revista "flores do verde pinho"

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1 Albino Pereira, Ana Moreira, Anabela Gil, Ângela Torres, Carla Martins, Carlos Moura, Carmen Ramos, Cristiana Leal, Cristina Veiga, César Biltes, Eduarda Moreira, Elisabete Silva, Emídio Baptista, Filipe Barros, Gisela Meireles, Joana Faria, João Lima, João Paulo Sousa, José Brito, Luís Santos, Mariana Santos, Sandra Costa, Sara Pinto, Susana Nunes REVISTA DA ESCOLA SECUNDáRIA DE VILELA NúMERO 4 | MAIO DE 2011

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Revista da Escola Secundária de Vilela

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Page 1: Revista "flores do verde pinho"

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Albino Pereira, Ana Moreira, Anabela Gil,

Ângela Torres, Carla Martins, Carlos Moura,

Carmen Ramos, Cristiana Leal, Cristina Veiga,

César Biltes, Eduarda Moreira, Elisabete Silva,

Emídio Baptista, Filipe Barros, Gisela Meireles,

Joana Faria, João Lima, João Paulo Sousa,

José Brito, Luís Santos, Mariana Santos,

Sandra Costa, Sara Pinto, Susana Nunes

Revista da escola secundáRia de vilela

númeRo 4 | maio de 2011

Page 2: Revista "flores do verde pinho"

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agRadecimentos

A equipa editorial da Revista Flores do Verde Pinho agradece a todos os que apoiaram

e colaboraram de alguma forma com este projecto, com uma referência especial aos

alunos do Curso Profissional de Técnico de Fotografia, cujos trabalhos ilustram toda

a revista. Pela confiança depositada neste trabalho, pela vossa disponibilidade em o

tornar possível e pela partilha das vossas Viagens, o nosso obrigado.

Page 3: Revista "flores do verde pinho"
Page 4: Revista "flores do verde pinho"

manifesto

Brainstorming editorialAlbino Pereira

viagem Sara Pinto

Carlos Moura

o primeiro passo Joana Faria

viajante e turista Ângela Torres e Carla Martins

acto de ir de um lugar a outro Eduarda Moreira

as viagens de orlando Anabela Gil, Eduarda Moreira e Emídio Baptista

ir e ficar... José Brito

sempre gostei de aeroportos... Carmen Ramos

uma viagem à época dos Faraós Filipe Barros

um caminho marítimo com destino Elisabete Silva

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a viagemAna Moreira

viagem pelo genoma humano Cristiana Leal, Luís Santos e Mariana Santos

sobre as ondasSusana Nunes

el viaje del caballero de la triste FiguraCristina Veiga

a paciência dos amantes João Paulo Sousa

PolaroidsSandra Costa

da viagem à metaviagemEmídio Baptista

viagens na nossa terra César Biltes

núpcias João Lima

escrever com luz: foto grafia Carlos Moura e Gisela Meireles

Índice

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A viagem é inerente à condição humana. Desde o tempo dos ancestrais povos nóma-das que a insatisfação do ser humano perante o universo que lhe é dado apreender o leva a encetar deslocações capazes de o colocar perante novos horizontes. A viagem configura-se como uma abertura perante o mundo e, em simultâneo, um desafio permanente. A alteração de perspectiva que lhe está inerente significa também um enriquecimento daquele que contempla, na medida em que o seu olhar se desdobra e multiplica, rompendo todos os limites, como um voo inaugural de ave.

A riqueza da viagem está também nas suas inúmeras possibilidades de concretização. Os constrangimentos de diversa ordem nunca impediram o ser humano de viajar, apenas lhe condicionaram o processo de realização desse objectivo, dando origem a uma ampla tipologia. Se a viagem física é aquela que mais depressa nos ocorre ao pensamento, igualmente válida é a que se realiza apenas no plano mental, quase como uma resposta ao célebre verso de Fernando Pessoa: «Viajar! Perder países!». De igual modo, poderemos tecer uma distinção entre a viagem que se configura no espaço, acrescentando mundos geográficos ao mundo, e a que ganha forma no tempo, distendendo a história dos seres ou dos povos até extremos imprevisíveis. Em ambos os casos, ela pode ser traçada de antemão, como uma rota que se pretende cumprir mais ou menos escrupulosamente, ou como uma deriva, uma descoberta total, um trajecto sem rumo, proporcionando a coincidência total entre as noções de viagem e de aventura.

Serão estas as linhas estruturantes da nossa revista, este ano dedicada integralmente ao tema da viagem. As diversas contribuições de membros da nossa comunidade educativa distribuem-se livremente pelas possibilidades acima enunciadas de a conjugar. Esperamos que a súmula destes trabalhos faculte ao leitor uma viagem tão abrangente e completa como as melhores e mais inesquecíveis.

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Entusiasmo, excitação, escolha, prazer, preparação, partida, ida, olhares, registos,

novidades, descoberta, enriquecimento, crescimento, partilha, recordações.

Ou

Entusiasmo, escolha, local, conforto, desfolhar, partir, descobrir, emoção, crescer,

fechar, abandonar, recordações.

Ou

Vontade, escolha, auscultadores, ligar, abandono, entrega, emoção, memórias.

Ou

Olhos, fechar, imaginação, abrir, continuação.

E/Ou

Simplesmente Viver.

E a Escola onde fica? Lembro-me de um texto que li, há tempos, e de que gostei, onde se comparava a vida a uma viagem de comboio. Em cada estação, saem alguns passageiros e entram outros – assim é, ano lectivo após ano lectivo, na vida escolar. Por um lado, sentimos orgulho dos que nos deixam, com uma bagagem mais rica do que a que tinham quando cá chegaram, mas também há um senti-mento de pena por não continuarem a ser companheiros próximos de viagem. Acolhemos alegremente os que chegam, com a bagagem que trazem, e tentamos contribuir para que esta se vá engrandecendo, em quantidade e em qualidade.

Deveremos estar atentos aos nossos parceiros de viagem. Um dia, também nós descemos numa qualquer estação…

Albino Pereira

coisa que gosto é poder partirsem ter planosmelhor ainda é poder voltarQuando quero

Milton Nascimento, Encontros e despedidas

BRainstoRming editoRial

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Pode ser aquela que faças de casa até à escola e vice-versa.Aquela que fazes até à loja que tem os melhores chocolates da zona e arredores. Aquela em que viajas pelo mundo

fora e vives dias intensos e maravilhosos. Aquela em que perdes completamente o controlo de ti mesmo, em que dás tudo pela outra pessoa, e esta é, talvez, a viagem mais árdua, pois o amor é uma viagem com muitos stops, mas também com muitos semáforos com a tal luzinha verde que te dá forças e te preenche o coração. Mas além de todas estas e mais algumas viagens, a que te dá mais alento é aquela que, quando fechas os olhos, vem ter contigo: sem a pedires e sem querer algo em troca – o sonho! Porque o sonho é algo que, mesmo estando-se a dormir, vive-se, e, mesmo que abras os olhos, logo que os tornes a fechar, ele vem ter contigo e a tal utopia volta a tomar conta de ti. O sonho é uma forma de viver e, se dormes 8 horas por noite e numa hora desses 480 minutos sonhares e fores feliz, já não podes dizer durante esse dia que não és feliz, porque a felicidade veio ter contigo durante 60 minutos. O sonho é uma forma de viver, é a viagem que menos cansa, e já o poeta dizia: o sonho comanda a vida!

Sara Pinto [12.º E]

viagem

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Viagens. O melhor são os companheiros.

De todas as viagens que fiz, algumas longínquas, outras ali ao pé, umas interiores, a fugir, também a fingir. Do que melhor me recordo é dos companheiros de viagem. Não foram muitos, diria até que são em número curto.

Viajar é um acto de purificação. Deixamos cair o pó e a pele, abrimos os olhos e partimos puros.

(os lugares são o que quisermos, não me deterei aí)

…Neste estado, viajamos. No início, há conversas, euforia até. Depois, começa verdadeiramente a jornada. Não se diz muito. As palavras são abafadas pelo silêncio, substituídas pelo vento, pelo sol, pela terra, pelo tempo.

Continuamos a conversar, as palavras é que estão quietas.

A viagem. Aos amores, aos amigos. Os companheiros.

Carlos Moura

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Texto elaborado a partir da fusão do conceito de viagem apresentado por diversos autores. As ilustrações representam a resposta dos alunos do Curso Profissional de Técnico de Fotografia ao exercício de ilustração de frases de autor sobre o tema «Viagem». Este exercício propunha que fossem desenvolvidos dois trabalhos: um que comunicasse e reforçasse, de uma forma directa, o significado da frase; já no segundo, a mesma ideia deveria ser apresentada de uma forma mais indirecta, recorren-do ao uso das mãos, como elemento obrigatório da composição, e à técnica da fotografia. Joana Faria

o PRimeiRo Passo

uma longa viagem começa com um único passo... mas, para partir, é preciso parar de sonhar. se nunca iniciarmos a viagem, o mundo, sendo um livro, revela apenas os segredos de uma só página. assim, os nossos olhos nunca poderão partir.

Um dia é preciso parar de sonhar e,

de algum modo, partir.

Amyr Klink

Pior que não terminar uma viagem

é nunca partir.

Amyr Klink

Hugo Santos

Joana Nunes

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Uma longa viagem começa com

um único passo.

Lao-Tsé

Ler é viajar com os olhos.

Serginho Cordeiro

O mundo é um livro e os que não viajam

acabam lendo só uma página.

Santo Agostinho

Adriana Coelho

Marlene Gomes

Pedro Leal

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viajante e tuRista

Muitas têm sido as teorias que distinguem os conceitos de viajante e de turista.

Desde logo, classifica-se como turista aquele que permanece num local por um mínimo de 24 horas e chama-se viajante a alguém quando está de passagem num local que não é o seu local de residência.

Com base noutros pressupostos, também se considera que turista é quem visita com pressa, tira fotografias, mas não degusta, não permanece, não vive intensamente a cultura como um habitante local. Em contrapartida, viajante é quem privilegia a experiência e a própria viagem, vive e valoriza a cultura local, frequentando locais menos anunciados.

Assim, o turista seria um visitante, que se desloca voluntari-amente por período de tempo igual ou superior a vinte e quatro horas para um local diferente da sua residência e do seu trabalho. De facto, a palavra turista era utilizada exclusi-vamente para designar aqueles que viajavam por mero prazer, ou para aumentar os seus conhecimentos, como diferenciação face às pessoas que se deslocam por um motivo diferente: profissional, de saúde ou de religião.

No filme O Céu sobre Nós, de Bernardo Bertolucci, faz-se referência a esta distinção, explícita neste diálogo, entre as personagens Turner, Kit e Port:

Turner somos os primeiros turistas desde a guerra…Kitsomos viajantes, não turistas. TurnerQual a diferença? Porto turista pensa em voltar para casa assim que chega. Kite o viajante pode nem voltar.

Segundo este filme, o viajante é, então, a pessoa que tem um sonho e o persegue, tendo as coisas menos previstas, poden-do até ficar para sempre no destino. Ao longo da caminhada, o viajante pretende descobrir novas sensações e encontrar, por exemplo, o autoconhecimento. Neste contexto, deixa-se, para finalizar, uma sugestão cine-matográfica, o filme Comer, Rezar e Amar (2010), de Ryan Murphy, baseado no livro homónimo de Elizabeth Gilbert, e três sugestões bibliográficas, África Acima e Planisfério Pessoal, de Gonçalo Cadilhe, e Sul, de Miguel Sousa Tavares, todas da editora Oficina do Livro.

Ângela Torres e Carla Martins [11.º E]

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Ao iniciar este texto sobre o tema «viagem», deparei-me com um conjunto de situações relacionadas com o que poderia escrever. Falar sobre os lugares que quero visitar. Relatar experiências, sensações vividas e sentidas em alguns locais. Das pes-soas que me acompanharam e das que conheci nesses lugares. Ou então da enorme frustração que sinto de termos ficado só pelas «intenções» de realizar a «viagem», no presente ano lectivo, dos alunos, das turmas D e E do décimo segundo ano, a Auschwitz… Da tristeza e do turbilhão de emoções que me invadiram quando olhei os seus rostos e disse «não se realiza».

Enfim, poderia redigir sobre tantas coisas…Contudo, dada a minha formação académica, algo me impele a analisar o conceito do ponto de vista geográfico. Assim, peguei num dicionário de Geografia e procurei o significado do conceito. No primeiro dicionário que consultei não aparecia o vocábulo. Faço mais uma pesquisa e mais uma vez o resultado é infrutífero. Terceira tentativa novamente em vão. Concluo que tenho que renovar as minhas fontes geográficas. Só num dicionário de Língua Portuguesa encontro o significado: Viagem - acto de ir de um lugar a outro mais ou menos distante; jornada; percurso extenso; descrição do que se viu ou aconteceu durante um passeio ou jornada... 1. Cai por terra a minha vontade de relacionar o tema com a Geografia. Dou comigo a reflectir sobre a definição teórica procurando associá-la a emoções vivenciadas. Assim, Acto de ir de um lugar… quantas viagens já fiz sem sair de um local. As minha viagens «imaginárias», que me ensinaram quase tanto como as «reais». …mais ou menos distante… e alio ao movimento pendular que faço todos os dias para o meu local de trabalho, proporcionando-me tantas descobertas, experiências, saberes, emoções, frustrações (dependendo do dia, da hora ou do mo-mento). …jornada… e penso nas etapas da minha vida, que já passaram, povoadas de pessoas que me proporcionaram alegrias, tristezas, desilusões e ilusões. Agrego ainda jornada a caminhada, a trajecto, ao caminho que tenho pela frente, que poderá resultar num percurso intenso. Tomara que esse percurso intenso não se desvie do sábio princípio de Orlando Ribeiro, maior geógrafo português do século XX: «ensinar algumas coisas, aprender outras e fazer o bem...». afinal, regressei à geografia…

Eduarda Moreira

1 Dicionário da Língua Portuguesa, Porto, Texto Editora, 2009, p. 1638.

acto de iR de um lugaR a outRo mais ou menos distante

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Pode uma viagem revelar todo o âmago da Geografia?

Como Orlando Ribeiro (1911-1997) entendia melhor do que ninguém a resposta à questão colocada. Geógrafo português de eleição, renovador da Geografia Portuguesa, marco essen-cial do conhecimento do território nacional de aqui e além- -mar. As viagens e os trabalhos que destas brotaram são o maior testemunho da sua vasta obra, elos reveladores da sua sensibilidade perante o território e as gentes que os habitam. Acompanhado com os seus blocos de notas, transformados em cadernos de campo, juntamente com a sua Leica, registou, narrou, descreveu, assinalou, ilustrou, fotografou e imaginou a Geografia Portuguesa. As suas capacidades literárias aliadas ao gosto pela apurada descrição trouxeram-nos os mais variados e autênticos traços paisagísticos dos sítios e lugares que percorreu, das gentes que viu e escutou, bem como das relações que estas estabeleceram com essas paisagens.

Através dos seus cadernos de campo, deixou-nos um legado de autenticidade, único, dos territórios, do Minho ao Algarve, das Ilhas, do Ultramar, unificando o Espaço Ibérico, nada escapando aos seus instantes de observação:

«Nos Açores, a zona soalheira, onde se cultiva a vinha, a bananeira e o trigo, limita-se às fajãs (planuras) à beira-mar; a meia encosta, milho e batata doce, base da alimentação; nos cimos, envoltos em nuvens desde 400-600m, pastagens em substituição da mata primitiva, mas separação total entre o pastoreio e a agricultura.»1

«A Madeira, com o vigor do relevo, com a gente branca, o ambiente provinciano das povoações, uma elegante cidade que era a terceira da Metrópole, os frutos exóticos no aroma, no sabor e na forma, misturando-se a outros que nos são familiares, com pinheiros, macieiras, castanheiros e ca-sas e barracas disseminadas pelo campo, causaram uma das minhas mais profundas impressões de nóvel geógrafo.»2.

«A 16º de latitude N [as ilhas de Cabo Verde] constituem o derradeiro eco da Europa e uma das mais curiosas e atra-entes soluções do encontro de raças.»3

«A impressão de quem chega à Guiné por avião é, porém, totalmente diversa. A faixa de contacto da terra com o mar mostra extrema complexidade. Inúmeras ilhas e braços de água, canais em todos os sentidos, uma orla muito larga invadida pela maré, que deixa a descoberto uma faixa de lodos onde os rios e riachos desenham um curso que é uma sequência de harmoniosos meandros.»4

«São Tomé é outro mundo [...]. Clima equatorial de chuvas abundantes [...]. O ar húmido sobe nas encostas [...]. Vinho não se pode fazer [...]. A roça, com analogia com o monte alentejano e a fazenda do Brasil, orienta a produção apenas no sentido do comércio.»5

[Em Angola] «O mato é denso e hostil, cinzento na luz crua que recorta a monotonia dos seus ramos. Ergue-se distante o fumo da queimada – a estrada é nua, deserta e desolada. Apenas a rubra flor Erythrina põe nesta uniformidade uma nota de ternura discreta na imensidão onde se abre.»6

as viagens de oRlando

1 Geografia da Expansão Portuguesa, 1961, p. 14. 2 Prefácio de A Ilha da Madeira até Meados do Século XX, 1985, p. 9.3 Geografia da Expansão Portuguesa, 1961, p. 15.4 Acerca do mapa topográfico da Guiné, 1950, p. 38.5 Geografia da Expansão Portuguesa, 1961, p. 16.6 A Colonização de Angola e o seu Fracasso, 1981, p. 9.7 A Colonização de Angola e o seu Fracasso, 1981, p. 92.

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Bibliografia

Ribeiro, Orlando, Geografia da Expansão Portuguesa, Arquivos da Universidade de Lisboa,

Nova Série, 2, Primeiro Curso Universitário de Férias no Ultramar, 1961.

Ribeiro, Orlando, A Colonização de Angola e o seu Fracasso, Lisboa, Imprensa Nacional-

-Casa da Moeda, Col. Estudos Portugueses, 1981.

Ribeiro, Orlando, A Ilha da Madeira até Meados do Século XX, Lisboa, Instituto de Cultura

e Língua Portuguesa,1985.

Saint-Exupéry, Antoine de, O Principezinho, Lisboa, Editorial Presença, 1946.

http://www.orlando-ribeiro.info/home.htm

«Em 1963 pudemos ver ainda, no Mossuril, fronteiro à Ilha de Moçambique, um entreposto onde se guardavam escra-vos até data tão recente que dele [do tráfico] se conservava lembrança.»7

[Goa, Damão e Diu] «As Velhas Conquistas [...]. Nesta paisa-gem marcada pelos sinais de uma religião estranha – igrejas, ermidas no alto dos montes, cruzeiros e nichos nos caminhos, nas várzeas, nas fontes – está o mais forte e perdurável da influência portuguesa.»8

Ao contrário da personagem do geógrafo de Saint-Exupéry em O Principezinho (1946, p. 54), que considerava que «o seu papel não era de ir à procura de cidades, de rios, de monta-nhas, de mares, de oceanos e de desertos», pois este papel era confinado aos exploradores, afirmando que o geógrafo era «importante de mais para andar a vadiar» e que o geógrafo nunca deveria «sair do gabinete», o nosso geógrafo, Orlando Ribeiro, perpetuará para sempre as memórias das viagens e do papel fundamental que o geógrafo tem na percepção e na interpretação do espaço.

Nós, que da tua Geografia descendemos, antes de ir ao en-contro do seu âmago, teremos que empreender a Viagem!

Anabela Gil, Eduarda Moreira e Emídio Baptista

8 Geografia da Expansão Portuguesa, 1961, p. 21.

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A Viagem. A, artigo definido; Viagem com maiúscula. Então, qual é a viagem que cada um de nós define como mais e melhor?Costuma dizer-se: «há mar e mar, há ir e voltar». Para mim, viajar é ir e ficar (na memória)!Há cerca de trinta anos desaguei num recanto que nunca mais me saiu da memória e onde voltei muitas vezes e levei família e amigos. Aliás, num azulejo na parede há uma quadra intitulada Eternidade:

As águas são para o marAs folhas são para o vento!Só as fragas se não mudamNelas fica o pensamento…

Estamos muito de acordo, viajar é evasão. E não é que no lo-cal podemos ler uma quadra intitulada Ascenção [sic]:

O rio passa em CabanasPor entre fragas… tão lindoQue embora desça da serraParece que vai subindo.

Já estão a pensar em verde, água?... Mas podem continuar a imaginar uma ponte pequena e estreita, um solar, uma igreja e uma alta, e frondosa, magnólia que mereceu um soneto a Alberto de Oliveira. Deixo aqui a primeira estrofe, as outras podem ou devem ser lidas no azulejo da parede, à sombra:

iR e FicaR…

Alta magnólia, brônzea de folhagem,E de flores de neve a arder ao lumeDe capitoso e oriental perfume, Do convento-solar guarda a passagem.

O local inspirou Pedro Homem de Mello, proprietário vizinho, o poeta do «povo que lavas no rio», que Amália Rodrigues imortalizou. São dele as duas primeiras quadras, datadas de 14-8-939 e 6-9-939, respectivamente.Sem check-in, nem bilhetes, filas ou esperas, os quilómetros aqui são passos e o custo é inversamente proporcional ao prazer. Faz este texto sentido? Talvez sim, mas faltam-lhe os sentidos da visão, do olfacto e da audição. Só indo… Porque é lindo!É ir e ficar (a namorar)!

José Brito

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…e de estações de caminho-de-ferro. Ouvem-se risos e choros; vêem-se lágrimas, de alegria ou de tristeza… A sensação é de emoção, escape, espaço-de-ninguém e… de todos…Também sou daquelas que fica a olhar para o céu, como uma criança, de cada vez que passa um avião a voo baixo.A nossa vida é feita de hábitos e de uma boa dose de monoto-nia… Faz parte!Porém, de repente, viagem! Lá se vai a monotonia!Viagem, viagem, viagem!… Penso que dificilmente se asso-cia este termo a repetição, quotidiano, rotina. Viagem lembra ar fresco. Aqui refiro-me mesmo à viagem física, à deslocação para outros mundos, no nosso… Porque, eu sei, há tantas ou-tras: um livro, um filme, um jantar… Mas… e sentir o cheiro do local?, ser afectado pela brisa?, efectivamente testemunhar a luz?, a cor?, a temperatura? Se for livro, ou quadro… Bem, é possível aproximar muito… mas só com genialidade!Mesmo antes da viagem sente-se a potencialidade, um certo receio, aquele frio na barriga… a curiosidade e a projecção… O que virá?Há tanto mundo por ver! E o que trazemos?De uma viagem traz-se sempre horizontes alargados, novos conceitos… experiências!É curioso como qualquer coisa em viagem nos afecta… até algo que pode existir na nossa rua, sem nunca nos termos dado conta, pode de repente gerar perplexidade e encanto!Depois, queremos trazer recordações, souvenirs, recuerdos, mas realmente o que vale é o que trazemos na nossa memória, o que acrescentamos ao Eu, e principalmente o capital emo-cional: difícil é entender beleza, sem ver coisas belas!; difícil é exigir beleza se ela não faz parte na nossa vida; o privilégio da viagem deve ser imperdível, a meu ver, não sendo, embora, o único meio, obviamente!E o capital humano, humanista, o experimentar a tolerância contactando com o diferente ali ao lado… Isto se nos deixar-mos envolver, e isso, claro, também depende da forma como viajamos: dos «olhos» que levamos!… É possível ir de sen-tidos cerrados, mas a isso… nem chamo viagem!Ainda e assim, e para além de tudo isto, a verdadeira razão do meu fascínio: aeroportos, caminhos-de-ferro, viagens… está numa certa libertação, numa tal leveza, em libertarmo-nos de

nós, por momentos, não do nós essencial, mas daqueles aspec-tos que vamos acorrentando a nós, a cada passo que damos, a cada escolha que fazemos, e em cada encruzilhada no meio do nosso caminho. Por momentos, levamo-nos a nós, sós, (quase) libertos…Mas nas palavras de Milan Kundera: será sustentável a total leveza do ser? …Precisamos do regresso à nossa densidade, ao chão que criá-mos, nas suas diversas formas. Isso faz do Regressar outra coisa emocionalmente apelativa. A viagem permite-nos ver a nossa rua, o nosso país, o nosso mundo de uma total outra forma, a saudade de casa:

Triste de quem vive em casa,Contente com o seu lar,Sem que um sonho, no erguer de asa,Faça até mais rubra a brasaDa lareira a abandonar!

[in Mensagem, de Fernando Pessoa]

Carmen Ramos

semPRe gostei de aeRoPoRtos…

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Esta noite, sonhei que tinha viajado até à época do faraó Tuthmosis III, da XVIII dinastia egípcia. Eu era um ar-queólogo à procura de um ornamento em ouro com duas cabeças de pato que o faraó guardava religiosamente em honra dos seus antepassados. Estava no ano 1454 a.C., mais pre-cisamente na cidade de Qatna, onde o faraó Tuthmosis III tinha pernoitado uns dias antes. Ele e as suas tropas dirigiam-se a Orontes para expandir o domínio egípcio em terras governadas pelo rei Danusa durante o poder de Mitanni.Como já estava na sua oitava cam-panha, cansado de tanto viajar, pediu para que as suas tropas guardassem o ornamento dentro de uma das pirâmides de Qatna, com medo de não sobreviver às lutas que iria travar daí para a frente.Soube do esconderijo pelo escravo que cuidou do faraó durante a estadia. Dirigi-me imediatamente à pirâmide para tentar encontrar a relíquia. Passei pela grande população desta cidade, onde a pirâmide social egípcia estava toda representada. Os escravos carregavam blocos de pedra, sendo chicoteados até sangrar.Os camponeses e os artesãos estavam debaixo das tendas a vender os seus produtos, resultado de um trabalho árduo. Estava um calor tórrido das fornalhas que derretiam o barro.Ao passar na rua principal, vi vários escribas numa casa onde registavam em papiros, com penas e tinta-da-china, os costumes egípcios e feitos importantes para dar a conhecer

às outras civilizações dos grandes rios.Continuando a minha travessia pela cidade, parei em frente a um templo grandioso pelo seu tamanho e pela sua sump-tuosidade. Um sacerdote coberto até aos pés por um manto branco rezava perante uma população atenta e devota. Ouvia o povo dizer que ele tinha um enorme prestígio e poder, tanto espiritual como material, pois administrava os bens e as riquezas dos templos; ele era um dos mais sábios sacerdotes.Jovens egípcios diziam que os nobres e altos funcionários reunidos no palácio ao lado estavam descontentes com estas movimentações. Pois eles é que eram responsáveis por administrar o império e controlar a arrecadação dos impostos.

uma viagem à éPoca dos FaRaós

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Eram eles que dirigiam os guerreiros e fiscalizavam as construções e as obras públicas, além de presidirem a o mais alto tribunal de justiça e serem os comandantes das tropas.Já era tarde, por isso decidi despachar-me, mas ainda reparei que na janela ao lado estava a família do faraó a jantar; os filhos mais novos do faraó estavam a brincar e a sorrir enquanto os mais velhos e o faraó estavam sentados, com uma cara de angústia, séria, e a olhar uns para os outros.Já estava a escurecer, por isso decidi acampar à beira de um rio, o que me fez lembrar o Nilo, esse rio tão importante para o povo egípcio, pois, na altura de Junho, as suas cheias davam de «beber» à terra para ela ficar mole e os egípcios cultivarem produtos, como, por exemplo, o trigo e o centeio.No dia seguinte, acordei bem cedinho para ir à pirâmide onde se situava o tal ornamento e ouvi dois homens a falar de qualquer coisa de logo à noite e de irem roubar o ornamento de ouro com as duas cabeças de pato.Eu, ao ouvir aquilo, decidi acelerar a minha excursão, consultei o meu mapa de pirâmides para perceber melhor qual o caminho a tomar, chegando passado algumas horas.Já estava a escurecer, eu não queria encontrar-me com os que planea-vam roubar a relíquia, por isso segui caminho. Dentro das pirâmides encontrei um papiro, era um mapa para encontrar o ornamento, e comecei a procurá-lo. Tive que enfrentar algumas armadilhas, uma delas era fugir de três múmias andantes, mas, felizmente, consegui escapar são e salvo.Estava numa sala enorme que tinha uma porta ao fundo com uma luz amarela: era o ornamento. De repente, apareceram os outros dois homens que ouvi a falar de manhã, eles tinham passado por todas as armadilhas a que eu escapara, pois não tinham nenhum arranhão. A porta estava a fechar-se e começámos a correr em direcção a ela. A porta ia-se fechando cada vez mais, mas eu rebolei de tal maneira que consegui ficar do outro lado e eles não.Lá estava o ornamento, o belíssimo ornamento de ouro com duas cabeças de pato…– Toca a acordar que tens que ir para a escola! – disse a minha mãe.Bem, pelo menos tinha ficado o gosto da conquista do troféu, mesmo que só tenha sido em sonho!

Filipe Barros [7.º B]

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Movido pelo interesse de expandir o reino português, pela ânsia de domínio das rotas comerciais, pela redução de custos nas trocas comerciais com a Ásia e pela tentativa de monopolizar o comércio das especiarias, D. João II começou a planear uma grande viagem marítima com a construção de numerosos navios.

Mas, mesmo antes de conseguir concretizar este maravilhoso sonho, D. João morreu, deixando o sonho nas mãos do seu sucessor, o rei D. Manuel I, que empreendeu e continuou este projecto.

Já com todos os preparativos terminados, faltava ainda escolher alguém para chefiar. Com uma impressão fortemente negativa de alguns cortesãos, o rei D. Manuel I escolheu Vasco da Gama, cavaleiro da sua casa, para capitão da sua armada.

No dia 18 de Julho de 1497, constituída por três navios, as naus de S. Rafael, S. Gabriel e Bérrio, capitaneadas por Paulo da Gama, Vasco da Gama e Nicolau Coelho, partiu de Lisboa a armada, com cerca de centena e meia de soldados e mari-nheiros, seguindo a linha de costa de Cabo Verde até à Serra Leoa. Durante meses a fio de viagem, muitos dos homens que estas naus carregavam não resistiram e acabaram por morrer, por falta de uma alimentação saudável. Mas, mesmo assim, nesses meses, foram conseguidos pontos cruciais para a armada, para além de descobrirem uma rica fauna e uma abundante flora nas costas africanas.

um caminho maRÍtimo com destino

Em Melinde, a 13 de Abril de 1498, Vasco da Gama encontrou um piloto árabe que o conduziu ao destino – segundo Jaime Cortesão, nesse dia nasceu a Humanidade! E foi no dia 20 de Maio de 1498 que esta lutadora tripulação desembarcou próxima de Calecute. Estabeleceram-se, então, fortes ligações entre os povos desta região e o povo português, conseguindo Vasco da Gama, assim, uma carta com direitos de comercia-lização com a Índia.

Com o regresso a Lisboa, ficou consolidada uma ligação marítima, que, durante décadas, pôde ser bastante explorada pela coroa, e o estabelecimento de uma Índia portuguesa.

E assim se estabeleceu uma nova rota que ligava directa-mente as regiões produtoras das especiarias aos mercados europeus. A rota do Cabo, assim dominada por nós, os portugueses, até ao século XVII, foi um importante factor de desenvolvimento económico da metrópole.

Elisabete Silva [11.º C]

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a viagemEsta é, como muitas outras, uma viagem entre o tempo e o espaço, uma viagem entre o passado, o presente e o futuro.

Tudo começou pela origem do universo há milhares, milhões de anos no passado. Diz-se por aí que esta origem se deve a um fenómeno denominado Big Bang. Os cientistas do nosso planeta, para explicarem este fenómeno, criaram o CERN (Centre Européen pour la Recherche Nucléaire – Centro Europeu para Pesquisa Nuclear). Este Centro situa-se entre a Suíça e a França, e a professora de Física e Química decidiu levar-nos a conhecer um pouco mais da origem do universo, neste pequeno mundo que nos tenta oferecer uma perspectiva mais realista do que foi este fenómeno.

Esta viagem foi, antes de mais, o conhecer de um pouco mais dos recantos do nosso planeta, mas, além disso, enviou-nos para uma realidade nunca antes imaginada, permitiu-nos «ver» que o universo se terá formado na sequência de uma violenta ex-plosão. Ver como começou a origem do universo é como conhecer um pouco mais do planeta, de nós próprios; foi uma experiência única que nos levou a uma perspectiva diferente, mais real, provavelmente mais científica do que é o Big Bang.

Com esta ida ao CERN, sentimo-nos como se fôssemos uma das pequenas partículas que pertenceu à explosão que deu origem ao nosso universo.

Ana Moreira [11.º B]

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No preciso momento em que se encontra a ler este texto, duas em cada três pessoas morrerão devido a causas rela-cionadas com os genes de que são portadores. À semelhança da geografia que requer a utilização de mapas, a genética é uma ciência que trabalha com um mapa especial, o mapa da nossa herança. Cada célula do nosso corpo contém cerca de 1,80 metros de DNA e, se fosse possível alinhar todo o DNA das células de um ser humano, este ocuparia uma extensão equivalente a 1000 viagens de ida e volta à Lua.

Heródoto (484 – 420 a.C.), geógrafo grego e grande conhece-dor do mundo, viajando em torno do Mediterrâneo, concluiu, na época, que o continente europeu era tão extenso quanto a África e a Ásia juntas. Apesar de Heródoto ter possuído uma ideia aproximadamente correcta da localização relativa dos principais locais do mundo, as distâncias físicas calculadas entre estes (número de quilómetros) estavam totalmente erradas. A percepção que os cartógrafos gregos tinham da distância era calculada pela duração das viagens entre dois sítios e não pela distância efectiva que os separava; por isso, tal como na cartografia terrestre, o processo de cartografia genética teve também de aguardar pela chegada da tecno-logia. Há 20 anos, a visão dos biólogos do mapa genético humano era algo infantil, já que se conheciam apenas alguns fragmentos do seu DNA. De há 15 anos para cá, graças à aplicação de numerosas técnicas como a electroforese, de métodos sofisticados como o FISH e o DIRVISH e do recurso a computadores e a enzimas, foi criado um projecto que veio revolucionar a cartografia do DNA humano, o Projecto do genoma humano. O seu principal objectivo era sequenciar os 3200 milhões de letras (bases) que compõem o «livro» de instruções para fabricar um Homo sapiens, tendo esta tarefa sido entregue à Celera Genomics, um consórcio privado que reuniu investigadores e instituições mundiais, financiadas com dinheiros públicos de países como os EUA, Reino Unido,

França, Alemanha, China e Japão. No final do séc. XX, 95% da sequenciação estava concluída (na altura, era possível a um investigador estudar cerca de 5000 bases de DNA por ano, mas, actualmente, as rotinas de trabalho permitem obter cerca de 50 vezes mais) e, em finais de 2003, 99,9% da codi-ficação feita. Para podermos ter uma perspectiva do aspecto do mapa genético humano, vamos estabelecer uma analogia entre a genética e a geografia física.

Imagine uma jornada geográfica através de todo o DNA do seu corpo alinhado, o equivalente a uma viagem entre Faro e Valença, passando por Beja, Setúbal, Lisboa, Leiria, Coimbra e Porto, numa distância a percorrer de cerca de 840 quilóme-tros. Seria necessário distribuir cerca de 38 bases (letras) de DNA por cada centímetro percorrido, ou seja, 3.800.000 bases por quilómetro. O itinerário a seguir inclui a passagem por 46 concelhos de diferentes dimensões, sendo o número destas divisões administrativas igual ao número dos cromossomas em que o DNA humano está «arrumado».Iniciamos a viagem de automóvel saindo de Faro e, olhando pela janela do carro, começamos por ver que a maior parte da paisagem que se nos depara é monótona, repetitiva e total-mente improdutiva. Cerca de um terço de toda a distância da viagem, aproximadamente 280 quilómetros e equivalente à distância Faro – Lisboa, é ocupada por repetições da mesma mensagem (42 quilómetros são preenchidos por palavras de cinco, seis ou mais letras, repetidas infindavelmente umas a seguir às outras). Muitas destas mensagens lêem-se da mesma maneira da esquerda para a direita e vice-versa, como acontece, por exemplo, com a frase «Orava o Avaro». Algumas destas «repetições sucessivas» estão dispersas em blocos por todo o genoma, e a posição, o número e o comprimento de cada bloco variam de pessoa para pessoa, constituindo assim as suas próprias «impressões digitais». Grande parte do genoma humano é constituída por estas lon-

viagem Pelo genoma humano

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gas e complicadas mensagens que parecem não ter qualquer significado e que são específicas de cada ser humano (no nosso cromossoma 19, por exemplo, 57% do seu DNA são sequências repetitivas deste tipo).Abalamos agora de Lisboa e, à medida que a viagem prossegue, observamos que a «paisagem» hereditária está agora preenchida por «cadáveres» de genes (genes abandonados), genes que, apesar do seu aspecto e da sua composição (sequência de bases) se parecer bastante com a dos outros genes, estão paralisados, inactivos e, por isso, são totalmente improdutivos. Provavelmente, num determinado momento qualquer da sua história, uma parte crucial dos seus mecanismos foi danificada (sofreram uma mutação) e, a partir daí, foram-se «enferrujando» lentamente até deixarem de funcionar.Após muitos quilómetros de terreno desértico de DNA abor-recido e repetitivo, começamos a avistar lugares onde algo está a ser feito. São os genes activos (ou funcionais). Um

gene activo pode reconhecer-se pela ordem das letras do texto do DNA, já que se inicia por palavras de três letras escri-tas segundo um código (código genético) e cujas instruções permitem o fabrico de uma determinada proteína.A Celera (e o Projecto do Genoma Humano) aponta para um número de genes activos (genes que codificam a produção de proteínas) que se deverá situar entre os 26.383 e os 39.114 genes, e muitos deles estão dispostos em «grupos» (famílias de genes), sintetizando várias substâncias, sendo a mais conhecida a hemoglobina, pigmento vermelho do sangue. De todo o DNA das células da medula óssea (órgão produtor de células sanguíneas e, particularmente, dos glóbulos verme-lhos), só um pequeno grupo de genes é que está continu-amente atarefado a trabalhar: o grupo de genes da betaglo-bina. Esta família de genes encontra-se, na nossa viagem, aproximadamente, a meio do comprimento total do DNA (na zona de Coimbra) e produz, além da hemoglobina, as proteínas envolvidas no transporte do oxigénio. O Complexo Industrial da Globina contém cerca de seis secções de DNA, sendo a secção que produz parte da molécula da hemoglo-bina bastante pequena (cerca de 40 cm de comprimento na escala deste mapa). A alguns metros de distância desta secção, encontra-se outra, que fabrica a globina existente no embrião e, perto dela, está uma carcaça enferrujada de um equipamento industrial que deixou de funcionar há alguns anos. Esta instalação industrial de globina estende-se por uma área de 15 metros e coopera com outra, de dimensões semelhantes, situada perto de Lisboa neste mapa, que produz

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outra globina. Em conjunto, estes dois complexos industriais produzem as duas globinas que constituem a hemoglobina, o pigmento vermelho do sangue. Muitos dos genes activos que possuímos nem sempre estão próximos uns dos outros, encontrando-se dispersos por todo o genoma.Estamos a chegar ao Porto e, na paisagem hereditária que agora percorremos, surgem genes que são vestígios de antigas infecções bacterianas e víricas, ou seja, partes de DNA vírico ou bacteriano que aqui chegaram e ficaram «gravadas» no genoma. Alguns quilómetros à frente, avistamos outro gene que, estranhamente, é quase igual a um gene cuja função conhecida é alterar o padrão das veias das asas dos insectos.Estamos agora nos arredores de Ponte de Lima e, ao dobrar uma curva, surge uma bizarra instalação industrial (gene), que lança na paisagem à sua volta materiais tóxicos e polu-entes, num raio de cerca de 100 quilómetros. Após a leitura da sequência de letras do DNA deste gene, verificamos no «road book» («livro de código»), que estas instalações sofre-ram danos irreparáveis, sofreram pequenos erros. Esta nova sequência de letras (instalação danificada) leva à produção de um material tóxico, uma proteína anormal, formada por cerca de 1500 aminoácidos, sendo o comprimento total do gene que a codifica de 250.000 bases, ou seja, o equivalente a cerca de 65 metros de instalações industriais. Relativamente a esta proteína, falta-lhe apenas um aminoácido, a um terço do comprimento da molécula, mas isto é o suficiente para gerar uma doença hereditária muito vulgar entre os indivíduos de pele branca, a fibrose quística. O gene da fibrose quística foi finalmente identificado em 1990 e este projecto custou cerca

de 150 milhões de dólares. A doença é resultante de uma deficiência na transferência de sal através da membrana que circunda as células (membrana celular), já que a proteína «deficiente» atravessa várias vezes a membrana celular, actu-ando como bomba hidráulica. Até há poucos anos, as crianças que contraíam a doença morriam cedo e, embora a medicina tenha aumentado a sua esperança de vida, foram poucos, no entanto, os indivíduos que conseguiram sobreviver para lá dos 35 anos. A descoberta deste gene levou os cientistas a sonhar com a erradicação desta doença genética, mas, infeliz-mente, a cartografia molecular mostrou que a fibrose quística pode ser causada por mais de 200 alterações (mutações) diferentes do DNA e, como tal, a utilização do mapa genético para detectar os indivíduos em risco (aqueles que poderão ser portadores de uma cópia do gene «deficiente») não será tão simples como se chegou a pensar.Apesar de tudo, muitos dos genes responsáveis por numero-sas e importantes doenças hereditárias foram já localizados no DNA, e um caso sintomático é o da doença de Huthington, que provoca a degenerescência do sistema nervoso e leva a que os indivíduos, ao atingirem a meia-idade, morram. Em 1983, foram feitos alguns progressos nesta área, mas foram necessários ainda 10 anos para se localizar e identificar o gene responsável por esta doença. Sabe-se agora que este gene se situa na extremidade do cromossoma 4 e a proteína «deficiente», a «huntingteína» (como imaginativamente lhe chamaram), já foi estudada, havendo, pela primeira vez, alguma esperança de progresso na compreensão da natureza desta doença. A sequenciação do genoma humano permitiu

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revelar também outros genes que estarão relacionados com várias doenças como a doença de Alzheimer, a esquizofre-nia, a depressão e a asma. Da mesma forma que o mapa de Heródoto nos dá informação sobre o tamanho das cidades, a sua posição e as rotas de migração utilizadas pelos viajantes naquela época, espera-se que o mapa genético da Humani-dade nos possa revelar futuramente o segredo de muitas doenças que nos afligem. É o caso do cancro, doença das civi-lizações modernas, cuja cura, segundo vários investigadores, poderá estar na concepção e produção de medicamentos específicos para actuarem, por exemplo, sobre as enzimas que reparam o DNA das células cancerosas, de modo a impedir estas células malignas de se continuarem a dividir. No caso do cancro da mama, por exemplo, já se conseguiram detectar dois genes, o BRCA1 e o BRCA2, que estão relacionados com uma maior susceptibilidade a esta doença por parte das pes-soas que os possuem.Em jeito de conclusão, sabemos hoje que os seis biliões de seres humanos que habitam o planeta Terra partilham entre si 99,9% do seu material genético, ou seja, do ponto de vista matemático, somos uma multidão de gémeos. O genoma humano contém apenas 30.000 genes activos e as diferenças que nos separam de seres que normalmente esborrachamos sem um pingo de arrependimento, como a mosca-do-vinagre (que tem apenas menos 13000 genes) ou o verme Caenorhabditis elegans (que tem quase dois terços dos nossos genes), são bem menores do que pensávamos. Mais: apenas 300 desses 30 mil genes são diferentes, o que significa que a explicação para a imensa complexidade do

ser humano não está no número dos genes que possui mas sim na rede de associações existente entre os seus genes e na relação destes com as proteínas. O que parece de facto existir é um jogo de influências no organismo que, ora activa ora desactiva genes, permitindo ainda que o mesmo gene comande o fabrico de proteínas diferentes, conforme a célula ou o ambiente que a envolve.Isto significa que, após termos decifrado as letras do livro (genes), será muito mais importante tentar compreender a forma como os genes comandam o fabrico das proteínas e conhecer melhor essas próprias proteínas, projectando-se já no horizonte um novo projecto, o «Projecto Proteoma», fundamental para os avanços que se farão, por exemplo, ao nível da Medicina.Uma coisa está clara hoje para os cientistas: não somos mais complexos do que um verme ou uma planta apenas porque usamos mais genes. Compreender o que produz a nossa maior complexidade, esse sim, será o desafio do próximo século.

Cristiana Leal [11.º A]

Luís Santos

Mariana Santos [11.º A]

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Não sabemos, com certeza, onde e quando nasceu, sabemos, com certeza, onde e quando morreu, 10 de Junho de 1580.

«Se depois de eu morrer, quiserem escrever a minha biogra-fia, / Não há nada mais simples. / Tem só duas datas – a da minha nascença e a da minha morte.», ao argonauta Caeiro permitiram-lhe a identidade, ao épico, o desconhecido, o duvidoso desvendar.

A vida do imortal cantor dos lusíadas1 acha-se envolvida em tantas incertezas que impossível se torna, a cada passo, extremar nela a realidade puramente histórica, das lendas ou conjecturas mais ou menos fantasistas.

Atrevemo-nos a encetar uma curta odisseia, aflorando passos da vida do poeta, na tentativa de laurear o Homem e a Obra.

Luís Vaz de Camões, segundo a opinião mais geralmente aceite, nasceu em Lisboa, em 1524. Foram seus pais Simão Vaz e Ana de Macedo. Terá estudado em Coimbra até 1542, onde enriqueceu a sua inteligência peregrina com os vastos e variados conhecimentos que entrevemos na sua obra. Conhe-ceu a fundo as literaturas clássicas, a mitologia, a geografia, a história, as referências teológicas, com que frequentemente nos deparamos, demonstrando que em nenhum destes assun-tos era hóspede. Incerto o ano em que começou a frequentar a corte de D. João III, certo o desterro a que foi obrigado para o Ribatejo por haver caído no desagrado do monarca, talvez (agora permitam-me enumerar suposições) pelas alusões no Auto de El-Rei Seleuco, por alguma rixa violenta a que o arrastasse a sua mocidade impetuosa, por intrigas de figuras invejosas dada a enorme aceitação que entre as damas do paço gozava o poeta… «Luís de Camões poeta namorado,

…soBRe as ondas

1 O termo lusíadas, isto é, portugueses, não é invenção de Camões, já antes dele o

célebre André de Resende havia empregado este vocábulo no seu Carmen eruditum et

elegans… de 1531.

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desenvolto e brigão que andava inquietando os corações e fantasias da donzelaria» do paço, testemunha o Conde de Sabugosa, in Bobos na côrte. Foi de curta duração o seu desterro no Ribatejo, dado que em 1547 partiu para Ceuta, onde se bateu em mais de uma refrega, numa das quais perdeu um dos olhos. Em 1552, já em Lisboa, a sua índole aventureira novamente o leva à prisão; envolveu-se numa luta com um moço do paço, a quem feriu, e foi encarcerado no Tronco da cidade. Em clausura e repouso, terá lido a primeira Década, de João de Barros, e, de Fernão Lopes de Castanheda, a sua História do descobrimento e conquista da Índia pelos portugueses. Crê-se que estas duas obras forneceram a Camões copiosos elementos na contextura da sua epopeia. Perdoado em 1553, partiu para a Índia, onde, como soldado, tomou parte em várias expedições. Lembre-mos a incomparável canção X, que começa

«Junto de um sêco, duro, estéril monte, ….».

Achando-se em Goa, aquando da investidura do governador Francisco Barreto, escreveu o Auto do Filodemo, a Sátira do torneio e umas décimas intituladas Disparates da Índia. No dizer de alguns biógrafos, estas composições foram a causa de o poeta ter sido afastado da capital da Índia e despachado para Macau com o cargo de Provedor de Defuntos e Ausentes, ofício ao que parece não ter dado boa conta, porquanto, acusado de defraudar a fazenda nacional, foi mandado para Goa, sob prisão, para se justificar das acusações que lhe eram feitas. No seu regresso a Goa, em 1559, naufragou nuns baixos do mar da China, conseguindo a custo salvar Os Lusíadas, e desembarcou em Malaca, onde se demorou algum tempo. Aportando em Goa, em fins desse ano, foi posto em liberdade por diligências do Conde de

Redondo (vice-rei da Índia). Torturado de desgostos e desi-lusões (supomos nós…), resolveu voltar à pátria. Em 1567, embarcou para o reino, indo invernar em Moçambique, onde Diogo do Couto o encontrou «tão pobre que comia de amigos». Daí velejou Camões para Portugal, vindo encontrar Lisboa devastada pela peste de 1569. Após a publicação d`Os Lusíadas, em 1572, foi-lhe abonada a tença de 15:000 réis. Pouco se conhece dos últimos anos do poeta.

Rápida foi esta viagem que sugerimos ser continuada com a leitura da obra camoniana, precioso escrínio das glórias nacionais e, segundo acreditamos, ainda hoje um dos meios idóneos para acender os brios patrióticos do peito da gente portuguesa. Em cada verso, sentirão palpitar a alma do país, o Portugal esquecido, com todas as qualidades e todos os defeitos característicos, ousado e ingénuo, heróico e sonha-dor, paladino e missionário… Se os gloriosos feitos do povo português, consagrados pelo génio do poeta, podem desper-tar ainda energias latentes nos corações lusos, e galvanizar, quem sabe?, uma nação agonizante, leia-se, medite-se, espalhe-se profusamente a obra e os ideais de um Homem. Hoje, mais do que nunca, a sua leitura, salutarmente suges-tiva, torna-se indispensável a não querermos que gerações se deixem imbecilizar de todo por um ambiente absurdo de opressão e mentira, sem fé e sem ideal, que as mirra e atrofia. Mais ainda do que nas vésperas de 1580, hoje o país corre iminente risco de perder totalmente a consciência da dignidade e brios nacionais, espécie de letargia cataléptica, mil vezes mais nociva e desoladora que a «…rudeza / duma austera, apagada e vil tristeza» que o poeta lamentava no seu tempo.

Susana Nunes

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Quien no conoce el caballero más famoso y más viajero de toda España, el de la triste figura, el gran D. Quijote de la Mancha. Su viaje tiene pues inicio en su casa en La Mancha, pasa por Aragón y Barcelona y vuelve de nuevo a su casa. Pero este viaje además de ser un viaje físico por tres de las grandes comunidades de España, es un viaje espiritual en busca de un ideal que no vislumbra un final pues en esta historia el final es algo que no existe, algo inalcanzable, algo utópico.

Todo empieza con la partida de D. Quijote desde su casa, en La Mancha, con su fiel escudero Sancho Panza, que van en busca de aventuras, aquellas de los libros de caballería, y enfrentan gigantes, caballeros malos, monstros y reinos. D. Quijote es un caballero valiente cuya honra es su forma de vida y su inspiración es su amada y querida dama, la Señora Dulcinea del Toboso.

Este viaje es nada más que un viaje de un hombre que es la metáfora de la evolu-ción humana y también del recogimiento, de la reflexión incluso, que empieza en su casa, en su lugar de sosiego e introspección, un lugar propicio a la cordura, y cuando sale de su espacio de protección y se acerca al peligro, a la intemperie, a la aventura y a lo desconocido, podrá ser visto también como el viaje de la iniciación del héroe en el camino de la búsqueda de la sabiduría. O de la felicidad o tal vez de la serenidad, de la resignada y lucida aceptación de los hechos.

El viaje de D. Quijote es el viaje de todos nosotros pues todos somos un poco quijotescos al entrar en los viajes de nuestras vidas, pues todos compartimos las locuras de Alonso Quijano que vivía leyendo y pasaba las noches en claro y los días de turbio en turbio, de ese caos aburrido, de esa vida rutinaria y sin sentido que era su vida y son, por veces, nuestras vidas. ¿Cómo salir de ese marasmo? Entrando en un viaje en búsqueda de un ideal quijotesco que sabemos utópico, pero que traerá aventura a nuestras vidas.

Cervantes tuvo la agudeza genial de no dibujar un personaje en una sola dimen-sión, sino que al diseñar su perfil está mostrando el amplio espectro y las contradic-ciones del alma humana.

Cristina Veiga

el viaje del caBalleRo de la tRiste FiguRa

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Para a interlocutora.

Por um desses acasos a que a humana vontade de conferir ordem ao mundo insiste em atribuir uma lógica ou uma razão, fui há pouco tempo confrontado com um verso de Shakespeare que começou por me parecer desconhecido e se revelou depois como pertencente a uma peça que eu já vira encenada. Se é certo que esta última circunstância não bastaria para que eu o tivesse memorizado, não se justifi-cando, portanto, que me censurasse por não o ter identificado logo, a verdade é que a sua insistência em, por assim dizer, se colocar à minha frente me despertou um inusitado desejo de aprofundar o seu sentido, ainda por cima estimulado pela leitura que dele fizera quem, no decurso de uma conversa, o resgatara do meu esquecimento e o depusera diante de mim. O verso em questão, «Journeys end in lovers meeting» (que, numa tradução literal, equivale a algo como «A viagem acaba no encontro dos amantes»), número 41 da cena 3 do acto II de Noite de Reis (ou, para ser mais exacto, Twelfth Night, peça provavelmente escrita em 1601 ou 1602), é parte integrante da fala de um bobo, de uma dessas personagens a que o teatro conferiu a possibilidade de dizerem verdades incómodas com um desplante que raramente era conferido a outros intervenientes dos espectáculos, e é também uma antecipação do destino dos protagonistas, mas, como tantas frases em Shakespeare, guarda espaço para outras leituras; a da minha interlocutora – acreditando que faço jus às suas pa-lavras – encarava a «viagem» do verso shakespeariano como o trajecto mental que antecipa o encontro erótico, como o percurso imaginário que cada um dos futuros amantes compõe até esse momento que, se a expressão não parecesse

horrivelmente antiquada, poderíamos chamar a epifania amo-rosa. Nesta leitura, a viagem terminaria aí porque também aí se fecharia a deriva imaginária, substituída pelo áspero combate com o real.Ao ouvir esta proposta de possessão do verso shakespeariano (interpretar um texto é apoderarmo-nos dele), perguntei-me se ela aguentaria submeter-se a um confronto com a litera-tura ao longo dos tempos, dada a frequente reiteração da ideia de que a arte não se faz com bons sentimentos e tendo em conta o facto de o amor ser habitualmente considerado um deles. Em suma, falará a literatura de amores imaginados – paralelamente configurados como viagens – que acabam por se consumar?Experimentemos começar pelo início, não exactamente

a Paciência dos amantes

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pelo primeiro livro da literatura ocidental, essa Ilíada tão sangrenta, mas pela sua quase gémea, pela Odisseia, pela viagem do mítico guerreiro Ulisses, que, forçado a combater em Tróia, demora no regresso a casa muito mais do que teria podido crer. Provavelmente escrita nos séculos VII ou VI antes da era cristã, a epopeia modelar de Homero (poeta de quem nada se sabe além do nome) distende-se por vinte e quatro cantos, para narrar em verso as lendárias peripécias que vão retendo o viajante e os seus companheiros no moroso retorno. Como é sobejamente sabido, Ulisses só irá reencon-trar a mulher, Penélope, no final da obra, ou seja, no término de uma viagem pontuada por longas interrupções. Em todo o caso, se ele, retido na ilha da feiticeira Circe, chora diante do mar, atormentado pelo desejo de regressar aos braços da sua amada, também esta, por seu turno, pensa nele quando en-gana os pretendentes com o seu astucioso plano centrado na mortalha de Laertes: propunha-se escolher um homem para ocupar o lugar de Ulisses quando acabasse de tecer a mor-talha, mas desfazia à noite o que fazia durante o dia. Assim desejado, o encontro dos amantes (trata-se de um reencontro, mas que, decorridos tantos anos, se configura mais como uma novidade) decorre numa noite que a deusa Atena prolonga, para que cada um conte ao outro as aventuras por que tinha passado: «Mas depois que Ulisses e Penélope satisfizeram o seu desejo / de amor, deleitaram-se com palavras, contando tudo um ao outro»1.É também num plano que poderíamos considerar fantástico, se o termo não fosse inadequado para a época em questão, que Dante Alighieri situou a sua viagem. Publicada entre 1304 e 1321, a Commedia (posteriormente conhecida como La Divina Commedia) é um poema alegórico, dividido em três partes e cem cantos, que descreve a viagem de um homem pelo Inferno, passando pelo Purgatório, até chegar ao Paraíso, onde será recebido pela sua adorada Beatriz. Este homem, que, aos 35 anos, se considera no meio do caminho da vida, diz ter empreendido esta viagem singular entre a noite de

quinta-feira santa (7 de Abril) da Páscoa do ano de 1300 e a quarta-feira seguinte (13 de Abril). Escrevendo em língua vulgar, pondo de parte o latim, ele tem a preocupação de contar tudo o que viu. Ao longo das duas primeiras etapas, é guiado pelo poeta latino Virgílio, mas o percurso no Paraíso faz-se ao lado de Beatriz, assim elevada a uma condição única para a época, que consistia em colocar uma mulher sem biografia de realce, nem especial aptidão para a santidade, como guia, não só dele próprio, mas de todos os crentes. Mesmo considerando as muito particulares características da viagem empreendida por Dante, merece destaque o facto de o encontro do poeta com a amada se concretizar à entrada do lugar que se pretendia descrever como o mais belo de entre todos os que eram conhecidos ou era possível imaginar. É a recompensa por um trajecto cuja aspereza se vai progres-sivamente atenuando, como se a caminhada pelos círculos infernais correspondesse afinal à dolorosa via crucis dos amantes que se desejam à distância, sem talvez saberem que o desejo é recíproco. O encontro não poderia, assim, deixar de vir marcado pelo espanto, pela perplexidade: «Olha-me bem! Sou bem, sou bem Beatriz»2.A viagem imaginária também pode, no entanto, encontrar-se ancorada num espaço mais prosaico, como o demonstrou a obra do russo Fiódor Dostoievski, nomeadamente através do romance Crime e Castigo (Prestupleniye I Nakazaniye, 1866). O protagonista desta narrativa publicada originalmente por capítulos num jornal russo é Raskólnikov, um jovem estudante que vive em São Petersburgo com crescentes dificuldades financeiras, o que acaba por levá-lo a cometer um duplo homicídio (de uma velha usurária e da sua irmã, cuja ines-perada irrupção na cena do crime a torna na segunda vítima). Mais tarde, o herói (ou anti-herói, dada a sua fragilidade e o seu desenraizamento) começará a sentir remorsos e a necessidade de se redimir, o que apenas se tornará possível por intermédio de outra personagem igualmente situada num

1 Homero, Odisseia (trad. de Frederico Lourenço), Lisboa, Livros Cotovia, 2003, p. 376. 2 Dante Alighieri, A Divina Comédia (trad. de Vasco Graça Moura),

Venda Nova, Bertrand, 1996, p. 563.

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plano inferior da escala social; será Sónia, uma jovem prostituta, que o con-vencerá a entregar-se à justiça, para que, uma vez lavada a culpa, possam viver os dois juntos. Irá depois acompanhá-lo até à Sibéria, quando ele para aí for levado, para os trabalhos forçados, visitando-o sempre e nunca deixando de o apoiar. É num desses momentos em que, pelo facto de todos se terem habitua-do a vê-la por perto, já ninguém, nem o próprio guarda, lhes presta muita aten-ção, num desses instantes em que todos parecem tê-los esquecido e eles estão completamente entregues a si mesmos, que, invisível à superfície, ocorre uma transformação, uma profunda e radical modificação das perspectivas de ambos sobre as suas vidas, semelhante talvez ao avistamento de terra por parte dos marinheiros de uma viagem de longo curso, os quais ficam assim a saber que o destino não lhes foi demasiado cruel e lhes reserva ainda um porto de abrigo, mesmo que provisório, mesmo que capaz apenas de durar um breve lapso de tempo: «Nem ele próprio sabia como aquilo aconteceu, mas de repente parecia que alguma coisa o agarrava e o lançava aos pés dela. Chorava e abraçava- -lhe os joelhos. No primeiro instante, Sónia ficou horrivelmente assustada, e o seu rosto ficou lívido de morte. Saltou do lugar e, a tremer, olhou para ele. Mas logo, nesse mesmo instante, compreendeu tudo. Nos seus olhos brilhou uma infinita felicidade; compreendeu, e para ela não havia já dúvida, que ele a amava, que a amava infinitamente e que esse momento chegava por fim»3.Dostoievski sabia, no entanto, que não podia terminar desse modo o romance, mergulhando as personagens numa suposta felicidade que não resistiria ao confronto com a prosa da vida, criando uma ilusão beatífica a que a sua obra é alheia; sabia também que apenas o estado de expectativa induz uma alegria nunca contrariada, porque sempre adiada, e, em sintonia com a leitura do verso shakespeariano ensaiada pela minha interlocutora, optou por encerrar Crime e Castigo pondo Sónia e Raskólnikov a sonharem com o tempo que ha veria de chegar depois da libertação («Sete anos, apenas sete anos!»), com esse tempo onde o ser humano consegue albergar intocável a felicidade – porque nunca até aí pode viajar –, que é o sempre irrealizável futuro.

João Paulo Sousa

3 Fiódor Dostoievski, Crime e Castigo (trad. de António Pescada), Lisboa, Relógio D’Água, 2009, p. 458.

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IPressinto que o silêncio pode ser uma forma de combater a imobilidade. Coloco em cima da mesa a imagem da casa que tem uma tonalidade rosa velho nos pedaços de parede que ainda não caíram. A casa onde as fendas não começam nem acabam e os restantes pedaços de parede parecem sugerir que todos os poemas têm algo de abandonado. A porta principal permanece com um cadeado mesmo quando levanto os olhos para o céu e os vidros das janelas talvez nunca estivessem lá. Um dia, hei-de parar o carro em frente à casa e tentar perceber se o que nela me encanta é a luz trémula que imagino sobre os soalhos ou a certeza de que não há uma explicação para o invisível.

IIO muro fica num caminho que deixei de percorrer e forma uma curva co-berta de folhas vermelhas adornadas pelo sol. Ao lado do muro, a estrada é em alcatrão mas as bermas são de terra e de ervas daninhas. Com alguma atenção, consigo ver as nuvens pro-jectadas no princípio daquilo que fica para trás.

IIIO ângulo retira da imagem o que está para além da melodia das coisas 1. Fica a casa, outra casa onde o tempo também rasgou as paredes, o limoeiro carregado pelo aroma dos limões e um azulejo com a Virgem como se soubés-semos que a existência tem sempre necessidade de encontrar a primeira palavra para anunciar o sagrado. Não chove e a luz, rarefeita ainda quando passo, é a do mundo pela manhã.

IVA sombra dos dois carvalhos pende sobre a estrada como uma intenção acesa. Apesar dessa inquietude e mesmo que vários pássaros lá façam os ninhos, agora, tal como da última vez que alguém fez daquele sítio miradouro, as folhas das duas árvores permanecem quietas. De repente, entendo que já não sou eu quem olha. Ao fundo, ouve-se, como se viesse depois de outro tempo, o rumor do rio.

VChego ao lugar onde a estrada se divide em dois versos. Como se fosse uma escolha, apago os ângulos da imagem porque o tempo de exposição à luz foi porventura demasiado. Quando o silên-cio se impõe há paisagens que morrem

para sempre.

Sandra Costa

1Do título da obra de Rainer Maria Rilke, Notas sobre a melodia das coisas (Averno, 2011).

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Sempre que nos propomos iniciar uma viagem, seja ela de que índole for, deveríamos contemplar uma série de condições, conceber uma espécie de check-list. Numa orga-nização, que pode ser uma escola, a minha escola, se apon-tamos para um caminho que pretendemos percorrer, convém, antes de mais, tomar o pulso às condições, elaborar uma lista que inclua traços da realidade com que nos deparamos, co-nhecer o que somos e como somos, o que nos une e desune, o que nos condiciona ou potencia. Mas, posto isto, estaremos já prontos para encetar a via-gem? Não, não estamos. Precisamos ainda de saber o que fomos até aqui, o que nos trouxe até onde nos encontramos, de conhecer o caminho percorrido, a viagem feita e o que ficou no diário de bordo. Saberemos melhor para onde ir, se soubermos de onde vimos. Perguntem aos historiadores o quão importante é sabermos do passado, e eles responderão afirmando que o que somos é produto do que fomos. Esta-remos, então, finalmente, em condições de iniciar a viagem? Não, há agora que estabelecer uma meta, pois, se ouvissem o historiador até ao fim, ainda o escutariam dizer que o que fo-mos e somos projecta-se naquilo que queremos e poderemos

ser. Há que definir o que queremos ser: enquanto organização que aprende, trate-se de fazer jus à formulação de uma meta, de algo que nos propomos atingir. Mas, afinal, porque temos que partir? Que mal tem este porto de abrigo? A ânsia da viagem está no devir, lei universal que nos envolve de mudança.Escolhido o caminho, preparada a viagem, estabelecida a meta, há que levantar âncoras. Sem grandes ilusões, step by step, as dificuldades ainda agora estão a começar. Na viagem, vamos encontrar todo o tipo de obstáculos, encruzilhadas, terrenos lamacentos, falsas indicações, até sabotagem. Acham que há verdadeira viagem sem agruras? Apelemos, então, à resiliência da organização e daqueles que a compõem. São os inconvenientes que alimentam a capacidade de uma orga-nização em transformar a adversidade em oportunidade, o esforço é compensador, a intensidade que aplicamos na supe-ração das dificuldades traduz-se em cimento organizacional: o que não me mata torna-me mais forte. A viagem vai a meio. Há motins, e os amotinados querem regressar, já não acreditam que seja possível levar a viagem até à meta. A organização enfrenta o maior dos desafios:

da viagem à metaviagem: a meta de uma oRganização aPRendente

nenhum vento é favorável para um barco que anda à deriva. e anda à deriva se não existe um projecto concreto de viagem, se não há forma de controlar o barco ou se não esta-mos a navegar na direcção correcta.

Santos Guerra [2002]

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quantas viagens sucumbiram perante tal contratempo? Nestas alturas, surgem as lideranças intermédias, cabendo- -lhes a árdua tarefa de levantar ânimos, de renovar energias, de levar a acreditar, envolvendo. E o líder, demasiado só, isolado, acometido no seu desígnio, obstinado por natureza, vai em frente, esperando que o sigam. A sua capacidade de ressonância está em jogo: se for ressonante não falha! Este é o tipo de líder que é capaz de «subir à árvore mais alta da floresta e exclamar: malta, estamos na mata errada!», estão todos com ele, sentem-se como parte, são ouvidos, há uma cultura organizacional que funciona como antídoto para qualquer motim ou tentativa de cartelização de interesses ou insensibilidades.Líder, lideranças intermédias, soldados, todos sendo partes de um todo, em que a sua soma o supera. Deve ser esta a filo-sofia de uma organização em viagem, transportando consigo valores, qualidade de vida no local de trabalho, identidade e normas que sejam assimiladas por todos, conferindo autenti-cidade e carácter inimitável a esta organização aprendente.

cenário 1A organização desenvolveu todos os esforços, no entanto, ficou aquém da meta estabelecida. Não há necessidade de entrar em pânico: nada que um bom plano de contingência não resolva! Como é óbvio, a organiza-ção, mesmo munida de um bom plano de viagem, não pode diferenciar-se do meio em que se move, dos imponderáveis e das vicissitudes. Há que redobrar energias e que partir para outra. Outra viagem, outro plano, outra meta, a mesma vontade! Não há viagens iguais, e esta será bem diferente. Aposto que aumentaram as probabilidades de, desta feita, a viagem ser bem sucedida, porque a organização evoluiu, está agora numa outra fase de maturação, tem mais antídotos.

cenário 2A organização desenvolveu todos os esforços e chegou à meta estabelecida.Estamos todos de parabéns, êxito total para a reconstrução colectiva. Depois das justas alvíssaras, há que empreender nova caminhada, pois novos desafios se levantam. Ou seja, por mais que se alcancem metas, numa organização apren-dente, existe sempre a necessidade de reconstruir uma reali-dade, onde a marca mais profunda é a da mudança, cada vez mais veloz, e para a qual temos que arrepiar caminho, pois o carácter volátil dos mecanismos que arquitectam a organiza-ção são a demanda fatal.

cenário 3A organização está espartilhada e o espartilho são as suces-sivas balcanizações.E se nunca chegámos a partir, e se ainda estamos amarrados ao porto e se o peso da organização inviabiliza qualquer tentativa de estabelecer um plano de viagem, e se o medo de partir nos impele para o cais? Bem, poderemos sempre fazer- - de-conta. Faz-de-conta que temos um plano de viagem, faz- -de-conta que estamos em viagem, faz-de-conta que vamos para algum sítio, embora não sabendo bem para onde, mas vamos. Depois, quando alguém exterior à organização nos vier acordar, abortando o nosso destempero onírico, aí sim, vamos reconhecer a necessidade de romper com o espartilho e desaportar.

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cenário 4A organização é demasiado naïf, pejada de niilistas envoltos em cíclicas bravatas.E se fizermos a viagem sem recorrer a um plano, a um roteiro que nos permita chegar a uma meta. Será isto possível? Qualquer organização pode iniciar, desenvolver e terminar uma viagem nestas condições. Isso tem um nome, é aventura! Acontece que, nestas condições, reduzem-se as hipóteses de aportar, poderemos, até, ficar sempre em mar revolto, à deri-va. Aumenta o espírito de aventura, é verdade, mas esfumam- -se as hipóteses de conferirmos sentido à nossa viagem.

Na viagem desta organização aprendente, há portos de abrigo aos quais teremos que aportar para reabastecimento? Existem e são os seguintes: Shared Vision (visão, missão, va-lores e objectivos partilhados por todos em diferentes níveis), Systems Thinking (sistema visto como um conjunto de forças interrelacionadas), Mental Models (mapas mentais e percep-ções que temos sobre os processos organizacionais), Personal Mastery (habilidade e vontade em compreender e trabalhar com as forças que rodeiam o indivíduo) e Team Learning (um

conjunto de pessoas que precisam umas das outras para obter um resultado – e como é importante sabermos que precisamos uns dos outros).

A organização aprendente estrutura-se na perspectiva de que a aprendizagem tem um significado estratégico, que permite assegurar a inteligência competitiva necessária à sua capaci-dade de reconstrução de realidades e nos diferentes con-textos em que se vai movendo. Sendo certo que a viagem é inevitável e necessária, que seja, já agora, uma metaviagem, algo de transformador para todos e para a organização, pois, quando chegarmos a uma qualquer meta, seremos outros, a organização será diferente, mais eficiente e mais eficaz.

Emídio Baptista

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As vidas são viagens. No tempo e no espaço. Umas longas, outras penosas, algumas divertidas. Contemplativas ou frenéticas. Partilhadas ou solitárias. Ou tudo isto e muito mais.Como viagens que são, umas já estão destinadas à partida, vidas determi-nadas, planeadas, ambiciosas. Viagens marcadas, pela cor, pela dor. Outras há ao deus-dará, que ontem não deu, amanhã logo se vê. Vidas adiadas, pela sorte, pela morte.Vida «errante navegante», canta Caetano, «Terra! Quem jamais te esqueceria» se, como o balão que a minha filha largou, o azul planeta me libertasse da atracção que sobre mim exerce, era grave agora já não sou, vou a Marte até morrer, por Júpiter, serei soturno em Saturno, ufano em Urano, oportuno em Neptuno, querido

viagens na nossa teRRa

e solidário em Plutão, pobre coitado, deprimido desde que foi despromovido, percebo-te perfeitamente, saí há pouco de Portugal… Chegados aqui e agora, é viragem ou prosseguimos viagem? Nas vidas, regressamos ao casulo ou corta-mos as amarras, vamos à aventura ou cedemos à saudade do bacalhau cozido com todos e muito azeite, como o João Sem Medo, do José Gomes Ferreira. Ou alternamos.São mundos a descobrir, as vidas, via-gens de descobrimentos, épicas ou nem por isso, a Índia quase sempre a fugir, o mar a crescer, cabos de trabalhos, de tormentas e de esperanças, terra à vista, que bem sabe aterrar depois de dias de mar. E que saudades de voltar a nave-gar depois de vista a terra, explorada e desvendada.Ser pai, ser professor, ser vivo, tanta

coisa para aprender, errar, remendar.Vamos largando partes de nós em cada porto, desfazendo-nos, reconstruindo- -nos, livros em aberto, páginas de futuro em branco. Quantos somos? Quantos sou? Ontem fui assim, hoje sou assado, amanhã serei ou não, mas essa não é a questão.E se não sei onde estou? E quando me encontro no sítio errado? Engano-me no caminho? Reconheço, consolado, que há muitas maneiras de chegar ao mesmo lado.As viagens que não faço, finjo-as. Os gozos que não tive, sonho-os. Quem não visitei que aguarde, guardo memórias como destinos.Não tenho nada para dizer. Só sei que vi viagens a nascer, vi viagens a crescer, vi viagens a morrer. Beijo para todas.

César Biltes

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(A sós.

Hoje, não se abala para um grande amor, proibido,

permitido que seja. Hoje, entretece-se um entretém,

que não é uma deriva excessiva e que é uma esca-

pada virtual dos serviços. Nem sim, nem não, assim

tipo sei lá, quem sabe. Não há uma decisão singular,

mas o devaneio em nada explícito, indefinindo-se

por jogos de espelhos. Ad infinitum et ad nauseam.

Não há a viagem ao desvairo. Voga-se encalhado em

águas pardacentas.

Fecho, agora, o parêntesis, que me levou e trouxe

deste apeadeiro suburbano.)

Estou d’abalada. Desta casa e de um lugar dis-

tante onde foram acontecendo os traçados e as an-

danças de um professor. Vou viajar. Nem de propósi-

to. Haveremos, talvez, de nos reencontrar. Nas voltas

do Eterno ou nas do correio, no acaso dos encontros

e dos desencontros. Nos caminhos da escrita, talvez.

Talvez.

Sempre vosso.

João Lima

núPcias

Gus

tav

Klim

t, O

Beijo

[190

7/08

]

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A definição do tema «Viagens» foi feita no início do ano lectivo, o que permitiu incluí-lo na planificação das disciplinas de Fotogra-fia e Projecto e Produção Fotográfica, do Curso Profissional de Técnico de Fotografia (10.º F).A escolha atempada resultou na proposta de um trabalho que consistiu na produção de imagens simbólicas, abrangentes, sobre o tema. O recorte/silhueta foi a técnica proposta. Estes objectos individuais seriam posteriormente sequenciados de forma a cons truir- -se um cenário com os diferentes planos. Após a construção deste espaço cénico, os alunos realizaram várias experiências com a luz, modelando as imagens, jogando com os valores de sombra/luz, e percepcionando a qualidade e a simbologia da cor.O trabalho final conjunto foi utilizado como imagem do cartaz de divulgação da revista.

Aprende-se a ler. Aprende-se a escrever.Devagar.

Carlos Moura

Gisela Meireles

escReveR com luzFoto gRaFia

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Ficha técnica

Coordenação editorial

joão Paulo sousa

sandra costa

Coordenação gráfica

carlos moura

gisela meireles

Propriedade

escola secundária de vilela

Tiragem

100 exemplares

Maio de 2011

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oFeRta FoRmativa 2011/2012

cursos Profissionais

Técnico de Design, opção Equipamento

Técnico de Higiene e Segurança no Trabalho

Técnico de Turismo Ambiental e Rural

Técnico de Apoio à Gestão Desportiva

curso de educação e Formação de jovens

Práticas Técnico-Comerciais [Nível II, Tipo 3]