revista dos bancários 36 - nov. 2013

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www.bancariospe.org.br DOS Bancários Revista Ano III - Nº 36 - Novembro de 2013 Publicada pelo Sindicato dos Bancários de Pernambuco Lançado em julho pelo Governo Federal, o programa Mais Médicos já conta com 6.600 profissionais que cuidam da saúde de 10,3 milhões de pessoas que vivem em regiões carentes. A maioria dos médicos veio de Cuba e, a despeito da falsa polêmica criada pela grande imprensa, eles estão mudando a realidade nos rincões do país DOUTORES DA ESPERANÇA

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Page 1: Revista dos Bancários 36 - nov. 2013

www.bancariospe.org.br

DOS BancáriosRevista

Ano III - Nº 36 - Novembro de 2013 Publicada pelo Sindicato dos Bancários de Pernambuco

Lançado em julho pelo GovernoFederal, o programa Mais Médicosjá conta com 6.600 profissionaisque cuidam da saúde de 10,3 milhõesde pessoas que vivem em regiõescarentes. A maioria dos médicos veiode Cuba e, a despeito da falsa polêmicacriada pela grande imprensa, eles estão mudando a realidade nos rincões do país

DOUTORESDA ESPERANÇA

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2 REVISTA DOS BANCÁRIOS

Opinião Editorial

>>A luta por direitos nunca acaba, ela sempre se renova com o objetivo de construir um mundo mais igualitário e justo para todos

Direitos

DOS BancáriosRevista

Redação: Av. Manoel Borba, 564 - Boa Vista, Recife/PE - CEP 50070-00Fone: 3316.4233 / 3316.4221Correio eletrônico: [email protected]ítio na rede: www.bancariospe.org.br

Presidenta: Jaqueline MelloSecretária de Comunicação: Anabele SilvaJornalista responsável: Fábio Jammal MakhoulConselho editorial: Anabele Silva, Geraldo Times, Jaqueline Mello e João RufinoRedação: Fabiana Coelho, Fábio Jammal Makhoul e Sulamita EsteliamDiagramação: Bruno LombardiFoto da capa: Ivaldo BezerraImpressão: NGE GráficaTiragem: 11.000 exemplares

Informativo do Sindicato dos Bancários de Pernambuco

ÍndiceMais médicos

Entrevista: Silvia Castrillón

Consciência negra

Segurança bancária

Dicas de cultura

Bancário artista

Conheça Pernambuco

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As reportagens desta edição da Revista dos Bancários abordam diversos temas, mas todas elas têm uma questão em comum: o direito. A matéria de capa trata do direito à saúde, a entrevista do mês fala do direito à leitura e outras duas reportagens abordam a luta pela igualdade de direitos entre negros e brancos e o direito à segurança

nos bancos. Segundo o Dicionário Aurélio,

direito é o “complexo de leis ou normas que regem as relações entre os homens”. A história do direito está ligada ao desenvolvimento das civili-zações. E a falta dele mostra o quanto nossa sociedade ainda precisa evoluir.

É um absurdo, por exemplo, que em pleno século 21 a cor da pele ainda resulte em desigualdade no exercício da cidadania. É um absur-do que num país rico como o Brasil ainda faltem médicos para atender

a população decentemente. É inacreditável que, na era digital, milhões e milhões de pessoas em todo o planeta ainda não tenham acesso a um livro. E mais inacreditável ainda é que os bancos que atuam no Brasil, e que lucram mais de R$ 60 bilhões por ano, não garantam a seguran-ça de clientes e usuários.

Mas tudo isso está mudando. Lentamente, mas está. E é isto que a edição de novembro da Revista dos Bancá-rios mostra nas reportagens.

O Programa Mais Médicos, do Governo Federal, está garantindo o direito básico de atendimento à saúde de milhares de pessoas. Ações do governo também estão ampliando a cidadania da população negra que nunca teve acesso pleno aos direitos.

Já a bibliotecária Silvia Castrillón, nossa entrevistada, ajudou a criar uma rede de bibliotecas na Colômbia e esta experiência está inspirando outros países, como o Brasil.

Por fim, a luta dos bancários garantiu a implantação do projeto-piloto de segurança nas mais de duzentas agên-cias de Recife, Olinda e Jaboatão. A conquista ampliou a segurança nos bancos destas cidades, mas os assaltantes estão migrando para outros municípios.

Tudo isso mostra, também, que a luta por direitos nunca acaba, ela sempre se renova com o objetivo de construir um mundo mais igualitário e justo para todos.

@bancariospe

/bancariospe

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Capa Saúde

Uma ajudamuito bem-vindaA cubana Noraida Perez é médica.

Atualmente, atende no Posto de Saúde da Família “Josefa Ana da Conceição”, também conhe-

cido como Posto Siqueira, na área rural

de Machados, Agreste de Pernambuco. A Revista dos Bancários esteve no município: conversou com os médicos cubanos, com os pacientes e com a equipe da prefeitura. Viu o quanto o Brasil tem a ganhar com esta cooperação internacional. No início de dezembro, a cidade recebe a visita do ministro da Saúde de Cuba, que passará nos lu-gares do Brasil onde houve maior integração entre a equipe local e a cubana. >>

A MéDiCA CuBAnA norAiDA PErEz é Só CArinho CoM SEuS novoS PACiEntES, EM MAChADoS

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A consulta com a médica No-raida Perez não dura menos de vinte minutos, meia hora. Antes de atender, puxa a

cadeira do paciente para junto de si. Fala devagar e olha nos olhos de cada um deles enquanto conversa e escuta. Depois que prescreve a receita, explica tudo o que está escrito e pergunta se a pessoa está entendendo sua letra. Caso o paciente não saiba ler, faz questão de inquirir se há, em sua família, al-guém que possa ler para ele. Noraida é cubana e veio ao Brasil por meio do

Programa Mais Médicos.Junto com ela, veio Norge Rodri-

guez, que também atende nos Postos de Saúde da Família do município de Machados, no Agreste de Pernambu-co. Ambos têm mais de vinte anos de experiência em medicina e fazem questão de salientar: “Não viemos para competir, viemos para complementar”, diz Norge.

Machados tem uma população de pouco mais de 14 mil pessoas, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geogra-fia e Estatística), e uma situação privi-

Capa Saúde

Saúde reforçadaO que mudou no município de Machadoscom a chegada dos médicos cubanos

ProgrAMA MAiS MéDiCoS foi lAnçADo EM julho E AtEnDE uMA DAS PrinCiPAiS rEivinDiCAçõES DoS ProtEStoS quE AgitArAM o PAÍS no MêS AntErior

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legiada no que se refere à assistência em saúde. São quatro Postos de Saúde da Família e duas unidades de apoio em áreas rurais.

Além dos dois cubanos, há quatro médicos do Provab (Programa de Valorização da Atenção Básica) e um médico efetivo. Além disso, há um hos-pital de pequeno porte, com diversas especialidades: psiquiatra, ortopedista, cardiologista, ginecologista, entre outros. Existem médicos plantonistas todos os dias, laboratório próprio e até um centro de fisioterapia na cidade. “Temos uma equipe muito boa, com treze médicos ao todo, e conseguimos garantir uma integração perfeita dos cubanos com os outros”, afirma a se-cretária de Saúde do município, Leila Carvalho.

No começo, segundo Angélica Albu-querque, coordenadora dos Postos de Saúde da Família, havia resistência de alguns médicos brasileiros integrantes da equipe. “Mas a própria postura dos cubanos, a simplicidade, o amor pela profissão, foi quebrando estas barrei-ras. Hoje, eles moram todos na mesma casa e até já fizeram churrasco juntos”, conta Angélica.

A chamada Casa dos Médicos, que

abriga os dois cubanos e os quatro mé-dicos do Provab, é bancada pela Pre-feitura de Machados. É uma residência confortável, em área privilegiada da cidade e com uma pessoa contratada para fazer a limpeza e as refeições. “Estamos fazendo o possível para que eles se sintam bem em nossa cidade.

Sabemos que eles estão longe das famílias e ainda acompanharam essa polêmica difundida pela mídia quanto à vinda dos cubanos...”, afirma Leila.

rECEPtiviDADESegundo Norge, em nenhum momen-

to eles sofreram qualquer problema no acolhimento. Desde sua chegada no aeroporto, eles foram bem tratados. No entanto, acompanharam pelos no-ticiários o que ocorria com alguns de seus conterrâneos. “Fiquei com muito temor. Felizmente, a receptividade foi ótima. Temos uma relação maravilhosa com os colegas, com os moradores e com o pessoal da prefeitura”, afirma Noraida.

Diferente do que se propagou na mídia, ela diz que não é qualquer mé-dico de Cuba que pode participar das missões internacionais. “Há muitos re-quisitos. Tudo é analisado”, explica. O processo de formação em Cuba começa pelo ingresso nos cursos de medicina.

Capa Saúde

norAiDA: tEMoS uMA rElAção MArAvilhoSA

CoM oS ColEgASBrASilEiroS

MéDiCoS CuBAnoS forAM hoStilizADoS nA ChEgADA Ao BrASil Por uM PEquEno gruPo

quE rEPEtiA o DiSCurSo PrEConCEituoSo DA grAnDE iMPrEnSA. nA viDA rEAl, 74% DoS BrASilEiroS AProvAM o ProgrAMA

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Capa Saúde

“É avaliado o índice acadêmico e há, também, uma prova de ingresso. Para alguns cursos, como o de medicina, não é possível entrar com média inferior a 95 pontos”, conta Noraida.

São seis anos de formação, totalmen-te custeada pelo estado – inclusive os livros. Depois, o aluno precisa prestar dois anos de serviço social para a po-pulação mais carente. Só então, pode optar por uma especialidade, que dura mais três a cinco anos. Noraida tem formação em Medicina Integral Pedi-átrica, medicina interna, gineco-obste-trícia, e mestrado em atenção integral à mulher. Norge tem especialização em medicina geral e integral e pós--graduação em medicina bioenergética.

Ambos estão na segunda missão internacional. Noraida passou três anos na Venezuela; Norge, sete. “O Estado divulga a lista de exigências para quem quiser participar dos pro-gramas internacionais. Quem tiver interesse e preencher os requisitos, se inscreve”, explica a cubana. A cada onze meses fora de seu país, eles têm direito a passar férias de um mês com a família. Cada missão tem duração de três anos, que podem ser renovados. “É uma experiência enriquecedora para nossa profissão: conhecer realidades e experiências diferentes. Além disso, desta forma também apoiamos o nosso país pois, na medida em que colabora-

EM MAChADoS, oS PoStoS AtEnDEM

uMA MéDiA DE 40 A 50 PESSoAS Por DiA

AngéliCA AlBuquErquE, CoorDEnADorA DoSPoStoS DE SAúDE DAfAMÍliA DE MAChADoS

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mos com outros países, também eles podem cooperar com o nosso”, afirma Noraida.

SiStEMA DE SAúDENorge e Noraida são unânimes em

afirmar que o SUS (Sistema Único de Saúde) e o sistema de saúde cubano são muito semelhantes. Pelo menos, na filosofia e nas suas pretensões. No entanto, em Cuba, há uma equipe de profissionais para cada mil habitantes. No caso de Machados, a média é de uma equipe para cada três mil. E vale ressaltar: trata-se de um caso excepcio-nal, já que na maior parte dos municí-pios, o número de habitantes atendido por cada equipe é muito maior que esse.

Assim como no SUS, o encami-nhamento aos serviços de referência quando necessário também é parte da concepção da saúde cubana. “Aqui, eu percebo que ainda existem algumas dificuldades burocráticas quando esse encaminhamento é necessário. Mas acredito que é uma falha que pode ser superada”, opina Noraida.

Em Machados, uma das dificuldades é com a realização de alguns exames. “Como somos um município de peque-no porte, não temos acesso a exames como endoscopia, ultrassonografia e oftalmologia, por exemplo. Estamos tentando negociar, com a central de re-gulação, para que os pacientes possam realizar estes exames em municípios próximos, de maior porte, como Li-moeiro. No entanto, eles ainda estão bloqueados”, explica Leila.

A filosofia preventiva também faz parte do Programa Saúde da Família, assim como é a base do sistema de saúde cubano. “Mas ainda temos que trabalhar a cultura da população que, geralmente, só procura um médico quando a doença se manifesta”, diz a secretária de Saúde de Machados. Se-gundo Leila, já existem projetos para construção de um Núcleo de Apoio à

Saúde da Família e de uma Academia da Saúde – espécie de Academia da Ci-dade, que trabalhe de forma integrada com os Postos de Saúde da Família.

oS PACiEntESEm Machados, os postos atendem

uma média de 40 a 50 pessoas por dia. São pacientes que têm problemas de pressão, buscam acompanhamentos na gestação e até orientações para nutrição. Gente como José Simão, agricultor, que sofre de pressão alta e precisava de acompanhamento médico para extrair um dente. Foi atendido por Norge pela primeira vez. “Pensei que era mais difícil, mas entendi tudo que ele falou”, diz.

Etiene Henriques veio para sua segun-da consulta. “Gostei muito. Ele faz uma consulta bem demorada, explica tudo direitinho, conversa bastante...”, opina.

Assim como José Simão e Etiene, os moradores de Machados já aprovaram os médicos recém-chegados. Aliás, não são apenas os moradores do município que aprovam o programa Mais Médi-cos. Pesquisa realizada em setembro pela CNT (Confederação Nacional dos Transportes) revela que 73,9% dos bra-sileiros apoiam o programa. Em julho, 49,7% dos brasileiros eram favoráveis à medida. Em relação ao número dos que desaprovam, a taxa diminuiu de 47,4% para 23,8%.

Para Leila e Angélica, da Prefeitura de Machados, a cidade só ganhou com a chegada dos novos médicos. “Um ga-nho fundamental que eles trazem é este olhar humanizado para o paciente. Nós temos médicos excelentes no Brasil, mas ainda existe uma cultura baseada na quantidade de atendimentos, que não permite esta visão holística e esta preocupação com a saúde e bem-estar integral de cada pessoa atendida. E acho que, com a convivência com os cubanos, a medicina no Brasil só tem a melhorar”, afirma Angélica.

Capa Saúde

joSé SiMão não tEvEDifiCulDADE PArA EntEnDEr o MéDiCo CuBAno

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lEilA CArvAlho, SECrEtáriA DE SAúDE DE MAChADoS

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Entrevista Silvia Castrillón

Quando o assunto é política pú-blica de leitura e biblioteca, a Colômbia é referência para a América Latina e inspira

experiências Brasil afora, inclusive no Recife. O diferencial inovador no trato com cultura escrita, sobretudo na capital Bogotá, em Medellín e Cáli, está na par-ticipação popular na construção e gestão do processo.

O trabalho da bibliotecária Silvia Castrillón está na gênese desse processo, ainda que a pesquisadora tenha, hoje, uma visão crítica dos resultados. Espe-cialista em políticas públicas para leitura e a escrita, ajudou a implementar a rede nacional de bibliotecas em 28 cidades colombianas, incluídas as supracitadas. É autora de vários livros. Dentre eles, “O direito de Ler e de Escrever”, publicado no Brasil há dois anos.

Silvia nasceu em Medellín e vive em Bogotá. Participou da criação da Asso-ciación Colombiana para el Libro Infantil y Juvenil, da Funda-Lectura (Fundación para El Fomento de la Lectura) e presidiu a Associación Colombiana de Lectura e Escritura (Asolectura). Integra o Comitê Executivo da IBBY (International Board on Books for Young People), e é consul-tora de organismos internacionais como a Unesco e a ONU. Também presta con-sultoria a programas de leitura no Brasil, a exemplo de São Paulo e Porto Alegre.

Castrillón esteve no Recife e em Olinda, mês passado, para participar do II Encontro de Bibliotecas Públicas em Pernambuco, a convite da Releitura PE – Bibliotecas Comunitárias em Rede da

Leitura e bibliotecasformam identidadesEspecialista em políticas públicas envolvendo a leitura e a escrita, Silvia Castrillón ajudou a implementar a rede nacional de bibliotecas da Colômbia, que hoje é referência mundial

PArA SilviA CAStrillón, A lEiturA não rESolvE toDoS

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Entrevista Silvia Castrillón

Região Metropolitana. O evento integrou a programação da IX Bienal Internacio-nal do Livro, no Centro de Convenções.

A Revista dos Bancários acompa-nhou a pesquisadora durante dois dias. A entrevista que se segue é fruto das palestras, conversas nos intervalos da intensa programação - que incluiu visita à Biblioteca Multicultural Nascedouro, em Peixinhos - e posterior troca de men-sagens, via correio eletrônico.

O que torna a experiência da Co-lômbia na promoção da leitura e do acesso às bibliotecas um exemplo para a América Latina, especialmente?

De forma alguma apresentaria a expe-riência da Colômbia como modelo para a América Latina, por diversas razões: a primeira, porque não se podem ter mo-delos neste campo. Todas as experiências são únicas e não se pode transferi-las. Segundo, porque ainda que a Colômbia tenha refletido bastante sobre o tema, tais reflexões avançam em pequenos grupos, em espaços onde se coincidiu estarem

pessoas com atitude de leitor, dispostas a questionar suas próprias convicções. Por último, porque outros países também realizaram experiências interessantes.

Entretanto, creio que poderia definir um bom programa de promoção de lei-tura, digno de ser levado em conta, se ele é capaz de ser ao mesmo tempo espaço de reflexão de práticas de leitura e escola de formação permanente, onde se reflita, se discuta e se converse sobre leitura e sobre literatura. De modo especial, um programa que abra tempo e espaço para a leitura em grupos literários, conver-sas sobre textos e sobre a experiência dessa leitura. Enfim, que considere que a leitura literária tem, por si mesma, valor suficiente, para as pessoas e para a sociedade, para merecer ser promovida como direito.

Na Colômbia, de fato, temos uma gran-de tradição em bibliotecas, sobretudo em bibliotecas públicas. Estamos, há 30 anos, pelo menos, fazendo bibliotecas. As redes são includentes, alcançam toda a população - crianças, jovens e adultos

- e estão em todo o país.No plano nacional, o governo, há cerca

de 10 anos, começou a trabalhar para fazer uma biblioteca pública em cada município do país, o que não significa que todas funcionem como deveriam.

Há cerca de 1.196 bibliotecas na Colômbia, 10% delas estão em Bogotá e Medellín. Então, temos tradição, mas temos problemas também. Todavia, seguramente, a diferença fundamental é que o processo de criação das políti-cas públicas de leitura parte do povo, da sociedade organizada, para o poder público.

A demanda por políticas de leitura e bibliotecas como direito, que impul-siona a promoção da cultura escrita na Colômbia, pressupõe certo nível cultural e de conscientização cidadã, não é verdade? Qual a mola propul-sora da experiência e qual o papel da Academia nesse processo?

Este é outro ponto fundamental: o investimento na formação política e

A ColôMBiA tEM 1.196 BiBliotECAS: “EStAMoS há 30 AnoS, PElo MEnoS, fAzEnDo BiBliotECAS”, Diz CAStrillón

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Entrevista Silvia Castrillón

social de professores de bibliotecono-mia. Temos bibliotecários muito bem formados, e relativamente organizados, conscientes do papel da biblioteca na formação social, política e cultural, de construção da cidadania, enfim. Em Medellín, onde está a Escola Interameri-cana de Biblioteconomia, isso estava em debate há 40 anos. É movimento e com-promisso. Em Medellín, nos anos 80/90, começaram a se organizar grupos de professores e bibliotecários que tinham a consciência da cultura escrita como direito. Formaram grupos de leitura que se reuniam para ler e discutir formas de se apoderar desse direito. Creio que isso é o mais importante, a forma como se formou esse conceito. As bibliotecas comunitárias surgem pela iniciativa das

comunidades, das pequenas necessidades das mães de ter um local onde as crianças pudessem fazer suas tarefas. Então elas se organizam, vem o apoio das ONGs, e os grupos de jovens e apropriam dos espaços. Hoje têm orçamentos e gestões próprias, a partir de verbas definidas pelo orçamento participativo. Não é bom que fiquem à mercê dos humores políticos e do político da vez.

Pode-se perceber, claramente em suas falas, escritos e palestras, a crítica explícita às bibliotecas-parques e aos excessos do uso das novas tecnologias na promoção da leitura e da biblioteca. Cultura escrita e entretenimento são incompatíveis?

Não se trata disso. Minhas críticas

se devem à necessidade de que as bi-bliotecas, realmente, se convertam em espaços de acesso de todas as pessoas à cultura escrita. Trata-se mais de não se deixar levar por outras coisas... Às vezes se pensa que as bibliotecas não terão público se não lhes oferecermos vídeos e internet suficientes. Porém, a leitura mesmo, a leitura-livros, a leitura--textos escritos passam a um segundo plano. A verdade é que o lugar que ocupa a leitura nas bibliotecas parques me preocupa. Não poupam investimen-tos em prédios e tecnologias, mas me pergunto onde o contato com o livro como lugar e objeto para pensar a si mesmo há nesses espaços. Internet, vídeos e jogos interativos em excesso dão à biblioteca o caráter funcionalista ou de lugar de entretenimento, e a meu ver se contrapõem, ou se sobrepõem, ao sentido da leitura literária na construção da identidade e do pensamento como agentes transformadores das nossas vidas e da sociedade. Então, uma das minhas lutas na Colômbia é que a leitura de livros e textos escritos e, sobretudo, a leitura literária de qualidade sejam um dos programas fundamentais das bibliotecas.

No Recife, o poder municipal pensa em usar a experiência de Medellín com as bibliotecas-parques para, segundo dizem, promover a paz social. A seu ver, biblioteca pode ser parte de polí-tica de segurança pública?

Não é papel da biblioteca eliminar situações de conflito, de violência, mas dar acesso ao direito à cultura escrita, a melhores condições de vida, à cidadania, enfim. Recife, aliás, se aproxima de Me-dellín no que é bonito (risos). A leitura não se basta a si mesma nem resolve todos os problemas, mas nos faz refletir sobre o sentido que se quer da vida. A violência se origina da desigualdade, na pobreza, na exclusão e a biblioteca não pode responder por esses problemas.

PArA CAStrillón, o ACESSo AoS livroS é uM DirEito

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Sociedade Mês da Consciência negra

Os desafios da igualdade racial

O mito da democracia racial brasileira não resiste à rea-lidade dos números. Apesar da Constituição Cidadã e dos

avanços inegáveis nos últimos 10 anos com efetivas políticas públicas inclusivas, dados oficiais escancaram as situações de exclusão e desigualdade no exercício da cidadania. O acesso aos direitos não tem nada de igual, e desafia governos, organizações e ativistas pela igualdade racial no país.

A própria presidenta Dilma Rousseff o reconhece: “Não devemos ignorar que a

Os desafios da igualdade racialApesar dos avanços conquistados na última década, os negros aindasofrem com a exclusão e a desigualdade no exercício da cidadania

cor da pele foi, e infelizmente ainda é, motivo de exclusão, discriminação e precon-ceito contra milhões de brasileiros”, disse na abertura do 3º Congresso Nacional da Igualdade Racial, que aconteceu em Brasília na primeira semana de novembro - mês da Consciência Negra, celebrado dia 20, e também do combate à violência contra a mulher, fixado no dia 25.

É o primeiro congresso sob a vigência do Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010). Durante a cerimônia, a presidenta Dilma, dentre outras medidas, assinou decreto que institucionaliza o Estatuto, que passa a direcionar as políticas afirmativas do Estado nos diferentes setores da vida de mais da metade da população brasileira: 50,7% segundo o Censo/IBGE 2010.

Estabelece, também, o partilhamento das responsabilidades em cadeia, fundamental, segundo a ministra Luiza Bairros, da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, na execução das iniciativas direcionadas à população negra: “Isso envolve órgãos estaduais e municipais, com autonomia administrativa, orçamentária e financeira para fazer com que as nossas políticas cheguem à população”, explica.

Exemplos de desafios não faltam. Na saúde, a taxa de mortalidade materna entre as mulheres negras é 65,1% superior à das mulheres brancas.

Outro exemplo: o número de homicídios de brancos caiu 25,5% de 2002 a 2010, o de negros aumentou 29,8%. O Mapa da Violência 2012 não deixa mentir: morrer ou sobreviver tem a ver com a cor da pele.

A cor da pele faz a diferença, ainda, no que diz respeito à educação. Embora a pre-sença de negros graduados e nas universidades tenha aumentado – graças às políticas de cotas e a programas como o ProUni –, o analfabetismo na população negra ainda é o dobro dentre os brasileiros maiores de 15 anos: 13,3% contra 5,9%.

No mercado de trabalho, as desigualdades prevalecem. No caso do sistema financeiro, por exemplo, “apenas 3% dos bancários são negros e ocupam os postos mais baixos”, lembra Eleonora Costa, diretora do Sindicato. O racismo no setor é tema do Fórum Nacional pela Visibilidade Negra no Sistema Financeiro, promovido pela Contraf--CUT nos dias 13 e 14 de novembro, no Rio de Janeiro. E o Sindicato dos Bancários de Pernambuco, claro, se faz presente no evento.

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Segurança Projeto-piloto

As agências bancárias de Recife, Olinda e Jaboatão estão mais seguras desde agosto, quando os bancos terminaram de implantar

um projeto-piloto de segurança pioneiro no país, conquistado pelos bancários na Cam-panha Nacional do ano passado.

Embora ainda existam alguns problemas com a implantação do projeto, os resulta-dos já começaram a aparecer. O número de assaltos a banco nestas três cidades caíram quase que pela metade: de dezoito ocorrências registradas nos dez primeiros meses do ano passado para dez no mesmo período deste ano. Mas o número de assal-tos a bancos em todo o Estado continua o mesmo: 27. Isso mostra que o projeto-piloto tem levado os assaltantes a migrarem para outros municípios de Pernambuco.

Para a presidenta do Sindicato, Jaqueline Mello, a implantação do projeto-piloto é uma grande vitória dos bancários. “Este é o resultado de anos de luta e muita pressão. Conseguimos dar um grande passo para que os bancos cumpram a sua responsabilidade. Agora, vamos acompanhar de perto todo o andamento do programa aqui em Pernam-buco para que, em breve, essas medidas se-jam estendidas para todo o Brasil”, salienta.

O projeto-piloto conquistado pelos ban-cários garantiu a implantação dos principais itens de segurança reivindicados pela cate-

Agênciasmais seguras

Conquistado pelos bancários na Campanha Nacional do ano passado, o projeto-piloto

de segurança já está funcionando nas agências de Recife, Olinda e Jaboatão.E os resultados começaram a aparecer

goria nas mais de duzentas agências de Recife, Olinda e Jaboatão. Essas unidades ganharam portas de segurança com detectores de metais, câmeras internas e externas, biombos entre a bateria de caixas e as filas, guarda-volumes, vigilantes armados e com coletes a prova de balas e cofre com dispositivo de retardo.

Para verificar a adequação e cumprimento do acordo, o Sindicato percorreu as agências dos três municípios e realizou uma pesquisa minuciosa. “Apesar de ainda haver algumas falhas na instalação dos equipamentos, as agências estão cumprindo os itens previstos no projeto”, afirma o secretário de Formação do Sindicato, João Rufino, que representa o Nordeste no Coletivo Nacional de Segurança Bancária da Contraf-CUT (Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro).

Os problemas estão, sobretudo, na forma de instalar os biombos. No Itaú, por exemplo, assim com em algumas unidades do Banco do Brasil, os biombos não cumprem sua finali-dade. “É como se eles tivessem sido colocados apenas para cumprir a lei, sem preocupação com o objetivo de resguardar a privacidade das operações dos clientes, evitando os chamados crimes de saidinha de banco”, explica Rufino.

O assunto já foi tratado pelos diretores do Sindicato em conversa com representantes

MoBilizAção E lutA Do SinDiCAto E DoS BAnCárioS forAM funDAMEntAiS PArA A ConquiStA Do ProjEto-Piloto

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Segurança Projeto-piloto

do Itaú. Eles reconheceram as falhas e alegaram que a implantação foi feita de forma paliativa. Garantiram que está sendo elaborado um projeto de readequação.

As agências visitadas também já implan-taram portas com detector de metais, guarda volumes, cofres com dispositivos de retardo e circuito interno de câmeras, inclusive na área externa. “Existem ainda alguns pontos cegos no interior de agências que precisam ser ajustados, mas a instalação das câmeras conforme previsto no projeto amplia, e mui-to, a segurança nas agências”, diz Rufino.

Outro ponto que merece atenção diz respeito aos vigilantes. Ainda que quase todas as unidades tenham número adequa-do de vigilantes, o uso de rendeiros para o horário de almoço não acompanha esse cenário. “E essa fragilidade já foi percebida pelos bandidos, tanto que boa parte dos

assaltos ocorre justamente neste período”, explica o secretário de Saúde do Sindicato, Wellington Trindade.

Embora não esteja discriminado no protocolo de intenções do projeto, muitos bancos vêm adotando também o uso de ca-bines blindadas e escudos – o que aumenta a segurança das agências. “É o caso do HSBC, Safra e de boa parte das agências do Itaú e Santander. No Banco do Brasil, algumas agências utilizam o escudo para os vigilantes, mas a empresa ainda está se adequando”, revela Rufino.

novA fASEO projeto-piloto de segurança bancária

em Pernambuco entrou, no dia 4 de no-vembro, em nova fase com a criação de um grupo de trabalho para acompanhar todo o processo. Nesta primeira reunião, o Sindi-

cato e a Contraf cobraram dos bancos mais transparência nas informações e a partici-pação ativa de todos os atores envolvidos.

Para isso, os representantes dos bancários sugeriram a realização de uma reunião ampliada do grupo com a participação da Secretaria de Defesa Social do Governo de Pernambuco, do Comando da Polícia Mili-tar, do Delegado Geral da Polícia Civil, do Ministério Público, das prefeituras das três cidades e de representantes de todas as du-zentas agências que fazem parte do projeto.

Além disso, os bancários solicitaram que integre o grupo um representante do BNB, já que hoje fazem parte apenas os seis maiores bancos: Banco do Brasil, Caixa, Bradesco, Santander, Itaú e HSBC. Pelo lado dos trabalhadores, os bancários solicitaram a participação do Sindicato dos Vigilantes.

Segundo Jaqueline, de todas essas reivin-dicações, os bancos só aceitaram incluir o BNB no grupo. “Esta primeira reunião do grupo deixou a desejar. Para que o projeto--piloto funcione, de fato, precisamos envol-ver todas as agências e todos os órgãos que fazem parte do acordo”, diz.

Os representantes dos bancários soli-citaram que a próxima reunião do grupo de trabalho seja marcada para a primeira semana de dezembro e que ela seja realizada na sede do Sindicato.

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joão rufino

jAquElinE MEllo

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14 REVISTA DOS BANCÁRIOS

Cultura Dicas

Charges da aboliçãoCharges e histórias em quadrinhos de-

senhadas na época da escravatura podem ser conferidas no livro “Educação para abolição – charges e histórias em quadri-nhos no segundo reinado”. De autoria do historiador Thiago Modenesi, o livro está disponível na Editora Universitária.

Cinema negroEste mês, o cine “É proibido cochilar”

(Rua do Bom Jesus, quartas, 19h) mostra o cinema negro da década de 70: Vida Nova por Acaso, de Odilon Lopez; Compasso de espera, de Antunes Filho; Na Boca do Mundo, de Antônio Pitanga; e As Aventuras Amorosas de um Padeiro, de Waldir Onofre.

noVEMBRo nEGRorECoMEnDADoS

FESTA dA LITERATuRA

Encontro de leitores

Encontro de Sanfoneiros do recife

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Começa no dia 14 a 19ª edição da Festa Literária Internacional de Pernambuco – a Fliporto. Até o dia 17, tem programação para todos os gostos na Praça do Carmo, em Olinda. Tem Fliporto Criança, Fli-porto Nova Geração, Fliporto Cordel, Ecofliporto, gastronomia, cinema, Feira do Livro, entre outras programações específicas. O Congresso Literário abre a festa das leituras, com gente como Pilar Del Rio – a companheira de José Saramago; Ana Maria Machado, Ronaldo Correia de Brito, Fernando Báez, Luiz Ruffato, entre outros. Os debates ocorrem nos quatro dias de evento e tem o jogo como mote: jogos do poder, jogos com palavras, jogos poéticos; jogos da memória; jogos de guerra. Para saber mais, acesse: http://fliporto.net/2013.

Entre novembro e dezembro, acontece a 16ª edi-ção do Encontro de Sanfoneiros do Recife. Além de percorrer escolas, asilos, postos de saúde e hospitais do Grande Recife, os músicos estarão nos merca-dos públicos nos dias 9, 16, 23 e 30 de novembro; no Teatro de Santa Isabel no dia 4 de dezembro; e no bar Nosso Quintal, ao lado da Chesf, dias 6 e 7 de dezembro. Entre os artistas, estão Toninho Ferragutti, Zé Calixto, Mestre Camarão, Borguetti, Cezzinha, Waldonnys, além de grupos de xaxado, aboiadores, violeiros e bacamarteiros.

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REVISTA DOS BANCÁRIOS 15

Cultura Bancário Artista

João Campos sempre gostou de ler e, às vezes, arriscava algumas es-trofes de poesia. Mas foi dentro do banco, e graças ao incentivo de um

colega, que ele mergulhou no universo do cordel. Hoje, tem mais de dez cordéis publicados, vários rascunhos nas gave-tas, poemas distribuídos entre amigos nos quatro cantos da cidade, e alguns projetos em mente para o ano que vem.

Funcionário do BNB há 34 anos, seu ingresso no mundo da literatura veio bem depois, graças ao colega José Ho-nório, que inaugurou a sessão Bancário Artista da Revista dos Bancários, edição número 6. “Ele me convidou a participar dos encontros da Unicordel (União dos Cordelistas de Pernambuco). Eu ia com ele no Pátio de São Pedro, participava das reuniões e, um dia, arrisquei um poema, mostrei ao pessoal e acabei gostando...”, conta João Campos.

Seu primeiro folheto publicado é, tam-bém, o filho predileto do autor. “Saudades da Boa Música”, de 2005, faz um passeio pelas canções e compositores que marca-ram épocas.

A música, aliás, também faz parte da vida de João: ex-baterista e irmão de músico, ele tem algumas composições

Foi Deus quem me deu a vidaMinha mãe me concebeuAmigos incentivaramUm poeta em mim nasceuFaço rima, faço versoE não há nesse universoAlguém mais feliz que eu

que pretende tirar da gaveta no ano que vem.Depois do primeiro folheto, vieram outros. Alguns sob encomenda – para convites

de casamento, por exemplo. Outros engraçados, como a história da barata que sobe por baixo da saia da noiva no dia do casamento. Alguns são homenagens a pessoas queridas, como seu pai. Outros relatam lembranças, como “A vida começa aos qua-renta”. O mais recente, escrito no ano passado, foi uma homenagem aos sessenta anos do BNB – que acabou levando o primeiro lugar no Prêmio de Literatura de Cordel promovido pelo banco.

Há, também, os cordéis que não foram publicados, mas que proporcionaram momen-tos alegres em confraternizações de colegas. É o caso do que foi criado para comemorar os 22 anos da pelada do Curió. “Tinha algumas pessoas da pelada com quem eu não tinha proximidade. O Curió e o Gago, sabendo que eu fazia cordéis, me pediram para escrever um poema para o grupo. E me falaram sobre cada pessoa: os apelidos, as histórias curiosas. A leitura do cordel acabou sendo um momento bem divertido da confraternização, que ajudou a integrar o grupo”, conta João.

Para o cordelista, a grande dificuldade é a declamação. “Quando estamos entre ami-gos, eu recito sem problemas. Mas, quando o público é de estranhos, eu fico nervoso, a boca seca, e preciso do incentivo dos colegas pra ir adiante”, diz. Mesmo assim, quando o grupo de poetas da Unicordel decidiu gravar um CD de poesias recitadas, ele também fez sua parte.

Para o próximo ano, há dois projetos em mente. O primeiro é a gravação de um CD. “Quero chamar várias pessoas para declamarem minhas poesias e entremeá-las com música, colocando – com ajuda de meu irmão –, um arranjo legal nas composições que estão guardadas”, diz. O segundo projeto é reunir os vários sonetos que estão espalhados entre amigos e estantes para publicá-los em livro.

O despertarde um poeta

joãoCAMPoS

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16 REVISTA DOS BANCÁRIOS

Turismo Conheça Pernambuco

Falar de Sertânia é falar de cul-tura, de poesia. Um lugar onde até as cabras se transformam em poemas, onde a história e

a cultura se confundem e os encantos da natureza são acompanhados dos encantamentos da arte.

Situada no Sertão do Moxotó, Ser-tânia abriga doze vilas e povoados e uma imensa zona rural, que a tornam o quinto maior município em extensão territorial de Pernambuco. Entre seus destaques, está a caprinocultura. Pos-sui, inclusive, uma cabra nativa, canta-da pelo poeta João Cabral de Melo Neto em seu “Poema da Cabra”: a Cabra Moxotó. O que a distingue de outras é sua incrível capacidade de resistência e de adaptação às secas.

Para Josessandro Andrade, poeta, professor, dramaturgo, compositor e morador de Sertânia, esta resistência da Cabra Moxotó integra a atmosfera

da cidade que reúne, entre seus filhos, muitos revolucionários e contestadores que foram vítimas da ditadura militar.

Mas a marca da cidade é a arte. São de lá, por exemplo, Ulysses Lins – o trovador do Moxotó, número 1 da Academia Pernambucana de Letras; Alcides Lopes de Si-queira, o Menestrel do Sertão, um dos fundadores do Movimento Armorial; Marcos Cordeiro, Wilson Freire, Luís Carlos Monteiro, Ésio Rafael, entre outros tantos.

“Você encontra poetas em todas as atividades e profissões: prefeito, juiz, presidente da Câmara, padres, pastores, advogados, professores, engenheiros, médicos, servidores públicos, bancários, garçons, eletricistas, garis e até o coveiro da cidade”, conta Josessandro.

Mas não é só na poesia que Sertânia se destaca: na prosa, tem Marcelino Frei-re; na literatura infantil, Vanusa Silva e Bruna Ranyeri; na música, Orquestra Marajoara, Cristina Amaral, Adilson Medeiros, entre vários outros. No artesa-nato, o destaque são as esculturas alongadas, produzidas no bairro Alto do Rio Branco por Marcos Paulo, Ivo, Daniel e Carlos Fernando; além das esculturas em madeira de Biu Aleijadinho. No teatro, há vários personagens ilustres, entre os quais Joacy de Castro, ex-diretor do TPN (Teatro Popular do Nordeste) e MCP (Movimento de Cultura Popular).

Quem quiser conhecer Sertânia, portanto, não pode deixar de se integrar a esta atmosfera artística. No início de dezembro, época das celebrações da padroeira, além das novenas e atividades religiosas, há reisados, pastoris, banda de pífanos, festival de repentistas, mesa de glosas, parque de diversões e o FLIS (Festival Literário do Sertão), com lançamento de livros, recitais, debates e caminhadas poéticas.

SErtâniA

Moxotódas artes

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