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Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Revista Jurídica: órgão nacional de doutrina, jurisprudência, legislação e crítica judiciária. Ano 62, nº 435, Janeiro de 2014.

Diretor: Elton José Donato

Bimestral: 1953-1962; trimestral: 1963-1965; irregular: 1966-1967; anual: 1968; trimestral: 1977; bimestral: 1982; mensal: 1988

Tiragem: 4.000 exemplares

ASSINATURAS: São Paulo: (11) 2188-7507 – Demais Estados: 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico:São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188-7900

Demais Estados: 0800.7247900

Os conceitos emitidos em trabalhos assinados são de responsabilidade de seus autores. Os originais não serão devolvidos, embora não publicados. Os artigos são divulgados no idioma original ou traduzidos.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias dos originais obtidas na Secretaria do Supremo Tribunal Federal e dos demais tribunais.

Proibida a reprodução parcial ou total, sem autorização dos editores.

E-mail para remessa de artigos: [email protected]

© Revista Jurídica®

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Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900

Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

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ISSN 0103-3379

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ANO 62 – JANEIRO DE 2014 – Nº 435

RepositóRio AutoRizAdo de JuRispRudênciASupremo Tribunal Federal: 03/85

Superior Tribunal de Justiça: 09/90Tribunais Regionais Federais 1ª, 2ª e 4ª Regiões

FundAdoR

Professor Angelito Asmus Aiquel

diRetoR editoRiAl

Elton José Donato

GeRente editoRiAl e de consultoRiA

Eliane Beltramini

cooRdenAdoR editoRiAl

Cristiano Basaglia

conselho editoRiAlAda Pellegrini Grinover – Alexandre Pasqualini – Alexandre Wunderlich

Anderson Vichinkeski Teixeira – Antonio Janyr Dall’Agnol Jr.Araken de Assis – Arruda Alvim – Carlos Alberto Molinaro

Cezar Roberto Bitencourt – Daniel Francisco Mitidiero – Daniel UstárrozDarci Guimarães Ribeiro – Eduardo Arruda Alvim – Eduardo de Oliveira Leite

Eduardo Talamini – Ênio Santarelli Zuliani – Fátima Nancy AndrighiFredie Didier Júnior – Guilherme Rizzo Amaral – Humberto Theodoro Júnior

Ingo Wolfgang Sarlet – Jefferson Carús GuedesJoão José Leal – José Carlos Barbosa Moreira – José Maria Rosa TesheinerJosé Roberto Ferreira Gouvêa – José Rogério Cruz e Tucci – Juarez Freitas

Lúcio Delfino – Luis Guilherme Aidar Bondioli Luís Gustavo Andrade Madeira – Luiz Edson Fachin – Luiz Guilherme MarinoniLuiz Manoel Gomes Júnior – Luiz Rodrigues Wambier – Márcio Louzada Carpena

Mariângela Guerreiro Milhoranza – Paulo Luiz Netto LôboRolf Madaleno – Salo de Carvalho – Sergio Cruz Arenhart

Sérgio Gilberto Porto – Teresa Arruda Alvim Wambier – William Santos Ferreira

colAboRAdoRes destA ediçãoAugusto Franke Dahinten, Bernardo Franke Dahinten, Felipe Heck Soares,

Gustavo Bohrer Paim, Milene Ana dos Santos Pozzer, Tiago Bitencourt de David,

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Sumário

Su

ri

o

Doutrinas

Civil, ProCessual Civil e ComerCial

1. O Depoimento Pessoal a Requerimento da Própria Parte Como Meio de Prova no Direito Processual CivilTiago Bitencourt de David ...........................................................9

2. O Seguro Obrigatório DPVAT e o Código de Defesa do ConsumidorAugusto Franke Dahinten e Bernardo Franke Dahinten ..............15

3. O Direito Fundamental à Duração Razoável do Processo e a Corte Europeia dos Direitos do HomemGustavo Bohrer Paim ...................................................................37

Penal e ProCessual Penal

1. Análise dos Institutos Despenalizadores da Lei nº 9.099/1995 à Luz da Teoria dos Jogos, em Especial da Transação PenalFelipe Heck Soares e Milene Ana dos Santos Pozzer .....................65

JurisprudênciaCivil, ProCessual Civil e ComerCial

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça .........................................................85

2. Superior Tribunal de Justiça .........................................................93

3. Tribunal Regional Federal da 2ª Região .......................................99

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência Civil, Processual Civil e Comercial ....105

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Penal e ProCessual Penal

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Supremo Tribunal Federal ..........................................................145

2. Superior Tribunal de Justiça .......................................................155

3. Tribunal Regional Federal da 1ª Região .....................................163

4. Tribunal Regional Federal da 4ª Região .....................................169

ementário de JurisprudênciA

1. Ementário de Jurisprudência Penal e Processual Penal .....................209

Índice Alfabético e Remissivo ................................................223

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EDITORIAL

A Revista Jurídica trata de temas atuais e de suma relevância aos profissionais do direito. Os trabalhos doutrinários, de autoria de relevantes juristas, são divididos nas áreas cível e penal.

Doutrina Cível

O Doutor Tiago Bitencourt de David discute tema atual de Processo Ci-vil, sobre o depoimento pessoal a requerimento da própria parte como meio de prova no Direito Processual Civil.

Os Mestres Augusto Franke Dahinten e Bernardo Franke Dahinten têm como objetivo analisar o seguro obrigatório DPVAT como relação de consu-mo. Sabidamente, via de regra, os contratos de seguro indubitavelmente se configuram como relação de natureza consumerista.

O Advogado e Professor Gustavo Bohrer Paim versa sobre o Direito Fundamental à Duração Razoável do Processo e a Corte Europeia dos Direi-tos do Homem.

Doutrina Penal

Os Doutores Felipe Heck Soares e Milene Ana dos Santos Pozzer têm como objetivo demonstrar a eficiência e a viabilidade dos institutos despe-nalizadores, em especial da transação penal (do art. 76 da Lei dos Juizados Especiais, Lei nº 9.099/1995), tendo como meio para isso uma análise destes pela teoria dos jogos, para, assim, mostrar que uma possível negociação e arbitragem é benéfica ao ordenamento jurídico brasileiro. Deste modo, com a ideia de que a teoria dos jogos tenta explicar e prever os comportamentos estratégicos que podem ser tomados por indivíduos em uma relação de que a estratégia de um pode e vai influenciar as tomadas de decisões e estratégias do outro e que na transação penal temos um jogo que é sequencial, depen-dendo do Ministério Público ofertar a transação.

Os Editores

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Doutrina

Do

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l

CívelO DEPOIMENTO PESSOAL A REQUERIMENTO

DA PRÓPRIA PARTE COMO MEIO DE PROVA NO DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Tiago BiTencourT de david Juiz Federal Substituto da 3ª Região, Pós-Graduado em Direito Civil

pela Universidad de Castilla-La Mancha (UCLM, Toledo/Espanha).

Tradicionalmente, entende-se que o depoimento pessoal consiste na oitiva da parte, a pedido da outra, visando à confissão. Eis a concep-ção conservadora e francamente dominante na prática jurisprudencial e na processualística brasileira.

Apenas como exemplo de tal pensamento, traz-se à colação o co-mentário de Jorge Americano1 ao CPC/1939: “Desde que a confissão faz prova contra e não a favor do confitente, entende-se que tudo quanto o depoente alegar em seu favor nada vale senão quando haja nos autos outras provas que lhe sirvam de apoio”.

Tal concepção ainda ecoa forte nos pretórios e obras de Direito Processual Civil, ainda que sem a assunção clara dos pressupostos cora-josamente assumidos por Jorge Americano. Jorge Americano assumiu o paradigma bem descrito por Perelman e Olbrechts-Tyteca2 como sendo aquele no qual não importa o efetivo convencimento do julgador, mas no qual é buscado o que deveria convencer, pois o sistema é estruturado de forma a desconsiderar a percepção e a sensibilidade do Magistra-do impondo a ele que atribua um determinado peso a uma espécie de prova em detrimento da outra, estabelecendo uma metódica apriorística

1 AMERICANO, Jorge. Comentários ao código de processo civil do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1958. p. 350.

2 PERELMAN, Chaim; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado de argumentação. Lisboa: Piaget, 2007. p. 10. D

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que visa objetivar o discurso de forma a dar um tom de cientificidade que se acredita já alcançado pelas ciências naturais. Como asseveram Arenhart3, Perelman e Olbrechts-Tyteca4, o empirismo tenta objetivar o discurso.

A concepção dominante resulta de uma noção duelística de processo, na qual uma parte, em regra, o autor, tenta submeter a outra em um jogo no qual o erro (confissão) é o lance mais esperado e no qual o que as pessoas têm a dizer vai solenemente ignorado quando não houver a confissão. Tanto é assim que, na vigência das Ordenações Alfonsinas, como noticia Moacyr Amaral Santos5, o depoimento pessoal era uma prova que só poderia ser pro-duzida a requerimento do autor, mas nunca do réu.

O caráter místico-religioso do depoimento pessoal mostra-se ao ser tra-tado como um giuramento no sistema jurídico italiano. Por isso, Luigi Paolo Comoglio, Ferri Corrado e Michele Taruffo6 explicam que tal meio de prova é visto, atualmente, como ultima ratio, vez que os italianos não conseguem mais acreditar nos depoentes em tempos de decadência da influência religiosa e a afirmação do Estado laico. Mais uma vez, revela-se que a fala no processo só possui valor em vista da confissão que, por sua vez, também possui uma utilidade místico-religiosa de incentivar o reconhecimento do erro para alívio do confitente7 (expiação), mas mais ainda, para o funcionamento de um siste-ma judiciário incapaz de lidar com a incerteza e com o erro8.

Portanto, a concepção conservadora possui um ranço inquisitorial for-tíssimo que antagoniza com a noção democrática, discursiva e cooperativa de processo.

Essa é a posição mais tradicional a respeito do tema e que representa na prova a adoção das premissas dos positivismos jurídico e sociológico, sendo própria do Processualismo.

3 ARENHART, Sérgio Cruz. A verdade e a prova no processo civil. Disponível em: <http://www. abdpc.org.br/abdpc/artigos/Sérgio%20Cruz%20Arenhart(2)%20-%20formatado.pdf>. Acesso em: 27 mar. 2011.

4 PERELMAN, Chaim; OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Op. cit., p. 10.5 SANTOS, Moacyr Amaral. Prova judiciária no cível e comercial. 3. ed. São Paulo: Max Limonad,

1968. p. 143.6 COMOGLIO, Luigi; CORRADO, Ferri, TARUFFO, Michele. Lezione sul processo civile.

Bologna: il Mulino, 1998. p. 646 ss. 7 Aqui retomamos um diálogo via e-mail tido com Aury Lopes Jr. anos atrás.8 A necessidade de incorporar-se ao Direito Processual Civil uma teoria sobre o erro é da

autoria de Ricardo Aronne.

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De outra banda, Pontes de Miranda possui opinião no sentido de que o depoimento pessoal pode beneficiar o depoente, não servindo apenas à ob-tenção da confissão, inclusive criticando tal concepção adotada em aresto da Corte de Apelação do Distrito Federal por ele censurado. Veja-se passagem do escólio abalizado de Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda9:

O enunciado de que o depoimento da parte não lhe aproveita, e pode apenas prejudicá-la, se há confissão, ou revelação de fato que sirva à ar-gumentação da outra parte, é falso, porque nem sempre isso acontece. O depoimento tem, não raro, força convincente que, no processo com o prin-cípio do livre convencimento do juiz, pode fazê-lo um dos fundamentos da convicção.

[...]

Assim, o dito “quando a parte confessa faz prova contra di mesma, e o quanto diz a seu favor de nada vale”(Corte de Apelação do Distrito Fede-ral, 13 de novembro de 1922, B. do STF, 50, 60) deve ser repelido.

Entretanto, insta apontar que, mesmo admitindo que o depoimento pessoal pode pesar a favor do depoente, Pontes de Miranda entende que ser--lhe-ia vedado requerer o próprio depoimento. Assim, Pontes de Miranda não admite que a própria parte requeira o seu depoimento pessoal, mas acei-ta que, uma vez prestado, pode ser utizado favoravelmente em prol do pres-tador, servindo ao julgamento da causa.

A mesma linha de entendimento é trilhada na atualidade por Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira, que, inclusive, buscaram nos ensinamentos de Pontes de Miranda sua fundamentação. Veja-se a passagem que externaliza o entendimento de Didier Jr., Sarno e Braga10: “A parte não pode requerer o seu próprio depoimento. As declarações de uma parte, contu-do, podem servir como meio de prova em seu favor, na medida em que refor-cem a convicção do Magistrado”.

No mesmo sentido, ainda há o entendimento de João Batista Lopes11. João Batista Lopes12 ainda traz ilustrativo julgado sobre o tema:

9 PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro: Forense, t. IV, 1974. p. 267 e 268.

10 BRAGA, Paula Sarno; DIDIER JR., Fredie; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. 5. ed. Salvador: JusPodivm, v. 2, 2010. p. 108.

11 LOPES, João Batista. A prova no direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 102 e 103.

12 Idem, ibidem.

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Em acordão relatado pelo Juiz Ivan Rihhi, a 1ª Câmara Cível do extinto Tri-bunal de Alçada do Paraná deixou assentado, por maioria de votos: “Nem se diga que o depoimento da parte litigante não possa beneficiá-la em juízo, aumentando-lhe a perspectiva de obter ganho de causa. Essa possibilidade foi suficientemente demonstrada, na Itália, por Mauro Cappelletti (La tes-timonianza della parte nem sistema dellóralità) e, no Brasil, por Moniz de Ara-gão (Exegese do código de processo civil. Rio de Janeiro: Aide, v. IV, t. I, 1981. p. 146). Eis o entendimento do jurista por último citado: No texto comen-tado (que é o do art. 343), cuida o Código do interrogatório com função probatória, a que denomina, com redundância tradicional, ‘depoimento pessoal’, muito embora todo depoimento seja pessoal. Contrariamente ao interrogatório previsto no artigo anterior, o depoimento da parte é meio de prova e como tal deve ser tratado. Nele se encontra manifesta infração ao princípio nullus testis in re sua auditur (nenhuma testemunha seja ou-vida em causa sua), pois o litigante pode produzir prova em seu próprio favor (pro se declaratio) não só quando presta ‘depoimento pessoal’, mas em outras situações igualmente reconhecidas nas leis processuais (p. ex. confissão, art. 354; assentamentos mercantis, art. 379). Em todos esses casos fica afastada a idéia de o testemunho da parte (ou de outro litigante no processo, como o litisconsorte, p. ex.) só ter valor naquilo em que contraria o seu próprio interesse (contra se declaratio), a partir do momento em que foi atribuída ao juiz ampla liberdade na apreciação da prova (art. 131), as res-trições ao testemunho pro se enfraqueceram-se sobremodo”. (RT 601/209)

Existe, ainda, uma terceira corrente que sustenta que tanto depoimento pode pesar em favor do depoente quanto que ele próprio pode requerer sua própria oitiva. Admitindo expressamente que a própria parte pode requerer o seu depoimento pessoal, encontram-se, pelo menos, os posicionamentos de Michele Taruffo13, Cassio Scarpinella Bueno14 e Eduardo Cambi15.

Michele Taruffo16 aponta, como dois extremos a respeito do tema, a Itália e a Alemanha, onde na primeira nem mesmo quem poderia ter sido parte pode testemunhar, ao passo que na segunda a própria parte pode falar

13 TARUFFO, Michele. Simplesmente la verdad: el juez y la construcción de los hechos. Madrid: Marcial Pons, 2010. p. 169 e 170.

14 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, v. 2, t. I, 2007. p. 243. Na terceira edição da mesma obra (Curso sistematizado de direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, t. I, 2010), a posição foi mantida, sendo apresentada nas páginas 285 e 286.

15 CAMBI, Eduardo. A prova civil. São Paulo: RT, 2006. p. 163 e 164.16 TARUFFO, Michele. Op. cit., p. 169 e 170.

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em seu favor na qualidade de testemunha no instituto do Partenvernehmung. Taruffo17 ainda coloca ao lado da Alemanha os países da common law como ad-mitindo o testemunho em causa própria. Nas palavras de Michele Taruffo18:

En estos ordenamientos el legislador no se ha preocupado, obviamente, de excluir de forma preliminar el testimonio de sujetos que podrían ser partes en la causa, pero no lo son. Naturalmente, la admisibilidad del testimonio de las partes, y de los posibles intervinientes, no se basa en uma falta de preocupación epistémica por parte del legislador, sino el convencimiento – epistémicamente correcto – de que el juez está perfectamente en condiciones de valorar la credibilidad de testigos que tienen un interés en la causa, con la debida cautela respecto de la fiabilidad de sus declaraciones, pero también con la posibilidad de extraer de ellas cuanto pueda resultar razonablemente útil para la determinación de la verdad. Por consiguiente, lo que resulta epistémicamente oportuno es la admisibilidad de estos testimonios, y no su exclusión; su exclusión, que termina por privar al juez de fuentes de cono-cimiento potencialmente útiles para el juicio sobre los hechos, resulta, en cambio, fuertemente contraindicada.

Na mesma linha, Eduardo Cambi19 admite a oitiva requerida pela pro-pria parte na condição de lidima prova testemunhal. Veja-se a posição de Cambi20 vazada nos seguintes termos:

O impedimento de a parte ser considerada testemunha está baseado na in-compatibilidade entre as duas posições que não pode ser conciliadas, uma vez que a parte, por ter interesse na causa, não pode fornecer uma declara-ção isenta de interesse, o que pode comprometer a sua credibilidade. Em outras palavras, as partes têm interesse no resultado da causa; por isso, as suas alegações e as suas declarações não podem servir como prova em seu benefício (nullus idoneus testis in re sua intelliitur).

No entanto, esse argumento não é suficiente para inviabilizar o exercício do direito constitucional à prova, sobretudo nas situações em que a víti-ma se encontra sozinha, sob pena de a tutela jurisdicional de seu direito substancial ser prejudicada pela impossibilidade do exercício do direito à prova (v.g. nas ações de reparação de danos por acidentes automobilísticos em que ambos os motoristas saem feridos e imputam ao outro a conduta lesiva; nas ações de reparação decorrentes de auto-acidentes, como a inges-tão de comida enlatada ou congelada estragada ou, ainda, do consumo de remédios cujos efeitos colaterais não estão especificados na bula, bem como

17 Idem, ibidem.18 Idem, ibidem.19 CAMBI, Eduardo. Op. cit., p. 163.20 Idem, ibidem.

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de todo produto ou serviço nos quais as especificações não eram claras no momento em que o contrato se concretiza, etc.).

Segundo Cassio Scarpinella Bueno21, o depoimento por iniciativa da própria parte deve ser admitido na qualidade de prova atípica:

Não há razão para recusar que a própria parte possa pretender, indepen-dentemente de determinação judicial ou de pedido formulado pela parte contrária, prestar seu depoimento em juízo para esclarecer fatos relevantes e pertinentes da causa. Justamente porque a prova não e expressamente prevista pelas leis processuais civis brasileiras é que ela deve ser entendida como prova atípica e, nessa medida, admitida.

Cassio Scarpinella Bueno entende que se trata de prova atípica, ao pas-so que Michele Taruffo e Eduardo Cambi admitem a prova na qualidade de testemunho. Contudo, parece não haver qualquer óbice que se admita a fala da parte – a seu próprio pedido – como autêntico depoimento pessoal. O que menos importa é a que título, sendo o mais relevante a questão da admissão que a pessoa vá até a presença do Magistrado e seja, de fato e de Direito, ouvida.

A possibilidade de requerimento e aproveitamento do depoimento re-querido pela própria parte revela-se como a postura mais consentânea com o perfil atual do processo. A fala e a audiçãoatenta são o modo de ser do modelo processual democrático e cooperativo, revelando-se como autênticas garan-tias do Direito Processual Civil brasileiro contemporâneo.

Revela-se de todo equivocado presumir a mentira por parte da parte naquilo que lhe favorecer e, por isso, excluir as porventura valiosas infor-mações que possam estar sendo trazidas ao processo. Impõe-se promover a dignidade dos envolvidos no processo, sem ficar à espera da mentira, como se fossem preparadas arapucas e como se a Jurisdição fosse uma instituição que buscasse a verdade – ao invés da certeza jurídica –, castigando quem à ela se opusesse, identificando pecadores, esterilizando as impurezas, as dúvidas, hipostasiando o aspecto declaratório dos provimentos jurisdicionais.

O direito (garantia) de requer sua própria oitiva é manifestação intrín-seca e necessária do direito de influenciar e participar no processo, sendo desarrazoada – porque arbitrária – a sua exclusão do plexo de posições ine-rentes às partes no Direito Processual Civil.

21 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 3. ed. São Paulo: Saraiva, v. 2, t. I, 2010. p. 285.

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O SEgURO ObRIgATÓRIO DPVAT E O CÓDIgO DE DEfESA DO CONSUMIDOR

The DPVAT ComPulsory InsurAnCe AnD The Consumer Defense CoDe

augusTo Franke dahinTen

Mestrando em Direito pela PUCRS, Especialista em Direito Internacional Público e Privado pela UFRGS, Especialista em

Direito Ambiental Nacional e Internacional pela UFRGS, MBA em Direito Empresarial com ênfase em Direito Tributário pelo

Instituto de Desenvolvimento Cultural – IDC, Advogado.

Bernardo Franke dahinTen

Mestrando em Direito pela PUCRS, Especialista em Direito Empresarial pela PUCRS, Especialista em Direito Imobiliário, Contratos e Responsabilidade

Civil pelo Instituto de Desenvolvimento Cultural – IDC, Advogado.

RESUMO: Este artigo tem como objetivo analisar o seguro obriga-tório DPVAT como relação de consumo. Sabidamente, via de regra, os contratos de seguro indubitavelmente se configuram como rela-ção de natureza consumerista. Esta é a realidade da grande maioria dos seguros facultativos, como seguros de automóvel, de vida e de saúde. Nesse contexto, inúmeras são as demandas versando sobre seguro DPVAT que alegam estar igualmente configurada relação de consumo, o que, todavia, é extremamente polêmico, eis se tratar de um seguro obrigatório, imposto por lei. Assim, vale uma breve aná-lise acerca do seguro DPVAT, principalmente a partir da diferencia-ção entre os seguros facultativos e obrigatórios, com o objetivo de se apresentar essa controvérsia, o atual panorama jurisprudencial a seu respeito e, ao final, algumas considerações que poderiam justificar o não enquadramento deste seguro obrigatório como de natureza consumerista.

PALAVRAS-CHAVE: Contrato de seguro; seguros facultativos; se-guros obrigatórios; seguro DPVAT; relação de consumo.

ABSTRACT: This essay has as its scope to analyze the DPVAT insurance as a consumption relationship. It is known that, usually, the insurance contracts doubtlessly configure consumption bonds.

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This is the reality of the majority of the optional insurances, such as the insurances for vehicles, life and health. In this context, there are numerous lawsuits regarding the DPVAT insurance, which claim to be equally configured a consumption relationship, what is, nevertheless, extremely polemic, once it is a compulsory insurance, imposed by law. Thus, it is valid to make a brief analysis over the DPVAT insurance, mainly starting from the differences between the optional and compulsory insurances, with the goal of demonstrating this controversy, as well as the currently existing jurisprudential panorama before this subject, and, at the end, several considerations which could justify the not-configuration of that compulsory insurance as a consumption relationship.

KEYWORDS: Insurance contract; optional insurances; compulsory insurances; DPVAT insurance; consumption relationship.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Seguros facultativos e obrigatórios; 2 O se-guro DPVAT; 3 Seguro como relação de consumo; 4 Seguro DPVAT e o CDC; 5 Panorama jurisprudencial; 6 Desnecessidade de proteção especial; Considerações finais; Referências.

INTRODUÇÃO

Sabidamente, inúmeras são as questões polêmicas e controvertidas en-volvendo contratos de seguro e suas cláusulas. Igualmente verdade é que, na grande maioria das vezes, essas controvérsias dizem respeito aos chamados seguros facultativos, como de automóvel, residência e vida, cuja opção pela contratação compete ao segurado.

Entretanto, as matérias securitárias que são enfrentadas judicialmen-te não constituem exclusividade dos seguros facultativos. O seguro DPVAT (danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres), maior exemplo brasileiro da modalidade de seguro obrigatório (imposto por lei), é igualmente responsável por milhares de demandas que ingressam diaria-mente no Judiciário.

O objeto destas, via de regra, é a obtenção da indenização não rece-bida administrativamente, ou da complementação do valor recebido extra-judicialmente. Nessa esteira, as discussões destas demandas se concentram, sobretudo, no preenchimento, ou não, dos requisitos previstos em lei para o recebimento desta ou daquela indenização.

Nesse contexto, ainda que em um plano secundário, destaca-se uma questão que, pelo menos juridicamente, é extremamente relevante. Fala--se aqui da polêmica acerca da configuração, ou não, do seguro obrigatório DPVAT como uma relação de consumo. Não raro, as demandas propostas

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em desfavor da seguradora líder (e/ou de alguma de suas consorciadas1), já em suas petições inaugurais, clamam estar caracterizada uma relação de consumo, requerendo, por consequência, a incidência, no litígio, do Código de Defesa do Consumidor – CDC e dos dispositivos de cunho consumerista.

Essa discussão reforça-se na medida em que, ainda hoje, vários são os julgados, principalmente em sede de primeiro grau, que acolhem dita argu-mentação autoral e apontam pela incidência do CDC. O presente artigo trata justamente dessa questão, com destaque ao entendimento jurisprudencial atualmente existente nas principais Cortes nacionais.

1 SEgUROS fACULTATIVOS E ObRIgATÓRIOS

Quando se fala em contratos de seguro, antes mesmo de dividi-los conforme sua segmentação (automóvel, saúde, vida etc.), cabe classificá-los em facultativos e obrigatórios. Essa distinção, conforme se demonstrará pos-teriormente, é crucial para a aferição acerca da incidência, ou não, do CDC na relação existente entre o beneficiário do seguro DVPAT e o consórcio de seguradoras responsáveis por este seguro.

Em singela síntese, os seguros obrigatórios diferenciam-se dos seguros facultativos na medida em que, enquanto aqueles são impostos por lei, estes são contratados por livre opção do interessado.

Nesse contexto, enquanto o prêmio – contraprestação paga pelo segu-rado em razão da garantia financeira prestada pelo segurador – nos seguros facultativos se dá na forma prevista no contrato, nos seguros obrigatórios é pago conforme estabelecido pela lei, de forma compulsória e inarredável, como se um tributo fosse2, tanto que, no caso do seguro DPVAT, é pago anu-almente, junto com o IPVA3.

1 Em 1986, com o fito de resolver vários problemas envolvendo o pagamento do seguro DPVAT, foi criado um consórcio reunindo todas as seguradoras que operam com este seguro obrigatório. A partir de 2008, a administração deste consórcio passou a ser realizada pela Seguradora Líder do Consórcio do Seguro DPVAT, passando esta a ser responsável pela arrecadação e administração dos recursos, bem como pelos pagamentos (SENE, Leone Trida. Seguro de pessoas. Negativas de pagamento das seguradoras. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2009. p. 161).

2 Conforme consta no portal virtual do próprio seguro DPVAT: “Pela lei, o seguro DPVAT é parte integrante da licença anual do veículo. Portanto, pagá-lo é estar com o licenciamento do veículo em dia” (Disponível em: <http://www.dpvatsegurodotransito.com.br/pagamento- anual-do-seguro.aspx>. Acesso em: 30 nov. 2012).

3 Decreto nº 2.867/1998: “Art. 2º O prêmio do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres – DPVAT será pago junto com a cota única, ou

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Também por essa razão, o seguro facultativo “funciona” estritamente conforme as disposições contratuais, de forma que o pagamento de even-tual indenização estará sempre condicionado à ocorrência do sinistro tal qual previsto no contrato, ao passo que, no seguro obrigatório, basta que estejam preenchidas as condições insertas na lei.

Da mesma forma, ao passo que as indenizações nos seguros facultati-vos são calculadas conforme a extensão dos danos e os limites previstos nas apólices, nos seguros obrigatórios as indenizações se dão de acordo com os valores fixados na lei, sejam estes considerados justos ou não. No caso espe-cífico do seguro DPVAT, os valores, previstos na lei, são, atualmente, os se-guintes: R$ 13.500,00 para morte; até R$ 13.500,00 para invalidez permanente; e até R$ 2.700,00 para despesas médicas e hospitalares.

Em conclusão, portanto, enquanto o seguro facultativo se funda no contrato (dado seu caráter privado, atendendo aos interesses particulares), o seguro obrigatório, gênero do qual o seguro DPVAT é espécie, vincula-se à lei (dado seu caráter público, com indubitável fim social).

2 O SEgURO DPVAT

No Brasil, a regulamentação legal básica no que diz com as operações de seguros e resseguros se encontra no Decreto-Lei nº 73, de 1966, também conhecido como a “Lei dos Seguros”4. Dito diploma normativo, em seu art. 205, elenca quais são os seguros obrigatórios. O atual texto deste dispositivo arrola 11 (onze) modalidades distintas, como, por exemplo, o seguro de res-ponsabilidade civil do proprietário de aeronaves e do transportador aéreo e a garantia do cumprimento das obrigações do incorporador e construtor de imóveis.

Neste rol, a alínea l é a responsável pela base do seguro DPVAT, a qual, hoje, após alterações legais, apresenta a seguinte redação: “Danos pessoais causados por veículos automotores de vias terrestres e por embarcações, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não”6. Nessa esteira, a efetivação do seguro DPVAT, na forma como existe atualmente, veio alguns anos de-pois, com a introdução da Lei nº 6.194, de 1974, cujo preâmbulo assim reza:

com a primeira parcela, do Imposto sobre Propriedade de Veículos Automotores – IPVA”.4 SENE, Leone Trida. Seguro de pessoas. Negativas de pagamento das seguradoras. 2. ed.

Curitiba: Juruá, 2009. p. 54.5 “Art. 20. Sem prejuízo do disposto em leis especiais, são obrigatórios os seguros de: [...].”6 Redação conferida pela Lei nº 8.374, de 1991.

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“Dispõe sobre Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por veículos automotores de via terrestre, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não”.

Diferentemente do que ocorre nos seguros facultativos, em que o se-gurado contrata, entre as várias opções apresentadas pelo segurador, as co-berturas que melhor lhe satisfazem (tais como para furto ou roubo do veí-culo, danos materiais ou morais causados a terceiros, entre inúmeras outras possibilidades), os danos cobertos no seguro DPVAT são estritamente aque-les previstos nesta lei, em seu art. 3º7: (a) morte, (b) invalidez permanente e (c) despesas médicas e hospitalares.

Sobrevindo algum desses três eventos, a vítima – ou o beneficiário, no caso de morte da vítima – tem direito ao valor previsto na lei, sem necessi-dade de qualquer discussão acerca da culpa ou do pagamento de franquia, ao revés do que ocorre nos seguros facultativos (como o de automóvel, por exemplo). Tampouco é necessário que o causador do dano seja identificável, ou que este esteja em dia com o pagamento do seu prêmio8.

Ilustra-se com um caso hipotético: um acidente envolvendo 2 (dois) veículos, cada um com 4 (quatro) pessoas, e também um pedestre. Se todos forem atingidos (e restando configurados alguns dos três danos cobertos), todos os 9 (nove) participantes terão direito, individualmente, a requerer in-denização a título de seguro DPVAT9.

Evidentemente, o recebimento da indenização do seguro obrigatório não prejudica o direito da vítima de demandar contra o causador do dano, visando à obtenção de indenização maior e/ou de outros danos/prejuízos que tenham eventual e igualmente decorrido do infortúnio.

Repisa-se, portanto, o inegável cunho social do seguro DPVAT, cujo objetivo é tão somente amenizar, mediante uma indenização mínima, as con-

7 “Art. 3º Os danos pessoais cobertos pelo seguro estabelecido no art. 2º desta lei compreendem as indenizações por morte, por invalidez permanente, total ou parcial, e por despesas de assistência médica e suplementares, nos valores e conforme as regras que se seguem, por pessoa vitimada: [...].”

8 Súmula nº 257 do STJ: “A falta de pagamento do prêmio do seguro obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT) não é motivo para a recusa do pagamento da indenização”.

9 AMORÍN, Marcelo de Oliveira. Guia prático do seguro DPVAT. Campo Grande: Contemplar, 2011. p. 20.

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sequências advindas de acidentes de trânsito10, diversamente dos seguros fa-cultativos que visam a garantir economicamente bens (assim como serviços e atividades), contra riscos predeterminados, na extensão dos danos, respeita-dos os valores previstos nas apólices11.

3 SEgURO COMO RELAÇÃO DE CONSUMO

Os contratos de seguro, via de regra, configuram-se como de relação de consumo. Primeiro, pois, o próprio art. 3º, § 2º12, do CDC, ao definir os servi-ços prestados pelo fornecedor, inclui, expressamente, os serviços de natureza securitária.

Segundo que os seguros, em grande parte das vezes, são pactuados “em massa”, entre pessoas físicas e seguradoras, sendo estas últimas fornece-doras de serviço por excelência, que detêm imenso poderio econômico e que inegavelmente elaboram as cláusulas e disposições contratuais, sem qualquer influência ou participação do segurado.

A doutrina corrobora no sentido de que o contrato de seguro apre-senta-se como uma relação de consumo13. Robson Matos e Fabiana Molina14, por exemplo, nesse sentido, afirmam ser incontroversa a hipossuficiência do contratante (consumidor) no pacto securitário:

Isto porque se trata de um instrumento complexo, regido por princípios desconhecidos de grande parte dos consumidores, que necessitam de tal

10 AMORÍN, Marcelo de Oliveira. Guia prático do seguro DPVAT. Campo Grande: Contemplar, 2011. p. 181.

11 CC/2002: “Art. 760. A apólice ou o bilhete de seguro serão nominativos, à ordem ou ao portador, e mencionarão os riscos assumidos, o início e o fim de sua validade, o limite da garantia e o prêmio devido, e, quando for o caso, o nome do segurado e o do beneficiário”.

12 CDC: “Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. [...] § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista”.

13 Exemplo maior desta constatação encontra-se nos planos de saúde, emblemático caso de natureza securitária, cujo enquadramento como relação de consumo já foi, inclusive, sumulado: Súmula nº 469 do STJ.

14 MATOS, Robson Pedron; MOLINA, Fabiana Ricardo. O contrato de seguro e o Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Quartier Latin, 2006. p. 57.

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serviço e não dispõem de nenhuma condição para discutir suas cláusulas com as seguradoras.

No mesmo norte, consigna Cláudia Lima Marques15 serem muitas as práticas e cláusulas presentes no mercado brasileiro de seguros que são consideradas abusivas, impondo-se a implementação de uma tutela especial para aquele contratante em posição mais vulnerável:

[...] há que se presumir a boa-fé subjetiva dos consumidores e impor deve-res de boa-fé objetiva (informação, cooperação e cuidado) para os fornece-dores, especialmente tendo em conta o modo coletivo de contratação e por adesão.

A jurisprudência, igualmente, atesta essa constatação. A título de ilustração, suscita-se o Agravo de Instrumento nº 70051735975, Relatora Isabel Dias Almeida (TJRS), julgado em 06.11.201216, e o Recurso Especial nº 1293006/SP, Relator Ministro Massami Uyeda (STJ), julgado em 21.06.201217, precedentes cujas ementas atestam expressamente o enquadra-mento da relação securitária como de natureza consumerista.

Não por menos, Cláudia Lima Marques18 chega a afirmar que os con-tratos de seguro foram responsáveis por uma grande evolução jurispruden-cial no que diz com a conscientização da necessidade de um direito contra-tual mais social, menos influenciado pelo dogma da autonomia da vontade.

Com efeito, inegável, pois, que esses fatores acima referidos, em espe-cial a hipossuficiência do consumidor e a sua posição de desvantagem técnica e econômica, normalmente, outorgam, ao vínculo originado no contrato de

15 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações. 6. ed. São Paulo: RT, 2011. p. 495/496 e 498/499.

16 Segue a ementa: “Agravo de instrumento. Seguros. Ação ordinária de indenização. Inversão do ônus da prova. possibilidade. 1. Incidência do Código de Defesa do Consumidor, por se tratar de relação de consumo. [...]. Recurso a que se nega seguimento, em decisão monocrática” (TJRS, AI 70051735975, 5ª C.Cív., Relª Isabel Dias Almeida, J. 06.11.2012 – grifos nossos).

17 Segue a ementa: “Recurso especial. Contrato de seguro. Relação de consumo. Cláusula limitativa. Ocorrência de furto qualificado. Abusividade. Identificação, na espécie. Violação ao direito de informação ao consumidor. Recurso especial provido. [...] II – A relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo e, portanto, impõe-se que seu exame seja realizado dentro do microssistema protetivo instituído pelo Código de Defesa do Consumidor, observando-se a vulnerabilidade material e a hipossuficiência processual do consumidor. [...] V – Recurso especial provido” (REsp 1293006/SP, 3ª T., Rel. Min. Massami Uyeda, J. 21.06.2012 – grifos nossos).

18 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações. 6. ed. São Paulo: RT, 2011. p. 495/496 e 498/499.

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seguro, a condição de relação de consumo. Por essa razão, a premissa maior, no que tange aos pactos securitários, é a de que as regras existentes no CDC, diploma este que se propõe, justamente, a equilibrar a relação e a proteger o polo mais fraco, são plenamente válidas e incidentes.

Importante grifar, contudo, que a análise do caso concreto jamais pode ser dispensada. Diz-se isso, pois, há relações securitárias – mesmo nos segu-ros facultativos – que não retratam relação consumerista, como, por exemplo, aquelas em que o segurado adquire a garantia financeira como insumo para a sua atividade-fim, hipótese típica do transportador19. Nesses casos, a juris-prudência entende pela não incidência do CDC, eis que inexistente a figura do consumidor final (do serviço securitário). Decisões nesse sentido encon-tram-se, por exemplo, no TJSP (como, por exemplo, a Apelação nº 0451170-97.2010.8.26.0000, Rel. Israel Góes dos Anjos, J. 30.10.201220).

Excetuadas essas hipóteses acima referidas, conforme demonstrado, via de regra, os contratos de seguro (facultativos, grifa-se) refletem e presu-mem-se como de relação de consumo, sendo, neles, portanto, plenamente incidente o CDC e as normas protetivas do consumidor.

4 SEgURO DPVAT E O CDC

Ao se confrontar o CDC, no que diz com a sua aplicabilidade, e os se-guros, de fato a controvérsia maior está quanto à incidência, ou não, daquele, nos seguros obrigatórios, em especial no seguro DPVAT, objeto de análise deste artigo.

Essa questão ganha contornos bastante práticos na medida em que são inúmeras as ações de seguro DPVAT em que as vítimas/beneficiários cla-mam veementemente estar configurada uma relação de consumo. A razão para

19 Nesse sentido, justamente por esta razão, Bruno Miragem afirma que nem sempre é fácil identificar a hipótese de incidência do Código de Defesa do Consumidor aos contratos de seguro (MIRAGEM, Bruno. O contrato de seguro e os direitos do consumidor. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo: RT, v. 76, p. 242, out./dez. 2010).

20 Segue a ementa: “Ação de cobrança de seguro. Transporte rodoviário de mercadorias. Roubo da carga. [...] Código de Defesa do Consumidor. Sentença que afastou o princípio da pacta sunt servanda por entender que se aplicam as regras do Código de Defesa do Consumidor. Inaplicabilidade. A questão não é de relação de consumo, porque a atividade da autora é a de empresa de transportes e por tal razão o eventual pagamento pela seguradora de indenização pelo sinistro seria por ela utilizado no cumprimento da sua atividade empresarial de transportes, para cobrir os riscos que a envolvem. [...] Recurso provido” (TJSP, Apelação nº 0451170-97.2010.8.26.0000, 37ª CDPriv., Rel. Israel Góes dos Anjos, J. 30.10.2012 – grifos nossos).

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essa pretensão é evidente: a incidência do CDC no litígio traz inegáveis van-tagens e benefícios ao consumidor, com destaque à possibilidade de inversão do ônus da prova.

Reforça essa praticidade (e a própria polêmica) o fato de que, não ra-ramente, sentenças e despachos interlocutórios acolhem dita argumentação e entendem pela aplicação do diploma consumerista.

Com efeito, essa discussão, no âmbito do seguro DPVAT, tem impli-cações bastante visíveis. Veja-se um caso prático: determinada vítima resulta com lesões corporais de um acidente de trânsito, vindo a propor ação judi-cial. Nesse contexto, alega estar com invalidez permanente de algum mem-bro e requer a indenização correlata. De acordo com a Lei nº 6.194/1974, art. 5º, caput21 e §§ 4º22 e 5º23, nesta hipótese (de invalidez permanente), deve a vítima apresentar, em síntese, prova da ocorrência do acidente e dos danos.

Em uma situação como esta, se interpretada sob a ótica da “regra geral” (estabelecida no Código de Processo Civil – CPC, em especial seu art. 333, I24), esta comprovação (do acidente e dos danos, “prova constituti-va”) compete exclusivamente ao demandante, sendo seu o ônus da prova.

Por outro lado, se abordada a questão à luz do CDC, o qual prevê a possibilidade de haver a inversão do ônus da prova, na forma do seu art. 6º, VIII25, a incumbência no que diz com a produção das provas – in casu, capazes de desconstituir as alegações autorais – passa a ser ônus da seguradora. Na prática, ocorre que a tese autoral e as suas alegações passam a ser presumidas

21 “Art. 5º O pagamento da indenização será efetuado mediante simples prova do acidente e do dano decorrente, independentemente da existência de culpa, haja ou não resseguro, abolida qualquer franquia de responsabilidade do segurado.”

22 “§ 4º Havendo dúvida quanto ao nexo de causa e efeito entre o acidente e as lesões, em caso de despesas médicas suplementares e invalidez permanente, poderá ser acrescentado ao boletim de atendimento hospitalar relatório de internamento ou tratamento, se houver, fornecido pela rede hospitalar e previdenciária, mediante pedido verbal ou escrito, pelos interessados, em formulário próprio da entidade fornecedora.”

23 “§ 5º O Instituto Médico Legal da jurisdição do acidente ou da residência da vítima deverá fornecer, no prazo de até 90 (noventa) dias, laudo à vítima com a verificação da existência e quantificação das lesões permanentes, totais ou parciais.”

24 CPC: “Art. 333. O ônus da prova incumbe: I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; [...]”.

25 CDC: “Art. 6º São direitos básicos do consumidor: [...] VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; [...]”.

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como verdadeiras, cabendo à fornecedora, destarte, a comprovação em senti-do contrário (“prova desconstitutiva”).

A diferença entre apreciar o litígio à luz da regra geral (CPC) e o CDC é, como visto, enorme e imediata. A vantagem obtida mediante o instrumen-to processual da inversão do ônus da prova, como resultado da caracterização da relação sub judice como de natureza consumerista, é inegável e, sem dúvida, tende a conduzir a demanda à sua procedência.

Essa realidade impera, por exemplo, em grande parte das vezes, nos li-tígios de seguros (facultativos) e/ou de planos de saúde, que retratam, salvo exceções, efetivas e indubitáveis relações de consumo.

Verdade, contudo, que essa regra tem sido, por vezes, flexibilizada, exigindo-se, mesmo nas relações de consumo, que o consumidor faça prova mínima de suas alegações. Para ilustrar esse entendimento, cita-se a Apelação Cível nº 70041764986, Relator Romeu Marques Ribeiro Filho (TJRS), julgada em 20.04.2011, em cuja ementa restou assim consignado: “A prova dos fatos constitutivos do direito alegado pelo autor é ônus que lhe cabe, art. 333, I, do CPC, apenas minorado pela relação de consumo entabulada, não afastando, contudo, o ônus de prova mínima ao demandante”26.

Ainda assim, não obstante essa corrente jurisprudencial, não há como negar que a possibilidade de inversão do ônus da prova – como fruto, reprisa--se, do reconhecimento da relação em questão como de consumo – está forte-mente presente nas demandas que envolvem matéria de natureza securitária, gênero do qual o seguro DPVAT é espécie, refletindo um obstáculo em po-tencial extremamente tormentoso, por vezes intransponível (para a defesa) e que tem o condão de, por si só, determinar o desfecho dos litígios.

É inequívoco, portanto, o interesse de ambas as partes litigantes (desta espécie de demanda) nesta questão, tamanha a sua influência e a sua capaci-dade de conduzir a lide para um, ou outro final.

26 Mediante esse entendimento, ao revés de se exigir do demandado a realização de prova “negativa”, que é sabidamente difícil senão de impossível produção – tanto que chamada de “prova diabólica” –, passa-se a exigir que o demandante atenda, ainda que de forma mínima, à incumbência esculpida no art. 333, I, do CPC. Segue decisão nesse sentido: “Apelação cível. Alienação fiduciária. Ação indenizatória. Cobrança abusiva. [...] O ônus da prova dessa assertiva fática (nexo causal) recai sobre aquele que postula ressarcimento dos danos (art. 333, I, do CPC); inviável atribuir tal ônus à parte contrária, pois significaria a produção de prova evidentemente negativa (prova diabólica). Preliminar afastada. Recurso improvido” (TJRS, AC 70050242510, 14ª C.Cív., Rel. Judith dos Santos Mottecy, J. 18.10.2012 – grifos nossos).

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No caso do seguro DPVAT, repisa-se, essa controvérsia é intensa. Con-forme se verá, nem mesmo nos principais Tribunais do País há consenso.

5 PANORAMA JURISPRUDENCIAL

Para fins deste trabalho, foram analisadas decisões dos Tribunais de Justiça dos Estados do Rio Grande do Sul (TJRS), São Paulo (TJSP) e Rio de Janeiro (TJRJ).

No que diz com o TJRS, o entendimento é pacífico quanto à inexistên-cia de relação de consumo. Justamente por essa razão, tampouco há falar em inversão do ônus da prova nas demandas de seguro DPVAT, conforme os arestos que se seguem:

Agravo de instrumento. Seguros. DPVAT. CDC. Inversão do ônus da prova. Descabimento. 1. A relação havida entre a seguradora demandada e o agravado é de ordem obrigacional, versando quanto ao seguro DPVAT, possuindo este regula-mentação própria. 2. Ademais, o caráter público e impositivo deste tipo de seguro, em função de se tratar de uma obrigação legal, afasta a possibilidade de inversão do ônus da prova com base na legislação consumerista, sem que haja a demonstração do fato constitutivo do direito alegado. 3. Deste modo, cabe ao demandante com-provar a ocorrência do fato constitutivo de seu direito, ou seja, a invalidez perma-nente decorrente do acidente de trânsito, a teor do que estabelece o art. 333, I, do CPC. [...] Dado provimento, de plano, ao agravo. (TJRS, AI 70051584803, 5ª C.Cív., Rel. Jorge Luiz Lopes do Canto, J. 28.10.2012 – grifos nossos)

Agravo de instrumento. Seguro obrigatório. Inversão do ônus da prova. Desca-bimento. Inexistência de relação de consumo. O seguro obrigatório tem natureza social, não decorrendo de uma relação de consumo. Uma vez que o seguro DPVAT tem por escopo garantir o pagamento de indenização em casos de invalidez per-manente e morte, o ônus probatório não pode ser transferido àquele que, por força legal, tem o dever de efetuar o pagamento, sendo da vítima, e de seus beneficiários, o dever de fazer a prova cabal da hipótese de incidência do referido seguro. Inversão do ônus probatório descabida. Decisão modificada. Agravo de instrumento provido. (TJRS, AI 70048416077, 5ª C.Cív., Rel. Romeu Marques Ribeiro Filho, J. 18.04.2012 – grifos nossos)

Em síntese, o TJRS entende não haver relação de consumo nas ações versando sobre seguro DPVAT. Bem resume o posicionamento do Tribunal gaúcho o seguinte trecho do voto proferido pelo Desembargador Antônio Corrêa Palmeiro da Fontoura, em 09.10.2009, quando do julgamento mono-crático do Agravo de Instrumento nº 70032645681:

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Tendo em vista que a discussão posta em causa diz respeito à ação de in-denização decorrente do seguro obrigatório DPVAT, não há falar em inci-dência do CDC, porquanto não se está a tratar de relação de consumo, mas sim de relação obrigacional.

Dito entendimento é igualmente encontrado no TJSP. Seguem decisões exemplificativas:

Ação de cobrança. Acidente de trânsito. Seguro DPVAT. Inversão do ônus da prova. Inviabilidade ante a não caracterização da relação de consumo. [...]. (TJSP, AI 0138170-35.2012.8.26.0000, 27ª CDPriv., Rel. Dimas Rubens Fonseca, J. 25.09.2012 – grifos nossos)

Seguro DPVAT. Ação de cobrança. Inversão do ônus da prova. Inviabilidade. Relação de consumo não configurada [...]. Agravo de instrumento provido. (TJSP, AI 0063425-84.2012.8.26.0000, 34ª CDPriv., Relª Cristina Zucchi, J. 16.07.2012 – grifos nossos)

O fundamento utilizado na Corte paulista para afastar o CDC das ações de seguro DPVAT é essencialmente o mesmo pacificado no TJRS e é sintetizado no seguinte trecho do voto do Desembargador Dimas Rubens Fonseca, quando do julgamento do Agravo de Instrumento nº 0138170-35.2012.8.26.0000: “Outrossim, tem-se que não é caso de inversão do ônus da prova, porquanto, em se tratando de seguro obrigatório, não incidem as regras do Código de Defesa do Consumidor”.

Reproduz-se, também, o trecho seguinte do dito voto:

A generalidade da obrigação não admite a figura do consumidor sob a égi-de do estatuto protetivo, daí por que a inviabilidade da inversão do ônus da prova na forma prevista no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Con-sumidor.

Entretanto, diferentemente do TJRS, cujo entendimento é pacífico quanto à inexistência de relação de consumo nas demandas em apreço, o TJSP apresenta decisões, também, no sentido contrário, isto é, que enqua-dram o seguro DPVAT como uma relação de natureza consumerista:

Agravo de instrumento. Ação de cobrança. Seguro DPVAT. Prova peri-cial [...]. Tratando-se de típica relação de consumo e verificada a hipossuficiência econômica e técnica do autor, de rigor a inversão do ônus da prova, como forma de facilitação da defesa dos seus direitos em juízo (art. 6º, VIII, do CDC). Sendo da agravante o interesse em comprovar suas alegações e possuindo meios econômicos para tanto, é dela a responsabilidade pelo custeio dos hono-

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rários periciais, a fim de não tornar inócua a aplicação da regra protetiva prevista na legislação consumerista. Negado provimento ao recurso. (TJSP, AI 0177090-70.2012.8.26.0000, 25ª CDPriv., Rel. Hugo Crepaldi, J. 12.09.2012 – grifos nossos)

Seguro obrigatório. DPVAT. Cobrança. Antecipação das despesas judiciais para realização de perícia. Prova requerida pelas partes. Determinação para que a ré antecipe as despesas judiciais para realização de perícia. Relação de consumo. Admissibilidade. Honorários periciais. Remuneração que deve ser fixada de acordo com a complexidade do trabalho. Montante adequado. Agravo não provido. (TJSP, AI 0143553-91.2012.8.26.0000, 29ª CDPriv., Relª Silvia Rocha, J. 08.08.2012 – grifos nossos)

Dita corrente – que, no TJSP, é, frisa-se, tão presente quanto a contrária – se funda no art. 3º, § 2º, do CDC, conforme demonstra o seguinte trecho do voto do Desembargador Ferraz Felisardo, proferido no julgamento do Agra-vo de Instrumento nº 0229827-58.2012.8.26.0000: “A relação entre as partes configura relação de consumo, já que a agravante é prestadora de serviços, sendo companhia seguradora, submetendo-se ao Código de Defesa do Con-sumidor, com fundamento no art. 3º, § 2º, deste diploma legal”.

A filiação a esse entendimento é bastante forte na Corte paulista, po-dendo-se citar inúmeros outros julgados que dele compartilham, como, por exemplo, os seguintes: Agravo de Instrumento nº 0229827-58.2012.8.26.0000, 29ª Câmara de Direito Privado, Relator Ferraz Felisardo, julgado em 14.11.2012; Apelação nº 0020399-35.2009.8.26.0196, 35ª Câmara de Direito Pri-vado, Relator Manoel Justino Bezerra Filho, julgada em 18.06.2012; e Agravo de Instrumento nº 0041027-46.2012.8.26.0000, 25ª Câmara de Direito Privado, Relator Marcondes D’Angelo, julgado em 16.05.2012.

No mesmo norte, encontram-se decisões do TJRJ, entendimento que é sintetizado no seguinte trecho do voto da Desembargadora Odete Knaack de Souza, proferido em 03.10.2012, lavrado quando do julgamento do Agravo de Instrumento nº 0042971-78.2012.8.19.0000: “Quanto à aplicação do CDC, bem como a inversão do ônus da prova, a jurisprudência desta Corte vem se posicionando, de forma majoritária, quanto à existência de relação consume-rista, não sendo descaracterizada em face da natureza legal da obrigação”. E seguem as razões desse posicionamento:

Isso porque tal prestação do serviço de seguro é realizada por operadora que visa ao lucro, impondo-se aos proprietários de automóvel o recolhi-mento do seu valor, tendo como beneficiários aqueles que sofrem um aci-dente de trânsito, em consonância com o art. 3º do CDC.

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Já no que diz com os Tribunais superiores, não se encontra, até o pre-sente momento, decisão ventilando, expressa e diretamente, essa questão. Há apenas indícios, como os Recursos Especiais nºs 855.165/GO e 858.056/GO, julgados pelo STJ em 07.02.2008 e 11.06.2008, respectivamente, que tratam acerca da possibilidade, ou não, de o Ministério Público ajuizar ação civil pública para tutela dos interesses dos beneficiários do seguro DPVAT27. En-tre os argumentos suscitados pela seguradora, parte em ambos os litígios, encontra-se, justamente, a alegação de que o seguro em exame não se trata de uma relação de consumo.

Ambos os casos foram solucionados, todavia, sem que houvesse po-sicionamento específico quanto à dita controvérsia. Cabe a reprodução do seguinte trecho, proferido pela Ministra Nancy Andrighi, que menciona a problemática, mas não a enfrenta:

A interpretação sistemática do ordenamento jurídico impede que prevale-ça a tese da recorrente. Se a tutela dos interesses individuais homogêneos ficasse adstrita às relações de consumo, conforme inciso II do art. 1º da Lei nº 7.347/1985, o texto do inciso IV do mesmo artigo, que manda aplicar a ação civil pública “a qualquer outro interesse difuso ou coletivo”, seria letra morta. Por isso, para que se caracterize a legitimidade ativa do Ministério Público, é absolutamente irrelevante avaliar se o Seguro Obrigatório de Danos Pessoais – DPVAT é uma relação de consumo. Ainda que não haja relação de consumo, pode o Ministério Público valer-se da ação civil pública para pleitear a tutela de direito difuso, coletivo ou individual homogêneo. Não se vislumbra, portanto, qualquer violação aos arts. 2º e 3º do CDC. (grifos nossos)

Deve-se registrar, todavia, trecho do voto-vista do Ministro Ari Par-gendler, o qual indica posicionar-se no sentido contrário, entendendo pela configuração da relação de consumo:

Trata-se de seguro obrigatório, é verdade, estipulado a favor de terceiro. Mas isso não desqualifica da condição de consumidor aquele que suporta o pagamento do respectivo prêmio, que faz as vezes do estipulante do segu-ro. Mesmo à vista do art. 2º do Código de Defesa do Consumidor, não há dificuldade em identificar como consumidor esse terceiro, beneficiário do seguro. A situação dele não difere daquela que se vê nos demais seguros

27 Atualmente, essa discussão, em sede de STJ, a princípio, foi superada, pacificando-se o entendimento pela ilegitimidade do Ministério Público (STJ, AgRg-EDREsp 855.165/GO, 2ª S., Rel. Min. João Otávio de Noronha, J. 04.06.2010).

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em que há estipulação a favor de terceiro. Como quer que seja, é induvido-so que, sob o prisma de quem paga o seguro obrigatório, e que adquire o produto ou serviço (fora de toda dúvida, consumidor), a presente ação civil pública trará proveito, se procedente o pedido.

Com efeito, grifa-se que essa discussão – com relação à legitimidade do Ministério Público para demandar em nome dos beneficiários do segu-ro DPVAT – já teve, inclusive, a sua repercussão geral reconhecida pelo Su-premo Tribunal Federal – STF, em 08.09.2011, no Recurso Extraordinário nº 631.111/GO, de relatoria do Ministro Ayres Brito (já substituído pelo Mi-nistro Teori Zavascki). Atualmente, dito recurso aguarda apreciação quan-to ao seu mérito, momento que representará, também, nova oportunidade para o efetivo pronunciamento quanto ao enquadramento do seguro DPVAT como sendo, ou não, relação de consumo.

Em síntese, portanto, o argumento utilizado para afastar a caracteri-zação de relação de consumo do seguro DPVAT concentra-se no fato de que este se trata de obrigação imposta por lei, entendimento que é pacificado no TJRS e do qual parte do TJSP também compartilha. Por outro lado, a corrente contrária, responsável por nortear parte das decisões do TJSP, bem como as decisões do TJRJ, fundamenta-se na interpretação literal no art. 3º, § 2º, do CDC (o qual menciona “serviços de natureza securitária”) e no entendimento de que as seguradoras prestam seu serviço com vistas à obtenção de lucro. O STJ e o STF, reprisa-se, até o presente momento, não se manifestaram especi-ficamente quanto ao ponto.

6 DESNECESSIDADE DE PROTEÇÃO ESPECIAL

Ponderados os argumentos que sustentam os posicionamentos de am-bos os lados, revela-se coerente defender que o seguro DPVAT não se enqua-dra como uma efetiva relação de consumo. Diz-se isso com base nos seguin-tes fundamentos:

Primeiro, pois, a própria ratio legis28 da legislação consumerista, qual seja, a necessidade de proteção em razão da vulnerabilidade29 dos consumidores

28 PASQUALOTTO, Adalberto de Souza. O Código de Defesa do Consumidor em face do Código Civil de 2002. In: PFEIFFER, Roberto A. C.; PASQUALOTTO, Adalberto de Souza (Coord.). Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002: convergências e assimetrias. São Paulo: RT, 2005. p. 135/151.

29 Sergio Cavalieri, nesse sentido, afirma, inclusive, que essa vulnerabilidade chega a existir em três aspectos: fático, jurídico e técnico (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de direito

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perante os fornecedores – a qual, inclusive, encabeça o rol dos princípios da Política Nacional das Relações de Consumo30 – sequer existe, de fato, no se-guro obrigatório.

A presumida desigualdade verificável nas relações de consumo, que serviu como propulsora para as inovações legislativas capazes de evitar o esmagamento dos indivíduos pelas corporações31, não se mostra presente no seguro DPVAT.

A própria vulnerabilidade, típica das efetivas relações de consumo, mor-mente nos seus aspectos técnico e econômico, em regra presente nos seguros facultativos, não se encontra no seguro DPVAT, já que neste, de natureza obri-gatória, diferentemente daqueles, não há “margem de discricionariedade” no que diz com o oferecimento do “serviço”.

Tampouco há aspectos a serem avaliados quanto a cláusulas abusivas. Veja-se que, enquanto os seguros facultativos se materializam em contratos cuja redação, ainda que previamente autorizada pela Susep32, é sabidamente imposta pelo segurador (contratos de adesão33), o mesmo não acontece no se-

do consumidor. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011. p. 7). A doutrina já aponta, ainda, a existência de uma quarta espécie de vulnerabilidade, a informacional, a qual toma corpo próprio, especialmente nesta era contemporânea de globalização e virtualização das relações, em que a informação adquire destacada importância, desempenhando “o maior fator de desequilíbrio da relação vis-à-vis dos fornecedores” (MARQUES, Cláudia Lima; MIRAGEM, Bruno. O novo direito privado e a proteção dos vulneráveis. São Paulo: RT, 2012. p. 154/160).

30 CDC: “Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: I – reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo”.

31 TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. A proteção ao consumidor no sistema jurídico brasileiro. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo: RT, v. 60, p. 09, out./set. 2006.

32 A Susep – Superintendência de Seguros Privados. A exceção ocorre nos casos dos contratos de planos de saúde e seguro saúde, cuja fiscalização e regulação cabe à ANS – Agência Nacional de Saúde Suplementar.

33 CDC: “Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo”; Cláudia Lima Marques, quanto a estes, ensina o seguinte: “O contrato de adesão é oferecido ao público em um modelo uniforme, geralmente impresso e estandardizado, faltando apenas preencher os dados referentes à identificação do consumidor-contratante, do objeto e do preço” (MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 6. ed. São Paulo: RT, 2011. p. 76).

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guro DPVAT, haja vista que este se encontra estritamente ligado aos termos da lei.

Nesse contexto, não se vislumbra a possibilidade de as seguradoras participantes do consórcio DPVAT virem, por exemplo, a modificar as exigên-cias deste seguro, muito menos no sentido de dificultar o seu alcance pelos beneficiários.

Se existe burocratização, esta decorre, sobretudo, do grandioso núme-ro de acidentes e indenizações a serem pagas, além da necessária cautela no sentido de garantir que os mínimos requisitos legais estejam, no caso concre-to, satisfeitos, com o fito de se evitarem fraudes e abusos.

Além disso, a própria finalidade dos seguros em geral – garantir finan-ceiramente danos causados por riscos predeterminados34 – não age no seguro DPVAT tal qual nos seguros facultativos. Ao passo que aqueles se prestam a recompor bens perdidos, ou compensá-los no valor correspondente, este visa tão somente a amenizar os danos causados às vítimas de acidentes de trânsito, estando, repisa-se à exaustão, invariavelmente vinculado aos termos, riscos e valores estabelecidos na Lei nº 6.194/1974.

Por essas razões, percebe-se que o seguro DPVAT não se trata de um simples “produto” oferecido no mercado de consumo, tal qual ocorre com os mais diversos tipos de serviços e produtos apresentados aos consumidores.

Corrobora com essa afirmação o fato de que, no seguro DPVAT, tam-pouco há falar em concorrência. Esta, que não apenas se revela elementar para a economia de mercado como também fundamental à própria proteção dos consumidores35, não tem lugar no sistema do seguro obrigatório, posto que não há competição entre os prestadores de serviços, nem variedade no que diz com o serviço em questão. Ao segurado não está facultada, sequer, a opção pela contratação, muito menos a escolha do “produto” e/ou do “fornece-dor”. Da mesma forma, não é possível que outra empresa passe a operar neste mercado e apresente um produto melhor, mais barato ou, por exemplo, com tecnologia mais avançada.

Outro aspecto que merece, ainda, ser considerado diz respeito à lu-cratividade dessa atividade, posto que esta, igualmente, apresenta contornos

34 CC/2002: “Art. 757. Pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo a pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados”.

35 PETTER, Lafayete Josué. Direito econômico. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2011. p. 219.

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particulares no seguro DPVAT, mormente se comparado com os seguros fa-cultativos. Diz-se isso, pois, além de a quantia arrecadada com os prêmios possuir destinação própria, a vantagem econômica auferível pelas segurado-ras é mínima e limitada.

Conforme expressamente estipula o Decreto nº 2.867, de 1998, 50% do valor total da arrecadação dos valores pagos a título de prêmio são investidos na saúde pública e na política nacional de trânsito, na proporção de 45% e 5%, respectivamente. Os outros 50%, por sua vez, são utilizados no pagamen-to das indenizações e na administração das operações deste seguro em nível nacional36. Do total arrecadado, o resultado líquido das seguradoras consor-ciadas está limitado a 1,2%, o que permite concluir, s.m.j., ser impróprio pen-sar que, no caso do DPVAT, as seguradoras desempenham essa atividade buscando o lucro37.

Justamente por isso, reforça-se a tese pela não caracterização da relação de consumo. Como é cediço, o empresário38 desenvolve determinada ativida-de visando à obtenção de lucros39. Essa premissa é tão elementar no mundo dos negócios que o próprio conceito de fornecedor, tal qual esculpido no art. 3º do CDC, é, inclusive, associado à noção do próprio empresário40, este tido

36 Decreto nº 2.867/1998. “Art. 1º O prêmio do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres – DPVAT será arrecadado pela rede bancária e repassado diretamente e sem qualquer retenção, do seguinte modo: I – quarenta e cinco por cento do valor bruto recolhido do segurado a crédito direto do Fundo Nacional de Saúde, para custeio da assistência médico-hospitalar dos segurados vitimados em acidentes de trânsito, nos termos do parágrafo único do art. 27 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991; II – cinco por cento do valor bruto recolhido do segurado ao Departamento Nacional de Trânsito, por meio de crédito direto à conta única do Tesouro Nacional, para aplicação exclusiva em programas destinados à prevenção de acidentes de trânsito, nos termos do parágrafo único do art. 78 da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997; III – cinquenta por cento do valor bruto recolhido do segurado à companhia seguradora, na forma da regulamentação vigente”.

37 Conforme Relatório da Administração com as demonstrações financeiras relativas ao primeiro semestre de 2011. Disponível em: <http://www2.susep.gov.br/download/demofin20110630/Lider.pdf>. Acesso em: 19 dez. 2012.

38 CC/2002: “Art. 966. Considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”.

39 RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. São Paulo: Método, 2010. p. 27.

40 De acordo Bruno Miragem, a atividade econômica desenvolvida pelo fornecedor é desempenhada por este visando a determinada vantagem econômica, que, geralmente, é a contraprestação pecuniária ou a remuneração (MIRAGEM, Bruno. Curso de direito do consumidor. 2. ed. São Paulo: RT, 2010. p. 97/100).

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como o sujeito que exerce, habitualmente, atividade econômica, de forma organizada e profissional, com o inequívoco intuito de obter lucro. Nesse contexto, considerando os números acima, é fato que o objetivo de lucros não se encaixa no funcionamento do seguro DPVAT, sendo este outro fator a corroborar com a tese aqui esboçada, no sentido de que não há relação de consumo no seguro em exame.

Por derradeiro, há de se reconhecer que ao atribuir ao seguro DPVAT o status de relação de consumo se está, em verdade, enfraquecendo e desvirtuando o próprio CDC, diploma cuja relevância é máxima no ordenamento e que de-veria ser reservado para aquelas situações em que a natureza consumerista, mormente nos moldes em que prevista na lei, é patente, sob pena de banali-zação e descrédito do Codex em apreço.

Em síntese, tendo em vista (I) a ausência de vulnerabilidade e a corre-lata necessidade de proteção, (II) a inexistência de cláusulas abusivas, (III) a impossibilidade de as seguradoras modificarem as exigências no que tange ao merecimento e à liberação das indenizações, (IV) a finalidade de amenizar os danos e não de recompô-los, (V) a inexistência de concorrência por parte de fornecedores, (VI) a limitação quanto à lucratividade passível de ser au-ferida pelas seguradoras e (VII) o enfraquecimento do CDC em razão de sua aplicação desnecessária e imprópria, conclui-se que o seguro DPVAT sequer se trata de um “serviço” ou “produto” oferecido no mercado de consumo, não se enquadrando, portanto, como uma relação consumerista.

Não há a opção pela sua contratação, posto que esta é compulsória, com objetivo de proteção da população. No máximo, pode a vítima optar por não recebê-lo, mas, por lei, caso preenchidos os requisitos legais, o beneficiá-rio tem o direito de ser contemplado com o valor respectivo ao sinistro.

CONSIDERAÇÕES fINAIS

Combinar o seguro DPVAT com o CDC não é um tema pacífico. Os tribunais consultados comprovam que, pelo menos por ora, não há entendi-mento pacificado quanto a essa matéria.

Ainda que se respeite e compreenda o entendimento contrário, crê-se que o melhor posicionamento é pela não caracterização do seguro DPVAT como uma relação consumerista. A letra fria da lei, in casu, do art. 3º, § 2º, do CDC, não pode ser utilizada à revelia da essência do seguro DPVAT, na medida em que este não se trata de uma simples garantia financeira contra-tada pelo particular para a eventualidade de sobrevirem perdas econômicas

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ao seu patrimônio. Esse papel é indubitavelmente – e apenas – dos seguros facultativos.

A finalidade do seguro DPVAT, por outro lado, é outra, de cunho emi-nentemente social, tanto que imposto por lei, a toda a população, e limitado às coberturas e aos critérios estabelecidos no texto legal. Os fatores que levam a enquadrar um contrato de seguro comum (facultativo) como de relação de consumo não estão presentes no seguro obrigatório.

Em verdade, ambas as espécies de seguro se assemelham, unicamente, pelo fato de serem “seguros”, estes lidos como garantias financeiras para riscos predeterminados. A despeito dessa identidade, são diferentes: um é privado e visa aos interesses dos particulares; o outro é público, com objetivo visivel-mente social.

Sopesando o todo exposto, a única conclusão certa é a de que, de fato, o tema é controvertido e as decisões acima transcritas e mencionadas compro-vam isto. A legitimidade de algum dos argumentos poderá eventualmente sobrepor-se, quando o STJ ou o STF apreciarem diretamente a matéria, o que, até o presente momento, não foi realizado. Certo é, apenas, que o tema, tal qual ocorre com inúmeras questões securitárias, é inegavelmente controver-tido e polêmico.

REfERÊNCIAS

AMORÍN, Marcelo de Oliveira. Guia prático do seguro DPVAT. Campo Grande: Contemplar, 2011.CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de direito do consumidor. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2011.MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 6. ed. São Paulo: RT, 2011.______; MIRAGEM, Bruno. O novo direito privado e a proteção dos vulneráveis. São Paulo: RT, 2012.MATOS, Robson Pedron; MOLINA, Fabiana Ricardo. O contrato de seguro e o Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Quartier Latin, 2006.MIRAGEM, Bruno. O contrato de seguro e os direitos do consumidor. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo: RT, v. 76, p. 239/276, out./dez. 2010.______. Curso de direito do consumidor. 2. ed. São Paulo: RT, 2010.PASQUALOTTO, Adalberto de Souza. O Código de Defesa do Consumidor em face do Código Civil de 2002. In: PFEIFFER, Roberto A. C.; PASQUALOTTO, Adalberto de Souza (Coord.). Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil de 2002: convergências e assimetrias. São Paulo: RT, 2005.

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PETTER, Lafayete Josué. Direito econômico. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2011.RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito empresarial esquematizado. São Paulo: Método, 2010.______. Direito empresarial esquematizado. São Paulo: Método, 2010.SENE, Leone Trida. Seguro de pessoas. Negativas de pagamento das seguradoras. 2. ed. Curitiba: Juruá, 2009.TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo. A proteção ao consumidor no sistema jurídico brasileiro. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo: RT, v. 60, p. 07/36, out./set. 2006.

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O DIREITO fUNDAMENTAL à DURAÇÃO RAzOáVEL DO PROCESSO E A CORTE

EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM gusTavo Bohrer Paim

Advogado, Professor de Direito Processual Civil na Unisinos.

RESUMO: A duração razoável do processo é um direito fundamen-tal de suma importância, tendo como destinatários os poderes Legis-lativo, Executivo e Judiciário. Para melhor análise da razoabilidade da duração de um processo, imprescindível o estudo dos critérios estabelecidos pela Corte Europeia dos Direitos do Homem em suas decisões, bem como a sua influência sobre os seus Estados-membros.

PALAVRAS-CHAVE: Direitos fundamentais; duração razoável; Corte Europeia dos Direitos do homem; processo civil.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O tempo e o direito; 1.1 O tempo do pro-cesso; 1.2 Tempo, direito processual e direito material; 2 Direito fundamental à duração razoável do processo; 2.1 Breve histórico; 2.2 Conteúdo mínimo e destinatários; 2.3 Duração razoável e cele-ridade; 2.4 Duração razoável do processo e seu reconhecimento in-ternacional; 3 Duração razoável e a Corte Europeia dos direitos do homem; 3.1 Breve análise estatística; 3.2 Critérios para aferição da duração razoável; 3.3 Influência sobre os Estados-membros; Conclu-são; Referências.

INTRODUÇÃO

Um dos grandes tormentos do Direito, indubitavelmente, é o tempo de duração dos processos, via de regra, muito superior ao que se poderia enten-der por uma ideia de razoabilidade.

Inúmeras são as causas da exagerada duração da tramitação dos pro-cessos no ordenamento jurídico brasileiro, que acabam por trazer consequên-cias nefastas aos jurisdicionados, dissociando-se, muitas vezes, da urgência que o direito material em jogo demanda.

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Nesse contexto, essencial, dentro de um direito ao processo justo, o di-reito fundamental à duração razoável do processo, ou o direito a um processo sem dilações indevidas.

Impõe-se salientar que tal direito fundamental tem como destinatários tanto o Poder Judiciário quanto o Poder Legislativo e o Poder Executivo, que têm o dever de densificá-lo.

Não por outra razão, o direito à duração razoável do processo encon-tra-se consagrado em inúmeros ordenamentos alienígenas, tanto de âmbito nacional quanto regional ou supranacional.

Pode-se destacar, no âmbito regional, a Corte Europeia dos Direitos do Homem, cuja atuação é reconhecida na imposição aos Estados-membros da tramitação dos processos em tempo razoável, que é aferido em conformidade com os parâmetros estabelecidos pela Corte.

E, em razão de suas decisões, a Corte Europeia dos Direitos do Homem acaba influenciando seus Estados-membros a adotarem providências no sen-tido de cumprir a duração razoável dos processos, o que assegura maior efi-cácia ao direito fundamental à duração razoável do processo.

1 O TEMPO E O DIREITO

Em que pese a dificuldade de domínio de seu conteúdo, pode-se dizer que o tempo possui uma relação indissociável com a vida de cada um de nós, com a história da humanidade, até mesmo porque, sem tempo, não haveria vida ou história. Não é diferente com o Direito, que é indissociável do tempo.

O tempo tem sido um dos grandes dramas do Direito, tendo em vista as necessidades prementes, que não se coadunam com os longos e morosos procedimentos que regram o dia a dia jurídico.

Inegável a desarmonia entre a dilação temporal dos procedimentos ju-rídicos pátrios e as imperiosas demandas por uma prestação jurisdicional mais célere e efetiva, capaz de salvaguardar o direito posto em causa. Tal desajustamento não é um fenômeno recente, embora tenha ocorrido um drás-tico agravamento dele nos últimos anos. Inseparáveis são, pois, Direito e tem-po, sofrendo aquele os inevitáveis influxos das contingências deste.

Uma grande demonstração da insatisfação em relação ao descompasso existente entre o tempo e o direito transparece da Emenda Constitucional nº 45, que acrescentou aos direitos fundamentais a duração razoável do pro-

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cesso, esculpida no art. 5º, LXXVIII, da Constituição da República Federativa do Federal.

Torna-se imperiosa a busca pela atenuação dos nefastos efeitos do tem-po para a concretização do direito material em jogo. A grande dificuldade está em permitir a aceleração procedimental com respeito aos direitos funda-mentais das partes envolvidas, repartindo-se o ônus do tempo do processo.

Há substanciais diferenças entre os muitos conflitos submetidos ao cri-vo do Poder Judiciário. Ademais, vivemos em uma sociedade de massas, em que os direitos antigamente de mera natureza privada passam a conviver com direitos sociais, coletivos, difusos que “no soportan el transcurso del tiempo del proceso”1.

De qualquer sorte, os extremos não são recomendáveis, tanto no sen-tido da universalização da ordinariedade, com uma consequente cognição plena e exauriente, quanto da sumarização absoluta dos procedimentos, vis-to que há situações em que se faz importante ter paciência para acalmar os ânimos das partes envolvidas, a fim de que não haja uma discronia2 decorren-te da exacerbada utilização das “tutelas de urgência”. Assim, deve haver um equilíbrio capaz de propiciar condições harmônicas tanto para as situações que exigem uma celeridade maior como para aquelas que demandam uma salutar meditação do julgador.

Nesse diapasão, percebe-se a indissociável relação entre o tempo e o Direito, em que se faz relevante o respeito à complexidade das relações so-

1 MONROY GÁLVEZ, Juan; MONROY PALACIOS, Juan. Del mito del proceso ordinario a la tutela diferenciada. Apuntes iniciales. Revista de Processo, São Paulo, n. 109, p. 195-196, 2003. “Además de nuevos, estos derechos requieren una cobertura judicial urgente, porque si van ser resueltos una vez concluido un proceso ordinario – por citar un ejemplo – el agravio a su titular se convertiría en definitivo y el proceso habría significado una actividad infructuosa. El tiempo – esa ‘cueva de ladrones’ como lo llamó Benedetti – se va a tragar a todos los nuevos derechos si se pretende que su eficacia se concrete a través de un proceso con cognición plena. Digamos que los nuevos derechos le plantean al procesalista un reto de supervivencia: o se cambia sustancialmente el proceso a fin de adecuarlo a las nuevas exigencias de la sociedad, o se le hace perecer. En este contexto, resulta indispensable que surja una alternativa a la tutela jurisdiccional ordinaria”.

2 OST, François. O tempo do direito. Lisboa: Piaget, 1999. p. 37-41. Para François Ost, discronia seria, juntamente com a eternidade, a entropia e o determinismo, uma patologia temporal, que significaria o risco de não se atentar à pluralidade do tempo, visto existirem “ritmos específicos, durações particulares, ciclos singulares, velocidades diferenciadas”. Dever-se-ia atentar ao “direito ao seu tempo, direito ao seu ritmo”, com diferentes tempos sociais, cada um a demandar sua própria cadência. Dessa forma, far-se-ia necessário ter cuidado para não banalizar o uso das tutelas de urgência.

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ciais, com procedimentos mais céleres e aptos a preservar o direito material em discussão, mas sem jamais perder de vista o respeito aos direitos fun-damentais existentes. Nesse sentido, encontra-se superada a total separação entre o processo de conhecimento e o processo de execução.

1.1 O tempo do processo

O Estado, ao vedar o direito à autotutela, comprometeu-se com a pro-teção jurisdicional a ser prestada ao cidadão, como a contrapartida inevitável da vedação ao uso da justiça privada. Assim, em uma sociedade “civilizada”, o ato de proibir alguém de fazer justiça a si mesmo tem como corolário indis-pensável a faculdade reconhecida a todos, sem qualquer discriminação, de ir ao Judiciário para buscar a justiça.

Contudo, o jurisdicionado, ao consentir com a mediação institucio-nal, concordando em submeter ao Judiciário a satisfação de suas pretensões, acaba admitindo a existência de um obstáculo ao imediatismo temporal. Ao abdicar de fazer justiça de mão própria, o cidadão também renuncia a obter a justiça imediatamente, visto que tempo e processo estão intimamente liga-dos. A própria noção de “processo”, do latim procedere, “avançar”, “andar”, implica a ideia de evolução e de maturação. O processo “não esgota o seu ciclo de vida em um único momento, mas destina-se a se desdobrar ao longo do tempo, tendo uma duração própria, irredutível porque fisiológica”3.

Conforme salienta Marco Jobim,o processo necessita de um tempo de maturação para que seja julgado e efe-tivado, sendo que este tempo é um passivo necessário a qualquer processo que seja apreciado pelo Poder Judiciário sem, contudo, torná-lo excessivo, sendo este o grande enfoque a ser perseguido pela doutrina na atualidade.4

3 CHAINAIS, Cécile. La protection juridictionnelle provisoire dans le procès civil en droit français et italien. Paris: Dalloz, 2007. p. 08-09: “Or la médiation institutionnelle à laquelle consent le citoyen en acceptant de recourir à un tribunal fait obstacle, d’un même mouvement, à l’immédiateté temporelle. En renonçant à se faire justice lui-même, le citoyen renonce également à obtenir justice instantanément: temps et procès sont intimement liés. La notion même de ‘procès’, du latin ‘procedere’, ‘avancer’, ‘marcher’, implique l’idée d’évolution et de maturation. Le procès ‘n’épuise pas son cycle vital en un seul instant, mais est destiné à se dérouler dans le temps, ayant pour cela une durée propre, irréductible parce que physiologique’”.

4 JOBIM, Marco Félix. O direito à duração razoável do processo: responsabilidade civil do Estado em decorrência da intempestividade processual, 2. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. p. 112.

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O Direito coloca-se ao lado da reflexão e, portanto, de uma certa len-tidão. O Estado de Direito não organiza somente a possibilidade de recorrer a um juiz; ele também deve fornecer algumas garantias necessárias para a realização prática do Direito, cujo exercício exige alguma duração. Esta cer-tamente não é uma condição suficiente para garantir uma boa justiça, mas é uma condição indispensável5.

Assim, o direito processual possui sua parcela de culpa frente à demo-ra da prestação jurisdicional, aparecendo como o grande vilão nessa ausên-cia de sintonia entre o tempo e o Direito, muito embora não sejam as regras processuais responsáveis exclusivas, nem primordiais, pela morosidade do Poder Judiciário.

Paulatinamente, têm sido realizadas reformas processuais visando à redução da penosa duração processual, especialmente no que diz respeito à disciplina dos recursos em que, por exemplo, se tornou o agravo retido, regra, e o de instrumento, exceção, evitando frequentes paralisações quando da discussão de decisões interlocutórias6.

No entanto, para que caminhemos com maior vigor e efetividade em direção à celeridade da prestação jurisdicional, a técnica da sumarização pro-cedimental mereceria um estudo mais aprofundado, a fim de que se viabili-zasse uma aplicação maior dos procedimentos sumários, fator essencial para a solução eficaz dos complexos litígios da sociedade moderna.

Tais instrumentos deveriam se tornar acessíveis aos jurisdicionados em geral, não podendo, no entanto, se tornar uma verdadeira panaceia, de sorte que tenhamos que nos sujeitar a uma generalização do urgente. Deve--se ter em mente que o processo possui, como característica, “durar, no ser instantáneo o momentáneo, prolongar-se”, demandando, em respeito a um giusto processo, obediência “a uma série de garantias das partes (due process of law) cuja observância se faz incompatível com a precipitação”.

A justiça exige serenidade do juiz para a sua realização, pois qualquer julgamento sobre o mérito requer certa duração. Por isso, há necessidade de uma proteção provisória, para atender ao risco induzido pela necessidade dessa maturação, na medida em que esse lapso temporal pode ser prejudicial para uma das partes. O objetivo primordial da tutela provisória é responder

5 Idem, p. 09.6 O projeto do novo Código de Processo Civil prevê o fim do agravo retido, bem como

estabelece tipificadamente as hipóteses de cabimento do agravo de instrumento.

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às situações de urgência processual. Se a proteção jurisdicional provisória é necessária, é imperioso que ela aborde a contradição profunda entre o tempo necessário para o desenvolvimento de um processo sobre o mérito, de um lado, e todas as situações de urgência em que essa espera não é tolerável, de outro.

De um ponto de vista teórico, o direito à proteção jurisdicional provi-sória decorre diretamente da proibição de se fazer justiça de mão própria, justiça privada. Assim, a organização dos procedimentos provisórios aparece como uma necessária contrapartida à vedação da autotutela, juntamente com a constatação de que a proteção jurisdicional é exercida no decurso do tempo.

Ademais, o tempo, como realidade, não possui uniformidade, de modo que se possa ter um sentido unívoco para definir o referido vocábulo, no que tange à sua exteriorização. Em verdade, o tempo sofrerá tantas diferentes in-terpretações quantos diferentes forem seus intérpretes, visto que o que, para alguém, pode parecer de grande efemeridade, para outrem pode significar uma tormentosa eternidade. Quer-se dizer, com isso, que a mensuração do tempo possui um quê muito aflorado de subjetividade.

Em uma determinada relação processual, as partes envolvidas no li-tígio poderão ter concepções diametralmente opostas acerca da duração da controvérsia, eis por que o autor provavelmente terá interesse em uma pron-ta solução, enquanto que o réu, em regra, terá benefícios com a perpetuação da discussão.

O tempo do processo traz consequências diversas às partes, sendo que a plenariedade e a ordinariedade, próprias de uma suposta neutralidade do legislador e do julgador, acabam por sujeitar o autor ao elevado custo da espera da longa duração processual. A contrario sensu, decisões tomadas li-minarmente acabam por, em inúmeros casos, inviabilizar a realização de um salutar diálogo, podendo violar garantias constitucionais do réu.

Deve-se ter em conta que o deferimento de uma liminar inaudita altera parte poderá trazer a violação de um direito do demandado, enquanto que o indeferimento do pedido talvez ofenda uma garantia do demandante.

O que não se pode é atribuir ao autor, na totalidade dos casos, o ônus da delonga procedimental, impondo um difundido procedimento plenário, sem que se permita, em determinados casos concretos, que se propicie ao de-mandante uma via mais célere e efetiva na busca de seu direito. O princípio da isonomia das partes deve preponderar no processo.

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1.2 Tempo, direito processual e direito material

Um dos fatores relevantes da perquirição acerca da duração dos pro-cessos diz respeito à satisfação do direito material pleiteado. Inúmeros casos demandam uma resolução mais célere, a fim de que não se torne inócua a prestação jurisdicional pelo decurso do tempo.

Importante, pois, ter-se em mente que o direito processual não pode estar totalmente desvinculado do direito material, visto que a satisfação des-te depende da razoável duração daquele. O direito processual não pode ser alheio às vicissitudes fáticas, a demonstrar que o caso concreto poderá vir a influenciar no rito processual a ser adotado.

Essa necessária relação existente entre direito processual e direito ma-terial é causa do desenvolvimento da tutela diferenciada pela doutrina italia-na, muito difundida também em nosso ordenamento jurídico. Nem todos os conflitos suscitados ao Poder Judiciário poderiam ser enquadrados em um mesmo rito processual, tendo em vista as peculiaridades do caso concreto, do direito em discussão.

Deve-se ter em conta que o processo não se basta, possuindo relação com o direito material, o que traz a necessidade de diferentes procedimentos, tendo em vista os diferentes bens a serem tutelados, ora exigindo maior cele-ridade, ora demandando análise mais acurada pelo julgador.

2 DIREITO fUNDAMENTAL à DURAÇÃO RAzOáVEL DO PROCESSO

Por mais que as partes, em uma contenda judicial, tenham o interesse em obter êxito em suas pretensões, certamente os jurisdicionados não de-sejam que o resultado dessa lide se prolongue indefinidamente, sendo que o natural inconformismo com um resultado adverso é, nos dizeres de José Rogério Cruz e Tucci, “mais tênue do que o excessivo e intolerável prolonga-mento da luta processual”7.

Assim, um julgamento tardio irá perdendo progressivamente seu sentido repa-rador, na medida em que se postergue o momento do reconhecimento ju-dicial dos direitos; e, transcorrido o tempo razoável para resolver a causa,

7 Sobre a duração razoável do processo na Europa comunitária: Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, v. 44, p. 89, 2011.

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qualquer solução será, de modo inexorável, injusta, por maior que seja o mérito científico do conteúdo da decisão.8

A bem da verdade, o julgamento final de uma ação deve se dar de forma harmoniosa com o direito material posto em contenda, sob pena de a decisão se tornar injusta, independentemente de sua fundamentação.

Aliás, o julgamento tempestivo da lide é elemento indispensável para a segurança jurídica, havendo a necessidade de respeito à razoável duração do processo, levando-se em conta o tempo fisiológico de tramitação, mas im-pondo-se, em razão da efetividade, que não se postergue em demasia o feito, evitando-se o tempo patológico, a fim de que se tenha um processo justo e uma decisão justa.

Não há como negar o direito fundamental à tutela adequada, efetiva e tempestiva, a demonstrar a relevância do direito fundamental à duração razoável do processo, até mesmo para que se contemple o direito ao processo justo.

2.1 breve histórico

O direito fundamental à duração razoável do processo foi expressa-mente introduzido, em nosso ordenamento jurídico, pela Emenda Constitu-cional nº 45, que inseriu o inciso LXXVIII ao art. 5º da Constituição da Repú-blica Federativa do Brasil.

Cumpre salientar, no entanto, que tal direito fundamental não é ne-nhuma novidade, visto que é corriqueiro em ordenamentos alienígenas9. Ali-ás, entende-se, inclusive, que tal direito já estava presente no ordenamento jurídico pátrio, mesmo antes do advento da Emenda Constitucional nº 45.

Pode-se dizer que a ideia de duração razoável dos processos é muito antiga. Já no direito romano haveria a previsão de duração razoável de deter-minados processos, havendo previsão no Código de Justiniano de lei editada para “abreviar em todo o tempo e lugar os processos” e “que todos os proces-sos que versem sobre crédito, condições, direitos municipais ou privados, ou

8 Idem, p. 90.9 Como exemplos, entre outros, temos a Convenção Europeia para a Salvaguarda dos Direitos

do Homem e das Liberdades Fundamentais, de 1950, a Constituição espanhola de 1978 e a Carta Canadense dos Direitos e Liberdades, de 1982 (CRUZ E TUCCI, José Rogério. Tempo e processo. Op. cit., p. 66-79). A Constituição italiana, igualmente, em seu art. 111, positiva a duração razoável do processo.

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sobre posse, domínio, hipoteca ou servidões [...] não ultrapassem um triênio, contado da litis contestatio”10.

Pode-se perceber, na Magna Carta de 1215, mesmo com sua curta du-ração, que havia previsão, em seu art. 40, de que não se atrasaria o direito ou a justiça. Assim, já se identificava alguma preocupação com o referido direito fundamental, em que pese não fosse autônomo11.

A própria bula papal clementina saepe, do Papa Clemente V, de 1306, trazia uma sumarização preocupada com a celeridade dos procedimentos comerciais. Previu também um procedimento executivo próprio, como os tí-tulos executivos extrajudiciais.

Conforme Victor Fairen Guillén, os princípios informativos do novo juízo da bula Saepe Contingit e dos que dela derivaram eram os seguintes:

1. Liberación de la litis contestatio; 2. Limitación de las apelaciones interlocutorias; 3. Liberación del orden legal de los actos, impuesto con gran amplitud anteriormen-te en el solemnes ordo iudiciarius; 4. Acortamiento de los plazos; 5. Concesión al Juez de la dirección del proceso para poder repeler actuaciones superfluas; 6. Con-cesión al mismo del poder de cerrar la audiencia y dictar sentencia cuando hallare al proceso suficientemente instruido; 7. Supresión de formalidades superfluas.12

Nos Estados Unidos, desde 1682, com o Frame of Government of Pensylvania, já se assegurava um julgamento sem postergações, sendo que a Virginia Declaration of Rights trouxe a previsão do speedy trial, que constou na sexta emenda americana, no ano de 179113.

Em relação aos instrumentos regionais de direitos do homem, pode-se destacar a Convenção Europeia para Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, que já consagrava o direito à duração razoá-vel do processo em 1950, bem como a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, que igualmente previa o referido direito fundamental já em 1969.

E, mesmo em relação ao Direito brasileiro, poder-se-ia argumentar que o direito fundamental ao processo justo, previsto no art. 5º, LIV, da Constitui-

10 JOBIM, Marco Félix. O direito à duração razoável do processo: responsabilidade civil do Estado em decorrência da intempestividade processual. 2. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012. p. 72.

11 Idem, p. 73.12 GUILLÉN, Victor Fairen. El juicio ordinario y los plenarios rápidos. Barcelona: Bosch, 1953.

p. 44.13 JOBIM, Marco Félix. Op. cit., p. 74.

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ção Federal, já traria ínsito um dever de que as controvérsias fossem dirimi-das em um tempo razoável. Até mesmo o simples e indispensável bom-senso demonstra a necessidade da razoabilidade da duração processual.

Como se não bastasse, por meio do Pacto de São José da Costa Rica já se afirmava presente o direito fundamental à duração razoável do processo em nosso sistema processual14.

A bem da verdade, o catálogo de direitos fundamentais expressos em nossa Constituição Federal constitui-se um rol materialmente aberto, visto que o § 2º do art. 5º da Constituição Federal literalmente afirma que “os direi-tos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. Nesse sentido, as garan-tias do art. 5º da Constituição Federal não exaurem os direitos fundamentais de nosso ordenamento jurídico.

Ocorre que o Brasil é signatário do Pacto de São José da Costa Rica, que expressamente previu um processo dentro de um prazo razoável, razão pela qual se pode entender que, mesmo antes da Emenda Constitucional nº 45, já havia, no Direito brasileiro, um direito à duração razoável dos processos.

Repisa-se que, mesmo que não fôssemos signatários do pacto interna-cional, certo é que o direito fundamental a um processo justo já demonstra ser imperiosa a garantia da razoável duração do processo.

Deve-se ressaltar, no entanto, que tal regra não pode servir apenas para que se gere um direito subjetivo às partes de demandarem o Estado pelas delongas processuais, mas sim deve servir de norte para o legislador e para os operadores do Direito, no sentido de procurarem, dentro das limitações existentes, formas de tornar mais efetiva a prestação jurisdicional15.

14 O art. 8º, I, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, firmada em San José, Costa Rica, em 22.11.1969, estabelecia que “toda pessoa tem direito de ser ouvida com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei anterior, na defesa de qualquer acusação penal contra ela formulada, ou para a determinação de seus direitos e obrigações de ordem civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza”. Trata-se de norma supranacional, que estabelece direitos fundamentais, tendo o Brasil como país signatário. Texto aprovado no Congresso Nacional em 1992. Publicação do Decreto nº 678 em 1992.

15 José Maria Rosa Tesheiner, no que tange à duração razoável do processo, escreveu artigo em seu site www.tex.pro.br, acesso em 30 de janeiro de 2006, em que questiona a efetividade da duração razoável do processo, incorporada ao nosso ordenamento jurídico pela Emenda Constitucional nº 45, aduzindo que a duração razoável do processo seria um

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Nesse diapasão, inclusive, Luiz Guilherme Marinoni expressa que

o inciso LXXVIII do art. 5º, ao falar em direito aos meios que garantam a ce-leridade da tramitação do processo ao lado do direito à duração razoável, apenas sublinha a incidência do direito fundamental à duração razoável sobre o Executivo e o Legislativo, tendo o objetivo de deixar claro que a duração razoável do processo não é algo que depende apenas do Poder Judiciário, mas também requer prestações do executivo e do Legislativo.16

Impõe-se, pois, a análise do conteúdo mínimo e dos destinatários do direito fundamental à duração razoável do processo.

2.2 Conteúdo mínimo e destinatários

O direito fundamental à duração razoável do processo, em seu âmbito de incidência, deve ser respeitado em toda e qualquer espécie de processo, seja jurisdicional, seja administrativo17.

Trata-se de um princípio redigido como cláusula geral, possuindo, em seu suporte fático, um termo indeterminado, a duração razoável, e não pre-vendo a cominação de consequência jurídica para a hipótese de descumpri-mento. Trata-se de um princípio que impõe um estado de coisas que deve ser promovido pelo Estado, seu destinatário18.

sonho do legislador e que, mesmo que não seja proibido sonhar, melhor seriam sonhos que assegurassem a “duração razoável da vida humana”. Afirma que “haveria esta diferença: com o princípio da duração razoável do processo, visa-se a apressar o seu desfecho, ao passo que, com o da razoável duração da vida humana, tratar-se ia de postergá-lo, ainda que não tanto que se perenizassem os velhos, cessando o ciclo das gerações”. Afirma Tesheiner que uma das razões do “sonho do legislador” seria o modelo europeu, visto que a Constituição italiana assegura o giusto processo e a ragionevole durata, em seu art. 111. Outro motivo decorre de ser “politicamente incorreto” votar contra uma duração razoável do processo. Assim, “o princípio da “duração razoável do processo” servirá, pelo menos, como fundamento para ações de indenização contra o Poder Público, numa lógica de ferro: se o Estado veda a defesa privada, obrigando-se a prestar a jurisdição em tempo razoável, deve indenizar quem a obteve, mas tardiamente. Teremos, portanto, mais ações, que exigirão mais juízes para julgá-las, e mais fundamentos para extrair dinheiro do Tesouro do Estado”.

16 MARINONI, Luiz Guilherme. Abuso de defesa e parte incontroversa da demanda. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 34.

17 MARINONI, Luiz Guilherme. Direito fundamental à duração razoável do processo. Revista Jurídica, n. 379, p. 24, 2009.

18 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de direito constitucional. São Paulo: RT, 2012. p. 678.

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Hodiernamente, deve-se entender o direito de ação como o direito à tutela adequada, efetiva e tempestiva, evidenciando-se a importância da tem-pestividade para a obtenção da tutela do direito material19.

De suma importância para a densificação dos direitos fundamentais é o estudo do seu conteúdo mínimo e de seus destinatários. Assim, para Sarlet, Marinoni e Mitidiero, o conteúdo mínimo do direito fundamental à duração razoável do processo está em vincular tanto o legislador, como o administra-dor e o juiz20.

Assim, o direito à duração razoável exige prestações positivas do le-gislador, do administrador e do juiz, devendo o Estado dar tempestividade à tutela jurisdicional21.

Nesse contexto, passa-se a analisar o legislador como destinatário do direito ao fundamental ao processo justo, em seu dever de proteção norma-tiva.

Conforme destacam Sarlet, Marinoni e Mitidiero, o direito fundamen-tal à duração razoável do processo vincula o legislador no sentido de que ele deve viabilizar técnicas processuais que permitam a prestação tempestiva da tutela jurisdicional, normas que reprimam comportamentos atentatórios à duração razoável, e deve estabelecer a previsão de responsabilidade civil do Estado pelo descumprimento do referido direito fundamental22.

No mesmo sentido, Marinoni assevera que o legislador é obrigado a dar proteção normativa à duração razoável do processo em três dimensões, (1) devendo editar normas com o fim de regular a prática dos atos processu-ais em prazo razoável, estabelecer prazos que realmente permitam a prática dos atos processuais e fixar sanções preclusivas diante da não observância dos prazos; (2) devendo “dar às partes meios de controle das decisões judi-ciais que violem as normas processuais destinadas a dar proteção ao direito fundamental à duração razoável, assim como formas de controle das deci-sões que, sem atentar contra regras infraconstitucionais, neguem diretamente o direito fundamental à duração razoável”; e (3) devendo “instituir meios

19 MARINONI, Luiz Guilherme. Direito fundamental à duração razoável do processo. Revista Jurídica, n. 379, p. 12, 2009.

20 Op. cit., p. 678.21 MARINONI, Luiz Guilherme. Direito fundamental à duração razoável do processo. Revista

Jurídica, n. 379, p. 12-13, 2009.22 Op. cit., p. 678.

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processuais capazes de permitir o exercício da pretensão à tutela ressarcitória contra o Estado”23.

No que tange à primeira dimensão, no que diz respeito à viabiliza-ção de técnicas processuais capazes de viabilizar a tutela tempestiva, pode--se destacar, entre outras normas, as hipóteses atinentes à antecipação de tutela, que viabilizam uma melhor distribuição do ônus do tempo do pro-cesso, como a antecipação de tutela decorrente da urgência (art. 273, I, do CPC), a antecipação de tutela em razão da evidência da parcela incontroversa (art. 273, § 6º, do CPC) e a antecipação de tutela pela evidência diante do abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (art. 273, II, do CPC).

Conforme Luiz Guilherme Marinoni, deve o legislador traçar os pro-cedimentos a as técnicas processuais idôneas a dar duração razoável ao pro-cesso, devendo estabelecer procedimentos especiais em razão do direito ma-terial em jogo, bem como deve instituir regras que permitam a construção do procedimento adequado ao caso concreto24.

Ademais, impõe-se ao legislador viabilizar normas legais que repri-mam, mediante previsão de sanções, a atuação protelatória das partes, de-sincentivando e sancionando condutas que exasperem o tempo fisiológico do processo, tendo-se como exemplo o art. 14, II, IV, V, e parágrafo único, e o art. 17, IV e VII, e art. 18, todos do Código de Processo Civil25.

Por fim, impõe-se ao legislador a edição de normas que regulamentem a responsabilidade civil do Estado pelo descumprimento do direito funda-mental à duração razoável do processo, fixando critérios e parâmetros que permitam aferir, no caso concreto, a violação ou não da duração razoável, bem como estabelecendo a competência para o julgamento da demanda, vis-to que não seria racional que o próprio órgão jurisdicional que apreciou a ação em que teria ocorrido violação ao direito fundamental pudesse julgar a ação ressarcitória26.

Assim como o Legislativo, o Executivo também é destinatário do di-reito fundamental à duração razoável do processo, em seu dever de dotação.

23 Direito fundamental à duração razoável do processo, p. 13-17.24 Idem, p. 15.25 MARINONI, Luiz Guilherme. Direito fundamental à duração razoável do processo. Revista

Jurídica, n. 379, p. 14, 2009.26 MARINONI, Luiz Guilherme. Direito fundamental à duração razoável do processo. Revista

Jurídica, n. 379, p. 17, 2009.

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Nesse diapasão, o administrador também está vinculado ao direito fundamental, devendo adotar técnicas gerenciais aptas a viabilizá-lo, organi-zando de forma idônea os órgãos jurisdicionais27.

Inegavelmente, para que se preste a jurisdição de forma efetiva e tem-pestiva, há a necessidade de que se tenha uma estrutura administrativa com-patível, com pessoal qualificado, com tecnologia adequada e com material idôneo28.

Para garantir a estrutura adequada para a prestação jurisdicional, o Poder Judiciário necessita de um orçamento que contemple suas necessida-des, razão pela qual o direito fundamental à razoável duração do processo impõe ao Poder Executivo uma prestação de caráter econômico, uma dotação orçamentária adequada29.

Não há como negar, pois, que o Poder Executivo é destinatário do di-reito fundamental à duração razoável do processo, visto que, sem uma es-trutura compatível com a demanda existente, sem mão de obra qualificada e em quantidade adequada, sem tecnologia da informação apta a otimizar a prestação dos serviços pelo Poder Judiciário, não há como se prestar uma tutela jurisdicional tempestiva.

E, como não poderia ser diferente, o Poder Judiciário também é desti-natário do direito fundamental à duração razoável do processo, impondo-se ao julgador o dever de prestar a tutela jurisdicional de forma tempestiva, vin-culando-se o juiz na condução do processo em respeito à duração razoável30.

Nos dizeres de Marinoni, “a tutela jurisdicional dos direitos é certa-mente indissociável da dimensão do tempo, pois tutelar de forma intempes-tiva equivale a não proteger ou a proteger de forma indevida”31.

Impõe-se salientar que a prestação jurisdicional tempestiva não se dá apenas para tutelar o direito do autor, mas também para garantir ao deman-dado um processo justo, sem submetê-lo a uma pendência processual que exceda a razoabilidade32.

27 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Op. cit., p. 678.

28 MARINONI, Luiz Guilherme. Direito fundamental à duração razoável do processo, p. 19.29 Idem, p. 19-20.30 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de

direito constitucional. São Paulo: RT, 2012. p. 678.31 Direito fundamental à duração razoável do processo, p. 17.32 Idem, ibidem.

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Nesse sentido, tendo o juiz como destinatário, impõe-se uma condu-ção do processo que contemple o direito fundamental à duração razoável, combatendo-se atos judiciais que dilatem de forma indevida o feito, sejam atos omissivos, sejam atos comissivos33.

Pode-se destacar, como omissão do julgador na condução do processo, capaz de causar dilação indevida e violar o direito fundamental à duração razoável, a não análise de um pedido de tutela antecipatória ou a não repres-são de atos abusivos das partes, deixando de conduzir o processo de forma a assegurar a tempestividade da tutela jurisdicional34.

Da mesma forma, a violação do direito à duração razoável do processo pode se dar por uma conduta comissiva do julgador, ao determinar a produ-ção de prova sobre fato incontrovertido ou impertinente, ou ao se equivocar na escolha de uma técnica processual idônea à tempestividade da tutela ju-risdicional35.

Salienta Marinoni que, quando a dilação está em curso, se pode invo-car “o direito fundamental à duração razoável no próprio processo em que a demora injustificada está ocorrendo”, enquanto que, quando a excessiva demora já se consumou, causando dano, “terá que ser proposta ação ressar-citória contra o Estado”36.

Percebe-se, por conseguinte, que o direito fundamental à duração ra-zoável do processo vincula os três Poderes estatais, Judiciário, Legislativo e Executivo, que possuem deveres para densificá-lo.

2.3 Duração razoável e celeridade

Impõe-se referir que, por duração razoável, não se deve entender uma duração determinada, sob pena de se falar em “duração legal”. Não há um prazo certo, determinado pelo legislador para que seja cumprido, razão pela qual se deve levar em consideração o caso concreto, não se admitindo a prá-

33 Idem, p. 17-18.34 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Op. cit.,

p. 680. Conforme salientam os autores, “se a parte se comporta de forma inaceitável, gerando incidentes procrastinatórios, por exemplo, há responsabilidade do Estado. É preciso perceber que o juiz tem o dever de velar pela rápida solução do litígio, tendo de conduzir o processo de modo a assegurar a tempestividade da tutela jurisdicional. Daí que o juiz que se omite na repressão do ato abusivo da parte contribui para dilação indevida, dando azo à responsabilidade estatal”.

35 MARINONI, Luiz Guilherme. Direito fundamental à duração razoável do processo, p. 18.36 Idem, p. 19.

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tica de atos dilatórios injustificados. Não se tem como cogitar uma duração razoável sem que as partes possam, adequadamente, participar do feito, exercendo seus direitos fundamentais de natureza processual e podendo in-fluenciar o convencimento do julgador37.

Deve-se entender o direito fundamental à duração razoável do proces-so tanto na perspectiva do autor, que não quer ver o reconhecimento do seu direito submetido a um tempo patológico, quanto do réu, de ver respeitado o tempo fisiológico do processo que lhe permita exercer seu direito de defesas e suas garantias fundamentais.

Para Francisco Rosito, o processo deve demorar exatamente o tempo necessário para atender a sua finalidade de resolver o conflito com justiça, outorgando-se o direito material a quem efetivamente o tem, sem deixar de respeitar o contradi-tório, a ampla defesa, a igualdade entre as partes e o dever de adequada fundamentação, sob pena de violarmos garantias transcendentais de nosso sistema.38

Nesse contexto, Luiz Guilherme Marinoni salienta que “o direito à duração razoável confere direito à tutela jurisdicional tempestiva, direito ao prazo adequado para a prática dos atos processuais e direito de não ter a esfera jurídica restringida por tempo superior ao devido”, razão pela qual “não há como confundir direito à duração razoável com direito à celeridade do processo”39.

O direito à duração razoável do processo não pode ser confundido com celeridade processual, não se tratando de expressões sinônimas, visto que o processo demanda certa dilação, sendo o tempo fisiológico inerente ao pro-cesso.

Assim, deve-se analisar se o tempo processual foi proporcional ou não em relação à tutela do direito material em conflito. Para Sarlet, Marinoni e Mitidiero:

A natureza necessariamente temporal do processo constitui imposição de-mocrática, oriunda do direito das partes de nele participarem de forma ade-

37 Idem, p. 19-20.38 ROSITO, Francisco. O princípio da duração razoável do processo sob a perspectiva

axiológica. Revista de Processo, n. 161, p. 36, 2008.39 Direito fundamental à duração razoável do processo, p. 21.

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quada, donde o direito ao contraditório e os demais direitos que confluem para organização do processo justo ceifam qualquer possibilidade de compre-ensão do direito ao processo com duração razoável simplesmente como direito a um processo célere. O que a Constituição determina é a eliminação do tempo pa-tológico – a desproporcionalidade entre duração do processo e a complexidade do debate da causa que nele tem lugar.40

Para considerar se a duração do processo foi proporcional ou não, de-ve-se levar em conta seu spatium temporis, o desenvolvimento temporal que se dá entre o dies a quo e o dies ad quem41, ou seja, “levando-se em consideração todo o tempo em que pendente a judicialização do conflito entre as partes”42.

Percebe-se, pois, que por duração razoável do processo não se deve entender processo célere, tendo em vista a necessidade de respeito ao tempo fisiológico do processo, buscando-se evitar o seu tempo patológico. E, para se aferir a proporcionalidade da duração temporal, necessário levar em consi-deração alguns critérios, que serão estudados no item 3.2.

2.4 Duração razoável do processo e seu reconhecimento internacional

O direito à razoável duração do processo encontra-se positivado em inúmeros ordenamentos alienígenas, a demonstrar o reconhecimento inter-nacional de sua fundamentalidade.

Nesse sentido, a Constituição italiana, modificada em 1999, estampou, em seu art. 111, que “La giurisdizione si attua mediante il giusto processo regolato dalla legge. Ogni processo si svolge nel contraddittorio tra le parti, in condizioni di parità, davanti a giudice terzo e imparziale. La legge ne assicura la ragionevole durata”, evidenciando-se a garantia constitucional da duração razoável.

Também a Constituição espanhola, de 1978, no art. 24.2, estabeleceu:Artículo 24. Todas las personas tienen derecho a obtener la tutela efectiva de los jueces y tribunales en el ejercicio de sus derechos e intereses legítimos, sin que, en ningún caso, pueda producirse indefensión.

40 Op. cit., p. 678-679.41 SANA, Cecilia. La durata ragionevole dei processi nel dialogo tra giudici italiani ed europei.

Milano: Giuffrè, 2008. p. 83.42 Idem, p. 679. Continuam os autores salientando que “a duração razoável do processo deve

levar em conta o tempo para a prestação da tutela do direito – acaso a parte autora se sagre vencedora – ou a simples prestação da tutela jurisdicional – acaso a parte autora sucumba ou seja prolatada decisão que extinga o processo sem resolução de mérito”.

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2. Asimismo, todos tienen derecho al Juez ordinario predeterminado por la ley, a la defensa y a la asistencia de letrado, a ser informados de la acusación formulada contra ellos, a un proceso público sin dilaciones indebidas y con todas las garantías, a utilizar los medios de prueba pertinentes para su defensa, a no declarar contra sí mismos, a no confesarse culpables y a la presunción de inocencia.

Percebe-se que, na Espanha, utiliza-se a expressão processo sem dila-ções indevidas, e não duração razoável do processo.

A Constituição da República Portuguesa, de 1976, também positivou, em seu art. 20.4, que “todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo”.

Também o Canadá, em sua Constitution Act, de 1982, art. 11, b, estam-pou que toda pessoa tem o direito “to be tried within a reasonable time”.

E não apenas os ordenamentos nacionais possuem previsão acerca da duração razoável do processo, mas também os instrumentos regionais pre-veem tal direito fundamental.

Nesse sentido, a Convenção Europeia para Salvaguarda dos Direi-tos do Homem e das Liberdades Fundamentais, de 1950, positivou, em seu art. 6º, 1, que “toda pessoa tem direito a que sua causa seja examinada equi-tativa e publicamente num prazo razoável”.

Também a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, de 1969, previu, em seu art. 8º, que trata das garantias judiciais, que:

1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, inde-pendente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer ou-tra natureza.

Não é diferente com a Corte Africana de Direitos Humanos, que esta-belece, em seu art. 7.1, c, que toda a pessoa tem direito a ser “julgado em um prazo razoável por um tribunal imparcial”, nem com a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que assegura, em seu art. 47, que toda pessoa tem direito a que sua causa seja julgada de forma equitativa, publica-mente e num prazo razoável.

Assim, inegável o reconhecimento nacional e supranacional que recebe o direito fundamental à duração razoável do processo, merecendo destaque a atuação da Corte Europeia dos Direitos do Homem.

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3 DURAÇÃO RAzOáVEL E A CORTE EUROPEIA DOS DIREITOS DO HOMEM

A Convenção Europeia para Salvaguarda dos Direitos dos Homens e das Liberdades Fundamentais, firmada em Roma, em 1950, assegurou, em seu art. 6º, 1, que “toda pessoa tem direito a que sua causa seja examinada equitativa e publicamente num prazo razoável”.

Conforme José Rogério Cruz e Tucci, foi, sem dúvida, a partir da edição desse diploma legal supranacional que o direito ao processo sem dilações indevidas passou a ser concebido como um direito subjetivo constitucional, de caráter autônomo, de todos os membros da coletividade (incluídas as pessoas jurídicas) à tutela jurisdicional dentro de um prazo razoável.43

Como se não bastasse o caráter histórico, é notória e efetiva a atuação da Corte Europeia dos Direitos do Homem no que tange ao direito funda-mental à duração razoável dos processos.

3.1 breve análise estatística

Fazendo uma breve pesquisa, sem muito cientificismo, na página da internet da Corte Europeia, pode-se encontrar, com a utilização das expres-sões “procédure civil” e “délai raisonnable”, cerca de três mil julgamentos, sen-do que isso não significa que sejam todos casos distintos, visto que a Corte procede ao julgamento pelos seus órgãos fracionários, as seções, e também pela Grande Câmara, o Pleno da Corte Europeia.

Em seu artigo, José Rogério Cruz e Tucci colaciona uma estatística de 2009, em que apresenta o número de demandas dessa natureza julgadas pro-cedentes pela Corte Europeia contra os Estados-membros, destacando-se o alto número de condenações da Grécia, e apresentando uma sensível dimi-nuição contra a Itália, muito em razão da Lei Pinto, que posteriormente será analisada44.

De qualquer sorte, tal pesquisa também não é muito aprofundada, vis-to que traz o número de demandas procedentes, sem, contudo, analisar a existência de demandas coletivas, o que pode macular sensivelmente a esta-

43 Sobre a duração razoável do processo na Europa comunitária: Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil, n. 44, p. 91, 2011.

44 Op. cit., p. 100-101.

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tística, tendo em vista, por exemplo, que, no caso Gaglione e outros x Itália, são 475 demandas conexas promovidas contra o Estado italiano.

Fazendo-se a mesma pesquisa na página da internet da Corte Euro-peia, agora apenas em relação aos processos de 2012, podem-se encontrar 105 casos, contra os seguintes Estados europeus:

Turquia 33; Grécia 22; Portugal 14; Itália 12; Romênia 8; Bélgica 3; Rússia 3; Polônia 2; Letônia 2; República Tcheca 1; Bulgária 1; França 1; Luxemburgo 1; Espanha 1; Moldávia 1

Tendo em vista a grande quantidade de demandas, não se pode apro-fundar o resultado dos processos, tampouco a pluralidade de litigantes. De qualquer sorte, chama a atenção o alto número de casos propostos contra Turquia e Grécia.

Aliás, o Estado grego tem sido muito criticado pela Corte Europeia, sendo que o Tribunal advertiu expressamente, e por diversas vezes, o go-verno grego a solucionar o alto índice de demandas, concedendo-lhe prazo de um ano para inserir no ordenamento grego, em atendimento ao art. 13 da Convenção, mecanismo processual apto a possibilitar a formulação da quei-xa pela excessiva demora do processo45.

3.2 Critérios para aferição da duração razoável

Com a evolução dos seus julgados, a Corte Europeia dos Direitos do Homem foi paulatinamente consolidando critérios para aferir se a tramitação processual atendeu ao direito fundamental à duração razoável.

Nesse sentido, não havendo um tempo legal, predeterminado em lei, há a necessidade de se analisar as circunstâncias do caso concreto para que se verifique a razoabilidade da duração do processo, se o processo cumpriu apenas o seu tempo fisiológico ou se teve um tempo patológico, decorrente de dilações indevidas.

Acerca das dilações indevidas, José Rogério Cruz e Tucci esclarece que são

os atrasos ou delongas que se produzem no processo por inobservância dos prazos estabelecidos, por injustificados prolongamentos das etapas mortas que separam a realização de um ato processual de outro, sem subordinação

45 Ver, por exemplo, o caso Vassilios Athanasiou e outros x Grécia (Processo nº 500.973/08).

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a um lapso temporal previamente fixado, e, sempre, sem que aludidas dila-ções dependam da vontade das partes ou de seus mandatários.46

Assim, não há como se fixar em abstrato, a priori, um tempo que se considere razoável para a duração de um processo, tendo em vista as parti-cularidades do caso concreto, que são levadas em consideração nos critérios consolidados pela Corte Europeia.

Atribui-se ao Caso Neumeister contra Áustria47, de 1963, o precedente em que a Corte Europeia primeiramente alinhavou os critérios para a aferi-ção da duração razoável do processo.

No caso em comento, o diretor de uma empresa de transportes com-pareceu pela primeira vez como suspeito em 21.01.1960, tendo sido preso provisoriamente por fraude fiscal (pena de 5 a 10 anos) em 23.02.1961. Poste-riormente, foi colocado em liberdade em 12.05.1961. Em 12.07.1962, foi preso pela segunda vez, tendo efetuado vários pedidos de liberdade e oferecimento de caução, todos recusados. Em 08.01.1964, uma decisão permitiu a liberdade mediante pagamento de 2 milhões de schilings, sendo que Neumeister ofere-ceu um milhão de schillings e foi posto em liberdade em 16.09.1964.

Em que pese a natureza penal do processo, e das particularidades que por si só suscitam em relação ao processo civil, pode-se destacar que a Corte Europeia fixou sete critérios para a análise da razoabilidade da duração da prisão provisória de Neumeister, quais sejam: (1) a duração efetiva da deten-ção; (2) a duração da detenção preventiva em comparação com a natureza da infração; (3) os efeitos de ordem material, moral ou outra causados pela detenção; (4) a conduta do acusado, levando-se em consideração (a) se ele contribuiu para retardar ou acelerar a instrução, (b) se ele retardou por de-mandas de liberdade, recursos, (c) se ele demandou sua liberdade mediante caução ou se ofereceu outras garantias; (5) as dificuldades de instrução do caso (complexidade quanto aos fatos, número de testemunhas); (6) a maneira como a instrução foi conduzida (sistema de instrução e a condução da instru-ção); e (7) a conduta das autoridades judiciárias (no exame dos pedidos de liberdade e no julgamento do caso).

A relevância desse caso para o presente estudo decorre do fato de que a Corte Europeia levou em consideração alguns desses critérios para a aná-

46 Op. cit., p. 92.47 Processo nº 1936/63.

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lise do direito fundamental à duração razoável do processo, destacando-se os critérios 1, 4, 5, 6 e 7, ou seja, a duração efetiva, a conduta do acusado, as dificuldades de instrução do caso, a forma como a instrução foi conduzida e a conduta das autoridades judiciárias, na análise dos pedidos e no julgamento do caso.

Após esse precedente, os critérios para análise da razoabilidade da du-ração foram sistematizados e consagrados nos casos Konig contra Alema-nha (Processo nº 6232/73), Buchholz contra Alemanha (Processo nº 7759/77), Zimmermann e Steiner contra Suíça (Processo nº 8737/79), entre outros48.

Os critérios, consolidados pela Corte Europeia, levariam em conta, ba-sicamente, em análise ao caso concreto, (a) a complexidade da causa, (b) o comportamento dos litigantes e de seus procuradores e (c) a atuação do ór-gão jurisdicional (autoridades competentes).

Posteriormente, além dos três critérios clássicos referidos, a Corte Eu-ropeia passou a levar em consideração um quarto critério, levando-se em consideração a pessoa do litigante e a relevância do direito em jogo para a vida do litigante prejudicado pela duração não razoável do processo. Nesse sentido, podem-se destacar os casos H contra Reino Unido, de 1987, X contra França, de 1991, Buchholz contra Alemanha, de 77, Commissione contra Di-namarca, de 1996, entre outros49.

Percebe-se, por conseguinte, que a Corte Europeia analisa o caso em concreto, o direito posto em jogo, sua complexidade, o comportamento das partes e seus procuradores, bem como a atuação das autoridades competen-tes para aferir se a duração processual foi ou não proporcional.

48 Em seu artigo, à p. 92, José Rogério Cruz e Tucci aponta o caso Capuano contra Itália (Processo nº 9381/81) como precedente, em que pese seja posterior aos julgados anteriormente referidos.

49 DALMOTTO, Eugenio. Diritto all’equa riparazione per l’eccessiva durata del processo. In: CHIARLONI, Sergio (a cura di). Misure acceleratorie e riparatorie contro l’irragionevole durata dei processi. Torino: Giappichelli, 2002. p. 68-225. Conforme Eugenio Dalmotto, à p. 176, o critério da posta in gioco foi introduzido pela Corte de Estrasburgo em causas envolvendo portadores do vírus HIV, em que havia uma necessidade de levar em consideração a complexidade do caso concreto, suas peculiaridades de fato e de direito, impondo-se a condução do processo com uma excepcional diligência, a fim de assegurar a rapidez de um julgamento em que a decisão é de crucial importância para o jurisdicionado. Também é analisado, no critério da posta in gioco, o status pessoal, a importância da controvérsia para o jurisdicionado, destacando-se, por exemplo, o direito de visitas a menor, a adoção, bem como a liberdade da pessoa, em processos penais.

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Ressalta Cruz e Tucci que a Corte Europeia demanda uma “diligência normal” da parte demandante, “não lhe sendo imputável a demora decor-rente do exercício de direitos ou poderes processuais, como o de recorrer ou de suscitar incidentes”. Assim, não serão “indevidas” as dilações decorrentes do esforço das partes, a utilização das regras processuais previstas e que cau-sam uma natural delonga processual50.

Em que pese não haja um termo legal, convém salientar que existem decisões da Corte Europeia que consideram excessivo, como regra, o prazo superior a 5 anos, por considerar que seria razoável a tramitação de 3 anos do processo em primeiro grau e de 2 anos para o procedimento recursal51.

Em relação ao valor indenizatório, não há um valor pré-fixado, mas o quantum arbitrado, como regra, é fixado entre 1000 e 1500 euros para cada ano excedente ao spatium temporis considerado fisiológico e, por consequên-cia, aceitável, podendo variar em razão das circunstâncias peculiares do caso concreto52.

Tendo em vista o grande número de demandas propostas contras Esta-dos-membros pelo descumprimento do direito fundamental à duração razo-ável, a Corte Europeia preceitua a necessidade de os seus Estados-membros adotarem mecanismos legais internos que solucionem a desproporcional du-ração processual, adaptando-se às orientações da Corte.

3.3 Influência sobre os Estados-membros

Em razão das reclamações crescentes, em meados da década de 90, fi-cou clara a estrutura insuficiente da Corte Europeia para atender a todas as demandas em tempo hábil. Assim, em 1998, foram realizadas inúmeras alte-rações, consolidadas no Protocolo XI. A Corte passou a ser permanente e, por força do art. 13, impôs aos Estados-membros o dever de instituírem remédios internos efetivos para atender ao direito fundamental à duração razoável do processo53.

50 Op. cit., p. 93. Continua o autor aduzindo que “é necessário, pois, que a morosidade, para ser reputada realmente inaceitável, decorra do comportamento doloso de um dos litigantes, ou, ainda, da inércia, pura e simples, do órgão jurisdicional encarregado de dirigir as diversas etapas do processo”.

51 Idem, ibidem.52 Idem, p. 94.53 Idem, p. 95.

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Nesse sentido, o art. 35 da Convenção reservou jurisdição subsidiária à Corte Europeia, sendo que a parte interessada deve recorrer à Corte, no prazo de 6 meses, após exaurir a via judicial interna, junto aos órgãos nacio-nais54. De qualquer sorte, a Corte Europeia tem admitido, excepcionalmen-te, a reclamação da parte interessada mesmo “antes do termo final do pro-cesso, quando: a) a demora for desmedida e absolutamente injustificável; e b) a compensação deferida ao queixoso, pelo Estado-membro, afastar-se to-talmente da orientação pretoriana prevalente na Corte Europeia”55.

Ademais, mesmo que as decisões da Corte Europeia não tenham eficá-cia vinculante aos julgadores dos Estados-membros, devem estes, dentro do possível, levar em consideração os padrões estabelecidos pela Corte, contem-plando os princípios estampados na Convenção Europeia56.

Nesse particular, destaca-se a Lei Pinto italiana, decorrente da estarre-cedora estatística que apontava que, em meados dos anos 90, 85% das causas relativas à violação da duração razoável submetidas à Corte Europeia eram movidas contra o Estado italiano57.

Assim, em 24 de março de 2001, editou-se a Lei nº 89, chamada Legge Pinto, cujo objetivo era criar um remédio intra muros para cumprir a norma exposta no art. 13 da Convenção Europeia.

Em seu Capítulo II, que trata da justa reparação, a Lei Pinto estabelece o direito a uma justa reparação para quem sofrer dano patrimonial ou extra-patrimonial decorrente da violação da duração razoável prevista no art. 6º, § 1º, da Convenção Europeia. Como critérios para aferição da proporcionali-dade da duração processual, a Lei Pinto estabelece os mesmos consolidados nas decisões da Corte Europeia58.

54 “Art. 35. A corte não pode ser acionada, senão após o exaurimento da via recursal interna, em consonância com os princípios de direito internacional geralmente reconhecidos e dentro de 6 meses a partir da data da decisão definitiva interna.”

55 Idem, ibidem.56 Idem, p. 96.57 Idem, ibidem.58 “Art. 2. (Diritto all’equa riparazione). 1. Chi ha subi’to un danno patrimoniale o non patrimoniale

per effetto di violazione della Convenzione per la salvaguardia dei diritti dell’uomo e delle liberta’ fondamentali, ratificata ai sensi della legge 4 agosto 1955, n. 848, sotto il profilo del mancato rispetto del termine ragionevole di cui all’articolo 6, paragrafo 1, della Convenzione, ha diritto ad una equa riparazione. 2. Nell’accertare la violazione il giudice considera la complessita’ del caso e, in relazione alla stessa, il comportamento delle parti e del giudice del procedimento, nonche’ quello di ogni altra autorita’ chiamata a concorrervi o a comunque contribuire alla sua definizione.”

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Igualmente, o dano se dá em relação ao tempo patológico, ou seja, o que ultrapassou a natural duração fisiológica, sendo que decisões italianas costumam levar em consideração a regra dos 5 anos da Corte Europeia e o valor de 1000 euros por ano excedente, mesmo que não haja qualquer subor-dinação hierárquica ou política entre as duas jurisdições59.

Impõe-se salientar, contudo, que a Corte Europeia entende que o paga-mento do montante indenizatório devido deve ocorrer no prazo de 6 meses do termo em que a decisão passa a ter executoriedade, sendo que, nos casos Cocchiarella contra Itália e Gaglione contra Itália, condenou o Estado italiano por descumprir a própria Lei Pinto, pois os pagamentos, no caso Gaglione, levavam de 9 a 49 meses, sendo que cerca de 65% dos casos ultrapassavam os 19 meses.

Percebe-se, pois, que a própria Lei Pinto, que buscava a duração razoá-vel dos processos, não está sendo cumprida em tempo razoável, o que faz novas demandas virem a ser propostas perante a Corte Europeia.

Da mesma forma, a Grécia tem sido muito criticada pela Corte Euro-peia, tendo o governo grego sido advertido e tendo lhe sido concedido prazo para inserir, em cumprimento ao art. 13 da Convenção Europeia, um me-canismo processual que permita a formulação da demanda pela excessiva demora processual.

Inegável, portanto, a importância dos julgados da Corte Europeia para a satisfação do direito fundamental à duração razoável dos processos.

CONCLUSÃO

Indispensável, para o direito processual, que se viabilize, conforme a análise do caso concreto, a tutela adequada, efetiva e tempestiva do direito pretendido.

Nesse sentido, de fundamental relevância é o estudo da relação entre tempo e direito, mormente no sentido de se buscar a efetivação de uma tutela tempestiva.

Para tanto, o direito fundamental à duração razoável do processo é um notável avanço no Direito brasileiro, consagrado pela Emenda Constitucio-nal nº 45, que inseriu o inciso LXXVIII ao art. 5º da Constituição da República

59 CRUZ E TUCCI, José Rogério. Op. cit., p. 97-98.

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Federativa do Brasil. De qualquer sorte, mesmo antes dessa positivação, já se reconhecia o direito fundamental à duração razoável no Brasil.

Tal direito fundamental é consagrado em inúmeros ordenamentos alienígenas, e impõe ao Estado – Poder Legislativo, Poder Judiciário e Poder executivo – deveres para sua densificação, havendo um dever de proteção normativa, um dever de dotação e um dever de prestação de tutela jurisdi-cional tempestiva.

Cumpre destacar, em relação ao direito fundamental à duração razoá-vel, a atuação da Corte Europeia dos Direitos do Homem, especialmente em razão dos critérios adotados para a aferição da proporcionalidade da duração do processo, além de sua forte influência sobre seus Estados-membros, dan-do efetividade ao direito fundamental.

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PenalANáLISE DOS INSTITUTOS DESPENALIzADORES

DA LEI Nº 9.099/1995 à LUz DA TEORIA DOS JOgOS, EM ESPECIAL DA TRANSAÇÃO PENAL

AnálIsIs De los InsTITuTos De DereCho DesPenAlIzADores nº 9.099/1995 lA luz De lA TeoríA

De Juegos Con esPeCIAl TrAnsACCIón PenAlFeliPe heck soares

Advogado, Bacharel em Direito – Unipar/Toledo.

milene ana dos sanTos Pozzer

Advogada, Mestre em Direito Processual Civil e Cidadania – Unipar, Pós-Graduada em Políticas Públicas – Unioeste, Pós-Graduada em

Segurança Pública – Unioeste, Bacharel em Direito – Unipar, Responsável Técnica do Serviço de Assistência Judiciária Gratuita da Unipar, Orientadora da Área Jurídica do Programa Patronato de Toledo.

RESUMO: A pesquisa tem como objetivo demonstrar a eficiên-cia e a viabilidade dos institutos despenalizadores, em especial da transação penal (do art. 76 da Lei dos Juizados Especiais, Lei nº 9.099/1995), tendo como meio para isso uma análise destes pela teoria dos jogos, para, assim, mostrar que uma possível negociação e arbitragem é benéfica ao ordenamento jurídico brasileiro. Deste modo, com a ideia de que a teoria dos jogos tenta explicar e prever os comportamentos estratégicos que podem ser tomados por indivíduos em uma relação de que a estratégia de um pode e vai influenciar as tomadas de decisões e estratégias do outro e que na transação penal temos um jogo que é sequencial, dependendo do Ministério Público ofertar a transação. E do noticiado, autor do fato, aceitá-la, ocorrendo uma ordem previamente determinada para que se ocorra o procedimento. Assim, encontramos um ponto de equilíbrio na relação que beneficia ambas as partes, que pode ser considera-do um equilíbrio de Nash, no qual a estratégia de todos acaba por gerar o melhor resultado para todos os interesses. Conclui

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o autor que o ponto de equilíbrio é o oferecimento da transação e sua aceitação, sendo este o resultando mais esperado e que reflete a melhor decisão racional para o caso concreto.

PALAVRAS-CHAVE: Teoria dos jogos; juizado; transação penal.

RESUMEN: La investigación tiene como objetivo demostrar la efica-cia y la viabilidad de los institutos despenalizadores, en particular, la transacción penal (el arte. 76 de la Ley sobre los tribunales es-peciales, la Ley nº 9.099/1995), tomándolo como un medio para un análisis de las mismas por la teoría de juegos, por lo tanto, muestran que una posible negociación y el arbitraje es beneficioso para el sis-tema jurídico brasileño. Así, con la idea de que la teoría de juegos se intenta explicar y predecir el comportamiento estratégico que pue-de ser tomada por los individuos en una relación que la estrategia puede y va a influir en la toma de decisiones y las estrategias de la otra y que la transacción penal tiene un juego que es secuencial, los fiscales dependiendo ofrecer transacción. Y el comunicado, autor del hecho, lo aceptan, dándose un orden predeterminado de modo que se produce el procedimiento. Así nos encontramos con un equilibrio en la relación que beneficia a ambas partes, que se puede considerar un equilibrio de Nash, en el que la estrategia de todos en última instancia genera el mejor resultado para todos los intereses. El autor concluye que el punto de equilibrio es la oferta y la aceptación de la transacción, con esta resultante más esperado y refleja la mejor decisión racional para el caso.

PALABRAS CLAVE: Teoría de juegos; del Tribunal de Menores; de transacción penal.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Juizados Especiais Criminais; 2 Institu-tos despenalizadores da Lei dos Juizados; 2.1 Composição civil dos danos; 2.2 Transação penal; 2.3 Suspensão condicional do processo; 3 Teoria dos jogos; 3.1 Tipos e classificações de jogos; 4 Estratégia dominante e equilíbrio de Nash; 5 A transação penal e os custos para

os jogadores; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

O presente trabalho busca discutir sobre as medidas alternativas na Lei nº 9.099/1995, quais sejam, a composição civil dos danos, a transação penal e a suspensão condicional do processo, utilizando a teoria dos jogos e alguns de seus institutos e conceitos. Para tanto, o método utilizado foi o dedutivo, mediante pesquisa bibliográfica em doutrinas e jurisprudência.

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O tema abordado desperta uma visão do Direito sob a perspectiva da economia, explicando, com base na teoria dos jogos, as possíveis formas das escolhas dos institutos despenalizadores pelo Estado e pelo autor do fato. Tal entendimento ajuda-nos a compreender os possíveis comportamentos to-mados pelas partes nas relações e, com base nisso, criar meios de alcançar os objetivos pretendidos em lei, no caso estudado, a compreensão se dá quando do entendimento que a transação, no seu oferecimento e aceitação, é o melhor resultado para a resolução do caso concreto.

No primeiro capítulo, disporá rapidamente sobre a necessidade de criação dos Juizados Especiais Criminais (Lei nº 9.099/1995), sua origem le-gislativa e como se entende a sua atuação, competência e função nos dias de hoje.

No segundo capítulo, explicitará o que são os institutos despenalizado-res da Lei nº 9.099/1995 da composição civil dos danos, da transação penal e da suspensão condicional do processo, ressalvando a transação penal, que é o instituto especialmente abordado para a aplicação da teoria dos jogos.

No terceiro e quarto capítulos, apresentará o que seria a teoria dos jo-gos, explicando suas definições e classificações, dando especial atenção ao jogo de estratégias dominantes e ao equilíbrio de Nash.

No quinto e último capítulo, abordará a análise da teoria dos jogos, com seus institutos e peculiaridades, à transação penal, buscando a compro-vação da manutenção e o incentivo dos institutos despenalizadores no orde-namento jurídico brasileiro.

Por fim, conclui que, para a transação obter o seu equilíbrio de Nash com o oferecimento da transação e a aceitação desta, é importante que as partes tenham conhecimento de todas as informações do jogo e a possuam de maneira racional e sem considerar as suas vontades pessoais, levando apenas em jogo as técnicas e jurídicas.

1 JUIzADOS ESPECIAIS CRIMINAIS

A sociedade evolui e cresce constantemente gerando constante au-mento na demanda de causas ao Poder Judiciário, e, desse modo, segundo Martins Filho (1999, p. 1), em vistas ao não comprometimento da prestação jurisdicional ao jurisdicionado, prestigiam-se formas alternativas de compo-sição de conflitos.

Tendo isso em vista, o nosso legislador pátrio desenvolveu, segundo Miranda, Petrillo e Oliveira Filho (2003, p. 14-15), meios de responder a essas

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necessidades; em 1984, com a Lei nº 7.244, criaram-se os Juizados de Peque-nas Causas com o intuito de garantir solução a conflitos menores, e, após mais ou menos dez anos, melhorando os institutos e as ideias já trazidas em 1984, foi editada a Lei nº 9.099/1995, a Lei dos Juizados Especiais Criminais.

No mesmo sentido, Greco Filho (2012, p. 272) nos traz que:

Há cerca de 20 anos ou até um pouco mais, desenvolveu-se no Brasil um movimento em direção à ampliação do acesso à justiça, inspirado, entre outros, no monumental trabalho de Cappelletti e Garth, que identificaram três waves of reform no access-to-justice movement: a garantia de assistência jurídica para os pobres, a representação dos direitos difusos e a informali-zação do procedimento de resolução de conflitos.

Desse modo, a Lei dos Juizados Especiais Criminais tem, no seu art. 62, diversos dispositivos que versam sobre sua aplicação, em especial o da não aplicação de pena privativa de liberdade. Impossível aplicar pena ou repri-menda sem o devido processo legal previsto no art. 5º, LIV, da Constituição Federal, às vistas do direito à liberdade. Entretanto, é possível o pagamento de multa ou a restrição de algum direito considerando evitar-se um processo e a solução de problema penal em detrimento do contraditório e da ampla defesa (Nucci, 2013, p. 435).

Segundo Masson (2010, p. 162-164), o crime é, quanto às teorias de aná-lise, tripartido, sendo composto por fato típico, antijurídico e culpável, ou bipartido, sendo somente fato típico e antijurídico. Ainda, segundo ele, aque-les critérios de existência do crime são defendidos por doutrinadores como Cezar Roberto Bitencourt e Nélson Hungria. De outro ponto, esses critérios são defendidos por Damásio E. de Jesus e Júlio Fabrini Mirabeti.

Desse modo, em análise de nosso Código Penal, encontramos posi-cionamentos favoráveis para os dois pensamentos; entretanto, utilizaremos, para este trabalho, a visão dada por Bitencourt (2010, p. 717-718), da teoria tripartida do crime, sendo, portanto, composto por fato típico, antijurídico e culpável, não sendo correto acrescentar a punibilidade no conceito ou ainda retirar a culpabilidade dele.

Nesse mesmo diapasão, os Juizados Especiais Criminais são competen-tes para julgar infrações de menor potencial ofensivo, competência já previs-ta constitucionalmente no inciso I do art. 98 da Constituição Federal, e que, após longa discussão doutrinária, entendeu-se, como demonstra Nucci (2013, p. 433):

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Segundo o disposto no art. 61, são as contravenções penais (qualquer que seja a pena prevista em abstrato), bem como os crimes a que a lei comine pena máxima de até dois anos. Supera-se, finalmente, a discussão absur-da, que se havia criado, na doutrina e na jurisprudência, entre o dispos-to no antigo art. 61, considerando infração de menor potencial ofensivo a que tiver pena máxima de até um ano, e o art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 10.259/2001 [...] tratando a infração de menor potencial ofensivo como aquela que possui pena máxima de até dois anos. Está unificado o entendi-mento. É infração de menor potencial ofensivo a que possuir pena máxima, em abstrato, não superior a dois anos.

Igual entendimento tem o Supremo Tribunal Federal, expresso, por exemplo, quando do julgamento do Habeas Corpus nº 85.694 de Mi-nas Gerais, no qual foi relatora a Ministra Ellen Gracie, e do Habeas Corpus nº 109.277 do Sergipe, no qual foi relator o Ministro Ayres Britto, no mo-mento em que afirmam, respectivamente, que o conceito de crime de me-nor potencial ofensivo é aquele previsto no art. 2º, parágrafo único, da Lei nº 10.259/2001, qual seja, os crimes com pena máxima não superior a dois anos e que a lesividade dada pelo art. 98, I, da Constituição Federal a cri-mes de menor potencial ofensivo, por mais brando que seja o dano para a vítima, não deve este ser retirado do alcance do poder punitivo do Estado. Ressalta-se que, por política criminal, a conduta é penalmente típica, porque, significante, assim dizendo, as infrações de menor potencial ofensivo, não há regra de lesividade a justificar uma resposta punitiva “rigorosa do Esta-do”. Vejamos, por exemplo, o caso da prática de crime ambiental previsto no art. 38 da Lei nº 9.605/1998:

Habeas corpus. Penal. Processual penal. Crime contra o meio ambiente. Ação penal. Competência da Justiça Federal comum. Pena máxima supe-rior a dois anos. Ordem denegada. I – A lei prevê como infrações de menor potencial ofensivo as contravenções e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a dois anos, cumulada ou não com multa. II – O Mi-nistério Público denunciou o paciente pela suposta prática do crime pre-visto no art. 38 da Lei nº 9.605/1998, que prevê a pena de detenção de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente, de modo que não há falar, in casu, de infração de menor potencial ofensivo. Afastada, pois, a competência do Juizado Especial Federal Criminal. III – Ordem denegada. (HC 112758, 2ª T, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, J. 16.10.2012, processo eletrônico DJe-220 divulg. 07.11.2012, public. 08.11.2012)

Ainda, o art. 62 da Lei nº 9.099/1995 nos traz alguns princípios norte-adores dos Juizados Especiais Criminais, que, segundo Nucci (2013, p. 430),

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são os da oralidade, que prevê a supremacia da palavra oral pela escrita, visando à possibilidade de concentração de todos os atos em uma única au-diência e o contato direto do julgador com as provas, o da informalidade, sem burocracia inútil e sem cerimônias, o da economia processual e celeridade, que visam ao ganho de tempo e à agilidade processual.

A título de exemplo:

Habeas corpus. Crimes de menor potencial ofensivo. Suspensão condicional do processo. Art. 89, § 2º, da Lei nº 9.099/1995. Condições facultativas impos-tas pelo juiz. Doação de cestas básicas. Possibilidade. Precedentes. Ordem denegada. Os crimes investigados são daqueles que admitem a suspensão condicional do processo mediante o cumprimento dos requisitos estabele-cidos para a concessão do benefício. O § 2º do art. 89 da Lei nº 9.099/1995 faculta ao juiz da causa “especificar outras condições a que fica subordi-nada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado”. Nesse ponto, a doação de cestas básicas não caracteriza a espécie de pena restritiva de direito prevista no inciso I do art. 43 do Código Penal, atinge à finalidade da suspensão do processo e confere rápida solução ao litígio, atendendo melhor aos fins do procedimento criminal. Ordem dene-gada. (HC 108927, 2ª T., Rel. Min. Joaquim Barbosa, J. 28.02.2012, processo eletrônico DJe-101 divulg. 23.05.2012, public. 24.05.2012.

Assim sendo, é necessário ressaltar que, nos casos englobados pela Lei dos Juizados Especiais Criminais, não há a figura do inquérito policial, mas sim de um termo circunstanciado, que tem preenchimento mais simples do que o inquérito policial, mas deve ser completo o suficiente para possibilitar a fundamentação da transação penal e de uma possível denúncia (Nucci, 2013, p. 443), no caso de não preenchimento dos requisitos da transação ou de sua não aceitação.

2 INSTITUTOS DESPENALIzADORES DA LEI DOS JUIzADOS

A Lei dos Juizados Especiais Criminais trouxe ao nosso ordenamento jurídico institutos despenalizadores, que, segundo Machado (2006, p. 72), “a despenalização consiste em transferir as intervenções sobre alguns compor-tamentos para outras modalidades de controle social que não a justiça penal”.

Na mesma ideia, Bitencourt (2012, p. 1034) ensina que são institutos de “despenalização de fatos que, com a evolução ético-social, perderam seu caráter lesivo e a consequente reprovabilidade, possibilitando, igualmente, a exclusão do injusto das chamadas lesões insignificantes”.

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Defende o Ministro Celso de Mello, relator no julgamento do Inquérito nº 1.055-3 do Amazonas, que:

A Lei nº 9.099/1995, que constitui o estatuto disciplinador dos Juizados Es-peciais Criminais, mais do que a regulamentação normativa desses órgãos judiciários de primeira instância, importou em expressiva transformação do panorama penal vigente no Brasil, criando instrumentos destinados a viabilizar, juridicamente, processos de despenalização, com a inequívoca finalidade de forjar um novo modelo de justiça criminal, que privilegie a ampliação do espaço de consenso, valorizando, desse modo, na definição das con-trovérsias oriundas do ilícito criminal, a adoção de soluções fundadas na própria vontade dos sujeitos que integram a relação processual penal. (grifos nossos)

Com efeito, segundo Capez (2012, p. 611), o procedimento sumaríssi-mo dos Juizados Especiais dá ao Ministério Público uma discricionariedade quanto ao oferecimento da ação penal, sendo esta discricionariedade regra-da pela conveniência e a oportunidade, desde que preenchidos os requisitos legais. Tal entendimento é reiterado por Jesus (2007, p. 58) quando este diz que a “transação, prevista no dispositivo, com fundamento ao princípio da discricionariedade regulada, constitui exceção à regra, mitigada pelo contro-le jurisdicional”.

Assim, são eles, em espécie, a composição civil dos danos (art. 72), a transação penal (art. 76) e a suspensão condicional do processo (art. 89), que podem ser aplicados nos crimes abrangidos pelos Juizados Es-peciais Criminais e nos crimes por ela não abrangidos, sendo os critérios de-terminados por cada um deste.

2.1 Composição civil dos danos

A composição civil dos danos é instituto despenalizador presen-te na Lei nº 9.099/1995 e da simples leitura do art. 72 da Lei dos Juizados e ocorre na audiência preliminar, no procedimento dos juizados.

A composição civil tem o objetivo de assegurar a reparação civil dos danos causados à vitima; dessa forma, estando presentes todas as partes em audiência, Ministério Público, autor do fato, vítima e seus respectivos advo-gados, e realizado o acordo, cabe ao juiz homologá-lo (Nucci, 2013, p. 447).

Há de se ressaltar a decisão do Pleno, retirada a possibilidade aos cri-mes militares:

Habeas corpus. Processo penal militar. Lei nº 9.099/1995. Art. 74, parágrafo único. Há incompatibilidade de composição civil (Lei nº 9.099/1995, art.

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74, parágrafo único) com o crime militar. Neste transitam outros valores--hierarquia, disciplina, segurança – que não são encontráveis nos crimes comuns. Há outros interesses protegidos além dos circunscritos à vítima. (HC 74581, Tribunal Pleno, Rel. Min. Nelson Jobim, J. 01.04.1998, DJ 04.12.1998, p. 00011, Ement. v. 01934-02, p. 00197)

Do mesmo modo, Capez (2012, p. 515) leciona:

À vista disso, marcando o início da fase de redescobrimento, nosso orde-namento jurídico recebeu, em boa hora, a Lei nº 9.099/1995, possibilitando, em infrações consideradas de menor potencial ofensivo [...], a extinção da punibilidade mediante a composição civil entre lesado e autor do fato, ob-jetivando a total reparação dos prejuízos suportados pelo primeiro.

Segundo Nucci (2013, p. 447-448), na composição civil dos danos ho-mologada, ocorre a renúncia ao direito de queixa ou representação (art. 74, parágrafo único, parte final). Desse modo, a composição prevê o anterior acordo civil, que pode ser executado na esfera cível, por ter força de título executivo judicial. Assim, ocorre, com a realização da composição civil, a re-núncia ao direito de queixa ou representação por já ter aceitado a reparação do dano, já tendo sido satisfeita a lesão sofrida pelo dano gerado pelo autor do fato. Entretanto, pode ainda a vítima não realizar a composição, propondo a ação penal, e, ao final desta, exigir a devida indenização.

2.2 Transação penal

A transação penal é outro instituto despenalizador que também se faz presente na Lei n 9.099/1995, em seu art. 76, é cabível no caso de ser a ação penal pública e não sendo o caso abarcado em nenhuma das hipóteses elen-cadas no art. 76, § 2º, I, II e III, da Lei dos Juizados, quais sejam: a) não ter sido o noticiado, por sentença transitada em julgado, condenado a pena privativa de liberdade, por outro crime; b) ter sido o noticiado alguma vez, nos últimos cinco anos, beneficiado com pena restritiva de direitos ou multa, nos termos da transação penal; c) e não indicarem os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, os motivos, as circunstâncias não ser esta a melhor medida a ser aplicada.

Na transação penal, para Capez (2012, p. 614), temos que “consiste ela em um acordo celebrado entre o representante do Ministério Público e o au-tor do fato, pelo qual o primeiro propõe ao segundo uma pena alternativa (não privativa de liberdade), dispensando-se a instauração do processo”.

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A transação penal é (Nucci, 2013, p. 449) um acordo entre o órgão acu-satório, Ministério Público, e o acusado, autor do fato, visando a evitar os malefícios trazidos com a ação penal, por meio da aplicação de uma medida restritiva de direitos ou multa, sem a necessidade do devido processo legal. Tudo por já se encontrar previsto e autorizado no art. 98, I, da Constituição Federal. É possível, também, a ocorrência de não aplicação de medida alter-nativa com a transação penal, haja vista que não teria sentido propor tran-sação, com aplicação de qualquer espécie de punição, a quem realizou algo penalmente irrelevante.

Pode ocorrer, ainda, a discordância do juiz com o promotor, podendo este utilizar-se do art. 28 do CPP, encaminhando o termo circunstanciado ao Procurador Geral de Justiça, para que este ofereça ou determine a outro promotor oferecer a proposta ou ainda, que se proceda ao arquivamento do feito (Grinover et al., 2002, p. 145). Tal entendimento se coaduna com o en-tendimento do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Espe-cial nº 261.570, de São Paulo, no qual foi relator o Ministro Jorge Scartezzini , do qual se extrai trecho do voto:

Em inúmeros julgados, tanto nesta eg. Corte quanto no Supremo Tribunal Federal, tem-se proclamado que, em tais casos – recusa do órgão ministe-rial em propor a transação penal, assim como a suspensão do processo –, a questão deve ser resolvida, em princípio, com a aplicação analógica do art. 28 do CPP, vale dizer, com o encaminhamento dos autos à Procurado-ria-Geral de Justiça.

Por fim, ainda segundo Nucci (2013, p. 457), entre as vantagens para o autor do fato, temos a invisibilidade da transação para os demais fins que não a reaplicação de transação pelo prazo de cinco anos da transação anterior – não podendo o noticiado sofrer mais nenhuma represália que não a execução dos termos feitos da transação.

2.3 Suspensão condicional do processo

A suspensão condicional do processo é um instituto despenalizador que, como os outros dois anteriormente expostos, tem como finalidade a boa política criminal, e, segundo Greco Filho (2012, p. 1058), tem o objetivo fim de desafogar a máquina estatal, evitando, assim, os custos e ônus dos processos ao Estado.

Desse mesmo modo, ensina Nucci (2013, p. 475):

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Trata-se de um instituto de política criminal, benéfico ao acusado, propor-cionando a suspensão do curso do processo, após o recebimento da denún-cia, desde que o crime imputado ao réu não tenha pena mínima superior a um ano, mediante o cumprimento de determinadas condições legais, como fito de atingir a extinção da punibilidade, sem a necessidade do julgamento do mérito propriamente dito, é denominado, também, sursis processual.

No mesmo sentido, segundo Nucci (2013, p. 476-478), o art. 89 da Lei nº 9.099/1995 elenca os casos de aplicação da suspensão condicional do pro-cesso como sendo os crimes com pena mínina, em abstrato, não superior a um ano e que não esteja o acusado sendo processado por outro crime. Da mesma maneira, ainda são requisitos os mesmos impostos a suspensão con-dicional da pena (sursis) do art. 77 do Código Penal, quais sejam, não ser o denunciado reincidente em crime doloso, a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do agente, motivos e circunstâncias que autorizem o benefício.

Ademais, defende Greco Filho (2012, p. 1064-1065) que, nos incisos I, II, III e IV do art. 89, temos os termos da suspensão, quais sejam: a reparação do dano, salvo a impossibilidade de fazê-lo; a proibição de freqüentar deter-minados lugares; a proibição de ausentar-se da comarca onde reside sem a autorização do juiz; o comparecimento mensal, pessoal e obrigatório em ju-ízo para informar e justificar suas atividades. Ainda, pode o juiz, em análise pormenorizada do caso concreto, aplicar outra medida, diferente destas, que saciem as necessidades do fato e da situação pessoal do acusado. Da mesma forma, há os casos de revogação do sursis processual nos §§ 3º e 4º do art. 89, tanto como existe a extinção da punibilidade do acusado pelo cumprimento das medidas no lapso temporal determinado na suspensão no § 5º. E, como não poderia ser diferente, com a não aceitação da proposta de suspensão pro-cessual, o processo continuará até seus ulteriores termos (art. 89, § 7º, da Lei nº 9.099/1995), ou seja, prosseguirá até sentença terminativa do feito.

3 TEORIA DOS JOgOS

A economia, segundo Arenhart (2009, p. 9), analisa o direito, as leis e os procedimentos jurídicos por meio da aplicação de princípios econômicos. Essa análise é feita por meio de instrumentos como estatísticas, matemática, econometria e a teoria dos jogos.

Assim, temos alguns precursores da teoria dos jogos, como Antoine Cournot (1801-1877), Ernest Firedrich Ferdinand Zermelo (1871-1953) e Justin

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Emile Borel (1871-1956); entretanto, foi somente no início do século XX que houve real aprofundamento, mais especificamente em 1928, com o primeiro trabalho de John Von Neumman (1903-1957) e depois em 1944, em coautoria com Oskar Morgenstern (1902-1977), com o título “A teoria dos jogos e o com-portamento econômico” (Fiani, 2006, p. 34-37); a partir desse ponto, vários trabalhos se seguiram, em especial o de John Nash, como se expõe adiante.

Para Carvalho (2007, p. 215):

A teoria dos jogos é um método utilizado para representar e compreender as decisões tomadas por agentes que interagem entre si. Também é correto afirmar que, a partir dessa compreensão, constitui um meio para a adoção da melhor escolha nos casos de interação estratégica.

No mesmo pensamento, Fiani (2006, p. 9-10) argumenta que a teoria dos jogos nos ajuda, a partir do entendimento da situação concreta dos jo-gadores, a compreender teoricamente o processo de decisão dos envolvidos, possibilitando o desenvolvimento de raciocínio estratégico, que, por muitas vezes, difere da escolha intuitiva.

Nesse sentido, Silveira (2008, p. 86) nos traz três elementos que devem ser destacados quando da utilização do jogo, por serem estes os pressupostos básicos da sua existência, quais sejam: o jogador, que é o indivíduo tomador de decisões; as estratégias, cursos de ações que podem ser adotados depen-dendo das informações que o jogador possua; payoff, retorno esperado ao final da partida, podendo ser mensurado em termos monetários ou de utili-dade.

Ainda, a teoria dos jogos, segundo Vasconcellos e Oliveira (2000, p. 207), depende de um jogo em que os jogadores tenham um comportamento racional no qual todas as opções que eles possam vir a tomar sejam lógicas e baseadas em informações previamente recebidas pelo jogador do meio e dos outros jogadores, isso considerando que, para que a teoria tenha efeito, não deve o jogador ter contato com os outros participantes do jogo, muito menos fazer qualquer espécie de acordo ou acerto para alteração dos resultados.

3.1 Tipos e classificações de jogos

Existem algumas classificações que separam os jogos para que estes se adaptem aos casos concretos estudados; a primeira dessas classificações se dá quanto ao momento da escolha das estratégias; neste temos os jogos simultâneos, nos quais os jogadores apresentam suas estratégias ao mesmo tempo, e, por outro lado, temos os jogos sequenciais, que são aqueles que

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realmente nos interessam no presente trabalho, haja vista serem os que se aplicam à transação penal, por se dar, segundo Vasconcellos e Oliveira (2000, p. 209-214).

Quanto aos jogos cooperativos e não cooperativos: estes, quando exis-tem interesses conflitantes entre si, não sendo possível um acordo prévio en-tre os jogadores; naqueles, é possível um acordo prévio entre os jogadores, permitindo, assim, que estes criem suas estratégias em conjunto (Silveira, 2008, p. 87).

Outra classificação que temos é a de jogos de informação perfeita e imperfeita, conforme elucida Fiani (2006, p. 61):

Um jogo é dito de informação perfeita quando todos os jogadores conhe-cem toda a história do jogo antes de fazerem suas escolhas. Se algum joga-dor, em algum momento do jogo, tem de fazer suas escolhas sem conhecer exatamente a história do jogo até ali, o jogo é dito de informação imperfeita.

Por fim, temos os jogos de informações completas, nos quais se pres-supõe que os jogadores conhecem suas estratégias e payoffs e os de seus ad-versários, da mesma maneira que sabe que seus adversários têm o mesmo conhecimento; já nos jogos de informações incompletas, o jogador também sabe as regras do jogo de seus payoffs, mas não sabem os payoffs dos outros jogadores (Silveira, 2008, p. 87-88).

4 ESTRATÉgIA DOMINANTE E EQUILÍbRIO DE NASH

Nos jogos, temos as estratégias dominantes que são aquelas, em breves linhas, segundo Vasconcellos e Oliveira (2000, p. 209), em que “[...] a melhor estratégia para um jogador, qualquer que seja a estratégia adotada pelo ou-tro”. Portanto, em outras palavras, independente das ações e dos meios que os adversários tomarem para alcançar seus payoffs, o jogador sempre escolhe-rá a jogada que melhor atenderá a seus interesses.

De outro lado, temos o equilíbrio de Nash, que se dá quando em um jogo ambos os jogadores fazem escolhas ótimas em relação às escolhas dos outros jogadores, sendo as estratégias por eles adotadas as melhores possí-veis para alcançar os seus payoffs. Nesse sentido, Balbinotto (2006, p. 17):

Um equilíbrio de Nash consiste num equilíbrio no qual cada jogador faz a escolha ótima (aquela que maximiza seu payoff), dada a escolha do outro. Em outras palavras, dizemos que um par de estratégias constitui-se num equilíbrio de Nash se a escolha de A for ótima, dada a escolha de B, e a es-

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colha de B for ótima dada a escolha de A e não houver incentivos para que ambos mudem de estratégia.

Nesse diapasão, Vasconcellos e Oliveira (2010, p. 212) esclarecem que nem sempre se alcançará uma estratégia dominante ou será difícil alcançá-la; deste modo, é necessário que se encontre, entre os jogadores e suas estraté-gias, uma delas, de cada jogador, que preencha as expectativas de payoffs de cada um deles, e a essa congruência de estratégias chamamos de equilíbrio de Nash. Pensamento contínuo, Fiani (2006, p. 92-93) leciona que o equilíbrio de Nash somente é possível quando o equilíbrio é verdade para ambos os jogadores.

Portanto, a diferença entre a estratégia dominante e equilíbrio de Nash é encontrada no momento em que os jogadores consideram, ou não, o payoff do adversário, sendo a não consideração elemento da estratégia dominante e a consideração elemento do equilíbrio de Nash.

5 A TRANSAÇÃO PENAL E OS CUSTOS PARA OS JOgADORES

Quanto aos custos para os jogadores, mais especificamente na ideia da onerosidade dos custos da continuidade do procedimento para o Estado, temos, segundo Arenhart (2009, p. 35), que o procedimento é oneroso para ambas as partes, Ministério Público (Estado) e noticiado, autor do fato, por conta dos gastos judiciais e das custas para a manutenção e busca de provas à causa, devendo as partes pensar cuidadosamente sobre as decisões que po-dem vir a tomar em cada etapa do processo.

Mostrado esse ponto da morosidade judicial, Campos (2011, p. 1) ex-põe que:

A morosidade dos processos judiciais, o não cumprimento e eficácia de suas decisões e os limites da transparência retardam o desenvolvimento nacional, desestimulam investimentos, propiciam a inadimplência, geram impunidade e colocam em dúvida a crença dos cidadãos ao regime demo-crático de direito.

Assim, qualquer ato que não seja realmente necessário para o fiel anda-mento da máquina judicial acaba por gerar custos que em nada interessam a boa prestação jurisdicional.

Como exemplo, temos:

Processo penal. Recurso ordinário em habeas corpus. Estelionato. Transação penal. Homologação. Descumprimento do acordo. Retomada da persecu-

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ção penal. Possibilidade. Recurso não provido. 1. A Suprema Corte reconhe-ceu a repercussão geral do tema, por ocasião da análise do RE 602.072/RS (DJe 26.02.2010), tendo o Pleno decidido que “não fere os preceitos consti-tucionais a propositura de ação penal em decorrência do não cumprimento das condições estabelecidas em transação penal”. Tal julgamento ensejou a mudança de entendimento dessa Turma, a partir do desate do HC 217.659/MS. 2. Recurso ordinário em habeas corpus improvido. (RHC 34.580/SP, 6ª T., Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, J. 12.03.2013, DJe 19.03.2013)

Ou vejamos:

Processo penal. Habeas corpus. Impetração substitutiva de recurso ordinário em habeas corpus. Impropriedade da via eleita. Art. 121, c/c art. 14, II, do Código Penal. Desclassificação para o art. 329 do Código Penal. Transação penal. Não oferecimento. Motivação válida. Ausência. Ordem concedida de ofício. 1. É imperiosa a necessidade de racionalização do emprego do habeas corpus, em prestígio ao âmbito de cognição da garantia constitucio-nal, e, em louvor à lógica do sistema recursal. In casu, foi impetrada indevi-damente a ordem como substitutiva de recurso ordinário em habeas corpus. 2. Segundo a orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça, desclas-sificado o crime para outro que se amolde aos requisitos previstos nos arts. 76 e 89 da Lei nº 9.099/1995, é cabível a formulação de proposta de transa-ção penal e suspensão condicional do processo (Precedentes). Na espécie, tem-se por inadequada a motivação do Ministério Público Estadual deixar de oferecer a transação penal, em razão apenas do fenômeno da desclassi-ficação. 3. Ordem não conhecida, expedido habeas corpus de ofício para sus-pender os efeitos da sentença condenatória nos Autos nºs 052.09.004716-0 (1ª Vara do Tribunal do Júri da Capital/SP), determinando-se a remessa dos autos ao Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo para que se manifeste fundamentadamente sobre o oferecimento da transação penal, em observância analógica ao art. 28 do Código de Processo Penal; na hipótese de insistência na negativa de proposta do benefício, devida-mente fundamentada, ou se o paciente eventualmente a recusar, deve ser restabelecido o trânsito em julgado. (HC 203.278/SP, 6ª T., Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, J. 07.05.2013, DJe 14.05.2013)

Ou, ainda, quando não ocorre o cumprimento das condições impostas na transação penal e se tem que propor a ação penal em decorrência do des-cumprimento delas (RE 602072-QO-RG, Rel. Min. Cezar Peluso, J. 19.11.2009).

Para exemplificar, utilizaremos, em um primeiro momento, o estudo e o levantamento feito por Sadek (2004, p. 1), que demonstra que, entre 1990 e 2002, entraram, em média, na justiça brasileira, 6.350,598 processos por ano,

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sendo que, em 1990, ocorreu a entrada de 3.617.064 processos e, em 2002, ocorreu a entrada de 9.764.616, mais que dobrando a quantidade de entra-das de ações no Poder Judiciário. Por outro lado, nesse mesmo período, os processos julgados apresentaram uma média de 4.593.839, ficando claro que houve um aumento de 311% no número de ações julgadas no período e um aumento 270% no número de entrada de ações. Assim, mesmo com a melho-ra na agilidade de julgamento de ações pelo Judiciário, a procura pela respos-ta jurisprudencial cresce ainda mais, tendo em uma média de julgamento de processos ingressos de 72%.

Com esse primeiro exemplo, fica demonstrado que o Estado não conse-gue dar conta dos processos que recebe, e qualquer maneira encontrada para evitar tais ações é bem vinda.

Nota-se que a ideia de utilizar-se de mecanismo processual para o me-lhor andamento da prestação jurisdicional é aceita inclusive em nível de tri-bunais superiores, conforme exemplo abaixo:

Penal. Processual penal. Habeas corpus. Crime de lesões corporais. Denún-cia. Promotor de justiça processado perante o Tribunal de Justiça. Recusa do tribunal em possibilitar a composição civil e a transação. Alegação de inaplicabilidade em procedimento especial. Lei nº 9.099/1995. I – Os pre-ceitos de caráter penalmente benéficos da Lei nº 9.099/1995 aplicam-se a qualquer processo penal, inclusive nos Tribunais. Precedentes do STF: INQ 1.055/AM (Questão de Ordem), C. de Mello, RTJ 162/483; HC 76.262/SP, O. Gallotti, DJ 29.05.1998. II – HC deferido. (HC 77303, 2ª T., Rel. Min. Carlos Velloso, J. 15.09.1998, DJ 30.10.1998, p. 00004, Ement. v. 01929-02, p. 00321)

Ademais, em um segundo momento, utilizaremos o estudo feito por Silveira e Santos (2012, p. 1), quando analisaram a quantidade e o custo das folhas de papel nos processos e execuções criminais no Brasil. No trabalho, constatou-se que do inquérito policial à execução penal se gasta em média 570 folhas de papel, e temos um total de aproximadamente 500 mil presos, tendo, assim, um total de 285 milhões de folhas de papéis gastas até o mo-mento. E, considerando também que esse número só tende a aumentar, os autores defendem a virtualização do processo penal, com o intuito de cortar gastos e recursos.

Assim, restando claro o custo de uma ação penal (conhecimento ou execução) para o Estado e o fato dos custos das ações, sejam eles quais forem, resta para o Estado o melhor benefício de encontrar maneira de evitar a ação penal.

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Quanto aos custos específicos para o noticiado, temos a chance de ele se ver, ao final do processo, condenado e sofrendo as diversas sanções da pena, os custos do processo, maiores para este por ser mais fraco na relação processual, além da carga emocional sofrida por este e por seus familiares.

Não há dúvidas sobre as vantagens deste em transacionar ou aceitar qualquer uma dos institutos despenalizadores oferecidos.

Desse modo, para melhor entendimento do que ocorre no jogo da tran-sação penal, vamos nos valer de fluxograma demonstrando uma representa-ção extensiva deste:

Figura 1: representação extensiva do jogo sequencial na transação penal.

Nele podemos ver os caminhos possíveis para o caso concreto da tran-sação penal, com a primeira grande cisão nas opções com o oferecimento ou não da transação e a segunda com a possibilidade de aceitação da propos-ta de transação ou não. Nos casos de não oferecimento da transação, não

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há qualquer interferência que pode fazer o noticiado1, não ocorrendo mais o jogo. Desse modo, não há de se considerar essa opção para a aplicação dos institutos econômicos estudados, por não ocorrer mais interação estratégica entre os jogadores, portanto, sem mais um jogo para análise.

Para o Estado, o processo judicial é normalmente custoso e pesado aos cofres públicos, atolando o Judiciário com a discussão de causas que muitas vezes em nada acrescentam à sociedade, no caso em tela, a transação penal, por abranger os casos de crimes de pequena monta, é um exemplo gritante dessa realidade. Já para o noticiado, o custo e o desgaste se dão com a própria ação e sombra constante de possível condenação.

CONCLUSÃO

A presente pesquisa demonstrou que os institutos despenalizadores presentes na Lei nº 9.099/1995 vieram em bom tempo, trazendo o consenso, já presente em outras searas do direito, para o direito penal, mesmo em se considerando que os casos em que ele é aplicado são poucos, mas, ainda as-sim, influem na sociedade.

Ainda, ficou evidenciado que a teoria dos jogos, com o uso do equilí-brio de Nash, pode nos trazer um norte quanto às possíveis ações que podem ser tomadas pelos jogadores, Estado e noticiado, nos dando qual seria a ação mais racional e lógica a ser escolhida nos casos concretos.

Deste modo, conclui-se, com o estudo realizado, que, para o caso con-creto, a melhor estratégia que pode ser utilizada na transação penal, no qual são jogadores o Ministério Público e o noticiado, para se alcançar o melhor payoff para ambos, é o oferecimento da proposta de transação por parte do Ministério Público e a aceitação desta proposta pelo noticiado – isso consi-derando que qualquer outra decisão que não esta resultaria, para ambos, em um processo moroso e custoso, com um dispêndio de tempo e dinheiro que de nada interessaria a nenhuma das partes, e em especial para o noticiado poderia gerar uma possível condenação criminal.

Portanto, encontrando-se o equilíbrio de Nash com a propositura e a aceitação da transação penal e tendo os jogadores informações completas e ações racionais, fica claro que este é o melhor caminho possível na relação de conflito de interesses exposta, desse modo, sempre ocorrendo a tendência a

1 Isso sem considerar possível habeas corpus ou recurso no procedimento.

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seguir este caminho. Por fim, gera vantagens e alcança os payoffs do Estado e do noticiado.

REfERÊNCIAS

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Jurisprudênciacível

STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Recurso Especial nº 1.411.969 – SP (2013/0339479-2)Relatora: Ministra Nancy AndrighiRecorrente: Ficra S/A Planejamento Administração e ParticipaçãoAdvogados: Fábio Haddad NasrallaFábio Yunes Fraiha e outro(s)Flávio Yunes FraihaRaquel Bellini DestroFilippi Dias Maria e outro(s)Recorrido: Luiz Cardamone Neto – Espólio e outrosAdvogado: Lina Cioderi Albarelli e outro(s)Interes.: Aveiro Incorporações S/AAdvogado: Daniel de Camargo Jurema e outro(s)

EMENTA

PROCESSO CIVIL – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL – PENHORA DE IMÓVEL DO

DEVEDOR – DIREITO DE ARREMATAÇÃO DO CREDOR-EXEQUENTE – CONCURSO DE PREfERÊNCIAS

PROCESSUAL E MATERIAL – ARTIgOS ANALISADOS: 690, § 3º, 690-A, PARÁGRAFO ÚNICO, E 711, CPC1. Ação de execução de título extrajudicial, distribuída em

1986, da qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 22.10.2013.

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2. Discute-se se a existência de execução em curso e de penhora é condição indispensável para o exercício de preferência do credor traba-lhista sobre o crédito obtido com a alienação judicial do bem do devedor comum, promovida por outro credor.

3. A jurisprudência do STJ há muito se firmou no sentido da im-possibilidade de se sobrepor uma preferência processual a outra de di-reito material – na hipótese, crédito trabalhista –, bem como de que para o exercício desta preferência não se exige a penhora sobre o bem, mas o levantamento do produto da alienação judicial não prescinde do apare-lhamento da execução pelo credor trabalhista.

4. Assim como na adjudicação, o direito do exequente de arrema-tar o bem com seu crédito está condicionado à inexistência de outros credores com preferência de grau mais elevado, caso em que poderá o Juiz optar por outra proposta mais conveniente, como prevê o § 3º do art. 690 do CPC.

5. Recurso especial conhecido e desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nesta parte, negar provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha. Dr(a). Raquel Bellini Destro, pela parte Recorrente: Ficra S/A Planejamento Administração e Participação.

Dr(a). Daniel de Camargo Jurema, pela parte Interes.: Aveiro Incorpo-rações S/A.

Brasília/DF, 10 de dezembro de 2013 (data do Julgamento).

Ministra Nancy Andrighi Relatora

RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Ministro Nancy Andrighi (Relator):

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Cuida-se de recurso especial interposto por Ficra S/A Planejamento Administração e Participação, fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão do TJ/SP.

Ação: execução de título extrajudicial, ajuizada por Ficra S/A – Plane-jamentos Administração e Participação, em face de Maria Helena dos Santos Cardamone e outros, relativa a um crédito de Cz$ 80.000.000,00 (oitenta mi-lhões de cruzados), consubstanciado em duas notas promissórias emitidas pela devedora e avalizadas por Luiz Cardamone Neto e Usina Martinópolis S/A Açúcar e Álcool, no curso da qual foram penhorados diversos imóveis, incluindo o de propriedade do recorrido (Matrícula nº 5.817 do 4º Cartório de Registro de Imóveis de São Paulo).

Decisão: o Juízo de primeiro grau indeferiu o lanço por crédito ofereci-do pela recorrente, embora superior ao da arrematante, para evitar a frustra-ção de credores trabalhistas.

Acórdão: o TJ/SP deu parcial provimento ao agravo de instrumento interposto pela recorrente, em acórdão assim ementado:

Ação de execução – Arrematação – Discussão acerca do melhor lanço ofere-cido pelo imóvel penhorado nos autos – Hipótese em que tal decisão deve aguardar informação da eg. Justiça do Trabalho – Decisões agravadas que devem ser anuladas – Recurso em parte provido.

Recurso especial: interposto sob a alegação de ofensa aos arts. 690, § 3º, 690-A, parágrafo único, e 711, todos do Código de Processo Civil, além da ocorrência de dissídio jurisprudencial.

Juízo prévio de admissibilidade: o recurso foi admitido pelo Tribunal de origem.

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Ministro Nancy Andrighi (Relator):

Cinge-se a controvérsia a decidir se a existência de execução em curso e de penhora é condição indispensável para o exercício de preferência do credor trabalhista sobre o crédito obtido com a alienação judicial do bem do devedor comum, promovida por outro credor.

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1 DO CONCURSO DE PREfERÊNCIAS (VIOLAÇÃO DOS ARTS. 690, § 3º, 690-A, PARÁGRAFO ÚNICO, E 711, DO CPC E DIssíDIO JURISPRUDENCIAL)

01. É fato incontroverso a existência de inúmeras ações trabalhistas ajuizadas em face do espólio de Luiz Cardamone Neto, uma delas, inclusive, com penhora sobre o imóvel de que tratam os autos (fl. 88, e-STJ – Av. 23 da Matrícula nº 5.871).

02. Diante disso, o TJ/SP entendeu por bem anular a decisão que in-deferiu o lanço ofertado pela recorrente, apesar de ser o de maior valor, para que a análise relativa ao melhor lanço se faça após as informações prestadas pela Justiça Laboral. Consignou, para tanto, o Relator, que “tais ofícios de-vem, discriminadamente, apontar o crédito de cada um dos reclamantes e conter somente os créditos já consolidados e em fase de exigibilidade, con-forme decidido no Agravo de Instrumento nº 0005723-20.2011.8.26.0000” (fl. 335, e-STJ – grifou-se).

03. Com efeito, nos termos do art. 711 do CPC, enquanto não interve-nha outro credor com grau de preferência superior à do exequente, a execu-ção faz-se em proveito deste. Ao revés, instaurado o concurso singular de credores, cabe ao Juiz decidir acerca da preferência e da anterioridade da penhora (art. 712 do CPC).

04. Na hipótese, não se nega a preferência do crédito trabalhista sobre o produto da alienação judicial de bem do devedor, realizada em ação de execução promovida por outro credor.

05. De fato, a jurisprudência do STJ há muito se firmou no sentido de que “não é possível sobrepor uma preferência processual a uma preferência de direito material” (REsp 159.930/SP, Rel. Min. Ari Pargendler, 3ª Turma – DJ de 16.06.2003). Outrossim, este Tribunal também já decidiu que para o exercício desta preferência não se exige a penhora sobre o bem, mas o levan-tamento do produto da alienação judicial não prescinde do aparelhamento da execução pelo credor trabalhista. Citem-se, a propósito, os seguintes pre-cedentes:

CIVIL E PROCESSO CIVIL – EXECUÇÃO – CRÉDITO TRABALHISTA – PREFERÊNCIA – CONCURSO DE CREDORES – DUPLA PENHORA

I – Na linha da jurisprudência desta Corte não é possível sobrepor uma preferência de direito processual a uma de direito material. Dessa forma, o credor trabalhista prefere aos demais, sobre o crédito obtido na alienação do bem penhorado, independentemente do momento em que ajuizada a

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sua execução ou mesmo da existência de dupla penhora sobre o mesmo bem a que faz referência o art. 711 do Código de Processo Civil.

II – Não se admite, contudo, que ele se aproprie do produto da penhora havida em outro processo sem que promova a sua própria execução, no bojo da qual seja dado ao devedor oportunidade de defesa.

Recurso especial a que se nega provimento.

(REsp 732.798/RS, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, Julgado em 04.08.2009, DJe 18.08.2009)

PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – CRÉDITO DE NATURE-ZA TRABALHISTA – PREFERÊNCIA SOBRE PENHORA ANTERIOR, LEVADA A EFEITO EM EXECUÇÃO AJUIZADA POR TERCEIRO – EXE-GESE DOS ARTS. 711 DO CPC E 186 DO CTN – LEVANTAMENTO CON-DICIONADO A EXECUÇÃO APARELHADA PELO PRÓPRIO CREDOR – RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO

1. Nos termos do art. 711 do CPC, “concorrendo vários credores, o dinheiro ser-lhes-á distribuído e entregue consoante a ordem das respectivas prela-ções; não havendo título legal à preferência, receberá em primeiro lugar o credor que promoveu a execução, cabendo aos demais concorrentes direito sobre a importância restante, observada a anterioridade de cada penhora”, dispositivo que consagra a máxima jurídica segundo a qual o primeiro no tempo tem preferência no direito – prior in tempore, potior in iure. Ressalva foi feita, todavia, à existência de título legal à preferência, o que vale di-zer que o produto da arrematação deve ser distribuído com observância da anterioridade das penhoras (título de preferência decorrente de direito processual) se inexistir preferência fundada em direito material (como, por exemplo, hipoteca ou o crédito trabalhista).

2. Por outro lado, o art. 186 do CTN proclama que o crédito de natureza fiscal não está sujeito a concurso de credores, razão por que os créditos de natureza trabalhista, que sobressaem em relação àqueles, por lógica, não estarão. Ressalte-se que nem o art. 711 do CPC nem o art. 186 do CTN restringem o exercício do direito de preferência de crédito trabalhista ao âmbito de processo falimentar ou de insolvência civil, motivo pelo qual a exegese mais acertada dos mencionados artigos é aquela que os aplica também às execuções individuais contra devedor solvente.

3. Não obstante, o credor cujo título egressa da legislação trabalhista, para receber tal crédito, não é dispensável o aparelhamento da respectiva exe-cução. Não há razão, lógica ou jurídica, para ser dispensada a execução própria simplesmente pelo fato de já haver outra ajuizada por terceiros.

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Do ponto de vista do executado, tal solução conduz à redução dos meios de defesa que lhe são disponíveis se de execução autônoma se tratasse. Em face do exeqüente, poderá opor-lhe embargos à execução. Não poderá fazê-lo, no entanto, em relação ao credor que simplesmente habilita seu crédito na execução alheia, circunstância que testilha com a lógica do sis-tema processual. Porém, exigir pluralidade de penhoras para o exercício do direito de pre-ferência reduz, significativamente, a finalidade do instituto – que é ga-rantir a solvência de créditos cuja relevância social sobeja aos demais –, assemelhando-se o credor com privilégio legal aos outros desprovidos de tal atributo.Portanto, mostra-se imperiosa uma solução intermediária: garante-se o di-reito de preferência do credor apenas reservando-lhe o produto da penho-ra, ou parte deste, levada a efeito em execução de terceiros, condicionando o seu levantamento a execução futura aparelhada pelo próprio credor. As-sim, ficam assegurados, por outro lado, todos os meios de defesa disponí-veis ao executado.4. Recurso especial conhecido e provido.

06. Vale ressaltar, que, assim como na adjudicação, o direito do exe-quente arrematar o bem com seu crédito, porque o exonera da obrigação de exibir o preço (parágrafo único do art. 690-A do CPC), está condicionado à inexistência de outros credores com preferência de grau mais elevado.

07. Ademais, ao contrário do que sustenta a recorrente, o melhor lanço ou a proposta mais conveniente não será, necessariamente, a de maior valor.

08. Nesse cenário, acertado e prudente se mostra o decisum impugna-do, na medida em que condiciona a decisão acerca da arrematação do bem à informação sobre “o crédito de cada um dos reclamantes [trabalhistas] [...]

já consolidados e em fase de exigibilidade” (fl. 335, e-STJ), de modo que, a depender do teor das informações prestadas pelo Juízo Trabalhista, poderá o Juiz optar pela proposta mais conveniente, como prevê o § 3º do art. 690 do CPC.

Forte nessas razões, conheço do recurso especial e nego-lhe provimento.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2013/0339479-2

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Processo Eletrônico REsp 1.411.969/SP

Números Origem: 01041496720118260000 1041496720118260000 20116829520 20120000333633 5830019868151819 808970

Pauta: 10.12.2013 Julgado: 10.12.2013

Relatora: Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Mário Pimentel Albuquerque

Secretária: Belª Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AUTUAÇÃO

Recorrente: Ficra S/A Planejamento Administração e Participação

Advogados: Fábio Haddad Nasralla

Fábio Yunes Fraiha e outro(s)

Flávio Yunes Fraiha

Raquel Bellini Destro

Filippi Dias Maria e outro(s)

Recorrido: Luiz Cardamone Neto – Espólio e outros

Advogado: Lina Cioderi Albarelli e outro(s)

Interes.: Aveiro Incorporações S/A

Advogado: Daniel de Camargo Jurema e outro(s)

Assunto: Direito civil – Obrigações – Títulos de Crédito

SUSTENTAÇÃO ORAL

Dr(a). Raquel Bellini Destro, pela parte Recorrente: Ficra S/A Planejamen-to Administração e Participação

Dr(a). Daniel de Camargo Jurema, pela parte Interes.: Aveiro Incorpora-ções S/A

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CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Terceira Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso espe-cial e, nesta parte, negou provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.

Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.

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STJSuperior Tribunal de JuSTiça

Recurso Especial nº 1.408.908 – SP (2013/0335583-1)Relatora: Ministra Nancy AndrighiRecorrente: Simone Florêncio RodriguesAdvogado: Vicente Borges da Silva Neto e outro(s)Recorrido: Bradesco Seguros S/AAdvogado: Karina Francisca de Andrade Shono e outro(s)

EMENTA

CIVIL – RESPONSAbILIDADE CIVIL – DANO MATERIAL, MORAL E ESTÉTICO – CUMULAÇÃO – POSSIbILIDADE

– CONTRATOS – SEgURO – CObERTURA PARA DANOS CORPORAIS – ALCANCE – LIMITES

1. Ação ajuizada em 31.08.2000. Recurso especial concluso ao ga-binete da Relatora em 20.09.2013.

2. Recurso especial em que se discute a cumulatividade dos da-nos materiais, morais e estéticos, bem como, o alcance, em contratos de seguro, da cobertura por danos corporais.

3. É lícita a cumulação das indenizações por dano material, moral e estético. Incidência do Enunciado nº 387 da Súmula/STJ.

4. A apólice de seguro contra danos corporais pode excluir da co-bertura tanto o dano moral quanto o dano estético, desde que o faça de maneira expressa e individualizada para cada uma dessas modalidades de dano extrapatrimonial, sendo descabida a pretensão da seguradora de estender tacitamente a exclusão de cobertura manifestada em relação ao dano moral para o dano estético, ou vice-versa, ante a nítida distin-ção existente entre as rubricas.

5. Hipótese sob julgamento em que a apólice continha cobertura para danos corporais a terceiros, com exclusão expressa apenas de da-nos morais, circunstância que obriga a seguradora a indenizar os danos estéticos.

6. Recurso especial parcialmente provido.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Ter-ceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.

Brasília/DF, 26 de novembro de 2013 (data do Julgamento).

Ministra Nancy Andrighi Relatora

RELATÓRIO

A Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relator):

Cuida-se de recurso especial interposto por Simone Florencio Rodrigues com fundamento no art. 105, III, c, da CF, contra acórdão do TJ/SP.

Ação: indenizatória por danos materiais, morais e estéticos, ajuizada pela recorrente em desfavor de Hugo Rocha de Andrade, em decorrência dos prejuízos causados por acidente de trânsito.

Contestação: em sede de defesa, o réu denunciou à lide a Bradesco Seguros S.A., o que foi admitido pelo Juiz singular.

Sentença: julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para condenar o réu ao pagamento de indenização por danos materiais, morais e estéticos. A Bradesco Seguros, por sua vez, foi condenada a reembolsar ao réu as quantias relativas aos danos material e estético (fls. 406/410 e 435/436, e-STJ).

Acórdão: o TJ/SP negou provimento ao apelo da recorrente e deu provimento ao apelo da Bradesco Seguros para afastar da sua condenação o dever de reembolsar as despesas relativas aos danos estéticos (fls. 594/603, e-STJ).

Embargos de declaração: interpostos pela recorrida, foram acolhidos pelo TJ/SP tão somente para declarar que ficavam mantidos os honorários advocatícios fixados na sentença (fls. 613/614, e-STJ).

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Embargos de declaração nos embargos de declaração: mais uma vez in-terpostos pela recorrente, dessa vez foram rejeitados pelo TJ/SP (fls. 634/637, e-STJ).

Recurso especial: requer seja incluída na condenação da Bradesco Se-guros o reembolso das despesas relativas aos danos morais e estéticos, ale-gando dissídio jurisprudencial (fls. 643/649, e-STJ).

Prévio juízo de admissibilidade: o TJ/SP admitiu o recurso especial, determinando a remessa dos autos ao STJ (fls. 712/713, e-STJ).

É o relatório.

VOTO

A Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relator):

Cinge-se a lide a determinar se, na hipótese específica dos autos, a apólice contratada junto à Bradesco Seguros incluiu cobertura para danos estéticos e morais.

01. A recorrente constrói sua tese com base no pressuposto de que “existe no contrato de seguro coberturas aos danos materiais e corporais” (fl. 646, e-STJ), para concluir, à luz de precedentes desta Corte, que “existindo no contrato cobertura de danos corporais, esses, por sua vez, abrangem os da-nos morais e estéticos” (fl. 648, e-STJ).

02. Em primeiro lugar, cumpre salientar que se encontra assente no STJ o entendimento quanto à autonomia dos danos materiais e morais, divisão já consagrada há tempos, e mais recentemente dos danos estéticos, cada qual possuindo natureza jurídica própria.

03. Muito embora – assim como o dano moral – também tenha caráter ex-trapatrimonial, o dano estético deriva especificamente de lesão à integri-dade física da vítima, ocasionando-lhe modificação permanente (ou pelo menos duradoura) na sua aparência externa. Apesar de, por via oblíqua, também trazer dor psicológica, o dano estético se relaciona diretamente com a deformação física da pessoa, enquanto o dano moral alcança outras esferas do seu patrimônio intangível, como a honra, a liberdade individual e a tranquilidade de espírito.

04. Aliás, essa diferenciação encontra-se consolidada no Enunciado nº 387 da Súmula/STJ, que declara ser lícita a cumulação das indenizações por dano moral e estético.

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05. Por outro lado, esta Corte também já decidiu que “a previsão contratual de cobertura dos danos corporais abrange os danos morais nos contratos de seguro” (AgRg no AREsp 360.772/SC, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe de 10.09.2013. No mesmo sentido, além dos precedentes al-çados a paradigma pela recorrente – AgRg no Ag 1.042.450/SC, 3ª Turma, Rel. Min. Massami Uyeda – DJe de 17.06.2009; e AgRg no Ag 935.821/MG, 4ª Turma, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJe de 17.03.2008 – destaca--se, ainda: AgRg no AREsp 230.166/PR, 3ª Turma, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe de 27.08.2013; e AgRg no AREsp 100.958/RS, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti – DJe de 29.08.2012).

06. Em outras palavras, não havendo exclusão expressa de cobertura para os danos morais (e, por analogia, para os danos estéticos), deve-se en-tender que o termo “danos corporais” compreende todas as modalidades de dano: material, moral e estético.

07. Na hipótese específica dos autos, o TJ/SP – soberano na análise da prova – afirma que “o dano corporal está expressamente coberto pelo con-trato havido entre a litisdenunciada e o réu”, com a ressalva de que “o dano estético é físico, corporal, não abrangido expressamente pela exclusão dos danos morais” (fls. 601/602, e-STJ).

08. Vale dizer, com base no panorama fático delineado pelo TJ/SP, tem-se que a apólice firmada entre o réu e a Bradesco Seguros continha co-bertura para danos corporais a terceiros, com exclusão expressa apenas de danos morais, portanto sem nenhuma menção à exclusão de danos estéticos. Qualquer conclusão em sentido contrário exigiria o reexame da prova dos autos, notadamente o contrato de seguro celebrado entre litisdenunciante e litisdenunciada, procedimento que encontra óbice nos enunciados nºs 05 e 07 da Súmula/STJ.

09. Embora o acórdão recorrido traga distinção, para efeitos de cober-tura securitária, entre dano estético e corporal, extraída do site da Superin-tendência de Seguros Privados, essa diferença terminológica não modifica a realidade dos autos, em relação à qual o próprio TJ/SP admite que o contrato entabulado entre as partes não excluía de cobertura os danos estéticos, de sorte que, na linha da jurisprudência dessa Corte, deve-se entender que a referida modalidade de dano está contida na expressão “danos corporais” prevista na apólice.

10. Em suma, portanto, a Bradesco Seguros deve ser condenada a re-embolsar as quantias relativas aos danos materiais e estéticos. Quanto aos da-

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nos morais, havendo cláusula expressa de exclusão de cobertura, não devem ser incluídos na condenação da seguradora.

Forte nessas razões dou parcial provimento ao recurso especial, para condenar a Bradesco Seguros S.A. a reembolsar ao litisdenunciante as quan-tias relativas aos danos materiais e estéticos.

No mais, ficam mantidas as condenações impostas pelas instâncias or-dinárias, inclusive no que se refere às verbas sucumbenciais.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO TERCEIRA TURMA

Número Registro: 2013/0335583-1

Processo Eletrônico REsp 1.408.908 / SP

Números Origem: 1032000002726 5830420000248178 92079109720078260000 992070636884

Pauta: 26.11.2013 Julgado: 26.11.2013

Relatora: Exma. Sra. Ministra Nancy Andrighi

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Mário Pimentel Albuquerque

Secretária: Bela. Maria Auxiliadora Ramalho da Rocha

AUTUAÇÃO

Recorrente: Simone Florêncio Rodrigues

Advogado: Vicente Borges da Silva Neto e outro(s)

Recorrido: Bradesco Seguros S/A

Advogado: Karina Francisca de Andrade Shono e outro(s)

Assunto: Direito civil – Responsabilidade civil – Indenização por dano mo-ral – Acidente de trânsito

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CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Terceira Turma, ao apreciar o processo em epí-grafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Terceira Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso especial, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.

Os Srs. Ministros Sidnei Beneti, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro João Otávio de Noronha.

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TrF 2ª r.Tribunal regional Federal da 2ª região

IV – Apelação Cível nº 2012.50.01.0002469-2Nº CNJ: 0002469-39.2012.4.02.5001Relator: Juíza Federal Convocada Carmen Silvia Lima de ArrudaApelante: Margarida Maria Hortolani Nardoto – EspolioAdvogado: Roberto Tenorio KatterApelado: Caixa Econômica Federal – CEF e outroAdvogado: Alex Werner Rolke e outrosOrigem: 5ª Vara Federal Cível de Vitória/ES (201250010024692)

EMENTA

DIREITO PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO CAUTELAR – SfH – MORTE DA MUTUáRIA – QUITAÇÃO DO SEgURO – INADIMPLEMENTO DE PRESTAÇÕES PRETÉRITAS –

DL 70/1966 – NOTIFICAÇÃO PEssOAL – IRREGULARIDADE – NULIDADE – SENTENÇA REfORMADA

1. Caso em que insurge-se o apelante em face da sentença que jul-gou improcedente a suspensão dos efeitos da adjudicação, até a solução da lide e determinou a apresentação das cópias dos contratos de seguro e de contrato de mútuo.

2. O provimento cautelar tem pressupostos específicos para sua concessão. São eles: o risco de ineficácia do provimento principal e a plausibilidade do direito alegado (periculum in mora e fumus boni iuris), que, presentes, determinam a necessidade da tutela cautelar e a sua con-cessão, se for o caso, para que se protejam aqueles bens ou direitos de modo a se garantir a produção de efeitos concretos do provimento juris-dicional principal (CPC, art. 796).

3. Falecida a mutuária, o seguro quitou as prestações decorrentes do contrato de financiamento de imóvel. Não tendo havido o pagamen-to de prestações pretéritas, foi deflagrada a execução extrajudicial, pelo

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nº DL 70/1966, com a notificação pessoal de Margarida Maria Hortolani Nardoso N/P de Josira Hortolani Nardoto, em 14 de junho de 2010, bem como houve notificação para ciência dos leilões: uma, em 27 de setembro de 2010 e outra em 18 de março de 2001, recebida pela mesma pessoa.

4. Tendo havido o falecimento da mutuária, abre-se a sucessão. No entanto, existindo herdeiros menores, relativamente à administra-ção da herança, até o compromisso do inventariante, o art. 1.797, do Código Civil, enumera as pessoas a quem caberá exercer esse encargo.

5. Inexistindo comprovação de quem assumiu o encargo de in-ventariante, impossível a validação da notificação pessoal na pessoa de Josira Hortolani Nardoto, revelando a irregularidade do ato, maculando o procedimento de execução extrajudicial, eis que eivado de nulidade.

6. Presença dos requisitos legais, eis que demonstrada a presença do periculum in mora, ante a possibilidade da perda de moradia (direito constitucionalmente tutelado) dos herdeiros da mutuária falecida, bem como do fumus boni iuris, ante a flagrante irregularidade de notificação pessoal do devedor, a fim de possibilitar a purgação da mora, impondo--se, deste modo, a reforma da sentença guerreada.

7. Apelação conhecida e provida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Sexta Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Re-gião, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.

Rio de Janeiro, 28.10.2013 (data do Julgamento).

Carmen Silvia Lima de Arruda Juíza Federal Convocada Relatora

RELATÓRIO

1. Trata-se de Apelação Cível interposta pelo Espólio de Margarida Maria Hortolani Nardoto em face de sentença originária do Juízo da 5ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Espírito Santo, proferida nos autos de Ação Cautelar Inominada, ajuizada pelo ora apelante em face da EMGEA – Empresa Gestora de Ativos e Caixa Econômica Federal – CEF, objetivando,

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liminarmente: (i) a suspensão dos efeitos da adjudicação, até o julgamento da lide, mantendo a parte requerente na posse do imóvel; (ii) que sejam requeri-das as cópias dos contratos de seguro habitacional, do mútuo, bem como do procedimento da adjudicação; (iii) “seja, em respeito ao princípio da legalidade fixado como termo inicial para contagem do prazo para propositura da ação principal a entrega da documentação pela requeridas.”

Esclarece a parte autora, na petição inicial, que Margarida Mari Hor-toloni Nardoto celebrou contrato de financiamento de imóvel pelo Sistema Financeiro da Habitação, tendo falecido em 25 de agosto de 2004 (fls. 19), dei-xando dois herdeiros menores, sendo que Igor Nardoto Moto, o mais novo, só completou a maioridade em 2011 (fls. 20), momento no qual, na qualidade de inventariante (fls. 30), buscou a formação do espólio, quando teve a notícia de que o imóvel financiado havia sido adjudicado no dia em 26 de abril de 2011, o que não poderia ter ocorrido, por estar suspenso o prazo prescricio-nal, considerando a menoridade dos herdeiros.

2. Indeferimento da tutela liminar, por decisão de fls. 135/136.

3. A r. sentença julgou o pedido parcialmente procedente, condenando as rés a apresentarem, em juízo, cópias dos contratos de mútuo habitacional e do seguro firmado.

Como razões de decidir, reconheceu a lisura do procedimento de exe-cução extrajudicial do imóvel adjudicado, esclarecendo que houve notifica-ção pessoal de Josira Hortolani Nardoto, considerando presumida sua repre-sentação legal dos interesses dos menores, filhos da mutuária falecida, eis que residente no imóvel financiado, reputando ser devida a apresentação dos contratos de mútuo e seguro, “por se tratarem de documentos imprescindíveis à instrução de eventual ajuizamento de ação principal visando discutir as cláusulas contratuais e/ou quaisquer outros pleitos atinentes ao contrato” (161/168).

4. Em suas razões recursais, o apelante sustenta, em síntese, que “a Sra. Josira Hortolani Nardoto, ‘não é mãe da falecida nem avó dos herdeiros’, sendo in-cabível a legitimidade da mesma para responder pelos atos do espólio.” e que a CEF agiu de má fé no procedimento de retomada do imóvel, porque “tinha ciência da necessidade de abertura de inventário que seria, no caso em pauta por pessoa de confiança do Juiz ou do credor” (sic). Alega, ainda, de forma truncada “...se não há os documentos que embasariam a prova da mora, a prova dos encargos cobrados, incabível a verificação da legalidade do processo de retomada e consequentemente incabível não se deferir a manutenção da posse.” E arremata: “Por outro lado, ainda, deferida a procedência para determinar a apresentação das cópias dos contratos, inó-

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cua futura medida de provada a irregularidade do pacto, fazendo-se ‘mister’ a reforma da R. Decisão.” Requer a procedência de seu apelo, com a reforma da sentença.

5. Recebido o recurso, e oferecidas contrarrazões (fls. 179/182), subi-ram os autos para este Tribunal.

É o relatório. Peço dia para julgamento.

Carmen Silvia Lima de Arruda Juíza Federal Convocada Relatora

VOTO

1. Conheço da apelação, porque presentes os seus requisitos de admis-sibilidade.

2. Primeiramente observo que, apesar de não ter havido remessa dos autos ao Ministério Público, considero a mesma dispensável, pois não se trata de qualquer uma das hipóteses previstas no art. 82 do CPC, a justificar sua intervenção no feito.

3. Como relatado, insurge-se o autor em face da sentença que julgou improcedente a suspensão dos efeitos da adjudicação, até o julgamento da lide e determinou a apresentação das cópias dos contratos de seguro e de contrato de mútuo.

4. A irresignação do apelante merece prosperar, senão vejamos.

5. O provimento cautelar tem pressupostos específicos para sua con-cessão. São eles: o risco de ineficácia do provimento principal e a plausibili-dade do direito alegado (periculum in mora e fumus boni iuris), que, presentes, determinam a necessidade da tutela cautelar e a sua concessão, se for o caso, para que se protejam aqueles bens ou direitos de modo a se garantir a produ-ção de efeitos concretos do provimento jurisdicional principal (CPC, art. 796).

É de ser ressaltado que no caso em análise, firmado “CONTRATO POR INSTRUMENTO PARTICULAR DE COMPRA E VENDA DE UNIDADE ISO-LADA E MÚTUO COM OBRIGAÇÕES E HIPOTECA” versando sobre imóvel situado à rua Zacarias Fernandes Moça, nº 179, apto. 201, Morada de Cam-buri, Vitória/ES, em 1988, entre as partes desta ação, a mutuária Margarida Maria Hortolani Nardoto veio a falecer em 25 de agosto de 2004, época em

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que já se encontrava separada judicialmente do marido, deixando dois filhos menores, Igor Nardoto Mota (11 anos) e Hugo Nardoto Mota, (8 anos).

Noticia a CEF, na contestação apresentada, ter havido cobertura do si-nistro, no valor de R$17.135,25(dezessete mil, cento e trinta e cinco reais e vinte e cinco centavos), nos termos do contrato financiado. Entretanto, cons-tatou-se a inadimplência referente a prestações pretéritas, de nºs 19 a 73, to-talizando cinquenta e quatro meses em atraso, que não são liquidadas pelo seguro, por ser de responsabilidade dos herdeiros da ex-mutuária.

6. Não tendo havido o pagamento devido, foi deflagrada a execução extrajudicial, pelo nº DL 70/66, com a notificação pessoal de Margarida Maria Hortolani Nardoso N/P de Josira Hortolani Nardoto, em 14 de junho de 2010, consoante certificado às fls. 100, bem como houve notificação para ciência dos leilões: uma, em 27 de setembro de 2010 (fls. 120) e outra em 18 de março de 2001 (fls. 128).

Cabe, então, avaliar a regularidade desta notificação.

7. Acerca da execução extrajudicial, o Decreto-Lei nº 70/1966, em seu art. 31, elenca os requisitos formais necessários para a regular intimação do devedor para purgar a mora oriunda de contrato de financiamento imobiliá-rio, não sendo necessária tal intimação para o leilão.

Ora, o objetivo da intimação do devedor, antes da instauração do pro-cedimento de execução extrajudicial, é dar ciência ao mesmo de que está em mora, como forma de defesa, de modo a possibilitar a regularização da dívi-da e, consequentemente, evitar a perda do imóvel.

8. No caso em análise, tendo havido o falecimento da mutuária, abre-se a sucessão. No entanto, havendo herdeiros menores, relativamente à admi-nistração da herança, até o compromisso do inventariante, o art. 1.797, do Código Civil, enumera as pessoas a quem caberá exercer esse encargo.

9. Sobre este aspecto, não se pode afirmar, no caso dos autos não, quem passou a exercer esse encargo, revelando a irregularidade da notificação pes-soal para purgação da mora, eis que a citação de Josira Hortolani Nardoto não se presta a validar o ato, maculando o procedimento de execução extra-judicial.

10. No caso em questão, portanto, verifica-se a presença dos requisi-tos necessários para a concessão da medida liminar, eis que demonstrada a presença do periculum in mora, ante a possibilidade da perda de moradia (direito constitucionalmeente tutelado) dos herdeiros da mutuária falecida,

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bem como do fumus boni iuris, ante a flagrante irregularidade de notificação pessoal do devedor, a fim de possibilitar a purgação da mora, impondo-se, deste modo, a reforma da sentença guerreada.

11. Por fim, não há ilegalidade no deferimento da apresentação de có-pias dos contratos de seguro habitacional e de mútuo, sendo este um direito da parte apelante.

12. Ante o exposto, conheço da apelação, dando-lhe provimento a fim de suspender os efeitos da adjudicação, relativamente ao imóvel situado à rua Zacarias Feranndes Moça, nº 179, apto. 201, Morada de Caburi, Vitória/ES, até o julgamento da lide.

Intime-se, imediatamente, a Caixa Econômica Federal para pronto cumprimento.

É como voto.

Carmen Silvia Lima de Arruda Juíza Federal convocada Relatora

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EmEntário Civil

AÇÃO ANULATÓRIA DE EXECUÇÃO E LEILÃO EXTRAJUDICIAL –

CANCELAMENTO DE REgISTRO IMObILIáRIO – NECESSIDADE DE

INTIMAÇÃO PESSOAL DO DEVEDOR

33149 – “Processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Ação anulatória de execução e leilão extrajudicial. Cancelamento de registro imobiliário. Intimação pes-soal do devedor. DL 70/1966. Súmula nº 7/STJ. 1. É indispensável a intimação pes-soal dos devedores acerca da data designada para o leilão do imóvel hipotecado em processo de execução extrajudicial realizado nos termos do Decreto-Lei nº 70/1966. 2. No caso concreto, o Tribunal de origem concluiu pela regularidade da intimação pessoal do devedor para purgar a mora. A alteração desse entendimento demandaria o reexame de fatos e provas, inviável em recurso especial, ante o disposto na Súmula nº 7/STJ. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1093492/MG – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – J. 03.12.2013 – DJe 13.12.2013)

AÇÃO DE bUSCA E APREENSÃO – NOTIfICAÇÃO EXTRAJUDICIAL

– CARTÓRIO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS – COMARCA

DIVERSA DO DOMICÍLIO DO DEVEDOR – VALIDADE

33150 – “Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação de busca e apreensão. Notificação extrajudicial. Cartório de Títulos e Documentos de Comarca diversa do domicílio do devedor. Validade. Decisão mantida. 1. ‘A notifica-ção extrajudicial realizada e entregue no endereço do devedor, por via postal e com aviso de recebimento, é válida quando realizada por Cartório de Títulos e Documen-tos de outra Comarca, mesmo que não seja aquele do domicílio do devedor’ (REsp 1184570/MG, submetido ao rito do art. 543-C do CPC, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª Seção, Julgado em 09.05.2012, DJe 15.05.2012). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp 393.021/MS – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – J. 26.11.2013 – DJe 10.12.2013)

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AÇÃO DE CObRANÇA DO SEgURADO CONTRA O SEgURADOR

– SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO EM fACE DO PEDIDO ADMINISTRATIVO

– sÚMULA Nº 229/sTJ

33151 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Seguro. Ação de cobrança do segurado contra o segurador. Prescrição. Súmulas nºs STJ/101 e 229. Improvimen-to. 1. A ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora prescreve em um ano (Súmula nº 101/STJ). 2. O pedido do pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão (Súmula nº 229/STJ). 3. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 410.758/SC – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 21.11.2013 – DJe 06.12.2013)

AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE fIANÇA – CONTRATO DE

AbERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE – CLáUSULA

DE PRORROgAÇÃO AUTOMáTICA – INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA

33152 – “Agravo regimental. Ação de exoneração de fiança. Contrato de abertura de crédito em conta corrente. Prorrogação automática. Fiança. Ausência de anuên-cia. Ineficácia. Aplicação da Súmula nº 83/STJ. 1. ‘A cláusula que prevê prorrogação automática no contrato bancário não vincula o fiador, haja vista a interpretação res-tritiva que se deve dar às disposições relativas ao instituto da fiança’ (AgRg-REsp 849.201/RS, Relª Ministra Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, Julgado em 27.09.2011, DJe 05.10.2011). 2. Agravo Regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1411683/RS – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 21.11.2013 – DJe 09.12.2013)

AÇÃO DE PRESTAÇÃO DE CONTAS – HONORáRIOS DO PERITO

33153 – “Agravo regimental. Recurso especial. Ação de prestação de contas. Segunda fase. Responsabilidade pelos honorários do perito. Precedentes. 1. Conforme a juris-prudência das Turmas que compõem a 2ª Seção desta Corte, na ação de prestação de contas, se a parte deu causa, não só à ação, mas também à realização de perícia, deve adiantar os honorários periciais. 2. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1404766/PR – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

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AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO – PROMESSA DE COMPRA E VENDA

DE IMÓVEL – ANTECIPAÇÃO DE TUTELA – DISTRATO

ANTECIPADO – SUSPENSÃO DOS PAgAMENTOS – ALIENAÇÃO

DO IMÓVEL – POSSIbILIDADE

33154 – “Processual civil. Agravo de instrumento. Ação de rescisão de contrato. Promessa de compra e venda de imóvel. Promissários adquirentes. Mora. Cláusula penal. Abusividade. Antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional. Suspensão dos pagamentos. Extração dos efeitos da mora. Alienação do imóvel. Verossimilhança e risco. Inadimplemento contratual. Configuração. 1. A antecipação de tutela tem como pressupostos genéricos a ponderação da subsistência de prova inequívoca e a veros-similhança da argumentação alinhada de forma a ser aferido que são aptas a forrar e revestir de certeza o direito material invocado, resultando da aferição da inveros-similhança do aduzido a ausência da probabilidade indispensável à sua concessão, à medida que não tem caráter instrumental, ensejando, ao contrário, o deferimento da prestação perseguida de forma antecipada. 2. Emergindo incontroverso o desinte-resse dos promitentes compradores de imóvel em construção em continuar o vínculo contratual que os enlaça ao compromisso firmado e transmudá-lo em compra e venda e não havendo a oposição da promitente vendedora quanto ao distrato, remanescen-do controvertidos somente os efeitos da rescisão contratual, torna-se desprovido de utilidade e lastro material se permitir que a vendedora adote medidas endereçadas a inclinar os adquirentes ao cumprimento das obrigações hostilizadas, como é o caso, v.g., da inclusão do seu nome nos cadastros de devedores inadimplentes, devendo, sob esse prisma, serem prevenidos os efeitos da mora, que deverão ser resolvidos tão somente como corolário da rescisão e sob a moldura do convencionado e da le-gislação positiva. 3. A apreensão de que o distrato antecipado do contrato legitima a promitente vendedora, inclusive, a alienar o imóvel após a suspensão do pagamento das parcelas pactuadas, notadamente porque se trata de imóvel ainda em construção, torna inteiramente inócua e carente de interesse a pretensão formulada pelos adqui-rentes almejando que seja autorizada a alienação da unidade que fizera o objeto da promessa que firmaram, mormente porque da negativa desse provimento não lhes advém qualquer prejuízo ou risco de dano, pois passa a afetar exclusivamente a esfe-ra de disponibilidade da promissária vendedora. 4. Agravo conhecido e parcialmente provido. Unânime.” (TJDFT – Acórdão AI nº 20130020202212AGI – 1ª T.Cív. – Rel. Des. Teófilo Caetano – J. 11.12.2013 – DJe 08.01.2014)

AÇÃO MONITÓRIA – CONTRATO DE MÚTUO –

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INSTRUMENTO PARTICULAR DE NATUREzA PESSOAL –

PRESCRIÇÃO QUINQUENAL

33155 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação monitória. Contra-to de mútuo. Prescrição quinquenal. Art. 206, § 5º, do Código Civil de 2002. Improvi-mento. 1. Aplica-se a prescrição quinquenal, prevista na regra do art. 206, § 5º, I, do Código Civil de 2002, às ações de cobrança em que se requer pagamento de dívida líquida constante de instrumento particular de natureza pessoal. 2. Aplicação da re-gra de transição acerca da prescrição, considerando-se interrompido o prazo na data do início da vigência do Código Civil de 2002 (11.01.2003) e passando a fluir, desde então, a prescrição quinquenal do Novo Estatuto Civil. 3. Agravo regimental impro-vido.” (STJ – AgRg-AREsp 420.703/RJ – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 21.11.2013 – DJe 09.12.2013)

AÇÃO REVISIONAL – MANUTENÇÃO NA POSSE DO bEM – ANTECIPAÇÃO

DE TUTELA – INTERPRETAÇÃO DOs REQUIsITOs DO ART. 273 DO

CÓDIgO DE PROCESSO CIVIL

33156 – “Processo civil. Agravo interno. Agravo em recurso especial. Ação revisio-nal. Manutenção na posse do bem. Verossimilhança das alegações e abusividade das cláusulas contratuais e encargos financeiros. Não demonstração. Exclusão/absten-ção de inscrição em cadastros de proteção ao crédito. Requisitos não demonstrados. Decisão agravada mantida. Improvimento. 1. Conforme entendimento assente nesta Corte, o simples ajuizamento de ação revisional, com a alegação da abusividade das cláusulas contratadas, não importa no reconhecimento do direito do contratante à antecipação da tutela, sendo necessário o preenchimento dos requisitos do art. 273 do Código de Processo Civil. Assim, o deferimento do pedido de manutenção do devedor na posse do bem está condicionado à demonstração de verossimilhança das alegações de abusividade das cláusulas contratuais e dos encargos financeiros, o que, conforme se infere do acórdão recorrido, não restou comprovado no caso dos autos. 2. Para que seja deferido o pedido de cancelamento ou de abstenção da inscrição do nome do contratante nos cadastros de proteção ao crédito, é indispensável que este demonstre a existência de prova inequívoca do seu direito, com a presença conco-mitante de três elementos: a) ação proposta por ele contestando a existência integral ou parcial do débito; b) demonstração efetiva da cobrança indevida, amparada em jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal ou do Superior Tribunal de Justiça; c) sendo parcial a contestação, que haja o depósito da parte incontroversa ou a prestação de caução idônea, a critério do Magistrado. Essa a orientação da 2ª Seção (REsp 527.618/RS, Rel. Min. César Asfor Rocha, DJ 24.11.2003). Na espécie, não res-taram satisfeitos todos os mencionados requisitos, razão pela qual deve ser mantida

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a conclusão do acórdão recorrido. 3. O recurso não trouxe nenhum argumento capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamen-tos. 4. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 422.931/MS – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 10.12.2013)

APELAÇÃO PROTOCOLADA EM COMARCA DIVERSA DAQUELA EM

QUE TRAMITA O PROCESSO – ERRO gROSSEIRO – INTEMPESTIVIDADE

33157 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Recurso de apelação. In-tempestividade. Recurso protocolado em vara de comarca diversa daquela em que tramita o processo. Erro grosseiro. Precedentes. 1. O protocolo de apelação em vara de comarca diversa da que tramita o processo, ainda que protocolada no prazo legal, acarreta a intempestividade do recurso, por tratar-se de erro grosseiro Precedentes da Corte. 2. O agravo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos. 3. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 424.057/PR – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

AÇÃO CIVIL PÚBLICA – LEgITIMIDADE ATIVA DO

SINDICATO – DEfESA DE DIREITOS INDIVIDUAIS HOMOgÊNEOS

DE SEUS fILIADOS

33158 – “Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação civil pública. Revisão de contratos bancários. Sindicato rural. Legitimidade ativa. Precedentes. Súmula nº 83/STJ. Arts. 2º e 29 do CDC. Ausência prequestionamento. Súmulas nºs 282 e 356/STF. Decisão mantida. 1. Incide as Súmulas nºs 282 e 356 do STF, nos casos em que a matéria não foi objeto de apreciação pelo acórdão recorrido, nem mesmo foram opostos embargos de declaração. 2. O sindicato possui legitimida-de ativa para ajuizar ação civil pública em defesa de direitos individuais homogêneos de seus filiados. Precedentes. Incidência da Súmula nº 83/STJ. 3. Agravo regimen-tal improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 392.167/MT – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

CONCEITO DE CONSUMIDOR – BysTAnDer – ALCANCE –

EXEGEsE ART. 17, CDC33159 – “Civil, processo civil e consumidor. Administradora de shopping center. Ex-plosão por vazamento de gás. Cadeia de fornecimento. Responsabilidade solidária.

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Empregado do fornecedor. Figura do consumidor por equiparação. Aplicação. Im-possibilidade. Existência de relação jurídica específica. Danos morais. Valor. Revi-são em sede de recurso especial. Impossibilidade. Montante razoável. Dispositivos legais analisados: arts. 2º, 3º, 7º, parágrafo único, 17 e 25 do CDC; e 21, parágrafo único, do CPC. 1. Ação ajuizada em 13.04.1999. Recurso especial concluso ao gabi-nete da Relatora em 14.03.2013. 2. Recurso especial em que se discute a extensão da figura do consumidor por equiparação prevista no art. 17 do CDC. 3. Os arts. 7º, parágrafo único, e 25 do CDC impõem a todos os integrantes da cadeia de forneci-mento a responsabilidade solidária pelos danos causados por fato ou vício do pro-duto ou serviço. 4. O art. 17 do CDC prevê a figura do consumidor por equiparação (bystander), sujeitando à proteção do CDC aqueles que, embora não tenham participa-do diretamente da relação de consumo, sejam vítimas de evento danoso decorrente dessa relação. Todavia, caracterização do consumidor por equiparação possui como pressuposto a ausência de vínculo jurídico entre fornecedor e vítima; caso contrário, existente uma relação jurídica entre as partes, é com base nela que se deverá apurar eventual responsabilidade pelo evento danoso. 5. Hipótese em que fornecedor e víti-ma mantinham uma relação jurídica específica, de natureza trabalhista, circunstância que obsta a aplicação do art. 17 do CDC, impedindo seja a empregada equiparada à condição de consumidora frente à sua própria empregadora. 6. A indenização por danos morais somente comporta revisão em sede de recurso especial nas hipóteses em que o valor fixado se mostrar irrisório ou excessivo. Precedentes. 7. Nos termos do art. 21, parágrafo único, do CPC, se um litigante decair de parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas verbas de sucumbência. 8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido.” (STJ – REsp 1370139/SP – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – J. 03.12.2013 – DJe 12.12.2013)

CONSUMIDOR – DEfEITO EM VEíCULO ZERO-QUILÔMETRO

– EXTRAPOLAÇÃO DO RAzOáVEL – DANO MORAL

33160 – “Consumidor e civil. Responsabilidade civil contratual. Defeitos em veículo zero-quilômetro. Extrapolação do razoável. Dano moral. Existência. Juros de mora. Dies a quo. Citação. Dispositivos legais apreciados: arts. 18 do CDC e 186, 405 e 927 do CC/2002. 1. Ação ajuizada em 14.05.2004. Recurso especial concluso ao gabinete da Relatora em 08.08.2013. 2. Recurso especial em que se discute se o consumidor faz jus à indenização por danos morais em virtude de defeitos reiterados em veículo zero-quilômetro que o obrigam a levar o automóvel diversas vezes à concessionária para reparos, bem como o dies a quo do cômputo dos juros de mora. 3. O defeito apresentado por veículo zero-quilômetro e sanado pelo fornecedor, via de regra, se qualifica como mero dissabor, incapaz de gerar dano moral ao consumidor. Todavia, a partir do momento em que o defeito extrapola o razoável, essa situação gera senti-

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mentos que superam o mero dissabor decorrente de um transtorno ou inconveniente corriqueiro, causando frustração, constrangimento e angústia, superando a esfera do mero dissabor para invadir a seara do efetivo abalo psicológico. 4. Hipótese em que o automóvel adquirido era zero-quilômetro e, em apenas 06 meses de uso, apresentou mais de 15 defeitos em componentes distintos, parte dos quais ligados à segurança do veículo, ultrapassando, em muito, a expectativa nutrida pelo recorrido ao adqui-rir o bem. 5. Consoante entendimento derivado, por analogia, do julgamento, pela 2ª Seção, do REsp 1.132.866/SP, em sede de responsabilidade contratual os juros de mora referentes à reparação por dano moral incidem a partir da citação. 6. Recurso especial desprovido.” (STJ – REsp 1395285/SP – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – DJe 12.12.2013)

Nota: Trata-se de um caso polêmico envolvendo direito do consumidor: o defeito constatado em carro zero-quilômetro geraria dano moral indenizável? Se posi-tivo, qual o dies a quo para o cômputo dos juros de mora? Inicialmente, foi proposta ação de rescisão de negócio jurídico cumulada com restituição de valores pagos e indenização por danos morais por consumidor em face da concessionária que lhe vendeu veículo zero-quilômetro, assim como em face da fabricante Ford. Segundo os fatos expostos, o veículo adquirido apresentou diversos defeitos em um curto período de tempo (parte dos quais ligados à segurança, como problemas no cinto de segurança, nos discos e pasti-lhas de freio e na barra de direção), necessitando de constantes reparos.Em primeiro grau, a sentença julgou parcialmente procedente os pedidos ini-ciais para condenar as rés, solidariamente, ao pagamento de danos morais em 20 salários-mínimos. Em segundo grau, o Tribunal de Justiça de São Paulo deu parcial provimento ao apelo da Ford Motor, fixando a indenização por danos morais em R$ 7.600,00, na data da sentença, por reconhecer que a correção do valor da indenização não pode ser atrelada ao salário-mínimo. Descontente, em sede de recurso especial, a Empresa Ford alegou violação aos arts. 186, 405 e 927 do CC/2002. A justificativa é que o entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justi-ça é de que o mero dissabor não caracteriza dano moral, bem como que eventual defeito em veículo, via de regra, se enquadra no conceito de simples aborreci-mento, incapaz de causar abalo psicológico. Logo, para a fabricante, teria havi-do um “mero dessabor”.Apenas para fins de aclaramento, ressalta-se que vícios e defeitos são institutos diversos. De acordo com Paulo de Tarso Vieira Sanseverino “no defeito, o bem jurídico tutelado é a segurança física e patrimonial do consumidor, enquanto nos vícios, protege-se a adequação do produto ou serviço à finalidade a que se destinam” (SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Responsabilidade civil no có-digo do consumidor e a defesa do fornecedor. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 168).O Superior Tribunal de Justiça entendeu que, no caso concreto, o automóvel adquirido era zero-quilômetro e, em apenas 6 meses de uso, apresentou mais

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de 15 defeitos em componentes distintos, os quais não se limitaram a reduzir apenas a utilidade do bem, mas também a sua segurança e de seus ocupantes. Tantos problemas obrigaram o recorrido a levar o seu veículo à concessionária 6 vezes, sendo que na última vez o automóvel foi batido por preposto da própria concessionária.Sendo esta a realidade fática, em seu voto, a Relatora, Ministra Nancy Andrighi, asseverou que, com base nas regras de experiência comum, o número de defei-tos apresentados pelo veículo, parte dos quais ligados à segurança, ultrapassou, em muito, a expectativa nutrida pelo recorrido ao adquirir o automóvel, sobre-tudo considerando tratar-se de bem zero-quilômetro.Para a Ministra, a partir do momento em que o defeito vai além de o razoá-vel, essa situação gera sentimentos que extrapolam o mero dissabor decorrente de um inconveniente corriqueiro, entre os quais se destacam: “(i) a perda da sensação de prazer inerente à aquisição do bem (diga-se, de elevado valor e culturalmente um símbolo de status), que por vezes se transforma até mesmo em motivo de deboche; (ii) a perda da confiança na utilização do automóvel, levando o proprietário à constante preocupação de estar conduzindo um veí-culo que a qualquer momento pode apresentar um defeito, capaz inclusive de colocar ele e os demais passageiros em risco; e (iii) a perda da certeza quanto ao investimento feito, deixando o proprietário apreensivo quanto à dificuldade futura de revenda”.Ainda, registra-se que, não obstante o art. 18 do CDC verse sobre a reparação dos danos materiais causados pela existência de vício de qualidade ou quanti-dade do produto, o regime legal instituído pelo referido dispositivo não exclui o direito do consumidor à reparação por danos morais, nas hipóteses em que esse vício causar algum dano de ordem extrapatrimonial.Com efeito, há precedentes desta Corte considerando existente o dano moral, exatamente pelo fato de adquirente de veículo ter sido obrigado a retornar à concessionária diversas vezes, em curto espaço de tempo, para a realização de reparos, independentemente de o fornecedor ter solucionado os vícios. Nesse sentido: AgRg-AREsp 13.600/RN, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe de 01.09.2011; AgRg-RESp 895,706/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe de 16.09.2008.Por fim, quanto ao dies a quo dos juros de mora, o Tribunal de Justiça de São Paulo determinou que a indenização por danos morais fosse corrigida desde a data da sentença até a data do pagamento de acordo com o art. 405 do CC/2002. Conforme o mencionado artigo: “Contam-se os juros de mora desde a citação inicial”.A Empresa Ford, inconformada, alegou que o art. 405 do CC/2002 fala das per-das e danos líquidos, mas não abrange os danos morais, pois estes não serão quantificados até a decisão que os arbitre.Todavia, esse novo posicionamento não foi chancelado pela 2ª Seção do STJ que, no julgamento do REsp 1.132.866/SP, Relª Min. Maria Isabel Galloti, DJe de 03.09.2012, ratificou o entendimento anterior, consolidado no Enunciado

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nº 54 da Súmula/STJ, ressaltando que “o fato de, no caso de dano moral puro, a quantificação do valor da indenização, objeto da condenação judicial, só se dar após o pronunciamento judicial, em nada altera a existência da mora do de-vedor, configurada desde o evento danoso”. O caso envolvia responsabilidade extracontratual.Destacou-se, ademais, que a adoção de orientação diversa, ou seja, de que, na prática, o início da fluência dos juros moratórios se iniciasse a partir do trânsito em julgado, “incentivaria o recorrismo por parte do devedor e tornaria o lesa-do, cujo dano sofrido já tinha o devedor obrigação de reparar desde a data do ato ilícito, obrigado a suportar delongas decorrentes do trâmite do processo e, mesmo de eventuais manobras processuais protelatórias, no sentido de adiar a incidência de juros moratórios”.Esse raciocínio, conforme o entendimento da Ministra Nancy, se aplica analo-gicamente à responsabilidade contratual, fazendo prevalecer o entendimento de que, nesses casos, os juros devem ser computados desde a citação. Neste sentido: REsp 1.081.793/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Marco Buzzi, DJe de 28.10.2013. No mesmo sentido: EDcl-REsp 1.062.990/PR, 4ª Turma, Rel. Min. Raul Araújo, DJe de 20.09.2013; e AgRg-REsp 1.132.658/MG, 3ª Turma, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, DJe de 29.08.2012.Nesse ponto final, portanto, no juízo da ilustre Ministra Relatora, além de não se vislumbrar violação do art. 405 do CC/2002, incidiria o Enunciado nº 83 da Súmula/STJ, pelo qual “não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recor-rida”.Ante todo o exposto, a 3ª Turma, por unanimidade, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora Nancy Andrighi, negou provimento ao recurso especial.

CONSUMIDOR – INgESTÃO DE bARRA DE CEREAL CONTENDO

OVOS E LAgARTA MORTA – DANOS MORAIS – R$ 10.000,00

– VALOR RAzOáVEL

33161 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Ingestão de barra de cereal contendo ovos e lagarta morta. Danos morais. Ausência de omissões no acórdão. Pro-va pericial. Reexame do conjunto fático-probatório. Impossibilidade. Súmula nº 7/STJ. Ausência de similitude fática. Dissídio jurisprudencial não comprovado. Decisão agravada mantida. Improvimento. 1. Não se detecta qualquer omissão, contradição ou obscuridade no acórdão recorrido, uma vez que a lide foi dirimida com a devida e suficiente fundamentação, apenas não se adotou a tese do agravante. 2. Ultrapas-sar os fundamentos do acórdão recorrido, afastando os danos morais reconhecidos, demandaria, inevitavelmente, o reexame de provas, incidindo, à espécie, o óbice da Súmula nº 7 desta Corte. 3. Não houve demonstração de dissídio jurisprudencial,

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diante da falta do exigido cotejo analítico entre os julgados mencionados, bem como pela ausência de similitude fática, de maneira que inviável o inconformismo apon-tado pela alínea c do permissivo constitucional. 4. A intervenção do STJ, Corte de caráter nacional, destinada a firmar interpretação geral do Direito Federal para todo o país e não para a revisão de questões de interesse individual, no caso de questio-namento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível quando o valor fixado pelo Tribunal de origem, cumprindo o duplo grau de jurisdição, se mostre teratológico, por irrisório ou abusivo. 5. Inocorrência de teratologia no caso concreto, em que foi fixado o valor de indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais), devido pelo ora agravante à autora, a título de danos morais decorrentes de ingestão de alimento contaminado por ovos e larvas de inseto 6. O agravo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos. 7. Agravo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos. 8. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREs 409.048/RJ – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Bene-ti – J. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013)

CONSUMIDOR – INVERSÃO DO ÔNUs DA PROVA DECORRENTE

DA LEI – INVERSÃO oPe legIs – REEXAME DE PROVAS

– IMPOSSIbILIDADE

33162 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Inversão do ônus da prova ope legis. Forma objetiva. Fato do produto ou do serviço. Reexame de provas. Súmula nº 7/STJ. Quantum indenizatório. Razoabilidade. 1. A 2ª Seção deste Tribunal, no julgamento do REsp 802.832/MG, Rel. Paulo de Tarso Sanseverino, DJ de 21.09.2011, pacificou a jurisprudência desta Corte no sentido de que em demanda que trata da responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço (arts. 12 e 14 do CDC), a inver-são do ônus da prova decorre da lei. 2. ‘Diferentemente do comando contido no art. 6º, inciso VIII, que prevê a inversão do ônus da prova ‘a critério do juiz’, quando for verossímil a alegação ou hipossuficiente a parte, o § 3º do art. 12, preestabelece – de forma objetiva e independentemente da manifestação do magistrado –, a distribuição da carga probatória em desfavor do fornecedor, que “só não será responsabilizado se provar: I – que não colocou o produto no mercado; II – que, embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste; III – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. É a diferenciação já clássica na doutrina e na jurisprudência entre a in-versão ope judicis (art. 6º, inciso VIII, do CDC) e inversão ope legis (arts. 12, § 3º, e art. 14, § 3º, do CDC). Precedente da 2ª Seção’ (REsp 1095271/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª Turma, Julgado em 07.02.2013, DJe 05.03.2013). 3. Em âmbito de recurso especial não há campo para se revisar entendimento assentado em provas, conforme está sedimentado no Enunciado nº 7 da Súmula desta Corte. 4. A intervenção do STJ,

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Corte de caráter nacional, destinada a firmar interpretação geral do Direito Federal para todo o país e não para a revisão de questões de interesse individual, no caso de questionamento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível quando o valor fixado pelo Tribunal de origem, cumprindo o duplo grau de jurisdição, se mos-tre teratológico, por irrisório ou abusivo. 5. Inocorrência de teratologia no caso con-creto, em que, para o defeito na prestação do serviço – não entregou a documentação regular do veículo no momento da contratação –, foi fixado o valor de indenização de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de dano moral, consideradas as forças econômicas do autor da lesão. 6. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 402.107/RJ – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013)

CONSUMIDOR – PLANO DE sAÚDE – COBERTURA DE

TÉCNICA MAIS MODERNA – CONCEITO NORMATIVO DE

“TRATAMENTO EXPERIMENTAL”

33163 – “Recurso especial. Plano de saúde. Tratamento. Técnica moderna. Cirurgia. Negativa de cobertura. Cláusula abusiva. Violação ao art. 535 do CPC não configu-rada. 1. Não configura violação ao art. 535 do CPC a decisão que examina, de forma fundamentada, as questões submetidas à apreciação judicial. 2. Tratamento experi-mental é aquele em que não há comprovação médica-científica de sua eficácia, e não o procedimento que, a despeito de efetivado com a utilização equipamentos modernos, é reconhecido pela ciência e escolhido pelo médico como o método mais adequa-do à preservação da integridade física e ao completo restabelecimento do paciente. 3. Delineado pelas instâncias de origem que o contrato celebrado entre as partes pre-via a cobertura para a doença que acometia o autor, é abusiva a negativa da operado-ra do plano de saúde de utilização da técnica mais moderna disponível no hospital credenciado pelo convênio e indicada pelo médico que assiste o paciente. Preceden-tes. 4. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.320.805/SP – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – J. 05.12.2013 – DJe 17.12.2013)

Nota: O presente caso trata de negativa de plano de saúde de cobertura de procedi-mento cirúrgico (prostatectomia radical laparoscópica), com técnica robótica, em paciente com câncer. O procedimento, segundo o médico responsável, era indispensável para evitar a metástase da neoplasia.O procedimento chegou a ser autorizado pela operadora Itauseg Saúde, mas, depois de realizado o ato cirúrgico, a cobertura foi negada em razão de a cirur-gia ter sido executada com o auxílio de robô. A operadora argumentou, ainda, que o hospital no qual foi realizada a cirurgia havia recebido novo equipamento pouco tempo antes, e que a técnica convencional poderia ter sido adotada com

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sucesso, sem a necessidade de ter sido empregada a técnica mais moderna ao tratamento.A sentença julgou ilegal a exclusão da cobertura, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), reformando a decisão de primeiro grau, acolheu as alegações da Itauseg Saúde, ao entendimento de que a utilização de técnica robótica seria de natureza experimental e, portanto, excluída da cobertura do plano de saúde. Irresignado, o segurado interpôs recurso especial alegando a violação do art. 10, inciso I, da Lei nº 9.656/1998, bem como que o entendimento do acórdão recorrido encontrava-se em divergência com a orientação do Superior Tribunal de Justiça, adotada no julgamento do REsp 668.216/SP e de diversos outros tribunais do País, que distinguem o conceito de procedimento experimental do “registro burocrático do tratamento no órgão governamental competente”.Conforme o art. 10, I, da mencionada lei que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde: “É instituído o plano-referência de assistência à saúde, com cobertura assistencial médico-ambulatorial e hospitalar, compre-endendo partos e tratamentos, realizados exclusivamente no Brasil, com padrão de enfermaria, centro de terapia intensiva, ou similar, quando necessária a inter-nação hospitalar, das doenças listadas na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde, da Organização Mundial de Saúde, respeitadas as exigências mínimas estabelecidas no art. 12 desta lei, exceto: I – tratamento clínico ou cirúrgico experimental; [...]”.Em seu voto, a Ministra Relatora Maria Isabel Gallotti proveu o recurso especial, sob o fundamento de que o tratamento experimental não se confunde com a mo-dernidade da técnica cirúrgica. Segundo a Relatora, “tratamento experimental é aquele em que não há comprovação médica-científica de sua eficácia, e não o procedimento que, a despeito de efetivado com a utilização de equipamentos modernos, é reconhecido pela ciência e escolhido pelo médico como o método mais adequado à preservação da integridade física e ao completo restabeleci-mento do paciente”.Conforme o seu voto, os planos de saúde não têm a liberdade de impor o tra-tamento de custo menor, apenas em razão de não haver prova de que a técni-ca mais moderna eleita pelo médico seja absolutamente indispensável. Nessa linha, entendeu a Relatora que o contrato celebrado entre as partes previa a cobertura para a doença que acometia o autor da ação, é abusiva a negativa da operadora do plano de saúde de utilização da técnica mais moderna disponível no hospital credenciado pelo convênio e indicado pelo médico que assiste o paciente.Em suas palavras: “Isso quer dizer que se o plano está destinado a cobrir despe-sas relativas ao tratamento, o que o contrato pode dispor é sobre as patologias cobertas, não sobre o tipo de tratamento para cada patologia alcançada pelo contrato”. Nesse sentido está a jurisprudência consolidada do Superior Tribu-nal (REsp 183.719/SP, 4ª Turma, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJ 13.10.2008;

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REsp 1.106.789/RJ, 3ª Turma, Relª Min. Nancy Andrighi, DJ 18.11.2009; AgRg--AREsp 194.590/PA, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJ 08.10.2012).Com amparo nesses fundamentos, foi provido o recurso especial.

CONTRATO DE CONfISSÃO DE DÍVIDA – ART. 30 DO DECRETO Nº 21.981/1932 – VEDAÇÃO QUE

NÃO PODE SER INVOCADA PELO PRESTADOR DA gARANTIA –

CONTRATO DESVINCULADO DO EXERCÍCIO DE SUAS fUNÇÕES

COMO LEILOEIRO – BOA-FÉ

33164 – “Civil. Contrato de confissão de dívida. Exceção de pré-executividade. Lei-loeiro oficial. Aval ou fiança. Decreto nº 21.981/1932, art. 30. Garantia prestada alheia ao exercício das funções. Validade. Princípio da boa-fé. Preservação. 1. A jurispru-dência do STJ privilegia o princípio da boa-fé. A vedação do art. 30 do Decreto nº 21.981/1932 não pode ser invocada pelo prestador da garantia para se eximir da obrigação que assumiu em contrato desvinculado do exercício de suas funções como leiloeiro, sob pena de privilegiar a torpeza de quem se beneficiaria com a imunidade legal. 2. Legalidade da garantia, prestada em contrato alheio à atividade de leiloeira, não se cogitando, no caso em exame, de que a garantia prestada pela recorrente preju-dique a fiança legalmente oferecida, por força do art. 6º do mesmo decreto, ou direitos de terceiro. 3. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ – REsp 1214440/SP – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – J. 05.11.2013 – DJe 06.12.2013)

CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL – RESCISÃO – ARbITRAMENTO

DE ALUgUÉIS CUMULADO COM CLáUSULA PENAL – POSSIbILIDADE

– AUSÊNCIA DE BIs In IDem

33165 – “Agravo regimental. Direito do consumidor. Processual civil. Contrato de promessa de compra e venda de imóvel. Rescisão por culpa do comprador. Arbitra-mento de aluguéis em razão do uso do imóvel. Possibilidade. Ausência de bis in idem com cláusula penal. 1. Não há se falar em bis in idem na condenação ao pagamento dos aluguéis cumulada com cláusula penal. O pagamento de aluguéis é devido não porque se enquadram estes na categoria de perdas e danos decorrentes do ilícito, mas por imperativo legal segundo o qual a ninguém é dado enriquecer-se sem causa à custa de outrem. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AREsp 394.466/PR – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 03.12.2013 – DJe 10.12.2013)

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CONTRATO DE SEgURO DE VIDA INDIVIDUAL – RESCISÃO sÚBITA UNILATERAL – FATOR DE IDADE – DESCAbIMENTO – OFENsA À BOA-FÉ OBJETIVA

33166 – “Agravo regimental no recurso especial. Contrato de seguro de vida indivi-dual. Rescisão unilateral. Descabimento. Ressalva da possibilidade de sua modifica-ção pela seguradora, mediante a apresentação prévia de extenso cronograma, no qual os aumentos sejam apresentados de maneira suave e escalonada. Súmula nº 83/STJ. Improvimento. 1. Consoante a jurisprudência da 2ª Seção, em contratos de seguro de vida, cujo vínculo vem se renovando ao longo de anos, não pode a seguradora modificar subitamente as condições da avença nem deixar de renová-la em razão do fator de idade, sem ofender os princípios da boa-fé objetiva, da cooperação, da confiança e da lealdade que devem orientar a interpretação dos contratos que regu-lam as relações de consumo. 2. Admitem-se aumentos suaves e graduais necessários para reequilíbrio da carteira, mediante um cronograma extenso, do qual o segurado tem de ser cientificado previamente (REsp 1.073.595/MG, Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 29.04.2011). 3. Inafastável, no caso em tela, a incidência da Súmula nº 83/STJ (Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida). 4. Agravo regimental improvi-do.” (STJ – AgRg-REsp 1408753/SC – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 19.11.2013 – DJe 06.12.2013)

CUMPRIMENTO DE SENTENÇA – CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL OU CAUÇÃO fIDEJUSSÓRIA – gARANTIA DE PAgAMENTO –

SUbSTITUIÇÃO PELA INCLUSÃO DOS bENEfICIáRIOS NA fOLHA DE PAgAMENTO DE SOCIEDADE EMPRESáRIA – fACULDADE DO JUIZ – ART. 475-Q, § 2º, DO CPC

33167 – “Agravo regimental. Ação de indenização. Cumprimento de sentença. Omis-são do acórdão recorrido. Inexistência. Constituição de capital. Súmula nº 313/STJ. Superveniência de alteração legislativa (art. 475-Q, § 2º, do CPC). Reexame de prova. Descabimento. Súmula nº 7/STJ. 1. Consoante dispõe o art. 535 do CPC, destinam-se os embargos de declaração a expungir do julgado eventuais omissão, obscuridade ou contradição, não se caracterizando via própria ao rejulgamento da causa. 2. ‘Em ação de indenização, procedente o pedido, é necessária a constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia de pagamento da pensão, independentemente

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da situação financeira do demandado’ (Súmula nº 313/STJ). 3. Com o advento da Lei nº 11.232/2005 foi instituído o atual art. 475-Q, § 2º, do CPC, estabelecendo ser faculdade do juiz, e não direito subjetivo do devedor, a substituição da determina-ção de constituição de capital pela inclusão dos beneficiários na folha de pagamento de sociedade empresária que apresente notória capacidade econômica. 4. No caso, a pretensão de rever a conclusão do acórdão recorrido, com vistas ao afastamento da constituição de capital como garantia de cumprimento do julgado em função da solvabilidade da empresa recorrente, encontra óbice na Súmula nº 7 deste Tribunal. 5. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 412.643/SC – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 10.12.2013)

DANO ESTÉTICO – CUMULAÇÃO COM DANOS MORAIS

– POSSIbILIDADE

33168 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Dano estético. Julgamen-to extra petita. Inocorrência. Dano moral. Inscrição indevida. Quantum indenizatório fixado com razoabilidade. 1. O entendimento desta Corte é firme no sentido de que o pedido deve ser extraído a partir de uma interpretação lógico-sistemática de toda a petição inicial. Ademais, expostos os fatos, não pode o Magistrado se esquivar da análise ampla e detida da relação jurídica posta em exame. 2. A intervenção do STJ, Corte de caráter nacional, destinada a firmar interpretação geral do Direito Federal para todo o País e não para a revisão de questões de interesse individual, no caso de questionamento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível quan-do o valor fixado pelo Tribunal de origem, cumprindo o duplo grau de jurisdição, se mostre teratológico, por irrisório ou abusivo. 3. Inocorrência de teratologia no caso concreto, em que houve a fixação do valor de indenização por dano moral, em R$ 100.000,00 (cem mil reais), e danos estéticos em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), em 24.08.2012, para o dano consistente em perda da visão do olho direito, decorrente de explosão da capa do regulador de pressão R-204. 4. O agravo regimental não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar o decidido, que se mantém por seus próprios fundamentos. 5. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 382.483/TO – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013)

DESCUMPRIMENTO DE ORDEM JUDICIAL – REVISÃO DE AsTreInTe

PELO STJ – IMPOSSIbILIDADE – sÚMULA Nº 7/sTJ

33169 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Descumprimento de or-dem judicial. Aplicação de multa diária. Valor da multa. Reexame de prova. Súmula nº 7/STJ. Fundamento inatacado. Súmula nº 283/STF. 1. O art. 461 do Código de

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Processo Civil autoriza o julgador a impor multa diária para que seja efetivada a obrigação de fazer ou não fazer estabelecida na decisão judicial. 2. A convicção a que chegou o acórdão recorrido, tendo entendido pela necessidade de aplicação da mul-ta, decorreu da análise do conjunto fático-probatório, e o acolhimento da pretensão recursal demandaria o reexame do mencionado suporte, obstando a admissibilidade do especial à luz da Súmula nº 7 desta Corte. 3. A revisão do valor da multa comi-natória aplicada (astreinte) somente é possível, em sede de recurso especial, quando o valor for irrisório ou exagerado, o que não ocorre no presente caso. 4. Mantém-se inalterada a conclusão do acórdão recorrido, se o especial não impugna o fundamen-to nele adotado (Súmula nº 283/STF). 5. Agravo improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 425.880/PR – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

DIREITOS AUTORAIS – TELEVISORES E RáDIOS EM QUARTOS DE HOTEL

– DIREITOS AUTORAIS DEVIDOS – EXEgESE DA LEI Nº 9.610/1998

33170 – “Recurso especial. Direitos autorais. Televisores e rádios em quartos de ho-tel. Serviços prestados pelos meios de hospedagem. Exploração de obras artísticas. Pagamento de direitos autorais. Recurso provido. 1. São devidos, os pagamentos re-ferentes aos direitos autorais em razão da disponibilização de televisores e rádios dentro dos quartos de hotéis, por configurarem exploração de obras artísticas para incremento dos serviços prestados pelo meios de hospedagem. 2. Orientação firmada sob a égide da Lei nº 9.610/1998, que constitui a base legal de regência do caso, visto que sobre ela focalizou-se o debate nos autos, como legislação invocada pela inicial, sentença, acórdão recorrido e pelo recurso especial, não sendo o processo, por falta de prequestionamento, apto ao julgamento a respeito do disposto no art. 23 da Lei nº 11.771/2008. 3. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1396265/RS – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

DIREITO bANCáRIO – CAPITALIzAÇÃO MENSAL DOS

JUROS – PACTUAÇÃO EXPRESSA – JUROS REMUNERATÓRIOS –

AbUSIVIDADE NÃO CONSTATADA

33171 – “Civil e processual civil. Bancário. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Capitalização mensal dos juros. Pactuação expressa. Juros remuneratórios. Abusividade não constatada. Súmulas nºs 5 e 7/STJ. Decisão mantida. 1. ‘A capi-talização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara. A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual

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contratada’ (REsp 973827/RS, Relatora para o Acórdão Ministra Maria Isabel Gallot-ti, 2ª Seção, Julgado em 08.08.2012, DJe 24.09.2012). Precedente representativo da con-trovérsia (art. 543-C do CPC). 2. As taxas de juros remuneratórios devem ser fixadas à taxa média de mercado quando verificada, pelo Tribunal de origem, a abusividade do percentual contratado. 3. No caso concreto, o acórdão recorrido afastou a alegada abusividade da taxa contratada. Dessa forma, inviável o conhecimento do recurso especial ante o óbice das Súmulas nº 5 e 7 do STJ. 4. Não cabe ao STJ o exame de matéria constitucional, sob pena de usurpação da competência do STF. Precedentes. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp 400.027/MS – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

DIREITO DAS COISAS – PRESCRIÇÃO AQUISITIVA DA USUCAPIÃO

EXTRAORDINáRIA – APLICAÇÃO DOS ARTS. 1.238, PARágRAfO

ÚNICO, E 2.029 DO CC/2002

33172 – “Recurso especial. Direito das coisas. Prescrição aquisitiva da usucapião ex-traordinária. Aplicação dos arts. 1.238, parágrafo único, e 2.029 do CC/2002. Recurso provido. 1. Na análise da prescrição aquisitiva da usucapião extraordinária prevista no art. 1.238, parágrafo único aplica-se a regra de transição prevista no art. 2.029 do Código Civil de 2002. 2. O art. 1.238, parágrafo único, do CC/2002, tem aplica-ção imediata às posses ad usucapionem já iniciadas na vigência do Código anterior, qualquer que seja o tempo transcorrido, devendo apenas ser respeitada a fórmula de transição, segundo a qual serão acrescidos dois anos ao novo prazo, nos dois anos após a entrada em vigor do Código de 2002. 3. No caso, da data da posse (meados de 1994) até a entrada em vigor do CC/2002 (11.01.2003) haviam transcorridos 9 (nove) anos. Aplicando-se a regra de transição do art. 2.029, ao tempo implementado deverão ser acrescidos 2 anos, assim o prazo da prescrição aquisitiva da usucapião extraordinária aperfeiçoou-se no dia 11.01.2005, sendo que a ação foi proposta em 11.06.2008. 4. Recurso especial provido para afastar o obstáculo do lapso temporal e determinar o prosseguimento do julgamento, na origem, pelo mérito.” (STJ – REsp 1314413/MG – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013)

DIREITO DE fAMÍLIA – ALIMENTOS AVOENgOS –

ObRIgAÇÃO COMPLEMENTAR

33173 – “Direito de família. Alimentos avoengos. Obrigação complementar. Chama-mento dos avós maternos afastado. Inovação recursal. Processo já avançado. Impos-sibilidade do genitor demonstrada. Valor exorbitante. Redução. Possibilidade. Apelo parcialmente provido. 1. A despeito da existência de litisconsórcio necessário entre os

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avós na ação de alimentos complementares, não é possível o chamamento dos avós maternos no caso em apreço, seja porque tal argumento não foi enfrentado perante o primeiro grau de jurisdição, encontrando-se o feito em estágio avançado, seja porque os netos, querendo, podem propor ação autônoma em desfavor dos avós faltantes. 2. Evidenciado que os autores esgotaram os meios disponíveis para localizar o ge-nitor, é admissível o chamamento direto dos avós para prestarem, de forma com-plementar, os alimentos aos netos. 3. Mostrando-se o quantum arbitrado excessivo, impõe-se sua minoração a patamar mais adequado e que não represente sacrifício aos avós, privando-os das comodidades e necessidades naturais das suas idades. 4. Apelação parcialmente provida.” (TJDFT – AC 20120110568432APC – 2ª T.Cív. – Rel. Des. J. J. Costa Carvalho – Rev. Sérgio Rocha – J. 18.12.2013 – DJe 07.01.2014)

DIREITO DE VIzINHANÇA – CONDOMÍNIO – IMPOSSIbILIDADE

DE SE VEDAR A UTILIzAÇÃO DE ELEVADORES EM RAzÃO

DE INADIMPLÊNCIA – CARACTERIzAÇÃO DE

DANO MORAL

33174 – “Civil. Recurso especial. Ação declaratória cumulada com pedido de com-pensação por danos morais. Embargos de declaração. Omissão, contradição ou obs-curidade. Não ocorrência. Inadimplemento de taxas condominiais. Desprogramação dos elevadores. Suspensão de serviços essenciais. Impossibilidade. Exposição inde-vida da situação de inadimplência. Violação de direitos da personalidade. Danos morais. Caracterização. 1. Ação declaratória distribuída em 22.03.2011, da qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 26.09.2013. 2. Cinge--se a controvérsia, além de apreciar a existência de omissão no acórdão recorrido, a definir se é possível impor restrição ao condômino inadimplente quanto à utilização dos elevadores e, caso verificada a ilegalidade da medida, se a restrição enseja com-pensação por danos morais. 3. Ausentes os vícios do art. 535 do CPC, rejeitam-se os embargos de declaração. 4. O inadimplemento de taxas condominiais não autoriza a suspensão, por determinação da assembleia geral de condôminos, quanto ao uso de serviços essenciais, em clara afronta ao direito de propriedade e sua função social e à dignidade da pessoa humana, em detrimento da utilização de meios expressamente previstos em lei para a cobrança da dívida condominial. 5. Não sendo o elevador um mero conforto em se tratando de edifício de diversos pavimentos, com apenas um apartamento por andar, localizando-se o apartamento da recorrente no oitavo pavimento, o equipamento passa a ter status de essencial à própria utilização da pro-priedade exclusiva. 6. O corte do serviço dos elevadores gerou dano moral, tanto do ponto de vista subjetivo, analisando as peculiaridades da situação concreta, em que a condição de inadimplente restou ostensivamente exposta, como haveria, também, tal

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dano in re ipsa, pela mera violação de um direito da personalidade. 7. Recurso espe-cial provido.” (STJ – REsp 1401815 – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – J. 03.12.2013 – DJe 13.12.2013)

Nota: Cuida-se de ação declaratória cumulada com pedido de compensação por da-nos morais, ajuizada por moradora de prédio residencial de luxo no Espírito Santo, em face do condômino edilício, em razão de ter sido impedida de usar o elevador para chegar ao seu apartamento, no oitavo andar, por estar em atraso com as taxas do condomínio.Em razão do atraso, o condomínio alterou a programação dos elevadores para que eles não atendessem mais ao oitavo andar, de modo que a família da deve-dora teve de passar a usar as escadas do edifício. Essa medida teria sido auto-rizada em Assembleia Geral Extraordinária, em razão de regra do condomínio que dispõe que o acesso aos elevadores é cortado após 30 dias de atraso no pagamento das taxas condominiais. Em sua defesa, a moradora alegou que sempre pagou as taxas de condomínio, no valor de quase R$ 3 mil mensais, mas teve dificuldades financeiras que a obrigou a deixar duas taxas em atraso, ocasionando esta “punição desmedida”, que atingiu toda sua família, inclusive crianças, obrigadas a subir de escada até o oitavo andar, causando situação vexatória.A primeira instância julgou improcedente o pedido da devedora, decisão que foi ratificada pelo Tribunal de Justiça de Espírito Santo, nos seguintes termos: “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL – APELAÇÃO CÍVEL – CONDOMÍNIO EDI-LÍCIO – DELIBERAÇÃO DE ASSEMBLÉIA GERAL – TAXA CONDOMINIAL – CONDÔMINO INADIMPLENTE – SANÇÕES – LICITUDE – O art. 1.334, inciso IV, do Código Civil, autoriza a cominação de sanções ao condômino inadimplente com despesas condominiais (taxa de condomínio), ressalvada a necessidade de observância dos princípios da proporcionalidade e razoabili-dade”.Irresignada, a moradora interpôs recurso especial, sustentando que o sistema legal prevê sanções específicas para o inadimplemento das cotas condominiais, quais sejam juros e multa. Aduziu também a possibilidade de execução judicial das despesas em atraso. Ainda, que a desprogramação dos elevadores importa em ofensa à dignidade da pessoa humana e ao princípio da isonomia. Pleiteou danos morais compensatórios.No STJ, a controvérsia cinge-se, em suma, em definir se é possível impor res-trição ao condômino inadimplente quanto à utilização dos elevadores, e, caso verificada a ilegalidade da medida, se a restrição é fato gerador de compensação por danos morais.Em seu voto, a Ministra Nancy Andrighi ilustrou que o art. 1.331 do CC/2002 estabelece que “pode haver, em edificações, partes que são propriedade exclu-siva, e partes que são propriedade comum dos condôminos”. Assim, a manu-

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tenção das partes comuns é responsabilidade de todos os condôminos solidaria-mente, na proporção de suas frações ideais. De acordo com o Código, nos condomínios edilícios, a convenção de condomí-nio, o regimento interno e demais normas instituídas pela assembleia geral são manifestação da autonomia da vontade e, portanto, adquirem força de lei nas dependências do condomínio, podendo sujeitar, inclusive, terceiros que dela não participaram, como, por exemplo, locatários.Contudo, mesmo que as decisões da assembleia sejam imperativas no âmbito do condomínio, essa autonomia não é irrestrita e deve ser exercida nos limites do direito à moradia, do direito de propriedade e de sua função social, todos entrelaçados ao princípio da dignidade da pessoa humana. Considerou a Ministra que a medida adotada pelo condomínio é diversa da hipótese de suspensão de serviços essenciais – como água e luz, por exemplo – por concessionárias de serviço público, tendo em vista que, na última hipótese, trata-se da prestação de serviço público indiretamente pelo Estado, vigorando, portanto, regras de direito público, em que o particular encontra-se em posição de sujeição em face da Administração, o que não prevalece no direito privado, no qual impera a horizontalidade das relações jurídicas.Outrossim, feita essa ressalva, alega a Ministra Relatora que a lei civil prevê con-sequências específicas para inadimplemento das contribuições condominiais, como a imposição de multa e juros de mora ao condômino que não cumprir com seu dever de pagar a contribuição, nos termos no art. 1.336, § 2º, do CC/2002, ou até mesmo a execução forçada – que faculta ao credor ingressar na esfera patrimonial do devedor para obter a quantia em atraso. Nesse contexto, é firme o entendimento do STJ no sentido de que o imóvel, conquanto se trate de bem de família, se sujeita à penhora em execução de dívi-da decorrente do inadimplemento de cotas condominiais. Confira-se: AgRg-Ag 1.164.999/SP, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe 16.10.2009.Por fim, assegura a Ministra que o corte de acesso aos elevadores impede o pró-prio exercício do direito de propriedade, que “mais que um direito do condômi-no, é verdadeiramente uma garantia fundamental”. Igualmente, a medida fere a dignidade da pessoa humana, porque evidencia perante os outros moradores a condição de devedor. A Corte ainda ressaltou que o uso de elevadores, principalmente em edifícios de vários pavimentos, não pode ser considerado mero conforto, mas sim um serviço essencial. Deste modo, a decisão da assembleia do condomínio invia-bilizou a utilização de um serviço essencial em área de propriedade exclusiva, diferentemente do que ocorreria com o corte de acesso a bens e serviços comuns e de caráter supérfluo, como piscina e salão de festas. Tendo concluído pela ilicitude da suspensão do uso dos elevadores, a Relatora sustentou que, apesar de nem todo ilícito ensejar dano moral, no caso concreto a recorrente e seu marido foram submetidos à situação inegavelmente vexatória, violando os seus direitos de personalidade e gerando, consequentemente, dano moral passível de compensação.

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Nos termos da ilustre Ministra: “A violação à imagem da recorrente, mediante a exposição de sua condição de inadimplente à coletividade, é suficiente para gerar um direito a reparação moral”. Destarte, haveria dano moral, tanto do ponto de vista subjetivo, analisando as peculiaridades da situação concreta, como haveria, também, tal dano in re ipsa, pela mera violação de um direito da personalidade.Nessa linha, ensina Anderson Schreiber que “a definição do dano moral como lesão a atributo da personalidade tem a extrema vantagem de se concentrar sobre o objeto atingido (o interesse do lesado), e não sobre as conseqüências emocionais, subjetivas e eventuais da lesão”. (SCHREIBER, Anderson. Direitos da personalidade. São Paulo: Atlas, 2011. p. 17)Forte nessas razões, a 3ª Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, para julgar procedente o pedido, a fim de declarar a ilegalidade da deliberação da Assembleia Geral Extraordinária, vedando, assim, a restrição ao uso dos elevadores em decorrência do inadimplemento de taxas condominiais. Ainda, foi concedida compensação por danos morais, no valor de R$ 10 mil, sobre o qual incidirão correção monetária, a partir da data desta decisão, e juros de mora, contados da data do evento danoso.

DIREITO DE VIzINHANÇA – TESE DE CONSERVAÇÃO DE MARCO

DIVISÓRIO ATRIbUÍDA AOS CONfINANTES – INTERPRETAÇÃO

DO ART. 1.297, § 1º, DO CÓDIGO CIVIL – PRESUNÇÃO RELATIVA

33175 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Negativa de prestação ju-risdicional. Ausência de omissão do acórdão recorrido. Direito de vizinhança. Res-ponsabilidade objetiva. Indenização por danos materiais e morais. Tese de conserva-ção de marco divisório atribuída aos confinantes. Art. 1.297, § 1º, do CPC. Inaplica-bilidade. Presunção relativa. Comprovado nos autos que o muro divisório dos imó-veis estava sob os cuidados dos recorrentes. Incidência da Súmula nº 7/STJ. Decisão agravada mantida. 1. Não se viabiliza o Especial pela indicada ausência de prestação jurisdicional quando, embora rejeitados os embargos de declaração, verifica-se que a matéria em exame foi devidamente enfrentada pelo colegiado de origem, que sobre ela emitiu pronunciamento de forma fundamentada e sem omissões, ainda que em sentido contrário à pretensão do recorrente. A jurisprudência desta Casa é pacífica ao proclamar que, se os fundamentos adotados bastam para justificar o concluído na de-cisão, o julgador não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos utilizados pela parte. 2. No caso concreto, a Corte de origem afastou a aplicação, no caso dos autos, do art. 1.297, § 1º, do Código Civil, pois restou comprovado que o muro divisório dos imóveis dos litigantes, estava sob o cuidado dos recorrentes, consignando, ainda, que a regra insculpida em referido dispositivo legal é meramente relativa, podendo ser

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ilidida por prova em contrário, como ocorreu na espécie. 3. Assim, no caso dos autos, a convicção a que chegou o Tribunal a quo, decorreu da análise do conjunto fático--probatório constante dos autos, sendo vedado nova análise, a teor do que preconiza a Súmula nº 7 deste Superior Tribunal de Justiça: ‘A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial’. 4. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg--AREsp 399.367/ES – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 21.11.2013 – DJe 06.12.2013)

DIREITO DO CONSUMIDOR – CRITÉRIOS PARA A RESPONSAbILIDADE CIVIL DO PROVEDOR

33176 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Direito do consumidor. Provedor. Mensagem de conteúdo ofensivo. Retirada. Registro de número do IP. Dano moral. Ausência. Provimento. 1. Na linha dos precedentes desta Corte, o pro-vedor não responde objetivamente pelo conteúdo inserido pelo usuário em sítio ele-trônico, por não se tratar de risco inerente à sua atividade. Está obrigado, no entanto, a retirar imediatamente o conteúdo moralmente ofensivo, sob pena de responder so-lidariamente com o autor direto do dano. 2. Agravo regimental a que se nega provi-mento.” (STJ – AgRg-AREsp 416.593/RJ – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 21.11.2013 – DJe 09.12.2013)

DIREITO DO CONSUMIDOR – CONTRATO DE COMPRA DE IMÓVEL

– DESfAzIMENTO – NECESSIDADE DE IMEDIATA RESTITUIÇÃO DAS PARCELAS PAgAS PELO PROMITENTE COMPRADOR

33177 – “Recurso especial representativo de controvérsia. Art. 543-C do CPC. Di-reito do consumidor. Contrato de compra de imóvel. Desfazimento. Devolução de parte do valor pago. Momento. 1. Para efeitos do art. 543-C do CPC: em contratos submetidos ao Código de Defesa do Consumidor, é abusiva a cláusula contratual que determina a restituição dos valores devidos somente ao término da obra ou de forma parcelada, na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e ven-da de imóvel, por culpa de quaisquer contratantes. Em tais avenças, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador – integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento. 2. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1300418/SC – 2ª S. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 13.11.2013 – DJe 10.12.2013)

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DIREITO DO CONSUMIDOR – INDENIzAÇÃO POR DANOS

MORAIS E MATERIAIS – ENTREgA DE VESTIDO DE NOIVA

DEfEITUOSO – NATUREzA – bEM DURáVEL – PRAzO

DECADENCIAL – NOVENTA DIAS

33178 – “Recurso especial. Direito do consumidor. Indenização por danos morais e materiais. Entrega de vestido de noiva defeituoso. Natureza. Bem durável. Art. 26, inciso I, do Código de Defesa do Consumidor. Prazo decadencial de noventa dias. 1. A garantia legal de adequação de produtos e serviços é direito potestativo do con-sumidor, assegurado em lei de ordem pública (arts. 1º, 24 e 25 do Código de Defesa do Consumidor). 2. A facilidade de constatação do vício e a durabilidade ou não do produto ou serviço são os critérios adotados no Código de Defesa do Consumidor para a fixação do prazo decadencial de reclamação de vícios aparentes ou de fácil constatação em produtos ou serviços. 3. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca 30 (trinta), em se tratando de produto não durável, e em 90 (noventa) dias, em se tratando de produto durável (art. 26, incisos I e II, do CDC). 4. O início da contagem do prazo para os vícios aparentes ou de fácil consta-tação é a entrega efetiva do produto (tradição) ou, no caso de serviços, o término da sua execução (art. 26, § 1º, do CDC), pois a constatação da inadequação é verificável de plano a partir de um exame superficial pelo ‘consumidor médio’. 5. A decadência é obstada pela reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca (art. 26, § 2º, inciso I, do CDC), o que ocorreu no caso concreto. 6. O vestuário representa produto durável por natureza, porque não se exaure no primeiro uso ou em pouco tempo após a aquisição, levando certo tempo para se desgastar, mormente quando classificado como artigo de luxo, a exemplo do vestido de noiva, que não tem uma razão efêmera. 7. O bem durável é aquele fabri-cado para servir durante determinado transcurso temporal, que variará conforme a qualidade da mercadoria, os cuidados que lhe são emprestados pelo usuário, o grau de utilização e o meio ambiente no qual inserido. Por outro lado, os produtos ‘não duráveis’ extinguem-se em um único ato de consumo, porquanto imediato o seu des-gaste. 8. Recurso provido para afastar a decadência, impondo-se o retorno dos autos à instância de origem para a análise do mérito do pedido como entender de direito.” (STJ – REsp 1161941 – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – J. 05.11.2013 – DJe 14.11.2013)

DIREITO EMPRESARIAL – CRÉDITOS DECORRENTES DE ARRENDAMENTO

MERCANTIL OU COM gARANTIA

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fIDUCIáRIA – NÃO SUbMISSÃO à RECUPERAÇÃO JUDICIAL

33179 – “Agravo regimental em recurso especial. Direito empresarial. Recuperação judicial. Créditos resultantes de arrendamento mercantil e com garantia fiduciária. Não submissão à recuperação. 1. Interpretando o art. 49, § 3º, da Lei nº 11.101/2005, a jurisprudência entende que os créditos decorrentes de arrendamento mercantil ou com garantia fiduciária – inclusive os resultantes de cessão fiduciária – não se su-jeitam aos efeitos da recuperação judicial. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1181533/MT – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 05.12.2013 – DJe 10.12.2013)

DIREITO SUCESSÓRIO – DIREITO INTERTEMPORAL – LEI VIgENTE

à DATA DO ÓbITO – DIREITOS DA COMPANHEIRA SObREVIVENTE

33180 – “Direito das sucessões. Recurso especial. Sucessão aberta anteriormente à vigência do Código Civil de 2002. Companheira sobrevivente. Direito real de habi-tação não reconhecido no caso concreto. 1. Em matéria de direito sucessório, a lei de regência é aquela referente a data do óbito. Assim, é de se aplicar ao caso a Lei nº 9.278/1996, uma vez que o Código Civil ainda não havia entrado em vigor quando do falecimento do companheiro da autora, ocorrido em 19.10.2002. 2. Não há direito real de habitação se o imóvel no qual os companheiros residiam era propriedade conjunta do falecido e de mais doze irmãos. 3. O direito real à habitação limita os direitos de propriedade, porém, quem deve suportar tal limitação são os herdeiros do de cujus, e não quem já era proprietário do imóvel antes do óbito e havia permitido sua utilização a título de comodato. 4. Recurso especial não provido.” (STJ – REsp 1.212.121/RJ – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 03.12.2013 – DJe 18.12.2013)

Nota: Trata-se de discussão acerca da possibilidade ou não de companheira ter direito real de habitação sobre imóvel em copropriedade, com irmãos do de cujus, que o haviam emprestado gratuitamente para uso (comodato).Conforme os dados fáticos da causa, o apartamento pertencia inicialmente ao irmão pré-morto do finado companheiro, não tendo nenhum dos dois deixado filhos ou pais vivos. Logo, o casal vivia em comodato, pois o imóvel passou a pertencer conjuntamente aos irmãos do falecido, em razão de direitos hereditá-rios. Esclarece-se que, na falta de descendentes, ascendentes e cônjuge sobrevi-vente, são chamados a suceder os colaterais até terceiro grau, sendo que os mais próximos excluem os mais remotos, razão pela qual o imóvel passou aos irmãos daquele pré-morto.Sabe-se que, pelo princípio da saisine (art. 1.784 do CC/2002), opera-se a trans-missão imediata do patrimônio do de cujus para os demais herdeiros. De tal

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modo, no momento do falecimento do irmão do de cujus, o imóvel objeto da controvérsia passou a pertencer a uma pluralidade de pessoas, em condomínio.Após a morte do seu companheiro, inconformada com a atitude dos irmãos des-te de compeli-la a abandonar o imóvel, a mulher moveu então ação possessória contra os referidos irmãos objetivando a manutenção na posse do apartamento.Inicialmente, o juízo da vara cível do Rio de Janeiro entendeu que não cabia discussão acerca da posse, mas sim sobre a existência ou não de união estável e de direito real de habitação da companheira. À vista disso, declinou da compe-tência para uma das varas de família. O juízo da vara de família julgou procedente o pedido para declarar a união es-tável entre o casal, de 1999 a 2002 (data do falecimento do companheiro), e para reconhecer o direito real de habitação à autora sobre o bem imóvel.Todavia, em grau de apelação, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro reformou a sentença para afastar o direito à permanência da autora no imóvel nos seguin-tes termos: “CIVIL – DIREITO REAL DE HABITAÇÃO – COMPANHEIRA SUPÉRSTITE – Possibilidade, desde que o imóvel não esteja em condomínio com terceiros, não beneficiários da herança do finado convivente. Apelo provido.”Irresignada, a companheira interpôs recurso especial sustentando que o direito real de habitação independe da existência ou não do direito sucessório sobre o imóvel. Em seu voto, o ilustre Ministro Relator Luiz Felipe Salomão, explicou que com o advento da Lei nº 9278 de 10.05.1996, art. 7º, parágrafo único, previu-se expres-samente o direito real de habitação também aos companheiros, consagrando a concepção constitucional de união estável como entidade familiar (art. 226, § 3º, CF). Salientou que “dissolvida a união estável por morte de um dos conviven-tes, o sobrevivente terá direito real de habitação, enquanto viver ou não consti-tuir nova união ou casamento, relativamente ao imóvel destinado à residência da família”. Considerando-se que, em matéria de direito sucessório, se aplica a lei sob cuja égide ocorreu o óbito e a transmissão da herança, tendo o companheiro falecido em 19.10.2012, a controvérsia deveria ser solucionada à luz da Lei nº 9.278/1996.No entanto, o presente caso continha uma peculiaridade: o bem sobre o qual a autora pretende exercer o direito real de habitação pertencia a treze proprie-tários, de modo que ao companheiro falecido cabia apenas 1/13 sobre o bem imóvel. Nesse sentido, destacou o voto que o parágrafo único do art. 7º da Lei nº 9.278, ao utilizar os termos “relativamente ao imóvel destinado à residência da família”, não teve o condão de conceder à companheira direito real de habi-tação em bens de terceiros. Segundo o Relator, o dispositivo deve ser interpretado em conjunto com o con-teúdo sobre direito real de habitação existente quando de sua criação, ou seja, o previsto no art. 1.611 e parágrafos do Código Civil de 1916, que reza: “A falta de descendentes ou ascendentes será deferida a sucessão ao cônjuge sobrevivente

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se, ao tempo da morte do outro, não estava dissolvida a sociedade conjugal; § 1º O cônjuge viúvo se o regime de bens do casamento não era o da comunhão universal, terá direito, enquanto durar a viuvez, ao usufruto da quarta parte dos bens do cônjuge falecido, se houver filho deste ou do casal, e à metade se não houver filhos embora sobrevivam ascendentes do de cujus; § 2º Ao cônjuge sobrevivente, casado sob o regime da comunhão universal, enquanto viver e permanecer viúvo será assegurado, sem prejuízo da participação que lhe caiba na herança, o direito real de habilitação relativamente ao imóvel destinado à re-sidência da família, desde que seja o único bem daquela natureza a inventariar”.Com base nesse quadro normativo, o Ministro Relator concluiu que “não é crí-vel presumir que o silêncio da lei poderia levar o reconhecimento de direito real de habitação sob imóvel do locador, por exemplo, um terceiro absolutamente estranho à relação jurídica subjacente”.Na mesma linha de pensamento, a professora Maria Berenice Dias destaca que “o direito de habitação só existe sobre bem que pertence ao de cujos. Se o casal residia em imóvel de outrem, não é possível assegurar a permanência do sobre-vivente. A hipótese mais comum é quando o casal constrói sua residência em terreno que pertencia aos pais de um deles” (DIAS, Maria Berenice. Manual das sucessões. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 65).Dessa forma, o direito real à habitação limita os direitos de propriedade, porém, quem deve suportar tal limitação são os herdeiros do de cujus, e não quem já era proprietário do imóvel antes do óbito, como é o caso em tela em que os irmãos do falecido companheiro permitiram a utilização do imóvel pelo casal a título de comodato.Por fim, o Relator considerou que a companheira não poderia obter mais direi-tos do que os previstos atualmente para o cônjuge, sob pena de infringência ao princípio da isonomia previsto na Constituição Federal.Diante do exposto, a 4ª Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

EXECUÇÃO – EMbARgOS DO DEVEDOR – TÍTULO EXECUTIVO

JUDICIAL – ALTERAÇÃO DE CRITÉRIOS DE CáLCULO

– COISA JULgADA

33181 – “Direito processual civil. Execução. Embargos do devedor. Título executivo judicial. Alteração de critérios. Coisa julgada. Honorários advocatícios. Valor exa-gerado ou irrisório. Não configurado. Fixação. Art. 20, § 4º, do CPC. 1. Embargos do devedor opostos na origem em 15.12.2000, do qual foram extraídos os presentes recursos especiais, conclusos ao Gabinete em 04.02.2013. 2. Discute-se a possibilida-de de revisão do título judicial executado, por alegado erro de cálculo na fixação da condenação, e, de outro lado, a adequação dos honorários advocatícios fixados nos

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presentes embargos. 3. Transitado em julgado o título judicial, todas as matérias de-duzidas e dedutíveis tornam-se juridicamente desimportantes, não sendo possível te-cer considerações acerca da justiça da decisão. 4. Os critérios de cálculo utilizados em elaboração de laudo pericial não se confundem com mero cálculo aritmético, ficando, portanto, acobertados pela imutabilidade da decisão. 5. Nos embargos à execução, os honorários advocatícios devem ser fixados equitativamente pelo juiz, na forma do art. 20, § 4º, do CPC, não ficando adstritos aos parâmetros do mencionado § 3º, podendo situar-se acima ou abaixo do intervalo de 10% a 20%. 6. De regra, o arbitra-mento de honorários advocatícios escapa ao controle do STJ, admitindo-se a interven-ção somente nos casos de manifesto exagero ou irrisoriedade que ofenda os limites do razoável. 7. Recursos especiais não providos.” (STJ – REsp 1366918/SP – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

INADIMPLEMENTO CONTRATUAL – CLáUSULA PENAL –

NATUREzA COMPENSATÓRIA – CUMULAÇÃO COM PERDAS E

DANOS – IMPOSSIbILIDADE

33182 – “Agravo interno em agravo de instrumento. Civil. Inadimplemento contra-tual. Cláusula penal. Natureza compensatória. Cumulação com perdas e danos. Im-possibilidade. Agravo desprovido. 1. É inviável a cumulação da multa compensatória com o cumprimento da obrigação principal, uma vez que se trata de uma faculdade disjuntiva, podendo o credor exigir a cláusula penal ou as perdas e danos, mas não ambas, conforme o art. 401 do Código Civil. 2. A jurisprudência desta Corte de Justiça tem admitido tal cumulação somente quando a cláusula penal tiver natureza mora-tória, e não compensatória (REsp 1.355.554/RJ, 3ª Turma, Rel. Min. Sidnei Beneti, DJe de 04.02.2013), o que, no entanto, não se verifica na hipótese dos autos. 3. Agravo interno a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag 741.776/MS – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – J. 07.11.2013 – DJe 11.12.2013)

INSCRIÇÃO INDEVIDA – CADASTROS DE PROTEÇÃO

AO CRÉDITO – DANO MORAL – ATÉ 50 sALÁRIOs-MíNIMOs

– RAzOAbILIDADE

33183 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Dano moral. Inscrição indevida. Razoabilidade do montante indenizatório. Súmula nº 7/STJ. Recurso não provido. 1. O Tribunal de origem, apreciando as peculiaridades fáticas da causa, jul-gou procedente o pedido de indenização por dano moral deduzido em desfavor do agravante, haja vista a inscrição indevida do nome da agravada nos cadastros de

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proteção ao crédito. A orientação pacificada no Superior Tribunal de Justiça é de que o valor estabelecido pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais pode ser revisto tão somente nas hipóteses em que a condenação se reve-lar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se evidencia no presente caso. 3. Esta Corte firmou entendimento de que, em casos de indenização por danos morais, decorrentes de inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito, é razoável a condenação em até 50 (cinquenta) salários-mínimos (da época do evento). 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg--AREsp 310.148/RJ – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – J. 12.11.2013 – DJe 11.12.2013)

INTERESSE DE AgIR – PROPOSITURA DE AÇÃO DE

EXIbIÇÃO DE DOCUMENTOS – CORRENTISTA CONTRA O bANCO

– DESNECESSIDADE DE PEDIDO NO ÂMbITO ADMINISTRATIVO

33184 – “Agravo regimental no agravo (544 do CPC). Medida cautelar de exibição de documento. Decisão monocrática que negou provimento ao recurso. Insurgência da casa bancária. 1. Esta Corte firmou entendimento quanto à existência de interesse de agir na propositura de ação de exibição de documentos de correntista contra o ban-co, independentemente do pedido no âmbito administrativo. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AREsp 341.610/SP – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – J. 07.11.2013 – DJe 06.12.2013)

INVENTáRIO – SENTENÇA HOMOLOgATÓRIA DE PARTILHA

– AÇÃO ANULATÓRIA EM fACE DAQUELES QUE PARTICIPARAM

DA PARTILHA – CAbIMENTO

33185 – “Civil e processo civil. Inventário. Sentença homologatória de partilha. Des-constituição. Ação anulatória. Cabimento. Legitimidade passiva de quem participou da partilha. Artigos analisados: 486, 1.030 e 12, V, CPC. 1. Ação anulatória de partilha distribuída em 06.08.2002, da qual foi extraído o presente recurso especial, concluso ao Gabinete em 15.04.2013. 2. Discute-se a ação adequada para desconstituir a partilha homologada por sentença nos autos do inventário, assim como a legitimidade dos herdeiros para figurar no polo passivo. 3. A análise da ação adequada à invalidação da partilha tem por pressuposto a análise do conteúdo e dos limites da sentença proferida nos autos do inventário: se homologada, simplesmente, a partilha, mesmo que para aprovar o plano apresentado pelo inventariante, mas desde que ausente litigiosidade, deve-se ajuizar a ação anulatória; se, ao revés, na sentença forem resolvidas questões

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suscitadas pelos interessados quanto à divisão de bens e/ou à admissão de herdeiros, cabível é a ação rescisória. 4. Na espécie, a invalidação pretendida na ação anulatória é do ato homologado e não da sentença homologatória, porquanto ficou demonstrado nos autos que, ao elaborar as primeiras declarações e o esboço de partilha, a inventa-riante (recorrente), intencionalmente, omitiu a condição de meeira da então compa-nheira do falecido, embora a tenha indicado na petição inicial do inventário, preterin-do, assim, o seu direito à meação. 5. Transitada em julgado a sentença que homologou a partilha, cessa o condomínio hereditário e os sucessores passam a exercer, exclusiva e plenamente, a propriedade dos bens e direitos que compõem o seu quinhão, nos ter-mos do art. 2.023 do CC/2002. Não há mais falar em espólio, sequer em representação em juízo pelo inventariante, de tal forma que a ação anulatória deve ser proposta em face daqueles que participaram da partilha; na espécie, a filha (recorrente) e a ex-mu-lher do falecido. 6. Recurso especial conhecido e desprovido.” (STJ – REsp 1238684/SC – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – J. 03.12.2013 – DJe 12.12.2013)

leAsIng – AÇÃO DE REINTEgRAÇÃO POSSE – DEVOLUÇÃO DO VALOR

RESIDUAL gARANTIDO (VRg) PAgO ANTECIPADAMENTE – JULgAMENTO eXTrA PeTITA

– NÃO CONfIgURAÇÃO

33186 – “Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação de reintegração posse. Devolução VRG. Violação dos arts. 128 e 460 do CPC. Súmula nº 7/STJ. Súmula nº 83/STJ. Decisão mantida. 1. O recurso especial não é instrumento apropria-do para rever a questão da alegação de julgamento extra petita, se para tanto é necessá-rio a revisão do conjunto fático-probatório dos autos. Incidência da Súmula nº 7/STJ. 2. O acórdão que determina a devolução do valor residual garantido, pago antecipa-damente, não extrapola os limites ação de reintegração de posse, não se constituindo como julgamento extra petita, já que é entendido como consequência de tal reintegração. Precedente. Súmula nº 83/STJ. 3. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 401.872/DF – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013)

NÃO APRESENTAÇÃO DO COMPROVANTE DE PAgAMENTO

DAS CUSTAS JUDICIAIS – MOMENTO DA INTERPOSIÇÃO – CONCESSÃO

DE PRAzO PARA REgULARIzAÇÃO – IMPOSSIbILIDADE

33187 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Não apresentação do comprovante de pagamento das custas judiciais. Momento da interposição. Recurso

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especial. Art. 511 do CPC. Incidência da Súmula nº 187 do STJ. Deserção. Concessão de prazo para o recolhimento. Impossibilidade. Precedentes. 1. O art. 7º da Resolução nº 4/2013 do Superior Tribunal de Justiça, vigente à época da interposição deste ape-lo, determina que os valores constantes da tabela de pagamento das custas judiciais devem ser recolhidos mediante preenchimento da Guia de Recolhimento da União – GRU, com o Código de Recolhimento nº 18832-8. 2. Só se concede prazo para re-gularização do preparo nas hipóteses de recolhimento insuficiente, e não, como nos autos, quando não houver sido recolhida a totalidade do valor relativo às custas judi-ciais exigidas. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp 390.976/MG – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – J. 22.10.2013 – DJe 06.12.2013)

PLANO DE sAÚDE – AÇÃO REVISIONAL – PRAzO

PRESCRICIONAL DECENAL

33188 – “Agravo regimental em recurso especial. Plano de saúde. Ação revisional de cláusula contratual abusiva. Prazo prescricional decenal. 1. Em se tratando de ação objetivando a declaração de abusividade de cláusula contratual que prevê o aumento das mensalidades, não havendo previsão específica quanto ao prazo prescricional, incide o prazo geral de 10 (dez) anos, previsto no art. 205 do Código Civil. 2. Agra-vo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1416799/RJ – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

PLANO DE sAÚDE – RECUsA INDEVIDA DE CObERTURA

RELATIVA A MEDICAMENTOS DE QUIMIOTERAPIA – DANO

MORAL CARACTERIzADO

33189 – “Direito civil e processual civil. Recurso especial. Ação de indenização por danos materiais e compensação por danos morais. Plano de saúde. Exclusão de co-bertura relativa a medicamentos de quimioterapia. Abusividade. Dano moral. Arti-gos analisados: art. 186 do Código Civil; art. 14 do CDC. 1. Recurso especial, concluso ao Gabinete em 03.10.2013, no qual discute o cabimento de compensação por danos morais em razão do não reembolso integral do valor de medicamentos referente a tra-tamento de saúde (quimioterapia). Ação cominatória c/c reparação por danos mate-riais e compensação por danos morais ajuizada em 12.05.2011. 2. Embora geralmente o mero inadimplemento contratual não seja causa para ocorrência de danos morais, é reconhecido o direito à compensação dos danos morais advindos da injusta recusa de cobertura de seguro saúde, pois tal fato agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do segurado, uma vez que, ao pedir a autorização da segurado-ra, já se encontra em condição de dor, de abalo psicológico e com a saúde debilitada.

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3. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1411293/SP – 3ª T. – Relª Min. Nancy Andrighi – J. 03.12.2013 – DJe 12.12.2013)

PREVIDÊNCIA PRIVADA – CObRANÇA DE PARCELAS

DE COMPLEMENTAÇÃO DE APOSENTADORIA E RESTITUIÇÃO

DE VALORES – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – sÚMULA Nº 291/sTJ

33190 – “Agravo regimental no recurso especial. Previdência privada. Reserva de poupança. Resgate. Prescrição quinquenal. Súmula nº 291/STJ. Improvimento. 1. Consoante decidiu a col. 2ª Seção, no julgamento do REsp 1.111.973/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti – selecionado como representativo da controvérsia (CPC, art. 543-C, § 1º, e Resolução nº 8/2008/STJ) –, a prescrição quinquenal prevista na Súmula nº 291/STJ incide não apenas na cobrança de parcelas de complementação de apo-sentadoria, mas, também, por aplicação analógica, na pretensão a restituição de con-tribuição (reserva de poupança) ou diferenças de correção monetária incidentes so-bre restituição da reserva de poupança, cujo termo inicial é a data em que houver a devolução a menor das contribuições pessoais recolhidas ao plano previdenciário. 2. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1403969/MG – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

PRISÃO CIVIL – DÉbITO ALIMENTAR – hABeAs CorPus – IMPOSSIbILIDADE DE DILAÇÃO

PRObATÓRIA – ORDEM DENEgADA

33191 – “Processual civil. Habeas corpus. Prisão civil. Inadimplência do débito ali-mentar. Incidência da Súmula nº 309/STJ. Regularidade da ordem de prisão. Impos-sibilidade de cumprimento da obrigação. Inobservância do binômio necessidade/possibilidade. Alegação. Análise. Dilação probatória. Inviabilidade no writ. Ordem denegada. 1. O débito recente, para fins de aplicação do art. 733 do CPC, compre-ende as prestações vencidas nos três meses anteriores à propositura da execução, incluídas as que se vencerem no decorrer do referido processo, conforme dispõe a Súmula nº 309/STJ. 2. Diante da impossibilidade de dilação probatória no âmbito do habeas corpus, não há como analisar o argumento relativo à eventual dificuldade para o adimplemento da obrigação pelo encerramento das atividades da sociedade empre-sária da qual o alimentante é sócio, nem a alegação de inobservância do binômio ne-cessidade/possibilidade na fixação do encargo, devendo ser discutidas tais questões

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nos autos da ação revisional de alimentos. 3. Ordem denegada e liminar cassada.” (STJ – HC 260.017/SP – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – J. 03.12.2013 – DJe 12.12.2013)

PROCESSO CIVIL – AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTO DE MULTA DO ART.

538, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC – IMPEDIMENTO DO CONHECIMENTO

DE RECURSO SUbSEQUENTE

33192 – “Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC). Ausência de recolhimento da multa de 5% sobre o valor da causa imposta pelo Tribunal a quo nos segundos em-bargos de declaração. Art. 535, parágrafo único, do CPC. Recurso não provido. 1. O não recolhimento da multa aplicada com fulcro no art. 538, parágrafo único, do CPC, impede o conhecimento de qualquer outro recurso subsequente, inclusive de natu-reza especial, por se tratar de pressuposto objetivo de admissibilidade. Precedentes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp 219.954/SP – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – J. 26.11.2013 – DJe 10.12.2013)

PROCESSUAL CIVIL, EfICáCIA PRECLUSIVA DO JULgADO –

INVIAbILIDADE DE RENOVAR MATÉRIA CONCERNENTE à

fASE DE COgNIÇÃO DURANTE O CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

33193 – “Agravo regimental. Ação de cobrança. Cumprimento de sentença. Realiza-ção de perícia grafotécnica. Pleito concernente à fase cognitiva. Descabimento. 1. A eficácia preclusiva do julgado impede que a parte renove, na fase de cumprimento de sentença, matéria atinente ao processo de conhecimento (REsp 482.079/RS, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJ 16.02.2004). 2. Entendimento que se reforça, no caso, pela afirmação feita no voto vogal no sentido de que os ora agravantes ‘pretendem rediscutir na fase de cumprimento de sentença, questão processual já decidida na fase de conhecimento, momento em que foi rechaçada a produção da prova pericial grafotécnica’, o que torna irrelevante o fato de a sentença ainda não ter transitado em julgado. 3. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 395.207/MS – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

PROCESSUAL CIVIL – PRINCÍPIO DA IDENTIDADE fÍSICA DO

JUIz – MAgISTRADO QUE

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PROCEDEU à COLHEITA DE PROVAS CONVOCADO PELA

PRESIDÊNCIA DO TRIbUNAL – fEITO SENTENCIADO POR JUIz SUbSTITUTO – REgULARIDADE

33194 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Apelação. Acidente de trânsito. Danos materiais e morais. Magistrado titular que procedeu à colheita de pro-vas convocado pela presidência do Tribunal no momento da prolação da sentença, razão pela qual o feito foi sentenciado por juiz substituto. Vulneração ao princípio da identidade física do juiz. Inocorrência. Alegação de cerceamento de defesa. Incidên-cia da Súmula nº 7/STJ. Danos materiais devidos aos pais do menor vítima de aciden-te. Alegação de inocorrência de culpa e inexistência de nexo de causalidade. Reexame de provas. Incidência do Enunciado Sumular nº 7 deste Superior Tribunal de Justiça. Decisão agravada mantida. 1. Não há ofensa ao princípio da identidade física do juiz quando o magistrado titular, que procedeu à colheita das provas, encontrava-se con-vocado pela Presidência do Tribunal de origem no momento da prolação da sentença, razão pela qual o feito foi sentenciado pelo Magistrado substituto. 2. ‘Com relação à tese de cerceamento de defesa, a necessidade ou não de produzir provas no curso da instrução é da exclusiva e soberana discricionariedade das instâncias ordinárias, com apoio no acervo probatório, esbarrando, portanto, a questão federal (art. 330, I, do CPC), neste particular, no óbice da Súmula nº 7/STJ’ (AgRg-REsp 853.943/CE, Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ 03.12.2007). 3. ‘A morte de menor em acidente, mes-mo que à data do óbito ainda não exercesse atividade laboral remunerada ou não con-tribuísse com a composição da renda familiar, autoriza os pais, quando de baixa renda, a pedir ao responsável pelo sinistro a reparação por danos materiais, aqueles resul-tantes do auxílio que, futuramente, o filho poderia prestar-lhes’ (REsp 1044527/MG, Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 01.03.2012). 4. No caso concreto, a adoção de enten-dimento diverso quanto à culpa e nexo de causalidade do acidente, demandaria ree-xame do acervo fático-probatório dos autos, vedado pelo teor da Súmula nº 7/STJ. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp 399.412/MS – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013)

RECURSO ESPECIAL – PREQUESTIONAMENTO

– CONfIgURAÇÃO

33195 – “Agravo regimental. Recurso especial. Ausência de prequestionamento. Configuração do prequestionamento. Voto-condutor recorrido. 1. ‘Para configurar--se a existência do prequestionamento não basta que o recorrente devolva a questão controvertida para o tribunal, sendo necessário que a causa tenha sido decidida à luz da legislação federal indicada, bem como seja exercido juízo de valor dos dispositi-vos legais, interpretando-se a sua aplicação ou não ao caso concreto. Nesse diapasão,

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também não é suficiente a simples menção da norma considerada violada, seja no relatório ou no voto condutor, sem que se atenda aos requisitos adrede menciona-dos’ (AGA 348.942/RS, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª Turma, Julgado em 16.04.2001, DJ 13.08.2001, p. 139). 2. ‘Para que se configure o prequestionamento é necessário que os dispositivos legais ou a matéria jurídica a eles relacionada tenham sido deba-tidos no voto-condutor recorrido’ (AgRg-Ag 440.126/RJ, Rel. Min. José Delgado). 3. Agravo improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1417431/SC – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013)

RECURSO INTERPOSTO POR ADVOgADO SEM PODERES NOs AUTOs – sÚMULA Nº

115/STJ – INEXISTÊNCIA

33196 – “Agravo regimental no agravo em recurso especial. Procuração. Ausência da cadeia de substabelecimento. Incidência da Súmula nº 115/STJ. Improvimento. 1. Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procu-ração nos autos (Súmula nº 115/STJ). 2. Se a procuração outorgada pela parte não consta dos autos dos embargos, mas apenas dos autos da execução, compete ao re-corrente, quando da interposição do recurso, providenciar o traslado daquele instru-mento ou juntar nova procuração. Hipótese em que, permanecendo os autos da exe-cução na instância originária, a cópia da procuração deixou ser trasladada aos autos dos respectivos embargos, impedindo na instância especial o exame da regularida-de da representação processual (AgRg-AREsp 369232/RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, 1ª Turma, DJe 25.09.2013). 3. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-AREsp 401.115/SP – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 10.12.2013)

RELAÇÃO DE CONSUMO – PESSOA JURÍDICA E INSTITUIÇÃO

fINANCEIRA – TEORIA MAXIMALISTA – PRESCRIÇÃO

– MOVIMENTAÇÕES NÃO AUTORIzADAS – VALOR

DA INDENIzAÇÃO

33197 – “Reparação de danos morais e materiais. Relação de consumo. Prescrição. Pessoa jurídica e instituição financeira. Movimentações não autorizadas. Valor da indenização. 1. É de consumo a relação travada entre pessoa jurídica e instituição financeira, devendo ser aplicado o Código respectivo a partir da teoria maximalista, que impõe a aplicação da Lei nº 8.078/1990 com base no reconhecimento da vulne-rabilidade do consumidor, pessoa física ou jurídica, no mercado de consumo; 2 Nos

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termos do art. 27 do CDC prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos da-nos causados por fato do produto ou do serviço; 3 Não há que se falar em contratação tácita ou anuência com a realização de descontos não autorizados previamente. Os fornecedores de serviços não podem impor aos consumidores a contratação, de modo que se o consumidor não reclamar, presume-se aceito o serviço ou produto. Trata-se de abordagem agressiva e abusiva, não podendo ser aceita ainda que se sustente que a empresa não é consumidora, pois a prática afronta a própria boa-fé objetiva. Dei-xando o banco de apresentar qualquer prova da existência prévia de contratação que autorizasse a realização dos descontos, deixou, em verdade, de cumprir o ônus im-posto pelo art. 333 do Código de Processo Civil; 4 Ausência de negativação indevida, havendo apenas a retirada mensal, da conta bancária da pessoa jurídica, de cerca de R$ 5.000,00 de forma não autorizada, fato que evidentemente lhe causou transtornos e obstáculo à livre administração de seu patrimônio. Tal fato deve ser indenizado. Contudo, o valor arbitrado pelo Magistrado a quo, de R$ 50.000,00, ultrapassa os limi-tes do razoável. Não se nega que a postura do banco é repreensível e descabida, com-portando punição, reparando-se o dano causado. Mas o valor fixado para que tais finalidades sejam atingidas mostrou-se desproporcional. Diante disso, a indenização pretendida deve ser mantida, mas reduzido seu valor para quantia equivalente a R$ 20.000,00 (vinte mil reais), suficiente para reparar os danos causados e impingir ao banco o dever de aprimorar a prestação de seus serviços. Recurso provido em parte, apenas para reduzir o valor da indenização por danos morais.” (TJSP – AC 9231169-87.2008.8.26.0000 – 20ª CDPriv. – Relª Desª Maria Lúcia Pizzotti – J. 16.12.2013 – DJe 07.01.2014)

RESPONSAbILIDADE CIVIL – AMbULÂNCIA – ACIDENTE

DE TRÂNSITO – OITIVA COMO INfORMANTE – VALOR

PRObANTE – CULPA MANIfESTA – DEVER DE INDENIzAR

33198 – “Responsabilidade civil. Ação indenizatória. Agravo retido. Acidente de trânsito. Motorista da ambulância causador do acidente. Oitiva como informante. Valor probante. Culpa manifesta. Dever de indenizar. A oitiva como informante não traduz desconsideração das informações prestadas em juízo ou que não possa o Ma-gistrado se utilizar destas para firmar sua convicção O fato de a viatura estar com o giroflex e a sirene ligados não autoriza seu condutor a trafegar livremente pelas ruas, sem atentar para as mínimas regras de segurança, indispensáveis à ordem e ao bom fluxo do trânsito. Culpa manifesta do condutor da ambulância que deixou de ado-tar as necessárias cautelas para a manobra.” (TJMG – AC 1.0024.11.223493-5/001 – 9ª C.Cív. – Rel. Des. Amorim Siqueira – J. 17.12.2013 – DJe 07.01.2014)

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RESPONSAbILIDADE CIVIL – DESCONTOS INDEVIDOS NA fOLHA

DE PAgAMENTO – REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO – MÁ-FÉ

CARACTERIzADA – POSSIbILIDADE – DANO MORAL DEVIDO

33199 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Dano moral. Emprésti-mos. Descontos indevidos sobre a folha de pagamento do agravado. Má-fé. Repe-tição do indébito em dobro. Conclusão do colegiado estadual firmada com base na análise dos elementos fáticos-probatórios. Revisão obstada pela Súmula nº 7/STJ. Inscrição desabonadora do nome do agravado. Responsabilidade do agravante pelo dano moral. Incidência da Súmula nº 7/STJ. Quantum indenizatório fixado com ra-zoabilidade. Revisão obstada em sede de recurso especial.redimensionamento dos ônus sucumbenciais. Incidência da Súmula nº 7/STJ. 1. Conforme assentado na ju-risprudência desta Corte, a repetição será em dobro quando existir má-fé do credor. A revisão do acórdão recorrido, que concluiu pela má-fé do agravante, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório delineado nos autos, providência inviável em âmbito de recurso especial, incidindo o óbice da Súmula nº 7 deste Tribunal. 2. A revisão do acórdão recorrido, que concluiu pela prática de ato ilícito praticado pelo agravante que ensejou a inscrição do nome do agravado em órgão de proteção ao crédito, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório delineado nos autos, providência inviável em âmbito de recurso especial, incidindo o óbice da Súmula nº 7 deste Tribunal. 3. A intervenção do STJ, Corte de caráter nacional, destinada a firmar interpretação geral do Direito Federal para todo o País e não para a revisão de ques-tões de interesse individual, no caso de questionamento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível quando o valor fixado pelo Tribunal de origem, cum-prindo o duplo grau de jurisdição, se mostre teratológico, por irrisório ou abusivo. 4. Inocorrência de teratologia no caso concreto, em que, para a inscrição indevida do nome do agravado, foi fixado, em 17.01.2011, a indenização no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de dano moral. 5. A jurisprudência desta Corte já decidiu que ‘a apreciação do quantitativo em que autor e réu saíram vencidos na demanda, bem como a verificação da existência de sucumbência mínima ou recíproca, encontram inequívoco óbice na Súmula nº 7/STJ, por revolver matéria eminentemente fática’ (AgRg-EDcl-REsp 757.825/RS, Relª Min. Denise Arruda, DJe 02.04.2009). 6. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 406.086/DF – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 21.11.2013 – DJe 06.12.2013)

RESPONSAbILIDADE CIVIL – fALHA NA PRESTAÇÃO DE

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SERVIÇO bANCáRIO – APLICAÇÃO DA sÚMULA Nº 479/sTJ

33200 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Responsabilidade civil. Fa-lha na prestação de serviço bancário. Danos morais. Reexame do conjunto fático-pro-batório. Quantum indenizatório. Razoabilidade. Impossibilidade. Súmula nº 7/STJ. Decisão agravada mantida. Improvimento. 1. A convicção a que chegou o Tribunal a quo quanto à existência de dano moral indenizável, decorreu da análise das circuns-tâncias fáticas peculiares à causa, cujo reexame é vedado em âmbito de recurso espe-cial, a teor do Enunciado nº 7 da Súmula desta Corte. 2. Com a edição da Súmula nº 479 deste Tribunal, a 2ª Seção desta Corte pacificou entendimento no sentido de que as instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. 3. A intervenção do STJ, Corte de caráter nacional, destinada a firmar inter-pretação geral do Direito Federal para todo o País e não para a revisão de questões de interesse individual, no caso de questionamento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível quando o valor fixado pelo Tribunal de origem, cumprindo o duplo grau de jurisdição, se mostre teratólogico, por irrisório ou abusivo. 4. Inocor-rência de teratologia no caso concreto, em que foi fixado o valor de indenização em R$ 10.000,00 (dez mil reais), devido pelo ora agravante ao autor, a título de danos mo-rais decorrentes de inscrição indevida em cadastro de proteção ao crédito. 5. O agra-vo não trouxe nenhum argumento novo capaz de modificar a conclusão do julgado, a qual se mantém por seus próprios fundamentos. 6. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 388.345/SP – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

RESPONSAbILIDADE CIVIL HOSPITALAR – fALHA NA

PRESTAÇÃO DE SERVIÇO MÉDICO – DANO MORAL – R$ 40.000,00

33201 – “Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Responsabilidade civil. Falha na prestação de serviço médico. Responsabilidade do nosocômio. Danos mo-rais. Fixação. Razoabilidade. Reexame do conjunto fático-probatório. Impossibilida-de. Súmula nº 7/STJ. Decisão agravada mantida. Improvimento. 1. Ultrapassar os fundamentos do acórdão e acolher a tese sustentada pela agravante, afastando a cul-pa do corpo clínico do hospital agravante reconhecida pelo Tribunal a quo, deman-daria inevitavelmente, o reexame de provas, incidindo, à espécie, o óbice da Súmula nº 7 desta Corte. 2. A intervenção do STJ, Corte de caráter nacional, destinada a firmar interpretação geral do Direito Federal para todo o País e não para a revisão de ques-tões de interesse individual, no caso de questionamento do valor fixado para o dano moral, somente é admissível quando o valor fixado pelo Tribunal de origem, cum-prindo o duplo grau de jurisdição, se mostre teratológico, por irrisório ou abusivo.

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3. Inocorrência de teratologia no caso concreto, em que, em razão de má prestação de serviço hospitalar que ocasionou a perda de testículo, foi fixado o valor de indeniza-ção de R$ 40.000,00 (quarenta mil reais) devido pela ora agravante ao autor, a título de danos morais. 4. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AREsp 399.309/SP – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 09.12.2013)

REVELIA – CURADOR ESPECIAL – HONORáRIOS ADVOCATÍCIOS

DE SUCUMbÊNCIA DEVIDOS

33202 – “Agravo regimental. Recurso especial. Honorários advocatícios. Curador especial. Antecipação. Descabimento. 1. Conforme a orientação jurisprudência do-minante desta Corte, os honorários advocatícios fixados em favor do curador es-pecial, nomeado ao réu revel, não são adiantados pelo autor, cabendo-lhe, apenas, o pagamento no final da demanda, se vencido. 2. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1400229/PR – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 06.12.2013)

SEgURO – NEgATIVA DE CObERTURA – DOENÇA

PREEXISTENTE – NECESSIDADE DE REALIzAÇÃO DE PRÉVIO EXAME MÉDICO OU PROVA

INEQUíVOCA DE MÁ-FÉ

33203 – “Agravo regimental em recurso especial. Seguro. Negativa de cobertura. Do-ença preexistente. 1. A doença preexistente só pode ser oposta pela seguradora ao segurado como negativa para prestar a cobertura securitária, mediante a realização de prévio exame médico ou prova inequívoca de má-fé. 2. Agravo regimental impro-vido.” (STJ – AgRg-REsp 1358243/PB – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 19.11.2013 – DJe 06.12.2013)

SEgURO DE VIDA – CObRANÇA – RESPONSAbILIDADE SOLIDáRIA

DA EMPRESA DE SEgUROS E DO bANCO PERANTE O

CONSUMIDOR – PRECEDENTES

33204 – “Agravo regimental no recurso especial. Seguro de vida. Cobrança. Legiti-midade passiva da estipulante. Seguro relação de consumo. Seguro contratado no interior do banco. Súmula nº 83/STJ. Questão decidida com base nas circunstâncias fáticas da causa. Súmula nº 7/STJ. 1. ‘É parte legítima para responder à ação em que é

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cobrado o cumprimento do contrato de seguro o banco que divulga o produto, recebe o valor do prêmio, expede apólice e presta as informações necessárias ao segurado. Precedentes do STJ’ (REsp 592.510/RO, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ 03.04.2006). 2. ‘Na esteira de precedentes desta Corte, a oferta de seguro de vida por companhia seguradora vinculada a instituição financeira, dentro de agência bancária, implica responsabilidade solidária da empresa de seguros e do banco perante o consumidor’ (REsp 1.300.116/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, DJe 13.11.2012). 3. Estando o acórdão recorrido em perfeita harmonia com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justi-ça incide a Súmula nº 83 desta Corte, aplicável por ambas as alíneas do permissivo constitucional. 4. Para prevalecer a pretensão em sentido contrário à conclusão do Tribunal de origem quanto à solidariedade passiva do banco na demanda, mister se faz a revisão do conjunto fático dos autos, o que, como já decidido, é inviabilizado ante o óbice da Súmula nº 7 desta Corte. 5. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1040622/RS – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – J. 19.11.2013 – DJe 12.12.2013)

SEgURO DE VIDA EM gRUPO – NÃO RENOVAÇÃO – PEDIDO DE DANO

MORAL – PRESCRIÇÃO ANUAL

33205– “Agravo regimental em agravo no recurso especial. Seguro de vida em gru-po não renovado. Dano moral. Prescrição anual. Divergência jurisprudencial. Impro-vimento. 1. É de um ano o prazo prescricional para a propositura de ação de indeni-zação por danos morais fundada em contrato de seguro de vida que deixou de ser renovado pela seguradora. Precedentes. 2. A divergência jurisprudencial deve ser demonstrada nos termos do art. 255, §§ 1º e 2º, do Regimento Interno deste Superior Tribunal de Justiça, mediante o confronto analítico dos paradigmas com o acórdão re-corrido devendo eles guardar, além de similitude jurídica, também a similitude fáti-ca. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AREsp 415.916/SP – 3ª T. – Rel. Min. Sidnei Beneti – J. 26.11.2013 – DJe 10.12.2013)

SEgUROS – NÃO RENOVAÇÃO DO CONTRATO DE SEgURO DE VIDA

EM gRUPO – POSSIbILIDADE

33206 – “Processo civil. Embargos de declaração. Não renovação de seguro de vida em grupo por prazo determinado. Pacificação da jurisprudência da segunda seção. 1. A 2ª Seção, no julgamento do REsp 880.605/RN, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Rel. p/o Acórdão Min. Massami Uyeda, em sessão realizada no dia 13.06.2012, publicado no DJe de 17.09.2012, por maioria, pacificou a jurisprudência desta Corte no sentido da inexistência de abusividade da cláusula que prevê a possibilidade de não renova-ção do contrato de seguro de vida em grupo. 3. Embargos de declaração acolhidos

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com efeito infringente, para dar provimento aos recursos especiais. Prejudicadas as demais questões suscitadas.” (STJ – EDcl-AgRg-REsp 1094116/DF – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – J. 05.12.2013 – DJe 10.12.2013)

SENTENÇA gENÉRICA PROfERIDA NA AÇÃO CIVIL COLETIVA –

EXECUÇÃO INDIVIDUAL – EfEITOS ergA omnes – COISA JULgADA

33207 – “Processual civil. Embargos declaratórios no recurso especial. Recebimento como agravo regimental. Requisitos de admissibilidade. Execução individual de sen-tença coletiva. Expurgos inflacionários em caderneta de poupança. Limites subjetivos da sentença. Abrangência nacional da demanda. Coisa julgada. Regularidade do tí-tulo. Prosseguimento da execução. Decisão mantida. 1. Os fundamentos do acórdão recorrido foram devidamente impugnados pelo recurso especial. Não incidência da Súmula nº 283/STJ. 2. Não houve conotação constitucional nas considerações con-tidas no acórdão recorrido. Inaplicabilidade da Súmula nº 126/STJ. 3. ‘A sentença genérica proferida na ação civil coletiva ajuizada pelo Instituto Brasileiro de Defe-sa do Consumidor, que condenou o Banco do Brasil ao pagamento de diferenças decorrentes de expurgos inflacionários sobre cadernetas de poupança ocorridos em janeiro de 1989, dispôs que seus efeitos teriam abrangência nacional, erga omnes. Não cabe, após o trânsito em julgado, questionar a legalidade da determinação, em face da regra do art. 16 da Lei nº 7.347/1985 com a redação dada pela Lei nº 9.494/1997, questão expressamente repelida pelo acórdão que julgou os embargos de declaração opostos ao acórdão na apelação’ (REsp 1348425/DF, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª Turma, Julgado em 05.03.2013, DJe 24.05.2013). 4. Conforme a orientação jurispru-dencial fixada pelo STJ, a abrangência nacional expressamente declarada na Ação Civil Pública nº 1998.01.1.016798-9 não pode ser alterada na fase de execução, sob pena de ofensa à coisa julgada, sendo, portanto, aplicável a todos os beneficiários, independentemente de sua residência ou domicílio no Distrito Federal. 5. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se nega provimento.” (STJ – EDcl-REsp 1329647/DF – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – J. 05.12.2013 – DJe 12.12.2013)

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JurisprudênciaPenal

STFSupremo Tribunal Federal

03.12.2013 Primeira TurmaHabeas Corpus nº 118.858 São PauloRelator: Min. Luiz FuxPacte.(s): Wagner da Silva PereiraImpte.(s): Defensoria Pública da UniãoProc.(a/s)(es): Defensor Público-Geral FederalCoator(a/s)(es): Superior Tribunal de Justiça

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL – hABeAs CorPus – CONTRAbANDO DE CIgARROS (ART. 334, § 1º, D, DO CP) – DESCLASSIfICAÇÃO PARA O CRIME DE DESCAMINHO – IMPOSSIbILIDADE – PRINCÍPIO DA INSIgNIfICÂNCIA

– NÃO INCIDÊNCIA – ORDEM DENEgADA1. O cigarro posto mercadoria importada com elisão de impos-

tos, incorre em lesão não só ao erário e à atividade arrecadatória do Estado, mas a outros interesses públicos como a saúde e a atividade industrial internas, configurando-se contrabando, e não descaminho. Precedente: HC 100.367, Primeira Turma – DJ de 08.09.11.

2. O crime de contrabando incide na proibição relativa sobre a importação da mercadoria, presentes as conhecidas restrições dos órgãos de saúde nacionais incidentes sobre o cigarro.

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3. In casu, a) o paciente foi condenado a 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, pela prática do crime previsto no art. 334, § 1º, alínea d, do Código Penal (contrabando), por ter adquirido, para fins de revenda, mercadorias de procedência estrangeira – 10 (dez) maços, com 20 (vinte) cigarros cada – desacompanhadas da documentação fiscal comprobatória do recolhimento dos respectivos tributos; b) o valor total do tributo, em tese, não recolhido aos cofres públicos é de R$ 3.850,00 (três mil oitocentos e cinquenta reais); c) a pena privativa de liberdade foi substituída por outra restritiva de direitos.

4. O princípio da insignificância não incide na hipótese de con-trabando de cigarros, tendo em vista que “não é o valor material que se considera na espécie, mas os valores ético-jurídicos que o sistema normati-vo penal resguarda” (HC 118.359, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia – DJ de 11.11.2013). No mesmo sentido: HC 119.171, Pri-meira Turma, Relatora a Ministra Rosa Weber – DJ de 04.11.2013; HC 117.915, Segunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Mendes – DJ de 12.11.2013; HC 110.841, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia – DJ de 14.12.2012.

5. Ordem denegada.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, sob a Presidência do Senhor Ministro Luiz Fux, na conformidade da ata de julgamento e das notas taqui-gráficas, por unanimidade de votos, em denegar a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Relator.

Brasília, 3 de dezembro de 2013.

Luiz Fux – Relator

RELATÓRIO

O Senhor Ministro Luiz Fux (Relator): Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado pela Defensoria Pública da União, em benefício de Wagner da Silva Pereira, contra acórdão do Superior Tribunal de Justiça sintetizado na seguinte ementa, verbis:

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – OFENSA AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE – NÃO OCORRÊNCIA – CRIME

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DE CONTRABANDO – CIGARRO – ALTO GRAU DE REPROVABILIDA-DE DA CONDUTA – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – INAPLICA-BILIDADE

1. Não viola o princípio da colegialidade a apreciação unipessoal, pelo re-lator, do mérito do recurso especial, quando obedecidos todos os requisitos para a sua admissibilidade, bem como observada a jurisprudência domi-nante desta Corte Superior e do Supremo Tribunal Federal. Ademais, a reapreciação da matéria pelo órgão colegiado, no julgamento de agravo regimental, supera eventual violação ao princípio da colegialidade.

2. Em se tratando de cigarros importados com elisão de impostos, não há apenas uma lesão ao erário e à atividade arrecadatória do Estado, mas a outros interesses públicos, configurando a conduta contrabando e não des-caminho.

3. No caso, muito embora também haja sonegação de tributos, trata-se de produto sobre a qual incide proibição relativa.

4. Agravo regimental desprovido.”

Colhe-se dos autos que o paciente foi condenado a 1 (um) ano de re-clusão, em regime inicial aberto, pela prática do crime previsto no art. 334, § 1º, alínea d, do Código Penal (contrabando), por ter adquirido, para fins de revenda, mercadorias de procedência estrangeira – 10 (dez) maços, com 20 (vinte) cigarros cada – desacompanhadas da documentação fiscal comproba-tória do recolhimento dos respectivos tributos. O valor total do tributo, em tese, não recolhido aos cofres públicos é de R$ 3.850,00 (três mil oitocentos e cinquenta reais). A pena privativa de liberdade foi substituída por outra restritiva de direitos.

Irresignada, a defesa apelou, mas o Tribunal Regional Federal da 3ª Região negou provimento ao recurso.

Interpôs, então, recurso especial, inadmitido na origem. Ato contínuo, interpôs agravo. O Ministro Marco Aurélio Bellizze, do Superior Tribunal de Justiça, negou provimento ao recurso.

Contra essa decisão, a defesa interpôs agravo regimental, improvido pelo colegiado do STJ.

Nesta impetração, sustenta que a conduta praticada pelo paciente con-figura o crime de descaminho e não o delito de contrabando. Alega, ainda, a aplicabilidade do princípio da insignificância no caso sub examine.

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Requer, ao final, a concessão de medida liminar a fim de “suspender os efeitos da condenação e obstar o início da execução criminal, até decisão final de mérito no presente writ”. No mérito, pleiteia “que seja concedida a ordem, a fim de declarar a correta classificação jurídica dos fastos incontroversos, proclamando que a importação de cigarros sem o desembaraço aduaneiro e sem o recolhimento dos tributos federais devidos caracteriza-se como crime de descaminho”.

A medida liminar foi indeferida em decisão assim ementada, verbis:

“PENAL E PROCESSO PENAL – HABEAS CORPUS – CONTRABANDO DE CIGARROS – ALTERAÇÃO DA TIFICAÇÃO LEGAL – ALEGAÇÃO DE QUE OS FATOS COMETIDOS CONFIGURAM O DELITO DE DESCA-MINHO – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – AUSÊNCIA DE FUMUS BONI JURIS – LIMINAR INDEFERIDA.”

O Ministério Público Federal manifesta-se pela denegação da ordem.

Transcrevo a ementa do parecer ministerial, verbis:

“HABEAS CORPUS – PENAL – PROCESSUAL PENAL – CRIME DE CONTRABANDO DE CIGARROS IMPORTADOS – ART. 334, DO CP – IMPOSSIBILIDADE – PRODUTO SOBRE O QUAL INCIDE PROIBIÇÃO RELATIVA, DANDO RELEVÂNCIA À TIPICIDADE PENAL – PRINCÍ-PIO DA INSIGNIFICÂNCIA – INAPLICABILIDADE – COAÇÃO ILEGAL INEXISTENTE

– Parecer pela denegação da ordem.”

É o relatório.

Voto – Min. Luiz Fux

VOTO

O Senhor Ministro Luiz Fux (Relator): A controvérsia dos autos refere--se à tipificação da conduta praticada pelo paciente – adquirir, para fins de revenda, mercadorias de procedência estrangeira (dez maços de cigarros, com vinte unidades cada), sem a documentação fiscal do recolhimento dos respectivos tributos – bem como à aplicabilidade, ou não, do princípio da insignificância no caso sub examine.

Verifica-se que, em se tratando de cigarro a mercadoria importada com elisão de impostos, não há apenas uma lesão ao erário e à atividade arreca-

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datória do Estado, mas também a outros interesses públicos como a saúde e a atividade industrial internas. Eis a doutrina de Damásio de Jesus sobre o tema, in verbis:

No sentido jurídico, a expressão contrabando quer dizer importação ou exportação de mercadorias ou gêneros cuja entrada ou saída do País é proibida, enquanto o termo descaminho significa fraude no pagamento de impostos e taxas devidos para o mesmo fim (entrada e saída de mercadorias ou gêneros). A diferença entre contrabando e descaminho reside em que no primeiro a mercadoria é proibida; no segundo, sua entrada ou saída é permi-tida, porém o sujeito frauda o pagamento do tributo devido.

O objeto jurídico é o interesse estatal no que diz respeito ao erário pú-blico lesado pelo comportamento do sujeito, que, importando ou exportando mercadoria proibida ou deixando de pagar os impostos e taxas devidos, pre-judica não só o poder público como a indústria nacional. Assim, secundaria-mente, protege-se também a indústria brasileira, a moralidade e até a saúde pública, que pode vir a ser lesada pela entrada de produtos nocivos a ela e, por isso, proibidos. (Direito Penal: parte especial, 4. v., 12 ed., Saraiva: 2002, pp. 237-238)

Na mesma esteira o entendimento de Márcia Dometila Lima de Carva-lho, citada por Rogério Greco:

[...] Assim, enquanto o descaminho, fraude no pagamento dos tributos adu-aneiros, é, grosso modo, crime de sonegação fiscal, ilícito de natureza tribu-tária pois atenta imediatamente contra o erário público, o contrabando pro-priamente dito, a exportação ou importação de mercadoria proibida, não se enquadra entre os delitos de natureza tributária. Estes, procedidos de uma relação fisco-contribuinte, fazem consistir, o ato de infrator, em ofensa ao direito estatal de arrecadar tributos. Em resumo, o preceito contido nas normas tipificadoras dos fiscais acha-se assentado sobre uma relação fisco--contribuinte, tutelando interesses do erário público e propondo-se, com as sanções respectivas, a impedir a violação de obrigações concernentes ao pagamento dos tributos. Já o preceito inerente à norma tipificadora do contrabando visa a proteger outros bens jurídicos, que, embora possam configurar interesses econômicos-estatais, não se traduzem em interesses fiscais. Inexiste uma relação fisco-contribuinte entre o Estado e o autor do contrabando. Proibida a exportação ou importação de determinada merca-doria, o seu ingresso ou a sua saída das fronteiras nacionais configura um fato ilícito e não um fato gerador de tributos. (Curso de Direito Penal, v. IV, pp. 524-525)

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Ainda nesse sentido, o acórdão proferido pela Primeira Turma desta Corte no julgamento do HC 100.367, de que fui Relator – DJ de 08.09.2011, cuja ementa transcrevo:

“PENAL – HABEAS CORPUS – CONTRABANDO (ART – 334, CAPUT, DO CP) – PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – NÃO-INCIDÊNCIA: AU-SÊNCIA DE CUMULATIVIDADE DE SEUS REQUISITOS – PACIENTE REINCIDENTE – EXPRESSIVIDADE DO COMPORTAMENTO LESIVO – DELITO NÃO PURAMENTE FISCAL – TIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA – ORDEM DENEGADA – 1. O princípio da insignificância incide quando presentes, cumulativamente, as seguintes condições obje-tivas: (a) mínima ofensividade da conduta do agente, (b) nenhuma peri-culosidade social da ação, (c) grau reduzido de reprovabilidade do com-portamento, e (d) inexpressividade da lesão jurídica provocada. Preceden-tes: HC 104403/SP, rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma – DJ de 01.02.2011; HC 104117/MT, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, 1ª Turma – DJ de 26.10.2010; HC 96757/RS, Rel. Min. Dias Toffoli, 1ª Turma – DJ de 04.12.2009; RHC 96813/RJ, Relª Min. Ellen Gracie, 2ª Turma – DJ de 24.04.2009) 2. O princípio da insignificância não se aplica quando se trata de paciente rein-cidente, porquanto não há que se falar em reduzido grau de reprovabili-dade do comportamento lesivo. Precedentes: HC 107067, Relª Min. Cár-men Lúcia, 1ª Turma – DJ de 26.05.2011; HC 96684/MS, Rel. Min. Cármen Lúcia, 1ª Turma – DJ de 23.11.2010; HC 103359/RS, Relª Min. Cármen Lú-cia, 1ª Turma – DJ 06.08.2010. 3. In casu, encontra-se em curso na Justiça Federal quatro processos-crime em desfavor da paciente, sendo certo que a mesma é reincidente, posto condenada em outra ação penal por fatos aná-logos. 4. Em se tratando de cigarro a mercadoria importada com elisão de impostos, há não apenas uma lesão ao erário e à atividade arrecadatória do Estado, mas a outros interesses públicos como a saúde e a atividade indus-trial internas, configurando-se contrabando, e não descaminho. 5. In casu, muito embora também haja sonegação de tributos com o ingresso de cigar-ros, trata-se de mercadoria sobre a qual incide proibição relativa, presentes as restrições dos órgãos de saúde nacionais. 6. A insignificância da conduta em razão de o valor do tributo sonegado ser inferior a R$ 10.000,00 (art. 20 da Lei nº 10.522/2002) não se aplica ao presente caso, posto não tratar-se de delito puramente fiscal. 7. Parecer do Ministério Público pela denegação da ordem. 8. Ordem denegada” – Sem grifos no original.

In casu, o paciente foi flagrado com mercadorias de procedência estran-geira – 10 (dez) maços, com 20 (vinte) cigarros cada desacompanhadas da do-cumentação fiscal comprobatória do recolhimento dos respectivos tributos. Transcrevo o seguinte trecho da denúncia, verbis:

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“[...]

1. No dia 1º de Maio de 2005, no Posto da Polícia Rodoviária Estadual lo-calizado na MS-060, Km 407, agentes da polícia rodoviária estadual abor-daram um veículo GM, Monza, Classic SE, conduzido pelos denunciados para procederem a vistoria de rotina. Durante a vistoria depararam-se com uma grande quantidade de cigarros no porta-malas do automóvel.

2. Os denunciados não estavam em posse de quaisquer documentos que comprovassem a origem lícita de tais mercadorias, motivo pelo qual foram presos em flagrante delito.

3. Os cigarros apreendidos foram adquiridos, segundo os denunciados, em Dourados/MS, em diversas bancas de vendas de cigarros. Pretendiam le-var essa mercadoria até a cidade de Campo Grande, para lá revenderem, nas proximidades do Mercado Municipal.

4. Além de não terem as notas fiscais dos cigarros apreendidos, tampouco possuíam comprovantes da legal importação, ou mesmo quaisquer docu-mentos que provassem a legalidade destes.

5. Os denunciados tinham conhecimento da ilicitude de suas condutas (fl. 05), mesmo assim, arriscaram-se com o fito de lucrar com a venda das mer-cadorias ilegalmente importadas.

6. O laudo de exame merceológico (fls. 42-44) confirma que os cigarros apreendidos são de origem/fabricação estrangeira, especificamente, de origem paraguaia.

7. O material apreendido consistia em 350 pacotes de cigarros. Cada pacote com 10 maços de 20 cigarros cada. O valor total da mercadoria apreendida é de R$ 3.850,00.

[…].”

Destarte, trata-se de crime de contrabando, no qual incide proibição relativa sobre a importação da mercadoria, presentes as conhecidas restrições dos órgãos de saúde nacionais incidentes sobre o cigarro.

Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal fixou entendimento no sentido da impossibilidade da incidência do princípio da insignificância na hipótese de contrabando de cigarros, tendo em vista que “não é o valor material que se considera na espécie, mas os valores ético-jurídicos que o sistema normativo--penal resguarda” (HC 118.359, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia – DJ de 11.11.2013). Transcrevo o inteiro teor da ementa do referido julgado:

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“EMENTA: HABEAS CORPUS – PENAL – PROCESSUAL PENAL – CRI-ME DE CONTRABANDO DE CIGARROS – ALEGAÇÃO DE INCIDÊN-CIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA: INVIABILIDADE – OR-DEM DENEGADA

1. A tipicidade penal não pode ser percebida como exame formal de sub-sunção de fato concreto à norma abstrata. Além da correspondência for-mal, para a configuração da tipicidade é necessária análise materialmente valorativa das circunstâncias do caso, para se verificar a ocorrência de lesão grave e penalmente relevante do bem jurídico tutelado. 2. O princípio da insignificância reduz a incidência de proibição aparente da tipicidade legal e torna atípico o fato, apesar de lesão a bem juridicamente tutelado pela norma penal. 3. Para aplicação do princípio da insignificância, devem ser relevados o valor do objeto do crime e também aspectos objetivos do fato, como a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de pericu-losidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comporta-mento e a inexpressividade da lesão jurídica causada. 4. Impossibilidade de incidência, no contrabando de cigarros, do princípio da insignificância. Não é o valor material que se considera na espécie, mas os valores ético--jurídicos que o sistema normativo-penal resguarda. 5. Ordem denegada” – Sem grifos no original.

(HC 118.359, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia – DJ de 11.11.2013)

No mesmo sentido, as seguintes decisões:

“EMENTA HABEAS CORPUS – CONTRABANDO – CIGARROS – PRIN-CÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA – ART. 20 DA LEI Nº 10.522/2002 – INA-PLICABILIDADE – REPROVABILIDADE DA CONDUTA – 1. A perti-nência do princípio da insignificância deve ser avaliada considerando os aspectos relevantes da conduta imputada. 2. O patamar previsto no art. 20 da Lei 10.522/2002, para conduzir ao arquivamento de execuções fis-cais, não se aplica ao delito de contrabando de cigarros. 3. Reprovabilidade da conduta suficiente a afastar a aplicação do princípio da insignificância. 4. Ordem denegada” – Sem grifos no original.

(HC 119.171, Primeira Turma, Relatora a Ministra Rosa Weber – DJ de 04.11.2013)

“Habeas corpus. 2. Contrabando. Cigarros. 3. Aplicação do princípio da in-significância. 4. Impossibilidade. Maior desvalor da conduta do agente. ‘Não se cuida de sopesar o caráter pecuniário do imposto sonegado, mas,

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principalmente, de tutelar, entre outros bens jurídicos, a saúde pública’ (HC 110.964/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes – DJe 02.04.2012). 5. Ordem de-negada.”

(HC 117.915, Segunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Mendes – DJ de 12.11.2013)

“EMENTA: HABEAS CORPUS – PROCESSUAL PENAL – CRIME DE CONTRABANDO DE CIGARROS ESTRANGEIROS – ARQUIVAMENTO DE INQUÉRITO E ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 28 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL – INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL – PRETENSÃO DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA INSIG-NIFICÂNCIA – IMPROCEDÊNCIA – HABEAS CORPUS DENEGADO – 1. Nenhuma irregularidade há na decisão proferida pelo Superior Tribunal de Justiça, que restabeleceu a viabilidade do exame do inquérito pelo Pro-curador-Geral de Justiça, após o Juízo local ter considerado improcedente o pedido de arquivamento. 2. O princípio da insignificância reduz o âmbito de proibição aparente da tipicidade legal e, por consequência, torna atípico o fato na seara penal, apesar de haver lesão a bem juridicamente tutelado pela norma penal. 3. Para a incidência do princípio da insignificância, de-vem ser relevados o valor do objeto do crime e os aspectos objetivos do fato, tais como, a mínima ofensividade da conduta do agente, a ausência de periculosidade social da ação, o reduzido grau de reprovabilidade do comportamento e a inexpressividade da lesão jurídica causada. 4. Impossi-bilidade de incidência, no contrabando de cigarros estrangeiros, do princí-pio da insignificância. Precedentes. 5. O criminoso contumaz, mesmo que pratique crimes de pequena monta, não pode ser tratado pelo sistema pe-nal como se tivesse praticado condutas irrelevantes, pois crimes considera-dos ínfimos, quando analisados isoladamente, mas relevantes quando em conjunto, seriam transformados pelo infrator em verdadeiro meio de vida. 6. O princípio da insignificância não pode ser acolhido para resguardar e legitimar constantes condutas desvirtuadas, mas para impedir que desvios de conduta ínfimos, isolados, sejam sancionados pelo direito penal, fazen-do-se justiça no caso concreto. Comportamentos contrários à lei penal, mes-mo que insignificantes, quando constantes, devido a sua reprovabilidade, perdem a característica da bagatela e devem se submeter ao direito penal. 7. Habeas corpus denegado” – Sem grifos no original. (HC 110.841, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia – DJ de 14.12.2012)

Ex positis, denego a ordem.

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EXTRATO DE ATA

Extrato de Ata – 03.12.2013

Primeira Turma

Habeas Corpus nº 118.858

Proced.: São Paulo

Relator: Min. Luiz Fux

Pacte.(s): Wagner da Silva Pereira

Impte.(s): Defensoria Pública da União

Proc.(a/s)(es): Defensor Público-Geral Federal

Coator(a/s)(es): Superior Tribunal de justiça

Decisão: A Turma denegou a ordem de habeas corpus, nos termos do voto do Relator. Unânime. Não participou, justificadamente, deste julgamen-to, o Senhor Ministro Marco Aurélio. Presidência do Senhor Ministro Luiz Fux. 1ª Turma, 03.12.2013.

Presidência do Senhor Ministro Luiz Fux. Presentes à Sessão os Senho-res Ministros Marco Aurélio, Dias Toffoli, Rosa Weber e Roberto Barroso.

Subprocuradora-Geral da República, Dra. Cláudia Sampaio Marques.

Carmen Lilian Oliveira de Souza Secretária da Primeira Turma

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STJSuperior Tribunal de JuSTiça

AgRg no Agravo em Recurso Especial nº 356.473 – PE (2013/0216521-1)Relatora: Ministra Assusete MagalhãesAgravante: Ministério Público FederalAgravado: Francisco Bezerra RodriguesAdvogado: Defensoria Pública da União

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL – AgRAVO REgIMENTAL NO AgRAVO EM RECURSO ESPECIAL – SONEgAÇÃO

FIsCAL – ART. 1º, IV, DA LEI Nº 8.137/1990 – DELITOs DE fALSUM (ARTS. 299 E 304, CP) – APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO

DA ESPECIALIDADE – PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO – PRECEDENTES DO STJ – AgRAVO REgIMENTAL IMPROVIDO

I – O art. 1º, IV, da Lei nº 8.137/1990 prevê, como conduta típica contra a ordem tributária, suprimir ou reduzir tributo, mediante elabora-ção de documento falso ou uso do documento contrafeito, pelo que, em face do princípio da especialidade, fica afastada a incidência da lei geral, que tipifica os crimes dos arts. 299 e 304 do Código Penal.

II – Com efeito, se, nos crimes contra a ordem tributária, a con-trafação ou o uso do falsum foram erigidos, pela Lei nº 8.137/1990, em elementos constitutivos de outro ilícito, tem-se, na espécie, delito único, que é o de suprimir ou reduzir tributo, mediante aquelas ações referidas no art. 1º, IV, da mencionada Lei nº 8.137/1990, afastando-se, na espécie, pelo princípio da especialidade, os crimes previstos nos arts. 299 e 304 do Código Penal.

III – Ademais, a legislação do imposto de renda determina que o contribuinte que lançar deduções em sua declaração deverá estar de posse dos respectivos comprovantes para apresentação posterior à au-toridade administrativa, quando solicitado. A simples entrega da de-claração de ajuste anual, elaborada com base em recibos falsos, que não

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corresponderam à efetiva prestação de serviços, com a indicação do beneficiário no informe de rendimentos pagos, implica no uso dos res-pectivos recibos, para o fim de eliminação ou redução do tributo, dada a efetiva possibilidade de a Receita Federal averiguar as informações ali prestadas e intimar o contribuinte para a apresentação das provas das despesas declaradas. Assim, a ulterior apresentação, ao Fisco, dos reci-bos falsos, usados na anterior declaração de rendimentos anual, deu-se para facilitar ou encobrir a falsa declaração, com vistas à efetivação do crime de sonegação fiscal – crime-fim –, que ainda viria a se consumar, com o lançamento definitivo do crédito tributário, por constituir o delito do art. 1º, IV, da Lei nº 8.137/1990 crime material, na forma da Súmula Vinculante nº 24, do Colendo STF.

IV – Consoante a jurisprudência do Superior Tribunal de Justi-ça, “o crime de falso cometido única e exclusivamente com vistas a su-primir ou reduzir tributos é absorvido pelo crime de sonegação fiscal, sendo irrelevante, para tanto, que a apresentação do documento falso perante a autoridade fazendária seja posterior à entrega da declaração de imposto de renda porque apenas materializa a informação falsa an-tes prestada” (STJ, AgRg no REsp 1.372.457/MG, Relª Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma – DJe de 10.09.2013).

V – Agravo regimental improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indi-cadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.

Os Srs. Ministros Rogerio Schietti Cruz, Marilza Maynard (Desembar-gadora Convocada do TJ/SE), Maria Thereza de Assis Moura e Sebastião Reis Júnior votaram com a Sra. Ministra Relatora.

Brasília/DF, 19 de novembro de 2013 (data do Julgamento).

Ministra Assusete Magalhães Relatora

RELATÓRIO

Ministra Assusete Magalhães: Trata-se de Agravo Regimental, inter-posto pelo Ministério Público Federal, contra decisão de minha lavra, que

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conheceu do Agravo e negou-lhe provimento, com fundamento no art. 544, § 4º, II, a, do CPC c/c o art. 3º do CPP.

Sustenta o agravante, em síntese, que o acórdão recorrido está em de-sacordo com julgados do Superior Tribunal de Justiça, “que reiteradamente tem pronunciado que a apresentação posterior do documento falso, com o objetivo de assegurar a impunidade do crime de sonegação fiscal, denota a autonomia das condutas, afastando-se a incidência do princípio da consun-ção” (fl. 245e).

Defende, assim, a não incidência do óbice enunciado na Súmula nº 83/STJ.

Deduz, ainda, que a falsidade praticada não constitui meio para con-sumar a sonegação fiscal, mas apenas uma tentativa de ocultação do delito fiscal, constituindo crimes autônomos.

Requer, por fim, a reconsideração da decisão agravada, ou, caso assim não se entenda, a sua reforma, pelo Colegiado, a fim de serem providos o Agravo e o Recurso Especial.

É o relatório.

VOTO

Ministra Assusete Magalhães (Relatora): A decisão agravada tem o se-guinte teor:

“Trata-se de Agravo, interposto pelo Ministério Público Federal, em face de decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que não admitiu o Recurso Especial do agravante.

Depreende-se dos autos que, interposto Recurso em Sentido Estrito, o Tri-bunal de origem negou provimento ao recurso, pelos fundamentos sinteti-zados na seguinte ementa:

“PENAL – RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – UTILIZAÇÃO DE DO-CUMENTO FALSO – SONEGAÇÃO FISCAL – PRINCÍPIO DA CONSUN-ÇÃO

1. O crime de sonegação fiscal, previsto no art. 1º, IV, da Lei nº 8.137/1990, perfaz-se com o lançamento definitivo do crédito tributário, de forma que eventuais fraudes perpetradas pelo contribuinte para suprimir/reduzir tributo integrariam o iter criminis daquele, sendo pelo mesmo absorvidas: princípio da consunção.

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2. Hipótese em que o Fisco não chegou sequer a iniciar a respectiva ação fiscal, não tendo havido, portanto, a constituição definitiva do crédito tri-butário.

3. Em observância ao princípio da especialidade, é vedado, in casu, ao Mi-nistério Público promover ação penal com base na conduta descrita no art. 299 c/c arts. 304, 61, II, “b”, e 70, todos do Código Penal.

4. Recurso em sentido estrito improvido” (fl. 151e).

Daí a interposição do Recurso Especial, com base nas alíneas a e c do per-missivo constitucional, no qual se alega, além do dissídio jurisprudencial, violação aos arts. 299 e 304 do Código Penal.

Defende, em síntese, que as condutas ora em apreciação são autônomas, tornando inaplicável o princípio da consunção.

Não admitido o Recurso Especial (fls. 195/196e), foi interposto o presente Agravo (fls. 200/206e).

O Ministério Público Federal manifestou-se pelo provimento do Agravo (fls. 223/229e).

A irresignação não merece acolhimento.

Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça encontra-se pacificada no sentido de que o crime de falso praticado com vistas à efeti-vação do crime de sonegação fiscal constitui mero exaurimento do crime tributário, como se vê dos seguintes arestos:

“PENAL E PROCESSO PENAL – AGRAVO REGIMENTAL NO RE-CURSO ESPECIAL – USO DE DOCUMENTO FALSO E SONEGAÇÃO FISCAL – CONSUNÇÃO – ACÓRDÃO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE – SÚMULA Nº 83/STJ – AGRA-VO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO

1. A atual jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça adota o entendi-mento de que o crime de falso cometido única e exclusivamente com vistas a suprimir ou reduzir tributos é absorvido pelo crime de sonegação fiscal, sendo irrelevante, para tanto, que a apresentação do documento falso perante a au-toridade fazendária seja posterior à entrega da declaração de imposto de renda porque apenas materializa a informação falsa antes prestada.

2. Agravo regimental improvido”. (STJ, AgRg no REsp 1372457/MG, Relª Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma – DJe de 10.09.2013)

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“PENAL – SONEGAÇÃO FISCAL – FALSIDADE IDEOLÓGICA – USO DE DOCUMENTO FALSO – DECLARAÇÃO FALSA PRESTA-DA PARA REDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE RENDA DA PESSOA FÍSICA – APRESENTAÇÃO DE RECIBOS FISIO-TERAPÊUTICOS IDEOLOGICAMENTE FALSOS À AUTORIDADE FAZENDÁRIA – EXAURIMENTO DA CONDUTA ANTERIOR – DE-LITOS AUTÔNOMOS – INOCORRÊNCIA

1. A declaração falsa inserida na Declaração de Ajuste Anual do Imposto de Renda da Pessoa Física nada mais é do que a representação da informação con-tida no documento ideologicamente falsificado, do qual se utiliza o agente para obter a redução ou supressão do referido tributo, circunstância que impede a incidência dos tipos penais previstos no art. 299 e 304 do Código Penal, para que não ocorra o vedado bis in idem.

2. O fato do sujeito passivo da obrigação tributária apresentar o documento ide-ologicamente falsificado à autoridade fazendária, quando chamado a comprovar as declarações prestadas em momento anterior, configura mero exaurimento da conduta necessária para a configuração do delito de sonegação fiscal, já que desprovido, neste momento, de qualquer outra potencialidade lesiva que exija a aplicação autônoma do delito descrito no art. 304 do Estatuto Repressor.

3. Agravo regimental a que se nega provimento” (STJ, AgRg no REsp 1347646/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, DJe de 15.02.2013).

Destarte, aplica-se, ao caso, o entendimento consolidado na Súmula 83 desta Corte, in verbis:

“Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida”.

Importa ressaltar que o referido enunciado aplica-se, igualmente, aos recursos interpostos com base na alínea a do permissivo constitucional. Ante o exposto, conheço do Agravo e nego-lhe provimento, com fundamento no art. 544, § 4º, II, a, do CPC c/c art. 3º do CPP.

I”.

As razões expendidas no Agravo Regimental não são capazes de infir-mar os fundamentos da decisão agravada.

Com efeito, o art. 1º, IV, da Lei nº 8.137/1990 prevê, como conduta típi-ca contra a ordem tributária, suprimir ou reduzir tributo, mediante elaboração de documento falso ou uso do documento contrafeito, pelo que, em face do

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princípio da especialidade, fica afastada a incidência da lei geral, que tipifica os crimes dos arts. 299 e 304 do Código Penal.

Ademais, a legislação do imposto de renda determina que o contribuin-te que lançar deduções em sua declaração deverá estar de posse dos respecti-vos comprovantes para apresentação posterior à autoridade administrativa, quando solicitado. A simples entrega da declaração de ajuste anual, elabora-da com base em recibos falsos, que não corresponderam à efetiva prestação de serviços, com a indicação do beneficiário no informe de rendimentos pa-gos, implica no uso dos respectivos recibos, para o fim de eliminação ou re-dução do tributo, dada a efetiva possibilidade de a Receita Federal averiguar as informações ali prestadas e intimar o contribuinte para a apresentação das provas das despesas declaradas. Assim, a ulterior apresentação, ao Fisco, dos recibos falsos, usados na anterior declaração de rendimentos anual, deu-se para facilitar ou encobrir a falsa declaração, com vistas à efetivação do crime de sonegação fiscal – crime-fim –, que ainda viria a se consumar, com o lan-çamento definitivo do crédito tributário, por constituir o delito do art. 1º, IV, da Lei nº 8.137/1990 crime material, na forma da Súmula Vinculante nº 24, do colendo STF, que assim dispõe:

“Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no art. 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/1990, antes do lançamento definitivo do tributo” (Súmula Vinculante nº24, do STF).

Ademais, a jurisprudência mais recente do Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de que o crime de falso, quando praticado com a fi-nalidade exclusiva de ocultar a supressão ou redução de tributo, constitui crime-meio para a prática de sonegação fiscal, como se vê dos seguinte precedentes:

‘AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL – PENAL – SO-NEGAÇÃO FISCAL – ABSORÇÃO DOS DELITOS DE ESTELIONATO, FALSIDADE IDEOLÓGICA E USO DE DOCUMENTO FALSO – PRIN-CÍPIO DA CONSUNÇÃO – POSSIBILIDADE – FALSIDADE PRATI-CADA COM FIM EXCLUSIVO DE LESAR O FISCO, VIABILIZANDO A SONEGAÇÃO DO TRIBUTO – FALSO EXAURIDO NA SONEGA-ÇÃO – PRECEDENTES – AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO

1. É aplicável o princípio da consunção quando os crimes de estelionato, uso de documento falso e falsidade ideológica - crimes meio – são praticados para faci-litar ou encobrir a falsa declaração, com vistas à efetivação do pretendido crime de sonegação fiscal – crime fim –, localizando-se na mesma linha de desdobra-mento causal de lesão ao bem jurídico, integrando, massim, o iter criminis do delito-fim.

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2. No caso dos autos, as instâncias ordinárias, após minuciosa análise dos ele-mentos de prova coligidos aos autos, entenderam que os Acusados usaram re-cibos falsos de despesas médicas com o fim único e específico de burlar o Fisco, visando, exclusivamente, à sonegação de tributos. A lesividade das condutas não transcendeu, assim, o crime fiscal, razão porque tem aplicação, na espécie, mutatis mutandis, o comando do Enunciado nº 17 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça.Precedentes.3. Não tendo o Agravante trazido tese jurídica capaz de modificar o po-sicionamento anteriormente firmado, mantenho, na íntegra, a decisão recorrida por seus próprios fundamentos.4. Agravo regimental desprovido.’ (STJ, AgRg no REsp 1.366.714/MG, Relª Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, DJe de 05.11.2013)‘PENAL – AGRAVO REGIMENTAL – AGRAVO – DOCUMENTO FALSO – USO – RECIBO – DESPESAS ODONTOLÓGICAS – COM-PROVAÇÃO – DEDUÇÃO – ABSORÇÃO – SONEGAÇÃO FISCAL1. A conduta do agente de apresentar recibos ideologicamente falsos à Receita Federal, como forma de comprovar a dedução de despesas para a redução da base de cálculo do Imposto de Renda, visou unicamente perpetrar o crime previsto no art. 1º da Lei nº 8.137/1990, configurando as demais condutas, pois, simples fase do iter criminis.

2. Não há justa causa para o prosseguimento do feito em relação ao uso de do-cumento falso, por não se vislumbrar a autonomia entre os delitos. Precedentes.

3. Não trazendo o agravante tese jurídica capaz de modificar o posicio-namento anteriormente firmado, é de se manter a decisão agravada na íntegra, por seus próprios fundamentos.

4. Agravo regimental a que se nega provimento’ (STJ, AgRg no AREsp 350.165/PE, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Turma, DJe de 30.08.2013).”

Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental.

É como voto.

CERTIDÃO DE JULGAMENTO SEXTA TURMA

AgRg no AREsp 356.473/PE

Número Registro: 2013/0216521-1

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MATÉRIA CRIMINAL

Números Origem: 10480001132200316 1051 126000003138200601 200783000129180 2007830001291801051 4101002004004613 652007

Em Mesa

Julgado: 19.11.2013

Relatora: Exma. Sra. Ministra Assusete Magalhães

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Moacir Mendes Sousa

Secretário: Bel. Eliseu Augusto Nunes de Santana

AUTUAÇÃO

Agravante: Ministério Público Federal

Agravado: Francisco Bezerra Rodrigues

Advogado: Defensoria Pública da União

Assunto: Direito Penal – Crimes contra a Fé Pública – Uso de documento falso

AGRAVO REGIMENTAL

Agravante: Ministério Público Federal

Agravado: Francisco Bezerra Rodrigues

Advogado: Defensoria Pública da União

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia Sexta Turma, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Sexta Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimen-tal, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.

Os Srs. Ministros Rogerio Schietti Cruz, Marilza Maynard (Desembar-gadora Convocada do TJ/SE), Maria Thereza de Assis Moura e Sebastião Reis Júnior votaram com a Sra. Ministra

Relatora.

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TrF 1ª r.Tribunal regional Federal da 1ª região

Recurso em Sentido Estrito nº 0052756-11.2011.4.01.3500/GO

Relator: Desembargador Federal Olindo Herculano de Menezes

Recorrente: Ministério Público Federal

Procurador: Daniel de Resende Salgado

Recorrido: Jeronimo Gonçalves Martins

Defensor: Defensoria Pública da União – DPU

EMENTA

PROCESSUAL PENAL – RECURSO EM SENTIDO ESTRITO – CRIME DE DESCAMINHO – OPERAÇÃO POLICIAL – INVASÃO DE DOMICÍLIO SEM MANDADO JUDICIAL

1. As provas obtidas na investigação policial, de suposto desca-minho, provieram de busca domiciliar – invasão de residência com es-calada de muro – sem mandado judicial, não tendo serventia para dar arrimo à persecução penal. São inadmissíveis as provas ilícitas, assim entendidas em violação a normas constitucionais e legais (art. 157, § 1º – CPP). Hipótese em que as suspeitas dos policiais não justificariam a conclusão de flagrante delito, para justificar a invasão da residência.

2. Decisão mantida. Recurso em sentido estrito desprovido.

ACÓRDÃO

Decide a Turma negar provimento ao recurso em sentido estrito, à una-nimidade.

4ª Turma do TRF da 1ª Região – Brasília, 26 de novembro de 2013.

Desembargador Federal Olindo Menezes, Relator

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RELATÓRIO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Olindo Menezes (Relator): – O Ministério Público Federal recorre em sentido estrito de decisão da 11ª Vara Federal/GO, que rejeitou a denúncia contra Jeronimo Gonçalves Martins, pelo crime de descaminho (art. 334, § 1º, c, CP), ao fundamento de ausência de justa causa para a ação penal (art. 395, III, CPP). Segundo a denúncia, o acusado foi:

“[...] flagrado, em 01.12.2010, na sua residência, cujo endereço foi apre-sentado no preâmbulo da presente, mantendo em depósito, no exercício de atividade comercial, mercadorias de procedência estrangeira, listadas entre os itens 04 a 25, do auto de apresentação e apreensão nº 576/2010, encartado às fls. 10-11, do citado inquérito policial e que dizem respeito, substancialmente, a aparelhos de sonorização automotora, por ele introdu-zidas clandestinamente, em 26.11.2010.

[...]

O total de tributos federais iludidos, segundo estimativa da Receita Federal (fls. 76), é de R$ 28.586,79, caracterizando a clandestinidade da conduta, dada a ausência de qualquer comprovação de internação regular dos bens.

Sua ação delituosa foi descoberta em 01.12.2010, por equipe da Polícia Mili-tar, integrada pelos PM Paulo Ramon Mesquita Gomes e PM Gilmar Alves dos Santos, que receberam denúncia anônima, no sentido de que o acusa-do teria sido visto com grande quantidade de droga, ingressando em sua residência.

Na abordagem realizada, os policiais não lograram resposta do acusado e, ainda perceberam movimentação por eles compreendida como fuga, levando-os à conclusão de existir, na espécie, a situação de flagrante delito, o que, de fato se confirmou, com a apreensão das mercadorias.

[...].”

Pugna pelo recebimento da denúncia, sustentando que autoridade po-licial não adentrou na residência do acusado “sem qualquer suspeita”, mas que, “a partir de uma notícia encaminhada pelo Copom, empreenderam dili-gências para confirmá-la. A partir daí, somada à reação do investigado, des-confiaram da possibilidade de Jeronimo Gonçalves se encontrar em flagrante delito”.

Destaca que “as suspeitas dos policiais tiveram uma origem. Por outro lado, apesar de essa origem ter sido anônima, foram realizadas diligências

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que a confirmou, fato que lhe passa a conferir validade. Em outras palavras: O veículo Voyage, branco, encontrava-se, realmente, na residência informa-da”.

Finalmente, aduz que: “foram apreendidas diversas mercadorias de procedência estrangeira, adquiridas por Jeronimo Gonçalves, em depósito na sua própria residência, sendo possível a prisão em flagrante enquanto o agente estiver com a posse da coisa.” (fls. 116 – 123).

O Ministério Público Federal nesta instância, em parecer firmado pelo Procurador Regional da República Blal Yassine Dalloul, opina pelo provi-mento do recurso (fls. 160 – 167).

É o relatório.

VOTO

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Olindo Menezes (Relator): – A decisão recorrida, em síntese, está vazada nos seguintes termos:

“No presente caso, em suma, os policiais militares invadiram a residência do Denunciado porque a PMGO recebeu uma delação anônima de que o Denunciado acabara de chegar do Paraguai num veículo Voyage de cor branca transportando grande quantidade de drogas. Depois de receber a delação anônima, a equipe da ROTAM dirigiu-se ao endereço indicado pelo delator. Nesse endereço, a equipe, após confirmar a existência de um veículo Voyage cor branca estacionado na garagem da residência, e de ver pelas frestas do portão da residência que uma pessoa saíra de uma sala logo em seguida à batida no portão, resolveu invadir a residência mediante escalada do muro.

O STF reconheceu a legitimidade de busca domiciliar que não foi “provo-cada tão somente por denúncia anônima, [...], mas baseada em elementos da convicção colhidos durante inquérito policial instaurado pela autorida-de policial” [...]

A invasão da residência do Denunciado pelos policiais fundou-se em duas circunstâncias de fato: 1) o fato de o veículo informado na delação anônima ser idêntico ao existente na garagem da residência do Denunciado; 2) o fato de alguém, após ouvir as batidas no portão, ter saído de um dos cômodos dessa residência, devem ser vistos em sua totalidade na avaliação da exis-tência de fundadas razões para fundamentar a busca domiciliar. [...]

No presente caso, diversamente, do precedente do STF acima invocado (HC 91350/SP), a única informação confirmada pela autoridade policial

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foi a relativa à existência de um veículo Voyage de cor branca estacionado na garagem da residência indicada na delação anônima. Esse fato apenas confirmou que o delator conhecia o endereço residencial do Denunciado, bem como o modelo e a cor do veículo por ele utilizado. Bilhões de pesso-as, ao redor do globo, conhecem o endereço residencial de seus vizinhos e amigos, bem como o modelo e a cor dos veículos por eles utilizados. Dessa forma, essa informação não tem a relevância que lhe atribuiu a autoridade policial.

Além disso, a autoridade policial invocou como comportamento suspeito o fato de alguém, no interior da residência, haver saído de uma sala depois de ouvir as batidas no portão. No entanto, o fato de a pessoa haver saído de um dos cômodos da residência depois de, presumivelmente, ter ouvido as batidas no portão, não constitui, ipso facto, comportamento suspeito. Se o portão estava trancado, a pessoa poderia ter saído do cômodo a fim de bus-car as chaves respectivas, por exemplo, não significando, assim, comporta-mento suspeito algum. A pessoa poderia ter sido chamada a outro cômodo. A pessoa poderia estar se dirigindo ao sanitário, à cozinha para fazer um lanche, ao quarto para dormir, por exemplo. A pessoa poderia ter saído do cômodo por uma série de fatores não necessariamente relacionados às batidas no portão. Ademais, se as mercadorias objeto de descaminho es-tavam acondicionadas no veículo estacionado na garagem da residência, a saída da pessoa poderia ser suspeita se ela tivesse se dirigido ao veículo para esconder as mercadorias, por exemplo. Portanto, a suspeita alegada pelos policiais é manifestamente subjetiva. A fundada suspeita não pode “fundar-se em parâmetros unicamente subjetivos, exigindo elementos concretos”.” (STF, HC 81305/GO, acima citado). Ora, considerando que as fundadas razões são mais do que simples fundada suspeita, é preciso, para a caracterização daquelas, muito mais do que é necessário para a identifi-cação da presença desta.

[...]

Na espécie, para que houvesse fundadas razões não bastava a informação anônima da prática do crime de tráfico de drogas. Era necessário que a Polícia Militar, antes de invadir a residência do Denunciado, tivesse rea-lizado outras diligências visando a confirmar a veracidade da informação anônima. Por outro lado, os policiais poderiam ter montado campana e solicitado ao juiz competente a expedição de mandado de busca domiciliar. Não poderiam, porém, ter invadido a residência do Denunciado com base apenas na delação anônima. Ora, se para que a polícia incomode o cidadão bastar apenas uma informação para o “Serviço 190”, é grande o risco de que pequenas desavenças entre vizinhos possa levar um deles a informar falsa-mente a suspeita do “porte de drogas” pelo outro, com o que o “suspeito”

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seria importunado, indevidamente, pela polícia, podendo, inclusive, de-pendendo das circunstâncias, ser morto numa ação policial aparentemente legítima. “A se agasalhar a óptica da denúncia anônima, mediante carta apócrifa, ter-se-à aberta a porta à vindita, à atuação voltada tão-somente a prejudicar desafetos, alguém que tenha contrariado interesses.” (STF, HC 84827/TO, Rel. Ministro Marco Aurélio, Julgamento: 07.08.2007, Primeira Turma, DJ 23.11.2007, p. 79).

[...]

A ilegalidade e a inconstitucionalidade da entrada dos policiais militares na residência do Denunciado, contra a vontade dele, implica a ilicitude da apreensão das mercadorias estrangeiras acondicionadas no veículo Voya-ge. Constituição Federal, art. 5º, inciso LVI; Código de Processo Penal, art. 157.

Por sua vez, são também inadmissíveis, no presente caso, as provas deriva-das da apreensão ilícita das mercadorias estrangeiras (CPP, art. 157, § 1º), e consistentes na lavratura do APrF com as oitivas do condutor, das duas testemunhas e do Denunciado. São ainda inadmissíveis as demais provas documentais e periciais, porquanto derivam, diretamente, da apreensão ilícita das mercadorias estrangeiras. Ademais, nenhuma das provas deri-vadas, no presente caso, poderia ter sido obtida por fonte independente da ilícita apreensão em causa. Código de Processo Penal, art. 157, § 2º.

[...]

Como já exaustivamente repetido nas transcrições, os policiais milita-res receberam notícia anônima de que o acusado teria sido visto com grande quantidade de drogas ingressando em sua residência. Se a existência do obje-to da notícia anônima houvesse sido confirmada, em tese teria sido legítima a ação policial, uma vez que a jurisprudência1 entende que no crime de tráfico de drogas, por sua natureza permanente, a sua consumação se prolonga no tempo, configurando a situação de flagrância enquanto perdurar a posse da droga pelo agente, sendo possível o ingresso da polícia na residência, sem mandado de prisão ou de busca e apreensão, pois restaria abarcado pela ex-cepcionalidade prevista no art. 5º, XI, CF (a casa é asilo inviolável do indiví-duo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial).

1 (HC 208.957/SP, Rel. Ministro Vasco Della Giustina (Desembargador convocado do TJ/RS), Sexta Turma, Julgado em 06.12.2011, DJe 19.12.2011).

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No caso, o suposto crime praticado pelo acusado, de descaminho (art. 334, § 1º, c, CP), por se tratar de crime formal, independe de resultado naturalístico2, consumando-se com o mero ingresso da mercadoria no terri-tório nacional sem o pagamento dos tributos devidos. Não havia, portanto, a ocorrência de tráfico de drogas no interior da residência que pudesse autori-zar a invasão, sem o mandado judicial, ainda que pelo teor dos depoimentos dos policiais a notícia anônima era de que havia a existência do crime de tráfico de drogas.

Não consta dos autos o mandado de busca domiciliar firmado por Juiz Federal. A expedição do mandado firmado pelo juiz competente não é mera formalidade, mas constitui pressuposto de eficácia da prova colhida para a instauração do processo penal. A busca domiciliar, na forma do disposto no art. 240, § 1º, CP, pressupõe fundadas razões para seu deferimento, o que torna inequívoco o fato de que meras suspeitas de que o agente seria o possí-vel autor de crime cometido no local investigado, não autoriza a entrada dos policiais em sua residência, sob o fundamento de flagrante delito.

O vício insanável da ausência de mandado judicial de busca domiciliar para franquear a operação policial constitui justa causa para obstar o recebi-mento da denúncia. É inadmissível a prova colhida de forma ilícita e, tam-bém, a prova derivada da ilícita (art. 157, § 1º – CPP), ante o evidente nexo causal entre a invasão de domicílio e a apreensão das mercadorias

Nesse contexto, nego provimento ao recurso em sentido estrito, confirman-do a decisão recorrida.

É o voto.

2 (RSE 0003266-43.2008.4.01.3300/BA, Rel. Desembargador Federal I’talo Fioravanti Sabo Mendes, 4ª T., e-DJF1, p.1063, de 27.04.2012).

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TrF 4ª r.Tribunal regional Federal da 4ª região

Apelação Criminal nº 5023341-84.2011.404.7000/PRRelator: Des. Federal Victor Luiz dos Santos LausApelante: Irene Ferreira de SouzaProcurador: Henrique Guimarães de Azevedo (DPU) Dpu129Apelado: Ministério Público Federal

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL – PENAL – ESTELIONATO CONTRA O INss – ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL – DECLARAÇÃO fALSA PARA A CONCESSÃO DE bENEfÍCIO ASSISTENCIAL

– CONDUTA DE AgENTE QUE IMPLEMENTA A fRAUDE PARA QUE TERCEIRO LOgRE O AMPARO INDEVIDO –

CRIME INSTANTÂNEO – MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS – DOSIMETRIA – REDUÇÃO DAS

SANÇÕES IMPOSTAS – PRESCRIÇÃO RETROATIVA1. Para a configuração do delito de estelionato é necessário o em-

prego, pelo agente, do meio fraudulento e a obtenção de vantagem pa-trimonial indevida, para si ou para outrem, em prejuízo alheio.

2. Devidamente provados a autoria, a materialidade e o dolo da agente, e sendo o fato típico, antijurídico e culpável, considerando a ine-xistência de causas excludentes de ilicitude ou exculpantes, a manuten-ção da sentença condenatória é medida que se impõe, reduzindo-se as sanções impostas.

3. É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base, seja em qual circunstância judicial o for. Inteligência da Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça e dos precedentes daquela egrégia Corte.

4. Esse Colegiado tem como critério, para permitir a valora-ção negativa das consequências do crime a presença de um prejuízo

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ao Erário maior do que R$100.000,00 (cem mil reais), a exemplo das ACRs 2002.71.07.013022-0 (Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Pen-teado – DJU 22.11.2006), 2007.72.08.002723-5 (Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DE 30.04.2010) e 2006.70.00.031205-1/PR (de minha relatoria, DE 18.03.2011). No caso, o dano suportado pela União foi abai-xo desse patamar, devendo ser afastada a desfavorabilidade dessa cir-cunstância.

5. Cuidando-se da conduta daquele que realizou a fraude para terceiro perceber o benefício assistencial, resta caracterizado delito de natureza instantânea. Decorridos mais de quatro anos entre a data do auferimento da primeira prestação e o recebimento da denúncia, opera-se a prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal, impondo-se a declaração da extinção da punibilidade da ré de ofício.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação para reduzir as sanções impostas na sentença e declarar, de ofício, extinta a punibilidade de Irene Ferreira de Souza, com fulcro no art. 107, IV, do Código Penal, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre – RS, 18 de dezembro de 2013.

Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Relator

RELATÓRIO

O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra Irene Ferreira de Souza (nascida em 13-11-1964 – evento 01 do processo originário, “INQ4”, p. 44), dando-a como incursa nas sanções dos artigos 171, §3º, do Código Pe-nal, nos seguintes termos (evento 01 do processo originário, “INIC1”):

“1. Em data de 24.11.2003, a denunciada Irene Ferreira de Souza, despa-chante de pedidos de benefícios junto ao Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, deu entrada em pedido de concessão de benefício de Ampa-ro Social ao Portador de Deficiência Física, em nome de Gisele Machado

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Batista, preenchendo os documentos necessários com informações inverí-dicas.

2. De acordo com a Lei Orgânica da Assistência Social (Lei nº 8.742/1993), ao tratar da concessão de benefícios de prestação continuada:

‘Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) sa-lário-mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto (Redação dada pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)

§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de de-ficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o tra-balho.

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.’

3. A denunciada, com o fim de preencher os requisitos supramenciona-dos, completou os documentos de fls. 02/03 do Apenso I, Volume II, com as informações de que Gisele Machado Batista moraria sozinha e que não possuiria renda familiar, fatos estes que posteriormente se constataram in-verídicos.

4. Vê-se, portanto, que a denunciada, de forma livre e consciente, utilizou--se de documento ideologicamente falso para, induzindo o Instituto Na-cional de Seguro Social – INSS em erro, obter vantagem ilícita, consistente na concessão indevida de benefício previdenciário, em prejuízo daquela autarquia previdenciária. Incorreu, dessa forma, nas sanções do art. 171, §3º, do Código Penal.

5. A materialidade do delito encontra-se comprovada nos documentos cons-tantes dos autos. O Instituto Nacional da Seguridade Social – INSS, em processo de verificação do pedido de concessão de benefício, realizou di-versas diligências que comprovaram a falsidade das informações prestadas no documento de fl. 03 do Apenso I, Volume II.

Alvair de Fátima Machado Batista, mãe de Gisele Machado Batista, infor-mou à fl. 31 que em meados de 2003, época do pedido de concessão do benefício, Gisele residia com a irmã da declarante, Célia Regina Machado, e não sozinha como é informado no documento questionado. Tal informação

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foi comprovada pela própria Gisele às fls. 35/36 dos autos, bem como pelo seu pai, Antônio Carlos de Souza Batista, à fl. 33.

Alvair de Fátima Machado Batista ainda elaborou duas declarações escri-tas, em que afirma que Gisele Machado Batista mora na sua residência, junto com a declarante, desde o mês de maio de 2007 (fls. 40 e 62 do Apenso I, Volume II).

Com base nessa informação, o Instituto Nacional da Seguridade Social – INSS concluiu que o benefício concedido encontrava-se irregular desde a competência de maio de 2007, causando um prejuízo à autarquia federal no valor de R$ 11.864,20 (onze mil, oitocentos e sessenta e quatro reais e vinte centavos) – fl. 68 do Apenso I, volume II.

No que diz respeito à renda familiar utilizada ao sustento de Gisele Macha-do Batista, também restou comprovada a falsidade da informação prestada à fl. 03 do Apenso I, Volume II, constatou-se que Alvair de Fátima Macha-do Batista, mãe de Gisele, detém cargo ativo de Agente Penitenciário desde 11.04.1986, e que seu salário correspondia, já no ano de 2002, ao valor de R$ 1.562,51 (mil quinhentos e sessenta e dois reais e cinquenta e um centavos), ou seja, superior ao valor máximo exigido pelo § 3º da Lei nº 8.742/1993 (renda mensal inferior a ¼ do valor do salário mínimo à épo-ca do pedido).

6. A autoria do delito também restou plenamente demonstrada nos autos.

Gisele Machado Batista prestou depoimento às fls. 35/36 dos autos, ale-gando que:

‘[...] se lembra que foi uma pessoa de nome Irene, cujo sobrenome não se recorda, a pessoa que auxiliou a declarante e que fez o pedido de benefício no INSS, tendo a declarante assinado alguns documentos e entregue alguns documentos para Irene, somente a declarante indo ao INSS para realização de perícia [...] que esclarece que quando assinou os documentos de fls. 02/03 do apenso I vol. II, tais documentos esta-vam em branco, tendo assinado os mesmos para Irene a seu pedido; que não é sua a grafia que consta nos documentos de fls. 02/03 citados acima; QUE não tinha conhecimento de que no seu pedido de benefício previdenciário iria constar que a declarante residia sozinha, conforme 03, do apenso I, vol. II; QUE esclarece que IRENE quando orientou a declarante sobre o benefício, nada disse sobre a declarante ter de infor-mar que residia sozinha, bem como nada informou sobre algum tipo de informação sobre a renda familiar na residência da declarante.’

Foi colhido o material gráfico da denunciada Irene Ferreira de Souza às fls. 46/52, tendo sido submetido a exame pericial pelo Instituto de Crimi-

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nalística, com o fim de se determinar a autoria pelo preenchimento das informações nos documentos de fls. 02/03 do Apenso I, volume II.

Foi elaborado Laudo de Exame Documentoscópico às fls. 62/67. Ao com-parar os documentos supramencionados com a grafia colhida de Irene Fer-reira de Souza, os peritos verificam diversos elementos de convergência, de foma a concluir que os manuscritos constantes nos documentos analisados partiram do punho de Irene Ferreira de Souza.”

A peça incoativa foi recebida em 10.10.2011 (evento 03 do processo ori-ginário).

Instruído o feito, sobreveio sentença (evento 56 do processo originá-rio), disponibilizada na plataforma digital em 28.06.2012, julgando proceden-te a denúncia, para condenar Irene Ferreira de Souza pela prática do delito previsto no art. 171, caput e § 3º, do Código Penal, às penas de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto, e 44 (quarenta e quatro) dias-multa, à razão unitária de 1/4 (um quarto) do salário mínimo vigente ao tempo da cessação do crime (em 07/2009, quando cessou o pagamento do benefício). A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários mínimos. Foi fixado o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, em R$ 11.864,20 (onze mil e oitocentos e sessen-ta e quatro reais e vinte centavos).

A Defensoria Pública da União, atuando na defesa de Irene, interpôs recurso de apelação. Em suas razões (evento 73 do processo originário), re-quer a absolvição da ré, sustentando a ausência de prova do caráter ilícito da vantagem obtida. Argumenta, ainda: a) a necessidade de diminuição da pena-base e do número de dias-multa, sob o entendimento de que ocorreu bis in idem, consistente na valoração de antecedentes, conduta social e personali-dade em função das mesmas circunstâncias, bem como que a vetorial “conse-quências do crime” deve ser reputada neutra; b) a ausência de fundamenta-ção na fixação da prestação pecuniária; c) a excessividade do valor arbitrado para o dia-multa e que a época dos fatos deve ser considerada como sendo dia 24.11.2003, quando obtido o benefício e; d) necessidade da supressão do valor mínimo dos danos a reparar, por ausência de apuração adequada e para evitar o enriquecimento sem causa, tendo em conta que “o próprio INSS não considerou indevido o benefício no período entre 24.11.2003 e 30.04.2007”.

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Com contrarrazões (evento 77 do processo originário), ascenderam os autos a esta Corte.

O Ministério Público Federal atuante nesta instância manifestou-se pelo desprovimento do recurso (evento 05).

É o relatório.

À revisão.

Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Relator

VOTO

Trata-se de apelação interposta por Irene Ferreira de Souza em face de sentença que a condenou pela prática do crime previsto no art. 171, caput e § 3º, do Código Penal, às penas de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de re-clusão e 44 (quarenta e quatro) dias-multa, à razão unitária de ¼ (um quarto) do salário mínimo vigente em julho de 2009 (quando cessou o pagamento do benefício assistencial).

1 IMPUTAÇÃO PENAL

O delito cuja prática é atribuída à acusada encontra-se assim descrito no Estatuto Repressivo:

“Art. 171 Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa.

§ 3º A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assis-tência social ou beneficência.”

Destarte, para a subsunção de determinada conduta no tipo penal aci-ma descrito, é essencial a presença dos seguintes elementos objetivos:

“Para que o estelionato se configure, é necessário: 1º) o emprego, pelo agen-te, de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento; 2º) induzimento ou manutenção da vítima em erro; 3º) obtenção de vantagem patrimonial ilícita pelo agente; 4º) prejuízo alheio (do enganado ou de terceira pessoa).

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Portanto, mister se faz que haja o duplo resultado (vantagem ilícita e pre-juízo alheio) relacionado com a fraude (ardil, artifício etc.) e o erro que esta provocou.” (DELMANTO, Celso et alli. Código Penal Comentado. 6. ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 396)

Na espécie em julgamento, consta da denúncia que a acusada obteve vantagem ilícita para Gisele Machado Batista, consistente em benefício assis-tencial de amparo à pessoa portadora de deficiência, em prejuízo do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, mediante o preenchimento de falsa decla-ração no sentido de que a requerente residia sozinha (evento 01 do proces-so originário, “AP-INQPOL6”, p. 03). Segundo a exordial, Gisele não tinha direito ao benefício, uma vez que fora concedido sem considerar sua renda familiar.

No tocante à alegação defensiva de eventual licitude do benefício assis-tencial obtido por Gisele Machado Batista, há que ser rechaçada. Isso porque restou claro, durante a instrução processual, que a família de Gisele não se encontrava em situação de miserabilidade que justificasse a percepção do be-nefício assistencial.

O benefício de amparo assistencial à pessoa portadora de deficiência encontra respaldo no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, regulamen-tado pela Lei nº 8.742/1993. De acordo com o art. 20 do mencionado diploma legal, em sua redação original, “benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família”.

Tal não é o caso desta ação penal, uma vez que a ré informou, de forma livre e consciente, que a beneficiária, além de não possuir renda própria, resi-dia sozinha, sendo este dado inverídico. Dessa forma, afastou a necessidade de análise da renda do núcleo familiar em que Gisele estava inserida, resul-tando na concessão, de plano, do benefício pleiteado.

Outrossim, cabe destacar que restou claro, nos depoimentos judiciais de Gisele e de seus genitores (eventos 46 e 47 do processo originário), que aquela sempre recebeu o apoio da família, corroborado pelo fato de que, em momento algum, foi mencionado que os pais da beneficiária deixaram de exercer o poder familiar sobre esta, apenas contando com o apoio da fa-mília extensa nos cuidados necessários com ela. Também, Alvair de Fátima Machado Batista, mãe de Gisele, esclareceu que esta apenas passou residir com a irmã, entre 2003 e 2007, porque teria uma melhor assistência e convi-

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vência com os três primos. Ainda, consta no evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 44/47, que a genitora de Gisele, ocupava, em 05.06.2009, o cargo público de Agente Penitenciário desde 11.04.1986, e, em dezembro de 2002, percebia remuneração no valor de R$ 1.562,51, ou seja, em muito superior ao patamar de ¼ do salário mínimo por pessoa da família (art. 20, §3º, da Lei nº 8.742/1993), sem considerar a renda mensal do pai e da tia com quem resida à época dos fatos, todos “funcionários públicos” (eventos 01 e 47 do processo originário, “INQ4”, p. 30, e “TERMOTRANSCDEP1”, p. 04).

Ademais, Gisele asseverou, em seu depoimento judicial (evento 46 do processo originário), que utilizava exclusivamente para si o beneficio assis-tencial, não mencionando a necessidade de auxílio nas despesas domésticas.

Logo, o benefício assistencial percebido por Gisele era indevido, não havendo se falar em vantagem lícita, restando perfeitamente configurado o delito de estelionato imputado à ré.

Encontram-se presentes, portanto, os requisitos para a configuração do delito de estelionato, visto que comprovadamente foi utilizado meio fraudu-lento para induzir e manter a entidade de direito público em erro, obtendo-se vantagem patrimonial ilícita em prejuízo da Autarquia.

2 MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO

A materialidade do delito em questão está atestada pelos seguintes ele-mentos:

a) Processo administrativo que determinou a concessão do benefício assistencial LOAS nº 87/131.831.845-6 a Gisele Machado Batista (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”);

b) Ofício nº 561/2009 da Secretaria de Estado da Administração e da Previdência, informando o vínculo funcional efetivo de Alvair de Fáti-ma Machado Batista, genitora de Gisele (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 44/46);

c) Consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais de Alvair de Fátima, referente ao ano de 2002 (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 47);

d) Cálculo e atualização monetária de valores recebidos indevida-mente, totalizando, apenas no período de maio de 2007 a julho de 2009, R$ 11.864,20 (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 63);

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e) Relatório emitido pela Gerência-Executiva do INSS em Curitiba (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 66/68);

f) Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico) 1976/2010 (evento 01 do processo originário, “INQ4”, p. 61/66);

g) Depoimentos judiciais da beneficiária Gisele Machado Batista e de sua genitora Alvair de Fátima Machado Batista, nos quais afirmam: que Gi-sele assinou documento em branco para que a ré o preenchesse, a fim de instruir o pedido de benefício assistencial de amparo a pessoa portadora de deficiência, sendo acordado o pagamento do valor aproximado de três salá-rios mínimos caso benefício fosse concedido e; que a beneficiária, em razão de suas limitações físicas, que a tornam, de forma notória, dependente de cuidados permanentes, jamais residiu sozinha (eventos 46 e 47 do processo originário);

h) Depoimento judicial da ré manifestando, de forma inequívoca, ciên-cia da necessidade de comprovação do requisito econômico para a obtenção do benefício assistencial pleiteado e, em contrapartida, asseverando não ter buscado saber o que a tia e a mãe de Gisele faziam (eventos 46 e 47 do pro-cesso originário).

No que tange à autoria delitiva, transcrevo os bem lançados fundamen-tos da sentença, os quais adoto como razões de decidir (evento 56 do proces-so originário):

“11. A acusada Irene Ferreira de Souza, na condição de despachante de be-nefícios junto ao INSS, protocolou, em 24.11.2003, requerimento de benefí-cio de Amparo Social ao Portador de Deficiência Física, em nome de Gisele Machado Batista, utilizando-se de informações inverídicas, uma vez que teria sido informado que a beneficiária residia sozinha, quando na verdade ela residia com sua tia. Após monitoramento operacional do INSS, o bene-fício foi suspenso quando da constatação de que Gisele passou a residir a partir de maio/2007 com a sua mãe – Alvair Fátima Machado Batista – e que a renda per capita do grupo familiar era superior a estabelecida pela Lei nº 8.743/1993 (fl. 49 do apenso I, vol. II, do inquérito policial). Teria sido constatado prejuízo à Autarquia Previdenciária no valor de R$ 11.864,20 (fl. 66-69, do apenso I, vol. II, do inquérito policial).

[...]

14. Inquirida sobre os fatos em Juízo, a acusada confirmou ter intermediado o requerimento de benefício para Gisele mediante pagamento, mas negou a conduta que lhe é imputada, afirmando que não preencheu o formulário

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acostado às fls. 02-03 do apenso I, vol II, do inquérito policial. Transcreve--se o seguinte trecho do interrogatório judicial:

‘Juíza Federal: – Tá. Nesse momento então a senhora lembra de ter con-tatado ou de ter sido contatada pela Gisele para entrar com esse pedido?

Interrogada: – Sim, ela me ligou, perguntou se eu poderia fazer para ela porque ela não tinha condições de ir na fila de madrugada, não é?

[...]

Juíza Federal: – Quem que formulou, quem que assinou e escreveu es-ses dados, quem que preencheu esses dados?

Interrogada: – Quem preencheu não me recordo, mas quem assinou...

Juíza Federal: – Parece com a sua letra?

Interrogada: – Não. Eu não lembro.

Juíza Federal: – Tá. A senhora consegue visualizar que é uma letra bem diferente daquela que esta assinada ali embaixo pela Gisele, não é? Uma letra de forma e não uma grafia. Nem se parece com a sua letra?

Interrogada: – Não.

Juíza Federal: – Tá. Foi feito um laudo grafotécnico aqui que colheu material gráfico da senhora e a perícia constatou que essa letra é sua. A senhora não confirma isso?

Interrogada: – Não, não confirmo.

Juíza Federal: – Certo. A próxima página então, por favor. A senhora sabe me dizer quem é que preencheu isso?

Interrogada: – Eu não me recordo.

Juíza Federal: – Não se recorda? Essa letra parece com a da senhora?

Interrogada: – Não é parecida.

Juíza Federal: – Não é parecida também? Ok. Normalmente esses for-mulários eles eram entregues em branco para a requerente preencher ou ela mesma que preenchia?

Interrogada: – Nós, na época a gente entregava para ela e eles traziam preenchido já com toda documentação que a gente pedia.’ (evento 47)

15. Em que pese a negativa da acusada, as evidências constantes nos autos apontam em sentido contrário. A beneficiária, tanto no inquérito policial como

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durante a instrução processual, afirmou que não preencheu os documen-tos, tendo assinado-os em branco. Veja-se:

‘que esclarece que quando assinou os documentos de fls. 02-03 do apen-so I vol. II, tais documentos estavam em branco, tendo assinado os mes-mos para Irene a seu pedido’ (Gisele Machado Batista, fl. 35 do IPL)

‘Juíza Federal: – Tá. Na época desses fatos aqui a senhora lembra de ela ter... da senhora ter preenchido algum tipo de requerimento para ela entrar no INSS?

Depoente: – Não, eu não preenchi nada, eu só assinei uma folha em branco.

Juíza Federal: – Está bem. Eu vou lhe mostrar aqui às fls. 02 e 03 que constam do Apenso 01, Volume II. Quero saber se a senhora reconhece como sendo sua, a sua assinatura aqui, logo abaixo. A senhora lembra de ter preenchido esse documento para ela?

Depoente: – Eu lembro que... eu lembro que eu assinei uma folha em branco.

Juíza Federal: – Não lembra se era essa?

Depoente: – Não, estava em branco a folha.

Juíza Federal: – A folha 03 a senhora também não lembra se a senhora chegou a assinar ali embaixo onde tem um X?

Depoente: – Não, não. Estava em branco a folha que eu assinei.’

(Gisele Machado Batista, evento 47)

16. A mãe da beneficiária também afirmou em Juízo que os documentos foram assinados por Gisele em branco, e que, segundo lhes teria sido infor-mado, seriam preenchidos posteriormente por Irene. Confira-se:

‘Defesa: – Sim, Excelência. Obrigada. Dona Alvair, a senhora... a sua filha disse que ela tomou conhecimento desse serviço de despachante prestado pela Sra. Irene, numa igreja. A senhora confirma?

Depoente: – É... não sei direito. Ela falou que foi amigos dela parece que falaram, que ela sempre pensava, ela queria ter o dinheirinho dela.

Defesa: – Sim.

Depoente: – Daí os amigos dela falaram: ‘Mas Gisele, você tem direito. Você não trabalha, você é deficiente’. Não é? Daí acho que deram o en-dereço para ela, deram o telefone da Irene para ela.

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Defesa: – E a senhora acompanhou todas as vezes... a senhora acompa-nhou a Gisele todas as vezes que ela se encontrou com a Dona Irene?

Depoente: – Eu só fui uma vez, encontrei com a Dona Irene uma vez.

Defesa: – Uma vez? E que vez foi essa, foi no dia que a sua filha...

Depoente: – Foi o dia que foi levado os papel lá.

Defesa: – Foi levar os documentos?

Depoente: – Hum-hum.

Defesa: – E a senhora se lembra se a sua filha assinou algum documen-to? Algum requerimento?

Depoente: – Ela assinou um papel.

Defesa: – Um papel?

Depoente: – Hum-hum.

Defesa: – E a senhora se lembra do conteúdo desse papel?

Depoente: – Não.

Defesa: – A senhora não acompanhou a sua filha...

Depoente: – Não, ela assim... ela disse que ela assinava o papel, depois ela, depois a Dona Irene disse que preenchia. Uma coisa assim.

Defesa: – Hum-hum.

Depoente: – Não lembro direito, era uma coisa assim, ela assinou o pa-pel e depois a Dona Irene disse que iria preencher.

Defesa: – Mas a senhora presenciou essa cena, a senhora viu ou esse papel estava em branco, se era um papel pautado com várias perguntas, um formulário apresentado pelo INSS?

Depoente: – Não lembro direito, era um papel do INSS.

[...]

Juíza Federal: – Nas fls. 02 e 03 aqui dos autos. É esse documento ou de repente foi o da fl. 03?

Depoente: – É, foi esse documento mesmo que ela assinou.

Juíza Federal: – Foi esse documento? E ele estava preenchido a caneta ou ele estava...

Depoente: – Estava em branco.

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Juíza Federal: – Totalmente em branco, tanto da fls. 02 quanto da fls. 03?

Depoente: – Estava em branco.’

(Alvair de Fátima Machado Batista, evento 47)

17. De outra parte, na perícia grafotécnica realizada por meio da compara-ção da grafia fornecida pela acusada e daquela constante nos documentos fraudados, restou consignado: ‘verificou-se alguns elementos de conver-gência entre tais manuscritos, na forma e gênese fráficas de determinados caracteres ‘G’, ‘C’, ‘L’, ‘P’, ‘M’, ‘Z’ e em certos gramas dos caracteres ‘R’, entre outros, bem como na presença característica de um ponto entre os vocábulos, que indicam terem partido do mesmo punho escritor as escritas com-paradas’ (fl. 66 do inquérito policial).”(grifos originais)

Com efeito, o Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico) 1976/2010 (evento 01 do processo originário, “INQ4”, p. 61/66) aponta que as anotações constantes nos formulários que instruíram o pedido do benefí-cio assistencial para Gisele podem ter partido do punho da apelante. Cote-jando tal ilação com os depoimentos prestados em juízo pela beneficiária e seus genitores e pela própria ré, que confirmou ter encaminhado o pedido do benefício em tela junto ao INSS, conclui-se que as anotações foram efetuadas por Irene Ferreira de Souza.

No tocante ao dolo presente na conduta da ré, anote-se, outrossim, como bem salientado no decisum recorrido, que:

“18. É certo que o fato de ter sido a acusada quem preencheu o documen-to – como se extrai da perícia – não pode ensejar por si só a sua condena-ção; isso porque ela pode, como argumenta a sua Defesa, ter preenchido o documento com base nas informações então repassadas pela requerente. Ocorre que a própria acusada afirmou no interrogatório que Gisele havia lhe dito que morava com uma tia, e não sozinha, como constou no reque-rimento ao INSS:

‘Ministério Público Federal: – E consta aqui então marcado que ela vive sozinha, no formulário que a senhora verificou e manuseou. A senhora sabe de onde veio essa informação?

Interrogada: – Olha, o que ela me passou é que ela morava com a irmã da mãe, com a tia, não é? Que ficava cuidando dos parentes como ela já afirmou, não é, sobrinho, primo.’

(Irene Ferreira de Souza, acusada, evento 47)

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19. Ademais, há outra circunstância que demonstra que a acusada agiu de forma fraudulenta perante o INSS. Veja-se que, pelo que se extrai do seu interrogatório, a acusada tinha plena ciência do requisito econômico para a concessão do benefício, mas mesmo assim não procurou se informar com a requerente a fim de verificar se ela realmente possuía o direito ao benefício social.

‘Juíza Federal: – De toda forma, a senhora perguntou para ela como que era a situação de renda dela?

Interrogada: – Eu perguntei, ela falou que morava com uma tia, que ela não tinha renda nenhuma.

Juíza Federal: – Ela falou que morava com uma tia?

Interrogada: – Uma tia, irmã da mãe, uma coisa assim.

Juíza Federal: – Isso ela lhe disse?

Interrogada: – Me disse, e só disse que ela não tinha renda nenhuma e que ela precisava muito porque ela queria estudar, queria até fazer faculdade, ela disse: “Eu preciso de um benefício”. Que os amigos fala-ram que ela tinha direito, não é? Eu disse: “Olha, eu não digo que você tem direito, nós podemos dar entrada. Quem vai dizer se tem direito ou não é o próprio INSS”.

Juíza Federal: – Tá. Mas a senhora, ciente dos requisitos para esse bene-fício, se a pessoa mora com alguém que lhe sustente, ela tem direito ao benefício assistencial?

Interrogada: – Desde que não tenha renda superior a um tanto lá que eles

pedem, não é?

Juíza Federal: – Tá. E a senhora chegou a perguntar do que a tia dela trabalhava?

Interrogada: – Não, não perguntei.

Juíza Federal: – Tá, e a senhora recebeu algum valor para esse serviço?

Interrogada: – Eu não lembro na época, mas me pagaram.

Juíza Federal: – Pagaram para senhora?

Interrogada: – Pagaram alguma coisa, parece que parcelado, eu não lembro.

Juíza Federal: – E pagaram só para senhora ficar na fila?

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Interrogada: – Não, para mim poder protocolar, não é, porque daí como eu não pude ir no dia o meu esposo que foi daí para protocolar, para não perder a senha, não é.

Juíza Federal: – Tá. Então em momento nenhum a Gisele lhe disse que ela morava sozinha, ela lhe disse que morava com a tia?

Interrogada: – Ela disse que morava sozinha e dependia da tia, não é, só que também eu não entrei em detalhes para eu saber o que a tia fazia, ou a mãe fazia também, não.’ (evento 47)

20. Considerando que a própria acusada afirmou que à época dos fatos atu-ava como despachante junto ao INSS, com ciência inclusive dos requisitos para a concessão do benefício de amparo social ao portador de deficiência física, causa estranheza o fato de ela não ter verificado se a requerente real-mente possuía direito ao benefício.

21. Sopesando tal circunstância, o fato de haver prova de que foi a acusada quem preencheu o formulário de requerimento (laudo pericial às fls. 62-67 do inquérito policial e depoimentos indicando que a requerente assinou os documentos em branco), e ainda a simples negativa de autoria, torna-se fortalecida a tese da Acusação, de que ela teria intencionalmente induzido o INSS em erro, fazendo-o acreditar que a requerente residia sozinha e sem renda, a fim de adequá-la às condições impostas pela Lei nº 8.743/1993.

22. Saliente-se, por outro lado, que, cf. se extrai dos autos, a beneficiária residia à época da concessão do benefício com sua tia, que trabalhava como funcionária pública estadual, sendo de todo improvável que a sua renda fosse igual ou inferior a estipulada como limite para a concessão do be-nefício (renda per capita do grupo familiar inferior a ¼ do salário mínimo vigente). Confira-se:

‘que quando sua filha Gisele Machado Batista fez o pedido de bene-fício previdenciário em meados de 2003, a mesma residia com a irmã da declarante, Célia Regina Machado, junto com outros três filhos des-ta; que na época Célia trabalhava, sendo funcionária pública estadual da Secretaria de Justiça, no cargo de auxiliar de escritório;(Alvair de Fátima Machado Batista, mãe da beneficiária, fl. 31 do inquérito poli-cial)

‘Defesa: – E qual a formação dos seus pais?

Depoente: – Ai... eles trabalham para o estado, funcionário público.

Defesa: – Eles são funcionários públicos?

Depoente: – Sim.

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Defesa: – Entendi. E a sua tia?

Depoente: – Também.

Defesa: – Também, os três são funcionários públicos?

Depoente: – Isso.’

(Gisele Machado Batista, evento 47)”

De todo o exposto, não restam dúvidas acerca da indevida concessão do benefício de prestação continuada à segurada Gisele Machado Batista, a qual foi instruída pela ré Irene que, sem o conhecimento da beneficiária, preencheu formulário com declaração falsa de que Gisele residia sozinha, aparentando o desamparo familiar. Entrementes, a ré tinha plena consciên-cia da ilicitude perpetrada, tanto que afirmou, em seu interrogatório judicial, embora ciente da necessidade de aferição do requisito “renda familiar”, não ter questionado Gisele, nem a sua genitora, acerca de seus rendimentos (fato confirmado pelos depoimentos de Gisele e de sua mãe).

Nesses termos, demonstrados a materialidade, a autoria e o dolo da agente, e ausentes quaisquer circunstâncias que excluam a tipicidade, a an-tijuridicidade ou a culpabilidade, afigura-se incensurável a condenação de Irene Ferreira de Souza pela prática do delito de estelionato majorado, nos termos do art. 171, §3º, do Código Penal.

3. DOSIMETRIA

Na primeira fase, a sentença estabeleceu a desfavorabilidade: dos ante-cedentes, considerando a condenação com trânsito em julgado na ação penal 2004.70.00.012740-8; da conduta social e da personalidade, com base em outros apontamentos criminais nos eventos 5, 11, 20 25 e 30, contendo registros da prática de crime da mesma natureza; das consequências do delito, em vista do prejuízo causado ao Estado (R$ 11.864,20), aumentando a reprimenda em 09 (nove) meses, restando a pena-base fixada em 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão.

No que pertine à exasperação das vetoriais da personalidade da agente e de sua conduta social, segundo a Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça, “é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”, e, segundo a jurisprudência daquela Corte, seja em qual circunstância judicial for:

“HABEAS CORPUS – DIREITO PENAL – HOMICÍDIO QUALIFICADO – CONDENAÇÃO – DOSIMETRIA DA PENA – CONDUTA SOCIAL NE-

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GATIVA – INIDONEIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO – AUSÊNCIA DE CONDENAÇÕES TRANSITADAS EM JULGADO – CULPABILIDADE DO AGENTE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME – MOTIVAÇÃO VÁLI-DA – ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA

1. [...]

2. Inquéritos policiais ou ações penais em andamento não se prestam a majorar a pena-base, seja a título de maus antecedentes, conduta social negativa ou persona-lidade voltada para o crime, em respeito ao princípio da presunção de não culpabi-lidade. Incidência do Enunciado nº 444 da Súmula desta Corte.

[...]

4. Ordem parcialmente concedida para, mantida a condenação do Paciente, reformar a sentença de primeiro grau e o acórdão impugnados, no tocante à dosimetria da pena, nos termos acima explicitados.” (HC 194.318, 5ª Tur-ma, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe 01.09.2011)

“HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS COMETIDO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 6.368/1976 – DOSIMETRIA – PENA-BASE – FIXAÇÃO ACI-MA DO MÍNIMO LEGAL – MAUS ANTECEDENTES – CONDENAÇÃO SEM CERTIFICAÇÃO DO TRÂNSITO EM JULGADO – SOPESAMENTO PARA A ELEVAÇÃO DA REPRIMENDA NA PRIMEIRA ETAPA DA DO-SIMETRIA – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 444 DESTE STJ – CONS-TRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO – SANÇÃO REDIMENSIO-NADA

1. Consoante orientação já sedimentada nesta Corte Superior, condenação sem a certificação do trânsito em julgado não pode ser levada à consideração de maus antecedentes, má conduta social ou personalidade desajustada para a elevação da pena-base, em obediência ao princípio da presunção de não-culpabilidade. Exege-se da Súmula 444 deste STJ.[...]” (HC 96.007, 5ª Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi – DJe 02,09,2011)

Ademais, tais circunstâncias não suscitam valoração negativa na per-sonalidade da agente, a qual se refere a outros parâmetros:

“[...] personalidade distingue-se de maus antecedentes e merece ser ana-lisada, no contexto do art. 59, separadamente. Por isso, é imprescindível cercar-se o juiz de outras fontes, tais como testemunhas, documentos etc., demonstrativos de como age o acusado na sua vida em geral, indepen-dentemente de acusações no âmbito penal.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 13. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 433).

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“[...] A personalidade é formada pelo conjunto dos dados externos e inter-nos que moldam um feitio de agir do réu, instrumental que ele herdou ou adquiriu e com o qual responde às diversas situações que lhe são propostas na vida diária. Foi definida como ‘a organização dinâmica dos sistemas psi-cofísicos que determinam o ajustamento do indivíduo ao meio circundan-te’. Quanto mais esse conjunto levou o réu a comportamentos reprováveis, tanto mais o crime é um reflexo dessa personalidade, que, por isso mesmo, deve sofrer um juízo-negativo; é o que acontece quando a personalidade do autor revela tendências criminais.[...]” (AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado. Aplicação da Pena. In Revista da AJURIS, nº 70, em setembro/2000, p. 232).

Assim, considero neutras as vetoriais da personalidade e conduta so-cial.

Outrossim, este Colegiado tem como critério, para permitir a valo-ração negativa das consequências do crime a presença de um prejuízo ao Erário maior do que R$ 100.000,00 (cem mil reais), a exemplo das ACRs 2002.71.07.013022-0 (Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado – DJU 22,11,2006), 2007.72.08.002723-5 (Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DE 30.04.2010) e 2006.70.00.031205-1/PR (de minha relatoria, DE 18.03.2011). No caso, o dano suportado pela União foi abaixo desse pa-tamar. Por esse motivo, reduzo a sanção basilar para 01 (um) ano e 02 (dois) meses e 07 (sete) dias de reclusão.

Na segunda etapa, não foram reconhecidas agravantes ou atenuantes, mantendo-se a reprimenda no mesmo patamar do passo anterior, o qual foi reduzido.

Na derradeira etapa, incidiu corretamente a causa de aumento de 1/3 (um terço) do § 3º do art. 171 do Código Penal, considerando que o sujeito passivo da conduta é entidade pública de direito público (INSS). Assim, resta a pena definitiva fixada em 01 (um) ano, 06 (seis) meses e 29 (vinte e nove) dias de reclusão.

No tocante à pena de multa, em atendimento à simetria entre as san-ções, verifico que poderia ter sido fixada em patamar até superior ao estabe-lecido pelo julgador monocrático. Todavia, em face da vedação da reformatio in pejus, mantenho-a em 44 (quarenta e quatro) dias-multa, o que se afigura razoável à espécie e mais benéfico à condenada. Entretanto, reduzo o valor do dia-multa para 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo da consumação do crime, em vista da situação econômica da ré.

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Ainda, impende destacar que, em se tratando a ré apenas de falsá-ria, que não a destinatária direta do benefício previdenciário, o crime é instantâneo e se consuma com o recebimento da primeira parcela do be-nefício, in casu, 24 de novembro de 2003 (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 63). Esse é o entendimento fixado na seguinte decisão proferida por esta Colenda Turma:

“PENAL E PROCESSUAL PENAL – ART. 171, §3°, DO CÓDIGO PENAL C/C O ART. 29 DO MESMO ESTATUTO – PRELIMINAR DE MÉRITO – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA – TRANSCURSO DE MAIS DE QUATRO ANOS ENTRE O RECEBIMENTO DA PRIMEIRA PRESTA-ÇÃO PREVIDENCIÁRIA E O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA OU DO SEU ADITAMENTO

1. O Supremo Tribunal Federal possui posicionamento (por todos o HC 82965, 2ª Turma, Rel. Ministro Cesar Peluso – DJe 28.03.2008) de que, o ter-mo inicial para a contagem do prazo prescricional do crime de estelionato previdenciário é a data do recebimento da primeira prestação do benefício indevido, quando é imputado a alguém o comportamento de realização de uma fraude para permitir a percepção do benefício por terceiro.

2. As rés receberam reprimendas entre um e dois anos de reclusão, ense-jando um prazo prescricional de quatro anos (art. 109, inciso V, do Código Penal). Assim, como entre a data da consumação das condutas atribuídas às acusadas e o recebimento da denúncia ou o seu aditamento transcor-reu prazo maior do que quatro anos, resta configurada a prescrição da pretensão punitiva.” (ACR 0002581-20.2007.404.7105, minha Relatoria, DE 01.12.2011).

Neste sentido, tendo em conta a eventualidade da prescrição pela pena concretamente aplicada, cabe, no caso em tela, seu reconhecimento de ofício. Com o trânsito em julgado para a acusação, a prescrição regula-se pela pena concretamente aplicada, consoante os §§ 1º e 2º do art. 110 do Código Penal, na redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.07.1984, vigente ao tempo dos fatos. A pena, definitivamente imposta, equivale a 01 (um) ano, 06 (seis) meses e 29 (vinte e nove) dias de reclusão, o que atrai o patamar prescricional de 04 (qua-tro) anos, previsto no art. 109, V, do Código Penal. Portanto, considerando ter transcorrido tal período entre a época em que se tipificou o delito (24.11.2003 – evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 63) e o recebimento da denúncia 10.10.2011 (evento 03 do processo originário), reconheço a prescri-ção da pretensão punitiva estatal, declarando extinta a punibilidade de Irene Ferreira de Souza pelos fatos que lhe são imputados nesta demanda.

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4 DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação para reduzir as sanções impostas na sentença e declarar, de ofício, extinta a punibilidade de Irene Ferreira de Souza, com fulcro no art. 107, IV, do Código Penal.

Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Relator

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18.12.2013

Apelação Criminal nº 5023341-84.2011.404.7000/PR

Origem: PR 50233418420114047000

Relator: Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus

Presidente: Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus

Procurador: Carlos Augusto da Silva Cazarré

Revisor: Des. Federal Leandro Paulsen

Apelante: Irene Ferreira de Souza

Procurador: Henrique Guimarães de Azevedo (DPU) DPU129

Apelado: Ministério Público Federal

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18.12.2013, na sequência 15, disponibilizada no DE de 09.12.2013, da qual foi intimado(a) o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública.

Certifico que o(a) 8ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epí-grafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação para reduzir as sanções impostas na sentença e declarar, de ofício, extinta a punibilidade de Irene Ferreira de Souza, com fulcro no art. 107, IV, do Código Penal, nos termos do voto do relator.

Relator acórdão: Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus

Votante(s): Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Des. Federal Leandro Paulsen Des. Federal João Pedro Gebran Neto

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Lisélia Perrot Czarnobay Diretora de Secretaria

EMENTA

PENAL E PROCESSUAL PENAL – ESTELIONATO CONTRA O INss – ART. 171, §3º, DO CÓDIGO PENAL – DECLARAÇÃO

fALSA PARA A CONCESSÃO DE bENEfÍCIO ASSISTENCIAL – CONDUTA DE AgENTE QUE IMPLEMENTA A fRAUDE PARA QUE TERCEIRO LOgRE O AMPARO INDEVIDO –

CRIME INSTANTÂNEO – MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS – DOSIMETRIA – REDUÇÃO DAS

SANÇÕES IMPOSTAS – PRESCRIÇÃO RETROATIVA1. Para a configuração do delito de estelionato é necessário o

emprego, pelo agente, do meio fraudulento e a obtenção de vantagem patrimonial indevida, para si ou para outrem, em prejuízo alheio.

2. Devidamente provados a autoria, a materialidade e o dolo da agente, e sendo o fato típico, antijurídico e culpável, considerando a inexistência de causas excludentes de ilicitude ou exculpantes, a manutenção da sentença condenatória é medida que se impõe, reduzindo-se as sanções impostas.

3. É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base, seja em qual circunstância judicial o for. Inteligência da Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça e dos precedentes daquela egrégia Corte.

4. Esse Colegiado tem como critério, para permitir a valoração negativa das consequências do crime a presença de um prejuízo ao Erário maior do que R$ 100.000,00 (cem mil reais), a exemplo das ACRs 2002.71.07.013022-0 (Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado – DJU 22.11.2006), 2007.72.08.002723-5 (Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DE 30.04.2010) e 2006.70.00.031205-1/PR (de minha relatoria, DE 18.03.2011). No caso, o dano suportado pela União foi abaixo desse patamar, devendo ser afastada a desfavorabilidade dessa circunstância.

5. Cuidando-se da conduta daquele que realizou a fraude para terceiro perceber o benefício assistencial, resta caracterizado delito de natureza instantânea. Decorridos mais de quatro anos entre a data do auferimento da primeira prestação e o recebimento da denúncia, opera-se a prescrição retroativa da pretensão punitiva estatal, impondo-se a declaração da extinção da punibilidade da ré de ofício.

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ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação para reduzir as sanções impostas na sentença e declarar, de ofício, extinta a punibilidade de Irene Ferreira de Souza, com fulcro no art. 107, IV, do Código Penal, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre/RS, 18 de dezembro de 2013.

Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Relator

RELATÓRIO

O Ministério Público Federal ofereceu denúncia contra Irene Ferreira de Souza (nascida em 13.11.1964 – evento 01 do processo originário, “INQ4”, p. 44), dando-a como incursa nas sanções dos artigos 171, §3º, do Código Pe-nal, nos seguintes termos (evento 01 do processo originário, “INIC1”):

“1. Em data de 24.11.2003, a denunciada Irene Ferreira de Souza, despa-chante de pedidos de benefícios junto ao Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS, deu entrada em pedido de concessão de benefício de Ampa-ro Social ao Portador de Deficiência Física, em nome de Gisele Machado Batista, preenchendo os documentos necessários com informações inverí-dicas.

2. De acordo com a Lei Orgânica da Assistência Social (Lei nº 8.742/1993), ao tratar da concessão de benefícios de prestação continuada:

‘Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) sa-lário-mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.

§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto (Redação dada pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)

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§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de de-ficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o tra-balho.

§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.’

3. A denunciada, com o fim de preencher os requisitos supramenciona-dos, completou os documentos de fls. 02/03 do Apenso I, Volume II, com as informações de que Gisele Machado Batista moraria sozinha e que não possuiria renda familiar, fatos estes que posteriormente se constataram in-verídicos.

4. Vê-se, portanto, que a denunciada, de forma livre e consciente, utilizou--se de documento ideologicamente falso para, induzindo o Instituto Na-cional de Seguro Social – INSS em erro, obter vantagem ilícita, consistente na concessão indevida de benefício previdenciário, em prejuízo daquela autarquia previdenciária. Incorreu, dessa forma, nas sanções do art. 171, §3º, do Código Penal.

5. A materialidade do delito encontra-se comprovada nos documentos cons-tantes dos autos. O Instituto Nacional da Seguridade Social – INSS, em processo de verificação do pedido de concessão de benefício, realizou di-versas diligências que comprovaram a falsidade das informações prestadas no documento de fl. 03 do Apenso I, Volume II.

Alvair de Fátima Machado Batista, mãe de Gisele Machado Batista, infor-mou à fl. 31 que em meados de 2003, época do pedido de concessão do benefício, Gisele residia com a irmã da declarante, Célia Regina Machado, e não sozinha como é informado no documento questionado. Tal informação foi comprovada pela própria Gisele às fls. 35/36 dos autos, bem como pelo seu pai, Antônio Carlos de Souza Batista, à fl. 33.

Alvair de Fátima Machado Batista ainda elaborou duas declarações escri-tas, em que afirma que Gisele Machado Batista mora na sua residência, junto com a declarante, desde o mês de maio de 2007 (fls. 40 e 62 do Apenso I, Volume II).

Com base nessa informação, o Instituto Nacional da Seguridade Social – INSS concluiu que o benefício concedido encontrava-se irregular desde a competência de maio de 2007, causando um prejuízo à autarquia federal no valor de R$ 11.864,20 (onze mil, oitocentos e sessenta e quatro reais e vinte centavos) – fl. 68 do Apenso I, volume II.

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No que diz respeito à renda familiar utilizada ao sustento de Gisele Macha-do Batista, também restou comprovada a falsidade da informação prestada à fl. 03 do Apenso I, Volume II, constatou-se que Alvair de Fátima Macha-do Batista, mãe de Gisele, detém cargo ativo de Agente Penitenciário desde 11.04.1986, e que seu salário correspondia, já no ano de 2002, ao valor de R$ 1.562,51 (mil quinhentos e sessenta e dois reais e cinquenta e um centavos), ou seja, superior ao valor máximo exigido pelo § 3º da Lei nº 8.742/1993 (renda mensal inferior a ¼ do valor do salário mínimo à épo-ca do pedido).

6. A autoria do delito também restou plenamente demonstrada nos autos.

Gisele Machado Batista prestou depoimento às fls. 35/36 dos autos, ale-gando que:

‘[...] se lembra que foi uma pessoa de nome Irene, cujo sobrenome não se recorda, a pessoa que auxiliou a declarante e que fez o pedido de benefício no INSS, tendo a declarante assinado alguns documentos e entregue alguns documentos para Irene, somente a declarante indo ao INSS para realização de perícia [...] que esclarece que quando assinou os documentos de fls. 02/03 do apenso I vol. II, tais documentos esta-vam em branco, tendo assinado os mesmos para Irene a seu pedido; que não é sua a grafia que consta nos documentos de fls. 02/03 citados acima; Queridos pais, não tinha conhecimento de que no seu pedido de benefício previdenciário iria constar que a declarante residia sozinha, conforme 03, do apenso I, vol. II; que esclarece que Irene quando orien-tou a declarante sobre o benefício, nada disse sobre a declarante ter de informar que residia sozinha, bem como nada informou sobre algum tipo de informação sobre a renda familiar na residência da declarante.’

Foi colhido o material gráfico da denunciada Irene Ferreira de Souza às fls. 46/52, tendo sido submetido a exame pericial pelo Instituto de Crimi-nalística, com o fim de se determinar a autoria pelo preenchimento das informações nos documentos de fls. 02/03 do Apenso I, volume II.

Foi elaborado Laudo de Exame Documentoscópico às fls. 62/67. Ao com-parar os documentos supramencionados com a grafia colhida de Irene Fer-reira de Souza, os peritos verificam diversos elementos de convergência, de foma a concluir que os manuscritos constantes nos documentos analisados partiram do punho de Irene Ferreira de Souza.”

A peça incoativa foi recebida em 10.10.2011 (evento 03 do processo ori-ginário).

Instruído o feito, sobreveio sentença (evento 56 do processo originá-rio), disponibilizada na plataforma digital em 28-6-2012, julgando proceden-

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te a denúncia, para condenar Irene Ferreira de Souza pela prática do delito previsto no art. 171, caput e § 3º, do Código Penal, às penas de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, em regime aberto, e 44 (quarenta e quatro) dias-multa, à razão unitária de 1/4 (um quarto) do salário mínimo vigente ao tempo da cessação do crime (em 07/2009, quando cessou o pagamento do benefício). A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviço à comunidade e prestação pecuniária no valor de 03 (três) salários mínimos. Foi fixado o valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, nos termos do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, em R$ 11.864,20 (onze mil e oitocentos e sessen-ta e quatro reais e vinte centavos).

A Defensoria Pública da União, atuando na defesa de Irene, interpôs recurso de apelação. Em suas razões (evento 73 do processo originário), re-quer a absolvição da ré, sustentando a ausência de prova do caráter ilícito da vantagem obtida. Argumenta, ainda: a) a necessidade de diminuição da pena-base e do número de dias-multa, sob o entendimento de que ocorreu bis in idem, consistente na valoração de antecedentes, conduta social e personali-dade em função das mesmas circunstâncias, bem como que a vetorial “conse-quências do crime” deve ser reputada neutra; b) a ausência de fundamenta-ção na fixação da prestação pecuniária; c) a excessividade do valor arbitrado para o dia-multa e que a época dos fatos deve ser considerada como sendo dia 24.11.2003, quando obtido o benefício e; d) necessidade da supressão do valor mínimo dos danos a reparar, por ausência de apuração adequada e para evitar o enriquecimento sem causa, tendo em conta que “o próprio INSS não considerou indevido o benefício no período entre 24.11.2003 e 30.04.2007”.

Com contrarrazões (evento 77 do processo originário), ascenderam os autos a esta Corte.

O Ministério Público Federal atuante nesta instância manifestou-se pelo desprovimento do recurso (evento 05).

É o relatório.

À revisão.

Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Relator

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VOTO

Trata-se de apelação interposta por Irene Ferreira de Souza em face de sentença que a condenou pela prática do crime previsto no art. 171, caput e § 3º, do Código Penal, às penas de 02 (dois) anos e 04 (quatro) meses de re-clusão e 44 (quarenta e quatro) dias-multa, à razão unitária de ¼ (um quarto) do salário mínimo vigente em julho de 2009 (quando cessou o pagamento do benefício assistencial).

1 IMPUTAÇÃO PENAL

O delito cuja prática é atribuída à acusada encontra-se assim descrito no Estatuto Repressivo:

“Art. 171 Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:

Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa.

§ 3º A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assis-tência social ou beneficência.”

Destarte, para a subsunção de determinada conduta no tipo penal aci-ma descrito, é essencial a presença dos seguintes elementos objetivos:

“Para que o estelionato se configure, é necessário: 1º) o emprego, pelo agen-te, de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento; 2º) induzimento ou manutenção da vítima em erro; 3º) obtenção de vantagem patrimonial ilícita pelo agente; 4º) prejuízo alheio (do enganado ou de terceira pessoa). Portanto, mister se faz que haja o duplo resultado (vantagem ilícita e pre-juízo alheio) relacionado com a fraude (ardil, artifício etc.) e o erro que esta provocou.” (DELMANTO, Celso et alli. Código Penal Comentado. 6. ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2002, p. 396)

Na espécie em julgamento, consta da denúncia que a acusada obteve vantagem ilícita para Gisele Machado Batista, consistente em benefício assis-tencial de amparo à pessoa portadora de deficiência, em prejuízo do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, mediante o preenchimento de falsa decla-ração no sentido de que a requerente residia sozinha (evento 01 do proces-so originário, “AP-INQPOL6”, p. 03). Segundo a exordial, Gisele não tinha direito ao benefício, uma vez que fora concedido sem considerar sua renda familiar.

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No tocante à alegação defensiva de eventual licitude do benefício assis-tencial obtido por Gisele Machado Batista, há que ser rechaçada. Isso porque restou claro, durante a instrução processual, que a família de Gisele não se encontrava em situação de miserabilidade que justificasse a percepção do be-nefício assistencial.

O benefício de amparo assistencial à pessoa portadora de deficiência encontra respaldo no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, regulamen-tado pela Lei nº 8.742/1993. De acordo com o art. 20 do mencionado diploma legal, em sua redação original, “benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família”.

Tal não é o caso desta ação penal, uma vez que a ré informou, de forma livre e consciente, que a beneficiária, além de não possuir renda própria, resi-dia sozinha, sendo este dado inverídico. Dessa forma, afastou a necessidade de análise da renda do núcleo familiar em que Gisele estava inserida, resul-tando na concessão, de plano, do benefício pleiteado.

Outrossim, cabe destacar que restou claro, nos depoimentos judiciais de Gisele e de seus genitores (eventos 46 e 47 do processo originário), que aquela sempre recebeu o apoio da família, corroborado pelo fato de que, em momento algum, foi mencionado que os pais da beneficiária deixaram de exercer o poder familiar sobre esta, apenas contando com o apoio da família extensa nos cuidados necessários com ela. Também, Alvair de Fátima Ma-chado Batista, mãe de Gisele, esclareceu que esta apenas passou residir com a irmã, entre 2003 e 2007, porque teria uma melhor assistência e convivên-cia com os três primos. Ainda, consta no evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 44/47, que a genitora de Gisele, ocupava, em 05-6-2009, o cargo público de Agente Penitenciário desde 11.04.1986, e, em dezembro de 2002, percebia remuneração no valor de R$ 1.562,51, ou seja, em muito superior ao patamar de ¼ do salário mínimo por pessoa da família (art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993), sem considerar a renda mensal do pai e da tia com quem resida à época dos fatos, todos “funcionários públicos” (eventos 01 e 47 do processo originário, “INQ4”, p. 30, e “TERMOTRANSCDEP1”, p. 04).

Ademais, Gisele asseverou, em seu depoimento judicial (evento 46 do processo originário), que utilizava exclusivamente para si o beneficio assis-tencial, não mencionando a necessidade de auxílio nas despesas domésticas.

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Logo, o benefício assistencial percebido por Gisele era indevido, não havendo se falar em vantagem lícita, restando perfeitamente configurado o delito de estelionato imputado à ré.

Encontram-se presentes, portanto, os requisitos para a configuração do delito de estelionato, visto que comprovadamente foi utilizado meio fraudu-lento para induzir e manter a entidade de direito público em erro, obtendo-se vantagem patrimonial ilícita em prejuízo da Autarquia.

2 MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO

A materialidade do delito em questão está atestada pelos seguintes ele-mentos:

a) Processo administrativo que determinou a concessão do benefício assistencial LOAS nº 87/131.831.845-6 a Gisele Machado Batista (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”);

b) Ofício nº 561/2009 da Secretaria de Estado da Administração e da Previdência, informando o vínculo funcional efetivo de Alvair de Fátima Machado Batista, genitora de Gisele (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 44/46);

c) Consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais de Alvair de Fátima, referente ao ano de 2002 (evento 01 do processo origi-nário, “AP-INQPOL6”, p. 47);

d) Cálculo e atualização monetária de valores recebidos indevi-damente, totalizando, apenas no período de maio de 2007 a ju-lho de 2009, R$ 11.864,20 (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 63);

e) Relatório emitido pela Gerência-Executiva do INSS em Curitiba (evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 66/68);

f) Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico) 1976/2010 (evento 01 do processo originário, “INQ4”, p. 61/66);

g) Depoimentos judiciais da beneficiária Gisele Machado Batista e de sua genitora Alvair de Fátima Machado Batista, nos quais afir-mam: que Gisele assinou documento em branco para que a ré o preenchesse, a fim de instruir o pedido de benefício assistencial de amparo a pessoa portadora de deficiência, sendo acordado o pagamento do valor aproximado de três salários mínimos caso

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benefício fosse concedido e; que a beneficiária, em razão de suas limitações físicas, que a tornam, de forma notória, dependente de cuidados permanentes, jamais residiu sozinha (eventos 46 e 47 do processo originário);

h) Depoimento judicial da ré manifestando, de forma inequívoca, ciência da necessidade de comprovação do requisito econômico para a obtenção do benefício assistencial pleiteado e, em contra-partida, asseverando não ter buscado saber o que a tia e a mãe de Gisele faziam (eventos 46 e 47 do processo originário).

No que tange à autoria delitiva, transcrevo os bem lançados fundamen-tos da sentença, os quais adoto como razões de decidir (evento 56 do proces-so originário):

“11. A acusada Irene Ferreira de Souza, na condição de despachante de be-nefícios junto ao INSS, protocolou, em 24.11.2003, requerimento de benefí-cio de Amparo Social ao Portador de Deficiência Física, em nome de Gisele Machado Batista, utilizando-se de informações inverídicas, uma vez que teria sido informado que a beneficiária residia sozinha, quando na verdade ela residia com sua tia. Após monitoramento operacional do INSS, o bene-fício foi suspenso quando da constatação de que Gisele passou a residir a partir de maio/2007 com a sua mãe – Alvair Fátima Machado Batista – e que a renda per capita do grupo familiar era superior a estabelecida pela Lei nº 8.743/1993 (fl. 49 do apenso I, vol. II, do inquérito policial). Teria sido constatado prejuízo à Autarquia Previdenciária no valor de R$ 11.864,20 (fl. 66-69, do apenso I, vol. II, do inquérito policial).

[...]

14. Inquirida sobre os fatos em Juízo, a acusada confirmou ter intermediado o requerimento de benefício para Gisele mediante pagamento, mas negou a conduta que lhe é imputada, afirmando que não preencheu o formulário acostado às fls. 02-03 do apenso I, vol II, do inquérito policial. Transcreve--se o seguinte trecho do interrogatório judicial:

‘Juíza Federal: – Tá. Nesse momento então a senhora lembra de ter con-tatado ou de ter sido contatada pela Gisele para entrar com esse pedido?

Interrogada: – Sim, ela me ligou, perguntou se eu poderia fazer para ela porque ela não tinha condições de ir na fila de madrugada, não é?

[...]

Juíza Federal: – Quem que formulou, quem que assinou e escreveu es-ses dados, quem que preencheu esses dados?

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Interrogada: – Quem preencheu não me recordo, mas quem assinou...

Juíza Federal: – Parece com a sua letra?

Interrogada: – Não. Eu não lembro.

Juíza Federal: – Tá. A senhora consegue visualizar que é uma letra bem diferente daquela que esta assinada ali embaixo pela Gisele, não é? Uma letra de forma e não uma grafia. Nem se parece com a sua letra?

Interrogada: – Não.

Juíza Federal: – Tá. Foi feito um laudo grafotécnico aqui que colheu material gráfico da senhora e a perícia constatou que essa letra é sua. A senhora não confirma isso?

Interrogada: – Não, não confirmo.

Juíza Federal: – Certo. A próxima página então, por favor. A senhora sabe me dizer quem é que preencheu isso?

Interrogada: – Eu não me recordo.

Juíza Federal: – Não se recorda? Essa letra parece com a da senhora?

Interrogada: – Não é parecida.

Juíza Federal: – Não é parecida também? Ok. Normalmente esses for-mulários eles eram entregues em branco para a requerente preencher ou ela mesma que preenchia?

Interrogada: – Nós, na época a gente entregava para ela e eles traziam preenchido já com toda documentação que a gente pedia.’ (evento 47)

15. Em que pese a negativa da acusada, as evidências constantes nos autos apontam em sentido contrário. A beneficiária, tanto no inquérito policial como durante a instrução processual, afirmou que não preencheu os docu-mentos, tendo assinado-os em branco. Veja-se:

‘que esclarece que quando assinou os documentos de fls. 02-03 do apen-so I vol. II, tais documentos estavam em branco, tendo assinado os mes-mos para Irene a seu pedido’ (Gisele Machado Batista, fl. 35 do IPL)

‘Juíza Federal: – Tá. Na época desses fatos aqui a senhora lembra de ela ter... da senhora ter preenchido algum tipo de requerimento para ela entrar no INSS?

Depoente: – Não, eu não preenchi nada, eu só assinei uma folha em branco.

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Juíza Federal: – Está bem. Eu vou lhe mostrar aqui às fls. 02 e 03 que constam do Apenso 01, Volume II. Quero saber se a senhora reconhece como sendo sua, a sua assinatura aqui, logo abaixo. A senhora lembra de ter preenchido esse documento para ela?

Depoente: – Eu lembro que... eu lembro que eu assinei uma folha em branco.

Juíza Federal: – Não lembra se era essa?

Depoente: – Não, estava em branco a folha.

Juíza Federal: – A folha 03 a senhora também não lembra se a senhora chegou a assinar ali embaixo onde tem um X?

Depoente: – Não, não. Estava em branco a folha que eu assinei.’

(Gisele Machado Batista, evento 47)

16. A mãe da beneficiária também afirmou em Juízo que os documentos foram assinados por Gisele em branco, e que, segundo lhes teria sido infor-mado, seriam preenchidos posteriormente por Irene. Confira-se:

‘Defesa: – Sim, Excelência. Obrigada. Dona Alvair, a senhora... a sua filha disse que ela tomou conhecimento desse serviço de despachante prestado pela Sra. Irene, numa igreja. A senhora confirma?

Depoente: – É... não sei direito. Ela falou que foi amigos dela parece que falaram, que ela sempre pensava, ela queria ter o dinheirinho dela.

Defesa: – Sim.

Depoente: – Daí os amigos dela falaram: ‘Mas Gisele, você tem direito. Você não trabalha, você é deficiente’. Não é? Daí acho que deram o en-dereço para ela, deram o telefone da Irene para ela.

Defesa: – E a senhora acompanhou todas as vezes... a senhora acompa-nhou a Gisele todas as vezes que ela se encontrou com a Dona Irene?

Depoente: – Eu só fui uma vez, encontrei com a Dona Irene uma vez.

Defesa: – Uma vez? E que vez foi essa, foi no dia que a sua filha...

Depoente: – Foi o dia que foi levado os papel lá.

Defesa: – Foi levar os documentos?

Depoente: – Hum-hum.

Defesa: – E a senhora se lembra se a sua filha assinou algum documen-to? Algum requerimento?

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Depoente: – Ela assinou um papel.

Defesa: – Um papel?

Depoente: – Hum-hum.

Defesa: – E a senhora se lembra do conteúdo desse papel?

Depoente: – Não.

Defesa: – A senhora não acompanhou a sua filha...

Depoente: – Não, ela assim... ela disse que ela assinava o papel, depois ela, depois a Dona Irene disse que preenchia. Uma coisa assim.

Defesa: – Hum-hum.

Depoente: – Não lembro direito, era uma coisa assim, ela assinou o pa-pel e depois a Dona Irene disse que iria preencher.

Defesa: – Mas a senhora presenciou essa cena, a senhora viu ou esse papel estava em branco, se era um papel pautado com várias perguntas, um formulário apresentado pelo INSS?

Depoente: – Não lembro direito, era um papel do INSS.

[...]

Juíza Federal: – Nas fls. 02 e 03 aqui dos autos. É esse documento ou de repente foi o da fl. 03?

Depoente: – É, foi esse documento mesmo que ela assinou.

Juíza Federal: – Foi esse documento? E ele estava preenchido a caneta ou ele estava...

Depoente: – Estava em branco.

Juíza Federal: – Totalmente em branco, tanto da fls. 02 quanto da fls. 03?

Depoente: – Estava em branco.’

(Alvair de Fátima Machado Batista, evento 47)

17. De outra parte, na perícia grafotécnica realizada por meio da compara-ção da grafia fornecida pela acusada e daquela constante nos documentos fraudados, restou consignado: ‘verificou-se alguns elementos de conver-gência entre tais manuscritos, na forma e gênese fráficas de determinados caracteres ‘G’, ‘C’, ‘L’, ‘P’, ‘M’, ‘Z’ e em certos gramas dos caracteres ‘R’, entre outros, bem como na presença característica de um ponto entre os vocábulos, que indicam terem partido do mesmo punho escritor as escritas com-paradas’ (fl. 66 do inquérito policial).” (grifos originais)

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Com efeito, o Laudo de Exame Documentoscópico (Grafoscópico) 1976/2010 (evento 01 do processo originário, “INQ4”, p. 61/66) aponta que as anotações constantes nos formulários que instruíram o pedido do benefí-cio assistencial para Gisele podem ter partido do punho da apelante. Cote-jando tal ilação com os depoimentos prestados em juízo pela beneficiária e seus genitores e pela própria ré, que confirmou ter encaminhado o pedido do benefício em tela junto ao INSS, conclui-se que as anotações foram efetuadas por Irene Ferreira de Souza.

No tocante ao dolo presente na conduta da ré, anote-se, outrossim, como bem salientado no decisum recorrido, que:

“18. É certo que o fato de ter sido a acusada quem preencheu o documen-to – como se extrai da perícia – não pode ensejar por si só a sua condena-ção; isso porque ela pode, como argumenta a sua Defesa, ter preenchido o documento com base nas informações então repassadas pela requerente. Ocorre que a própria acusada afirmou no interrogatório que Gisele havia lhe dito que morava com uma tia, e não sozinha, como constou no reque-rimento ao INSS:

‘Ministério Público Federal: – E consta aqui então marcado que ela vive sozinha, no formulário que a senhora verificou e manuseou. A senhora sabe de onde veio essa informação?

Interrogada: – Olha, o que ela me passou é que ela morava com a irmã da mãe, com a tia, não é? Que ficava cuidando dos parentes como ela já afirmou, não é, sobrinho, primo.’

(Irene Ferreira de Souza, acusada, evento 47)

19. Ademais, há outra circunstância que demonstra que a acusada agiu de forma fraudulenta perante o INSS. Veja-se que, pelo que se extrai do seu interrogatório, a acusada tinha plena ciência do requisito econômico para a concessão do benefício, mas mesmo assim não procurou se informar com a requerente a fim de verificar se ela realmente possuía o direito ao benefício social.

‘Juíza Federal: – De toda forma, a senhora perguntou para ela como que era a situação de renda dela?

Interrogada: – Eu perguntei, ela falou que morava com uma tia, que ela não tinha renda nenhuma.

Juíza Federal: – Ela falou que morava com uma tia?

Interrogada: – Uma tia, irmã da mãe, uma coisa assim.

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Juíza Federal: – Isso ela lhe disse?

Interrogada: – Me disse, e só disse que ela não tinha renda nenhuma e que ela precisava muito porque ela queria estudar, queria até fazer fa-culdade, ela disse: ‘Eu preciso de um benefício.’ Que os amigos falaram que ela tinha direito, não é? Eu disse: ‘Olha, eu não digo que você tem direito, nós podemos dar entrada. Quem vai dizer se tem direito ou não é o próprio INSS’.

Juíza Federal: – Tá. Mas a senhora, ciente dos requisitos para esse bene-fício, se a pessoa mora com alguém que lhe sustente, ela tem direito ao benefício assistencial?

Interrogada: – Desde que não tenha renda superior a um tanto lá que eles

pedem, não é?

Juíza Federal: – Tá. E a senhora chegou a perguntar do que a tia dela trabalhava?

Interrogada: – Não, não perguntei.

Juíza Federal: – Tá, e a senhora recebeu algum valor para esse serviço?

Interrogada: – Eu não lembro na época, mas me pagaram.

Juíza Federal: – Pagaram para senhora?

Interrogada: – Pagaram alguma coisa, parece que parcelado, eu não lembro.

Juíza Federal: – E pagaram só para senhora ficar na fila?

Interrogada: – Não, para mim poder protocolar, não é, porque daí como eu não pude ir no dia o meu esposo que foi daí para protocolar, para não perder a senha, não é.

Juíza Federal: – Tá. Então em momento nenhum a Gisele lhe disse que ela morava sozinha, ela lhe disse que morava com a tia?

Interrogada: – Ela disse que morava sozinha e dependia da tia, não é, só que também eu não entrei em detalhes para eu saber o que a tia fazia, ou a mãe fazia também, não.’ (evento 47)

20. Considerando que a própria acusada afirmou que à época dos fatos atuava como despachante junto ao INSS, com ciência inclusive dos requisi-tos para a concessão do benefício de amparo social ao portador de deficiên-cia física, causa estranheza o fato de ela não ter verificado se a requerente realmente possuía direito ao benefício.

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21. Sopesando tal circunstância, o fato de haver prova de que foi a acusada quem preencheu o formulário de requerimento (laudo pericial às fls. 62-67 do inquérito policial e depoimentos indicando que a requerente assinou os documentos em branco), e ainda a simples negativa de autoria, torna-se fortalecida a tese da Acusação, de que ela teria intencionalmente induzido o INSS em erro, fazendo-o acreditar que a requerente residia sozinha e sem renda, a fim de adequá-la às condições impostas pela Lei nº 8.743/1993.

22. Saliente-se, por outro lado, que, cf. se extrai dos autos, a beneficiária residia à época da concessão do benefício com sua tia, que trabalhava como funcionária pública estadual, sendo de todo improvável que a sua renda fosse igual ou inferior a estipulada como limite para a concessão do be-nefício (renda per capita do grupo familiar inferior a ¼ do salário mínimo vigente). Confira-se:

‘que quando sua filha Gisele Machado Batista fez o pedido de bene-fício previdenciário em meados de 2003, a mesma residia com a irmã da declarante, Célia Regina Machado, junto com outros três filhos des-ta; que na época Célia trabalhava, sendo funcionária pública estadual da Secretaria de Justiça, no cargo de auxiliar de escritório;(Alvair de Fátima Machado Batista, mãe da beneficiária, fl. 31 do inquérito poli-cial)

‘Defesa: – E qual a formação dos seus pais?

Depoente: – Ai... eles trabalham para o estado, funcionário público.

Defesa: – Eles são funcionários públicos?

Depoente: – Sim.

Defesa: – Entendi. E a sua tia?

Depoente: – Também.

Defesa: – Também, os três são funcionários públicos?

Depoente: – Isso.’

(Gisele Machado Batista, evento 47)”

De todo o exposto, não restam dúvidas acerca da indevida concessão do benefício de prestação continuada à segurada Gisele Machado Batista, a qual foi instruída pela ré Irene que, sem o conhecimento da beneficiária, preencheu formulário com declaração falsa de que Gisele residia sozinha, aparentando o desamparo familiar. Entrementes, a ré tinha plena consciên-cia da ilicitude perpetrada, tanto que afirmou, em seu interrogatório judicial, embora ciente da necessidade de aferição do requisito “renda familiar”, não

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ter questionado Gisele, nem a sua genitora, acerca de seus rendimentos (fato confirmado pelos depoimentos de Gisele e de sua mãe).

Nesses termos, demonstrados a materialidade, a autoria e o dolo da agente, e ausentes quaisquer circunstâncias que excluam a tipicidade, a an-tijuridicidade ou a culpabilidade, afigura-se incensurável a condenação de Irene Ferreira de Souza pela prática do delito de estelionato majorado, nos termos do art. 171, §3º, do Código Penal.

3 DOSIMETRIA

Na primeira fase, a sentença estabeleceu a desfavorabilidade: dos ante-cedentes, considerando a condenação com trânsito em julgado na Ação Penal nº 2004.70.00.012740-8; da conduta social e da personalidade, com base em ou-tros apontamentos criminais nos eventos 5, 11, 20 25 e 30, contendo registros da prática de crime da mesma natureza; das consequências do delito, em vista do prejuízo causado ao Estado (R$ 11.864,20), aumentando a reprimenda em 09 (nove) meses, restando a pena-base fixada em 01 (um) ano e 09 (nove) meses de reclusão.

No que pertine à exasperação das vetoriais da personalidade da agente e de sua conduta social, segundo a Súmula nº 444 do Superior Tribunal de Justiça, “é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”, e, segundo a jurisprudência daquela Corte, seja em qual circunstância judicial for:

“HABEAS CORPUS – DIREITO PENAL – HOMICÍDIO QUALIFICADO – CONDENAÇÃO – DOSIMETRIA DA PENA – CONDUTA SOCIAL NE-GATIVA – INIDONEIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO – AUSÊNCIA DE CONDENAÇÕES TRANSITADAS EM JULGADO – CULPABILIDADE DO AGENTE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME – MOTIVAÇÃO VÁLI-DA – ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA

1. [...]

2. Inquéritos policiais ou ações penais em andamento não se prestam a majorar a pena-base, seja a título de maus antecedentes, conduta social negativa ou persona-lidade voltada para o crime, em respeito ao princípio da presunção de não culpabi-lidade. Incidência do Enunciado nº 444 da Súmula desta Corte.

[...]

4. Ordem parcialmente concedida para, mantida a condenação do Paciente, reformar a sentença de primeiro grau e o acórdão impugnados, no tocante

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à dosimetria da pena, nos termos acima explicitados.” (HC 194.318, 5ª Tur-ma, Relª Ministra Laurita Vaz – DJe 01.09.2011)

“HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE DROGAS COMETIDO SOB A ÉGIDE DA LEI Nº 6.368/1976 – DOSIMETRIA – PENA-BASE – FIXAÇÃO ACI-MA DO MÍNIMO LEGAL – MAUS ANTECEDENTES – CONDENAÇÃO SEM CERTIFICAÇÃO DO TRÂNSITO EM JULGADO – SOPESAMENTO PARA A ELEVAÇÃO DA REPRIMENDA NA PRIMEIRA ETAPA DA DO-SIMETRIA – IMPOSSIBILIDADE – SÚMULA Nº 444 DESTE STJ – CONS-TRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO – SANÇÃO REDIMENSIO-NADA

1. Consoante orientação já sedimentada nesta Corte Superior, condenação sem a certificação do trânsito em julgado não pode ser levada à consideração de maus antecedentes, má conduta social ou personalidade desajustada para a elevação da pena-base, em obediência ao princípio da presunção de não-culpabilidade. Exegese da Súmula nº 444 deste STJ.[...]” (HC 96.007, 5ª Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi – DJe 02.09.2011)

Ademais, tais circunstâncias não suscitam valoração negativa na per-sonalidade da agente, a qual se refere a outros parâmetros:

“[...] personalidade distingue-se de maus antecedentes e merece ser ana-lisada, no contexto do art. 59, separadamente. Por isso, é imprescindível cercar-se o juiz de outras fontes, tais como testemunhas, documentos etc., demonstrativos de como age o acusado na sua vida em geral, indepen-dentemente de acusações no âmbito penal.” (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 13. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013, p. 433).

“[...] A personalidade é formada pelo conjunto dos dados externos e inter-nos que moldam um feitio de agir do réu, instrumental que ele herdou ou adquiriu e com o qual responde às diversas situações que lhe são propostas na vida diária. Foi definida como ‘a organização dinâmica dos sistemas psi-cofísicos que determinam o ajustamento do indivíduo ao meio circundan-te’. Quanto mais esse conjunto levou o réu a comportamentos reprováveis, tanto mais o crime é um reflexo dessa personalidade, que, por isso mesmo, deve sofrer um juízo-negativo; é o que acontece quando a personalidade do autor revela tendências criminais.[...]” (AGUIAR JÚNIOR, Ruy Rosado. Aplicação da Pena. In Revista da AJURIS, nº 70, em setembro/2000, p. 232).

Assim, considero neutras as vetoriais da personalidade e conduta so-cial.

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Outrossim, este Colegiado tem como critério, para permitir a valo-ração negativa das consequências do crime a presença de um prejuízo ao Erário maior do que R$ 100.000,00 (cem mil reais), a exemplo das ACRs 2002.71.07.013022-0 (Rel. Des. Federal Luiz Fernando Wowk Penteado – DJU 22.11.2006), 2007.72.08.002723-5 (Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DE 30.04.2010) e 2006.70.00.031205-1/PR (de minha relatoria, DE 18.03.2011). No caso, o dano suportado pela União foi abaixo desse patamar. Por esse motivo, reduzo a sanção basilar para 01 (um) ano e 02 (dois) meses e 07 (sete) dias de reclusão.

Na segunda etapa, não foram reconhecidas agravantes ou atenuantes, mantendo-se a reprimenda no mesmo patamar do passo anterior, o qual foi reduzido.

Na derradeira etapa, incidiu corretamente a causa de aumento de 1/3 (um terço) do § 3º do art. 171 do Código Penal, considerando que o sujeito passivo da conduta é entidade pública de direito público (INSS). Assim, resta a pena definitiva fixada em 01 (um) ano, 06 (seis) meses e 29 (vinte e nove) dias de reclusão.

No tocante à pena de multa, em atendimento à simetria entre as san-ções, verifico que poderia ter sido fixada em patamar até superior ao estabe-lecido pelo julgador monocrático. Todavia, em face da vedação da reformatio in pejus, mantenho-a em 44 (quarenta e quatro) dias-multa, o que se afigura razoável à espécie e mais benéfico à condenada. Entretanto, reduzo o valor do dia-multa para 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente ao tempo da consumação do crime, em vista da situação econômica da ré.

Ainda, impende destacar que, em se tratando a ré apenas de falsária, que não a destinatária direta do benefício previdenciário, o crime é instan-tâneo e se consuma com o recebimento da primeira parcela do benefício, in casu, 24 de novembro de 2003 (evento 01 do processo originário, “AP-INQ-POL6”, p. 63). Esse é o entendimento fixado na seguinte decisão proferida por esta Colenda Turma:

“PENAL E PROCESSUAL PENAL – ART. 171, §3°, DO CÓDIGO PENAL C/C O ART. 29 DO MESMO ESTATUTO – PRELIMINAR DE MÉRITO – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA – TRANSCURSO DE MAIS DE QUATRO ANOS ENTRE O RECEBIMENTO DA PRIMEIRA PRESTA-ÇÃO PREVIDENCIÁRIA E O RECEBIMENTO DA DENÚNCIA OU DO SEU ADITAMENTO

1. O Supremo Tribunal Federal possui posicionamento (por todos o HC 82965, 2ª Turma, Rel. Ministro Cesar Peluso – DJe 28.03.2008) de que, o ter-

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mo inicial para a contagem do prazo prescricional do crime de estelionato previdenciário é a data do recebimento da primeira prestação do benefício indevido, quando é imputado a alguém o comportamento de realização de uma fraude para permitir a percepção do benefício por terceiro.

2. As rés receberam reprimendas entre um e dois anos de reclusão, ense-jando um prazo prescricional de quatro anos (art. 109, inciso V, do Código Penal). Assim, como entre a data da consumação das condutas atribuídas às acusadas e o recebimento da denúncia ou o seu aditamento transcor-reu prazo maior do que quatro anos, resta configurada a prescrição da pretensão punitiva.” (ACR 0002581-20.2007.404.7105, minha Relatoria, DE 01.12.2011)

Neste sentido, tendo em conta a eventualidade da prescrição pela pena concretamente aplicada, cabe, no caso em tela, seu reconhecimento de ofício. Com o trânsito em julgado para a acusação, a prescrição regula-se pela pena concretamente aplicada, consoante os §§ 1º e 2º do art. 110 do Código Penal, na redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.07.1984, vigente ao tempo dos fatos. A pena, definitivamente imposta, equivale a 01 (um) ano, 06 (seis) meses e 29 (vinte e nove) dias de reclusão, o que atrai o patamar prescricional de 04 (qua-tro) anos, previsto no art. 109, V, do Código Penal. Portanto, considerando ter transcorrido tal período entre a época em que se tipificou o delito (24.11.2003 – evento 01 do processo originário, “AP-INQPOL6”, p. 63) e o recebimento da denúncia 10.10.2011 (evento 03 do processo originário), reconheço a prescri-ção da pretensão punitiva estatal, declarando extinta a punibilidade de Irene Ferreira de Souza pelos fatos que lhe são imputados nesta demanda.

4 DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação para reduzir as sanções impostas na sentença e declarar, de ofício, extinta a pu-nibilidade de Irene Ferreira De Souza, com fulcro no art. 107, IV, do Código Penal.

Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Relator

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18.12.2013

Apelação Criminal nº 5023341-84.2011.404.7000/PR

Origem: PR 50233418420114047000

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Relator: Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus

Presidente: Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus

Procurador: Carlos Augusto da Silva Cazarré

Revisor: Des. Federal Leandro Paulsen

Apelante: Irene Ferreira de Souza

Procurador: Henrique Guimarães de Azevedo (DPU) DPU129

Apelado: Ministério Público Federal

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18.12.2013, na seqüência 15, disponibilizada no DE de 09.12.2013, da qual foi intimado(a) o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública.

Certifico que o(a) 8ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epí-grafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento à apelação para reduzir as sanções impostas na sentença e declarar, de ofício, extinta a punibilidade de Irene Ferreira de Souza, com fulcro no art. 107, IV, do Código Penal, nos termos do voto do relator.

Relator Acórdão: Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus

Votante(s): Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus Des. Federal Leandro Paulsen Des. Federal João Pedro Gebran Neto

Lisélia Perrot Czarnobay Diretora de Secretaria

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EmEntário PEnal

CONTRAbANDO DE CIgARROS

30759 – “Penal e processual penal. Habeas corpus. Contrabando de cigarros (art. 334, § 1º, d, do CP). Desclassificação para o crime de descaminho. Impossibilidade. Princí-pio da insignificância. Não incidência. Ordem denegada. 1. O cigarro posto mercado-ria importada com elisão de impostos, incorre em lesão não só ao Erário e à atividade arrecadatória do Estado, mas a outros interesses públicos como a saúde e a atividade industrial internas, configurando-se contrabando, e não descaminho. Precedente: HC 100.367, Primeira Turma, DJ de 08.09.2011. 2. O crime de contrabando incide na proi-bição relativa sobre a importação da mercadoria, presentes as conhecidas restrições dos órgãos de saúde nacionais incidentes sobre o cigarro. 3. In casu, a) o paciente foi condenado a 1 (um) ano de reclusão, em regime inicial aberto, pela prática do crime previsto no art. 334, § 1º, alínea d, do Código Penal (contrabando), por ter adquirido, para fins de revenda, mercadorias de procedência estrangeira – 10 (dez) maços, com 20 (vinte) cigarros cada – desacompanhadas da documentação fiscal comprobatória do recolhimento dos respectivos tributos; b) o valor total do tributo, em tese, não recolhido aos cofres públicos é de R$ 3.850,00 (três mil oitocentos e cinquenta reais); c) a pena privativa de liberdade foi substituída por outra restritiva de direitos. 4. O princípio da insignificância não incide na hipótese de contrabando de cigarros, tendo em vista que ‘não é o valor material que se considera na espécie, mas os valores ético--jurídicos que o sistema normativo – penal resguarda’ (HC 118.359, Segunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 11.11.2013). No mesmo sentido: HC 119.171, Primeira Turma, Relatora a Ministra Rosa Weber, DJ de 04.11.2013; HC 117.915, Se-gunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJ de 12.11.2013; HC 110.841, Se-gunda Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 14.12.2012. 5. Ordem denega-da.” (STF – HC 118.858 – São Paulo – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 03.12.2013)

CRIME DE DESObEDIÊNCIA

30760 – “Recurso especial. Penal. Desobediência. Art. 330 do Código Penal. Condu-ta omissiva. Momento consumativo. Crime instantâneo. Marco inicial da prescrição da pretensão punitiva. Recurso provido. 1. O crime de desobediência, previsto no art. 330 do Código Penal, pode ser praticado mediante conduta omissiva ou comis-siva. No caso, a ré se absteve de cumprir ordem judicial, consistente no bloqueio de valores para o pagamento de verbas reconhecidas em reclamação trabalhista. Foi con-cedido à ré o prazo de 10 (dez) dias para o cumprimento do mandado. 2. O delito se

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consumou no momento em que findou o prazo para atendimento da ordem emanada da autoridade competente, não se prolongando no tempo. Configurada a natureza de crime puramente formal e instantâneo, tem-se como marco inicial para a prescrição da pretensão punitiva o dia em que se consumou a infração. 3. Recurso provido.” (STJ – REsp 1.365.383 – (2012/0252586-9) – 5ª T. – Relª Min. Laurita Vaz – DJe 19.12.2013)

CRIME DE fALSIDADE IDEOLÓgICA

30761 – “Penal e processual penal. Conflito negativo de competência. Crimes de fal-sidade ideológica e uso de documento falso. Ausência de lesão a bem, serviço ou interesse da União. Concurso entre a jurisdição comum e a militar. Unidade de julga-mento. Ressalva. Art. 79, I, do CPP. Competência da Justiça Estadual. I – Cuida-se de Inquérito Policial, instaurado para apuração da suposta prática dos crimes previstos nos arts. 299 e 304 do Código Penal, cometidos, em tese, por José Ricardo Silva San-tos, que foi preso em flagrante, na posse de vários documentos falsificados, portando uniforme militar, fazendo-se passar por Oficial da Aeronáutica. II – No tocante às condutas de uso indevido de uniforme militar e falsificação de documentos públicos que atentam contra a administração militar – tipificadas, em princípio, nos arts. 172 e 311 c/c art. 9º, III, a, do Código Penal Militar –, em face do disposto no art. 79, I, do Código de Processo Penal, devem ser remetidos, ao Ministério Público Militar competente, cópia do Inquérito Policial e o uniforme militar utilizado. III – Os delitos remanescentes, consubstanciados, em tese, no uso de documento de identidade falsa de jornalista e na falsificação ou uso de carteira de identidade falsa, expedida no âmbito estadual, previstos nos arts. 304 e 299 do Código Penal, não causaram qual-quer prejuízo a bens, serviços ou interesse da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, consoante previsto no art. 109, IV, da Constituição Federal, afastando, assim, a competência da Justiça Federal para processar e julgar o feito. IV – Consoante a jurisprudência, ‘a qualificação do órgão expedidor do documento público é irrelevante para determinar a competência do Juízo no crime de uso de documento falso, pois o critério a ser utilizado para tanto define-se em razão da en-tidade ou do órgão ao qual foi apresentada, porquanto são estes quem efetivamente sofrem os prejuízos em seus bens ou serviços’ (STJ, CC 99.105/RS, Rel. Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe de 27.02.2009). V – Conflito conhecido, para declarar com-petente o Juízo de Direito da Comarca de Navegantes/SC, o suscitado.” (STJ – CC 108.024 – (2009/0182295-0) – 3ª S. – Relª Min. Assusete Magalhães – DJe 11.12.2013)

CRIME DE PISTOLAgEM

30762 – “Processo penal. Recurso ordinário em habeas corpus. Duplo homicídio e tentativa de homicídio. Crime de pistolagem. Prisão cautelar. Gravidade concreta. Circunstâncias. Modus operandi. Motivação idônea. Ocorrência. Recurso a que se nega

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provimento. 1. Não é ilegal o encarceramento provisório que se funda em dados con-cretos a indicar a necessidade da medida cautelar, especialmente em elementos ex-traídos da conduta perpetrada pelo acusado, demonstrando a necessidade da prisão para garantia da ordem pública. 2. Recurso a que se nega provimento.” (STJ – Rec-HC 41.006 – (2013/0316023-0) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 19.12.2013)

CRIME DE ROUbO

30763 – “Penal e processual penal. Habeas corpus. Crime de roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo, concurso de agentes e restrição da liberdade da vítima (CP, art. 157, caput, c/c § 2º, I e II). Pena fixada em 6 (seis) anos. Rediscussão dos critérios de dosimetria da pena. Fundamentação idônea pelas instâncias ordinárias. Impossi-bilidade de revisão pelo Supremo Tribunal Federal. Pedido de aplicação do benefício da delação premiada (art. 14 da Lei nº 9.807/1999). Não conhecimento. Necessidade de reexame de matéria probatória, inviável na via do habeas corpus. Ordem denegada. 1. A dosimetria da pena, bem como os critérios subjetivos considerados pelos órgãos inferiores para a sua realização, não são passíveis de aferição na via estreita do habeas corpus, por demandar minucioso exame fático e probatório inerente a meio proces-sual diverso. Precedentes: HC 97058, Rel. Min. Joaquim Barbosa, Segunda Turma, Julgado em 01.03.2011; HC 94073, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, Julgado em 09.11.2010. 2. O habeas corpus não é instrumento jurídico que se preste a revisar os elementos de prova invocados e valorados pelas instâncias ordinárias de mérito, somente sendo cabível a intervenção corretiva do Supremo Tribunal Federal nas hipóteses de equívoco flagrante ou de decisão teratológica. 3. In casu, o paciente foi condenado à pena de 6 (seis) anos de reclusão, em regime inicial semiaberto, pela prática do delito de roubo triplamente qualificado (art. 157, caput, e § 2º, I, II e V, do Código Penal), pois, juntamente com outros oito corréus, ‘em concurso e com unidade de desígnios, mediante violência e grave ameaça com emprego de arma, subtraíram dois caminhões carregados de mercadorias adrede apreendidas pela Receita Federal, com destino à cidade de catarinense de São Francisco do Sul, mantendo os motoristas [...], ambos servidores públicos federais, em seu poder, e restringindo sua liberdade, mediante grave ameaça [...] para a abordagem dos dois caminhões da Receita Fede-ral, usando giroflex e distintivos da Polícia Federal, lograram os denunciados render os motoristas com violência e ameaça com o emprego de arma, submetendo-os à cár-cere privado, conduzindo, ato contínuo, os dois caminhões para o barracão, alugado em nome [de um dos corréus], onde, [...] puseram-se a descarregá-los, subtraindo para si diversas mercadorias’ avaliadas em R$ 479.291,52, conforme laudo pericial. 4. No caso sub examine, a pena-base foi fixada no mínimo legal de 4 (quatro) anos e o acréscimo no patamar de 1/2, em razão da incidência das causas de aumento de pena prevista no art. 157, § 2º, I (se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo), II (concurso de duas ou mais pessoas) e V (se o agente mantém a vítima em

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seu poder, restringindo a liberdade), está devidamente fundamentado, ‘diante do grande número de agentes a participar da empreitada criminosa, com tarefas bem delineadas para o êxito da operação, bem como pela manutenção das vítimas em cativeiro sob a vigilância armada’. 5. A concessão do benefício da delação premiada exige revolvimento de matéria probatória para fins de identificar o preciso grau de efetividade das contribuições da paciente para as investigações do crime, o que é in-compatível com a via estreita do habeas corpus, conforme a remansosa jurisprudência desta Corte Suprema. Precedentes (HC 106393, Relª Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, Julgado em 15.02.2011; RHC 98731, Relª Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, Julgado em 02.12.2010; HC 72979, Rel. Min. Moreira Alves, Primeira Turma, Julga-do em 23.02.1996; HC 93369, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, Julgado em 15.09.2009). 6. Ordem denegada. 2 HC 117946/PR triplamente qualificado (art. 157, caput, e § 2º, I, II e V, do Código Penal), pois, juntamente com outros oito corréus, ‘em concurso e com unidade de desígnios, mediante violência e grave ameaça com emprego de arma, subtraíram dois caminhões carregados de mercadorias adrede apreendidas pela Receita Federal, com destino à cidade de catarinense de São Fran-cisco do Sul, mantendo os motoristas [...], ambos servidores públicos federais, em seu poder, e restringindo sua liberdade, mediante grave ameaça [...] para a abordagem dos dois caminhões da Receita Federal, usando giroflex e distintivos da Polícia Fe-deral, lograram os denunciados render os motoristas com violência e ameaça com o emprego de arma, submetendo-os à cárcere privado, conduzindo, ato contínuo, os dois caminhões para o barracão, alugado em nome [de um dos corréus], onde, [...] puseram-se a descarregá-los, subtraindo para si diversas mercadorias’ avaliadas em R$ 479.291,52, conforme laudo pericial. 4. No caso sub examine, a pena-base foi fixada no mínimo legal de 4 (quatro) anos e o acréscimo no patamar de 1/2, em razão da incidência das causas de aumento de pena prevista no art. 157, § 2º, I (se a violência ou ameaça é exercida com emprego de arma de fogo), II (concurso de duas ou mais pessoas) e V (se o agente mantém a vítima em seu poder, restringindo a liberdade), está devidamente fundamentado, ‘diante do grande número de agentes a participar da empreitada criminosa, com tarefas bem delineadas para o êxito da operação, bem como pela manutenção das vítimas em cativeiro sob a vigilância armada’. 5. A con-cessão do benefício da delação premiada exige revolvimento de matéria probatória para fins de identificar o preciso grau de efetividade das contribuições da paciente para as investigações do crime, o que é incompatível com a via estreita do habeas corpus, conforme a remansosa jurisprudência desta Corte Suprema. Precedentes (HC 106393, Relª Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, Julgado em 15.02.2011; RHC 98731, Relª Min. Cármen Lúcia, Primeira Turma, Julgado em 02.12.2010; HC 72979, Rel. Min. Moreira Alves, Primeira Turma, Julgado em 23.02.1996; HC 93369, Rel. Min. Celso de Mello, Segunda Turma, Julgado em 15.09.2009). 6. Ordem denegada.” (STF – HC 117.946 – Paraná – 1ª T. – Rel. Min. Luiz Fux – J. 03.12.2013)

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DELITO DE TRÂNSITO

30764 – “Recurso especial. Penal e processual penal. Crime de homicídio tentado. Desclassificação. Possibilidade. Irradiação dos efeitos objetivos da coisa julgada material. Reconhecimento de conduta culposa. Resultado doloso. Impossibilidade. Prescrição da pretensão punitiva do Estado. Ocorrência. Extinção da punibilidade do agente. Recurso provido. 1. Na esfera penal, os efeitos da coisa julgada material estão previstos expressamente no art. 110, § 2º, do Código de Processo Penal e atin-gem a parte dispositiva da sentença, bem como o fato principal, independentemente da qualificação jurídica a ele atribuída, irradiando os seus efeitos para dentro e para fora do processo, ficando o órgão julgador vinculado ao que foi decidido. 2. Os efeitos da coisa julgada material têm por objetivo evitar a prolação de decisões conflitantes referentes ao mesmo fato e sujeitos processuais, observando o princípio da segurança jurídica e da estabilidade das relações de direito material. 3. No caso, o agente, me-diante uma só ação, deu causa a resultados jurídicos diversos – morte e lesão corporal de vítimas distintas. A despeito da ocorrência de concurso formal de crimes, os fatos tiveram tramitação em diferentes procedimentos penais. Em relação ao processo cri-minal referente ao resultado morte (que não é objeto do presente recurso), o agravan-te, ao ser submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri por crime de homicídio doloso, teve a sua conduta desclassificada para homicídio culposo, tendo a decisão transitada em julgado. Referindo-se esse processo à mesma conduta que se examina no presente feito, é de rigor a extensão dos efeitos daquela decisão transitada em julgado para os autos desta ação penal, reconhecendo-se, assim, tratar-se, no caso, igualmente de conduta culposa, haja vista a prática de apenas um ato pelo agente. 4. Havendo a prática de uma conduta culposa pelo agravante, o resultado naturalísti-co e indesejado somente lhe pode ser imputado a título culposo, situação que impõe a desclassificação do fato para lesão corporal culposa (art. 303 do Código de Trânsito Brasileiro). 5. A sentença de pronúncia e o acórdão que a confirma continuam a ser marcos interruptivos da prescrição, ainda que procedida a desclassificação da condu-ta do agente. Súmula nº 191/STJ. 6. Diante da reclassificação do crime e verificando-se a nova pena abstratamente cominada ao delito – 2 (dois) anos de detenção –, constato o transcurso do lapso prescricional entre a data do acórdão que confirmou a decisão de pronúncia (07.12.2004) – último marco interruptivo dos autos – até a presente data. Recurso especial provido para reclassificar a conduta para o crime previsto no art. 303 do Código de Trânsito Brasileiro e, nos termos do art. 61 do Código de Processo Pe-nal, declarar extinta a punibilidade do agente pela prescrição da pretensão punitiva do Estado.” (STJ – REsp 1.021.670/SP – (2008/0002866-8) – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 11.12.2013)

Nota: O vertente acórdão trata de recurso especial interposto com fulcro no art. 105, III, a e c, da Constituição da República contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo.

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O acórdão recorrido violou os arts. 14, I e II, 18, I e II, 121, caput, todos do Código Penal, 303 do Código de Trânsito Brasileiro e os arts. 410, caput, 609 e 619, todos do Código de Processo Penal, bem como divergiu de julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A defesa alega que a tentativa é incompatível com o dolo eventual, razão pela qual deve ser desclassificada a conduta do recorrente para lesão corporal cul-posa.Aduz que as provas demonstram a inexistência de dolo eventual.Observa que houve violação ao art. 385 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça de São Paulo, uma vez que o Relator e o revisor dos embargos infrin-gentes deveriam ser integrantes da Terceira Câmara Criminal e não da Quarta Câmara, a qual havia procedido ao julgamento do recurso em sentido estrito.Com isso, pleiteia a desclassificação do crime para lesão corporal culposa.Após decisão do Tribunal do Júri que condenou o réu por crime culposo, não é possível que ele seja condenado, em outro processo, por crime doloso resultante da mesma conduta.Vale trazer trecho do voto do Relator: “Se o agente, mediante ação ou omissão imprudente, negligente ou imperita – espécies de culpa –, dá causa a um resultado indesejado, este não poderá ser imputado a título de dolo, mas tão somente a título culposo, pois uma conduta culposa não pode dar causa a resultado doloso, visto que não deriva da inten-ção do agente e sim da violação de um dever objetivo de cuidado. Ou seja, se o agente não teve a intenção de produzir o resultado, não o quis nem assumiu o risco de produzi-lo – dolo –, mas, por violação a dever jurídico de cuidado – culpa – deu causa a resultado típico, ilícito e culpável, este não lhe pode ser imputado a título doloso, mas apenas culposamente e desde que previsto em lei a punição daquele fato a título culposo, uma vez que, no crime culposo, o resultado danoso é involuntário. Portanto, se praticado o fato mediante conduta culposa, o resultado advindo daquela somente poderá ser imputado ao agente a título culposo por uma ligação causal de previsibilidade do evento danoso.”Nesse sentido é a lição de Guilherme de Souza Nucci: “Elementos da culpa.a) concentração na análise da conduta voluntária do agente, isto é, o mais im-portante na culpa é a análise do comportamento e não do resultado;b) ausência do dever de cuidado objetivo, significando que o agente deixou de seguir as regras básicas e gerais de atenção e cautela, exigíveis de todos que vivem em sociedade. Essas regras gerais de cuidado derivam da proibição de ações de risco que vão além daquilo que a comunidade juridicamente organi-zada está disposta a tolerar (cf. Marco Antonio Terragni, El delito culposo, p. 29);c) resultado danoso involuntário, ou seja, é imprescindível que o evento lesivo jamais tenha sido desejado ou acolhido pelo agente;d) previsibilidade [...];

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e) ausência de previsão [...];f) tipicidade, vale dizer, o crime culposo precisa estar expressamente previsto no tipo penal. [...];g) nexo causal, significando que somente a ligação, através da previsibilidade, entre a conduta do agente e o resultado danoso pode constituir o nexo de cau-salidade no crime culposo, já que o agente não deseja a produção do evento lesivo.” (NUCCI, G. S. Manual de direito penal: parte geral e parte especial. 6. ed., Revista dos Tribunais, 2009. p. 231/232).Como a natureza culposa da conduta do acusado foi decidida pelo Tribunal do Júri e isso não pode ser modificado, o Relator afirmou que não é possível a condenação por tentativa de homicídio. Com esse entendimento, a conduta foi desclassificada para lesão corporal culposa.

ESTELIONATO

30765 – “Penal e processual penal. Estelionato qualificado. Art. 171, § 3º, c/c art. 29 do Código Penal. Materialidade e autoria delitivas comprovadas. Princípio da insig-nificância. Inaplicabilidade. Condenação mantida. Multa. Arts. 59 e 68 do CP. Critério trifásico. Observância. 1. Materialidade de crime de estelionato qualificado, previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, consubstanciado no fato de os réus terem obtido, para si ou para outrem, mediante fraude, vantagem indevida em detrimento da Caixa Econômica Federal. 2. Materialidade e autoria delitivas sobejamente comprovadas, de sorte a não remanescer qualquer dúvida quanto à presença dos elementos objeti-vos e subjetivos que culminaram por caracterizar o ilícito penal. 3. Embora possa ser, em tese, admitida a incidência do princípio da insignificância em razão do valor da vantagem recebida indevidamente, em contrapartida resta inaplicável tal preceito em razão de que a violação não se resumiu à subtração do dinheiro da empresa pública federal, mas também ao abalo à fé pública causado pelo uso dos documentos falsos apresentados para enganar a instituição bancária. 4. O uso de documentos falsos não é elementar do crime de estelionato, podendo ser invocado como circunstância desfa-vorável para aumentar a pena-base. 5. A aplicação da pena de multa deve observar o caminho trifásico preconizado nos arts. 59 e 68 do Código Penal, sob pena de nulida-de. 6. Apelações parcialmente providas.” (TRF 1ª R. – ACr 2008.38.01.001187-6/MG – Relª Desª Fed. Monica Sifuentes – DJe 17.01.2014)

ESTUPRO DE VULNERáVEL

30766 – “Penal. Agravo regimental em agravo em recurso especial. Estupro de vul-nerável (art. 217-A do CP). Prisão cautelar. Fundamentação idônea. Gravidade do crime. Modus operandi empregado. Acórdão a quo em consonância com jurisprudência desta Corte. Súmula nº 83/STJ. Condenação. Dosimetria. Pena-base acima do míni-mo legal. Violação dos arts. 59 de 68 do CP. Improcedência. Circunstâncias judiciais

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negativas (circunstâncias e consequências do crime). Fundamentação idônea. Preten-são absolutória. Insuficiência probatória. Inviabilidade. Tema que demanda reexame de matéria fático-probatória. Súmula nº 7/STJ. 1. A gravidade concreta do crime, caracterizada pelo modus operandi empregado, constitui fundamentação idônea para a prisão cautelar com base na garantia da ordem pública. Precedentes. 2. No caso, a majoração da pena-base acima do mínimo legal está devidamente fundamentada, uma vez que as circunstâncias e consequências do crime justificam o agravamento da pena. 3. A revisão da conclusão adotada pelas instâncias ordinárias quanto à presen-ça de provas suficientes à condenação exigiria o reexame do conjunto fático-probató-rio dos autos, o que não é admitido na via especial. Incidência da Súmula nº 7/STJ. 4. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AG-REsp 366.192 – (2013/0249493-4) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 13.12.2013)

EXECUÇÃO PENAL

30767 – “Habeas corpus. Execução penal. Remição de pena. Jornada de trabalho. Pre-tensão do cômputo da remição em horas, e não em dias trabalhados. Improcedência. Ordem denegada. 1. Para fins de remição de pena, a legislação penal vigente estabe-lece que a contagem de tempo de execução é realizada à razão de um dia de pena a cada três dias de trabalho, sendo a jornada normal de trabalho não inferior a seis nem superior a oito horas, o que impõe ao cálculo a consideração dos dias efetivamente trabalhados pelo condenado e não as horas. 2. Ordem denegada.” (STF – HC 114.393 – Rio Grande do Sul – 2ª T. – Relª Min. Cármen Lúcia – J. 03.12.2013)30768 – “Habeas corpus substitutivo de recurso especial. Execução penal. Crime de la-trocínio. Progressão para o regime semiaberto. Deferimento pelo juízo das execuções penais. Cassação do decisum pela Corte de origem. Realização de exame criminológi-co. Decisão fundamentada. Ordem de habeas corpus não conhecida. 1. Como é consa-bido, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal e ambas as Turmas desta Corte, após evolução jurisprudencial, passaram a não mais admitir a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário, nas hipóteses em que esse último é cabí-vel, em razão da competência do Pretório Excelso e deste Superior Tribunal tratar-se de matéria de direito estrito, prevista taxativamente na Constituição da República. 2. Esse entendimento tem sido adotado pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça também nos casos de utilização do habeas corpus em substituição ao recurso especial, com a ressalva da posição pessoal desta Relatora, sem prejuízo de, even-tualmente, se for o caso, deferir-se a ordem de ofício, em caso de flagrante ilegalida-de. 3. ‘Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada’ (Enunciado nº 439 da Súmula desta Corte). 4. O Tribunal de ori-gem entendeu que seria recomendável uma melhor avaliação do requisito subjetivo, por meio da realização do exame criminológico, com amparo na periculosidade do ora paciente, devidamente comprovada nos autos, uma vez que foi condenado por delito cometido com violência e praticou faltas graves no decorrer de sua pena, com

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término previsto para 9 de agosto de 2027, recomendando uma melhor avaliação do requisito subjetivo. Precedentes. 5. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 88.052/DF (Rel. Min. Celso de Mello, DJ de 28.04.2006), afirmou que ‘não consti-tui demasia assinalar, neste ponto, não obstante o advento da Lei nº 10.792/2003, que alterou o art. 112 da LEP – para dele excluir a referência ao exame criminológico –, que nada impede que os magistrados determinem a realização de mencionado exa-me, quando o entenderem necessário, consideradas as eventuais peculiaridades do caso, desde que o façam, contudo, em decisão adequadamente motivada’. 6. Ordem de habeas corpus não conhecida.” (STJ – HC 280.186 – (2013/0352256-0) – 5ª T. – Relª Min. Laurita Vaz – DJe 19.12.2013)

fRAUDE EM LICITAÇÕES

30769 – “Processual penal. Fraude em licitações. Condenação. Ausência de impug-nação de todos os fundamentos do decisum agravado. Súmula nº 182/STJ. Agravo não conhecido. 1. A falta de impugnação específica de todos fundamentos utilizados na decisão agravada atrai a incidência do Enunciado Sumular nº 182 desta Corte Su-perior. 2. ‘A agravante não infirma especificamente todos os fundamentos da decisão agravada, impondo-se a aplicação do enunciado da Súmula nº 182 deste Superior Tribunal de Justiça’ (AgRg no Ag 1175713/RJ, Rel. Ministro Og Fernandes, Sexta Tur-ma, Julgado em 21.10.2010, DJe 16.11.2010). 3. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-AG-REsp 121.953 – (2012/0011989-3) – 5ª T. – Rel. Min. Jorge Mussi – DJe 19.12.2013)

fURTO

30770 – “Habeas corpus. Constitucional. Penal. Furto. Pretensão de aplicação do prin-cípio da insignificância. Inviabilidade. Reincidência. Ordem denegada. 1. A tipicida-de penal não pode ser percebida como o exercício de mera adequação do fato concre-to à norma abstrata. Além da correspondência formal, a configuração da tipicidade demandaria análise materialmente valorativa das circunstâncias do caso concreto, para verificar a ocorrência de alguma lesão grave, contundente e penalmente rele-vante do bem jurídico tutelado. 2. Reincidência do paciente assentada nas instâncias antecedentes. 3. Ordem denegada.” (STF – HC 118.428 – Minas Gerais – 2ª T. – Relª Min. Cármen Lúcia – J. 10.12.2013)

HOMICÍDIO CULPOSO

30771 – “Apelação da defesa. Acidente de trânsito. Homicídio culposo. Inobservân-cia dos cuidados devidos e omissão de socorro. Compensação de culpa. Impossibi-lidade. Presentes as provas conclusivas da responsabilidade do condutor do veículo

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em acidente do qual resultou vítima fatal, justifica-se a condenação em conformidade com o art. 206 do CPM. Mantém-se a condenação em homicídio culposo, agravada pelo § 1º do art. 206 do CPM, quando caracterizadas a imprudência e a negligência do motorista, que não tomou os devidos cuidados para evitar a consumação do de-lito, bem como por evadir-se do local do acidente sem prestar socorro à vítima. A alegação de comportamento culposo da vítima não elide a responsabilidade penal do condutor, pois o direito penal pátrio não admite a compensação de culpa. Desprovi-do o apelo da Defesa para manter a Sentença hostilizada. Decisão Unânime.” (STM – Ap 161-14.2010.7.01.0301 – Rel. Min. Olympio Pereira da Silva Junior – DJe 09.01.2014)

HOMICÍDIO DOLOSO

30772 – “Penal. Recurso em habeas corpus. Homicídio doloso, ocultação de cadáver e porte ilegal de arma de fogo. Revogação da prisão preventiva. Impossibilidade. Fundamentação idônea. Assegurar a aplicação da lei penal. Acusado foragido há mais de dez anos. Recurso desprovido. A jurisprudência desta Corte tem procla-mado que a prisão cautelar, como medida de caráter excepcional, deve ser impos-ta, ou mantida, apenas quando atendidas, mediante decisão judicial fundamentada (art. 93, IX, da CF), as exigências do art. 312 do CPP. Isso porque a liberdade, antes de sentença penal condenatória definitiva, é a regra, e o enclausuramento provisório, a exceção, como têm insistido esta Corte e o Supremo Tribunal Federal em inúmeros julgados, por força do princípio da presunção de inocência, ou da não culpabilidade. A segregação cautelar foi devidamente justificada pelas instâncias ordinárias, não se podendo falar em carência de fundamentação para o decreto cautelar ou ausência de requisitos autorizadores, uma vez que a medida está respaldada na necessidade de garantir a aplicação da lei penal, destacando que o paciente, tendo inequívoca ciência da existência da presente ação penal, optou por evadir do distrito da culpa, encon-trando-se em local incerto e não sabido há mais de 10 (dez) anos. Recurso ordinário a que se nega provimento.” (STJ – Rec-HC 28.704 – (2010/0132559-6) – 6ª T. – Relª Min. Marilza Maynard – DJe 16.12.2013)

LESÃO CORPORAL

30773 – “Habeas corpus. Constitucional. Penal militar. Ofensa verbal e lesão corporal praticadas por militar contra militar, ambos da Marinha e da ativa. Delito supos-tamente praticado fora de situação de atividade e de local sujeito à administração militar e motivado por questões alheias às funções militares. Competência da Justiça Estadual comum. Ordem concedida. Precedentes. I – No caso sob exame, os fatos in-vestigados teriam ocorrido na residência do ofendido, ou seja, fora de área militar ou de situação de serviço. II – O suposto crime é de competência da Justiça Estadual co-mum, uma vez que a natureza militar do fato delituoso deve levar em conta a índole

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militar do ilícito e se o agente se encontra em situação de atividade, o que não se evi-dencia no presente caso. III – Ordem concedida para reconhecer a competência da Jus-tiça Estadual comum e anular o IPM 0000015-39.2013.7.06.0006, bem como eventual ação penal dele originada na Justiça Militar da União.” (STF – HC 120.166 – Bahia – 2ª T. – Rel. Min. Ricardo Lewandowski – J. 03.12.2013)

MOEDA fALSA

30774 – “Penal e processual penal. Moeda falsa. Art. 289, § 1º, do Código Penal. Ma-terialidade e autoria comprovadas. Princípio da insignificância. Inaplicabilidade. 1. Caracterizado o crime previsto no art. 289, § 1º, do Código Penal quando o réu, mes-mo ciente da falsidade da cédula, objetiva sua inserção no meio circulante. 2. Sendo a fé pública o bem jurídico tutelado nesses crimes, não há como se aplicar o princípio da insignificância. 3. Apelação provida.” (TRF 1ª R. – ACr 2007.36.00.002432-9/MT – Relª Desª Fed. Monica Sifuentes – DJe 17.01.2014)

PECULATO

30775 – “Habeas corpus substitutivo de recurso especial. Penal. Peculato. Pleito de fi-xação de regime prisional diverso do fechado. Pena superior a 8 anos de reclusão. Impossibilidade. Ordem de habeas corpus não conhecida. 1. Como é consabido, a Pri-meira Turma do Supremo Tribunal Federal e ambas as Turmas desta Corte, após evolução jurisprudencial, passaram a não mais admitir a impetração de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário, nas hipóteses em que esse último é cabível, em razão da competência do Pretório Excelso e deste Superior Tribunal tratar-se de ma-téria de direito estrito, prevista taxativamente na Constituição da República. 2. Esse entendimento tem sido adotado pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça também nos casos de utilização do habeas corpus em substituição ao recurso especial, com a ressalva da posição pessoal desta Relatora, sem prejuízo de, eventualmente, se for o caso, deferir-se a ordem de ofício, em caso de flagrante ilegalidade. 3. Nos termos do art. 33, § 2º, alínea a, do Código Penal, ‘o condenado a pena superior a oito anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado’. 4. Na hipótese, fixada a pena-base acima do mínimo legal, porque presentes circunstâncias judiciais desfavo-ráveis, mostra-se adequada a aplicação do regime inicial fechado, inclusive diante do quantum de pena total estabelecido (superior a 8 anos), conforme exegese do art. 33, § 2º, alínea a, do Código Penal. 5. Ordem de habeas corpus não conhecida.” (STJ – HC 272.206 – (2013/0190545-2) – 5ª T. – Relª Min. Laurita Vaz – DJe 19.12.2013)

PRAzO

30776 – “Habeas corpus. Processual penal. Art. 16 da Lei nº 10.826/2003. Condenação. Pena de 3 anos e 6 meses, em regime inicial fechado. Prisão preventiva que já passa de

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2 anos e 4 meses. Excesso de prazo no julgamento da apelação. Ocorrência. 1. Inexiste na lei processual prazo fixado para o julgamento do recurso de apelação. Evidenciada a demora injustificada no julgamento do recurso defensivo – em caso de condenado preso, por fato que não pode ser atribuído à defesa, configura-se o constrangimento ilegal por excesso de prazo. Precedentes. 2. Peculiaridade do caso, em que o pacien-te já cumpriu 2/3 da pena em regime fechado e a apelação retornou, em diligência não requerida pela parte, pela segunda vez, à Vara de origem. 3. Ordem concedi-da.” (STJ – HC 280.289 – (2013/0353190-2) – 6ª T. – Rel. Min. Sebastião Reis Júnior – DJe 13.12.2013)

PRISÃO EM fLAgRANTE

30777 – “Processual penal. Habeas corpus. Prisão em flagrante convertida em preven-tiva. Arts. 33, 35 e 40, I, da Lei nº 11.343/2006. Garantia da ordem pública e da apli-cação da Lei Penal. Gravidade concreta do delito e modus operandi. Constrangimento ilegal não evidenciado. Ordem denegada. 1. Mostra-se legítima a decretação da pri-são preventiva para a garantia da ordem pública, em face das circunstâncias do caso que retratam, in concreto, a periculosidade do agente, considerando-se, sobretudo, a considerável gravidade da conduta realizada, tendo em vista a grande quantidade de entorpecente apreendida e o modus operandi empregado. 2. Ordem denegada.” (TRF 1ª R. – HC 0071142-45.2013.4.01.0000/AM – Relª Desª Fed. Monica Sifuentes – DJe 17.01.2014)

PRISÃO PREVENTIVA

30778 – “Recurso ordinário em habeas corpus. 1. Furto. Prisão preventiva. Excesso de prazo para a formação da culpa. Não ocorrência. 1 (um) ano e 6 (seis) meses. Razoa-bilidade. Encerramento da instrução. Incidência da Súmula nº 52/STJ. 2. recurso ordinário improvido, com recomendação. 1. Conforme entendimento pacífico desta Corte Superior, eventual excesso de prazo deve ser analisado à luz do princípio da razoabilidade, permitido ao Juízo, em hipóteses excepcionais, ante as peculiarida-des da causa, a extrapolação dos prazos previstos na lei processual penal, visto que essa aferição não resulta de simples operação aritmética. No caso, o processo vem apresentando andamento regular, sendo certo que não sofreu interrupção por inércia ou negligência do Poder Público. Ademais, verifica-se que o feito está em fase de alegações finais, o que atrai a incidência do Enunciado nº 52 da Súmula desta Corte. 2. Recurso ordinário a que se nega provimento, com recomendação de julgamento da ação penal em prazo célere.” (STJ – Rec-HC 39.805 – (2013/0246702-7) – 5ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.12.2013)

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Jurisprudência penalrevista Jurídica 435

Janeiro/2014

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TRáfICO DE ENTORPECENTE

30779 – “Habeas corpus. Penal. Tráfico de entorpecentes. Lei nº 6.368/1976. Conde-nação. Alegação de reformatio in pejus indireta. Inocorrência. Pena fixada pela nova sentença manteve o quantum definitivo da condenação fixada na sentença anulada. Ordem denegada. 1. Não há reformatio in pejus na sentença penal condenatória que, ao manter a pena definitiva anteriormente fixada, não agrava a pena aplicada na senten-ça anulada nem piora a situação dos pacientes. 2. O Juízo de primeiro grau não está circunscrito ao reexame dos motivos da sentença anulada, detendo competência para reexaminar a causa à luz da nova instrução criminal e do art. 59 e seguintes do Códi-go Penal, podendo, para manter a mesma pena da sentença penal anulada, substituir por outras as circunstâncias judiciais ou legais de exasperação a que a decisão anu-lada tenha relevado. 3. Ordem denegada.” (STF – HC 113.512 – Mato Grosso – 2ª T. – Relª Min. Cármen Lúcia – J. 10.12.2013)

TRáfICO INTERNACIONAL DE DROgAS

30780 – “Recurso especial. Penal e processo penal. Tráfico internacional de dro-gas. Operação Tâmara. Escuta telefônica. Prazo e fundamentação. Ausência de pre-questionamento. Prova pericial. Necessidade. Reexame de provas. Ônus da prova. Distribuição. Dosimetria. Ausência de nulidade. Violação do art. 619 do CPP. Ino-corrência. I – É indispensável o efetivo exame da matéria pelo acórdão recorrido, em atenção ao disposto no art. 105, inciso III, da Constituição Federal, que exige o prequestionamento por meio da apreciação da questão federal pelo Tribunal a quo, de modo a se evitar a supressão de instância. II – Compete à defesa comprovar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos da pretensão acusatória, nos termos do art. 156 do Código de Processo Penal. III – Decidido pelo Tribunal a quo estar suficien-temente comprovada a autoria e a materialidade do crime, sendo desnecessária a pe-rícia de voz nas interceptações telefônicas, sem incursionar o acervo fático-probatório dos autos, não há como afastar as conclusões tomadas no julgamento da apelação. IV – Afastada a participação de menor importância suscitada, não viola o princípio da culpabilidade nem incorre em ilegalidade qualquer a fixação da mesma pena-base para os corréus no crime de associação para o tráfico, concreta e suficientemente mo-tivada na complexidade da organização criminosa, firmemente estruturada para a remessa contínua de entorpecentes para o exterior, além do número de participantes do grupo, tudo a evidenciar o grande potencial ofensivo da organização criminosa. V – A jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que a natureza e a grande quantidade da droga (22 quilos de cocaína) justificam a fixação da pena-base acima do mínimo legal. VI – Restando comprovado que o recorrente mantinha em depósito droga destinada à remessa ao território português, era mesmo de se lhe aplicar a causa de aumento de pena pela internacionalidade, incidente em

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Revista JuRídica 435JuRispRudência penal

JaneiRo/2014

todas as modalidades de tráfico, ainda que o entorpecente não tenha efetivamente deixado o território nacional. VII – Não há violação do art. 619 do Código de Processo Penal se o Tribunal a quo decide todas as questões suscitadas e utiliza fundamentação suficiente para solucionar a controvérsia sem incorrer em omissão ou contradição. VIII – Recurso improvido.” (STJ – REsp 1.342.749 – (2010/0145434-5) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 19.12.2013)

USO DE DOCUMENTO fALSO

30781 – “Penal e processual penal. Uso de documento falso. Passaporte nacional com visto consular falso. Art. 304 do Código Penal. Conduta atípica. Nulidade processual. Materialidade e autoria comprovadas. Dosimetria. 1. O uso de passaporte nacional contendo visto consular falso infringe a fé pública, haja vista que a falsidade do do-cumento público estrangeiro ocorreu dentro do território nacional e com a utilização de documento público brasileiro. 2. Rés intimadas de todas as fases processuais e assistidas por defensor público ou dativo nomeados pelo Juízo. 3. Materialidade e autoria devidamente comprovadas. 4. Uma vez que as circunstâncias do crime não se mostram desfavoráveis às acusadas, suas penas-base devem ser fixadas no mínimo legal. 5. Apelação não provida.” (TRF 1ª R. – ACr 2003.39.00.006967-0/PA – Relª Desª Fed. Monica Sifuentes – DJe 17.01.2014)

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Índice AlfAbético e Remissivo cÍvel e PenAl

Doutrina

Civil e ProCessual Civil

assunto

Defesa Do consumiDor

• o seguro obrigatório DPvaT e o Código de Defesa do Consumidor (augusto Franke Dahinten e Bernardo Franke Dahinten) ..................................................................... 15

Direito funDamental

• o Direito Fundamental à Duração razoável do Pro-cesso e a Corte europeia dos Direitos do Homem (Gustavo Bohrer Paim) ............................................................ 37

Prova

• o Depoimento Pessoal a requerimento da Própria Parte Como Meio de Prova no Direito Processual Civil (Tiago Bitencourt de David) .................................................................. 9

autor

augusto franke Dahinten

• o seguro obrigatório DPvaT e o Código de Defesa do Consumidor .............................................................................. 15

BernarDo franke Dahinten

• o seguro obrigatório DPvaT e o Código de Defesa do Consumidor .............................................................................. 15

gustavo Bohrer Paim

• o Direito Fundamental à Duração razoável do Processo e a Corte europeia dos Direitos do Homem ............................... 37

tiago Bitencourt De DaviD

• o Depoimento Pessoal a requerimento da Própria Parte Como Meio de Prova no Direito Processual Civil ...................... 9

Penal e ProCessual Penal

assunto

transação Penal

• análise dos institutos Despenalizadores da lei nº 9.099/1995 à luz da Teoria dos Jogos, em especial da Transação Penal (Felipe Heck soares e Milene ana dos santos Pozzer) .......................................................... 65

autor

feliPe heck soares

• análise dos institutos Despenalizadores da lei nº 9.099/1995 à luz da Teoria dos Jogos, em especial da Transação Penal ................................................................. 65

milene ana Dos santos Pozzer

• análise dos institutos Despenalizadores da lei nº 9.099/1995 à luz da Teoria dos Jogos, em especial da Transação Penal ................................................................. 65

acórDão na íntegra

Civil, ProCessual Civil e CoMerCial

assunto

execução De título extrajuDicial

• Processo civil – execução de título extrajudicial – Pe-nhora de imóvel do devedor – Direito de arremata-ção do credor-exequente – Concurso de preferências processual e material – artigos analisados: 690, § 3º, 690-a, parágrafo único, e 711, CPC (sTJ) .............................. 85

resPonsaBiliDaDe civil

• Civil – responsabilidade civil – Dano material, moral e esté-tico – Cumulação – possibilidade – Contratos – seguro – Co-bertura para danos corporais – alcance – limites (sTJ) ......... 93

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Revista JuRídica 435índice cível e Penal

JaneiRo/2014

sfh

• Direito processual civil – ação cautelar – sFH – Morte da mutuária – Quitação do seguro – inadimplemento de presta-ções pretéritas – Dl 70/1966 – notificação pessoal – irregula-ridade – nulidade – sentença reformada (TrF 2ª r.) ............. 99

Penal, ProCessual Penal

assunto

contraBanDo

• Penal e processual penal – Habeas corpus – Contrabando de cigarros (art. 334, § 1º, d, do CP) – Desclassificação para o crime de descaminho – impossibilidade – Princípio da in-significância – não incidência – ordem denegada (sTF) 145

crime De Descaminho

• Processual penal – recurso em sentido estrito – Crime de descaminho – operação policial – invasão de domicílio sem mandado judicial (TrF 1ª r.) ......................................... 163

estelionato contra o inss

• Penal e processual – Penal – estelionato contra o inss – art. 171, §3º, do Código Penal – Declaração falsa para a concessão de benefício assistencial – Conduta de agente que implementa a fraude para que terceiro logre o ampa-ro indevido – Crime instantâneo – Materialidade, autoria e dolo comprovados – Dosimetria – redução das sanções impostas – Prescrição retroativa TrF 4ª r.) .......................... 169

sonegação fiscal

• Penal e processual penal – agravo regimental no agravo em recurso especial – sonegação fiscal – art. 1º, iv, da lei nº 8.137/1990 – Delitos de falsum (arts. 299 e 304, CP) – aplicação do princípio da especialidade – Prin-cípio da consunção – Precedentes do sTJ – agravo regimental improvido (sTJ) ................................................... 155

ementário

Civil, ProCessual Civil e CoMerCial

assunto

ação anulatória

• Processual civil. agravo regimental no recurso especial. ação anulatória de execução e leilão extrajudicial. Cance-lamento de registro imobiliário. intimação pessoal do deve-dor. Dl 70/1966. súmula nº 7/sTJ ............................. 33149, 105

ação De Busca e aPreensão

• Processual civil. agravo regimental no agravo em recurso especial. ação de busca e apreensão. noti-

ficação extrajudicial. Cartório de Títulos e Documen-tos de Comarca diversa do domicílio do devedor. validade. Decisão mantida ......................................... 33150, 105

ação De coBrança Do seguraDo contra o seguraDor

• agravo regimental no agravo em recurso especial. segu-ro. ação de cobrança do segurado contra o segurador. Prescrição. súmulas nºs sTJ/101 e 229. improvimento. 1. a ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora prescreve em um ano (súmula nº 101/sTJ). 2. o pedido do pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado te-nha ciência da decisão (súmula nº 229/sTJ). 3. agravo regimental improvido .................................................. 33151, 106

ação De exoneração De fiança

• agravo regimental. ação de exoneração de fiança. Contra-to de abertura de crédito em conta corrente. Prorrogação automática. Fiança. ausência de anuência. ineficácia. apli-cação da súmula nº 83/sTJ ....................................... 33152, 106

ação De Prestação De contas

• agravo regimental. recurso especial. ação de prestação de contas. segunda fase. responsabilidade pelos honorá-rios do perito. Precedentes ........................................ 33153, 106

ação De rescisão De contrato

• Processual civil. agravo de instrumento. ação de rescisão de contrato. Promessa de compra e venda de imóvel. Pro-missários adquirentes. Mora. Cláusula penal. abusividade. antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional. suspensão dos pagamentos. extração dos efeitos da mora. aliena-ção do imóvel. verossimilhança e risco. inadimplemen-to contratual. Configuração ........................................ 33154, 107

ação monitória

• agravo regimental no agravo em recurso espe-cial. ação monitória. Contrato de mútuo. Prescrição quinquenal. art. 206, § 5º, do Código Civil de 2002. improvimento ............................................................. 33155, 108

ação revisional

• Processo civil. agravo interno. agravo em recurso especial. ação revisional. Manutenção na posse do bem. veros-similhança das alegações e abusividade das cláusulas contratuais e encargos financeiros. não demonstração. exclusão/abstenção de inscrição em cadastros de proteção ao crédito. requisitos não demonstrados. Decisão agrava-da mantida. improvimento.......................................... 33156, 108

aPelação

• agravo regimental. agravo em recurso especial. recurso de apelação. intempestividade. recurso protocolado em vara de comarca diversa daquela em que tramita o proces-so. erro grosseiro. Precedentes................................. 33157, 109

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Índice cÍvel e PenalRevista JuRÍdica 435

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ação civil PúBlica

• Processual civil. agravo regimental no agravo em re-curso especial. ação civil pública. revisão de contratos bancários. sindicato rural. legitimidade ativa. Prece-dentes. súmula nº 83/sTJ. arts. 2º e 29 do CDC. ausên-cia prequestionamento. súmulas nºs 282 e 356/sTF. Decisão mantida ........................................................ 33158, 109

conceito De consumiDor

• Civil, processo civil e consumidor. administradora de shop-ping center. explosão por vazamento de gás. Cadeia de for-necimento. responsabilidade solidária. empregado do for-necedor. Figura do consumidor por equiparação. aplicação. impossibilidade. existência de relação jurídica específica. Danos morais. valor. revisão em sede de recurso especial. impossibilidade. Montante razoável. Dispositivos legais analisados: arts. 2º, 3º, 7º, parágrafo único, 17 e 25 do CDC; e 21, parágrafo único, do CPC) ................................. 33159, 109

consumiDor

• Consumidor e civil. responsabilidade civil contratual. De-feitos em veículo zero-quilômetro. extrapolação do razoá-vel. Dano moral. existência. Juros de mora. Dies a quo. Citação. Dispositivos legais apreciados: arts. 18 do CDC e 186, 405 e 927 do CC/2002 ....................................... 33160, 110

• agravo regimental. agravo em recurso especial. inges-tão de barra de cereal contendo ovos e lagarta morta. Danos morais. ausência de omissões no acórdão. Prova pericial. reexame do conjunto fático-probatório. impossi-bilidade. súmula nº 7/sTJ. ausência de similitude fática. Dissídio jurisprudencial não comprovado. Decisão agrava-da mantida. improvimento.......................................... 33161, 113

• agravo regimental. agravo em recurso especial. inversão do ônus da prova ope legis. Forma objetiva. Fato do pro-duto ou do serviço. reexame de provas. súmula nº 7/sTJ. Quantum indenizatório. razoabilidade ...................... 33162, 114

• recurso especial. Plano de saúde. Tratamento. Téc-nica moderna. Cirurgia. negativa de cobertura. Cláusula abusiva. violação ao art. 535 do CPC nãoconfigurada ................................................................ 33163, 115

contrato De confissão De DíviDa

• Civil. Contrato de confissão de dívida. exceção de pré--executividade. leiloeiro oficial. aval ou fiança. Decreto nº 21.981/1932, art. 30. Garantia prestada alheia ao exercício das funções. validade. Princípio da boa-fé. Preservação ............................................................... 33164, 117

contrato De Promessa De comPra e venDa De imóvel

• agravo regimental. Direito do consumidor. Processual ci-vil. Contrato de promessa de compra e venda de imóvel. rescisão por culpa do comprador. arbitramento de aluguéis em razão do uso do imóvel. Possibilidade. ausência de bis in idem com cláusula penal ........................................ 33165, 117

contrato De seguro De viDa inDiviDual

• agravo regimental no recurso especial. Contrato de se-guro de vida individual. rescisão unilateral. Descabimen-to. ressalva da possibilidade de sua modificação pela seguradora, mediante a apresentação prévia de extenso cronograma, no qual os aumentos sejam apresenta-dos de maneira suave e escalonada. súmula nº 83/sTJ. improvimento ............................................................. 33166, 118

cumPrimento De sentença

• agravo regimental. ação de indenização. Cumprimento de sentença. omissão do acórdão recorrido. inexistência. Cons-tituição de capital. súmula nº 313/sTJ. superveniência de alteração legislativa (art. 475-Q, § 2º, do CPC). reexame de prova. Descabimento. súmula nº 7/sTJ .................... 33167, 118

Dano estético

• agravo regimental. agravo em recurso especial. Dano estético. Julgamento extra petita. inocorrência. Dano mo-ral. inscrição indevida. Quantum indenizatório fixado com razoabilidade .............................................................. 33168, 119

DescumPrimento De orDem juDicial

• agravo regimental. agravo em recurso especial. Descum-primento de ordem judicial. aplicação de multa diária. valor da multa. reexame de prova. súmula nº 7/sTJ. Fundamen-to inatacado. súmula nº 283/sTF .............................. 33169, 119

Direitos autorais

• recurso especial. Direitos autorais. Televisores e rádios em quartos de hotel. serviços prestados pelos meios de hospedagem. exploração de obras artísticas. Pagamento de direitos autorais. recurso provido......................... 33170, 120

Direito Bancário

• Civil e processual civil. Bancário. agravo regimental no agravo em recurso especial. Capitalização mensal dos juros. Pactuação expressa. Juros remuneratórios. abusividade não constatada. súmulas nºs 5 e 7/sTJ. Decisão mantida ........................................................ 33171, 120

Direito Das coisas

• recurso especial. Direito das coisas. Prescrição aqui-sitiva da usucapião extraordinária. aplicação dos arts. 1.238, parágrafo único, e 2.029 do CC/2002. recurso provido ......................................................... 33172, 121

Direito De família

• Direito de família. alimentos avoengos. obrigação com-plementar. Chamamento dos avós maternos afastado. inovação recursal. Processo já avançado. impossibilidade do genitor demonstrada. valor exorbitante. redução. Pos-sibilidade. apelo parcialmente provido ....................... 33173, 121

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Revista JuRídica 435índice cível e Penal

JaneiRo/2014

Direito De vizinhança

• Civil. recurso especial. ação declaratória cumulada com pedido de compensação por danos morais. embargos de declaração. omissão, contradição ou obscuridade. não ocorrência. inadimplemento de taxas condominiais. Des-programação dos elevadores. suspensão de serviços es-senciais. impossibilidade. exposição indevida da situação de inadimplência. violação de direitos da personalidade. Danos morais. Caracterização ................................... 33174, 122

• Direito de vizinhança – tese de conservação de marco divi-sório atribuída aos confinantes – interpretação do art. 1.297, § 1º, do Código Civil – presunção relativa ............................. 125

• agravo regimental. agravo em recurso especial. negativa de prestação jurisdicional. ausência de omissão do acórdão recorrido. Direito de vizinhança. responsabilidade objetiva. indenização por danos materiais e morais. Tese de conserva-ção de marco divisório atribuída aos confinantes. art. 1.297, § 1º, do CPC. inaplicabilidade. Presunção relativa. Compro-vado nos autos que o muro divisório dos imóveis estava sob os cuidados dos recorrentes. incidência da súmula nº 7/sTJ. Decisão agravada mantida ........................................ 33175, 125Direito Do consumiDor

• agravo regimental. agravo em recurso especial. Direi-to do consumidor. Provedor. Mensagem de conteúdo ofensivo. retirada. registro de número do iP. Dano mo-ral. ausência. Provimento .......................................... 33176, 126

• recurso especial representativo de controvérsia. art. 543-C do CPC. Direito do consumidor. Contrato de com-pra de imóvel. Desfazimento. Devolução de parte do valor pago. Momento ............................................ 33177, 126

• recurso especial. Direito do consumidor. indenização por danos morais e materiais. entrega de vestido de noiva defeituoso. natureza. Bem durável. art. 26, inci-so i, do Código de Defesa do Consumidor. Prazo de-cadencial de noventa dias.......................................... 33178, 127Direito emPresarial

• agravo regimental em recurso especial. Direito empre-sarial. recuperação judicial. Créditos resultantes de arrendamento mercantil e com garantia fiduciária. não submissão à recuperação .......................................... 33179, 128Direito sucessório

• Direito das sucessões. recurso especial. sucessão aberta anteriormente à vigência do Código Civil de 2002. Companheira sobrevivente. Direito real de habitação não reconhecido no caso concreto. 1. em matéria de direito sucessório, a lei de regência é aquela referen-te a data do óbito. assim, é de se aplicar ao caso a lei nº 9.278/1996, uma vez que o Código Civil ainda não havia entrado em vigor quando do falecimento do companheiro da autora, ocorrido em 19.10.2002 ............................ 33180, 128execução

• Direito processual civil. execução. embargos do devedor. Título executivo judicial. alteração de critérios. Coisa julga-

da. Honorários advocatícios. valor exagerado ou irrisório.não configurado. Fixação. art. 20, § 4º, do CPC ....... 33181, 130

inaDimPlemento contratual

• agravo interno em agravo de instrumento. Civil. inadimple-mento contratual. Cláusula penal. natureza compensatória. Cumulação com perdas e danos. impossibilidade. agravo desprovido. 1. É inviável a cumulação da multa compensató-ria com o cumprimento da obrigação principal, uma vez que se trata de uma faculdade disjuntiva, podendo o credor exi-gir a cláusula penal ou as perdas e danos, mas não ambas, conforme o art. 401 do Código Civil ........................... 33182, 131

inscrição inDeviDa

• agravo regimental no agravo em recurso especial. Dano moral. inscrição indevida. razoabilidade do montante indenizatório. súmula nº 7/sTJ. recurso não provido ................................................................................... 33183, 131

interesse De agir

• agravo regimental no agravo (544 do CPC). Medida cau-telar de exibição de documento. Decisão monocrática que negou provimento ao recurso. insurgência da casa bancá-ria. 1. esta Corte firmou entendimento quanto à existência de interesse de agir na propositura de ação de exibição de documentos de correntista contra o banco, independente-mente do pedido no âmbito administrativo. Precedentes. 2. agravo regimental não provido .............................. 33184, 132

inventário

• Civil e processo civil. inventário. sentença homologatória de partilha. Desconstituição. ação anulatória. Cabimento. legitimidade passiva de quem participou da partilha. artigos analisados: 486, 1.030 e 12, v, CPC ......................... 33185, 132

Leasing

• Processual civil. agravo regimental no agravo em recurso especial. ação de reintegração posse. Devolução vrG. violação dos arts. 128 e 460 do CPC. súmula nº 7/sTJ. súmula nº 83/sTJ. Decisão mantida ......................... 33186, 133

Pagamento Das custas juDiciais

• agravo regimental no agravo em recurso especial. não apresentação do comprovante de pagamento das custas judiciais. Momento da interposição. recurso especial. art. 511 do CPC. incidência da súmula nº 187 do sTJ. Deserção. Concessão de prazo para o recolhimento. im-possibilidade. Precedentes ........................................ 33187, 133

Plano De saúDe

• agravo regimental em recurso especial. Plano de saú-de. ação revisional de cláusula contratual abusiva. Prazo prescricional decenal ...................................... 33188, 134

• Direito civil e processual civil. recurso especial. ação de indenização por danos materiais e compensação

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índice cível e penalRevista JuRídica 435

JaneiRo/2014

por danos morais. Plano de saúde. exclusão de cober-tura relativa a medicamentos de quimioterapia. abu-sividade. Dano moral. artigos analisados: art. 186 do Código Civil; art. 14 do CDC ...................................... 33189, 134

PreviDência PrivaDa

• agravo regimental no recurso especial. Previdência priva-da. reserva de poupança. resgate. Prescrição quinquenal. súmula nº 291/sTJ. improvimento ............................ 33190, 135

Prisão civil

• Processual civil. Habeas corpus. Prisão civil. inadimplên-cia do débito alimentar. incidência da súmula nº 309/sTJ. regularidade da ordem de prisão. impossibilidade de cum-primento da obrigação. inobservância do binômio necessi-dade/possibilidade. alegação. análise. Dilação probatória. inviabilidade no writ. ordem denegada...................... 33191, 135

Processo civil

• agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC). ausência de recolhimento da multa de 5% sobre o valor da causa imposta pelo Tribunal a quo nos segundos embargos de declaração. art. 535, parágrafo único, do CPC. recurso não provido ............................................................... 33192, 136

• agravo regimental. ação de cobrança. Cumprimento de sentença. realização de perícia grafotécnica. Pleito concer-nente à fase cognitiva. Descabimento ....................... 33193, 136

• agravo regimental. agravo em recurso especial. apelação. acidente de trânsito. Danos materiais e morais. Magistra-do titular que procedeu à colheita de provas convocado pela presidência do Tribunal no momento da prolação da sentença, razão pela qual o feito foi sentenciado por juiz substituto. vulneração ao princípio da identidade física do juiz. inocorrência. alegação de cerceamento de de-fesa. incidência da súmula nº 7/sTJ. Danos materiais devidos aos pais do menor vítima de acidente. alega-ção de inocorrência de culpa e inexistência de nexo de causalidade. reexame de provas. incidência do enun-ciado sumular nº 7 deste superior Tribunal de Justiça. Decisão agravada mantida ........................................ 33194, 137

recurso esPecial

• agravo regimental. recurso especial. ausência de pre-questionamento. Configuração do prequestionamento.voto-condutor recorrido.............................................. 33195, 137

recurso interPosto Por aDvogaDo sem PoDeres nos autos

• agravo regimental no agravo em recurso especial. Procura-ção. ausência da cadeia de substabelecimento. incidência da súmula nº 115/sTJ. improvimento ........................ 33196, 138relação De consumo

• reparação de danos morais e materiais. relação de con-sumo. Prescrição. Pessoa jurídica e instituição financeira. Movimentações não autorizadas. valor da indenização ................................................................................... 33197, 138

resPonsaBiliDaDe civil

• responsabilidade civil. ação indenizatória. agravo retido. acidente de trânsito. Motorista da ambulância causa-dor do acidente. oitiva como informante. valor probante. Culpa manifesta. Dever de indenizar. a oitiva como in-formante não traduz desconsideração das informações prestadas em juízo ou que não possa o Magistrado se utilizar destas para firmar sua convicção o fato de a via-tura estar com o giroflex e a sirene ligados não autoriza seu condutor a trafegar livremente pelas ruas, sem aten-tar para as mínimas regras de segurança, indispensáveis à ordem e ao bom fluxo do trânsito. Culpa manifesta do condutor da ambulância que deixou de adotar as necessá-rias cautelas para a manobra..................................... 33198, 139

• agravo regimental. agravo em recurso especial. Dano mo-ral. empréstimos. Descontos indevidos sobre a folha de pa-gamento do agravado. Má-fé. repetição do indébito em do-bro. Conclusão do colegiado estadual firmada com base na análise dos elementos fáticos-probatórios. revisão obsta-da pela súmula nº 7/sTJ. inscrição desabonadora do nome do agravado. responsabilidade do agravante pelo dano moral. incidência da súmula nº 7/sTJ. Quantum indenizató-rio fixado com razoabilidade. revisão obstada em sede de recurso especial.redimensionamento dos ônus sucumben-ciais. incidência da súmula nº 7/sTJ ......................... 33199, 140

• agravo regimental. agravo em recurso especial. res-ponsabilidade civil. Falha na prestação de serviço bancário. Danos morais. reexame do conjunto fático--probatório. Quantum indenizatório. razoabilidade. impos-sibilidade. súmula nº 7/sTJ. Decisão agravada mantida. improvimento ............................................................. 33200, 141

resPonsaBiliDaDe civil hosPitalar

• agravo regimental. agravo em recurso especial. respon-sabilidade civil. Falha na prestação de serviço médico. responsabilidade do nosocômio. Danos morais. Fixação. razoabilidade. reexame do conjunto fático-probatório. impossibilidade. súmula nº 7/sTJ. Decisão agrava-da mantida. improvimento.......................................... 33201, 141

revelia

• agravo regimental. recurso especial. Honorários advo-catícios. Curador especial. antecipação. Descabimento ................................................................................... 33202, 142

seguro

• agravo regimental em recurso especial. seguro. negativa de cobertura. Doença preexistente. 1. a doença preexisten-te só pode ser oposta pela seguradora ao segurado como negativa para prestar a cobertura securitária, mediante a realização de prévio exame médico ou prova inequívoca de má-fé. 2. agravo regimental improvido ...................... 33203, 142seguro De viDa

• agravo regimental no recurso especial. seguro de vida. Cobrança. legitimidade passiva da estipulante. seguro re-

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Revista JuRídica 435índice cível e Penal

JaneiRo/2014

lação de consumo. seguro contratado no interior do banco. súmula nº 83/sTJ. Questão decidida com base nas circuns-tâncias fáticas da causa. súmula nº 7/sTJ ................ 33204, 142

seguro De viDa em gruPo

• agravo regimental em agravo no recurso especial. se-guro de vida em grupo não renovado. Dano moral. Pres-crição anual. Divergência jurisprudencial. improvimento ................................................................................... 33205, 143

seguros

• Processo civil. embargos de declaração. não renova-ção de seguro de vida em grupo por prazo determinado. Pacificação da jurisprudência da segunda seção. 1. a 2ª seção, no julgamento do resp 880.605/rn, rel. Min. luis Felipe salomão, rel. p/o acórdão Min. Massami uyeda, em sessão realizada no dia 13.06.2012, publicado no DJe de 17.09.2012, por maioria, pacificou a jurisprudência desta Corte no sentido da inexistência de abusividade da cláusu-la que prevê a possibilidade de não renovação do contrato de seguro de vida em grupo ...................................... 33206, 143

sentença genérica ProferiDa na ação civil coletiva

• Processual civil. embargos declaratórios no recurso es-pecial. recebimento como agravo regimental. requisitos de admissibilidade. execução individual de sentença cole-tiva. expurgos inflacionários em caderneta de poupança. limites subjetivos da sentença. abrangência nacional da demanda. Coisa julgada. regularidade do título. Prossegui-mento da execução. Decisão mantida ....................... 33207, 144

Penal e ProCessual Penal

assunto

contraBanDo De cigarros

• Penal e processual penal. Habeas corpus. Contraban-do de cigarros (art. 334, § 1º, d, do CP). Desclassifi-cação para o crime de descaminho. impossibilidade. Princípio da insignificância. não incidência. ordem denegada ................................................................... 30759, 209

crime De DesoBeDiência

• recurso especial. Penal. Desobediência. art. 330 do Có-digo Penal. Conduta omissiva. Momento consumativo. Crime instantâneo. Marco inicial da prescrição da preten-são punitiva. recurso provido .................................... 30760, 209crime De falsiDaDe iDeológica

• Penal e processual penal. Conflito negativo de competên-cia. Crimes de falsidade ideológica e uso de documento falso. ausência de lesão a bem, serviço ou interesse da união. Concurso entre a jurisdição comum e a militar. uni-dade de julgamento. ressalva. art. 79, i, do CPP. Compe-tência da Justiça estadual ......................................... 30761, 210

crime De Pistolagem

• Processo penal. recurso ordinário em habeas corpus. Duplo homicídio e tentativa de homicídio. Crime de pis-tolagem. Prisão cautelar. Gravidade concreta. Circuns-tâncias. Modus operandi. Motivação idônea. ocorrência. recurso a que se nega provimento ........................... 30762, 210

crime De rouBo

• Penal e processual penal. Habeas corpus. Crime de roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo, concurso de agentes e restrição da liberdade da vítima (CP, art. 157, caput, c/c § 2º, i e ii). Pena fixada em 6 (seis) anos. re-discussão dos critérios de dosimetria da pena. Fundamen-tação idônea pelas instâncias ordinárias. impossibilidade de revisão pelo supremo Tribunal Federal. Pedido de aplicação do benefício da delação premiada (art. 14 da lei nº 9.807/1999). não conhecimento. necessidade de reexame de matéria probatória, inviável na via do habeas corpus. ordem denegada .......................................... 30763, 211

Delito De trânsito

• recurso especial. Penal e processual penal. Crime de homicídio tentado. Desclassificação. Possibilidade. ir-radiação dos efeitos objetivos da coisa julgada mate-rial. reconhecimento de conduta culposa. resultado doloso. impossibilidade. Prescrição da pretensão pu-nitiva do estado. ocorrência. extinção da punibilidade do agente. recurso provido ....................................... 30764, 213

estelionato

• Penal e processual penal. estelionato qualificado. art. 171, § 3º, c/c art. 29 do Código Penal. Materialidade e autoria delitivas comprovadas. Princípio da insignificância. inapli-cabilidade. Condenação mantida. Multa. arts. 59 e 68 do CP. Critério trifásico. observância ............................. 30765, 215

estuPro De vulnerável

• Penal. agravo regimental em agravo em recurso espe-cial. estupro de vulnerável (art. 217-a do CP). Prisão cautelar. Fundamentação idônea. Gravidade do crime. Modus operandi empregado. acórdão a quo em conso-nância com jurisprudência desta Corte. súmula nº 83/sTJ. Condenação. Dosimetria. Pena-base acima do mínimo legal. violação dos arts. 59 de 68 do CP. improcedência. Circunstâncias judiciais negativas (circunstâncias e con-sequências do crime). Fundamentação idônea. Preten-são absolutória. insuficiência probatória. inviabilidade. Tema que demanda reexame de matéria fático-probatória. súmula nº 7/sTJ ........................................................ 30766, 215

execução Penal

• Habeas corpus. execução penal. remição de pena. Jor-nada de trabalho. Pretensão do cômputo da remição em horas, e não em dias trabalhados. improcedência. ordem denegada ................................................................... 30767, 216

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índice cível e penalRevista JuRídica 435

JaneiRo/2014

• Habeas corpus substitutivo de recurso especial. execução penal. Crime de latrocínio. Progressão para o regime se-miaberto. Deferimento pelo juízo das execuções penais. Cassação do decisum pela Corte de origem. realização de exame criminológico. Decisão fundamentada. ordem de habeas corpus não conhecida ................................... 30768, 216

frauDe em licitações

• Processual penal. Fraude em licitações. Condenação. ausência de impugnação de todos os fundamentos do decisum agravado. súmula nº 182/sTJ. agravo não conhecido ............................................................ 30769, 217

furto

• Habeas corpus. Constitucional. Penal. Furto. Pretensão de aplicação do princípio da insignificância. inviabilidade. reincidência. ordem denegada................................. 30770, 217

homicíDio culPoso

• apelação da defesa. acidente de trânsito. Homicídio culposo. inobservância dos cuidados devidos e omis-são de socorro. Compensação de culpa. impossibili-dade. Presentes as provas conclusivas da responsa-bilidade do condutor do veículo em acidente do qual resultou vítima fatal, justifica-se a condenação em confor-midade com o art. 206 do CPM ................................. 30771, 217

homicíDio Doloso

• Penal. recurso em habeas corpus. Homicídio doloso, ocul-tação de cadáver e porte ilegal de arma de fogo. revogação da prisão preventiva. impossibilidade. Fundamentação idô-nea. assegurar a aplicação da lei penal. acusado foragido há mais de dez anos. recurso desprovido ..................... 30772, 218

lesão corPoral

• Habeas corpus. Constitucional. Penal militar. ofensa verbal e lesão corporal praticadas por militar contra militar, am-bos da Marinha e da ativa. Delito supostamente praticado fora de situação de atividade e de local sujeito à adminis-tração militar e motivado por questões alheias às funções militares. Competência da Justiça estadual comum. or-dem concedida. Precedentes..................................... 30773, 218

moeDa falsa

• Penal e processual penal. Moeda falsa. art. 289, § 1º, do Código Penal. Materialidade e autoria comprovadas. Prin-cípio da insignificância. inaplicabilidade .................... 30774, 219

Peculato

• Habeas corpus substitutivo de recurso especial. Penal. Pe-culato. Pleito de fixação de regime prisional diverso do fecha-

do. Pena superior a 8 anos de reclusão. impossibilidade. or-dem de habeas corpus não conhecida ...................... 30775, 219

Prazo

• Habeas corpus. Processual penal. art. 16 da lei nº 10.826/2003. Condenação. Pena de 3 anos e 6 meses, em regime inicial fechado. Prisão preventiva que já passa de 2 anos e 4 meses. excesso de prazo no julgamento da apelação. ocorrência ................................................. 30776, 219

Prisão em flagrante

• Processual penal. Habeas corpus. Prisão em flagrante convertida em preventiva. arts. 33, 35 e 40, i, da lei nº 11.343/2006. Garantia da ordem pública e da aplicação da lei Penal. Gravidade concreta do delito e modus ope-randi. Constrangimento ilegal não evidenciado. ordem denegada ................................................................... 30777, 220

Prisão Preventiva

• recurso ordinário em habeas corpus. 1. Furto. Prisão preventiva. excesso de prazo para a formação da cul-pa. não ocorrência. 1 (um) ano e 6 (seis) meses. ra-zoabilidade. encerramento da instrução. incidência da súmula nº 52/sTJ. 2. recurso ordinário improvido, com recomendação ........................................................... 30778, 220

tráfico De entorPecente

• Habeas corpus. Penal. Tráfico de entorpecentes. lei nº 6.368/1976. Condenação. alegação de reformatio in pejus indireta. inocorrência. Pena fixada pela nova sentença man-teve o quantum definitivo da condenação fixada na sentençaanulada. ordem denegada ........................................ 30779, 221

tráfico internacional De Drogas

• recurso especial. Penal e processo penal. Tráfico inter-nacional de drogas. operação Tâmara. escuta telefônica. Prazo e fundamentação. ausência de prequestionamento. Prova pericial. necessidade. reexame de provas. Ônus da prova. Distribuição. Dosimetria. ausência de nulidade. vio-lação do art. 619 do CPP. inocorrência ...................... 30780, 221

uso De Documento falso

• Penal e processual penal. uso de documento falso. Passa-porte nacional com visto consular falso. art. 304 do Código Penal. Conduta atípica. nulidade processual. Materialidade e autoria comprovadas. Dosimetria ........................... 30781, 222