revista do tribunal regional federal 5ª regiÃo … · 2015-10-29 · o ministério da...

294
REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO JURISDIÇÃO Pernambuco - Alagoas - Ceará Paraíba - Rio Grande do Norte e Sergipe Número 117 - Setembro/Outubro - 2015 R. TRF 5ª Região, nº 117, pp. 1-294, Setembro/Outubro - 2015

Upload: dodang

Post on 08-Feb-2019

233 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

REVISTA DOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL

5ª REGIÃO

JURISDIÇÃOPernambuco - Alagoas - Ceará

Paraíba - Rio Grande do Norte e Sergipe

Número 117 - Setembro/Outubro - 2015

R. TRF 5ª Região, nº 117, pp. 1-294, Setembro/Outubro - 2015

Page 2: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,
Page 3: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

REVISTA DOTRIBUNAL REGIONAL FEDERAL

5ª REGIÃO

Diretor da RevistaDESEMBARGADOR FEDERAL

EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR

Repositório de jurisprudência – versão eletrônica – credenciado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o nº 70 (Portaria nº 05/2010, DJe de 13/04/2010, pág. 4173)

Administração

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃOCais do Apolo, s/nº - Bairro do Recife

CEP 50030-908 - Recife - Pernambuco

Page 4: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

Revista do Tribunal Regional Federal da 5ª Região v. 1 (1989)Recife, Tribunal Regional Federal da 5ª Região, 1989

Bimestral, a partir do volume n° 73.

A partir do v. 4, n° 1, de 1992, a numeração passou a ser contínua.ISSN 0103-4758

1. Direito - Periódicos. I. Brasil. Tribunal Regional Federal da 5ª Região

CDU 34(05)

GABINETE DA REVISTA:

DiretorDESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR

Supervisão de Coordenação de Gabinete e Base de DadosNIVALDO DA COSTA VASCO FILHO

Supervisão de Pesquisa, Coleta, Revisão e PublicaçãoARIVALDO FERREIRA SIEBRA JÚNIOR

Apoio TécnicoSEYNA RÉGIA RIBEIRO DE SOUZA

DiagramaçãoGABINETE DA REVISTA

Endereço eletrônico: www.trf5.jus.brCorreio eletrônico: [email protected]

Page 5: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO

Desembargador Federal ROGÉRIO DE MENESES FIALHO MOREIRA - 05.05.08

Presidente

Desembargador FederalFRANCISCO ROBERTO MACHADO - 10.12.14

Vice-Presidente

Desembargador Federal FERNANDO BRAGA DAMASCENO - 15.05.13

Corregedor

Desembargador FederalJOSÉ LÁZARO ALFREDO GUIMARÃES - 30.03.89

Desembargador FederalPAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA - 17.05.01

Desembargador Federal MANOEL DE OLIVEIRA ERHARDT - 08.08.07

Diretor da Escola de Magistratura Federal

Desembargador Federal VLADIMIR SOUZA CARVALHO - 27.02.08

Desembargador FederalEDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR - 21.07.10

Diretor da Revista

Desembargador FederalPAULO MACHADO CORDEIRO - 14.04.15

Coordenador dos Juizados Especiais Federais

Desembargador FederalCID MARCONI GURGEL DE SOUZA - 15.06.15

Page 6: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

Desembargador FederalCARLOS REBÊLO JÚNIOR - 09.09.15

Desembargador FederalALEXANDRE COSTA DE LUNA FREIRE (CONVOCADO)

Desembargador FederalIVAN LIRA DE CARVALHO (CONVOCADO)

Desembargador FederalMANUEL MAIA DE VASCONCELOS NETO (CONVOCADO)

Desembargador FederalRUBENS DE MENDONÇA CANUTO NETO (CONVOCADO)

Page 7: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO

TRIBUNAL PLENO(quartas-feiras)

Presidente: Desembargador Federal ROGÉRIO FIALHO MOREIRAVice-Presidente: Desembargador Federal ROBERTO MACHADO

Corregedor: Desembargador Federal FERNANDO BRAGA

PRIMEIRA TURMA(quintas-feiras)

Desembargador Federal MANOEL ERHARDT - PresidenteDesembargador Federal ALEXANDRE LUNA (CONVOCADO)Desembargador Federal RUBENS CANUTO (CONVOCADO)

SEGUNDA TURMA(terças-feiras)

Desembargador Federal VLADIMIR SOUZA CARVALHO - PresidenteDesembargador Federal PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA

Desembargador Federal IVAN LIRA (CONVOCADO)

TERCEIRA TURMA(quintas-feiras)

Desembargador Federal PAULO MACHADO CORDEIRO - PresidenteDesembargador Federal CID MARCONI GURGEL DE SOUZA

Desembargador Federal CARLOS REBÊLO JÚNIOR

QUARTA TURMA(terças-feiras)

Desembargador Federal EDILSON NOBRE - PresidenteDesembargador Federal LÁZARO GUIMARÃES

Desembargador Federal MANUEL MAIA (CONVOCADO)

Page 8: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,
Page 9: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

SUMÁRIO

1. Jurisprudência ....................................................................... 13

2. Índice Sistemático ............................................................... 283

3. Índice Analítico .................................................................... 287

Page 10: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,
Page 11: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

JURISPRUDÊNCIA

Page 12: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,
Page 13: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

13

AÇÃO PENAL Nº 148-PE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADOAutor: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALRéus: ANTONIO ZILCLECIO PINTO SARAIVA E EUGÊNIO MARCELO PEREIRA LINSAdvs./Procs.: DRS. RODRIGO LEONARDO DE A. TENÓRIO E CE- CÍLIO TIBURTINO CAVALCANTE DE LIMA (RÉUS)

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. ART. 1º, I, DO DECRETO-LEI Nº 201/67. CONSTRUÇÃO DE 4 PASSAGENS MOLHADAS NA ZONA RURAL. CONVÊNIO QUE NÃO PREVIA A LOCALIZAÇÃO DAS OBRAS. MODIFICAÇÃO DE MATERIAIS PREVISTOS NO CONVÊNIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES ESPONTANEAMENTE. EXECUÇÃO A CONTENTO. MERAS IRREGULARIDADES. PRIN-CÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. APLICABILIDADE.- Ação penal em desfavor de A.Z.P.S., ex-Prefeito do Município de Exu/PE, e E.M.P.L., representante legal da J.H.M. Engenharia Ltda. e atual Prefeito do Município de São José do Belmonte/PE, pela prática da conduta descrita no art. 1º, I, do De-creto-Lei nº 201/67, c/c o art. 29 do CP. Segundo a inicial acusatória, os denunciados, entre junho e outubro/2000, apropriaram-se e desviaram, em proveito próprio ou alheio, rendas públicas federais destinadas à execução do Convênio nº 827/99, celebrado entre o Município de Exu/PE e o Ministério da Integração Nacional, cujo objeto era a construção de passagens molhadas na zona rural do município.- As divergências apontadas pela fiscalização da Caixa caracterizam-se como meras irregu-laridades formais, não ensejando a aplicação do Direito Penal. Em relação à constatação de que uma das passagens teria sido construída em local diverso do previsto no convênio, não há elementos nos autos que comprovem, com a

Page 14: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

14

certeza necessária a justificar uma condenação penal, que o convênio especificava onde deve-riam ter sido construídas as quatro passagens molhadas, nem que houve má-fé por parte dos réus ao supostamente substituir a passagem molhada que deveria ter sido construída sobre o Riacho Cedro pelo Riacho Tabocas.- É verdade que a Prefeitura não poderia, unila-teralmente, sem consultar o Ministério da Inte-gração Nacional, ter modificado qualquer dos materiais previstos no convênio. Porém, de fato, não há qualquer elemento que indique que houve má-fé na substituição. Pelo contrário, a Prefei-tura, com a substituição, conseguiu concluir a construção das quatro passagens molhadas e ainda devolveu R$ 20.095,66 aos cofres públicos, sem contar que, ultrapassados mais de 10 anos da construção, os depoimentos acostados aos autos confirmam que as passagens ainda bene-ficiam a população.- O próprio Órgão fiscalizador afirmou que en-controu dificuldade na análise em razão das divergências no concreto das fundações, o que até poderia justificar as diferenças do percentual executado encontradas pela Caixa.- Ainda que se trate de coisa pública e que se reconheça que o bem jurídico tutelado pelo art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67 também seja a mo-ralidade administrativa, tem-se por necessária a aplicação do princípio da insignificância. Prece-dentes do STF, do STJ e do Pleno deste Tribunal.- Não há como afirmar que houve apropriação, ou sequer desvio, de verbas públicas, muito menos que estes recursos tenham aproveitado os réus ou terceiros. Tratou-se, em verdade, de mera irregularidade administrativa, fato que não se amolda ao tipo penal previsto no art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67, garantindo, portanto, a necessária distinção entre atos próprios do coti-

Page 15: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

15

diano político-administrativo e atos que revelam o cometimento de ilícitos penais.- Ação penal improcedente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os presentes autos, decide o Pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, julgar improcedente a ação penal, nos termos do relatório e voto anexos, que passam a integrar o presente julgamento.

Recife, 2 de setembro de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO - Re-lator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MA-

CHADO:

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL - MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA, ex-Prefeito do Município de Exu/PE, e EUGÊNIO MARCELO PEREIRA LINS, representante da J.H.M. Engenharia Ltda. e atual Prefeito do Município de São José do Belmonte/PE, pela prática da conduta descrita no art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67, c/c o art. 29 do Código Penal - CP. Segundo o Parquet Federal, os denunciados, entre junho e outubro/2000, apropriaram-se e desviaram, em proveito próprio ou alheio, rendas públicas federais destinadas à execução do Convênio nº 827/99, celebrado entre o Município de Exu/PE e o Ministério da Integração Nacional, tendo como objeto a construção de passagens molhadas na zona rural do município. A acusação arrolou duas testemunhas.

Notificados, os denunciados apresentaram Defesa Prévia às fls. 15/19 e 27/54. ANTÔNIO ZILCLÉCIO afirmou, em síntese, que: 1) inexistem falhas na execução do convênio, cujo objeto fora integralmente cumprido; 2) o simples fato de que foram efetivadas algumas alterações no plano de trabalho do objeto do convênio não demonstra qualquer irregularidade, pois tais alterações trouxeram apenas benefícios, a prova disso é que o pagamento foi feito em

Page 16: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

16

quantia menor do que fora contratado; 3) os atos praticados não causaram prejuízo ao erário, nem contribuiu para o enriquecimento ilícito do defendente ou de terceiros. EUGÊNIO MARCELO, por seu turno, disse que: 1) a Justiça Federal é incompetente para processar e julgar esta demanda, uma vez que a verba federal entregue ao município incorpora-se ao patrimônio deste; 2) a empresa executou 100% das obras contratadas, observando o edital de convocação, o contrato e a ordem de serviço, sendo de responsabilidade do município eventual modificação do objeto do convênio; 3) não houve apropriação ou desvio de rendas públicas por parte da empresa, pois os pagamentos recebidos correspon-deram ao efetivamente executado; 4) deve ser reconhecida a prescrição virtual antecipada.

O Juiz da 27ª Vara Federal de Pernambuco afastou a preliminar de incompetência e, diante de um mínimo de prova da materiali-dade e de indícios suficientes de autoria, recebeu a denúncia em 12/09/2012 (fls. 86/88).

Devidamente citados, os réus apresentaram Resposta à acu-sação. ANTÔNIO ZILCLÉCIO requereu “seja reconhecida a incom-petência deste juízo (matéria de ordem pública) [...], bem como seja a denúncia ofertada considerada inepta. No caso de eventual enfrentamento de mérito seja a mesma julgada IMPROCEDENTE, pelas relevantes razões de fatos e de direito acima apontadas, e, em eventual condenação seja reconhecida a prescrição da sen-tença em concreto, haja vista ser primário, de bons antecedentes e ter decorrido entre os fatos (obras das passagens molhadas) cuja Ordem de Serviço foi expedida em 09/05/2000 e/ou termo final de entrega da obra se deu 120 (cento e vinte) dias depois desta data e a do recebimento da denúncia em 12/09/2012”, arrolando quatro testemunhas (fls. 153/163). EUGÊNIO MARCELO repete os termos da sua Defesa Prévia e pede, ainda, em caso de condenação, a substituição da eventual pena restritiva de liberdade por sanções restritivas de direito; arrola duas testemunhas (fls. 195/225).

Considerando que o réu EUGÊNIO MARCELO PEREIRA LINS tomou posse como Prefeito do Município de São José do Belmonte/PE, situação que lhe assegura foro especial por prerrogativa de função, a Magistrada do 1º grau declinou da competência com remessa dos presentes autos a este Tribunal (fls. 250/250v).

Page 17: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

17

Através da decisão de fls. 263/264, o então Desembargador Francisco Cavalcanti, em 13/05/2013, ratificou o recebimento da denúncia e determinou o interrogatório dos réus.

Em audiência realizada em 25/06/2013 e 24/07/2013, os réus ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA e EUGÊNIO MARCELO PEREIRA LINS foram interrogados, respectivamente (mídias di-gitais às fls. 287 e 343).

Com fulcro no art. 8º da Lei nº 8.038/90, os réus apresentaram Defesa prévia praticamente repetindo os termos das Respostas à acusação apresentadas no Juízo do 1º grau (fls. 348/355 e 358/377).

As testemunhas de acusação e defesa foram ouvidas (Evane Santos de Souza - fl. 556, Agenor Alves Machado Neto - fl. 717, Rosa Edite Moreira Gonçalves - fl. 646, Gilvan Pereira Luna - fl. 646, José Wilson Pinto Saraiva - fl. 646, João Ribeiro da Silva Júnior - fl. 513 e Pedro José da Silva - fl. 461).

As diligências requeridas pelo réu EUGÊNIO MARCELO PE-REIRA LINS com fulcro no art. 10 da Lei nº 8.038/90 foram inde-feridas, em razão de já constar nos autos visita técnica atestando a incompletude da obra e a consequente consumação, em tese, do delito (vide fls. 738 e 744).

A alegação de nulidade dos interrogatórios dos réus e da oitiva da testemunhas de acusação foi julgada procedente. Por conse-guinte, determinou-se novo interrogatório dos réus e nova oitiva da testemunha de acusação Evane Santos de Souza (fls. 744/745).

Interrogatório de ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA à fl. 785. Oitiva da testemunha Evane Santos de Souza à fl. 856. Interrogatório de EUGÊNIO MARCELO PEREIRA LINS à fl. 892.

Em sede de alegações finais, o MPF destaca que: 1) o Parecer Técnico nº 35/2005 concluiu que “a Prefeitura Municipal de Exu/PE deverá devolver aos cofres públicos, devidamente corrigidos, o valor financeiro de R$ 44.631,40 (quarenta e quatro mil, seiscentos e trinta e um reais e quarenta centavos), referente à obras/serviços não realizados e/ou alterados, que foram constatados no relatório de Avaliação Final da Caixa Econômica Federal - RAF - MI”; 2) “determinada a devolução de quantia aos cofres da União, o Mu-

Page 18: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

18

nicípio de Exu foi inscrito em inadimplência efetiva no Cadastro de Inadimplentes do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal - SIAFI, não havendo notícia nos autos de que o valor tenha sido pago”; 3) “restou sobejamente demonstrado que os acusados se apropriaram de rendas públicas federais destina-das à execução de convênio firmado entre o Município de Exu/PE e o Ministério da Integração Nacional, o que não fora executado na sua integralidade, não havendo a devida devolução do recurso aos cofre da União”. Pede, ao final, que seja julgada procedente a presente ação penal, condenando os denunciados como incursos nas sanções previstas no art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67, c/c o art. 29 do CP (fls. 899/905).

ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA apresentou alegações finais às fls. 906/954. Sustenta que: 1) a denúncia é inepta; 2) ao contrário do que afirma a acusação, foram construídas quatro pas-sagens molhadas no Município de Exu/PE (duas sobre o Riacho Tabocas, uma sobre o Riacho Pau Grande e a última sobre o Riacho Onças), beneficiando de forma incontestável a população local, cujas obras são utilizadas até a presente data; 3) o Relatório Final de Avaliação da CEF considerou apenas três passagens molhadas (execução de 55,37% do convênio), em que pese a passagem molhada do Riacho Cedro ter sido construída no Riacho Tabocas 4) se tivesse sido considerada a construção da 4ª passagem mo-lhada (que foi de fato construída), o percentual de execução do convênio se elevaria para 73,82% e se completaria na totalidade (100%) com o percentual relativo ao valor de R$ 20.095,66 devol-vido pelo Município ao Ministério da Integração Nacional; 5) não houve desvio ou apropriação de verbas públicas, sendo devolvido pela municipalidade ao cofres federais a quantia de R$ 20.095,66, valor não utilizado para a execução do convênio; 6) inexistia no plano de trabalho a definição das localidades para execução das passagens molhadas, deixando livre ao gestor público para exe-cutar tais melhorias da construção nas áreas mais necessitadas do município; 7) no máximo ocorreu uma irregularidade formal, o que não é suficiente para condenar os réus no âmbito penal; 8) inexiste nos autos qualquer demonstração do elemento subjetivo do tipo, ou seja, o dolo de apropriar-se de bens ou rendas públicas ou desviá-los em proveito próprio ou alheio. Ao final, requer que seja

Page 19: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

19

acolhida a preliminar de inépcia de denúncia, e, na eventualidade de ser rejeitada, postula a total improcedência da inicial acusatória.

EUGÊNIO MARCELO PEREIRA LINS apresentou alegações finais às fls. 1.175/1.197. Defende que: 1) a empresa vencedora do certame executou os serviços nos termos do edital licitatório, da proposta apresentada, do contrato firmado e da ordem de serviço; 2) a partir do momento em que o Relatório de Avaliação Final da CEF considera a existência de 4 passagens molhadas executadas, o percentual de aplicação dos recursos eleva-se para 73,82%, correspondendo justamente ao valor total pago à empresa J.H.M. Engenharia Ltda. pelos serviços/obras executadas; 3) inexiste qualquer dano ao patrimônio público causado pelo réu EUGÊNIO MARCELO, posto que executou efetivamente aquilo para o que foi contratado e recebeu efetivamente os pagamentos pelo que execu-tou; 4) o réu ANTÔNIO ZILCLÉCIO afirmou, em seu depoimento pessoal, que a quarta localidade onde foi construída a passagem molhada dá acesso a 350 famílias, algo em torno de 2.000 pessoas, enquanto que a outra localidade Cedro do município daria acesso a 20/30 pessoas; 5) inexiste o elemento subjetivo do tipo. Ao final, pede que a denúncia seja julgada totalmente improcedente.

É o relatório.

Vão os autos ao Desembargador Federal Revisor.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MA-

CHADO (Relator):

Como ensaiado no relatório, trata-se de Ação Penal contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA, ex-Prefeito do Município de Exu/PE, e EUGÊNIO MARCELO PEREIRA LINS, representante legal da J.H.M. Engenharia Ltda. e atual Prefeito do Município de São José do Belmonte/PE, pela prática da conduta descrita no art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67, c/c o art. 29 do CP. Segundo a inicial acusatória, os denunciados, entre junho e outubro/2000, apropriaram-se e desviaram, em proveito próprio ou alheio, rendas públicas federais destinadas à execução do Convênio nº 827/99, celebrado entre o Município de Exu/PE e o Ministério da Integração Nacional, cujo objeto era a construção de passagens molhadas na zona rural do município.

Page 20: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

20

Preliminarmente, não há que se falar em inépcia da petição inicial, haja vista que os fatos narrados na peça inaugural e a participação dos réus ficaram claramente estabelecidos, ainda que de maneira sucinta. Ressalto que “não se exige a descrição pormenorizada, mas a suficiente para que o acusado possa exercer com plenitude a sua defesa”1, o que ocorreu na hipótese presente.

Não se verifica, portanto, vício na petição inicial.

Passo ao mérito.

Dispõe o art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67:Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores:I - apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio;[...]§ 1º Os crimes definidos nêste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos.

Trata-se de delito que busca proteger o bom andamento da Administração Pública, tanto em seu aspecto patrimonial quanto de respeito à moralidade administrativa, a qual não pode ser ressarcida ou efetivamete mensurada. A conduta de apropriar-se tem o sentido de tomar para si, passar a agir como dono, o que pode ser revelado por condutas incompatíveis com a condição de possuidor ou detentor; enquanto desviar significa dar um destino diverso daquele que deveria ser dado2.

Para a configuração do crime, faz-se necessária a presença do elemento subjetivo do tipo – dolo, não havendo previsão na modalidade culposa.

1 GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antônio Scarance; GOMES FILHO, Antônio Magalhães. As nulidades no processo penal. 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: RT, 2006. p. 111.

2 BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes Federais. 8. ed. rev., atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2012. p. 334.

Page 21: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

21

Para melhor deslinde da questão, faço um breve resumo dos fatos.

Em dezembro/1999, o Município de Exu/PE firmou com o Mi-nistério da Integração Nacional o Convênio nº 827/99, com repasse de R$ 100.00,00 da União, sem contrapartida do município.

O Termo Simplificado do Convênio esclarece que é compro-misso do convenente promover a execução do objeto do convênio na forma e prazos estabelecidos no Plano de Trabalho anexo, que descreve o projeto como “construção de passagens molhadas” (fls. 258/261 do Anexo 2).

Repassado o valor de R$ 100.000,00 à Municipalidade em 11/04/2000 (fl. 263 do Anexo 2), a Prefeitura deu início ao proce-dimento licitatório nos termos legais, sagrando-se vencedora do certame a empresa J.H.M. Engenharia Ltda.

Ao final do serviço, a Prefeitura de Exu/PE entendeu que fora executado, para a construção das quatro passagens molhadas, R$ 81.462,12, montante pago à Construtora contratada. Por conseguinte, devolveu espontaneamente aos cofres públicos, em 27/11/2000, o importe de R$ 20.095,66 (fl. 1002).

O Relatório de Avaliação Final da Caixa concluiu que, em vir-tude de uma das quatro passagens molhadas ter sido construída em local diferente do proposto (a passagem molhada do Riacho Cedros teria sido substituída pelo Riacho Tabocas), apenas 55,37% do convênio fora cumprido. Para chegar a tal percentual, conside-rou apenas três passagens molhadas: uma sobre o Riacho Paus Grandes, uma sobre o Riacho Onças e apenas uma das duas construídas sobre o Riacho Tabocas. Ressaltou que, quando se considera a construção das quatro passagens molhadas (uma em Paus Grandes, uma em Onças e duas em Tabocas), o percentual executado sobe para 73,82%. Destacou, ainda, os seguintes pontos: divergências no concreto das fundações, projeto técnico inconsistente e plantas em duplicidade, divergindo dos serviços mencionados no Plano de Trabalho, dificultando a análise.

Na inicial acusatória, o MPF afirma que “a materialidade de-litiva restou evidenciada pela visita técnica realizada pela Caixa Econômica Federal (fls. 348/351), a qual constatou que o Convênio

Page 22: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

22

nº 827/99 (Siafi nº 389126) fora executado apenas parcialmente e, no entanto, o pagamento à empresa executora foi integral, bem como pelos cheques pagos à Construtora J.H.M. Engenharia Ltda. (fls. 406, 408, 412 e 416)” (fl. 05).

No meu sentir, as divergências apontadas pela fiscalização da Caixa caracterizam-se como meras irregularidades formais, não ensejando a aplicação do Direito Penal, que só deve se ocupar daquelas lesões mais graves ao bem jurídico tutelado e quando os demais ramos do direito não se revelarem suficientes.

Em relação à constatação de que uma das passagens teria sido construída em local diverso do previsto no convênio, tenho que não há elementos nos autos que comprovem, com a certeza necessária para justificar uma condenação penal, onde deveriam ter sido construídas as quatro passagens molhadas objeto do con-vênio, ou que houve má-fé por parte dos réus ao supostamente substituir a passagem molhada que deveria ter sido construída sobre o Riacho Cedro pelo Riacho Tabocas.

São os seguintes os meus elementos de convicção:

1) não há, no Termo do Convênio ou no Plano de Trabalho, a especificação das localidades onde seriam construídas as quatro passagens molhadas;

2) em que pese a Responsável técnica que subscreveu o Relatório de Avaliação da Caixa (Evane Santos de Souza) ter relatado que “o ofício da MIR (pag. 23) faz referência às localidades Paus Grandes, Onças, Tabocas e Cedro”, este tal documento não se encontra nos autos;

3) em depoimento, Evane Santos de Souza afirma não recordar de onde extraiu a informação de que deveria ter sido construída uma passagem molhada no Riacho Cedro, dado, no meu sentir, realmente difícil de ser lembrado depois de passados quase 10 anos (fl. 856); todavia, o próprio MPF também não esclarece onde estaria essa informação, limitando-se a se reportar ao relatório da Caixa para afirmar que houve o cumprimento de apenas 55,37% do convênio;

4) nestes autos, há dois conjuntos de planilhas orçamentárias praticamente idênticos elaborados pela Prefeitura de Exu/PE

Page 23: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

23

em agosto/1999, sendo que em um deles há a indicação da passagem molhada sobre o Riacho Cedro e no outro não (fls. 959/962 e 1.109/1.112);

5) todos os documentos relacionados ao procedimento licitató-rio descrevem como objeto do certame a construção de duas passagens molhadas no Riacho Tabocas, uma no Riacho Paus Grandes e uma no Riacho Onças, sem menção ao Riacho Cedro (fls. 264/347 do Anexo 2);

6) ainda que se considere que a Prefeitura, unilateralmente, tenha decidido substituir a passagem de Cedro por mais uma passagem no Riacho Tabocas, não há qualquer elemento capaz de indicar que a suposta troca teria o intuito de benefi-ciar ou prejudicar alguém especificamente. Pelo contrário, as testemunhas afirmam que as passagens beneficiaram e ainda beneficiam a população de distritos afastados das cidades;

7) a fim de justificar as divergências encontradas pela Caixa, a Prefeitura de Exu/PE explicou: a) o “Riacho Cedro” é na verdade um córrego, que jamais comportaria uma passagem molhada do porte da que foi executada no Riacho Tabocas; b) para garantir o acesso ao Distrito de Tabocas, era necessária a construção de duas passagens molhadas consecutivas no Riacho Tabocas, com uma determinada distância uma da outra (fls. 354 do Anexo 2).

Pelo exposto, penso que deve ser levado em conta a segunda passagem construída sobre o Riacho Tabocas. Ainda que se ima-gine que o município, sem anuência do Ministério da Integração Nacional, substituiu a passagem do Riacho Cedro pela segunda passagem sobre o Riacho Tabocas, não existe qualquer indício de que houve má-fé, prejuízo para a população ou benefício dirigido a algum aliado dos réus, mas apenas mera irregularidade formal.

Portanto, todas as quatro passagens molhadas devem ser consideradas para aferição do percentual executado do convênio, ou seja, deve-se considerar, a princípio, a efetivação de 73,82% do convênio.

Demais disso, como a Prefeitura, espontaneamente, devolveu R$ 20.095,66 à União referente a valores não executados (aprox.

Page 24: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

24

20,1% do convênio), ficaria pendente de execução tão somente 6,1% do convênio, que equivale à aproximadamente R$ 6.100,00.

Neste tocante, a Prefeitura esclareceu, antes mesmo da ava-liação final da Caixa, que a devolução se deu em decorrência da substituição de materiais orçados utilizados na estrutura das pas-sagens por outros mais apropriados e de menor custo. Confira-se:

Com relação á alvenaria de pedra (elevação), e o concreto de fundações, o erro no cálculo apresentado no Plano de Trabalho, ocasionou divergências de quantitativos, tendo em vista que foi considerada alvenaria de pedra na parte interna da passagem, quando na verdade se fazia necessário apenas a execução de aterro, para que haja uma melhor proteção para os tubos, tendo em visto que os mesmos ficam recobertos, e protegidos contra os impactos ocasionados diretamente sobre os tubos de passagem. Assim como, o concreto passou a ser usado apenas na parte abaixo dos tubos para nivelamento do terreno, para que os tubos ficassem assentados no mesmo nível. Devido à retirada da alvenaria de pedra a ser executada na parte interna da passagem e parte do concreto, o serviço foi substituído por execução de aterro, com a mesma quantidade, levando em consideração a relatividade dos preços com os quantitativo (fl. 354 do Anexo 2).

Na planilha orçamentária, o cálculo estrutural inicial das passagens molhadas previa 388m3 de alvenaria com pedra rachão argamassada, entretanto, na execução da obra a quantidade necessária, após medição, foi de 196,73m3, restando um saldo de 191,21m3 de alvenaria de pedra rachão argamassada, correspondendo ao valor da devolução já efetuada pelo município (fl. 992).

O réu EUGÊNIO MARCELO PEREIRA LINS, representante da J.H.M. Engenharia Ltda. e engenheiro civil, também justificou a necessidade de substituição do material utilizado, destacando que se tivesse sido utilizado o mais caro (previsto no convênio), haveria danos à obra devido às cargas pesadas que por ali pas-sassem (fl. 892).

Sabe-se que a Prefeitura não poderia, unilateralmente, sem consultar o Ministério da Integração Nacional, ter modificado qual-

Page 25: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

25

quer dos materiais previstos no convênio. Porém, de fato, não há qualquer elemento indicando que houve má-fé na substituição. Pelo contrário, a Prefeitura, com a substituição, conseguiu concluir a construção das quatro passagens molhadas e devolveu dinheiro aos cofres públicos, sem contar que, ultrapassados mais de 10 anos da construção, os depoimentos acostados aos autos confirmam que as passagens ainda beneficiam a população.

Vale notar que, em razão da substituição de parte da estrutura de pedra rachão orçada por aterro, sem comunicação prévia ao órgão concedente, a Caixa, na vistoria in loco, considerou como não identificada parte da obra e não quantificou o dispêndio com o aterro. O próprio Órgão fiscalizador afirmou que encontrou dificul-dade na análise, em razão das divergências no concreto das fun-dações (fl. 367 do Anexo II), o que até poderia justificar a diferença aproximada de R$ 6.100,00, que estaria pendente de execução.

Ademais, ainda que se trate de coisa pública e que se reconhe-ça que o bem jurídico tutelado pelo art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67 também seja a moralidade administrativa, tenho por necessária a aplicação do princípio da insignificância. Esse entendimento vem sendo adotado inclusive pelo STF e pelo STJ, desde que preenchi-dos os seguintes requisitos: a) mínima ofensividade da conduta do agente; b) nenhuma periculosidade social da ação; c) reduzidíssimo grau de reprovabilidade do comportamento; d) inexpressividade da lesão jurídica provocada3, presentes no caso concreto.

O Pleno deste Tribunal também já afastou a aplicação do Direito Penal em caso de meras irregularidades cometidas pelo agente público no âmbito de sua administração:

O tipo penal ínsito no art. 1º, III, do Decreto-Lei nº 201 (emprego irregular de verbas públicas), não incide em toda e qualquer irregularidade, mas, sim, reserva-se para aquelas que efetivamente ofendam ao mínimo ético exigido pela sociedade (INQ 00140873320104050000, Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, TRF5 - Pleno, DJe - Data: 12/04/2011)

3 STF, HC 84412, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julga-do em 19/10/2004, DJ 19-11-2004. STJ, RHC 28318, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, STJ - Quinta Turma, DJe: 12/05/2011.

Page 26: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

26

Neste contexto, tenho comigo que não há como afirmar que houve apropriação ou sequer desvio de verbas públicas, muito menos que estes recursos tenham aproveitado os réus ou terceiros. Tratou-se, em verdade, de mera irregularidade administrativa, fato que não se amolda ao tipo penal previsto no art. 1º, I, do Decreto-Lei nº 201/67, garantindo, portanto, a necessária distinção entre atos próprios do cotidiano político-administrativo e atos que revelam o cometimento de ilícitos penais.

Por fim, destaco que, em relação ao réu EUGÊNIO MARCE-LO PEREIRA LINS, representante da Empresa responsável pela execução da obra, não há como lhe imputar qualquer ilícito penal, haja vista ter executado a obra conforme contratado, observando todos os termos da licitação e as alterações de material apontadas pela Prefeitura, recebendo valores pelos serviços efetivamente prestados. Não há quaisquer elementos nos autos que demonstrem sua participação em eventual modificação do objeto do convênio firmado entre a Prefeitura e o Ministério da Integração Nacional.

Assim, com fulcro no art. 386, III, do CPP (não constituir o fato infração penal), julgo improcedente a presente ação penal.

É como voto.

AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 125.844-SE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE CAR- VALHO (CONVOCADO)Agravante: BANCO DO BRASIL S/AAgravado: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALParte Int.: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEFAdvs./Procs.: DRS. FRANCISCO JOSÉ SANTOS AQUINO E OU- TROS (AGRTE.)

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA PROFERIDA NOS AUTOS DA AÇÃO PRINCIPAL. MESMO SENTIDO DA DECISÃO LIMINAR MODIFI-CADA PELO TRIBUNAL. NÃO OCORRÊNCIA DA PERDA DO OBJETO. ATENDIMENTO IMEDIATO ÀS PESSOAS PORTADORAS DE DEFICIÊNCIA,

Page 27: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

27

IDOSOS DE SESSENTA ANOS, GESTANTES, LACTANTES E PESSOAS ACOMPANHADAS POR CRIANÇAS DE COLO. RAZOABILIDADE. DIFICULDADE LOGÍSTICA.- Agravo de instrumento contra decisão que, em sede de ação civil pública, concedeu tutela an-tecipada, determinando o atendimento imediato às pessoas portadoras de deficiência, idosos de sessenta anos, gestantes, lactantes e pessoas acompanhadas por crianças de colo, indepen-dentemente da disponibilização de guichês ex-clusivos, sob pena de multa diária, no prazo de trinta dias, com ampla divulgação em todas as agências bancárias no Estado de Sergipe. - Liminarmente, foi atribuído efeito suspensivo à decisão agravada, considerando a dificuldade logística de cumprimento da mesma. Sentença proferida no processo principal, julgando parcial-mente procedentes os pedidos, e determinando à CEF e ao Banco do Brasil, ora agravante, a disponibilização de, no mínimo, dois guichês exclusivos, em todas as agências bancárias no Estado de Sergipe, para atendimento às pes- soas portadoras de deficiência, idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, gestantes, lactantes e pessoas acompanhadas por crianças de colo.- A prolação de sentença nos autos da ação principal, no mesmo sentido da decisão liminar agravada, reformada por este Tribunal, não tor-na sem objeto o recurso que impugna decisão de primeira instância. Não ocorrência da perda do objeto do presente agravo, uma vez que seu julgamento produzirá repercussão no proces-so originário. Precedentes: AG133134/PB, Rel. Des. Federal Convocado Élio Wanderley de Siqueira Filho, 4ª Turma, DJe 31/10/2013; PJe: 08009911020134050000, Rel. Des. Federal Convo-cado Bruno Teixeira, 4ª Turma, DJe: 22/10/2013.

Page 28: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

28

- No tocante à determinação de atendimento imediato às pessoas portadoras de deficiência, idosos de sessenta anos, gestantes, lactantes e pessoas acompanhadas por crianças de colo, in-dependentemente da disponibilização de guichês exclusivos, é verdade que o Banco do Brasil, como instituição financeira, possui obrigação de adaptar a sua estrutura, além de profissio-nalizar seus servidores no sentido, a fim de que o serviço prestado atenda às exigências da lei. No entanto, deve ser levado em consideração que a quantidade de serviços prestados pela instituição, inclusive em razão de ser também gestora de grande número de programas sociais do governo, a impor a aplicação do princípio da razoabilidade.- Não cabe prestigiar de forma absoluta o referido atendimento prioritário, sob risco de inviabilizar, em determinadas circunstâncias, o atendimen-to não-prioritário em tempo razoável, no caso de Aracaju, previsto em Lei Municipal (Lei nº 3.441/2007), que estabelece a necessidade de atendimento em instituições bancárias em 15 minutos (ou 30 minutos em dias especificados na lei). Tal situação eventualmente ensejaria pre-juízo aos demais consumidores (não prioritários) do serviço bancário e, inclusive, poderia expor as instituições bancárias ao risco de ilicitude decorrente do cumprimento de decisão judicial.- Agravo de instrumento provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de ins-trumento, em que são partes as acima mencionadas, acordam os Desembargadores Federais da Segunda Turma do Tribunal Regio-nal Federal da 5ª Região, à unanimidade, em dar provimento ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator e das notas taquigráficas que estão nos autos e que fazem parte deste julgado.

Page 29: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

29

Recife, 28 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE CARVALHO - Relator Convocado

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE

CARVALHO (Convocado):

Cuida-se de agravo de instrumento contra decisão que, em sede de ação civil pública, concedeu tutela antecipada, determinando o atendimento imediato às pessoas portadoras de deficiência, idosos de sessenta anos, gestantes, lactantes e pessoas acompanhadas por crianças de colo, independentemente da disponibilização de guichês exclusivos, sob pena de multa diária, no prazo de trinta dias, com ampla divulgação em todas as agências bancárias no Estado de Sergipe.

Liminarmente, foi atribuído efeito suspensivo à decisão agra-vada, considerando a dificuldade logística de cumprimento da decisão agravada.

Após regularmente processados, vieram-me conclusos os autos por força de distribuição por sucessão, em abril de 2015.

É o relatório.

Peço a inclusão do feito em pauta para julgamento.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE

CARVALHO (Relator Convocado):

De início, destaco que restou informado nos autos, e confir-mado via consulta ao sistema de acompanhamento processual deste Regional, que foi proferida, em 30/01/2015, sentença no processo principal, julgando parcialmente procedentes os pedidos, e determinando à CEF e ao Banco do Brasil, ora agravante, a disponibilização de, no mínimo, dois guichês exclusivos, em todas as agências bancárias no Estado de Sergipe, para atendimento às pessoas portadoras de deficiência, idosos com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, gestantes, lactantes e pessoas acompanhadas por crianças de colo.

Page 30: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

30

Acerca da matéria, este Regional vem entendendo que ape-nas a superveniência de sentença em sentido contrário à decisão liminar proferida pelo Tribunal não implica na perda de objeto do agravo interposto contra decisão do juízo a quo. Nesses casos, pre-sente a divergência entre os entendimentos de 1ª e 2ª instâncias, deverá prevalecer a decisão do Tribunal até o trânsito em julgado da sentença ou o julgamento de eventual apelação.

Ocorre que, no caso, a sentença proferida está no mesmo sentido da decisão liminar agravada, reformada por este Tribunal. Sendo assim, não cabe o alegado reconhecimento da perda do objeto do presente agravo, uma vez que seu julgamento produzirá repercussão no processo originário.

Nesses casos, presente a divergência entre os entendimentos de 1ª e 2ª instâncias, deverá prevalecer a decisão do Tribunal até o trânsito em julgado da sentença ou o julgamento de eventual apelação. Precedentes TRF5: AG133134/PB, Rel. Des. Federal Convocado Élio Wanderley de Siqueira Filho, 4ª Turma, DJe 31/10/2013; PJe: 08009911020134050000, Rel. Des. Federal Convocado Bruno Teixeira, 4ª Turma, DJe: 22/10/2013.

Sobre o assunto, embora que tratando de situações inversas, cito os seguintes arestos:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. SENTENÇA PROFERIDA EM PRIMEIRA INSTÂNCIA. PERDA DO OBJETO. FALTA DE INTERESSE RECURSAL SUPERVENIENTE. - Agravo de instrumento manejado com o fito de refor-mar decisão que reconsiderou medida liminar outrora concedida em favor do ora agravante, reconhecendo sua ineficácia.- Proferida sentença no processo originário, inclusive ratificando a decisão agravada.- Perda de objeto do agravo, visto que o seu julgamento não produzirá efeito no processo originário.- Agravo de instrumento prejudicado.[AGTR, Processo: 08009259320144050000, Data do Julgamento: 01/07/2014, Segunda Turma, Relator: Desembargador Federal Carlos Wagner Dias Ferreira (Convocado)]

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROLAÇÃO SUPERVENIENTE DE SENTENÇA DE

Page 31: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

31

PROCEDÊNCIA. PERDA DE OBJETO. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU SEGUI-MENTO AO RECURSO.1. O agravo de instrumento se encontra prejudicado, tendo em vista a superveniente prolação de sentença, a qual julgou procedente o pedido da ação originária, conforme bem apontado pela decisão que negou seguimento ao recurso, objeto do presente agravo interno.2. Verifica-se, ademais, que a decisão liminar proferida no presente recurso, resumiu-se a confirmar o indeferimento da antecipação de tutela, o que faz perder sua utilidade prática, notadamente quando a sentença não a deferiu. Assim, não há se falar em ultratividade do agravo quan-do não houver conflito entre o entendimento do Relator (na decisão que apreciou a liminar) e aquele exposto na sentença, o que se verifica na espécie, vez que nenhuma das decisões deferiu a antecipação da tutela.3. Desse modo, resta clara a perda de objeto do agravo de instrumento, motivo pelo qual deve ser integralmente mantida a decisão que negou seguimento ao referido recurso.4. Agravo interno improvido.(AGTAG 130.989/01/CE, Segunda Turma, Relator: De-sembargador Federal Fernando Braga, DJe - 02/02/2015)

No tocante à determinação de atendimento imediato às pes-soas portadoras de deficiência, idosos de sessenta anos, ges-tantes, lactantes e pessoas acompanhadas por crianças de colo, independentemente da disponibilização de guichês exclusivos, é verdade que o Banco do Brasil , como instituição financeira, possui obrigação de adaptar a sua estrutura, além de profissionalizar seus servidores no sentido, a fim de que o serviço prestado atenda às exigências da lei.

No entanto, deve ser levado em consideração que a quanti-dade de serviços prestados pela instituição , em razão de ser a gestora de grande número de programas sociais do governo, deve ser aplicado o princípio da razoabilidade com relação à exigência relativa ao tempo de espera nas filas.

Nesse diapasão, concordo com o então relator, quando da apreciação liminar, Des. Fed. Marco Bruno Miranda Clementino (convocado), quando destaca:

Page 32: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

32

A despeito da absoluta relevância da pretensão coletiva deduzida na origem e da necessidade de fiscalização efetiva do cumprimento das prioridades de atendimento nas instituições bancárias (deficientes, idosos, gestantes, lactantes e pessoas acompanhadas de crianças de colo), penso que a decisão proferida pelo juízo a quo põe o agravado numa situação muito complicada, em particular nos dias de fluxo anormal de consumidores, como, por exemplo, naqueles em que são realizados determinados pagamentos governamentais. Essa circunstância, aliás, já fora reconhecida no âmbito do AGTR 127.379-SE, por meio do qual a Caixa Econômica Federal também se insurgia contra a decisão agravada. Naquela ocasião, a propósito, afirmou o Desembargador Federal convocado Sérgio Murilo Wanderley Queiroga: Contudo, entendo que a decisão agravada ao determinar o imediato atendimento das pessoas portadoras de deficiência, idosos a partir de 60 (sessenta) anos, gestantes, lactantes e pessoas acompanhadas por crianças de colo, independentemente da disponibilização de guichês exclusivos, de modo que sejam atendidas antes de qualquer outra, depois de con-cluído o atendimento que estiver em andamento, pode provocar confusão e descontentamento dos usuários, principalmente, nos dias destinados ao pagamento de programas de governo, pagamentos de RPV/precatórios, etc, quando há aumento significativo do número de usuá-rios nas referidas agências bancárias. Naquela ocasião, o Desembargador Federal convocado Sérgio Murilo Wanderley Queiroga findou por decidir que, embora não fosse possível estabelecer o atendimento prioritário de forma absoluta, deveria haver a disponibilização mínima de dois guichês para tanto, cada agência bancária. No entanto, sou obrigado a ponderar que, ainda assim, não considero razoável a decisão proferida no AGTR 127.379-SE, pelo eminente Desembargador Federal convocado Sérgio Murilo Wanderley Queiroga. É que, para que se reconheça a viabilidade da providência ali determinada, impõe-se partir de uma premissa não confirmada concre-tamente: a de que todas as agências recebem o mesmo fluxo médio de pessoas. Do contrário, um número mínimo de dois guichês pode ser uma determinação exagerada, tornando a estrutura de atendimento prioritário obsoleta,

Page 33: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

33

mas sobretudo insuficiente, dependendo da envergadura da agência e do quantitativo de pessoas que a frequen-tam diariamente em média. Por que não manter, então, a decisão agravada, que assegura o cumprimento abso-luto do atendimento prioritário? Respondo que o direito absorveu de relatividade e hoje repugna aos regimes democráticos a ideia de existência de direitos absolutos. Daí porque atualmente se admite que a norma jurídica detém traços de relatividade e de adaptabilidade, a fim de produzir a consequência jurídica circunstancialmente mais adequada ao caso concreto para o qual se projeta. A relatividade, por sua vez, atende à ideia de liberdade negativa, à medida que possibilita o gozo de direitos individuais quando estes estiverem em confronto com direitos (também individuais) de terceiros. Para este caso específico, prestigiar de forma absoluta aqueles que fazem jus a atendimento prioritário, independente-mente de qualquer outra ponderação, pode significar, em determinadas circunstâncias, a inviabilização do atendi-mento não-prioritário em tempo razoável, não apenas em prejuízo dos demais consumidores do serviço bancário, mas também expondo as instituições bancárias ao risco de ilicitude. É que, em Aracaju-SE, por exemplo, muni-cípio abrangido territorialmente pelos efeitos da decisão agravada, vigora a Lei nº 3.441/2007, que estabelece a necessidade atendimento em instituições bancárias em 15 minutos (ou 30 minutos em dias especificados na lei). Assim, a se manter a decisão agravada ou mesmo uma determinação de dois guichês por agência, corre-se o risco de, eventualmente, o banco ser coagido, pelo cum-primento de decisão judicial agravada, a descumprir a lei municipal. Há de se reconhecer, portanto, a aplicação ao presente caso do brocardo latino ad impossibilia nemo tenetur, já que o agravado não pode ser coagido a des-cumprir uma norma a fim de cumprir outra. E, por outro lado, não faz sentido que o agravado, a fim de cumprir a decisão agravada, disponibilize uma estrutura excessiva de atendimento, se porventura estiver conseguindo ga-rantir o atendimento prioritário num tempo célere, ainda que sem resguardar uma prioridade absoluta. Penso que, mais do que assegurar um direito absoluto ao atendimento prioritário, é mais interessante avaliar o tempo efetivo de atendimento, a partir da análise da estrutura disponibili-

Page 34: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

34

zada como um todo. É que, se o atendimento for célere, ainda que se aplique uma prioridade relativa, não haverá violação a direitos de minorias. O que não faz sentido é estabelecer uma prioridade absoluta sem corrigir as deficiências do atendimento geral, já que isso corrigiria, por um lado, o problema do atendimento prioritário, porém somente agravaria a situação do não prioritário.

Diante do exposto, dou provimento ao agravo de instrumento, para suspender os efeitos da decisão agravada.

É como voto.

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO Nº 11.239-CE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE CAR- VALHO (CONVOCADO)Apelante: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSSApelados: AGENOR AVELINO DA SILVA E OUTROSRepte.: PROCURADORIA DO INSSAdvs./Procs.: DRS. ANTÔNIO INIMA FERNANDES LIMA E OU- TROS (APDOS.)

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. LEGITIMIDADE PASSIVA. INSS. REVISÃO DE BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO DE EX-COMBATENTE. DATA DE INÍCIO DE BENEFÍCIO HÁ MAIS DE 40 ANOS. PRESCRIÇÃO. SEGURANÇA JURÍDICA. TUTELA ANTECIPADA. CABIMENTO. CONDENAÇÃO EM VERBA SUCUMBENCIAL. REMESSA E APELA-ÇÃO NÃO PROVIDAS.- Hipótese de remessa oficial e apelação do INSS contra sentença que julgou procedente o pedi-do para determinar à autarquia previdenciária a abstenção em revisar os benefícios previdenciá-rios de aposentadoria por tempo de serviço de ex-combatente (espécie 72), minorando a renda mensal percebida, com base em suposta deso-bediência aos parâmetros da Lei nº 5.698/71, e

Page 35: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

35

a não realizar respectivos descontos a título de ressarcimento aos cofres públicos.- A Lei nº 5.698/71, revogando a Lei nº 4.297/63, transferiu para o Regime Geral de Previdência Social as concessões e manutenções dos bene-fícios de ex-combatente, de modo que patente é a legitimidade passiva do INSS para figurar no pólo passivo da demanda, já que trata de insurgência contra procedimento de revisão do benefício previdenciário deflagrado pela autar-quia previdenciária.- No período anterior ao da vigência da Lei 9.784/99, embora inexistisse prazo decadencial para a revisão dos atos administrativos, há que se examinar a possibilidade de revisão à luz do princípio da segurança jurídica. Nesta ordem de ideias, para considerar-se indevida a anulação, operada pela própria autarquia, de atos adminis-trativos concessivos de benefícios previdenciá-rios, observe-se o transcurso de um dado tempo – no caso, por aplicação simétrica do Decreto nº 2.0910/32, o lapso de 5 anos.- Na específica hipótese dos autos, os quatro be-neficiários são idosos com idade avançada, cujos benefícios possuem data de início em 20.02.1966, 17.01.73, 25.05.65 e 20.05.72, insurgindo-se os requerentes contra a revisão e respectiva redu-ção dos benefícios a ser lançada sob a forma de consignação em sua renda mensal.- Diante da peculiar situação do processo e, particularmente, dos autores que são pessoas idosas e titularizam benefícios há mais de 40 (quarenta) anos, é de se entender que não podem ser revistos após o transcurso de 5 (cinco) anos, já que editado muito antes do advento da Lei n° 9.784/99, quando se aplicava o prazo do Decreto n° 20.910/32.- Em nome da segurança jurídica e do contexto histórico e fático em que inseridas as situações

Page 36: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

36

ora analisadas, impedir-se a revisão dos benefí-cios e eventuais descontos, a título de ressarci-mento à administração, é medida que se impõe.- Destaque-se que os valores de benefício previ-denciário percebidos de boa-fé não podem ser repetidos, dada a natureza alimentar da verba. A disposição contida no art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, justifica-se na hipótese de conduta fraudulenta por parte da segurada, o que não é a hipótese dos autos.- Cabível a manutenção da tutela antecipada outorgada, eis que presentes os requisitos do art. 273 do Código de Processo Civil, quais seja, plausibilidade do direito invocado e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação diante dos interesses que envolvem (subsistên-cia de ex-combatentes aposentados há cerca de 40 anos).- Deve ser mantida, igualmente, a condenação da parte vencida ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), na forma do art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC.- Remessa oficial e apelação do INSS conhecidas e não providas.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação / reexame necessário, em que são partes as acima mencionadas, acordam os Desembargadores Federais da Segunda Turma do Tribunal Re-gional Federal da 5ª Região, à unanimidade, em negar provimento à apelação e reexame necessário, nos termos do voto do Relator e das notas taquigráficas que estão nos autos e que fazem parte deste julgado.

Recife, 7 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE CARVALHO - Relator Convocado

Page 37: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

37

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE

CARVALHO (Convocado):

Trata-se de remessa oficial e recurso de apelação interposto pelo INSS contra sentença prolatada nos autos de ação ordinária que julgou procedente o pedido para determinar à autarquia pre-videnciária a abstenção em revisar os benefícios previdenciários minorando a renda mensal percebida, com base em suposta de-sobediência aos parâmetros da Lei nº 5.698/71, e a não realizar descontos a título de ressarcimento aos cofres públicos, com base no mesmo fundamento.

Em suas razões recursais, o INSS alega, em síntese:

a) Legitimidade passiva ad causam exclusiva da União; sendo flagrante a ilegitimidade da autarquia previdenciária;

b) Com o advento da Lei nº 5.968/71 os benefícios conferidos aos ex-combatentes e seus dependentes devem ser regulados pela legislação previdenciária, submetendo-se ao respectivo teto da Previdência, incidindo o prazo decadencial de 10 (dez) anos para que a administração pública proceda à revisão dos benefícios a contar da edição da Lei nº 10.839/2004.

Ofertadas as respectivas contrarrazões recursais, pugnando pela manutenção da sentença em todos os seus termos.

Subiram os autos, sendo-me conclusos por força de sucessão em abril de 2015.

É o relatório.

Peço a inclusão do feito em pauta para julgamento.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL IVAN LIRA DE

CARVALHO (Relator Convocado):

Hipótese de remessa oficial e apelação do INSS contra sen-tença que julgou procedente o pedido para determinar à autarquia previdenciária a abstenção em revisar os benefícios previdenciários de aposentadoria por tempo de serviço de ex-combatente (espécie 72), minorando a renda mensal percebida, com base em suposta

Page 38: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

38

desobediência aos parâmetros da Lei nº 5.698/71, e a não realizar descontos a título de ressarcimento aos cofres públicos, com base no mesmo fundamento.

A) Legitimidade passiva ad causam.

A Lei nº 5.698/71, revogando a Lei nº 4.297/63, transferiu para o Regime Geral de Previdência Social as concessões e manuten-ções dos benefícios de ex-combatente.

Assim, patente é a legitimidade passiva do INSS para figurar no pólo passivo da demanda, já que o objeto da presente deman-da é a insurgência contra procedimento de revisão do benefício previdenciário deflagrado pela autarquia previdenciária.

B) Revisão dos benefícios de ex-combatente.

A administração pública tem o poder-dever de revisar os seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, atendendo aos princípios constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

A Lei nº 8.213/91 não previu, inicialmente, um prazo decaden-cial para a revisão dos benefícios previdenciários, entretanto, não é razoável que não se fixe um limite temporal para a Administração Pública, o que se faz em respeito ao princípio da segurança jurídica.

O poder dever da Administração Pública de anular seus atos ile-gais deve ser limitado em certas situações, sob pena de se conferir instabilidade às relações jurídicas realizadas entre a administração e os administrados, principalmente quando a eventual anulação ocasionará danos superiores àqueles decorrentes da manutenção do ato administrativo.

Limita-se a atuação do Administrador a um marco temporal, após o que restará convalidada a situação fática e o próprio direi-to do Administrado, no caso presente, segurado da Previdência, diante do norte traçado pelo princípio da segurança, da estabilidade jurídica e da razoabilidade, que devem sempre pautar a conduta da Administração.

Até o advento da Lei 9.784/99, tanto a doutrina quanto a juris-prudência entendiam que essa faculdade estava sujeita ao decurso de cinco anos, uma construção apropriada do Decreto 20.910/32,

Page 39: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

39

e assim sucessivamente, culminando na legislação que instituiu o procedimento administrativo no âmbito da Administração Pública Federal.

Com base nesse posicionamento assevera-se que a orien-tação quanto à fluência do prazo de cinco anos para a Autarquia Previdenciária revisar seus atos a partir da entrada em vigor da Lei nº 8.213/91 nunca foi afastada e restou apenas confirmada pela Lei nº 9.784/99, perenizando a garantia do segurado em não ter revista a benesse usufruída após cinco anos de sua concessão, quando não verificada hipótese de fraude, prazo este que apenas foi ampliado para dez anos com a edição da Lei 10.839/04 (pre-cedida pela MP 138/2003).

O nosso ordenamento jurídico não afasta a possibilidade de eficácia retroativa das normas em casos excepcionais e desde que expressa em lei. No entanto a retroatividade não pode ferir direito adquirido e tampouco a segurança jurídica, sob pena de padecer de inconstitucionalidade. As normas, em regra, vigem para o futuro, notadamente no direito social, como é o direito à pensão por morte.

No caso, a lei nova, Lei nº 10.839/04, que confere maior prazo para a administração anular seus atos, não pode ter eficácia sobre os atos praticados antes da sua vigência, de modo a reger os efei-tos futuros do ato praticado antes, ou mesmo incidir sobre aquele ato impedindo que se perfectibilize, sob pena de se comprometer a segurança das relações jurídicas entre administrados, dada a possibilidade do Poder Público intervir unilateralmente, editando sucessivas normas majorando o prazo decadencial.

Em suma, no período anterior ao da vigência da Lei 9.784/99, embora inexistisse prazo decadencial para a revisão dos atos administrativos, há que se examinar a possibilidade de revisão à luz do princípio da segurança jurídica. Nesta ordem de idéias, para considerar-se indevida a anulação, operada pela própria autarquia, de atos administrativos concessivos de benefícios previdenciários, observe-se o transcurso de um dado tempo – no caso, por aplicação simétrica do Decreto nº 2.0910/32, o lapso de 5 anos.

Com o advento da Lei nº 9.784/99, o seu art. 54 passou a reger a matéria, nos seguintes termos:

Page 40: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

40

Art. 54. O direito da Administração de anular os atos ad-ministrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

Considerando que a Lei nº 9.784 entrou em vigor em 01/02/ 1999, o prazo final para o INSS revisar os benefícios concedidos antes da sua vigência é o dia 1/2/2004, operando-se a decadência após essa data. O prazo decadencial fixado no art. 103-A da Lei nº 8.213/91, por se dirigir, de forma ampla e irrestrita, à Previdência Social alcança todos os atos por ela praticados mesmo antes de sua vigência, ainda mais quando guardem relação com as pres-tações por ela mantidas, inclusive os benefícios previdenciários pagos a ex-combatentes ou a seus dependentes com base na Lei nº 5.698/71. Contudo, no cômputo do prazo de 10 (dez) anos de que trata o art. 103-A da Lei nº 8.213/91, instituído pela MP nº 138/2003, convertida na Lei nº 10.839/2004, deve ser considerado o tempo decorrido entre as datas de vigência da Lei nº 9.784/99 e da MP nº 138/2003. Precedente do STJ, em sede de recurso especial repetitivo (REsp 1.114.938-AL, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, Julg.: 14/04/2010, Dec.: Unânime.).

Desta feita, quanto aos atos anteriores à Lei n° 9.784/99, aplica--se o prazo de 5 (cinco) anos para revisão, pelo INSS, dos atos que tenham importado em vantagem para os segurados.

Na específica hipótese dos autos, os quatro beneficiários são idosos com idade avançada, cujos benefícios possuem data de início em 20.02.1966 (fl. 118), 17.01.73 (fl. 135), 25.05.65 (fl. 160) e 20.05.72 (fl. 184).

Insurgem-se os requerentes contra a revisão e respectiva re-dução dos benefícios a ser lançada sob a forma de consignação em sua renda mensal.

Conforme se extrai dos documentos acostados aos autos, o ato de revisão se ateve aos índices aplicados a título de reajuste, por considerar o INSS que o correto seria a aplicação de índices do RGPS, e não de reajuste da categoria profissional.

Porém, considerando a peculiar situação do processo e, par-ticularmente, dos autores que são pessoas idosas e titularizam

Page 41: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

41

benefícios há mais de 40 (quarenta) anos, é de se entender que não podem ser revistos após o transcurso de 5 (cinco) anos, já que editado muito antes do advento da Lei n° 9.784/99, quando se aplicava o prazo do Decreto n° 20.910/32.

Em nome da segurança jurídica e do contexto histórico e fático em que inseridas as situações ora analisadas, impedir-se a revisão dos benefícios e eventuais descontos, a título de ressarcimento à administração, é medida que se impõe.

Vale transcrever precedente desta Segunda Turma:ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. DE-CADÊNCIA.1. Descabe agravo inominado contra pronunciamento do relator que atribui ou não efeito suspensivo ao agravo de instrumento;2. Agravo de instrumento manejado contra decisão que, em sede de ação ordinária, deferiu antecipação de tute-la, para determinar que o INSS se abstenha de realizar qualquer ato tendente à redução do benefício da autora, ou, caso já tenha promovido tal ajuste, que providencie o imediato restabelecimento da revisão, nos moldes fixados antes da revisão administrativa, pois entendeu o douto magistrado que ocorreu a decadência em relação à revisão do ato administrativo pelo INSS;3. Trata-se de benefício cuja DIB remonta 11/08/65 (aposentadoria do instituidor). Em data de 27/06/2003, a autora obteve da autarquia demandada uma pensão por morte de ex-combatente. Por último, o processo revisor da Administração data de 04/12/2008;4. É certo que a Lei nº 9.784/99, em seu art. 54, caput, preconiza o prazo decadencial de cinco anos para a Admi-nistração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos destinatários. O poder de autotu-tela da Administração cede o passo à segurança e à estabilidade das relações jurídicas. Todavia, o termo a quo do prazo decadencial estabelecido pelo referido diploma é a data de sua publicação (01.02.99), é dizer, já em 01 de fevereiro de 2004 se ultimara. Interpretação diversa, data venia, afronta a Constituição Federal, porque resulta em aplicação retroativa da lei; agride a lógica, dado que a lei estipularia um prazo que já teria

Page 42: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

42

decorrido; além de consagrar a injustiça, por vedar ao titular de um direito o seu exercício, sem que este houvesse dado causa à interdição;5. Ademais, a verba possui irretorquível natureza ali-mentar, o que inspira maior cuidado em sua redução incontinenti, que poderá ser determinada após reflexão exauriente;6. Agravo inominado não conhecido e agravo de instru-mento improvido. (PROCESSO: 200905000567844, AG 98.711/CE, RELA-TOR: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA, Terceira Turma, JULGAMENTO: 02/12/2010, PUBLICAÇÃO: DJe 07/12/2010 - Página 96)

Destaque-se que os valores de benefício previdenciário percebidos de boa-fé não podem ser repetidos, dada a natureza alimentar da verba. A disposição contida no art. 115, II, da Lei nº 8.213/91, justifica-se na hipótese de conduta fraudulenta por parte da segurada, o que não é a hipótese dos autos.

Cabível a manutenção da tutela antecipada outorgada, eis que presentes os requisitos do art. 273 do Código de Processo Civil, quais seja, plausibilidade do direito invocado e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação diante dos interesses que envolvem (subsistência de ex-combatentes aposentados há cerca de 40 anos).

Deve ser mantida, igualmente, a condenação da parte vencida ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 2.000,00 (dois mil reais), na forma do art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC, mostrando--se valor condizente com a menor complexidade da causa.

É como voto.

Page 43: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

43

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO Nº 30.933-CE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL ALCIDES SALDA- NHA (CONVOCADO)Apelantes: RAIMUNDO TOMÉ DA SILVA E DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRAESTRUTURA DE TRANS- PORTES - DNITApelados: OS MESMOSRepte.: PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª RE- GIÃOAdvs./Procs.: DRS. SÉRGIO VASCONCELOS SANTANA E OU- TROS

EMENTA: INDENIZAÇÃO. DANOS EMERGEN-TES. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. JUROS COMPENSATÓRIOS E LUCROS CESSANTES. POSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO. LUCROS CESSANTES. RESPONSABILIDADE OBJETIVA CONFIGURADA. CÁLCULO. DEDUÇÃO DE DES-PESAS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SUCUM-BÊNCIA RECÍPROCA. COMPENSAÇÃO. APELA-ÇÃO DO PARTICULAR IMPROVIDA. APELAÇÃO DO DNIT E REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDAS.- Ausência de comprovação dos danos emergen-tes, pois o autor não se desincumbiu do ônus de provar que o dinheiro dos empréstimos feitos ao Banco do Nordeste foi efetivamente empregado em sua atividade avícola.- Enquanto os juros compensatórios destinam-se a ressarcir o expropriado pela perda antecipada da posse do imóvel, os lucros cessantes visam à reposição dos ganhos que o expropriado teria se não houvesse sido privado de seu bem, pelo que são distinto e cumuláveis.- O laudo do perito oficial, acostado às fls. 153/157, foi claro ao afirmar que a atividade antes exercida pelo autor não pode mais ser explorada devido às obras da estrada Transnordestina,

Page 44: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

44

não somente pela proximidade entre os galpões de criação avícola e a estrada de ferro, como também pelo fato de que, no período invernoso, há grande acúmulo de águas, que deságuam no terreno do requerente, provocando alagamento dos galpões.- Os lucros cessantes são devidos não pelo va-lor da receita bruta auferida, mas pelo valor do lucro líquido apurado. Precedentes (STJ, REsp 1110417/MA, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 28/04/2011).- Não tendo o perito oficial podido projetar o lucro cessante, nada obsta possa o Juízo fazê-lo com fundamento nas informações contidas nos autos e no juízo de equidade. Considerando-se o valor da receita bruta auferida informado pelo promo-vente no laudo técnico de fl. 11 (R$ 71.820,00), prova unilateralmente produzida, mas não refuta-da pela parte adversa, é razoável deduzir-se 50% (cinquenta por cento) a título de despesas várias, alcançando-se um lucro líquido de R$ 35.910,00 (trinta e cinco mil, novecentos e dez reais). - Em caso de parcial procedência dos pedidos, é de se reconhecer a sucumbência recíproca. Honorários advocatícios compensados entre os litigantes.- Apelação do particular improvida. Apelação do DNIT e remessa oficial parcialmente providas.

ACÓRDÃO

Vistos etc., decide a egrégia Segunda Turma do Tribunal Re-gional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do particular e dar parcial provimento ao DNIT e à remessa oficial, nos termos do voto do Relator.

Recife, 14 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL ALCIDES SALDANHA - Re-lator Convocado

Page 45: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

45

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALCIDES SAL-

DANHA (Convocado):

Trata-se de remessa oficial e de apelações interpostas em face de sentença que, em Ação de Indenização por Danos Emergentes e Lucros Cessantes, julgou parcialmente procedentes os pedidos.

Na sentença de fls. 183/189, o Juízo a quo reconheceu a responsabilidade objetiva do DNIT pelos danos suportados pelo autor em decorrência da construção da estrada Transnordestina. Ressaltou, porém, que, apesar de o requerente ter postulado a reparação de danos emergentes e de lucros cessantes, somente logrou êxito na comprovação destes, uma vez que “quando de sua inicial, o demandante se limitou a apresentar, à fl. 12, tão somente uma planilha contendo os números dos contratos que firmou com o Banco do Nordeste e o valor contratado, não se desincumbindo do ônus de comprovar que tal quantia foi, em seu total, efetivamente empregada para a implantação e exploração da atividade avícola prejudicada pela atividade da ré. Nem mesmo os contratos foram juntados aos autos”. Consignou, ainda, que, conforme laudo téc-nico anexado à exordial, o qual não foi impugnado pelo DNIT, o promovente deixou de aferir receita bruta anual de R$ 71.820,00 (setenta e um mil, oitocentos e vinte reais), em virtude do encer-ramento de suas atividades.

Recurso de apelação interposto pelo particular às fls. 193/196. Em suas razões recursais, o recorrente alega que os danos emer-gentes encontram-se provados nos autos, tendo em vista o teor do laudo pericial. Aduz que a planilha de fl. 12 aponta e quantifica o valor dos empréstimos efetuados junto ao Banco do Nordeste e que, por não haver sido impugnada especificadamente pelo DNIT, como exige o art. 302 do CPC, deve ser tida como verdadeira. Re-quer, por fim, a majoração do quantum dos honorários advocatícios.

Recurso de apelação interposto pelo DNIT às fls. 205/207. Em suas razões recursais, a autarquia alega, em síntese, que: a) as parcelas referentes aos lucros cessantes já foram incluídas no valor da desapropriação; b) os recursos destinados à indenização da terra seriam suficientes para que o desapropriado construísse o galpão noutra parte de terras; c) o requerente não comprovou o

Page 46: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

46

dano; d) a culpa pela paralisação da atividade não se deu por ato do Poder Público, mas por inação do autor; e) devem ser descon-tados os valores relativos aos custos da atividade, totalizando a receita líquida uma quantia em torno de 30% (trinta por cento) do valor da receita bruta informada.

Contrarrazões de apelação do DNIT às fls. 209/211.

Contrarrazões de apelação do particular às fls. 216/221.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALCIDES SAL-

DANHA (Relator Convocado):

Não há, nos autos, qualquer comprovação dos danos emer-gentes alegados. As informações contidas na planilha de fl. 12 (Si-mulador de Cálculo de Operações de Crédito) demonstram apenas os números e os respectivos valores dos contratos firmados com o Banco do Nordeste, mas o promovente não se desincumbiu do ônus de provar que tais numerários foram, efetivamente, empre-gados na atividade avícola que exercia. Aliás, o requerimento de expedição de ofício ao Banco do Nordeste, formulado pelo autor às fls. 48/49, para que a instituição financeira apresentasse as cópias dos referidos contratos, foi indeferido na decisão de fls. 54/56, sob o argumento de que, figurando ele como parte no contrato, teria o direito de obter junto ao banco cópia dos instrumentos contratuais, fazendo-se desnecessária, em princípio, determinação judicial para tanto.

Embora ausente impugnação específica da parte ré quanto à mencionada planilha, não diligenciando o autor no sentido de lograr os documentos necessários à devida comprovação de suas alegações, é de se indeferir o pleito de reparação por danos emergentes, haja vista aludir o art. 302 do CPC a uma presunção de veracidade relativa ou juris tantum, passível, portanto, de ser afastada pelo acervo probatório constante dos autos.

No que tange ao argumento do DNIT de que as parcelas referentes aos lucros cessantes já estão incluídas no valor da desapropriação, tal não merece acolhida. É que, enquanto os

Page 47: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

47

juros compensatórios destinam-se a ressarcir o expropriado pela perda antecipada da posse do imóvel, os lucros cessantes visam à reposição dos ganhos que o expropriado teria se não houvesse sido privado de seu bem. Assim, lucros cessantes e juros com-pensatórios possuem fundamentos diversos. Nesse sentido é o precedente a seguir colacionado:

ADMINISTRATIVO. AÇÃO DE DESAPROPRIAÇÃO POR UTILIDADE PÚBLICA COM A FINALIDADE DE EXPRO-PRIAR IMÓVEL PARA FINS RODOVIÁRIOS. REFORMA DA SENTENÇA PARA ADOÇÃO DO LAUDO PERICIAL. RUBRICAS LEGAIS. 1 - O laudo pericial dista 4 anos do laudo administrativo, circunstância que não poderia prejudicar o expropriado, eis que a avaliação teria que se basear em elementos contemporâneos ao exame técnico. O cálculo da inde-nização, pois, deve ser fixado de acordo com a data da perícia judicial, consoante precedente do STJ. 2 - As conclusões do Perito Oficial se basearam no método comparativo de dados do mercado, comumente usado nas perícias dos processos expropriatórios, e de acordo com os critérios da NBR 14.653-2 da ABNT, através de inferência estatística, além de terem sido realizadas pes-quisas de mercado. 3 - O DNIT não trouxe elementos suficientemente sólidos e capazes de comprometer as conclusões do perito. 4 - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite a cumulação de lucros cessantes com juros compensató-rios, dada a natureza diferenciada, enquanto o primeiro refere-se ao que se deixou de lucrar o segundo diz res-peito ao dano emergente. 5 - Juros moratórios, a partir de 1º de janeiro do exercício seguinte àquele em que o pagamento deveria ser feito, nos termos do art. 100 da CF/88, à base de 6% (seis por cento) ao ano 6 - Juros compensatórios de 1% (hum por cento) ao mês (Súmula nº 618 do STF), a partir da imissão na posse do imóvel, até o dia do efetivo pagamento da indenização, considerando a diferença entre 80% (oitenta por cento) do valor ofertado em juízo e o valor fixado para a indeni-zação, calculados sobre o valor da indenização, corrigido monetariamente (Súmula nº 113 do STJ).

Page 48: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

48

7 - Correção monetária, a partir do laudo de avaliação, como se infere da Súmula nº 67 do STJ, até o efetivo pagamento. 8 - Honorários de advogado, à base de 2% (dois por cento) sobre a diferença corrigida entre a oferta e o preço final da indenização, devidamente atualizado (Súmulas 131 e 141 do STJ). 9 - Apelação do expropriado provida e do DNIT improvida.(TRF5, AC 200883000101320, Rel. Des. Federal Lázaro Guimaraes, Quarta Turma, DJe 04/09/2014)

Tampouco merecem prosperar as alegações de que a inde-nização recebida pela desapropriação seria suficiente para que se construísse o galpão em outra área, de que o requerente não comprovou o dano e de que a paralisação da atividade deu-se por culpa do autor. O laudo do perito oficial, acostado às fls. 153/157, foi claro ao afirmar que a atividade antes exercida pelo autor não pode mais ser explorada devido às obras da estrada Transnordes-tina, não somente pela proximidade entre os galpões de criação avícola e a estrada de ferro, como também pelo fato de que, no período invernoso, há grande acúmulo de águas, que deságuam no terreno do requerente, provocando alagamento dos galpões.

No que concerne ao argumento de que, na fixação da quantia referente aos lucros cessantes, devem ser descontados os valores relativos aos custos da atividade, assiste razão à autarquia. Com efeito, os lucros cessantes são devidos não pelo valor da receita bruta auferida, mas pelo valor do lucro líquido apurado. Nesse sentido são os precedentes a seguir:

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA. CÁLCULO DOS LUCROS CESSANTES. DESPESAS OPERACIONAIS. DEDUZIDAS. TERMO FINAL. ALIE-NAÇÃO DO BEM.1. Para o atendimento do requisito do prequestionamento, não se faz necessária a menção literal dos dispositivos tidos por violados no acórdão recorrido, sendo suficiente que a questão federal tenha sido apreciada pelo Tribunal de origem. Ausência de violação do art. 535 do CPC.2. Lucros cessantes consistem naquilo que o lesado dei-xou razoavelmente de lucrar como consequência direta do evento danoso (Código Civil, art. 402). No caso de

Page 49: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

49

incêndio de estabelecimento comercial (posto de gasoli-na), são devidos pelo período de tempo necessário para as obras de reconstrução. A circunstância de a empresa ter optado por vender o imóvel onde funcionava o em-preendimento, deixando de dedicar-se àquela atividade econômica, não justifica a extensão do período de cálculo dos lucros cessantes até a data da perícia.3. A apuração dos lucros cessantes deve ser feita com a dedução de todas as despesas operacionais da empresa, inclusive tributos.4. Recurso especial provido.(STJ, REsp 1.110.417/MA, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, DJe 28/04/2011)

CIVIL. LUCROS CESSANTES. FATURAMENTO E LU-CRO: DISTINÇÃO. O faturamento seguido pelo pagamento corresponde à receita, que, todavia, não equivale ao lucro, porque este é o resultado das receitas menos os custos da atividade empresarial (despesas operacionais, tributos etc). Recurso especial conhecido e provido em parte.(STJ, REsp 575.080/CE, Rel. Min. Ari Pargendler, Terceira Turma, DJ 26/03/2007)

ACIDENTE DE TRÂNSITO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E LUCROS CESSANTES. RESPONSA-BILIDADE OBJETIVA DO DNIT. CONSERVAÇÃO DA ESTRADA. CULPA CONCORRENTE. INOCORRÊNCIA. LUCROS CESSANTES. - Ocorrente o nexo de causalidade entre a omissão da autarquia (má conservação da rodovia em que ocorreu o sinistro/buraco) e o dano causado ao requerente (danos materiais), é de ser mantida a condenação ao pagamento dos danos materiais e lucros cessantes. - Devidos os lucros cessantes, porém não pelo valor da receita bruta, e sim pelo lucro líquido a ser apurado em sede de liquidação de sentença.(TRF4, AC 200271000207343, Rel. Desa. Cláudia Cristina Cristofani, Quarta Turma, DJ 15/09/2004)

Entretanto, no laudo de fls. 153/157, o perito oficial consignou que “não foi apresentado pelo autor nenhuma documentação para comprovação das receitas e lucros, fato que impossibilita o cálculo da previsão de lucro por parte deste expert”. Ocorre que o laudo

Page 50: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

50

técnico de fl. 11, acostado à inicial, explicita o valor da receita bruta auferida pelo promovente, no importe de R$ 71.820,00, não ha-vendo nos autos quaisquer elementos que possibilitem avaliar os reais custos com que tem de arcar o requerente para o exercício da atividade. Deste modo, hei por bem fixar os lucros cessantes em 50% (cinquenta por cento) do valor da receita bruta, segundo critérios de razoabilidade, perfazendo um total de R$ 35.910,00 (trinta e cinco mil, novecentos e dez reais).

Finalmente, quanto aos honorários advocatícios, não assiste razão ao particular.

Em sede de remessa oficial, verifico que, em caso de parcial procedência dos pedidos, é de se reconhecer a sucumbência recíproca. Nos termos do art. 21 do CPC, os honorários serão proporcionalmente distribuídos e compensados entre os litigantes. Na espécie, não há falar, portanto, em arbitramento de honorários advocatícios para qualquer das partes.

Nego provimento à apelação do particular. Dou parcial provi-mento à apelação do DNIT e à remessa oficial.

É como voto.

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO Nº 31.321-CE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE OLI- VEIRA ERHARDTApelante: UNIÃOApelado: MIGUEL EUGÊNIO GUIMARÃES LIMAAdv./Proc.: DR. MIGUEL EUGÊNIO GUIMARÃES LIMA (APDO.)

EMENTA: PROCESSO CIVIL. ELEITORAL. CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DANOS MORAIS. SEN-TENÇA PENAL CONDENATÓRIA. SUSPENSÃO DE DIREITOS POLÍTICOS. RESTABELECIMENTO. TRANSFERÊNCIA DE TÍTULO. IMPOSSIBILIDADE. DECURSO DO PRAZO. CULPA CONCORRENTE.- Cuida-se de ação ordinária, objetivando inde-nização de danos morais, porque o autor não

Page 51: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

51

conseguiu transferir seu título de eleitor de Icó para Fortaleza e consequentemente impedido de votar nas Eleições de 2010, em virtude do registro da informação de suspensão de direitos políticos decorrente de sentença criminal con-denatória; pena já havia sido cumprida. O juízo a quo condenou a União Federal ao pagamento de R$ 3.000,00.- Diferentemente da União Federal, que alega a culpa exclusiva da vítima, e de parte dos funda-mentos da sentença, houve a culpa concorrente do autor, tendo em vista que ele compareceu ao Cartório Eleitoral em 15/08/10, após o fechamento do período de cadastro em 05/05/10, último dia para o eleitor requerer a inscrição eleitoral ou a transferência de domicílio, conforme dispõe o art. 91 da Lei nº 9.504/97 e Resoluções do TSE de nºs 23.089/10, 23.223/10 e 23.247/10.- Também diferentemente do argumento do autor de que poderia votar em separado, o voto em separado era admitido somente na hipótese de dúvida quanto à identidade do eleitor (art. 147 da Lei nº 4.737/65 – Código Eleitoral), o que não é a questão. E isso também não é mais possível, haja vista o disposto no art. 62 da Lei nº 9.504/97 e no art. 54 da Resolução do TSE de nº 21.633/04, que impedem de votar o eleitor, cujo nome não figure na folha de votação ou no cadastro de eleitores da seção constante da urna eletrônica, ainda que apresente título correspondente à se-ção e documento que comprove a sua identidade.- Ainda que a comunicação entre a Justiça Fede-ral e a Justiça Eleitoral tenha demorado a tramitar no sentido de suspender os direitos políticos do autor em decorrência da sentença criminal condenatória, assim como de restabelecê-los em tempo hábil pelo cumprimento da pena, e que constasse esse impedimento no Cartório Eleitoral, impossibilitando-o de transferir o tí-

Page 52: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

52

tulo de eleitor de Icó para votar em Fortaleza, verifica-se a culpa concorrente do mesmo, pelo seu comparecimento extemporâneo, conforme já explicitado anteriormente. E, mesmo que não houvesse impedimento registrado, ele não pode-ria realizar a transferência desejada, em virtude do decurso do prazo legal. Portanto, em tais situações, a responsabilidade estatal é mitigada e a indenização merece ser reduzida à metade (R$ 1.500,00). - Apelação da União Federal e do autor não pro-vidas e remessa oficial provida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELREEX 31.321-CE, em que são partes as acima mencionadas, acordam os Desembargadores Federais da Primeira Turma do TRF da 5ª Região, por unanimidade, em negar provimento às apelações da União Federal e do autor e dar provimento à remessa oficial, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte do presente julgado.

Recife, 23 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE OLIVEIRA ERHARDT - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE

OLIVEIRA ERHARDT:

1. Trata-se de apelação interposta pela UNIÃO FEDERAL contra sentença do Juiz Federal da 6ª Vara da Seção Judiciária do Ceará, Dr. Francisco Roberto Machado, que julgou procedente ação ordinária, para condenar a ré a indenizar R$ 3.000,00 à parte autora a título de danos morais e pagar honorários advocatícios de 15% sobre a condenação, ao entendimento de que a Justiça Federal demorou a comunicar à Justiça Eleitoral o cumprimento da pena aplicada em ação criminal e o fim da suspensão dos direitos políticos do autor, impedindo-o de participar das Eleições de 2010.

Page 53: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

53

2. Alega a apelante a culpa exclusiva da vítima, excludente da responsabilidade extracontratual da Administração Pública, por descaracterizar o nexo causal, uma vez que o fator que im-pediu o autor de votar foi o seu comparecimento tardio (16/08/10) ao Cartório Eleitoral após o fechamento do período de cadastro eleitoral (05/05/10), último dia para o eleitor requerer a inscrição eleitoral ou a transferência de domicílio, nos termos do art. 91 da Lei nº 9.504/97 e Resoluções do TSE de nºs 23.089/10, 23.223/10 e 23.247/10.

3. Recorre também o autor, requerendo a majoração da inde-nização, para, no mínimo, R$ 200.000,00.

4. Sem contrarrazões.

5. É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE

OLIVEIRA ERHARDT (Relator):

1. A mais alta Corte de Justiça do país já firmou entendimento no sentido de que a motivação referenciada (per relationem) não constitui negativa de prestação jurisdicional, tendo-se por cum-prida a exigência constitucional da fundamentação das decisões judiciais. Adotam-se, portanto, parte dos termos da sentença como razão de decidir:

I - RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária proposta por MIGUEL EUGÊNIO GUIMARÃES LIMA, qualificado nos autos, contra a UNIÃO, por meio da qual pretende a condenação da ré no pagamen-to de indenização por danos morais e materiais no valor de R$ 530.000,00 (quinhentos e trinta mil reais), aduzindo: 1) ter sido condenado no crime de injúria, a quatro meses de detenção, no processo 2974-66.2009.4.05.8100, da 12ª Vara Federal da Seção Judiciária de Fortaleza/CE; 2) a pena de liberdade foi substituída pela restritiva de direito, com servi-ços prestados a comunidade; 3) teve seus direitos políticos suspensos; 4) cumpriu a pena alternativa de janeiro 2009 a abril de 2009, tendo sua punibilidade extinta em 02/06/2009, com processo arquivado em 04/08/2009 (TEBAS); 5) os au-

Page 54: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

54

tos foram arquivados sem comunicação da Justiça Federal ao Tribunal Regional Eleitoral do Ceará sobre o cumprimento da pena e consequente restabelecimento dos direitos polí-ticos; 6) dirigiu-se ao Cartório Eleitoral da Praia de Iracema, com intuito de requerer a transferência de seu título de Icó/CE para Fortaleza, quando foi informado do impedido na frente de todos, resultando em constrangimento; 7) ficou impossibilitado de votar nas eleições de 2011 e prestar concurso público; 8) o erro do judiciário enseja indenização.

Citada, a UNIÃO ofereceu a contestação às fls. 75/95, advo-gando: 1) falta de fundamentação jurídica para alicerçar a pretensão autoral de indenização; 2) ausência de compro-vação dos fatos narrados e provas nos autos capazes de configurarem os pressupostos necessários da responsabili-dade da União; 3) por fim, argumenta que a Justiça Federal e o Tribunal Regional Eleitoral do Ceará agiram no estrito cumprimento do dever legal. Requer indeferimento da ação.

Antecipação de tutela indeferida às fls. 116/117.

Embargos de declaração opostos pelo autor às fls. 120/123, aos quais foram negados provimentos (fls. 134/135).

Réplica às fls. 144/148.

Inexiste necessidade de produção de prova em audiência, porque a vexata quaestio encerra matéria predominante-mente de direito, sendo caso, pois, de julgamento antecipado da lide (art. 330, I, CPC).

II - FUNDAMENTAÇÃO

O autor demanda a condenação da UNIÃO em danos mo-rais, em importância não inferior a R$ 530.000,00, advogan-do que a ausência de comunicação da Justiça Federal e o erro do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará em manter à suspensão de seus direitos políticos de forma equivocada causou-lhe uma série de transtornos: retirou-lhe os meios de exercício da cidadania.

Diga-se, prima facie, que na atual ordem constitucional o dano moral é passível de indenização, bastando que o ofendido demonstre o prejuízo e a relação de causalidade entre o fato e o pretenso dano, comportando, inclusive, sua cumulação com danos materiais, ainda que oriundos do mesmo fato, segundo lição pacífica do STJ.

Page 55: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

55

Sabe-se que o dano moral resulta, em regra, de ato lesivo que afeta a personalidade do indivíduo, sua honra, sua in-tegridade psíquica, suas virtudes, enfim, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor econômico. É por isso que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que, sobrevindo perturbação nas relações psíquicas, na tranquilidade, nos sentimentos e nos afetos de uma pessoa, em razão de ato ilícito, configura-se o dano moral, passível de indenização.

No caso concreto, em análise a documentação acostada aos autos, resta comprovado que, em 9 de março de 2006, o Juízo da 11ª Vara Federal da Seção Judiciária do Ceará, na Ação Penal nº 2005.81.00.012966-0, determinou a ex-pedição de ofício ao eg. TRE/CE para fins de cumprimento do art. 15, III, da CF/88 (v. fls. 162/167).

Dessa forma, em 20/02/2009, o Corregedor do Tribunal Regional Eleitoral do Ceará encaminhou o Ofício CRE nº 735/09 ao Juiz da 15ª Zona Eleitoral de Icó/CE, para que fosse efetuada a suspensão da inscrição do autor mediante fase 337.

Verifico, ainda, que no Ofício nº 155/2013/15ª ZE/CE (v. fl. 174) consta a informação de que a suspensão dos direitos políticos do autor foi processada em 20/05/2010, decorrente do processo nº 2005.81.00.012966-0, da 12ª Vara Federal do Ceará (Execução Penal), ocorrendo a cessação de tal impedimento somente em 28/03/2011.

Por sua vez, observo que constam nos autos certidões emi-tidas pela Justiça Eleitoral (v. fls. 39 e 65) referentes ao título do autor de inscrição nº 006577660701, da 15ª zona, do Mu-nicípio 14095-ICÓ, a primeira informando que nada consta no registro de condenação criminal eleitoral (23/08/2010) e a segunda comunicando que o autor se encontra quite com a justiça eleitoral (09/04/2010).

Desta feita, verifico em consulta ao sistema Tebas da Justiça Federal, Processo nº 2005.81.00.012966-0, que a senten-ça de extinção da punibilidade do autor, por cumprimento da pena, ocorreu em 02/06/2009, com arquivamento em 04/08/2009.

Deste modo, a anotação relativa ao autor nos Registros de Sistema de Alistamento Eleitoral foi realizada de modo equivocado no tocante as datas e procedimentos a serem

Page 56: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

56

cumpridas, uma vez que a comunicação para a suspensão dos direitos políticos do autor se deu 20/02/2009, enquanto seu processamento somente aconteceu em 20/05/2010, mais de um ano depois da comunicação e quase um ano após a extinção da punibilidade.

Portanto, realmente a inscrição eleitoral do autor foi sus-pensa, consoante se infere na documentação acostada aos autos, ao que tudo indica por equivoco da Justiça Eleitoral no tocante as datas e pela ausência de informação da Justiça Federal.

Por sua vez, não resta dúvida acerca dos percalços sofri-dos pelo autor a partir da manutenção indevida do proces-samento de suspensão de seus direitos políticos fora do prazo estipulado na sentença de punibilidade, assim como a ausência de comunicação entre os Tribunais.

Nestes termos, é de se observar que a indenização por dano moral vem sendo amplamente aceita pela doutrina e jurisprudência, estando inclusive integrada em nosso direito, conforme previsão constitucional (art. 5º, inciso X, da CF/88) a saber:

Art. 5º - (...).X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a hon-ra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; (...) (G.N.)

Dúvidas não há de que os fatos narrados atingiram a repu-tação e a honra do demandante, uma vez que, como bem asseverou a parte autora foi impedido de proceder à trans-ferência do título perante o Cartório Eleitoral de Fortaleza, na presença das pessoas, tal fato o impossibilitou do pleno exercício da cidadania, através do voto. Nesse sentido é a jurisprudência in verbis:

RESPONSABILIDADE CIVIL. SUSPENSÃO DE DIREITOS POLÍTICOS DE MODO INDEVIDO. VO-TAÇÃO IMPEDIDA. DANO MORAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Há dano moral a ser compensado quando demons-trado que, por equívoco, o agente público registrou

Page 57: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

57

no Sistema de Alistamento Eleitoral ter sofrido o de-mandante condenação criminal quando na verdade a decisão judicial acolheu a promoção ministerial no sentido do arquivamento do feito, porquanto evidentes os constrangimentos ocasionados ao ser impedido de votar na presença de terceiros e de exercer plenamente a sua cidadania. 2. A quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais) atende à necessidade de imprimir caráter pedagógico e punitivo à condenação a ser imposta ao ofensor, não resultan-do, por outro lado, em enriquecimento indevido para a parte ofendida, mormente quando não demonstrado que o episódio gerou maiores implicações. 3. De acordo com o disposto na Súmula 362 do Colen-do Superior Tribunal de Justiça “a correção monetária do valor da indenização do dano moral incide desde a data do arbitramento”. 4. Nas hipóteses em que o Magistrado fixa a indeni-zação por danos morais considerando a razoabilidade deste valor à data da prolação da sentença, os juros moratórios devem ter como termo a quo esta mesma data, mormente se constatado que o valor dos juros de mora, acaso fosse considerado como termo a quo o evento danoso (Súmula nº 54 do STJ) ou a propositura da demanda, atingiria montante sobejamente superior ao da própria indenização. 5. A alteração do valor dos honorários advocatícios pelo Tribunal é restrita às hipóteses em que a fixação de tal verba tenha implicado ofensa às normas processuais, o que não é o caso dos autos onde deverá prevalecer o percentual atribuído pela instância originária, pois a maior proximidade do Juízo a quo dos fatos ocorridos no processo permite a aferição mais fidedigna das alíneas mencionadas no § 3º do art. 20 do CPC. 6. Remessa necessária e apelações desprovidas.(APELREEX 200351010273759, Desembargador Federal MARCELO PEREIRA/no afast. Relator, TRF2 - OITAVA TURMA ESPECIALIZADA, E-DJF2R - Data: 30/11/2010 - Página: 108.)

Relativamente à questão da apuração do valor de tal indeni-zação, há um razoável consenso na magistratura no sentido de que “o arbitramento do dano moral será apreciado livre-

Page 58: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

58

mente pelo juiz, atendendo à repercussão econômica, à pro-va da dor e ao grau de dolo ou culpa do ofensor”, consoante anota Clayton Reis, professor e magistrado no Estado do Paraná. Segundo ensina Yussef Said Cahali, a quantificação do dano moral deverá levar em conta fatores diversos, dentre os quais a natureza da lesão e a extensão do dano, as con-dições pessoais do ofendido e do responsável, a gravidade da culpa, além de equidade, cautela, prudência e finalidade da indenização. Em suma, aludida reparação deve repre-sentar uma “compensação”, no propósito de minorar a dor da vítima, além de uma reprimenda ao agressor, inibindo-o de futuras reincidências e ensejando-lhe expressivo, porém suportável gravame patrimonial, sem, contudo, ultrapassar os limites da razoabilidade e proporcionalidade, nem servir de instrumento de enriquecimento sem causa.

No caso concreto, o autor pede a condenação da União, a título de reparação pelos danos morais sofridos, em im-portância não inferior a R$530.000,00 (quinhentos e trinta mil reais). É vero que ele, em virtude do processamento de suspensão de seus direitos políticos em data indevida, foi lhe retirado o direito de exercício da cidadania, de votar e ser votado, assim como de poder realizar a transferência de seu título de eleitor. Em todo caso, não é possível acolher a pre-tensão inicial, pelo menos na cifra ali pretendida, sob pena de permitirmos que a indenização a título de dano moral se transforme em instrumento de verdadeiro enriquecimento sem causa. Ainda que se tome, como critério de fixação do dano moral, o grau de culpa do ofensor e se reconheça o abuso cometido pela União. Este é aspecto importante, insista-se, que a doutrina e a jurisprudência recomendam observar na hora da fixação do dano moral.

Atento, portanto, às particularidades do caso concreto e tendo por mira assegurar ao autor a devida reparação pelo dano moral que lhe foi causado pela União, sem, no entanto, permitir que a indenização se torne instrumento de enrique-cimento sem causa, acosto-me à orientação mais recente e reiterada do Superior Tribunal de Justiça, que tem fixado, em casos semelhantes, indenizações por danos morais em R$ 3.000,00 (três mil reais), verbis:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. BLOQUEIO DE PAGAMENTO ATRAVÉS

Page 59: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

59

DO CARTÃO MAGNÉTICO. SUSPENSÃO. RESPON-SABILIDADE. REQUISITOS CONFIGURADORES. PRETENSÃO DE AFASTAMENTO. IMPOSSIBILI-DADE. NECESSIDADE DE REEXAME DE PROVAS. SÚMULA 7/STJ. QUANTUM INDENIZATÓRIO. VALOR RAZOÁVEL. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Em relação à responsabilização do agravante pelos danos sofridos pelo agravado, o Tribunal de origem, apreciando o conjunto probatório dos autos, concluiu pela presença dos requisitos ensejadores da respon-sabilidade civil. A alteração de tal entendimento, como pretendida, demandaria a análise do acervo fático--probatório dos autos, o que é vedado pela Súmula 7 do STJ, que dispõe: “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. 2. A orientação pacificada no Superior Tribunal de Justiça é de que o valor estabelecido pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais pode ser revisto tão somente nas hipóteses em que a condenação se revelar irrisória ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se evidencia no presente caso. Desse modo, não se mostra desproporcional a fixação em R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de reparação moral, decorrente das circunstâncias específicas do caso concreto, moti-vo pelo qual não se justifica a excepcional intervenção desta Corte no presente feito, como bem consignado na decisão agravada. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.

III - DISPOSITIVO

Assim, julgo PROCEDENTE a ação para condenar a UNIÃO ao pagamento de indenização por danos morais ao autor fixando-a no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais), acrescidos de correção monetária e juros legais.

Condeno a União em honorários advocatícios, os quais fixo em 15% sobre o valor da condenação, aqui já observado os critérios das alíneas a, b e c do § 3º, c/c § 4º do art. 20 do CPC.

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório, ino-correndo recurso voluntário, subam ao e. TRF da 5ª Região.

Page 60: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

60

2. No entanto, diferentemente da União Federal, que alega a culpa exclusiva da vítima, e de parte dos fundamentos da sen-tença acima transcrita, penso que houve a culpa concorrente do autor, tendo em vista que ele compareceu ao Cartório Eleitoral em 15/08/10 (fl. 180), após o fechamento do período de cadastro (05/05/10), último dia para o eleitor requerer a inscrição eleitoral ou a transferência de domicílio, conforme dispõe o art. 91 da Lei nº 9.504/97 e Resoluções do TSE de nºs 23.089/10, 23.223/10 e 23.247/10.

3. Ademais, também diferentemente do argumento do autor de que poderia votar em separado, o voto em separado era admitido somente na hipótese de dúvida quanto à identidade do eleitor (art. 147 da Lei nº 4.737/65 – Código Eleitoral), o que não é a questão. E isso também não é mais possível, haja vista o disposto no art. 62 da Lei nº 9.504/97 e no art. 54 da Resolução do TSE de nº 21.633/04, que impedem de votar o eleitor, cujo nome não figure na folha de votação ou no cadastro de eleitores da seção constante da urna eletrônica, ainda que apresente título correspondente à seção e documento que comprove a sua identidade.

4. Assim, ainda que a comunicação entre a Justiça Federal e a Justiça Eleitoral tenha demorado a tramitar no sentido de suspender os direitos políticos do autor em decorrência da sentença criminal condenatória, assim como de restabelecê-los em tempo hábil pelo cumprimento da pena, e que constasse esse impedimento no Cartório Eleitoral (fls. 162/172), impossibilitando-o de transferir o título de eleitor de Icó para votar em Fortaleza, verifica-se a culpa concorrente do mesmo, pelo seu comparecimento extemporâneo, conforme já explicitado anteriormente. E, mesmo que não houvesse impedimento registrado, ele não poderia realizar a transferência desejada, em virtude do decurso do prazo legal. Portanto, em tais situações, a responsabilidade estatal é mitigada e a indenização merece ser reduzida à metade (R$ 1.500,00).

5. Diante do exposto, nego provimento às apelações e dou provimento à remessa oficial, reformando a sentença recorrida, para reduzir o valor da indenização. Sem condenação das partes em honorários advocatícios em razão da sucumbência recíproca.

6. É como voto.

Page 61: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

61

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO Nº 32.243-AL

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIROApelantes: ELAINE DOS SANTOS, ESTADO DE ALAGOAS E UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS - UFALApelados: OS MESMOS E MUNICÍPIO DE MACEIÓ (AL)Repte.: PROCURADORIA REGIONAL FEDERALAdvs./Procs.: DRS. RAPHAEL MARTINIANO DIAS E OUTROS E ALYSSON PAULO MELO DE SOUZA E OUTROS E LAILA SOARES CAVALCANTE E OUTROS

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRA-TIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE. OMISSÃO. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA DO ESTADO. CULPA DO ESTADO DE ALAGOAS CONFIGURADA. MANUTENÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. INEXISTÊNCIA DE NEXO CAU-SAL QUANTO À UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS.- A sentença apelada condenou o Estado de Alagoas e a Universidade Federal de Alagoas ao pagamento de indenização por danos morais decorrentes da deficiente prestação do serviço público de saúde, nos respectivos valores de R$ 40.000,00 e R$ 20.000,00. O juízo a quo entendeu que, quanto à morte do feto (imputada ao Estado de Alagoas) e quanto ao descuido com relação aos gêmeos e à autora (atribuído à UFAL), res-taram suficientemente comprovados o dano, a conduta negligente e o nexo causal.- Caso em que, no dia 10/04/2009, a demandante dirigiu-se à Maternidade Escola Santa Mônica (Estado de Alagoas) relatando sentir fortes dores, contrações, perda de sangue e outros fluidos. A paciente foi atendida, examinada e rapidamente dispensada. Em 27/04/2009, a parturiente entrou em trabalho de parto e foi atendida pela equipe

Page 62: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

62

do Hospital Universitário Prof. Alberto Antunes (UFAL), eis que os outros estabelecimentos hos-pitalares que buscara não a receberam. O proce-dimento de parto teve duração de 49 (quarenta e nove) minutos, culminando com a concepção do primeiro gêmeo natimorto e do segundo gêmeo em vida.- Preliminar de ilegitimidade passiva ad causam suscitada pelo Estado de Alagoas rejeitada, porquanto, embora o parto tenha ocorrido nas dependências do Hospital Universitário da UFAL, a morte da criança não foi consequência da atu-ação dos seus funcionários. Do laudo pericial extraiu-se que o feto havia sido concebido já em estágio de decomposição e que já estava em óbito desde a data anterior ao parto.- Não acolhimento da preliminar aventada pela UFAL, eis que o STJ sedimentou o entendimen-to de que “é quinquenal o prazo prescricional para propositura de ação indenizatória contra a Fazenda Pública, a teor do art. 1º do Decreto n. 20.910/32, afastada a aplicação do Código Civil” (AgRg no REsp 1384087/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 19/03/2015), quan-do do julgamento do REsp 1.251.993/PR, sob os auspícios do art. 543-C do CPC.- Da análise das provas carreadas aos autos, evidenciou-se que a conduta da maternidade estadual foi negligente, dado que houve flagrante descaso da instituição para com a paciente, a despeito da situação de risco em que se encon-trava. - Tratando-se de danos morais, à falta de critérios objetivos legalmente previstos para a fixação, o arbitramento deve ser feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao nível socioeconômico da parte autora, devendo o julgador orientar-se pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoa-

Page 63: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

63

bilidade, atento às peculiaridades de cada caso. O quantum arbitrado pelo juízo sentenciante observou tais balizas no que diz respeito à con-denação do Estado de Alagoas em R$ 40.000,00.- Diante do desconhecimento acerca do caso da autora por parte dos funcionários do Hospital Universitário, e de que um dos fetos já se encon-trava morto, não se pode rotular a conduta da equipe médica como sendo descuidada.- Não restou evidenciado que no momento do parto os funcionários do Hospital Universitá-rio não estavam à espera do nascimento do filho da autora. Ao revés, o interregno entre o atendimento inicial da parturiente e o parto do natimorto foi de 49 (quarenta e nove) minutos, tempo considerado normal para a realização de um procedimento de tal natureza e em que houve aplicação de anestesia.- Observou-se que não houve negligência, imprudência ou imperícia por parte da equipe médica do HU-UFAL, carecendo à composição da Responsabilidade Civil Subjetiva o elemento da culpa.- Apelação de Elaine dos Santos e apelação do Estado de Alagoas desprovidas. Remessa ofi-cial parcialmente provida e Apelação da UFAL - Universidade Federal de Alagoas provida, para eximi-la da responsabilidade pelo pagamento da indenização fixada na sentença.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que figuram como partes as acima identificadas, decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação de Elaine dos Santos e à apelação do Estado de Ala-goas, dar parcial provimento à remessa oficial e dar provimento à apelação da UFAL - Universidade Federal de Alagoas, nos termos do relatório, do voto do Relator e das notas taquigráficas constantes dos autos, que passam a integrar o presente julgado.

Page 64: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

64

Recife, 21 de maio de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEI-RO - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHA-

DO CORDEIRO:

Cuida-se de remessa oficial e apelações interpostas por Elaine dos Santos, pelo Estado de Alagoas e pela UFAL, contra sentença proferida pelo MM. Juiz da 1ª Vara Federal - AL (fls. 223/245). O juízo a quo condenou as entidades ao pagamento de indenização a título de danos morais suportados pela autora, decorrentes da deficiente prestação do serviço público de saúde, cuja derradeira consequência consistiu no óbito de um dos seus filhos gêmeos.

A primeira insurgente afirma (fls. 257/273), em suma: a) que o quantum indenizatório arbitrado em desfavor do Estado de Alagoas (R$ 40.000,00) é irrisório; b) que o valor da condenação arbitrado em face da UFAL (R$ 20.000,00) é igualmente ínfimo. Pugna pela majoração de ambos os numerários.

O Estado de Alagoas, em suas razões (fls. 274/287), sustenta: a) preliminarmente, que é parte ilegítima para figurar no polo passi-vo da demanda, eis que o malogrado parto ocorreu nas dependên-cias do Hospital Universitário da UFAL; b) que a conduta errônea foi do tipo “omissão”, sendo necessária a analise do caso dos autos sob a ótica da responsabilidade subjetiva da administração pública; c) que inexistiu atividade culposa por parte dos agentes; d) que o valor fixado na condenação é abusivo.

Por sua vez, a UFAL argumenta (fls. 327/343): a) prelimi-narmente, que há de ser reconhecida a prescrição da pretensão autoral, porquanto o direito de ajuizar ações de responsabilização civil do Estado prescreve em 3 anos; b) que não houve atraso no atendimento da demandante parturiente tamanho a ensejar os pre-juízos relatados; c) que a realização de um parto cesárea depende do conhecimento de urgências da criança e/ou da mãe, devendo o parto, em geral, ser realizado de forma natural; d) que a atua-ção dos médicos presentes no Hospital Universitário foi correta e

Page 65: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

65

diligente; e) que inexiste nexo causal entre a conduta dos agentes (médicos e enfermeiros) e o dano (sofrimento da demandante e morte do seu filho); f) que o quantum indenizatório é exorbitante.

Contrarrazões de Elaine dos Santos às fls. 292/303 e 358/369.

Contrarrazões do Estado de Alagoas às fls. 346/357.

Contrarrazões da UFAL às fls. 304/313 e 314/326.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHA-

DO CORDEIRO (Relator):

Inicialmente, entendo ser necessário declinar um breve escorço dos fatos que contextualizam a contenda devolvida a esta Corte Regional.

A autora tomou conhecimento de sua gravidez em 2008, tendo sido informada no 3° mês da gestação de que estaria grávida de gêmeos – a partir de então passou a realizar o acompanhamento pré-natal junto à Maternidade Escola Santa Mônica (Estado de Alagoas). Tratando-se de gravidez gemelar, na Maternidade foi encaminhada ao setor “pré-natal de risco”, ao qual compareceu mês a mês com o fito de regularmente acompanhar o desenvolvi-mento dos fetos (v. fl. 66).

Em 10/04/2009, a demandante dirigiu-se à Maternidade rela-tando sentir fortes dores, contrações, perda de sangue e outros fluidos. Sendo atendida e examinada, foi dispensada com a infor-mação de que ambos os bebês estariam vivos e bem1. Relata que nos dias posteriores as dores persistiram.

Conforme registra o prontuário médico à fl. 66, em 16/04/2009 a autora realizou sua terceira e última consulta pré-natal na Ma-ternidade Escola Santa Mônica, inexistindo no citado documento qualquer outra observação acerca da saúde dos gêmeos.

1 A autora afirma na inicial que fora orientada a utilizar o antiespasmódico “Buscopan” “sempre que as dores voltassem a lhe atormentar” (fl. 11).

Page 66: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

66

Na data de 27/04/2009, a parturiente entrou em trabalho de par-to e foi atendida pela equipe do Hospital Universitário Prof. Alberto Antunes (UFAL), eis que os outros estabelecimentos hospitalares que buscara não a receberam2 (negativa de atendimento em razão de superlotação; greve de servidores; carência de profissionais in loco). O procedimento de parto teve duração de 49 (quarenta e nove) minutos3, culminando com a concepção do primeiro gêmeo natimorto e do segundo gêmeo em vida.

Traçado esse breve cotejo cronológico, passo à análise das questões preliminarmente suscitadas.

O Estado de Alagoas sustenta sua ilegitimidade para figurar no polo passivo da lide. Tal alegação não merece prosperar, porquanto, embora o parto tenha ocorrido nas dependências do HUPAA-UFAL, a morte de um dos gêmeos não foi consequência da atuação dos seus funcionários. Consta no laudo pericial que “o primeiro gêmeo já nasceu em estágio de maceração”4 e que “o primeiro gemelar já estava em óbito desde a data anterior à internação” (fls. 174/176).

Da leitura do caderno processual, extrai-se que a negligência com a qual a paciente foi atendida pela Maternidade Escola Santa Mônica em 10/04/2009 foi crucial para o óbito da criança, conforme será adiante exposto. Portanto, rejeito a preliminar de ilegitimidade ad causam da segunda apelante.

Igualmente, não merece acolhida a preliminar suscitada pela UFAL, eis que o Superior Tribunal de Justiça sedimentou o entendi-mento de que “é quinquenal o prazo prescricional para propositura de ação indenizatória contra a Fazenda Pública, a teor do art. 1º

2 Na exordial, demandante narra que primeiro buscou atendimento junto à Maternidade Escola Santa Mônica – contudo, a tentativa foi inexitosa; a teste-munha Silvio Rocha Tavares fez declarações no mesmo sentido (fls. 11, 227).

3 Informação prestada pela testemunha Dr. Rommel Oliveira Cavalcanti (res-ponsável pelo parto), colhida pelo juízo a quo quando da realização da audiência de instrução (fls. 215, 236).

4 “Sinal de que o óbito fetal já havia ocorrido várias horas antes do parto”; estágio de decomposição.

Page 67: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

67

do Decreto n° 20.910/32, afastada a aplicação do Código Civil”5, quando do julgamento do REsp 1.251.993/PR, sob os auspícios do art. 543-C do CPC.

Passo a examinar o mérito.Analisando o grau de responsabilidade das instituições, o juízo

sentenciante registrou:(...) no que se refere à responsabilização por parte da Maternidade Escola Santa Mônica, é relevante destacar, inicialmente, que esta, apesar de não ter feito o parto da autora, realizou todo o seu pré-natal, em decorrência da demandante ser portadora de uma gravidez de risco, conforme ficara comprovado por meio dos documentos arrolados aos autos (fls. 38/66).21. Além disso, insta consignar que a autora, em suas declarações, afirmou que no dia 10/04/09 sentiu fortes dores, contrações, além da perda de sangue e outros líquidos e que, por isso, procurou assistência médica, tendo sido examinada, medicada e posteriormente libe-rada, ainda com dores, em razão de ter sido constatado que seus filhos estavam bem. 22. Tais fatos foram devidamente confirmados pela Ma-ternidade, uma vez que consta em seu prontuário médi-co que a demandante veio à triagem com urgência em decorrência de inúmeras dores, motivo pelo qual foram realizados alguns exames em que, apesar de não ter sido auscultado os batimentos de um dos fetos, foi constado, por meio de uma ultrassom e de um su-mário de urina, que os fetos estavam vivos, motivo pelo qual a Sra. Elaine fora medicada e recebeu alta. 23. No entanto, a autora afirmou que nos dias que se-guiram a dor persistiu, todavia por não serem tão fortes, fora aconselhada a não se preocupar em virtude de ser uma consequência do pouco espaço para seus bebês e, visando aliviar o seu desconforto, foi indicado pela médica responsável pela triagem da Maternidade Santa Mônica que a autora tomasse o remédio “Buscopan” sempre que as dores voltassem a lhe atormentar. (Negritei)

5 AgRg no REsp 1.384.087/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 19/03/2015.

Page 68: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

68

Tratando do mesmo incidente acima relatado, o prontuário médico da demandante consigna, in litteris, que a demandante (v. fl. 66):

Veio à triagem (urgência) da MESM 10/04/09 com queixa de dor abdominal, disúria (ardência ao urinar) e polaciúria (aumento do número de micção), foi examinada e cons-tatado colo impérvio e sem perdas transvaginais. Medida de fundo uterino não compatível com idade gestacional, principalmente por se tratar de gêmeos e não conseguiu ausculta dos batimentos fetais. Solicitado ultrassonografia (US) e sumário de urina. (...)

Portanto, a despeito das “fortes dores, contrações, além da per-da de sangue e outros líquidos”, e da incompatibilidade da medida de fundo uterino com seu estágio gestacional, a autora rapidamente recebeu alta da Maternidade, quando sequer foi possível identificar os batimentos cardíacos fetais por ausculta.

Embora a ultrassonografia tenha revelado que os gêmeos estariam vivos, a instituição foi negligente ao liberar a paciente, diante do que havia sido apurado na consulta em comento. Ade-mais, tratando-se de uma gravidez na qual fora constatado que as medidas uterinas eram inferiores às que normalmente se verifica para tais casos, é, no mínimo, temerária uma recomendação feita no sentido de que a paciente deveria se automedicar, fazendo livre uso de um antiespasmódico em toda e qualquer oportunidade que as dores viessem a retornar6.

No laudo pericial realizado na primeira instância, a perita--médica concluiu que:

No caso em questão, o que parece ter ocorrido foi que, houve o sofrimento fetal de um dos gêmeos, certamente anterior ao dia do parto. Os documentos descrevem que o primeiro gêmeo já nasceu em estágio de maceração (sinal de que o óbito fetal já havia ocorrido várias horas antes do parto).

Assim, evidencia-se que o óbito do primeiro gêmeo ocorreu antes do parto – isto é, antes do dia 27/04/2009 – não podendo,

6 A autora declarou à fl. 11 que as dores “ocorriam praticamente todos os dias, sendo aliviadas somente através da ingestão do citado medicamento”.

Page 69: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

69

portanto, atribuir-se a responsabilidade pelo fato ao Hospital Uni-versitário Prof. Alberto Antunes. Nos termos do juízo a quo:

(...) em juízo de alta probabilidade, percebe-se que a mor-te de um dos seus filhos ocorreu dias antes do momento em que ela entrou em trabalho de parto, devendo recair a responsabilidade a Maternidade Santa Mônica (Estado de Alagoas) pela morte de um dos filhos da Sra. Elaine.

O art. 196 da Carta Magna assevera que a saúde é direito de todos e dever do Estado, competindo primordialmente ao Poder Público a execução de ações e serviços que garantam ao cidadão, em última análise, o direito à vida.

No âmbito do direito público, “a Teoria do Risco Administrativo, aliada ao mandamento básico de responsabilidade civil do Estado, determina que o Estado será responsável pelo ressarcimento do dano, uma vez reconhecido o nexo causal e o dano, independen-temente de culpa ou dolo do agente”7. É cediço que a Teoria do Risco Administrativo deve ser aplicada em casos de dano decor-rente de conduta comissiva – resultante de uma ação – por parte da Administração Pública.

Todavia, no caso sub examine, verifica-se que a conduta lesiva foi do tipo omissão, eis que o dano decorreu da não prestação dos cuidados devidos à demandante. Assim, o evento deve ser anali-sado à luz da Responsabilidade Subjetiva do Estado.

Prevalece na jurisprudência pátria o entendimento de que, “na atribuição de atos omissivos aos entes públicos, não se aplica a teoria do Risco Administrativo, havendo que se demonstrar a culpa do ente público”8.

Com efeito, para que nasça a responsabilidade civil subjetiva faz-se indispensável a existência do nexo causal, isto é, do laço entre a conduta e o dano, de modo que, rompido este laço por

7 REsp 1.299.900/RJ, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 03/03/2015.

8 Confira-se a fundamentação adotada quando do julgamento do AC 576.326/PE, Rel. Des. Fed. Manoel Erhardt, Primeira Turma, julgado em 16/04/2015; AgRg no Ag 1.216.939/RJ, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 16/12/2010.

Page 70: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

70

qualquer excludente, não há que se falar em reparação. Ademais, deve ser comprovada a negligência, imprudência ou imperícia do agente causador do dano.

Pelo que foi acima exposto, restaram suficientemente compro-vados o dano, a omissão administrativa e o nexo de causalidade entre o evento danoso e o comportamento negligente da Materni-dade Escola Santa Mônica.

Paralelamente, deve-se levar em consideração que, como o óbito fetal ocorreu no interregno entre 16/04/2009 e 27/04/2009, é possível que outros fatores tenham agravado o quadro do primeiro gêmeo. De todo modo, ainda que não se possa atribuir exclusi-vamente à Maternidade a causa do óbito, evidenciou-se que o comportamento desidioso adotado, no mínimo, retirou chances reais de sobrevida de um bebê que – ao que indicam as provas carreadas aos autos – era saudável.

Assim, valendo-se da Teoria da Perda de uma Chance, é pos-sível afirmar que há nexo de causalidade e culpa porque os danos morais advêm, além do descaso em relação à gestante, também de uma conduta descuidada, de modo que se impõe ao Estado de Alagoas o dever de indenizar o dano moral experimentado pela autora.

Tratando-se de danos morais, à falta de critérios objetivos legalmente previstos para a fixação, o arbitramento deve ser feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao nível socioeconômico da parte autora, devendo o julgador orientar-se pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento às peculiaridades de cada caso.

Na espécie, o quantum indenizatório arbitrado na primeira instância em face do Estado de Alagoas observa tais balizas, eis que, como foi mencionado, é possível que outros fatores tenham concorrido para o óbito da criança durante o período entre 16/04 e 27/04 de 2009, devendo ser mantido o valor da condenação de R$ 40.000,00.

Todavia, entendo que não se pode afirmar o mesmo quanto à condenação imposta à terceira apelante.

Page 71: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

71

O HUPAA-UFAL não possuía qualquer conhecimento acerca do caso da autora (o primeiro contato entre a instituição e a deman-dante ocorreu no dia do parto), tampouco de que um dos fetos já se encontrava morto, de modo que não se pode rotular a conduta dos funcionários como sendo negligente.

Enquanto o laudo pericial tenha enfatizado que o parto em comento deveria ter sido realizado cirurgicamente e com urgência, sendo este o procedimento indicado quando for detectado que hou-ve a morte de um dos gêmeos, esta informação era desconhecida pelos médicos da instituição (bem como pela própria paciente). Portanto, não há como recair sobre os funcionários do HU uma responsabilização pela não realização imediata de uma operação cesariana – procedimento que deve ser utilizado apenas em casos excepcionais, não constituindo a regra.

Ademais, quando foi constatada a possibilidade de existência de risco no quadro da parturiente, houve a mobilização de uma equipe cirúrgica para a cesárea, entretanto a concretização do procedimento não foi possível, porquanto a aplicação da anestesia levou ao relaxamento da musculatura, rapidamente acarretando o parto do primeiro gêmeo. A partir de então não se poderia sus-pender o nascimento da outra criança.

Outrossim, o juízo de piso observou que “não restou evi-denciado que no momento do parto a equipe médica não estava esperando pelo nascimento do filho da autora”, bem como que “do atendimento ao primeiro parto duraram 49 (quarenta e nove) minutos, conforme constava no prontuário médico, tempo este considerado normal para a realização de um procedimento de tal natureza”.

Da análise dos autos, verifica-se que carece ao álbum pro-cessual substrato probatório que corrobore a existência do nexo causal quanto à UFAL.

Quanto ao relato da primeira apelante concernente à atitude do médico responsável pelo parto, que “ao revés de dar início aos procedimentos cirúrgicos, (...) passou a dar algumas instruções aos estagiários/estudantes”, não se trata de comportamento lesivo ou desidioso, uma vez que os hospitais universitários constituem

Page 72: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

72

um prolongamento de um estabelecimento de ensino no âmbito da Saúde. Tais entidades desempenham dupla função, proporcionan-do atendimento médico de maior complexidade a uma parcela da população, enquanto simultaneamente fomentam o aprendizado prático dos acadêmicos da Saúde.

Deve ainda ser levado em consideração que o HUPAA en-contrava-se sobrecarregado em virtude da greve das unidades hospitalares municipais e estaduais, e, sobretudo, que foi a única instituição que, enfim, acolheu a demandante. Assim, penso que o HU não deve, por sua vez, ser retribuído com uma condenação que não lhe teria sobrevindo acaso houvesse reproduzido a conduta adotada pelos outros hospitais, negando atendimento à parturiente.

Com tais considerações, nego provimento à apelação de Elaine dos Santos e à apelação do Estado de Alagoas, dou parcial pro-vimento à remessa oficial e dou provimento à apelação da UFAL - Universidade Federal de Alagoas, para eximi-la da responsabili-dade pelo pagamento da indenização fixada na sentença.

É como voto.

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO Nº 32.247-PB

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE MEN- DONÇA CANUTO (CONVOCADO)Apelantes: MARIA ILZENI MOREIRA FRANCA E UNIÃOApelados: OS MESMOSAdvs./Procs.: DRS. FELIPE RIBEIRO COUTINHO GONÇALVES DA SILVA E OUTROS

EMENTA: CIVIL E ADMNISTRATIVO. RESPON-SABILIDADE CIVIL EXTRA-CONTRATUAL E INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE. DANOS MATERIAIS EM IMÓVEL CONTÍGUO A RODOVIA FEDERAL EM DUPLICAÇÃO. SOTER-RAMENTO DE ÁREA DE LAZER POR ÁGUAS PLUVIAIS QUE PASSARAM A ESCOAR COM MAIOR INTENSIDADE APÓS A OBRA DE DUPLI-

Page 73: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

73

CAÇÃO. PISCINA DE ALVENARIA. ÚNICA BEN-FEITORIA DETERIORADA. APURAÇÃO POR PE-RÍCIA. LAUDO OMISSO QUANTO AO CUSTO DA MÃO DE OBRA PARA RECONSTRUÇÃO DESSA BENFEITORIA. ACRÉSCIMO NA CONDENAÇÃO. NECESSIDADE. APURAÇÃO DO QUANTUM EM LIQUIDAÇÃO. OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA DE PEQUENA PARTE DO IMÓVEL POR MÁQUINAS E OPERÁRIOS. INTERVENÇÃO RESTRITIVA E NÃO SUPRESSIVA DA PROPRIEDADE. PLEITO INDENIZATÓRIO. IMPROCEDÊNCIA. SERVIDÃO ADMINISTRATIVA. CARACTERIZAÇÃO. CONS-TRUÇÃO DE LAGOAS DE CONTENÇÃO E CANA-LETAS DE ESCOAMENTO DENTRO DO IMÓVEL PRIVADO. RESTRIÇÃO DE GOZO DO DOMÍNIO. INDENIZAÇÃO. NECESSIDADE. APURAÇÃO EM LIQUIDAÇÃO POR ARTIGOS. RESSARCIMENTO POR DANOS MORAIS. PROCEDÊNCIA. INSTITUI-ÇÃO DE DUAS OBRIGAÇÕES DE FAZER À UNIÃO PELA SENTENÇA: (I) RESTABELECIMENTO DO FLUXO DE ÁGUA DE FONTE EXISTENTE NO IMÓVEL E (II) REPARAÇÃO DE CANALETAS DE ESCOAMENTO E LAGOAS DE CONTENÇÃO. MANUTENÇÃO QUE SE IMPÕE. - Apelos do particular e da União e remessa ofi-cial em face de sentença que condenou o ente federal em favor do particular da seguinte forma: a) efetuar o pagamento do valor de R$ 10.615,20 relativo ao de custo de reprodução da área de la-zer existente na propriedade e que foi soterrada, estimado pelo perito oficial; b) promover a repa-ração do fluxo de água existente na propriedade e comprometido pelas obras de construção da rodovia, no prazo de 60 dias; e c) realizar, em 90 dias, obras para assegurar o escoamento e des-tinação final adequado das águas pluviais que caem da BR-101 para dentro da área atingida da Fazenda Recreio (2,942 ha), de modo a evitar a ocorrência de erosão e lixiviação do solo.

Page 74: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

74

- Prova pericial que revela o nexo de causal entre a obra de duplicação da rodovia federal realiza-da pela União e a existência de danos materiais ocorridos na antiga área de lazer do imóvel da au-tora. Isso porque houve um aumento do volume de águas pluviais que passaram a ser despejadas com maior intensidade e velocidade em parte do imóvel da demandante após a duplicação da BR-101, o que ocasionou o soterramento de uma antiga área de lazer que ali existia.- Conquanto o expert tenha atribuído o valor de R$ 10.615,20 para a reconstrução de uma piscina de alvenaria, sem revestimento, que se asseme-lharia a “um tanque de alvenaria” (única benfei-toria), verifica-se que na tabela de composição de custos para a reprodução dessa benfeitoria, de fato, não está incluso o gasto com a mão de obra, visto que nela só há referência ao valor unitário em reais dos itens “muro de alvenaria com reboco” e “piso cimentado”. Logo, é devida a inclusão do custo da mão de obra no montante a ser pago a título de danos materiais. Apuração do quantum em liquidação de sentença. Apelo do particular provido neste item.- O mero uso temporário da propriedade privada contígua à rodovia em duplicação por parte de operários e para a alocação de máquinas não confere, por si só, direito a indenização, tendo em vista que a ocupação temporária, espécie de intervenção restritiva e não supressiva, apenas impõe algumas restrições e condicionamentos temporários ao uso da propriedade particular, sem, no entanto, retirá-la de seu dono. Inapli-cabilidade a espécie do disposto no art. 36 do Decreto-Lei nº 3.365/1941, uma vez que a hipó-tese dos autos não é de ocupação temporária para a realização de obras públicas vinculadas a processo expropriatório, mas tão somente de ocupação temporária para obras em geral, ou seja, desvinculada de desapropriação.

Page 75: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

75

- Demonstrado que os lagoas de contenção e as canaletas de escoamento são permanentes e fo-ram construídas dentro do imóvel da demandan-te, causando-lhe prejuízos por restringir o uso de sua propriedade, além de ser certo que tais obras se destinam ao interesse público no sen-tido de viabilizar a duplicação da rodovia federal por meio da drenagem de águas pluviais, deve ser instituída a servidão administrativa, inclusive com o pagamento de indenização pelos prejuízos decorrentes dessa limitação, nos termos do art. 40 do Decreto-Lei 3.365/41. Apuração do quantum em liquidação por artigos.Provimento da apelação do particular também neste ponto.- Procedência dos alegados danos morais. Isso porque a obra de duplicação da rodovia, ao redu-zir o uso e o gozo de parte do imóvel da autora, seja através do ingresso de máquinas e operários no interior da propriedade privada por conside-rável lapso de tempo em face da necessidade de construção de lagoas de contenção e de ca-naletas de escoamento, seja pelo soterramento de área de lazer que era utilizada pela família da demandante há muitos anos, causou-lhe sérios desconfortos e consternações que extrapolam a situação de um mero aborrecimento. Provimento do apelo.- Montante indenizatório por danos morais arbi-trado em R$ 10.000,00, por se tratar de quantia razoável e proporcional à extensão do dano, nos termos do art. 944 do CC/02.- Manutenção das duas obrigação de fazer im-postas à União. A primeira para que proceda, em 60 dias, à reparação do fluxo de água de fonte existente no imóvel (alegada mineral, mas sem comprovação nos autos) que, segundo a perícia, restara comprometido. E a segunda para que realize, em 90 dias, obras necessárias para as-

Page 76: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

76

segurar o escoamento e destinação adequados das águas da chuva que continuam a atingir parte do imóvel da autora (2,942 ha), mesmo após a construção das indigitadas lagoas e canaletas, evitando, pois, futura erosão e/ou lixiviação do solo.- Apelo do particular parcialmente provido e apelação da União e remessa oficial improvidas.

ACÓRDÃO

Vistos etc., decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do particular e negar provimento à apelação da União e à remessa oficial, nos termos do relatório, voto e notas taquigráfi-cas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 9 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE MENDONÇA CANUTO - Relator Convocado

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE

MENDONÇA CANUTO (Convocado):

Trata-se de remessa oficial e apelações interpostas por MARIA ILZENI MOREIRA FRANÇA e pela UNIÃO contra sentença que, em sede de ação de ressarcimento por danos materiais e morais decorrentes de prejuízos causados em imóvel particular pela du-plicação de rodovia federal, julgou parcialmente procedentes os pedidos para condenar o ente federal ora recorrente a:

a) efetuar o pagamento do valor de R$ 10.615,20 (dez mil, seiscentos e quinze reais e vinte centavos) relativo ao de custo de reprodução da área de lazer existente na propriedade e que foi soterrada, estimado pelo perito oficial às fls. 150/151;

b) promover a reparação do fluxo de água existente na proprie-dade e comprometido pelas obras de construção da rodovia, no prazo de 60 (sessenta) dias;

Page 77: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

77

c) realizar, em 90 (noventa) dias, obras para assegurar o escoamento e destinação final adequado das águas pluviais que caem da BR-101 para dentro da área atingida da Fazenda Recreio (2,942 ha – fl. 154), de modo a evitar a ocorrência de erosão e lixiviação do solo.

Em suas razões recursais, alega a parte autora que o valor fixado a título de indenização por danos materiais não levou em consideração o custo da mão de obra para a reconstrução da área de lazer que fora soterrada, mas tão somente o valor isolado de benfeitorias – piscina e churrasqueira – que ali se encontravam.

Sustenta que é devida indenização mensal por ocupação tem-porária da área, uma vez que, no mínimo, a autora ficou privada da utilização da área de lazer, além de afirmar que a ocupação dos operários não se restringira a estrada, na medida em que as lagoas ou bacias de retenção foram construídas dentro de sua propriedade.

Argumenta, também, que as obras de construção de canaletas e de bacias de contenção, por restringirem o uso da propriedade, ensejam o pagamento de indenização pela ocupação irregular do imóvel, visto que se constituem servidão indireta.

Assevera, ainda, que são cabíveis danos morais pela destrui-ção de parte do imóvel, eis que além de a área destruída pertencer há anos à família da autora, não houvera comunicação prévia do Poder Público acerca da realização da obra, tendo sido surpreen-dida com a invasão de sua propriedade por operários e máquinas.

Requer, por derradeiro, (i) a majoração dos danos materiais de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) de maneira a abranger o custo real de reparação da área de lazer destruída; (ii) fixação de indenização a título de danos morais; (iii) o arbitramento de indenização por ocupação tempo-rária no valor mensal de R$ 10.000,00 (dez mil reais), na forma do art. 33 do Decreto-Lei 3.365/41; e (iv) a instituição de servidão indireta do imóvel, com fixação de indenização, nos termos art. 40 do Decreto-Lei 3.365/41.

Por sua vez, aduz a UNIÃO, em sua peça recursal, que a sen-tença deve ser reformada por ausência absoluta de provas quanto

Page 78: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

78

à ocorrência de danos, bem como pela inexistência de nexo causal entre as alegações da autora e a atuação da Administração.

Alega que a prova pericial apenas fez referência a indícios da existência da área de lazer, sem que tenha sido conclusiva quanto ao motivo da suposta destruição, não tendo a parte autora pleiteado a complementação do laudo (fl. 174).

Afirma, ainda, que as obras que são objeto de reclamação da parte demandante somente trouxeram benefícios para o seu imóvel, uma vez que contribuíram para a valorização imobiliária na região, conforme comprovariam os laudos de avaliação colacionados pela própria autora às fls. 165/166.

Sustenta que são despiciendas as obrigações de fazer im-postas na sentença, haja vista que já foram realizadas todas as obras necessárias ao regular escoamento das águas – canaletas e bacias de contenção –, bem como pelo fato de o imóvel da parte autora situar-se em área de declive, razão pela qual seria natural a ocorrência de erosão provocada pela força da chuva e não pela duplicação da rodovia BR-101.

Contrarrazões da União às fls. 206/214 e do particular às fls. 222/229.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE

MENDONÇA CANUTO (Relator Convocado):

Conforme sumariado, a parte autora e a União recorrem de sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos no sentido de condenar a segunda recorrente em favor da primeira nas seguintes parcelas:

1) indenização por danos materiais no valor de R$ 10.615,20, pelos prejuízos causados pelo soterramento de área de lazer existente no imóvel;

2) instituição de duas obrigações de fazer consistentes na repa-ração, em 60 dias, do fluxo de água de uma fonte existente na Fazenda Recreio que restou comprometido pela obra realizada

Page 79: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

79

pela União e, em 90 dias, na realização de obras para garantir o escoamento e destinação adequados das águas pluviais que jorram da BR-101 sobre parte da propriedade da autora.

Da análise das provas contidas nos autos, em especial da prova pericial de fls. 139/152, observa-se que não há dúvidas acerca da demonstração do nexo de causalidade entre a obra de duplicação da rodovia federal realizada pela União e a existência de danos materiais ocorridos na antiga área de lazer do imóvel de propriedade da autora.

Isso porque após a duplicação da BR-101 houve um aumento do volume de águas pluviais que passaram a ser despejadas em parte do imóvel da autora, o que ocasionou o soterramento de uma antiga área de lazer que ali existia, uma vez que as bacias e canaletas de contenção feitas pelo Exército Brasileiro não foram suficientes para represar o excesso das águas das chuvas que escorreram e ainda escorrem da rodovia duplicada em direção à parte do terreno de propriedade da autora.

Improvimento do apelo da União neste item.

Todavia, conquanto o expert tenha atribuído o valor de R$ 10.615,20 (dez mil, seiscentos e quinze reais e vinte centavos) para a reconstrução de uma piscina de alvenaria, sem revesti-mento, que se assemelharia a “um tanque de alvenaria” (única benfeitoria danificada), verifica-se que na tabela de composição de custos para a reprodução dessa única benfeitoria à fl. 151, de fato, não está incluso o gasto com a mão de obra, visto que nela só há referência ao valor unitário em reais dos itens “muro de alvenaria com reboco” e “piso cimentado”.

Além disso, mesmo que o SINAPI1 - Sistema Nacional de Pes-quisa de Custos e Índices da Construção Civil, utilizado pelo perito

1 O SINAPI “tem gestão compartilhada entre Caixa e IBGE e divulga men-salmente custos e índices da construção civil. A Caixa é responsável pela base técnica de engenharia (especificação de insumos, composições de serviços e projetos referenciais) e pelo processamento de dados, e o IBGE, pela pesquisa mensal de preço, metodologia e formação dos índices”. Disponível em: <http://www.caixa.gov.br/poder-publico/apoio-poder-publico/sinapi/Paginas/default.aspx>. Acesso em 03.07.15.

Page 80: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

80

para elaboração do cálculo das benfeitorias, disponibilize informa-ções sobre preços medianos não só de materiais da construção civil, mas também de mão de obra e equipamentos, inexiste no laudo pericial menção sobre o custo da mão de obra para recons-trução da piscina que fora soterrada. Por essa razão, conclui-se que essa despesa foi indevidamente desconsiderada pelo perito.

Logo, o custo da mão de obra para a construção dessa ben-feitoria (uma piscina de alvenaria) deverá ser incluído no montante indenizatório por danos materiais, que inicialmente foi fixado em R$ 10.615,20 (dez mil, seiscentos e quinze reais e vinte centavos), através da apuração de seu respectivo valor por ocasião da liqui-dação de sentença/acórdão, ainda que a parte autora não tenha impugnado o laudo pericial à época própria, na medida em que o prejuízo material neste ponto restou comprovado.

Apelo autoral provido nesta parte.

No que diz respeito ao pedido de indenização mensal de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por ocupação temporária, a sentença de improcedência não merece reproche.

Explica-se. É permitido ao Poder Público, no uso de seu poder de império (ius imperii) e em vista da função social da propriedade (arts. 5º, XXIII e 170, III, da CF/88, c/c art. 1.228, § 1º, do CC/02), efetuar intervenções pontuais na propriedade particular quando está presente o interesse público primário, que é aquele no qual predomina o interesse da coletividade e não apenas o interesse meramente patrimonial do Estado.

Portanto, a supremacia do interesse público em face do inte-resse particular, aliado a função social da propriedade, conferem legitimidade para a intervenção estatal junto a propriedade privada. Na verdade, é natural que a imposição interventiva do Estado na propriedade privada cause uma insatisfação ao titular do domínio em função da contrariedade de seu interesse particular, mas, como toda intervenção visa ao atendimento do interesse público, ela – a atuação estatal restritiva ou condicionante – estará devidamente justificada e poderá (deverá) ser implementada, ainda que contrária ao interesse privado.

No caso concreto, o mero uso temporário de parte da pro-

Page 81: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

81

priedade privada contígua à rodovia em duplicação (bem de uso comum do povo) por operários e para a alocação de máquinas não confere, por si só, direito a indenização ao titular do domínio particular, tendo em vista que a ocupação temporária, espécie de intervenção restritiva e não supressiva da propriedade, apenas impõe algumas restrições e condicionamentos temporários ao uso da propriedade particular, sem, contudo, retirá-la de seu dono.

Dessa forma, é inaplicável a espécie o disposto no art. 36 do Decreto-Lei nº 3.365/1941, uma vez que a hipótese dos autos não é de ocupação temporária para a realização de obras públicas vin-culadas a processo expropriatório, mas tão somente de ocupação temporária para obras em geral, na qual inexiste perda do domínio privado, ou seja, desvinculada de desapropriação.

Nesse sentido, transcrevo a seguir a excerto extraído da obra de José dos Santos Carvalho Filho2 acerca da distinção doutrinária entre as duas modalidades de ocupação temporária, in verbis:

(...) Pensamos que se podem apresentar duas moda-lidades de ocupação temporária para obras públicas vinculadas ao processo de desapropriação, esta a pre-vista no citado art. 36 da lei expropriatória. A outra é a ocupação temporária para as demais obras e para dos serviços em geral, sem qualquer vínculo com o processo de desapropriação executado pelo Estado. (...) A primeira delas implica dever do Estado de indenizar o proprietário pelo uso do imóvel. (...) Na ocupação desvinculada da desapropriação, a regra é a mesma que vale para a servidão administrativa, ou seja, a princípio não haverá indenização, mas esta será devida se o uso acarretar comprovado prejuízo ao proprietário. Por isso é que os casos que citamos, de obras em estradas e de serviços eleitorais, não rendem, como regra, ensejo a qualquer indenização. (Negritei)

Indevida, pois, indenização pela ocupação temporária em si, tendo em vista que os prejuízos materiais ocasionados no imóvel já foram reconhecidos anteriormente.

2 In Manual de direito administrativo, 27ª ed., São Paulo, Atlas, 2014, p. 808/809.

Page 82: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

82

Entretanto, esse mesmo raciocínio não deve ser aplicado à servidão administrativa. Isso porque a construção dos lagos de contenção (fls. 31/32) e das canaletas de escoamento (fl. 35) rea-lizada pela União, através do Exército Brasileiro, se deu dentro do imóvel em questão, ou seja, em propriedade particular, ensejando restrição de uso.

Portanto, é inegável que essa intervenção do Poder Público causa prejuízos à dona do imóvel, na medida em que tais obras limitarem os poderes inerentes ao domínio privado, pelo menos em relação ao uso e gozo dos locais em que foram construídas as lagoas de contenção e as canaletas de escoamento, muito embora essa intervenção não tenha ocasionado a perda da propriedade da terra nua (desapropriação indireta).

Também não se pode afirmar que as obras de drenagem foram realizadas exclusivamente no interesse particular da demandante, tendo em vista que outras propriedades vizinhas à Fazenda Re-creio, todas elas localizadas no Município de Alhandra, também foram atingidas pelo assoreamento provocado pela duplicação da BR-101, a exemplo da granja “Águas Vermelhas”, consoante se vê no Relatório de Vistoria nº 23/2011 do IBAMA às fls. 78/91, mais precisamente à fl. 84, o que denota a existência de interesse público nessa intervenção administrativa.

Logo, demonstrado que os lagoas de contenção e as canaletas de escoamento são permanentes e foram construídas dentro do imóvel da demandante, causando-lhe prejuízos por restringir o uso de sua propriedade, além de ser certo que tais obras se destinam ao interesse público no sentido de viabilizar a duplicação da ro-dovia federal por meio da drenagem das águas pluviais, deve ser instituída a servidão administrativa, inclusive com o pagamento de indenização pelos prejuízos decorrentes dessa limitação, nos termos do art. 40 do Decreto-Lei 3.365/41.

Entretanto, por inexistirem elementos nos autos acerca da extensão do prejuízo provocado pela restrição no gozo do domínio privado, deverá o quantum indenizató-rio ser apurado em procedi-mento de liquidação de sentença por artigos (art. 475-E do CPC), na medida em que só serão ressarcidos os prejuízos decorrentes da restrição do gozo do imóvel relativa à área das canaletas de

Page 83: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

83

escoamento e das lagoas de contenção que foram construídas dentro dos limites do bem de propriedade da autora, a serem apurados naquele procedimento de liquidação.

Apelo do particular provido neste ponto.

No que pertine aos danos morais, também assiste razão à autora.

Isto porque a obra de duplicação da rodovia, ao reduzir o uso e o gozo de parte do imóvel da autora, seja através do ingresso de máquinas e operários no interior da propriedade privada por considerável lapso de tempo em face da necessidade de constru-ção de lagoas de contenção e de canaletas de escoamento, seja pelo soterramento de área de lazer que era utilizada pela família da demandante há muitos anos, causou-lhe sérios desconfortos e consternações que extrapolam a situação de um mero aborre-cimento.

Por essa razão, é devido o ressarcimento pelos danos morais sofridos.

No que se refere ao montante indenizatório a título de repara-ção por danos extrapatrimoniais, penso ser razoável e proporcional à extensão do dano a quantia de R$ 10.000,00 (dez mil reais), nos termos do art. 944 do atual Código Civil.

No que se refere às duas obrigações de fazer impostas pela sentença em desfavor da União, não há dúvidas de que elas de-vem ser mantidas.

A primeira porque a perícia demonstrou que muito embora não tenha havido a interrupção do fluxo de água de fonte existente no imóvel (alegada fonte de água mineral, porém sem comprovação nos autos), houve comprometimento da nascente (cf. fl. 146). Logo, razoável a determinação para que a União proceda, em 60 (sessenta) dias, à reparação da referida fonte para que seja restabelecido o fluxo de água.

A segunda devido à comprovação pelo expert de que as canaletas de escoamento e as lagoas de contenção não foram suficientes para conter de maneira efetiva as águas pluviais que escoam em alta velocidade da BR-101 em direção ao imóvel da

Page 84: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

84

autora. Por esse motivo, não menos razoável a determinação para que a União realize, em 90 (noventa) dias, obras necessárias para assegurar o escoamento e destinação adequados das águas da chuva que continuam a atingir parte do imóvel em questão (2,942 ha – cf. levantamento planialtimétrico de fl. 154), evitando, pois, futura erosão e/ou lixiviação do solo.

Apelo da União desprovido também nestes dois pontos.

Sobre o montante indenizatório fixado a título de danos mate-riais, em se tratando de responsabilidade extracontratual, deverão incidir, a contar do evento danoso (Súmula 54 do STJ), juros de mora de 0,5% ao mês e correção monetária na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, na forma do que restou decidido, na sessão do dia 17/06/2015, pelo Plenário desta Corte nos autos dos Embargos Declaratórios em Embargos Infringentes nº 0800212-05.2013.4.05.8100, sob a relatoria do Des. Federal Rogério Fialho.

Já em relação à indenização por danos morais, incidirão, desde o evento danoso, juros de mora no percentual de 0,5% ao mês e correção monetária, a partir da publicação do presente acórdão (Súmula 362 do STJ), na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal.

Em face de a parte autora ter decaído de parte mínima do pedido, condeno a União a arcar com as custas e despesas pro-cessuais, bem como na verba honorária sucumbencial no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), nos termos do art. 21, parágrafo único, do CPC.

Ante o exposto, dou parcial provimento ao apelo do particular e nego provimento à apelação da União e remessa oficial.

É como voto.

Page 85: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

85

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO Nº 32.359-PB

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONIApelante: UNIÃOApelado: LAFAYETTE LEAL DE OLIVEIRA JÚNIORAdvs./Procs.: DRS. JÚLIO CÉSAR DA SILVA BATISTA E OUTROS (APDO.)

EMENTA: ADMINISTRATIVO. CONTRATO TEMPO-RÁRIO. MOTORISTA CONTRATADO PELO EXÉR-CITO PARA A CONSTRUÇÃO DA BR-101. LEI Nº 8.745/93. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. LAU-DO PERICIAL. INEXISTÊNCIA. HORAS EXTRAS. INTERVALO INTRAJORNADA. COMPENSAÇÃO. POSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111 DO STJ.- Autor que foi contratado pelo Exército, por meio de contrato temporário de trabalho, no cargo de motorista, para exercer suas funções na obra de Adequação de Capacidade e Restauração da BR-101, no Município de Alhandra/PE.- Não havendo a comprovação de que o autor ficava de sobreaviso durante os arejamentos ocorridos, os mesmos podem ser abatidos do saldo de horas extras não pagas, ainda que cons-te, no contrato, somente o pagamento das horas extras, em observância ao princípio da vedação do enriquecimento sem causa. - Deve ser subtraído do saldo de horas extras a ser pago ao Demandante, levando-se em conta o total reconhecido pela União, as horas extras comprovadamente pagas, mais o montante de horas em “arejamento”, inclusive aquele que tenha sido compensado ao final da jornada de trabalho, documentalmente comprovado pela demandada.- Descabida a concessão do adicional de insalu-bridade, tendo em vista a ausência de prova (lau-do pericial) do exercício de atividades insalubres.

Page 86: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

86

- Correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios mantidos, como fixados na senten-ça, observados, contudo, quanto aos honorários advocatícios, os limites da Súmula 111 do STJ. - Apelação e remessa necessária providas, em parte.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que são partes as acima identificadas, decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, dar provimen-to, em parte, à apelação e à remessa necessária, nos termos do relatório, voto do Desembargador Relator e notas taquigráficas constantes nos autos, que passam a integrar o presente julgado.

Recife, 23 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI:

Apelação interposta pela União, em face da sentença que julgou procedentes, em parte, os pedidos contidos na inicial, re-conhecendo ser devido ao autor o pagamento: a) das horas extras efetivamente trabalhadas e não pagas administrativamente; b) de uma hora diária, a título de intervalo para repouso ou alimentação, acrescida de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remune-ração da hora normal de trabalho; c) do adicional de insalubridade, no percentual de 10% (dez por cento), decorrentes do contrato de trabalho temporário, inclusive quando em gozo das chamadas dispensas “arejamentos”, com os respectivos reflexos sobre as demais verbas de natureza salarial.

A ré foi condenada, ainda, a efetuar os recolhimentos previ-denciários incidentes sobre as verbas concedidas, acrescidas de correção monetária e juros de mora, nos termos da Lei 11.960/09, e ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação – fls. 252/262.

A União sustentou, em suma, que: 1) no tocante às horas extras, segundo as informações enviadas pelo 2º Batalhão de

Page 87: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

87

Engenharia de Construção – fls. 61/63 dos autos –, a quantidade de horas extras trabalhadas está em conformidade com os valores pagos ao autor, mediante pagamento registrado nos contrache-ques (fls. 73/94), ou ainda compensados por dispensas/folgas/arejamentos, como reconhecido pelo demandante, às fls. 246/248, e por outros declarantes; 2) o parecer produzido pela Contadoria Judicial, no qual a sentença tomou como base para conceder as horas extras, está eivado de erros, dentre outros, por ter incluído a GAE; 3) no tocante ao adicional de insalubridade, o autor tra-balhava como motorista de caminhão basculante, transportando areia, cimento, etc., e não, de caminhão tanque (transporte de óleo diesel); 4) em relação ao intervalo intrajornada, a sentença baseou-se exclusivamente nos termos de declaração prestadas sem o devido compromisso (art. 405, § 4º, do CPC), além de “fugir à razoabilidade imaginar que, durante todo período do contrato, o autor não dispunha de intervalo intrajornada”, e de não ser possível a aplicação de dispositivo da CLT, no caso em tela.

Por fim, requereu a reforma da sentença, para que sejam julgados improcedentes os pedidos formulados na inicial e, alter-nativamente, determinar a compensação das horas concedidas ao autor a título de folga (fls. 267/276).

Sem contrarrazões. Sentença submetida ao reexame neces-sário. Dispensada a revisão.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI

(Relator):

Andou bem o Magistrado a quo ao afastar a preliminar de incompetência da Justiça Comum para apreciar e julgar esta de-manda.

Quanto a esse ponto, subscrevo, sem ressalvas, as bem--lançadas razões de decidir postas na sentença, adotando-as como razões de decidir. Ditos fundamentos ficam fazendo parte deste voto, independentemente de aqui estarem reproduzidos. A preliminar, portanto, fica de logo desacolhida.

Page 88: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

88

Feito o registro, passo ao mérito.

Pretendeu o autor, contratado pelo Exército por tempo deter-minado, na função de motorista, para a Adequação de Capacidade e Restauração da BR-101, no Município de Alhandra/PE, que a União fosse condenada ao pagamento de horas extras, intervalo intrajornada, adicional de insalubridade, com o decorrente reco-lhimento previdenciário, e indenização por danos morais, além da anotação na CTPS.

Sobre a matéria, este Tribunal já se pronunciou, verbis:Constitucional, Administrativo e Previdenciário. Remessa oficial e apelação em face de sentença, fls. 170-185, que julgou parcialmente procedentes os pedidos, para condenar a ré a efetuar o pagamento, devido durante o contrato de trabalho temporário, com os respectivos reflexos sobre as demais verbas de natureza salarial: a) das horas extras efetivamente trabalhadas e não pagas administrativamente ao autor, de acordo com o informado na planilha, fls. 160-161; b) de uma hora diária a título de intervalo para repouso ou alimentação, acrescida de 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho; c) do adicional de insalubridade, no percentual de 10%; condenando ainda a efetuar os recolhimentos previdenciários incidentes sobre as verbas concedidas; com correção monetária e juros de mora, uma única vez, até o efetivo pagamento, nos termos da Lei 11.960/09; e no pagamento de honorários advocatícios, fixados em dez por cento sobre o valor da condenação.- A demanda gira em torno de direitos trabalhistas do autor-apelado, contratado pela União, por tempo determi-nado, com regência da Lei 8.745/93, para desempenhar a função de motorista, com pagamento deste por meio dos recursos destinados à Obra de Adequação de Capacidade e Restauração da BR-101/PB – Corredor Nordeste.- A competência para julgar causas em que se discute relação de trabalho entre o Poder Público e seus servido-res apresenta caráter jurídico-administrativo é da Justiça comum, e não da Justiça do Trabalho, e sendo parte órgão federal, cabe à Justiça Federal. Nesse sentido os arestos do Supremo Tribunal Federal. Precedentes: CC-AgR 7231-AM, min. Marco Aurélio, julgado em 24 de abril de

Page 89: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

89

2013; Rcl 4464, min. Carlos Britto, julgado em 20.05.2009.- Incide no caso em apreço a prescrição quinquenal do Decreto 20.930/32, tendo em conta que o contrato de temporário se iniciou em 1º de dezembro de 2006, encerrou-se em 30 de novembro de 2010, e a ação ocor-reu em 22 de setembro de 2011, não foi ultrapassado o lustro prescricional.- A apelante reconhece que o apelado prestou horas extras durante a vigência do contrato temporário de tra-balho. Os arejamentos ocorridos, afirmados pelos apelado e declarantes, podem ser utilizados para abater o saldo de horas extras não pagas, não se provando que o autor ficava de sobreaviso durante essa dispensa, ainda que a cláusula contratual só preveja o pagamento das horas extras, em homenagem ao princípio da vedação do en-riquecimento sem causa. Destarte, tem parcial razão a apelante, nesse ponto, devendo o saldo de horas extras a ser pago, com base no total confessado pela apelante, subtraindo-se daí o total de horas extras já pagas, veri-ficável nos contracheques do apelado, mais o montante de horas em “arejamento” comprovado documentalmente pela demandada, tudo isso a ser calculado na fase de liquidação.- No referente ao intervalo intrajornada questionado, uma vez que a apelante não fez contraprova do alegado na audiência de instrução e julgamento, fls. 145, 148 e 149, em que se afirma suprimido pela Administração aquele intervalo, a qual, por sua vez, admite que o inter-valo intrajornada do apelado pode ter sofrido redução extraordinária em determinadas situações excepcionais de extrema necessidade, fl. 83, porém não provando que aquele intervalo tenha sido compensado ao final da jornada de trabalho, é devido ao autor, com base no art. 343, parágrafo 2º, do Código de Processo Civil. Destarte, sem razão a apelante, nesse ponto.- Para a concessão do adicional de insalubridade pleite-ado, a atividade exercida pelo trabalhador deve colocá-lo em contato com agentes insalubres, acima dos limites de tolerância estabelecidos pelo Ministério do Trabalho, o que, por sua vez, deve ser demonstrado por laudo de perito, conforme prevê a Portaria 3.214/78-MTB, NR 15, anexos 10, 11 e 13. Todavia, inexiste laudo pericial nos

Page 90: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

90

autos para aferir a insalubridade na atividade exercida pelo apelado. Diante do quadro exposto, com razão a apelante, nesse ponto, devendo ser afastada a sua condenação no pagamento de adicional e insalubridade, diante da ausência de prova contra si.- O recolhimento previdenciário deve ser mantido, pelas razões apresentadas pela r. sentença recorrida, com ful-cro na cláusula primeira do contrato de trabalho, e na Lei 8.647/93, apenas com o ajuste do seu valor ao montante das verbas ora reconhecidas ao apelado.- Juros de mora e correção monetária na forma estabe-lecida na r. sentença recorrida.- Honorários advocatícios de sucumbência mantidos con-forme estabelecido na r. sentença recorrida, observando--se o novo montante da condenação.- Parcial provimento da remessa oficial e da apelação. (PROCESSO: 00029306720114058200, APELREEX 29.011/PB, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR CARVALHO, Segunda Turma, JULGAMENTO: 26/08/2014, PUBLICAÇÃO: DJe 29/08/2014 - Página 63)

ADMINISTRATIVO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. MOTORISTA. LEI Nº 8.270/91. HORAS-EXTRAS. LAU-DO PERICIAL. ATIVIDADE SALUBRE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. DESCABIMENTO.I. A questão posta em lide refere-se ao pagamento de adicional de insalubridade e horas-extras a funcionário temporário, contratado pelo Exército, por meio de pro-cesso seletivo simplificado, para trabalhar como motorista do 3º Batalhão de Engenharia e Construção na obra da BR-101, que liga os Estados de Pernambuco e Paraíba.II. Por força do art. 11 da Lei nº 8.745/93, que regulamenta a contratação por tempo determinado no âmbito do servi-ço público, os funcionários contratados temporariamente tiveram reconhecidos o direito à percepção adicional de insalubridade e por serviço extraordinário, dentre outras vantagens decorrentes do trabalho assalariado.III. No entanto, a perícia concluiu pela ausência de exposi-ção aos agentes nocivos caracterizadores da insalubrida-de, visto que no período de 1/9/2006 a 31/8/2010, o autor executou o serviço de transporte de asfalto, concreto, brita, argila e pó de pedra, da usina até o local da obra, em veículo com cabine fechada e climatizada.

Page 91: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

91

IV. No tocante às horas extras, não se configura na hipótese o denominado “horário britânico”, dado que a regularidade nos horários de início e intervalo para refeições pode ser atribuída à disciplina observada nas instituições militares. Ademais, apesar da uniformidade no horário de início da jornada, é possível observar uma larga variação no horário de saída, o que se compatibiliza com a natureza da atividade desenvolvida.V. Deve ser adotado no cálculo do adicional de horas extras, o divisor de 200(duzentas) horas mensais. Pre-cedente: STJ. REsp 1019492/RS, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 03/02/2011, DJe 21/02/2011.VI. Como a ação foi ajuizada em 6/12/2012, estão prescri-tas as parcelas anteriores a 6/12/2007, à luz do disposto no Dec. nº 20.910/32.VII. Juros de mora de acordo com o disposto na Lei nº 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.VIII. Honorários advocatícios nos termos da sentença.IX. Apelação do autor improvida. Apelação da União e remessa oficial parcialmente providas, para determinar que as horas extraordinárias sejam apuradas, em sede de liquidação, a partir dos cartões de ponto apresentados pela União Federal, utilizando-se a jornada fixada pela sentença para os períodos em que não houve a exibição do ponto.(PROCESSO: 00010086120114058306, APELREEX 27.608/PE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL BRUNO TEIXEIRA (CONVOCADO), Quarta Turma, JUL-GAMENTO: 11/06/2013, PUBLICAÇÃO: DJe 14/06/2013 - Página 214)

Depreende-se, portanto, que o apelado faz jus ao pagamento das horas extras efetivamente trabalhadas e não pagas adminis-trativamente, levando-se em conta o montante confessado pela ré – descontado o total de horas extras efetivamente pago pela União, mais o montante de horas em “arejamento” que for comprovado documentalmente pela demandada –, além de uma hora diária, a título de intervalo para repouso ou alimentação, acrescida de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho.

Page 92: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

92

No que toca ao adicional de insalubridade, o autor não faz jus ao mesmo, em razão da ausência de laudo pericial comprobatório da insalubridade das atividades exercidas.

Correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios mantidos, como estabelecidos na sentença, observada, contudo, a Súmula 111 do STJ.

Sob o influxo de tais considerações, dou provimento, em par-te, à apelação e à remessa necessária, apenas para determinar que seja subtraído do saldo de horas extras a ser pago ao autor, levando-se em conta o montante confessado pela ré, o total de horas extras efetivamente pago pela União, mais o montante de horas em “arejamento”, inclusive aquele que tenha sido compensa-do ao final da jornada de trabalho, documentalmente comprovado pela demandada, e para afastar da condenação o pagamento do adicional de insalubridade, e para que seja observada a Súmula 111 do STJ.

É como voto.

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO Nº 32.406-PE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIROApelante: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSSApelados: UACI EDVALDO MATIAS SILVA E CÔNJUGERepte.: PROCURADORIA DO INSSAdvs./Procs.: DRS. LUIZ MIGUEL DOS SANTOS E OUTROS (APDOS.)

EMENTA: ADMINISTRATIVO. CIVIL E PROCES-SUAL CIVIL. AÇÃO DE USUCAPIÃO. COMPRO-MISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NÃO FORMALIZADO. PAGAMENTO DE PARCELAS DA AVENÇA. BEM PERTENCENTE AO ANTIGO IA-PECT, SUCEDIDO PELO INSS. IMPOSSIBILIDADE DE USUCAPIR BEM PÚBLICO. INOCORRÊNCIA NA ESPÉCIE. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DA AQUISIÇÃO DA PRESCRIÇÃO

Page 93: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

93

AQUISITIVA DE PROPRIEDADE EM FAVOR DOS PARTICULARES.- Apelação em face de sentença da lavra do juízo da 12ª Vara-PE que julgou procedente o pedido, para declarar a aquisição pela prescrição aqui-sitiva da propriedade do imóvel situado na Rua Santos Cosme e Damião, nº 613, Ipsep, Recife/PE, em favor de UACI EDVALDO MATIAS SILVA e JOSENILDE ALVES MATIAS.- É consabido que a Lei Civil vigente prevê em seu art. 1.238 a possibilidade daquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquirir-lhe a pro-priedade, independentemente de título e boa-fé, podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.- Todavia, há no ordenamento pátrio – art. 182, § 3º, da Constituição da República, e art. 102, do Código Civil – vedação expressa no sentido de que os bens públicos não estão sujeitos a usucapião. - Hipótese em que o arcabouço fático colhido dos autos evidencia a existência de promessa de compra e venda do imóvel em questão no lon-gínquo ano de 1962, figurando como partes o Sr. Arnaldo do Rego Barros, e, de outro, o IAPETC, inferindo-se, ainda, a existência de recibos de pagamento respeitantes à mencionada avença (quitação relativas aos meses de fevereiro a outubro/1962).- Há, outrossim, registro do falecimento da par-te originária, a qual foi representada em seus interesses pelos seus respectivos herdeiros, os quais buscaram junto ao INSS – na qualidade de sucessor do IAPETC – a regularização da proprie-dade, o que inocorreu, embora permanecessem residindo no imóvel desde os idos de 1971.- Caso em que não remanesce a qualidade de

Page 94: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

94

bem público, cujo fato consistiria em óbice à pretensão deduzida pelos recorridos, afigurando--se escorreita a manutenção da sentença que re-conheceu a aquisição pela prescrição aquisitiva do imóvel em questão em favor dos particulares.- Perfilhar entendimento em sentido diverso do aqui esposado, seria admitir enriquecimento sem causa do Erário, bem como beneficiar o próprio Poder Público pela sua ineficiência em promover a regularização da propriedade em comento.- Apelação e remessa necessária desprovidas.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que figuram como partes as acima identificadas, decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa necessária, nos termos do Relatório, do voto do Relator e das notas taquigráficas constantes dos autos, que passam a integrar o presente julgado.

Recife, 27 de agosto de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEI-RO - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHA-

DO CORDEIRO:

Cuida-se de apelação manejada pelo INSS e de remessa oficial em face de sentença que julgou procedente a ação de usucapião.

Em seu recurso (fls. 255/266), alega a autarquia recorrente que não se afigura escorreito o entendimento esposado pela julgadora monocrática, porquanto se revela vedada a pretensão de usucapião de bem público. Aduz, nesse ponto, que o imóvel objeto de con-trovérsia nos autos foi adquirido pelo Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Empregados em Transportes e Cargas ( IAPETC) junto à Sociedade de Terrenos do Ibura Limitada (SOTIL), em 16 de abril de 1953, tendo sido o referido instituto sucedido em todos

Page 95: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

95

os direitos e obrigações pelo INPS, o qual, por sua vez, veio a ser sucedido pelo INPS e este transformado no INSS. Assevera, desse modo, que o imóvel de propriedade em referência passou a integrar o patrimônio do INSS, consoante consta da Certidão atualizada do 1º Ofício de Registro de Imóveis desta Capital.

Contrarrazões (cf. fls. 271/281).

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHA-

DO CORDEIRO (Relator):

A matéria devolvida para exame deste Tribunal diz respeito à correção da sentença que julgou procedente a ação de usucapião promovida pela parte autora, ora apelada.

No exame da matéria, firmo entendimento no sentido de que a sentença não merece retoques.

Com a vênia da autarquia, penso que, no caso sub examine, não há óbice em se tomar a fundamentação deduzida na senten-ça como razões de decidir. A fundamentação per relationem, a propósito, não importa em ofensa ao ditame inserto no artigo 93, inciso IX, da Constituição da República, consoante jurisprudência sedimentada no Supremo Tribunal Federal. Confira-se, por todos, o seguinte precedente:

EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DIREITO CIVIL. VEICULAÇÃO DE IMAGEM SEM AUTORIZAÇÃO. DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. SUPOSTA AFRONTA AOS ARTS. 5º, IV, IX E XIV, 93, IX, E 220 DA CARTA MAIOR. MOTIVAÇÃO REFERENCIADA (PER RELA-TIONEM). AUSÊNCIA DE NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. ACÓRDÃO REGIONAL EM QUE ADOTADOS E TRANSCRITOS OS FUNDAMENTOS DA SENTENÇA LASTREADA NO CONJUNTO PROBATÓ-RIO. SÚMULA 279/STF. INTERPRETAÇÃO DE NORMAS DE ÂMBITO INFRACONSTITUCIONAL. EVENTUAL VIOLAÇÃO REFLEXA NÃO VIABILIZA O MANEJO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. - Consoante pacificada jurisprudência deste Supremo Tribunal Federal, tem-se por cumprida a exigência cons-

Page 96: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

96

titucional da fundamentação das decisões mesmo na hipótese de o Poder Judiciário lançar mão da motivação referenciada (per relationem). Precedentes. - Além de a pretensão da recorrente demandar reelabo-ração da moldura fática delineada no acórdão de origem, a suposta afronta ao preceito constitucional indicado nas razões recursais dependeria da análise de legislação infraconstitucional, o que torna oblíqua e reflexa eventual ofensa, insuscetível, portanto, de viabilizar o conhecimen-to do recurso extraordinário, considerada a disposição do art. 102, III, a, da Lei Maior. - Agravo conhecido e não provido. (AI 855829 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 20/11/2012, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-241 DIVULG 07-12-2012 PUBLIC 10-12-2012)

Neste passo, penso seja oportuno reproduzir alguns excertos da sentença verberada, que bem equacionam as questões esgri-midas no apelo:

O cerne da controvérsia instaurada nesses autos reside na decisão, em última análise, sobre se o imóvel situado na Rua Santos Cosme e Damião, nº 613, Ipsep, Recife/PE constitui-se em imóvel público para os fins do art. 191, parágrafo único, da Constituição Federal, que reza:

Parágrafo único. Os imóveis públicos não serão adqui-ridos por usucapião.

Interessantemente, essa mesma discussão já foi subme-tida ao crivo desta magistrada quando atuava como Juíza Federal Substituta da 21ª Vara Federal por ocasião do julgamento da Ação de Reintegração de Posse ajuizada pelo INSS contra os autores desta demanda. Embora não se trate, obviamente, de hipótese de litispendência, já que naquele feito o objeto era apenas a posse do bem e aqui é o domínio, o fato é que houve incursão aprofundada na cadeia dominial do imóvel e nas circunstâncias que envolveram a sua alienação pelo IAPETC ao ocupante original do bem, o Sr. Arnaldo do Rego Barros.

Os documentos que serviram para embasar a sentença proferida naqueles autos foram todos colacionados a este feito pelo próprio INSS, sendo certo que ambas as partes puderam exercer o contraditório referentemente à prova

Page 97: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

97

emprestada da aludida ação que tramitou sob o número 0017823-88.2010.4.05.8300. Como se verá, ali foram exa-minados percucientemente todos os elementos de prova que remontam ao longínquo ano de 1962 e que fazem prova, no meu sentir, de que houve a efetiva compra e venda do bem pelo IAPETC ao particular, suprimindo deste a inalienabili-dade inerente aos bens públicos.

Porque absolutamente idêntica a situação de fato e de direito, e porque as partes de um e outro processo são rigo-rosamente as mesmas, e ainda tendo em vista a expressa consagração pelo STJ da legitimidade da fundamentação per relationem, peço vênia para traduzir os fundamentos que serviram como razões de decidir naquele feito:

Para melhor apreciar o pedido do demandante, mostra--se pertinente uma breve exposição do arcabouço fático colhido dos autos. No longínquo ano de 1962 o Sr. Arnaldo do Rego Barros solicitou ao IAPETC autorização para aquisição do imóvel em contenda, o qual já ocupava há cerca de 2 anos. Na época, a intenção do ocupante era realizar o pagamento do bem de forma parcelada, consoante se depreende do requerimento de fl. 11.

Em resposta a esse requerimento, o diretor da Divisão de Aplicação do Patrimônio do extinto IAPETC opinou que fosse autorizado o recebimento das prestações como pagamento de preço do contrato de compra e venda a partir da data de ocupação do prédio pelo Sr. Arnaldo (fl. 22).

Por sua vez, há vários documentos nos autos que autorizam presumir que depois disso houve a forma-lização do contrato de compra e venda do aludido imóvel. Destacam-se recibos de pagamento referentes a “prestação do pagamento do seu débito referente ao CONTRATO DE COMPRA E VENDA do imóvel à rua Santo Cosme e Damião, nº 613 da Vila P. Arlindo Maciel”, dando conta da quitação das prestações re-lativas aos meses de fevereiro a outubro de 1962 (fls. 23/24, 27/28). Às fls. 43/45 consta o pagamento de prestações do ano de 1963.

Também há alguns documentos que fazem alusão ao contrato de compra e venda, tais como a missiva de

Page 98: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

98

fl. 26, o requerimento de fl. 37 e o requerimento de fl. 46. E merece destaque o teor da correspondência trocada entre o Diretor do DAP e o Delegado Estadual do IAPETC na qual se afirma categoricamente que “o então titular da DAP em exposição de motivo feita ao então Delegado Alfredo Pinto de Oliveira, aprovando o expediente do Sr. Sadock Cunha Câmara, concordou plenamente que fosse recebidas as prestações (sic) como compra e venda a partir da data de ocupação”. (fl. 48).Prosseguindo na análise da documentação acostada aos autos, verifica-se que o Sr. Arnaldo continuou pro-cedendo ao pagamento das prestações do imóvel e que chegou a requerer a liquidação antecipada da dívida, seguindo-se uma série de comunicações nas quais se discute o valor da avaliação realizada pelo IAPETC.Durante a adoção dos procedimentos necessários ao atendimento da solicitação de liquidação antecipada, foi noticiado o falecimento do Sr. Arnaldo, tendo sido suspensas as medidas necessárias à antecipação da liquidação da dívida. O IAPETC ainda manteve conta-tos com os herdeiros do Sr. Arnaldo, mas por razões as mais variadas as negociações não evoluíram.Em 1971 (fl. 73), o Extinto INPS – sucessor do IAPETC – ainda dava andamento aos trâmites internos para a lavratura da escritura definitiva de compra e venda do referido imóvel.Após 1971 e até o ano de 2010, o INSS quedou-se inerte diante da situação do imóvel contestado nos pre-sentes autos, inclusive, no que se refere à cobrança dos valores eventualmente inadimplidos pelo Sr. Arnaldo.Com o passar dos anos sem que houvesse qualquer sinalização do INSS acerca da sua intenção de reto-mada do imóvel, os herdeiros do Sr. Arnaldo do Rego Barros transmitiram seus direitos hereditários ao ora demandado, que, desde 1993, reside no imóvel com sua família.Considerando que os fatos aqui considerados datam de quase cinquenta anos, a prova colacionada aos autos se afigura mais do que suficiente para fazer prova de que houve a celebração de um negócio jurídico entre o extinto IAPETC e o Sr. Arnaldo do Rego Barros con-

Page 99: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

99

solidando a compra e venda do imóvel em cuja posse o INSS pretende se imitir.

De consequência, pode-se inferir que a partir dessa época o que havia era uma dívida de valor entre o adquirente originário e o instituto de aposentadoria e uma obrigação de fazer (lavrar a escritura no cartório de imóveis) pendente de cumprimento, mas a inten-ção de transmissão da propriedade já houvera sido formalizada pelo antigo proprietário (IAPETC), que inclusive chegou a receber por anos a fio os valores das prestações do parcelamento.

Nesse contexto, incabível a alegação do demandante de que o imóvel objeto da lide não pode ser adquirido por usucapião por se tratar de imóvel público se, desde 1962, haviam sido adotadas providências administrati-vas com vistas à transferência da sua propriedade para particular mediante contraprestação pecuniária que se verifica cumprida nos fólios do processo administrativo que instrui a inicial.

Eventual alegação de que existem parcelas em aberto ou que o valor integral não foi cumprido deveriam ter sido alegadas no momento oportuno, uma vez que o pretenso direito a cobrança encontra-se há muito pres-crito, nos termos do artigo 1º do Decreto nº 20.910/32.

Também não há que se falar em impossibilidade da alienação do bem por inexistência de negócio jurídico formal e da vedação de ajuste verbal com a Administra-ção Pública, haja vista que, no já mencionado processo administrativo, restou expressamente consignado o pacto celebrado entre o Sr. Arnaldo do Rego Barros e o IAPETC, ainda que não se tratasse de instrumento formal de promessa de compra e venda.

Dessa forma, por entender que o demandado funda a sua posse em justo título e que a dívida referente ao financiamento do imóvel já se encontra prescrita, con-cluo carecer de amparo jurídico a pretensão do INSS de ser reintegrado no imóvel em liça.

Destaco que a sentença que ali proferi foi desafiada por recurso de apelação ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que confirmou in totum os seus termos e negou

Page 100: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

100

provimento ao recurso e à remessa oficial. Porque pertinente ao exame da causa, novamente rogo vênia para transcre-ver excertos e ementa do voto do Desembargador Federal MARCELO NAVARRO:

A sentença não carece de reparo, senão vejamos:

Sabe-se que a promessa irretratável de venda de imóvel (ou compromisso de compra e venda) gera duas ordens de efeitos no âmbito jurídico: a) efeitos obrigacionais relacionados à adjudicação compulsória e à obrigação de celebrar o contrato definitivo; b) efeito real, caso haja o registro do contrato no Cartório Imobi-liário para fins de atribuição de direito real de aquisição. No caso, embora a promessa de compra e venda não tenha sido devidamente registrada no Cartório de Imó-veis, há vários documentos nos autos que permitem inferir que, de fato, tal contrato foi formalizado. Nesse sentido, conforme bem ressaltado pelo magistrado de primeiro grau:

(...)

Com efeito, o contrato de promessa de compra e venda celebrado entre o IAPETC, sucedido pelo Instituto Na-cional do Seguro Social - INSS e o Sr. Arnaldo, mesmo que não formalizado, permitiu que o imóvel objeto do contrato ficasse vinculado aos efeitos obrigacionais, tendo sido cumprida a prestação do contratante. Não há, portanto, de se cogitar de eventual invalidade dos negócios jurídicos realizados de cessão e de promes-sa de cessão dos direitos aquisitivos referentes ao compromisso de compra e venda. Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação e à remessa necessária e, assim, mantenho a sentença prolatada.

Eis o acórdão lavrado pela eg. Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região:

DIREITO CIVIL. COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL NÃO FORMALIZADO. IMÓVEL DO ANTIGO IAPECT SUCEDIDO PELO INSS. PAGA-MENTO PARCIAL DO PREÇO. DIREITO À COBRAN-ÇA PRESCRITO. DECRETO Nº 20.910/32.1. A matéria sob julgamento desta Corte consiste na possibilidade da adjudicação compulsória de imóvel,

Page 101: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

101

objeto de contrato de compromisso de compra e venda não formalizado entre o então IAPECT, hoje sucedido pelo INSS e promissário comprador (ou compromis-sário), em 1962.2. A promessa irretratável de venda de imóvel (ou compromisso de compra e venda) gera duas ordens de efeitos no âmbito jurídico: a) efeitos obrigacionais relacionados à adjudicação compulsória e à obrigação de celebrar o contrato definitivo; b) efeito real, caso haja o registro do contrato no Cartório Imobiliário para fins de atribuição de direito real de aquisição.3. “Eventual alegação de que existem parcelas em aberto ou que o valor integral não foi cumprido de-veriam ter sido alegadas no momento oportuno, uma vez que o pretenso direito à cobrança encontra-se há muito prescrito, nos termos do artigo 1º do Decreto nº 20.910/32.”4. Remessa necessária e apelação do INSS impro-vidas.(APELREEX 20039/PE, Relator Des. Fed. MARCELO NAVARRO, Terceira Turma, JULGAMENTO: 14/02/2013, PUBLICAÇÃO: DJe 21/02/2013 - Página 194)

Como já assentado, a prova produzida nesses autos em nada altera o entendimento que declinei naquela oportuni-dade, donde concluo que o simples fato de não ter havido a efetiva escrituração do bem em favor do ocupante original por burocracia interna do então alienante não retira a eficácia do negócio jurídico de compra e venda do bem.

Entender em sentido contrário albergaria, a meu ver, hipóte-se de enriquecimento sem causa ao erário público – já que não há dúvidas de que o Sr. Arnaldo do Rego Barros pagou efetivamente pelo bem – e ainda levaria o Poder Público a se beneficiar da sua própria ineficiência, uma vez que apenas questões de ordem burocrática impediram o então IAPETC de lavrar a competente escritura pública.

Concluo, portanto, que os elementos de prova são sufi-cientes para comprovar que há cerca de cinquenta anos o legítimo proprietário do bem (o IAPETC) alienou o imóvel a particular (na época o Sr. Arnaldo) que pagou por ele o preço justo, donde não há que se cogitar vedação à incidência do instituto da usucapião do imóvel.

Page 102: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

102

III - DISPOSITIVO

À luz dessa considerações, JULGO PROCEDENTE o pe-dido, extinguindo o processo com resolução de mérito nos termos do art. 269, I, do CPC, para declarar a aquisição pela prescrição aquisitiva da propriedade do imóvel situado à Rua Santos Cosme e Damião, nº 613, Ipsep, Recife/PE em favor de UACI EDVALDO MATIAS SILVA e JOSENILDE ALVES MATIAS, qualificados na inicial.

Condeno o INSS no pagamento de honorários advocatícios, que arbitro em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Após o trânsito em julgado, expeça-se mandado translativo de domínio em favor dos autores para fins de averbação junto ao Cartório de Imóveis, após satisfeitas as obrigações fiscais.

Sentença sujeita ao duplo grau obrigatório.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Recife, 3 de dezembro de 2014.

POLYANA FALCÃO BRITOJuíza Federal no exercício da titularidade da 12ª Vara/PE

Com essas considerações, nego provimento à apelação e à remessa necessária.

É como voto.

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO Nº 32.442-CE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONIApelante: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSSApelado: JOSÉ RODRIGUESS BARROSRepte.: PROCURADORIA DO INSSAdvs./Procs.: DRS. VÂNIA MARIA GOMES DUWE E OUTRO (APDO.)

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AMPUTAÇÃO TRAUMÁTICA. ANTEBRAÇO DIREITO. AUSÊNCIA DE PERÍCIA JU-DICIÁRIA. UTILIZAÇÃO DE ATESTADOS MÉDICOS

Page 103: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

103

APRESENTADOS PELO SEGURADO. ADMISSIBI-LIDADE. INCAPACIDADE LABORATIVA COMPRO-VADA. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. TERMO INICIAL. REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. JUROS DE MORA A CONTAR DA CITAÇÃO.- Apelação interposta em face de sentença que julgou procedente pedido de Concessão de Aposentadoria por Invalidez de segurado rural.- Diante da possibilidade de se apurar a real si-tuação do beneficiário – amputação do antebra-ço esquerdo – através dos atestados médicos colacionados e da prova testemunhal, os docu-mentos colacionados aos autos são suficientes para determinar a incapacidade do Segurado não havendo fundada dúvida quanto ao fato de o autor-apelado não possuir um braço.- Restou incontroverso nos autos a amputação do membro superior do autor. Os exames médi-cos aos quais foi submetido ao longo dos anos desde o acometimento do fato que lhe amputou o braço direito serviram para elucidar dúvidas remanescentes, no tocante ao grau da possível incapacidade de que padeceria o segurado.- Benefícios de natureza urgente como é o caso da Aposentadoria por invalidez de segurado es-pecial podem ser justificados, excepcionalmente, com base em atestados médicos, como meio de tornar efetiva a prestação jurisdicional que, se retardada, causaria ao segurado um dano irre-parável (Precedentes). Preliminar de nulidade da sentença rejeitada.- Qualidade de segurado especial incontroversa. Os documentos anexados aos autos possuem força probante suficiente no presente feito e em momento algum a parte ré contestou a condição de rurícola do autor.- Autor que exerceu, primordialmente, ativida-des relativas à agricultura, as quais requer a utilização tanto dos membros inferiores como

Page 104: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

104

superiores, exigindo esforços físicos com o ma-nuseio de ferramentas pesadas em movimento repetitivo, o que, induvidosamente, ante o estado de saúde do demandante, torna-se uma tarefa de impossível realização.- Termo inicial do benefício a partir do requeri-mento administrativo, observada a prescrição quinquenal.- Juros de mora a contar da citação.- Honorários advocatícios mantidos em 10% (dez por cento) (art. 20, §§ 3º e 4º, do CPC; Súm/111/STJ). - Apelação e remessa necessária providas, em parte (item 7).

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que são partes as acima identificadas, decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no mérito, dar provimento, em parte, à apelação e à remessa necessária, nos termos do relatório, voto do Desem-bargador Relator e notas taquigráficas constantes nos autos, que passam a integrar o presente julgado.

Recife, 23 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI:

Apelação interposta pelo INSS, em face da sentença que julgou procedente o pedido de aposentadoria por invalidez de trabalhador rural, com pedido de antecipação de tutela.

A sentença de fls. 206/208 condenou o INSS a implantar o be-nefício pleiteado, a contar da data do requerimento administrativo, declarando, desde já, prescritas as parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que precedeu o ajuizamento da ação (25.10.2004), com incidência de juros de mora e correção monetária segundo o

Page 105: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

105

disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com as alterações dadas pela Lei nº 11.960/09.

Condenou o réu, ainda, ao pagamento de honorários advoca-tícios arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, incidindo somente sobre as parcelas vencidas até o momento da prolação da sentença, de acordo com o art. 20, § 3º, do CPC, e em con-formidade com a Súmula 111/STJ. Sem condenação em custas e despesas processuais, por gozar o INSS de isenção legal, a teor do disposto na Lei 8.620/93.

Nas razões de recurso a Autarquia Previdenciária trouxe, em síntese, as alegações de: a) nulidade da sentença, em virtude da perícia médica ter sido fornecida por particular, aduzindo ser fundamental a perícia médica por perito oficial, nomeado pelo Magistrado; b) divergência de pedidos na esfera administrativa e judiciária. Por fim, em virtude do princípio da eventualidade, pug-na pela alteração do termo inicial, para que este seja a partir do trânsito em julgado da decisão condenatória ou da data do laudo pericial, além da minoração dos honorários advocatícios para 5% (cinco por cento) do valor da condenação – fls. 223/229.

Contrarrazões às fls. 232/241. Sentença sujeita ao reexame necessário.

É o relatório. Dispensada a revisão.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CID MARCONI

(Relator):Inicialmente, cumpre analisar a preliminar de nulidade da sen-

tença ante a ausência de perícia médica judicial.Aduz a apelante que a sentença recorrida teria se baseado

em atestado médico fornecido pelo particular (fl. 173) para fins de aferição do requisito da incapacidade, quando era fundamental a realização de perícia médica por perito oficial nomeado pelo Magistrado, como, também, que não houve resposta aos quesitos formulados pelo INSS. Fatores estes que ensejariam a nulidade do julgado, devendo os autos serem retornados à instância de origem para a realização da perícia médica judicial.

Page 106: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

106

Da análise dos autos, infere-se que, de fato, não houve a realização de uma perícia médica por um especialista atuante no juízo originário, mas a aferição da incapacidade não se baseou em atestado médico fornecido pelo particular (como afirma a apelante).

O MM. Juiz sentenciante solicitou que a Secretaria de Saúde do município indicasse profissional habilitado para a realização da prova pericial, através do Ofício de no 339/08 (fl. 89). O médico indicado pela Secretaria de Saúde foi quem emitiu o receituário de fl. 92.

Ademais, o juiz a quo enviou ofícios à Secretaria de Saúde (fl. 112), ao Fórum da Justiça Federal em Fortaleza (fl. 114) e ao Conselho Regional de Medicina do Estado do Ceará (fl. 119), na busca pela indicação de um profissional habilitado para a reali-zação da perícia judicial, tentativas estas que perduraram mais de 5 (cinco) anos e que a condição de invalidez do segurado fora atestada por uma série de documentos médicos subscritos por profissionais diversos.

Neste ponto, entendo acertada a decisão do magistrado a quo, ao sentenciar de maneira favorável ao autor/apelado, adotando tais argumentos como razões de decidir:

Da análise dos autos constata-se a não realização da perícia durante a instrução processual. Porém, se faz necessário relacionar as seguintes considerações a res-peito: 1 - A instrução processual se arrastou por mais de 5 anos na tentativa de realizar um exame pericial; 2 - O autor – declarante pobre na forma da lei – em nenhum momento processual se opôs à perícia, que somente não foi levada a feito em virtude da não disponibilização de meios pelo Estado; 3 - O INSS não questionou a ampu-tação do membro superior do autor, sequer as condições em que nessa amputação ocorreu, limitando-se a argu-mentar que a perda de um dos braços não incapacita o autor para outras atividades laborativas; 4 - Constam dos autos diversos documentos médicos atestando a amputa-ção do membro superior direito do autor (fls. 10/11, 173, 174), os quais foram subscritos por médicos distintos). (fls. 206/207).

Não se desconhece o fato de que, em se tratando de benefícios previdenciários, cujo deferimento dependa de auxílio de profissional

Page 107: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

107

com conhecimento técnicos específicos, o juiz pode designar um perito que oficiará com o órgão auxiliar do juízo, sem interesse na lide, e com o dever de guardar equidistância dos interesses em confronto.

Ocorre que, diante da possibilidade de se apurar a real situação do beneficiário – amputação do antebraço esquerdo – através dos atestados médicos colacionados (fls.10/11, 1731 174) e da prova testemunhal (fls. 64/66), os documentos colacionados aos autos são suficientes para determinar a incapacidade do particular não havendo fundada dúvida quanto ao fato de o autor-apelado não possuir um braço.

Assim sendo, restou incontroverso nos autos a amputação do membro superior do autor. Os exames médicos aos quais foi sub-metido o Segurado ao longo desses anos desde o acometimento do fato que amputou-lhe o braço direito serviram para elucidar dúvidas remanescentes, no tocante ao grau da possível incapacidade de que padeceria o segurado.

O TRF 4ª Região já se manifestou nesse mesmo sentido, segundo a ementa transcrita a seguir:

PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. GREVE DOS FUNCIONÁRIOS DO INSS. IMPOSSIBILIDADE DA RE-ALIZAÇÃO DE PERÍCIA MÉDICA. UTILIZAÇÃO DE ATES-TADOS MÉDICOS APRESENTADOS PELO SEGURADO. ADMISSIBILIDADE. 1 - Em questões que envolvem benefícios de natureza urgente, como o auxílio-doença, a concessão do benefício se justifica, mesmo que com base em atestados médicos, como meio de tornar efetiva a prestação jurisdicional que, se retardada, causaria ao segurado um dano irreparável, ou por ser obrigado a trabalhar sem ter condições de saúde para tanto, ou por se ver privado de sua fonte de sustento. 2 - O segurado não pode ficar desamparado em virtude de obstáculos de ordem interna do INSS e o mandado de segurança é o instrumento viável para evitar que lesão aos seus direitos se efetive. (TRF4, AMS 2001.71.00.028955-0, Quinta Turma, Relator Antonio Albino Ramos de Oliveira, DJ 25/06/2003)

Page 108: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

108

Preliminar de nulidade que se rejeita. Passo, agora, ao exame do mérito.

A aposentadoria por invalidez é devida ao segurado que, es-tando ou não, em gozo de auxílio doença for considerado incapaz para o trabalho e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo o benefício pago enquanto permanecer essa condição (art. 42 da Lei nº 8.213/91).

Os requisitos necessários à fruição desses benefícios são: qualidade de segurado, carência e invalidez permanente para qualquer atividade laboral (aposentadoria por invalidez), ou pro-visória e suscetível de recuperação para a mesma ou para outra atividade (auxílio-doença).

No que tange à comprovação da atividade laboral e efetivo exercício de atividade rural, penso que os documentos anexados aos autos – fls. 10, 12, 175, 176, 177/182 – e a prova oral, cujas transcrições constam nas fls. 64/66, possuem força probante su-ficiente no presente feito. Afora isto, o ora Apelante em momento algum contestou a qualidade de segurado especial conferido ao autor, fato este que torna tal questão incontroversa.

O art. 26, II, da Lei nº 8.213/91 dispensa a exigência de carência para o benefício em questão, como pode ser constatado a seguir:

Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:(...)II. Auxílio-doença e aposentadoria por invalidez nos casos de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como nos casos de segurado que, após filiar-se ao Regime Geral de Previdência Social, for acometido de algumas das doenças e afecções especificadas em lista elaborada pelos Ministérios da Saúde e do Trabalho e da Previdência Social a cada três anos, de acordo com os critérios de estigma, deformação, mutilação, deficiência, ou outro fator que lhe confira especificidade e gravidade que mereçam tratamento particularizado.

O terceiro requisito, a incapacidade laborativa, em que pese ter sido proferido por perito não designado pelo magistrado, tam-bém restou devidamente comprovado, diante da farta e robusta

Page 109: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

109

documentação acostada aos autos que comprovam ser o autor, ora apelado, amputado do braço direito (CID S58.1) em virtude de um acidente com uma forrageira, há 9 anos (como pode ser comprovado na fl. 11).

Faz-se mister perquirir, em razão da incapacidade atribuída ao autor, o que de fato demarcaria, penso assim, a amplitude da incapacidade para as atividades laborais. Ao que me parece ser, o marco delimitador entre esses benefícios se identifica no resultado do processo de reabilitação profissional.

Se o segurado não foi submetido ao processo de reabilitação profissional – ao encargo do INSS –, para o exercício de outra ati-vidade, razoável entender como persistentes os efeitos da incapa-cidade de forma ampla. De outra banda, verificada a possibilidade de exercício de outra atividade no processo de reabilitação profis-sional do Autor, haveria elementos que justificariam a restauração da capacidade laborativa, a ensejar garantia do seu sustento.

Do que se depreende dos autos, não há informações a respeito da inexistência do processo de reabilitação do autor. Saliente-se, ainda, que a situação de incapacidade deve ser examinada no contexto da enfermidade que acomete o requerente. Pelos registros constantes nos autos, o autor exerceu, primordialmente, ativida-des relativas à agricultura, as quais requer a utilização tanto dos membros inferiores como superiores, exigindo esforços físicos com o manuseio de ferramentas pesadas em movimento repetitivo, o que, induvidosamente, ante o estado de saúde do demandante, torna-se uma tarefa de impossível realização.

Portanto, do que consta nos autos, permito-me concluir que as provas que se acostaram à inicial e as que foram produzidas posteriormente são inequívocas e demonstram os argumentos da parte autora, de que se trata de segurado especial, acometido de doença incapacitante do exercício de sua atividade habitual.

Diante de tais considerações, entendo não merecer prosperar a irresignação do INSS quanto à disparidade do pedido requeri-do na via administrativa e na via judicial. Cabe esclarecer que, a questão controvertida seria a incapacidade laborativa para o tra-balho habitual. Tal questão foi negada na via administrativa, desta maneira, mesmo que fosse pleiteado o benefício de aposentado-

Page 110: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

110

ria por invalidez, o mesmo também seria negado, uma vez que o critério de incapacidade para o trabalho não foi constatado na perícia designada pela Autarquia Previdenciária, e que é de fácil compreensão diante da ausência do braço direito do ora apelado, trabalhador rural com pouca instrução e que já se apresenta com 42 anos de idade, dificultando sua inserção em outro ramo no mercado de trabalho.

Destarte, tendo em vista o preenchimento dos requisitos, entendo fazer jus o demandante ao benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez, nos termos fixados na decisão a quo, ou seja, desde a data do requerimento feito junto ao INSS, (16/08/1994), observada as parcelas prescritas anteriormente ao quinquênio que precedeu o ajuizamento da ação, uma vez que restou comprovado nos autos que os sintomas apresentados e o estado de incapacitação do autor-apelado preexistia desde à época, como consta na documentação acostada nos autos.

A verba honorária deve ser mantida, como fixada na sentença, em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observada a Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça - STJ.

Esforçado nestas razões, rejeito a preliminar e, no mérito, dou provimento, em parte, à apelação e à remessa necessária, apenas para fixar como termo a quo da incidência dos juros de mora a data da citação.

É como voto.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 564.949-AL

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOUZA CARVALHOApelante: MÔNICA LUNA LIMA CASADOApelada: UNIÃOAdvs./Procs.: DRS. MARCELO HENRIQUE BRABO MAGALHÃES E OUTROS (APTE.)

EMENTA: ADMINISTRATIVO. RECURSO DE APE-LAÇÃO DA DEMANDANTE, ANTE SENTENÇA

Page 111: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

111

QUE JULGA AÇÃO VISANDO ANULAR ATO DE DEMISSÃO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, NA DE-FESA DE QUE EXERCIA APENAS NA SOCIEDADE PRIVADA FIO DE CABELO ARMARINHO LTDA. A ATIVIDADE DE CABELEIREIRA FORA DO HORÁ-RIO DE EXPEDIENTE.- Inocorrência de cerceamento do direito de defe-sa, por não ter sido ouvida nenhuma testemunha. Trafega-se no caminho de fatos, que se compro-vam via documentos, constantes da sindicância levada a frente pelo Ministério da Saúde, cuja conclusão redundou, depois, na demissão da ora apelante. No entanto, a inicial só trouxe os documentos de fls. 38-109, com destaque para o Parecer da Advocacia-Geral da União, fls. 43-68, sugerindo a demissão da apelante, fl. 67, e o relatório final do Ministério da Saúde, fls. 69-109.- No que diz respeito ao fato em si – exercício por parte da apelante, servidora do Ministério da Saúde, da gerência de entidade privada, ou seja, salão de beleza e sua demissão – é o que expõe, deixando tudo o mais a margem de toda a discussão, que aqui se faz, através da presente demanda, na tentativa de anular a portaria de fl. 42. - Ante a exposição que se procede, o fato de o juiz do feito não ter admitido a produção de prova testemunhal não pode nunca atingir ao cume de cerceamento do direito de defesa, porque não é a prova testemunhal que vai ilidir todo o acervo em que a ré, ora apelada, se apoiou para retirar do mundo positivo a portaria aludida, fl. 42. Depois, a inicial nem ao menos arrola uma só testemu-nha, registrando apenas o protesto no sentido de provar o alegado por todos os meios de prova em direito permitidos, especialmente documental, entre outras que se fizerem necessárias, fl. 36. - A demandante, ora apelante, poderia trazer aos autos a documentação que tivesse em mãos

Page 112: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

112

a todo e qualquer momento, desde que fosse antes da sentença. Não trouxe. Quanto à prova testemunhal, esta, isoladamente, não teria a força para ilidir a eficácia da [prova] documen-tal, sedimentada na sindicância instaurada pelo Ministério da Saúde.- Neste ponto e com tais explicações, não se en-xerga nenhum cerceamento ao direito de defesa por parte da demandante.- No mérito, caberia à autora a demonstração de sua inocência, ou seja, de não ter participado da gerência ou administração de sociedade priva-da, a teor da redação do inc. X do art. 117 da Lei 8.112, de 1990. Bastava ter tangido aos autos a documentação atinente aos contratos da entida-de privada chamada de Fios de Cabelo Armarinho Ltda. Não trouxe. Os contratos, do primeiro ao último, apontam a participação da apelante na sociedade privada já nominada, desde o seu início, nos idos vividos de 1992 até os dias da sindicância administrativa. - Entretanto, nada foi trazido aos autos, um só documento atinente à constituição de Fios de Cabelo Armarinho Ltda., a não ser os contratos de fls. 276-311, dos quais alguma luz se extrai, embora sem ser suficiente para iluminar todo o cenário no qual a controvérsia em foco se situa.- No contrato de fl. 279, há referência na cláusula sexta que a gerência da sociedade e o uso do nome comercial serão exercidos pelo(s) sócio(s) indicado(s) na forma deste instrumento, mas não há menção a quem exerce a gerência. O contrato consigna a data de 15 de janeiro de 1992, fl. 279.- Adiante, numa página quase em branco, apa-rece a assinatura dos dois sócios e de duas testemunhas. Na identificação do sócio Luiz Napoleão Casado Aranud Neto, há a referência a ser sócio-gerente, enquanto na da demandante apenas a de ser sócia, fl. 285. Levando em conta

Page 113: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

113

a alteração de contrato, da qual faz parte, o fato teria ocorrido em 27 de novembro de 1996, fl. 283. - O estranho é que somente na alteração data-da de 12 de agosto de 2005, fl. 302, constou na cláusula oitava que a administração da socieda-de é exercida pelo administrador Luis Napoelão Casado Arnaud Neto a quem compete a adminis-tração geral de todas as operações comerciais e administrativas da empresa, representando ativa e passivamente em juízo ou fora dele, (...), fl. 300.- Ou seja, justamente quando denúncia anônima chegou ao Ministério da Saúde, ensejando a ins-taurando de sindicância, através da Portaria NE/AL n° 170, de 1º de novembro de 2005 (fl. 4), fl. 44. A coincidência leva a crer que, ante a notícia da denúncia, a condição do sócio Luiz Napoleão Casado Aranud Neto, como gerente, mereceu o destaque do registro na Junta Comercial do Estado de Alagoas.- O certo é que, no espremer do limão, faltou a demandante sedimentar a prova de que não era gerente nem administradora de Fio de Cabelo Armarinho Ltda., tarefa que lhe pertencia, na tentativa de derrubar a demissão que a portaria de fl. 42 lhe impingiu. Nesse aspecto, ressalte-se que a demissão partiu de uma sindicância, cujo instrumento tomou mais de quinhentas páginas, bafejada por documentos e prova testemunhal, que foi completamente desprezada pela deman-dante, limitada, apenas a negar ter sido gerente ou administradora de Fio de Cabelo Armarinho Ltda. - Improvimento do recurso.

ACÓRDÃO

Vistos etc., decide a egrégia Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por maioria, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas constantes dos autos.

Page 114: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

114

Recife, 4 de agosto de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOUZA CARVA-LHO - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOU-

ZA CARVALHO:

Trata-se de apelação interposta por Mônica Luna Lima Casa-do contra sentença proferida pelo Juízo da 13ª Vara Federal, em Alagoas, que negou provimento ao pedido da inicial por entender que não foi desproporcional a penalidade aplicada a autora, uma vez que o art. 132, inc. XIII, da Lei 8.112/90, atribui expressamen-te a pena de demissão ao servidor público que pratica a conduta especificada no art. 117, inc. X, da referida lei.

Alega a apelante, em preliminar, a nulidade do julgamento, sustentando que houve cerceamento de defesa por não ter o Juízo a quo procedido a oitiva das testemunhas.

No mérito aduz, em síntese, que os documentos responsáveis por causar sua demissão, em nada demonstram a sua participação na gerência ou administração da empresa Fios de Cabelo, apenas demonstram o exercício da função de cabeleireira, função esta exercida fora do expediente público e que em nada prejudicava a sua atuação junto à Secretaria Municipal de Saúde. Declara restar demonstrado que o fato narrado não configura evidente infração disciplinar, devendo, portanto, ser a denúncia arquivada por falta de objeto, conforme art. 144 da Lei 8.112, fl. 238.

Contrarrazões apresentadas, repelindo a alegação cerceamen-to de defesa, sob o argumento de que os documentos constantes nos autos – produzidos no bojo de um processo administrativo que observou os princípios de contraditório e da ampla defesa – foram suficientes para fundamentar e formar o convencimento do magistrado.

Sustenta a apelada, ainda, estar a sentença correta, pois, o conjunto probatório revela que a recorrente é sócia administradora da empresa Fios de Cabelo desde de 1992, quando da sua criação,

Page 115: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

115

até a alteração contratual em 2005, conforme se verifica na sexta cláusula do contrato social, fl. 262.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL VLADIMIR SOU-

ZA CARVALHO (Relator):

De início, há preliminar de cerceamento do direito de defesa, fl. 219, que, aliás, não procede. E, por razões bem simples: es-tamos no caminho de fatos, que se comprovam via documentos, constantes da sindicância levada a frente pelo Ministério da Saúde, cuja conclusão redundou, depois, na demissão da ora apelante. No entanto, a inicial só trouxe os documentos de fls. 38-109, com destaque para o Parecer da Advocacia-Geral da União, fls. 43-68, sugerindo a demissão da apelante, fl. 67, e o relatório final do Ministério da Saúde, fls. 69-109.

No que diz respeito ao fato em si – exercício por parte da apelante, servidora do Ministério da Saúde, da gerência de enti-dade privada, ou seja, salão de beleza e sua demissão – é o que expõe, deixando tudo o mais a margem de toda a discussão, que aqui se faz, através da presente demanda, na tentativa de anular a portaria de fl. 42.

Ante a exposição que se procede, o fato de o juiz do feito não ter admitido a produção de prova testemunhal não pode nunca atingir ao cume de cerceamento do direito de defesa, porque não é a prova testemunhal que vai ilidir todo o acervo em que a ré, ora apelada, se apoiou para retirar do mundo positivo a portaria aludida, fl. 42. Depois, a inicial nem ao menos arrola uma só testemunha, registrando apenas o protesto no sentido de provar o alegado por todos os meios de prova em direito permitidos, especialmente documental, entre outras que se fizerem necessárias, fl. 36.

Pois bem.

A demandante, ora apelante, poderia trazer aos autos a do-cumentação que tivesse em mãos a todo e qualquer momento, desde que fosse antes da sentença. Não trouxe. Quanto à prova testemunhal, esta, isoladamente, não teria a força para ilidir a efi-

Page 116: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

116

cácia da prova documental, sedimentada na sindicância instaurada pelo Ministério da Saúde.

Neste ponto e com tais explicações, não vejo nenhum cerce-amento ao direito de defesa por parte da demandante.

No mérito, caberia à autora a demonstração de sua inocência, ou seja, de não ter participado da gerência ou administração de sociedade privada, a teor da redação do inc. X do art. 117 da Lei 8.112, de 1990. Bastava ter tangido aos autos a documentação atinente aos contratos da entidade privada chamada de Fios de Cabelo Armarinho Ltda. Não trouxe. Os contratos, do primeiro ao último, apontam a participação da apelante na sociedade privada já nominada, desde o seu início, nos idos vividos de 1992 até os dias da sindicância administrativa.

Entretanto, nada foi tangido aos autos, um só documento atinente à constituição de Fios de Cabelo Armarinho Ltda., a não ser os contratos de fls. 276-311, dos quais alguma luz se extrai, embora sem ser suficiente para iluminar todo o cenário no qual a controvérsia em foco se situa.

No contrato de fl. 279, há referência na cláusula sexta que a gerência da sociedade e o uso do nome comercial serão exercidos pelo(s) sócio(s) indicado(s) na forma deste instrumento, mas não há menção a quem exerce a gerência. O contrato consigna a data de 15 de janeiro de 1992, fl. 279.

Adiante, numa página quase em branco, aparece a assinatura dos dois sócios e de duas testemunhas. Na identificação do sócio Luiz Napoleão Casado Aranud Neto, há a referência a ser sócio--gerente, enquanto na da demandante apenas a de ser sócia, fl. 285. Levando em conta a alteração de contrato, da qual faz parte, o fato teria ocorrido em 27 de novembro de 1996, fl. 283.

O estranho é que somente na alteração datada de 12 de agosto de 2005, fl. 302, constou na cláusula oitava que A administração da sociedade é exercida pelo administrador Luis Napoelão Casado Arnaud Neto a quem compete a administração geral de todas as operações comerciais e administrativas da empresa, representando ativa e passivamente em juízo ou fora dele, (...), fl. 300.

Page 117: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

117

Ou seja, justamente quando denúncia anônima chegou ao Ministério da Saúde, ensejando a instaurando de sindicância, atra-vés da Portaria NE/AL n° 170, de 1º de novembro de 2005 (fl. 4), fl. 44. A coincidência leva a crer que, ante a notícia da denúncia, a condição do sócio Luiz Napoleão Casado Aranud Neto, como gerente, mereceu o destaque do registro na Junta Comercial do Estado de Alagoas.

O certo é que, no espremer do limão, faltou a demandante sedimentar a prova de que não era gerente nem administradora de Fio de Cabelo Armarinho Ltda., tarefa que lhe pertencia, na tentativa de derrubar a demissão que a portaria de fl. 42 lhe im-pingiu. Nesse aspecto, ressalte-se que a demissão partiu de uma sindicância, cujo instrumento tomou mais de quinhentas páginas, bafejada por documentos e prova testemunhal, que foi completa-mente desprezada pela demandante, limitada, apenas a negar ter sido gerente ou administradora de Fio de Cabelo Armarinho Ltda.

Sem ter desempenhado o ônus que lhe pertencia, não há como reverter o resultado da r. sentença atacada.

Por este entender, nego provimento ao apelo.

É como voto.

Page 118: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

118

APELAÇÃO CÍVEL N° 576.505-CE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUIMA- RÃESApelante: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉ- GRAFOS - ECTApelados: BANCO BRASILEIRO DE DESCONTO S/A - BRA- DESCO S/A, ESTADO DO CEARÁ, ANTÔNIO CLÁUDIO MOTA MARTINS E CÔNJUGE, ANTÔNIO MENDES BEZERRA E CÔNJUGE, HORÁCIO MARQUES NETO, DIRCEU FERREIRA DE ANDRA- DE, ATANÁSIO LUÍS PEREIRA SAMPAIO E ADRIA- NA MILITÃO DE SOUSA SAMPAIO E OUTROSAdvs./Procs.: DRS. SABRINY MARIA DOS SANTOS SERRA CAS- TELO E OUTROS (APTE.), FRANCISCO SAMPAIO DE MENEZES JÚNIOR E OUTROS, VICENTE MAR- TINS PRATA BRAGA, FRANCISCO REGIS DOS SANTOS ALBUQUERQUE E OUTROS, ALÉXIS MENDES BEZERRA E OUTROS, AZIZ MANUEL FARIAS JEREISSATI E JOSÉ GOMES LEAL FILHO E OUTRO

EMENTA: AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE REGISTRO DE IMÓVEL C/C NULIDADE DE ES-CRITURA PÚBLICA, REINTEGRAÇÃO DE POSSE E DESFAZIMENTO DE OBRAS E CONSTRUÇÕES INDEVIDAS. IMPOSSIBILIDADE DE DECRETA-ÇÃO DA NULIDADE POR ATINGIR TERCEIRO DE BOA-FÉ QUE JÁ PREENCHEU AS CONDIÇÕES DE USUCAPIÃO DO IMÓVEL. DISCIPLINA DO ART. 214, § 5º, A LEI DE REGISTROS PÚBLICOS. APELO IMPROVIDO. - A presunção de legitimidade do registro, as-sociada à boa-fé do adquirente, culmina por excepcionar a intransigência da regra geral de que o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, tampouco convalesce pelo decurso do tempo. Na hipótese, é irrefutável a boa-fé dos adquirentes do imóvel objeto do presente litígio,

Page 119: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

119

que já preencheram as condições de usucapião do imóvel (alongado lapso temporal, posse man-sa, pacífica e de boa-fé). Disciplina do art. 214, § 5º, da lei de registros públicos. - Apelo improvido.

ACÓRDÃO

Vistos etc., decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigrá-ficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 28 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUIMARÃES - Re-lator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUI-

MARÃES:

Cuida-se de apelação interposta pela Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT contra sentença que julgou improce-dentes os pedidos formulados, revogando a antecipação de tutela concedida, em ação em que se pretende obter a declaração de nulidade de registro imobiliário, cumulada com nulidade de escri-tura pública, reintegração de posse e desfazimento de obras e construções indevidas, com o reconhecimento da propriedade do autor sobre o bem, que teria sido adquirido por meio de doação realizada pela Prefeitura de Palmácia, lavrada por escritura pública em 11 de março de 1963.

A improcedência dos pedidos autorais, conforme fundamen-tação da sentença vergastada, decorre da mora no cumprimento do encargo a que se submetia o autor. A doação em comento foi feita com a condição de ser construído o prédio da Agência Postal Telegráfica da cidade de Palmácia, o que não foi cumprido pelo autor, não sendo possível o reconhecimento da validade da doação e da consequente propriedade da empresa autora.

Page 120: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

120

Alega a recorrente, em síntese, que: a) no caso dos autos, embora a doação tenha sido feita com ônus, observa-se que não houve estipulação de prazo para o cumprimento do encargo, inexistindo notificação judicial ou qualquer outra comunicação formal que viesse a caracterizar a mora da recorrente, nos termos do art. 562, Código Civil/2002; b) o município não se desincum-biu do ônus de comprovar que constituiu a recorrente em mora, mediante a sua devida notificação, tornando-se válida a doação; c) a doação do terreno foi efetuada pela Prefeitura Municipal de Palmácia/CE, representada pelo seu Prefeito Atanásio Perdigão Sampaio, através de escritura pública de doação, lavrada no dia 11 de março de 1963, devidamente autorizada pela Lei nº 33, de 8 de janeiro de 1963, constando como donatário o Departamento Regional dos Correios e Telégrafos do Ceará, hoje com a denomi-nação de Empresa Brasileira de Correios e Télegrafos - ECT; d) o Cartório de Registro de Imóveis de Maranguape, afrontando a Lei de Registros Públicos, em 15 de junho de 1981, criou a Matrícula nº 3753, incluindo o terreno de propriedade da ECT como proprie-dade de Atanásio Perdigão Sampaio; e) o bem de titularidade da ECT foi vendido pelo inventariante do espólio de Atanásio Perdigão Sampaio como se fosse seu bem particular, violando o direito de propriedade da apelante, razão pela qual pretende obter a declara-ção de nulidade de registro imobiliário, cumulada com nulidade de escritura pública, reintegração de posse e desfazimento de obras e construções indevidas.

Contrarrazões apresentadas.É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUI-

MARÃES (Relator):Cinge-se a controvérsia à análise do pedido de declaração

de nulidade de registro imobiliário, cumulada com nulidade de escritura pública, reintegração de posse e desfazimento de obras e construções indevidas.

Da análise dos autos verifica-se que o bem objeto do litígio foi doado ao apelante pela Prefeitura Municipal de Palmácia/CE, representada pelo seu Prefeito Atanásio Perdigão Sampaio, atra-

Page 121: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

121

vés de escritura pública de doação, lavrada no dia 11 de março de 1963, constando como donatário o Departamento Regional dos Correios e Telégrafos do Ceará, hoje com a denominação de Empresa Brasileira de Correios e Télegrafos - ECT, estando supostamente autorizada pela Lei nº 33, de 8 de janeiro de 1963, transcrita na escritura de doação, verbis:

Lei nº 33, de 13 de dezembro de 1962.(...)Art. 1º - Fica o Executivo Municipal autorizado a fazer doação de um terreno ao Departamento Regional dos Correios e Telégrafos, situado à rua Joaquim de Almeida, esquina com a Rua Pedro Sampaio, na cidade de Pal-mácia, Estado do Ceará, destinando-se exclusivamente à construção de um prédio para instalação da agência postal telegráfica.Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data da sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

Prefeitura Municipal de Palmácia, 13 de dezembro de 1962.

A Lei Municipal nº 33, de 8 de janeiro de 1963, autorizou o Executivo Municipal a fazer doação de um terreno ao Departamento Regional dos Correios e Telégrafos, situado à rua Joaquim de Al-meida, esquina com a Rua Pedro Sampaio, na cidade de Palmácia, Estado do Ceará, cujo imóvel a ser doado somente foi adquirido pela Prefeitura em 28/02/1963, ou seja, a lei municipal autorizou a doação de imóvel que não pertencia à Prefeitura.

Em que pese a transmissão do imóvel via doação à apelante, em 18/03/1963, constata-se que a esta nunca tomou posse do bem, somente se tornando possuidor do imóvel através de contrato de locação firmado em 2001 com o proprietário à época, só vindo a promover a presente ação em 26/11/2008, ou seja, transcorridos mais de 45 (quarenta e cinco) anos da doação.

Não obstante, sustenta o recorrente que o Cartório de Registro de Imóveis de Maranguape, afrontando a Lei de Registros Públi-cos, em 15 de junho de 1981, criou a Matrícula nº 3753, incluindo o terreno de propriedade da apelante como propriedade de Ata-násio Perdigão Sampaio e que, assim, o bem de sua titularidade foi vendido pelo inventariante do espólio de Atanásio Perdigão

Page 122: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

122

Sampaio como se fosse seu bem particular, violando o direito de propriedade da apelante, razão pela qual pretende obter a declara-ção de nulidade de registro imobiliário, cumulada com nulidade de escritura pública, reintegração de posse e desfazimento de obras e construções indevidas.

Embora as nulidades de pleno direito invalidem o registro, independentemente de ação, “a nulidade não será decretada se atingir terceiro de boa-fé que já tiver preenchido as condições de usucapião do imóvel. Nestes termos, disciplinou a lei de Registros Públicos nº 6.015/73, com redação dada pela Lei nº 10.931/2004, em seu art. 214, § 5º, verbis:

Art. 214 - As nulidades de pleno direito do registro, uma vez provadas, invalidam-no, independentemente de ação direta. (Renumerado do art. 215 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).(...).§ 5º A nulidade não será decretada se atingir terceiro de boa-fé que já tiver preenchido as condições de usucapião do imóvel. (Incluído pela Lei nº 10.931, de 2004)

É o caso dos autos.Ainda que se considerasse a doação objeto do presente apelo

como válida, não se cogita a hipótese de nulidade do Registro Imobiliário nº R-1-3753, efetuado na matrícula nº 3753 e seus atos subsequentes, bem como do Registro Imobiliário nº R-1-31, efetuado na matrícula nº 31 e seus atos subsequentes, tendo em vista que atingiria terceiro de boa-fé, que já preencheu os requisitos para usucapião do imóvel (alongado lapso temporal, posse mansa, pacífica e de boa-fé).

A intenção do legislador foi de fazer prevalecer a fé pública e a boa-fé, em face de suposta nulidade há muito cometida, mas não contestada. Assim, a presunção de legitimidade do registro, associada à boa-fé do adquirente, culmina por excepcionar a intransigência da regra geral de que o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, tampouco convalesce pelo decurso do tempo.

Na hipótese, é irrefutável a boa-fé dos adquirentes do imóvel objeto do presente litígio, constando à fl. 182 dos autos trans-crição nº 8.022, de 28/07/1962, que transmite ao Sr. Atanásio

Page 123: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

123

Perdigão Sampaio, um total de 7 imóveis por herança, dentre os quais o 6º imóvel foi que deu origem à matricula 3753, discutida pelo apelante. Assim, pela análise dos documentos públicos, verifica-se que o bem integrante do patrimônio do Sr. Atanásio, alienado em cadeia a diversos compradores, esteve presente em toda a cadeia registral, sem que se tornasse visível qualquer vício ou descontinuidade.

Nesse sentido, recentemente se posicionou a jurisprudência do e. STJ:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE ESCRITURAS PÚBLICAS DE COMPRA E VENDA E MATRÍCULA DE TERRENOS (LOTES 9 E 10) LOCA-LIZADOS EM CAPÃO DA CANOA/RS. FALSIDADE DE ASSINATURA NOS TÍTULOS TRANSMISSIVOS DE PROPRIEDADE CONSTANTE DOS REGISTROS IMOBILIÁRIOS REALIZADOS QUANDO EM VIGOR O DIPLOMA CIVILISTA DE 1916. ARGUIÇÃO, COMO MATÉRIA DE DEFESA, DO IMPLEMENTO DOS RE-QUISITOS DA USUCAPIÃO ORDINÁRIA NO TOCANTE AO LOTE 10. TRIBUNAL A QUO QUE MODIFICOU A SENTENÇA A FIM DE JULGAR IMPROCEDENTE A DEMANDA ANULATÓRIA ANTE A DECLARAÇÃO DE QUE OS IMÓVEIS FORAM ABSORVIDOS PELA PRES-CRIÇÃO AQUISITIVA. PRONUNCIAMENTO EXARADO DE OFÍCIO RELATIVAMENTE AO LOTE 9. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO PELO AUTOR. - Hipótese: Controvérsia que se subsume à possibilidade de se declarar, de ofício, a prescrição aquisitiva da proprie-dade, no bojo de ação anulatória movida por proprietário que teve sua assinatura forjada por falsários os quais, fazendo uso de títulos que ensejaram as Escrituras Pú-blicas nº 13540 e 13608, transferiram direito alheio como sendo próprio (venda a non domino). 1. As informações constantes de registro público possuem presunção relativa, nos termos do caput do art. 214 da Lei de Registros Públicos – “as nulidades de pleno direito do registro, uma vez provadas, invalidam-no, indepen-dentemente de ação direta” – porém, consoante o § 5º do referido dispositivo “a nulidade não será decretada se atingir terceiro de boa-fé que já tiver preenchido as condições de usucapião do imóvel”.

Page 124: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

124

- A declaração de usucapião é forma de aquisição origi-nária da propriedade e de outros direitos reais, contra o anterior proprietário, consubstanciando o exercício da posse ad usucapionem pelo interregno temporal exigido por lei. - A presunção de legitimidade do registro, associada à boa-fé do adquirente, culmina por excepcionar a intransi-gência da regra geral de que o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, tampouco convalesce pelo decurso do tempo. - Na hipótese, é irrefutável a boa-fé dos adquirentes dos lotes 9 e 10, pois, além dessa ser presumida por expressa disposição legal (art. 490, parágrafo único, do Código Civil de 1916), verifica-se que foram enganados por falsários mediante a utilização de título aparentemente justo capaz de iludir qualquer pessoa naquela situação. 2. No ordenamento jurídico brasileiro, existem duas for-mas de prescrição: a extintiva e a aquisitiva. 2.1 A prescrição extintiva, prescrição propriamente dita, conduz à perda do direito de ação por seu titular negli-gente, ao fim de certo lapso de tempo. A prescrição aqui-sitiva, por sua vez, faz com que um determinado direito seja adquirido pela inércia e pelo lapso temporal, sendo também chamada de usucapião. Ambas têm em comum os elementos tempo e inércia do titular, mas enquanto na primeira eles dão lugar à extinção do direito, na segunda produzem a sua aquisição. - A legislação que instituiu o § 5º do artigo 219 do Código de Processo Civil não estabeleceu qualquer distinção em relação à espécie de prescrição. Contudo, tal diferencia-ção é imprescindível sob pena de ocasionar insegurança jurídica, além de violação aos princípios do contraditório e ampla defesa, pois, no processo de usucapião, o direito de defesa assegurado ao confinante é impostergável, eis que lhe propicia oportunidade de questionar os limites oferecidos ao imóvel usucapiendo. - O dispositivo constante do art. 219, § 5º, está intimamen-te ligado às causas extintivas, conforme expressamente dispõe o art. 220 do CPC: “o disposto no artigo anterior aplica-se a todos os prazos extintivos previstos na lei”, sendo que a simples leitura dos arts. 219 e 220 do CPC demonstra a impropriedade de se pretender projetar os di-tames do § 5º do art. 219 para as hipóteses de usucapião.

Page 125: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

125

- Usucapião e prescrição constituem institutos díspares, sendo inadequada a aplicação da disciplina de um deles frente ao outro, vez que a expressão prescrição aquisitiva tem vínculos mais íntimos a fundamentos fáticos/históri-cos do que a contornos meramente temporais. 2.2 Na prescrição aquisitiva, ou usucapião, é indispensá-vel que o postulante alegue seu direito, quer por via de ação própria, quer por exceção de domínio, nos termos da súmula 237/STF, “o usucapião pode ser arguido em defesa”, não sendo dado ao magistrado declará-lo de ofício mediante a invocação do art. 219, § 5º, do CPC. - O momento para a arguição da prescrição aquisitiva, sob pena de preclusão, é na contestação, uma vez que ante o princípio da igualdade das partes no processo, consoante o art. 128 do CPC, deve o juiz decidir a lide nos limites em que foi proposta, sendo-lhe defeso conhecer de questões não suscitadas a cujo respeito a lei exige a iniciativa da parte. 2.3 No caso, apenas no tocante ao lote 10 houve pedido para a declaração do direito à usucapião, o que denota a impossibilidade da declaração de ofício, pelo Tribunal de origem, a respeito da prescrição aquisitiva do lote 9. - No que concerne ao lote 10, em razão de existir a ale-gação, na contestação, do direito à usucapião, impres-cindível a esta Corte Superior promover a verificação dos requisitos legais utilizados pelo Tribunal de origem para a constatação da prescrição aquisitiva, especificamente o prazo legal (art. 551 do CC/1916) a ser aplicado na hipótese, uma vez que a presente ação foi proposta em 31/10/1995, o prazo legal utilizado pela Corte a quo foi o de 10 anos e a data considerada como termo inicial da posse dos réus 13/12/1983. - Tribunal a quo que não observa ter o legislador civilista de 1916, no artigo 551, previsto prazos de prescrição aquisitiva distintos para as hipóteses de estarem as partes ausentes (15 anos) ou presentes (10 anos). Necessidade de retorno dos autos ao Tribunal de origem para a verifi-cação da adequada ocorrência de prescrição aquisitiva relativa ao lote 10. 3. Recurso especial parcialmente provido para declarar incabível a aplicação da prescrição aquisitiva de ofício, com a consequente procedência da ação anulatória no tocante ao lote 9, e, relativamente ao lote 10, determinar o

Page 126: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

126

retorno dos autos ao Tribunal de origem para que analise detidamente a efetiva ocorrência da prescrição aquisitiva alegada como matéria de defesa.(STJ - REsp: 1.106.809 RS 2008/0260795-5, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 03/03/2015, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/04/2015)

Por essas razões, nego provimento ao apelo. É como voto.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 578.251-PE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE LUNA FREIRE (CONVOCADO)Apelante: FAZENDA NACIONALApelado(a): DAMINY MARIA MACHADO MACIELRecte. Ades.: DAMINY MARIA MACHADO MACIELAdv./Proc.: DR. RODRIGO DE LUCENA ARAÚJO

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE TERCEIRO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. BEM DE PROPRIE-DADE DE TERCEIRO. DESCONSTITUIÇÃO DA PENHORA.- As partes têm o ônus de, para demonstrar a verdade dos fatos que alegam, diligenciar e reunir, elas próprias, elementos de prova para instrução dos autos. Daí a prescrição do art. 396 do CPC. Bem por isso, eventual requerimento de produção de prova que caiba à parte providenciar por si mesma deve ser indeferido, sob pena de delegar ao Judiciário atribuição que não é sua. - No caso concreto, o requerimento da Fazenda Nacional, o de ser requisitada a certidão vin-tenária do imóvel, foi acertadamente rejeitado, pois cabia a ela mesma providenciar o aludido documento e trazê-lo ao processo para compro-vação de eventual tese defensiva sua, como bem

Page 127: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

127

salientado pelo juízo a quo. Preliminar de cerce-amento de defesa rejeitada, à vista, inclusive, do documento (posteriormente juntado aos autos), que não aproveita à comprovação da alegação de fraude fiscal.- O bem constrito judicialmente, na Execução Fiscal, pertence a terceiro, cuja posição de pro-prietário foi adquirida de pessoa alheia àquele processo de cobrança, conforme dá conta o conjunto probatório dos autos. Do mesmo modo, à vista da cadeia dominial do imóvel penhorado, não se constata qualquer anterior proprietário que tenha ligação com aquela Execução Fiscal. Portanto, sendo o bem comprovadamente de ter-ceiro e ausente qualquer indício de fraude fiscal, há de ser desfeita a penhora sobre o imóvel.- Majoração da verba honorária para R$ 3.000,00, tendo em vista notadamente o art. 20, §§ 3º, c, e 4º, do CPC e a jurisprudência desta Turma.- Remessa obrigatória e apelação da Fazenda Na-cional a que se nega provimento. Apelação adesi-va da embargante a que se dá parcial provimento.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira Turma do egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento à ape-lação da Fazenda Nacional e à remessa obrigatória e dar parcial provimento à apelação adesiva, nos termos do relatório e voto constantes dos autos que integram o presente julgado.

Recife, 30 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE LUNA FREIRE - Relator Convocado

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE

LUNA FREIRE (Convocado):

Page 128: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

128

Trata-se de apelação cível em embargos de terceiro ajuizados por Daminy Maria Machado Maciel contra a Fazenda Nacional, cuja pretensão consiste em que seja desconstituída a penhora sobre o bem imóvel nos Autos da Execução Fiscal nº 000626-68.2011.4.05.8306.

Na petição inicial, sustenta-se, em síntese, que a embargante é proprietária do imóvel penhorado, na Execução Fiscal, por força de escritura pública de doação lavrada e registrada perante o Cartório Figueiredo Dornelas Serviço Notarial e Registral da Comarca de Cabedelo/PB. Nessa linha, alega-se que o imóvel foi adquirido, em 22.10.2001, através do doador, José da Costa Diniz, o qual não é parte no processo de execução fiscal. Subsidiariamente, assevera-se que o imóvel constrito judicialmente é bem de família, nos termos da Lei nº 8.009/90.

No final da exordial, requerem-se, entre outros pedidos, o be-nefício da assistência judiciária gratuita, a suspensão do processo principal e a concessão de liminar para determinar a revogação da penhora que recaiu sobre o imóvel ora embargado.

A petição inicial veio acompanhada dos documentos de fls. 18-233.

A decisão de fls. 235-236 deferiu o pedido de justiça gratuita, mas não concedeu o pedido de antecipação de tutela e a suspen-são das execuções fiscais apensas.

Às fls. 245-246, a embargante noticiou a interposição de agravo de instrumento, nos termos do art. 526 do CPC1.

Comunicação da decisão proferida, nos autos do agravo de instrumento, negando a atribuição de efeito suspensivo ativo ao recurso às fls. 271-273.

Citada, a Fazenda Nacional apresentou impugnação à fl. 275, requerendo fosse “oficiado o cartório de Figueiredo Dornela Serviço

1 Art. 526. O agravante, no prazo de 3 (três) dias, requererá juntada, aos autos do processo de cópia da petição do agravo de instrumento e do comprovante de sua interposição, assim como a relação dos documentos que instruíram o recurso.

Parágrafo único. O não cumprimento do disposto neste artigo, desde que arguido e provado pelo agravado, importa inadmissibilidade do agravo.

Page 129: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

129

Notarial e Registral da Comarca de Cabedelo/PB, a fim de informar (...) quanto à certidão narrativa vintenária do bem imóvel situado à Rua Vitória, nº 57, desse município, com o propósito de elucidar a questão da procedência do imóvel quanto a seu outorgante”.

O despacho de fl. 276 indeferiu o requerimento da embargada, sob o fundamento de que cabe a ela “diligenciar no sentido de reu-nir elementos para a sua defesa. Não parece razoável, portanto, que o embargado queira transferir ao Poder Judiciário um ônus que é só seu”.

Às fls. 279-285, a Fazenda Nacional apresentou nova impug-nação, requerendo fossem julgados improcedentes os pedidos deduzidos na exordial.

O Juízo a quo proferiu a sentença de fls. 288-290, que julgou procedente o pedido formulado nos embargos de terceiro, decla-rando cancelada a penhora do bem imóvel em litígio, e condenou a embargada em honorários advocatícios no valor de R$ 2.000,00.

Entendeu, em suma, o Magistrado de primeiro grau que “a embargante recebeu por doação o imóvel penhorado nos autos do executivo fiscal, em 22/10/2001. Na escritura pública carreada aos autos (fl. 27) consta como outorgante doador, o Sr. José da Costa Diniz, que é pessoa estranha à sociedade executada, de acordo com o contrato social e alterações (fls. 90/114)”. Ao final, ainda considerou ser “desnecessária a providência requerida pela embargada à fl. 275, para oficiar ao Cartório de Registro de Imó-veis de Cabedelo/PB, vez que (...) o outorgante doador é pessoa estranha à sociedade empresarial”, e não se antevia “como poderia a certidão vintenária da matrícula do imóvel subsidiar a tese da embargada, de manutenção da penhora requestada”.

Às fls. 325-336, a Fazenda Nacional interpôs recurso de ape-lação. Em suas razões recursais, a apelante sustenta, preliminar-mente, a ocorrência de cerceamento de defesa, em razão de ter sido indeferido o seu requerimento para ser juntada aos autos a certidão vintenária do imóvel embargado. Ainda, alega que houve violação ao art. 333, caput, I, do CPC2, pois não há prova de não ter

2 Art. 333. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

Page 130: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

130

existido fraude na doação do bem à embargante/apelada. Nessa linha, salienta que “não se sabe a quem pertencia o imóvel antes da doação, quem é o doador, JOSÉ DA COSTA DINIZ, por que fez a doação, se houve algum ato alienatório depois da doação, etc.” e, ainda, que “a doação é de 22.10.2001 e a execução fiscal é de 04.07.2001”.

Já no mérito, assevera que não há provas de que o imóvel penhorado é bem de família. Nesse contexto, aduz que não existem, nos autos, elementos demonstrando o imóvel ser o único de propriedade da embargante e a sua entidade familiar o utilizar como residência permanente.

Contrarrazões às fls. 341-351, requerendo o não provimento do recurso de apelação e trazendo, em anexo, a certidão vintenária do imóvel.

Recurso adesivo interposto às fls. 354-367, no qual Daminy Maria Machado Maciel requer a majoração da verba honorária fixada na sentença.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE

LUNA FREIRE (Relator Convocado):

Remessa obrigatória tida por interposta, à vista do art. 475 do CPC3.

Primeiramente, aprecio a preliminar de cerceamento de defesa. De acordo com a apelante, houve violação ao contraditório e à

II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Parágrafo único. É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:

I - recair sobre direito indisponível da parte;II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.

3 Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença: (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)

Page 131: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

131

ampla defesa, em razão de ter sido indeferido o requerimento de requisição da certidão vintenária do bem embargado ao registro imobiliário.

Como se sabe, não há direito absoluto à produção de prova. Ao juiz, enquanto destinatário da prova, compete-lhe indeferir, à vista do conjunto probatório dos autos e do meio de prova que os fatos exigem, as diligências as quais considerar inúteis, desnecessárias ou inadequadas para a investigação da verdade das alegações fáticas das partes, consoante art. 130 do CPC4.

Por outro lado, as partes têm o ônus de, para demonstrar a verdade dos fatos que alegam, diligenciar e reunir, elas próprias, elementos de prova para instrução dos autos. Daí a prescrição do art. 396 do CPC5. Bem por isso, eventual requerimento de produção de prova que caiba à parte providenciar por si mesma deve ser indeferido, sob pena de delegar ao Judiciário atribuição que não é sua.

I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público; (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)

II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI). (Redação dada pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)

§ 1° Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los. (Incluído pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)

§ 2° Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execu-ção de dívida ativa do mesmo valor. (Incluído pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)

§ 3º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença esti-ver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente. (Incluído pela Lei nº 10.352, de 26.12.2001)

4 Art. 130. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias.

5 Art. 396. Compete à parte instruir a petição inicial (art. 283), ou a resposta (art. 297), com os documentos destinados a provar-lhe as alegações.

Page 132: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

132

No caso concreto, o requerimento da Fazenda Nacional, o de ser requisitada a certidão vintenária do imóvel, foi acertadamente rejeitado, pois cabia a ela mesma providenciar o aludido docu-mento e trazê-lo ao processo para comprovação de eventual tese defensiva sua, como bem salientado pelo Juízo a quo (fl. 276).

De qualquer forma, por ocasião das contrarrazões, a embar-gante/apelada trouxe a certidão vintenária aos autos (fl. 352). Tal documento, como se verá, em nada aproveita à embargada/apelante na comprovação de sua tese de possível fraude na transferência do bem. Deste modo, por mais esta razão, sendo a prova então requerida inútil ao processo, não há de falar-se em cerceamento de defesa.

Pois bem. Rejeitada a preliminar, passo ao mérito.

O conjunto probatório dos autos dá conta de o imóvel penho-rado na Execução Fiscal nº 0000626-68.2011.4.05.8306 ser de propriedade da embargante/apelada, a qual o recebeu, por meio de doação, de José da Costa Diniz, pessoa estranha àquele pro-cesso de cobrança6. Do mesmo modo, à vista da cadeia dominial do imóvel7, não se constata qualquer anterior proprietário que tenha ligação com aquela execução fiscal.

Portanto, sendo o bem comprovadamente de terceiro e au-sente qualquer indício de fraude fiscal, nos termos do art. 185 do CTN8, há de ser desfeita a penhora que recai sobre o imóvel, como acertadamente sentenciado pelo Juízo a quo.

Por fim, no tocante à majoração da verba honorária, requerida no apelo adesivo da embargante, penso que merece prosperar.

6 V. escritura pública à fl. 27.

7 V. certidão vintenária à fl. 352.

8 Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa. (Redação dada pela LCP nº 118, de 2005)

Parágrafo único. O disposto neste artigo não se aplica na hipótese de terem sido reservados, pelo devedor, bens ou rendas suficientes ao total pagamento da dívida inscrita. (Redação dada pela LCP nº 118, de 2005)

Page 133: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

133

Fixo, então, os honorários advocatícios em R$ 3.000,00, tendo em vista notadamente o art. 20, §§ 3º, c, e 5º, do CPC e a juris-prudência desta Turma.

Isto posto, nego provimento à remessa obrigatória e à apela-ção da Fazenda Nacional e dou provimento parcial à apelação da embargante para fixar a verba honorária em R$ 3.000,00.

É o meu voto.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 579.523-CE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE MEN- DONÇA CANUTO (CONVOCADO)Apelante: MUNICÍPIO DE FORTALEZA (CE)Apelados: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E INSTITUTO BRA- SILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMARepte.: PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª RE- GIÃOAdvs./Procs.: DRS. LUCÍOLA MARIA DE AQUINO CABRAL E OU- TROS (APTE.)

EMENTA: AÇÃO CIVIL PÚBLICA. DANO AMBIEN-TAL. PER RELATIONEM. APLICAÇÃO. IMÓVEL CONSTRUÍDO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PER-MANENTE (ÁREA ESTUARINA). MUNICÍPIO DE FORTALEZA/CE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. FISCALIZAÇÃO EM ÁREA DE PERÍMETRO URBA-NO. DANO. FATO INCONTROVERSO. CONDENA-ÇÃO. POSSIBILIDADE. DEMOLIÇÃO DO IMÓVEL COM RETIRADA DO MORADOR. INSERÇÃO EM PROGRAMA DE HABITAÇÃO POPULAR. MULTA. REDUÇÃO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONA-LIDADE. PRECEDENTES. - É firme a jurisprudência da nossa Suprema Corte no sentido de que a motivação referen-ciada (per relationem) não constitui negativa de prestação jurisdicional, tendo-se por cumprida a

Page 134: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

134

exigência constitucional da fundamentação das decisões judiciais.- Ação civil pública proposta pelo Ministério Pú-blico Federal contra Antônio Augusto de Melo Luz e Município de Fortaleza, julgada procedente a lide, que restou por condenar o município a: i) providenciar a retirada do ocupante irregular da área descrita na inicial, de forma imediata, e a sua inclusão em um dos programas de habitação popular pela prefeitura administrados; ii) demolir qualquer construção que exista na área descrita na inicial, com a recomposição da área com o replantio da vegetação nativa; e iii) ao pagamento de multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), que deverão ser direcionados ao Fundo Federal de Defesa e Reparação de Interesses Difusos Lesados (Lei 9.240/95).- É fato incontroverso de que houve o dano, visto que não se nega sua ocorrência, onde apenas se busca eximir-se da responsabilidade. Cabe ao município, em suas atribuições constitucio-nais e legais, fiscalizar as áreas de preservação ambiental inseridas em seu perímetro urbano. Precedentes.- O Município de Fortaleza não cumpriu o dever de fiscalizar a ocupação e uso do solo urbano, permitindo a ocupação irregular de área de prote-ção permanente, e mesmo depois de provocado, o ente municipal manteve-se inerte.- Não obstante a manutenção da condenação do município por ocorrência de dano ambiental, a sentença deve ser modificada em relação ao va-lor arbitrado. Por se tratar de imóvel de pequena dimensão, levando-se em conta a área de preser-vação, bem como os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, o novo valor da multa deverá ser de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Manutenção da sentença em seus demais termos.- Apelação e remessa oficial parcialmente providas.

Page 135: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

135

ACÓRDÃO

Vistos etc., decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e à remessa oficial, nos termos do relatório, voto e no-tas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 23 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE MENDONÇA CANUTO - Relator Convocado

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE

MENDONÇA CANUTO (Convocado):

Trata-se de apelação interposta em face da sentença 196/200, da lavra do MM. Juiz da 5ª Vara/CE, que nos autos da presente ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal contra Antônio Augusto de Melo Luz e Município de Fortaleza, julgou procedente a lide, a fim de condenar o município a: i) providenciar a retirada do ocupante irregular da área descrita na inicial, de forma imediata, e a sua inclusão em um dos programas de habitação popular pela prefeitura administrados; ii) a demolir qualquer construção que exista na área descrita na inicial, com a recomposição da área com o replantio da vegetação nativa; e iii) ao pagamento de multa de R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), que deverão ser direcionados ao Fundo Federal de Defesa e Reparação de Interesses Difusos Lesados (Lei 9.240/95).

O município apresentou recurso de apelação contra r. sentença em que alega haver realizado fiscalização ostensiva na área invadi-da, afastando-se a tese de que tenha sido omisso no cumprimento do seu dever de fiscalizar. Por outro lado, aduz que a área pertence ao patrimônio estadual, o que afastaria sua responsabilidade em responder pelos danos causados pela invasão realizada pelo par-ticular, devendo-se, pois, chamar à lide do ente estadual.

Reverbera pela nulidade da sentença diante do julgamento antecipado da lide, por entender que há necessidade de realizar perícia no intuito de se constatar se o imóvel se encontra em área

Page 136: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

136

de preservação, do Estado ou do município, e estando, se houve dano e sua extensão. Por fim, aduz que a sentença é extra petita, por não ter havido pedido expressos acerca das condenações que lhes foi imposta, bem como a multa se apresenta excessiva, pres-supondo ser uma multa coercitiva (astreintes), no sentido de coagir o município em cumprir o determinado na sentença. A imposição de inclusão do outro réu em programa de habitação entende ser abusiva devido ao fato de não ser observado os requisitos formais para inclusão no programa de habitação municipal.

Foram apresentadas contrarrazões em que se traz preliminar de intempestividade do recurso, por ausência de ratificação, depois de julgados os embargos de declaração. No mérito apenas pugna pela manutenção da sentença por seus próprios fundamentos.

Parecer do Parquet Federal com representação nesta Corte, pela manutenção da sentença.

Conclusos os autos determinei sua inclusão em pauta.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE

MENDONÇA CANUTO (Relator Convocado):

Antes de adentrar no mérito aprecio a preliminar de intempes-tividade do apelo da prefeitura.

É o caso de se rejeitar a preliminar visto que tal regra somente se aplica em relação aos nominados recursos extremos, quais sejam, recurso especial e extraordinário, na hipótese em que apenas estes dois têm como pressuposto de admissibilidade o esgotamento das vias ordinárias. Precedente desta Corte: (PJe: 08026569020134058300, APELREEX/PE, RELATOR: DESEM-BARGADOR FEDERAL ÉLIO WANDERLEY DE SIQUEIRA FILHO (CONVOCADO), Terceira Turma, JULGAMENTO: 09/04/2015)

Acerca da preliminar de incompetência da Justiça Federal para processar e julgar o presente também se encontra superada visto que estando presente o interesse do IBAMA em figurar na lide no polo ativo na condição de litisconsorte, sendo a hipótese de se rejeitar a preliminar.

Page 137: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

137

É firme a jurisprudência da nossa Suprema Corte no sentido de que a motivação referenciada (per relationem) não constitui nega-tiva de prestação jurisdicional, tendo-se por cumprida a exigência constitucional da fundamentação das decisões judiciais.

Na hipótese, a sentença vergastada apresenta-se escorreita ao condenar o Município de Fortaleza/CE pelo dano ambiental em tela, visto que em se tratando de dano ambiental a responsabilidade é objetiva, ou seja, aquele que direta ou indiretamente tenha contri-buído para sua ocorrência, independentemente de comprovação do elemento subjetivo.

É fato incontroverso de que houve o dano, visto que não se nega sua ocorrência, onde apenas se busca eximir-se da responsa-bilidade. Cumpre ao município, em suas atribuições constitucionais e legais, fiscalizar as áreas de preservação ambiental inseridas em seu perímetro urbano, que por tais razões, quanto aos fundamentos para sua condenação, devem ser mantidos, conforme se lê.

Portanto, adoto a sentença como razões de decidir em sua integralidade em relação ao mérito:

Quanto à inclusão do Estado do Ceará no polo passivo, não há motivação para que ocorra. O dano não foi em unidade de conservação pelo aludido ente criada, mas na área de desembocadura do Rio Cocó (área estuarina), no bairro Caça e Pesca, no Município de Fortaleza.Passo ao mérito.O dano indicado na inicial é manifesto, assim como a sua autoria.O promovido ANTÔNIO AUGUSTO DE MELO LUZ ocupa área de preservação permanente, na área de desembo-cadura do Rio Cocó (área estuarina), no bairro Caça e Pesca, no Município de Fortaleza. Conforme o Laudo Técnico 037/07 - NLA/SUPES/IBAMA/CE, nos autos às folhas 19 a 23, em 25 de abril de 2007 foi constada a ocu-pação indevida e oficiado ao Município de Fortaleza para a adoção das providências pertinentes, como responsável pelo uso e ocupação do solo no município.Persistindo a inércia do ente municipal, a ocupação não foi retirada, o que ocasionou a lavratura do auto de infra-ção 343694, do IBAMA, cuja cópia, inclusive de todo o procedimento administrativo, consta às folhas 107 a 172

Page 138: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

138

dos autos, sendo demonstrada a construção em solo não edificável, por constituir área de proteção permanente. Nos autos do procedimento administrativo antes referido consta cópia de ofício dirigido ao então Secretário Mu-nicipal de Meio Ambiente e Controle Urbano - SEMAM, Deodato José Ramalho Júnior, datado de 1º de junho de 2010, solicitando a adoção de providências.É sabido, em conformidade com as decisões mais re-centes do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que a obrigação de reparar o dano deve ser a mais ampla possível, alcançando inclu-sive o Poder Público que tenha sido omisso no dever de fiscalizar.É exatamente a hipótese dos autos. O Município de Fortaleza não cumpriu o dever de fiscalizar a ocupação e uso do solo urbano, permitindo a ocupação irregular de área de proteção permanente. Observe-se que mesmo depois de provocado o ente municipal manteve-se inerte.Assim, impõe-se a sua condenação a providenciar a desocupação do imóvel erigido em área de proteção permanente - APP e o pagamento de pena de multa, pela inércia no dever de fiscalizar.O promovido ANTÔNIO AUGUSTO DE MELO LUZ, hipossuficiente, ocupa irregularmente área de proteção permanente, em que construiu a sua morada e de sua família. Injustificada a sua permanência, o que impõe a sua imediata retirada, contudo, deve o promovido ser incluído em um dos programas de habitação popular da Prefeitura Municipal de Fortaleza, como meio de efetiva-ção do direito à moradia, de sede constitucional. (original sem destaque)Presentes os requisitos autorizadores de concessão, antecipo os efeitos da tutela, a fim de determinar que o Município de Fortaleza providencie a retirada imediata do promovido ANTÔNIO AUGUSTO DE MELO LUZ da área ocupada e o inclua em um de seus programas de habitação popular.

A corroborar o entendimento aqui explicitado trago à colação precedentes deste Regional:

DIREITO AMBIENTAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONS-TRUÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. APELAÇÃO CONTRA SENTENÇA QUE JULGOU PRO-

Page 139: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

139

CEDENTE A DEMANDA. INQUESTIONÁVEL AFRONTA À LEI DE REGÊNCIA. DANO AMBIENTAL CONFIGURADO.- Responsabilidade objetiva do proprietário do imóvel, apesar da existência de licenciamento concedido pela prefeitura do município. Ato administrativo revestido de nulidade. Responsabilidade solidária e objetiva do ente municipal. Condenação dos réus à demolição da edificação e ao replantio da vegetação natural da área degradada. Manutenção do decisum a quo. - Apelações desprovidas.(PROCESSO: 00044905320114058100, AC 565.229/CE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZA-RO GUIMARÃES, Quarta Turma, JULGAMENTO: 21/10/2014, PUBLICAÇÃO: DJe 30/10/2014 - Página 238)

DIREITO AMBIENTAL. CONSTRUÇÃO IRREGULAR DE IMÓVEL. ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDÁRIA DE TODOS OS ENVOLVIDOS. ALEGAÇÃO DE OMISSÃO DO DNOCS EM FISCALIZAR A OCUPAÇÃO DO IMÓVEL BEM COMO DE TOMAR PROVIDÊNCIAS NO SENTIDO DE REAVÊ-LO. LEGITIMIDADE PARA FIGURAR NO POLO PASSIVO DA AÇÃO AJUIZADA PELO MPF. 1. A Constituição Federal e a Lei 6.938/81 dispõem que a responsabilidade pelo dano ambiental não depende da verificação de culpa (responsabilidade objetiva). 2. A responsabilidade pelo dano ambiental é solidária. Ocorrendo a infração ambiental, todos os responsáveis, seja por ação ou omissão, sejam estas dolosa ou culposa, responderão pela reparação do dano causado. 3. Sendo objetiva e solidária a responsabilidade pelo dano ambiental, na defesa do meio ambiente não basta aos órgãos públicos e as entidades administrativas adotarem comportamentos ativos e omissivos neutros, insuficientes para reparar e precaver danos ambientais. É necessário que executem tarefas de sua responsabilidade direciona-das sempre à reparação ou à proteção mais adequada, mais eficaz possível, do meio ambiente. 4. Haverá responsabilidade ambiental solidária do ente público quando conceder licença ambiental (ação) a qualquer atividade vedada pela legislação ambiental ou quando se omitir (omissão) em adotar providência para impedir a invasão de área de proteção ambiental.

Page 140: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

140

5. A decisão agravada pontuou, adequadamente, que a negligência do DNOCS em não fiscalizar a forma de utilização do imóvel durante o prazo da concessão bem como a sua omissão em não adotar as medidas voltadas a reaver o imóvel ocupado teria contribuído para a con-figuração do dano ambiental. 6. Legitimidade do DNOCS para ocupar o polo passivo da relação processual. 7. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (PROCESSO: 00064693220134050000, AG 133.034/PB, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉ-RIO FIALHO MOREIRA, Quarta Turma, JULGAMENTO: 05/11/2013, PUBLICAÇÃO: DJe 07/11/2013 - Página 439)

Não obstante a manutenção da condenação do município por ocorrência de dano ambiental, a sentença deve ser modificada em relação ao valor arbitrado. Por se tratar de imóvel de pequena dimensão levando-se em conta a área de preservação, bem como os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, o novo valor da multa deverá ser de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Posto isto, dou parcial provimento ao apelo do município e à remessa oficial, apenas para diminuir a multa para o montante de R$ 10.000,00 (dez mil reais), mantendo-se a sentença nos demais termos.

É como voto.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 579.788-SE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE OLI- VEIRA ERHARDTApelante: MARIA LÚCIA RIBEIRO MACIELApelada: UNIÃOAdvs./Procs.: DRS. JOSÉ LUIZ JABORANDY RODRIGUES FILHO E OUTROS (APTE.)

EMENTA: CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS MATERIAIS E MORAIS. DOENÇA OCUPA-CIONAL. LER - LESÃO POR ESFORÇO REPETITI-VO. AGRAVO RETIDO. NOVA PERÍCIA. DISPEN-

Page 141: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

141

SÁVEL. NEXO DE CAUSALIDADE INEXISTENTE. AUSÊNCIA DO DEVER DE INDENIZAR.- A apelação insurge-se contra a decisão proferi-da pelo juízo de primeiro grau que julgou impro-cedente o pedido de indenização moral e material supostamente decorrentes de doença profissio-nal. Em preliminar, agravo retido interposto com o fim de reformar a decisão interlocutória que indeferiu a arguição de suspeição do perito e o pedido de nova perícia, bem como a realização de audiência para oitiva de testemunhas. Juízo de retratação quanto ao pedido de prova teste-munhal. Em relação à arguição de suspeição do perito e pedido de nova perícia, tem-se por não caracterizada a suspeição visto não ter sido evidenciado nenhum dos motivos ensejadores dispostos no art. 135 do CPC.- Sobre o pedido de realização de nova perícia fundamentado no art. 437, CPC, os autos apre-sentam provas suficientes para o deslinde da questão, carreando provas documentais, tes-temunhal e pericial. Desprovida de utilidade a realização de nova perícia.- O deslinde da controvérsia reside na apreciação acerca da imparcialidade do laudo pericial e sua importância para fundamentar a questão, além da caracterização dos elementos que determinam a responsabilidade da União nos casos de LER/DORT.- Em que pese as discussões acerca da impar-cialidade do laudo pericial, ressalta-se que os elementos probatórios acostados são suficientes para o deslinde da questão e conduzir a análise acerca da responsabilidade de indenizar por parte da União.- A perícia médica prestou-se sobretudo a con-firmar os diagnósticos. Não se vislumbra que o resultado do laudo tenha sido contrário ao conjunto probatório, como alega a agravante/

Page 142: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

142

apelante, visto que reconhece a existência da lesão, acrescentando questionamentos sobre as possíveis causas.- Incontestável a existência da lesão a que a apelante é acometida, tem-se que os argumentos trazidos pelo perito acerca das causas da refe-rida lesão, não foram considerados essenciais na fundamentação da sentença. A circunstância de ter sido levantada, segundo o laudo, a possi-bilidade de recuperação da capacidade laboral da apelante, pouco influi na presente questão. Tal assertiva seria relevante se estivesse sendo discutida revisão da aposentadoria, o que não é o caso.- Considerando relativa a influência do resultado do laudo pericial no convencimento do juízo, além de reconhecer a imparcialidade do mesmo, decide-se pela legalidade do resultado pericial e, consequentemente, pela validade da sentença.- Da análise dos autos é possível extrair algumas premissas: a apelante é portadora de LER/DORT e por essa razão foi aposentada por invalidez em 2010; apesar de estar aposentada por invalidez pelo INSS e ter sido exonerada em março/2007, a apelante continuou vinculada ao plano de saúde do TRT 20ª Região, por força de decisão expedida no presente processo, até maio/2010 (reforma da decisão por agravo de instrumento).- Para a responsabilização por acidente de traba-lho, não basta a existência do dano (lesão) e da constatação de que a lesão foi provocada pelo esforço repetitivo do trabalho, faz-se necessária a prova de que a lesão tenha sido causada por culpa, evidenciada pela conduta negligente da apelada, ou seja, que reste demonstrado que a moléstia ocupacional tenha sido adquirida em razão de condutas impositivas forçadas ou pela falta de ações para proporcionar adequadas condições no ambiente de trabalho.

Page 143: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

143

- Oportuno destacar a postura do Tribunal com a segurança e bem estar dos seus servidores, demonstrados na expedição de normas proteto-ras. Constata-se que foram implantadas medidas preventivas nos postos de trabalho de todo o Tribunal, como a dinâmica da ginástica laboral, a distribuição de suportes para teclados e mouse para todos os servidores, além de ter instituído pausas de 10 minutos a cada período de 50 minu-tos de trabalho consecutivo (através da Portaria GP nº 226/2001). Desse modo, o órgão federal cumpriu com o seu dever legal previsto no art. 19, inciso I, da Lei nº 8.213/91, ao adotar medidas individuais e coletivas de proteção e segurança do trabalhador.- Prova testemunhal no sentido de que vários servidores exerciam as mesmas atividades da apelante, sem registros de que algum fora aco-metido de patologia semelhante.- Não há como se concluir que a aquisição da doença ocupacional da apelante decorreu das condições do ambiente de trabalho oferecidas e da falta de adoção de medidas preventivas às moléstias laborais. Daí suscitar-se que a apelante já tenha iniciado suas funções com predisposi-ção à referida moléstia.- Não havendo comprovação do nexo causal entre a conduta comissiva/omissiva do órgão federal e o resultado danoso (LER) que enseje em indenização para compor os danos suportados pela apelante, conclui-se pela manutenção da sentença impugnada.- Agravo retido e apelação improvidos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de AC 579.788-SE, em que são partes as acima mencionadas, acordam os Desem-bargadores Federais da Primeira Turma do TRF da 5ª Região, por maioria, em negar provimento ao agravo retido e à apelação,

Page 144: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

144

nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte do presente julgado.

Recife, 23 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE OLIVEIRA ERHARDT - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE

OLIVEIRA ERHARDT:

1. Trata-se de apelação interposta por MARIA LÚCIA RIBEIRO MACIEL, em face de sentença que julgou improcedente o pedido de reparação por danos decorrentes de acidente de trabalho.

2. A apelante pleiteia indenização por danos morais e materiais em razão de incapacidade decorrente das atividades exercidas no Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região, às fls. 996/1019.

3. Agravo retido contra decisão que indeferiu o pedido de realização de nova perícia, bem como a produção de prova teste-munhal, às fls. 888/896.

4. Contrarrazões ao agravo retido pela União, às fls. 912/917.

5. Juízo de retratação em relação à prova testemunhal, à fl. 923.

6. Contrarrazões à apelação pela União, às fls. 1024/1027.

7. É o que há de relevante para relatar.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE

OLIVEIRA ERHARDT (Relator):

1. A apelação insurge-se contra a decisão proferida pelo juízo de primeiro grau que julgou improcedente o pedido de indenização moral e material supostamente decorrentes de doença profissional.

2. Preliminarmente, admito o agravo retido interposto com o fim de reformar a decisão interlocutória que indeferiu a arguição de suspeição do perito e o pedido de nova perícia, bem como a realização de audiência para oitiva de testemunhas.

Page 145: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

145

3. No tocante ao pedido de prova testemunhal, o juízo de primeiro grau retratou-se, e abriu prazo para indicação do rol de testemunhas, tendo a agravante/apelante indicado 3 (três) nomes, desistindo posteriormente de uma delas. Foram ouvidas as demais.

4. Em relação à arguição de suspeição do perito e pedido de nova perícia, entendo não caracterizada a suspeição visto não ter sido evidenciado nenhum dos motivos ensejadores dispostos no art. 135 do CPC. Compulsando os autos, constata-se que houve a preclusão no que se refere à arguição de suspeição. Concordando com o entendimento do Juízo a quo, julgo não ser suficiente para demonstrar a parcialidade do perito o argumento de que o mesmo tem se posicionado, em um número substancial de perícias médicas realizadas, pela inexistência de doença e/ou de nexo causal em relação a acidentes de trabalho. Pelas razões expostas, rejeito o pedido incidental de suspeição do perito.

5. Sobre o pedido de realização de nova perícia por não se considerar suficientemente esclarecida a matéria (art. 437, CPC), entendo que os autos apresentam provas suficientes para o des-linde da questão, carreando provas documentais, testemunhal e pericial. Desse modo, não vislumbro a utilidade de realização de nova perícia.

6. O mérito da apelação fundamenta-se nos seguintes argu-mentos: (i) imprestabilidade do laudo pericial produzido em juízo, por suspeição do perito, com a necessidade de realização de nova perícia e a consequente declaração de nulidade da sentença; (ii) laudo pericial dissonante com os demais elementos de prova que residem nos autos.

7. Em confronto argumentativo, a União apresenta contrarra-zões alegando que: (i) pedido de suspeição do perito está precluso; (ii) capacidade profissional reconhecida não apenas pelo perito judicial, mas pelos peritos do INSS, os quais determinaram que a apelante voltasse ao trabalho, mas tal decisão foi contestada judicialmente; (iii) recuperação da capacidade laboral por parte da apelante, devendo a mesma ser readaptada; (iv) não demonstração do nexo causal entre as lesões e o trabalho desenvolvido no TRT; (v) a apelante não se desincumbiu de desconstituir as conclusões do perito judicial, fazendo sempre referência a documentos emi-tidos no passado.

Page 146: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

146

8. O deslinde da controvérsia reside na apreciação acerca da imparcialidade do laudo pericial e sua importância para fun-damentar a questão, além da caracterização dos elementos que determinam a responsabilidade da União nos casos de LER/DORT.

9. No tocante ao questionamento acerca da parcialidade do laudo pericial, constata-se que a impugnação ao perito por parte da apelante deu-se, principalmente, sob o fundamento de que “o perito tem a postura expressa de dizer claramente que ninguém está doente, não há incapacidade e a empresa não causou dano ao empregado” (fl. 388). O Juízo a quo considerou que tal justifica-tiva não era suficiente para justificar a nomeação de outro perito, e essa questão foi transitada em julgado. Contudo, após a conclusão do laudo pericial, a apelante impugnou o resultado pleiteando a realização de nova perícia, tendo sido negada.

10. Em que pese as discussões acerca da imparcialidade do laudo pericial, ressalto que as alegações em apreço vem demons-tradas também através de outros meios de prova, suficientes para conduzir a análise acerca da responsabilidade de indenizar por parte da União.

11. A perícia médica prestou-se a complementar as informa-ções e confirmar os diagnósticos, sobretudo no tocante ao estado da agravante/apelante na ocasião. Não se vislumbra que o resul-tado do laudo foi contrário ao conjunto probatório, como alega a agravante/apelante, visto que reconhece a existência da lesão, acrescentando questionamentos sobre as possíveis causas.

12. Portanto, incontestável a existência da lesão a que a ape-lante é acometida, tem-se que os argumentos trazidos pelo perito acerca das causas da referida lesão, confere ao laudo inferior peso probatório e persuasivo, na medida em que a avaliação foi efetuada mais de um ano após a aposentadoria da apelante. Diferente seria se a perícia fosse realizada durante o período laboral, apto a captar as lesões em possível estado de agravamento. A circunstância de ter sido levantada, segundo o laudo, a possibilidade de recupera-ção da capacidade laboral da apelante, pouco influi na presente questão. Tal assertiva seria relevante se estivesse sendo discutida revisão da aposentadoria, o que não é o caso.

Page 147: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

147

13. Por essas razões, considerando relativa a influência do re-sultado do laudo pericial no convencimento do juízo, além de estar convencido da imparcilidade do mesmo, decido pela legalidade do resultado pericial e, consequentemente, pela validade da sentença.

14. Da análise dos autos é possível extrair algumas premissas: a apelante é portadora de LER/DORT e por essa razão foi aposen-tada por invalidez em 2010; apesar de estar aposentada por inva-lidez pelo INSS e ter sido exonerada em março/2007, a apelante continuou vinculada ao plano de saúde do TRT 20ª Região, por força de decisão expedida no presente processo, até maio/2010 (reforma da decisão por agravo de instrumento).

15. Atente-se que, para a responsabilização por acidente de trabalho, não basta a existência do dano (lesão) e da constatação de que a lesão foi provocada pelo esforço repetitivo do trabalho, faz-se necessária a prova de que a lesão tenha sido causada por culpa, evidenciada pela conduta negligente da apelada, ou seja, que reste demonstrado que a moléstia ocupacional tenha sido adquirida em razão de condutas impositivas forçadas ou pela falta de ações para proporcionar adequadas condições no ambiente de trabalho.

16. Oportuno destacar a postura do Tribunal com a segurança e bem estar dos seus servidores, demonstrados na expedição de normas protetoras. Constata-se que foram implantadas medidas preventivas nos postos de trabalho de todo o Tribunal, como a dinâ-mica da ginástica laboral, a distribuição de suportes para teclados e mouse para todos os servidores, além de ter instituído pausas de 10 minutos a cada período de 50 minutos de trabalho consecutivo (através da Portaria GP nº 226/2001). Desse modo, o órgão federal cumpriu com o seu dever legal previsto no art. 19, inciso I, da Lei nº 8.213/91, ao adotar medidas individuais e coletivas de proteção e segurança do trabalhador.

17. Da prova testemunhal extrai-se que vários servidores exerciam as mesmas atividades da apelante, sem registros de que algum fora acometido de patologia semelhante. Registre-se que as funções por ela praticadas estão inseridas na atividade fim do TRT, havendo um número considerável de servidores que exercem as mesmas atividades sem que haja um clamor quanto a essa questão.

Page 148: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

148

18. Portanto, não há como se concluir que a aquisição da do-ença ocupacional da apelante decorreu das condições do ambiente de trabalho oferecidas e da falta de adoção de medidas preventivas às moléstias laborais. Daí suscitar-se que a apelante talvez já tenha iniciado suas funções com predisposição à referida moléstia. Trago à colação recente julgado que expõe o entendimento dessa Corte em situação semelhante:

ADMINISTRATIVO. ENFERMEIRA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LER - LESÃO POR ESFORÇO RE-PETITIVO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.I - Cuida-se de ação ordinária ajuizada contra a FIOCRUZ, objetivando receber pensão vitalícia, a título de indeniza-ção por danos materiais, além de danos morais, em razão da perda de sua capacidade laborativa.II - No caso dos autos, a autora já recebe aposentadoria por invalidez, decorrente da sua incapacidade para o trabalho, não sendo cabível se falar em indenização por danos materiais, vez que esta aposentadoria já possui natureza indenizatória.III - No tocante aos danos morais caso, em face do conjunto probatório constante nos autos, os transtornos decorrentes do trabalho desempenhado na função de enfermeira, acrescido das atividades relativas a empurrar macas, ou carregar algum equipamento do hospital, como balões de oxigênio, por si só, não ensejam responsabili-zação por dano moral.IV - Ressalte-se, ainda, que dos documentos acostados aos autos, conclui-se que o agravamento da enfermidade que acometeu a apelante, LER - Lesão por Esforço Re-petitivo, não se deu em razão da atividade que a autora alega ter desempenhado indevidamente.V - Apelação improvida. (AC 515.430/SE, Tribunal Regional Federal - 5ª Região, Quarta Turma, Rel.: Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho (Convocado), DJe 22/01/2015, decisão unânime)

19. Dessa maneira, não havendo comprovação do nexo causal entre a conduta comissiva/omissiva do órgão federal e o resultado danoso (LER) que enseje em indenização para compor os danos suportados pela apelante, conclui-se pela manutenção da sentença impugnada.

Page 149: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

149

20. Pelo exposto, nego provimento à apelação.

21. É como voto.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 580.073-SE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIORApelante: MJS COMERCIAL DE MÓVEIS LTDA.Apelada: FAZENDA NACIONALAdvs./Procs.: DRS. GILBERTO VIEIRA LEITE NETOL, ISABELLA CARVALHO MAGALHÃES, ALEXSANDRO MONTEI- RO MELO, PABLO FERNANDES ARAUJO HARD- MAN E MAÍRA MAYNART DE OLIVEIRA FRANCO (APTE.)

EMENTA: TRIBUTÁRIO. REQUISITO DE VALI-DADE DA CDA. CONTRIBUIÇÕES PREVIDEN-CIÁRIAS. INCRA. EMPRESA URBANA: TEMA JULGADO SEGUNDO O REGIME DE RECURSOS REPETITIVOS. APELAÇÃO IMPROVIDA.- No tocante à contribuição para o custeio do INCRA, conforme se depreende do julgamento proferido no Recurso Especial nº 977.058/RS, de relatoria do Ministro LUIZ FUX, publicado no DJe de 10/11/2008, submetido ao regime dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o adicional de 0,2% destinado ao INCRA é plenamente exigí-vel, tendo inequívoca natureza de contribuição especial de intervenção no domínio econômico, não tendo sido extinta pelas Leis n° 7.787/89, 8.212/91 e 8.213/91, sendo perfeitamente exigível das empresas urbanas.- A multa sub examine fora alçada ao patamar de 20% (vinte por cento), o que não configura, nem de longe, o desacerto da sentença fustigada, quer seja no âmbito da violação ao princípio do não

Page 150: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

150

confisco, tampouco através de suposto maltrato ao princípio da razoabilidade.- A Taxa SELIC é legítima como índice de corre-ção monetária e de juros de mora, na atualização dos débitos tributários pagos em atraso, ex vi do disposto no artigo 13 da Lei 9.065/95. (REsp 1.073.846/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/11/2009, DJe 18/12/2009 - sujeito ao regime previsto no art. 543-C do CPC.- A alegação de incerteza e iliquidez da dívida, pela inexistência dos requisitos legais aptos a legitimar a CDA que instrumentaliza o execu-tivo fiscal, está pautada em meras afirmações genéricas, inábeis, de conseguinte, para afastar a higidez do referido título. Igualmente, verifico que o STJ consagrou o entendimento, em sede de recurso representativo de controvérsia, se-gundo o qual não é necessário o discriminativo de cálculo do valor que se reputa devido nos executivos fiscais, tendo em vista que a LEF dis-põe expressamente quais os requisitos a serem observados na CDA, sendo inaplicável o art. 614, II, do CPC (AgRg nos EDcl no REsp 1.167.745/SC, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/05/2011, DJe 24/05/2011).- Apelação improvida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos do processo tombado sob o número em epígrafe, em que são partes as acima identifi-cadas, acordam os Desembargadores Federais da Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em sessão realizada nesta data, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas que integram o presente, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator.

Recife, 30 de junho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR - Relator

Page 151: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

151

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PE-

REIRA NOBRE JÚNIOR:

Cuida-se de apelação interposta por MJS COMERCIAL DE MÓVEIS LTDA. contra sentença que julgou improcedentes os embargos à execução, por considerar que a CDA preenchia todos os requisitos legais, assim como a higidez quanto à exigibilidade para o INCRA.

Em suas razões recursais, assevera a apelante que a certidão da dívida ativa não contém todos os requisitos formais a que se refere o art. 2º, § 5º, da Lei nº 6.830, de 22 de setembro de 1980.

Ressalta ser ilegal a cumulação da SELIC com outro índice de correção monetária e juros de mora.

Aduz que a contribuição ao INCRA encontra-se eivada de ilega-lidade, uma vez que não poderia ser exigida das empresas urbanas, dado que tem por escopo o fomento rural e a reforma agrária.

Finaliza a sua exposição defendendo a ilegalidade das contri-buições previdenciárias de terceiros: SESI/SEST/SENAT.

Contrarrazões apresentadas pela Fazenda Nacional às fls. 200/210.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PE-

REIRA NOBRE JÚNIOR (Relator):

No tocante à contribuição para o custeio do INCRA, conforme se depreende do julgamento proferido no Recurso Especial nº 977.058/RS, de relatoria do Ministro LUIZ FUX, publicado no DJe de 10/11/2008, submetido ao regime dos recursos repetitivos, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que o adicional de 0,2% destinado ao INCRA é plenamente exigível, tendo inequívoca natureza de contribuição especial de interven-ção no domínio econômico, não tendo sido extinta pelas Leis n°

Page 152: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

152

7.787/89, 8.212/91 e 8.213/91, sendo perfeitamente exigível das empresas urbanas. Referido julgado está assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. TRIBUTÁ-RIO. CONTRIBUIÇÃO DESTINADA AO INCRA. ADICIO-NAL DE 0,2%. NÃO EXTINÇÃO PELAS LEIS 7.787/89, 8.212/91 E 8.213/91. LEGITIMIDADE.1. A exegese Pós-Positivista, imposta pelo atual estágio da ciência jurídica, impõe na análise da legislação infra-constitucional o crivo da principiologia da Carta Maior, que lhe revela a denominada “vontade constitucional”, cunhada por Konrad Hesse na justificativa da força nor-mativa da Constituição.2. Sob esse ângulo, assume relevo a colocação topográ-fica da matéria constitucional no afã de aferir a que vetor principiológico pertence, para que, observando o princípio maior, a partir dele, transitar pelos princípios específicos, até o alcance da norma infraconstitucional.3. A Política Agrária encarta-se na Ordem Econômica (art. 184 da CF/1988) por isso que a exação que lhe custeia tem inequívoca natureza de Contribuição de Intervenção Estatal no Domínio Econômico, coexistente com a Ordem Social, onde se insere a Seguridade Social custeada pela contribuição que lhe ostenta o mesmo nomen juris.4. A hermenêutica, que fornece os critérios ora eleitos, re-vela que a contribuição para o Incra e a Contribuição para a Seguridade Social são amazonicamente distintas, e a fortiori, infungíveis para fins de compensação tributária.5. A natureza tributária das contribuições sobre as quais gravita o thema iudicandum, impõe ao aplicador da lei a obediência aos cânones constitucionais e complementa-res atinentes ao sistema tributário.6. O princípio da legalidade, aplicável in casu, indica que não há tributo sem lei que o institua, bem como não há exclusão tributária sem obediência à legalidade (art. 150, I, da CF/1988, c/c art. 97 do CTN).7. A evolução histórica legislativa das contribuições rurais denota que o Funrural (Prorural) fez as vezes da seguri-dade do homem do campo até o advento da Carta neo--liberal de 1988, por isso que, inaugurada a solidariedade genérica entre os mais diversos segmentos da atividade econômica e social, aquela exação restou extinta pela Lei 7.787/89.

Page 153: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

153

8. Diversamente, sob o pálio da interpretação histórica, restou hígida a contribuição para o INCRA cujo desígnio em nada se equipara à contribuição securitária social.9. Consequentemente, resta inequívoca dessa evolução, constante do teor do voto, que: (a) a Lei 7.787/89 só suprimiu a parcela de custeio do Prorural; (b) a Previ-dência Rural só foi extinta pela Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, com a unificação dos regimes de previdência; (c) entretanto, a parcela de 0,2% (zero vírgula dois por cento) – destinada ao INCRA – não foi extinta pela Lei 7.787/89 e tampouco pela Lei 8.213/91, como vinha sendo proclamado pela jurisprudência desta Corte.10. Sob essa ótica, à míngua de revogação expressa e inconciliável a adoção da revogação tácita por incompa-tibilidade, porquanto distintas as razões que ditaram as exações sub judice, ressoa inequívoca a conclusão de que resta hígida a contribuição para o INCRA.11. Interpretação que se coaduna não só com a litera-lidade e a história da exação, como também converge para a aplicação axiológica do Direito no caso concreto, viabilizando as promessas constitucionais pétreas e que distinguem o ideário da nossa nação, qual o de constituir uma sociedade justa e solidária, com erradicação das desigualdades regionais.12. Recursos especiais do INCRA e do INSS providos.

Ressalte-se que a constitucionalidade da cobrança da referida contribuição vem sendo reiteradamente confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (Primeira Turma, AI-AgR 700.932, Rel. Min. CAR-MEN LÚCIA, DJe 06/02/2009; Segunda Turma, AI-AgR 700.833, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJe 03/04/2009; Segunda Turma, AI-AgR 663.176, Rel. Min. EROS GRAU, DJ 14/11/2007).

Por sua vez, cumpre advertir que as contribuições para o SESI/SEST/SENAT não estão contempladas na CDA que aparelha o executivo fiscal fustigado (fl. 46), não havendo interesse recursal a justificar o conhecimento do apelo, neste particular.

Noutro passo, pretende a apelante a reforma da sentença na parte que entendeu a aplicação da multa de forma razoável.

Sobre a matéria, não é de hoje que a seara da tributação contém repulsa a penalidades pecuniárias excessivas. Conforme se pode ver da Seção IX da Declaração de Direito do Bom Povo

Page 154: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

154

da Virgínia, de 16 de junho de 17761, antecedente próximo da independência norte-americana, cuja irrupção foi influenciada prin-cipalmente pelas injustiças tributárias impostas pelo Parlamento Britânico aos colonos, continha previsão no sentido de proibir as multas desproporcionais.

O tema encontrou desenvolvimento perante o Supremo Tribu-nal Federal, o qual analisa a matéria sob o colorido da vedação ao confisco. Nesse diapasão, compreendeu que não são justificáveis os percentuais de 100% (cem por cento), embora, contrariamente, tenha considerável como legítimos os percentuais de 20% (vinte por cento) e 30% (trinta por cento).

Vejamos. No Recurso Extraordinário 91.707-MG2, sob a vigên-cia da Constituição pretérita, restou mantida decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, a qual reduziu de 100% (cem por cento) para 30% (trinta por cento) a multa de mora incidente em cobrança de ICM, assentando o seu caráter confiscatório.

Noutra oportunidade, desenvolvida à luz da vigente Lei Básica, o Pretório Excelso julgou procedente a ADI 551-1-RJ3, para o fim de declarar a inconstitucionalidade dos §§ 2º e 3º do art. 57 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, os quais, respectivamente, previam o estabelecimento de multas de mora e por sonegação em patama-res não inferiores a duas e cinco vezes o valor do tributo devido.

Nesse aresto – é necessário que se enfatize – restou deline-ado um critério objetivo para a aferição da natureza confiscatória da multa, consistente na desproporção evidente entre a violação

1 De inegável importância para a história do Estado de Direito, o texto do referido documento dispunha: “Não podem ser exigidas cauções demasiado elevadas, aplicadas multas excessivas ou infligidas penas cruéis ou aberrantes”. Conferir versão para o português em Jorge de Miranda (Textos históricos do direito constitucional. Lisboa: Imprensa Nacional - Casa da Moeda, 1980, p. 33).

2 2ª Turma, v.u., rel. Min. Moreira Alves, DJU de 29-02-1980.

3 Pleno, v.u., rel. Min. Ilmar Galvão, DJU de 14-02-2003.

Page 155: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

155

da regra jurídica, qual seja o inadimplemento, a sonegação ou a fraude, frente ao montante da penalidade4.

Mais recentemente, o tema voltou à baila por ocasião do julgamento do Agravo Regimental no Agravo de Instrumento 523.471 - MG5, onde, com o acréscimo de pitadas de objetividade quanto às multas moratórias, ratificou-se o critério firmado pela jurisprudência, consistente em salientar que a mera referência à mora, de forma isolada, afigura-se insuficiente para respaldar uma

4 Interessante a leitura de passagem do voto do relator: “Assim, resta analisar se os limites mínimos estabelecidos pelos §§ 2º e 3º do art. 37 do ADCT flumi-nense para a fixação de multas têm, de fato, efeito confiscatório. Segundo tais dispositivos, as multas consequentes do não recolhimento de impostos e taxas não podem ser inferiores a duas vezes o seu valor e as decorrentes de sonegação não podem ser fixadas em menos de cinco vezes o valor do tributo. O eventual caráter de confisco de tais multas não pode ser dissociado da proporcionalidade que deve existir entre a validade da norma jurídica tributária e sua consequência jurídica, a própria multa. Desse modo, o valor mínimo de duas vezes o valor do tributo como consequência do não recolhimento apresenta-se desproporcional, atentando contra o patrimônio do contribuinte, em evidente efeito de confisco. Igual desproporção constata-se na hipótese de sonegação, na qual a multa não pode ser inferior a cinco vezes o valor da taxa ou imposto, afetando ainda mais o patrimônio do contribuinte. Configurada, assim, a contrariedade dos dispositivos impugnados com o inciso IV do art. 150 da Constituição Federal, o que desde logo permite a declaração de sua inconstitucionalidade, sem a necessidade de análise de possível vício formal, tal como apontado no julgamento cautelar”.

5 2ª Turma, v.u., rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe de 22-04-2010. Eis, para fins exemplificativos, a ementa que segue: “PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGI-MENTAL. CONSTITUTICIONAL. TRIBUTÁRIO. MULTA. VEDAÇÃO DO EFEITO DE CONFISCO. APLICABILIDADE. RAZÕES RECURSAIS PELA MANUTENÇÃO DA MULTA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO PRECISA DE PECULIARIDADE DA IN-FRAÇÃO A JUSTIFICAR A GRAVIDADE DA PUNIÇÃO. DECISÃO MANTIDA. 1. Conforme orientação fixada pelo Supremo Tribunal Federal, o princípio da vedação ao efeito de confisco aplica-se às multas. 2. Esta Corte já teve oportunidade de considerar multas de 20% a 30% do valor do débito como adequadas à luz do princípio da vedação do confisco. Caso em que o Tribunal de origem reduziu a multa de 60% para 30%. 3. A mera alusão à mora, pontual e isoladamente con-siderada, é insuficiente para estabelecer a relação de calibração e ponderação necessárias entre a gravidade da conduta e o peso da punição. É ônus da parte interessada apontar peculiaridades e idiossincrasias do quadro que permitiram sustentar a proporcionalidade da pena almejada. Agravo regimental ao qual se nega provimento”.

Page 156: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

156

relação de ponderação equilibrada entre a gravidade da conduta e o peso da punição. Por isso, com a negativa de provimento do referido agravo regimental, interposto pela União Federal, restou excluída, com base na vedação ao confisco, a multa moratória de 60% (sessenta por cento), prevista no art. 35 da Lei 8.212/91.

Volvendo-se ao caso concreto, penso que a jurisprudência do Pretório Excelso, acima mencionada, encontra inteira aplicação.

O pressuposto indispensável para o reconhecimento do caráter confiscatório reside na ausência de correspondência entre a falta supostamente perpetrada pelo contribuinte e o montante da multa.

No caso, a multa sub examine fora alçada ao patamar de 20% (v. CDA de fl. 47), o que não configura, nem de longe, o desacerto da sentença fustigada, quer seja no âmbito da violação ao princípio do não confisco, tampouco através de suposto maltrato ao princípio da razoabilidade.

No que diz respeito à utilização da taxa SELIC como índice de atualização de correção monetária e juros de mora, não assiste melhor sorte à apelante.

A Taxa SELIC é legítima como índice de correção monetária e de juros de mora, na atualização dos débitos tributários pagos em atraso, ex vi do disposto no artigo 13 da Lei 9.065/95. (REsp 1.073.846/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/11/2009, DJe 18/12/2009 – sujeito ao regime previsto no art. 543-C do CPC.

De outra banda, não há ilegitimidade na SELIC, conforme jurisprudência do STJ (AGA 1.114.509/MG, Segunda Turma, julg. em 07/05/2009, rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 27/05/2009, REsp 1.099.363/RS, Segunda Turma, julg. em 13/03/2009, rel. Min. ELIANA CALMON, DJe de 27/05/2009).

Portanto, a exigência da SELIC de maneira capitalizada, é válida, tendo a sua previsão na Lei 9.250/95, em seu art. 39.

Ao fim e ao cabo, observo que a alegação de incerteza e iliquidez da dívida, pela inexistência dos requisitos legais aptos a legitimar a CDA que instrumentaliza o executivo fiscal, está pauta-da em meras afirmações genéricas, inábeis, de conseguinte, para afastar a higidez do referido título.

Page 157: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

157

Igualmente, verifico que o STJ consagrou o entendimento, em sede de recurso representativo de controvérsia, segundo o qual não é necessário o discriminativo de cálculo do valor que se reputa devido nos executivos fiscais, tendo em vista que a LEF dispõe expressamente quais os requisitos a serem observados na CDA, sendo inaplicável o art. 614, II, do CPC:

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO RE-GIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. CERTIDÃO DE DÍVIDA ATIVA. CDA. REQUISITOS DE CERTEZA E LIQUIDEZ. APRESENTAÇÃO DE DEMONS-TRATIVOS DO DÉBITO. DESNECESSIDADE. PRECE-DENTE: RESP 1.138.202/ES. SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. EXCESSO NA EXECUÇÃO. SITUAÇÃO FÁTICA. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. TRIBUTOS FEDERAIS. ATUALIZAÇÃO MONETÁ-RIA. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC. RESP 1.111.175/SP. SISTEMÁTICA DO ART. 543-C DO CPC. MULTA E JU-ROS MORATÓRIOS. CUMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES.1. Não há falar em violação do art. 535 do CPC, pois o Tribunal local analisou as questões importantes para o deslinde da controvérsia.2. A decisão agravada está baseada na jurisprudência do STJ que, na sistemática do art. 543-C do CPC, quando do julgamento do REsp 1.138.202-ES, de relatoria do Min. Luiz Fux, ratificou posicionamento no sentido de que é desnecessária a apresentação do demonstrativo de cálculo, em execução fiscal, uma vez que a Lei 6.830/80 dispõe, expressamente, sobre os requisitos essenciais para a instrução da petição inicial e não elenca o de-monstrativo de débito entre eles. Inaplicável à espécie o art. 614, II, do CPC.3. Quanto à tese de excesso na execução, a Corte local consignou que “a contribuinte não apresentou as declarações anuais de ajuste do IRPF no prazo legal, e estas seriam o meio hábil a informar ao Fisco acerca de eventuais valores que deveriam ser deduzidos da base de cálculo. Portanto, o próprio comportamento da embargante deu causa ao lançamento do imposto por arbitramento, com os elementos disponíveis” (fl. 232).

Page 158: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

158

Revisar o entendimento firmado encontra óbice na Sú-mula 7/STJ. (AgRg nos EDcl no REsp 1.167.745/SC, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/05/2011, DJe 24/05/2011)

Com essas considerações, nego provimento à apelação.

É como voto.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 582.236-CE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMAApelante: CAIXA ECONÔMICA FEDERALApelado: FRANCISCO ANTÔNIO MENDES DE AZEVEDOParte R.: CAIXA SEGURADORA S/AAdvs./Procs.: DRS. MARIA ROSA DE CARVALHO LEITE NETA E OUTROS (APTE.), GERLANO ARAUJO PEREIRA DA COSTA (APDO.) E NEUMAYER DE SOUSA MAIA E OUTROS (PARTE R.)

EMENTA: CIVIL E PROCESSO CIVIL. VÍCIOS EM IMÓVEL. DANOS NÃO COBERTOS PELA APÓLI-CE. IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS FORMULA-DOS NA INICIAL. PROVIMENTO DA APELAÇÃO DA CEF.- A inicial narrou que, desde 2006, o imóvel adquiri-do com financiamento da Caixa Econômica Fede-ral teria apresentado problemas estruturais, de-correntes de falhas técnicas em sua construção (acontecida há mais de três décadas), pelo que o autor acionou a seguradora para cobertura do sinistro. Ante a negativa, ajuizou a presente ação contra a instituição bancária que intermediou a compra, bem como contra a própria seguradora, ao fim julgada parcialmente procedente pelo Juí-zo a quo (para reparação dos vícios na estrutura do imóvel, discriminados no laudo pericial) – há apelo apenas da CEF.

Page 159: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

159

- Segundo a Circular n° 111/2009 da Superinten-dência de Seguros Privados (SUSEP), na Cláu-sula 3ª (sobre as “Condições Particulares Para os Riscos de Danos Físicos”, fl. 90), os riscos cobertos “deverão ser decorrentes de causa ex-terna, assim entendidos os causados por forças atuantes de fora para dentro do prédio, ou sobre o solo ou subsolo em que o mesmo se acha edificado, lhe causem danos, excluindo-se, por conseguinte, todo e qualquer dano sofrido pelo prédio ou benfeitorias que seja causado por seus próprios componentes, sem que sobre eles atue qualquer força anormal”.- Tendo o perito judicial concluído que os danos encontrados não teriam essa natureza (fls. 313, final), exsurge clara, portanto, a inviabilidade da cobertura pretendida em juízo.- Caso em que a CEF, ademais, atuou como agen-te financeiro, oportunizando a construção e a aquisição do imóvel pelos mutuários, situação na qual deve responder – única e exclusivamente – pelas contendas relacionadas ao financiamento, consoante entendimento pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (REsp 897.045/RS). A fiscalização empreendida pelos agentes do banco tem o condão tão só de acompanhar o cronograma físico-financeiro das obras para liberação das parcelas do financiamento, jamais ensejando responsabilidade acerca do material utilizado ou da técnica de construção respectiva.- Provimento da apelação da CEF.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que fi-guram como partes as acima indicadas, decide a Segunda Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator e das notas taquigráficas, que passam a integrar o presente julgado.

Page 160: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

160

Recife, 1° de setembro de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLI-VEIRA LIMA - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBER-

TO DE OLIVEIRA LIMA:

Trata-se de apelação interposta pela CAIXA ECONÔMICA FE-DERAL contra sentença que, em ação ajuizada por FRANCISCO ANTONIO MENDES DE AZEVEDO, julgou parcialmente proce-dentes os pedidos formulados na inicial, determinando à apelante, bem como à CAIXA Seguradora S/A, também ré, a reparação dos vícios na estrutura do imóvel discriminados no laudo pericial.

A CEF alega julgamento extra petita e que inexistiria previsão legal ou contratual para a cobertura dos vícios decorrentes de construção do imóvel.

Contrarrazões apresentadas (fls. 417/431).

É o que importa relatar.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBER-

TO DE OLIVEIRA LIMA (Relator):

A recorrente, que não tem razão na preliminar agitada, tem-na quanto ao mérito em si. Explico.

Não há a extrapetição noticiada, porquanto a solução judicial, bem lidos os pedidos, encontra-se dentro do espectro da preten-são exercitada. Faz algum tempo que a legislação processual civil estabeleceu certa fungibilidade entre as formas de adimplemento das obrigações, autorizando a reparação quando se haja querido o fazer (CPC, art. 461, § 1º), o inverso sendo possível desde sempre. Supero, pois, e vou à matéria de fundo.

A inicial narrou que, desde 2006, o imóvel adquirido com finan-ciamento da Caixa Econômica Federal (CEF) teria apresentado problemas estruturais, decorrentes de falhas técnicas em sua construção (acontecida há mais de três décadas), pelo que o autor

Page 161: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

161

acionou a seguradora para cobertura do sinistro. Ante a negativa, ajuizou a presente ação contra a instituição bancária que inter-mediou a compra, bem como contra a própria seguradora, ao fim julgada parcialmente procedente pelo Juízo a quo (para reparação dos vícios na estrutura do imóvel, discriminados no laudo pericial).

Houve, como visto no relatório, apelo apenas da CEF.

Segundo a Circular n° 111/2009 da Superintendência de Se-guros Privados (SUSEP), na Cláusula 3ª (sobre as “Condições Particulares Para os Riscos de Danos Físicos”, fl. 90), os riscos cobertos “deverão ser decorrentes de causa externa, assim en-tendidos os causados por forças atuantes de fora para dentro do prédio, ou sobre o solo ou subsolo em que o mesmo se acha edificado, lhe causem danos, excluindo-se, por conseguinte, todo e qualquer dano sofrido pelo prédio ou benfeitorias que seja cau-sado por seus próprios componentes, sem que sobre eles atue qualquer força anormal”.

Tendo o perito judicial concluído que os danos encontrados não teriam essa natureza (fl. 313, final), exsurge clara, portanto, a inviabilidade da cobertura pretendida em juízo. Eis a conclusão do expert:

5. CONCLUSÃO

Na análise das peças técnicas que embasam a presente Ação Ordinária, quais sejam: Laudo Técnico Pericial (fls. 52 a 73), apresentado pelo autor, e o Termo de Negativa de Cobertura (fl. 45) juntamente com o Laudo de Vistoria Inicial (fls. 46 e 48), apresentados pela CAIXA SEGURA-DORA S.A., destaca-se o seguinte:

* Na conclusão do Laudo Técnico Pericial, no item 3, é afirmado que “as fissuras são decorrentes de falhas técnicas da época de sua construção”.

* No Termo de Negativa de Cobertura é indicado como causa do sinistro “Vício de Construção”.

* No Laudo de Vistoria Inicial é apontado como causa principal do sinistro “Vício na Construção”.

Ou seja, todas as peças técnicas concluem que os defeitos da edificação tiveram como causas falhas técnicas ou vícios de construção. No caso do laudo

Page 162: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

162

técnico apresentado, é afirmado que remontam à época de construção do imóvel.Como esclarecimento, vícios ou anomalias de uma cons-trução podem decorrer de falhas dos projetos, falhas de execução ou devido à má utilização ou manutenção da edificação. (...)

Caso em que a CEF, ademais, atuou como agente apenas financeiro, oportunizando a construção e a aquisição do imóvel pelos mutuários, situação na qual deve responder – única e ex-clusivamente – pelas contendas relacionadas ao financiamento, consoante entendimento pacificado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (REsp 897.045/RS):

RECURSOS ESPECIAIS. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. SFH. VÍCIOS NA CONSTRUÇÃO. AGEN-TE FINANCEIRO. ILEGITIMIDADE. DISSÍDIO NÃO DEMONSTRADO. INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. VÍCIO NA REPRESENTAÇÃO PRO-CESSUAL.1. A questão da legitimidade passiva da CEF, na condição de agente financeiro, em ação de indenização por vício de construção, merece distinção, a depender do tipo de financiamento e das obrigações a seu cargo, podendo ser distinguidos, a grosso modo, dois gêneros de atuação no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, isso a par de sua ação como agente financeiro em mútuos concedidos fora do SFH (1) meramente como agente financeiro em sentido estrito, assim como as demais instituições finan-ceiras públicas e privadas (2) ou como agente executor de políticas federais para a promoção de moradia para pessoas de baixa ou baixíssima renda.2. Nas hipóteses em que atua na condição de agente financeiro em sentido estrito, não ostenta a CEF legitimi-dade para responder por pedido decorrente de vícios de construção na obra financiada. Sua responsabilidade con-tratual diz respeito apenas ao cumprimento do contrato de financiamento, ou seja, à liberação do empréstimo, nas épocas acordadas, e à cobrança dos encargos estipula-dos no contrato. A previsão contratual e regulamentar da fiscalização da obra pelo agente financeiro justifica-se em função de seu interesse em que o empréstimo seja utili-zado para os fins descritos no contrato de mútuo, sendo

Page 163: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

163

de se ressaltar que o imóvel lhe é dado em garantia hipo-tecária. Precedente da 4ª Turma no REsp 1.102.539/PE.3. Hipótese em que não se afirma, na inicial, tenha a CEF assumido qualquer outra obrigação contratual, exceto a liberação de recursos para a construção. Não integra a causa de pedir a alegação de que a CEF tenha atuado como agente promotor da obra, escolhido a construtora, o terreno a ser edificado ou tido qualquer responsabilidade em relação ao projeto.4. O acórdão recorrido, analisando as cláusulas do contra-to em questão, destacou constar de sua cláusula terceira, parágrafo décimo, expressamente que “a CEF designará um fiscal, a quem caberá vistoriar e proceder à medição das etapas efetivamente executadas, para fins de libera-ção de parcelas. Fica entendido que a vistoria será feita exclusivamente para efeito de aplicação do empréstimo, sem qualquer responsabilidade da CEF pela construção da obra.” Essa previsão contratual descaracteriza o dissídio jurisprudencial alegado, não havendo possibili-dade, ademais, de revisão de interpretação de cláusula contratual no âmbito do recurso especial (Súmulas 5 e 7).5. Recurso especial da CAIXA SEGURADORA S/A não conhecido e recurso especial do CONDOMÍNIO EDIFÍCIO RESIDENCIAL DA PRAÇA E OUTROS não provido.(REsp 897.045/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GAL-LOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 09/10/2012, DJe 15/04/2013)

A fiscalização empreendida pelos agentes do banco tem o condão tão só de acompanhar o cronograma físico-financeiro das obras para liberação das parcelas do financiamento, jamais ense-jando responsabilidade acerca do material utilizado ou da técnica de construção respectiva.

Assim, dou provimento à apelação.

Ante a sucumbência da parte autora (relativamente à CEF), seria o caso de condená-la ao pagamento das verbas decorren-tes, que deixo de arbitrar em atenção aos favores que lhe foram deferidos durante a tramitação à fl. 162 (de gratuidade judicial).

É como voto.

Page 164: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

164

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 11.654-RN

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRAApelantes: TIRSO RENATO DANTAS, RYLZA MANSUR PE- REIRA, GABRIEL MANSUR PEREIRA JANINO, RUY PEREIRA JÚNIOR, CARLOS FREDERICO DA SILVA MARIZ E MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALApelados: OS MESMOSAdvs./Procs.: DRS. MARCOS AURÉLIO SANTIAGO BRAGA E OUTRO E MARCUS VINÍCIUS C. LEAL DE OLIVEI- RA E OUTRO

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. ESTE-LIONATO. CONCESSÃO DE PENSÃO VITALÍCIA. CASAMENTO REALIZADO PERANTE TABELIÃO SEM O CUMPRIMENTO DE TODAS AS FORMA-LIDADES LEGAIS. NUBENTE EM SITUAÇÃO DE IMINENTE PERIGO DE VIDA. NEOPLASIA MALIGNA COM METÁSTASE PARA PULMÃO E OSSOS EM ESTADO AVANÇADO. CASAMENTO NUNCUPATIVO. DISPENSA DE MAIORES FOR-MALIDADES. DECLARAÇÃO DE DOMICÍLIO COMO MEIO PARA VIABILIZAR O PROCEDI-MENTO FORMAL DO CASAMENTO. AUSÊNCIA DE POTENCIALIDADE LESIVA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. PROVIMENTO ÀS APELAÇÕES DOS RÉUS. - Apelações criminais interpostas pela defesa dos acusados e pela acusação contra sentença que julgou procedente a denúncia para condenar todos os réus pela prática do crime previsto no artigo 171, § 3º, do Código Penal.- Caso em que, consoante a denúncia, os acusa-dos, em conluio de vontades, teriam contribuído para a realização do matrimônio de TIRSO RENA-TO DANTAS e RUYMA MANSUR PEREIRA, nos últimos momentos da vida dela, que padecia de estágio terminal de câncer de pulmão e ossos,

Page 165: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

165

com o fim exclusivo de viabilizar a concessão de beneficío previdenciário vitálício de pensão por morte em favor de TIRSO RENATO DANTAS e, por sua vez, perpetuar, por via indireta, o recebimen-to do benefíco em favor do seu filho, então com 18 (dezoito) anos de idade, GABRIEL MANSUR PEREIRA JANINO, também acusado.- Não se configura a prática do crime de este-lionato sem a prova da obtenção, para si ou para outrem, de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento (CP, art. 171). - O casamento realizado entre RUYMA MANSUR PEREIRA e TIRSO RENATO DANTAS, perante o tabelião do Cartório de Registro de Pessoas Natu-rais de Tangará/RN, ainda que sem a observância de todas as formalidades legais, não se equipara a meio fraudulento para a obtenção de vantagem ilícita, uma vez que a própria lei civil (CC, art. 1.540), dispensa as formalidades que não foram observadas, quando um dos cônjuges esteja em iminente risco de vida (casamento nuncupativo).- O instrumento procuratório particular, por meio do qual RUYMA MANSUR PEREIRA, ex-servidora do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, outorgou poderes a sua irmã, RYLZA MANSUR PEREIRA, para a prática de diversos atos da vida civil, dentre eles o de contrair casamento, embora não satisfaça a exigência do art. 1.536 do Código Civil, somado ao depoimento das testemunhas e tendo em vista o delicadíssimo estado de saúde em que se encontrava a outorgante, decorrente do agravamento da doença que a levou a óbito em poucos dias (câncer com metástase para os ossos e pulmão), serve de prova da última vontade livre e consciente da falecida de con-volar matrimônio com seu antigo marido TIRSO RENATO DANTAS.

Page 166: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

166

- A concessão de pensão vitalícia ao conjuge TIR-SO RENATO DANTAS, em razão do falecimento de RUYMA MANSUR PEREIRA, não pode ser con-siderada com obtenção de vantagem ilícita, para si ou para outrem, em prejuízo alheio, tendo em vista que os nubentes, seja porque as irregulari-dades apontadas não impediriam a realização do casamento nuncupativo, seja porque, segundo os relatos das testemunhas, os nubentes, antes unidos pelo vínculo do matrimônio, passaram, após o divorcio de seus respectivos consortes, a desenvolver relação marital.- A declaração de domícilio dos nubentes, como sendo no Município de Tangará/RN, ainda que se entendesse pela existência de prova suficiente de que eles eram, na verdade, domiciliados no Município de Natal/RN, serviu apenas como meio de obtenção da desejada celeridade do procedi-mento formal para o casamento, não configuran-do, assim, conduta penalmente relevante, tendo em vista que dela não resultaria qualquer outra potencialidade lesiva. Aplicação do princípio da consunção.- Apelações dos réus providas para reconher a atipicidade das condutas. Prejudicada a apelação do Ministério Público Federal.

ACÓRDÃO

Vistos etc., decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à unanimidade, dar provimento à apelação dos réus e julgar prejudicada a apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigrá-ficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 2 de junho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIALHO MOREI-RA - Relator

Page 167: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

167

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIA-

LHO MOREIRA:

Trata-se de apelações criminais interpostas pela defesa do acu-sado CARLOS FREDERICO DA SILVA MARIZ (fls. 455/469); pelo MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (fls. 500/516) e pela defesa dos acusados TIRSO RENATO DANTAS, RYLZA MANSUR PEREIRA, GABRIEL MANSUR PEREIRA JANINO e RUY PEREIRA JÚNIOR (fls. 582/609), contra sentença proferida pelo Juízo Federal da 14ª Vara/RN (Natal) – fls. 406/432, que julgou procedente a denúncia para condenar todos os réus pela prática do crime previsto no artigo 171, § 3º, do Código Penal.

As penas foram dosadas da seguinte forma:

I - para o acusado CARLOS FREDERICO DA SILVA MARIZ em 4 anos e 2 meses de reclusão, em regime semiaberto, e 30 dias-multa;

II - para o acusado TIRSO RENATO DANTAS em 4 anos e 4 meses de reclusão, em regime semiaberto, e 30 dias-multa;

III - para a acusada RYLZA MANSUR PEREIRA em 4 anos de reclusão, em regime aberto, e 20 dias-multa. A pena de reclusão foi substituída por restritivas de direito;

IV - para o acusado GABRIEL MANSUR PEREIRA JANINO em 2 anos e 2 meses e 20 dias de reclusão, em regime aberto, e 10 dias-multa. A pena de reclusão foi substituída por restritivas de direito;

V - para o acusado RUY PEREIRA JÚNIOR em 2 anos e 2 me-ses e 20 dias de reclusão, em regime aberto, e 20 dias-multa. A pena de reclusão foi substituída por restritivas de direito.

A sentença apelada deixou de fixar o valor mínimo decorrente dos prejuízos ocasionados pelos réus (CPP, art. 387, IV), tendo em vista que os fatos teriam sido levados ao conhecimentos do INSS, em cumprimento à decisão proferida na Ação Declaratória de Ine-xistência de Casamento com pedido de antecipação dos efeitos da Tutela nº 0100172-53.2013.8.20.0133 (fls. 392/394 – do apenso I).

Page 168: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

168

Ressalvou a sentença que a aplicação da detração penal restou prejudicada, vez que nenhum dos acusados foi preso cautelar ou temporariamente por fatos relacionados a esta ação penal.

Consoante a denúncia, os acusados, em conluio de vontades, teriam contribuído para a realização do matrimônio entre TIRSO RENATO DANTAS e RUYMA MANSUR PEREIRA, nos últimos momentos de vida dela, que padecia de estágio terminal de câncer no pulmão e ossos, com o fim exclusivo de viabilizar a concessão de benefício previdenciário vitalício de pensão por morte em favor de TIRSO RENATO DANTAS e, por sua vez, perpetuar, por via indireta, o recebimento do benefício em favor do seu filho, então com 18 (dezoito) anos de idade, GABRIEL MANSUR PEREIRA JANINO, também acusado.

Giza a denúncia que o acusado CARLOS FREDERICO DA SILVA MARIZ, na condição de Tabelião do Cartório de Registros Civis de Tangará/RN, e em razão da relação de amizade existente com os denunciados, determinou a realização dos atos necessá-rios à celebração irregular do casamento entre TIRSO RENATO DANTAS e RUYMA MANSUR PEREIRA, que foi representada naquela ocasião por sua irmã e procuradora, também acusada, RYLZA MANSUR PEREIRA.

Os acusados GABRIEL MANSUR PEREIRA JANINO e RUY PEREIRA JÚNIOR (filho e pai de RUYMA MANSUR PEREIRA) foram testemunhas do matrimônio, juntamente com a acusada, e também procuradora no processo de habilitação e casamento, RYLZA MANSUR PEREIRA.

Ressalva a denúncia que o real motivo de toda a fraude não era somente viabilizar o casamento antes do falecimento da Sra. RUYMA MANSUR PEREIRA, mas sim o de viabilizá-lo para em-basar a concessão indevida de benefício previdenciário de pensão por morte ao denunciado TIRSO RENATO DANTAS, vez que no dia 27 de fevereiro de 2012, quase dois meses após a morte de RUYMA MANSUR PEREIRA, foi exarada, pelo INSS, Portaria concedendo pensão vitalícia a TIRSO RENATO DANTAS (viúvo) e pensão temporária a GABRIEL MANSUR PEREIRA JANINO (filho menor) da servidora RUYMA MANSUR PEREIRA, que ocupava o cargo de Técnica do Seguro Social, do quadro do INSS, com o valor correspondente a 100% dos proventos da ex-servidora,

Page 169: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

169

rateada em duas cotas-partes iguais entre os beneficiários (viúvo e filho menor).

Destaca a denúncia que o acusado GABRIEL MANSUR PE-REIRA JANINO, em que pese constar que era menor de idade, à época do falecimento da sua mãe RUYMA MANSUR PEREIRA (óbito ocorrido 2 de janeiro de 2012), já havia atingido a maioridade, pois nasceu em 01/12/1993, sendo possível vislumbrar, consoante a denúncia, o interesse desse núcleo familiar em providenciar, junto ao Tabelião e amigo da família CARLOS FREDERICO, um casamento simulado para a Sra. RUYMA, que objetivava o evento certo de cessamento do benefício do denunciado Gabriel Mansur, que somente seria assistido por pouco tempo (até o máximo de 24 anos de idade, caso estudante), o que resultaria na perda do benefício temporário por ausência de outros dependentes.

A acusação, no seu recurso de apelação (fls. 499/516), insurge--se tão somente no que tange à dosimetria da pena, requerendo:

I - que seja alterada a pena alternativa de prestação de ser-viços aplicada para os acusados RILZA MANSUR PEREIRA, GABRIEL MANSUR PEREIRA e RUY PEREIRA JÚNIOR, mais precisamente na razão de 7 (sete) horas por semana;

II - a majoração da quantidade de dias-multa aplicada aos réus, a fim de guardar proporcionalidade com a pena privativa de liberdade;

III - a elevação para, no mínimo, de 2/3 (dois terços) do sa-lário-mínimo, o valor unitário do dia-multa aplicado aos réus CARLOS FREDERICO DA SILVA MARIZ, TIRSO RENATO DANTAS e RUY PEREIRA JÚNIOR.

A defesa de todos os acusados, CARLOS FREDERICO DA SILVA MARIZ (fls. 455/469); TIRSO RENATO DANTAS, RYLZA MANSUR PEREIRA, GABRIEL MANSUR PEREIRA JANINO e RUY PEREIRA JÚNIOR (fls. 582/609), pugnam pela absolvição, alegando, em síntese: a) atipicidade; b) ausência de dolo e de efetivo potencial conhecimento da ilicitude do fato; c) ausência de materialidade delitiva.

Alternativamente, no caso de ser mantida a sentença condena-tória, requerem a reavaliação das penas aplicadas para o mínimo

Page 170: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

170

legal, ante a ausência de circunstâncias judiciais desfavoráveis aos réus.

Contrarrazões pela acusação (fls. 473/495 e fls. 612/623); pela defesa dos acusados Tirso Renato Dantas, Rylza Mansur Pereira, Gabriel Mansur Pereira Janino e Ruy Pereira Júnior (fls. 534/546) e pela defesa do acusado Carlos Frederico da Silva Mariz (fls. 561/577).

No Parecer de fls. 626/638, o Exmo. Sr. Procurador Regional da República, Alex Amorim de Miranda, opinou pelo não provimento dos recursos de apelação interpostos pela acusação e pela defesa, com a manutenção da sentença apelada em todos os seus termos, inclusive quanto à dosimetria aplicada.

É o que havia de relevante para relatar.

Ao eminente Revisor, nos termos do Regimento Interno desta Corte.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ROGÉRIO FIA-

LHO MOREIRA (Relator):

Nos termos do art. 171 do Código Penal, não se configura o crime de estelionato sem a prova da obtenção, para si ou para outrem, de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou man-tendo alguém em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento. In verbis:

Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento:Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhen-tos mil réis a dez contos de réis.

Da análise detida dos fatos, chega-se à conclusão de que o ca-samento civil realizado entre RUYMA MANSUR PEREIRA e TIRSO RENATO DANTAS, perante o tabelião do Cartório de Registro de Pessoas Naturais de Tangará/RN, ainda que sem a observância de todas as formalidades legais, não pode ser equiparado a meio fraudulento para a obtenção de vantagem ilícita.

Page 171: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

171

Isso porque a própria lei civil dispensa o preenchimento dos requisitos e formalidades que não foram observadas no caso concreto (tramitação do pedido de habilitação no município de re-sidência dos nubentes, registro de que o casamento estava sendo realizado através de procuração, instrumento público de procuração contendo a indicação do nome com quem a outorgante pretendia se casar, o regime de bens a ser adotado e o nome com que eles pasariam a assinar), na hipótese em que pelo menos um dos nu-bentes estiver em iminente risco de vida (casamento nuncupativo).

Com efeito, o art. 1.540 do Código Civil, ao dispor sobre as formalidades para a celebração do casamento em caso iminente risco de vida, exige para a validade do ato apenas a presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham relação de parentesco em linha reta, ou, na colateral, até segundo grau, quando não se fizer presente autoridade à qual incumba presidir o ato ou o seu substituto:

Art. 1.540. Quando algum dos contraentes estiver em imi-nente risco de vida, não obtendo a presença da autoridade à qual incumba presidir o ato, nem a de seu substituto, poderá o casamento ser celebrado na presença de seis testemunhas, que com os nubentes não tenham paren-tesco em linha reta, ou, na colateral, até segundo grau.

No caso concreto, a Sra. RUYMA MANSUR PEREIRA esteve internada no Hospital da Liga Contra o Câncer para tratamento de câncer de ossos e pulmão, tendo seu quadro de saúde bastante agravado a partir do dia 20/12/2011, chegando a óbito no dia 02/01/2012, ou seja, em apenas 13 (treze) dias (vide prontuário médico e atestado de óbito às fls. 72 e 105 do Apenso). Restando, assim, evidenciada a gravidade e rápida evolução da doença que levou a nubente à morte, tenho como caracterizado o iminente risco de vida a autorizar a realização do casamento nuncupativo.

Nesse passo, embora o casamento tenha sido formalizado perante o tabelião do Cartório de Registro de Pessoas Naturais de Tangará/RN, talvez em virtude de os nubentes desconhecerem a possibilidade de casamento nuncupativo – até porque ninguém, em situação de urgência, optaria pelo procedimento mais longo e burocrático sabendo da existência do procedimento mais simples

Page 172: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

172

– percebe-se que não haveria qualquer óbice a sua celebração apenas perante testemunhas.

Por outro lado, os depoimentos prestados pelas testemunhas de defesa não deixam dúvidas de que os nubentes tinham real-mente o desejo e manifestaram a intenção de restabelecer os laços conjugais desfeitos no passado. Vejamos:

Maria Bezerra de Araújo:

[...] Eles foram casados há muitos anos atrás foram casados. Ela sempre me falava desse casamento. Não deu certo. Posteriormente se separaram, mas mantiveram uma amizade. Ele era sempre uma pes-soa muito amiga, interessada dos problemas que ela passava. O que ele passava também compartilhava, e era assim que eu sabia [...] O sonho dela era reatar com Renato, era casar, entendeu? E ela falava muito que ia fazer uma pequena cerimônia, que ela não ia morrer antes de fazer essa realização, que era o so-nho dela, e ele também tinha esse sonho, porque era o grande amor da vida dela, eles se amaram desde a infância, casaram-se ainda adolescentes, e os laços, assim, deles eram muito fortes (...) Ela tinha esse so-nho de casar com ele (...) E ela dizia que nunca tinha esquecido dele, nunca tinha desistido dele, e que ela ia ficar boa e que eles iam formar uma família, inclusive ele era bom pros filhos dela [...].

Denise Pereira Gaspar:

[...] Eu estava no Rio. Quando voltei, RUYMA estava doente, me comunicou que já estava com um relacio-namento com RENATO DANTAS. Eu por várias vezes fui visitá-la, encontrei com RENATO DANTAS levando flores pra ela. Ela achava que ia ficar boa, e que quando ficasse boa ia casar com ele, porque tinha sido o amor da vida dele [...].

Maria Ariane Gaspar

[...] Com a doença de RUYMA, muitas vezes que fui visitá-la na casa dela tive o prazer de encontrar RENATO lá, que estava lá, auxiliava ela, inclusive em tudo que ela precisava, se a necessidade que ela não

Page 173: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

173

levantava mais, ir ao banheiro, ajudando a levantar, a levar ao banheiro, ajudando aos filhos [...] Algumas vezes ela externou a mim que tinha a intenção de casar com RENATO, apesar de já estar doente e bastante comprometida [...].

Reforçando essas declarações, consta dos autos a cópia da procuração assinada por Sra. RUYMA MANSUR PEREIRA, em 7/12/2011 (fls. 257/258), outorgando poderes a sua irmã para ca-sar à sua irmã, RYLZA MANSUR PEREIRA, que, apesar de não conter o nome do consorte, pelo relato das testemunhas e pela singularidade do caso concreto, deve-se admitir como sendo ele a pessoa com quem ela mantinha relacionamento amoroso (TIRSO RENATO DANTAS).

Entendo, assim, que o instrumento procuratório particular, por meio do qual RUYMA MANSUR PEREIRA, outorgou poderes a sua irmã, RYLZA MANSUR PEREIRA, para a prática de diversos atos da vida civil, dentre eles o de contrair casamento, embora não satisfaça a exigência do art. 1.536 do Código Civil, somado ao depoimento das testemunhas e tendo em vista o delicadíssimo estado de saúde em que se encontrava a outorgante, decorrente do agravamento da doença que a levou a óbito em poucos dias (câncer com metástase para os ossos e pulmão), serve de prova da última vontade livre e consciente da falecida de convolar matri-mônio com seu antigo marido TIRSO RENATO DANTAS.

Em síntese, ainda que os réus tivessem realmente conjugado esforços com o objetivo de promover a celebração do casamento sem a observância das formalidades legais perante o Registro Ci-vil, não haveria como considerar que suas condutas constituíram meio fraudulento para obtenção de vantagem indevida, uma vez que, no caso concrreto, sequer o casamento perante o Cartório de Registro Civil era necessário.

De igual modo, a concessão de pensão vitalícia ao cônjuge TIRSO RENATO DANTAS, em razão do falecimento de RUYMA MANSUR PEREIRA, não pode ser considerada como obtenção de vantagem ilícita, para si ou para outrem, em prejuízo alheio, tendo em vista que os nubentes, seja porque as irregularidades aponta-das não impediriam a celebração do casamento nuncupativo, seja

Page 174: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

174

porque, segundo os relatos das testemunhas, os nubentes, antes unidos pelo vínculo do matrimônio, passaram, após o divórcio de seus respectivos consortes, a desenvolver relação marital.

A declaração de domicílio dos nubentes, como sendo no Mu-nicípio de Tangará/RN, ainda que se entendesse pela existência de prova suficiente de que eles eram, na verdade, domiciliados no Município de Natal/RN, serviu apenas como meio de obtenção da desejada celeridade do procedimento formal para o casamento, não configurando, assim, conduta penalmente relevante, tendo em vista que dela não resultaria qualquer outra potencialidade lesiva. A hipótese, portanto, é de incidência do princípio da consunção. Nesse sentido, destaco os seguintes julgados:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTELIONATO MAJORADO (ART. 171, PARÁGRAFO 3º, DO CP). AUXÍLIO-DOENÇA. ATESTADO MÉDICO FALSO. PATOLOGIA COMPROVADA POR PERÍCIA DO INSS. AUSÊNCIA DE VANTAGEM INDEVIDA. ATIPICI-DADE. USO DE DOCUMENTO FALSO. CRIME MEIO. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. ABSOLVIÇÃO.- Hipótese em que restou o apelante condenado por ter obtido o benefício previdenciário de auxílio-doença me-diante utilização de atestados médicos falsos.- Utilização de documentos contrafeitos que não foram determinantes na concessão ou manutenção do benefí-cio, haja vista a obrigatoriedade de realização de perícia médica oficial atestando incapacidade laborativa, bem como sua persistência, o que, de fato, ocorreu.- Preenchimento dos requisitos legais necessários à concessão do auxílio-doença, não havendo provas que elidam a legitimidade do procedimento administrativo deflagrado.- Percebimento de benefício que não pode ser reputado como indevido, uma vez que a patologia restou evidencia-da por perícia médica realizada pelo INSS, não estando configurada a elementar “vantagem ilícita”, prevista no art. 171 do CP.- Uso de documentação falsa que se deu exclusivamente com o fito de obtenção do benefício previdenciário, a consubstanciar crime-meio para consecução do crime-fim, restando por este último absorvido, mediante a aplicação

Page 175: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

175

do princípio da consunção. Potencialidade lesiva do uso do documento falso exaurida no estelionato, nos termos da Súmula n° 17 do STJ.- Apelo provido.(ACR 200680000061215, Desembargador Federal Francisco Wildo, TRF5 - Segunda Turma, DJe - Data: 15/12/2011 - Página: 255.)

EMENTA: DIREITO PENAL. ART. 297, § 1º, CP. SELO FAZENDÁRIO FALSO EM DECLARAÇÃO DE BAGA-GEM ACOMPANHADA. ATIPICIDADE DA CONDUTA. INSIGNIFICÂNCIA. CRIME-MEIO PARA A PRÁTICA DO CRIME-FIM. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA CONSUN-ÇÃO. ABSOLVIÇÃO. - Se a conduta “fim” é irrelevante para a intervenção penal, a conduta-meio (falsidade de DBA) também o é, uma vez que a intenção do denunciado era deixar de pagar os tributos devidos. Portanto, o falsum (artigo 293, § 1º, do CP) deve ser absorvido pelo descaminho, aplicando-se o princípio da consunção. (TRF4, ACR 5002138-94.2010.404.7002, Sétima Turma, Relatora p/ Acórdão Cláudia Cristina Cristofani, juntado aos autos em 19/08/2014)

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. ARTIGO 304, C/C ARTIGO 298 DO CÓDIGO PENAL. CRIME--MEIO PARA O DELITO DE DESCAMINHO. PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. ABSOLVIÇÃO. ARTIGO 183 DA LEI 9.472/97. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO COMPROVADOS. CONDENAÇÃO. PRESTAÇÃO PE-CUNIÁRIA. REDUÇÃO. 1. Para analisar a aplicabilidade do princípio da consun-ção, deve ser verificada a potencialidade lesiva do docu-mento espúrio, porquanto o crime de falsidade somente pode ser absorvido se sua aptidão de causar dano exaurir--se totalmente no crime-fim, para o qual supostamente estaria voltado o dolo do agente. 2. Se o uso da nota fiscal falsificada exauriu-se no desca-minho, e se este foi arquivado por atipicidade, deve ser absolvido o réu quanto à falsificação, com fulcro no artigo 386, III, do Código de Processo Penal. 3. Materialidade, autoria e dolo comprovados em rela-ção ao crime contra as telecomunicações. Condenação mantida.

Page 176: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

176

4. O valor da prestação pecuniária substitutiva deve ser proporcional às condições econômicas do condenado.(TRF4, ACR 5003636-94.2011.404.7002, Oitava Turma, Relator p/ Acórdão Gilson Luiz Inácio, juntado aos autos em 02/04/2014)

Ante o exposto, dou provimento às apelações dos réus para absolver os réus da imputação de terem praticado o crime do art. 171, § 3º, do Código Penal, reconhecer a atipicidade das condutas, nos termos do art. 386, inciso III, do Código de Processo Penal.

Prejudicada a apelação do Ministério Público Federal.

É como voto.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 11.821-SE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUIMA- RÃESApelante: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALApelado: ELIZANDRO RODRIGUES DE JESUS DANTASRepte.: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. APE-LAÇÃO. ART. 183 DA LEI Nº 9.472/97. DESEN-VOLVIMENTO CLANDESTINO DE ATIVIDADES DE TELECOMUNICAÇÕES. EXPLORAÇÃO DE SERVIÇOS DE INTERNET SEM AUTORIZAÇÃO DA ANATEL. CONSTITUCIONALIDADE DO TIPO PENAL. MATERIALIDADE E AUTORIA COM-PROVADAS. CRIME FORMAL E DE PERIGO ABSTRATO. A SIMPLES PRÁTICA DA CONDUTA PREVISTA NO TIPO PENAL CARACTERIZA O EFETIVO DANO AO BEM JURÍDICO. ART. 3º, I, DA RESOLUÇÃO Nº 506/2008 DA ANATEL. EMISSÃO DE RADIAÇÃO RESTRITA. ATIVIDADE EXTRAPO-LA OS LIMITES DE UMA MESMA EDIFICAÇÃO. INTERESSE COLETIVO. NECESSIDADE DE AU-TORIZAÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA PARA CONDENAR O RÉU. DOSIMETRIA DA PENA.

Page 177: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

177

AUSÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. PENA-BASE FIXADA NO MÍ-NIMO LEGAL. 2 (DOIS) ANOS DE DETENÇÃO. ATENUANTE DE CONFISSÃO ESPONTÂNEA. IM-POSSIBILIDADE DE REDUÇÃO DA PENA AQUÉM DO MÍNIMO LEGAL. SÚMULA 231 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. PENA DE MULTA DE R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS). SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. REGIME INICIAL DE CUMPRIMENTO DE PENA: ABERTO. APELO PROVIDO. - O Ministério Público Federal interpôs o presente recurso de apelação com vistas a reformar a sen-tença proferida pelo Juízo a quo para condenar o réu às penas previstas no art. 183 da Lei nº 9.472/97.- O apelante afastou o argumento de atipicidade na medida em que a simples prática da conduta prevista no tipo penal caracteriza o efetivo dano ao bem jurídico tutelado (segurança das teleco-municações), pois se trata de crime formal e de perigo abstrato.- Não obstante o acusado utilizar equipamentos de radiação restrita, a prestação de serviços de internet extrapolava uma mesma edificação e, considerando ainda que o funcionamento das es-tações está associado à exploração de serviço de interesse coletivo, era necessária a autorização do serviço (art. 3º, I, da Resolução nº 506/2008 da ANATEL).- Materialidade e autoria comprovadas.- Reforma da sentença para condenar o réu às penas previstas no art. 183 da Lei nº 9.472/97.- Dosimetria da pena: ausência de circunstâncias judiciais favoráveis, fixação da pena no mínimo legal, qual seja 2 (dois) anos de reclusão. Presen-ça da atenuante de confissão espontânea, entre-tanto, de acordo com a Súmula 231 do Superior

Page 178: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

178

Tribunal de Justiça, a incidência dessa atenuante não pode conduzir à redução da pena a patamar inferior ao mínimo legal. Pena de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. Regime inicial de cumprimento de pena: aberto.- Apelo provido.

ACÓRDÃO

Vistos etc., decide a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigrá-ficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 30 de junho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUIMARÃES - Re-lator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS CA-

NUTO (Convocado):

Cuida-se de apelação interposta pelo Ministério Público Fede-ral, irresignado com a sentença da lavra do Dr. Ronivon de Aragão, MM. Juiz Federal da 2ª Vara da Seção Judiciária de Sergipe, que, com base no art. 386, III, do Código de Processo Penal, absolveu o réu Elizandro Rodrigues de Jesus Dantas, o qual havia sido denun-ciado pela prática do delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97.

Sustenta o apelante, em síntese, que a simples prática da conduta prevista no tipo penal em tela caracteriza o efetivo dano ao bem jurídico, pois se trata de crime formal e de perigo abstra-to. Sustenta ainda a presença de tipicidade, pois de acordo com a primeira parte do inciso I do art. 3º da Resolução nº 506/2008 da ANATEL, mesmo que o réu tenha operado as atividades de telecomunicações dentro da faixa de transmissão destinada à radiação restrita, subsistia a necessidade de autorização legal

Page 179: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

179

para a exploração do serviço. Por fim, alega que os depoimentos testemunhais e o interrogatório do réu atestam o funcionamento clandestino e comercial do serviço de internet.

Em contrarrazões, o apelado pugna pela aplicação dos prin-cípios da insignificância e da intervenção mínima, afirmando que o Direito Administrativo se mostra mais eficaz para punir o delito em questão. Defende ainda a declaração de inconstitucionalida-de do tipo penal previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97, uma vez que viola o princípio constitucional da liberdade de comunicação. Finalmente, alega que a ausência de dano restou demonstrada pelas conclusões da nota técnica da própria ANATEL, concluindo, assim, pela atipicidade da conduta.

Em parecer da lavra do Dr. Fernando José Araújo Ferreira, a douta Procuradoria Regional da República opina pelo provimento da apelação.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL LÁZARO GUI-

MARÃES (Relator):

O recurso interposto pelo Ministério Público Federal visa à reforma da sentença proferida pelo magistrado a quo no sentido de condenar Elizandro Rodrigues de Jesus Dantas pela prática do crime previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97, que consiste em desenvolver clandestinamente atividades de telecomunicação.

Inicialmente, importa mencionar a constitucionalidade do tipo penal em objeto, uma vez que o bem jurídico tutelado – segurança das telecomunicações – possui amparo constitucional, sendo as-sim, a tutela penal se mostra necessária. Nessa linha, destaca-se a sentença de primeiro grau:

Por conseguinte, tem-se que, em verdade, a partir dos critérios de política criminal (exercidos pelo legislador ordi-nário), necessariamente orientados a partir dos princípios e valores estabelecidos na Constituição Federal de 1988 (para que se atenha ao momento presente, histórico e de maturidade dogmática e político-institucional), que, no caso, há proporcionalidade e transcendentalidade (para

Page 180: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

180

se usar expressões caras a Luiz Flávio Gomes, citado na peça defensiva) na seleção do bem jurídico relativo às telecomunicações (sentido amplo), autorizativo da consequente tutela jurídica na esfera penal.

Passando ao mérito, observa-se que o sentenciante decidiu pela absolvição do réu fundamentada na atipicidade da conduta, afirmando que não ficou demonstrado prejuízo ao bem jurídico tutelado (segurança das telecomunicações). Entretanto, deve-se notar que o delito em questão é crime formal e de perigo abstra-to, significando que independe da ocorrência de efetivo prejuízo, bastando apenas a possibilidade de ocorrência de dano. Nesse sentido, segue entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMEN-TAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PROVIMENTO AO AGRAVO EM RECURSO ESPE-CIAL. DECISÃO MONOCRÁTICA. POSSIBILIDADE. ART. 544, § 4º, II, A, DO CPC C/C ART. 3º DO CPP. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA COLEGIALIDADE. INE-XISTÊNCIA. APRECIAÇÃO DA MATÉRIA EM JULGA-MENTO COLEGIADO. EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE DE RADIODIFUSÃO, SEM AUTORIZAÇÃO DA AUTO-RIDADE ADMINISTRATIVA COMPETENTE. DELITO DO ART. 183 DA LEI 9.742/97. CRIME DE PERIGO ABSTRATO. TUTELA DA SEGURANÇA DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA IN-SIGNIFICÂNCIA. IMPOSSIBILIDADE. ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DO STJ, EM SENTIDO CONTRÁRIO À PRETENSÃO RECURSAL. SÚMULA 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I. A negativa de provimento ao Agravo em Recurso Espe-cial, de forma monocrática, ainda que sejam apreciados aspectos do mérito, está prevista no art. 544, § 4º, II, a, do CPC c/c art. 3º do CPP, sendo possibilitada quando estiver correta a decisão que não admitiu o recurso. De outra parte, a apreciação das questões expendidas no Recurso Especial, quando do julgamento colegiado do Agravo Regimental, torna superada a alegação de ofensa ao princípio da colegialidade. II. Consoante a pacífica jurisprudência do STJ, o desen-volvimento de atividade de telecomunicação na clandesti-nidade, ou seja, sem a competente concessão, permissão

Page 181: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

181

ou autorização, seja qual for a potência do equipamento utilizado, traduz o crime do art. 183 da Lei 9.472/97, que é formal, de perigo abstrato, e tem, como bem jurídico tutelado, a segurança dos meios de comunicação, uma vez que a utilização de aparelhagem clandestina pode causar sérios distúrbios, por interferência em serviços regulares de rádio, televisão e até mesmo em navegação aérea. Para a consumação do delito, basta que alguém desenvolva atividades de telecomunicações, de forma clandestina, ainda que não se apure prejuízo concreto para as telecomunicações, para terceiros ou para a se-gurança em geral. III. A jurisprudência de ambas as Turmas da 3ª Seção do STJ orienta-se no sentido de que, em relação ao delito do art. 183 da Lei 9.472/97, “não há como reconhecer o reduzido grau de reprovabilidade ou a mínima ofensi-vidade da conduta, de forma a ser possível a aplicação do princípio da insignificância. A instalação de estação clandestina de radiofrequência, sem autorização dos órgãos e entes com atribuições para tanto – o Ministério das Comunicações e a ANATEL –, já é, por si, suficiente a comprometer a regularidade e a operabilidade do sis-tema de telecomunicações, o que basta à movimentação do sistema repressivo penal” (STJ, AgRg no AREsp 108.176/BA, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, DJe de 09/10/2012). Em igual sentido: STJ, AgRg no REsp 1.113.795/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, DJe de 13/08/2012. Incidência, in casu, da Súmula 83/STJ. IV. Agravo regimental improvido.(STJ, AgRg no AREsp 299.913/BA, Rel. Ministra AS-SUSETE MAGALHÃES, SEXTA TURMA, julgado em 18/06/2013, DJe 07/08/2013)

Conforme relata a Nota Técnica 06/2013 da ANATEL (fl. 06, Inquérito Policial), não obstante as emissões que se situam na faixa de radiação restrita não necessitarem de autorização para uso de radiofrequência, o serviço fiscalizado possuía aptidão para causar dano à segurança das telecomunicações em geral. Sendo assim, a falta de efetiva lesão ao bem jurídico tutelado não pode ser utilizada como fundamento de atipicidade da conduta.

Page 182: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

182

Outro fundamento utilizado pelo juízo de primeiro grau para sustentar a atipicidade da conduta diz respeito ao afastamento do elemento normativo “clandestinidade”, uma vez que o acusa-do operou equipamentos de radiação em faixa isenta de prévia autorização, conforme dispõe o caput do art. 3º da Resolução de nº 506/2008 da ANATEL. Deve-se atentar, contudo, que a desne-cessidade de prévia autorização apresenta ressalvas, conforme dispõe o parágrafo único do referido art. 3º:

Art. 3º As estações de radiocomunicação, que fizerem uso de equipamentos de radiação restrita caracterizados por este Regulamento, estão isentas de cadastramento ou licenciamento para instalação e funcionamento.Parágrafo único. Quando a atividade de telecomunicações desenvolvida pela estação de radiocomunicação extrapo-lar os limites de uma mesma edificação ou propriedade móvel ou imóvel, e as estações de radiocomunicações fizerem uso de equipamentos definidos nas Seções IX e X deste Regulamento, aplicam-se as seguintes disposições:I - quando o funcionamento dessas estações estiver associado à exploração do serviço de telecomunicações de interesse coletivo, será necessária a correspondente autorização do serviço, bem como o licenciamento das estações que se destinem à:(...)

Assim, mesmo quando se trata de equipamentos de radiação restrita, na hipótese do desenvolvimento de atividades de teleco-municações que extrapolam os limites de uma mesma edificação ou propriedade móvel ou imóvel e, considerando ainda que o funcionamento das estações está associado à exploração de ser-viço de interesse coletivo, é necessária a autorização do serviço. Observa-se, portanto, que a situação ora descrita se aplica ao caso concreto na medida em que o serviço de internet interessa à coletividade e também porque as atividades de telecomunicações ultrapassavam os limites da residência do acusado, sendo o sinal de serviço de internet comercializado para pessoas residentes nas proximidades. Não há, portanto, que se falar em atipicidade.

Ademais, a materialidade e autoria delitiva restaram com-provadas por meio do relatório de fiscalização da ANATEL, dos depoimentos testemunhais e do interrogatório do réu.

Page 183: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

183

Feitas essas considerações, dou provimento à apelação para condenar o réu Elizandro Rodrigues de Jesus Dantas pela prática do delito previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97. Passo então à dosimetria da pena.

Primeiramente, analisando as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do Código Penal tem-se o seguinte: a) Culpabilidade: normal à espécie; b) Antecedentes: não constam nos autos re-gistros de condenação criminal do réu; c) Conduta social: não há nos autos elementos que desabonem a conduta social do réu; d) Personalidade: não há nos autos elementos capazes de analisar a personalidade do réu; e) Motivos: não influem no grau de repro-vabilidade da conduta; f) Circunstâncias: demonstram que não houve sofisticação ou engenhosidade maior na sua prática; g) Consequências: normal à espécie; h) Comportamento da vítima: em nada contribuiu para o resultado.

Inexistindo circunstâncias judiciais desfavoráveis, fixo a pena--base no mínimo legal, qual seja 2 (dois) anos de detenção.

Verifica-se a presença da circunstância atenuante de confissão espontânea. Considerando o disposto na Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça, a incidência dessa atenuante não pode conduzir à redução da pena a patamar inferior ao mínimo. Sendo assim, mantenho a pena fixada.

Não existindo causas de aumento nem de diminuição, torno definitiva a pena de 2 (dois) anos de detenção.

Considere-se ainda que o tipo penal prevê, cumulativamente, pena de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).

Em definitivo, aplico ao réu a pena de 2 (dois) anos de deten-ção e multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pela prática do crime previsto no art. 183 da Lei nº 9.472/97.

Com base no art. 33, § 2º, alínea c, do Código Penal, fixo o regime inicial de cumprimento da pena em aberto.

Estando presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, substituo a pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em duas prestações de serviços à comuni-dade ou a entidades públicas, a serem estabelecidas pelo juízo de execução penal.

Page 184: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

184

Diante do exposto, e por tudo mais que dos autos consta, dou provimento ao presente recurso para condenar o réu Elizandro Ro-drigues de Jesus Dantas, já qualificado nos autos, ao cumprimento das penas de 2 (dois) anos de detenção – substituída por duas prestações de serviços à comunidade ou a entidades públicas –, além de multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por infração ao art. 183 da Lei nº 9.472/97.

É como voto.

APELAÇÃO CRIMINAL Nº 12.301-PE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIORApelantes: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL E MANUEL DIO- NÍSIO DA COSTA FILHOApelados: OS MESMOSAdvs./Procs.: DRS. GUSTAVO BOTTO BARROS FELIX E OUTROS

EMENTA:CONSTITUCIONAL E PENAL. APELA-ÇÕES CRIMINAIS. ART. 273, §§ 1º E 2º, DO CÓ-DIGO PENAL. APLICAÇÃO A TERCEIROS, POR PROFISSIONAIS DA MEDICINA, DA TOXINA FINE TOX. INEXISTÊNCIA DE REGISTRO PELA ANVI-SA. NÃO DEMONSTRAÇÃO DE QUE TAL PRODU-TO TEM, EM TESE, APTIDÃO PARA PROVOCAR PREJUÍZO À SAÚDE HUMANA. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE. PROVIMENTO DA APELAÇÃO DO ACUSADO E IMPROVIMENTO DO APELO DA ACUSAÇÃO.- É perfeitamente enquadrada na expressão “medicamentos”, prevista no § 1º do art. 273 a toxina botulínica retratada nos autos, já que a própria ANVISA, inclusive para fins de registro, classifica a toxina botulínica do tipo A como um “medicamento biológico”, conforme se vê no Informe SNVS/Anvisa/GFARM n° 6, de 20 de julho de 2007.

Page 185: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

185

- O direito penal, na atualidade, não pode se dis-sociar dos valores que informam o Estado consti-tucional, surgido e expandido depois da segunda metade do século XX, ao qual rende vassalagem o Estado Democrático de Direito instituído pela Constituição de 1988. Desse modo, o legislador penal não pode desprezar, na produção de nor-mas jurídicas, os postulados constitucionais, não sendo necessária, para as incriminações, a só presença de um bem jurídico, mas, igualmente, que a conduta reprovável cause uma efetiva lesão ou dano sobre aquele. - Mesmo em se tratando de crime de perigo abstrato o delito tipificado no art. 273, §§ 1º e 2º, do Estatuto Punitivo, a sua configuração não se manifesta pela só ausência de registro do medicamento na ANVISA, havendo, igualmente, a necessidade da demonstração de uma probabi-lidade de lesão, por mínima que seja, isto é, que o produto em causa seja idôneo, em tese, para ofender o bem jurídico tutelado pelo ordenamen-to, consistente na saúde humana.- No caso concreto, o laudo pericial, elaborado por integrantes do Laboratório de Imunopatolo-gia Keizo Azami (LIKA) da Universidade Federal de Pernambuco, e representativo de uma análise global do material apreendido, não informou, nem de passagem, que o emprego da toxina Fine Tox é capaz, ao menos em tese, de causar ofensa à saúde humana.- A inexistência de prova de que a malsinada to-xina é hábil para causar ofensa à saúde humana afasta a tipicidade da conduta narrada na denún-cia, harmonizando a aplicação do art. 273, §§ 1º e 2º, do Código Penal, aos valores consagrados pelo Estado de Direito Democrático (art. 1º, caput, CF de 1988).- Ao contrário do sustentado pelo Ministério Pú-blico, não se afigura possível a incidência do art.

Page 186: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

186

7º, IX, da Lei 8.137/90, seja em razão da hipótese, por se tratar de medicamento, envolver conflito aparente de normas, apenas podendo, confor-me o caso, retratar eventual ofensa ao art. 273 do CP, seja por conta do laudo pericial não ser conclusivo quanto à impropriedade do produto ao consumo. - Apelação do acusado provida, para o fim de ser exarado édito absolutório. Recurso do Ministério Público Federal a que se nega provimento.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos do processo tombado sob o número em epígrafe, em que são partes as acima identifi-cadas, acordam os Desembargadores Federais da Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em sessão realizada nesta data, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas que integram o presente, por unanimidade, dar provimento à ape-lação do particular e negar provimento à apelação do Ministério Público Federal, nos termos do voto do Relator.

Recife, 1° de setembro de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PEREIRA NOBRE JÚNIOR - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PE-

REIRA NOBRE JÚNIOR:

Não se conformando com a v. sentença de fls. 214/227, a qual julgou parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal para, promovendo a emendatio libelli, condenar MANUEL DIONÍSIO DA COSTA FILHO pela prática do crime tipificado no art. 273, § 2º, c/c art. 71, ambos do Código Penal, este e o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL interpuseram recurso de apelação.

Requer o Parquet Federal (fls. 229/248), em resumo, a reforma da sentença para que seja condenado o réu pela prática dos crimes previstos nos arts. 273, § 1º-B, I, III, IV, V e VI, do Código Penal,

Page 187: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

187

e/ou 7º, IX, da Lei 8.137/90 c/c arts. 61, II, g, 70 e 71 do Código Penal, ou, subsidiariamente, caso mantida a condenação no art. 273, § 2º, c/c art. 70, ambos do Código Penal, o conhecimento da agravante prevista no art. 61, II, g, do Código Penal, bem como a fixação da pena-base e da quantidade de dias-multa em patamares acima do mínimo legal.

Em seu apelo (fls. 258/268), requer MANUEL DIONÍSIO DA COSTA FILHO, em síntese, a sua absolvição, ante os seguintes argumentos: a) a conduta que se pretende se punir nesta ação criminal (aplicação da toxina Fine Tox em pacientes) não tinha potencialidade para lesionar ou colocar em risco o bem jurídico protegido pela norma penal; b) a substância utilizada (Fine Tox) possuía toxina botulínica em quantidade igual ou inferior às marcas registradas pela ANVISA, de modo que não oferecia nenhum perigo aos pacientes; e c) a toxina botulínica não se enquadraria no termo “produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais”, contido na redação do art. 273, caput, do Código Penal.

Contrarrazões às fls. 269/291 (MANUEL DIONÍSIO DA COSTA FILHO) e 293/301 (MPF).

A Procuradoria Regional da República, em parecer da lavra do procurador Antônio Edílio Magalhães Teixeira, às fls. 322/333, opinou pelo provimento parcial do apelo do MPF e pelo não pro-vimento da apelação do réu.

É o relatório. À revisão.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL EDILSON PE-

REIRA NOBRE JÚNIOR (Relator):Um dos argumentos suscitados pelo réu em seu apelo é de que

a toxina botulínica não se enquadraria no termo “produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais”, contido na redação do caput do supracitado preceito normativo, porquanto, muito embora a Medi-cina reconheça a existência de finalidades terapêuticas para essa substância, ela teria sido utilizada, na hipótese em apreço, para fins estéticos, o que, segundo defende o apelante, impossibilitaria o enquadramento da sua conduta no tipo penal em comento.

Page 188: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

188

Tal tese defensiva não merece ser acolhida, tendo em vista o disposto no § 1º do citado dispositivo, com redação dada pela Lei 9.677/98, que ampliou o rol dos objetos materiais dessa in-fração penal, incluindo os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico, sendo perfeitamente enquadrada na expressão “medicamentos” a toxina botulínica retratada nos autos, já que a própria ANVISA, inclusive para fins de registro, classifica a toxina botulínica do tipo A como um “medicamento biológico”, conforme se vê no Informe SNVS/Anvisa/GFARM n° 6, de 20 de julho de 20071.

Ainda que assim não fosse, a aplicação da toxina botulínica Fine Tox com finalidade estética, isto é, para o rejuvenescimento facial ou a diminuição de rugas e linhas de expressão, possibilita o seu enquadramento como produto destinado a fins cosméticos2, dando ensejo, por conseguinte, à sua inserção no significado da ex-pressão “cosméticos”, contida no § 1º do art. 273 do Código Penal.

Não obstante, tenho que essa discussão não esgota o que, a meu sentir, merece ser examinado nos autos, conforme as linhas que seguem.

No caso concreto, a sentença condenou o réu às penas do art. 273, § 2º, do Código Penal. A apelação do Ministério Público Federal, por sua vez, pretende a reforma da sentença, para o fim da condenação recair no art. 273, §1º-B, I, do Estatuto Punitivo, combinado com o art. 7º, IX, da Lei 8.137/90, enquanto que a do acusado pleiteia a sua absolvição.

Os autos – conforme inequívoco no interrogatório do réu – refletem situação na qual ele confessou aplicar aos seus clientes,

1 Disponível Em: http://portal.anvisa.gov.br/wps/content/Anvisa+Portal/Anvisa/Pos+-+Comerc ia l izacao+-+Pos+-+Uso/Farmacovig i lanc ia/Alertas+por+Regiao+Geografica/INFORMES/Informes+de+2007/Informe+GFARM+n+6+de+20+de+julho+de+2007. Acesso em: 26.08.2015.

2 A propósito, confira-se artigo acadêmico que aborda o uso cosmético da toxina botulínica do tipo A: BACHUR, Tatiana Paschoalette Rodrigues et al. Toxina bo-tulínica: de veneno a tratamento. Revista Eletrônica Pesquisa Médica - REPM. vol. 3, n. 1, jan-mar 2009, p. 13. Disponível em: http://www.fisfar.ufc.br/pesmed/index.php/repm/article/viewFile/216/208. Acesso em 26.08.2015.

Page 189: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

189

de forma habitual, a toxina Fine Tox, ao contrário de outras hipó-teses já julgadas por esta Turma, nas quais inexistente a figura do consumo público.

Preocupa-me – e muito – o exame do tipo do art. 273, justa-mente porque, a partir da Lei 9.677/98, a pena cominada oscila entre dez a quinze anos, superando, no seu mínimo, a pena do homicídio simples (seis anos) e, igualmente, a do delito de tráfico de entorpecentes, prevista no art. 33 da Lei 11.343/2006, a qual é de cinco anos.

É sabido que referido tipo penal surgiu no sistema jurídico em processo legislativo guiado sob um forte lastro emocional, a partir de notícias veiculadas na mídia, denunciando a falsificação de remédios.

Especificadamente, imputa-se ao acusado a suposta prática do crime previsto no art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal, em virtude de fornecer a consumo medicamento não registrado pela ANVISA.

O tipo – que se consuma com a só ausência de registro pelo órgão de fiscalização – pode acarretar, se levado às últimas con-sequências, situações absurdas, tais como a demora da Admi-nistração em concluir o procedimento de registro, demonstrando uma falta de eficiência, muitas vezes conatural nessas plagas, e, de outro lado, privando o cidadão de um tratamento eficaz para as suas enfermidades.

A isso se ajunte que, na sociedade da cibernética, resultante da acumulação de conhecimentos resultantes de séculos de estudos, as descobertas de novos meios de tratamento, inclusive e principal-mente na área médica, sucedem-se de forma assídua. O que dizer, então, daquele médico que, para o tratamento de câncer, ou mesmo de cardiopatia, recomende aos seus pacientes medicamentos de última geração – na maioria das vezes, importados –, mas que ainda não obtiveram o competente registro? Tal fato, sem sombra de dúvida, estaria, em tese, abrangido pelo tipo penal.

Hipóteses como essa, que se sucedem nos dias atuais, têm provocado um novo despertar do constitucionalismo para o direito penal, a exemplo do que ocorreu com as declarações de direito das revoluções liberais frente ao direito penal do Ancien Régime.

Page 190: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

190

Daí que, tentando reviver o debate, Luis Prieto Sanchís (La limi-tación constitucional del legislador penal. In: Justicia constitucional y derechos fundamentales. Madri: Editorial Trotta, 2003, p. 284), relembrando que ao legislador penal – ao modo como acontece com os demais ramos da ciência jurídica – não cabe desprezar, na produção de normas jurídicas, os postulados constitucionais, enfatiza não ser necessário, para as incriminações, a só presença de um bem jurídico, mas, igualmente, ser preciso que a conduta reprovável cause uma efetiva lesão ou dano sobre aquele. Assim, toda lesão não poderia ser objeto do direito criminal, o qual não pode se converter num direito administrativo reforçado.

Interessante é que, no conteúdo de sua exposição, e num momento anterior (loc. cit., p. 274), chama atenção para que, em virtude mesmo do princípio da lesividade, deva ser procedida uma reformulação quanto ao exame dos delitos de perigo abstrato ou presumido.

Entre nós, esse debate ganhou ressonância na doutrina pátria, especialmente depois da alteração que a Lei 9.677/98 imprimiu ao art. 273 do Estatuto Punitivo. No particular do art. 273, § 1º-B, I, do Código Penal, Miguel Reale Júnior defende a sua inconstitu-cionalidade, compreendendo que, ao se incriminar atuação com lastro na só falta de registro do medicamento no órgão competen-te, para a qual já é prevista sanção administrativa, sem qualquer indagação acerca de sua periculosidade, está se evidenciado a desproporcionalidade.

Ademais, considerando-se que, por força do art. 12, § 3º, da Lei 6.360/76, a Administração Sanitária dispõe do intervalo de noventa dias para efetuar o registro, muitas vezes estar-se-á evitando o emprego de medicamento de última geração e de elevada eficácia pela mora administrativa3.

3 Eis, no substancial, algumas passagens da exposição do autor: “Com efeito, segundo a nova lei, constitui crime hediondo vender medicamento, cosmético ou saneante sem registro no órgão de vigilância sanitária, sendo indiferente saber se o produto comercializado sem registro é inócuo ou nocivo à saúde. Basta que não haja registro para configurar-se o crime punido com reclusão de 10 a 15 anos. Assim, pode o medicamento até mesmo ser benéfico ou o cosmético ser eficaz:

Page 191: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

191

Abordando os tipos do art. 273 do Código Penal, Cezar Bitten-court (Tratado de Direito Penal. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012. Volume 4, p. 543) sustenta que a sua interpretação haverá de ser realizada em função da relação existente entre as correspondentes ações frente ao bem jurídico saúde pública.

Essa conexão – acentua o autor – afigura-se indispensável justamente por se cuidar de crime de perigo abstrato, pois, em assim não sendo, não se terá por superada eventual mácula de constitucionalidade a recair sobre a tese de desnecessidade da demonstração da idoneidade da conduta para produzir o dano ao bem jurídico tutelado.

Na doutrina estrangeira, é digno de observação o ensinamento de Giuseppe Bettiol (Direito Penal. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977. Volume I, p. 387-390) no qual deixa esclarecido que o perigo configura uma realidade objetiva, não podendo ser uma criação da mente. Por isso, o perigo sempre será uma proba-bilidade de dano, isto é, uma probabilidade de lesão.

Daí repudiar uma distinção entre crime de perigo concreto e perigo abstrato, considerando-se nesta categoria aqueles que contêm como elemento do tipo uma situação de perigo presumida de forma absoluta. Isso porque um perigo meramente abstrato não existe, tendo em vista que todo perigo envolve sempre uma probabilidade de um evento temido.

Esse remate é de grande serventia para a hipótese, por ser capaz de evidenciar uma solução que afasta a inconstitucionalidade do art. 273, § 1º-B, do Código Penal, e, ao mesmo tempo, aponta um viés interpretativo que o harmoniza ao postulado constitucional da proporcionalidade.

nada importa, pois a ausência de registro é elemento suficiente, segundo os incisos do § 1º-B, para se consumar o crime hediondo” (...) “Verifica-se, portanto, uma perspectiva verdadeiramente perversa: transforma-se em crime hediondo a venda de medicamentos, muitas vezes de última geração, em razão do descaso ou desorganização da Administração, que não concede o registro no prazo legal, aliás excedendo-o em alguns anos, desatendendo ao princípio da eficiência, recen-temente incluído no art. 37 da CF (LGL\1998\3), como norteador da Administração Pública” (A inconstitucionalidade da lei dos remédios. Revista dos Tribunais, vol. 763, ano, maio de 1999. Disponível em: www.revistadostribunais.com.br).

Page 192: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

192

Nessa linha, é preciso se compreender que, mesmo nos casos de delitos de perigo dito abstrato, não há uma desnecessidade da demonstração de toda e qualquer probabilidade de lesão. Abso-lutamente. O que não se demanda, porque presumido, é que se demonstre, no caso concreto, uma real situação de perigo. No entanto, há indispensabilidade que se evidencie uma probabilidade de dano, à medida que os elementos objetivos do tipo, ao serem realizados pelo agente, possam, ao menos, serem idôneos ou capazes para ofender o bem jurídico tutelado pelo ordenamento.

Com tal solução se prestigia a atividade legislativa, tão cara ao Estado Democrático, como o nosso (art. 1º, parágrafo único, CF), sem que, para tanto, tenha-se que se ofender aos valores que a Constituição de 1988 consagra para a seara punitiva.

A jurisprudência, por sua vez, encontra-se atenta ao proble-ma, conforme é possível se ver da Apelação Criminal 0011391-38.2010.4.01.3200 - AM. Tratou-se de operação, conjuntamente realizada pela ANVISA e pela Polícia Federal, que teria surpreen-dido o apelante na manutenção em depósito, em seu estabeleci-mento mercantil, de cento e oito latas de Vick Vaporub, importado do México e que não se encontrava registrado pela agência acima mencionada. O juiz singular proferiu édito de absolvição sumária.

Em sede de apelação, o relator expôs que a hipótese retratava atipicidade, justamente pela evidente ausência de periculosidade para a saúde pública do uso de referida substância. Sumariando a motivação do julgamento, eis a ementa abaixo:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. ABSOLVIÇÃO SUMÁ-RIA. DELITO DO ART. 273, § 1º - B, I, DO CP. IMPORTAR, VENDER, EXPOR À VENDA, TER EM DEPÓSITO PARA VENDER MEDICAMENTO SEM REGISTRO NO ÓRGÃO COMPETENTE DE PRODUTO DESTINADO A FINS TERAPÊUTICOS OU MEDICINAIS. ATIPICIDADE DA CONDUTA. POTENCIALIDADE LESIVA NÃO EVIDEN-CIADA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. 1. Mantida a sentença que absolveu sumariamente o réu da prática do delito do art. 273, § 1º - B, I, do CP, por atipicidade da conduta (art. 397, III, CPC). 2. Doutrinariamente o crime do art. 273 e seus parágrafos é crime formal e de perigo abstrato, não exigindo para a

Page 193: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

193

sua consumação a existência de resultado naturalístico. 3. Na hipótese em que a conduta não possui potencia-lidade lesiva à saúde pública, fica afastado o elemento subjetivo do tipo, consistente no dolo de perigo. 4. Atipicidade da conduta. Lesividade ínfima. 5. Apelação a que se nega provimento. Mantida a absol-vição sumária do réu (Terceira Turma, v.u., rel. Des. Fed. Ney Bello, julgamento em 04-11-2014).

A preocupação com os atritos entre a nova redação do art. 273 do Código Penal e a Lei Básica veio, posteriormente, reforçada pelo reconhecimento, por parte da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, durante o desate do HC 239.363-PR (un., j. 26/02/2015, DJe 10/04/2015), da inconstitucionalidade do preceito secundário do seu § 1º-B, V, justamente em face de uma violação à proporcionalidade da atuação legislativa.

Ao motivar o seu entendimento, o relator, Min. Sebastião Reis Júnior, realçou que tal desproporcionalidade, verificada entre a ação tipificada no art. 273, § 1º-B, V (ter em depósito, para venda, produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais de procedência ignorada) e a pena cominada, tem sua razão de ser em torno da indispensabilidade do dano concreto à saúde dos usuários, remate que – inegavelmente – é capaz de repercutir quanto ao modo de interpretação do tipo do inciso I.

Não competia – é certo – à acusação demonstrar que, em vir-tude da aplicação do produto Fine Tox, todos, ou alguns pacientes, viessem a sofrer danos à sua incolumidade física.

Não menos correto, portanto, afirmar-se caber ao Ministério Público, ao se desincumbir do ônus que lhe impõe o art. 155 do Código de Processo Penal, evidenciar, sem espaço para dúvidas, que, em tese, tal produto é prejudicial à saúde humana.

Nos autos, consta laudo pericial elaborado que somente teve início no mês de fevereiro de 2013, por integrantes do Laboratório de Imunopatologia Keizo Azami (LIKA) da Universidade Federal de Pernambuco. Para tanto, não foram examinadas, de forma separada, para cada processo, o material apreendido.

Diversamente, procedeu-se, ao que parece, a uma análise global, assim distribuída: a) noventa e três recipientes de vidro

Page 194: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

194

transparente, com massa bruta total de 551 gramas, sem rótulos, com tampa plástica cor branca; b) quarenta e nove recipientes de vidro transparente, com massa bruta total de 291 gramas, sem rótulos, com tampa plástica cor azul, na qual constam as inscrições em alto relevo “FLIP” e “OFF”; e c) dez recipientes de vidro trans-parente, com massa bruta total de 75 gramas, sem rótulos, com tampa plástica cor laranja. Para fins de confronto, foram solicitadas amostras dos laboratórios que fabricam produtos similares e que possuem registro na ANVISA.

Quando do Item VI, destinado à resposta aos quesitos, impor-tante destacar a seguinte conclusão:

Ao 4. Foram identificadas, pelos métodos empregados, as seguintes substâncias, nos produtos questionados. a) Produtos com tampa de cor branca. Manitol e sacarose; b) Produtos com tampa de cor azul. Manitol, sacarose, albumina e hemaglutininas; c) Produtos com tampa de cor laranja. Manitol e sacarose. Com relação aos produtos questionados com tampas de cor branca e laranja, a presença apenas dos açúcares sacarose e manitol, não permite aos Peritos inferir sobre sua identificação. A identificação das substâncias sacarose, manitol, albu-mina e hemaglutininas, indicam que possivelmente os produtos questionados de tampa azul correspondam a um produto farmacêutico que tem como princípio ativo a toxina Botulínica de tipo A, na forma de pó liófilo injetá-vel, porém em uma concentração inferior aos produtos farmacêuticos registrados na ANVISA. Entretanto, o complexo ativo do produto farmacêutico, a neurotoxina de massa molecular relativa de 150 kDa, não foi cons-tatado nos produtos questionados, talvez devido à baixa concentração, tornando os resultados não conclusivos. Novos experimentos deverão ser realizados visando à identificação de proteínas em menores quantidades”. (Laudo 232/2012 - SETEC/SR/DPF/PE, fls. 100/101 do volume 3 do Apenso)

Não somente da passagem acima, mas observado integral-mente o laudo pericial, é de se observar que não consta informa-ção de que, no caso concreto, as substâncias analisadas seriam capazes de, ao menos em tese, acarretar perigo à saúde humana.

Page 195: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

195

Sendo assim, sou forçado a compreender que não se pode cogitar de ação típica. Pelo menos, essa é a única solução que harmoniza o tipo em exame com a exigência de proporcionalida-de, baliza que reclama prevalência por força do art. 5º, LIV, da Lei Maior (devido processo legal substantivo).

Trata-se, assim, de uma interpretação que conforma o art. 273, bem assim seus parágrafos, ao texto constitucional inspirado nos valores democráticos.

Ressalva-se, no entanto, a possibilidade da constatação de infração administrativa, cujos pressupostos objetivos e subjetivos são diversos, análise que compete, com exclusividade, à Admi-nistração Pública, seja pelos órgãos próprios, ou pelos conselhos fiscalizadores dos profissionais da medicina.

Pela argumentação acima, tem-se que a apelação do Minis-tério Público, portanto, não merece ser provida, na parte na qual pretende a condenação do acusado como incurso nas penas do art. 273, § 1º-B, do Código Penal.

O recurso do Ministério Público vai além da pretensão quanto à condenação do acusado como incurso nas penas do art. 273, § 1º-B, do Código Penal. Pretende o reconhecimento da caracteri-zação do delito tipificado no art. 7º, IX, da Lei 8.137/90. Trata-se de um fundamento autônomo.

A mesma motivação, por sua vez, conduz ao provimento da apelação do réu, para o fim de afastar a incidência do art. 273, § 2º, do Código Penal.

Conforme exaustivamente exposto, a configuração do delito do art. 273, § 1º-B, do mencionado diploma, exige que o produto farmacêutico seja capaz de ofender, uma vez abstratamente con-siderado, a saúde humana. Isso, se é aplicável – é óbvio – à forma dolosa, com mais razão se impõe à modalidade culposa.

Remanesce, contudo, a apreciação de suposta ofensa ao art. 7º, IX, da Lei 8.137/90.

Penso, mais uma vez, que não prospera o argumento da parte acusadora. Inicialmente, porque, em se tratando de medicamento, incide concurso aparente de normas, a qual se revolve pelo critério

Page 196: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

196

da especialidade, razão por que uma suposta tipicidade recairia unicamente no art. 273 e seus parágrafos do Código Penal.

Ainda que assim não fosse, a incidência do art. 7º, IX, da Lei 8.137/90, demandaria a informação inconteste de que o produto se afigura impróprio para o uso a que se destina e que gerou ex-pectativa no consumidor.

Nesse sentido, eis o deliberado pelo Superior Tribunal de Justiça no RHC 49.752-SC, no qual são mencionados inúmeros precedentes:

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO (ARTIGO 7º, INCISO IX, DA LEI 8.137/1990). DENÚNCIA. CRIME QUE DEIXA VESTÍGIOS. MATERIALIDADE DELITIVA. NECESSIDADE DE EXAME DE CORPO DE DELITO. PRESUNÇÃO LEGAL DE IMPROPRIEDADE AO CON-SUMO. CONCEITO PREVISTO EM NORMA ESTADUAL. OFENSA À REGRA CONSTITUCIONAL DE COMPETÊN-CIAS LEGISLATIVAS. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. TRANCAMENTO. INSURGÊNCIA PROVIDA.1. Da leitura do artigo 7º, inciso IX, da Lei 8.137/90, percebe-se que se trata de delito contra as relações de consumo não transeunte, que deixa vestígios materiais, sendo indispensável, portanto, a realização de perícia para a sua comprovação, nos termos do artigo 158 do Código de Processo Penal. Doutrina. Precedentes do STJ e do STF.2. Na hipótese dos autos, a recorrente foi dada como in-cursa no delito em comento, pois, em operação realizada em conjunto por diversos órgãos estatais destinados à tutela das relações de consumo, foram encontrados no estabelecimento comercial pelo qual era responsável legal diversos produtos “sem registro no SIE” expostos à venda.3. O acórdão recorrido reputou suficientes as informações contidas no auto de infração lavrado pelas referidas au-toridades, tendo em vista o conceito de matérias-primas e mercadorias impróprias ao consumo previsto no artigo 18, § 6º, inciso II, do Código de Defesa do Consumidor, combinado com o Decreto Estadual n° 31.455/87, o qual estabelece os requisitos da propriedade ao consumo de alimentos e bebidas para fins de comercialização.

Page 197: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

197

4. A conclusão exarada pela Corte de origem significaria dar relevância penal a decreto apto a produzir efeitos apenas no âmbito da referida unidade da federação, em flagrante ofensa à competência privativa da União para legislar sobre Direito Penal, prevista no artigo 22, inciso I, da Constituição Federal.5. Em casos como tais, uma persecução criminal condi-zente com os princípios e objetivos de um Estado Demo-crático de Direito deve ser acompanhada de comprovação idônea da materialidade delitiva, conforme preceitua o artigo 158 do Código de Processo Penal, não sendo admissível a presunção de impropriedade ao consumo de produtos expostos à venda com base exclusivamente no conteúdo de normas locais, circunstância que revela a flagrante ausência de justa causa na hipótese.6. Recurso provido para determinar o trancamento da ação penal deflagrada em desfavor da recorrente.(RHC 49.752/SC, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 14/04/2015, DJe 22/04/2015)

No caso em análise, o laudo pericial, antes mencionado, não se mostra conclusivo quanto à circunstância apontada.

Com essas considerações, nego provimento ao apelo da acu-sação e dou provimento à apelação do réu, julgando improcedente a pretensão punitiva contra ele formulada.

É como voto.

Page 198: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

198

EMBARGOS INFRINGENTES NA AÇÃO RESCISÓRIA Nº 6.898-PE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGAEmbargante: COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS - CBTUEmbargados: PRISCILA CLÁUDIA SANTANA DA SILVA E JOACY BARBOSA DE SOUZARepte.: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃOAdvs./Procs.: DRS. NELSON WILIANS FRATONI RODRIGUES E OUTROS (EMBTE.)

EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATOS APROVADOS DEN-TRO DO NÚMERO DE VAGAS OFERTADAS NO EDITAL. LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL. SUPERAÇÃO DOS LIMITES ORÇAMENTÁRIOS IMPOSTOS. NÃO COMPROVAÇÃO. RESPON-SABILIZAÇÃO DO ADMINISTRADOR, NÃO DOS CANDIDATOS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PRO-PORCIONALIDADE (EXIGIBILIDADE).- Embargos infringentes opostos pela COMPA-NHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS - CBTU em face de acórdão, não unânime, do Pleno desta egrégia Corte Regional, que julgou procedente a ação rescisória ajuizada pelos particulares embargados nos termos do voto exarado pelo Desembargador Federal José Maria Lucena.- Na espécie, o voto vencido exarado pelo De-sembargador Federal Edilson Nobre divergiu do voto vencedor proferido pelo Desembargador Federal José Maria Lucena no tocante ao enten-dimento de que a simples alegação de que teria sido atingido o limite de contratação previsto no parágrafo único do art. 22 da Lei Complementar nº 101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal, seria suficiente para afastar o dever da CBTU de efetivar em seu quadro de pessoal os particulares

Page 199: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

199

embargados, devidamente aprovados, dentro do número de vagas, no concurso público realizado por aquela sociedade de economia mista.- Por sua vez, o entendimento do voto vencedor foi no sentido de que, considerando a orientação do STF quando do julgamento do RE 598.099/MS, submetido à sistemática da repercussão geral prevista no § 3º art. 543-B do CPC, no bojo do qual ficou estabelecido que, durante o prazo de validade do concurso público, a Administração Pública tem o dever de nomear todos os apro-vados dentro do número de vagas previstas no edital do certame, a CBTU seria obrigada a efe-tivar os embargados em seu quadro de pessoal, sobretudo quando, nos autos, não há qualquer prova que corrobore a efetiva impossibilidade de nomeação (situação superveniente, imprevi-sível, grave ou indispensável à organização do orçamento público).- O embargante, em suas razões, pugna pela improcedência da ação rescisória ajuizada pe-los embargados com base nas alegações de: a) ausência de violação literal ao inciso IV do art. 37 da Constituição Federal, eis que não ocorreu preterição na contratação de aprovado no con-curso, esclarecendo que a nomeação não ocor-reu por conta de a despesa total com pessoal haver excedido os limites estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal; b) impossibilidade de reexame de provas em sede de ação rescisória; c) impossibilidade de julgamento de ação resci-sória com base em mudança de entendimento jurisprudencial em razão da aplicabilidade, ao caso, da inteligência da Súmula nº 343 do Supre-mo Tribunal Federal - STF.- Afasto a impossibilidade de reexame de provas em sede de ação rescisória, tendo em vista que o acórdão embargado teve como fio condutor a assertiva segundo a qual eventual sobrecarga

Page 200: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

200

orçamentária não poderia servir de pretexto para a recusa à nomeação dos candidatos aprova-dos dentro do número de vagas oferecidas no edital, pois o impacto financeiro deveria ter sido verificado de forma prévia por meio de estudo e avaliação detida do quadro financeiro da entidade contratante.- No que concerne à impossibilidade de julga-mento de ação rescisória com base em mudança de entendimento jurisprudencial em razão da aplicabilidade, ao caso, da inteligência da Sú-mula nº 343 do Supremo Tribunal Federal - STF, tenho que, conforme assentado em firme juris-prudência, “tal enunciado sumular tem incidência apenas quando há interpretação controvertida de lei federal nos tribunais; não, porém, quando se cuida da exegese de preceito constitucional”. (AR 199800111310, JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJ DATA: 14/06/2004 PG: 00153 RDDT VOL.: 00107 PG: 00126 RSTJ VOL.: 00185 PG: 00039 ..DTPB:.).- Registre-se que o voto dissidente não negou a procedência do direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital do concurso, autorizando en-tender que tal construção jurisprudencial à época da prolação do acórdão rescindindo já havia se assentado, limitando-se a apontar como empe-cilho para tal a superação do limite estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal. - A superação dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal impõe, em verdade, a responsabilização do administrador público por infringência às normas de direito financeiro, e não dos candidatos, que cumpriram de forma escrupulosa os termos do certame. - A não contratação dos ora embargados cons-tituiu, na situação posta, evidente ofensa ao princípio da proporcionalidade, na sua dimensão

Page 201: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

201

da exigibilidade (necessidade), pois, para dar cabo ao cumprimento dos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, evitando a ofensa ao direito subjetivo do candidato apro-vado em concurso público dentro do número de vagas disponibilizadas, poderia a embargante promover outras providências saneadoras do desequilíbrio financeiro, de molde a configurar quadro menos gravoso aos concursados, sem descurar da obtenção do mesmo resultado.- Embargos infringentes não providos.

ACÓRDÃO

Decide o Pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento aos embargos infringentes, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigrá-ficas que passam a integrar o presente julgado.

Recife, 22 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO

BRAGA:

Trata-se de embargos infringentes (fls. 611/620) opostos pela COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS - CBTU em face de acórdão (fls. 603/605), não unânime, do Pleno desta egrégia Corte Regional, que julgou procedente a ação rescisória ajuizada pelos particulares embargados nos termos do voto exarado pelo Desembargador Federal José Maria Lucena (fls. 583/592).

Restou vencido o Desembargador Federal Edilson Nobre, que negou provimento à ação rescisória por entender que, na espécie, a simples alegação de que teria sido atingido o limite de contrata-ção previsto no parágrafo único do art. 22 da Lei Complementar nº 101/2000 – Lei de Responsabilidade Fiscal seria suficiente para afastar o dever da CBTU de efetivar em seu quadro de pessoal os particulares embargados, devidamente aprovados, dentro do

Page 202: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

202

número de vagas, no concurso público realizado por aquela so-ciedade de economia mista (fls. 601/601-v).

Nas razões dos presentes embargos infringentes, alega, em síntese, a CBTU:

a) a ausência de violação literal ao inciso IV do art. 37 da Constituição Federal;

b) a impossibilidade de reexame de provas em sede de ação rescisória;

c) a impossibilidade de julgamento de ação rescisória com base em mudança de entendimento jurisprudencial em razão da aplicabilidade, ao caso, da inteligência da Súmula nº 343 do Supremo Tribunal Federal - STF.

Contrarrazões apresentadas às fls. 648/659-v.

Admitido o recurso, vieram-se os autos conclusos por distri-buição.

É o relatório.

Ao eminente Revisor.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO

BRAGA (Relator):

Trata-se de embargos infringentes (fls. 611/620) opostos pela COMPANHIA BRASILEIRA DE TRENS URBANOS - CBTU em face de acórdão (fls. 603/605), não unânime, do Pleno desta egrégia Corte Regional, que julgou procedente a ação rescisória ajuizada pelos particulares embargados nos termos do voto exarado pelo Desembargador Federal José Maria Lucena (fls. 583/592).

Pois bem. Na espécie, o voto vencido (fls. 601/601-v) exarado pelo Desembargador Federal Edilson Nobre divergiu do voto ven-cedor proferido pelo Desembargador Federal José Maria Lucena (fls. 583/592) por entender que a simples alegação de que teria sido atingido o limite de contratação previsto no parágrafo único do art. 22 da Lei Complementar nº 101/2000 – Lei de Responsa-bilidade Fiscal seria suficiente para afastar o dever da CBTU de efetivar em seu quadro de pessoal os particulares embargados,

Page 203: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

203

devidamente aprovados, dentro do número de vagas, no concurso público realizado por aquela sociedade de economia mista.

Confira-se:Administração Pública traça sua linha de argumentação a partir do entendimento de que não se faz possível a contratação do impetrante por ter sido excedido o limite previsto no art. 22, parágrafo único, da Lei Complementar nº 101/2000, Lei de Responsabilidade Fiscal, sendo, por-tanto, vedado o provimento de cargo público, admissão ou contratação de pessoal a qualquer título, ressalvadas as hipóteses previstas em lei.

(...)

Em assim sendo, penso que quando o limite máximo com gasto de pessoal fixado pela Lei de Responsabilidade Fiscal é atingido por parte do órgão de Poder contratante, a nomeação de candidatos torna-se juridicamente inviável enquanto persistir o desequilíbrio fiscal. (Fls. 601/601-v)

Por sua vez, o entendimento do voto vencedor (fls. 583/592) foi no sentido de que, considerando a orientação do STF quando do julgamento do RE 598.0991/MS, submetido à sistemática da

1 RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL. DIREITO À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS. I. DIREITO À NOMEAÇÃO. CANDIDATO APRO-VADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. Dentro do prazo de validade do concurso, a Administração poderá escolher o momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público. Uma vez publicado o edital do concurso com número específico de vagas, o ato da Administração que declara os candidatos aprovados no certame cria um dever de nomeação para a própria Administração e, portanto, um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas (...). III. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO. Quando se afirma que a Administração Pública tem a obrigação de nomear os aprovados dentro do número de vagas previsto no edital, deve-se levar em consideração a possibilidade de situações excepcionalíssimas que justifi-quem soluções diferenciadas, devidamente motivadas de acordo com o interesse público. Não se pode ignorar que determinadas situações excepcionais podem exigir a recusa da Administração Pública de nomear novos servidores. Para jus-

Page 204: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

204

repercussão geral prevista no § 3º2 do art. 543-B do CPC, no bojo do qual ficou estabelecido que, durante o prazo de validade do concurso público, a Administração Pública tem o dever de nomear todos os aprovados dentro do número de vagas previstas no edital do certame, a CBTU seria obrigada a efetivar os embargados em seu quadro de pessoal, sobretudo quando, nos autos, não há qual-quer prova que corrobore a efetiva impossibilidade de nomeação (situação superveniente, imprevisível, grave ou indispensável à organização do orçamento público).

Confira-se:Pois bem, no caso dos autos, observa-se que os autores, ambos, foram aprovados dentro do número de vagas dis-postas no edital do concurso, bem assim que não houve

tificar o excepcionalíssimo não cumprimento do dever de nomeação por parte da Administração Pública, é necessário que a situação justificadora seja dotada das seguintes características: a) Superveniência: os eventuais fatos ensejadores de uma situação excepcional devem ser necessariamente posteriores à publicação do edital do certame público; b) Imprevisibilidade: a situação deve ser determi-nada por circunstâncias extraordinárias, imprevisíveis à época da publicação do edital; c) Gravidade: os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis devem ser extremamente graves, implicando onerosidade excessiva, dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das regras do edital; d) Necessidade: a solução drástica e excepcional de não cumprimento do dever de nomeação deve ser extremamente necessária, de forma que a Administração somente pode adotar tal medida quando absolutamente não existirem outros meios menos gravosos para lidar com a situação excepcional e imprevisível. De toda forma, a recusa de nomear candidato aprovado dentro do número de vagas deve ser devidamente motivada e, dessa forma, passível de controle pelo Poder Judiciário. (...) V. NE-GADO PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. (STF, RE 598099/MS, Rel.: Ministro Gilmar Mendes, Órgão Julgador: TRIBUNAL PLENO, Julgado em: 18/08/2011, DJ: 30/09/2011)

2 Art. 543-B. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica controvérsia, a análise da repercussão geral será processada nos ter-mos do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, observado o disposto neste artigo.

(...)§ 3º Julgado o mérito do recurso extraordinário, os recursos sobrestados

serão apreciados pelos Tribunais, Turmas de Uniformização ou Turmas Recur-sais, que poderão declará-los prejudicados ou retratar-se. (Incluído pela Lei nº 11.418, de 2006)

Page 205: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

205

recusa motivada às nomeações, mas simples omissão do Administrador Público.

Apenas por ocasião da apresentação de informações, documento esse contendo 22 (vinte e duas) páginas, a autoridade impetrada menciona, brevemente, que a de-cisão liminar, proferida em favor dos então impetrantes, “contratia o disposto no art. 5º, inc. II, da Constituição Federal/88, bem como o art. 22 da Lei de Responsabili-dade Fiscal” (fl. 208).

Tal afirmação só foi robustecida com mais alguns argu-mentos na peça de apelação. Entretanto, jamais foi corro-borada por um sequer documento capaz de demonstrá-la, ainda que indiciariamente.

(...)

A decisão rescindenda, tomando por verdade absoluta a breve alegação constante das informações da autoridade tida por coatora, olvidou por completo a ausência de pro-vas nesse sentido e, também, o fato de que uma eventual sobrecarga orçamentária já deveria ter sido verificada previamente, por ocasião do estudo do impacto financeiro do preenchimento das vagas oferecidas no edital, jamais podendo servir, portanto, de pretexto para recusar-se a CBTU a nomear os candidatos aprovados dentro do nú-mero de vagas oferecidas no edital. (Fls. 590/591)

Fixadas estas premissas, passo à análise do mérito, destacan-do, inicialmente, o enunciado normativo que prescreve a situação ensejadora do manejo dos embargos infringentes, verbis:

Art. 530. Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da divergência.

Assim, considerando que, no caso, a divergência é restrita à possibilidade de nomeação dos particulares embargados, por conta da superação do limite previsto no art. 22, parágrafo único, da Lei Complementar nº 101/2000, Lei de Responsabilidade Fiscal, conclui--se que, por força da segunda parte do dispositivo legal em destaque, o efeito devolutivo dos presentes embargos infringentes deve ser restrito à matéria que foi alvo de dissidência no acórdão embargado.

Page 206: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

206

Nas palavras de Fredie Didier Jr. e Leonardo José Carneiro da Cunha (sem grifos no original):

O efeito devolutivo dos embargos infringentes restringe--se, contudo ao objeto da divergência. Se a divergência for total, será reexaminado todo o julgamento em razão da interposição dos embargos infringentes. Caso, todavia, a divergência seja parcial, os embargos se restringem ao objeto da divergência, possibilitando o reexame apenas dessa matéria que foi alvo de dissidência no julgamento originário.3

Sucede que o embargante, em suas razões, pugna pela im-procedência da ação rescisória ajuizada pelos embargados com base nas alegações de: a) ausência de violação literal ao inciso IV do art. 37 da Constituição Federal, eis que não ocorreu preterição na contratação de aprovado no concurso, esclarecendo que a nomeação não ocorreu por conta de a despesa total com pessoal haver excedido os limites estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal; b) impossibilidade de reexame de provas em sede de ação rescisória; c) impossibilidade de julgamento de ação rescisória com base em mudança de entendimento jurisprudencial em razão da aplicabilidade, ao caso, da inteligência da Súmula nº 3434 do Supremo Tribunal Federal - STF.

Nesse contexto, afasto, desde já, a impossibilidade de reexame de provas em sede de ação rescisória, tendo em vista que o acór-dão embargado teve como fio condutor a assertiva segundo a qual eventual sobrecarga orçamentária não poderia servir de pretexto para a recusa à nomeação dos candidatos aprovados dentro do

3 DIDIER JR. Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito proces-sual civil – meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos tribunais, Volume 3, 8ª edição, Salvador, Jus Podivm, 2010.

4 Cabimento. Ação Rescisória. Ofensa a Literal Dispositivo Baseado em Texto Legal de Interpretação Controvertida nos Tribunais.

Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a de-cisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais. (STF Súmula nº 343 - 13/12/1963 - Súmula da Jurisprudência Pre-dominante do Supremo Tribunal Federal - Anexo ao Regimento Interno. Edição: Imprensa Nacional, 1964, p. 150.)

Page 207: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

207

número de vagas oferecidas no edital, pois o impacto financeiro deveria ter sido verificado de forma prévia por meio de estudo e avaliação detida do quadro financeiro da entidade contratante.

No que concerne à impossibilidade de julgamento de ação res-cisória com base em mudança de entendimento jurisprudencial em razão da aplicabilidade, ao caso, da inteligência da Súmula nº 343 do Supremo Tribunal Federal - STF, tenho que tal óbice não deve ser acolhido, tendo em vista que o precedente citado no acórdão embargado, que reconheceu o direito à nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital, teve como lastro a evolução da jurisprudência do STF, que culminou no julgamento do RE nº 227.480, publicado no DJe de 21/08/2009, no qual restou assentado que há direito subjetivo à nomeação, salvo se sobrevier interesse público que determine que, por uma nova circunstância, o que acontecer na hora da convocação ponha abaixo o edital.

Registre-se que, conforme restou demonstrado, o voto dissi-dente não negou a procedência do direito subjetivo à nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital do concurso, autorizando entender que tal construção juris-prudencial à época da prolação do acórdão rescindindo já havia se assentado, limitando-se a apontar como empecilho para tal a su-peração do limite estabelecido na Lei de Responsabilidade Fiscal.

Ademais, conforme assentado em firme jurisprudência, “Tal enunciado sumular tem incidência apenas quando há interpretação controvertida de lei federal nos tribunais; não, porém, quando se cuida da exegese de preceito constitucional”. (AR 199800111310, JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJ DATA: 14/06/2004 PG: 00153 RDDT VOL.: 00107 PG: 00126 RSTJ VOL.: 00185 PG:00039 ..DTPB:.)

No que concerne à superação dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal como razão fundante para a não con-tratação dos embargados, ainda que tenham se classificado no certame dentro do número de vagas oferecidas, mantenho o meu posicionamento ao concordar com os termos do voto do relator por ocasião do julgamento da ação rescisória (fl. 594), ressaltando, ademais, que tal circunstância, ao reverso do pretendido, impõe,

Page 208: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

208

em verdade, a responsabilização do administrador público por infringência às normas de direito financeiro, e não dos candidatos, que cumpriram de forma escrupulosa os termos do certame.

Observo, por complemento, que a não contratação dos ora em-bargados constituiu, na situação posta, evidente ofensa ao princípio da proporcionalidade, na sua dimensão da exigibilidade (necessida-de), pois, para dar cabo ao cumprimento dos limites estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal, evitando a ofensa ao direito subjetivo do candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas disponibilizadas, poderia a embargante, como bem ponderou o Desembargador Federal FRANCISCO BARROS DIAS (fl. 599), promover a extinção dos cargos de confiança e re-duzir o pagamento de horas-extras aos demais servidores, como providências saneadoras do desequilíbrio financeiro, de molde a constituir quadro menos gravoso aos concursados, sem descurar da obtenção do mesmo resultado.

Por fim, releva considerar que a alegação acerca da inexistên-cia de disponibilidade orçamentária como óbice à nomeação dos candidatos não se presta a eximir a Administração de tal obrigação, eis que a verificação da existência de disponibilidade orçamentária deve anteceder a publicação do Edital, não podendo a Adminis-tração suscitar esse argumento após a divulgação dos resultados. (APELREEX - 14057 Rel. Desembargador Federal MARCELO NAVARRO - TRF5 - Órgão julgador: TERCEIRA TURMA - DJe - DATA: 21/06/2011 - Página: 525 - DECISÃO UNÂNIME)

Tal circunstância restou precisamente delimitada no seguinte trecho do voto do relator do acórdão embargado:

De fato, a existência de disponibilidade orçamentária para a contratação dos candidatos é uma questão que precede a publicação do edital, não se apresenta minimamente razoável que a Administração invoque este argumento após a realização das provas e divulgação dos resultados. Aliás, a decisão da Suprema Corte alude claramente à necessidade de que os fatos ensejadores do descum-primento da proposta firmada por meio do edital sejam posteriores a ele.

Posto isso, nego provimento aos embargos infringentes. É como voto.

Page 209: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

209

EMBARGOS INFRINGENTES NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 529.944-SE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLIVEIRA LIMA Embargante: UNIÃOEmbargados: LUCIANO BISPO DE LIMA E OUTROParte R.: CARMEN SILVA ALVES DOS SANTOS Parte A.: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALAdvs./Procs.: DRS. GILBERTO VIEIRA LEITE NETO E OUTROS (EMBDOS.)

EMENTA: ADMINISTRATIVO. EMBARGOS IN-FRINGENTES. SUCESSIVAS PRORROGAÇÕES DE CONTRATO, NÃO JUSTIFICADAS, POR TEMPO SUPERIOR AO PERMITIDO E COM INCLUSÃO DE SERVIÇOS NÃO ORIGINALMENTE PREVISTOS. PRETENSO COMETIMENTO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA POR VIOLAÇÃO AOS PRIN-CÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA (LEI 8.429/92, ART. 11). AUSÊNCIA, TODAVIA, DE MÁ--FÉ. EMBARGOS IMPROVIDOS.- Cuida-se de embargos infringentes opostos pela UNIÃO, nos autos de ação civil pública por impro-bidade administrativa, pretendendo a reforma do julgado para a condenação dos réus (ex-prefeito e ex-secretário do Município de Itabaiana/SE) pelo ilícito previsto no art. 11, I, da LIA.- A controvérsia objeto dos embargos cinge-se à qualificação (ou não) de ímprobas às sucessivas prorrogações (não justificadas devidamente, por tempo superior ao permitido legalmente e com inclusão de serviços não originalmente previs-tos) de contrato administrativo. O voto que se pretende fazer prevalecer é o proferido no sentido da condenação.- A denúncia narrou a ocorrência de burla ao princípio licitatório por ocasião das sucessivas prorrogações do Contrato n° 01/97, decorrente

Page 210: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

210

do certame na modalidade concorrência, tendo como objeto a execução de diversas obras as-sociadas a saneamento, infraestrutura urbana e melhoria habitacional (valor de mais de 10 milhões de reais) durante o ano de 1997. Os ser-viços seriam os seguintes (fl. 1145, Apenso 6): 1. Serviço de drenagem pluvial;2. Coletora de águas servidas (rede coletora);3. Sistema de esgotos sanitários (rede coletora);4. Sistema de esgotos sanitários (estação de tratamento de esgotos);5. Sistema de esgotos sanitários (emissário para gravidade);6. Pavimentação;7. Construção de casas e urbanização de lotes;8. Pavimentação e drenagem do povoado Quei-mada;9. Sistema de esgotamento sanitários (emissá-rio);10. Sistema de esgotamento sanitários (sub--bacia);11. Sistema de esgotamento sanitários (estação elevatória).- Haja vista a enormidade do objeto do contrato, necessita-se, para sua realização, de um longo pe-ríodo de tempo, distinguindo-se de outras aven-ças em que o prazo pode ser mensurado e resta previsto no próprio instrumento. A prorrogação do prazo inicialmente estabelecido não é estra-nha à Lei de Licitações, que prevê, em seu art. 57, exceções à norma de que os contratos firmados ficam adstritos à vigência dos respectivos crédi-tos orçamentários. A hipótese dos autos não faz parte do rol de ressalvas da lei. A despeito disso, verifica-se que o negócio firmado com a empresa vencedora em 12/01/1998 foi prorrogado pelo 37° termo aditivo pelo menos até o dia 31/12/2004, ex-cedendo em muito o prazo inicialmente previsto (420 dias, cf. fl. 1146).

Page 211: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

211

- A cada repasse das verbas pela Caixa Eco-nômica Federal, um novo aditivo era assinado com a Construtora Andrade Galvão Engenharia Ltda., vencedora da licitação, sendo formalizados 40 (quarenta) aditivos ao contrato original (fls. 1150 e ss. do Apenso 6), entre prorrogações, suspensões e aprovações de preços e quantita-tivos, todos com parecer jurídico favorável pela assessoria do município.- É certo que não houve superfaturamento, con-soante Ofício da Caixa Econômica Federal (fls. 630/631) e Certidão do Tribunal de Contas de Sergipe (fl. 632). Tampouco há elementos que apontem desvio ou apropriação de verbas pú-blicas, pelo que a controvérsia cinge-se à pecha de ímprobas às irregularidades perpetradas, bem como na existência do dolo.- Inexistente na conduta dos réus a perniciosi-dade, má-fé, ou mesmo malícia, pois cada um dos termos aditivos teve parecer jurídico favo-rável pela assessoria do município, pelo que se presume a convicção de que se estava agindo dentro da lei. O mesmo pode-se dizer do objeto do contrato. A licitação foi realizada poucos anos depois da vigência da Lei de Licitações (8.666/93); e naquela época não era incomum a realização de certames com amplos objetos. Dessa maneira, não se pode ampliar a previsão legal para nela enquadrar condutas meramente irregulares, conforme entendimento do STJ.- Embargos infringentes não providos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que figu-ram como partes as acima indicadas, decide o Pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por maioria, negar provimento aos embargos infringentes, nos termos do voto do Relator e das notas taquigráficas, que passam a integrar o presente julgado.

Page 212: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

212

Recife, 17 de junho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBERTO DE OLI-VEIRA LIMA - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBER-

TO DE OLIVEIRA LIMA:

Cuida-se de embargos infringentes opostos pela UNIÃO, nos autos de ação civil pública por improbidade administrativa, preten-dendo a reforma do julgado para a condenação dos réus LUCIANO BISPO DE LIMA, ex-prefeito, e ROBERTO BISPO DE LIMA, ex--secretário de infraestrutura e planejamento, ambos vinculados ao Município de Itabaiana/SE, pelo ilícito previsto no art. 11, I, da Lei de Improbidade Administrativa. Eis a ementa do acórdão objurgado:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDA-DE ADMINISTRATIVA. LICITAÇÃO. CARTA-CONVITE. EXECUÇÃO DE CONTRATO. ADITIVOS. MERAS IR-REGULARIDADES ADMINISTRATIVAS. INEXISTÊNCIA DE DOLO. FALTA DE PROVA DE CONDUTA ÍMPROBA. RECURSOS PROVIDOS. ABSOLVIÇÃO.1 - Em 1997 não foi efetuado nenhum repasse. Ao todo, de ano não fixado nos autos a 2003, em diversos repas-ses, a soma total atingiu o valor de R$ 8.632.251,26, tendo o município contribuído com R$ 1.110.251,26, ao que acrescenta a soma de R$ 74.885,49, “de rendimen-tos de aplicações financeiras que foram utilizados no mesmo objeto do contrato”. A própria citação feita pela r. sentença dos contratos de repasses 125894-46/2001, 140861-61 e 140862- 85/2002, mostra que a quantia re-passada pela Caixa Econômica Federal não se verificou no ano de 1997, pela menção aos anos de 2001 e 2002, respectivamente.2 - O contrato foi fruto da Concorrência Pública n° 001/97, em obediência à Lei de Licitações.3 - Os serviços, a serem executados em cada repasse – melhorias habitacionais em áreas urbanas e rurais (uma vez), implantação de sistema de tratamento de esgota-mento sanitário (uma vez), pavimentação e drenagem (duas vezes), melhoria das condições habitacionais

Page 213: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

213

(duas vezes), a construção de canal, pavimentação e drenagem (uma vez), pavimentação de ruas (uma vez) e, enfim, pavimentação e drenagem de ruas (uma vez) – se encaixam perfeitamente nos itens de serviços indicados no contrato celebrado entre a Prefeitura Municipal de Itabaiana e a Andrade Galvão Engenharia Ltda., em 12 de janeiro de 1998. Como se enquadravam nos itens de serviço, ocorreu – pelo que se colhe dos autos – que, cada vez os recursos eram repassados pela Caixa Eco-nômica Federal, em 13 de novembro de 2000, em 23 de dezembro de 2000, em 12 de dezembro de 2001, em 3 de julho de 2002 (três contratos), e em 21 de novembro de 2002, respectivamente, a Prefeitura Municipal de Itabaiana assinava um aditivo com a Construtora Andra-de Galvão Engenharia Ltda., no entendimento de estar agindo dentro da Lei de Licitação, levando em conta a concorrência de licitação pública, da qual a referida firma sagrou-se vencedora.4 - Se verificaram apenas irregularidades, plenamente justificáveis, porque os apelantes outorgaram à empre-sa vencedora apenas os serviços indicados no contrato celebrado em 12 de janeiro de 1998, tendo promovido novos certames de licitações para outros serviços no mu-nicípio de Itabaiana, como a documentação dos anexos, fartamente, demonstra.5 - O Tribunal de Contas da União, no final, multou o apelante Luciano Bispo de Lima em R$ 10.000,00, ante a presença de irregularidades formais na execução de di-versas obras fruto de licitações outras, examinadas todas em conjunto, mas – o que é importante – sem detectar nenhuma improbidade administrativa em sua conduta, a ponto de determinar apenas, com relação ao Município de Itabaiana, uma série de recomendações, sem ordenar a remessa de cópias para exame de alguma medida, cível ou penal, contra os apelantes, além de finalizar as determinações com o arquivamento dos autos, de modo que nenhuma improbidade administrativa foi percebida no julgamento operado pelo Tribunal de Contas da União.6 - Apelações cíveis providas.

Os embargos visam à prevalência do voto vencido do Desem-bargador Federal Francisco Cavalcanti, sob o argumento de que a não condenação (na via administrativa) pelo TCU não ilidiria a

Page 214: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

214

condenação por improbidade administrativa, mesmo porque as instâncias seriam independentes e o dano restaria presumido.

Contrarrazões apresentadas (fls. 665/671).

Houve revisão.

É que importa relatar.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO ROBER-

TO DE OLIVEIRA LIMA (Relator):

Cuida-se de embargos infringentes opostos pela UNIÃO, nos autos de ação civil pública por improbidade administrativa, pretendendo a reforma do julgado para a condenação dos réus LUCIANO BISPO DE LIMA, ex-prefeito do Município de Itabaiana/SE, e ROBERTO BISPO DE LIMA, ex-secretário de infraestrutura e planejamento, pelo ilícito previsto no art. 11, I, da LIA.

A controvérsia objeto dos embargos cinge-se à qualificação (ou não) de ímprobas às sucessivas prorrogações (não justificadas devidamente, por tempo superior ao permitido legalmente e com inclusão de serviços não originalmente previstos) de contrato. O voto que se pretende fazer prevalecer é o proferido pelo Desem-bargador Francisco Cavalcanti.

O voto-vencedor, da lavra do Desembargador José Maria Lucena, foi no sentido do provimento dos apelos, levando em consideração, dentre outros elementos, o julgamento das contas pelo Tribunal de Contas da União que, detectando a presença de diversas irregularidades, não as julgou como ato de improbidade, somente aplicando multa e determinando ao município uma série de recomendações (fls. 69 e ss. do Apenso 1).

Pois bem.

A inicial narrou a ocorrência de burla ao princípio licitatório por ocasião das sucessivas prorrogações do Contrato n° 01/97, decorrente do certame na modalidade concorrência, tendo como objeto a execução de diversas obras associadas a saneamento, infraestrutura urbana e melhoria habitacional (valor de mais de 10 milhões de reais) durante o ano de 1997. Os serviços seriam os seguintes (fl. 1145, Apenso 6):

Page 215: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

215

1- Serviço de drenagem pluvial;

2. Coletora de águas servidas (rede coletora);

3. Sistema de esgotos sanitários (rede coletora);

4. Sistema de esgotos sanitários (estação de tratamento de esgotos);

5. Sistema de esgotos sanitários (emissário para gravidade);

6. Pavimentação;

7. Construção de casas e urbanização de lotes;

8. Pavimentação e drenagem do povoado Queimada;

9. Sistema de esgotamento sanitários (emissário);

10. Sistema de esgotamento sanitários (sub-bacia);

11. Sistema de esgotamento sanitários (estação elevatória).

Induvidoso, pelo amplo objeto licitado, que se tratou de um contrato “guarda-chuva”, com a concentração de diversos serviços numa mesma licitação, quando o objeto poderia ter sido fracionado, assim como também pareceu ao Tribunal de Contas da União (fls. 69 e ss. do volume 1).

Com efeito, a enormidade do objeto do contrato impõe, para sua realização, um longo período de tempo, distinguindo-se de outras avenças em que o prazo pode ser mensurado e resta pre-visto no próprio instrumento. A prorrogação do prazo inicialmente estabelecido não é estranha à Lei de Licitações, que prevê, em seu art. 57, exceções à norma de que os contratos firmados ficam adstritos à vigência dos respectivos créditos orçamentários. A hipótese dos autos, certo, não faz parte do rol de ressalvas da lei.

A despeito disso, verifica-se que o contrato firmado com a empresa vencedora em 12/01/1998 foi prorrogado pelo 37° termo aditivo pelo menos até o dia 31/12/2004, excedendo em muito o prazo inicialmente previsto (420 dias, cf. fl. 1146).

O termo aditivo é instrumento acessório ao contrário, que tem como finalidade efetuar acréscimos ou supressões, ou pequenos ajustes, como adequação de quantitativos, modificações de prazos ou adaptações das especificações desejadas em contrato anterior-

Page 216: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

216

mente firmado, desde que as alterações/acréscimos/supressões não configurem em alterações substanciais no que já fora pactuado. A modificação no projeto das especificações permitida pela Lei de Licitações diz respeito a ajustes que provêm da necessidade de-tectada quando já na execução do contrato. A previsão legal não pode ser utilizada para inclusões provenientes de novas demandas de serviços/produtos surgidas após a assinatura do contrato.

Pelo que se extrai dos autos, a cada repasse das verbas pela Caixa Econômica Federal, um novo aditivo era assinado com a Construtora Andrade Galvão Engenharia Ltda., vencedora da licita-ção, sendo formalizados 40 (quarenta) aditivos ao contrato original (fls. 1150 e ss. do Apenso 6), entre prorrogações, suspensões e aprovações de preços e quantitativos, todos com parecer jurídico favorável pela assessoria do município.

É certo que não houve superfaturamento, consoante Ofício da Caixa Econômica Federal (fls. 630/631) e Certidão do Tribunal de Contas de Sergipe (fl. 632). Tampouco há elementos que apontem desvio ou apropriação de verbas públicas, pelo que a controvérsia cinge-se à pecha de ímprobas às irregularidades perpetradas, bem como na existência do dolo.

Militam contra os réus os seguintes argumentos:

a) o objeto da licitação foi extremamente genérico, frustrando as diretrizes da economicidade e competitividade que norteiam os certames;

b) ausência de indicação precisa dos recursos orçamentários correspondentes;

c) inexistência de detalhamento minucioso do objeto do con-trato;

d) ausência de justificação para as prorrogações dos prazos;

A essa altura, cabe um pequeno registro: o art. 11 da LIA pres-cinde, para sua configuração, do concurso de uma das situações previstas nos seus incisos, bastando, tão somente, que a conduta amolde-se ao descrito no caput, que funciona como cláusula geral em relação ao disposto nos incisos. É esse o entendimento do STJ (vide REsp 1377703/GO, REsp 1080221/RS).

Page 217: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

217

Quanto ao elemento subjetivo, é necessária, para o enqua-dramento no tipo previsto no art. 11 da Lei 8.429/92, a presença do dolo, a vontade consciente de desatender às previsões legais específicas para a conduta:

ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRA-VO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LICITAÇÃO. ENTEN-DIMENTO DO TRIBUNAL A QUO DE AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CONDUTA DOLOSA. PRETENSÃO RECURSAL QUE ESBARRA NO ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.1. É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, para que seja configurado o ato de improbidade de que trata a Lei 8.429/99, “é necessária a demonstração do elemento subjetivo, consubstanciado pelo dolo para os tipos previstos nos artigos 9º e 11 e, ao menos, pela culpa, nas hipó-teses do artigo 10” (REsp 1.261.994/PE, Rel. Min. BE-NEDITO GONÇALVES, Primeira Turma, DJe 13/4/12).2. O Tribunal de origem concluiu, diante do caso concreto, pela ausência dos elementos aptos à configuração do ato de improbidade administrativa.3. A inversão do julgado, nos termos propostos pelo Minis-tério Público Federal, demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, procedimento vedado nos termos da Súmula 7/STJ.4. Consoante entendimento do Superior Tribunal de Justiça, “a tipificação da lesão ao patrimônio público (art. 10, caput, da Lei 8.429/92) exige a prova de sua ocorrência, mercê da impossibilidade de condenação ao ressarcimento ao erário de dano hipotético ou presumido” (REsp 939.118/SP, Rel. Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe 1º/3/11).5. Agravo regimental não provido.(AgRg no AREsp 107.758/GO, Rel. Ministro ARNAL-DO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/12/2012, DJe 10/12/2012)

Não vislumbro na conduta dos réus a perniciosidade, má-fé ou mesmo malícia. Cada um dos termos aditivos teve parecer jurídico favorável pela assessoria do município, pelo que se presume a convicção de que se estava agindo dentro da lei. O mesmo pode-se

Page 218: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

218

dizer do objeto do contrato. A licitação foi realizada poucos anos depois da vigência da Lei de Licitações (8.666/93); e na época não era incomum a realização de certames com amplos objetos.

Dessa maneira, não se pode ampliar a previsão legal para nela enquadrar condutas meramente irregulares, conforme en-tendimento do STJ:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, CAPUT, DA LEI 8.429/92. LICITAÇÃO. PARTICIPAÇÃO INDIRETA DE SERVIDOR VINCULADO À CONTRATAN-TE. ART. 9º, III E § 3º, DA LEI 8.665/93. FALTA SUPRIDA ANTES DA FASE DE HABILITAÇÃO. SÚMULA 07/STJ. AUSÊNCIA DE DANO AO ERÁRIO. MÁ-FÉ. ELEMENTO SUBJETIVO ESSENCIAL À CARACTERIZAÇÃO DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.1. O caráter sancionador da Lei 8.429/92 é aplicável aos agentes públicos que, por ação ou omissão, violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, lealdade às instituições e notadamente: (a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); (b) causem prejuízo ao erário público (art. 10); (c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11) compreendida nesse tópico a lesão à moralidade administrativa.2. A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e ímprobo, e a ilegalidade só adquire o status de impro-bidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvado pela má-intenção do administrador.3. A improbidade administrativa está associada à noção de desonestidade, de má-fé do agente público, do que decorre a conclusão de que somente em hipóteses ex-cepcionais, por força de inequívoca disposição legal, é que se admite a sua configuração por ato culposo (artigo 10 da Lei 8.429/92).4. O elemento subjetivo é essencial à caracterização da improbidade administrativa, sendo certo, ainda, que a tipi-ficação da lesão ao patrimônio público (art. 10, caput, da Lei 8.429/92) exige a prova de sua ocorrência, mercê da impossibilidade de condenação ao ressarcimento ao erário de dano hipotético ou presumido. Precedentes do STJ: REsp 805.080/SP, PRIMEIRA TURMA, DJe 06/08/2009;

Page 219: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

219

REsp 939142/RJ, PRIMEIRA TURMA, DJe 10/04/2008; REsp 678.115/RS, PRIMEIRA TURMA, DJ 29/11/2007; REsp 285.305/DF, PRIMEIRA TURMA; DJ 13/12/2007; e REsp 714.935/PR, SEGUNDA TURMA, DJ 08/05/2006.5. In casu, a ausência de má-fé dos demandados (ele-mento subjetivo) coadjuvada pela inexistência de dano ao patrimônio público, assentado no voto condutor do acórdão recorrido, verbis: “consoante se infere da perícia levada a efeito, os serviços contratados foram efetiva e satisfatoriamente prestados, não tendo sido registra-do qualquer prejuízo ou perda financeira e/ou contábil causado à Administração e, ao revés, reconhecida pelo Tribunal de Contas do Estado a regularidade da licitação (fls. 857/861). Na verdade, não restou demonstrado no curso do processo a prática de ato ilícito dos réus que constituísse lesão ao erário público e possibilitasse a indenização pelos prejuízos suportados” (fl. 1458), revela error in judicando a análise do ilícito apenas sob o ângulo objetivo.6. Ademais, a exegese das regras insertas no art. 11 da Lei 8.429/92, considerada a gravidade das san-ções e restrições impostas ao agente público, deve ser realizada com ponderação, máxime porque uma interpretação ampliativa poderá acoimar de ímpro-bas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, posto ausente a má-fé do administrador público e preservada a moralidade administrativa e, a fortiori, ir além do que o legislador pretendeu.7. Outrossim, é cediço que não se enquadra nas espécies de improbidade o administrador inepto. Precedentes: REsp 1149427/SC, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17/08/2010, DJe 09/09/2010; e REsp 734984/SP, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/12/2008, DJe 16/06/2008.8. O recurso especial não é servil ao exame de ques-tões que demandam o revolvimento do contexto fático--probatório dos autos, em face do óbice erigido pelo teor da Súmula 07/STJ.9. In casu, o recurso especial não reúne condições de admissibilidade quanto à apontada violação ao art. 9º, III, § 3º, da Lei 8.666/93, mormente porque a questão relativa à participação, nas primeiras fases de procedimento licita-

Page 220: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

220

tório, antecedentes à habilitação, de empresa que contava em seus quadros com a presença de servidor da autarquia contratante, e a posterior sanação desse vício em razão da demissão do servidor – foi solucionada pelo Tribunal a quo à luz do contexto fático-probatório engendrado nos autos, consoante se infere da fundamentação expendida no voto condutor do acórdão recorrido, portanto insindi-cável pelo STJ, ante a ratio essendi da Súmula 07/STJ.10. Ad argumentandum tantum, ainda que assim não fosse, é mister nessas hipóteses de impossibilidade ale-gada, que se comprove que o servidor atuou como insider information o que, in casu, não ocorreu.11. Deveras, em sede de ação de improbidade admi-nistrativa da qual exsurgem severas sanções, o dolo não se presume. Precedentes do STJ: AgRg no Ag 1324212/MG, SEGUNDA TURMA, DJe 13/10/2010; e REsp 1140315/SP, SEGUNDA TURMA, DJe 19/08/2010.12. Recurso especial parcialmente conhecido, e, nesta parte, desprovido.(REsp 939.118/SP, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 15/02/2011, DJe 01/03/2011)

A essa mesma conclusão chegou a douta maioria, formada a partir do voto do Desembargador José Maria Lucena:

Há apenas o entendimento de que seria legal a realiza-ção dos serviços, constantes da concorrência pública nº 01/97, pela empresa vencedora. Tanto que, na imensa maioria dos Aditivos de nºs 21 a 40, existentes no vol. 6, às fls. 1.152, 1.155, 1.158, 1.161, 1.164, 1.167, 1.172, 1.175, 1.178, 1.185, 1.190, 1.193, 1.197 e 1.202, res-pectivamente, a mostrar a preocupação dos apelantes com a legalidade dos aditivos referidos. Depois, há de se observar que o primeiro repasse para os serviços, dentro da documentação constantes dos apensos, só veio a se concretizar em 13 de novembro de 2000, mais de dois anos depois de assinado o contrato de 12 de janeiro de 1998, fazendo com que os apelantes ligassem a finalidade do repasse para com o contrato referido, aumentada a convicção de legalidade com o parecer da assessoria jurídica, fato já mencionado.

Tanto não há burla alguma que o Tribunal de Contas da União, no final, multou o apelante Luciano Bispo de

Page 221: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

221

Lima em R$ 10.000,00, fl. 113, vol. 1 do apenso, ante a presença de irregularidades formais na execução de di-versas obras, fruto de licitações outras, examinadas todas em conjunto, mas – o que é importante – sem detectar nenhuma improbidade administrativa em sua conduta, a ponto de determinar apenas, com relação ao Município de Itabaiana, uma série de recomendações, como se vê dos itens 9.2.1 a 9.2.5, sem ordenar a remessa de cópias para exame de alguma medida, cível ou penal, contra os apelantes, além de finalizar as determinações com o arquivamento dos autos, tudo como se constata da mencionada fl. 113 do vol. 1 do apenso, de modo que nenhuma improbidade administrativa foi percebida no julgamento operado pelo Tribunal de Contas da União, sendo de se estranhar que a douta sentença, ao destacar trechos do julgamento referido, não tenha se preocupado em fazer referência à conclusão aqui firmada.

Em consequência, não vendo conduta dolosa dos ape-lantes, não tendo o valor de todos os contratos saído da equação financeira inicial, não tendo ocorrido nenhuma le-são ao erário federal, estando todas as obras dos aditivos previstas no Contrato de Concorrência Pública nº 01/97, não tendo, enfim, o Tribunal de Contas da União perce-bido nenhuma conduta de improbidade administrativa, não vejo como manter a condenação imposta pelo douto juízo de primeiro grau, e, nesse sentido, dou provimento aos recursos de apelação, para julgar improcedentes a presente ação.

Não vejo como dissentir.

Assim, nego provimento aos embargos infringentes.

É como voto.

Page 222: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

222

EMBARGOS INFRINGENTES NA APELAÇÃO CÍVEL Nº 551.125-PB

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADOEmbargante: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALEmbargado.: PORTAL ADMINISTRADORA DE BENS LTDA.Assist.: ASSOCIAÇÃO PARAIBANA DOS AMIGOS DA NA- TUREZA - APAN E MUNICÍPIO DE JOÃO PESSOA (PB)Partes Int.: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA E MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUALRepte.: PROCURADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª RE- GIÃOAdvs./Procs.: DRS. SANDRA LEAL PESSOA E OUTRO, ROBER- TO NOGUEIRA GOUVEIA E OUTROS E MARCOS DOS ANJOS PIRES BEZERRA E OUTROS

EMENTA: AMBIENTAL. CAUTELAR PREPARA-TÓRIA DE AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OBRAS NO MANAÍRA SHOPPING, ÀS MARGENS DO RIO JAGUARIBE/PB. LEGISLAÇÃO QUE NÃO PRE-SERVAVA ÁREA ANTROPIZADA. NOVO CÓDIGO FLORESTAL. INAPLICABILIDADE. PERIGO DA DEMORA. NÃO DEMONSTRAÇÃO.- Embargos infringentes interpostos pelo MPF contra acórdão não unânime que cassou a sen-tença que, em sede de medida cautelar preparató-ria de ação civil pública, determinara a suspensão de obras no Manaíra Shopping insertas na faixa de 50 metros de largura, ao longo da faixa mar-ginal do Rio Jaguaribe, medida a partir do seu nível mais alto, em projeção horizontal.- A divergência estabelecida entre o voto ven-cido e o voto condutor restringe-se à apelação do particular, especialmente no que concerne à interpretação das normais ambientais que esta-belecem as áreas de preservação permanente, bem como à possibilidade de incidência dos

Page 223: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

223

dispositivos do Novo Código Florestal.- Desde a inauguração do Manaíra Shopping até os dias atuais, foram várias as alterações legislativas acerca das normas ambientais que tratam da preservação de vegetação ao longo dos rios. Porém, não houve qualquer modificação na redação do caput do art. 2º da Lei nº 4.771/1965, pelo que se pode afirmar que, nas faixas margi-nais ao longo dos rios, o antigo Código Florestal somente cuidava da vegetação nativa, já que seus dispositivos visavam a proteger a própria cobertura vegetal: o ambiente florestal.- Não há como prevalecer a tese do MPF de que a proteção conferida à área em debate é anterior à construção do shopping, em 1989, haja vista que, no caso concreto, as obras objeto desta cautelar estão inseridas em área totalmente antropizada, já degradada, sem vegetação típica, inclusive que já consta com a construção de um estacio-namento pavimentado descoberto. Não havendo no local cobertura vegetal nativa, nem ambiente preservável segundo a lei de regência em vigor à época, não há previsão legal que imponha a suspensão das obras.- No que concerne à aplicação do Novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), que revogou a Lei nº 4.771/1965, tem-se que as áreas de preserva-ção permanente passaram a se submeter a um novo regramento. Desde então, deixou de existir a restrição prevista no art. 2º da Lei nº 4.771/1965, que considerava de preservação permanente apenas as “florestas e demais formas de vege-tação natural”. Todavia, não se vislumbra a pos-sibilidade de aplicação deste novo regramento à hipótese dos autos, em consonância com o entendimento firmado pelo STJ no sentido de que o Novo Código Florestal não pode retroagir para atingir ato jurídico perfeito, direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada, sendo essa a posi-

Page 224: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

224

ção que vem sendo seguida em outros julgados, visando afastar a insegurança jurídica para os proprietários de terras e órgãos ambientais.- Não demonstrada a presença do requisito do perigo da demora no caso concreto, posto que não se vislumbra incremento nos danos ambien-tais pela construção das obras em debate em área que já se encontra inteiramente urbanizada.- Embargos infringentes improvidos.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os presentes autos, decide o Pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por maioria, negar provi-mento aos embargos infringentes, nos termos do relatório e voto anexos, que passam a integrar o presente julgamento. Vencido o Desembargador Federal Fernando Braga.

Recife, 22 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO - Re-lator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MA-

CHADO:

O MPF e o MP/PB ajuizaram AÇÃO CAUTELAR preparatória de ação civil pública em face de PORTAL ADMINISTRADORA DE BENS LTDA., pessoa jurídica responsável pelo MANAÍRA SHOPPING, pugnando pela imposição de providências de urgên-cia, à vista de obras de ampliação do empreendimento comercial, promovidas notadamente de 2002 em diante, que, supostamente, estariam atingindo área de preservação permanente (APP) às margens do Rio Jaguaribe, em desconformidade com a legislação ambiental e ocasionando danos ao meio ambiente.

Os requerentes postularam as seguintes medidas acautelató-rias (fls. 30/31): a) suspensão de quaisquer obras e do início de novas atividades empresariais na faixa marginal de 50 metros, a partir do nível mais alto do Rio Jaguaribe (APP, segundo o art. 2º,

Page 225: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

225

a, item 2, do Código Florestal, e o art. 3º, I, b, da Resolução CO-NAMA nº 303/2002; b) depósito judicial das receitas auferidas pelo empreendimento, deduzidos os custos normais de funcionamento, na parte em que se encontra edificado sobre a APP (ou, alterna-tivamente, o depósito judicial das receitas decorrentes apenas da exploração do estacionamento).

O Juízo Federal a quo, diante das teses autorais e defensivas, julgou parcialmente procedente o pedido, para confirmar a liminar anteriormente deferida em parte e determinar a suspensão das obras de ampliação insertas na faixa de 50 metros de largura, ao longo da faixa marginal do Rio Jaguaribe, medida a partir do seu nível mais alto, em projeção horizontal, com invocação do art. 2º, a, item 2, da Lei nº 4.771/65, e do art. 3º, I, b, da Resolução CONAMA nº 303/2002 (fls. 1123/1130).

Os embargos de declaração interpostos pelo MPF (fls. 1203/1205) foram rejeitados (fls. 1219/1220).

A requerida, o MPF, o IBAMA e o MP/PB interpuseram apela-ções (fls. 1132/1164, 1223/1242, 1252/1256 e 1259/1262).

Apresentações das contrarrazões recursais (fls. 1210/1217, 1244/1249, 1272/1285, 1287/1301 e 1303/1319).

Parecer da PRR5, no sentido do desprovimento dos recursos (fls. 1330/1333).

A Terceira Turma deste TRF5, por unanimidade, negou pro-vimento às apelações do MPF, do MP/PB e do IBAMA, na linha do voto do Relator, e, por maioria, deu provimento à apelação da requerida, nos termos do voto condutor, exarado pelo Desem-bargador Federal Marcelo Navarro, que foi acompanhado pelo Desembargador Federal Luiz Alberto Gurgel de Faria, restando vencido o Desembargador Federal Geraldo Apoliano (Relator).

Em seu voto vencido (fls. 1343/1347), o Relator fundamentou, reportando-se ao pronunciamento da PRR5: 1) ausência de vege-tação no local não impede a aplicação do Código Florestal, no que atine à proteção das APP, porque essa compreensão redunda em interpretação benéfica ao próprio responsável pela supressão da cobertura florestal; 2) a obrigação de conservar APP tem natureza propter rem; 3) não houve violação ao princípio da irretroatividade

Page 226: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

226

das leis, porque a Lei nº 7.511, alteradora do Código Florestal, estabelecendo o resguardo da faixa marginal de 50 metros para os rios com largura entre 10 e 50 metros, é de 1986, ao passo que a construção do shopping remonta a 1989; 4) não ocorreu mácula ao princípio da legalidade, porque a conclusão do Juízo senten-ciante não resultou de aplicação isolada da Resolução CONAMA nº 303/2002, mas de dispositivos do Código Florestal; 5) o direito de propriedade não é absoluto, mas condicionado a uma série de restrições legais, devendo ser exercitado em atenção à sua função social; 6) não está comprovada a suposta dragagem contemporâ-nea do leito do rio, que o teria alargado, resultando em aumento da área a ser considerada como APP.

No voto vencedor (fls. 1349/1353), as razões de decidir foram as seguintes: 1) deve-se ter bom senso na aplicação de novas normas ambientais; 2) há precedentes jurisprudenciais negando a aplicação integral do novo Código Florestal a construções, em- preendimentos ou atividades preexistentes à edição dessa norma; 3) de acordo com a legislação ambiental anterior, vigente por oca-sião do licenciamento do empreendimento, não se preservava, no perímetro urbano, área à margem de rio, e sim a vegetação típica ali localizada; 4) a aplicação de normas ambientais novas não pode atingir atos jurídicos perfeitos, direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada.

O MPF, então, interpôs EMBARGOS INFRINGENTES, adu-zindo: 1) o acórdão da Terceira Turma violou o art. 6º da LINDB e os arts. 4º, I, b, e 7º da Lei nº 12.651/2012; 2) a obrigação de conservar APP é propter rem; 3) mesmo admitida a possibilidade de inexistência de vegetação em toda área marginal de 50 me-tros, à época da construção do shopping, impõe-se ao possuidor a obrigação de recompor e proteger a cobertura vegetal; 4) não foram maculados pela sentença os princípios da irretroatividade das leis e da legalidade, bem assim o direito de propriedade; 5) deve prevalecer o voto vencido.

Os embargos infringentes foram admitidos, segundo decisão de fl. 1367.

Intimados, os embargados não apresentaram contrarrazões recursais (fl. 1373).

Page 227: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

227

É o relatório.

À douta Revisão.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MA-

CHADO (Relator):

Como ensaiado no relatório, trata-se de embargos infringentes interpostos pelo MPF contra acórdão não unânime que, dando provimento à apelação da Portal Administradora de Bens Ltda., cassou a sentença que, em sede de medida cautelar preparatória de ação civil pública, determinara a suspensão de obras no Manaíra Shopping insertas na faixa de 50 metros de largura, ao longo da faixa marginal do Rio Jaguaribe, medida a partir do seu nível mais alto, em projeção horizontal.

A divergência estabelecida entre o voto vencido, de lavra do Desembargador Federal Geraldo Apoliano, e o voto condutor, de lavra do Desembargador Federal Marcelo Navarro, restringe-se à apelação do particular, especialmente no que concerne à inter-pretação das normais ambientais que estabelecem as áreas de preservação permanente, bem como à possibilidade de incidência dos dispositivos do Novo Código Florestal.

De início, destaco que o objeto destes embargos infringentes é um conjunto obras de reforma/ampliação do Manaíra Shopping realizadas por volta de 2007, em área descoberta e pavimentada, já degradada em momento anterior (construção de um muro de alvenaria, edifício garagem, instalação de subestação de energia elétrica, torres de refrigeração, área de shows e eventos e tanques de armazenamento). O próprio MPF, nestes embargos, não contra-diz a parte do voto vencedor do Desembargador Marcelo Navarro, que afirma inexistir vegetação na área em debate.

Também não cabe nestes autos a discussão se deve (ou não) o estabelecimento reparar os danos ambientais decorrentes da sua construção inicial, se é que tais danos foram causados pelo shop-ping. Note-se que na própria inicial o MPF afirma que, em meados de 1995, o proprietário do empreendimento devastou a vegetação existente e construiu um estacionamento no local, fato que ensejou o ajuizamento da Ação Civil Pública nº 200.95.000.782-9 perante a

Page 228: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

228

1ª Vara de Conflitos Agrários e do Meio Ambiente, que resultou na assinatura de alguns Termos de Ajustamento de Conduta - TAC’s visando a estabelecer compensações pelos atos ilícitos praticados.

Delimitada a controvérsia, passo à análise das questões de direito suscitadas pelo MPF nestes embargos infringentes.

Desde a inauguração do Manaíra Shopping até os dias atuais, foram várias as alterações legislativas acerca das normas ambien-tais que tratam da preservação de vegetação ao longo dos rios.

Inicialmente, por força do antigo Código Florestal (Lei nº 4.771/1965), a legislação ambiental federal considerava de pre-servação permanente as florestas e demais formas de vegetação natural ao longo dos rios, in verbis:

Art. 1° As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País, exercendo-se os direitos de propriedade, com as limitações que a legislação em geral e especialmente esta Lei estabelecem.(...).Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:a) ao longo dos rios ou de outro qualquer curso d’água, em faixa marginal cuja largura mínima será:1 - de 5 (cinco) metros para os rios de menos de 10 (dez) metros de largura:2 - igual à metade da largura dos cursos que meçam de 10 (dez) a 200 (duzentos) metros de distancia entre as margens;(...) (Grifos nossos)

Em 07/07/1986, os números da alínea a do art. 2º da Lei nº 4.771/1965 foram alterados pela Lei nº 7.511, aumentando a largura da mata ciliar a ser protegida. Confira-se a nova redação:

Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:a) ao longo dos rios ou de outro qualquer curso d’água, em faixa marginal cuja largura mínima será:

Page 229: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

229

1. de 30 (trinta) metros para os rios de menos de 10 (dez) metros de largura;2. de 50 (cinquenta) metros para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;(...). (Grifos nossos)

Em 18/07/1989, houve nova alteração do regramento da matéria com a publicação da Lei nº 7.803, que alterou a redação da alínea a do art. 2º e seus respectivos números, nos seguintes termos:

Art. 2° Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: 1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura; 2 - de 50 (cinquenta) metros para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura; (...). (Grifos nossos)

Com a publicação da Medida Provisória nº 2.166/2001, inclui--se no art. 1º da Lei nº 4.771/65 (§ 2º, inciso II) o conceito de área de preservação permanente, definida como aquelas elencadas no arts. 2º e 3º do Código Florestal, estejam ou não cobertas com vegetação nativa. Confira-se:

II - área de preservação permanente: área protegida nos termos dos arts. 2º e 3º desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;

Por seu turno, a Resolução CONAMA nº 303/2002, em seu art. 3º, I, instituiu como local de preservação permanente a área situada em faixa marginal, in verbis:

Art. 3º Constitui Área de Preservação Permanente a área situada:I - em faixa marginal, medida a partir do nível mais alto, em projeção horizontal, com largura mínima, de:

Page 230: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

230

a) trinta metros, para o curso d’água com menos de dez metros de largura;b) cinquenta metros, para o curso d’água com dez a cinquenta metros de largura;(...)

Todavia, note-se que, em que pese a introdução do conceito de área de preservação permanente, continuou o Código Florestal a proteger, nas faixas marginais ao longo dos rios, tão somente a vegetação nativa, visto que continuou inalterado o caput do art. 2º da Lei nº 4.771/65.

Perceba-se que no próprio conceito de área de preservação trazido com a edição da Medida Provisória nº 2.166/2001 está des-crito que se trata de área com sete funções ambientais, o que não se pode esperar de uma área que está completamente urbanizada.

Além disso, feriria o princípio da legalidade imaginar que uma resolução exceda os limites dados por uma lei, criando verdadeira norma jurídica autônoma.

Sobre o Código Florestal de 1965, já com redação determinada pela Medida Provisória nº 2.166/2001, leciona a doutrina de Édis Milaré que o aludido código cuida da vegetação, e não de uma área sem função ecológica:

(...) os arts. 2º e 3º do aludido Código tratam de florestas e demais formas de vegetação que não podem ser remo-vidas, tendo em vista a sua localização e a sua função ecológica. Assim, a vegetação localizada ao longo dos cursos de água [...], dada sua importância ambiental, é considerada de perservação permanente1.

Como bem asseverou o Desembargador Paulo Roberto de Oliveira Lima ao julgar a AC 552683-PE, o antigo Código Florestal (Lei nº 4.771/65) “somente cuidava de áreas ainda preserva-das, já que seus dispositivos visavam a proteger a própria cobertura vegetal, o ambiente florestal”2.

1 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. A Gestão Ambiental em foco. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 953.

2 AC 200983080000682, Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, TRF5 - Segunda Turma, DJe - Data: 19/12/2013.

Page 231: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

231

Por conseguinte, não há como prevalecer a tese do MPF de que a proteção conferida à área em debate é anterior à construção do shopping em 1989, haja vista que, no caso concreto, as obras objeto desta cautelar estão inseridas em área totalmente antropi-zada, já degradada, sem vegetação típica, inclusive que já consta com a construção de um estacionamento descoberto pavimentado. Não havendo no local cobertura vegetal nativa, nem ambiente preservável segundo a lei de regência em vigor à época, não há previsão legal que imponha a suspensão das obras.

No que concerne à aplicação do Novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), que revogou a Lei nº 4.771/1965, tem-se que as áreas de preservação permanente passaram a se submeter a um novo regramento. Desde então, deixou de existir a restrição prevista no art. 2º da Lei nº 4.771/1965 que considerava de preservação permanente apenas as “florestas e demais formas de vegetação natural”. A partir de então, ainda que não se trate área com ve-getação nativa, as faixas marginais devem ser consideradas como área de preservação permanente, pois a preocupação passou a ser com a área adjacente aos rios. Confira-se:

Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por:I - Amazônia Legal: os Estados do Acre, Pará, Amazonas, Roraima, Rondônia, Amapá e Mato Grosso e as regiões situadas ao norte do paralelo 13° S, dos Estados de To-cantins e Goiás, e ao oeste do meridiano de 44° W, do Estado do Maranhão;II - Área de Preservação Permanente - APP: área pro-tegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversi-dade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, prote-ger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas;(...)Art. 4º Considera-se Área de Preservação Perma-nente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei:I - as faixas marginais de qualquer curso d’água natural, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de:I - as faixas marginais de qualquer curso d’água na-

Page 232: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

232

tural perene e intermitente, excluídos os efêmeros, desde a borda da calha do leito regular, em largura mínima de: (Incluído pela Lei nº 12.727, de 2012). a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

Todavia, não vislumbro a possibilidade de aplicação deste novo regramento à hipótese dos autos, em consonância com o entendimento firmado pelo STJ no sentido de que o Novo Código Florestal não pode retroagir para atingir ato jurídico perfeito, direitos ambientais adquiridos e a coisa julgada, sendo essa a posição que vem sendo seguida em outros julgados, visando a afastar a insegurança jurídica para os proprietários de terras e órgãos ambientais3.

Ademais, não se pode esquecer que, em se tratando de medida cautelar, faz-se necessária a presença, além do requisito da fumaça do bom direito, a demonstração do perigo da demora, não estando este evidenciado no caso concreto, posto que não se vislumbra incremento nos danos ambientais pela construção das obras em debate em área que já se encontra inteiramente urbanizada.

Assim, nego provimento aos embargos infringentes, man-tendo o acórdão que deu provimento à apelação da Portal Admi-nistradora de Bens Ltda. para julgar improcedente esta medida cautelar.

É como voto.

3 REsp 201100461496, Herman Benjamin, STJ - Segunda Turma, DJe DATA: 11/09/2012.

Page 233: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

233

EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO (PLENO) N° 861-RN

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL EMILIANO ZAPATA LEITÃO (CONVOCADO)Excipiente.: MARIA PEREIRAExceptos.: JUÍZES FEDERAIS DA TURMA RECURSAL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO RIO GRANDE NORTEParte Int.: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE - UFRNRepte.: ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO - AGU E PROCU- RADORIA REGIONAL FEDERAL - 5ª REGIÃO

EMENTA: PROCESSUAL CIVIL. EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. JUÍZES MEMBROS DE TURMA RE-CURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS. JULGAMENTO. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL. APLICAÇÃO DO RITO DOS FEITOS REPRESENTATIVOS DE CONTROVÉR-SIA. ANALOGIA AO DISPOSTO NOS ART. 14 E 15 DA LEI Nº 10.259/01. CABIMENTO. TENTATIVA DE UTILIZAÇÃO DA EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. REJEIÇÃO.- Na ausência de um órgão recursal expressa-mente designado na Lei nº 10.259/01 para julga-mento de exceção de suspeição oposta contra juízes federais membros de Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais, e tendo em vista que a suspeição alegada é questão que trans-cende às matérias afetas exclusivamente ao âmbito de competência dos Juizados Especiais Federais, dizendo respeito à própria idoneidade da prestação jurisdicional, e sendo de evidente interesse jurídico do Tribunal Regional Federal a que vinculados aqueles juízes a sua aprecia-ção (inclusive, ante às potenciais repercussões funcionais-administrativas em relação à conduta dos magistrados em relação aos quais alegada a suspeição), impõe-se o reconhecimento da competência do Tribunal Regional Federal da 5ª

Page 234: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

234

Região para julgamento da presente exceção de suspeição, por aplicação subsidiária do art. 313 do CPC, e do procedimento/competência existen-te em relação aos Juízes Federais componentes da Justiça Federal da 5ª Região.- A utilização do rito processual do representativo de controvérsia à presente exceção, com a reten-ção no órgão julgador de origem das centenas de exceções de suspeição de idêntico conteúdo propostas em processos de idêntica natureza na qual a parte autora tem representação judi-cial idêntica, ademais, é medida processual que encontra respaldo nos princípios da economia e celeridade processual que norteiam os Juizados Especiais Federais e na aplicação analógica das disposições da própria Lei nº 10.259/01 relativas ao processamento de incidentes de uniformiza-ção de jurisprudência e recursos extraordinários (arts. 14 e 15 da referida Lei) sob essa sistemá-tica processual, vez que, cuidando-se de ques-tionamento processual de idêntica natureza e conteúdo àquele que embasa todas as referidas exceções já propostas (em número inicial de 118, mas com notícias de oposição de mais algumas centenas), se mostraria contraproducente e con-trário à própria lógica regente da simplicidade processual dos Juizados Especiais Federais a necessidade de processamento e julgamento individual de cada um desses incidentes, quando as questões neles postas são idênticas.- Na hipótese, pois, a decisão da presente exce-ção de suspeição deve, por analogia ao previsto nos arts. 14 e 15 da Lei nº 10.259/01, ser aplicada em relação a todas as exceções de suspeição idênticas em processos de igual natureza àquele na qual proposta esta, ficando essa aplicação autorizada, desde logo, ao órgão julgador de ori-gem, uma vez concluído o presente julgamento.- Quanto ao mérito da presente exceção de sus-

Page 235: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

235

peição, vê-se, pela simples leitura da sua petição inicial, que a excipiente pretende a sua utilização para afastar o julgador natural da causa por dis-cordar das decisões por ele proferidas nela e em mais uma centena de causas de igual natureza, ou seja, pretende a excipiente utilizar esta exce-ção como sucedâneo recursal, finalidade para a qual ela não se presta.- Essa conclusão é reforçada pelo fato de que fo-ram propostas centenas de exceções de suspei-ção de idêntico conteúdo em processos de igual natureza na qual os Juízes Federais da Turma Recursal dos Juizados Especiais do Rio Grande do Norte haviam aplicado sistemática de nega-tiva de subida à instância superior de recursos das partes autoras, com mesma representação judicial, e, diante da oposição de sucessivos embargos de declaração, aplicado multa por natureza protelatória destes e condicionado a interposição de novos recursos ao depósito des-ta, sendo a irresignação da excipiente dirigida, em realidade, contra essas decisões judiciais e a tentativa de afastamento dos julgadores ape-nas uma forma de tentar viabilizar a reversão daquelas pela atuação de outros julgadores que tivessem entendimento diverso dos exceptos.- A parcialidade invocada diz respeito ao mérito do entendimento dos julgadores e ao fato de que a excipiente já havia tentado na via correcional, sem sucesso, a adequação deste ao posiciona-mento sobre a condução do feito que ela enten-de correto, o que, também, reforça a conclusão acima de tentativa de utilização da exceção de suspeição como sucedâneo recursal.- Esse evidente desvirtuamento da utilização da exceção de suspeição autoriza, portanto, a sua rejeição de plano.- Improcedência da presente exceção de suspei-ção, autorizando a aplicação do rito processual

Page 236: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

236

dos feitos representativos de controvérsia a ela, com a negativa de seguimento pelo órgão julga-dor de origem a todas as exceções de suspeição de idêntico conteúdo e natureza já propostas perante aquele e aquelas que, de igual forma, vierem a sê-lo, sem necessidade de sua subida a este Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

ACÓRDÃO

Vistos etc., decide o Pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à unanimidade, julgar improcedente a exceção de suspeição, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 29 de julho de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL EMILIANO ZAPATA LEITÃO - Relator Convocado

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL EMILIANO ZA-

PATA LEITÃO (Convocado):

Trata-se de exceção de suspeição proposta por Maria Perei-ra, autora no Processo nº 0502251-21.2013.4.05.8400, contra os membros da Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, Juízes Federais Almiro José da Rocha Lemos e Francisco Glauber Pessoa Alves, sob o fundamento de ausência de imparcialidade dos magistrados referi-dos, o que restaria demonstrado pela forma de condução por esses juízes federais pelo fato de terem eles e uma outra juíza substituta atuante naquele órgão recursal (Juíza Federal Substituta Sophia Nóbrega), proferido decisões abusivas no processo, aplicando “prejudicialidade” com base em um julgado da TNU que não foi selecionado pelo órgão competente, que não analisou o mérito do recurso, que não transitou em julgado, pautado em norma in-constitucional e que contraria jurisprudência pacífica do STJ, bem como, ainda, terem considerados como protelatórios embargos de declaração opostos pela parte autora e aplicado-lhe multa, além

Page 237: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

237

de terem condicionado a interposição de qualquer outro recurso ao pagamento dessa multa em desobediência ao momento processual previsto para essa determinação.

Sustenta que a parcialidade dos magistrados está demonstrada pela sua representação à Corregedoria Regional e pela decisão teratológica produzida após esse fato.

A decisão de fls. 279/280, do Juiz Federal Presidente da Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, considerando a interposição de 117 exce-ções de suspeição idênticas à presente em processos em que as partes autoras estão representadas pelo mesmo advogado, com idênticas razões delas embaixadoras, determinou a reunião dos 117 (cento e dezessete processos) e a subida de uma única exceção de suspeição para julgamento pelo TRF da 5ª Região, ficando as demais exceções no aguardo do julgamento desta.

A 4ª Turma do TRF da 5ª Região, ante à relevância das ques-tões objeto da presente exceção de suspeição do ponto de vista processual relativas à competência par sua apreciação, ao rito a ela atribuído e à repercussão potencial sobre diversos feitos de igual conteúdo, determinou a afetação da sua apreciação ao Pleno do TRF da 5ª Região.

É o relatório.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL EMILIANO ZA-

PATA LEITÃO (Relator Convocado):

Na ausência de um órgão recursal expressamente designado na Lei nº 10.259/01 para julgamento de exceção de suspeição oposta contra juízes federais membros de Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais, e tendo em vista que a suspeição alegada é questão que transcende às matérias afetas exclusiva-mente ao âmbito de competência dos Juizados Especiais Federais, dizendo respeito à própria idoneidade da prestação jurisdicional e sendo de evidente interesse jurídico do Tribunal Regional Federal a que vinculados aqueles juízes a sua apreciação (inclusive, ante às potenciais repercussões funcionais-administrativas em relação à conduta dos magistrados em relação aos quais alegada a sus-

Page 238: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

238

peição), impõe-se o reconhecimento da competência do Tribunal Regional Federal da 5ª Região para julgamento da presente exce-ção de suspeição, por aplicação subsidiária do art. 313 do CPC, e do procedimento/competência existente em relação aos juízes federais componentes da Justiça Federal da 5ª Região.

A utilização do rito processual do representativo de controvérsia à presente exceção, com a retenção no órgão julgador de origem das centenas de exceções de suspeição de idêntico conteúdo pro-postas em processos de idêntica natureza na qual a parte autora tem representação judicial idêntica, ademais, é medida processual que encontra respaldo nos princípios da economia e celeridade processual que norteiam os Juizados Especiais Federais e na aplicação analógica das disposições da própria Lei nº 10.259/01 relativas ao processamento de incidentes de uniformização de jurisprudência e recursos extraordinários (arts. 14 e 15 da referida Lei) sob essa sistemática processual, vez que, cuidando-se de questionamento processual de idêntica natureza e conteúdo àquele que embasa todas as referidas exceções já propostas (em número inicial de 118, mas com notícias de oposição de mais algumas centenas), se mostraria contraproducente e contrário à própria lógica regente da simplicidade processual dos Juizados Especiais Federais a necessidade de processamento e julgamento individual de cada um desses incidentes, quando as questões neles postas são idênticas.

Na hipótese, pois, a decisão da presente exceção de suspeição deve, por analogia ao previsto nos arts. 14 e 15 da Lei nº 10.259/01, ser aplicada em relação a todas as exceções de suspeição idênti-cas em processos de igual natureza àquele na qual proposta esta, ficando essa aplicação autorizada, desde logo, ao órgão julgador de origem, uma vez concluído o presente julgamento.

Quanto ao mérito da presente exceção de suspeição, vê-se, pela simples leitura da sua petição inicial, que a excipiente pre-tende a sua utilização para afastar o julgador natural da causa por discordar das decisões por ele proferidas nela e em mais uma centena de causas de igual natureza, ou seja, pretende a excipiente utilizar esta exceção como sucedâneo recursal, finalidade para a qual ela não se presta.

Page 239: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

239

Essa conclusão é reforçada pelo fato de que foram propostas centenas de exceções de suspeição de idêntico conteúdo em processos de igual natureza na qual os Juízes Federais da Turma Recursal dos Juizados Especiais do Rio Grande do Norte haviam aplicado sistemática de negativa de subida à instância superior de recursos das partes autoras, com mesma representação judicial, e, diante da oposição de sucessivos embargos de declaração, aplicado multa por natureza protelatória destes e condicionado a interposição de novos recursos ao depósito desta, sendo a irresig-nação da excipiente dirigida, em realidade, contra essas decisões judiciais e a tentativa de afastamento dos julgadores apenas uma forma de tentar viabilizar a reversão daquelas pela atuação de ou-tros Julgadores que tivessem entendimento diverso dos exceptos.

A parcialidade invocada diz respeito ao mérito do entendimento dos julgadores e ao fato de que a excipiente já havia tentado na via correcional, sem sucesso, a adequação deste ao posicionamento sobre a condução do feito que ela entende correto, o que, também, reforça a conclusão acima de tentativa de utilização da exceção de suspeição como sucedâneo recursal.

Esse evidente desvirtuamento da utilização da exceção de suspeição autoriza, portanto, a sua rejeição de plano.

Improcedência da presente exceção de suspeição, autori-zando a aplicação do rito processual dos feitos representativos de controvérsia a ela, com a negativa de seguimento pelo órgão julgador de origem a todas as exceções de suspeição de idêntico conteúdo e natureza já propostas perante aquele e àquelas que, de igual forma, vierem a sê-lo, sem necessidade de sua subida a esta Tribunal Regional Federal da 5ª Região.

É como voto.

Page 240: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

240

HABEAS CORPUS Nº 5.875-RN

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊLO JÚNIOR (CONVOCADO)Impetrante: DIEGO TOBIAS DE CASTRO BEZERRAImpetrado: JUÍZO DA 10ª VARA FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTEPaciente: BIANCA FERNANDES DE NEGREIROS LOBATO

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO À COMUNIDADE. EXECUÇÃO QUE ESTÁ EM CONFORMIDADE COM AS CONDIÇÕES PESSOAIS DA APENADA. ART. 148 DA LEI DE EXECUÇÃO PENAL. MODIFICAÇÃO DO LOCAL DA EXECUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM DENEGADA.- Habeas corpus impetrado contra decisão que indeferiu o pedido de alteração do local de cum-primento de pena alternativa de prestação de serviços à comunidade.- Hipótese em que a paciente foi condenada a uma pena de 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, c/c art. 29, ambos do Código Penal, em virtude de fraude documental perpetrada contra o Fisco, a qual foi substituída por duas penas restritivas de direitos e prestação pecuniária.- A paciente foi designada para cumprir a pena alternativa nas funções de auxiliar de serviços gerais em abrigo de idosos na Cidade de Mossoró (RN), e pretende mudar de local sob a alegação de que estaria sujeita ao contato direto com produtos de limpeza, poeira, fungos e outros agentes nocivos à saúde, que podem trazer risco à sua vida.- Não se concebe que uma instituição destinada a abrigar idosos possa apresentar nível de insa-

Page 241: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

241

lubridade incompatível com o estado de saúde da paciente, ou mesmo que seja um ambiente que possa trazer risco à sua vida. - O fato da paciente ser acometida de rinite alérgica é insuficiente para amparar o pedido de mudança do local do cumprimento da pena alternativa, e os sucesssivos adiamentos para o início do cumprimento da pena demonstram uma tentativa da paciente de se furtar a prestar o serviço comunitário no local designado pelo Juízo da execução.- O Juízo da Execução poderá, em qualquer fase da execução, motivadamente, modificar a forma de cumprimento da pena alternativa de prestação de serviços à comunidade, quando tal circuns-tância se mostrar necessária para conciliar com as condições pessoais do condenado e às ca-racterísticas do estabelecimento designado (art. 148 da Lei de Execução Penal). As circunstâncias do caso concreto não amparam a concessão da mudança pretendida. - Ordem de habeas corpus denegada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indi-cadas, decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5a Região, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, na forma do relatório e voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 27 de agosto de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊLO JÚNIOR - Relator Convocado

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊ-

LO JÚNIOR (Convocado):

Page 242: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

242

Habeas corpus impetrado em face da decisão que indeferiu o pedido de alteração do local de cumprimento de pena alternativa de prestação de serviços à comunidade.

A paciente foi condenada a uma pena de 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, pela prática do crime previsto no art. 171, § 3º, c/c art. 29, ambos do Código Penal, em virtude de fraude documental perpetrada contra o Fisco.

A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos e prestação pecuniária.

Em audiência realizada em 18.03.2014 ficou definido que a apenada deveria realizar a prestação de serviços comunitários junto ao Instituto Amantino Câmara, na Cidade de Mossoró (RN), à razão de 14 (quatorze) horas semanais. A pena pecuniária foi estabelecida no quantum de 150 (cento e cinquenta) dias-multa, no valor unitário de 1/10 do salário mínimo.

Na petição de fls. 114/115 a paciente alegou que em meados de setembro de 2014 iniciou o cumprimento da pena junto ao abrigo Instituto Amantino Câmara, exercendo as funções de auxiliar de serviços gerais e de auxiliar de cozinheira.

Por meio do presente writ, o impetrante pretende alterar o local da prestação do serviço comunitário a ser cumprido pela paciente. Alegou, em síntese, que:

a) os laudos e atestados médicos juntados aos autos compro-vam que a paciente é doente de asma e rinite alérgica, bem como atestam a recomendação médica para que a paciente permaneça afastada de locais fechados e abafados, bem como que se abstenha de manter contato com produtos de limpeza, poeira, baratas, fungos e penas de ave;

b) além das atividades de enfermeira e técnica de enfermagem – privativas de profissionais com qualificação nessa área – o estabelecimento onde a paciente está cumprindo sua pena oferece apenas trabalhos como auxiliar de serviços gerais, lavanderia e cozinha, sendo que em todos estes a pacien-te inevitavelmente terá que manter contato com produtos alergênicos que pioram o seu estado de saúde;

Page 243: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

243

c) há comprovação nos autos de que o manuseio de produ-tos de limpeza põe em risco à saúde da paciente e pode desencadear problemas mais graves, inclusive com risco à sua vida;

d) a paciente possui escolaridade em nível superior, com for-mação em História, e deveria ser designada para prestar o serviço comunitário perante uma das escolas públicas cadastradas perante o juízo da execução, onde poderia haver melhor aproveitamento de sua capacidade técnica;

e) em conformidade com o preceito da Dignidade da Pessoa Humana, a Lei de Execução Penal estabelece, em seu art. 46, § 3º, que a prestação de serviços à comunidade deverá ser atribuída conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho.

O Juiz de primeiro grau prestou informações onde afirma que a apenada não comprovou satisfatoriamente a impossibilidade de cumprir sua pena na instituição filantrópica designada pelo Juízo (fls. 294/295).

O requerimento liminar foi denegado pelo relator (fls. 294/295).

O Ministério Público Federal opinou pela denegação da ordem, sob o argumento de que no Instituto Amantino Câmara há ativida-des que podem ser prestadas e que são conciliáveis com o estado de saúde da paciente, inexistindo razões para se deixar de cumprir a pena de prestação de serviços na forma que foi determinada pelo Juízo da execução (fls. 307/311).

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊ-

LO JÚNIOR (Convocado):

FUNDAMENTAÇÃO

A pretensão do impetrante, em verdade, se trata de um inci-dente em sede de execução penal. Não obstante, nada impede a sua análise por meio do presente writ.

Page 244: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

244

A controvérsia diz respeito à possibilidade de se modificar o local de cumprimento de pena restritiva de direitos (prestação de serviços à comunidade) a que a apenada foi condenada a prestar em estabelecimento designado pelo Juízo da execução.

A paciente foi condenada a cumprir uma pena de 2 (dois) anos, 2 (dois) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, que foi convertida em duas penas restritivas de direitos, sendo uma de prestação de serviços à comunidade.

Em 15.05.2014, a apenada requereu a prorrogação do prazo para o início da prestação de serviços, bem como a substituição do respectivo local de cumprimento, alegando problemas de saúde que a impossibilitavam de prestar serviço comunitário no Instituto Amantino Câmara.

Contudo, o pleito da apenada foi indeferido pelo juízo da exe-cução penal, sob o argumento de inexistência de razões para se alterar o respectivo local de cumprimento da sanção, bem como em virtude da não comprovação do problema de saúde invocado para embasar o pedido.

Constatado o retardamento no início do cumprimento da sanção penal, a apenada foi intimada para justificar as razões da sua recalcitrância. Em resposta, a apenada aduziu que estava acometida de doença e a necessidade de realização de cirurgia marcada para o dia 21.05.2014, razão pela qual requereu que o início de cumprimento da pena fosse postergado em dois meses.

O Juízo da execução determinou a realização de nova audiên-cia em 27.08.2014, na qual ficou estabelecido que a prestação do serviço comunitário deveria ser feita perante o Instituto Amantino Câmara, em Mossoró (RN).

Por ocasião da referida audiência, a apenada foi devidamente cientificada de que aquela seria a última chance para o cumpri-mento das medidas que lhe foram impostas, sob pena de imediata conversão da pena restritiva de direitos em privativa de liberdade.

Portanto, verifica-se que, por ocasião da audiência admonitória, o Juízo da execução já determinou à apenada que os serviços à comunidade fossem prestados no abrigo de idosos para o qual foi designada.

Page 245: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

245

Nos termos do art. 46 do Código Penal, a prestação de servi-ços à comunidade dar-se-á em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres.

O impetrante sustenta que as atividades a serem prestadas pela apenada no Instituto Amantino Câmara são penosas e que a propria Instituição informa que naquele estabelecimento não há atividades específicas destinadas à reeducanda que “trata-se de pessoa com nível superior e não tem aptidão técnica para exercer o mister de Auxiliar de Serviços Gerais, Lavanderia, Cozinha, En-fermeira ou Técnica de Enfermagem com inscrição no COREN”.

Ao iniciar a prestação de serviços no Instituto Amantino Ca-mara, a paciente foi designada para trabalhar como Auxiliar de Serviços Gerais. Porém, alega que não pode trabalhar no referido estabelecimento, visto que é doente de rinite alérgica e naquele local estará em contato direto com produtos de limpeza, poeira, fungos e outros agentes nocivos à saúde e que podem trazer risco a sua vida.

Nos termos do art. 148 da Lei de Execução Penal, o Juízo da execução poderá, em qualquer fase da execução, motivadamente, realizar as alterações na forma de cumprimento da pena alternativa de prestação de serviços à comunidade, quando tal circunstância se mostrar necessária para conciliar com as condições pessoais do condenado e às características do estabelecimento designada.

Eis o teor o citado dispositivo legal: Art. 148. Em qualquer fase da execução, poderá o Juiz, motivadamente, alterar, a forma de cumprimento das pe-nas de prestação de serviços à comunidade e de limitação de fim de semana, ajustando-as às condições pessoais do condenado e às características do estabelecimento, da entidade ou do programa comunitário ou estatal.

Entretanto, merece ser ressaltado que a instituição designada para o cumprimento da pena da paciente se trata de um abrigo de idosos, de forma que não se concebe que uma instituição dessa natureza possa apresentar nível de insalubridade que seja incom-patível com o estado de saúde da paciente. Até porque se trata de uma instituição que abriga idosos e muitos destes com a saúde debilitada. Tal fato denota que o referido estabelecimento seja

Page 246: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

246

um local que apresente condições de trabalho que não venham a comprometer a saúde da apenada.

Como bem destacou o representante do Parquet, em seu Parecer de fls. 309/311, caso ficasse comprovado que o Instituto Amantino Camara abriga dezenas de idosos sujeitos às intempéries citadas na exordial, seria caso até mesmo de fechamento daquele estabelecimento.

Ademais, dentre as várias atividades de serviços gerais que pode ser executadas no Instituto Amantino Camara, certamente haverá alguma que seja compatível com a condição de saúde da apenada.

Consta dos autos que a paciente iniciou o cumprimento da pena no Instituto Amantino Camara. Entretanto, por diversas ve-zes buscou o adiamento do cumprimento da sanção penal e até mesmo a mudança do respectivo local de cumprimento, o que foi indeferido pelo Juízo da execução.

O que se verifica é uma clara tentativa da paciente de se furtar ao cumprimento da pena de prestação de serviço à comunidade no local designado para a sua execução.

A execução da pena de prestação de serviços comunitários no Instituto Amantino Camara está em conformidade com as condições pessoais da paciente, de modo que não se justifica a pretensão de modificação do lugar da execução da pena, sob a alegação de ser um ambiente insalubre é inadequado para ser frequentado pela paciente.

A alegação de que a paciente sofre de rinite alérgica é insufi-ciente para amparar o pedido de mudança do local do cumprimento da pena alternativa.

Verifica que foram deferidos os pedidos de adiamento do início de cumprimento da pena, visando atender o tratamento de saúde e a realização de cirurgia a que foi submetida a apenada. Da mesma forma, pelo que consta dos autos, foi oportunizada a adequação das atividades da apenada no Instituto Amantino Câmara.

Assim, ante a possibilidade da paciente cumprir a sua pena alternativa no estabelecimento designado pelo Juízo da execução,

Page 247: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

247

deve ser indeferido o pleito de modificação do local de cumpri-mento da pena.

DISPOSITIVO

Pelo exposto, denega-se a ordem de habeas corpus.

HABEAS CORPUS Nº 5.915-CE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊLO JÚNIOR (CONVOCADO)Impetrante: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃOImpetrado: JUÍZO DA 11ª VARA FEDERAL DO CEARÁPaciente: IFESINACHI UJAGBA INNOCENT (RÉU PRESO)

EMENTA: PROCESSUAL PENAL. HABEAS COR-PUS. CRIME DE USO DE DOCUMENTO FALSO. ESTRANGEIRO FORAGIDO. CONDENADO POR OUTRO CRIME - TRÁFICO ILÍCITO DE ENTOR-PECENTES. ORDEM DENEGADA.- Os documentos acostados aos autos e as in-formações prestadas pela autoridade impetrada demonstram que o paciente foi denunciado em dezembro de 2008 pelo Ministério Público Federal, nos autos do Processo nº 0000638-60.2007.4.05.8100 por uso de documento público falso (art. 304 do CP), pois no dia 26 de agosto de 2006, por ocasião de sua prisão em flagrante por tráfico de drogas no Aeroporto Internacional Pinto Martins, fez uso de passaporte com o nome falso.- O paciente fora denunciado e condenado por outro delito, qual seja, tráfico de drogas à pena de 4 (quatro) anos de reclusão e pagamento de duzentos dias-multa nos autos da Ação Penal Pública nº 2006.81.00.014945-5.- A Delegacia de Imigração comunicou que o Mi-nistério da Justiça havia determinado a expulsão do réu em dezembro de 2008.

Page 248: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

248

- Não bastassem tais fatos, o réu não foi citado pessoalmente nos autos do processo-crime a que responde por uso de documento falso, porque fugira da Colônia Agropastoril do Amanari, em 30.01.2009. Daí a citação por edital.- Os elementos colhidos nos autos denotam que o paciente se encontra foragido. As condutas delituosas por eles praticadas demonstram o seu potencial ofensivo a revelar que a prisão cautelar torna-se necessária como garantia da aplicação da lei penal e manutenção da ordem pública.- Em precedentes sobre a matéria, este egrégio Tribunal destacou que o STF já se manifestou no sentido de que o paciente que permanece foragido, tendo ciência do processo há mais de um ano e meio, demonstra tentativa concreta de fuga e causa suficiente para caracterizar risco a aplicação da lei penal.- Precedentes deste Tribunal: Primeira Turma, HC 5.633/CE, Relator: Desembargador Federal Roberto Machado – convocado, julg. 16/10/2014, publ. DJe: 23/102014, pág. 123, decisão unânime; Segunda Turma, HC 4.835/PE, Relator: Desembar-gador Federal Sérgio Murilo Wanderley Queiroga, julg. 09/10/2012, pág. 267, decisão unânime.- No caso em tela, o paciente se encontra foragido há mais de seis anos e outras medidas cautelares não se mostram eficientes para garantir a instru-ção processual penal nem suficientes para evitar reiteração delituosa do acusado.- Ordem de habeas corpus denegada.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indi-cadas, decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, denegar a ordem de habeas corpus, na forma do relatório e voto constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Page 249: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

249

Recife, 6 de agosto de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊLO JÚNIOR - Relator Convocado

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊ-

LO JÚNIOR (Convocado):

Habeas corpus, postulando, liminarmente, a imediata cassação da decisão que ordenou a prisão preventiva do paciente. Citado por edital, não se manifestou.

Entendeu o Juiz, na decisão, ora atacada:20. In casu, estão devidamente caracterizados os pres-supostos e requisitos da custódia cautelar.

21. O agente é estrangeiro, sem vínculos no país, já foi condenado por este Juízo por tráfico de drogas e fugiu do presídio no qual cumpria a pena. Respondeu ao pro-cesso penal pelo tráfico com o nome falso de NELSON THOMAS, só posteriormente vindo à tona o verdadeiro nome do agente, IFESINACHI UJAGBA INNOCENT. O Ministério da Justiça já decretou a expulsão do imputado, que está foragido.

22. Destarte, estão plenamente configurados os pres-supostos e requisitos da prisão preventiva diante da ne-cessidade de garantir a aplicação da lei penal, existente a materialidade delitiva e indícios suficientes de autoria. Ademais, o réu é condenado por crime doloso e o delito imputado é doloso punido com pena máxima superior 4 anos.

Sustentou o impetrante que a fundamentação para a decre-tação da prisão preventiva se respaldou, apenas no requisito da garantia da aplicação da lei penal em face da não localização do acusado.

Afirmou, ainda que de acordo com os precedentes jurispru-denciais que trouxe à colação do STF e do STJ, inidônea é a decretação de prisão preventiva fundada, única e exclusivamente no não comparecimento do réu em juízo, após a sua citação por

Page 250: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

250

edital, sem, indicar e fundamentar qualquer dos requisitos da cus-tódia cautelar previstos no art. 312 do CPP, quais sejam: garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e garantia da aplicação da lei penal.

Alegou, assim, que o paciente não tem nem ciência da presente ação, ou seja, não possui razões para evadir-se ou se esconder, não tendo inclusive consciência da ação movida. Nessa circuns-tância, a prisão do paciente se revela desnecessária e contrária ao princípio constitucional da proporcionalidade, razão pela qual deve ser mantida a liberdade, em decorrência da ausência de elementos concretos que evidenciem o risco à manutenção da ordem pública, à conveniência da instrução criminal e à garantia de aplicação da lei penal.

Argumentou, também, que a prisão preventiva, por ser medida excepcional, somente pode ser decretada em último caso, ou seja, quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar. Ressaltou, que na hipótese, outras medidas cautelares poderiam ser adotadas para assegurar o normal transcurso do processo criminal e garantir a efetividade da prestação jurisdicional. Por essa razão, não se justificaria a manutenção da prisão preventiva do paciente, segundo o impetrante.

Por último, apontou a desproporcionalidade entre a decretação da prisão preventiva e o eventual advento da sentença penal con-denatória, pois caso venha o paciente a ser condenado, será no mínimo legal, qual seja, dois anos de reclusão, ante a inexistência de circunstâncias agravantes, não podendo ser recolhido a prisão.

O Juízo impetrado prestou informações (fls. 47/53).

Parecer do Ministério Público Federal às fls.59/63) opinando pela denegação da ordem por subsistirem os motivos que deram ensejo a decretação da prisão preventiva do paciente, sobretudo para se garantir a aplicação da lei penal, diante da prova da exis-tência do crime e da participação do paciente na prática criminosa, considerando que se trata de estrangeiro já condenado, foragido desde janeiro de 2009, cuja expulsão foi ordenada pelo Ministério da Justiça em dezembro de 2008 e que se utilizou de passaporte falso para entrar no território nacional.

Page 251: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

251

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS REBÊ-

LO JÚNIOR (Convocado):FUNDAMENTAÇÃOConforme se infere dos documentos acostados aos autos e

das informações prestadas pelo Juiz Federal Danilo Fontenelle Sampaio, da 11ª Vara-CE, o paciente foi denunciado em dezembro de 2008 pelo Ministério Público Federal, nos autos do Processo nº 0000638-60.2007.4.05.8100 por uso de documento público falso (art. 304 do CP), pois no dia 26 de agosto de 2006, por ocasião de sua prisão em flagrante por tráfico de drogas no Aeroporto In-ternacional Pinto Martins, fez uso de passaporte com o nome de NELSON THOMAS.

Além disso, fora denunciado e condenado pelo tráfico de drogas à pena de 4 (quatro) anos de reclusão e pagamento de duzentos dias-multa nos autos da Ação Penal Pública nº 2006.81.00.014945-5.

Registre-se, também, que segundo se observa dos autos, a Delegacia de Imigração comunicou que o Ministério da Justiça havia determinado a expulsão do réu em dezembro de 2008.

Não bastassem tais fatos, paciente não foi citado pessoal-mente nos autos do processo-crime a que responde por uso de documento falso, porque fugira da Colônia Agropastoril do Amanari, em 30.01.2009. Daí a citação por edital.

Os elementos colhidos nos autos denotam que o paciente se encontra foragido. As condutas delituosas por eles praticadas demonstram o seu potencial ofensivo a revelar que a prisão cau-telar torna-se necessária como garantia da aplicação da lei penal e manutenção da ordem pública.

É oportuno salientar que em precedentes sobre a matéria destacou que o STF já se manifestou no sentido de que o paciente que permanece foragido, tendo ciência do processo ha mais de um ano e meio, demonstra tentativa concreta de fulga e causa suficiente para caracterizar risco a aplicação da lei penal, in verbis:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. MATERIALIDADE E ÍNDICIOS DE AU-TORIA DEMONSTRADOS. CUSTODIA CAUTELAR LAS-

Page 252: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

252

TREADA NA GARANTIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL E NA APLICAÇÃO DA LEI PENAL. EVASÃO DO DISTRITO DE CULPA. CARÁTER DE HABITUALIDADE REVELADO NA PRÁTICA CRIMINOSA. DENEGAÇÃO DA ORDEM.1. A prisão preventiva, por se tratar de medida cautelar de constrição à liberdade, reveste-se de excepcionalidade, somente justificando sua decretação quando configurada a potencialidade lesiva a quaisquer dos juízos tutelados na legislação de regência, ainda assim quando satisfei-tos os requisitos da materialidade do delito e os indícios suficientes de autoria (art. 312 do CPP).2. Narra a denúncia: Os acusados compõem uma quadri-lha, a qual atua na prática de estelionato, aplicando golpes no comércio de Iguatu, Juazeiro do Norte e Fortaleza, bem como nos Estados de Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, cuja quadrilha é chefiada e comandada pelo acusado E.P.A.(paciente).3. O caráter de habitualidade revelado pelo paciente na prática criminosa, haja vista o fato de responder ele pela prática de outro crime perante a mesma Comarca, cuja denúncia, ofertada em 2002, já noticiava a mesma pratica de abertura de contas bancárias e retirada talonários de cheques, usando nomes e documentos de identidade falsos, fatos que autorizam a ilação de que, uma vez autorizada a expedição do alvará de soltura, incidirá o paciente na reiteração da prática delitiva, justificando a adoção da medida constritiva para assegurar a aplicação da lei penal.4. Segundo precedente do STF, o fato de o paciente permanecer foragido, tendo ciência do processo há mais de um ano e meio, constitui tentativa concreta de fuga e causa suficiente para caracterizar risco à aplicação da lei penal. O STJ, em recente julgado (RHC 51009/MG), assentou que “a evasão do réu do distrito da culpa, com-provadamente demonstrada, é fundamentação suficiente a embasar a manutenção da custódia preventiva para garantir a aplicação da lei penal”.5. A prisão do paciente se impõe, ainda, para garantir a instrução criminal, a qual, consoante informações pres-tadas pelo Juiz a quo e consulta realizada no sítio da Justiça Federal do Ceará, ao contrário do defendido pelo impetrante, ainda não se encerrou.

Page 253: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

253

6. A primariedade, os bons antecedentes, a profissão lícita e o endereço certo são elementos que não se pres-tam, isoladamente, para afastar a incidência da regra do art. 312 do CPP, quando verificados os requisitos e as condições definidos no mencionado dispositivo legal para a decretação da custódia preventiva. Neste sentido, precedentes do STF e STJ7. Ordem de habeas corpus denegada.(Primeira Turma, HC 5.633/CE, Relator: Desembargador Federal Roberto Machado - convocado, julg 16/10/2014, publ. DJe: 23/102014, pág. 123, decisão unânime)

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. ESTELIO-NATO. ARTIGO 171, PARÁGRAFO 3º DO CÓDIGO PE-NAL. PRISÃO PREVENTIVA. ARTIGO 312 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. EXISTÊNCIA DE REQUISITOS AUTORIZADORES. GARANTIA À APLICAÇÃO DA LEI PENAL E CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO PENAL. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. EXCESSO DE PRAZO NÃO CONFIGURADO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL.1. Cuida-se de habeas corpus em favor de acusado da suposta prática do crime de estelionato qualificado, tipificado no artigo 171, parágrafo 3°, do Código Penal.2. A prisão preventiva impõe o reconhecimento de seus pressupostos, que são a prova da materialidade e indícios suficientes da autoria delituosa, e ocorrência de um dos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal, no caso, para garantia à ordem pública e por conveniência da instrução criminal.3. Não configurado constrangimento ilegal na decisão hostilizada, que indeferiu pedido de revogação da prisão preventiva do paciente, foragido por mais de cinco anos, sendo reconhecido que medidas cautelares não se mos-tram suficientes para salvaguardar a instrução processual penal e a sociedade da provável reiteração delituosa e postura desidiosa do acusado.4. A alegação de excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal, mormente quando a sua extrapo-lação decorre da própria complexidade da ação penal, há que ser considerada em face do princípio da razoabi-lidade, e não em critérios aritméticos de rigor inconteste5. Parecer ministerial acolhido.

Page 254: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

254

6. Ordem de habeas corpus denegada. (Segunda Turma, HC 4.835/PE, Relator: Desembar-gador Federal Sérgio Murilo Wanderley Queiroga, julg. 09/10/2012, publ. DJe: 10/10/2012, pág. 267, decisão unânime)

No caso em tela, o paciente se encontra foragido há mais de seis anos e outras medidas cautelares não se mostram eficientes para garantir a instrução processual penal nem suficientes para evitar reiteração delituosa do acusado.

Encontrando-se presentes os requisitos autorizadores que ensejaram a decretação da prisão preventida de que trata o art. 312 do CPC, quais sejam, manutenção da ordem pública, garantia da instrução penal e aplicação da lei penal, há de se denegar a ordem de habeas corpus.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, denega-se a ordem de habeas corpus.

HABEAS CORPUS Nº 5.959-PE

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE LUNA FREIRE (CONVOCADO)Impetrantes: JOSÉ AUGUSTO BRANCO E OUTROImpetrado: JUÍZO DA 4ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO Paciente: DEUD SALOMÃO RAMEH NETO

EMENTA: CONSTITUCIONAL. PENAL E PROCES-SUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME CON-TRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL (ART. 16, LEI 7.492/86). “DESCARREGO” DE BANCA DE JOGO DO BICHO. EQUIPARAÇÃO À ATIVIDADE SECURITÁRIA. IMPOSSIBILIDADE. ATIPICIDADE DA CONDUTA. CONCESSÃO DA ORDEM.- Denominada “descarrego” a atividade secun-dária e sucessiva das bancas de jogo do bicho onde há réplica de apostas ulteriores, com o propósito de evitar quebra da banca anterior, onde a aposta ocorreu.

Page 255: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

255

- A questão a ser aferida é de tipicidade. Sucede que o propósito, o móbil, a ação diz respeito a enquadrar o fato numa hipótese legal (subsunção e adequação) à hipótese de substância (subsun-ção do fato à regra).- O que é finalístico é o intento, a ação tida por impecável para os fins penais. O desfecho no caso, não apresenta, ainda, delitos contra a União, no tocante à atividade financeira ou no tocante à pretendida equiparação à securitária. - A reprodução ou disseminação de novas apos-tas não pode ser analógica. Assim nem se fale em seguros sucessivos. - Descarrego é uma gíria como carrego é uma gíria “carregada”. E atividade financeira a atrair interesse da União, também, não pode ser con-siderada por típica fora da Lei nº 7.492/86. - Ordem concedida.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira Turma do egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, conceder a ordem de ha-beas corpus, nos termos do relatório e voto constantes dos autos que integram o presente julgado.

Recife, 3 de setembro de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE LUNA FREIRE - Relator Convocado

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE

LUNA FREIRE (Convocado):

Cuida-se de ordem de habeas corpus impetrada por Bel. José Augusto Branco e Bel. Hélcio França em favor de DEUD SALOMÃO RAMEH NETO, na qual se pretende o reconhecimento da Incom-petência Absoluta da Justiça Federal para processar e julgar os fatos investigados na Ação Penal n° 0001389-48.2015.4.05.8300.

Page 256: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

256

Narra a Petição Inicial (fls. 02/23):Fora o aqui paciente, juntamente com mais outras pes-soas, denunciado pelos crimes dispostos no art. 16 da Lei n° 7.492/861, no art. 1º da Lei n° 9.613/982, no art. 4º, a,

1 Art. 16. Fazer operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração falsa, instituição financeira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio:

Pena - Reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.

2 Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.

Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.

§ 1º Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal:

I - os converte em ativos lícitos;

II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere;

III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verda-deiros.

§ 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:

I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal;

II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei.

§ 3º A tentativa é punida nos termos do parágrafo único do art. 14 do Código Penal.

§ 4º A pena será aumentada de um a dois terços, se os crimes definidos nesta Lei forem cometidos de forma reiterada ou por intermédio de organização criminosa.

§ 5º A pena poderá ser reduzida de um a dois terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de direitos, se o autor, coautor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais, à identificação dos autores, coauto-res e partícipes, ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.

Page 257: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

257

da Lei nº 1.521/513 e, por fim, no art. 288, caput, do CP4 (doc. 02 – denúncia).

(...) Como se pode ver, in casu, o único delito que poderia, em tese, trazer a competência para a Justiça Federal seria o disposto no art. 16 da Lei n° 7.492/86. No entanto, essa acusação, como se verá adiante, cai por terra, haja vista que o seu núcleo não se opera com relação ao aqui paciente.

3 Art. 4º Constitui crime da mesma natureza a usura pecuniária ou real, assim se considerando:

a) cobrar juros, comissões ou descontos percentuais, sobre dívidas em di-nheiro superiores à taxa permitida por lei; cobrar ágio superior à taxa oficial de câmbio, sobre quantia permutada por moeda estrangeira; ou, ainda, emprestar sob penhor que seja privativo de instituição oficial de crédito;

b) obter, ou estipular, em qualquer contrato, abusando da premente necessi-dade, inexperiência ou leviandade de outra parte, lucro patrimonial que exceda o quinto do valor corrente ou justo da prestação feita ou prometida.

Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos, e multa, de cinco mil a vinte mil cruzeiros.

§ 1º Nas mesmas penas incorrerão os procuradores, mandatários ou me-diadores que intervierem na operação usuária, bem como os cessionários de crédito usurário que, cientes de sua natureza ilícita, o fizerem valer em sucessiva transmissão ou execução judicial.

§ 2º São circunstâncias agravantes do crime de usura:

I - ser cometido em época de grave crise econômica;

II - ocasionar grave dano individual;

III - dissimular-se a natureza usurária do contrato;

IV - quando cometido:

a) por militar, funcionário público, ministro de culto religioso; por pessoa cuja condição econômico-social seja manifestamente superior à da vítima;

b) em detrimento de operário ou de agricultor; de menor de 18 (dezoito) anos ou de deficiente mental, interditado ou não.

4 Art. 288. Associarem-se 3 (três) ou mais pessoas, para o fim específico de cometer crimes:

Pena - reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos.

Parágrafo único. A pena aumenta-se até a metade se a associação é armada ou se houver a participação de criança ou adolescente.

Page 258: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

258

Ainda que se valorassem como verdadeiros os fatos nar-rados na peça acusatória, o que não confere, mas, ainda assim, ver-se-ia que o aqui paciente jamais fez operar instituição financeira, até porque inexiste “instituição financeira” in casu, e o artigo de lei é bem claro em discipli-nar no seu tipo que o crime se caracteriza quando o agente faz “operar, sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração (vetado) falsa, instituição fi-nanceira, inclusive de distribuição de valores mobiliários ou de câmbio”.

Pela própria narrativa da peça acusatória, constata-se, claramente, que o que verbaliza o art. 16 não se encaixa nas atitudes comissivas ali verbalizadas no que se refere ao ora paciente, pois ele nunca fez operar “instituição financeira” e a norma penal em testilha exige que seja a operação específica de “instituição financeira”.

Ainda que se trate de uma casa de jogo de bicho, essa não é uma “instituição financeira” e jamais pode ser equipara a tal, além de que o art. 16 da Lei n° 7.492/86 não traz qualquer equiparação ou correlação com outro segmento do ramo, mas sim, única e exclusivamente, quando se tratar de uma “instituição financeira”, ope-rada sem a devida autorização, ou com autorização obtida mediante declaração falsa, o que não acontece no presente caso.

Não se pode ampliar o conceito verbalizado por um tipo penal, nem elastecer o seu núcleo e alcance das condutas puníveis, sob pena de flagrante violação à le-gislação posta e até mesmo à própria Carta Constitucional, ferindo princípios basilares que regem todo o ordenamento jurídico pátrio.

Se o delito menciona, em seu tipo verbal, que o crime exsurge apenas quando se faz operar “instituição finan-ceira”, sem a existência dessa instituição não se tem o crime, já que a norma não traz qualquer equivalente.

Portanto, com a extração desse tipo penal, a competên-cia, por ser regra, firma-se perante a Justiça Estadual, conforme visto alhures, já que não há prática de qualquer delito contra o sistema financeiro e a ordem econômico--financeira, ou em detrimento de bens, serviços ou

Page 259: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

259

interesses da União, ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas, como reza a norma legal.

Tal como já evidenciado, o Parquet Federal deu parecer pela incompetência da Justiça Federal, salientando que a suposta atividade de “descarrego” não pode tecnicamente ser entendida como seguro (instituição financeira por equi-paração), porquanto o objeto segurado (apostas do jogo do bicho – contravenção penal) seria ilícito e, por consequência, a autorização da SUSEP (elemento normativo do tipo do art. 16 da Lei n° 7.492/86) nunca poderia ser dada e, assim, estaria afastada a possibilidade de a conduta descrita na denúncia amoldar-se ao tipo penal ali invocado.

A denúncia descreve os seguintes fatos (fls. 53/71):Pelo menos desde março de 2014, DEUD SALOMÃO RA-MEN NETO, RENAN PORTELA SALOMÃO e RODRIGO RODRIGUES SALOMÃO RAMEH, de modo consciente e voluntário, realizaram atividade típica de empresas seguradoras, ao fazerem operar, sem a devida autori-zação, instituição financeira. Além disso, utilizando-se de pessoas interpostas (laranjas), ocultavam a propriedade de bens e valores percebidos por meio dessa prática delituosa, e ainda realizavam empréstimos com dinheiro proveniente da atividade ilícita, cobrando sobre as dívidas resultantes juros superiores ao dobro da taxa permitida por lei.

EDY ARRUDA AZEVEDO, funcionário da banca “A Parai-bana”, realizava o cálculo da taxa de juros cobrados pela concessão de empréstimos e trocas de cheques, em clara participação na prática do delito de usura, bem como cedia suas contas bancárias para movimentação dos valores do grupo, auxiliando materialmente na lavagem dos valores ilícitos.

Já o denunciado EMANUEL MORAES ARARUNA procedeu à abertura da conta em nome do laranja” Alberes Nasci-mento de Lima Reis, na presença de DEUD e RODRIGO, e mantinha esses denunciados informados sobre as mo-vimentações, embora eles sequer estivessem habilitados como procuradores, auxiliando, portanto, materialmente na lavagem dos valores ilícitos.

A atuação dos denunciados foi descoberta a partir da investigação dos demais grupos especializados na explo-

Page 260: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

260

ração de jogos de azar, para os quais o grupo em questão (“A Paraibana”) realizava a função vulgarmente conhecida como “descarrego”.

Segundo a representação da autoridade policial:

O Grupo “A Paraibana” foi, inicialmente, objeto da In-formação Policial n° 46/2014 - NIP/SR/DPF/PE. Consta dessa informação que o escritório sede está localizado na Rua Passo da Pátria, n° 120, Bairro de São José Recife/PE, mesmo endereço que consta no Sistema INFOSEG/com sendo da residência DEUD SALOMÃO RAMEH NETO.

(...)

Na Grande Recife, DEUD SALOMÃO RAMEH NETO é conhecido no meio do jogo do bicho, como a pessoa que financia o “descarrego”. Ele possui grande capital financeiro, funcionando como um “caixa forte” do jogo, pagando os prêmios de valores altos.

203. Conforme informação policial precitada, “des-carrego” significa o ato de “descarregar” o jogo, ou seja, “passar” em outras bancas uma milhar na qual algum jogador tenha feito jogo muito alto. Assim, as bancas, quando de uma aposta que tenha a possibilidade de pagar um valor muito alto ao contemplado, efetuam o “descarrego” na banca de DEUD, transferindo a ele o risco do prejuízo. DEUD SALOMÃO, por seu turno, lucra por absorver jogos com valores altos das outras bancas, quando a con-templação temida não ocorre. Ao fazê-lo, portanto, ganha “assumindo os riscos”.

Referida prática, que foi sistematicamente registrada por meio de fax, interceptados com autorização judicial, ca-racteriza atividade típica de seguradora, sem a necessária autorização do órgão competente, configurando, assim, o funcionamento ilegal de instituição financeira.

Segundo as investigações, DEUD SALOMAO RAMEH NETO, além de possuir bancas de jogo do bicho (“A Paraibana”), era o principal responsável pelo “descar-rego” de bancas de outros grupos, dentre eles Sonho Real, Aky Loterias e Aliança, conforme transcrição de

Page 261: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

261

áudios interceptados (áudios 66588, 66577, 66585, 66598 e 66611, de 25/06/2014):

Além disso, o referido denunciado mantém contato direto com outros investigados da Operação Trevo, como JUNIOR MIRIM5 e pessoas ligadas às bancas Monte Carlos e Caminho da Sorte (áudios 43928, de 22/04/2014, 106381 de 19/08/2014, 105327, de 18/08/2014, 99235, de 14/08/2014, 106383, de 19/08/2014).

Corroborando o envolvimento de DEUD SALOMÃO com a prática de “descarrego”, a interceptação te-lemática, (Auto Circunstanciado de Interceptação telemática n° 01/2014), realizada pela autoridade policial, revelou o acesso desse denunciado a pá-ginas de intemet relacionadas a jogos de azar e a um sistema integrado de controle adrninistrativo, o qual, devido aos dados visualizados em uma tabela do sistema, sugere representar o controle de áreas relacionadas a jogos.

Outro integrante do grupo em comento era RODRIGO RODRIGUES SALOMÃO RAMEH, sobrinho de DEUD, que participava ativamente das atividades da banca “A Paraibana”, atuando como um “braço direito” de seu tio. O áudio 94960, de 12/8/2014, demonstra a importância do denunciado na administração da banca e a confiança que DEUD depositava nele. As intercep-tações comprovam que RODRIGO recebia ligações solicitando o resultado dós sorteios de jogos, bem como operacionalizava as “extrações” realizadas nas bancas e, assim como tio, cuidava da parte financeira do negócio (áudios 64348, de 23/06/2014; 66305 e 66307, de 25/06/2014, 106844, de 19/08/2014).

RENAN PORTELA SALOMÃO, filho de DEUD, é mais um componente importante do grupo sob análise. Conforme se depreende dos áudios 52533, de 30/05/2014 e 53853, de 31/05/2014, pai e filho trabalham em sistema de reve-zamento na banca.

5 Integrante do grupo “Shock Machine – Show Ball”, também denunciado por este órgão ministerial.

Page 262: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

262

Em sua oitiva, RENAN confirmou trabalhar com seu pai, DEUD, auxiliando-o no jogo do bicho, porém negou assumir a administração da empresa, na sua ausência (fls. 57/61, IPL n° 643/2014).

O denunciado RENAN confirmou que o termo “descarrego” no jogo do bicho significa uma espécie de seguro, em que uma banca, ao receber uma aposta muito alta, divide o jogo e o risco de pagar um prêmio muito alto com outras bancas. Explicou ele o “descarrego”:

(...) QUE, por exemplo, se há uma aposta de R$ 7,00 no milhar (o que geraria um prêmio de R$ 56.000,00) em uma banca que tenha um limite máximo de R$ 5,00 para a aposta no milhar (o que geraria um Prê-mio de R$40.000,00), é possível fazer o descarrego facilmente fazendo uma aposta de R$ 2,00 no mesmo milhar em outra banca (o que geraria um prémio de R$ 16.000,00); QUE em alguns casos este procedimento também pode ser feito on line; QUE quando ocorre o descarrego, a banca ganha o mesmo dinheiro que ganharia normalmente caso a aposta tivesse sido feita diretamente nela; QUE o pagamento do descarrego pode ser feito através de um jogo normal feito por um funcionário de uma banca em uma outra banca; QUE como explicado anteriormente, o descarrego por parte da Banca Paraibana se dá de várias formas, podendo ser on-line, por meio de um programa que transfere automaticamente as apostas de uma banca para outra, ou mesmo pela realização de apostas em outras ban-cas; (...) QUE confirma que algumas bancas enviam, por fax, à Banca Paraibana as apostas necessárias para a prática do descarrego: QUE, na verdade, a comunicação pode ser feita por fax ou por qualquer meio, a exemplo de mensagem de texto de celular; (...)

A prática de “descarrego” por parte de DEUD, RODRIGO e RENAN, entre outros, restou clara com a interceptação de comunicações via fax que efetivavarn a prática. Aliado a isso, conversas ao telefone vieram a robustecer as provas. Nesse sentido, o diálogo 51059, de 29/5/2014, em que DEUD acaba por oferecer melhores condições de “DEUD”, Como concorrente de DARWIN, já investigado como dono da banca “CAMINHO DA SORTE”. Os documentos apreendidos

Page 263: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

263

na sede da Banca “A Paraibana” e na residência de DEUD, quando da deflagração da Operação Trevo (Relatório: de Análise de Material Apreendido Equipe 5 – fls. 231/247 e Relatório de Análise de Material Apreendido. Equipe 7 – fls. 248/260), também comprovam a prática do “descarrego” por parte dos denunciados.

Do exposto, vê-se que DEUD, RODRIGO e RENAN reali-zavam atividade típica de empresas seguradoras, fazendo operar, sem a devida autorização, instituição financeira, fato que se amolda ao delito previsto no art. 16 da Lei n° 7.492/86.

Também foi possível constatar que os denuriciados em-pregavam parte do dinheiro proveniente da exploração da mencionada atividade ilícita em empréstimos pessoais a juros superiores aos permitidos por lei.

Os áudios 138854 e 138901, de 27/09/2014, revelam em-préstimos que seriam realizados para o financiamento da campanha de dois políticos locais, com incidência de juros de 3% ao mês.

EDY ARRUDA AZEVEDO, funcionário da Banca Paraibana amplamente citado nos áudios intercaptados (áudio 98826 e 98875, de 14/06/2914, 138854 e 138901, de 27/09/2014), confessou ser o responsável por realizar o cálculo da taxa de juros cobrados, em clara participação na atividade (mídia à fl. 167, IPL n° 643/2014). Com relação às suas contas ban-cárias, confessou também tê-las cedido para movimentação dos valores do grupo, tendo dito ainda que DEUD pediu pessoalmente para usar a conta e, disse que se houvesse algum problema com a Receita Federal se responsabili-zaria. As movimentações financeiras, inclusive, já haviam sido reportadas como suspeitas pelo COAF (Relatórios de Inteligência Financeira 12.361 e 12.998).

A taxa de juros mensal cobrada pelo denunciado DEUD gira em torno de 3% (três por cento) ao mês, o que redunda em 36% (trinta e seis por cento) ao ano, quando o limite não deveria ultrapassar o dobro do percentual especificado em nossa legislação.

(...) Como a taxa de juros cobrada pelo denunciado girava em torno de 3% (três por cento), percebe-se claramente que ela ultrapassava o dobro do percentual estabelecido para a taxa SELIC (taxa legal), o que demonstra a prática de usura.

Page 264: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

264

Desta forma, observa-se que DEUD, RODRIGO e RENAN realizavam empréstimos com, dinheiro proveniente de suas atividades ilícitas; cobrando sobre as dividas resultantes juros superiores ao dobro da taxa permitida por lei, infra-ção que se amolda ao delito previsto no art. 4°, a, da Lei n° 1.521/51.

(...) Restou comprovado também que os denunciados, valendo-se de “laranjas”, ocultavam a propriedade de bens e de valores percebidos em decorrência da sua atuação ilícita como instituição financeira e como banca de jogo do bicho. Segundo a representação policial, a descoberta desse fato deveu-se à interceptação de diálogo entre DEUD e seu sobrinho, RODRIGO, (áudio 67436, de 26/06/2014), em que aquele denunciado se mostrava receoso de que sua ex--mulher, sem o seu conhecimento, sacasse montantes das contas, em nome de terceiros, nas quais estavam deposi-tados boa parte dos valores ilicitamente obtidos pelo grupo.

Os nomes que surgiram no referido diálogo, como sendo dos “laranjas”, eram os de Alberes e Mere.

De acordo com a Informação Policial n° 122/2014 (fls. 15/33, IPL n° 643/2014), nos Relatórios de Inteligência Financeira do COAF n° 12.361 e 12.998, Alberes Nascimento de Lima Reis (vulgo Mudo), trabalhador rural, é referido como titular de conta responsável pelo depósito de aproximadamente dois milhões de reais. No entanto, em verdade, Alberes é funcionário da banca “A Paraibana” e recebe um benefício assistencial por ser portador de deficiência (surdo-mudo).

Ainda de acordo com a citada informação policial, Alberes, apesar de sequer possuir habilitação, possui quatro veículos em seu nome, todos com endereços de cadastro coinciden-tes com o da banca “A Paraibana”. Tal fato é confirmado em diálogo entre RENAN SALOMÃO, filho de DEUD, e um individuo conhecido como “Bola”, em que aquele confirma que o carro que costuma conduzir está em nome de Mudo (Alberes) (áudio 74871, de 02/07/2014).

O depoimento de Alberes, interpretado por sua irmã (fl. 133 e mídia à fl. 167, IPL n° 643/201), demonstra que ele não tinha ciência de nenhuma das condutas dos denunciados e da existência das contas bancárias em seu nome, bem como evidencia que não recebia qualquer vantagem para admitir

Page 265: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

265

as movimentações financeiras em “suas” contas bancárias. Desconhecia por completo a existência dos automóveis em seu nome e da conta bancária no Banco Safra contendo R$ 2.499.986,61.

A outra pessoa citada nos diálogos interceptados é Mere Caitano de Melo, ex-empregada doméstica de DEUD, conforme Informação Policial n° 152/2014 (fls. 36/40, IPL n° 643/2014). Mere figura como a titular de uma conta no Banco Bradesco, que é movimentada por DEUD, segundo o próprio denunciado, consoante demonstra o áudio 67436, de 26/06/2014. Em pesquisa realizada no Sistema de Movimen-tação Bancária (SIMBA), a autoridade policial verificou que a referida conta possui expressiva movimentação financeira (fl. 150, IPL n° 643/2014).

Confirmando a prática de lavagem de dinheiro pelos denun-ciados, RODRIGO afirmou:

QUE MERE foi demitida, mas trabalhava como faxi-neira na banca e doméstica na casa de DEUD; QUE nunca movimentou conta bancária de MERE e ALBE-RES; QUE não sabe informar se DEUD já movimentou; QUE quanto ao áudio datado de 26/06/2014, acredita que foi quando seu tio queria se separar de JOSEANE e resolveu tirar o dinheiro da conta de MERE; QUE retifica afirmação anterior, esclarecendo que DEUD usava a conta de MERE e ALBERES para movimentar dinheiro do jogo do bicho.

Ouvida pela autoridade policial, Mere confirmou não ter ciência da movimentação/existência de sua conta pelos denunciados (fl. 134 e mídia à fl. 167, IPL n° 64312-14). Des-conhecia, por completo, a existência da conta do Bradesco em que houve o bloqueio de R$ 1.807.444,92. Alegando apenas que DEUD a chamava uma vez por ano para assinar uns papéis, mas que não lia os mencionados documentos. Sempre que encontrava o ex-patrão pedia dinheiro empres-tado, cerca de R$ 1.000,00/R$1.500,00, e tinha que pagar a DEUD, que pagava normalmente em 5 parcelas.

Foram enconfrados diversos documentos, quando da deflagração da Operação Trevo, na residência de DEUD (Relatório de Análise de Material Apreendido Equipe 7 – fls. 248/260), que comprovam a utilização das contas dos dois empregados acima mencionados para movimentação de

Page 266: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

266

valores ilícitos por DEUD, RENAN e RODRIGO, dentre eles: extratos do Banco Safra em nome de Alberes, cartão do Banco Safra em nome de Alberes, cheques de titularidade de Mere da conta do Bradesco e de Alberes da conta do Banco Safra (fls. 251/252, 254/256).

Outrossim, com base nos áudios interceptados (áudio 68847, de 27/06/2014), verificou-se que o gerente da conta de Alberes, EMANUEL MORAES ARARUNA, tinha ciência não apenas da conduta de DEUD e de RODRIGO, que atua-vam como reais responsáveis pela conta, como também da natureza ilícita dos valores.

Em suas declarações, EMANUEL, embora tenha negado inicialmente, acabou por reconhecer ter de fato ciência da origem dos valores, que eram proveniente do jogo. Aliás, foi ele quem procedeu à abertura da conta na presença de DEUD e RODRIGO, bem como mantinha esses denunciados informados sobre as movimentações, embora eles sequer estivessem habilitados como procuradores (fls. 174/176 e mídia à fl. 167, IPL n° 643/2014).

Dito isto, vê-se que, de forma consciente e voluntária, EMANUEL MORAES ARARUNA auxiliou materialmente os demais denunciados na ocultação da origem e titularidade dos valores, tendo incorrido no delito previsto no art. 1° da Lei n° 9.613/1998.

Destarte, restou também demonstrado que os denunciados DEUD, RODRIGO e RENAN valiam-se de terceiros para ocultar/dissimular a propriedade de bens e valores pro-venientes da sua atividade ilícita, fato que se amolda ao delito de lavagem de capitais, nos termos do art. 1°, caput, da Lei n° 9.613/98.

Outrossim, demonstrou-se que os denunciados DEUD, RO-DRIGO, RENAN e EDY ARRUDA constituíam associação estável e permanente, organizada sob forma empresarial, destinada á práticá reiterada dos delitos acima mencionados.

A decisão proferida pela autoridade impetrada (fls. 39/49): (...) 10. Percebe-se, então, que as respostas às seguintes indagações são que definirão o rumo deste processo:

a) A atividade de “descarrego” pode tecnicamente ser equiparada a atividade de seguro?

Page 267: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

267

b) Somente é tipicamente relevante, em termos penais, para os fins do art. 16 da Lei nº 7.492/86, o exercício de atividade que, ao menos em tese, possa ser auto-rizada, ou também aquela que nem em tese o possa ser também perfaz a descrição típica invocada? [...]

32. É evidente que, para o direito civil, não é possível que o “descarrego” seja formalizado como um contrato de seguro, contudo não significa que a atividade de descarrego não corresponda, na prática a uma atividade seguradora.

33. Com efeito, os elementos do contrato de seguro são (i) o prêmio (prestação paga pelo segurado), (ii) a garantia (prestação do segurador), (iii) o interesse (relação de per-tencimento entre a pessoa e o bem que se visa a proteger) e (iv) o risco (a possibilidade de ocorrência de um evento pré-determinado no contrato, lesivo ao interesse garantido).

34. No caso da atividade de “descarrego”, a banca que presta a garantia (“seguradora”) divide com aqueloutra, em que recebida uma aposta muito alta (“segurada”), tanto o jogo quanto o risco de pagar um prêmio muito alto.

35. Assim, o “prêmio” (elemento do contrato de segu-ro) pago pela “segurada” é justamente a parte do jogo/aposta recebida que cede à “seguradora” para não arcar sozinha com o risco elevado.

36. Já a “garantia” (elemento do contrato de seguro) prestada pela “seguradora” é exatamente a assunção de parte do risco de pagar um prêmio muito alto.

37. O “interesse” (elemento do contrato de seguro) é a relação existente entre a banca de jogo de bicho e os valores recebidos pelas apostas, a intenção de preservá--los e de não vê-los diminuído em caso de a aposta alta sair-se vencedora.

38. Por último, o “risco” (elemento do contrato de segu-ro) é justamente a possibilidade de a aposta alta sair-se vencedora.

39. Como se vê, todos os elementos do contrato de segu-ro estão presentes na atividade do “descarrego”, apenas não pode ser o contrato de seguro formalizado no caso porquanto visa a assegurar apostas do jogo do bicho,

Page 268: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

268

que é uma contravenção penal, portanto desatende o art. 104, II, do CC/2002 (e não propriamente o art. 757 do CC/2002, para quem entender que o interesse legítimo é aquele de quem estiver realmente interessado em que o sinistro não ocorra).40. Por conseguinte, a resposta àquela primeira indagação acima feita (se “a atividade de ‘descarrego’ pode tecnicamen-te ser equiparada a atividade de seguro”) deve ser afirmativa.

41. De seu turno, passo a enfrentar a segunda indagação, se “somente é tipicamente relevante, em termos penais, para os fins do art. 16 da Lei nº 7.492/86, o exercício de atividade que, ao menos em tese, possa ser autorizada, ou também aquela que nem em tese o possa ser também perfaz a descrição típica invocada”.

42. Nesse tocante, relevante relembrar a objetividade jurí-dica da Lei nº 7.492/86.

43. Da análise dos tipos penais previstos em referido diplo-ma legal, percebe-se que a configuração de crime contra o Sistema Financeiro Nacional é verificada quando a conduta do agente passa a colocar em perigo a credibilidade de que deve ser detentor o Estado, no que tange ao especial aspecto de gestão financeira, produzindo real ameaça para o bem estar financeiro da sociedade, justamente porque essa credibilidade financeira é o principal fator de atração de investimentos para determinado país e, por via reflexa, de geração de riqueza.

44. No caso dos autos, o risco decorrente da atividade de-nunciada existe, é verdade, não para o sistema financeiro nacional ADMINISTRATIVAMENTE REGULADO (porque não pode o jogo do bicho ser formalmente garantido por um contrato de seguro regular), mas por que não se admitir que um sistema financeiro está sendo sim violado no caso, entendendo-se sistema financeiro como parte integrante da ordem econômica e, pois, equivalente à circulação de riquezas, decorrente da livre iniciativa (regulada pelo Esta-do somente em certos limites) e do empenho do trabalho humano, que somente é legítima quando visa a garantir a justiça social, não o sendo, por outro lado, quando exer-cida com o objetivo de puro lucro e realização pessoal do empresário ou quando vise a eliminar a concorrência ou a dominar mercado?

Page 269: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

269

45. Pois bem.

46. Entendido o sistema financeiro como a circulação de riquezas no País, mediante (i) a captação da poupança popular, ou seja, recursos de terceiros, que (ii) retornam ao público na forma de financiamentos, créditos, permitindo a realização de investimentos na produção, a geração de riquezas, de divisas e empregos, ao final viabilizando-se (iii) a consecução da almejada justiça social (art. 170 da CF), pode-se entrever a importância desse sistema e razão pela qual o Poder Público traça regras que devem ser fielmente obedecidas, para que possa realizar o controle e a fiscali-zação desse mercado.

47. Se a riqueza, em certo nicho desse mercado, está efe-tivamente circulando, mas de forma não autorizada pelo ordenamento jurídico pátrio, na verdade à margem de qual-quer possibilidade de autorização, sem qualquer submissão a regras estatais, significa que não existe nesse nicho um sistema financeiro? Penso que a resposta deve ser negativa.

48. Assim é que, no caso dos autos, na medida em que a banca de jogo do bicho que realiza o “descarrego” está injetando recursos nessa atividade para prestar uma garantia contra um risco de uma grande aposta sair-se vencedora e causar um prejuízo demasiado à banca de jogo do bicho segurada, está evidente que a riqueza está circulando nessa atividade, que integra, sim, a meu sentir, o sistema financeiro nacional.

49. Atente-se, inclusive, a que a injeção de recursos opera-cionalizada por meio do “descarrego” trata-se, em tese, de aporte de recursos de terceiros, advindos justamente das apostas recebidas pela banca “seguradora”, que os injeta na banca “segurada”, e, o lucro dessa atividade é utilizado para novas práticas de “descarrego”.

50. Ora, o que vai distinguir a atividade de financiamento própria ou exclusiva de instituição financeira daquela ativi-dade de realizar simples contratos de empréstimo previstos na lei civil é justamente a verificação concomitante de dois requisitos básicos: (i) obtenção de lucro stricto sensu na atividade de emprestar, frente ao financiado ou a terceiro e (ii) a reinserção do resultado dos financiamentos (lucro stricto sensu) no fluxo comercial específico, de forma

Page 270: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

270

manifesta ou presumida, ou seja, o mutuante (a banca “seguradora”) recebe em retorno o capital injetado/emprestado por meio do lucro decorrente da eventual não realização do risco (não haver a aposta alta se tornado vencedora), e concede com essa pecúnia um novo financiamento (garantia), realizando novo “descar-rego” (habitualidade), assim praticando ato próprio ou exclusivo de instituição financeira. É que essa reinserção exigida não é no fluxo econômico da atividade, mas sim no fluxo comercial do mesmo esquema de financiamento/garantia, objetivando a repetição e, via de consequência, a continuidade do modo de auferir lucro stricto sensu.

51. E se os poderes regular e disciplinar postos à disposição do Estado são condição sine que non da necessária confian-ça de que deve gozar o sistema financeiro nacional, sem a qual o sistema pode ruir, com grave risco para o mercado e para o País, na medida em que a riqueza está circulando num mercado não regulado pelo Estado, justamente porque não se amolda aos ditames previamente definidos para que ele funcione, com mais razão estará contribuindo para que a confiança no sistema reste comprometida.

52. Ora, e não é justamente a manutenção dessa confiança, dessa credibilidade no sistema financeiro nacional (circula-ção de riquezas) que o Direito Penal visa a manter quando incrimina, no art. 16 da Lei nº 7.492/86, a atividade de (ou equiparada a) instituição financeira sem autorização do órgão competente? É essa justamente a objetividade jurí-dica da norma penal tratada neste caso e que está sendo supostamente violada pela atividade desenvolvida pelos denunciados.

53. Se as demais bancas de jogo do bicho não contempladas com o “descarrego”, bem como os respectivos apostadores (clientes das bancas) – diretamente prejudicados com a ati-vidade de “descarrego” exercida em favor de outras bancas e outros apostadores – exercem uma atividade ilegal, não significa que a riqueza que circula nessa atividade esteja à margem do sistema financeiro. Há nessas atividades riqueza circulando e se de certa forma parte dos atores recebem alguma espécie de garantia (ainda que informal) em detri-mento de outros, a credibilidade do sistema financeiro resta obviamente atingida.

Page 271: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

271

54. Não se deslembre que os crimes descritos na Lei nº 7.492/86 são pluriofensivos, pois ofendem mais de um bem ou interesse jurídico: ofendem de forma direta e imediata a confiança que deve existir no sistema financeiro pátrio (interesse de toda a coletividade) e ofendem de forma indi-reta e mediata também interesses individuais, patrimoniais de pessoas físicas ou jurídicas. Por isso, o fato de serem prejudicados com o “descarrego” as demais bancas de jogo do bicho com aquela garantia não contempladas, bem como os respectivos apostadores (clientes das bancas) não desnatura, a meu sentir, a ofensa ao bem jurídico tutelado pelo art. 16 da Lei nº 7.492/86.

55. Assim, penso que não poder ser dada a “autorização” mencionada no art. 16 da Lei nº 7.492/86, nem em tese, no caso da atividade descrita na exordial (“descarrego” para as bancas de jogo do bicho), não afasta, ao contrário, confirma a violação àquele dispositivo legal, isto é, o importante não é se a atividade poderia ou não ter a autorização da SUSEP para ser exercida, mas que, na prática, essa autorização efetivamente não existe.

56. Penso que o ordenamento jurídico pátrio não deseje a existência de um sistema financeiro paralelo que possa acobertar, lastrear e fomentar financeiramente atividades supostamente ilícitas, desenvolvidas em vários casos por alegadas organizações criminosas e o tipo penal do art. 16 da Lei nº 7.492/86 existe justamente para punir essa prática.

57. A corroborar esse pensamento, veja-se, por exemplo, que ao Banco Central é vedado autorizar atividade de câm-bio exercida por pessoas físicas, somente podendo fazê-lo no que concerne àquelas desempenhadas por pessoas jurídicas. Por isso, a atividade de um doleiro (pessoa física) nunca seria autorizada pelo Banco Central, mas isso não afasta a possibilidade de ele cometer o crime em apreço, porque o foco é a atividade em si do agente, e não se po-deria ser ou não autorizada. Na prática, inclusive, importa frisar, os doleiros (pessoas físicas) são diuturnamente con-denados judicialmente pela prática do crime do art. 16 da Lei nº 7.492/86.

58. Assim, a resposta àquela segunda indagação posta no início desta decisão (se “somente é tipicamente relevante, em termos penais, para os fins do art. 16 da Lei nº 7.492/86,

Page 272: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

272

o exercício de atividade que, ao menos em tese, possa ser autorizada, ou também aquela que nem em tese o possa ser também perfaz a descrição típica invocada”) deve ser a de que a atividade que nem em tese possa ser autorizada pela SUSEP perfaz igualmente a descrição típica do art. 16 da Lei nº 7.492/86.

59. A vigorar essa conclusão, atenta, inclusive, à natureza da atividade do “descarrego”, que me parece não seja um mero apêndice do jogo do bicho, como de certa forma argumenta o ilustre órgão ministerial, reconhecendo-se a autonomia do “descarrego” frente à atividade contravencional do jogo desenvolvida pelos banqueiros, pode-se até mes-mo entrever a possibilidade de reduzir-se o estímulo à continuidade daquela atividade, que passa a ser enca-rada – como o deve ser – como atentatória ao sistema financeiro nacional, passível de punição na Justiça Federal.

60. Destaco que apesar de o pleito aparentemente ser somente de competência ou não da Justiça Federal, na verdade essa questão é decorrente de outra, pois, antes de discutir-se onde ela deva ser processada e julgada, está--se justamente a apreciar a própria tipicidade da conduta. Com efeito, acaso a conduta do “descarrego” não possa ser subsumida no art. 16 da Lei nº 7.492/86, ela simplesmente será atípica, ou poderia ser enquadrada no tipo penal con-travencional, como sugerido pelo MPF?

61. A análise da competência nestes autos é somente uma consequência da aferição da tipicidade, já que, afastando--se o tipo que atrai a competência da Justiça Federal os supostos delitos remanescentes deverão ser julgados pela Justiça Estadual e, portanto, declinados por este juízo.

62. A interpretação que a defesa e o Parquet desejam ver reconhecida ocasiona um reconhecimento, a meu ver, de que o sistema penal não pode punir a atividade securitária de atividades ilícitas, seja qual for, ou seja, atividades se-curitárias de tráfico de drogas, de grupos de extermínio, de jogo do bicho, dentre outros inimagináveis. Penso tratar-se de uma folha em branco para que o crime organizado pos-sa criar seus subsistemas financeiros e econômicos sem qualquer intervenção estatal.

63. Ocorre que esse entendimento vai de encontro frontal ao texto da norma (art. 16 da Lei nº 7.492/86) e indica uma

Page 273: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

273

interpretação textual e restritiva que foge claramente da intenção do legislador, de punir as condutas daqueles que violem o sistema financeiro nacional, sejam elas atividades que podem ser administrativamente autorizadas ou aquelas que sequer podem ser autorizadas, obviamente mais graves.

64. Com essas considerações, tenho por bem divergir do entendimento esposado pelas partes neste caso e manter o reconhecimento da competência deste Juízo Federal para a causa, na medida em que entendo que a descrição fática contida na denúncia perfaz, ao menos em tese, a ofensa ao art. 16 da Lei nº 7.492/86 e, por conseguinte, pela cone-xão, as demais imputações (inicialmente de competência estadual) restam atraídas para processamento e julgamento conjunto, neste feito, por este Juízo.

Liminar deferida às fls. 148/161.

Parecer do Ministério Público Federal pela denegação da ordem, assim ementado (fls. 139/142):

CONSTITUCIONAL. DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIME DA LEI Nº 7.492/86. COMPETÊNCIA FEDERAL. PELA DENEGAÇÃO DA OR-DEM. 1) A controvérsia gira em torno da fixação da competência na Justiça Federal ou na Justiça Estadual para processar e julgar a Ação penal nº 0001389-48.2015.4.05.8300, em virtude da conduta praticada pelo Paciente se enquadrar ou não no tipo do art. 16 da Lei nº 7.492/86.2) O habeas corpus é um remédio constitucional célere, em que a coação ou ato ilegal deve vir demonstrado de plano. Na via estreita deste writ não é permitido ao julgador esmiuçar os fatos.3) Se no curso da instrução processual ficar evidenciada que a competência para processar e julgar a ação penal citada não é da Justiça Federal, o feito será remetido para a Justiça Estadual, onde o Juízo então competente poderá ratificar todos os atos praticados.4) Opina o representante do Ministério Público Federal pela DENEGAÇÃO da ordem.

É o relatório.

Page 274: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

274

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE

LUNA FREIRE (Relator Convocado):

Há pouco a acrescentar ao exposto na decisão6 onde apreciei o pedido de liminar.

Os fatos narrados nos autos (atividade de “descarrego” de bancas de jogo do bicho) não se subsumem ao preceito incrimi-nador da norma penal (Lei nº 7.492/86), sendo inviável o uso da analogia em desfavor do réu.

Pelo exposto, em não se tratando de conduta típica, tem-se a incompetência da Justiça Federal.

Pela concessão da ordem de habeas corpus.

É o meu voto.

6 Denominada “descarrego” a atividade secundária e sucessiva das bancas de jogo do bicho onde há réplica de apostas ulteriores, com o propósito de se evitar quebre-se a banca anterior onde a aposta ocorreu.

A questão é de tipicidade a ser aferida. Sucede que o propósito, o móbil, a ação diz respeito a enquadrar o fato numa hipótese legal (subsunção e adequação) à hipótese de substância (subsunção do fato à regra).

Não consigo ver neste habeas corpus quadro de movimentação e possíveis operações a envolver no caso o suporte fático de uma conduta típica.

O que é finalístico é o intento a ação tida por impecável para os fins penais. O desfecho no caso, não apresenta, ainda, delitos contra a União no tocante à atividade financeira ou no tocante à pretendida equiparação à atividade securitária.

Quanto ao “descarrego” a reprodução ou disseminação de novas apostas não pode ser analógica. Assim nem se fale em seguros sucessivos.

Descarrego é uma gíria como carrego é uma gíria “carregada”. E atividade financeira a atrair interesse da União também não pode ser

considerada por típica fora da Lei 7.492/86. Até porque trata-se de jogo/aposta associada a jogos de azar em conceito concreto.

Pelo exposto, concedo a medida liminar para suspender o curso processual da Ação Penal n° 0001389-48.2015.4.05.8300.

Cientifique-se, com a máxima urgência, a autoridade impetrada. Intimem-se.

Page 275: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

275

REVISÃO CRIMINAL Nº 180-RN

Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGARequerente: WILSON GOMES BENTORequerido: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERALAdv./Proc.: DRA. HILANA MONTE CIPRIANO DA SILVA (REQTE.)

EMENTA: PENAL E PROCESSO PENAL. REVI-SÃO CRIMINAL. ROUBO QUALIFICADO. RÉU CONDENADO POR SEIS CRIMES DE ROUBO EM CONCURSO MATERIAL. CONDUTAS QUE OCORRERAM NAS MESMAS CIRCUNSTÂNCIAS DE TEMPO E LUGAR, UMA COMO CONTINUA-ÇÃO DA OUTRA. CONTRARIEDADE AO TEXTO EXPRESSO DO ARTIGO 71 DO CÓDIGO PENAL. - Na sentença rescindenda, o requerente restou condenado pela prática de 6 crimes de roubo qualificado (CP-157, § 2º, I e II) e um crime de formação de quadrilha (CP-288, parágrafo único), o que redundou numa pena de reclusão de 63 anos e 8 meses, haja vista o reconhecimento do concurso material.- Os seis crimes de roubo foram praticados nas mesmas condições de tempo e lugar e na se-quência de uma “invasão” à cidade de Touros, no Rio Grande do Norte: primeiro foram tomados de assalto dois carros; depois, as armas, algemas e coletes dos policiais que guarneciam a cidade; na sequência, um malote dos Correios em trans-porte e dinheiro em espécie, que se encontrava nas agências do Banco do Brasil e dos Correios; por fim, outro carro, para a fuga.- Continuidade delitiva reconhecida a partir dos fatos como considerados na sentença, sem a necessidade de reexame/reapreciação da prova.- Indeferem-se os pedidos de aplicação do prin-cípio da consunção, de negativa de autoria, de absolvição do crime de quadrilha e de erro na dosimetria da pena, pois a revisão criminal não se

Page 276: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

276

presta para reapreciar prova nem para uniformi-zar jurisprudência sobre questão controvertida, como pretende o autor. Precedentes: RVCR n° 136/SE; RVCR n° 143/PB.- Precedente deste Plenário: RVCR 160/RN, Re-lator: Desembargador Federal Fernando Braga, Pleno, DJe 14/02/2014.- Revisão criminal que se julga parcialmente pro-cedente, para refazer a totalização da pena com base no artigo 71, parágrafo único, do Código Penal, importando a pena revista em 29 anos de reclusão.

ACÓRDÃO

Decide o Pleno do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, julgar parcialmente procedente a revisão crimi-nal, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas que passam a integrar o presente julgado.

Recife, 12 de agosto de 2015. (Data do julgamento)

DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA - Relator

RELATÓRIOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO

BRAGA:

Trata-se de revisão criminal proposta por Wilson Gomes Bento, com base no artigo 621, I, do Código de Processo Penal, tendo por objetivo desconstituir a sentença proferida nos autos da Ação Penal n° 2003.84.00.002148-1, em que o requerente foi condena-do, em concurso material, pela prática dos crimes tipificados nos artigos 157, § 2º , I e II (roubo qualificado, por seis vezes), e 288, parágrafo único (formação de quadrilha), ambos do Código Penal, à pena concretizada de 63 anos e 8 meses de reclusão.

Nas suas razões, o requerente alega, em suma, que (i) o caso dos autos configura a hipótese de crime continuado. Pleiteia a (ii) aplicação do princípio da consunção em relação aos crimes de roubo qualificado do veículo “Ford/F-250”, armas, coletes e algemas

Page 277: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

277

policiais e o malote de dinheiro. Requer sua (iii) absolvição quanto ao crime de quadrilha, e o (iv) reconhecimento da não comprovação do crime de roubo qualificado do veículo “Saveiro”. Por fim, pede a (v) reanálise das circunstâncias judiciais (fls. 02/23).

Em parecer, a Procuradoria Regional da República da 5ª Região opinou pela improcedência do pedido de revisão às fls. 102/104.

É o relatório.

Ao eminente Revisor.

VOTOO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO

BRAGA (Relator):

O deslinde do presente recurso de apelação reside em perquirir se os fatos que levaram à condenação do requerente a 63 anos e oito meses de reclusão configuram o chamado crime continuado (art. 71 do CP).

Da leitura da denúncia (fls. 27/43), vê-se que os fatos se deram como desdobramento de uma única empreitada: invasão à sede do Município de Touros/RN e assalto a estabelecimentos bancários (ou equivalentes) ali localizados.

As seis condutas praticadas pelo requerente podem ser vistas como desdobramento (ou como etapas) de uma única ação (de roubo), na medida em que foram praticadas da mesma maneira – ameaça mediante o uso das mesmas armas de fogo e com o apoio dos mesmos agentes – e nas mesmas circunstâncias de lugar e tempo: note-se que o roubo do veículo Saveiro utilizado para a “invasão” da cidade se deu apenas duas semanas antes, e o veículo F-250 ocorreu no mesmo dia, com diferença de minutos.

Assim, mesmo sem a necessidade de reexaminar/reavaliar a prova produzida no âmbito do feito sob revisão, tomando os fatos como considerados na sentença, forçoso reconhecer que os mesmos reclamam a aplicação do artigo 71 do Código Penal, que assim dispõe:

Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omis-são, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e,

Page 278: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

278

pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

O reconhecimento do concurso material (em detrimento da continuidade delitiva) deu-se, ademais, em violação à literalidade do dispositivo transcrito, o que, por força do disposto no artigo 621, I, do Código de Processo Penal, autoriza a revisão.

Desse modo, considerando que o caso se amolda à hipótese do parágrafo único do artigo 71 do CP, haja vista se tratar de crimes dolosos com grave ameaça à pessoa, cometidos contra vítimas diferentes, tomo a pena aplicada ao “roubo do malote da ECT” – a mais grave – e a dobro, por se tratar de seis condutas.

Nesse sentido, colaciono os seguintes precedentes judiciais:PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. ROUBO QUALIFICADO. RÉU CONDENADO POR SEIS CRIMES DE ROUBO EM CONCURSO MATERIAL. CON-DUTAS QUE OCORRERAM NAS MESMAS CIRCUNS-TÂNCIAS DE TEMPO E LUGAR, UMA COMO CONTI-NUAÇÃO DA OUTRA. CONTRARIEDADE AO TEXTO EXPRESSO DO ARTIGO 71 DO CÓDIGO PENAL.1. Na sentença rescindenda, o requerente restou con-denado pela prática de 6 crimes de roubo qualificado (CP-157, parágrafo 2º, I e II) e um crime de formação de quadrilha (CP-288, parágrafo único), o que redundou numa pena de reclusão de 63 anos e 8 meses, haja vista o reconhecimento do concurso material.2. Os seis crimes de roubo foram praticados nas mes-mas condições de tempo e lugar e na sequência de uma “invasão” à cidade de Touros, no Rio Grande do Norte: primeiro foram tomados de assalto dois carros; depois, as armas, algemas e coletes dos policiais que guarne-ciam a cidade; na sequência, um malote dos Correios em transporte e dinheiro em espécie, que se encontrava nas agências do Banco do Brasil e dos Correios; por fim, outro carro, para a fuga.3. Continuidade delitiva reconhecida a partir dos fatos como considerados na sentença, sem a necessidade de reexame/reapreciação da prova.

Page 279: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

279

4. Indefiro os pedidos de aplicação do princípio da con-sunção, de negativa de autoria, de absolvição do crime de quadrilha e de erro na dosimetria da pena, pois a revisão criminal não se presta para reapreciar prova nem para uniformizar jurisprudência sobre questão controvertida, como pretende o autor. Precedentes deste Plenário: RVCR n° 136/SE; RVCR n° 143/PB.5. Revisão criminal que se julga parcialmente procedente, para refazer a totalização da pena com base no artigo 71, parágrafo único, do Código Penal, importando a pena revista em 29 anos e dois meses de reclusão.(TRF da 5ª Região. RVCR 160/RN, Relator: Desembar-gador Federal Fernando Braga, Pleno, DJe 14/02/2014).

Indefiro os demais pedidos (aplicação do princípio da con-sunção; negativa de autoria; absolvição do crime de quadrilha; erro na dosimetria da pena). A revisão criminal não se presta para reapreciar prova nem para uniformizar jurisprudência sobre ques-tão controvertida (Precedentes deste Plenário: RVCR n° 136/SE; RVCR n° 143/PB), como pretende o autor.

Posto isso, julgo parcialmente procedente a revisão criminal, para corrigir a condenação do requerente para 24 anos de re-clusão, pelos seis crimes de roubo praticados em continuidade delitiva, a qual deve ser somada àquela aplicada para o crime de quadrilha – reclusão, de 5 anos –, totalizando uma pena de 29 anos de reclusão.

É como voto.

Page 280: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,
Page 281: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

ÍNDICE SISTEMÁTICO

Page 282: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,
Page 283: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

283

JURISPRUDÊNCIA

AÇÃO PENAL

148-PE Rel. Des. Federal Roberto Machado..................... 13

AGRAVO DE INSTRUMENTO

125844-SE Rel. Des. Federal Ivan Lira de Carvalho (Convo- cado) ..................................................................... 26

APELAÇÃO / REEXAME NECESSÁRIO

11239-CE Rel. Des. Federal Ivan Lira de Carvalho (Convo- cado) ..................................................................... 3430933-CE Rel. Des. Federal Alcides Saldanha (Convocado) . 4331321-CE Rel. Des. Federal Manoel de Oliveira Erhardt ...... 5032243-AL Rel. Des. Federal Paulo Machado Cordeiro ......... 6132247-PB Rel. Des. Federal Rubens de Mendonça Canuto (Convocado).......................................................... 7232359-PB Rel. Des. Federal Cid Marconi .............................. 8532406-PE Rel. Des. Federal Paulo Machado Cordeiro ......... 9232442-CE Rel. Des. Federal Cid Marconi ............................ 102

APELAÇÃO CÍVEL

564949-AL Rel. Des. Federal Vladimir Souza Carvalho ........ 110576505-CE Rel. Des. Federal Lázaro Guimarães.................. 118578251-PE Rel. Des. Federal Alexandre Luna Freira (Convo- cado) ................................................................... 126579523-CE Rel. Des. Federal Rubens de Mendonça Canuto (Convocado)........................................................ 133579788-SE Rel. Des. Federal Manoel de Oliveira Erhardt .... 140580073-SE Rel. Des. Federal Edilson Pereira Nobre Júnior .. 149582236-CE Rel. Des. Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima.158

Page 284: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

284

APELAÇÃO CRIMINAL

11654-RN Rel. Des. Federal Rogério Fialho Moreira........... 16411821-SE Rel. Des. Federal Lázaro Guimarães.................. 17612301-PE Rel. Des. Federal Edilson Pereira Nobre Júnior .. 184

EMBARGOS INFRINGENTES NA AÇÃO RESCISÓRIA

6898-PE Rel. Des. Federal Fernando Braga ..................... 198

EMBARGOS INFRINGENTES NA APELAÇÃO CÍVEL

529944-SE Rel. Des. Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima.209551125-PB Rel. Des. Federal Roberto Machado................... 222

EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO (PLENO)

861-RN Rel. Des. Federal Emiliano Zapata Leitão (Convo- cado) ................................................................... 233

HABEAS CORPUS

5875-RN Rel. Des. Federal Carlos Rebêlo Júnior (Convo- cado) ................................................................... 2405915-CE Rel. Des. Federal Carlos Rebêlo Júnior (Convo- cado) ................................................................... 2475959-PE Rel. Des. Federal Alexandre Luna Freira (Convo- cado) ................................................................... 254

REVISÃO CRIMINAL

180-RN Rel. Des. Federal Fernando Braga ..................... 275

Page 285: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

ÍNDICE ANALÍTICO

Page 286: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,
Page 287: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

287

A

Adm, Cv e PrCv Ação de usucapião. Compromisso de com-pra e venda de imóvel não formalizado. Pagamento de parcelas da avença. Bem pertencente ao antigo IAPECT, sucedido pelo INSS. Impossibilidade de usucapir bem público. Inocorrência na espécie. Manutenção da sentença de procedência da aquisição da prescrição aquisitiva de propriedade em favor dos particulares.

APELREEX 32406-PE ...............................92

Cv Ação Declaratória de Nulidade de Registro de Imóvel c/c Nulidade de Escritura Pública, reintegração de posse e desfazimento de obras e construções indevidas. Impossibi-lidade de decretação da nulidade por atingir terceiro de boa-fé que já preencheu as con-dições de usucapião do imóvel. Disciplina do art. 214, § 5º, da Lei de Registros Públi-

cos. Apelo improvido. AC 576505-CE .......118

Ct e Pen Apelações criminais. Art. 273, §§ 1º e 2º, do Código Penal. Aplicação a terceiros, por profissionais da medicina, da toxina fine tox. Inexistência de registro pela ANVISA. Não demonstração de que tal produto tem, em tese, aptidão para provocar prejuízo à saúde humana. Ausência de tipicidade. Provimento da apelação do acusado e improvimento do apelo da acusação. ACR

12301-PE ...................................................184

Prev Aposentadoria por invalidez. Amputação trau-mática. Antebraço direito. Ausência de perícia judiciária. Utilização de atestados médicos apresentados pelo segurado. Admissibilidade.

Page 288: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

288

Incapacidade laborativa comprovada. Conces-são do benefício. Termo inicial. Requerimento administrativo. Juros de mora a contar da

citação. APELREEX 32442-CE ....................102

PrCv Atendimento imediato às pessoas portado-ras de deficiência, idosos de sessenta anos, gestantes, lactantes e pessoas acompanha-das por crianças de colo. Sentença profe-rida nos autos da ação principal. Mesmo sentido da decisão liminar modificada pelo Tribunal. Não ocorrência da perda do objeto. Razoabilidade. Dificuldade logística. AGTR

125844-SE .................................................26

Adm Ato de demissão do Ministério da Saúde. Recurso de apelação da demandante, ante sentença que julga ação visando anular ato de demissão do Ministério da Saúde, na defesa de que exercia apenas na Sociedade Privada Fio de Cabelo Armarinho Ltda. a atividade de cabeleireira fora do horário de

expediente. AC 564949-AL ........................110

B

PrCv e Trbt Bem de propriedade de terceiro. Descons-tituição da penhora. Embargos de terceiro. Cerceamento de defesa. Inocorrência. AC

578251-PE .................................................126

C

Amb Cautelar preparatória de ação civil pública. Obras no Manaíra Shopping, às margens do Rio Jaguaribe/PB. Legislação que não preservava área antropizada. Novo Código Florestal. Inaplicabilidade. Perigo da demora.

Não demonstração. EINFAC 551125-PB ....222

Page 289: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

289

Pen e PrPen Concessão de pensão vitalícia. Estelionato. Casamento realizado perante tabelião sem o cumprimento de todas as formalidades legais. Nubente em situação de iminente perigo de vida. Neoplasia maligna com metástase para pulmão e ossos em estado avançado. Casamento nuncupativo. Dispen-sa de maiores formalidades. Declaração de domicílio como meio para viabilizar o proce-dimento formal do casamento. Ausência de potencialidade lesiva. Aplicação do princípio da consunção. Provimento às apelações

dos réus. ACR 11654-RN ..........................164

Adm e PrCv Concurso público. Candidatos aprovados dentro do número de vagas ofertadas no edital. Lei de Responsabilidade Fiscal. Superação dos limites orçamentários im-postos. Não comprovação. Responsabiliza-ção do administrador, não dos candidatos. Ofensa ao Princípio da Proporcionalidade

(Exigibilidade). EINFAR 6898-PE ..............198

Adm Contrato temporário. Motorista contratado pelo Exército para a construção da BR-101. Lei nº 8.745/93. Adicional de insalubridade. Laudo pericial. Inexistência. Horas extras. Intervalo intrajornada. Compensação. Pos-sibilidade. Honorários advocatícios. Súmula

111 do STJ. APELREEX 32359-PB ...........85

Trbt Contribuições previdenciárias. Requisito de validade da CDA. INCRA. Empresa ur-bana: tema julgado segundo o regime de recursos repetitivos. Apelação improvida.

AC 580073-SE ...........................................149

Page 290: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

290

PrPen Crime de uso de documento falso. Estran-geiro foragido. Condenado por outro crime – tráfico ilícito de entorpecentes. Ordem

denegada. HC 5915-CE ............................247

D

Amb Dano ambiental. Imóvel construído em área de preservação permanente (área estuari-na). Município de Fortaleza/CE. Responsa-bilidade objetiva. Fiscalização em área de perímetro urbano. Dano. Fato incontroverso. Condenação. Possibilidade. Demolição do imóvel com retirada do morador. Inserção em programa de habitação popular. Multa. Redução. Razoabilidade e proporcionalida-

de. AC 579523-CE .....................................133

Cv Danos emergentes. Indenização. Ausência de comprovação. Juros compensatórios e lucros cessantes. Possibilidade de cumula-ção. Lucros cessantes. Responsabilidade objetiva configurada. Cálculo. Dedução de despesas. Honorários advocatícios. Sucum-bência recíproca. Compensação. Apelação do particular improvida. Apelação do DNIT e remessa oficial parcialmente providas.

APELREEX 30933-CE ..............................43

Ct, Pen e PrPen “Descarrego” de banca de jogo do bicho. Crime contra o Sistema Financeiro Nacio-nal (Art. 16, Lei 7.492/86). Equiparação à atividade securitária. Impossibilidade. Atipi-cidade da conduta. Concessão da ordem.

HC 5959-PE ..............................................254

Pen e PrPen Desenvolvimento clandestino de ativida-des de telecomunicações. Exploração de serviços de internet sem autorização da

Page 291: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

291

ANATEL. Constitucionalidade do tipo pe-nal. Materialidade e autoria comprovadas. Crime formal e de perigo abstrato. Emissão de radiação restrita. Atividade extrapola os limites de uma mesma edificação. Interes-se coletivo. Necessidade de autorização. Reforma da sentença para condenar o réu. Dosimetria da pena. Ausência de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Pena-base fixada no mínimo legal. 2 (dois) anos de detenção. Atenuante de confissão espontânea. Impossibilidade de redução da pena aquém do mínimo legal. Súmula 231 do Superior Tribunal de Justiça. Pena de multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Substituição da pena privativa de liberdade por duas restritivas de direitos. Regime ini-cial de cumprimento de pena: aberto. Apelo

provido. ACR 11821-SE .............................176

Cv Doença ocupacional. LER - Lesão por Es-forço Repetitivo. Responsabilidade civil. Da-nos materiais e morais. Agravo retido. Nova perícia. Dispensável. Nexo de causalidade. Inexistente. Ausência do dever de indenizar.

AC 579788-SE ...........................................140

E

PrCv Exceção de suspeição. Juízes membros de Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais. Julgamento. Competência do Tribunal Regional Federal. Aplicação do rito dos feitos representativos de controvérsia. Analogia ao disposto nos arts. 14 e 15 da Lei nº 10.259/01. Cabimento. Tentativa de utilização da exceção de suspeição como sucedâneo recursal. Rejeição. EXSUSPPL

861-RN ......................................................233

Page 292: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

292

PrPen Execução penal. Prestação de serviço à comunidade. Execução que está em conformidade com as condições pessoais da apenada. Art. 148 da Lei de Execução Penal. Modificação do local da execução. Impossibilidade. Ordem denegada. HC

5875-RN ....................................................240

I

Cv e Adm Intervenção restritiva e não supressiva da propriedade. Ocupação temporária de pequena parte do imóvel por máquinas e operários. Responsabilidade civil extra--contratual e intervenção do Estado na propriedade. Danos materiais em imóvel contíguo a rodovia federal em duplicação. Soterramento de área de lazer por águas pluviais que passaram a escoar com maior intensidade após a obra de duplicação. Piscina de alvenaria. Única benfeitoria dete-riorada. Apuração por perícia. Laudo omis-so quanto ao custo da mão de obra para reconstrução dessa benfeitoria. Acréscimo na condenação. Necessidade. Apuração do quantum em liquidação. Pleito indenizatório. Improcedência. Servidão administrativa. Caracterização. Construção de lagoas de contenção e canaletas de escoamento dentro do imóvel privado. Restrição de gozo do domínio. Indenização. Necessidade. Apuração em liquidação por artigos. Res-sarcimento por danos morais. Procedência. Instituição de duas obrigações de fazer à União pela sentença: (i) restabelecimento do fluxo de água de fonte existente no imó-vel e (ii) reparação de canaletas de escoa-mento e lagoas de contenção. Manutenção

que se impõe. APELREEX 32247-PB .......72

Page 293: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

293

M

Pen e PrPen Modificação de materiais previstos no convê-nio. Devolução de valores espontaneamente. Execução a contento. Construção de 4 passa-gens molhadas na zona rural. Convênio que não previa a localização das obras. Meras irregularidades. Princípio da Insignificância.

Aplicabilidade. APE 148-PE ......................... 13

P

Ct e Adm Prestação do serviço público de saúde. Omissão. Responsabilidade subjetiva do Estado. Culpa do Estado de Alagoas con-figurada. Indenização por danos morais. Manutenção do quantum indenizatório. Inexistência de nexo causal quanto à Uni-versidade Federal de Alagoas. APELREEX

32243-AL ...................................................61

Adm Pretenso cometimento de improbidade administrativa por violação aos princípios da Administração Pública. Sucessivas pror-rogações de contrato, não justificadas, por tempo superior ao permitido e com inclusão de serviços não originalmente previstos. Ausência, todavia, de má-fé. Embargos

improvidos. EINFAC 529944-SE ...............209

R

Prev e PrCv Revisão de benefício de aposentadoria por tempo de serviço de ex-combatente. Data de início de benefício há mais de 40 anos. Legitimidade passiva. INSS. Prescrição. Segurança jurídica. Tutela antecipada. Cabimento. Condenação em verba sucum-bencial. Remessa e apelação não providas.

APELREEX 11239-CE ...............................34

Page 294: REVISTA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 5ª REGIÃO … · 2015-10-29 · o Ministério da Integração Nacional, ... MPF ofereceu denúncia contra ANTÔNIO ZILCLÉCIO PINTO SARAIVA,

294

Pen e PrPen Roubo qualificado. Réu condenado por seis crimes de roubo em concurso mate-rial. Condutas que ocorreram nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, uma como continuação da outra. Contrariedade ao tex-to expresso do artigo 71 do Código Penal.

RVCR 180-RN ...........................................275

S

PrCv, Eleitoral Suspensão de direitos políticos. Ação in-denizatória. Danos morais. Sentença penal condenatória. Restabelecimento. Transfe-rência de título. Impossibilidade. Decurso do prazo. Culpa concorrente. APELREEX

31321-CE ..................................................50

V

Cv e PrCv Vícios em imóvel. Danos não cobertos pela apólice. Improcedência dos pedidos formu-lados na inicial. Provimento da apelação da

CEF. AC 582236-CE ..................................158

e Cv