanho reduzido,mas configuradas e equipadas para esta mis-

são específica. Para oComandante Manseck,as Marinhas e ForçasAéreas serão emprega-das, com frequência, noapoio às forças terrestresque atuam no entornofluvial propriamente dito.

Entretanto, analisaManseck, os orçamen-tos de defesa raramen-te contemplam esses ti-pos de unidades, ape-sar de já se observar uminteresse crescente ne-las devido a ações deterrorismo internacionale atividades ilícitas nosgrandes sistemas fluvi-ais do mundo. Em es-sência, prossegue, aguerra ribeirinha éconduzida, principal-mente, mas não exclu-sivamente, por forças

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RMB2oT/2011 261

REVISTA DE REVISTAS

pequenas, em lanchas pequenas ou médiase com armamento leve. A velocidade e mobi-lidade são fatores importantes, garante.

Após essa análise introdutória, o arti-culista identifica detalhadamente o entor-no fluvial, ressaltando sua importânciacomo rotas naturais de transporte e de co-municações por suas linhas terrestres decomunicações complementadas por gran-des superfícies de água ou cursos d’águainteriores. Os sistemas fluviais em todasas suas variantes são importantes para ascomunidades assentadas nas suas margensou proximidades, provendo o sustento comalimentos e água e facilitando o transportee a produção de energia, afirma Manseck.

Ele apresenta então quadro com os prin-cipais sistemas fluviais da América Centrale da América do Sul, por países, de acordocom a importância do transporte fluvial eda possibilidade de conflito regional, e lis-ta outros grandes deltas fluviais, algunscom mais de 4 mil km2 de área.

zação, ele advoga pelo planejamento meti-culoso e pela precisão na execução e que ocomando deve ser de um único chefe deforça conjunta, com uma estrutura de co-mando que integre as capacidades de to-das as forças participantes.

Com relação ao planejamento e execu-ção, além de outras importantes ressalvas,Manseck relaciona as cinco fases essenci-ais do assalto fluvial, todas elas inter-rela-cionadas. Cita também outras ações nasquais as forças fluviais podem desempe-nhar papel essencial: na ajuda humanitáriaem geral e em casos de desastres naturais(terremotos, inundações, deslizamentos deterra etc.) em particular. Segundo ele, aslanchas fluviais podem se constituir nomelhor meio para resgate de pessoas e parase distribuir ajuda humanitária. São, alémdisso, adequadas para apoio na luta con-tra o narcotráfico e grupos insurgentes. Oapoio fluvial é, na opinião do autor, “ele-mento-chave para o estabelecimento derelações militares e para promover a esta-bilidade regional”.

O autor prossegue fazendo considera-ções operacionais e operativas, analisan-do os requisitos para o êxito de operaçõesribeirinhas. Investiga o envolvimento dasforças principais e das de apoio, os princi-pais tipos de ações táticas desenvolvidospor cada uma, a necessidade de coordena-ção estreita entre elas, aspectos de superi-oridade aérea, terrestre ou naval, e outrosrequisitos para o sucesso desse tipo deoperação. No quesito comando e organi-

O Comandante Manseck analisa em segui-da os teatros de atuação possíveis na Améri-ca do Sul e busca, por meio de exemplos deforças ora existentes, indicar os meios ade-quados a uma força fluvial equilibrada.

Em conclusão de seu importante artigopara o desenvolvimento das operações ri-beirinhas, o autor assevera que esse tipo de

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262 RMB2oT/2011

REVISTA DE REVISTAS

operação seguirá sendo muito importanteem inúmeras regiões do mundo, abarcando,cada vez mais, mais países. Seu caráter com-plexo e conjunto, na maioria das vezes, re-quer treinamento e planejamento especiais,baseados em doutrina clara. Os comandos eestados-maiores devem conhecer profun-damente o entorno fluvial. As forças ribeiri-

nhas devem ser integradas por grande quan-tidade de lanchas modernas equipadas comsensores e armamento à altura do estado daarte, assegura o Comandante Manseck. Efinaliza afirmando: “O elemento humano comelevado nível de adestramento de combatecontinuará a ser indispensável para o êxitodas operações ribeirinhas no futuro”.

Apesar de ser tema antigo, inclusive de-finido no 1o artigo da Convenção daJamaica de 1982, a contaminação do mar eas medidas para se buscar evitar suasconsequências, na opinião do autor desteartigo, não vêm sendo tratadas com a rele-vância que merecem.

No entender do Comandante GonzálezFernández, em congressos, simpósios, me-sas redondas etc., onde se aborda, comfrequência, o tema mar e sua segurança,fica-se com a impressão de que o assuntoderramamentos incontroláveis é sujo e, porisso, evitado. Nesses tipos de encontros,é frequente que cada grupo, agência ouinstituição debata por manter sua influên-

SEGURANÇA MARÍTIMA E DERRAMAMENTOSINCONTROLÁVEIS NO MAR

Capitão de Mar e Guerra (Reserva – Espanha) Marcelino González Fernández*(Cuadernos de Pensamiento Naval, Escola de Guerra Naval, Armada Española, Núm. 12,

Suplemento de la Revista General de Marina, 2o semestre 2010)

* Oficial da reserva da Marinha da Espanha.

Afundamento do petroleiro Amoco Cádiz, em1978, na Bretanha francesa - 234 mil tonela-

das de petróleo foram derramadas no mar

PORCENTAGEM

54% a 45%

10% a 19%

10%

2%

7%

12%

5%

ORIGEM

Terra

Ar

Causas naturais

Explotação no mar

Funcionamento depetroleiros

Funcionamentode outros navios

Acidentes

Tabela 1. Causa e porcentagemdos derramamentos no mar

cia em determinada área, por monopolizá-la ou mesmo por ter a última palavra nadefinição de conceitos que a afetem. Noentanto, quando se trata de derramamen-tos, é comum que estes grupos simples-mente se retirem das conversações ou ne-gociações sem trazer algo positivo, a nãoser que seu futuro imediato esteja em jogo.

Ao longo deste seu extenso e detalha-do artigo, o autor busca demonstrar a rele-

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RMB2oT/2011 263

REVISTA DE REVISTAS

vância do tema e concitar leitores a refleti-rem e aportarem contribuições ao necessá-rio e grande esforço coletivo de preserva-ção de nosso mundo globalizado.

A linha de demonstração adotada porGonzález Fernández se inicia demonstran-do por meio da Tabela 1, baseada em estu-dos realizados nos Estados Unidos daAmérica (EUA), a causa da maioria dosderramamentos.

Ressalta o autor que apenas alguns des-ses derramamentos (5%) têm como origemacidentes ou atuações pontuais, normal-mente involuntárias, mas com grande im-pacto na região onde ocorrem. Quandoacontecem acidentes desse tipo, se verte aomar grande quantidade de poluente em pou-co tempo e em região restrita, gerando gran-des manchas visíveis com capacidade decausarem desastres ecológicos e ambientaiscom riscos para a saúde pública, para a florae a fauna locais, provocando danos nas cos-tas, praias, portos, áreas de pesca e de ex-ploração turística etc., com perda da quali-dade de vida na região afetada.

González Fernández analisa extensamen-te vários dos principais acidentes com navi-os petroleiros, rupturas de gasodutos e ocor-rências em depósitos e instalações, no mare em terra, que causaram derramamentos depetróleo, alguns dos quais ele apresenta deforma sumária por meio da Tabela 2.

Essas ocorrências, segundo o autor, fo-ram muito além de simples notíciasdivulgadas na mídia, convertendo-se emgrandes tragédias e dramas para as pessoasdireta ou indiretamente afetadas. Entretan-to, prossegue, após grande mobilização, tan-to de pessoas como de governos, comuns aesse tipo de ocorrências, passado o aciden-te e, de certo modo suas consequências,todos tendem a esquecer o que ocorreu.

Em prosseguimento, González busca in-vestigar o lado positivo desses acidentes,identificando e analisando medidas preven-

tivas que vêm sendo adotadas e os resul-tados delas obtidos. Assim, lista as medi-das mais recentes adotadas para melhorara segurança no mar e cita a existência denormas, convênios, acordos e inúmerosoutros dispositivos relacionados à conta-minação do mar, tanto no Direito Internaci-onal como no interno dos países. Entre-tanto, em sua opinião, o cumprimento des-sas regras esbarra nos interesses empre-sariais e sociais e nas bandeiras de conve-niência, escudadas por fortes interesseseconômicos, impedindo a aplicação do ri-gor das normas e a exigências das respon-sabilidades. Ele reconhece, porém, que al-gum avanço vem sendo obtido no que serefere à qualidade do transporte marítimo,com navios melhores e de casco duplo, aosauxílios à navegação e à fiscalização de na-vios e agências, e, também, na imposiçãode normas.

Incêndios no Golfo do México

O autor, em seguida, aborda as diversasformas de energia disponíveis atualmente,comparando-as entre si e concluindo pelaimprescindibilidade do petróleo. Ressalvaa sua característica não renovável e defen-de que sua utilização deva ser conscientedos riscos ambientais envolvidos, especi-almente no mar, em todas as fases de suaprodução, desde a extração até o consumofinal.

Em suas reflexões ao final do artigo, oComandante González Fernández alerta queas grandes explorações de petróleo no mar

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264 RMB2oT/2011

REVISTA DE REVISTAS

ANO

1893

19401950

1960

1967

1969

1970

1970

1970

1970

1971

1971

1972

1972

1972

1972

1975

1975

1976

1976

1976

1977

1977

1978

1978

1979

1979

1979

1979

1979

NOME

Gluckauf

–––

Sinclair Petrolore

Torrey Canyon

Julios Schindler

Al Bacruz

Arrow

Polycommander

Metula

Wafra

Texaco Oklahoma

Giuseppe Giuletti

Trader

Texana yOswego Guardian

Sea Star

Jacob Maersk

Showa Maru

Saint Peter

Urquiola

Argo Merchant

–––

Hawaiian Patriot

Amoco Cádiz

Andos Patria

Gino

Ixtoc I

Aegean CaptainAtlantic Empress

Ioannis Angelicoussis

Chevron

TIPO

Petroleiro

Zona industrial

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiros

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Superpetroleiro

Petroleiro

Poço

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Plataforma

Petroleiros

Petroleiro

Petroleiro

LUGAR

Ilha de Fire (Nova York)

Greenpoint, Brooklin (Nova York)

Brasil

Ilhas Scilly (Sul da Inglaterra)

Açores

300 milhas de Açores

Nova Escócia (Canadá)

Ilhas Cíes (Ría de Vigo)

Estreito de Magalhães (Chile)

Cabo das Águias (África do Sul)

100 milhas do Cabo Hatteras (EUA)

Cabo de São Vicente (Portugal)

180 milhas ao sul da Grécia

Costas do Cabo (África do Sul)

Golfo de Omã

Leixões, Portugal

Estreito de Málaca

Baía Ancón de Sardinas (Equador)

La Coruña

Massachusetts (EUA)

Ekofisk (Mar do Norte)

300 milhas de Honolulu

Bretanha Francesa

30 milhas de Sisargas (Coruña)

Bretanha Francesa

Campeche (Golfo do México)

Trinidad y Tobago

65 milhas de Cabinda (Angola)

Deer Park Shell Oil Hawaii

TONELADASDERRAMADAS

Possivelmente foi aprimeira maré negra

76.300

60.000

120.000

92.000

20.400

13.000

13.000

53.000

30.000

33.000

26.000

35.000

100.000

115.000

80.000

237.000

33.000

100.000

27.000

81.000

95.000

234.000

60.000

32.000

500.000

280.000

35.000

33.000

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RMB2oT/2011 265

REVISTA DE REVISTAS

ANO

1979

1979

1980

1980

1983

1983

1985

1988

1989

1989

1989

1989

1991

1991

1991

1992

1992

1993

1993

1994

1994

1994

1994

1994

1996

1997

1999

2002

2003

NOME

Gunvor Maersk

Independenta

Irenes Serenade

–––

Castillo de Bellver

–––

Nova

Odyssey

Puppy

Khark 5

Exxon Valdez

Aragón

–––

Haven

ABT Summer

Mar Egeo

–––

Braer

Maersk NavigatorSanko Honor

Morris J. Berman

–––

Cosmas

Nassia

New Wordl

Sea Empress

Najodka

Erika

Prestige

Tasman Spirit

TIPO

Petroleiro

Superpetroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Poço

Petroleiro

Campo petrolífero

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Superpetroleiro

Barris de bruto

Petroleiro

Superpetroleiro

Petroleiro

Poço

Petroleiro

SuperpetroleiroPetroleiro

Barcaça

Oleoduto

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

Petroleiro

LUGAR

Amazonas (Brasil)

Estreito de Bósforo

Baía de Navarin (Grécia)

Líbia

África do Sul

Guerra Irã-IraqueNowruz (Irã) - Golfo Pérsico

Golfo Pérsico

Canadá

1.350 milhas de Bombaim (Índia)

400 km das Canárias

Alaska

Madeira

Golfo PérsicoKuwait - Golfo Pérsico

Uma milha de Gênova

700 milhas de Angola

La Coruña

Fergana Valley (Uzbequistão)

Ilhas Shetland

Sumatra

Porto Rico

Komi (Russia)

Mar da China, a 530 de Hong Kong

Bósforo

200 milhas ao sudoeste de Portugal

Sudoeste de Gales

Costa ocidental do Japão

Bretanha Francesa

Águas de Galícia

Karachi

TONELADASDERRAMADAS

12.000

93.000

102.000

143.000

267.000

267.000 a 600.000

70.000

146.000

40.000

80.000

37.000

25.000

1.500.000

100.000

260.000

80.000

285.000

85.000

25.000

109.000

104.000

23.000

20.000

11.000

73.000

19.000

10.000

63.000

28.000

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266 RMB2oT/2011

REVISTA DE REVISTAS

ANO

2005

2006

2007

2009

2010

2010

NOME

“Katrina” y “Rita”

–––

Hebei Spirit

West Atlas

Deepwater Horizon

–––

TIPO

Furacões

PlantaenergéticaPetroleiro

Plataforma

Plataforma

Oleoduto

LUGAR

Golfo do México

Ataque de Israel ao Líbano. 30 km aosul de BeiruteCoreia do Sul

Mar de Timor

Golfo do México

Dalian (China)

TONELADASDERRAMADAS

30.000

15.000

10.500

15.000

1.800 a 2.800 diáriasdurante 4 meses

75.000

Tabela 2. Alguns acidentes com derramamento no mar

devem prever todas as contingências, nãose devendo esperar a ocorrência de aci-dentes para buscar soluções e depoiscolocá-las em prática: “Se as soluções sãoconhecidas, deve-se exigir seu cumprimen-to”, assevera. Por fim, realça que os foros

que se reúnem para discutir a segurançano mar devem também discutir os derrama-mentos incontroláveis, identificando ondeeles podem ser produzidos e atuando “demodo que nossos descendentes possamdesfrutar de um planeta um pouco melhor”.

Neste artigo, a revista Tecnologia Mili-tar faz a transcrição completa da versão noidioma português do acordo militar assina-do em 8 de novembro de 2010 entre o Gover-no da República Federal da Alemanha e oGoverno da República Federativa do Brasilsobre Cooperação em Matéria de Defesa.

O acordo contém nove artigos e, em suaintrodução, prevê buscar-se contribuir paraa paz e a segurança internacional, desejan-do fortalecer as várias formas de coopera-ção de defesa entre os dois países, tendocomo base a reciprocidade e o interessemútuo.

Estão previstas cooperações em assun-tos relacionados à política de defesa e trei-namento e operações militares; pesquisa edesenvolvimento, aquisição de produtos

ALEMANHA E BRASIL:TRATADO DE COOPERAÇÃO EM MATÉRIA DE DEFESA

(Tecnologia Militar, Ano 33, no 1/2011, pág. 52)

Ministro da Defesa brasileiro, Nelson Jobim,e o alemão, Karl-Theodor zu Guttenberg

e serviços de defesa e apoio logístico;assessoramento em equipamentos de de-fesa; compartilhamento de conhecimentose experiências na área de Ciência eTecnologia (C&T); intercâmbio de informa-

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RMB2oT/2011 267

REVISTA DE REVISTAS

ções sobre segurança internacional e deexperiências relacionadas à prevenção deconflitos internacionais e a operações degerenciamento de crises; e outras áreas nodomínio da defesa de interesse mútuo en-tre os dois países.

O Acordo prevê que sua condução sebaseará nos princípios da igualdade, re-ciprocidade e interesse mútuo, obedecen-

do às legislações nacionais e em sintoniacom as obrigações internacionais daspartes.

O documento assinado entre os doisministros da Defesa prevê ainda o respeitoà Carta das Nações Unidas, incluindo aigualdade soberana entre Estados, a inte-gridade e inviolabilidade territorial e a nãointervenção em assuntos internos.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Esta seção destina-se a registrar e divulgar eventos importan-tes da Marinha do Brasil e de outras Marinhas, incluída aMercante, dar aos leitores informações sobre a atualidade e per-mitir a pesquisadores visualizarem peculiaridades da Marinha.

Colaborações serão bem-vindas, se possível ilustradas comfotografias.

SUMÁRIO(Matérias relacionadas conforme classificação para o Índice Remissivo)

ADMINISTRAÇÃOATIVAÇÃO

Ativação da Agência Fluvial de Humaitá (272)Ativação da Companhia de Defesa Química, Biológica e Nuclear de Aramar (272)

COMEMORAÇÃO146o aniversário da Batalha Naval do Riachuelo (273)Comunicação Social na Marinha completa 50 anos (279)Dia Internacional dos Mantenedores da Paz (280)Farol de Abrolhos completa 150 anos (282)

CONDECORAÇÃOOficial de Marinha é o primeiro militar brasileiro a receber medalha da Unifil (283)

INAUGURAÇÃOInaugurados núcleos do Escritório de Ciência, Tecnologia e Inovação da

Marinha junto a universidades (283)POSSE

Assunção de cargos por almirantes (286)PRÊMIO

Navio de Socorro do ano (286)Premiação nacional da Operação “Cisne Branco” 2010 (287)

PROMOÇÃOPromoção de almirantes (288)

TRANSFERÊNCIA DE NAVIOAviPa Anequim é transferido para o setor operativo da Marinha (288)

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270 RMB2oT/2011

NOTICIÁRIO MARÍTIMO

APOIOCONSTRUÇÃO NAVAL

Navantia fez proposta à Marinha para construção de 11 navios (289)

ATIVIDADES MARINHEIRASABASTECIMENTO

Navios-Patrulha Guaíba e Graúna apoiam São Pedro e São Paulo (290)BUSCA E SALVAMENTO

Marinha resgata tripulante de barco pesqueiro no Rio Grande do Sul (290)Navio-Patrulha Bocaina realiza evacuação médica no Amazonas (291)

CIÊNCIA E TECNOLOGIA (C&T)CIÊNCIA DO MAR

Marinha amplia conhecimentos oceanográficas na Amazônia Azul (291)CONSTRUÇÃO NAVAL

Primeiro navio de propulsão parcialmente eólica chega a portos do Brasil (292)CIÊNCIA E TECNOLOGIA NA MARINHA

Femar aprimora apoio à C&T da Marinha (293)MÁQUINAS

Produção nacional de grupos geradores para operações marítimas e de petróleo (294)PESQUISA

Fundação patrocinará revista Pesquisa Naval (294)TECNOLOGIA

Solução sustentável em lubrificação para a indústria naval (294)

CONGRESSOSCONFERÊNCIA

Conferência Nacional de Segurança e Proteção Marítima (295)ENCONTRO

Encontro sobre Certificação de Containers Offshore (296)Viva a Mata 2011 (296)

FEIRAMarinha participa da 8a LAAD (297)

EDUCAÇÃOEDUCAÇÃO NO BRASIL

Interação e dinamismo marcam o projeto Uma Aula no Museu (299)ESPORTE

Resultados esportivos (300)

FORÇAS ARMADASMARINHA DA NAMÍBIA

Emgepron entrega avisos de patrulha à Namíbia (302)OPERAÇÃO

A Marinha na Operação Amazônia 2011 (302)Marinha do Brasil participa da Caribex-2011 (303)Navio-Patrulha Bocaina encerra Operação Patrulha Naval Atlântico

Norte participando de campanha contra escalpelamento (304)Operação Unitas LII (305)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

MEIO AMBIENTEECOLOGIA

75% dos recifes de corais estão ameaçados de extinção (307)

PODER MARÍTIMOCONSTRUÇÃO NAVAL

Vale Brasil realiza provas de mar (308)MARINHA MERCANTE

Log.Star intensifica operações de carga geral (308)Maestra Navegação e Logística entra no setor de cabotagem (309)

PSICOSSOCIALAJUDA HUMANITÁRIA

Marinha apoia vítimas das enchentes no sul do País (310)Vítimas das enchentes no Paraná recebem apoio da Marinha (311)

MÚSICA“Uma tarde especial” no Espaço Cultural da Marinha (312)

LANÇAMENTO DE LIVROA Construção Naval Militar Brasileira do Século XX (313)Lançado o livro Nos limites da Amazônia Azul (314)

TEATRODe volta para o passado (316)

TELEVISÃOMergulho na Camaquã (317)

VALORESSÍMBOLO

Novos símbolos do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (318)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Foi ativada, em 21 de março último, aAgência Fluvial de Humaitá (AgHumaitá).A cerimônia de ativação foi realizada nasdependências da Agência e Vila Naval dacidade de Humaitá (AM), assumindo o car-go de agente fluvial o Capitão-Tenente (AA)José Adelino Silva. Presidiu a cerimônia ocomandante de Operações Navais, Almiran-te de Esquadra João Afonso Prado Maia deFaria, que expediu a seguinte Ordem do Dia:

“Em cumprimento à Portaria no 430/MB,de 17 de novembro de 2010, do comandan-te da Marinha, que criou a Agência Fluvialde Humaitá, realiza-se hoje a sua cerimôniade ativação.

Dentre outros motivos, contribuírampara a criação desta nova Agência a dis-tância entre as cidades de Humaitá e PortoVelho, o considerável quantitativo de ha-bitantes exercendo atividades ligadas ànavegação, além do grande número de em-barcações e da crescente utilização do RioMadeira, um dos mais importantes corre-dores fluviais da Região Norte, o qual in-terliga áreas produtivas aos mercados con-sumidores, no País e no exterior.

Cabe registrar que sua ativação ocorreem um momento oportuno devido ao avan-ço do projeto de construção do ComplexoHidrelétrico do Rio Madeira, o qual possi-bilitará o incremento da agroindústria e do

ATIVAÇÃO DA AGÊNCIA FLUVIAL DE HUMAITÁ

ecoturismo, unindo as redes fluviais deBrasil/Bolívia/Peru e colocando a via fluvi-al Madeira/Mamoré/Guaporé na condiçãode integrada à infraestrutura de transporteintermodal da ligação oceânica Atlântico-Pacífico, dentro de um contexto que apon-ta para um considerável aumento do tráfe-go de embarcações nesta região.

Sua criação possibilitará um incrementonas atividades relacionadas à AutoridadeMarítima no Estado do Amazonas, por meiodas ações em prol da segurança do tráfegoaquaviário, da formação de aquaviários, dasalvaguarda da vida humana e da preven-ção da poluição hídrica na sua área de ju-risdição, que contribuirão para ampliar aaplicação do Poder Naval na Amazônia.

Por fim, ao ativarmos a Agência Fluvialde Humaitá, à margem esquerda do RioMadeira, ressalto, ao Agente e à primeiratripulação desta nova organização militar,a grande responsabilidade que terão pelafrente. Exorto-os a se dedicarem inteiramen-te em fazê-la ser, desde seu nascimento,um modelo de eficácia, com alto grau deeficiência, na execução das suas ativida-des, honrando as tradições da Marinha doBrasil, presente na Amazônia desde 1728,com a criação da Divisão Naval do Norte.”

(Fontes: Bono no 193, de 18/3/2011 eBono Especial no 198, de 21/3/2011)

Foi ativada, em 29 de abril último, a Com-panhia de Defesa Química, Biológica eNuclear de Aramar (CiaDefQBN-Aramar).A cerimônia de ativação da nova Organiza-ção Militar (OM) foi realizada no CentroExperimental Aramar, Iperó (SP), presididapelo diretor-geral do Material da Marinha,Almirante de Esquadra Arthur Pires Ramos.

ATIVAÇÃO DA COMPANHIA DE DEFESA QUÍMICA,BIOLÓGICA E NUCLEAR DE ARAMAR

A seguir, transcrevemos a Ordem do Diado Almirante Pires Ramos relativa ao evento:

“Em cumprimento à Portaria no 352/MB,de 17 de setembro de 2010, do comandanteda Marinha, realiza-se, na presente data, acerimônia de Mostra de Ativação da Com-panhia de Defesa Química, Biológica eNuclear de Aramar.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Esta cerimônia conclui a materializaçãode um projeto individualizado, previsto noPlano de Articulação e Equipamento daMarinha (Paemb), e ocorre em um momen-to oportuno, em virtude do contínuo avan-ço do Programa Nuclear da Marinha, sen-do de grande importância a execução dastarefas previstas para esta Organização Mi-litar, que terá o propósito de prover a segu-rança física das instalações e de executarações de controle e combate a emergênci-as de natureza química, biológica e nuclear,potenciais ou reais, na área do Centro Ex-perimental Aramar.

Conforme previsto em sua portaria de cri-ação, a implantação da Companhia de Defe-sa Química, Biológica e Nuclear de Aramarserá efetivada de modo progressivo, confor-me disponibilidades orçamentárias e de Pró-prio Nacional Residencial (PNR) para a tripu-lação. Certamente, com a movimentação dopessoal e o aporte de recursos materiais, estaOrganização Militar terá a sua capacidadeoperativa atingida em breve.

Ao ser ativada esta nova unidade doCorpo de Fuzileiros Navais, saliento ao seucomandante e à sua primeira tripulação ogrande desafio e a responsabilidade queterão pela frente. Nesse sentido, incenti-

vo-os a se dedicarem em fazê-la crescer eser um modelo de eficácia no cumprimentodas tarefas atinentes à defesa química, bio-lógica e nuclear nas Forças Armadas.

À Companhia de Defesa Química, Bioló-gica e Nuclear de Aramar, desejo todo su-cesso e êxito nesse caminho que ora se ini-cia. Seja muito bem-vinda ao Serviço Ativo!

Adsumus!”A CiaDefQBN-Aramar permanecerá su-

bordinada ao Centro Tecnológico da Mari-nha em São Paulo.

(Fontes: Bonos nos 297, de 28/4/2011, e302, de 29/4/2011)

Primeiro cerimonial à bandeira realizado naCiaDefQBN-Aramar

146o ANIVERSÁRIO DA BATALHA NAVAL DO RIACHUELODATA MAGNA DA MARINHA

No dia 11 de junho comemora-se o Ani-versário da Batalha Naval do Riachuelo –Data Magna da Marinha. A batalha é con-siderada pelos historiadores como decisi-va na Guerra da Tríplice Aliança contra oParaguai (1865-1870) – o maior conflito mi-litar na América do Sul, somente superadoem vítimas, no Novo Mundo, pela GuerraCivil Americana (1861-1865).

Até aquela data, o Paraguai tinha a inicia-tiva na guerra e a batalha inverteu a situação,

garantiu o bloqueio e o uso pelo Brasil dosrios, que eram as principais artérias do teatrode operações de guerra, e desincentivou pos-síveis adesões de simpatizantes argentinose uruguaios à causa paraguaia.

Logo após sua independência, oParaguai procurou manter-se afastado dosconflitos frequentes que ocorriam na Re-gião do Prata. Quando Francisco SolanoLópez assumiu o poder em 1862, após amorte de seu pai, Carlos Antônio López,

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

passou a exercer uma política externa maisatuante, tentando fazer com que sua pre-sença se sobressaísse na região.

O Brasil foi o primeiro país a reconhecera independência do Paraguai. Isso estavade acordo com a política externa do Impé-rio de não ser favorável à sua anexação,diversas vezes desejada, pelas ProvínciasUnidas do Rio da Prata, futura Argentina.

Havia questões de limites entre o Brasil eo Paraguai, mas era improvável que isso le-vasse a um conflito armado. A intervençãobrasileira no Uruguai em 1864, no entanto,contrariou os planos políticos e as aliançasde Solano López. Ele considerou que a inva-são do Uruguai por tropas brasileiras era umato de guerra do Brasil contra os interessesdo Paraguai e iniciou as hostilidades. Comolhe foi negada a permissão para que seu exér-cito atravessasse território argentino paraatacar o Rio Grande do Sul, invadiu a Provín-cia de Corrientes, envolvendo a Argentinano conflito.O Paraguai estava se mobilizan-do para uma possível guerra desde o iníciode 1864. López se julgava mais forte e acredi-tava que teria o apoio do Partido Blanco uru-guaio e dos partidários argentinos de JustoJosé de Urquiza, que exercia o poder na pro-víncia argentina de Entre Rios. Tal não ocor-reu. Sua derrota em Riachuelo acabou com apossibilidade de uma vitória rápida. Seuspossíveis aliados não aderiram. Ele tambémsuperestimou o poder econômico e militar doParaguai e subestimou o potencial e a dispo-sição do Brasil para a luta.

Esquadra brasileira

No início da Guerra da Tríplice Aliança,a Esquadra brasileira dispunha de 45 navi-os armados. Desses, 33 eram navios de pro-pulsão mista, a vela e a vapor, e 12 depen-diam exclusivamente do vento. O Arsenalde Marinha do Rio de Janeiro (Arsenal daCorte) passara por uma modernização em

meados do século XIX. Diversos dos na-vios do início da guerra foram projetados econstruídos no País. Mais tarde, o Arsenalconstruiu também navios encouraçadospara o teatro de operação no Rio Paraguai.

Os navios brasileiros disponíveis antesdessa guerra eram adequados para operarno mar e não nas condições de águas res-tritas e pouco profundas que o teatro deoperações nos rios Paraná e Paraguai exi-gia; a possibilidade de encalhar era um pe-rigo sempre presente. Além disso, essesnavios possuíam casco de madeira, o queos tornava muito vulneráveis à artilhariade terra, posicionada nas margens.

Esquadra paraguaia

A Esquadra paraguaia possuía 32 navi-os, incluindo os que eles apresaram do Bra-sil e da Argentina, dos quais 24 eram navi-os de propulsão mista, a vapor e vela, eoito eram navios exclusivamente a vela.Todos os navios de propulsão mista, excetoum deles, eram de madeira, com rodas depás. Embora todos eles fossem adequadospara navegar nos rios, somente o Taquariera um verdadeiro navio de guerra.

Os paraguaios desenvolveram, então, achata com canhão como arma de guerra. Eraum barco de fundo chato, sem propulsão,com canhão de seis polegadas de calibre,que era rebocado até o local de utilização,onde ficava fundeado. Transportava ape-nas a guarnição do canhão, e sua borda fi-cava próxima da água, deixando à vista umreduzidíssimo alvo. Via-se somente a bocado canhão, acima da superfície da água.

Antecedentes da Batalha

Coube ao Almirante Joaquim MarquesLisboa, Visconde de Tamandaré, depoisMarquês de Tamandaré, o Comando dasForças Navais do Brasil em Operações de

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Guerra contra o Governo do Paraguai. AMarinha do Brasil representava praticamen-te a totalidade do Poder Naval presente noteatro de operações. O Comando-Geral dosExércitos Aliados era exercido pelo Presi-dente da República da Argentina, GeneralBartolomeu Mitre. As Forças Navais doBrasil não estavam subordinadas a ele, deacordo com o Tratado da Tríplice Aliança.

A estratégia naval adotada pelos aliadosfoi o bloqueio. Os rios Paraná e Paraguai eramas artérias de comunicação com o Paraguai.As Forças Navais do Brasil foram organiza-das em três divisões – uma permaneceu noRio da Prata e as outras duas subiram o RioParaná para efetivar o bloqueio. Com o avan-ço das tropas paraguaias ao longo da mar-gem esquerda do Paraná, Tamandaré resol-veu designar seu chefe do Estado-Maior oChefe de Divisão (posto que correspondia acomodoro, em outras Marinhas) FranciscoManoel Barroso da Silva, para comandar aForça Naval que estava rio acima. Barrosopartiu de Montevidéu em 28 de abril de 1865,na Fragata Amazonas, e se juntou à ForçaNaval em Bela Vista.

A primeira missão de Barroso foi um ata-que à cidade de Corrientes, que estava ocu-pada pelos paraguaios. O desembarque ocor-reu com bom êxito, em 25 de maio. Não erapossível manter a posse dessa cidade na re-taguarda das tropas invasoras e foi preciso,logo depois, evacuá-la. Ficou evidente, po-rém, que a presença da Força Naval brasileiradeixaria o flanco dos invasores sempre muitovulnerável. Era necessário destruí-la, e issomotivou Solano López a planejar a ação quelevou à Batalha Naval do Riachuelo.

A Batalha

A Força Naval Brasileira comandada porBarroso estava fundeada no Rio Paraná,próximo à cidade de Corrientes, na noite de10 para 11 de junho de 1865.

O plano paraguaio era surpreender osnavios brasileiros na alvorada do dia 11 dejunho, abordá-los e, após a vitória, rebocá-los para Humaitá. Para aumentar o poder defogo, a Força Naval paraguaia, comandadapelo Capitão de Fragata Pedro IgnácioMezza, rebocava seis chatas com canhões.Adicionalmente, a Ponta de Santa Catalina,próxima à foz do Riachuelo, foi artilhada pe-los paraguaios. Havia também tropas de in-fantaria posicionadas para atirar sobre osnavios brasileiros que escapassem.

No dia 11 de junho, aproximadamenteàs 9 horas, a Força Naval brasileira avistouos navios inimigos descendo o rio e se pre-parou para o combate. Mezza se atrasara edesistiu de iniciar a batalha com a aborda-gem. Às 9h25, dispararam-se os primeirostiros de artilharia. A Força Naval paraguaiapassou pela brasileira, ainda imobilizada, efoi se abrigar junto à foz do Riachuelo, ondeficou aguardando.

Após suspender, a Força Naval brasilei-ra desceu o rio em perseguição e avistou osnavios inimigos parados nas proximidadesda foz do Riachuelo. Desconhecendo que amargem estava artilhada, Barroso deteve seucapitânia, a Fragata Amazonas, para cortarpossível fuga dos paraguaios. Com sua ma-nobra inesperada, alguns dos navios de suaForça retrocederam, e o Jequitinhonha en-calhou em frente às baterias de SantaCatalina. O primeiro navio da linha, oBelmonte, passou por Riachuelo separadodos outros, sofrendo o fogo concentradodo inimigo e, logo após, encalhou proposi-tadamente, para não afundar.

Corrigindo sua manobra, Barroso, com aAmazonas, assumiu a vanguarda e efetuoua passagem, combatendo a artilharia da mar-gem, os navios e as chatas, sob a fuzilariadas tropas que atiravam das barrancas.

Completou-se, assim, aproximadamente às12 horas, a primeira fase da Batalha. Até en-tão, o resultado era altamente insatisfatório

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para o Brasil: o Belmonte fora de ação, oJequitinhonha encalhado para sempre e oParnaíba, com avaria no leme, sendo abor-dado e dominado pelo inimigo, apesar da re-sistência heróica dos brasileiros, como oGuarda-Marinha Greenhalgh e o MarinheiroMarcílio Dias, que lutaram até a morte. Então,Barroso decidiu regressar. Desceu o rio, fez avolta com os seis navios restantes e, logodepois, estava novamente em Riachuelo.

Tirando vantagem do porte da Amazonas,ele usou seu navio para abalroar e inutilizarnavios paraguaios e vencer a Batalha. Qua-tro navios inimigos fugiram perseguidos pe-los brasileiros. Antes do pôr do sol de 11 dejunho, a vitória era brasileira. A Esquadraparaguaia fora praticamente aniquilada e nãoteria mais participação relevante no conflito.Estava também garantido o bloqueio que im-pediria que o Paraguai recebesse armamen-tos do exterior, inclusive os encouraçadosque encomendara na Europa.

Foi a primeira grande vitória da TrípliceAliança na guerra e, por isto, muito come-morada. Com a vitória em Riachuelo, com aretirada dos paraguaios da margem esquer-da do Paraná e a rendição dos invasoresem Uruguaiana, a opinião dos aliados erade que a guerra terminaria logo. Isso, po-rém, não ocorreu. O Paraguai era um paísmobilizado, e Humaitá ainda era uma forta-leza inexpugnável para aqueles navios demadeira que venceram a Batalha. A guerrafoi longa, difícil e causou muitas mortes esacrifícios. Foi nela que brasileiros de to-das as regiões do País foram mobilizados,conheceram-se melhor e trabalharam jun-tos para a defesa da Pátria. Consolidou-se,assim, a nacionalidade brasileira.

MENSAGEM DA PRESIDENTE DAREPÚBLICA

“A Batalha Naval do Riachuelo, em 11de junho de 1865, foi um evento decisivo

na Guerra da Tríplice Aliança e o ponto cul-minante da ação então protagonizada pelaMarinha do Brasil.

Reverenciar, neste dia, a Data Magnadessa Arma é enaltecer as qualidades maisnobres do povo brasileiro.

As lições heróicas do passado servemde inspiração para a execução, no presen-te, das muitas responsabilidades da nossaMarinha.

A defesa da Pátria, a segurança do trá-fego aquaviário, o patrulhamento do ocea-no e dos 40 mil quilômetros de calhas fluvi-ais navegáveis, a salvaguarda da vida depessoas e a prevenção da poluição encon-tram sustentação na atitude profissional edesprendida dos homens e mulheres queservem nessa instituição exemplar.

Destaco, nesse contexto, a importânciada assistência médico-hospitalar prestadapelos “Navios da Esperança”, que levamapoio de saúde a populações carentes dasregiões Norte e Centro-Oeste.

A presença constante da Marinha emnossas águas jurisdicionais, na “Amazô-nia Azul” e nos rios da Bacia Amazônica edo Pantanal é garantia da segurança do Paíse constitui motivo de particular orgulhopara os brasileiros.

A decidida defesa dos interesses doBrasil é fundamental para a consolidaçãode nosso projeto como nação próspera,democrática e soberana. As recentes des-cobertas de riquezas minerais na platafor-ma continental impulsionam o progressoe, ao mesmo tempo, aumentam nossas res-ponsabilidades de defesa.

Neste momento, sei que há marinheirosbrasileiros patrulhando nosso mar, em cujagigantesca área de 4 milhões e meio dequilômetros quadrados se encontram asregiões de exploração de óleo e gás, inclu-sive as reservas do pré-sal.

Daí a importância de a Força ser dotadade navios-patrulha capazes de executar

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

essas tarefas da forma mais eficiente, atu-ando, em particular, na área onde se encon-tram nossas principais bacias petrolíferas.

Nesse mesmo contexto estratégico in-sere-se o Programa de Desenvolvimentode Submarinos, respaldado pelo bem-su-cedido Programa Nuclear da Marinha.

O desenvolvimento da capacidade na-cional de superação das dificuldadestecnológicas nessa área permitirá, junta-mente com a renovação e o aparelhamentoda Esquadra, a constituição de um instru-mento de considerável poder dissuasório.

Deve ser destacada também a participa-ção dos marinheiros e fuzileiros navais bra-sileiros em missões de paz e humanitárias,sob a égide da ONU e da OEA. Essa valio-sa contribuição da Marinha corrobora ocompromisso brasileiro de tornar o mundocada vez mais pacífico.

Nesta oportunidade, na qualidade deGrã-Mestra da Ordem do Mérito Naval, te-nho a grata satisfação de cumprimentar assenhoras e os senhores agraciados comessa alta condecoração.

Integrantes da Marinha! Homens e mu-lheres, militares e civis que se dedicam comafinco ao serviço da Força Naval! Orgu-lhem-se do uniforme azul e branco queenvergam, com galhardia, no dia de hoje.Parabéns, Marinha do Brasil!”

ORDEM DO DIA DO COMANDANTEDA MARINHA

“No dia 11 de junho de 1865, destemi-dos brasileiros protagonizaram um dos mai-ores feitos da nossa história: a vitória naBatalha Naval do Riachuelo, o que concor-reu decisivamente para o desfecho favorá-vel na Guerra da Tríplice Aliança.

As hostilidades, que culminariam comaquele embate, haviam começado em 1864,quando ocorreu a invasão das provínciasde Mato Grosso e Rio Grande do Sul. Na-

quele tempo, os navios da Esquadra eraminadequados para a região do conflito,onde os rios, pouco profundos, exigiambarcos com pequeno calado.

O Almirante Joaquim Marques Lisboa,comandante em chefe da Esquadra, entãoVisconde de Tamandaré e que, mais tarde,se tornaria o Patrono da Marinha, atribuiu atarefa de realizar o bloqueio dos riosParaguai e Paraná, a fim de cortar a principallinha de apoio logístico do adversário, aoChefe de Divisão Francisco Manoel Barro-so da Silva, o qual, mesmo com todas asdificuldades, conseguiu retomar a cidadeargentina de Corrientes, importante posiçãopara o cumprimento da missão, fundeandoo seu grupo-tarefa nas proximidades.

Assim, naquela manhã do dia 11, o inimi-go, armado com oito naus, seis barcaçasartilhadas a reboque e dispondo de tropas ecanhões ao longo da margem esquerda doRio Paraná, o que constituía uma enorme van-tagem em relação às nossas embarcações,cujos cascos eram de madeira, decidiu desfe-char o seu ataque, visando interromper aobstrução imposta, sendo travado um com-bate decisivo para ambos os contendores.

Graças às suas coragem, iniciativa eperspicácia, o Almirante Barroso conseguiucontrapor-se à investida do oponente, in-fringindo-lhe pesadas baixas e obrigando-o a bater em retirada. Na luta sangrenta ecruel, evidenciaram-se diversos atos debravura e de amor à Pátria, inclusive com osacrifício da própria vida, como aconteceucom o Guarda-Marinha Greenhalgh e o Im-perial Marinheiro Marcílio Dias.

Hoje, cabe-nos relembrar as passagensvalorosas de Riachuelo, reafirmando a cren-ça e o compromisso com os exemplos quenos foram legados por aqueles que, há 146anos, lutaram, com suprema dedicação, pelaintegridade territorial.

Na atualidade, a conjuntura geopolíticamudou, e a Marinha vem acompanhando

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

as transformações, estando comprometidacom os anseios de uma nação moderna esignificativamente mais atuante no cenáriointernacional, o que tem exigido de seupessoal a mesma motivação e adaptabili-dade dos marinheiros daquela época, que,apesar de não disporem de meios adequa-dos, lograram superar os óbices que seapresentaram.

Se as distâncias físicas entre os paísespermanecem inalteradas, o mesmo não sepode afirmar acerca da maior interconecti-vidade de seus povos, fato extremamentecontemporâneo. Para atuar nesse novoambiente, a nossa instituição vem se de-senvolvendo, revendo paradigmas e crian-do outros; contudo, sem se esquecer dosensinamentos do passado, que represen-tam o arcabouço do que somos e que indi-cam a trajetória que devemos seguir paraatingir o que pretendemos ser.

A Marinha do presente continua empe-nhada em sempre se aproximar da socieda-de, enfatizando as potencialidades e as ri-quezas das nossas águas jurisdicionais emostrando a necessidade de dispor de umaForça Naval atualizada, equilibrada e ba-lanceada, de porte compatível com suasresponsabilidades constitucionais, queesteja à altura da estatura do País e sejacapaz de garantir os seus interesses naconhecida “Amazônia Azul”.

O Brasil vem desempenhando um papelrelevante no mundo. Temos recursos mi-nerais abundantes, diversos deles locali-zados na Plataforma Continental e algunscom significativo valor estratégico; pos-suímos condições climáticas favoráveis àprodução de alimentos; e detemos gran-des reservas de água potável. Isso nos levaa visualizar um futuro promissor, aliando

desenvolvimento econômico com preser-vação ambiental, garantindo a melhoria dascondições sociais das pessoas e investin-do em independência científico-tecnoló-gica. Por outro lado, não podemos descar-tar a possibilidade de surgirem movimen-tos espúrios, contrários à consecução des-sa destinação nacional. Daí a importânciade contarmos com um Poder Naval que,efetivamente, contribua para a dissuasão epara a garantia da soberania.

Dentro desse enfoque, cabe-me ressal-tar que o Programa de Desenvolvimentode Submarinos (Prosub) já é uma realida-de, tendo a construção do primeiro delessido iniciada em 2010, além das obras daUnidade de Fabricação de Estruturas Me-tálicas, da Base e do Estaleiro, em Itaguaí,estarem em pleno andamento e cumprindoo cronograma estabelecido, o que permiteantever que, em alguns poucos anos, fare-mos parte do seleto grupo das cinco na-ções capazes de construir e operar subma-rinos com propulsão nuclear.

Meus comandados!No momento em que comemoramos a

nossa Data Magna, devemos relembrar aslições que nos foram transmitidas pelosheróis de Riachuelo e somar esforços nosentido de alcançarmos a Marinha que oBrasil necessita e que tanto desejamos.

Por fim, ao hastearmos os sinais de Bar-roso nos mastros dos navios e das Organi-zações Militares em terra, devemos exaltar amemória daqueles que defenderam a Pátriaem 11 de junho de 1865 e que, assim comoos marinheiros de hoje, viram nos desafiosnão obstáculos, mas motivação para conti-nuarem seguindo sempre adiante.”

(Fontes: Bonos Especiais nos 409 e 410,de 9 de junho de 2011)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

A Marinha comemorou, em 5de abril último, o cinquentenárioda Comunicação Social. A ceri-mônia ocorreu no prédio sede doComando da Marinha, em Brasília(DF). O evento foi presidido pelocomandante da Marinha, Almi-rante de Esquadra Julio Soaresde Moura Neto.

Na solenidade, foram homena-geados ex-diretores do Serviço deRelações Públicas da Marinha(SRPM) e do Centro de Comuni-cação Social da Marinha(CCSM). Entre eles estavam oAlmirante de Esquadra KleberLuciano de Assis, Contra-Almirante Cláu-dio Portugal de Viveiros, Contra-AlmiranteJosé Aloysio de Melo Pinto, Capitão de

COMUNICAÇÃO SOCIAL NA MARINHA COMPLETA 50 ANOS

Mar e Guerra (Refo) José Paulo MachadoChagas, Capitão de Mar e Guerra (Refo) ErvêNogueira e Capitão de Mar e Guerra (Refo)

Luiz Francisco Nunes de Souza.Por ocasião da comemoração dos 50

anos, foram lançados um selo comemo-rativo e um livro sobre a trajetória da Co-municação Social na Marinha. De acor-do com o comandante da Marinha, a Co-municação Social evoluiu, mas as metasainda são as mesmas: “Divulgar a impor-tância do mar, a importância da Marinhae fazer com que a sociedade entenda aimportância da nossa Força”, disse.

Em 1961, era criado o SRPM, integra-do à estrutura organizacional do Gabi-nete do Ministro da Marinha. Ao longodesse tempo, geraram-se maiores respon-sabilidades e foram ampliadas as atribui-ções do então SRPM, culminando com aalteração de sua denominação para Cen-tro de Comunicação Social da Marinha.Hoje, o CCSM possui uma vasta diversi-dade de produtos e serviços que têm opropósito de divulgar a Marinha para asociedade.

(Fonte: www.mar.mil.br)Livro comemorativo

Selo comemorativo

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Foi comemorado, em 29 de maio último, oDia Internacional dos Mantenedores da Pazdas Nações Unidas – ONU (Peacekeepers).O ministro de Estado da Defesa, NelsonJobim, e o comandante de Operações Na-vais, Almirante de Esquadra João AfonsoPrado Maia de Faria, expediram Ordens doDia alusivas à data.

ORDEM DO DIA DO MINISTRO DADEFESA

“Neste dia, prestamos homenagem aoshomens e mulheres que participam de ope-rações de paz da ONU em todo o mundo enos recordamos com gratidão de seus sa-crifícios – que incluem muitas vezes a en-trega da própria vida a serviço da paz.

Tropas da ONU têm salvado inúmerasvidas e produzido resultados tangíveis.Muitos países estão hoje em situação maisestável por causa de seus esforços, inclu-indo Namíbia, El Salvador, Moçambique eAngola, entre outros.

Hoje, a manutenção da paz das NaçõesUnidas está sob grande pressão devido aoaumento do volume e da complexidade dasoperações em todo o globo. Nos últimosanos, a ONU criou novas missões em rápidasucessão, o que aumentou não somente ademanda por tropas bem equipadas e trei-nadas, mas também por policiais qualifica-dos. Cerca de 124 mil soldados de 115 paí-ses estão atualmente servindo em mais deuma dezena de missões ao redor do mundo.

Para aumentar a eficácia das missões depaz, estamos trabalhando para assegurar queos mandatos de manutenção da paz sejamcredíveis e exequíveis. A liderança das mis-sões precisa ser forte e estar amplamenterespaldada do ponto de vista político. Damesma forma, a construção da paz apresen-ta-se como crucial para o sucesso das estra-

DIA INTERNACIONAL DOS MANTENEDORES DA PAZ

tégias de saída das crises que suscitaram acriação das missões de paz.

A Missão de Estabilização da ONU noHaiti (Minustah) é um exemplo do quepode ser feito por meio da solidariedadeinternacional. O Brasil, ao liderar essa mis-são, afirma de modo inequívoco sua voca-ção para o altruísmo e o avanço dos valo-res humanistas.

Tragicamente, as Nações Unidas sofre-ram ano passado o maior número de baixasem uma missão de paz, quando 96 solda-dos da Minustah morreram no terremotode 12 de janeiro no Haiti. Neles estão inclu-ídos vários heroicos brasileiros.

Quando nos lembramos desses indiví-duos e honramos as suas memórias,comprometemo-nos a apoiar continuamen-te os milhares de soldados e policiais mo-bilizados em todo o mundo, responsáveispor garantir que milhões de inocentes te-nham suas vidas preservadas da barbárieda violência.

Para os capacetes azuis da ONU desdo-brados em torno do mundo, e em especialpara os oficiais e praças das Forças Armadasbrasileiras que ora servem em missões de paz,registre-se aqui o meu muito obrigado pelasua dedicação, profissionalismo e coragem.O mundo, em geral, e o Brasil, em particular,estão orgulhosos do trabalho que desenvol-vem em prol da proteção de nossos irmãosmais vulneráveis e da construção de um mun-do fraterno, justo e equilibrado.”

ORDEM DO DIA DO COMANDANTEDE OPERAÇÕES NAVAIS

“Após o término da Segunda GuerraMundial, os países aliados, preocupadosem evitar que conflitos como aquele se re-petissem e buscando a manutenção da paze a segurança internacional, fundaram a

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Organização das Nações Unidas (ONU),que nasceu oficialmente em 24 de outubrode 1945, data de promulgação da Carta dasNações Unidas, assinada na época por 51países, entre eles, o Brasil.

Por intermédio do Departamento deOperações da Paz (DPKO), ocorre o em-prego das forças militares, os capacetesazuis, com vistas à manutenção ou aorestabelecimento da paz e da segurançainternacionais.

A data de 29 de maio foi instituída comosendo o “Dia Internacional dos Mantenedoresda Paz das Nações Unidas”, como reconheci-mento aos militares que, voluntariamente, dei-xam seus lares e suas pátrias imbuídos em le-var alento e esperança a outros povos, a fimde restabelecer a paz nos mais longínquospaíses, marcados por conflitos e tragédias.

A Marinha do Brasil tem desempenhadopapel relevante nas operações de paz quan-do da participação brasileira. O atualposicionamento do Brasil no cenário inter-nacional faz crescer a probabilidade de no-vas atuações de militares de nossa Marinhanessas operações, quer como observadoresmilitares (UNMO), comandantes de Forçasou compondo seus estados-maiores, inte-grantes de contingentes de tropa ou, ainda,desenvolvendo ações humanitárias. Destaforma, avultam de importância o contínuoaperfeiçoamento instrucional, além da aqui-sição e da manutenção de meios, o que ga-rantirá o aprestamento para essas operações.

O primeiro registro da participação doBrasil em organismos voltados para a ma-nutenção da paz data de 1933, quando, ain-da sob a égide da Liga das Nações, foi re-presentado por um oficial da Marinha emuma comissão para mediar um litígio, entrea Colômbia e o Peru, na região de Letícia.

Atualmente, destaco a atuação da Ma-rinha do Brasil com a participação de mili-tares atuando como observadores milita-res da ONU no Timor Leste (Unmiset),

Saara Ocidental, Sudão e Costa do Marfim,além de militares na Missão de Assistênciaà Remoção de Minas na América do Sul(Marminas), na fronteira entre o Equador eo Peru, e a Missão de Grupo de MonitoresInternacionais (GMI), na Colômbia, essasduas últimas missões, subordinadas à Or-ganização dos Estados Americanos (OEA).No Haiti, onde o Brasil e a Marinha do Bra-sil concentram os seus maiores esforçosem operações de paz, encontra-se ativado,desde 2004, um Grupamento Operativo deFuzileiros Navais, integrando a Missão dasNações Unidas para Estabilização do Haiti(Minustah).

Somando-se a esses esforços, no dia 24de fevereiro próximo passado, a Marinha doBrasil assumiu o comando da Força TarefaMarítima (MTF) da Força Interina das Na-ções Unidas no Líbano (Unifil), primeirocomando no mar em missões de paz da ONU.A MFT tem a missão de patrulhar as águasjurisdicionais do Líbano e é composta denavios de diversas nacionalidades, servin-do como reconhecimento da competênciada Marinha do Brasil e fazendo aumentar,ainda mais, a responsabilidade de nosso Paísperante as Nações Unidas.

Acrescem-se a estes esforços o apoiologístico às tropas de fuzileiros navais edo Exército Brasileiro, desdobradas noHaiti, e o transporte de itens de ajuda hu-manitária, empregando meios navais eaeronavais.

Em todas essas operações, nossos ma-rinheiros e fuzileiros navais, em nome damanutenção da paz, vêm cumprindo comabnegação todas as missões recebidas. Oexcelente preparo profissional, aliado aoequilíbrio emocional e ao espírito de cor-po, faz com que nossos militares desfru-tem do respeito e do reconhecimento dospovos ajudados e da admiração dos repre-sentantes de outros países, contribuindopara ampliar o prestígio do Brasil e de nos-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

sa Marinha perante a sociedade brasileirae a comunidade internacional.

Por todos esses motivos, parabenizo osmantenedores da paz de todos os temposda Marinha do Brasil, e exorto aqueles queainda contribuirão com a paz mundial a

manterem o legado de desprendimento eprofissionalismo no desempenho das mis-sões de paz das Nações Unidas.

Bravo Zulu! Adsumus! Viva a Marinha!”(Fontes: Bonos especiais nos 377 e 378,

de 27/5/2011)

O Farol de Abrolhos, localizado na Ilhade Santa Bárbara, a maior do Arquipélagode Abrolhos (BA), completou, em 8 de maioúltimo, 150 anos de instalação. O Farol foiinstalado no ano de 1861, por ordem de D.Pedro II, com o propósito de tornar seguraa navegação das embarcações que faziama rota marítima entre Salvador e os portosdo sul do País, tendo em vista o grandeperigo que era navegar naquela região.Desde então, tornou-se o sinal náutico maisimportante do sul da Bahia, fazendo comque o número de acidentes náuticos na re-gião caísse a quase zero.

O nome Abrolhos decorre do termo “abraos olhos”, utilizado pelos navegantes dopassado devido à grande quantidade de pe-rigos submersos. Confeccionado pela fábri-ca de faróis francesa Barbier, Bernard &Turenne e construído pelos irmãos Miers e

FAROL DE ABROLHOS COMPLETA 150 ANOS

Vista do Farol de Abrolhos ao entardecer

Maylor, o Farol de Abrolhos possui umatorre de ferro fundido sobre a rocha, cujofoco luminoso encontra-se a 60 metros donível do mar, podendo ser avistado do con-tinente. Atualmente, é classificado interna-cionalmente como radiofarol, ou seja, alémdos lampejos luminosos que o caracterizamcomo farol, possui também equipamentoseletrônicos modernos (DGPS, Racon e NDB),que permitem aos navegantes de grandesembarcações o posicionamento pelo méto-do eletrônico.

Em comemoração à data, o Comando do2o Distrito Naval (Salvador-BA), por meiodo Serviço de Sinalização Náutica do Leste,programou atividades que, além de marca-rem festivamente os 150 anos do Farol, vi-saram chamar a atenção da população so-bre a importância dos faróis brasileiros paraa segurança da navegação e para a Amazô-

nia Azul. Assim, foi ins-talada uma placa alusi-va à data na torre do Fa-rol de Abrolhos. Alémdisso, os faróis GarciaD’Ávila (localizado naPraia do Forte, municí-pio de Mata de SãoJoão) e da Barra (Salva-dor) foram abertos àvisitação pública e abri-garam a exposição “Lu-zes da Amazônia Azul”,contendo peças histó-ricas de faróis.(Fonte: www.mar.mil.br)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

É da Marinha do Brasil o primeiro militarbrasileiro a receber a Medalha da Força Inte-rina das Nações Unidas no Líbano (Unifil). Ooficial de Operações Marítimas do Estado-Maior da Força, Capitão de Mar e Guerra Gil-berto Santos Kerr, foi agraciado pelo coman-dante da Força, Major-General Alberto AsartaCuevas, em cerimônia realizada em 18 de mar-ço último, no Quartel-General da Missão emNaqoura, no Líbano.

A medalha é concedida a militares dediversos países que prestam serviços àmissão por um período superior a 90 dias.A cerimônia de entrega ocorreu em come-moração ao 33o aniversário de estabeleci-mento da Unifil.

A Força Interina das Nações Unidas noLíbano foi estabelecida para confirmar aretirada das forças israelenses do sul do

OFICIAL DE MARINHA É O PRIMEIROMILITAR BRASILEIRO A RECEBER MEDALHA DA UNIFIL

CMG Gilberto Santos Kerr (D) recebendo amedalha da Unifil

Cerimônia em comemoração ao 33o aniversá-rio de estabelecimento da Unifil

Líbano, devolver a paz e a segurança inter-nacional e assistir o Governo libanês naretomada da sua autoridade na região. Em2006, após a 2a Guerra do Líbano, a Unifilteve seu mandato ampliado e foi reforçadapor novos contingentes. Atualmente, con-ta com cerca de 13 mil militares de 35 paí-ses, posicionados no sul do país, entre oRio Litani e a fronteira com Israel e ao lon-go do litoral.

A Unifil foi a primeira missão de paz daOrganização das Nações Unidas (ONU) acontar com uma parcela de caráter naval deque o Brasil participa. A Força-Tarefa Ma-rítima (MTF, da sigla em inglês) é compos-ta por 800 militares de 33 países, conta comoito navios e é comandada, desde 24 defevereiro de 2011, pelo contra-almirantebrasileiro Luiz Henrique Caroli.

(Fonte: www.mar.mil.br)

INAUGURADOS NÚCLEOS DO ESCRITÓRIO DE CIÊNCIA,TECNOLOGIA E INOVAÇÃO DA MARINHA

JUNTO A UNIVERSIDADES

Foram inaugurados, em março último, oNúcleo do Escritório de Ciência,Tecnologia e Inovação da Marinha junto àUniversidade Federal Fluminense

(NucEscCTI-MB/UFF), na Escola de En-genharia daquela universidade, e o junto àUniversidade Federal do Rio de Janeiro(NucEscCTI-MB/UFRJ).

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Secretário de Ciência, Tecnologia e Inovação daMarinha, Vice-Almirante Ilques, cumprimentao reitor da Universidade Federal Fluminense,

Professor Roberto de Souza Salles

Vice-Almirante Ilques assina o acordo com aUniversidade Federal Fluminense

O Núcleo junto à UFF é subordinado aoCentro de Análises de Sistemas Navais(Casnav) e tem o propósito de fortalecer ointercâmbio tecnológico e científico entre auniversidade e a Marinha e a cooperaçãoem pesquisas e prospecção tecnológica. Nainauguração, que contou com um públicode aproximadamente 200 pessoas, foi tam-bém assinado um Acordo de CooperaçãoAcadêmica, Técnica e Científica entre a Se-cretaria de Ciência, Tecnologia e Inovaçãoda Marinha (SecCTM) e a Universidade, oqual norteará essa parceria estratégica e asatividades do NucEscCTI-MB/UFF.

Para o secretário Municipal de Ciênciae Tecnologia de Niterói, Professor JoséRaimundo Martins Romeo, que abriu oevento, a iniciativa “abre caminhos para oprogresso econômico e social”. O presi-dente do Conselho Acadêmico do Núcleode Estudos Estratégicos da UFF, Almiran-te de Esquadra (RM1) Mauro CésarRodrigues Pereira, enfatizou a importânciade parcerias entre as Forças Armadas e aárea acadêmica. “Devemos estruturar esserelacionamento, criando capacidade inte-lectual para solucionar as mazelas brasilei-ras. Assim, trabalhamos pela independên-cia e a soberania do nosso país”.

O reitor da UFF, Professor Roberto deSouza Salles, falou sobre o aumento donúmero de professores e pesquisadores noquadro da universidade, o que proporcio-na aumento do número de seus cursos ealunos. “Tecnologia não funciona sem pes-soas. Só podemos crescer se investirmosem capacitação”, declarou.

Para o secretário de Ciência, Tecnologia eInovação da Marinha, Vice-Almirante IlquesBarbosa Junior, que encerrou a cerimônia, asingularidade político-estratégica do País estábaseada nos pilares Educação, Ciência,Tecnologia e Inovação. “Para a gestão doconhecimento, é fundamental a formação deparcerias estratégicas como essa”, concluiu.

A cerimônia contou, ainda, com a presen-ça, na mesa de abertura, do diretor do Centrode Análises de Sistemas Navais (Casnav),Contra-Almirante Antonio Reginaldo PontesLima Junior; do vice-reitor da UFF, ProfessorSidney Luiz de Matos Mello; do chefe doDepartamento de Fomento, Análise e Acom-panhamento Técnico da Financiadora de Es-

Desenlace da fita de inauguração do escritório

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Da esq. para a dir. Professor Osvaldo Galvão,Contra-Almirante (EN) Maurillo (IPqM),Professor Aquilino Senra (Coppe UFRJ),

Vice-Almirante Ilques Barbosa (SecCTM),Professor Segen Estefen (Coppe UFRJ) e Dr.

André Cabral (Finep)

Representantes da Marinha e da UFRJassinam o Acordo de Cooperação Técnica e

Acadêmica

tudos e Projetos (Finep), André Cabral deSouza; do diretor de Engenharia da UFF,Hermano José Oliveira Cavalcanti; do ex-rei-tor da UFF Luiz Pedro Antunes; e do diretorda Escola de Engenharia da UFF, Miguel LuizRibeiro Ferreira.

Dentre os projetos em andamento está odesenvolvimento de um simulador de pas-sadiço para treinamento das manobras dosnavios. Esse trabalho visa à redução de cus-tos durante o treinamento, à otimização dacapacitação de profissionais e à diminuiçãodo risco de possíveis incidentes.

Já o Núcleo junto à UFRJ foi inauguradocom a interveniência da Fundação Coorde-nação de Projetos, Pesquisas e EstudosTecnológicos (Coppetec), no Centro de Ges-tão Tecnológica (CGTEC-CT2) da CidadeUniversitária. Este núcleo ficará subordina-do ao Instituto de Pesquisas da Marinha(IPqM) e tem o mesmo propósito que o daUFF. Foi assinado acordo acadêmico com aUFRJ/Coppetec, que norteará as atividadesdo NucEscCTI-MB/UFRJ/Coppetec.

Ambas as parcerias têm como propósi-to conferir maiores eficácia e efetividade àgestão pública, visando à união de esfor-ços para prestação de apoio mútuo às ati-

vidades de pesquisa, prospecçãotecnológica, como também parcerias embolsas de estudos, projetos de interessescomuns e estudos técnicos. Os dois nú-cleos ampliam a capacidade da Marinha doBrasil no desenvolvimento de seus proje-tos de Ciência, Tecnolocia e Inovação(CT&I), assim como nas atividades de re-cebimento de tecnologias (offset).

Durante a celebração do Acordo entreas duas instituições, compuseram a mesa asseguintes autoridades: vice-diretor do Ins-tituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-gradua-ção e Pesquisa de Engenharia, Professor Dr.Aquilino Senra Martinez; secretário de Ci-ência, Tecnologia e Inovação da Marinha,Vice-Almirante Ilques Barbosa Junior; dire-tor de Tecnologia e Inovação do InstitutoAlberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação ePesquisa de Engenharia, Professor Dr. SegenFarid Estefen; diretor do Instituto de Pes-quisas da Marinha, Contra-Almirante (EN)Maurillo Euclides Ferreira da Silva; e o che-fe do Departamento de Fomento, Análise eAcompanhamento Técnico da Financiadorade Estudos e Projetos (Finep), Dr. AndréCabral de Souza, representando o diretor deDesenvolvimento Científico e Tecnológicoda Finep.

(Fontes: Bonos no 193, de 18/3/2011, e208, de 24/3/2011)

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

– Contra-Almirante Paulo RicardoMédici, chefe do Estado-Maior da Esqua-dra, em 31/3;

– Contra-Almirante Rodolfo Henriquede Saboia, coordenador do Programa deReaparelhamento da Marinha, em 1/4;

– Contra-Almirante Alípio JorgeRodrigues da Silva, coordenador da Ma-nutenção de Meios, em 1/4;

– Contra-Almirante Afrânio de PaivaMoreira Junior, comandante da Força deSubmarinos, em 6/4;

– Contra-Almirante Flávio SoaresFerreira, subchefe de Estratégia do Esta-do-Maior da Armada, em 6/4;

– Vice-Almirante José GeraldoFernandes Nunes, diretor de Comunica-ções e Tecnologia de Informação da Mari-nha, em 8/4;

– Contra-Almirante (Md) José Luiz deMedeiros Amarante Junior, diretor doCentro Médico Assistencial da Marinha,em 8/4;

– Contra-Almirante Carlos FredericoCarneiro Primo, chefe de Estado-Maior doComando do 1o Distrito Naval, em 11/4;

– Contra-Almirante Marcio Ferreira deMello, comandante do 6o Distrito Naval,em 13/4;

ASSUNÇÃO DE CARGOS POR ALMIRANTES

– Vice-Almirante Antonio Carlos FradeCarneiro, comandante do 9o Distrito Naval,em 15/4;

– Contra-Almirante Carlos AlbertoMatias, secretário de Acompanhamento eEstudos Institucionais do Gabinete de Se-gurança Institucional da Presidência daRepública, em 15/4;

– Contra-Almirante Cid Augusto ClaroJunior, subchefe de Operações doComOpNav, em 20/4;

– Contra-Almirante (Md) Edmar da CruzArêas, diretor do Centro de MedicinaOperativa da Marinha, em 26/4;

– Contra-Almirante Edlander Santos,subchefe de Organização e Assuntos Ma-rítimos do ComOpNav, em 27/4;

– Vice-Almirante Luiz Guilherme Sá deGusmão, comandante do 8o Distrito Naval,em 28/4;

– Contra-Almirante Domingos SávioAlmeida Nogueira, comandante da Forçade Superfície, em 28/4;

– Contra-Almirante Carlos Augusto deMoura Resende, comandante da 1a Divi-são da Esquadra, em 28/4;

– Vice-Almirante Arnaldo de MesquitaBittencourt Filho, diretor de Obras Civisda Marinha, em 3/5.

O Comando de Operações Navais(ComOpNav) divulgou, em março último, aclassificação (com o total de pontos) obti-da pelos Navios de Socorro Distritais noano de 2010, até o 25o colocado, relativa aoprêmio Navio de Socorro do Ano.

Destacaram-se os seguintes navios:– 1o lugar: Navio-Patrulha (NPa) Graúna

(303,8 pontos);– 2o lugar: NPa Gurupá (271,1 pontos);

NAVIO DE SOCORRO DO ANO

– 3o lugar: Rebocador de Alto-Mar(RbAM) Tritão (256,4 pontos);

– 4o lugar: NPa Guaíba (250,9 pontos); e– 5o lugar: NPa Guaratuba (235,6

pontos).Os Navios de Socorro Distritais do Ano

por Área de Jurisdição SAR (Busca e Sal-vamento) foram:

– RbAM Tritão (Salvamar Sul – 256,4pontos);

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

– RbAM Almirante Guilhem (SalvamarNorte – 143,7 pontos);

– NPa Gurupá (Salvamar Sueste – 271,1pontos);

– NPa Graúna(Salvamar Nordeste –303,8 pontos);

– NPa Guaratuba(Salvamar Leste – 235,6pontos);

– Navio-PatrulhaFluvial (NPaFlu)Roraima (Salvamar Noroeste – 166,0 pon-tos); e

– NPa Piratini (Salvamar Oeste – 111,0pontos).

O prêmio de Navio de Socorro do Ano éconcedido anualmente ao navio que totalizao maior número de pontos entre os naviosde socorro e salvamento da Marinha do Bra-

sil, e o prêmio de Naviode Socorro Distrital aoque totalizar o maiornúmero de pontos en-tre os navios de socor-ro e salvamento da áreade Serviço de Busca eSalvamento (SAR), as-

sociada a cada Serviço de Busca e Salva-mento da Marinha (Salvamar) distrital.

(Fonte: Bono Especial no 197, de21/3/2011)

NPa Graúna

Foi realizada, em 31 de março último, nasede do Comando do 8o Distrito Naval (SãoPaulo-SP), a entrega do prêmio OperaçãoCisne Branco 2010, em âmbito nacional. Aaluna Wendy Livramento, da Escola Esta-dual Visconde de Itaúna, sagrou-se vence-dora do Ensino Médio. O prêmio foi um

PREMIAÇÃO NACIONAL DA OPERAÇÃO“CISNE BRANCO” 2010

laptop ofertado pela Poupex e entreguepelo comandante do 8o DN, Vice-AlmiranteArnaldo de Mesquita Bittencourt Filho, epelo representante da Poupex em São Pau-lo, Coronel Aizcorbe.

A vencedora destacou a importância doprêmio: “A minha felicidade foi grande ao

saber que recebi pela segunda vezo prêmio estadual, mas não imagi-nava que seria escolhida a nível na-cional. É uma sensação inexplicável,que em palavras não tenho comodescrever. Simplesmente maravilho-so! Agradeço e apoio iniciativascomo esta, pois incentivam as pes-soas a participarem não somentepelos prêmios, mas pelo prazer deconhecer e desenvolver determina-dos assuntos. Aproveitando o en-sejo, quero dizer que o Navio-Velei-ro Cisne Branco é esplêndido. Aminha viagem foi incrível”.

(Fonte: www.mar.mil.br)Aluna Wendy Livramento recebe um laptop das

mãos do Vice-Almirante Bittencourt

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Foram promovidos por decreto presi-dencial, contando antiguidade a partir de31 de março de 2011, os seguintes oficiais:

– no Corpo da Armada: ao posto deContra-Almirante, os Capitães de Mar eGuerra Flávio Soares Ferreira, Carlos

PROMOÇÃO DE ALMIRANTESFrederico Carneiro Primo e Cid AugustoClaro Junior;

– no Corpo de Saúde da Marinha: aoposto de Contra-Almirante (Md), o Capi-tão de Mar e Guerra (Md) Edmar da CruzArêas.

O Aviso de Patrulha (AviPa) Anequim foitransferido para o Setor Operativo da Mari-nha do Brasil (MB) em 26 de maio último. ACerimônia de Recebimento, Batismo e Trans-ferência do navio foi realizada no píer do MarinaPark Hotel, Praia de Iracema, Fortaleza (CE), epresidida pelo diretor-geral do Material daMarinha (DGMM), Almirante de EsquadraArthur Pires Ramos. Também estiveram pre-sentes o diretor-presidente da EmpresaGerencial de Projetos Navais (Emgepron), Vice-Almirante (RM1) Marcelio Carmo de CastroPereira; o comandante do 3o Distrito Naval,Vice-Almirante Airton Teixeira Pinho Filho; e odiretor-presidente do Estaleiro Inace (Indús-tria Naval do Ceará), onde o navio foi cons-

AviPa ANEQUIM É TRANSFERIDO PARA O SETOROPERATIVO DA MARINHA

truído, Antônio Gil Fernandes Bezerra, alémde outras autoridades civis e militares.

A seguir, transcrevemos a Ordem do Diado DGMM relativa ao evento:

“Em cumprimento às tradições navais,finalizada a edificação de um navio, é reali-zada marcante cerimônia em que o meio ébatizado por uma madrinha e recebe seunome oficial, costume simbolizado com aquebra em seu costado de uma garrafad’água ou de licor, que representa sorte àvida do navio. Em seguida é lançado ao mar.

Na Marinha do Brasil, o passo seguinteao batismo é a incorporação, quando pelaprimeira vez é hasteado o Pavilhão Nacio-nal a bordo. A partir deste momento, sua

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

trajetória passará a ser registrada em livropróprio, onde serão lançados os dados re-levantes e de interesse da vida de bordo.Em tempos passados, tais registros termi-navam com a frase “Deus nos guie”.

O batismo do Aviso de Patrulha Anequim,respeitoso cumprimento às tradições navais,se reveste de especial significado, pois con-solida os frutos de uma longa e exitosa parce-ria da Marinha, intermediada pela EmpresaGerencial de Projetos Navais (Emgepron), como Estaleiro Inace. O sucesso dessa parceria,calcada na capacidade técnica e profissionaldo estaleiro e nos laços de amizade e confian-ça entre as duas instituições, foi comprovadopelos projetos já entregues, entre os quais doisnavios-patrulha de 500 toneladas.

Os avisos de patrulha são embarcaçõesrápidas e com autonomia superior à daslanchas que hoje a Marinha emprega nascapitanias, delegacias e agências. O Avisode Patrulha Anequim, após a sua incorpo-ração, irá se unir aos meios do Comandodo Grupamento de Patrulha Naval do Nor-deste para ser empregado em tarefas depatrulha e inspeção naval, em águas sob

jurisdição nacional, devendo também serutilizado em manobras de reboque de em-barcações de porte semelhante, além derealizar fainas de busca e salvamento (SAR),dar apoio a operações de mergulho livre eautônomo e outras tarefas subsidiárias.

Nesta ocasião em que entrego o Avisode Patrulha Anequim ao Comando do 3o

Distrito Naval, não poderia deixar de regis-trar os meus sinceros cumprimentos aoInace, à Emgepron e às DiretoriasEspecializadas, participantes ativas no pro-cesso de acabamento desse meio, bemcomo aos operários, homens e mulheresque tornaram este sonho uma realidade.

Aviso de Patrulha Anequim, que seja rá-pido, forte e que tenha o seu valor reconhe-cido, tal qual o tubarão que lhe dá o nome, eque Deus permita, doravante, executar suastarefas com eficácia, profissionalismo, ver-satilidade e confiança.

Finalmente, rogo ao Senhor dosNavegantes que lhe conceda bons ventose mares tranquilos em sua singradura!”

(Fontes: Bonos nos 364, de 23/5/11, e 374,de 26/5/11)

NAVANTIA FEZ PROPOSTA À MARINHAPARA CONSTRUÇÃO DE 11 NAVIOS

O estaleiro espanhol Navantiafez oferta à Marinha do Brasil (MB),que consiste em um navio de apoioAOR (petroleiro de reabastecimen-to), cinco fragatas e cinco navios-patrulha. As necessidades brasilei-ras serão adaptadas aos projetosjá comprovados do AOR Cantabria,fragatas F-100 e patrulhas BVL.Esta proposta foi apresentada aogoverno do Brasil pouco antes dafeira de Defesa Laad 2011, realiza-da no Rio de Janeiro em abril últi-mo, na qual a empresa espanholaesteve presente.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

A proposta inclui também mecanismosde cooperação entre os dois países. Em fe-vereiro último, uma delegação da Marinhado Brasil pôde conhecer de perto o potenci-

al dos navios da Navantia, por ocasião dolançamento dos navios anfíbios Canberra eJuan Carlos I e de uma fragata F100.

(Fonte: www.naval.com.br)

No período de 6 a 15 de abril, os Navios-Patrulha (NPa) Guaíba e Graúna prestaramapoio ao Arquipélago de São Pedro e SãoPaulo. Na primeira fase, o Guaíba transpor-tou pessoal e material para o arquipélago.Na segunda fase, o Graúna efetuou o trans-porte do pessoal para Natal (RN).

Fizeram parte da comissão seis militaresda Base Naval de Natal incumbidos de rea-lizar obras de manutenção nas instalaçõesda Estação Científica do arquipélago, umtécnico da Embratel, que efetuou a manu-tenção dos sistemas de comunicações, eum professor da Universidade Federal do

NAVIOS-PATRULHA GUAÍBA E GRAÚNA APOIAMSÃO PEDRO E SÃO PAULO

Estação Científica do Arquipélago deSão Pedro e São Paulo

Rio Grande do Norte, encarre-gado da instalação de um sis-mógrafo, com o propósito demonitorar a atividade sísmicano arquipélago e adjacências.

O Arquipélago de São Pedroe São Paulo é um conjunto depequenas ilhas rochosas comárea total emersa de cerca de 17mil m², localizado a cerca de milquilômetros de Natal.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Na manhã do dia 15 de abril último, umaaeronave do 5o Esquadrão de Helicópterosda Marinha resgatou um tripulante do bar-co pesqueiro Dom Manoel III, localizado a50 milhas náuticas a sudeste de Rio Gran-

MARINHA RESGATA TRIPULANTE DE BARCO PESQUEIRONO RIO GRANDE DO SUL

de (RS). Ele sofria convulsões e teve umataque cardíaco.

O estado do mar e o tipo da embarcaçãode pequeno porte dificultaram o resgate. Omédico só pôde ser arriado ao barco após a

Navio-Patrulha Guaíba nas proximidadesdo Arquipélago de São Pedro e São Paulo

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Paciente sendo conduzido para o hospitalVista aérea do barco pesqueiro Dom Manoel III

diminuição da velocidade deste, que se tor-nou mais estável. Em seguida, o tripulantefoi posto na maca, que foi içada para o heli-cóptero. As 11h45, a aeronave da Marinhapousou no aeroporto do Rio Grande e o

doente foi transferido para ambulância doServiço de Atendimento Móvel de Urgên-cia (Samu) e conduzido ao Hospital deCardiologia da Santa Casa do Rio Grande.

(Fonte: www.mar.mil.br)

O Navio-Patrulha (NPa) Bocaina realizou,em 7 de maio último, operação de evacuaçãomédica de uma tripulante do Empurrador JeanFilho 52, que sofreu um Acidente VascularCerebral (AVC). O Bocaina recebeu o pedidode socorro da embarcação durante trânsitono Rio Amazonas. O Jean Filho 52 navega-va com destino a Manaus, na altura da Ilhado Curuá (PA).

Duas lanchas de ação rápida efetuaram oresgate, ainda de madrugada. Em conjuntocom a Delegacia Fluvial de Santarém, o NPaBocaina coordenou o apoio de uma ambu-lância para o resgate da paciente. Em Santarém

NAVIO-PATRULHA BOCAINA REALIZAEVACUAÇÃO MÉDICA NO AMAZONAS

(PA), a tripulante foi levada para o HospitalMunicipal, onde foi medicada.

O Navio-Patrulha Bocaina, subordinadoao Comando do Grupamento de PatrulhaNaval do Norte, unidade operativa do Co-mando do 4o Distrito Naval (Belém-PA), sus-pendeu daquela capital no dia 2 de maio, comdestino a Manaus (AM), fazendo parte deum grupo-tarefa de transporte de tropas epatrulha naval. O grupo, constituído tambémpelo Navio-Auxiliar Pará e pelo Navio-Pa-trulha Pampeiro, realizou a Operação Com-binada Amazônia 2011 até o dia 16 de junho.

(Fonte: www.mar.mil.br)

O Centro de Hidrografia da Marinha(CHM) passou a disponibilizar produtosde previsões oceanográficas de correntese temperaturas da superfície do mar naintranet e na internet, no link “Previsão Nu-

MARINHA AMPLIA CONHECIMENTOS OCEANOGRÁFICOSNA AMAZÔNIA AZUL

mérica”. As previsões são geradas pelaaplicação regional do modelo numéricoHybrid Coordinate Ocean Model (Hycom),com assimilação de dados de altimetria ede temperatura da superfície do mar obti-

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Exemplo de produto disponível

dos por satélite, processado em um com-putador de alto desempenho do CHM. OHycom é um modelo de circulação geral dooceano que resolve equações primitivas dahidrodinâmica deste meio e é empregadoem diversas instituições para fins de pes-quisa e para a previsão oceanográficaoperacional.

O ineditismo dessa aplicação deve-seao fato de, no Hemisfério Sul, somente aAustrália processar algo semelhante coma mesma resolução. No mundo, somenteos Estados Unidos, a França e o Japão pro-

cessam modelos na mesma esca-la. A Inglaterra e a Noruega ro-dam modelos semelhantes, maspara uma resolução menor.

O desenvolvimento dessa apli-cação específica é resultado daparceria interinstitucional entre aMarinha (CHM), Petrobras, Uni-versidade Federal do Rio Grande(Furg), Universidade Federal daBahia (UFBA), Universidade Fe-deral do Rio de Janeiro (UFRJ) eUniversidade de São Paulo (USP),no projeto da Rede de Modela-gem e Observação Oceanográfi-ca (Remo). As simulações são re-alizadas numa grade tridimensio-nal que cobre a área Metarea-V/

Navarea-V, de responsabilidade do Brasil,com resolução espacial horizontal de novequilômetros e 21 níveis verticais, com pre-visões a cada seis horas, para um períodode 90 horas.

Com os dados gerados pela previsãonumérica, é possível ampliar os conheci-mentos das condições oceanográficas emtoda a Amazônia Azul, em apoio às Opera-ções Navais e contribuindo para a segu-rança da navegação e para a pesquisa ci-entífica do ambiente marinho.

(Fonte: Bono no 334, de 10/5/2011)

O navio de bandeira alemã E-Ship 1, oprimeiro de propulsão parcialmente eólica,passou, em janeiro último, por portos doBrasil. A embarcação atracou no porto dePecém, no Ceará, em 12 de janeiro, e seguiuviagem para o porto de Rio Grande (RS),onde atracou no dia 21, tendo desembar-cado pás de aerogeradores que serão usa-das em parques eólicos gaúchos.

PRIMEIRO NAVIO DE PROPULSÃO PARCIALMENTE EÓLICACHEGA A PORTOS DO BRASIL

As energias eólica e motora trabalhamem conjunto para movimentar o navio, ouseja, por meio de motores diesel auxiliadospela força dos ventos, gerando, assim, o queé conhecido como efeito Magnus. Essemecanismo, composto por quatro rotorescom cilindros de 27 metros de altura por 4metros de diâmetro que giram em torno dopróprio eixo em decorrência da ação motora

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e do vento, gera uma eco-nomia de 30 a 40 por centono consumo de combustí-vel, na velocidade de 16 nós.

Antes de retornar ao por-to de Emden, na Alemanha,o E-Ship 1 atracou no portode Santos (SP) no dia 26, paradescarregar material.

(Fonte: Informativo Ma-rítimo da Diretoria de Por-tos e Costas, jan./mar. 2011)

FEMAR APRIMORA APOIO À C&T DA MARINHA

Em decorrência de esforços de diversossetores da Marinha do Brasil (MB), a Fun-dação de Estudos do Mar (Femar) foicredenciada para atuar como Fundação deApoio ao Núcleo de Inovação Tecnológicada Marinha do Brasil (NIT-MB).

O credenciamento para apoio a projetosde pesquisa, ensino, extensão e de desen-volvimento institucional, científico etecnológico de interesse das instituiçõescientíficas e tecnológicas da MB está con-forme a portaria Conjunta no 9 do Ministé-rio da Ciência e Tecnologia (MCT) e Mi-nistério da Educação, publicada no DiárioOficial da União no 79, de 27 de abril último.

Além do mérito dos funcionários daFemar, especialmente da Equipe de Proje-tos da Fundação, a Secretaria de Ciência,Tecnologia e Inovação da Marinha(SecCTM) contribuiu para este fato. Essanova situação permitirá à Femar aprimorarainda mais o apoio ao setor de Ciência eTecnologia da MB, apoiando os projetos

de inovações tecnológicas ligados ao mare às coisas do mar.

Além disso, a Femar também foicredenciada pelo Conselho Nacional de De-senvolvimento Científico e Tecnológico(CNPq) como instituição habilitada a realizarimportações de bens e equipamentos desti-nados à pesquisa científica e tecnológica,com os benefícios previstos na Lei 8.010/90.O credenciamento foi publicado no DiárioOficial da União de 17 de maio de 2011.

O CNPq é uma agência governamental vin-culada ao MCT e que tem como finalidades ofomento da pesquisa científica e tecnológica eo incentivo à formação de pesquisadores.

Este credenciamento, válido por cincoanos, é importante para a Femar por permitiraumentar o seu espectro de atuação, a partirda possibilidade de participar de projetos depesquisa de grande complexidade que de-mandem a utilização de insumos importados.

A Fundação de Estudos do Mar, desde1966, desenvolve, apoia e presta serviços

E-Ship 1, com quatro rotores de 27 metros de altura

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especializados nas áreas de ensino, pes-quisa e extensão.

Para atender a clientes nos segmentosmarítimo e de petróleo, que procuram porsoluções de potência, a multinacionalCaterpillar Inc. produzirá no Brasil gruposgeradores e sistemas de propulsão diesel-elétricos da Série 3500C. As operações paraa fabricação serão iniciadas no terceiro tri-mestre deste ano, na fábrica da Caterpillarem Piracicaba, São Paulo.

“A decisão de expandir a oferta de produ-tos fabricados no Brasil baseia-se na previsãode um crescimento de longo prazo no País. Anecessidade por equipamentos com potênci-as confiáveis para o segmento offshore emaplicações marítimas e de petróleo acompa-nhará o crescimento da exploração das reser-vas de petróleo do Brasil”, disse Richard Case,vice-presidente da Caterpillar.

Os grupos geradores e os sistemas depropulsão diesel-elétricos que serão fabri-cados em Piracicaba terão alto índice de

PRODUÇÃO NACIONAL DE GRUPOS GERADORES PARAOPERAÇÕES MARÍTIMAS E DE PETRÓLEO

nacionalização. E, com a expansão das ope-rações brasileiras, a empresa ampliará oatendimento aos clientes nos crescentesmercados marítimo e de petróleo. Nos últi-mos anos, importantes reservas de petró-leo e gás natural foram descobertas na ca-mada pré-sal da costa brasileira. “Estes pro-dutos são ideais para atender às necessi-dades e exigências de nossos clientes, par-ticularmente agora que o Brasil está inves-tindo nas reservas do pré-sal”, observou opresidente da Caterpillar Brasil, Luiz Calil.

No mercado marítimo, os grupos gera-dores da Série 3500C, para propulsão die-sel-elétrica e geração de energia auxiliar,têm registrado um desempenho recorde nasmais variadas aplicações. São comumenteutilizados em embarcações como reboca-dores, cargueiros e em aplicações offshore.

(Fonte: Press-release da CDI Comuni-cação Corporativa)

A revista Pesquisa Navalpassará, a partir de 2012, a serpatrocinada pela FundaçãoConrado Wessel, de São Pau-lo, uma das mais importantesfundações de apoio ao desen-volvimento da ciência e àtecnologia no Brasil.

FUNDAÇÃO PATROCINARÁ REVISTA PESQUISA NAVAL

A concretização dessa parceria es-tratégica somente foi possível devi-do à importância político-estratégicado Programa de Submarinos e ao re-conhecimento da excelência das ati-vidades de Ciência, Tecnologia e Ino-vação (CT&I) da Marinha do Brasil.

(Fonte: Bono no 300, de 29/4/2011)

(Fontes: Bono no 300, de 29/4/2011, epress-release da Femar)

A indústria naval passa a contar comuma nova solução em lubrificação: doisnovos óleos sintéticos e biodegradáveis,

SOLUÇÃO SUSTENTÁVEL EM LUBRIFICAÇÃOPARA A INDÚSTRIA NAVAL

que não agridem o meio ambiente. Os pro-dutos são da empresa Klüber Lubrication,de origem alemã, especialista global em

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soluções especiais de lubrificação para di-versas atividades industriais.

A linha da empresa para este setor éconhecida pela lubrificação de engrena-gens abertas de guinchos e guindastes comprodutos de alto desempenho, como osóleos minerais Klüberfluid CF-3 e oKlüberplex AG 11-462.

Os novos óleos, Klüberbio RM 2-150 eKlüberbio EG 2-150, têm como um dosprincipais diferenciais o fato de serem ami-

gáveis ao meio ambiente. No caso da in-dústria naval, ressalta que, “conforme otransporte marítimo cresce, aumentam asperdas de óleos causadas por vazamen-tos em razão de desgastes normais, pe-quenos acidentes ou erros de operação, oque representa uma ameaça constante aomeio ambiente”, explica o diretor-geral daKlüber Lubrication South America, Enri-que Garcia.

(Fonte: ADS Assessoria de Comunicações)

Para debater a segurança a e proteção dosportos e da fronteira marítima brasileira, foirealizada, entre 7 e 9 de junho, na cidade doRio de Janeiro, a Conferência Nacional deSegurança e Proteção Marítima (ConMar). Oevento reuniu oficiais da Marinha do Brasil,integrantes de órgãos de segurança (como aPolícia Federal), entidades do setor marítimoe portuário, além de consultores em seguran-ça, executivos da indústria setorial de defesae segurança, acadêmicos e juristas.

Na abertura, o comandante de Opera-ções Navais, Almirantede Esquadra João Afon-so Prado Maia de Faria,falou sobre a importânciada proteção marítima paraa Defesa Nacional. O se-cretário da Comissão Interministerial paraos Recursos do Mar da Marinha (Secirm),Contra-Almirante Marcos José de Carva-lho Ferreira, fez uma explanação sobre aspotencialidades econômicas marítimas dafronteira brasileira pelo mar e a proteçãodos recursos da Amazônia Azul – uma áreaque corresponde à metade do território con-tinental do Brasil, ou seja, 4,5 milhões dequilômetros quadrados, recentemente ain-da mais valorizada a partir das descobertasde jazidas petrolíferas no chamado pré-sal.

CONFERÊNCIA NACIONAL DE SEGURANÇA E PROTEÇÃOMARÍTIMA

Já o gerente de segurança empresarial daPetrobras, Pedro Aramis de Arruda, apresen-tou a visão da empresa sobre a importânciada proteção patrimonial em alto-mar, o inves-timento da empresa em proteção intramuros,a interação com órgãos públicos para articu-lar a defesa e a segurança de bens e pessoase sobre a troca de informações com as auto-ridades, entre outros temas.

Uma atualização sobre o andamento doProjeto Leplac (Levantamento da Platafor-ma Continental, no qual se baseiam os ar-

gumentos brasileirospara o exercício da sobe-rania nacional sobre avasta extensão marítima)e os benefícios e opor-tunidades decorrentes

da ampliação dos limites da plataforma con-tinental também integrou a Conferência efoi conduzida pelo assessor para o Leplacda Diretoria de Hidrografia e Navegação,Contra-Almirante (RM1) Jair Alberto RibasMarques.

A legislação brasileira para assuntosmarítimos; a segurança dos portos e suaimportância para o desenvolvimento doPaís; a regulamentação do tráfegoaquaviário brasileiro; a atuação do Tribu-nal Marítimo; o modelo de inspeção da

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Comissão Nacional de Segurança Públicanos Portos, Terminais e Vias Navegáveis(Conportos) para a declaração de confor-midade e os benefícios reais das auditoriasdas normas de ISPS Code nas instalaçõesportuárias; e a atuação das guardas portu-árias e sua relevância no cenário de Segu-rança Pública Nacional foram outros temaspresentes na agenda do encontro.

Encerrou a Conferência uma sessão es-pecial sobre segurança de portos e aeropor-tos, que incluiu debates sobre o uso detecnologia, treinamento de pessoal e inves-timentos da Infraero. Nessa sessão tambémestiveram presentes convidados represen-tantes da Agência Nacional de Transportes

Aquaviários (Antaq), Polícia Federal e Agên-cia Nacional de Aviação Civil (Anac).

Ainda sobre segurança portuária, des-tacou-se um painel sobre a importância dasGuardas Portuárias no cenário da Seguran-ça Pública Nacional, com a participação dosuperintendente da Guarda Portuária doPorto de Santos, Comandante CelsoSimonetti Trench Junior. Este painel con-tou com a presença do delegado da PolíciaFederal Luiz Carlos de Carvalho Cruz, alémde representantes de outras instituiçõesconvidadas.

(Fonte: Press-release da Assessoria deImprensa da Clarion Events ewww.naval.com.br)

Foi realizado em Macaé (RJ), em 25 demaio último, o 2o Encontro sobre Certifica-ção de Containers Offshore. O evento, pro-movido pela Bureau Veritas, foi criado paraapresentar ao setor as normas de certifi-cação adotadas pela Petrobras.

Representantes da Bureau Veritas, daDiretoria de Portos e Costas (DPC) e da

ENCONTRO SOBRE CERTIFICAÇÃO DE CONTAINERSOFFSHORE

Petrobras apresentaram palestras relativasao tema. Participaram do encontro empresá-rios, executivos, gerentes e profissionais deempresas de diversos segmentos, tais comofabricantes, locadores, usuários e fornece-dores de cabos de aço e acessórios.

(Fonte: Press-release da Máquina PublicRelations)

Nos últimos anos, a sociedade vem se de-parando com uma série de discussões sobreconstrução e expansão de portos na zonacosteira da Mata Atlântica. Esses empreen-dimentos vêm sendo marcados por proces-sos de licenciamento polêmicos em áreas comdestacada relevância socioambiental e voca-ção para o turismo, como em Santa Catarina,São Paulo e Bahia.

A fim de discutir o impacto dessa expan-são portuária, foi realizado, de 20 a 22 de maioúltimo, no Parque Ibirapuera, São Paulo (SP),

VIVA A MATA 2011

o Viva a Mata 2011. Nesta sétima edição doevento, que mostra iniciativas e projetos emprol daquelas áreas, especialistas apresenta-ram, no painel “O que vem com os portos naMata Atlântica?”, três estudos de casos so-bre regiões que podem receber novos portos.

O encontro foi mediado pela biólogaLeandra Gonçalves, coordenadora de cam-panhas do Greenpeace-Brasil, e apresen-tou os seguintes estudos de caso: “Em-preendimentos em São Francisco do Sul eFlorianópolis (SC)”, com o biólogo Fabia-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

no Grecco de Carvalho, do MovimentoBabitonga é Vida; “Expansão do Porto deSão Sebastião (SP)”, com Carlos Nunes,do Instituto Ilha Bela Sustentável; e “Por-to Sul em Ihéus (BA)”, com Rui Rocha, daRede Sul da Bahia Justo e Sustentável.

Durante o encontro, também foi promo-vido o debate “Quem está invadindo suapraia”, que abordou a qualidade ambientaldas praias e discutiu os desafios para ouso ordenado desses ambientes. Partici-param o gestor de projetos da ONG Ecosurfi(formada por surfistas engajados na causaambiental), Bruno Pinheiro, a bióloga KarlaCristiane Pinto, especialista na avaliaçãosanitária das águas e areias de praias, e

Érika Bechara, advogada especializada emdireito ambiental.

Organizações que atuam nas mais vari-adas regiões com programas pela conser-vação da Mata Atlântica participaram doencontro. Com mais de cem projetos, a pro-gramação incluiu peças de teatro, oficinade plantio com distribuição de mudas, pa-lestras, debates e jogos educativos.

Este ano, o Viva a Mata comemorou umadata especial: o 25o aniversário da Funda-ção SOS Mata Atlântica, organizadora doevento, que também celebrou o Dia Nacio-nal da Mata Atlântica (27 de maio).

(Fonte: Press-release da Lead Comuni-cação e Sustentabilidade)

Discurso do presidente da República emexercício, Michel Temer

Comandante da Marinha em visita àsexposições externas da MB

Foi realizada no Riocentro (Rio de Ja-neiro-RJ), de 12 a 15 de abril último, a 8a

edição da maior e mais importante feira dedefesa e segurança da América Latina – aLatin American Aero&Defense (LAAD). Oevento reúne bienalmente empresas brasi-leiras e internacionais especializadas nofornecimento de equipamentos e serviçospara as forças armadas, polícias, forçasespeciais, serviços de segurança, consul-tores e agências governamentais.

Estiveram presentes à Cerimônia de Aber-tura o presidente da República em exercício,

MARINHA PARTICIPA DA 8a LAAD

Michel Temer; o governador do Estado doRio de Janeiro, Sérgio Cabral; o ministro daDefesa, Nelson Jobim; o comandante daMarinha, Almirante de Esquadra Julio Soa-res de Moura Neto; o comandante do Exér-cito, General de Exército Enzo Martins Peri;e o comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro do Ar Juniti Saito, dentre outrasautoridades. Após a abertura do evento, opresidente em exercício e a comitiva percor-reram estandes situados nos pavilhões 4 e 5do Centro de Convenções.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Reunião entre os Ministérios da Defesa doBrasil e de Angola

Nelson Jobim (E), Michel Temer (C) e SérgioCabral (D) descerram a faixa inaugural

Em discurso, o ministro da Defesa falousobre o Programa de Reaparelhamento dasForças Armadas e ressaltou que a feira é umaforma de fomentar a indústria de Defesa e atroca de conhecimento. Entre os temas que aMarinha do Brasil expôs na feira estiveram oPrograma de Desenvolvimento de Submari-nos (Prosub), o Sistema de Gerenciamentoda Amazônia Azul (SisGAAz) e a construçãode navios em território nacional.

De acordo com o comandante da Marinha,a Força tem acompanhado o desenvolvimen-to tecnológico na área de defesa. “Estamosaqui para mostrar uma tecnologia de ponta, éisso que a Marinha busca”, afirmou.

Na LAAD, foi apresentada a mais novaaeronave da Marinha do Brasil, o EC-725Super Cougar, que recebeu a visita do co-mandante da Marinha. Sobre a importânciade expor o meio na feira, ele disse: “Essanova aeronave é importante para a Mari-nha, e trazê-la para a LAAD é uma confirma-ção de que a Marinha continua crescendo”.

O comandante da Força Aeronaval, Con-tra-Almirante Liseo Zampronio, explicou quea aeronave veio substituir o UH-14 SuperPuma: “Essa é a primeira de um grupo de 16aeronaves que irá nos proporcionar um sal-to tecnológico em termos de aviônica. É aprimeira que traz uma capacidade para o Paísde fabricar uma aeronave de grande porte”.

A LAAD também proporcionou ao Mi-nistério da Defesa do Brasil e ao Ministé-rio da Defesa de Angola a assinatura deum memorando de entendimento técnicode delimitação da Plataforma Continentaldaquele país que, cumprindo as regrasestabelecidas pela Convenção das NaçõesUnidas sobre o Direito do Mar, permitiráque suas Águas Jurisdicionais sejam am-pliadas, assegurando direitos sobre todosos recursos naturais do subsolo marinho.

De acordo com o diretor-presidente daEmpresa Gerencial de Projetos Navais(Emgepron), Vice-Almirante (RM1) MarcelioCarmo de Castro Pereira, a assinatura domemorando dá suporte a um contrato co-mercial também firmado entre os dois go-vernos e a Emgepron. Ele conta que esse éum trabalho que o Brasil já fez na sua Plata-forma Continental, sendo o segundo paísdo mundo a apresentar essa delimitação àOrganização das Nações Unidas (ONU).

Em quatro dias intensos de debates eexposições, a Latin America Aero & Defencereuniu 663 expositores, em uma área de 47mil m2, o dobro de sua versão anterior. Noevento, foi possível encontrar desde cole-tes à prova de balas a helicópteros militaresde última geração. Todos os expositores ti-veram o mesmo propósito: atrair a atençãodas delegações oficiais, que são compostaspor militares de alta patente, autoridades,

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

especialistas e funcionários de governos detodo o mundo, que decidem ou assessorama tomada de decisões sobre quais equipa-mentos/veículos de defesa e segurança de-vem ser adquiridos.

Com cerca de 24 mil visitantes, a Mari-nha do Brasil chamou a atenção pela diver-sidade de projetos em exposição. Partici-param o Instituto de Pesquisas da Mari-nha, o Centro Tecnológico da Marinha emSão Paulo, o Centro de Análises de Siste-mas Navais, o Centro de Reparos e Supri-

EC-725 Super Cougar

Tropa da paz durante divulgação dos 5o JogosMundiais Militares na LAAD

mentos Especiais do Corpo de FuzileirosNavais e o Instituto de Estudos do MarAlmirante Paulo Moreira. Foram expostos,ainda, projetos do Programa de Submari-nos e sobre a Amazônia Azul.

Também estiveram presentes à feiraArion e seus amigos, mascotes oficiais dosJogos da Paz. Eles divulgaram os 5o JogosMundiais Militares, que ocorrerão no perí-odo de 16 a 24 de julho deste ano.

(Fonte: www.mar.mil.br)

O Museu Naval, localizado no Rio de Ja-neiro (RJ), vem desenvolvendo um novo pro-jeto educacional que leva alunos dos ensi-nos Fundamental e Médio para assistirem aaulas de História do Brasil nas suas depen-dências. O projeto Uma Aula no Museu pre-tende ampliar a consciência marítima por meiodas aulas, ministradas por oficiais historia-dores da Diretoria de Patrimônio Histórico eDocumentação da Marinha (DPHDM).

Com ênfase na importância do mar para aformação do País, dinamismo e interaçãopautam as aulas, que duram 1 hora e 30 mi-nutos. Imagens, documentos, ambientaçõese o acervo museológico da coleção da Mari-nha do Brasil enriquecem os ensinamentos.

INTERAÇÃO E DINAMISMO MARCAM O PROJETO UMAAULA NO MUSEU

Militar ministra aula para alunos participan-tes do projeto Uma Aula no Museu

A metodologia é discutida previamente coma coordenação pedagógica de cada uma dasescolas, o que permite potencializar o co-nhecimento dos alunos, uma vez que os te-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

mas a serem vistos durante a visita foramanteriormente abordados em salas de aula.

Além da aula no Museu Naval, as escolasoptam por estender a visita ao Espaço Cultu-ral da Marinha, com a possibilidade de fazero passeio marítimo a bordo do Rebocador deAlto-Mar Laurindo Pitta, de onde visualizamlocais históricos da Baía de Guanabara.

Iniciado em outubro do ano passado, oprojeto mostra que a ideia é bem-vinda e cres-ceu. De acordo com a DPHDM, com base nasvisitas agendadas pelas escolas até julho des-te ano, mais de 1,2 mil alunos visitarão o Com-plexo Cultural da Marinha. A primeira fase doprojeto contempla apenas escolas particula-res, mas a segunda etapa pretende levar UmaAula no Museu também às escolas públicas,a partir da captação de patrocínio para o trans-

Alunos participantes do projetoUma Aula no Museu

porte e lanche dos alunos, já que, no caso dasescolas privadas, elas mesmas providenciam.

Escolas interessadas em participar doprojeto devem telefonar para (21) 2104-5506, ramal 254.

(Fonte: www.mar.mil.br)

CAMPEONATO ÁREA RIO 2011 DECROSS-COUNTRY

Realizado no Centro de Educação Físi-ca Almirante Adalberto Nunes (Cefan), em24 de março, contou com 40 atletas, repre-sentando seis setores da Marinha. Foramobtidos os seguintes resultados:

– Percurso longo individual (12 km): 1o

lugar - CB Leandro Melo de Souza (Forçade Fuzileiros da Esquadra-FFE), 2o – 2o SGVilmar Gonçalves Camargos (FFE), 3o – CBFrancisco Assis de Lima (Esquadra);

– Percurso curto (4 km): 1o – SD Lean-dro Santos Almeida (FFE), 2o – CB Jefersondos Santos Vieira (FFE), 3o – CB Guilhermede Oliveira Junior (FFE);

– Geral por Equipes: 1o – FFE, 2o – Es-quadra e 3o Comando-Geral do Corpo deFuzileiros Navais (CGCFN).

ULTRAMARATONA DE 6 HORAS DAAMAN

Competição realizada na Academia Mi-litar de Agulhas Negras – Aman (Resende-

RESULTADOS ESPORTIVOSRJ), em 27 de março. Os integrantes da equi-pe de Ultramaratona da Marinha do Brasilobtiveram os seguintes resultados: 1o lu-gar – SO (FN) Sebastião da Guia (Cefan) e2o – 1o SG Joaquim Gomes de Morais (2o

Batalhão de Infantaria de Fuzileiros Navais– 2o BtlInfFuzNav).

CAMPEONATO PAN-AMERICANODE JUDÔ

Realizado de 1o a 4 de abril, em Guadala-jara, México, pela Confederação Pan-Ame-ricana de Judô. Os atletas da Seleção Brasi-leira Militar de judô e pertencentes ao Cefan

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

obtiveram os seguintes resultados:MN Taciana Lima – 3o lugar na CategoriaLigeiro, MN Erika Miranda – 3o na CategoriaMeio-Leve, MN Mariana Silva – 2o na Cate-goria Meio-Médio, MN Maria Portela – 2o

na Categoria Médio, MN Mayra Aguiar – 2o

na Categoria Meio-Pesado e MN BrunoMendonça – 1o na Categoria Leve.

1a ETAPA DA COPA EUROPEIAJÚNIOR DE JUDÔ

Realizada em 24 de abril, em SãoPetersburgo, Rússia. A MN Giullia Penalberobteve medalha de bronze na Categoria Leve.

2o TORNEIO INTERNACIONAL DEPENTATLO NAVAL

Ao final da competição, realizada de 25a 29 de abril no Cefan, a equipe brasileirade pentatlo naval, que disputará os 5o Jo-gos Mundiais Militares em julho, obteveresultados expressivos diante dos atuaiscampeões e vice-campeões mundiais damodalidade (Alemanha e Polônia). Resul-tados obtidos pelos atletas da Marinha:

– Pista de Obstáculos: Masculino – 1o

SG Carlos Lourenço – 1o lugar e CB DilvanTribuno – 2o; Feminino – MN Jéssica Lessa– 1o, MN Manuella Corrêa – 2o e CB FabianeMarinho, 3o.

– Natação de Salvamento: Feminino –MN Monique Rodrigues – 1o, MN ManuellaCorrêa – 2o e CB Fabiane Marinho – 3o.

– Natação Utilitária: Feminino – MNMonique Rodrigues – 1o e CB Ana BrenaMilitão, 3o.

– Habilidade Naval: Masculino – CBVinícius Moraes – 1o, CB Alex Barreto – 2o e3o SG Max dos Santos – 3o; Feminino – MNManuella Corrêa – 1o, CB Fabiane Marinho– 2o e MN Jéssica Lessa – 3o.

– Cross-Country Anfíbio: Masculino –3o SG Max dos Santos – 2o; Feminino – MNManuella – 1o e MN Jéssica Lessa – 3o.

– Geral Individual: Feminino MN ManuellaCorrêa – 1o e MN Jéssica Lessa – 3o.

– Equipes Masculino: Brasil – 1o,Polônia – 2o e Alemanha – 3o.

2a ETAPA DA COPA EUROPEIAJÚNIOR DE JUDÔ

A MN Giullia Penalber ganhou medalhade bronze na Categoria Leve. A competiçãofoi realizada em 1o de maio, em Roma, Itália.

CAMPEONATO CARIOCA DE JUDÔ2011

Realizado em 1o de maio, no Rio de Janei-ro (RJ). Os atletas da Marinha obtiveram osseguintes resultados: MN Roberto Vicente– medalha de ouro na Categoria Meio-Mé-dio e MN Deborah Almeida – medalha deouro na Categoria Meio-Pesado.

MATCH RACE BRASIL 2011A Seleção Brasileira Militar de Vela, que

representará o Brasil nos 5o Jogos MundiaisMilitares, foi campeã invicta da competição,realizada de 5 a 8 de maio, no Iate Clube doRio de Janeiro. Ao todo, 11 equipes disputa-ram o título da mais importante competiçãobarco contra barco da vela brasileira. A equi-pe vencedora foi composta pelos seguintesmilitares atletas: MN Henrique Haddad, MNFelipe Haddad, MN Mário Trindade, MNPedro Caldas e MN Fernanda Decnop.

10a EDIÇÃO DO TROFÉU BRASILINTERCLUBES DE JUDÔ

Realizado em Brasília, em 8 e 9 de maio.Foram os seguintes os resultados obtidospelos atletas da Marinha: MN ErikaMiranda e MN Ketleyn Quadros – meda-lhas de ouro na Categoria Meio-Leve, MNNatália Bordignon – medalha de ouro naCategoria Médio, MN Mayra Aguiar – me-dalha de ouro na Categoria Meio-Pesado,MN Mariana Barros – medalha de prata naCategoria Meio-Médio, MN Taciana Lima– medalha de bronze na Categoria Ligeiro eMN Danielle Yuri – medalha de bronze naCategoria Meio-Médio.

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

A Empresa Gerencial de Projetos Navais(Emgepron) exportou para a Marinha daNamíbia os Avisos de Patrulha Möwe Baye Terrace Bay. A cerimônia de entrega dosnavios foi realizada em 25 de maio último,no estaleiro Inace, em Fortaleza (CE).

EMGEPRON ENTREGA AVISOS DE PATRULHA À NAMÍBIA

As embarcações, construídas naqueleestaleiro sob gerenciamento da Emgepron,possuem 22 metros de comprimento, deslo-cam 47 toneladas e serão empregadas na vi-gilância e no policiamento da costa namibiana.

(Fonte: Bono no 371, de 25/5/2011)

Realizada de 23 de maio a 3 de junho, aOperação Amazônia 2011 envolveu meiose militares da Marinha, Exército e Aeronáu-tica em um importante exercício de simula-ção de guerra na Amazônia, que visou man-ter a capacidade operativa das tropas naregião, além de prestar apoio às comunida-des ribeirinhas por meio de ações cívico-sociais. O exercício envolveu aproximada-mente 4.500 militares.

Este é o nono exercício desse porte rea-lizado na Região Amazônica desde 2002,com o propósito de aprimorar o adestra-mento das três Forças para atuar, de formacoordenada e eficaz, em conflitos conven-cionais no ambiente de selva.

Este ano, a operação conjunta foi de-senvolvida em uma área de aproximadamen-te 800 mil km2, abrangendo os municípios

A MARINHA NA OPERAÇÃO AMAZÔNIA 2011

Navio-Patrulha Fluvial Pedro Teixeira

de Manaus, São Gabriel da Cachoeira, Tefé,Coari, Japurá, Fonte Boa, Jutaí e Yauaretê.

Estima-se que pelo menos 2 mil pessoasforam atendidas nas ações cívico-sociaispromovidas, que levaram atendimento mé-dico e odontológico à população de locali-dades isoladas como Fonte Boa, Japurá eYauaretê. Nessas ações, foram emprega-dos navios de assistência hospitalar daMarinha, além de militares dos Corpos deSaúde das três Forças, que atuaram utili-zando a estrutura de saúde dos municípiosenvolvidos.

De acordo com o Estado-Maior Conjuntodas Forças Armadas, órgão encarregado deplanejar o emprego conjunto das Forças, asatividades relacionadas à Operação Amazô-nia começaram oito meses antes do início dodeslocamento das tropas. Esse planejamento

envolveu o desenho decenários de guerra econflitos na RegiãoAmazônica, bem comoo emprego eficaz dasForças em forma inte-grada com outros ór-gãos federais e estadu-ais que atuam na região.

A Marinha partici-pou com os seguintesmeios: Navio-PatrulhaFluvial Pedro Teixei-ra, Navio-PatrulhaFluvial Rondônia, Na-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

vio-Patrulha Fluvial Amapá, Navio-Patru-lha Pampeiro, Navio-Patrulha Bocaina,Navio Auxiliar Pará, Navio de AssistênciaHospitalar Oswaldo Cruz e dois helicópte-ros UH-12 Esquilo, do 3o Esquadrão de He-licópteros de Emprego Geral(com sede em Manaus). Alémdisso, aproximadamente 400militares formam o Grupa-mento Operativo de Fuzilei-ros Navais, composto porefetivos do Comando da For-ça de Fuzileiros da Esquadra(com sede no Rio de Janeiro)e do Grupamento de Fuzilei-ros Navais de Belém e do Ba-talhão de Operações Ribeiri-nhas (com sede em Manaus).

Além da Operação Amazô-nia, o Estado-Maior Conjun-to planeja exercícios em outras

Navio de Assistência HospitalarOswaldo Cruz

regiões do País. Estão programadas paraacontecer, até dezembro de 2011, operaçõesconjuntas de intensificação da área de fron-teira nas regiões Norte, Sul e Centro-Oeste.

(Fonte: www.mar.mil.br)

O Rebocador de Alto-Mar Triunfo e oNavio-Patrulha Grajaú, subordinados aoComando do Grupamento de Patrulha Na-val do Nordeste, participaram, até o dia 11

MARINHA DO BRASIL PARTICIPA DA CARIBEX-2011

de maio, do Grupo de Adestramento Caribe,acompanhados dos Navios-PatrulhaBracuí e Guanabara. A primeira atividadeda Comissão Caribex-2011, com o navio-

patrulha francês La Capricieuse,foi a execução de exercíciosoperativos que, além de contri-buírem para o aumento do nívelde adestramento dos meios e ainteroperabilidade entre as for-ças, estreitaram ainda mais os la-ços da Marinha do Brasil com aMarinha francesa.

Os navios fizeram visitasoperativas a diversos portos dacosta das Américas Latina e Cen-tral. De 14 a 16 de abril, eles esti-veram no porto de Georgetown,na Guiana, onde receberam as vi-sitas do chefe de Estado-Maior

Embaixador do Brasil em Antígua e Barbuda chega a bordo doRebocador de Alto-Mar Triunfo

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

das Forças de Defesa da Guiana, ComodoroGary Anthony Rodwell Best, e do coman-dante da Guarda Costeira, Coronel JullianBrewster Lovell, além de 233 alunos da redeescolar da cidade.

Ainda naquele porto, dois militares daGuarda Costeira daquele país embarcaramno Rebocador de Alto-Mar Triunfo com opropósito de participar da comissão atéParamaribo, no Suriname.

De 21 a 25 de abril, os navios atracaramno porto de San Juan, em Porto Rico. Du-rante a estadia na cidade, os militares dosnavios brasileiros visitaram a base da Guar-da Costeira dos Estados Unidos, no intui-to de ampliarem os conhecimentos sobreas tarefas executadas por aquela Força, jáque suas atividades se assemelham às de-sempenhadas pelos navios distritais daMarinha do Brasil.

Na noite de 26 de abril, quando atraca-ram no porto de St. John’s, os navios parti-cipantes da Comissão Caribex-2011 se tor-naram as primeiras embarcações da Mari-nha do Brasil a visitarem a nação caribenhade Antígua e Barbuda. Os navios foram re-

Navios da Marinha do Brasil atracados noporto de Georgetown

cebidos pelo embaixador brasileiro no país,Brian Michael Fraser Neele, que promoveudiversos eventos para a tripulação. Em retri-buição à acolhida, o Rebocador de Alto-MarTriunfo ofereceu um almoço às autoridadesmilitares antiguanas e o Navio-PatrulhaGrajaú recebeu a visita do primeiro-minis-tro de Antígua e Barbuda, Baldwin Spencer.

A Comissão Caribex-2011 visitou, ain-da, os portos de Fort-de-France, emMartinica, e Paramaribo, no Suriname, erealizou vários exercícios operativos no mar.

(Fonte: www.mar.mil.br)

O Navio-Patrulha Bocaina encerrou aOperação Patrulha Naval no Atlântico Nor-te com 46 embarcações inspecionadas, deznotificadas e 11 apreendidas. Realizada de6 a 18 de abril, na faixa marítima entre a fozdos rios Oiapoque (fronteira com a GuianaFrancesa) e Pará (na Ilha de Marajó-PA), aoperação foi gerenciada pelo Comando doGrupamento de Patrulha Naval do Norte,unidade operativa do Comando do 4o Dis-trito Naval (Belém-PA).

Entre as embarcações apreendidas es-tava um barco pesqueiro que utilizava ar-

NAVIO-PATRULHA BOCAINA ENCERRA OPERAÇÃOPATRULHA NAVAL ATLÂNTICO NORTE PARTICIPANDO

DE CAMPANHA CONTRA ESCALPELAMENTO

Barco pesqueiro apreendido peloNavio-Patrulha Bocaina

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Militares com estruturas metálicas para cobrireixos de barcos ribeirinhos

rasto, violando o período de defeso, nasproximidades da Ilha do Machadinho, anordeste da Ilha de Marajó. Ele foi reboca-do para Belém, onde os fiscais do Ibamalavraram o auto de infração.

Durante a última fase das ações de pa-trulha, a equipe do Bocaina instalou co-berturas de eixo nas embarcações regio-nais em prol da Campanha contra oEscalpelamento.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Terminou, em 9 de maio último, a Opera-ção Unitas LII – 2011, que reuniu as Mari-nhas da Argentina, do Brasil, dos EstadosUnidos da América e do México. A primeirafase aconteceu na área marítima compreendi-da entre Salvador (BA) e Rio de Janeiro (RJ),e a segunda entre o Rio de Janeiro e a cidadedo Rio Grande (RS). A Unitas é a maisantiga Operação multinacionaldo mundo.

O propósito da Opera-ção foi aprimorar ainteração operacionalentre as Marinhas dasAméricas e contribuirpara a manutenção dasboas relações diplomá-ticas existentes, estreitan-do laços de confiança e so-lidariedade nos hemisférios.

A atracação dos meios en-volvidos no porto do Rio Grandeaconteceu no dia 8 de maio. Durante a es-tadia no porto, foi feita uma aposição floralno Panteão Tamandaré, com a participaçãode uma representação da Marinha brasilei-ra e de quatro estrangeiras, acompanha-das pelo comandante do 5o DN, Vice-Almi-rante Sergio Roberto Fernandes dos San-tos. Localizado em um dos recantos

OPERAÇÃO UNITAS LII

ajardinados da sede do Comando do 5o DN,o Panteão é um monumento arquitetônicoem homenagem ao Patrono da Marinha, orio-grandino Almirante Tamandaré, e queabriga seus restos mortais desde 1994.

Em coletiva à imprensa, falaram sobre aoperação o comandante do 5o DN; o coman-

dante da 1a Divisão da Esquadra, Con-tra-Almirante Carlos Augusto

de Moura Resende; e os co-mandantes dos Grupos-Ta-

refa (GT) norte-americano,Marc Weeks; argentino,Luis Lopes Mazzeo; emexicano, José BarradasCobos. Conforme o co-mandante do 5o DN, o

encerramento da Unitas2011 ocorreu em Rio Gran-

de por reconhecimento à re-levância do município no as-

pecto econômico, ao crescimentoque nele vem ocorrendo devido às suas re-lações com a Amazônia Azul, ao Polo Navale aos investimentos no porto, além dos la-ços históricos que unem a cidade à Marinhado Brasil. O Contra-Almirante Resende, tam-bém comandante do GT multinacional, des-tacou que a Unitas foi muito importante sobo enfoque do adestramento, pois foram rea-

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

lizados desde exercícios básicos até os dealta complexidade.

“O importante da Unitas é o intercâmbiode conhecimentos”, salientou Resende,acrescentando que a operação também foiuma oportunidade para a Marinha brasileiraobservar equipamentos utilizados pelas es-trangeiras. Um destes é o helicóptero SH-60Seahawk, que foi usado pelo GT norte-ame-ricano. Segundo ele, a Marinha brasileira estáadquirindo este tipo de helicópteros, sendoque as primeiras unidades serão recebidasno segundo semestre deste ano.

O comandante do GT norte-americano tam-bém afirmou que a Unitas é um exercício muitoimportante para os Estados Unidos, pois dáoportunidade de a Marinha daquele país ope-rar com navios de guerra de Marinhas interna-cionais, utilizando práticas de interoperabilida-de nos exercícios de guerra clássicos.

A destacar na Operação Unitas LII-2011está o lançamento do míssil superfície-arAspide pela Fragata Independência, daMB, no dia 4 de maio. A fragata norte-ame-ricana USS Tach, que também participouda operação, foi responsável pelo lança-mento do alvo remotamente controlado. Osnavios do Grupo-Tarefa utilizaram os seussistemas de armas e efetuaram disparos de

canhão em direção ao alvo. “O lançamentodo míssil Aspide se reveste de grande im-portância, pois, além de atuar na qualifica-ção e treinamento da tripulação, testa acapacidade dos equipamentos utilizadospela Marinha do Brasil”, afirmou o Capitãode Corveta Fajard, chefe do Departamentode Armamento da Fragata Independência.

Esse lançamento também foi importantepara aferição de parâmetros de voo erastreamento do míssil ao longo de sua tra-jetória até o alvo. Por meio de equipamentosde telemetria, instalados a bordo da Inde-pendência, a equipe de técnicos daMectron, apoiada pelos militares do Centrode Apoio a Sistemas Operativos (Casop),pôde avaliar o desempenho do míssil.

No Grupo-Tarefa da Marinha do Brasilque participaram da Unidas LII – 2011 esta-vam as Fragatas Niterói, Independência eBosísio; um helicóptero de esclarecimentoe ataque AH-11A Super Lynx; dois helicóp-teros de emprego geral UH-12 Esquilo; oNavio-Tanque Almirante Gastão Motta; eo Submarino Tikuna. Ao todo, foram envol-vidos na Operação cerca de 2.300 militares,sendo aproximadamente 1.200 brasileiros.

Fontes: www.mar.mil.br e www.naval.com.br

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Uma análise global dos recifes de co-rais realizada por mais de 25 organiza-ções ambientais e de centenas de cien-tistas descobriu que 75% dos recifes decorais do mundo estão ameaçados deextinção. “Reefs at Risk Revisited” é aavaliação mais detalhada das ameaçasaos recifes de corais já realizada no mun-do. O relatório foi lançado pelo WorldResources Institute (WRI), juntamentecom a organização não governamental(ONG) The Nature Conservancy (TNC),o Centro WorldFish, a InternationalCoral Reef Action Network, o GlobalCoral Reef Moni-toring Network e oCentro Mundial deMonitoramento daConservação do Pro-grama das NaçõesUnidas para o MeioAmbiente.

Pela primeira vez,a análise inclui asameaças das mudan-ças climáticas, inclu-indo o aquecimento dos mares e aumen-to da acidificação dos oceanos. O relató-rio mostra que as pressões locais, taiscomo a sobrepesca, o desenvolvimentocosteiro e a poluição são os riscos maisimediatos e diretos, ameaçando mais de60% dos recifes de corais. De acordo coma nova análise, se nada for feito, opercentual de recifes ameaçados subirápara mais de 90% em 2030 e para quasetodos os recifes em 2050. “Os recifes decorais mantêm estáveis nossos supri-mentos alimentares e produzem compos-tos para encontrar soluções em medica-

75% DOS RECIFES DE CORAISESTÃO AMEAÇADOS

DE EXTINÇÃO

mentos para o câncer, doenças cardíacase o HIV. Quando garantimos a preserva-ção dos recifes, garantimos também o fu-turo dos humanos”, explica MarkSpalding, cientista marinho sênior daTNC e principal autor do relatório.

A pesca excessiva e destrutiva, princi-palmente, já está causando impactos gra-ves na maioria dos recifes, aumentandopara 30%, desde 1998, os recifes que so-frem com essa área. As pressões globaistambém estão crescendo, causando bran-queamento dos corais devido às tempera-turas do mar e a acidificação dos oceanos,

com o crescente au-mento de dióxido decarbono.

O relatório incluirecomendações paraproteger e gerir os re-cifes de uma melhorforma, que vão des-de ações individuaispara a colaboraçãointernacional. O do-cumento mostra que

mais de um quarto dos recifes já estãoem uma ampla variedade de parques e re-servas, no entanto apenas 6% estão emáreas protegidas e são geridos de formaeficaz.

O relatório identifica pela primeira vezas 27 nações do mundo que são mais vul-neráveis à degradação dos recifes de corale perdas, entre elas o Brasil. Os nove paí-ses mais vulneráveis são: Haiti, Granada,Filipinas, Ilhas Comores, Vanuatu,Tanzânia, Kiribati, Ilhas Fiji e Indonésia.

(Fonte: Press-release da Lead Comuni-cação e Sustentabilidade)

Se nada for feito, opercentual de recifes

ameaçados subirá paramais de 90% em 2030 e

para quase todos os recifesem 2050

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NOTICIÁRIO MARÍTIMO

Foram realizadas, em março último, asprovas de mar do Vale Brasil, o primeironavio de 400 mil toneladas da nova frotada Vale, que prepara a entrada de oito navi-os próprios para atendimento da demandapara destinos de longo curso.

O Vale Brasil é o primeiro tipo VLOC(Very Large Ore Carriers) dos encomen-dados junto a estaleiros chineses, volta-dos para o transporte de grandes volumesde minério de ferro.

O navio tem 365 metros de comprimento,66 de boca e 23 de calado. Seu propulsor édo tipo MCP Wärtsilä – sete cilindros – RT-flex82T, dois tempos. Essa máquina desen-volve 29.400 kW a 76 rpm (39.410 hp) e éeletronicamente controlada. Seu sistemacommon-rail foi especificamente desenvol-vido para operação econômica e é muitousado em navios VLCC (Very Large CrudeCarriers), atendendo às exigências da Or-ganização Marítima Internacional (IMO).

VALE BRASIL REALIZA PROVAS DE MAR

Vale Brasil – 400 mil toneladasClasse “Valemax”

O Vale Brasil é atualmente o maior na-vio para carga seca em operação, ultrapas-sando o norueguês Berge Stahl, de 365 miltoneladas, que durante décadas manteve aprimeira posição.

O ore carrier Vale Brasil é o primeiroda classe de VLOC, já apelidada como“Valemax”.

(Fonte: http://www.blogmercante.com ewww1.folha.uol.com.br)

O crescimento da economia interna doBrasil e a grande gama de projetos deinfraestrutura, originada pela exploração dopré-sal e pelos investimentos da Copa doMundo, têm favorecido o incremento daparticipação da navegação interna na ma-triz modal do País.

Com base nessa realidade, a MarinhaMercante tem ampliado sua atuação nanavegação nacional. Um exemplo vem daLog.Star Navegação S.A., ao anunciar umincremento na participação na cabotagembrasileira. Parceria entre a Log-In LogísticaIntermodal S.A. e a TBS International, acompanhia tem “forte interesse em expan-dir-se no setor de carga de projeto”, se-gundo o presidente Christian Silva

LOG.STAR INTENSIFICA OPERAÇÕES DE CARGA GERAL

Bielecke, também diretor da TBS do Brasil,e também pretende aumentar a utilizaçãodo transporte de carga geral na cabotagem.

A empresa surgiu em dezembro de 2009com o intuito de transportar granéis,breakbulk, cargas superdimensionadas ecarga geral, além de equipamentos offshoree de energia eólica ao longo da costa brasi-leira, Mercosul e demais rotas comerciaisque possam utilizar navios de bandeira bra-sileira. Dessa forma, a Log.Star efetuou oembarque de cerca de 65 mil toneladas decanos/tubos do porto de Angra dos Reis(RJ) para o projeto da Bacia de Tupi.

Desde novembro do ano passado a com-panhia concentra viagens da Região Nor-deste para Sudeste e Sul, com carregamen-

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O Angra Star

tos de equipamentos eólicos deSuape (PE) para Imbituba (SC).Além disso, a Log.Star realizou re-centemente o transporte de umadraga que fora utilizada nas obrasde dragagem do Plano Nacional deDragagem (PND).

Atualmente, a empresa possuitrês navios: Angra Star (ex-Log-In Belém), Jari Star (ex-Log-InManaus), ambos construídos em1994, e Recife Star (ex-Log-InMacau), construído em 1998. Todos sãonavios multipropósito tweendeckers comcerca de 1.300 toneladas de capacidade econstruídos no estaleiro Eisa.

(Fonte: Gerência de Gestão Marítima daLog.Star Navegação S.A.)

A Maestra Navegação e Logística, quepertence à Triunfo Participação e Investi-mentos, foi apresentada durante a 17a

Intermodal South America, a Intermodal2011, realizada de 5 a 7 de abril último, emSão Paulo (SP). A Intermodal é a principalfeira de negócios dos setores de logística,transporte de carga e de comércio interna-cional das Américas e conta com a partici-pação de expositores nacionais e interna-cionais, além de seminários, fóruns eworkshops.

A Maestra, voltada exclusivamente parao mercado nacional e que tem como foco otransporte de cabotagem, está habilitada afazer tanto o transporte porto a porto, comotambém o transporte porta a porta. “A ideiaé oferecer um serviço de logística integra-da, coordenando todos os braços do trans-porte de cargas”, explica Fernando Real,presidente da companhia, completando que“60 a 70% do volume total será no porta aporta”.

MAESTRA NAVEGAÇÃO E LOGÍSTICA ENTRA NO SETORDE CABOTAGEM

Com um navio já em teste – o MaestraAtlântico, que tem capacidade para 1.356 Teus(unidade de contêiner de 20 pés) – e outro emfase de finalização de reparos – o MaestraMediterrâneo, com capacidade para 1.200Teus –, a Maestra, cujo aporte de investimen-tos realizado pela Triunfo (empresa brasileirado setor de infraestrutura) soma aproximada-mente R$ 60 milhões, atenderá ao mercado comquatro embarcações, mantendo frequência re-gular semanal. Com os embarcados, a empre-sa terá cerca de 250 colaboradores. A rotaçãodos navios Maestra começa em Navegantes(SC), passa por Santos (SP), Salvador (BA),Suape (PE) e Manaus (AM).

Com as grandes perspectivas de desen-volvimentos locais, principalmente nas re-giões Norte e Nordeste do País, e com oaquecimento do mercado doméstico, o exe-cutivo acredita que os gargalos logísticosdo Brasil podem ser superados com acabotagem. “As metas audaciosas do go-verno no transporte, tanto em redução de

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custos, bem como em medidas mais ecoló-gicas, podem ser alcançadas com acabotagem, beneficiadas pela longa exten-são da costa brasileira e também devido às

vantagens no transporte marítimo de lon-gas distâncias”, afirma.

(Fontes: Voice Comunicação Institucio-nal e www.intermodal.com.br)

MARINHA APOIA VÍTIMAS DAS ENCHENTESNO SUL DO PAÍS

A Marinha do Brasil (MB), por intermé-dio do Comando do 5o Distrito Naval (RioGrande-RS), prestou apoio à Defesa Civilna cidade de São Lourenço do Sul, umadas mais afetadas pelas chuvas no Rio Gran-de do Sul, com oito mortos. O apoio foiprestado desde que o município teve de-cretado estado de calamidade pública, em10 de março último.

No dia 12, a ministra-chefe da SecretariaNacional de Direitos Humanos, Maria doRosário, e a ministra da Pesca e Aquicultura,Ideli Salvatti, embarcaram em helicópteroda Marinha para um sobrevoo da cidade,quando puderam verificar a dimensão dosprejuízos. Após, elas percorreram o giná-sio onde foram concentrados e distribuí-dos os donativos para a cidade.São Lourenço do Sul

Ministras sobrevoaram a região a bordo dehelicóptero da Marinha

Marinha apoia Defesa Civil em São Lourenço do Sul

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Nas ações de apoio e regaste, foramempregados pela Marinha o Navio-Pa-trulha Benevente, uma lancha, dois bo-tes, duas viaturas, três ônibus e cerca de40 militares, além da aeronave EsquiloMonoturbina AS350, do 5o Esquadrão deHelicópteros de Emprego Geral(EsqdHU-5), que sobrevoou as regiõesafetadas transportando as ministras emateriais.

As enchentes do mês de março nosul do País também atingiram os mora-dores do litoral do Paraná, que tiveram

Militares da Marinha e do Corpo de Bombeiros doParaná trabalham no envio de mantimentos e água

para as famílias desabrigadas

os seus acessos rodoviários interdita-dos. No entanto, o abastecimento na re-gião foi mantido com o apoio da Mari-nha do Brasil e do Corpo de Bombeiros,que enviaram helicópteros e embarca-ções para serem utilizadas nos resgatese no envio de mantimentos e água paraas famílias desabrigadas. O comando daoperação incluiu representantes da Ma-rinha do Brasil, do Corpo de Bombeiros,da Polícia Militar, da Prefeitura deParanaguá e da Guarda Municipal.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Lanchas da Marinha levam colchões e cobertorespara comunidades isoladas no Paraná

Militares da Capitania dos Portos doParaná (CPPR), em conjunto com a DefesaCivil, o Exército, o Corpo de Bombeiros e aPolícia Militar do Paraná, atuaram no res-gate, remoção e transporte de moradoresde municípios do Estado atingidos por en-chentes em março último. Nas cidades lito-râneas de Guaratuba, Antonina, Morretese Paranaguá, quase 10 mil pessoas ficaramdesabrigadas ou desalojadas. As chuvasrecorrentes devastaram comunidades ru-rais, destruíram pontes e assorearam osmananciais que abastecem os municípios.

VÍTIMAS DAS ENCHENTES NO PARANÁ RECEBEM APOIODA MARINHA

Militares carregam lancha com mantimentos

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Lanchas levam mantimentos aos municípiosatingidos pelas chuvas

Os militares da Marinha do Brasil se-guiram para as regiões atingidas em viatu-ras e lanchas transportando comida, col-chões, cobertores, medicamentos e águapotável, uma vez que os acessos rodoviá-rios aos municípios paranaenses foram in-terrompidos. O tráfego na BR-277 (que ligao litoral à capital, ao interior do Paraná e aoEstado de São Paulo), bem como na BR-376 (que liga o Paraná a Santa Catarina)ficou precário, com trechos liberados emmeia pista em períodos predeterminadospela Polícia Rodoviária Federal.

Na localidade de Floresta, no municípiode Morretes, por exemplo, mais de 150 pes-soas foram retiradas pelas equipes de res-gate. Famílias inteiras foram socorridas porterra e mar e levadas aos abrigos instala-dos em escolas locais. Após o período deresgate das pessoas atingidas pelas chei-as, a determinação do capitão dos Portosdo Paraná, Capitão de Mar e Guerra JoséHenrique Corbage Rabello, foi de atendi-mento aos desabrigados e desalojados.

Diuturnamente, as equipes da CPPR trans-portam materiais para essas localidades. Nodia 14 de março, caixas com hipoclorito desódio (utilizado para o tratamento de água)foram levadas nas lanchas da Marinha doBrasil para os municípios atingidos. No dia15, alimentos foram transportados atéAntonina, para o Colégio Moisés Lupyon,que alojou 40 desabrigados. Diariamente, maisde 100 pessoas, entre desalojados e voluntá-rios, se alimentaram com os produtos das do-ações. Cestas básicas também seguiram paraa Defesa Civil para serem distribuídas.

Para restabelecer a água em Paranaguá,a Marinha do Brasil apoiou a missão detransporte de uma balsa, pesando 3 tone-ladas e contendo uma bomba de recalque eequipamentos, para a represa do RioMiranda, onde ocorreu o bombeamento departe da água que abastece o município. OHelicóptero Super Puma (UH-14), apoiadopor dez militares, também foi empregadona missão, iniciada no dia 17.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Helicóptero Super Puma (UH-14),empregado na operação de transporte da balsa

O Espaço Cultural da Marinha, no Riode Janeiro, foi palco, em 19 de março últi-mo, do evento “Uma Tarde Especial”.

“UMA TARDE ESPECIAL”NO ESPAÇO CULTURAL DA MARINHA

Protagonizado por crianças de comunida-des carentes e jovens músicos portadoresde necessidades especiais, em conjunto

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com a Banda do Corpo de Fuzileiros Na-vais, o evento teve o propósito de estimu-lar a integração musical destes artistas.

Cerca 200 pessoas, entre civis e milita-res, prestigiaram o acontecimento.

Participaram dois corais: o Tocarte, doInstituto Tocando em Você, e o EcumênicoInfantil Boa Vontade, que pertence à Le-gião da Boa Vontade (LBV). A Banda doCorpo de Fuzileiros Navais abriu o eventocom o Hino Nacional, seguido de clássi-cos da Música Popular Brasileira.

Banda do Corpo de Fuzileiros Navais abre oevento tocando o Hino Nacional

As crianças do Coral Ecumênico Infantil BoaVontade atraíram a atenção de todos

Coral Ecumênico Infantil Boa Vontade encerrao evento entoando o “Cisne Branco”

O Coral Tocarte é formado por jovensportadores de necessidades especiais quetêm na música um instrumento de inclusãosocial. O Instituto Tocando em Você contacom uma equipe interdisciplinar que traba-lha a terapia e a música de forma integrada.A diretora do Instituto, Regina Lucia Olivei-ra Colucci, elogiou o projeto: “Acredito quea Marinha atua com cidadania, pois abre asportas para todos e incentiva pessoas es-peciais a desenvolverem seu potencial”.

Composto por 39 crianças de comuni-dades do entorno do bairro de Del Castilho,o Coral Ecumênico Infantil Boa Vontade éum projeto social da LBV que estimula oconvívio das crianças com a música. O re-pertório engloba canções que vão de hi-nos a músicas de cantores consagrados,como Djavan e Milton Nascimento.

No encerramento da apresentação, ascrianças da LBV emocionaram o públicoentoando a “Canção do Marinheiro”, maisconhecida como “Cisne Branco”, acompa-nhadas da Banda do Corpo de FuzileirosNavais.

Foi lançado em 24 de maio último, no Mu-seu Naval (Rio de Janeiro-RJ), o livro A Cons-

A CONSTRUÇÃO NAVAL MILITAR BRASILEIRANO SÉCULO XX

trução Naval Militar Brasileira no SéculoXX, de autoria do Engenheiro Naval Eduardo

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Câmara, com distribuição pela Sociedade Bra-sileira de Engenharia Naval (Sobena).

A obra, de 240 páginas, é repleta de fo-tos e desenhos exclusivos e conta uma his-tória que começa em 1890, com a constru-ção do Monitor Fluvial Paraguaçu, e che-ga praticamente até os dias atuais. O livrovai além de mostrar as construções maisconhecidas, como a dos contratorpedeiroslançados nos anos 1940 e as das fragatas ecorvetas lançadas desde os anos 1970 e1980. Isso porque também aborda os navi-os auxiliares e até embarcações fornecidasao Exército Brasileiro, projeto por projeto,destacando a origem histórica e os aspec-tos importantes da engenharia naval dosnavios militares construídos no Brasil aolongo do século XX.

O livro foi produzido com recursos dopróprio autor, que começou a elaborá-lo em2001, quando residia e trabalhava na Noru-ega. A ideia acabou levando a anos de pes-quisas em arquivos pessoais, repletos deraridades, e nos de diversos estaleiros pe-los quais o engenheiro passou ou mante-ve contato desde quando era estagiário doArsenal de Marinha do Rio de Janeiro, noinício dos anos 1970.

Eduardo Câmara é graduado em enge-nharia naval pela Universidade Federal doRio de Janeiro. Sempre atuou na área técni-ca, principalmente com projeto e aprovaçãode estruturas de navios, nos estaleiros Ebin-Só, MacLaren e na sociedade classificadoraDet Norske Veritas. Retornou ao Brasil após15 anos de trabalho no exterior, quando re-

sidiu em Japão, Coreia do Sul, Cingapura eNoruega. Continua trabalhando na profis-são e, nas horas vagas, dedica-se a estudarepisódios e temas de natureza histórica doramo da engenharia naval.

(Fonte: Bono no 365, de 23/5/11, ewww.naval.com.br)

Nos Limites da Amazônia Azul, livro comfotografias de Simone Marinho e textos deAntônio Marinho e Roberta Jansen, foi lança-do em 28 de fevereiro último, no Espaço Cultu-ral da Marinha, Rio de Janeiro (RJ). A obra

LANÇADO O LIVRO NOS LIMITES DA AMAZÔNIA AZUL

reúne dados históricos do Arquipélago de SãoPedro e São Paulo e da Ilha da Trindade.

O Arquipélago de São Pedro e São Pau-lo, no Nordeste, e a Ilha da Trindade, noSudeste, garantem a soberania nacional a

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Nos Limites da Amazônia Azul

A fotógrafa Simone Marinho (E) e os autoresAntônio Marinho (C) e Roberta Jansen (D)

no lançamento do livro

Esq. para Dir.: CMG (FN) Walter Marinho; Vice-Almirante Bittencourt (Refo -EN), Diretor dePatrimônio Histórico e Documentação da Marinha; Escritor Antonio Marinho; e

Contra-Almirante Farias Alves, Diretor do Centro de Comunicação Social da Marinha

mais de mil quilômetros do continente. Osdois conjuntos de ilhas oceânicas estão noslimites da Amazônia Azul, uma área marítimade cerca de 3,5 milhões de quilômetros qua-drados, que poderá atingir 4,5 milhões dekm2 com a expansão da plataforma continen-tal que está sendo pleiteada pelo Brasil jun-

to à Comissão de Limites da Plataforma Con-tinental (CLPC) da Convenção das NaçõesUnidas sobre o Direito do Mar (CNUDM). AAmazônia Azul é uma área quase tão grandequanto a da floresta amazônica e rica embiodiversidade e recursos naturais, muitosainda não identificados.

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A ocupação permanente desses pequenosterritórios é estratégica, sobretudo em temposde pré-sal: ela amplia a área de exploração depetróleo, gás, minérios, biodiversidade e pes-ca. É a presença de cientistas e militares nes-sas ilhas que demarca a Amazônia Azul.

A primeira marca dessa área, no extremonordeste do Brasil, é o Arquipélago de SãoPedro e São Paulo, distante 1.010 km do lito-ral do Rio Grande do Norte. Lá, a pouca terradisponível é inóspita – uma montanha sub-marina, que aflora de uma profundidade de4 mil metros, na forma de dez rochedos commenos de 20 metros de altura. Sem praia,

vegetação, água doce, nenhuma sombra eameaçado por terremotos e alagamentos, oarquipélago é rico em fauna: funciona comorefúgio e área de reprodução de aves e de-zenas de espécies marinhas.

A segunda marca é a Ilha da Trindade, a1.167 quilômetros de Vitória (ES), o pontomais extremo a leste do País. A ilha é a ex-tremidade oriental de uma cadeia de mon-tanhas submersa que se liga ao continentee se eleva a 5,5 mil metros do fundo do mar.Tem apenas 8,2 km2 de área, mas é de gran-de importância estratégica.

(Fonte: www.mar.mil.br)

Que tal utilizar uma máquina do tempo paraconhecer um pouco da história marítima? Estaé a proposta da peça “De volta para o passa-do”, que está sendo apresentada no EspaçoCultural da Marinha (ECM), no Rio de Janei-ro (RJ), como parte do projeto educativo “Co-nhecendo e Brincando no Espaço Culturalda Marinha”. Inspirada no filme “De voltapara o Futuro” (um clássico dos anos 80), oespetáculo oferece uma fascinante e diverti-da viagem numa máquina do tempo,engenhoca construída pela cientista e pes-quisadora Dra. Tempus e sua assistente Pu-pila, uma adolescente muito curiosa.

Esses personagens – que voltam do fu-turo – utilizam a “máquina do tempo” paravisitar o ECM e o Museu Naval a fim deconhecer mais sobre os antepassados dacientista, que fizeram parte da aventura dasGrandes Navegações. Assim, de formalúdica e divertida, são abordados temascomo a aventura das Grandes Navegaçõese a Evolução das Embarcações, Arqueolo-gia Subaquática e a embarcação Galeota D.João VI, a importância dos museus e dotrabalho dos museólogos e restauradores.

A ideia de se usar a figura da máquinado tempo tem o propósito de mostrar como

DE VOLTA PARA O PASSADO

os museus são igualmente fascinantescomo testemunho da História. Estes sãomostrados como verdadeiras máquinas dotempo por conservarem elementos repre-

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sentativos de diversas épocas da humani-dade e da cultura através dos tempos.

O projeto “Conhecendo e Brincando noEspaço Cultural da Marinha” é da Direto-ria de Patrimônio Histórico e Documenta-ção da Marinha em parceria com a Liga dosAmigos do Museu Naval e com patrocínioda Companhia de Navegação Norsul. Acoordenação é da museóloga Vera LuciaFinkel e a produção e a coordenação de

montagem são de Raquel Brum. AlessandraCervieri assina a direção da peça, que temno elenco Alessandra Cervieri e Rita J.Bogado.

A atividade acontece aos sábados edomingos, às 14h30 e às 16 horas, e o ECMfica na Av. Alfred Agache, s/n, Centro, pró-ximo à Praça XV. Há também a realização deOficina de Arte às 15 horas e às 15h50. Aentrada é franca.

A Rede Globo de televisão exibiu em seuprograma jornalístico Bom Dia Brasil, em22 de abril último, o interessantedocumentário “Corveta afundada vira atra-ção turística no litoral de Alagoas”.

O mergulho abordado diz respeito aocasco da Corveta Camaquã, pertencente auma série de seis navios-mineirosconstruídos no Arsenal da Marinha do Riode Janeiro, e cuja incorporação à Esquadraocorreu em 7 de junho de 1940. À classe,

MERGULHO NA CAMAQUÃalém da Camaquã, pertenceram as corvetasCarioca, Cananeia, Cabedelo, Caravelase Camocim. Esses navios de 57 metros decomprimento deslocavam 550 toneladas,calavam 2,5 metros e navegavam em velo-cidades superiores a 15 nós. Eles possuí-am canhão de 102 milímetros e duas metra-lhadoras antiaéreas de 20 milímetros, alémde calhas para lançamento de bombas deprofundidade.

A Camaquã, como os demais navios desua classe, prestou inestimáveis serviços deguerra fazendo parte de escoltas de numero-sos comboios ao longo da Segunda GuerraMundial. Chegou a cerca de 700 a quantidadede navios por ela escoltados. Seu naufrágiose deu em ação de guerra, às 9h30 da manhãdo dia 21 de julho de 1944, nas proximidades

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da cidade de Recife (PE). Ela soçobrou em ser-viço de escolta de um comboio devido às pés-simas condições de mar em meio a violentatempestade, de acordo com informação doGabinete do Ministro da Marinha à época.

O documentário exibido pela Rede Glo-bo encontra-se disponível na internet, no

endereço http://g1.globo.com/videos/bom-dia-brasil/v/corveta-afundada-na-segun-da-guerra-e-atração-turistica-no-litoral-de-alagoas/1491114/.

(Fontes: Rede Globo e Revista Maríti-ma Brasileira, 3o trim./1944, 3o trim./1959 e2o trim./1995)

NOVOS SÍMBOLOS DO ESTADO-MAIOR CONJUNTO DASFORÇAS ARMADAS

Por meio da Portaria no 377 do Ministé-rio da Defesa, de 3 de março de 2011, foramcriados o brasão, o estandarte e a insígniade Chefia do Estado-Maior Conjunto dasForças Armadas (EMCFA). Além destessímbolos, o logotipo do EMCFA, que nãoestá incluído na Portaria, também será utili-zado oficialmente.

Estandarte

Brasão

O brasão é um escudo circular, terciadoem palas. Tem a central branca, carregadacom um sabre, sobre a lâmina a inscrição“Brasil” e, abaixo do punho, a inscrição“EMCFA”, ambas em ouro, conjuntoencimado pelo símbolo da Marinha. A des-tra é verde-oliva, carregada com símbolodo Exército. A sinistra azul é carregada como símbolo da Força Aérea. Traz um escudoenvolvido por uma corrente, simbolizando

a união e a coesão das Forças Armadas e éornamentado por uma coroa de louros dou-rada com um laço na mesma cor, carregadocom a inscrição, em negro, “25 Agosto2010”, data de criação do EMCFA.

Insígnia

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O estandarte tem a forma retangular, tipobandeira universal e franjada de ouro; abordadura é amarela, representando o Mi-nistério da Defesa. Traz um campo terciadoem faixas: a central branca, em chefe verde-oliva e em contrachefe azul, cores alusi-vas, respectivamente, à Marinha do Brasil,ao Exército Brasileiro e à Força Aérea Bra-sileira. Em abismo brocante, traz o brasãodo EMCFA e um laço militar nas cores ver-de e amarela, carregado com a inscrição“Ministério da Defesa” e “EMCFA”, emcaracteres dourados.

A insígnia de chefia tem forma retangu-lar, tipo bandeira universal, partida em doiscampos. O primeiro campo é em amarelo,representando o Ministério da Defesa, car-regado, em abismo, com o brasão do

Logo

EMCFA. O segundo campo é terciado emfaixas, a exemplo do estandarte.

(Fonte: www.mar.mil.br)

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A SEGUNDA MAIS ANTIGA DO MUNDO

A Revista Marítima Brasileira completou 160 anos em 1o de março de 2011. Fundada em 1851 pelo

Primeiro Tenente Sabino Elói Pessoa,foi a segunda revista mais antiga do mundo

a tratar de assuntos marítimos e navais.Conforme os registros obtidos, a Rússia foi o primeiro

país a lançar uma revista marítima,a Morskoii Sbornik, (1848).

Depois vieram:Brasil – Revista Marítima Brasileira (1851),

França – Revue Maritime (1866),Itália – Rivista Marittima (1868),

Portugal – Anais do Clube Militar Naval (1870),Estados Unidos – U.S Naval Institute Proceedings (1873)República Argentina – Boletín Del Centro Naval (1882).