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ACUPUNTURA: SAÚDE DIRETO AO PONTO VIAGEM AO MUNDO DAS CORES: GUATEMALA Ano 6 N 0 2 8 R $ 2, 50 Colônia OS SABORES DA CULINÁRIA ALEMÃ

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Edição de agosto de 2004

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ACUPUNTURA: SAÚDE

DIRETO AO PONTO

VIAGEM AO MUNDO

DAS CORES: GUATEMALA

A n o 6 N0

2 8 R $ 2, 50

ColôniaOS SABORES DA CULINÁRIA ALEMÃ

80945_Capa.p65 02/09/04, 14:501

Milene Leal

[email protected]

EDITORA E DIRETORA DE REDAÇÃO

REDAÇÃO Beatriz Guimarães, Cris Berger, Fernanda Doering, Paula Taitelbaum,

Tetê Pacheco

REVISÃO Flávio Dotti Cesa

PROJETO GRÁFICO Odyr Bernardi

DIREÇÃO E EDIÇÃO DE ARTE Luciane Trindade [email protected]

ILUSTRAÇÕES Nik

FOTOGRAFIA Angela Farias, Cris Berger, Cristiano Sant’Anna, Flávia de Quadros,

Letícia Remião

PRODUÇÃO DE ALIMENTOS Jorge Nascimento

COLUNISTAS Fernando Lokschin, Luís Augusto Fischer, Martha Medeiros,

Malu Coelho, Tetê Pacheco

EDITORA RESPONSÁVEL Milene Leal (7036/30/42 RS)

COLABORADORES Celso Gutfreind, Livraria Cultura, Studio AD,

Ponto de Antiguidades

Izabella Boaz

[email protected]

DIRETORA DE ATENDIMENTO

PUBLICIDADE HRM Representações

(51) 3231.6287 9983.7169 9987.3165 [email protected]

DEPTO. DE ATENÇÃO AO LEITOR Renata Xavier Soares

[email protected]

A revista Estilo Zaffari é uma publicação bimestral da Contexto Marketing Editorial Ltda.,

sob licença da Companhia Zaffari Comércio e Indústria. Distribuição exclusiva nas lojas

da rede Zaffari e Bourbon. Estilo Zaffari não publica matéria editorial paga e não é

responsável por opiniões ou conceitos emitidos em entrevistas, ar tigos e colunas

assinadas. É vedada a reprodução total ou parcial do conteúdo desta revista sem

prévia autorização e sem citação da fonte.

TIRAGEM 25.000 exemplares

PRÉ-IMPRESSÃO Maredi

IMPRESSÃO Pallotti

ENDEREÇO DA REDAÇÃO

Rua Padre Chagas, 185/801– Porto Alegre/RS – Brasil – 90570-080

(51) 3395.2515 (51) 3395.2404 (51) 3395.1781

[email protected]

CAPA: FOTO DE LETÍCIA REMIÃO, COM

PRODUÇÃO DE LÚCIA REIS, DO STUDIO AD

80945_expediente.p65 01/09/04, 17:042

N O T A D O E D I T O R

Aqui na redação da Estilo Zaffari temos um Beck, um Kraemer e um Doering. Três

gaúchos que certamente cresceram escutando expressões em alemão (nem que fossem

apenas impropérios e palavrões) e, com alguma sorte, deliciando-se com os quitutes da

culinária germânica: pão de mel, cucas, bolos de frutas...

Nossa equipe, em que também aparecem sobrenomes italianos, árabes, portugueses,

espanhóis e alguns bem brasileiros (os Silva não poderiam faltar!), reproduz a mistura de

etnias que compõe a população gaúcha.

Na verdade, com certeza não somente o Beck, o Kraemer e o Doering convivem

diariamente com elementos típicos da cultura alemã. Presentes há 180 anos em território rio-

grandense, os germânicos influenciaram sobremaneira nosso estilo de vida, transmitiram hábitos,

plantaram costumes, definiram conceitos. Nosso Estado é um tanto alemão, assim como é um

tanto italiano, outro tanto português, polaco, turco, africano, japonês, judeu, espanhol...

Nesta edição da Estilo Zaffari estamos homenageando o aniversário da imigração

alemã, em reconhecimento à imensa contribuição desses imigrantes e seus descendentes

para a construção do Rio Grande. E também para poder transmitir aos leitores da revista

os segredos daquelas iguarias que fazem parte do dia-a-dia de muitas famílias gaúchas, e

que outras tantas só podem degustar à mesa das confeitarias e restaurantes típicos.

Faça um brinde – com chopp, é claro – e comemore conosco esse aniversário.

A revista está linda, e não parou na Alemanha. Passamos por Veneza, pela Guatemala,

fizemos uma paradinha na China (pra falar de acupuntura), sobrevoamos a França (para

investigar como nascem os “chefs de cuisine”) e aterrissamos no Brasil, a tempo de roubar

alguns minutos do grande gaúcho (além de português e alemão) Jorge Fur tado, que

encerra a edição com uma entrevista de qualidade internacional. Boa viagem!

OS EDITORES

alles blau*

Alles gut,

* Tudo bem, tudo azul

80945_nota do editor1.p65 02/09/04, 14:502

Í N D I C E

Cartas

Cesta Básica

Cotidiano

Sabor e o saber

Lugar: Veneza

Viagem: Guatemala

Bem-Viver

Perfil: Jorge Furtado

8

13

22

44

48

66

64

86

Como a batata se transformou

em um dos alimentos mais

importantes do mundo

24

terra

Pãoda

80945_indice.p65 01/09/04, 19:482

ACUPUNTURA: DIRETO AO PONTO 82

ColôniaOS SABORES DA CULINÁRIA ALEMÃ

30

Os novos

gourmets

Crianças e cozinha podem

formar uma combinação

maravilhosa. E divertida!56

80945_indice.p65 01/09/04, 19:483

Correio

DICAS CONFIÁVEIS

Olá, meu nome é Fernanda Sebben, sou ar-

quiteta na cidade de Guaporé-RS. Sempre compro

a revista, e na edição número 27 me deparei com a

belíssima reportagem da Fazenda Cachoeira. Como

estava para sair de férias e iria a Minas, resolvi visi-

tar o local. Gostaria de dizer que a reportagem de

vocês é muito verdadeira, pois a fazenda é tudo o

que vocês falam e muito mais. Parabéns pela repor-

tagem, pelas informações verdadeiras. As dicas que

vocês deram foram ótimas. Isso me faz gostar muito

mais da revista, que ao meu ver já era ótima, mas

agora se mostrou também confiável. Obrigada, tive

umas férias ótimas, e mais uma vez parabéns pela

reportagem e pela seriedade da revista.

FERNANDA SEBBEN

UM BRINDE AO CAFÉ

Oi. Gostamos da reportagem sobre café.

A revista toda é muito boa. Parabéns. Meu nome

é Paulo, sou consultor e minha esposa Marisa é

estilista. Freqüentemente estamos lá no Café do

Porto, na Padre Chagas, curtindo o charme do

lugar e a delícia do bom café. Abraços e muita

saúde, paz e felicidades.

PAULO ROBERTO SCHWAN (CAMPO BOM)

PEIXE FISGADO

Olá. Adoro a revista, principalmente porque

é escrita com o sotaque do sul, e essa reporta-

gem sobre café ficou bem legal. Porém me em-

polguei bastante foi com a pescaria. Esse tipo de

pescaria é feito só em grupos fechados? Se possí-

vel, vocês poderiam me passar o contato da

organizadora? Obrigado.

RICARDO DÖTH

Oi, obrigado pelos elogios. Para informa-ções sobre as expedições de pesca na Ama-zônia, entre em contato com EduardoMacedo, no fone (51) 3028.7627, ok?Boa sorte, abraço!

FAZENDO ESCOLA

Neste final de semana, o Rio ganhou uma nova

publicação, a revista O Globo, que substitui o Jor-

nal da Família, encarte que teve vida longa, cerca

de 32 anos. A nova revista faz parte da edição do-

minical do jornal e será o espaço do leitor para se

informar sobre comportamento, ciência, saúde,

educação, bem-estar, culinária, moda, beleza, de-

coração, entre outros. Sem faltar a coluna do chefJosé Hugo Celidônio, com receitas contemporâ-

neas. A revista também contará com a lucidez da

escritora gaúcha Martha Medeiros.

Ao receber o número zero, que tem um pro-

jeto gráfico simples e ousado, feito pelo editor

de arte do jornal, Léo Tavejnhansky, muito me

fez lembrar vocês. Explico: lembro-me de quan-

do vocês haviam relançado a revista Estilo Zaffari

e, de pronto, ousei prenunciar, sem medo de er-

rar, que, naquele momento, vocês estariam cri-

ando uma nova escola e que, a partir daí, ganha-

riam seguidores mundo afora. Não deu outra!

A revista é a cara de vocês. A comparação é ine-

vitável! A similitude salta aos olhos de qualquer

leitor desavisado. Abraços.

MARCIO MALTA (RIO DE JANEIRO)

Marcio, ficamos honradíssimos com suasafirmações. Quem nos dera servir de ins-piração para o projeto da revista O Globo!Seria realmente um feito e tanto! De qual-quer modo, você nos fez um imenso elogio.Obrigado pela gentileza, por estar sempreacompanhando nosso trabalho e pela suasensibilidade. Um forte abraço.

MAIS DESTAQUE!

Adoro a Estilo, acho uma revista de qualida-

de, com artigos interessantes, muito bem elabora-

da, com ilustrações de primeiríssima e tudo o mais

que se espera de uma revista. Porém, fico um pou-

co decepcionada quando vejo a revista nas lojas

sem um lugar de destaque. Sou uma divulgadora

da Estilo, e todas as pessoas a quem recomendei

gostaram e se tornaram assíduas leitoras. Fica uma

sugestão: dar um local de mais destaque dentro

das lojas, pode ser? Um abraço e sigam em frente.

IARA MIGUEL DE CAMARGO

Iara, a Estilo fica exposta junto aos cai-xas, área considerada das mais nobres den-tro das lojas. É um espaço disputadíssimo!De qualquer modo, sua preocupação nosdeixa contentes, e estamos abertos a suges-tões quanto à forma de exposição da revis-ta, ok? Obrigado e, por favor, continue di-vulgando a Estilo, ok? Um abração!

8 Estilo Zaffari

80945_cartas1.p65 01/09/04, 11:332

MÃO NO CORAÇÃO

Já faz tempo que quero escrever, pois a re-

vista Estilo Zaffari me impressionou muito. Eu po-

nho a mão no coração quando falo dela, com or-

gulho. Meus parabéns a toda a equipe! Os dese-

nhos, as fotos, as receitas, os artigos, as entrevis-

tas. Tudo é perfeito e essa revista deveria ser re-

conhecida mundialmente. Moro em Sydney/Aus-

trália, e como a minha família está aí em Porto eu

recebo a revista através da minha irmã, a Mirna

(que também ama vocês).

Desde que cheguei aqui tive muito contato

com culinária em geral, restaurantes e revistas.

Agora estou escrevendo receitas para uma revis-

ta nova, feita para backpackers (gente que viaja o

mundo de mochila nas costas). Gostaria de man-

dar para vocês uns exemplares de revistas daqui,

só para verem como a revista Estilo Zaffari está

ao par com as melhores revistas de um país de

Primeiro Mundo. Gostaria de enviar também uma

revista de um supermercado daqui, que é muito

boa e pode trazer idéias a vocês!

Desculpem o meu português, mas já estou

há dez anos fora. Mais uma vez meus parabéns

por esse excelente trabalho! Com carinho.

MAIRA (SYDNEY – AUSTRÁLIA)

Puxa, estamos esperando ansiosos poressas publicações aí da Austrália. É sem-pre inspirador conhecer revistas de outrospaíses. E adoramos os elogios! Que mara-vilha receber tanto carinho vindo lá dooutro lado do mundo! Beijos!

EU NA ESTILO!

Desde a edição sobre o Txai eu queria man-

dar este e-mail. Agora não pude deixar de es-

crever, pra repetir que sou leitora de carteirinha

da Estilo, pela originalidade, qualidade, conteú-

do e beleza, do início ao fim. Estava eu no meu

Zaffari Ipiranga em uma tarde congelante de sá-

bado quando vejo a Estilo, novinha em folha, na

prateleira do caixa. Vim correndo pra casa e, pra

acompanhar minha leitura, fiz um café, inspira-

da pela capa. Fui saboreando cada página e cada

gole até que, me deliciando com as fotos lindas,

tão características da revista, me deparo com

quem, sentada em uma mesa na matéria sobre o

Café do Porto? EUZINHA! Que emoção! Eu,

fazendo parte da Estilo! Te mete comigo! Nem

preciso dizer que fiquei mais fã ainda. Mando

beijos pra todos que fazem essa delícia. A edição

de junho veio linda, quente, saborosa e me dei-

xou ligadíssima, como um bom café. Foi um agra-

do na alma e na vaidade. Thanks a lot!

FLÁVIA DENTICE

80945_cartas1.p65 01/09/04, 12:463

Consumo

Ficar inteligente virou moda? Tô meio desconfiada...

O EMPACOTAMENTO DO CÉREBRO

Deve ser porque o mundo nunca esteve tão burro

que ficar inteligente virou moda. Seria uma revanche

contra a ignorância epidêmica da era do telemarketing?

Ou apenas mais um modismo cuja importância não deve

ir além da próxima eleição norte-americana?

Vale a pena observar.

O fato é que os cursinhos de história da arte, antes

restritos a alguns museus e senhoras de meia-idade, se

multiplicaram e ganharam centenas de novos e moder-

nos seguidores.

Outro dia recebi um folheto da recém-inaugurada

Casa do Saber (www.casadosaber.com.br) com a relação

de cursos para o segundo semestre. O repertório de assun-

tos impressiona. O preço também. Por 70 reais, você pode

ouvir a Lygia Fagundes Telles falar durante 2 horas. Se a

verba para incrementar os neurônios for maior (uns 700

reais, 10 aulas), pode-se garantir uma vaga para desven-

dar as Grandes Questões da Humanidade ou estudar

Maquiavel e outros Maquiavélicos ou ter uma Introdução

à Música Erudita do século 20. Chovem interessados.

Hum. Sendo bastante cínica, tô meio desconfiada.

É evidente que cultura e informação nunca fizeram

mal a ninguém, pelo contrário.

Mas não é estranho surgirem tantos neo-eruditos

do dia para a noite?

Todo mundo está fazendo algum tipo de cursinho.

Todo mundo freqüenta café com livraria, acha a FNAC

e a Cultura os melhores lugares para se levar as crianças

no domingo e os shopping centers não param de patroci-

nar encontros de gente que pensa com gente que com-

pra. “Ai, eu preciso ver o Picasso.” Ouvi isso de pessoas

acostumadas a usar o mesmo tom para se referir ao últi-

mo lançamento da Louis Vuitton.

Para usar um jargão comum ao universo da moda,

o significado de estudar Mitologia Grega, por exemplo,

parece estar mais associado a uma idéia de consumo

vintage.

Assim como os vestidos, o pensamento usado, de

outras épocas, antigo, seria o último must em assuntos

de coquetel. Nada mais profundo que isso.

Tô radicalizando? Pode ser.

Mas num momento da História em que se cultua

tanto a fama instantânea e as modas passageiras, acho

que vale a pena manter um certo senso crítico.

Que venham os cursos que prometem conteúdo em

10 aulas.

Mas que se aprimorem também os sentidos intuiti-

vos e a capacidade criativa, sem os quais não existe pos-

sibilidade de se levar uma conversa inteligente e muito

menos de se pensar algo que valha a pena.

Acabo de ler que o Houaiss e o Aurélio dividem o

mercado na guerra dos minidicionários.

Guerra dos minidicionários?

Hum. Mas pode ser que eu esteja enganada.

T E T Ê P A C H E C O

TETÊ PACHECO É PUBLICITÁRIA

12 Estilo Zaffari

80945_consumo1.p65 02/09/04, 10:361

Cesta básica

A Padre Chagas, uma das mais charmosas ruas de Porto

Alegre, ganhou em julho uma nova atração que já está

fazendo o maior sucesso: a pizzaria À Lenha. O restaurante,

bastante conhecido pelos freqüentadores da praia de

Atlântida, abriu as portas de sua primeira franquia na

capital gaúcha, sob o comando de Gustavo Piccinini.

O menu é totalmente diferenciado, combinando sabores

populares e receitas mais requintadas, além de temperos

frescos, ingredientes de primeira qualidade e uma deliciosa

massa caseira. Cada detalhe da confecção das pizzas pode ser

apreciado pelos clientes, pois o forno à lenha, localizado no

andar inferior da casa, fica à vista de todos. Entre as

novidades do cardápio está a irresistível pizza Padre Chagas,

elaborada com presunto de Parma, e a Pio Gelatto, feita com

sorvete de creme, doce de leite, maçã e canela. Outro

diferencial da casa está em seus ambientes acolhedores e

confortáveis, decorados com cores fortes. Nesse astral

“caliente”, qualquer opção será um convite ao deleite e aos

prazeres da boa mesa.

FERNANDA DOERING, JORNALISTA

Pizzas com estilo

NESTA SEÇÃO VOCÊ ENCONTRA DICAS

E SUGESTÕES PARA CURTIR

O DIA-A-DIA E SE DIVERTIR DE VERDADE:

MÚSICA, CINEMA, LUGARES, COMIDINHAS,

OBJETOS ESPECIAIS, PASSEIOS,

COMPRAS. BOM PROVEITO

FOTOS: CRISTIANO SANT’ANNA

80945_cestabasica3.p65 02/09/04, 08:021

Cesta básica

Com cara de “casa da vovó”, a loja-atelier Composé

está localizada na Bordini, 841, quase esquina com a

Eudoro Berlink. Cursos de patchwork, de bonecas de

pano e de pedrarias movimentam o segundo andar,

enquanto que, no térreo, estão à venda materiais para

a confecção dos artesanatos e também trabalhos já

prontos. Aquelas colchas de retalhos que só se vêem em

revista de decoração americana são um exemplo do que

é possível aprender a fazer lá mesmo. A linha de

bonecas inclui figuras decorativas de parede, pesos de

porta e móbiles. As proprietárias, Ângela Leão Tosca

e Cristina Pilla do Valle, costumam fazer viagens de

atualização, trazendo novidades em estampas, técnicas

e acessórios para acabamentos. Quem gostaria de

aprender mas não se acha habilitado, vai descobrir lá

que existem muitos recursos modernos de modelagem

e montagem, capazes de revelar talentos. Para aqueles

que amam o patchwork e que ainda assim acham mais

seguro ficar longe de tesouras e agulhas, a loja oferece

mil sugestões de decoração e presentes. Fone: 333.3666

RUZA AMON, JORNALISTA

Mundo encantado

Mergulhando novamente nas peculiaridades dalinguagem dos gaúchos, o escritor Luís AugustoFischer lançará, em parceria com o professor IuriAbreu, o livro “Gauderiadas – a sabedoria gaúchaem frases definitivas”. Trata-se de uma reunião dediversas frases comparativas, características dasabedoria popular gauchesca, como a utilizada notítulo desta nota. Mais alguns exemplos: “faceirocomo gordo de camiseta”, “mais lustroso quetelefone de açougueiro”, “forte como sapato depadre”. As frases foram reunidas, divididas portemas e comentadas pelos autores em um textoleve e muito bem-humorado. Foram utilizadoscomo fonte de pesquisa diversos clássicos daliteratura gaúcha, como “O Analista de Bagé”,de Luis Fernando Verissimo, “Rapa de Tacho”,de Apparicio Silva Rillo, “Contos Gauchescose Lendas do Sul”, de Simões Lopes Neto,e “O Tempo e o Vento”, de Erico Verissimo, entreoutros. O lançamento está previsto para setembro.CAMILA KIELING, JORNALISTA

UM LIVRO BOM

COMO BEIJO DE PRIMA

FOTO: FLÁVIA DE QUADROS

O ESCRITOR LUÍS AUGUSTO FISCHER

80945_cestabasica3.p65 01/09/04, 20:523

Cesta básica

Quem quiser se profissionalizar no preparo de pratos

típicos da Itália agora tem uma excelente opção.

A primeira escola do mundo a ensinar gastronomia

exclusivamente italiana fora do país europeu está bem

pertinho de nós, na Serra gaúcha. O estabelecimento

foi inaugurado no dia 10 de agosto, em Flores da

Cunha, em uma parceria entre a Universidade de

Caxias do Sul e o Italian Culinary Institute for

Foreigners (ICIF). A data é dedicada a São Lourenço,

santo dos cozinheiros e também padroeiro da escola.

Além de oferecer especialização em massas e risotos,

os cursos dispõem de uma sala especial para a

degustação de vinhos nobres. As opções serão várias:

Master em Gastronomia, formação de chef de cozinha

e diversos cursos temáticos de curta duração, abertos

ao público em geral. A escola oferece uma infra-

estrutura completa aos alunos: laboratórios de

panificação, confeitaria, sorvetes, massas frescas e

cozinhas fria e industrial, além de um anfiteatro, para

aulas de demonstração. Tudo isso com o objetivo de

criar um verdadeiro centro de referência de alta

gastronomia italiana na América Latina.

RAFAEL BECK, JORNALISTA

Escola de

Gastronomia

DESIGN GAÚCHO

E CONTEMPORÂNEO

Eduardo Machado é gaúcho, natural de Pelotas.Formado em arquitetura, há cinco anos optou pordedicar-se à área de design. Hoje, ele tem um atelier eshowroom em Porto Alegre, onde cria os mais variadosobjetos – cerca de 80 tipos de peças – utilizandoalumínio fundido. São duas linhas de produtos: aCollezione Reciclado e a Brasil Ofício. A primeirainclui objetos de decoração para casa, como travessas,vasos e suporte para velas; já a série Brasil Ofícioapresenta produtos para escritórios, elaborados commetatrilato: porta-canetas, suporte para cartões, porta-correspondência. O showroom fica na rua JardimCristoffel, 205, bairro Moinhos de Vento.F.D., JORNALISTA

80945_cestabasica3.p65 31/08/04, 23:002

Cesta básica

Quem gosta de combinar a tranqüilidade encontra-

da em uma cidade do interior com a adrenalina

proporcionada pelos esportes radicais já tem

endereço certo. Hospedar-se na Pousada De Rossi

pode ser uma verdadeira aventura. Apesar do

ambiente bastante familiar e das programações

caseiras, o lugar oferece diversas opções de lazer,

incluindo uma inesquecível trilha ecológica de jipe.

O passeio é pura descontração. Além de se reviver a

trajetória dos colonizadores do município de

Antônio Prado, é possível apreciar uma das mais

deslumbrantes paisagens da serra gaúcha, com

direito a um almoço típico no Belvedere Valente,

apreciando a magnífica vista do Rio das Antas. Mas

o grande destaque é, sem dúvida, a emoção propor-

cionada pelas trilhas feitas nas estradas da região.

O município é conhecido por sediar,

freqüentemente, raids de jipe pelos lamacentos

caminhos, muitos deles intransitáveis com veículos

convencionais. Por isso, é importante preparar o

espírito e usar roupas confortáveis. A diversão e a

poeira são garantidas. O telefone da Pousada De

Rossi é (54) 293-1771.

FERNANDA DOERING, JORNALISTA

GUATEMALA:

COM MUCHO GUSTO

A colorida e vibrante Guatemala, que

enfeita 16 páginas desta edição da Estilo Zaffari,

pode ser vista também na mostra fotográfica

“Com Mucho Gusto, Guatemala” de Cris Berger.

A partir de 9 de setembro, visite o Pub Barbazul

(rua Itaqui, 57, Porto Alegre) e confira de perto

os encantos da civilização maia. Palmas à Copa

Airlines, Instituto Guatemalteco de Turismo,

Process Laboratório Fotográfico, Gráfica

Impresul, Autêntica Visual, Overtech Computer

Solution e ao designer João de Lucena, que

viabilizaram este projeto.

CRIS BERGER, REPÓRTER E FOTÓGRAFA

Emoção e

adrenalina

80945_cestabasica3.p65 31/08/04, 23:014

Cotidiano

Os intervalos também têm sua função

DOLCE FAR NIENTE

Uma amiga voltou de férias dias atrás. Não viajou para

nenhum lugar longínquo e extraordinário, simplesmente passou

três semanas na sua casa na serra, longe de tudo e de todos.

Quando nos encontramos, falei que ela parecia dez anos mais

moça – esses dias devem ter sido realmente serenos. Ela confir-

mou. Disse que fazer nada era tudo de que ela precisava. Mas

que sentia uma culpa vulcânica.

Culpa, imagina. Ela se sentia culpada por ter dado este

tempo a si mesma, por ter se conectado com as coisas que real-

mente importam nesta vida. Quem disse que isso é fazer nada?

No último verão, passei um tempo quase indecente de

férias, fora da cidade, sem trabalhar. Tirei uma infinidade de dias

para fazer o que se costuma chamar de nada. Mas só eu sei

quanta coisa eu fiz.

Nesse longo período de ostracismo, dei uma adiantada num

tapete que eu andava bordando. Caminhei, somando todos os

dias, uns 200 quilômetros. Li Pedro Juan Gutierrez, Amós Oz,

Nelson Rodrigues. E, de Caras a Bravo, tracei todas as revistas

disponíveis nas bancas. Tirei sestas. Escrevi uns poemas. E desfru-

tei ao máximo da companhia das minhas filhas. E o mais grave:

sem um pinguinho desta tal culpa vulcânica.

É uma rotina peculiar se comparada com a que a gente

enfrenta no dia-a-dia, com horários, trânsito, reuniões, compro-

missos e encrencas. Acho bem tentadora esta agitação urbana, o

telefone tocando e trazendo ora problemas, ora soluções. A gente

até sente falta quando se afasta, pois é no olho do furacão que

temos a sensação de existir. Férias são como uma não existência,

um intervalo da vida.

Só que, contrariando as expectativas, os intervalos têm sua

função. Enquanto eu fazia nada vezes nada nas minhas últimas

férias, passei horas intermináveis pensando sobre família, amor,

amizade, saúde, ultrapassando a pieguice dessas palavras e indo

fundo em busca do que elas representam de verdade. Pensei

muito também no que significa sentir-se em casa, e descobri que

sentir-se em casa é deixar os outros em paz e ficar em paz consigo

mesmo: uma sensação quase uterina.

Enquanto eu não fazia nada, me lembrei de um monte de

gente de que eu gosto, e de como também vale gostar de longe,

gostar através da memória e da saudade.

Fiz alguns planos enquanto não fazia nada, e você sabe:

resolver fazer alguma coisa às vezes dá mais prazer do que fazê-la

realmente. Só de resolver fazer, já me sentia realizada.

Como não estava fazendo nada mesmo, aproveitei para

fazer menos ainda: não me sentia na obrigação de ir para a beira

da praia só porque tinha sol, não me sentia na obrigação de escre-

ver só porque tinha um laptop à mão. Não me sentia nem mesmo

na obrigação de evitar coisas que desprezo: via o Big Brother

quase todos os dias. Devo, não nego, pago quando puder.

Isso tudo é passado. Hoje estou imersa nesta roda-viva, na

ciranda incessante de obrigações. Faço parte da turma dos que

são produtivos e estão sempre atrasados para alguma coisa. Tudo

bem, é o meu hábitat natural, me adapto bem ao caos. Mas sinto

falta daqueles dias em que eu não fazia nada, nadinha, e me

pareciam igualmente intensos.

M A R T H A M E D E I R O S

MARTHA MEDEIROS É ESCRITORA

22 Estilo Zaffari

80945_cotidiano1.p65 01/09/04, 16:2312

Alimento

Pão

80945_alimento batata1.p65 31/08/04, 22:502

P O R B E A T R I Z G U I M A R Ã E S

F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O

terrada

80945_alimento batata1.p65 31/08/04, 22:513

AlimentoAlimento

80945_alimento batata1.p65 31/08/04, 22:514

As origens

A batata – um tubérculo originário do Peru – foi des-

coberta pelos espanhóis por volta de 1536, embora já fos-

se conhecida há muitos anos pelos incas, que a utilizavam

não só como alimento, mas também como planta medici-

nal e nos seus rituais religiosos. Foi enviada em seguida

para a Europa, mas a sua popularização só ocorreu muito

mais tarde. Havia um certo preconceito com relação à ba-

tata, pois era considerada por alguns como venenosa, cau-

sadora de lepra, e por outros, apenas uma ração própria

para os animais, especialmente para os porcos.

Ainda no século 16, é possível que a batata tenha

sido levada à Europa pelos ingleses, que a utilizavam como

planta ornamental. A novidade vinda da América do Sul

acabou se tornando um alimento mais popular somente

por volta dos séculos 17 e 18, e foi fundamental para evitar

a fome em muitos dos países europeus, como Irlanda, In-

glaterra, Holanda, Alemanha e tantos outros, contribuin-

do, inclusive, para o aumento demográfico naquele conti-

nente.

Frederico, o Grande, rei da Prússia, chegou a obrigar

seus súditos a plantar e a comer batatas, como forma de

evitar a fome. Ela era chamada de “o pão dos pobres”, pois

muitas vezes substituiu outros alimentos, inclusive o pão.

Parmentier

Mas um agente decisivo para a popularização da ba-

tata na França – e na Europa como um todo – foi o agrô-

nomo e farmacêutico francês Antoine Augustin Parmentier

(1737-1813), que depois de viver numa prisão na Prússia –

onde eram servidas batatas aos prisioneiros – acabou por

interessar-se pelo tubérculo, desenvolveu estudos e tornou-

se um verdadeiro entusiasta do seu consumo.

Num jantar em sua casa, Parmentier serviu uma va-

riedade de pratos feitos com batatas. Dentre os convidados

havia pessoas da maior importância e influência, como Ben-

jamin Franklin, cientista e empreendedor americano, que

estava na França para entendimentos com o Rei Luís XVI;

Lavoisier, o fundador da química moderna; o filósofo e ma-

temático d’Alambert e o aristocrata sueco Axel de Fersen,

amante da Rainha Maria Antonieta.

Com isso, Parmentier conseguiu introduzir definiti-

vamente a novidade na corte, e depois ocorreu a difusão

por toda a França. Atualmente, há inúmeros pratos que

levam o seu nome, como homenagem ao grande

incentivador do consumo da batata na dieta alimentar eu-

ropéia.

Batata inglesa ou irlandesa?

Ao final do século 18, a Irlanda dependia quase que

unicamente da batata como alimento base de sua dieta.

Calcula-se que cada irlandês comia, em média, 10 batatas

por dia. O cultivo da batata na Irlanda cresceu rapidamen-

te, pois não atendia apenas o consumo humano – servia de

ração também aos animais de criação, que produziam ovos,

leite e derivados.

Em 1840, e por três safras seguidas, a plantação de

batatas da Irlanda foi dizimada por uma terrível praga.

O FRANCÊS PARMENTIER FOI O GRANDE DIVULGADOR

DA BATATA EM TERRITÓRIO EUROPEU, NO SÉCULO 18

Estilo Zaffari 27

80945_alimento batata1.p65 31/08/04, 22:515

A destruição das plantações teve um impacto imediato,

matando 1 milhão de irlandeses de fome e fazendo com

que quase 2 milhões deles emigrassem para os Estados Uni-

dos. Nessa mudança, também levaram para o novo país a

paixão pelas batatas.

São os imigrantes irlandeses os principais

incentivadores do consumo de batata nos Estados Unidos.

Ela continuou seguindo sua trajetória de alimento subs-

tancial e indispensável. Seu uso se expandiu não só pela

Europa, alcançou outros continentes, tornando-se um ali-

mento básico tanto para populações pobres, como para os

mais exigentes, já que a batata pode ser utilizada numa

infinidade de pratos e receitas.

Um jantar com Picasso

Numa passagem de Memórias de uma Moça Bem Com-

portada, Simone de Beauvoir relata a sua alegria ao saber

que Picasso viria jantar em sua casa. Eram tempos difíceis,

em plena Segunda Guerra, e a escassez de alimentos na

Europa – e especialmente na França – era extrema.

A maioria da população vivia de migalhas, e muitos passa-

ram fome e necessidades. Simone, então, recorre ao mer-

cado paralelo e paga uma pequena fortuna por uma bata-

ta. Iria cozinhá-la à noite. Para receber Picasso, sopa de

batata. Apenas água e uma batata. Era um banquete.

Van Gogh

Um dos quadros mais famosos do grande pintor ho-

landês Van Gogh chama-se “Os comedores de batatas”,

pintado em 1885. Nessa fase, ele queria reproduzir a vida

simples dos camponeses, mostrando que as mesmas mãos

que comiam aquele alimento também o plantavam e cava-

vam a terra para colhê-lo.

A Holanda é uma das maiores consumidoras e pro-

dutoras de sementes de batata do mundo. Um de seus pra-

tos mais típicos é o arenque com cenouras e batatas, que

eles comem uma vez ao ano, pelo menos, para celebrar

uma data nacional.

Ao vencedor, as batatas

Em Quincas Borba, Machado de Assis ironiza a natu-

reza humana como sendo mesquinha, destrutiva e impla-

cável para com seus semelhantes. Abaixo, transcrevemos

um dos pensamentos do personagem Quincas Borba, cuja

última frase ficou mais conhecida que a própria obra:

“Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas.

As batatas apenas chegam para alimentar uma das tribos,

que assim adquire forças para transpor a montanha e ir à

outra vertente, onde há batatas em abundância; mas, se as

duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, não che-

gam a nutrir-se suficientemente e morrem de inanição. A paz,

nesse caso, é a destruição; a guerra é a conservação. Uma das

tribos extermina a outra e recolhe os despojos. Daí a alegria da

vitória, os hinos, aclamações, recompensas públicas e todos os

demais efeitos das ações bélicas. Se a guerra não fosse isso, tais

demonstrações não chegariam a dar-se, pelo motivo real de que

o homem só comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajo-

so, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza

uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou com-

paixão; ao vencedor, as batatas”.

A CÉLEBRE FRASE DE QUINCAS BORBA: “AO VENCIDO,

ÓDIO OU COMPAIXÃO; AO VENCEDOR, AS BATATAS”.

28 Estilo Zaffari

80945_alimento batata1.p65 31/08/04, 22:516

A BATATA É UM ALIMENTO RICO EM CARBOIDRATO, SAIS MINERAIS E

VITAMINAS, É NUTRITIVA E AJUDA O CORPO A MANTER CALOR. SEU PRE-

PARO É FÁCIL E ELA PODE SER UTILIZADA DE DIVERSAS FORMAS, EM

SOPAS, ASSADOS, FRITURAS, ETC., E ATÉ SE PODE OBTER ÁLCOOL DE

SUA FERMENTAÇÃO.

A BATATA É O 4º

ALIMENTO MAIS CONSUMIDO NO MUNDO, FICANDO

ATRÁS APENAS DO TRIGO, DO ARROZ E DO MILHO. SEU CONSUMO NO

BRASIL É CONSIDERADO BAIXO EM RELAÇÃO A OUTROS PAÍSES: DE

12 A 13 KG POR PESSOA AO ANO, ENQUANTO QUE A MÉDIA MUNDIAL

CHEGA A 60 KG. A PRODUTIVIDADE DE BATATAS NO BRASIL AINDA É

PEQUENA, DE APENAS 15 TONELADAS POR HECTARE, ENQUANTO QUE

NA EUROPA CHEGA A 40 TONELADAS E NA ARGENTINA FICA ENTRE 20

E 30 TONELADAS.

ACONSELHA-SE COZINHAR AS BATATAS COM CASCA, PARA NÃO PER-

DEREM AS PROPRIEDADES DURANTE O SEU PREPARO. AS BATATAS

ESVERDEADAS E BROTANDO NÃO DEVEM SER CONSUMIDAS, POIS PO-

DEM CAUSAR INTOXICAÇÕES, CÓLICAS, GASTRITES, ETC.

TAMBÉM SE PODE USAR A BATATA CRUA PARA DORES DE ESTÔMAGO

E PROBLEMAS INTESTINAIS. SUCO DE BATATA CRUA, TOMADO EVENTUAL-

MENTE, PODE COMBATER ÚLCERAS DE ESTÔMAGO, DUODENO E INTESTI-

NOS. A BATATA CRUA RALADA, APLICADA NO LOCAL, PODE COMBATER

INFECÇÕES, PICADAS DE INSETOS E IRRITAÇÕES DA PELE.

PROPRIEDADES DA BATATA

80945_alimento batata1.p65 31/08/04, 22:527

80945_alemaes.p65 31/08/04, 22:462

Os primeiros grupos de alemães chegaram ao Rio Gran-

de do Sul por volta de 1824 e se instalaram na região que

hoje é conhecida por São Leopoldo. Nos primeiros 50 anos

vieram em torno de 30 mil alemães, provenientes das mais

diversas cidades e regiões, como Holstein, Hamburgo,

Mecklemburgo, Hannover, Pomerânia, Palatinado, Westfalia,

Wurtemberger, Boêmia, Renânia, Prússia e Saxônia. Aos

poucos, foram se espalhando pelo Rio Grande.

Na sua maioria, agricultores, mas muitos eram arte-

sãos livres, que não encontravam condições melhores de

vida e de trabalho em suas terras. Entre vários sobreno-

mes, alguns revelavam a profissão. Os Schmidt eram os

ferreiros; os Müller, moleiros; os Schumacher, sapateiros;

os Zimmerman, carpinteiros, originários de uma longa

tradição de artesãos na Europa, desde a Idade Média.

As guerras napoleônicas haviam deixado marcas de

destruição por todo o lado. A propriedade da terra era cada

vez mais difícil na Europa, e as promessas do império brasi-

leiro eram muitas: 50 hectares de terra, vacas, isenção de

impostos, liberdade religiosa, entre tantos outros atrativos.

O governo brasileiro tinha intenção de povoar o Rio

Grande por uma questão estratégica de assegurar a posse

de um território distante, despovoado e ameaçado pelas

constantes invasões dos castelhanos. A economia do sul

era quase que exclusivamente a pecuária – dominada pe-

los portugueses – , fundamental para fornecer gado para o

centro do país. A vinda dos alemães, portanto, poderia

atender a esses interesses.

Para os alemães, que tinham muito pouco a perder, já

que a Europa vivia transformações drásticas que excluíam

populações inteiras, o Brasil era a visão do paraíso: sol,

terras, liberdade e abundância.

Cerveja e chimarrão

Mas o paraíso era o paraíso, e o Brasil, um diamante

bruto, belo e selvagem. Os problemas eram infindáveis e,

para os imigrantes, desconhecidos. Não existiam estradas,

por isso os alemães tiveram que recorrer à navegação flu-

vial – e se tornaram exímios nisso. Populações imensas de

índios desagregados e em decadência, devido à invasão

OS ALEMÃES E O

RIO GRANDE DO SUL:

VIDAS ENTRELAÇADAS,

RIQUEZA CULTURAL

P O R B E A T R I Z G U I M A R Ã E S I L U S T R A Ç Õ E S N I K

Estilo Zaffari 31

80945_alemaes.p65 31/08/04, 22:463

branca, atacavam e saqueavam os vilarejos, em busca de

comida e de defesa do território. Aqui o clima era muito

diferente, quente e úmido, também existiam os bichos, ani-

mais selvagens que destruíam as plantações, ameaçavam

pessoas, havia o abandono do governo, falta de ferramen-

tas e de suporte para a agricultura, problemas de comuni-

cação. Tinha-se a mata desconhecida e assustadora, fonte

de medo e fascínio, que foi sendo domada pouco a pouco,

condição inevitável com a chegada do europeu. Tudo ti-

nha que ser feito do nada: do chão batido e da madeira

bruta se ergueram as casas, a escola, a igreja, e dali a lavou-

ra e a criação. E depois vieram as pequenas indústrias, as

chamadas “de fundo de quintal”.

A vinda dos alemães, ao longo do século 19, trouxe

uma nova configuração cultural para o Rio Grande e foi

responsável por uma identidade que nos diferencia do resto

do país até hoje. Assim, numa combinação quase impossí-

vel, a cultura germânica se enlaça com a portuguesa, mais

bugra que lusitana, para construir aqui o seu próprio paraíso.

Alargando a roda de chimarrão, trouxeram a cerveja, a mú-

sica e a alegria. Vieram também contar seus “causos” e dei-

xaram para sempre sua marca em terras meridionais.

Alemão batata

“Alemão batata, come queijo com barata...” – ecoa o

dito popular e preconceituoso na memória coletiva dos des-

cendentes de alemães que aqui viviam. Uns chegaram mais

cedo, outros mais tarde, mas a verdade é que o Brasil é um

país feito de imigrantes, que por uma razão ou outra deixa-

ram seus países e vieram arriscar a sorte num lugar distan-

te. São portugueses, espanhóis, italianos, árabes, polone-

ses e tantos outros que tiveram o mesmo começo pobre e

árduo, falando errado, usando tamancos, trabalhando muito

numa terra fértil que nos permitiu chegar aos tempos mais

confortáveis de hoje.

Pois o alemão batata virou filósofo, arquiteto, músico,

escritor, empresário, esportista, líder político, cientista...

Quando se fala na contribuição dos alemães no sul

do Brasil, pensamos logo na eficiente indústria criada aqui,

que vai desde a alimentícia até uma siderúrgica como a

Gerdau, que é uma referência internacional, além da in-

dústria do vestuário, couro, calçados, de peças e equipa-

mentos diversos, e tantas outras. Mas a grande contribui-

ção dos alemães é muito mais abrangente e profunda do

que podemos pensar inicialmente.

Arte e cultura

O Rio Grande do Sul, graças à influência alemã, in-

centivou o surgimento de filósofos, e dentre estes pode-se

destacar Gerd Borheim, que também foi um dos maiores

críticos de teatro no Brasil – dirigiu Esperando Godot, com

a saudosa Lilian Lemmertz, – e Paulo José, nos finais dos

anos 50, no Centro de Arte Dramática da UFRGS. Temos

escritores como Lya Luft, que nos seus primeiros romances

traz a atmosfera tensa vivida numa família tipicamente ale-

mã, porém com uma temática universal.

Temos uma tradição na música – não só instrumen-

tal, mas os corais, tão populares em todo o Estado, e que

são bastante típicos daqui. Nas artes, de um modo geral, a

contribuição dos alemães e de seus descendentes tem sido

vastíssima.

O auge da arquitetura no Rio Grande foi nos anos 20

e 301

, justamente quando está entre nós o grande arquite-

to alemão Theo Wiedersphan, nascido em Dresden, che-

Sabor

A VINDA DOS ALEMÃES TROUXE UMA NOVA CONFIGURAÇÃO

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gando aqui em 1908. Wiedersphan revoluciona a arquite-

tura gaúcha – ainda com uma forte influência lusitana –

criando a Escola de Ofícios, em 1914, cujo programa man-

tinha semelhanças com a da Bauhauss alemã, fundada mais

tarde em Weimar.

Esporte e beleza

Theo Wiedersphan, por meio da empresa Rudolf

Ahrons, será o responsável pela criação dos mais belos pré-

dios em Porto Alegre, como a Delegacia Fiscal, hoje sede do

Margs, Correios e Telégrafos, hoje Memorial do RS. Além

disso, criou o prédio do Tumelero, o dos Moinhos Chaves

Barcelos, na Voluntários da Pátria, do Edifício Bier Ulmann,

do Santander Cultural, antigo Banco do Comércio, a sede

do Clube Sogipa, a Cervejaria Bopp, depois Brahma, hoje

Shopping Total, entre inúmeros outros. Um dos seus pré-

dios mais conhecidos é o do Hotel Majestic, que atualmen-

te abriga o Centro de Cultura Mario Quintana.

Com a chegada da Segunda Guerra Mundial houve,

também no Brasil, uma animosidade intensa contra os ale-

mães. Wiedersphan também foi discriminado, seu traba-

lho passou a ser desconsiderado, assim como tudo que re-

fletisse a Alemanha.

Os alemães foram pioneiros em introduzir a prática

esportiva por aqui. Foram eles os primeiros a criar os clu-

bes de regatas, de ginástica, times de futebol, tênis, bolão e

tantos outros. Dessa forma introduziram o saudável hábito

dos exercícios físicos e da competição esportiva.

Da comunidade alemã surgiu um dos poucos presi-

dentes da República originários das camadas pobres. Ape-

sar de não ter sido eleito democraticamente, e de ter exer-

cido o poder durante a ditadura militar, Ernesto Geisel,

natural de Estrela, foi muito pobre, mas um aluno aplica-

do e brilhante, e exerceu o mais alto cargo público do

país com um projeto de desenvolvimento que não conse-

guiu ser igualado depois dele.

No começo da década de 70, quando ninguém no

Brasil se preocupava com isso, José Lutzemberguer come-

ça a falar em proteção ambiental, incentivando a criação

de organizações ambientalistas, fazendo do Rio Grande do

Sul um dos estados mais atuantes nessa área. Durante toda

a sua vida difundiu a prática ambientalista no Brasil. Coe-

rente e íntegro, foi enterrado, no seu rincão, apenas com

um lençol cobrindo seu corpo.

Por causa dos alemães, também as nossas páscoas e

os nossos natais são diferentes dos do resto do Brasil.

Quem criaria tantas delicadezas como os ninhos de Pás-

coa, os ovos pintados à mão – e os enfeites natalinos, os

cartões-calendário que são feitos na época do Natal, além

das canções, os corais? E os biscoitos de mel, então? E as

schmiers? As schmiers só existem por aqui. São a grande

invenção da doçaria gaúcha, criada pelos nossos colonos

alemães.

E finalmente, para brilhar em mais uma área que ain-

da não tinha sido explorada, a beleza e a graça de Gisele

Bündchen impressionam e encantam o mundo todo. Ela

não é apenas bonita, tem personalidade forte, determina-

da, e sem dúvida é bastante madura para a sua idade. Em-

bora de origem alemã, dos quatro costados, Gisele tem uma

espontaneidade bem brasileira, tem a franqueza dos gaú-

chos, e pode-se dizer que ela é a melhor representação da

presença dos alemães no Brasil.

1 Ver Günter Weimer, Arquitetura da Imigração Alemã no RS, Ed. da UFRGS, 1983

CULTURAL, UMA IDENTIDADE PARA O RIO GRANDE DO SUL

80945_alemaes.p65 31/08/04, 22:465

Sabor

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Passe azeite e sal em volta dos cortes de pato. Leve-os a uma

grelha bem quente e deixe por 5 a 8 minutos aproximada-

mente de cada lado. Enquanto isso, corte as maçãs em oito

fatias, mantendo as cascas. Coloque as maçãs em água com

suco de limão, para evitar que fiquem escuras. Aqueça a frigi-

deira e coloque a manteiga. Retire as maçãs da água, seque-as

e ponha na frigideira. Deixe dourar, ponha o açúcar, a canela

e depois de alguns minutos acrescente o vinho. Mexa as ma-

çãs até reduzir o vinho. Retire os filés da grelha, corte-os em

fatias diagonais e sirva junto com as maçãs. A carne do pato

deve estar rosada para que não fique muito seca.

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Amarre bem o tatu com um barbante ao longo da peça.

Numa panela grande, ponha o azeite e deixe o tatu fritar

em todos os lados. Acrescente o bacon, e depois a cebola.

Deixe dourar e acrescente os temperos e a cerveja. Abai-

xe o fogo, tampe a panela e deixe cozinhar lentamente.

Adicione água quente, caso precise. Mais ao final, ponha

os tomates e o sal. Deixe cozinhar bem até a carne ficar

macia. Corte em fatias finas, e sirva com purê de batatas.

1 PATO LIMPO E CORTADO EM COXAS,

SOBRECOXAS E PEITOS (DESOSSADOS)

AZEITE / SAL / 4 MAÇÃS VERDES

1 COLHER (SOPA) DE MANTEIGA

2 COLHERES (SOPA) DE AÇÚCAR

100 ML DE VINHO BRANCO

CANELA EM PAU

PATO GRELHADO

COM MAÇÃS NO VINHO

1 TATU, OU MÚSCULO

1 CEBOLA

TOMILHO FRESCO

1 FOLHA DE LOURO

100 G DE BACON PICADO

AZEITE

300 ML DE CERVEJA PRETA DOCE

2 TOMATES SEM SEMENTES, PICADOS

CARNE DE PANELA NA CERVEJA

PRETA E PURÊ DE BATATAS

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Sabor

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Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Misture a manteiga com um pouco de mostarda e passe

nas fatias de pão. Monte os sanduíches com as fatias do

lombo e corte em 4 partes. Acrescente o pepino fatiado,

tomate e ovos de codorna cortados ao meio. Numa frigi-

deira aqueça o azeite, doure bem a cebola, adicione sal, os

grãos de zimbro machucados e, por fim, coloque a cerveja

aos poucos até reduzir o molho. Corrija o tempero e colo-

que um pouco sobre cada sanduíche. Sirva em seguida.

SANDUÍCHE ALEMÃO

1 PÃO PRETO EM FATIAS

1 LOMBO DE PORCO FATIADO

PEPINOS EM CONSERVA

FATIAS DE TOMATE FRESCO

OVOS DE CODORNA COZIDOS

1 CEBOLA PICADA

1 COPO DE CERVEJA PRETA DOCE

3 GRÃOS DE ZIMBRO

1 COLHER DE AZEITE

SAL

MANTEIGA

MOSTARDA FORTE

APFELSTRUDEL

MASSA

250 G DE FARINHA DE TRIGO PENEIRADA

1 PITADA DE SAL / 1 OVO BATIDO

174 ML DE ÁGUA MORNA (MENOS DE 1 XÍCARA)

65 G DE MANTEIGA DERRETIDA

RECHEIO

70 G DE FARINHA DE ROSCA CASEIRA

1 KG DE MAÇÃS, SEM CASCA E FATIADAS

SUCO DE LIMÃO, SOBRE AS MAÇÃS

100 G DE AÇÚCAR / 100 G DE PASSAS DE UVA

50 G DE NOZES PICADAS / CANELA EM PÓ

1 COLHER DE AÇÚCAR CONFEITEIRO PARA COBRIR

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Faça um círculo com a farinha e ponha o sal, o ovo e a água no

meio, misturando tudo com cuidado até formar uma massa lisa.

Divida em duas partes, e deixe a massa repousar, coberta, por

30 minutos. Com o rolo, abra bem a massa sobre uma toalha de

algodão para que fique bem fina. Pincele a massa com mantei-

ga, ponha a farinha de rosca, as maçãs, as passas, o açúcar, as

nozes e a canela em pó. Enrole o strüdel pincelando-o com o

restante da manteiga. Leve-o a uma forma untada e asse em

forno pré-aquecido a 200º

C por cerca de 50 minutos ou até

ficar dourado. Antes de ficar pronto, pincele mais uma vez com

manteiga e ponha o açúcar confeiteiro por cima. Obs.: rende

dois apfelstrudels.

Estilo Zaffari 37

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Sabor

4 CHULETAS DE PORCO

1 COPO DE VINHO BRANCO SECO

SAL

AZEITE

1 COLHER DE FARINHA DE TRIGO

2 CEBOLAS CORTADAS EM RODELAS FINAS

1 PITADA DE AÇÚCAR

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Tempere as chuletas com sal e polvilhe um pouco de fari-

nha de trigo sobre elas. Aqueça uma frigideira com azeite

e frite a carne por uns 5 minutos de cada lado até dourar.

Retire da frigideira e reserve. Enquanto isso, na mesma

frigideira ponha a cebola, o sal e deixe dourar bem. Acres-

cente o açúcar para dar brilho. Adicione o vinho aos pou-

cos e deixe reduzir bem. Sirva sobre as costeletas junto

com o repolho roxo.

CHULETAS DE PORCO COM REPOLHO

ROXO E CEBOLAS DOURADAS

500 G DE ESCALOPES DE VITELA OU FILÉ MIGNON

1 LIMÃO / 100 G DE FARINHA DE TRIGO

SAL / PÁPRICA / 2 COLHERES DE MANTEIGA

½ COPO DE VINHO BRANCO SECO

200 G DE COGUMELOS FRESCOS (CORTADOS

EM FATIAS NÃO MUITO FINAS)

1 CEBOLA PICADA / NOZ-MOSCADA

100 ML DE NATA FRESCA

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Deixe os escalopes no suco de limão por 30 minutos. Se-

que-os em papel-toalha e passe na farinha, sal e páprica.

Numa frigideira frite os escalopes por 3 a 4 minutos de cada

lado, acrescentando, então, o vinho. Depois de ferver, deixe

os escalopes por mais 2 minutos e retire da frigideira, man-

tendo-os aquecidos. Adicione mais manteiga na mesma fri-

gideira e ponha a cebola, deixando-a dourar, e depois os co-

gumelos. Deixe por uns 5 minutos e adicione, então, a nata.

Corrija o sal, e sem deixar ferver misture bem o molho e

ponha sobre os escalopes. Sirva em seguida.

RAHMSCHNITZEL

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Sabor

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FILÉ COM NATAS E PIMENTA ROSA

4 FILÉS – 600 G DE CARNE BOVINA

1 COLHER (SOPA) DE ÓLEO

3 COLHERES (SOPA) DE CONHAQUE

200 ML DE CALDO DE CARNE

100 G DE NATA FRESCA / SAL

2 COLHERES (SOPA) DE MANTEIGA

1 COLHER (SOPA) DE PIMENTA ROSA

CEBOLINHA FRANCESA (CIBOULETTE)

MASSA CASEIRA – SPAETZLE

450 G DE FARINHA PENEIRADA

4 OVOS BATIDOS

SAL

NOZ-MOSCADA

1 COLHER DE NATA, OU KIRSCHMIER

RASPA DE LIMÃO

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Tempere e frite os filés, retire da frigideira e mantenha-

os aquecidos. Na mesma frigideira, adicione o conhaque

e reduza. Depois, coloque o caldo de carne e reduza até a

metade. Depois de reduzir o caldo, acrescente a nata mis-

turando bem, até atingir a consistência desejada. Ponha

por fim a manteiga, a cebolinha e o sal. Cubra os filés

com esse molho e acrescente a pimenta rosa por cima.

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Faça um círculo com a farinha e misture todos os outros

ingredientes – menos a raspa de limão – aos poucos, até

formar uma massa homogênea. Ponha água numa panela

e leve ao fogo. Depois que ferver, acrescente o sal. Divida

a massa em três ou quatro partes. Com os dedos, forme

pequenos bocados de massa (como nhoques amassados)

e jogue na panela de água fervendo. Quando subirem à

superfície, retire com uma escumadeira e coloque num

recipiente com manteiga. Repita a operação até o fim e

finalize com raspa de limão. Geralmente o Spaetzel é ser-

vido como acompanhamento para carnes, por isso use o

molho da carne que for usar.

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Sabor

CUCA - KUCHEN

240 ML DE LEITE MORNO

30 G DE FERMENTO FRESCO PARA PÃO OU UM

SACHET DE FERMENTO BIOLÓGICO INSTANTÂNEO

180 G DE AÇÚCAR / 3 OVOS

600 G DE FARINHA DE TRIGO

SAL / 100 G DE MANTEIGA MACIA

FAROFA - STREUSEL

1 XÍCARA DE FARINHA 120 G

1 XÍCARA DE AÇÚCAR 120 G

CANELA EM PÓ / 60 G DE MANTEIGA

PÃO DE MEL

1 XÍCARA DE MEL / 1 XÍCARA DE AÇÚCAR

1 XÍCARA DE LEITE / 1 XÍCARA DE ÁGUA

5 XÍCARAS DE FARINHA / 1 LIMÃO

1 ENVELOPE DE FERMENTO RÁPIDO

4 COLHERES DE ÓLEO GIRASSOL, OU SIMILAR

2 COLHERES (SOBREMESA) DE CANELA EM PÓ

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Faça um círculo com a farinha, e no meio acrescente o

mel, leite, água, óleo e o restante dos ingredientes, me-

xendo bem. Forme uma massa homogênea e coloque em

forma untada com óleo e farinha. Leve ao forno baixo

(180º

C) e deixe por uns 35 minutos. Deixe esfriar e de-

pois corte em quadrados.

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Desmanche o fermento com um pouco de açúcar e água

morna. Reserve. Num recipiente grande, coloque a farinha

em círculo. No centro, adicione o fermento, o açúcar, a man-

teiga, o sal e os ovos levemente batidos. Misture e acrescen-

te o leite, incorporando a farinha aos poucos, sempre de fora

para dentro, até formar uma massa homogênea. Adicione

mais farinha, se necessário. Amasse bem e reserve por uma

hora. Sove novamente e coloque em duas formas de pão

untadas com óleo. Deixe crescer por mais uma hora, acres-

cente a farofa e leve ao forno quente até ficar pronta, em

torno de 50 minutos a 1 hora. Retire do forno, desenforme,

e deixe a esfriar por cerca de 10 minutos antes de cortá-la.

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Corte os pêssegos em pedaços mantendo os caroços. Colo-

que tudo numa panela com o açúcar e cozinhe em fogo

brando, mexendo até ficar pastoso e escuro. Passe a schmier

por uma peneira para eliminar os caroços. Guarde em

compoteiras.

SCHMIER DE PÊSSEGO

1 KG DE PÊSSEGOS SEM PELE

600 G DE AÇÚCAR CRISTAL

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80945_alemaes.p65 31/08/04, 22:4815

O sabor e o saber

F E R N A N D O L O K S C H I N

PURÊ DE CAMPANHA

Não fossem as batatas nós não estaríamos aqui

Cego pelo brilho do ouro, prata e esmeraldas, Pizarro

morreu sem perceber que a maior riqueza “daquelas Índias”

era o tubérculo pequeno de casca terrosa que os incas cha-

mavam de papas e que ele pensava ser uma espécie vulgar de

trufas: a batata.

Se ao pé dos Andes havia o milho, nos cumes só cres-

cia a batata, um dos principais alimentos do império inca.

Ali, até orações eram dedicadas à batata e a duração de seu

cozimento, a forma usual de se medir o tempo.

Os incas, que desconheciam a roda e a escrita, enten-

diam de batatas: todos os fundamentos de produção e indus-

trialização foram por eles desenvolvidos.

Sem o glamour da trufa, a batata levou quatro séculos

para ser colhida e acolhida pelo mundo. De início, os euro-

peus desconfiaram das batatas, reservando seu consumo aos

animais, apenados e indigentes.

Para os ricos, tal “alimento satânico” tinha uso medici-

nal. Felipe II aplicava rodelas de batatas como anestésico e

enviou a planta ao Papa Pio IV para que tratasse suas crises

de gota.

A batata integrava a desvalorização européia ao novo

mundo. Esta terra “ainda informe” e “molhada do dilúvio”

era de flores sem perfume, árvores sem frutos, pássaros sem

canto. Seus débeis nativos tinham pouca barba e pênis, e ca-

reciam de “ardor pela fêmea”. A anta era o elefante da Amé-

rica e a lhama, um camelo degenerado. A batata, “triste for-

ma de matar a fome”, não podia mesmo ser grande coisa.

Havia razões menos ridículas para a desconfiança. Como

o tomate, a batata pertence a uma família botânica rica em

venenos, a mesma da beladona, datura e tabaco.

Em alguns locais, por razões de saúde, a batata foi proi-

bida. A comparação entre o tubérculo e as lesões da lepra e

tuberculose criou o temor de que causasse doenças.

Havia também a religião. Agricultores evitavam o cul-

tivo, porque a batata, subterrânea como o inferno, não era

citada na Bíblia. Alguns contornavam o problema lavando as

mudas com água benta e fazendo o plantio às sextas-feiras

santas...

Mas o obstáculo maior era a profunda identificação eu-

ropéia com o pão. A batata não combina, compete com o

trigo e, pobre em glúten, não se presta à panificação.

Os incas legaram o tubérculo, mas não o nome: papas é

uma palavra que ficou restrita à hispano-américa. Batata e

potato derivam do nome haitiano da batata-doce, planta sem

parentesco botânico com a batata.

Foi a confusão inicial com a trufa que gerou kartoffel, apalavra alemã para batata, e o nome italiano original de tartufobianco. Já o francês pomme de terre era empregado para muitos

vegetais antes de se ater à batata.

A presença espanhola na América foi tão extrativa, que

quem semeou a batata pelo mundo – a “nova-Espanha” in-

clusive – foram outros povos.

As batatas chegaram ao Brasil pelo caminho mais lon-

go, vieram da Europa junto com a imigração germânica, daí a

expressão “alemão batata”. A contraposição ao trigo ganhou

expressão nos clichês do imigrante alemão – camponês e

“plantador de batata” – com o português – urbano e dono de

padaria.

Foi a França que deu o aval culinário à batata. Antoine

Parmentier era um militar que, prisioneiro durante a guerra

franco-prussiana, tomou gosto pela ração de porcos com que

era alimentado: batatas. Solto no final da guerra, passou a

divulgar sua dieta como a ideal para estômagos desprovidos.

Parmentier convenceu Luis XVI a plantar batatas e a

adotar técnicas pioneiras de marketing: a rainha Maria

Antonieta usava flores de batateiro nos seus chapéus, e sen-

tinelas reais guardavam a plantação durante o dia a fim de

valorizar as plantas e estimular o furto à noite.

Seguindo a política do rei, que acharam por bem deca-

pitar, os revolucionários franceses fizeram de tudo para levar

as batatas ao povo. Ungiram a batata a símbolo republicano e

até transformaram os belos roseirais dos Jardins das Tulherias

em nutritivos batatais.

A batata tornou-se um pilar da alimentação mundial,

principalmente na cuisine des pauvres, aqueles sem pão ou

brioches. Afinal é um vegetal perene, rico em calorias, de cul-

tivo fácil e fecundo: um quintal semeado pode sustentar um

casal, meia dúzia de filhos, uma vaca e uma porca por um ano

inteiro.

Foi como “Comedores de Batatas” que Van Gogh retra-

tou os pobres holandeses, sua primeira grande obra (1885),

onde as faces camponesas imitam a forma e cor de batatas.

O próprio nhoque seria a tentativa de dar batata aos que

não tinham trigo – por isto tradicionalmente servido nos dias

FOTOS: LETÍCIA REMIÃO

44 Estilo Zaffari

80945_sabor e o saber.p65 31/08/04, 23:222

REFOGAR BACON E MUITA CEBOLA PICADA EM AZEITE. ACRESCENTAR PEDAÇOS DE ALHO

E FRITÁ-LOS RAPIDAMENTE. MISTURAR BEM COM BATATAS COZIDAS AMASSADAS EM

PURÊ. LEVAR NOVAMENTE AO FOGO, MEXENDO BEM A MISTURA. PODEM SER

ACRESCENTADOS NATA, TEMPERO VERDE, NOZ-MOSCADA, CASTANHAS E NOZES MOÍDAS

E PASSAS DE FRUTAS. SERVIR ACOMPANHANDO CARNES ASSADAS (LEITÃO, PATO, ETC.)

80945_sabor e o saber.p65 31/08/04, 23:223

O sabor e o saber

F E R N A N D O L O K S C H I N

FERNANDO LOKSCHIN É MÉDICO E GOURMET

[email protected]

29 (fim de mês e de salário) e com uma moeda sob o prato

para chamariz.

A batata democratizou o reinado do trigo. Se até o séc.

XIX só metade das crianças européias viviam mais que três

anos, a disseminação da batata, diminuindo a fome e a mor-

talidade, favoreceu a explosão demográfica que resultou na

revolução industrial e modernidade. De alguma forma somos

todos subprodutos das batatas.

Como a descoberta da pólvora e o Grande Incêndio de

Londres, alguns pratos de batatas surgiram como acidentes

de cozinha. No banquete inaugural de uma ferrovia francesa

em 1837, o cozinheiro iniciou a fritar as batatas no horário

programado. Como o trem atrasou, o homem teve de retirar

as batatas do fogo para refritá-las ao ouvir o apito na estação.

As batatas, antes murchas como larvas, inflaram e douraram

como borboletas. Nascia, partejada pelo atraso de um trem, a

batata suflê, a rainha das batatas fritas.

O chips, cuja mordida traduz a vitória do ruído sobre o

paladar, também é cria da adversidade. Foi em 1853 num res-

taurante nova-iorquino. Quando um freguês por duas vezes

recusou as batatas fritas com a queixa que estavam muito

grossas, o exasperado cozinheiro fatiou as batatas ultrafinas

para que não pudessem ser presas no garfo. O freguês adorou,

e depois dele, o resto do mundo. Na cozinha, como no quarto

ou escritório, toda crise é uma oportunidade.

Santo de casa não faz milagres – as batatas estão hoje

mais enraizadas na Irlanda do que no altiplano peruano.

Segundo a lenda, as batatas chegaram sozinhas ao solo

irlandês, deram na praia depois do naufrágio de um galeão

espanhol. Na Irlanda, região com o maior consumo per capita,

até a sobremesa pode ser batata: torta de batatas com maçãs.

“Rainha da horta”, a batata assumiu de tal modo a die-

ta irlandesa que uma praga dos batatais ocorrida entre 1858 e

1860 causou uma calamidade de fome com mortalidade e emi-

gração sem precedentes. A ilha perdeu mais da metade da

população, estando hoje mais despovoada do que há 150 anos!

Pode-se dizer que foi um fungo nas batatas que empur-

rou Henry Ford à indústria, John Ford ao cinema e John

Kennedy à política.

Literalmente nascida no underground, a batata galgou a

pirâmide social e conquistou a burguesia que ela mesma aju-

dou a criar. Hoje é o vegetal mais consumido e industrializa-

do no Ocidente e só lhe falta expressão na cozinha asiática,

monopolizada e monotonizada pelo arroz e pela soja.

A linguagem documenta sua abrangência: a nossa ba-

tata inglesa é a irish potato dos ingleses. Temos as batatas suí-

ças e os americanos engordam com french fries, na verdade

uma invenção belga (fritas em gordura de cavalo). O

McDonald’s, nome irlandês, disseminou o hambúrguer com

fritas pelo mundo. A Inglaterra é fanática por fish and chips, aEspanha é adita à tortilla de papas e o complemento das mil

receitas portuguesas com bacalhau é a batata.

Tudo o que é bom tem detratores. Marlene Dietrich,

que crescera numa dieta de nabos com batatas, creditava suas

formas aos nabos; Nietzsche dizia que a dieta de batatas leva-

va ao álcool, e Brillart-Savarin definia comer batatas como a

maneira mais sem gosto de se matar a fome.

As batatas são consortes, nunca a atração principal, mas

as acompanhantes perfeitas. A batata jamais será uma diva.

Sem o carisma da estrela, é a coadjuvante que faz a estrela

brilhar, orquestra que realça o solista à mesa.

Imitemos Marlene Dietrich, um prato de batatas sem

nabos. Honremos a trufa branca, riqueza desta América, ale-

gre maneira de matar a fome.

Como ensina a lógica machadiana, “ao vencido, o ódio

ou a compaixão, ao vencedor, as batatas”. Primeiro a Europa

conquistou a América, depois a batata conquistou o mundo.

E nada como uma batata quente, não na mão mas na

boca. Não fossem as batatas nós não estaríamos aqui.

46 Estilo Zaffari

80945_sabor e o saber.p65 01/09/04, 21:334

A FORÇA DA BATATA

Bom conselho

P O R M A L U C O E L H O

Existem muitas variedades de batatas: branca, amarela, verme-

lha e até algumas produzidas em laboratório. Mas, como consumido-

res, o que devemos realmente valorizar é a preciosa colaboração desse

tubérculo aos nossos cardápios. Além de permitir a criação de diver-

sos pratos, sejam simples ou requintados, a batata influencia direta-

mente na qualidade nutricional da nossa alimentação.

Conheça algumas das qualidades nutricionais de uma batata

média (150 g): 150 calorias de energia, 3,7 gramas de proteínas,

0 grama de gordura, 23 gramas de carboidratos, 27 gramas de fibras, 5

miligramas de sódio e 729 miligramas de potássio.

PARA AS BATATAS FRITAS FICAREM SEQUINHAS E MACIAS, ANTES DE FRITAR COLOQUE-AS NO

CONGELADOR POR MEIA HORA.

O PURÊ DE BATATA GANHA SABOR E UMA CONSISTÊNCIA MAIS LEVE SE VOCÊ ACRESCENTAR À

MISTURA UMA CLARA EM NEVE.

PARA AS BATATAS NÃO DESMANCHAREM DURANTE O COZIMENTO, COLOQUE UM POUCO DE ÓLEO

NA ÁGUA.

TAMBÉM NO COZIMENTO, PARA QUE NÃO ESCUREÇAM, COLOQUE LIMÃO OU VINAGRE NA ÁGUA.

SÓ SALGUE AS BATATAS NA HORA DE SERVIR.

FURE AS BATATAS COM UM GARFO ANTES DE LEVÁ-LAS AO FOGO, POIS ASSIM ELAS COZI-

NHAM POR IGUAL.

JÁ SABEMOS QUE A BATATA SE MOSTRA EXTREMAMENTE EFICIENTE COMO ALIMENTO.

VAMOS, ENTÃO, A ALGUMAS DICAS PARA PREPARÁ-LA COM MAIS SABOR:

AGORA QUE VOCÊ SABE ALGUNS TRUQUES PARA INCREMENTAR O CONSUMO DESSE

ALIMENTO TÃO USADO NA CULINÁRIA ALEMÃ, DESCUBRA E INVENTE OUTRAS MANEI-

RAS DE APROVEITÁ-LO. A BATATA TEM HISTÓRIA, TEM VALOR NUTRICIONAL E É TAM-

BÉM MUITO VERSÁTIL.

PERÍODO DE SAFRA: JANEIRO A JUNHO.

Estilo Zaffari 47

80945_bom conselho.p65 01/09/04, 20:131

80945_veneza1.p65 31/08/04, 23:252

Veneza

Gloriosa

T E X T O E I L U S T R A Ç Õ E S P O R N I K

ESTA É UMA VIAGEM DIFERENTE E EMOCIONANTE. NIK FOI

A VENEZA, VIVEU A CIDADE E, COM SENSIBILIDADE DE ARTISTA,

DESENHOU SEUS ENCANTOS E NARROU SEUS SEGREDOS.

80945_veneza1.p65 31/08/04, 23:253

80945_veneza1.p65 01/09/04, 21:054

“AGORA ME SINTO ASSIM, COMO QUE AINDA EM DÚVIDA SOBRE

A VENEZA QUE VI. SE AQUELAS ÁGUAS QUE SUBIAM DURANTE

A NOITE, NA PIAZZA SAN MARCO, FOSSEM ÁGUAS DA MEMÓRIA,

ESSAS ÁGUAS DO ADRIÁTICO – OU DO MAR VENEZIANO, COMO

UM DIA FOI CONHECIDO – PODERIAM TRAZER ATÉ AS MARGENS

NAVIOS MERCANTES VINDOS DO ORIENTE, CHEIOS DA RIQUEZA

QUE CONSTRUIU A PRAÇA.

A CIDADE PARECE FLUTUAR, É UM BARCO EM QUARENTENA, COMO

DISSE UM CRÍTICO MUSICAL CHAMADO BRUNO BARILLI.

É MESMO DE SE FICAR TONTO ANDAR POR ALI, SUBIR E DESCER

DO VAPORETTO, ESSE ÔNIBUS TÃO PECULIAR. MESMO NAS RUAS

MAIS SÓLIDAS E DISTANTES DO TOQUE MACIO DAS ÁGUAS, ESSA

VENEZA PARECE FLUTUAR. É MESMO

DE SE FICAR TONTO ANDAR POR ALI

Estilo Zaffari 51

80945_veneza1.p65 01/09/04, 21:055

Lugar

TONTURA RETORNAVA, O QUE ME FEZ PENSAR QUE TALVEZ SE

TRATASSE DE ALGUM SEGREDO AINDA NÃO DESCOBERTO DA

CIDADE: ELA RESPIRA. DUVIDAR DISSO NÃO SE PODE. ASSIM COMO

AS ÁGUAS TÊM SUAS VARIAÇÕES, TAMBÉM AS RUAS, COM SUAS

PASSAGENS ESCURAS SOBRE BLOCOS DE EDIFÍCIOS (OS

SOTTOPORTALI), COM SUAS PONTES E PRAÇAS, PARECEM ESTAR

EM CONSTANTE TROCA DE POSIÇÕES. É COMO SE BRINCASSEM

COM A ORIENTAÇÃO DO VISITANTE, FAZENDO COM QUE, A PARTIR

DAQUELE MOMENTO, ELE PASSASSE A DUVIDAR DE TUDO QUE

PENSAVA SABER.

OS VENEZIANOS TALVEZ PARTICIPEM DESSE JOGO. TAMBÉM ELES

NÃO PARECEM REAIS, QUASE NUNCA SE QUEIXAM DA MULTIDÃO

DE TURISTAS QUE ASSUSTA QUEM CRUZA DA PONTE DE RIALTO

ATÉ A PIAZZA SAN MARCO. SURGEM E DESAPARECEM PELAS ES-

QUINAS, COM SEUS ROSTOS VERMELHOS E O OLHAR TRANQÜILO

DE MARINHEIROS. ESTÃO CIENTES DE QUE O TEMPO DE GLÓRIA

DA REPÚBLICA DE VENEZA ACABOU FAZ MUITO, MAS NÃO SE

IMPORTAM, A GLÓRIA DA CIDADE ESTÁ VIVA, RESPIRA!

TALVEZ SEJA UM SEGREDO

AINDA NÃO DESCOBERTO

DA CIDADE: ELA RESPIRA.

É UMA TERRA QUE SE MOVE

80945_veneza1.p65 01/09/04, 21:046

80945_veneza1.p65 31/08/04, 23:267

Lugar

SENTEI DURANTE DOIS DIAS EM CANTOS SILENCIOSOS, PARA DE-

SENHAR. TAMBÉM EM BARES E CAFÉS ANIMADOS, E PROVEI SA-

BOROSAS ESPECIARIAS, TRAZIDAS ATÉ ALI UM DIA POR ALGUM

VIAJANTE. MARCO POLO? TALVEZ, ESSE ILUSTRE CURIOSO QUE

RESUME BEM O ESPÍRITO DE UMA TERRA QUE SE MOVE. CORTO

MALTESE, PERSONAGEM DE QUADRINHOS QUE TANTO ADMIRO,

É FILHO DE UM VENEZIANO. MARINHEIRO ERRANTE, SEMPRE

ENTRE O ÓCIO E A AVENTURA, ENTRE O SONHO E A GUERRA, É

TAMBÉM UM TÍPICO VENEZIANO. MINHA SENSAÇÃO NA DESPEDI-

DA FOI DE DAR ADEUS À PESSOA AMADA. ME VIRAVA NA JANELA

DO AVIÃO TENTANDO VER DO ALTO UM POUCO MAIS DE SUAS

FORMAS, ESPERANDO QUEM SABE UM ADEUS, MAS NADA. VENEZA

SUMIU E COM ELA DEIXEI PARTE DO MEU CORAÇÃO, QUE ESTÁ LÁ

EM ALGUM LUGAR, SOB SUAS ÁGUAS VERDES.”

A SENSAÇÃO NA DESPEDIDA FOI DE DAR ADEUS À PESSOA

AMADA. EM VENEZA DEIXEI PARTE DO MEU CORAÇÃO

54 Estilo Zaffari

80945_veneza1.p65 31/08/04, 23:268

80945_veneza1.p65 31/08/04, 23:269

Estilo

80945_juju na cozinha3.p65 01/09/04, 21:182

Os novos

gourmets

P O R T E T Ê P A C H E C O F O T O S L E T Í C I A R E M I Ã O

80945_juju na cozinha3.p65 01/09/04, 21:183

Estilo

Cresci ouvindo que cozinha não era lugar de crian-

ça. Aliás, não era lugar de ninguém que não fosse a dona

da casa e sua assistente quase sempre gorda. As incursões

culinárias da minha família nunca foram muito além dos

churrascos de final de semana e de um ou outro lanche

noturno. Nossa especialidade eram as pipocas e os pinhões.

De vez em quando meu pai arriscava uns tostex.

Quase não tenho recordações de fazer maravilhas com

leite moça ou de assistir a meus irmãos lidarem com ape-

trechos de gourmet.

Cozinha era aquele lugar que ficava lá: “Tá lá na co-

zinha…”. Lá era longe do resto da casa. Não aparecia na

televisão em horário nobre e muito menos era exibida bem

no meio da sala. Mas isso foi no século passado. Nos anos

2000 a cozinha está na moda. Ficou democrática. Virou

um charme estar nela com as mãos todas sujas de farinha.

A cozinha ganhou lojas especializadas, livros inspiradores

e, como não poderia deixar de ser, uma legião de especialis-

tas. Todo mundo está freqüentando algum curso de culiná-

ria ou indo atrás de alguma espécie de ingrediente.

Inclusive meu filho de 4 anos.

“Mãe, tem ovo?” Pra atirar em quem? – pensei,

preocupada, antes de descobrir que era para levar para

a escola. Na maioria das pré-escolas modernas, a culi-

nária é assunto constantemente em pauta. Por meio

dela, as crianças desde bem pequenas têm noções de

A COZINHA AGUÇA OS SENTIDOS DAS CRIANÇAS E É UM

58 Estilo Zaffari

80945_juju na cozinha3.p65 31/08/04, 23:054

história, geografia, matemática. E aprendem também

a se relacionar umas com as outras, dividir tarefas, ter

paciência, e não apenas observar, mas também usufruir

o resultado de um trabalho de grupo.

A cozinha aguça os sentidos, reforça os vínculos fa-

miliares, sacode a preguiça, é um verdadeiro playground

para a descoberta de novas cores, sabores e texturas. Pou-

cas brincadeiras oferecem tantas oportunidades.

Além do mais, se é de pequeno que se aprende a

comer direito, é possível que o contato com ingredien-

tes e receitas diferentes estimule as crianças a enten-

derem que existe vida depois do hambúrguer com bata-

ta frita. E, assim, quem sabe elas possam crescer mais

VERDADEIRO PLAYGROUND

CLUBINHO DO ESQUILO

ENSINA CULINÁRIA

PARA A GAROTADA

Há alguns anos a Companhia Zaffari vemdesenvolvendo um projeto de ensino de culináriaà garotada. Aos sábados, sob o comando daprofessora Rosaura Fraga, os participantes doClubinho do Esquilo fazem aulas práticas eaprendem a preparar diversas receitas. O palcodessas aventuras é o Atelier de Culinária Zaffari,instalado na loja da rua Cristóvão Colombo, emPorto Alegre.

Crianças de 5 a 9 anos podem participar dasaulas, que são gratuitas. A organização apenassolicita que cada um leve, a título de inscrição, umquilo de alimento não-perecível, para doar aentidades carentes. Não se trata de exigência, masde um pedido. E todas as crianças fazem questãode contribuir.

Nas tardes de sábado, das 15h às 16h,paramentados com aventais do Clubinho, osmeninos e meninas exercitam seus talentosgastronômicos. E ao final de cada aula fazem umagrande festa, quando podem degustar todos ospratos preparados. Para obter mais informaçõessobre o Clubinho do Esquilo e as aulas de culinária,entre em contato com o Marketing da CompanhiaZaffari, pelo fone 3337.3111, ramal 3402.

80945_juju na cozinha3.p65 31/08/04, 23:065

Estilo

comer tranqüilamente junto, como família, menos prova-

velmente sentiremos a necessidade de fazer mil dietas. Sa-

borear uma boa refeição simplesmente nos faz sentir bem.

A comida não deve ser temida. Deve ser uma fonte de pra-

zer e bem-estar”.

As fotos que ilustram esta matéria foram estrela-

das por Juju Pernambuco, que acaba de lançar um livro,

e seus três convidados, numa fria, cinza e chuvosa ma-

nhã de julho, em Porto Alegre.

O clima mais que perfeito para a emocionante

aventura de preparar um cookie.

A receita, para quem ficou com água na boca, está

na página seguinte. Divirtam-se.

O CONTATO COM RECEITAS AJUDA A CRIANÇA A DESCOBRIR

saudáveis e criteriosas, menos lotadas das porcarias que

se escondem atrás dos salgadinhos, refrigerantes e ou-

tras guloseimas falsamente coloridas.

Nunca vou esquecer do estado de choque que eu

fiquei quando meu filho pediu alcachofra para o garçom

de um restaurante e, diante da negativa – não tinha alca-

chofra fresca –, ele emendou, “… Ah, então me traz pal-

mito mesmo”. Eu fui descobrir o que era alcachofra com

pelo menos cinco vezes mais idade que ele.

Li recentemente no site do The New York Times um

texto do autor de Every Night Italian, Giuliano Hazan.

Reproduzo: “… Quanto mais ensinarmos nossos filhos a

apreciar a boa comida e o prazer que se pode extrair de

60 Estilo Zaffari

80945_juju na cozinha3.p65 31/08/04, 23:066

QUE EXISTE VIDA ALÉM DO HAMBÚRGUER COM FRITAS

JUJU NA COZINHA DO CARLOTA

AUTOR: CARLA PERNAMBUCO E PINKY WAINER

EDITORA: CARAMELO (80 PÁGINAS)

EXPEDITO, O COZINHEIRO

AUTORAS: LILIANA IACOCCA E MICHELE IACOCCA

EDITORA: MODERNA (48 PÁGINAS)

FOGÃOZINHO – CULINÁRIA INFANTIL EM HISTÓRIAS

AUTORES: FREI BETTO E MARIA STELLA LIBANIO CHRISTO

EDITORA: MERCURYO (62 PÁGINAS)

LIVROS QUE PODEM MUITO BEM

FREQÜENTAR A ESTANTE DOS BRINQUEDOS

COLEÇÃO HISTÓRIAS PARA LER E SABOREAR

AUTORA: ROSANA RIOS, EDITORA: STUDIO NOBEL

UM QUADRO NA PAREDE E DOCE DE ABÓBORA NO TA-

CHO: 32 PÁGINAS; PÔR-DE-SOL E PÃO DE QUEIJO: 40

PÁGINAS; A CIDADE, OS ERRES E AS ROSQUINHAS DE

COCO: 40 PÁGINAS

O LIVRO DE RECEITAS DO MENINO MALUQUINHO

AUTOR: ZIRALDO (RECEITAS DE FÉ EMMA XAVIER)

EDITORA: MELHORAMENTOS (79 PÁGINAS)

BOCA MOLE

AUTORAS: CIÇA KFOURI MOREIRA FERREIRA E CLAUDIA

MORALES. EDITORA: TERRA VIRGEM (47 PÁGINAS)

Estilo Zaffari 61

80945_juju na cozinha3.p65 31/08/04, 23:067

Estilo

Carla ficou grávida de Júlia e do Carlota ao mes-

mo tempo. Era o ano de 1995 e os Pernambuco tinham

acabado de chegar de Nova York.

Um mundo de possibilidades se abria para eles. Fi-

lho novo, restaurante novo, Brasil de novo. Carla circu-

lava entre as mesas recém-inauguradas com aquele bar-

rigão próspero e feliz. O sucesso era óbvio. Quase dez

anos depois, o Carlota é um dos melhores restaurantes

do Brasil e o ex-barrigão de Carla é uma menina linda,

como não poderia deixar de ser a filha da inventora do

petit gateau de doce de leite, um doce de pessoa.

Pois Carla e Júlia acabam de aprontar mais uma

para a gente se deliciar: Juju na Cozinha do Carlota,

com ilustrações de Pinky Wainer. “É um livro infantil de

receitas, e não um livro de receitas infantis”, diz Carla.

Júlia comenta a frase de sua mãe com um sorrisinho no

canto da boca que diz tudo. Filha de chef, chefzinha é.

DE QUEM FOI A IDÉIA DO LIVRO?

Da minha mãe, claro.

QUAL A SUA RECEITA FAVORITA?

Ai, não é só uma. O brownie, o petit gateau e o nuggets.

VOCÊ PRETENDE UM DIA ABRIR SEU PRÓPRIO RESTAURANTE?

Um restaurante não sei, mas um lugar pra comer doces

De mãe para filha desde 1995

62 Estilo Zaffari

80945_juju na cozinha3.p65 31/08/04, 23:068

e salgadinhos. E vai se chamar Chez Juju.

COZINHA É LUGAR DE…

Crianças!… Com adulto junto.

QUE INGREDIENTES UM CANDIDATO A “CHEF” DEVE TER?

… chocolate, açúcar, ovos, farinha, fermento e a minha mãe.

COM QUEM VOCÊ DIVIDIRIA UM COOKIE?

Com meu irmão Felipe.

NEGRINHO OU BRIGADEIRO?

Os dois, ué. E fim de semana no Rio.

COOKIES DE CHOCOLATE

1/2 XÍCARA DE MANTEIGA AMOLECIDA

1 XÍCARA DE AÇÚCAR MASCAVO

3 COLHERES (SOPA) DE AÇÚCAR

1 OVO INTEIRO

2 COLHERES (CHÁ) DE ESSÊNCIA DE BAUNILHA

1 XÍCARA E 3/4 DE DE FARINHA DE TRIGO

1/2 COLHER (CHÁ) DE FERMENTO EM PÓ

1/2 COLHER (CHÁ) DE BICARBONATO

1/2 COLHER (CHÁ) DE SAL

1 XÍCARA E 1/2 DE CHOCOLATE EM

TABLETE PICADO PEQUENO

Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:Modo de fazer:

Coloque a manteiga e os açúcares na tigela da ba-

tedeira. Bata com a pá-raquete em velocidade mé-

dia por 30 segundos, até que a mistura fique fofa.

Junte o ovo e a baunilha e bata até misturar bem.

Em outra tigela, peneire a farinha com o fermen-

to, o bicarbonato e o sal. Vá colocando a farinha e

o fermento peneirados, aos poucos, na mistura que

está na batedeira, enquanto ela estiver ligada.

Depois acrescente o chocolate picado. Molde os

biscoitos em formato oval. Asse em forno médio

pré-aquecido, durante 6 a 8 minutos.

RECEITA EXTRAÍDA DO LIVRO “JUJU NA COZINHA DO CARLOTA”

80945_juju na cozinha3.p65 31/08/04, 23:079

Bem Viver

Questão de impressão digital

EQUILÍBRIO EMOCIONAL

Este é um texto de encomenda. Significa que não foi es-

pontâneo. Partiu de uma demanda, que foi a de um artigo sobre o

equilíbrio emocional, de preferência com algumas dicas. Isso não

é problema, é desafio. Muitos outros já o aceitaram e dele fizeram

obras-primas, como Mozart. Tentaremos ser mais modestos; mo-

déstia faz bem à saúde mental.

Se equilíbrio emocional existe e é divino, o diabo é que

não existem dicas. Isso porque, como afirmou O. Cavalcanti, cada

pessoa é como uma impressão digital. Original, irreplicável (até

clone em contrário), única. Se eu disser, como direi, que faz bem

ter bom humor, religião (ou fé) e viver em companhia (as estatís-

ticas provam), logo virá a minoria de carrancudos, mal-humorados

e céticos gritando em coro: vamos bem, obrigado.

Por isso a primeira grande dica é ignorar este texto. Se ele

tem humor, e tem, é porque S. Freud mostrou o quanto é saudá-

vel rir de si mesmo. E a etnopsiquiatria provou o quanto as refe-

rências culturais (e as crenças) nos tornam mais saudáveis men-

talmente. E. B. Bettelheim defendeu a idéia de encontrar um sen-

tido para a vida. E D. Stern mostrou que nada nos faz melhor do

que a matriz de apoio, que são os outros com quem contamos.

No entanto, acima disso, estamos nós com nossa impres-

são digital originalíssima, que pode estar pedindo uma outra his-

tória. É importante, como pregou S. Ferenczi, poder pensar por si

mesmo, com autonomia. Se nos cobram um tipo de trabalho,

nossa essência pode estar pedindo outro.

Essa idéia leva a outra. Se você está bem taludinho, muito

tempo foi perdido. Mas se você ganhou um bebê, a chance é

enorme de ajudá-lo a construir um certo equilíbrio emocional.

Eis uma tarefa que começa cedo: na gravidez. No primeiro ano

de vida. Tocando o bebê, cantando para ele, olhando. Deixan-

do-o o máximo possível de fora de nossas próprias dores. Respei-

tando a sua autonomia. Para chegar em uma base sólida, marca

talvez universal para uma vida mais feliz.

Depois de crescido, há tempo ainda. Todo encontro repe-

te o primeiro. Nunca é agora, disse um poeta ou um filósofo, o

que dá no mesmo. A cada novo encontro, revivemos nossa base,

e estamos dispostos a mudar. Certa vez, conheci dona Zenaide.

Quase octogenária, contava uma história de isolamento e maus-

tratos, desde que era bebê. Formávamos um grupo que contava

histórias. No fim da história, dona Zenaide era outra. Mais pró-

xima de si própria, dos outros e da neta de sete anos, para quem

nunca havia contado nada. Pois contou.

Aliás, contar é saudável. Expressar, também. Transformar

fantasmas e dores em um momento de esporte, em um espaço

de arte, em alguma coisa. O que é terapêutico, mas não é lei.

Este texto, afinal, não foi espontâneo. Mas foi bom. Tornou-me

mais saudável no dia de hoje. Pois se os especialistas recomen-

dam caminhada e algum sol, minha impressão digital me reco-

menda há muito tempo a reclusão e a escrita. Meu colesterol

não anda lá essas coisas; o peso, tampouco. Mas o equilíbrio

emocional dá as caras e até sorri.

C E L S O G U T F R E I N D

CELSO GUTFREIND É MÉDICO PSIQUIATRA E ESCRITOR. COMO MÉDICO, ESPECIA-

LIZOU-SE EM PSIQUIATRIA DO BEBÊ E DA CRIANÇA NA UNIVERSIDADE DE PA-

RIS. COMO ESCRITOR, TEM QUINZE LIVROS PUBLICADOS.

64 Estilo Zaffari

80945_Bem Viver1.p65 31/08/04, 22:551

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:342

T E X T O S E F O T O S P O R C R I S B E R G E R

gusto,

Com mucho

Guatemala

Estilo Zaffari 67

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:353

A Guatemala é o segundo país da América Central

que tenho o imenso prazer de conhecer. Não sei se estou

influenciada pelo road movie “Diários de Motocicleta”, de

Walter Salles, mas começo a achar que este canto do mun-

do tem a alma mais livre. Carrega a aura de ser Centro-

América. É o berço da civilização maia. Foram 36 anos de

guerra civil que ficaram para trás. Possui 24 idiomas dife-

rentes, sendo 21 deles de origem maia, e é cercada por vul-

cões. Um currículo nada menos do que impressionante. A

viagem aconteceu mais ou menos assim: era uma quarta-

feira quando o convite para participar da “press trip” a esse

exótico país adentrou minha caixa de e-mails. Primeira re-

ação? Euforia. Claro, topei na hora. Depois comecei a pen-

sar: onde fica a Guatemala? O que vou encontrar por lá?

Meu natural espírito aventureiro desafiava meu medo do

desconhecido. Lembrei uma frase antiga de que todo mun-

do um dia já ouviu falar: “Aventurar-se causa ansiedade,

mas deixar de aventurar-se é perder a si mesmo”. A deci-

são estava tomada. O cinema, como sempre, foi minha

fonte de inspiração. Véspera de viagem, uma lista de tare-

fas a cumprir e eu entregue ao “Diários” de Walter Salles.

Não haveria melhor película para me conectar aos sete dias

que estavam por vir.

A caminho da Guatemala

Entre São Paulo e o Panamá, onde é feita a escala

para a Guatemala, são 7 horas de vôo. Reserve um assento

na parte direita da aeronave. Na quinta hora e meia de

viagem você vai contemplar o rio Amazonas. Ele é lindo.

As águas marrons dividem a floresta em duas. Densidade e

força. A exatidão do contorno entre o rio e a mata é im-

pressionante. Nuvens brancas enfeitam ainda mais o cená-

rio, e sombras displicentes correm pelas copas das árvores.

A visão é vibrante.

O aeroporto do Panamá é a base de vôos para os de-

mais países da América Central. Ele é um convite ao con-

sumo. Depois de Miami, o lugar mais barato para a compra

de eletrônicos. São necessárias mais três horas de viagem

para chegar à Guatemala. Garanto: a espera compensa.

Minha primeira noite na Cidade da Guatemala aconte-

ceu em grande estilo. Não poderia deixar de sugerir o hotel,

Quinta Real, como endereço de chegada. A decoração é

neocolonial. A riqueza dos detalhes, deslumbrante. Os hós-

pedes são recebidos com champanhe. Atendimento de pri-

meira. No quarto, presentinhos em cima da cama e uma ba-

nheira à sua espera. Depois de uma merecida noite de sono,

acorde com calma e faça um tour pelo Quinta. Do jardim

você terá sua primeira visão do vulcão. Respire fundo!

Contrastes à flor da pele

Cheguei despida de preconceitos e cheia de curiosi-

dade. Logo no início da viagem pude perceber que o con-

traste é marca latente do país. Na porta de um dos luxuo-

sos hotéis da capital meus olhos encontraram os de Juan

Viagem

68 Estilo Zaffari

SUBI AS ESCADARIAS DAS PIRÂMIDES, ROMPI MEUS

LIMITES E A RECOMPENSA FOI UMA LINDA VISTA

80945_viagem guatemala1.p65 01/09/04, 21:274

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:355

Viagem

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:366

Al. Pele escura, típica do povo guatemalteco, com olhos de

um verde quase transparente, deixou-se fotografar. Con-

tou quem era. Vendedor de batatas e bananas fritas, traba-

lha há 35 anos nas ruas.

A poucos metros de onde estávamos, na recepção do

hotel, deparei com a suntuosidade de um lustre de cristal e

traços de decoração clássica européia. Mais uma vez regis-

trei através da minha lente o belo, desta vez arquitetônico.

Um casal de americanos chamou minha atenção. Fui con-

versar com eles no intuito de entender o que os turistas

buscam na Guatemala. Minha surpresa foi descobrir que

aquele casal estava ali para adotar uma criança.

Conheci os dois Antonio Reys algumas horas mais

tarde. Antonio Reys, de 55 anos, é uma figura clássica

do jornalismo da Guatemala. Destaca-se no meio da mul-

tidão. Talvez seja a pele escura, a espessa barba branca,

os olhos puxados, a simpatia no olhar. Ganhei sua aten-

ção e fui apresentada para o seu filho, o precoce Anto-

nio Reys Filho, de 13 anos, que promete se candidatar a

presidente da República em 2025.

Mais alguns dias pelo país e entendi que o povo,

apesar de todas as diferenças e dificuldades, sabe sorrir.

Um sorriso sincero, puro e bonito. Eles amam seu país e

se orgulham da sua cultura e tradição. Não cansam de

repetir as doces palavras que trago no coração: “Com

mucho gusto, señorita”.

Este foi apenas o começo. Ainda havia muito a ver e

viver nos próximos dias de viagem.

O passado e o presente tornam-se um só

“La Antigua Guatemala” revelou-se uma deliciosa

surpresa. Foi fundada em 1543. A Unesco a declarou

Patrimônio Cultural da Humanidade, em 1979. Durante

mais de 200 anos foi capital do país. O grande terremoto

de 1773 fez com que a sede política se mudasse para a Ci-

dade da Guatemala, a 45 quilômetros de Antigua.

As ruas são feitas de pedras, as construções datam

do século XVI. Pátios internos encantam com seus jar-

dins impecáveis. A colonização espanhola deixou mar-

cas na arquitetura. Aconchego e inspiração são esban-

jados a cada esquina. No horizonte, acima da fachada

das casas, os vulcões El Água e El Fuego revelam-se im-

ponentes. Mulheres maias carregam, em cima das cabe-

ças, grandes cestas, esbanjando o colorido do artesana-

to local. Carros antigos compõem um cenário de nostal-

gia ao lado dos grandes casarões. Os trajes típicos em-

prestam um charme especial a seus moradores.

Seduções de Antigua

Tomar café da manhã contemplando um vulcão é

uma sensação revigorante. Dias ensolarados em Antigua,

uma dádiva. As cores ficam mais fortes e a cidade ainda

mais bonita. Acordar cedo em viagens pode parecer insa-

nidade, mas acredite, é nas primeiras horas do dia que o sol

ilumina de uma maneira especial. As melhores imagens

que fiz de Antigua foram captadas entre sete e oito e meia

da manhã. Além de a luz estar perfeita, vi a cidade acordar.

NO HORIZONTE, ACIMA DA FACHADA DAS CASAS,

OS VULCÕES REVELAM-SE IMPONENTES!

Estilo Zaffari 71

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:367

ELES AMAM O PAÍS, SUA CULTURA E TRADIÇÃO E NÃO

CANSAM DE REPETIR: COM MUCHO GUSTO, SEÑORITA

Viagem

As crianças indo para a escola. Os adultos, trabalhar.

Os ônibus coloridos despertando para mais um dia de idas

e vindas. O ritmo da vida seguindo seu fluxo natural.

O cair da tarde é outro momento especial. Viajantes

se deixam levar pelas horas. O azul do céu cede espaço

para o negro da noite e o brilho das estrelas. O clima ame-

no e agradável torna irresistível a idéia de uma caminhada.

O ar se enche de música. A noite está começando. Se o

momento é de um drink, o pub irlandês Reilly’s é bárbaro.

A poucos passos dele está o Gaia. O dono é judeu, o que

explica a forte presença de características do Oriente Mé-

dio na decoração. Lugarzinhos românticos para jantar?

Elejo o rústico El Sabor del Tiempo e o elegantíssimo Da

Vinci. A qualquer hora do dia o restaurante espanhol

Gitanos é uma ótima pedida. O Miguel e o Joseph são os

criadores da casa. A especialidade são tapas mediterrâneas.

Pelas paredes há um toque marroquino. Não deixe de pro-

var a sangria preparada pelo Miguel. A simpatia dos garo-

tos que trocaram o frio da América do Norte pela prima-

vera da Guatemala conquista os visitantes. Se bater sauda-

de de casa, peça para eles tocarem um dos maravilhosos

CDs de bossa nova que constam no repertório do Gitanos.

Para garantia de bons sonhos aposto no “Porta Hotel

Antigua”. Tem ótima vista para o vulcão, e os quartos são

um aconchego só. Outra boa pedida é a “Posada El Antaño”,

uma graça. Bom gosto é um dom democrático por lá. Não

é maravilhoso?

Se você deseja momentos de contemplação, calma

e paz de espírito, não se apresse em seguir viagem. Fique

um pouco mais. Vá descobrindo a cidade aos

pouquinhos. Uma maneira bacana de conhecer o terri-

tório é contratar o serviço de um mototáxi. Já explico

do que estou falando: são motos transformadas em pe-

quenos carros. Pequenos mesmo. Na frente tem lugar só

para o motorista, atrás cabem até três passageiros (bem

juntinhos). Essa é uma maneira criativa e engraçada de

fazer um city tour. Peça para o motorista levar você no

Convento de Santa Catalina e das Capuchinas, na “Plaza

Mayor”, na Casa Santo Domingo e na Igreja La Merced.

Reserve umas quatro noites em Antigua e depois siga

para as ruínas maias em Tikal.

Berço da civilização maia

O Parque Nacional de Tikal fica no extremo norte

do país. As ruínas e pirâmides da civilização maia encon-

tram-se em meio à selva de Petén. A melhor maneira de

chegar a Tikal é de avião. Da Cidade da Guatemala saem

vôos regulares para Flores, que fica a 65 km do Parque.

Eu fui e voltei no mesmo dia. Minha sugestão: durma

uma noite por lá. Você poderá percorrer o parque com

mais calma e liberdade. Em Tikal faz bastante calor e é

úmido. Não podem faltar na sua bagagem roupas leves,

sapatos confortáveis, protetor solar e repelente.

Contrate um guia e se prepare para conhecer o maior

72 Estilo Zaffari

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:368

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:379

Viagem

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:3710

sítio arqueológico maia. São 3 mil construções em 16 qui-

lômetros quadrados.

Quebrando limites

A primeira pirâmide que eu conheci foi a número 5

(elas são identificadas por numeração). Na lateral esquer-

da tem uma escada que leva os mais corajosos até o topo

(65 metros). Eu de corajosa não tenho nada. Por algum

motivo que desconheço, quando percebi estava no décimo

degrau dos 90 que se tem pela frente. Entrei em pânico.

A escada é quase uma reta, e a subida tem que ser feita de

lado, porque senão os joelhos batem no próximo degrau.

O mesmo ímpeto que me fez desejar subir me ajudou a

dominar o medo. O segredo é não olhar para baixo e con-

trolar a adrenalina, ou, pelo menos, tentar. A visão das

outras pirâmides e templos maias no meio da selva é des-

lumbrante. Estamos acima do vôo dos pássaros. Se subir

foi um ato heróico, descer nem se fala. Foi o meu bom

amigo Guilherme Scarance quem me ajudou. Descemos

lado a lado, enquanto ele tentava me distrair contando uma

piada. Subir nessa pirâmide foi quebrar limites. Se você é

como eu, aproveite a oportunidade.

De volta à estrada, o caminho segue entre trilhas

menores e maiores e nos leva para a grande atração de

Tikal: a praça central, que toma conta do espetáculo.

Nela fica a principal pirâmide: o Templo Jaguar, com 52

metros. Vestígios indicam que, no século I, existiram vi-

O MERCADO DE CHICHICASTENANGO É O

MAIOR CAOS POÉTICO QUE EU JÁ CONHECI

las agrícolas com palácios, mercados, templos religiosos

e grandes habitações. Monumentos, objetos de culto e

adornos que foram encontrados levam a crer que du-

rante mil anos houve vida ativa em Tikal. Ver o sol nas-

cer entre as ruínas é uma experiência única. Imaginar

como a civilização maia pôde construir tão gloriosa ar-

quitetura é um exercício que nos leva a crer na imensa

capacidade humana de criação.

Um motivo para voltar

Não posso excluir o Lago Atitlán desta matéria. Mi-

nha passagem por ele foi muito rápida e abaixo de chuva

torrencial. Peço que me perdoem, mas não pude registrar a

beleza que inspirou Aldous Huxley ao dizer ser esse o lago

mais belo do mundo. Atrevo-me a sugerir uma estada no

Hotel Atitlán, que abriga um jardim botânico a poucos

passos das margens do lago. Recanto perfeito para contem-

plar os três vulcões que emolduram suas águas.

Lanchas levam os viajantes para conhecerem aldei-

as indígenas à beira do Atitlán. O percurso não leva mais

do que 20 minutos. Conheci o povoado indígena de San-

tiago. Confesso que imaginei encontrar uma aldeia mais

primitiva, bucólica. Me senti uma turista invadindo terri-

tório alheio. Quanto a eles, imagino que estejam cansa-

dos dos disparos das máquinas fotográficas. Para serem

fotografados cobram 1 quetzal. Foi difícil não registrar

tamanha peculiaridade, mas não gostei de ser uma intru-

Estilo Zaffari 75

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:3711

Viagem

sa. Das escadarias da igreja local, que fica no topo do po-

voado, se tem uma vista privilegiada da paisagem do lago.

Uma ida a Santiago vale para conhecer a cultura do lugar

e voltar para casa com novas histórias para contar.

Caos poético de Chichicastenango

O cenário é surreal. Imagine uma igreja do século

XVI, toda branca. Esta é a igreja de Santo Tomás. O local

onde está construída a igreja cristã foi cenário de culto maia.

Rituais de purificação maia continuam sendo feitos sobre

ela nos dias de hoje. Romeiros misturam ritos católicos e

maias. Aos seus pés, o mercado de Chichicastenango, com

suas tendas de artesanatos, vestimentas e máscaras de um

colorido impressionante. Uma quantidade expressiva de

pessoas circula pelas ruelas. Turistas, índios, viajantes, pe-

regrinos. Rostos marcados pelo passar dos anos, crianças

penduradas por panos e carregadas nas costas das mães,

olhos curiosos por tanta singularidade. O mercado de Chichi

acontece todas as quintas-feiras e domingos.

O vulcão fala conosco

Último dia. Saudades de casa, é verdade. Uma von-

tade enorme de começar a contar esta história. Tanto a

escrever. A responsabilidade de traduzir um país distante

do meu. A Guatemala que fui descobrindo, me tornando

íntima, próxima e tão bem recebida. Jamais esquecerei as

últimas horas da viagem. O grupo de jornalistas brasileiros

que havia sido dividido em duas equipes volta a se encon-

trar. Decidimos desvendar o vulcão Pacaya. Um dos três

em atividade no país. O sol estava escondido atrás de mui-

tas nuvens. Nosso guia, o Vinícius, não nos deixou subir

até a cratera. Medida de segurança em função da pouca

visibilidade. Mesmo assim foi uma experiência mágica.

A trilha que liga o pequeno vilarejo de San Francisco de

Sales até os pés do vulcão é inspiradora. Uma caminhada e

tanto. Pela frente, uma subida íngreme que deve ser per-

corrida desfrutando a paisagem. Três cães por companhia.

Fiéis amigos. A temperatura começa a cair. O corpo es-

quenta com o exercício. O coração acelera. O silêncio do-

mina e só é quebrado pelo canto dos pássaros. A terra é

negra, são as pedras do vulcão. Mesas e bancos feitos de

pedras convidam os aventureiros para um descanso. Hora

de tirar fotos. Confraternizar. Sentimos que o lugar mexe

conosco. Ficamos mais amigos. Chegamos na base do

Pacaya depois de duas horas de caminhada. Brumas escon-

diam o vulcão. Quando ele se deixava revelar nos faltavam

palavras diante de tamanha beleza.

Um último olhar antes de partir

Pedimos ao Vinícius para nos levar a um mercado

típico local. Assim chegamos a Palín. Embaixo de uma

grande seiba (árvore típica da Guatemala), bancas de

frutas, verduras, artesanatos e os mais diversos produtos

eram comercializados entre os moradores. Já eram qua-

tro horas da tarde quando se votou por uma pausa para

o almoço. Antigua me chamava e não pude ficar. Pro-

A GUATEMALA É COMO UMA COLCHA DE RETALHOS:

COLORIDA, MULTICULTURAL, DINÂMICA E BELA

76 Estilo Zaffari

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:3712

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:3813

EM 1543, ANTIGUA FOI FUNDADA. NO ANO DE 1979,

DECLARADA PATRIMÔNIO CULTURAL DA HUMANIDADE

curei por um táxi que me levasse até ela e de volta ao

hotel. Eu estava disposta a gastar US$ 40, mas ninguém

queria me levar por menos de US$ 50. Quando eu já

estava quase desistindo encontrei o Davi, que aceitou

minha proposta. Acabei ganhando um amigo. Fomos

conversando durante todo o trajeto. Davi me contou

dos anos de guerrilha nas montanhas, da atual delin-

qüência juvenil, de como o povo maia é negociante e

inteligente e também de quanto gosta de ser

guatemalteco. Com orgulho, falou do clima agradável

que predomina em todas as estações do ano, da riqueza

multi-cultural de seu país e da alegria de sua gente.

Percorri, mais uma vez, as ruas irregulares de Anti-

gua. Era uma segunda-feira e a cidadezinha estava agitada.

Totalmente por acaso entrei no “Almacen Troccoli”. Fui

recebida pela simpática Carmem Beatriz Herrera, outra

guatemalteca que não poupa elogios a seu povo e nem eco-

nomiza aplausos ao rum Ron Zacapa Centenário, produzi-

do na Guatemala e considerado o melhor do mundo, pelo

The Beverage Testing Institute, de Chicago.

O Troccoli é fruto do amor entre um italiano e uma gua-

temalteca. Isso há 101 anos. O armazém é lindo. Licores,

vinhos, cafés tomam conta de toda a parede e enchem os

olhos com rótulos coloridos, garrafas com diferentes for-

matos e tonalidades. Não deixe de trazer para o Brasil uma

garrafa de rum e um pacote do café Dalton, outro motivo

de orgulho do país.

Oito horas da noite. O ponto de encontro com o Davi

era na frente da catedral. Ganhei mais cinco minutos para

uma última foto. Enquanto me esperava, meu mais novo

amigo foi pesquisar um livro que pudesse responder às mi-

nhas perguntas sobre os anos de guerra civil. Para os curio-

sos como eu, passo adiante a dica “História da Guatemala”,

de Francis Polo Sifontes.

Durante três horas me deixei levar entre uma ruela e

outra. Apesar do meu péssimo espanhol, consegui fazer

alguns amigos, registrei muitas imagens, fiz anotações no

meu bloquinho de viagens e finalmente me senti prepara-

da a traduzir um pouquinho da essência da Guatemala.

Dicas de quem vos escreve

Na sua primeira noite entregue-se às mordomias do

Hotel Quinta Real. Afinal, quem não gosta de ser bem

tratado? No dia seguinte chame um táxi e siga para “La

Antigua Guatemala”. Esqueça da vida por uns quatro dias.

Trate-se bem. Curta os deliciosos restaurantes e os en-

cantos dos hotéis. Embarque na máquina do tempo e des-

vende o passado de Antigua. Tire um dia para conhecer

o vulcão Pacaya. Hora de seguir em frente. Voe para Tikal

para conhecer o mundo maia. Em dois dias você faz isso.

De volta à Cidade da Guatemala, rume de carro para

Panajachel, onde está o Lago Atitlán. Depois de um “par

de dias”, como falam os guatemaltecos, dirija até o mer-

cado de Chichicastenango. É imperdível! Aposto que você

concordará que esta reportagem não poderia ter outro

nome, senão: Com mucho gusto, Guatemala!

Viagem

78 Estilo Zaffari

80945_viagem guatemala1.p65 01/09/04, 21:2714

Viagem

ANTIGUA GUATEMALA

HOSPEDAGEM

PORTA HOTEL ANTIGUA

8ª CALLE PONIENTE, Nº 1

FONE: 502-832.2801 – WWW.PORTAHOTELS.COM

POSADA EL ANTAÑO

6ª AVENIDA NORTE, Nº 36

FONE: 502-832.7351 – WWW.POSADAANTANO.COM

RESTAURANTES

EL SABOR DEL TIEMPO

CALLE DEL ARCO Y 3ª CALLE PONIENTE

FONE: 502-832.1233 ITALIANO

DA VINCI

6ª AVENIDA NORTE, Nº 32

FONE: 502-832.0546 ITALIANO

GITANOS

1ª CALLE PONIENTE Y 6ª AVENIDA PONIENTE, Nº 9

FONE: 502-832.0098 ESPANHOL

REILLY’S IRISH CAVERN

5ª AVENIDA NORTE, Nº31

FONE: 502-499.2331 IRLANDÊS

GAIA

6ª AVENIDA NORTE, Nº86

FONE: 502-832.3670 MEDITERRÂNEO

ALMACEN TROCCOLI

CALLE DEL ARCO Y 3ª CALLE PONIENTE

FONE: 502-832.0516

GUATEMALA

QUINTA REAL

PROLONGACIÓN BOULEVARD LOS PRÓCERES, KM 9, ZONA

15. FONE: 502-379.5000 – WWW.QUINTAREAL.COM

LAGO ATITLÁN

HOTEL ATITLÁN

FINCA SAN BUENAVENTURA, PANAJACHEL

TELEFONE: (502) 762.1441 – WWW.HOTELATITLAN.COM

COMPANHIA AÉREA

COPA AIRLINES.

FONE: 11-3138.6200 – WWW.COPAAIR.COM

CRIS BERGER VIAJOU A CONVITE DA COPA AIRLINES E DO INSTITUTO

GUATEMALTECO DE TURISMO WWW.INGUAT.GOB.GT.

DICAS DE QUEM JÁ FOI:

80 Estilo Zaffari

80945_viagem guatemala1.p65 31/08/04, 22:3916

Saúde

Direto

80945_acupuntura.p65 31/08/04, 22:412

pontoao

P O R P A U L A T A I T E L B A U M I L U S T R A Ç Õ E S N I K

Você já acordou com um torcicolo do tipo que im-

pede a travessia de uma rua de mão dupla? É, daqueles

que não deixam você mexer a cabeça pros lados? Pois

eu já. Só pra resumir a saga da minha dor, passei por

relaxante muscular, antiinflamatório, homeopatia, mas-

sagem, bolsa de água quente e, quando já estava quase

pedindo morfina, uma amiga sugeriu: quem sabe

acupuntura...

Lá fui eu para o consultório do Sr. Miyai, um japo-

nês que vai direto ao ponto, ou melhor, aos pontos. Che-

guei meio nervosa, com aquela sensação de que meu cor-

po iria virar uma almofadinha de alfinetes. Falei onde

doía, ele apertou, fez shiatsu e, no final, colocou

microagulhas nos pontos que estavam mais doloridos. Fui

embora menos de uma hora depois, com alguns espara-

drapos escondendo as agulhinhas e a recomendação de

não mexer em nada até a próxima consulta. Naquela

noite, depois de duas semanas de sofrimento, finalmente

consegui dormir a noite inteira. Virei devota. Santa

acupuntura.

Uma terapia milenar

A acupuntura não trata somente a dor. E não se

limita a cravar agulhinhas nas pessoas. É muito, muito

mais do que isso. Hoje, se faz acupuntura até com raio

laser. Hein? Pois é... Mas antes de entrar nesse assunto,

é bom saber um pouco sobre a história da acupuntura.

Ela nasceu no vale do rio Amarelo, nas costas do mar da

China (não é engraçado ela ter nascido nas costas?), há

cerca de 5 mil anos. Huang Di, conhecido como o Im-

perador Amarelo, foi o responsável pela autonomia da

medicina chinesa e pela difusão da acupuntura. Ele es-

creveu o Tratado da Medicina Interna do Imperador

Amarelo, um texto em forma de diálogos em que o im-

Estilo Zaffari 83

80945_acupuntura.p65 01/09/04, 21:373

Saúde

perador troca informações com seu ministro a respeito

da arte de curar. Não me pergunte como Huang Di che-

gou às suas brilhantes conclusões, porque está além do

meu conhecimento. Eu só sei que, depois disso, a

acupuntura se expandiu pela Ásia, passou por um perío-

do de estagnação, renasceu feito Fênix, ganhou segui-

dores na Europa, atravessou mares, desembarcou nas

Américas e chegou em Porto Alegre.

Hoje, graças a Deus (ou seria a Buda?), ela está

ajudando a gente a tratar os nossos desequilíbrios.

A visão oriental da acupuntura defende que ela atua

sobre os 14 meridianos do corpo, canais invisíveis que

estão relacionados com os órgãos internos e com nossa

energia yin e yang. O Sr. Miyai, cujo avô já trabalhava

com as agulhas no Japão, me explicou que a acupuntura

controla a energia vital do corpo e que ela é um trata-

mento interno e externo que traz o equilíbrio. Ou seja,

não se limita a tratar um ponto específico.

Na fronteira entre o Oriente e o Ocidente

Os médicos ocidentais, cada vez mais adeptos da

acupuntura, têm uma visão um pouco menos zen. Para

eles, os benefícios são alcançados porque a estimulação

de certos pontos do corpo têm efeito direto sobre o sis-

tema nervoso, liberando substâncias como a serotonina

(que traz bem-estar), o cortisol (antiinflamatório natu-

ral) e a endorfina (analgésico). O Dr. João Elias Cabrera,

presidente da Sociedade Médica de Acupuntura do RS,

considera que a acupuntura está justamente na frontei-

ra entre a tradição oriental e modernidade ocidental.

Técnicas superantigas, como a moxabustão, mesclam-

se com outras mais modernas, como a acupuntura a laser

e a eletroacupuntura. O Dr. Cabrera trabalha com

acupuntura desde a década de 70 e acredita que uma

A ACUPUNTURA É UM

TRATAMENTO INTERNO

E EXTERNO QUE TRAZ O

EQUILÍBRIO, CONTROLA A

ENERGIA VITAL DO CORPO

84 Estilo Zaffari

80945_acupuntura.p65 31/08/04, 22:424

releitura é necessária, pois nada fica estagnado no tem-

po. Eu pedi para ele me contar alguns casos que o im-

pressionaram, e ele falou de uma experiência que teve

na China, quando presenciou um homem que não abria

uma das pálpebras conseguir fazê-lo após ser tratado com

a moxabustão, que é um tipo de acupuntura em que

não se trabalha com agulhas, mas com um bastão que

transmite calor aos pontos. Outro caso foi de uma

paciente sua que tinha uma dor de cabeça diária há 20

anos e que se curou completamente. “A cefaléia era tão

presente na vida dessa paciente que depois de curada

ela chegou ao ponto de dizer que sentia saudades da dor.”

Os resultados parecem milagrosos

Conversando com acupunturistas e pessoas que fo-

ram tratadas por eles, chegamos à conclusão de que os re-

sultados são mesmo milagrosos. É comum ouvir falar de

gente que tinha limitação de movimento e que saiu do con-

sultório se mexendo perfeitamente, de pessoas que sofriam

de depressão e que conseguiram superar a doença, de dores

crônicas que sumiram num picar de agulhas. A astróloga

Amanda Costa é adepta da acupuntura desde que era ado-

lescente. Já tratou problemas digestivos, enxaqueca, aler-

gias respiratórias graves, estresse e, de uns anos pra cá, faz

sessões para aliviar os efeitos de uma tendinite adquirida

por causa do uso contínuo do computador. Ela diz que com

a acupuntura sente uma melhora quase imediata e que,

depois da aplicação, fica super-relaxada e bem disposta.

Amanda já passou por cinco acupunturistas diferentes. Por

que essa infidelidade? “São momentos de vida diferentes.

De alguma forma, os acupunturistas estavam mais ligados

a pessoas que eu conhecia, a indicações de amigos. E cada

um tem um estilo, uma mão. Alguns têm a mão mais pesa-

da e dói desnecessariamente.”

Sem contra-indicações ou reações adversas

Na pesquisa que fiz para esta matéria, ouvi comen-

tários do tipo “eu odeio a idéia de tomar picadas, só fa-

ria acupuntura em caso de vida ou morte”. Bobagem!

Você não sabe o que está perdendo, meu amigo. As agu-

lhas são da espessura de um fio de cabelo e não doem

quando entram na pele. A sensação é de um leve cho-

que e de um calorzinho local. Pense bem: essas picadinhas

podem revitalizar seu organismo, atuam como analgési-

co e antiinflamatório, são excelentes para o sistema

imunológico e regulam todo o organismo. O efeito é pra-

ticamente imediato e não há nenhuma contra-indica-

ção ou reação adversa. Tenho certeza de que um dia

você vai ter vontade de experimentar. Nem que seja

naquela manhã em que você levantar com o pescoço

todo torto...

Pontos positivos

O SUS, Sistema Único de Saúde, oferece acu-

puntura. Em Porto Alegre, o Centro de Saúde Modelo,

por exemplo, atende 40 pacientes por semana.

Para tornar-se um acupunturista não é necessá-

rio ser médico formado, mas é preciso passar por um

curso com 700 horas/aula e prestar uma prova de nível

nacional.

As agulhas são sempre pessoais ou descartáveis,

normalmente feitas de aço inoxidável, e podem variar

de 1 cm a 12 cm de comprimento.

A acupuntura é indicada para o tratamento de

dor de cabeça e enxaqueca, sinusite e rinite, amigdali-

te, soluço, gastrite, hipertensão, paralisia facial, incon-

tinência urinária noturna, dor nas costelas, dor ciáti-

ca, dor lombar, artrite reumatóide, ansiedade, depres-

são e por aí vai.

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P O R P A U L A T A I T E L B A U M F O T O S A N G E L A F A R I A S

ELE TERIA MOTIVOS DE SOBRA PRA FAZER O TIPO

“ESTRELÃO”. MAS, UFA, ESTÁ MAIS PARA O GÊNERO QUERIDÃO.

JORGE FURTADO É UM DOS PRINCIPAIS ROTEIRISTAS BRASILEI-

ROS, UM CINEASTA PREMIADO, UM FABRICANTE DE IDÉIAS E...

ENFIM, JÁ BOTOU A MÃO EM TANTO FILME E PROGRAMA DE TV

QUE, PARA SABER MAIS DETALHES, É MELHOR ENTRAR NO SITE

DA CASA DE CINEMA DE PORTO ALEGRE, DA QUAL, POR SINAL,

ELE É SÓCIO. EM JANEIRO, ESTRÉIA SEU NOVO LONGA-METRAGEM:

Perfil

“MEU TIO MATOU UM CARA”. EU TIVE O PRIVILÉGIO DE ASSISTIR

AO TRAILER ANTES DE ENTRAR NO CIRCUITO COMERCIAL E, SINCE-

RAMENTE, NEM É PRECISO TER A INTELIGÊNCIA ELEVADA AO CUBO

COMO O JORGE PARA SABER QUE VAI SER UM SUCESSO. A SE-

GUIR, UM POUCO DA NOSSA CONVERSA, QUE ACONTECEU NO

APARTAMENTO ONDE ELE MORA COM A NORA (GOULART, PRODU-

TORA DE CINEMA), A ALICE (A FILHOTA DE 4 ANOS) E COM SUAS

CENTENAS (OU SERIAM MILHARES?) DE LIVROS, DVDS E CDS.

Salve

Jorge!

,

86 Estilo Zaffari

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“TEMPORAL” FOI TEU PRIMEIRO CURTA-METRAGEM, FEITO EM

1984. NAQUELA ÉPOCA, TU IMAGINAVAS QUE ESTARIAS ASSIM, VI-

VENDO DE CINEMA, VINTE ANOS DEPOIS?

Não, na verdade eu só tive a idéia de cinema, como

uma coisa profissional, mais tarde. Em 84, eu fazia televi-

são, onde o negócio vai ao ar e quem não viu não vê nunca

mais. Já o filme tem uma durabilidade que é sedutora. En-

tão a nossa turma da TV se juntou e fizemos um filme que

é o Temporal, mas que é ruim, muito ruim, horrível... Ba-

seado num conto do Verissimo. Nós estragamos bastante o

conto. Ele é bem fotografado, bem produzido, mas eu não

tinha a menor idéia de como é que se fazia. Eu e o Zé Pedro

(Goulart) dirigimos. Um absurdo completo... eu era o dire-

tor e nunca tinha visto uma câmera...

E QUANDO É QUE ENGRENOU?

Em 86, a gente fez um outro curta-metragem, O Dia

em que Dorival Encarou a Guarda. Esse é legal... até hoje eu

acho legal. E aí o filme teve uma repercussão enorme, ga-

nhou o Festival de Gramado, ganhou prêmios fora do Bra-

sil. Fui pra Cuba, o filme foi comprado, enfim... aí come-

çou: “Ué, dá pra fazer isso profissionalmente”.

QUAL É O MARCO DO JORGE FURTADO “CINEASTA”?

O Ilha das Flores, de 1989, é o primeiro filme que eu

escrevi e dirigi sozinho. Desde então, tem sido assim. Eu

sou muito mais um roteirista que resolveu fazer seus pró-

prios filmes do que um diretor.

O “ILHA DAS FLORES” TEM UMA LINGUAGEM DE COLAGEM QUE

ATÉ HOJE A GENTE PERCEBE NOS TEUS FILMES.

A palavra é essa: colagem. Eu sempre gostei de colagem.

Eu fiz o Instituto de Artes, eu gostava, até hoje gosto de dese-

nhar, mas eu não sabia desenhar realmente, então usava mui-

to a colagem. O Dorival já tem uma coisa de colagem, ele mis-

tura Casablanca, King Kong, quadrinhos e tal... O Barbosa (cur-

ta-metragem de Furtado sobre o goleiro Barbosa, da seleção de 1950)

é uma mistura de documentário e ficção, tem as cenas dos

jogos com entrevista, então tem um pouco de colagem. E o

Ilha é radicalmente isso. É uma colagem mesmo. Eu gosto de

pegar várias coisas diferentes e misturar...

DÁ PRA DIZER QUE TU TENS UMA LINGUAGEM PRÓPRIA?

Acho que sim, eu tento não ter, mas, ao escrever, o

estilo meio que se revela. Meu jeito de pensar as coisas, de

relacionar as coisas é de colagem. O Homem que Copiava

(longa-metragem de 2003) também tem essa lógica, por-

que ele é contado do ponto de vista de um narrador que é

um garoto no limite da esquizofrenia.

TU MUDAS MUITO O TEU ROTEIRO QUANDO ESTÁS DIRIGINDO?

Mudo, mudo, xingo o roteirista, como é que ele escre-

veu essa cena? Faço isso o tempo todo. Tu escreves “cho-

ve”... Aí, pra filmar isso é uma desgraça, porque tu tens que

chamar bombeiro... Às vezes eu falava pras pessoas da Glo-

bo: se me incomodarem muito eu coloco no roteiro “cho-

ve”. Pra mim são cinco letras, pra vocês é um inferno.

E QUANDO OUTRO DIRETOR MUDA UM ROTEIRO TEU, INCOMODA?

Acontece seguido... Uma das primeiras coisas que eu escrevi

pra Globo foi um episódio do programa Delegacia de Mulheres.

Só vi depois de pronto. Eu lembro que tinha uma cena em que a

Heloísa Mafalda assistia uma menina tendo um ataque, berran-

do e tal. No meu roteiro chegava um cara e perguntava “O que é

que ela tem?”. E a Mafalda respondia: “O que é que ela tem? Ela

tem quinze anos”. Era assim o meu texto. E aí (ele começa a rir) eu

fui ver o negócio no ar e dizia assim: “O que é que há com essa

menina?”. E a resposta: “O que é que há? Ela tem quinze anos”.

Eu queria morrer! Aaaah, não! É tem! É tem! Quando eu falei,

reclamei, os caras da Globo nem entenderam o que eu tava fa-

lando. Que é que esse cara tá dizendo? E eu meio que resolvi

dirigir por isso, entende? Eu sou muito detalhista, principalmente

em termos de diálogos.

A IDÉIA PRA UM ROTEIRO SURGE DE ONDE?

Ela pode surgir de vários lugares, de um conceito, de uma

frase, de uma paisagem, de um cenário, de uma luz, de um

som, de uma música, de qualquer coisa. Eu já fiz um filme que

surgiu de um cenário, um cassino abandonado em Canela, eu

sempre quis filmar naquele lugar, então fiz uma história que

UM ROTEIRO PODE SURGIR DE UM CONCEITO,

DE UMA FRASE, DE UMA MÚSICA, DE UMA LUZ...

88 Estilo Zaffari

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pudesse se passar lá. Em outro filme, que eu fiz com a Rô

(Rosângela Cortinhas), a idéia surgiu das grades, porque Porto

Alegre é uma cidade que tem muitas grades, muito mais do

que as cidades normalmente têm. Um arquiteto espanhol que

esteve aqui disse que é a cidade do mundo que mais grades

tem, ele nunca viu nada igual. É uma paranóia desproporcio-

nal com a violência. Aí a gente começou a pensar nessa coisa

e escrevemos um roteiro que era sobre isso.

E O ROTEIRO DE “O HOMEM QUE COPIAVA”?

O Homem que Copiava já veio de uma idéia, pensei em

escrever a história de um cara que faz cópia e que não usa o

cérebro pro trabalho, mas pra fazer outra coisa. Comecei as-

sim, não tinha mais nada além disso. Eu fiquei escrevendo as

coisas que ele pensava, depois é que fui inventar uma história.

TU FALASTE EM PORTO ALEGRE. NÃO PENSAS EM SAIR DAQUI?

Eu penso em morar um tempo fora, mas ir e voltar, não

me transferir pra outro lugar. Eu gosto daqui. O pessoal de

fora diz “Tu CONTINUAS em Porto Alegre?”. Eu acho meio

ofensiva essa pergunta. Por que vocês morar no Rio? Por que

vocês moram em São Paulo? No Rio até entendo, que é lin-

do... Mas morar em São Paulo é um inferno na terra... Eu

moro aqui porque nasci aqui, na verdade a qualidade de vida

de Porto Alegre é a melhor do Brasil, tem tudo num tamanho

razoável. Eu não consigo ir em todos os shows que acontecem

em Porto Alegre, não consigo ver todos os filmes que passam.

Então tá de bom tamanho.

É BOM FILMAR AQUI?

É, por vários motivos. A luz é muito boa. E o tamanho

da cidade, o deslocamento.

TU ACHAS QUE O CINEMA BRASILEIRO TEM UMA PERSONALIDADE?

Mais ou menos. Tem uma coisa boa que é a mistureba de

raças, de cultura, de tudo. Essa mistura tá bem representada no

cinema, com estilos diferentes. Em um determinado período

todos os filmes eram muito parecidos uns com os outros, e isso

criava um tipo de espectador de filmes brasileiros. Tem uma

pergunta que é hilária, que eu já ouvi várias vezes. Eu tava em

Tramandaí, em um restaurante, vendo a locação pro Dois Ve-

rões (Houve uma Vez Dois Verões, longa de 2002) e o garçom

chegou e disse: “O que vocês estão fazendo aí?”. “Estamos fa-

zendo um filme.” E ele perguntou: “Nacional?” (ele ri) “Não, é

iraniano”... Virou um gênero: cinema brasileiro.

MAS ISSO MUITO PELA MEMÓRIA DOS ANOS 70...

Esses dias comentaram sobre filme brasileiro e alguém fa-

lou “filme brasileiro? Aquela coisa preto-e-branco com umas

pessoas cantando?”. Aí tu vês que tem gente que parou nos

anos 50, nas chanchadas da Atlântida. Mas assim, eu acho o

cinema brasileiro, na média, muito melhor, em termos de con-

teúdo, do que o cinema americano. Tem um exemplo que eu

acho engraçado: imagina se um cineasta brasileiro fizesse um

filme onde o presidente da República, no dia 7 de setembro,

pegasse um jato pra impedir a invasão de marcianos. Pra eles

isso é sério! Não é comédia! O cinema brasileiro é mais madu-

ro. Mas ao mesmo tempo, eu acho que o maior problema do

país talvez seja um excesso de pretensão artística. Eu vejo,

muitas vezes, pessoas que não sabem filmar uma cena básica,

não sabem o mínimo de decupagem, de diálogo, de encena-

ção, querendo fazer um filme que revolucione.

QUAL A IMPORTÂNCIA DE TER UMA MULHER LINDA NO ELENCO

DE UM FILME?(“O HOMEM QUE COPIAVA” TEM LUANA PIOVANI NO

ELENCO E “MEU TIO MATOU UM CARA” TEM DEBORAH SECCO)

Muito importante, nada é mais bonito do que uma

mulher bonita. E “a beleza salvará o mundo” (Dostoievski).

HUMOR É FUNDAMENTAL?

Eu acho que é fundamental, sempre. Tu podes alter-

nar a tragédia com o humor. Quem inventou isso foi o

Shakespeare, ninguém antes misturava tanto. A piada te

leva a um limite do pensamento que tu não exploraste ain-

da. Nietzsche já dizia: desconfie de toda verdade que não

contiver uma gargalhada.

QUAL A COISA MAIS ENGRAÇADA QUE TU LEMBRAS DE TER ACON-

TECIDO NUM SET DE FILMAGEM?

Uma coisa engraçada que já me aconteceu mais de

NIETZSCHE DIZIA: “DESCONFIE DE TODA VERDADE

QUE NÃO CONTIVER UMA GARGALHADA”

90 Estilo Zaffari

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uma vez foi dirigir uma pessoa pensando se tratar de um

figurante e descobrir que era uma pessoa “real”, que estava

passando. Parei um sujeito na calçada e disse que ele esta-

va saindo atrasado do prédio, tinha que sair antes. O cara

ficou me olhando com uma expressão estranhíssima até eu

perguntar se ele era figurante. Ele morava no prédio e es-

tava saindo para o trabalho...

COMO É A TUA ROTINA? TU ESCREVES TODOS OS DIAS?

Escrevo todos os dias. Acordo, começo a escrever no

mais tardar às 9 horas. Leio os jornais, respondo a e-mails e

fico lendo e escrevendo o dia inteiro, se eu não tô dirigin-

do, claro. Eu escrevo muitas coisas ao mesmo tempo, abro

várias janelas.

ESTÁS ESCREVENDO PRA GLOBO NO MOMENTO?

Ano passado eu fiz o Cena Aberta, uma série. E tenho

encomenda de outra. Tô assim, procurando histórias, por-

que ali são adaptações. Às vezes escrevo coisas que eu não

tenho a menor idéia de pra que servem, vou escrevendo,

vou escrevendo...

Perfil

TU LÊS BASTANTE?

Eu leio compulsivamente. Sou um leitor totalmen-

te indisciplinado, leio de tudo, sempre tô lendo, normal-

mente mais de um livro ao mesmo tempo. Agora estou

lendo A Pintura como Arte, de Richard Wollhein (Cosac

e Naify).

ALGUM GÊNERO PREFERIDO?

Política, sociologia, coisas assim. Gosto de poesia, na

verdade comecei mais lendo poesia do que outras coisas.

NUNCA ESCREVESTE POESIA?

Já! Todo mundo já escreveu... Mas felizmente o bom

senso me fez parar...

QUAL O CORREDOR DE QUE MAIS GOSTAS NO SUPERMERCADO?

Corredor preferido? Aquele do meio, que cruza por

todos os outros e de onde eu posso enxergar tudo.

O QUE É QUE NUNCA FALTA NA TUA GELADEIRA?

Suco de laranja. Água, iogurte...

NADA É MAIS BONITO DO QUE UMA MULHER BONITA. E

92 Estilo Zaffari

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TU COZINHAS?

Não.

E QUAL O TEU PRATO PREFERIDO?

Massa. De vez em quando me dá vontade de co-

mer massa. Aliás, Porto Alegre tá mal de restaurantes

de massas.

TEM ALGUMA COISA QUE NÃO FIZESTE AINDA E QUERES FAZER?

Pois é... Tem um monte de coisa que eu não fiz. Eu não

fiz nenhum filme infantil. Eu nunca fiz um musical. Eu não

fiz filme de terror. Eu não fiz nenhum pornô (ri)...

MAS JÁ PASSOU PELA TUA CABEÇA FAZERES TUDO ISSO?

Já, já...

E OS PRÓXIMOS PROJETOS?

Eu tô escrevendo dois roteiros ao mesmo tempo. Um é

uma comédia rasgada, cubana, comédia política. E o outro

é um drama completo, que eu tô escrevendo há mais tem-

po, bem adulto, seria o meu primeiro longa totalmente

adulto, os personagens são mais velhos.

TU ÉS CALMO ASSIM QUANDO ESTÁS DIRIGINDO?

Sou, sou supercalmo... Aliás, eu sou preguiçoso, um do-

mingo desses a gente passou o dia inteiro em casa, de pijama,

eu brincando com a Alice, jogando joguinho. Quando termi-

nou o dia ela falou: “Que dia bom, nem tirei o meu pijama”.

POR FALAR EM FICAR EM CASA, QUE FILME TU RECOMENDAS

PRAS PESSOAS ASSISTIREM NO DVD?

Qualquer um do Billy Wilder. Crepúsculo dos Deuses,

Irma la Douce, Testemunha de Acusação...

QUAL TEU MAIOR SONHO DE CONSUMO?

Uma casa com uma enorme biblioteca na beira de um

lago na Itália, com uma janela de onde eu possa

ver meus bisnetos velejando.

ALGUM LEMA DE VIDA...

(Ele ri). Continue a nadar, continue a nadar, como diz

a Dolly do filme Procurando Nemo.

“A BELEZA SALVARÁ O MUNDO” (DOSTOIEVSKI)

Estilo Zaffari 93

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Assim, ó...

180 anos depois, símbolos de trabalho, alimento e partilha

ALEMÃES, ALEMÃOS

Dos alemães que vieram para cá no século 19 povoar o Rio Gran-

de do Sul, muitos foram para o campo e lá ficaram, mas teve quem

viesse direto para a cidade, ali permanecendo. A maioria era gente po-

bre, disposta a se matar de trabalho para vencer na vida, e isso de fato

aconteceu em vários casos. Havia uma pequena parte de migrantes

com algum dinheiro, ou pelo menos com algum conhecimento técnico,

alguma destreza particular. A divisão foi mais ou menos assim: pobres e

sem habilitação foram para o campo, enquanto os com dinheiro e/ou

profissão definida vieram para a cidade. Eram poucos, comparados ao

montante de gente que foi para as colônias.

Se a gente se perguntar que imagem desses bravos alemães origi-

nais ficou em nós, se a rural ou a urbana, a resposta vai indicar a primei-

ra, aquela referente ao mundo da terra, ao trabalho na agricultura. Toda

uma vibrante experiência urbana germânica que de fato houve em Por-

to Alegre, mais ou menos entre 1840 e 1940, parece ter desaparecido,

ou pelo menos perdido força.

Um estudo bem recente (Presença teuta em Porto Alegre no

século XIX – 1850-1889, de Magda Roswita Gans, Ed. UFRGS) faz

contas meticulosas e conclui que, em 1856, da população total na capi-

tal dos gaúchos (19.890 almas), uns 1.260 seriam alemães. Menos de

10% do total, alguém dirá; sim, mas é preciso considerar que se tratava

de uma sociedade escravocrata, com talvez um quarto da população

em condição servil. É de ver também que os teutos eram uma gente

totalmente integrada na cidade, sendo a esmagadora maioria vinda di-

retamente da Europa com algum ofício sabido e praticado. (A autora

calcula que apenas uns poucos eram pobres, para quase 80% de classe

média e o restante gente com posses.)

Eram alfaiates, pintores, sapateiros, carpinteiros, chapeleiros,

charuteiros, fabricantes de carroças, afiadores, reparadores de várias

coisas, funileiros, cervejeiros, passadeiras e engomadeiras, professores,

relojoeiros, cozinheiros, mais os hoteleiros, restaurateurs, donos de ba-

res e de fábricas as mais variadas. Moravam quase todos no centro da

cidade. A tal ponto eram presentes, que algum viajante que passou por

aqui anotou em seu caderninho: “Parece uma cidade alemã”. Nos anos

de 1860 e 70, criam-se sociedades entre a população alemã: a Socieda-

de Orfeu, de São Leopoldo, a futura Sogipa e a Sociedade Leopoldina

Juvenil. Décadas mais tarde, nos vibrantes anos da década de 1920, um

jovem e futuroso jornalista chamado Carlos Reverbel, chegando para

fazer a vida na capital, também constatava que bares, restaurantes, con-

feitarias, todo um mundo cultural em Porto Alegre era marcado pela

presença alemã.

Mas veio a Guerra, a Segunda, entre 1939 e 1945. Era o tempo

da demência nazista na Alemanha, e aqui os alemães e seus descenden-

tes, tivessem ou não relação com a antiga pátria (a maioria não tinha

mais vínculo algum), foram castigados pelo destino: tudo que lembrasse

Hitler, mesmo que fosse apenas um vago sobrenome Schmidt ou Fischer,

era visto como ligado a ele, ou pelo menos era suspeito. O presidente

Getúlio Vargas teve a iniciativa de suprimir o ensino em alemão nas

escolas (também o italiano e o japonês). A tese era a da unificação do

país, o que estava correto, mas ao preço de eliminar as diferenças, o que

foi tremendo. Muita gente parou de falar a língua, deixando de trans-

miti-la aos filhos e netos.

No interior, porém, essa perseguição parece ter poupado algu-

mas regiões, que preservaram uma ligação mais orgânica com a cultura

da língua alemã. Era gente com menos letras, menos cultura sofistica-

da, mas com grande capacidade de trabalho. Gente que por ter perma-

necido em contato com a tradição pôde passar adiante a língua e a

cultura. Gente que hoje, 180 anos depois dos primeiros a chegarem por

aqui, nos dá notícia de um jeito específico de ser.

Desses homens e mulheres simples nos ficou o “kerb”, festa origi-

nalmente feita em torno da igreja – parece que a palavra vem de Körbe,

plural de Korb, cesto, exatamente o cesto que cada família levava, cheio

de comida preparada em casa, para compartilhar com os amigos e vizi-

nhos. Nos ficou a chimia (Schmier), a cuca (Kuchen) e a mesa farta

para espantar o fantasma das fomes antigas. Ficaram símbolos de traba-

lho, alimento e partilha, o que afinal não é má idéia, antes ou agora.

L U Í S A U G U S T O F I S C H E R

LUÍS AUGUSTO FISCHER É PROFESSOR DE LITERATURA E ESCRITOR

94 Estilo Zaffari

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