revista manuelzão 74 - julho 2015

24
Saúde, Ambiente e Cidadania na Bacia do Rio das Velhas # 74 JULHO u 2015 Fundado em 1997 por iniciativa de professores da Faculdade de Medicina da disciplina Internato em Saúde Coletiva, UFMG sustentabilidade? ética? saúde? transposição? participação?

Upload: projeto-manuelzao

Post on 22-Jul-2016

232 views

Category:

Documents


9 download

DESCRIPTION

Publicação do Projeto Manuelzão da UFMG pela revitalização da bacia hidrográfica do Rio das Velhas

TRANSCRIPT

Page 1: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Saúde, Ambiente e Cidadania na Bacia do Rio das Velhas

# 74JULHO u 2015

Fundado em 1997 por iniciativa de professores da Faculdade de Medicina da disciplina Internato em Saúde Coletiva, UFMG

sustentabilidade?

ética?

saúde?

transposição?

participação?

Page 2: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Av. Alfredo Balena, 190, sl. 813.

Page 3: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 cOMUNIDADE 3

Menos esgoto no rio

Foi aprovada a obra de interli-gação de esgoto na região do Parque Belmonte que vai permi-tir interceptar o esgoto de cerca de 40 mil pessoas na região do Baixo Onça. Isso foi anunciado no evento “Deixa O Onça Beber Água Limpa” realizado no Parque Belmonte com organização do Comurpa, e apoio do Projeto Ma-nuelzão e CBH Velhas.

Mais aves no céu

O projeto ‘Aves do Carste’ irá criar mais um bioindicador da quali-dade ambiental do Rio das Ve-lhas. O intuito é capacitar alunos e professores do ensino médio na identificação, documentação e monitoramento e acompanha-mento da migração da avifauna local, que será integrado a uma rede de informação. Participarão do projeto escolas de Confins, Funilândia, Lagoa Santa, Matozi-nhos, Pedro Leopoldo e Prudente de Morais. O projeto será coorde-nado pelo ICB/UFMG.

Pela revitalização do Córrego Capão

Em comemoração à Semana do Meio Ambiente, o Núcleo Capão e a comunidade do bairro Lagoa da Regional Venda Nova realizaram o evento “Enquanto Houver Sol”, em favor da preservação dos recursos hídricos e da revitalização do Córre-go do Capão. O evento aconteceu no dia 2 de junho na Escola Muni-cipal Adauto Lúcio Cardoso. Foram realizadas oficinas, trilhas, palestras e apresentações culturais.

Augusto de Lima

Cerca de 600 estudantes, entre crianças e adolescentes, visitaram o ônibus do Manuelzão em Augusto de Lima. A visita fez parte da reali-zação do ‘Seminário sobre Conser-vação de Água e Solo’.

COMUNIDADEmanuelzão

rio S. Francisco tá morrendo!

Foi interrompida a navegação no São Francisco no trecho entre Ibotirama e Petrolina (700 km), devido à baixa va-zão e assoreamento do rio. Sobradi-nho está com 21% da sua capacidade de armazenamento. A vazão no Baixo São Francisco está em 900m³/s numa região onde a vazão era de 1500m³/s.

Parque do Brejinho: ainda um sonho

As obras para a bacia de detenção do Parque do Brejinho, no bairro São Francisco, região Norte de BH, se en-contram paralisadas e os recursos para implantação ainda não estão garanti-dos. Enquanto isso, as nascentes estão sendo degradadas.

Alta tensão no rio das Velhas

A proposta de instalação de uma rede de altíssima tensão passando pela re-gião do Alto Velhas ligando Rio Acima, Itabirito e Vespasiano, está preocupan-do ambientalistas. Isso porque a linha de 500KV gera uma grande radiação, o que pode acarretar danos à saúde humana, à fauna e à flora da região. Além disso, há um risco de passar por regiões habitadas.

Aquíferos "estressados"

Um terço dos aquíferos do mundo está secando a uma taxa alarmante, revelam dados da NASA. Oito dos 37 principais aquíferos, inclusive o Gua-rani, foram classificados como “sobre estressados” e outros 5, classificados como “altamente estressados”.

Envie seu relato ou denúncia: [email protected] ou facebook.com/manuelzao

Córrego da Avenida Dois

Sou vice-presidente da Associa-ção de Moradores do Bairro Co-lorado e membro do comitê ges-tor da bacia. No dia 06 de maio tivemos uma audiência pública com a Copasa e o Departamento de Obras Públicas (DEOP) em que foi tratada a retomada das obras de canalização do Córrego da Avenida Dois em Contagem – algo que demorou cerca de 18 anos para acontecer. Recente-mente recebi um documento do Ministério Público atestando que a obra já estava concluída. Levei o documento, tirei cópia, espalhei pela comunidade e o promotor me deu 10 dias para contestar por escrito aquele documento. Na audiência pública que teve em maio na Associação, o DEOP e a Copasa assumiram o com-promisso de retomarem as obras no prazo de 10 a 15 dias e estão cumprindo até o momento.

Carlos Alberto FerreiraNúcleo João Gomes

carta do leitor

Causa santa

O Papa Francisco divulgou a Encíclica Am-biental intitulada “Laudato si” (Louvado Seja). O documento cobra uma postura menos gananciosa de países desenvolvi-dos para evitar mais alterações climáticas e lembra que a ecologia integral deve incluir as dimensões humanas e sociais.

Page 4: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.20154 HISTÓRIA

a história da ocupação humana da bacia do rio das velhasnavegar pelo velhas é vasculhar suas origens e mudanças, desvendando uma região que faz parte da formação de minas

Eugênio GoulartCoordenador de Publicações

Científicas e Literárias do Manuelzão

Os primeiros seres humanos che-garam há cerca de 12 mil anos atrás, com-provam os estudos por datação com o car-bono radioativo encontrado na natureza. Nessa época, ainda pastavam e caçavam pela várzea do Rio das Velhas muitos ani-mais, alguns da megafauna, que logo em seguida foram extintos: preguiça gigante, tigres dente-de-sabre, cavalos pré-histó-ricos e tatus imensos. As tribos indígenas vieram do norte, pois deixaram a Ásia e chegaram às Américas pela ponte de gelo que naquela época existia, ligando a Sibéria ao Alasca. Lentamente foram descendo em direção ao sul, explorando novos territó-rios. Quando chegaram ao centro do nosso continente, usavam com frequência as grutas como abrigo, como, por exemplo,

as existentes no médio Rio das Velhas. Na região de Lagoa Santa, muitos ossos foram encontrados, tanto de animais, como de seres humanos. O mais antigo fóssil huma-no já encontrado nas Américas foi desen-terrado a poucos quilômetros das margens do Rio das Velhas. Os ossos eram de uma mulher de 1,50 metros de altura e com cer-ca de 20 anos de idade. Ganhou o nome de Luzia, dado pelos arqueólogos que a estu-daram. Os traços culturais do seu povo puderam ser estudados parcialmente. Luzia tinha a habilidade de iniciar um fogo, por meio da fricção de gravetos, de trançar uma cesta para coletar côcos e raízes comestí-veis, caçar pequenos animais, e pescar com anzóis feitos com ossos. Morreu acidental-mente, ao cair no escuro de uma caverna, e não recebeu os rituais de sepultamento típicos da sua tribo. O fato surpreendente é que o estudo do seu crânio, assim como de outros fósseis contemporâneos a ela, mostraram características negróides, mais parecido com a fisionomia dos africanos.

Caiqueiros durante expedição pelo rio São Francisco

Portanto, um formato de face bastante diferente dos indígenas posterio-res, que chegaram às Américas, pelo mes-mo roteiro, nos últimos oito mil anos, que apresentam faces com características asiá-ticas. Estes achados antigos da bacia do Rio das Velhas chamaram a atenção do mundo. Assim, a região de Lagoa Santa tem impor-tância reconhecida internacionalmente na área da arqueologia e paleontologia. A ocupação humana seguinte ocorreu no período colonial, quando os bandeirantes vasculharam toda região em busca de ouro e pedras preciosas. A mais famosa expedição da época foi a coman-dada por Fernão Dias, no final dos anos 1600, que ganhou fama como o “caçador das esmeraldas”. Muitas outras bandeiras palmilharam cada recanto, garimpando e aprisionando índios para o trabalho escra-vo. Foi tamanha a captura dos nativos que a grande maioria das tribos indígenas foi extinta. Os bandeirantes fundaram as pri-meiras cidades de Minas Gerais, todas pró-

ACERVO MANUELZÃO

Page 5: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 HISTÓRIA 5

Apesar da degradação ambiental, a cultura regional sobreviveu com criatividade e firmeza

PROCÓPIO DE CASTRO

lUZIA: A PRIMEIRA MINEIRA

ximas ao Rio das Velhas: Ouro Preto, na sua nascente, e a poucos quilômetros, na bacia do Rio Doce, a cidade de Mariana. E ainda na bacia do Velhas: Sabará, Caeté e Santa Luzia. Parte do município de Diamantina, fundada nos anos 1700, pertence também à bacia hidrográfica do Rio das Velhas. O rio, e toda a sua bacia, sofreram muito com o garimpo, com o desmatamento, inclusive das matas ciliares, e depois com a explo-ração das montanhas regionais, ricas em minério de ferro. E sofreram também com a poluição originada nos centros urbanos, que utilizam os curso d’água como destino para todo o tipo de esgoto e lixo. Apesar da degradação ambien-tal dos últimos séculos, a cultura regional sobreviveu com criatividade e firmeza. Isso pode ser constatado no depoimento de moradores, como, por exemplo, sempre valorizam as memórias de suas cidades e vilas. Nos relatos emocionados e saudo-

sistas sobre os vestígios da navegação, em barcos apelidados de “gaiolas”, que des-ciam o rio em direção à Bahia, e o subiam no retorno. E dos restos da extensa rede ferroviária iniciada no tempo do Brasil Im-pério, com suas patéticas marias-fumaça. Também, nos atuais grupos organizados de dança, música, teatro e na fértil produção literária dos seus habitantes, que resistem ativos, mesmo com a falta de estímulo de órgãos governamentais. No orgulho em preservar as receitas antigas da típica culi-nária mineira e na apreciação, nem sempre moderada, dos derivados alcoólicos à base da cana-de-açúcar, cada um deles com sua história de muitas décadas e de muitas ge-rações de cultivadores, produtores e consu-midores. Atualmente, a bacia hidrográfica do Rio das Velhas tem uma população de aproximadamente quatro milhões e meio de habitantes, espalhados em 51 municí-pios, que englobam inclusive a Região Me-tropolitana de Belo Horizonte. Vários gru-pos organizados estão lutando em defesa

do rio, de seus afluentes e de suas milhares de nascentes. O Projeto Manuelzão, sedia-do na Universidade Federal de Minas Ge-rais, orgulhosamente faz parte deste grupo de entidades. Além de nossa participação co-tidiana em defesa do rio, já promovemos cinco FestiVelhas, todos com o objetivo de conciliar as agendas ambiental e cultural. O primeiro, em 2005, na cidade de Morro da Garça; o segundo, em 2007, em Jequitibá; o terceiro, em 2009, itinerante por seis cida-des da bacia do Velhas (Ouro Preto, Santa Luzia, Curvelo, Presidente Juscelino, Várzea da Palma, terminando em Belo Horizon-te); o quarto em Belo Horizonte; e neste ano, quando é comemorada a maioridade do Projeto Manuelzão, pois chega aos 18 anos de existência, e 10 anos do primeiro FestiVelhas, a cidade escolhida foi Itabirito. Mais uma vez, teremos a oportunidade de valorizar as várias formas de expressão da rica cultura da bacia hidrográfica do Rio das Velhas, fruto de vários séculos de ocupação de toda a região pelo Homo sapiens. u

Pinturas rupestres da região de Lagoa Santa, datadas em seis mil anos

WALTER NEVES/USP

Page 6: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.20156 crise e cultura

Nada melhor que um contexto de crise para nos dar a sensação de que a vida muda, que a história anda e precisa ser mudada. A crise nos faz importantes, pois fazemos parte dela e passamos a ser ouvidos. A crise está nas ruas, na acade-mia, na política, e por isso a democracia tem valor. Ela nos tira da zona de conforto, do esperar acontecer e nos obriga a pen-sar, a refletir sobre o porquê de chegarmos a este ponto e como reagir. A crise nos tira as certezas que julgávamos ser verdades absolutas e eternas, nos tira o chão e nos precipita no voo. O voo nos leva a buscar novas referências e novos caminhos. Não chegamos à escassez hídrica por acaso, mas por um caminho que a nossa cultura construiu. A nossa cultura elaborada social-mente e perpetuada através da reprodu-ção do conhecimento nos levou a pensar e agir sobre o ambiente de forma arrogante e prepotente. Nos posicionamos acima de todas as espécies, da biodiversidade, do planeta e até da própria vida. Fizemos do planeta Terra uma ”grande oportunidade de negócios”, e re-solvemos consumi-lo como forma de ge-ração de riqueza. Esquecendo que a maior riqueza do planeta é a própria vida. E nem mesmo poupamos os da nossa espécie. Matamos e violentamos até os nossos próprios irmãos. Nossos rios não ficaram imunes a este processo de destruição coletivo. Eles estão morrendo de sede, pois não tem água. Antes eles nos alimentavam, hoje morrem de sede. Mas a crise é uma escola, e nos ensina. Neste contexto, descobrimos que as empresas de saneamento não produ-zem água, mas apenas tratam e distri-buem o que captam de nossos manan-

UMA NOVA CULTURA PARA ALÉM DA ESCASSEZ

A crise está nas ruas e por isso a democracia tem valor. Ela nos tira da zona de conforto e nos obriga a pensar, refletir e reagir

Marcus v. PolignanoProfessor e Coord. do Manuelzão

RENATO CRISPINIANO

pONTE SOBRE O RIO DAS VELHAS

EM VÁRZEA DA PALMA EM 2014

Page 7: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 crise e cultura 7

ciais. Que estes dependem de sistemas naturais complexos que requerem áreas de recarga, solo permeável, áreas de pro-teção, vegetação e nascentes para se man-terem vivos. Ao longo de nossa história ge-ramos uma cultura de degradação e de morte lenta dos rios, e assim passamos despejando esgotos domésticos, efluentes industriais e minerários para dentro dos cursos d’água. As nascentes foram degra-dadas, aterradas e enterradas e córregos deixaram de ser perenes para se tornarem intermitentes. Com isso, os afluentes dei-xam de alimentar o Rio das Velhas, que como outros, deixam de alimentar o São Francisco. Assim vai se formando um ce-mitério de rios. A crise nos ensina que a degra-dação não é conceito, mas uma institui-ção, pois nossa cultura legitima e reforça este modelo com o argumento do cresci-mento a qualquer custo. A escassez não é somente hídrica. Ela também é ética, política, de falta de compromisso com a questão ambiental, com a justiça social e com as gerações futuras. Portanto, há muito o Projeto Ma-nuelzão defende que as mudanças neces-sárias e fundamentais tem que vir através

da cultura. De uma cultura que seja “per-meável” a água e comprometida com a vida. Uma cultura que entenda cada nas-cente como expressão do nascimento da vida e da necessidade de preservação, que torne as cidades “permeáveis”, deixando os rios existirem e seguir seu caminho na-tural sem poluição. Que preservar e não poluir seja a preocupação básica e fundamental de qualquer empreendimento, que poupar anteceda em muito o consumir; que a res-ponsabilidade com a vida se torne o com-promisso maior e essencial da sociedade.Infelizmente, nossa atual cultura é da es-cassez, que representa o fim de um mo-delo. Continuar a reproduzi-lo é levar o

Não chegamos à escassez hídrica por acaso, mas por um caminho que a nossa cultura construiu

processo a exaustão total, da qual com certeza não teremos salvação. A crise só não pode nos privar de futuro, pois nela também há os oportunis-tas que ao invés de procurar rever concei-tos, querem apenas vender soluções sim-plificadas do mesmo. Repetindo modelos e não pensando o novo. A crise tem que ser uma ponte para novos paradigmas e não para o precipício. Nela os prejuízos são socializados. Assim, apesar da escassez de água, da energia e do ambiente, o lucro que não cessa a mudança de modelos não é discutido. É possível aumentar as tarifas, garantir os lucros do capital e socializar a má gestão de serviços e do modelo am-biental, seguindo a expressão-símbolo do liberalismo econômico “laissez faire, laissez aller, laissez passer”, que significa literal-mente “deixai fazer, deixai ir, deixai passar”. Nesse contexto, o FestiVelhas Ma-nuelzão convoca a todos para refletirem e pensarem sobre este estado de coisas, res-gatando as raízes históricas e culturais para entender que somos fruto desta fusão de ideais, energias e expressões. Temos que utilizar isso para resgatar a história do Rio das Velhas para que possamos reconstruí-la de outra forma para o futuro. u

ALEXSANDER SOUSA

Que preservar seja a preocupação básica da sociedade. No Festivelhas, a população esperou os caiaqueiros

Page 8: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.20158 autonomia e ação

AUTONOMIA E PARTICIPAÇÃO NA GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOSdiálogo e construção coletiva são chaves na formação autônoma

Carla wstaneRodrigo Lemos

Marcus V. Polignano

Autonomia pode ser entendida como um conceito aplicável à instituições ou pessoas que possuem a capacidade de se autogerir, de estabelecer as suas pró-prias regras, sem imposições de outrem. A autonomia é o andar sozinho, com as pró-prias energias, ciente e responsável de suas ações e do contexto em que se insere. O oposto da autonomia é a hete-ronomia que representa a incapacidade de reconhecer a origem das regras, de obe-decer cegamente sem compreender e sem questionar as formas como as coisas se constroem. Por isso, como é oposto à he-teronomia, a autonomia deve pressupor a transgressão e o questionamento às regras externas; não significa negar as estruturas externas, mas sim reconhecer essas estru-turas e de forma crítica poder discordar e mudá-las se assim for necessário. A autonomia não deve se formar pelo isolamento, mas deve se consolidar pelo diálogo e pela construção coletiva, ela é uma travessia, uma construção contínua desenvolvida pelas práticas e diálogos coti-dianos. O professor Paulo Freire, nesse sen-tido, nos ensina que a autonomia é “ama-durecimento do ser para si, é processo, é vir a ser. Não ocorre em data marcada. É neste sentido que uma pedagogia da autonomia tem de estar centrada em experiências es-timuladoras da decisão e da responsabili-dade, vale dizer, em experiência respeitosas da liberdade”. (FREIRE, p. 67, 1997) Acreditamos que é possível en-tendermos autonomia como uma sucessão de conquistas que permitam a transgres-são e a construção diferenciada a partir da perspectiva dos sujeitos. A autonomia é um conceito que pode ser utilizado para se pensar pessoas e instituições, mas como discutir a aplicação do conceito de auto-nomia a uma instituição complexa, plural e conflituosa como os comitês de bacia e os subcomitês?

Segundo a Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9433/97), “a gestão dos recursos hídricos deve ser descentrali-zada e contar com a participação do Poder Público, dos usuários e das comunidades” (BRASIL, 1997). Os comitês são compos-tos por diferentes (e conflituosos) atores e deve buscar o diálogo, procurando aprimo-rar o entendimento entre esses entes, com-partilhando experiências e promovendo novas formas de atuar no território. Os rios são apropriados de múltiplas formas pelas sociedades modernas – além de importan-te recurso –, são vistos também como po-tenciais instrumentos políticos por meio da dinâmica social que os envolve. A autonomia é um pré-requisito para a valorização do outro e de sí próprio. Acreditamos que pessoas autônomas re-conhecem seus limites e suas incertezas, assim como valorizam os diversos saberes individuais e coletivos, saberes que nem sempre são técnicos. Para se ter uma re-flexão sobre a autonomia dos comitês de bacias, é preciso pensar em como se cons-troem espaços de encontro do complexo, como se possibilita a participação de vários tipos de sujeitos na gestão das águas de forma justa, e da mesma maneira, como se promove a descentralização dos poderes em condições distintas de existência. Aqui é preciso destacar a impor-tância de um processo dialógico de debate, que priorize e reconheça a existência de realidades desiguais e conflituosas no seio dos comitês de bacias. Além da gestão do substrato espacial (o rio e sua bacia) é pre-ciso gerir também as relações sociais que ali se encontram. Na prática muitas contra-dições podem existir e a gestão compar-tilhada das águas deve permitir que uma pluralidade de interesses, muitas vezes conflitantes e supostamente incompatíveis, se encontrem. Mas como é possível diálo-go se temos instâncias e estruturas tão di-ferentes e tão desiguais. Como pode haver diálogo entre o Estado, as grandes empre-sas usuárias de água, as comunidades ri-beirinhas e as organizações da sociedade civil? Como dialogar se os atores possuem

capacidades técnicas e articulações políti-cas tão discrepantes e desiguais? É justa-mente devido à existência de discursos distintos, dessa estrutura desigual, que se precisa visar à autonomia de seus partici-pantes, apenas assim podemos construir relações menos desiguais e consequente-mente mais justas, efetivando condições de negociar interesses tão discrepantes. Nessa perspectiva a autonomia é entendida como um processo de conquista social, conquista de grupos que hoje conseguem construir uma sociedade que se auto-questiona, que se desconstrói e reconstrói a partir das ne-cessidades e interesses coletivos. Não existe receita de bolo. Mas, ao olhar para trás e ver o caminho percor-rido pelo Comitê de Bacia Hidrográfica do Rio das Velhas, é possível perceber a bus-ca por autonomia em momentos de sua existência. O CBH Rio das Velhas buscou efetivar o que preconiza a Lei 9.433/97 ao publicar a Deliberação Normativa 02/2004, que instituiu seus Subcomitês: com “finali-dades propositivas e consultivas, cada um a sua maneira, como formas efetivas de des-centralização do planejamento e da gestão territorial” (SEPULVEDA, p. 5, 2012). Avan-

O Comitê tem de ir além de suas capacidades ... O comitê tem de ser um espaço de questionamento e também de transgressão, onde se constrói política pública a partir das águas e pelas águas

Page 9: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 autonomia e ação 9

çou no sentido de descentralizar a tomada das suas decisões, compartilhando poderes com representantes de toda a bacia. Além desses espaços de diálogo, que são os sub-comitês, é importante lembrar também atuação na bacia do rio das Velhas, do Pro-jeto Manuelzão, que criou um movimento social em prol de rios vivos. A existência dos Núcleos Manuelzão, que compartilham informações, discutem e definem ações lo-cais para solucionar problemas ambientais e sociais. É possível aos comitês terem au-tonomia, uma vez que são amarrados de forma heterônoma às estruturas e às com-petências jurídicas e normativas? É possível que o CBH seja mais que uma instância de decisão de alguns instrumentos de uma política setorial e restrita? Queremos que o CBH faça mais do que analisar instrumen-tos da gestão de recursos hídricos! Acredi-tamos que é possível que os Comitês, se-guindo com seu tempo e suas condições limitadas, possam desenvolver autonomia, partindo de um movimento social e de um forte imaginário na mente dos sujeitos. O Comitê tem de ir além de suas capacidades normativas e jurídicas para efetivar uma

gestão territorial social e ambientalmente mais justa; o comitê tem de ser um espaço de questionamento e também de trans-gressão, onde se constrói política pública a partir das águas e pelas águas. Se queremos a autonomia isso significa o direito de discordar uns dos ou-tros, mas este discordar deve ser propositi-vo, deve conseguir questionar as estruturas e propor adequações. É preciso permitir a mudança em um legítimo espaço de diá-logo e construção. Sabemos que para que um espaço de diálogo legítimo seja cons-truído, é preciso que os agentes da socie-dade civil, acreditem em sua própria força, escavem e briguem pela construção de um tipo de participação igualitária. Isso se dá, entre diversas outras ações políticas, na formulação, desenvolvimento e avaliação dos projetos que são comuns a todos. Essa é uma forma de explicitar as diferenças, fazendo desvelar o sentimento de corres-ponsabilidade de todos nos processos de construção de um projeto público. Da mesma forma deve ser enten-dimento do Estado que a democracia parte também da construção de condições para a participação coletiva. Uma relação que

possa permitir a liberdade de negociação entre vários atores sociais se estabelece quando gera a sensação de interdepen-dência envolvendo o Estado e a sociedade. Discutir autonomia significa dis-cutir as relações de poder que existem e as responsabilidades que geram. E justamen-te, por este motivo, grupos sociais precisam constantemente fazer valer a autoridade que lhe é legítima. A autonomia que se quer construir não está apenas em parida-de quantitativa, mas na qualidade de sua participação, no respeito à liberdade de ex-pressão e no poder de transformação. Para isso, é preciso exercitar uma democracia que se reinventa no cotidiano, entendendo isto como certo alargamento da política, trazida para os lugares de experimentação da vida. Os caminhos percorridos pelos conselheiros devem permitir o diálogo en-tre diversos saberes e práticas e, na dire-ção de somar conhecimentos aos níveis de consciência dos sujeitos, se deixar deslocar, buscando perceber formas de ser e atuar no mundo. Não existe uma fórmula de como ter autonomia, mas existem formas de con-duzir escolhas, de ter atitudes e comporta-mentos coerentes com o que se almeja em grupo. Para isso é preciso navegar, nadar, atravessar o rio, o que não se encerra em operacionalizar as ações. É preciso reavaliar constantemente nossas práticas, capacitan-do os conselheiros, convidando outros ato-res, ampliando o debate na direção do ho-rizonte que se quer alcançar. Que sejamos também capazes de reconhecer a origem deste movimento, do seu imaginário trans-gressor que faz de sua autonomia uma tra-vessia, uma construção contínua e também um estado a ser atingido em sucessão de pequenas conquistas. u

LILA GAUDÊNCIO

Referências

FREIRE, Paulo. Pedagogia da auto-nomia: saberes necessários a prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1997.

Brasil. LEI DAS ÁGUAS. Lei 9.433, de 08 de Janeiro de 1997. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9433.htm; acesso em 04 de maio de 2011.

SEPULVEDA, Rogério. Descentralização participativa por meio dos subcomi-tês na bacia hidrográfica do rio das Velhas/Brasil. VI Fórum Mundial das Águas. Marselha/França, fev. 2012.

É PRECISO CONSTRUIR POLÍTICAS A PARTIR DAS ÁGUAS E PELAS ÁGUAS

Page 10: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.201510 sustentabilidade

Como nossos hábitos, costumes e ações conduzem e nos transformaram numa sociedade que privilegia a abundan-cia momentânea, o consumo exacerbado? Porque mantemos o discurso de susten-tabilidade praticando o desperdício e a dilapidação dos recursos planetários que estão nos conduzindo a quadros sombrios futuros, onde a gestão não será mais de riquezas e sim da escassez? É preciso de-bater esta condição humana e nos colocar em estado de alerta para que possamos re-pensar nossos valores e recuperar a consci-ência e o cuidado com os bens disponíveis, cujo acesso a estes bens aparentemente ilimitados, aconteceu muito recentemente na história humana. Este acesso fácil trou-xe benefícios indiscutíveis à humanidade é também o que foi, em pouco mais de um século, o responsável pela degradação pla-netária em intensidade maior do que todo nosso passado. A relação predatória e de muitas facilidades tem produzido euforias con-sumistas e inconsequentes. Em pequena parte da população, representada perfeita-mente no perfil egocêntrico dos “yuppies” na década de noventa, onde o “eu sou, eu posso”, se refletiu no modo de vida, e cultu-ra e arte de toda uma geração que almeja-va atingir aquele patamar idílico de sucesso e estilo de poder, na realidade insustentá-vel, logo se mostrou uma bolha explosiva de falsa riqueza. A crise que se seguiu, infelizmente, parece não produziu aprendi-zado contra o desenvolvimento a qualquer custo. As nações continuam, junto com o sistema capitalista, na prática do modelo de corrida pela geração de riqueza acumu-lativa de rendas descomunais para poucos e socialização dos prejuízos. O capitalismo tem seus méritos, pois foi o sistema que permitiu os avanços tecnológicos e de acessos para grande parte da humanidade, mas que necessita de correções para que aprenda a distribuir social e igualitariamen-te seus resultados, promovendo o equilí-brio entre pobres e ricos. Esta é a seara de políticas públicas nacionais e transnacio-

o falso discurso da sustentabilidade

A relação predatória produz euforias consumistas inconsequentes

nais a ser aprimorada, principalmente pelo desenvolvimento de valores para além dos meramente econômicos e que reduzam as perdas dos excedentes produzidos fomen-tando e praticando uma distribuição mais eficiente e igualitária. Não é possível querer produzir cada vez mais e se jogar fora o excesso de produção quando o preço não é aceitável apenas na visão do capital e do lucro. Esta é a hora de ações do Estado regulador e fomentador de políticas pela nação e pela distribuição das benemesses. O planeta não aguenta o modelo do sempre mais e mais. A cultura do desperdício esta acaban-do com os recursos naturais em suas fontes mineração/produção, e no seu fim com a geração cada vez maior de resíduos, que apesar de serem matérias primas em po-tencial, são tratadas apenas como lixo des-cartável e que nesta quantidade e por sua composição contaminam todo o planeta, desde o solo, onde são jogados aos cursos d’água, e ao mar, formando uma triste pe-gada ecológica de passivos insustentáveis. A obsolescência programada estimula o desenvolvimento de novas tecnologias e

novos mercados, mas seu exagero, prati-cada sem políticas publicas transnacionais de mínimo controle, tem consumido o es-toque de matéria prima, exigindo outros planetas para esgotar a fúria consumista. A nossa realidade brasileira não é diferente e, sim, possuidora de agravantes no modelo civilizatório imposto pelos eu-ropeus portugueses que aqui não vieram para morar e sim extrair riquezas de for-ma predatória e rápida. Modelo este, que a bacia do rio das Velhas foi palco prefe-rencial por sua riqueza mineral, em especial o ouro. Queimadas eram praticadas pelos bandeirantes a partir das margens dos rios (Warming in Lagoa Santa 1908), instituin-do a prática da destruição da vegetação em prol do interesse imediato. Prática que também norteou a agricultura nos últimos séculos com o nome de coivara para abrir novos campos de cultivo, trazendo grandes prejuízos para as terras, promovendo o seu rápido esgotamento pela lixiviação do solo e a perda da biodiversidade. Criou-se uma cultura e uma prática que até hoje persiste e é difícil de ser erradicada. O modelo da mineração do ouro

pROCÓPIO DE CASTROPres. do Instituto Guaicuy

ANôNIMO, 1780; COLEçÃO j.f. ALMEIDA PRADO IEb/USP

Extração de ouro por lavagem de barranca aurífera no rio das Velhas

Page 11: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 sustentabilidade 11

promoveu desvios de cursos d’água para lavagem de barrancas auríferas, assore-ando os rios, segundo o geólogo alemão Barão de Eschewege: “Revolvendo-se fre-quentemente as cabeceiras dos rios, estas se carregam cada vez mais de lama, a qual se foi depositando sobre a camada rica, alcançando de ano para ano maior espes-sura, tal como vinte, trinta e até mesmo cinquenta palmos. Por este motivo, as di-ficuldades tornaram-se tão grandes, que não se pode mais atingir o cascalho vir-gem.” (ESCHWEGE, 1833, p. 168) apud Gue-des. O assoreamento histórico, por causas naturais e minerárias, atingem até 12 me-tros conforme estudos realizados na calha do rio do Velhas por Giovana Parizzi et al (2011) : “Geofísica e sedimentologia aplica-das à avaliação do grau de assoreamento de trecho do Rio das Velhas em Rio Acima, Minas Gerais”. Este mesmo modelo extrativista adotado pela mineração do ferro e outros minerais, resulta em imensos passivos que extrapolam a área das minas. Um modelo relegado ao extrativismo sem preocupa-ções em se desenvolver as fases sequen-ciais dos processos produtivos em que outros valores são agregados aos produtos finais por adição de tecnologia. O Rio das Velhas é testemunha dos assoreamentos, das contaminações químicas, dos desma-tamentos, dos passivos históricos de ca-vas não recuperadas e do esgotamento de recursos e de insegurança de um futuro incerto para quando o mineral acabar. O resultado desta cultura predatória nos di-reciona para sermos gestores da escassez que o modelo produz.

A escassez da águaA nossa forma de agir construiu um mode-lo civilizatório que claramente conduz a es-cassez deste líquido precioso, seja por con-duzir à sua falta, seja por contaminá-la. Isto se reflete claramente na expressão “tempo bom” que significa sol de rachar. Esta ex-pressão reflete nossa cultura de expulsão da água praticada na impermeabilização dos quintais, na eficiência dos sistemas de drenagem, nas retificações dos rios, na des-truição dos sistemas naturais de absorção, como os alagadiços e matas ciliares. Depois que a água desaparece pensamos em soluções emergenciais da reservação, sem praticar a recuperação dos sistemas naturais produtores de água. Uma floresta absorve a água da chuva e a libera lentamente por longos períodos. Em nos-sas cidades impermeabilizadas a absorção é muito baixa e a água é liberada com mui-ta rapidez.

Comparação rural e urbano No campo á água é absorvida pela vege-tação e pelo solo e demora para escoar en-quanto na cidade impermeabilizada ela se esvai rapidamente provocando enchentes e outros problemas. Culturalmente viramos as costas para o rio e nele jogamos nossos dejetos humanos e industriais como sendo a coisa mais normal a se fazer. Realmente o rio tem capacidade de depuração, mas esta nunca foi sua função, que é prioritariamente a de fornecer base de vida para todos os seres vivos. Quando o usamos para limpar nossa sujeira o estamos poluindo e prejudicando a todos os que dele ainda necessitarão fa-

REFERÊNCIAs

WARMING, Eugênius. Lagoa Santa: a Vegetação dos Cerrados brasileiro por Ferri, Mario G. Belo Horizonte, Itatiaia; São Paulo, Ed. da USP, 1973.

GUEDES, Valdir Lamim. Uma análise históri-co-ambiental da região de Ouro Preto pelo relato de naturalistas viajantes do século XIX. Disponível em: https://naraiz.wordpress.com/2010/11/05/uma-analise-historico-am-biental-da-regiao-de-ouro-preto-pelo-rela-to-de-naturalistas-viajantes-do-seculo-xix/. Acessado em 12-06-2015

M.G. PARIzzI, et al. / Geofísica e sedimentologia aplicadas à avaliação do grau de assoreamento de trecho do Rio das Velhas em Rio Acima, Mi-nas Gerais - Geonomos, 19(2), 152-162, 2011.

zer uso. Esta é a mentalidade mais perver-sa no modo que lidamos com a água, pois transfere aos outros o prejuízo da nossa inconsciência. O resultado é que rios que poderiam ser fonte de vida se tornam em locais evitados, malcheirosos, perigosa-mente poluídos: rios mortos produtores de doenças e mortes. Rios que para serem provedores de água para consumo huma-no e industrial necessitam de tratamento cada vez mais caros e na natureza produ-zem a escassez de vida, pois ela não têm como reagir. O produto final é a mortanda-de de peixes que nos faz lembrar o que diz o lema do Projeto Manuelzão: “o destino do peixe anuncia o nosso”. Temos que mudar este paradigma ou nunca produziremos sustentabilidade e nossa herança para as próximas gerações será apenas a escassez. u

área florestal área residencial área urbana

InfiltraçãoEscoamento InfiltraçãoEscoamento InfiltraçãoEscoamento

10 a 20%

40 a 50%

90 a 100%

0 a 10%

50 a 60%

80 a 90%

Page 12: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.201512 água e cultura

A água é inseparável do fenômeno da vida. É um recurso que com-partilhamos com o resto dos seres vivos. Do ponto de vista antropo-cêntrico, a importância da água na

vida se reflete de muitas formas e enten-der que isto é fundamental para conseguir uma gestão adequada deste recurso é pri-mordial para se caracterizar uma cultura da água. “Cultura pode ser entendida como sendo um conjunto de característi-cas humanas que não são inatas, ou seja, não nascem com os indivíduos”, afirma a professora doutora em Administração e Mestre em Turismo e Meio Ambiente, Fer-nanda Matos. Para ela, essas característi-cas culturais se desenvolvem, preservam ou aprimoram através da comunicação e cooperação entre indivíduos em socieda-de, associada a uma capacidade de simbo-lização considerada própria da vida coleti-va. Portanto, como explica, a cultu-ra é fortemente influenciada por seu am-biente. “Assim, as condições geográficas influenciam toda a cultura de seus habi-tantes. Onde a cultura determina o meio ambiente, e, também é determinada por ele, adaptando às condições externas im-portantes a fim de elevar a qualidade de vida”, declara. Ao relacionar a questão cultu-

Há diferentes culturas da água e diferentes formas de reflexão a respeito desse recurso. Estas culturas são povoadas por discursos

que são de uma só vez manifestações estruturantes, reguladoras e instrutivas de ações. A cultura não é uma, mas multifacetada e

variada quanto a própria humanidade.

por umaC U L T U R A

da ÁGUA

Renato CrispinianoRepórter

ral à água, ela faz um paralelo e revela os simbolismos destes termos na história. Os egípcios estabeleceram uma rica civiliza-ção às margens do Rio Nilo. “O rio favo-receu a produtividade da terra e serviu de acesso às fontes de matérias primas”.

Há uma escassez de cultura? Atualmente muito se fala em escassez de cultura, seja no que se concerne a palavra, como um conjunto de características hu-manas, ou num contexto social e econô-mico. Para Fernanda Matos, não há uma escassez cultural, pois cada cultura é o resultado de evolução histórica e sua rela-ção com outras culturas. “Nesse sentido, a cultura é o meio de adaptação do homem aos diferentes ambientes. Existem dois tipos de mudança cultural: interna, que resulta da dinâmica do próprio sistema cultural. Esta mudança é lenta; porém, o ritmo pode ser alterado por eventos histó-ricos, como catástrofe ou uma grande ino-vação tecnológica. E a mudança externa, que é resultado do contato de um sistema cultural com outro. Esta mudança é mais rápida e brusca”, esclarece. “Os rios favoreceram o desen-volvimento urbano e agrícola, mas esse crescimento tem ocasionado a ‘morte’ de vários deles, ao transformá-los em meio de escoamento de esgoto. Os rios urbanos sofrem com a poluição, o assoreamento,

o mau cheiro (a Lagoa da Pampulha, por exemplo), o desvio de seus cursos, a des-truição das matas ciliares, mudança de co-loração, incapacidade de uso original de seus recursos (por exemplo, o Rio Tietê e o Rio Iguaçu)”, disse. A professora do Departamento de Antropologia e coordenadora do Ges-ta (Grupo de Estudos em Temáticas Am-bientais)/UFMG, Andrea zhouri, também considera que não há escassez de cultu-ra, mas uma despolitização da sociedade. “A ideia de escassez é própria da cultura ocidental, que pensa a natureza fora como algo que é delimitado. Há na verdade um problema e ele é político. Há uma escassez política, vivemos na verdade uma crise de má distribuição do poder na sociedade. Pequenos grupos têm o poder de definir como as coisas devem ser para a maioria. O poder está mal distribuído e com ele, o meio ambiente também”, afirma ao res-saltar que: “cultura não é sabedoria, não é informação e nem acesso a determinado atendimento. Ela é uma forma de ser no mundo. É a introdução do ser no mundo, são formas de existir no mundo”. “È preciso resgatar a política em todos os níveis. E isso significa abrir o de-bate à diferença de opiniões, incorporá-la, ouví-la e abrir espaços para o contraditó-rio. A despolitização do debate ambiental de certa forma banil o dissenso, a oportu-

Page 13: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 água e cultura 13

nidade do não. Fica um debate em torno dos meios e esquecem os fins, sobre o que queremos da sociedade. Qual o projeto político e modelo de sociedade querem construir?”, acrescenta zhouri.

Ambiente geográfico e cultura“O ambiente não determina o tipo e o grau de cultura dos povos, mas limita ou favorece o desenvolvimento de uma cul-tura”, afirma Matos. Para ela, quanto mais uso e aproveitamento uma cultura faz do meio geográfico, tanto mais dependente ela fica. Ou seja, o domínio do homem so-bre a natureza o torna cada vez mais de-pendente desses recursos. “Desempenhando um leque de funções, a água é utilizada para cultivo e produção de alimentos, como símbolo po-lítico e cultural, bem como um local para entretenimento, lazer e esportes. Ao longo da história da arte a água também aparece em esculturas, pinturas, objetos, além de música e literatura. A representação do ele-mento aquático na arte ocorreu também por meio de alegorias mitológicas, como os personagens Netuno, Narciso e as se-reias”, argumenta Matos ao revelar que as representações culturais das águas variam segundo as culturas, as religiões, o habitat em que se desenvolveram, sua maior ou menor disponibilidade e sazonalidade. As comunidades aprenderam a

conviver com a sazonalidade do ciclo da água. “Os ribeirinhos amazônicos e panta-neiros vivem ao sabor das cheias e vazan-tes, expandindo sua vida social durante o período de estiagem e restringindo-a du-rante a subida das águas”, exemplifica Fer-nanda Matos ao destacar que ao percorrer as cidades, pode-se perceber também a incorporação da água como elemento na-tural ao ambiente construído pelo homem, como fontes (os chafarizes das cidades históricas mineiras, os monjolos e rodas d’água), pontes, aquedutos, barragens, dentre outros que são partes do patrimô-nio cultural; presentes também no paisa-gismo com a valorização da paisagem dos espelhos d’água e lagos urbanos. Nas religiões, ela também des-taca que o uso ritual da água segue um ritmo de envolvimento crescente que vai desde a simples aspersão, até a total imersão. Para se livrarem do ciclo de reen-carnações, os hindus mergulham nos rios considerados sagrados, como o Ganges. Os judeus se purificam pelo banho ritual. Os muçulmanos lavam os pés, os braços e o rosto antes da oração. Do mesmo modo, o cristianismo incorporou, no sacramento do batismo (presente também em outras denominações religiosas) o simbolismo de regeneração que a água irradia, e o uso da água benta. No espiritismo tem-se o uso da água fluidificada, no qual, segundo a

ACERVO MANUELZÃO

crença, fluidos medicamentosos são adi-cionados à água. Nas tradições afro-bra-sileiras têm-se também elementos relacio-nados à água. Entre os usos múltiplos da água, o turismo depende de forma direta da existência de patrimônio hídrico com po-tencial cênico e paisagístico. No Brasil, parte significativa das localidades com atividades turísticas ou com potencial tu-rístico - como é o caso da Serra do Gan-darela, em Minas Gerais -, a água torna-se um atrativo. Nesse contexto, é relevante a articulação da gestão de recursos hídricos com a gestão do patrimônio cultural.

conscientização culturalFalar em cultura da escassez, numa época em que temos muitos caminhos e modos de receber informações, é desafiador, por-que vemos sempre no novo, possibilida-des diversas. Mas cultura não diz apenas do conjunto dos conhecimentos adqui-ridos, mas do que é feito desse conheci-mento e como ele pode transformar nos-sas vidas. A proposta é ir além e fazer com que a identidade das manifestações cultu-rais possa contribuir para o entendimento do processo da atual cultura de degrada-ção e destruição por qual estamos passan-do, perdendo valores e criando outros que geralmente não consolidam um sentimen-

O CONTRASTE ENTRE A CULTURA DE DEGRADAÇÃO DOS CÓRREGOS POLUÍDOS E AS NASCENTES LIMPAS: PRESERVAR É PRECISO

Page 14: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.201514 água e cultura

LILA GAUDÊNCIO

ALEXSANDER SOUSA

Envolver a comunidade nas ações pró-meio ambiente fortalece a conscientização política local

INTERVENÇão REALIZADa NO PARQUE MUNICPAL: "GUARDA CHUVA"

to de pertencimento. No entanto, é pre-ciso despertar a conscientização cultural das pessoas para a necessidade absoluta de uma política cultural, seja ela qual for, como fruto do mais amplo debate, cuja preparação todas as pessoas possam con-tribuir sem dogmatismos. Por isso, é importante sensibili-zar criticamente as pessoas sujeitas a um permanente processo de massificação e procurar transformá-las em agentes ati-vos da criação cultural, pois quando se fala em cultura da escassez, não se quer dizer cultura ‘popular’ ou ‘erudita’; a questão vai além, remete a cultura do que falta, a cul-tura da miséria de pensamentos e atitudes, pois a escassez cultural se faz na falta de conscientização e efetivação dos fazeres locais. Estamos nos acostumando a não dialogar com nossa própria cultura e nos-so saber local, por isso, é necessário uma substancial democratização da cultura que terá que ser inevitavelmente completada pela descentralização das suas consequ-ências, ou seja, uma cultura germinada, apropriada por todos e que retrate o pro-cesso cultural que se deu por diferentes raças, povos, e interesses que forjaram um processo diverso que ora resiste, ora justi-fica essas ações de degradação. A escassez não se esgota na cul-tura enraizada, lógica, pontual, vivida, mas também no ponto de vista social, quando revela as mazelas da sociedade. Do ponto de vista educacional, quando não há uma educação de qualidade quando a popula-ção não tem o mínimo necessário para se satisfazer; ora fisiologicamente, ora ma-terialmente. A hora de mudar é agora e o movimento tem que ser o de alertar para a necessidade de um esforço para descons-truir uma cultura poluidora, consumidora e que nos levou a escassez, pois a luta se amplia e vai além da quantidade de água, também se faz na qualidade consciente, mostrada através de uma nova dimensão cultural. É necessário que haja um com-promisso ético e esse passa pela constru-ção de alternativas e exemplos práticos em que as melhorias da qualidade de vida se baseiem na recuperação e conservação dos ecossistemas hídricos e não se limi-tem apenas a ser compatíveis com eles. Uma das chaves está em reconhecer e en-tender que um rio é muito mais que um canal de água, do mesmo modo que hoje entendemos que um bosque é muito mais que um armazém de madeira. A questão é entender os valores sociais, culturais e de identidade, tanto territorial como coletiva da água. u

Page 15: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 ENTREVISTA 15

S diante dos desafios atuais, como trabalhar uma nova proposta de preservação ambiental?

Penso que hoje a mais danosa questão cultural brasileira seja não a da des-truição ambiental em si, mas a do des-conhecimento e depois a da omissão perante o fato. Atualmente Belo Ho-rizonte, com seus mais de 3 milhões de habitantes, está ameaçada por um projeto de mineração irresponsável (Projeto Apolo) que irá comprometer gravemente seu abastecimento hídri-co nos próximos anos. Tudo porque, em outubro do ano passado, foi criado um parque nacional na região da Ser-ra do Gandarela que inexplicavelmen-te não contemplou locais de imensa importância para a preservação de nascentes responsáveis por 70% do abastecimento da cidade. Este cená-rio catastrófico iminente não pertence ao diálogo cotidiano da maior parte daqueles que serão diretamente atin-gidos. Logo, a cultura da destruição ambiental, por parte de segmentos da sociedade, sequer é percebida. Então a função principal do Movimento é a difusão deste conhecimento e suas implicações. Basicamente sensibilizar para mobilizar.

S Há atualmente uma cultura da escassez? Por quê?

A gestão dos recursos naturais de for-ma sustentável exige tempo e esforço de todos os setores, sejam eles públi-cos ou privados. A urgência dos inte-resses de grandes corporações num país emergente, claramente vulnerá-vel à imposição do capital, implica no atropelamento dos melhores procedi-mentos. A esse quadro se soma o tão falado enraizamento da corrupção na sociedade e o resultado é a ruptura do compromisso social a longo prazo. Vi-vemos, antes de todas essas precarie-dades, a escassez moral, das empresas e do poder público principalmente. Conceder licenciamentos para de-terminados empreendimentos pode ser o atestado de óbito de todo um contexto cultural. Estamos assistindo isso acontecer em Conceição do Mato Dentro, por exemplo, onde a implan-tação de uma mina e mineroduto mo-dificou de maneira brusca a qualidade de vida na cidade. Observe o contras-te: a menos de 60 km dali, Itambé do

O Gandarela, o Fica Ficus, Salve a Mata do Planalto e os Núcleos Manuelzão, em BH, são alguns exemplos de mobilização popular. Para o músico Bernardo puhler, um dos coordenadores do Movimento pela Serra do Gandarela, a mais danosa questão cultural brasileira talvez não seja a da destruição ambiental, mas o desconhecimento e a omissão do fato.

Mato Dentro é a cidade com menor índice de violência no Estado. Já Conceição está regularmente no noticiário do crime, algo inacreditável para uma cidade com menos de 10 mil habitantes na zona urbana que era considerada até há pouco tempo a ca-pital mineira do ecoturismo.

S O que estaria levando as pessoas a essa cultura?

Fundamentalmente dois pontos protago-nizam na construção desse perfil: primei-ro o estímulo ao consumo inconsciente e depois fragilidade do sistema educacional de base. Os dois partidos que dominam a política brasileira permanecem alheios à questão ambiental. Há uma disputa pelos números de crescimento do poder de con-sumo. Fulano comemora que a classe X já pode comprar TV 40 polegadas, mas se es-quece que as questões básicas de cidada-nia continuam inacessíveis. Não há saúde, segurança e principalmente educação de qualidade. Se houve um reposicionamento de receita para uma parcela da sociedade não existiu uma condução deste processo, orientando este novo fator. Veja, por exem-plo, o constante estímulo à indústria auto-mobilística com todo seu lobby criminoso que atingiu estratégias de desenvolvimen-to brasileiro ao longo das últimas décadas e, paralelamente, políticas de transporte público e/ou alternativo totalmente in-cipientes. Os governos permanecem de mãos dadas com a indústria automobilísti-ca e as mineradoras. Enquanto isso, as cida-des têm graves problemas de mobilidade e

escassez de água. Isso para não dizer outros resíduos. Ainda não sabemos calcular, por exemplo, o que significa a extinção de um bioma tão raro como o campo rupestre sobre as cangas ferruginosas ou os raros trechos de mata atlântica primaria que restaram em Minas Gerais e estão na Serra do Gandarela. O que está evidente é o impacto que representará a perda de um aquífero fundamental.

S O que representa a água para a cultura de uma população?

Desde cedo aprendemos na escola que o Brasil é a maior reserva de água doce do mundo. Esqueceram de fa-lar, no entanto, que a maior parte da população brasileira não tem acesso à abundância desse recurso, que veio sendo mal gerido pelos órgãos com-petentes. Penso que esse discurso de nossas potencialidades tem certa cul-pa no comportamento irresponsável com o meio-ambiente que apresen-tamos. Trazemos ainda a herança do índio e sua relação plena com a natu-reza. O índio tomava 3 banhos por dia, no rio, e tais reflexos podem ser vistos na sociedade moderna. Mas o índio não destruía seu habitat e nem joga-va esgoto em cursos d`água. A maior parte dos brasileiros hoje tem grande zêlo com a higiene pessoal, mas não tem mais contato direto e diário com a água, a não ser a que saí das torneiras. Não tem mais os rios pra se banhar quando quiser. É esse o ponto onde a adaptação ao meio se deu de manei-ra equivocada e a água deixou de ter o valor que sempre teve em qualquer cultura no mundo.

S O movimento acredita na transformação cultural pela mudança da realidade?

Achamos que a transformação a par-tir da cultura é potencialmente uma ferramenta poderosa, de acesso ao coração e à sensibilidade das pesso-as. E, por mais que isso pareça ingê-nuo, ainda acreditamos que este é o melhor caminho. Não podemos crer que as pessoas só irão se movimentar quando não houver mais uma gota de água na torneira. Até por que as pos-sibilidades reais de mudar a grave si-tuação atual estão no “agora”, porque qualquer minuto adiante já pode ser tarde demais. u

Bernardo puhlerMúsico e Comunicólogo

fO

TO:

ALI

CE O

kAW

ARA

Page 16: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.201516 REVITALIZAÇÃO

Muito já se falou sobre o descaso para com o Arrudas em Belo Horizonte: O rio foi canalizado e hoje não é mais perce-bido como um elemento natural. Seu leito natural foi sucessivamente retificado, cana-lizado e por fim coberto. Seu vale foi trans-posto por dezenas de viadutos, mas poucas são as passarelas que unem a margem sul e norte para pedestres. Sua topografia cor-robora este aspecto de divisor norte-sul: se levarmos em conta que junto ao Arrudas temos a ferrovia que foi aproveitada como trem urbano, há três barreiras paralelas tra-balhando juntas: rio, topografia de fundo de vale e ferrovia. Sua presença na cidade só é manifesta como obstáculo e problema (enchente, mau-cheiro, poluição sonora e visual, descuido de áreas públicas, edifícios abandonados). E sua arquitetura, que po-

POR UMA VISÃO URBANÍSTICA DE INCLUSÃO DOS RIOS

a infraestrutura existente deve ser tratada como paisagem, indo contra uma arquitetura funcionalista para algo mais poético

CARLOS M. TEIXEIRAArquiteto

deria tirar partido do único elemento natu-ral presente no Centro, é uma arquitetura de serviço, predominando galpões, postos de gasolina, depósitos e vazios urbanos. O prédio da Rodoviária, por exemplo, situa-se num rotor de modais de-sarticulados que necessita ser costurado. O que antes era uma várzea do rio separando o Centro do bairro Lagoinha transformou-se num mar de viadutos, num complexo de vias expressas bem típico do urbanismo rodoviarista que infelizmente moldou as ci-dades brasileiras nas últimas décadas. Com a transferência de suas funções para os bairros, seu novo programa pode se trans-formar numa oportunidade para iniciarmos uma nova relação entre arquitetura e rio. Urge ir contra aquele urbanismo e privilegiar as áreas verdes, as praças e, principalmente, o resgate da força do sim-bolismo como potenciais requalificadores da cidade. Ao norte, a Lagoinha precisa de uma melhor conexão de pedestres com o

Centro; de uma transposição que possa aproveitar o vetor da passarela existente para então remodelá-la e transformá-la num parque elevado, como se fosse uma extensão do jardim suspenso de Burle-Marx plantado sobre a laje da Rodoviária. Esse paisagismo flutuaria sobre aquela ba-rulhenta conjunção de viadutos, provendo sombras ao árido percurso bairro-Centro, revisitando os padrões burle-marxistas da Rodoviária e incorporando uma ciclovia, assim permitindo que a futura malha ciclo-viária da avenida Antônio Carlos seja arti-culada às ciclovias das avenidas Paraná e Santos Dumont. Passarelas de pedestres poderiam se transformar num verdadeiro instrumen-to de uma nova identidade do vale: pontes generosas, com programas acoplados e potencial para valorizar um rio para o qual a cidade virou as costas. Lembremos não apenas de exemplos históricos que propor-cionam, alhures, uma travessia de rios ur-

CARLOS M. TEIXEIRA

Jardins, praças e cinema sobre o rio arrudas piscina filtrante no rio hudson em nova york

Page 17: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 REVITALIZAÇÃO 17

banos prazerosa para o pedestre (a Ponte Vecchio de Florença, a Ponte do Brooklin de Nova York, a Pont Neuf de Paris, a ponte D. Luiz I no Porto, em Portugal), mas também o fato de que nossas pontes mais ambicio-sas são de uma escala intimidante para não dizer acachapante: a ponte mais famosa do Brasil é a Rio-Niterói... Além de uma conexão Centro-La-goinha mais generosa que a pinguela de pedestres atual, é preciso construírmos vá-rias outras: uma primeira ligando o circuito da praça Floriano Peixoto à praça Duque de Caxias em Santa Tereza, outra como con-tinuação da rua Sapucaí e rua Itambé na Floresta até o Parque Municipal, uma outra na Avenida Bernardo Monteiro – todas co-laborando para que a infraestrutura urbana se transforme para prover identidade e no-vos marcos visuais a estes bairros.

Um Parque LinearE sob essas passarelas, não um trânsito de passagem, mas um parque linear ao longo de um canal com seções de diferentes ti-pos e com novas encostas verdes, quadras esportivas, escadarias, jardins verticais e diversos equipamentos para a prática de esportes – todos conformando um futuro Corredor Verde Centro-Leste. Sendo uma das raríssimas regiões planas de BH, este corredor vai funcionar também como item fundamental da rede de ciclovias que está sendo implantada, definindo uma nova infraestrutura de mobilidade e desempe-nhando papel importante num urbanismo agora pensado para a experiência daqueles que mais fazem uso da cidade: o pedestre e o usuário de transporte coletivo.

Infraestrutura como PaisagemNo Centro, o chamado Boulevard Arrudas precisa se transformar num boulevard de fato, com calçadas mais largas, árvores que justifiquem sua alcunha e um tratamento ambiental ambicioso que vai da Praça da Estação ao Corredor Verde. Nesta perspec-tiva, a Avenida Andradas deixa de ser uma via de oito pistas para se transformar num calçadão capaz de recriar um vale verde Centro-Leste. A infraestrutura do canal existente deve passar a ser vista com um olhar me-nos funcionalista e um pouco mais poético. As centenas de vigas de concreto sobre o Arrudas não estão a espera de novas pistas de rolagem (como o foram no retrógrado Boulevard Arrudas): são vazios expectantes onde estão os melhores futuros da cidade. Já há a Praia da Estação; agora imaginemos a praia sobre o rio: o leito do Arrudas como um vazio urbano a espera de jardins ele-vados, cinemas ao ar livre, shows musicais, atividades cívicas inusitadas. Quimeras? Enquanto Belo Hori-zonte duplica a avenida Andradas, outras cidades estão redescobrindo seus rios. Aquelas vigas, elemento molesto concebi-do por uma engenharia de trânsito caduca, podem ser ressignificadas como elemento propulsor de novos espaços públicos e de uma nova relação com o Centro e com o rio. E assim uma cidade de festas e de cele-brações poderá reativá-lo: o Arrudas como evento, como um campo ativo capaz de ca-talisar uma ampla gama de atividades fixas e transitórias, públicas e privadas, lúdicas e de lazer, possibilitando diferentes arranjos e assumindo as mais diversas facetas. u

Nas últimas décadas, o des-matamento de encostas, das matas ciliares e o uso inadequado dos so-los tem contribuído para a diminui-ção dos volumes e da qualidade da água, um bem natural insubstituível na vida do ser humano. Os cuidados devem se iniciar com a preservação das nascentes, pois, são as origens dos rios. Elas são manifestações su-perficiais de água armazenadas em reservatórios subterrâneos, chama-dos de aquíferos ou lençóis, que dão início a pequenos cursos d’água, que formam os córregos, se juntando para originar os riachos e dessa for-ma surgem os rios. Para a conservação de nas-centes e mananciais em proprieda-des rurais, podem ser adotadas algu-mas medidas de proteção do solo e da vegetação, que vão desde a elimi-nação das práticas de queimadas até o enriquecimento das matas nativas. “A água é um recurso valioso nas áre-as rurais e por isso precisamos cuidar para que sejam sempre limpas e vi-vas”, comenta Odilon Lima, produtor rural da região de Acurui, em Itabiri-to. Para ele, perceber que a água é um bem vital e que pode de-terminar a cultura de um local é fun-damental para que haja mais pesso-as dispostas a conviver em sintonia com o meio ambiente. “Em minha propriedade temos 13 nascentes que cuidamos com carinho e técnicas de preservação como as barraginhas e outras”, disse. “È necessário conviver com o meio ambiente e isso é o mínimo. Aqui fazemos com que a nature-za seja parte de nosso cotidiano e um meio de socialização. No Brasil, a agricultura familiar pode ser um meio diferente de utilização do meio ambiente rural. Uma alternativa a essa cultura da destruição”, afirma Odilon.

Os prefeitos de quatro muni-cípios da região do Alto Rio das Velhas: Nova Lima, Rio Acima, Raposos e Ita-birito, assinaram em junho, em Nova Lima, acordo de cooperação para recu-perar e preservar as nascentes e áreas de preservação permanente da região. Os prefeitos somarão esfor-ços para a revitalização ambiental, ca-bendo às cidades que têm viveiros flo-restais, como Nova Lima e Rio Acima, produzir as mudas de espécies nativas para recomposição da mata ciliar e do

nascentes ou 'morrentes'?

Prefeitos assinam por proteção de nascentes

entorno das nascentes. O convênio prevê implantar a gestão compartilhada da bacia com ações socioambientais para proteção dos afluentes do Rio das Velhas. As ações terão abrangência no território de cada um dos municípios e as prefei-turas deverão fazer o mapeamento das nascentes, estabelecendo prioridades e cronogramas dos planos. O trabalho começará pela identificação das áreas mais comprometidas e pela conscien-tização das comunidades do entorno.

Page 18: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.201518 áreas verdes urbanas

Soluções ecológicas que investem na cultura socialas áreas verdes são resultado de uma melhor integração do espaço urbano

RENATO CRISPINIANORepórter

O Projeto Manuelzão vem de-fendendo a criação de parques lineares como modelo de harmonia arquitetôni-ca de convivência com os rios urbanos. O Parque Ecológico de Itabirito, palco da quinta edição do FestiVelhas é um modelo de parque linear a ser seguido. A arquiteta Rousemara Lopes, uma das idealizadoras do projeto, faz um histórico do processo. “Coincidentemente, na mesma época, es-crevi meu trabalho final do curso de pós-graduação em Planejamento Ambiental Urbano, sobre o tema dos vazios urbanos da cidade. Havia acabado de constatar que os interesses comerciais haviam aca-bado com quase todas as áreas verdes da região central da cidade, restando apenas as áreas localizadas às margens de rios, em áreas muito íngremes ou de difícil acesso. Não foi necessário muito tempo para amadurecermos juntos sobre a ideia da criação de um parque ecológico na-quele local”, disse. Segundo ela, a área era bem grande e se encontrava totalmente sem uso e completamente tomada por lixo. “Alguns corajosos moradores do bairro Nossa Senhora de Fátima e trabalhadores do Distrito Industrial atalhavam por den-tro dessa área, em uma trilha de terra, em meio a muito lixo e falta de segurança. Ela pertencia a um próspero comerciante lo-cal, que pretendia instalar ali futuramente um supermercado ou um shopping cen-ter”, explicou ao revelar que no início o processo de desapropriação que se arras-tou em litígio por vários anos. “A vegetação se restringia a inú-meros eucaliptos e muito mato. Não foram poucas as pessoas que não acreditaram

fOTOS: DIMAS CORREIA

transformação do espaço natural em cultura e lazer

Page 19: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 áreas verdes urbanas 19

que naquele local poderia surgir um belo e harmonioso parque. Buscamos arquite-tos especialistas na criação de parques e contamos ainda com o apoio do IEF no auxílio do trabalho de planejamento da substituição gradual dos eucaliptos por espécies mais adequadas à nova realida-de da área, pois queríamos um local com muitos pássaros, sombreado e seguro. To-neladas de lixo, inclusive de lixo hospitalar seriam retirados da área”. Sobre essa situação de abando-no, especialistas esclarecem que, nas cida-des, o urbano pode ser entendido como o resultado maior da capacidade social de transformar o espaço natural. Assim, as diferentes intervenções do homem no crescente “espaço urbano”, nem sempre foram pautadas em ações de controle e preservação ambiental, e como decorrên-cia deste fato, muitos problemas foram se fazendo cada vez mais presentes. O Parque Ecológico possui 45 mil metros quadrados, com lagoa, anfiteatro, passarela, mirante, centro de educação ambiental, ciclovia, pista de caminhada, playground, lanchonete, aparelhos de gi-nástica para idosos, cinco nascentes pre-servadas e áreas com mata nativa. Possui também viveiros com animais sem condi-ções de voltar ao habitat natural, cedidos e legalizados pelo Ibama. O parque tem um diferencial, faz divisa com o Rio Itabirito, afluente do Rio das Velhas. “Para valorizar e proteger o rio e incentivar a prática de esportes decidi-mos manter o acesso ao Distrito Industrial por bicicleta. “Infelizmente outras áreas verdes não são poupadas pela especula-ção imobiliária e acabam se transforman-do em prédios comerciais e residenciais, fazendo com que o percentual de área verde por habitante seja baixo na zona ur-bana. O sonho de vários parques urbanos que se complementem está cada dia mais distante nos municípios brasileiros, o que é um prejuízo enorme para os cidadãos que não veem surgir outros pontos de la-zer, esporte e cultura”. u

Serviço

O Parque Ecológico de Itabirito se localiza à Avenida Queiroz Júnior, 1510, e funciona de terça a domingo e feriados de 7h às 22h.

caminhos apontam as mudanças do espaço verde em itabirito

Page 20: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.201520 festivelhas 2015 ARTE E CULTURA NA BACIA DO RIO DAS VELHAS

FestiVelhas é o Festival Cultu-ral da Bacia do Rio das Velhas, idealizado pelo Projeto Manuelzão UFMG a partir da expedição de 2003 que percorreu toda a extensão do rio. Além da riqueza em biodi-versidade, esse rio alimenta uma corrente-za cultural que compartilha o seu destino. Entretanto, como consequência da degra-dação das águas, muitas espécies da fauna e da flora começaram a desaparecer e, com elas, várias manifestações culturais. Cada dia fica mais difícil pescar um dourado, um pacu, descansar à sombra de um jequitibá, ver um beija-flor gravata verde, um canarinho chapinha, um trinca-ferro, ou ouvir um violeiro tocar uma moda de viola. As lavadeiras não cantam, nem la-vam; os barcos não navegam, a biodiversi-dade morre por não ter água limpa. Desde o início, o Projeto Manuel-zão se empenhou em mudar esse paradig-ma de progresso sem conservação, que aniquila as veredas e a fauna das Gerais,

arte, cultura E transformação

um movimento cultural que convocou as populações ribeirinhas a se manifestarem usando a arte como linguagem

desfigurando suas características naturais e o modo de vida dos povos que habitam a região. A cultura é parte fundamental do Projeto Manuelzão que, desde seu surgi-mento, anunciou que a revitalização da bacia do Rio das Velhas depende da cons-trução de novos imaginários. O objetivo é fazer da cultura o motor da mudança de mentalidade que se transforme em ação. Graças à expedição, surgiu a ideia de organizar um movimento cultural que con-vocasse as populações ribeirinhas a se ma-nifestarem usando a arte como linguagem. E deu certo. Centenas de artistas, escritores, dançarinos, violeiros, contadores de histó-rias, homens e mulheres de toda a bacia reuniram-se no “FestiVelhas Manuelzão em Morro da Garça”, em 2005, que procurou demonstrar a diversidade cultural da bacia no “FestiVelhas Jequitibá 2007” fortale-cemos os debates e procuramos sinalizar a riqueza do passado através do folclore presente em todas as regiões da bacia. Já o

“FestiVelhas 2009” foi itinerante, e aconte-ceu durante a expedição de 2009 pelo Rio das Velhas, com o objetivo de sensibilizar todas as comunidades da bacia para a pro-posta de revitalização da Meta 2010. A edição do evento em Belo Hori-zonte, no ano de 2011, focou no teatro do “absurdo” as ações antrópicas insustentá-veis movidas por um modelo econômico sem preocupação com a gestão ambiental. Passada a Meta 2010-2014 é necessário estabelecer novos rumos e metas a serem alcançadas. A nova edição do Festivelhas 2015, em Itabirito, tem como objetivo resgatar o movimento sociocultural da bacia, inte-grando povos e pensamentos através da arte e cultura na busca da transformação da mentalidade em tempo de escassez hí-drica. O FestiVelhas Itabirito é uma realiza-ção do Projeto Manuelzão em parceria com a prefeitura de local e o Comitê de bacia do Rio das Velhas. u

fOTOS: DIVULGAçÃO

Page 21: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 festivelhas 2015 ARTE E CULTURA NA BACIA DO RIO DAS VELHAS 21

Capoeira Cativeiro

Fundado em 1978 por cinco mes-tres, incluindo o Miguel Machado, hoje o grupo itabiritense é coorde-nado pelo Mestre Beto Braga e dá verdadeiras aulas de capoeira.

Carlos Bolívia

O “cantautor” mescla gêneros como samba, rock e música caribenha em canções sobre o cotidiano da cida-de, em busca de um diálogo próxi-mo com o público.

Há 32 anos o premiado grupo de dança clássica e contemporânea de Lagoa Santa encanta com suas coreografias ecléticas, sempre as-sociadas à cultura brasileira.

Contato 31 9931.8088Contato 31 8849.4090

cia. Belkiss Amorim

Contato 31 8778.0406

cia. primitiva

O rico e importante histórico afri-cano, se faz presente nas apre-sentações desse grupo que se ca-racteriza pela força da raça e suas conquistas.

Contato 31 7546.2669

circo em cena

Com o objetivo de difundir a cul-tura circense, a companhia encanta crianças e adultos com espetáculos, oficinas e intervenções, adaptando-se aos mais diversos espaços.

Contato 31 8736.6422

fanfarra da paz

A Fanpaz de Itabirito trabalha com crianças, jovens e adultos, promo-vendo o desenvolvimento musical e cultural de seus integrantes em apresentações por Minas Gerais.

Contato 31 8751.0544 . 8870.0544

Formado por professores de Geo-grafia, Artes e Literatura, além de cantores e compositores, o grupo canta para falar de amor, poesia e sertão.

Contato 31 3395.4672

Após gravar um disco interpretan-do chorinhos de seu avô Godofredo Guedes, o também músico Gabriel Guedes está lançando um novo tra-balho, agora autoral.

gabriel guedes

Contato 31 9553.3279

FLOR DO CERRADO

De um lado, a banda Ganga Bruta carrega em suas músicas uma mar-ca de Blues, do outro o Congadar representa o Congado; ambos esti-los originados da África.

ganga b. & congadar

Contato 31 3771.2743

Page 22: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.201522 festivelhas 2015 ARTE E CULTURA NA BACIA DO RIO DAS VELHAS

alto batuque

Com batidas fortes e um som vi-brante, o grupo de BH usa a per-cussão para encantar o público, to-cando corações e fazendo com que todos participem do show.

grupo urucum

Grupo de amigos que se reuniram para criar um bloco caricato e levar para as ruas grandes nomes da bos-sa, da tropicália, do baião, das ciran-das de roda, da MPB e do axé.

O coral infanto-juvenil de Itabirito representa um marco da cultura local. Seu estilo inconfundível traz positividade e alegria aos cora-ções de quem os ouve.

Contato 31 8868.3605Contato 31 8587.5899

libre cantare

Contato 31 3561.0080

Lil Rinox

Atual e com estilo próprio, os MCs tomam conta da nova geração. Lil Rinox não é diferente e com seus shows de rap e duelo de MCs cha-ma a galera para dançar.

Contato 31 7536.7988

Lollipop Chinatown

Desde 2012 a banda reúne músicos com trajetórias musicais diferentes, mas um objetivo em comum: criar um som visceral a partir das vivên-cias com rock, eletro e MPB.

Contato 31 9398.5048

Meninas de Sinhá

Jovens senhoras que encontram em velhas cantigas de roda uma forma de rejuvenescer. Entregam-se à arte, tocando seus instrumen-tos e o coração de quem as assiste.

Contato 31 9243.3291 . 8862.0937

As orquestras jovens Vallourec, Es-cola Estadual Padre João Botelho e o Grupo de Câmara participam do projeto que já realizou mais de 200 apresentações em Minas.

Contato 31 3225.9746

O violeiro, rabequeiro, cantor e com-positor de Teófilo Otoni tem uma carreira reconhecida em todo territó-rio brasileiro: um verdadeiro ícone da viola caipira.

Pereira da Viola

Contato 31 9973.1246

Orquestra Jovem Romero Bicalho

O músico canta sobre as coisas simples da vida, como os valores humanos e a beleza de sua terra, numa mescla de samba, reggae e Música Popular Brasileira.

Contato 31 3541.2868 . 8809.4202

Page 23: Revista Manuelzão 74  - julho 2015

Manuelzão • 07.2015 festivelhas 2015 ARTE E CULTURA NA BACIA DO RIO DAS VELHAS 23

Rosas do S. Bernardo

Oriundo do projeto Senhores e Senhoras do Tempo, o grupo de mulheres trabalha desde 2008 pela cultura popular e pelo resgate da memória do patrimônio cultural.

Samba de Cumpadre

Ricardo Coelho (voz e violão) e Vini-cius Nascimento (percussão) tocam canções autorais e interpretam gran-des artistas do samba de raiz. Já se apresentaram em vários locais.

Contato 31 8628.9207 . 9641.7259Contato 31 3491.8620 . 3456.2609

Severino Iabá

Salve Nossa Mãe terra! Poeta, o artista mineiro dedica seus ver-sos a natureza, ao meio ambiente e, em especial, aos guardiões das nossas águas.

Contato 31 9171.1314

Vilmar e o Trio

A banda “Vilmar e o Trio Lapinhô”, de Lapinha da Serra, representa a cultura popular da Serra Espinhaço, a cantoria regional brasileira e a pre-servação ambiental das serras.

Contato 31 8736.6422 . 2510.6558

Soneto da Meditação Com quantas bombas se destrói o mundo? Quanto cimento faz um coração? Com quantos mortos se ganha uma guerra? Com quantas serras, a devastação?

Com quanto lixo se assassina um rio? Com quantos votos se vende uma nação? Com quanto ouro se faz uma vida? Com quantos brios, uma insurreição?

De quanto tempo o futuro é feito? Quanto amor enternece um peito? Quantos compassos para uma canção?

Com quantos passos se faz um caminho? Com quantos laços se trança o carinho? Viva a esperança da reflexão! Viva o FestiVelhas! Viva Itabirito! Viva a força da nossa união.

Tadeu Martins

ACERVO MANUELZÃO

Page 24: Revista Manuelzão 74  - julho 2015